universidade de sÃo paulo escola de comunicaÇÃo … · 4.3 categoria descriÇÃo arquivistica e...
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES
CLÉIA MÁRCIA GOMES AMARAL
Organização e tratamento da informação nos arquivos: estudo crítico
São Paulo
2017
CLÉIA MÁRCIA GOMES AMARAL
Organização da informação nos arquivos: estudo crítico
Versão corrigida
Tese apresentada à Escola de Comunicação e Artes da
Universidade de São Paulo – USP, para a obtenção do título
de Doutora em Ciência da Informação
Área de concentração: Cultura e Informação
Orientadora: Nair Yumiko Kobashi
São Paulo
2017
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou
eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.
Catalogação na Publicação Serviço de Biblioteca e Documentação Escola de Comunicações e Artes
da Universidade de São Paulo Dados fornecidos pela autora
Amaral, Cléia Márcia Gomes
Organização e tratamento da informação nos arquivos: estudo crítico /
Cléia Márcia Gomes Amaral; orientadora, Nair Yumiko Kobashi. - 2017.
202 f.
Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Ciência da
Informação - Escola de Comunicações e Artes, ECA / Universidade de São
Paulo. São Paulo, 2017.
Versão corrigida
Bibliografia 1. Tratamento da informação 2. Arquivística 3. Arquivos I.
Kobashi, Nair Yumiko, oriente. II. Título.
CDD 21.ed. - 020
FOLHA DE APROVAÇÃO
Nome: Cléia Márcia Gomes Amaral
Título: Organização e tratamento da Informação: estudo crítico
Tese apresentada à Escola de Comunicação e Artes da Universidade
de São Paulo para a obtenção do titulo de Doutor em Ciência da
Informação
Profa. Dra. Georgete Medleg Rodrigues
Instituição: Universidade de Brasília, UnB
Julgamento: Aprovado
Prof. Dr. Daniel Flores
Instituição: Universidade Federal de Santa Maria, UFSM
Julgamento: Aprovado
Profa. Dra. Ligia Maria Arruda Café
Instituição:Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC
Julgamento: Aprovado
Profa. Dra. Marilda Lopes Ginez de Lara
Instituição: Universidade de São Paulo, USP
Julgamento: Aprovado
Profa. Dra. Nair Yumiko Kobashi (Orientadora)
Instituição: Universidade de São Paulo, USP
Julgamento: Aprovado
DEDICATÓRIA
Ás minhas avós Maria Ferreira de Oliveira e Joana Soares Alkimim pela existência.
Os meus sobrinhos Isabela, João Antônio, Mariana e Miguel pela alegria de viver.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a minha orientadora Professora Doutora Nair Yumiko Kobashi por este
tempo de prazerosa e feliz convivência. Sinto-me profundamente agradecida e
honrada por ter sido recebida como sua orientanda. Os ensinamentos serão eternos.
Agradeço as professoras do Curso de Graduação em Biblioteconomia da UFMG
Márcia Milton Viana e Mônica Cardoso Pitella que me apresentaram o caminho da
pesquisa e da educação.
Agradeço a Professora Doutora Christine Nougaret que me recebeu para um estágio
de doutorado na École Nationale de Chartes, onde pude ampliar os meus horizontes
do conhecimento sobre os arquivos.
Agradeço aos professores da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de
São Paulo pela grata convivência e pelos ricos ensinamentos.
Agradeço a todos os meus alunos da Pontifica Universidade Católica de Minas
Gerais por me fazer ter a certeza de que a minha escolha pelo aprendizado contínuo
foi a melhor.
Agradeço em especial aos colegas do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte
onde iniciei a minha caminhada pelos arquivos. Foi com eles que aprendi a me
deslumbrar todos os momentos com o mundo dos arquivos, o que me fez chegar até
aqui.
RESUMO
AMARAL, C. M. G. Organização da informação nos arquivos: estudo crítico. Tese
(Doutorado em Ciência da Informação – Escola de Comunicação e Artes.
Universidade de São Paulo), São Paulo, 2017. 201f.
A organização e tratamento da informação nos arquivos é um processo essencial na
prática arquivística, que comporta um conjunto de atividades encadeadas para
propiciar pesquisas e acesso aos documentos nela abrigados. O objetivo inicial da
presente pesquisa foi compreender as teorias e métodos subjacentes a esse
conjunto de processos. A hipótese inicial foi a de observar as teorias e práticas
arquivísticas de organizar e tratar documentos e apontar suas interações com a
Ciência da Informação. A pesquisa, de natureza qualitativa, utilizou o método
hipotético dedutivo como ponto de partida, tendo como objeto empírico um corpus
de artigos científicos da área da arquivística, do período de 2000-2015. Foi possível
identificar nesse corpus as mudanças propostas para a realização de atividades de
classificação, indexação, descrição arquivística, normalização e diplomática, ao
longo desse período. Ao final, foi possível constatar que a arquivística é uma
disciplina com fundamentos teóricos e práticos sedimentados, conta com um
conjunto de métodos, procedimento e instrumentos específicos para organizar e
tratar a informação. Foi possível identificar conceitos comuns entre a Ciência da
Informação e a Arquivística, tais como classificação, análise de informação e
indexação, entre outros. No entanto, não há ligação teórica ou prática explícita entre
as duas áreas, visto que esses conceitos, na arquivística, são utilizados atrelados
aos princípios arquivísticos da proveniência, da ordem original e do ciclo de vida dos
documentos. Com base nesses princípios, a arquivística responde adequadamente,
aos problemas contemporâneos relacionados ao complexo problema da
autenticidade dos documentos digitais. Trata-se, portanto, de uma área em contínuo
desenvolvimento, que constrói teorias, métodos e procedimentos próprios que
respondem satisfatoriamente às demandas sociais de busca e acesso a informações
para garantir os direitos dos cidadãos e a gestão de políticas públicas.
Palavras chave. Arquivística. Organização da informação. Classificação. Indexação.
Descrição arquivística.
ABSTRACT
AMARAL, C. M. G. Information organization in archives: a critical approach. 190f.
Dissertation (Doutorado em Ciência da Informação – Escola de Comunicação e
Artes. Universidade de São Paulo), São Paulo, 2017, 201f.
The organization and information processing in archives is an essential process in
archival practices and includes a set of linked activities to facilitate the search and
access to documents. The initial objective of this research was to understand the
fundamental theories and methods that support this process. The initial hypothesis
was to explore the relations of the archival practices of document processint and
organization to point out their interactions with Information Science. This research
has qualitative approach, used the hypothetical deductive method as a starting point
and the content analysis of a corpus of scientific articles presented in serials
dedicated to archival sciences, published in 2000-2015. It was possible to identify
common concepts used in Archival science and Information Science, such as
classification, analysis and indexing, but this does not denote an explicit theoretical
and practical connection between the two domains, since these concepts are used in
the archival science coupled with the archival principles of provenance, original order
and the document life cycle. Based in these principles, the Archival Science present
solutions, to the contemporary questions as the complex problems related to the
authenticity of digital documents. It was possible to identify the changes that occurred
in the activities of classification, indexing, archival description, normalization and
diplomatics throughout this period. Archival Science is a domain that develops
reflecting and constructing specific theories, methods and procedures to promote
satisfactory responses to social demands of access to information to the citizens and
to the management of public policies.
Key words. Archival science. Organization of information. Classification. Indexing.
Archival description.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Fases de evolução da arquivística ........................................ 34
Figura 2. Termo “Classification”: definição e relações.......................... 116
Figura 3. Termo Classification............................................................... 124
Figura 4. Termo Indexing...................................................................... 139
Figura 5. Termo Archival description .................................................... 151
Figura 6. Termo Diplomatic .................................................................. 172
LISTA DE QUADROS
Pag.
Quadro 1 – Normas de descrição – resumo .......................................................
81
Quadro 2 - Composição da amostra por periódicos nacionais e internacionais. ....................................................................................................
121
Quadro 3 - Artigos sobre “Classificação” ............................................................
126
Quadro 4 – Artigos sobre “Indexação” ................................................................ 141
Quadro 5 – Artigos sobre “Descrição arquivística – definição” ...........................
152
Quadro 6 – Artigos sobre “Descrição arquivística – princípios arquivísticos”...
150
Quadro 7 – Artigos sobre “Descrição arquivística – aplicação” ........................
161
Quadro 8 – Artigos sobre “Descrição arquivística – normalização” ...................
164
Quadro 9 – Artigos sobre “Diplomática” .............................................................. 173
LISTA DE SIGLAS
AACR2 – The anglo-American Cataloguing Rules, Second Edition
AFNOR - Association Française de Normalisation
CONARQ – Conselho Nacional de Arquivos
CPBS – Comitê de Boas Práticas para Normalização
DACS - Describing Archives: A Content Standard
EAC (CPF) - Encoded Archival Context – Corporate Bodies, Person, Families)
EAD - Encoded Archival Description
ICA – International Council Archives
IFLA - International Federation of Library Associations and Institutions
ISAAR (CPF) - Standard Archival Authority Record for Corporate Bodies, Persons
and Families
ISAD (G) - The General International Standard Archival Description
ISDF - The International Standard for Describing Functions
ISDIAH - The International Standard for Describing Institutions with Archival Holdings
ISO – International Organization for Standarization
NOBRADE - Norma Brasileira de Descrição Arquivística
UNESCO – United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................... 15
1.1 PROBLEMATIZAÇÃO ............................................................................ 20
1.2 HIPÓTESE DE TRABALHO ................................................................... 21
1.3 OBJETIVOS: GERAL E ESPECÍFICOS ................................................ 24
1.4 JUSTIFICATIVA ..................................................................................... 24
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................
26
2.1 OS ARQUIVOS E A ARQUIVÍSTICA .................................................... 26
2.2 ORGANIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO .................................................... 35
2.3 ORGANIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO NOS ARQUIVOS ........................ 38
2.4 DEFINIÇÃO DE DOCUMENTO ............................................................. 41
2.4.1 As bases de Paul Otlet e Suzanne Briet ............................................ 41
2.4.2 O documento nas ciências sociais e da informação ........................ 44
2.4.3 A teoria do documento ........................................................................ 46
2.5 DOCUMENTO NA ARQUIVÍSTICA ....................................................... 49
2.6 PRINCÍPIOS DE FUNDAMENTAÇÃO DA PRÁTICA ARQUIVÍSTICA .. 53
2.6.1 Princípio da territorialidade ................................................................ 53
2.6.2 Princípio da proveniência ................................................................... 54
2.6.3 Abordagem das três idades ou ciclo de vida dos documentos ....... 57
2.7 GESTÃO DE DOCUMENTOS ............................................................... 60
2.7.1 A Gestão de documentos e o ciclo de vida dos documentos ......... 62
2.7.2 Normas do records management ...................................................... 66
2.7.3 Implantação da gestão de documentos.............................................. 69
2.7.4 Avaliação de documentos ................................................................... 70
2.8 DESCRIÇÃO DE DOCUMENTOS ARQUIVÍSTICOS ........................... 71
2.8.1 A normalização da descrição ............................................................. 76
2.8.2 As normas de descrição arquivística – Histórico de criação .......... 78
2.9 DIPLOMÁTICA ARQUIVÍSTICA ............................................................ 83
2.9.1 INTERPARES.......................................................................................... 88
2.10 CLASSIFICAÇÃO NOS ARQUIVOS ...................................................... 90
2.11 REGIME DE INFORMAÇÃO .................................................................. 94
2.12 TEORIAS DE LINGUAGEM ................................................................... 96
3 METODOLOGIA DE PESQUISA ......................................................... 104
3.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .............................................. 108
3.2 COLETA DOS DADOS PARA CONSTITUIÇÃO DO CORPUS ............ 108
3.2.1 Gazette des Archives ........................................................................... 108
3.2.2 Archival Science ................................................................................. 109
3.2.3 The American Archivist ....................................................................... 110
3.2.4 Archivaria .............................................................................................. 110
3.2.5 Acervo ................................................................................................... 111
3.3 PERÍODO DE COBERTURA ................................................................. 112
3.4 COMPOSIÇÃO DO CORPUS ................................................................ 112
3.5 DEFINIÇÃO DAS CATEGORIAS DE ANÁLISE .................................... 114
4 ANÁLISE DO CORPUS ......................................................................... 122
4.1 CATEGORIA CLASSIFICAÇÃO ........................................................... 122
4.1.1 Definições de classificação nos arquivos ......................................... 126
4.1.2 As bases teóricas de elaboração de classificações ......................... 132
4.1.3 Os produtos da classificação ............................................................. 133
4.1.4 Críticas ao uso da classificação nos arquivos ................................. 134
4.2 CATEGORIA INDEXAÇÃO .................................................................... 137
4.2.1 Definição de indexação ....................................................................... 141
4.2.2 Aplicação da indexação ...................................................................... 142
4.2.3 Críticas à indexação ............................................................................ 146
4.3 CATEGORIA DESCRIÇÃO ARQUIVISTICA E NORMALIZAÇÃO ................... 149
4.3.1 Descrição arquivística – definição ..................................................... 151
4.3.2 Descrição arquivística – princípios arquivísticos ............................. 155
4.3.3 Descrição arquivística – função ......................................................... 160
4.3.4 Descrição arquivística – normalização .............................................. 163
4.3.4.1 Importância da normalização nos arquivos ............................................ 164
4.3.4.2 Normas de descrição arquivística específicas ....................................... 167
4.3.4.3 As normas de descrição para o meio digital .......................................... 168
4.4 CATEGORIA DIPLOMÁTICA ................................................................. 171
4.4.1 A diplomática de Luciana Duranti....................................................... 173
4.4.2 A diplomática e o conceito de evidência............................................ 177
4.4.3 Análise arquivística.............................................................................. 178
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................... 182
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 189
APENDICE – Lista dos artigos analisados 199
15
1 INTRODUÇÃO
A arquivística contemporânea tem sido objeto de estudos de vários
pesquisadores que discutem seu papel enquanto ciência ou disciplina do
conhecimento, sua função, suas práticas. Tais estudos podem ser sistematizados
em categorias: a) em uma primeira categoria, encontram-se autores que tratam dos
fundamentos da disciplina e seus desafios paradigmáticos, como Terry Cook
(1996,1997), Ketellar & Thomassen (1998), Dahlin (2000), Bruno Delmas (2010); b)
uma segunda categoria é constituída de estudos que abordam a relação entre a
Hstória e a Arquívistica, como o de Duchein (1992) e Devriese (2014); c) uma
terceira categoria pode reunir estudos que apontam a necessidade de elevar o
estatus da disciplina dentro das ciência sociais, tal como o de Bertram Muller (2011);
d) em uma quarta categoria, podem ser incluídos textos de natureza epistemológica,
os quais interrogam direta ou indiretamente o conceito e a noção de arquivo e, em
decorrência, cobram mudanças em relação ao seu papel científico, social e político.
Os autores principais dessa corrente são Michel Foucault, com seu livro
“Arqueologia do saber” (1969), Paul Ricoeur, autor de Temps et récit, (1983) e La
mémoire, l’histoire, l’oubli, (2003) e Jacques Derrida, com “Mal de arquivos. Uma
impressão freudiana”.
Os impactos tecnológicos na área da arquivística, como as mídias digitais, a
digitalização, a internet, as ferramentas de aceso à informação em suas variadas
formas constituem uma quinta categoria. Nesse contexto, são destacados os
desafios teóricos e práticos colocados para a área, chamando-se atenção para os
limites tênues entre dados, documentação, documento e arquivo. São exemplos
dessa categoria autores como Luciana Duranti (2001), Bertram Muller (2008),
Christine Nougaret e Françoise Banat-Berger (2014) e Céline Guyon (2015).
Finalmente, em uma sexta categoria, encontram-se estudos recentes que
indicam a necessidade de renovar o campo por meio de rupturas, cujo cerne é a
proposição de novas alternativas de organização e tratamento de informações,
contrapostas às concepções tradicionais, em face dos novos usos dos arquivos. Os
autores que se destacam nessa vertente são Anne Klein, Yvon Lemay (2013,2014) e
Bénédicte Grailles (2014).
As obras desses autores possibilitam compreender a arquivística
contemporânea, disciplina que se constituiu a partir de duas ações fundadoras: a
16
publicação do Manual de arranjo e descrição de arquivos dos holandeses (1898) e
do Manual de Jenkinson, dos ingleses (1922). Ambos são trabalhos oriundos de
contextos históricos específicos e de tradições arquivísticas distintas. Os holandeses
estão ligados ao império austro-húngaro, agora desmembrado, com a necessidade
de organizar e tratar os arquivos herdados do império desfeito. O referido manual
privilegia a organização dada pelo arquivista, responsável por colocar ordem na
desordem presente, para preservar a ordem original dada pelo órgão administrativo
no qual o documento foi produzido, interessante para a pesquisa histórica. Mas
deixa aberta a possibilidade de o arquivista “refazer” a ordem original.
Jenkinson, por sua vez, confere o papel central na organização ao produtor
do documento, não privilegiando, portanto, a visão do historiador, mas a do criador e
do provável usuário. Aqui, a ordem original deve ser seguida à risca. Essa
abordagem traduz uma recusa radical a todo tipo de interversão subjetiva no
tratamento e classificação dos documentos de arquivo. Segundo Devriese (2014,
p.27), Jenkison considera o documento e não o seu conteúdo, cita que “Jenkison ne
considère que le <documento> (record) et non pas <ce qui il documente>>”. É a
aplicação do princípio da neutralidade axiológica de Max Weber1 no tratamento do
documento de arquivo.
A arquivística contemporânea e o Records Management se desenvolvem
nesse contexto e se sustentam na obediência ao princípio da neutralidade. Pode-se
afirmar, nesse sentido, que essas linhas de pensamento e de ação procuram
desconectar o documento de sua função histórica, por ser ele uma peça resultante
de uma ação, ou utilizada para praticá-la, e não propriamente uma fonte de
informação. Assim se dá a separação entre arquivo histórico, que tem como base o
manual dos holandeses, em que o arquivista interpreta e organiza, e o Records
management, em que prevalece a neutralidade na organização dos documentos. A
separação entre a arquivística clássica, histórica e a contemporânea se dá não
apenas nos princípios de partida adotados, mas principalmente nos métodos de
organização dos documentos arquivísticos.
1 Segundo Lessa (2013) O termo axiologia (do grego axiologos, digno de ser dito) começou a ser
empregado no começo para designar o estudo dos valores que até então se estruturava nos valores morais. Max Weber utiliza o termo no sentido amplo e consiste em estabelecer uma distinção entre o registro dos fatos e as avaliações de valor. Na Metodologia das Ciências Sociais de Max Weber, e uma das principais categorias empregadas por ele na concepção da atividade de pesquisa e na construção teórica do seu objeto, a ação social.
17
Em forma de síntese, pode-se afirmar que a arquivística vem sendo
impactada por questões de natureza teórica, metodológica e tecnológica. As ideias
criadas no pós-estruturalismo ou pós-modernismo2 e as tecnologias da informação e
comunicação, com o surgimento de documentos digitais, são expressões desses
impactos. Um dos principais autores dos questionamentos teóricos é o filósofo
francês Michel Foucault, que apresenta seus argumentos em seu livro Arquelologia
do saber (2014). A principal característica desse pensamento é a desconstrução das
ideias totalitaristas vigentes e o retorno do sujeito como protagonista das ações. A
realidade social é uma construção subjetiva em constante movimento. Os estudos
do pós-estruturalismo se deslocam em direção aos estudos dos problemas da
consciência que os homens têm dos seus atos. Os sistemas sociais são analisados
também sob o prisma das motivações insconscientes, ou seja, as novas abordagens
partem dos fenômenos das ações significantes e não aparentes, para explicar a
consciência dos atores. Portanto, o estudo das ações humanas é o foco para
compreender a realidade e conhecer as intenções conscientes dos atores. Isso
provoca mudanças nas metodologias de busca de conhecimentos científicos.
A área da arquivística é profundamente afetada por essas ideias, cujos
impactos mais significativos se expressam nas concepções sobre os processos de
organização e tratamento de documentos. Os documentos de arquivo organizados
segundo o princípio de respeito aos fundos, ou principio da proveniência definida
pelo produtor, ou pela interpretação subjetiva do arquivista são contestados como
elementos únicos para retratar ações e atividades dentro das organizações. Assim, a
comprovação dos elementos de evidência necessita de intervenção interpretativa
humana para ter o status de documento arquivístico. A neutralidade arquivística é,
portanto, posta à prova.
Disciplinas de áreas afins da arquivística contribuem para criar as bases de
fundamentação para novas práticas. A diplomática medieval, por exemplo, tem sua
base disciplinar incorporada à diplomática contemporânea, para tratar documentos
em meio eletrônico (Luciana Duranti, 1989) e os métodos de análise arquivística
2 Para este trabalho, compreendemos o conceito de pós-estruturalismo como sendo o movimento intelectual de
reação de pensadores alemães e franceses do século XX que procuraram refletir e compreender o fenômeno
da progressiva opressão da vida humana exercida de forma planejada, racional e científica e a impotência do
indivíduo perante o poder anônimo das grandes organizações burocráticas. São reflexões sobre a sociedade
do pós-guerra e dos regimes totalitaristas. São representados pelos filósofos frankfurtianos Adorno,
Horkheimer e Marcuse e Foucault e Deleuze. A idéia pós-estruturalista pensam o papel e a importância da
ação do individuo na sociedade. No contexto dos arquivos aborda o questionamento dos arquivos como
instrumento de poder de regimes totalitários. BUENO (2015).
18
propostas por Gérard Naud (1989, 2012) são reconhecidos e incorporados às
Normas Internacionais de Descrição Arquivística ISAD (G) (2006).
É possível pensar o campo da arquivística como um “avatar polymorphe”
(Devriese, 2014) proveniente do Direito positivo, da História, das teorias da
informação e da documentação. Um objeto híbrido que, a partir da ciência
administrativa, se constitui segundo dois braços maiores: de um lado para servir
contra ou a favor do poder público e, de outra parte, para a construção das
identidades coletivas.
Em 1994, o filósofo francês Jacques Derrida proferiu uma conferência no
colóquio internacional Memória: a questão dos arquivos, em que refletiu sobre a
natureza dos arquivos históricos. A conferência foi publicada em 1995, sob o título
Mal de Arquivo: uma impressão Freudiana. Derrida (2001) desenvolveu sua reflexão
por meio da analogia entre os arquivos e a psicanálise. Admitia o arquivo como o fio
condutor para a formação da memória, a partir de seu estoque de “impressões”, e
ressaltava que, não por acaso, privilegia as figuras da marca e da tipografia, a
“censura e o recalcamento, a repressão e a leitura dos registros” (p. 9), como forma
de criar espaços e retratar ações. Essa reflexão dá início a uma nova abordagem
dos estudos arquivísticos e à estruturação dos arquivos na contemporaneidade.
Essa conferência de Derrida deu origem a trabalhos que discutem as
mudanças nos arquivos, tais como o de Cook (1997, 2001); Eric Ketelaar (1999,
2001); Fredriksson (2003), Tom Nesmith (1999), Brietn Brothman (1999) e outros.
Essas publicações abordam explicitamente o papel dos arquivos como instituições
responsáveis pela formação da memória oficial e exploram, também, os impactos
das tecnologias digitais no conceito de arquivo e sua função nesta nova
configuração. Referidos trabalhos chamam a atenção para a instabilidade dos
documentos de arquivo no meio digital, porque eles podem sofrer alterações ou
serem eliminados; discutem também a importância do texto do documento e sua
relação com a linguagem e a escrita.
Terry Cook (2001), em um artigo histórico, Archival Science and
postmodernism: new formulations for old concepts, publicado no primeiro número do
periódico Archival Science, aborda a ocorrência de uma mudança paradigmática na
área. Ele pontua os vários elementos que podem ser identificados nas alterações
operadas na ciência arquivística, principalmente em relação aos documentos. Nessa
nova visão, os documentos não mais são vistos como produto passivo da atividade
19
humana ou administrativa, mas como “agentes ativos na formação da memória
humana e organizacional” (p.4). Segundo Cook (2001), o discurso teórico
arquivístico modifica ênfases: de produto para processo, de estrutura para função,
de arquivos para arquivamento, de registro para contexto de registro, de resíduo
“natural” ou subproduto passivo da atividade administrativa para memória social
construída conscientemente e mediada ativamente.
No prefácio do livro dos canadenses, Rousseau e Couture (1998) e F. Evans
(1998) também ressalta a ampliação do conceito de documento como consequência
das alterações ocorridas na administração públicas: “Assim, os arquivistas devem
reexaminar os seus conceitos tradicionais, os seus princípios e métodos e modificar
ou substituir as práticas herdadas que já não se coadunam com as necessidades
actuais (sic)” (p. 18). Também Eastwood (1993), citado por Cook (2001) observou
que “é necessário entender o meio político, econômico, social e cultural de qualquer
sociedade para entender seus arquivos” (apud COOK, 2001), assim como suas
práticas e funções na sociedade contemporânea.
A estruturação da arquivística como disciplina fundamentou-se na
admissibilidade do documento, enquanto suporte, como seu objeto prioritário. Pode-
se afirmar que as mudanças provocadas nessa disciplina estão largamente
relacionadas àquelas sofridas pelo conceito de documento de arquivo. Em
decorrência, a arquivística descritiva cria os instrumentos essenciais para a
organização de acervos documentais, sustentada pelo Princípio da Proveniência e
pelas disciplinas Diplomática, História e Administração.
Pode-se observar que a função clássica do arquivo remete à concepção de
que os documentos, enquanto instrumentos de prova de ação (DURANTI, 1994),
devem ser resguardados para preservar e retratar as instâncias de poder das
organizações e contribuir para o resgate da memória organizacional. Na arquivística
tradicional, portanto, o foco da atividade centra-se na descrição do documento,
nascido naturalmente, e na preservação dos seus elementos originais.
Desse modo, a organização da informação nos arquivos, na visão tradicional,
fundamenta-se no Princípio da Proveniência e o Princípio da Manutenção da Ordem
Original. São esses princípios que definem as regras de organização dos
documentos. A não alteração da ordem é, portanto, um princípio básico,
fundamental; e sua desobediência provoca vários riscos: a perda dos vínculos e
20
laços do documento com o criador e a perda das funções de prova e verdade que
deve resguardar.
Porém, a função dos arquivos, como instituição social, se modifica no tempo e
evolui baseada na ideia de que contribuem para a construção da memória coletiva e
social, a partir das ações de indivíduos socialmente envolvidos em diferentes
contextos. Nessa medida, os profissionais que atuam em arquivos começam a
desenvolver novas atividades e instrumentos de organização, tratamento e
recuperação. Portanto, nas atividades arquivísticas contemporâneas, as práticas
anteriores, restritas à descrição física, classificação e ordenação dos documentos,
tornam-se insuficientes para atender a esses novos papéis. Os documentos passam
a ter novos atributos, sendo dada maior importância às necessidades informacionais
dos usuários. Assim, o documento, na nova concepção, é um objeto informacional
complexo, com características que precisam ser interpretadas para terem uso social
mais amplo. Essa ideia fundamenta a arquivística funcional, na qual as práticas de
organizar informação assumem a função de dizer sobre os contextos em que o
conteúdo do documento é produzido, bem como de mostrar as relações com outros
documentos. Nessa configuração, ganham importância as teorias sociais e o
conhecimento interdisciplinar para fundamentar teórica e metodologicamente a área.
1.1 PROBLEMATIZAÇÃO
Na sociedade contemporânea, ampliam-se as condições de criar, armazenar
e acessar informações em meio digital. Diversas áreas que lidam com a informação,
como o jornalismo, a publicidade, a Ciência da Informação, a museologia e a
arquivística são afetadas por essa configuração. Essas mudanças têm provocado,
necessariamente, a revisão de teorias, métodos e as práticas dos profissionais que
lidam com o fenômeno informacional. De fato, as atividades de organizar a
informação e o conhecimento têm incorporado cada vez mais em seu fazer a
realidade do meio digital, os contextos dos usuários da informação e, principalmente,
as relações interdisciplinares com outras áreas do conhecimento. Esse contexto
suscita diversas questões. Esta pesquisa limitou-se a duas indagações: 1) quais são
os traços que caracterizam a arquivística, na contemporaneidade? 2) Quais são as
principais modificações teóricas e metodológicas que incidiram ou influenciou o fazer
arquivístico?
21
1.2 HIPÓTESE DE TRABALHO
Pode-se levantar a hipótese de que o contexto social provocou alterações nas
teorias e métodos arquivísticos. Nessa medida, houve modificações em diversos
conceitos próprios do campo da arquivística, como seu objeto – o documento de
arquivo –, nos princípios teóricos que fundamentam a prática de organização da
informação e na caracterização dos usuários dos documentos de arquivo. O
documento de arquivo é, em princípio, visto como um elemento informacional
materializado, resultante de processos sociais, construído com intenções
específicas. Assim, ele é complexo, passível de interpretações e suscetível aos
elementos do contexto de criação e dos possíveis usos enquanto um produto social.
Para organizar, tratar, analisar e criar representações desse documento, a
arquivística necessita de um arcabouço teórico que fundamente de forma adequada
a sistematização das atividades, os processos e a criação de ferramentas e produtos
que possibilitem atender a uma ampla diversidade de usos que o documento de
arquivo pode ter no contexto atual.
A Arquivística, nesses processos de renovação de suas concepções,
estabeleceu novos diálogos, como, por exemplo, com a Ciência da Informação,
disciplina que se preocupa com a organização do conhecimento humano para
disseminação de informações sobre esse saber. Nesse contexto, pode-se indagar: é
possível utilizar os métodos discutidos e propostos pela Ciência da Informação para
tratar e organizar documentos de arquivo? A Ciência da Informação recorre aos
conhecimentos teóricos de várias áreas para responder às necessidades de lidar
com o trabalho de organização da informação e do conhecimento, tais como a
comunicação, as ciências da computação, as ciências da linguagem e as ciências
sociais. Os conceitos de regime informacional e as teorias da linguagem são
exemplos de conhecimentos que vêm trazendo importantes contribuições para a
Ciência da Informação.
O conceito de regime de informação de Bernd Frohmann (1995), em
particular, possibilita a análise dos aspectos públicos e sociais da informação para
entender o complexo universo da produção dessa informação na atualidade para
obter os efeitos que respondam a interesses diversos. Nessa medida, entender
como esses processos afetam o indivíduo nos contextos público, privado, social e
22
político torna-se fundamental. As teorias da linguagem, por sua vez, apresentam um
arcabouço teórico e metodológico capaz de auxiliar na tarefa de analisar e descrever
e interpretar os registros de informação em sua enorme diversidade. Os conceitos
de símbolo, signo, forma, sentido e significado, bem como os de semântica e
pragmática são utilizados em vários estudos relacionados ao processo de
organização e recuperação da informação.
Se o documento de arquivo for compreendido como um registro de
informação produzido em contextos informacionais complexos, pode-se, por
analogia, considerar que os conceitos de regime informacional e as teorias da
linguagem podem contribuir para a definição de atividades de organização da
informação em arquivos.
Em texto sobre a Organização da Informação, Gonzáles de Gómez (1993)
ressalta que o contexto social atual demanda que esta área adote modelos
analíticos descritivos, relacionais e construtivistas que possibilitem, nos produtos da
organização da informação, refletir ou retratar a complexa matriz de relações entre
atores e as práticas sociais de comunicação e informação. Os avanços nos estudos
da Ciência da Informação, com a incorporação de perspectivas linguísticas,
possibilitaram a criação de formas de representação do conhecimento específicas.
Por analogia, pode-se considerar que os estudos da linguagem podem ser
importantes para atender às demandas de informações acumuladas em arquivos.
Com efeito, Bondia (2002) parte da convicção de que “as palavras produzem
sentido, criam realidades e, às vezes, funcionam como potentes mecanismos de
subjetivação" (p. 21). As experiências e as incertezas são também coletivas e
externas ao homem, o que gera o acúmulo de conhecimentos, difíceis de serem
absorvidos, lidos e gerenciados. As palavras são usadas para registrar, dar
materialidade e fisicalidade aos documentos de arquivo, sendo igualmente um
mecanismo de subjetivação, sugerindo, portanto, a impossibilidade de organizá-los
como veículos exatos e objetivos de comprovação das ações humanas. Pode-se,
nessa medida, questionar os princípios tradicionais que fundamentam a organização
da informação dos documentos de arquivo e perguntar se esses instrumentos
tradicionais possibilitam expressar realidades e experiências e ressaltar a riqueza de
informação neles contida.
Com base nessas reflexões, foram adotadas como referenciais teóricos, as
teorias da linguagem e o conceito de regime informacional, tidos como fundamentos
23
para a análise dos discursos sobre a organização e tratamento de documentos de
arquivos.
As respostas para os questionamentos colocados apontam, portanto, para a
necessidade de abordagem epistemológica da arquivística que, na configuração
contemporânea, rompe e propõe o distanciamento das visões teóricas e práticas
tradicionais, porque essas visões a impedem de fundamentar o seu fazer prático, em
particular no que se refere à organização da informação arquivística.
Na perspectiva abordada, a arquivística sai do âmbito de uma ciência
fundamentada no racionalismo científico e positivista para o de uma disciplina
científica fundamentada em teorias sociais, de análise e adaptação de contextos, de
visões, de interpretações e de subjetividade. O seu objeto, até então o documento
de arquivo, algo real, único e concreto, produzido naturalmente em função das
ações do homem em seus domínios e nas organizações, passa a considerar o
documento como um registro informacional, construído intencionalmente. Essa
concepção é responsável por mudanças significativas nas teorias arquivísticas, fato
que poderá ser identificado quando da análise dos discursos apresentados em
periódicos científicos da área, o que permitirá sistematizar as mudanças
epistemológicas operadas no campo. O diagnóstico dessa literatura permitirá
mapear as principais mudanças relativas ao conceito de documento e as novas
propostas voltadas para a criação, manutenção e gerenciamento desse objeto.
Partiu-se da compreensão de que a renovação das teorias e métodos de
organização da informação nos arquivos foi determinada por seus diálogos com as
ciências da linguagem e pelo seu entendimento das relações sociais, que são
determinantes na construção do seu objeto, o documento de arquivo, e,
consequentemente, nas práticas para o seu tratamento e organização. Assim sendo,
se estabeleceu como hipótese inicial, que a compreensão do processo de
organização e tratamento da informação está no cerne da renovação do saber
teórico e prático da arquivística. Este estudo buscou, por meio da análise de
conteúdo de um corpus representativo da literatura de Arquivística, a compreensão
desse processo, bem como as bases para sustentar a hipótese de trabalho.
24
1.3 OBJETIVOS: GERAL E ESPECÍFICOS
O objetivo geral deste estudo é analisar os aspectos epistemológicos, teóricos
e metodológicos da organização e tratamento de informação propostos pela
arquivística contemporânea, veiculada em artigos de periódicos selecionados da
produção científica na área, a fim de se verificar o papel das teorias e metodologias
de organização da informação em arquivos contemporâneos, identificar as teorias
que vêm contribuindo para a renovação das concepções e práticas da área da
arquivística e mostrar elementos que justifiquem a metodologia de organização e
tratamento da informação.
Um dos objetivos específicos desta pesquisa é estudar a evolução da prática
de organização e tratamento da informação nos arquivos apresentados pelos
estudiosos, para entender em que medida essas mudanças influenciam a atividade
prática da arquivística.
Outro objetivo específico é avaliar a evolução da prática de organização e
tratamentos dos documentos nos arquivos, pelo exame dos elementos teóricos que
fundamentam essa prática, e perceber como essas teorias são expressas em
processos e atividades para o tratamento dos documentos nos arquivos.
Por último, pretende-se analisar a existência ou não de elementos teóricos ou
práticos que possam comprometer a qualidade da atividade de organização e
tratamento de documentos nos arquivos.
Após o estudo do corpus e análise do conteúdo, foi possível a identificação e
sistematização dos princípios de organização e tratamento da informação
tradicionais e seu julgamento por meio dos princípios adotados
contemporaneamente.
1.4 JUSTIFICATIVA
A organização da informação em arquivos e sua classificação, em especial, é
processo central na arquivística. O Princípio da Proveniência foi criado para coibir
práticas de classificação que pudessem comprometer a organização e a integridade
do arquivo. Sousa (2007) destaca que “uma função tão importante merece estudos
mais aprofundados, não apenas descritivos. Precisamos de trabalhos que
verticalizem teoricamente a questão” (p. 79). Por parte da Ciência da Informação, a
25
organização da informação é considerada uma área nuclear, em torno da qual se
estruturam as questões relacionadas ao fenômeno informacional, como produção,
recuperação e acesso a conteúdos informacionais.
Estudos sobre a atividade de organização da informação são fundamentais na
Ciência da Informação e nas ciências que têm o fenômeno informacional como
objetos de reflexão e de práticas. No caso dos arquivos, essa organização implica
certificação dos documentos produzidos no interior das instituições.
Considerando a Arquivística como uma Ciência da Informação, muitos são os
autores que enfatizam a necessidade de estudos que caracterizem ou aproximem as
duas áreas (Fonseca, 2005; Silva, 2002; Lopes, 2000).
Rousseau e Couture (1998), por exemplo, destacam a importância do papel
social do arquivísta, enfatizando que ela deve maximizar a sua eficácia
administrativa e profissional “através da instauração, manutenção e desenvolvimento
de uma gestão saudável da informação (...) e permitir a emergência de pontos de
concentração com os outros técnicos das ciências da informação a fim de servir
ainda melhor a sociedade” (p. 24). Eles se referem à visão global e integrada dos
arquivos. Eles ressaltam, ainda, “o papel contemporâneo que é de uma gestão
saudável da informação orgânica”.
Assim como a Ciência da Informação – uma ciência social aplicada, a
Arquivística tem suas raízes fundamentadas nos fenômenos sociais e institucionais.
Portanto, seus processos e atividades são afetados pelo contexto em função da
intencionalidade de criação dos registros de dados, de informação, dos documentos
e pela inserção das tecnologias digitais. Desse modo, estudos que visam investigar
sua fundamentação teórica, seus objetos e seus métodos – enquanto Ciência da
Informação social – podem contribuir para o fortalecimento da identidade da
arquivística e para a sociedade como um todo.
Os resultados desta pesquisa poderão colaborar com o fortalecimento das
bases teóricas que fundamentam a atividade de tratamento e organização da
informação nos arquivos, e assim auxiliar para que os estudos na área evoluam na
busca por sanar os problemas teórico-metodológicos novos ou aqueles que
persistem no tocante a organização e tratamento da informação em arquivos.
26
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O objetivo deste capítulo foi o de resumir a história de transição dos arquivos
na contemporaneidade, para dar suporte à problemática desta pesquisa e definir
pontos importantes para o desenvolvimento do trabalho.
2.1 OS ARQUIVOS E A ARQUIVÍSTICA
A existência dos arquivos está apoiada na história da civilização humana. O
desejo do homem de capturar, dominar ou vencer o tempo, preservar sua história,
suas memórias e o percurso de sua existência no espaço e no tempo está
intimamente relacionado ao nascimento da escrita e das formas de registrar
acontecimentos. A escrita permite ao homem organizar seu mundo, seus afazeres,
ordenar os acontecimentos, possibilitar lembrar e reconstruir eventos.
De acordo com o historiador Jean Favier (1975), a Arquivística tem seu
nascimento moderno definido pela instituição do princípio de respeito aos fundos e à
abordagem das três idades, que a definem como uma disciplina singular. Em uma
obra sobre a história dos arquivos, o autor expõe o que vem a ser um fundo de
arquivo, originário do princípio de respeito aos fundos. Esses tópicos foram
discutidos nos princípios de fundamentação da prática arquivística em outro ponto
deste referencial teórico.
Um texto fundamental, que mostra a evolução das teorias e seus impactos
nas práticas arquivísticas, elencando os elementos de transição da área, é o de
Terry Cook (1997; 2001). A escolha justificou-se pelo fato de o autor abordar a
evolução da arquivística fundamentada em análise da literatura da área e fornecer
uma relevante fonte de informação para aprofundamento de pontos importantes da
Arquivística e dos arquivos.
Cook (2001) expõe a evolução da arquivística tradicional com foco na
descrição do documento como o objeto principal do arquivo; com base nesta
concepção, são construídos os princípios que regem o processo de trabalho com os
documentos de arquivo. Este último, como instituição, desempenha sua função de
lugar de guarda e preservação do objeto documental em um espaço definido, único
e estático, sacralizado. Essa concepção, ao longo da evolução da arquivística,
27
caminha para um modelo de arquivo funcional, dinâmico, que acompanha a
evolução da sociedade, incorporando elementos que o fazem mais próximo dela, do
cidadão e, em decorrência, mais comprometido com a funcionalidade das
instituições.
Para compreender melhor como se dá a transição da concepção de arquivo
descritivo para o arquivo funcional, apresenta-se a seguir um resumo da evolução da
disciplina, a partir da arquivística tradicional, passando pela moderna até chegar à
chamada arquivística contemporânea ou pós-moderna.
A arquivística tradicional nasceu com base no positivismo lógico e no
racionalismo científico. O arquivo é compreendido como um conjunto de documentos
orgânicos, produzidos naturalmente no exercício das atividades das instituições. O
documento, por sua vez, é instrumento de fé e prova de verdade, que nasce como
consequência da atividade institucional. O suporte mais comum do documento
arquivístico é o papel e suas variações. O foco da prática arquivística, neste
contexto, é a preservação do documento para servir como prova. Os estudiosos que
fundamentam a arquivística tradicional são os holandeses S. Muller, J. A. Feith e R.
Fruin, autores do Manual de Arranjo e Descrição de Arquivos, publicado pela
primeira vez em 1898, e que apresenta um conjunto de regras práticas sobre como
organizar os arquivos. Dita obra se firma, ao longo do tempo, como um arcabouço
de princípios fundamentais da arquivística.
Outro autor que consolida a prática arquivística moderna e seus fundamentos
é o inglês Hilary Jenkinson, com a obra A Manual of Archive Administration,
publicada pela primeira vez em 1922. Essas e outras obras são disseminadas como
manuais práticos de rotinas de organização dos documentos de arquivos, em âmbito
internacional, constituindo-se em fundamentos da disciplina arquivística. O autor
promove o fortalecimento da arquivística nos países da Europa, principalmente por
compartilhar contextos evolutivos semelhantes de natureza histórica, política e
social.
Com a arquivística tradicional, nasce o Princípio da Proveniência ou de
Respeito aos Fundos, concebidos como dois parâmetros de normas aplicáveis de
forma universalizada em todos os contextos. O historiador francês Natalis de Wailly
emitiu uma circular, em 24 de abril de 1841, na qual propõe reunir em fundos “todos
os títulos (documentos) provenientes de um corpo, de um estabelecimento, de uma
família ou de um indivíduo, e dispô-los segundo uma determinada ordem”
28
(ROSSEAU e COUTURE, 1998, p. 80), ou seja, defendia a ideia segundo a qual a
organização dos documentos, nos arquivos, deveria seguir a estrutura hierárquica
de funcionamento da instituição que os produziu. Essa ordem estrutural de
organização de fundos arquivísticos não deveria ser modificada, isto é, os fundos
não deveriam ser reclassificados ou reordenados.
Essa concepção, sendo o principal fundamento da disciplina arquivística,
determina toda a lógica de formação, funcionamento e gestão, principalmente das
atividades de organização e tratamento dos documentos integrantes do arquivo.
Esses princípios pretendem assegurar a função primeira do documento de
arquivo como instrumento de prova das atividades realizadas nas instituições. Aliada
ao Princípio de Respeito aos Fundos e à Preservação da Ordem Original do
documento, a Proveniência estabelece modelos e regras rígidas de organização e
tratamento de documentos que perduram na arquivística ao longo de décadas.
Nasce desse modelo a arquivística descritiva, com foco na fisicalidade do
documento, em seu formato e nas relações com os demais componentes do
conjunto documental. A Diplomática e a História são as ciências que dão suporte
aos processos da arquivística tradicional. Os produtos decorrentes da organização
dos documentos arquivísticos são os arranjos de fundos arquivísticos e as
classificações de fundo, com base na estrutura dos organismos produtores dos
documentos. Nesse contexto, os principais usuários são o historiador e os
administradores de instituições.
A evolução da arquivística tradicional para a moderna tem como
representantes os norte-americanos T. R. Schellenberg (autor do Modern Archives)
e Charles M. Dollar, com seus trabalhos de preservação digital de documentos
eletrônicos, do NARA (National Archives and Records Administration), dos Estados
Unidos. Para eles, a arquivística procura apresentar soluções para os problemas da
produção crescente de documentos e suas consequências para os arquivos,
principalmente os históricos. O conceito de documento de arquivo se firma como o
registro documental de processos, criado naturalmente, com a função de retratar as
atividades de processos orgânicos, apresentado em diversas formas, inclusive no
formato digital. Conforme a tese desses autores, a prática arquivística privilegia a
racionalidade da produção de documentos e a gestão do processo de criação dos
mesmos, que agora contam com o auxílio das tecnologias de informação e
comunicação.
29
Aliada ao Princípio da Proveniência e Respeito aos Fundos tem-se a
“abordagem das três idades” (ROUSSEAU E COUTURE, 1998, p.126, 127)3, da qual
derivam os conceitos de “ciclo de vida” ou das 3 idades. Nessa perspectiva, têm-se
os arquivos correntes, intermediários e permanentes, que fundamentam as práticas
da produção e gestão de documentos. Cria-se e difunde-se, nesse contexto, o
conceito de Records Management, que propõe a adoção de práticas de avaliação e
seleção de documentos.
Para a organização dos documentos de arquivo são elaboradas ferramentas
de auxílio, tais como Políticas de Gestão de Documentos, Políticas de Seleção e
Avaliação e as Quadros de Temporalidade e Destinação de Documentos. A
classificação, antes estrutural, passa a ser também funcional e baseada nas
atividades orgânicas para acompanhar a dinâmica das mudanças nas estruturas das
organizações. Além dos tradicionais usuários dos arquivos, o historiador, os
membros das organizações, a administração pública e os órgãos dos Poderes
Executivo, Legislativo, Judiciário, o corpo administrativo de cada órgão passa a se
servir dos arquivos em busca da eficiência da administração pública, inclusive dos
processos legislativos e judiciais.
Nas décadas de 1950 e 1960, o campo da arquivística passa por uma fase de
transição entre o modelo tradicional e o modelo de organização iniciado no pós-
guerra. Schellenberg, em sua obra “Modern archives: principles and techniques”, de
1956, é um representante das mudanças que influenciaram a literatura e a prática
arquivísticas, nesse período.
A Austrália, os Estados Unidos e o Canadá, países que não vivenciaram
historicamente a organização/reorganização de documentos permanentes do
período pós-guerra, começam a lidar com a produção documental no contexto das
novas tecnologias da informática. Nesses países, a organização dos acervos
documentais enfrenta as questões relativas dos arquivos modernos, período
caracterizado pela produção crescente de documentos, facilidades de reprodução e
necessidade de seleção e avaliação. Schellenberg (1956/2002) denomina esses
novos arquivos de arquivos correntes, distintos dos permanentes ou históricos que,
3 No A Glossary of Archival and Records Terminology, SAA, (2005) adota o termo “Life cycle” para a língua
inglesa e refere-se às distintas fases de um documento, desde de a sua criação até a sua destinação final.
Rousseau e Couture (1998) preferem utilizar o termo “Abordagem” das três idades em lugar de “teoria” das
três idades. O termo “teoria das três idades” é utilizado na França. Para este trabalho adotaremos o termo
“abordagem das três idades”, por entendermos que não se trata de uma teoria, mas um processo de
organização.
30
por sua vez, têm características e necessitam de práticas específicas de
organização.
Com efeito, as administrações públicas necessitam implantar medidas de
controle, como as chamadas políticas de Paperwork Reduction Act, para regular a
produção documental das instâncias governamentais e das empresas. Algumas
soluções propostas não são absorvidas de forma unânime. Os conceitos de arquivo
ativo e inativo e, mais tarde, a criação do conceito de arquivística integrada,
propostos por Rousseau e Couture (1998), sugerem soluções que possam se
moldar a contextos. Da mesma forma, os australianos Upward (1996) e Reed (2007)
criam o conceito de arquivo contínuo ou Records Continuum, como solução para a
apropriação das dimensões e dos contextos de produção dos arquivos, bem como
para assegurar e capturar a representação de ações dispostas em documentos,
desde sua origem.
A evolução da arquivística para um novo paradigma, como ressaltam Cook
(1984, 1997, 2001) e Ketelaar (2001), provoca o rompimento com os princípios
tradicionais e modernos. A nova arquivística se fundamenta em teorias sociais, em
que não mais prevalece a noção de verdade absoluta e universal, com base no
racionalismo científico. Dito de outro modo, nada é totalmente objetivo, pois a
realidade pode ser moldada, apresentada e reapresentada. O foco na fisicalidade do
documento se contrapõe à ideia de interpretação de elementos simbólicos. Isso
provoca um novo entendimento do documento de arquivo, sendo ele considerado
um registro informacional, dependendo do contexto definido pelo tratamento a ele
dado.
Entende-se, portanto, que o documento de arquivo não tem criação natural e
neutra. “Nenhum texto é um mero e inocente subproduto da ação” (COOK, 2001,
p.7). Tudo pode ser moldado em função de interesses. O criador do documento é o
dono da ação e isso pode causar impactos no futuro, seja qual for a função que esse
documento venha a desempenhar. O documento é uma evidência não neutra, “é um
sinal, um significante, uma construção mediada e em constante mudança, não um
receptáculo vazio no qual atos e fatos são derramados”. (COOK, 2001, p.7). Citando
Le Goff, Cook (2001) afirma que o documento não é objetivo, nem constitui matéria
prima inocente, mas expressa o poder passado ou presente da sociedade sobre a
memória e sobre o futuro, “o documento é o que fica” (COOK, 2001, p.8) de todos os
acontecimentos.
31
Em consequência dessa mudança conceitual do objeto documento de
arquivo, novos elementos podem ser incorporados ao fazer arquivístico, tais como a
necessidade de visão de processo, dependência de contextos, análise da
linguagem, presença de metáforas, análise de padrões discursivos. Se antes o
documento era criado naturalmente, agora ele é “descoberto” como um documento
de arquivo em uma teia de registros de dados.
Os instrumentos de organização da informação evoluem para poderosos
sistemas automatizados de busca e recuperação, com a possibilidade de mostrar
relações entre documentos. O usuário pode ser o historiador, o gestor, o
pesquisador e qualquer cidadão que necessita recuperar documentos e o seu
contexto de criação.
Como consequência dessas mudanças, surgem os diálogos da Arquivística
com outros campos de conhecimento, como a Computação, a Ciência da
Informação, a Administração, o Direito, a Sociologia, a Filosofia. A arquivística
descritiva, ligada ao princípio da proveniência e ao respeito aos fundos, evolui para a
arquivística funcional, com base em domínios de conhecimentos e contextos
organizacionais e sociais em que a instituição arquivística está inscrita.
A interdisciplinaridade nas ciências se torna evidente também na descoberta
dos registros de informação interconectados, de diversas áreas, que podem resultar
em um documento de arquivo. Isso pode ser observado em casos de investigação
de crimes, situações em que se produzem dados decorrentes de testes de
laboratório, de análise de imagens, de transcrição de vozes, ou seja, conjugam-se
várias áreas de conhecimento para atingir um objetivo comum: elucidar o crime por
meio de registros documentais variados.
A evolução dos arquivos e da arquivística envolve alguns pontos
convergentes e divergentes entre suas fases evolutivas.
O primeiro deles se encontra no conceito de documento, que é único,
insubstituível e incontestável. São definidos princípios, processos, atividades no
sentido de assegurar que o documento de arquivo não seja contestado. No modelo
tradicional, ele é concebido como objeto único, nascido naturalmente, capaz de
conceder ou não algo a alguém, simplesmente pelo fato de existir. Nessa
perspectiva, o foco principal está na forma, na simbologia que este representa. Na
Modernidade, são desenvolvidas práticas de racionalização da produção para
garantir essa concepção de objeto único, sagrado e que não pode nunca ser
32
confundido ou misturado a cópias, anexos ou versões. Na pós-Modernidade, mesmo
com o intenso uso das tecnologias de informação, procura-se identificar o que pode
ser realmente considerado documento original, a despeito da importância dada ao
processo de criação coletiva e social e da intencionalidade da sua criação com um
fim. Ou seja, prevalece a ideia da necessidade de entender o processo para, por
meio dele, certificar o que é e o que não é documento dentro de uma infinidade de
tipos de registros de informação e dados. O documento de arquivo é “descoberto”
como tal, em meio aos variados registros de informação e as relações que são
possíveis entre eles para, então, compô-lo.
Outro ponto de convergência se refere à existência de um “usuário” ou um
indivíduo que tem interesse pelo documento. A organização da informação nos
arquivos se desenvolve no sentido de atender às suas demandas, criando-se
classificações, inventários, índices, sistemas de busca. Ao longo dessa evolução, o
usuário é centrado em administradores, juristas, gestores, historiadores e passa a
incorporar também o cidadão comum.
A conjugação dos modelos da arquivística descritiva e da arquivística
funcional pode funcionar, sem que uma elimine a prática da outra, o que constitui
mais um ponto convergente na sua evolução histórica. Ambas são usadas com o
intuito de trazer eficiência ao processo de organização dos documentos, com foco
no resultado final, quer seja a organização deles ou as necessidades dos usuários
de arquivo.
Já em relação aos pontos divergentes no processo evolutivo dos arquivos e
da arquivística, o primeiro aspecto que pode ser observado é relativo aos processos
de organização e tratamento dos documentos de arquivo, que podem se diferenciar
principalmente em função de diversos elementos que o qualificam, os tipos de
documentos, as instituições às quais os arquivos estão subordinados ou ligados e
respectiva instituição depositária. A despeito da existência de princípios, leis, normas
criadas para disciplinar e padronizar a organização dos documentos, tais
normativos, na realidade, convivem com várias contingências e particularidades que
levam a práticas que divergem muito umas das outras, como no caso da gestão de
documentos correntes, difundida nos Estados Unidos, mas que encontram
resistências nos países europeus.
Quanto às funções dos arquivos, também existem divergências sobre as
fases evolutivas da arquivística. Há instituições arquivísticas que veem os arquivos
33
como partes não integradas em um todo, ou seja, eles não são concebidos como
sistemas. Isso provoca discrepâncias no desempenho das funções de preservar,
resguardar, de dar suporte ao processo de criação e gestão, com a decorrente
criação de ações e práticas que têm puramente a finalidade de resolver o problema
de parte do arquivo, em detrimento do todo. Podem ser citadas como exemplos as
políticas de seleção e descarte aplicadas aos arquivos correntes, que podem afetar
as políticas de preservação da história e da memória. As fases da evolução podem
ser verificadas na Fig. 1.
Figura 1 – As fases de evolução da Arquivística
Fonte: Elaborado pela autora, com base na fundamentação teórica.
Pré e Modernidade
Positivismo lógico
Racionalismo Cientificismo
Arquivística tradicional (Holandeses, Jankison)
Documento arquivístico: conjunto de documentos orgânicos, produzidos naturalmente no exercício das atividades. Formato papel e suas variações
Princípio da proveniência
Obediência a ordem natural
Neutralidade e objetividade
Doc. prova/verdade/Fe
Visão atomista Diplomática
Arranjo de Fundo
Organização
Classificação
Arquivística Descritiva
Índices, Inventário, Plano de classificação. Usuário Historiador, Administrador. Prova documental
Modernidade
Estruturalismo
Formalismo
Arquivística Modena
(Schelemberg)
Estruturas Funcionais e Gerenciais, Records Management, Teoria das três idades, Avaliação e Seleção
Documento arquivístico:. Registro documental de processos. Formas diversas e meio digital
Produtos: Gestão de documentos, Quadros de temporalidade
Sistema de registro. Controle de Acesso. Protocolo. Usuário: Historiador, Gestor. Precisão e gestão do processo.
Pós Modernidade
Teoria Contextual Social
Humanismo
Arquivística
Pós Moderna Funcional
(Terry Cook, Delmas, Estwood, etc. Canadenses, Ingleses, Australianos)
Visão de Processo, Dependência do contexto, Análise da Linguagem, Métaforas, Padrões dos discursos das palavras.
Documento arquivístico: registro informacional. Formato digital. Imagem, Vídeo. Documento contínuo. Arquivística pós-custodial.
Registro de informação e suas relações contextuais. O documento arquivístico é descoberto.
Sistema de informação / Usuário: todos. Necessidade de informação para o conhecimento.
Arquivística Funcional
34
2.2 ORGANIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO
Neste tópico, foram abordados os conceitos de organização da informação, a
análise desses processos na arquivística e os elementos teóricos que norteiam os
estudos recentes da área.
A atividade de organização da informação e do conhecimento é central no
contexto da Ciência da Informação. Muitos são os autores que alertam para a
importância desses estudos, em parte, pelo fato de a organização da informação
estar por trás dos processos de comunicação da informação, de assimilação de
conteúdos compreensíveis, de assimilação da informação e de “como entender as
diversas (quase infinitas...) formas de conhecer” (RODRIGUES E LOPES, 2003, p.
18) e, em parte, em função das mudanças que vêm ocorrendo nos processos de
produção, divulgação e uso da informação na contemporaneidade.
Taylor e Joudrey (2009), a partir da definição do Merriam-Webster’s Collegiate
Dictionary, entendem organização da informação como aquilo que é realizado para
formar uma unidade coerente de funcionamento de um todo integrado. Isso é feito
para organizar elementos em um todo composto de partes independentes. O
processo de organizar é inerente ao ser humano e está relacionado à sua
capacidade de reconhecer o mundo, entender o funcionamento das coisas, obter e
dominar os mecanismos de sobrevivência. Decorrem daí os sistemas de
organização do conhecimento.
A informação registrada ou fonte de informação é estruturada por um sistema
de organização do conhecimento, sendo inscrita em itens como texto verbal escrito,
imagem fixa e em movimento, áudio, representações cartográficas e páginas web.
Os atributos básicos desses documentos são: título, autor ou criador, conteúdo e
outros elementos, nomeados aqui de metadados. Os metadados conferem valor
informacional aos documentos e potencializam seu uso.
Algumas das atividades mais comuns executadas em um sistema de
organização da informação são:
a) identificar a existência dos tipos de informação;
b) identificar trabalhos que contenham fontes de informação ou parte delas;
c) mapear as fontes de informação de coleções e de instituições depositárias,
tais como bibliotecas, arquivos, museus;
35
d) produzir listas das fontes de informação capturadas; e) identificar nome, título,
assunto e outros pontos de acesso para busca das fontes; f) providenciar os
meios de localização e acesso.
É possível afirmar que existem duas orientações sobre os processos de
organização da informação. Uma compreende o processo de organizar aspectos
materiais dos objetos informacionais. A outra é orientada pelos pressupostos da
organização do conhecimento, que trata de explicitar as relações conceituais de
informações de um domínio de conhecimento.
Hjorland (2008) entende a organização do conhecimento sob duas
perspectivas: de um lado, como atividade e, de outro, como área de conhecimento
ou campo de estudos. Como atividade, a organização do conhecimento ocupa-se da
descrição, indexação e classificação de documentos em espaços como bibliotecas,
arquivos, museus e instituições de memória. Como um campo de estudos, se ocupa
da natureza e qualidade dos processos de organização do conhecimento e dos
sistemas de organização do conhecimento.
A organização da informação pode ser distinguida da organização do
conhecimento. Para Brascher e Café (2008, p. 4), a organização da informação é
“um processo que envolve a descrição física e de conteúdo dos objetos
informacionais”, que compreende também a organização de um conjunto deles para
arranjá-los sistematicamente em coleções. Trata-se de um processo que se aplica
às ocorrências isoladas, ou seja, a separação e a individuação de um item dentro de
um vasto número de objetos informacionais.
Segundo Brascher e Café (2008), o produto do processo de organização da
informação é a representação da informação, compreendida como o conjunto de
atributos, compactados, que representam o conteúdo e a origem de determinado
objeto informacional, obtido por processos de descrição física e de conteúdo. O
objetivo da organização da informação é possibilitar o acesso e a recuperação de
objetos informacionais. O objeto-alvo do processo de organização da informação
são os registros informacionais, que podem ser: livros, mapas, fotos, filmes, paginas
web, documentos ou objetos.
A organização do conhecimento, ainda conforme Brascher e Café (2008), é
um processo que se aplica a unidades do pensamento (conceitos), cujo objetivo é
construir modelos de representação, abstrações da realidade, e permitem ao
indivíduo descrever e fornecer explicações sobre os fenômenos que observa. O
36
processo visa à construção de sistemas de representação do conhecimento de um
domínio específico, baseado na “análise do conceito e de suas características para o
estabelecimento da posição que cada conceito ocupa num determinado domínio,
bem como das suas relações com os demais conceitos que compõem esse sistema
nocional”. (BRASCHER e CAFÉ, 2008, p. 8).
As autoras citam a definição de Dahlberg (1993, p. 211) sobre a organização
do conhecimento fundamentadas na teoria de conceito, como sendo "a ciência que
estrutura e organiza sistematicamente unidades do conhecimento (conceitos)
segundo seus elementos de conhecimento (características) inerentes e a aplicação
desses conceitos e classes de conceitos ordenados a objetos/assuntos". Ainda
citando Dahlberg, as autoras esclarecem que o objeto da organização do
conhecimento é o conceito, suas características, suas relações e seus significantes
semânticos (termos, nomes e códigos).
O resultado do processo de organização do conhecimento é a representação
deste, feita por meio de diferentes tipos de sistemas de organização a ele relativos,
que são conceituais e representam determinado domínio por meio da sistematização
dos conceitos e das relações semânticas que se estabelecem entre eles. Citam-se
como exemplos de produtos da representação do conhecimento: sistemas de
classificação, cabeçalhos de assunto, listas de autoridade, redes semânticas e
ontologias, dicionários, glossários, taxonomias e tesauros.
Quanto aos objetivos da organização do conhecimento, Brascher e Café
(2008) citam Soergel (1999), que destaca os seguintes:
a) prover um mapa semântico para domínios individuais e para os
relacionamentos entre domínios, fornecendo orientação para servir como um
instrumento de referência;
b) melhorar a comunicação e o ensino;
c) prover uma base conceitual para a boa execução e implementação de uma
pesquisa;
d) prover classificação para a ação, isto é, para o uso prático dos sistemas de
organização do conhecimento em diferentes atividades profissionais, como a
classificação de doenças para diagnósticos médicos e de mercadorias para
comércio;
e) apoiar a recuperação da informação;
37
f) prover uma base conceitual para sistemas baseados em conhecimento e para
a definição de elementos de dados e hierarquias de objetos na engenharia de
software;
g) servir como um dicionário mono, bi ou multilíngue, para uso pelo homem ou
por sistemas automáticos de processamento da linguagem natural.
(BRASCHER E CAFÉ, 2008, p. 8).
Outro autor que trata dos objetivos da organização do conhecimento é Hodge
(2000). Em bibliotecas, museu e arquivos, os sistemas e organização do
conhecimento devem servir como ferramentas para auxiliar o processo de
organização da informação, principalmente a descrição de conteúdos; nessa
medida, cumprem a função de padronizar a representação da informação para
identificação de assuntos de documentos.
Em síntese, a organização da informação, ou organização da informação e do
conhecimento, no domínio da Ciência da Informação, pode ser compreendida como
uma série de atividades processuais, cuja finalidade é descrever conteúdos
documentais para serem representados em sistemas de recuperação da informação.
Criam-se, por esses processos, representações de informação registrada, seja do
seu contexto ou do seu conteúdo, em diferentes âmbitos institucionais: arquivos,
bibliotecas e museus. Cada instituição, de acordo com seus objetivos, define o
domínio da organização da informação.
2.3 ORGANIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO NOS ARQUIVOS
Segundo Couture e Rousseau (1998), a disciplina Arquivística desenvolveu-
se a partir de ações práticas de organização e tratamento de documentos. Os
primeiros instrumentos de organização foram criados entre a Idade Média e a
Revolução Francesa. Eram listas para identificar os documentos de certas comunas,
os “cartulários”: Essas listas arrolavam títulos, privilégios e atos administrativos. São
considerados os primeiros instrumentos de descrição documental de acesso a
documentos para consultá-los. Iniciam-se, nesse período, as primeiras tentativas de
uso da classificação como forma de construir listas. Surgem, também, os primeiros
problemas relativos ao uso da classificação em arquivos, aspecto que foi detalhado
em tópico específico.
38
As mudanças na forma de organizar documentos em arquivos têm início a
partir da Revolução Francesa, quando aparecem as primeiras “discussões em torno
dos princípios de base que devem presidir a classificação dos arquivos”
(ROUSSEAU e COUTURE, 1998, p. 49), tema que foi significativamente influenciado
pelos enciclopedistas e pela ciência positivista nascente. Segundo Elio Ludolini,
citado por Rosseau e Couture (1998), tem início, nesse período, a aplicação do
princípio da pertinência para proceder à organização.
Porém, apenas no século XIX, quando é formulado o princípio de respeito aos
fundos, por Natalis de Wally em 1841, é que se desenvolvem efetivamente os
“métodos que permitiram uniformizar a classificação de um fundo em particular”.
(ROUSSEAU e COUTURE, 1998, p. 53). O princípio da proveniência passa a ser a
base fundamental da principal atividade de organização da informação em arquivos,
a organização de documentos arquivísticos em fundos. Esta última dá origem à
descrição física dos documentos para a elaboração de índices de acesso. Em
alguns arquivos são utilizados, ainda, instrumentos de controle, como as listas de
autoridades, de instituições, de funções administrativas e de tipologias documentais,
para subsidiar o processo de análise e descrição física dos documentos.
A prática de organização de documentos de arquivo tem origem nos
chamados “arquivos históricos”, ou “arquivos definitivos”, quando eles chegam às
instituições arquivísticas depois de cessado seu uso na instituição ou órgão que
criou o conjunto documental. Até sua permanência na instituição, a organização dos
documentos é dada pelo produtor do documento, responsável pelo uso e acesso a
ele. A organização deve ser feita em função da utilização do documento, de acordo
com a estrutura funcional ou departamental da instituição produtora. Em geral, a
classificação criada no órgão de origem é transferida para o arquivo definitivo para
compor os fundos arquivísticos.
No processo de avaliação e seleção dos documentos executado nos arquivos,
para racionalizar sua produção, estabelecem-se critérios de valor. Assim, muitos
documentos se perdem ao longo do tempo e os que restam podem perder os
aspectos relativos ao contexto de produção, o que dificulta o resgate dos elementos
de origem e proveniência tanto para garantir seu valor de evidência de prova quanto
para resgatar o patrimônio cultural.
Segundo Terry Cook (2000), que critica o princípio da proveniência como
forma de garantia da evidência de prova do documento, é difícil para o arquivista
39
ficar neutro neste processo de atribuição de valor ao documento com base na
descrição das evidências. Para ele, o valor do documento pode estar não nele
próprio, mas no contexto da sua produção ou em evidências que estão fora do
contexto do arquivo ou da instituição. Este ponto de crítica ao princípio da
proveniência foi analisado em tópico específico.
A atividade de indexação temática de documentos de arquivo não encontra
respaldo significativo, principalmente de arquivistas que adotam o princípio da
proveniência como eixo norteador.
Nesse caso, o arquivista deve ser neutro no processo de organizar e tratar
documentos e se eximir de toda e qualquer atividade interpretativa que implique
juízo de valor. Segundo essa visão, a classificação temática, por ser subjetiva, pode
comprometer a função do documento de arquivo.
Mudanças nesta concepção surgem, em larga medida, com a adoção das
tecnologias da informação e comunicação nos processos arquivísticos. O
documento arquivístico digital, em virtude de suas características específicas, requer
a manutenção de sua forma física original, como forma de manter sua estabilidade
(RONDINELLI, 2013).
Na perspectiva de garantir acesso aos documentos tradicionais e digitais,
reveste-se de atenção a elaboração de instrumentos de pesquisa, que são os
produtos principais de qualquer processo de organização e tratamento da
informação em arquivos e, conforme atesta Nougaret (1999), são tão antigos quanto
os arquivos. Esses instrumentos tradicionais possibilitam aos usuários saberem o
que existe nos arquivos e como acessá-los.
O princípio de respeito aos fundos, a identificação de documentos por
tipologia e a organização temática foram os elementos norteadores da criação dos
instrumentos de pesquisa.
As estratégias e ferramentas adotadas nos arquivos, ao longo de sua história,
são muitas, mas este estudo se ateve à descrição de documentos arquivísticos,
sobretudo às normas de descrição arquivística e à diplomática contemporânea,
elementos que fundamentam este fazer, que tanto podem servir à fase de gestão de
documentos correntes e intermediários quanto aos arquivos históricos.
40
2.4 DEFINIÇÃO DE DOCUMENTO
Iniciou-se a abordagem do conceito de documento a partir de estudos
realizados no campo da Ciência da Informação, porque eles podem contribuir para
discutir o conceito de documento arquivístico. Muitos autores abordam o tema no
intuito de clarear a complexidade conceitual do termo. O enfoque do conceito de
documento se deu a partir da revisão de literatura de Lund (2009), publicada no
Annual Review of Information Science and Technology (ARIST), que cobre o período
de 1903 a 2009, por uma breve análise histórica, a fim de demonstrar como
evoluíram os diferentes entendimentos sobre o assunto.
Lund (2009) recupera da Antiguidade Clássica o termo Documentum, em
latim, que faz referência a algo feito à mão, uma evidência construída, cujo conceito
está relacionado ao ensino e à instrução. No século XVII, com o fortalecimento do
Estado burocrático e o nascimento do estado moderno, o documento passou a
significar um objeto escrito, usado para afirmar e provar transações, acordos e
decisões tomadas por cidadãos. Também era entendido como um escrito que
fornece provas ou informações sobre qualquer assunto, como o manuscrito, o título
de domínio, a lápide, a moeda e a imagem. Este conceito constituía a base do
Direito escrito, em oposição ao costumeiro. Aqui, documento é um elemento de
prova.
Ainda segundo Lund (2009), o conceito de autenticidade é crucial para a
existência do conceito de documento. Em outra acepção, nesse período, tem-se o
documento como base para a emissão de informação na concepção educacional,
uma peça escrita que diz alguma coisa, um escrito que reflete o verdadeiro
conhecimento.
2.4.1 As bases de Paul Otlet e Suzanne Briet
No século XVIII, segue-se a tradição legal. A prova empírica é apoiada por
documentos. Na base do desenvolvimento do conhecimento positivista, no século
XIX, surge o termo “documentação”, derivado de “documentar” e de “documento”. A
qualidade do trabalho científico depende da documentação que os pesquisadores
podem apresentar a seus colegas e ao público, como base para suas reivindicações
e argumentos. O documento é o elemento base para a prova empírica do
41
conhecimento descoberto. Nesse quadro, nasce a primeira concepção da teoria do
documento, criada por Paul Otlet, o que Lund (2009) chama de “primeiro movimento
da documentação”.
Paul Otlet (1868-1944) foi o primeiro a pensar o documento teoricamente,
com o fim de concretizar o objetivo prático de organizar um catálogo bibliográfico
universal da documentação científica: Repertoire Bibliographique Universel. O autor
explica a definição de documento a partir do conceito de “ciência da bibliografia”,
que estuda as questões comuns a diferentes tipos de documentos: produção,
fabricação, distribuição, inventário, estatísticas, preservação e uso de documentos
bibliográficos.
Paul Otlet (1934), no Traité de documentation, desenvolveu um conceito
amplo de documento, com foco em livros e em outros tipos de textos impressos. Ele
buscava a definição de documento com vistas à organização e preservação do
conhecimento humano. O objetivo da definição de Otlet é a funcionalidade do
documento.
Lund (2009) aborda as contribuições de Suzanne Briet (1894–1998),
documentalista francesa que criou os serviços de referência da Biblioteca Nacional
da França. Briet (1951) trata o conceito de documento a partir da funcionalidade dos
serviços de referência. Ela percebe a necessidade de formular princípios teóricos
para as atividades práticas da documentação, a nova ciência do documento. Em
1951, publicou “Qu´est-ce que la documentation?”, obra na qual reuniu várias
definições de documento:
a) documento é uma prova de sustentação de um fato;
b) documento é toda a base de conhecimento fixada materialmente que pode
ser usada para consulta, estudo e prova;
c) é um objeto que informa qualquer que seja sua forma material;
d) toda indicação concreta simbólica, conservada ou registrada, com a finalidade
de representar, de reconstituir ou de prova de um fenômeno físico ou
intelectual.
As definições de Briet ressaltam o documento como um objeto físico e
material, que registra algo, que mostra algo, que é recuperado, que é acessado.
Para explicar o conceito de documento, Briet (1951) pergunta: Uma estrela é um
documento? Um cascalho rolado por uma enxurrada é um documento? Um animal
vivo é um documento? Ela responde que não. Mas as fotografias no catálogo sobre
42
estrelas, as pedras de um museu de mineralogia e os animais catalogados e
expostos em um jardim zoológico são documentos.
Briet (1951) classifica os documentos em primário e secundário. Cita o caso
de um antílope de uma nova espécie encontrada na África, capturado e exposto no
Jardin des Plantes, em Paris. Este fato gera uma publicação na imprensa, uma
notícia no rádio e na televisão, uma nota publicada pela sociedade científica. Um
professor, ao ensinar sobre o novo animal, produz trabalhos científicos. Este animal,
quando morto, será empalhado e exposto no museu. As obras sobre o animal, como
livros, enciclopédias e tratados serão catalogados, indexados e classificados e
estarão disponíveis na biblioteca para consulta. Briet (1951) explica que o animal
capturado é o documento primário e os outros documentos derivados desse evento
são secundários.
A autora acolhe as influências da semiótica de Charles Peirce (1939-1914),
filósofo, matemático e lógico americano que teorizou os signos, a construção de
significados e as circunstâncias de construção dos significados pelos indivíduos
envolvidos em um processo de comunicação. Briet (1951) adota os conceitos de
signo, índice, símbolo, signo concreto e signo simbólico. O objeto (animal)
catalogado é o signo concreto, documento primário. Os demais documentos criados
a partir dele são secundários (o catálogo da exposição, o ingresso, a foto, o artigo do
jornal e a reportagem). A produção documentária são os signos simbólicos
derivados da subjetividade, os quais não têm ligação física direta com o documento
primário, sendo, porém, subjetivamente dependentes dele.
Também é possível perceber neste exemplo do antílope a ideia de
intencionalidade na criação dos documentos e a explicitação de sua organicidade,
para compreender sua definição e função e possibilitar seu uso. Os documentos
são, portanto, resultantes da manipulação de signos.
Outro aspecto relacionado ao conceito de documento, enfatizado por Briet
(1951), diz respeito à proliferação da documentação decorrente do desenvolvimento
das tecnologias de produção dos registros e das necessidades informacionais dos
usuários. Ressalta a função das bibliografias, das bibliografias retrospectivas e dos
catálogos de documentos como instrumentos para possibilitar o acesso e a
divulgação da grande produção documentária. Para a elaboração das bibliografias e
dos catálogos de acesso é necessário estabelecer critérios de seleção e realizar
operações que organizem e descrevam esses documentos. Enfatiza o papel da
43
organização da informação como elemento essencial ao acesso e à comunicação
dos documentos de um determinado repositório.
É significativa a influência das ideias de Briet na Ciência da Informação norte-
americana, segundo os estudos de Buckland (1991 e 1997). Mostram que o trabalho
de Briet modernizou a disciplina técnica da documentação, tendo influenciado mais
tarde a construção das bases da Ciência da Informação, com a delimitação de seus
objetos de estudo, a compreensão dos fluxos de produção e comunicação de
documentação secundária, a formalização das atividades de organização da
informação e dos sistemas de recuperação da informação.
2.4.2 O documento nas ciências sociais e da informação
Lund (2009), em sua revisão sobre o conceito de documento, explica que
após a Segunda Guerra, a documentação era considerada fora de moda nos países
anglófonos, acontecendo o contrário nos países latino-francófonos. Nos estudos
sobre o documento, é enfatizada a relação entre informação, comunicação e
documentação. No arquivo, um documento refere-se a um evento, um processo, um
ato administrativo ou ato legal que foi expresso em algum meio, por qualquer deles
pode ter sido criado. Na biblioteca, um documento pode ser a cópia de um livro ou a
expressão de um pensamento humano em algum meio, sendo, portanto, a memória
humana materializada.
As discussões na Ciência da Informação avançam no sentido de esclarecer o
que é o documento em seu próprio âmbito. São explorados o conceito de valor de
documento, dado pelo seu criador, gestor e usuário, e os elementos da semiótica
peirceana que o definem como um ícone, ou mensagem simbólica,
permanentemente incorporado em um meio e usado pelo emissor, o mediador ou o
receptor da informação.
Segundo Lund (2009), na busca por uma teoria geral do documento, nas
décadas de 1960 e 1970, a teoria da documentação latino francófona perde lugar
para as teorias da informação do mundo anglófono, e os estudos sobre a teorização
da informação fazem a transformação da ciência da documentação em Ciência da
Informação. Uma nova teoria documental nasce fora da disciplina da documentação
como uma teoria crítica do documento, ou teoria crítica documental. Autores da
sociologia, filosofia e antropologia focalizam as discussões sobre o papel do
44
documento na construção social e na construção do conhecimento, a chamada
“pesquisa sociológica”. Alguns autores citados por Lund. (2009) como exemplos
dessa vertente são:
Karl Mannheim (1893-1947). Sociologia das ideias ou Sociologia do
conhecimento. O documento é tido como objeto natural e objeto cultural e
possui três tipos de significado: objetivo, expressivo e documentário. A função
social do documento não é expressa. O significado do documento é expresso.
O documento é interpretado.
Harold Garfinkel and Dorothy E. Smith. (1960/70). Etnometodologia, que
estuda como os documentos são construídos a fim de desempenhar um papel
fundamental na vida social. São construídos para validar um poder, para
governar por meio de documentos.
Bruno Latour e Steve Woolgar. Antropologia. Estudam o fato científico e os
diferentes documentos gerados a partir dele.
John Seely Brow e Paul Duguid (1996). Estudam a vida social do documento
e questionam a noção generalizada do documento como uma espécie de
transporte em papel das ideias ou informações pré-formadas através do
espaço e do tempo. Destacam que as novas tecnologias trazem maior poder
de transformação aos meios que usam o documento e tornam-se cada vez
mais importantes. Autores do século XX ressaltam a importância, para as
ciências sociais, das abordagens baseada nos documentos e a necessidade
de teorizar sobre isso.
Destacam-se nesse cenário as ideias de Michel Foucault (1926–1984),
filósofo francês, um dos principais historiadores críticos da Modernidade. Seus
estudos abordam as relações entre poder e conhecimento e como eles são usados
pelas instituições sociais para manter o controle social, justificar e constituir as ações
de domínio e poder. Foucault desenvolve uma teoria geral do documento como base
para seus estudos sobre o poder e a criação do conhecimento:
A história transforma o documento em monumento, para “memorizar” o
passado.
O documento é elemento de construção de uma história totalitária.
Demonstra como a teoria do documento pode ser usada não somente para
os estudos históricos, mas também como ferramenta de análise crítica em
relação à sociedade moderna em geral.
45
Os principais escritos de Foucault, nesta área, são as obras As palavras e as
coisas e Arqueologia do saber. Em As palavras e as coisas (2011), aborda a função
discursiva da literatura, mais fortemente a partir do século XVIII. O autor realiza um
estudo histórico da evolução da linguagem, dos signos e do significado e interpreta
as linguagens a partir do que ele chama “configuração epistêmica”, nos séculos XVI
(Renascimento), XVII e XVIII (Idade Clássica) e no século XVIII (Modernidade).
Nesse trabalho, o autor aprofunda a análise do papel da linguagem na construção
dos documentos e atribuição de significado, destacando que, ao longo da história, a
conjuntura é o elemento que atribui significação ao signo linguístico. A partir da
conjuntura específica em que um signo está inserido, é possível ver nele as marcas
e os sinais que apontam para seu significado.
Somente na Modernidade é que a linguagem, enquanto teoria que se ocupa
dos signos, deixa de ser vista como criação divina e passa a ser considerada uma
criação humana. Agora, sua interpretação deixa de ser um ato divinatório, sendo ela
guiada por um método para a interpretação dos signos, a hermenêutica. Então, os
signos devem ser conhecidos para serem interpretados e o ato de saber e conhecer
são facultativos ao ser humano que faz parte dessa conjuntura ou contexto do signo.
Segundo Foucault (2011), é o homem que conhece o signo por meio de
processos cognitivos, com base no método hermenêutico.
Suas ideias sobre a interpretação dos signos reforçam a mudança sobre a
noção do documento de arquivo criado naturalmente para a percepção moderna do
documento criado intencionalmente, em uma dada conjuntura social. O documento
será reconhecido pelo indivíduo e seu grupo social a partir da interpretação do signo
linguístico que o compõe. Essas ideias reforçam, ainda, a importância da linguagem
e os códigos linguísticos na criação do documento e, consequentemente, em sua
organização intelectual; semelhante organização contribui para a devida
interpretação dos signos.
2.4.3 A teoria do documento
Lund (2009) aponta que os estudos sobre o documento pelos autores da
Ciência da Informação levam à criação do que ele chama de “Teoria do documento”.
Na busca por uma teoria, ocorre a valorização das ideias de Otlet e Briet, que são
traduzidos, citados e estudados como alternativas de respostas para as questões
46
atuais relacionadas à definição de documento na biblioteconomia e na Ciência da
Informação, com destaque para os trabalhos de Buckand e Hahn (1998, 1997),
Buckland e Liu (1995) e Frohmann (2000). Esses trabalhos, por um lado, refletem a
procura por um conceito contemporâneo de documento e documentação, no âmbito
da Ciência da Informação e, de outro, nos estudos que abordam as tecnologias da
informação. A era do computador possibilitou, em larga medida, a concretização do
sonho de Otlet.
Na busca por uma teorização do conceito de documento, podem ser citados
os trabalhos de Buckland, com destaque para o artigo Information as thing (1991),
em que o autor questiona o foco dado à dimensão subjetiva da informação.
Estabelece distinção entre a informação considerada como processo, conhecimento
e coisa, destacando este último aspecto como o mais significativo para a Ciência da
Informação, em especial porque é referida condição que justifica a existência dos
sistemas de recuperação da informação. Buckland destaca claramente a influência
de Otlet e Briet na construção de sua argumentação. De fato, quem primeiro tratou o
documento como objeto ou coisa foi Briet, em seu livro sobre a documentação.
Em outro trabalho de Buckland, What is a document? (1997), são revistos
vários conceitos de documento que apontam também para as questões relacionadas
à sua criação. O autor afirma que o documento é uma construção social e que a
percepção dos seus elementos e componentes não pode ser dela dissociada.
Na visão contemporânea, portanto, enfatiza-se a construção social de sentido,
fato que pode evidenciar o caráter do documento como prova. Essa mudança de
olhar, da fisicalidade do documento para o contexto social de sua criação, evidencia
a importância da linguagem e da tradição semiótica de interpretação dos signos.
No trabalho Document theory: an introduction, Buckland (2013) destaca as
bases da teoria documental, em que o documento é percebido e reconhecido por
seus vários aspectos:
a) aspectos fenomenológicos − os documentos são entendidos, enquanto
objetos, como algo que significa, e o estado de ser documento não é inerente,
próprio ou essencial, mas atribuído a um objeto (documento), sendo o
significado sempre construído pelo espectador;
b) os códigos culturais − todas as formas de expressão comunicativa dependem
de entendimento compartilhado pelo grupo social, as quais podem ser
pensadas como linguagem em sentido lato;
47
c) tipos de mídia – as formas de expressão variam: podem ser textos, imagens,
números, diagramas, arte, música, dança, etc.;
d) mídia física − tabuletas de argila, papel, filme, fita magnética analógica,
cartões perfurados, mídia digital, e assim por diante.
Assim, para ser um documento, ele deve ser considerado por alguém como
tal, no interior de um código cultural, com os aspectos físicos de tipo e gêneros e
suas combinações culturais e históricas definidas.
Buckland identifica, ainda, três aspectos que precisam ser explorados na
definição de documento, na Ciência da Informação:
a) Visão convencional, ou visão material − rotineiramente, muitos objetos tornam-se
documentos, materializados em registros gráficos, em textos, feitos em papel ou
similar que, identificados como relevantes, são armazenados, distribuídos e
acessados.
b) Visão funcional − quase tudo pode ser documento: maquetes, brinquedos
educativos, coleções de história natural. Vestígios arqueológicos podem ser
incluídos nesta categoria. Existe a preocupação do acesso aos elementos de prova
para que os objetos possam tornar-se documentos.
c) Visão semiótica − qualquer coisa pode ser considerada documento se for
evidência de algo, independentemente da vontade do criador. Assim, os aspectos
simbólicos, de significação e interpretativos são necessários para a efetiva criação,
organização e uso do objeto que se torna documento.
Buckland (2013) enfatiza que a literatura sobre o tema destaca os aspectos
inerentes ao documento, sendo necessário, porém, ter uma visão geral em relação
aos documentos. Para isso, pode-se recorrer à retórica, à semiótica e a campos
mais especializados, como a psicologia educacional, a hermenêutica. Destaca,
ainda, os estudos relacionados à comunicação e os aspectos que envolvem o
documento e o processo de comunicação.
Lund (2009) finaliza sua revisão citando os aspectos que ainda merecem ser
abordados quando se fala de documento e da definição da teoria social do
documento, como segue:
a) a teoria do documento pode ter uma definição ampla e incorporar diferentes
tipos de mídias e situações sociais, tendo a sociologia e a filosofia como
bases de sustentação;
48
b) pode-se ter uma definição estrita, considerando os aspectos linguísticos da
mensagem escrita ou falada, o que é relevante para o desenvolvimento das
bases teórica para o gerenciamento de documentos na Ciência da Informação
(inspirados na disciplina Documentação e na análise e crítica dos trabalhos
de Briet e Otlet);
c) os processos documentais são coletivos e necessitam de diferentes meios e
tecnologias para existirem;
d) intensificar os estudos interdisciplinares entre Documentação e Comunicação;
e) estudar a diversidade de materiais e a vasta gama de problemas relacionados
aos processos de documentação e registros resultantes do trabalho com o
documento: o nível geral, o específico e o de conteúdo.
Com relação à teoria do documento na era digital, os aspectos a serem
enfatizados são:
a) as discussões em torno da garantia de materialidade e da estabilidade do
documento digital para promover a comunicação, a acessibilidade, a
recuperação, seus usos ou reusos;
b) a definição de documento em meio digital passa pela compreensão de
diferentes níveis de materialidade: o trabalho de fazer o documento digital
(computação), o texto em si e o documento;
c) as questões relacionadas à definição de documento original, tendo em vista
as ligações possíveis a partir das tecnologias e as diversas intervenções que
um texto pode ter a partir do uso e interpretações;
d) o foco no documento como um produto semiótico transcrito ou registrado em
uma estrutura perene, que o carrega com atributos específicos para facilitar
as práticas associadas com a sua utilização em uma estrutura que permite as
transações de comunicação e distribuição através do espaço e do tempo.
2.5 DOCUMENTO NA ARQUIVÍSTICA
O documento arquivístico, ou documento de arquivo, entendido inicialmente
por autores da arquivística como sinônimo da palavra arquivo, definição ambígua,
distingue-o da definição de documento (document) genérico, entendido como
informação registrada, independente do suporte ou de suas características (ICA,
2000), distinto de documento de arquivo (record).
49
Para a definição de documento de arquivo, os autores da área de arquivística
compartilham algumas concordâncias, dentre as quais que o elemento principal que
distingue um documento qualquer de um documento de arquivo é a função para a
qual foi criado ou a razão de seu emprego. Isso determina a distinção entre
documento e outros tipos de registros de informação.
Tal pensamento é compartilhado por Muller, Feith e Fruin (1898), Hilary
Jenkinson (1937), Eugenio Casanova (1928), Adolf Brenneke (1953), Elio Lodolini
(1990), Rousseau e Couture (1998) e Schellenberg (2002). Este último, no livro
“Arquivos Modernos”, faz um histórico dos elementos comuns que definem um
documento de arquivo, com base nos manuais de arquivística mais conhecidos.
Schllenberg (2002) resume esses elementos em:
a) a razão pela qual os materiais (arquivos) foram criados, entendendo “material”
o documento de arquivo quando este é visto como um objeto preservado ao
longo do tempo;
b) os valores pelos quais os arquivos (documentos) são preservados, que vão
desde razões oficiais (administrativas e comprobatórias) até culturais e
históricos. Neste tópico, vale destacar as razões elencadas por Jenkison, que,
em 1937, afirmava que os arquivos são documentos criados para “sua própria
informação” ou “para referência”, ressaltando o documento de arquivo como
algo que tem a função de objeto de comunicação da informação e
preservação para a posteridade;
c) sua origem, ou custódia, ligada a uma instituição, pessoa ou órgão. O
documento deve comprovar essa custódia original. Este elemento presente
no documento de arquivo garante a função de comprovação de ação ou a
materialidade do fato e a ligação orgânica do fato ou ação com o seu criador
ou gerador.
Nesta pesquisa, adotou-se como definição de documento de arquivo aquela
disseminada pelo Conselho Internacional de Arquivos, que serve como fonte para
diversos autores nacionais e internacionais da arquivística (Schllenberg (2002),
Belloto (2004), Paes (2007), Rousseau e Couture (1998) e pelos Archives de
France, Australian Archives, National Archives USA e NARA em diversos
documentos administrativos), bem como pelos documentos normativos adotados
internacionalmente, editados pelo ICA, tais como a Norma Geral Internacional de
Descrição Arquivística, ISAD (G) (2001) e a Norma Internacional de Registro de
50
Autoridades Arquivísticas, ISAAR (2004) e o Dicionário de Terminologia Arquivística,
todos com traduções e versões em português (2005).
O Internacional Council on Archives – ICA - define documento de arquivo
(record) como “informação registrada, independente da forma ou suporte, produzida
ou recebida e mantida por uma instituição ou pessoa no decurso de suas atividades
públicas ou privadas” (ICA, 2002). Nessa definição podem ser incorporados os
elementos de razão, função, valor e origem, que caracterizam e distinguem um
document de um record.
De modo aliado à definição de documento de arquivo, faz-se necessário
promover o entendimento dos conceitos de fidedignidade e autenticidade que, na
arquivística, são seus elementos qualificadores. Os elementos que asseguram a
fidedignidade e a autenticidade comportam um conjunto de evidências formadas por
dados, estudados e definidos pela diplomática a partir do estudo da forma, estrutura
e tipologia do documento.
A diplomática é uma área interdisciplinar da arquivística voltada para a análise
dos documentos quanto às suas formas e tipos. Ela visa assegurar o cumprimento
das funções de comprovação de fato ou ação e os elementos que dão materialidade
e valor ao documento, razão da criação e origem do documento de arquivo
(RONDINELLI, 2005).
Duranti (2009) e MacNeil (2002), (apud Rondinellii (2013), definem
diplomática como um corpo de conceitos e métodos que tem por objetivo “provar a
fidedignidade e a autenticidade dos documentos”, que evolui para um sistema
sofisticado de ideias sobre sua natureza, origem, composição e suas relações com
as ações, pessoas a eles conectados e com o contexto organizacional, social e
legal, evidenciando a organicidade da informação neles representada ou no seu
conjunto. Para que o documento de arquivo seja aceito e entendido como tal, nas
ações da sociedade, é necessário que tenha sua confiabilidade garantida, para que
as ações judiciais e a compreensão do passado ocorram, ou seja, para que a
informação contida em documentos seja estabelecida e aceita como uma verdade
para os seus intérpretes ou as ações sejam carregadas de elementos verossímeis.
Duranti (2009) (apud Rondinelli 2013) explica que o documento de arquivo é
fonte de prova, e não prova em si. Neste ponto, ressalta-se a importância
fundamental do tratamento da informação na arquivística, pois a descrição e a
51
análise dos elementos e signos contidos no documento podem evidenciar um fato ou
ação.
Em síntese, para a definição do documento de arquivo tem-se um conjunto de
elementos concretos (origem) e abstratos (razão, valor) ou tangíveis e intangíveis
que, agregados a outros elementos, tais como suporte e estrutura, o caracterizam
como tal e portador dos elementos qualificadores de autenticidade, fidedignidade e
organicidade.
A Diplomática mostra os elementos identificadores dos documentos de
arquivo para que eles se constituam em evidência de um fato ou ação. Para a
discussão deste trabalho, entendeu-se que os elementos adotados pela arquivística,
para definir documento de arquivo, podem ser entendidos como signos ou dados
que, ao serem analisados pelo observador, tornam-se um objeto de informação
qualquer, document, em documento de arquivo record. Considerando-se
preliminarmente que um dado, ou um signo, pode ser compreendido como o
elemento principal para o estabelecimento de um processo de comunicação e
entendimento de significados e como elemento de compreensão e expressão da
informação, entende-se que existe uma clara ligação do objeto “documento de
arquivo” com as teorias de significação, com as teorias da linguagem, em especial
com a semiótica e as ciências de interpretação de signos (ECO, 2004; 2008;2009); .
Tal como destaca a literatura das áreas de arquivística e diplomática, a
definição de documento de arquivo e sua qualificação procuram evidenciar a
presença de dados e signos que fazem com que ele seja entendido em sua natureza
essencial. O dado e o signo são considerados elementos de análise essencial da
teoria de significação e das análises semióticas. Esses conceitos serão abordados
de forma mais específica no capítulo sobre as teorias de linguagem.
A revisão dos conceitos de documento, tanto na Ciência da Informação
quanto na arquivística, enfatiza os elementos que procuram evidenciá-lo como um
registro de informação, como instrumento de prova, enquanto objeto portador de
algo e, mais recentemente, como resultante de um processo social, do qual não
pode ser dissociado para ser compreendido. O documento apresenta elementos
fenomenológicos, culturais e físicos; é utilizado pelas pessoas como objeto
informacional, como documento de arquivo e como elemento do processo de
comunicação.
52
A necessidade de enfatizar as relações sociais do documento e seus
aspectos linguísticos para a definição e interpretação de conteúdos é útil para
esclarecer sua definição na Ciência da Informação e nos domínios onde também é
objeto, como na arquivística.
As transformações contemporâneas e o intenso uso das tecnologias de
informação e comunicação evidenciam a necessidade da realização de estudos que
possam ressaltar o papel, a função e a constituição do documento em contextos
sociais e culturais.
2.6 PRINCÍPIOS DE FUNDAMENTAÇÃO DA PRÁTICA ARQUIVÍSTICA
A criação de instituições públicas delimita um novo paradigma de gestão
administrativa tanto geral quanto arquivística. Essa nova ordem política e social
implica criação de instituições e processos para que o Estado possa funcionar. Este
momento é o marco para o desenvolvimento dos princípios que norteiam a prática
da arquivística moderna. São os princípios de fundamentação da disciplina que
norteiam as práticas executadas na área e, em geral, são delimitados a partir de
uma prática existente, sendo formulados como conceituais e epistêmicos. A
organização da informação nos arquivos é norteada por esses princípios. Entender a
organização dos arquivos implica entender os princípios que as fundamentam.
Segundo Couture e Rousseau (1998), existem três princípios que constituem
o fundamento da disciplina arquivística, nos quais se apoiam as intervenções feitas
com os documentos de arquivo: o princípio da territorialidade; o princípio de respeito
aos fundos, ou princípio da proveniência, e a abordagem das três idades.
2.6.1 Princípio da territorialidade
O princípio de territorialidade assegura que os documentos públicos de um
país ou território pertencem a ele. Foi criado pelo Direito para resguardar a
propriedade dos vencedores que, para garantirem sua posse, devem ter também a
posse dos documentos desse território. Foi fortalecido oficialmente por meio dos
acordos da Convenção Internacional das Nações Unidas. Os documentos
produzidos em uma instância governamental, um país ou instituição, por direito,
pertencem a ela e devem ser por ela mantidos e resguardados. Assim, cada
53
instância de governo deve responsabilizar-se pela produção, guarda e acesso ao
documento por ela produzido ou recebido.
Este princípio foi utilizado para a restituição de fundos de arquivos após a
divisão de países e territórios. Tem sua fundamentação principalmente no Manual de
Arranjo e Descrição de Arquivos, dos holandeses Muller, Feith e Fruin (1898). O
manual dos holandeses não é uma obra sobre os princípios teóricos de
fundamentação da arquivística. Este manual estabele um conjunto de regras de
trabalho e de soluções práticas para a atividade de organização dos arquivos, que
até então, era feito de acordo com as circunstâncias de cada instituição, o que
poderia provocar a dispersão de acervos arquivisticos em função da interpretação de
quem o organizava. O trabalho dos arquivistas holandeses é considerado um marco
para o tratamento e organização de documentos nos arquivos contemporâneos.
Segundo os autores Muller, Feith e Fruin (1898), a obra tem um conjunto de
regras a serem seguidas para se obter “uniformidade no tratamento dos inventários"
produzidos nas instituições arquivísticas que estavam nascendo. Ela é de
fundamental importância para a área, pois unifica as práticas aplicadas e seguidas
internacionalmente.
A partir das regras práticas e das sugestões de solução dos problemas
encontrados na organização dos arquivos, torna-se possível a formalização de
alguns dos principais princípios da arquivística.
2.6.2 Princípio da proveniência
O princípio da proveniência é atribuído a Natalis de Wailly, historiador francês,
chefe administrativo dos Arquivos Departamentais do Ministério do Interior da
França, por meio de uma circular para o governo, em 1841.
Define que os documentos produzidos por um órgão administrativo devem ser
“agrupados, sem misturar a outros arquivos provenientes de outro órgão
administrativo, de um estabelecimento ou de uma pessoa” (DUCHEIN, 1985). Os
documentos devem ser agrupados e constituir fundos de arquivo ou fundos
arquivísticos. É complementar ao princípio da territorialidade, mas alguns autores os
separam.
54
Este princípio foi criado para disciplinar a prática de organização e descrição
de documentos. Já o princípio da territorialidade trata da formalização de um
aspecto de Direito Internacional.
A proveniência é um princípio norteador para elaborar os planos de
classificação de fundos com base na estrutura da organização que o originou, e não
de acordo com a classificação em assuntos ou temas (COUTURE e ROUSSEAU,
1998).
Duchein (1985), um dos principais estudiosos desse princípio, argumenta que
a justificativa para seu estabelecimento é resguardar o direito às evidências, com
base na crença de que o documento de arquivo é produzido naturalmente a partir da
atividade do organismo, devendo ser resguardadas as evidências para manter a
qualidade dos arquivos e seus elementos legais e de prova. Segundo o autor, essas
evidências não eram respeitadas até o começo do século XIX pelos administradores
e arquivistas, os quais não temiam dividir e dispersar documentos de uma mesma
origem nem reagrupar ou misturar documentos de proveniências diferentes quando
fosse necessário, por razões práticas. Um prova disso é que as antigas
classificações de documentos foram construídas agrupando-se documentos por
material, assunto e lugar.
Foi “desfeita”, portanto, uma ordem original para realizar uma nova ordem
decorrente de uma avaliação subjetiva. Isso parece não ser problemático para
conjuntos documentais pequenos, mas pode ser problemático em grandes depósitos
de documentos do século XVIII. Após esse período, cresceram as práticas
administrativas fundamentadas em documentos e aumentaram as possibilidades de
sua produção e reprodução. Nascem, assim, os grandes conjuntos documentais que
devem ser organizados em depósitos para posterior localização. É o caso da França
que, após a Revolução Francesa, criou o Archives Nationale, que agrupam
documentos originários de diversos órgãos governamentais.
A aplicação do princípio de proveniência fez surgir as primeiras classificações
de documentos segundo a tendência do desenvolvimento científico imperante nos
séculos XVIII e XIX. Nesse período, nasceram também as classificações de Linné
(biologia, da zoologia, da botânica) e da física. A ideologia cientificista procura
organizar, descrever e classificar para ordenar o universo e as coisas dentro dele.
Esse espírito parece também ter chegado aos arquivos e essa concepção ideológica
55
de classificação foi difundida nos arquivos com base no princípio da proveniência e
na noção de fundo de arquivo.
Segundo Duchein (1985), agrupar documentos em fundos significa reunir
títulos de documentos que provêm de um corpo ou de um estabelecimento, de uma
família ou de um indivíduo, e dispor, após colocá-los em certa ordem, em diferentes
fundos, denominados pela origem da estrutura do corpo que os originou.
Mais tarde, Natalis de Wailly (citado por DUCHEIN, 1985), respondendo às
críticas provocadas por essa nova noção de desenvolver e conceber a classificação,
explicou que a classificação geral por fundos é a única verdadeiramente própria para
assegurar a pronta realização de uma ordem regular e uniforme. Sem isso, a
organização dos arquivos pode gerar o caos, correndo-se o risco de perder os
documentos dentro do arquivo.
O princípio de respeito aos fundos, ou princípio da proveniência, é admitido
como base da arquivística teórica e prática. As críticas existentes referem-se à sua
aplicação, e não necessariamente ao princípio, que pode ser considerado de
fundamentação teórica definitiva na arquivística (DUCHEIN, 1985). Este princípio
auxilia os arquivistas a visualizarem a ideia sistêmica de arquivo, com base na qual
um conjunto de documentos é considerado no todo (fundo de arquivo), embora seja
um todo feito de partes, uma vez que os documentos são analisados em partes para
serem reconhecidos e classificados como pertencentes a um fundo, e não a outro.
Isso permite construir classificações de documentos, elaborar inventários e sistemas
de descrição e recuperação de documentos e de conjuntos documentais. Para o
usuário, possibilita estabelecer conexões com outros documentos que possam ter
relação com o documento por ele buscado.
O respeito aos fundos possibilita que o trabalho do profissional de arquivo
possa ser feito com assertividade, desprovido de subjetividades, uma vez que,
seguindo uma ordem orgânica e predefinida em sua criação, ele não incorre em
erros que possam não refletir o estado real de construção do documento.
Duchein (1985) aponta alguns problemas que interferem na prática da
organização dos arquivos pela aplicação do princípio de respeito aos fundos:
a) o uso da definição de fundo como referência à hierarquia dos organismos
produtores dos arquivos. O risco existe, porque as instituições são dinâmicas,
podendo mudar as nomenclaturas das estruturas dos órgãos ou deixarem de
existir. Este passa a ser um problema para os fundos arquivísticos, os
56
inventários e as classificações oriundas dessas estruturas (estruturação
hierárquica);
b) as repercussões sobre a composição dos fundos derivadas das competências
dos organismos produtores, que podem mudar, serem unidas ou
desmembradas (estruturação funcional);
c) a definição da noção de proveniência em fundo aberto e fechado, para
quando uma organização funcional deixar de existir. Como se constituem os
fundos para os órgãos que mudam? Devem ser incorporados a outros ou
devem permanecer como foram criados?
d) respeito à integridade dos fundos dada pelas classificações existentes nos
organismos produtores de arquivos, respeitando divisões internas em
situações particulares. Como atender às questões particulares da
classificação em detrimento de uma organização de documentos que, a priori,
tem o organismo como usuário direto desses documentos?
Os estudos mais recentes sobre a proveniência demonstram a utilidade do
princípio, principalmente em virtude do modelo de produção do documento em meio
digital, em que o produtor não tem o domínio completo do processo.
Os elementos de identificação da proveniência são evidenciados como forma
de garantir autenticidade e permitem a sua rastreabilidade no meio eletrônico. Os
críticos ao princípio salientam que, no meio eletrônico, com as possibilidades de
rastreabilidade e os metadados dos documentos, é possível reconstituir o seu
processo de construção ao longo da vida do documento, não importando a
obediência a uma origem inicial, uma vez que é possível reconstruir essa origem a
partir dos dispositivos computacionais.
2.6.3 Abordagem das três idades ou ciclo de vida dos documentos
A abordagem das três idades divide o tempo de vida do documento em três
fases e se baseia em dois valores que os arquivos têm ou podem ter: o valor
administrativo e o valor de testemunho histórico, e considera ainda a frequência de
uso deles na instituição que os criou (COUTURE e ROUSSEAU, 1998).
Os canadenses denominam as fases de “ativos”, “semiativos” e “inativos” e,
os norte-americanos, de “correntes”, “intermediários” e “permanentes”. Os
documentos que cumprem valor administrativo, por terem um tempo de vida definido
57
por sua validade legal, são chamados “correntes”. Os documentos que, cessado o
valor administrativo, são selecionados por seu valor de testemunho histórico são
recolhidos aos arquivos permanentes.
Os norte-americanos criaram a expressão Records Management para as
práticas de organização e uso dos documentos na fase corrente. Também são
utilizados os termos gestão de documentos, gestão de arquivos e gestão de
arquivos vivos. Os franceses demoraram a aceitar a divisão dos documentos em
ciclos de vida. Assim que o documento é criado, usam o termo arquivo
contemporâneo para as atividades de seleção, triagem e recolhimento em arquivos
permanentes.
Os documentos intermediários são aqueles que ainda podem ter valor
administrativo ou que ainda precisam de avaliação antes de ser considerado seu
valor de testemunho. Na prática, o documento intermediário é uma criação para a
fase intermediária; é uma solução econômica e de contingência para evitar o
excesso de documentos em arquivos permanentes. O conceito nasceu nos Estados
Unidos, a partir dos anos de 1940, como alternativa para gerenciar e controlar a
grande quantidade de documentos produzidos pelos setores administrativos,
fenômeno conhecido como “explosão documental”.
As tecnologias informatizadas influenciam o processo de produção e
reprodução da informação e possibilitam, também, a democratização do acesso à
informação; têm sua fundamentação na criação dos trabalhos do inglês Hilary
Jenkison e do norte-americano T.R. Schellenberg, que propõem a separação entre
arquivo administrativo e arquivo histórico como solução moderna para o problema do
acúmulo de documentos.
Schellenberg (2002) define arquivos correntes e destaca sua importância para
a formação dos arquivos permanentes. Ressalta a importância dos processos de
seleção e avaliação na transposição de um ciclo para outro. Com isso, nascem
alguns dos importantes instrumentos da administração dos arquivos, como os
instrumentos de Quadros temporalidade e destinação dos documentos e as políticas
de seleção e avaliação.
Ao longo do desenvolvimento da arquivística, muitos autores passaram a
estudar a funcionalidade desses princípios aplicados às práticas de organização da
informação. Elas sofreram críticas, mas o que se pode perceber é que nenhuma foi
58
capaz de refutar completamente esses princípios norteadores das atividades dos
arquivos.
Alguns autores, como Luciana Duranti (2001), Bruno Delmas (2001),
Fernanda Ribeiro (2001), Terry Cook (2001), Paulo Conway (2015) e Jennifer
Meehan (2009), partem do princípio de que na contemporaneidade, as tecnologias
da informação e comunicação trazem desafios que precisam ser considerados nas
práticas da Arquivística. Desse modo, muitos elementos definidos pelos princípios
de fundamentação da arquivística precisam ser revistos. Eles são unânimes em
afirmar que a contemporaneidade provocou mudanças na natureza dos arquivos, na
criação dos documentos, na utilização e nas formas de acesso.
Luciana Duranti (2001) ressalta a importância crucial que a ciência
arquivística deve ter com a produção do conhecimento atual, por seu papel de
preservar e possibilitar o uso dos documentos hoje criados e acessados em meio
digital. A autora sustenta que os arquivos devem ser vistos como sistemas
integrados ao processo de produção do conhecimento, e não instituições passivas à
espera de receber o que restar do processo de criação do conhecimento. Ela
defende a intervenção neste processo, principalmente a partir dos princípios da
diplomática, que podem assegurar o registro do conhecimento e, também, seu papel
enquanto registro das ações humanas.
Os estudos de Duranti (2001) consideram que os processos hoje acontecem
na sociedade digital, principalmente na web, que é dinâmica e opera em termos de
processo. Destaca que a arquivística deve considerar os aspectos relacionados ao
modo de vida sistêmico, que requer a identificação das partes, das estruturas e dos
processos, devendo ser capaz de descrever os relacionamentos existentes. Essa
nova visão deve afetar todo o modo de fazer arquivístico.
Posição parecida tem o arquivista francês Bruno Delmas (2001), que destaca
que a arquivística vive o contexto da sociedade da informação, deve conhecer os
processos de comunicação existentes e entender que eles são determinantes para a
prática atual. A produção, a troca e a conservação de informações, conhecimentos e
dados tornaram-se elementos essenciais desse sistema nervoso mundial. Ele
defende a aplicação dos tradicionais princípios da diplomática como forma de
garantir o resgate da existência dos registros do conhecimento produzidos hoje.
Destaca que os arquivos devem assumir novas funções neste contexto de criação
59
de registros e assumir uma posição mais ativa para assegurar que tenhamos uma
sociedade com memória.
Fernanda Ribeiro (2001) defende o avanço da arquivística enquanto Ciência
da Informação e, como tal, a área deve lidar com a informação social ou informação
como produto social, dinâmico, às vezes imaterial. Para ela, a arquivística deve
utilizar os recursos da teoria sistêmica como ferramenta de interpretação do
fenômeno social.
Angelica Menne-Haritiz (2001), ao discutir as questões da contemporaneidade
relacionadas aos aspectos de armazenamento e acesso, destaca que as
possibilidades de acesso aos arquivos demandam mudanças nas práticas de
organização e descrição dos documentos, antes centradas no objetivo da
preservação; atualmente, porém, devem voltar-se para atender às diferentes
possibilidades de acesso, tanto fisicamente quanto por meio das tecnologias de
informação.
Esses autores apontam que as mudanças que vêm ocorrendo na área dos
arquivos são importantes e merecem estudos sobre seus reflexos, tanto do ponto de
vista teórico quanto metodológico, para fortalecer a arquivística como uma área de
conhecimento científico consolidada. A história da concepção do percurso do
documento foi abordada novamente no item sobre a Gestão de Documentos.
2.7 GESTÃO DE DOCUMENTOS
A gestão de documentos ou records management ou ainda gestion de
documents delimita um marco na história da Arquivística contemporânea; a gestão
dos documentos administrativos nas organizações é uma prática que acompanha a
história administrativa dos governos, como aborda Duranti (1989) no artigo “The
odissey of records managers”. Nesse artigo, ela descreve as práticas de
gerenciamento de documentos nas várias instâncias administrativas, desde tempos
antigos, no período medieval e moderno, o que demonstra que sua organização e a
gestão de documentos sempre foi uma preocupação, mesmo que os objetivos e as
circunstâncias motivadoras tenham mudado ao longo do tempo.
Couture e Rousseau (1994) também analisam o panorama histórico de
desenvolvimento da gestão de documentos com destaque para os ciclos de vida do
documento.
60
O conceito de Gestão de Documentos começa a fazer parte da literatura dos
Estados Unidos a partir da década de 1950, como forma de racionalizar a produção
documental e facilitar o acesso. Uma das principais consequências da introdução
deste conceito foi a elaboração a partir da abordagem das três idades, ou ciclo vital,
isto é, os documentos de arquivo têm uma idade ou fase, de acordo com as
necessidades do órgão que o produziu.
O objetivo aqui não foi discutir o conceito de Gestão de Documentos e suas
implicações. A Gestão de Documentos é um tema amplo na arquivística e que
merece estudo específico e aprofundado. O objetivo desta pesquisa foi o de buscar
evidências dessa aproximação da gestão de documentos com o processo de
organização e tratamento e o ciclo de vida, pois se acredita que os processos para o
tratamento e organização do documento iniciam-se com o seu nascimento e o
acompanham no seu ciclo evolutivo.
Segundo Yves Peròtin (1962), a concepção de gestão de documentos nasce
nos Estados Unidos em 1948, quando foi criada a Commission Hoover, destinada a
melhorar o funcionamento da administração pública do pais, após a Segunda Guerra
Mundial. Essa comissão criou uma força tarefa, coordenada por J. Leahy, antigo
funcionário do Arquivo Nacional, que se dedicou ao chamado Records management.
No relatório final, entregue à Comissão Hoover em 14 de outubro de 1948,
recomenda-se a criação do “Federal Records Administration”, que englobaria o
Arquivo Nacional e os depósitos intermediários (records centers) existentes nos
setores governamentais e definiria as obrigações e as responsabilidades dos
“Records Center Officer”, criados para conduzir o programa. As recomendações da
força tarefa são reforçadas e colocadas no relatório final da Comissão Hoover, em
1949.
Uma segunda Comissão Hoover é criada entre 1953 e 1955. Ela fará outras
recomendações sobre as tarefas de gestão de papéis ou paperwork management.
Essas medidas visavam gerenciar o fluxo dos documentos e sua crescente
quantidade nos setores administrativos do governo. Desde o início, as atividades de
Records management passam a existir em todos os países onde a atividade
administrativa e econômica é acompanhada da produção em massa de documentos,
conservados por seu valor de prova ou seu valor de informação dentro dessas
organizações.
61
Segundo Chabin e Watel (2006) a maneira de executar essa tarefa difere de
um país para outro, por razões culturais e pelo histórico do desenvolvimento da
gestão da informação e de documentos, que resulta em concepções e práticas
diversas.
Os países europeus que já vêm com uma forte tradição de organização dos
documentos em arquivos e têm sedimentada uma prática arquivística, sentem o
impacto da adoção do novo conceito em suas atividades de gerenciamento. Países
como a França, a Bélgica, a Suíça e a Alemanha desenvolvem novas práticas de
organização. A gestão dos documentos, em alguns casos, é separada dos arquivos,
ficando a cargo dos documentalistas das empresas. Mas, outros países, como
Estados Unidos, Canadá, Austrália, ditos países novos, incorporam o conceito de
gestão de documentos, muito em função do histórico de suas práticas de gestão de
registros documentais e da informação, pois não têm a tradição de organizar e tratar
documentos antigos e medievais. A adoção da gestão dos documentos
administrativos, correntes e intermediários é considerada mais adequada à realidade
desses países. Isso provoca uma grande movimentação na área de arquivos com
defensores do modelo e a busca de alternativas de gerenciamento do documento.
Chabin e Watel (2006) descrevem as dificuldades enfrentadas pelos membros
da Association Française de Normalisation - AFNOR, órgão francês de normalização
e representante da International Organization for Standartization – ISO, fato que
contribui para a elaboração de normas internacionais, pois ficaram hesitantes com
relação à adoção de um termo correspondente na língua francesa para records
management. Por fim, optaram por não traduzir o termo, mas adotaram o modelo
adaptado à realidade do país. Mais do que uma tentativa de separar os arquivos
tradicionais da gestão de documentos, as discussões fortalecem a área e um grande
passo dado é a criação da norma ISO 15489, em 20014.
2.7.1 A gestão de documentos e o ciclo de vida dos documentos
4 Norma ISO 15489:2001 Information and Documentation – Records Management. Publicada pela
International Organization for Standardization (ISO). Regula a gestão de documentos produzidos nas organizações públicas ou privadas. A primeira versão foi publicada em 2001. Em 2016 foi publicada uma atualização.
62
A abordagem da três idades, ou ciclo de vida dos documentos, assim
nomeada por alguns, surge em 1961, na França, a partir da visão de Yves Pérotin
(“L´administration et les trois âges des archives”). Trata-se de um relatório para o
diretor do arquivo nacional da França, após uma visita aos arquivos americanos a
fim de conhecer a processo de gestão de documentos (KERN, HOLGADO, COTTIN,
2015).
A abordagem das três idades é uma modelo operacional que não é admitido
universalmente como um princípio arquivístico. Parece ter uma melhor aceitação na
arquivística norte-americana e nos países da América Latina. Segundo Kern,
Holgado e Cottin (2015), que fazem uma revisão sobre a história do ciclo de vida dos
documentos e seu alcance mundial, o termo “ciclo de vida” surge na América do
Norte nos anos 1980. A abordagem é baseada na ideia de que um documento tem
vida similar à de um organismo biológico: ele nasce (fase de produção), vive (fase
de conservação e utilização) e morre (destino final), considerando ou não a fase de
arquivamento definitivo.
Nos anos 1970, a representação do ciclo de vida do documento, que ainda
não era conhecido com essa nomenclatura, era uma forma de os gestores
controlarem os documentos provenientes do mundo digital e, assim, garantir sua
integridade e autenticidade. Com esse contexto de nascimento dos documentos
digitais, carregado de muitas dúvidas em relação à preservação, guarda,
originalidade, autenticidade e outras questões, pareceu adequado adotar um modelo
em que fosse possível ou necessário acompanhar todo o ciclo de vida do
documento, para se tenha um visão do seu percurso.
A adoção do modelo de ciclo de vida parece ser uma solução no emaranhado
de dúvidas que os gestores de documentos tinham até então. Embora seja
controvertida a sua adoção em muitos arquivos, é um modelo referendado nas
normas de gestão de documentos. Não obstante seja possível considerar um maior
número de fases do documento, além das três, a aplicação do ciclo de vida tem mais
impacto de aplicação prática do que conceitual, como atesta o trabalho de Kern,
Holgado e Cottin (2015). O maior impacto assinalado pelos autores diz respeito ao
papel e responsabilidade dos atores intervenientes na gestão do ciclo (produtores,
profissionais da gestão documental, arquivistas, usuários, etc.).
Neste trabalho de revisão conceitual, com mais de 50 definições de ciclo de
vida dos documentos, em diferentes autores e culturas, considerou-se pertinente à
63
abordagem feita pelos autores desse conceito atrelado à origem da gestão de
documentos, o que levou à compreensão da relação entre os dois conceitos, que a
seguir tentou-se explicar.
Os autores apresentam algumas conclusões já sedimentadas sobre o ciclo de
vida dos documentos. Kern, Holgado e Cottin (2015) constatam que a origem do
ciclo de vida ou abordagem das três idades não tem necessariamente origem no
relatório norte-americano da Comisão Hoover (1948-1949), nem no manual de
Schellenberg (1956). Essa abordagem tem origem na tradição do Registrature, ou
Registratum, que se baseia na tradição arquivística clássica até a Revolução
Francesa. Nessa época, o arquivo era o lugar de registro de atos notariais que
serviam primeiramente às instituições e às pessoas, para provar seus direitos.
Ocorria, então, a eliminação de documentos considerados desnecessários e eram
conservados aqueles ainda úteis, sem que tivessem necessariamente uma função
histórica.
Com a concepção histórica da arquivística do século XIX, a gestão de
documentos nas entidades produtoras é proposta por administradores ou
secretários, uma vez que somente a gestão dos arquivos ditos históricos fora
proposta pela arquivística nas administrações. O fosso entre produtores de
documentos e arquivistas se amplia: estes ignoram o que fazem aqueles e vice-
versa. (KERN, HOLGADO E COTTIN, 2015).
A partir da segunda metade do século XIX, com o desenvolvimento das
técnicas administrativas e de reprodução, aumentou consideravelmente a massa
documental. Os arquivos se veem repletos e sem espaço suficiente para abrigá-los.
A gestão de documentos nasce para administrar o espaço de conservação e
proceder às eliminações de maneira racional, para desafogar os depósitos dos
arquivos, ainda que a realidade dos arquivos intermediários funcione, em alguns
casos, como debeladores do processo de eliminação racional ditada pela gestão dos
documentos.
Kern, Holgado e Cottin (2015) afirmam que o primeiro a abordar o conceito de
percurso do documento é Jósef Paczkowski, arquivista polonês, em 1928, que
apresenta um artigo sobre o assunto na administração moderna e sua importância
para a ciência histórica. Porém, Paczkowski cita Eugenio Casanova, arquivista
italiano que, em seu manual de 1928, afirma que o os arquivos são uma realidade
que nasce de uma fonte comum e que vive a sua própria vida e depois morre.
64
Alguns anos mais tarde, o arquivista norte-americano Philip Coolidge Brooks,
em 1940, faz referência às diferentes etapas da história de vida de um conjunto de
documentos. Ainda, nesse documento de 1940, Brooks conclui que quanto mais
cedo for realizado o processo de seleção na história de vida de um documento,
melhor é para todas as pessoas envolvidas; assim, a cooperação entre o produtor e
o arquivista pode ser estabelecida mais cedo e o trabalho de cada um será
facilitado.
Outro autor citado por Kern, Holgado e Cottin (2015) sobre o percurso do
documento é Adolf Brenneke que, em 1953, descreve que “O percurso de vida dos
dossiês” é conduzido da chancelaria para o registratum.
Em 1956, Schellenberg, diretor do Arquivo Nacional dos Estados Unidos,
menciona na obra “Arquivos modernos: princípios e técnicas” a duração de vida dos
documentos. Ele afirma que a gestão de documentos compreende toda a duração
de vida de grande parte dos documentos. Schellenberg teoriza a visão diferenciada,
porém englobante, de gestão de documentos (records management) e arquivos
(archives management).
Schellenberg também se atém aos vários critérios que permitem distinguir os
documentos de arquivos, a saber, o valor primário e o valor secundário de
informação para avaliá-los. Ele evidencia dois períodos do documento: o da
administração (valor primário) e o da história (valor secundário).
Outro autor importante a discutir o percurso do documento é Yves Pérotin,
que publica “L’adminstration et les trois âges des archives”, em 1961, destinado aos
administradores da França. Pérotin estabelece distinção entre documento corrente
da administração e documento permanente, do arquivo histórico. A importância
dessa distinção é o fato de chamar a atenção para a fase corrente do documento a
fim de garantir a criação dos arquivos permanentes de qualidade. O autor
sistematiza as bases da abordagem das três idades instituída no modelo de
administração de arquivos da França. Porém, os franceses demoram a aceitar a
ideia de ciclo de vida do documento e a gestão de documentos.
Contudo, a necessidade prática demanda a criação do Centre des archives
contemporaines, em 1969, para receber os arquivos da administração, antes de
serem recolhidos definitivamente ao Arquivo Nacional da França.
Em síntese, o que se pode destacar da revisão de Kern, Holgado e Cottin
(2015) quanto ao ciclo de vida e a gestão de documentos é:
65
Há unanimidade na compreensão de que o ciclo de vida é constituído de
etapas da existência de um documento desde sua criação até a sua
função/destinação final. O conceito de ciclo de vida não aborda, porém, o
arquivamento definitivo, que vem após a definição da sua destinação final
(destruição ou conservação final).
Os norte-americanos se referem ao ciclo de vida da informação ou ciclo de
vida do registro, mas não do documento.
Os australianos adotam records continum e registrum continum e documento
continuum em lugar do termo ciclo de vida, mas consideram de maneira
particular a existência de etapas na vida do documento.
Para os franceses, a noção de ciclo de vida confunde-se com a “teoria” das
três idades. Ao se buscar o termo ciclo de vida no dicionário terminológico do
Arquivo Nacional da França, o leitor é redirecionado para o termo “Teoria das
três idades”, definido como a noção fundamental sobre a qual repousa a
arquivística contemporânea. Desse modo, todos os documentos passam por
três períodos: corrente, intermediário e definitivo ou permanente.
As normas ISO 15489 (2001) e ISO 30300 (2011) não definem o termo ciclo
de vida, embora incorpore os seus preceitos.
As bases do ciclo de vida dos documentos e a teoria das três idades são a
principal sustentação teórica da arquivística contemporânea, por
considerarem, de maneira completa, a trajetória do documento do nascimento
até a extinção definitiva.
As concepções básicas do ciclo de vida e da gestão de documentos
sustentam as atividades necessárias à gestão dos documentos digitais,
complexos e em constante evolução.
2.7.2 Normas do records management
A International Organization for Standartization - ISO, na busca de consensos
conceituais e práticos, iniciou, desde a década de 1980, o desenvolvimento de
normas para promover melhorias no funcionamento das organizações, por meio da
implantação de sistemas de gestão.
66
As normas internacionais ISO 9001 a 14001 apontam, entre outras
recomendações, a necessidade de organizar corpus de documentos de qualidade
nas empresas para que estas tenham documentos representativos das ações de
seus negócios. Embora recomendem a busca de qualidade dos documentos, essas
normas não especificam o que vem a ser “documento com qualidade”. As
recomendações obrigam as empresas e instituições arquivísticas a pensarem as
questões relacionadas à conservação, tratamento e comunicação dos documentos
que nascem de atividades diversas. Para isso, recomendam ações que visam
controlar o tempo de vida dos documentos (DUCOL, 2006).
A norma ISO 15489A precisa as diretrizes de como deve ser uma gestão de
documentos voltada para a qualidade.
A primeira edição da norma ISO 15489 Information and documentation,
“records manangement” foi lançada em 2001. Esta teve origem na norma AS 4390
“records management”, criada pelo governo da Austrália, em 1996, proposta pela
ISO como norma internacional.
Segundo Couture e Roy (2006), a adoção dessa norma pelos arquivos não foi
pacífica, pois as questões a respeito de vocabulário, histórico e modelos de gestão a
dificultaram, sendo criado um comitê técnico para avaliar os problemas e realizar
adaptações para sua admissão como norma internacional “records management”.
Em 2001, foi lançada a sua primeira edição, com as diretrizes para normalizar
as práticas de gestão da informação no ambiente de multiplicação crescente de
documentos e uso da informática na criação, tratamento, armazenamento e
conservação dos documentos. O acolhimento de uma norma internacional é
necessário no contexto da mundialização, em que as relações comerciais, de
produção e fusões entre as empresas têm consequências importantes na gestão dos
documentos por elas produzidos (White-Dollmann 2004).
Em 2016 foi publicada uma atualização da norma. Após mais de dez anos de
apresentação da primeira edição, constata-se a necessidade de mudanças,
principalmente em relação aos conteúdos digitais.
Para Convery (2016), a principal atualização refere-se aos metadados, um
importante mecanismo de controle dos documentos. Apesar de não especificar a
adoção de nenhum modelo, destaca a necessidade de interoperabilidade dos
documentos com os diversos agentes.
67
Outra mudança relaciona-se aos comentários a serem acrescentados para
acompanhar a avaliação contínua do documento nos negócios.
A definição de records management, apresentada na norma ISO 14589-1
2016 (ISO, 2016), estabelece o campo da gestão como responsável pelo controle
sistemático e eficiente da criação, recebimento, manutenção, uso e comunicação
dos documentos; inclui, ainda, processos para a captura e manutenção das
evidências e informações sobre as atividades e transações comerciais sob a forma
de documentos.
O objetivo da gestão de documentos é gerenciar a produção e a conservação
dos mesmos, com os critérios de autenticidade, confiabilidade e integridade, para
que possam ser utilizados a fim de promover eficiência e eficácia aos negócios.
O conceito de autenticidade de um documento está relacionado à sua
capacidade em ser prova de algo, enquanto a confiabilidade está relacionada à sua
capacidade de representar completamente e de forma precisa as atividades ou
operações nele retratadas. A integridade relaciona-se à sua proteção contra
alterações não autorizadas. A interoperabilidade deve garantir que o documento
possa ser usado em todos os momentos e ser identificado, recuperável e
comunicado sempre que necessário. O formato ou o meio no qual ele é mantido
deve permitir a sua reutilização pelo tempo necessário.
A norma de gestão de documentos não especifica ações, operações ou
ferramentas a serem usadas na gestão de documentos, mas identifica cinco
características específicas para controle do processo do sistema de gestão, desde a
produção do documento até o seu uso efetivo ou descarte, após cessada sua
necessidade na organização. São elas:
Confiabilidade: o sistema deve garantir que os documentos produzidos como
partes de uma atividade devem ser criados de modo a serem fonte de
informação. Para tanto, deve informar e dar acesso aos documentos e às
informações nele contidas, incluindo os metadados, que precisam ser
integrados ao sistema e organizados de modo a refletir as operações do
produtor, preservando o máximo de informações sobre seu contexto de
produção. O sistema deve acompanhar a trajetória do documento sem afetar
suas características básicas, sem necessidade de alterá-las no caso de
transferência ou migração,
68
Integridade: o sistema deve prover medidas de controle sobre a identidade
dos usuários, como os direitos de acesso, modificação e remoção de
documentos. Mecanismos de segurança em geral devem ser desenvolvidos e
implementados para evitar o uso não autorizado do sistema.
Conformidade: o sistema deve atender aos requisitos decorrentes das
atividades de negócios com base nas legislações, regulamentos, normas e
práticas a ele referentes.
Âmbito de aplicação: deve ser definido no sistema o alcance e a
determinação das atividades que serão integradas. A integração pode ser
feita em etapas e por processo ou setor, ou definida em função do negócio.
Caráter sistemático: a gestão de documentos, assim como seus processos e
procedimentos, devem ser implementados em conjunto, a fim de sistematizar
os métodos de produção e conservação. Os processos e procedimentos
devem ser específicos e aplicados em todos os casos.
2.7.3 Implantação da gestão de documentos
As atividades da gestão de documentos estão relacionadas ao controle do
seu ciclo de vida, no período de tempo em que ficarão sob a custódia da
organização. O ciclo de vida compreende: a criação e recepção, a manutenção, o
uso, a disponibilidade e a comunicação do documento.
Para cumprir as funções da gestão, é necessário que a organização defina
métodos, atividades e papéis de suporte ao processo de organização dos
documentos. De acordo com a norma ISO 14589-1(ISO 2016), esse conjunto de
medidas deve compreender as seguintes funções:
a) criação, aprovação e reforço das diretrizes de armazenamento, incluindo
sistemas de classificação e uma política de conservação de documentos,
desde seu nascimento;
b) criação e manutenção de um plano de classificação de documentos que
inclua a localização a curto, médio e longo prazo dos arquivos físicos e
digitais;
c) identificação dos documentos existentes e aqueles recém-criados, sua
classificação e armazenamento, segundo os procedimentos em vigor.
69
d) coordenação do acesso aos documentos de arquivos e sua circulação, dentro
da organização;
e) eliminação de documentos dos arquivos, segundo as orientações,
necessidades operacionais, funções e critérios jurídicos.
De acordo com a norma ISO 14589-1 (ISO, 2016), os elementos que devem
ser contemplados em uma política ou diretriz da gestão de documentos são:
a) o ciclo de vida dos documentos: definição, função, regras de criação, de
tramitação, localização física, armazenamento, manuseio;
b) a definição dos instrumentos de controle do ciclo de vida dos documentos:
TDD, plano de classificação. Regras de elaboração, atualização, inclusão e
responsabilidades pela gestão desses instrumentos;
c) definir regras de avaliação dos documentos e dos instrumentos da GD:
câmara técnica de documentos, câmara técnica de avaliação de documentos;
d) definir modelos de formulários de gerência da GD: formulários de
transferência, recolhimento, eliminação, acesso;
e) definir políticas de preservação e conservação dos documentos em toda a
cadeia de uso e em todos os meios;
f) definição de sistemas de recuperação da informação: escolha de
equipamentos computacionais de hardware e software, participação da
elaboração de políticas de gestão da tecnologia de informação do sistema;
g) equipe de trabalho: profissional da informação, historiadores, conservadores,
profissionais de informática, do direito.
2.7.4 Avaliação de documentos
A avaliação, seleção e destinação de documentos talvez sejam as mais
complexas atividades de gestão. Desenvolve-se mediante a análise e avaliação dos
documentos acumulados, com vistas a estabelecer prazos de guarda, arquivamento
permanente e eliminação, por terem perdido seu valor de prova e de informação
para a instituição.
Le tri, (le triage), “separação do trigo do joio”, como denominam os franceses,
é a operação que implica uma enorme responsabilidade para o arquivista, na
medida em que um documento destruído jamais poderá ser reconstituído.
(MALHEIROS DA SILVA, 2000). Compreende um trabalho interdisciplinar que
70
consiste em identificar valores para os documentos (imediato e mediato) e analisar
seu ciclo de vida, com vistas a estabelecer prazos para sua guarda ou eliminação,
contribuindo para a racionalização dos arquivos e eficiência administrativa, bem
como para a preservação do patrimônio documental.
Tem também o objetivo de refletir sobre a produção documental; racionalizar
espaço, estabelecer valor ao documento e contribuir para a criação do arquivo
histórico ou arquivo permanente.
Como vantagens da aplicação da avaliação, Bernardes (1998) aponta que a
redução da massa documental é o principal objetivo alcançado por ela, além de
outros como: agilidade na recuperação e nas informações, eficiência administrativa,
melhor conservação dos documentos de guarda permanente, racionalização da
produção e do fluxo de documentos.
A tabela de temporalidade é a principal ferramenta usada na gestão para
proceder à seleção e descarte racional, e resulta de avaliação administrativa e
científica dos documentos dos arquivos. É o ponto de junção que permite à
arquivística contemporânea intervir sobre todos os documentos de arquivos, desde a
sua criação até a sua eliminação ou guarda permanente. (Rousseau; Couture,
1998) .
2.8 DESCRIÇÃO DE DOCUMENTOS ARQUIVÍSTICOS
A descrição arquivística constitui-se na representação intelectual e material,
que identifica precisamente uma unidade arquivística e permite a sua localização e
utilização. (NOUGARETH, 1999).
A arquivística tradicional, nos manuais de prática de organização dos
documentos, reconhece na atividade de descrição o caminho e os procedimentos a
serem seguidos para a elaboração dos instrumentos de pesquisa. Esses
procedimentos são norteados pelos princípios arquivísticos da territorialidade, da
proveniência e do ciclo de vida dos documentos.
A arquivística contemporânea busca tratar a atividade de descrição como um
processo acima da classificação tipológica e a vê como uma atividade pertinente a
qualquer tipo de arquivo, seja na gestão dos documentos que nascem na
organização, seja em massas de documentos recolhidos aos arquivos permanentes.
Ao longo da evolução arquivística, a descrição vem sendo progressivamente
71
regulamentada, o que possibilita afirmar, atualmente, que se trata de uma atividade
consolidada, principalmente por possuir um conjunto de normas internacionais que a
regulamentam.
O objetivo neste trabalho, ao se discorrer sobre a descrição arquivística, não
foi o de reproduzir os diferentes manuais adequados às tipologias de arquivos e
tipologias de documentos, mas a tentativa de se conhecer um pouco mais as
implicações decorrentes da descrição nos arquivos e as diretrizes importantes que
podem ser observadas sobre esta temática.
Um primeiro ponto observado é a definição dos elementos de descrição que
atendem aos princípios arquivísticos. O que é preciso informar sobre cada unidade
de descrição? O que é pertinente identificar para as diversas instâncias
administrativas? De que forma? Qual a ordem lógica adequada? O que informa
sobre o documento para os usuários? Essa preocupação por parte dos arquivistas é
tão antiga quanto os arquivos e remonta ao registro e controle de índices, da
antiguidade clássica até a contemporaneidade.
A necessidade de registrar as informações sobre os documentos existentes
nos arquivos é fundamental para a própria prática arquivística. Conforme apontam
Rousseau e Couture (1998) são “unidades de trabalho” ou meios de abordar a tarefa
de tratar os documentos que, segundo os autores “situa-se, pois, no coração dos
próprios fundamentos da disciplina. Aplicam-se ao conjunto das suas funções, pouco
importando a idade, a natureza ou o suporte dos documentos” (p. 132).
A arquivística moderna nasce da tradição dos manuais de trabalho, do
manual dos holandeses. A publicação de 1898, de Muller, Faith e Fruin, nasce da
inquietação dos arquivistas holandeses com os rumos que a organização da
informação nos arquivos estava tomando. Cada qual, independentemente e
isoladamente, fazia sua interpretação de como realizar a organização das
informações em arquivo. A tradição manualista denota justamente a tentativa de
impor um método de trabalho, principalmente quando cada um pensava a
organização do seu acervo de forma própria.
Hornsman, Ketelaar, Thomassen (2003) retomam a história de nascimento do
manual dos holandeses para entender como se deu a evolução da elaboração das
regras nele contidas e a formulação dos princípios que regem a arquivística
moderna. Com o manual dos holandeses, surgem as bases para o princípio da
72
preservação da ordem original como fundamento para a organização e o tratamento
dos documentos.
Em outra tentativa, vem da escola arquivística tradicional francesa, os
prenúncios do princípio de respeito aos fundos, quando é publicado o decreto de 24
de abril de 1841, com instruções ministeriais para colocar em ordem e classificar os
arquivos departamentais e de comunas, de modo a formar coleções provenientes de
um mesmo corpus, de um mesmo estabelecimento, de uma mesma família ou
indivíduo, sem misturá-los. (DIRECTION DES ARCHIVES DE FRANCE, 1999).
Assim como a teoria das três idades ou ciclo de vida dos documentos, que
regulamenta o tratamento dos documentos correntes, obedecendo ao seu ciclo de
vida na organização, com base no valor, que é definido pela identificação de
produtor, origem, data, intenção, conhecidos com a descrição desses elementos nos
diversos instrumentos de busca dos arquivos.
Nasceram dos manuais de prática da organização de descrição dos
documentos os princípios fundamentais da arquivística, corroborando a afirmativa de
Rousseau e Couture (1998) sobre ser essa atividade o coração da arquivística
moderna.
Quanto à descrição nos arquivos, vários elementos da fundamentação da
disciplina arquivística são retomados, o que demonstra a característica nuclear do
tema. Conforme Rousseau e Couture (1998):
Com efeito, a noção de ciclo de vida, de valor primário ou secundário dos documentos, de cadeia documental, de dossiê, de classificação interna e externa dos fundos, até mesmo a de avaliação, tornam-se todas, por uma razão ou por outra, corolário do conceito de unidade de trabalho, ele próprio ligado ao princípio da universalidade. (p.132).
No modelo de descrição dos canadenses, segundo Rousseau e Couture
(1998), para desenvolver qualquer atividade normativa de descrição de documentos
de arquivos, é necessário reconhecer uma hierarquia de instâncias que se inicia com
o que eles chamam de patrimônio arquivística, até chegar ao dado informacional. A
descrição é o processo de situar e reconhecer as várias instâncias nas quais o
documento, ou conjunto de documentos, está inserido, para conferir a noção de
pertencimento; explicita as relações do documento com outras instâncias ou
tipologias documentais, dentro e fora do arquivo ao qual pertence.
73
Com isso, cumpre-se a função primária da descrição arquivística, a de
reconhecer um registro de informação como um documento de arquivo com as suas
características e funções. No modelo de Rousseau e Couture (1998) constam os
seguintes conceitos:
a) patrimônio arquivístico comum: é a instância máxima onde se situa o arquivo
(arquivo nacional, estadual, municipal, central), dependendo da
particularidade de cada instância. O reconhecimento de identidade para
proceder à descrição vem dessa instância; portanto, as regras, normas e leis
que devem ser respeitadas na descrição são definidas, regulamentadas e
atualizadas por essas instâncias;
b) arquivos de um estado: esta é a instância arquivística do governo, seja
estado, federação ou município ao qual o arquivo pode estar ligado;
c) arquivos de um organismo: a instituição ou órgão que tem objetivos comuns e
onde se situa ou a quem pertencem os fundos arquivísticos;
d) grupo de arquivos: conjuntos de fundos arquivísticos de natureza idêntica ou
da mesma área temática;
e) fundo de arquivo: conjunto organizado de documentos resultante da aplicação
do princípio da proveniência, que pode conter subdivisões;
f) série: organização da estrutura interna do fundo. É a organização de
unidades de informação com base na função, atividade, assunto, conforme
estabelecido por um plano de classificação. Pode ter subdivisões;
g) unidade de instalação: é o local ou a estrutura ou o modo como se faz a
junção das peças arquivísticas; pode ser caixa, registro, processo, disco,
volume, etc. O dossiê é um conjunto de peças, documentos ou dados,
constituído organicamente com base no assunto;
h) peça: a unidade arquivística indivisível, que integra o dossiê. Pode conter
vários documentos;
i) documento: um suporte ou peça com conteúdo de informação registrado;
j) dado informacional: a menor parte de representação informacional lógica ou
digital, que pode ser um nome, um número, um fato, um conceito. O dado é o
menor elemento da descrição arquivística, que em conjunto compõe o registro
de descrição arquivística.
A decisão quanto ao modelo de organização de conjuntos documentais é
baseada em vários fatores: a classificação do arquivo, os tipos de documentos, o
74
histórico de recolhimento do documento, os objetivos da organização do conjunto
documental. Os dois modelos mais comuns tomam como base o fundo e a coleção.
No modelo denominado fundo arquivístico, a organização segue o princípio
da proveniência, sendo os fundos constituídos com base na estrutura organizacional
ou em função ou atividade. Fundo é definido no Dicionário Brasileiro de Terminologia
Arquivística (2005) como “o conjunto de documentos de uma mesma proveniência.
Termo que equivale a arquivo” (p.97).
Aqui, denominou-se fundo de arquivo a um conjunto de documentos de toda
natureza, constituído de maneira orgânica por uma pessoa física ou moral (o
produtor do fundo) no exercício das suas atividades (NOUGARET, 1999). Por
exemplo, “Arquivo da Secretaria Municipal de Cultura”, equivale a dizer que dentro
de um arquivo municipal da cidade, onde se encontra essa secretaria, há um fundo
arquivístico onde são localizados fisicamente os documentos da referida Secretaria,
para onde são recolhidos os documentos dentro do seu processo de gestão. Essa
mesma informação será descrita nos conjuntos de documentos tratados nesse
fundo.
Segundo Nougaret (1999), o fundo de arquivo não é uma reunião artificial de
documentos, nem uma criação da arquivística para facilitar o trabalho. Ele resulta
das atividades de uma pessoa física ou moral que produz e recebe documentos. O
quadro de fundo, que é uma ferramenta que retrata a estrutura dos fundos
arquivísticos, serve como instrumento para entender a organização e como
ferramenta de localização de fundos e documentos. Os franceses o denominam
Quadro de Classificação de Fundos ou “Cadres de classement”, entendido como um
plano preestabelecido da repartição de fundos no interior dos arquivos e as
correspondentes divisões e subdivisões em séries e subséries, quando for o caso.
Outro modelo de organização é a “coleção”, como “conjunto de documentos
com características comuns, reunidos intencionalmente” (DICIONÁRIO BRASILEIRO
DE TERMINOLOIGA ARQUIVISTICA, 2005, p.52), cuja definição é mesma da
norma ISAD (G) (2006). Esse modelo se aplica a diversas situações, sendo usado
predominantemente naquelas em que o fundo arquivístico é desconhecido ou de
difícil determinação.
Para manter a organicidade dos documentos, o modelo de organização por
coleção apresenta-se como solução viável. O assunto organização com base na
75
coleção foi analisado no item sobre a descrição arquivística e serve como
instrumento para conhecer e acessar o conjunto documental.
Em ambos os modelos, o arquivista deve decidir, com base em evidências
que justifiquem e fundamentem sua decisão, criar e nomear fundos e coleções. Os
modelos são decisões interpretativas que, ao longo do tempo, podem se sustentar
enquanto modelos de organização ou podem sofrer revisões e alterações, como no
caso de fundos fechados, quando cessam as atividades de um setor ou este muda
de nome ou estrutura e decide-se por encerrar o recolhimento de documentos para
aquele fundo e abrir outro. Esses dois modelos são motivo constante de discussões
e interpretações que afetam diretamente o processo de organização e tratamento de
arquivos.
Os modelos de descrição arquivística a serem adotados nos arquivos em
geral utilizam as hierarquias de instâncias de identificação dos documentos,
realizando as devidas adaptações ou traduções da nomenclatura mais adequadas a
cada arquivo.
Os profissionais de arquivo devem adotar modelos genéricos ou específicos
de descrição, de acordo com cada instituição, tipo de acervo, ciclo de vida do
documento, mas, em geral, esse modelo acompanha as diretrizes da descrição
arquivística, por retratarem os princípios que regem os procedimentos da
organização e tratamento dos arquivos.
2.8.1 A normalização da descrição
Um segundo tema abordado nos estudos sobre a descrição arquivística é a
padronização ou normalização das atividades de descrição arquivística.
A padronização internacional de descrição arquivística ficou a cargo do ICA,
Conselho Internacional de Arquivos. Em 1994, publicou a primeira edição da Norma
Internacional de Descrição Arquivística (ISAD-G), cuja versão brasileira é a
NOBRADE. Essa norma contém parâmetros de descrição de “documentos em todo
e qualquer suporte, respaldada em procedimentos metodológicos já implementados,
bem como definindo um universo de elementos de descrição para registro de
informações tradicionalmente recuperadas” (NOBRADE, 2006, p.7).
A norma ISAD (G) tem como objetivo: “identificar e explicar o contexto e o
conteúdo de documentos de arquivo, a fim de promover o acesso a eles. Isso é
76
alcançado pela criação de representações precisas e adequadas e organização
dessas representações de acordo com modelos predeterminados” (NOBRADE,
2006p. 11).
A Norma esclarece, ainda, que os "processos relacionados à descrição
podem começar na, ou, antes, da produção dos documentos e continuar durante a
vida” (NOBRADE, 2006p. 11). Isso mostra a relação da normalização com as
atividades de gestão e controle do ciclo de vida dos documentos.
A gestão de documentos dispõe de um instrumento que pode auxiliá-la a
garantir a integridade e autenticidade dos mesmos, por meio das informações neles
descritas, desde sua criação. Isso pode ser confirmado na introdução da norma, que
aponta que em qualquer estágio de sua vida, “as informações sobre o documento
permanecem dinâmicas e podem ser submetidas a alterações à luz de maior
conhecimento de seu conteúdo ou do contexto de sua criação” (ISAD (G), 2006, p.
11). Portanto, à medida que o documento sofre alterações físicas, de uso ou de
conteúdo, a descrição arquivística também é alterada.
Habitualmente, a descrição arquivística procede do geral para o específico, ou
do fundo para o item documental. A norma pode ser adotada para qualquer nível de
descrição.
Na versão brasileira da ISAD (G), são definidos 28 elementos de descrição
para descrever os fundos arquivísticos, uma série, subsérie, um dossiê, um
documento ou toda unidade descritiva e de gestão de documentos,
independentemente da natureza ou tipo de arquivo.
Esses elementos são agrupados em oito áreas: identificação,
contextualização, conteúdo, condição de acesso, fontes relacionadas, notas,
controle da descrição e pontos de acesso.
Dos 28 elementos, sete são obrigatórios para qualquer nível de descrição:
código de referência, título, datas, nível de descrição, dimensão e suporte, nome do
produtor e condições de acesso.
A norma ISAAR (CPF), Norma Internacional de Registro de Autoridade
Arquivística, complementar à primeira, ISAD (G), regula a descrição do produtor,
entidade fundamental para identificar o contexto dos documentos. O objetivo é
estabelecer regras para descrever os produtores dos documentos de maneira
independente, mas ligada à descrição prevista na norma ISAD (G). Essa tática
auxilia os eventuais rearranjos e reagrupamentos de documentos e suas ligações
77
com o produtor; auxilia a controlar as mudanças erráticas de nomenclatura de
órgãos e entidades; auxiliam na adoção de nomenclatura comum de entidades,
produtores, órgãos e famílias e toda a hierarquia administrativa a que o arquivo
possa estar ligada.
A norma não define regras específicas de criação de nomes ou formas
autorizadas de nomes; ela se refere às regras de conversão nacional e internacional
para registros de entidades e autoridades.
A segunda edição da ISAAR (CPF) tem o objetivo de facilitar os processos de
interoperabilidade entre os sistemas com a preocupação de estabelecer ligação
entre os itens autorizados, para facilitar as trocas de informação entre os arquivos e
as entidades a eles ligadas.
Foram publicadas posteriormente a versão da ISAAR (CPF) para entidades
coletivas, pessoas e famílias (ISAAR-CFG) e a Norma Internacional para Descrição
de Funções (ISDF), com os mesmos objetivos de complementaridade da norma
ISAAR (CPF) para as funções administrativas. Depois, vieram as normas EAD
(Encoded Archival Description) e a EAC – CPF (Encoded Archival Context –
Corporate Bodies, Person, Families) para documentos em meio digital, que foi
desenvolvida inicialmente pela Associação dos arquivistas norte-americanos. Segue
o mesmo princípio da ISAD (G) de padronização da descrição, mas o principal
objetivo é codificar os instrumentos de pesquisa em linha, para que as relações
hierárquicas entre as diferentes unidades de documentos que compõem um fundo
possam ser relacionadas com outras unidades nas redes de computadores.
A descrição arquivística, em termos de instrumentalização prática, caminha
para a adoção de padrões de normalização cada vez mais unificados
internacionalmente. Como pontua Fonseca (2010), “a visão atual não é a criação de
mais normas, mas sim de divulgação e treinamento dos profissionais naquelas
existentes, bem com a explicitação das relações entre todas essas ferramentas
existentes” (p.259).
O uso das tecnologias de informação para a construção de sistemas de
recuperação de informação em arquivos auxilia a popularizar o uso de normas de
descrição, mas as peculiaridades das instituições arquivísticas e a diversidade de
tipologias documentais é uma barreira na busca de padronização, uma vez que esta
nem sempre atende às especificidades de cada arquivo.
78
2.8.2 As normas de descrição arquivística – Histórico de criação
O Conselho Internacional de Arquivos (ICA) é o órgão responsável
mundialmente por discutir e propor a criação de normas internacionais de arquivo.
Esse trabalho teve início em 1988, em Ottawa, a convite de Harold Naugler,
responsável pelo ICA Automation Committee, juntamente com o Arquivo Nacional do
Canadá. Foi constituído um grupo de especialistas de arquivos, de vários países,
para discutir a criação de uma norma internacional de descrição arquivística (ICA,
2015), conforme descrito na história de criação do comitê.
O principal motivador para o início das discussões sobre a criação de uma
norma internacional foi o processo de automação dos arquivos que, na década de
1980, começam a adotar as tecnologias de informação e comunicação em larga
escala. Tal fato provocou o surgimento de várias iniciativas de projetos de
desenvolvimento de sistemas informatizados para a gestão e descrição em arquivos.
Isso cria a necessidade de troca de informações para o trabalho com as tecnologias
emergentes, como o desenvolvimento de bancos de dados e criação de ferramentas
de recuperação da informação. Devido às experiências de automação em outros
equipamentos como bibliotecas e museus, sabe-se que a automação exige
consistência na abordagem e nos procedimentos a serem automatizados.
Outro motivador para a criação de normas internacionais de padronização da
descrição surgiu da necessidade de troca de informações descritivas sobre os
acervos arquivísticos, principalmente para beneficiar arquivistas e usuários que
lidam com as possibilidades de ampliar as fontes de pesquisa, por meio do acesso
às informações descritivas de outros acervos. Para que as informações sobre outras
acervos possam ser devidamente intercambiadas, é necessário adotar um padrão
da descrição que possibilite a comunicação entre os acervos de diferentes arquivos.
Vários países buscaram soluções para o uso de sistemas informatizados nos
arquivos, fato que provocou o surgimento de uma diversidade de modelos de
descrição. Países como o Canadá e a Austrália são exemplos de iniciativas próprias
de desenvolvimento de normas e padrões de descrição de seus acervos
arquivísticos. São países com práticas de gestão de acervos correntes, concretos e
efetivos.
79
Definidas as necessidades e questões pertinentes sobre o tema, o grupo
defendeu a criação de um comitê internacional para estudar a criação das normas, o
ICA, juntamente com a UNESCO, que sediou em 1989 o encontro em Paris.
Em 1990, em reunião na Alemanha, os integrantes desenvolveram uma
Declaração de Princípios de Descrição Arquivística, que foi revisada posteriormente
em 1992, em uma reunião realizada na Espanha, tendo sido oficialmente aprovada
em setembro de 1992, em reunião anual do ICA, em Montreal.
Em meio a discussões e divergências, principalmente em relação ao ponto de
partida, foi criada uma subcomissão composta por Wendy Duff, do Canadá, Michael
Cook, Reino Unido, Sharon Thibodeau, Estados Unidos, e Hugo Stibbe, do Canadá
para elaborar a primeira versão da norma ISAD (G). O projeto da norma foi
apresentado e aprovado em uma reunião em Madri em 1992 e traduzido em cinco
línguas.
Em 1993, em uma reunião em Estocolmo, foram acolhidas críticas e opiniões.
Em 1993, em Madri, o ICA publicou o documento com o título de ISAD(G): General
International Standard Archival Description, adotada pela Comissão Ad Hoc sobre
Padrões Descritivos, em Estocolmo, Suécia, aprovado no Canadá em 1994.
No prefácio da norma está prevista a revisão a cada cinco anos. Desde 1997,
a comissão ad hoc passou a ser um comitê permanente que se ocupa da revisão
constante das normas, no ICA.
Em 1996, no congresso internacional do ICA, em Pequim, foi publicada a
ISAAR (CPF), norma internacional de registro de autoridade arquivística para
entidades coletivas, pessoas e famílias.
Durante o desenvolvimento da ISAD (G), percebeu-se que não somente a
descrição do material arquivístico ou da unidade arquivística necessitava ser
padronizada. A norma oferece os pontos de acesso que são os produtores do
documento (pessoa ou entidade). Estava claro que a descrição dessa entidade
também poderia ser alvo de padronização. Foi com esse intuito que a norma ISAAR
(CPF) foi criada, para estabelecer padrões de descrição de pessoas e entidades
produtoras dos documentos.
A norma ISAD (G) menciona a necessidade de controle de autoridade como
ferramenta para padronizar a descrição desses pontos de acesso. Segundo o ICA
(2015), para o desenvolvimento de uma norma internacional, o comitê de elaboração
de normas baseou-se em pesquisas relacionadas a registros de autoridade
80
arquivística, em andamento no Canadá e nos Estados Unidos, bem como registros
internacionais de autoridade que foram realizados pela Federação Internacional de
Bibliotecas Associações e Instituições (IFLA), nos anos 1970 e 80, como fontes de
orientação para entradas de autoridade e de referência (IFLA, 1984).
Após o processo de definição de um documento prévio, houve a
incorporação de sugestões e modificações à norma ISAAR (CPF): Norma
Internacional de registro de autoridade arquivística para entidades coletivas,
pessoas e famílias, em Paris, em novembro de 1995.
Como forma de continuar a atualização das normas arquivísticas, o ICA criou
em 2004 o Comitê de Boas Práticas e Normas (CPBS). Esse comitê centralizou
todas as discussões sobre a criação e atualização de normas dentro do ICA. O
órgão constatou que existem, dentro dos vários comitês do ICA, projetos e
discussões relacionadas à criação de normas, mas eram iniciativas dispersas. Com
a criação do CPBS, a tarefa de estudar e elaborar normas para toda a área de
arquivos, e não somente da descrição, ficou sob responsabilidade desse comitê.
Em seguida, foram publicadas as atualizações da ISAAR (CPF), em 2004. Foi
criada a norma ISDF, Norma internacional para descrição de funções e a ISDIAH,
Norma Internacional para descrição de instituições com acervo arquivístico. Essas
duas normas complementam o princípio de criação da ISAAR (CPF) de direcionar a
normalização de nomes de funções e instituições, principalmente como ferramentas
de apoio à criação de catálogos de acervos arquivísticos em linha e a troca de
informações via sistemas de descrição em linha.
Em resumo, as normas destinadas à descrição e o histórico de sua criação
demonstram a preocupação com que o ICA vem tratando este tema, de suma
importância, principalmente com o crescimento da quantidade de documentos, dos
sistemas de informação nos arquivos, dentre outros, que demandam um trabalho
compartilhado de padronização.
Quadro 1 – Normas de descrição elaborado pelo ICA – (1989-2008)
NORMA EDIÇÃO DESENVOLVIMENTO PUBLICAÇÃO
DECLARAÇÃO DE
PRINCÍPIOS
1989-1992 1992
ISAD (G) 1.ed. 1990-1993 1994
ISAAR (CPF) 1.ed. 1993-1995 1996
ISAD (G) 2.ed. 1996-2000 1999
81
ISAAR (CPF0 2.ed 2000-2004 2004
ISDF 1.ed 2005-2007 2007
ISDIAH 1.ed 2005-2008 2008
FONTE: adaptado de Gueguen, et al. 2013
A discussão sobre os benefícios da adoção de normas internacionais pelos
arquivos apresenta defensores e críticos. Uma autora, entre os que defendem os
benefícios, é Sibille de Grimouard (2012), que ressalta que os profissionais de
arquivo encontram nas normas um modelo de representação de entidades
arquivísticas na concepção de sistemas de descrição arquivística.
O modelo é baseado nos princípios fundamentais da arquivística como o
princípio de proveniência e de respeito aos fundos e, o mais importante, possibilita a
descrição em diferentes níveis, realizados separadamente, porém, ligados aos
contextos de produção dos documentos. A autora destaca que a adoção das normas
auxilia o trabalho do profissional de arquivo em âmbito nacional e internacional,
elevando o nível de qualidade do trabalho e possibilitando a melhoria do processo
de comunicação entre os profissionais, os arquivos e os usuários.
Outros autores, a exemplo de Cook (2007), em análise sobre a descrição
arquivística e a crítica textual, apontam que a descrição para definir a autenticidade
do documento, de acordo com norma ISAD (G), que separa a informação de
contexto da informação de conteúdo “falha em apoiar o processo integralmente ao
não lidar especificamente com a informação que estabeleceria a autenticidade”
quando essa informação está fora dos elementos de forma ou conteúdo.
Grailles e Ducol (2012), por sua vez, apontam a necessidade de treinamento
de profissionais para trabalhar com as normas. Destacam a dependência do
profissional de uma rede de sustentação para a descrição, que se configura como
uma atividade a mais a ser incorporada à administração dos arquivos.
A gestão de documentos apresenta problemas de implantação porque afeta
toda a hierarquia institucional; necessita, portanto, da adesão de toda a organização
nos aspectos relativos aos recursos financeiros, cultura organizacional e barreiras
tecnológicas. (Bruebach, 2007).
O que pode ser inferido sobre a descrição de arquivos é que não é possível
pensar em item documental sem necessariamente conectar esse item a uma cadeia
maior que, segundo Rousseau e Couture (1998), e também Nougareth (1990)
82
contempla a ideia de patrimônio arquivístico comum. Toda concepção de descrição
procura conectar os dois elementos básicos, o item e o patrimônio arquivístico
comum, compostos pelos arquivos que formam o patrimônio nacional dos
documentos de um estado, de uma entidade administrativa ou governamental.
Assim, a descrição pode conectar um grupo de arquivos, um fundo de
arquivo, uma série, uma unidade de instalação ou o lugar que deve ocupar o dossiê,
a peça, o documento, o dado informacional. Para viabilizar essas conexões, a
Arquivística se desenvolve enquanto disciplina científica com suas ferramentas e
princípios, enquanto a normalização promove a integração de arquivos sem limites
de acesso.
2.9 DIPLOMÁTICA ARQUIVÍSTICA
Os documentos de arquivo antigos ou contemporâneos devem ser tratados
levando-se em conta a sua natureza, a finalidade, os objetivos e a função. Quando o
assunto tratamento dos documentos de arquivo é abordado, deve-se falar da
Diplomática, que compõe o arcabouço de conhecimentos para estudos da forma e
escrita utilizados, na prática, para assegurar as evidências e os atos dos
documentos de arquivo.
Duranti (1989), afirma que a Diplomática nasce no contexto da Reforma e
Contra-Reforma do século XVII como um método sistemático, que foi desenvolvido
para determinar a autenticidade dos registros. A publicação de De Re Diplomatica
em 1681 - O tratado de Dom Jean Mabillon, religioso beneditino e históriador
francês, fornece os instrumentos para avaliar a conformidade dos elementos de um
documento estabelecendo assim a sua autenticidade. A diplomática surge no
contexto do empirismo e torna-se um instrumento de apoiou à filosofia do empirismo
racionalista. A diplomática preparou o caminho para o desenvolvimento do conceito
de evidência como inferência de regras do direito. Com essa regra, os documentos
apresentados como prova no tribunal são boatos, pois contêm afirmações de fora do
tribunal. No entanto, em circustâncias em que não existem evidências concretas dos
atos em julgamento, os documentos recebidos ou mantidos no curso de atividades
ou eventos podem ser admitidos e considerados como prova. O trabalho de Dom
Jean Mabillon inaugura a crítica do documento de arquivo.
83
Segundo Duranti (1987), a escola arquivística europeia tem sua
fundamentação teórica na Diplomática e na Paleografia, embora tenha incorporado
também a História, a Administração e o Direito. Já a escola arquivística norte-
americana tem suas bases na história e na história administrativa, embora ao longo
do seu desenvolvimento tenha dado especial atenção à diplomática e à paleografia,
pela necessidade de compreender o arquivo como um todo, composto de partes que
devem ser compreendias e controladas.
Os princípios, os conceitos e os métodos da diplomática são válidos e
reconhecidos universalmente e podem trazer a necessária sistematização,
objetividade e cientificidade para as pesquisas arquivísticas no tocante à forma, à
natureza e características dos documentos. Esta pesquisa ateve-se ao estudo da
diplomática nos aspectos relativos ao tratamento de documentos em arquivos
contemporâneos, que têm como objetos documentos da era moderna com suas
características próprias. Não se abordou a paleografia por ser uma disciplina
utilizada no tratamento de documentos históricos antigos, que são objetos de
tratamento em arquivos históricos.
No Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística (2005), que apresenta
equivalências com os termos do Dictionnary of Archival Terminology, do Conselho
Internacional de Arquivos, CIA (1984, 1988, 2002), encontra-se a definição do termo
diplomática como sendo a “Disciplina que tem como objeto o estudo da estrutura
formal e da autenticidade dos documentos” (p.79). Uma definição bastante sucinta
que não esclarece os elementos de composição da diplomática.
Na definição do Vocabulaire International de Diplomatique (1997), elaborado
pela Commission Internationale de diplomatique da Europa, com termos que
abrangem preferencialmente a Idade Média e o início da Idade moderna, a
diplomática é definida como a ciência que estuda a tradição, a forma e a elaboração
dos atos escritos, com a finalidade de criticar, de julgar a veracidade e a qualidade
dos textos, de realçar fórmulas e os elementos do conteúdo suscetíveis de serem
utilizados por historiadores para datá-los.
A diplomática é considerada a ciência dos atos escritos e estuda sua
respectiva elaboração, forma e transmissão para julgar sua autenticidade e avaliar a
qualidade do texto escrito. A diplomática atua no exame crítico dos documentos para
compreender a história de sua elaboração e julgar sua autenticidade.
84
A disciplina é dividida em diplomática clássica, que nasceu na época medieval
para se ocuparem dos pergaminhos, papéis antigos e raros e a diplomática
contemporânea, que se ocupa dos documentos atuais em suportes diferenciados, às
vezes instáveis e frágeis.
A diplomática contemporânea vem ao longo dos anos sendo fonte para a
definição dos elementos de descrição de documentos em meio digital, por meio da
definição e descrição dos metadados de documentos digitais.
Nos últimos anos, os estudos acerca da diplomática ganharam destaque na
literatura sobre a arquivística, dada a sua tradicional função de estudar a criação dos
documentos e dos desafios que a arquivística contemporânea vem encontrando
para tratar documentos de arquivo.
Um destaque dessa literatura é a publicação de Luciana Duranti, em 1989, no
periódico Archivaria, que pode ser considerado um marco nos estudos recentes
sobre a Diplomática. A publicação compõe-se de uma série de seis artigos que
examinam teoricamente a diplomática do ponto de vista da arquivística
contemporânea. O tema aparece com especial destaque na arquivística
contemporânea relacionada aos estudos com o documento digital para identificar
elementos de evidência, de forma, de qualidade dos documentos, de confiabilidade
e autenticidade (NOUGARET, 2016; DELMAS, 2010; DURANTI & THIB (2001);
DURANTI (1989). Para estes autores, a diplomática se constitui no corpo de
conhecimentos que define a identidade da arquivística contemporânea que,
juntamente com a paleografia, se constituem a base dos estudos de forma e de
escrita dos documentos.
Os princípios, os conceitos e os métodos da diplomática, validados
universalmente, trazem qualidade científica para a arquivística, como campo de
estudos, assim como outras áreas do conhecimento como a História, a
Administração, o Direito.
Segundo Delmas (2010), a finalidade da diplomática clássica “é facilitar aos
medievalistas o acesso aos documentos pela crítica, a autenticação, a análise
descritiva dos documentos de um conjunto.” (p.141). Na época clássica, as
dificuldades para se obter uniformidade em escritos, ou mesmo uma forma definida
e estruturada de documentos não era possível em virtude de vários fatores:
diversidade linguística, diferentes modelos de governo, a incipiente noção de direito,
cidadania e identidade cultural. Apesar das variações, a forma permaneceu bastante
85
semelhante, sendo esta a fundamentação da diplomática clássica, o estudo da
forma escrita. Portanto, os documentos, para serem reconhecidos como autênticos e
aceitos como retratos de fatos e ações de governo, necessitam ser transcritos,
editados, traduzidos, certificados.
A diplomática define forma como um conjunto de regras de representação
utilizadas para enviar mensagens. A forma considera os elementos físicos e os
elementos intelectuais. “A forma física refere-se ao layout externo do documento (...)
e a forma intelectual refere-se à sua articulação interna” (DURANTI, 2015, p.197).
Os elementos da forma física são denominados elementos externos ou extrínsecos
e os elementos da forma intelectual, internos ou intrínsecos.
Segundo Nougaret (2016), os atos escritos são encontrados na realização de
um ato jurídico. Em outras palavras, em um ato jurídico, qualquer elemento escrito
de uma forma que lhe dê validade, que assegure a sua confiabilidade. Um ato
escrito autêntico é um ato que atende à forma requisitada e que possui as marcas
de validação necessárias para darem-lhe plena fé do conteúdo à pessoa que tem o
direito reconhecido de assinar e de reconhecer a sua autenticidade.
Na França se distingue a diplomática medieval, que se ocupa dos atos
escritos até o século XV, da diplomática contemporânea, que se atém aos tempos
atuais. O que caracteriza a mudança para a diplomática contemporânea é a
revolução documentária, em que o modo de produção do documento muda e
provoca uma avalanche de documentos nos arquivos. Como consequência desse
fato, e para que ele seja tratado, o modo de arranjo privilegia a organização por
grupo de documento e não por item documental.
A arquivística começa a se destacar em relação à diplomática enquanto área
que se ocupa do documento, em planejá-lo e prospectá-lo na sua respectiva criação.
A diplomática passa a ser uma ferramenta subordinada àquela, que vai auxiliar na
tarefa de coletar, tratar e comunicar os documentos.
Na fase de coleta, auxilia no reconhecimento de documentos autênticos e
válidos. Na fase do tratamento, contribui no reconhecimento dos elementos externos
e internos do documento. Se os arquivistas se enganarem no reconhecimento dos
elementos, os historiadores também se enganarão. Na fase de comunicar, vai
coadjuvar na identificação de documentos que podem e não podem ser acessados.
(NOUGARET, 2006).
86
Segundo Duranti (2015), a diplomática se ocupa da forma física e de
conteúdo dos atos escritos. Forma é compreendida como um conjunto de regras de
representação utilizadas para enviar mensagens. A forma do documento considera
os elementos físicos e os elementos intelectuais. “A forma física refere-se ao layout
externo do documento (...) e a forma intelectual refere-se à sua articulação interna”
(p.197).
Os elementos da forma física são denominados externos ou extrínsecos e os
elementos da forma intelectual são denominados internos ou intrínsecos.
Os elementos externos são o suporte (papel), a apresentação do suporte
(folha, rolo, impresso, telegrama, carta, encadernado), a escrita, a disposição do
conteúdo.
Os elementos internos são a língua, o estilo, a organização interna do
discurso. O estilo pode revelar o nível de educação, o estilo administrativo.
A organização revela o modelo da escrita, por exemplo, uma carta que tem
um modelo de organização para apresentar os elementos: remetente, destinatário,
data, local, inicio, fim. Os elementos a serem identificados são:
a) o protocolo inicial: data, autor, destinatário;
b) o corpo do texto: motivo da escrita; objetivo do documento; discurso;
c) o protocolo final: assinatura, carimbo, que são os elementos de validade do
documento;
d) carimbo de chegada, mensagem de recebido;
e) itens que ficam à margem do documento: comentários, aceite, observações,
carimbo de origem. (NOUGARET, 2016).
A diplomática estuda a presença dos elementos internos e externos do
documento para elaborar um estudo da gênese ou origem dos atos escritos, com o
objetivo de reconhecer-lhe a validade jurídica e conferir-lhe autenticidade. A
diplomática analisa o documento ou conjunto de documentos na busca de
evidências que lhe confiram o caráter de autêntico.
Na busca por evidências, a diplomática estuda o conjunto detalhado e
minucioso dos traços de autoria, dos instrumentos de escrita, das formas de
transmissão dos atos para reconstituir o contexto, as distinções de cópia e original.
A arquivística, quando esbarrou na necessidade de tratar e organizar os
documentos em meio digital, se deparou com diversos problemas complexos e
difíceis de serem solucionados.
87
Os estudos para resolver essas questões sobre como validar um documento
digital e como reconhecer a validade jurídica de documentos, para definir o que é
autêntico ou não, buscaram na arquivística elementos que pudessem ser usados
nessa tarefa. (NOUGARET, 2016).
A diplomática digital se ocupa em reconhecer os mesmos elementos externos
e internos para avaliar e assegurar a validade do documento digital. (VASSEUR,
2016). Os mesmos elementos externos e internos do documento físico são passíveis
de serem localizados no documento digital, porém, no caso deste, eles não são
suficientes para o estudo da sua autenticidade e validade no meio digital. Este vem
sendo o grande desafio da arquivística contemporânea, qual seja, o de estabelecer
os elementos que garantam a autenticidade do documento.
Os metadados digitais são os dados do documento que dizem respeito à sua
composição, estrutura, origem no meio digital. Os metadados digitais, quando
identificados, permitem traçar o percurso do documento no meio digital e reconhecer
os diversos elementos internos e externos. O conceito de rastreabilidade é essencial
para verificar a autenticidade do documento digital. Rastrear quer dizer ser capaz de
entender claramente o percurso de um documento no meio digital, para conhecer
sua origem, as alterações nele ocorridas, de onde partiu e aonde chegou, o tempo
de execução das ações nele envolvidas, as ligações com os outros documentos, ou
seja, traçar um histórico fidedigno da vida do documento.
Na diplomática digital entende-se que o tratamento do documento começa na
sua origem, uma vez que nesse meio todas as ações ocorridas com o documento
vão sendo descritas pelos metadados, que passam a ser os elementos que
identificam e representam o dado digital. A partir dos metadados é possível acessar
o dado em meio digital.
2.9.1 INTERPARES.
INTERPARES, The International Research on Permanent Authentic Records
in Electronic Systems, é um projeto coordenado pela pesquisadora Luciana Duranti.
Teve início em 1994 na universidade de British Columbia, Canadá. O projeto tem o
objetivo de desenvolver conhecimento teórico metodológico sobre a preservação de
conteúdos em meio digital e tem na diplomática digital e nos conhecimentos da
arquivística
88
A primeira fase do projeto - INTERPARES 1 - aconteceu entre 1999 e 2001 e
teve como foco principal desenvolver pesquisas e estudos com os documentos
produzidos e mantidos em bases de dados e nos sistemas de gestão de
documentos. A fase 2, de 2002 a 2006, - INTERPARES 2 -. foco nos documentos
produzidos e/ou mantidos em programas interativos, experimentais e em ambientes
dinâmicos. O INTERPARES 3 denominado TEAM, “Theoretical Elaborations into
Archival Management: Implementing the theory of preservation of authentic records
in digital systems in small and medium-sized archival organizations”, tem o objetivo
de ampliar os conhecimento em projeto desenvolvidos pelos países participantes.
Na primeira fase do projeto, os pesquisadores exploraram o conceito de
documento para determinar as características de um documento digital com base na
arquivística e na diplomática. Segundo Duranti (2006) as duas áreas são
complementares: enquanto a diplomática examina registros como itens, permitindo a
identificação das características incorporadas aos documentos ao longo da sua vida,
a arquivística trata o documento como parte de conjuntos, examinando suas
relações com outros registros, com pessoas envolvidas na sua criação, as atividades
relacionadas e como e porque eles foram criados e usados. Ao final foi possível
elaborar um conjunto de características que identificam o documento digital que são:
Uma forma fixa onde o documento é armazenado de modo que permaneça
completo e inalterado;
Um conteúdo imutável
Ligação explicita com outros registros dento ou fora do sistema digital através
de um código de classificação ou identificador único
Uma identificação administrativa do contexto
Um autor, um destinatário e um escritor.
Uma ação em que o registro participa ou que o registro apoie como parte do
processo de tomada de decisão
Ao longo dos anos, o projeto definiu conceitos importantes relacionados aos
documentos digitais, tais como os elementos do documento autêntico, os elementos
de evidência no meio digital, os parâmetros de metadados para identificar e validar
documentos digitais, os parâmetros para uma disciplina que se ocupe da gestão dos
dados digitais da Diplomática digital forense. Todos os estudos procuram assegurar
o princípios arquivísticos para os documentos em meio digital.
89
2.10 CLASSIFICAÇÃO NOS ARQUIVOS
A classificação é uma atividade que nasceu com a criação dos arquivos e
acompanha a evolução da prática arquivística. Sousa (2007) afirma que “uma função
tão importante merece estudos mais aprofundados, não apenas descritivos.
Precisamos de trabalhos que verticalizem teoricamente a questão” (p.79).
A classificação era praticada nos primórdios para gerar listas de documentos,
de títulos e de atos, organizadas cronologicamente ou por origem. Por vezes, o
resultado da classificação imprimia uma ordem subjetiva e interpretativa própria de
cada classificador. Alguns arquivistas eram partidários da ordenação cronológica, ou
temática, ou de lugar, o que poderia dispersar os conjuntos documentais.
Para corrigir o problema da dispersão, foi instituído o princípio de
proveniência, que se desdobrou no princípio de respeito à ordem original. Tais
medidas visavam coibir a prática da classificação temática, que poderia ocasionar
interpretações diferentes dos conjuntos documentais e provocar o caos no processo
de recolhimento de documentos.
Essa preocupação veio após a Revolução Francesa, quando se concretizou a
ideia de Estado moderno. Muitos dos novos Estados eram oriundos de reinos da
Monarquia que se dividiram ou se fundiram para criar o moderno Estado europeu.
Nesse novo modelo, o Estado passou a reconhecer o “novo” cidadão, com direitos e
deveres assegurados mediante a prática de regulamentação burocrática de registros
de todas as suas funções e obrigações.
Também foi criada uma grande quantidade de novas instituições de
administração do Estado, cujas funções estavam amparadas por registros em
documentos. Nesse panorama, o documento desempenhava a importante função de
certificar e garantir direitos aos cidadãos, além de servir de instrumento de
comprovação de ações das instituições, do Estado e dos cidadãos. Organizar os
documentos provenientes desse novo modelo de organização e lidar com a
quantidade crescente de documentos não era tarefa fácil. A classificação deveria,
pois, ser uma atividade facilitadora do uso dos documentos de arquivo.
90
O princípio da proveniência visa disciplinar o processo de organização dos
documentos nos arquivos por meio de regras para executar a principal atividade
neles praticada, a de classificar os documentos. Com a adoção deste princípio, a
classificação passa a ser executada com base na função das atividades das quais
se originava ou das funções do documento no arquivo a que pertence.
A partir desse momento, a classificação tornou-se um processo feito “para
representar a atividade intelectual de construção de instrumentos para organização
dos documentos, independente da idade à qual eles pertençam”. (SOUSA, 2007, p.
85). O produto principal da classificação é o arranjo, expresso no plano de
classificação do arquivo ou no quadro de arranjo arquivístico. A nomenclatura pode
variar de acordo com a terminologia arquivística adotada.
O processo de classificação e os produtos dele resultantes objetivam imprimir
transparência, compreensão e conhecimento sobre o percurso das instituições,
facilitar a tomada de decisões e auxiliar na preservação e resgate da memória
institucional.
A classificação vem, entretanto, sendo instrumentalizada com escasso
ferramental teórico: o princípio da proveniência e a ordem original (SOUSA, 2003,
2007). Em função dos avanços das tecnologias de informação e da dinâmica das
mudanças da sociedade, estes princípios são atualmente bastante questionados.
Por exemplo, Boles (1982) e Duchein (1985) destacam a impossibilidade do uso do
princípio da ordem original para organizar acervos de documentos particulares,
porque, via de regra, as informações sobre a coleta e a criação são escassas. Esses
autores levantam ainda outras questões: será que esses princípios são suficientes
para fundamentar uma prática essencial da área? É possível manter a ordem
original em todos os tipos de arquivos? Qual é a ordem original a ser seguida, no
caso do documento digital? Como ficam a atividade de classificação e o processo de
organização da informação diante das possibilidades de uso das ferramentas da
tecnologia da informação, que expandem as possibilidades de criar diferentes
formas de organização da informação para arquivos e usuários?
Para Sousa (2007), a classificação é uma preocupação antiga. Sua
importância não teve reflexos no estabelecimento de um instrumental teórico-
metodológico consolidado. Fala-se, por exemplo, em criar sistemas de classificação
sem agregar ao desenvolvimento desse conceito as contribuições da filosofia. Sem
discutir os meios necessários para fazê-lo, a classificação nos arquivos será sempre
91
intuitiva. O autor aponta alguns elementos que justificam o aprofundamento dos
estudos na área, uma vez que o arcabouço teórico atual da arquivística não parece
ser suficiente para:
a) lidar com grande quantidade de documentos acumulados diariamente pelo
modo de produção das organizações atuais;
b) promover o uso consistente das tecnologias da informação em todo o ciclo de
produção, armazenamento e uso dos documentos digitais;
c) promover o envolvimento do indivíduo cidadão em todo o processo de criação
e uso do documento.
Sousa (2007) afirma, ainda, que a ausência de estudos sobre a classificação
nos arquivos decorre dos seguintes fatores:
a) do fato de a organização da informação com fins documentários ser recente,
isto é, os elementos estão em construção;
b) da especificidade do documento arquivístico;
c) da indefinição e imprecisão do objeto de estudo da arquivística;
d) do caráter positivista das práticas e intervenções na produção do
conhecimento da área;
e) da ausência de procedimentos metodológicos para coletar dados necessários
à construção de instrumentos de classificação.
Sousa (2007) aponta, ainda, o problema gerado pela divisão, na arquivística,
entre a gestão de documentos e o arquivo histórico, ou permanente. Semelhante
desvinculação do documento com a sua origem pode fazê-lo perder elementos de
sua trajetória, aspecto essencial ao trabalho da classificação.
Em síntese, a organização da informação é compreendida como um processo
que visa disponibilizar e gerar conhecimentos. A representação do conhecimento
requer, por sua vez, o domínio de um vasto campo teórico capaz de subsidiar as
ações do campo da informação.
Gómez (1993) aborda as questões da organização e representação do
conhecimento na conjuntura atual e as questões teóricas e práticas envolvidas
nesse processo:
Hoje, a busca de uma informação que seja uma resposta pertinente e relevante às nossas perguntas requer a reconstrução de um complexo cenário onde sejam agregadas as populações de fontes e canais de informação, de modo a permitir processos seletivos, organizados e econômicos de busca e recuperação. (GÓMEZ, 1993, p.15).
92
O modelo a ser praticado na organização da informação e representação do
conhecimento, diante dos problemas existentes, “abre espaço a modelos analíticos
descritivos, relacionais, construtivistas, que permitem focalizar o papel dos atores e
as práticas sociais de comunicação e informação” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 1993).
O histórico de representação do conhecimento ocidental, ainda de acordo
com a autora, passou por três momentos. No primeiro, o conhecimento é ontológico,
representando o homem e suas relações de mundo. No segundo, ocorre a
representação de mundo consciente. No terceiro, “o elemento representado do
conhecimento em sua investidura semiótica, manifesta-se como autônomo,
independente do sujeito e do objeto do conhecimento” (p. 17). A linguagem é o
“sistema de significados ou matéria sinalética” (p.17); é um campo a se conhecer e
entender para a realização do processo de organizar e representar informação e
conhecimento nos arquivos.
A linguagem, dotada de características variadas, diversas, dispersas e
múltiplas, faz proliferar uma quantidade de signos e significados. Nesse aspecto, é
necessário promover a articulação de teorias mais amplas que deem conta do
caráter particular da informação e do sujeito envolvido no processo, devendo-se
produzir soluções variadas aptas a atender as diferentes demandas sociais.
No caso dos arquivos, especificamente, apesar de as normas de descrição
arquivística fornecerem os elementos que denotam as noções de uso das teorias de
linguagem na organização dos documentos, ainda são poucos os estudos que
exploram essa vertente. Ressalva deve ser feita para alguns trabalhos que abordam
essas questões, tais como, os de Fernanda Ribeiro (1996), que estudou a indexação
aplicada aos arquivos, e os de Renato Tarcísio Barbosa de Sousa (2012), que
apresenta vários estudos teóricos sobre a classificação em arquivos. Os novos
trabalhos dos canadenses, com destaque para Yvon Lemay Anne Klein (2012) e
autores, como Terry Cook (1985, 2001, 2007), Bruno Delmas (2001), Angelika
Menne-Haritz, (2001) e Berndt Fredriksson (2003) já destacaram a relevância e a
necessidade de estudos sobre a mudança do paradigma da arquivística, na pós-
modernidade. Chamam a atenção para os aspectos organizacionais dos arquivos
em função do contexto digital, das tecnologias de informação e da inserção do
usuário cidadão no arquivo.
Os novos trabalhos dos canadenses, com realce para Yvon Lemay e Anne
Klein (2012, 2013), que desenvolveram estudos sobre o uso dos arquivos como
93
fontes de criação artística, apontam a importância de atender às necessidades de
recuperação da informação nos arquivos, e para isso ressaltam a importância da
organização da informação.
Na mesma direção, Luciana Duranti (2001) salienta os impactos das
tecnologias digitais na arquivística, principalmente na preservação dos elementos de
prova, além de alertar para a necessidade de organizar e tratar o documento que
tem o meio digital como lugar de existência.
Podem ser citados também o trabalho de Banat-Berger e Nougaret (2013),
que chamam a atenção para a mudança epistemológica do termo arquivo nas
organizações, o qual vem perdendo seu uso, para o termo dado, atualmente
adotado. E é sob este termo que se desenvolvem muitas das atividades de
organização do registro de informação e do documento de arquivo.
Diante do exposto, realizar estudos que investiguem a fundamentação teórica
da prática de organização da informação nos arquivos é útil e necessário para obter
melhores resultados nos processos de disseminação.
2.11 REGIME DE INFORMAÇÃO
O conceito de regime de informação foi tomado como importante base teórica
no desenvolvimento da presente tese. Neste item apresentou-se a definição
proposta por Frohmann e por outros autores que estudam a aplicação do conceito.
Segundo Frohmann (1995), regime de informação é todo meio estável ou
sistema ou rede na qual a informação flui através de canais determinados, por
produtores específicos, por meio de estruturas organizacionais próprias, para
alcançar consumidores ou usuários que lhe são peculiares.
Como elementos do regime de informação, o autor cita o rádio, a televisão, a
distribuição de filmes, as publicações acadêmicas, as bibliotecas e os fluxos de
dados em fronteiras.
Os diferentes tipos de regimes de informação nasceram, muitas vezes, à
revelia de ações de governos formais e não seguem critérios claros. Eles decorrem
do desenvolvimento das organizações, dos processos, das necessidades de
usuários individuais, governos e setores sociais e culturais, compondo os diversos
fluxos de informação que nos rodeiam: cultural, social financeira, científica,
industrial, acadêmica.
94
González de Gómez (2012), na mesma direção de Frohmann, define regime
de informação como:
o modo informacional dominante em uma formação social, o qual define quem são os sujeitos, as organizações, as regras e as autoridades informacionais e quais os meios e os recursos preferenciais de informação, os padrões de excelência e os modelos de sua organização, interação e distribuição, enquanto vigentes em certo tempo, lugar e circunstância. (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2012, p.43).
Para essa autora, o regime de informação está sujeito às condições culturais,
políticas e econômicas. O regime de informação está relacionado aos aspectos
públicos e sociais da informação atualmente; muitas vezes não se tem uma noção
clara de como isso opera e quais são as intenções que os diferentes regimes de
informação buscam expressar, influenciar ou manipular na sociedade, por meio das
suas ações práticas.
A ferramenta de ação do regime de informação é ela mesma, que, em função
da sua complexidade teórico-conceitual, adquire diversas formas e fluxos para
atender aos diferentes regimes.
Ainda segundo Frohmann (2006), para lidar com o universo complexo dos
diferentes regimes de informação, é preciso conceber a informação como algo
material, e não como algo abstrato, presente apenas na mente dos indivíduos. Para
o autor, o indivíduo não é um agente isolado dos processos de informação, pois
estes são resultantes de ações sociais. O conceito de materialidade da informação é
uma abordagem importante para estudar o caráter público e social da informação,
na atualidade.
Em defesa da materialidade da informação, como modo de entender os
aspectos complexos do regime de informação que permeia a sociedade atual,
Frohmann (2006) defende que o documento é um objeto que expressa a
materialidade da informação e afirma que “se a materialidade é importante para o
entendimento dos aspectos públicos e sociais da informação, então os estudos da
documentação tornam-se importantes para os estudos da informação “(p.21).
O referido autor recorre a Foucault para refletir sobre o valor dos enunciados
dos documentos como forma de compreender estes últimos. Destaca que os
enunciados dos documentos são importantes porque “estimulam as investigações
específicas e detalhadas sobre como os enunciados são estabilizados, como são
95
mantidos, como exercem poder e força, que efeitos específicos provêm deles, como
são desestabilizados e como deixam de existir” (FROHMANN, 2006, p.22).
Os estudos de Foucault sobre os enunciados se compõem na argumentação
de Frohmann para analisar a criação dos regimes de informação, sua influência, seu
poder e seu modo de agir e conhecer. O objetivo é estabelecer a documentação
como forma de materialização da informação e ter assim recursos teóricos para
analisar o caráter público e social da informação nos regimes de informação.
Nessas circunstâncias, sublinha a importância dos princípios propostos por
Otlet e Briet, que pensavam a documentação como recurso para coordenar e
controlar o processo de produção de registros de informação em diferentes níveis. A
documentação possibilitaria a reestruturação de toda a produção documental sobre
um determinado tema, dispersa em diferentes instituições e formatos.
A partir do conceito de regime de informação e dos estudos de Frohmann
(2006), que propõe a abordagem dos contextos públicos e sociais da informação por
meio da materialidade do documento, admite-se ser possível considerar a
importância do papel dos arquivos e dos documentos de arquivos na viabilização
dos estudos de regimes de informação.
De fato, o modelo de organização dos arquivos é construído de forma a
garantir a materialidade dos documentos e, também, para retratar seus contextos de
criação. Sendo assim, aqui se presume a possibilidade de adoção do conceito de
regime de informação nos arquivos para melhor compreensão das práticas de
organização dos documentos, buscando expressar os diferentes elementos que
compõem o regime de informação.
2.12 TEORIAS DA LINGUAGEM
As teorias da linguagem são necessárias para construir, com o conceito de
regime de informação, o arcabouço teórico da pesquisa.
Cultura é o universo das práticas sociais humanas que diz respeito a tudo o
que o homem acrescentou à natureza, por meio de seu trabalho e do que foi
aprendido por ele no curso da vida. A linguagem é um produto da cultura e os
processos informacionais ocorrem por meio daquela; assim, a produção da
informação, do documento, sua organização, interpretação e uso são feitos pela
linguagem.
96
A linguagem se estabelece por meio de um sistema de signos, utilizado
pelos indivíduos para a aprendizagem, conservação, transformação e transmissão
da cultura (LOPES, 2008). A semiologia ou semiótica é a ciência que estuda os
sistemas de signos.
A semiótica é definida por Saussure (1916), citado por Eco (2009), como
“uma ciência que estuda a vida dos signos no quadro da vida social”. Eco (2009)
esclarece que o signo está presente em todos os sistemas utilizados pelo homem
para exprimir suas ideias. A semiótica estuda a realidade cultural de uma
comunidade, todas as espécies de sistemas sígnicos que o homem construiu ao
longo dos séculos e seu objeto de estudo é o conhecimento da realidade dos
sistemas linguísticos que criam e recriam a realidade. A relação entre o homem e
outro homem, dentro da sociedade, é mediada pelos signos. (LOPES, 2008).
Segundo Eco (2009), Peirce (Charles Sanders Peirce), filósofo, lógico e
matemático norte-americano (1839-19140), oferece a melhor compreensão de
semiótica: doutrina da natureza essencial das variedades fundamentais de cada
semiose, isto é, a doutrina da natureza essencial e das variedades fundamentais de
cada semiose possível” (Eco, p. 10, 2009).
Peirce define semiose como “uma ação, uma influência que seja, que envolva
a cooperação de três sujeitos, como, por exemplo, um signo, o seu objeto e o seu
interpretante, tal influência “tri-relativa” não sendo jamais passível de resolução em
uma ação entre duplas” (p. 10). Diante dessas definições, entende-se que o homem
está envolvido no processo semiótico de produção semiótica, em que ele usa a
informação (objeto/signo) e produz outras informações (objetos/signos) para dizer
coisas sobre o passado ou o futuro ou sobre o estado de coisas.
A semiose é uma ação ou coevolução, em que o signo gera outro signo,
processo ao qual Peirce chama de interpretante: “aquilo que o signo produz na
quase-mente que é o intérprete” (Eco, p. 58, 2009). Assim, o signo, o intérprete e o
interpretante formam os elementos da relação “tri-relativa”. Dessa forma, o signo e o
interpretante estão em constante geração, o que implica o processo denominado
semiose ilimitada, em que o signo-interpretante sempre se referirá ao anterior como
seu objeto para gerar outro signo-interpretante. Ou seja, a geração de signos é
ilimitada nesse contexto de representação da informação.
A semiose ilimitada mostra como a significação e a comunicação “por meio de
deslocamentos contínuos, que referem um signo a outros signos ou a outras cadeias
97
de signos, circunscrevem as unidades culturais de modo assintótico, sem conseguir
jamais tocá-las diretamente, mas tornando-as acessíveis através de outras unidades
culturais” (Eco, 2009, p.60).
O signo interpretante gera significados continuamente, influenciando e
orientando a geração de significados. Assim, o signo/informação é uma ação, um
processo que continua, uma vez que um signo pode gerar ilimitados interpretantes.
Moura (2002) se refere à concepção semiósica como sendo “a consciência que o
homem tem da ação de seu interpretante em outra mente e o movimento que esse
homem implementa, consciente ou inconscientemente, para influenciar essa outra
mente” (p.17). Em outra obra, Lector in fabula, Eco (2008) explica que a semiose
peirciana vai ao encontro da necessidade anterior do homem de encontrar um signo
que tenha relação direta com seu objeto, numa relação concreta de denotação.
A semiose necessita, então, de um entendimento pragmático, e o
pragmatismo de Peirce explica a semiose por nosso modo de agir in natura. “Depois
de receber uma sequência de signos, o nosso modo de agir no mundo é
permanentemente ou transitoriamente alterado. Essa nova atitude é o interpretante
final” (Eco, 2008, p.29). O autor sustenta, ainda, que, dados os hábitos e as
regularidades da natureza, o significado último de um signo é “concebido como regra
geral”, que produz entendimentos regulares de signos, que permite ao indivíduo
avaliar os signos e gerar interpretantes. Eco observa que no pragmatismo peirceano
é possível entender que “a semiose morre a todo o momento, mas, como morre,
ressurge das próprias cinzas” (p. 30). Ele ressalta que com a visão do pragmatismo
de Peirce é possível entender que
[...] o círculo da semiose se fecha a todo instante e jamais se fecha. O sistema dos sistemas semióticos, que poderia parecer um universo cultural idealisticamente separado da realidade, de fato leva a agir sobre o mundo e a modificá-lo; mas cada ação modificadora se converte, por sua vez, num signo e dá origem a um novo processo semiótico. (ECO, 2008, p. 30).
Um documento pode ser entendido com um signo compreendido e aceito para
expressar uma ação. A partir da aceitação e do entendimento desse
signo/interpretante de uma ação, o documento pode ser compreendido e aceito
como tal. Por outro lado, o documento não morre em si, enquanto resultante de uma
ação. Assim como no processo de semiose, ele renasce quando acessível aos
98
indivíduos que o reconhecem como signo e passa a ser o signo criador de signos
interpretantes, sucessivamente.
Em seguida, os signos interpretantes gerados inserem-se no contexto de
desencadeadores de ações de negação ou de assertividade de ações, como, por
exemplo, no momento em que um documento é reconhecido como atestador de uma
ação em um tribunal e aceito como prova. Ilustra o caso, um exame de tipo
sanguíneo em um tribunal, que confirma ser igual ao sangue da vítima o sangue da
mão do suposto assassino. O signo que habitualmente é conhecido para expressar
o tipo sanguíneo (Fator Rh, positivo, negativo, tipo A, B, AB, O) pode ser entendido e
interpretado pelo leitor por ser resultante de uma ação de semiose contínua e passa
a fazer parte de um contexto de interpretação, juntamente com outros signos, para
evidenciar o que o documento atesta.
O signo, segundo Pinto (1996), “é a interface que estabelece a mediação
entre um usuário e os objetos que o usuário quer manipular” (p. 88). “Os signos são
objetos e os objetos são signos”. Portanto, objeto não é coisa, mas a coisa
significada (p. 89). Essa coisa significada pode ser entendida como a informação
captada pelos interpretantes do signo. O conhecimento apreendido a partir dessa
informação, por sua vez, gera mais signos para compor o processo de significação e
sentido.
Na semiótica peirceana, o signo é entendido como coisa que representa algo
para alguém. Portanto, estabelece a interface de significação entre um usuário e os
objetos. Sendo assim, “um signo é algo que está no lugar de algo para alguém, em
algum aspecto ou capacidade. Dirige-se a alguém, isto é, cria na mente daquela
pessoa um signo equivalente ou, talvez, um signo mais desenvolvido” (Pinto, 1993,
p.89).
Pode-se afirmar que o mesmo ocorre quando o arquivista descreve um
documento de arquivo e disponibiliza a informação para que o usuário entenda o
que contém o referido documento. O documento não está presente. O que está
presente é um signo que deve significar algo para o usuário que busca o documento
e deseja saber o que ele contém, sem que ele esteja em suas mãos.
A semiótica peirceana estabelece uma lógica para explicar a relação de
mediação entre um sujeito e o objeto através de um signo respectivo, denominada
de relação triádica, ou seja, a compreensão do objeto por meio do signo
(estabelecer a compreensão da informação por intermédio da informação ou do
99
documento mediante a sua descrição e representação). São as categorias
peirceanas de primeiridade, secundidade e terceiridade, chamadas de “as três
categorias da experiência de percepção do signo”.
Segundo Pinto (1993), a primeiridade refere-se às emoções iniciais, aos
instantâneos da mente sobre o objeto, às primeiras percepções sem reflexão.
Refere-se aos aspectos qualitativo, formal e sensorial do objeto, atendo-se aos
aspectos da lógica básica.
A secundidade trata da reação diante da percepção inicial. É a formação do
objeto na nossa mente. Nesse momento, a partir da referência de passado, tem-se a
noção do presente e da relação com o objeto.
A terceiridade é a mediação entre o sujeito e o objeto. É a percepção do
objeto como um signo, que passa a ter um significado. O objeto torna-se signo,
portanto, um significado. Com o afastamento do objeto é possível generalizar coisas
sobre ele, mas nunca dizer tudo.
Com a interpretação do objeto e o acesso ao signo inicia-se o processo de
informação, que é dinâmico, incompleto, vago e impreciso, pois a percepção de um
signo equivale a encadear o processo de semiose que vai sempre gerar
interpretante a partir de signos, encadeando, assim, um processo infinito, capaz de
gerar informação. Tal é entendida, inicialmente, como representação de signos por
parte do indivíduo, constantemente, a partir de um contexto ou campo de domínio.
A análise dos conceitos de semiótica, semiose e signo, permite concluir:
Signo é coisa significada.
O homem produz signos e novos signos para compreendê-lo a partir dos objetos.
O signo não pode ser percebido integralmente; pode sempre gerar interpretante.
O fluxo de entendimento e produção de signos é dinâmico e infinito.
O processo de semiose gera signos que evoluem, “O signo não signi-fica ele
signi-vai” (Pinto, 1993, p. 21).
O entendimento do signo faz gerar hábitos que fazem com que novos signos
sejam criados e interpretados.
O signo gerado, o interpretante, é usado para interpretar ou dizer algo sobre o
signo/objeto.
A informação é resultante da interpretação de signos continuamente e pode ser
alterada.
100
Diante desse entendimento, pode-se estabelecer relação entre os conceitos
envolvidos na teoria semiótica e a atividade de descrição de documentos de arquivo.
Para tanto, entende-se que:
a) a análise do documento de arquivo configura-se como a manipulação de um
conjunto de signos, que pode ser visto como um processo de produção
semiótica, pois no procedimento de análise do documento é gerada a
interpretação de um conjunto de signos contidos no documento analisado
isoladamente e/ou em conjunto, ou seja: (texto, logomarcas, assinaturas,
fotos, estrutura e forma do documento e datas);
b) são gerados outros signos, informações resultantes da análise e da
compreensão, no entendimento do documento de arquivo, tais como, ficha de
descrição, registro em um banco de dados, catálogo e índice, ocorrendo
diferentes representações para diferentes contextos e indivíduos que se
deseja atingir (este processo é compreendido como uma concepção
semiótica, pois quem descreve seleciona e utiliza um conjunto de signos,
previamente conhecidos, mas nunca em sua totalidade, a partir daquilo que
se pode ou se quer dizer sobre o documento para um usuário daquele
documento);
c) a não totalidade da apreensão dos signos durante o processo de análise do
documento de arquivo é uma característica do processo de compreensão dos
signos e isso pode determinar a alteração do processo de descrição como
algo nunca acabado ou definitivo, tendo em vista a dinâmica dos significados,
que podem mudar ao longo do tempo, e das ocorrências de fatos que podem
ser evidenciados no documento.
Para explicar melhor o entendimento do processo semiótico, pode-se dizer
que quem descreve o documento tem domínio sobre a ação do interpretante, gerado
a partir do signo observado no documento. Essa ação pode ser consciente ou
inconsciente. Consciente, por exemplo, quando alguém observa o conjunto de
signos no documento de arquivo e deixa de mencionar algo presente no documento,
imaginando que aquilo pode interessar a determinado usuário que não se quer
atingir ou que aquela informação pode desencadear uma ação não desejada pelo
indivíduo ou organização ligada ao documento. Por exemplo, em determinado
arquivo histórico de um país onde ocorrem disputas territoriais, um documento, um
101
registro de posse e propriedade especifica os limites territoriais de uma região.
Qualquer referência a essa informação na descrição do documento comunicada ao
público usuário pode desencadear o interesse em acessar o documento específico e
provocar uma ação judicial não desejada por um indivíduo (o arquivista) ou grupo (o
Estado, uma organização). Assim, propositalmente, o signo não se torna um
interpretante e, por conseguinte, não se torna informação.
De outro lado, a ação pode ser inconsciente quando se negligencia a
existência de um símbolo em um documento ou, mesmo, quando o indivíduo que o
observa não possui conhecimento anterior que lhe permita compreender o
significado daquele símbolo ou, ainda, não aconteceram os fatos que façam com
que aquele signo possa tornar-se outro signo. Considerem-se os exemplos descritos
a seguir.
Em um primeiro exemplo, tem-se uma situação em que as anotações em uma
prova tipográfica de um manuscrito de autor, que podem ou não ser importantes,
não são reconhecidas por quem está procedendo à descrição, por ser uma área de
conhecimento que o sujeito não domina ou por outros motivos. Essas anotações de
correção tipográfica podem ser descartadas ou reconhecidas como documentos
únicos e raros. Citam-se as anotações de Guimarães Rosa nos manuscritos dos
seus livros.
Em um segundo exemplo, têm-se as anotações em um documento de um
economista ganhador de um prêmio, que representa um cálculo de um problema de
economia. As anotações do cálculo contábil podem ser notadas na descrição do
documento ou mesmo serem descartadas em um processo de avaliação, se o autor
ainda não foi reconhecido em seu campo de domínio. Pode acontecer, ainda, de que
quem descreve os documentos não perceba tais informações de cálculos (signos)
presentes na margem do documento.
Em ambos os casos, na concepção semiótica, é possível alterar a ação do
interpretante. No primeiro caso, tal fato pode ocorrer à medida que se dá a aquisição
de novos significados simbólicos do signo ou, mesmo, gerar novos interpretantes
pela ação do tempo, exceto nas situações em que o documento foi descartado por
não ter mais valor administrativo.
Na Ciência da Informação são muitos os trabalhos que exploram os estudos
de linguagem na organização da informação, como o de ALMEIDA (2009), Peirce e
a organização da informação: contribuições teóricas da Semiótica e do
102
Pragmatismo. A partir da constatação da existência de vínculos da semiologia com a
organização da informação e do conhecimento, o autor se pergunta sobre as
interrelações teóricas e aplicadas entre a organização da informação e do
conhecimento e a filosofia e semiótica peirceanas. O estudo, uma investigação
epistemológica com abordagem plural, dá conta do caráter interdisciplinar que
norteia a Ciência da Informação, em particular a área de organização da informação.
A teoria peirceana abordada no estudo não está desvinculada dos estudos da
fenomenologia, da lógica e do pragmatismo, que reunidos buscam esclarecer o
fenômeno da linguagem, de fundamental importância para entender o processo de
organização da informação e do conhecimento.
103
3. METODOLOGIA DE PESQUISA
O presente estudo é de natureza qualitativa. A pesquisa qualitativa é um
campo de investigação característico das ciências humanas e sociais. Uma definição
genérica é feita por Denzin e Lincoln (2006) que afirmam que pesquisa qualitativa “é
uma atividade situada que localiza o observador no mundo” (p.17), composta por um
conjunto de práticas materiais e interpretativas que dão visibilidade ao mundo.
Segundo os autores, a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem interpretativa
em que os pesquisadores buscam entender, ou interpretar, os fenômenos em
termos dos significados que as pessoas a eles conferem. A pesquisa qualitativa
possibilita que o pesquisador utilize uma variedade de práticas interpretativas
interligadas para compreender melhor o tema de estudo.
Para construir uma abordagem qualitativa é necessário construir um objeto de
investigação e um método. Todo método pressupõe a existência de um objeto e
também um caminho que nos conduz a ele, com a intenção de conhecê-lo. Método,
termo de origem grega, significa o caminho do conhecimento. Mais que um caminho
consiste em um conjunto de passos, procedimentos e etapas de formulação de
problemas, execução de recortes e seleção de aspectos do objeto a ser conhecido.
O foco da abordagem pode ser amplo, o todo da ciência, ou restrito, a
especialização, no conhecimento moderno, dependendo da perspectiva do
observador ou do sujeito. (DOMINGUES, 2005).
A presente pesquisa utilizou como método para obter conhecimento o
hipotético dedutivo. Os estudos que se baseiam no método de argumentação
indutivo e dedutivo fundamentam-se em premissas, ou conhecimento prévio.
Segundo Marconi e Lakatos (2003), se, por um lado, os argumentos dedutivos
são premissas verdadeiras que levam inevitavelmente à conclusão verdadeira, os
indutivos conduzem apenas a conclusões prováveis. O objetivo dos métodos
indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das
premissas nas quais se basearam.
A argumentação hipotético-dedutiva busca testar a falsidade de uma
proposição. Ou seja, a partir de uma hipótese de estudo inicial estabelecida, busca,
por meios de procedimentos metodológicos, negar a hipótese. Neste método, a
verdade se mostra por meio da busca por eliminar o que é falso. Com a eliminação
104
do falso busca-se estabelecer de hipóteses alternativas que fundamentem o
conhecimento novo.
Karl Popper (1902-1994) é o criador do método hipotético dedutivo. Segundo
ele, existem etapas no processo investigativo: a primeira é o problema, que é
explicitado por meio do conhecimento prévio e inicial. Em seguida, a solução é
propor uma nova teoria por meio de proposições a serem testadas por um
procedimento metodológico. E por fim, a etapa de testes de falseamento que são as
tentativas de refutação por meio da observação e experimentação. Se a hipótese
não supera os testes, ela é falsa e será refutado, o que exige nova reformulação do
problema e da hipótese, que, se superar os testes rigorosos, estará
corroborada, confirmada provisoriamente, mas não definitivamente como no
pensamento indutivo. (MARCONI e LAKATOS, 2003).
O conhecimento novo, confirmado pela hipótese, sinaliza a evolução do
conhecimento cientifico na área pesquisada e nova hipótese implica na formulação
de novos problemas e de novas pesquisas.
O método hipotético dedutivo exige rigor nos processos de coleta e análise do
conjunto de dados, por meio da experimentação ou observação. Neste estudo,
optou-se por utilizar a análise de conteúdo como técnica de análise de dados por
meio da observação do tema “tratamento e organização de documentos nos
arquivos” presente em artigos científicos da área de arquivística.
A análise de um corpus, composto de artigos científicos selecionados nos
periódicos de diferentes partes do mundo, foi detalhada em tópico adiante. O
objetivo da apreciação proposta nesse corpus foi a melhor compreensão dos
aspectos do processo de tratamento e organização de informações de documentos
de arquivo.
A análise de conteúdo é definida por Laurence Bardin (2011) como um
método, composto por um “conjunto de técnicas de análise das comunicações”
(p.37) que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo
das mensagens. O objetivo é diminuir as incertezas por meio da leitura dos dados
coletados. Segundo Bardin (2011), qualquer comunicação de um emissor para um
receptor, em qualquer veículo, pode ser analisada pelas técnicas de análise de
conteúdo. Sendo assim, considerou-se que os artigos de periódicos científicos
constituem-se em um tipo de comunicação científica, no caso, da área de
arquivística e que será nosso objeto de exame. Para a aplicação da análise de
105
conteúdo, adotaram-se as bases definidas por Bardin (2011) de execução do
método de análise de conteúdo.
De acordo com Bardin (2011), a primeira etapa da análise do conteúdo é a
interpretação, ou seja, o que é possível ser dito com base no conteúdo analisado.
Em seguida, foram elaboradas inferências sobre o universo de escritos
analisados. Em certos conteúdos estudados não interessou necessariamente a
respectiva descrição, mas sim o que pôde ser dito sobre eles após serem tratados,
ou seja, as “outras coisas” que puderam ser mencionadas sobre o tema pesquisado,
por meio das inferências.
A inferência é a dedução lógica de um conhecimento, que pode ser sobre o
emissor da mensagem ou sobre o meio ou sobre o comportamento do tema
estudado, em relação a todo o conteúdo ou em relação às categorias escolhidas
para estudo.
Segundo Bardin (2011), o método de análise de conteúdo compreende a
execução de três etapas: a pré-análise, a exploração do material, o tratamento dos
resultados.
A fase de pré-análise corresponde à exploração do material a ser analisado,
implica a escolha dos documentos a serem submetidos à análise, a formulação das
hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que fundamentem a
interpretação final.
Esta fase tem por objetivo a organização do material, adequada aos
contingentes da pesquisa, tais como, gênero do documento, acesso físico, definição
do corpus, que é o “conjunto dos documentos tidos em conta para serem
submetidos aos procedimentos analíticos” (BARDIN, p.126).
Uma vez definido o tipo de documento que constitui o corpus, o pesquisador
deve definir as regras de seleção. Algumas dessas regras citadas por Bardin (2011)
são:
a) exaustividade, não pode ser deixado de lado nenhum elemento de acordo
com o definido para a seleção;
b) representatividade, diz respeito à composição da amostragem para que essa
possa representar o todo; critérios de cobertura, tempo, quantidade;
c) homogeneidade, os documentos selecionados devem obedecer aos critérios
estabelecidos para a escolha;
106
d) pertinência, os documentos definidos devem ser adequados enquanto fonte
de informação para os objetivos do estudo.
A etapa de exploração do material corresponde à aplicação dos critérios
estabelecidos na pré-analise. Em alguns casos, realiza-se a correção de algum
critério. Segue-se o que foi estabelecido e coleta-se o material, de acordo com esses
critérios.
A fase de tratamento dos resultados obtidos e a interpretação compreendem
a execução de atividades com os documentos coletados de modo que estes tenham
significados válidos para construir uma resposta para os objetivos da pesquisa.
Após a execução das três fases é necessário definir as técnicas de análise
dos resultados obtidos. Um das técnicas é a categorização que se constitui em uma
“operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por
diferenciação, e em seguida, por reagrupamento segundo o gênero (analogia), com
os critérios previamente definidos” (BARDIN, p.145).
Os critérios de categorização podem ser semântico, sintático, léxico e
expressivo. De acordo com os critérios semânticos, a categorização é feita com base
no tema tratado no documento.
A categorização sintática é feita de acordo com classes de palavras (verbos,
adjetivos). A categorização por léxico é feita pelo sentido da palavra, agrupadas a
seus sinônimos. A categorização “expressiva” agrupa as diversas formas de
expressão da linguagem.
A classificação dos documentos em categorias possibilita a análise dos
elementos comuns entre eles. Com a categorização é possível obter a condensação
de dados, com representação simplificada dos dados brutos, para construir as
análises e inferências. A categorização dos documentos para análise de conteúdos
deve seguir critérios para garantir a qualidade do agrupamento em categorias.
Bardin (2001) sugere os critérios de exclusão mútua, onde cada elemento não
pode existir em mais de uma categoria; homogeneidade, onde um único princípio
deve governar a categorização; pertinência quando o material categorizado se
adapta os critérios estabelecido; objetividade e a fidelidade, onde os critérios de
pertencimento do elemento a categoria devem ser bem claros; a produtividade, onde
um conjunto de elementos categorizados pode fornecer dados significativos para a
análise.
107
No presente estudo, optou-se por descrever os critérios de categorização no
item que contém a análise dos dados, dadas as especificidades do conjunto
analisado. Para a nomeação das categorias de análise, foi utilizado como base de
definição o Glossário especializado de arquivística da Associação dos Arquivistas
dos Estados Unidos.
Na categorização, foi necessário realizar adequações. Por exemplo, nem
todos os periódicos atribuem palavras-chave aos artigos. Nestes casos, os artigos
foram lidos para definir sua inclusão em categorias. Os procedimentos realizados
foram explicitados a seguir.
3.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Organizar documentos é, de fato, um dos processos centrais da atividade
arquivística. Partiu-se do pressuposto de que o tratamento e a organização de
documentos não são atividades que possam ser observadas isoladamente ou de
maneira direta. Sendo assim, um estudo sobre o tema “organização e tratamento de
documentos de arquivo” implicou ater-se inicialmente aos processos macro. Para
isso, o tema foi abordado sob o ponto de vista de um conjunto de processos. Os
processos de organizar e tratar documentos determinam, em larga medida, a forma
como a Arquivística se estrutura como disciplina científica. Porém, como tantas
outras disciplinas, a arquivística criou suas bases teóricas a partir de experiências
práticas.
O objetivo geral, na presente pesquisa, como afirmado na Introdução da tese,
foi o de analisar os discursos sobre a organização da informação na Arquivística.
Assim sendo, procurou-se compreender os significados da atividade de organização
e tratamento dos documentos em arquivos por meio do diagnóstico da produção
científica da área. Tratou-se, em suma, de analisar, compreender e contrastar o que
diferentes autores escreveram sobre o tema.
Como técnica de estudo ou procedimento de pesquisa, definiu-se um corpus
constituído da literatura científica de artigos de periódicos produzidos principalmente
por pesquisadores da arquivística. A seleção de artigos foi feita de maneira
sistêmica, descrita a seguir.
108
3.2 COLETA DOS DADOS PARA CONSTITUIÇÃO DO CORPUS
O critério inicial para constituir o corpus da pesquisa foi identificar e selecionar
as fontes de dados, ou seja, a fase de pré-análise definida por Bardin (2011). As
fontes para seleção dos artigos foram quatro periódicos científicos da área da
arquivística, do exterior, de abrangência internacional, que abordam a evolução
teórica e prática da área e suas principais correntes de pensamento.
São eles: Gazette des Archives; Archival Science; The American Archivist,
Archivaria. Foi selecionado também um periódico nacional, específico da área de
arquivos, a Revista Acervo, do Arquivo Nacional. As fontes foram completadas com
mais duas revistas do campo da Ciência da Informação – Perspectiva em Ciência da
Informação, Informação e Sociedade e Ciência da Informação, que publicam artigos
sobre a arquivística. São periódicos de prestígio e abrangência internacional, que
representam diferentes vertentes da arquivística mundial, norte-americana, francesa,
canadense, europeia, de acordo com a bibliografia básica do International Council of
Archives, ICA (ICA, 2016).
Esses periódicos, exceto Archival Science, são editados por associações de
arquivistas dos países correspondentes, com linhas editoriais que privilegiam
trabalhos teóricos e práticos. Divulgam também resultados de pesquisas
acadêmicas tanto da área de arquivos quanto de áreas correlatas.
Archival Science, inicialmente, em 2000, teve sua publicação ligada à
Associação dos Arquivistas da Holanda, mas depois foi vinculada à Springer, editora
mundial de periódicos científicos.
A seguir, foi apresentada uma breve descrição dessas fontes. Optou-se por
periódicos publicados em língua inglesa, francesa e publicações em português, para
as publicações brasileiras.
3.2.1 La Gazette des Archives
Este periódico, editado pela Associação dos Arquivistas Franceses, iniciou
sua publicação em 1933. É considerado o primeiro periódico científico da área de
arquivística. Sua linha editorial privilegia a publicação de artigos de arquivistas
franceses, com abertura para profissionais de áreas vizinhas, como informação e
comunicação, além de atas de reuniões das seções da associação e anais dos
109
eventos científicos organizados pela associação. Publica também artigos de
historiadores, genealogistas e agentes administrativos que utilizam fontes e técnicas
de arquivos, trabalhos de participantes de associações e de organismos
internacionais de profissionais de arquivos de diferentes países. É editada
trimestralmente (quatro números por ano), cujos fascículos são sempre temáticos,
publicados exclusivamente em língua francesa. A quantidade de artigos por número
varia entre cinco a 15 artigos. O periódico não é indexado em bases de dados ou
serviços de indexação e não possui sistema de recuperação de informação para
buscas. Os artigos não possuem palavras-chave, não dispondo, portanto, de um
índice temático. O site disponibiliza o sumário de cada número e um índice por autor
(archivistes.org/-La-Gazette-des-archives). A seleção foi feita acessando cada
volume e número publicado de 2000 a 2015 na biblioteca da École Nationale de
Chartes.
3.2.2 Archival Science
A publicação teve início em 2001. O primeiro grupo de editores foi composto
por Peter Horsman, Eric Keteeplar, Theo Thomassen, pesquisadores da arquivística
contemporânea e professores da escola arquivística holandesa. Foi publicada uma
primeira versão em holandês em 1995/1996. Nasceu no contexto da arquivística
pós-moderna e dos novos paradigmas da área. Expressa, sobretudo, a visão
arquivística europeia contemporânea, que acompanha a tendência das escolas
americanas, canadense e australiana, em contraponto com a tradição arquivística
europeia, ligada à escola francesa. A linha editorial do periódico busca promover o
desenvolvimento da ciência arquivística como uma disciplina científica autônoma. Os
artigos cobrem todos os aspectos das teorias, metodologias e práticas da ciência
arquivística e retratam as visões de diferentes culturas, promovem a troca e a
comparação de conceitos e procedimentos.
A Archival Science adota abordagem integrada, interdisciplinar e intercultural,
abarca o campo da informação registrada, retratando o processo, a forma, a
estrutura e o contexto de criação dos mesmos. Os artigos tratam da função dos
registros de informação, da forma como são criados, preservados e recuperados, o
contexto em que são gerados, gerenciados e usados, tanto quanto o ambiente social
e cultural de produção dos registros em diferentes épocas e lugares. Desde seu
110
lançamento, o periódico vem crescendo em importância na área, principalmente pela
qualidade dos artigos publicados e corpo editorial, formado por pesquisadores
influentes da área de arquivística. A revista está disponível no portal de periódicos
da Capes. Os artigos possuem palavras-chave. A publicação é trimestral (quatro
números por ano).
3.2.3 The American Archivist
É publicada desde 1938 pela Associação dos arquivistas americanos. Tornou-
se referência na área de arquivos, sobretudo como fonte de expressão da
arquivística norte-americana. Os trabalhos são caracterizados por reflexões teóricas,
resultados de pesquisas, estudos de caso, revisões de literatura, uso de tecnologias
em arquivos.
A linha editorial destaca que o periódico busca refletir sobre o
desenvolvimento teórico e prático da profissão de arquivista; as relações entre os
arquivistas e os criadores e usuários de arquivos; as questões culturais, sociais,
legais e tecnológicas que afetam a natureza da informação registrada e a
necessidade de criá-la e mantê-la.
As linhas de publicação são: artigos de pesquisa; estudos de caso;
perspectivas, que são comentários e opiniões sobre a prática arquivística; cenário
internacional; recursos profissionais; fórum de discussão com leitores e resenhas de
publicações. Pode ser pesquisada na plataforma de busca do periódico
(americanarchivist.org). Os artigos não possuem palavras-chave. A publicação é
semestral. A pesquisa neste periódico foi feita no site do periódico, analisando o
sumário de cada número, dentro do período coberto da pesquisa.
3.2.4 Archivaria
Periódico publicado pela Associação dos Arquivistas Canadenses. Começou
a ser publicada em 1975. A linha editorial define como política do periódico a
publicação de pesquisas científicas acadêmicas sobre a arquivística no Canadá e
em outros países.
Os temas publicados exploram a história, a natureza da teoria arquivística e a
utilização dos arquivos. Segundo a linha editorial, o periódico visa tornar-se uma
111
ferramenta de comunicação entre os arquivistas e os usuários de arquivos. A linha
editorial, embora não declare a publicação como interdisciplinar, enfatiza os
trabalhos de áreas correlatas tais como a História, Ciência da Informação, Ciência
Política, Sociologia, Direito, Antropologia Cultural, História da Arte, Geografia e
Estudos de Mídia e Comunicação, como áreas que dão suporte às pesquisas em
Arquivística.
São temas abordados nos artigos: a história dos arquivos, dos arquivistas e
da Arquivística; a evolução e características das diversas mídias; os novos campos
de estudos históricos; os novos tipos de documentos; as novas tecnologias
utilizadas em arquivos; as questões legais e éticas; a análise das práticas de gestão
dos documentos no tempo e espaço; a ligação entre os arquivistas e os outros
profissionais da gestão da informação. A publicação é semestral e está disponível
em um portal de busca específico (archivaria.ca). A pesquisa neste periódico foi feita
no site do periódico, analisando o sumário de cada número, dentro do período
coberto da pesquisa.
3.2.5 Acervo
Periódico corrente publicado pelo Arquivo Nacional do Brasil, desde 1986,
cujo objetivo é divulgar estudos e fontes nas áreas de ciências humanas e sociais
aplicadas, especialmente Arquivística.
Apresenta diferentes seções: a secção de dossiê temático apresenta artigos
sobre um mesmo tema. Outra seção são os artigos livres sobre temas variados. A
seção Documento destina-se à publicação de documentos relevantes do acervo do
Arquivo Nacional.
A temática predominante é de trabalhos com os resultados de pesquisas
históricas da arquivística brasileira, mas é também o principal periódico nacional que
contempla a publicação de trabalhos teóricos da área. A publicação é semestral e
está disponível online (revista.arquivonacional.gov.br/), onde é possível acessar seu
sumário e proceder à busca de artigos por ano, volume, número.
A escolha desse periódico para compor a amostra deu-se para ter
representatividade da literatura nacional no corpus. Este é um dos únicos periódicos
correntes que representam a Arquivística nacional. Existem outros periódicos
112
nacionais onde são publicados trabalhos de Arquivística, mas devido à dispersão
dessa literatura, optou-se por não utilizá-los no corpus da pesquisa.
Para efeito de organização da amostra, junto ao grupo de artigos da Revista
Acervo, foram acrescentados três trabalhos selecionados da revista Perspectiva em
Ciência da Informação; três trabalhos da revista Ciência da Informação e da revista
Informação e Sociedade.
Os trabalhos desses quatro periódicos visam exemplificar a literatura nacional
brasileira sobre o tema da organização da informação nos arquivos. Foram
selecionados os periódicos de Ciência da Informação com avaliação A1, no índice
Qualis da Capes. O periódico Transinformação também foi pesquisado, mas não
foram encontrados artigos que atendessem aos critérios estabelecidos para a
composição da amostra.
3.3 PERÍODO DE COBERTURA
O segundo passo foi a definição do período de cobertura: de 2000 a 2015.
Um período de 15 anos da literatura da área possibilita observar como as
transformações ocorridas nos arquivos na contemporaneidade podem ser refletidas
na literatura e como esses reflexos podem ser observados nas experiências vividas
nos arquivos e nos trabalhos publicados sobre a organização e tratamento do
documento de arquivo.
Esse espaço de tempo corresponde a mudanças significativas nos arquivos,
mais precisamente nas formas de criação de registros de informação, em virtude da
adoção das tecnologias de informação nas atividades das organizações. Acredita-se
que essas mudanças também provocaram alterações nas instituições e nas formas
de organização funcional.
3.4 COMPOSIÇÃO DO CORPUS
As regras de seleção do corpus, segundo Bardin (2011) devem ser
estabecidas após uma leitura “flutuante”, que consiste em um contato prévio com as
fontes de seleção das amostras que comporão o corpus. Os critérios definidos por
Bardin (2011) para a seleção do corpus são a exaustividade, a representatividade, a
homogeneidade e pertinência, descritos no item sobre a metodologia.
113
Para operacionalizar a coleta de dados e seleção, ao critério de
exaustividade, definiu-se que o artigo deveria conter, no título, no resumo e no corpo
do texto termos ligados ao processo de “organização e o tratamento dos
documentos de arquivo”. Seguindo o critério da exaustividade, obtive-se uma
amostra representativa sobre o tema, em todos os periódicos analisados.
Os critérios de homogeneidade e pertinência da amostra tornaram-se
possíveis a partir do cumprimento do critério de exaustividade. Como são periódicos
em línguas distintas, foi necessário realizar a leitura dos artigos para fazer a devida
correspondência de termos em inglês, francês e português.
A coleta e a seleção de artigos para o corpus foram realizadas entre março a
setembro de 2016. Nos periódicos Gazette des Archives e Archival Science foi feita
a consulta à coleção física, na biblioteca da École de Chartes (França). O periódico
Archival Science foi consultado no portal de periódicos da Capes para a captura dos
artigos selecionados. Os artigos selecionados da Gazette des Archives foram
digitalizados, pois o periódico não possui versão eletrônica. Nos periódicos American
Archivist, Archivaria e Acervo a consulta foi feita na versão digital do periódico,
através do portal dos próprios periódicos.
Os artigos das revistas Archival Science e Acervo possuem palavras-chave.
Os outros periódicos não possuem palavras-chave atribuídas pelos autores dos
artigos.
Em virtude de a busca ter sido feita em periódicos editados em três línguas
diferentes, no início, foi possível a percepção de que existe uma variação de
linguagens utilizadas quando se referem ao tema de organização e tratamento em
documentos. Sendo assim a busca somente pelo título e por palavras-chave,
quando essas existiam, não foi o suficiente para compor uma amostra consistente e
uniforme. Além da leitura de título, palavras-chave, introdução, foi necessária uma
leitura previa de todos os artigos para confirmar a sua participação na amostra ou
não. Esse processo se repetiu para a procura em todos os periódicos.
Os termos utilizados como norteadores da busca, inicialmente, foram:
organização e tratamento, classificação, indexação, processamento, descrição
arquivística, arranjo e descrição, normas de descrição arquivística, diplomática,
gestão de documentos. O objetivo foi manter o foco no processamento da
informação nos documentos.
114
Ao longo da seleção percebeu-se a ocorrência de outros termos que
poderiam fazer parte do escopo de termos de busca, em virtude do melhor
entendimento do contexto temático. Por exemplo, nos periódicos The American
Archivist, Archival Science e Archivaria, o termo “evidence” apareceu em várias
situações aliados aos termos diplomática e descrição arquivística. O mesmo
aconteceu com o periódico Gazette des Archives, com o termo “traitement” e
“classament”, que têm significados específicos na arquivística francesa. A solução
encontrada para essas questões de variação linguística foi a leitura do artigo para o
entendimento da conotação do termo e para a decisão sobre se eles fariam parte ou
não da amostra. Outra solução foi a procura nos dicionários especializados da área
para certificar da compreensão do termo.
3.5 DEFINIÇÃO DAS CATEGORIAS DE ANÁLISE
Para guiar a seleção dos artigos para compor o corpus utilizou-se o “A
Glossary of archival and records terminology” de autoria de Richard Pearce-Moses,
editado pela Associação dos Arquivistas Americanos (Society of American Archivists,
SAA, 2005). Esse glossário é um vocabulário controlado sobre arquivística, que
apresenta a definição dos termos e suas relações. Essa ferramenta foi útil na
compreensão dos conceitos e sua estrutura hierárquica, sendo a única, dentre as
terminologias consultadas, que apresenta os termos em estrutura hierárquica, o que
facilitou a compreensão do tema dentro da área. Para efeitos práticos a referência a
esta obra no corpo do texto será feita por Glossário da SAA.
Diferentemente da primeira edição publicada pela SAA, em 1990, voltada
para profissionais arquivistas, curadores de manuscritos e gestores de documentos,
a versão de 2005 busca ampliar a compreensão dos termos utilizados na
arquivística para um público mais amplo. A principal característica dessa ferramenta
é a atualização do vocabulário da arquivística. Incorpora, nessa medida, expressões
atualizadas utilizadas na arquivística contemporânea, apresentando definições e
relações entre os conceitos. A ferramenta apresenta ainda a contextualização dos
termos, agregando citações de obras que utilizam o termo.
O glossário contém mais de 2000 entradas definidas e mais
de 600 termos com entradas controladas, tais como sinônimos ou termos não
usados. Apresenta cerca de 700 citações de 280 fontes. Incorpora 2500 referências
115
cruzadas, apresetando, ainda, uma estrutura sintética que mostra as relações entre
termos, recurso que auxilia na compreensão e uso do conceito.
A Fig.2. exemplifica como o termo aparece na publicação. Neste exemplo, o
termo “Classificação”, apresenta as definições e relações entre os termos, tal como
em um dicionário especializado.
Figura 2 – Termo “Classification”: definição e relações
classification, n. (classify, v.) ~ 1. The organization of materials into categories according to a scheme that identifies, distinguishes, and relates the categories. – 2. The process of assigning materials a code or heading indicating a category to which it belongs; see code. – 3. The process of assigning restrictions to materials,la limiting access to specific individuals, especially for purposes of national security; security classification. DF: arrangement NT: business activity structure classification system, class, class code, coded classification, faceted classification, functional classification, security classification, subject classification, synthetic classification RT: access, code, controlled vocabulary, decimal filing system, declassification, taxonomy Notes: Classification may involve physically arranging the materials or use of a class code to index and retrieve documents stored in a different order. For electronic documents, classification may involve assigning a class code used to index and retrieve the document. In some schemes, documents may be assigned to more than one class. – Classification2 in libraries refers to the process of assigning a Dewey, Library of Congress, or other code to indicate where a book is to be shelved.
Fonte: Reproduzido de “A Glossary of archival and records terminology”, SAA, 2015.
O terceiro passo foi a escolha dos termos utilizados para a busca na
classificação dos artigos selecionados. Optou-se por escolher o termo principal e os
relacionados a este, tal como apresentado no glossário. Para a seleção dos termos
foi feita uma leitura detalhada do Glossário e escolhidos os termos ligados ao
processo de tratamento e organização de documentos de arquivo, tendo como base
a fundamentação teórica sobre a atividade de organização e tratamento de
documentos de arquivo, construída para a pesquisa.
Em linhas gerais, considerou-se como termo inicial que caracteriza a atividade
de organização da informação o termo “processing”, que se traduziu por
“processamento”. De acordo com o A Glossary of archival and records terminology
(2005), processamento é o arranjo, descrição e a organização do material
arquivístico para armazenagem e uso. Também pode ser utilizado o termo
processamento arquivístico, mas, de acordo com as notas explicativas do Glossário,
a literatura da área comumente utiliza o termo mais curto “processamento” quando
se trata da organização de material arquivístico.
116
O termo “tratamento” também é usado em alguns casos para abordar o
processo de organização de material arquivístico, principalmente na língua francesa,
“traitement”, mas esse termo aparece mais associado a atividades de preservação e
conservação de documentos de arquivo, quando se aplicam técnicas próprias para
restaurar e conservar os documentos fisicamente. Assim sendo, o termo
“processamento” é o mais adequado para o caso.
De acordo com a literatura arquivística e a fundamentação teórica da
pesquisa, entende-se que os produtos provenientes da atividade de processamento
são o arranjo e a descrição arquivística.
O arranjo compreende a atividade de organização do material, respeitando a
sua proveniência e ordem original para proteger o contexto e preservar a integridade
física e intelectual de todo o material recolhido.
A descrição arquivística compreende o processo de análise, organização e
registro dos detalhes acerca dos elementos formais de um documento de arquivo ou
de uma coleção de documentos de arquivo tais como produtor, título, datas, medidas
e conteúdo, para facilitar o trabalho de identificação, gestão e compreensão do
conteúdo.
No processamento para a criação do arranjo e descrição são executadas
atividades que têm como bases a classificação, a análise de conteúdo e a
indexação. As principais ferramentas utilizadas são as normas de descrição
arquivística, como a ISAD (G), ISAAR, e normas específicas do arquivo em questão
ou do país em questão. Nos arquivos americanos e canadenses também é utilizado,
na descrição de arquivos especiais, o Manual de Catalogação AACR2.
Nas atividades de classificação podem ser construídas ou utilizadas
ferramentas de controle de vocabulário, tais como tesauros, listas de cabeçalhos de
assuntos temáticos, planos de classificação, quadros de arranjo sistemático, dentre
outros.
A arquivística também utiliza como base para a organização e tratamento dos
documentos os princípios da diplomática, que se referem à criação, à forma e à
transmissão dos documentos, tanto quanto a relação com os fatos nele
representados para identificar, avaliar e comunicar sua natureza e autenticidade.
Dessa forma, o termo diplomática também foi selecionado para guiar a
composição do corpus. No caso do termo “análise arquivística”, adotou-se o termo
117
tal como aparece nos artigos de língua francesa, apesar de o mesmo não figurar no
glossário ou no dicionário brasileiro de Arquivística.
A análise arquivística, segundo a literatura, compreende a etapa de análise do
conjunto documental ou do item documental para compreender as relações
hierárquicas dos documentos, ou do item documental, para classificação e para a
atribuição de termos de indexação, dependendo das circunstâncias.
Os princípios arquivísticos que fundamentam a atividade de processamento
de documentos: princípio da proveniência, princípio da ordem original e a teoria das
três idades ou ciclo de vida, assim como o conceito de gestão de documentos, não
foram utilizados como termos para a busca direta dos artigos. Foram, porém,
considerados no momento de fazer a seleção de itens do corpus, uma vez que são
esses os princípios que norteiam a atividade de organização da informação em
arquivos.
De acordo com a literatura analisada, esses conceitos são nela tratados em
função de características próprias, tais como a história, a função e os objetivos, que
não são o foco específico da pesquisa. Por isso, não foram utilizados diretamente
como termos de busca. Mas os mesmos são considerados e contemplados nos
termos específicos na seleção do material. Por exemplo, se um artigo que contempla
a atividade de descrição arquivística foi selecionado e se a questão ou o problema
abordado tivesse relação com o princípio da proveniência, ele foi tratado no artigo.
Dessa forma, foi contemplada e analisada a relação de um conceito com
outro, ou seja, examinando-se a descrição arquivística, abordaram-se as questões
que se relacionam com o princípio da proveniência, quando esta era questão ou o
problema em estudo. Entendeu-se, portanto, que esses conceitos, quando
relacionados à atividade de organização e tratamento dos documentos de arquivo,
estavam contemplados na amostra selecionada que compôs o corpus.
De posse dessa compreensão, foi feita a escolha dos termos do Glossário
para guiar a seleção e organização do corpus. Decidiu-se pela tradução dos termos
para o português, apesar de os artigos serem expressos, em sua maioria, nas
línguas inglesa e francesa. Para auxiliar na tradução dos termos utilizou-se como
ferramenta o Dicionário Brasileiro de Terminologia Arquivística (CONARQ, 2005) e o
Dicionário Collins Cobuild, English Dictionary, 2008.
Os termos selecionados apresentados, a seguir, em ordem alfabética, são
acompanhados dos seus termos específicos, que também serviram de guia para a
118
seleção dos textos. Fizeram-se algumas adaptações dos termos encontrados no
Glossário da SAA para que o objetivo de agrupar assuntos semelhantes fosse
alcançado. Por exemplo, no Glossário consta o termo “descrição”, termo genérico
para descrição bibliográfica, descrição hierárquica e níveis de descrição; o termo
específico “descrição arquivística”, por sua vez, aborda especificamente a descrição
de documentos de arquivo e suas questões. Para atender aos objetivos da pesquisa
e não dispersar o conteúdo optou-se por agrupar os dois termos em um único,
“descrição arquivística” uma vez que estava se tratando especificamente da
descrição de documentos de arquivo a partir de trabalhos da arquivística.
Finalmente, foram escolhidos os termos de seleção dos artigos e agrupados
nas categorias temáticas. Essas mesmas categorias foram utilizadas para
apresentar os resultados da análise dos dados. Seguem os termos utilizados na
seleção e análise do corpus5:
Análise – ou análise de assunto, análise arquivística, análise de conteúdo,
significado, sentido, significação, linguagem;
Arranjo – arranjo arquivístico; princípio da proveniência, ordem original;
Classificação – arranjo, sistema de classificação de atividade, classe, código
de classificação, classificação facetada, classificação funcional, classificação
por assunto, classificação sintética, controle de vocabulário, taxonomia;
Descrição arquivística – história administrativa, manual de descrição
arquivística, regras para descrição arquivística; notas de escopo, notas de
conteúdo; sistema de descrição de série; descrição bibliográfica, descrição
coletiva, descrição hierárquica, nível de descrição, representação;
Diplomática – autenticidade, confiabilidade, veracidade;
Indexação – indexação por conceito, indexação por atribuição, indexação
automática;
Metadados – metadado administrativo, metadado descritivo, Dublin Core,
Marc, preservação de metadados, metadado estrutural;
Normas de descrição – normalização em arquivos, normas de descrição
arquivística; regras para descrição arquivística; AACR2 ou Anglo American
Cataloguing Rules; EAD ou Encoded Archival Description; ISAD ou
5 Vale salientar que esta são as categorias de seleção da amostra, as categorias de analise serão
apresentadas no item 4. Análise de Corpus.
119
International Standart Archival Description; MARC Format for Archival and
Manuscripts Control; Documentos pessoais e manuscritos;
Vocabulário controlado – linguagem, linguagem natural, linguagem
controlada, controle de autoridade, classificação, descritor; índice, termo de
índice, thesaurus, thesaurus de nomes geográficos, ontologia, folksonomia.
De posse desses conceitos, foi feita a seleção dos artigos dos periódicos da
área de Arquivística do período de 2000 a 20015. Para fazer parte do corpus era
indispensável que o tema principal do artigo apresentasse um ou mais termos
definidos para a seleção.
Nos periódicos Gazette des Archives, The American Archivist e Archivaria os
artigos não possuem palavras-chave atribuídas pelos autores. Foi necessário,
portanto, atribuí-los a esses artigos.
Os periódicos Acervo e Archival Science possuem palavras-chave atribuídas
pelos autores e que foram utilizadas como guias e adaptadas, em alguns casos,
para os termos selecionados na indexação dos artigos e, assim, definir-se a temática
do artigo. Essa tarefa foi executada unicamente com o objetivo de organizar a
amostra para posterior análise de conteúdo.
Não foi estabelecido um limite de palavras-chave para indexar os artigos.
Considerou-se o grau de profundidade com que o tema era tratado após a leitura e
análise de cada artigo.
Ao longo da análise serão apresentados os artigos dentro de cada categoria
ou subcategoria. O conjunto final de artigos pesquisados será apresentado no
APENDICE – Lista de artigos analisados.
Ao final, a composição da amostra teve como universo de partida cerca de
378 artigos. Após várias etapas de leituras para então compor a amostra e seguindo
os critérios estabelecidos, para a pesquisa, destes, 80 artigos foram selecionados
para compor a amostra pesquisada. A seleção foi feita seguindo os critérios para a
análise de conteúdo, definidos por Bardin (2011) e descritos na Seção 3.4
composição do corpus. Na seleção da amostra foi feita preferencialmente de
trabalhos teóricos em detrimento de relatos ou estudos de caso, embora, alguns
trabalhos de cunho teórico às vezes utilizam relatos de casos como exemplo ou
explicação da teoria. A preferência por trabalhos teóricos deu-se em função de
cumprir o objetivo da pesquisa que foi compreender a fundamentação teórica da
atividade de organização e tratamento da informação nos arquivos do ponto de vista
120
da literatura produzida na área de Arquivística específicamente. A seleção final é
apresentado no Quadro 2.
Quadro 2 – Composição da amostra por periódicos nacionais e internacionais (2000-2015).
TITULO PERIÓDICO NUMERO DE ARTIGOS
Internacionais
Archival Science 17
Archivaria 11
La Gazette des Archives 23
The American Archivist 11
Total 62 artigos
Nacionais
Acervo – Revista do Arquivo Nacional 13
Ciência da Informação 2
Informação e Sociedade 1
Perspectiva em Cin. Info. 2
Total 18 artigos
Fonte: Elaborado pela autora da pesquisa com base nos artigos selecionados da amostra
A distribuição dos artigos dentro das grandes categorias estabelecidas, que
serão detalhadas dentro da analise de cada uma, ficou assim distribuida:
• Categoria Classificação: 19 artigos
• Categoria Indexação: 7 artigos
• Categoria Descrição arquivística e normalização: 37 artigos
• Categoria Diplomática: 16 artigos
Algumas observações que podem ser feitas sobre composição da amostra,
em relação aos números, uma vez que análise de conteúdo evidenciará as
observações do conteúdo. São elas:
a) predominância da literatura internacional nos trabalhos teóricos
relacionados ao tratamento da informação. Destaque dado ao periódico La Gazette
des Archives, onde se destacam trabalhos nas categorias de Classificação (10
artigos) e Descrição arquivística – normalização (10) artigos. Isso reflete a influência
da Arquivística francesa nestas duas categorias de assunto. Também se destaca o
periódico Archival Science (17 artigos), que é um periódico novo na área de
Arquivística, mas que possui uma característica editorial com predomínio de
trabalhos teórico.
b) O periódico Acervo publicou um número especial em 2007 sobre normas e
terminologias em arquivos, com destaque para as normas de descrição arquivística.
121
São 12 artigos, dentre estes 8 são de autores estrangeiros que escrevem sobre o
tema ou são traduções de trabalhos publicados em periódicos internacionais.
Acontece também com o artigo de Duranti (2015), sobre Diplomática, que é a
tradução do artigo publicado no periódico Archivaria em 1991. O que mostra que,
mesmo sendo um periódico nacional, e tendo artigos na amostra, os autores não
são nacionais e os trabalhos não refletem um pensamento teórico nacional sobre o
tema. O que mostra que a representatividade da literatura brasileira sobre o tema é
pouco expressiva na amostra coletada. Mas não é possível afirmar que isso reflete
em toda a literatura nacional em função dos requisitos definidos para compor a
amostra e em função das fontes pesquisadas.
c) A amostra evidencia uma predominância de trabalhos na categoria de
“Descrição Arquivística e normalização”, (37 artigos). Isso evidência uma
preocupação da área com o tema no período coberto da pesquisa (2000-2015) e
reflete o período de criação das normas arquivística e o início da adoção das
mesmas nos arquivos.
d) Por outro lado, a amostra evidencia um número pequeno de trabalhos
sobre o tema Indexação (7 artigos), em relação a outros temas dentro da área de
tratamento e organização da informação nos arquivos.
e) As categorias “Classificação” (19 artigos) e “Diplomática” (16 artigos),
evidenciando um equilíbrio no número de artigos sobre o tema.
122
4 ANÁLISE DO CORPUS
Adotou-se, como exposto na metodologia, o método de análise de conteúdo
(BARDIN, 2011). Para a operacionalização, foram escolhidas as categorias de
temas selecionadas a partir do Glossário da SAA (2005).
Quando necessário, certos conceitos foram agrupados para obter uma ordem
lógica de classificação. Quando um documento abordava mais de um tema, foi ele
classificado em mais de uma categoria. Por exemplo, descrição arquivística e
normalização: em trabalhos que abordam a “descrição arquivística”, aborda-se, via
de regra, também a “normalização”. Preferiu-se separar o tema para obter um
conhecimento verticalizado e aprofundado sobre o mesmo. Quando necessário,
foram também agrupados elementos de análise, como foi o caso dos temas “análise”
e “análise arquivística”, porque esses termos se referem a um mesmo conteúdo sob
denominações distintas.
Em síntese, as grandes categorias de análise de conteúdo utilizadas foram:
Classificação, Indexação, Descrição arquivística, Diplomática . A estes termos foram
subsumidos outros mais específicos, processo explicitado em cada item da análise
realizada .
4.1 CATEGORIA CLASSIFICAÇÃO
A classificação é um processo de organização abstrato cognitivo para
conhecer algo. É também um instrumento para obtenção de conhecimentos
essenciais sobre uma coisa, objeto ou informação.
Segundo Lalande (1993) a classificação é a maneira de ordenar entre si os
conceitos, segundo certas relações que se querem pôr em evidência; relação de
gênero com a espécie; relação do todo com a parte; relação de genealogia, de
hierarquia. O processo de classificação pode ser compreendido, portanto, como
ação de identificar conceitos e suas relações, com a finalidade de compreender um
conjunto de conceitos e suas relações; o instrumento “sistema de classificação” é o
parâmetro utilizado para entender, organizar, representar um conhecimento
existente, de forma sistemática.
O processo de classificação se estrutura com base na linguagem, que se
constitui no instrumento de comunicação das ideias, de externalização do
pensamento. A linguagem é o instrumento de comunicação entre os seres vivos, e
123
também o produto da comunicação entre eles. “Linguagem constitui a capacidade
do homem de designar os objetos que o circundam assim como de comunicar-se
com os seus semelhantes”. (DAHLBERG, 1979, p.101). O processo de classificação
implica reconhecer uma determinada forma de linguagem, representada por signos,
e assim estabelecer ou reconhecer as relações expressas por essa linguagem por
meio dos conceitos.
Classificar é um processo humano carregado de subjetividade e
intencionalidade e por isso sujeito a contradições. Foucault (2007) refere-se às
dificuldades do processo de classificar as coisas do mundo; o ato em si de classificar
algo é complexo e controvertido:
Inútil voltar aos pressupostos de tal método. Basta mostrar aqui suas consequências: a dificuldade de apreender a rede capaz de ligar, umas às outras, pesquisas tão diversas como as tentativas de taxonomia e as observações microscópicas; a necessidade de registrar como fatos de observação os conflitos entre os fixistas e os que não são, ou entre os partidários do sistema; a obrigação de dividir o saber em duas tramas que se imbricam, embora estranhe uma à outra: a primeira, definida pelo saber já acumulado (a herança aristotélica ou escolástica, o peso do cartesianismo, o prestígio de Newton), a segunda pelo que ainda se ignorava (a evolução, a especificidade da vida, a noção de organismo); e, sobretudo, a aplicação de categorias que são rigorosamente anacrônicas em relação a esse saber. (Foucault, 2007, p. 174).
O termo classificação é apresentado no Glossário da SAA da seguinte forma:
Figura 3 – Termo Classification
classification, n. (classify, v.) ~ 1. The organization of materials into categories according to a scheme that identifies, distinguishes, and relates the categories. – 2. The process of assigning materials a code or heading indicating a category to which it belongs; see code. – 3. The process of assigning restrictions to materials, limiting access to specific individuals, especially for purposes of national security; security classification. DF: arrangement NT: business activity structure classification system, class, class code, coded classification, faceted classification, functional classification, security classification, subject classification, synthetic classification RT: access, code, controlled vocabulary, decimal filing system, declassification, Taxonomy
Fonte: Reproduzido de “A Glossary of Archival and Records Terminology”, SAA, 2005.
Conforme o Glossário, a classificação é o processo de organizar materiais em
categorias, de acordo com parâmetros que as identificam, distinguem e relacionam.
O termo é definido como arranjo e agrupa como termos específicos, os sistemas de
classificação de estrutura, de atividades empresariais, classe, código de classe,
classificação codificada, classificação facetada, classificação funcional, classificação
124
de segurança, classificação de assunto, classificação sintética. Os termos
relacionados são, acesso, código, controle de vocabulário, sistema de classificação
decimal, desclassificação, taxonomia.
Observa-se que o termo “classificação” aparece na literatura da arquivística
como denominação dos processos para organizar documentos de acordo com um
plano de classificação pré-estabelecido, como também em atividades relacionadas
ao processo de criar planos ou esquemas de classificação.
Para a análise do corpus da presente pesquisa, o termo “classificação” foi
tratado tanto como atividade própria de classificar quanto como a concepção e
criação de instrumentos de classificação.
Para tanto, considerou-se “classificação” como um termo geral, subordinando
a ele o termo “arranjo”, tal como apresentado no Glossário, ou seja, foram
agrupados os documentos que abordam a classificação genericamente falando e os
documentos que se referem aos sistemas de classificação de atividades, classes,
códigos de classificação, classificação facetada, classificação funcional,
classificação por assunto, classificação sintética, controle de vocabulário e sistema
de classificação decimal e taxonomia.
A classificação nos arquivos é a atividade inicial do processo de organizar
documentos, sendo essencial para a identificação de itens de descrição arquivística
para a organização de fundos e análise de conteúdo dos documentos de arquivo,
tanto para avaliação e seleção, quanto para localização e acesso.
O corpus aponta uma produção representativa sobre classificação. Foi
identificado um total de 18 trabalhos, sendo três publicações nacionais e 15
publicações do exterior.
O periódico Gazette des Archives, apresentou o maior número de trabalhos.
Os trabalhos deste periódico, como também os trabalhos da Archival Science e
Archivaria são principalmente caracterizados como relatos de caso.
São detalhados o contexto do caso e as atividades ocorridas e, nessa
perspectiva, apresentada também uma abordagem teórica sobre o tema
classificação.
Os artigos selecionados dos periódicos brasileiros são estudos teóricos sobre
o tema ou revisões de literatura.
125
Quadro 3 – Artigos sobre “Classificação” em periódicos nacionais e internacionais (2001- 2013)
AUTOR TITULO PERIODICO ANO
1 Maria Guercio Principles, Methods, and Instruments for the Creation, Preservation, and Use of Archival Records in the Digital Environment
The American Archivist
2001
2 Paul Sabourin Constructing a Function-Based Records Classification System: Business Activity Structure Classification System
Archivaria 2001
3 Claire Sibille Le fonds Dampierre aux Archives nationales (archives familiales et de fiefs)
La Gazette des Archives
2005
4 Elizabeth Verry Le fonds Lionel Chretien aux Archives Departamentales de Maine-et-Loire
La Gazette des Archives
2005
5 Myriam Drouhard, et al
Les outils de la conservation et du classement (par les auteurs du Petit guide)
La Gazette des Archives
2006
6 Luiz Carlos Ribeiro Et Al
Descrição arquivística do acervo documental do conselho regional de desporto do Paraná Acervo
2007
7 Elaine Rosa Rios, Rosa Inês Novais Cordeiro
Plano de classificação de documentos arquivísticos e a teoria da classificação:
Pers. em Ciência da Inf.
2010
8 Jean-Baptiste Auzel Décrire les relations entre les fonds. Analyses et propositions à la lumière des archives napoléoniennes
La Gazette des Archives
2011
9 Sabine Mas, Dominique Maurel, And Inge Alberts
Applying Faceted Classification to the Personal Organization of Electronic Records: Insights into the User Experience
Archivaria 2011
10 Aude Collet Le plan de classement des documents dans un environnement électronique : concepts et repères
La Gazette des Archives
2012
11 Florence Beaume Externaliser le classement : une approche pragmatique
La Gazette des Archives
2012
12 Greg Bak Continuous classification: capturing dynamic relationships among information resources
Archival Science 2012
13 Maria Izabel De Oliveira
Classificação e avaliação de documentos. Normalização dos procedimentos técnicos de gestão de documentos
Pers. Ciência da Inf.
2012
14 Anne Citeau-Berg Du plan d’archivage au système documentaire numérique: le records management en pratique à CUS Habitat
La Gazette des Archives
2012
15 Bénédicte Grailles La fonction archives à l’UNESCO, entre exemplarité et controverses (1947-1971)
La Gazette des Archives
2013
16 Émilie Charrier; Sylvie Le Goëdec
Décrire et conditionner le fonds du service central photographique du ministère de l’Intérieur : un exemple de classement d’images sans paroles
La Gazette des Archives
2013
17 Julie Lauvernier Mettre en ordre les archives des départements : genèse et élaboration du cadre de classement des Archives départe-mentalês
La Gazette des Archives
2013
18 Murilo Billig Schäfer, Eliseu Do Santos Lima
A classificação e a avaliação de documentos: análise de sua aplicação em um sistema de gestão de documentos arquivísticos digitais
Ciência da Informação
2013
19 Patricia Garcia Documenting and classifying labor: the effect of legal discourse on the treatment of H-2A workers
Archival Science 2015
Fonte: Elaborado pela autora com base amostra selecionada de artigos
126
Para a analise, definiram-se os seguintes itens, dentro da categoria
classificação:
a) definição de classificação nos arquivos;
b) as bases teóricas de elaboração de classificações;
c) os produtos da classificação;
d) as críticas quanto ao uso da classificação nos arquivos.
4.1.1 Definições de classificação nos arquivos
A discussão sobre a definição de classificação aplicada aos arquivos é uma
constante nos documentos consultados. Embora os processos sejam comuns, a
função e os objetivos da classificação são adaptados ao contexto dos arquivos.
Drouhard et al (2006) destacam que a classificação é uma operação
complexa e delicada, que consiste em compreender a estrutura de um fundo
documental e identificar uma ordem lógica dos documentos por meio de um exame
objetivo. Classificar é dar valor aos documentos.
Schafer e Lima (2012) citando Lopes (1997) esclarecem que a classificação é
a “sequência de operações que, de acordo com as estruturas organizacionais,
funções e atividades, visam distribuir os documentos em classes e subclasses”.
(p.141).
Para a arquivística francesa, o termo “Classement” é uma das etapas do
recolhimento de documentos, sendo o conjunto documental levado ao arquivo para
ser tratado e descrito, alocado no fundo arquivístico a que pertence, por meio do
“quadre de classement” ou quadro de fundo (PIAF, 2015). Trata-se da escolha do
local do fundo arquivístico, ao qual o conjunto documental pertence.
O fundo é estabelecido, a princípio, no quadre de classement, com a definição
de série e subsérie do arquivo. O processo de classificação ocorre na elaboração a
priori do fundo arquivístico, levando em consideração as atribuições e missão do
arquivo e a história de constituição do organismo ao qual ao arquivo está ligado.
Para Sousa e Araújo Junior (2013), a classificação nos arquivos tem o
objetivo de “manter o vínculo arquivístico, fundamentar a avaliação e a descrição e
possibilitar a recuperação da informação contida nos documentos” (p.132).
127
A classificação nos arquivos é um processo que considera todo o ciclo de
existência do documento; é base, portanto, das atividades de gestão de documentos
até sua incorporação aos arquivos definitivos. A seguir, foram apresentadas as
principais funções presentes na amostra estudada.
Uma das funções da classificação é conhecer o conjunto documental e
estabelecer o valor do documento para as operações de avaliação, seleção e
gestão. Aplica-se também à identificação de elementos para a descrição e para a
criação de instrumentos de recuperação da informação.
Drouhard et al (2006) afirmam que, para estabelecer o valor do documento,
faz-se necessário um preâmbulo ao ato de conhecer os documentos, que é
conhecer a história do acervo. Faz-se isso para atribuir-lhe uma ordem,
classificando-o, para depois descrever ou inventariar o acervo.
Sibille (2006) descreve a organização do arquivo do fundo Dampierre, família
de marqueses da França e seus aliados. O trabalho de recolhimento do fundo ao
Arquivo Nacional da França é um exemplo de classificação utilizado como
instrumento para conhecer a história do arquivo e entender o valor dos documentos.
A autora destaca que, por meio da classificação, foi possível encontrar
documentos que estavam dispersos em três fundos, em função das mudanças
ocasionadas pelas decisões que a família tomou ao longo do tempo. As primeiras
tentativas de organizar o acervo tiveram início em 1933, mas somente em 2002 foi
possível juntar os vários fundos e identificar documentos que enriqueceram o
acervo. A classificação possibilitou a localização de documentos que estavam
dispersos em diferentes fundos. Isso fez os documentos adquirirem valor e
importância a partir da identificação da relação dos mesmos dentro dos fundos.
Nesse caso, com o processo de classificação, também foi possível identificar o
percurso de conjuntos documentais.
Esse exemplo mostra como a classificação escolhida pode explicitar as
diferentes visões de diferentes organizadores, arquivistas, ao longo de um processo
de tratamento. Isso é recorrente nos processos de organização de arquivos que
possuem grande quantidade de itens e levam anos para serem organizados e,
consequentemente, passam por profissionais diferentes e com diversas visões. A
classificação pode ajudar a estabelecer o real valor do documento ao longo do
processo de tratamento.
128
Sabourin (2001); Schafer e Lima (2012); Rios e Cordeiro (2010) e Sousa e
Araújo Junior (2013) apontam uma série de benefícios que a classificação pode
proporcionar na obtenção de eficiência na avaliação e gestão de documentos.
A gestão de documentos arquivísticos envolve ações de controle das
informações sobre o documento, desde a sua criação até a destinação final, por
meio da avaliação do valor informacional que ele possui e que “para atingir esse
objetivo, as adoções de instrumentos voltados à classificação e avaliação tornam-se
indispensáveis” (SOUSA, ARAUJO JUNIOR, 2013, p.143).
O plano de classificação e a Quadro de temporalidade são os instrumentos
empregados no processo de avaliar o valor do documento na gestão de
documentos.
A classificação nos arquivos é utilizada para a elaboração dos planos de
classificação e depois para seu uso e acontece, em geral, junto à produção do
documento, “de modo a auxiliar na racionalização dos procedimentos para a gestão
documental institucional” (RIOS E CORDEIRO, 2010, p. 125). O documento então é
integrado à política de informação do arquivo.
Sabourin (2001) destaca que a busca de eficiência nos processos de gestão
da informação e dos documentos nas instâncias de governo é essencial para manter
a qualidade dos serviços administrativos. O projeto relatado buscou atualizar o
esquema de classificação de documentos, baseado em assuntos, que fora criado na
década de 1960, para um sistema baseado em funções administrativas. Segundo o
autor, o sistema de classificação de documentos proposto tende a melhorar os
processos de avaliação e identificação do valor do documento, explicitado pelas
funções organizacionais ao qual ele está relacionado, e não por seu conteúdo,
porque podem estar carregados de análise subjetiva e circunstancial.
No caso relatado por Citeau-Berg (2012), foi desenvolvido um plano de
classificação como ferramenta de suporte à gestão de documentos do setor de
habitação da prefeitura da cidade de Strasbourg, na França. O setor GUS Habitat é
responsável pela gestão dos aluguéis sociais da cidade, desde 1923. O setor é
responsável por conservar os documentos dos processos e controlar o valor jurídico
das atividades.
Após anos de trabalho, o acervo foi digitalizado para racionalizar espaços e
melhorar o processo de recuperação e busca dos documentos. O setor de gestão da
informação juntamente com a gestão de documentos elaboraram um plano de
129
classificação por processos para controlar a validade jurídica dos documentos e
atribuir classe temática aos documentos digitalizados e aos que foram produzidos e
estão alocados em meio digital.
O plano de classificação dos documentos auxilia a gestão dos documentos
quanto aos aspectos de avaliação, recolhimento e recuperação. A dificuldade
relatada no caso é manter a atualização das classes de assuntos, para o meio
eletrônico, pois quando existe qualquer alteração das classes e subclasses de
documentos no plano, isso implica realizar alterações em toda a cadeia
correspondente.
Sousa e Araújo Junior (2013) destacam a classificação como ponto de partida
para a construção de toda a prática arquivística, pois ela sustenta os processos
principais de avaliação e descrição arquivísticas, seja na gestão de documentos ou
nos arquivos definitivos. A classificação explicita o “conjunto documental
representado pelo fundo, série ou subsérie, isto é, os agrupamentos documentais
resultantes do processo de classificação.” (p.133).
Outra função da classificação é auxiliar a restaurar a ordem original dos
documentos. Schafer e Lima (2012) afirmam que entre os objetivos da classificação
“destacam-se: a recuperação do contexto original de produção dos documentos,
visibilidade das funções, subfunções e atividades do organismo produtor” (p.141).
No caso do fundo Dampierre, descrito por Sibille (2006), a dispersão do fundo
decorreu por decisão dos detentores do acervo. Os conjuntos documentais de
natureza pessoal ou arquivos familiares foram dispersos e, em alguns casos, foram
acrescentados documentos, retirados ou separados.
A classificação apresenta-se como um processo ou instrumento que
possibilita recompor a ordem original ou mesmo fazer com que os organizadores
possam entender o que ocorreu com o percurso do documento.
Esse também foi o caso relatado por Verry (2005), que descreve o
recolhimento de um arquivo familiar do fundo Lionel Chretien nos Archives
Departamentales de Maine-et-Loire. O acervo foi afetado por um desastre natural,
uma tempestade, que destruiu grande parte do acervo do fotógrafo Lionel Chretien.
O acervo era considerado de grande riqueza, pois era a coleção de uma linhagem
de fotógrafos que retratava a evolução histórica da região de Angers, na França.
Após o acidente, o que restou do acervo foi tratado, recuperado e reconhecido e, por
meio da classificação do fundo, foi possível identificar as lacunas existentes no
130
acervo e proceder à sua recomposição por meio de fotos identificadas em outros
fundos do arquivo.
Charrier e Le Goedec (2013); Sousa e Araújo Junior (2013); Mas; Maurel;
Alberts (2011) destacam em seus trabalhos a função da classificação como
instrumento para promover a determinação mais exata e clara dos conteúdos de
informação nos documentos.
Mas; Maurel; Alberts (2011) abordam o caso dos documentos digitais
carregados de especificidades semânticas dos criadores; dentro de seus campos de
trabalho, são beneficiados pelo uso de instrumentos construídos com base na
classificação. No caso específico, foi utilizado um sistema de recuperação baseado
em classificação facetada, que auxiliou a melhor definir os conteúdos dos
documentos, bem como estabelecer relações entre eles, o que melhora a
compreensão e a recuperação em sistemas de informação.
Charrier e Le Goedec (2013) expõem a organização do acervo fotográfico do
ministério do interior da França, com um volume de cerca de 3250 caixas, composto
de negativos recolhidos em 1978. Relatam que a falta de documentos sobre a
produção desse acervo, acompanhada da dificuldade inerente da leitura das
imagens de negativos, foi um obstáculo para o tratamento do acervo. Ao longo do
tempo, dois outros conjuntos de documentos foram reunidos a este, por
características físicas e para fins de preservação e conservação.
A necessidade de tratar o acervo, em vista de seu interesse crescente nos
arquivos contemporâneos e o uso das tecnologias digitais para tratar imagens
contribuiu para dar maior celeridade ao tratamento. Mas o trabalho de classificação,
de acordo com os fundos arquivísticos existentes no arquivo Nacional, foi bastante
difícil, pela ausência de informações sobre o histórico de composição do fundo.
Segundo Charrier e Le Goedec (2013), f oi necessário realizar o levantamento
do funcionamento do serviço no ministério, detalhar os setores, os serviços e o
funcionamento, para, a partir dessa estrutura de classificação, realizar o trabalho de
identificar o conteúdo das imagens digitalizadas, identificar a quais serviços as
imagens pertenciam e os elementos presentes nas mesmas. As imagens
digitalizadas dos negativos não mostravam somente pessoas, mas também imagens
de documentos dos setores. Por meio da identificação, a partir do conteúdo das
imagens, foi possível datar um período histórico entre 1907 a 1963 e recompor os
elementos para conhecer o acervo.
131
Esse caso foi pioneiro no tratamento do conteúdo das imagens, por meio de
um plano de classificação, para recompor os elementos de funcionamento da
estrutura funcional da instituição. Diferentemente do documento escrito, em que
seus elementos físicos intrínsecos facilitam o reconhecimento, no caso de imagens é
necessário definir elementos de identificação de conteúdo para sua efetiva
recuperação e usos.
Sousa e Araújo Junior (2013) também destacam a função dos arquivos no
auxílio à determinação de conteúdos, ressaltando que isso pode contribuir para
melhorar o processo de recuperação de informação. Apontam que a classificação,
juntamente com a indexação de documentos, com uso de vocabulários controlados,
mostra as “relações entre os documentos e os conteúdos de que tratam os
documentos, espelhando suas funções/atividades e conduzindo os usuários à
recuperação da informação” (p.133).
Em síntese podemos compreender que a definição de classificação nos
arquivos esta atrelada a sua função nos arquivos como suporte a processos e
operações. Sendo assim podemos compreender que:
a) Com base nas definições de Drouhand, et al (2006), Sibille, (2006) podemos
entender que a classificação é compreendida como um processo abstrato,
intelectual de compreender o conjunto documental e seu histórico de criação com a
função para assegurar o valor do documento e do conjunto documental e poder
assim, descreve-los, organiza-los e gerencia-los.
b) As definições de Sabourin (2001); Schafer e Lima (2012); Rios e Cordeiro (2010)
Sousa e Araújo Junior (2013); podemos compreender que a classificação pode ser
entendida como uma operação que tem a função dar suporte a avaliação, seleção,
gestão e para a criação de instrumentos de recuperação da informação, tais com os
planos de classificação, a Quadro de temporalidade e destinação dos documentos.
132
4.1.2 As bases teóricas de elaboração de classificações
Como a classificação é um processo de organização do conhecimento que
serve a várias áreas da ciência, muitos são os modelos teóricos utilizados na sua
elaboração.
Sabourin (2001) descreve a construção de um sistema de classificação de
documentos baseado em funções administrativas, utilizado pelo governo do Canadá
para a avaliação e eliminação de documentos. A ferramenta é utilizada para a
gestão de documentos do governo canadense e as entidades nacionais privadas.
A construção do sistema, BASCS, Bussiness Activity Struture Classification
System, baseia-se em um modelo que evidencia as funções institucionais.
Rios e Cordeiro (2010) apresentam um estudo sobre as propostas
metodológicas de construção de planos de classificação. Destacam que os planos
de classificação arquivísticos são diferentes de outras ferramentas de controle de
vocabulário, como os tesauros e listas de cabeçalho de assunto; na classificação
arquivística, os assuntos estão presentes nas classes e subclasses que refletem a
estrutura, as funções e as atividades da instituição. “O assunto pode ser uma
disciplina, ramo ou tópico do conhecimento, espaço geográfico, época, período ou
tempo cronológico, pessoa ou instituição” (p. 126) e, de maneira secundária, uma
forma de apresentação da informação.
Como base para o estabelecimento de assuntos, Rios e Cordeiro (2010)
também apontam a classificação facetada de Ranganathan, os esquemas da
Classificação Decimal de Dewey e da Classificação Decimal Universal. Os critérios
mais utilizados na elaboração de planos de classificação de arquivos têm como base
o modelo funcional, que corresponde às funções desenvolvidas pela instituição
produtora ou receptora dos documentos. Outro critério de organização é a ordem
estrutural, que se refere às divisões estruturais da instituição.
Também no trabalho de Maurel e Alberts (2011) é proposta a adoção do
modelo de facetas, com base na classificação facetada de Ranganathan, para a
elaboração de sistemas de classificação de documentos eletrônicos. Este modelo
tende a melhorar a eficiência do uso da classificação de documentos, por ser
possível identificar os diferentes atributos de um documento, tarefa que muitas
vezes impossibilita a sua classificação em um lugar único, além de comportar
diferentes pontos de vistas do classificador. Neste caso, foi desenvolvido um projeto
133
piloto, em uma universidade, para classificar os documentos eletrônicos de cursos,
utilizados pelos professores.
Para Rios e Cordeiro (2010) e Sousa e Araújo Junior (2013), o princípio da
proveniência, da ordem original e de respeito aos fundos é considerado a base mais
usual de tratamento de documentos e também para a elaboração de planos de
classificação. Porém, mais do que um modelo para a construção de esquemas de
classificação, este processo operacionaliza tais princípios no trabalho arquivístico.
O esquema de classificação construído com base na estrutura funcional
institucional define a origem dos documentos e seus desdobramentos na ordem
original e na definição do quadro de fundo onde o documento será alocado.
É claro que esse procedimento funciona de maneira mais eficiente na etapa
de gestão de documentos, em que é possível ter um controle maior sobre a origem
do conjunto documental. Nos casos de massas de documentos resultantes de
recolhimento, em que é difícil a identificação de origem, pode não ser possível
reestabelecer a ordem original. Nestes casos, a classificação por assuntos é uma
ferramenta do processo de organização e identificação de conteúdos que permite
sua recuperação a despeito da não identificação de origem.
4.1.3 Os produtos da classificação
Nos trabalhos analisados, os autores destacam como produtos da operação
de classificação o conhecimento da história de composição dos conjuntos
documentais, a identificação e classificação de conteúdos e os elementos de
identificação para a descrição física e para a estrutura do fundo, série, subsérie,
coleção, dossiê e item documental, quando for o caso. Possibilitam, também, a
criação de um plano de classificação do conjunto documental ou do fundo.
Drouhard, et al (2006) destacam que a classificação reflete de maneira
objetiva a natureza dos documentos ou dossiês documentais, que tornam possível a
identificação, dentro de um conjunto, dos documentos arquivísticos de valor e a
definição do lugar do documento no fundo ou dossiê, como também o
reconhecimento de elementos cronológicos, temáticos e topográficos do documento
para a criação de inventários e outros instrumentos de pesquisa.
No trabalho de Charrier e Le Goedec (2013) é possível perceber que a
classificação gera como produto a identificação do conteúdo de imagens de
134
negativos de filmes, atrelado à estrutura histórica do acervo. Uma vez que a
classificação, a partir da estrutura funcional, define atividades e serviços a que o
acervo de imagens está ligado, possibilita a identificação e o reconhecimento de
conteúdo das imagens.
4.1.4 Críticas ao uso da classificação nos arquivos
Apesar da afirmativa de autores da arquivística, como Rousseau e Couture
(1994) e Fernanda Ribeiro (1996), que ressaltam a importância do uso da
classificação nos arquivos, a adoção dessa prática e das ferramentas de
classificação e indexação temáticas não é um tema pacífico na área. Fernanda
Ribeiro ressalta a distinção entre a classificação empregada em arquivos e em
bibliotecas:
O quadro de classificação de um fundo é, muitas vezes, utilizado como meio para aceder ao conteúdo, especialmente quando o tratamento da documentação se faz a um nível pouco detalhado, como acontece no caso da elaboração de um inventário. Assim, poder-se-ia pensar que o quadro classificativo de um fundo é suficiente para uma abordagem geral do seu conteúdo, sendo dispensável a indexação. Porém, esta suposição não é correcta, (sic) (...). Um quadro de classificação em Arquivo representa a estrutura orgânico/funcional do fundo ao qual se aplica; é completamente diferente, na sua essência, dos sistemas de classificação bibliográficos, cujas rubricas representam assuntos. (RIBEIRO, 1996, p.59).
Rosseau e Couture (1994) pontuam que “a classificação de documentos
administrativos foi objeto de muitas tentativas” (p.49). As consequências da
Revolução Francesa de juntar os arquivos e abri-los para consulta “evidencia os
problemas da classificação”; era preciso conhecer os documentos para ordená-los e
disponibilizá-los aos cidadãos.
A base cronológica, metodológica e os princípios dos enciclopedistas
fundamentam as controvérsias sobre classificação em arquivos. Foi o princípio da
proveniência que instituiu a base para que a classificação se desenvolvesse de
maneira adequada à natureza dos arquivos. A obediência a esse princípio e a
necessidade de preservar a ordem original permitiu o desenvolvimento dos sistemas
de classificação de fundos arquivísticos. Com isso, os documentos podem ser
recolhidos aos arquivos, já classificados de acordo com a sua origem, de modo a
facilitar os processos de avaliação, identificação e descrição.
135
No corpus analisado, Bénedict Grailles (2013) discutem o arquivo da
UNESCO, e a influência que o modelo de organização desse arquivo teve na
arquivística mundial. O arquivo da UNESCO foi criado em 1945. É um arquivo
histórico, denominado de “registry”. Baseou-se na classificação decimal universal
(CDU) para a gestão de documentos, para criar dossiês. O autor relata a influência
desse modelo, baseado na CDU, na arquivística francesa e as pressões para
propagar o modelo UNESCO na criação de planos de classificação de arquivos na
França e em várias partes do mundo.
Em 1954, Johan Piertese, então chefe da divisão de classificação da
UNESCO, publicou um artigo “Les archives administratives: pour l’organisation
rationnelle des services du courrier”, no periódico Archivum, sugerindo a adoção do
modelo teórico da CDU para a criação do plano de classificação para todos os
arquivos da UNESCO e para os arquivos de todos os órgãos associados e
instituições. Ele defendeu enfaticamente a utilização da CDU como plano de
classificação e como ferramenta de uniformização e padronização internacional de
tratamento dos arquivos. Este modelo contrapõe-se ao modelo francês de
estabelecimento de fundos e subfundos arquivísticos, baseado no princípio da
proveniência.
Depois desse artigo, surgiu uma forte corrente defensora da adoção do
modelo para os arquivos franceses. Um dos defensores na França do modelo da
UNESCO foi Rene Dubuc, presidente da Federação Internacional de
Documentação.
Guy Dubosq, presidente da Associação dos Arquivistas Franceses e futuro
diretor do Arquivo Nacional recusou polidamente a investida de Dubuc e explicou
que o modelo não era condizente com a realidade da prática arquivística francesa,
composta de milhares de pequenos arquivos. Sua adoção poderia promover o
desacordo total com a gestão dos arquivos em virtude da diversidade de
interpretações que o modelo poderia ter.
Após as tentativas de alguns arquivos em substituir seus modelos de plano
de classificação pelo modelo da UNESCO, a Associação dos Arquivistas Franceses
construiu progressivamente uma ofensiva anti-CDU. O arquivista Roger Sève,
elaborou um relatório rebatendo ponto por ponto as questões propostas pelos
defensores da CDU como modelo; finalizou afirmando que a CDU é uma
classificação usada para documentos bibliográficos, portanto, para organizar o
136
conhecimento humano geral, encontrado em livros, e não para um conjunto de
documentos específicos gerados por uma instituição, em decorrência de suas
atividades particulares.
Em 1959, Yves Pérotin encerrou, em um relatório, a questão sobre a adoção
do modelo UNESCO nos arquivos franceses e distribuiu uma circular a todos os
arquivos da França enfatizando o não uso do modelo da CDU em planos de
classificação. Em 1971, no congresso da UNESCO, em Bonn, os arquivistas da
instituição declararam que entendiam e aceitavam o princípio de proveniência e de
respeito aos fundos como modelo de classificação para os dossiês, rejeitando,
portanto, a CDU como modelo. Em 2000, esse modelo foi totalmente abandonado
pelos arquivos da UNESCO.
Outros problemas com relação à adoção da classificação nos arquivos
referem-se à transitoriedade do valor do documento. O documento classificado pode
ter diferentes atributos (assuntos) e pode ser classificado em diferentes lugares ou
sob diferentes assuntos (DROUHARD, et al, 2006), (MAS, MAUREL, ALBERTS,
2011). Os documentos são classificados em um local, segundo a avaliação arbitrária
e subjetiva de um indivíduo (MAS, MAUREL, ALBERTS, 2011).
Outra dificuldade aparece no uso dos esquemas de classificação baseados
em estruturas institucionais para agrupar documentos digitais. A dificuldade está no
fato de os termos utilizados na terminologia organizacional serem genéricos e
formais, não contemplando as peculiaridades dos termos utilizados em ambientes
operacionais pelos funcionários, criadores dos documentos e utilizadores, que
adotam terminologia de acordo com a semântica relacionada ao domínio de
expertise. (MAS, MAUREL, ALBERTS, 2011).
Maurel, Alberts (2011) e Sousa e Araújo Junior (2013) observam que a rigidez
dos esquemas de classificação baseados na estrutura institucional e sua não
atualização desencorajam o uso destes esquemas. Sousa e Araújo Junior (2013)
resumem em quatro facetas a problemática do uso da classificação em arquivos:
A primeira, a indefinição e imprecisão do objeto de estudo da arquivística. A segunda, a necessidade de um tratamento interdisciplinar da questão. A terceira, o caráter positivista das práticas e intervenções, verificado na trajetória da produção do conhecimento na área. E por último, a ausência de procedimentos metodológicos para a coleta de dados necessários à construção de instrumentos de classificação (p.135).
Em resumo, pode-se concluir que o uso da classificação nos arquivos é uma
prática fundamentada em processos e bases teóricas. Apresenta-se como uma
137
prática que sustenta a instauração dos princípios arquivísticos da proveniência e
ordem original e serve como instrumento para a organização de todos os tipos de
conjuntos documentais, seja para a gestão de documentos ou em arquivos
definitivos.
Com relação às funções de classificação nos arquivos, foi possível perceber a
relação intrínseca do processo de classificar com a gestão de documentos e a
descrição arquivística, sendo que a função de conhecer a produção documental e o
conteúdo dos documentos é facilitada pela classificação. Cumpre-se, desta forma, o
princípio básico da classificação como instrumento para conhecer a realidade e
organizar o saber.
4.2 CATEGORIA INDEXAÇÃO
Os manuais tradicionais de tratamento de arquivos consideram que eles
devem ser tratados como conjuntos ou agrupamentos documentais em fundo, série,
subsérie, seção ou dossiês. A justificativa para a adoção desse modelo está ligada,
em parte, à grande quantidade de massas documentais tratadas. Alguns autores
que estudam a classificação, a categorização e a descrição nos arquivos com base
em princípios arquivísticos (YEO, 2012; MEEHAN, 2010; CURRALL, MOSS,
STUART 2004, MILLAR, 2002), também atribuem a adoção desse modelo de
tratamento juntamente à necessidade de manutenção dos itens de forma agrupada,
respeitando os princípios arquivísticos da proveniência e da ordem original. A
manutenção dos conjuntos documentais facilita as pesquisas futuras, evitando a
dispersão de documentos.
A perspectiva de tratar os documentos como itens documentais é uma
atividade relativamente recente, porque o tratamento de conjuntos documentais
pode não atender às necessidades dos usuários (MILLAR, 2002). Os motivos
apontados para essa mudança levam em consideração o processo de produção dos
documentos, em meio digital, no contexto das organizações, os hábitos de pesquisa
dos usuários e a adoção das tecnologias de informação no trabalho dos arquivistas.
Na lógica de trabalho contemporâneo, os produtores de documentos estão
espalhados na organização ou fora dela, muitas vezes ligados pela rede internet.
138
Dito de outro modo, atualmente, a produção de documentos é realizada por
várias categorias de trabalhadores, em plataformas de trabalho diferentes, sendo
gerados documentos em diferentes formatos, de forma dispersa.
Atrelada a essa realidade, os hábitos de pesquisa dos usuários e a
disponibilização de ferramentas tecnológicas para criar sistemas de recuperação de
informação afetam o modelo de agrupamento de documentos em conjunto. Por
esses motivos, a classificação e a indexação vêm sendo cada vez mais
consideradas nos arquivos, a despeito de ainda ser o tema pouco frequente na
literatura e nas ferramentas terminológicas da área. O termo indexação está
presente no Glossário da AAS da seguinte forma:
Figura 4 – Termo Indexing
indexing, n. ~ The process of creating an ordered list of concepts, expressed as terms or phrases, with pointers to the place in indexed material where those concepts appear. NT: assignment indexing, automatic indexing, concept indexing, coordinate indexing system, depth indexing, extraction indexing, postcoordinate indexing, precoordinate indexing RT: index, self-indexing files, specificity of indexing
Fonte: Glossary of Archival and Records Terminology, 2005, p. 201.
A indexação nos arquivos é prioritariamente vista como indexação por
assuntos, conforme aponta o Glossário do SAA, que a define como um processo de
criação de uma lista ordenada de conceitos, expressos em termos ou frases,
indicando os documentos em que eles aparecem. No Dicionário Brasileiro de
Arquivística (2005) o termo “indexação” é também definido como um processo “pelo
qual documentos ou informações são representados por termos, palavras-chave ou
descritores, propiciando a recuperação da informação.” (p. 107).
O termo aparece no Dicionário Brasileiro de Arquivística (2005) somente em
língua portuguesa, não tendo tradução para nenhum outro idioma. A norma ISAD(G)
(2006) não apresenta o termo “indexação” em seu glossário, porém apresenta os
termos “indexação pós-coordenada”, definida como indexação por termos que são
combinados durante a busca feita nos instrumentos de pesquisa e “indexação pré-
coordenada”, que é a atribuição de termos aos documentos previamente, com uma
ferramenta de controle de vocabulário, antes de ser inserido em um sistema de
descrição e recuperação.
Posteriormente, esses mesmos termos podem auxiliar nas buscas de
documentos em sistemas de recuperação. Embora na definição da Norma ISAD (G)
139
não se encontrem especificadas as tipologias de ferramentas utilizadas para a
indexação pré-coordenada, a mesma norma define o termo “tesauro” que é
reconhecidamente uma ferramenta de controle de vocabulário.
Em um tesauro, os termos são extraídos da linguagem natural, são
“normalizados, agrupados por afinidades semânticas, com a indicação das relações
de equivalência, hierárquicas, partitivas, de negação e funcionais estabelecidadas
entre eles”. (ISAD (G), 2006, p. 16).
Para a análise do corpus da presente pesquisa, a indexação foi considerada
como um processo pelo qual são identificados os termos representativos do
conteúdo dos documentos arquivísticos. Esses elementos podem fazer parte do
conteúdo explicito do documento, tais como nome, lugar, tipologia documental ou
ser identificados por meio de análise de conteúdo, com uso de uma ferramenta de
controle de vocubulário, como um tesauro (cabeçalhos de assuntos, índices de
assuntos, entre outros).
A ferramenta de controle de vocabulário deve ser aderente ao contexto da
instituição arquivística e refletir a realidade das suas ações e atividades. Por essa
razão, o ideal seria cada arquivo elaborar as suas diferentes ferramentas de controle
de vocabulário.
O processo de indexação visa, portanto, a atribuir pontos de acesso às
informações contidas em documentos. Conforme Smit e Kobashi (2003, p.13), “o
acesso à informação nos arquivos é mediado por pontos de acesso, portas ou
pontes que permitem detectar agrupamentos de documentos, distiguindo-os de
outros agrupamentos de documentos”.
Nos textos do corpus, o termo indexação aparece em vários trabalhos, mas
não foi tratado em profundidade. São trabalhos em que no termo é somente citado, o
que acontece em praticamente toda a amostra, em geral relacionado a outros temas
do corpus. Para os fins desta pesquisa, foram selecionados os trabalhos em que o
termo indexação é o tema principal, sendo possíveis exemplos de como o assunto
indexação é tratado dentro da Arquivística.
Foram identificados cinco trabalhos sobre indexação, na amostra total. Aqui
também foi exposto um trabalho sobre controle de vocabulário, pela proximidade
com o tema, de Aguiar e Talámo (2012).
Os trabalhos de Paterson (2001), Beaume e Vesson (2007) e Santos Neto e
Cordeiro (2015) são casos de aplicação da “indexação” em contextos específicos.
140
Os trabalhos de Yeo (2007, 2008) propõem a utilização da representação do
contéudo de documentos como método de estudo do conceito de documento e sua
relação com os conceitos de evidência e informação, em diferentes conjuntos
documentais. Estes dois estudos tratam em conjunto dos conceitos de documento,
evidência, informação e representação que, a princípio, não apresenta a indexação
como tema principal, mas preferiu-se analisá-lo nesta categoria em virtude do
método de estudo, que usou a análise dos termos do documento para comprovação
de evidências em documentos.
O trabalho de Yakel Torres (2007) é um estudo de usuários, os genealogistas,
a partir da percepção de que os mesmos têm de documento, e como são
caracterízados a partir do uso que fazem dos registros documentais de arquivos.
Esse texto foi considerado importante pois utiliza a percepção dos genealogistas
sobre o conteúdo de documentos nas atividades de pesquisa. Inicialmente, não há
relação direta com a indexação, mas eles são estudados sob este tema em função
da compreensão dos autores sobre o conceito de conteúdos de documentos e como
dele fazem uso em suas pesquisas. Embora em nenhum momento façam menção à
indexação, fica evidente que ela é, para eles, uma ferramenta de trabalho. Os
trabalhos selecionados sobre o tema indexação são apresentados no Quadro 3.
Quadro 4 – Artigos sobre “Indexação” em periódicos nacionais e internacionais (2001 – 2015)
AUTOR TITULO PERIODICO ANO
1 David Paterson A Perspective on Indexing Slaves' Names
The American Archivist
2001
2 Florence Beaume; Valery Vesson
L’indexation collaborative aux Archives départementales de l’Ain
La Gazette des Archives
2007
3 Elizabeth Yakel, Deborah Torres
Genealogists as a "Community of Records"
The American Archivist
2007
4 Geoffrey Yeo Concepts of Record (1): Evidence, Information, and Persistent Representations
The American Archivist
2007
5 Geoffrey Yeo Concepts of Record (2): Evidence, Information, and Persistent Representations
The American Archivist
2008
6 Francisco Lopes de Aguiar; Maria Talamo
Controle de vocabulário da lingua organico-funcional. Concepção e príncipios teórico-metodologico
Acervo
2012 (continua)
7 Antonio Laurindo dos Santos Neto, Rosa Inês de Novais Cordeiro
Contribuições para análise, descrição, e representação arquivística da informação dos cinejornais da Agência Nacional
Informação e Sociedade
2015
Fonte: Elaborado pela autora com base na amostra selecionada de artigos
141
Foram delimitados como categoria de análise dos trabalhos os seguintes elementos:
a) definição de indexação;
b) aplicação da indexação;
c) críticas quanto ao uso da indexação nos arquivos.
4.2.1 Definição de indexação
Deve-se observar que o termo indexação não é discutido ou definido nos
trabalhos selecionados. Os autores Paterson (2001), Beaume e Vesson (2007)
utilizam o termo indexação apenas mostrando o seu emprego no caso estudado.
Foram encontrados alguns termos que identificam o processo, utilizando,
porém, palavras como: “descrição da informação baseada no conteúdo”,
“representação do conteúdo”, “representação documentária”. (SANTOS NETO e
CORDEIRO, 2015). Outros: “análise individual do conteúdo”, “representação do
conteúdo informacional”, “análise e identificação do conteúdo das entrevistas”,
“análise arquivística do discurso”, em Yakel, Torres (2007). No trabalho de Yeo
(2008) encontram-se termos como “representação dos artefatos de informação”,
“representação da intencionalidade do documento”, “representação das evidências”.
Todos esses termos, dentro do contexto analisado, tratam da identificação de
e representação de documentos baseados nos conteúdos, distintos, portanto, dos
elementos de descrição física dos documentos. Deve-se ressaltar que as normas de
descrição arquivística relacionam a identificação a elementos da forma e ao
conteúdo analítico, atribuído por meio de análise do arquivista.
4.2.2 Aplicação da indexação
O texto de Paterson (2001) faz um relato sobre o tratamento de documentos
sobre a escravidão, nos Estados Unidos, especificamente sobre a indexação de
nomes de escravos em arquivos públicos e privados desse país. O problema
colocado aqui se relaciona a como identificar essas pessoas individualmente e
relacionar os indivíduos com os documentos para se obter um registro histórico
coerente e fidedigno da história da escravidão.
O autor esclarece as particularidades dos arquivos sobre a escravidão ao
longo da história nos Estados Unidos. Os escravos são nomeados e descritos em
uma grande variedade de tipos de arquivos dispersos; são arquivos das cortes
142
judiciais e policiais, arquivos de transações mercantis, arquivos pessoais. Os
registros incluem documentos de propriedade, apólices, testamentos, documentos
de divórcio, recibos de compra, cartas, avisos de débitos, registros policiais, jornais,
cartas, correspondências, diários pessoais, correspondências pessoais, etc.
Nesse texto, o autor cita o exemplo de um arquivo da corte judicial, onde os
escravos são identificados como mercadorias, testemunhas, vítimas, réus ou
envolvidos em crimes contra pessoas livres. Há uma grande variedade de tipos de
informações, dispersas em muitos tipos de documentos. Nos arquivos, os escravos
não eram identificados por nome, pois são tratados como propriedade de alguém.
Assim, muitos nomes estão ligados aos nomes do proprietário, sem a identificação
do escravo por um nome próprio. Muitos deles adotavam o sobrenome do
proprietário como nome de família.
Uma das estratégias utilizadas pelos genealogistas para traçar o histórico do
indivíduo foi identificar o nome do último proprietário do escravo para rastrear o
nome do escravo. Dessa forma, esses arquivos adotam a estratégia de utilizar o
sobrenome do proprietário como termo de indexação primário para identificar e
encontrar informações sobre os escravos, individualmente. Esta não é, porém, uma
estratégia eficaz, tendo em vista a grande quantidade de pessoas escravas ou ex-
escravas com o mesmo nome, o que resultava na identificação de um número muito
grande de Marys, Williams, Isaacs...
Os pesquisadores e os arquivistas que trabalham com esses documentos
começaram a adotar a estratégia de agregar termos de elementos secundários
aliados aos nomes registrados, para dar individualidade a essas pessoas. Alguns
desses elementos aliados ao nome principal são os nomes intermediários, local,
nome da propriedade, do evento envolvendo o nome principal, o apelido. Por
exemplo, “George (free mam from Alabama), property, farm Silver Lake” ou “Mariah,
the property of James Adamns”.
Com essa estratégia, foi possível identificar diferentes documentos
relacionados a uma mesma pessoa. O autor apresenta ainda várias outras
estratégias de indexação para nomes de escravos, como o tratamento dos apelidos
ou “nicknames”, os nomes do meio, os sufixos acrescentados aos nomes, e as
tentativas de criar ferramentas como índices gerais de nomes, ou glossários de
nomes de escravos, para facilitar a indexação desses documentos e guiar melhor os
pesquisadores. Neste caso, a indexação é útil nos processos de relacionar
143
documentos dispersos e complementar os elementos para além da informação
derivada da descrição arquivística. Tratou-se, portanto, de superar as limitações
decorrentes do tratamento arquivístico centrado em conjuntos documentais, para
procurar individualizá-los para melhor atender aos pesquisadores.
Em outro exemplo, referido autor se reporta a um arquivo privado: somente a
análise de itens dessa série possibilitou identificar a oferta de um escravo como
meio de pagamento de uma dívida. A carta em questão contém detalhes que
permitem identificar o escravo, tais como nome, lugar e características
apresentadas. Observa-se, portanto, que a indexação oferece os elementos de
ligação para outros documentos que podem constituir, então, um conjunto de
documentos que retratam a trajetória do indivíduo.
Beaume e Valery (2007) relatam o processo de indexação voluntária dos
registros de nascimento digitalizados no arquivo da região de L’Ain, na França. Foi
proposto aos usuários, em sua maioria pesquisadores de genealogia, participar de
maneira voluntária da indexação das imagens digitalizadas do acervo por meio do
sistema de gestão de documentos eletrônicos desenvolvido para pesquisa e acesso
aos documentos digitais. Os usuários, na sala de consulta, acessam as imagens
digitalizadas das atas e, se desejarem, podem preencher o formulário abaixo da
imagem, com nome, sobrenome, nome do pai, da mãe, parentes, etc. das pessoas
identificadas por eles nos registros de nascimento.
O projeto inicial ficou em fase de testes pelo período de dois anos, até que os
pesquisadores (usuários) se acostumassem com a proposta. Estes se mostraram
pouco receptivos e iniciaram um movimento de recusa e boicote ao projeto de
indexação voluntária. O motivo apontado pelos autores foi a insatisfação desses
usuários (genealogistas), com os registros digitalizados, pois preferem consultar os
documentos originais. Os genealogistas consideram a indexação dos registros um
inimigo dos índices nominais por eles produzidos. Parece haver aqui uma clara
manifestação de competição entre arquivistas e genealogistas.
A partir de 2004, o projeto abriu para a participação de outros usuários além
dos genealogistas, de modo a ampliar as possibilidades de contar com quantidade
maior de indexadores voluntários. Essas medidas resultaram em um expressivo
volume de imagens indexadas. Em 2007, o site do arquivo foi aberto na internet,
sendo adotadas novas medidas para a continuidade do projeto.
144
No caso acima relatado, há um processo de indexação colaborativa
controlada pelo arquivo. As imagens indexadas são conferidas e os termos de
indexação atribuídos passam pela validação de um profissional especializado para
melhorar a qualidade do tratamento. Somente a indexação validada é disponibilizada
para consulta. Através do site, os usuários que aceitam ser indexadores voluntários
têm um material que esclarece o processo de indexação. Os indexadores voluntários
são registrados e são elaborados perfis que listam os material indexado e o volume
de atas indexadas. Os voluntários passam por um teste de paleografia de
identificação de vilas, comunas, lugares geográficos, em atas do século XVII, XVIII e
XIX.
Os resultados do projeto, que conta com cerca de 120 indexadores
voluntários, que indexaram cerca de 10% do acervo de imagens, são considerados
positivos.
Yatel e Torres (2007) relatam a experiência do arquivo de Virgin Islanders na
criação, identificação e o estabelecimento de relações entre os documentos
pertencentes a um grupo. Expõem o caso de uma comunidade de genealogistas que
são os usuários mais frequentes dos arquivos. Na internet, as pesquisas de histórias
de famílias ou genealógicas crescem exponencialmente em arquivos e bibliotecas.
Segundo os autores, esses pesquisadores, além de pesquisarem sobre as
famílias, buscam informações sobre costumes e hábitos de grupos. Os
genealogistas, para estudar e traçar o perfil de famílias e comunidades, identificam
e estudam os documentos produzidos por esses grupos, as características desses
documentos, o que eles possuem de informações ou mesmo os tipos de registros
de informação, de acordo com cada tipo de comunidade. A partir disso, os
genealogistas conseguem traçar e definir um grupo e identificar as relações e os
laços familiares.
Como pesquisadores, eles constroem significados sobre os registros por meio
da interação com os contextos das famílias pesquisadas. Essas características de
grupos de documentos identificadas pelos genealogistas auxiliam os arquivos a
compreenderem os grupos de documentos e o que eles podem refletir sobre
determinado grupo de pessoas.
Segundo Yatel e Torres (2007), os genealogistas, no trabalho com os
documentos de arquivos, ressaltam a importância da busca de significados nos
registros arquivísticos, extrapolando, assim, os limites da forma documental
145
enquanto fonte. Isto é, ligam tipologias e conteúdos de documentos a características
e comportamentos de grupos. Yatel e Torres (2007) usam o termo “Community of
Records” para designar o trabalho dos genealogistas, a forma como eles pesquisam
interagem com os documentos, com as famílias e com outros genealogistas na
busca de significados contidos nos documentos.
O trabalho de Santos Neto e Cordeiro (2015) relata a análise dos cinejornais
que fazem parte do fundo arquivístico da Agência Nacional, que integra o acervo do
Arquivo Nacional. São documentos audiovisuais num total de 35 jornais
cinematográficos, das décadas de 1960 e 1970.
Segundo os autores, o “cinejornal faz parte do gênero audiovisual, possuindo
características próprias em relação a outros tipos de imagens em movimento e
gêneros cinematográficos. (...) os cinejornais possuem atributos singulares.” (p.55).
Os autores ressaltam que a fragmentação dos temas e assuntos nos cinejornais é
um desafio para o tratamento arquivístico. No trabalho relatado foram definidas as
categorias que caracterizam o material: estrutura, conteúdo, responsabilidade para
fazer o tratamento, tanto quanto uma política de indexação. Os autores destacam
que, no caso desse tipo de material de uma agência governamental, a
representação arquivística da informação exige do profissional um conhecimento da
história do governo. Os autores destacam que a informação descrita deve ser de
qualidade para que possa atender a uma multiplicidade de usuários. “O analista de
filmes deve procurar, portanto, ser o mais fiel possível ao que as imagens e sons
“dizem” e não o que queriam “dizer” (p.60).
Os dois trabalhos de Yeo, de 2007 e 2008, publicados na The American
Archivist, são estudos teóricos que discutem a definição do termo “records”, que
traduziu-se como documento, para a arquivística, a partir da visão de vários autores
da área. Inicialmente, o autor destaca a dificuldade em estabelecer definições para
termos chave de uma área em razão das diferentes argumentações, visões e
contextos sociais considerados.
O primeiro artigo analisa as declarações sobre a natureza do “records” feitas
por indivíduos e grupos profissionais da arquivística. O artigo mostra as diferentes
ênfases sobre o termo. As categorias utilizadas na análise, pelo autor, são
evidência, informação, “records” como documento de produtores ou de atividades e
a abordagem alternativa, que interessa para os estudos da indexação: a abordagem
do “records” como representação persistente.
146
Segundo Yeo (2007), a representação persistente possui capacidade de ir
além das circunstâncias imediatas que levaram à sua criação. Persistência não
implica sobrevivência sem limites de tempo. Os registros documentais podem durar
para sempre ou podem ser destruídos por decisões tomadas. Nos documentos
persistentes, porém, as decisões perduram além do fim temporal das atividades que
eles representam. Sua durabilidade permite ser compartilhado.
O autor conclui que os documentos contemporâneos, sejam eles audiovisuais
ou textuais, registros em base de dados ou objetos tridimensionais, podem
incorporar a noção de representação persistente de atividades. De fato, o que
caracteriza a comunidade arquivística hoje é a ideia que diferentes documentos
necessitam de diferentes abordagens de análise e que essa multiplicidade pode ser
positiva. O segundo artigo de Yeo (2008) aprofunda o conceito de representação
persistente.
4.2.3 Críticas à indexação
Muitos são os autores que afirmam que a indexação de documentos de
arquivos é um trabalho complexo, difícil de ser realizado. Conforme destacam
Santos Neto e Cordeiro (2015, p.61), “Entendemos que trabalhar com os jornais
cinematográficos, com enfoque na representação arquivística da informação, é uma
tarefa desafiadora e complexa.”.
A complexidade depende do tipo de documento. Como observam Santos
Neto e Cordeiro (2015), é necessário realizar estudos detalhados sobre a tipologia
documental para certificar-se das suas características, composição, estrutura, dados
históricos e intencionais de criação, o produtor/criador, costumes de época, entre
outros aspectos.
Beume e Vesson (2007) argumentam que, além da complexidade do
processo, não há, muitas vezes um padrão ou norma especifica sobre certos tipos
de documentos, sendo necessário um estudo prévio de definição de métodos
específicos para os diferentes tipos de acervos, tipos de instituições e seus usuários.
Apontam ainda a necessidade de criar mecanismos de controle de qualidade dos
produtos da indexação. Para esse controle é necessário dispor de pessoal
especializado e de políticas específicas, aspectos que podem tornar o processo
lento e dispendioso.
147
Outro ponto destacado por Beume e Vesson (2007) refere-se às dificuldades
para conhecer as necessidades dos usuários em relação à documentação. Nessa
medida, a indexação pode não corresponder às expectativas dos usuários ou aos
seus hábitos de uso dos documentos. No caso específico do arquivo de L’Ain, os
principais usuários eram os genealogistas que têm preferência por consultar o
documento físico e não o digital.
Já o artigo de Yatel e Torres (2007) que observou essa mesma categoria de
usuários, já aponta a necessidade de tratamento de conteúdo dos documentos,
porque a pesquisa por registros familiares, na internet , vem se tornando uma prática
constante.
Vale aqui uma observação quanto ao contexto dos dois casos, citados:
Beume e Vesson (2007) fazem referência a um arquivo francês que utiliza práticas
arquivísticas tradicionais, enquanto Yatel e Torres (2007) tratam do contexo das
Virgin Islanders, cuja história arquivística é contemporânea, tendo, ainda, usuários
com características diferentes.
Um ponto crítico salientado por Beume e Vesson (2007) diz respeito aos
equipamentos de tecnologia da informação e aos sistemas disponíveis para a
atividade arquivística. A capacidade de armazenamento dos atuais sistemas de
recuperação não foi acompanhada pela criação de programas específicos para
gerenciar a indexação com segurança e agilidade. As tecnologias da informação são
importantes para viabilizar o trabalho dos indexadores voluntários, porque podem
utilizar a rede internet. O não funcionamento adequado da infraestrutura tecnológica
pode dificultar o trabalho desses colaboradores. As críticas aos equipamentos
informatizados poderiam proceder em 2007, mas, passados quase 10 anos, a
realidade das tecnologias disponíveis é hoje certamente outra.
Com efeito, há atualmente disponível uma grande variedade de equipamentos
e softwares que pode atender a todo tipo de arquivo. Cresceu também a oferta de
sistemas voltados especificamente para a realidade dos arquivos.
Para concluir, os casos relatados por Paterson (2001), Beaume e Valery,
Santos Neto e Cordeiro (2015) mostram que a indexação está sendo empregada
nos arquivos para explorar os conteúdos dos documentos para além da forma, e
utilizar os produtos da indexação como meios para auxiliar os pesquisadores a
reconstruir a história de pessoas esquecidas pelo anonimato, pela escravidão, por
148
regimes políticos, prisioneiros de guerra, imigrantes e outras categorias de cidadãos
anônimos.
Os processos de identificação de registros como conjuntos documentais,
seguindo os padrões de descrição adotados mundialmente atendem a uma
demanda de acesso a conjuntos documentais. No entanto, a possibilidade de ligar
documentos existentes em diferentes conjuntos documentais fica comprometida.
Podemos perceber que o acesso aos documentos de arquivo, segundo
características específicas, requer maior aprofundamento para promover maior
possibilidade de uso e exploração por diferentes tipos de usuários. O tratamento por
fundo arquivístico e conjunto documental, em oposição ao tratamento de item
documental, pode esconder traços de informação relevantes dos documentos.
A oposição à indexação de itens documentais, racionalmente justificada pela
grande quantidade de material a ser tratado, falta de pessoal especializado, falta de
ferramentas adequadas, pode ser contestada principalmente pela disponibilidade de
recursos digitais. A digitalização de documentos amplia o acesso aos documentos
que podem ser compartilhados por pesquisadores e arquivos e possibilitar a
discussão sobre o conteúdo dos mesmos. Os sistemas de recuperação da
informação que facilitam a busca e o cruzamento de informações tornam-se aliados
tanto de arquivistas, que podem trabalhar esses documentos no processamento
técnico, quanto dos usuários pesquisadores.
O que se pôde observar da análise da literatura é que o tema é ainda tratado
de forma incipiente, com poucas pesquisas e sempre destacando a necessidade de
maiores estudos a ele relativos.
Os trabalhos de Yatel e Torres (2007) e Yeo (2007 e 2008) apontam um
caminho de pesquisas para explorar o documento para além da forma, tanto para
definir modelos e formatos de documentos, que representam grupos e culturas de
usuários, como para explorar novas concepções para abordar o documento de
arquivo na sua complexidade. A indexação nos arquivos, apesar de pouco frequente
na literatura analisada, é um desafio a ser explorado por profissionais da área.
Conforme enfatizam Santos Neto e Cordeiro:
A representação da informação é que poderá garantir a sua disseminação e
utilização. Daí é fundamental o trabalho de descrição e indexação dos
documentos arquivísticos, independentemente do gênero, com foco no
149
contexto de produção, no perfil dos documentos e na demanda dos
usuários. (SANTOS NETO, CORDEIRO, 2015, p.53).
4.3 CATEGORIA DESCRIÇÃO ARQUIVÍSTICA E NORMALIZAÇÃO
Para análise da categoria descrição arquivística, os artigos foram separados
em cinco subcategorias.
A primeira subcategoria é formada por trabalhos em que a temática principal é
a definição do termo descrição arquivística.
A segunda subcategorias é composta por trabalhos que abordam a descrição
e os princípios arquivísticos.
A terceira subcategoria é composta por trabalhos que mostram a função da
descrição arquivística para além dos aspectos de acesso aos conteúdos descritos.
A quarta subcategoria é composta de trabalhos sobre a normalização da
descrição arquivística. Foram agrupados, aqui também, os trabalhos sobre a
temática da normalização em geral nos arquivos, apesar desse tópico aparecer no
Glossário do SAA como uma categoria separada.
A análise desses trabalhos em conjunto de deu porque seu conteúdo está
intimamente ligado à normalização da descrição e representação dos documentos
de arquivo, seja em meio físico ou digital.
O quinto grupo é constituído de casos sobre o uso da descrição arquivística e
sobre as normas de descrição.
Uma análise geral sobre as publicações mostra que existe a predominância,
em um número especial da Revista Acervo, do Arquivo Nacional do Brasil, de 2007,
dedicada especificamente ao tema e a edição de 2012, da Gazette des Archives
sobre o tema Normalização e Gestão de documentos, e também sobre a
normalização da descrição arquivística.
Outro grupo de artigos concentra-se, entre 2012 e 2013, na abordagem da
principal norma de descrição, ISAD (G), cuja primeira edição é de 1994 e a segunda,
de 1999. De acordo com a amostra do corpus, pode-se inferir que os arquivos
passam por um período de adaptação entre a publicação da norma e sua adoção
efetiva.
O conteúdo característico dos trabalhos, tanto no grupo de publicações de
2007, quanto de 2012, 2013, é dedicado ao resgate histórico da publicação da
150
norma, sua origem e discussões sobre o conteúdo e as circunstâncias de sua
publicação. Os escritos de 2007 são de divulgação dos objetivos da norma. Os
trabalhos de 2012 em diante são de avaliação do uso da norma e as perspectivas
futuras.
Na amostra, são poucos os relatos sobre a aplicação efetiva da norma na
descrição arquivística. Vale esclarecer que a pouca expressividade de trabalhos
sobre estudos de casos pode ser atribuída ao fato de serem periódicos em que
predominam as abordagens teóricas. Esses relatos de aplicação da norma podem
ser mais expressivos se coletados em fontes como os anais de eventos científicos.
Para detalhar melhor a observação do conteúdo, procedeu-se à separação seguinte.
O termo descrição arquivística é definido no Glossário do AAS (2005) como
um processo de análise, organização e registro dos elementos formais de um
documento ou coleção de documentos, tais como criador, título, data, dimensões e
conteúdo. Podemos entender que a descrição tem o objetivo de facilitar o trabalho
de identificação, gestão e compreensão do documento.
Figura 5 – Termo Archival description
Fonte: Reproduzito de “A Glossary of Archival and Records Terminology” (2005, p. 25).
Os termos relacionados à descrição arquivística abordam os modelos de
descrição, regras, padrões com EAD, manuais de descrição, notas de conteúdo,
notas de escopo. Observa-se que o processo de descrição vem ao longo do tempo
sendo normalizado, tanto em nível nacional quanto internacional. Envolve um
conjunto complexo de procedimentos com várias determinantes e tem como base de
estruturação os princípios arquivísticos, principalmente de respeito aos fundos e à
ordem original (ISO, 2000).
A seguir, foi analisado o conteúdo da amostra referente à descrição
arquivística e à normalização. Os trabalhos foram agrupados da seguinte forma:
a) descrição arquivística – definição;
b) descrição arquivística – princípios arquivísticos;
c) descrição arquivística – função;
archival description, n. ~ 1. The process of analyzing, organizing, and recording details about the formal elements of a record or collection of records, such as creator, title, dates, extent, and contents, to facilitate the work’s identification, management, and understanding. – 2. The product of such a process. DF: bibliographic description BT: description RT: administrative history, biographical note, Encoded Archival Description, Manual of Archival Description, Rules for Archival Description, scope and contents note, series descriptive system
151
d) descrição arquivística e normalização;
e) descrição arquivística e normas – casos de aplicação.
4.3.1 Descrição arquivística - definição
Os trabalhos analisados para o estudo da descrição arquivística foram
descritos na Quadro 5.
Quadro 5 – Artigos sobre “Descrição arquivística – definição”, em periódicos nacionais e internacionais (2002-2007)
Autor Titulo Periódico Ano
1 Margaret Hedstrom Archives, Memory, and Interfaces with the Past
Archival Science 2002
2 Wendy M. Duff; Verne Harris
Stories and Names: Archival Description as Narrating Records and Constructing Meanings
Archival Science 2002
3 Elizabeth Yakel Archival Representation Archival Science 2003
4 Michel Cook Desenvolvimento na descrição arquivística: algumas sugestões para o futuro
Acervo 2007
5 Maria Jose Santos Representação da informação em arquivos
Acervo 2007
Fonte: Elaborado pela autora com base na amostra selecionada de artigos
A definição de descrição arquivística nos trabalhos da amostra cita a definição
da norma ISAD (G). Nessa norma, o fito da descrição é identificar e explicar o
contexto e o conteúdo dos documentos de arquivo, e garantir o acesso.
Esse objetivo é alcançado por meio da criação de representações precisas e
pertinentes, organizadas em conformidade com um modelo pré-estabelecido. Esses
procedimentos relacionados à descrição permitem que se obtenham os controles
intelectuais necessários para assegurar uma descrição fiel, compreensível e
utilizável do documento ou do conjunto de documento (ISO, 2000).
Hedstrom (2002) estuda o conceito de “interface” na descrição arquivística.
Criar interfaces é um dos objetivos da descrição. As ferramentas de busca, que
contêm o produto da descrição arquivística, são instrumentos de interface entre o
usuário e o acervo documental. A autora explora o uso da interface como um meio
pelo qual os arquivistas permitem interpretação do passado, como também podem
dificultar a interpretação do passado.
Ela considera a interface um meio de externalização da descrição arquivística,
que opera como uma fronteira que permite a passagem de pessoas, informações e
152
ideias de um espaço a outro. As interfaces de um site de arquivo são o local onde
ocorre o poder de negociação entre arquivista e usuário. Para os arquivistas, esse
poder é exercido conscientemente e inconscientemente por meio dos documentos e
suas representações. Hedstrom (2002) destaca que os arquivistas exercem esse
poder sobre as pessoas, a coletividade e o passado, por meio da avaliação, da
descrição e da construção de interfaces.
A analogia da descrição com as interfaces dos sistemas de arquivo chama a
atenção para a importância da descrição como instrumento para construir pontes de
acesso entre o usuário e a informação sobre os documentos, sendo ainda uma
ferramenta de acesso à memória e ao passado. A descrição é um meio para
construir interfaces de acesso.
O trabalho de Yakel (2003) aborda o conceito de representação e sua relação
com a descrição. A representação é definida como um processo ou atividade de
representar e objeto reproduzido por uma instância na sua atividade. O processo de
representação busca estabelecer uma sistemática correspondência entre a etiqueta
de um domínio e o modelo de domínio, por meio da captura de um objeto, um dado,
uma informação daquele domínio.
A representação arquivística refere-se ao processo de organização
(respeitando ou desrespeitando uma ordem) e descrição. Resulta dessa atividade a
criação de ferramentas que contêm as representações, que são guias, inventários,
registros bibliográficos ou sistemas (catálogos online, bases de dados bibliográficas,
registros bibliográficos) para acesso.
Combinando o conceito de representação e representação arquivística, Yakel
(2003) aponta que esta é o trabalho realizado para (re)ordenar, interpretar e
(re)apresentar, criando, assim, substitutos e desenhando arquiteturas para um
sistema representacional que contém os substitutos do material arquivístico
concreto.
A autora destaca que a representação arquivística, assim como qualquer
representação, nunca será igual ou fiel ao objeto representado, por ser uma
reconstrução ou um “re-present” ou uma forma de re-apresentá-lo.
O trabalho de Duff e Harris (2002) explora a descrição arquivística como um
campo do pensamento e da prática arquivísticas. Os autores destacam que a
descrição arquivística foi o marco de criação da arquivística contemporânea e cita o
153
exemplo do Manual dos Holandeses, Manual of the Duth, de 1898, de Muller, Feith e
Fruin, que foi inteiramente devotado ao arranjo e à descrição.
Para muitos, essa obra é o marco do trabalho propriamente arquivístico, que
continua influenciando o trabalho de arranjo e descrição. Na busca por uma resposta
sobre o que é a descrição arquivística, os autores afirmam que existe um limite
pesado e instável entre o texto e o contexto. O papel do arquivista em relação ao
documento é revelar seus sentidos e significados – não para participar da
construção destes – através do exercício do controle intelectual.
A construção dos significados fica a cargo de quem interpreta o documento,
acessado por meio da descrição. A intervenção do arquivista no arranjo e descrição
está, ao mesmo tempo, isolada da criação do registro e dos processos sociais
geradores relacionados ao documento. O arquivista que aspira ao papel de
profissional imparcial pode ser um promotor das relações de poder. Assim, os
autores demonstram que a descrição arquivística não é somente uma atividade
imparcial de representação de conteúdo de um documento, mas a demonstração de
uma relação de poder do arquivista por meio da execução do processo de organizar
e descrever os documentos de um arquivo.
No trabalho de Cook (2007), sobre os rumos das pesquisas da área de
descrição arquivística coletadas em um seminário arquivos e records management,
discute-se a semelhança entre a crítica textual e a descrição arquivística, pontuando
que “tanto a crítica textual quanto a descrição arquivística estão preocupadas em
estabelecer a autenticidade do material que é seu objeto”. (p. 126). Para o autor, os
arquivistas estabelecem a autenticidade dos documentos por meio da análise e
descrição do contexto no qual ocorreram a produção e a transmissão do documento.
Nessa definição pode-se ver acrescentado à descrição arquivística o papel de
reconhecer a autenticidade do documento de arquivo. Percebe-se, assim, a ligação
da gestão de documento na abordagem da descrição arquivística.
Santos (2007), numa tentativa de aproximar a biblioteconomia e a arquivística
pelo viés da representação, aborda a representação descritiva como a
caracterização do item, qualquer que seja o suporte, tal como um livro ou outro tipo
de documento.
Em suma, na análise da definição de descrição arquivística é possível
constatar que os autores abordam o tema sob diferentes perspectivas:
154
a) a descrição como interface, uma ponte, entre a informação do documento e o
usuário (HERDSTROM, 2002);
b) a análise e descrição como instrumento revelador de sentidos e significados
(DUFF E HARRIS, 2002);
c) o arranjo e a descrição como uma re-apresentação do objeto (YAKEL, 2003);
d) a análise e a descrição como meios de estabelecer a autenticidade dos
documentos (COOK, 2007);
e) a representação descritiva como a caracterização de um item documental
(SANTOS, 2007).
Pode-se entender que a descrição de documentos arquivísticos é um
processo que comporta a construção de interfaces de representações dos
documentos e que estas possibilitam ao usuário a formação de significados e
sentidos e de compreensão do que são aqueles.
Nas definições dos autores também foi possível a percepção da ênfase dada
ao papel do arquivista. A descrição de documentos é vista como um exercício de
perpetuação de poder, tendo em vista que é ele quem escolhe ou decide os
elementos de representação (HEDSTROM, 2002; DUFF e HARRIS, 2002).
Conforme destacam Duff e Harris (2002), a imparcialidade é um elemento difícil de
existir neste processo.
Ainda pôde-se observar que o termo descrição aparece associado a outros
termos: “análise e descrição”, “arranjo e descrição” e “descrição e representação”,
que foram entendidos como atividades associadas à descrição; desse modo, variam
as abordagens em função dos objetivos da descrição feita no arquivo.
A descrição, para ser feita, pode ser precedida da análise física e de conteúdo
do documento. Seu objetivo é definir o arranjo de um acervo, sendo que é uma
representação do documento.
Na norma de descrição arquivística ISAD (G), o termo “descrição de
documentos de arquivísticos” não apresenta observações quanto às variações de
tratamento do termo. Também nos artigos analisados não se encontrou a
abordagem dessas questões, o que demonstra a necessidade de um estudo mais
aprofundado sobre o tema.
155
4.3.2 Descrição arquivística – princípios arquivísticos
Os trabalhos selecionados do corpus abordam a descrição arquivística e os
princípios de organização dos documentos.
Quadro 6 – Artigos sobre ‘Descrição arquivística e os princípios arquivísticos”, em periódicos
nacionais e internacionais (2002-2013)
AUTOR TÌTULO PERIÓDICO ANO
1 Laura Millar The Death of the Fonds and the Resurrection of Provenance: Archival Context in Space and Time
Archivaria
2002
2 Peter Horsman; Eric Ketelaar; Theo Thomassen
New Respect for the Old Order: The Context of the Dutch Manual
The American Archivist
2003
3 James Currall, Michael Moss, Susan Stuart
What is a collection? Archivaria 2004
4 Adrian Cunningham O Poder da Proveniência na Descrição Arquivística. Uma perspectiva sobre o desenvolvimento da segunda edição da ISAAR(CPF)
Acervo 2007
5 Jennifer Meehan Rethinking Original Order and Personal Records
Archivaria 2010
6 Geoffrey Yeo The Conceptual Fonds and the Physical Collection
Archivaria 2012
7 Gretchem Gueguen; Vitor Fonseca; Daniel Vitti; Claire Sibille de Grimouard
Para um modelo conceitual internacional de descrição arquivística
Acervo 2013
Fonte: Elaborado pela autora da pesquisa com base na amostra de artigos selecionados
Millar (2002) aponta os problemas decorrentes da abordagem dos
documentos digitais segundo o princípio de fundo arquivístico que, de acordo com a
interpretação dada no Canadá, contida no relatório do Canadian Archives da década
de 1980, adverte que os documentos originários de uma mesma fonte devem ser
mantidos juntos e não interagir com registros de outras fontes.
Assim, o contexto dos arquivos é mantido intacto para enfrentar sua
dispersão. No passado, muitos arquivos públicos, privados, de instituições em geral,
foram recolhidos sem observar as estruturas administrativas de origem. Na falta de
instruções específicas de arranjo e descrição, os arquivistas identificavam as
múltiplas aquisições em classes, grupos de documentos ou de manuscritos,
classificando-os por assunto, data e forma.
156
Nesse modelo de organização foi dada pouca atenção para o contexto
administrativo do documento. Para combater essa abordagem de organização
orientada por assuntos, o Working Group on Archival Descriptive Standards, 1985,
reiterou a importância do princípio da proveniência como a base da organização e
arranjo em fundos arquivísticos. A proveniência como base para o recolhimento foi
adotada como prática na publicação dos RAD – Rules for Archival Description, de
1984. Segundo o princípio de respeito aos fundos, os documentos de um
determinado criador, quando recolhidos ao arquivo de guarda, devem ser mantidos
juntos, de acordo com a ordem dada pelo criador, como uma unidade orgânica,
sendo ela definida pela proveniência, ou seja, de onde o documento veio. O respeito
aos fundos respeita o criador e seus enquadramentos. Por isso, a autora defende
que, na descrição arquivística, deve ser dada atenção à descrição do histórico do
criador, do documento, do porquê o documento foi preservado como um documento
de arquivo.
Na visão de Millar (2002), tratar os documentos digitais de acordo com os
fundos não é adequado, pois eles ignoram a realidade dos documentos no tempo e
no espaço, uma vez que os fundos são definidos com base na estrutura da unidade
ou outras variações e não no histórico de criação do produtor e do documento e da
sua preservação, como acontece na organização que adota a proveniência como
modelo.
O trabalho de Horsman, Ketelaar e Thomassen (2003) tece críticas ao Manual
dos Holandeses como obra fundamental para a definição dos princípios modernos
de descrição arquivística, principalmente no que se refere à definição de fundo
arquivístico. Os autores fazem um estudo detalhado da história da publicação e suas
abordagens quanto ao arranjo e descrição. Concluem que os princípios de arranjo e
descrição descritos no manual, na realidade, não têm início como os autores
holandeses do manual, mas com o histórico de centenas de anos da organização de
documentos, graças ao histórico dos holandeses, que acumularam experiências
administrativas de regimes antigos na organização de seu patrimônio histórico e da
aplicação da diplomática no desenvolvimento de métodos de organizar e descrever.
Conforme os autores, quando, na Holanda, o império se dividiu, de 1795 a
1813, os arquivos foram mantidos intactos e organizados, sendo fácil aplicar o
princípio de respeito à ordem original. Porém, os autores afirmam que o conceito de
orgânico parece não ter nascido com os holandeses, mas ter sido introduzido nos
157
arquivos com a adoção do conceito de classificação nos arquivos, que os autores
atribuem a NijHoff e Darwin e John Stuart Mill.
Os autores concluem também que os conceitos de orgânico e classificação
são pouco abordados na descrição arquivística; na realidade, são adotados em
modelos de organização e classificação que a precedem.
Portanto, é possível entender que a obra principal, à qual se credita a
fundamentação da descrição arquivística moderna, na realidade, não é de fato
precursora na definição dos parâmetros desta, mas foi reconhecidamente a
divulgadora dos elementos que são hoje por ela utilizados, em todo o mundo.
Cunningham (2007) analisa o princípio da proveniência como base para a
criação da norma ISAAR (CPF). Destaca que um dos principais objetivos da
proveniência é comprovar a origem institucional ou pessoal do documento e, assim,
dar um contexto a ele, sendo o que comprova a sua ligação com a ação retratada.
A descrição arquivística dá evidência à proveniência do documento por meio
da identificação do produtor, das instituições de ligação do documento e outros
elementos, isto é, a descrição liga o documento a uma origem. O que o autor afirma
é que essa identificação da entidade de proveniência não é tão simples de ser
assegurada nos tempos atuais. As mudanças erráticas de nomes, contextos de
atuação, função das instituições e pessoas tornam os registros de entidades difíceis
e complexos.
A produção de documentos no mundo digital pode refletir uma complicada
rede de colaboração, dependendo da organização. O modo de trabalho colaborativo
e em rede dificulta a definição de origem do documento, versões, pessoas
responsáveis, autoras, usuárias. Identificar a proveniência tal como estabeleceu o
Manual dos Holandeses, no contexto atual, pode não ser fácil.
O autor relata o caso da Austrália, um país jovem, de cultura administrativa
peculiar em função de sua origem ligada ao Reino Unido. O autor mostra, no caso
australiano, como vem sendo tratada a identificação da proveniência na descrição
arquivística. Para se adequar, abandona-se a noção de fundo baseado na estrutura
e passa-se a usar o conceito de série baseado nas funções, como forma de debelar
as múltiplas relações de proveniências que o documento pode ter, fato que
impossibilitava a definição de um único fundo a que ele pertencia.
Cabe assim utilizar a descrição arquivística como forma de mostrar a
realidade dinâmica da proveniência. Os australianos dedicam-se, na descrição
158
arquivística, a fazer o controle de contexto, registrando as entidades produtoras e
suas relações com outras entidades e o controle dos documentos, identificando os
documentos da série e itens que o compõem.
A norma ISAAR é a norma que auxilia o processo de descrição de entidades
produtoras para que ela seja efetivada de acordo com o princípio da proveniência.
Segundo Cunninghan (2007), o objetivo da norma é “identificar
especificamente a entidade descritiva e definir um ponto de acesso normalizado
para referências relacionadas, a informação biográfica, familiar e histórico-
administrativa” (p.87).
Meehan (2010) estuda o princípio da ordem original de classificação e
descrição de documentos pessoais. Segundo a autora, o referido princípio não é
levado em conta na tradição arquivística. Nos arquivos pessoais, os processos de
acumulação nem sempre são conhecidos ou seguem um princípio de criação e, ao
longo do tempo, passam por muitas variações.
Os arquivistas, para trabalhar com esses acervos, tentam reconstruir a ordem
original com base em fragmentos de informação, ou quando não conseguem
reconstruir, criam uma nova ordem. Meehan (2010) propõe a definição de uma
ordem original para os arquivos pessoais que leve em conta a situação dos
documentos utilizando os termos, as palavras e expressões empregadas pelo seu
dono, e não modelos preestabelecidos de fora. Assim, será possível construir
elementos que possam ajudar o arquivista a se aproximar da ordem original. Propõe
que o processo de análise seja multidimensional e não somente o processo
tradicional, do geral para o específico.
No trabalho de Yeo (2012) os conceitos de coleção e fundo estão atrelados à
descrição arquivística. Trata-se da continuidade da discussão iniciada há 10 anos,
antes com Millar (2002) e depois com Curral, Moss e Stuart (2004); Yeo cita esses
autores como motivadores de sua pesquisa.
Mas, enquanto esses trabalhos anteriores abordam a definição de coleção
para analisar a possibilidade desse modelo se adaptar ou não ao arranjo e descrição
dos documentos digitais, em detrimento do modelo de fundo, Yeo (2012) propõe
discutir os dois conceitos mostrando os pontos fortes e fracos dos conceitos de
coleção e fundo, sem dar preferência a nenhum, concluindo que ambos não são
completamente adequados enquanto modelos de organização, mas se moldam à
realidade dos arquivos em diferentes contextos.
159
Yeo (2012) trata do conceito de fundo e coleção por meio de abordagem
comparativa entre as coleções artificiais e os fundos orgânicos. Ele concorda que
essa não é uma comparação adequada, pois, na realidade, deve ser feita levando
em conta que o fundo de arquivo é uma organização intelectual, enquanto a coleção
é uma organização física ou material. Porém, em ambos, é possível perceber o
caráter subjetivo e superficial da organização. O autor não exclui nem um dos dois
modelos de organização. Parecem ser a forma de organização que aceita maior
diversidade, sendo por isso mais fácil de ser assimilada e compreendida.
O mundo digital amplia as possibilidades de formação de coleções, onde o
compartilhamento, a transferência e a cópia tornam prática sua criação e
gerenciamento. Apesar de todo o desenvolvimento das tecnologias digitais, os
arquivistas têm preferência pelo modelo de fundo, pois permite encontrar
documentos autênticos e confiáveis, assegurados pela procedência.
Gueguen, et al (2012) fazem parte do Grupo de Especialistas em Descrição
Arquivística (GEDA), criado em 2012, para desenvolver um modelo conceitual de
descrição arquivística que integre as quatro normas existentes da CIA.
Esse modelo deve estar em consonância com as tecnologias de comunicação
presentes em todas as organizações, com possibilidades de trabalho cooperativo.
Será utilizado para as futuras revisões das normas. Os trabalhos indicam que a
adoção de qualquer modelo para a descrição arquivística deve estar em
consonância com os princípios arquivísticos, que são a base para construção e
revisão das normas.
As diretrizes do GEDA reforçam a necessidade de estudos que abordem os
princípios na descrição arquivística, conforme pode ser constatado nos relatos
analisados anteriormente.
Em síntese, o ponto em comum neste conjunto de trabalhos é que os autores
são unânimes em apontar a necessidade de retomar os estudos e as discussões
dos princípios arquivísticos. Assuntos como avaliação e documentos digitais vêm
sendo preferidos nas pesquisas arquivísticas.
Porém, há muito a ser explorado nos estudos sobre os princípios da
arquivística, para resolver seus problemas atuais.
Os principais motivos para uma retomada dos estudos nessa área são os
arquivos da era digital, que requerem novas abordagens (MILLAR, 2002; CURRALL,
MOSS, STURAT, 2004, YEO, 2012).
160
Esses modelos também são questionados em decorrência das mudanças nos
modos de trabalho e de organização da sociedade, seja pelas mudanças
provocadas pelos novos arranjos administrativos (CUNNIGHAM, 2007) ou por conta
das modificações nas formas de criar os documentos e os arquivos pessoais
(MEEHAN, 2010).
Em síntese, observam-se, portanto, duas correntes.
a) uma onde a ampla maioria que referenda os princípios arquivísticos para a
formulação das bases da descrição arquivística contemporânea (CURRALL, MOSS,
STURAT, 2004; CUNNIGHAM, 2007; MEEHAN, 2010; YEO, 2012; GUEGUEN, et
al.,2012) e ;
b) outra que critica os princípios, por não serem considerados suficientes para
resolver os problemas de descrição nos arquivos contemporâneos (MILLAR, 2002;
CURRALL, MOSS, STURAT, 2004).
4.3.3 Descrição arquivística – função
Nesta categoria de análise foram agrupados os trabalhos que entendem o
processo de descrição arquivística com uma finalidade específica, para além da
função de representação e de acesso aos conteúdos de documentos.
Quadro 7 – Artigos sobre “ Descrição e suas aplicações” em periódicos internacionais. (2005 –
2015).
AUTOR TITULO PERIÓDICO ANO
1 Heather MacNeil Picking Our Text: Archival Description, Authenticity, and the Archivist as Editor
The American Archivist
2005
2 Laura Millar An Obligation of Trust: Speculations on Accountability and Description
The American Archivist
2006
3 Jennifer Meehan Making the Leap from Parts to Whole: Evidence and Inference in Archival Arrangement and Description
The American Archivist
2009
4 Heather Macneil Archivalterity: Rethinking Original Order
Archivaria 2008
5 Sara White Crippling the archives: negotiation notions of disability in appraisal and arrangement and description
The American Archivist 2012
6 Stacy Wood et al Mobilizing records: re-framing archival description to support human rights
Archival Science 2015
Fonte: Elaborado pela autora da pesquisa com base nos artigos selecionados da amostra
161
Muitas são as funções, objetivos e atribuições da descrição arquivística, como
se viu pelo estudo do conceito. A descrição pode ser uma representação de um
documento, objeto, ou informação, ser a ponte entre o usuário e contexto de criação
do documento.
Duff, Wendy e Haworth, Kent (1997) apresentam um estudo sobre os
propósitos a serem seguidos na elaboração de normas de descrição arquivística nos
arquivos do Canadá e Estados Unidos: fornecer o acesso a materiais de arquivo por
meio da descrição, que recupere no mínimo a proveniência dos documentos;
promover a compreensão de tais documentos, seus contextos, estrutura e conteúdo;
estabelecer os motivos para presumir que os registros são documentos, que seja
possível saber os motivos da sua preservação, do seu arranjo e as circunstâncias da
sua criação.
Dessa maneira, o produto da descrição arquivística (catálogos de acesso,
inventários, registros de documentos) auxilia o usuário a encontrar o documento
para diferentes finalidades, sendo possível observar que a descrição arquivística
pode ampliá-las. Os trabalhos desse grupo destacam abordagens que exploram a
aplicação da descrição arquivística.
MacNeil, H (2005, 2008) tem dois trabalhos que abordam o mesmo tema: a
descrição arquivística e a autenticidade. A publicação de 2005 relata o estudo da
relação da descrição arquivística com a crítica textual como meio para estabelecer a
autenticidade e a certificação de origem. No caso da crítica textual, a função é
descobrir a real intenção do autor do texto. No caso da descrição arquivística é
saber a verdadeira finalidade do criador do documento.
Assim, a descrição arquivística pode auxiliar a reconstruir para descobrir a
ordem original de um conjunto de documentos. Ressalta a importância dos
elementos de contexto e histórico de criação do documento na descrição elaborada
nos arquivos. Por meio desses elementos é possível recuperar os elementos
autênticos da intenção do criador do documento.
O trabalho de 2008 é uma revisão de literatura que mostra a proximidade dos
conceitos de autenticidade e descrição arquivística, buscando formular propostas
para melhorar esta última nos arquivos do Canadá.
Millar (2006) relata o uso da descrição arquivística como apoio aos processos
contábeis de prestação de contas. A autora relata a comparação da descrição de
acordo com o modelo tradicional de descrição arquivística e como modelo do
162
documento continuum. Os dois modelos foram satisfatórios para identificar e explicar
o contexto e o conteúdo do material arquivístico e também para propiciar sua
acessibilidade aos gestores que verificam as provas documentais de prestação de
contas.
Meehan (2009) estuda como os registros de descrição arquivística podem ser
fontes para arquivistas e historiadores identificarem a evidência de ações e fazer
inferências para estabelecer relações entre documentos, partes de documentos e
outras fontes arquivísticas. A descrição, como parte de um todo, permite acesso às
coleções de documentos, pois contém os elementos de evidência que os arquivistas
ou pesquisadores usam para fazer inferências. A autora discute os conceitos de
inferência e evidência e analisa como a descrição arquivística pode ser um
instrumento para concretizar os dois conceitos, dentro do arquivo, na análise do
documento.
Os trabalhos de White, S. (2012) e Wood, S (2014) apresentam uma
abordagem comum sobre a descrição arquivística.
A abordagem de White (2012) questiona como os arquivos estão
documentando a deficiência e têm registrado a história de populações marginais,
principalmente nos Estados Unidos. A autora propõe um modelo que sugere que os
arquivistas considerem, nos processos de avaliação e descrição, questões sobre
como a pessoa vivenciou a deficiência em diferentes contextos, observando a
presença de indivíduos nas organizações. E que isso possa ser retratado na
descrição arquivística para que seja possível construir a história da deficiência com
base nos documentos de arquivo.
Wood (2014) faz o mesmo questionamento sobre como os arquivos estão
tratando os documentos relativos aos direitos humanos. Analisa as mudanças
necessárias nas políticas de arquivo e nos padrões arquivísticos para melhorar a
transparência e descobrir estratégias a fim de possibilitar a identificação dos abusos
cometidos no passado.
Em síntese, esses trabalhos mostram como é possível ampliar as funções da
descrição arquivística para além dos objetivos de dar acesso a conteúdos de
documentos. Temos então a :
a) que a descrição pode contribuir para que suas evidências garantam
autenticidade dos documentos. (MACNEIL, H (2005, 2008); MILLAR (2006)), e
ajudar a estabelecer a ordem original de conjuntos de documentos,
163
b) que a descrição pode retratar elementos que possibilitem o resgate
histórico de culturas de indivíduos e suas características específicas e
consequentemente a garantia de direitos desses povos. (MEEHAN, (2009); WHITE,
S. (2012); WOOD, S, (2014))
4.3.4 Descrição arquivística – Normalização
Essa categoria contém a maior quantidade de trabalhos analisados. São
trabalhos sobre a normalização nos arquivos e a normalização, de forma genérica,
que tratam especificamente das normas de descrição arquivística.
Quadro 8 – Artigos sobre “Descrição arquivística – Normalização” em periódicos nacionais e
internacionais. (2005-2015).
AUTOR TITULO PERIÓDICO ANO
1 Jean Dryden Cooking the Perfect Custard Archival Science 2003
2 Claire SIBILLE La seconde édition de la norme ISAAR
La Gazette des Archives
2005
3 Jean Dryden A tower of Babel : Standardizing archival terminology
Archival Science 2006
4 Silvia Schenkolewski-Kroll, Assaf Tractinsky
Archival description, Information Retrieval, and the construction of thesauri in Israel Archives
Archival Science 2006
5 Claudia Lacombe Rocha e Margareth da Silva
Padrões para garantir a preservação e o acesso aos documentos digitais
Acervo 2007
6 Niels Bruebach Acesso Eletrônico à Informação Arquivística: Vantagens e potenciais das normas de descrição
Acervo 2007
7 Michel Duchein Os arquivos na torre de Babel. Problemas de terminologia arquivística internacional
Acervo 2007
8 Heloisa Liberalli Bellotto
A terminologia das áreas do saber arquivistico o caso da arquivística
Acervo 2007
9 Michel Fox Por que precisamos de normas? Acervo 2007
10 Marion Beyea A favor de normas para a prática arquivística
Acervo 2007
11 Claire Sibille A Descrição Arquivística na França, Entre Normas e Práticas
Acervo 2007
12 Heather MacNeil What finding aids do: archival description as rhetorical genre in traditional and web-based environments
Archival Science 2012
13 Richard Dancy RAD Past, Present, and Future Archivaria 2012
14 Bénédicte Grailles Et Laurent Ducol
Les enjeux de la normalisation dans les services d’archives
La Gazette des Archives
2012 continua
164
AUTOR TITULO PERIÓDICO ANO
15 Michel Cottin Et Stéphanie Dargaud
Des archivistes et des normes La Gazette des Archives
2012
16 Claire Sibille - De Grimoüard
Les normes internationales de description archivistique : origines, développements, perspectives
La Gazette des Archives
2012
17 Stéphanie Roussel Le champ normatif de l’archivage électronique
La Gazette des Archives
2012
18 Stacy Wood et al Mobilizing records: re-framing archival description to support human rights
Archival Science 2015
19 Alice Motte La normalisation de la description archivistique : enjeux et actualités
La Gazette des Archives
2015
20 Laurent PRÉVEL Normalisation et certification : deux piliers pour l’archivage électronique
La Gazette des Archives
2015
Fonte: Elaborado pela autora da pesquisa com base nos artigos selecionados da amostra
Para melhor compreensão do cenário dessa categoria, os trabalhos foram
agrupados em três grupos que apresentam temática semelhante dentro do tema
normalização:
a) a importância da normalização nos arquivos;
b) normas de descrição arquivística específicas;
c) normas de descrição para o meio digital.
4.3.4.1 Importância da normalização nos arquivos
Em um primeiro grupo da amostra, há trabalhos que ressaltam a importância
da normalização nos arquivos de maneira geral, como os de Beyea, M.(2007), Fox,
M. (2007),Grailles e Ducol, (2012), que são unânimes em ressaltar a importância das
normas para os arquivos; consideram que a atividade de normalização é um meio
para melhorar continuamente os processos e produtos.
Grailles e Ducol (2012) abordam a normalização realçando que essa foi
sempre uma busca dentro das instituições que lidam com documentos e informação,
principalmente para bibliotecários e documentalistas europeus. Exemplificam com o
trabalho de Paul Otlet e Henri La Fontaine e a bibliografia universal. Mas, para os
arquivos, os autores destacam que essa busca só começa depois da Segunda
Guerra Mundial e de maneira indireta, como por exemplo, com a definição das
dimensões do papel definidas pela AFNOR em 1933.
165
Quanto aos fatores determinantes para adoção das normas, Fox, M. (2007) e
Grailles e Ducol (2012) salientam que a normalização nos arquivos é uma
consequência natural, tal como aconteceu em outros tipos de organizações, como
montadoras de carro e bancos. É inevitável que os arquivos busquem racionalizar e
padronizar seus trabalhos na busca de eficiência.
Baye (2007) enfatiza que o documento digital é outro fator que
necessariamente obriga os arquivos a adotarem normas em seu trabalho. Mais um
fator determinante para o uso das normas é a adoção da informática como
ferramenta de auxílio ao trabalho do arquivista.
Quanto às perspectivas futuras, Baye (2007), Fox, M. (2007) se referem à
busca para definir normas internacionais que ajudem a unificar o trabalho nos
arquivos, a fim de melhorar qualidade das informações nas bases de dados. Eles
reforçam o papel do ICA como instituição que se ocupa da tarefa de controlar a
criação de normas internacionais para os arquivos. Fox (2007) ressalta o paradoxo
da normalização, que tende a deixar de lado a especificidade dos arquivos e unificar
tarefas em instituições maiores.
Grailles e Ducol (2012), em um trabalho recente, avaliam o percurso de uso
das normas após alguns anos de seu aparecimento. Apontam a necessidade de
serem revistas as práticas profissionais do trabalho com a normalização, porque a
adoção da norma, isoladamente, não garante a melhoria da qualidade do trabalho
do arquivista. Destacam que não é necessária a criação de mais normas, mas a
adoção de práticas de trabalho que possibilitem o uso e aplicação consistentes das
que já existem.
Outro trabalho que chama a atenção sobre o preparo do profissional para
trabalhar com as normas é o de Cottin e Dargaud (2012). Esses autores destacam
que a adoção das normas nos arquivos não ocorreu por acaso, mas decorreu de
necessidades determinadas por vários fatores tais como:
a) a necessidade de internacionalização dos trabalhos; a crescente necessidade
de uso dos sistemas de gestão de documentos eletrônicos que obriga à
adoção de padrões; o meio digital e as redes funcionam de acordo com
padrões que devem ser observados;
b) as instituições ligadas aos arquivos, governos, diretores, presidentes, devem
aprovar e referendar o uso das normas e às vezes também definir parâmetros
166
legais e políticos para isso; a interação de diferentes instâncias demanda a
adoção de parâmetros;
c) a grande quantidade de informação em circulação obriga à adoção de normas
e padrões;
d) o processo de judicialização da sociedade traz demandas efetivas em relação
aos documentos; as instâncias judiciais funcionam com base em regras
rígidas e os arquivos, como parceiros, devem se adaptar a isso;
e) as demandas sociais por democratização da informação e por transparência
nas ações de governo obrigam os arquivos a seguirem parâmetros de
garantia dessa exigência da sociedade.
Os trabalhos de Dryden, (2005), Duchein (2007), Schenkolewski-Kroll,
Tractinsky (2006), (2007), Bellotto, H. L. (2007) são sobre a terminologia arquivística.
Esses autores abordam especificamente a criação das ferramentas terminológicas
como instrumentos para aprimorar a comunicação entre os profissionais e melhorar
o diálogo entre teoria e prática.
A arquivística, enquanto disciplina do conhecimento, é uma área recente, que
lida com grande diversidade de abordagens linguísticas e conceituais. A despeito
disso, possui princípios arquivísticos, que regulamentam a sua prática, amplamente
aceitos na comunidade, o que facilita a busca pela unificação terminológica. As
ferramentas terminológicas, tais como dicionários, glossários, vocabulários
controlados, ontologias contribuem para a busca de compreensão mútua entre os
profissionais de diversas partes do mundo.
Como pontua Dryden (2005), a tradição de criar ferramentas terminológicas
na arquivística está presente desde o tradicional manual dos holandeses, que
recomendava a elaboração de terminologias para certos inventários.
Schenkolewski-Kroll, Tractinsky (2006) relatam o percurso de construção de
ferramentas terminológicas nos arquivos de Israel e as especificidades dos arquivos
israelenses que lidam com uma enorme diversidade linguística nos documentos.
Sem as ferramentas terminológicas, o trabalho de descrição dos documentos é
impossível.
Sendo assim, a tarefa de criar ferramentas terminológicas é uma função nos
arquivos que tende a facilitar o trabalho, promovendo e melhorando os processos de
comunicação deles com o mundo.
167
Em síntese, nesta subcategoria que destaca a importância da normalização
nos arquivos, podemos perceber que a normalização torna-se importante e passa a
ser uma busca nos arquivos a medida que as instituições arquivisticas percebem a
necessidade :
a) de melhorar seus processos e produtos com a racionalização e
padronização de seus trabalhos (BAYEA, 2007; FOX, 2007, GRAILLES E DUCOL,
2012).
b) de internacionalizar os trabalhos de arquivistas por meio da adoção de
padrões internacionais para execução das atividades, tidadas principalmente pela
adoção dos sistemas de informação e das tecnologias de computação adotadas
tanto na criação dos documentos quanto nos sistemas de informação para descrição
dos documentos (COTTIN, DARGAUD,2012)
c) de adotar ferramentas terminológicas como instrumento para aprimorar o
processo de comunicação entre os profissionais e usuários de documentos de
arquivo. (DRYDEN,2005; DUCHEIN, 2007; TRACTINSKY, 2007; BELLOTTO, 2007).
4.3.4.2 Normas de descrição arquivística específicas
Neste grupo de artigos da amostra analisou-se os trabalhos que abordam
especificamente as normas de descrição arquivística. São os trabalhos de de
Dryden (2003), Claire Sibille, C. (2007), De Grimoüard, C. S, (2012), Richard Dancy
(2012), Motte, A. (2015). Em todos os outros trabalhos desta categoria, as normas
arquivísticas de descrição também são tratadas, mas estes trabalhos da amostra se
referem especificamente a este tema.
Dryden, J. (2003) aborda o trabalho da força tarefa criada pelo Canadá e
pelos Estados Unidos para definir os parâmetros de uma norma nacional de
descrição arquivística. O autor detalha os trabalhos da CUSTARD project (Canada-
U.S. Task Force on Archival Description), criada para definir os parâmetros de
trabalho para a adoção das normas do ICA, International Council on Archives, a
norma ISAD (G) e ISAAR (CPF). Este projeto conjugou as regras de catalogação
dos Estados Unidos e Canadá para a descrição de documentos de arquivo.
Mais tarde, o trabalho de Richard Dancy (2012) avaliou a implantação do
RDAD, Règles pour la description des documents d’archives (RDDA), que é fruto do
168
projeto do CUSTARD, utilizado nos arquivos canadenses. Esse modelo de regras
utilizou a ISAD (G) e o AACR2 como bases.
Passados alguns anos de implantação, o autor faz um balanço positivo, mas
ressalta como prejudicial a separação dos arquivos dos modelos de tratamento
inicialmente adotados em bibliotecas. Nas perspectivas futuras, ele aponta a
necessidade de se fazer uma revisão completa para que o formato se adapte ao
padrão internacional.
Os trabalhos de Sibille, C. (2007), Grimoüard, C. S, (2012) Motte, A. (2015)
fazem um balanço do uso das normas internacionais de descrição arquivística da
família ISAD (G). Eles descrevem detalhadamente cada norma e as histórias de
criação. Nos trabalhos Grimoüard, C. S. (2012) e Motte, A. (2015), avaliam sua
adoção, principalmente na França. Destacam os motivos pelos quais é necessário
utilizar nos arquivos as normas internacionais de descrição. Ressaltam que a
adoção das normas permite ter um modelo de representação de entidades
arquivísticas que respeitam os princípios arquivísticos que podem ser reproduzidos
nos sistemas de descrição arquivística digital. As normas possibilitam a construção
de uma melhor comunicação com os profissionais de todo o mundo.
4.3.4.3 As normas de descrição para o meio digital
Os trabalhos de Shepherd (2009) e Zhang, Mauney (2013) abordam o uso da
norma EAD, Encoded Archival Description e a busca por padrões de descrição
adequados para o meio digital.
Shepherd (2009) aborda os metadados descritivos compartilhados na
descrição arquivística, ressaltando que a área deve voltar a atenção para aumentar
as possibilidades de participação nesse contexto de compartilhamento de dados,
como forma de melhorar suas práticas e serviços. Para isso, devem ser revistas as
práticas de descrição arquivística para se tornarem adequadas ao novo modelo de
trabalho arquivístico. Pontua alguns passos que a comunidade arquivística deve
seguir para se ligar ao contexto da descrição arquivística de conteúdos digitais nas
redes digitais, que são a implementação dos princípios de metadados
compartilhados e protocolos de compartilhamento de dados, a criação de
ferramentas de colaboração de boas práticas, a construção de metadados de valor
agregado para a participação do usuário no processo de descrição e o trabalho
169
colaborativo com a comunidade relacionada aos arquivos – museus e bibliotecas
que vivem realidades parecidas.
Zhang e Mauney (2013) também pontuam a necessidade de serem revistas
as práticas de descrição arquivística, no sentido de trabalhar com a descrição de
conteúdos em meio digital, ressaltando que os arquivistas devem ter consciência da
necessidade de se fazer a conexão entre a descrição arquivística que é o contexto,
com o item digital, que é o conteúdo. Esses dois elementos não podem seguir
separados na lógica de trabalho em meio digital.
DeRidder, Presnell, Walker (2012) apontam os problemas existentes nos
sistemas de acesso aos conteúdos digitais para pesquisa.
Em todos os trabalhos, os autores fazem revisões de literatura sobre o
desenvolvimento dos modelos de padrões de compartilhamento de dados descritivos
e relatam as várias iniciativas que vêm aparecendo na arquivística, com destaque
para o padrão do EAD, Encoded Archival Description.
DeRidder, Presnell, Walker (2012) destacam que o início da criação de
padrões de descrição de dados surgiu com o AACR2, Anglo American Cataloging
Rules, 2.ed., que tornou-se bastante popular em todo o mundo, por meio da Library
of Congress. Esse padrão de descrição para as bibliotecas foi adotado pelos
arquivos quando ainda não tinham um padrão específico de descrição para materiais
especiais. Isso acontece especificamente nos Estados Unidos, onde a sociedade
arquivística adota as regras de descrição do AACR2 para descrição desses
materiais.
Os trabalhos de Rocha e Silva (2007), Bruebach (2007), Botão (2013),
Roussel (2014) abordam especificamente as normas para garantir a preservação e o
acesso aos conteúdos digitais. Ressaltam que a grande preocupação na área da
informação é a preservação dos documentos digitais e também a garantia de que
eles possam ser acessados por um longo tempo ou para sempre.
Os primeiros trabalhos, de 2007, especificam as necessidades de definição
desses padrões de criação e manutenção de documentos em meio digital, com
detalhamento das características dos documentos digitais.
Rocha e Silva (2007) destacam a iniciativa brasileira do e-Arq e propõe a
adoção desse modelo no caso do Brasil; Bruebach (2007) recomenda a adoção da
norma ISSAR (CDF) e do EAD, Encoded Archival Description e EAC Arquival
Context. Botão e Sousa (2013) abordam especificamente a adoção da norma
170
brasileira para recuperar imagens digitais. Roussel (2012) analisa a adoção da
norma ISSO 14721, OAIS, Open Archival Information System, um modelo conceitual
de referência para a criação de sistemas abertos de arquivamento de informações e
preservação. Detalha o modelo e destaca as suas funções para acesso a
informações que necessitam ser preservadas.
A característica básica do conteúdo desses trabalhos que abordam a
normalização, e especificamente a descrição de arquivos, refere-se à necessidade
de os arquivos adotarem práticas, sistemas e padrões comuns de descrição de
documentos, tanto em meio físico como em meio digital.
Essa preocupação cresce em função da adoção das tecnologias digitais, para
criação e acesso aos documentos em todo o mundo, e a necessidade de dar
permissão a esses conteúdos, para responder às demandas crescentes dos
usuários, bem como a necessidade de transparência das informações contidas nos
arquivos.
Os trabalhos iniciais pontuam essa preocupação, pois é o momento em que
os arquivos em todo o mundo estão lidando, na prática, com a realidade de trabalhar
com os documentos digitais e a necessidade de dar acesso às informações dos
acervos por meio dos sistemas de informação.
No início das décadas de 1990 e 2000 começam a aparecer os primeiros
catálogos de acervos arquivísticos em rede. Os anos de 2000 demonstram a
preocupação com a adoção de modelos de descrição arquivística e modelos de
criação e acesso a documentos digitais. Constata-se que é um trabalho complexo,
que envolve outros conhecimentos que não são do domínio dos arquivos, como a
computação, as redes de dados, os sistemas de informação.
A literatura Arquivística reflete as preocupações com as necessidades de
mudanças dentro do seu próprio seio, no caso, a descrição arquivística, para se
adaptar a essa nova maneira de trabalhar.
Esses padrões e normas devem possibilitar o compartilhamento de dados
entre as instituições arquivística, fornecer acesso aos conteúdos digitais e não
somente às descrições sobre conteúdo, possibilitar que as descrições e os
conteúdos possam ser disponibilizados aos usuários para busca em linha.
Os trabalhos destacam que essas iniciativas fazem com que o trabalho do
arquivo torne-se mais eficiente e de melhor qualidade e que elas possibilitam
melhorar o acesso às informações e ao documento de arquivo.
171
Os trabalhos do final do período de cobertura da amostra, 2015, são
caracterizados por relatos de casos sobre como lidar com esse contexto. São
trabalhos que avaliam a aplicação das normas em arquivos, mostram o longo
percurso de criação de um modelo, um padrão, uma norma, evidenciando a
complexidade de se chegar a um deles, de forma que possam ser adotados
mundialmente, demostrando ainda o cuidado na elaboração para que lhes sejam
incorporados os princípios da arquivística.
Em síntese, com relação as normas de descrição específicas para os
arquivos e para os documentos digitais podemos destacar:
a) o trabalho das instituições internacionais como ISO, ICA, governos e as
associações de arquivos de vários países no esforço para definir normas especificas
para os arquivos que reflita e respeite os princípios arquivisticos. (DRYDEN, 2003;
DANCY, 2012; SIBILLE, 2007; GRIMOUARD, 2012; MOTTE, 2015)
b) o trabalho demorado e meticuloso para a elaboração de uma norma até o
seu uso efetivo nos processos arquivisticos (SIBILLE, 2007; DANCY, 2012)
c) a busca constante de atualização das normas para se adequar à realidade
da sociedade, no caso das normas para os documentos em meio digital, tanto para a
criação do documento digital, o armazenamento, a descrição e manutenção e
preservação permanente. (SHEPHERD, 2009; ZHANG, MAUNEY, 2013)
4.4. CATEGORIA DIPLOMÁTICA
O termo diplomática é apresentado no Glossário da SAA da seguinte forma:
Figura 6 – Termo Diplomatics
Fonte: Reproduzito de “A Glossary of Archival and Records Terminology” (2005, p. 148).
Conforme o Glossáro, SAA (2005), diplomática é a área da arquivística que
estuda a criação forma e transmissão dos documentos. A diplomática se ocupa de
verificar a relação existente entre o documento e os fatos representandos nele, a fim
de identificar, avaliar a sua natureza e autenticidade. A diplomática está relacionada
diplomatics, n. ~ The study of the creation, form, and transmission of records, and their relationship to the facts represented in them and to their creator, in order to identify, evaluate, and communicate their nature and authenticity. NT: general diplomatics, special diplomatics RT: authenticity, reliability, trustworthiness Notes: The first major work on diplomatics is Jean Mabillon’s De Re Diplomatica (1681; supplement, 1704). Diplomatics is primarily concerned with the process of determining whether a document is authentic or a forgery through a detailed examination of internal and external characteristics.
172
com os conceitos de autenticidade, veracidade e confiabilidade do documento.
Busca garantir esses conceitos por meio da identificação dos elementos intrisecos e
extrisecos presentes no documento.
O conjunto de trabalhos sobre a Diplomática no período coberto retoma as
definições clássicas da diplomática enquanto disciplina de análise de atos escritos
(DELMAS, B, 2001; DURANTI, L. 2015). Nessa perspectiva, definem a base da
diplomática contemporânea, propondo a retomada dos estudos sobre o tema como
uma das formas de enfrentar os desafios atuais, principalmente em relação ao
tratamento de documentos arquivísticos em meio digital. Para uma melhor
compreensão da evolução dessas propostas, será analisado o conjunto de trabalhos
da pesquisadora Luciana Duranti. Em seguida, serão abordados os trabalhos que
contêm estudos sobre o conceito de evidência. Optou-se por analisar os trabalhos
de Gerard Naud e Christine Nougaret sobre análise arquivística por sua
complementaridade conceitual com a diplomática contemporânea.
Quadro 9 – Artigos sobre “Diplomática”. em periódicos nacionais e internacionais (2001-2015).
AUTOR TITULO PERIÓDICO ANO
1 Luciana Duranti Meeting the Challenge of Contemporary Records: Does It Require a Role Change for the Archivist?
The American Archivistic
2001
2 Luciana Duranti The impact of digital tecnology on archival science
Archival Science
2001
3 Bruno Delmas Archival science facing the information society
Archival Science
2001
4 Jonathan Furner Conceptual Analysis: A Method for Understanding Information as Evidence, and Evidence as Information
Archival Science
2004
5 Heather MacNeil Contemporary Archival Diplomatics as a Method of Inquiry: Lessons Learned from Two Research Projects
Archival Science
2004
6 Anne Gilliland; Nadav Rouche; Lori Lindberg; Joanne Evans
Towards a 21st Century Metadata Infrastructure Supporting the Creation, Preservation and Use of Trustworthy Records: Developing the InterPARES 2 Metadata Schema Registry
Archival Science
2005
7 Luciana Duranti; Kenneth Thibodeau
The Concept of Record in Interactive, Experiential and Dynamic Environments: the View of InterPARESw
Archival Science
2006
8 Jennifer Meehan Towards an Archival Concept of Evidence
Archivaria
2006 continua
173
AUTOR TITULO PERIÓDICO ANO
9
Malcolm Tood
Power, Identity, Integrity, Autheticity, and the archives: a comparative study of the application of archival methodologies to comporary privacy
Archivaria
2006
10 Luciana Duranti From Digital Diplomatics to Digital Records Forensics
Archivaria
2009
11 Luciana Duranti, Corinne Rogers, And Anthony Sheppard
Electronic Records and the Law of Evidence in Canada: The Uniform Electronic Evidence Act Twelve Years Later
Archivaria 2010
12 Christiene Nougaret Théoriser l’archivistique: Gèrard Naud et l’analyse des archives contenporaines
La Gazette des Archives
2012
13 Gérard Naud <<Pré-Archiver>>? D’abord, analyser Gazette des Archives
2012
14 Gárard Naud L’analyse des archives administrative contenporaines
Gazette des Archives
2012
15 Natália Bolfarini Tognoli, José Augusto Chaves Guimarães
Contribuições da metateoria para o método diplomático em Arquivística
Ciencia da Informção
2013
16 Luciana Duranti Diplomática. Novos usos para uma antiga ciencia part V
Acervo 2015
Fonte: Elaborado pela autora da pesquisa com base nos artigos selecionados da amostra
4.4.1 A diplomática de Luciana Duranti
A diplomática é compreendida como disciplina que se ocupa dos atos
escritos. Evoluiu de forma significativa principalmente em virtude de apresentar
soluções para as questões ligadas ao documento digital e à preservação da
informação em meio digital. Essa evolução se deve, em parte, aos trabalhos da
pesquisadora Luciana Duranti. A pesquisadora e historiadora trabalha na School of
Library, Archival and Information Studies, Universidade de British Columbia, Canadá.
Publicou, na revista Archivária, um conjunto de artigos intitulado “Diplomatics: News
uses for an old Science”. Divididos em seis partes, foram os artigos publicados entre
1989 e 1992. Neste conjunto de trabalhos, a autora detalha desde a história das
formas de registro dos documentos, na antiguidade clássica, até chegar às bases da
instituição da diplomática como uma disciplina científica. Esses trabalhos passam a
ser a base de desenvolvimento da diplomática. Nougaret (2016) destaca que os
trabalhos de Luciana Duranti sobre a diplomática contemporânea e a diplomática
digital têm contribuído para o fortalecimento da disciplina. Segundo Nougaret (2016),
a influência deve-se ao fato de ela propor o uso da diplomática para lidar com as
questões do documento digital sem abandonar os princípios norteadores da
174
diplomática clássica. Suas pesquisas sobre o tema trazem como resultado o
desenvolvimento de conceito e diretrizes que contribuem para a evolução e
atualização da diplomática. Luciana Duranti desenvolve, neste conjunto de artigos,
os fundamentos do trabalho de análise de documentos a partir da identificação de
elementos extrínsecos e intrínsecos como elementos que evidenciam a
autenticidade do documento. Esses trabalhos trazem à tona os conceitos de
evidência e de prova, bastante discutidos no contexto dos documentos digitais.
O primeiro trabalho, de 2000, é o texto de uma conferência feita no encontro
anual da Society of American Archivists, em 1999, foi “Meeting the Challenge of
Contemporary Records“. Apesar de o tema central não ser uma abordagem
especifica da diplomática, este trabalho tem um significado especial porque nele a
autora faz um balanço dos desafios profissionais do arquivista para lidar com os
documentos na contemporaneidade. Ressalta que os futuros profissionais devem
fazer distinção entre os métodos arquivísticos e a missão do arquivista e o trabalho
do arquivista e entre a função da arquivística e as questões do profissional em face
das questões da arquivística. A autora embasa essa afirmativa após a análise de
diferentes trabalhos publicados sobre os desafios, a missão, a função dos
profissionais, concluindo que essas discussões não estão abordando a questão real.
Em síntese, a questão central não deve ser o papel tradicional e novo do arquivista,
mas o que é a função do arquivista, a função do arquivo, seus métodos de trabalho
para lidar com a questão do documento na contemporaneidade. O que é possível
compreender é que, não deve existir dúvida quanto à relevância cultural que a
arquivística tem, quanto a seus métodos e quanto ao papel do profissional. Essa
deve ser a lógica para entender como as mudanças devem ser encaradas.
O reflexo desse pensamento pode ser observado nos trabalhos seguintes em
que a autora e seus colaboradores demonstram que a utilização dos métodos da
arquivística tradicional para tratar os assuntos contemporâneos é um caminho a ser
seguido para a área. A criação do projeto INTERPARES, em 1999, pode ser visto
como exemplo dessa visão de que os métodos e a clareza da função da arquivística
para tratar os documentos na contemporaneidade já estão postos. O projeto discute
em que pontos é necessário evoluir, melhorar conceitualmente, criar novas diretrizes
para lidar com a realidade do meio digital. A proposta do projeto é, portanto,
enfrentar os desafios do tratamento do documento digital.
175
O conjunto dos trabalhos Luciana Duranti e seus colaboradores sobre o tema
são denominados: diplomática, diplomática contemporânea ou diplomática digital. O
primeiro deles, (DURANTI, 2001), semelhante ao trabalho de 2000 aborda o impacto
das tecnologias digitais na arquivística e os desafios dp profissional arquivista para
lidar com tais tipos de registros. A autora propõe abordar a arquivística como um
sistema em que partes e componentes que se juntam para realizar uma ação final.
Destaca as iniciativas de projetos em que esse modelo, baseado na visão sistêmica
enfrenta para lidar como os problemas da contemporaneidade. O primeiro projeto de
pesquisa coordenado por ela foi “The Preservation of Integrity of Eletronic Records”
entre 1994 e 1997, na Universidade de British Columbia, em colaboração com o
Departamento de Defesa dos Estados Unidos. O objetivo desse projeto foi identificar
e definir conceitualmente a natureza e os componentes dos documentos digitais e as
condições necessárias para sua assegurar sua integridade, confiabilidade e
autenticidade. O resultado da pesquisa foi confrontado com os conceitos
fundamentais da arquivística para assegurar a integridade do documento e com os
conhecimentos da diplomática para estabelecer os elementos de análise dos
componentes do documento digital.
Assim, nasce a associação da diplomática com a arquivística para lidar com o
documento em meio digital, de um lado a arquivística, com os princípios que
asseguram a autenticidade e a confiabilidade de documentos e, de outro, a
diplomática com a definição dos parâmetros de análise das evidências. Neste
projeto, o documento digital acompanha a tradicional definição da arquivística - que
o documento de arquivo é qualquer documento criado e mantido ou recebido por
uma entidade física ou jurídica na execução de ações referente a atividades, como
um instrumento ou seu produto. As pesquisas relatadas pela autora definem as
bases para o reconhecimento, organização e acesso aos documentos em meio
digital, ressaltando a importância da diplomática como ferramenta para lidar com o
novo contexto documentos digitais, em que se percebe o abandono dos termos
forma física e forma intelectual, em favor do retorno dos termos elementos
extrínsecos e elementos intrínsecos da forma documental. Isso se dá em função da
dificuldade de identificar no documento digital o que é físico e o que intelectual. São
esse os elementos que servem de base para a análise dos documentos tanto na
diplomática clássica quanto na diplomática contemporânea ou diplomática digital,
que ela, mais tarde, vai chamar também de diplomática forense digital.
176
No trabalho de 2006, (DURANTI, THIBODEAU, 2006), a autora e seus
colaboradores apresentam os resultados do INTERPARES, (International resarch on
Permanent Authentic Records in Electronin Systems) nas fases 1 e 2, que tratam de
documentos produzidos e/ou mantidos em programas interativos, experimentais, em
ambientes dinâmicos.´
É ressaltado que para chegar a uma definição de documento digital a equipe
de pesquisadores trabalhou com a hipótese fundamental da diplomática, que
considera que todos os documentos são similares o suficiente para ser possível
identificar os seus elementos, independente das diferenças de natureza, forma,
proveniência ou data. Também o trabalho de GILLILAND, A, et al., (2005), abordam
a fase 2 do projeto INTEPARES, relatando os resultado dos estudos sobre a
identificação de componentes essenciais de metadados, necessário para a
infraestrutura de suporte para a criação, preservação e acessibilidade a documentos
confiáveis. Os autores descrevem a necessidade estabelecimento de metadados em
documentos digitais no momento da sua criação e a importância do seu
reconhecimento para garantir confiabilidade.
Os estudos sobre metadados de documentos digitais se fundamentam nas
normas de descrição arquivística, significando, portanto, que os conteúdos dos
metadados são estabelecidos para reconhecer os elementos de identificação de
documentos ou de conjuntos documentais estabelecidos pela norma ISAD (G). Os
autores destacam o exemplo da norma de EAD, Encoded Arquive description,
publicada pelo ICA, como um exemplo de como os metadados de documentos
digitais se articulam com os parâmetros das normas de descrição arquivística
utilizados tanto para descrever documentos tradicionais como documentos digitais.
Com base na evolução dos estudos sobre metadados, os estudos do INTERPARES
propõe um modelo de metadados que articula o conceito de descrição arquivística e
ciclo de vida dos documentos para garantir que os elementos de metadados
acompanhem toda a vida do documento e se constituam em elementos essenciais
da preservação e acesso em meio digital.
No trabalho de 2009, (DURANTI, 2009) apresenta o conceito de diplomática
digital desenvolvido no projeto INTERPARES, com base no conceito de “forense
digital”. Define as bases do conceito de diplomática para documentos digitais, o
conceito de documento digital, o conceito de registros digitais em ambientes
confiáveis, precisão, confiabilidade, integridade e os métodos de trabalho para a
177
diplomática digital e forense digital. O que vale ressaltar do conteúdo do trabalho de
Duranti e seus colaboradores, dentro do projeto INTERPARES, é o avanço concreto
das discussões sobre como reconhecer, validadar, tratar e preservar documentos
em meio digital e a concretização de propostas para isso, tanto em termos de
pesquisa quanto em ações concretas.
Em síntese, podemos inferir que os elementos já habitualmente utilizados na
diplomática e na arquivística para tratar documentos arquivisticos são a base
fundante dessa evolução. É possível inferir, ainda, que as duas áreas têm papeis
distintos que se complementam na ideia de tratar a arquivística como um sistema em
que partes se complementam na tarefa de lidar com o documento em meio digital.
Sendo assim, à arquivística cabe o papel de avaliar documentos e conjuntos
documentais e sua validade enquanto documentos arquivísticos e o papel da
diplomática é reconhecer o conjunto de elementos que evidenciam a confiabilidade e
autenticidade dos documentos.
4.4.2. A diplomática e o conceito de evidência
Meehan (2006) aborda o conceito de evidência, de resto presente em todo o
discurso da arquivística. Relata a importância do conceito na prática arquivística e
procura mostrar a relação do conceito de valor de prova, documento e evento. O
artigo faz uma revisão detalhada da evolução do conceito na arquivística, desde a
abordagem de Hilary Jenkinson, que ressaltava as qualidades do arquivista como
alguém comprometido com a “santidade da evidência” e como o responsável por
preservar e considerar os fragmentos de provas dos documentos. Se a abordagem
inicial sobre o conceito de evidência na arquivística ressalta a necessidade de
preservar os elementos de evidência do documento, uma abordagem mais recente
indica a importância da confiabilidade dos documentos para a memória corporativa e
para a prestação de contas. A arquivística vem utilizando o termo para referir-se à
natureza, função e valor dos documentos, embora existam muitas variações no uso
do termo, tais como: documento como evidência, documentos possuem evidência,
documentos fornecem provas de evidência. A abordagem que nos interessa aqui é a
que relaciona documento e evidência, decorrente da ligação com a diplomática e a
descrição arquivísticas. O autor pontua que são as atividades da prática arquivística
que mostram o documento como elemento de prova por meio da identificação,
178
reconhecimento e representação das evidências contidas no documento. O autor
ressalta que a ligação entre documento e a evidência vem se firmando na literatura
como resultado da busca de soluções para o tratamento dos documentos digitais e a
necessidade de reconhecer evidências para atribuir-lhes o valor de prova. A
diplomática e a descrição são os instrumentos que reconhecem os elementos físicos
do documento físico e essa mesma lógica se aplica ao documento digital,em que
onde os elementos físicos, as evidências, lhe atribuem valor de prova.
Duranti, Rogers, Sheppard (2010), analisam o “Uniform Eletronic Evidence
Act” depois de doze anos da sua adoção para tratar a complexidade dos
documentos, criados, consultados ou preservados em meio digital. É uma lei criada
pelo governo do Canadá, em 1989, para regulamentar a utilização da tecnologia
digital como principal meio de conduzir atividades e produzir documentos por meio
do reconhecimento de evidências. Considera ser necessário controlar as evidências
ao longo do ciclo de vida para ser mantida a sua confiabilidade. O trabalho dos
autores argumenta que o desenvolvimento de regras governamentais deve
considerar o controle do ciclo de vida para que os mesmo possam ser mantidos
confiáveis e invioláveis ao longo do tempo. Essa difícil tarefa exige a colaboração de
profissionais, não somente gestores ou da área jurídica, mas também daqueles com
conhecimentos de tecnologia de informação da diplomática digital. Somente a partir
do conhecimento legal, diplomático, forense e arquivístico e do desenvolvimento de
conceitos e métodos para interpretar evidências em meio eletrônico, pode-se
identificar, descrever, autenticar e adquirir documentos digitais de indivíduos e
organizações e criar documentos digitais que garantam a sua admissibilidade em
ações legais. Os autores propõem a criação da disciplina “Digital Records
Forensics”, que integra conhecimentos da diplomática, do arquivamento digital, da
pericia computacional e da legislação.
4. 4.3 Análise arquivística
Em 2012, a Gazette des Archives publicou um número especial
comemorativo, consagrado ao arquivista francês Gerard Naud, intitulado “Gerard
Naud: une archiviste de notre temps”. Nesta publicação especial é ressaltada a
importância desse arquivista, que foi o primeiro diretor do Centre des archives
contemporaines à Fontainebleau, instituição que recolhe os documentos antes de
179
eles serem enviados definitivamente ao Arquivo Nacional da França. Inicialmente
concebido como Pré-arquivo. A partir dessa experiência em arquivos
contemporâneos, elaborou um conjunto de teorias do que será denominado
“Análise arquivística”, definida como descrição do conteúdo de um documento
indicando ao menos sua data, do que ele é objeto e informações sobre os critérios
do seu recolhimento ao arquivo.
Nougaret (2012) cita a obra de Gerad Naud que publicou, em 1988, na
Gazette des Archives, com o titulo “le traitement des archives au centre des archives
contemporaines des Archives Nacionales. Les centre des archives contenporaines
dasn le système archivisique français, suas ideias sobre o que vem a ser a análise
arquivística, sua importância e suas bases de execução, ideias inovadoras para os
padrões franceses. Segundo Nougaret (2012), a maior inovação de Naud é a de se
interrogar sobre o conteúdo dos documentos e de demonstrar que ele não pode ser
reduzido a uma “Nature de documents” ou aum documento natural; ao contrário,
deve ser considerada a sua finalidade administrativa, ou seja, a finalidade pela qual
ele foi criado. Coloca em cena, também, o agente da ação administrativa para quem
o documento foi útil. Os elementos de nome do serviço de envio do documento, o
agente da ação, o objeto da ação a data e a forma devem ser descritos no momento
do recebimento do documento no arquivo contemporâneo, portanto, antes do seu
recolhimento. Essas diretrizes deverão dar apoio a duas atividades principais dos
arquivos: a eliminação dos documentos inúteis e a criação dos instrumentos de
pesquisa. Para os arquivos franceses essas ideias são consideradas bastante
inovadoras, tendo em vista a tradição de recolher absolutamente todos os
documentos enviados para o arquivo, dentro da concepção de que o serviço ou
setor que os enviou considerou e reconheceu que aqueles documentos são
importantes. Desse modo, a prática de análise de conteúdo de documentos para
atribuir valor, tendo em vista sua eliminação ou manutenção parece completamente
novo.
O contexto de trabalho de Naud pode explicar a defesa que ele faz do
processo de análise do documento de arquivo antes de sua incorporação definitiva
ao arquivo. No artigo intitulado “Pré-archive’? D’abord, analiser” reproduzido nesta
edição de 2012 da Gazette des Archives, Naud fundamenta suas análises na
perspectiva de que, no futuro, os arquivos devem fazer a análise no pré-
arquivamento por necessidade de racionalização da gestão dos arquivos e melhor
180
atribuir valor aos documentos. Segundo Naud (2012), a cada envio de documento ao
arquivo deve ser redigido um sumário que será utilizado para a indexação do objeto
da ação, do agente e do tipo de ação. Esse sumário se apresenta como resultado de
uma análise de conteúdo sintética que caracteriza a ação administrativa exercida à
qual o documento estava ligado, o autor dessa ação, se há um serviço de arquivo
interno ou a prática de gestão de documentos, onde ocorrem os objetos dessa ação,
os tipos de documentos, o contexto particular eventual (leis, eventos históricos,
lugar) e datas limites.
Segundo Naud (2012), a análise arquivística pode ser feita para um item
documental ou para um conjunto de arquivos. Segundo Nougaret (2012), a adoção
da prática de análise arquivística na França foi precedida por várias publicações,
dentre elas as principais são “La Pratique archivistique française classement et
description”, da Direção Geral do Arquivo Nacional da França, em 1993, que com
essa publicação instituiu a prática da análise nos arquivos na França. Em 1994, o
Arquivo Nacional também publicou uma norma interna AD-94-8 Traitemente des
archives contemporaines. Indexation. Instruments de recherche e, por fim, a
articulação com a norma ISAD (G) de descrição arquivística, no capitulo 4 da edição
francesa, que explica como utilizar a norma no contexto francês. Em síntese, adota o
elemento intitulado “analyse”, para a identificação do trio agente, objeto e ação do
documento.
As ideias de Gerard Naud sobre a análise arquivística são concretizada na
criação do programa PRIAM (Préarchivage Informatisé de Archives de Ministeres) 1
e 2, em 1983-1995, que permite a gestão cotidiana de recebimento das
comunicações no arquivo de Fontainebleau (NAUD, CHRISTINE, 2012). Esta base
de dados permite, aos arquivistas e usuários, o acesso ao conteúdo descrito nos
documentos. Naud pensava que não haveria motivo para a guarda de documentos
correntes ou intermediários aos quais não pudesse ser dado acesso ao conteúdo.
De fato, sem conhecer o conteúdo dos documentos, não se pode identificar seu
valor.
Em síntese, a categoria de artigos sobre Diplomática, demonstra que o tema
tem um destaque significativo para a área de Arquivística com atividades para
organização e tratamento das informações sobre os documentos arquivísticos.
Podemos resumir destacar que:
181
a) a despeito de trabalhar com diretrizes que são seguidas a séculos no
reconhecimento de evidências dos documentos e sua produção e validação, a
Diplomática ampliar seu campo de atuação no tratamento dos documentos em meio
digital, evidenciado pelo desenvolvimento da Diplomática Digital e a Diplomática
Forense (DURANTI, 2001).
b) as diretrizes seguidas pela Diplomática para tratar o documento, tanto para
o documento tradicional quanto para o documento digital, e da qual se serve a
Arquivística, são determinantes na aplicação do conceito de evidência no documento
de arquivo e atribuição de valor arquivístico e de prova que o documento possui.
(MEEHAN, 2006; DURANTI, ROGERS, SHEPPARD, 2010):
c) portanto é possível entender que o desenvolvimento da disciplina
Diplomática, como aquela que se ocupa dos documentos fisicamente, na busca pela
determinação e reconhecimento das suas evidencias de prova, tem ligação estreita
com as atividades da descrição arquivística, com suas normas de descrição do
documento com base nos princípios aquivísticos e com a gestão de documento e
gestão do ciclo de vida do documento. Isso mostra que as duas áreas, Diplomática e
Arquivística possuem uma relação que fortalece a arcabouço de conhecimento
prático e teórico de ambas.
d) a análise arquivística, praticada para reconhecer minimamente o conteúdo
dos documentos para sua gestão e tratamento e para entender as razões da sua
criação (NAUD, 2012; NOUGARET, 2012), demonstra que a ligação da Arquivística
e da Diplomática suscita o estabelecimento de práticas no tratamento do documento,
que vem sendo incorporada definitivamente nas atividades do arquivo.
e) a Diplomática, a Diplomática Digital, Diplomática Forense, a Análise
Arquivísticas são evidências de como a Arquivística vem se atualiza tanto na teoria
quanto na prática para lidar com questões contemporâneas relacionadas ao
documento de arquivo e seu tratamento e organização.
182
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ernst Posner (1940), em um belo relato sobre o desenvolvimento da
arquivística a partir da Revolução Francesa, destaca que a principal criação desta foi
a concepção de arquivo central ou provincial, como um lugar para onde todos os
documentos da administração do Estado eram enviados, a fim de ficarem
preservados e à disposição para consulta pelo cidadão que buscam o conhecimento
de seus direitos. Ele trata da função da Revolução Francesa na criação do modelo
de arquivo contemporâneo.
O autor processegue, afirmando que o ‘princípio da acessibilidade’ “não
evoluiu e não se materializou e não poderia materializar-se até receber um impulso
externo e desenvolver uma atitude inteiramente nova em relação aos arquivos”
(POSNER, 1940, p.275). Posner acentua, ainda, que a Revolução Francesa tornou
os arquivos acessíveis aos estudos eruditos, o que a princípio lhes era uma função
secundária.
Um novo impulso dado ao desenvolvimento dos arquivos foi o fato de que os
cidadãos passaram a ser cada vez mais conscientes do poder da sua
individualidade frente ao Estado e começaram a usar a história pátria “como fonte de
encorajamento em momentos de desastre nacional” (POSNER, 1940, p.279). Isso
fez com que a publicação de fontes documentais sobre o assunto, acessíveis ao
público, fosse o objetivo da historiografia nacional. Para esse novo propósito, os
arquivos se empenharam em recolher e organizar os documentos das
administrações gerais.
Nesse sentido, os arquivos se reinventam, sendo criados novos princípios
norteadores do trabalho de organização dos documentos. Nascem, assim, os
princípios de respeito aos fundos e à ordem original. Esses princípios são
fortalecidos pela publicação de manuais de trabalho, de normas e padrões
internacionais que norteiam o trabalho nos arquivos.
Em algumas passagens é possível ver discussões dentro da Arquivística
sobre a possibilidade de aprimoramento dos processos de organização e tratamento
de documentos de arquivos por meio da aproximação teórica e metodológica com a
Ciência da Informação, a título de exemplo podemos citar Fonseca (2005). Nesse
sentido, nesta pesquisa, inicialmente, procuramos incorporar os conceitos de regime
de informação e teorias da linguagem para verificar se no corpus analisado seriam
183
identificadas referências a esses conceitos. Isso porque a presente pesquisa teve
início com o objetivo de verificar a hipótese de que a arquivística poderia caminhar
no sentido de adotar os modelos teóricos da Ciência da Informação nos processos
de organização e tratamento dos documentos de arquivo. Buscou-se então, em um
conjunto de textos da literatura da arquivística, com cobertura de 15 anos, os
elementos que pudessem comprovar a interação teórica metodológica entre as duas
áreas – a Ciência da Informação e a arquivística.
Foi feito um levantamento exaustivo nos periódicos Gazette des Archives,
Archival Science, The American Archivist, Archivaria e Acervo. Foram selecionados
trabalhos cujos temas estivessem relacionados às atividades de organização e
tratamento de documentos em arquivos.
Entretanto, na análise do corpus, é forçoso afirmar que não foram
encontradas evidências suficientes para sustentar a existência de uma forte ligação
entre as atividades de organização da informação entre as duas áreas. Verificou-se,
que questões relativas ao conceito de regime de informação e linguagem não estão
explicitamente presentes nessa literatura. Constatação feita, a direção da pesquisa
voltou-se para o estabelecimento de hipóteses alternativas, de acordo com o método
de pesquisa hipotético-dedutivo adotado. Nesse método, estabelece-se uma
hipótese inicial com base em conhecimentos prévios como exposto no item sobre os
procedimentos metodológicos.
A ausência de evidências para sustentar essa hipótese inicial determinou a
elaboração de hipóteses alternativas. Assim sendo, estabeleceu-se como hipótese
de trabalho alternativa a ideia de que os processos de organização e tratamento da
informação estão que estão no cerne da renovação do saber teórico e prático da
arquivística fundamentam-se em princípios próprios. A análise de conteúdo de um
corpus representativo da literatura de Arquivística mostrou como são elaborados os
discursos sobre o tema da organização e tratamento da informação neste domínio.
Inicialmente, foi possível constatar que alguns conceitos são abordados com
certa frequência nos artigos analisados, como é o caso da classificação e da
indexação. Apesar do uso dos termos classificação e indexação, tanto na Ciência da
Informação quanto na arquivística, não há coincidências teórico-metodológicas entre
as atividades de arranjo de fundos e de coleções arquivísticas e o tratamento
documentário realizado em bibliotecas e em sistemas de informação bibliográfica.
184
Para a arquivística, a classificação procura retratar e recompor a ordem
original de fundos arquivísticos e coleções de conjuntos documentais. Tem a
finalidade básica de evitar a dispersão de conjuntos documentais que, isoladamente,
podem não ter significado.
A teoria da classificação é, portanto, um arcabouço teórico para dar
sustentação às atividades de dar unidade a um conjunto de documentos e reforçar a
importância do arquivo enquanto meio de recomposição e reconstituição de
contextos para compreender conteúdos individuais ou de grupos. Um documento
isolado, fora de um conjunto, é certamente uma fonte de informação, mas não é
forçosamente reconhecido como um documento de arquivo.
A literatura analisada sobre a classificação na arquivística mostrou os
esforços teóricos que vêm sendo empreendidos na busca de modelos de aplicação
da classificação atrelados aos princípios que fundamentam a organização e o
tratamento de documentos de arquivo.
O mesmo ocorre com a indexação. Os autores analisados relatam a ausência
desse procedimento nos arquivos. Foi possível verificar, no entanto, que a
indexação é realizada nos arquivos, de forma específica, apresentando
características relacionadas aos princípios da Arquivística, de indexar por meio das
evidências documentais e não por meio da análise subjetiva dos assuntos contidos
em documentos ou em conjuntos documentais. Indexa-se por nome de pessoas,
lugares, profissões, atividades, que são elementos evidenciados na análise
arquivística. O controle de vocabulário, processo estreitamente relacionado à
indexação, é utilizado, na arquivística, para estabelecer equivalências entre os
diferentes termos que representam um mesmo contexto.
Por outro lado, foi possível constatar que a arquivística possui um conjunto de
conhecimentos próprios, oriundos dos princípios arquivísticos e da tradição de
elaboração de manuais práticos que contribuem para dar sustentação à área
enquanto disciplinar científica.
Em outras palavras, a literatura analisada mostra que a arquivística
contemporânea construiu um arcabouço teórico com ferramentas capazes de dar
rigor à execução das funções próprias dos arquivos, no caso, organizar e tratar os
documentos de arquivo e disponibilizá-los para consulta em diferentes contextos.
A categoria de descrição arquivística mostrou que ela se fundamenta nos
princípios básicos de respeito aos fundos e à ordem original, apresentando modelos
185
e regras que sustentam e permitem cumprir as tarefas de organizar e tratar os
documentos para difusão.
A criação e aplicação das normas de descrição, ao longo dos anos, evidencia
a maturidade da área da arquivística em lidar com a articulação entre a teoria e a
prática, levando-a a caminhar para uma constante atualização de suas normas e
padrões de trabalho. Os desafios de lidar com os documentos digitais e com a
grande quantidade de informação que circula em novos formatos vêm sendo
enfrentados de forma consistente, havendo já as bases que permitem evoluir em
consonância com os princípios fundamentais que regem a área. O foco da
organização e tratamento do documento é, em primeiro lugar, a explicitação da
autenticidade do documento e sua validação. Os princípios arquivísticos são
valiosos para nortear esses processos.
A diplomática, área de conhecimento interdisciplinar, oferece, nas novas
abordagens, um conjunto específico de regras de organização e tratamento de
documentos de arquivo. Pode-se afirmar que a diplomática tem evoluído e se
beneficiado com as contribuições da arquivística. Ela é capaz de fornecer elementos
tanto para os tradicionais documentos arquivísticos quanto para os documentos em
meio digital, por meio da diplomática digital, concretizada em projetos de construção
de modelos de preservação, conservação e disponibilidade de documentos em meio
digital e em redes de compartilhamento de dados, como o projeto Interpares.
A diplomática vem oferecendo não somente elementos norteadores para o
estabelecimento das práticas de descrição arquivística, mas tem também atuado no
momento de criação de documentos, contribuindo, assim, para a busca de eficiência
nos sistemas de gestão de documento.
A análise arquivística contemporânea, proposta por Gérard Naud, mostra que
é possível, mesmo para os tradicionais arquivos franceses, evoluir com base em
suas próprias práticas. No modelo clássico, a função dos arquivos era recolher e
armazenar, não pairando dúvidas sobre a sacralidade dos documentos e seu
conteúdo. O conteúdo e as evidências de ação eram investigados e definidos por
pesquisadores e historiadores.
Atualmente, em meio a uma grande quantidade de documentos, variedade
tipológica, origem dispersa, faz-se necessário estabelecer regras aplicáveis desde o
momento de criação ou recebimento do documento no arquivo. Esse procedimento
de controle permite que o documento possa ser analisado e interpretado para que
186
lhe seja atribuído o valor de documento de arquivo, preparando assim seu percurso
até sua guarda definitiva em arquivos definitivos.
A análise arquivística inova ao propor a descrição não apenas da forma, mas
também do conteúdo. Como consequência, o profissional de arquivo passa a ter um
papel mais ativo no processo de organização e tratamento do documento.
Esses processos são hoje estudados na diplomática arquivística. O conteúdo
das evidências documentais é identificado principalmente com base em elementos
internos e externos, propostos pela diplomática tradicionalmente, desde Mabillon e
não com base apenas na interpretação subjetiva do conteúdo.
Muitas são as possibilidades de a arquivística se aventurar em explorar os
conteúdos dos documentos. Gerard Naud foi um inovador na tarefa de organizar e
tratar documentos. Quando era responsável pelo serviço educativo do Arquivo de Le
Man, organizou, em 1965, uma exposição cujo tema foram as duas grandes guerras.
Nessa exposição juntou, no mesmo espaço, objetos da biblioteca, do museu e do
arquivo, tal como esses elementos eram organizados e tratados nessas instituições.
Nessa atividade, Gerard Naud evidenciou a possibilidade de
compartilhamento de diferentes visões institucionais, ao promover uma exposição
temática. Cada tipo de instituição – biblioteca, museu e arquivo – apresentou seu
universo específico nos aspectos relativos ao tratamento de elementos sobre um
mesmo tema. Evidenciou que a interação institucional pode ser possível, desde que
cada um preserve e respeite o seu corpus teórico e prático de abordagem do tema.
Por meio da observação do corpus, constatou-se que a arquivística possui um
conjunto teórico-metodológico próprio que possibilita o seu desenvolvimento
enquanto disciplina científica. A análise mostrou que as práticas de organização e
tratamento de documentos atendem aos objetivos a que se propõem e que a área
evolui continuamente e inova suas práticas atendendo às demandas da sociedade.
A capacidade de se reinventar não advém, porém, de uma característica
endógena ou insular. Ao contrário, é possível afirmar que a arquivística evolui
estabelecendo diálogos fortes e consistentes com outras áreas de conhecimento, a
exemplo das pesquisas relacionadas ao tratamento do documento digital onde a
Arquivística alia-se a Diplomática, ao Direito, a Computação, a Administração e
outras áreas do conhecimento.
O objetivo da pesquisa foi cumprido e os resultados obtidos com a hipótese
alternativa de trabalho confirmaram a importância da organização e tratamento de
187
documentos como atividade nuclear da área porque permite realizar as atividades de
avaliação, preservação, gestão de documentos e recuperação da informação.
Como toda pesquisa, esta apresenta lacunas. As escolhas feitas, por
questões contingenciais, não permitiram avançar sobre o tema dos instrumentos de
pesquisa nos arquivos como um produto da atividade de tratamento e organização,
e mais especificamente, da descrição arquivística.
Portanto, a presente pesquisa pode ter vários desdobramentos. Como
possibilidades de desenvolvimento, propomos:
a) Analisar o processo de construção e uso das ferramentas de pesquisa nos
arquivos poderá ampliar o entendimento sobre a função da descrição arquivística na
perspectiva de verticalização do tema, em trabalhos futuros.
b) Investigar como ocorre na prática dos arquivos brasileiros a atividade de
organização e tratamento seria outro viés de estudo sobre o tema, que poderá levar
a novas constatações, visto que a realidade brasileira difere da realidade dos países
de origem da maioria da bibliografia analisada. Tem-se consciência de que a
realidade dos arquivos no Brasil difere da realidade dos países europeus, norte-
americanos, australianos e um estudo sobre as práticas desenvolvidas nos arquivos
brasileiros poderá ampliar os conhecimentos sobre o tema.
c) Outro tema que merece ser analisado em profundidade, a partir dos
resultados da pesquisa, refere-se às ferramentas de controle terminológico, que
foram identificadas no corpus analisado como ferramentas de apoio essenciais para
o trabalho da descrição dos documentos. É um tema ainda pouco explorado nos
textos sobre os processos de organização e tratamento de documentos
arquivísticos.
d) A diplomática foi uma grande descoberta neste estudo, pois possibilitou
entender como a área da Arquivística continua apresentando respostas consistentes
para os dilemas enfrentados pelas demais áreas que lidam com a informação, tais
como o controle da origem do documento e as questões relacionadas à originalidade
e veracidade dos dados. Os conceitos de evidência e autenticidade relacionados a
esse termo também são estudos fundamentais para a área de organização e
tratamento para que os arquivos contribuam efetivamente para a democratização do
acesso à informação, para a gestão de políticas públicas e construção da memória
social.
188
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