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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
DISTÚRBIOS E TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM NA VISÃO
DO ORIENTADOR EDUCACIONAL E PEDAGÓGICO
Por: Carla Santiago Ferro Silva de Jesus
Orientador
Profª. Mary Sue Carvalho Pereira
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
Distúrbios e Transtornos de Aprendizagem na Visão do
Orientador Educacional e Pedagógico
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Orientação
Educacional e Pedagógica.
Por: Carla Santiago Ferro Silva de Jesus
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela inspiração.
À minha família pela compreensão e
apoio.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todas as crianças
que me fizeram buscar compreender o
que as tornam tão incompreendidas.
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RESUMO
Como identificar, compreender e conduzir as dificuldades, distúrbios de
aprendizagem e transtornos de comportamento, a fim de orientar
adequadamente família, escola e criança? Constantemente, pais, responsáveis
e educadores têm se deparado com crianças apresentando dificuldades em
assimilar conteúdos, dificuldades na leitura e na escrita, dificuldades em
cálculos, falta de atenção e concentração, aparente falta de interesse e
motivação, agitação, agressividade, impulsividade e comportamentos difíceis
de lidar. Tal problemática justifica o desejo de alcançar, através deste estudo,
esclarecimentos acerca destes problemas que tanto afligem família, escola e
sociedade. Através deste trabalho, identificaremos os distúrbios e transtornos
mais comuns, a fim de orientar pais, educadores e responsáveis para o melhor
desenvolvimento da criança ou adolescente, encontrando ações mais eficazes
para a condução dos mesmos.
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METODOLOGIA
Este trabalho foi realizado através de estudo e pesquisa bibliográfica
incluindo livros acadêmicos, revistas especializadas, artigos da internet, DVDs
educativos e demais fontes científicas relacionadas ao tema abordado.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - Visão Geral da Aprendizagem 12
CAPÍTULO II - Diferenciando Dificuldades, Distúrbios e Transtornos 22
CAPÍTULO III – Os Distúrbios de Aprendizagem 29
CAPÍTULO IV – Os Transtornos de Aprendizagem 36
CONCLUSÃO 50
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 52
SITES CONSULTADOS 54
ÍNDICE 55
FOLHA DE AVALIAÇÃO 57
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INTRODUÇÃO
“Nas salas de aula, não temos um sujeito epistêmico, mas alunos em em várias fases de desenvolvimento com a obrigação de ensinar a todos simultaneamente.” Jean Piaget
O que fazer com aquele aluno que não consegue assimilar o
conteúdo? Com o extremamente agitado e disperso? Com o agressivo?
Com o sonolento? Com o aparentemente desinteressado e desmotivado?
Antes de qualquer coisa, é preciso evitar o pré-julgamento, é preciso evitar
rotular a criança.
Rotulá-los como bagunceiros, indisciplinados ou desinteressados
pode ser um erro muito grave cometido pela falta de preparo e informação
em reconhecer as possíveis causas das dificuldades de aprendizagem e
transtornos de comportamento presentes em sala de aula.
O esclarecimento é o primeiro passo para evitar enganos e permitir
que todos recebam a atenção necessária para o desenvolvimento de suas
potencialidades.
Através deste trabalho, estudaremos alguns distúrbios de
aprendizagem e transtornos de comportamento identificando-os e
diferenciando-os, com o objetivo de oferecer a estas crianças e suas
famílias, orientação, encaminhamento e tratamento adequados dentro e fora
da escola.
Discutiremos a visão do Orientador Educacional e Pedagógico
diante de mais este desafio que, geralmente é classificado por professores e
até pela família apenas como incapacidade de aprender, indisciplina,
preguiça ou demais conceitos que se colocam no aluno que não consegue
se adaptar ao ambiente escolar, não segue o ritmo de aprendizagem de sua
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turma e da sua idade, não consegue se relacionar ou que apresenta
irritabilidade, agitação e agressividade.
O trabalho do Orientador deverá ir além destes rótulos ou clichês.
Conscientizar família e educadores será o primeiro passo para ajudá-los a
compreender as diferentes causas dessas dificuldades e transtornos. Sendo
estes gerados por fatores genéticos, patológicos, sociais, emocionais,
cognitivos, dificultando o aprendizado ou a socialização.
A partir do momento em que rotulamos, estamos definindo um
comportamento sem respeitar as causas. É claro que não podemos deixar
de ter o cuidado para não isentar o aluno de sua parcela de
responsabilidade, bem como, cada uma das partes envolvidas no processo
ensino-aprendizagem: família e escola.
A rotulação costuma criar um caminho de justificativa muito fácil
para o educador. Normalmente, o professor ao identificar que a criança está
com dificuldade, já a encaminha para a orientação solicitando que a família
procure logo um especialista antes mesmo de tentar solucionar o problema
em sala de aula. Em muitos casos, uma simples mudança na forma de
ensinar, na forma de olhar seria suficiente. O que ocorre é que muitas vezes
os próprios professores, pela desinformação, não sabem distinguir
problemas de aprendizagem de distúrbios ou transtornos, inclusive os de
comportamento.
Todos os distúrbios, dificuldades e transtornos vivenciados no
cotidiano de uma sala de aula, exigem atenção especial, um olhar
diferenciado, estudos minuciosos com uma visão geral da criança em todos
os aspectos de seu desenvolvimento e em todos os contextos aos quais
está inserida.
Ora, se “o ser humano é um produto do meio em que vive”, por
onde iniciar os ajustes para evitar tantas dificuldades e transtornos?
Faz-se necessário direcionar a atenção para a base maior do
homem no início de suas relações sociais: a família. Ressaltando a sua
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relevância no desenvolvimento e comportamento do indivíduo, é no seio da
família que são gerados valores imprescindíveis à formação de hábitos
indispensáveis à conduta do cidadão.
É preciso reconhecer que a família é a primeira referência do
indivíduo. É aonde irá introjetar valores que o acompanharão por toda a vida
e definirão o seu desenvolvimento humano, profissional e pessoal para que,
ao ser inserido no contexto escolar, possa se libertar de dificuldades e
transtornos, ampliar seus horizontes para que, ao chegar ao mercado de
trabalho, tenha características como adaptação disciplinar e relacionamento
social adequado ao meio.
Na sociedade em que vivemos, mesmo com seus valores
mutilados pelos avanços do tempo e da tecnologia, a família sempre será a
base do indivíduo. A parceria família-escola, mesmo em tempos de guerras,
desamores, ainda é sinônimo de educação de qualidade, pois esses pilares
foram e sempre serão os guias que conduzirão o homem pelo sinuoso
caminho da realização pessoal e profissional.
Então, o segundo grande elemento de formação do indivíduo é a
escola. A criança vem para ela com um enorme potencial de aprendizagem
intelectual e convivência social. Sabemos que dois elementos básicos
contribuem para a formação do indivíduo: herança genética e ambiente. Os
avanços da neurociência que possibilitou o maior conhecimento do
funcionamento do cérebro, mostram a importância do ambiente nos
primeiros anos de vida. Até os três anos de idade é que se estrutura a base
da nossa personalidade e nossa forma de interagir com o mundo.
Uma criança nascida em um ambiente de carinho, proteção,
estímulos afetivos, sensoriais e limites começa a fazer mais e mais
conexões neurais que a tornam confiante e saudável. A criança nascida em
um lar com essas características tem mais equilíbrio emocional com maior
capacidade de aprendizado e de resolver os conflitos normais do dia-a-dia.
Problemas no âmbito familiar como financeiros, emocionais,
conjugais, de autoridade e estabelecimento de regras e limites, geram vários
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desencontros e desentendimentos entre os membros e é na escola que vão
surgir alterações de comportamento que deixam pais e professores
perplexos e perdidos sem saber como proceder.
É fundamental que pais e educadores conheçam mais sobre os
fatores que causam esses estresses, dificuldades e transtornos nas
crianças. Alguns são só tensões que podem ser resolvidas com orientações
à família e aos professores de proporcionar mais diálogo, presença
significativa da família na vida da criança, encontro constante entre pais e
professores.
Este estudo não tem a pretensão de apontar soluções, mas
procurará contribuir para o conhecimento das possíveis causas que levam
nossas crianças a passar por dificuldades, distúrbios de aprendizagem e
transtornos de comportamento.
O objetivo deste trabalho é esclarecer pais, familiares, professores
e educadores, acerca da linha tênue que existe entre o que pode ser
considerado normal, uma dificuldade ou transtorno. É importante estar alerta
para saber identificar os sintomas apresentados pela criança, família e
escola, pois estes podem estar intimamente ligados ou relacionados.
Sabemos que, frequentemente, é na escola, por alterações de
comportamento e de desempenho, que estes problemas se manifestam.
Então, é nosso desejo, informar e orientar, a fim de facilitar a identificação e
o manejo de tais sintomas comportamentais característicos de cada
dificuldade, distúrbio ou transtorno que tanto sofrimento causam às crianças,
suas famílias e professores.
Já existem tratamentos eficazes para a maioria deles. É nosso
dever reconhecê-los precocemente e tratá-los efetivamente para o melhor
desenvolvimento dessas crianças.
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CAPÍTULO I
VISÃO GERAL DA APRENDIZAGEM
De acordo com Aurélio Buarque de Holanda, em seu dicionário,
“aprendizagem é o ato ou a ação de aprender, que envolve aprendizado. É o
tempo durante o qual se aprende.” E, segundo o mesmo autor, “aprender, é
adquirir conhecimento, instruir-se.”
Em uma visão mais ampla e, de acordo com os principais estudiosos
da educação, podemos resumir integrando o mesmo pensamento:
“O processo de aprendizagem pode ser definido de forma
sintética como o modo como os seres adquirem novos
conhecimentos, desenvolvem competências e mudam o
comportamento. Contudo, a complexidade desse
processo dificilmente pode ser explicada apenas através
de recortes do todo. Por outro lado, qualquer definição
está, invariavelmente, impregnada de pressupostos
político-ideológicos, relacionados com a visão de homem,
sociedade e saber.”
(Site: www.wikipédia.org )
Para obter uma visão geral do ato de aprender, faz-se necessário
refletir acerca da história desde ato ao longo dos tempos, pois no passado,
crianças e adolescentes não eram valorizados como um ser humano que
está, em qualquer tempo e espaço, em constante crescimento e
aprendizado.
É importante considerarmos alguns aspectos que surgiram na
tentativa de entender os processos educacionais, desde a Antiguidade até
os tempos atuais.
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Breve Histórico
Na antiguidade, predominava o pensamento de que a criança era um
“adulto em miniatura” e uma “tabula rasa” onde se adicionavam conceitos de
acordo com o interesse da cultura na qual estava inserida.
Gustavo Teixeira (2006, p.3), nos mostra que nesta época, as crianças
realmente eram vistas como “mini-adultos”, não tinham o direito de brincar,
estudar ou “ser criança” e até mesmo as roupas e vestimentas eram idênticas
às usadas pelos adultos.
Ainda segundo Teixeira (2006, p.3), essa visão equivocada da infância
se deu pelo fato de que o termo “família” era designado apenas à fidelidade
dos servos ao senhor feudal, sem nenhuma conotação sentimental ou de
núcleo hereditário como temos hoje. Teixeira diz que “a partir desta época,
com o final do feudalismo, o surgimento das cidades e o desenvolvimento do
capitalismo, ocorreu na Europa a expansão das escolas e dos conceitos
iniciais de pedagogia.”
A aprendizagem começou a ser estudada e sistematizada desde os
povos da antiguidade oriental. No Egito, na China e na Índia a finalidade era
transmitir as tradições e os costumes.
Já na antiguidade clássica, na Grécia e em Roma, a aprendizagem
passou a seguir duas linhas opostas, porém complementares. Uma delas foi a
pedagogia da personalidade que visava a formação individual e a outra, a
pedagogia humanista, que desenvolvia os indivíduos numa linha onde o
sistema educacional era representativo da realidade social, enfatizando a
aprendizagem universal.
Durante a Idade Média, a aprendizagem e, consequentemente, o
ensino, seguiram o mesmo rumo e passaram a ser determinados pela religião
e seus dogmas. Por exemplo, uma criança “aprendia” não ser canhota,
ou sinistra, embora neurologicamente o fosse. Não havia respeito a estas
particularidades orgânicas e neurofuncionais.
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No final daquele período, iniciou-se a separação entre as teorias da
aprendizagem e do ensino com a independência em relação ao que era
determinado pela igreja. Devido às modificações que ocorreram com o advento
do humanismo e da Reforma, no século XVI, e sua ampliação a partir da
revolução francesa, as teorias do ensino-aprendizagem continuaram a seguir
seu rumo natural.
Do século XVII até o início do século XX, a doutrina central sobre a
aprendizagem era demonstrar cientificamente que determinados processos
universais regiam os princípios da aprendizagem tentando explicar as causas e
as formas de seu funcionamento, forçando uma metodologia que visava
enquadrar o comportamento de todos os organismos num sistema unificado de
leis, da mesma forma de sistematização efetuada pelos cientistas para a
explicação dos demais fenômenos das ciências naturais.
Muitos acreditavam que a aprendizagem estava intimamente ligada
somente ao condicionamento. Um exemplo de experiência sobre o
condicionamento foi realizada pelo fisiólogo russo, Ivan Pavlov, que
condicionou cães para salivarem ao som de campainhas.
Na década de 30 os cientistas Edwin R. Guthrie, Clark L. Hull e
Edward C. Tolman pesquisaram sobre as leis que regem a aprendizagem.
Guthrie acreditava que as respostas, ao invés das percepções ou os
estados mentais, poderiam formar os componentes da aprendizagem.
Hull afirmava que a força do hábito, além dos estímulos originados
pelas recompensas, constituía um dos principais aspectos da aprendizagem, a
qual se dava num processo gradual.
Tolman seguia a linha de raciocínio de que o princípio objetivo visado
pelo sujeito era a base comportamental para a aprendizagem. Percebendo o
ser humano na sociedade em que está inserido, se faz necessário uma maior
observação de seu estado emocional.
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Teixeira (2006, p.3), nos lembra acerca da visão que se tinha da
família, que somente no final do século XVIII, passou a ser observada como
“núcleo unificador” dos valores morais e éticos da sociedade, a criança passou
a ser cada vez mais valorizada e protegida. Surge a preocupação com a
Educação Infantil, com o desenvolvimento e aprendizagem da criança, a
valorização dos cuidados maternos e da proteção familiar.
Teixeira (2006, p.4), aponta que a partir dos estudos de Jean Jacques
Rousseau, a sociedade passou a compreender que a criança é um ser com
características próprias, que possui idéias e interesses e não poderia mais ser
vista como uma “tabula rasa” ou um “adulto em miniatura”. Cada fase da vida
da criança possui determinadas características e a educação deveria atender
às necessidades e peculiaridades de cada etapa, atendendo as modificações
individuais de cada indivíduo em formação.
Teixeira (2006, p.4), nos mostra que, diferentemente da rígida e
hierarquizada educação da época, Rousseau propôs a utilização de
brinquedos, esportes, linguagem, canto, aritmética e geometria com a intenção
de estimular o desenvolvimento infantil, respeitando suas diferenças quando
comparadas aos adultos.
A partir da valorização desses novos conceitos absorvidos pela
sociedade, a própria medicina passou a se interessar e a estudar os aspectos
comportamentais infantis. Em meados do século XX, surgiram as primeiras
referências sobre os transtornos hipercinéticos na literatura médica, referindo-
se ao comportamento de crianças hiperativas.
A partir de então, o estudo comportamental infantil progrediu
intensamente até ficar marcado com o início de nova especialidade médica no
I Congresso de Psiquiatria Infantil de Paris em 1937.
No Brasil, Teixeira (2006, p.5), enfatiza como marco inicial destes
estudos, a criação da Associação Brasileira de Neuropsiquiatria Infantil
(ABENEPI), por Stanislau Krynski e Antônio Branco Lefèvre, em 1967.
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As definições de aprendizagem
Segundo os principais estudiosos da educação, podemos
compreender que a aprendizagem é um processo integrado que provoca uma
transformação qualitativa na estrutura mental daquele que aprende. Essa
transformação se dá através da alteração de conduta de um indivíduo, seja por
condicionamento operante, experiência ou ambos, de uma forma
razoavelmente permanente. As informações podem ser absorvidas através de
técnicas de ensino ou até pela simples aquisição de hábitos. O ato ou vontade
de aprender é uma característica essencial do psiquismo humano, pois
somente este possui o caráter intencional, ou a intenção de
aprender; dinâmico, por estar sempre em mutação e procurar informações
para a aprendizagem; criador, por buscar novos métodos visando a melhora da
própria aprendizagem, por exemplo, pela tentativa e erro.
Outro conceito de aprendizagem é uma mudança relativamente
durável do comportamento, de uma forma mais ou menos sistemática, ou não,
adquirida pela experiência, pela observação e pela prática motivada.
O ser humano nasce potencialmente inclinado a aprender,
necessitando de estímulos externos e internos (motivação, necessidade) para
o aprendizado. Há aprendizados que podem ser considerados natos, como o
ato de aprender a falar, a andar, necessitando que ele passe pelo processo de
maturação física, psicológica e social. Na maioria dos casos a aprendizagem
se dá no meio social e temporal em que o indivíduo convive; sua conduta
muda, normalmente, por esses fatores, e por predisposições genéticas.
Todos estes cientistas contribuíram para a visão que temos hoje da
aprendizagem. Vejamos agora, o que dizem dois dos principais estudiosos da
pedagogia e psicologia.
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O processo de aprendizagem para Vygotsky (1896-1934)
Vygotsky (1993 p. 44), parte da concepção de que o “pensamento
verbal” não é uma forma de comportamento natural e inata, mas é
determinado pelo processo histórico-cultural ao qual o indivíduo está
inserido com propriedades e leis específicas que não podem ser encontradas
nas formas naturais de pensamento e fala. Uma vez admitido o caráter
histórico do pensamento verbal, devemos considerá-lo sujeito a todas as
premissas do materialismo histórico, que são válidas para qualquer fenômeno
histórico na sociedade humana. Sendo o pensamento sujeito às interferências
históricas às quais está o indivíduo submetido, entende-se que, o processo de
aquisição da ortografia, a alfabetização e o uso autônomo da linguagem
escrita, são resultantes não apenas do processo pedagógico ensino-
aprendizagem propriamente dito, mas das relações subjacentes a isto.
Vygotsky (1991 p. 101), diz ainda que “o pensamento propriamente
dito é gerado pela motivação isto é, por nossos desejos e necessidades,
nossos interesses e emoções. Por trás de cada pensamento há uma tendência
afetivo-volitiva.” Essa compreensão plena e verdadeira do pensamento do
outro só é possível quando entendemos sua base afetivo-volitiva. Desta forma,
entendemos que, não seria válido estudar as dificuldades de aprendizagem
sem considerar os aspectos afetivos. Avaliar a fase ou estágio de
desenvolvimento, ou realizar testes psicométricos não responde
completamente as questões levantadas acerca das dificuldades. Segundo
Vygotsky, é necessário fazer uma análise do contexto emocional, das relações
afetivas, do modo como a criança está situada historicamente no mundo.
Na abordagem de Vygotsky (1991 p. 101), a linguagem tem um papel
de “construtor e de propulsor do pensamento”, afirma que o aprendizado não é
desenvolvimento, o aprendizado adequadamente organizado resulta em
desenvolvimento mental e põe em movimento, vários outros processos de
desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer. A
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linguagem seria então, o motor do pensamento, contrariando assim a
concepção desenvolvimentista que considera o desenvolvimento a base para a
aquisição da linguagem. Vygotsky (1991 p. 102), defende que os processos de
desenvolvimento não coincidem com os processos de aprendizagem, uma vez
que o desenvolvimento progride de forma mais lenta, indo atrás do processo
de aprendizagem. Isto ocorre de forma sequencial.
O processo de aprendizagem para Jean Piaget (1896-1980)
Segundo Barry Wadsworth (1996), os estudos de Piaget revelam a
teoria da equilibração, que trata a aprendizagem como “um ponto de equilíbrio
entre a assimilação e a acomodação, e assim, é considerada como um
mecanismo auto-regulador, necessária para assegurar à criança uma interação
eficiente dela com o meio-ambiente.” Piaget nos mostra que “todo esquema de
assimilação tende a alimentar-se, isto é, a incorporar elementos que lhe são
exteriores e compatíveis com a sua natureza.” E também que, “todo esquema
de assimilação é obrigado a se acomodar aos elementos que assimila”, isto é,
entendemos que, a assimilação pode se modificar em função de suas
particularidades, sem com isso, perder sua continuidade nem seus poderes
anteriores de assimilação. (Piaget, 1975, p. 14)
Piaget (1975, p.14) define que o equilíbrio cognitivo depende da
“presença necessária de acomodações nas estruturas, bem como a
conservação de tais estruturas em caso de acomodações bem sucedidas”.
Explica que esta equilibração é necessária porque se uma pessoa só
assimilasse, desenvolveria apenas alguns esquemas cognitivos, esses muito
amplos, comprometendo sua capacidade de diferenciação. Contudo, se uma
pessoa só acomodasse, desenvolveria uma grande quantidade de esquemas
cognitivos, porém muito pequenos, comprometendo seu aprendizado de tal
forma que a maioria das coisas seriam vistas sempre como diferentes, mesmo
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pertencendo à mesma classe. Essa noção de equilibração foi a base para o
conceito, desenvolvido por Sara Pain (1989), sobre as modalidades de
aprendizagem, que se servem dos conceitos de assimilação e acomodação, na
descrição de sua estrutura processual.
Segundo Wadswort, “se a criança não consegue assimilar um
estímulo ela tenta, então, fazer uma acomodação, modificando um esquema
ou criando um esquema novo. Quando isso é feito, ocorre a assimilação do
estímulo e, nesse momento, o equilíbrio é alcançado.” (Wadsworth, 1996)
Piaget (1982) nos esclarece que o pleno desenvolvimento da
personalidade sob seus aspectos mais intelectuais é indissociável do conjunto
das relações afetivas, sociais e morais que constituem a vida da instituição
educacional. O desenvolvimento da personalidade parece depende dos fatores
afetivos. Na realidade, a educação forma um todo indissociável e não é
possível formar personalidades autônomas no domínio moral se o indivíduo
estiver submetido a uma coerção intelectual tal que o limite a aprender
passivamente, sem tentar descobrir por si mesmo a verdade, se ele é passivo
intelectualmente não será livre moralmente. Mas reciprocamente, se sua moral
consiste exclusivamente numa submissão à vontade adulta e se as
únicas relações sociais que constituem as relações de aprendizagem são as
que ligam cada estudante individualmente a um professor que detém todos os
poderes, ele não pode tampouco ser ativo intelectualmente. Piaget afirma que
"adquirida a linguagem, a socialização do pensamento manifesta-se pela
elaboração de conceitos e relações e pela constituição de regras. É justamente
na medida, até, que o pensamento é transformado pela sua natureza coletiva q
ele vai se tornando capaz de comprovar e investigar a verdade, em contraste
com os atos práticos dos atos da inteligência sensório-motora e à sua busca de
êxito ou satisfação" (Piaget, 1975 p. 115).
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Percebemos então, que a aprendizagem é influenciada pela inteligência
e pela motivação, e, segundo alguns teóricos, pela hereditariedade, com
algumas controvérsias, onde o estímulo, o impulso, o reforço e a resposta são
os elementos básicos para o processo de fixação das novas informações
absorvidas e processadas pelo indivíduo, como na concepção behaviorista.
Compreender o processo de aprendizagem é de suma importância para
o estudo do comportamento. Alguns autores afirmam que certos processos
neuróticos, ou neuroses, nada mais são que uma aprendizagem distorcida, e
que a ação recomendada para algumas psicopatologias são um
redirecionamento para a absorção da nova aprendizagem que substituirá a
antiga, de forma a minimizar os sintomas que tanto incomodam e perturbam
família, escola e sociedade. Isto é, através da reaprendizagem ou re-
educação, ou ainda, da intervenção profissional através da Psicopedagogia,
Psicomotricidade, Psicologia, Psiquiatria, Neurologia, Terapia Ocupacional,
dentre outras, conseguiremos alcançar êxito no desenvolvimento e
aprendizagem de nossas crianças e adolescentes.
Compreendendo então, que uma nova aprendizagem só se concretiza
quando o material novo se incorpora e se relaciona, com os conhecimentos e
saberes que se possui, começou-se a pensar na utilização de métodos que
explicassem a aprendizagem de forma dinâmica, e não estática, levando-se
em conta o desenvolvimento global do indivíduo em todos os seus aspectos:
cognitivo, neurológico, afetivo, psicomotor e social.
Com o decorrer do tempo e das experimentações, surge a educação
sistematizada, onde os jovens são afastados de suas famílias para
aprenderem com outros adultos, seguindo metodologias e currículos comuns.
Este novo ensino trouxe consigo uma nova situação. Ao estarem juntos, com
os mesmos professores e aprendendo as mesmas coisas, percebe-se que
nem todos aprendem da mesma forma e com a mesma rapidez.
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As dificuldades de aprendizagem passaram a ser foco de atenção e a
medicina começou a estudar a causa desses problemas e suas possíveis
correções.
No final do séc. XIX, educadores, psicólogos, psiquiatras e
neuropsiquiatras, começaram a se preocupar com os aspectos que interferiam
na aprendizagem e a organizar métodos para a educação.
Simaia Sampaio (2009, p.28), referindo-se aos estudos de José & Coelho
(2002, p.23), nos mostra que “existem inúmeros fatores que podem
desencadear problemas ou distúrbios de aprendizagem”:
• Fatores orgânicos – saúde física deficiente, falta de integridade
neurológica (sistema nervoso doentio), alimentação inadequada, etc.
• Fatores psicológicos – inibição, fantasia, ansiedade, angústia,
inadequação à realidade, sentimento generalizado de rejeição, etc.
• Fatores ambientais – o tipo de educação familiar, o grau de estimulação
que a criança recebeu desde os primeiros dias de vida, a influência dos
meios de comunicação, etc.
Ainda segundo esses autores, sintomas e comportamentos infantis se
apresentam com tal intensidade que fica cada vez mais difícil para pais e
educadores classificar e lidar adequadamente com tais problemas de maneira
a diferenciá-los em dificuldade, distúrbio ou transtorno de aprendizagem.
É sobre esta diferença que discutiremos no capítulo a seguir.
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CAPÍTULO II
DIFERENCIANDO DIFICULDADES, DISTÚRBIOS E
TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM
Considerando que “o aprendizado é um processo complexo e dinâmico,
que resulta em modificações estruturais e funcionais do sistema nervoso
central” (Olivier, 2008) e que o sucesso do indivíduo deve-se em grande parte
ao bom desempenho escolar, percebemos que um número cada vez maior de
crianças vêm apresentando problemas nesta área.
Família e escola buscam orientação especializada e, cresce o número
de crianças atendidas por neuropediatras, psiquiatras, psicólogos,
psicopedagogos e fonoaudiólogos com queixas de problemas de
aprendizagem, de comportamento, de relacionamento, adaptação ao ambiente
escolar e outros.
Geralmente, tais problemas são intitulados por familiares e educadores
como dificuldade, distúrbio ou transtorno. Os termos utilizados são
empregados de forma aleatória e inadequada.
Neste capítulo, esclareceremos a diferença entre estes termos, afim de
melhor orientar o trabalho do educador, da escola e da família, permitindo
assim melhor integração de todos, profissionais e leigos, envolvidos no
processo de aprendizagem.
Um primeiro passo é compreender que a presença de uma dificuldade
de aprendizagem não implica necessariamente em um transtorno. As
dificuldades geralmente estão ligadas a um grupo heterogêneo de problemas
passageiros que podem estar associados como, por exemplo, a conteúdos
escolares inadequados, que não se relacionam à realidade escolar do aluno, a
dificuldades que a criança pode apresentar em algum momento da vida, como
a separação dos pais ou a perda de alguém querido e, até mesmo, de algum
animal de estimação, trazendo então, problemas psicológicos,
comportamentais, falta de motivação e baixa auto-estima.
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Além de fatores emocionais, fatores orgânicos também podem estar
associados aos problemas de aprendizagem. Vários estudos na área da saúde
mental ajudaram a mudar conceitos e interpretações equivocadas a respeito
da aprendizagem mostrando que é de extrema importância, o estudo e a
investigação de todas as causas possíveis para que a criança não seja vista
como a única responsável por não conseguir aprender.
Se esta investigação não for feita adequadamente ou se por ventura for
mascarada, dificilmente a criança obterá êxito no aprender e não conseguirá
prosseguir seus estudos gerando assim, o tão falado fracasso escolar.
É preciso que família e escola se unam num processo incessante de
investigação para ajudar a criança na superação ou amenização de sua
dificuldade, distúrbio ou transtorno de aprendizagem.
Antes de elucidarmos acerca das dificuldades, distúrbios e transtornos
de aprendizagem, vale ressaltar que, neste percurso, existe o que é
considerado normal.
Lou de Olivier (2008, p.33) nos apresenta claramente algumas
características normais do desenvolvimento infantil para que possamos
compreender e analisar o que pode ser considerado normal, dificuldade e com
tendências ao distúrbio ou transtorno.
O que é normal?
Entendemos normal como tudo que se refere ao desenvolvimento
natural do ser humano, desde o seu nascimento, passando por todas as fases
esperadas até a sua maturidade.
Para esta visão, contamos com vários estudiosos do desenvolvimento
do ser humano que muito contribuíram para que pudéssemos compreender o
que acontece em cada fase, como por exemplo, os estudos realizados por
Piaget, Freud, Vygotsky, Wallon, dentre outros.
Olivier (2008, p.33), nos faz lembrar que no recém-nascido até os seis
meses de vida, o normal é que ele tenha domínio sobre os reflexos, chore ao
sentir algum desconforto, reaja aos mais variados estímulos do ambiente,
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como às sensações e emoções do convívio social. É normal que consiga sugar
durante a amamentação, tenha boa digestão, bom funcionamento intestinal e
tenha um sono tranquilo. É normal que dos 6 aos 24 meses, desenvolva
aspectos motores como o engatinhar, andar e falar.
Torna-se problemático quando, em alguma fase do desenvolvimento
apareçam alterações do que é considerado normal, esteja o ser humano na
fase da infância, adolescência ou adulta.
Todas as características do desenvolvimento normal devem ser
estudadas e analisadas para se ter um parâmetro do que considerar
“problemático”. Olivier (2008, p.34) nos alerta que, se por ventura o bebê, a
criança ou adolescente apresentar uma ou duas características do
“problemático”, não há motivo para pânico, pois pode ser apenas uma
característica de personalidade do indivíduo ou comportamento momentâneo
em resposta a alguma situação vivida, seja no aspecto emocional ou social.
Mesmo assim, devemos consultar os profissionais adequados a fim de ajudar a
descartar possibilidades avaliando o grau de desenvolvimento apresentado.
O primeiro profissional a ser procurado deverá ser o pediatra que já
conhece e acompanha a criança desde seus primeiros meses ou anos de vida.
No caso de a criança apresentar uma ou mais características do distúrbio, já é
motivo para atenção especial e, o próprio pediatra analisará e avaliará suas
características fazendo os encaminhamentos necessários a outros
profissionais, como para o psicólogo, fonoaudiólogo, neuropediatra,
psicopedagogo e até mesmo para o psiquiatra, se por ventura reunir todos os
sintomas de algum distúrbio. Geralmente, encaminham-se para o psiquiatra
quando o problemático começa a interferir na vida normal do indivíduo, é
quando os sintomas se apresentam em excesso como, irritabilidade e
instabilidade emocional, intolerância à frustração, dificuldades nas funções
executivas, choro excessivo, tiques nervosos, atrasos na fala e no andar,
problemas motores mais acentuados, convulsões, isolamento, apatia, etc.
Crianças em idade escolar que apresentam diversos sintomas tais
como, desatenção, desinteresse, desmotivação, dificuldades na leitura e
25
escrita, na aritmética, na coordenação motora, devem ser encaminhados ao
psicopedagogo que irá avaliar sua capacidade de aprendizagem.
Entender o que é normal é ter uma visão completa do desenvolvimento
e aprendizagem do indivíduo e não rotular ao primeiro sintoma. Ponderar e ter
bom senso, analisar a história completa de vida da criança e sua família é um
dos passos principais para iniciar um acompanhamento e investigação acerca
do problema apresentado.
Cabe a nós, pais e educadores, iniciarmos este estudo aprofundado do
que é normal e do que pode ser considerado distúrbio ou transtorno, para
alcançarmos êxito no atendimento às necessidades de nossas crianças.
O que é dificuldade? O que é distúrbio? O que é transtorno?
Diante dos mais variados problemas que atrapalham o processo de
aprendizagem, podemos destacar os que têm origem pedagógica, causados
por desajustes do aluno à escola, por um descompasso entre família e escola
ou até mesmo pela má formação e falta de atualização do professor. Estes
problemas podem gerar as dificuldades de aprendizagem.
Alguns problemas refletem disfunções nas áreas do cérebro que são
responsáveis pela linguagem. Há uma perturbação nas medidas de leitura e
escrita, como acontece no caso da dislexia, por exemplo. Este tipo de
alteração é característico dos distúrbios de aprendizagem.
Outros problemas têm origem nas funções executivas do cérebro cuja
integridade favorece o levantamento de informação, organização, análise,
planejamento, fixação de objetivos e planos de acordo com elas.
Desorganização e impulsividade podem ser notadas, por exemplo, no TDAH/I.
Problemas nestas áreas são característicos dos transtornos de
aprendizagem.
A Professora Lucília Panisset, sintetiza:
26
“Distúrbios e transtornos têm origem interna, dificuldades
têm origem externa, no ambiente e no outro.” (Lucília
Panissete. DVD – Educação Especial. Multiverso, 2009).
Dificuldades de aprendizagem
Então, podemos afirmar que os fatores envolvidos nas dificuldades de
aprendizagem podem estar associados a fatores relacionados com a escola,
dependendo das condições físicas e ambientais, condições pedagógicas e
condições do corpo docente, a fatores relacionados com a família, como a
escolaridade dos pais, hábitos de leitura e histórico da família com relações a
doenças, uso de drogas e demais influências e, ainda, com relação à criança,
problemas físicos, sensoriais, como problemas de visão, audição,
comprometimentos emocionais e sociais como a timidez, a insegurança,
ansiedade, baixa auto-estima, fobias, depressões e demais problemas
emocionais.
As dificuldades de aprendizagem podem ser consideradas as mais
fáceis de serem diagnosticadas e tratadas, pois os fatores envolvidos podem
ser revertidos e até tratados de forma preventiva.
Segundo Relvas (2009, p.59), para que a escola consiga um bom
rendimento de seus alunos é importante promover condições físicas
adequadas de salas de aula, como higiene, boa iluminação, boa ventilação e
um limite aceitável de número de alunos por turma. Promover condições
pedagógicas e disponibilidade de material didático adequado à faixa etária e
método pedagógico que atenda à realidade sócio-cultural dos alunos. E ainda,
promover condições para atuação do corpo docente, mantendo uma equipe
motivada, dedicada, qualificada e com remuneração adequada.
Ainda segundo essa autora, a família deve oferecer condições para que
a criança tenha todos os estímulos necessários à aprendizagem. A
escolaridade dos pais, o hábito da leitura e o histórico familiar muito
influenciam no desenvolvimento cognitivo da criança.
27
Já os fatores relacionados com a criança devem ser tratados de forma
específica, de maneira a atender suas necessidades educativas. Podem estar
inclusos as deficiências geradas por dificuldades sensoriais seja ela visual ou
auditiva, dificuldades motoras como as deficiências físicas e até
comprometimentos neurológicos como a paralisia cerebral, a deficiência
mental, a epilepsia.
A criança que não ouve ou não enxerga direito não pode ser rotulada
como desatenta ou hiperativa, simplesmente ela precisa se movimentar ou
levantar a todo o momento para tentar ouvir ou ver melhor. Problemas de otite,
sinusites, miopias, astigmatismos ou outras doenças físicas como
reumatismos, parasitoses, hipotiroidismo, cardiopatias, nenfropatias,
pneumopatias, desnutrição e doenças imunoalérgicas também podem
comprometer o aprendizado. E ainda, os problemas emocionais como já
citamos anteriormente.
Distúrbios de aprendizagem
Vimos que, distúrbios de aprendizagem estão relacionados com
disfunções em determinada área do cérebro responsável pela linguagem.
Simaia Sampaio (2009, p.90 apud Taya 2003) aponta que “os
distúrbios de aprendizagem se definem em um ou mais processos
neuropsicológicos básicos implicados na compreensão ou no uso da
linguagem falada ou escrita, que pode manifestar em uma habilidade imperfeita
para escutar, falar, ler, escrever, soletrar ou fazer cálculos matemáticos.”
Encontramos dentre os distúrbios de aprendizagem as dislexias, as
hiperlexias, as dilalias, as disgrafias, as disortografias, as discalculias.
Transtornos de aprendizagem
Segundo Relvas (2009, p. 53) “os transtornos de aprendizagem se
traduzem por um conjunto de sinais sintomatológicos que provocam uma série
de perturbações no aprender da criança, interferindo no processo de aquisição
28
e manutenção de informações de maneira acentuada, envolvendo disfunções
cerebrais.”
Relvas (2009, p.53) nos mostra que a descrição dos transtornos da
aprendizagem é encontrada em manuais internacionais de diagnósticos de
doenças: CID – 10 ¹ e DSM – IV ². Ambos os manuais reconhecem a falta de
exatidão do termo “transtorno”, justificando seu emprego para evitar problemas
ainda maiores, inerentes ao uso das expressões “doenças” ou “enfermidades”.
Os transtornos de aprendizagem, segundo Relvas (2009. p.53)
envolvem alterações graves no funcionamento do sistema nervoso central,
causando transtornos psiquiátricos, deficiência mental e doenças neurológicas.
As doenças neurológicas mais frequentes que causam transtornos de
aprendizagem são a paralisia cerebral e o transtorno de déficit de
atenção/hiperatividade.
Os transtornos de aprendizagem devem ainda ser subdivididos em
transtornos do desenvolvimento, que envolvem comprometimentos em
algum estágio do desenvolvimento normal e em transtornos do
comportamento, aqueles relacionados às mudanças comportamentais
causando estranheza com relação aos comportamentos normalmente
esperados.
Trataremos mais detalhadamente sobre os distúrbios e transtornos de
aprendizagem nos capítulos a seguir.
______________
¹ A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID – 10) foi elaborada por clínicos e pesquisadores da Organização Mundial da Saúde. ² O Manual Diagnóstico Estatístico de Transtornos Mentais (DSM – IV) foi organizado pela Associação de Psiquiatria Americana, publicado em 1994.
29
CAPÍTULO III
OS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
Como vimos no capítulo anterior, os distúrbios de aprendizagem são de
causa orgânica e estão relacionados a disfunções cerebrais em áreas
responsáveis pela linguagem, incluindo os sistemas neurológicos envolvidos
na fala, escrita e aritmética.
Segundo Relvas (2009, p.66), investigações científicas realizadas para
o estudo do cérebro humano, levaram à constatação de que “o sucesso da
criança na aprendizagem da leitura, escrita e aritmética depende do
amadurecimento neurofisiológico das células, bem como do emocional e
social.”
A criança aprende naturalmente a falar a linguagem do grupo social ao
qual está inserida. Cabe à escola, desenvolver e sistematizar os conteúdos
nesta área a fim de oferecer à criança o desenvolvimento das habilidades
necessárias para garantir a aquisição da leitura, da escrita e das noções
básicas da aritmética.
Contudo, quando problemas nesta área surgem, familiares, criança e
escola têm um longo desafio a enfrentar, pois como já vimos, disfunções em
áreas do cérebro, responsáveis por estas habilidades, geram diversos
distúrbios aos quais passaremos a expor.
30
Distúrbios na Leitura
Dislexia
De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia a ABD, entre 5% e
17% da população mundial apresenta a dislexia. E este é um dos distúrbios
mais discutidos no meio médico, escolar e familiar dos últimos tempos.
De causa hereditária, a dislexia é um distúrbio de aprendizagem
ocasionado por falhas em determinadas conexões cerebrais, mais
especificamente no lobo parietal, parte esquerda do cérebro, responsável pela
linguagem. Esta região, dividida em três sub-partes: a parte que processa
fonemas, a parte que analisa palavras e a última, que reconhece as palavras.
Existe ainda a parte principal que é a que memoriza as palavras. Esta é a
sequência a ser seguida pelo cérebro que nos faz aprender a ler e a escrever.
O cérebro da criança disléxica só processa fonemas, não consegue
decodificar, reconhecer e memorizar as palavras. Todo esse processo deverá
ser realizado através de tratamento adequado, para que a criança consiga com
o tempo com que seu cérebro processe as informações necessárias ao
domínio da leitura e da escrita.
A leitura é a grande dificuldade para a criança disléxica, pois cada
palavra, mesmo já trabalhada, é como se fosse nova, porque o cérebro não a
reconhece, não estava no banco de memória. Para a criança disléxica é como
se ela começasse do zero a cada palavra.
De acordo com a ABD (Associação Brasileira de Dislexia), a criança
disléxica sempre terá dificuldades com a linguagem, com a escrita, com a
ortografia e lentidão na aprendizagem da leitura. Podem ocorrer também
dificuldades como a disgrafia e a discalculia. Dificuldades com a memória de
curto prazo e com a organização do pensamento, por exemplo, para a
elaboração de uma redação. Dificuldades em seguir indicações de caminhos e
em executar sequências de tarefas complexas. Dificuldades em compreender
textos escritos, dificuldades em aprender outra língua e eventuais dificuldades
com a fala, percepção espacial e confusão entre esquerda e direita.
31
Contudo, não podemos confundir a dislexia com deficiência intelectual.
Pessoas disléxicas não são menos inteligentes.
Segundo Simaia Sampaio (2009, p.112) “a criança dislexa possui
inteligência normal ou, muitas vezes, acima da média. Sua dificuldade está em
não conseguir identificar símbolos gráficos (letras e/ou números), tendo como
consequência a dificuldade na leitura e na escrita, embora muitas tenham
dificuldades de lembrar-se de fatos ou coisas a fazer.”
Antes mesmo de ir à escola, ou quando inicia seus estudos, pais e
educadores devem estar atentos aos primeiros sintomas que a criança pode
apresentar que são: a dispersão, fraco desenvolvimento da atenção, atraso no
desenvolvimento da fala e da linguagem, dificuldades de aprender rimas e
canções, fraco desenvolvimento da coordenação motora, dificuldades com
quebra-cabeças, falta de interesse por livros impressos.
A dislexia tem tratamento apropriado. O primeiro passo é procurar
ajuda de especialistas adequados para ajudar a criança dislexa. Procurar uma
equipe multiprofissional contendo neurologista, fonoaudiólogo e
psicopedagogo para o diagnóstico e tratamento e, até mesmo um psicólogo
para cuidar do emocional, pois a criança dislexa pode apresentar baixa auto-
estima, insegurança, tristeza e sentimento de culpa por não conseguir
aprender a ler e a escrever como as outras crianças da turma.
Na escola, o professor pode adotar metodologia e estratégias para
trabalhar com o aluno disléxico com o objetivo de que ele passe a perceber o
som das palavras. Simaia Sampaio (2009, p.114) nos fornece algumas dicas
como, por exemplo, trabalhar com rimas, identificando os sufixos e prefixos
das palavras, elaborar cartões com as figuras das rimas para depois fazer a
classificação. O professor dever criar diversas estratégias para ajudar a criança
a desenvolver a consciência fonológica, amenizando as dificuldades de leitura.
É bom lembrar que o dislexo apresenta dificuldades na leitura e não na
interpretação. Quando alguém lê em voz alta para o dislexo, este consegue
compreender e interpretar o que está sendo lido. Por isso, se sai bem em
atividades e avaliações orais.
32
Hiperlexia
Caracteriza-se por uma desordem na linguagem, porém com preciosa
habilidade para a leitura. Crianças hiperlexas aprender a ler mecanicamente
desde muito cedo, antes mesmo de iniciar o processo de escolarização. Pode
ser definida também como o espelho da dislexia, pois o indivíduo apresenta
enorme capacidade em decodificar os sinais para a leitura, mas com grandes
dificuldades para a linguagem escrita ou falada. Pode ainda ser caracterizada
como apenas distúrbio da linguagem.
Lou de Olivier (2009, p.91) afirma que “a hiperlexia é um dos mais
complexos distúrbios, não só pela variação dos sintomas e características
apresentados como também pela dificuldade em diagnosticar a criança
hiperlexa.” Alguns autores chegam a classificar a hiperlexia como parte do
quadro dos Transtornos Invasivos do Desenvolvimento (TID), onde são
classificados os autistas e portadores das síndromes de Rett e Asperger.
O que chama atenção nas crianças hiperlexas é o aprendizado
acelerado da leitura e da escrita, podendo até se auto-alfabetizar e tornarem-
se autodidatas, com excelente capacidade de memorizar conceitos e
capacidade em realizar cálculos complicados.
Parecendo aprender sozinhas, são erroneamente classificadas como
“gênios”, pois existe uma imaturidade emocional e social para realização de
outras atividades exigidas, sem respeitar sua idade mental e cronológica,
pulam etapas que lhes farão falta mais tarde em seu desenvolvimento e
aprendizagem.
Crianças hiperlexas, geralmente são inquietas, impacientes,
apresentam impulsividade, podem apresentar agressividade, machucando seu
colega na intenção de brincar (comportamento autista), incapacidade para
prestar atenção aos ensinamentos, têm dificuldades de relacionamento e
acabam abandonando a escola muito cedo por não se adaptarem à
metodologia regular.
Assim como a dislexia, a hiperlexia deve ser diagnosticada e tratada
adequadamente e com profissionais especializados. Olivier (2009, p.96) nos
33
alerta de que “nem todos os hiperlexos apresentam dificuldades de linguagem”
essas crianças podem se comunicar muito bem, mas terem outras áreas de
seu desenvolvimento afetadas. É importante, pais e educadores estarem
atentos ao desenvolvimento da criança para ajudá-la da melhor forma
oferecendo-lhe o tratamento e acompanhamento adequados às suas
limitações e necessidades.
Distúrbios na escrita
Disgrafia
É a dificuldade ou ausência na aquisição da escrita. Isso ocorre no
estabelecimento da relação entre o sistema simbólico e as grafias que o
representam como aglomeração de letras, omissão de letras, inversão de
sílabas, letras e números.
Lou de Olivier (2009, p.41) diz que a criança que apresenta disgrafia
possui “desordem de integração visual-motora”, isto é, não consegue
coordenar o que vê com o que escreve. Ela fala, lê, mas “não consegue
transmitir informações visuais ao sistema motor.” A criança lê, mas não
escreve e pode apresentar outros problemas motores e de equilíbrio.
Na maioria dos casos de crianças com disgrafia, faz-se necessário um
acompanhamento neurológico em conjunto com o psicopedagógico, pois este
distúrbio pode estar associado a outros distúrbios neurológicos.
A causa da disgrafia também é neurológica gerando dificuldades
motoras e espaciais. Para detectar os sintomas da disgrafia é importante
verificar se a criança apresenta rigidez no traço das letras, relaxamento gráfico,
impulsividade e instabilidade no traçado, lentidão ao escrever, dificuldades
relativas ao espaçamento e à uniformidade, dificuldades relativas à forma das
letras, aos ligamentos e à inclinação.
34
Após detectar este distúrbio, psicopedagogo, escola e família poderão
ajudar a criança a superar suas dificuldades, através de tratamento e
estratégias pedagógicas adequados.
Disortografia
A disortografia é a dificuldade de assimilar e compreender a ortografia,
isto é, a escrita das palavras. É causada por um atraso na aquisição da
linguagem e não tem ligação com a coordenação motora espacial como no
caso da disgrafia.
Muitas vezes, a disortografia acompanha a disgrafia, porém não
necessariamente quem apresenta disortografia também é disgráfico.
É de conhecimento geral que, os primeiros textos de uma criança em
séries iniciais contêm vários erros ortográficos, o que é comum e totalmente
natural, pois a criança ainda está em processo de alfabetização.
Porém, se a criança continuar apresentando um número grande de
erros ao escrever depois do 3º ano do Ensino Fundamental, é preciso ficar
alerta porque pode ser disortografia.
Os erros vão desde a troca de letras e sílabas passando pelas
inversões, junções e fragmentação de palavras.
A limitação de palavras conhecidas e utilizadas pela criança também
podem contribuir para o aparecimento da disortografia.
Distúrbios na aritmética
Discalculia
Não é de hoje que a Matemática é vista pela maioria das pessoas com
certa resistência e até mesmo, aversão. Crianças em idade escolar tendem a
não gostar de Matemática, achando a disciplina chata e difícil. É importante
35
observar atentamente os sintomas, porque aversão à matemática não implica
necessariamente em discalculia.
A discalculia também tem sua origem em disfunções cerebrais que
resulta em dificuldades ao lidar com cálculos e números. Crianças com
discalculia apresentam desde cedo, dificuldades em classificar e identificar os
números, dificuldades em compreender a sequência numérica e memorizá-la,
dificuldades em fazer cálculo mental e escrito.
A discalculia mental caracteriza-se quando a dificuldade se mostra em
pensar matemática, aritmética e geometricamente. Já a discalculia gráfica se
dá quando existe a dificuldade no manejo dos instrumentos matemáticos
através da coordenação visual e motora e apropriada para traduzir em sinais e
desenhos em um determinado espaço.
No caso da disortografia, o profissional mais adequado a ajudar a
criança é o psicopedagogo que irá fazer uma avaliação e possível
acompanhamento. O professor deverá acompanhar e criar estratégias
pedagógicas a fim de melhor atender as dificuldades do aluno com
disortografia.
Se a criança com disortografia não for tratada precocemente, poderão
ocorrer, segundo Sampaio (2009, p.124), comprometimento do
desenvolvimento global, insegurança e medo de situações novas, baixa auto-
estima e, ao crescer, o adolescente ou o adulto apresentará dificuldades em
usar a matemática em sua vida.
Estes são os principais distúrbios de aprendizagem que podem
aparecer em decorrência de disfunções cerebrais. Vale lembrar que devemos
observar atentamente nossas crianças e avaliar toda sua história de vida a fim
de conhecermos o desenvolvimento e aprendizagem das mesmas, pois cada
criança é única em sua forma de aprender e também do não aprender.
Discutiremos no capítulo a seguir, os transtornos do desenvolvimento
e comportamento que também interferem na aprendizagem.
36
CAPÍTULO IV
OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM
Trataremos neste capítulo, de alguns transtornos de aprendizagem
classificados no Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais – 4ª
edição, publicado pela associação psiquiátrica americana em 1994, o DSM –
IV. Este manual é a principal referência em diagnóstico da saúde mental criada
e usada por médicos dos EUA, também usado em Portugal e Brasil.
De acordo, então, com o DSM – IV, os transtornos de aprendizagem
podem ser divididos em transtornos globais do desenvolvimento e
transtornos do comportamento.
Apresentaremos cada grupo separadamente para compreendermos
melhor as características de cada transtorno.
Transtornos Globais do Desenvolvimento
Os Transtornos Globais do Desenvolvimento são os transtornos
gerados por alguma alteração no desenvolvimento normal do indivíduo. Esta
alteração pode acontecer ainda na fase intra-uterina, ou em qualquer fase do
desenvolvimento após o nascimento, seja ela, infância, adolescência ou fase
adulta.
Os Transtornos Globais do Desenvolvimento são danos graves que
afetam as habilidades de interação social e comunicação. Também ocorrem
danos graves nas habilidades de imaginação, que se manifestam através de
comportamentos, interesses e atividades estereotipadas.
O comprometimento da interação social, da comunicação e da
imaginação é conhecido como a tríade que caracteriza os transtornos globais
do desenvolvimento.
37
Geralmente, os sintomas dos transtornos do desenvolvimento são
perceptíveis desde os primeiros meses de vida, quando a criança ainda é
muito nova e antes mesmo de entrar para a escola. Os pais começam a
perceber comportamentos diferentes dos que são considerados “normais” e,
preocupados, procuram ajuda especializada, onde são diagnosticados os
transtornos globais do desenvolvimento.
Os transtornos globais do desenvolvimento mais comuns são: o
Autismo, o Transtorno de Asperger, o Transtorno de Rett e o Transtorno
Desintegrativo da Infância. Algumas Síndromes como a de Down, de
Klinefelter e outras, são de origem genética, decorrentes de falhas na
distribuição dos cromossomos, podendo também ser consideradas como
transtornos do desenvolvimento.
Trataremos aqui, dos principais transtornos globais do
desenvolvimento.
O Autismo
O Autismo é um transtorno que causa prejuízo na tríade que
caracteriza os transtornos globais do desenvolvimento de que falamos
anteriormente: interação social, comunicação, imaginação.
Os primeiros sinais do autismo podem ser notados antes dos três
anos de idade, pelos próprios pais. A criança apresenta atraso do
desenvolvimento da fala e, algumas vezes a criança não fala. Não que ela seja
muda, na verdade é como se não existisse para ela, a necessidade de manter
qualquer tipo de comunicação com as pessoas, seja ela através de contato
verbal ou gestual. Esta é uma evidência clara do comprometimento da
interação social, pois a criança não apresenta qualquer sinal de que possa
tentar comunicar-se, seja através de gestos, expressão facial ou contato visual.
Aliás, a criança que tem autismo evita trocas interpessoais e, aparentemente,
ignora as pessoas à sua volta, podendo negar até o carinho e afeto de seus
familiares, como pais e irmãos. Prefere o isolamento e, frequentemente, age
como se fosse surda, não dando importância a chamados, por exemplo.
38
A criança autista tem dificuldade de entender o que queremos dela,
pois apresenta dificuldade em lidar com o mundo subjetivo das pessoas,
intenções ou emoções. Isto pode gerar problemas de comportamento como
agitação, instabilidade emocional e, até mesmo, agressividade.
A criança com autismo costuma brincar sozinha e com uma maneira
própria, diferente de outras crianças, não respondendo bem a brincadeiras
como, por exemplo, de faz-de-conta ou que envolvam regras e conceitos
abstratos.
Se seu contato com pessoas é quase nulo, com objetos é bem
diferente. Pequenos objetos, não necessariamente brinquedos, podem chamar
muito a atenção da criança autista. Para ela, o objeto representa um grande
amigo e geralmente demonstra apego real a ele.
De posse do objeto querido, a criança autista manuseia-o de forma
peculiar, girando-o no ar ou no chão, sempre colocando movimento ao objeto
inerte. Se o objeto é retirado, pode continuar o movimento com o próprio corpo,
balançando braços, o tronco, batendo palmas, estalando os dedos, etc. Aliás,
estes movimentos podem aparecer mesmo sem a presença de objetos.
Além de movimentos repetitivos, o autista, até por sua dificuldade
natural em comunicar-se, tanto por não estabelecer relações e muitas vezes
ter a fala comprometida, geralmente não consegue iniciar um diálogo ou
mantê-lo por muito tempo.
Três situações estão interligadas no autismo, medo, resistência a
mudanças e agressividade. O autista não tem noção real de perigo, como
atravessar a rua sem olhar, o que pode resultar num atropelamento e, em
contrapartida, situações inofensivas podem lhe causar medo excessivo e
deixá-lo em pânico. Mudanças em sua rotina também lhe deixam assustado e
agitado, aliás, talvez nem consiga realizar nenhuma mudança nela. A
insistência da pessoa que tem autismo em manter as coisas sempre da
mesma forma não vai ser facilmente dobrada e, muitas vezes, isso pode
desencadear um acesso de raiva ou de agressividade, tanto ao próximo como
a si mesmo, causando lesões em si mesmo.
39
O autismo chega a ser quatro vezes mais comum em meninos do que
em meninas e, quando elas apresentam este transtorno, o grau de retardo
mental é muito maior.
Apesar de ser um transtorno que vai acompanhar a criança por toda
a vida, a tríade entre interação social, comunicação e imaginação pode se
manifestar de inúmeras formas diferentes, mas isto dependerá do nível de
autismo e dos comprometimentos envolvidos.
A ausência de um desses sintomas descritos acima, como ignorar
pessoas ao seu redor, recusar-se a falar ou evitar contato físico, por exemplo,
não significa ausência de autismo. É importante ficar atento ao
desenvolvimento global da criança.
Geralmente, quando a criança entra na escola, alguns dos sintomas se
acentuam ou começam a melhorar apresentando um pequeno progresso.
Porém, se acentuam, principalmente na dificuldade de interagir com o
ambiente e as pessoas. É importante notar que não se sabe se o progresso
acontece porque a criança está mais velha, por influência do ambiente escolar,
por amadurecimento neurológico e emocional ou por qualquer outro motivo. O
progresso também dependerá muito do nível do autismo.
Síndrome de Asperger
Este transtorno foi descrito pela primeira vez em 1944, porém, só
entrou no DSM - 4 em 1994. Muitos pesquisadores consideram a Síndrome de
Asperger um autismo de alto funcionamento, pois apresenta várias
características do autismo. Contudo, a inteligência é preservada e também
pode haver o desenvolvimento de habilidades específicas. Por causa destas
habilidades, é que muitos chamam este transtorno de “Síndrome do Gênio”.
A grande maioria de pessoas com Asperger possui elevada
potencialidade e grande habilidade em áreas como a Informática e Artes, como
por exemplo, Mozart, Darwin, Miguelangelo, Einstein, Newton e Bill Gates,
possuindo grandes traços de Asperger.
40
Segundo a Associação e Amigos do Autista, a AMA, as
características principais da criança que tem Asperger são: “atraso na fala,
interesses restritos, presença de habilidades incomuns, interpretação literal,
dificuldade para entender e expressar emoções, apego a rotinas e rituais,
atraso no desenvolvimento motor e frequentes dificuldades na coordenação
motora e fina, inclusive na escrita, hipersensibilidade sensorial.”
(Site: www.ama.org.br)
É fundamental lembrar que, assim como acontece com o autismo, a
Síndrome de Asperger tem características mais comuns, porém o que a define
é o comprometimento na tríade: interação social, comunicação e imaginação,
associados à uma inteligência normal e até bem superior à média.
A ausência de algumas características específicas como as que foram
ilustradas acima não descartam a possibilidade de Asperger.
De acordo com (Marc Segar, 2008), “crianças com Síndrome de
Asperger não gostam de surpresas, regras devem ser aplicadas
cuidadosamente, a criança aprenderá melhor quando a área de interesse
pessoal estiver na agenda, muitos alunos com Asperger respondem bem a
mapas listas, figuras, pois apresentam facilidade com números, códigos e
formas definidas.”
Vale lembrar que essas orientações também são úteis nos casos de
autismo. O trabalho educativo tanto para crianças com autismo quanto para as
que apresentam Asperger, deverá estar voltado para a estimulação e o
desenvolvimento de aspectos relacionados à tríade: interação social,
comunicação e imaginação. Principalmente para os portadores de Asperger,
pois, diante da inteligência acima do normal que geralmente a criança
apresenta, os pais tendem a ignorar os demais sintomas, achando que os
mesmos desaparecerão com o tempo.
41
Transtorno de Rett
O transtorno de Rett acomete principalmente as meninas, com
raríssimos casos no sexo masculino.
De acordo com a Associação Brasileira de Síndrome de Rett, a
ABRE- TE, dos seis aos dezoito meses de idade, pode haver um
desenvolvimento aparentemente normal da menina. Seus pais, até este
momento, principalmente se for o primeiro filho, não conseguem imaginar que
a filha apresenta este transtorno e que precisará de muita ajuda médica.
Começam a aparecer os primeiros sinais como a lentidão do
crescimento do crânio, levando à microcefalia e a regressão de ganhos
psicomotores, inclusive os da linguagem. O que a criança conseguia fazer
antes, no que se refere às habilidades manuais, são perdidas gradualmente,
embora em alguns casos essa perda seja abrupta. As que aprenderam a falar
deixam de fazê-lo e a maioria nunca chega a falar. Aos poucos, deixam de
manipular objetos e aparecem movimentos estereotipados das mãos como
contorcê-las, apertá-las, bater palmas sem motivo aparente, esfregá-las, levá-
las à boca, dentre outros.
Ainda hoje, em muitos casos, a menina pode se erroneamente
diagnosticada como autista, pois há perda significativa da interação social,
situação que pode ser temporária. Diferentemente do que acontece com as
pessoas autistas.
Crianças com este transtorno não têm potencial para a
aprendizagem, pois tudo o que adquirem, perdem, pois ocorre a regressão de
tudo que aprenderam. A criança se isola, deixa de responder e brincar.
O Transtorno de Rett possui características bem específicas,
representadas por problemas na marcha e nos movimentos do tronco, severo
prejuízo no desenvolvimento da linguagem expressiva ou receptiva e retardo
psicomotor severo.
A evolução deste transtorno passa por quatro estágios distintos. No
primeiro estágio, que pode durar meses, há a parada precoce do
desenvolvimento e, nem sempre é possível fazer o diagnóstico clínico neste
42
período, pois nem sempre os pais conseguem perceber essa parada. Apenas
um pediatra experiente poderá de fato, considerar a possibilidade da não
percepção dos pais e fazer o encaminhamento à especialidade correta nesta
fase.
É no segundo estágio, que pode durar breves semanas ou alguns
meses, que a maioria das meninas é diagnosticada. Ocorre rápida regressão
do desenvolvimento, ou seja, habilidades aprendidas são rápida ou
gradualmente perdidas.
Já o terceiro estágio, chamado de pseudo estacionário, onde as
regressões “parecem” estacionar, embora muitos problemas clínicos se
instalem, pode durar muitos meses ou mesmo anos. Muitas meninas podem
permanecer neste estágio por toda a vida. Os problemas clínicos mais comuns
se referem a desordens gastresofágicas, refluxo e constipação intestinal,
desordens respiratórias, crises convulsivas e cardiovasculares, apnéias,
hiperventilações e pneumonias de repetição.
Geralmente a partir dos 10 anos de idade, já no quarto estágio, uma
parte considerável dessas meninas pode apresentar deterioração motora
tardia, representada por atrofia muscular gradual e espasticidade.
Parte das poucas crianças que andam, cerca de 30% ou 40%, podem
deixar de andar nessa fase. Esse estágio dura anos ou longas décadas.
De acordo com a ABRE–TE, crianças com Rett atingem em média:
“desenvolvimento cognitivo compatível, no máximo, ao de uma criança de 36
meses, ou seja, até os 3 anos, tudo o que aprendem é comunicado apenas
pelo olhar, em média, não têm uso prático das mãos, nem linguagem, não
compreendem conceitos básicos como cores, tamanhos e formas.”
(Site: www.abrete.com.br)
A ABRE–TE nos dá várias orientações em como lidar com este
transtorno favorecendo o máximo possível de aprendizagem. Porém, o
principal deles é o da preservação e manutenção da integridade física e
motora de crianças com Rett, por isso é imprescindível o tratamento
43
sistemático da fisioterapia, fonoaudiologia e musicoterapia, para que qualquer
intervenção cognitiva tenha de fato, resultado satisfatório.
A criança com Rett, embora tenha grave comprometimento cognitivo,
não para de aprender, ela possui certas limitações. Podemos dizer que essas
crianças, de acordo com Piaget (1896 – 1980), estariam no estágio sensório
motor e não ultrapassariam este estágio. O potencial cognitivo delas, talvez
esteja entre 2 e 3 anos de idade para efeitos de potencial. Contudo, o lado
emocional é muito mais desenvolvido, através da empatia, da comunicação
como o olhar, desenvolvendo o conhecimento das pessoas, dos afetos, dos
meios e das circunstâncias.
A criança com Síndrome de Rett, não é exatamente uma criança que
possa ser inserida na educação regular, é uma criança para a reabilitação, pois
ela não possui potencial para o aprendizado escolar como aprender a ler e a
escrever, por exemplo, devido ao severo comprometimento neurológico e
psicomotor.
Transtornos do Comportamento
Trataremos agora, de alguns transtornos do comportamento que
afetam crianças dentro e fora da escola dificultando seu aprendizado e suas
relações interpessoais.
Os Transtornos de Comportamento caracterizam-se principalmente
por dificuldades em lidar com autoridades e em seguir regras, as quais
costumam desrespeitar, dificuldades de atenção e concentração,
hiperatividade, impulsividade e agressividade.
Contudo, a intensidade destas características varia nos três tipos de
comportamento que apresentaremos a seguir.
Transtorno do Déficit de Atenção / Hiperatividade
Dificuldades em focar a atenção e concentrar-se, facilidade em
distrair-se com qualquer coisa, esquecer ou perder objetos pessoais, ser
44
incapaz de ficar parado por muito tempo, apresentar agitação e dificuldades de
relacionamento interpessoal, podem ser sintomas do transtorno do déficit de
atenção com hiperatividade, mais conhecido como TDAH.
São sintomas que podem acometer crianças, adolescentes e adultos.
O TDAH atinge cerca de 6% das crianças e 4,7% dos adultos. É uma doença
genética e os primeiros sintomas podem aparecer por volta dos sete anos de
idade.
Este transtorno tem afetado cada vez mais um número maior da
população, principalmente a de idade escolar. Crianças que apresentam este
transtorno na escola, apresentam dificuldades em prestar atenção ao que o
professor está explicando, parecem não ouvir o que lhe é dito, parecem se
“desligar” do que está ocorrendo no momento. Apresentam dificuldades em
concluir as atividades escolares, não conseguem ficar sentadas, levantando de
seu lugar a todo o momento, parecendo sempre estarem a “mil por hora”. Em
consequência desse comportamento extremamente agitado, não conseguem
se organizar.
Gustavo Teixeira (2006, p.33) diz que:
“Trata-se de uma síndrome clínica caracterizada
basicamente pela tríade sintomatológica: déficit
de atenção, hiperatividade e impulsividade.”
O diagnóstico de TDAH é clínico, não existem exames específicos. A
criança apresenta o mesmo comportamento sempre, em todos os lugares, em
casa, na escola, em festas de aniversários e lugares públicos.
O TDAH não tem cura, mas existem tratamentos para que seus
sintomas sejam amenizados, desde medicamentos, até acompanhamento de
psicólogos e psicopedagogos. Com o tempo, os sintomas de hiperatividade
vão diminuindo, permanecendo o déficit de atenção. Diferente de outros
transtornos, as pesquisas de TDAH estão em nível bem avançado, levando a
grande probabilidade de que a genética influencia muito nesses casos.
O TDAH é um transtorno biológico/neurológico complexo, pois
envolve dificuldades no gerenciamento do cérebro, resultando em
45
desorganização cerebral, distúrbio neurocomportamental e comprometimento
da capacidade de autocontrole (impulsividade).
Teixeira (2006, p.35) nos mostra que o cérebro de crianças com
TDAH funciona de maneira diferente do de uma criança sem o transtorno.
Estudos neurológicos apontaram a ausência de dois neurotransmissores, a
dopamina e a noradrenalina. Os medicamentos são utilizados para repor
justamente estes componentes químicos que ajudam a regular o
comportamento.
Antes dessas informações, muitos acreditavam que o TDAH era
originado pela criação inadequada dada pelos pais, agravada pela influência
do ambiente em que estas crianças viviam. Hoje, estudos científicos mostram
que portadores do TDAH têm alterações na região frontal e suas conexões
com o resto do cérebro. Esta região do cérebro é responsável pela atenção e
concentração, memorização, autocontrole, organização e planejamento.
Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção - ABDA, as
causas deste transtorno ainda não estão bem definidas. Há uma possibilidade
de que seja hereditária, pois muitas crianças que apresentam este transtorno
possuem algum familiar com o mesmo diagnóstico. Também existem fatores
físicos, como complicações na gravidez ou no parto, traumatismos, infecções
ou intoxicações no nascimento.
Lou de Olivier (2008, p.81), nos mostra que há basicamente três tipos
de TDAH: o predominantemente desatento, em que a hiperatividade não
aparece, podendo ser denominado de DDA (desordem do déficit de atenção)
mais comum em meninas; o predominantemente hiperativo-impulsivo, que é
aquele que não consegue parar; e o tipo combinado, que apresenta tanto a
desatenção como a hiperatividade e impulsividade.
O TDAH é uma tendência contemporânea. Crianças que antes eram
chamadas de “mal educadas”, “peraltas”, “avoadas”, “desatentas”, “agitadas” e
“desorganizadas” agora estão em uma categoria diagnóstica de TDAH. Hoje,
com a velocidade de informação, crianças estão cada vez mais “antenadas” e
acompanham a tecnologia, o movimento e as mudanças do mundo atual. Cada
vez mais pais e escolas precisam estar atualizados e acompanhar o ritmo de
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desenvolvimento em que nossas crianças estão inseridas. É natural que a
criança, quando vai para a escola necessite também de ambientes interativos
e atrativos. Comportamentos hiperativos vêm aumentando porque o mundo
hoje tem outro movimento. Faz-se necessário um acompanhamento bastante
atento a essas tendências, bem como para os sintomas que nossas crianças
venham a apresentar, para fazermos o diagnóstico correto.
Transtorno Desafiador Opositivo
Segundo Gustavo Teixeira (2006, p.17) este é um transtorno que
pode ser definido como “um padrão persistente de comportamentos
negativistas, hostis, desafiadores e desobedientes observados nas interações
sociais da criança com adultos e figuras de autoridade de uma forma geral,
como pais, tios, avós e professores.”
É um transtorno do comportamento que acomete tanto meninas
quanto meninos, geralmente antes dos 8 anos, que pode durar por toda a
adolescência, alguns meses ou anos. Estes jovens tendem a apresentar tais
comportamentos com pessoas com as quais têm intimidade, ou seja,
principalmente no ambiente familiar. Têm dificuldades com regras e limites.
Suas atitudes não podem ser encaradas como simples desobediência ou
teimosia e sim como um transtorno grave de comportamento.
De acordo com o DSM – IV, a criança com o transtorno desafiador
opositivo pode perder a paciência facilmente, discutir com adultos, desafiar
ativamente ou recusar-se a obedecer a solicitações ou regras dos adultos,
fazer deliberadamente coisas que aborrecem outras pessoas, ser rancoroso e
vingativo, responsabilizar outras pessoas por seus próprios erros ou mau
comportamento, for suscetível ou facilmente aborrecido pelos outros, mostrar-
se enraivecido e ressentido.
Para que seja diagnosticado o transtorno desafiador opositivo, é
preciso que no mínimo quatro destas características descritas acima, façam
parte do comportamento da criança.
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Apesar deste aparente comportamento de revolta, as agressões não
passam de verbais, porém, quando as agressões são físicas, passam a se
caracterizar em transtorno de conduta.
Segundo Gustavo Teixeira (2006) as causas do transtorno desafiador
positivo são complexas. Estudos científicos evidenciam que múltiplos fatores
de risco estão relacionados com o surgimento do transtorno. Estes fatores são
eventos, características ou processos que aumentam as chances de
desencadeamento do problema comportamental e seu desenvolvimento está
provavelmente relacionado com a quantidade de fatores presentes na criança.
Questões sociais como, por exemplo, a violência doméstica, falta de estrutura
familiar, moradia em área de grande criminalidade e ambientes familiares em
que as regras e limites sejam pouco claros, podem contribuir para o
desencadeamento desta condição comportamental.
Como em vários outros transtornos, síndromes e deficiências, quanto
antes for diagnosticado e tratado, melhor será a resposta e melhor será a
chance desta pessoa não evoluir para o transtorno de conduta.
Intervenções escolares devem enfocar o trabalho de prevenção ao
comportamento bullying, prevenção ao consumo de álcool e outras drogas,
identificação de possíveis casos de transtorno desafiador opositivo para
avaliação e tratamento com médico psiquiatra da infância e adolescência.
Transtorno de Conduta
De acordo com o DSM-IV, o transtorno de conduta tem como
característica principal um padrão repetitivo e persistente de comportamento
no qual são violados os direitos básicos dos outros, normas ou regras sociais
importantes apropriadas à idade com prejuízo no funcionamento social,
acadêmico e ocupacional.
Infelizmente a idade para a manifestação do transtorno de conduta é
a partir dos 5 anos até os 16 anos, ou seja, em crianças ainda muito novas.
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Pode ser considerado uma evolução do TDO – Transtorno Desafiador
Opositivo, porém, apresenta traços mais violentos com relação a quebra de
regras, podendo resultar até mesmo em crimes como o estupro e mais
raramente, homicídios.
O transtorno de conduta pode ser dividido em dois tipos: com início
na infância e com início na adolescência. O T.C com início na infância se dá
antes dos 10 anos de idade. Desenvolvê-lo nesta idade, aumenta a
possibilidade de que ele dure por mais tempo passando a infância e
adolescência até a vida adulta, fase em que poderão desenvolver também o
transtorno da personalidade antissocial.
Este transtorno tem prevalência nos meninos com as características
de agressividade física, características do transtorno desafiador opositivo
precoce antes do desenvolvimento do de conduta. Jovens com transtorno de
conduta com início na adolescência são mais estáveis e menos agressivos do
que na infância. Para entrar nesta categoria, os sintomas não estiveram
presentes antes dos 10 anos de idade.
Além dessa subdivisão, é preciso saber que, assim como outros
transtornos ou deficiências, o TC também possui níveis de gravidade: leve,
moderado ou severo.
No transtorno de conduta leve, aparecem poucos problemas de
comportamento e, se existirem aqueles necessários para fazer o diagnóstico,
causam danos relativamente pequenos aos outros, como por exemplo,
mentiras ou rompimento de promessas, “matar aulas”, permanência na rua até
tarde, desobedecer pais e professores.
No transtorno de conduta moderado, a quantidade de problemas de
comportamento e o efeito sobre os outros são intermediários entre “leves” e
“severos”. Podemos citar como exemplo, os furtos sem confronto com a vítima
e o vandalismo, iniciam lutar corporais frequentemente.
Já no transtorno de conduta severo, muitos problemas de
comportamento estão presentes, além daqueles necessários para fazer o
diagnóstico. Causam danos consideráveis e até irreparáveis, como por
exemplo, o sexo forçado, a crueldade física com pessoas ou animais, o uso de
49
armas, roubo com confronto com a vítima, arrombamentos e invasões,
provocam incêndios com a intenção de causar sérios danos.
Na escola, a influência do transtorno de conduta em sala de aula, vai
além do relacionamento difícil com os colegas. A criança ou jovem podem ter
também problemas de aprendizagem principalmente de leitura e de escrita e
outros relacionados à comunicação. Normalmente, crianças e adolescentes
com este transtorno também podem ser diagnosticados com TDAH ou outros
transtornos mentais relacionados, como transtornos relacionados a
substâncias.
Aliás, este é um ponto bem delicado do transtorno de conduta, uma
de suas possíveis causas é a genética. Vários estudos indicaram que pais
dependentes de álcool têm maior propensão a ter filhos com transtorno de
conduta. Estes responsáveis também sofreriam de outros transtornos como o
TDAH, o de humor e até mesmo de esquizofrenia.
Contudo, o ambiente frequentado por esta criança ou jovem, também
é um fator de extrema relevância. Agressividade e falta de preocupação com o
próximo leva à ausência de culpa ou remorso por seus atos.
Quando aprendem que podem ser perdoados caso peçam desculpas,
jogam com esta possibilidade sempre, sem demonstrarem qualquer tipo de
remorso. Passando a ser mais um dos valores com os quais não se importam.
Esses jovens acabam dificultando, inclusive o seu tratamento, por não
apresentarem qualquer tipo de arrependimento.
Segundo Teixeira (2006, p.26), a violação de regras é a principal
característica deste transtorno, pois podem apresentar comportamento
antissocial, sendo muitas vezes autores de bulliyng, outra preocupação entre
educadores na atualidade.
Ainda segundo Teixeira (2006, p.27), o transtorno de conduta pode
regredir ou continuar na idade adulta. Quanto mais precocemente, crianças e
adolescentes forem diagnosticados e tratados, maiores serão as chances de
serem reintroduzidos e readaptados ao convívio social.
50
CONCLUSÃO
Diante de tudo o que foi exposto ao longo deste trabalho, podemos
considerar que família, escola, médicos e demais profissionais envolvidos na
educação de crianças e jovens, têm pela frente uma variedade de desafios a
serem superados. Com os avanços das tecnologias e movimentos acelerados
do mundo atual, cada vez mais chegam até nossas mãos (pais, educadores e
profissionais de saúde), crianças com distúrbios de aprendizagem e
transtornos do comportamento.
O Sistema Educacional Brasileiro, apesar da Lei de Inclusão, ainda
não está preparado para atender corretamente toda essa demanda de
estudantes e seus diversos problemas de aprendizagem e desenvolvimento.
Um primeiro passo já se sabe, foi dado através das políticas de
inclusão educacional para portadores de necessidades especiais. Porém, cabe
a nós, pais, educadores e profissionais de saúde, compreendermos o
processo, analisarmos cada caso para ter uma visão completa do
desenvolvimento e aprendizagem da criança, com o cuidado de não rotular ao
primeiro sintoma.
Ponderar e ter bom senso, analisar a história completa de vida da
criança e sua família, para que a partir de então, possamos compreender e
criar estratégias (educadores), acompanhar e colaborar (família), diagnosticar
e tratar (profissionais da saúde), cada um dos casos em sua particularidade.
O orientador educacional e pedagógico deverá atuar, com esta visão,
pois a escola representa um dos principais ambientes sociais em que crianças
e adolescentes estão inseridos. Além do ambiente familiar, laços afetivos e de
confiança também se apresentam na escola durante várias horas de contato
diário com colegas, professores e funcionários.
É papel do orientador educacional e pedagógico facilitar o processo de
inclusão destes alunos. Incluir não é necessariamente e simplesmente colocar
o aluno na escola. Incluir é atender às necessidades educativas do mesmo e ir
além das dificuldades, distúrbios ou transtornos. É trabalhar com o
51
preconceito, principal desafio à inclusão. Infelizmente, o preconceito é uma das
piores doenças da humanidade.
Devemos incluir num âmbito muito mais amplo: o social. A inclusão
dever ser feita com consciência e responsabilidade, promovendo o acesso, o
ingresso e a permanência desses alunos nas escolas, para que no futuro,
sejam inseridos na sociedade como cidadãos especiais respeitados.
Compreender para incluir. Esta deve ser a chave para adentrarmos no
tão complexo mundo das diversidades. Pais, educadores e profissionais da
saúde devem se unir em prol das necessidades educativas de nossas
crianças, jovens e até mesmo adultos.
A inclusão deve ser um instrumento importante para assegurar a
construção de um modelo educacional que venha atender a todos, e não
somente os alunos com deficiência física, sensorial, com síndromes, distúrbios
ou transtornos, mas a todos indistintamente. Deve-se incluir a todos, do mais
novo ao mais velho, de quem sabe ler ao analfabeto, da pessoa obesa a mais
magra, do alto ao mais baixo, do heterossexual ao homossexual, do que
possui baixa ou alta condição financeira.
Trabalhar com a inclusão é algo urgente, inevitável e indispensável. É
uma tarefa difícil, mas não impossível. O primeiro passo é vencermos o
preconceito, depois estudar para compreender cada caso. A partir de então,
criar possibilidades de ajudar a criança e sua família na superação de tais
obstáculos. Fazendo valer a inclusão de verdade.
Sendo assim, termino este estudo com as palavras da professora
Maria da Glória de Souza Almeida, do Instituto Benjamim Constant:
.
“Quando você vê barreira em tudo, você não vê
possibilidade em nada.”
Maria da Glória de Souza Almeida
(Professora do Instituto Benjamim Constant)
52
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
ALVES, Fátima. Inclusão: muitos olhares, vários caminhos e um grande
desafio. 4ª edição. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2009.
CARVALHO, Rosita Edler. Removendo Barreiras para a Aprendizagem:
educação inclusiva. 3ª edição. Porto Alegre: Editora Mediação, 2003.
OLIVIER, Lou de. Distúrbios de Aprendizagem e de Comportamento. 4ª
edição. Rio de Janeiro: Wak Editora, 2006.
PAÍN, Sara. Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. 3ª
edição. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. 23ª edição. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 1998.
_____________ . A Equilibração das Estruturas Cognitivas. Rio de Janeiro:
Zahar Editores, 1975.
_____________ e INHELDER, Barbel. A Psicologia da Criança. São Paulo:
DIFEL, 1982.
______________ . A Linguagem e o Pensamento da Criança. São Paulo:
Martins Fontes, 1993.
RELVAS, Marta Pires. Neurociência e Transtornos de Aprendizagem; as
múltiplas eficiencias para uma educação inclusiva. 3ª edição. Rio de Janeiro:
Wak Editora, 2009.
SAMPAIO, Simaia. Dificuldades de Aprendizagem: a psicopedagogia na
relação sujeito, família e escola. Wak Editora, 2009.
53
TEIXEIRA, Gustavo. Transtornos Comportamentais na Infância e
Adolescência. Rio de Janeiro: Editora Rúbio, 2006.
VYGOTSKY, Lev S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes,
1991.
______________ . Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes,
1993.
WADSWORTH, Barry . Inteligência e Afetividade da Criança. 4ª edição. São
Paulo: Enio Matheus Guazzelli, 1996.
54
WEBSITES CONSULTADOS
www.vezdomestre.com.br, ícone monografía, Rio de Janeiro – Universidade
Cândido Mendes – 2004.
www.wikipédia.org.br, a enciclopedia livre.
www.ama.org.br , Associação Brasileira dos Amigos do Autista.
www.dilexia.org, Associação Brasileira de Dislexia.
www.abrete.com.br, Associação Brasileira do Transtorno de Rett
www.tdah.org.br, Associação Brasileira do Déficit de Atenção.
www.abenepi.com.br, Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil.
www.humanaeditorial.com.br, DVD – Educação Especial. Multiverso produtos
educacionais.
55
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
VISÃO GERAL DA APRENDIZAGEM 12
Breve Histórico 13
As Definições de Aprendizagem 16
O Processo de Aprendizagem para Vygotsky 15
O Processo de Aprendizagem para Piaget 17
CAPÍTULO II
DIFERENCIANDO DIFICULDADES, DISTÚRBIOS E
TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM 22
O que é normal? 23
O que é dificuldade? O que é distúrbio?
O que é transtorno? 25
Dificuldades de Aprendizagem 26
CAPÍTULO III
OS DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM 29
Distúrbios na Leitura 30
Dislexia 30
Hiperlexia 32
56
CAPÍTULO IV
OS TRANSTORNOS DE APRENDIZAGEM 36
Transtornos Globais do Desenvolvimento 36
O Autismo 37
Síndrome de Asperger 39
Transtorno de Rett 41
Transtornos do Comportamento 43
Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade 43
Transtorno Desafiador Opositivo 46
Transtorno de Conduta 47
CONCLUSÃO 50
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 52
SITES CONSULTADOS 54
ÍNDICE 55
FOLHA DE AVALIAÇÃO 57
57
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes
Instituto A Vez do Mestre
Título da Monografia: Distúrbios e Transtornos de Aprendizagem na Visão do
Orientador Educacional e Pedagógico.
Autor: Carla Santiago Ferro Silva de Jesus
Data da entrega: 17/04/2010
Avaliado por: Mary Sue Pereira Carvalho
Conceito: