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1 UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO Vera Lúcia Lopes Dias ROMPENDO A BARREIRA DO SILÊNCIO: INTERAÇÕES DE UMA ALUNA SURDA INCLUÍDA EM UMA CLASSE DO ENSINO FUNDAMENTAL Rio de Janeiro / 2006

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO

Vera Lúcia Lopes Dias

ROMPENDO A BARREIRA DO SILÊNCIO: INTERAÇÕES DE UMA ALUNA SURDA INCLUÍDA EM UMA CLASSE

DO ENSINO FUNDAMENTAL

Rio de Janeiro / 2006

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ROMPENDO A BARREIRA DO SILÊNCIO: INTERAÇÕES DE

UMA ALUNA SURDA INCLUÍDA EM UMA CLASSE DO ENSINO FUNDAMENTAL

Dissertação apresentada à Universidade Estadual do Rio de Janeiro como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Educação. Orientadora: Rosana Glat.

Rio de Janeiro, novembro de 2006.

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A rua de acesso à inclusão não tem um fim porque ela é, em sua essência, mais um processo do que um destino. A inclusão representa, de fato, uma mudança na mente e nos valores para as escolas e para a sociedade como um todo...

(MITTLER, 2003 , p. 36).

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Dedico esta dissertação à minha

querida, abençoada e corajosa mãe,

Wandilma Guerra Lopes.

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AGRADECIMENTOS

Toda pesquisa é um trabalho solitário, ao mesmo tempo que se torna coletivo. Tomo

a liberdade de agradecer de forma singular e sincera:

• a Deus, pela minha vida, pelo meu trabalho, pelas minhas conquistas;

• às colegas professoras do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) pelas

contribuições e incentivo para a realização deste trabalho;

• à minha orientadora, Profª. Drª Rosana Glat, minha terna amiga, pelos seus

conhecimentos, estímulos, paciência, apoio e compreensão durante a elaboração

desta dissertação;

• aos professores do Curso de Mestrado em Educação da UERJ pela contribuição

de seus conhecimentos;

• aos colegas do curso, pelo companheirismo e pelas valorosas discussões em

torno deste assunto do qual somos todos partícipes, afinal, somos todos

diferentes, saudades...;

• às professoras participantes desta pesquisa, à mãe da aluna surda e à diretora da

escola pesquisada, às colegas de trabalho, às chefias que prontamente permitiram

minha ausência para que pudesse dar continuidade aos meus estudos;

• à minha querida mãe, Wandilma Guerra Lopes, cuja força, coragem e apoio

foram fundamentais em minha vida e foi responsável pela minha determinada

vontade de vencer;

• à minha amiga e aluna Taís de Victa Rocha que me incentiva a lutar e a trabalhar

em prol da causa dos surdos;

• à minha amiga e grande incentivadora Profa. Dra. Tânia Amara Felipe;

• àqueles que, no anonimato, estiveram comigo e, de alguma forma, contribuíram

para a concretização desta etapa da minha vida.

MUITO OBRIGADA!

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SUMÁRIO

Índice de Quadros ....................................................................................................p. 8

Índice de Ilustrações..................................................................................................p.9

Resumo..................................................................................................................... p.10

Abstract.................................................................................................................... p.11

CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO.............................................................................p.12

1.1 – Objetivo do Estudo.............................................................................................p.12

1.2 – Contextualização do Problema..........................................................................p. 15

1.3 – Justificativa.......................................................................................................p. 18

CAPÍTULO 2 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA...............................................p.21

2.1 – O que é Surdez..............................................................................p.21

2.2 – Surdez e Linguagem na Concepção Sócio-Interacionista...........p.25

2,3 – História da Educação de Surdos..................................................p.28

2.4 – A Educação de Surdos no Brasil..................................................p.29

2.5 – Principais Metodologias Utilizadas na Educação de Surdos.......p.34

2.5.1 – Oralismo...............................................................................p.35

2.5.2 – Língua de Sinais...................................................................p.37

2.5.3 – Comunicação Total...............................................................p.39

2.5.4 – Bilingüismo...........................................................................p.40

2.6 – Algumas Considerações Sobre os Conceitos de Integração

e Inclusão......................................................................................p.43

2.7 –Principais Características de Aprendizado do Aluno Surdo e as

Dificuldades Encontradas para a sua Inclusão..............................p.50

CAPÍTULO 3 – PESQUISA DE CAMPO.............................................................p. 54

3.1 – Metodologia..................................................................................p.54

3.2 – Sujeitos da Pesquisa......................................................................p.56

3.2.1 – Principais Participantes........................................................p.56

3.2.2 – Perfil da Aluna....................................................................p.57

3.2.3 – Perfil das Professoras da escola..........................................p.59

3.2.4 – Perfil das Professoras de Lia...............................................p.59

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3.3 – Procedimentos...............................................................................p.60

3.3.1 – Procedimentos Preliminares................................................p.60

3.3.2 – Instrumentos para a Coleta de Dados..................................p.62

3.3.2.1– Entrevistas................................................................p.62

3.3.2.2– Questionários............................................................p.63

3.3.2.3 – Observações.............................................................p.64

3.4 – Descrição da Escola....................................................................p.65

CAPÍTULO 4 – ANÁLISE DOS DADOS...............................................................p.67

4.1 – Descrição da Classe......................................................................p.67

4.2 – Comunicação de Lia com seus Coleguinhas de Turma................p.72

4.3 – Relação de Lia com suas Professoras..........................................p.74

4.3.1 – Relação de Lia com a Profa. Cristina...............................p.74

4.3.2 – Relação de Lia com a Profa. Mariza................................p.79

4.4 – Relação de Lia com os Coleguinhas..........................................p. 82

4.5 – Entrevista com a mãe de Lia.......................................................p.86

4.6 – Entrevista com os dois inspetores...............................................p.88

4.7 – Entrevista com a merendeira.......................................................p.89

4.8 – Entrevista com outros professores...............................................p.91

4.9 – Observações Relevantes Feitas em Sala de Aula........................p.92

4.10 – Visão das professoras sobre o processo de inclusão.................p.93

4.10.1– Processo de Inclusão.......................................................p.93

4.10.2 –Aceitação da diferença por força da Lei na

visão das professoras.................................................................p.95

4.11 – A diferença lingüística e o processo de aprendizagem

do aluno surdo no contexto escolar......................................................p.103

4.12 – Os Recursos de Comunicação de Lia com os colegas................p.105

4.13 –A visão da mãe da aluna..............................................................p.106

Considerações Finais.............................................................................................p.110

Bibliografia Citada.................................................................................................p.121

Documentos Citados..............................................................................................p.127

Anexos....................................................................................................................p. 128

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ÍNDICE DE QUADROS

QUADRO 1 – Classificação Da Surdez por Davis e Silvermann ............................p.22

QUADRO 2 – Comparação de Conceitos entre Vygotsky e Bakhtin.......................p.26

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ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES

ILUSTRAÇÃO 1 – Uma das Salas de Aula da Educação Infantil da Escola ..........p.65

ILUSTRAÇÃO 2 – Lia (ao centro) e alguns de seus coleguinhas de turma............p.66

ILUSTRAÇÃO 3 – Atividade do contorno do Boneco-Fantasma do conto lido pela

professora da turma.....................................................................................................p.69

ILUSTRAÇÃO 4 – Alunos mostrando orgulhosos seus bonecos-fantasmas..........p.70

ILUSTRAÇÃO 5 – Alunos Fernanda, uma das coleguinhas de Lia exibindo seu boneco-fantasma .......................................................................................................p. 71

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RESUMO

A presente pesquisa trata do processo de inclusão de uma criança surda no

ensino regular em uma escola particular do Rio de Janeiro. Para tanto, buscou-se: a)

identificar a forma de como a comunicação era estabelecida entre a aluna surda, suas

professoras, seus colegas ouvintes, e a comunidade escolar como um todo.; b) verificar

as maiores dificuldades encontradas pelas professoras para trabalhar com alunos surdos

no contexto de sala de aula regular; c) obter informações da mãe da aluna surda sobre o

grau de satisfação, credibilidade, desenvolvimento e aprendizagem atribuído à sua filha,

estando ela num espaço educativo voltado para os alunos ouvintes.

O universo investigado neste estudo constituiu-se da equipe docente e

administrativa da escola, incluindo as duas professoras que trabalhavam diretamente

com a aluna, e sua mãe. A aluna foi observada no ambiente de sala de aula, na interação

com seus colegas e em demais situações cotidianas da escola. Tratou-se de uma

pesquisa qualitativa com enfoque etnográfico, tendo sido utilizados como principais

instrumentos para a coleta de dados o diário de campo e entrevistas semi-estruturadas.

A língua natural da aluna surda era a língua de sinais (Língua Brasileira de

Sinais -LIBRAS), que foi aprendida por suas duas professoras ao longo do período

letivo, que a ensinaram também à classe, facilitando a socialização e a inclusão da

aluna. Os dados obtidos evidenciaram que a inclusão do surdo no ensino regular lhe

garante desenvolvimento e aprendizagem, desde que haja uma preparação prévia dos

professores; mostraram também que a comunicação entre um aluno surdo e seus colegas

ouvintes ocorre de inúmeras maneiras, através de gestos, oralidade e mímica.

As maiores dificuldades encontradas pelos docentes da escola regular no

trabalho com alunos surdos dizem respeito à ausência de comunicação por meio da

língua compartilhada. Eles também manifestaram apreensão e preocupação com o

futuro ademico da aluna na escola. A mãe da aluna surda, no entanto, estava satisfeita e

acreditava que a filha surda estava incluída e se desenvolvendo dentro do espaço escolar

ouvinte.

Palavras-chave: Educação Inclusiva. Surdez. Capacitação de Professores. Etnografia.

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ABSTRACT

The present research dealt with the inclusion process of a deaf child in a regular

private school of the City of Rio de Janeiro. Its purpose was to: a) identify the way the

communication was established between the deaf student, her teachers, her fellow

students non-handicapped students, and the school community as a whole; b) verify the

main difficulties encountered by the teachers to work with deaf students in the context

of a regular classroom; c) obtain information from the student’s mother about the degree

of satisfaction, credibility and learning she attributed to her daughter in a educational

space arranged for hearing students.

The universe investigated in this study comprised of the teaching and

administrative team of the school, including the two teachers that worked directly with

the student, and her mother. The student was observed in the classroom, in her

interaction with her fellow students and in other daily school activities. It was a

qualitative research with an ethnographic approach; the field diary and semi-structured

interviews were the main data collection tools.

The student’s natural language was the Brazilian Sign Language, which was

learned by her two teachers during the year, and they also taught it to the rest of the

class, making it easier the student’s socialization and inclusion in the class. The data

showed that the inclusion of the deaf in the regular school provides development and

learning if there is a previous preparation of the teachers; they also showed that the

communication between a deaf student and his fellows hearing students takes different

forms through gestures, oralization and mimics.

The main difficulties encountered by the teachers of the regular school to work

with deaf students are related to the lack of communication by means of a shared

language. They also showed apprehension and worry about the academic future of the

student in the school. The student’s mother, however, was very satisfied and believed

that her deaf daughter was included and developing in the hearing school environment.

Key-words: Inclusive Education. Deafness. Teacher Training. Ethnografy.

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CAPÍTULO 1

INTRODUÇÃO

1.1 – Objetivo do Estudo

Essa pesquisa teve como objetivo investigar o processo educacional de uma

aluna surda incluída em uma classe regular, bem como a relação que se estabeleceu

entre ela e suas duas professoras ouvintes, que não possuíam experiência anterior para

lidar com alunos surdos.Os dados foram colhidos a partir de entrevistas com as

professoras e observações na sala de aula freqüentada pela aluna.

Esse trabalho de pesquisa, de cunho etnográfico, não pretende esgotar os

pressupostos que têm orientado o trabalho realizado com os surdos no decorrer dos

tempos. Eles estão presentes na minha formação e em minha prática. Quando

mencionados no presente estudo, objetivam, sobretudo, ilustrar o meu relato, que reflete

a minha experiência como ex-aluna surda e como professora itinerante nas escolas

regulares da Rede Pública do Município do Rio de Janeiro.

Com a disseminação da política de Educação Inclusiva, os professores das

classes regulares passaram a ter um “novo alunado”: “alunos especiais”, “com

deficiência”, “com necessidades educativas especiais”. Estudantes que antes estavam

excluídos da rede regular de ensino começam agora a freqüentar, a “pertencer”, às

escolas da sua comunidade, onde seus irmãos, primos e vizinhos estudam.

A educação inclusiva representa um passo muito concreto e manejável que pode ser dado em nossos sistemas escolares para assegurar que todos os estudantes comecem a aprender que o `pertencer’ é um direito, não um status privilegiado que deva ser conquistado (Kunc ,1992 apud SASSAKI, 1997, p. 123).

Ao professor da classe comum é imprescindível, além da capacitação e de apoio,

que esteja preparado para receber o “novo aluno”, para que a inclusão não seja somente

física, mas que haja uma aprendizagem significativa para todos os alunos. Para que se

dê essa significativa aprendizagem é necessário saber o que o professor pensa, suas

expectativas, suas ansiedades em relação ao “diferente”. É preciso saber, também, o que

esse professor necessita e o que ele almeja, e como o desenvolve na prática.

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As crianças já nascem em um mundo estruturado por valores, atitudes e

representações sociais, e é com estas representações que elas se desenvolverão. Assim,

uma criança especial que já ‘vem rotulada’ pela sociedade, ao entrar na escola terá que

conviver com as representações que seu professor e seus colegas fazem da sua diferença

/ deficiência, sejam elas quais forem. Nesse sentido a representação que o professor faz

de seu aluno é importante, ela definirá a forma das relações entre eles e dará sentido às

experiências a serem vivenciadas influenciando como os demais alunos se relacionam

com seu colegas “especial”. Nesse contexto, os objetivos específicos desse estudo foram:

• Analisar a interação professor-aluno surdo em relação aos aspectos atitudinais,

metodológicos e de participação em situação de ensino em turmas de Educação

Regular.

• Verificar se a posição metodológica adotada e atitude assumida pelo professor, em

relação ao ensino influenciam a participação do aluno surdo nas atividades em sala

de aula.

• Levantar as representações e expectativas dos profissionais da Educação a respeito

da inclusão de alunos surdos no Ensino Regular.

Para alcançar os objetivos propostos, esse estudo está dividido em cinco capítulos.

No capítulo 2.1, construo a definição da Surdez e no capítulo 2.2, apresento as

concepções de surdez e linguagem numa perspectiva sócio-interacionista, sedimentada

nos pressupostos dos autores russos Vygotsky e Bakhtin.

No capítulo 2.3, apresento um breve histórico da educação do surdo no mundo, a

partir de idéias sobre a surdez que, equivocadas ou não, foram evoluindo ao longo do

tempo, em diferentes locais, chegando até nosso país.

No capítulo 2.4, descortino um panorama da história da Educação do Surdo no

Brasil, importante para situar o leitor nas atuais dificuldades encontradas para a sua

integração.

No capítulo 2.5 inicio uma discussão sobre as metodologias para se desenvolver a

comunicação de surdos, quais sejam: o Oralismo, a Língua de Sinais, a Comunicação

Total e o Bilingüismo.

No capítulo 2.6 construo algumas considerações sobre os termos integração e

inclusão e no capítulo 2.7 descrevo as principais características de aprendizado do aluno

surdo e as dificuldades encontradas para a sua inclusão na escola regular.

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No terceiro capítulo, a seguir, descrevo a metodologia da pesquisa, realizada

com uma aluna surda matriculada no ensino regular e sua interação com suas

professoras, pais e seus colegas ouvintes em 2005.

No capítulo 4, analiso as entrevistas realizadas, ressaltando que os dados

coletados estarão sendo analisados sob a ótica da surdez considerada um traço cultural.

No relato abordei como está sendo a inserção da aluna surda, numa escola do ensino

regular de periferia do município do estado do Rio de Janeiro.

Finalmente, apresento minhas considerações finais sobre essa pesquisa, que

revelou ser um estudo de caso bem sucedido de uma inclusão de uma aluna surda no

ensino regular, descrevendo as técnicas utilizadas por suas professoras, bem como as

dificuldades e descobertas efetuadas por ambas para a superação das mesmas.

Busco através desta uma maneira de clarear minha experiência e de outros

professores sobre o tema, por meio de situações que enfrentei e enfrento no dia-a-dia

escolar, dos meus sucessos e dificuldades, entremeados com o posicionamento dos pais,

dos alunos surdos e ouvintes e de outros professores que os atendem diretamente, em

suas salas de aula.

1.2 – Contextualização do Problema

No Brasil, a política de Educação Inclusiva foi difundida principalmente após

a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), fruto de uma conferência mundial de

Educação realizada em Salamanca, Espanha, que contou com representantes de 88

países e 25 organizações internacionais. Nessa Conferência, foi unânime, por parte dos

representantes, o compromisso com a Educação para todos. Embora a Educação

Inclusiva, de acordo com a Declaração de Salamanca, se refira a uma população mais

ampla, ela se aplica também à população tradicionalmente atendida pela Educação

Especial, que, historicamente, vem sendo excluída da escola e da sociedade, de modo

geral.

A Educação Inclusiva tem sido conceituada como um processo de educar,

conjuntamente e de maneira incondicional, nas classes de ensino comum, alunos ditos

“normais” com alunos que apresentem necessidades educacionais especiais – com

deficiência ou não (Carvalho, 1999). Com isso, a escola inclusiva se propõe a ser uma

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escola para todos, que atenda à diversidade do alunado, de modo que todos os alunos

aprendam juntos.

Apesar da inclusão do aluno com deficiência na escola regular ser um direito

garantido pela legislação, muitos preconceitos ainda se fazem presentes na comunidade

escolar. Esses preconceitos, de um modo geral, decorrem da ignorância, negligência,

superstição e medo, fruto de uma construção histórico-social sobre a pessoa com

deficiência.

Os dados que serviram de ponto de partida para corroborar essas afirmações,

foram fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) disponíveis

no site http://www.ibge.gov.br , do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)

disponíveis no site http://www.unicef.org/brazil/indicadores.htm, e também pelo

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), divulgados no site

http://www.inep.gov.br/, que transcreveremos a seguir. Eles servem como alerta para

que os educadores percebam a urgência da implantação de um projeto de capacitação de

professores de classes regulares de todo o Brasil, para atender e incluir adequadamente

os portadores de deficiência como ampliarem seus conhecimentos sobre o processo de

inclusão. Os mesmos revelaram um cenário preocupante, tanto da parte dos alunos

quanto dos professores.

Existem no País 24,6 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência,

equivalente a 14,5% da população, segundo o Censo 2000 do IBGE. Estima-se que

desse total, 5,7 milhões de pessoas sofrem de surdez profunda ou de algum tipo de

deficiência auditiva.

Ao realizar a leitura dos dados do relatório do Censo de 2000 do IBGE,

reparamos que a população com deficiência é representada por todas as faixas etárias.

Ressaltamos o fato de que, quanto maior a idade, maior também a quantidade de

indivíduos que possuem alguma deficiência. Dentre os 24,6 milhões de brasileiros com

deficiência, apenas 1,5% estão na faixa que vai de 0 a 4 anos, enquanto que na

população com 60 anos ou mais este índice é de 29%.

O "Relatório da Situação da Infância e Adolescência Brasileira 2003 - Versão

Preliminar", divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) ,

mostra, dentre inúmeros outros dados importantes, que 61 milhões de crianças e

adolescentes vivem no Brasil : 23,1 milhões na faixa etária de 0 a 6 anos, 27,2 milhões

de 7 a 14 anos e 10,7 milhões de 15 a 17 anos. Destes, 4,7% apresentam uma

deficiência, perfazendo um contingente de 2.9 milhões de pessoas.

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Como já mencionamos anteriormente, os dados do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE) de 2000, mostraram que 5,7 milhões de brasileiros são

portadores de deficiência auditiva. Desse total, mais de 406 mil estão em idade escolar.

Os dados mais recentes são preocupantes. O último censo escolar, de 2004, mostrou que

pouco mais de 56 mil pessoas, entre adultos e crianças, estavam matriculadas na

educação básica em 2003. No ensino médio eram 2 mil estudantes e nas universidades

apenas 300.

Ainda segundo o relatório de 2003 do UNICEF, na faixa de 4 a 6 anos de idade,

38,7% das crianças e adolescentes com deficiência não freqüentam escola, em

contraponto com 38,5% dos que não têm uma deficiência. Na faixa de 7 a 14 anos de

idade, 11,4% dos que têm uma deficiência, em contraponto com 5,1% dos que não têm.

Na faixa de 12 a 17 anos de idade, 21% dos que têm uma deficiência, em contraponto

com 14,1% dos que não têm.

Das crianças e adolescentes com deficiência, na faixa de 4 a 6 anos de idade, não

freqüentam escola 64,6% dos que apresentam paralisia ou falta de um membro, 56,3%

dos que apresentam uma deficiência motora, 54,1% dos que têm deficiência mental,

38,7% dos surdos ou que têm perda auditiva, e 31,7% dos cegos, ou pessoas com baixa

visão.

Das crianças e adolescentes com deficiência, na faixa de 7 a 14 anos de idade,

não freqüentam escola 39% dos que apresentam paralisia ou falta de um membro,

33,5% dos que tem deficiência mental, 29,7% dos que apresentam uma deficiência

motora, 13,1% dos surdos ou que têm perda auditiva, e 6,7% dos cegos, ou pessoas com

baixa visão.

Das crianças e adolescentes com deficiência, na faixa de 12 a 17 anos de idade,

não freqüentam escola 44,9% dos que apresentam paralisia ou falta de um membro,

44,3% dos que tem deficiência mental, 37,27% dos que apresentam uma deficiência

motora, 22,9% dos surdos ou que têm perda auditiva, e 15,9% dos cegos, ou pessoas

com baixa visão.

Estes dados indicam altos índices de exclusão escolar na população de crianças e

adolescentes, em nosso país, e em especial dos que têm uma deficiência. Destes, os mais

atingidos, em ordem decrescente, são os que apresentam paralisia, ou falta de um

membro, os que apresentam algum nível de deficiência mental e os que apresentam uma

deficiência motora. Os que apresentam perda auditiva e os que apresentam perda visual

são os que mais têm tido oportunidade de freqüentar escola, embora ainda com altos

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índices de exclusão. Verifica-se, também, que a faixa etária menos penalizada é a de 7 a

14 anos de idade.

No que se refere à alfabetização, na faixa dos 7 aos 14 anos de idade, 22,4% das

crianças e adolescentes com deficiência não se encontram alfabetizados, em contraponto

com 11,% dos que não têm uma deficiência. Na faixa dos 12 aos 17 anos de idade, a

iniqüidade aumenta, com percentuais de 14% e 3,6%.

Dentre as crianças e adolescentes com deficiência, constata-se que não estão

alfabetizadas, na faixa de 7 a 14 anos de idade, 55,5% das crianças e adolescentes com

deficiência mental, 50,9% das que apresentam paralisia, ou falta de um membro, 44,5%

das que apresentam uma deficiência motora, 28,2% das surdas ou que têm uma perda

auditiva, 14,4% dos cegos ou com baixa visão.

Na faixa de 12 a 17 anos de idade, não estão alfabetizadas 48,3% das crianças e

adolescentes com deficiência mental, 39,1% das que apresentam paralisia ou falta de um

membro, 31,7% das que apresentam uma deficiência motora, 18,1% das surdas ou que

têm uma perda auditiva e 7,0% das cegas ou com baixa visão.

Novamente se pode constatar que as crianças e adolescentes com deficiência

mental e as que apresentam paralisia, falta de um membro, ou uma deficiência motora

são as mais penalizadas quanto ao acesso à linguagem formal.

A média de anos de escolaridade também se mostra baixa, sendo de 3,1 para os

alunos com deficiência na faixa de 10 a 14 anos de idade e de 3,8 para os que não

apresentam uma deficiência. Na faixa de 12 a 17 anos de idade, a média é de 4,8 anos

para os alunos com deficiência, e de 5,5 para os que não apresentam uma deficiência.

No “Relatório da Situação Mundial da Infância 2005”, lançado pelo UNICEF em

dezembro de 2004, demonstra que a deficiência é um grande fator de exclusão da

escola. Ele ressalta que segundo os dados do Dados do Censo Demográfico de 2000

mostraram que o percentual de crianças de 7 a 14 anos sem acesso a escola, que era de

5,5% em todo o Brasil, sobe para 11,4% se consideradas somente as crianças com

deficiência e para assustadores 39% para crianças com paralisia ou falta de algum

membro.Pelo menos 179 mil crianças brasileiras com alguma deficiência estão privadas

de seu direito ao Ensino Fundamental.

No seu relatório mais recente, lançado em dezembro de 2005, intitulado “O

Direito à Sobrevivência e ao Desenvolvimento”, cujo foco está na situação da infância

brasileira nos primeiros seis anos de vida da criança, declara que:

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“[...] As crianças com deficiência também estão em desvantagem. A lei garante que meninos e meninas com deficiência podem freqüentar a educação infantil regular. Do total de 109.596 em creches e pré-escolas em 2004, 78,2% vão para escolas especiais. A existência dessas instituições especializadas é importante, mas a maior parte foca seu trabalho na saúde e não realiza atividades que estimulem a socialização, como em uma escola regular. O ideal seria que as duas atividades fossem complementares.” (UNICEF ,2005, p.66).

Os números mostram que se faz prioritário garantir não só o acesso à

escolarização, mas também a permanência das crianças e adolescentes na escola, e em

especial, aquelas que têm uma deficiência, segmento mais penalizado nesse universo

populacional. Os dados quantitativos obtidos apontam, sem dúvida, para um quadro

alarmante, caracterizado por desigualdade e exclusão, quando se pensa em suas

conseqüências para o desenvolvimento do cidadão brasileiro e do país, como um todo.

1.3 - Justificativa

A motivação para o desenvolvimento dessa pesquisa surgiu da observação das

dificuldades apresentadas por crianças surdas incluídas no ensino regular na sua relação

com seus professores. Como professora do Instituto Nacional de Educação de Surdos

(INES), desenvolvo um trabalho de orientação a pais de crianças surdas que freqüentam

escola regular e recebem atendimento especializado paralelamente na Instituição. A

minha convivência com essas crianças e seus pais me levou a uma busca de caminhos e

alternativas que facilitassem a integração dessas crianças nas classes regulares.

A minha experiência pessoal como professora surda, conduziu-me também a

uma reflexão a respeito do estigma social que é aplicado ao aluno surdo, encaminhado

de uma classe especial para uma classe regular, considerando, principalmente que sua

“deficiência” – a surdez – tenderá nessa passagem a ser mais evidenciada no contato

com os colegas, ditos normais e no relacionamento com seu professor.

Desse modo, essa pesquisa visa oferecer subsídios para futuros pesquisadores

interessados em examinar os fatores críticos de sucesso e fracasso para a inclusão de

alunos portadores de necessidades especiais, com ênfase na surdez, em classes

regulares.

Considero que esse estudo tem especial relevância pois, a partir de 1997, o

Ministério da Educação, pelo Programa de Municipalização de Educação Especial,

incentivou os Municípios a ofertarem atendimento educacional adequado aos alunos

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portadores de necessidades especiais, considerando que é onde o aluno mora que devem

ser resolvidas as diferentes questões que cotidianamente negam a sua cidadania.

Adicionalmente, poderia justificar a sua relevância, pelo fato de que a prática da

inserção de crianças com necessidades educativas especiais no país é recente e demanda

estudos com vistas a subsidiar políticas mais efetivas de formação inicial e continuada

de professores para a educação inclusiva e implementação de novas organizações

escolares.

Concomitantemente às novas determinações estabelecidas pelo Ministério da

Educação, o INES passou a receber apelos desesperados por parte dos professores de

todo o Brasil, por meio de cartas, telefonemas, fax e e-mails pedindo que fossem feitas

visitas às escolas e realizados mais eventos e cursos para os profissionais da área da

Educação que desejassem se aperfeiçoar, na grande maioria dos casos, nos problemas

envolvidos na inclusão de alunos surdos em classes regulares.

Assim sendo, com o aumento da demanda de alunos surdos na escola regular é

fundamental se conhecer a imagem que professores de escola regular estão construindo

a respeito da surdez e do aluno surdo, bem como a influência desta imagem na sua

prática pedagógica. Há que considerar, ainda, o aspecto qualitativo de como essa

inclusão vem acontecendo na prática cotidiana.

Aceitar um aluno com deficiência numa sala de aula comum implica em diversas

mudanças, sobretudo nas atividades de ensino e isso, muitas vezes acaba sendo uma

tarefa dos professores. Dessa forma, para os professores do ensino fundamental que não

têm uma visão da Educação Especial, torna-se, no mínimo, complicado entender o

ensino inclusivo. Oliveto e Manzini (1999) ao estudarem as dificuldades de professores

de pré-escola no trabalho de inclusão dos alunos com deficiência, apontam que os

professores têm necessidades de obter maior conhecimento sobre a criança portadora de

deficiência e também como desenvolver procedimentos para trabalhar com ela.

Ainda segundo esses autores, a resistência dos professores do ensino regular em

trabalhar com os alunos portadores de deficiência se deve, na maioria dos casos, na falta

de conhecimento de como lidar com esses alunos e, assim, eles se sentem inseguros em

assumir um trabalho inclusivo. Eles acrescentam ainda que, o próprio profissional da

Educação Especial apresenta essa mesma atitude, por entender que, à medida que seus

alunos forem incluídos no ensino regular, seus espaços de atuação podem ser reduzidos.

De certa forma, sentem-se ameaçados profissionalmente.

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Para Fujisawa (2000, apud MIRANDA,2001), contudo, na perspectiva do

paradigma da inclusão é um risco um tanto remoto o temor dos professores da Educação

Especial de perderem o seu espaço, devido à ampliação do papel desses especialista, no

sentido de ser um mediador e um articulador do processo educativo dos alunos

deficientes sob sua responsabilidade, seja no atendimento direto a essa população, ou na

função de apoio ao trabalho pedagógico desenvolvido pelos professores do ensino

regular.

Para FREITAS (2001),

[...] o professor, em sua prática diária, deve ter consciência das dificuldades e limitações desses educandos surdos e assim, construir a sua prática tendo o aluno como referência. A presença de alunos surdos em sala de aula de ensino regular, nas escolas observadas, fez com que os professores adaptassem a sua didática de forma que os alunos fossem atendidos (pg.23).

Ainda segundo esse autor,

[...] deveremos nos questionar se a escola inclusiva tem essa conotação a partir de adaptações curriculares ou da conscientização dos profissionais envolvidos no processo educativo? Os alunos têm que aprender juntos sempre que possível, mas a instituição de ensino tem que assegurar condições para que esse processo seja concluído. Mas não vamos atribuir toda culpa à escola, pois ela é apenas a ponta do “iceberg”. Os Estados e Municípios deveriam assegurar que essas instituições tivessem condições necessárias para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais. Na fala de um professor entrevistado, o processo da Escola Inclusiva fica caracterizado como “atropelado”. De certa forma, no caso os professores designados pelo Estado, estes chegam até a escola sem ter conhecimento do que vão encontrar. Nesse caso, nota-se a falta de compromisso do órgão gestor, que não se preocupa em garantir que esses educandos tenham um atendimento adequado as suas necessidades (p.25).

O aspecto mais importante desta pesquisa é analisar como está sendo a inclusão

de uma aluna no cotidiano de uma classe regular, focalizando em quais são as

dificuldades e os fatores que contribuem para o sucesso ou o fracasso dessa experiência.

Portanto, podemos também considerar que a realização dessa pesquisa visa

fornecer subsídios para a elaboração de programas de qualificação do magistério,

especialmente aqueles voltados para a educação de alunos portadores de surdez.

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CAPÍTULO 2

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 – O que é Surdez

A Surdez é resultado da perda, maior ou menor, da capacidade de percepção

normal do sons. Verifica-se a existência de vários tipos de portadores de deficiência

auditiva, de acordo com a época em que a mesma ocorreu (se antes ou após a aquisição

da língua oral), de acordo com os diferentes graus de perda da audição, de acordo com a

causa, etc. (Brasil, 1995).

Segundo SACKS (1999), o termo “surdo” é vago, ou melhor, é tão abrangente

que nos impede de levar em conta os graus de surdez imensamente variados, graus que

têm importância qualitativa e mesmo “existencial”. Há os que têm “ dificuldade para

ouvir”, pessoas estas que conseguem ouvir parte do que se fala com o auxílio de

aparelhos auditivos e um pouco de atenção e paciência provindo de quem fala com eles.

Há também os “seriamente surdos”, muitos deles vítimas de doenças ou dano no

ouvido, na juventude; mas no caso deles, assim como no dos que têm dificuldade para

ouvir, ainda é possível ouvir a fala, em especial com os novos e modernos aparelhos

auditivos, altamente sofisticados, computadorizados e “personalizados” que surgiram

recentemente no mercado. Existem também os “profundamente surdos”, que não têm

esperança alguma de ouvir qualquer fala, não importa que avanços tecnológicos

imagináveis possam surgir. As pessoas profundamente surdas não são capazes de

conversar de maneira usual , elas precisam ler os lábios, usar a língua de sinais ou

ambas as coisas.

Quanto à medição auditiva sabemos que a audição, é medida em decibéis (dB),

unidade sonora que afeta a intensidade, o volume dos sons, e, em Hertz (Hz), unidade

que determina o comprimento de onda sonora (número de ciclos/segundo), atendendo a

capacidade de perceber sons graves e agudos.

Segundo DAVIS e SILVERMANN (1970), a audição normal quanto à

intensidade sonora, tem seu limiar situado entre a faixa de 10 a 26 dB e quanto à

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freqüência de 20 a 2000 Hz(1995). As freqüências mais importantes para o

reconhecimento da fala estão entre os intervalos de 500 a 2000 Hz.

Os autores Davis e Silvermann (1970, apud STROBEL & DIAS, 1995, p.7-8),

elaboraram o quadro comparativo a seguir, que baseia-se na média obtida na soma do

limiar encontrado em 500, 1000 e 2000 Hz:

QUADRO 1: Classificação Da Surdez por Davis e Silvermann

Classificação Média Encontrada Características

Normal 0 a 25 dB

Não percebe os fonemas da mesma forma,

isto altera a compreensão das palavras;

voz fraca e distinta não é ouvida.

Leve 26 a 40 dB Criança considerada desatenta; a aquisição

da linguagem é normal/lenta e, mais tarde,

vai ter dificuldade na leitura e/ou na

escrita; precisa de acompanhamento.

Moderada 41 a 70 dB Percebe a voz com certa intensidade, pode

ocorrer atraso na linguagem/alteração

articulatória, discriminação difícil em

lugares ruidosos.

Severa 71 a 90 dB Identifica ruídos familiares

(predominando os graves) ; percebe voz

forte; família necessita de orientação

precoce para auxiliar o rendimento da

criança; compreensão verbal associada à

grande aptidão visual;

Profunda Acima de 91 dB Não percebe a voz humana, sem estímulo

adequado (ex:prótese auditiva); não há

feedback auditivo; maior facilidade para

perceber as pistas visuais.

De acordo ainda com Davis e Silvermann (1995), o entendimento da função do

som é dada por três níveis:

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• Nível simbólico: Refere-se ao nível social. A audição serve para compreender a

linguagem e, assim, as palavras, que representam os objetos que fazem parte da

realidade. Permite, assim, a verbalização e facilita a intercomunicação. Essa

função da audição é a mais conhecida. Por ser a linguagem, simbólica por

natureza, esse nível é chamado assim, de nível simbólico.

• Nível de alarme: Esse nível funcional do som está ligado à vigilância, atraída

pelo som. Como afirma McLuhan (1972), o ouvido não fecha, como os olhos.

Dia e noite, ele está aberto para informar qualquer modificação no ambiente.

• Nível primitivo: Por meio desse nível de som, há o relacionamento com o

mundo ao nível muito primitivo, abaixo dos níveis de percepção e consciência.

São os sons, ruídos de fundo, que realizam um importante papel na simbiose

com a vida diária.

Pesquisas mostram que um ou dois bebês entre mil nascem com problemas

auditivos sérios e de 20 a 30 irão apresentar alguma perda auditiva até a idade de cinco

anos (BOOTHROYD, 1982; NORTHREN & DOWNS, 1989). Estudos mais recentes,

referenciados pelo Joint Committee on Infant Hearing da American Academy of

Pediatrics estimam a existência de 1,5 a 6,0 crianças com perdas auditivas em cada

1.000 nascimentos (JCIH, 1995).

Para melhor compreendermos a surdez, cabe saber sua classificação em um

modelo clínico-terapêutico versus um modelo cultural, que demonstram que a maioria

das crianças que não fala ou têm dificuldades no aprendizado da linguagem, durante o

primeiro ano de vida, pode apresentar , como motivo, a surdez: “Estatísticas mostram

que a surdez é responsável por 60% dos casos; 30% têm como causa, a personalidade

da crianças, resultada de problemas no ambiente; e 10% por causas desconhecidas”,

VIANA (1996,p.47).

A privação auditiva constitui, assim, grave distúrbio sensorial, que afeta a

capacidade de comunicação oral e de aprendizagem.

Convém aqui ressaltarmos que não é apenas o grau de surdez que importa, mas

principalmente a idade, ou estágio em que ela ocorre. Segundo SACKS (1999), para

pessoas que perderam a audição antes de terem adquirido a linguagem (a chamada

surdez pré-lingüística) encontram-se numa categoria diferente de todas as demais. Para

essas pessoas que nunca ouviram, que não têm lembranças, imagens ou associações

auditivas possíveis, nunca poderá ocorrer a ilusão do som e o resultado é algo

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devastador num sentido radical. Os surdos pré-lingüisticos ficam incapazes de ouvir

seus pais e correm o risco de ficarem atrasados, quando não permanentemente

deficientes, na compreensão da língua, a menos que se tomem providências eficazes

com toda a presteza. Sacks considera que, para um ser humano, ser deficiente na

linguagem é uma das calamidades mais terríveis, porque é apenas por meio da língua

que entramos plenamente em nosso estado e cultura humanos, que nos comunicamos

livremente com nossos semelhantes, adquirimos e compartilhamos informações.

Para Silva (1996), a surdez prejudica a recepção da fala e sua retroalimentação,

essenciais ao aprendizado dos atos coordenados necessários à aquisição da língua oral.

A perda auditiva é o impedimento maior para o desenvolvimento da língua oral, pois

restringe o indivíduo na recepção desta e reduz sua habilidade em monitorar sua própria

fala.

Surdos severos e profundos são incapazes de aprender a falar sem técnicas

especiais. A falta da audição reduz a monitoração primária necessária ao

desenvolvimento normal da aquisição da língua oral. Para Helen Keller, cega e surda,

que aprendeu a comunicar-se pelo tato, os problemas da surdez são mais profundos,

mais complexos e mais importantes que os da cegueira. Diz ela : “a surdez é o maior

dos infortúnios, a perda do mais vital dos estímulos: o som da voz, que nos traz a

linguagem, desencadeia os pensamentos e nos mantém na companhia intelectual dos

homens” (ALMEIDA & IORIO, 1996).

A linguagem é uma atividade mental que abrange os dois níveis de experiência:

simbolização e conceituação. A linguagem surge quando há associação entre o

significante (sons e imagens) e o contexto que traz o significado (idéias ou experiências

que se quer comunicar). O ser humano utiliza um código lingüístico, isto é, utiliza uma

língua para se expressar (Rinaldi, 1997).

Segundo Silva (1996), a língua oral utiliza elementos simbólicos com

capacidade quase infinita de construção e, sendo abstrata, tornou-se o instrumento

fundamental de comunicação do pensamento humano. A língua oral é desenvolvida e

organizada através das relações afetivas e sócio-culturais do indivíduo em interação

com o ambiente.

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2.2 – Surdez e Linguagem na Concepção Sócio-Interacionista

A língua carrega consigo conceitos generalizados, que são fonte do

conhecimento humano. Instrumentos culturais especiais, como a escrita e a aritmética,

expandem enormemente os poderes do homem, tornando a sabedoria do passado

analisável no presente e passível de aperfeiçoamento no futuro (VIGOTSKY, LURIA &

LEONTIEV, 1988).

Segundo Albano (1990) a fala humana é importante, sendo substrato

indispensável para a construção da linguagem, construída na interação com o adulto.

Para a autora, quatro condições são absolutamente para o desenvolvimento da

linguagem: a presença de um interesse subjetivo por ela; a existência de pelo menos um

sistema sensório-motor que permita exorbitar da brincadeira; a inserção num meio onde

a linguagem faça parte das rotinas significativas; a presença de uma língua

minimamente referenciada. Na concepção da autora, aprender a falar é descobrir como

gramaticalizar recursos já explorados ludicamente nos subsistemas da

sensoriomotricidade que melhor se prestem à reinvenção de processos de auto-

referência.

Para Albano (1990), o que o homem tem a mais que outros animais é

simplesmente um excedente de substância neural eficientemente organizada de forma a

permitir-lhe uma maior capacidade e vontade de brincar. Assim, o homem pode ser

considerado o único animal capaz de tirar grande prazer do exercício exploratório das

suas potencialidades.

Do meu ponto de vista, a abordagem sócio-histórica do desenvolvimento

humano, é a que melhor se aplica para o entendimento do desenvolvimento da

linguagem no ser humano. Nesse tipo de abordagem, a relação com o outro se dá, na e

pela linguagem, que configura o caracteristicamente humano. À luz dessa corrente de

pensamento, o homem somente se constitui como sujeito no âmbito das interações.Isso

ficou bem evidenciado nos postulados enunciados nas obras de dois autores Bakhitin e

Vygotsky. Embora Bakhitin e Vygotsky tenham vivido na mesma época (começo do

século XX) na antiga União Soviética e terem ambos estudado sobre linguagem, não

encontramos na literatura indícios de algum encontro entre eles.

No entanto, muitos conceitos desenvolvidos por ambos são semelhantes, como

os descritos no seguinte quadro comparativo:

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QUADRO 2 – Comparação De Conceitos Entre Vygotsky E Bakhtin

Vygotsky Bakhtin

Linguagem: “O desenvolvimento do

pensamento é determinado pela

linguagem, isto é, pelos instrumentos

lingüísticos do pensamento e pela

experiência sócio-cultural da

criança.”(1991:44)

Língua: “A língua constitui um processo

de evolução ininterrupto, que se realiza

através da interação verbal social dos

locutores”(1997: 127)

Palavra: “As palavras desempenham um

papel central não só no desenvolvimento

do pensamento, mas também na evolução

da histórica da consciência como um

todo. Uma palavra é um microcosmo da

consciência.”(1991: 132)

Palavra:“A palavra (o discurso interior)

se revela como o material semiótico

privilegiado do psiquismo. (...) se

apresenta como o fundamento, a base da

vida interior. A exclusão da palavra

reduziria o psiquismo a quase

nada.”(1997:52)

Curso da linguagem:”O pensamento

não é simplesmente expresso em

palavras, é por meio delas que ele passa

a existir” (1991:108)

Curso da linguagem:“Não é a atividade

mental que organiza a expressão, mas ao

contrário, é a expressão que organiza a

atividade mental, que a modela e

determina sua orientação”(1997: 112)

Os dois autores demonstraram, assim, a importância da interação social para o

desenvolvimento da linguagem, a primazia da palavra para a constituição do

pensamento / psiquismo e o fato de que a aquisição da linguagem que se faz “de fora

para dentro” (do social para o individual).Tais aproximações nos fazem eleger os dois

autores para embasar nossas reflexões sobre a educação dos surdos, embora Bakhtin

nunca tenha escrito sobre os surdos.

Meus questionamentos a respeito da educação dos surdos, a partir desta

concepção socio-interacionista adotada pelos autores, é a seguinte:

Partindo do pressuposto de que a língua não pode ser ensinada, mas precisa ser

vivenciada, como podemos acreditar que o ensino da língua oral possa suprir as

necessidades lingüísticas do surdo, tanto na função de interação social como de suporte

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para seu pensamento? Como é possível à criança surda, que nasce numa família de

ouvintes desenvolver-se lingüísticamente numa língua não acessível a ela ?

De acordo com os princípios teóricos postulados pelos dois autores, o surdo,

como qualquer pessoa, necessita de uma língua que possa ser adquirida

espontaneamente, apenas pelo convívio social. Nesta concepção socio-histórica a língua

não é vista como algo que é transmitido do adulto para a criança e aprendido pela

imitação. Ao contrário, os autores destacam o papel ativo da criança no fluxo dinâmico

da cadeia de comunicação de seu meio social.

“Os indivíduos não recebem a língua pronta para ser usada; eles penetram na corrente de comunicação verbal; ou melhor, somente quando mergulham nesta corrente é que sua consciência começa a operar.(...) Os sujeitos não “adquirem” a língua materna; é nela e por meio dela que ocorre o primeiro despertar da consciência. (ALBANO,1990,p. 108)

Por esta razão, defendo uma educação bilíngüe para os surdos, ou seja, de que a

criança que nasceu surda profunda adquira a Língua de Sinais o mais cedo possível com

um adulto surdo. A Língua de Sinais permite ao surdo um desenvolvimento completo

de sua linguagem, pois, sendo uma Língua de modalidade visual-gestual não há

qualquer empecilho orgânico para que o surdo a adquira. Esta língua não precisa ser

ensinada. Ao ter contato com adultos e outras crianças que usam a Língua de Sinais, a

criança poderá mergulhar no “fluxo da comunicação” e ter, então, o despertar da sua

consciência.

Segundo BRITO (1993):

“As Línguas naturais têm a importante função de suporte do pensamento, função esta freqüentemente ignorada por especialistas envolvidos na educação do surdo que consideram a Língua apenas como meio de comunicação.(...) As Línguas de Sinais, por serem naturais e de fácil acesso para os surdos, são extremamente importantes para o preenchimento da função cognitiva e suporte do pensamento.” ( p. 34)

A respeito das Línguas de Sinais, convém ressaltar que em 1930, Vygotsky

aconselhava os professores a evitar a “mímica”, pois ela estava tão arraigada nos surdos,

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que era preciso utilizar métodos anti-naturais para acabar com ela. O mais importante

nesta afirmação é a própria constatação de que a Língua de Sinais é inerente, está

arraigada aos grupos surdos. Ao orientar os professores a lutarem contra ela, Vygotsky

confirma a importância da mímica para os surdos, ou seja,o fato de estar “arraigada”

neles. A história nos mostrou que essa luta foi em vão e que todos esforços das

educadores não foi suficiente para apagar essa língua dos grupos surdos.

Portanto, hoje, podemos afirmar com certeza, que ao invés de lutar contra ela, a

educação dos surdos deve escolher como língua de instrução a língua própria dos

grupos surdos, não apenas como uma concessão, mas como uma escolha política.

2.3 – Históricos da Educação dos Surdos

Até meados do século XVI, surdos, denominados surdos-mudos, eram

considerados ineducáveis e, consequentemente, deixados à margem como inúteis à

coletividade. No entanto, desde essa época, já havia esforços para tornar possível a sua

educação. O médico italiano Girolamo Cardano, por exemplo, ainda no século XVI,

afirmou que os surdos-mudos podiam ser postos em condições de “ouvir lendo e de

falar escrevendo“.Posteriormente, o frade espanhol Pedro Ponce de Leon conseguiu

ensinar a linguagem articulada a surdos-mudos e, em 1620, outro espanhol, Juan Pablo

Bonet, publicou o primeiro livro sobre o assunto, em que explica como exercitar o

educando para a emissão dos sons. Visto que os surdos na época quase sempre eram

também mudos, isso fazia com que eles não fossem reconhecidos como pessoas capazes

de possuírem direitos legais. O reconhecimento de surdos filhos de famílias nobres

como pessoas de lei, para que pudessem herdar títulos e a fortuna da família, foi um

fator para o desenvolvimento de métodos educacionais especiais para os surdos (Sacks,

1998).

Até 1750, a situação das pessoas com surdez pré-lingüística era calamitosa, pois

eram considerados incapazes de desenvolver a fala, e portanto “mudos”, incapazes de

comunicar-se livremente até mesmo com pais e familiares, restritos a alguns sinais e

gestos rudimentares. Isolados, exceto nas grandes cidades, até mesmo da comunidade de

pessoas com o mesmo problema, privados de alfabetização e instrução, de todo o

conhecimento do mundo, forçados a fazer os trabalhos mais desprezíveis, vivendo

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sozinhos, muitas vezes à beira da miséria, eram considerados pela lei e pela sociedade

como pouco mais do que imbecis (Sacks, 1998).

O abade francês Charles Michel de L’Épée criou o chamado método silencioso

no século XVIII. Sem desprezar a importância da palavra oral, L’Épée deu relevo

especial ao emprego de sinais manuais, estabelecendo uma linguagem convencional,

como meio de instrução dos surdos. Esse sistema foi amplamente difundido em toda a

Europa até o surgimento do método oral, que emprega a palavra e a leitura labial na

transmissão das idéias. A controvérsia entre defensores do método oral e os partidários

da linguagem de sinais que se estabeleceu em princípios do século XIX, persiste ainda

hoje (Enciclopédia Barsa, 1993).

2.4 – A Educação de Surdos no Brasil

Na época do Império, as elites dirigentes, que já tinham por costume enviar seus

filhos para estudar na Europa, passaram a mandar também para lá os que apresentavam

deficiências, para que se beneficiassem dessas viagens educativas. A primeira tentativa

de institucionalização da educação do deficiente no Brasil foi feita em 1835 pelo

Deputado Cornélio Ferreira, que apresentou à Assembléia um projeto de lei para a

criação do cargo de “professor de primeiras letras para o ensino de cegos e surdos e

mudos” (Fundação Getúlio Vargas, 1989). Entretanto, somente em 1856, teve início o

ensino dos surdos-mudos, quando o professor francês Eduard Huet, também surdo,

fundou no Rio de Janeiro, sob os “auspícios” de D. Pedro II, o Instituto Nacional de

Surdos-Mudos – INSM, hoje, Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES.

Segundo REIS (1992):

Corria a informação, nos primórdios da instituição, de que D. Pedro II teria trazido para o Brasil o professor Huet para iniciar o ensino do surdo no Brasil, porque a Princesa Isabel tinha um filho que era surdo e que, em função disso, D. Pedro II teria se interessado em iniciar a educação dos surdos no Brasil (p. 62).

O terceiro Diretor do INSM foi Tobias Rabello Leite, escreveu assim em sua

obra “Compêndio para o Ensino de Surdos-Mudos” :

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É estimá-lo, e dar-lhe sinais de afeição. Por outro modo não se

poderia obter dele confiança, nem dominar sua índole selvagem. [...]

A educação, que é indispensável ao surdo-mudo, [...] consiste nos

hábitos de asseio, de decência, de ordem, de obediência e respeito,

assim como na cultura das faculdades intelectuais e morais pela

prática da linguagem (LEITE,1881, p. 52).

Pode-se observar, em algumas considerações desse autor, indícios das idéias nas

quais ele se fundamentava e que eram adotadas em sua época, particularmente no que se

refere à sua afirmação de que as atividades agrícolas seriam, entre outras razões, mais

apropriadas aos surdos, porque exigiam menos argúcia e a lavoura carecia de braços

para suprir a escassez de escravos.

Leite distinguia o “surdo-mudo congênito” e o “surdo mudo acidental”,

entendendo que apenas 15% dos primeiros tinham inteligência suficiente para as letras.

Já, entre os surdos-mudos acidentais, 65% teriam inteligência igual à dos falantes.

Assim, Leite só encaminhava para as oficinas do INSM os alunos que iriam morar nas

cidades e que tinham emprego garantido, pois o Instituto não precisava formar letrado,

mas cidadãos úteis. Reis (1992) afirma que: “ele chegou mesmo a não permitir que um

aluno, que se destacara no ofício de sapateiro, ensinasse os outros colegas, alegando

ser de maior interesse formar pessoas capacitadas para atividades agrícolas” (p. 63).

O INSM aceitava a Língua de Sinais e a dactilologia, ou seja, o alfabeto

manual.Para disciplinar os alunos, eram aplicadas primeiramente advertência (verbais e

escritas); e em caso de reincidência, havia suspensão; depois, repetindo-se de novo a

falta, ocorria diminuição de alimentação; em último caso e por fim, optava-se pela

expulsão. Era proibido o castigo corporal, mas havia uma prisão para o aluno que

incorria em falta, geralmente por questões de homossexualismo, já que neste instituto

eram admitidos apenas alunos do sexo masculino.

Por volta de 1891, o Instituto dispunha de apenas 35 vagas para atender 11.595

surdos e mudos. Tudo indicava que o Governo não tinha interesse em assumir essa

tarefa, tanto que passou esse encargo para as províncias. Assim, foi fadada ao

esquecimento, juntamente com a instrução pública primária que, garantia gratuidade a

todos pela Constituição de 1824, mas relegada aos minguados recursos provinciais.

Em 1911, já com nova denominação, o Instituto Nacional dos Surdos, INS, foi

remodelado, adotando o método oral puro (Oralismo). Proibiu-se em sala de aula o uso

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da Língua de Sinais, dando preferência ao treinamento da fala. Para impedir o uso da

Língua de Sinais, o Instituto proibiu os alunos mais velhos de terem contato com os que

ingressavam nas primeiras séries. Apesar de proibida, a Língua de Sinais continuava

sendo utilizada, tanto no Instituto como fora dele, independentemente do que fosse

adotado oficialmente.

Em 1923, surgiu no Brasil a segunda escola para surdos, denominada Instituto

Santa Terezinha, em São Paulo, seguindo-se, muito depois a de Porto Alegre, em 1954 e

a de Vitória, em 1957. No início da década de 50, foi promovido o primeiro “Curso de

Formação de Professores para Recuperação de Deficientes da Audição e da Linguagem

Falada”. Até então, os professores de surdos eram autodidatas ou tinham realizado sua

formação no exterior (Vanni, 1952).

Para superar dificuldades da Educação Especial foram iniciadas a partir de 1957,

as chamadas Campanhas. Em dezembro de 1957, deu-se a primeira, denominada

Campanha para a Educação do Surdo. As Campanhas representaram “a primeira

participação direta, sistemática e de âmbito nacional do Poder Público brasileiro na ação

em favor dos excepcionais” (Fundação Getúlio Vargas, 1989).

A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n° 4024 – LDB/61

enquadrou a educação de excepcionais no sistema geral de ensino, tendo em vista,

justamente, a integração desses alunos na comunidade. Para Brejon (1983), foi a

LDB/61, que unificou toda a educação do país em um só sistema, dedicou o capítulo X,

sob o título “Da Educação de Excepcionais” e seus artigos 88 e 89 ao tema,

estabelecendo que:

A educação de excepcionais deve, no que for possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade. Toda iniciativa privada considerada eficiente pelos Conselhos Estaduais de Educação, e relativa à educação de excepcionais, receberá dos poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudos, empréstimos e subvenções (p. 248).

Para Santoro (1994):

[...] a partir dos anos 60, iniciou-se uma mudança importante na educação dos surdos como resultado da influência de diferentes fatores. De modo geral, estes fatores relacionam-se a um contexto mais amplo de transformações sociais e políticas. Os anos 60 foram um tempo de grandes mudanças sociais, assistiram o ativismo do movimento pelos direitos civis que, nas palavras de Hutzler citado por esta autora: levantaram as vozes das minorias: mulheres, negros, favelados, deficientes, homossexuais, etc. Assim, tiveram peso as

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discussões sobre a questão da dominação cultural versus o direito das minorias serem diferentes, sobre a afirmação da identidade étnica. Stewart e Akamatsu, também citados por esta autora, completam ainda que: na década de 60 nos Estados Unidos, a legislação favoreceu a educação bilíngüe, tendo o inglês como segunda língua, valorizando o vernáculo negro, o havaiano e o inglês crioulo, abrindo, de certo modo, a oportunidade de uma educação bilíngüe também para o surdo com reconhecimento da Língua de Sinais (p. 18 – 19).

A educação da pessoa surda, nos anos sessenta, acompanhou esse movimento,

tendo como bandeiras: o reconhecimento da Língua de Sinais, as pesquisas sobre a

aquisição da linguagem e a tomada de consciência dos educadores dos resultados pouco

satisfatórios dos métodos orais para a aquisição de conhecimentos pelos surdos.

Destaco aqui o fato de que a Lei 5692/71 dedicou apenas um artigo à Educação

Especial, postura que, na época, recebeu inúmeras críticas dos especialistas da área. O

artigo 9º estabelecia que os alunos que apresentassem deficiências físicas ou mentais, ou

que se encontrassem em atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os

alunos superdotados deveriam receber tratamento especial, de acordo com as normas

fixadas pelos Conselhos de Educação.

Em 1978, surgiram os primeiros cursos de pós-graduação strictu sensu, como o

da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), relacionados às áreas das

deficiências, impulsionando uma produção científica mais consistente, prenúncio de

medidas e disposições legais que trariam sensíveis mudanças na postura da sociedade

em relação à educação dos alunos surdos.

O Poder Público, por meio do Decreto nº 93.481 de 29.10.1986, criou a

Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE,

órgão que foi incumbido de elaborar os planos e programas que compõem a Política

Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, bem como tinha o

objetivo de propor medidas que garantissem sua completa implantação e seu adequado

desenvolvimento, além de acompanhar e orientar a execução dessa Política.

Posteriormente, o Decreto nº 914 de 6.9.1993 instituiu a Política Nacional para a

Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, a ser executada sob coordenação da

CORDE. A criação desse órgão foi importante para as pessoas surdas, pois com ajuda

dele elas podiam ter garantias plenas à sua cidadania.

Uma decisão de especial relevância para a educação dos surdos no Brasil foi

tomada pelo Congresso Nacional, ao sancionar a lei federal nº 10.436, de 24 de abril de

2002, que declarava nos seus três primeiros artigos:

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“Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. ART. 2º Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão da Língua Brasileira de Sinais - Libras como meio de comunicação objetiva e de utilização corrente das comunidades surdas do Brasil. Art. 3º As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor. “

Art. 4º O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente. Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa.“

Outra importante conquista que merece destaque foi a assinatura do Decreto que

regulamenta a Lei que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras. O Decreto

estabelece que a Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos

cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e

superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas.

Atualmente, uma das conseqüências do Decreto foi o primeiro exame de

proficiência de Libras, o Prolibras, Programa Nacional para Certificação de Proficiência

em Libras e para Certificação de Proficiência em Tradução e Interpretação da Libras,

que foi oferecido pelo Ministério da Educação, em parceria com a Universidade Federal

de Santa Catarina - UFSC e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

“Anísio Teixeira” - INEP, em todos os estados. As inscrições foram realizadas pelo

site: http://www.prolibras.ufasc.br no período de 21/09/06 a 16/10/06.

Ainda na área da educação, outra importante realização foi a criação a primeira

universidade bilíngüe, Português-Libras, com o Curso de Magistério Superior Bilíngüe,

no INES, Instituto Nacional de Educação de Surdos, no Rio de Janeiro.

Na área das comunicações, houve a publicação da Norma Complementar sobre

acessibilidade na TV, que previa a inclusão de recursos como a janela com intérprete de

Libras, a legenda oculta e a narração das cenas em canal secundário de áudio para

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pessoas com deficiência auditiva e visual na programação da TV aberta brasileira,

permitindo que estas pessoas tenham acesso ao grande número de informações

veiculadas diariamente na TV. Os pronunciamentos oficiais também passaram a contar

com janela de Libras.

Além disso, já se encontram à disposição das instituições, aparelhos para uso de

pessoas surdas e com deficiência auditiva que contam com centrais de intermediação de

comunicação telefônica. Esta ação está sendo implementada através Programa de

Atendimento às Pessoas com Deficiência, com recursos do Fundo de Universalização

dos Serviços de Telecomunicações (FUST). É a primeira vez que o FUST irá liberar

recursos. Estão sendo destinados R$ 7 milhões para a promoção da acessibilidade na

comunicação das pessoas com deficiência.

E por último, mais um passo pela garantia da cidadania às pessoas surdas: pela

primeira vez a propaganda eleitoral está sendo acessível através da utilização da

Linguagem Brasileira de Sinais ou recursos de legenda, seguindo Instrução do Tribunal

Superior Eleitoral, TSE.

Estas são ações que contribuem para promover a inclusão de um maior número

de pessoas surdas e com deficiência auditiva nas escolas, no trabalho e na sociedade, e

merecem ser comemoradas. Mas sabemos que ainda há muitos outros passos a serem

dados nesta caminhada.

2.5 – Principais Metodologias Utilizadas Para a Educação de Surdos

A complexidade do problema e a enorme diversidade de tipos de deficiências

auditivas resultam em uma multiplicidade de métodos e propostas. Apesar das

diferentes opiniões que dividem e subdividem as metodologias específicas ao ensino de

surdos, em termos de pressupostos básicos existem quatro grandes correntes

metodológicas: o Oralismo, a Comunicação Total, a Língua de Sinais e o Bilingüismo.

Podemos observar, através de uma leitura comparativa entre diversos autores

(BUENO, 1998; CICCONE, 1996; PERDONCINI & COUTO-LENZI, 1996;

BEVILACQUA & FORMIGONI, 1997), a existência de uma polêmica na educação dos

surdos.

De um lado, há os que defendem o Oralismo (ensinar a falar) e, de outro, os

defensores da linguagem gestual (Língua De Sinais), havendo ainda uma corrente que

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defende a Comunicação Total. Ao longo da história, essas três metodologias coexistiram

sem que nenhuma delas conseguisse prevalecer, embora a tendência atual seja optar pelo

Bilingüismo, segundo levantamentos e estudos efetuados por diversos autores

(FERNANDES; FELIPE, 1990 & GONDINHO, 1982).

2.5.1 Oralismo

Nessa metodologia de ensino, predominante nos cursos de formação de grande

parte dos professores que ensinam em instituições especializadas para surdos, a

aprendizagem da fala é ponto central. Para desenvolvê-la, algumas técnicas específicas

às orientações orais1são utilizadas. Essas técnicas são, basicamente, as relatadas a

seguir:

a) O treinamento auditivo: estimulação auditiva para reconhecimento e discriminação

de ruídos, sons ambientais e sons da fala:

b) O desenvolvimento da fala: exercícios para a mobilidade e tonicidade dos órgãos

envolvidos na fonação (lábios, mandíbula, língua etc), e exercícios de respiração e

relaxamento (chamado também de mecânica de fala);

c) A leitura labial: treino para a identificação da palavra falada através da

decodificação dos movimentos orais do emissor. Cabe ressaltar aqui que, por existirem

articulações idênticas no momento da emissão, só um terço dos sons emitidos resultam

em movimentos labiais observáveis, por isso as inferências e compreensão do contexto

em que se dá a fala são aspectos relevantes para a decodificação da mensagem.

No atendimento educacional de surdos, a orientação oralista consolidou-se no

final do século XIX, predominou por um longo período e se faz presente ainda hoje.

Nessa proposta, embora haja variações nos procedimentos pedagógicos, os esforços

educacionais são apoiados, de forma exclusiva, como observa Góes (2000), no uso da

língua majoritária, isto é, do grupo majoritário ouvinte, objeto privilegiado do ensino e o

meio para a organização das atividades curriculares em geral.

O Oralismo, em suas divergências de configuração, passou a ser criticado pelo

fracasso em oferecer condições efetivas para a educação e o desenvolvimento da pessoa

surda. Dessa forma, na tentativa de impor o meio oral, interditando formas de

comunicação gestual-visual, reduz as possibilidades de trocas sociais, somando, assim,

obstáculos à integração pretendida.

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Os defensores dos métodos orais (PERDONCINI; COUTO-LENZI, 1996;

BEVILACQUA & FORMIGONI, 1997) preconizam uma intervenção que tem como

proposta priorizar a alteração primária da criança: a audição. O objetivo é auxiliar as

crianças a usarem sua audição residual e assim crescerem aprendendo a ouvir e a falar

de tal forma que possam aumentar seus conhecimentos, suas experiências de vida e se

tornarem pessoas integradas e participantes na sociedade em geral.

Abordagens orais visam o desenvolvimento da linguagem oral, para que a

criança com deficiência auditiva possa alcançar melhor desempenho possível da língua

falada. Para Bevilacqua & Formigoni (1997), 95% das crianças surdas apresentam uma

audição residual dos mais variados graus. Assim sendo, entendem que deva ser dada a

estas crianças a oportunidade de desenvolverem os resíduos auditivos, por menor que

sejam. As crianças com deficiência auditiva podem receber algum tipo de informação

sobre o meio ambiente através da audição.

Segundo esses autores (COUTO-LENZI;EVILACQUA & FORMIGONI, 1997),

a educação auditiva e o uso de Aparelhos de Amplificação Sonora Individual (A.A.S.I.)

permitem aprimorar as habilidades dos resíduos auditivos, proporcionando melhorias no

automonitoramento, sendo portanto os mais importantes meios para o desenvolvimento

da fala e linguagem em surdos.

Os especialistas na aquisição da linguagem recomendam a intervenção para

desenvolvimento da fala o mais cedo possível (MARCHESI, 1987; COUTO-LENZI,

1991). Para BEVILACQUA & FORMIGONI (1997), a intervenção precoce

possibilitará a minimização das dificuldades que esse déficit impõe, não só daquelas que

dizem respeito ao processo de comunicação, mas também das dificuldades encontradas

durante todo o processo posterior. A precocidade é, portanto, um requisito fundamental

nesta aquisição.

Para Sheets (1971), o bebê surdo se engaja na produção de sons auto-reflexivos

durante os primeiros meses de vida mas, devido à ausência da estimulação sonora, irá

regredir e gradualmente se tornar silencioso, enquanto que o indivíduo ouvinte irá

continuar com a produção dos sons, para o estágio do balbucio.

Nos primeiros meses de vida, mesmo sendo incapaz de ouvir sua própria voz, a

criança com deficiência auditiva chora e vocaliza da mesma maneira que uma criança

ouvinte. Entretanto, conforme vai ficando mais velha, seu repertório tende a manter-se

restrito com respeito à qualidade e à quantidade de sons, e pode não desenvolver o

balbucio silábico. No final do primeiro ano, sua vocalização reduz-se aos sons que ela

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pode sentir, sons guturais ou gritos agudos, similares àqueles produzidos por bebês de

um mês de vida. Ela não desenvolve controle suficiente sobre sua voz e fala (Sheets,

1971).

Para o máximo aproveitamento auditivo, o Oralismo tem como princípio a

indicação de prótese individual, que amplifica os sons, admitindo a existência de

resíduo auditivo em qualquer tipo de surdez, mesmo na profunda. Esse método procura

assim, reeducar auditivamente a criança surda, através da amplificação dos sons

juntamente com técnicas específicas de oralidade.

A aquisição da língua oral, embora reconhecidamente difícil e demorada, é

recomendada por quase todos os estudiosos, de quase todas as metodologias propostas

para a educação de surdos.

2.5.2 A Língua de Sinais

Na década de 60, ocorreram vários fatores que fizeram vir à tona novos

conhecimentos teóricos e que levaram a uma mudança significativa na educação do

surdo (Marchesi,1995; Sánchez,1990).Neste momento, já se tornava claro para os

professores de surdos que a abordagem oralista na educação de surdos não estava

proporcionando um nível suficiente de linguagem oral, leitura orofacial, articulação e

habilidades de leitura que garantissem a sua validade. Concomitantemente, os estudos

realizados sobre a Língua de Sinais (Stokoe, 1960), tanto no nível de sua estruturação

interna como de sua gramática, provaram que ela tinha valor lingüístico semelhante às

línguas orais e que cumpria as mesmas funções, com possibilidades de expressão em

qualquer nível de abstração.

Segundo Moores (1978, apud Moura,2000, p. 56) foram então realizados estudos

comparando Filhos Surdos de Pais Surdos (“FSPS”) com Filhos Surdos de Pais

Ouvintes (“FSPO”). Estes estudos vieram da observação de que “FSPS” que

freqüentavam as escolas para surdos e que tinham acesso desde pequenos à Língua de

Sinais em casa com seus pais tinham um desenvolvimento escolar melhor de que seus

colegas “FSPO”, sem detrimento do desenvolvimento da fala e da leitura orofacial.

Concluiu-se que os “FSPS” eram superiores aos “FSPO” em realização acadêmica,

matemática, leitura e escrita, vocabulário, sem diferenças na fala e na leitura orofacial.

Como resultado dessas pesquisas, concluiu-se que o aprendizado da Língua de

Sinais não prejudicava o desenvolvimento das crianças surdas, mas, ao contrário,

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ajudavam-nas no seu desenvolvimento escolar sem prejuízo para as suas habilidades

orais.Além disso, essas pesquisas foram o embrião da idéia da implantação de uma

educação bilíngüe para surdos (sob a forma de exposição à Língua de Sinais e ainda não

com a denominação de Bilingüismo), já que os dados científicos delas demonstravam a

ineficiência do Oralismo, a validade da Língua de Sinais como uma língua completa e a

necessidade do surdo ser reconhecido como diferente e não como doente.

Atualmente a Língua de Sinais é comsiderada como a língua natural dos surdos,

pois ela é adquirida de forma espontânea sem que seja preciso um treinamento

específico. Porém é preciso lembrarmos quevivemos em uma sociedade na qual a língua

oral é imperativa, e por conseqüência caberá a todos que fazem parte dela se adequarem

aos seus meios de comunicação, independentemente de suas possibilidades. Qualquer

outra forma de comunicação, como ocorre com a Língua de Sinais, ainda é considerada

inferior e impossível de ser comparada com as línguas orais.

Muitos profissionais que trabalham com surdos persisitem ainda na visão sobre a

Língua de Sinais como uma forma de comunicação, não atribuindo a ela o status de

língua e considerando-a apenas uma alternativa para os surdos que não conseguiram

desenvolver a língua oral. Segundo Skliar (1997), o oralismo é considerado pelos

estudiosos uma imposição social de uma maioria lingüística sobre uma minoria

lingüística.

Como conseqüência do predomínio dessa visão oralista sobre a língua de sinais e

sobre surdez, o surdo acaba não participando do processo de integração social. Embora

a premissa mais forte que sustenta o Oralismo seja a integração do surdo na comunidade

ouvinte, ela não consegue algumas vezes ser alcançada na prática por alguns surdos,

prejudicando o desenvolvimento de sua linguagem.

Não há como se negarem os avanços que a tecnologia trouxe para a detecção

precoce da surdez e para a intervenção nesse processo. Segundo Koslowisky (1997),

com o surgimento das emissões otoacústicas e os programas de Screening Auditivo

Neonatal Universal é possível diagnosticar precocemente a surdez e iniciar um trabalho

de intervenção precoce, abrangendo o bebê e a família.Além disso, as próteses auditivas

digitais possibilitam maior potência com melhor qualidade sonora para adaptação em

crianças (Buerkli-Halevy & Checkley, 2002). Os implantes cocleares multicanal

também têm sido uma opção para os que não se beneficiam da prótese auditiva

(Koslowisky, 1997). Além disso, na área da informática, a quantidade de softwares que

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exploram a imagem visual é cada vez mais comum no mercado, facilitando uma série de

acessos aos educadores de surdos.

Entretanto, é importante a conscientização de que toda esta tecnologia disponível

não é de acesso a toda a população surda, especialmente considerando-se nossa

realidade social, cultural e econômica. Além do mais, ainda que toda essa tecnologia

fosse acessível, ela por si não garante o desenvolvimento lingüístico, identificatório e

cultural do sujeito surdo. A utilização destes recursos não garantirá que esses sujeitos

serão oralizados e integrados na sociedade, como assim defende a premissa oralista.

De acordo com as pesquisas de Dizeu & Caporali (2005), é preciso aceitar as

diferenças existentes entre os surdos com relação à modalidade de comunicação

utilizada, seja oral ou Língua De Sinais. Essa diferença não quer dizer inferioridade. As

autoras também constataram que a discussão gestualismo versus oralidade ocorre desde

os primórdios da educação dos surdos. Elas declararam que nos países que têm sistemas

de saúde e de educação mais avançados, como Suécia, Dinamarca, Noruega, Holanda e

até mesmo Estados Unidos da América, as discussões sobre a surdez e o baixo

alcance educacional dos surdos também eram polêmicas. Assim, concluíram que era

preciso mudar o foco no trabalho com os surdos, e esse trabalho deveria ser centrado

no desenvolvimento de linguagem.

Em 1976, segundo Schindler (1988, apud MOURA,2000, p.57), foi encontrada

pelos estudiosos uma situação intermediária em que os sinais seriam utilizados como

instrumento de comunicação,mas sem que fosse utilizada a Língua De Sinais.Esta

situação intermediária recebeu o nome de Comunicação Total, que será descrito a

seguir.

2.5.3 Comunicação Total

Em tradução literal do inglês Total Communication, era um modelo de trabalho

pedagógico que foi idealizado nos Estados Unidos na década de 60 e consistia em uma

prática que utilizava todas as estratégias possíveis para o ensino de surdos, isto é, valia

tudo: “uso de sinais (itens da LIBRAS) , emprego de sinais criados para marcar

aspectos gramaticais da língua oral, o desenho, a dramatização, o treino auditivo, a

estimulação dos órgãos fonoarticulatórios, a escrita, a expressão corporal...” (Sousa,

1998). Nessa visão, a forma de comunicação não importava desde que os objetivos

educacionais fossem alcançados. Como se pode deduzir, a interação entre professores e

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alunos continuava truncada, pois nem usavam a língua oral, nem a língua de sinais.

Mestres e aprendizes continuavam a sofrer a falta de um sistema lingüístico comum.

Entretanto, graças a essa nova abordagem, a língua de sinais pôde ao menos subsistir

ainda que somente usada de fato entre seus usuários – os surdos. (Souza, 1998).

Os defensores da Comunicação Total fomentam incentivos à comunicação

aproveitando, quando válidas, as alternativas que viabilizam a comunicação quer por

sinais acústicos, quer por sinais visuais. Um programa de Comunicação Total não

exclui, entre outras técnicas e recursos, a estimulação auditiva, a adaptação de aparelhos

de amplificação sonora individual, a leitura labial, a oralização, a leitura e a escrita

(CICCONE, 1996).

Outros autores defendem a abordagem da Comunicação Total, na qual a fala e a

sinalização devem ser praticadas consistente e congrüentemente. O termo genérico de

comunicação simultânea parece não poder expressar, com clareza, esses aspectos.

Porém, a simultaneidade numa comunicação bimodal, é também enfatizada como forma

importante de se considerar aspectos educacionais valiosos (Ciccone, 1996). Para a

autora, a melhor forma de linguagem a ser eleita deverá ser aquela que os familiares

ouvintes possam aprender com a maior rapidez e a maior facilidade e da qual possam

fazer um uso mais confortável, quando a praticarem com os filhos surdos.

A autora Moura (2000), no entanto, não acredita que a Comunicação Total seja

uma abordagem melhor aceita que a oralista, pois as imposições da sociedade,

representadas pela família e pela escola, não dão condições para que seu

desenvolvimento venha a ocorrer de forma como deveria, visto que a aceitação por parte

da família ouvinte da criança surda de um sistema de sinais que difere tanto da sua

forma de comunicação é difícil e a compreensão da escola da necessidade de se

enfatizar este aspecto da comunicação, em detrimento de aspectos da fala ou

articulatórios, não se dá sempre, levando à diminuição de uma possível eficácia da

utilização de sinais, ainda que de uma forma semelhante à língua oral.

2.5.4 Bilingüismo

Para os adeptos do Bilingüismo, os surdos formam uma comunidade, com

cultura e língua próprias. O bilingüismo, tal como entendemos, é mais do que o uso de

duas línguas. É uma filosofia educacional que implica em profundas mudanças em todo

o sistema educacional para surdos. A educação bilíngüe consiste, em primeiro lugar, na

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aquisição da língua de sinais, sua língua materna. Surdo, em contato com outros surdos,

passa por um processo de identificação com sua comunidade de surdos. Essa

comunidade está inserida na grande comunidade de ouvintes que, por sua vez,

caracteriza-se por fazer uso de linguagem oral e escrita.

O Bilingüismo propõe que o surdo comunique-se fluentemente na sua língua

materna (língua de sinais) e na língua oficial de seu país. Será ela oral? Será escrita?

Essas são duas questões polêmicas que dividem os educadores de surdos. No entanto,

todos concordam que o desenvolvimento cognitivo, afetivo, sócio-cultural e acadêmico

das crianças surdas não dependem necessariamente de audição, mas sim do

desenvolvimento espontâneo da sua língua. E assim sendo, a língua de sinais propicia o

desenvolvimento lingüístico e cognitivo da criança surda, facilita o processo de

aprendizagem e serve de apoio para a leitura e compreensão.

Existem duas maneiras da aplicação da posição bilingüista. A primeira acredita

que a criança surda deve adquirir a língua de sinais e a modalidade oral da língua de seu

país, sendo que posteriormente a criança deverá ser alfabetizada na língua oficial de seu

país.

Outros autores, como Sánches (1993 apud GOLDFELD 1997), acreditam ser

necessário para o surdo adquirir a língua de sinais e a língua oficial de seu país apenas

na modalidade escrita e não na oral. Bilingüistas como Perlin (1998) afirmam que a

escrita do surdo não vai se aproximar da escrita ouvinte, e não há que se exigir do surdo

uma construção simbólica tão natural como a do ouvinte. Autores como Kolowski

(1998) preconizam, entre outros instrumentos, a leitura precoce, desenvolvida a partir de

18 meses, como parte de sua proposta pedagógica, visando garantir ao surdo

instrumentos para comunicação e estruturação do pensamento.

Mesmo dentro de uma visão bilingüista, a necessidade da oralização é uma

realidade para o surdo brasileiro quando se pensa em educação de nível superior,

inserção social e profissional (Kolowski, 1998). Autores como Aguirre, Goldfeld E

Ferreira (1999) seguem a filosofia educacional do bilingüismo e pretendem criar um

método de oralização coerente com suas bases teóricas. Pimenta, Ramos & Soares

(1998) atuam no modelo bilingüista de educação de surdos, e mesmo reconhecendo que

nem todo surdo atinge a expressão oral com clareza, ainda assim acreditam que é

imprescindivel que todos possam interagir na cultura da maioria da população,

buscando sua integração e cidadania.

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Em minha opinião, a proposta bilíngüe é a que melhor atende às expectativas do

surdo, pois ela não privilegia uma língua, mas quer dar direito e condições ao indivíduo

surdo de poder utilizar duas línguas; portanto, não se trata de negação, mas de respeito;

o indivíduo escolherá a língua que irá utilizar em cada situação lingüística em que se

encontrar. Esta proposta leva em consideração as características dos próprios surdos

incluindo a opinião dos surdos adultos com relação ao processo educacional da criança

surda (Kozlowski, 1998).

Segundo SANCHEZ (1991, p.39),

Falar em Bilingüismo no campo da educação dos surdos é fazer referência a algo muito concreto, e algo sem controvérsias à luz dos conhecimentos atuais da lingüística: a existência de duas línguas ao redor dos surdos. Dito de outra forma, o Bilingüismo reconhece que o surdo vive numa situação bilingüe “

A Secretaria de Educação Especial (Brasil, 1995) preconiza a atuação dos

serviços de Educação Especial para atendimento de surdos em função do grau de perda

auditiva. No caso de surdez leve, em que a criança apresenta dificuldades no período de

alfabetização com relação à leitura e/ou à escrita, esta deverá receber um atendimento

especializado, constituído das atividades de treinamento fonoarticulatório/fala e

linguagem. As recomendações para portadores de surdez moderada são similares às

anteriores com maiores atenções.

Para portadores de surdez severa, a Secretaria de Educação Especial recomenda

que o aluno poderá freqüentar uma escola especial para adquirir a linguagem interior e

receptiva (ou de compreensão) e expressiva (ou de expressão), uma vez que, em geral,

não chega a adquirir a linguagem pelos processos naturais. Mesmo nos casos em que o

aluno adquire alguma linguagem, esta não será suficiente para sua comunicação oral.

Além de adquirir a linguagem oral, esse aluno poderá aprender a ler e escrever na escola

especial.

No caso de surdez profunda, o aluno precisará adquirir uma linguagem que

permita sua comunicação com os ouvintes, além de possibilitar o desenvolvimento da

escolaridade. A alfabetização do aluno com surdez profunda deverá ser realizada

paralelamente à estruturação da linguagem oral. Poderão ser adotadas, para atendimento

ao portador de surdez, diferentes metodologias ou filosofias educacionais: o Oralismo,

A Comunicação Total, O Bilingüismo e outras. A opção inicial por qualquer dos

métodos deve ser feita pelos pais (Brasil, 1995).

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2.6 – Algumas Considerações Sobre os Conceitos de Integração e Inclusão

A minha tentativa ao falar um pouco sobre os termos inclusão ou integração é

estar colocando como estes termos vêm sendo apresentadas atualmente e o que elas

representam. Ao tomar como base a História do Homem sobre a Terra, constatei que a

sociedade dos homens, em todas as partes do mundo e em todas as épocas, sem

qualquer exceção praticamente, colocou e continuará colocando à margem dessa certos

tipos de indivíduos que dela poderiam fazer parte.

Como afirma SILVA (1996):

Preconceitos e medidas discriminatórias existem concretamente contra quase todos os tipos de “anormalidades” ou “anomalias”, muito embora essas atitudes apresentem tonalidades de ênfase diferente, pois a maioria das pessoas não tem contra os deficientes a mesma espécie de preconceitos, que alimenta contra certos grupos religiosos, raciais ou desfavorecidos (p. 363).

Para melhor compreender as origens deste problema, é preciso conscientizar-se

que existe um padrão de normalidade socialmente construído. As pessoas são diferentes,

pois não existe um indivíduo sequer que seja idêntico a outro; e ser diferente, portanto é

próprio da natureza humana. Logo, podemos afirmar que as diferenças são de caráter

universal. No entanto essa mesma diferença muitas vezes acarreta a exclusão de um

determinado grupo social fazendo com que esse “diferente” seja colocado de lado.

É preciso deixar claro que o termo excepcional muitas vezes é utilizado para

designar essa diferença convergindo em dois sentidos diferentes, tanto para determinar o

melhor ou o pior. Quando ele destaca o lado positivo, pode estar dando ênfase a algo

extraordinário “belo”, “perfeito” porque não dizer “excepcional”. Mas muitas vezes esse

mesmo termo traz imbuído o sentido negativo, ou seja, é utilizado para destacar aquilo

que falta em um determinado ser humano segundo os padrões da normalidade.

Situações que fogem aos padrões normais existem no mundo inteiro, mas as

características próprias dos tipos de preconceitos e das diversas formas de discriminação

a elas relacionadas dependem diretamente dos padrões culturais de cada povo.Têm

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significado bastante variável de povo para povo e só poderão ser bem compreendidas no

contexto social onde ocorrem.

Diante disso as diferenças individuais e que caracterizam cada um dos seres

humanos serão encontradas sempre. Será o grupo social, todavia, que irá estabelecer

quais as divergências que poderão ser consideradas como prejudiciais ou vantajosas e

quais que provocam depreciações ou valorizações do ser humano.

Sabendo-se disso é que busquei na Constituição Brasileira e nas Leis de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional dados sobre o direito à educação, pública e

gratuita das pessoas com deficiência. É certo que o registro legal, por si, não assegura

direitos, especialmente numa realidade em que Educação Especial tem reduzida

expressão política no contexto da educação geral, reproduzindo talvez a pequena

importância que se concede às pessoas com deficiência em nossas políticas sociais.

Daí se entendem manifestações comuns na área, de que a legislação fundamental

já está dada e trata de se fazer cumprí-la. Para chegar até estes foi preciso clarear os

termos “integração e inclusão” que vem sendo citados por vários autores ao se referirem

às pessoas que se encontram excluídas da escola.

A maioria dos autores que consultei usam indistintamente os vocábulos inclusão

e integração, ao referir-se ao direito das crianças com deficiências de freqüentarem as

salas de aula da educação regular.

Conforme Werneck (1997), o sistema de integração é organizado a partir do

conceito de “corrente principal”, conhecido como mainstream. O objetivo da “corrente

principal” é proporcionar ao aluno um ambiente educacional o menos restritivo

possível, uma vez que ninguém aprende quando não tem liberdade e não se vê

valorizado.

O processo de integração por meio da “corrente principal” depende do “sistema

de cascata” de serviços de Educação Especial. Nesse sistema todos os alunos têm o

direito de entrar na corrente principal e transitar por ela; tanto podem subir como descer

a cascata, conforme suas necessidades específicas.

Assim sendo, integração escolar tem como objetivo inserir o aluno portador de

deficiência na escola regular, porém, essa escola permanece organizada da mesma

forma e é o aluno que foi inserido que deverá adaptar-se a ela.

Educação inclusiva, entendida sob a dimensão didático-curricular, é aquela que

proporciona ao aluno com necessidades educativas especiais participar das atividades

cotidianas da classe regular, aprendendo as mesmas coisas que os demais - mesmo que

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de modos diferentes, preferencialmente sem defasagem idade-série. Como agente

mediador do processo ensino-aprendizagem, cabe ao professor o papel de fazer as

adaptações necessárias no currículo escolar (Glat e Oliveira, 2003).

A inclusão de alunos com necessidades especiais no sistema regular de ensino é

hoje a diretriz principal das políticas públicas educacionais, tanto a nível federal, quanto

estadual e municipal (Ferreira e Glat, 2003; Glat, Ferreira, Oliveira & Senna, 2003)

Alguns autores relatam a pouca atenção destinada à formação do professor e

propõem que a capacitação destes, bem como o preparo de toda a comunidade escolar,

constitua-se um primeiro passo para a educação inclusiva (Glat, 1998; Kafrouni & Pan,

2001; Martins, 2001).

O currículo para uma escola inclusiva, entretanto, não se resume apenas a

adaptações feitas para acomodar os alunos com deficiências ou demais necessidades

especiais. A escola inclusiva demanda uma nova forma de concepção curricular, que

tem que dar conta da diversidade do seu alunado. Ferreira (2003), utilizando-se da

Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), considera escola inclusiva aquela que

“reconhece e satisfaz as necessidades diversas dos seus alunos, adaptando-se aos

vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação

para todos...”.

No sistema de ensino inclusivo é a escola que se reorganiza para atender a

especificidade de cada aluno. Sendo assim, o foco da integração é o aluno com

deficiência e o foco da inclusão é o sistema de ensino que tem que oferecer um ensino

de qualidade a todos.

Penso que esta forma de se pensar a escola representa um novo paradigma, para

o qual estamos acumulando experiência. A escola inclusiva é, portanto, uma nova

escola, que ainda está sendo aperfeiçoada. Nesse sentido, a universidade, a partir de

suas três dimensões constitutivas — ensino, pesquisa e extensão — tem uma grande

contribuição no desenvolvimento e implementação deste processo. A universidade pode

(e deve) atuar na formação e capacitação de professores e demais agentes educacionais,

bem como na produção de conhecimento por meio de pesquisas e projetos que validem

e disseminem ações educativas bem sucedidas que atendam a esta nova proposta.

A segregação prejudica a todos, porque impede que as crianças das escolas

tenham oportunidade de conhecer a vida humana em todas as suas dimensões e desafios.

Para Werneck (1997), as pessoas evoluem quando percebem que:

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“Incluir não é tratar igual, pois as pessoas são diferentes. Alunos diferentes terão oportunidades diferentes, para que o ensino alcance os mesmos objetivos. Incluir é abandonar estereótipos” (p. 51).

Desta forma, o conceito de moralidade, de culturas das pessoas com deficiência

no seu sentido preconceituoso / negativo, deve ser revisto como diferença e não como

déficit.

O que mais tem perturbado os pais e profissionais da Educação Especial e

regular e os clínicos (fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos, médicos e outros) é o

fato da inclusão exigir mudanças: de posturas, currículos e propostas pedagógicas que

atendam as diferenças. Na integração até mesmo quando se trata da inserção de uma

criança com deficiência leve na escola regular, há questionamentos. Quando é o caso de

ainda inserir um aluno com comprometimentos múltiplos e severos, a intolerância é

maior ainda e apela-se para a exclusão.

O professor que atua no ensino regular fundamental é figura primordial na

construção de uma sociedade inclusiva. Logo, é preciso que os cursos e Universidades

que formam educadores procurem conscientizá-los de que os alunos com deficiência

são responsabilidade de todos os educadores.

A investigação sobre a inclusão e a integração escolares, na legislação

educacional brasileira, no que diz respeito aos direitos dos alunos com necessidades

educacionais especiais, requer leitura e a reflexão sobre estes importantes documentos: a

Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases, nº 9394, de 20 de dezembro

de 1996, e a Lei Federal nº 7853, de 24 de outubro de 1989, entre outros.

Após a promulgação da Constituição de 1988, foi iniciado intenso debate para a

elaboração de um projeto para uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB) que contemplasse os interesses dos setores menos favorecidos da

sociedade e que fosse, também, coerente com uma nova conjuntura legal brasileira.

A LDB aprovada, finalmente, em 1996, dedicou o Capítulo V, dos artigos 58 a

60 à Educação Especial.

Segundo o Artigo 58 da LDB/96:

Entende-se por Educação Especial, para efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com necessidades especiais.

No parágrafo 1º a LDB dispõe que:

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Atualmente os alunos surdos continuam sendo enquadrados como “alunos

portadores de deficiência sensorial” – Art. 227, § 1º, inciso II e ou da “Educação

Especial” conforme a LDB/96.

A Constituição Federal garante atendimento educacional especializado aos

alunos com deficiência. Ele tem que estar disponível em todos os níveis de ensino

regular, pois a rede regular de ensino tem preferência para esse fim. Trata-se, de fato, do

ambiente ideal para se garantir o relacionamento dos surdos com os alunos da mesma

faixa etária, que encoraja todo tipo de interação que possa favorecer seu aprendizado

global.

Nossa Constituição também considera que este atendimento especializado possa

ser oferecido fora da rede regular de ensino, ou seja, em qualquer instituição, desde que

seja somente um complemento e não um substituto do ensino oferecido pela rede

regular.

Com o intuito de ter esse direito lingüístico reconhecido foi encaminhado ao

Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 131 de 1996, que posteriormente foi decretado e

tornou-se a Lei nº 10.436, em 24 de Abril de 2002, ficando assim estabelecido:

Fica reconhecida como meio legal de comunicação e

expressão, a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, e outros

recursos de expressão a ela associados.

O Parágrafo único do Artigo 1º desse decreto diz que:

Compreende-se como LIBRAS um sistema lingüístico de natureza visual– motora, com estrutura gramatical própria, oriunda de comunidades de pessoas surdas do Brasil. É a forma de expressão do surdo, sua língua natural.

Já no Artigo 4º.

A LIBRAS deverá ser incluída, como conteúdo obrigatório da disciplina Educação Especial, na área de surdez, nos cursos de formação inicial, formação continuada e de especialização de professores, de forma a lhes propiciar condições de interação com alunos surdos.

E no artigo 6º.

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As instituições de ensino público deverão garantir, quando solicitadas, a presença e utilização da Língua Brasileira de Sinais, no processo ensino-aprendizagem, desde a Educação Infantil até os níveis mais elevados de sistema educacional.

Parágrafo único.

A Língua Brasileira de Sinais não poderá substituir a modalidade escrita da Língua Portuguesa.

Diante da aprovação da Lei nº 10.436 tornou-se claro que os direitos lingüísticos

dos surdos foram reconhecidos pelo Congresso, e devem ser respeitados e satisfeitos, na

escola e fora dela. Este documento propõe a reflexão sobre a língua de sinais e como

esta pode facilitar as trocas comunicativas entre surdos e ouvintes e esclarecer a

comunidade sobre a importância desta língua.

Considerando-se o atendimento clínico oferecido ao surdo, como recursos

necessários a sua comunicação, deve-se oferecer aos alunos que optarem pela oralidade

treinamento de leitura orofacial. Se o aluno adquiriu a Língua de Sinais, na mais tenra

idade, o conhecimento do significado das palavras será melhor assimilado e

contextualizado por ele.

Sob o ponto de vista da Educação Inclusiva, a possibilidade de se utilizar

práticas de ensino que dão conta das mais diversas necessidades dos alunos, nas salas de

aula de ensino regular, deve ser a regra a ser seguida em todos os níveis de ensino. Estas

incluem: ampliação de textos, adaptação de textos para o Braille, divulgação de Língua

de Sinais, recursos de adaptação manual para deficientes físicos ou utilização dos

recursos da informática.

Voltando ao caso da inserção de alunos surdos no ensino regular, os

atendimentos especializados e os serviços de intérpretes de LIBRAS, instrutores de

leitura orofacial e outros, não caracterizam e não devem substituir os deveres do

professor responsável pela sala de aula que tem alunos surdos aí integrados, mas

complementares ao trabalho escolar.

Observei, no entanto, algumas contradições entre a proposta de inclusão

conforme determina a lei e o que ocorre de fato em algumas escolas. Isso ocorre devido

a formação que receberam os profissionais da educação que atuando nessa rede de

ensino e as concepções que cada um detém a respeito de deficiência e como devem

incluir neste contexto escolar todas as diversidades. Sabe-se que ainda é pouco presente

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o tema diversidade nos cursos de formação dos professores e outros profissionais,

mesmo com recomendações e indicações legais para que se supere essa lacuna.

Diante desse quadro situacional, é que me propus na minha pesquisa a analisar

como uma aluna surda, egressa da Educação Especial recebida no INES, estava sendo

atendida na escolas de ensino regular de uma escola particular do município do estado

do Rio de Janeiro.

Queria, sobretudo, mostrar como essa aluna estava sendo atendida nas suas

necessidades (atendimento educacional especializado – garantido pela Constituição/88)

e que benefícios estaria, porventura, usufruindo na sala de aula de ensino regular,

juntamente com seus colegas ouvintes nas séries iniciais do Ensino Fundamental .

Pela minha própria experiência de vida como aluna surda em escola regular,

tendo vivido numa época em que o surdo só conseguia freqüentar uma escola regular se

fosse capaz de se oralizar convenientemente para os padrões exigidos pelas escolas,

acredito estar em uma posição privilegiada para fazer esta exposição, além de checar as

condições favoráveis e desfavoráveis para a boa inclusão da aluna, o que relatarei no

capítulo quatro.

A seguir, relatarei as técnicas de comunicação empregadas na Educação do

Surdo, o que facilitará a melhor compreensão das dificuldades enfrentadas pelos

professores das escolas regulares, particularmente as profesoras da escola da nossa

aluna-alvo da pesquisa.

2.7 – Principais Características de Aprendizado do Aluno Surdo e as Dificuldades Encontradas para a sua Inclusão

A origem de meus estudos sobre a educação dos alunos surdos centra-se no fato

de que a idéia de inclusão escolar dessas pessoas continua enfrentando problemas,

ligados a preconceitos e posturas segregacionistas, que levam pais de alunos e mesmo

educadores a demonstrar dificuldades e resistência em aceitar que esses alunos, por

força da legislação e conquista de direitos, adentrem as salas de aula de escolas de

ensino regular.

De acordo com Góes (1996), entre as principais dificuldades ao aprendizado do

aluno surdo em classe regular estão a falta de equipamentos e despreparo das escolas

regulares para o atendimento específico desses alunos. Para ela incluir não é só alocar o

aluno surdo na sala de ensino regular, mas oferecer condições reais de aprendizagem.

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De acordo com os discursos da Educação para Todos e da Escola Inclusiva este

é o desafio que hoje se impõe à escola, pois ela deve atender a todos os alunos, ou

melhor, a diversidade humana, como instituição social que é, e que, por força da

legislação, não continue reagindo no sentido inverso, rejeitando ou segregando aqueles

que não aprendem como os demais.

No que diz respeito ao aluno surdo, em muitos aspectos ele é mal compreendido

e discriminado pela sociedade, a começar pela família. Esta, na maioria das vezes, tem

enorme dificuldade para aceitar, analisar e enfrentar os problemas que interferem em

seu desenvolvimento.

Crianças surdas, no geral, são privadas de estímulos para o desenvolvimento da

linguagem que lhe é própria ou mesmo da linguagem oral, pela leitura oro-facial, o que

acarreta para elas outras privações importantes, como as experiências prazerosas de

interação social que a audição de sons, mesmo que não verbais, e a fala proporcionam.

Em minhas observações de campo, durante a realização desta pesquisa,

entrevistei uma professora da escola que Lia, a aluna-alvo desse trabalho, estudava.

Entre os problemas citados por essa professora como responsáveis pela dificuldade de

inclusão dos alunos surdos em classes regulares, ela apontou, como principal, a falta de

conhecimento de uma metodologia diferenciada para trabalhar com tais alunos.

Normalmente todos os professores de uma escola, durante grande parte de sua vida no

magistério, utilizam a linguagem oral, o quadro-negro e o atendimento individualizado,

quando necessário. Esta professora afirmou que considerava muito difícil que a maioria

das escolas, nos moldes atuais, pudessem atender ao aluno surdo, pois as salas de aula

geralmente são muito numerosas. Além disso, ela mencionou o fato de que o

relacionamento entre o professor e o aluno surdo seria dificultado se o professor não

tivesse conhecimento da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS.

Segundo ainda a professora entrevistada, normalmente não existe uma

preparação para receber esses alunos na escola e a explicação oral continua a ser o meio

mais comum de se ensinar o conteúdo acadêmico ao aluno surdo.

Para o aluno surdo usuário da LIBRAS, certamente, que esse meio dificulta a

sua aprendizagem.

Segundo GOTTI (1998, p.366):

A leitura oro-facial realizada pelo aluno surdo é um auxílio à comunicação e não um substituto da audição, uma vez que grande quantidade de fonemas

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que “soam” diferentes para quem tem audição normal, parecem iguais nos lábios de quem as pronuncia, e outros fonemas nem mesmo aparecem

FERREIRA BRITO (1993, p. 8 – 9), argumenta a respeito:

[...] para que isto não ocorra devem existir escolas especiais para surdos, pois as crianças surdas, pela perda da audição, estarão inaptas a participarem da aula com crianças ouvintes. Por serem as informações de classe de ouvintes transmitidas basicamente através da fala, a criança surda terá assim acesso limitado a estas e estará, conseqüentemente impedida de completar seu aprendizado escolar

Embora eu considere a importância da Língua Brasileira de Sinais não concordo

com a autora quando ela afirma que a criança surda não pode participar e aprender

numa classe de crianças ouvintes. Para esta autora, a integração social só será efetiva

quando for reconhecida a diferença existente na linguagem da comunidade surda,

levando-se em conta que um trabalho lingüístico e cognitivo deve ser oferecido aos

alunos surdos através da Língua de Sinais, para garantir o seu aprendizado e

desenvolvimento, favorecendo também a sua atuação na sociedade. Acredito que a

preocupação com relação ao processo educacional do aluno surdo não deva ser apenas

com o tipo de escola (regular ou especial) que ele freqüentará, mas com as

oportunidades lingüísticas que lhe serão oferecidas.

Essa preocupação já estava presente em meu cotidiano ao iniciar este trabalho há

alguns anos como professora de alunos surdos, primeiro na instituição especializada em

que trabalho, o Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES) e posteriormente

como professora itinerante dando apoio a ex-alunos do INES que foram matriculados

em escolas regulares do município do Rio de Janeiro, ao vivenciar esta realidade

observei as dificuldades enfrentadas pelos professores, bem como pelos alunos surdos

no processo de escolarização. Compartilhando a rotina escolar de tais alunos, crianças

ou jovens, é que me dispus a pesquisar e compartilhar desta realidade bem como

procurei desenvolver diferentes alternativas para trabalhar com estes e seus professores

na escola regular.

Minha vivência é fundamentada em três fatores fundamentais :

1) Minha própria história de vida como aluna surda que freqüentou na infância

escolas regulares e foi educada no método oralista;

2) Minha experiência de dez anos como professora especializada na área de

Surdez;

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3) Meus estudos sobre os pressupostos teóricos e jurídicos que têm orientado os

trabalhos relacionados à integração escolar de todos os alunos surdos no ensino

regular;

Assim sendo, com base na minha experiência de dez anos com educadora,

acredito ser perfeitamente possível criar um ambiente de aprendizagem favorável ao

aluno surdo, assegurando as condições necessárias para que eles possam ter uma

educação de qualidade. Para isso, os professores desses alunos deverão passar por um

programa de capacitação, onde deverão ter acesso aos conhecimentos necessários para

facilitar o processo ensino e aprendizagem dos surdos. Neste programa deverão ser

contemplados conteúdos específicos, ou seja, a parte conceitual da deficiência auditiva,

a linguagem de sinais e os aspectos didático-pedagógicos, que na maioria dos casos, os

professores das escolas regulares, em sua maioria, não possuem ou não foram

preparados.

Além disso, esses professores deverão ter, durante todo o período em que

estiverem com o aluno surdo em sua classe, uma intérprete na Língua de Sinais e o

acompanhamento de uma pedagoga especializada na área da surdez, bem como contar

com uma assessoria pedagógica e psicopedagógica, que vai auxiliá-los na identificação

e resolução dos problemas que surgirem no processo de ensino e aprendizagem dos

surdos Desta forma, podemos perceber que a diferença deste projeto, baseado no

princípio da inclusão, se dá de maneira inversa, onde os docentes é que se integrarão ao

mundo dos surdos e não os surdos a eles.

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CAPÍTULO 3

PESQUISA DE CAMPO

3.1 – Metodologia

Escolhi realizar esse trabalho como sendo uma pesquisa qualitativa, de natureza

etnográfica. Minha opção deveu-se ao fato de que a pesquisa qualitativa permite um

aprofundamento de dimensões da vida social que não podem ser quantificadas, como é o

caso desse estudo. A pesquisa qualitativa:

(...) trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis (Minayo, 1994, apud PLETSCH, 2005, p. 43)

Como metodologia facilitadora para a realização dessa pesquisa, foi utilizado o

estudo de caso com abordagem etnográfica, tendo como locus uma escola particular do

ensino fundamental e médio da rede municipal de Educação do Rio de Janeiro, que contava

pela primeira vez com uma aluna surda egressa da Educação Especial do INES incluída em

uma classe. regular.

Defendo que a pesquisa educacional, aqui relatada, pode ser classificada como um

estudo de caso de natureza etnográfica, pois esse tipo de pesquisa é uma forma privilegiada

de se compreender o cotidiano escolar. Ela permite ao pesquisador enfatizar o

conhecimento do particular, seja de uma pessoa, escola, programa ou grupo social. O meu

interesse ao usar a abordagem etnográfica, tinha como objetivo compreender “as relações

sociais entre os sujeitos participantes da referida investigação e os significados de suas

ações” (ANDRÉ, apud MACHADO, 2005, p. 53).

A etnografia é também compreendida como ,

“o estudo, pela observação direta e por um período de tempo, das formas

costumeiras de viver de um grupo particular de pessoas. (...) O objetivo é

documentar, monitorar e encontrar o significado da ação”. (MATTOS,

2001, p. 43)

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Como aponta ANDRÉ (2003, p. 49): “por um lado, o estudo de caso etnográfico

possibilita uma visão profunda e ao mesmo tempo ampla e integrada de uma unidade

complexa, por outro demanda um trabalho de campo intenso e prolongado”. Isto permite

descobrir aspectos novos ou poucos conhecidos do problema estudado. Um estudo de caso

etnográfico é normalmente usado, segundo essa autora,

“(1) quando se está interessado numa instância em particular; (2) quando se deseja conhecer profundamente essa instância particular em sua complexidade e em sua totalidade; (3) quando se estiver mais interessado naquilo que está ocorrendo do que nos seus resultados; (4) quando se busca descobrir novas hipóteses teóricas, novas relações, novos conceitos sobre um determinado fenômeno; e (5) quando se quer retratar o dinamismo de uma situação numa forma muito próxima do seu acontecer natural”

Para descobrir alguns aspectos sobre como está sendo a inclusão da aluna surda alvo

da pesquisa, bem como as dificuldades encontradas por suas professoras no decorrer do

seu processo educativo utilizando a aplicação da abordagem etnográfica tive três

preocupações:

a) estudar o contexto sempre da maneira mais global possível --- neste caso,o contexto é a

escola da aluna para realização da pesquisa;

b) envolver no estudo os agentes investigados na pesquisa --- que foram as duas

professoras, a mãe da aluna, seus colegas de turma e outras pessoas da equipe escolar com

quem a aluna mantinha contato;

c) revelar relações significativas, de modo a impulsionar o diálogo entre a teoria e a prática

no curso da atividade de pesquisa --- na escola busquei correlacionar a teoria sobre

Educação Inclusiva e como a proposta se deu na prática.

Em suma, usei para essa pesquisa técnicas e procedimentos etnográficos que não

seguem padrões rígidos ou predeterminados.

Segundo MACHADO (2005,p.54),

“a escolha da etnografia como abordagem de investigação científica

justifica-se pela importância que essa metodologia traz às pesquisas

qualitativas voltadas para o estudo das desigualdades e exclusões sociais.

A opção pela realização de um estudo de caso com abordagem

etnográfica dá-se,ainda, com vistas à singularidade da situação, já que

essa metodologia é extremamente útil para conhecer os problemas, as

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dificuldades e entender a dinâmica da prática educativa, assim como as

relações entre os sujeitos envolvidos no caso estudado.”

Sendo a pesquisa também um estudo de caso, conforme Walker (1980, apud

ANDRÉ, 2003, p. 55), ela deve ser um retrato vivo da situação a ser investigada, e, além

disso, “o pesquisador tem, assim, uma certa obrigação de apresentar as interpretações

diferentes que diferentes grupos ou indivíduos têm sobre uma mesma situação e deve fazê-

lo de tal forma que possibilite uma variedade de interpretações por parte do leitor”.

No que se refere ainda à etnografia, é interessante ressaltar que tal palavra vem do

grego “graf (o)” e significa escrever sobre, escrever sobre um tipo particular — um “etn

(o)” —, ou uma sociedade em particular (Mattos, 2003). Etnografia significa, pois, escrever

sobre outras pessoas ou sobre determinados grupos sociais, com o objetivo de compreender

as relações entre eles.

Essa metodologia foi inicialmente aplicada por antropólogos preocupados em

compreender sociedades desconhecidas e sua cultura — hábitos, valores, linguagens,

representações, crenças — a partir das interações estabelecidas pelos sujeitos que as

compunham. Por cultura entende-se aqui “a forma como o homem significa o seu mundo a

partir da teia de signos e símbolos que ele criou e teceu ao longo de sua história

(MATTOS, 2003, p. 50)”.

A etnografia, portanto, está preocupada em compreender as relações entre grupos

sociais, dados esses que não podem ser coletados simplesmente questionando informantes.

“Isto envolve o uso direto da observação para gerar inferências em relação às ações

habituais, julgamentos e avaliações que estariam operando fora do desinteresse consciente

do falante ou ouvinte” (ERICKSON, 1988, p. 8-9).

3.2 - Sujeitos da Pesquisa

3.2.1 – Principais Participantes

A pesquisa em pauta foi realizada com uma aluna surda , chamada Lia1, egressa

de uma classe especial no INES, e que estava frequentando uma classe comum. A

pesquisa teve duas fases distintas: acompanhamento a aluna quando ela estava no

maternal com a Profa Cristina e na segunda fase, na classe de pré-alfabetização, com a

1 Todos os nomes utilizados nesta pesquisa, incluindo o da escola, são fictícios, a fim de preservar a privacidade dos participantes.

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Profa Mariza.

Além da aluna e suas duas professoras, foram envolvidos ainda na pesquisa,

outras 11 professores de outras classes da mesma escola, o pessoal técnico-

administrativo da escola uma Diretora, dois inspetores, duas assistentes-administrativas

que trabalhavam na secretaria da escola, uma psicóloga e uma merendeira) para

conhecermos sua opinião sobre o processo de inclusão. Duas colegas de classe de Lia,

bem como a família da menina (sua mãe e a irmã mais velha), também foram ouvidas .

3.2.2 – Perfil da aluna

Com cinco anos e meio no início da pesquisa, Lia é portadora de surdez

neurossensorial bilaterial profunda, com perda de 87 dB no ouvido direito e 86 dB no

ouvido esquerdo. Sua surdez foi adquirida através da rubéola que acometeu sua mãe aos

dois meses de gravidez.

Ela freqüentou desde os dois anos aos trabalhos de reabilitação no INES, onde

permaneceu até os três anos e meio de idade quando professora , do SEDIN (Setor de

Educação Infantil), que iniciou com ela os trabalhos da classe de Educação Precoce,

entrou em contato com a Diretora da escola visando sua transferência para uma classe

regular. Lia passou a freqüentar a escola regular em março de 2005, na classe Jardim

III.

Os pais de Lia são ouvintes, estão na faixa de 35 anos e possuem o segundo grau

completo. A mãe é cabeleireira e o pai é metalúrgico, e trabalha na Usina de Volta

Redonda.Quando Lia tinha três anos, seus pais se separaram e sua mãe ganhou na

justiça sua guarda definitiva.

Em entrevista, sua mãe relatou que a menina não falou até completar dois anos e

iniciar sua educação precoce na classe de Educação Infantil no INES, onde conseguiu

pronunciar sua primeira palavra mamãe. Segundo sua professora, no período de um ano

seu vocabulário se ampliou, mas ela sempre preferiu utilizar a língua de sinais, que é até

hoje sua forma preferencial de comunicação.

Lia possui uma irmã mais velha, ouvinte, fruto de um casamento anterior de sua

mãe, que tem atualmente nove anos de idade e ambas vivem com a mãe num

apartamento, perto da escola que estuda. A irmã de Lia estuda numa escola pública

perto de casa e está na segunda série do ensino fundamental.

Eu visitei Lia em sua residência e constatei que a menina é cercada de carinhos e

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mimos por sua mãe, tendo um quarto só para si, cheio de brinquedos e uma pequena

televisão. Observei que Lia gosta de colecionar gibis e possui muitos livrinhos infantis.

A mãe relatou que Lia adora desenhar e sempre procura imitar a irmã quando a via

fazendo suas lições de casa e gosta de usar a tesoura para recortar figuras de revistas.

Desde os dois anos de idade, quando começou a freqüentar o INES, Lia aprendeu

junto com a sua professora da classe de Educação Especial do INES e seus coleguinhas

surdos a Língua de Sinais, da qual se utiliza com freqüência., Sua mãe freqüentou o

curso de LIBRAS para os pais de surdos do INES e é fluente nesta língua. Enquanto

Lia freqüentava a classe a mãe, que na época não trabalhava fora, a esperava passando o

tempo freqüentando o curso de LIBRAS. A mãe de Lia achava que era mais fácil ser

compreendida pela filha por meio de sinais e assim a menina adquiriu sua estruturação

de pensamento por meio da LIBRAS, que se tornou sua linguagem natural. Além disso,

a mãe de Lia sentia que a comunicação entre as duas fluía melhor quando a menina se

comunicava por sinais e a filha conseguia obedecer suas ordens com mais rapidez. A

irmã de Lia aprendeu a LIBRAS e contou que prefere se comunicar com sua irmã surda

nessa modalidade por acha que ela reage melhor. Entretanto ela me revelou que sempre

tenta de vez em quando que a irmã fale e se comunique oralmente com ela, obtendo

algum sucesso algumas vezes.

Durante todo o estudo não tive qualquer contato com o pai de Lia, mas soube

através da mãe e da irmã que ele nunca apoiou o uso da língua de sinais pela filha,

preferindo se comunicar com ela por meio de mímica e leitura labial. Segundo elas,

também nunca incentivou a filha a se expressar nessa modalidade, tendo muitas vezes

condenado e brigado com sua mãe por permitir e incentivar a filha a utilizar a língua de

sinais. A posição do pai de Lia contra a filha utilizar a língua de sinais já foi motivo de

muito conflito com a mãe. Embora Lia goste de estar com o pai, segundo a mãe, ela às

vezes fica nervosa e chora quando o pai quer obrigá-la a se expressar oralmente.Nessas

ocasiões a menina fica amuada e pede para que o pai a leve de volta para casa.

Constatei que Lia tem bom relacionamento com outros parentes, como sua tia e

sua avó maternas (ambas conhecem LIBRAS, que aprenderam um pouco com a menina

e um pouco com a mãe). Ela também costuma brincar com as crianças da vizinhança,

sendo uma menina alegre e bastante curiosa, que gosta de fazer perguntas sobre as

pessoas próximas. Segundo a mãe, os vizinhos sempre convidam sua filha para festas

infantis e não se incomodam de tomar conta dela quando a mãe precisa se ausentar por

breves períodos.

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3.2.3 – Perfil das professoras da escola

O perfil das 13 (treze) professoras analisadas através de questionários mostrou

que a maioria era de idade superior a 30 (trinta) anos, todas eram casadas, com poucos

filhos e considerável tempo de magistério, atuando todas nas séries inicias do Ensino

Fundamental. Algumas professoras afirmaram já ter tido contato com pessoas

portadoras de deficiência; enquanto outras não tiveram essa experiência. Todas as

professoras da escola que participaram diretamente da educação de Lia não possuíam

treinamento ou experiência pedagógica anterior sobre como lidar com a surdez.

3.2.4 Perfil das Professoras de Lia

As duas professoras que trabalharam diretamente com Lia foram a Profa. Cristina

e a Profa. Mariza.

A Profa. Cristina na época da entrevista tinha 34 anos, cursou o Normal

Superior e fez pós-graduação Psicopedagogia . Ela declarou que possuía 10 anos de

magistério , sendo que trabalhava há seis anos no Menino Jesus e era especialista em

Educação Infantil. Antes de receber Lia em sua classe, não possuía nenhuma

experiência ou conhecimento sobre a surdez. Porém, ao ser alertada pela diretora que

teria uma aluna surda em classe, entrou em contato com o INES que providenciou sua

matrícula numa turma de um curso em LIBRAS. Ela também informou que no primeiro

dia que Lia chegou à sua classe, ela já conhecia alguns sinais básicos e recebera apoio

material e informativo da ex-professora de Lia no período em que ela estava na

Educação Infantil do INES. Lia esteve sob seus cuidados durante cinco meses, quando

ela entrou com pedido de licença.

A Profa. Mariza, colega de Cristina , tinha 28 anos na época em que a entrevistei,

possuía 3 anos de magistério no Menino Jesus, escola em que começou sua carreira

profissional, era formada em Pedagogia e tinha especialização em Educação Infantil.

Ela entrou na vida de Lia quando foi indicada para substituir a Profa. Cristina , que

entrara de licença. Não possuía qualquer experiência anterior com alunos surdos e

declarou que sua formação pedagógica não a preparara para lidar com esse tipo de

alunado. Ao assumir a classe de Lia declarou-se “insegura e temerosa”, mas foi

convencida por sua colega Cristina que estaria à altura da tarefa e recebeu muito apoio

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desta que, antes de se retirar da classe, trabalhou junto com ela na classe, fornecendo

todos os dados necessários. Além disso, a ex-professora de Lia no tempo em que a

menina estudava no INES esteve presente nessas semanas de transição, ensinando-lhe

um pouco da língua de sinais e fornecendo fitas de vídeo de cursos de LIBRAS que

segundo ela, foram “muito úteis e indispensáveis” para que ela aperfeiçoasse sua

comunicação com Lia.

3.3 - Procedimentos

3.3.1 - Procedimentos Preliminares

A sondagem inicial da pesquisa começou sendo feita com a diretora e as treze

professoras da escola, com o objetivo de elaborar uma radiografia em profundidade da

situação da educação naquela escola, com destaque para o aspecto da inclusão de alunos

portadores de surdez. Essa sondagem utilizou observações de campo, entrevistas semi-

estruturadas e questionários visando avaliar a qualidade da instituição escolar quanto às

características desejáveis do seu corpo docente que poderiam contribuir para o sucesso

educativo desse tipo de alunado

Concomitantemente, foi observado também a postura, o comportamento e as

atitudes da aluna Lia frente à classe regular.

O primeiro movimento para realização da pesquisa foi o contato feito com a mãe de

Lia, para pedir autorização para que eu pudesse obter seus dados médicos e inteira-la do

meu desejo de iniciar uma investigação acadêmica acerca da inclusão de sua filha na escola

regular. Tivemos o nosso primeiro encontro informal em sua casa, onde nos conhecemos e

trocamos idéias pela primeira vez. A mãe de Lia mostrou-se receptiva também à idéia de

tirarmos fotos de sua filha em suas atividades rotineiras na escola e se prontificou a ajudar-

me em tudo o que eu julgasse necessário.

Após obtida autorização da mãe de Lia, o Instituto Nacional de Educação de Surdos

(INES), onde trabalho e que já prestava assessoria à Profa. Cristina , encaminhou uma carta

à Diretora da escola de Lia, pedindo autorização para que eu pudesse realizar minha

pesquisa sobre o processo educativo de Lia naquela escola, freqüentando, participando e

documentando o dia-a-dia da aluna, durante um período de vinte e cinco dias de

observações ao longo de três meses (março, abril e maio de 2005) com a Profa. Cristina e

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num período de dez dias ao longo de dois meses (agosto e setembro de 2005) com a Profa.

Mariza.

No dia seguinte a Diretora concordou que eu comparecesse e agendou comigo

uma reunião no mesmo dia para me conhecer e traçarmos os rumos da minha pesquisa e os

primeiros contatos com a professora de Lia.

Travei meu primeiro contato com a Diretora, na própria escola de Lia, e fui

calorosamente recebida por ela, que me contou que se sentia muito grata ao INES pelo

apoio que nossas professoras tinham sempre fornecido à escola, cedendo gratuitamente

materiais, revistas, CD´s e fitas de vídeo, apoio material considerado imprescindível para o

corpo docente, como também o apoio logístico. Naquele mesmo dia, a Diretora me

apresentou aos outros participantes da pesquisa, a saber: o corpo docente da escola e alguns

de seus funcionários administrativos que mantinham um contato mais freqüente e próximo

com a aluna.

Foi nesse cenário propício e extremamente favorável que comecei minhas pesquisas

e observações de campo. Desde aquele dia, minha atitude foi a de procurar sempre manter

uma postura de distanciamento necessária para a não interferência do desenrolar dos fatos,

a fim de descrever as situações de relacionamento entre os participantes da forma mais

realística possível. Para alcançar esse objetivo, fiz uma reunião prévia com todos os

participantes, expus os objetivos da minha pesquisa, bem como os cuidados que esta seria

cercada a fim de que minha participação em sala de aula não interferisse no cotidiano do

aprendizado de Lia.

Em primeiro lugar, deixei claro para as professoras e a Diretora que, no cenário da

sala de aula, eu não exerceria de maneira alguma papel de professora auxiliar e mesmo que

eu tivesse alguma opinião acerca da metodologia de ensino adotada não faria qualquer

sugestão ou opinião, me limitando tão somente ao papel de observadora e documentadora

dos fatos. Eu estaria sempre no fundo da sala e, como Lia já me conhecia, caso ela se

dirigisse a mim, a professora deveria interferir e dizer à menina que eu estava trabalhando e

procurar desviar sua atenção. Eu delicadamente também procuraria me tornar o mais

“invisível” possível, não incentivaria às crianças a me darem qualquer tipo de atenção, tão

somente se acostumarem com a minha presença na sala de aula, não respondendo a seus

apelos para participar das brincadeiras com elas e nem respondendo aos sinais que Lia me

faria , pois a menina sabia que eu era professora do INES e conhecia a língua de sinais.

Expliquei às professoras e à Diretora que essa postura de isenção era necessária

para a correta interpretação dos dados da pesquisa e me comprometi, ao final do período

estabelecido para minha estada na sala de aula, eu entregaria e comentaria finalmente todos

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os fatos e poderíamos enfim, trocar idéias e expor nossas dúvidas e comentários acerca do

desenrolar do processo.

3.3.2– Instrumentos Para a Coleta de Dados

Para a coleta de dados, foram utilizados os seguintes instrumentos : Entrevistas,

Questionários e Observações de Campo, que serão descritas a seguir.

3.3.2.1 – Entrevistas

A utilização das entrevistas visou obter informações que proporcionassem

evidências sobre os possíveis fatores dificultadores e facilitador7 3o senrutilizaç�em

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recebem as respostas do informante, seguindo espontaneamente a linha de pensamento do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração o conteúdo da pesquisa.

O trabalho de entrevista com as professoras de Lia, os professores regentes da

escola, a Diretora e os funcionários administrativos que mantinham contato mais

estreito com a aluna (a merendeira e dois inspetores) e a mãe da aluna aconteceu de

forma individual, numa sala reservada na própria escola, exceto com a mãe, cuja

entrevista foi realizada em sua residência. É importante salientar que o mesmo roteiro

de entrevistas foi utilizada com as professoras de Lia e as demais professoras que

trabalhavam na escola, mas não mantinham contato mais estreito com a aluna.Um

exemplo da entrevista realizada com as professoras de Lia encontra-se no Anexo I, da

mesma forma que o roteiro da entrevista que elaborei para a mãe de Lia se encontra

disposto no Anexo II. . No Anexo III, é apresentado o roteiro de entrevista com a

Diretora. No Anexo IV, temos o roteiro da entrevista que elaborei para os outros

professores da escola. E, finalmente, temos o Anexo V, que ilustra um desenho de Lia

comparando-o com o de sua colega de classe, Fernanda, que atesta sua criatividade,

atenção aos detalhes e excelente controle manual.

3.3.2.2 – Questionários

Também foram distribuídas às professores da escola com questões voltadas para a

temática da inclusão (Anexo IX).

O questionário elaborado foi constituído de perguntas objetivas fechadas, com

opções previsíveis de múltipla escolha, em um total de quarenta e oito (48), divididas

em três partes: Dados de Identificação Pessoal (9); Questões Diversas, relacionadas ao

tema inclusão e deficiências (17); Questões Específicas favoráveis (8) e contrárias (14)

à Educação Inclusiva.

O objetivo desse questionário foi procurar esclarecer, nos Dados de Identificação

Pessoal, o perfil do grupo de profissionais pesquisados.; nas Questões Diversas,

verificar a realidade do processo inclusivo, na sala de aula, e o quanto o grupo de

profissionais da escola estudada estava preparado para receber a aluna portadora de

surdez; nas Questões Específicas, apontar o quanto a administração e os professores

eram favoráveis ou não, ao sistema inclusivo de ensino na escola pesquisada.

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Também elaborou-se um outro tipo de questionário de avaliação (Anexo VII),

específico para as duas professoras que conviveram mais estreitamente com Lia, a fim

de capturarmos maiores detalhes sobre seus respectivos relacionamentos,interações e

técnicas que usaram com a aluna.

3.3.2.3 - Observações

Estive na sala de aula de Lia, observando a aluna, num em local que me permitia

uma visão ampla da sala e dos sujeitos, para possibilitar o registro e a interação

acontecida entre a aluna, sua professora e seus colegas, fossem elas dadas por

intermédio da linguagem oral, corporal, mímica, escrita ou sinalizada. O roteiro do

diário de campo que utilizei se encontra no AnexoVI.

A observação transcorreu num período de vinte e cinco dias, ao longo dos meses

de março, abril e maio de 2005 com a Profa. Cristina, primeira professora de Lia, com as

professoras da escola, com a diretora, com a merendeira e os dois inspetores. Em agosto

e setembro do mesmo ano, durante dez dias, fiz as mesmas observações com a Profa.

Mariza, a segunda professora de Lia, que a substituiu no início do segundo semestre

letivo.

O diário de observações foi utilizado dia a dia, com anotações detalhadas de

todas as situações da vivência nesse contexto, e o registro, com riqueza de detalhes,

possibilitou a análise mais apurada e possível nas situações observadas. Durante todo o

período de minha permanência na sala de aula, limitei-me a observar sem fornecer

nenhum tipo de ajuda ou interferência aos alunos ou à professora, num total de vinte e

cinco dias, com a Profa. Cristina e num total de dez dias com a Profa. Mariza.

Procurei observar as seguintes situações :

- comportamento da professora com a aluna surda e vice-versa;

- comportamento da aluna surda com os colegas;

- comportamento dos colegas ouvintes com a aluna surda;

- comportamento da professora com os alunos ouvintes;

- comportamento dos alunos ouvintes entre si;

Através das observações realizadas, os dados levantados foram confrontados e

analisados, oferecendo condições de se evidenciar situações que foram classificadas

como fatores de sucesso e também fatores dificultadores à inclusão da aluna surda.

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3.4 Descrição Da Escola

Ilustração 2 - Uma das Salas de Aula da Educação Infantil da escola

O Centro Educacional Menino Jesus2, situado em um bairro da Zona Norte do

Rio de Janeiro, é uma escola particular fundada em janeiro de 1995. Nos dois primeiros

anos de existência da escola foram prestados serviços educacionais, desde o Maternal

até a Educação Infantil (Pré I e II). A partir de 1998, a escola passou a contar também

com o Ensino do 1º Grau (1ª a 8ª), precedido pela Classe de Alfabetização.

Quando estive lá no início do ano letivo de 2005 para um primeiro contato com a

Diretora, a fim de obter a autorização para minha pesquisa, ela relatou que a Pré-Escola

(atualmente denominada Educação Infantil) era a porta de entrada da criança na escola.

Durante essa fase, “a criança adquire mais da metade do acervo intelectual que levará

pela vida”.

Conforme já mencionado, desde o nosso primeiro encontro, a Diretora mostrou-

se solícita e me autorizou a conversar com todo o corpo docente e administrativo,

demonstrando boa-vontade e interesse pela minha pesquisa, o que muito me

sensibilizou. Passei quatro semanas nessa escola e aproveitei para efetuar filmagens,

tirar algumas fotos e, principalmente, conversar e entrevistar não apenas os professores,

mas também alguns personagens interessantes do cotidiano da instituição, como a

merendeira, o inspetor, a agente administrativa responsável pelos controles da secretaria

2 Como já foi informado, todos os nomes são fictícios .

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escolar, bem como algumas coleguinhas de turma da Lia. Concomitantemente, coletei

impressões e comentários num diário de campo, conforme já descrito.

Ilustração 2- Lia (ao centro) e alguns de seus coleguinhas de turma

Uma das minhas primeiras impressões positivas foi em relação à estrutura

espaço-físico e arquitetônica.

Esta é uma escola bem estruturada, com 400 m² de área útil, dois parques

ensolarados com um espaçoso playground num deles,contando com salas de aula

climatizadas (o que aumenta o rendimento no verão para alunos e professores , pois fica

em um dos bairros mais quentes do Rio de Janeiro. Conta ainda com uma biblioteca

infantil informatizada, uma sala de informática, áreas de recreação, alimentação. Para

além do currículo convencional, a escola oferece várias atividades extra classe. Entre

essas atividades, destacam-se os passeios orientados (por exemplo a museus e parques

recreativos) e principalmente, as aulas com professores especializados em música, artes

e ginástica artística.

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CAPÍTULO 4

ANÁLISE DOS DADOS

Neste estudo, procurei estabelecer um diálogo entre o referencial teórico

apresentado no segundo capítulo e a realidade encontrada, ou seja, a prática efetiva

desencadeada por meio da inclusão da aluna surda no espaço do ensino regular,

procurando nas observações feitas as razões que forneçam sustentação ao processo de

inclusão e o confronto com a realidade encontrada.

No presente capítulo pretendo aprofundar a discussão sobre a inclusão da aluna

surda no contexto do ensino regular, a partir de uma aproximação entre as reflexões

provocadas pelo discurso acadêmico e sóciopolítico a favor da Educação Inclusivae a

sua sustentação legal por intermédio dos tantos discursos sociopolíticos e a observação

in loco sobre a práxis pedagógica realizada pelos educadores da escola pesquisada.

4.1 – Observações na Classe

A classe infantil de Lia é constituída por um total de doze crianças, seis meninas

e quatro meninos, sendo que apenas Lia é a única portadora de necessidade especial.

A rotina semanal da classe de Lia inclui aula de Artes,onde os alunos liberam a

criatividade desenhando conforme o tema passado pela professora ou executam

trabalhos manuais (confecção de bonecos, chapéus comemorativos, bichinhos de papel

com dobraduras estilo origami), Informática (eles usam o programa Logo, que segundo

a professora auxilia no desenvolvimento da coordenação motora) e Educação Física.

A sala de aula é bem alegre e pintada de cores vibrantes (predomínio do amarelo

canário nas paredes), com um grande quadro branco na parede principal, de frente para

os alunos. As outras paredes contêm murais cobertos com desenhos dos próprios alunos

e material didático: como, por exemplo, um grande relógio de cartolina para ensinar a

ver as horas e cartazes comemorativos, contendo as datas de aniversário de cada aluno.

Nas conversas com o corpo docente eles me revelaram que, visando a qualidade

dos serviços prestados, a escola oferece aulas de reforço para os alunos que estão

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apresentando dificuldade e desenvolve constantes treinamentos de sua equipe, assim

como, procura sempre inovar em seus equipamentos e recursos físicos.

No terceiro dia, um fato significativo das observações ocorreu que revelou o

bom preparo pedagógico e o excelente entrosamento entre a equipe da escola, bem

como o grau de integração de Lia na classe.

Na turma de Lia, quando se aproximava a hora do término da aula, havia o que

se denominava a “Hora do Conto” na biblioteca infantil. Nessa atividade, a professora

escolhia um livro bastante ilustrado e lia o conteúdo para as crianças. Ela era geralmente

acompanhada por uma psicóloga, que analisava as reações das crianças à história, e

fornecia sugestões e apartes sempre que considerava necessário. Tanto a psicóloga

quanto a professora de Lia possuíam conhecimentos de LIBRAS. Vale lembrar que

tanto a psicóloga como essa professora regente tinham razoável domínio da língua de

sinais.

Nesse dia, as crianças formaram um semicírculo em torno da professora, e, antes

que ela começasse a ler, algumas crianças comentaram que de vez em quando sentiam

medo. A professora, então, perguntou-lhes que tipo de medo era esse, e em que

situações isso acontecia. Responderam que era medo de escuro, de lobo, de gato, de

lobisomem, de esqueleto, de fada, de fantasma, de lugar estranho, de “gente que nunca

viu”, de “um espaço muito grande”. Se “tiver muita gente”. Uma delas disse que “dava

até frio na barriga”.

Lia, a nossa aluna-alvo, foi também interrogada pela professora na língua de

sinais sobre o que ela lhe causava medo. A menina respondeu, fazendo o sinal de

cachorro; mais tarde averigüei junto a sua mãe que ele fora mordida por um cão no ano

passado e ficara muito traumatizada.

A partir dessa conversa inicial, a psicóloga sugeriu à professora trocar o livro de

histórias por outro intitulado: "O Fantasma do Medo" 3 que estava numa outra

prateleira. No prefácio vinha escrito: "no momento em que for trabalhar com a criança,

o educador deve ter em mente que o medo existe na natureza humana para a nossa

proteção" (p. 22). Também diz: "A pessoa corajosa não é a que jamais tem medo e sim,

aquela que melhor sabe relacionar-se com ele" (pág. 21).

Assim, esse livro que foi lido para as crianças conta a história desse livro que

conta como um menino-fantasma., a qual lembra a situação vivida por um outro

3 de autoria de Domingos Oliveira Medeiros, da Editora Rideel,1998.,

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conhecido personagem infantil, o Gasparzinho, aquele fantasminha camarada do

desenho animado, que só queria encontrar amigos mas sempre acabava metendo medo

nas pessoas. No livro o protagonista consegue ao final conquistar a amizade dessas

mesmas pessoas que antes fugiam dele.

O mais importante nesse episódio é que enquanto a professora contava a

história, a psicóloga traduzia simultaneamente em língua de sinais para a Lia. A menina

olhava muito atenta para ela, parecendo estar apreciando muito a historinha.

No dia seguinte, a professora conduziu as crianças para a sala de recreação onde

havia um largo tecido de algodão branco contendo vários contornos da cara e do corpo

do boneco/fantasma da ilustração da capa do livro lido no dia anterior, estendido numa

mesa retangular comprida. Cada criança sentou-se na sua cadeirinha e manuseando a

sua tesourinha, recortou seu boneco/fantasma.

Ilustração 3 – Atividade do contorno do Boneco-Fantasma do conto lido

pela professora da turma

Em seguida, a atividade das crianças foi contornar o boneco/fantasma recortado

no dia anterior no tecido, registrando a face (olhos, nariz e boca), e dando–lhes uma

expressão amiga. As crianças tiveram permissão para levaram o boneco feito por elas

para casa. Segundo a psicóloga explicou, essa atividade teve como objetivo principal

ajudar as crianças lidarem melhor com seus medos.

Outros objetivos alcançados por essa atividade, segundo relato posterior da Profa.

Cristina, foram o desenvolvimento da linguagem oral (e isso , em sua opinião,

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incentivaria Lia a se manifestar mais nessa área); desenvolvimento da autonomia,

segurança, controle das emoções, adaptação à novas situações; desenvolvimento da

linguagem corporal, expressiva e motora; além do desenvolvimento da linguagem

plástica.

O que mais me chamou a atenção, ao observar a reação de Lia e de seus

coleguinhas, foi a afetividade com que elas acolheram o Fantasma. Parecia que ele tinha

se tornado verdadeiramente um companheiro. Brincaram com ele durante todo o dia,

levaram-no para tomar lanche, para passear pela escola, para comer pipoca. Cada

criança tinha o seu Fantasma.

Na hora do recreio, aproveitei para entrevistar também as crianças sobre essa

atividade e algumas das respostas mais significativas que colhi de algumas delas estão

ilustradas abaixo :

Ilustração 4 – Alunos mostrando orgulhosos seus bonecos-fantasmas

Relato dos Alunos:

"... O que vocês vão fazer quando levarem o fantasma para casa pela primeira vez?

“Vou conversar com ele, deixá-lo em cima da minha cama e trazer depois para a

escola.”

“Vou esconder porque minhas filhinhas (bonecas) têm medo dele.”

“Vou deixar ele dormindo, depois vou tomar banho e levar ele para passear."

“Vou brincar muito com ele” (tradução da resposta feita por sinais de Lia).

(Professora) "...O que vocês vão fazer com o Fantasma em casa quando o levarem

para casa ? Ele ficou amigo de vocês?”

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“Eu vou bater papo com ele, dormir e deixar ele sozinho”.

“Eu não vou fazer nada.”

“Minha mãe vai deixar ele dormir comigo e ficar todo amassadinho..”.

“ Eu vou conversar, dormir com ele e depois jogar bola." (tradução da resposta feita

por sinais de Lia).

(Professora) "...Onde vocês vão guardá-lo, quando levarem o Fantasma para casa?

“Vai ficar na minha cama .”

“Vou deixar ele no carrinho para passear com as minhas filhinhas e depois vai ficar no

berço. Elas não vão ter medo, porque ele já virou amigo.”

“Vou dormir em cima dele.”

“Vou guardar na minha casa”. (tradução da resposta feita por sinais de Lia).

(Professora) "...Bem, o Fantasma/Amigo de vocês está pronto. Vocês gostariam de

falar mais alguma coisa sobre ele?”

“Vai se chamar Alexandre, vai ser um boneco que pode brincar e pode dormir.”

“Vai ser a Bela Adormecida “

“Vai se chamar Alcione.”

“ Vai ser meu amigo.” (tradução da resposta feita por sinais de Lia).

É importante ressaltar que as respostas fornecidas por Lia estavam plenamente similares

às dos demais alunos.

Sem dúvida, essa foi uma experiência pedagógica bem preparada e eficientes de

inclusão na área da Educação Infantil a que documentei. Pude comprovar o quanto a

atividade da construção do boneco/fantasma contribuiu muito para a participação e

integração social de Lia na sua turma.

Ilustração 5 -

Fernanda, uma das coleguinhas de Lia exibindo seu boneco-fantasma

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4.2 A Comunicação De Lia Com Seus Coleguinhas De Turma

Sendo uma criança cuja primeira língua é a LIBRAS, empenhei-me desde o

primeiro dia em que obtive autorização da escola para efetuar minha pesquisa de campo

na sala de aula, em verificar qual seria o comportamento de Lia na sua interação social

com seus coleguinhas que, no início desconheciam totalmente essa língua. Apresentaria

ela alguma dificuldade em se fazer entender? Os colegas da sua turma a rejeitariam e se

recusariam a brincar com ela devido a esse fato? Será que Lia, que segundo sua mãe, é

uma criança tímida, se sentiria só e isolada, apresentando um comportamento típico de

criança com problemas de relacionamento ?

Não precisei esperar muito para constatar que Lia se encontrava perfeitamente

integrada aos seus colegas apesar da diferença de comunicação. Devido a um trabalho

bem construído por parte da professora e da psicóloga, os colegas de Lia foram

introduzidos a cada dia no aprendizado de alguns sinais da LIBRAS e, como contou a

professora, as crianças encararam aquilo como mais um dos aprendizados que faziam

parte de sua rotina escolar e, já na primeira semana, pediam à Lia em sinais os materiais

para as tarefas de rotina , como lápis, livros de histórias, borracha e caderno. A

estratégia adotada pela professora, com o suporte da psicóloga, foi tentar apresentar,

sempre que possível, os sinais em LIBRAS para as crianças como uma coisa natural,

como mais uma tarefa escolar. E elas aprenderam bem depressa. A professora calcula

que, após um mês, todos os colegas de classe da menina sabiam o significado e

utilizavam bem cerca de trinta sinais elementares.

A professora relatou-me que no primeiro dia de aula a menina chorou um pouco

e manifestou a vontade de ir para a casa e perguntando muito pela mãe. Parecia

temerosa de participar das brincadeiras em grupo e se isolava num canto. Entretanto,

quando observou que os coleguinhas estavam aprendendo com a professora alguns

sinais bem conhecidos por ela, foi se chegando aos poucos. No final do primeiro mês de

aula, já se encontrava mais à vontade e colaborativa, fazendo até questão de ajudar a

professora a colocar bem a posição e o movimento correto das mãos.

Com o passar do tempo, o conhecimento dos sinais entre as meninas cresceu

mais do que os meninos, pois Lia parecia gostar mais da convivência com as meninas

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no recreio e as coleguinhas de Lia pareciam ter criado mais laços de amizade com ela,

sendo que duas meninas eram consideradas por Lia suas melhores amigas. De fato,

observei no recreio que tanto Fernanda como Bia eram mais próximas de Lia, parecendo

tr com ela uma relação de irmãs mais velhas que protegem uma irmã caçula: gostavam

de conduzi-la pela mão, chegaram a limpar o uniforme de Lia quando ela se

desequilibrou e caiu ao sair do balanço e chamar a inspetora para que endireitassem os

cadarços do seu tênis que estavam desamarrados.

A compreensão dessas meninas quanto aos problemas de comunicação da

coleguinha surda era surpreendente para a idade. Ao entrevistar Fernanda, de cinco

anos, uma de suas colegas mais próximas, perguntei à menina sobre o que se ela achava

difícil brincar com a colega por causa do problema da surdez e ela me deu a seguinte

resposta: “A Lia usa aparelho no ouvido e fala com as mãos, mas entendo tudo o que

ela diz porque aprendi a língua dela e agora a gente pode conversar e brincar muito.”

Fernanda parecia muito orgulhosa ao me dizer isso, como se o fato dela saber falar em

sinais com Lia fosse de fato uma grande façanha e conquista. E deixou claro também

que considerava a colega sua melhor amiga. Esse fato demonstra que, quando a

professora aceita e trabalha naturalmente com a língua de sinais, as crianças passam a

encarar a mesma como algo que merece ser aprendido e se esforçam para dominá-la tão

bem quanto a outra que a tem como sua língua natural. E o domínio da mesma passa a

ser motivo de orgulho, algo que estimula a auto-estima da criança.

Fernanda também manifestou muitas vezes atitudes superprotetoras em relação à

Lia, procurando bancar sua intérprete junto às pessoas que a abordavam e observei que

ela muitas vezes tentava ajudar sua colega nas tarefas de recorte e colagem, quando Lia

não conseguia executar direito ou sugeria à colega utilizar determinados lápis de cores

em seus desenhos. Notei que Lia desenvolveu uma tendência a depender certas horas de

Fernanda para executar certas tarefas em classe, procurando pelo seu olhar de aprovação

tanto quanto ao de sua professora e quando não conseguis recortar direito uma figura,

chamava Fernanda para fazê-lo para ela. Esse fato deve ser ressaltado, pois a professora

declarou que considerava essa atitude de Fernanda muito positiva para Lia, mas penso

que ela deveria interferir algumas vezes e não permitir essa dependência de Lia da

colega, pois estaria incentivando Lia a procurar sempre depender dos outros no futuro,

ao invés de utilizar e procurar desenvolver seus próprios métodos para superar as

dificuldades.

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4.3 – Relação De Lia Com Suas Professoras

4.3.1 – Relação De Lia Com a Profa. Cristina

Durante o período de observação, pude verificar que a aluna Lia tinha um bom

relacionamento com a sua primeira professora, embora algumas vezes ela levasse à

Profa. Cristina a um estado de frustração quando se tornava birrenta e exigindo toda a

atenção para si. Notava-se nessas ocasiões que suas crises de choro e malcriação

pareciam desafiar a paciência e a boa vontade da professora, que precisava utilizar todo

o seu recursos de autocontrole e firmeza ao tentar controlar seu comportamento. Havia,

no entanto, dias em que ela era bastante dócil, deixando a Profa. Cristina conduzí-la

facilmente pela mão. Demonstrava sua afeição por ela abraçando suas pernas e pedindo

para dar um beijo na professora quando ela, por meio da linguagem de sinais, a

parabenizava por uma atividade bem-feita .

Sabendo que Lia adorava desenhar, a Profa. Cristina não pedia a ocasião de elogiar

seus desenhos e sempre os pendurava no mural, dialogando com a menina por sinais

sobre o tema do desenho, as cores que escolhera, sendo que também procurava

comentar com os coleguinhas dela sobre algum pormenor dos mesmos. Ela me relatou

que nessas ocaiões tinha que ter sempre um cuidado especial de também elogiar os

desenhos dos outros coleguinhas na frente de Lia. Porém quando Lia se encontrava

sozinha ou um pouco mais afastada, ela se tornava mais enfática com os elogios para a

menina. Segundo a professora essa sua atitude permitia que não se criasse situações de

ciúme entre os outros alunos, que poderiam pensar que eles não eram merecedores de

elogios também de sua parte se ela só se preocupasse em destacar as realizações de Lia.

Os elogios da professora aos seus desenhos e trabalhos manuais pareciam deixar sua

aluna muito feliz e orgulhosa, pois quando a mãe chegava para levá-la de volta para

casa ao término da aula, ela sempre dava um jeito de arrastar a mãe pela mão e levá-la

na sala para apreciar seus desenhos pendurados no mural, dizendo para a mãe que a

professora gostara muito deles.

Observei, porém, como já comentado, que o relacionamento de Lia com a Profa.

Cristina foi pontuado de ocasiões de muita tensão quando a menina se via contrariada

algumas vezes em seu desejo de se desviar do ritmo da aula ou de impor a sua vontade

de efetuar outra tarefa ou brincadeira que não aquela determinada pela professora.

Porém, esses momentos se tornaram raros à medida que sua integração e adaptação às

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rotinas escolares foram se consolidando e ela foi se tornando mais confiante e segura do

seu espaço.

De todos os alunos de sua classe, na opinião de sua professora, Lia foi a que

apresentou um comportamento mais inconstante e que lhe deu mais trabalho, muito

embora na sua classe também existisse um menino com diagnóstico de hiperatividade.

Comparando o comportamento de Lia com o de seu coleguinha, a Profa. Cristina

relatou que ambos possuíam uma grande tendência a serem dispersivos e irriquietos,

mas Lia chegava a ser mais instável do que ele. Em sua opinião, isso ocorria porque o

menino, por ser ouvinte, era capaz de entender quando ela não aprovava seu

comportamento, e Lia demorava mais a se aperceber do que estava errado, necessitando

que ela ficasse muitas vezes de frente para a menina, obrigando a mesma a encarar suas

feições a fim de que ela percebesse que seu comportamento não estava agradando.

Outros aspecto importante relatado por Cristina sobre seu relacionamento com

Lia, foi sua descoberta de como conseguiu fazer a menina entender que ela devia

esperar a sua vez de receber atenção e respeitar a vez dos seus colegas. Cristina

verificou que, sempre que Lia procurava chamar sua atenção, se ela não podia atendê-la

de imediato,seja por estar lidando com os outros alunos que também queriam a mesma

coisa, seja por outros problemas, deveria procurar nessa hora sinalizar imediatamente

para Lia e que ela esperasse um minutinho que a atenderia logo e deveria seguir a

promessa à risca, procurando não ultrapassar mais do que alguns minutos. Se tal não

fosse possível, ela procurava enviar a Lia sinais que mostrassem que ela estava fazendo

um esforço para atendê-la, dizendo por sinais : “Ainda não dá, Lia ! Aguarde mais um

pouco !”. Isso faria com que a menina se certificasse que a professora não se esquecera

dela e julgava seus pedidos de atenção importantes também, mantendo-a sempre na

expectativa de ser logo atendida e evitando crises de frustração. Outro aspecto que ela

levou em consideração, depois de verificar que em algumas ocasiões não conseguia

fazer com que Lia atendesse seus pedidos de para executar uma tarefa, porque

demonstrava estar cansada ou irritada, era que nessas horas o melhor a fazer era dar sua

boneca preferida, que se encontrava guardada na caixa de brinquedos, e deixar ela um

pouco sozinha brincando, ao invés de insistir para que ela participasse da roda com os

colegas. Cristina observou ainda que, quando Lia reparava em sua expressão e percebia

que ela estava elogiando um coleguinha seu por um desenho ou uma tarefa bem feita,

ela devia também dar a entender a Lia, que a menina também era capaz de fazer aquilo.

Além disso, se quisesse que Lia colaborasse com o colega, devia manifestar através de

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sua expressão corporal e dizer por sinais, que ficaria ainda mais contente se ela também

fizesse aquilo pois gostaria de mostrar para a turma que o quanto Lia era inteligente.

Cristina confessava que às vezes tinha que exagerar nos elogios, mas que essa estratégia

dava resultado, gerando menos tensões e deixava Lia mais atenta , embora reconhecesse

que essa medida era paliativa, e que em certas situações Lia deveria aprender a

reconhecer suas limitações e que outras pessoas poderiam se destacar tanto ou mais que

ela em determinadas situações. Mas a Profa. Cristina reconhecia que devido à sua pouca

maturidade, ela ainda não alcançava esse fato, sendo por isso ainda um pouco

egocêntrica. Mas essa estratégia de exagero e supervalorização dos feitos da criança,

embora com todas as críticas e condenação que porventura pudessem ser feitas por

alguns especialistas em Educação Infantil, era a única estratégia que ela pudera utilizar

naquela situação crítica que exigira uma solução imediata. A respeito desse episódio,

Cristina para demonstrar sua importância, correlacionou-o a um fato que ocorrera

durante seu estudos no curso de pós-graduação em Psicopedagogia. Ela relatou que

nessa ocasião, tivera uma professora que lhe explicara que o importante ao lidar com

uma criança agressiva era essencial saber distinguir quando um comportamento

agressivo era passageiro, por motivos temporários, como o nascimento de um

irmãozinho, a hospitalização ou perda de um ente querido, ou ainda por mudança de

casa ou escola ou se pode ser considerado como um transtorno de conduta, caso em que

é necessário um acompanhamento de especialista para auxiliar a sanar o problema. Se

não dermos a devida importância nesta fase essas atitudes poderão evoluir de forma

prejudicial na adolescência e vida adulta, podendo transformar a criança no denominado

“agente ou alvo de Bullying”, isto é, como ela explicou para a pesquisadora,, é um

termo da moda, cunhado por especialistas em educação americanos, que foi

incorporado recentemente ao vocabulário dos especialistas brasileiros. É um tipo de

comportamento que sempre existiu, e que recentemente foi batizado com um esse nome.

Não existe uma tradução precisa para o português. Refere-se a todo tipo de

comportamento agressivo que ocorre sem nenhuma razão aparente. E Cristina

acrescentou que essa professora sempre lembrava-lhe, quando ela perguntava como agir

diante do comportamento agressivo de uma criança, que a personalidade da criança

forma-se até os seis anos de idade e por isso, toda experiência e sua qualidade vividas

nessa fase é de fundamental importância. Por mais que, às vezes, possa parecer ineficaz,

elogio, afeto, prazer e compreensão sempre teriam resultados muito mais rápidos e

menos estressantes do que bronca, castigo, sofrimento e indiferença. Cristina nunca se

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esquecera desse conselho e dizia que valia tudo, que ela recorreria a qualquer estratégia

que sua intuição lhe assegurasse estar correta para aquele momento, mesmo que

parecesse à primeira vista pouco ortodoxa ou que violasse as normas de conduta ditas

seculares ensinadas no seu curso de formação de professores, para alcançar os objetivos

propostos por ela para sua aluna: ter um desenvolvimento e integração social com seus

colegas harmonioso, aceitando a existência de normas de conduta e limites e,

principalmente, que ela encontrasse meios de se comunicar mais facilmente com o

mundo sem sofrer preconceito ou desrespeito por sua preferência pela LIBRAS.

Cristina também relatou-me que tinha esperança e, mais do que isso, acreditava

por tudo que já aprendera em sua convivência com Lia, que a barreira da surdez não era

nenhum empecilho para Lia desenvolver seus dotes artísticos (para a idade dela, era

desenhava muito bem, colocando muitos detalhes no seu desenho que as outras crianças

não davam importância, como quando ela desenhara sua própria professora junto ao

castelinho de brinquedo que existia no pátio da escola. Lia chegara a observar os

mínimos detalhes do castelo, colocara as nuvens e um sol risonho, com nariz e um belo

sorriso (Anexo V). Ao mostrar o desenho de Lia para a psicóloga que o comparara com

os das outras crianças da classe, diagnosticara que Lia era uma menina muito

observadora, expressiva e que tinha ânsia de se comunicar com as pessoas e atrair sua

atenção, pois era constante em seus desenhos colocar as pessoas e objetos com grandes

sorrisos.e escolhia cores vibrantes para seus desenhos. Em seu parecer final, a psicóloga

dissera que o tipo e a firmeza dos traços de Lia eram indícios de uma inteligência um

pouco acima da média para crianças da sua idade.

Cristina, com a convivência com a criança, aprendera a identificar os sinais que

possibilitavam reconhecer quando Lia estava mais apta a colaborar, quando ela se sentia

irritada ou infeliz, quais os sinais que indicavam que ela estava entendendo o que se

esperava dela, enfim, o comportamento de Lia, pelas anotações diárias feitas por

Cristina, deram-lhe um quadro menos assustador da personalidade, das reações, das

limitações e do potencial de aprendizagem da menina que possibilitaram que ela

resolvesse aceitar a incumbência de assumir sua educação. Cristina também relatou que

se sentia que Lia lhe proporcionava grandes desafios na sua profissão, que era um

estímulo para que ela investigasse, pesquisasse e estivesse sempre em busca de novas

maneiras de se comunicar com seus alunos . Lia era, nas palavras de Cristina, um

“tesouro” a descobrir e poderia oferecer subsídios para que ela aperfeiçoasse cada vez

mais sua prática pedagógica como professora de educação infantil, pois uma técnica que

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ela descobrisse que dava certo com Lia poderia servir também para ampliar seu

horizonte de conhecimentos acerca do comportamento dos outros alunos. Enfim,

Cristina conseguiu com seus narrativas e sucessos obtidos na sua relação com Lia

contagiar e entusiasmar sua colega Mariza e até mesmo os erros que cometera com Lia

no início, quando temia ser mais firme com a menina, na suposição de que ela se

fecharia mais ou aumentaria suas crises de frustração, foram um fator positivo para

convencer a colega a assumir a sua turma quando ela entrou de licença.

Com o tempo, Cristina percebeu que a criança não deixara de gostar menos dela

por ter sido mais firme e não permitido certas horas que ela fizesse a sua vontade, pelo

contrário, Lia algumas horas estava pondo-a à prova, para saber até onde poderia ir.

Com o tempo, justamente por ter imposto limites, ela sentia que a menina passara a

respeitá-la mais e acatar com mais prontidão seus desejos e ordens, por perceber que

isso a faria também ganhar o respeito e a colaboração dela e dos outros, sendo uma

grande recompensa para sua auto-estima. Ela convenceu sua colega Mariza que, não

deveria temer as “cenas” de Lia e sim, nessas horas procurar evitar que a criança se

machucasse, levá-la para um local afastado e quieto, tentar estabelecer um mínimo de

comunicação com ela que permitisse mostrar que seu comportamento a deixava triste e

era inadequado, e mesmo que demorasse um pouco, Lia acabaria se cansando da própria

birra e em algum momento se abriria novamente para o mundo, tentando se comunicar,

pois já tiveram demonstrações mais de uma vez que suas crises eram passageiras e ela

depois esquecia tudo e tentaria agradar de novo a professora. Além disso, seu ponto

fraco era ser sensível a elogios e demonstrações de afeto e estima. O sucesso de Cristina

também pode ser atribuído ao fato dela explorar o gosto de Lia por querer ensinar aos

outros seus sinais. Na hora da raiva, muitas vezes Cristina dramatizava com uma

coleguinha de Lia uma conversa em LIBRAS e propositalmente errava um sinal ou

fazia uma pantomina com ares de surpresa que esquecera o sinal do objeto que

apontava. Lia não se conformava e saía do seu canto, despia a carapaça do mau humor

e, indignada, corria para a professora para “corrigir” o sinal. Era o quanto bastava para

trazê-la de volta ao grupo.

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4.3.2 – Relação De Lia com a Profa. Mariza

A Prof. Mariza Picinni já trabalhava há três anos no Centro Educacional Menino

Jesus. Por indicação da Profa. Cristina, que entrou de licença, ela assumiu a turma da

colega, pois estava acostumada a ajudá-la nas pesquisas sobre atividades infantis para

sua turma e já lhe dera valiosas sugestões. Segundo Cristina, outro fator positivo que a

qualificava para o encargo, era que muitas vezes elas trocavam idéias sobre a melhor

forma de incentivar Lia a colaborar nas tarefas rotineiras da classe e a Profa. Mariza

manifestara interesse em aprender a se comunicar com Lia em LIBRAS. Além disso, no

recreio era a única professora que demonstrava vontade de se aproximar de Lia e tentar

se comunicar com a menina com alguns sinais muitas vezes inventado por ambas. Por

causa disso, Lia demonstrava simpatizar com ela, sempre a recebia com um grande

sorriso e dizia para Cristina que a “Tia” Mariza era sua “aluna” de LIBRAS.

No entanto, mesmo com todas esses fatores favoráveis , a Profa Mariza relatou que

se sentira um pouco insegura quando resolveu aceitar a incumbência, pois considerava

que o sucesso da inclusão da aluna na escola se devia ao preparo anterior que a Profa.

Cristina tivera de realizar, através do seu contato com o INES. A Profa. Mariza relatou

que admirava o empenho e a dedicação que a colega professora demonstrava em vencer

as barreiras da comunicação com a aluna e sentia que isso a contagiara a ponto de tentar

aprender a se comunicar com a menina durante o recreio e que sentira um misto de

orgulho e satisfação em constatar que conseguira , mesmo tendo que inventar sinais e

usar mímica, fazer que Lia a compreendesse.

Além disso, Mariza sentia que Cristina possuía uma espécie de “dom” especial para

lidar com alunas com problemas, a considerava mais paciente do que ela e tiveram mais

tempo de convivência com Lia. e por isso tinha uma bagagem muito maior de

conhecimento sobre suas reações e gostos. Já tivera inclusive ocasião de presenciar uma

das famosas cenas “assustadoras” de ataques de frustração de Lia, com muito choro,

gritos e pontapés direcionados para ela mesma e até para a própria professora, e

observara como comportamento controlado e profissional de Cristina perante aquela

situação que poderia contagiar e deixar nervosos os outros alunos, lograra controlar e

acalmar a aluna. Em suma, ela sentia o convite era uma grande responsabilidade e que

seus talentos seriam testados ao máximo caso aceitasse assumir a tarefa de substituir a

colega. Ela teria apenas duas semanas para se preparar e a própria Cristina lhe dissera

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que, caso resolvesse assumir a sua turma, ela teria de participar a princípio como

professora auxiliar na classe durante esse período para que as crianças se acostumassem

com sua presença e se adaptassem a ela. Ficaria combinado que Cristina a apresentaria à

classe aos poucos, acostumando a turma a aceitá-la ao mesmo tempo em que a

ambientava com as personalidades, gostos e particularidades de cada aluno (a).

Mariza temia, claro, as reações que Lia teria ao se ver sozinha com ela pela primeira

vez, sob suas ordens e orientação e confessara isso à Cristina. Uma coisa era brincar por

alguns minutos com Lia no recreio e demonstrar que simpatizava com ela, tentar

descobrir maneiras de se fazer compreendida pela menina, outra bem diferente era ter de

conviver com a aluna durante as quatro horas e meia de duração da permanência de

ambas em sala, tendo que procurar se comunicar com ela numa língua que ela não

dominava e não tivera ainda tempo suficiente para se familiarizar.

Cristina tinha o hábito de manter um diário particular sobre as personalidades,

hábitos e gostos de sues alunos, além dos fatos mais significativos que ocorriam em

cada dia de aula que compartilhava com Mariza. Isso foi de fundamental importância

para que Mariza se decidisse a encarar o desafio. Esse diário digitado no computador,

foi entregue entregues à Mariza com a recomendação de lê-los e analisá-los o mais

rapidamente possível para que ambas marcassem um encontro na escola para discutirem

como Mariza poderia se adaptar à turma e principalmente como daria continuação ao

trabalho de inclusão de Lia na escola. Enquanto isso, a Diretora também tomou uma

providência sugerida pela própria Cristina: pediu para a mãe de Lia marcasse uma

reunião com ela e as duas professoras a fim de transmitir o fato de que Lia teria uma

nova professora e para que a mãe da aluna contasse a história da filha e como a escola

estava contribuindo para o sucesso ou não de sua inclusão social.

Ao ler as anotações de Cristina, Mariza sentiu que realmente tinha um grande

trunfo nas mãos: num dia em que estivera brincando com Lia no escorrega, ajudando a

menina a se levantar do chão, a aluna dissera para Cristina que a “Tia” Mariza era muito

legal e estava aprendendo sinais com ela. Esse relato a encheu de coragem e ela chegou

à conclusão que se de fato a menina gostara dela, já era meio caminho andado.Talvez a

tarefa não fosse tão árdua se ela conseguisse evitar as situações que poderiam

desencadear a ira e as conseqüentes crises de Lia.

E assim Mariza, após duas semanas de preparação e convivência com a turma de

Cristina, se sentiu pronta a assumi-la com segurança. Ela também relatou que seguiria o

exemplo da colega no hábito de fazer anotações e reflexões num pequeno caderno ao

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final da aula e pôde constatar que os conselhos de sua colega foram de grande valia.

Suas expectativas em relação ao seu sucesso com a educação de Lia cresceram aos

poucos, e ela relatou que embora ainda se sentisse um pouco insegura, sua ansiedade

diminuiu e ela também se sentia mais à vontade na presença da menina. Um dos erros

que ela custou a corrigir era sua mania de tentar falar num tom de voz mais alto com

Lia, um hábito que ela interpretou, com suas próprias palavras, como sendo “no fundo

estava ligado ao sentimento inconsciente e bastante natural” das pessoas de audição

normal de tentar captar uma palavra articulada de forma ininteligível por outra pessoa

aumentando o volume da própria voz. Ela teve que se policiar por um tempo e lembrar

que no caso de Lia, como demonstrava seus exames audiométricos, sua perda auditiva

se dava na área da fala e, portanto, era indiferente que ela falasse num tom alto ou

baixo, pois a criança era totalmente refratária a isso e só compreendia os sinais.

Para estimular a leitura labial de Lia, Mariza inventou um jogo, no qual colocava

numa mesa um monte de brinquedos pequenos e gulodices e pronunciava uma palavra

sem som, representando um brinquedo ou doce e a criança que compreendesse seu

significado tinha direito de correr para a mesa e apanhar o que ela dissera. No começo,

ela contou que Lia se recusou a fazer isso e estava a ponto de ter uma das suas crises de

raiva. Mas Mariza passou a articular a palavra e, ao mesmo tempo, fazer o sinal em

LIBRAS correspondente em Português, o que agradou a menina. Depois de algum

tempo a professora fez uma descoberta maravilhosa : quando ela inverteu o jogo e pediu

aos coleguinhas de Lia que eles só poderiam correr para a mesa para apanhar os

brinquedos e os doces pedidos quando fizessem o sinal certo para a palavra, Lia reagiu

de uma forma inesperada: passou a prestar mais atenção à leitura labial da professora,

pois queria ser a primeira a dizer para seus colegas que eles estavam errados, que o

brinquedo ou doce que eles apanhavam não era o do sinal que eles faziam. E ficava toda

prosa quando chamava a atenção do colega e se dirigia à Mariza dizendo em LIBRAS

veementemente: “Errado ! Errado ! Errado sinal ! Certo sinal assim !”4

No último encontro que teve com a Prof a. Mariza, constatei que, 1 mês depois

de ter assumido a turma, Lia risonha e feliz, e sua professora demonstrava estar também

mais apta e segura ao lidar e se comunicar com ela. O futuro desta criança naquela

escola parecia estar assegurado e todos que conviviam com ela demonstravam acreditar

que ela lograria chegar ao mesmo patamar que qualquer criança ouvinte da mesma

4 Conforme traduzido literalmente na ordem gramatical da LIBRAS, significando: “Está errado ! O sinal correto é assim !”

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idade. A Profa. Mariza repetia incessantemente : “Ela é muito inteligente, faz cada

desenho lindo, tem firmeza nas mãos, já escreve o próprio nome e pede a toda hora que

lhe dêem coisas para escrever. No dia das Mães desenhou um cartão com a mãe e

pediu para escrever “Eu te amo Mamãe !” e assinou sozinha o próprio nome embaixo,

no meio de um coração bem grande que desenhou com a mãe ela dentro dele. Eu fiquei

muito emocionada e soube pela própria mãe dela que ela chorou de emoção ao ler as

palavras que a filha escrevera no cartão. Não é fantástico ?”

4.4 Relação de Lia Com os Coleguinhas

Podemos observar que em qualquer escola, para as crianças, além do conteúdo

acadêmico, existe um aspecto que é crucial para o fracasso ou o sucesso na vida de

uma criança - as amizades.

Quando comecei a pesquisa, a primeira coisa que queria observar é como Lia,

que possuía um vocabulário oral muito limitado e que era incapaz de se expressar de

um forma inteligível à maioria das crianças ouvintes, poderia fazer amizades ? Quando

as crianças estivessem pulando e correndo no playground, como a professora ou a

própria Lia faria para não ser excluída ? As crianças poderiam ser cruéis e ter

implicância com ela. Lia poderia até alcançar o mesmo nível de aprendizado que

muitos de seus colegas, mas o que aconteceria se não conseguisse fazer amigos, se

ficasse isolada ?

Foi importante observar a maneira como a equipe escolar e principalmente a

Prof Cristina reagiu a ela, pois isso teve grande efeito sobre os seus colegas.

Lia era diferente no modo de se comunicar das outras 12 crianças da sua turma e,

sem dúvida, ela chamava a atenção de todos quando se dirigia a alguém em sua língua

natural, a LIBRAS. No começo, senti que sua professora e a equipe escolar procuravam

evitar repreendê-la quando ela se tinha crises de raiva e frustração, como verifiquei em

uma ocasião aconteceu quando outra menina lhe tirou um brinquedo das mãos. Percebi

que de alguma forma parecia cruel para sua professora agir e falar severamente com

alguém tão pequena (era a mais baixa da turma), de aparência frágil, e com uma

deficiência. Entretanto, acredito que para uma inclusão verdadeira, a menina não

deveria ser tratada ou encarada diferente das demais.

Pela manhã todas as crianças chegavam na sala de aula, após guardarem suas

mochilas e casacos, sentavam-se no tapete em frente à professora. Esse era um

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momento em que as crianças deveriam ficar quietas. Lia estava sempre feliz de ver suas

colegas, e começava os dias com muito entusiasmo. Entretanto, esperava-se que as

crianças prestassem atenção na hora da chamada e que ficassem atentas quando a

professora apresentava para elas as instruções sobre as atividades do dia.

Freqüentemente nessas ocasiões, Lia se distraía, levantava-se do tapete e se

encaminhava em direção ao armário de brinquedos, apontando para uma boneca Barbie

que era a sua predileta, fazendo gestos para a professora pegá-la a fim de brincar com

ela. Esse era o primeiro momento de tensão do dia, pois a Prof Cristina tinha de

levantar-se, pegar Lia pela mão, reconduzi-la ao círculo e comunicar-se com ela por

meio de sinais pedindo à menina que ficasse quietinha e esperasse que ainda não era

hora de brincar com a boneca. Algumas vezes Lia se irritava com a atitude da professora

e indicava por gestos que queria ir embora, pedindo em LIBRAS para a professora

chamar sua mãe. Realmente, nessas horas notava-se nitidamente o desconforto da Prof

Cristina que, apesar de tentar ao máximo não repreendê-la, acabava algumas vezes

tendo que fazê-lo. Observei que Lia fazia birra, chegando a tentar bater na professora e

mais de uma vez derramava lágrimas de frustração. Nessas ocasiões, a professora

tomava uma atitude mais firme, e fingia não lhe dar atenção. A estratégia surtia efeito e

Lia parecia, afinal, compreender que sua atitude não levaria a lugar algum e depois de

alguns minutos começava, embora ainda um pouco amuada a participar das atividades

com suas colegas.

Não havia tempo suficiente nas manhãs de segunda-feira para que todas as 12

crianças contassem à professora o que havia acontecido no final de semana, e se Lia

tivesse novidades, ela teria de esperar sua vez como as demais. Quando a Prof Cristina

finalmente se dirigia a ela pedindo em sinais e, ao mesmo tempo articulando bem as

palavras olhando em sua direção, que ela contasse as novidades do seu fim de semana,

Lia tentava transmitir primeiramente em sinais, mas alguns dos seus colegas muitas

vezes a interrompia e lhe dirigiam perguntas . Algumas vezes Lia dava sinais de que

não estava entendendo uma pergunta, e olhava interrogativamente para a professora

pedindo que ela lhe fizesse sinais em LIBRAS, traduzindo a pergunta. Por exemplo,

houve uma ocasião em que ela contava para a classe que seu pai a levara no domingo ao

Parque Terra Encantada , um parque de diversões situado no Recreio e que ela brincara

muito no Pula Pula, uma espécie de cama cama elástica na qual as crianças adoram

pular e rolar. Ela relatou isso para a turma em sinais e a única palavra vocalizada que

pronunciou soou algo como ula-ula, que significava Pula Pula. Claro que naquela

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ocasião a Prof Cristina não entendeu o que Lia estava querendo transmitir, só conseguiu

apreender a palavra parque e o verbo ir, pois sabia os sinais dos mesmos. O único

comentário da professora em sinais fez, poderia ser traduzido como “Que bom, Lia.

Você adorou mesmo o passeio!”. Para escapar da “saia justa” e não querendo

demonstrar para a turma nem para a própria Lia que não estava entendendo nada, ela

passou a palavra para outra criança e quando terminou o tempo para todos fazerem seus

relatos, ela pediu às crianças para se levantarem e colocou-as em volta das mesas e

pediu para desenharem o bicho que mais gostavam.

Quando a aula terminou e tocou a sineta anunciando o recreio, ela me chamou do

canto em que eu sempre ficava como observadora e pediu minha ajuda, pois ela sabia

que eu conhecia um pouco mais de LIBRAS do que ela. Confidenciei à professora que

minhas observações sobre os gestos que Lia fizera podiam ser traduzidos com uma ida a

um parque de diversões, mas também não conseguira entender um outro gesto que ela

fizera, como também o que a professora me traduziu como sua emissão vocal. Ficamos

especulando o que poderia ser esse tal de ula-ula e chegamos juntas à conclusão que

deveríamos no final da aula falar com sua mãe, que sempre a apanhava na escola,

pedindo para nos esclarecer o mistério.

Ao término da aula, quando finalmente encontramos a mãe de Lia e contamos o

episódio, ela riu muito e nos esclareceu que a filha adorava pular na cama elástica do

parque com os irmãos e sempre pedia aos pais para que a deixassem ficar naquele

brinquedo pulando muito.

No dia seguinte, a Prof Cristina teve uma idéia: levou fotos do Parque Terra

Encantada que baixara da Internet e imprimira em sua casa para a sala e disse para as

crianças, apontando para as fotos de alguns dos brinquedos do parque (montanha russa,

o Pula Pula,etc) pedindo para escolherem a foto do brinquedo que mais gostavam.

Como ela esperava, Lia mais que depressa apontou para a foto da cama elástica,

demonstrando um contentamento incrível e vocalizando o famoso “ula-ula”. Foi desse

modo que os seus colegas de classe finalmente entenderam o que ela quisera contar no

dia anterior e a Prof Cristina aproveitou para mostrar a todos como era o sinal em

LIBRAS ,que tanto intrigara a todos, do brinquedo que a Lia mais gostava. A aula

inteira depois disso transcorreu sem incidentes, com toda a turma parecendo alegre e

dizendo para a professora que iam pedir aos pais para levarem elas no Pula Pula

também e ficaram imitando a Lia que resolvera ficar pulando pela sala numa alegria

incontida , imitando os pulos que dera no brinquedo. Nesse dia, percebia-se que Lia

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ficara mais sociável e participativa, pois ela parecia sentir que seu relato e seu gosto

pelo seu brinquedo predileto era apreciado por todos. Esse fato foi um importante num

sinal de que ela passara a se sentir membro do grupo, uma vez que se fizera entender.

Normalmente crianças não são paternalistas e boazinhas o tempo todo com

alguém que muitas vezes demonstra ter problemas. Mas reparei que algumas colegas de

Lia pareciam ter se afeiçoado a ela, procurando incluí-la em suas brincadeiras e, sempre

que podiam, a chamavam para participar com eles. Duas de suas colegas se destacavam

em atitudes protetoras para com ela, oferecendo a ela seus lápis para desenho sempre

que ela os deixava cair e acariciavam sua cabeça quando ela tinha um dos seus famosos

ataques de frustração e encolhia-se no chão, com as pernas de encontro ao peito. Essas

colegas eram as que mais tentavam se comunicar por sinais com Lia e pareciam

aparentar uma certa empatia com ela. Acredito que essas suas colegas se beneficiaram

da presença de Lia na classe desenvolvendo paciência e empatia, além de torná-la

menos egocêntrica e mais antenada nas necessidades e desejos das outras crianças.

Observei, no final do período de observação, que Lia também aprendeu a confiar

na Profa. Mariza como confiava anteriormente na Profa Cristina, e não pedia mais para

chamar sua mãe sempre que se sente contrariada. Ao mesmo tempo, seu suas crises de

frustração se tornaram esparsas e, quando ocorriam, a Profa Mariza, já se sentia mais

segura nas atitudes que deveria tomar para superá-las .

Reparei que à medida que o tempo passava e Lia se sentia mais segura e aceita

na escola, apesar de sua maneira peculiar de se comunicar, suas amizades se formavam

mais naturalmente. Na hora do recreio, quando estava no playground, Lia costumava

sentar-se num banco ou mesmo no chão e era cercada pelas outras crianças que muitas

vezes a pegavam pela mão e a conduziam para o balanço ou o escorrega , fazendo um

grande estardalhaço, rindo muito uma com as outras e senti que nessas ocasiões para as

outras crianças ela era considerada uma igual.

Observei que a Prof Cristina sempre encorajou as crianças a aprenderem sinais

novos e vez por outra encontrava uma maneira de introduzi-los em sala de aula. Sua

estratégia favorita era se dirigir à Lia num pequeno diálogo em LIBRAS onde utilizava

o sinal que ela queria ensinar para as crianças. Depois disso, ela se voltava para a turma

e dizia:

- Sabem que sinal é esse ? Gostariam de aprender ?

A turma respondia em uníssono que sim e ela explicava, pedindo a ajuda de Lia.

E o mais notável dessa atitude da professora é que no dia seguinte, quando a professora

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se dirigia à turma vez por outra falando o significado do sinal articulando-o bem sem

fazer ao mesmo tempo a tradução em LIBRAS para Lia, imediatamente ela que até

aquele momento estava olhando fixamente para os lábios da professora, se voltava para

a turma e, sem que ninguém pedisse, traduzia a palavra para LIBRAS. Creio que esse

fato demonstra claramente uma fórmula de sucesso que a professora encontrou para

fazer com que Lia se interessasse em compreender / aprender uma outra forma de se

expressar, respeitando ao mesmo tempo sua língua natural. Concomitantemente, para os

colegas de Lia, essas ocasiões se tornaram um momento bastante lúdico e divertido,

fazendo com que eles também respeitassem e quisessem aprender mais a linguagem de

Lia, encarando-a como uma coisa tão natural como se em vez de LIBRAS a menina

fosse uma colega estrangeira que falasse uma língua diferente da deles, mas

perfeitamente coerente e compreensível.

4.5 Entrevista com a mãe de Lia

Entrevistei um dia a mãe de Lia no pátio da escola enquanto ela esperava a saída

da filha ao término da aula, e ela me contou que na primeira vez que levara Lia na

escola, ela não sabia como deveria se sentir. Ficara muito preocupada que a filha

achasse a vida escolar mais difícil que as crianças "normais", e que as próprias crianças

dificultassem a sua vida se fossem cruéis. Mas passados os primeiros meses, ela já

percebia que os progressos da filha eram tão notáveis que se sentia segura e convicta

que tomara a atitude correta ao colocá-la naquela escola.

Ela assim se manifestou: “Vejo minha filha agora contente ao vir para a escola,

principalmente quando ela sabe que naquele dia terá aula de Educação Física.”

Esse sentimento refletido nas palavras dessa mãe sugere que a prática

pedagógica deve, para o surdo, ocorrer de forma mais consistente em atividades que o

levem a se expressar e a se manifestar enquanto corpo. O trabalho em sala de aula, um

ambiente fechado, poucas vezes permite ao aluno surdo desenvolver todo o seu

potencial expressivo, e muitas vezes por isso, os professores podem concluir

erroneamente que ele é um ser apático, triste e distante. O desempenho em jogos, em

brincadeiras, permite ao surdo o desenvolvimento da sua corporeidade, por intermédio

dos trabalhos de expressão corporal realizados nas práticas dos exercícios nas aulas da

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disciplina de Educação Física, trabalhando de forma harmoniosa, mas não em menor

intensidade, sua psicomotricidade, sua inteligência corporal.

A expectativa da mãe de Lia em relação ao papel da escola regular na educação

da filha surda mostrou-se intensa. RABÊLLO (1998, p. 65), convalidando suas

expressões, aporta em Spolin (1979) que afirma:

“quando uma pessoa trabalha além do plano constrito, ela está, realmente,

aberta para aprender.”

Acredito que essa é a forma de se trabalhar e obter sucesso com o aluno surdo,

entendendo que ele possui sua comunicação aflorada no campo gestual visual. Por ter

levado para dentro da sala de aula essa visão, descoberta ao longo da convivência

cotidiana com a criança, as duas professoras de Lia em muito contribuíram para o

sucesso do processo de inclusão da menina.

Convém mencionarmos aqui que as opções para as famílias de alunos surdos que

valorizam o diploma do E.F. são restritas: inclusão na rede regular ainda durante o

período pré-escolar; inclusão depois de garantir, na escola especial, os fundamentos de

linguagem e alfabetização; ou matrícula no Ensino Supletivo, mais tarde, na

adolescência. Diante das posições antagônicas de profissionais e especialistas sobre o

melhor ambiente para a educação do surdo, a decisão por colocar o(a) filho(a) na escola

especial ou no ensino regular vem angustiando muito as famílias, como já foi

demonstrado anteriormente no início desse capítulo pela mãe da aluna. Ela parecia ter

consciência que era preciso pesar os ganhos nas áreas sócio-afetiva e de linguagem que

a filha poderia ter na escola especial (INES), onde a matriculara nos seus três primeiros

anos de vida, contra os benefícios da possibilidade de cursar o ensino fundamental em

ambiente menos segregado, do conteúdo curricular menos pasteurizado do que

geralmente é esperado oferecer numa instituição especial, e do direito a certificado de

conclusão do curso.

Com base em tudo o que observei, concluí que se Lia tivesse permanecido no

INES, isso não representaria uma trajetória menos tranqüila, levando em conta que o

domínio da língua de sinais e a alfabetização plena não estão necessariamente

garantidos numa escola especial, mas por outro lado, a experiência escolar na rede

comum de ensino nem sempre pode ser bem sucedida.

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preparar não apenas o corpo docente, mas todo o corpo administrativo da escola para

recebê-lo e com isso facilitar ainda mais a sua socialização.

10m()trevista com a merendeira

Assim como os inspetores, a tomada de consciência e a adaptação da merendeira

Sandra, que fora contratada pela escola há apenas três meses, com uma aluna que se

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No dia seguinte, na reunião, a Diretora acompanhada de todos os funcionários da

escola, fez uma exposição sobre o problema de Lia e disse que esperava a colaboração

de todos para facilitar sua integração e socialização na escola. Foi pedido a ela que

tentasse aprender alguns sinais básicos para se comunicar com Lia. Porém Sandra

retrucou que, como tinha experiência anterior com crianças, visto ser mãe de três filhos

pequenos, acreditava que todas as crianças apresentavam o mesmo comportamento,

apreciando brincadeiras e a comer doces por exemplo, que ela julgava que não teria

problemas de comunicação com Lia pois julgava que a menina a compreenderia bem se

ela fizesse mímica e com o tempo ambas chegariam até a se entenderem pelo olhar. No

entanto, a Diretora retrucou que, embora concordasse com seu ponto de vista de que Lia

era antes de tudo uma criança que apreciava as mesmas coisas que todas as outras

crianças como ela, independente de sua deficiência, Sandra só teria a lucrar se

aprendesse um pouco a língua de sinais, pois ela gostaria que todos na escola

demonstrassem para Lia e para o mundo que falar em língua de sinais podia ser uma

coisa natural . Além disso, o esforço de todos da escola para aprenderem um pouco de

LIBRAS ajudaria os outros funcionários da escola e até os colegas de Lia a perderem

quaisquer vestígios de preconceito contra a língua de sinais.Para isso a Diretora

informou-a que tomara a providência de contratar um professor surdo, que lecionava no

INES, para ministrar a ela e aos outros funcionários e professores, num horário pré-

estabelecido, um curso básico de LIBRAS.

Sandra relatou que saiu da reunião muito surpresa com todas aquelas

informações e comentara com outros colegas funcionários que achava tudo aquilo uma

grande bobagem , um esforço descabido para lidar com uma menina de apenas cinco

anos cujo único problema era não ouvir bem e ser muda, mas que, com o decorrer do

tempo e a convivência com Lia, foi se conscientizando da importância de se investir no

aprendizado da LIBRAS, pois até os colegas de Lia na hora do recreio e durante o

lanche se dirigiam a ela para pedir seus lanches prediletos vez por outra na língua de

sinais, principalmente quando Lia se encontrava presente acompanhada de suas

amiguinhas prediletas, Fernanda e Patrícia, que embora falassem normalmente,

conversavam e se dirigiam a ela fazendo sinais. Isso contagiava a turma de tal forma no

refeitório que quando Sandra se apercebia, todas as crianças enquanto merendavam

estavam fazendo sinais uma para as outras e ela acabava por se sentir um peixe fora

d´água , incapaz de acompanhar a conversação delas.

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4.8 Entrevista com Outros Professores

O repensar a educação do surdo está distante da realidade de alguns professores

da escola de Lia, conforme pudemos colher em entrevista:Eu vejo o surdo como mais

um aluno pois temos muitos problemas em sala de aula. Não posso fazer diferente as

aulas. Como ficam os outros? A gente ensina em português, ler, escrever, contar [...] E,

eu sei que ele não se dá bem nisso. Mas, é isso aí. Tenho que esquecer um pouco dele

senão fico rodando e não saio do lugar com os outros porque ele não se dá bem na

sala, entende?

Essas explicações pressupõem, por um lado, um professor que não sabe como

trabalhar com o surdo e, por outro, a necessidade de que ele reveja a sua postura

pedagógica.Ambas as situações deixam entrever um aluno surdo perdido nos

emaranhados das tantas tentativas cercadas de acertos e erros.

GÓES (2000, p. 38) afirma: “Não há limitações cognitivas ou afetivas inerentes

à surdez, tudo dependendo das possibilidades oferecidas pelo grupo social para seu

desenvolvimento, em especial, para a consolidação da linguagem.”

A exposição acima reflete um momento que não visualizamos no contexto da

sala de aula, apenas nas brincadeiras feitas na hora do recreio e nas atividades realizadas

nas práticas da disciplina de Educação Física, levando-nos a afirmar que o

desenvolvimento cognitivo do surdo não está sendo possibilitado desenvolver-se, pela

simples razão de que ele apenas imita ou copia as atividades elaboradas pelo professor e

colocadas no quadro-de-giz.

O relato colhido de uma das professoras regentes cuja expressão “ele copia tudo

direitinho” deixa claro que ele realiza esse ato de forma mecânica, sem estar aplicando,

nessas atividades, o seu entendimento, a sua reflexão e a sua aprendizagem.

Afirmações como “ele está sempre atrasado, não aprende nada, tenho que insistir

para que ele resolva sozinho alguma coisa, pois ele está sempre perdido, esperando

alguém para ajudá-lo” explicam o modo pelo qual o surdo está seguindo em busca de

sua aprendizagem, ou seja, nenhum, pois ele não está em sintonia com o mundo da sala

de aula, pura e simplesmente, para o ato de receber, e, para ele, receber o desconhecido,

originado pela comunicação verbal.

Os dados colhidos a partir das respostas do questionário da entrevista com as

professoras que não tinham contato mais estreito com Lia, mas pertenciam ao quadro de

docentes da escola, são bastante reveladores. Através deles percebi que os que eram a

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favor da inclusão argumentaram sobre a importância da socialização da aluna surda

entre outros alunos da escola regular, de modo geral, falaram dos direitos iguais, da

importância de lutar contra a discriminação. Para mim, foi interessante perceber que

nenhum professora utilizou o argumento de que na escola comum a aluna surda teria

acesso a conteúdos curriculares importantes para a formação humana. Ou seja, o

objetivo primeiro da escola, que a meu ver, é a transmissão de conhecimentos, não foi

utilizado para argumentar a favor da inclusão, mas sim a socialização e a aceitação da

aluna surda. As professoras que se colocaram contra a inclusão também utilizaram o

argumento dos direitos da aluna surda, mas neste caso com o viés de que essa aluna

tinha direito a ensino especializado, que respeita sua diferença. Também assinalaram a

falta de preparo delas e da escola para lidar com a problemática específica desse tipo de

aluno. As professoras que apontaram restrições para a presença de Lia na escola

reivindicaram número menor de alunos, apoio de uma professora especialista que

pudesse trabalhar em parceria com a professora da classe regular, remuneração

adicional que para o professor, acesso a recursos didáticos e entrada desse tipo de aluna

somente após conclusão do processo de alfabetização.

4.10 Observações Relevantes Feitas em Sala de Aula

Durante a observação dentro da sala de aula, um dia verifiquei que a professora

elaborou uma atividade que consistia em trabalhar com recorte, colagem e a confecção

de bolinhas para o contorno dos desenhos. Lia realizou essas atividades de forma

organizada e com qualidade. Observei que havia coordenação em suas mãos e seu olhar

brilhava junto ao papel.

Num segundo momento, a professora desencadeou a brincadeira com música,

para o que ela associou batidas de palmas e de pés. Constatei a surpreendente reação de

Lia que, em ritmo compassado, observando os movimentos realizados pela Profa.

Cristina, desenvolveu com maestria essa atividade, incorporando os movimentos

rapidamente. A criança controlava seu corpo e flexionava-o de forma leve, dançando e

fazendo a música, com seus gestos, tentando até emitir sons. Verifiquei que seus colegas

de turma a olhavam admirados com sua destreza e ritmo.

O uso da música para trabalhar com o surdo revelou-se de grande importância pelas

possibilidades de comunicação que o surdo pode estabelecer com os sujeitos de sua

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relação. Para isso, apoiamo-nos em ORMEZZANO E TORRES (2003, p. 85) que se

pautam em Fregmann (1989):

Os caminhos da música e do tão encerram estreitos paralelismos: não podem ser expressos simbolicamente em palavras, pois não são idéias e nem conceitos, podem ser sentidos, mas não explicados, adivinhados, mas não racionalizados, intuídos, mas não classificados.

Em minha opinião, esta é a dimensão que precisa entender todo professor que

tem um aluno surdo em classe regular: o surdo possui sua linguagem nas mãos, nos

movimentos e, dessa forma, pode apresentar-lhe outras possibilidades de aprendizagem,

muito além do tradicionalismo percebido em sala de aula. Não queremos, aqui, tecer

críticas ao trabalho docente, mas auxiliá-lo na reflexão de que o surdo, além de tudo,

música, arte e dança, é movimento; não pode ser apresentado como alguém que não se

comunica porque não ouve. Mas, como alguém que se comunica e ouve por meio do

contato do corpo e da visão, elementos necessários ao desenvolvimento do ser humano

e, principalmente, do surdo.

4.10 – Visão das professoras sobre o processo de inclusão

4.10.1 Processo de Inclusão

Nos dias de hoje, a inclusão social de portadores de necessidades especiais se

constitui num grande desafio para professores, família e a sociedade de um modo geral.

Mesmo havendo leis que dêem garantia jurídica, percebo ainda, com base nessa

pesquisa, que existe um certo desconforto por parte de alguns professores em lidar com

essa situação, se por um lado sabidamente existente, por outro igualmente inesperada

O discurso em torno da aceitação da diferença por parte dos docentes nos permite

entender melhor a prática de suas vivências. Uma das professoras da escola

entrevistada, comentando comigo acerca de sua visão sobre a inclusão de alunos

portadores de necessidades especiais em escolas que tivera oportunidade de visitar,

assim se exprimiu : “Meus colegas docentes não tinham o apoio de ninguém. Eles têm

de aceitar esses alunos, pois é Lei, mas esta inclusão é uma mentira. Ele só está

fisicamente na sala. Eles não podem garantir seu desenvolvimento com tantos alunos

na sala e o conteúdo todo a ser vencido.”

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Essa pesquisa reforçou minha crença no fato de que determinar, por força de lei,

que crianças com “necessidades especiais” sejam absorvidas pelo sistema regular de

ensino, que não consegue dar conta, atualmente, sequer das crianças ditas “normais”, é

pretender uma solução fácil e ilusória para o problema da Educação Especial. Assim

sendo, professores do ensino regular se não forem preparados para a tarefa de lidar com

crianças com necessidades educativas especiais e, sem este preparo, por melhor que seja

o método utilizado, as chances de sucesso são muito limitadas.

Ficou patente nessa pesquisa, nas falas de alguns professores que, por não

conhecerem as implicações da surdez, tendem a não acreditar no potencial do aluno

surdo, atribuindo todas as suas dificuldades à surdez. Por exemplo, uma das professoras,

quando inquirida sobre se ela acreditava no futuro de Lia naquela escola, declarou que

“Se Lia amanhã não passar de ano isso não me surpreenderia. Ela tem dificuldades de

comunicação sérias que, por enquanto, não são muito evidentes, uma vez que no seu

atual estágio ela não precisa ser submetida a uma avaliação. Mas quando ela começar

a ser alfabetizada e tiver que ler e interpretar a história lida... Não sei, mas acho que

sem apoio será muito difícil, não digo impossível pois acredito que essa escola já conta

com um bom apoio de professores especiais.Penso que sua próxima professora não

poderá dar conta sozinha de Lia e ao mesmo tempo ensinar os outros alunos que,

provavelmente, estarão freqüentando uma classe mais numerosa do que a atual classe

de doze crianças que essa menina está.”

Com essa declaração, pude constatar que, se o aproveitamento de Lia no futuro

revelar-se insuficiente, isso confirmaria a baixa expectativa da professora, e Lia seria

considerada deficiente e com isso a professora se isentaria da responsabilidade de

ensinar, pois é a aluna que não aprende devido à sua surdez.

Assim sendo, estou de acordo com Schwartzman (1997), quando esse autor

afirma que “determinar, por força de lei, que crianças com “necessidades especiais”

sejam absorvidas pelo sistema regular de ensino, que não consegue dar conta,

atualmente, sequer das crianças ditas “normais”, é pretender uma solução fácil e

ilusória para o problema da educação especial”. É preciso sempre destacar o fato de

que se os professores do ensino regular não forem preparados para a tarefa de lidar com

crianças com necessidades educativas especiais, por melhor que seja o método utilizado,

as chances de sucesso são muito limitadas.

Para reforçar minha crença anterior sobre a importância de se ter um preparo

prévio da escola antes de receber o aluno portador de necessidade especial, acrescento

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aqui um depoimento relevante de outra professora da escola, ao ser questionada por

mim sobre a problemática da inclusão, me relatou que observara a distância estabelecida

entre os ideais que originaram o processo de inclusão num colégio em que trabalhara :

“ Naquele colégio, recebi um aluno portador de síndrome de Down. Sentia-me sozinha

e parecia que todas as pessoas daquele estabelecimento achavam que ele era somente

um problema meu, que apenas eu é que teria que encontrar uma forma de integrá-lo na

turma. Não recebia apoio de ninguém.”

Percebo que hoje a situação é de construção do processo de inclusão, porém

como pude constatar, tanto nas entrevistas com as professoras do Centro Educacional,

como nas práticas realizadas pelas duas professoras de Lia, para que o aluno surdo

possa ter a possibilidade de desenvolver-se no ambiente da sala de aula, deverá haver

estratégias diferenciadas e adaptações que o levem a desenvolver-se através do uso da

LIBRAS.

“No colégio em que trabalhei, aceitamos o aluno com Síndrome de Down por

uma questão humanitária. Sinceramente, penso que é o que a maioria das escolas pode,

hoje, fazer concretamente”, afirmou uma professora entrevistada.

4.10.2 Aceitação da diferença por força da Lei na visão das professoras

A questão legal, que preconiza o acesso e a permanência de todos os educandos

nas escolas de ensino regular, nos faz refletir sobre a fala de uma das professoras

entrevistadas: “A gente tem que aceitar esta situação, porque não podemos ir contra a

Lei.” Ou, ainda: “ninguém seria louco, a tal ponto, de dizer: eu não aceito este aluno

em minha sala de aula.”

Alguns docentes desabafaram que, em sua opinião, o processo que desencadeou

a pretensão de fazer Escola para Todos, indistintamente, originou-se de cima para baixo

e idealizado por técnicos em gabinetes que desconhecem o campo educacional: “a Lei

veio para regulamentar todo o aspecto legal, mas, na prática, é o que você viu, é uma

situação fracassada.”

Ou, ainda, fica patente em algumas falas, a negação do processo com vistas a

levar o aluno surdo à aprendizagem nesse contexto: “Esses técnicos fizeram uma

investigação para saber a quantas anda a situação do aluno surdo dentro das quatro

paredes da sala de aula?” Acredito que a dúvida colocada por esta professora é

justificada. Afinal, não adianta existir uma legislação que assegura a matrícula um aluno

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portador de necessidade especial em escola comum, se, paralelo, não existir

acompanhamento e suporte verdadeiro para acontecer o que chamamos de processo de

inclusão do aluno surdo no contexto do ensino regular de forma eficiente.

Nesta pesquisa verifiquei, portanto, a urgente necessidade de colocarmos em

prática as disposições do MEC contidas, principalmente, na Lei 9.394 (BRASIL, 1996),

cujo artigo 56 estabelece que os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com

necessidades especiais não só currículos e recursos educativos para atender às suas

necessidades, mas também professores com especialização adequada e professores do

ensino regular capacitados para a inclusão desses educandos nas classes comuns.

Uma outra questão levantada por uma das professoras entrevistadas, que

lecionava na terceira série do Ensino Fundamental do Menino Jesus, se refere ao grande

número de alunos nas salas. Ela confidenciou-me que: “Minha sala atualmente tem

trinta e dois alunos. Então, que lei é esta que pensou a inclusão e esqueceu-se de olhar

este quadro ? Se Lia , que está atualmente na primeira série, conseguir alcançar um dia

a minha turma e forem mantidas as atuais condições, naturalmente teremos problemas

e temo que a qualidade do seu ensino caia. ”

Para Skliar (1999), esse é o cenário de conflito desencadeado pela lei que

regulamentou a matrícula compulsória, mas não viabilizou o seu processo, legitimando

a incorporação do fracasso, da incapacidade, e também a superioridade do mundo

ouvinte.

Asseverou-me uma outra professora entrevistada: “Não há inclusão sem

preparo de toda a escola e nenhuma escola se torna inclusiva sem ter condições

materiais e suporte. Seria bom que a sociedade se conscientizasse disso de uma vez por

todas e acabasse com esse discurso de direitos iguais para todos. Sim, eles tem direito

de estarem na escola, de receberem educação, mas a escola também tem de estar

preparada para recebê-los.” Com essa afirmação, a professora confirma a nossa

opinião de que simplesmente colocar o surdo em contato com o ouvinte, não lhe trará

crescimento efetivo, ficando ele apenas com sua socialização favorecida. Mas, a

realidade do mundo exigirá muito mais dele, Skliar (1999, p. 216) pontua sobre este tipo

de escola inclusivista :

A Escola Inclusiva é entendida como um espaço de tolerância para com os diferentes. A experiência escolar cotidiana, ao lado dos colegas normais, seria visto como elemento integrador. É como se para esses alunos fosse mais importante a convivência com os

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colegas normais do que a própria aquisição do conhecimento mínimo necessário para a sua, aí sim, possibilidade de inserção social.

Assim, pelo depoimento prestado pelas professoras, podemos esperar que a

inclusão bem sucedida de um aluno surdo em sala de aula junto com alunos ouvintes

preconiza a pré-existência de suporte a essas escolas para que o aluno surdo seja

também visto como um ser que deve exercer a sua cidadania. E, isso deve ter sido visto

paralelo ao processo que se instala e, assim fazendo, superar a posição de ceticismo por

parte dos professores em relação à Lei que legitima o acesso a todos os alunos aos

bancos escolares, no entanto não contemplando o seu desenvolvimento intelectual.

O aspecto legal da inclusão do aluno surdo na escola regular também suscita

questionamentos e debates sobre os docentes que estão envolvidos no processo para, ao

menos, permitir que eles se encontrem guarnecidos de elementos que venham a

contribuir para o seu trabalho.

Uma das professoras, que trabalhou numa escola que recebeu um aluno com

Síndrome de Down, assim se manifestou sobre a experiência que vivenciou, numa

contundente declaração : “Desde que comecei na época a trabalhar com esse aluno

diferente, senti-me bastante amedrontada pois não tive acompanhamento do meu

trabalho. A família matriculou o aluno naquela escola porque a Lei amparava, mas

essa mesma Lei nos desamparava em nossa condição de profissionais. Para mim, o

que acontece é o mero discurso político que se faz para conclamar a sociedade a

apoiar a iniciativa da escola para todos.”

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação do Brasil, Lei 9.394/96 (BRASIL,

1996), prevê serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às

peculiaridades desses alunos, conforme seu Capítulo V, no entanto observamos, na

maioria das vezes, um professor angustiado, sozinho e perdido em meio a essa situação.

Ainda dentro da própria dimensão legal, há o estabelecimento da cláusula que prevê que

os sistemas de ensino deverão assegurar professores especializados ou devidamente

capacitados, conforme observei em minha experiência profissional como professora

itinerante, entretanto, isso ainda não se concretiza na maioria das escolas públicas.

Um exemplo é essa expressão colhida, em entrevista, com uma professora da

segunda série do Ensino Fundamental do Menino Jesus, quando indagada sobre as

possibilidades concretas de inclusão de aluno surdo em uma escola pública regular:

“Como discutir quando a Lei impera sobre a nossa vontade? Será que não percebem

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que estamos brincando com a vida do aluno surdo? Que fazem os Órgãos Centrais que

não se aperceberam que a coisa está cristalizando um período de inclusão física tão

somente?”

Diante desse quadro, encontramos, de um lado, um arsenal legal colocando o

processo de inclusão como viável, exeqüível e bom, de outro, vemos um professor não

capacitado, angustiado e sozinho na difícil tarefa de atender todos, indistintamente,

inviabilizando a sistematização do conhecimento por parte do surdo.

Vejamos o que me disse uma outra professora da segunda série do Ensino

Fundamental : “O que se faz é aceitar a sua presença física sem, no entanto, nos

responsabilizar pelo seu crescimento cognitivo.” Com esse cenário, é impossível

prevermos um surdo elevado à condição de cidadão. Associado a isso, verifiquei o fato

de que há docentes que ainda não vêem com naturalidade o surdo nesse meio ouvinte.

O termo inclusão também reflete o momento histórico de um processo de

progressão por que passa a visão da nossa sociedade. Como destacou Pires et.al. (2006,

p.31) “ a prática da inclusão reflete uma luta maior pela educação para todos que, por

sua vez, faz parte do processo maior ainda de luta pelo reconhecimento da igualdade

de valores e direitos entre os seres humanos.”

Corroborando o ponto de vista da autora supracitada, Almeida (2002 apud

PIRES et al., 2006, p. 124), assim se manifesta sobre o termo:

“A inclusão não é algo natural. O ser humano tem uma tendência a acreditar que as dificuldades que temos são dificuldades de sempre e que não podem ser mexidas....

Essas práticas correspondem ao conceito de “destino”... Mas a civilização ocidental ou não ocidental conseguiu, mesmo muito marcada pelo pensamento grego, reverter esse movimento do destino e criar o conceito de historicidade, em que a história é o questionamento ao inevitável, a história é a fé na rejeição de nossos limites...(p.81).”

´

Mas, para isso, acredito que é necessário que os grupos sociais em que os

“diferentes” estejam inseridos dirijam seus esforços para romper com preconceitos e

estigmas, tendo em vista a história da civilização ocidental e oriental, que vinculou

competências e capacidades à inserção no mercado de trabalho e nas concepções

capitalistas sobre o homem.

Foi interessante constatar que grande parte dos professores que não participavam

diretamente do processo educacional de Lia no momento, me relataram que se sentiam

extremamente preocupados em ter Lia futuramente em suas salas de aula. Como até

naquele momento eles não possuíam formação para lidar com alunos surdos, achavam

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que não era possível fazer uma inclusão efetiva. Principalmente, por possuírem turmas

numerosas, algumas com mais de trinta alunos, não acreditavam que poderiam oferecer

à menina um atendimento adequado. Uma professora da terceira série até chegou a

sugerir que Lia,caso lograsse alcançar a segunda série no semestre seguinte, deveria

receber atendimento especializado na escola regular, em horário alternado. “Seria bom

para a aluna que ela tivesse alguém dentro da escola, uma professora especializada

contratada pela escola em caráter efetivo, que pudesse orientá-la quanto à sua

aprendizagem, já que a socialização dela já está sendo garantida com sucesso pela

escola,” argumentou.

A respeito da declaração dessa professora, penso que não seria má idéia a aluna

ter um atendimento paralelo, porém ressalto que esse atendimento deveria ser realizado

como uma forma de complementar o trabalho feito pela professora em classe. Porém

analisando nas entrelinhas, verifiquei que o sentido que essa professora atribui ao

atendimento fornecido pela professora especializada (itinerante ou que faça uso de sala

de recursos), é que essa professora ficaria com a responsabilidade pelo ensino da aluna,

enquanto que na classe a aluna estaria apenas se socializando. Essa é justamente uma

das críticas ao modelo de integração que conduziu à proposta da educação inclusiva.O

professor, em minha opinião, não pode se furtar à sua responsabilidade pela

aprendizagem do aluno portador de necessidade especial, devendo realizar todos os

esforços ao seu alcance para garantir a sua escolarização plena. Ele poderá contar com o

apoio do colega especialista, mas nunca, em hipótese alguma, deverá abdicar do seu

papel de educador e atribuir essa responsabilidade a outrem, por mais capacitado e

experiente que seja.

Duas outras professora da segunda série,mostraram-se céticas no que se referia

ao sucesso futuro da inclusão de Lia. A primeira professora disse: “[...] Esta inclusão,

como querem fazer, é que irá gerar a verdadeira segregação para Lia no futuro, pois

não estamos aptos a levá-la a situações de aprendizagem. Por enquanto ela está na

primeira série, mas doravante as coisas vão se complicar, pois ela terá de ser avaliada

como as outras e temo que ela não consiga alcançar os padrões exigidos. Não sei se

estou falando besteira, mas imagino que muitas vezes ela só copiará o que colocarei no

quadro branco, mas talvez ela não consiga seguir a linha de raciocínio exigida para a

compreensão da matéria por causa da barreira da comunicação. Não acredito que

todos os professores dessa escola dominarão bem a língua de sinais como sua atual

professora e se sintam à vontade nesse tipo de comunicação. Penso que far-se-á

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necessário a contratação de um intérprete na escola e ela terá que ter aulas de reforço

com uma professora da disciplina que seja ao mesmo tempo fluente em LIBRAS e

especialista na matéria”.

A segunda professora afirmou: “Se Lia vier a freqüentar a minha classe,

procurarei fazer o melhor que posso, mas receio que ela seja apenas mais um dentre os

tantos da minha sala de aula, quieta, distante, alheia, sentada em sua carteira, isolada

do mundo [...].”

E ela foi ainda mais longe: “Se incluir é estar dentre os demais, ok. Se incluir é

torná-lo cidadão, que saiba se virar neste mundo ouvinte, aí, estamos nos enganando e

estaremos enganando principalmente à aluna surda se não fornecermos a ela um

suporte adequado para transpor a barreira da comunicação.”

Essa situação, de baixa expectativa em relação ao que o aluno surdo pode

desenvolver, por parte de sua professora, remete-nos a SKLIAR (1999, p. 145) que

reflete:

“As expectativas que os professores possuem de seus alunos marcam, de alguma forma, suas próprias atitudes, as respostas que recebem e a evolução dessas respostas.”

A essa altura, cabe aqui nos questionarmos: Para onde, de fato, caminha o aluno

surdo diante dessa expectativa de seu docente? São tantas as falas otimistas e

pessimistas em torno da entrada do surdo na escola regular, mas os os dizeres benéficos

dessa iniciativa caem por terra diante da observação que me fez a diretora do Menino

Jesus quando a entrevistei : “Teremos que ser realistas. Apesar da proposta do governo

e técnicos, nós, que trabalhamos com o dia-a-dia, sabemos da dificuldade que

encontramos e que a aluna surda também encontra, daí porque sempre procuro

ressaltar para os professores desse estabelecimento que colocar junto, não cumpre com

os direitos da aluna surda que é a de adquirir uma aprendizagem que a capacite a

exercer sua cidadania, tirando-a deste círculo alienante que nós, ouvintes, o

colocamos. È preciso que todos eles doravante tomem a iniciativa de se especializarem

para suprir a lacuna aberta pela ausência de capacitação adequada que os antigos

currículos de seus cursos de formação não forneceram. Isso deve ser o primeiro

grande passo.”

Embora concordemos, em parte, com a Diretora, quando ela “cobra” dos

profissionais uma maior iniciativa, não podemos também criticar as professoras que se

sentem pouco estimuladas a se aperfeiçoar ou se capacitar para a inclusão. Não

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podemos julgá-las duramente, pois embora reconheçam os méritos da inclusão e dos

benefícios que Lia estava usufruindo na escola, a maioria trabalhava em mais de uma

escola e “não sobrava tempo nem dinheiro”, para se especializarem em deficiência

auditiva ou sequer encontrarem uma brecha para aprender LIBRAS.

Quanto à alegação dos docentes sobre a dificuldade de aprendizagem existente

para alunos surdos, percebi que era fabricada por uma prática pedagógica dissociada ou

independente do exercício da língua(gem), uma vez que as formas de comunicação que

elas utilizavam, na tentativa de se fazerem entender por Lia, eram deficitárias, gestuais e

com abundância de mímica e pantomimas.

Convém aqui mencionarmos um estudo realizado por Thoma (1998), a autora

destaca que em contato com surdos adultos, com quem trabalha em parceria nos últimos

anos, estes relatam, quando questionados sobre suas vidas escolares junto a ouvintes,

que hoje os surdos têm sido contrários a esta política de inclusão porque, em geral, os

professores, os colegas e toda a escola não estão preparados para isto. E quando se

pensa neste preparo, as “dicas” que comumente são dadas para o professor que possui,

entre seus alunos, um surdo, não são lingüística nem psicologicamente aceitáveis. As

estratégias utilizadas pelo professor ouvinte da classe regular, como falar devagar,

sempre de frente para o aluno surdo para que ele possa “ler os lábios” do professor,

entre outras, poderiam servir caso este aluno já tivesse sido oralizado por profissionais

ouvintes, com os quais tivesse aprendido a discriminar primeiro o som de cada fonema,

em seguida a união de dois fonemas para formar a sílaba e posteriormente a palavra, até

que a criança surda pudesse formular uma frase e expressar suas idéias. Para que este

aluno aprendesse a discriminar as frases e ordens da professora e dos demais colegas

ouvintes, bem como de outras pessoas de seu convívio, seria necessário muito tempo e

investimento financeiro em sessões de “terapia da fala”, as quais objetivam ensinar a

fala e a “leitura labial” ao surdo.

Assim sendo, para o surdo poder estar efetivamente incluído na classe com os

ouvintes, na concepção de algumas professoras entrevistadas, ele precisaria dominar a

língua oral, o que, a meu ver, para os que nasceram com surdez pré-lingüistica só pode

ocorrer após seu desenvolvimento em língua de sinais. Caso contrário, ele não

conseguirá participar das discussões, fazer perguntas, entender o que a professora diz,

etc. Sua integração física estará assegurada, mas não seu sucesso escolar. E, mais ainda,

poderia ocorrer dessa criança acabar se isolando socialmente pela dificuldade de

comunicação. Há a tendência de fazer com que os conteúdos da disciplina ministrada

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pelo professor sejam reduzidos ou simplificados numa tentativa de ajudar o aluno surdo,

uma vez que o professor que o atende na classe regular não utilizará a língua de sinais, o

que acabará dificultando a compreensão, por parte dos alunos surdos, do que está sendo

transmitido.

Um dado positivo obtido nas entrevistas, foi o fato de que todas as professoras,

mesmo aquelas que possuíam maiores resistências e temores quanto à inclusão,

expressarem a preocupação de que o trabalho da escola não deveria se resumir a

simplesmente aceitar a aluna surda . O papel da professora deveria ser o de atendê-la e,

se possível, fazer com que ela adquirisse algum tipo de aprendizagem.

A Profa. Mariza, que foi a segunda professora de Lia, confessou : “Mesmo com

todas as minhas melhores intenções e o apoio do INES, sei que Lia no futuro

encontrará dificuldades de comunicação com seus professores e colegas se não tiver

um suporte adequado, na forma de um intérprete, ou adquirir fluência na língua

portuguesa e o domínio da leitura labial. Não quero que ela se torne um fragmento

dentro do espaço escolar, mas isso se tornará inevitável se ela não puder escrever e

dominar a gramática da língua portuguesa. Já coloquei para a Diretora que, no futuro,

a escola precisará contratar intérpretes para ela.”

Convém aqui abrir um parênteses para, aproveitando a observação feita pela

professora, e destacar que a aprendizagem de Lia não deve ser reduzida apenas à

convivência com seus colegas, professoras e funcionários da escola, conforme observei

nas brincadeiras e em diversas situações dentro da sala de aula. A referida professora

reforça o que já mencionei nos fundamentos teóricos a respeito da modalidade de ensino

denominada Bilingüismo, como sendo a metodologia mais adequada para o ensino do

aluno surdo nas escolas. O Bilingüismo propõe que o surdo comunique-se fluentemente

na sua língua materna (Língua de Sinais) e na língua oficial de seu país. Será ela oral?

Será escrita? Essas são duas questões polêmicas que dividem os educadores de surdos.

No entanto, todos concordam que o desenvolvimento cognitivo, afetivo, socio-cultural e

acadêmico das crianças surdas não dependem necessariamente de audição, mas sim do

desenvolvimento espontâneo da sua língua. A Língua de Sinais propicia o

desenvolvimento lingüístico e cognitivo da criança surda, facilita o processo de

aprendizagem, serve de apoio para a leitura e compreensão.

Em síntese, creio que a integração plena da pessoa surda passa, necessariamente,

pela garantia de convívio em um espaço, onde não haja repressão de sua condição de

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surdo, onde possa expressar-se da maneira que mais lhe satisfaça, mantendo situações

prazerosas de comunicação e de aprendizagem.

4.11 A diferença lingüística e o processo de aprendizagem do aluno surdo no contexto escolar

Vygotsky (1988) se opunha veementemente à avaliação das crianças portadoras

de incapacidades com base em seus defeitos ou deficiências, seus “menos”; ele as

avaliava, em vez disso, com base no que elas tinham de intacto, seus “mais”. Ele não as

via como deficientes e sim como diferentes. “Uma criança com uma incapacidade

representa um tipo qualitativamente diferente, único de desenvolvimento”. E era essa

diferença qualitativa, essa singularidade, na opinião de Vygotsky, que qualquer esforço

educacional ou reabilitador devia privilegiar: “Se uma criança cega ou surda atinge o

mesmo nível de desenvolvimento de uma criança normal”, escreve ele, “então a

criança com uma deficiência atinge-o de outro modo, por outro caminho, por outro

meio; para o pedagogo, é particularmente importante conhecer a singularidade do

caminho pelo qual deve conduzir a criança. Essa singularidade transforma o menos da

deficiência no meio da compensação”. (p. 45).

O desenvolvimento de funções psicológicas superiores, para Vygotsky, não é algo

que ocorre “naturalmente”, de um modo automático – requer mediação, cultura, um

instrumento cultural. E o mais importante desses instrumentos culturais é a língua. Mas

os instrumentos culturais e as línguas, explica Vygotsky, foram desenvolvidos para

pessoa “normal”, a pessoa que tem intactos todos os órgãos dos sentidos, todas as suas

funções biológicas. O que, então, será melhor para o deficiente, para a pessoa diferente?

A chave para seu desenvolvimento será a compensação – o uso de um instrumento

cultural alternativo. Assim, Vygotsky chega à educação especial dos surdos: o

instrumento cultural alternativo, para eles, é a língua de sinais – uma língua que foi

criada para e por eles. A língua de sinais está voltada para as funções, as funções

visuais, que ainda se encontram intactas; constitui o modo mais direto de atingir as

crianças surdas, o meio mais simples de lhes permitir o desenvolvimento pleno, e o

único que respeita sua diferença, sua singularidade. Por isso, educar a criança na sua

própria língua favorece seu desenvolvimento emocional (construção de sua identidade,

segurança, auto-estima, etc), cognitivo e social.

De fato, a literatura atual tem mostrado que a língua de sinais deve ser a primeira

língua para o surdo tanto no contexto familiar quanto educacional, pois é a partir dela

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que o surdo tem a garantia de seu desenvolvimento lingüístico, social, cultural,

emocional e acadêmico (Quadros, 1997; Goldfeld, 1997; Skliar, 1998).

Brito (1993) aponta as línguas de sinais como única modalidade de língua que

permite ao surdo desenvolver-se plenamente em seu potencial lingüístico e, portanto,

cognitivo, oferecendo-lhes possibilidades de socialização que não apresentaria

defasagem em comparação à língua dos ouvintes. Isto é, a língua de sinais é o

instrumento mais importante para a integração social do surdo.

Nesse sentido, Goldfeld (1997) analisou o desenvolvimento cognitivo e a

aquisição da linguagem de uma criança surda em interações na família, na escola e na

clínica fonológica, em comparação com seu irmão gêmeo ouvinte. Sua pesquisa

mostrou a influência determinante nas relações interpessoais, bem como as línguas a

que a criança está exposta no seu desenvolvimento cognitivo, ou seja, o valor das

informações lingüísticas em sua constituição. Para a autora, não somente a qualidade

das interações é importante, mas também a quantidade de participação da criança surda

nos momentos interativos. Dito de outra forma, as dificuldades cognitivas observadas na

criança surda se devem a pouca estimulação lingüística recebida, o que não aconteceu

com seu irmão gêmeo ouvinte.

Alguns estudos sobre a linguagem e cognição da criança surda, pressupondo que o

sujeito é interativo e se constitui nas relações sociais, enfatizam a importância do

contato, o mais precoce possível, de crianças surdas com adultos fluentes na língua de

sinais, pois é nessa circunstância que a criança pode aprender a língua e praticar o uso

apropriado da sintaxe.

Dessa forma, a criança surda atingirá uma comunicação fluente e, conseqüentemente,

seu desenvolvimento cognitivo (Brito, 1993; Quadros, 1997; Fernandes, 1990).

Outro fator relevante e destacado por vários pesquisadores (Fernandes, 1990;

Goldfeld, 1997 e Quadros 1997) é que entre 90 e 95 % dos surdos são filhos de pais

ouvintes e estes chegam à escola sem dominar nenhuma língua, encarregando a escola

de criar condições para a aquisição de sua primeira língua (que é, na visão dominante, a

língua portuguesa, no caso do Brasil).

Góes (1996) reflete sobre a importância das experiências de linguagem nas

interações com o meio social para o desenvolvimento da criança surda, destacando que

“a criança nasce imersa em relações sociais que se dão na linguagem. O modo e as possibilidades dessa imersão são cruciais na surdez, considerando-se que é restrito ou impossível, conforme o caso, o acesso a formas de linguagem que dependam de recursos da audição. Sobretudo nas

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situações de surdez congênita ou precoce em que há problemas de acesso à linguagem falada, a oportunidade de incorporação de uma língua de sinais mostra-se necessária para que sejam configuradas condições mais propícias à expansão das relações in

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problemas de comunicação. Tudo é permitido para buscar o entendimento [...] Na

brincadeira tudo é bonito, perfeito, vozes e gritos se fundem num só e me leva a pensar

que entre as crianças tudo é mais fácil [...] Não há regras impostas [...] as brincadeiras

organizadas ou não, permitem que Lia se solte, estabeleça uma comunicação eficiente

com o colega. Tão diferente ela se revela na sala de aula [...] Aqui ela é igual a

qualquer criança e os problemas de comunicação em certas circunstâncias

desaparecem...”

Corroborando essa constatação de que as brincadeiras parecem dirimir as

dificuldades encontradas pelos professores nas suas práticas didáticas, Silva (2002, p.

22) ratifica, afirma que “A brincadeira assume uma importância central no

desenvolvimento afetivo e cognitivo do sujeito.”

De fato, observei, durante o recreio, que, nas brincadeiras, mesmo que exigido

algum tipo de regra, esta é colocada de forma lúdica, não causa impacto, fazendo com

que Lia consiga aprendê-la, mesmo não havendo o estabelecimento de comunicação,

apenas gestos indicativos.

4.13 - A visão da mãe da aluna

Em sua entrevista a mãe de Lia apresentou uma realidade muita aberta,

transparente e franca, quando ela me disse que sua filha não é doente, mas que possui

uma forma diferente de se comunicar.

Para ela, a escola, como hoje se apresentava, era inclusiva, pois sua filha se

sentia bem e gostava dos colegas e professores. A mãe insistiu em seu desejo de que ela

estivesse entre as crianças que ouvem: “Eu quero minha filha junto com os que ouvem

e não gostaria que ela fosse para uma escola só de surdos. Ela não é doente para ficar

isolada.”

Diante desse quadro, comprovei que a principal preocupação da mãe ao colocar

sua filha naquela escola era vê-la junto com as crianças ouvintes e com isso se

socializar.

A mãe de Lia também declarou que, embora seus parentes e ela própria

dominem a LIBRAS, acreditava ser perfeitamente possível para aqueles de fora da

família se comunicarem sem problemas com sua filha por meio de gestos e mímica.

Além disso, considera que a escola naquele momento, pelo fato da filha ser muito nova,

não precisava se preparar para recebê-la, denotando que ela vê a escola principalmente

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como local de aceitação e faz parecer que Lia se torna ,assim, o mais normal possível

ante a sociedade. “A escola no começo não estava preparada, nem as professoras, mas

o importante aconteceu: a aceitação da minha filha e vejo que a professora gosta dela,

e os colegas também. Acredito que com o tempo, a escola se capacitará ainda mais e

superará os problemas de aprendizagem que ela poderá apresentar. ”

Porém acredito que a função social da escola precisa garantir não apenas a

socialização da aluna, como também a parte referente ao cognitivo, já que está claro que

a maior preocupação das mãe é quanto à socialização da filha. Também observei que há

uma certa resignação por parte da mãe de Lia em relação às dificuldades que a surdez

ocasiona para sua filha, mas que não ela não as considera como uma não-aceitação ou

limitação da própria escola: “Esta é a escola ideal porque nunca ninguém vai saber

falar direito com minha filha, porque quem fala com ela escuta [...] Mas uma das

professoras demonstrou vontade de aprender LIBRAS (se referindo à Prof. Cristina) e

passou essa vontade para toda a classe. Hoje eu fico feliz de ver no recreio algumas

coleguinhas da minha filha fazendo sinais para ela Só por isso, tudo valeu a pena.”

Em minha experiência profissional, como professora itinerante, observei muitas

vezes que as mães de outros alunos surdos no seu envolvimento com a escola, se elas

são fossem chamadas a saber dos avanços e das necessidades do filho, informavam que

não eram chamadas pela escola e, nas vezes em que se dirigiram até a escola, foram

para saber de alguma reclamação que a professora tinha a fazer em relação à

perturbação ou falta de interesse do seus filhos. Tal não acontecia com a mãe de Lia: ela

era muito participativa e envolvida no processo da educação de sua filha. Estava

sempre presente todos os dias na chegada e na saída da escola da filha, e sua

participação e envolvimento muitas vezes extrapolava as ocasiões normalmente

concedidas pela escola, tais como reuniões e festas comemorativas. As professoras de

Lia freqüentemente, ao término da aula, a encontravam esperando pela filha no pátio da

escola e aproveitavam a ocasião para conversar com ela e contar os progressos e as

dificuldades que Lia apresentara naquele dia.

Em meus contatos profissionais anteriores com outros colégios em que

estudavam alunos surdos, algumas vezes as mães dos alunos me diziam coisas do tipo :

“A escola nunca me chamou, às vezes, a professora diz que ele não quer fazer nada, ele

se esconde no banheiro, ele foge da sala”. Essas eram informações preciosas que me

confirmavam o que observava nas salas de aula, como idas ao banheiro e retornos

depois de muito tempo, e a professora, absorta no atendimento às outras crianças, nem

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percebia esse fato. O aluno surdo, na verdade, não fazia falta, e sua ausência não era

notada. Certamente, concordo com as colocações de algumas professoras que um

ambiente superlotado não é o ideal para a condução do processo de inclusão de um

aluno surdo no ensino regular. Ocorre que, conforme realidade levantada, os grupos são

heterogêneos, mas as práticas adotadas para ministrar as aulas, por parte do professor,

são homogêneas, ou seja, cabe a todos, indistintamente, validando as muitas vezes que

eles dizem não possuir formação para trabalhar com a diversidade. Também há

necessidade de vencer os conteúdos e há cobrança por parte dos dirigentes das escolas

para que a disciplina seja mantida na sala de aula. Caso fossem propostas alternativas

diferenciadas, acredito que ocorreriam maiores debates, conversas paralelas e uma

aparente desordem, buscando incutir uma nova ordem cognitiva e social.

Quanto à necessidade de buscarmos um trabalho com estratégias diferenciadas

para ensinar um aluno surdo, os pais, de modo geral, demonstram pouco conhecimento

dessa lacuna. Eles possuem uma confiança quase cega no ambiente escolar, vendo-o

como um saudável espaço de acolhimento. Por mais de uma vez, manifestou-me assim

uma mãe seus sentimentos acerca da escola do filho: “Meu filho está incluído porque

esta escola o acolheu e faz bem pra ele.” É natural e ingênua essa visão, pois eles não

são especialistas, e por isso não percebem a necessidade de mudança que deve haver

numa escola, que se diz inclusiva, para poder atender adequadamente um aluno surdo e

não se limitar à sua presença física tão somente

Sobre a precariedade da comunicação estabelecida, a mãe de Lia disse:

“Nenhuma escola normal hoje sabe LIBRAS, então, o certo é o que ela tenta fazer

sempre na escola: ela) faz de tudo para se comunicar com todos e deseja que todos se

comuniquem com ela de um jeito ou de outro, inclusive tenta até ensinar sinais para as

pessoas. Outro dia ela estava com o inspetor Roberto brincando com os dedos dele,

ensinando-o a dizer o nome dela em LIBRAS. Assim também é no contato com os

nossos vizinhos e pessoas estranhas que vão lá em casa. Minha filha hoje tem um

enorme desejo de se comunicar mesmo comas pessoas que não conhecem os sinais.Foi

um verdadeiro presente para Lia ter uma professora que aprendeu LIBRAS e quis

ensinar alguns sinais para que os coleguinhas dela pudessem conversar mais com ela.”

Considero um fato significativo a mãe de Lia ser tão participativa, desejar se

informar sempre de todos os detalhes da educação de sua filha com as professoras, pois

em minha experiência como professora, verifico que é sempre um grande desafio

manter as famílias parceiras na condução do processo educativo de um aluno portador

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de necessidade especial. O compromisso é grande, pois a escola, para os pais, revela-se

como uma oportunidade muito boa para que a criança diferente aprenda a lidar com suas

limitações de forma sadia e natural.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho de pesquisa, procurei entender como tem se dado a inclusão de

uma criança surda em sala de aula regular no Ensino Fundamental numa escola

particular do Rio de Janeiro, tendo como eixos analíticos as categorias de Educação de

Surdos e inclusão.

À luz dos dados coletados e apresentados, considero importante tecer algumas

considerações finais, obtidas por meio da pesquisa teórica e prática realizada no

cotidiano socioeducativo das crianças do Centro Educacional Menino Jesus, bem como

dos meios sistemáticos em que a infância, a Educação Infantil e a inclusão de crianças

portadoras de deficiência vêm sendo apresentadas, assessoradas e concebidas.

Nesse sentido, diante dos dados apresentados no corpo dessa dissertação, pude

constatar que a realidade educacional cotidiana, tanto intra quanto extra-escolar

(assessoramento), referente à inclusão da criança surda, ainda é ambígua e paradoxal,

para não dizer complexa e, às vezes, mal-entendida pelos principais atores do processo

educacional – professores, técnicos, assessores, crianças, dentre outros. Ou seja, quando

se analisa o conceito de inclusão pelo prisma global – não só pelo aspecto social, mas

pelo social, afetivo, cognitivo e intelectual – precisa-se levar em conta que essa

conceituação é um processo que não se refere exclusivamente aos alunos portadores de

deficiência ou em situação de dificuldade, mas para todas as crianças que estão na

escola.

Bianchetti e outros (1998, Prefácio) se reportam a Guimarães Rosa que, em suas

palavras, fala da essência humana de que todos, indistintamente, não somos seres vivos

concluídos diante das tantas etapas da vida. Somos todos diferentes. “Mire e veja: o

importante e bonito do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, e ainda

não foram terminadas – mas que elas vão sempre amando. Afinam ou desafinam.

Verdade maior. É o que a vida me ensinou.”

Nesse sentido, essa pesquisa me possibilitou constatar a complexidade e o

desafio da prática educativa entre os pessoas surdas e ouvintes. O que acontece dentro

da Escola é muito mais o resultado da cadeia de relações que constrói o dia-a-dia do

professor, do aluno e do conhecimento e muito menos a atitude e decisão isoladas de um

desses elementos. Os anéis dessa cadeia se ligam de várias maneiras aos anéis que

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compõem o todo institucional, o qual se articula de muitas formas com as várias esferas

do social mais amplo.

Por tudo isso que foi documentado e narrado aqui também acredito que essa foi

sem sombra de dúvida, um exemplo de uma inclusão bem sucedida e uma grande parte

desse sucesso se deu, sobretudo, pela coragem das duas professoras de Lia, que não

temeram encarar o desafio, enxergando nisso uma questão de auto-aperfeiçoamento de

sua práxis pedagógica. Elas não tiveram medo de errar acreditando ser possível

descobrir formas criativas de se comunicarem com Lia e estimularem sua auto-estima,

bem como mostrar para a turma ser possível a convivência e o aprendizado com um ser

humano que possuía uma forma de comunicação tão diferente.

Minhas observações do cotidiano de Lia na escola levaram-me a concluir que

existem pontos fundamentais para o pleno sucesso da inclusão de uma aluna surda em

classe regular. Descrevo a seguir seis deles :

1) A professora deve procurar encorajar e desenvolver as amizades da aluna surda

com os colegas de classe;

2) A professora deve reunir se pelo menos uma vez por mês com uma professora

especialista em surdez, bem como qualquer outro profissional apto a trocar

idéias e sugestões que facilitem o aprendizado e a plena integração desse aluno

com a turma;

3) Procurar não fazer concessões excessivas para comportamentos inapropiados e

não temer repreender a aluna nessas ocasiões. Ela deverá tratá-la sempre o

máximo possível como trata as outras crianças e não demonstrar insegurança ou

temor frente às atitudes de rebeldia ou frustração da aluna;

4) Não deve pressionar a aluna surda a se comunicar de forma oral, mas deve

estimulá-la e elogiá-la sempre que era demonstrar interesse em fazê-lo;

5) Procurar sempre que possível ensinar alguns dos sinais mais comumente

utilizados ou executados por sua aluna surda;

6) Manter a família da aluna surda sempre informada dos progressos e problemas

enfrentados, pedindo sugestões e informando-os das estratégias que a escola

adotará. Pelo menos uma vez por semana a professora deve se comunicar com os

responsáveis pela aluna, seja por meio de reunião agendada na escola ou

qualquer outro meio (telefone,bilhetes ou relatórios), relatando os fatos mais

significativos de sua educação.

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Com este trabalho, não pretendo findar o assunto, muito pelo contrário, pretendemos

suscitar novas discussões, novas tomadas de consciência a respeito da inclusão do surdo

no ensino regular e suas reais implicações neste espaço ouvinte. Por meio de autores e

teorias pertinentes, de estudos, discussões e investigações realizadas, foi possível

alcançar o objetivo proposto, centrado na investigação da realidade vivida por alunos

surdos e professores implicados no processo da inclusão dele no ensino regular das

escolas da rede do município do Estado do Rio de Janeiro.

Como pesquisadora da situação do aluno surdo no contexto do Ensino Fundamental,

na escola regular, percebi a grande dificuldade enfrentada pelos docentes envolvidos

estas escolas que não tiveram preparação prévia. Isso pode inviabilizar a inclusão real e

efetiva do surdo em classe regular, seus professores em reféns de sua falta de preparo.

Essa situação origina professores angustiados, frustrados, que, apesar de conscientes

do grande desafio desse momento, vêem-se em labirintos sem saída quando esquecidos

nas salas de aula junto com seus alunos, ouvintes e surdos em salas superlotadas. A

condição legal para a inclusão não se faz realidade exeqüível em seus propósitos, no

dia-a-dia, por absoluta falta de condições para exercício docente profícuo.

Pude constatar que a convivência entre professores, alunos e comunidade escolar

ocorria com tranqüilidade e respeito. A comunidade escolar acolheu de bom grado a

entrada de Lia, porém a questão relativa à aprendizagem da aluna não está contemplada

na prática pedagógica de sala de aula em outras séries que não a inicial em que ela se

encontra, tampouco no Projeto Político Pedagógico da escola.

Assim, embora o cunho da socialização da aluna surda esteja gam

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entre os alunos surdos e ouvintes se constitui na “dependência” unilateral de um dos

aprendizes: o surdo. Assim, nessas relações ocorre a tutela, a defesa e a proteção do

ouvinte para com o surdo, que revelou ausência de aprendizagem e transparente

dependência do ouvinte em todas as situações.

Essa prática sugere uma redefinição em nossas Universidades e nos Cursos de

Formação do Magistério, do profissional educador/professor para que ele tenha um

mínimo da noção de como trabalhar com o surdo, uma vez que não possui

conhecimento da LIBRAS, e se utiliza da prática gestual visual para estabelecer a

comunicação entre as partes.

Para que o aluno surdo consiga colher os benefícios da escolaridade inclusiva, o

sistema regular de ensino deve assegurar meios para sua inserção na prática da educação

dos sujeitos das classes populares. A ele, vamos propor que a educação reveja seu papel

e objetivos e, assim, promova a otimização do processo de aprendizagem. O professor

deve realizar uma aproximação mediadora, buscando apreender as zonas dinâmicas da

cognição e da inteligência da criança, para, a partir daí, avaliar seus avanços e

progressos.

Para promover uma avaliação que leve a focalizar o ponto vago da cognição do

surdo, o professor deve possuir o entendimento de que todas as diferenças se pautam

num fenômeno de ordem social e psicológico, e não biológica; portanto, o meio dita o

quadro da deficiência no indivíduo, seus limites e suas possibilidades reais de

crescimento. É nessas condições que o professor deve refletir sua ação pedagógica.

É preciso que a escola se adeqüe, organize-se diante dessa diferença lingüística.

Esse grito se encontra retido na garganta dos professores pesquisados. É o eco

silencioso que está acompanhando o docente que trabalha com o surdo.

Conforme preconiza a LDB, 9.394/96 (BRASIL, 1996), em seu capítulo V, os

sistemas de ensino deverão assegurar currículos, métodos, técnicas, professores

especializados ou devidamente capacitados para promover a integração desses

educandos em salas de aula comum. Isso dá condições aos professores que possuem

alunos surdos incluídos o direito de reivindicar aos órgãos competentes, auxílio em suas

atividades pedagógicas de forma a subsidiar e aprimorar o desenvolvimento de seu

trabalho.

Porém, entendo que esse esforço deve ser coletivo, não se resumindo ao grito do

professor que possui um aluno surdo em sua classe. A união garante a força no gesto, e

o chamamento à cumplicidade e ao dever, os órgãos instituídos que legalizaram o

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processo de inclusão do surdo no sistema escolar. É preciso coragem e ousadia para

dizer: desse jeito, colocando o aluno surdo dentro da classe, para obedecer às exigências

da lei, simplesmente não dá.

Ancorada no discurso da igualdade, direito e justiça, a escola desconsidera que o

desenvolvimento dos diferentes demanda, necessariamente, de diferentes formas de

organização, e que estar com os outros em um mesmo contexto físico, não é garantia de

eqüidade. Se, por um lado, diante da trajetória histórica, que ensejava o abandono e a

exclusão do surdo, esse quadro mostra um significativo avanço, por outro,

indubitavelmente, um tratamento igual dispensado aos diferentes acaba por se constituir

na pior forma de exclusão e injustiça. O que proponho é que a escola perceba que tratar

os diferentes como iguais é mascarar sua segregação. É preciso que haja alguma reação

em prol da mudança desse quadro, pois não podemos passar de uma real segregação em

instituições especiais para as salas de aulas comuns. A classe especial, em escola

comum, foi uma das soluções sugeridas pelo grupo de professores como aquela capaz

de, aceitando as diferenças inegáveis de desenvolvimento, manter o também inegável

direito à igualdade de vida, com o ser humano.

Aponto o dado positivo que observei na escola de Lia que, ao assumir a

incumbência de educar Lia, tomou como norte a Declaração de Salamanca, sem

negligenciar uma importante passagem do documento que, a meu ver, é de fundamental

importância para que a proposta se concretize. Assevera o documento em relação ao

surdo:

Deve ser levada em consideração, por exemplo, a importância da linguagem dos

sinais como meio de comunicação para os surdos, e ser assegurado a todos os

surdos, acesso ao ensino da linguagem, de sinais de seu país (UNESCO, 1994, p.

31).

Esse dado é de especial relevância, pois infelizmente, com base em minha

experiência como professora itinerante, observo que a LIBRAS não está sendo

trabalhada em algumas escolas regulares que têm surdos incluídos, uma vez que a

maioria delas ainda não possuem em seu quadro docentes bilíngües ou intérpretes,

tampouco outros alunos surdos que observei dominam a língua. Ficou evidenciada a

oralização dos professores associada a gesto, à sinal, à mímica, para estabelecer a

comunicação entre alunos e professores.

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Diante da análise das entrevistas e na conversa informal com as professoras e a

mãe da aluna, percebi que, com exceção das professoras Cristina e Mariza, os corpo

docente da escola não atribuía importância ao uso da LIBRAS, achando necessário

apenas que a comunicação aconteça e da forma como for ou, o que é pior, afirmando

que a aluna precisa ser oralizada.

Penso que o caminho para a saída desse impasse passa pela a formação de

professores bilíngües, a inserção da LIBRAS nos Cursos de Formação do Magistério e

apostar nas Matrizes Curriculares acrescidas da língua – LIBRAS – como forma de

fomentarmos a inclusão real da minoria lingüística aos níveis mais elevados do

conhecimento e não somente ao ensino básico. Chamamos também à responsabilidade

as Universidades, principais catalisadoras dos ideais de transformação, para estabelecer

essa parceria com a inclusão dessa modalidade lingüística em todas graduações e em

todas as áreas. Apraz-nos também desejar que estudos surdos façam parte da matriz

curricular do ensino fundamental ao médio.

É um grande desafio, sabemos, estruturar e preencher lacunas abertas,

consolidando os ideais embutidos nos processos de inclusão e não praticar a roda dos

excluídos sob os desígnios de uma falsa inclusão. A luta é direcionada aos seres

humanos que precisam conscientizar-se que a deficiência e a diferença são inerentes ao

homem e, por isso, caminham ao nosso lado, uma vez que todos somos diferentes em

nossas “eficiências.”

Ficou constatado que as professoras e os professores pesquisados possuem

características de fraternidade, acolhimento e respeito aos surdos. Para esses

profissionais e para os colegas dessas escolas, fica evidente o companheirismo, a

afetividade e o respeito, a não-discriminação e a ausência de estigma, porém essas

atitudes, ricas em sentimentos humanos, não são garantia de proporcionarem à aluna

surda incluída situações de aprendizagem, de abstração do conhecimento.

Isso porque ela se encontra tão somente se desenvolvendo no aspecto social, mas

completamente desprovidos das condições reais de crescimento e aprendizagem, pois

essa sociedade que hoje o acolhe, amanhã poderá vê-lo como um inútil.

É imprescindível discutir a formação da pessoa surda, da sua identidade. É

preciso coragem para afirmar que o aluno surdo, hoje, conforme condições de sua

entrada e permanência no mundo escolar ouvinte, está deixado à própria sorte. Vejo

como necessário afirmar que a exclusão acontece na escola, mesmo que a mãe da aluna

insista em afirmar que ela está incluída, já que a escola o aceitou e os professores são

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afáveis e dóceis para com a filha surda. É necessário mencionar a grande falácia que é

hoje a inclusão do surdo no ensino regular descontextualizado da LIBRAS. E, fazê-las

cientes disso.

Faz-se mister que reflitamos sobre a possibilidade real de provermos uma

inclusão com vistas ao crescimento produtivo do aluno surdo. É importante ressaltar a

todos que a escola, sozinha, não dará conta. É preciso vontade de mudar. Vontade

daqueles que superficialmente apontam a inclusão como benéfica, sem, contudo,

adentrar esses espaços que se dizem inclusivos. Tornou-se essencial buscar a realidade,

como fiz na realização desta pesquisa, e os resultados que proporcionarão discussões e

profundas reflexões sobre os espaços escolares ouvintes na educação do surdo.

É preciso mudar o quadro e, para isso, discutir com muita paixão, como

sociedade, pais, irmãos, entidades de classes, associações, enfim, todo segmento que

acredita na potencialidade do diferente sobre como incorporar na escola um modo

produtivo para todos.

Devemos também vislumbrar uma inclusão verdadeira, apoiada, assessorada,

monitorada e estruturada. A sociedade é a alavanca, o vetor dessa estratégia de

transformação.Precisamos ter consciência do que é inclusão, seus benefícios e sua real

possibilidade de execução. Faz-se necessário mudanças sensíveis para que esse processo

desencadeado em nossas escolas se firme como inclusão verdadeira. Reafirmamos que o

grande e essencial chamamento é a conscientização do professor.

Se, por força de lei, nossos diferentes adentraram nossos espaços educativos

formais, sem a mínima estrutura, é urgente também fazer ecoar nosso grito para que a

sociedade entenda a grande convulsão decorrente dessa ação. A intenção real dessa

investida deve ser questionada com muita responsabilidade. É preciso construir uma

cultura de inclusão e entender que a inclusão do diferente na escola comum impõe a

vivência com o novo, a busca de cooperação, o embate entre os sentimentos e a tomada

de decisões. É importante entender que não há apenas uma diferença semântica entre

integração e inclusão. É necessário entender que inclusão é algo forte, transformador e

também inquietante ante os grandes obstáculos existentes. É essencial saber para onde

queremos levar nosso aluno diferente.

É mister entender que não precisamos de bondade, piedade. Precisamos de ações

que levem o diferente a crescer. Não basta aceitarmos em nossas salas de aula a entrada

do diferente e ir dormir pensando “nossa como sou boazinha”, é necessário postura,

sentimento de mudança, brios fortes e, acima de tudo, muita clareza a respeito desse

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momento e não se apoiar em sub-informações a respeito do que se quer com a inclusão

do surdo em nossas escolas regulares. É imprescindível que leiamos o lado oculto desse

processo.

Para Sá (1988), a inclusão pressupõe diálogo. É necessário que a comunidade

escolar em sua totalidade, pais, alunos, professores, direção, Conselhos Deliberativos,

Clube de Mães, discuta a forma de inclusão que está acontecendo, para promover o

entendimento de que um grupo não pode impor o que ele acredita ser melhor para outro

grupo, de fora para dentro ou de cima para baixo. Deve haver a luta por propostas

inclusivas, e a rejeição do autoritarismo e a defesa por propostas participativas. “[...] a

questão não é: os surdos têm direito a estudar na escola regular; mas sim: os surdos

têm direito a uma educação plena e significativa” (SÁ, 1988, p. 188).

E, a discussão deve ser ampla. É preciso entender que os surdos possuem sua

diferença lingüística. Não é possível simplesmente considerá-lo como um dos tipos de

aluno com necessidades educativas especiais. E, isso demanda tempo. Um tempo que as

políticas públicas de inclusão do surdo no espaço da escola regular não levaram em

consideração.

É essencial projetar. Projetar o que se quer atingir, traçar metas, estabelecer

parcerias e, acima de tudo, cobrar dos órgãos competentes a estruturação do sistema

regular de ensino para que venha, de fato, a ser inclusivo, uma vez que se entende

inclusão na perspectiva que contempla a participação no meio social e não no sentido de

espaço físico dessa ou daquela escola, mas o espaço que propicie ao aluno condições de

desenvolvimento e participação social.

Sugiro que essa escola pratique no futuro o hábito de efetuar reuniões de estudo

e nessas reuniões pedagógicas, os conselhos de classe e outros momentos pedagógicos

comuns às escolas, aconteçam as discussões sobre o processo de inclusão dos diferentes,

no sentido de melhorar a melhor maneira de ensinar de forma verdadeira o surdo a

construir sua aprendizagem para o que acreditamos ser possível tendo o suporte da

LIBRAS.

Penso que a reflexão terá que ser profunda dentro da escola a respeito da rede

ideológica que torna pais, professores e alunos solidários na manutenção de uma

realidade (a do fracasso) que acabam por não superar quando da educação do surdo. É

imprescindível conscientização política dessas instâncias porque são eles, em parceria

muito próxima, que poderão mudar a escola por dentro e mudá-la por dentro, é repensar

o que nela se pratica.

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Sugiro que uma das possibilidades de ser começo para a mudança desse quadro,

refere-se a garantir a utilização da LIBRAS no espaço escolar, de modo a assegurar a

especificidade de educação intercultural e bilíngüe dos alunos surdos, com a presença

de professor bilíngüe de 1ª a 4ª série do ensino fundamental e, para as demais séries, a

presença de um professor intérprete na sala com habilitação e formação afim, visando

prover ao surdo condições de possuir acesso ao conhecimento sistematizado.A questão

não está em recusar, a priori, as tentativas de inclusão do surdo nos espaços escolares

comuns. Para que se efetive essa inclusão, é essencial que haja uma nova estrutura dessa

escola, do seu currículo, do seu papel pedagógico, desvencilhando-se da velha política

educacional de exclusão historicamente praticada e reproduzida nos discursos oficiais. É

de extrema importância, também, autonomia às escolas para buscarem suas respostas

coletivamente, rompendo, assim, de forma consciente, com o programa educacional

oficial proposto como único e com a visão de que a escola deva ser a mesma para todos,

pois não temos uma escola voltada à prática de uma inclusão verdadeira e transparente.

E, isso, então, requer uma ruptura com os mecanismos de poder e de controle

dos saberes que transformam surdos em ouvintes que não ouvem, negando as diferenças

sociais por absorção de massas de alunos sob os desígnios de uma escola para todos.

É preciso refletir profundamente sobre o quadro das escolas que possuem alunos

surdos matriculados e professoras(es) sentindo-se desconcertadas(os), não

preparadas(os) e sem amparo para dar conta do desafio hercúleo de lidar com trinta ou

trinta e cinco crianças marcadas por singularidades.

Sem querer esgotar o assunto sobre o processo da inclusão do surdo no contexto

de nossas escolas regulares, destaco aqui como relevantes as palavras da Profa. Cristina

sobre o processo surdo/inclusão:

Torno a declarar que, apesar da atual proposta do Governo, nós, que trabalhamos o dia-a-dia, nós que temos a responsabilidade de ensinar Lia junto com os outros alunos em sala de aula, sabemos da necessidade de se refletir sobre a inclusão, da forma como hoje se faz sem querer ser resistente, porém, só colocar junto, não significa cumprir todos os objetivos de uma escola. É preciso dar uma resposta séria aos pais dos surdos que hoje estão em nossas salas e que acreditam que os mesmos estejam incluídos. Não sou contra a continuidade dessa iniciativa. O que precisamos é conscientizar a sociedade, os colegas, os dirigentes, e juntos, buscar a estrutura necessária. A união, a reflexão, os estudos, as discussões e a conscientização apontarão a estrutura necessária. Acredito que é por aí. O caminho foi aberto, e não podemos deixar que o mesmo se feche, para que possamos ver através dele, um horizonte melhor do que hoje temos.Quem sabe se tivéssemos um ensino em LIBRAS, professor bilíngüe na escola, professor intérprete em sala a

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partir da 5ª série, essas diferenças que precisamos entender existentes, não seria melhor trabalhadas? Não quero que minhas colegas professoras amanhã recebam Lia na sala de aula e apenas a acolham gentilmente e a aceitem apenas para cumprirem seu dever, sem explorar suas potencialidades, sem verificar outras possibilidades e métodos para ela aprender o que seus colegas aprendem. Minha preocupação está em como eles trabalharão sua aprendizagem para que ela não tenha o triste futuro que vejo de algumas pessoas surdas que encontro por aí. Outro dia fui abordada no sinal por um homem surdo que estava vendendo uma cartela contendo o alfabeto manual da LIBRAS impresso, e verifiquei que os motoristas ao meu redor recusavam a oferta sistematicamente. E ao refletir sobre essa cena, cheguei à conclusão que, se as coisas continuarem assim, Lia e nossos futuros alunos surdos não poderão almejar o sonho de terem um emprego digno e de freqüentarem uma universidade.”

Concordo com a visão expressa pela Profa. Cristina, que percebeu que: a

inclusão do surdo no espaço do ensino regular ouvinte não lhe garante acesso ao

conhecimento; a comunicação estabelecida com o surdo se faz através da oralidade, da

mímica e dos gestos; a maior dificuldade encontrada pelos docentes na comunicação

com o surdo é a absoluta ausência da língua compartilhada; a mãe da aluna surda

acredita que sua filha está incluída, aprendendo e se desenvolvendo por estar num

ambiente aparentemente destinado a todos os “normais”; a aluna surda possui a sua

socialização garantida, porém sua cognição esquecida, não trabalhada. Isso leva à

necessidade de dar continuidade a pesquisas como esta, para que esta situação possa

estar sendo revista. O espaço foi criado, porém também alguns professores entrevistados

ainda pensam que as dificuldades e os possíveis fracassos futuros de Lia nessa escola

poderão ser atribuídos única e exclusivamente à sua comunicação em LIBRAS e à sua

surdez.

É necessário desfazer a rede de conveniência que se estabeleceu dentro do

sistema educacional. É preciso novas lentes para observar e interferir positivamente

neste contexto.

Vislumbrar um crescimento real para o surdo se constitui como elo principal da

corrente pela inclusão dele no espaço educativo ouvinte, pois a escola ainda é vista

como transformadora. Mas, devemos entender que, se isso não acontecer, a sociedade

abandonará o surdo e o trabalho realizado terá sido em vão. Daí a importância dessa

pesquisa, que mostrou ser possível incluir, e com sucesso, uma aluna surda em classe de

ouvintes, sem alterar muito o planejamento pedagógico e as condições materiais da sala

de aula.

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Esta é a realidade e as possibilidades de ação. A luta será travada. E o embate,

necessário.

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ANEXOS

ANEXO I – Questionário e Respostas das Professoras de Lia ................................p. 129

ANEXO II – Roteiro para a entrevista com a mãe de Lia........................................p. 142

ANEXO III – Roteiro para a entrevista com a diretora............................................p. 143

ANEXO IV – Roteiro para entrevista com professores da classe regular................p. 145

ANEXO V – Desenhos de Lia e de sua colega Fernanda ........................................p. 146

ANEXO VI – Roteiro para Entrevista com Professores

da Classe Regular .....................................................................................................p. 149

ANEXO VII – Avaliação da Aluna e da Professora...............................................p. 150

ANEXO VIII – Roteiro para Diário de Campo......................................................p. 156

ANEXO IX – Questionário para as professoras.....................................................p. 157

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ANEXO I

Questionário e Respostas das Professoras de Lia

No. Questões Profa. Cristina Profa. Mariza

1 Dados Pessoais e

Formação Profissional

Nome Completo : Cristina Bastos Idade : 34 anos Formação : Normal Superior –Associação Educacional Dom Bosco -Pós-Graduação em Psicopedagogia - Universidade Castelo Branco (UCB) Tempo de serviço na educação? 10 anos

Nome Completo: Mariza Souza Idade : 28 anos Formação : Pedagogia – Universidade Federal Fluminense, em 1999. Tempo de serviço na educação: 3 anos.

2 Em quantas escolas você atua ? Somente no Menino Jesus

Em duas escolas, no Menino Jesus no turno da manhã e outra, particular, na Tijuca , no turno da tarde.

3 Quanto tempo você atua nesta escola?

Há cinco anos.

Há quase um ano e meio.

4 Você tem alguma

formação em Educação Especial ?

Não, embora tenha feito no ano passado um curso de especialização em Deficiência Auditiva no INES e assistido algumas palestras sobre o

tema. Estou tentando agora terminar o meu curso de LIBRAS no próprio

INES. Já estou no terceiro nível, faltando apenas um para terminar.

Nenhuma, e estou ansiosa para complementar meus estudos rapidamente nessa área, pois estou tendo que lidar agora com uma criança muito especial, que é a Lia.

5 Em caso afirmativo, quem promoveu essa formação

e como foi ?

Resolvi me aperfeiçoar por conta própria, visto que algumas amigas,

que eram professoras em outras instituições, me contavam que

Nada declarou.

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estavam recebendo alunos especiais em suas classes e estavam

encontrando dificuldades no trato com eles. Isso me deixou preocupada

com a possibilidade de num futuro próximo passar pelo mesmo

problema e assim resolvi me preparar melhor. Aconselhei-me com a uma

antiga colega de curso e ela me indicou o curso de especialização do INES que me valeu muito. Logo que me formei, dois meses depois recebi

a Lia em minha classe, o que considero um grande presente e uma

excelente oportunidade de poder aplicar todos os conhecimentos adquiridos no curso do INES.

6 Como você avalia essa

formação ? Você sugeriria outra ?

Eu avalio como excelente minha formação adquirida no INES. O

Curso de Especialização na área da Deficiência Auditiva no INES foi de

alto nível e , em todas as oportunidades, estou sempre o recomendando a todas minhas

colegas professoras. Sempre digo que graças a ele pude receber bem a Lia

em minha classe e esse curso me preparou muito bem para lidar com

suas dificuldades. Assim posso afirmar que minha formação foi muito boa e sugeriria a todas as

minhas colegas que o façam.

Nada declarou.

7

Que tipo de dificuldades você enfrenta no seu

trabalho com seu aluno que não é portador de

surdez ?

Em minha classe tenho alunos que apresentam dificuldades de

aprendizagem por demonstrarem estar tendo problemas familiares em casa. Tenho um menino, da mesma

idade da Lia, cujos pais recentemente se separaram e a mães está em

disputa judicial pela guarda dele com o pai. Observei que ele de três meses para cá, quando ocorreu a separação

dos pais, está mais agressivo e arredio com os colegas, preferindo se isolar num canto e não gosta mais de participar das atividades em grupo.

Também tenho um outro menino, que apresenta um comportamento muito

irriquieto, é superativo, não pára

Minha experiência profissional foi reforçada

quando assumi a educação de Lia na minha classe. Mas

independente dela ser portadora de surdez, aprendi que mesmo que ela escutasse

bem ainda assim ela seria diferente em relação aos

demais. Considero que todos meus alunos são diferentes e algumas dessas diferenças

podem incluir uma deficiência como no caso de Lia, mas eles não deixam de ser crianças com vivências e

potenciais diferentes.

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quieto e tenho de vigiá-lo o tempo todo, pois ele está sempre querendo sair porta afora e não consegue se

concentrar nas atividades da classe. Se peço a ele para fazer um simples desenho, ele é bem capaz de pegar o papel e o lápis e atirá-los em mim ou nos colegas. Já conversei com os pais

dele há dois meses atrás e eles me prometeram levar o menino para um

psicólogo analisar seu comportamento.

Portanto, na minha classe de alfabetização, é natural que alguns escrevam melhor,

joguem melhor, desenhem melhor que os outros. Mas

aprendi que nessa altura não é tarefa da escola fazer tal

julgamento. O meu papel de professora é cuidar para que

os que não aprendem tão bem sejam mais cuidados do que aqueles que conseguem ou já aprendem bem.Aprendi que

nessa faixa etária a comparação é nociva em qualquer circunstância,

porque sempre as crianças saem perdendo com isso. Por

que se entende ainda que alguns devem perder?

Acredito que isso seja o preceito básico de uma sociedade excludente e

elitista. Quando eu estava no

primeiro ano de Pedagogia na UFF, tive uma professora que adorava Emília Ferreiro. Ela gostava de citar uma frase

dessa grande educadora que guardo até hoje que era assim

: "Temos uma imagem empobrecida da criança que aprende: a reduzimos em um

par de olhos, um par de ouvidos, uma mão que pega um instrumento para marcar e um aparelho fonador que emite som". Aprendi com

essa minha professora que as crianças não são pequenos

robôs que chegam no ambiente escolar pronto para que o professor "encha-o" de

conteúdos que lhe possibilitem aprender. Pelo

contrário, quando esse aluno vem para a escola tem

vivências de produção de escrita que fazem parte do seu

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dia-dia. Claro que alguns, como no caso de Lia, terão devido à surdez, maiores dificuldades em dominar

certos conteúdos, mas aprendi com ela que tudo é uma questão de adaptação.

Concluindo minha resposta à sua pergunta sobre as dificuldades que enfrento

com meus alunos não portadores de surdez, diria

que são dificuldades normais da faixa etária deles, eles são

apenas crianças com comportamentos típicos de

crianças : gostam às vezes de fazer bagunça, são curiosos e

exploradores e às vezes gostam de correr riscos desnecessários como se

pendurarem de cabeça para baixo no balanço do pátio no recreio. Eles são cheios de

energia e eu preciso sempre estar inventando e criando atividades para que eles gastem essa energia, não fiquem dispersos e criem

sentimentos de pertencerem ao grupo.

8

Que tipo de dificuldades você enfrenta no seu

trabalho com seu aluno portador de surdez ?

As dificuldades de comunicação são as mais evidentes. A Lia, no primeiro mês que entrou na minha classe, há quatro meses atrás, apresentava dificuldades de articular bem as palavras e compreender frases completas. Além disso, sua participação em brincadeiras que envolvessem cantigas de roda, notamos que ela se sentia inicialmente receosa e deslocada. Mas com o correr do tempo, observamos que seu desejo de participar das brincadeiras e se integrar com os coleguinhas era tão forte que ela superou as dificuldades

Tudo começou com um convite da diretora para que eu assumisse a classe da Prof Cristiane, que estava tirando uma licença por causa do mestrado dela na PUC. Essa minha colega professora foi a primeira educadora da Lia no Laura Mattos e atuou por cinco meses com a menina. Antes de aceitar o convite da diretora para substituí-la, tivemos uma reunião com todas as pessoas envolvidas diretamente com a aluna : a mãe, a própria Cristiane, a

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e encontrou um jeito de “ouvir” a música, através da minha expressão facial e corporal , bem como da reação dos colegas. Percebi que se colocasse as caixas acústicas perto dela ou voltadas para o chão, ela era capaz de sentir as vibrações da música e, conseqüentemente, acompanhar melhor o ritmo e descobrir a hora certa de pular ou seguir uma determinada ordem de acordo com as regras estabelecidas para a brincadeira com base num determinado tipo de som. Esse fato foi muito importante para sua perfeita integração à turma e a tornou até mais falante, diria até que ela “destravou” um pouco mais a língua e por isso seu vocabulário cresceu e ela atualmente demonstra uma grande vontade de conversar e se expressar ainda mais.

Prof Ana Lúcia , professora especialista da Lia no INES, que iniciou seu trabalho de educação precoce da e a diretora da nossa escola. Fui colocada a par de todo o histórico educacional anterior de Lia e soube através de sua mãe que, quando a Lia apareceu no primeiro dia de aula ela quase não falava, só se comunicava por sinais e seu vocabulário era limitado. A Prof Ana Lúcia informou-me também que, embora a Lia fosse uma menina muito tímida e arredia quando a conhecera e que há apenas dois anos pronunciara sua primeira palavra, ela constatara feliz que agora ela era capaz de entender a leitura labial, que estava mais sociável e acessível e conseguia ter bom convívio com as coleguinhas de classe. Esclareceu-me que eu deveria falar com ela sempre de frente, me certificando primeiro se ela realmente estava lendo meus lábios. Ela me ensinou alguns sinais simples, como ir ao banheiro, levantar, sentar e me deu até uma pequena cartilha de LIBRAS editada pelo INES. Confesso que ao final da reunião eu fiquei um pouco temerosa da responsabilidade que iria assumir, me perguntando se daria conta do recado. Imaginava a todo instante como poderia superar os problemas de comunicação que se com certeza se estabeleceria entre mim e ela nos primeiros dias e me sentia um pouco insegura, pois sabia que a Cristiane fizera um trabalho maravilhoso com ela

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e que eu teria que dar seguimento ao mesmo e manter o ritmo dos seus progressos. Mas no íntimo eu pensava : se a diretora e a Cris demonstraram confiança em mim eu tenho mais é que corresponder e assim resolvi encarar o desafio, aceitando assumir a turma da Lia. Encarei o primeiro dia de aula com muita apreensão e me sentia muito travada. Parecia-me certas horas que eu estava só dando aula para a Lia, tamanha a minha preocupação em me certificar se ela estava entendendo o que eu falava. Eu sabia que ela não ouvia minha voz, mas várias vezes me dei conta de que eu tentava falar muito mais alto do que de costume. Hoje, depois de três de nossa convivência, percebo que o mais importante é articular bem as palavras e não o tom e o volume da minha voz, mas até eu pegar o jeito, creio que passei uns dois meses tentando me adaptar à nova realidade que era a convivência com uma aluna surda.

9

Você observou alguma(s) dificuldade(s)

semelhantes entre seu aluno portador de surdez e o restante dos alunos não

portadores de surdez ?

Em relação à dificuldade na compreensão das frases e a pronta execução das ordens transmitidas oralmente, somente a Lia apresenta esse problema de forma mais evidente. Os outros alunos apenas apresentam as dificuldades normais devido à sua maturidade emocional, incluindo aí a própria Lia, pois são todos crianças dentro da faixa de quatro a cinco anos . Como já mencionei na pergunta anterior (no. 9) , tenho aluno com problemas familiares e outro que apresenta problemas de hiperatividade.

Não, nunca tive dificuldade de comunicação até a Lia aparecer com nenhum dos

meus alunos normais. Até o aparecimento da Lia minhas

experiências no ensino fundamental foram bem sucedidas e sempre fui

querida pelos meus alunos.

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10 Como você se comunica

com seu aluno portador de surdez ?

Minha comunicação com a Lia hoje é feita a maior parte do tempo oralmente (embora algumas vezes eu faça uso de sinais, para agilizar nossa comunicação em certas ocasiões), eu falo de frente para ela, coloco a mão no seu ombro quando desejo chamar sua atenção e a trato como qualquer outro aluno meu, só que presto mais atenção nas suas reações às minhas determinações e procuro me certificar se ela entendeu o que desejo que ela faça, pedindo que ela repita sempre que possível as minhas palavras.

Minha comunicação com a Lia até hoje é feita de altos e baixos. Mas na maioria das

vezes consigo fazer com que ela me entenda e execute as atividades que passo para a classe. Constato que ela é

uma criança como qualquer outra, gosta de desenhar, de

fazer bagunça, de correr pelo pátio na hora do recreio, se

você não é informado de que ela é surda, não observa nada

de mais no primeiro momento. Apenas quando

você precisa chamá-la ou se dirige a ela é que sente que algo está muito errado. Ela

costuma olhar fixamente seu rosto, não obedece de pronto a uma ordem , você às vezes precisa apontar muito, repetir as coisas várias vezes até ela entender o que se deseja que ela faça. Quando a classe está mais agitada ela costuma ficar

bastante nervosa, pois tem dificuldade em acompanhar o que está se passando ao redor, observo que ela fica nervosa e

impaciente e nessas horas tenho de criar uma atividade que desvie sua atenção do

grupo, pois ela chega algumas vezes a chorar de frustração.

È difícil para mim nessas ocasiões conseguir que ela fique mais calma e muitas

vezes tenho que deixar de dar atenção a outros alunos e me

dedicar a acalmá-la. Os outros alunos acabam se ressentindo

do excesso de atenção que dou para ela e me cobram

também mais atenção. Tem horas que chego a

acreditar que na minha classe deveria ter duas professoras: eu e uma professora auxiliar

só para me ajudar nessas

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horas com a Lia. Apesar de todas as dificuldades, percebo que estou aprendendo muita coisa com ela, descobrindo a cada dia formas criativas de

superar suas dificuldades para integrá-la melhor com seus

colegas. Sinto que recentemente nossa relação

está melhorando um pouco e me considero gratificada tanto

como pessoa e como profissional por estar

conseguindo ter mais acertos do que erros até agora na sua educação. Confesso que estou

tento muito suporte da Prof Ana Lúcia do INES e que sem

esse suporte eu talvez não conseguisse dar cabo da

tarefa.

11

Você fez alguma adaptação no material didático utilizado pelo

aluno portador de surdez ?

Minha turma é da classe de pré-alfabetização, o que creio que facilita muito, pois os livros para essa faixa

etária são ricos de ilustrações e fotografias e os exercícios que eles

fazem visam , numa perspectiva construtivista, ao seu pleno

desenvolvimento emocional e intelectual, preparando-a para o

contato com as primeiras letras. Uma coisa é certa : na minha classe nunca

poderei privilegiar o método fonoaudiológico no aprendizado da leitura e da escrita , pois se assim o fizer , estarei dificultando as coisas

para a Lia. Uma cartilha do tipo “Vovô viu a uva” não serve para ela e ousaria dizer que nem para os outros alunos. Creio que devemos nessa fase

alfabetizar a criança letrando sem descuidar da especificidade do

processo de alfabetização, ou seja, acredito que especificidade é ensinar

a criança e ela aprender.O aluno precisa entender a tecnologia da

alfabetização. Há convenções que precisam ser ensinadas e aprendidas,

Sim. Aceitei algumas sugestões da Prof Ana Lúcia e selecionei alguns livros e materiais didáticos que pudessem estimular tanto a Lia quanto os outros alunos. Descobri que algumas fitas de vídeo, CDs e DVDs produzidos pelo INES continham histórias infantis com legendas e intérpretes em Língua de Sinais e as crianças (a Lia principalmente) adoram assisti-los. Verifiquei, com surpresa, que todas crianças até aprenderam alguns sinais através desses materiais, pois os passei para a classe toda e não apenas para a Lia. Eles me pedem para passar essas fitas com muita freqüência e todas elas hoje em dia já sabem pelo menos alguns sinais e adoram conversar com a Lia no recreio na “língua das mãos” como se

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trata-se de um sistema de convenções com bastante complexidade. Meus

alunos nessa fase, além de decodificar letras e palavras, precisa aprender toda uma tecnologia ainda muito

complicada para eles : como segurar o lápis, escrever de cima pra baixo e da esquerda para a direita; escrever numa linha horizontal, sem subir ou

descer. São convenções que os adultos letrados acham óbvias, mas

que são difíceis para eles.

refere à LIBRAS a Érica, uma de suas coleguinhas.

12

Você recebe assessoramento para o desempenho de suas

atividades pedagógicas em relação as crianças com deficiência

auditiva?

Sim, no caso da Lia, conto com o auxílio precioso da ex-professora dela, Ana Lúcia Nascimento, que

trabalhou com a Lia no INES antes dela freqüentar ao Laura Matos.

Sim, o INES está sempre presente e trocamos

informação com freqüência. A Prof Ana Lúcia vem à escola um vez por mês e

fazemos reuniões para troca de informações e materiais,

avaliações e idéias.

13

Você reformulou o Currículo e a Metodologia para poder trabalhar com essa criança (surda) na

Inclusão?

Claro que sim. Sempre troco idéias e sugestões com a antiga professora dela no INES, a Prof. Ana Lúcia. É

bastante significativo o fato de mantermos uma estreita relação de

amizade, já que a Prof Ana Lúcia foi também uma das minhas instrutoras

no curso do INES e contribuiu significativamente para a plena

inclusão da Lia na escola. Tanto que uma vez por mês mantemos na escola

uma reunião de avaliação dos progressos e dificuldades apresentados pela aluna.

Sim. Não poderia ser de outro modo, visto que, apesar de ela ser uma criança como as outras, não resta dúvida

que necessita de mais apoio e incentivo que seus colegas

para alcançar o mesmo patamar que eles e se sentir tão capaz quanto as outras.

14

Você tem facilidade de se comunicar com essa criança (surda)? E os

colegas dela ?

Graças ao curso de especialização realizado no INES, hoje me encontro bem preparada para lidar com crianças como os problemas da Lia e, portanto, posso afirmar que tenho facilidade de lidar com o problema e aprendi muito com minha própria aluna. Ela mesma me forneceu muitos subsídios, por meio de suas reações, para a correta adaptação das atividades e do material didático.

Como já mencionei, nossa comunicação é feita de altos e

baixos. Alguns dias é boa e em outros nem tanto, mas

considero o saldo até agora muito positivo.À medida que fui ficando mais familiarizada com sua maneira peculiar de se comunicar, aprendendo

alguns de seus sinais e entendendo melhor sua

expressão corporal, a coisa foi fluindo melhor.

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15

O seu ambiente de trabalho está de acordo

com a Metodologia aplicada?

Sim, quase nada mudou, exceto que providenciei a compra de duas caixas acústicas mais possantes e determinei

a compra de softs educativos com histórias em LIBRAS dos contos

infantis mais conhecidos para facilitar na hora da leitura a compreensão do que está sendo narrado pela Lia, que

conhece bem a língua de sinais.

Sim, a maioria dos profissionais do Laura Mattos

(eu inclusive) estamos nos preparando para receber no

futuro mais alunos portadores de deficiência e acreditamos que nossa experiência com a

Lia está ajudando a consolidar a convicção de

que é possível trabalhar com algumas dessas crianças

portadoras de deficência em classes comuns.

16

Como você analisa o papel da família nesse processo educacional?

De extrema e indiscutível importância. Observei que a Lia vem de uma família bem estruturada, com pais e mãe amorosos, que se revesam em apanhá-la no colégio. Até mesmo

seus avós e tios já foram buscá-la algumas vezes e manifestam vivo interesse em observá-la em suas atividades na classe e me fazem

perguntas acerca do seus progressos. Atribuo grande parte do sucesso da

inclusão da Lia aos estímulos recebidos em casa por sua família.

Graças a Deus que a Lia tem uma mãe de coragem e que demonstra um grande amor e preocupação pela filha. Ele é incansável, vinha à escola toda a semana conversar comigo, almoçávamos juntas e se não fosse seu apoio , creio que não teria conseguido..

17 Como você vê a inclusão

educacional?

Algo extremamente benéfico para o aluno. E a prova viva disso é minha própria aluna, a Lia. Observo dia a dia seu crescente progresso que se traduz na melhoria de sua fala e na

sua participação cada vez mais ativa na escola. Mas,sem dúvida, para mim dois fatores foram fundamentais para

esse sucesso : pesa bastante o fato dela ter uma família que a estimula e

apóia e também e eu ter feito um curso de especialização que ajudou a

compreender e a lidar com as suas dificuldades de comunicação.

Eu tive apenas uma única experiência que foi a Lia. Mas essa experiência me

provou uma coisa : inclusão sem apoio de entidades ou pessoas especializadas no problema está fadada ao

fracasso.

18

Você acredita que uma aluna portadora de surdez

estaria melhor numa classe especial do que

numa regular ?

Não, em absoluto. Esses alunos só tem a lucrar estando na escola regular, embora eu também considere importante a participação e a orientação de um professor especial, como foi o no meu caso.

Hoje, com base na minha experiência com a Lia, acredito que alguns alunos podem obter êxito com a inclusão. Isso é o resultado de uma série de fatores favoráveis que contribuíram para que els fosse bem aceita

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na Laura Mattos: o apoio tanto de sua família quanto dos profissionais do INES, que estão sempre em estreita colaboração com a escola.

19

O que você sentiu no primeiro contato com seu aluno portador de surdez que tem dificuldade de

comunicação ?

Como recebi orientação adequada e tive uma boa troca de idéias e

experiências com a Prof Ana Lúcia do INES, me senti plenamente

capacitada e preparada para lidar com sua especificidade e superar os problemas advindos da surdez.

Já coloquei isso numa questão anterior, mas vou

repetir aqui : senti-me insegura a princípio, mas ao

mesmo tempo com muita vontade e disposição de

encarar esse desafio. Afinal Lia, apesar de ser surda, era uma criança e precisava de

toda a minha ajuda e eu procuro, como educadora, dar o melhor de mim. O esforço

valeu a pena, pois estou tendo uma resposta positiva por

parte dela.

20

Em sua opinião, que tipo de aluno portador de

necessidade especial pode ser incluído em rede regular de ensino?

Embora reconheça a importância da convivência com todos os alunos, não importando a sua especificidade, não sou a favor da inclusão de alunos com

comprometimentos mentais de gravidade de tal ordem que os

impeçam de se comunicarem ou manterem um mínimo de

sociabilidade com os demais.

Uma coisa eu extraí da minha experiência com a Lia :

surdos podem ser incluídos em escola normal, desde que os professores recebam apoio

pedagógico de instituições especializadas como o INES.

Com essa experiência positiva que estou tendo com a Lia, acredito que a surdez não cause tantos transtornos

assim, pelo menos na educação infantil, naquela

fase em que as crianças estão na pré-escola ou no maternal. Pensando bem, creio que até

nas séries mais avançadas não deva haver maiores

problemas. Com os recursos tecnológicos de hoje, posso até concluir que tudo é uma

questão de adaptação. Quanto aqueles que possuem

outras deficiências , como cegueira, paralisia cerebral,

síndrome de Down, etc, creio que alguns precisarão de mais

apoio que os outros, mas é perfeitamente possível que

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alguns tenham êxito desde que tenham, como a Lia, um apoio da própria escola e de professores especializados

em sua deficiência apoiando os professores dessa escola.

21

De que maneira o contexto social influencia

o processo de inclusão escolar?

Acredito que o meio social tenha uma poderosa influência. De que adianta

apenas o professor fazer a sua parte e não contar com a colaboração das

autoridades competentes e leis sancionadas por políticos

comprometidos com a idéia de justiça social ? Também acredito na importância do trabalho de

divulgação e apoio de algumas organizações não governamentais

voltadas para a causa dos portadores de deficiência.

Acredito que o contexto social é importantíssimo.

Sem preparo e esclarecimento de toda a sociedade não é

possível uma inclusão verdadeira e de sucesso.

22 Como a estrutura física da escola favorece ou não o

processo de inclusão?

Para alguns alunos com comprometimentos severos, uma

escola que dispusesse de um corpo docente composto de professores

regulares e professores especializados trabalhando em conjunto , como

também salas de recursos e de apoio, seria o ideal.

Creio que a escola deve se preparar de antemão,

construir rampas para os deficientes físicos, contratar professores cujos currículos tenham tido disciplinas que contemplem o problema da

deficiência e suas implicações. Só dessa

maneira nós , professores nos sentiremos seguros e

amparados, prontos a receber esses alunos.

23

De que maneira a estrutura institucional e pedagógica favorece ou

não o processo de inclusão?

Não acredito na inclusão apenas com a participação do corpo docente. È necessário que todos, do inspetor à

merendeira, estejam comprometidos e recebam orientação adequada para saber lidar com todos os tipos de

alunos.

Penso que se escola puder contar com professores regulares e especiais ao

mesmo tempo, ou professores que tenham tido formação e cursos de aperfeiçoamento

ela pode almejar algum sucesso no processo de

inclusão.

24 Como você vê o seu

trabalho frente à educação inclusiva?

O sucesso obtido com a Lia me estimulou a estudar e me capacitar

para lidar com outros tipos de comprometimentos. Sei que como educadora não devo e nem posso escolher quem vou educar. Assim

sendo, no futuro devo estar preparada

Estou me sentindo uma professora mais consciente e

realizada com tudo o que aprendi no meu contato com

minha aluna e quero encontrar tempo agora para

complementar meu currículo

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para lidar com alunos cegos, com síndrome de Down, enfim, com o que aparecer pela frente. Lia me ensinou muito e minha convivência com ela fortaleceu minha vontade de encarar novos desafios. Sinto até que meu

autoconceito como professora cresceu e se valorizou ainda mais com essa

experiência.

com cursos de aperfeiçoamento na área da surdez, pois pretendo me

dedicar no futuro à educação de alunos portadores desse tipo de deficiência. E a Lia me ajudou a descobrir que sou capaz de obter êxito

nesse campo. Serei eternamente grata a ela por ter me ajudado a descobrir

esse meu potencial.

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ANEXO II

Roteiro Para a Entrevista Com A Mãe De Lia

1 - Sua filha gosta de freqüentar a escola atual ?

2 - Você acompanha o trabalho que a professora da classe da sua filha vem

desenvolvendo com ela ?

3 - Em caso de resposta afirmativa à questão anterior, conte-nos como vc acompanha o

trabalho que a professora da classe regular vem desenvolvendo com sua filha.

4 - Em caso de resposta negativa, justifique por que não vem acompanhando o trabalho

da professora da classe regular está desempenhando com sua filha.

5 - Está satisfeita com o atendimento que sua filha está recebendo na classe regular ?

6 - Quais as dificuldades que sua filha tem encontrado na classe regular ? Enumere-as.

7 - Sua filha mostra-se satisfeita com o atendimento proporcionado pela professora da

classe regular ?

8 - Você tem recebido reclamações da professora da classe regular em relação à sua

filha ? (que tipo de reclamação ?)

9 - Você acha que o atendimento oferecido à sua filha na classe comum precisa ser

modificado ?

10 - Em caso de resposta afirmativa, quais modificações você sugeriria ?

11 - Você tem críticas (negativas ou positivas) a fazer quanto ao atendimento oferecido

a sua filha na classe regular ?

12 - Você teria sugestões para melhorar o atendimento oferecido à sua filha na classe

regular ?

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13 - Acha que os alunas ouvintes receberam bem a aluna surda ?

14 - Qual é a opinião dos professores da classe regular em relação ao aluna surda ?

15 - A família dessa aluna surda está satisfeita com o atendimento da filha em classe

regular ?

16 - O que é feito com os alunos que apresentam dificuldades em classe regular na sua

escola ?

17 - A aluna surda participa de todas as atividades programadas para a escola ?

18 - O que a senhora sugere para melhor desenvolvimento da aluna surda em classe

regular ?

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ANEXO IV

Roteiro para Entrevistas com Professores da Classe Regular

1 - Você recebeu alguma orientação para trabalhar com alunos surdos ? 2 - Que tipo de orientação você gostaria de receber ? 3 - Para você trabalhar com alunos surdos você precisaria modificar os procedimentos didáticos que você utiliza ? 4- Você acha que para atender um aluno surdo em sua classe é importante manter contato com uma professora especializada ? 5 - Você encontraria alguma dificuldade em receber um aluno surdo em sua classe ? 6 - Você acha que os demais alunos de sua classe receberam bem o aluno surdo ? 7 - Você acha que o aluno surdo se adaptaria bem na sua classe ? 8 - Na sua opinião como deve ser escolhido o professor de classe regular para atender o aluno surdo ? 9 - Você conseguiria se comunicar com um aluno surdo ? 10 – Você gostaria de trabalhar com um aluno surdo ? Explique os motivos.

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ANEXO V

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DESENHO DE LIA ( COM 5 ANOS) FEITO EM 08/04/05

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DESENHO DE FERNANDA (COM 5 ANOS),COLEGA DE CLASSE DE LIA FEITO EM 08/04/05

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ANEXO VI ROTEIRO PARA ENTREVISTA COM PROFESSORES DA CLASSE REGULAR 1 - Você recebeu alguma orientação para trabalhar com a aluna surda ?

2 - Que tipo de orientação você gostaria de receber ?

3 - Para você trabalhar com sua aluna surda você precisou modificar os procedimentos

didáticos utilizados anteriormente ?

4- Você acha que para atender um aluno surdo em sua classe é importante manter contato

com uma professora especializada ?

5 - Você encontrou alguma dificuldade em receber uma aluna surda em sua classe ?

6 - Você acha que os demais alunos de sua classe receberam bem a aluna surda ?

7 - Você acha que a aluna surda adaptou-se bem à classe regular ?

8 - Na sua opinião como deveria ser escolhido o professor de classe regular para atender o

aluno surdo ?

9 - Você consegue comunicar-se com sua aluna surda ?

10 - Você acha que a participação da aluna surda em classe comum tem facilitado o

processo de escolarização da referida aluna ?

11 - Os alunos ouvintes conseguem se comunicar com a colega surda ?

12 - Gostaria ou não de continuar trabalhando com alunos surdos ?

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ANEXO VII 150

Avaliação da Aluna e da Professora

Observação : Este questionário foi adaptado por mim a partir de um trabalho desenvolvido em 1958 pelo fonoaudiólogo francês Guy Perdoncini, denominado “ L’audition est lávenir de lénfant sourd”. O trabalho e o método de Guy Perdoncini para a educação de crianças surdas foi traduzido e descrito no livro “Audição É O Futuro da Criança Surda” (AIPEDA,RJ,1996), elaborado por Álpia Couto-Lenzi, que foi aluna de Perdoncini e mais tarde em 1982, nomeada diretora do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES),

NOME DO ESTABELECIMENTO : MENINO JESUS DATA DA AVALIAÇÃO : 05 /04 /2005 PROFESSORA : CRISTINA

AVALIAÇÃO DA ALUNA

Satisfatório Moderado Insuficiente Nula Negativa (prejudicada) No. Indicador de Integração

3 2 1 0 -1

01

A aluna participa de todas as atividades da escola

comum e recebe atendimento especial na

escola regular para estimulação auditiva e

aquisição da linguagem

X

02

A aluna participa ao mesmo tempo da programação da escola regular e da escola

especial X

03

A aluna possui bom entrosamento com os colegas normais e se

integra nos trabalhos em grupo e é aceito por eles

X

04

A aluna se comunica oralmente na maior parte

das vezes com os colegas e é compreendido por eles

05

A aluna se comunica oralmente com a professora na maior parte das vezes e

é compreendido por ela

X

06

A aluna faz uso de prótese auditiva durante toda a

permanência em sala de aula

X

onde exerceu o cargo até 1990. Os questionários de avaliação de alunos e professores descritos no seu livro tornaram-se um padrão de consulta e aplicação no INES e a partir da leitura dos mesmos, extraí e adaptei as questões propostas para efetuar minha pesquisa .

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ANEXO VII 152

Avaliação da Aluna e da Professora

Observação : Este questionário foi adaptado por mim a partir de um trabalho desenvolvido em 1958 pelo fonoaudiólogo francês Guy Perdoncini, denominado “ L’audition est lávenir de lénfant sourd”. O trabalho e o método de Guy Perdoncini para a educação de crianças surdas foi traduzido e descrito no livro “Audição É O Futuro da Criança Surda” (AIPEDA,RJ,1996), elaborado por Álpia Couto-Lenzi, que foi aluna de Perdoncini e mais tarde em 1982, nomeada diretora do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES),

NOME DO ESTABELECIMENTO : MENINO JESUS DATA DA AVALIAÇÃO : 05 /04 /2005 PROFESSORA : CRISTINA

AVALIAÇÃO DA PROFESSORA

Satisfatório Moderado Insuficiente Nula Negativa (prejudicada) No. Indicador de Integração

3 2 1 0 -1

01 A professora procura falar sempre de frente para o aluno deficiente auditivo

X

02

A professora procura não falar muito depressa nem

muito devagar, conservando um ritmo natural

X

03

A professora evita colocar as mãos ou algum objeto

em frente ao rosto enquanto fala

X

04

A professora evita movimentar-se na sala

enquanto dá uma explicação

X

05

A professora proporciona oportunidade para que a aluna surda fale sempre

em aula X

06 A professora verifica antes

da aula se o aluno está utilizando a prótese auditiva

X

07

O professor verifica se a aluna surda compreendeu cada explicação ou tarefa

ministrada em aula fazendo perguntas ao final das

mesmas

X

onde exerceu o cargo até 1990. Os questionários de avaliação de alunos e professores descritos no seu livro tornaram-se um padrão de consulta e aplicação no INES e a partir da leitura dos mesmos, extraí e adaptei as questões propostas para efetuar minha pesquisa .

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ANEXO VII 153

Avaliação da Aluna e da Professora

Observação : Este questionário foi adaptado por mim a partir de um trabalho desenvolvido em 1958 pelo fonoaudiólogo francês Guy Perdoncini, denominado “ L’audition est lávenir de lénfant sourd”. O trabalho e o método de Guy Perdoncini para a educação de crianças surdas foi traduzido e descrito no livro “Audição É O Futuro da Criança Surda” (AIPEDA,RJ,1996), elaborado por Álpia Couto-Lenzi, que foi aluna de Perdoncini e mais tarde em 1982, nomeada diretora do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES),

NOME DO ESTABELECIMENTO : MENINO JESUS DATA DA AVALIAÇÃO : 05/04 /2005 PROFESSORA : CRISTINA

Satisfatório Moderado Insuficiente Nula Negativa (prejudicada) No. Indicador de Integração

3 2 1 0 -1

08

A professora tem o hábito de sublinhar os pontos

importantes durante uma aula ou trabalho

X

09 A professora estimula os alunos normais a falarem

com a aluna surda X

10

A professora corrige com freqüência a pronúncia

errada da aluna, interrompendo a tarefa ou explicação para fazer isso

X

11

A professora trata a aluna surda sem distinção em

relação aos outros colegas normais

X

onde exerceu o cargo até 1990. Os questionários de avaliação de alunos e professores descritos no seu livro tornaram-se um padrão de consulta e aplicação no INES e a partir da leitura dos mesmos, extraí e adaptei as questões propostas para efetuar minha pesquisa .

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ANEXO VII 154

Avaliação da Aluna e da Professora

Observação : Este questionário foi adaptado por mim a partir de um trabalho desenvolvido em 1958 pelo fonoaudiólogo francês Guy Perdoncini, denominado “ L’audition est lávenir de lénfant sourd”. O trabalho e o método de Guy Perdoncini para a educação de crianças surdas foi traduzido e descrito no livro “Audição É O Futuro da Criança Surda” (AIPEDA,RJ,1996), elaborado por Álpia Couto-Lenzi, que foi aluna de Perdoncini e mais tarde em 1982, nomeada diretora do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES),

NOME DO ESTABELECIMENTO : MENINO JESUS NOME DO PROFESSOR : CRISTINA DATA : 05 /04/2005 1) O que significa ser surda para mim ? Significa não ter percepção auditiva e ter dificuldade de comunicação oral em língua portuguesa se não recebeu treinamento adequado para isso. 2) Considero minha aluna uma deficiente ? Se sim, justifique.

Não, em hipótese alguma. Lia é uma criança normal, esperta, curiosa e inteligente, capaz de aprender como as outras, desde que tenha apoio e se trabalhe com ela respeitando suas especificidade de comunicação . 3) O que penso quando minha aluna fracassa na escola ? Penso ser isso

normal considerando “suas” limitações ?

Não, se ela não aprendeu é porque precisamos implantar uma nova estratégia de ensino ou descobrir onde está o problema: se na forma de apresentação ou se ela deixou de perceber alguma informação.

4) O que eu entendo e conheço da comunidade surda ?

Considero uma comunidade surda como um grupo de indivíduos que Tem em comum o fato de serem surdos e se comunicarem pela Língua de Sinais. Mas fora do INES, que freqüento por causa do meu curso de LIBRAS, não conheço nenhuma comunidade surda.

5) Quantas pessoas surdas eu conheço ?

Antes de Lia, eu nunca tinha trabalhado com alunos surdos. Agora, depois que ela foi para a minha classe e fiz cursos de aperfeiçoamento no INES , em

onde exerceu o cargo até 1990. Os questionários de avaliação de alunos e professores descritos no seu livro tornaram-se um padrão de consulta e aplicação no INES e a partir da leitura dos mesmos, extraí e adaptei as questões propostas para efetuar minha pesquisa .

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ANEXO VII 155

Avaliação da Aluna e da Professora

Observação : Este questionário foi adaptado por mim a partir de um trabalho desenvolvido em 1958 pelo fonoaudiólogo francês Guy Perdoncini, denominado “ L’audition est lávenir de lénfant sourd”. O trabalho e o método de Guy Perdoncini para a educação de crianças surdas foi traduzido e descrito no livro “Audição É O Futuro da Criança Surda” (AIPEDA,RJ,1996), elaborado por Álpia Couto-Lenzi, que foi aluna de Perdoncini e mais tarde em 1982, nomeada diretora do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES),

Deficiência Auditiva, já conheço muitas pessoas surdas, pois passei a freqüentar regularmente o INES e já converso com muitos alunos e funcionários da instituição em LIBRAS.

6) Sou capaz de compreender a LIBRAS ? Se sim, onde aprendi.

Sim, comecei a aprender há três meses atrás, no INES . Assim que soube pela Diretora que Lia iria para a minha classe, procurei o INES e me matriculei numa turma do Nível I.

7) Aceito a língua portuguesa como segunda língua para minha aluna surda ? Justifique.

Sim. Ela ainda é muito nova, mas precisa ter uma língua que permita transmitir com facilidade suas idéias e desejos que é a LIBRAS, sua língua natural.. Mais tarde, a escola já terá recebido suporte suficiente e os seus futuros professores já estarão treinados para a apresentarem convenientemente à língua portuguesa. 8) Estou habilitado (a) a ensinar a língua portuguesa como uma segunda

língua para meu aluno ? Não, estou me familiarizando agora com o processo com o apoio do INES. 9) Acredito que minha aluna surda é normal dentro da comunidade surda ?

Justifique.

Sim, pois dentro da comunidade surda ele se comunica na língua materna deles, que é a LIBRAS.

10) Quais as perspectivas que eu tenho sobre o futuro da minha aluna surda ?

AAcredito nas possibilidades da minha aluna. Ela tem todas as condições de se desenvolver normalmente como meus outros alunos, desde que encontre professores preparados , suporte de professores especializados e o apoio familiar excelente que ela já tem.

onde exerceu o cargo até 1990. Os questionários de avaliação de alunos e professores descritos no seu livro tornaram-se um padrão de consulta e aplicação no INES e a partir da leitura dos mesmos, extraí e adaptei as questões propostas para efetuar minha pesquisa .

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ANEXO VIII

Roteiro Para Diário de Campo 1. Como é o ambiente físico onde a aluna surda se encontra na sala de aula?

2. Como é a relação da professora para com a aluna surda em termos de comunicação,

afetividade, aceitação?

3. Ao fazer as explicações dos conteúdos, como age a professora em relação a aluna surda ?

4. Essa explicação acontece via oralidade ou por meio da LIBRAS?

5. Será que a aluna surda está entendo a explicação dada pelo professor em relação aos

conteúdos abordados?

6. A professora percebe quando a aluna surdo está apreendendo o conteúdo de forma

significativa?

7. Ele realiza prontamente as atividades ou limita-se a esperar pela ajuda dos colegas e

professores para a realização das atividades?

8. Nas atividades de Língua Portuguesa, há comunicação entre a aluna e a professora e de

que forma isso acontece?

9. A aluna demonstra à professor que não entende a mensagem quanto à realização das

atividades? E, como o faz?

10. Como é a forma de comunicação utilizada pela aluna surda?

11. Como é a forma de comunicação utilizada pela professora e pelos colegas para se

comunicar com a aluna surda?

12. Como é a relação dos colegas e a aluna surda?

13. Como o professor avalia as atividades desenvolvidas pela aluna surda?

14. Como a surdez é vista dentro do contexto da escola?

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ANEXO IX Questionário Para As Professoras

DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

1 .Idade:

2. Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino

3. Estado Civil: ( ) Solteiro () Casado ( ) Outros

4. Filhos: ( ) Sim ( ) Não

5. Grau de Instrução:

( ) 2° Grau completo ( ) 3° Grau incompleto ( ) 3° Grau completo

em anos6. Tempo de Serviço no Magistério:

7. Qual sua função na escola?

( ) Prof. (a ) Coordenador( a) ( ) Asssitente Pedagógica ( ) Diretor(a) ( ) Pedagoga

8. Nível em que atua hoje: ( ) Maternal ( ) Pré-Alfabetização ( ) Alfabetização ( ) Ensino Fundamental () 1a Série ( ) 2 a Série ( ) 3 a Série

9. Já teve algum contato com pessoas portadoras de deficiências: ( ) Sim ( ) Não

QUESTÕES DIVERSAS 1. A sua escola possui classe especial? ( ) Sim ( ) Não

2. A sua escola possui alunos surdos? ( ) Sim ( ) Não

3. Você está familiarizado (a) com a idéia da inclusão? ( ) Sim ( ) Não

4. Como você conceitua a inclusão ?

( ) Não 5. A filosofia da sua escola incorpora a idéia da inclusão? ( ) Sim

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6. Sua escola recebe incentivos para implantação de programas inclusivos? ( )Sim ( ) Não 7. Os Professores de sua escola têm feito cursos para melhor implantarem a inclusão nas suas salas de aula? ( )Sim ( ) Não 8. Quantifique estes alunos: ( ) Deficiência Mental ( ) Deficiência Auditiva ( ) Condutas Típicas () Altas habilidades ( ) Deficiência Visual ( ) Deficiência Física 9. Como estão inseridos os portadores de necessidades espeéiais em sua escola? ( ) Todos em uma mesma sala ( ) Em salas diversas ( ) Outros O. Os alunos especiais são: ( ) Aceitos plenamente ( ) Aceitos com restrições ( ) Não aceitos 10. Os alunos especiais são : ( ) Aceitos plenamente ( ) Aceitos com Restrições ( ) Não Aceitos 11. Que tipo de professor aceita esse aluno? ( ) O que está mais familiarizado com o problema dos deficientes ( ) Qualquer Prof.r que esteja no quadro do primeiro grau ( ) Outros 12. Qual o rendimento escolar desse aluno? ( ) Bom ( ) Regular ( ) Fraco 13. Quais as causas desse rendimento? 14. Que tipo de deficiência é melhor aceita na sala de aula? ( ) Deficiência Mental ( ) Deficiência Auditiva ( ) Condutas Típicas () Altas habilidades ( ) Deficiência Visual ( ) Deficiência Física 15. Que tipo de deficiência é menos aceita na sala de aula? ( ) Deficiência Mental ( ) Deficiência Auditiva ( ) Condutas Típicas () Altas habilidades ( ) Deficiência Visual ( ) Deficiência Física

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16. Como é o comportamento dos alunos em relação ao deficiente na escola? ( ) Ajuda ( ) Indiferença ( ) Hostilidade 17. Que tipo de metodologia você utilizaria em sala de aula para com seus alunos surdos ( ) Oralização ( ) Comunicação Total (todas as formas possíveis para se fazer compreender) ( ) Bilingüismo (LIBRAS + Oralização) ( ) Não sei QUESTÕES ESPECÍFICAS Assinale apenas uma das cinco alternativas presentes em cada uma das afirmativas abaixo relacionadas, escolhendo a que mais se aproxima de sua maneira de pensar. Neste questionário não há respostas certas ou erradas, em virtude de ser apenas um levantamento de opiniões. 01. O aluno com necessidades especiais, estando inserido na escola regular, se sentirá discriminado mesmo que todas as idéias da Educação Inclusiva sejam implementadas de forma efetiva no Brasil. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 02. No processo inclusivo nas escolas da região pesquisada, as pessoas deficientes auditivas devem ter as mesmas oportunidades de Educação que aquelas ditas normais. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 03. A inclusão visa ao não isolacionismo dos alunos surdos que só se integram com seus pares. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente

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04. Para muitos, a Educação Inclusiva caracteriza-se por "descarregar" estudantes portadores de deficiência auditiva em sala de aula comum. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 05. Os alunos surdos são mais teimosos e difíceis de lidar que os alunos não deficientes, mesmo na escola inclusiva. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 06 .No processo inclusivo nas escolas da região pesquisada, o aluno surdo, por não compreender o seu Prof.r e colegas, é menos perceptivo em sala de aula. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 07 Os pais dos alunos ditos normais incentivariam o processo de inclusão, permitindo uma real implantação do mesmo. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 08. O sujeito com deficiência auditiva, quando diagnosticado e encaminhado para um atendimento especializado precocemente e incluído na Rede Pública Regular de Ensino, não apresenta nenhuma diferença em relação aos seus colegas de classe. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente

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161 09. Cabe a família e especialistas atender a criança de alto risco de surdez para que esta não apresente desempenho escolar diferenciado quando integrada na classe regular do processo inclusivo nas escolas pesquisadas. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 10. Mesmo com a implantação da Educação Inclusiva nas escolas brasileiras, a sociedade continuaria a estigmatizar o aluno portador de deficiência auditiva como ineficiente. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 11. O processo inclusivo nas escolas pesquisadas requer um perfeito nível de cooperação e colaboração entre educadores do sistema regular e especial. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 12. A Educação Inclusiva irá exigir mudanças nas atividades da instituição escolar, o que desestruturará a organização da escola. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 13. O Prof. da Rede Regular de Ensino na prática inclusiva se vê prejudicado no tempo de execução de seu plano de trabalho. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente

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14. O Prof. da escola regular não está preparado para trabalhar com a pessoa portadora de deficiência auditiva, mesmo no processo inclusivo nas escolas da região pesquisada. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 15. A Educação Inclusiva estabelece a equiparação de oportunidades para todos os alunos que compõem o quadro educacional brasileiro, dando a eles iguais oportunidades para seu futuro profissional. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 16. Uma classe com aluno portador de deficiência auditiva seria conduzida, pelo Prof., em ritmo mais lento, o que comprometeria o progresso dos demais alunos. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 17. Mesmo na escola inclusiva, quanto mais adiantado o grau do aluno surdo na classe regular, mais diferenciada é a sua aprendizagem em relação a seus colegas de classe. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 18. O processo inclusivo nas escolas pesquisadas permite a detecção mais rápida dos problemas de aprendizagem. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente

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163 19. O trabalho com pessoa portadora de deficiência auditiva deve ser especializado, demandando uma metodologia específica que, de forma eficiente, seria difícil nas classes regulares, mesmo no processo inclusivo nas escolas pesquisadas. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 20. No processo inclusivo nas escolas da região pesquisada, os alunos surdos estudam pela metodologia da oralização pura e simples, não compreendendo a aula ministrada pelo Prof.r da Escola Regular de Ensino. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 21. Na inclusão de surdos na Escola Regular de Ensino, o Bilingüismo é uma metodologia muito difícil de ser empregada nas salas de aula. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente 22. A metodologia da Comunicação Total é difícil de ser empregada por Prof.res e de ser compreendida pelos alunos surdos, mesmo na escola inclusiva. ( ) Discordo totalmente ( ) Discordo ( ) Não tenho opinião ( ) Concordo ( ) Concordo totalmente

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