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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE Deficiência Visual – Não feche os olhos para este mundo. Por: Camila Furtado Azevedo Orientador Prof. Edla Trocoli Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

Deficiência Visual – Não feche os olhos para este mundo.

Por: Camila Furtado Azevedo

Orientador

Prof. Edla Trocoli

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

Deficiência Visual – Não feche os olhos para este mundo.

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção do grau de especialista em Educação

Inclusiva.

Por: .Camila Furtado Azevedo

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AGRADECIMENTOS

Aos meus professores, todos que

passaram pela minha vida escolar e

universitária, sem os mesmos este

estudo não seria possível.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a Deus pela benção

de poder estudar;

À minha mãe Maria, pela confiança em

mim;

Ao meu noivo Leonardo pela mão amiga

sempre estendida.

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METODOLOGIA

O presente trabalho pretende oferecer subsídios para que o leitor realize

uma reflexão sobre a Educação de crianças deficientes visuais, assim como a

reabilitação de jovens, adultos e idosos.

Para que se faça possível alcançar uma prática pedagógica real e

eficiente na Educação Infantil,Ensino Fundamental,Ensino Médio e ou na

reabilitação de deficientes visuais, cegos ou com baixa visão, devemos

penetrar em seus universose, muitas vezes, nos colocarmos em seus lugares,

na tentativa de compreendermos a verdadeira situação resultante de sua

condição visual, para que possamos traduzir sentimentos,emoções, interesses,

buscas e necessidades.

Os principais autores utilizados na realização deste foram Márcia Fonseca

Linhares, Maria da Glória de Oliveira Lemos, Vera Lúcia Vaz Agarez e

Instituições como a Fundação Dorina Nowill, IBC- Instituto Bejamin Constant e

LARAMA- Associação Brasileira de Assistência ao Deficiênte Visual.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07

CAPÍTULO I - A Legislação e o conceito 08

CAPÍTULO II - A Aprendizagem 43

CAPÍTULO III – A Família 55

CONCLUSÃO 66

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 68

ANEXOS 69

ÍNDICE 73

FOLHA DE AVALIAÇÃO 74

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INTRODUÇÃO

Deficiência refere-se qualquer perda ou anormalidade da estrutura ou

função psicológica, fisiológica ou anatômica, podendo resultar numa limitação

ou incapacidade no desempenho normal de uma determinada atividade que,

dependendo da idade, sexo, fatores sociais e culturais, pode se constituir em

uma deficiência.

Desta forma, uma doença ou trauma na estrutura e funcionamento do

sistema visual pode provocar no indivíduo a incapacidade de “ver” ou de “ver

bem”, acarretando limitações ou impedimentos quanto à aquisição de

conceitos, acesso direto à palavra escrita, à orientação e mobilidade

independente, à interação social e ao controle do ambiente, o que poderá

trazer atrasos no desenvolvimento normal.

A criança deficiente visual é aquela que difere da média a tal ponto que irá

necessitar de professores especializados, adaptações curriculares e ou

materiais adicionais de ensino, para ajudá-la a atingir um nível de

desenvolvimento proporcional às suas capacidades.

Os alunos com deficiência visual não constituem um grupo homogêneo,

com características comuns de aprendizagem, sendo também, um erro

considerá-los como grupo à parte, uma vez que suas necessidades

educacionais básicas são geralmente as mesmas que as das crianças de visão

normal.

No trabalho com crianças cegas ou portadoras de visão subnormal há

necessidade de um conhecimento prévio de cada caso, para elaboração de um

plano educacional adequado às características e necessidades do educando.

Algumas informações importantes devem ser colhidas junto aos pais ou

responsáveis pela mesma, as quais serão posteriormente ampliadas ou

rejeitadas de acordo com o desenvolvimento das atividades no contato direto

com o aluno.

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CAPÍTULO I

A Legislação e o conceito.

“... A capacidade de um ser humano não se mede por olhos, ouvidos,

pernas...” (ALMEIDA,Maria da Glória de Souza – Chefia de Gabinete do IBC).

A partir da Constituição Federal Brasileira de 1988 foi assegurado às

pessoas portadoras de deficiências o direito à educação e o direito de recebê-

la,sempre que possível, em convívio com as pessoas nas escolas regulares. A

Constituição também assegura o direito à saúde, esporte, cultura e trabalho.

Em sequência, a sociedade brasileira, assumindo inclusive compromissos

internacionais, legitimou estes direitos em legislações internas pertinentes:

• Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei n° 9394/96); Política

Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (Decreto

n° 3298/99);

• Acessibilidade de Pessoas Portadoras de Deficiência para instruir

processos de autorizaçãao e de reconhecimento de cursos superiores e

credenciamento de instituições (Portaria MEC n° 1679/99);

• Lei da Acessibilidade (Lei n° 10.098/00);

• Resolução n°02 CEB/CNE de 2001 que estabelece as Diretrizes

Nacionais de Educação Especial na Educação Básica;

• Política Nacional de Saúde de pessoas portadoras de deficiência

(Portarias MS n°1060/02);

• Rede Estadual de Assistência a Pessoas Portadoras de Deficiência

Física (Portarias MS 818/01 e 185/05);

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• Regulamentação da Lei n° 8213/91 que dá garantia de trabalho e

emprego à pessoa portadora de deficiência e o Decreto n° 3956/01 que

promulga a Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as

Formas de Discriminação contra Pessoas Portadora de Deficiência.

Conceito

O termo deficiência visual refere-se a uma situação irreversível de

diminuição da resposta visual, em virtude de causas congênitas ou

hereditárias, mesmo após tratamento clínico e/ou cirúrgico e uso de óculos

convencionais. A diminuição da resposta visual pode ser leve, moderada,

severa, profunda (que compõem o grupo de visão subnormal ou baixa

visão) e ausência total da resposta visual (cegueira).

De acordo com a intensidade da deficiência, temos a deficiência visual

leve, moderada, profunda, severa e perda total da visão. De acordo com

comprometimento de campo visual, temos comprometimento central,

periférico e sem alteração. De acordo com a idade de início, a deficiência

pode ser congênita ou adquirida. Está-se associada a outro tipo, como

surdez, por exemplo, a deficiência pode ser múltipla ou não.

Categorias

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• CEGO – Tem somente a percepção da luz ou não tem nenhuma visão

e precisam aprender através do método Braille e de meios de

comunicação que não estejam relacionados com o uso da visão.

• Pessoas com VISÃO PARCIAL tem limitações da visão a distância,

mas são capazes de ver objetos e matérias quando estão a poucos

centímetros ou no máximo a meio metro de distância.

• Pessoas com VISÃO REDUZIDA indivíduos que podem ter seu

problema corrigido por cirurgias ou pela utilização de lentes.

Causas

De maneira genérica, podemos considerar que nos países em

desenvolvimento as principais causas são infecciosas, nutricionais,

traumáticas e causadas por doenças como as cataratas. Nos países

desenvolvidos são mais importantes as causas genéricas e

degenerativas. As causas podem ser divididas também em:

congênitas ou adquiridas.

• Causas congênitas: amaurose congênita de Leber,

malformações oculares, glaucoma congênito e catarata

congênita.

• Causas adquiridas: traumas oculares, catarata, degeneração

senil de mácula, glaucoma, alterações retinianas relacionadas

à hipertensão arterial ou diabetes.

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Fatores de Risco

• Histórico familiar de deficiência visual por doenças de

caráter hereditário: por exemplo, glaucoma.

• Histórico pessoal de diabetes, hipertensão arterial e outras

doenças sistêmicas que podem levar ao comprometimento

visual, por exemplo: esclerose múltipla.

• Senilidade, por exemplo: catarata, degeneração senil de

mácula.

• Não realização de cuidados pré-natais e pré-maturidade.

• Não utilização de óculos de proteção durante a realização

de determinadas tarefas (por exemplo,durante o uso de

solda elétrica).

• Não imunização contra rubéola da população feminina em

idade reprodutiva, o que pode levar a uma maior chance

de rubéola congênita e consequente acometimento visual.

Modalidade de Atendimento Educacional para o Aluno

com Deficiência Visual

A educação da criança deficiente visual, pode se processar por meio de

programas diferentes desenvolvidos em classes especiais, mantidas por

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escolas especiais, historicamente denominadas de segregadas, ou no ensino

integrado, nas salas de recursos, no ensino itinerante ou na classe comum,

recebendo apoio do professor especializado.

Em qualquer destes programas os objetivos, conteúdos e procedimentos

não são essencialmente diferentes da educação comum; tais crianças

necessitam de uma boa educação geral, somada a um tipo de educação

compatível com seus requisitos especiais, fazendo ou não, uso de materiais ou

equipamentos de apoio.

A educação do deficiente visual, como toda educação especial, necessita

de professores especializados nesta área, métodos e técnicas específicas de

trabalho, instalações e equipamentos especiais, bem como algumas

adaptações ou adições curriculares.

O principal fator a considerar no encaminhamento de uma criança aos

programas de educação especial para deficientes visuais, é a existência de um

impedimento visual de tal ordem que, mesmo após a correção óptica ou

tratamento, ela não apresente condições para acompanhar o ensino regular

sem as devidas adaptações ou recursos específicos, requerendo a

participação de especialistas para a orientação e desenvolvimento de

habilidades que permitam progressivamente, sua inclusão no ensino comum.

A tendência atual da educação especial, em todo mundo é a educação

inclusiva, ou seja, mantê-las em escolas regulares pois os educandos que

podem ser educados num programa regular de ensino, com ou sem serviços

suplementares, não devem ser institucionalizados.

Esta posição há muito tempo vem sendo considerada mais desejável,

tanto do ponto de vista ético, quanto social e econômico. O interesse da

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criança, da família e da comunidade em geral, é melhor atendido quando os

programas de educação especial são instalados em escolas locais,

proporcionando ao educando o máximo de convivência com outras crianças e

pessoas de seu próprio círculo de relações sociais.

A criança cega ou de visão subnormal precisa aprender a viver num

mundo de pessoas que não apresentam deficiência. Mesmo que este processo

lhe seja, muitas vezes, difícil e penoso. Cabe a sociedade a responsabilidade

de prover os auxílios necessários para que a criança se capacite e possa

integrar-se no grupo social a que pertence. Assim sendo, a forma ideal de

educação é aquela que proporciona ao aluno maiores oportunidades de

assimilação pelo sistema regular de ensino.

Segundo esses pressupostos filosóficos, a rede regular de ensino matem

em suas escolas serviços de apoio pedagógico para esta clientela nas classes

especiais, sala de recursos, na classe comum e no ensino itinerante, contando

ainda, com centras de atendimento ( Centros de Apoio Pedagógico – CAP),

que oferece serviços especializados complementares a alunos matriculados

em qualquer classe ou nível do ensino regular, orientando os pais, professores,

pessoal da escola e a comunidade, bem como oferecendo cursos de formação

continuada aos especialistas da educação.

Classe especial

É o tipo de agrupamento tradicionalmente utilizado nas escolas

especiais organizadas para o atendimento de um determinado tipo de

deficiência, no caso, a visual. Estas escolas foram as primeiras a iniciar a

educação destes alunos sendo, durante muitos anos, considerada a única

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forma de atendimento para estes educandos, assim como as mais

adequadas devido às facilidades apresentadas nas instalações,

equipamentos, materiais específico e pessoal com experiência na área.

Embora tais escolas possam oferecer oportunidades mais completas para o

ensino face aos recursos disponíveis, são evidentes as desvantagens da

própria institucionalização como a rotina, formalidade, segregação familiar e

social, rigidez de horários e outros aspectos.

Por outro lado, crianças pertencentes a comunidades que não contam

com recursos educacionais especializados, que pertencem a ambiente

familiar altamente desfavorável, ou portadoras de incapacidades adicionais,

poderão ser beneficiadas por uma escola especial.

Atualmente as escolas especiais existentes em nosso meio vêm

proporcionando um eficiente processo de reformulação de conceitos e de

seus programas com o objetivo de melhor atender a clientela sob sua

responsabilidade e minorar os efeitos decorrentes da segregação. Tais

escolas desenvolvem programas educacionais e de internato ou semi-

internato e seus cursos se norteiam pela orientação geral das escolas

regulares. Planejam suas atividades em função do ano letivo, estimulando

amplamente a saída dos alunos nos fins de semana e nos períodos de férias,

nos casos de internato, numa tentativa de manter, dentro do possível, a

convivência familiar e social.

Na maioria dos casos, sempre que houver condições, as crianças

deficientes visuais devem ser educadas com as crianças videntes, devendo a

escola especial servir apenas aquelas que precisam e não podem beneficiar-

se de um serviço educacional especializado em sua própria comunidade.

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A forma de funcionamento da escola especial que provoca menos

segregação é em regime de externato ou semi-internato, uma vez que a

criança reside com a família e frequente a escola em período integral ou

parcial. No entanto, estas escolas deveriam ter como um de seus objetivos o

encaminhamento da criança para escolas da rede de ensino regular, tão logo

fosse possível, evitando permanecer com os educandos que já apresentam

condições a serem incluídos e receberem atendimento especializado através

das salas de recursos, ensino itinerante ou dos centros de atendimento

(Plano Oregon – Dunn,1971 e Declaração de Salamanca,1994).

Salas de Recursos

As salas de recursos são criadas e instaladas em estabelecimentos de

ensino regular, de acordo com os critérios estabelecidos pelo órgão central de

educação, contando com um professor especializado à disposição da unidade

escolar onde a mesma se encontra instalada.

Neste tipo de atendimento, o aluno cego ou portador de visão

subnormal, após avaliação educacional e desenvolvimento de atividades

introdutórias, pode ser encaminhado a uma classe regular correspondente ao

seu nível de adiantamento, recorrendo à sala de recursos quando encontrar

dificuldades de aprendizagens decorrentes de problemas impostos por sua

limitação visual, cuja solução seja impossível através dos recursos utilizados

pelo professor do ensino regular. Embora o processo educativo do aluno se

desenvolva na classe regular em que está matriculado, este poderá recorrer à

sala de recursos sempre que necessitar de materiais ou equipamentos,

suplementação de aulas através de material didático que facilite a

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concretização do aprendizado, ou ainda, para o desenvolvimento de atividades

especificas como da vida diária, orientação e mobilidade, treinamento da visão

residual, datilografia Braille e informática, dentre outras atividades.

Um aspecto para o qual o professor da sala de recursos deve estar

atento é o fato de que esta não se torne uma classe especial, evitando manter

nela os alunos por períodos mais longos do que o necessário, visto que esta

situação contraria os pressupostos desta forma de atendimento. É evidente,

que um aluno deficiente visual que inicia a escolaridade, não poderá ser

colocado diretamente numa classe de ensino regular, sendo necessário um

conhecimento prévio do mesmo para avaliação e definição da proposta de

trabalho a ser desenvolvida, sendo que o sistema Braille deverá ser ensinado

na sala de recursos e posterior, ou concomitantemente, ser escolhida a classe

comum que o aluno irá ficar após preparo do professor comum e dos colegas

que o terão na classe. No que se refere aos alunos portadores de visão

subnormal há necessidade de conhecimento sobre o nível de potencialidade

visual, oportunidades para usar a visão existente e adequação aos

equipamentos e recursos que irá necessitar.

As séries iniciais do ensino fundamental favorecem a integração do

aluno, tendo em vista os tipos de atividades desenvolvidas; entretanto, quando

o mesmo inicia a escolaridade em idade mais avançada que não permite o

agrupamento com crianças menores, ou porque suas necessidades exigem um

período mais longo na sala de recursos, o professor poderá sugerir sua

participação na classe comum através do plano cooperativo entre as duas

classes. Através deste plano o aluno inicialmente participa apenas de

atividades gerais da classe comum, desenvolvendo-se num crescente

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proporcional às suas condições, até atingir a completa integração tanto em

termos sociais quanto pedagógicos.

A sala de recursos atende a todos os educandos cegos e portadores de

visão subnormal que estejam matriculados no estabelecimento em qualquer

série ou grau. Pelo fato de o professor especializado estar exclusivamente num

estabelecimento e aí permanecer diariamente, podendo, inclusive, alternar seu

horário para atender aos alunos nos diferentes períodos da escola; esta forma

de atendimento proporciona mais auxílio específico e imediato do que o ensino

itinerante.

Escola Itinerante

O programa de ensino itinerante atende aos alunos deficientes visuais

que estejam matriculados em estabelecimentos de ensino comum de sua

comunidade em qualquer idade, série ou período. Em geral, este programa é

indicado quando o número de alunos a serem atendidos, em qualquer das

escolas ou região, não justifica a criação de uma sala de recursos e cujas

necessidades específicas dos educandos podem ser atendidas através dos

esforços conjugados do professor de classe regular e do ensino itinerante, bem

como da própria família.

Neste tipo de atendimento, o professor atende o aluno na escola em que

este se encontra matriculado obedecendo a um planejamento elaborado de

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forma a satisfazer às necessidades individuais de cada aluno e do pessoal da

escola.

Através da prestação de serviços diretos e indiretos, o professor procura

solucionar as dificuldades acarretadas pela deficiência, de modo a possibilitar

a inclusão do aluno na vida escolar, familiar e social; estimula a participação

dos pais no processo educacional, orientando-os sobre os procedimentos mais

adequados com relação à criança, além de a melhor forma de auxiliarem nas

tarefas escolares como leituras, gravações, aprendizado do Brailie, consultas a

bibliotecas especializadas, ampliação de materiais e outros esforços

necessários para possibilitar a continuidade do usufruto da convivência familiar

dessas crianças, ao mesmo tempo em que estudam em um ambiente

competitivo, junto às pessoas de visão normal e próximo de sua residência.

Tais professores podem estar sediados em um órgão administrativo, em uma

unidade escolar ou CAP, prestando serviços em diferentes estabelecimentos

de ensino onde estão matriculados os alunos sob sua responsabilidade. Tanto

o número de alunos atribuídos a cada professor, quanto à freqüência do

atendimento, devem estar em relação direta com as necessidades específicas

de cada aluno e do pessoal da escola (técnico-administrativo, docente e

discente), ou seja, quanto maior a necessidade, maior deve ser a freqüência

do atendimento. Este programa beneficia sobremaneira, os alunos do ensino

fundamental que já tenham certa independência, tanto pessoal quanto

acadêmica, bem como os de ensino médio, de cursos universitários, de línguas

estrangeiras, supletivos e outros.

O ensino itinerante é a modalidade de atendimento educacional que

proporciona maiores oportunidades para a integração do aluno; o fato de a

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criança freqüentar a escola de seu bairro, muitas vezes, como tinico deficiente

visual matriculado, é considerado um aspecto altamente significativo para

favorecer sua integração, que deverá se processar através da união de

esforços do professor itinerante, professor comum, pessoal da escola e pais,

devendo haver colaboração de todos no sentido de capacitá-lo para participar

das atividades escolares e manter-se no mesmo nível que seus colegas.

Alguns fracassos atribuídos a este programa, estão mais ligados ao padrão

das escolas e dos professores comuns, personalidade e competência do

professor especializado ou do próprio aluno, bem como carência de recursos

humanos e materiais especializados, do que ao tipo de atendimento

propriamente dito.

No ensino itinerante o professor especializado trabalha diretamente com

o aluno e indiretamente, podendo deixar orientações e atividades a serem

realizadas, até o seu retorno, pelo próprio aluno, o professor comum, a família

ou pelo pessoal da escola.

Atualmente alguns professores de salas de recursos saem de suas

unidades, exercendo funções de itinerante, ou recebem ex-alunos que foram

remanejados para outros estabelecimentos e que se encontram sem

orientação especializada.

CENTROS DE APOIO PEDAGÓGICO – CAP

Devido às dificuldades na ampliação dos serviços de

atendimento para deficientes visuais, face à carência de professores

especializados, insuficiência de materiais para estudos e pesquisas dos

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alunos, tanto em Brailie quanto em tipos ampliados, surgiram nos últimos anos

alguns centros especializados para dar suporte ao atendimento destes alunos.

A Secretaria de Estado da Educação de São Paulo criou o primeiro em

1994, cujo projeto serviu de modelo para os demais.

O Centro de Apoio Pedagógico para Atendimento às Pessoas com

Deficiência Visual, institucionalizado pelo Ministério da Educação através da

Secretaria de Educação Especial é resultado de um trabalho conjunto entre

esta Secretaria e as entidades filiadas à União Brasileira de Cegos UBC

(Associação Brasileira de Educadores de Deficientes Visuais, Instituto

Benjaniin Constant e Fundação Dorina Nowill para Cegos).

O objetivo do Projeto CAP é garantir às pessoas cegas e às de baixa

visão o acesso ao conteúdo programático desenvolvido na escola de ensino

regular, assim como acesso a literatura, à pesquisa e à cultura por meio da

utilização de equipamentos da moderna tecnologia e da impressão do livro em

Braille.

Uma das alternativas para dinamizar e favorecer a integração dos

deficientes visuais consiste, principalmente, na produção de material impresso

em Brailie, na ampliação de textos, na adaptação de materiais, na qualificação

de recursos humanos e outros recursos necessários ao processo de ensino e

aprendizagem do aluno.

Além do atendimento específico ao deficiente visual, o CAP orienta pais

e professores das escolas onde os alunos estão matriculados, além de

organizar programas e cursos para formaçã continuada e de capacitação dos

professores especializados da rede, colocando à disposição dosmesmos a

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bibliografia atualizada, materiais de apoio e equipamentos de última geração

para uso deles e de seus alunos.

Desta forma os CAPs poderão se estruturar oferecendo serviços através

de:

Núcleo de Produção Braille- Constituem-se em um conjunto de

equipamentos e tecnologias que tem por objetivo a geração de materiais

didáticos pedagógicos como livros e textos em Brailie, ampliados e sonoros

para distribuição aos alunos matriculados no ensino regula (prioritariamente no

ensino fundamental) bibliotecas e escolas especializadas. Responsabilizando-

se também, pela adaptação de materiais com a fmalidade de complementação

didático-curricular do ensino comum, como: mapas, gráficos, tabelas e outros.

Núcleo de Apoio Didático Pedagógico - Compreende um espaço

contendo acervo de materiais e equipamentos específicos ao processo de

ensino e aprendizagem, tendo a função de apoiar alunos, professores e

comunidade. Visa ainda promover curso de atualização, aperfeiçoamento ou

capacitação em serviços para professores, além de cursos específicos da área

de educação para pais e comunidade.

Núcleo de Tecnologias - Constitui-se em um conjunto de equipamentos

e materiais especializados ou adaptados, com o objetivo de promover a

independência do educando com deficiência visual, por meio do acesso e

utilização da tecnologia moderna para a produção de textos, estudos,

pesquisas e outros.

Núcleo de Convivência - Espaço interativo planejado para favorecer a

convivência, troca de experiências, pesquisa e desenvolvimento de atividades

lúdicas e culturais, integrando usuários com ou sem deficiência.

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Hoje, quase todos os Estados da Federação contam com este serviço de

apoio. Segundo depoimento de alguns professores especializados, o CAP veio

suprir, em parte, uma das necessidades básicas do aluno que é poder ter em

mãos seus livros e textos didáticos quase i mesmo tempo que os colegas de

classe.

Os CAPs devem contar com o apoio de um especialista em orientação

e mobilidade paia atuar junto aos professores e ao aluno favorecendo seu

desenvolvimento, independência pessoaL conhecimento da escola como um

todo e participação ativa em todas as atividades, com especial destaque para

as aulas de educação fisica quando, geralmente, são dispensados.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS EDUCACIONAIS

Como decorrência dos estudos e observações realizadas em torno da

educação das crianças e jovens deficientes visuais, LOWENFELD (1973)

estabeleceu didaticamente cinco princípios básicos que todo educador

consciente de suas funções deve considerar globalmente em qualquer etapa

de seu trabalho, visto se encontrarem intimamente ligados e interdependentes.

Individualização: se para a educação comum é importante a

consideração das diferenças individuais dos alunos, quanto mais em se

tratando de crianças com dificuldades visuais, pois a cegueira e os vários

graus de visão subnormal, não se constituem em condição para padronização

dos indivíduos; eles irão diferir entre si, tanto ou mais que as crianças videntes.

O grau de visão, época e condições em que surgiu a deficiência, estrutura

familiar, meio-ambiente, são aspectos que exigem um programa

individualizado que venha a atender às necessidades de cada criança, de

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acordo com suas potencialidades e ritmo de desempenho.

Concretização: o conhecimento da criança deficiente visual será obtido

através dos outros sentidos, que não a visão; para ela, realmente, perceber o

mundo à sua volta é necessário oferecer-lhe, sempre que possível, objetos

passíveis de toque e manipulação. Ela irá adquirir a noção de forma, tamanho,

peso, solidez, textura, flexibilidade, temperatura e outras características dos

objetos, principalmente através do tato. Os modelos deverão ser ampliados

quando os originais forem muito pequenos e diminuídos quando muito

grandes. Estas adaptações, no entanto, não deixam de ser uma distorção do

real e as diferenças devem ser detalhadamente explicadas à criança em suas

devidas proporções. Face às barreiras reais que o ambiente pode oferecer a

criança deficiente não está acostumada a grandes explorações do meio e dos

objetos à sua volta; ela precisa ser estimulada a comparar, detectar diferenças

para, realmente, conhecer e se inteirar do que é. Se não for dada especial

atenção à concretização, os conhecimentos formais poderão ser mal

compreendidos e deformados, levando- a à fazer conceituações errôneas, ou,

simplesmente, cair no verbalismo (descrever sem saber o que é).

Ensino Unificado: a experiência visual tende a unificar, globalizar o

conhecimento em sua totalidade. As orientações deverão ser transmitidas de

modo global, de tal forma, que permitam à criança localizar-se numa situação

real de vida, para poder ser auxiliada na aquisição de novos conhecimentos

em que não haja condições de observação em conjunto, estruturando

interiormente suas experiências num todo organizado. Para facilitar essa

globalização devem ser dadas ao educando oportunidades de observação

através de todos os sentidos remanescentes. O professor deve procurar

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descobrir todas as possibilidades auditivas, gustativas, olfativas, táteis e

cenestésicas do aluno e utilizá-las não só na exploração dos conteúdos

específicos da aprendizagem formal, como também nas atividades gerais da

vida diária e na orientação e mobilidade, sugerindo aos pais para também

fazerem o mesmo, sempre que possível.

Estímulo Adicional: a visão é um dos sentidos que mais recebe

estímulos para observação informal de situações novas e conseqüente

aprendizagem incidental. A criança cega pouco estimulada terá uma vida

relativamente restrita e, para ampliar seus horizontes, desenvolver suas

imagens mentais e orientá-las para ambientes mais amplos, é necessário

proporcionar-lhe experiências, através de estimulação adequada e sistemática,

em um nível proporcional ao seu desenvolvimento e motivação, fazendo-a

conhecer o mundo através de sua própria observação e experiência.

A orientação mental sobre ambientes mais próximos pode ser iniciada

pela exploração detalhada dos mesmos, seguida de descrição ou

representação, iniciando-se, por exemplo, pelo próprio quarto, sala, cozinha e

demais dependências; a sala de aula, banheiro, diretoria, refeitório e demais

ambientes que deve circular na escola; procurando estabelecer relações de

tamanho e distância entre os ambientes conhecidos, tanto do lar quanto da

escola, evoluindo conforme o interesse e domínio da criança. Este tipo de

atividade irá contribuir para que, futuramente, o aluno tenha os prá-requisitos

necessários para uma locomoção independente.

Auto-Atividade: toda criança precisa movimentar-se para adquirir

desenvolvimento fisico e motor harmonioso e para isto se efetivar, ela precisa

ser motivada; deve-se dirigir seus interesses no sentido de estimular o desejo

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de movimentar-se livremente. A mobilidade, a fala, o ato de preensão, de

alimentar-se, a socialização e outros aspectos poderão ser retardados se ela

não for orientada para executar tais atividades; ela só irá dominar estas

habilidades fazendo. Por outro lado, a maturação também precisa ser auxiliada

em todos os seus estágios, sendo necessário oferecer à criança oportunidades

para poder fazer sozinha atividades compatíveis com suas condições, num

ritmo crescente de interesses e complexidade.

RECURSOS INTRUCIONAIS ESPECÍFICOS

Aquele que pretende ingressar nesse campo de ensino precisará

saber que uma criança cega é um ser que se desenvolve, que constrói, que

aprende. Entretanto, ela apresenta necessidades específicas que reclamam

um atendimento especializado e basicamente dirigido a essas especialidades.

Uma criança não é mais ou menos capaz por ser cega. A cegueira não

confere a ninguém nem qualidades menores nem potencialidades

compensatórias. Seu crescimento efetivo dependerá exclusivamente das

oportunidades que lhe forem dadas, da forma pela qual a sociedade a vê, da

maneira como ela própria se aceita. É de fundamental importância que o

professor não veja nesta criança um aprendiz de segunda categoria, um

educando treinável, cujo adestramento de certas áreas promoverá um

desempenho educacional satisfatório.

Penetrando-se, mais profundamente, na teoria da construção do

conhecimento de Jean Piaget, compreende-se que só a educação

construtivista fornecerá dados concretos para que se cumpra, em essência, o

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desenvolvimento intelectual de uma criança cega. Interagindo com os objetos,

com o meio fisico e com as pessoas, essa criança terá o seu crescimento

mais facilitado e mais firme. Tomando-se as idéias construtivistas aplicadas à

educação, diríamos, num primeiro momento, ser de todo impossível

alfabetizar uma criança cega dentro de tais moldes. De maneira inversa a da

criança vidente que incorpora, assistematicamente, hábitos de escrita e de

leitura desde muito cedo, a criança cega demora muito tempo a entrar no

universo do “ler e escrever”.

O Sistema Brailie não faz parte do dia-a-dia, como um objeto

socialmente estabelecido. Somente os cegos se utilizam dele. As descobertas

das propriedades e funções da escrita tornamse impraticáveis para ela. As

crianças cegas só tomam contato com a escrita e com a leitura no período

escolar. Esse impedimento, sabe-se, pode trazer prejuízos e atrasos no

processo da alfabetização. É a hora da educação fazer-se mais forte e

cumprir com seus reais objetivos: abrindo frentes de conhecimento, suprindo

lacunas, minimizando carências. Os professores que seguem a linha

construtivista consideram até certo ponto desnecessários exercícios prévios,

que preparam o educando para ingressar no processo de alfabetização

propriamente dito. Eles não acreditam na chamada “prontidão para a

alfabetização”.

O que deve ficar claro, entretanto, é que no caso da educação de

crianças cegas esse procedimento não pode ser adotado. Como já foi

mencionado, o desenvolvimento global de uma criança cega requer técnicas

e recursos especializados. Dentro do processo educacional de crianças

cegas, é importante que sua evolução seja acompanhada de forma precisa e

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venha a propiciar realmente uma evolução, fazendo-a adquirir um grau mais

alto de eficiência. Por isso, nessa fase, dá-se grande ênfase ao

desenvolvimento de um conjunto de habilidades que são prérequisitos para a

leitura e a escrita do Sistema Braille. Capacitar uma criança não é condicioná-

la, transformando-a num ser automatizado, com respostas previsíveis e

resultados esperados. A capacitação ressaltada nasce da independência do

perfeito domínio de si mesmo. Quando se fala na importância de desenvolver

capacidades básicas, fala-se da finalidade máxima da educação especial: dar

ao indivíduo portador de qualquer deficiência as condições essenciais para

torná-lo um ser harmônico, uma pessoa plena, um homem com consciência

de si mesmo. Esses prérequisitos são trabalhados a partir das dificuldades

geradas pela própria cegueira. Assim, ao acionarem-se mecanismos capazes

de mobilizar estruturas internas, pode-se: ampliar movimentos corporais,

fortalecer músculos, refinar percepções, estimular memória e amadurecer

condutas.

Para o alfabetizador conquistar êxito em sua tarefa é fundamental que

seu trabalho se revista de inúmeros aspectos: conteúdos bem definidos,

métodos e técnicas adequados, material didático apropriado, enriquecimento

de informações reais, liberdade de criação e de expressão.

Não há uma receita pronta e infalível para educar esta ou aquela

criança, O alfabetizador tem de conhecer o educando que tem diante de si e

sobre o qual recai sua atenção pedagógica. No preparo e na coerência da

prática docente pode-se encontrar solução para grandes problemas.

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RECURSOS DIDÁTICOS NA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Talvez em nenhuma outra forma de educação os recursos didáticos

assumam tanta importância como na educação especial de pessoas

deficientes visuais, levando-se em conta que:

• um dos problemas básicos do deficiente visual, em especial o cego, é

a dificuldade de contato com o ambiente fisico;

• a carência de material adequado pode conduzir a aprendizagem da

criança deficiente visual a um mero verbalismo, desvinculado da realidade;

• a formação de conceitos depende do íntimo contato da criança com as

coisas do mundo;

• tal como a criança de visão normal, a deficiente visual necessita de

motivação para a aprendizagem;

• alguns recursos podem suprir lacunas na aquisição de informações

pela criança deficiente visual;

• o manuseio de diferentes materiais possibilita o treinamento da

percepção tátil, facilitando a discriminação de detalhes e suscitando a

realização de movimentos delicados com os dedos.

Definição

Recursos didáticos são todos os recursos fisicos, utilizados com maior

ou menor freqüência em todas as disciplinas, áreas de estudo ou atividades,

sejam quais forem as técnicas ou métodos empregados, visando auxiliar o

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educando a realizar sua aprendizagem mais eficientemente, constituindo-se

num meio para facilitar, incentivar ou possibilitar o processo ensino-

aprendizagem. De um modo genérico, os recursos didáticos podem ser

classificados como:

Naturais: elementos de existência real na natureza, como água, pedra,

animais.

Pedagógicos: quadro, flanelógrafo, cartaz, gravura, álbum seriado, slide,

maqueta.

Tecnológicos: rádio, toca-discos, gravador, televisão, vídeo cassete,

computador, ensino programado, laboratório de línguas.

Culturais: biblioteca pública, museu, exposições.

O bom aproveitamento dos recursos didáticos está condicionado aos

seguintes fatores:

capacidade do aluno;

experiência do educando;

técnicas de emprego;

oportunidade de ser apresentado;

uso limitado, para não resultar em desinteresse.

SELEÇÃO, ADAPTAÇÃO E CONFECÇÃO

Na educação especial de deficientes visuais, os recursos didáticos

podem ser obtidos por urna das três seguintes formas:

Seleção

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Dentre os recursos utilizados pelos alunos de visão normal, muitos

podem ser aproveitados para os alunos cegos tais como se apresentam. É o

caso dos sólidos geométricos, de alguns jogos e outros.

Adaptação

Há materiais que, mediante certas alterações, prestam-se para o ensino

de alunos cegos e de visão subnormal. Neste caso estão os instrumentos de

medir, como o metro, a balança, os mapas de encaixe, os jogos e outros.

Confecção

A elaboração de materiais simples, tanto quanto possível, deve ser feita

com a participação do próprio aluno. É importante ressaltar que materiais de

baixo custo ou de fácil obtenção podem ser freqüentemente empregados,

como: palitos de fósforos, contas, chapinhas, barbantes, cartolinas, botões e

outros.

COM RELAÇÃO AO USO, OS RECURSOS DEVEM SER:

Fartos - para atender a vários alunos simultaneamente;

Variados - para despertar sempre o interesse da criança, possibilitando

diversidade de experiências;

Significativos - para atender aspectos da percepção tátil (significativo

para o tato) e/ou da percepção visual, no caso de alunos de visão subnormal.

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MATERIAIS BÁSICOS

Para alcançar desempenho eficiente, o aluno deficiente visual,

especialmente o aluno cego, precisa dominar alguns materiais básicos,

indispensáveis no processo ensino-aprendizagem. Entre esses materiais,

destacam-se: reglete e punção, sorobã, textos transcritos em Braille e

gravador cassete.

Na medida do possível, o educando deverá usar máquina de datilografia

Braille, cujo rendimento, em termos de rapidez, pode mesmo ultrapassar o da

escrita cursiva dos videntes.

A máquina de datilografia comum pode ser utilizada pelo aluno

deficiente visual, a partir da quarta série, na apresentação de pequenos

trabalhos escolares. Constitui-se num valioso recurso de comunicação nas

fases posteriores da aprendizagem e tem inúmeras aplicações na vida prática

e no desempenho de muitas profissões.

Para alunos de visão subnormal, na maioria dos casos, os recursos

didáticos mais usados sao: cadernos com margens e linhas fortemente

marcadas e espaçadas; lápis com grafite de tonalidade forte; caneta hidrocor

preta; impressões ampliadas; materiais com cores fortes contrastantes.

CRITÉRIOS

O professor deverá levar em conta alguns critérios para alcançar a

eficiência na seleção, adaptação ou elaboração, tanto para crianças cegas

como para as crianças de visão subnormal. Tamanho: os materiais devem ser

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confeccionados ou selecionados em tamanho adequado às condições dos

alunos. Materiais excessivamente pequenos não ressaltam detalhes de suas

partes componentes ou perdem-se com facilidade, O exagero no tamanho

pode prejudicar a apreensão da totalidade (visão global).

Significação Tátil: o material precisa possuir um relevo perceptível e, tanto

quanto possível, constituir-se de diferentes texturas para melhor destacar as

partes componentes. Contrastes do tipo: liso/áspero, fino/espesso, permitem

distinções adequadas.

Aceitação: o material não deve provocar rejeição ao manuseio, fato que

ocorre com os que ferem ou irritam a pele, provocando reações de

desagrado.

Estimulação Visual: o material deve ter cores fortes e contrastantes para

melhor estimular a visão funcional do aluno deficiente visual.

Fidelidade: o material deve ter sua representação tão exata quanto

possível do modelo original. Facilidade de Manuseio: os materiais devem ser

simples e de manuseio fácil, proporcionando ao aluno uma prática utilização.

Resistência: os recursos didáticos devem ser confeccionados com

materiais que não se estraguem com facilidade, considerando o freqüente

manuseio pelos alunos.

Segurança: os materiais não devem oferecer perigo para os educandos.

MODELOS

A dificuldade de contato com o ambiente, por parte da criança deficiente

visual, impõe a utilização freqüente de modelos com os quais podem ser

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razoavelmente superados problemas de: tamanho dos objetos originais,

distância em que se encontram e impossibilidade de contato.

A melhor maneira de se dar ao aluno deficiente visual a noção do que

seja uma montanha, por exemplo, é mostrar-lhe um modelo deste acidente

geográfico. Ainda que se considere a possibilidade de a criança subir a

elevação, terá ela apenas a idéia do caminho percorrido.

Os modelos devem ser criteriosamente escolhidos e, sempre que

possível, sua apresentação ao aluno ser acompanhada de explicações

verbais objetivas. Objetos muito pequenos podem ser ampliados, para que se

tomem perceptíveis detalhes importantes. Objetos situados a grandes

distâncias, inacessíveis portanto, precisam ser apresentados sob forma de

modelos. O formato de uma nuvem, a forma do sol, da lua, só podem ser

apreendidos pelos alunos através de modelos miniaturizados.

MAPAS

Os mapas políticos, hidrográficos e outros, podem ser representados em

relevo ou, no caso do primeiro, por justaposição das partes (encaixe). Mapas

em relevo podem ser confeccionados com linha, barbante, cola, cartolina e

outros materiais de diferentes texturas. A riqueza de detalhes num mapa

pode dificultar a percepção de detalhes significativos.

LIVRO DIDÁTICO

O emprego de desenhos, gráficos, cores nos livros modernos vem

dificultando de forma crescente sua transcrição para o Sistema Brailie. Este

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fato impõe a adoção de uma das seguintes soluções:adaptação do livro para

transcrição em Brailie; elaboração de livros especiais para cegos.

A primeira solução pode acarretar perda de fidelidade quanto ao

original, daí a necessidade de tais adaptações serem feitas por pessoa

realmente especializada na educação de deficientes visuais. A segunda,

embora atenda às peculiaridades do aluno cego, é onerosa e lenta na

elaboração, decorrendo, assim, dificuldades em sua aplicação quando

inexistirem recursos materiais indispensáveis.

LIVRO FALADO

É o livro gravado em fitas cassete. De ampla utilização no Brasil,

constitui eficiente recurso como livro didático no segundo grau e no ensino

superior. A utilização do livro falado, no primeiro grau, deve limitar-se tanto

quanto possível, à literatura ou aos didáticos de leitura complementar.

AVANÇOS TECNOLÕGICOS

O grande avanço tecnológico verificado nos últimos anos vem

proporcionando, também à educação especial, recursos valiosos para o

processo ensino-aprendizagem, inclusive com a utilização de equipamentos

de informática. Entre esses recursos podem ser destacados os sistemas de

leitura ampliada.

Circuito Fechado de Televisão (CCTV) - Apresenta-se monocromático

ou colorido, podendo ampliar até 60 vezes o tamanho de um caractere e

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funciona como periférico acoplado a um microcomputador.

Programas (Sofiwares) - Providos de recursos para ampliação de caracteres,

permitindo sua leitura em monitores, bem como sua impressão.

THERMOFORM

Duplicador de materiais, empregando calor e vácuo, para produzir

relevo em película de PVC.

BRAILLE FALADO

Minicomputador, pesando 450 g e dispondo de 7 teclas através das

quais o aparelho pode ser operado, para edição de textos a serem impressos

no sistema comum ou em Braille. O Braille Falado, conectado a um

microcomputador, pode ser utilizado como sintetizador de voz, transferir ou

receber arquivos. Funciona ainda como agenda eletrônica, calculadora

científica e cronômetro.

MICROCOMPUTADOR

Equipamento que amplia recursos na área da educação especial, na

vida prática e em atividades profissionais dos deficientes da visão. Os

computadores existentes no mercaik, providos de programas específicos e de

diferentes periféricos, podem ser operados normalmente pelas pessoas

cegas.Entre os periféricos, podem ser destacados:

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Sintetizadores de Voz - Conectados a um computador, permitem a

leitura de informações exibidas em um monitor. Dentre as diferentes

modalidades produzidas em outros países, inclusive com voz sintetizada na

língua portuguesa, destaca-se o DOSVOX, desenvolvido pelo Núcleo de

Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Terminal Braille (Display Braille) - Representa, em uma ou duas linhas,

caracteres Braifle correspondentes às informações exibidas em um monitor.

Os caracteres Braille são produzidos por pinos que se movimentam

verticalmente em celas, dispostas numa placa, geralmente metálica.

Impressora Braille - Existem hoje, no mercado mundial, diferentes tipos

de impressoras Braifie, seja para uso individual (pequeno porte) ou para

produção em larga escala (médio e grande porte). As velocidades de

produção são muito variadas. Essas impressoras, geralmente, podem

imprimir Braille interpontado ou não em 6 ou 8 pontos, bem como produzir

desenhos. Algumas impressoras Brailie podem utilizar folha solta, mas a

maioria funciona com formulário contínuo.

Scanner de Mesa - A transferência de textos impressos para

microcomputadores (via scanner) vem alcançando ampla utilização entre

estudantes e profissionais deficientes da visão. O texto digitalizado pode ser

lido através de um sintetizador de voz de um terminal Braille, impresso em

Braille ou no sistema comum ampliado. O scanner pode ser operado com

facilidade por um deficiente visual.

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SISTEMA OPERACIONAL DOS VOX

O Núcleo de Computação Eletrônica da UFRJ (NCE) vem se dedicando

à implementação de um sistema destinado a atender aos deficientes visuais

que desejem utilizar computadores paza desempenharem diferentes tarefas.

Neste sentido, foram desenvolvidas as seguintes ferramentas

computacionais:

sintetizador de voz portátil que possibilita a produção de fala, ainda que

o computador não possua placa de som;

sistema operacional complementar ao DOS, destinado a produzir saída

sonora com fala em lingua portuguesa;

editor de textos;

caderno de telefones, agenda de compromissos, calculadora, relógio,

jogos etc.;

utilitários para acesso à INTERNET, para preenchimento de cheques e

outros.

O Sistema DOS VOX alcançou ampla aceitação em todo o Brasil,

registrando-se várias centenas de usuários, muitos deles, estudantes de

diferentes níveis de escolaridade.

O SISTEMA BRAILLE NO BRASIL

O Sistema Braille, utilizado universalmente na leitura e na escrita por

pessoas cegas, foi inventado na França por Louis Brailie, um jovem cego,

reconhecendo-se o ano de 1825 como o marco dessa importante conquista

para a educação e a integração dos deficientes visuais na sociedade.

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Antes desse histórico invento, registram-se inúmeras tentativas em diferentes

países, no sentido de se encontrarem meios que proporcionassem às

pessoas cegas condições de ler e escrever. Dentre essas tentativas, destaca-

se o processo de representação dos caracteres comuns com linhas em alto

relevo, adaptado pelo francês Valentin Hauy, fundador da primeira escola

para cegos no mundo, em 1784, na cidade de Paris, denominada Instituto

Real dos Jovens Cegos. Foi nesta escola, onde os estudantes cegos tinham

acesso apenas à leitura, através do processo de Valentin Hauy, que estudou

Louis Brailie. Até então, não havia recurso que permitisse à pessoa cega

comunicar-se pela escrita individual.

Louis Braille, ainda jovem estudante, tomou conhecimento de uma

invenção denominada sonografia ou código militar, desenvolvida por Charles

Barbier, oficial do exército francês. O invento tinha como objetivo possibilitar a

comunicação noturna entre oficiais nas campanhas de guerra. Baseava-se

em doze sinais, compreendendo linhas e pontos salientes, representando

sílabas na língua francesa. O invento de Barbier não logrou êxito no que se

propunha, inicialmente. O bem intencionado oficial levou seu invento para ser

experimentado entre as pessoas cegas do Instituto Real dos Jovens Cegos.

A significação tátil dos pontos em relevo do invento de Barbier foi à base

para a criação do Sistema Braille, aplicável tanto na leitura como na escrita

por pessoas cegas e cuja estrutura diverge fundamentalmente do processo

que inspirou seu inventor. O Sistema Braille, utilizando seis pontos em relevo,

dispostos em duas colunas, possibilita a formação de 63 símbolos diferentes

que são empregados em textos literários nos diversos idiomas, como também

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nas simbologias matemática e científica, em geral, na música e,

recentemente, na Informática.

A partir da invenção do Sistema Braille, em 1825, seu autor desenvolveu

estudos que resultaram, em 1837, na proposta que definiu a estrutura básica

do sistema, ainda hoje utilizada mundialmente. Comprovadamente, o Sistema

Braille teve plena aceitação por parte das pessoas cegas, tendo-se

registrado, no entanto, algumas tentativas para a adoção de outras formas de

leitura e escrita e, ainda outras, sem resultado prático, para aperfeiçoamento

da invenção de Louis Brailie.

Apesar de algumas resistências mais ou menos prolongadas em oulros

países da Eumpa e nos Estados Unidos, o Sistema Brailie, por sua eficiência

e vasta aplicabilidade, se inipós definitivamente como o melhor meio de

leitura e de escrita para as pessoas cegas.

Em 1878, um congresso internacional realizado em Paris, com a

participação de onze países europeus e dos Estados Unidos, estabeleceu

que o Sistema Braille deveria ser adotado de forma padronizada, para uso na

literatura, exatamente de acordo com a proposta de estrutura do sistema,

apresentada por Louis Braille em 1837, já referida anteriormente.

Os simbolos fundamentais do Braille utilizados para as notações

musicais foram, também. apresentados pelo próprio Louis Brailie na versão

final dos estudos constantes da proposta de estrutura do Sistema concluída

em 1837.

Hoje, a musicografia braille, já é adotada uniformemente por todos os

países. Para tanto, contribuíram, principalmente, os congressos realizados

em Colônia (Alemanha), 1888, em Paris (França), 1929 e, finalmente, num

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congresso realizado em Nova Torque, 1954, onde foram adaptados símbolos,

de acordo com novas exigências da musicografia.

A aplicação do Sistema Braille à Matemática foi também proposta por

seu inventor na versão do Sistema editada em 1837. Nesta, foram

apresentados os símbolos fundamentais para os algarismos, bem como as

convenções para a Aritmética e para a Geometria.

Esta simbologia fundamental, entretanto, nem sempre foi adotada nos

países que vieram a utilizar o Sistema Brailie, verificando-se, posteriormente,

diferenças regionais e locais mais ou menos acentuadas, chegando a

prevalecer, como hoje, diversos códigos para a Matemática e as ciências em

todo o mundo.

Com o propósito de unificar a simbologia brailie para a Matemática e as

ciências, realizou-se na cidade de Viena, em 1929, um congresso, reunindo

países da Europa e os Estados Unidos. Apesar desse esforço, a falta de

acordo fez com que continuassem a prevalecer as divergências, que se

acentuaram, face à necessidade de adoção de novos símbolos, determinada

pela evolução técnica e científica do século XX.

O Conselho Mundial para o Bem-Estar dos Cegos, criado em 1952, hoje

União Mundial dos Cegos, com apoio da UNESCO, passou a se preocupar,

através de seus especialistas, com o problema da unificação da simbologia

matemática e científica, a nível mundial.

Com esse propósito, a Organização Nacional de Cegos da Espanha

(ONCE), em princípios da década de 1970, desenvolveu estudos, através da

análise e comparação de diferentes códigos em uso no mundo, para,

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finalmente, propor um código unificado a que denominou “Notacion

Universal”.

A Conferência Ibero-Americana para a Unificação do Sistema Brailie,

realizada em Buenos Aires, 1973, foi uma tentativa de se estabelecer um

código imnico para países de língua castelhana e portuguesa. Na

oportunidade, foram apresentados três trabalhos, elaborados pela Espanha,

Argentina e Brasil. A acentuada divergência entre os códigos inviabilizou um

desejável acordo.

O Conselho Mundial para o Bem-Estar dos Cegos, reunido por seu

Comitê-Executivo na cidade de Riyadh, Arábia-Saudita (1977), criou o

Subcomitê de Matemáticas e Ciências, integrado por representantes da

Espanha, Estados Unidos, União Soviética, Alemanha Ocidental e Inglaterra,

com a finalidade principal de promover, em diferentes países, estudos e

experiências de âmbito nacional e regional, visando a unificação dos diversos

códigos em uso.

A nível de países de língua castelhana, finalmente, foi possível um

acordo para a unificação da simbologia matemática, celebrado em 1987 na

cidade de Montevidéu, durante uma reunião de representantes de imprensas

brailie dos países que falam o referido idioma. A esta reunião compareceram

representantes brasileiros, como observadores.

A nível mundial, o esforço para a unificação dos códigos matemáticos e

científicos ainda não alcançou o êxito desejado.

Especialistas no Sistema Brailie do Brasil, especialmente ligados ao

Instituto Benjamin Constant e à, hoje, Fundação Dorina Nowill para Cegos, a

partir da década de 70, passaram a se preocupar com as vantagens que

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adviriam da unificação dos códigos de Matemática e das ciências, uma vez

que a tabela Taylor, adotada no Brasil desde a década de 40, já não vinha

atendendo satisfatoriamente à transcrição em Brailie, sobretudo, após a

introdução dos simbolos da Matemática Moderna, revelando-se esta tabela,

insuficiente para as representações matemáticas e científicas em nível

superior.

Deste modo, o Brasil participou inicialmente dos estudos desenvolvidos

pelo Comitê de especialistas da ONCE e, posteriormente, acompanhou os

estudos desenvolvidos pelo Comitê da ONCE, deles resultando o Código de

Matemática Unificado.

Em 1991 foi criada a Comissão para Estudo e Atualização do Sistema

Brailie em uso no Brasil, com a participação de especialistas representantes

do Instituto Benjamin Constant, da Fundação Dorina Nowill para Cegos, do

Conselho Brasileiro para o Bem-Estar dos Cegos, da Associação Brasileira

de Educadores de Deficientes Visuais e da Federação Brasileira de

Entidades de Cegos, com o apoio da União Brasileira de Cegos e o patrocínio

do Fundo de Cooperação Econômica para Iberoamérica - ONCE-ULAC. Os

estudos desta comissão foram concluídos em 18 de maio de 1994, constando

das principais resoluções a de se adotar no Brasil o Código Matemático

Unificado para a Língua Castelhana, com as necessárias adaptações à

realidade brasileira.

Por orientação da União Brasileira de Cegos, especialistas da Comissão

na área da Matemática vêm realizando estudos para o estabelecimento de

estratégias, visando a implantação,em todo o território brasileiro, da nova

simbologia matemática unificada.

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Capítulo II

A aprendizagem

O UNIVERSO DA CRIANÇA - O PROCESSO DE

DESENVOLVIMENTO E A CEGUEIRA

Os processos de desenvolvimento da criança cega são semelhantes

aos da criança vidente. Porém, os profissionais que atuam na área da

cegueira podem encontrar algumas dificuldades para proporcionar

experiências compensatórias à perda da visão.

Um dado importante no trabalho com as crianças cegas é que muitas

das habilidades aprendidas, naturalmente pelas videntes, precisam ser

deliberadamente ensinadas para as crianças com cegueira. Os pais dessas

crianças devem ser devidamente orientados para que possam servir de

mediadores na aquisição de algumas habilidades básicas de seus filhos

durante a fase pré- escolar.

O processo de crescimento e desenvolvimento da criança cega é

semelhante ao das videntes em virtude do crescimento ser seqüencial, com

as mesmas etapas. É diferente porque cada criança se desenvolve de acordo

com seu ritmo, potencialidades, acrescentando ai a limitação visual. Apesar

disso as semelhanças entre todas as crianças são maiores do que as

diferenças.

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Pela visão a criança estabelece suas primeiras relações com o meio, e

percebe a forma, tamanho, distância, posição e localização de objetos.

A visão, chamada também de sentido da distância, é a única percepção

capaz de propiciar contato com o ambiente de forma global.

Consequentemente, a criança cega precisa ser ajudada em seu contato e

interação com o mundo.

A criança cega se relaciona com o ambiente por outros canais

sensoriais, tendo un imagem diferente das pessoas videntes ou daquelas que

perderam a visão após a formação de conceitos visuais.

O controle fisico da criança começa com a sustentação da cabeça e,

depois, de todo o corpo que lhe facilita rolar para os lados. Pela primeira vez,

consegue se mover independentemente. O rolar precede o engatinhar.

Quando os bebês começam a sentar-se, adquiriram força para equilibrar o

corpo e, pela primeira vez, estar com as mãos livres para explorar o mundo

em posição ereta.

O engatinhar exige planejamento do movimento e coordenação de

braços e pernas. Ao se movimentar, o universo das crianças se amplia

rapidamente. Elas aprendem a se adaptar através de experiências.

Quando o bebê começa a engatinhar, decide para onde ir e mantém o

destino em mente enquanto tenta alcançá-lo. O bebê circula pela casa

adquirindo habilidade de controlar o ambiente, não desperdiçando nenhuma

oportunidade de exploração. Engatinhar marca um tipo diferente de

conhecimento do mundo, pois introduzido em um ambiente novo, logo

começa a investigá-lo. Ele mapeia a sala onde está, aventurando-se a ir até

os cantos mais distantes. Usando uma pessoa (geralmente a mãe) como

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ponto de referência, o bebê estuda a posição de objetos, de outras pessoas,

muda de direção e reposiciona os objetos vistos. O bebê aprende a

reconhecer o seu lugar no mundo, juntando seus mapas fragmentados.

A criança tem dificuldade para estabelecer a noção de distância entre si

e o objeto, o que somente se desenvolve com o engatinhar.

O andar representa uma evolução como meio de locomoção. Apesar

das quedas, ficar em pé ajuda a explorar melhor o mundo, pois amplia o

campo visual. Andar apoiando-se em móveis ajuda a exercitar o equilíbrio. O

encorajamento dos pais a auxilia trocar os passos incertos por um andar

autônomo.

O bebê necessita de tempo para obter um andar mais competente e

maduro. A falta de arco nos pés e o seu andar de pato são obstáculos para

um andar eficiente, o senso de equilíbrio deve ser aperfeiçoado para

enfrentar subidas e descidas. Aproximadamente aos sete meses, após os

primeiros passos, ele deve ter boas habilidades de andar. O calcanhar toca o

chão antes do resto dos pés. As articulações se movem com mais

flexibilidade, os arcos dos pés já se desenvolveram e os pés começam a se

“fechar”, aproximando-se paralelamente um do outro. Os passos tomam-se

mais longos e tem início o balanceamento dos braços.

Aos dois anos de idade a criança pode correr, dar passos para o lado,

parar e mudar de direção. O andar amadurece e, embora caminhe com

facilidade, existe ainda desafios como descer uma escada. A criança já

apresenta todas as habilidades para andar e o refinamento acontecerá

aproximadamente até os sete anos.

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A CRIANÇA PORTADORA DE CEGUEIRA CONGÊNITA OU

ADQUIRIDA

Durante os primeiros três meses, o desenvolvimento do bebê cego é

muito semelhante ao de um vidente; exercita os reflexos, de forma

automática constrói seus primeiros hábitos ou esquemas de ação do corpo,

exceto os relativos à visão. Lentamente aperfeiçoa os esquemas de segurar,

coordenar, sucção, apreensão e de sorrir (FRAIBERG, 1978).

A partir dessa idade poderão ocorrer importantes diferenças no

desenvolvimento entre as crianças portadoras de cegueira e as videntes.

Com 16 semanas aproximadamente, a criança “normal” segue com os

olhos um objeto em movimento. A coordenação viso-manual tem início nas

primeiras experiências olho-mão. A criança cega, se não estimulada, poderá

tomar-se limitada para a seqüência natural de seu desenvolvimento.

Aproximadamente, no quinto mês, as crianças videntes já seguraram

objetos sob o controle visual, realizando constante exploração das

características e lugar que ocupam no espaço. As crianças cegas somente

terão consciência da existência dos objetos (quando fora de suas mãos), se

estes emitirem algum som e tiverem algum significado para elas. Os objetos,

em sua maioria, são silenciosos e só têm significado para elas, se já foram

trazidos ao seu alcance e por elas manuseados.

A capacidade visual estando ausente pode acarretar a inexistência de

exercícios funcionais com a cabeça e com o corpo, funções essenciais para

reação e integração do sistema vestibular, responsável pelo equilíbrio,

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movimentos harmoniosos e posturas adequadas, que são habilidades

essenciais para um bom desempenho na O&M.

O desenvolvimento perceptivo depende da qualidade de experiências

sensório-motoras vividas, da elaboração e organização construída pela

criança.

A ausência da visão pode levar à fraca atividade motora, proprioceptiva

e vestibular, que provavelmente trará rupturas nas experiências sensório-

motoras integradas. Quando as atividades motoras não são estimuladas por

experiências “compensatórias”, durante os primeiros anos de vida, poderão

trazer prejuízos à organização e planejamento do ato motor e vivência do

corpo no espaço, responsáveis pelo desenvolvimento do mecanismo de

adaptação e de organização “interna” da pessoa.

A reação ao estímulo auditivo não é automática, é mais lenta e depende

da distância, da intensidade, do tempo de permanência, da posição no

espaço e principalmente de seu significado para a criança.

No bebê cego, o comportamento normal de agarrar um objeto

dificilmente aparece antes dos oito meses, quando começa a procurar objetos

que antes teve nas mãos. Geralmente, a partir dos 12 meses, começa a

procurar objetos que ainda não manipulou; guiado pelo som que emitem.

Quanto ao sentar-se, engatinhar e andar, o bebê cego poderá ter um

atraso, se não houver mediação permanente de pessoas ligadas a ele, num

trabalho sistemático. Passa do sentar-se para o andar, e começa a andar

geralmente após os 19 meses.

O andar imaturo da criança cega muitas vezes permanece até a idade

adulta, dificultando sua mobilidade.

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A partir dos dois anos de idade, a criança cega começa a fazer

representação das coisas, embora o desenvolvimento do pensamento

representativo seja adquirido na adolescência.

A responsabilidade da educação da criança deficiente visual deve

iniciar-se desde o nascimento para que possam se estabelecer as bases do

seu desenvolvimento e atingir a maturidade necessária para uma boa

interação sócio-afetiva no seu meio. Cabe, ainda, aos especialistas da

Educação Especial, assumirem seu papel enquanto responsáveis pela

orientação e estimulação durante o desenvolvimento da criança procurando

evitar, prevenir e minimizar, na medida do possível, as defasagens que

poderão ocorrer tanto no desenvolvimento, quanto na aprendizagem, caso

não forem devidamente cuidados na idade pré-escolar.

É PRECISO REFLETIR: O QUE É ALFABETIZAR?

Por que essa etapa, dentro do processo educacional, extemaliza as

mais profundas preocupações de educadores, psicólogos, cientistas sociais?

Como envolver crianças, jovens e adultos nessa conquista? Tais perguntas

poderiam juntar-se a outras mais, que no entanto,

convergiriam para um único ponto: o indivíduo. Fala-se de cidadania, justiça

social, de liberdade e de democracia. Tnscrevem-se nestas palavras

conceitos concretos, ainda que complexos, que deverão ser os pilares onde a

educação, em todos os níveis, necessita apoiar-se. Faz-se necessário

estudar a problemática da alfabetização sob a inspiração dessas quatro

vertentes. De forma contrária, a tarefa esvazia-se de conteúdos significativos,

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forja discussões inócuas, incrementa idéias distorcidas, gera uma visão

superficial de assuntos tão relevantes. A alfabetização passa pelo

aprofundamento de vários fatores que inserem o homem no “mundo das

letras”.

O alfabetizado não é só aquele que reconhece sinais gráficos, aprende

fonemas, mecaniza procedimentos de leitura e de escrita, e os

alfabetizadores necessitam preparar-se e estar atentos à responsabilidade

que lhes cabe. Alfabetizar é rasgar horizontes, abrir atalhos, apontar saídas,

descobrir soluções, criar situações concretas e propor desafios. É fazer o

educando trilhar o caminho do conhecimento formal, e levá-lo a apreender “o

saber consciente”. Não se trata de uma mera linguagem metafórica, em cujo

ceme repousam comparações de efeito literário: essas palavras guardam a

justeza do exercício de uma verdade irrefutável. O vislumbre de novas

possibilidades provém da consciência; é essa consciência que deveria

perpassar todas as coisas, que precisaria estar viva e clara na proposta de

trabalho do professor alfabetizador. O fracasso escolar levanta

questionamentos importantes e, então, aparecem inúmeros fatores que

procuram explicar tal fato. A abordagem desse problema é larga e pede

diferentes instrumentos de interpretação. Dessa forma, a falência da

educação revela-se em muitas frentes. O despreparo dos professores, a

repetência e a evasão escolar apontam para uma realidade insustentável:

desqualifica-se o ensino e amesquinha-se o homem. É preciso ver o processo

educacional como resultante da conjugação de ações recíprocas. Assim, o

educando deixará de ser o dono das culpas absolutas, e o aprendiz um

incapaz, detentor de todas as deficiências. É hora de investir num novo rumo,

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numa outra postura ante a educação. O período da alfabetização é

responsável pelo insucesso de educandos e educadores. Essa barreira existe

e tem de ser transposta.

O estudo de uma nova conduta filosófica, de uma nova diretriz

educacional nesse campo, poderá servir de suporte para a implantação de

uma outra linha pedagógica que favoreça o alfabetizando, fazendo-o sujeito e

não objeto de sua aprendizagem, de forma a integrar-se em sua comunidade

cultural, descobrindo o mundo que o cerca, decodificando os muitos

contextos existentes, enfim, tomando-se um ser possuidor de senso crítico. É

necessário promover o debate e acionar os mecanismos mobilizadores de

uma ação participativa, criando instrumentos e fomentando recursos que

ergam uma escola capaz de trabalhar o educando como um todo,

pesquisando suas potencialidades e respeitando suas diferenças. A

educação especial não pode afastar-se dessa nova visão, visto que as

pessoas deficientes visuais precisam compartilhar, como quaisquer outras, da

construção do seu saber. Para tanto, devem ser criados ambientes

educacionais ricos de estímulos e experiências, onde se promovam situações

renovadas de aprendizagem. Constantes mudanças devem ser provocadas,

propiciando atitudes criativas, estimulando atividades que favoreçam o

desenvolvimento global de educandos cegos. A educação deve estribar-se no

mais sério propósito existente: a ascensão do ser humano.

Compreendendo este propósito, o educador atenderá o seu papel e

buscará exercê-lo com competência e visão crítica. A ação educativa impõe

constantes transformações e procura novas tentativas. Através dos tempos,

desde épocas mais remotas, o homem luta para aprender. Aprender no

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sentido mais amplo da palavra, o que passa pelo instinto de preservação (a

sobrevivência), e alcança seu ápice no refinamento mais elevado do espírito.

Quando se fala em educação especial pensa-se logo em alunos especiais. Corno se poderia entender o vocábulo “especiais”? Pessoas dflceis? Crianças problemáticas? Aprendizagem diferente?

ONDE TUDO COMEÇOU: O Instituto BENJAMIN CONSTANT

Em 1844, um menino chamado José Alvares de Azevedo, de 10 anos,

cego, foi estudar em Paris no Instituto dos Meninos Cegos de Paris, a

primeira escola para cegos no mundo, fundada em 1784. Já em 1850,

Álvares de Azevedo retorna ao Brasil cheio de ideais e com uma sólida

bagagem cultural e entende que o Brasil (século XIX — onde a população

não tinha direito a educação), precisava de uma escola nos moldes da escola

de Paris.

Após ter dado aulas particulares aos nobres e com sua grande

influência,, Álvares de Azevedo consegue então, em 17 de setembro de

1854, se fez inaugurar formalmente o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, já

que havia morrido seis meses antes.

Inicialmente com 11 alunos, sendo 9 meninos e 2 meninas (esta, uma

outra grande vitória). O Instituto Benjamin Constant foi criado pelo Imperador

D.Pedro II através do Decreto Imperial 11.0 1.428, de 12 de setembro de

1854, tendo sido inaugurado, solenemente, no dia 17 de setembro do mesmo

ano, na presença do Imperador, da Imperatriz e de todo o Ministério, com o

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nome de Imperial Instituto dos Meninos Cegos. Este foi o primeiro passo

concreto no Brasil para garantir ao cego o direito à cidadania.

Estruturando-se de acordo com os objetivos a alcançar, o Imperial

Instituto dos Meninos Cegos foi pouco-a-pouco derrubando preconceitos e fez

ver que a educação das pessoas cegas não era utopia, bem como a

profissionalização.

Benjamin Constant Botelho de Magalhães, grande articulador da

República, professor de matemática do colégio militar, chega ao Imperial

Instituto como professor de matemática em 1861 exercendo este cargo até

1869. Só então, com a morte do segundo diretor, ele assume o cargo e

consolida este caminho de grandes conquistas. Com o aumento da demanda

foi idealizado e construído o prédio atual, que passou a ser utilizado a partir

de 1890, após a 1a etapa da construção. Em 1891, o instituto recebeu o

nome que tem hoje: Instituto Benjamin Constant (IBC), em homenagem ao

seu terceiro diretor.

Fechado em 1937 para a conclusão da 2 e última etapa do prédio, o IBC

reabriu em 1944. Em setembro de 1945 criou seu curso ginasial, que veio a

ser equiparado ao do Colégio Pedro II em junho de 1946. Foi proporcionado,

assim, o ingresso nas escolas secundárias e nas universidades.

Atualmente, o Instituto Benjamin Constant vê seus objetivos

redirecionados e redimensionados. É um Centro de Referência, a nível

nacional, para questões da deficiência visual. Possui uma escola, capacita

profissionais da área da deficiência visual, assessora escolas e instituições,

realiza consultas oftamológicas à população, reabilita, produz material

especializado, impressos em Braille e publicações científicas.

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Toda a história centenária do IBC foi publicada no primeiro exemplar da

Revista Benjamin Constant, em um texto que apresenta os seguintes tópicos

históricos: antecedentes, fundação, primeiros diretores, nomes do instituto,

imprensa Braille e o instituto no século XX.

O QUE É O INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT HOJE?

Uma instituição multifacetada, não sendo apenas uma escola, mas

também:

Departamento técnico especializado com impressa Braille de produção

interna e externa;

Divisão de produção, criação e distribuição dos livros didáticos;

• Centro de capacitação profissional (capacitando profissionais de todo

Brasil);

• Departamento médico e de Reabilitação;

• Serviços hospitalares e ambulatoriais (atende cerca de 23 mil pessoas

por ano);

• Possui três bibliotecas (com 600 visitas por mês);

• Laboratório de baixa visão.

• O Instituto Benjamin Constant hoje, sob a direção de Erica Deslandes

e Maria da Gloria de Souza Almeida, atende a 273 alunos desde a

estimulação precoce ao 9° do Ensino Fundamental e 370 (última contagem

feita em março) de reabilitados.

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A INCLUSÃO PARA O INSTITUTO BENJAMIN CONSTANT

Desde 1947, já se preocupava com a inclusão, por este motivo, o

Instituto juntamente com o INEP realizou o 10 curso de capacitação para

especializar educadores. Considera a inclusão, marcada por dois grandes

movimentos:

• Década de 50—60 A Normalização

• Década de 60 — 70 A Integração

Em 1944, com a reunião de 92 países assinando um tratado

denominado Declaração de Salamanca, que garante uma Escola para todos,

com o pressuposto que a escola e a sociedade já estão prontos para

INCLUIR.

Ressalta que alguns teóricos abominam as escolas especiais e

garantem que ainda se faz muito importante se discutir a inclusão. Pois incluir

não é significa apenas de matricular.

“... Vamos prestar atenção para não excluir dentro da inclusão... “.

(ALMEIDA, Maria da Glória de Souza).

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Capitulo III

A Família

A IMPORTÂNCIA DO PAPEL DA FAMÍLIA

As pessoas com deficiência têm dificuldades para realizar as atividades

que as pessoas comuns realizam normalmente. Essas dificuldades podem

ser reproduzidas se elas tiverem a ajuda da família, dos amigos e da

comunidade.

Talvez você nunca tenha pensado nisso, mas é responsabilidade dos

parentes e da sociedade proporcionar uma melhor qualidade de vida aos

deficientes, ajudando-os a ser o mais independente possível.

Todos devem saber que auxiliar o paciente não é fazer as coisas por ele, mas

estimulá-lo a fazê-las.

Uma pessoa com deficiência deve participar das decisões como

membro da família e da comunidade em igualdade com as outras pessoas

que não são deficientes.

Para que a pessoa seja participante, os outros membros da família e da

sociedade devem respeitá-la como uma pessoa diferente. Sua deficiência

não deve ser um fator para que ela seja super protegida nem inferiorizada.

Claro que nem todas as pessoas deficientes podem tornar-se totalmente

independentes. Nesse caso, os parentes e a comunidade devem oferecer-

lhes meios que facilitem o cumprimento das suas tarefas.

Infelizmente, em algumas famílias e comunidades as pessoas

portadoras de deficiências são rejeitadas por diversos motivos, O fato de

parecerem diferentes e não se saber muito sobre elas pode criar certo temor

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nas pessoas. Um maior esclarecimento sobre a deficiência ajuda muito para

que elas se sintam aceitas, sem receio, como pessoas capazes de contribuir

com a sua coletividade.

AS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA E A FAMÍLIA: O QUE

ELAS QUEREM

• Tirar todas as dúvidas com os profissionais que tratam do paciente

sobre: o seu diagnóstico, possíveis complicações, possibilidade de melhoria,

de movimentação, de autocuidado e cuidados domiciliares.

• Solicitar a esses profissionais que esclareçam ao paciente o seu

problema e suas limitações. É importante que, em seguida, essas

informações sejam passadas aos demais membros da família junto com

orientações sobre realização de atividades, afazeres domésticos, passeios,

transporte, posicionamento, alimentação, hábitos de higiene etc.

• Respeitar a autodeterminação e o poder de decisão do paciente,

consultando-o sempre sobre todas as situações que digam respeito a ele,

sempre que suas faculdades mentais estiverem preservadas.

• Consultar o paciente sobre a sua vontade de conviver social-mente e

de receber visitas.

• Estimular ao máximo a pessoa portadora de deficiência para que

retome seus papéis familiares (chefe, pai, marido), lembrando que a

deficiência motora não é u fator de impedimento.

• Solicitar sua participação em todas as circunstâncias familiares que

envolvam decisões do grupo e comemorações.

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O QUE DIFICULTA A CONVIVÊNCIA

• Ausência de informações acerca da deficiência;

• Ausência de programas de reabilitação que promovam independência;

• Falta de estímulo para participação social;

• Ausência de diálogo com a pessoa sobre suas necessidades e

limitações.

O QUE TODOS DEVEM FAZER

• Informar a pessoa sobre as organizações voluntárias que existem na

comunidade (escotismo, clubes, diversos recursos, instituições prestadoras

de serviços), procurando saber se ela gostaria de participar como membro.

• Possibilitar a participação da pessoa nas atividades sociais e

comunitárias de sua preferência (reuniões, festivais, atividades culturais e

religiosas, etc.).

• Sensibilizar lideranças, chefes de organizações voluntárias, e

autoridades locais para que elas se interessem pelo problema da deficiência,

formando assim grupos ou conselhos locais.

Estes grupos devem ter a responsabilidade de cuidar do bem-estar dos

portadores de deficiência, de oferecer oportunidades iguais de trabalho, de

habilitação, transporte, ajuda econômica, saneamento básico etc.

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• Propiciar condições para que a pessoa possa se reunir com outros

portadores de deficiência para discutir os seus problemas, ajudar um ao outro

e para trocar experiências.

• Estimular as reuniões entre pessoas portadoras de deficiência e

grupos de pessoas sem deficiência para conscientizar a sociedade e

promover a inclusão social.

O QUE FAZER PARA EVITAR ATITUDES DISCRIMINATÓRIAS

• A possibilidade de casamento não deve ser negada ás pessoas

portadoras de deficiência. A pessoa deve procurar esclarecer-se sobre suas

possibilidades de manter vida sexualmente ativa e possibilidade de gerar

filhos, buscando orientação com o médico ou outro profissional da área da

saúde.

• Se a pessoa for uma criança, você deve mandá-la uma escola. Ela

deve brincar com outras crianças e tomar parte nas mesmas atividades.

• Evitar o confinamento familiar, apelidos, superproteção, rejeição.

• A criança também deve participar das atividades com os adultos. Isso

ajuda o seu desenvolvimento.

• Oferecer á pessoa todas as condições possíveis para o pleno exercício

de sua cidadania quando possível (estudar, trabalhar, votar).

• Valorizar os pequenos progressos individuais e conquistas sociais.

• Participar desde a infância das atividades comunitárias.

Lembre-se: o preconceito e a discriminação começam na própria casa.

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TEXTO REFLEXIVO

“TRÊS DIAS PARA VER”

Hellen Keller

Muitas vezes tenho pensado quão benéfico seria, se cada ser humano

fosse atingido pela cegueira e pela surdez, durante alguns dias somente, nos

começos da vida adulta. Por contraste, o negrume da cegueira o faria

apreciar melhor a visão; e o silêncio lhe ensinaria, certamente, as alegrias do

som.

Uma vez por outra faço uma sondagem entre os meus amigos dotados

de vista, a fim de descobrir o que é que eles vêem. Recentemente perguntei a

uma amiga, que acabava de voltar de uma longa caminhada pelos bosques, o

que havia observado por lá: Nada de particular, replicou ela.

Como é possível — perguntei então a mim mesma — passear durante

uma hora através do arvoredo, sem nada ver que seja digno de nota? Eu, que

não possuo o dom da vista, descubro meramente através do tato centenas de

coisas que me despertam interesse. Tateio a folha duma planta, e sinto a

delicada simetria de suas nervuras. Acaricio amorosamente a branda pele

dum vidoeiro prateado, ou a casca rugosa e áspera dum pinheiro...

Chegada a primavera, ando a apalpar os ramos das árvores na

esperança de descobrir um rebento, primeiro sinal da natureza que desperta

do longo sono do inverno. Ocasionalmente, se a sorte me favorece, ao

pousar a mão de leve num arbusto, sinto-o vibrar de alegria ao gorjeio dum

passarinho. Por vezes o coração chora-me no peito, com desejo de ver todas

essas coisas que a cegueira me esconde. Se o simples contacto da mão me

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pode dar tanto prazer, quanta mais beleza a visão das coisas poderia revelar-

me! E já me tenho abandonado a imaginar que é que eu mais gostaria de ver,

se me fosse dado o uso dos olhos, digamos, por três dias somente.

Começaria eu por dividir em três fases esse período. No primeiro dia,

gostaria de ver as pessoas cuja bondade têm tornado minha vida digna de

ser vivida. Eu não faço idéia do que seja poder ver o coração duma pessoa

amiga através do que chamam “as janelas da alma” — os olhos. Tudo que eu

posso “ver” são os contornos duma face — através a polpa de meus dedos...

Sei distinguir o riso, a mágoa, e muitas outras emoções que o rosto humano

reflete. Conheço meus amigos pelas sensações que me dão as suas faces...

Quanto mais fácil, e quanto mais satisfatório será para vós outros — que

podeis ver — o aprender rapidamente as qualidades essenciais de outra

pessoa, só com observar-lhes as sutilezas da expressão, o estremecimento

de um músculo, o gesto rápido da mão! Mas já porventura vos ocorreu utilizar

a vista para penetrar na natureza íntima dum amigo? Ou será que a maior

parte das pessoas, ao verem os seus semelhantes, se limitam a colher de

passagem os traços exteriores das fisionomias e se contentam com isso?

Por exemplo, será o leitor capaz de descrever com minúcias o rosto de cinco

dos seus melhores amigos? Tenho perguntado a vários maridos qual a cor

dos olhos das esposas, para receber em resposta expressões de embaraço e

confissão de que não sabem!

Oh, quantas coisas eu havia de ver, se me fosse dado o dom da vista

apenas por três dias!

O primeiro dia seria um dia pleno. Chamaria à minha presença todos os

meus amigos queridos, e olharia demoradamente para os seus rostos, de

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modo a gravar na minha mente as evidências externas da beleza que mora

dentro deles. Deixaria também repousar meus olhos na face dum bebê, para

poder captar uma visão da beleza ávida e inocente, que precede a

consciência individual dos conflitos provocados pela vida. Gostaria

igualmente de ver os livros que me têm sido lidos, e que me têm revelado as

correntezas mais profundas da alma humana.

E gostaria de penetrar nos olhos leais e confiantes de meus cães: o

meu cachorrinho escocês e o meu valoroso dinamarquês.

À tarde daria um grande passeio pelos bosques e embriagaria meus

olhos com as belezas do mundo natural. E rogaria a Deus que me deixasse

ver a glória dum ocaso deslumbrante de cor. Essa noite, acho que eu não

seria capaz de dormir!

No dia seguinte levantar-me-ia com a primeira luz da aurora, para

assistir ao milagre empolgante pelo qual a noite se transforma em dia. Cheia

de reverente assombro, eu havia de presenciar o magnificente panorama de

luz com que o sol desperta a tarde adormecida.

Esse dia, eu o consagraria a formar uma rápida visão do mundo, do

passado como do presente. Gostaria de ver desfilar diante de meus olhos o

cortejo do progresso humano, e para isso iria percorrer os museus, onde

abraçaria com a vista a história condensada da Terra — as raças humanas e

os animais representados no seu ambiente natural; as carcaças gigantescas

de dinossauros e mastodontes que povoavam o globo antes de o homem

haver aparecido com a sua minúscula estatura e o seu cérebro poderoso para

dominar todo o reino animal. Iria, depois, visitar os museus de arte. São-me

bastante familiares, através do tato, as esculturas dos deuses e deusas da

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antiga terra do Nilo. Já toquei e percorri com meus dedos reproduções de

frisos do Partenon, e senti sob eles a rítmica beleza dos guerreiros helênicos

em combate... As feições de Homero, nodosas e ornadas de barbas, me são

queridas, pois ele, como eu, era cego também.

Assim pois, nesse meu segundo dia, eu me esforçaria por penetrar na

alma do homem através as suas obras de arte. Reconheceria assim, pela

vista, os objetos que hoje conheço apenas pelo tatear de minhas mãos. E,

coisa mais prodigiosa ainda, todo o mundo magnífico da pintura me ficaria

aberto. Naturalmente, eu conseguiria apenas receber de tudo isso uma

impressão superficial, porque — consoante me dizem os artistas — para

apreciar a Arte com profundo e verdadeiro conhecimento, é preciso educar a

vista; é indispensável aprender pela experiência a

pesar os méritos da linha, da composição, da forma, da cor. Ah! Tivera eu

olhos capazes de ver e com que fervor e afinco empreenderia tão fascinantes

estudos!

A noite do meu segundo dia seria passada no teatro ou no cinema. Como eu

gostaria de seguir com os olhos a silhueta fascinante de Hamlet, ou a

rotundidade jovial de Falstaff entre os variegados parâmetros isabelinos! Não

posso apreciar a beleza dos movimentos rítmicos, exceto

na esfera muito restrita do toque de minhas mãos. Apenas vagamente posso

visionar a graça duma Pavlova, conquanto eu saiba alguma coisa dos

deleites do ritmo, pois com frequência posso adivinhar o compasso da

música, quando o soalho traz até mim as suas vibrações. Posso

perfeitamente imaginar como os movimentos cadenciados devem ser uma

das coisas mais agradáveis de contemplar no mundo! Foi-me possível

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apreender isso, seguindo com meus dedos as linhas dos mármores

esculpidos; se a graça das figuras estáticas pode ser tão adorável, quanto

mais agudo não será o prazer, a emoção de vê-las em movimento!

Na manhã seguinte, levantar-me-ia cedo, mais uma vez, para saudar o raiar

da aurora, ansiosa de descobrir novos prazeres, novas relações de beleza.

Este dia, o terceiro da minha incursão no mundo das imagens, eu iria passá-

lo entre os que trabalham, entre os homens e mulheres incessantemente

absorvidos nas mil ocupações da vida humana. A grande cidade é hoje

o meu destino. Fico, primeiro, de pé a uma esquina das mais movimentadas,

limitando-me a olhar a gente que passa, tentando compreender na sua

aparência alguma coisa das suas vidas cotidianas. Vejo sorrisos, e isso me

torna feliz. Vejo firme decisão, seriedade — e isso me dá orgulho. Vejo,

noutros rostos, pintado o sofrimento, o que me inspira compaixão.

Desço com o meu vagar uma grande avenida central. Deixo errar meus

olhos a esmo, sem fixar em nada, para não ver nada em especial, mas

apenas um fervilhante caleidoscópio de cor. Tenho certeza que as cores dos

vestidos das mulheres, passando em torrente nas ruas, devem constituir um

espetáculo de beleza de que eu não havia de me fatigar facilmente. Mas

talvez que, se gozasse da vista, eu fosse como a maior parte das outras

mulheres — demasiado interessada em modas e estilos, para poder prestar

atenção ao esplendor do colorido desfilando em massa!

Dessa grande avenida eu partiria a dar uma volta pela cidade — a ver os

seus bairros de miséria, as fábricas, os parques onde as crianças brincam.

Faria, sem sair do meu país, uma viagem ao estrangeiro, visitando os bairros

onde vivem aglomerados os imigrantes de outras terras. Iria de olhos sempre

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bem abertos para todas as visões de felicidade e miséria, de modo a poder

penetrar bem fundo e colher elementos para adicionar à minha compreensão

dos hábitos de vida e de trabalho do mundo.

Meu terceiro dia de férias no mundo da visão vai-se acercando já do

termo... Existem talvez muitos outros aspectos sérios da vida, aos quais eu

deveria consagrar as poucas horas de vista que me restam, mais creio que

esta noite — por ser a do último dia! — voltarei a correr ao teatro, para ver

alguma peça hilariante, que me permita apreciar as ressonâncias harmônicas

da comédia no espírito humano.

À meia-noite as trevas da cegueira voltariam a envolver-me... É natural

que durante esses três dias eu não tivesse visto tudo quanto desejaria ver. E

só quando a escuridão voltasse a descer sobre meu mundo, é que eu

compreenderia quanta coisa me ficara por ver!

Talvez este breve programa não coincida com o plano que o leitor,

dotado de vista, traçaria para si próprio, se soubesse que estava em vésperas

de ser ferido de cegueira irremediável. Estou certa, contudo, de que se ele

encarasse semelhante fatalidade, saberia fazer de seus olhos um uso tal

como nunca dantes fez. Tudo aquilo que visse se lhe tomaria querido. Seus

olhos roçariam e envolveriam amorosamente quanta coisa caísse dentro do

seu campo de visão. Depois, por fim, aprenderia a ver realmente, e um novo

mundo, um mundo de beleza, se lhe desdobraria diante dos olhos.

Eu, que sou cega, posso dar uma sugestão àqueles que vêem: façam

uso dos olhos como se amanhã a cegueira os esperasse. E o mesmo se

pode aplicar aos outros sentidos. Escutem a música das vozes, a canção das

aves, os acordes poderosos duma orquestra — como se amanhã a surdez os

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ameaçasse. Toquem cada objeto como se amanhã fossem perder o sentido

do tato. Aspirem o aroma das flores, saboreiem com delícia cada bocado,

como se amanhã fossem deixar para sempre de cheirar e saborear... Tirem o

máximo proveito de cada um dos sentidos!

Rejubilem em todas as facetas do prazer e da beleza que o mundo lhes

revela, através dos vários meios de contacto concedidos ao homem pela

natureza. Mas de todos os sentidos, estou certa que a vista deve ser o mais

grato de deleitoso.

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CONCLUSÃO

Não raramente, utilizamos a expressão “fechar os olhos” com a acepção

de “ignorar” ou “não considerar”.

Esses conceitos encontram-se presentes em nossos arquétipos mais

significativos e deles fazemos uso, mesmo sem nos dar conta. Contudo, uma

abordagem mais crítica e objetiva acerca das coisas que dizemos e fazemos

em nosso dia-a-dia, em nome dessas “idéias pré-concebidas”, nos levaria à

conclusão de que as mesmas abrigam preconceitos, erros de avaliação.

Buscamos a luz e, ao mesmo tempo, nos afastamos dela!

Muitos rejeitam o indivíduo de cor “negra” e, ao fazerem isto, estão,

inconscientemente, admitindo a si mesmos que a cor da pele é condição

necessária e suficiente para classificar alguém como “incapaz”, “ignorante”,

“incompetente”.

Da mesma forma, não são poucos aqueles que encaram a cegueira

como sendo uma condição limitadora, ou mesmo incapacitadora. A cegueira

é vista sob a ótica do medo. Mantendo-se distante o indivíduo cego, procura-

se afastar o receio inconsciente da “privação da luz”. O conhecimento puro e

objetivo que poderia advir da compreensão da realidade do indivíduo cego é,

então, deixado de lado e, mais uma vez, “fecha-se os olhos”.

Longe de ser limitado por sua condição, o deficiente visual não deve ser

visto como “uma pessoa digna de dó”, “urna pessoa desafortunada”, “alguém

que precisa ser tutelado, assistido em todos os seus atos”. Não obstante o

fato de que tem necessidades especiais, o deficiente visual apresenta os

mesmos sentimentos e aspirações daqueles considerados “videntes”. Possui,

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portanto, potencial que precisa ser estimulado e trabalhado de modo a

possibilitar sua integração ao mundo em que vive.

Não somente pela pesquisa, mas diante da realidade encontrada no

Instituto Benjamin Constant, poderíamos abrir uma outra reflexão, no que diz

respeito à Educação no Brasil, pois diante de fatos reais é possível constatar

que a educação visa um caráter econômico e não pedagógico, e a Educação

Especial em si poderá a partir desta visão ser dividida em duas grandes

épocas:

• Romântica

• Obrigatória

Antes de se impor decretos, leis e demais documentos legais, é

necessário sensibilizar cada ser humano que, o portador de deficiência visual,

ou sej a, ela qual for, é um ser humano com deficiência e não uma deficiência

com um ser. Ele, como nós, é um ser único.

“...Veja o homem acima de tudo como homem a despeito de qualquer

deficiência que ele carregue.”

(ALMEIDA, Maria da Glória de Souza).

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Bibliografia Consultada

ALGAREZ.Vera Lúcia Vaz.UMA ESCOLA MUITO ESPECIAL. Uma

experiência a ser compartilhada. Editora AGL,1999.

LARAMARA.Associação Brasileira de Assistência ao Deficiênte Visual.

LDB. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9394/96.

Declaração de Salamanca.

Fundação Dorina Nowill.

Revista Contato

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ANEXOS

Índice de anexos

Anexo 1 >>Alguns dos Principais Recursos Didáticos na Educação Especial;

Anexo 2 >> Fotos do Instituto Benjamin Constant

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Anexo 1

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Números

Escrita

A escrita do Braille pode se realizar por várias

maneiras: a mais antiga e a mais utilizada é a

reglete e o punção.

A pessoa prende o papel na reglete, e com o

punção vai fazendo todos os pontos que formam

as letras.

A segunda maneira são as máquinas de datilografia.

Existem muitos modelos de maquinas de datilografia.

Com elas o trabalho se torna muito mais rápido que

na reglete, pois a pessoa não precisa fazer ponto a

ponto com o punção.

Com o avanço da informática, já é possível produzir

um Braille com ótima qualidade em impressora

especial. Também já é possível imprimir gráficos, o

que não era possível nas maquinas de datilografia.

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Anexo 2

Fotos do Instituto Benjamin Constant

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

METODOLOGIA 5

SUMÁRIO 6

INTRODUÇÃO 7

CAPÍTULO I

A Legislação e Conceito 08

CAPITULO II

A Aprendizagem 44

CAPITULO III

A Família 57

Texto Reflexivo 60

CONCLUSÃO 66

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 69

ANEXOS 70

ÍNDICE 74

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição:

Título da Monografia:

Autor:

Data da entrega:

Avaliado por: Conceito: