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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO: O CONSENTIMENTO INFORMADO Rosângela de Assis Menezes Orientador: Ivan Garcia Rio de Janeiro / 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO: O CONSENTIMENTO INFORMADO

Rosângela de Assis Menezes

Orientador: Ivan Garcia

Rio de Janeiro / 2012

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO: O CONSENTIMENTO INFORMADO

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito Empresarial e dos

Negócios.

Rosângela de Assis Menezes.

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AGRADECIMENTOS

....a minha amiga Fernando Vidal pela

força para que eu não desistisse do

curso e ao meu marido pelo seu apoio.

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DEDICATÓRIA

Agradeço primeiramente a Deus pela existência

Aos meus amigos que foram fies nos momentos difíceis deste curso.

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RESUMO

O objetivo consiste na análise da responsabilidade civil médica à luz

do consentimento livre e esclarecido é um documento jurídico e bioético

imprescindível na prática da medicina. O respeito à autonomia do paciente

prevalece sobre os tratamentos paternalistas, exercidos pelo médico, na

relação com seus pacientes. O paciente deverá ser esclarecido de todas as

etapas de seu tratamento, riscos da terapia empregada, bem como seus

efeitos colaterais. Deverá ficar claro, que o paciente, por intermédio do

conhecimento livre e esclarecido, opinou, compreendeu e aceitou todos os

procedimentos propostos pelo médico. A nova postura do médico para com

o paciente determina um novo paradigma, que compreende uma prática

médica segura por meio da participação do paciente, transformando a

relação médico-paciente uma relação interativa. O uso de tal documento fará

com que o profissional se enquadre nas novas normas do Código Civil,

Código de Defesa do Consumidor e nas normas bioéticas. Portanto, a

importância jurídica do tema consiste no respeito a autonomia do paciente e

na proteção da classe médica em futuras demandas indenizatórias.

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SUMÁRIO

I - INTRODUÇÃO 07

II - CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES 10

III - A RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA 20

IV - A CULPA MÉDICA 28

V - OBRIGAÇÕES E A NATUREZA CONTRATUAL 35

VI- O CONSENTIMENTO INFORMADO NA ATIVIDADE MÉDICA 45

VII - CONCLUSÃO 66

BIBLIOGRAFIA 68

INDÍCE 72

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INTRODUÇÃO

No presente trabalho, analisaremos a problemática que envolve a

Responsabilidade Civil dos Médicos, sendo este assunto, certamente, um

dos mais comentados da atualidade. Verificamos que este é um tema de

grande importância social e, também, um dos mais polêmicos. Podemos ver

quase todos os dias na mídia casos de suspeita de erro por parte do médico,

se tornando alvo de discussões em todos os âmbitos da sociedade, desde

uma mesa de bar, passando por hospitais, chegando assim aos escritórios

de advocacia. Entretanto, não podemos responsabilizar o médico sempre

que o resultado não for satisfatório para o paciente e, por isso, tentaremos

diferenciar as diversas situações em que o resultado obtido não for o

esperado e, nestes casos, quando deverá o médico ser civilmente

responsabilizado por seus atos.

Começaremos, em nossa monografia, fazendo breves elucidações

sobre a Responsabilidade Civil de maneira geral, posteriormente, falaremos,

especificamente, sobre a Responsabilidade Civil Médica e de como este

tema é tratado pelo Conselho Federal de Medicina e por nossa

jurisprudência, além de sua relação com o Código de Ética Médica.

Através desta pesquisa, almejamos demonstrar os vários aspectos da

responsabilidade, além de analisar os meios jurídicos referentes à matéria,

esclarecendo, sistematizando e compreendendo o tema proposto.

Tema muito polêmico e sempre atual, o erro médico tem recebido

grande destaque nos meios de comunicação de massa. O aumento no

número de demandas indenizatórias contra médicos suspeitos de terem

agido culposamente vem ocorrendo intensamente, podendo se verificar

claramente algumas causas para este fato. Primeiramente, podemos apontar

as mudanças no relacionamento médico-paciente que provocou grande

distanciamento entre eles, passando a relação a ser de usuário e prestador

de serviços, havendo, assim, a perda do respeito e do afeto que existia

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antigamente, facilitando a propositura de ações. Outro fator que contribui

para este crescimento é o aumento desordenado de faculdades no país e a

queda no nível de ensino destas, pois, em muitos casos, jogam-se médicos

totalmente despreparados no mercado.

Porém, não se pode responsabilizar os médicos em todos os casos,

porque o sistema brasileiro de saúde pública é um caos, onde faltam

condições mínimas de trabalho, faltam materiais e faltam, inclusive,

profissionais, sendo assim, o erro decorre de “falhas estruturais”. Nestes

casos o profissional da medicina não poderá ser responsabilizado, pois não

concorreu para o resultado através da ação ou omissão, imprudência,

negligência ou imperícia, recaindo esta responsabilidade, ou seja, o ônus de

indenizar, sobre o Estado. O art. 3º do Código de Ética Médica reza ser

conditio sine qua non o médico ter boas condições de trabalho e ser

remunerado de forma justa a fim de que possa exercer a Medicina com

honra e dignidade, e o art. 23 deste código prescreve que o profissional

pode, inclusive, recusar-se a exercer sua atividade laborativa caso não

encontre essas condições. Mesmo em perfeitas condições de trabalho, para

se responsabilizar o profissional se faz necessário que se comprove à culpa

deste. Culpa esta que, de acordo com a teoria subjetiva adotada pelo nosso

Código Civil, deve ser demonstrada pela vítima, ou seja, o ônus da prova

caberá ao autor da ação indenizatória.

Do ponto de vista ético-moral, a competência para analisar esses

casos pertence aos Conselhos Regionais de Medicina, que são entidades

julgadoras e disciplinadoras da classe dotada de personalidade jurídica de

direito público, através de processos ético-disciplinares, segundo estipulam o

art. 21 e seu parágrafo único da Lei nº 3.268 de 30 de setembro de 1957,

regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958. Os

processos ético-disciplinares são o instrumento de que dispõe os conselhos

regionais para punir moral e administrativamente os profissionais que estão

sob sua jurisdição, ainda que estes já tenham sido alcançados por meio de

sanção civil pela condenação à reparação do dano causado ou da sanção

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penal via ação criminal regularmente instaurada e na qual venham a ser

julgados culpados.

No mundo jurídico o erro médico apresenta reflexos na área civil e

penal, podendo gerar efeitos de natureza administrativa quando decorrer de

atuação do profissional da medicina na administração pública. Esses efeitos

são todos derivados do conceito de responsabilidade médica.

Na relação tradicional, o médico exercia poder sobre o paciente, era

uma relação de submissão, restando ao paciente apenas se sujeitar as

decisões técnicas. Mas, no novo paradigma que se apresenta, o médico

passa a compartilhar as decisões técnicas com seus pacientes, dando-lhes

alternativas, respeitando seus limites, sendo tolerante e respeitando sua

autonomia.

O consentimento livre e esclarecido na área de saúde surge para dar

forma a essa realidade, sempre calcado no respeito à autonomia do

paciente. O respeito pela autonomia das pessoas como agentes morais

capazes de decisões informadas é central no dialogo bioético. A autonomia

é o alicerce que fundamenta o consentimento, de modo livre e independente.

Em nosso país, a necessidade de informar o paciente é obrigação

prevista no Código de Defesa do Consumidor, no Código Civil e no Código

de Ética Médica.

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CAPÍTULO I

CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

1.1. A Responsabilidade civil na história

A responsabilidade civil tem sua origem no direito romano, e como

fundamento principal, a concepção de uma vingança coletiva, que se

caracterizava pela reação conjunta do grupo contra o agressor pela ofensa a

um de seus componentes.1

Embora Maria Helena Diniz fale sobre vingança coletiva, o grande

civilista José de Aguiar Dias em sua clássica obra sobre o tema, afirma que, o

principal fundamento de responsabilidade civil vem da concepção de vingança

privada, “forma primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea

e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os povos nas suas

origens, para a reparação do mal pelo mal”.2

Os homens faziam justiça pelas próprias mãos, sob a égide da Lei de

Talião, ou seja, da reparação do mal, sintetizada nas fórmulas: “olho por olho,

dente por dente”, “quem com ferro fere, com ferro será ferido”. 3

Para coibir abusos, o poder público intervinha apenas para declarar

quando e como a vítima poderia ter o direito de retaliação, produzindo na

pessoa do lesante dano idêntico ao que experimentou. Na Lei das XII Tábuas,

aparece significativa expressão desse critério na tábua VII, Lei 11º: “si

nembrum rupsit, ni cume o pacit, tálio esto” (se alguém fere a outrem, que sofra

a pena de Talião, salvo se existiu acordo). A responsabilidade era objetiva, não

dependia da culpa.4

O termo responsabilidade não era nomeado no direito romano como

instituição, inexistindo um princípio geral fundado na culpa. A responsabilidade

era puramente casuística sempre buscando um justo equilíbrio.

1 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro( abrangendo o Novo Código Civil e a Lei n.10406, de 10-1-2002). 17. ed.; v.7. Responsabilidade civil – São Paulo: Saraiva 2003. P.9. 2 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 9. Ed., Rio de Janeiro: Forense, 1994. P.17. 3 DINIZ, Maria Helena. ob. cit. p.9. 4 Idem, p. 10.

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Uma investigação etimológica revela o sentido da palavra

responsabilidade: (responder a) ligar-se-á ao devedor, aquele que se

compromete à determinada prestação.5

Sabe-se que a noção de responsabilidade surge no final do século

XVIII. A construção dessa idéia foi fruto da escola histórica alemã e da filosofia

Kantiana, baseando-se na consciência da razão específica da natureza

humana. Originalmente a responsabilidade civil estava ligada ao moralismo da

época significando o dever de indenizar os danos causados culposamente ao

outro. Entretanto, a responsabilidade civil se constrói separadamente da

realidade da ordem natural das coisas, destinada a se rever um “justo reparo”

dos danos.6

O industrialismo evidência marcas de desigualdades econômicas, e

como reação a essas injustiças surge o início da observância da

responsabilidade civil. Este processo começou na França a partir do

pensamento de Saleilles e Josserand.7

Surge a idéia no âmbito extracontratual dando início aos seguintes

fatores objetivos: garantia, igualdade, abuso do direito e excesso da normal

tolerância entre os indivíduos.8

A Lex Aquilina de damno, teoria que cristalizava a idéia de reparação

do dano, impunha que o patrimônio do lesante suportasse os ônus de

reparação em razão do valor da responsabilidade. E em função desta,

esboçava-se a noção de culpa, de maneira que se o agente agisse sem culpa

isentar-se-ia de responsabilidade. Estabeleceu as bases da responsabilidade

extracontratual, criando uma forma pecuniária de indenização do prejuízo, com

base no estabelecimento de seu valor.9

Já no âmbito contratual, não se discute o caráter objetivo da obrigação

de segurança e de resultado. A responsabilidade civil “se liberta da prisão da

5SEGUÍ, Adela M. Revista de Direito do Consumidor. Aspectos relevantes de la responsabilidad civil moderno. 52. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. P. 268-277. 6Idem, p. 270. 7Ibidem, p. 275-276. 8DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro( abrangendo o Novo Código Civil e a Lei n.10406, de 10-1-2002). 17. ed.; v.7. Responsabilidade civil – São Paulo: Saraiva, 2003. p. 10. 9 Idem, p. 10.

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culpa”, e a lei, a jurisprudência e a doutrina a armam para outro combate, a

sociabilização dos riscos e perigos.10

Com a busca constante da reparação dos danos, surge uma nova

tendência que foi reconhecida em jornadas e congressos da especialidade,

onde o objetivo não era mais sancionar a quem causou um dano injustamente,

mas sim reparar quem injustamente o sofreu: os danos causados por produtos

elaborados, na responsabilidade extracontratual do Estado por atos ilícitos, no

dano ecológico, no dano informático, nos danos causados por produtos

medicinais e farmacêuticos, nos causados a terceiros na superfície por coisas

caídas de aeronaves, os provenientes de resíduos perigosos, dos causados no

âmbito da relação de consumo.11

O critério adotado permite uma ampliação dos direitos subjetivos

incluídos nas normas, estendendo-se para o campo da proteção dos direitos

personalíssimos, resultando na essência da admissão dos interesses simples e

interesses de fato, sérios e lícitos, como fatores de ressarcimento. Admitindo-

se reclamações indenizatórias de cônjuge sem direito fomentado antes da

morte do outro, da guardiã de um menor que perde a vida em um acidente, de

um nubente pela morte do outro, etc. A Corte de Cassação francesa retornou a

uma posição que havia abandonado, e apoiou-se sobre a generalidade dos

ternos do art. 1382 do Código e na ausência de toda condição relativa do dano,

se satisfazendo com a lesão de um simples interesse.12

No entendimento do ilustre Caio Mário da Silva Pereira:13

A responsabilidade civil consiste na efetivação da

reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito

passivo da relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito

passivo compõe o binômio da responsabilidade. Não importa

se o fundamento é a culpa, onde houver a subordinação de

um sujeito passivo à determinação de um dever de

ressarcimento, ai estará à responsabilidade civil.

10SEGUÍ, Adela M. ob. cit. p. 277. 11SEGUÍ, Adela M. Revista de Direito do Consumidor. Aspectos relevantes de la responsabilidad civil moderno. 52. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 278-279. 12Idem, p. 281-282. 13 SILVA PEREIRA, Caio Mario. Responsabilidade Civil. 9.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998. p.11.

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Já Sérgio Cavalieri Filho entende como função de responsabilidade

civil14:

O anseio de obrigar o agente, causador do dano, a

repará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça.

Isso se faz através de uma indenização fixada em proporção

ao dano. Indenizar pela metade é responsabilizar a vítima pelo

resto. Limitar a vítima à reparação é obrigá-la a suportar os

restos dos prejuízos não indenizados.

Merece destaque o princípio segundo o qual quem causa um dano

culpável injusto deve repará-lo, não sendo este absoluto. Pois existem casos

que se nega a ressarcitória, e se exige um fator de atribuição especial (dolo,

culpa grave), se modula a culpa ou se pondera o dano com referência

individualizado a dos sujeitos da relação.15

O século XXI encontra-se num momento de reflexões, pois a teoria da

responsabilidade civil está num estágio de revisão no mundo inteiro, pondo-se

em dúvida seus fundamentos e funções. Esse questionamento cresce no

compasso das mudanças produzidas pelos danos inexoráveis que o avanço de

desenvolvimento tecnológico provoca na sociedade. As causas da crise são:16

a) os novos direitos, na aparição de reparação no cenário do direito

privado, os direitos da personalidade.

b) a gravidade e irreversibilidade dos danos, merecendo destaque, a

contaminação da água, do solo e do ar, os danos provocados por

acidentes automobilísticos.

c) razões ideológicas da insuficiência do ressarcimento, sendo este

imponente para brindar adequada proteção a graves situações

substanciais dignas de tutela.

14 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.35. 15SEGUÍ, Adela M. Revista de Direito do Consumidor. Aspectos relevantes de la responsabilidad civil moderno. 52. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 287-288. 16Idem, p. 289.

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A preocupação pela prevenção ao dano vem sendo extremamente

compartida. Existiam normas dispersas no ordenamento jurídico que

consagravam remédios preventivos, assim como alguns pronunciamentos dos

tribunais, pois não havia se pensado na construção teórica de um sistema geral

de prevenção dos danos. É possível falar em prevenção em três sentidos: o

primeiro refere-se à adoção de medidas técnicas idôneas para evitar um dano;

o segundo refere-se à prevenção como função indireta da sanção ressarcitória;

o terceiro fazendo referência a um sistema de tutela dos direitos diferente da

clássica tutela ressarcitória, que está denominado como “tutela civil inibitória-

existência de uma ação civil preventiva genérica - para evitar que o dano se

prolongue”.17

Para que o juiz resolva de mérito um processo que alcance na coisa

julgada uma pretensão inibitória e ordene a prevenção final do dano, é preciso

que essa pretensão se ventile em um processo de conhecimento exaustivo,

pleno, com amplitude de defesas e de provas, e que leve a fim em tempo

suficiente essas exigências. O princípio da precaução é nascido dos temores

na falta de certeza científica (uma responsabilidade sem benefício de dúvida).18

A ordem de idéias compartilhadas das funções de reparação,

prevenção e punição em uma base de igualdade dentro do denominado direito

de danos, é a utilização da responsabilidade civil como um meio de penalizar

condutas danosas, e julgar a título de “pena privada”. Ao definir a

responsabilidade civil, na evolução de sua noção, elementos semelhantes de

sua estrutura se destacam: liberdade, causalidade e justo.19

A liberdade debilitada, critério de negar responsabilidade frente aos

terceiros, ainda que com culpa, atue sem exceder os limites da obrigação

encomenda.

As causalidades reduzidas, vindas da necessidade de estabelecer um

nexo causal entre o fato gerador e o dano foram progressivamente posta em

questão.

17Ibidem, p. 292-293. 18SEGUÍ, Adela M. ob. cit. p.298-299. 19SEGUÍ, Adela M. Revista de Direito do Consumidor. Aspectos relevantes de la responsabilidad civil moderno. 52. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 301-310.

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Nas mudanças da idéia do justo, está presente a idéia da justiça de

reparação. “La responsabilidad, enfocada desde esta nueva expresión de la

prevención, adopta uma acepción de anticipación y previsión de lo nocivo

potencialmente incierto e introduce una nuerva dimensión: no se trata ya de

reparar um daño sino um riesgo”.20

No futuro da responsabilidade civil cabe interrogar-se sobre os fatores

de atribuição, como também, se mudará a estrutura interna da mesma. A

distinção mais importante entre responsabilidade civil contratual e

extracontratual, consiste na extensão do ressarcimento e os prazos da

prescrição liberatória, separando-se o direito comum da responsabilidade dos

regimes especiais. Em particular o risco médico e de muitos riscos sérios

ligados à atividade industrial, do risco de poluição, etc. 21

Para eliminar os inconvenientes, se pensaram em diferentes

possibilidades solucionadoras, que vão desde a criação de “um regime

derrogatório do direito comum, destinado a todas as vítimas de um dano

corporal grave, convertendo em obrigatório o seguro individual contra todos os

acidentes corporais”.22

É necessário interrogar-se também sobre a sucessão do processo dos

danos iniciados no mesmo país mediante recurso a mecanismos alternativos

de responsabilidade civil sobre a base de idéias solidárias. A possibilidade

consiste em generalizar um mecanismo dos fundos de garantia, criando em

lugar daquilo que existe atualmente, um fundo de indenização de danos

corporais que intervencionaria a título subsidiário para indenizar as vítimas,

quando não puderem obter reparação de seus prejuízos corporais por vias que

existem atualmente.23

A alteração das finalidades da responsabilidade civil, tendo convicção

de que o século XX foi a de reparação dos danos, no presente será de

prevenção. Esta evolução revela, que as finalidades da responsabilidade estão

20 “A responsabilidade enfocada desde esta nova expressão de prevenção, adapta uma acepção de antecipação e de prevenção do nocivo potencial e introduz uma nova dimensão: não se trataria de reparar um dano, mas sim um risco”. 21SEGUÍ, Adela M. ob. cit. p. 312. 22Idem, p. 314. 23 Ibidem, p. 315.

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em vias de modificação, e no século XXI poderá haver o decorrer de uma nova

instituição.24

Por fim, o fundamento maior da responsabilidade civil está na culpa,

pois afinal, na grande maioria dos casos os atos lesivos são causados pela

conduta antijurídica do agente, por negligência ou por imprudência. A evolução

da responsabilidade civil gravita em torno da necessidade de socorrer a vítima,

o que tem levado a doutrina e a jurisprudência a marchar adiante dos códigos,

cujos princípios constritores entravam o desenvolvimento e a aplicação da boa

justiça. Foi preciso a outros meios técnicos, e aceitar, vencendo para isto

resistências quotidianas, que em muitos casos o dano é reparável sem o

fundamento culpa.25

1.2- A evolução do direito positivo brasileiro e a Constituição

Federal de 1988

Foi na Constituição Federal de 1988, que pela primeira vez em nossa

história foi instituído um dispositivo legal referindo-se a responsabilidade civil. O

constituinte brasileiro através de exemplos de constituições anteriores, como a

de Portugal de 1976 revisada em 1982, e a da Espanha de 1978, garantiu

direitos que até então eram cerceados de seu pleno exercício26, no dispositivo

constitucional do artigo 5º, inciso V, da CF/8827.

Com o referido inciso, seguindo as trilhas das constituições

contemporâneas, a idéia, por exemplo, da reparação do dano moral, que

durante muito tempo era vista dentro da tradição romanista (advinda do direito

romano) como irreparável, pela sua incomensurabilidade, irredutível a valores

monetários, passa a ser vista como indenizável, verdadeiro exemplo da

24SEGUÍ, Adela M. Revista de Direito do Consumidor. Aspectos relevantes de la responsabilidad civil moderno. 52. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 316. 25 PEREIRA DA SILVA, Caio Mário. Instituições de Direito Civil. 11 ed., v.3, Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 56. 26 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. ver. e atual. Até a Emenda Constitucional n. 35/2001. 4.ed., São Paulo: Saraiva, 2002. p. 93. 27 Artigo 5º, inc. V, CF/88: “Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasiLeiros e aos seus estrangeiros residentes do País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos dos seguintes: V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”;

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evolução da responsabilidade civil, a qual tem passado por várias alterações

em virtude das mudanças operadas na sociedade. Desta forma o constituinte

garantiu aos direitos individuais a reparabilidade dos danos morais.28

1.2.1. A revogação do Código Civil de 1916

Partindo da idéia de vingança privada, posteriormente surgiu a idéia de

reparação do dano injustamente causado e, por fim, que a responsabilidade

deveria ser proporcional ao dano causado, introduzindo-se, então, o elemento

culpa como fator decisivo para a responsabilização. A este contexto obedeceu

ao Código Civil de 1916 em seu artigo 159,29 que adotou a teoria da culpa,

dando início à responsabilidade civil objetiva, que teve sua fundamentação na

doutrina francesa.30

O Código Civil de 1916 começa a ficar arcaico em relação ao

problema da responsabilidade civil. É chegada a hora de uma reforma, pois o

que se observa no direito brasileiro é um certo retrocesso, por intermédio de

várias disposições do Código Civil .31

1.2.2. Princípios da Defesa do Consumidor (Lei 8078/90)

A promulgação da Lei 8078 de 11 de setembro de 1990, Código de

Defesa do Consumidor, marca a evolução em nosso ordenamento jurídico ao

tratar da responsabilidade civil, pois através de sua vigência surgiu uma nova

área de responsabilidade civil fulcrada nas relações de consumo.32

28BULOS, Uadi Lammêgo. ob. cit. p.93. 29 Artigo 159 – C.C./1916: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste Código, arts. 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553.”. 30 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4.ed., São Paulo: Malheiros, 2003. p.159. 31 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 28-29. 32CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p.40.

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A responsabilidade estabelecida no Código de Defesa do Consumidor

em seu artigo 1433 é objetiva, prevalecendo à teoria do risco (diferentemente do

Código Civil de 1916, que se baseava na teoria da culpa) onde a

responsabilidade passa a fundar-se no dever e segurança fornecedor, pólo da

relação contratual de consumo definido pelo artigo 3º34 do Código de Defesa do

Consumidor, no que se diz respeito aos produtos e serviços lançados no

mercado.35

A responsabilidade civil do profissional liberal à luz do Código de

Defesa do Consumidor retrata que os médicos e advogados – para citarmos

alguns dos mais conhecidos profissionais – são contratados ou constituídos

com base na confiança que inspiram aos respectivos clientes. Assim sendo,

somente serão responsabilizados por danos quando ficar demonstrada a

ocorrência de culpa subjetiva, em quaisquer das suas modalidades:

negligência, imprudência ou imperícia.36

Nos ensinamentos do ilustre mestre Sergio Cavallieri Filho, fica

subentendido que37:

O Código não criou para os profissionais liberais nenhum

regime especial, privilegiado, limitando-se a afirmar que a

apuração de suas responsabilidades continuaria a ser feita de

acordo com o sistema tradicional, baseado na culpa. Logo,

continuam a ser-lhes aplicáveis às regras da responsabilidade

subjetiva com culpa provada nos casos em que assumem

obrigação de meio, e as regras da responsabilidade subjetiva

com culpa presumida nos casos em que assumem obrigação

de resultado.

33Artigo 14, CDC: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existênciade culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, como informações suficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. 34Artigo 3º, CDC: “Toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. 35 CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p.40. 36KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p.179. 37 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4.ed., São Paulo: Malheiros, 2003. p. 369-372.

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1.2.3. O Código Civil de 2002 (Lei 10.406/02)

O Novo Código Civil Brasileiro passou por uma considerável

transformação para acompanhar a evolução ocorrida na área da

responsabilidade civil ao longo do século XX. Então, embora não tenha se

desfeito da responsabilidade subjetiva, sua essência está na objetiva, nas

cláusulas previstas em seus artigos, como a que trata da definição de ato ilícito

(artigo 18638), a do abuso do direito (artigo 18739), e com mais profundidade em

seus artigos 92740 e seguintes, dando assim para notar-se que pouco sobrou

para a responsabilidade subjetiva.41

38Artigo 186 - C.C./2002: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. 39Artigo 187 - C.C./2002: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. 40Artigo 927 - C.C./2002: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos específicos em Lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem”. 41 CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p. 159.

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CAPITULO II

A RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA

2.1- Conceito

O Código Civil em vigor trouxe para o direito civil uma essência

objetiva na responsabilidade civil, o que é uma inovação, pois o Código de

1916 era extremamente subjetivista. Assim, o direito moderno, no campo da

responsabilidade civil, tende a inclinar-se cada vez mais para a teoria do risco,

consubstanciando o dever de indenizar, bastando à existência do dano e do

nexo causal42.

Embora o novo código civil traga uma essência objetivista, também

dispõe em seu art. 18643, a exemplo do que já ocorria no código revogado, à

responsabilidade subjetiva, que continua coexistindo juntamente com a objetiva

para a contribuição harmônica das relações que enfocam a responsabilidade

civil. Eliminar a idéia de responsabilidade subjetiva como querem alguns é uma

atitude frágil e sem base sólida.44

A atividade médica e a preocupação com o problema que as doenças

ainda sem cura ocasionam não se traduzem em prática e discussão atuais,

pois esta matéria já era tratada desde os primórdios de uma sociedade

organizada. Há registro do surgimento da figura “médico”, ao lado dos

mágicos, curandeiros ou feiticeiro, nos primórdios da sociedade. Até então, a

cura dos males do homem era atribuída a forças divinas e à ocorrência de

doenças relacionadas aos pecados.45

Surge efetivamente nos séculos XVIII e XVII a.C, no Código de

Hamurabi instituído pelo sexto rei da primeira Dinastia da Babilônia, o Rei

42COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Instituições de direito médico. 1. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.7. 43 Artigo 186 – C.C./2002: “Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito”. 44 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. ob. cit. p. 8. 45 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p.527.

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Khamu-Rabi, três preceitos que cuidavam da atividade médica em seus

arts.21546, 21847 e 21948.

Segundo a romancista Taylor Caldwell: “Se a ciência e a medicina da

Babilônia nos tivessem chegado intactas, nosso conhecimento do mundo seria

muitíssimo mais avançado do que atualmente”.49

Para a prática da medicina, impõe-se que o profissional tenha

inscrição no Conselho Regional do respectivo Estado, Território ou Distrito

Federal, assim o profissional deverá cumprir normas de conduta ética e até

mesmo de comportamento pessoal.50

A relação médico-paciente que se resumia entre a confiança (do

cliente) e a consciência (do profissional liberal) hoje estão mudadas, estas se

massificaram distanciando o médico do paciente, ficando ambos sem

envolvimento de amizade, afeto, afeição, etc. Diante dessas mudanças o

médico passou a ser visto como “prestador de serviços” e o paciente como

“consumidor”, consequentemente aumentou-se e exarcebou-se a suspeita e a

prevenção deste último para com o primeiro e vice-versa, ocasionando um

aumento expressivo no mundo inteiro de ações responsabilidade civil, em

especial nos Estados Unidos da América, onde em 1970, um quarto dos

médicos respondia a ações de reparação de dano.51

A responsabilidade Civil Médica está ressaltada no art. 95152 do novo

Código Civil, que prevê a aplicação dos arts. 94853, 94954, e 95055 para

46Artigo 215: “Se um médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o cura ou se ele abre a alguém uma incisão com a lanceta de bronze e o olho é salvo, deverá receber dez siclos”. 47Artigo 218 : “Se o médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o mata, ou lhe abre uma incisão com a lanceta de bronze e o olho fica perdido, dever-se-lhe-á cortar as mãos”. 48Artigo 219: “Se o médico trata o escravo de um liberto de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o mata, deverá dar escravo por escravo”. 49 CALDWELL, Taylor, Apud. STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. 6. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 257. 50 STOCO, Rui. ob. cit. p.528. 51 Idem, p.529 52 Artigo 951 - C.C./2002: “O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplicam-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligencia, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”. 53 Artigo 948 - C.C./2002: “No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações: I – no pagamento das despesas com o tratamento da vítima, seu funeral e o luto da família; II – na prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vítima”.

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indenização oriunda em razão do atuar de agente por força do exercício da

atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, sempre que

sobreviver a morte do paciente ou outras enfermidades.56

A doutrina aponta algumas inquietações em relação ao art. 927-

parágrafo único-57 do novo Código Civil. Em um primeiro momento a frase

“independente de culpa” evidencia que o código civil resguarda em mais este

dispositivo a responsabilidade objetiva. E em um segundo momento não afirma

que a atividade mencionada seja qualquer uma e nem que o risco citado é

genérico.58

A atividade enquadrada no referido dispositivo legal não é qualquer

atividade devendo ser interpretada no sentido restrito de serviços. Tal definição

evidencia que a atividade mencionada não tem caráter de ação ou omissão,

palavras reservadas pelo legislador para o artigo 186 do novo Código Civil,

onde previu a responsabilidade civil subjetiva.

Conforme os ensinamentos do ilustre mestre Sergio Cavalieri: 59

Aqui não se leva em conta a conduta individual isolada,

mas sim a atividade como conduta reiterada habitualmente

exercida, organizada de forma profissional ou empresarial

para realizar fins econômicos.

A atividade médica por ser uma prestação de serviços considerada de

risco passou a ser comandada pela responsabilidade objetiva, respondendo o

esculápio (palavra de origem grega referente á atividade médica, oriunda de

54 Artigo 949 - C.C./2002: “No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido”. 55 Artigo 950 - C.C./2002: “Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu”. 56COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Instituições de direito médico. 1. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 8. 57Artigo 927 C.C./2002: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos específicos em Lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para os direitos de outrem”. 58COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. ob. cit. p. 8. 59CAVALIERI, Sergio Filho, Apud. COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. ob. cit. p. 9.

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um juramento feito por Hipócrates) independentemente de culpa. Cumpre

destacar que tal raciocínio conflita com o Código de Defesa do Consumidor,

que ressalta a responsabilidade médica como subjetiva.

Em relação ao risco, afirma-se que “todo o risco que existe na

prestação do serviço médico, clínico ou cirúrgico, não é, efetivamente, criado

pelo esculápio e, portanto trata-se de risco inerente à própria atividade

desempenhada, que foge, por conseguinte, ao domínio daquele que a

desempenha”.60

Mas se o médico no exercício de sua atividade for displicente, não se

valendo da boa técnica, ocasionando uma má prestação do serviço estaremos

diante de um resultado criado pelo prestador de serviço, e não de um risco,

ficando este na obrigação de indenizar pelos danos daí originados. 61

A responsabilidade civil surge quando o exercício da atividade

perigosa causa dano a outrem. O dever jurídico que se contrapõe ao risco é o

dever de segurança. Não haverá o dever de indenização, desde que o médico

e/ou o estabelecimento de saúde preste o serviço com a devida observância da

segurança, e ainda resulte uma consequência indesejável inerente ao risco da

atividade.62

Por todo exposto não há de se falar em responsabilidade objetiva do

médico, sendo essa atividade regida pelo art. 18663 do novo Código Civil, além

do art. 95164 do mesmo diploma.

2.2-Responsabilidade Objetiva e Responsabilidade Subjetiva

O novo Código Civil brasileiro, em seus arts. 186 e 951, não se afastou

da teoria subjetiva, a exemplo do Código revogado, em seus arts. 159 e 1545.

60 Idem, p. 11. 61COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Instituições de direito médico. 1. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004. p.11. 62Idem, p.12. 63Artigo 186 – C.C./2002: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. 64Artigo 951 - C.C./2002: “O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplicam-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligencia, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”.

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A responsabilidade do profissional de medicina continua a repousar no estatuto

da culpa – cabendo a vítima provar o dolo ou culpa stricto sensu do agente,

para obter a reparação do dano.65

A responsabilidade subjetiva, também conhecida como teoria da culpa,

está estabelecida como regra em nosso Código Civil, conforme nos ensina Rui

Stoco66: “O Direito Civil brasileiro estabelece que o princípio geral da

responsabilidade civil, em direito privado, repousa na culpa”.

Em hipóteses específicas o nosso direito positivo admite, alguns casos

de responsabilidade objetiva, ou responsabilidade sem culpa, pois a prova

muitas vezes torna-se difícil, aplicando neste caso o art. 951 do Código Civil.

Silvio Rodrigues afirma que67:

Acerca dos conceitos de responsabilidade subjetiva

(fulcrada na culpa), e objetivo (que a desconsidera), que a

rigor, não se podem vislumbrar espécies diferentes de

responsabilidade, mas sim maneiras diferentes de encarar a

obrigação de reparar o dano. Assim subjetiva é a

responsabilidade inspirada na idéia de culpa, e objetiva,

quando esteada na teoria do risco.

Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa

do agente para que seja obrigado a reparar o dano, ou a culpa é presumida

pela lei ou simplesmente se dispensa sua comprovação. Sendo a culpa

presumida inverte-se o ônus da prova, em benefício da vítima. 68

Sobre responsabilidade objetiva Rui Stoco69 nos ensina:

A doutrina objetiva, ao invés de exigir que a

responsabilidade civil seja resultante dos elementos

65 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 60. 66 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação jurisprudencial. 4.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p.79. 67 RODRIGUES, Silvio, Apud. KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5.ed., São Paulo: RT, 2003. p.61. 68 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 61-62. 69 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação jurisprudencial. 4.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p.78.

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tradicionais (culpa, dano, vínculo de causalidade entre uma e

outro), assenta-se na equação binária cujos pólos são o dano

e a autoria do evento danoso. Sem cogitar da imputabilidade

ou investigar a antijuridicidade do fato danoso, o que importa

para assegurar o ressarcimento é a verificação se ocorreu o

evento e se dele emanou o prejuízo. Em tal ocorrendo o autor

do fato causador é o responsável.

Em síntese responsabilidade objetiva é presumida, e nela, não se

cogita de culpa, por isso transfere-se ao causador do dano o ônus de provar

culpa exclusiva da vítima ou caso fortuito, circunstâncias que arredam o nexo

de causalidade, visando a eximir-se de obrigação de indenizar. 70

2.3- O Dano Material e o Dano Moral

Além do elemento culpa, é necessário que haja dano (elemento

nuclear da responsabilidade civil, decorrente da inobservância de uma norma),

sem este não existe prejuízo ressarcível e nexo de causalidade (toda condição

que tenha contribuído para o resultado) entre a conduta culposa do profissional

e o dano sofrido pela vítima, cabendo, em regra, a esta provar a existência

desses pressupostos. Conseqüentemente, o caso fortuito, a força maior e a

culpa exclusiva da vítima ou de terceiro excluem a responsabilidade do médico,

pois rompem o nexo causal.71

É o caso destacado por Kfouri Neto72:

O obstetra que atende no hospital gestante preste a dar

à luz, e lhe dá alta, agindo negligentemente. Em seguida a

mulher procura outro médico que a interna e realiza o parto,

porém a criança falece. Houve culpa na atuação do primeiro

médico, entretanto não existiu relação de causalidade entre a

conduta deste e o êxito letal.

70 KFOURI NETO, Miguel. ob. cit. p. 62. 71KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 87. 72 Idem, p. 93.

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Os danos decorrentes de erro médico podem ser materiais, que são,

em maioria, conseqüência de danos físicos (prejuízo corporal) ou morais, que

incluem os danos estéticos.73

Rui Stocco, ao discorrer sobre o dano74:

Dispôs a impossibilidade de haver responsabilidade sem

existência de dano efetivo, visto que o nosso código civil, em

seus artigos 40275 e 40376, condiciona o dever de indenizar à

existência do dano.

Sérgio Cavalieri Filho complementa dizendo77:

O ato ilícito nunca será aquilo que os penalistas chamam

de crime de mera conduta; será sempre um delito material,

com resultado de dano. Sem dano pode haver

responsabilidade penal, mas não há responsabilidade civil.

Os danos materiais, quanto aos lucros cessantes, se refere àquilo que

o paciente deixou de auferir na sua atividade durante todo o período de

inatividade causado pela conduta culposa do médico.78

O dano moral se caracteriza pela dor, tristeza, sofrimento, vexame e

humilhação sofridos pela vítima em razão de investidas de outrem. São casos

de dano moral decorrente de erro médico: a lesão estética; o mal-estar gerado

por distúrbios em alguma função como, por exemplo, a sexual; frustração na

carreira profissional, como por exemplo, o escultor que tem a mão amputada,

etc79.

73 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4.ed., São Paulo: Malheiros, 2003. p. 105. 74 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação jurisprudencial. 4.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p.653. 75 Artigo 402 - C.C./2002: “Salvo as exceções expressamente previstas em Lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar” . 76 Artigo 403 - C.C./2002: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na Lei processual”. 77 CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p. 89. 78 Idem, p. 106. 79 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4.ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p.106.

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É exatamente no dano ou em sua caracterização que se busca o

elemento indispensável e essencial do dever de indenizar do agente causador

da lesão. Sendo que, sem a verificação do dano não haverá o que indenizar.80

O dano estético se configura quando a vítima sofre ofensa corpórea

que lhe deixa aleijão ou deformidade permanente. O dano deve ser

permanente e imutável, pois, caso contrário, caberia a restauração “ad

integrum” da aparência do lesado. Ocorrerá dano estético indenizável quando

do erro médico resultar, não apenas o aleijão, mas também cicatriz, paralisia,

e outras deformidades ou deformações.81

80 SILVA PEREIRA, Caio Mário. Responsabilidade Civil. 9.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998, p.38-39. 81 CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit., p.107-109.

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CAPITULO III

A CULPA MÉDICA

3.1- A culpa stricto sensu

As condutas culposas, omissivas ou comissivas, causadoras de dano

ou prejuízo à terceiro, em que devem estar presentes as características de

negligência, imperícia ou imprudência, quando praticada pelo médico, provoca

o erro médico. Trata-se da conduta profissional inabilmente exercida, a

ausência das cautelas técnicas usualmente empregadas no procedimento

médico, à falta de observância de zelo e capacidade profissional, o

desconhecimento da técnica necessária, e existente, para a obtenção da cura,

que ocasiona um resultado danoso ao paciente e gera a responsabilidade

médica.82

Sendo assim, ocorrerá erro médico, e sua conseqüente

responsabilização, apenas quando o médico agir com culpa lato sensu. O

artigo 14, § 4º83 do Código de Defesa do Consumidor estabelece que a

responsabilidade dos profissionais liberais, inclusive os médicos, é subjetiva,

ou seja, para haver o dever de reparar o dano se faz mister à presença do

elemento culpa (imprudência, negligência e imperícia). Nosso Código Civil, em

seu artigo 95184, dispõe claramente que a responsabilidade do médico está

sujeita, da mesma forma, à responsabilidade subjetiva.85

Para prevenção da culpa o médico deverá primeiramente ser explicito

com o paciente. A culpa será efetivamente comprovada se o médico não agir

com clareza e informação para com o paciente, sendo comprovado seu pleno

entendimento da gravidade do problema, bem como a evolução da doença em

que encontrasse o referido paciente. A informação retratará para a prevenção à

82 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5.ed., São Paulo: RT, 2003. p.79-90. 83Artigo 14, do CDC: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, como informações suficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. § 4º- A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. 84Artigo 951- C.C./2002: “O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplicam-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligencia, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho”. 85 KFOURI NETO, Miguel. ob. cit. p. 91.

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culpa, as alternativas e o tratamento quando existirem, e os riscos confrontados

com os benefícios que cada alternativa pode oferecer86.

3.1.1. Negligência

É uma conduta omissiva em relação à esperada e recomendada. O

médico que deixa de realizar o necessário e preventivo cuidado para proceder

a uma cirurgia, conseqüentemente em razão de tal omissão de dever de

cautela, causará um mal ao paciente agindo desta forma negligentemente87.

Negligente é o profissional que age com desatenção, inércia, descaso,

falta de cuidado capaz de gerar responsabilidade com culpa. É culpa omissiva,

onde não se cumpre um dever, um desempenho da conduta. São casos de

negligência o erro de diagnóstico provocado por exame superficial e

inadequado, falta de higiene, esquecimento de compressas ou instrumentos

em operações cirúrgicas etc. Cabe frisar que, em relação a lesões originadas

de erro de diagnóstico, só será imputada responsabilidade ao médico que tiver

cometido erro inescusável ou grosseiro. Haverá erro escusável sempre que o

profissional, empregando correta e oportunamente os conhecimentos e regras

da sua ciência, chegar a uma conclusão falsa, embora possa ocorrer como

corolário um dano.88

3.1.2. Imprudência

É caracterizada pela conduta comissiva, com a falta do devido em

determinada ação, a realização de um ato sem a devida previdência89.

Imprudência consiste na ação precipitada, intempestiva, desponderada

e irrefletida na qual não procura o profissional evitar um resultado previsível. É

culpa comissiva, onde o médico enfrenta, desnecessariamente, um perigo. Age

com imprudência o cirurgião que não espera pelo anestesista, aplicando ele 86 MORAES, Irany Novah. Erro médico e a justiça. 5.ed., São Paulo: RT, 2002. p. 575-576. 87 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil Médica e Hospitalar. 1.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 29. 88 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5.ed., São Paulo: RT, 2003. p.92. 89 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. ob. cit. p. 29.

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mesmo a anestesia e ocasionando, assim a morte do paciente. Igualmente

imprudente é o esculápio que realiza em duas horas intervenção cirúrgica que,

normalmente, demoraria cinco horas ou o médico que resolve aplicar técnica

cirúrgica perigosa, sem eficácia comprovada, ao invés do processo habitual.90

3.1.3. Imperícia

É a inexistência da competente analise e da observação das normas

existentes para o desempenha da atividade. Nada mais é que o despreparo

profissional, falta de habilidade e desconhecimento técnico da profissão91.

Imperícia, que é a falta de habilidade, ignorância, falta de

conhecimento ou técnica profissional, inexperiência, revelando-se na realização

de serviço que venha a causar dano por falta de conhecimento acerca da arte,

profissão ou encargo. È imperito o obstetra que, na operação cesariana, corta a

bexiga da parturiente ou que, ao manusear o fórceps, causou traumatismo

crânio-encefálico, causando a morte do neonato. Outrossim, age com imperícia

o profissional que emprega meios de tratamentos ultrapassados. 92

3.2- Relação de causalidade

Elemento indispensável em quaisquer tipos de responsabilidade

civil, inclusive na responsabilidade objetiva que dispensa a culpa, o nexo

causal é o liame que une a conduta do agente ao dano, é um elemento

referencial entre a conduta e o resultado. È através dele que se pode concluir

quem foi o causador do dano. Para haver a responsabilidade do agente se faz

necessária a demonstração de que o resultado lesivo adveio da atuação do

lesante (ação ou omissão voluntária).93

Não é suficiente, para que seja exigível a responsabilidade civil, que o

demandante tenha sofrido um prejuízo nem que o demandado tenha agido com

90 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5.ed., São Paulo: RT, 2003. p. 95. 91 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade civil Médica e Hospitalar. 1.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 29. 92KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. ob. cit. p. 97. 93Idem, p.110.

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culpa. Deve reunir-se um terceiro e último requisito, a existência de um vínculo

de causa e efeito entre a culpa e o dano; é necessário que o dano sofrido seja

a conseqüência da conduta culposa cometida.94

Para ilustríssimo Sérgio Cavalieri Filho95:

A solução do caso concreto sempre exige do julgador

alta dose de bom senso prático e da justa ralação das coisas;

em suma, é imprescindível um juízo de adequação a ser

realizado com base na lógica do razoável.

A verificação do nexo de causalidade não oferece problemas quando o

resultado advém de um fato simples, porém quando decorre de vários fatos,

havendo uma série de condições (causalidade múltipla), o problema torna-se

um pouco complexo. Surgiram, então, diversas teorias para resolver a questão,

mas nosso código adotou, segundo a melhor doutrina, a teoria da causalidade

adequada.96

Adverte Miguel Kfouri Neto97:

O laço causal deve ser demonstrado às claras, atando as

duas pontas que conduzam à responsabilidade. Se a vítima

sofre o dano, mas não se evidencia o liame de causalidade

com o comportamento do réu, improcedente será o pleito.

É a teoria acolhida pelo direito civil brasileiro. “Só há uma relação de

causalidade adequada entre fato e o dano quando o ato ilícito praticado pelo

agente seja molde a provocar o dano sofrido pela vítima”.98

Seguindo as orientações das lições cediças do Caio Mario Pereira da

Silva99:

94Ibidem, p.110. 95CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.72. 96KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p.111. 97Idem, p.111. 98 CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p.68.

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O problema da relação de causalidade é uma questão

cientifica de probabilidade. Praticamente, em toda

indenização, o juiz tem de eliminar fatos relevantes, que

possam figurar entre os antecedentes do dano.

Para essa teoria, causa é o antecedente não só necessário, mas,

também, adequado à produção do resultado. Sendo assim, só será causa

aquela condição que for a mais apropriada a produzir o efeito. Essa teoria

recebe inúmeras críticas, pois nem sempre se faz satisfatória nos casos

concretos.100

A doutrina defende não ser proveitoso enunciar uma regra absoluta e

diz que deve caber ao julgador examinar cada caso.

Para Kfouri Neto101:

Em caso de concorrerem várias causas, para apreciar a

relação de causalidade tem-se que levar em conta que causa

é a eficiente ou decisiva, que, por suas circunstâncias,

determina o dano. Esse aspecto depende, essencialmente, de

avaliação de cada caso concreto.

Necessário se faz falarmos sobre as causas que rompem o nexo

causal, excluindo, em corolário, a responsabilidade. Excluem o nexo causal a

culpa exclusiva da vítima, pois o agente é mero instrumento do acidente; o fato

de terceiro, pois não há relação de causalidade entre a conduta do agente

aparente e o dano, sendo o ato de uma terceira pessoa a causa exclusiva do

evento; caso fortuito e força maior, pois nas condições em que ocorreu, o fato

era imprevisível ou inevitável.102

99 SILVA PEREIRA, Caio Mario. Responsabilidade Civil. 9.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1998. p.79. 100KFOURI NETO, Miguel. ob. cit. p.111. 101KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 112. 102 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 46.

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33

Também excluem a responsabilidade, apesar de não excluírem o nexo

de causalidade, o estado de necessidade, a legítima defesa e o exercício

regular do direito, pois constituem justificativa de conduta.103

3.3- A culpa civil e a culpa penal

Em casos de ilícito penal, o agente infringe uma norma penal, de

Direito Público. Já nos casos de ilícito civil, a norma violada é de Direito

Privado. Mas, por mais que buscassem os autores não encontravam uma

diferença substancial entre o ilícito civil e o penal, sendo ambos uma violação

de um dever jurídico, infração da lei.104

Quando uma mesma conduta constitui crime e ato ilícito passível de

indenização, podem ocorrer, ao mesmo tempo, a persecução penal e a ação

de ressarcimento. Crimes como o homicídio e o estelionato trazem

freqüentemente repercussões nessas duas esferas do Direito, no âmbito penal

o Estado e o seu direito de punir e no civil o interesse da vítima em ser

ressarcida.105

A conduta do médico, sendo esta, ativa ou passiva, por ação ou

omissão, quando danosa pode gerar responsabilidade civil ou penal, ou até

mesmo ambas.106

As condutas humanas mais graves, que atingem bens sociais de maior

relevância, são sancionadas pela lei penal, ficando a lei civil à repressão das

condutas menos graves, embora com interesse social, não afetando, a

princípio a segurança pública. O conceito de ato ilícito é um conceito aberto no

campo civil, exposto ao exame do caso concreto e às noções referidas do

dano, imputabilidade, culpa e nexo causal, as quais, também, fazem parte do

ilícito penal.107

103 Idem, p. 52. 104 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.36. 105 VENOSA, Silvio de Salvo. ob. cit. p.161. 106 KFOURI NETO, Miguel. ob. cit. p. 103. 107 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004. p.24.

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O Código Civil Brasileiro adotou, em seu artigo 935108, a

independência entre a responsabilidade civil e a criminal, porém podemos

verificar algumas exceções a esta regra, no referido artigo em sua parte final,

que nos ensina em sua parte final que não se poderá questionar mais sobre a

existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se

acharem decididas no juízo criminal. Sendo assim, se o réu for condenado no

juízo criminal, não poderá negar a culpa no juízo cível, ficando responsável, se

for do interesse da vítima, pela reparação cível. Esta situação é ratificada pelos

artigos 63109 do Código de Processo Penal e 91110, I do Código Penal. Ao réu

que for condenado na esfera criminal caberá apenas discutir o valor da

indenização devida.111

Sílvio Venosa destaca que112 :

Foi adotada por nosso ordenamento a independência

das jurisdições, porém com mitigação. O autor acrescenta que

a jurisdição, como função decorrente da soberania, é uma só.

Ela é una e indivisível, ocorrendo à distinção entre penal e

civil apenas por facilidade de organização.

108 Artigo 935 - C.C./2002: “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas do juízo criminal”. 109 Artigo 63 - C.P.P.: “ Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros”. 110 Artigo 91 - C.P.: “ São efeitos da condenação: I – tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime”. 111VENOSA, Silvio de Salvo. ob. cit.p.162. 112Idem, p.162.

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CAPÍTULO IV

OBRIGAÇÕES E A NATUREZA CONTRATUAL

4.1. Conceito de obrigações

A obrigação é uma relação jurídica que nasce de um impulso, fazendo

com que alguém se comprometa a fazer algo em prol de outrem, recebendo na

maioria das vezes algo em troca. O estímulo e a limitação psíquica é que

traçarão o perfil do homem equilibrado, pois se agravando um ou outro

elemento, socialmente falando, o indivíduo desestrutura-se, e

conseqüentemente seu patrimônio. A noção essencial de obrigação nasce do

equilíbrio entre o estímulo (o que impulsiona a obter algo) e a limitação

psíquica (o fato de se despender de algo, ou certa quantia, em favor de

determinada obtenção). 113

Clóvis Beviláqua definiu obrigações como114:

A relação transitória de direito, que nos constrange a dar,

fazer, ou não fazer alguma coisa economicamente apreciável,

em proveito de alguém que, por ato nosso, ou de alguém

conosco juridicamente relacionado, ou em virtude de lei,

adquiriu o direito de exigir de nós essa ação ou omissão.

Note-se, entretanto, que o renomado jurisconsulto não mencionou a

questão da responsabilidade do devedor inadimplente, sendo que esta mantém

estreita relação com as obrigações.

Tanto isto é verdade que Sérgio Cavalieri Filho faz a distinção entre

obrigação e responsabilidade115:

113 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 4.ed., São Paulo: Atlas, 2004. p.22. 114BEVILÁQUA, Clóvis. Apud. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 4.ed., São Paulo: Atlas, 2004. p. 24. 115CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.24.

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A obrigação – seja ela proveniente de lei, de atos

jurídicos stricto sensu ou de negócios jurídicos bilaterais ou

unilaterais é sempre um dever jurídico originário e a

responsabilidade um dever jurídico sucessivo, conseqüente à

violação do primeiro, ou seja, da obrigação, ou melhor, de seu

descumprimento, decorre a responsabilidade. Por dever

jurídico entende-se como conduta externa imposta pelo Direito

Positivo por exigência da convivência social. Assim como não

há sombra sem corpo físico, também não há responsabilidade

sem a correspondente obrigação.

A distinção entre obrigação e responsabilidade está prevista no Livro I

da Parte Especial do nosso Código Civil, em seu artigo 389116, e categoriza o

dever de indenizar como uma obrigação, em seu artigo 927117 e parágrafo

único118.

Existem muitas outras definições para as obrigações, mas entendemos

ser a melhor e mais completa a de Washington de Barros Monteiro119 segundo

o qual:

Obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório,

estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste

numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa,

devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o

adimplemento através de seu patrimônio.

116 Artigo 389 – C.C./2002: “Não cumprida a obrigação (obrigação originária), responde o devedor por perdas e danos (obrigação sucessiva - ou seja, a responsabilidade), mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. 117 Artigo 927 – C.C./2002: “Aquele que, por ato ilícito (arts.186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em Lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. 118CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.24. 119MONTEIRO,Washington de Barros,Apud. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos. 4.ed., São Paulo: Atlas, 2004. p.25.

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5.1.1. Obrigações de meio e de resultado

Em alguns casos o devedor se compromete apenas a se esforçar para

alcançar um determinado resultado, sem, contudo se vincular a obtenção

deste, como é o caso do contrato de prestação de serviços médicos, na maioria

dos casos, e advocatícios. O profissional assume o compromisso de prestar um

serviço ao qual dedicará atenção, cuidado e diligência exigidos pelas

circunstâncias, de acordo com o seu título, com os recursos de que dispõe e

com o desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção

de um certo resultado. Podemos citar, por exemplo, o caso do médico que se

obriga a aplicar seus melhores esforços e usar de todos os meios

indispensáveis á obtenção de cura, que, neste caso é o resultado, sem, porém

assegurar esta cura. 120

É a chamada obrigação de meio, onde o devedor (médico) deve se

utilizar da técnica própria de sua função, através de meios técnicos

apropriados, naquele momento, para o procedimento pelo qual se

comprometeu. Deve-se neste sentido atingir um resultado, sem, se vincular a

obtê-lo.121

Entretanto, há situações em que o devedor obriga-se a alcançar um

determinado fim, cuja não obtenção importa em descumprimento do contrato.

Não basta para ser cumprida a obrigação que o devedor haja com zelo, esforço

e técnica, se fazendo absolutamente necessária a obtenção do resultado122. É

o caso do contrato de transporte, por exemplo, no qual se o bem transportado

não chegar incólume ao destino previsto, há inadimplemento do transportador,

devendo este reparar os prejuízos do destinatário123.

Nestes casos destaca-se a obrigação de resultado, onde este é o

objeto do contrato, o que não ocorre na obrigação de meio, por isso seu

adimplemento só ocorrerá se o resultado for o esperado.124

120 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p.163. 121 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.175. 122 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p.164. 123 CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p.175. 124 Idem, p.164.

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Vale destacar, que a responsabilidade civil objetiva só se configura

quando a natureza do contrato firmado gerar ao devedor uma obrigação de

resultado, e não apenas de meio. 125

Na obrigação de meio, o ônus da prova cabe ao credor que deve

provar que o obrigado agiu com ausência total do comportamento exigido ou

que teve uma conduta pouco diligente, prudente e leal. Ou seja, o credor deve

provar que o devedor agiu com dolo, imprudência, imperícia ou negligência,

caso contrário, o obrigado irá eximir-se da responsabilidade. Ao contrário da

obrigação de resultado, que caberá ao médico provar que não agiu

culposamente, que o resultado previsto não foi alcançado devido a fatores

alheios a sua conduta, como o caso fortuito, a força maior, a culpa exclusiva da

vítima ou que agiu com todo o zelo e diligência necessários, pois apenas dessa

forma poderá se exonerar da responsabilidade de indenizar.126

Em relação à obrigação de meio não há divergências, porém a

questão não é pacífica em nossa doutrina quando se fala em obrigação de

resultado visto que alguns autores afirmam que o descumprimento de uma

obrigação de resultado geraria responsabilidade objetiva e outros igualam

culpa presumida a responsabilidade objetiva.

5.2- Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual

No passado, a responsabilidade dos médicos era colocada na esfera

extracontratual, porém, atualmente, nos parece ponto pacífico na doutrina que

essa responsabilidade é, em regra, contratual. Não se faz necessário o acordo

expresso de vontade para haver o contrato médico, bastando uma

manifestação tácita desta, ou seja, quando o médico atende a um paciente,

estabelece-se entre ambos um verdadeiro contrato, sendo a responsabilidade

médica de natureza contratual.127

Essa mudança de posicionamento foi vista por alguns juristas como

uma conquista do progresso científico. Trata-se de um contrato de prestação

125Ibidem, p.175. 126 KFOURI NETO, Miguel. ob. cit. p.164. 127DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1994. p.281-282.

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de serviços, sendo a prestação devida, da parte do médico, o serviço

correspondente à sua formação técnica, e, da parte do cliente, o pagamento

dos honorários correspondentes ao serviço prestado.128

O ilustre mestre Sérgio Cavalieri Filho, faz distinção entre a

responsabilidade contratual e a extracontratual129:

Se a transgressão se refere a um dever gerado em

negócio jurídico, há um ilícito contratual, por isso que mais

freqüentemente os deveres jurídicos têm como fonte os

contratos. Se a transgressão pertine a um dever jurídico

imposto pela lei, o ilícito é extracontratual, por isso que gerado

fora dos negócios jurídicos.

O Código Civil em seus artigos 389130 e 395131, afirma que o

inadimplente e o contratante fica sujeito ao dever de reparar as perdas e os

danos devidos ao credor, que abrangem, de acordo com o Código Civil,

art.402132, além do que se perdeu, o que se deixou de lucrar, sendo estes

dispositivos referentes aos danos exclusivamente patrimoniais da

responsabilidade contratual. Nos danos oriundos da atividade médica, o

médico responderá contratualmente pela má prática da medicina, ao agir

imprudentemente e provocar lesões no paciente, trata-se de um dano

patrimonial indireto, que consiste nos gastos com o tratamento e o lucro

cessante ao qual a vítima deixou de auferir durante o restabelecimento de sua

saúde.133

128KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 70. 129CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 5.ed., São Paulo: Malheiros, 2004. p.37. 130 Artigo 389 do C.C./2002: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. 131 Artigo 395 do C.C./2002: “Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. 132 Artigo 402 do C.C./2002: “Salvo as exceções expressamente previstas em Lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”. 133 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasiLeiro (abrangendo o Novo Código Civil e a Lei n.10406, de 10-1-2002). 16.ed.; v.7. Responsabilidade civil – São Paulo: Saraiva, 2003. p.125-127.

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Em se tratando de responsabilidade extracontratual, esta incidirá no

ressarcimento do dano à vida e a integridade corporal sofridos pela vítima.

Trata-se neste ponto do dano moral que não se confunde com a extensão do

prejuízo econômico, embora deva ser proporcional a ele.134

5.2.1. O erro médico

O erro médico nada mais é que a falha do médico no exercício da

profissão, o desvio maior ou menor, do objetivo a ser atingido.135A forma como

o médico age tecnicamente deve ser avaliada assim como o seu

relacionamento com o paciente.

Visto que, segundo o ilustre Irany Novah Moraes, médico e profissional

da área do direito136:

Um prognóstico com clareza é indispensável para que o

paciente tome ciência de que o médico tem o dever de cuidar

dele, e não necessariamente de curá-lo. Este ato é

imprescindível, pois o estado de tensão emocional que

determinada doença gera, torna a compreensão dos

problemas difícil, causando o inconformismo do paciente com

seu próprio destino.

Para a efetiva caracterização do erro além do elemento culpa, é

necessário que haja dano e nexo de causalidade entre a conduta culposa do

profissional e o dano sofrido pela vítima, cabendo, em regra, a esta provar a

existência desse pressuposto. Conseqüentemente, conforme analisamos, o

caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro excluem

a responsabilidade do médico, pois rompem o nexo causal.137

Responsabilidade médica é a obrigação inerente ao médico que, em

seu ofício, obrar com imprudência, imperícia, negligência ou dolo, causando

prejuízos a outrem.138 Os danos decorrentes de erro médico podem ser

134Idem, p.127-128. 135 MORAES, Irany Novah. Erro médico e a justiça. 5.ed., São Paulo: RT, 2002. p. 422. 136 Idem, p. 423. 137 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 52-58. 138 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 79-90.

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materiais, que são, em sua maioria, conseqüência de danos físicos (prejuízo

corporal) ou morais, que incluem os danos estéticos.139

O esclarecimento dos fatos e a análise às implicações legais

decorrentes do médico são de suma importância, pois o marketing contra a

imagem do médico torna-se gritante nos dias de hoje, organizado em base

cada vez mais sólida para implantação no Brasil, dos chamados “seguros pela

má prática”, à semelhança do que já existe nos Estados Unidos.140

Segundo Antonio Ferreira e Alex Pereira, especialistas em

responsabilidade civil141:

No caso do erro médico, cria-se muitas vezes, a falsa

impressão de que os órgãos da classe ou não julgam

adequadamente os erros ou os escondem, em atitude

corporativista. É bom lembrar que o médico, diferentemente do

cidadão leigo, quando comente erro (...) não é, pois,

acobertado nem julgado apenas pelos médicos, em suposta

atitude da “máfia de branco”; está sujeito a normatização, tanto

do Código Penal como do Código Civil.

Segundo Jurandir Sebastião, para o exercício da Medicina há a

seguinte unanimidade142:

O médico tem de agir com diligência e cuidado no

exercício de sua profissão, exigíveis de acordo com o estado

da ciência e as regras consagradas pela prática médica. E que

o médico deve esclarecer seu paciente sobre a sua doença,

prescrições a seguir, riscos possíveis, cuidados com seu

tratamento, aconselhando a ele e a seus familiares sobre as

precauções essenciais requeridas pelo seu estado.

139 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação jurisprudencial. 4.ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p.653. 140COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Instituições de direito médico. 1. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 25. 141Idem, p. 27 142 SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade Médica: civil, criminal e ética. 3.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 88.

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Segundo o ponto de vista de Santos Neto143:

Errar é um ato inerente à espécie humana e a prática

médica não é exceção. Esse tipo de erro é chamado não

intencional, acidente imprevisível ou “infelicitas facti”. Ele deve

ser diferenciado dos casos de imperícia, imprudência ou

negligência. Eventualmente, o limite entre imperícia e o erro

não intencional não é muito bem estabelecido. O erro não

intencional pode ocorrer durante o processo de elaboração

diagnóstica ou na fase terapêutica. A fase diagnóstica pode

ser didaticamente dividida em 3 etapas: obtenção da história

clínica, observação dos sinais do exame físico e análise dos

exames complementares. A fase diagnóstica tem sido

negligenciada na avaliação do tipo de erro não intencional.

No caso de erro médico poderão ocorrer três conseqüências: se o

médico adotar no exercício de sua profissão conduta vedada pela medicina,

aplicar-se-á punição administrativa. Já a reparação civil dependerá da vontade

da vítima, e versará tanto numa indenização material com numa imaterial,

mediante irregular processo judicial. Em contra partida a punição criminal

caberá se a conduta do médico em análise preencher alguma figura tipificada

como crime ou contravenção penal, sendo dispensável a vontade da vítima,

exceto quando a competência for do Juizado Especial Criminal.144

4.2.2. As transformações da relação médico-paciente

A relação médico-paciente está cada vez mais, longe se torna um

“diálogo entre a ciência e a consciência”.145

143 SANTOS NETO, L. Apud.. FRANÇA, Genival Veloso de; DRUMOND, José Geraldo de Freitas; GOMES, Julio César Meirelles. Erro médico. 4.ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. p.6. 144 SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade Médica: civil, criminal e ética. 3.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 89. 145COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Instituições de direito médico. 1. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 26.

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Irany Novah Moraes destaca em sua obra que146:

Admirar, gostar e até mesmo, amar é impulso emocional

que pode ocorrer entre as pessoas à primeira vista. A

continuidade do relacionamento dificilmente mantém aquele

sentimento, tal como o início. Raramente permanece o

mesmo, tudo dependendo do grau e natureza dos interesses

existentes entre os envolvidos. Os conflitos normalmente

ocorrem porque, para o ser humano a probabilidade de

prejudicá-lo é maior do que a de fortalecê-lo.

A referida relação a que se trata é contratual, tendo de um lado um

profissional que tem a possibilidade de tirar a dor e do outro lado, um leigo que

deseja livrar-se de um mal. Existe um anseio intrínseco de solução de ordem

psicológica e não simplesmente contratual. Para o paciente é difícil visualizar o

médico como um ser comum, limitado, normal como todo os seres humanos.147

Como já dito anteriormente a natureza jurídica dessa relação é

contratual, sendo extracontratual por exceção, quando o profissional atende o

paciente em estado grave e inconsciente. Em fim o objeto deste contrato é a

utilização de todos os meios necessários, recomendados para objetivar a cura

do paciente.

Independentemente de sexo, idade, ou grupo social, o paciente

vislumbra em seu médico uma pessoa que se presume ter aptidão para curá-lo,

minimizando sua angústia e sofrimento. Mas, mesmo diante da fragilidade que

se encontra o paciente, cumpre destacar que este também tem perante seu

médico obrigações e deveres inerentes da relação, tais como o de falar sempre

a verdade não ocultando informações, seguir as ordens médicas, etc. Assim,

da mesma forma que o médico deve cumprir com seus deveres técnicos e

éticos perante seu paciente, este também deverá cumprir com seus deveres

para o efetivo sucesso da relação.148

146 MORAES, Irany Novah. Erro médico e a justiça. 5.ed., São Paulo: RT, 2002. p. 401. 147COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. ob. cit. p. 28. 148 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade Civil Médica e Hospitalar. 1.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 35.

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Na relação médico-paciente, o paciente deverá ser claro, objetivo,

honesto, direto, nunca saindo do consultório com dúvidas, afinal está ali por

necessidade, não existindo nessa hora “perguntas idiotas, mas sim idiotas que

não fazem perguntas”.149

149 GAUDERER, Dr. Christian. Os direitos do pacientes. 1.ed., Rio de Janeiro: DP&A, 1998. p. 17-18.

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CAPITULO V

O CONSENTIMENTO INFORMADO NA ATIVIDADE

MÉDICA

5.1- Conceito

Consentimento é o comportamento mediante o qual se autoriza

alguém à determinada atuação. A obtenção deste representará o corolário do

“processo dialógico e de recíprocas informações”150 entre o médico e o

paciente – a fim de que o tratamento possa ter início.

A responsabilidade civil do médico pela não obtenção do

consentimento informado, só será caracterizada se for provada claramente a

relação entre a falta de informação e o prejuízo final. Assim o dano deve ser

conseqüência da informação falha ou inexistente, esta se liga àquele por nexo

de causalidade.151

De acordo com o ilustre mestre Jurandir Sebastião152:

Na relação médico-paciente ter o doente como aliado já

é meio caminho andado para o sucesso da terapia, quer

porque o tratamento será rigorosamente cumprido, quer

porque a confiança no profissional importará em fator positivo

a banir os eventuais componentes somáticos da doença.

O paciente deve ser informado pelo médico do diagnóstico,

prognóstico, riscos e objetivos do tratamento. Tendo o dever de aconselhar, o

médico deve prescrever cuidados que o enfermo deverá adotar. A

inobservância deste dever conduzirá à obrigação de indenizar e o ônus da

prova à obtenção do consentimento informado cabe ao médico. 153

150 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 37. 151 Idem, p. 38. 152 SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade Médica: civil, criminal e ética. 3.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 110. 153 KFOURI NETO, Miguel. ob. cit. p. 41.

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O ônus da prova recai sobre o médico, pois conhece todo o

procedimento, tendo mais facilidade de provar o ato. A comunicação ficará a

critério do médico desde que adote uma linguagem acessível e não técnica. O

médico deve fugir dos problemas lingüísticos que dificultam a compreensão do

leigo, saber da profissão deste para que o tratamento sugerido não o delimite,

considerando seus valores.154

Mais que um simples consentimento esclarecido, o médico carrega

consigo, permanentemente, o dever de aconselhamento ao paciente, quer se

trate de uma singela terapia, quer seja esta complexa e cuidadosa ou, ainda,

quando o caso recomende encaminhamento a especialista.155

Tal prova, preferentemente, deve ser escrita, revestir forma

documental: 156

Decisão da Corte de Cassação Francesa – mencionada pelo

Professor Galán - confirmou julgado da Corte da Apelação de

Rennes, para absolver ginecologista que aconselhou paciente

a realizar uma celioscopia (exame endoscópico da cavidade

abdominal depois de insuflada), mas no curso deste, depois

de insuflado ar na cavidade, sobreveio embolia gasosa, que

determinou a morte da paciente. O marido e filho da falecida

sustentaram, sem essência, a falta de informação sobre o

risco daquele exame. As Cortes entenderam que, por ser a

paciente técnica de laboratório naquele mesmo hospital onde

ocorrera a intervenção, e tendo mantido inúmeras

conversações com o médico, seria de se presumir estar

perfeitamente informada sobre os riscos inerentes do

procedimento.

As pessoas que não conseguem provar o erro médico invocam

ausência do consentimento informado. O médico não pode se comportar mais 154PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005. 155 SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade Médica: civil, criminal e ética. 3.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 111. 156 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 41.

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como um técnico, mas sim um comunicador. Em tempos mais remotos, na

época de Hipócrates, o princípio da beneficência bastava na relação médico-

paciente, mas hoje o principio máximo e indispensável da ética médica é a

chamada autonomia, conservando ainda o principio da beneficência e o

caminho da justiça.157

Vale destacar que o consentimento informado é dentre as diversas

formas de relacionamento médico-paciente o diálogo entre estes, por

intermédio do qual ambas as partes trocam perguntas e informações,

objetivando um acordo para um determinado e específico tratamento. Este

processo requer efetiva participação das partes, eliminando desta forma uma

atitude, muitas vezes, prepotente e arbitrária por parte do médico.158

5.2- Evolução do tema

Historicamente, a doutrina do consentimento recebeu fortes influências

norte-americanas, sendo considerado de origem jurídica. Trata-se de uma

sentença proferida pelo Juiz Benjamim Nathan Cardozo, em abril de 1914, no

caso conhecido como Schoendorff versus “Society of New York hospitals”. A

sentença judicial considera o paciente como indivíduo livre e autônomo para

tomar suas próprias decisões. Neste processo a paciente alega ter autorizado o

médico, apenas a realização de um exame invasivo, que tinha por objetivo

diagnosticar a existência de um tumor. Durante os exames, a paciente advertiu

o médico e a enfermeira, a qual se opunha a realização de cirurgia que tivesse

o intuito de extirpar o referido tumor. Entretanto, o médico resolveu, durante o

ato cirúrgico, extrair o tumor. Posteriormente, desenvolveu-se gangrena no

braço esquerdo da paciente, sendo necessário amputar alguns dedos e tendo

que suportar fortes dores e sofrimentos. Com isso tudo, a paciente resolveu

157 PEREIRA, André. ob. cit. 158 GIOSTRI, Hidelgard Taggesell. Responsabilidade médica, as obrigações de meio e de resultado: avaliação, uso e adequação. 1.ed., Curitiba: Editora Juará, 2001. p. 83.

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demandar contra o hospital. Este foi o primeiro caso de consentimento

informado que chegou a Suprema Corte Americana.159

Society of New York (1914): “Todo cidadão em idade adulta e com

capacidade mental normal, sabe o que fazer com seu próprio corpo, não é o

médico quem sabe o que é melhor para mim, cada um é que sabe o que é

melhor para si”. O consentimento informado pode ser observado sob duas

óticas: 160

1. Ótica paternalista – Lisboa 1973. Num tempo de total

paternalismo, o médico se enquadrava numa conduta antiquada e

ligeira, pois a sociedade ainda não tinha cidadãos “livres”,

efetivamente democráticos. O tribunal nesta época se adaptava a

essa mentalidade.

2. Ótica super autonomista – Paris 1999. Aqui não há uma visão

positivista (Lei geral e abstrata que se aplica a todos os casos), é

tudo muito vago, os médicos e advogados é quem irão fazer sua

própria jurisprudência. Estamos diante dos tempos o

jurisprudencialismo onde o direito é feito nos tribunais através da

argumentação, da tópica e da retórica, como já ensinavam os

grandes pensadores.

A nova relação médico-paciente sai do paternalismo clínico em busca

do princípio da autonomia. Durante séculos o médico não tinha meios técnicos

e farmacêuticos ao seu alcance, sua consulta era baseada única e

exclusivamente em conversações. A tecnologia vem evoluindo cada vez mais,

e hodiernamente o médico atende o paciente sem olhar sequer

nos seus olhos. Hiper especializado, com muita maquinaria, o profissional

quase nem aparece, pois muitas das vezes através de aparelhos e exames é

159 KFOURI NETO, Miguel. Culpa Médica e o Ônus da Prova. 1.ed., Sã Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 282. 160PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005.

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realizada a consulta, onde o computador é que prescreve a receita, tornando a

relação médico-paciente superficial.161

Na Itália o código de deontologia de 1955 contempla diversas regras

sobre consentimento informado. Na França já é clara a incidência de

responsabilidade do médico nos casos de tratamentos ministrados sem

consentimento livre e esclarecido do paciente, estando claramente expressa a

obrigação nos artigos 35 e 36 do novo código deontológico. Na Espanha, o

consentimento informado decorre da consagração constitucional do dever de

respeito à dignidade da pessoa humana e do direito à integridade humana. Em

Portugal, o consentimento informado como requisito para a prática do ato

médico, deriva da proteção aos direitos da personalidade: do direito à

integridade físico-psíquica e da liberdade de vontade (autodeterminação),

decorre do art.25 da Constituição da República Portuguesa, que protege o

direito a integridade e o desenvolvimento da personalidade. 162 Sendo o

consentimento um pré-requisito essencial de todo o tratamento ou internação

médica.163

Antes mesmo do Código de Defesa do Consumidor, em 1950, o

respeitado jurista José Aguiar Dias já chamava atenção para o dever do

médico de informar e obter o consentimento informado do paciente para uma

cirurgia, principalmente aquela que apresentava riscos.164

No Brasil, a literatura dispõe tanto sobre o consentimento na prática

clínica, quanto na pesquisa envolvendo seres humanos. O consentimento livre

e esclarecido é a autorização do indivíduo inserido na pesquisa, sendo uma

ferramenta obrigatória para efetivação do processo.165Na antropologia médica,

aos experimentos com indivíduos sadios, aplica-se o princípio da solidariedade

161 PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005. 162 KFOURI NETO, Miguel. Culpa Médica e o Ônus da Prova. 1.ed., Sã Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 284-287. 163 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 38. 164DIAS, José Aguiar. Apud. MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro/ 2004. p.25. 165 KFOURI NETO, Miguel. Culpa Médica e o Ônus da Prova. 1.ed., Sã Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 290.

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social e torna-se lícita a experimentação quando voluntária, o consentimento

deve ser absolutamente livre e esclarecido, sem constrangimento.166

A informação, o consentimento informado e a responsabilidade

solidária entre os hospitais e os médicos é um assunto que deve ser analisado

para que se torne mais tranqüila à relação médico – paciente.

De acordo com os ensinamentos de Michael Kloepfer:

Informação é tema transversal e multifacetado do direito

privado. Informação é, ao mesmo tempo, um estado subjetivo,

é o saber ou não saber, informação é um conteúdo, são os

dados, saberes, conhecimento, imagens, sons, formas,

palavras, símbolos ou informações organizadas, e - acima de

tudo – informação é um direito.167

Numa relação entre leigos e especialistas, pacientes e médicos, o

último detém a informação, sabe algo, e pode comunicar este algo para outro,

alertando sobre os riscos, os efeitos colaterais, a dor, as chances de morte ou

aleijão, ou não informar, não compartilhar a informação que detém.168

Cumpre destacar, as lições do mestre Aguiar Dias:169

A responsabilidade do médico é contratual e deve ser

cumprida de acordo com a boa-fé (...). O médico é ao mesmo

tempo em que conselheiro, protetor e guarda do enfermo que

lhe reclama cuidados profissionais. A soma excepcional dos

poderes do médico corresponde à característica limitação das

faculdades do cliente, que é, por definição, um fraco. (...).

166 ARAÚJO, Laís Záu Serpa de. FRANÇA, Beatriz Sottile. ARAÚJO, Carolina Záu Serpa de. Contribuição da antropologia médica na obtenção do consentimento informado. Revista Brasileira de Direito Médico, Alagoas, ano 1, nº 2, 2003. Disponível em: <http://www.revistadedireitomedico.com.br>. Acesso em: 10 fev. 2004. 167KLOEPFER, Michael. Apud. MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro/ 2004. p.21. 168DIAS, José Aguiar. Apud. MARQUES, Claudia Lima. ob. cit. p. 21. 169MARQUES, Claudia Lima. ob. cit. p. 22.

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A informação médica, clara e adequada é um dever de cuidado

imprescindível com o outro parceiro contratual (paciente) tornando a atuação

do profissional (médico) prudente.170

O dever de informar e a responsabilidade por falta de consentimento

informado estão totalmente interligados. A informação é advinda da boa-fé,

extremamente valorizada pela complexa sociedade de riscos. A boa-fé é um

principio de personalização da relação contratual, uma atuação pensando no

outro, no parceiro contratual, respeitando suas expectativas razoáveis, agindo

com lealdade, sem causar obstrução, informando, cuidando, sem causar lesão

ou desvantagem excessiva, cooperando para o bom fim das obrigações: “o

cumprimento do objeto contratual e a realização dos interesses das partes”.

Este dever encontra-se, entre outros, no Código de Defesa do Consumidor em

seus artigos 6º, III171, 8º, 10, 12, 14, 18, 20, 30, 31, 33, 34, 35, 46, 51, 52 e

54.172

A Boa-fé prevista no art. 187173 do Código Civil é objetiva e normativa,

assim entendida como uma conduta adequada, legal, correta e honesta que as

pessoas e os profissionais devem adotar em todas as relações sociais. O

Direito romano cultuava a deusa Fides na celebração dos negócios, em seus

primórdios. A referida palavra deu origem à fidelidade, cujo sentido era

extremamente ético. O termo Fides foi acrescido do substantivo bona, para

designar o comportamento que se espera da parte.174

Tal princípio encontra a sua razão de ser nos ditames constitucionais,

mantendo a ordem econômica e equilibrando as relações contratuais.

Baseando-se neste princípio, o médico desvia-se da linha traçada previamente

para a realização de um tratamento e elege uma conduta de prioridade para

170Idem, p. 22. 171III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”; 172 MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro/ 2004. p.23. 173 Artigo 187 – C.C./2002: “ Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. 174 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 4.ed., São Paulo: Malheiros, 2003. p.168.

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salvar o paciente. Um resultado insatisfatório ou até mesmo uma eventual

seqüela em caso fortuito, não fere absolutamente o princípio da Boa-fé.175

As funções da Boa-fé objetiva estão inseridas no novo Código Civil,

em seu art. 113176, no que se refere à interpretação dos negócios jurídicos, em

seu art. 422177 na fonte de deveres instrumentais ou secundárias dos contratos,

e em seu art. 187 que se refere ao limite do exercício dos direitos subjetivos

representando a Boa-fé, o padrão ético de confiança e lealdade indispensável

para convivência social.178

Na fase pré-contratual prevista no artigo 6º, II179, do Código de Defesa

do Consumidor, as informações são imprescindíveis para a decisão do

consumidor (qualidade, garantias, riscos, carências, exclusões de

responsabilidades, etc), não deve haver indução ao erro, ou seja, uma falha ou

dolo na informação por parte do fornecedor ou promessas vazias, pois as

informações prestadas passam a ter um valor jurídico relevante, e integram a

relação contratual.180

O consumidor deve conhecer o conteúdo do contrato, direito previsto

no artigo 46181 do Código de Defesa do Consumidor, para que possa entender

a extensão das obrigações que assume e no que cabe as obrigações da

prestadora de serviços, destacando-se assim a importância da clareza das

175 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade Civil Médica e Hospitalar. 1.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 61. 176 Artigo 113 – C.C./2002: “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. 177 Artigo 422 – C.C./2002: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”. 178CAVALIERI FILHO, Sérgio. ob. cit. p.168. 179Artigo 6º, do CDC: “ São direitos básicos do consumidor: II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, assegurados a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; 180 MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais. São Paulo, ano 93, v. 827, setembro/ 2004. p.23. 181Artigo 46, do C.D.C. - “Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”.

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cláusulas contratuais previstas no artigo 54182 do Código de Defesa do

Consumidor.183

Os artigos 10184, 14185, caput, e 31186 do Código de Defesa do

Consumidor destacam o dever de informar ao consumidor clara e lealmente

sobre os riscos existentes no serviço da área de saúde, que envolvem a saúde

deste. Resguardado pelo artigo 4º187, caput e III, o consumidor tem o direito à

informação sobre os riscos no serviço, o acesso a informações médicas,

básicas, clara, e objetiva sobre o tratamento proposto, para que desta forma

possa escolher se fará o serviço como especificam os inciso I, II e III do artigo

6º188 do Código de Defesa do Consumidor.189

Os riscos freqüentes devem ser desde logo informados, a

circunstância dos riscos improváveis, os quais só se realizam

excepcionalmente, não dispensa o médico de sua obrigação de informar. Além

da lei, a jurisprudência é imprescindível para analisar o assunto, pois não há

182 Artigo 54, do C.D.C. - “Contrato de adesão aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”. 183 MARQUES, Claudia Lima. ob. cit. p. 23. 184 Artigo 10, do C.D.C. - “O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança”. 185 Artigo 14, do C.D.C. - “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, como informações suficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. 186 Artigo 31, do C.D.C. - “A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidade, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”. 187 Artigo 4º, do C.D.C. - “A Polícia Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios”: III – harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art.170 da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores”; 188 Artigo 6º, do C.D.C.: “São direitos básicos do consumidor: I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento dos produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos”; II – a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, assegurados a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem” ; 189NORONHA, Fernando. Apud. MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004, p. 24.

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previsão dos riscos gravíssimos e pouco freqüentes, fazendo-se necessária à

análise de jurisprudências.190

O paciente é um leigo e para chegar a um consentimento livre e

esclarecido, voluntariamente necessita da informação do médico, que segundo

Fernando Noronha divide-se em: “deveres de esclarecimento, de conselho e de

advertência”.191

O paciente recebendo uma informação clara e objetiva fica esclarecido

dos riscos do tratamento.

A urgência deste é que vai servir de base para a necessidade do

consentimento informado. Quanto mais urgente é intervenção menos exigente

devemos ser em matéria de esclarecimento, mas mesmo neste caso logo que

possível, deve-se esclarecer o paciente. Quanto menos necessário o

tratamento mais rigorosa deve ser a informação.192 Em matéria de direitos

médicos e cirúrgicos de natureza estética, há obrigação de informação não

apenas dos riscos graves da internação, mas também todos os inconvenientes

que possam resultar. Conforme palavras cedidas por Néri Tadeu Câmara:193

Quando se tratar de cirurgia estética, a existência, no

tocante às informações que devam ser dadas ao paciente,

inclui que deva ser informado, principalmente dos riscos mais

raros do procedimento ao qual vai ser submetido.

Numa intervenção cirúrgica estética a informação sobre os riscos é

imprescindível para manter a liberdade e o esclarecimento do leigo, numa boa-

fé in contrahendo. Assim ensinam a doutrina e a jurisprudência:194

190PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005. 191 MARQUES, Claudia Lima. ob. cit. p. 24. 192 PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005. 193 SOUZA, Neri Tadeu Câmara. Responsabilidade Civil e Penal do Médico. 1.ed., Campinas: LZN, 2003. p. 68. 194MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004, p. 24.

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Responsabilidade civil do médico. Cirurgia estética. Dever de

informação. Processual civil. Arbitramento de honorários em

ação cautelar. Constitui dever básico do cirurgião plástico a

ampla informação da paciente sobre os riscos da cirurgia,

especialmente os mais prováveis, como a formação de

quelóides ou cicatrizes anestésicas. Cabe ao esculápio fazer a

prova de que se desincumbiu do mesmo. Sem a mesma,

incide a responsabilização (...). Dano moral e estético

abrangentes. Possibilidade de cumulação da indenização elo

prejuízo extrapatrimonial com a condenação a pagar

consultas, tratamento e cirurgia reparadores (...). (TJRS, APC

70004518759, Desa. Rejane Maria Dias de Castro Bins, j.

11.04.03).

A conduta médica na prática clínica é tornada lícita, por intermédio da

vontade do paciente em se submeter a um determinado tratamento clínico ou

cirúrgico, significa dizer que, a autodeterminação do paciente em renunciar a

um bem juridicamente tutelado, consciente da possibilidade de conseqüências

lesivas para ele, conseqüências essas ínsitas no tratamento, que asseguram a

transparência na relação médico-paciente.195

O melhor momento e forma de informar são escolhidos pelo médico e

o hospital desde que de boa-fé, e com ética sem causar constrangimento ao

paciente, não expondo sua situação em público. O médico não poderá abusar

de seu poder e da situação escolhendo momentos anteriores à cirurgia para

pedir a assinatura do paciente ou de seus familiares em um “consentimento

informado”, prevendo várias cláusulas limitativas de seus deveres e detalhes

sobre a alegada “informação anteriormente prestada em estado de perigo” ou

necessidade de consumo, tais cláusulas serão nulas, pois contrariam a boa-fé,

nos estritos termos do artigo 51,196 IV do Código de Defesa do Consumidor.197

195 PIERANGELLI, José Henrique. O consentimento do ofendido na teoria do delito. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1985. p.190. 196Artigo 51, do CDC: “São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV- estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”;

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O consentimento deverá ser formalizado e registrado sob pena de o

profissional ver-se impossibilitado de provar a efetiva obtenção do

consentimento do enfermo, fato que também poderá redundar em

conseqüências graves, no âmbito da responsabilidade civil.198

Nos momentos anteriores à cirurgia os consumidores (pacientes e

familiares), assinam qualquer documento, mesmo que abusivo. Cumpre

destacar que, diante destes fatos o consentimento informado obtido sob

“pressão” não terá validade e deve ser desconsiderado pelo magistrado. Assim,

caberá ao médico provar de outra forma, que informou ao paciente e que o

consentimento informado foi obtido em circunstâncias normais e prévias.199

O valor de um documento do tipo do consentimento informado não

deve, contudo, ser superestimado. Pois nada mais é, que uma peça de

evidência, que pode ser derrubada por outra de valor semelhante, como o uso

da má-fé, conduta maliciosa por parte da pessoa que obteve o consentimento

ou, ainda, de inabilidade por parte do paciente em comunicar-se na língua em

que o consentimento foi redigido. 200

É inadmissível que o formulário seja entregue ao paciente por uma

simples atendente. Cabe ao profissional o dever da informação comunicando

pessoalmente o paciente e controlando os conteúdos referentes ao formulário.

Tudo deve ser explicado no tempo adequado se não, não terá valor probatório. 201

A interpretação do contrato e de todas as suas cláusulas, documentos

anexos, referentes a informações ou pré-contratos e declarações sempre se dá

a favor do consumidor. Por isso o médico deve exercer o seu dever de

informação anterior à aceitação do serviço, em momento oportuno reservado

197 MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004. p. 26. 198 KFOURI NETO, Miguel. Culpa Médica e o Ônus da Prova. 1.ed., Sã Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 299. 199MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004. p. 27. 200 GIOSTRI, Hidelgard Taggesell. Responsabilidade médica, as obrigações de meio e de resultado: avaliação, uso e adequação. 1.ed., Curitiba: Editora Juará, 2001. p.84. 201PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005.

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de conversa individual, dando tempo para o esclarecimento de dúvidas do

consumidor.202

A capacidade para consentir ou competência, caberá aos adultos

capazes e aos menores acompanhados do poder paternal e sua autonomia

crescente. O formulário pode ter importância, mas o prontuário médico é que

gerará o sucesso do consentimento informado, objetivando a segurança do

tratamento, a facilidade da prova à cobrança de honorários e o controle dos

custos de saúde.203 O consentimento informado poderá ser oral ou escrito, mas

a forma escrita do ponto de vista legal é a mais recomendada.204

A reflexão feita pelo consumidor, sobre tema tão importante como

saúde e vida, não pode ser pressionada sem justa causa pelo médico ou

hospital. Como ensina o rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar Júnior, no caso Resp

467878-RJ, o hospital e os médicos têm o dever de informar e obrigação de

obter o consentimento informado do paciente, seja pelas exigências éticas, seja

pelas exigências da boa-fé objetiva: o fato de ser a Santa Casa uma entidade

filantrópica não a isenta da responsabilidade de atender ao dever de

informação e de responsabilizar-se pela falta cometida pelo seu médico, que

deixa de informar ao paciente de cirurgia de risco sobre as possíveis

conseqüências da intervenção. A obrigação de obter o consentimento

informado do paciente decorre não apenas da regra de consumo, mas muito

especialmente das exigências éticas que regulam a atividade médico-

hospitalar, destacando-se entre elas consentimento informado205. Ressalta-se

duas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, que condenaram a

instituição de saúde e o médico, por deixarem de informar o paciente:

Superior Tribunal de Justiça Ementa: Responsabilidade civil.

Hospital. Santa Casa. Consentimento informado. A Santa

202 MARQUES, Claudia Lima. ob. cit. p. 27. 203 PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005. 204 SOUZA, Neri Tadeu Câmara. Responsabilidade Civil e Penal do Médico. 1.ed., Campinas: LZN, 2003. p. 66. 205MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004, p. 27.

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Casa, apesar de ser instituição sem fins lucrativos, responde

solidariamente pelo erro do médico, que deixa de cumprir com

a obrigação de obter o consentimento informado a respeito de

cirurgia de risco, da qual resultou a perda da visão do

paciente. Recurso não conhecido. (4a Turma Resp nº467.878-

RJ- Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar)

Superior Tribunal de Justiça Ementa: Responsabilidade civil.

Médico. Consentimento informado. A despreocupação do

facultativo em obter do paciente seu consentimento informado

pode significar, nos casos mais graves, negligência no

exercício profissional. As exigências do principio do

consentimento informado devem ser atendidas com maior zelo

na medida em que aumenta o risco, ou o dano. Recurso

conhecido. .(4a Turma Resp nº436. 827-SP. Rel. Min. Ruy

Rosado de Aguiar)

A Constituição Federal já prevê e regulamenta o consentimento

informado em seus artigos 1º, III206, 5º207 e 6º208, onde se encontram previstas

as garantias à vida, a integridade física, a saúde, o respeito à dignidade da

pessoa humana e os direitos da personalidade, que tem em seus elementos

caracterizadores o consentimento informado. O Código de Ética médica por

sua vez trata do assunto em seus artigos 46209, 56210 e 59211. Já o novo Código

206 Artigo 1º, inciso III, da CF/88: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Município e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos”: III – a dignidade da pessoa humana”. 207 Artigo 5º, da CF/88: “Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasiLeiros e aos estrangeiros residentes do País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, (...)”. 208 Artigo 6º, da CF/88: “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. 209 Artigo 46, Cód. Ética Méd.: “É vedado ao médico, efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo em iminente perigo de vida”. 210 Artigo 56, Cód. Ética Méd.: “É vedado ao médico, desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução das práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de eminente perigo de vida”.

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Civil consagra o consentimento informado nos artigos 13212 e 15213, através do

princípio da autonomia. Segundo as sábias palavras do médico e advogado

Néri Tadeu Câmara, “o dever de informar é um das regras primordiais da

atividade médica”, no que tange a proteção do profissional.214

Ao passar dos anos a doutrina e a jurisprudência avançaram na

medida em que o prévio consentimento, deverá ser extremamente e

necessariamente esclarecido, sob pena de ineficácia da manifestação da

vontade. É necessário que o paciente saiba das conseqüências e das opções a

exercitar, diante dos riscos existentes, ou seja, a simples anuência do paciente

não basta mais. Em casos de iminente perigo de vida ou lesão permanente,

mesmo que tenha o médico agido sem a anuência do doente, deverá fazer

advertências prévias o quanto necessário à total compreensão do risco. Mais

do que simplesmente esclarecer, o médico deverá através das vistas ao

prognóstico ou ao diagnóstico, aconselhar o paciente para sua efetiva

motivação para prosseguir a terapia que a medicina indicar adequada para a

situação. Por outro lado devemos atentar, que é lícito ao médico silenciar

diante de determinados diagnósticos, para que o paciente não passe da

categoria de “sadio” para doente. 215

Quando a cirurgia não é de urgência, ou o mal é meramente estético e

de obesidade, o cumprimento do dever de boa-fé em relação ao leigo é de

extrema importância, devendo superar qualquer expectativa financeira do

profissional. O dever de informar é do médico, conforme ensina a

jurisprudência, cabendo ao mesmo provar que cumpriu com seu dever de boa-

fé e contratual inerente:216

211 Artigo 59, Cód. Ética Méd.: “É vedado ao médico deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta ao mesmo possa provocar-lhe dano, devendo, nesse caso, a comunicação ser feita ao seu representante legal”. 212 Artigo 13 C.C./2002: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes”. 213 Artigo 15 C.C./2002: “Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou intervenção cirúrgica”. 214 SOUZA, Neri Tadeu Câmara. Responsabilidade Civil e Penal do Médico. 1.ed., Campinas: LZN, 2003. p. 64. 215 COUTO, Sérgio. Erro médico: Responsabilidade civil médico-hospitalar.Seleções Jurídicas. Rio de Janeiro: ADV/COAD, abril/2004. p. 53. 216 MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais: São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004. p. 30-31.

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Responsabilidade civil. Médico. Cirurgia para a redução de

mamas. Paciente obesa. Súm. 7 da Corte. Embargos de

declaração. Súm. 98 da Corte. 1. Examinada a prova dos

autos pelo acórdão recorrido, com a indicação de que faltou o

médico com o dever de informação sobre os riscos da cirurgia,

ainda mais se tratando de paciente obesa, (...) presente está a

Súm. 7 da Corte, não havendo as alegadas violações aos arts.

131 e 458 do CPC (...). (STJ, REsp 332025-MG, Min. Carlos

Alberto Menezes Direito. J. 28.05.2002. DJ 05.08.2002, p.332).

A jurisprudência brasileira está começando a acompanhar a tendência

mundial de exigir maior autonomia de vontade do paciente-consumidor e de

sua família-consumidores equiparados, e estabelecer que a falta de

consentimento informado e esclarecido da vítima é, independentemente do erro

médico ocorrido naquela intervenção, um dano culposo, tornando a conduta

médica negligente, como demonstram as decisões do TJRS abaixo transcritas:

Ação ordinária de indenização. Danos materiais e morais.

Imperícia médica. Laqueadura de trompas. Reconvenção. Não

tendo a autora dado sua aquiescência à cirurgia, da qual

resultou estéril, presente a conduta indevida do médico, com o

que assente o dever de indenizar. Dano moral.

Reconhecimento. Quantificação em 80 salários mínimos,

atentando-se ao aspecto contextual. Danos materiais. Tendo a

autora, na república de danos materiais, pugnado por quantias

já pagas, responde na forma do artigo 1.531 do CC [ 1916 ].

Procedência do pedido reconvencional. Desprovimento do

apelo da autora e provimento parcial da apelação do réu

(ApCív 70002965127, Juíza Ana Lucia Carvalho Pinto Vieira,

j.04.12.2002)

Apelação cível. Responsabilidade civil. Erro médico. Dever de

informação. Dano moral. É dever do médico não apenas

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operar de forma a resguardar plenamente a vida e a saúde do

paciente, mas também informar todas as conseqüências

decorrentes do tratamento ou intervenção, cirúrgicos prescritos

e realizados, ademais, diante da possibilidade concreta de

serem graves. O dano moral, como prática atentatória aos

direitos da personalidade, traduz-se num sentimento de pesar

íntimo da pessoa ofendida, capaz de gerar-lhe alterações

psíquicas ou prejuízos à parte social ou afetiva de seu

patrimônio moral. O quantum indenizatório deve atender aos

princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Apelação

provida em parte. (Apelação cível nº 70003105178, Sexta

Câmara Cível, TJRS, Comarca de Origem: 2ª Vara Cível – 1.

Juizado; Relator: Desembargador Carlos Alberto Álvaro de

Oliveira, julgado em 7/11/01)

O tema discutido muito se enquadra na “teoria da perda de uma

chance”, a qual embora advinda da França é muito utilizada no Brasil para

pressupor a causalidade, viabilizando assim a prova do nexo causal. “Para o

STJ a chance deve ser mais que uma mera expectativa de direito, mas sim

prejuízo real e não perda hipotética (ou de lucro)”. 217

No caso de erro médico, defeito de informação e dos serviços

médicos, pode o magistrado incluir, na fixação do dano moral, a indenização

pela perda de uma chance como dano autônomo (art. 944218 do Código Civil

/2002)219 A indenização pela dor, angústia, sofrimento, Maria Celina Bodin de

Moraes em sua obra afirma 220:

Pressupõe que seja possível, de alguma forma, buscar

materializar o que se perdeu, ainda quando o dano é

exclusivamente o da dor. Nestes casos, o dano existe sem

217 MARQUES, Claudia Lima. A responsabilidade dos médicos e do hospital por falta no dever de informar ao consumidor. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 93, v. 827, setembro 2004. p. 33. 218 Artigo 944 – C.C./2002: “A indenização mede-se pela extensão do dano”. 219 MARQUES, Claudia Lima. ob. cit. p.34. 220 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana – Uma Leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p.305.

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necessariamente provas ou demonstrações, porque o

magistrado, humano que é, bem sabe do que se trata.

Com a democratização da relação médico-paciente surge à

responsabilidade médica por violação do consentimento informado, gerando

novos encargos para as instituições de saúde, nova mentalidade, dever de

documentação, respeito pela personalidade e autonomia do paciente. O direito

não se preocupa mais com o ter (patrimonial), mas sim com o ser. 221

“Nos dias atuais, as ocorrências associadas ao consentimento

informado têm assumido grande importância, no contexto de responsabilidade

civil do médico. Não será demasia afirmar que, em breve, será esse o ponto

central das discussões acerca do tema”.222

5.3- A ética médica

Desde Hipócrates, que viveu há cerca de 2500 anos, certamente não

existe outra categoria de profissionais que se preocupe tanto com a ética do

que a categoria médica. No Brasil, foram escritos três códigos para se

adequarem às rápidas mudanças da medicina e suas próprias relações sociais,

até a elaboração do Código de Ética Médica em 1965.223

O termo bioético surge pela primeira vez em 1971 no título da obra de

Van Rens Selaer Potter. Para ele a função da bioética era auxiliar a

humanidade no sentido de participação racional, porém cautelosa no processo

de evolução biológica e cultural. Esse sentido, ao qual se referia o livro de

Potter, não tem muita relação ao que se chama de bioética hodiernamente,

pois o referido termo trata de um conjunto de pesquisas e práticas

pluridisciplinares, objetivando elucidar e solucionar questões éticas provocadas

221 PEREIRA, André. O Consentimento informado, dignidade da pessoa humana. In: I Congresso Médico-Jurídico BrasiLeiro. São Paulo, 2004. Disponível em: < http://www.tvmed.com.br >. Acesso em: 05 jun.2005. 222KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. 5. ed., São Paulo: RT, 2003. p. 36. 223 FRANÇA, Genival Veloso de; DRUMOND, José Geraldo de Freitas; GOMES, Julio César Meirelles. Erro médico. 4.ed., Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. p. 64-65.

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pelo avanço das tecnociências biomédicas224. Nos dizeres de José Alberto

Mainetti por exemplo, a bioética responde ao “deslocamento dos pontos de

referência tradicionais da vida – as novas formas de nascer, procriar e morrer -

, com o intuito de impedir uma tecnociência cirúrgica sem consciência”.225

Conforme analisamos, o erro médico gera conseqüências não só no

mundo jurídico, pois provoca também conseqüências de ordem ética. Ética

significa conduta, tratando, como ciência da moral e dos costumes, do dever

ser, cuidando do modo de proceder da pessoa dentro do grupo social. Sendo

assim, toda classe profissional necessita de instrumentos reguladores de suas

atividades, inclusive a classe médica. É a chamada ética médica, regulada pela

Resolução CFM 1.246/1986 (Código de Ética Médica). Ética médica é o

conjunto de princípios que regem a conduta funcional dos médicos.

A partir da Lei 8.078/90, denominada Código de Proteção e Defesa do

Consumidor que normatizou as relações de consumo e trouxe uma

concentrada carga de ética, uma grande revolução social passou a ocorrer e

todo o sistema jurídico viu-se obrigado a modificar suas posições, devido à

influência das normas éticas, que representam hoje o maior salto que a

humanidade está convidada a dar, sem qualquer alternativa.226

A norma fundamental do Código de Ética Médica está exposta em seu

artigo 1º227. Nos artigos 46228 e 56229 dispõem sobre o consentimento do

paciente, vedando o profissional a efetuar qualquer procedimento médico ou

prática terapêutica sem o devido esclarecimento e consentimento prévio do

paciente ou de seu responsável legal, exceto em iminente perigo de vida.

224 VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 1.ed., São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999. p.15. 225 MAINETTI, José Alberto. Apud. VIEIRA, Tereza Rodrigues. Bioética e Direito. 1.ed., São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999. p.16. 226 COUTO FILHO, Antonio Ferreira; SOUZA, Alex Pereira. Responsabilidade Civil Médica e Hospitalar. 1.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 37. 227 Artigo 1º Cód. Ética Méd.: “A medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e deve ser exercida sem discriminação de qualquer natureza”. 228Artigo 46, Cód. Ética Méd.: “É vedado ao médico, efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo em iminente perigo de vida”. 229 Artigo 56, Cód. Ética Méd.: “É vedado ao médico, desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução das práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de eminente perigo de vida”.

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Em relação às cirurgias contraceptivas ou conceptivas, o direito do

paciente de decidir livremente sobre o método, devendo o médico sempre

esclarecer sobre a indicação, a segurança, a reversibilidade e o risco de cada

método, inclusive sobre as eventuais seqüelas e irreversibilidade. Este

dispositivo vai ao encontro do artigo 226230, § 7º da Constituição Federal de

1988, que estabelece o livre planejamento familiar.

O Código de Ética proíbe, também, o médico de contratar honorários

com base no resultado, de acordo com seu artigo 91231, visto que o objeto do

contrato médico consiste em uma obrigação de meio. Esta vedação ocorre

inclusive em relação à cirurgia plástica exclusivamente estética, porém,

segundo Jurandir Sebastião,232 “nestes casos se o resultado contratado não for

obtido, o paciente terá o direito de rever o valor dos honorários contratados,

para sua redução ao justo”.

O Código de Ética Médica se manifesta a respeito das falhas estruturais,

em seu art. 3º233 que reza ser conditio sine qua non, e o art. 23234 deste código

prescreve que o profissional pode, inclusive, recusar-se a exercer sua atividade

laborativa caso não encontre condições adequadas para tal.

A competência para punir o médico que ferir as normas do Código de

Ética (punição administrativa) pertence aos Conselhos Regionais de Medicina

(CRMs), que são entidades julgadoras e disciplinadoras da classe dotada de

personalidade jurídica de direito público, constituindo em seu conjunto uma

autarquia, nos termos do art. 1º235 da Lei nº 3.268/57. Esta punição

230 Artigo 226, da CF/88: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. § 7º: “Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado proporcionar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte das instituições oficiais ou privada”. 231 Artigo 91, Cód. Ética Méd.: “Firmar qualquer contrato de assistência que subordine os honorários ao resultado do tratamento ou à cura do paciente”. 232SEBASTIÃO, Jurandir. Responsabilidade Médica: civil, criminal e ética. 3.ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 96. 233 Artigo 3º, Cód. Ética Méd.: “A fim de que possa exercer a Medicina com honra e dignidade, o médico deve ter boas as condições de trabalho e ser remunerado de forma justa”. 234 Artigo 23, Cód. Ética Méd.: “Recusa-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar o paciente”. 235Artigo 1º - Lei nº 3.268/57 (Conselhos Regionais de Medicina): “Definir o ato profissional do médico como todo procedimento técnico-profissional praticado por médico legalmente habilitado e dirigido para”: I – a promoção da saúde e prevenção da ocorrência de enfermidades ou profilaxia (prevenção primária);

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administrativa é aplicada através de processos ético-disciplinares, segundo

estipula o art. 21236 e seu parágrafo único da Lei nº 3.268 , de 30 de setembro

de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958.

Os processos ético-disciplinares são o instrumento de que dispõe os

conselhos Regionais para punir moral e administrativamente os profissionais

que estão sob sua jurisdição, ainda que estes já tenham sido alcançados por

meio de sanção civil pela condenação à reparação do dano causado ou da

sanção penal via ação criminal regularmente instaurada e na qual venham a

ser julgados e culpados. O art. 22237 da referida lei estabelece sanções que

podem ser aplicadas aos profissionais, que podem ser: advertência

confidencial em aviso reservado; censura confidencial em aviso reservado;

censura pública em publicação oficial; suspensão do exercício profissional até

30 (trinta) dias; cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho

Federal.

II – a prevenção da evolução das enfermidades ou execução de procedimentos diagnósticos ou terapêuticos (prevenção secundaria) III – a prevenção de invalidez ou reabilitação dos enfermos (prevenção terciária)”. 236 Artigo 21 - Lei nº 3.268/57 (Conselhos Regionais de Medicina): “O poder de disciplinar e aplicar penalidades aos médicos compete exclusivamente ao Conselho Regional, em que estavam inscritos ao tempo do fato punível, ou em que ocorreu, nos termos do art. 18, § 1º”. Parágrafo único: “A jurisdição disciplinar estabelecida neste artigo não derroga a jurisdição comum quando o fato constitua crime punido em Lei”. 237 Artigo 22 - Lei nº 3.268/57 (Conselhos Regionais de Medicina): “As penas disciplinares aplicáveis pelos Conselhos Regionais aos seus membros são as seguintes: a) advertência confidencial em aviso reservado; b) censura confidencial em aviso reservado; c) censura pública em publicação oficial; d) suspensão do exercício profissional até 30 (trinta) dias;e) cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho Federal”. § 1º Salvo os casos de gravidade manifesta que exijam aplicação imediata da penalidade mais grave a imposição das penas obedecerá à gradação deste artigo. § 2º Em matéria disciplinar, o Conselho Regional deliberará de oficial ou em conseqüência de representação de autoridade, de qualquer membro, ou de pessoa estranha ao Conselho, interessada no caso. § 3º A deliberação do Comércio precederá, sempre, audiência do acusado, sendo-lhe dado defensor no caso de não ser encontrado, ou for revel. § 4º Da imposição de qualquer penalidade caberá recurso, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da ciência, para o Conselho Federal, sem efeito suspenso salvo os casos das alíneas c , e, f , em que o efeito será suspensivo. § 5º Além do recurso previsto no parágrafo anterior, não caberá qualquer outro de natureza administrativa, salvo aos interessados a via judiciária para as ações que forem devidas. § 6º As denúncias contra membros dos Conselhos Regionais só serão recebidas quando devidamente assinadas e acompanhadas da indicação de elementos comprobatórios do alegado”.

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VI – CONCLUSÃO

Após a analise do tema proposto concluímos que a responsabilidade

civil do médico será sempre subjetiva tanto à luz do Código Civil quanto do

Código de Defesa do Consumidor, ou seja, para que o médico seja obrigado a

indenizar, e se configure o erro médico, ele deve ter agido com culpa

(imprudência, imperícia, ou negligência), devendo ser verificada também a

presença de um dano e do nexo de causalidade entre a conduta culposa do

profissional e o dano sofrido pela vítima.

Quando a obrigação assumida pelo médico for de meio, a culpa

deverá ser provada pela vítima, quando for de resultado ocorrerá presunção de

culpa, devendo o médico, fazer prova em contrário.

O ônus da prova do dano e do nexo causal caberá ao paciente,

ficando, a critério do juiz, sua inversão quando a vítima for hipossuficiente ou

quando forem verossímeis as alegações deste, nos termos do artigo 6º, VIII do

Código de Defesa do Consumidor.

O erro médico pode ocasionar tanto dano moral quanto danos

materiais, sendo ponto pacífico na doutrina e na jurisprudência sua

cumulabilidade.

O médico e o paciente são sujeitos, via de regra, de uma relação

jurídica, de um contrato de prestação de serviços. A relação que antes era de

total submissão, vem mudando a cada dia com o avanço tecnológico dos meios

de comunicação e o enorme volume de informações, aumentando desta forma

a discussão sobre o papel de cada indivíduo, sua autonomia e sua

responsabilidade no contexto social.

O consentimento informado livre e esclarecido, associado ao

prontuário é mais um dos documentos considerados importantes para o

médico. Sua utilização favorecerá e viabilizará o médico em futuras demandas

judiciais, bem como auxiliará o paciente durante o tratamento.

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Assim o uso cotidiano segue o novo paradigma do respeito à

autonomia do paciente, da necessidade da relação médico-paciente ser

norteada pelo princípio da boa-fé e da lealdade.

No interesse de consolidar o uso e a prática do consentimento

informado em nosso país, seria conveniente uma revitalização da classe

médica nas novas dimensões éticas da profissão, levantadas nas últimas

décadas. A adequada preparação e funcionamento das inúmeras Comissões

de Ética contribuirá eficazmente no aprimoramento dessa e de outras práticas

e atitudes, que enobrecem o exercício da medicina e prestigiam a saúde de

uma nação.

O consentimento informado sendo documentado estará entrando no

plano da existência como fato jurídico, podendo ter efeitos jurídicos se

apresentado nos tribunais, em uma lide que por ventura venha a se instalar, em

decorrência do ato médico efetuado. Sem dúvida, o uso deste documento vem

crescendo devido à necessidade que tem o médico de demonstrar, quando em

juízo, que cumpriu com sua obrigação de “conselhos” na relação com o

paciente.

A real importância do consentimento sob a ótica jurídica não está no

objetivo de gerar prova em uma futura demanda judicial, mas na fiscalização do

cumprimento da lei, no sentido de fazer respeitar os direitos fundamentais da

pessoa e trazer responsabilidade ou chamar a atenção do pesquisador da área

médica aos seus deveres.

Portanto, a utilização deste novo documento pelo médico trará novas

perspectivas positivas na relação médico-paciente, ficando claro e evidente que

a utilização maciça do mesmo representa, não só segurança as partes, mas

traduz relevante importância ética e moral na relação médico-paciente.

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INDÍCE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

SUMÁRIO 6

INTRODUÇÃO 7

CAPITULO I

1 - CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES.....................................................10

1.1- A Responsabilidade civil na história......................................10

1.2 - A evolução do direito positivo brasileiro e a Constituição

Federal de 1988...........................................................................18

1.2.1- A revogação do Código Civil de 1916............................17

1.2.2- Princípios da Defesa do Consumidor (Lei 8078/90)....17

1.2.3- O Código Civil de 2002..................................................19

CAPITULO II

2 - A RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA

2.1. Conceito.................................................................................20

2.2 Responsabilidade civil objetiva e subjetiva............................23

2.3 - O Dano Material e Moral........................................................25

CAPITULO III

3 - CULPA MÉDICA

3.1- A culpa stricto sensu................................................................28

3.1.1. Negligência.....................................................................29

3.1.2. Imprudência....................................................................29

3.1.3. Imperícia ........................................................................30

3.2- Relação de causalidade..........................................................30

3.3- A culpa civil e a culpa penal......................................................33

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CAPITULO IV

4 - OBRIGAÇÕES E A NATUREZA CONTRATUAL

4.1- Conceito de obrigação..............................................................35

4.1.1Obrigação de Meio e de Resultado.....................................37

4.2- Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual ..............38

4.2.1. O erro médico..................................................................40

4.2.2. As transformações da relação médico-paciente ............42

CAPITULO V

5 - O CONSENTIMENTO INFORMADO NA ATIVIDADE MÉDICA

5.1- Conceito.........................................................................................45

5.2- Evolução do tema..........................................................................47

5.3- A ética médica...............................................................................62

6 - CONCLUSÃO..................................................................................................66

BIBLIOGRAFIA................................................................................................68

INDICE ...........................................................................................................72