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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE PSICODRAMA: sua estrutura e fundamentos num diálogo com a Arte-terapia. Por: Marcos Vinícius Campos de Oliveira Orientadora: Maria Poppe Rio de Janeiro 2.003 – 2

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

PSICODRAMA:

sua estrutura e fundamentos num diálogo com a Arte-terapia.

Por: Marcos Vinícius Campos de Oliveira

Orientadora: Maria Poppe

Rio de Janeiro

2.003 – 2

2

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

PSICODRAMA:

sua estrutura e fundamentos num diálogo com a Arte-terapia.

OBJETIVOS:

Apresentação de monografia ao

Conjunto Universitário Candido

Mendes como condição prévia para

conclusão do Curso de Pós-Graduação

“Lato Sensu” em Arte-terapia em

Educação e Saúde mental. .

3

AGRADECIMENTOS

À Maria Lúcia de Andrade

Campos, minha mãe, por ainda

possibilitar a minha permanência nos

estudos acadêmicos.

Ao amigo Viktor Chagas e

demais companheiros do grupo de teatro

Interpretarte S./A., que sempre

contribuíram nos meus onze anos de

experiência teatral.

Aos participantes do grupo de

Arte-terapia da Igreja de Jesus Cristo dos

Santos dos Últimos Dias, que muito

incentivaram o meu desenvolvimento na

prática da Arte-terapia.

À profª. Maria Poppe,

responsável pela organização e

apresentação final deste trabalho.

4

DEDICATÓRIA

Aos terapeutas que são médicos

da alma; principalmente os que atuam

com Psicodrama, pois permitem ao

homem ser ator, criador e até mesmo

Deus...

5

RESUMO

O gosto pessoal pelas artes dramáticas bem como a experiência nelas como

ator ou instrutor faz buscar no Psicodrama o mistério terapêutico que ronda o teatro.

Moreno, o criador do Psicodrama desvendou o grande mistério em seus estudos e

pesquisas, verificando também as possibilidades de cura pela dramatização.

Diante destes dois fatos supracitados, esta monografia busca quais objetivos

terapêuticos podem ser analisados no Psicodrama, considerando-se a teoria da

espontaneidade, da catarse; e qual o possível diálogo dele com a Arte-terapia.

Esta pesquisa monográfica, em linhas gerais, valoriza o Psicodrama dentre

outras terapias, abordando suas técnicas, a sua verificação de resultados e suas

teorias basilares. Acredita-se, assim, que os profissionais terapeutas possam

redescobrir o Psicodrama à luz dos dias atuais.

6

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO---------------------------------------------------------------------------------7

CAPÍTULO I ------------------------------------------------------------------------------------9

PSICODRAMA: TERAPIA DE OBJETIVOS SOCIAIS E INDIVIDUAIS-----------9

CAPÍTULO II ---------------------------------------------------------------------------------17

ELEMENTOS E ESTRUTURAS ESSENCIAIS AO PSICODRAMA--------------17

CAPÍTULO III --------------------------------------------------------------------------------35

VERIFICAÇÃO DE RESULTADOS EM PSICODRAMA ----------------------------35

CAPÍTULO IV --------------------------------------------------------------------------------38

DIÁLOGO DO PSICODRAMA COM A ARTE-TERAPIA ---------------------------38

CONCLUSÃO --------------------------------------------------------------------------------41

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ----------------------------------------------------42

ÍNDICE ----------------------------------------------------------------------------------------43

7

INTRODUÇÃO

Desde os primórdios da civilização humana, a arte se impôs ao homem como

forma de expressão capaz de aliviar as angústias e de preparar para a vida num

mundo em constante mudança. No ambiente da Arte-terapia, essa noção terapêutica

da arte é mais intensificada quando recebe uma base teórica advinda da medicina, da

psiquiatria e da psicologia. O fazer arte deixou de ser um ato puramente expressivo

para ser encarado como ato de tratamento e de cura de perturbações da mente.

Ao entender-se Arte-terapia de forma generalizada como sendo a terapia que

utiliza a arte como mediação da expressão, pode-se destacar dentro dela algumas

outras terapias, que pelo uso se fixaram e se desenvolveram, tornando-se terapias

autônomas, como é o caso do Psicodrama.

O médico e estudioso de filosofia, Jacob Levi Moreno foi o criador do

Psicodrama; trata-se de uma terapia com objetivos principalmente sociais, que almeja

ao mesmo tempo sanar distúrbios coletivos bem como individuais. O Psicodrama foi

fundado a partir das experiências de Moreno em psiquiatria e em artes dramáticas,

constituindo-se hoje, uma das terapias mais eficazes entre as que usam os fenômenos

despertados no relacionamento em grupo.

Os estudiosos e seguidores das idéias de Moreno desenvolveram diversas

linhas de trabalho que apesar de possuírem objetivos diferentes são convergentes; é

o caso do sociodrama, da dinâmica de grupo e da psicoterapia de grupo.

A cura e o tratamento pelo Psicodrama são devidos a dois fatores

substanciais desta terapia: a catarse e a espontaneidade. A espontaneidade

desenvolvida, permite aos indivíduos liberarem-se do que Moreno chamou “conserva

cultural”, ou seja, atitudes repetidas, pré-formuladas. Estando já os indivíduos

tomados por atos espontâneos, a catarse entra em ação; ela permitirá que as emoções

sejam purgadas. A catarse no Psicodrama é total, sendo somática, psicológica,

individual e coletiva. Assim, a catarse purga emoções não somente de espectadores,

como afirmava Aristóteles, mas também de atores espontâneos, que não se rendem

ao teatro tradicional, onde tudo é estático e acabado (textos, ensaios...).

8

As técnicas aplicadas, como a inversão de papéis e a duplagem, por exemplo,

com um largo surgimento de atos espontâneos orientam a eficácia da terapia, e isto

pode ser comprovado através de uma meticulosa análise qualitativa e quantitativa de

atitudes durante, antes e depois do tratamento. O próprio paciente acompanha seu

processo de cura à medida que toma consciência de seus papeis internos que nunca

foram representados. Toma esta consciência através da própria representação ou

através da representação de outros. Isto somente é possível pela catarse, que purga e

libera com auxílio da espontaneidade.

Situar o Psicodrama dentre as terapias que utilizam a arte como mediação da

expressão artística é uma tarefa árdua, pois o Psicodrama não encontra-se mais na

classificação genérica de Arte-terapia, entretanto, isto não impede uma combinação

de técnicas entre as duas terapias, pois ambas têm em comum a arte, que por ela

mesma já é terapêutica.

O capítulo I desta monografia aborda os objetivos do Psicodrama,

considerando a sua eficácia tanto no aspecto individual como no coletivo, bem como

aborda os dados bibliográficos de seu criador e os dados importantes no seu

desenvolvimento como terapia.

O capítulo II sistematiza os elementos essenciais para o desenvolvimento do

Psicodrama, como também, as teorias basilares e as técnicas utilizadas.

O capítulo III aponta sinteticamente quais fatores devem ser considerados na

avaliação de resultados em um tratamento por Psicodrama.

O capítuo IV diferencia Arte-terapia de Psicodrama, destacando em quais

pontos é possível uma aproximação entre as duas teorias.

A conclusão constata quais os fundamentos que permitem o tratamento e a

cura pelo Psicodrama, e qual a real possibilidade de um encontro entre ele e a Arte-

terapia.

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1 – PSICODRAMA: TERAPIA DE OBJETIVOS SOCIAIS

E INDIVIDUAIS

Segundo Morgam1, terapia é o nome usado para qualquer tentativa de tratar

de uma moléstia ou uma perturbação; e acrescenta que normalmente as terapias

utilizam técnicas psicológicas e por isso são chamadas de psicoterapias. Nessa

tentativa de cura reside o processo que garantirá a eficácia da terapia: é o processo de

libertação dos medos e angústias que atordoam o ser humano. Para tal objetivo ser

alcançado, estudiosos de diferentes áreas como os da psicologia, da psiquiatria, da

medicina, da sociologia e de outras estão aperfeiçoando suas técnicas e descobrindo

certas relações entre elas; como é o caso do Psicodrama. Ele associa elementos

psicológicos e sociais aos elementos dramáticos; porém isto não significa que o

Psicodrama seja um teatro com função terapêutica, mas sim, uma terapia que se

baseia em técnicas dramáticas; utiliza-as de forma a reduzir tensões.

O Psicodrama, criado por Jocob Levi Moreno, médico e estudioso de

filosofia, assim como outras terapias, surge a partir de observações e experiências

científicas, bem como da experiência pessoal vivida pelo seu criador ou defendida

por ele. Como terapia, o Psicodrama surge com caráter revolucionário no campo da

psiquiatria, em que juntamente com a transformação social (reinclusão) proposta por

Pinel, almeja a libertação do ser humano. Fala-se aqui da libertação das “conservas

culturais” que a sociedade de um modo geral impõe ao homem, impedindo-o de ser

criativo e espontâneo.

Para Pierre Weil2, de todas as técnicas e métodos de redução de tensões o

Psicodrama é o mais interessante e eficaz, por atingir ao mesmo tempo tensões

individuais e tensões coletivas, combinando num só método a realidade biológica, a

sociológica, a psicológica individual, a social, e mesmo a antropológica. Assim, o

1 MORGAN, Clifford T, 1977. P-246. 2 WEIL, Pierre, 1967. P- 17.

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Psicodrama em sua evolução, passou a ter aplicações muito além da psiquiatria,

estendendo-se a todos os campos em que há problemas de relações humanas e de

comunicações. Investigando os papéis e conflitos destes papéis no ser humano ou

numa área cultural, visa, sinteticamente, a preparação para a vida escolar,

sentimental, profissional, social, artística e cultural.

A libertação do ser humano através da espontaneidade dramática é baseada na

noção de catarse que é a purgação de emoções; é ela que fará o alívio das tensões.

Através da representação, onde o cliente é autor e ator simultaneamente de seu

roteiro, é que a catarse se manifesta; pois com as encenações e com a repetitividade

dos papéis a “conserva” é “esvaziada” ensejando transformações. Além da catarse,

outros elementos constituitivos do estilo dramático compõem a cena psicodramática;

são eles o pathos, o problema, os personagens etc... Todos estes são apresentados

com simbologias mais psicológicas que artísticas para que os objetivos do

Psicodrama sejam alcançados, ou seja, o caráter estático de cenas, textos decorados,

afinações de luz... são substituído uma expressividade espontânea.

Segue aqui, um resumo dos principais objetivos do Psicodrama, elaborado

segundo a sistematização de Pierre Weil:

Vivência do “tele” e do “encontro”: este objetivo seria a experiência pela

qual o grupo, despojado do artificialismo, viverá a relação de atração de uma pessoa

pela outra. O “tele” é uma transferência recíproca, ou seja, a atitude que uma pessoa

tem com outra pessoa gera uma reação positiva ou negativa nesta segunda pessoa. O

“encontro” é a relação já estabelecida, que pode variar, por exemplo, de uma

cooperação social para uma competição; isto se dará de acordo com os papéis

exercidos pelos componentes.

Experimentação pessoal do Estatuto Sociométrico: este objetivo permitirá ao

participante comparar o que percebe de si com o como os outros o percebem. A

técnica utilizada para tal – o sociograma – corresponde a um gráfico feito pelo

protagonista e pelos demais companheiros, em que há comparação de

comportamentos e atitudes de todos.

Libertação e desenvolvimento da espontaneidade criadora: este objetivo prevê

a o uso da espontaneidade, que segundo moreno é a resposta adequada a cada

situação, em cada momento que o homem se encontra; é uma reação no aqui e agora.

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Desenvolvimento da empatia: este objetivo possibilitará aos atores viverem

papéis alheios, reconhecendo em suas vidas, após a sessão psicodramática, as

diferentes visões que papel social pode ter, de acordo com certas situações.

Análise do mecanismo das comunicações e das suas barreiras: este objetivo

trabalhará a pragmática da linguagem, ou seja a linguagem em uso, os sentidos

existentes numa mensagem ao ser enviada de um emissor a um receptor (e vice-

versa). Sobretudo, este trabalhará a expressão não verbal, denunciando sua influencia

na linguagem verbal.

Preparo para situações de relações humanas futuras: este objetivo trará à

prática papéis que ainda não foram vividos pelos participantes mas que são

almejados por eles. Assim, as pessoas reconhecerão as dificuldades e as facilidades

de tais papéis, podendo analisá-los melhor e se prepararem para o futuro.

Regulação do controle emocional: este objetivo treinará o participante que

libera sua emoção, a ter maior controle sobre si mesmo. Ocorrerá então, a adequação,

o controle e o condicionamento emocional e instrutivo.

Experimentação da autonomia: este objetivo despertará nos participantes as

reações previstas pela interdependência, ou seja, em alguns momentos há a

dominação, em outros a subordinação; esta compreensão gradativa trabalha a

autoridade e conseqüentemente a autonomia do ser diante esta situação.

1.1 Dados biográficos de Moreno

A biografia de Moreno que segue neste capítulo, encontra-se mais baseada, na

que é apresentada por Didier Anzieu em seu livro Psicodrama analítico, pois está

mais rica em detalhes. Em contrapartida, essas informações, principalmente sobre o

nascimento de Moreno, são diferentes em relação as informações de outras obras

utilizadas.

Um outro ponto que deve ser esclarecido é a interdependência entre este

capítulo e o próximo, Histórico do Psicodrama, pois dissocia-los resultaria numa

tarefa incompleta e por vezes incompreensível. Tanto a história pessoal de Moreno

como a história do Psicodrama são complementares porque um fato é decorrente do

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outro, é o estreitamento entre os laços do criador e de sua criação. Porém, por caráter

didático, este trabalho monográfico seleciona e distingue os dados que estejam mais

vinculados a um fato ou a outro.

Jacob Levi Moreno nasceu, provavelmente , em 21 de maio de 1.892, num

navio em trânsito pelo Mar Negro, em direção à cidade de Bucareste, na Romênia;

entretanto, segundo Wilson Castelo de Almeida1, nasceu em 1.889. Filho de pais

muito jovens – a mãe era eslava e o pai de descendência judia-espanhola – não foi

logo registrado em Bucareste, o que permite dados imprecisos sobre seu nascimento.

Moreno foi educado em Viena, na Áustria, onde fez estudos de Medicina,

formando-se em 1.917. Entre 1.908 e 1.911, ele estreitava seus laços com o que mais

tarde fundamentaria o Psicodrama – o contato entre as pessoas e o improviso – pois

passava o tempo nos jardins públicos de Viena – rodeado de crianças. Lá, contava

histórias de fadas ou fazia com que as crianças improvisassem brincadeiras, como

por exemplo, a de dar umas às outros nomes fictícios.

Em outro momento de sua vida, entre 1.918 e 1.919, o então médico Moreno,

interrogava-se sobre a essência do divino, o que o levou a publicar na revista Daimon

os seus três primeiros artigos em que figuram os protocolos do Psicodrama: “Die

Gottheit als Komoediant” (Deus como ator), “Die Gottheit als Autor” (Deus como

autor) e “Die Gottheit als Redner” (Deus como orador). Neles, Moreno questionava a

prática religiosa através de livros e sermões; defendia que os religiosos deveriam

renunciar à prática artificial para encontrar pessoas de forma espontânea, no

improviso, da maneira como as idéias e os sentimentos chegam à mente.

A partir de 1.920, Moreno concentrou seus esforços na arte dramática e

tomou posição contrária ao teatro convencional, em que tudo está antecipadamente

pronto: o cenário, o texto, os acontecimentos ... Assim foi, que em 1º de abril de

1921 apresentou aos vienenses o primeiro sociodrama oficial, baseado no diálogo

1 ALMEIDA, Wilson Castelo de, 1.990. p-.10.

13

socrático; desta forma, Moreno pensava resolver os problemas políticos numa

catarse dialética.

Entre 1.921 e 1.924, Moreno continuou com suas práticas espontâneas,

realizando ensaios de improvisação dramática, cujo local chamava-se Teatro do

Improviso. Em 1.923, descobriu a eficiência catártica da improvisação dramática

para investigar e resolver conflitos psíquicos.

Em 1.925, devido à deserção de seus atores espontâneos para o teatro

convencional e devido o insucesso de seus dois livros: Das Stegreiftheater (Teatro de

Improviso; 1.923) e Das Testament dês Vaters (As Palavras de Deus, 1.920), Moreno

emigrou para os Estados Unidos da América. Este fato marcou um grande momento

na biografia dele, pois passou a pensar de forma mais científica e não tanto religiosa.

De 1.936 a 1.968 lecionou na Universidade de Nova Iorque e ampliou seus

estudos e técnicas sobre Psicodrama.

Faleceu em Beacon, Nova Iorque, em 14 de maio de 1.974, decorrente de

uma crise cardíaca que o atingiu em março de mesmo ano. Conhecedor dos

tratamentos médicos que passaria e estando consciente da sua contribuição, já feita,

no campo das terapias, Moreno preferiu não fazer uso de aparelhos nem de

medicamentos para prolongar sua existência.

1.2 Histórico do Psicodrama

Após a Segunda Guerra Mundial, o Psicodrama vem se desenvolvendo

largamente, primeiro pelos avanços tecnológicos e pelas pesquisas desenvolvidas no

campo da ciência biomédicas, em segundo, pelo desenvolvimento do campo das

terapias.

O Psicodrama, como uma terapia expressiva, tem sua história, porem, só

ultimamente ela vem sendo sistematizada como conseqüência do desenvolvimento

das técnicas e do desenvolvimento do seu potencial de tratamento dos distúrbios

sociais.

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No princípio, o Psicodrama estava confundido por considerações de valores

religiosos, sociais e metafísicos; depois, através de puros exercícios teatrais e de

teorias, como a da espontaneidade, o Psicodrama se mostrou como ciência. A

primeira forma de Psicodrama é o axiodrama (em 1.918) que representava uma

técnica para por à prova valores comumente reconhecidos (costumes) para que se

torne a achar o entusiasmo e força que os havia gerado. O axiodrama deseja então,

ativar valores religiosos, éticos e culturais por uma forma de espontaneidade

dramática. O segundo momento do Psicodrama é o sociodrama (em 1.921) onde o

comportamento em grupo é colocado em xeque.

Moreno reconheceu em Sócrates um pioneiro do Psicodrama, tendo sido as

primeiras sessões psicodramáticas desenvolvidas à forma do diálogo socrático:

Sócrates escolhia um contraprotagonista que lhe fosse equiparável (o sofista) e o

elevava à condição de mestre. Sem saber, Sócrates utilizava a técnica da inversão de

papéis; pois ficando com o papel de aluno ignorante, fazia perguntas que conduziam

o sofista para diferentes dilemas.

Foi em 1º de abril de 1.921 que Moreno apresentou o primeiro sociodrama

oficial, em que desejou curar a síndrome cultural da Áustria, que havia se tornado

presa da anarquia no pós-guerra. Moreno colocou ao seu lado, no palco, um trono

real com uma coroa e convidou cada participante a se sentar nela e agir como se

fosse rei. Talvez, uma mentalidade ainda abalada pelo pós-guerra tenha feito os

participantes desta sessão não compreenderem o seu verdadeiro sentido e motivo, e

assim, Moreno foi levado ao insucesso. Pode-se dizer que este primeiro fracasso

alertou ao criador do Psicodrama sobre a necessidade de uma realidade mais

científica e menos mística.

Paralelamente ao desenvolvimento do axiodrama e do sociodrama, Moreno

despertou seu interesse pela arte dramática, concentrando seus esforços na tentativa

de um teatro com o máximo de espontaneidade, ou seja, uma luta contra o teatro

convencional. Esse Teatro do Improviso, criado por Moreno, surgiu de uma situação

muito inusitada: num teatro de jovens, Moreno perturbou a representação de um

drama sobre Zaratustra. Quando o ator que fazia tal personagem entrou em cena,

Moreno saltou no palco pensando estar lidando com o verdadeiro Zaratustra. Ao

decepcionar-se, vendo que ali existia apenas um ator, Moreno abrigou-o a arrancar a

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máscara e a voltar a ser o homem que era no dia-a-dia. Nisto, um outro ator declarou

que o espectador saltara ao palco porque não havia suportado ver ali a sua própria

caricatura; era ele, o espectador, o próprio Zaratustra. Os risos explodiram e o espaço

para um teatro de improviso estava livre. Nestas representações, onde a

espontaneidade é a geradora, a situação de cena passa dos atores para o auditório,

existindo um teatro de grupo.

Em sua tentativa de realizar um teatro com 100% de espontaneidade, Moreno

encontrou resistência por parte de público, redundando mais uma vez em fracasso.

Entretanto, a sua grande descoberta durante o período do Teatro do Improviso foi a

utilização dos fenômenos de grupo no “tratamento” e “cura” de distúrbios sociais.

Essa descoberta foi feita fora do ambiente teatral; foi entre 1.913-1.914, quando

moreno participou de uma experiência para readaptação de prostitutas através de

sessões com discussões livres em pequenos grupos. Cada participante torna-se um

agente terapêutico do outro.

Uma outra descoberta no período do teatro do improviso pode ser relatada

observando-se o caso de Bárbara, uma atriz e aluna de Moreno. Bárbara

normalmente estava incumbida de realiza papéis cômicos. Seu marido Georges,

poeta e autor dramático, freqüentava juntamente com sua esposa o teatro de

improviso. Certa vez, Georges confidenciou a Moreno que a figura angelical de

Bárbara a qual todos conheciam, não se mantinha em casa , onde ela se comportava

como uma “fera”. Naquela noite, Moreno teve a idéia de fazer Bárbara representar

papéis cínicos e vulgares. Ela aceitou o proposto, porém temia não ter sucesso nesse

novo papel. Com o conseqüente sucesso da idéia, Moreno ampliou-a, permitindo que

Georges pudesse representar juntamente com sua esposa. Desta forma, os dois

representavam cenas quotidianas, vividas no dia-a-dia do casal. Alguns meses

depois, Bárbara e Georges recuperaram a harmonia. Esse caso, o de Bárbara, foi o

que marcou a eficácia do teatro com 100% de espontaneidade.

Antes de estipular sua técnica, Moreno buscou a verdade daquilo que havia

descoberto, e para tal, serviu-lhe a noção de catarse aristotélica, que ampliada para

um teatro espontâneo permite ao público ver seus “dramas” encenados por outros, o

que possibilita o encontro de soluções para os problemas. A exteriorização desperta a

catarse, mas não a explica. O que a explica é a repetição voluntária dos

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acontecimentos em condições favoráveis ; os fatos passados são recriados no

presente, tornando o homem senhor dos acontecimentos para supera-los.

Com a emigração de Moreno para os E.U.A., o Psicodrama encontrou um

terreno fértil para seu total desenvolvimento e aplicação, pois o povo americano já

estava habituado a uma psicologia da ação, a uma abordagem mais prática de cada

situação. Neste terreno já preparado, ocorreu em 1.928 a primeira experiência de

Psicodrama propriamente dito. De 1.929 a 1.931, sessões públicas se realizaram no

Carnegie Hall três vezes por semana.

Além de todo o desenvolvimento de sua obra, Moreno ainda possuía um

sonho: a construção do teatro terapêutico em termos físicos.Isto ocorreu em 1.936,

em Beacon, no estado de Nova Iorque. O palco é formado por três círculos

concêntricos com diâmetros variando de 3,60m a 4,80m, cada um deles mais alto

que o outro; correspondem aos níveis de espontaneidade. Algumas cadeiras e uma

mesa formam o cenário existente. Um quarto degrau, próprio aos estados de alma dos

heróis e dos profetas, é constituído por um balcão que domina todo o palco, que tem

3m . O auditório tem 15m de comprimento por 7,50m de largura e 12m de altura.

Comporta 70 lugares sentados. Um projetor permite tirar os efeitos de luz e cores.

Neste teatro, todas as semanas havia uma sessão psicodramática cobrada e pública;

as fechadas eram feitas com programação de consultas.

Nos dias atuais, o Psicodrama vem sendo adaptado da sua forma original e se

amalgamando às terapias expressivas, como a Arte - terapia, por exemplo. Outros

ramos terapêuticos também se “apropriaram” do Psicodrama infiltrando nele noções

teóricas da psicologia, como é o caso do Psicodrama analítico, que insere a

psicanálise no contexto psicodramático (ou vice-versa).

17

2 - ELEMENTOS E ESTRUTURAS ESSENCIAIS AO

PSICODRAMA

Para que o Psicodrama atingisse seus objetivos era preciso primeiro organizar

o grupo de técnicas utilizadas, pois esta condição orientaria mais tarde, quando o

Psicodrama se tornasse uma terapia cientificamente comprovada, o trabalho de

direcionamento das técnicas, ou seja, cada técnica estaria relacionada com um

objetivo prático no tratamento pela catarse. Assim fez Moreno.

Uma sessão de Psicodrama é constituída por três fases consecutivas:

aquecimento; ação; e participação do grupo e “feed back”. Estas fases organizam a

sessão sem que seja perdida a espontaneidade.

A primeira fase, o aquecimento, procurará tornar o ambiente mais “quente”,

isto é, permitirá a criação de um clima em que a relaxação e o interesse sejam

despertados, como também, a receptividade entre os participantes. Nesta fase, será

iniciada a prática da espontaneidade, pois nela escolhe-se o tema a ser tratado e o

protagonista mais indicado para o momento; ocorre uma escolha e não uma

imposição.

Na segunda fase, a ação, o diretor inicia o trabalho de aquecimento do

ambiente e dos protagonistas para a ação do tema escolhido. Após conseguir esse

clima propício o diretor retira-se e os protagonistas (ou o protagonista) passam a

dirigir o drama com sentimento de que a cena lhes pertencem. O diretor, um exímio

observador, “permite” que os outros personagens entrem em cena e que ela decorra

da forma mais criativa e espontânea possível.

A terceira fase, a participação do grupo e “feed back”, se inicia para suprimir

a carência que sofre o protagonista de retorno, de amor. Enquanto a fase anterior

permite ao protagonista se revelar ao grupo, a atual fase possibilita ao grupo expor as

situações vividas que sejam semelhantes às vividas [apresentadas] pelo protagonista.

Cada um reagirá com maior ou menor intensidade aos sentimentos e às sensações

expostas; assim ocorre o retorno: o protagonista faz a catarse do grupo e vice-versa.

Para que estas fases sejam cumpridas na sua plenitude, o Psicodrama exige

certas condições indispensáveis no que se refere aos meios humanos e materiais.

18

Esses “meios” foram destacados por Moreno e são cinco: cena, protagonistas,diretor

ou monitor, ego-auxiliares e platéia ou grupo.

A cena é o aparato físico utilizado; é constituída de palco, com projetores de

cores e biombos. Pierre Weil1 diz que a cena é usada sobretudo quando o Psicodrama

é feito em grandes grupos; já em grupos menores, o palco é substituído por um

espaço reservado para a cena.

Os protagonistas são os membros do grupo que desejem e necessitem ir ao

palco para representar cenas passadas, presentes ou futuras de suas vidas; isto de

forma espontânea, sem que haja “papéis” previamente definidos.

O diretor ou monitor – esses termos – são os que designam as pessoas

formadas e especialistas no assunto; são os facilitadores no processo terapêutico.

Os ego-auxiliares são psicólogos treinados ou membros do próprio grupo que

fazem papéis auxiliares, como pai, irmão, empregado... Podem, os egos auxiliares,

exercerem duas funções: a função de “duplo” e/ou a função de “feed-back”. A

primeira função representa o próprio protagonista sendo dividido pelos ego-

auxiliares; isto é, os egos-auxuiliares podem representar simultaneamente aspectos

diferentes e conflitos do protagonista – instinto ou seu super ego, por exemplo. Já a

segunda função, ocorre quando os ego-auxiliares refletem ao protagonista como ele

foi observado, percebido e sentido por eles ou então, como eles se sentiram quando

vivenciaram um papel exercido pelo protagonista.

Por fim, a platéia ou grupo, conforme já dito anteriormente, exerce o papel de

espectadores ativos no “feed-back” em relação ao protagonista. Quando a

representação e o “feed-back” ultrapassam os domínios dos problemas individuais

para os domínios dos problemas do grupo, trata-se então de sociodrama, e não apenas

Psicodrama.

1 WEIL, Pierre, 1.967. p-30.

19

2.1 Técnicas psicodramáticas

Nesse ambiente onde a espontaneidade é estimulada continuamente, a

teorização de técnicas soa incoerente. Cada monitor reagirá e criará uma técnica

seguindo as circunstâncias da sessão, do grupo e do momento. Este capítulo

descreverá as técnicas que comumente são utilizadas em vários domínios da atuação

do Psicodrama.

– Auto apresentação

Nesta técnica, o protagonista se descreve para os outros componentes do

grupo, descreve como se comporta e o que pensa de si. Esse retrato que é traçado

pelo indivíduo será utilizada na constituição do seu próprio sociodrama.

- Entrevista

Nesta técnica o monitor entrevista o protagonista sobre sua vida, sobre os

sentimentos que foram despertados durantes as cenas/ações psicodramáticas. A

entrevista poderá ser diretiva ou não diretiva, dependerá da postura do monitor. Esta

técnica permite que o protagonista também fale sobre a sua relação com os ego-

auxiliares; isto é muito importante, pois os ego-auxiliares podem representar ao

protagonista partes deles mesmos como a consciência, o instinto, ou ainda, papéis

como pai, irmão, mãe.

– Inversão de papéis

É considerada uma das mais importantes técnicas psicodramáticas, pois age

diretamente na referência que um indivíduo possui em relação ao outro. O

protagonista inverte seu papel com o que lhe é mais próximo na representação. Para

tal inversão é costume que se escolha os momentos mais tensos, com maior

envolvimento emocional.

20

– Duplagem

Esta técnica consiste em o ego-auxiliar (que será o “duplo”) adotar o mesmo

papel que o protagonista; o “duplo” coloca-se atrás dele adotando suas atitudes.

Caberá ao “duplo” dizer tudo o que o protagonista pensa mas não quer falar, ou

mesmo cabe-lhe refletir os processos internos (inconscientes). É interessante ao

terapeuta observar os pontos de divergência e convergência entre o protagonista e o

duplo.

– Solilóquio

Esta técnica virá após a ação, quando o protagonista já fora da cena, diga o

que sentiu com a cena que acabara de realizar e o que sentiu ao desempenhar seu

papel. O “duplo” poderá acompanhar o protagonista e se intitular durante o

solilóquio por “eu”: “Eu senti...”.

– Aparte

Este é um recurso que permite trazer à tona motivos e temas subconscientes; é

muito utilizado pelo teatro para colocar o público em sintonia com o enredo, isto é, o

protagonista interrompe o diálogo falando para si mesmo ou a platéia como se

estivesse só no local.

– Monólogo

Neste técnica, o protagonista representa todos os personagens

simultaneamente, inclusive ele mesmo.

– Diálogo

É a técnica mais freqüente; nela o protagonista seleciona um ou vários ego-

auxiliares, com os quais representará os acontecimentos.

– Duplagem múltipla

Nesta duplagem, mais de uma ego auxiliar divide a tarefa de fazer a

duplagem; o “eu” é segmentado, sendo cada ego-auxiliar responsável por um papel

21

vivido pelo protagonista: o de pai, filho, marido, negociante, ou mesmo papéis como

instinto ou superego. Esta técnica permite evidenciar e resolver conflitos de papéis

ou de camadas da personalidade.

– Espelho social

Esta é a técnica utilizada para auxiliar o protagonista quando ele não

consegue representar um papel, seja por inibição ou por se sentir incapaz. Nela, o

ego-auxiliar desempenha o papel, porém é o protagonista quem o comanda e limita.

– Projeção no futuro ou Psicodrama de antecipação

É a técnica que almeja preparar o protagonista para enfrentar situações de um

acontecimento previsível no futuro ou a evitar tensões e conflitos que algum evento

pode despertar. A partir desta técnica, P. Weil elaborou a técnica seguinte:

– Profissiodrama ou Psicodrama de antecipação vocacional.

Esta técnica almeja preparar adolescentes para escolher a sua profissão.

Através desta técnica, o adolescente, por exemplo, pode verificar o quanto há de

fantasia (ou não) na profissão que deseja seguir.

– Psicodrama por pessoa interposta

Nas ocasiões em que o protagonista não pode comparecer à sessão por estar

doente ou por ser resistente ao tratamento psicodramático, usa-se esta técnica. Nela,

uma pessoa da família ou amiga representa o problema do protagonista com ajuda

dos egos-auxiliares, e em cada sessão o caso é analisado, verificando-se as medidas e

providências a serem tomadas.

– Cadeira vazia

Esta é uma técnica simples e é um excelente ponto de partida para o

Psicodrama. O grupo ou o protagonista é apresentado a uma cadeira vazia, onde

imaginariamente estará sentado um ente com o qual há algum problema a ser

22

resolvido. A pessoa interessada se levanta e principia o diálogo com o ente

imaginário, exercendo os dois papéis ao mesmo tempo. Essa técnica é de Corsini.

– Técnica das cadeiras

É uma variação da técnica anterior. Em vez de uma, usam-se várias cadeiras

vazias.

– Cadeira de Costas

Esta técnica permitirá ao grupo dizer a um membro do próprio grupo como

ele é percebido. O protagonista fica sentado numa cadeira com as costas viradas para

o grupo que falará tudo o que pensa.

– Duplagem de grupo

Nesta técnica, o grupo é convidado a dizer o que acha que o protagonista

sente e pense num determinado momento de sua representação. Todo o grupo passa a

ser o “duplo”.

– Psicodrama de sonho

O protagonista deitado num divã procura lembrar-se dos detalhes do seu

sonho para descreve-lo. Escolhe os ego-auxiliares que representarão o sonho para ele

e para o grupo. O sonho é então discutido e interpretado por todos. A cena ocorrerá

no escuro, sendo apenas o palco iluminado. Nos casos de pesadelos repetidos, o

conteúdo pode ser alterado através da representação psicodramática daquilo que o

protagonista gostaria de sonhar.

– Método do mundo auxiliar

Este método era muito utilizado por Moreno, principalmente no caso de

doentes mentais, que se julgam ser grandes personagens como Cristo, Napoleão, etc.

Neste caso, os ego-auxiliares representam os personagens que fazem parte do delírio,

construindo-se um mundo fictício, que muito ajuda ao doente a reconstruir a

diferença entre realidade e ficção.

23

– Psicodrama de comunicação não verbal

Esta técnica visa estimular, geralmente em grupos muito intelectualistas e

verbalistas, o conhecimento de mensagens não verbais emitidas por cada membro. A

postura, os gestos, os tremores e as expressões faciais são exemplos de comunicação

não verbal que partem, na sua maioria, de zonas subconscientes e emocionais da

personalidade. Ao grupo, é pedido que permaneça em silêncio durante um

determinado tempo, sendo a comunicação permitida apenas pelo uso da linguagem

não verbal.

– Aproximação simbólica

Esta técnica é utilizada quando o grupo carece de espontaneidade e precisa de

“aquecimento”. Um tema genérico é representado por um grupo de voluntários; tal

tema, geralmente tem a propriedade de despertar no grupo o interesse em tratar

algum problema que surja durante a representação.

– Andar juntos

É uma técnica de aquecimento; consiste em tomar o protagonista pelo braço e

andar com ele em torno da cena. Esta técnica permite certa intimidade entre o

monitor e o protagonista, bem como auxilia em abstrair o protagonista da influência

da platéia. Essa conversa entre o monitor e o protagonista relaxa a tensão muscular e

liberta este último.

– Localização no tempo e no espaço

Antes de qualquer representação psicodramática o monitor precisa situar o

protagonista no tempo e no espaço, tal como a realidade. Algumas perguntas são

quase obrigatórias antes das sessões; por exemplo: em que dia foi, a que horas, como

era o local, quem estava presente?, etc. Sempre que possível, o monitor deve deixar o

protagonista dispor mobília e objetos no lugar conveniente.

24

– Eco de grupo

Após a ação psicodramática, o monitor convida o protagonista e os ego-

auxiliares a expressarem o que pensaram e sentiram durante o encontro, a sessão.

Logo depois, os expectadores serão convidados a fazer o mesmo.

– Dramatização (“role-playing”)

Consiste no uso da representação teatral com finalidade didática. O grupo tem

um minuto para preparar uma cena sobre um determinado tema; esta cena, depois,

será debatida em grupo.

– Preparo atrás da cortina

Esta técnica é simples; trata do aquecimento do protagonista com os ego-

auxiliares. Em alguns minutos eles se preparam fora da vista do grupo. A técnica é

muito satisfatória quando as pessoas ainda estão inibidas e quando é usada a técnica

da dramatização.

– Julgamento de Deus

Nesta técnica, o protagonista é informado que acabou de morrer, porém,

felizmente foi destinado ao céu, onde está vivendo junto de Deus. Um ego auxiliar

representará Deus e o protagonista ficará junto dele no balcão do teatro, ou no lugar

mais elevado do palco. Já no local mais baixo do palco estará outro ego-auxiliar, que

representará o diabo. O protagonista poderá pedir a Deus que o deixe entrar no céu

ou que o mande para o inferno. O protagonista torna-se um advogado e tem de

justificar a sua ida ou não para o céu. Se o pedido for para o céu, o diabo será o

advogado de acusação.

– Loja mágica

Esta técnica de Moreno consiste em pedir ao grupo que imagine uma menina

de cinco anos, vendedora de sorvetes mágicos. Cada sorvete tem o poder de

transformar a pessoa naquilo que ela mais quiser neste mundo. Tal técnica permite

um rápido aquecimento do grupo para obter a espontaneidade dentro do real e do

25

imaginário. Por ser uma técnica projetiva, permite uma tomada de consciência por

parte dos protagonistas, de aspectos desconhecidos por eles mesmos, da sua

personalidade.

– Psicodrama alucinatório

É uma técnica utilizada para despertar em doentes mentais o sentimento da

irrealidade das suas alucinações, e conseqüentemente o poder de controlá-las. É

pedido ao paciente que represente as suas alucinações com a ajuda de ego-auxiliares,

que procurarão dar à cena a maior realidade possível (sons, luzes, tons de voz, etc.).

– Choque psicodramático

Esta técnica é uma variante da precedente. Nesta, uma cena ligada a um

delírio alucinatório é previamente preparada. Sem estar avisado, o paciente é

colocado repentinamente na situação das suas alucinações. Por exemplo: se uma

pessoa teme ir para o inferno, aparece-lhe subitamente o diabo (fantasiado de

vermelho).

– Psicomúsica

Através da libertação da espontaneidade, esta técnica visa o desenvolvimento

da criatividade musical. Ela serve como auxílio na representação psicodramática, nos

casos da comunicação não verbal. A mímica substitui o diálogo, e vem acompanhada

de seqüências rítmicas, de exclamações musicadas, etc.

– Psicodança

Como a técnica anterior, esta é utilizada para libertação da espontaneidade; de

modo combinado entram a música e a dança na cena.

– Musicodrama

É a técnica cuja expressão de sentimentos é acompanhada de música

espontânea, com a ajuda de instrumentos primitivos, como colheres, panelas, canto,

mãos, pés.

26

- Hipnodrama

É a combinação da hipnose e do Psicodrama. Somente pode ser feito por

pessoas formadas por hipnose.

– Psicodrama individual

Esta técnica é utilizada quando protagonista possui certos conflitos que não

podem ser representados em público. O monitor e os ego-auxiliares agem sozinhos

juntamente com o protagonista, porém sem platéia.

– Psicodrama individual a dois

A técnica foi imaginada por Rosemary Lippitt e desenvolvida por Anne

Ancelin Schützenberger.. É utilizada por motivos econômicos ou nos casos da

inexistência de ego-auxiliares. Nela, apenas o monitor e o protagonista integram a

cena, sendo o monitor um ego-auxiliar.

– Psicodrama coletivo

Nesta técnica a platéia é sucumbida; todos assumem um papel na cena que

pode ser real ou imaginário. O Psicodrama coletivo clássico é a visita ao Jardim

Zoológico. Cada membro do grupo assume um papel: criança, babá, animais, etc. É

uma técnica excelente para aquecimento do grupo e treinamento da espontaneidade.

– Psicodrama de frustração

A técnica consiste em pedir ao protagonista que se recorde de uma cena em

sua vida, em que tenha se sentido frustrado. Após a representação da cena, ela pode

ser refeita com um término gratificante.

– Psicodrama de vinte e quatro horas

Utilizada em hospitais psiquiátricos, esta técnica se dá pela distribuição de

papéis de direção e administração do hospital para alguns doentes durante um dia.

Assim, por exemplo, o doente “assume” o lugar do médico por 24h.

27

– Psicodrama de reconciliação

Esta técnica é utilizada quando o protagonista tem estado em conflito com

pessoas das suas relações familiares, sobretudo quando se trata de parentes já

falecidos. Após a catarse de uma atividade psicodramática, o protagonista é

convidado a se reconciliar com a pessoa ou as pessoas motivo dos conflitos.

– Confrontação

Esta técnica visa dar ao protagonista a oportunidade de sair de si mesmo e

paralelamente se auto-avaliar. Para tal, é feita a dupla inversão de papéis: o

protagonista encena com um ego-auxiliar; faz-se a inversão de papel; e neste

momento, o monitor entre em ação entrevistando o protagonista no papel do outro,

ou seja, de si mesmo.

– Auto direção

É uma técnica muito simples, nela, o protagonista é quem dirige o seu próprio

drama, quem escolhe os ego-auxiliares, quem indica a sucessão das cenas, etc.

– Repetição de papéis

Trata-se de uma técnica de treinamento que visa o fortalecimento das atitudes

e comportamentos inerentes aos papéis exercidos pelo protagonista. Quanto maior

for a contrariedade do papel à natureza do protagonista, melhor será a eficácia da

técnica. Ao repetir o papel, o protagonista se compenetra dele.

– Imprevisto espontâneo ou treinamento da espontaneidade

Esta técnica de treinamento da espontaneidade consiste em utilizar cenas pré -

estabelecidas nas quais acontecimentos imprevistos podem ocorrer; são elas:

* A filha adolescente que pede à mãe para sair à noite com o namorado pela

primeira vez, e só quer retornar no final do baile, após a meia-noite.

* Um “maitre d’hotel” recebe um freguês, porém, todas as mesas estão

ocupadas, exceto a de uma senhora que permite que o freguês se sente. Durante a

refeição, a senhora percebe que esqueceu a carteira de dinheiro.

28

* O teste de espontaneidade, graduado por Moreno, consiste em representar a

cena de um incêndio. Este teste foi utilizado nos EUA para selecionar candidatos

para o exército e para as indústrias durante a Segunda Guerra Mundial. Ele é

formado em várias fases:

1ª fase: O protagonista é convidado a varrer a casa;

2ª fase: O monitor o avisa que surge um incêndio no quarto das crianças que

estão dormindo;

3ª fase: A mãe do protagonista chega e arrisca a se queimar, caso não seja

prevenida a tempo;

4ª fase: A mãe das crianças chega e desmaia ao chão;

5ª fase: O protagonista é avisado que existem jóias, dinheiro e um manuscrito

no primeiro andar para salvar, porém a fumaça impede a passagem pela escada e a

janela está a três metros de altura.

– Psicodrama analítico francês

É uma técnica variante do Psicodrama individual em grupo, porém é usado

para crianças ou adolescente que escolhem entre os terapeutas ego-auxiliares ou os

ego-auxiliares. A interpretação das escolhas é feita usando-se modelos psicanalíticos

de transferência.

– Psicodrama de fantoches

Nesta técnica o protagonista não representa pessoalmente o seu problema, ele

inventa uma história projetiva que é representada através de fantoches. Ocorre uma

catarse indireta. Esta técnica foi introduzida no Brasil por Helena Antipoff e suas

colaboradoras, na Sociedade Pestalozzi do Brasil.

– Psicodrama de brinquedos

Consiste no uso de brinquedos no desenvolvimento da sessão psicodramática.

29

– Combinação com Narco-análise, LSD, etc.

Nesta técnica, o protagonista ou mesmo o grupo interno é submetido ao uso

de drogas coadjuvantes do tratamento. Moreno1 diz que é difícil afirmar em tais

técnicas, qual o fator decisivo no alívio das tensões dos doentes.

– Psicodrama familiar

Esta técnica é utilizada em casos de conflitos entre marido e mulher ou entre

pais e filhos. A sessão de Psicodrama é feita com todos os protagonistas presentes

(todos participam: mãe, filho, marido).

– Expressão corporal

É uma técnica genérica que inclui o uso de exercícios provenientes da dança,

da música, do ritmo, da mímica, das técnicas de relaxação que permitem liberar a

espontaneidade e fazem com que o indivíduo descubra o seu verdadeiro eu.

2.2 Teoria da espontaneidade

A teoria da espontaneidade desenvolvida por Moreno não despertou muito

interesse aos estadunidenses pois eles valorizam mais a eficácia prática que a teoria.

Neste campo contrário à apreciação teórica, Moreno costurou sua teoria

psicodramática (da espontaneidade) fundamentando-se em dois estudos distintos e

complementares: teoria da espontaneidade e teoria da catarse.

O teórico Bérgson ofereceu em seus princípios um embasamento para que

Moreno desenvolvesse a teoria da espontaneidade. Tais princípios abordam o caráter

prático e terapêutico que a espontaneidade provoca nos indivíduos, tanto de forma

1 In WEIL, Pierre, 1967 – p.50.

30

individual como quando em grupo; os princípios são: 1º - existem atos que de

nenhum antecedente procedem, porque surgem imprevisivelmente; 2º - esses atos

exprimem a personalidade de quem os realiza; e 3º - esses atos permitem a

flexibilidade vital aos seres humanos, mantendo-os abertos.

Moreno1 faz algumas observações sobre a espontaneidade e situa-a no “aqui e

agora”, não sendo temporizada. Isto faz com que seja gratuita – não há precedentes

para que ela ocorra. Pode-se dizer que a espontaneidade obedece a uma lei de tudo

ou nada, em que ou se é espontâneo ou não. Por seu caráter imprevisível e rápido –

está ligada ao momento – não pode ser aprisionada, reservada ou armazenada, tendo

o ato espontâneo que ser continuamente “reinventado”. A estimulação dos atos

espontâneos fará com que eles sejam libertados em qualquer momento, tornando-os

inovadores; é esta característica que aproxima a criatividade da espontaneidade. Não

existe ato espontâneo que não seja criativo, inovador: a espontaneidade inventa

soluções tão inesperadas quanto apropriadas a cada situação. Surge aqui o principal

dever do Psicodrama no que se refere à espontaneidade; ela jamais poderá ser

sacrificada diante de qualquer situação, ao contrário, deve ser estimulada. A

constante estimulação quando não inventa, no sentido estricto da palavra, ela

revitaliza o homem em seus modelos culturais, permite que ele ressignifique o que

pertencia a um passado morto.

A espontaneidade apesar de ser gratuita não age em vão, o seu conteúdo é

uma tensão, ela se faz presente em circunstancias bem elevadas, que apresentem

algum problema para o ser humano. Talvez esta seja uma das razões de a

espontaneidade estar muito facilitada pelas técnicas teatrais, pois no teatro o que

mantém a cena em andamento é a tensão. A tensão dramática é baseada no pathos

que é o envolvimento emocional do texto (ou dos atores) com o público (e vice-

versa), e no problema, que é o questionamento constante que o “texto” deve provocar

na platéia.

1 In ANZIEU, Didier, 1.981. p-43.

31

Quanto à situação em que a espontaneidade pode aflorar, duas vertentes são

destacadas: a novidade e a adequação. Uma situação pode apresentar um grau de

novidade, a resposta a esse grau de novidade, é a espontaneidade. Tal resposta pode

ser adequada ou não e será julgada pelo grau da novidade, isto é, a espontaneidade

será mais adequada quanto maior for a novidade da situação. Caso contrário, o apoio

na confiança e no costume transformará a tal resposta num ato costumeiro, o que

caracterizará uma “conserva cultural”. Ressalta-se aqui, que por caráter

metodológico separou-se novidade e adequação de forma radical, porém a

dissociação entre esses dois somente ocorre nos casos de patologia grave.

Conforme já abordado, uma das funções da espontaneidade é a criativa. Duas

outras podem ser verificadas – a plástica e a dramática. Não apenas as artes plásticas,

mas sobretudo elas, desde a Antigüidade possibilitam ao ser humano expressar seus

temores e angústias diante do mundo, bem como permitem ao homem adaptar-se ao

mundo que evolui rapidamente. Em conseqüência ao registro plástico, o homem ali

purga seu medo ou dificuldade expressando-a, para depois partir à disputa direta com

a situação, quando entra a função dramática. A espontaneidade propõe a solução

expressa através da arte e impulsiona o homem para a atividade, para a prática da

solução.

Observando a espontaneidade sob o aspecto patológico, pode-se dizer que ela

se reduz a três formas: muita espontaneidade, muito pouca espontaneidade e

espontaneidade sem criatividade. No estudo das patologias da espontaneidade

Moreno acerta em perceber que qualquer anomalia na espontaneidade de um sujeito

perturba a relação entre ele e o grupo (social, familiar...)

A espontaneidade pressupõe uma ação, assim, o estudo de sua produção e de

sua medida consiste na passagem rápida do surgimento da idéia a sua imediata

prática. E seguida à prática, a espontaneidade deve ser compartilhada com outra

pessoa, pois a libertação dos atos espontâneos é melhor quando em contato com a

espontaneidade do outro.

Moreno propunha uma aquisição da espontaneidade em 100%, mas em graus

sucessivos. É o que comprova a psicologia genética da espontaneidade,

principalmente quando é observada em crianças que estão entrando na escola. Elas

estão, por volta dos cinco anos, com um alto grau de espontaneidade; após este

32

período (5 – 6 anos) a espontaneidade declina, pois a criança recebe a pressão dos

padrões culturais. Ao nascer, a criança está inapta à vida, então se desenvolve através

de atos espontâneos. Entretanto, não é somente pela espontaneidade que se

desenvolverá a criança, mas também serão necessários adultos que lhes ajudem a dar

partida ao processo de espontaneidade.

Em última análise pode-se dizer que um sujeito ao praticar um ato

espontâneo, esta vivendo efetivamente o tempo; o tempo curto da vida, que é o

tempo da espontaneidade.

2.3 Teoria da catarse

O caso de Bárbara permitiu que Moreno verificasse o poder terapêutico da

arte dramática, pois ao lado da teoria da espontaneidade ele resignificou o uso da

catarse, trazendo essa purgação de emoções para o aqui e agora do ator e do

espectador.

O sentido de catarse como libertação dos conflitos interiores foi empregado

por Aristóteles em seu livro Poética , de 1.499. nele, o autor considera a tragédia

como a imitação de uma ação incompleta que , suscitando a compaixão e o terror tem

por efeito obter a purgação (catarse) dessas emoções.

Durante o Renascimento, acreditava-se que a catarse era oriunda da tragédia,

que familiarizava o homem com o que há de horrível e doloroso. Assim, a tragédia

lhe dava maiores condições para enfrentar a vida.

Já na idade Média, a noção de catarse, que ainda se vinculava à tragédia, era o

desenvolvimento na alma do terror e da compaixão, duas paixões benéficas que

livrariam os homens das paixões mais perigosas, ou seja, quando, por exemplo, a

tragédia mostra aos espectadores o quanto Édipo é infeliz, enche-os de horror e

compaixão, livrando-os de cair na tentação de praticar as mesmas loucuras e

perversões.

33

Para os Românticos, a catarse foi concebida como dupla libertação: livrar o

que não permite a expressão das paixões e reduzir a influencia do que as impede de

se expressarem.

No campo da psicologia, a noção de catarse foi introduzida por Breuer e

Freud no tratamento da histeria, através da hipnose. Ao reviver cenas traumatizantes,

os pacientes obtinham certa redução dos sintomas; porém, estas cenas deveriam ser

com intensidade emocional, pois assim, os sentimentos recalcados e aparentemente

esquecidos seriam restituídos às qualidades deles mesmos, como verdadeiros, e não

apenas representativos. Com tal restituição, os sentimentos se esgotam, reduzindo os

sintomas da histeria. É fato, então, que Moreno não foi o primeiro a aplicar a catarse

aos fenômenos psicológicos; entretanto a sua descoberta original foi, diferentemente

da hipnose, despertar a catarse em estados de plena consciência. O teatro é esse

modo natural que permite obter a catarse por atos conscientes e espontâneos.

A catarse que Moreno tem a preocupação de provar não é a de Aristóteles,

que purifica o espectador por meio de uma tragédia escrita e acabada, nem a de

Freud, que visa principalmente reduzir tensões; mas sim a que almeja a

espontaneidade e a libertação do homem como ator, a libertação dos personagens que

existem dentro de si ou dos que jamais imaginara existir em estado potencial. Em

linhas gerais, seria uma catarse total, quádrupla: somática, mental, individual e

coletiva.

No Psicodrama, a catarse é assegurada pela ficção, pois o sujeito nada arrisca;

está fora da vida real. Nessa “representação da vida real de forma ficcional”, os

sentimentos empregados são reais. É por isto que há identificação entre o

personagem e a pessoa que o representou. Acrescenta-se que o dramático necessita

de um compromisso com a ação, ou seja, a entrega (através da espontaneidade) na

relação entre a ficcionalidade e a intensidade emocional deve ser total. Somente desta

forma, o dramático se perde dentro da ação, possibilitando a identificação com o

personagem.

Para Moreno, a grandeza do ser humano está em superar-se cada vez mais,

está na certeza de poder fazer mais do que faz, ou seja, em poder realizar todos os

papéis que carrega consigo. Todavia, esta grandeza é a sua frustração, pois sofre a

angústia causada pela pressão dos papéis que deveriam ser realizados e não são. Isto

34

justifica o fato de adolescentes recorrerem ao teatro a fim de fugir da pressão que

lhes é imposta quando têm de escolher alguma profissão ou algum estilo de vida.

Quanto à terminologia utilizada aos fenômenos da catarse Didier Anzieu1

afirma que Moreno se vale da terminologia de uma teoria que ele mesmo combate:

utiliza os termos transferência e resistência que pertencem à psicanálise. Entretanto,

Moreno dá a esses termos uma nova significação, destacando que eles, enquanto

fenômenos, não vêm do paciente, como na psicanálise, mas sim do psicoterapeuta.

A transferência ocorre quando a espontaneidade do diretor (monitor) desperta

a de seus clientes. Trata-se de um contágio de emoções.

A resistência ocorre de forma interpessoal: cabe aos ego-auxiliares a função

de suscita-la de maneira oportuna, com a finalidade de “incomodar”, de atacar o que

existe de “conservado” ou neurótico na conduta do paciente. A resistência em seu

extremo não seria facilitadora para a libertação catártica, assim, para que esta

situação seja contornada, é necessário um bom aquecimento com improvisação. Não

se pode negar que o terapeuta precisará dominar a persuasão para a representação; o

terapeuta nivela os seus clientes com um máximo de espontaneidade.

1 ANZIEU, Didier, 1.981. p-52

35

3 – Verificação de resultados em Psicodrama

Nas últimas décadas, a receptividade das técnicas de dinâmica de grupo,

Psicodrama e Sociodrama é baseada, principalmente, nas observações feitas sobre os

seus efeitos posteriores.

Todos os terapeutas que usaram tais técnicas são unânimes quando

reconhecem a eficácia obtida; os clientes afirmam que melhoram nas suas relações

interpessoais, que se sentem mais livres de tensões, que conseguiram paz interior,

etc.

Para que a eficácia no tratamento pelo Psicodrama seja comprovada alguns

critérios de avaliação são estabelecidos a partir de controles experimentais rigorosos.

A metodologia de controle do Psicodrama baseia-se em: níveis de pesquisa,

sucessão cronológica, controles e critérios de avaliação, amostragem, instrumentos

de verificação, controle das variáveis e catalogação das variáveis dependentes e

independentes.

O psicólogo pode centrar a sua atenção e a sua atuação em vários níveis ou

num único nível para análise dos casos; esses níveis podem ser: antropológico,

fisiológico, psicológico, psicossociológico e sociológico. As técnicas e objetivos

serão avaliados, juntamente com outros elementos de verificação, a partir de cada

nível.

A sucessão cronológica corresponde à época em que as medidas, se possível

quantificáveis, são tomadas para uma comparação possível. A época das aplicações

pode ser: antes, no início, no meio, no fim e depois.

Segundo P.Weil1, muitas pesquisas se limitam a fazer uma avaliação apenas

durante a dinâmica, pois alguns terapeutas somente têm contato com o grupo durante

as sessões. Já as pesquisas realizadas posteriores à terapia são raras, dificilmente

1 WEIL, Pierre, 1.967. p-88.

36

passam de um ou dois anos, a maioria parece situar-se entre três e seis meses,

complementa P.Weil.

Em psicologia e pedagogia experimental é de praxe o uso de grupos

experimentais e de controle; os primeiros não estão direcionados e controlados pelo

avaliador, os grupos de controle, sim; o avaliador possui controle sobre as variáveis

que podem ser dependentes ou independentes.

Um outro elemento para avaliação de resultados em Psicodrama são os

critérios de validação. Eles têm a finalidade de encontrar um apoio externo ou

interno para a comprovação das hipóteses. São os seguintes itens: opiniões e atitudes

de participantes; opiniões de subordinados, colegas, superiores ou parentes, produção

de grupo, produção individual, observação direta das variáveis; e observação do

comportamento.

Quanto às populações pesquisadas, P. Weil1 verifica que diversos autores

pesquisam àquelas constituídas de grupos naturais ou de grupos de estranhos, que se

organizam em: adolescentes, alcoólatras, casais, crianças, delinqüentes, dirigentes,

doentes mentais, estudantes, militares, neuróticos e trabalhadores.

As populações anteriormente citadas são analisadas com a ajuda de diferentes

instrumentos de pesquisa, que auxiliam a medida das variáveis dependentes; são eles:

análise de conteúdo, entrevistas, “Iteraction process analysis”, inventários e

questionários, sociometria, técnicas projetivas, testes caracteriológicos, testes

intelectuais e testes psicomotores.

As variáveis utilizadas para análise podem ser independentes ou dependentes;

as primeiras são representadas pelas técnicas utilizadas nas dinâmicas, bem como os

fatores nelas atuantes, como por exemplo, características relativas ao terapeuta (sexo,

idade, presença ou não) ou relativas às técnicas de Psicodrama: analítico,

experimental, moreniano e psicanalítico.

1 WEIL, Pierre, 1.967. p-91.

37

As variáveis dependentes são apresentados por P.Weil1 em função dos níveis

de pesquisa. Tal classificação tem um valor didático, porque cada variável pode ser

enquadrada em mais de um nível; são elas:

No nível antropológico: culturas diversas.

No nível sociológico: atitudes coletivas, autonomia, coesão de grupo, decisão

de grupo, moral, opiniões coletivas, produtividade de grupo e tensão de grupo.

No nível psico-social: acasalamento, agressão, amizade, atitude democrática,

competição, compreensão dos grupos, comunicações, empatia, espírito de equipe,

fuga, fases evolutivas, influência individual, liderança, método de ensino,

participação, percepções recíprocas e alo-percepção das relações familiares,

percepção relativa eu-ideal-comum, problemas de orientação, problemas de opiniões,

problema de controle, problema de decisão, problema de tensão e problemas de

integração.

No nível psicológico: ansiedade, autoridade, aceitação das idéias dos outros,

atrair atenção, controle emocional, competência inter-pessoal, compreensão de

problemas, comportamento, decisões individuais, esquizofrenia, flexibilidade,

conhecimento de si mesmo, maturidade emocional, orientação interna ou social

(endo ou exotátexis), necessidade de afiliação, psicastenia, percepção de si mesmo,

projetividade-objetividade, rigidez, satisfação e sentimento de responsabilidade.

No nível fisiológico: uso de psicotrópicos.

1 WEIL, Pierre. Psicodrama. Rio de Janeiro, CEPA, 1.967 – p.93.

38

4 – Diálogo do Psicodrama com a Arte-Terapia

Segundo o livro Teoria e técnica da Arte-terapia, de Sara Pain e Gladys

Jarreau, a noção de Arte-terapia inclui qualquer tratamento psicoterapeutico que

utiliza como mediação a expressão artística, seja dança, teatro, música, etc. O mesmo

livro, limita-se a abordar somente a representação plástica (pintura, desenho,

modelagem...), o que induz uma valorização das artes plásticas quando se trata de

Arte-terapia.

A arte, que por sua natureza já é terapêutica por permitir a expressão dos

sentimentos e medos do homem em relação ao mundo que está em constante

mudança, é valorizada como instrumento terapêutico quando, no final do século

XIX, os psiquiatras se interessam pelas produções plásticas dos alienados. Entre eles

pode-se citar Molvi (1.906), Simon (1.876 e 1.888) e Prinzhorn. Paralelamente,

pedagogos e outros pesquisadores educacionais incluíram no ambiente escolar as

artes, encorajando a expressão artística das crianças. Froëbel foi o primeiro a incluir

atividades artísticas no jardim de infância.

Neste mesmo período, outro fato contribuiu para a valorização das artes no

campo terapêutico: os tratamentos psicanalíticos e psicoterápicos das neuroses,

devido a seu elevado custo e a sua longa duração cederam espaço ao surgimento de

outras alternativas terapêuticas. Assim surgem as psicoterapias de grupo, o

Psicodrama, a musicoterapia e as terapias de expressão plástica, que mais tarde se

chamarão Arte-terapia.

A partir desta explanação anterior, o Psicodrama é um tipo de terapia que se

utiliza de uma expressão artística – o teatro – e portanto é uma vertente da Arte-

terapia. Entretanto, na prática, algumas vertentes da Arte-terapia, como a música ou a

dança, se especializaram em sua linguagem e em seus objetivos, que se tornaram

ímpares e completas, constituindo-se terapias expressivas. Assim também ocorreu

com o Psicodrama, que resgatou o teatro de dentro das terapias de expressão artística,

para dar-lhe nova roupagem com técnicas, elementos e objetivos mais definidos.

Delimitar os elementos que testificam a distinção entre Arte-terapia e

Psicodrama não é uma tarefa simples e nem cabe ao tema deste trabalho, porém duas

39

considerações podem ser feitas: a palavra como expressão verbal no Psicodrama terá

função secundária, enquanto que na Arte-terapia o efeito terapêutico advém da

expressividade verbal em torno do conteúdo da obra, ficando a expressão plástica

para segundo plano. A outra consideração é que, no Psicodrama, um sujeito é agente

terapêutico do outro, excluindo-se o monitor; já na Arte-terapia, mesmo que a sessão

seja em grupo, o vínculo terapêutico estará entre cada cliente e o arte-terapeuta.

Constituiu-se, empiricamente, que, para não haver conflitos entre

nomenclatura utilizada por ambas as terapias, será utilizado o termo “teatro-

terapêutico” para atividade arte-terapêutica que se vale do teatro como mediador da

expressão; e o uso de “Psicodrama”, será para atividade psicoterapêutica que utiliza

as normas e condições propostas por Moreno.

4.1 – Marionetes: atividade plástica e dramática

As marionetes datam desde a antigüidade e sempre se relacionam às

cerimônias religiosas como auxiliar do poder sacerdotal. Foi através das marionetes

que o tabu da representação humana foi contornado. Assim ocorreu na Tunísia, no

século XIV, quando os comediantes não podiam se mostrar no teatro, enquanto o

espetáculo com marionetes era permitido.

Pelo aspecto terapêutico, a técnica da Marionete é uma experiência muito rica

tanto para adultos como para crianças, pois ela age catarticamente com diversos

materiais e situações, ou seja, o fazer terapêutico passa pela criação plástica da

Marionete, pela decoração e acessórios, pela invenção de cenários, pela realização

grupal, pela utilização da palavra como parte da expressão principal e pelo uso da

expressão corporal. Ao que se percebe esta técnica arte-terapêutica vai ao encontro

da técnica Psicodrama de fantoches.

As marionetes podem ser planas, de fantoches (luva), de vara, etc, o que

valerá neste caso é o uso da criatividade como facilitadora da espontaneidade e da

catarse.

40

Após a feitura plástica da Marionete, entra a constituição da história que

pode, de acordo com a necessidade, ser previamente estabelecida ou decidida pela

improvisação, no momento. Tudo será um dado importante pelo aspecto terapêutico,

desde a complexidade ou não do enredo até definição de características físicas e

psicológicas dos personagens criados. A voz, os movimentos, as atitudes reacionais,

e os argumentos utilizados também devem ser observados, pois eles

inconscientemente revelam traços da personalidade dos clientes.

A atividade plástica amalgamada à representação teatral desperta um processo

simbólico que poderá encontrar algumas dificuldades: nem sempre a marionete será

feita como projetada, ou a representação poderá ser prejudicada pela limitação dos

movimentos.

Convém ao terapeuta equilibrar durante a sessão a necessidade de habilidade

plástica e dramática.

Um dos problemas da representação de um espetáculo encontrado pelo

terapeuta é o de encontrar o momento de fazer as intervenções. Na pintura ou na

modelagem, essa intervenção, normalmente, é feita durante o trabalho e de forma

individual. Essa intimidade, para o arte-terapêuta, pode fazer falta em uma condução

de grupo, onde a atenção tem de ser dividida entre os participantes.

41

CONCLUSÃO

Após analisar bibliograficamente os elementos essenciais do Psicodrama e as

teorias que o fundamentam, é possível constatar que o processo de tratamento e de

cura ensejado pelo Psicodrama fundamenta-se pela catarse coletiva, que não

abandona o aspecto social nem o individual e o psicológico.

Quando se fala em catarse coletiva, refere-se ao efeito que ela produz tanto no

protagonista como no público que assiste à representação psicodramática. Entretanto,

ao analisar as técnicas descritas no capítulo II deste trabalho, verifica-se uma

possibilidade escassa de o Psicodrama ser utilizado individualmente, ainda que a

platéia seja um elemento essencial para a realização da sessão.

Um outro ponto de suma importância na prática do Psicodrama é o

desenvolvimento de seu tratamento e cura pela ação dos atos espontâneos. São eles

que permitem ao protagonista a libertação das “conservas culturais” e a penetração

da carga dramática. A carga dramática é muito necessária para a ação catártica; ela

alimenta o desejo de representar ficcionalmente cenas reais, utilizando emoções

intensas e verdadeiras.

Com a ação catártica estimulada pelo desenvolvimento da espontaneidade, o

Piscodrama define sinteticamente seus objetivos terapêuticos: integrar pessoas e

trata-las de seus distúrbios sócio-psicológicos pela representação dramática

O tratamento psicodramático pode ser valorizado quando empregado com

algumas técnicas arte-terapêuticas, ou vice-versa. Foi possível verificar que a junção

da técnica arte-terapêutica – teatro de marionetes – com a psicodramática –

Psicodrama de fantoches – é muito eficaz, pois as duas permitem a exploração de

dois objetos de avaliação: as artes plásticas, na montagem do fantoches, e a

dramatização na representação do enredo. Contudo, Arte-terapia e Psicodrama são

originalmente diferentes, e conseqüentemente suas técnicas e objetivos também se

diferenciam, não sendo possível estabelecer um forte laço entre elas.

42

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, Wilson C. de. O que é Psicodrama. São Paulo: Brasiliense, 1.990.

ANZIEU, Didier. Psicodrama analítico. Rio de Janeiro: Campus, 1.981.

ARAÚJO, Milton C. de. Educação através do teatro. Rio de Janeiro: Editex, 1974.

COELHO, Paulo. O teatro na educação. Rio de Janeiro: Forense – universitária,

1.973.

LAROSA, Marco A. et Ayres, Fernando A. Como produzir uma monografia passo a

passo... siga o mapa da mina.. Rio de Janeiro: Wak, 2.003.

MORGAN, Clifford T. Introdução à Psicologia. São Paulo: Mcgraw – Hill do

Brasil, 1.977.

PAIN, Sara et JARREAU, Gladys. Teoria e técnica da Arte-terapia: a compreensão

do sujeito. Porto Alegre: Artes Médicas, 1.996.

PEREIRA, Regina de C. Chagas. A espiral do símbolo: a arte como terapia.

Petrópolis: Vozes, 1.976.

SANTOS, Amicy. Persona: O teatro na educação, o teatro na vida. Rio de Janeiro:

Eldorado Tijuca, 1.975.

STAIGER, Emil. Conceitos fundamentais da poética. Rio de Janeiro: Tempo

Brasileiro, 1.975

WEIL, Pierre. Psicodrama. Rio de Janeiro: CEPA, 1.967.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO -----------------------------------------------------------------7

1. – PSICODRAMA: TERAPIA DE OBJETIVOS SOCIAIS

E INDIVIDUAIS --------------------------------------------------------------9

1.1. – Dados Biográficos de Moreno -----------------------------------11

1.2. - Histórico do Psicodrama ----------------------------------------13

2. – ELEMENTOS E ESTRUTURAS ESSENCIAIS AO

PSICODRAMA --------------------------------------------------------------17

2.1. – Técnicas psicodramáticas ---------------------------------------19

2.2. – Teoria da espontaneidade -------------------------------------- 29

2.3. – Teoria da catarse ------------------------------------------------ 32

3. - VERIFICAÇÃO DE RESULTADOS EM PSICODRAMA-- 35

4. – DIÁLOGO DO PSICODRAMA COM A ARTE-TERAPIA-38

4.1 Marionetes: atividade plástica e dramática --------------------39

CONCLUSÃO ----------------------------------------------------------------41

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS -------------------------------- 42

44

FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PROJETO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSO”

TÍTULO: PSICODRAMA: Sua estrutura e fundamentação num

diálogo com a Arte-Terapia.

Data da entrega: 01 de setembro de 2.003.

Avaliação:

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Avaliado por: __________________________________ Grau: ______

___________________, _____ de ___________ de __________.