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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FFCLRP - DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENTOMOLOGIA Contribuição à taxonomia e ecologia dos Drosophilidae (Diptera) micófagos neotropicais Luís Eduardo Maestrelli Bizzo Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da USP, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ciências, Área: Entomologia RIBEIRÃO PRETO -SP 2008

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  • UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

    FFCLRP - DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA

    PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENTOMOLOGIA

    Contribuição à taxonomia e ecologia dos Drosophilidae (Diptera)

    micófagos neotropicais

    Luís Eduardo Maestrelli Bizzo

    Dissertação apresentada à Faculdade

    de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da

    USP, como parte das exigências para a obtenção do

    título de Mestre em Ciências, Área: Entomologia

    RIBEIRÃO PRETO -SP

    2008

  • UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

    FFCLRP - DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA

    PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENTOMOLOGIA

    Contribuição à taxonomia e ecologia dos Drosophilidae (Diptera)

    micófagos neotropicais

    Luís Eduardo Maestrelli Bizzo

    Orientador: Prof. Dr. Fábio de Melo Sene

    Dissertação apresentada à Faculdade

    de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da

    USP, como parte das exigências para a obtenção do

    título de Mestre em Ciências, Área: Entomologia

    RIBEIRÃO PRETO –SP

    2008

  • AGRADECIMENTOS

    Ao prof. Dr. Fábio de Melo Sene, pela orientação, incentivo e amizade durante

    todo o desenvolvimento deste trabalho;

    À Prof. Dr. Maura Helena Manfrin, pelo apoio e disponibilidade;

    À prof. Dr. Francisca do Val, pelo incentivo inicial, auxílio na taxonomia de

    Drosophilidae, leitura deste trabalho e amizade;

    Ao prof. Dr. Carlos Lamas, do Museu de Zoologia de São Paulo, pela

    oportunidade e pelo empréstimo de material zoológico;

    Ao amigo Marco Silva Gottschalk, pelo empréstimo de material, leitura deste

    trabalho e especialmente pelas discussões intermináveis sobre taxonomia e

    ecologia de drosofilídeos;

    À prof. Dr. Rosana Tidon, pela oportunidade de estágio em seu laboratorio;

    Aos colegas do laboratorio de Genética Evolutiva, por terem me acolhido com

    grande simpatia, em especial aos amigos Camila, Carlos, Érica, Fernando,

    Matheus e Paulo;

    À minha querida noiva, Jana, pelo carinho, amor e companheirismo

    incondicionais nesta nossa caminhada;

    Aos meus amigos de Floripa, São Paulo e Ribeirão, em especial à Milene e ao

    Luiz Carlos, grandes amigos de passeios, viagens e finais de semana e

    essenciais no nosso estabelecimento nesta nova cidade;

    À minha familia, em especial meus pais, Nelio e Sylvia, e irmãos, Lia e Enzo,

    pelo carinho e apoio;

    i

  • À Renata Andrade Cavallari, secretária do curso de Pós-Graduação em

    Entomologia, pela dedicação ao curso e aos seus alunos;

    À coordenação do curso de Pós-Graduação em Entomologia, pelo auxílio em

    coletas e materiais necessários;

    Ao CNPq, pela bolsa de mestrado do Programa Taxonomia;

    À USP, CNPq, FAPESP e CAPES, cujas verbas mantêm o Laboratorio de

    Genética Evolutiva.

    ii

  • RESUMO

    A família Drosophilidae (Insecta, Diptera) possui distribuição mundial e

    ecologia bastante diversa. O hábito de se alimentar de fungos durante os

    estágios larvais e/ou adulto é encontrado em alguns gêneros desta família. Na

    região Neotropical, o grupo de gêneros Zygothrica inclui os principais

    representantes desta categoria, Hirtodrosophila, Mycodrosophila, e Zygothrica.

    Neste trabalho, Mycodrosophila projectans (Sturtevant 1916) e M. elegans

    Wheeler e Takada 1963 foram redescritas; duas espécies novas de Zygothrica

    foram descritas; a diagnose de Mycodrosophila foi revista e ampliada com as

    espécies americanas tendo sido classificadas quanto ao subgênero. Novos

    dados sobre a ecologia e distribuição de Hirtodrosophila gilva Burla 1956 e H.

    thoracis (Williston 1896) foram adicionados, além de registros de utilização de

    fungos como recurso alimentar por drosofilídeos da radiação tripunctata de

    Drosophila e por Zaprionus indianus Gupta 1970.

    iii

  • ABSTRACT

    The family Drosophilidae (Insecta, Diptera) has worldwide distribution

    and diverse ecology. The habit of feeding on fungi at larval and/or adult stages

    is found in some genus within this family. At the Neotropical region, the

    Zygothrica genus group includes the main representatives of this caterogy,

    Hirtodrosophila, Mycodrosophila, and Zygothrica. In this work Mycodrosophila

    projectans (Sturtevant 1916) and M. elegans Wheeler & Takada 1963 were

    redescribed; two new species of Zygothrica were described; the diagnosis of

    Mycodrosophila is revised and enlarged with the classification of the American

    species into subgenus. New data on the ecology and distribution of

    Hirtodrosophila gilva Burla 1956 and H. thoracis (Williston 1896) were added,

    together with registers of fungi hosts by species of the Drosophila tripunctata

    radiation and by Zaprionus indianus Gupta 1970.

    iv

  • SUMÁRIO

    1- Introdução 11.1- Drosofilídeos micófagos neotropicais 51.2- Ecologia dos drosofilídeos micófagos 8

    2- Objetivos 102.1- Objetivo geral 102.2- Objetivos específicos

    3- Material e Métodos 103.1- Coleta de adultos 103.2- Coleta e criação de imaturos 113.3- Montagem e descrição dos espécimens 113.4- Lista das abreviaturas e índices utilizados nas descrições 12

    4- Resultados e Discussão 154.1- Redescrição de Mycodrosophila projectans e M. elegans 154.2- Descrições de duas novas espécies de Zygothrica 284.3- Distinção entre Mycodrosophila e Zygothrica 364.4- Revisão das diagnoses de Mycodrosophila e proposta de nova diagnose 374.5- Enquadramento das espécies americanas de Mycodrosophila em subgéneros e implicações biogeográficas 434.6- Ampliação da distribuição geográfica e da ecologia de outros drosofilídeos 45

    5- Conclusões 47 6- Referências 49

    v

  • 1- INTRODUÇÃO

    A família Drosophilidae pertence à superfamília Ephydroidea, infraordem

    Acalyptratae. Estas moscas medem geralmente entre 1 e 6mm de

    comprimento, possuem olhos vermelhos e coloração variando entre amarelo,

    marrom e preto; são encontradas em praticamente todos os ambientes

    terrestres, com exceção dos pólos e de grandes altitudes (Wheeler, 1987). Esta

    família possui cerca de 4000 espécies descritas, distribuídas em 73 gêneros

    (Bächli, 2007), sendo Drosophila o mais estudado e mais rico em espécies.

    Mesmo assim, estima-se que cerca de metade das espécies brasileiras deste

    gênero ainda não tenham sido descritas (Medeiros e Klaczko, 2004) e as

    distribuições geográficas de várias espécies comuns ainda não estão bem

    estabelecidas (De Toni et al. 2005; Gottschalk et al., 2006; Roque et al., 2006;

    Döge et al., 2007, entre outros). Os outros gêneros carecem ainda mais de

    trabalhos básicos quanto à taxonomia e distribuição.

    O hábito alimentar dos drosofilídeos é bastante diverso: algumas

    espécies se alimentam e ovipositam em frutos (Freire-Maia e Pavan, 1949),

    cladódios de cactos (Carson, 1971; Pereira et al., 1983), exudatos de caule

    (Carson, 1971), fungos (Carson, 1971; Val et al. 1981; Grimaldi, 1987) ou flores

    (Pipkin, 1966; Brncic,1983). Nestes recursos, os drosofilídeos se alimentam dos

    microorganismos (levedos e bactérias) que ocorrem durante a fermentação

    (Carson, 1971). A fermentação, por sua vez, só ocorre nos locais com maior

    concentração de carboidratos, como a polpa de frutos e os corpos de

    frutificação dos fungos.

    Como a maioria das coletas realizadas pelos drosofilistas utiliza banana

    fermentada como atrativo, as espécies micófagas estão entre as menos

    1

  • conhecidas, pois são raramente capturadas com este tipo de isca. Duas

    maneiras são utilizadas para coletar quantidades significativas destes

    drosofilídeos: uma é procurar por corpos de frutificação, aspirar as moscas

    adultas que estiverem ao redor e recolher o substrato, levando-os ao

    laboratório para a criação das larvas até a emergência dos adultos; e outra é

    utilizar fungos comerciais como isca.

    Na família Drosophilidae, o hábito micófago ocorre em vários gêneros

    (Val et al., 1981) e existem indícios de que tenha surgido independentemente

    em várias linhagens (Throckmorton, 1975). Estudos conduzidos em países de

    clima temperado indicam que esta é uma das famílias de Diptera mais

    abundantes neste substrato (Lacy, 1984; Guevara e Dirzo, 1999; Yamasita e

    Hijii, 2003), podendo representar mais de 50% dos insetos encontrados em

    cada amostra (Toda et al., 1999).

    Courtney et al. (1990) classificam os drosofilídeos micófagos em três

    tipos: os obrigatórios, que se alimentam exclusivamente de fungos; os

    facultativos, que podem utilizar outros substratos; e os generalistas, que

    utilizam muitos tipos de substrato, incluindo os fungos. A polifagia (utilização de

    diversas espécies de fungos) é muito comum em todas as classes (Lacy, 1984;

    Hanski, 1989).

    Inicialmente, foram propostas duas hipóteses para explicar este padrão:

    uma qualitativa, pois a composição dos fungos é bastante uniforme, altamente

    energética e de fácil digestão pelos insetos (Hanski, 1989); e outra,

    quantitativa, porque a presença de corpos de frutificação é muito imprevisível, o

    que torna improvável a especialização (Jaenike, 1978; Kimura et al., 1978).

    2

  • Courtney et al. (1990) ainda sugerem que isso possa ser reflexo da interação

    entre os microorganismos com o próprio fungo.

    Outro fator importante é a diversidade de fungos utilizados por estas

    moscas, que é muito grande. Um dos trabalhos mais abrangentes é o de

    Courtney et al. (1990), que encontraram drosofilídeos em várias ordens da

    classe Agaricomycetes, filo Basidiomycota. A maioria das moscas é encontrada

    em corpos de frutificação carnosos, dos tipos cogumelo (com chapéu e estípite)

    ou gelatinoso; e outras em corpos de frutificação rígidos, como os fungos

    ressupinados (em forma de prateleira). Alguns exemplos são mostrados na

    figura 1.

    Existe, no entanto, certo grau de especificidade entre as moscas e os

    fungos, que pode ser observado em algumas espécies micófagas obrigatórias.

    Estudos indicam que espécies que possuem poucos hospedeiros são

    especializadas em fungos previsíveis, de longa duração. Estas moscas são

    sempre raras e costumam compartilhar o mesmo substrato com outras moscas,

    generalistas ou micófagas facultativas (Lacy, 1984). Este padrão contrasta com

    os modelos de competição entre insetos que utilizam os mesmos recursos, em

    que a espécie especialista é dominante no recurso. Por este motivo, os

    drosofilídeos micófagos são freqüentemente utilizados como organismos

    modelo em experimentos de coexistência entre espécies (Atkinson e

    Shorrocks, 1981, 1984; Shorrocks, 1991; Toda et al., 1999; Wertheim et al.,

    2000).

    Os drosofilídeos utilizam os fungos também para outros fins que não a

    alimentação. Espécies de Zygothrica, por exemplo, utilizam fungos

    ressupinados brancos como área para corte sexual e cópula (Grimaldi, 1987).

    3

  • Figura 1 – Corpos de frutificação carnosos e rígidos de fungos Agaricomycetes. A - Volvariella sp. (Pluteaceae, Agaricales); B - Stecchericium seriatum (Lloyd) Maas Geest. (Bondarzewiaceae, Russulales); C - Auricularia fuscosuccinea (Mont.) Henn. (Auriculariaceae, Auriculariales). Fonte: GUERRERO, R. T. e HOMRICH, M. H. 1999.

    Courtney et al. (1990) fizeram uma ampla revisão sobre a ecologia dos

    drosofilídeos micófagos e ressaltam um aspecto comum: a maior parte do

    conhecimento sobre estas moscas reside na biologia de poucas espécies, em

    sua maioria dos grupos de espécies tripunctata e quinaria de Drosophila, sendo

    o primeiro representado por uma única espécie, Drosophila tripunctata Loew

    1862. Do mesmo modo, todo o esforço amostral foi concentrado em países

    como Estados Unidos, Inglaterra e Japão, onde a fauna é menos diversa que

    nos trópicos.

    4

  • Nos Estados Unidos, onde foi realizada boa parte dos estudos,

    predominam as espécies generalistas ou micófagas facultativas. Na Austrália,

    por outro lado, onde a fauna micófaga é similar à Neotropical (composta por

    vários gêneros de drosofilídeos micófagos obrigatórios), Van Klinken e Walter

    (2001) realizaram uma ampla investigação sobre os substratos utilizados por

    estas moscas e cerca de 50% das espécies de drosofilídeos não apresentaram

    sobreposição de nicho, emergindo cada uma de apenas um único corpo de

    frutificação. Assim, o conhecimento da fauna Neotropical é essencial para a

    compreensão dos processos ecológicos aqui presentes e sua comparação com

    os padrões e processos ocorrentes em outras regiões.

    1.1- Drosofilídeos micófagos neotropicais

    Na região Neotropical os drosofilídeos micófagos são representados

    principalmente pelos gêneros Hirtodrosophila, Mycodrosophila e Zygothrica

    que, junto com Paramycodrosophila e Paraliodrosophila, formam o grupo de

    gêneros Zygothrica (Grimaldi, 1990a; Remsen e O’Grady, 2002), cuja filogenia

    é mostrada na figura 2. É possível que façam parte deste clado outros dois

    pequenos gêneros australianos, Poliocephala e Bialba (Bock, 1989).

    A primeira grande contribuição à taxonomia dos drosofilídeos micófagos

    neotropicais é de Burla (1956) que, coletando no Rio de Janeiro, descreveu

    espécies de Hirtodrosophila e Zygothrica. Décadas depois, Grimaldi (1987 e

    1990b) analisou as coleções de vários museus e fez coletas no Peru,

    concluindo uma ampla revisão de Zygothrica, o que aumentou ainda mais o

    número de espécies descritas. Com isto, Zygothrica é hoje o segundo gênero

    mais diverso na região Neotropical, perdendo apenas para Drosophila. Mesmo

    5

  • assim, Grimaldi (1987) estima que apenas metade das espécies de Zygothrica

    existentes foram descritas. Paramycodrosophila e Paraliodrosophila, por outro

    lado, são gêneros praticamente desconhecidos.

    Figura 2 - Filogenia do grupo de gêneros Zygothrica proposta por Grimaldi (1990a).

    O trabalho de Burla (1956) também foi muito importante na taxonomia de

    Hirtodrosophila. Este gênero foi tratado em vários trabalhos, como Sturtevant

    (1920), Frota-Pessoa (1945 e 1951), Cordeiro (1952), Malogolowkin (1952),

    Wheeler (1954), Brncic (1957) e Mourão et al. (1965 e 1967), que em geral

    descreveram ou revisaram o status de uma ou duas espécies, porém o primeiro

    trabalho mais aprofundado sobre o gênero foi de Burla (1956). Recentemente,

    Vilela e Bächli (1990, 2002, 2004 e 2005) revisaram e ilustraram sete espécies

    neotropicais e descreveram mais três, totalizando 29 conhecidas até o

    momento. Estes autores continuam trabalhando na taxonomia deste gênero.

    Mycodrosophila conta com poucas publicações tratando da fauna

    americana. As revisões de Sturtevant (1918) e Wheeler e Takada (1963)

    detalharam a morfologia da terminália masculina e asas das duas espécies

    6

  • conhecidas até então e descreveram mais sete, totalizando nove espécies.

    Destas, três estão presentes exclusivamente na região Neártica e, sete, na

    região Neotropical, sendo que apenas M. dimidiata (Loew) ocorre nas duas.

    Sturtevant (1942), Wheeler e Takada (1963), Bock (1980) e McEvey e

    Polak (2005) listaram todas as publicações sobre Mycodrosophila, que hoje

    compreende 127 espécies descritas em todo o mundo. A maioria destas está

    presente nas regiões Oriental e Australásia (McEvey e Polak, 2005); a fauna

    americana descrita, portanto, corresponde a apenas 7% do total conhecido.

    Wheeler e Takada (1963) registraram três espécies de Mycodrosophila

    no Brasil: M. projectans (Sturtevant 1916), em localidade não especificada

    pelos autores; M. elegans Wheeler e Takada 1963, com um espécime

    capturado em Castanhal (PA); e M. brunnescens Wheeler e Takada 1963,

    conhecida apenas por duas fêmeas coletadas em Belém (PA).

    Desde então, nenhum estudo taxonômico abordou as Mycodrosophila

    americanas. A única contribuição é a de Lacy (1983) que, através de análises

    eletroforéticas, sugere a existência de uma décima espécie, críptica à neártica

    M. claytonae Wheeler e Takada 1963.

    Em outros continentes, no entanto, a taxonomia destas moscas foi mais

    bem estudada. Mesmo assim, o gênero ainda carece de estudos filogenéticos.

    Wheeler e Takada (1964), em revisão das Mycodrosophila da Micronésia,

    sugeriram a distinção entre dois táxons neste gênero, o que só foi formalizado

    duas décadas depois por Okada (1986a, b), que definiu os subgêneros

    Mycodrosophila e Promycodrosophila por meio de uma análise fenética. Como

    as espécies americanas foram descritas antes desta formalização, nenhuma

    delas foi relacionada a um dos subgêneros. Assim, o reconhecimento da fauna

    7

  • presente nas Américas se torna imprescindível para a elaboração de futuras

    hipóteses biogeográficas.

    1.2 - Ecologia dos drosofilídeos micófagos

    Ainda não existe algum trabalho amplo e sistemático sobre os substratos

    de oviposição utilizados pelos drosofilídeos do grupo de gêneros Zygothrica. O

    conhecimento atual baseia-se em observações escassas e fragmentadas, que

    indicam que Mycodrosophila, Hirtodrosophila e Paramycodrosophila são

    micófagos obrigatórios, enquanto Zygothrica utiliza principalmente flores

    (Pipkin, 1966, Grimaldi, 1987, Weiss, 1996).

    Uma dificuldade constante é a identificação dos fungos que geralmente

    ocorre apenas no nível de ordem ou família e impede maiores inferências

    ecológicas. Grimaldi (1987) ressalta que a maioria dos registros de substratos

    se resume a etiquetas em espécimes montados onde se pode ler algo como

    “reared from fungus” ou “Ex. fungus”.

    As melhores informações sobre os substratos utilizados como sítios de

    alimentação e oviposição dos drosofilídeos micófagos Neotropicais são de

    Grimaldi (1987), referentes apenas ao gênero Zygothrica, que identificou

    algumas espécies de fungos, mais comuns e de fácil identificação. São elas:

    Polyporus tricholoma Mont. (Polyporaceae: Polyporales), Favolus brasiliensis

    (agora Favolus tenuiculus P. Beauv.) (Polyporaceae), Pleurotus sp.

    (Polyporaceae) e Auricularia delicata (Fr.) Henn (Auriculariaceae:

    Auriculariales).

    Na Austrália, a fauna micófaga também é diversa e composta por vários

    gêneros de drosofilídeos. Van Klinken e Walter (2001) realizaram uma ampla

    8

  • investigação sobre os substratos utilizados por estas moscas e cerca de 50%

    das espécies de drosofilídeos não apresentaram sobreposição de nicho,

    emergindo cada uma de apenas um único corpo de frutificação. Isto indica que

    na região Neotropical provavelmente são conhecidos apenas os substratos

    mais comuns, os quais atraem moscas generalistas. Estudos futuros sobre os

    recursos alimentares utilizados por estas moscas, realizados em colaboração

    com micólogos, certamente contribuirão para o entendimento de seus nichos

    ecológicos e de suas interações com outras espécies.

    No Brasil, o número de trabalhos ecológicos com comunidades de

    drosofilídeos tem aumentado nos últimos anos. Um dos principais focos destes

    trabalhos tem sido o monitoramento da composição e estrutura das

    comunidades ao longo dos anos e em diferentes ambientes. As diferenças

    encontradas sugerem que alguns fatores ambientais podem ser relevantes na

    estrutura da comunidade (Tidon, 2006). Neste contexto, o estudo dos

    substratos utilizados por estas moscas toma importância crescente.

    O estudo dos drosofilídeos micófagos podem trazer informações valiosas

    para esta área, pois os fungos, em especial os com frutificações carnosas, são

    recursos fortemente sazonais e efêmeros e sua presença depende muito do

    substrato e das condições atmosféricas, em especial das chuvas e da

    temperatura (Yamashita e Hijii, 2004).

    Atualmente, a taxonomia dos drosofilídeos micófagos americanos

    encontra-se em desenvolvimento e existem poucas informações ecológicas,

    sistemáticas e de distribuição geográfica destas moscas. O presente estudo

    tem como objetivo suprir parcialmente algumas destas lacunas.

    9

  • 2- OBJETIVOS

    2.1- Objetivo geral:

    • Contribuir para o conhecimento taxonômico e sistemático da família

    Drosophilidae, coletando e descrevendo drosofilídeos que utilizam

    fungos como substrato de alimentação e/ou oviposição.

    2.2- Objetivos específicos:

    • Determinar os drosofilídeos até o nível específico, descrever as espécies

    novas encontradas e, se necessário, fazer redescrições das já

    conhecidas;

    • Aumentar o conhecimento da distribuição geográfica destes

    drosofilídeos;

    • Aumentar o conhecimento dos táxons de fungos utilizados pelos

    drosofilídeos;

    3- MATERIAL E MÉTODOS

    3.1- Coleta dos adultos:

    As coletas foram realizadas sempre pelo começo da manhã ou ao final

    da tarde, horários em que a atividade dos drosofilídeos é notadamente maior

    (Pavan et al., 1950). Os adultos que estavam sobre os fungos foram

    capturados por meio de aspirador bucal ou rede entomológica e preservados

    vivos, em um recipiente com meio de cultura, ou mortos, em álcool etílico 70%.

    Os espécimes levados vivos ao laboratório foram mortos em uma câmara de

    gás carbônico e espetados em alfinete entomológico através de dupla

    montagem. Os espécimes preservados em álcool 70% foram desidratados por

    10

  • meio de banhos de duas horas cada em: álcool etílico absoluto, álcool butílico

    absoluto e hexano, respectivamente, para posterior dupla montagem.

    3.2- Coleta e criação dos imaturos:

    Após a captura dos adultos, os corpos de frutificação foram coletados,

    armazenados em sacos de papel, enrolados em jornal e acondicionados em

    caixas de isopor com uma pequena bolsa térmica congelada. Este

    procedimento tem se mostrado eficiente para manter uma temperatura amena,

    diminuindo o estresse e a movimentação das larvas sem criar um ambiente

    encharcado onde elas poderiam morrer afogadas (Heed, 1968).

    No laboratório, os corpos de frutificação e quaisquer larvas que estavam

    rastejando pelo saco de papel foram transferidos para um recipiente plástico

    contendo areia previamente esterilizada, sendo fechado com uma rede fina

    (tecido voal). Os drosofilídeos que emergiram foram capturados e analisados.

    Todo o material zoológico deste estudo será depositado na coleção do Museu

    de Zoologia da Universidade de São Paulo.

    3.3- Montagem e descrição dos espécimes:

    A dupla montagem dos drosofilídeos seguiu procedimento padrão

    conforme descrito em Ashburner (1989). As terminálias masculina e feminina

    foram preparadas conforme a técnica proposta por Wheeler e Kambysellis

    (1966), modificada por Kaneshiro (1969), e as ilustrações foram elaboradas

    com o auxílio de microscópio óptico com câmara clara acoplada; primeiramente

    em grafite, depois redesenhadas em nanquim e digitalizadas.

    11

  • Depois de analisada, cada terminália foi preservada em um pequeno

    tubo com glicerina, sendo anexado ao alfinete do respectivo espécime. As

    descrições seguiram, de modo geral, as medições, índices e terminologias de

    Grimaldi (1987) e Vilela e Bächli (1990), com algumas modificações sugeridas

    por McEvey (1990) e Vilela e Bächli (2000). A medida da largura da fronte foi

    realizada na altura do primeiro ocelo, conforme McEvey & Polak (2005).

    Nas descrições, são apresentadas a média do comprimento de cada

    estrutura ou índice calculado, seguidos das medidas extremas, apresentadas

    entre parênteses. Em alguns momentos, a falta de termos e siglas em

    português referentes à morfologia destes insetos pode dificultar o entendimento

    do texto. Visando maior clareza, alguns termos em inglês serão mantidos e

    explicitados em itálico.

    As medições foram realizadas com auxílio de microscópio

    estereoscópico Zeiss Stemi 2000-C com câmera fotográfica digital Zeiss

    AxioCam MRc acoplada, através do programa Zeiss AxioVision 4.3.

    O conceito utilizado na delimitação das espécies foi o de morfoespécie,

    tomando como referência o fato de que diferenças consistentes em

    características morfológicas sugerem a existência de unidades evolutivas

    independentes.

    3.4- Lista das abreviaturas e índices utilizados nas descrições

    Cabeça

    • Índice frontal (frontal index): comprimento / largura da fronte;

    • poc (post ocellar seta): cerda pós-ocelar;

    12

  • • oc (ocellar seta):cerda ocelar;

    • or1: cerda orbital proclinada anterior;

    • or2: cerda orbital reclinada anterior;

    • or3: cerda orbital reclinada posterior;

    • Índice orbital (orbito index): distância entre as bases das cerdas orbital

    proclinada anterior (or1) e orbital reclinada posterior (or3) / distância entre

    as bases das cerdas orbital reclinada posterior (or3) e vertical interna.

    • Índice vt (vt index): comprimento da cerda vertical interna / externa;

    • Índice da gena (cheek index): largura da gena / largura do olho;

    • Índice do olho (eye index): comprimento do olho / largura.

    Tórax

    • Índice H (H index): comprimento da cerda pós-pronotal superior / inferior;

    • Índice dc (dc index): comprimento das cerdas dorsocentrais anteriores /

    posteriores;

    • Índice da posição escutelar (scut position index): distância entre as cerdas

    escutelares anteriores e posteriores / distância entre as posteriores;

    • Índice escutelar (scut index): comprimento das cerdas escutelares

    anteriores / posteriores;

    • Índice esternal (sterno index): comprimento da cerda katepisternal anterior /

    posterior;

    Abdômen

    • T: tergito.

    13

  • Asa

    As medidas utilizadas são ilustradas na figura 3.

    Figura 3 – Representação de uma asa de drosofilídeo, evidenciando suas veias e principais regiões utilizadas na taxonomia do grupo (em números romanos). Fonte: Bächli et al. 2004.

    • Comprimento: H até a ponta da asa

    • Índice costal: C-II / C-III;

    • Índice AC: C-III / C-IV;

    • Índice hb (hb index ou C3-Fringe): seção de C-III com cerdas marginais

    grossas / total de C-III;

    • Índice 4C: C-III/M-III;

    • Índice 4v: M-IV/M-III;

    • Índice 5x: seção apical de CuA / dM-Cu;

    • Índice M: seção apical de CuA / M-III;

    • prox.x: seção basal de R4+5 / M-III;

    14

  • 4- RESULTADOS E DISCUSSÃO

    Um total de 27 espécimes foi tomado por empréstimo da coleção do

    Museu de Zoologia de São Paulo e mais uma centena foram coletadas em

    Ribeirão Preto, Bertioga (SP) e Florianópolis (SC). Outros drosofilídeos foram

    tomados por empréstimo da coleção pessoal do doutorando Marco Silva

    Gottschalk, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, os quais também

    foram coletados em Florianópolis.

    Duas espécies de Mycodrosophila foram encontradas, M. projectans e

    M. elegans, e são aqui redescritas e suas terminálias reilustradas; algumas

    variações da morfologia externa e da terminália masculina são discutidas.

    Como os exemplares aqui estudados não fazem parte da série-tipo destas

    espécies, a publicação de Wheeler e Takada (1963) deve continuar como

    referência primária para a identificação.

    Dos 27 indivíduos provenientes do MZSP, identificados como

    Mycodrosophila, 9 pertencem, na verdade, ao gênero Zygothrica. Dentre estes,

    foram identificadas duas novas espécies, que são descritas a seguir. O

    enquadramento ao subgênero das espécies americanas de Mycodrosophila é

    avaliado e novos dados sobre a distribuição geográfica e a ecologia de outros

    drosofilídeos micófagos são acrescentados.

    4.1- Redescrição de Mycodrosophila projectans e M. elegans

    Mycodrosophila projectans Sturtevant

    DESCRIÇÃO ORIGINAL: Sturtevant (1916:342).

    MATERIAL EXAMINADO: 4 ♂♂ e 2 ♀♀. ♂♂ com as etiquetas “Luziânia, Goiás;

    16.vi.79 K. Kaneshiro & F. C. Val”; 1♀ “Luziânia Mata 16.vi.79 Kaneshiro & F.

    15

  • C. Val”; 1♀ “Casa Grande Salesópolis 29.iv.79 Pinus K. Kaneshiro” e “reared

    ex. gilled fungus #2”

    Figuras: 4 a 8

    Diagnose: fronte com brilho prata; abdômen variando de marrom a preto, T1

    apenas anteriormente amarelado, T4 com duas áreas brancas anteriores,

    sublaterais e às vezes confluentes, formando uma faixa branca. Asa com

    mancha transversal na base, lapela costal presente, veia R2+3 distalmente

    pouco curvada em direção a R1, índice C aproximadamente 1,0, índice 4v

    aproximadamente 2,2, índice 4c aproximadamente 1,9. Edeago característico.

    Descrição: 4 ♂♂. Comprimento 2,13mm (1,96-2,31).

    CABEÇA: cor geral marrom-escura; comprimento 0,39mm (0,32-0,46). Vertex

    marrom; fronte marrom-escura, com brilho prata; comprimento da fronte

    0,26mm (0,25-0,29); índice frontal 0,91 (0,81-0,97); relação entre largura do

    topo e da base da fronte 1,24 (1,17-1,27). Triângulo ocelar marrom, 29% (24%-

    34%) do comprimento frontal. Triângulo frontal marrom-escuro. Placa fronto-

    orbital marrom-escura, 68% (58%-80%) do comprimento frontal. or1

    convergente; or2 situada perto e atrás de or1, índice orbital 0,62 (0,54-0,78);

    or1/or3 1,00 (0,94-1,06); or2/or1 0,20 (0,14-0,27); poc 49% (48%-50%) e oc

    60% (55%-68%) do comprimento frontal; índice vt 0,99 (0,05-1,06). Vibrissa

    não cruzada, subvibrissa indistinta; gena marrom, pós-gena branca; índice da

    gena 8,94 (6,33-10,75); índice do olho 0,98 (0,79-1,08); cerdas intrafacetais

    curtas, indistintas. Pedicelo marrom-amarelado; primeiro flagelômero marrom-

    amarelado, com cerdas longas e amarelas; relação entre comprimento e

    largura 1,87 (1,70-2,00). Arista com quatro ramos superiores e um inferior, mais

    a furca apical. Face marrom-amarelada, com pilosidade na margem do clípeo;

    16

  • carina facial incompleta, bulbosa e marrom-amarelada; probóscide amarela;

    palpos marrom-amarelados. Clípeo marrom, com pilosidade.

    TÓRAX: cor geral marrom-escura, brilhante; comprimento 0,77mm (0,73-0,80).

    Póspronoto marrom-claro; índice H 1,04 (0,80-1,22). Escuto brilhante, marrom-

    escuro, com pequenas áreas pilosas ao redor das cerdas dorsocentrais

    posteriores; oito fileiras de cerdas acrosticais. Cerdas dorsocentrais anteriores

    ausentes. Escutelo fosco, marrom-escuro, com pilosidade. Cerdas escutelares

    anteriores convergentes, posteriores não cruzadas. Índice da posição escutelar

    2,50 (2,25-2,83); índice escutelar 0,40 (0,36-0,46). Parte medial do haltere

    branca, parte distal marrom-escuro. Pleura variando de marrom-claro a branca;

    índice esternal 0,52 (0,44-0,60). Pernas amarelas; par medial com uma cerda

    pré-apical.

    ASA: esfumaçada; comprimento 1,78mm (1,70-1,85); ápice arredondado. R4+5 e

    M paralelas. Área esfumaçada transversa entre a lapela costal proeminente e a

    célula anal. Índice C 0,87 (0,81-0,96); índice AC 4,28 (3,90-4,63); índice hb

    0,78 (0,74-0,81); índice 4c 1,88 (1,86-1,90); índice 4v 2,15 (2,13-2,17); índice

    5x 1,70 (1,54-1,86); índice M 0,56 (0,51-0,62); prox. x 0,29 (0,26-0,31)

    ABDÔMEN: cor geral marrom-escura, brilhante; comprimento 0,88mm (0,82-

    0,93). T1 a T4 fosco e marrom-escuro; T1 marrom-amarelado na parte anterior

    e marrom na parte posterior; T2 marrom-escuro com pequenas áreas laterais

    amarelas; T3 marrom-escuro, mas com uma área que vai de branca a amarela

    clara anterior e medial; T4 mais brilhante na parte anterior, com duas áreas

    brancas, sublaterais que, quando confluentes, formam uma faixa larga. T5 e T6

    marrom-escuro e brilhantes.

    17

  • MEDIDAS DAS FÊMEAS:

    CABEÇA: comprimento 0,44mm (0,40-0,48). Comprimento da fronte 0,29mm,

    índice frontal 0,97 (0,94-1,00); relação entre a largura superior e inferior 1,30

    (1,28-1,31). Triângulo ocelar estendendo-se a 36% (34%-38%) da fronte.

    Placas fronto-orbitais 59% (55%-62%) do comprimento da fronte. Índice orbital

    0,71; or1/or3 1,13; or2/or1 0,23 (0,22-0,24); poc 47% (45%-48%) e oc 59% do

    comprimento da fronte; índice vt 0,91 (0,86-0,95). Índice da gena 9,1 (8,2-10,0);

    índice do olho 1,23.

    TÓRAX: comprimento 0,91mm (0,90-0,92). Índice H 0,73 (0,71-0,75). Índice da

    posição escutelar 2,22; índice escutelar 0,42. Índice esternal 0,58.

    ASA: comprimento 2,01mm (1,94-2,05). Índice C 1,00; índice AC 4,50 (4,47-

    4,53); índice hb 0,63 (0,60-0,65); índice 4C 1,89; índice 4V 2,31 (2,24-2,37);

    índice 5x 1,13; índice M 0,64 (0,60-0,68); prox. x 0,25 (0,24-0,26).

    ABDÔMEN: Comprimento 0,99mm.

    TERMINÁLIA MASCULINA: Epândrio coberto de cerdas curtas, com cerca de

    seis cerdas superiores e seis inferiores. Cercos cobertos de cerdas curtas,

    ligados ao epândrio por tecido membranoso. Surstilo com sete a oito cerdas

    preênseis em forma de cone, três cerdas marginais laterais finas e uma cerda

    medial. Hipândrio quase do mesmo tamanho do epândrio, redondo a quadrado.

    Gonopódios fundidos ao hipândrio, com uma cerda na margem anterior interna.

    Edeago anteriormente bífido, com espinhos na ponta; dorsalmente pouco

    quitinizado, quase membranoso. Paráfises posteriormente membranosas,

    anteriormente quitinizadas, com seis espinhos; ligadas ao gonopódio por tecido

    membranoso.

    18

  • TERMINÁLIA FEMININA: Como não possui as pequenas cerdas apicais

    (sensilla) usadas na diferenciação entre cerdas marginais e discais (Vilela e

    Bächli, 1990), todas as cerdas da valva foram consideradas marginais. Valvas

    com 13 cerdas marginais e duas cerdas marginais subterminais, uma dorsal e

    outra ventral.

    BIOLOGIA: Não existem referências quanto à biologia desta espécie. Tem-se

    aqui o primeiro dado de um espécime que emergiu de um fungo lamelar não

    identificado.

    DISTRIBUIÇÃO: Esta é a espécie neotropical de maior distribuição geográfica,

    desde o México até o Brasil, além de várias ilhas do Caribe (Wheeler e Takada,

    1963). Como Wheeler e Takada (1963) não especificaram as localidades onde

    as moscas foram coletadas, na Figura 10 são apresentados somente as

    localidades dos espécimes aqui coletados.

    Figura4 – Terminália feminina de Mycodrosophila projectans, em vista lateral. A barra de escala representa 0,05mm.

    19

  • A

    B C

    Figura 5 – Terminália masculina de Mycodrosophila projectans. A - Epándrio, cercos e surstilos; B - Edeago e hipândrio em vista ventral; C - Edeago e hipândrio em vista lateral. A barra de escala representa 0,05mm.

    COMENTÁRIOS: Foram encontradas algumas variações na morfologia de M.

    projectans. Wheeler e Takada (1963) ilustraram o abdômen com uma única

    faixa branca no tergito 4, conforme a descrição de Sturtevant (1916). Aqui,

    foram encontrados espécimes com esta faixa ou com duas manchas

    20

  • sublaterais e semicirculares (Figura 6). Como estes autores ilustraram o

    polimorfismo de outras espécies, é possível que não tenham observado este

    polimorfismo devido ao encurtamento natural do abdômen do espécime seco,

    montado em alfinetes entomológicos. Outra possibilidade é que na América

    Central (onde a maioria dos espécimes foi coletada) não exista esta variação.

    Figura 6 – Abdomens de Mycodrosophila projectans, em vista dorsal. Não estão na mesma escala.

    As variações não se restringem à morfologia externa. O número de

    cerdas no lobo anterior do epândrio e do surstilo também é variável. A

    ilustração de Wheeler e Takada (1963) apresenta quatro cerdas no lobo do

    epândrio, porém foram encontrados espécimes com três a dez cerdas, que

    também podem apresentar pequena modificação em seu formato. Na

    extremidade do lobo elas geralmente são mais curtas, com formato de espinho,

    enquanto as outras são mais compridas (figura 7). No surstilo, a quantidade de

    cerdas preênseis e de cerdas marginais também é variável. Foram encontradas

    de sete a dez cerdas preênseis e entre uma e quatro cerdas laterais. Apenas a

    cerda medial é invariável.

    21

  • Figura 7 – Variações no número de cerdas do lobo do epândrio de Mycodrosophila projectans. A barra de escala representa 0,05mm.

    Todas estas estruturas da terminália masculina são usadas nas

    identificações dos drosofilídeos apesar da existência de pequenas variações.

    Como as variações aqui reportadas estão contidas em espécimes coletados na

    mesma localidade e estão distribuídas aleatoriamente entre os indivíduos, é

    muito improvável que se trate de duas ou mais espécies crípticas.

    A distinção entre espécies muito similares geralmente é realizada com

    base na morfologia do edeago, em especial, da sua porção apical. Este é o

    caso, por exemplo, de espécies do cluster Drosophila buzzatti (Vilela, 1983;

    Manfrin e Sene, 2006) entre muitas outras. Em M. projectans não foi

    encontrada nenhuma variação significativa nesta parte do edeago, o que

    reforça a hipótese de ser uma única espécie.

    Uma outra estrutura da terminália masculina, o apódema do edeago,

    também apresentou grande variação em tamanho. Os apódemas são locais de

    inserção de músculos e terminam seu desenvolvimento nos primeiros dias

    depois da imago emergir. A cada dia, uma camada de quitina é depositada, até

    que o tamanho máximo seja atingido (Ellison e Hampton, 1982; Johnston e

    Ellison, 1982). As linhas de crescimento às vezes são tão claras que são

    22

  • evidenciadas nos desenhos dos artigos taxonômicos. Em M. projectans, os

    espécimes recém-emergidos apresentaram um apódema muito menor (cerca

    de 18% em área) que os dos indivíduos maduros (figura 8). Embora não

    existam quantificações deste crescimento em nenhuma espécie de Drosophila,

    a diferença existente em M. projectans é provavelmente uma das maiores já

    encontradas; é também muito similar ao padrão encontrado em Drosophila

    impudica Duda 1927, conforme ilustrações de Vilela e Bächli (1990).

    Figura 8 – Variações no formato do apódema do edeago de Mycodrosophila projectans. A barra de escala representa 0,05mm.

    Mycodrosophila elegans Wheeler e Takada

    Descrição original: Wheeler e Takada (1963:398).

    Material Examiado: 2 ♂♂ , etiquetados “Campus USP – Ribeirão Preto - SP –

    BR. Bizzo, L; Esguícero, A. & Epifânio, P. 30.iii.2006. e “Luziânia, Mata, 16-vi-

    79 F. Val & K. Kaneshiro”

    Figura: 9.

    Diagnose: espécie variando de marrom-escuro a preto. Fronte com reflexo

    prata; abdômen variando de marrom-escuro a preto. Asa com cinco áreas

    23

  • esfumaçadas, veia R2+3 abruptamente curvada em sua parte distal na direção

    de R1, lapela costal presente.

    Descrição: 1♂. Comprimento 1,68mm

    CABEÇA: cor geral marrom-escura, brilhante; comprimento 0,30mm. Vertex

    marrom, fronte prateada, comprimento frontal 0,23mm; índice frontal 0,88;

    relação entre largura superior e inferior 1,23. Triângulo frontal preto; triângulo

    ocelar dourado, 30% do comprimento frontal. Placa fronto-orbital marrom

    brilhante, mais escura na parte superior, 57% do comprimento frontal. or1

    paralelas; or2 situada posterior e lateralmente a or1, índice orbital 0,6; or1/or3

    1,45; or2/or1 0,13; poc 35% e oc 52% do comprimento frontal; índice vt 0,88.

    Vibrissa não cruzada, subvibrissa indistinta, gena marrom, pós-gena branca,

    índice da gena 10,67; índice do olho 1,13; cerdas intrafacetais curtas. Primeiro

    flagelômero medianamente amarelo, lateralmente amarelo-amarronzado, com

    cerdas longas e amarelas; relação comprimento por largura 1,75. Arista com

    três a quatro ramos superiores e um inferior, mais furca terminal. Carina

    bulbosa, amarela na parte superior variando até amarela-amarronzada na área

    inferior; probóscide amarela-clara, palpos clavados, amarelos, cobertos com

    cerdas curtas e amarelas; uma cerda apical e uma subapical. Clípeo marrom.

    TÓRAX: cor geral marrom-escura, brilhante; comprimento 0,65mm. Pós-

    pronoto marrom-claro, índice H 0,88. Escuto marrom, brilhante, com áreas

    pilosas perto das cerdas dorsocentrais posteriores. Seis fileiras de cerdas

    acrosticais. Cerdas dorsocentrais anteriores ausentes. Escutelo marrom,

    brilhante, porém piloso. Cerda escutelar anterior convergente, cerda posterior

    não cruzada. Índice da posição escutelar 2,5. Parte basal do haltere branca,

    24

  • parte medial e distal marrom-escura, com o ápice claro. Pleura amarela-clara.

    Pernas amarelas, o segundo par com uma cerda apical na tíbia.

    ASA: Com padrões de esfumaçado; comprimento 1,61mm; ápice pouco

    pontiagudo. Um esfumaçado transversal, da lapela costal até a célula anal; veia

    R2+3 abruptamente curvada em sua parte distal na direção de R1, ambas

    apicalmente esfumaçadas. Veia transversal dm esfumaçada perto das veias

    longitudinais. R4+5 e M divergente. Índice C 0,87; índice AC 3,45; índice hb

    0,64; índice 4C 1,92; índice 4v 2,22; índice 5x 0,94; índice M 0,44; prox. x. 0,28.

    ABDÔMEN: cor geral marrom escuro a preto, comprimento 0,73mm. T1

    marrom claro, opaco; T2 e T3 marrom escuros e opacos, T3 anteriormente

    brilhante; T4 a T6 brilhantes, marrom escuros a pretos.

    TERMINÁLIA MASCULINA: Epândrio coberto em sua maioria por pequenas

    cerdas, com cerca de cinco cerdas longas acima e quatro abaixo. Cercos

    cobertos por pequenas cerdas, anteriormente fundidos ao epândrio. Surstilos

    com sete a oito cerdas preênseis, duas a três cerdas laterais e uma medial.

    Hipândrio menor que o epândrio, com projeções laterais. Gonopódios fundidos

    ao hipândrio, com uma cerda na margem anterior interna e pequenas cerdas ao

    redor. Edeago anteriormente bífido, com pequenas projeções apicais em forma

    de espinhos. Paráfises posteriormente membranosas e anteriormente

    quitinizadas, com três espinhos apicais; ligadas ao gonopódio por tecido

    membranoso.

    TERMINÁLIA FEMININA: existem alótipo e parátipos fêmeas, porém nenhum

    foi descrito nem dissecado.

    DISTRIBUIÇÃO: Espécie de distribuição Neotropical; são conhecidos apenas

    12 espécimes, coletados do Panamá ao Brasil (Wheeler e Takada, 1963).

    25

  • A

    B C

    Figura 9 – Terminália masculina de Mycodrosophila elegans. A - Epândrio, cercos e surstilos; B - Edeago e hipândrio em vista ventral; C - Edeago e hipândrio em vista lateral. A barra de escala representa 0,05mm.

    26

  • COMENTÁRIOS: O espécime aqui descrito apresenta pequenas diferenças em

    relação aos descritos por Wheeler & Takada (1963). Mesmo assim, foi

    considerado conspecífico, pois dentre as caracterísitcas diferentes,

    possivelmente apenas uma possui base biológica. As demais características,

    projeções laterais do hipândrio+gonopódio e as pequenas diferenças no

    edeago, podem ser atribuídas respectivamente à idade avançada do espécime

    e ao desenho, bastante esquemático, de Wheeler e Takada (1963).

    O comprimento da mosca é a característica mais destoante, 1,68mm

    contra 2,80mm. Sabe-se, no entanto, que o tamanho dos indivíduos é

    altamente variável e dependente de fatores como sexo, tempo de

    desenvolvimento, temperatura e alimentação durante a fase larval. A diferença

    encontrada pode ser decorrente da interação de alguns destes fatores.

    Apenas dois dos 12 indivíduos conhecidos desta espécie foram

    coletados na América do Sul, um na Colômbia e outro em Castanhal, nordeste

    do Pará (Wheeler e Takada, 1963). Neste trabalho foram identificados mais

    dois indivíduos, um de Luziânia (GO) e outro de Ribeirão Preto (SP). Deste

    modo, a distribuição desta espécie, que parecia ser restrita à floresta

    amazônica, é estendia as áreas de cerrado e de mata atlântica (figura 10).

    27

  • Figura 10 – Distribuição conhecida de Mycodrosophila projectans e M. elegans no Brasil.

    4.2- Descrições de duas novas espécies de Zygothrica.

    Como nove espécimes identificados como Mycodrosophila são, na

    verdade, Zygothrica e constituem duas novas espécies, optou-se por descrevê-

    las.

    Zygothrica sp.1

    MATERIAL TIPO: 1♀, com as etiquetas “K. Kaneshiro & Val, F.C.; Boracéia,

    6.vi.79” e “White bracket fungus” .

    Figura: 11

    28

  • Diagnose: Espécie de coloração variando de marrom a preta. Cabeça com

    quase toda a fronte e o pedicelo com cor branca; primeiro flagelômero com

    cerdas longas; arista com apenas três ramos superiores; cerdas interfacetais

    longas e densas; palpo marrom-amarelado. Tórax e escutelo bastante

    convexos e pilosos. Asas hialinas, índice costal aproximadamente 1,0.

    Abdômen com T1 a T3 marrom escuro, com uma área medial amarela; T4 e T5

    com dois semi-círculos amarelos anteriores, sub-laterais, mais largos

    medialmente e afilados lateralmente; T6 marrom-escuro.

    LOCALIDADE TIPO: Estação Ecológica Boracéia, estado de São Paulo,

    sudeste brasileiro.

    DISTRIBUIÇÃO: Conhecida apenas da Estação Biológica Boracéia.

    Encontrada em locais com vegetação de mata atlântica.

    DESCRIÇÃO: 1♀, comprimento 1,6mm.

    CABEÇA: cor geral marrom-escura; comprimento 0,28mm. Vertex marrom-

    escuro; fronte marrom-escura na parte superior e branco abaixo do triângulo

    ocelar, com reflexo prata; comprimento da fronte 0,19mm, índice frontal 0,76;

    relação entre a largura superior e inferior 1,28. Triângulo frontal indistinto.

    Triângulo ocelar marrom-escuro, 32% do comprimento da fronte. Placa fronto-

    orbital marrom-escura, pouco fosca, 74% do comprimento da fronte. or1

    divergente; or2 situada perto e lateral a or1, índice orbital 0,5; or1/or3 1,08;

    or2/or1 0,23; poc 47% e oc 84% do comprimento da fronte; índice vt 0,95.

    Vibrissa não cruzada, subvibrissa indistinta, gena marrom-escura, pós-gena

    amarela-clara com uma área marrom-clara, difusa; índice da gena 8,50; índice

    do olho 0,97; cerdas intrafacetais longas e densas. Pedicelo variando de

    branco a amarelo-claro, primeiro flagelômero marrom com cerdas longas e

    29

  • reflexo cinza, relação comprimento por largura 1,71. Arista com três ramos

    superiores e um inferior, mais a furca terminal. Face marrom-clara, carina facial

    incompleta e estreita, marrom-amarelada; probóscide amarela-escura, palpo

    marrom-amarelado. Clípeo marrom, brilhante, com pilosidade.

    TÓRAX: cor geral marrom-escura, brilhante, com pilosidade; comprimento

    0,59mm. Pós-pronoto marrom-claro, com pilosidade; índice H 0,89. Escuto

    marrom-escuro, brilhante e inteiramente piloso; distância transversal entre as

    cerdas dorsocentrais 313% da distância longitudinal, índice dc 0,61; seis fileiras

    de cerdas acrosticais. Escutelo marrom-escuro e brilhante, porém com

    pilosidade, bastante convexo. Cerdas escutelares anteriores convergentes,

    posteriores cruzadas. Índice da posição escutelar 1,56; índice escutelar 0,54.

    Base do haltere branca, porção medial marrom-escura e ápice amarelo-claro.

    Pleura amarela-clara, índice esternal 0,25. Pernas amarelas, par medial com

    uma cerda apical.

    ASA: hialina, comprimento 1,69mm; ápice arredondado. R4+5 e M convergentes

    a paralelas. Índice C 1,03; índice AC 4,87; índice hb 0,45; índice 4C 2,35;

    índice 4V 3,00; índice 5x 2,90; índice M 0,94; prox. x 0,19.

    ABDÔMEN: cor geral marrom-escura, brilhante; comprimento 0,71mm. T1 a T3

    marrom-escuros, com uma área medial amarela; T4 e T5 com dois semicírculos

    amarelos anteriores, sub-laterais, mais largos medialmente e afilados

    lateralmente. T6 marrom-escuro.

    TERMINÁLIA MASCULINA: Macho desconhecido.

    TERMINÁLIA FEMININA: Holótipo não dissecado. Em vista lateral, a

    extremidade do ovipositor é triangular, com muitas cerdas marginais.

    30

  • BIOLOGIA: O único espécime conhecido foi coletado em um fungo branco,

    ressupinado, poliporáceo.

    PARENTESCO: É difícil traçar relações de parentesco em Zygothrica sem o

    exame da terminália masculina. Zygothrica flavifrons Grimaldi 1990, conhecida

    da ilha de Trinidad, é a espécie mais parecida com esta, devido à fronte clara.

    No entanto, as duas diferem marcadamente em vários caracteres, como

    formato da carina facial, comprimento das cerdas do primeiro flagelômero,

    relação or1/or3, número de ramos da arista e índice C. A coloração do

    abdômen também é muito diferente: marrom tendendo, na lateral, para amarelo

    em Z. flavifrons, e marrom com manchas mediais e sublaterais em Z. sp.1.

    Figura 11 – Vista frontal de Zygothrica sp.1.

    Zygothrica sp. 2

    MATERIAL TIPO: HOLÓTIPO: 1♂, com a etiqueta “Praia do Guaratuba,

    Bertioga – SP – BR . 23°45’38’’S; 45°54’01’’W. 10m. 22.ix.2006. L. Bizzo e F.

    C. do VAL”. PARÁTIPOS: 4♂♂ e 6♀♀. 1♂ e 1♀ com a etiqueta “Est. Biol.

    Boracéia, Salesópolis – SP, Val, F.C. 3.v.78”; 1♀ “Est. Biol. Boracéia,

    31

  • Salesópolis – SP, K. Kaneshiro & Val, F.C. 3.iv.79”; 1♂ e 1♀ “Est. Biol.

    Boracéia, Salesópolis – SP, K. Kaneshiro & Val, F.C. 4.iv.1979”; 1♂ e 2♀♀ “Est.

    Biol. Boracéia, Salesópolis – SP, K. Kaneshiro & Val, F.C. 6.vi.79” e “white

    bracket fungus”; 1♂ e 1♀ “Praia do Guaratuba, Bertioga – SP – BR.

    23°45’38’’S; 45°54’01’’W. 10m. 22.ix.2006. L. Bizzo e F. C. do VAL”.

    Figuras: 12 e 13.

    Diagnose: Espécie com noto preto, brilhante, sem marcas. Cerdas intrafacetais

    longas e densas; triângulo ocelar preenchendo toda a fronte; palpos e

    probóscide marrons; noto torácico e escutelo bastante convexos e com

    pilosidade; pleura branca; asas hialinas; abdômen preto, medial e, na parte

    anterior, amarelo-difuso. Edeago característico.

    MATERIAL EXAMINADO: 2♂♂. Comprimento 1,6-2,0mm.

    CABEÇA: Cor geral preta, brilhante; comprimento 0,34mm (0,31-0,36). Vertex

    preto, com reflexo dourado em alguns ângulos; comprimento da fronte 0,22mm

    (0,21-0,23), índice frontal 0,70 (0,65-0,79); relação entre a largura superior e

    inferior 1,20 (1,16-1,24). Triângulo ocelar preto, brilhante, preenchendo toda a

    fronte. Triângulo frontal indistinto. Placa fronto-orbital preta, brilhante, 103%

    (100%-105%) do comprimento da fronte. or1 convergente a paralela; or2

    situada perto e lateral a or1, índice orbital 0,60 (0,58-0,62); or1/or3 0,81 (0,79-

    0,85); or2/or1 0,38 (0,36-0,42); poc 57% (52%-60%) e oc 102% (87%-110%) do

    comprimento da fronte; índice vt 1,05 (1,05-1,06). Vibrissa não cruzada,

    subvibrissa indistinta, gena preta, pós-gena variando de marrom-escura a

    preta; índice da gena 10,0 (9,5-10,5); índice do olho 1,12 (1,06-1,17); cerdas

    intrafacetais longas e densas. Pedicelo marrom; primeiro flagelômero marrom

    com cerdas longas e amarelas, relação comprimento por largura 1,70 (1,60-

    32

  • 1,78). Arista com quatro ramos superiores e um inferior, mais a furca terminal.

    Face marrom, um pouco fosca, com reflexo branco; carina facial incompleta,

    aguda, variando de amarela a marrom, com pilosidade na margem ventral;

    probóscide variando de amarela-escura a marrom, aparentemente longa;

    palpos marrons. Clípeo marrom, brilhante, com pilosidade.

    TÓRAX: cor geral preta, brilhante; comprimento 0,63mm (0,58-0,69). Pós-

    pronoto marrom, fosco, com pilosidade; índice H 0,78 (0,69-0,86). Escuto preto,

    brilhante, com área espiculada irregular entre as cerdas dorsocentrais e o

    escutelo; distância transversal entre as cerdas dorsocentrais 296% (280%-

    310%) da distância longitudinal, índice dc 0,62 (0,57-0,66); oito fileiras de

    cerdas acrosticais. Escutelo preto, fosco, com pilosidade e reflexo dourado em

    alguns ângulos. Cerdas escutelares anteriores convergentes, posteriores

    cruzadas. Índice da posição escutelar 1,71 (1,60-1,78); índice escutelar 0,57

    (0,56-0,57). Região anterior da base e do ápice do haltere marrom, região

    posterior branca. Pleura branca, às vezes com reflexo dourado em alguns

    ângulos; índice esternal 0,30 (0,24-0,36). Pernas amarelas, fêmur da perna

    anterior basalmente branco, par medial com uma cerda apical na tíbia.

    ASA: hialina, comprimento 1,57mm (1,50-1,65); ápice arredondado. R4+5 e M

    paralelas. Índice C 1,27 (1,25-1,29); índice AC 3,39 (3,26-3,47); índice hb 0,63

    (0,62-0,64); índice 4C 2,11 (1,97-2,30); índice 4V 2,84 (2,60-3,04); índice 5x

    2,90 (2,67-3,22); índice M 1,02 (0,93-1,17); prox. x 0,30 (0,28-0,31).

    ABDÔMEN: cor geral preta e brilhante; comprimento 0,80mm (0,68-0,88). T1 a

    T3 lateralmente pretos e um pouco foscos, com pilosidade e, em alguns

    ângulos, com reflexo dourado. Uma faixa medial longitudinal variando de

    amarela no centro a marrom-difuso sublateralmente. Esta faixa pode ser mais

    33

  • larga em T1 e na parte posterior de T3. T4 a T6 pretos, brilhantes. A margem

    anterior de T4 pode ser amarela em toda sua extensão, apenas no centro, ou

    inteiramente preta.

    MEDIDAS DAS FÊMEAS:

    CABEÇA: comprimento 0,33mm (0,31-0,34). Comprimento da fronte 0,22mm

    (0,21-0,23), índice frontal 0,68; relação entre a largura superior e inferior 1,25

    (1,24-1,26). Triângulo ocelar preenchendo 100% da fronte. Placa fronto-orbital

    105% do comprimento da fronte. Índice orbital 0,62 (0,46-0,77); or1/or3 0,68

    (0,64-0,71); or2/or1 0,38 (0,33-0,42); poc 59% (57%-61%) e oc 100% (96%-

    105%) do comprimento da fronte; índice vt 1,06. Índice da gena 9,8 (9,0-10,5);

    índice do olho 1,06.

    TÓRAX: comprimento 0,72mm (0,66-0,78). Índice H 0,85 (0,77-0,97). Distância

    transversal entre as cerdas dorso centrais 311% (246%-375%) da distância

    longitudinal, índice dc 0,62 (0,54-0,70). Índice da posição escutelar 1,55 (1,50-

    1,60); índice escutelar 0,51 (0,48-0,53). Índice esternal 0,35 (0,33-0,37).

    ASA: comprimento 1,72mm (1,67-1,76). Índice C 1,27 (1,16-1,37); índice AC

    3,50 (3,42-3,58); índice hb 0,64 (0,62-0,66); índice 4C 2,15 (2,10-2,19); índice

    4V 2,89 (2,84-2,94); índice 5x 2,91 (2,82-3,00); índice M 1,03 (1,00-1,06); prox.

    x 0,26.

    ABDÔMEN: Comprimento 0,88mm (0,84-0,91).

    TERMINÁLIA MASCULINA: Epândrio coberto em sua maioria por pequenas

    cerdas, com cerca de cinco cerdas longas acima e seis abaixo. Cercos

    cobertos por pequenas cerdas, ligados ao epândrio por tecido membranoso;

    placa do hipoprocto (hypoproctal plates) glabra, triangular; lobo ventral dos

    cercos em formato quadrado, com três a quatro pequenas cerdas mediais.

    34

  • Lobo do epândrio curto e quadrado. Surstilos com 11 a 12 cerdas preênseis

    setiformes. Hipândrio menor que o epândrio, quadrado. Gonopódios fundidos

    ao hipândrio, com uma cerda na margem anterior interna. Edeago com

    pequenas projeções apicais. Paráfises com dois espinhos mediais, ligadas ao

    gonopódio por tecido membranoso.

    TERMINALIA FEMININA: pontiaguda, com 14 cerdas marginais e uma cerda

    discal; quatro pequenas cerdas apicais.

    BIOLOGIA: Desconhecida.

    LOCALIDADE TIPO: Praia do Guaratuba, Bertioga – SP, Brasil.

    DISTRIBUIÇÃO: Conhecida apenas da Estação Biológica Boracéia e da Praia

    de Guaratuba, litoral norte de São Paulo, sudeste brasileiro. Encontrada em

    locais com vegetação de mata atlântica.

    PARENTESCO: Pertence ao clado 1 de Grimaldi (1987), devido ao triângulo

    ocelar expandido, ocupando quase toda a fronte.

    FIGURA 12 – Terminália feminina de Zygothrica sp. 2, em vista lateral. A barra de escala representa 0,05mm.

    35

  • FIGURA 13 – Terminália masculina de Zygothrica sp.2. A- Epândrio, cercos e surstilos; B- Edeago e hipândrio em vista dorsal; C Edeago em vista lateral; D- Edeago e hipândrio em vista ventral A barra de escala representa 0,05mm.

    A

    B C D

    4.3- Distinção entre Mycodrosophila e Zygothrica

    As principais características morfológicas utilizadas na diferenciação

    entre Mycodrosophila e Zygothrica são as apomorfias de Mycodrosophila

    (presença de lapela costal, tórax bastante convexo e apenas um par de cerdas

    dorsocentrais (Grimaldi, 1990a)) e a carina facial proeminente de Zygothrica.

    Outros caracteres que podem ajudar nesta diferenciação, como a probóscide

    longa, cerdas interfacetais longas e densas, cerdas longas no primeiro

    flagelômero e triângulo ocelar extenso, estão presentes em muitas espécies de

    36

  • Zygothrica, porém não fazem parte de sua diagnose atual. Alguns destes

    caracteres foram propostos como diagnósticos por Burla (1956), porém foi

    posteriormente excluído por Grimaldi (1987) por não estarem presentes na

    maioria das espécies.

    Como nem todas as Mycodrosophila possuem lapela costal, algumas

    possuem dois pares de dorsocentrais, e a forma da carina facial é bastante

    variável em Zygothrica, a separação entre os dois gêneros pode se tornar difícil

    e baseada apenas em um caráter de difícil visualização, a convexidade

    torácica.

    As espécies de Zygothrica aqui descritas apresentam convexidades

    torácicas muito similares às de M. projectans e M. elegans, e somente após o

    estudo das terminálias masculinas foi possível identificá-las como Zygothrica.

    Assim, a diferenciação entre estes gêneros fica ainda mais difícil e ilustra

    porque estes espécimes ficaram durante tanto tempo identificados como

    Mycodrosophila. A diagnose atual de Mycodrosophila mostra-se, portanto,

    ambígua e, de certo modo, deficiente, permitindo a inclusão de indivíduos que

    não pertencem ao gênero. Isto, somado ao fato de que vários trabalhos

    apresentam diagnoses um pouco diferentes, torna necessária a reavaliação da

    diagnose deste gênero e a elaboração de modo mais restritivo. A seguir são

    discutidas as principais diagnoses propostas.

    4.4- Revisão das diagnoses de Mycodrosophila e proposta de nova

    diagnose.

    O gênero Mycodrosophila foi inicialmente criado por Oldenberg (1914)

    para abrigar Amiota poecilogastra Loew 1874. No entanto, não foi elaborada

    37

  • uma diagnose para o gênero. A seguir são transcritas e comentadas todas as

    diagnoses encontradas na literatura.

    Sturtevant, 1921 – “American species of Drosophilidae”. Embora o trabalho seja

    sobre as espécies americanas, o autor se refere às nove espécies do gênero

    conhecidas na época em todo o mundo.

    “The genus is characterized as follows: middle (lower reclinate) orbital minute; postverticals large, convergent; thoracic bristles as in Drosophila, except that the anterior dorsocentral pair is missing or extremely minute, and prescutellars are never present; preapical bristles on first and second tibiae indistinct or missing; eyes bare or nearly so; mesonotum ‘humped up’; scutellum rounded, not so flat as in Drosophila; distal costal incision (just before tip of first vein) deep, costa somewhat swollen just basal to the incision; a single bristle before the distal costal break, instead of the usual two. The nine species are all dark and shining above, pale yellow on pleurae, legs, and face; abdomen shining dark brown or black with pale yellow markings.”

    Wheeler e Takada, 1964 – “Drosophilidae from Micronesia”.

    “Arista plumose, with one, rarely two, ventral branches; acrostichal hairs numerous; no prescutellars; no anterior dorsocentrals, posterior dorsocentrals sometimes placed rather far from scutellum; distal costal break usually deeply incised, apex of costa blackened and protruding as a broad lappet; basal scutellars much shorter than apicals. Fungivorous species.”

    Bock, 1980 – “Drosophilidae of Australia - Mycodrosophila”.

    “Arista large, plumose, usually with only 1 ventral ray. Carina usually well developed. Vibrissa single. Greatest diameter of eye vertical. Eyes bare. Middle orbital bristle small, fine. Ocellar, vertical and postvertical bristles large. Mesonotum strongly rounded, arched, usually darkly coloured, shining. Scutellum broadly rounded, dark, velvety or subshining. Subscutellum usually dark. Anterior dorsocentral bristles very small or absent. Acrostichal hairs in numerous rows; prescutellars bristles absent. Basal scutellar bristles short, fine; apical scutellars large, convergent. Apex of costa (at distal costal incision) usually darkened and protruding as a blackened lappet; front usually strongly silvery, especially centrally, when viewed at very acute angles. Uppermost parts of pleura (above level of wing articulation) dark; pleural coloration changing abruptly to pale tan below in most species.”

    38

  • Bock, 1982 – “Summary of the Drosophilidae of Australia” – Neste trabalho, o

    autor compila todos os dados da região e faz pequenas mudanças em relação

    ao texto anterior: desconsidera os caracteres do escutelo e pleura, além da

    diferença na fronte.

    “Arista large, plumose, usually with single ventral ray. Carina usually well developed; vibrissa single; greatest diameter of eye vertical; eye bare; middle orbital bristle small, fine; ocellar, vertical and postvertical bristles large; mesonotum strongly rounded, arched, usually darkly coloured, shining. Scutellum broadly rounded, dark, velvety or subshining; anterior dorsocentral bristles very small or absent; acrostichal hairs in numerous rows; prescutellars bristles absent; basal scutellar bristles short, fine; apical scutellars large, convergent; apex of costa (at distal costal incision) usually darkened and protruding as a blackened lappet; front usually strongly silvery, especially centrally, when viewed at very acute angles.”

    Okada, 1989 – “Establishing Drosophilidae tribes”. Neste trabalho foram

    utilizados 14 caracteres taxonômicos para estabelecer relações de semelhança

    morfológica entre os gêneros da família. A diagnose a seguir foi elaborada

    seguindo a codificação dos caracteres, como sugerido pelo autor.

    “Eye bare; arista plumose; ocellars inside ocellar triangle; postverticals present; carina undeveloped; anterior reclinate orbital seta fine; posterior reclinate orbital seta nearer proclinate than to inner vertical seta; prescutellar absent; anterior dorsocentral nearer to scutellum than to suture; acrostichal hairs in eight or less rows; lateral scutellars divergent; second costal break deep; second costal lappet large; discal and second basal cells confluent.”

    Wynn e Toda, 1990 – “Drosophilidae in Burma”. Os autores inserem as

    primeiras observações sobre o brilho do escuto e voltam a inserir dados do

    escutelo.

    “Diagnosis. Arista plumose, with 1, rarely 2, ventral branches; eye bare; anterior reclinate orbital small, or fine; mesoscutum arched dorsally, giving a ‘humped-back’ appearance, shiny; acrostichal hairs in numerous rows; no prescutellars; anterior dorsocentrals absent or rather short; posterior dorsocentrals sometimes placed

    39

  • rather far from scutellum; scutellum dull and velvety; anterior scutellar much shorter than posterior one. Fungivovous species”.

    Chen e Toda, 1994 – “Drosophilidae of Eastern China”

    “Diagnosos (modified from Bock, 1982). Arista with single ventral branch; anterior reclinate orbital seta small or fine; facial carina usually well developed; subvibrissal seta not diferentiated; scutum highly convex, usually darkly colored, glossy; scutellum broadly rounded, dark, velvety or subshining; anterior dorsocentral seta minute or absent; basal scutellar seta short or fine; portion of costal vein proximal to subcostal break usually thickened and blackened as costal lappet; frons usually silvery shining, especially in medial portion, when viewed at acute angles.”

    É possível notar que existem pequenas mudanças nas diagnoses de

    acordo com o local e a época de estudo. Provavelmente estas eram realizadas

    com base nos espécimes que os pesquisadores tinham em mãos, ou seja, na

    fauna local. Um exemplo é a diagnose de Wheeler e Takada (1964), que

    desconsidera Sturtevant (1921) com relação ao número de cerdas

    dorsocentrais. Esse é um caráter muito importante, em especial para

    Mycodrosophila. Bock (1982) também faz pequenas modificações de sua

    revisão anterior (1980), retirando os caracteres do escutelo das moscas;

    posteriormente, Wynn e Toda (1990) voltam a inseri-los na diagnose.

    Já o trabalho de Okada (1989) é bastante controverso, a começar pela

    análise fenética realizada. Grimaldi (1990a) ressalta os fatos de Okada ter, a

    priori, excluído a possibilidade de reversões e assumido o monofiletismo dos

    gêneros como dois dos fatores de maior descrédito da análise.

    Até hoje Mycodrosophila é tido como um gênero de fácil diferenciação,

    porém, como demonstrado, sua identificação pode não ser tão simples. A

    inclusão de informações sobre a terminália, em especial a masculina, pode

    facilitar futuras identificações e diminuir a possibilidade de futuros erros.

    40

  • Embora ainda pouco explorada quanto aos gêneros em Drosophilidae, as

    terminálias masculina e feminina mostram-se especialmente importantes na

    taxonomia de agrupamentos de difícil diferenciação. Um exemplo é a diagnose

    de Hirtodrosophila, à qual foi acrescido este tipo de dado por Grimaldi (1990a).

    Por ser um táxon que apresenta grande variabilidade, que o torna facilmente

    confundível com outros gêneros, esta modificação é bastante útil.

    Dados da terminália feminina também podem ser importantes na

    taxonomia dos drosofilídeos. Estas estruturas, no entanto, são menos

    estudadas e pouco valorizadas taxonomicamente, o que dificulta sua

    comparação. Não existe ainda nenhum “plano básico” desta estrutura para os

    gêneros que compõem o grupo de gêneros Zygothrica. Burla (1956) sugere um

    tipo comum em Hirtodrosophila, com a extremidade pontiaguda. Grimaldi

    (1990a) inclui na diagnose de Hirtodrosophila a existência de várias cerdas

    pequenas e cônicas na margem ventral e dorsal do ovipositor, separadas por

    duas grandes cerdas também cônicas. Burla (1956) também sugere que o

    ovipositor típico de Zygothrica seja reto na sua margem ventral, o que Grimaldi

    (1987) observou ocorrer na minoria das espécies.

    Okada (1956), ao descrever espécies de Mycodrosophila do Japão,

    observa espécies com as cerdas do ovipositor em um padrão muito diferente

    do encontrado nas outras já descritas. O autor sugere, no entanto, que existam

    cerdas subapicais distintas, que poderiam caracterizar o gênero.

    As muitas descrições posteriores ao trabalho de Okada reforçam a

    existência deste padrão. O tipo básico de ovipositor de Mycodrosophila,

    portanto, parece ser o de forma alongada, com pequenas cerdas cuneiformes

    ao longo da margem ventral e algumas na margem dorsal, com duas cerdas

    41

  • longas subapicais, uma dorsal e outra ventral. A espécie-tipo, M. poecilogastra

    (redescrita em Okada, 1956), também apresenta este padrão.

    Com base nos dados obtidos e nas descrições e ilustrações de Lee e

    Takada (1959), Okada (1968, 1986a, b), Wheeler e Takada (1963, 1964), Kang

    et al. (1966), Okada (1989), Chen et al. (1989), Wynn e Toda (1990), Sundaran

    e Gupta (1991), Tsacas e Chassagnard (1991), Chassagnard e Lachaise

    (2000) e McEvey e Polak (2005), foi elaborada uma nova diagnose do gênero,

    incluindo dados da terminália masculina e feminina.

    Gênero Mycodrosophila Oldenberg, 1914

    Espécie tipo: Mycodrosophila poecilogastra (Loew, 1874:419),

    designação original como Amiota poecilogastra Loew 1874.

    Sinonímias: Drosophila johni Pokorny ,1896 (Oldenberg, 1914)

    Mycodrosophila arcuata Chen, Shao e Fan, 1989 (Chen e Toda, 1994)

    Diagnose: Moscas escuras, com coloração geralmente entre marrom e

    preto no noto, contrastando com a pleura e as pernas variando de amarela-

    claras a brancas. Arista plumosa, com um ou raramente dois ramos ventrais;

    setas intrafacetais curtas, não proeminentes; cerda orbital reclinada anterior

    pequena; cerda pós-vertical presente; cerda subvibrissa curta, não

    diferenciada; fronte geralmente com brilho prata quando vista em alguns

    ângulos. Noto bastante convexo e geralmente brilhante, dando uma aparência

    “corcunda” à mosca; cerdas acrosticais em até oito fileiras; cerdas

    dorsocentrais anteriores ausentes ou muito mais curtas que as posteriores,

    sendo estas localizadas às vezes longe do escutelo; cerdas pré-escutelares

    42

  • ausentes; escutelo geralmente arredondado e com pouco brilho, cerdas

    escutelares anteriores muito menores que as posteriores. Asas hialinas ou

    esfumaçadas; porção da veia costal próxima à quebra subcostal geralmente

    mais grossa e esfumaçada, formando uma lapela costal. Surstilo com uma

    fileira de cerdas preênseis; gonopódio fundido ao hipândrio e geralmente

    também às paráfises; edeago com região distal bífida e, geralmente, com ápice

    denteado. Ovipositor geralmente alongado, com pequenas cerdas cuneiformes

    ao longo da margem ventral e algumas na margem dorsal, com duas cerdas

    longas subapicais, uma dorsal e outra ventral (com exceção de algumas

    espécies japonesas). Espécies fungívoras. Distribuição cosmopolita.

    4.5- Enquadramento das espécies americanas de Mycodrosophila em

    subgêneros e implicações biogeográficas.

    Os dois subgêneros formalizados por Okada (1986a, b) foram definidos

    como:

    • Subgênero Mycodrosophila (Okada, 1986a:112) – Lapela costal mais ou

    menos desenvolvida; segunda incisão costal profunda.

    Espécie tipo: Mycodrosophila poecilogastra (Loew)

    • Subgênero Promycodrosophila (Okada, 1986b:291) – Lapela costal não

    desenvolvida; mancha negra sob a segunda quebra costal geralmente

    ausente.

    Espécie tipo: Mycodrosophila separata De Meijere 1911

    43

  • Wheeler e Takada (1963) citam para as espécies americanas a presença

    da lapela costal, ora forte, ora fraca, o que enquadra todas no subgênero

    Mycodrosophila. As espécies neárticas, M. claytonae, M. stalkeri Wheeler e

    Takada 1963 e M. dimidiata (Loew, 1862), no entanto, possuem lapela costal

    pouco desenvolvida e não têm a mancha transversal na base da asa, sendo,

    portanto, mais similares a Promycodrosophila.

    Esta situação é parecida com a encontrada por Okada (1986b), com M.

    compacta Bock 1980 e M. costata Okada 1986. Este autor considera as duas

    como membros intermediários entre os dois subgêneros, e as inclui no

    subgênero Mycodrosophila, com base na morfologia da asa e do edeago,

    denteado no ápice (enquanto a maioria das espécies enquadradas em

    Promycodrosophila não apresenta este denteado). Segundo as ilustrações de

    Wheeler e Takada (1963), todas as espécies americanas apresentam este

    denteado. Deste modo, parece ser mais prudente seguir os critérios de Okada

    e enquadrar todas as espécies americanas no subgênero Mycodrosophila.

    A distribuição geográfica do gênero, portanto, parece ter a seguinte

    conformação: o subgênero Mycodrosophila é cosmopolita, com uma fauna

    aparentemente menos rica nas Américas e na Europa (ali representada por

    apenas uma espécie, M. poecilogastra), enquanto Promycodrosophila está

    restrito à região Indo-Pacífica, local de maior número de espécies do gênero.

    Outros dois gêneros próximos, Paramycodrosophila e Zygothrica, também

    possuem distribuição parecida, porém com maior diversidade na região

    Neotropical (Grimaldi, 1987, 1988, 1990b; Prigent e Toda, 2006).

    44

  • 4.6- Ampliação da distribuição geográfica e da ecologia de outros

    drosofilídeos.

    Parte dos drosofilídeos coletados neste trabalho são Hirtodrosophila,

    Drosophila ou Zaprionus. Das espécies identificadas, algumas representam

    novos registros de distribuição geográfica ou de sítio alimentar.

    Espécimes de Hirtodrosophila gilva Burla 1956 foram coletados sobre o

    fungo Auricularia sp. (Auriculariaceae: Auriculariales) em Guaratuba (litoral de

    São Paulo) e Florianópolis (litoral de Santa Catarina), e indivíduos emergiram

    deste mesmo fungo. Este é o primeiro registro desta espécie fora da localidade-

    tipo (no Rio de Janeiro) e também de substrato utilizado. Uma espécie muito

    próxima, H. mendeli (Mourão, Gallo e Bicudo 1965), também foi coletada sobre

    Auricularia, provavelmente A. fuscosuccinea (Mont.) Henn., no município de

    Mirassol, interior de São Paulo (Mourão et al., 1967) e foi identificada também

    na Argentina (Vilela e Bächli, 2004). Ao que parece, as duas espécies são

    alopátricas, com H. mendeli distribuída no interior e H. gilva no litoral. No

    entanto, mais coletas são necessárias para embasar melhor esta hipótese.

    Centenas de indivíduos de H. thoracis Williston 1896 sensu Burla (1956)

    emergiram de Marasmius sp. (Marasmiaceae, Agaricales) coletados no campus

    da Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis. Esta espécie era

    conhecida das Américas do Norte e Central e teve sua terminália masculina

    ilustrada por Burla (1956), com base em espécimes capturados no Rio de

    Janeiro. Vilela e Bächli (2004) põem em dúvida se estes exemplares são

    conspecíficos a H. thoracis descrita por Williston. Portanto, não é possível ter

    45

  • certeza de que trata-se uma única espécie. Entretanto é certo que os

    espécimes coletados correspondem plenamente aos ilustrados por Burla

    (1956).

    Várias espécies de Drosophila foram encontradas sobre fungos

    carnosos. São elas: D. atrata Burla e Pavan 1953 e D. calloptera Schiner 1868

    (do grupo calloptera), D. paraguayensis Duda 1927, D. roehrae Pipkin e Heed

    1964, D. cuaso Bächli, Vilela e Ratcov 2000 e D. mediopunctata Dobzhansky e

    Pavan 1943 (grupo tripunctata), D. griseolineata Duda 1927 (grupo guarani), D.

    sturtevanti Duda 1927 (grupo saltans), D. neocardini Streisinger 1946, D.

    cardinoides Dobzhansky e Pavan 1943 e D. cardini Sturtevant 1916 (grupo

    cardini). Indivíduos deste último grupo também emergiram de fungos coletados

    porém não identificados.

    Até o momento a micofagia em Drosophila é bem conhecida nos grupos

    neárticos quinaria e testacea, além de D. tripunctata (Markow e O´Grady,

    2005). Todos os grupos citados (com exceção de saltans) fazem parte da

    radiação tripunctata (definida por Throckmorton, 1975). Outras coletas de

    corpos de frutificação e com iscas de fungos comerciais capturaram as

    mesmas espécies (Gottschalk, dados não publicados). Indivíduos de

    Drosophila willistoni Sturtevant 1916 (grupo willistoni) também emergiram de

    corpos de frutificação (Roque et al., 2006). De modo geral, isto indica que o

    hábito micófago é bem mais difundido na radiação do que previamente

    considerado e pode ter tido um papel importante no seu sucesso.

    Zaprionus é outro gênero da família Drosophilidae e pertence à mesma

    tribo de Zygothrica e Drosophila. No Brasil, é representado por apenas uma

    espécie, Z. indianus Gupta 1970, que invadiu o continente americano há cerca

    46

  • de uma década (Vilela, 1999; Tidon et al. 2003). Esta espécie é tida como

    praga agrícola e é abundante em ambientes urbanos e de vegetação aberta.

    Na África, espécies deste gênero utilizam primariamente frutos como recurso

    alimentar, porém algumas espécies próximas a Z. indianus foram relatadas

    ocorrendo em flores (Lachaise e Tsacas, 1983; Chassagnard e Tsacas, 1993).

    Aqui, indivíduos adultos de Z. indianus foram coletados sobre Phallus sp.

    (Phallaceae, Phallales), provavelmente Phallus indusiatus Vent., no campus da

    USP Ribeirão Preto. Roque et al. (2006) encontraram resultado similar, com

    dois indivíduos de Z. indianus emergindo de fungos. Isto indica que esta

    espécie, além de estar presente em vários frutos e competir com as espécies

    nativas, pode ainda utilizar fungos como substrato alimentar.

    5- CONCLUSÕES

    Mycodrosophila projectans e M. elegans foram redescritas, as variações

    na coloração do tergito 3 e da terminália masculina de M. projectans foram

    discutidas e ilustradas.

    Duas novas espécies Neotropicais de Zygothrica, muito semelhantes a

    espécies do gênero Mycodrosophila, foram descritas.

    Os caracteres diagnósticos de Mycodrosophila e Zygothrica foram

    discutidos e a diagnose de Mycodrosophila foi revista e ampliada.

    As espécies americanas de Mycodrosophila foram enquadradas no

    subgênero Mycodrosophila.

    Hirtodrosophila gilva tem seu primeiro registro fora da localidade-tipo, em

    Guaratuba (SP) e Florianópolis (SC), e Hirtodrosophila thoracis sensu Burla

    (1956) também teve seu primeiro registro na região sul do Brasil (Florianópolis).

    47

  • Auricularia e Marasmius, respectivamente, são os primeiros recursos

    alimentares documentados para estas espécies.

    Várias espécies de Drosophila foram encontradas sobre fungos

    carnosos: D. atrata e D. calloptera (do grupo calloptera), D. paraguayensis, D.

    roehrae, D. cuaso e D. mediopunctata (grupo tripunctata), D. griseolineata

    (grupo guarani), D. sturtevanti (grupo saltans), D. neocardini, D. cardinoides e

    D. cardini (grupo cardini). Todos estes grupos (com exceção do saltans) fazem

    parte da radiação tripunctata (definida por Throckmorton, 1975), o que indica

    que este nicho é bem mais difundido na radiação do que previamente

    considerado e pode ter tido um papel importante no seu sucesso.

    Zaprionus indianus tem aqui seu primeiro registro de adultos coletados

    sobre fungos do gênero Phallus.

    48

  • 6- REFERÊNCIAS

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