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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ RICARDO CALLADO DE OLIVEIRA A JUSTA CAUSA COMO GARANTIA DE UM PROCESSO JUSTO São José 2010

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

RICARDO CALLADO DE OLIVEIRA

A JUSTA CAUSA COMO GARANTIA DE UM PROCESSO JUSTO

São José

2010

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RICARDO CALLADO DE OLIVEIRA

A JUSTA CAUSA COMO GARANTIA DE UM PROCESSO JUSTO

Dissertação submetida como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Direito, da Universidade do Vale do Itajaí.

Orientador: Prof.º Dr. Gilberto Callado de Oliveira

São José 2010

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TERMO DE INSENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade

pelo aporte ideológico e referencial conferido a esse trabalho científico, isentando a

Universidade do Vale do Itajaí, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca

Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca da

monografia.

Florianópolis/SC, maio de 2010.

Ricardo Callado de Oliveira

Orientando

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Dedico a Deus,

pela oportunidade de ter uma vida.

Aos meus pais pelo apoio integral em todos os

momentos desta longa caminhada.

Aos meus irmãos, amigos e a toda a minha família,

que, com muito carinho, não mediram esforços para

que eu chegasse ao fim de mais uma etapa em

minha caminhada.

Ao professor orientador, Dr. Gilberto Callado de

Oliveira, pelo apoio e encorajamento contínuos na

pesquisa.

Aos demais mestres desta instituição pelo

conhecimento transmitido.

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RESUMO

O processo penal é o único meio para obter uma pena através do poder

judiciário. Sendo um elemento incriminador forma-se um dos institutos mais

complexos enfrentados pela sociedade para se fazer justiça, pois busca uma justiça

entre dois direitos concorrentes. O direito de acusar contra o direito de defesa, o

primeiro é a acusação condicionada ao delito e o segundo a defesa igualitária com

enfoque de relevância social. Nessa idéia, a justa causa forma o intermédio

necessário à propositura da ação penal ao ponto que deve ser estudada juntamente

com as condições da ação. No mesmo compasso, o objetivo do presente trabalho é

abordar um estudo criterioso da justa causa como elemento necessário à proposição

da ação penal, que hoje conquistou um espaço reservado no código de processo

penal, para descrever desde a sua definição comum até o seu verdadeiro significado

jurídico delineando sua expressão normativa processual penal.

Palavras-chave: justa causa, garantia, subjetividade.

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RESUMEN

La acusación es el único medio para obtener una sanción por el poder

judicial. Siendo un elemento condenatorio formó un complejo de institutos que se

enfrenta la sociedad para hacer justicia, ya que busca una justicia entre dos

derechos concurrentes. El derecho de reclamar por el derecho de defensa, la fiscalía

primera está condicionada por la segunda ofensa y defensa con el mismo énfasis en

la pertinencia social. En esta idea, una causa justa la manera mediante la iniciación

de la acción penal correspondiente al punto que debe estudiarse junto con las

condiciones de la acción. El objetivo de este estudio es analizar un estudio

cuidadoso de la causa como un elemento necesario a la proposición de la acción

penal, que hoy ganó un marcador de posición en el código de procedimiento penal

para describir desde su definición común de su significado legal real esbozar su

expresión normas de procedimiento penal.

Palabras claves: causa, la seguridad, la subjetividad.

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SUMÁRIO

RESUMO......................................................................................................................5 RESUMEN....................................................................................................................6 INTRODUÇÂO.............................................................................................................9

1 AÇÃO PENAL........................................................................................................11

1.1 NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO DE AÇÃO...............................................11 1.2 CONCEITO ......................................................................................................13 1.3 AÇÃO PENAL PÚBLICA ..................................................................................14

1.3.1 Titularidade..............................................................................................15 1.3.2 Princípios aplicados à ação penal pública...........................................15 1.3.2.1 Princípio da oficialidade......................................................................15 1.3.2.2 Princípio da obrigatoriedade...............................................................16 1.3.2.3 Princípio da indisponibilidade .............................................................17 1.3.2.4 Princípio da intranscendência ............................................................17 1.3.2.5 Princípio da indivisibilidade ................................................................18 1.3.2.6 Princípio da divisibilidade ...................................................................18 1.3.3 Ação penal pública incondicionada......................................................19 1.3.4 Ação penal pública condicionada.........................................................19 1.3.4.1 Representação do ofendido ou de seu representante legal ...............20 1.3.4.2 Titularidade da representação............................................................21 1.3.4.3 Forma de fazer a representação ........................................................23 1.3.4.4 A quem se dirige a representação......................................................23 1.3.4.5 Prazo para oferecer a representação.................................................23 1.3.4.6 Retratação..........................................................................................24 1.3.4.7 Renúncia a representação .................................................................25 1.3.4.8 Requisição do Ministro da Justiça ......................................................25

1.4 CONCEITO DE AÇÃO PENAL PRIVADA.........................................................26 1.4.1 Princípios aplicados à ação penal privada...........................................27 1.4.1.1 Princípio da oportunidade...................................................................27 1.4.1.2 Princípio da disponibilidade................................................................27

1.4.1.2.1 Do perdão......................................................................................28 1.4.1.2.2 Decadência ...................................................................................29 1.4.1.2.3 Da perempção...............................................................................30 1.4.1.2.4 Da renúncia ...................................................................................30

1.4.1.3 Princípio da intranscendência .............................................................31 1.4.1.4 Princípio da indivisibilidade .................................................................32 1.4.2 Titularidade da ação penal privada.......................................................31 1.4.3 Requerimento do titular da ação penal privada ..................................32 1.4.4 Espécies de ação penal privada ..........................................................32 1.4.4.1 Ação Privada Exclusiva .......................................................................35 1.4.4.2 Ação Privada Personalíssima..............................................................35 1.4.4.3 Ação penal privada subsidiária da pública ..........................................36

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2 CONDIÇÕES DA AÇÃO........................................................................................38

2.1 LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO .......................................................................38 2.2 LEGITIMIDADE .....................................................................................................43 2.3 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.....................................................................45 2.4 INTERESSE DE AGIR.............................................................................................48 2.5 CONDIÇÕES ESPECÍFICAS OU DE PROCEDIBILIDADE ................................................50

3 A JUSTA CAUSA NA AÇÃO PENAL CONDENATÓRIA .....................................52

3.1 DA REJEIÇÃO DA DENÚNCIA OU QUEIXA..................................................................52 3.2 HISTÓRIA DA JUSTA CAUSA...................................................................................55 3.3 CONCEITO DE JUSTA CAUSA .................................................................................58 3.4 JUSTA CAUSA COMO INTERESSE DE AGIR ...............................................................60 3.5 JUSTA CAUSA COMO QUARTA CONDIÇÃO DA AÇÃO ..................................................62 3.6 JUSTA CAUSA COMO BASE DA AÇÃO PENAL ............................................................63

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................72

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................74

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INTRODUÇÃO

A ação penal é um dos institutos aplicados em nosso ordenamento

jurídico decorre do direito de ação em nossa Constituição Federal em seu artigo 5º,

inciso XXXV que dispõe “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão

ou ameaça a direito”.

Sendo certo, que para a ação penal possuir a qualidade acusatória

adequada à aplicar uma pena é necessária desde seu início que exista uma justa

causa para perfectibilização desse direito, capaz de suprir garantias como direito à

inviolabilidade da honra, da vida privada originando um conflito de interesses entre

partes sem que haja possibilidade de conciliação, salvo raras exceções.

A existência da justa causa para a ação penal adquiriu um espaço

peculiar com a entrada em vigor da lei 11.719, como um elemento autônomo ao

instituto acusatório.

Propõe-se uma análise criteriosa das condições da ação Penal

examinando as principais teorias arguidas pela corrente doutrinária, bem como pelo

nosso ordenamento jurídico processual penal.

Para tanto devemos entender qual a finalidade da ação penal

demonstrada através de um aspecto histórico da tutela jurisdicional com intuito de

inferir os requisitos necessários que compõem as condições da ação, sem as quais

não se perfectibiliza a denúncia ou queixa.

Muito embora exijam-se as condições de ação como requisitos

necessários para obter uma decisão de mérito, hoje, como se verá, a decisão de

mérito pode ser proferida sumariamente. Assim a ligação existente entre o direito de

ação e o pedido de condenação é um instrumento que pressupõe existência de três

condições conhecidas como legitimidade de parte, interesse de agir e possibilidade

jurídica do pedido.

Há, ainda, alguns doutrinadores que atribuem uma outra condição

conhecida como justa causa, que por ora se confunde como uma condição da ação,

senão também, como todas as condições existentes, porquanto são elementos

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materiais definidos como indícios de uma infração penal.

Desde já vale aferir que a ausência de quaisquer condições da ação

resulta em carência, seja com força de mérito ou não.

A necessidade de abordar o tema, é de grande relevância, em razão das

divergências encontradas na doutrina e na jurisprudência que, sustentam a

necessidade de justa causa como fundamento para a instauração da ação penal,

sob pena de seu trancamento, via habeas corpus.

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1 AÇÃO PENAL

1.1 NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO DE AÇÃO

A fim de tornar possível um estudo da justa causa na ação penal,

necessário tratá-la relacionado-a com conceitos previstos no código penal, no código

de processo penal, na doutrina e na jurisprudência.

Para tanto, começo a especificar a natureza jurídica do direito de ação e

depois quais as características que possui a ação penal, para após, definir os tipos

de ação penal junto às normas penais e processuais no sistema jurídico brasileiro.

Muitas são as teorias que definem a natureza jurídica do direito de ação.

A primeira, a teoria civilista do direito de agir, criada por Savigny, visando a ação

como o próprio conflito discutido em juízo, ou seja, o bem jurídico tutelado levado ao

conhecimento do juiz era incorporado com o instrumento processual que o cidadão

tinha para demandar este bem.1

Depois Windscheid e Muther, relatados por Rangel, descreveram falhas

na teoria civilista, e puderam criticá-la. Enquanto o primeiro criou a pretensão, o

segundo mostrou a distinção entre o direito material e o direito de ação, porquanto

fora vedada a auto-tutela. 2

Posteriormente, Adolph Wach, referenciados por Tourinho, mostrou a

autonomia da ação formada com a procedência da pretensão punitiva levada a

conhecimento do juiz. O direito de ação existiria somente quando houvesse

condenação favorável, tornando a natureza da ação em direito concreto ou

secundário, pois se não fosse procedente o pedido de condenação não existiria a

ação.3

A partir dessa conjetura surgiu outra teoria analisando a ação como um

direito autônomo, conhecida como a teoria do direito potestativo. Fundamentou-se

que a ação era oposta contra o réu e não contra o Estado, pois este tinha o poder de

1 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 212. 2 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 213. 3 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 298/299.

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coagir o delinquente perante o juízo para provar a sua inocência.4

Chiovenda, criador da teoria do direito potestativo, citado por Rangel,

assim define5:

A ação é um poder que nos assiste em face do adversário em relação a quem se produz o efeito jurídico da atuação da lei. O adversário não é obrigado a coisa nenhuma diante desse poder: simplesmente lhe será sujeito. Com seu próprio exercício exaure-se a ação, sem que seu adversário nada possa fazer, quer para impedi-la, que para satisfazê-la. Sua natureza é privada ou pública, consoante a vontade da lei, cuja atuação determina, seja de natureza privada ou pública.

Muito embora essas teorias repercutissem em sua época, no fim do

século XIX Plòsz e Degenkold, Tourinho tomou como parâmetro ao passo que,

tiveram grande influência, sustentando o direito abstrato do direito de ação.

Suscitaram a ação como um direito público, subjetivo, abstrato, genérico e

indeterminado perdurando até o nosso tempo.6

Por caráter público “[...] a atividade jurisdicional que se pretende provocar

é de natureza pública.” 7 São normas públicas que definem a competência para o

sujeito processual legal conduzir a ação penal perante o Estado, único sujeito

processual que pode aplicar pena.

Já por direito subjetivo, Paulo Rangel delibera a ação sendo “[...] inerente

a cada indivíduo [...]”. 8 Isto porque no nosso sistema normativo há dois sujeitos

processuais que podem propor a ação penal, o Ministério Público e o ofendido ou

seu representante, quando possível. Logo, existem normas e princípios próprios

para cada sujeito processual que diferenciam o modo que cada um propõe a ação

perante o judiciário.

Como direito autônomo entende-se que a formação da ação penal não

depende do direito penal objurgado, pois nosso sistema adotou o sistema dualístico,

ao passo que a autonomia da ação decorre de legislação própria sem qualquer

relação com o direito penal propriamente dito. 9

4RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 213. 5 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 213. 6 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 297. 7 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 113. 8 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 214 9 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 145.

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Destarte, parte da doutrina aponta a ação penal como um verdadeiro

direito concreto, enquanto outra, aponta a ação penal como direito abstrato, onde

Mougenot afirma que o direito de ação decorre de legislação própria distinta do

direito penal material, pois está fundada na Constituição Federal. Sustenta-se que o

direito em ver o Poder Judiciário se pronunciar não decorre de um direito material

objurgado, mas sim de um direito constitucional independentemente da resolução do

mérito na questão.10

Tourinho, ao trabalhar o direito da ação no plano processual, assim

explica:

“[...] quando o Juiz penal proclama, na sentença, que não houve crime, ou que o fato que se imputa ao réu não constitui crime, deixou, por acaso, de existir o direito de ação? Porventura ele não se fez presente? Houve o efetivo exercício do direito de ação, mas a pretensão deduzida não tinha fundamento.” 11

Conclui-se que o processo é o instrumento principal para satisfação de

uma pretensão pelo direito desobedecido, feita através da acusação, que só pode

ser exercida através da ação, independentemente da violação do direito material; do

contrário seria dizer que existiria ação penal quando existisse a comprovação do fato

delituoso que somente é reconhecido com a prolação da sentença criminal.

1.2 CONCEITO

São diversas as formas como os doutrinadores tratam o conceito da ação

penal. Fernando Capez assim define:

É o direito de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a um caso concreto. É também o direto público subjetivo do Estado-Administração, único titular do poder-dever de punir, de pleitear ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo, com a consequente satisfação da pretensão punitiva.12

Na mesma concepção, Tourinho Filho entende a ação penal como “o

direito de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do Direito Penal objetivo. Ou o direito de

10 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 145. 11 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 306. 12 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 111.

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pedir ao Estado-Juiz uma decisão sobre um fato penalmente relevante.” 13

Paulo Rangel define como “[...] um direito que serve de instrumento para

se exigir do Estado a prestação jurisdicional, independentemente da existência ou

não do direito material que irá se discutir em juízo. A ação é um direito autônomo.”

A partir desses conceitos se estabeleceu que a ação penal é um regular

exercício do direito, sendo favorável quando houver necessidade da aplicação da lei

penal a um caso concreto através do membro competente. E nosso sistema foi

instituído autores para a ação penal, dividindo-a em ação penal pública e ação penal

privada. 14

1.3 AÇÃO PENAL PÚBLICA

A ação penal é denominada pública por meio da legislação que possui

natureza pública. Logo, quando a lei não determinar que seja o ofendido a parte

legítima para acusar, o Estado é o legitimado para oferecer acusação, por meio do

órgão do Ministério Público segundo artigo 100, caput do Código Penal que diz “Art.

100. A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa

do ofendido.” 15

Outra regra para ação penal pública está prevista no artigo 24, § 2º do

Código de Processo Penal, que descreve a ação penal de iniciativa pública quanto

aos crimes praticados em detrimento do patrimônio público ou interesse da União,

Estado e Município.16

Destarte, podemos ver que a regra do nosso ordenamento jurídico é que

a ação penal é pública, existindo excepcionalmente a legitimidade ao ofendido para

alguns crimes, e mesmo que a tipificação legal a condicione à representação ou

requisição do Ministro da Justiça a ação ainda será pública.

Contudo, nosso legislador dividiu as ações em pública condicionada e

13 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 307. 14 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 15 BRASIL. Código Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 16 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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incondicionada por uma questão de relevância social em detrimento a determinado

tipo penal. Isto porque Pacelli diz:

Trata-se de proteção da vítima de determinados crimes contra os deletérios efeitos que, eventualmente, podem vir a ser causados pela divulgação pública do fato. Por isso, em razão do que a doutrina convencionou chamar de strepitus iudicii (escândalo provocado pelo ajuizamento da ação penal), reserva-se a ela o juízo de oportunidade e conveniência da instauração da ação penal, com o objetivo de evitar a produção de novos danos em seu patrimônio – moral, social, psicológico etc. – diante de possível repercussão negativa trazida pelo conhecimento generalizado do fato criminoso.17

Por fim, Capez entende como uma “[...] razão exclusiva política criminal.

Há crimes que ofendem sobremaneira a estrutura social e, por conseguinte, o

interesse geral. Por isso, são puníveis mediante ação pública incondicionada.”18

1.3.1 Titularidade

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 atribui a

competência exclusiva do Ministério Público por meio dos seus órgãos para exercer

a ação penal pública. Sendo assim, deve ele acompanhar todo o curso do processo

até o trânsito em julgado da ação, valendo-se de toda a sua prerrogativa prevista no

processo penal.19

1.3.2 Princípios aplicados à ação penal pública

1.3.2.1 Princípio da oficialidade

Esse princípio garante que a ação penal de iniciativa pública somente

poderá ser proposta através de órgão oficial para exercer a ação penal pelo Estado,

isto é o Ministério Público, sempre pelo convencimento dos órgãos, mediante a

17 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 13. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010. p. 149. 18 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 112. 19 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 166.

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existência da justa causa, tema dessa pesquisa científica. 20

Esse princípio encontra-se disciplinado na Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 129, I, que garante como função

institucional do Ministério Público “[...] promover, privativamente, a ação penal

pública, na forma da lei,” 21

Exceção à regra, caberá ação privada nos crimes de ação pública

quando o órgão ministerial não a promove no prazo legal, segundo artigo 29 do

código de processo penal, recepicionado pela Constituição da República Federativa

do Brasil de 1988 no art. 5, LIX que diz “ [...] será admitida ação privada nos crimes

de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal;”. 22

1.3.2.2 Princípio da obrigatoriedade

Há obrigatoriedade do Ministério Público para oferecer denúncia quando

existentes a materialidade do delito e indícios de autoria suficientes para amparar a

acusação. Deve exercer-se o poder dever da ação.23

Corroborando com o entendimento acima, Capez:

“No Brasil, quanto à ação penal pública, vigora o princípio da legalidade , ou obrigatoriedade, impondo ao órgão do Ministério Público, dada a natureza indisponível do objeto da relação jurídica material, a sua propositura, sempre que a hipótese preencher os requisitos mínimos exigidos. Não cabe a ele adotar critérios de política ou de utilidade social.”24

Exceção à regra é quando o Promotor de Justiça entenda não haver justa

causa para fundamentar a ação penal. Assim, o Ministério Público deverá propor o

arquivamento do inquérito policial ao juiz competente, fundamentando a razão do

pedido no artigo 28 do Código de Processo Penal. Vejamos a redação da lei:

Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação

20 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 117. 21 BRASIL. Constituição Federal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 22 BRASIL. Constituição Federal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 23 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 166. 24 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 116.

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ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender. 25

O princípio da obrigatoriedade deixou de ser absoluto com a entrada em

vigor da lei 9.099/95, que instituiu um modelo consensual no processo penal,

adotando o princípio da disponibilidade, possibilitando a transação penal entre o

Ministério Público e o autor do fato em razão do menor potencial lesivo da infração

penal cometida. 26

1.3.2.3 Princípio da indisponibilidade

Veja-se que o princípio acima abordado determina a obrigatoriedade de

oferecer a acusação quando evidenciada a justa causa, e em continuidade,

encontra-se entabulado no nosso código que, quando proposta a ação penal pública

o Ministério Público não poderá, de nenhum modo, dela desistir ou transigir de seus

efeitos, garantido assim o desenvolvimento do processo penal, até o trânsito em

julgado da sentença final. 27

Outra exceção são as infrações de menor potencial lesivo, possibilitando

um acordo de conduta entre as partes concedendo ao Ministério Público “a

possibilidade de preenchidos os requisitos legais, propor ao acusado, após o

oferecimento da denúncia, a suspensão condicional do processo [...]”.28

1.3.2.4 Princípio da intranscendência

Obriga que a ação penal seja proposta contra o infrator ou infratores do

delito, devidamente demonstrado através das provas colhidas nos autos de

inquérito, posto que ninguém pode responder por algo que não fez.29

25 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 26 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 116. 27 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 116/ 117. 28 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 117. 29 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 167.

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1.3.2.5 Princípio da indivisibilidade

A ação penal proposta pelo Ministério Público deve envolver todos os

infratores do delito, não podendo o acusador escolher quem irá denunciar, não

admitindo a sua conveniência em processar um indivíduo enquanto mais de um

autor concorreu para a prática delituosa.30

1.3.2.6 Princípio da divisibilidade

Hoje a jurisprudência possui entendimento contrário ao princípio da

indivisibilidade, eis que reconhece a divisibilidade do processo penal, em casos

extremos sempre quando houver diversos investigados envolvidos. Assim o

Ministério Público poderá oferecer denúncia contra os investigados com justa causa

e, depois, caso apresentarem novas provas contra outros investigados envolvidos no

crime, poderá aditar a denúncia incluindo o(s) novo(s) co-réu(s), ou ainda, poderá

propor ação penal separada contra o(s) novo(s) indivíduo(s).31

Essa é a jurisprudência majoritária do Supremo Tribunal Federal, bem

como a do Superior Tribunal de Justiça, referindo que o princípio da indivisibilidade

não se aplica à ação penal pública. Vejamos as ementas:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL PÚBLICA. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE. INAPLICABILIDADE. PRINCÍPIO DO PROMOTOR NATURAL. OFENSA. INEXISTÊNCIA. 1. O princípio da indivisibilidade não se aplica à ação penal pública. Daí a possibilidade de aditamento da denúncia quando, a partir de novas diligências, sobrevierem provas suficientes para novas acusações. 2. Ofensa ao princípio do promotor natural. Inexistência: ausência de provas de lesão ao exercício pleno e independente de suas atribuições ou de manipulação casuística e designação seletiva por parte do Procurador-Geral de Justiça. Ordem indeferida.32

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO. DENÚNCIA. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE DA AÇÃO PENAL. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO. INOCORRÊNCIA.

30 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 222. 31 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 168. 32 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 96700/PE, Relator(a): Ministro(a) Eros Grau, Órgão Julgador Segunda Turma, DJu 17/03/2009, DJe 13/08/2009.

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I - A eventual inobservância ao princípio da indivisibilidade da ação penal não gera nulidade quando se trata de ação penal pública incondicionada (Precedentes).

II - "A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido da inaplicabilidade de tal princípio à ação penal pública, o que, aliás, se depreende da própria leitura do artigo 48 do Código de Processo Penal" (Inq 2.245/MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJU de 09/11/2007).

III - In casu, o não oferecimento imediato da exordial acusatória pelos fatos ocorridos no dia 13/08/1997 não implica em renúncia tácita ao direito de ação, como ocorre na ação penal privada, não gerando, dessa forma, nulidade a ser reclamada. Ordem denegada. 33

Greco corrobora com esse entendimento em virtude de uma

conformidade processual dizendo que “o processo pode sempre ser desmembrado,

tendo em vista a conveniência processual, sem que, com isso, haja qualquer

interferência na situação penal de cada um dos agentes.” 34

1.3.3 Ação Penal Pública Incondicionada

A lei estabelece como titular da ação penal pública o Ministério Público

sempre que inexistir necessidade de manifestação do ofendido ou do Ministro da

Justiça para exercê-la no tipo penal. Neste caso, a ação penal pública será

incondicionada. 35

Da mesma forma define Greco “[..] de iniciativa exclusiva do Ministério

Público, é genérica, para todas as infrações penais em que a lei nada disponha com

relação à ação penal.”36, ou seja quando a lei não sujeita a uma condição, será ela

incondicionada.

1.3.4. Ação Penal Pública Condicionada

Excepcionalmente a ação será condicionada. Assim, segundo dispõe o

33 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 79673 / RJ, Relator(a) Ministro Felix Fischer, Órgão Julgador Quinta Turma, DJu 21/02/2008, DJe 31/03/2008. 34 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p .114. 35 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 168. 36 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 111.

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artigo 24, caput do Código de Processo Penal, “Nos crimes de ação pública, esta

será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o

exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de

quem tiver qualidade para representá-lo.” 37 Deste modo, para alguns crimes a lei

impõe uma condição específica à propositura da ação definida como representação

do ofendido ou de seu representante legal, ou a requisição do Ministro da Justiça,

consubstanciada na manifestação desses para que o Ministério Público possa fazer

a acusação, pressuposto que será abordado no próximo capítulo.

Extrai-se da lei que a representação do ofendido ou a requisição do

Ministro da Justiça é a manifestação de vontade desses para que seja proposta a

ação penal ou a instauração do inquérito policial. 38

Por fim, tanto a requisição do Ministro da Justiça como a representação

da vítima apenas autoriza o Ministério Público a denunciar. Vale esclarecer que

parte da doutrina as considera como verdadeira condição objetiva de

procedibilidade, conforme explica Capez:

“A representação é a manifestação de vontade do ofendido ou do seu representante legal no sentido de autorizar o desencadeamento da persecução penal em juízo. Trata-se de condição objetiva de procedibilidade. Sem a representação do ofendido ou, quando for o caso, sem a requisição do ministro da justiça , não se pode dar início à persecução penal.” 39

1.3.4.1 Representação do ofendido ou de seu representante legal

A representação é definida pela lei como consentimento, manifestação de

vontade de quem tem a qualidade de fazer, para que o Ministério Público para

proceder à ação penal segundo art. 24, caput do CPP, ou para autoridade

competente instaurar o inquérito policial como previsto no art. 5, § 4º, do CPP.40

Fica evidente que a representação é mero consentimento para o

Ministério Público acusar o delinquente pela prática de um crime, não se

confundindo com uma solicitação para o Promotor de Justiça, mas sim uma

37 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 276. 38 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 169. 39 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 112 e 121. 40 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 276.

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faculdade de exercer um direito.41

Exceção a regra, atribui a súmula 714 do Supremo Tribunal Federal que

descreve a possibilidade de legitimidade concorrente entre o Ministério Público e a

vítima. In casu:

“Concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções”. 42

Definindo a representação como uma autorização do ofendido ou do

Ministro da Justiça para o Promotor de Justiça decidir sobre o ajuizamento da ação

penal, torna-se esse ato como uma condição para o exercício desse direito. 43

1.3.4.2 Titularidade da representação

A lei atribui como legítimo para promover representação o ofendido ou

quem tenha qualidade de representá-lo, como prenuncia o artigo 39 do código de

processo penal, que diz “O direito de representação poderá ser exercido,

pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, [...], feita ao juiz, ao órgão

do Ministério Público, ou à autoridade policial.” 44

A representação do ofendido com idade inferior a 21 anos e superior a 18

anos prevista no artigo 34 do Código de Processo Penal, é controvertida pela

doutrina. A majoritária entende que o reconhecimento da maioridade civil não

necessita da representação legal quando o ofendido for maior de 18 anos,

fundamenta-se para tanto a maioridade civil.45

Para o ofendido menor de 18 anos será titular do direito o seu

representante legal. Contudo, caso o seu representante não exerça esse direito, o

prazo decadencial não correrá para o menor e, quando este completar a maioridade

41 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 169. 42 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 714. In:____. Constituição Federal. Código Penal e Processo Penal. __ed. São Paulo: Saraiva, 2009.. 43 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 108 e 111. 44 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 112. 45 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 122.

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possuirá o prazo para oferecer a representação. 46

Com relação ao ofendido morto ou declarado ausente, o direito de

representação segue a regra do artigo 24, §1º do Código de Processo Penal, o qual

atribui como titulares concorrentes do direito, o cônjuge, o ascendente, o

descendente ou o irmão, podendo qualquer um manifestar interesse em autorizar a

ação penal. 47

Quando o ofendido for incapaz e não possuir representante legal, seja por

morte do representante ou quando a vontade deste é contra a do incapaz, o juiz

aplica analogicamente o artigo 33 do Código de Processo Penal nomeando curador

especial, o qual não será obrigado a exercer a representação. Este livre arbítrio se

encontra com fontes desfavoráveis na doutrina. 48

Muito embora o artigo 33 do Código de Processo Penal se refira ao

“direito de queixa” entende-se que também se aplica a ação penal pública

condicionada. 49 Vejamos a letra da lei:

Art. 33. Se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal. 50

Com relação à possibilidade do curador averiguar a oportunidade em

representar o menor, sustenta-se que vai contra os interesses do menor ofendido,

pois este não possuindo capacidade postulatória, de certa forma, requer que seja

exercida a representação e, não aceitando representar descaracteriza o instituto

processual. 51

Por fim, a lei atribui legitimidade como titulares de ações penais pessoas

jurídicas, segundo se extrai do artigo 37 do Código de Processo Penal que firma:

As fundações, associações ou sociedades legalmente constituídas poderão exercer a ação penal, devendo ser representadas por quem os respectivos contratos ou estatutos designarem ou, no silêncio

46 CAPEZ, Fernando, Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 122. 47 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 112. 48 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 171/ 172. 49 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso em Habeas Corpus 14.924/GO, Relator(a) Ministro Paulo Medina, Órgão julgador Sexta Turma, Dju.15/03/2007, DJe 09/04/2007. 50 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 51 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 172.

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destes, pelos seus diretores ou sócios-gerentes. 52

1.3.4.3 Forma de fazer a representação

Nossa lei não regulou a forma de proceder à representação, podendo ser

feita por escrito ou oralmente, reduzido a termo. Como a representação é uma

manifestação de vontade da vítima, qualquer ato de vontade que demonstre seu

interesse em apurar o crime é visto como forma de representação, por exemplo, o

registro de um boletim de ocorrência. 53

1.3.4.4 A quem se dirige a representação

O artigo 39 do Código de Processo Penal determina que a representação

deva ser dirigida “ao juiz, ou ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade

policial.”54

Assim, quando a representação for dirigida ao juiz, esse determinará à

autoridade policial que inicie o inquérito policial; ou quando a representação for

dirigida ao Ministério Público e esta vier acompanhada da justa causa, aquele

poderá desistir do inquérito policial e oferecer a denúncia, acusando o suposto

delinquente por ser titular da ação penal como determinam os parágrafos do artigo

39 do Código de Processo Penal. 55

1.3.4.5 Prazo para oferecer a representação

O artigo 38 do Código de Processo Penal fixa o prazo decadencial, caso

não seja não exercido o direito de representação, em seis meses, começando a fluir

a partir do dia em que o ofendido ou seu representante legal venha saber quem é o

52 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 53 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 112. 54 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 55 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 173.

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autor do delito. Na redação da lei:

Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.56

Ainda, no caso de morte do ofendido ou se for declarado ausente por

decisão judicial, o novo titular terá também o prazo de seis meses, começando a

contagem inicial do prazo decadencial da data da morte ou da publicação da decisão

que o declarou ausente. Isto quando for conhecido o ofensor; ou quando seu

representante descobrir o verdadeiro autor do crime. 57

É interessante esclarecer que parte da doutrina define prazos sucessivos

ao proceder o prazo decadencial nos casos da morte do representante legal ou caso

venha tornar-se ausente. Sustentam que cada representante terá seis meses,

seguindo a ordem prevista na legislação processual cônjuge, ascendentes,

descendentes e irmãos.58

Já ao contrário, Greco diz que: “O prazo não comporta prorrogação ou

dilatação, de modo que seria incompatível com a natureza do instituto entender que

cada um teria um prazo autônomo a partir do conhecimento individual.” 59

Entre as divergências doutrinárias sobre a prorrogabilidade do prazo, esta

parece inútil, pois um irmão teria que esperar dois anos para oferecer a

representação e, nessa dilação temporal, ocorreriam três prorrogações do prazo

decadencial tripudiando a imutabilidade da extinção de punibilidade.

1.3.4.6 Retratação

Retratação é a revogação da representação conforme dispõem os artigos

102 do Código Penal e 25 do Código de Processo Penal “A representação será

irretratável, depois de oferecida à denúncia.” Assim, somente poderá ser retratada

56 BRASIL. Código de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 57 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 173. 58 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 174. 59 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 111.

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antes do Promotor denunciar o infrator. 60

Uma situação interessante é a retratação da retratação, que Tourinho

Filho identifica em alguns arestos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em

que o ofendido, após fazer a representação, retratou-se, permanecendo os autos no

cartório. Depois, antes do prazo decadencial o ofendido desfez a retratação e

requereu o prosseguimento do processo para conseguir o pronunciamento

jurisdicional. 61

1.3.4.7 Renúncia à representação

A renúncia ao direito de representação somente é admitida nos juizados

especiais criminais segundo artigo 74, § único, da lei 9.099/95, o qual determina a

renúncia ao direito de representação quando o juiz homologar acordo civil de

reparação pelos danos causados. 62

Deve-se observar que, quando existirem múltiplos agentes e um deles

reparar em parte o dano, somente acarretará renúncia ao réu que arranjou

civilmente, ou, quando reparado integralmente ela será estenderá a todos os réus.63

1.3.4.8 Requisição do Ministro da Justiça

Requisição é “um ato político, porque ‘há certos crimes em que a

conveniência da persecução penal está subordinada a essa conveniência política”.64

Nesse tipo de ação, nosso ordenamento não atribuiu um prazo para que

seja oferecida a requisição, possibilitando que seja feita a qualquer tempo antes da

extinção da punibilidade; e quando requisitado não obriga o Ministério Público a

60 BRASIL. Código de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 61 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 358. 62 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 174. 63 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 175. 64 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 383.

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oferecer denúncia, bem como não é admitida a sua retratação. 65

Por fim, vê-se que existem algumas hipóteses previstas na lei que

necessitam da requisição do Ministro da Justiça, dentre elas, por exemplo, o crime

cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, ou crimes contra a honra

praticados contra o presidente da República. 66

1.4 CONCEITO DE AÇÃO PENAL PRIVADA

A ação penal de iniciativa privada é denominada pela lei quando transmite

ao ofendido a titularidade de acusar e de representar-se em juízo. Mougenot define

como “[...] aqueles casos em que, por determinação legal, a ação penal será de

iniciativa privada (ou, abreviadamente, os casos de ação penal privada).”67

A doutrina majoritária afirma não existir problema de ordem jurídica

quando a lei atribui excepcionalmente a titularidade à vítima para conduzir a ação

penal, por conseguir o mesmo fim que a ação penal pública. Mougenot fez a

seguinte consideração:

“o particular, ajuizando e conduzindo a ação penal, na verdade, defende não apenas seu próprio interesse em ver punido o suposto autor de uma conduta criminal que se perpetra contra ele, mas também, e principalmente, o interesse social em que sejam perseguidos e devidamente punidos aqueles que infringem a lei penal.”, contudo, o Ministério Público continua sendo o fiscal da lei, inclusive nas ações de iniciativa privada.68

Importante firmar que o Estado não perde o direito de impor pena ou

medida de segurança para o infrator quando transfere para o ofendido o exercício da

ação penal, ele somente transfere a legitimidade ativa da ação penal para a vítima,

fazendo com que a mesma se responsabilize por todos os atos do processo, sob as

penas da lei. 69

65 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 128. 66 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 128. 67 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 177. 68 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 177. 69 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 133/134.

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1.4.1 Princípios aplicados à ação penal privada

Uma vez que a iniciativa da ação penal passa a ser privada esta possui

normas e princípios próprios diferentes dos que regem a ação penal de iniciativa

pública em razão da subjetividade do direito de ação; desse modo o querelante não

pode conduzir a ação penal da mesma forma que um órgão da administração

pública.70

1.4.1.1 Princípio da oportunidade

Sendo a ação privada iniciativa do ofendido, para ele se confere a

faculdade em promovê-la. Isto porque a ofensa ao bem jurídico muitas vezes é

irrelevante sendo oportuno não propo-la, cabendo a vítima, com vontade própria,

decidir se promove ou não à ação penal. 71

A oportunidade é a liberdade de escolha do ofendido em promover a ação

penal facultando-lhe que faça seu juízo crítico sobre o delito sofrido, pois muitas

vezes o bem tutelado é tão infame que acionar o judiciário poderá ser uma medida

desnecessária.72

Uma breve comparação feita nesse estudo científico é que o Ministério

Público é obrigado a propor a ação penal quando presente a justa causa, posto que,

a ação pública é obrigatória, em contrapartida, a ação penal privada atribui à vítima

ou ao seu representante legal a faculdade para promovê-la.

1.4.1.2 Princípio da disponibilidade

O ofendido pode a qualquer tempo, após propor a ação penal, decidir

sobre o bem jurídico sob tutela do Estado, que através de sua vontade determina

70 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 178. 71 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 249. 72 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 178.

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prossegui-la. 73

Com efeito, Mougenot assim pondera sobre a disponibilidade aplicado à

ação penal de iniciativa privada:

“[...] o titular da ação penal privada terá diversos meios de dela dispor, efetivamente decidindo se deseja que o suposto infrator da norma penal seja julgado. Com efeito, o titular da ação pode simplesmente deixar de exercê-la, permitindo, por sua inércia, a decadência desse direito. Poderá, também, renúnciar ao direito de exercê-la. Já durante o curso do processo, poderá ainda, simplesmente, abandoná-la.”74

Em casos de ação de iniciativa privada, a vítima deve ficar atenta às

diversas possibilidades que a lei apresenta como meios de por fim ao litígio que

podem ser por sua inércia ou não. O Código Penal prevê o perdão, a perempção, a

renúncia e a decadência, como institutos reguladores da disposição do ofendido.

1.4.1.2.1 Do perdão

O perdão do ofendido consubstancia-se na clemência concedida ao autor

da infração penal no curso do processo, tendo previsão legal como causa de

extinção de punibilidade no artigo 107, V, do Código Penal.75

Essa anistia é considerada um ato bilateral, pois não depende somente

da manifestação da vítima, o querelado também deve aceitar o pedido. Isto porque,

o suposto acusado respondendo à ação penal, tem o direito de provar a sua

inocência acerca da acusação que lhe é feita até o trânsito em julgado da

sentença.76

Exceção à regra é a inércia do querelado na oferta de perdão do

querelante. É esse o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de Santa

Catarina ao julgar o recurso da decisão que concedeu perdão nesta hipótese. Nota-

se na ementa:

QUEIXA-CRIME - PERDÃO DO OFENDIDO - ATO BILATERAL - QUERELADO QUE, INTIMADO PARA SE MANIFESTAR, SE MANTEVE SILENTE - ACEITAÇÃO TÁCITA - EXEGESE DO ART.

73 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 251. 74 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 179. 75 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 251. 76 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 191.

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58 DO CPP - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE - ART. 107, V, DO CP - RECONHECIMENTO DE OFÍCIO - ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA - INTELIGÊNCIA DO ART. 397 DO CPP, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 11.719/2008 - PRECEDENTE DESTA CORTE.

"O silêncio do querelado regularmente intimado para se manifestar acerca do PERDÃO do OFENDIDO importa em aceitação tácita e conseqüente extinção da punibilidade.

"A Lei n. 11.719, de 20 de junho de 2008, introduziu a possibilidade de absolvição sumária logo após o oferecimento da resposta escrita à acusação, nos casos previstos na nova redação do artigo 397 do Código de Processo Penal, dentre eles, a extinção da punibilidade". (Queixa-Crime n. 2006.029357-9, de Canoinhas).77

Essa modalidade de disposição da ação penal é cabível somente na ação

penal de iniciativa privada segundo o artigo 105 do Código Penal. Logo, quando

tratar-se de ação penal privada subsidiária da pública o ofendido fica impedido de

desistir da ação. 78

Por fim, o perdão concedido a um dos querelados a todos se estenderá,

porquanto nossa lei veda a concessão do perdão para apenas um infrator, por causa

do princípio da indivisibilidade que será abordado a frente. Diferente ocorre quando,

no concurso de infratores, um deles recusar o perdão, pois para este continuará o

processo. 79

1.4.1.2.2 Decadência

É a perda do direito de ação penal quando a vítima deixar de oferecer

queixa dentro do prazo de seis meses. O início do prazo começa a partir da data em

que o ofendido vier saber quem é o autor do crime, ou nos casos de ação penal

privada subsidiária da pública, quando o ofendido não oferece queixa em seis meses

após o último dia que o Ministério Público tinha para oferecer a denúncia e não a

ofereceu80

Exceção à regra é o crime de lesão corporal culposa decorrente de erro

médico pois, muitas vezes, a lesão somente é descoberta algum tempo depois da

77 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Queixacrime nº 2006.029363-4, de Canoinhas, Relator(a) Desembargador Rui Fortes, Órgão Julgador Primeira Câmara Criminal, DJu 11/12/2009, DJe 04/02/2010. 78 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 191. 79 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 191. 80 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Rio de Janeiro: Impetus, 2002. p. 293.

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cirurgia e, nesse caso, o prazo decadencial inicia a partir dessa descoberta. 81

1.4.1.2.3 Da perempção

A perempção é o instituto processual que causa extinção do

processo pela inércia do ofendido ou de seu representante legal por deixar

de promover o andamento do processo. São quatro situações específicas

subtraídas no art. 60 do código de processo penal que pode ensejar a

extinção do processo na ação penal de iniciativa privada. Vejamos o artigo

60 do Código de Processo Penal:

Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á perempta a ação penal:

I – quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo por 30 (trinta) dias seguidos;

II – quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto do art. 36;

III – quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais;

IV – quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor.82

Conclui-se que somente torna a queixa perempta pela inércia do

querelante em atos que resultem no bom andamento do processo, segundo subtrai-

se do artigo supracitado. Assim, todo decurso do tempo em que o querelante não

promover o bom andamento do processo, ou caso seja extinta uma pessoa jurídica

sem deixar sucessor incidirá como causa de extinção de punibilidade a

perempção.83

1.4.1.2.4 Da renúncia

A renúncia pode ser expressa ou tácita, na primeira modalidade ela deve

81 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Rio de Janeiro: Impetus, 2002. p. 293/294 82 BRASIL. Código de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 83 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p 117.

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ser assinada pelo ofendido ou por procurador com poderes especiais como dispõe o

art. 50 do Código de Processo Penal, já a tácita pode ser provada pela atuação do

ofendido quando seus atos forem contrários à vontade de ajuizar a ação penal. 84

Ressalva-se quando o querelado reparar os danos da vítima, com a

aceitação desta, a reparação pecuniária não implica renúncia ao direito de queixa

segundo art. 104, § único do Código Penal que diz “Importa renúncia tácita ao direito

de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercê-lo; não a implica,

todavia, o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime”,

exceto nos juizados especiais criminais, pois, a Lei 9.099/95 determinou como

renúncia ao direito de queixa crime, a reparação dos danos, quando homologado

pelo juiz. 85

Conclui-se que a renúncia é ato unilateral do querelante dependendo

apenas de sua manifestação em não querer propor a ação penal, seja por critério

próprio, ou por homologação pelo juiz quando possível. A renúncia ao direito de

ação, como visto é causa de extinção da punibilidade, e só pode ser feita antes de

iniciada a ação penal.86

A Renúncia se funda na manifestação da vítima consistente na

desistência de uma futura ação que atua como causa extinção da punibilidade, pois,

como estudado, a ação penal privada é disponível ao ofendido e renunciando o

direito de queixa crime, a ação penal jamais poderá ser exercida. 87

1.4.1.3 Princípio da intranscendência

Garante que a ação penal será proposta somente contra os autores e

participes da infração penal, impedindo que se estenda a outra pessoa. Assim

menciona Rangel: 88

“”Neste caso quem irá responder pelo ilícito penal será o autor do fato, pois o princípio da personalidade da pena, consagrado na

84 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 189. 85 BRASIL. Código Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 86 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 190. 87 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 115. 88 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 259.

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Constituição Federal (cf. art. 5º, XVL), não permite que a pena passe da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano ser estendida aos sucessores, nos termos da legislação civil”

Este princípio também faz parte da ação penal pública, o qual institui que

a ação penal somente pode ser proposta contra os autores, co-autores e participes

da infração penal, não podendo abranger um terceiro dessa relação jurídica.89

1.4.1.4 Princípio da indivisibilidade

Quando a vítima promover a ação penal, ela precisa indicar todos os

agentes infratores que praticaram o delito, conforme determina o artigo 48 do Código

de Processo Penal: “A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao

processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade.” Assim, o

querelante fica impedido de escolher contra qual autor irá propor a ação quando

existiram vários autores que participaram do delito. 90

O legislador aprimorou o código e, caso a vítima venha a reclamar contra

um único autor da infração, renunciando em relação a outro infrator, a renúncia será

estendido a todos os participantes, inclusive contra quem o querelante propôs a

ação penal. 91

Existem alguns casos que devem ser analisados criteriosamente, como

por exemplo, quando não for conhecida a identidade de todos os infratores e a ação

penal foi oposta contra um determinado infrator, sendo que após o recebimento da

queixa crime descobre-se a existência de outros infratores.92

Nessa ocorrência, se a vítima realmente não tinha conhecimento do

infrator poderá ser oportunizado prazo para inclusão do novo querelado ou, não

podendo aditar, poderá entrar com nova queixa crime sob pena de renúncia. É

assim que deve ser entendido, pois a omissão não decorreu da sua vontade.93

Em sentido contrário, parte da doutrina entende que o Ministério Público

pode aditar a queixa crime incluindo os infratores não elencados na acusação, com

89 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 179. 90 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 252. 91 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 115. 92 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 136. 93 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 136.

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base no art. 46, §2º do Código de Processo Penal, o que tripudia a regra prevista no

artigo 100, §2º do Código Penal e do artigo 30 do Código de Processo Penal que diz

que quem deve conduzir toda a ação penal privada é o ofendido. 94

Capez sublinha que existem decisões dos tribunais que reconhecem de

imediato o aditamento da queixa crime na circunstância que nem todos os autores

do crime sejam conhecidos e sobrevierem quando já fora oferecida a queixa, sem

autorização do Ministério Público. 95

Quando ocorrer aditamento da queixa devem ser realizados todos os atos

da instrução processual para os novos querelantes, ou ainda, caso já tenha sido

proferida a sentença deve ser ajuizada uma nova ação penal no mesmo juízo que

proferiu a sentença.96

1.4.2 Titularidade da ação penal privada

O titular legítimado para conduzir a ação penal é o ofendido maior de 18

anos, conforme previsão do artigo 30 do Código de Processo Penal e artigo 100, §2º

do Código Penal. Atribui-se essa legitimidade como sendo apenas um substituto

processual do órgão ministerial, conhecida como legitimidade extraordinária.97

Os incapazes de representarem em juízo seguem a regra do art. 33 do

Código de Processo Penal que dispões:

Se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal. 98

Quando o ofendido estiver morto ou for declarado ausente por

pronunciamento jurisdicional, o direito de queixa passa a ser do cônjuge,

ascendente, descendente ou irmão. Exceção à regra é a ação penal personalíssima

94 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 180. 95 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 136. 96 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 180. 97RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 234. 98 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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pois não há o direito de representação, o que será visto mais a frente. 99

O direito de queixa do ofendido com idade inferior a 21 anos e superior a

18 anos, prevista no artigo 34 do Código de Processo Penal é controvertida pela

doutrina. A majoritária entende que a maioridade civil torna descabida a

representação do ofendido em razão da capacidade civil. 100

Deve-se lembrar que caso o ofendido opte em promover a queixa crime,

deve ele passar procuração com poderes especiais, não sendo suficiente o mandato

ad judicia simples. Enquanto na circunstância de pobreza o juiz deverá nomear

advogado para propor a ação penal segundo art. 32 do Código de Processo

Penal.101

Por fim, nossa lei possibilita a pessoa jurídica para propor em ação penal

seguindo a mesma regra para a representação estudado no item 3.4.2.

1.4.3 Requerimento do titular da ação penal privada

Nesse tipo de ação, para se instaurar o inquérito policial é necessário o

requerimento do titular do direito, como dispõe o artigo 5, §5º, do Código de

Processo Penal: “Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: [...];

§ 5º Nos crimes de ação privada, a autoridade policial somente poderá proceder a

inquérito a requerimento de quem tenha qualidade para intentá-la” 102

Não possuindo todos esses elementos a instauração do inquérito será

indeferido, cabendo recurso para o chefe de polícia, como dispõe o § 2º do artigo já

citado. Hoje é o Delegado geral de Polícia ou o Secretário de Segurança Pública. 103

Mesmo que o requerimento não exige formalidade, deve conter a

narração dos fatos com todas as suas circunstâncias, a individualização do autor ou

de seus sinais característicos, aduzindo as razões de sua convicção ou presunção

acerca da autoria, a nomeação das testemunhas e sua qualificação, e quando 99 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 181/182. 100 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 244. 101BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 182/ 183. 102 BRASIL. Código de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 103 BRASIL. Código de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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impossibilitado de identificar o autor da infração, deve mencionar o motivo

impeditivo, como determina o artigo 5, §1º do diploma supra104

Uma vez preenchido os requisitos necessários do procedimento

investigatório o inquérito será enviado ao juízo competente e ficará

aguardando em cartório a iniciativa do ofendido ou seu representante, ou, o

traslado do inquérito à vítima ou seu representante legal. 105

1.4.4 Espécies de ação penal privada

A ação penal privada, dependendo dos fatos, poderá ser classificada em

três gêneros: a exclusiva, a personalíssima e a subsidiária da pública.

1.4.4.1 Ação Privada Exclusiva

Verifica-se este tipo de ação quando sua propositura possa ser feita pelo

ofendido ou por seu representante legal. 106 Também é conhecida como ação

privada propriamente dita ou ação privada principal, por serem titulares do direito

ofendido ou seu representante legal, nos casos já estudados.107

1.4.4.2 Ação Privada Personalíssima

A definição da ação privada em personalíssima é que a propositura da

queixa deve ser feita somente pelo ofendido, não podendo ser proposta pelo seu

representante legal nos casos de sua morte ou de sua ausência.

Hoje se encontra somente um crime que se procede mediante ação

104 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 183. 105 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 184. 106 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 184. 107 CAPEZ, Fernando, Curso de Processo Penal. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 137.

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privada personalíssima, conforme identifica Mougenot: 108

“A doutrina identifica como hipótese de ação privada personalíssima apenas os casos de adultério e de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento, crime contra o casamento. Com o advento da Lei n. 11.106/2005, que revogou o art. 240 do CP, que tipificava o crime de adultério, resta apenas uma hipótese de ação privada personalíssima, portanto.”

No crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento a

ação somente pode ser proposta através da queixa do contraente enganado, e

somente poderá ser intentada quando transitar em julgado a sentença que, por

motivo de erro ou impedimento, anule o casamento. 109

1.4.4.3 Ação Privada Subsidiária da Pública

Poderá desencadear-se essa ação quando a ação penal pública não for

proposta no prazo legal e o ofendido ou seu representante legal a ajuíza

subsidiariamente mediante queixa, segundo artigo 100, § 3º do Código Penal. 110

A ação penal privada subsidiária da pública se procede mediante queixa

crime e deve respeitar o prazo do órgão ministerial para apresentar a acusação. O

prazo começa a fluir a partir da data em que houver passado o prazo legal para

apresentação da denúncia.111

Nesse tipo de ação quando o ofendido não se pronunciar em algum ato

processual, o Ministério Público deverá assumir a titularidade até o trânsito em

julgado da sentença, segundo artigo 29 do código de processo penal.112

Rassalva-se que ficam legitimados para propor a ação penal privada o

ofendido ou seu representante legal. 113

Por fim, não obstante a divisão da ação penal em pública e privada, pode-

se ver em posicionamento doutrinário como jurisprudencial que elas possuem

108 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 185. 109 BRASIL. Código Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 110 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 465. 111 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 185. 112 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 191. 113 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. V.1. p. 442

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condições para a sua propositura. O legislador entendeu ser necessário condicioná-

las para obter um pronunciamento jurisdicional justo.

Essas condições são controvertidas na doutrina, a majoritária afirma

existir condições da ação e condição de procedibilidade. Isto porque o juiz ao

impedir que uma acusação produza efeitos pela ausência de uma das ditas

condições pode existir decisão de mérito, provocando inúmeras fontes de

discussões desfavoráveis pela doutrina as quais serão vistas no próximo capítulo.

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2 CONDIÇÕES DA AÇÃO

2.1 LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO

Sendo a ação penal um direito autônomo numa relação jurídica com o

direito alegado, para efetivar o exercício desse direito, tornou-se necessário

condicioná-lo a certas condições, conhecidas como condições de ação e de

procedibilidade, objetivando salvaguardar a amplitude da garantia fundamental do

direito de ação.114

Valer dizer que a lei 11.719 de 2008 revogou o artigo 43 do Código de

Processo Penal, o qual previa a rejeição da denúncia, alterando significativamente

sua redação.115 Este artigo era fonte de avaliações desfavoráveis pela doutrina, pois

não previa as condições de ação penal de forma expressa.116 A redação do

revogado artigo 43 era a seguinte:

Art. 43. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I - o fato narrado evidentemente não constituir crime;

II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;

III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.

Parágrafo único. Nos casos do no III, a rejeição da denúncia ou queixa não obstará ao exercício da ação penal, desde que promovida por parte legítima ou satisfeita a condição.117

Essa redação ilustrava inúmeras avaliações pela doutrina, que descrevem

que não se pode utilizar os conceitos previstos das condições de ação do código de

processo civil no processo penal118, tema controvertido e não pacificado, como se

analisará no exame das condições de ação.

Além desse critério de avaliação de conceitos civis e penais, alguns

114 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 525. 115 LOPES, Aury Jr.. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 336. 116 COSTA, Paula Bajer Fernander Martins da. Ação penal condenatória. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 92. 117 BRASIL. Código Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 118 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007.

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doutrinadores debatem a desnecessidade das condições da ação conforme coloca

José Antonio Paganella Boschi:

[...] simplesmente proclamam a inutilidade de toda e qualquer discussão sobre as condições de ação, usando do argumento de que o direito ao processo constitui manifestação ou desdobramento do direito constitucional de petição aos órgãos públicos (letra “a”, do inciso XXXIV, do art. 5º da CF). Não só o magistrado, mas qualquer autoridade, independentemente da hierarquia, afirmam os seguidores dessa corrente, tem o dever jurídico de pronunciamento sobre o pedido articulado pelo interessado.119

Nessa banda, Aury Lopes Jr. afirma não existirem todas as condições da

ação civil na ação penal, devendo buscar-se o conceito de condições da ação penal

junto à norma processual penal diante do antigo artigo 43 que rejeitava a acusação.

Confirma, este autor contudo, que não se pode confundir os conceitos de condições

da ação civil e penal, e se forem utilizados, é possível associar conceitos diferentes

exacerbando os conceitos civis com os penais, perdendo o verdadeiro sentido das

condições da ação civil. 120

Também Paganela mostrou o conflito trazido pela doutrina entre a

garantia do direito de ação (artigo 5, XXXV Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988) perante as condições da ação penal, descrevendo quando o

magistrado extingue a ação penal pela carência de uma das condições da ação

penal expondo “[...] como admitir e negar, ao mesmo tempo, que esse direito tenha e

não tenha sido exercido”. 121

Neste norte, Auri Lopes expõe a diferença entre garantia constitucional

com a ação no plano processual, in casu:

No primeiro momento, estamos na dimensão constitucional do poder de invocar a tutela estatal. Esse poder – ius ut procedatur – é completamente incondicionado. Ou seja, não existem condições para que a parte o exerça tampouco possibilidade de impedir seu exercício. Não há como proibir ou impedir alguém de ajuizar uma queixa-crime ou de o Ministério Público oferecer uma denúncia. 683 Essa a dimensão constitucional, abstrata e incondicionada desse direito. 122

E ainda:

119 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed São Paulo: AIDE, 1997. p. 63/64. 120 LOPES, Aury Jr., Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 336. 121 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed. São Paulo: AIDE, 1997. p. 67. 122 LOPES, Aury Jr., Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 332.

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Mas existe o segundo momento, de natureza não mais constitucional, mas sim processual penal. É no plano processual que se pode efetivar ou não a tutela postulada, obter ou não a resposta jurisdicional almejada, movimentar ou não a maquina estatal. Aqui sim podemos falar em condições da ação, no sentido de que constituem condições que subordinam o nascimento do processo.123

Ainda assim, mesmo que o direito não seja efetivo, a doutrina afirma que

independente do reconhecimento do direito de ação, a ação penal existiu até mesmo

quando extinta pela ausência de uma das suas condições, e nesse caso contra a

vontade do autor. É a análise feita por Liebman, criador da teoria dualista, citado por

Paganela:

Se ocorrem, ou não, as chamadas ‘condições da ação’ é algo que o juiz vai decidir dentro do processo formando a sua decisão, conforme o caso, terá a eficácia de determinar o prosseguimento do processo ou a extinção do mesmo. Sempre, porém, com eficácia de ato jurisdicional, de ato emanado do poder jurisdicional do Estado. Enfim, é no processo que se decide sobre o próprio processo (...). 124

Logo podemos ver a razão para subordinar a ação penal às suas

condições, bem como outras ações de outros ramos do direito com o intuito de

resguardar “[...] o Poder Judiciário das demandas inúteis [...], evitar a sobrecarga

das instâncias formais de controle, o dispêndio inútil de dinheiro público e,

principalmente, o desprestígio da Justiça.”125

Ada Pellegrini atribuiu a função das condições da ação como requisito

para o exercício ao direito de ação. Senão vejamos:

É que a função jurisdicional não deve ser invocada quando, pelo pedido formulado pelo autor, se percebe, desde o início do processo, que a pessoa que solicita a atividade estatal não é aquela que vai ser beneficiada e a pessoa em face de quem o provimento é pedido não pode sujeitar-se a este; ou que o provimento do pedido não é necessário, útil ou adequado para fruição do bem da vida pretendido; ou, ainda, quando o pedido formulado é negado pelo ordenamento. O exercício da ação mira o provimento de mérito e se logo verifica, pelos dados postos em juízo pela ação, que esta não é apta a levar a um resultado útil, o princípio de economia processual atua no sentido de cortar cerce a pretensão processual, extinguindo-se o processo pela carência da ação.126

Outra corrente doutrinária, dentre eles Pacelli, atribuiu “natureza

123 LOPES, Aury Jr.. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 332. 124 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed. São Paulo: AIDE, 1997. p. 67. 125 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed São Paulo: AIDE, 1997. p. 65. 126 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007

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eminentemente processual” 127 às condições da ação, porquanto por mérito da

causa entende-se a existência do fato e se este é imputável ao acusado, bem como

se constituí crime quando não extinta a punibilidade.

Contudo, como o direito material confunde-se com o direito de ação ou

processual há possibilidade do juiz proferir uma decisão de mérito. Tourinho

identifica o propósito para ser proferida uma sentença de mérito numa análise

sumária:

Percebe-se de pronto, que a ação, no plano estritamente processual, está ligada a uma pretensão, a um caso concreto, e esse caso concreto é aquele quid em relação ao qual o direito de ação é exercido. Claro. Ninguém ingressa em juízo sem que haja motivo. Este, obviamente, deve existir, ainda que aparente. 128

Concluiu-se que o vínculo existente entre o direito de ação e a pretensão

não é requisito para análise do mérito, mas sim para admissibilidade de o poder

jurisdicional dar amparo numa efetiva acusação, forçando o réu a vir em juízo, a se

defender até o trânsito em julgado da sentença. Tanto é que as condições de ação

são similares aos pressupostos processuais, os quais são requisitos para a validade

do instrumento processual em que a acusação utiliza para demandar a ação penal;

vejamos:

Ao invés de ficarem em espaço próprio entre os pressupostos processuais e o mérito, as condições, desse modo, acabam se confundindo com os primeiros, por também dizerem respeito à validade formal do processo, gerando, desse modo, como afirmou-se, certa inutilidade prática na própria distinção ou classificação dessas categorias jurídicas. 129

Cândido Dinamarco citado por Paganela identificou mais uma vez a

autonomia do direito de ação com relação ao mérito da pretensão, na forma que as

condições da ação possuem natureza processual e não material; in casu: 130

[...] do direito material que ordinariamente vêm os elementos em virtude dos quais se chega a concluir pela carência de ação, mas, de qualquer modo, no seu entender, “a carência em si mesma é fenômeno de direito processual, tipicamente. É o Estado renunciando a exercer cumpridamente sua função jurisdicional, o que com facilidade se compreende que difere, e muito, do exercício da jurisdição a emissão do provimento jurisdicional declarando

127 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 13. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010. p. 118. 128 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 525. 129 BOSCHI, José Antonio Paganella, Ação penal. 2. ed São Paulo: AIDE, 1997. p. 73. 130 BOSCHI, José Antonio Paganella, Ação penal. 2. ed. São Paulo: AIDE, 1997. p. 68.

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improcedente a demanda. Não se pode assimilar a carência de ação à improcedência da pretensão deduzida em juízo”.

Alguns doutrinadores entendem, ao tratar de extinção da ação pela

ausência de condição da ação, esta decisão tem apenas força de mérito e não de

mérito pretendido em juízo, pois este possui outros requisitos conforme expõe

Paganella:131

[...] se a descrição fosse de conduta por fato atípico, seria correto dizermos que o juiz rejeitaria sumariamente a denúncia, queixa ou aditamento sem adentrar no exame da configuração da justa causa ou no exame dos pressupostos da culpabilidade e das causas de ilicitude ou isenção de pena.

Igualmente ao rejeitar a denúncia ou queixa e declarar prescrito o crime

cometido, o magistrado estaria analisando o mérito do pedido, pois quando

transitado em julgado fará coisa julgada material, o que impede a nova propositura

da ação, senão vejamos:

[...] quando o fato narrado evidentemente não constituir crime ou quando já estiver extinta a punibilidade, por causa que faça desaparecer o direito de punir do Estado (art. 43, I e II, do Código de Processo Penal), deverá a peça acusatória ser rejeitada. Nessas hipóteses, não poderá ser renovada a ação, pois a decisão que rejeita inicial nesses termos analisa efetivamente o mérito da causa, fazendo, portanto, coisa julgada material. 132

Outra discussão levantada pela doutrina são as condições da ação. A

doutrina majoritária entende ser a legitimidade, o interesse de agir e a possibilidade

jurídica do pedido, lembrando que elas são reconhecidas pelos nossos tribunais. De

outro lado, alguns doutrinadores acrescentam a justa causa como sendo uma quarta

condição133, que, por tratar-se do tema deste trabalho, será estudada no próximo

capítulo, até em razão de sua complexidade. Existem, ainda, as denominadas

condições específicas da ação ou condição de procedibilidade, conhecidas também

como a possibilidade jurídica do pedido pela teoria da aparência134.

A divisão e distinção entre condições genéricas e de procedibilidade ou

especificas é que na primeira “são as mesmas do direito civil: legitimação ad

causam, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. As especiais são as

131 BOSCHI, José Antonio Paganella, Ação penal. 2. ed. São Paulo: AIDE, 1997. p. 69. 132 BONFIM, Edson Mougenot, Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 147. 133 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 118. 134 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007

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exigidas pelas peculiaridades que apresenta a justiça penal”.135 Compreende-se por

especiais porque são exigidas em determinado tipo penal especifico previsto na

parte especial do Código Penal, como se verá a seguir. 136

2.2 LEGITIMIDADE

A legitimidade ativa no processo penal é intrínseca ao tipo de ação penal.

Para ação penal pública o legitimado em promovê-la é o órgão do Ministério Público,

por meio do Promotor de Justiça; já a ação penal privada tem legitimidade

extraordinária, que é do ofendido. 137

Tourinho ensina a legitimidade legal da ação penal:

No nosso ordenamento, parte legitima para promover a ação penal pública, seja condicionada, seja incondicionada, é o Ministério Público. Sua legitimação não decorre de um interesse no conflito entre agressor e agredido, mas sim da lei. [...] Assim, as genuínas partes processuais são: o Estado e o infrator. Quem deve, pois, promover a ação penal é o Estado, e este o faz por meio de um dos seus órgãos: o Ministério Público. 138

E ainda:

[...] em determinados casos, em face daquelas razões de política criminal já por nos acentuadas, o Estado concedeu ao ofendido, à vítima do crime, o jus accusationis, o direito de acusar, de promover a ação penal. Nesses casos da ação privada, só o ofendido é quem deve promovê-la. Por isso se diz que, nessas hipóteses, existe para o ofendido legitimatio ad causam extraordinária, porquanto a verdadeira parte legitima ad causam é o Estado.139

Contudo, o problema levantado pela doutrina é quando se utiliza o

conceito de legitimidade do processo civil no processo penal. Isto porque no

processo civil atribui-se como legitimado para propor a ação o titular da relação do

direito material, e na esfera criminal o Ministério Público não participa da relação

135 BINDER, Alberto. Introdução ao Direito Penal. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 162. 136 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 539. 137 OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 97. 138 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 531. 139 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 531/532.

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jurídica dos fatos e circunstâncias alegadas na denúncia. 140

A vítima ou seu representante nos crimes de ação privada, ou o Ministério

Público possuem direito de colocar em funcionamento os órgãos de persecução

penal do Estado e de provocar o poder jurisdicional, junto às normas jurídicas em

decorrência de lei como tipificado no artigo 100, §§ 1, 2 e 3 141 do Código Penal, e

nos artigos 7 e 8 do Código de Processo Civil. 142 Senão vejamos:

Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

§ 2º - A ação de iniciativa privada é promovida mediante queixa do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo.

Art. 7o Toda pessoa que se acha no exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo.

Art. 8o Os incapazes serão representados ou assistidos por seus pais, tutores ou curadores, na forma da lei civil.

Pela leitura do artigo podemos ver que ambas as legitimidades, civil e

penal, decorrem atribuindo pessoas diferentes para cada uma das ações. Com

exceção à regra, são as ações como Habeas Corpus, revisão criminal ou mandado

de segurança em matéria criminal onde qualquer pessoa é legitima para propo-la.143

Esse é o entendimento do Tribunal de justiça do Estado de Santa

Catarina ao julgar o Habeas Corpus em que o réu foi indiciado por crime contra os

costumes. Vejamos a ementa:

HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA OS COSTUMES. PACIENTE DENUNCIADO POR INFRAÇÃO AO ART. 213, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. INEXISTÊNCIA DE PROVA QUANTO À MISERABILIDADE DOS REPRESENTANTES LEGAIS DA VÍTIMA. ELEMENTOS QUE DEMONSTRAM A POSSIBILIDADE DE PROVEREM AS DESPESAS DO PROCESSO. CRIME DE AÇÃO PENAL PRIVADA. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA A PROPOSITURA DA AÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. NULIDADE DO FEITO A PARTIR DA DENÚNCIA, INCLUSIVE. Nos crimes contra os

140 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 95. 141 BRASIL, Código Penal. 5.ed. São Paulo.Saraiva, 2009. 142 BRASIL, Código Processo Civil. 4.ed. São Paulo.Saraiva, 2008. 143 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 95.

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costumes a AÇÃO PENAL, via de regra, é privada, tornando-se pública condicionada à representação unicamente quando a vítima ou seus representantes legais não dispõem de meios para prover as despesas processuais, circunstância que confere ao representante do Ministério Público legitimidade ad causam. No entanto, se os elementos constantes dos autos permitem a conclusão de que inexiste a hipossuficiência, verifica-se a CARÊNCIA de AÇÃO, resultante da ilegitimidade ad causam do órgão do Ministério Público para a deflagração da AÇÃO PENAL, que é, em razão disso, nula ab ovo.CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL. AÇÃO PENAL PRIVADA. DIREITO DE QUEIXA QUE DEVE SER EXERCIDO PELOS PAIS OU REPRESENTANTES LEGAIS DA VÍTIMA NO PRAZO DECADENCIAL DE SEIS MESES, CONTADO DO DIA EM QUE SE DESCOBRIU O AUTOR DO DELITO. ARTS. 103 E 38, RESPECTIVAMENTE, DOS CÓDIGOS PENAL E PROCESSUAL PENAL. LAPSO TEMPORAL TRANSCORRIDO. DIREITO ATINGIDO PELA DECADÊNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO AGENTE RELATIVAMENTE AOS PAIS DA OFENDIDA. ORDEM CONCEDIDA [...].144

Por outra banda, quando se tratar de uma vítima incapaz deverá ela ser

representada pelo seu representante legal, suprindo a falta de capacidade do

incapaz de agir conforme a lei.145

Dessa forma, a legitimidade como qualidade de titular é legal, até mesmo

no conceito civil, não objurgando de tal forma o conceito legitimatio ad causam

quando a lei penal atribui como titular ora ao Ministério Público e ora ao ofendido.

2.3 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO

A possibilidade jurídica do pedido é conhecida por parte da doutrina como

“a providência que o autor pede, na hipótese, deve estar prevista em lei para que a

ação seja regularmente exercida.” 146

Somente é possível o exercício da ação se a conjuntura do

comportamento humano descrito na inicial for fato típico, ilícito e culpável, ou seja, a

conduta descrita na denúncia deve ser típica no ordenamento jurídico.147 É um tipo

144 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Habeas Corpus n.º 2005.018175-2, de Capital/Estreito, Relator(a) Desembargador Sérgio Paladino, Órgão Julgador Segunda Câmara Criminal, DJu 26/07/2005, DJe 26/07/2005. 145 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 532. 146 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 265. 147 GRECO Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 105.

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penal incriminador, apresentado pelo acusador e imputada ao acusado fundado na

justa causa.148

Ressalva-se quando o autor pedir uma condenação sem previsão legal,

ou vedada pelo ordenamento jurídico; nestes casos, é impossível o provimento do

pedido por tratar de conduta atípica. Ambos pedidos são impeditivos ao

desenvolvimento da ação penal por serem inviáveis ao atendimento da pretensão

por não possuírem previsão legal.149

Contudo, mesmo que ocorra um pedido que não seja possível, pode o juiz

ao prolatar a sentença, de ofício, adequar a pena que foi requerida para outra

compatível com a do crime que ficou provado no decorrer do processo. Nesse

sentido, Pacelli corrobora que a possibilidade jurídica do pedido é uma condição

insatisfeita na ação penal, visto que existe o princípio da legalidade . 150

Por outra banda, há quem trate a atipicidade do fato como a inépcia da

denúncia ou queixa, pela não descrição do fato criminoso com todas as suas

circunstancias, pois a “[...] petição inicial que não narra o fato criminoso com todas

as circunstância, ou, se narra o fato, não é ele criminoso.”151

É este o entendimento do Tribunal Superior de Justiça ao conceder ordem

de Habeas Corpus quando a denúncia não descreve todas as circunstâncias do

crime alvejado. Assim está a ementa:

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. ART. 171 DO CÓDIGO PENAL. AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO DO ERRO, ARTIFÍCIO, ARDIL OU OUTRO MEIO FRAUDULENTO. PRECEDENTES DO STJ. ORDEM CONCEDIDA.

1. A denúncia deve atender os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal – expondo o fato tido como delituoso, suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação do crime, o pedido de condenação e a apresentação do rol de testemunhas –, sob pena de ser considerada inepta.

2. A prolação de sentença condenatória não implica a perda de objeto do writ em que se alega inépcia da denúncia, e por conseguinte de falta de justa causa no prosseguimento da ação penal, uma vez que realizada antes do referido decisum.

148 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 147. 149 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 106. 150 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 98/99. 151 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 266.

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3. Não havendo a descrição do erro, artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, que teria sido utilizado pelo paciente, de modo a enquadrar sua conduta na tipificação contida no art. 171, caput, do Código Penal, impõe reconhecer que a denúncia não atende os requisitos do art. 41 do CPP, porque não há exposição do fato tido como delituoso com todas as suas circunstâncias, não permitindo, assim, o pleno exercício de sua ampla defesa, como assegurado constitucionalmente

4. Ordem concedida para anular o processo em relação ao paciente, a partir da denúncia, sem prejuízo de que outra seja ofertada com descrição circunstanciada da conduta a ele atribuída.152

Nota-se que ao concluir seu voto, o relator frisou que sua decisão faz

apenas coisa julgada formal. Nas seguintes palavras:

[...] concedo a ordem impetrada para anular a Ação Penal 266.01.2007.004943-3, a partir da denúncia, inclusive, sem prejuízo de que outra seja ofertada com descrição circunstanciada da conduta a ele atribuída, se for o caso fará coisa julgada formal, pois a denúncia quando rejeitada e transitada em julgado poderia ser reformulada adequando todas as circunstâncias a um novo tipo penal.153

Denota-se que a possibilidade jurídica do pedido decorre do princípio da

legalidade, previsto no art. 5, XXXIX da Constituição da República Federativa do

Brasil, que diz “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia

cominação legal.”154, bem como o impedimento de penas abusivas no art. 5, XVII, da

Constituição da República Federativa do Brasil. O pedido deve ser feito com base

em uma norma abstrata, descrevendo a conduta realizada pelo agente, como

antijurídica e culpável.155

A validade dessa condição está condicionada ao princípio da legalidade

como uma viabilidade de ajuizamento da ação para no final declarar a situação fática

do pedido através de uma decisão de mérito pelo juiz competente, assim Nucci

expõe:

[...] reduzindo-se no princípio da legalidade o cerne da acusação legítima, embora não se possa perder de vista o caráter prático da consideração de existência dessa condição da ação penal. [...] Somente a possibilidade de se permitir o ajuizamento da ação penal, inicialmente, produzindo-se prova ao longo da instrução, caso o

152 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.º 151031/SP, Relator(a) Ministro Arnaldo Esteves Lima, Órgão Julgador Quinta Turma, DJu 13/04/2010, DJe 03/05/2010. 153 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.º 151031/SP, Relator(a) Ministro Arnaldo Esteves Lima, Órgão Julgador Quinta Turma, Órgão Julgador QUINTA TURMA, DJu 13/04/2010, DJe 03/05/2010. 154 BRASIL. Constituição Federal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 155 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 265.

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pedido seja juridicamente viável, significando dizer que o fato é, em tese, considerado como crime.156

Assim, em razão do principio de legalidade consagrado em nossa

Constituição Federal no artigo 5, XXXIX, é que a possibilidade jurídica do pedido

possuí identidade, não necessitando tanta discussão acerca da tipicidade ou não do

pedido, pois somente é crime o que esta previsto como proibido.157

2.4 INTERESSE DE AGIR

Parte da doutrina corrobora o interesse de agir como a união de três

requisitos, sempre “[...] quando houver necessidade, adequação e utilidade para a

ação penal”158 ou em outras palavras, “guarda conexão com a tipicidade e tem por

escopo a movimentação da jurisdição, desde que possível a edição de sentença

condenatória executável.” 159

Fala-se em interesse pela necessidade, porquanto não se pode aplicar a

pena com as próprias mãos, mas somente pelo judiciário, e por utilidade. Pacelli

explica:

[...] desloca-se para o interesse de agir a preocupação com a efetividade do processo, de modo a ser possível afirmar que este, enquanto instrumento da jurisdição, deve apresentar, em juízo prévio e necessariamente anterior, um mínimo de viabilidade de satisfação futura da pretensão que informa seu conteúdo. É dizer: sob perspectiva de sua efetividade, o processo deve mostrar-se, desde a sua instauração, apto a realizar os diversos escopos da jurisdição, isto é, revelar-se útil. Por isso, fala-se em interesse-utilidade. 160

Por adequação Greco Filho vislumbra que haverá interesse se a ação “for

apta a produzir a correção da violação do direito aguido na inicial” 161

Então não haverá interesse na ação se esta não poder produzir os seus

efeitos. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça ao não reconhecer o

156 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal. 5. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 190. 157 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 188/189. 158 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal. 5. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 192. 159 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed. São Paulo: AIDE, 1997. p. 114. 160 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 123. 161 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 106.

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recurso interposto pela acusação, in casu:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR A AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. PRESCRIÇÃO PUNITIVA RECONHECIDA PELO TRIBUNAL A QUO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR.

1. Uma vez reconhecida a prescrição punitiva estatal pelo Tribunal a quo, resta evidenciada a perda de interesse de agir do Recorrente, que busca a nulidade da ação penal diante da incompetência da Justiça Federal para seu processamento e julgamento.A prescrição da pretensão punitiva afasta todos os efeitos do delito, como se ele nunca tivesse existido.

2. Recurso não conhecido.162

Haverá interesse quando não ocorrer nenhum evento previsto em lei que

torne a ação indisponível pela extinção da punibilidade prevista no artigo 107 do

código Penal. Presente um fenômeno processual citado, poderá impedir que o

Estado aplique a sanção penal, ou ainda, que impeça qualquer ação jurisdicional. 163

De outro lado, Lopes Jr., troca o interesse de agir pela “punibilidade

concreta” 164, configurando essa condição o interesse ao processo, e na

possibilidade da aplicação de pena ao infrator até o trânsito em julgado da sentença,

quando não tenha ocorrido nenhuma causa de extinção da punibilidade .

A antiga redação do inciso II do artigo supracitado é a seguinte “[...] II – já

estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa; [...]”.165

Aury demonstra que a “punibilidade concreta” também é causa de

absolvição sumária tipificada no artigo 397, IV do Código de Processo Penal,

corroborando, ainda, que a absolvição sumária será declarada no momento que “o

juiz rejeitar a denúncia ou queixa quando houver prova da extinção da

punibilidade.”166

Podemos ver que dos conceitos de interesse agir aqui levantados por

parte dos processualistas, mesmo com outra nomenclatura, o que merece ser

162 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Ordinário em Habeas Corpus n.º 19.691/RJ, Relator(a) Ministro Laurita Vaz, Órgão Julgador Quinta Turma, DJu 20/11/2007, DJe 17/12/2007. 163 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007 164 LOPES, Aury Jr.. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 336/339. 165 BRASIL. Código de Processo Penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. 166 LOPES, Aury Jr.. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 339.

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levado em conta é a possibilidade de aplicação da pena ao suposto crime levado a

tutela do juiz. E ainda, por grande relevância processual, a analisaremos no próximo

capítulo, mormente em razão de sua conexão com a justa causa.

2.5 CONDIÇÕES ESPECÍFICAS OU DE PROCEDIBILIDADE

A doutrina cognomina as condições de procedibilidade ou específicas da

ação pelo requisito intrínseco a um tipo penal, como denota Pacelli lecionando,

ainda, que apenas “[...] em determinadas situações, a lei exige o preenchimento de

determinadas e específicas condições para o exercício da ação penal.”167

Dentre as três condições já estudadas, existe ainda, por exemplo, a

representação do ofendido ou requisição do Ministro da Justiça como estudado no

primeiro capítulo, que são inerentes à alguns tipos penais.

Outra condição específica que a doutrina aponta é a decisão judicial de

anulação de casamento transitada em julgado, para o ajuizamento da ação penal

privada decorrente da prática do crime de induzimento a erro essencial e ocultação

de impedimento previsto no artigo 236 do Código Penal.168

É outro tema controvertido na doutrina. Uma parte a denomina como

“condição específica”169, enquanto a outra a entende como “possibilidade jurídica do

pedido”.170

A primeira fundamenta ser específica visto que não é uma condição geral

para todos os tipos penais, mas sim para determinados tipos penais. Assim, se

ausente uma das condições específicas, torna-se inadmissível o jus actionis.171

Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que reconhece a

167 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003. p. 100. 168 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 13. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010. p. 124. 169 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 539. 170 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007 171 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 539.

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representação como condição de procedibilidade, ao trancar a ação pena após

verificar que a vítima não compareceu a polícia para noticiar o crime. Senão vejamos

a emente:

HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. AUSÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO DOS GENITORES. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MISERABILIDADE. FALTA DE CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE. DECADÊNCIA. RECONHECIMENTO. ANULAÇÃO DA AÇÃO PENAL.

[...]

2. De igual modo, tem-se que nos casos de crime contra a liberdade sexual, o direito de representação ou queixa-crime depende de mera demonstração de interesse do ofendido em fazer o agressor responder a Ação Penal, não se exigindo grande formalidade (RHC-21.596/MG, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJ de 29.10.07).

3. Embora não se exija rigores formais, é certo que nos crimes de natureza sexual, a ação penal continua a ser pública condicionada.

Sem a representação ou comprovação de miserabilidade, não se terá por preenchida a condição de procedibilidade.

4. No caso, os genitores da vítima não compareceram à delegacia, para noticiar o fato (na verdade, a iniciativa partiu de um agente de polícia). Não houve, nem mesmo, manifestação de interesse na investigação, pois o inquérito foi instaurado de ofício, por portaria.

5. Ademais, o Juiz do processo, atendendo requerimento do membro do Ministério Público, intimou a genitora do menor a fim de que ela fizesse a representação pertinente, mas tal providência não foi levada a efeito, ante a inércia da genitora. Assim, incabível entender esteja preenchida a representação exigida pelo art. 225 do Código Penal.

6. Ordem concedida, com o intuito de anular a ação penal de que aqui se trata (Processo nº 023.03.000003-6, da Vara Única da Comarca de Angélica/MS). Expeça-se alvará de soltura, se por outro motivo não estiver preso o paciente. 172

Enquanto a segunda justifica como sendo “impossibilidade jurídica do

pedido” 173, pois quando ausente o requisito explícito a determinado tipo penal,

torna-se impossível que a ação penal seja amparada pelo judiciário, tornando

impossível a apreciação do pedido perante a algum órgão jurisdicional.

172 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus 93.026/MS, Relator(a) Ministro Og Fernandes, Órgão Julgador Sexta Turma, DJu 17/12/2009, DJe 22/02/2010. 173 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007

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3 A JUSTA CAUSA NA AÇÃO PENAL CONDENATÓRIA

3.1 DA REJEIÇÃO DA DENÚNCIA OU QUEIXA

O Código de Processo Penal, em sua antiga redação, elencava, no art.

43, as hipóteses de rejeição da denúncia:

Art. 43. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I - o fato narrado evidentemente não constituir crime;

II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;

III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.

Sem embargo, a redação do dispositivo supramencionado refere-se à

rejeição da denúncia cujo conteúdo aponta para uma conotação dupla: enquanto os

incisos I e II possibilitam examinar o mérito da causa, o inciso III diz respeito a

questões formais, sendo que não se referia expressamente à justa causa. 174

Por conta disso, tornou-se inevitável a distinção entre as expressões

rejeição, prevista no caput do artigo citado e do não recebimento da denúncia,

segundo o inciso I, do artigo 581, ambos do Código de Processo Penal, questão

debatida tanto pela doutrina quanto pela jurisprudência.175

Fundamentavam os doutrinadores que a rejeição da denúncia equivale ao

próprio julgamento do mérito antecipado, fazendo coisa julgada formal e material.

Logo, por analisar o mérito, o recurso cabível seria o de apelação. Já o não

recebimento da peça acusatória, por estar ligado questões formais, faz coisa julgada

meramente formal, e o recurso cabível seria o recurso em sentido estrito.176

Essa distinção adotada por parte da doutrina e pela jurisprudência era

corroborada pelo disposto no artigo 581, I, do Código de Processo Penal, que diz

respeito ao não recebimento da denúncia ou da queixa, referindo-se tão-somente à

expressão não recebimento. A redação do artigo é a seguinte “Art. 581. Caberá

174 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 147. 175 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 147. 176 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 147.

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recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença: I - que não receber a

denúncia ou a queixa; [...]”.177

Diante dessa divergência, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa

Catarina proferiu diversos julgados entendendo tratar-se de 'erro grosseiro' a

interposição de recurso em sentido estrito nos casos dos incisos I e II do art. 43, do

Código de Processo Penal. Vejamos:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PROCESSO PENAL. DECISÃO QUE REJEITOU A DENÚNCIA COM BASE NO ART. 43 INC. III DO CPP. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL PRETENDENDO A REFORMA. RECURSO IMPRÓPRIO. CABIMENTO DA APELAÇÃO CRIMINAL NA HIPÓTESE DE REJEIÇÃO DA DENÚNCIA (ART. 43 DO CPP). ROL DO ART. 581 DO CPP EXAUSTIVO E NÃO PREVÊ HA HIPÓTESE DE REJEIÇÃO (ART. 43 DO CPP), APENAS A DE NÃO RECEBIMENTO (ART. 41 DO CPP). ERRO GROSSEIRO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO.178

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. PROCESSO PENAL. DECISÃO QUE REJEITOU A DENÚNCIA SOB O ARGUMENTO DE QUE AS ÁRVORES ABATIDAS NÃO SE TRATAM DE FLORESTA, ADOTANDO O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRETENDIDA REFORMA. RECURSO IMPRÓPRIO. DICÇÃO DO ART. 581, I, DO CPP. CASO DE CABIMENTO DE RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL (ART. 593, II, DO CPP). ERRO GROSSEIRO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE INAPLICÁVEL. RECURSO NÃO CONHECIDO.179

Ocorre, todavia, que a Lei nº 11.719/08, que alterou o Código de

Processo Penal, tratou de encerrar a controvérsia ao revogar expressa e

integralmente o art. 43, tratando da hipótese de rejeição da denúncia em seu art.

395, cuja redação passou a ser da seguinte forma:

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I - for manifestamente inepta;

II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou

III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. 180

Veja-se que nenhuma das hipóteses do dispositivo citado refere-se à

177 BRASIL, Código de Processo Penal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 178 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Recurso Criminal n. 2008.027763-6, Relator(a) Desembargador(a) Alexandre d'Ivanenko, Órgão Julgador Terceira Câmara Criminal, DJu 07/08/2008, DJe 07082008. 179 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Recurso Criminal n. 2008.059945-3, Relator(a) Desembargador Torres Marques, Órgão Julgador Terceira Câmara Criminal, DJu 19/11/2008, DJe 19.01.2009. 180 BRASIL, Código de Processo Penal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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análise de mérito; com exceção da justa causa. Assim, o legislador corrigiu a

redação do antigo artigo 43, que, antes, ora exigia o exame de mérito para a sua

análise, ora requisitos formais. 181

Não receber a denúncia ou queixa por inépcia é quando elas não

cumpriam a forma determinada com todas as observações estipuladas no artigo 41

do Código de Processo Penal. Acabando vir a ser estipulada como possibilidade

jurídica do pedido. 182

Já o inciso segundo trata das condições da ação, já estudadas no capítulo

segundo, e dos pressupostos processuais que são incidentes de formalidade do

processo. Pacelli detalha:

a) questões tipicamente preliminares (exceções de suspeição, incompatibilidade ou impedimento, exceções de incompetência do juízo, de litispendência, de ilegitimidade da parte e de coisa julgada, bem como o conflito de jurisdição) [...]

b) questões de natureza acautelatórias de cunho patrimonial, [...]

c) questões tipicamente probatórias, seja no âmbito da aferição da culpabilidade (incidente de insanidade mental), seja no da materialidade do delito (incidente de falsidade documental). 183

Assim, a partir da vigência da Lei nº 11.719/08, já não há mais diferença

entre rejeição e não recebimento da peça acusatória. Rejeitar ou não receber, na

sistemática processual penal vigente, significa negar seguimento à ação,

extinguindo-a liminarmente, sem julgamento de mérito.

Agora, quando a denúncia ou queixa for rejeitada por qualquer hipótese

dentre as elencadas no art. 395, do Código de Processo Penal, caberá a

interposição de recurso em sentido estrito, nos termos do art. 581, I, deste Código,

por se tratar de análise de requisitos meramente formais. 184

Não se pode, no entanto, confundir a rejeição da denúncia com a

absolvição sumária a que se refere o art. 397, do CPP:

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar:

181 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 530. 182 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 266 183 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 13. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010. p. 311. 184 BONFIM, Edson Mougenot. Curso de Processo Penal. 4. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 159.

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I - a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;

II - a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;

III - que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou

IV - extinta a punibilidade do agente. 185

A rejeição da denúncia, como já bem elucidado, faz apenas coisa julgada

formal e permite, em tese, o ajuizamento de nova peça acusatória, desde que

removido o vício. Enquanto a absolvição sumária faz coisa julgada material, por se

tratar de decisão de mérito, o recurso cabível é a apelação. 186

Dessa forma torno-se interessante observar os conceitos trazidos pela

legislação, pela doutrina e pela jurisprudência relativas às condições da ação penal

pela influência que a justa causa exerce na ação e no processo.

3.2 HISTÓRIA DA JUSTA CAUSA

A análise da ação penal e das suas condições é de grande relevância

para desenvolver o estudo da justa causa prevista no art. 395, III, do Código de

Processo Penal, porquanto sua redação aponta uma visão ampla, tanto no direito

processual penal quanto no direito penal.187

O processo criminal é causa de constrangimento à pessoa que a ele

responder, e para torná-lo legal exige-se na sua instauração que a denúncia ou

queixa venha acompanhada de indícios mínimos e idôneos aproximados da conduta

típica, popularmente conhecida como justa causa. Hoje, salvo raras exceções, a

denúncia, além da descrição dos fatos, deve conter provas idôneas para resguardar

o individuo das acusações sem fundamentos.188

Isso porque o constrangimento em responder ao processo penal atinge a

dignidade da pessoa humana, segundo coloca Paganela:

Embora a simples prática do fato típico evidencie, por si só, a existência do interesse em acionar, a persecução não prescinde,

185 BRASIL. Código de Processo Penal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. 186 BADARÓ, Gustavo Henrique. Direito processual penal. Rio de Janeiro: Elsevier. 2008. p. 317. 187 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 97. 188 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed. AIDE: São Paulo. 1997. p. 93.

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entretanto, da necessidade de demonstração pelo perseguidor, mesmo que sumária, da viabilidade do direito invocado, eis que o processo atinge o status dignitatis do acusado.189

Por essa razão inseriram o constrangimento ilegal em nosso ordenamento

jurídico. O constrangimento ilegal foi introduzido na lei Brasileira em 16.12.1830 no

Código Penal do Império, e sempre esteve conexo ao Habeas Corpus pela prisão,

quando ilegal, ferindo o direito de ir, vir e ficar onde está. 190

Nessa época o Habeas Corpus somente era ligado à prisão física, pelo

cárcere do suposto culpado, e com o passar do tempo passou a abranger maiores

constrangimentos como “[...] detenção injusta, ou de ser ela verificada em lugar

ilegítimo, em cárcere privado, ou resultante de uma exigência forçada ou opressão

que comprimisse individualmente a liberdade do cidadão ou do homem.”191

O Habeas Corpus não era garantia constitucional, mas sim uma norma

infraconstitucional. Assim, um fato sem justa causa, além de ser um constrangimento

ilegal, passou a ser considerado quando algumas conjeturas. Miranda às observou:

1) quando o fato em que repousasse não estivesse provado sumária e concludentemente, resultando de tal prova a criminalidade ou justificação para a detenção do paciente; 2) quando o réu estivesse na cadeia, sem ser processado, por mais tempo do que o determinado em lei; 3) quando o processo estivesse evidentemente nulo; 4) quando a autoridade que mandasse efetuar a prisão não tivesse direito de fazê-lo; 5) quando cessasse o motivo que justificava a prisão. 192

Foi a respeito da ilegalidade que Coelho atribuiu a justa causa como ato

legal “[...] no terreno legal das violências, coações, constrangimentos serão – ‘justa

causa’ – os motivos que os fundamentem. Comparem-se pois esses motivos com as

leis e o critério do juiz ou tribunal decidirá de sua existência, justa ou injusta.”

Concluiu o autor que a justa causa estava ligada à tipicidade, ou com a ausência de

requisitos da lei, por exemplo, a prisão sem provas verídicas.193

Miranda analisou maiores violações ao dispositivo de lei, submetendo-a a

qualquer coação que interferia aos direitos de ir, vir e ficar, que são imprescindíveis

189 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed. AIDE: São Paulo. 1997. p. 93. 190 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 135. 191 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 135. 192 MIRANDA, Pontes. História e prática do Habeas Corpus. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 1979. V. 1. p. 144. 193 COELHO, Marcellino Da Gama. Do Habeas Corpus. Rio de Janeiro: Guimarães, 1990. p. 242.

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para o exercício da vida civil. 194

Ou seja, primeiramente a concessão de Habeas Corpus era permitida

para amparar a prisão como norma infraconstitucional e, a partir de reiteradas

manifestações de que coação fere direitos fundamentais é que a justa causa passou

a ser uma garantia constitucional. Analise feita por Miranda “[...]; de modo que, onde

quer que surja, onde quer que se manifeste a violência ou a coação, por um desses

meios, aí está estabelecido o caso constitucional do Habeas Corpus.” 195

Alguns estados não ficaram satisfeitos com a nova conotação de justa

causa como forma de constrangimento ilegal, pois estabeleceram em suas leis

infraconstitucionais a falta de justa causa para somente a atipicidade da conduta,

isto antes do Código de Processo Penal de 1941.196

Foi a partir desse entendimento que a jurisprudência ampliou a noção de

justa causa à coação ilegal, que passou a ser não só relacionada à legalidade da

prisão, mas também para a ação penal. Os tribunais passaram a analisar as causas

de prisão, como também o exame da existência de indícios mínimos indispensáveis

para o suposto acusado responder a um processo penal.197

Já a partir do Código de Processo Penal de 1941, a justa causa sempre

foi tipificada para algumas normas de forma genérica, sem ser definida. Isto fez com

que grande parte da doutrina definisse a justa causa como sendo qualquer ato

contrário à lei. 198

Por fim, veremos nesse estudo científico que a justa causa para ação

penal não possui uma qualificação uniforme, porquanto sofreu uma longa mutação

na história. Vale destacar que a justa causa se encontra em diversos ramos do

direito, e tanto no processo penal como no penal esta possui diversas tipificações

com conceitos diferentes gerando inúmeras discussões.

194 MIRANDA, Pontes. História e prática do Habeas Corpus. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 1979. V. 1. p. 158. 195 MIRANDA, Pontes. História e prática do Habeas Corpus. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 1979. V. 1. p. 175. 196 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 161/162. 197 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 158. 198 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 163.

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3.3 CONCEITO DE JUSTA CAUSA

A partir da evolução histórica sobre a noção de justa causa, se percebe o

quão difícil ou simplesmente impossível é definí-la de forma absoluta em todas as

suas faces no nosso ordenamento jurídico. Esta análise segundo Maria Thereza,

vem por dois motivos “‘causa’ possui significado vago e ambíguo, enquanto ‘justa’

constitui um valor.” 199

Nesse diapasão Maria Thereza observa:

Relativamente ao Direito Penal, analisamos que a justa causa é termo de conotação axiológica, presente em muitos tipos. Constitui ela elemento normativo do tipo, que deve ser valorado em cada caso concreto pelo julgado, por meio de juízo fundado, às vezes, na experiência e conhecimentos que esta proporciona; outras vezes, em conceituação de caráter jurídico, e, em certas ocasiões, com base na apreciação cultural.200

Conclui a referida autora considerando “[...], como o fato ou o conjunto de

fatos que justifiquem determinada situação jurídica, ora para excluir uma

responsabilidade, ora para dar-lhe certo efeito jurídico [...].”201 Por isso existem

inúmeras questões teóricas na doutrina penal, mas, para o objeto do trabalho, basta

saber se ela é uma condição de ação ou não,segundo as três teorias hodienamente

aceitas.

Podemos inferir das idéias supramencionadas o que são as noções

valorativas de justa causa para a ação penal, ao ponto que Greco Filho a define

como sendo “o conjunto de elementos probatórios razoáveis sobre a existência do

crime e da autoria.” 202 Esclarece ele ainda, que a justa causa não é um conjunto de

culpa, mas apenas uma conclusão da validade da ação penal para sustentar um

verdadeiro constrangimento legal.

Da mesma forma, Mougenot identifica a justa causa para ação penal

como “prova acerca da materialidade delitiva e, ao menos, indícios de autoria, de

199 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 97. 200 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 97. 201 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 100. 202 GRECO, Vicente Filho. Manual de Processo Penal. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p.78.

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modo a existir fundada suspeita acerca da prática de um fato de natureza penal.”

Na ação penal, o que se exige é um lastro mínimo de prova, ou melhor

dizendo, a pertinência do pedido, ou o que pode levar a efeito da pretensão

deduzida, de modo a se evitar a movimentação de todo o aparato judicial

inutilmente. 203

Entende-se por justa causa “aquele mínimo de suporte fático,

aquele início de prova (mesmo que indiciária), capaz de justificar a oferta da

acusação em juízo.”204 Vale destacar que, mesmo antes da reforma, muitos

doutrinadores já defendiam a justa causa, como uma condição genérica da

ação penal 205, muito embora existam posicionamentos que a colocam como

exame de mérito.206

Nesse diapasão, percebe-se que há dificuldade de compreender

qual o espaço reservado ao instituto processual da justa causa para ação

penal, podendo ser encontrada em três teorias. Dentre elas, uma mostra a

justa causa para ação penal como sendo o próprio interesse de agir207

, outra

diz ser ela uma quarta condição de ação208

, enquanto a última diz que a justa

causa não é uma condição mas sim a estrutura de toda ação penal. 209

Vale lembrar que o legislador tratou a controvérsia da justa causa

como hipótese de rejeição da denúncia sumariamente na Lei nº 11.719/08,

que fez meras alterações na redação do revogado artigo 43 do Código de

Processo Penal e incluiu a justa causa no inciso III do artigo 395, como

forma de rejeição da denúncia. 210

203 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 98. 204 GOMES, Luiz Flávio. CUNHA, Rogério Sanches. PINTO, Ronaldo Batista. Comentários às reformas do código de processo penal e da lei de trânsito. São Paulo:Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 337. 205 PACHECO, Denilson Feitoza. Direito processual penal. Niterói: Impetus, 2006. p. 200. 206 SOUZA, José Barcelos de. Direito processual civil e penal. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 155. 207 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 354. 208 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 267. 209 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal. 5. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 195. 210 BRASIL, Código de Processo Penal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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3.4 JUSTA CAUSA COMO INTERESSE AGIR

Parte da doutrina trata a justa causa e o interesse de agir como institutos

idênticos. Fundamentam para tanto que o interesse de agir, na ação penal, além de

estar presente em toda a ação, é indispensável para a ação penal que haja justa

causa ou elementos a mostrar uma infração penal e indícios de autoria. Tratam-na

como elemento interesse. 211

De uma forma geral, os doutrinadores não apontam as diferenças entre

interesse em acionar o judiciário com a necessidade de provar o alegado 212. Isto

porque são conceitos semelhantes enquanto o primeiro fica restrito quando se fala

em “necessidade, adequação e utilidade para a ação penal” 213, já a idéia de justa

causa coloca-se mesmo ao conteúdo do direito material em que é baseada a ação

penal. Primeiro analisa-se a prova para após ver se existe interesse, logo possuem

diferentes de aspectos no processo. 214

Ressalva-se que, no exame do interesse de agir como sendo a justa

causa, é pertinente a necessidade do provimento jurisdicional da ação penal.

Segundo coloca Frederico Marques a justa causa seria o motivo, ou interesse, ou

melhor dizendo, o fim com que se deseja a ação penal por meio de prova, pois a

função da “[...] jurisdição não é função que possa ser movimentada sem que exista

motivo que justifique o pedido da tutela estatal; e, como isto se faz por meio da ação,

a regra é que onde não há interesse não há ação.” 215

A necessidade da ação penal é conhecida quando, não obstante “[...] a

ausência de texto expresso exigindo o interesse legítimo, afirma-se que, para

propositura da ação penal, é preciso que haja ‘legítimo interesse’.” 216 Ou, quando

não estiver com nenhuma causa da extinção da punibilidade.

211 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 334/335. 212 BOSCHI, José Antonio Paganella. Ação penal. 2. ed. AIDE: São Paulo. 1997. p. 93. 213 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal. 5. ed. São Paulo: RT, 2008. p. 188. 214 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 165. 215 MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. Rio: Forense, 1961. V. 1. p. 319. 216 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 335.

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Para José Frederico Marques, em seu livro anterior à lei 11.719/08, a

ausência da previsão do legítimo interesse para ação penal era remediado pelo

artigo 648. Senão vejamos:

"é exato que a acusação se funda, não na existência do 'corpus delicti', e sim na 'opinio delicti'; mas esta deve originar-se de suspeita fundada e razoável. Do contrário, inepta seria a denúncia por ausência de justa causa e legítimo interesse do Estado em acusar. A não-existência de texto expresso sobre o legítimo interesse é suprida pela referência à justa causa contida no artigo 648, nº I, do Código de Processo Penal, uma vez que o interesse se confunde com a própria causa do direito de ação”.217

Por outra banda, Tourinho acrescenta justa causa como complemento do

interesse de agir quando nosso Código de Processo Penal reporta-se aos elementos

de convicção do direito alegado, seja no inquérito policial ou não. Nessa hipótese:

[...] a propositura de uma ação acarreta vexames mais ou menos sérios, graves, à pessoa contra quem foi proposta, e, por isso, indispensável que a denúncia ou queixa encontre, nos elementos que lhes serviram de suporte, indícios mais ou menos sérios de que a pessoa contra quem se propôs a ação penal seja tida como a responsável.218

Isto porque, como bem explica Tourinho, o interesse em apurar a prova já

advêm da finalidade do inquérito policial. In casu:

De fato. Diz o art. 4.º do CPP que a finalidade da Polícia Judiciária é a apuração das infrações penais e da sua autoria. Cabe-lhe, pois, investigar o fato infringente da norma e descobrir quem foi o seu autor. Para que? A fim de que o titular da ação penal possa promover a competente ação... como se constata pelo art. 12: “o inquérito policial acompanhara a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra.219

Em outras palavras, quando a inicial estiver desprovida de mínimos

indícios que possibilitam magistrado de exercer o juízo prévio de delibação sobre a

existência de um “estado de fato antijurídico” 220, pode-se dizer que a peça primária,

com pedido de condenação, estará destinada à rejeição, por ausência de interesse

de agir ou de justa causa.

Bem a propósito, Tourinho Filho, que entende justa causa como o próprio 217 MARQUES, José Frederico. Elementos de Direito Processual Penal. Rio: Forense, 1961. V. 2. p. 166/167. 218 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 334. 219 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 336. 220 TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Processual Penal. 31. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. V.1. p. 336.

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legítimo interesse ou interesse de agir, aduz que:

[...] ausente o lastro probatório ou interesse de agir, a denúncia ou queixa será rejeitada por lhe faltar justa causa. E inexistindo esta, haverá manifesto constrangimento ilegal, a teor do art. 648, I, do CPP. Era com base neste dispositivo que os Tribunais vinham trancando a ação penal. Hoje a matéria foi posta no seu devido lugar. Pode-se até dizer que o interesse de agir, ou justa causa, representa, no Processo Penal, a plausibilidade do pedido. Não se confunde com o mérito. Certo que se não houver prova suficiente para a condenação ou para demonstrar a autoria, o Juiz absolve com fundamento no art. 386, V ou VII, do CPP. Mas denunciar é uma coisa, condenar é outra. 221

Em posição contrária, Ada Pellegrini afirma que o interesse de agir não

pode ser unido à existência concreta do direito alegado, nem a sua aparência,

porquanto o direito de ação refere-se ao interesse processual, por isso não pode ser

confundido com o direito material. 222

Aparenta, em princípio, que essa diferenciação não enseja uma

relevância maior, isto por serem e terem idéias similares, até porque que as

consequências do reconhecimento da ausência de justa causa ou de interesse de

agir possui efeitos diferentes.

3.5 JUSTA CAUSA COMO QUARTA CONDIÇÃO DA AÇÃO

Esta teoria é definida por Afrânio Silva Jardim, citado por Rangel 223

como:

[...] suporte probatório mínimo que deve ter a ação penal relacionando-se com indícios da autoria, existência material de uma conduta típica e alguma prova de sua antijuricidade e culpabilidade. Somente diante de todo este conjunto probatório é que, a nosso ver, se coloca o princípio da obrigatoriedade do exercício da ação penal pública [...]

Pacelli indica que analisar a justa causa como condição pode ampliar o

preceito constitucional da ampla defesa, preceito constitucional instituído no art. 5º,

LV, da CF, sustentando que a denúncia ou queixa deve se basear nos moldes do

221TOURINHO, Fernando da Costa Filho. Código de processo penal comentado. São Paulo: Saraiva, 2009. 2 V. p. 15. 222 GRINOVER, Ada Pellegrini. As condições da ação penal. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, 2007, n. 69, p.179-199, Nov./dez. 2007. 223 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 267.

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artigo 41 do Código de Processo Penal entre os fatos alegados e a respectiva prova

levantada. 224

Em sentido contrario, Pacelli sustenta ser uma quarta condição da ação

por preservar a dignidade e moral do acusado, visto que o processo penal pode ter

repercussão moral para o acusado de difícil reparação, e se não houver justa causa

não existirá a ação e, consequentemente, o indivíduo não será exposto a nenhum

constrangimento. 225

Lopes Jr. diz que não se pode confundir a justa causa com o fumus

commissi delicti, explicando que:

Lá, exigimos fumaça da prática do crime, no sentido de demonstração de que a conduta praticada é aparentemente típica, ilícita e culpável. Aqui, a análise deve recair sobre a existência de elementos probatórios de autoria e materialidade. Tal ponderação deverá recair na análise do caso penal à luz dos concretos elementos probatórios apresentados. 226

Corroborando com esse entendimento, Pacelli, aduz que a lei 11.719/08

recepcionou a justa causa como uma quarta condição de ação, bem como afirma

que a jurisprudência já vinha considerando a justa causa como condição, porquanto

os tribunais já vinham admitindo a concessão de Habeas Corpus seja para trancar a

ação penal como o inquérito policial pela ausência daquela.227

3.6 JUSTA CAUSA COMO BASE DA AÇÃO PENAL

Maria Tereza explica que a justa causa não constitui condição de ação,

mas a base da ação penal. Senão vejamos:

Reafirmamos nós que a justa causa não constitui condição da ação, mas a falta de qualquer uma das apontadas condições implica falta de justa causa: se o fato narrado na acusação não se enquadrar no tipo legal; se a acusação não tiver sido formulada por quem tenha

224 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 106. 225 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 106. 226 LOPES, Aury Jr.. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 358. 227 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 107.

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legitimidade para fazê-lo em face de quem deva o pedido ser feito; e, finalmente, se inexistir o interesse de agir, faltará justa causa para a ação penal.228

Nesse sentido é que foi concedida a ordem no Habeas Corpus impetrado

no Supremo Tribunal Federal, que rejeitou a denúncia pela falta de justa causa, pela

bagatela, inferindo que a sonegação não atingiu o mínimo previsto como suficiente a

lesar a receita estatal. Senão vejamos a ementa:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ORDEM CONCEDIDA. Conforme precedentes do Supremo Tribunal Federal (HC 92.438, de minha relatoria), impõe-se a rejeição da denúncia ou o trancamento da ação penal, por falta de justa causa, quando o valor do tributo devido pelo acusado de descaminho for inferior ao montante mínimo legalmente previsto para a execução fiscal (art. 20 da Lei 10.522/2002, na redação dada pela Lei 11.033/2004), uma vez que não faz sentido que uma conduta administrativa ou civilmente irrelevante possa ter relevância criminal. Ordem concedida para reconhecer a atipicidade material da conduta atribuída ao paciente. 229

Da mesma forma, entende o Supremo Tribunal Federal ao rejeitar a

denúncia reconhecendo a atipicidade da conduta quando o fato narrado estava

inteiramente legado ao exercício do mandato parlamentar. Constata-se no

entendimento da autora supracitada, a seguinte ementa:

EMENTA: CRIMES CONTRA A HONRA. REJEIÇÃO DA INICIAL ACUSATÓRIA. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A INSTAURAÇÃO DA AÇÃO PENAL. ATIPICIDADE DA CONDUTA. QUEIXA-CRIME REJEITADA. PREJUDICADO O EXAME DAS PRELIMINARES. 1. O processamento da queixa-crime encontra óbice no inciso III do art. 395 do Código de Processo Penal. Não há justa causa para o exercício da ação penal se o fato increpado ao acusado (detentor de foro por prerrogativa de função) está estreitamente ligado ao exercício do mandato parlamentar, sabido que "os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos" (cabeça do art. 53 da CF/88). Torna-se imperioso, portanto, o reconhecimento da manifesta ausência de tipicidade da conduta descrita na inicial acusatória. [...] 3. Queixa-crime rejeitada, prejudicado o exame das preliminares defensivas. 230

Isto porque a justa causa pode corresponder no plano jurídico à

legalidade da acusação e num plano valorativo à legitimidade da acusação.231 Em

228 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 222. 229 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 96307/GO, Relator(a) Ministro Joaquim Barbosa, Órgão Julgador Segunda Turma, DJu 24/11/2009, DJe 10/12/2009. 230 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Inquérito 2674/DF, Relator(a) Ministro Carlos Britto, Órgão Julgador Tribunal Pleno, DJu 26.11.2009, DJe 25.02.2010. 231 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 222.

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um determinado momento a justa causa está de acordo com a lei, ou o que se pede,

e noutro se ela encontra-se em um estado legítimo, o motivo que levou alguém a

intentar uma ação, ou o porque se pede.232

Veja-se que no caso o objeto da decisão referida, havia possuía a prova

da sonegação e indício da autoria, mas no plano valorativo de legitimidade, a própria

lei diz não ter interesse nas demandas com valores ínfimos, assim não haverá a

justa causa para ação.

Em sentido contrário Lopes Jr., como visto no item anterior, sustenta ser

uma evidente condição, eis que:

“constitui um limite ao (ab)uso do ius ut procedatur, ao direito de ação. Considerando a instrumentalidade constitucional do processo penal, [...], o conceito de justa causa acaba por constituir numa condição de garantia contra o uso abusivo do direito de acusar.” 233

Maria Tereza contrapõe entendimento:

[...] a análise da justa causa, vale dizer, da justa razão ou da razão suficiente para a instauração da ação penal, não se faz apenas de maneira abstrata (vale dizer, em tese), mas também, e principalmente, calcada na conjunção dos elementos acima mencionados (isto é, em hipótese) que demonstrem a existência de fundamento de fato e de Direito, a partir do caso concreto. Diz respeito, portanto, e de forma prevalecente, ao mérito. Daí afirmamos não constituir ela condição da ação penal, nem de procedibilidade.234

Por fim, conclui-se que será legal a acusação para constranger o acusado

a se apresentar em juízo, desde que a denúncia ou queixa seja legítima, ou em

outras palavras, constituída por prova de veracidade de um fato e de autoria que a

“ordem jurídica legitima” 235 para um legítimo exercício do direito à jurisdição.

Não obstante a pertinência da justa causa como condição ou não da

ação, passamos a analisar alguns julgados, para melhor compreensão desse tema.

A segunda Câmara Ciminal do Tribunal do Estado de Santa Catarina

entende a justa causa prevista no artigo 395, III, do Código de Processo Penal como

indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do delito, ao reconhecer

232 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 222. 233 LOPES, Aury Jr., Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2008. p. 342. 234 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 223. 235 MOURA, Maria Tereza Rocha de Assis. Justa Causa para a ação penal. São Paulo: RT, 2001. p. 222.

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como válida a decisão proferida pelo juiz singular que rejeitou a denúncia por não

possuir prova pericial que demonstra ser a materialidade do delito. Nesse diapasão:

RECURSO CRIMINAL. CRIME DE HOMICÍDIO (CP, ART. 121, CAPUT). DENÚNCIA REJEITADA . AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL (CPP, ART. 395, III). IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL . EXAME DE CORPO DE DELITO. PRESCINDIBILIDADE. CADÁVER NÃO ENCONTRADO. MATERIALIDADE INDIRETA ADMISSÍVEL. MORTE DA VÍTIMA. IMPOSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO POR DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. DECISÃO MANTIDA.

I A JUSTA CAUSA relaciona-se com a demonstração mínima de justificativa para a deflagração da persecução penal, analisando-se a verossimilhança entre os fatos alegados na peça inicial e o substrato probatório colacionado pelo órgão acusatório, dos quais se evidenciam a materialidade do delito e indícios da autoria.

Dessume-se, nesse sentido, que a persecução criminal não se pode operar ao bel-prazer do particular ou do órgão ministerial, no sentido de se imputar a prática de conduta criminosa a outrem, sem contudo apontar elementos aptos a substanciar suas alegações. Deve a parte autora, interessada na instauração da ação penal, demonstrar, ao menos minimamente, a verossimilhança de sua acusação, por meio da indicação dos motivos que a justifiquem.

II Não se olvida que o art. 564, III, "b", do Código de Processo Penal, expressa a ocorrência de nulidade quando inexistente o exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, como no caso em comento, o provável homicídio imputado ao recorrido. [...]

E assim, por intermédio do cotejo analítico dos elementos constantes nos autos, embora não esteja presente exame pericial que ateste a possível ofensa sofrida pela vítima e que lhe tenha causado o suposto óbito, sabe-se que em inúmeras situações envolvendo os crimes de homicídio os vestígios acabam desaparecendo, ou seja, o cadáver da vítima resta ocultado ou destruído pelo agente, razão pela qual se tem admitido a dispensa de auto de necrópsia ou laudo cadavérico, em especial quando há registro de ocorrência e os depoimentos das testemunhas estão concatenadas em afirmar a ocorrência do crime. E assim, por intermédio do cotejo analítico dos elementos constantes nos autos, embora não esteja presente exame pericial que ateste a possível ofensa sofrida pela vítima e que lhe tenha causado o suposto óbito, sabe-se que em inúmeras situações envolvendo os crimes de homicídio os vestígios acabam desaparecendo, ou seja, o cadáver da vítima resta ocultado ou destruído pelo agente, razão pela qual se tem admitido a dispensa de auto de necrópsia ou laudo cadavérico, em especial quando há registro de ocorrência e os depoimentos das testemunhas estão concatenadas em afirmar a ocorrência do crime.

III Em que pese a prescindibilidade do exame de corpo de delito direto para o prosseguimento da ação penal, a admissibilidade da acusação por intermédio da materialidade indireta pressupõe uma coleta de elementos aptos a demonstrar, sem espaços para dúvidas, a prática da atividade delituosa.

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Com efeito, muito embora inegável e inconteste o desaparecimento da vítima, consubstanciado nos testemunhos encartados aos autos, além de indícios acerca de uma convivência conflituosa entre o casal, a divergência assinalada pelo relato de uma das testemunhas traduz-se em ponto relevante e suficiente para manter a decisão de primeiro grau no concernente a ausência de materialidade do crime descrito na DENÚNCIA.

Ademais, muito embora não houvesse motivos plausíveis para que a vítima sumisse de sua residência e do convívio com seus familiares, no decorrer das investigações policiais as testemunhas sequer aventaram a possibilidade de o recorrido ter dado cabo da vida da companheira, tampouco relataram terem visualizado o suposto crime de homicídio descrito na exordial acusatória.236

Também foi esse o entendimento da corte especial do Superior Tribunal

de Justiça, tratando como uma garantia ao cidadão de lhe ser imputada uma

acusação somente se baseava em provas mínimas e idôneas da autoria e

materialidade do delito. In casu:

PROCESSUAL PENAL – AGRAVO REGIMENTAL – DENÚNCIA OFERECIDA CONTRA DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL PELA SUPOSTA PRÁTICA DO DELITO TIPIFICADO NO ART. 10, IN FINE, DA LEI 9.296/96 – AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA – REJEIÇÃO DA EXORDIAL ACUSATÓRIA.

1. O processo penal constitucional detém, além da função de regular a ação do Estado para apuração de certo fato criminoso, o mister de servir como garantia ao cidadão de que não será, sem a devida razoabilidade, objeto de constrangimento e intromissão em sua vida privada.

2. A prerrogativa de foro prevista na Constituição da República tem por objetivo assegurar a certos agentes públicos que eventual delito a eles imputado será processado e julgado por órgão colegiado, dotado de maior experiência e longe de eventual ingerência. Garantia que não deve ser utilizada contra o acusado que detém foro privilegiado.

3. A denúncia, nos termos do art. 395, III, do Código de Processo Penal, deve estar lastreada em conjunto probatório mínimo de autoria e materialidade da prática de determinada infração penal. Exordial acusatória desprovida de justa causa em relação a um dos acusados.

4. Agravo regimental não provido.

(AgRg na APn .510/BA, Rel. Ministra ELIANA CALMON, CORTE ESPECIAL, julgado em 30/06/2009, DJe 23/11/2009) 237

Igualmente é o entendimento do Supremo Tribunal Federal ao declarar a

236 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Recurso em Sentido Estrito n.º 2009.071495-5, de Curitibanos, Relator(a) Desembargadora Salete Silva Sommariva, Órgão Julgador Segunda Câmara Criminal, DJu 31/03/2010, DJe 16/04/2010. 237 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental na Ação Penal n.º 510/BA, Relator(a) Ministra Eliana Calmon, Órgão Julgador Corte Especial, DJu 30/06/2009, DJe 23/11/2009.

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falta de justa causa pela atipicidade da conduta. Vejamos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO. DENÚNCIA OFERECIDA. ART. 312, CAPUT, CP. PECULATO-DESVIO. ART. 41, CPP. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. TIPICIDADE DOS FATOS. PRESENÇA DE JUSTA CAUSA. RECEBIMENTO. 1. A questão submetida ao presente julgamento diz respeito à existência de substrato mínimo probatório que autorize a deflagração da ação penal contra o denunciado, levando em consideração o preenchimento dos requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, não incidindo qualquer uma das hipóteses do art. 395, do mesmo diploma legal. 2. De acordo com o direito brasileiro, a denúncia deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado (ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo), a classificação do crime e, quando for o caso, o rol de testemunhas (CPP, art. 41). Tais exigências se fundamentam na necessidade de precisar, com acuidade, os limites da imputação, não apenas autorizando o exercício da ampla defesa, como também viabilizando a aplicação da lei penal pelo órgão julgador. 3. A verificação acerca da narração de fato típico, antijurídico e culpável, da inexistência de causa de extinção da punibilidade e da presença das condições exigidas pela lei para o exercício da ação penal (aí incluída a justa causa), revela-se fundamental para o juízo de admissibilidade de deflagração da ação penal, em qualquer hipótese, mas guarda tratamento mais rigoroso em se tratando de crimes de competência originária do Supremo Tribunal Federal. 4. Registro que a denúncia somente pode ser rejeitada quando a imputação se referir a fato atípico certo e delimitado, apreciável desde logo, sem necessidade de produção de qualquer meio de prova, eis que o juízo é de cognição imediata, incidente, acerca da correspondênci a do fato à norma jurídica, partindo-se do pressuposto de sua veracidade, tal como narrado na peça acusatória. 5. A imputação feita na denúncia consiste no suposto desvio de valores do erário público, na condição de deputado federal, ao indicar e admitir a pessoa de Sandra de Jesus como secretária parlamentar no período de junho de 1997 a março de 2001 quando, na realidade, tal pessoa continuou a trabalhar para a sociedade empresária "Night and Day Produções Ltda", de titularidade do denunciado, no mesmo período. 6. Houve preenchimento dos requisitos do art. 41, do Código de Processo Penal, havendo justa causa para a deflagração da ação penal, inexistindo qualquer uma das hipóteses que autorizariam a rejeição da denúncia (CPP, art. 395). 7. Há substrato fático-probatório suficiente para o início e desenvolvimento da ação penal pública de forma legítima. 8. Denúncia recebida. 238

Como se vê, existe divergência doutrinária em relação à qualificação da

rejeição da denúncia consubstanciada na justa causa é uma das condições de ação

ou uma quarta condição ou, por fim, não sendo nenhuma das condições.

O reconhecimento dos aspectos subjetivos da lei para reconhecer se a

238 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Inquérito n.º 1926/DF, Relator(a) Ministra Ellen Gracie, Órgão Julgador Tribunal Pleno, DJu 09/10/2008, DJe 20/11/2008.

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justa causa é uma condição ou não é de muita relevância.

Tem-se como desfecho que a justa causa é símile ao interesse de agir no

processo penal, porquanto a primeira está convicta na prova, o segundo está como

um pedido idôneo embasado numa convicção abstrata.

Pergunta-se: teria o legislador errado ao denominar a justa causa como

forma de rejeição da denúncia ou queixa sem definí-la como condição para o

exercício de ação?

É do comentário de Marcelus Polastri Lima que vê a impossibilidade de

defini-lá como condição:

Portanto, a justa causa se trata de um requisito especial para recebimento da inicial, ou seja, é erigida como condição de admissibilidade da denúncia ou queixa, que deve se lastrear em um suporte probatório mínimo (ao menos indiciário) e, daí, a exigência própria e específica do processo penal, que, diferentemente do processo civil, exige um procedimento prévio (inquérito ou outra investigação), ou, ao menos, a presença de peças de informação, que embasem a postulação aduzida pela acusação em juízo. E assim deve ser, obviamente, pois o processo penal envolve restrição à liberdade individual e um processo sem lastro algum é, sem dúvida, uma coação ilegal ao imputado (art. 648, I, do CPP) a autorizar, inclusive, impetração de habeas corpus.

Obviamente que não se fará aqui exame de mérito, na forma do art. 386 do CPP, pois não se trata de se aferir procedência da imputação com juízo de mérito, e sim de se averiguar se há suporte probatório mínimo para imputação, ou seja, se o fato narrado está embasado no mínimo de prova, se encontra correspondência em inquérito ou peça de informação.

[...]

Trata-se, na verdade, do mesmo fundamento razoável a que se referia Frederico Marques, que assim já definia a justa causa, aqui identificada com fundamento em elementos razoáveis ou mínimos.239

Com efeito, vale lembrar que o artigo 564, III, "b", do Código de Processo

Penal240, atribui a ocorrência de nulidade quando não há o exame de corpo de delito

nos crimes que deixam vestígios. Vejamos parte da decisão do Recurso em Sentido

Estrito que diz ser inadmissível a utilização de outra prova para substituir o laudo

cadavérico:

[...] Outrossim, o art. 158 da mesma norma prevê a necessidade de referida prova, sem que se possa supri-la pela confissão do acusado.

239 LIMA, Marcelus Polastri. Manual de processo penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 152. 240 BRASIL, Código de Processo Penal. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

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Todavia, ambos os artigos citados trazem em sua redação uma relativização dessa indispensabilidade, o primeiro fazendo ressalva ao art. 167 do diploma adjetivo penal ("não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecidos os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta") e, o segundo, lecionando que o exame de corpo de delito pode ser direto ou indireto. [...] 241

Nesse sentido é a lição de Julio Fabbrini Mirabete:

Por vezes, as infrações não deixam vestígios ou estes não são encontrados, desaparecem, não permanecem, impossibilitando o exame direto. Citem-se como exemplos, o homicídio praticado por afogamento em alto-mar, o furto em que a coisa subtraída não é recuperada, o estupro e o atentado violento ao pudor quando o fato é levado ao conhecimento da autoridade muitos dias após a ocorrência etc. Nessas hipóteses, inexistentes os vestígios, dispensa-se a perícia, fazendo-se então a prova da materialidade do crime por outros meios que não o exame direto. Forma-se, então, o corpo de delito indireto, como prevê a lei, em regra por testemunhas (art. 167).

Ensina a doutrina que não há qualquer formalidade para a constituição do corpo de delito indireto, normalmente revelado por prova testemunhal. O juiz deve inquirir a testemunha sobre a materialidade do fato e suas circunstâncias e a palavra dela bastará para firmar o convencimento do julgador, de acordo com o princípio da livre apreciação. 242

Quando não existir prova direta nos crimes que deixam vestígios é exigida

uma criteriosa avaliação ao magistrado. Isto porque a lei determina nestes casos a

realização do exame de corpo de delito, contudo pode ser suprido por outra prova. É

o que se constata na jurisprudência do STJ:

PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. ESCALADA. INCIDÊNCIA DA QUALIFICADORA. NECESSIDADE DE LAUDO PERICIAL.

I - O exame de corpo de delito, por expressa determinação legal, é indispensável nas infrações que deixam vestígios (art. 158 do CPP), podendo apenas supletivamente ser suprido pela prova testemunhal quando tenham estes desaparecido, ex vi do art. 167 do CPP.

(Precedentes).

II - Na hipótese de furto qualificado por escalada, é de se atentar, ainda, para a necessidade de realização da perícia, conforme o disposto no art. 171 do CPP.

Recurso especial provido.243

E, assim, através de uma análise dos elementos constantes no processo

241 BRASIL, Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Recurso em Sentido Estrito n.º 2009.071495-5, de Curitibanos, Relator(a) Desembargadora Salete Silva Sommariva, Órgão Julgador Segunda Câmara Criminal, DJu 31/03/2010, DJe 16/04/2010. 242 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 11. Ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 272. 243 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1133602/MG, Relator(a) Ministro Felix Fischer, Órgão Julgador Quinta Turma, Dju 16/03/2010, DJe 03/05/2010.

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é que se verá se a justa causa, está presente ou não.

As teorias que envolvem a justa causa são controvertidas, mas similares,

no fim estão intimamente ligadas à coação ilegal, revestidas de indícios de autoria e

prova da materialidade do delito.

Nota-se, por fim, que a Lei 11.719/08 inseriu, dentre as condições da

ação penal mencionadas no segundo capítulo, a justa causa, acolhendo, portanto,

apelo de estudiosos do assunto que defendem como sendo uma quarta condição

capaz de assegurar o respeito efetivo aos direitos da ampla defesa, contraditório e

ao princípio da dignidade da pessoa humana.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de tudo que foi estudado neste trabalho científico podemos

perceber a elevada importância que a justa causa possui para garantia de um

processo penal justo segundo nosso ordenamento jurídico.

Falar de ação dentro do plano constitucional constitui uma garantia ampla

sem nenhuma diversificação entre a natureza do direito alegado e o próprio direito

de ação, conceito que outrora lhe fora dado.

Observa-se na ocorrência de um suposto fato tido como criminoso a

existência de um direito de punir a ser cumprido, qual seja, a aplicação da pena.

Contudo, para que seja atribuída uma pena ao suposto delinquente é necessário

que seja feita por meio da tutela jurisdicional, através de uma ação penal. Logo,

existe a necessidade que seja reconhecido um outro direito conhecido como direito

de ação e, como visto, autônomo ao direito material.

Percebe-se neste estudo desenvolvido que a justa causa para a ação

penal representa a racionalidade que possui a acusação e a necessidade do suporte

probatório das provas produzidas perante a investigação criminal, pois estas é que

vão tornar a acusação apta a produzir efeitos numa instrução criminal.

Sendo certo que o direito de ação é para qualquer cidadão e que para a

ação ser admitida, tornou-se necessário impor requisitos para produzir atos da ação

penal, mas requisitos ao exercício da jurisdição que são as chamadas condições de

ação, quais sejam, legitimidade, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido.

Como se viu, na evolução de um direito ao processo justo se questiona

quais os elementos de prova necessários para a coação torna-se legal? Prova hoje

estipulada por justa causa, estabelecida como um o conjunto de elementos básicos

para a sustentação da acusação.

A partir da evolução doutrinária da coação ilegal, a justa causa passou a

ser apontada pela doutrina ou como condição autônoma, como uma quarta

condição.

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Atualmente, a justa causa está prevista no artigo 395 do Código de

Processo Penal, em seu inciso III, e é causa de rejeição da denúncia, sendo

conhecida como um conjunto de indícios de autoria e prova da materialidade do

delito.

É neste ponto que a justa causa passa a ser uma quarta condição, de

valor fundamental no processo penal.

Para finalizar, corrobora-se com o segmento doutrinário de que a

natureza da justa causa é de extrema importância para formação da ação penal,

possuindo ascendência sobre as suas condições tradicionais, capaz de equiparar-se

a elas quando seu significado deixa de ser específico, para entrar no âmbito

genérico de todas as condições. Afinal, faltando uma delas, não deixa de faltar justa

causa para a iniciação do processo.

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Criminal n. 2008.059945-3, Relator(a) Desembargador Torres Marques, Órgão

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