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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DAS ÁREAS FUNCIONAIS DA LINGUAGEM RELACIONADAS À DISLEXIA POR LUCIANA JERONIMO LIMA ORIENTADORA: MARTA PIRES RELVAS RIO DE JANEIRO JANEIRO / 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DAS

ÁREAS FUNCIONAIS DA LINGUAGEM RELACIONADAS

À DISLEXIA

POR

LUCIANA JERONIMO LIMA

ORIENTADORA: MARTA PIRES RELVAS

RIO DE JANEIRO

JANEIRO / 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DAS

ÁREAS FUNCIONAIS DA LINGUAGEM RELACIONADAS

À DISLEXIA

OBJETIVOS:

Esta publicação atende a complementação

didático-pedagógica de metodologia de

pesquisa e a produção e desenvolvimento

de monografia para o curso de pós-

graduação em Neurociências Pedagógica.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, em primeiro lugar, pela conclusão

deste trabalho e de minha trajetória acadêmica;

Aos meus familiares - Neusa, Ederson e

Andreia – por todo carinho, incentivo, amor e

atenção;

Aos amigos da Pós – Graduação pela troca de

experiências e aprendizados proporcionados

nas aulas;

Aos professores pelos incentivos e

aprendizagens construídas.

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia a todos aqueles

envolvidos com a educação e os seres

humanos em formação.

Acreditando que as crianças precisam ser

amadas e orientadas para que se tornem

adultos saudáveis e críticos.

Que todos os bravos profissionais da escola,

da saúde e os familiares, mesmo com

dificuldades, mas com uma dose extra de

persistência, não desistam do seu papel e

colaborem com diferentes descobertas,

valorizando e transformando nossa sociedade.

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RESUMO

Esta obra refere-se às contribuições da neurociência pedagógica para

a dislexia e apresenta a investigação das áreas funcionais da linguagem

relacionadas à dislexia numa visão neuropedagógica. Para a elaboração deste

trabalho, a metodologia compreendeu a pesquisa bibliográfica, voltada para a

aprendizagem dos alunos disléxicos, onde as escolas devem estar

comprometidas com a qualidade do ensino e também com a autonomia dos

mesmos na sociedade. Os objetivos abordados foram: identificar e caracterizar

a dislexia, explicar as descobertas da neurociência diante da dislexia e

exemplificar ações neuropedagógicas que auxiliam os disléxicos. Com esta

pesquisa foi possível perceber que a neurociência contribui para o bom

desenvolvimento dos alunos disléxicos, uma vez que, compreende-se

realmente o que é a dislexia e o que pode ser feito aos alunos por meio de um

trabalho pedagógico eficiente do professor, melhorando sua ação pedagógica,

alcançando assim, resultados satisfatórios com os alunos disléxicos.

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SUMÁRIO

Introdução.........................................................................................................7

Capítulo I–A importância da Neurociência – um breve histórico................12

1.1 – Evolução Humana – aspectos antropológicos..........................................12

1.2 – Descobertas sobre o funcionamento do cérebro humano........................16

1.3 – Uma visão neurocientífica do Aprender....................................................19

Capítulo II–Colaborações da Neurociência na compreensão da Dislexia..23

2.1 – Áreas Funcionais da Linguagem..............................................................24

2.2 – Dislexia e Linguagem................................................................................28

Capítulo III - Ações Neuropedagógicas: pressupostos para uma Educação

Inclusiva dos disléxicos.................................................................................40

3.1 – Ações que fazem a diferença...................................................................45

3.2 – O papel da escola.....................................................................................47

Conclusão.........................................................................................................51

Bibliografia.......................................................................................................57

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INTRODUÇÃO

O presente estudo é uma investigação das colaborações da

neurociência para a compreensão da dislexia no processo de aprendizagem

dos sujeitos em nosso meio educacional.

A educação encontra-se na vida de todos os educandos, educadores,

responsáveis, membros das áreas da saúde, quando de alguma forma, há o

envolvimento com a ação educativa, mesmo sendo este relacionado às

investigações de como o sujeito aprende.

A educação, assim como a aquisição da leitura e da escrita se constitui

como um processo que permite ao educador acompanhar o desenvolvimento

de seus alunos, observando se os objetivos propostos de acordo com a faixa

etária estão sendo alcançados e assim, perceber algum entrave que possa

estar impedindo a obtenção da aprendizagem e de resultados satisfatórios,

tendo a possibilidade de modificar a sua prática, orientado por um profissional

da saúde e por conhecimentos hoje existentes com base neurocientíficas que

ajudam na compreensão das dificuldades e nas possíveis ações que facilitam o

trabalho educativo. A neurociência torna-se desse modo, uma das ferramentas

que está a serviço do aprendizado, quando as pessoas envolvidas no processo

de aprendizagem a utilizam para conquistar melhorias.

Todavia em no cotidiano escolar ou familiar, nem sempre esses grupos

sociais a que pertencem os sujeitos disléxicos têm uma visão neuropedagógica

e por isso, muitas vezes, não sabendo lidar com a dislexia, tal realidade traz

desconfortos e insatisfações, tornando-se, em muitos casos, difícil e complexo

o processo educativo, para alunos e professores, principalmente na fase da

alfabetização.

Pensando nesta complexidade da dislexia, envolvendo a aquisição da

leitura e da escrita, cabe então, investigar como a neurociência, voltando-se

para as áreas da linguagem presentes no encéfalo, contribui na compreensão

dos aspectos que envolvem a dislexia.

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8É bem verdade que, segundo alguns profissionais da educação, estes

se sentem despreparados para auxiliar nas escolas os alunos disléxicos,

defendendo que as próprias escolas ainda precisam de meios para melhor

atendê-los, na verdade não só a eles, mas a todos que, de certa forma,

apresentam necessidades diferentes quanto à forma de aprender.

Apesar desta realidade, pretende-se conquistar uma educação

inclusiva e uma sociedade inclusiva de qualidade em nosso país, preocupada

com o bem-estar sócio-cognitivo dos sujeitos, sejam quais forem suas

diferenças.

Com isto, tem-se como base a Declaração de Salamanca (1994),

documento oficial da Confederação Mundial de Educação Especial, que

pressupõe a educação inclusiva como o atendimento a todos, onde um mesmo

currículo se apresente aberto às diferenças, garantindo o direito à construção

de conhecimentos e valores. O que a torna um processo gradual e dinâmico,

tomando-se o cuidado para que não se caia numa suposição falsa de inclusão

que não colabora para a felicidade e desenvolvimento da cidadania dos

sujeitos envolvidos nesta realidade.

Com muita propriedade a UNESCO expressa sua posição quanto à

educação inclusiva, afirmando em seus documentos, que a meta do processo

de inclusão, ultrapassa o ambiente da sala de aula ou um segmento isolado,

ela pretende, na verdade, alcançar e se organizar em todo o sistema

educacional brasileiro, caminhando por uma via única, que possa oferecer uma

educação que atenda às necessidades dos alunos. Para reforçar tal ideal de

inclusão, utiliza-se as palavras da própria UNESCO, 1988 (citado por

CARVALHO, 2000, p.19) que diz:

Em termos da reforma do sistema escolar, cuja

meta é a criação de uma escola comum que

ofereça uma educação diferenciada a todos, em

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9função de suas necessidades e num marco único e

coerente de planos de estudos.

Diante da necessidade de uma reforma não só no sistema de ensino

brasileiro, como também na postura social frente às diferenças para que

aconteça uma inclusão de qualidade, tem-se um grande desafio, que precisa

da colaboração da escola e da sociedade para alcançar seus objetivos na

melhoria do sistema educacional, combatendo a exclusão e os preconceitos

existentes diante das diferenças, priorizando ensinar aos diversos grupos

sociais que, as diferenças devem ser respeitadas para proporcionar um

ambiente de aprendizado agradável e acolhedor.

Desse modo, cabe frisar que as diferenças humanas se constituem

pelas singularidades que cada sujeito apresenta, assim o homem é um ser

singular que precisa fazer parte do contato social para se desenvolver e que,

sem as trocas as diversidades não seriam percebidas, nem compreendidas.

Mesmo sendo um ser singular, o homem é um ser social e suas interações com

o meio enriquecem seu processo de formação. Não se pode esquecer de suas

singularidades e necessidades individuais. Assim, o desafio é oferecer a todos

uma educação de qualidade que lhes proporcione oportunidades e mesmas

possibilidades humanas e sociais inerentes a qualquer indivíduo, sejam eles

disléxicos ou não.

A cada ano o desafio é incluir e, além disso, desenvolver um trabalho

de qualidade com as pessoas disléxicas, mas muitos educadores encontram

dificuldades em realizar sua ação pedagógica, o que compromete também a

aprendizagem nas escolas. Com esta situação surge a problemática deste

estudo que pode ser expressa da seguinte maneira: como a Neurociência

pode colaborar na compreensão da dislexia, abordando as áreas funcionais da

linguagem, favorecendo o trabalho de todos aqueles envolvidos no processo de

educar?

Para responder a esta questão e realizar o objetivo deste trabalho,

qual seja, investigar as contribuições que a Neurociência traz sobre a dislexia,

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10este estudo se deterá em três pontos específicos que são: explicar a evolução

da espécie humana, as descobertas e avanços da Neurociência diante do

funcionamento do cérebro e sua relação com a aprendizagem da linguagem –

aquisição da leitura e da escrita, identificar e caracterizar a dislexia;

exemplificar ações neuropedagógicas que auxiliem os disléxicos.

Buscando informações para a problemática abordada, é possível

encontrar uma vasta bibliografia relacionada à aprendizagem e à dislexia,

citando ainda estudos sobre a educação inclusiva, que vem se expandindo

cada vez mais. Porém, quando se trata da Neurociência voltada para a dislexia

com ações neuropedagógicas os estudos publicados ainda são recentes, por

ser a Neurociência uma área nova. Daí a importância da continuidade de

pesquisas empíricas relacionadas ao assunto.

Desta forma, conceber tais ações com enfoque inclusivo que oriente

os professores na sua prática docente e a família, deve ser um ideal que

anseia por investigações e práticas contínuas para se obter respostas válidas e

concretas que realmente colabore com a qualidade na aprendizagem dos

disléxicos.

Diante da situação desafiadora e a necessidade de uma prática

neuropedagógica na educação, este estudo torna-se importante por refletir a

atuação da Neurociência e sua contribuição com os aspectos pedagógicos e

psicopedagógicos da educação.

O estudo e a investigação do objeto as colaborações da Neurociência

na compreensão da dislexia pretende oferecer subsídios aos educadores,

familiares e todos aqueles envolvidos com a educação, no sentido de permitir

um maior embasamento com relação às questões da dislexia, desejando que

todos os sujeitos disléxicos ou não, sejam entendidos e respeitados com suas

reais necessidades, pois são capazes e podem ser autônomos trazendo

desenvolvimento à sociedade, oferecendo-lhes uma educação viva, ativa e de

qualidade.

Nesta perspectiva, com as novas contribuições da Neurociência,

pretende-se alcançar mudanças e melhorias na educação brasileira, visando

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11uma aprendizagem de qualidade com o desenvolvimento de ações

neuropedagógicas conscientes abertas às necessidades dos educandos, será

possível considerar uma grande conquista no trabalho educativo e na vida dos

sujeitos que convivem com a dislexia.

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CAPÍTULO I

A IMPORTÂNCIA DA NEUROCIÊNCIA – UM BREVE

HISTÓRICO

Este primeiro capítulo traz alguns aspectos relevantes referentes ao

percurso histórico dos avanços da Neurociência, abordando a evolução dos

estudos e descobertas sobre o cérebro, o que atualmente colabora com

diversas áreas, inclusive a educação.

Para compreender um pouco mais este processo histórico faz-se

necessário abordar questões pertinentes à antropologia e a própria história da

neurociência, o que ajuda a entender o fantástico funcionamento do cérebro

humano.

1.1 – Evolução Humana – aspectos antropológicos

O naturalista inglês Charles Darwin propôs sua famosa teoria da

seleção natural, em 1860, o que permitiu aos especialistas dizer que a espécie

humana moderna, o Homo Sapiens, evoluiu a partir de outras espécies, que o

remete a um primata, o primeiro dos hominídeos.

Ao longo do século XX, inúmeras descobertas paleoantropológicas

demonstraram a existência de um grande número de espécies de hominídeos,

como o Australopithecus, todas elas surgidas na África, em um período que

cobre os últimos 5,5 milhões de anos. O crescimento gradativo da capacidade

craniana e do volume do cérebro, o aparecimento da postura ereta permanente,

o surgimento do uso de ferramentas e da cultura simbólica, o domínio de

tecnologias como o fogo e a construção de abrigos e a caça, tudo isso é

bastante evidente a partir do exame do registro arqueológico dos hominídeos,

até o surgimento, 2 milhões de anos atrás, do Homo Habilis (homem habilidoso)

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13e do Homo Erectus (homem ereto), as primeiras espécies que podem ser

consideradas "humanas", no seu sentido moderno, pois desenvolveram a

linguagem falada complexa, a escrita, a construção de ferramentas, as

vestimentas, o fogo e tiveram sua capacidade craniana aumentada de 500 para

1200 cm3.

Todas essas características, diretas ou indiretamente, se relacionam

ao desenvolvimento do nosso cérebro. O enorme cérebro desenvolvido

principalmente no córtex cerebral dotou o ser humano de propriedades que não

existem, ou existem de forma primitiva em outros animais. É no córtex que há

os mais altos níveis de análise sintética. É lá que a visão do mundo é analisada,

planejada e programada para executar uma ação.

O grande desenvolvimento do cérebro, por sua vez, levou ao

nascimento de símbolos verbais, objetos da realidade e conceitos abstratos.

Além da capacidade verbal, desenvolve-se a habilidade de emitir sons de alta

precisão o que permitiu a evolução cultural e a transmissão de símbolos de um

ser humano a outro.

Com isso desenvolveu-se o conhecimento, que é uma propriedade

única do ser humano, tendo relação com o pensamento e a consciência (que

certamente podem existir em outros primatas não humanos, mas que diferem

em um grau muito amplo em relação à espécie humana).

Quando o homem se tornou um animal tribal, desde que começou a

andar ereto, mais de 4 milhões de anos atrás, passou a ser um caçador e

guerreiro tribal, onde a cooperação social era um fator importante de

sobrevivência. Todos os instintos sociais humanos se desenvolveram bem

antes da esfera intelectual: instinto maternal, cooperação, curiosidade,

criatividade, compaixão, altruísmo, e competitividade são comportamentos

antigos, e podem ser vistos também em outros seres da natureza.

Mas, o ser humano novamente se distingue dos outros primatas

através de uma característica mental muito forte: o autocontrole, a capacidade

de modificar qualquer comportamento social, mesmo que instintivo, de maneira

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14a torná-lo mais útil para a sobrevivência. Quanto mais disciplinado e capaz de

autocontrole e de planejamento, mais humano pode ser considerado.

Portanto, a espécie humana também tem o singular dom de dominar o

cérebro emocional por meio do cérebro racional. Isto, acoplado à capacidade

de planejar, gerou um animal capaz de vencer através da inteligência, usando

para si aquelas espécies que são úteis para seu próprio benefício como: as

bestas de carga, as cobaias de laboratório, transformando os outros animais

em alimentos.

Diante da evolução tanto de suas estruturas internas como da

capacidade de se adaptar ao meio externo, atualmente já se conhece

características fundamentais do funcionamento cerebral, permitindo classificar

o cérebro em três tipos:

a) Cérebro Primitivo - formado pelo tronco cerebral, pelo bulbo, pelo cerebelo,

ponte e mesencéfalo, pelo globo pálido e os bulbos olfatórios, responsável pela

manutenção da vida vegetativa, capaz de adaptar-se ao frio, ao calor, à fome e

à sede. Pode comandar a maior ou a menor intensidade de multiplicação das

partes e do todo; de corrigir os inúmeros desvios do processo de formação do

ser; de identificar o perigo e comandar a resposta. É, enfim, a expressão maior

da pulsão inicial da vida na cadeia evolutiva.

É neste cérebro que ocorre a manifestação primeira da vida, que se

encontram as informações de maior importância da experiência evolutiva do

homem, desde a célula inicial até hoje. De alguma forma, nesta evolução,

todas as experiências do homem, estão inscritas nas sinapses do cérebro

primitivo.

O cérebro humano ainda adquiriu três componentes que foram

surgindo e se superpondo: a parte inferior, a mais primitiva, correspondendo ao

cérebro dos répteis, é onde se encontram algumas estruturas como as do

tronco cerebral, responsáveis pelas ações involuntárias e o controle de certas

funções viscerais (cardíaca, pulmonar, intestinal, etc), indispensáveis à

preservação da vida.

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15 É nesta porção primitiva que são gerados os atos e comportamentos

mais básicos para a sobrevivência e preservação da espécie (os mecanismos

de agressão, de defesa, as posições hierárquicas no grupo e a delimitação de

território).

Apesar da impressionante dominância do neocórtex, até hoje muitos

atos são conduzidos com base no cérebro primitivo, como os antepassados, há

milhares de anos, pois possuíam e ainda possuem comportamentos

ritualísticos, matam para comer, tendem a discriminar pessoas fora do mesmo

grupo imediato (família, aldeia, raça) e defendem o espaço (domínio territorial).

b) Cérebro Intermediário – local onde se encontram as estruturas límbicas que

têm como principal função coordenar as emoções. Corresponde ao cérebro dos

mamíferos antigos. Muito se tem estudado e discutido quanto à localização e

os caminhos que as emoções percorrem, tem-se observado que não há uma

delimitação precisa da região onde se dão as emoções, pode-se apenas

afirmar que a região que intermedeia as emoções localiza-se entre o cérebro

primitivo e o neocórtex.

c) Cérebro Superior - a mente é resultado da ação combinada e integrada de

todas estas partes. O cérebro superior ou cérebro racional posiciona-se

recobrindo todo o encéfalo. É composto pelos dois hemisférios cerebrais e de

alguns conjuntos de neurônios subcorticais. É constituído por um tipo de tecido

cortical de formação recente chamado neocórtex. Acima de tudo encontra-se o

neocórtex, que funciona como a sede da consciência. No processo evolutivo do

embrião humano, percebe-se que foi o último a ser formado.

O homem, através do neocórtex, toma consciência de si mesmo e

assume um papel dominante na escalada evolutiva do planeta. Foi através do

neocórtex que ele se projetou no mundo da ciência, buscando conhecimento. O

conhecimento gerado através desta estrutura de certa forma se tornou

independente de sua origem.

A tomada de consciência nada mais é do que uma experiência

evolutiva que pode resultar em bem ou mal sucedida, de acordo com a

aplicação dessa consciência. Se aplicada na perpetuação da pulsão de vida,

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16pode ser uma experiência positiva, porém, se aplicada de forma desastrosa,

age contrariamente à pulsão de vida, como se vem fazendo, daí a importância

do uso deste cérebro racional em observações e pesquisas significativas que

ajudem a espécie humana a compreender melhor sua evolução, seu organismo

biológico, suas dificuldades, possíveis distúrbios e problemas que afetem a sua

rotina saudável de vida, caminhando em busca de respostas e soluções que

amenizem as dores e os sofrimentos humanos.

1.2 – Descobertas sobre o funcionamento do cérebro humano

Pode-se dizer que desde a antiguidade ocorreram participações

significativas neste processo de busca pelo entendimento das estruturas do

encéfalo, permeando estudos e descobertas, muitas vezes, pertinentes nesta

compreensão o que ajudou o homem no combate a prejuízos à sua saúde.

Sendo assim, pode-se citar vários exemplos de contribuições que

ajudaram a chegar naquilo que se sabe atualmente. A começar pelos gregos,

pois acreditavam que os ventrículos cerebrais eram órgãos sede dos humores

e da capacidade intelectual do homem, tal ideia deste povo aguçou a

curiosidade de vários estudiosos e pesquisadores, como Galeno, por exemplo

(177 d. c), mas no século XVI Andrea Versalius comparou a ideia da

capacidade intelectual estar nos ventrículos com o exemplo dos asnos,

refutando esta crença, pois os asnos possuem ventrículos e não tem

capacidade intelectual.

O Período Clássico abordou duas correntes: Hipocrática, a qual

localizava a mente no cérebro e Aristotélica, a mente tinha sua sede no

coração, ao cérebro cabia somente esfriar o sangue. Para Aristóteles a psique

era uma “entidade” (não material) que governava o comportamento, visão esta

também adotada pelo cristianismo em todo o Ocidente.

Na Era Moderna (1649) Descartes se opõe ao pensamento aristotélico,

localizando a mente no cérebro. Além de localizá-la no cérebro, ele a ligou ao

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17corpo, via a mente e o corpo como coisas separadas que se interligavam. Os

nervos eram ocos, por onde circulava o espírito animal e que a sede da mente

estava na glândula pineal. Ele ainda utilizou seus conhecimentos de

dispositivos mecânicos para explicar que as funções do corpo tinham princípios

semelhantes. Também propôs a ideia de arco reflexo, identificando seus

componentes, como: a sensação de dor, a condução da mesma pelos nervos

que levam ao sistema nervoso central, os nervos motores sendo excitados e

finalmente os músculos que são responsáveis pela ação.

Gall (1758-1822) foi o primeiro médico e neuroanatomista a defender a

ideia de que diferentes funções do córtex se localizam em diferentes regiões.

Explicou em seus estudos três ideias radicais: 1) Todo comportamento emana

do cérebro; 2) Determinadas regiões do córtex controlam funções específicas,

não agindo como um órgão único, dividido pelo menos em 27 órgãos; 3) Sem

comprovação científica, seria de que o centro de cada função cresceria com o

uso, o crânio incharia nas regiões mais desenvolvidas. Diferente de Gall,

Johann Spurzheim o dividiu em mais de 35 órgãos.

Em 1815 Thomas Foster chamou o trabalho de Gall e Spurzheim de

Frenologia (phrenos do grego = mente). Com o passar do tempo a frenologia

foi atacada pela ciência oficial, porém os estudos de Gall contribuíram para a

realização em laboratórios de experimentos por meio de lesões em animais

para analisar suas consequências, dando origem a Neurociência Experimental.

A partir daí, várias pesquisas sérias seguiram os estudos de Gall referentes ao

localizacionismo cerebral.

Cita-se ainda, Luigi Rolando que descobriu uma fissura no cérebro que

recebeu seu nome, sendo o responsável pela primeira estimulação de um

nervo no tecido cerebelar em 1809; pesquisando em cérebros de pombos

Pierre Flourens (1823- 1924) foi considerado o pai da pesquisa experimental

cerebelar e Phineas Gage (1848) atingido em uma explosão por uma barra de

ferro na parte frontal do cérebro, apesar de ter vivido muitos anos depois deste

incidente, teve seu comportamento totalmente transformado.

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18Entre 1860-1870 Pierre Broca descobre a área do cérebro relacionada

à expressão da fala, em seus estudos sobre afasia, com base em dados

anatômicos, situou o centro da imagem motora das palavras na terceira

circunvolução frontal, no hemisfério cerebral esquerdo, ao observar que este

hemisfério era sede desta função simbólica e cognitiva que é a linguagem.

Alguns anos depois, Carl Wernicke (1874) estudou uma área do cérebro

relacionada a um tipo de afasia, compreensão da linguagem (área auditiva da

linguagem), mais à frente, estas áreas serão abordadas de forma detalhada

diante das questões da dislexia.

Os progressos conquistados nas correlações das funções do cérebro

com determinadas áreas, só foi possível com as descobertas de Luigi Galvani

abordando a Eletricidade Animal, utilizando rãs que o levou a dedicar-se a

eletrofisiologia – a contração muscular só acontece por meio de estímulos

elétricos. Assim, a eletricidade quebrava o paradigma da mecânica, sendo a

principal responsável pelo funcionamento do sistema nervoso.

Luigi Galvani, médico e anatomista italiano, foi um dos primeiros a

investigar experimentalmente o fenômeno chamado bioeletricidade. Em uma

série de experimentos descobriu que a corrente elétrica liberada por um jarro

de Leyden ou um gerador eletrostático rotatório causava a contração dos

músculos na perna de um sapo e de muitos outros animais, tanto ao aplicar a

carga no músculo ou no nervo. Para ele a contração muscular era uma prova

de que os músculos do sapo estavam gerando eletricidade por si próprios,

como um tipo de energia vital similar, mas diferente da eletricidade “natural”

gerada por máquina ou raios.

Os experimentos de Galvani estabeleceram as bases para o estudo

biológico da neurofisiologia e neurologia. Com isso, a mudança de paradigma

se consolidou - os nervos não eram tubos de água ou canais, como Descartes

e seus contemporâneos pensavam, mas condutores elétricos. A informação no

sistema nervoso era transmitida pela eletricidade gerada diretamente pelo

tecido orgânico.

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19No século XIX já era possível o uso de técnicas sofisticadas em

animais e em humanos, ferramentas capazes de construir mapas detalhados

das funções cerebrais. Em 1902, Fedor Krauze publica 142 casos em

humanos, e também é publicada a citoarquitetura do córtex, com 47 áreas.

Os estudos de pesquisas na área de bioeletricidade e do

localizacionismo cerebral se incrementaram com os avanços técnicos, com a

descoberta de novos aparelhos: como Eletrômetros, Galvanômetros,

Comutadores e Indutores e também com avanços na microscopia.

No final do século XIX o conceito de localização cerebral foi

estabelecido nas Neurociências. Atualmente, a informação de que

determinadas funções cerebrais são desempenhadas por algumas estruturas e

não por outras, é de conhecimento da grande maioria das pessoas, graças aos

estudos persistentes de longos anos, destes vários pesquisadores que de

forma tímida ou mais evidente, trouxeram marcantes e preciosas informações

aos dias atuais.

Comprova-se assim, a doutrina do localizacionismo cerebral com a

ajuda dos mais sofisticados exames de imagens como ressonância magnética

funcional (FMRI), tomografia por emissão de positron (PET), dentre outros que

permite com precisão, visualizar as funções cerebrais no momento em que as

mesmas estão sendo realizadas pelo cérebro. Tal desenvolvimento das

ciências e da tecnologia foi um marco no auxílio à humanidade, sendo utilizado

com o intuito de trazer respostas não só a doenças, lesões e distúrbios, como é

o caso da dislexia, mas colaborar, inclusive, com a própria aprendizagem

humana.

1.3 – Uma visão neurocientífica do Aprender

Como se aprende sempre despertou a curiosidade daqueles

interessados nas capacidades cerebrais, por este motivo, muito se pesquisou e

se descobriu diante da arte do aprendizado, afinal abordar todo o

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20processamento neuronal que envolve a aprendizagem pode ser considerado

uma verdadeira obra-prima, até mesmo do ponto de vista educacional. Assim,

a necessidade de melhor conhecer o Sistema Nervoso Central e o crescimento

de investigações sobre o seu funcionamento nas últimas décadas, levou a

Organização Mundial de Saúde a eleger a década de 90 como a Década do

Cérebro.

Deste modo, não se poderia simplesmente relatar as questões da

dislexia sem primeiramente compreender com a ajuda destas investigações

onde se dá a aprendizagem.

RIESGO (2006, p. 21) aborda que

... o processo de aprendizagem se dá do Sistema

Nervoso Central que é uma estrutura complexa.

Quando chega ao SNC uma informação conhecida,

ela gera uma lembrança, que nada mais é do que

uma memória; quando chega ao SNC uma

informação inteiramente nova, ela nada evoca e

sim produz uma mudança – isso é aprendizado, do

ponto de vista estritamente neurobiológico.

Entende-se dessa forma que, o cérebro tem uma ampla capacidade de

aprender e de sofrer modificações do que se pensava até anos atrás, uma vez

que, cada cérebro apresenta cerca de cem bilhões de neurônios e o sistema

nervoso tem duas funções básicas: a manutenção da homeostase do

organismo e a emissão de comportamentos, resultados da interação dos fatores genéticos com o ambiente externo, sofrendo modificações constantes, a

partir desta relação entre meio externo e interno a aprendizagem começa a ser

definida.

Com a chegada das informações captadas pelos órgãos dos sentidos no

cérebro, por meio dos neurônios, as áreas de processamento dessas informações

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21são ativadas, depois de interpretadas e compreendidas, são enviadas para a

amígdala que é uma estrutura subcortical situada no lobo temporal, decidindo

quais experiências foram importantes o bastante para armazenar. Essa seleção

depende, é claro, do significado emocional, ou seja, se um fato não marca

suficientemente o indivíduo para ser arquivado, a amígdala não exerce seu papel.

Caso ocorra o contrário, um fato chocante demais, ela ficará hiperativa,

provocando o cancelamento da memória.

Tal função confere a amígdala uma posição extremamente importante na

aprendizagem, pois sendo significativa ficará retida na memória.

O próximo passo das informações é chegar ao hipocampo, onde serão

fixadas por segundos ou dias, na memória de curta duração, sendo depois,

distribuídas para as outras áreas do cérebro onde ficarão arquivadas.

Com a ajuda de processos bioquímicos e estruturais muitas conexões

entre células de diferentes regiões cerebrais são ativadas, formando redes neurais

de combinações infinitas, permitindo, o armazenamento da memória. Após a

consolidação destas informações, inicia-se a próxima etapa caracterizada pela

evocação das mesmas, entrando em ação o córtex frontal para comparar

informações novas e antigas, colaborando na resolução de problemas e

planejamento.

Entende-se desse modo que, as capacidades de linguagem, percepção,

compreensão, fala, escrita e resolução de problemas requerem o armazenamento

de informações, pois aprender nada mais é do que a formação de uma rede de

conexões das unidades neuronais, em que a aprendizagem se dá pela

modificação e consolidação dessas conexões, após experiências vividas, retenção

de hábitos ou aquisição de novas informações.

O sistema nervoso codifica a linguagem, coordena sua emissão e

recepção e a decodifica. Para a emissão, trabalham os órgãos relacionados ao

aparelho fonador e os músculos da escrita. Na recepção da linguagem

trabalham principalmente as orelhas e os olhos. Quanto aos aspectos neurais,

a emissão abrange, basicamente, o cerebelo, o córtex motor do cérebro

(situado na porção posterior do lobo frontal), a área de Broca (também

localizada na porção posterior do lobo frontal esquerdo) e os nervos motores.

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22Há diferentes pontos do córtex motor que geram os movimentos da laringe, da

mandíbula, da língua e dos lábios, como também pontos que comandam a

habilidade das mãos para vários movimentos, inclusive a escrita.

O Sistema Nervoso Central recebe os estímulos do meio também pela

área auditiva situada no lobo temporal e pela visual localizada com

predominância no lobo occipital.

Tem-se ainda, a área de Wernicke localizada na parte posterior do

lobo temporal esquerdo, nervos sensitivos e as áreas motoras, relacionadas

com os movimentos oculares e a rotação da cabeça, movimentos presentes

durante a leitura. Uma lesão na área de Wernicke impede a pessoa de

entender as palavras que ouve, embora reconhecendo os sons e emitindo

palavras com significado claro.

A decodificação da linguagem escrita acontece no giro angular, situado

na junção dos lobos parietal, temporal e occipital, integrando as informações

sensoriais, auditivas e visuais. Estas informações são processadas

respectivamente em cada uma dessas regiões. Outra área importante é o giro

angular esquerdo, fundamental para a leitura e a escrita por ocupar uma

posição central, lesões nesta área impedem a pessoa de compreender o que lê,

embora não tenha comprometimento na fala.

Sendo assim, foi possível perceber as áreas cerebrais que apresentam

uma valiosa participação e importância nas questões relacionadas à

aprendizagem de uma forma global e como as descobertas de especialistas,

neurocientistas e pesquisadores trouxeram a oportunidade de maior

compreensão e entendimento frente ao funcionamento do nosso organismo,

sua atuação com o meio, nesta interdependência.

Esta trajetória de descobertas possibilita sair um pouco do

desconhecido e pensar a aprendizagem e possíveis dificuldades em uma ótica

biológica e não somente filosófica ou teórica, permite compreender que as

áreas cerebrais precisam estar em sintonia, uma com a outra, para que

efetivamente as conexões neurais se estabeleçam e a aprendizagem aconteça.

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23

CAPÍTULO II

COLABORAÇÕES DA NEUROCIÊNCIA NA

COMPREENSÃO DA DISLEXIA

O interesse crescente dos estudiosos ligados às neurociências tanto

na área da saúde como da educação tem contribuído de forma significativa

para o conhecimento da das áreas responsáveis pela linguagem, que é de

fundamental importância na comunicação interpessoal e para este estudo no

sentido de compreender a dislexia.

Como já foi abordado no capítulo anterior, com as descobertas da

neurociência, hoje já é possível ver o cérebro de alguém em funcionamento.

Estudos sofisticados com imagens do cérebro de uma pessoa que está lendo

permite aos pesquisadores rastrear o registro da palavra impressa (a leitura

pelo lobo occipital) quando ela é percebida visualmente, sendo depois

transformada em som da linguagem (área de Broca) e logo após ativa seu

significado (área de Wernicke).

Sabe-se então, que a comunicação humana (fala e linguagem)

depende diretamente dos processos que ocorrem no sistema nervoso, quando

o funcionamento ou desenvolvimento deste processo não está acontecendo

como deveria, algumas dificuldades podem surgir, com isso é necessário estar

atento.

Muitas vezes, no início do desenvolvimento, quem percebe a

dificuldade na aquisição da linguagem é a família ou uma pessoa mais próxima

da criança, comparando-a com outras crianças de mesma idade ou o

profissional da saúde, um pediatra, por exemplo, que a acompanha. Por isso,

este profissional deve possuir um bom entendimento da definição, da natureza

e das causas dos distúrbios e das dificuldades para contribuir no processo de

diagnóstico, visando uma intervenção precoce e intensiva, pois quanto antes

isso acontecer melhor será para a criança.

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24Com isso, cabe ressaltar que um distúrbio refere-se a uma questão

que compromete um “normal” desenvolvimento de alguns aspectos no sujeito,

trazendo um prejuízo ao convívio e bem-estar social do mesmo, todavia,

compreende-se que uma pessoa com algum tipo de distúrbio da linguagem

tende a sentir-se desvalorizada ou incapaz diante das dificuldades que

apresenta, atingindo diretamente sua comunicação e causando prejuízos em

seu relacionamento com os outros indivíduos e na sua autoestima.

2.1 – Áreas Funcionais da Linguagem

Entende-se que a linguagem é uma capacidade peculiar de se

comunicar por meio de um código simbólico adquirido (fala, gestos ou escrita),

o que permite transmitir pensamentos, ideias, emoções e sentimentos aos

semelhantes.

No primeiro capítulo já foram abordadas as contribuições de Broca e

Wernicke com suas descobertas relacionadas à linguagem, mas vale retomar

estes estudiosos referindo-se de forma mais aprofundada sobre suas

colaborações.

A partir dos estudos de Broca, afirmando que a fala acontece no

hemisfério esquerdo, deu-se início a ideia de assimetria hemisférica,

observando-se uma mão dominante, geralmente, a direita e a lateralização das

atividades com a mão, o pé e o olho, dando a este hemisfério as características

de dominância para os três seguimentos. Com estas contribuições, sabe-se

atualmente que o hemisfério esquerdo é, na maioria das vezes, o responsável

pelo controle da sequência temporal do ato de falar, sendo sua função mais

lógica com uma análise sequencial da informação, tendo esta área relação com

a articulação da fala.

Mais tarde Wernicke estudando pacientes afásicos, encontrou mais

dificuldades na compreensão do que na expressão, ficando claro que, a área

de Wernicke no hemisfério esquerdo está relacionada ao significado da palavra

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25e sua relação com as outras palavras da frase. Já esta região na parte

temporal no hemisfério direito relaciona-se a compreensão da emoção contida

no ato de falar, ou seja, a compreensão da afetividade na linguagem.

Os avanços dos estudos relacionados às áreas da linguagem mostram

que as áreas anatômicas da linguagem são mais complexas e constam de: a)

área de Broca (área 44) e parte da área de Brodmann (área 45) localizada no

pé da circunvolução frontal ascendente, responsável pelo planejamento motor

da linguagem oral; b) área de Wernicke (área 42 de Brodmann) nas porções

mediana e superior do lobo temporal, responsável pela percepção auditiva

envolvida na linguagem; c) fascículo arqueado que liga as duas áreas

anteriores; d) circunvolução angular ou prega curva, que corresponde à área 39

de Brodmann responsável pela integração do lobos parietal, occipital, frontal e

temporal, situada no entroncamento parietotemporoccipital, mas tem ligações

com as áreas motoras da fala e da escrita; e) circunvolução supramarginal,

localizada no lobo parietal inferior; f) fibras de associação como o corpo caloso,

que constitui a principal estrutura integradora inter-hemisférica; g) áreas

subcorticais que constituem o quadrilátero de Pierre Marie, acrescido do

tálamo; h) área frontomesial anterior, nos dois hemisférios, sendo

predominante no esquerdo, responsável pela intenção e vontade de usar a

linguagem; i) hemisfério não–dominante responsável pela prosódia e pelo

pragmatismo.

Compreende-se melhor as áreas relacionadas à linguagem nas figuras

abaixo de acordo com SHAYWITZ (2006, p.62 e 71)

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26

Vale ressaltar que nas crianças tais áreas ainda não estão bem

estabelecidas e as desordens aferenciais, sensoriais e motoras podem

transtornar a organização da linguagem, mesmo sem uma lesão cerebral, pois

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27não há centros pré-formados e sim, pré-formas de organização que aos poucos

vão adquirindo forma à medida que a comunicação vai se estabelecendo.

A maturação acontece primeiro nas áreas posteriores

occipitotemporais e depois nas anteriores frontais e pré-frontais, por isso a

maturação da assimetria hemisférica no nascimento apresenta-se nos dois

hemisférios cerebrais, contudo, diante da herança genética já se pode observar

em recém-nascidos leve assimetria na parte temporal do hemisfério esquerdo,

o que ocorre devido a rápida maturação e maior plasticidade cerebral nos dois

primeiros anos de vida. A partir desta idade, o lado esquerdo do cérebro

apresenta a região temporal, responsável pela linguagem, mais desenvolvida

no hemisfério esquerdo do que no direito.

Quando chega a fase adulta, a linguagem é controlada, na maioria das

vezes, pelo hemisfério esquerdo. A percepção da fala é conduzida para a área

de Wernicke, no lobo temporal esquerdo pelo nervo auditivo (VIII nervo

craniano), onde a mensagem é decodificada. A informação é transmitida pelo

fascículo arqueado para a área de Broca, também no hemisfério esquerdo,

local de elaboração da resposta motora, sendo assim, entende-se que o

hemisfério esquerdo é dominante para a linguagem no adulto, mas não na

criança bem pequena.

Nesse caminho que a informação faz em nosso cérebro para chegar à

aquisição da linguagem, não se pode desconsiderar os estímulos do meio,

compreendidos pelos sentidos que também fazem parte de todo o processo e

assim, a linguagem acontece em etapas dependentes entre si, que podem ser

classificadas em:

1) Sensação – capacidade de sentir o som;

2) Percepção – capacidade em que se reconhece o som;

3) Elaboração – capacidade de reflexão sobre os sons percebidos;

4) Programação ou organização das respostas e articulação –

capacidade de permitir a emissão sonora que depende da articulação da fala.

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28Este panorama sobre os processos cerebrais que envolvem a

linguagem facilita a compreensão frente ao trabalho do cérebro e as vias de

acesso que possui para que tal capacidade de comunicação seja eficiente.

2.2 – Dislexia e linguagem

Para uma melhor noção da complexidade do universo que envolve a

dislexia e sua relação com a linguagem, deve-se entender a definição de leitura

que, para muitos em um sentido amplo, é como a interpretação de sinais

gráficos, levando o pensamento a imaginar uma outra situação além daquela

vivida no momento real. Fazendo uma análise de forma restrita, a leitura é vista

como a interpretação de sinais gráficos, que uma comunidade convencionou

utilizar para substituir os sinais linguísticos da fala, em se tratando de substituir,

mentalmente ou pela fala, as palavras ou ainda dizer que a leitura é a

capacidade de levantar hipóteses e conclusões diante das informações

coletadas no texto, criando novas ideias.

Sendo assim, ao perceber que a leitura apresenta um enredamento

relacionado à aprendizagem simbólica, pois uma pequena mudança em uma

palavra já altera seu sentido e pronúncia, convém explicar que ler envolve

atenção, habilidade motora, vários tipos de memória, organização de texto e

imagem mental. Neste aspecto também é preciso levar em consideração a

subjetividade, a idade, o sexo, hereditariedade, prática e motivação do

indivíduo. Para tanto, a linguagem como a leitura são atividades que, apesar de

simples para muitos, podem para alguns ser sinônimo de entraves e

dificuldades, principalmente no caso dos disléxicos.

Sabe-se que a aquisição da leitura é um processo muito importante em

nossa sociedade, principalmente na fase da alfabetização, contudo alguns

sujeitos a partir deste período começam a apresentar significativas dificuldades

no que se refere à leitura e a escrita. É bem verdade que nem todos os casos

de dificuldades de aprendizagem, em se tratando da leitura e da escrita, deve

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29ser entendido como dislexia, por isso a necessidade de ter o cuidado em não

generalizar e buscar um diagnóstico sério e preciso, pois afeta uma minoria de

sujeitos.

No Brasil, como em muitos outros países foi adotado atualmente o

termo dislexia para denominar um distúrbio específico na aquisição da leitura e

da escrita, tal nomenclatura foi dada pelo fato de etimologicamente, ao

desmembrar a palavra dislexia termos: dis = distúrbio, dificuldade; lexia =

leitura (do latim) e /ou linguagem (do grego), então, temos dislexia = distúrbio

da linguagem.

Este termo foi usado pela primeira vez por Berlin, em 1872, ressurgiu

em 1917 com Hinshelwood que atendeu um paciente com inteligência normal,

mas apresentava dificuldades na leitura e na escrita. Foram observadas

distorções perceptivas em crianças que não conseguiam reconhecer e

compreender palavras impressas, concluiu-se na época que a causa mais

provável seria um defeito no cérebro, afetando a memória visual de palavras e

letras, por isso os oftalmologistas foram os primeiros profissionais a auxiliarem

no reconhecimento da dislexia, suas contribuições ocorreram no sentido de

mostrar que a dificuldade apresentada não estava relacionada a um problema

nos olhos, e sim, no funcionamento de áreas responsáveis pela linguagem no

cérebro.

A primeira definição mais esclarecedora sobre dislexia é do

neurologista americano, Dr. Samuel T. Orton, que foi homenageado tendo seu

nome na primeira instituição para pesquisas e estudos sobre a dislexia, a Orton

Dislexia Society, a atual International Dyslexia Association, cuja definição foi

citada por IANHEZ e NICO (2002, p. 21)

È uma dificuldade que ocorre no processo de

leitura, escrita, soletração e ortografia, não é uma

doença, mas um distúrbio com uma série de

características. Torna-se evidente na época da

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30alfabetização, embora alguns sintomas já estejam

presentes nas fases anteriores. Apesar da

instrução convencional, adequada inteligência e

oportunidade sociocultural e ausência de distúrbios

cognitivos fundamentais, a criança falha no

processo de aquisição da linguagem. A dislexia

independe de causas intelectuais, emocionais e

culturais. É hereditária e a maior incidência é em

meninos na proporção de três para um (ou seja, a

cada três meninos que nascem com dislexia,

apenas uma menina nasce disléxica).

Com base nas descobertas do dr. Orton e outros pesquisadores que

se dedicaram ao tema, a partir da década de 60 intensificou-se a busca na

tentativa de encontrar uma definição para o termo dislexia, considerando-a um

distúrbio que se manifesta pela dificuldade na aprendizagem da leitura, mesmo

com um bom nível de inteligência e um ambiente sociocultural adequado.

A definição mais aceita atualmente é a que segue abaixo, encontrada

nas pesquisas de neuroanatomia e neuropsicologia e adotada pela Associação

Brasileira de Dislexia, elaborada no Comitê de Abril de 1994, citada por

IANHEZ e NICO (2002, p. 23)

A dislexia é um dos distúrbios de aprendizagem. É

um distúrbio específico de linguagem, de origem

constitucional caracterizado pela dificuldade em

decodificar palavras simples. Mostra uma

insuficiência no processo fonológico. Essas

dificuldades em relação às palavras simples não

são esperadas em relação à idade. Apesar de

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31instrução convencional, adequada inteligência,

oportunidade sociocultural e ausência de distúrbios

cognitivos e sensoriais fundamentais, a criança

falha no processo da aquisição da linguagem com

frequência, incluídos aí os problemas de leitura,

aquisição e capacidade de escrever e soletrar.

Convém ainda expressar que, ao menor sinal de dificuldade na

linguagem, não podemos identificar um indivíduo como disléxico. Para um

diagnóstico preciso é necessário investigar e observar várias causas com

caráter multidisciplinar e de exclusão, a observação de alguns sintomas deve

ser incluído em um “quadro de risco”, ou seja, apresentar algumas

características que podem confirmar a dislexia, mas isso precisa ser aprovado

com uma avaliação adequada.

Em todas as idades os leitores que apresentam uma leitura

consistente e fluente ao lerem ativam fortemente a parte posterior do cérebro,

com menor ativação na parte frontal, os disléxicos apresentam mudanças com

o passar da idade nas ativações cerebrais, tal ativação nas crianças disléxicas

mais velhas é maior nas regiões frontais, de forma que, quando adolescentes

acontece uma superativação na área de Broca, ou seja, passam a usar mais

frequentemente as regiões frontais para a leitura e então, precisam usar

sistemas da parte frontal do cérebro para compensar o problema da parte

posterior, esta é uma maneira de tentar equilibrar a dificuldade de leitura, como

vemos na figura a seguir SHAYWITZ (2006, p. 74)

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32

Por conta disso, os disléxicos utilizam sistemas de leitura

compensatórios, além de dependerem mais da área de Broca, eles usam

outros caminhos secundários, fazendo uma diferente rota de leitura, localizado

no lado direito na parte anterior do cérebro, mas que não é automático,

impedindo o reconhecimento rápido das palavras, o desenvolvimento da parte

anterior e do lado direito, permite uma leitura precisa, mas ainda muito lenta.

Também é importante frisar que durante muito tempo não havia um

consenso com relação às características mais aparentes da dislexia, mas

atualmente especialistas abordam que os sintomas mais comuns da dislexia

são:

• Desempenho inconstante;

• Demora na aquisição da leitura e da escrita;

• Lentidão nas tarefas de leitura e escrita, mas não nas orais;

• Dificuldade com os sons das palavras e, consequentemente,

com a soletração;

• Escrita incorreta com trocas, omissões, junções e aglutinações

de fonemas;

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33• Dificuldade em associar o som ao símbolo;

• Dificuldade com rima (sons iguais no final das palavras) e

aliteração (sons iguais no início das palavras);

• Discrepância entre as realizações acadêmicas, as habilidades

linguísticas e o potencial cognitivo;

• Dificuldade em associações, por exemplo, associar um rótulo ao

seu respectivo produto;

• Dificuldade na organização sequencial, por exemplo, ordenar as

letras do alfabeto, os meses do ano, tabuada, etc;

• Dificuldade em nomear objetos, tarefas, etc;

• Dificuldade em organizar-se com o tempo (hora), no espaço

(antes e depois) e direção (direita e esquerda);

• Dificuldade em nomear números de telefone, mensagens, fazer

anotações ou fazer alguma tarefa que sobrecarregue a memória

imediata;

• Dificuldade em organizar tarefas e realizar cálculos mentais;

• Desconforto em tomar notas e /ou relutância para escrever;

• Persistência no mesmo erro, embora conte com ajuda

profissional.

Segundo o dr. Norman Geschwind, diretor da unidade de Neurologia

do Beth Israel Hospital em Boston, citado por IANHEZ e NICO (2002, p. 27)

O que pode ser dito é que os conhecimentos de

vários aspectos da dislexia podem ser enriquecidos

se forem vistos por um enfoque biológico e

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34sociológico. Temos de entender sua relação com o

talento muito desenvolvido e também com as

condições sociais que fazem dele um distúrbio.

Temos de entender também as outras formas de

distúrbio de aprendizagem, uma vez que estas

podem nos ajudar a perceber aspectos da dislexia

que, de outra forma, nos poderiam ter escapado.

Quanto mais amplo o contexto em que observamos

a dislexia, mais poderemos entender suas causas e

isso, por sua vez, poderá contribuir para o

refinamento do diagnóstico e também para o

tratamento mais eficaz.

Em se tratando da dislexia ou de qualquer outro distúrbio, um

diagnóstico correto, feito no momento adequado, logo que as dificuldades

tenham surgido ou as tenham observado, é de suma importância para a

criança e para a família, liberando-os de um outro diagnóstico ou das dúvidas

sobre o que realmente aquela criança apresenta.

O diagnóstico da dislexia é de exclusão e por isso, deve ser feito por

uma equipe multidisciplinar, formada por: psicólogo, fonoaudiólogo,

psicopedagogo e quando necessário, deve ser feito um encaminhamento ao

neurologista e outros profissionais, como: oftalmologista, pediatra,

otorrinolaringologista, para se determinar se realmente existem fatores que

possam estar comprometendo o processo de aprendizagem ou mesmo

comprovar a dislexia. Por isso um diagnóstico multidisciplinar, pois todos os

profissionais devem trocar informações para confirmar o distúrbio, ao grupo de

profissionais também deve estar atrelado ainda a família e a escola, dois

grupos aos quais a criança faz parte que sem nenhuma dúvida podem

colaborar com informações e práticas valiosas nesse processo de investigação.

A dislexia é um problema persistente até a vida adulta, o disléxico tem

dificuldades em automatizar as operações relacionadas ao reconhecimento de

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35palavras, assim, empregam mais tempo e energia em tarefas de leitura, porém

este indivíduo pode prosseguir seus estudos e conquistar uma vaga na

educação superior, por exemplo. Contudo isto exige bastante esforço e

dedicação do mesmo.

É válido frisar que a dislexia está presente desde os primeiros anos de

escolaridade, só em casos de lesão cerebral é que ela será considerada

adquirida, sendo assim, suas evidências são genéticas, causada por diferenças

funcionais no hemisfério esquerdo.

Cabe ainda citar, baseado nos estudos de MOOJEN e FRANÇA

(2006, p.168) e nas investigações realizadas por outros estudiosos em uma

população, cujas famílias apresentavam um considerável número de disléxicos,

os resultados encontrados definiram dois marcadores: no cromossomo 15

(Smith et al., 1983) e no cromossomo 6 (Cardo et al.,1994). As análises de

Grigorenko e seus colaboradores (1997) retratam que o fenótipo de dislexia

que está ligada à inabilidade para a leitura global da palavra (uso da rota

lexical) está relacionada com a alteração do cromossomo 15, enquanto a

disfunção fonológica está ligada ao cromossomo 6. Outro importante

pesquisador da neurogenética, Galaburda (1999) demonstrou uma simetria no

plano temporal como suporte anatômico da dislexia.

Outros aspectos relacionados à questão da dislexia se referem ao não

comprometimento intelectual, uma vez que os disléxicos apresentam

capacidade intelectual normal, visão e audição normais e não apresentam

problemas psíquicos e neurológicos graves que tenham ligação com o

diagnostico de dislexia. O distúrbio da dislexia também pode estar presente em

indivíduos que tiveram um bom nível de escolarização, não apresentaram

rompimento com o processo escolar e nem um considerável número de faltas

no ano letivo.

O quadro de dislexia supõe um déficit primário com relação à

inabilidade no processamento fonológico e da memória. O comprometimento

da linguagem dos disléxicos é específico do processo fonológico, enquanto

outros sistemas encontram-se intactos. Como toda língua alfabética é

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36fundamentada na relação fonema-grafema, os disléxicos com uma

representação fonológica mal especificada, definem um modelo diferente para

decodificar a palavra, isto inibe a aprendizagem no reconhecimento fluente das

palavras.

A dificuldade na representação fonológica acarreta uma limitação na

capacidade de armazenar informações verbais na memória de curto prazo, o

que ocasiona deficiência no mapeamento de sequências de fonemas, de letras

e de palavras e compromete a nomeação das mesmas, fazendo com que o

disléxico use, muitas vezes, a tentativa de adivinhação, utilizando palavras

inadequadas naquela leitura.

A dislexia pode ser classificada em três tipos, considerando as duas

vias independentes que possibilitam o reconhecimento de uma palavra escrita:

1) Via léxica ou direta – nesta se estabelece uma conexão

direta entre a forma visual da palavra, a pronúncia e o

significado na memória lexical (como uma foto da palavra);

2) Via fonológica, indireta, pré-léxica ou de subpalavras –

refere-se a um processo de recodificação fonológica que

envolve a aplicação de regras na conversão letra-som,

diante de palavras desconhecidas.

Para uma boa leitura fluente, deve-se utilizar as duas vias, caso se

utilize apenas uma ou outra, haverá pouca destreza na leitura o que pode

caracterizar um quadro de dislexia.

A figura abaixo representa o Modelo Dual citado por MOOJEN e

FRANÇA (2006, p.169), segundo versão de Jorm e Share (1983) em que se

observa o percurso das rotas lexicais.

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37

(a) Via direta ou léxica; (b) e (c) Via indireta ou fonológica.

Tipos de Dislexia:

a) Dislexia Fonológica (sublexical ou disfonética) – dificuldade

seletiva para operar a rota fonológica durante a leitura, apresentando um

funcionamento aceitável na rota lexical. Neste caso, o problema aparece na

conversão entre fonema-grafema e/ou no momento de juntar os sons parciais

em uma palavra completa. Deste modo, a dificuldade reside na leitura de

palavras ainda não familiarizadas, nas tarefas de memória e de consciência

fonológica. Portanto, há um esforço em manter a atenção nas palavras para

não esquecer a sua formação (as sílabas) dificultando compreender o que foi

lido.

b) Dislexia Lexical (de superfície) – a dificuldade reside na operação da

rota lexical, preservada ou quase preservada a rota fonológica, afetando

a leitura de palavras irregulares. Neste caso, a leitura é lenta com

oscilações e erros frequentes, pois a rota fonológica é mais vagarosa em

seu funcionamento, permitindo um maior número silabações, repetições

e retificações, podendo às vezes acentuar também de forma incorreta as

palavras.

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38c) Dislexia Mista – há problema tanto para operar a rota fonológica

quanto a lexical. São situações mais graves que exigem um esforço

maior para abrandar o comprometimento às vias de acesso ao

vocabulário.

É de suma importância compreender que mesmo a dislexia, sendo um

distúrbio linguístico que apresenta como uma de suas características persistir

da infância até a fase adulta, a presença de dificuldades na leitura ou escrita,

não determina um quadro de dislexia por si só. É preciso estar atento às

diversas características que uma criança pode apresentar no seu

desenvolvimento da linguagem em geral, estas observações podem ser feitas

desde cedo, não há a necessidade de esperar a criança chegar à

alfabetização. Em futuras suspeitas de dislexia, na educação infantil, por

exemplo, (de 0 a 6 anos) já se pode observar:

• Lentidão no desenvolvimento da fala e linguagem expressiva,

atrasando a automatização dos fonemas e da fala semelhante

a dos adultos;

• Dificuldades em atividades que necessitem dividir uma palavra

em pedaços (sílabas) e brincar com rimas;

• Dificuldade de conhecer as letras e evocar palavras,

apresentando um vocabulário restrito.

Nas séries iniciais:

• Desempenho inferior nas tarefas de habilidades fonológicas;

• Déficits na nomeação rápida das palavras;

• Dificuldades em aprender a ler e a escrever;

• Memória verbal de curto prazo deficiente;

• Dificuldade para aprender sequências comuns, como: dias da

semana, meses do ano, etc;

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39• Dificuldade em língua estrangeira;

• Dificuldades na matemática não aparecerão na capacidade de

calcular, mas sim, na tentativa de interpretar o que o problema

está pedindo.

Na fase adulta:

• Tendência à leitura lenta, embora alguns disléxicos nesta

fase já consigam ler de forma mais correta;

• Dificuldade com a ortografia e produção textual;

• Dificuldades em língua estrangeira.

Um olhar diferenciado para o sujeito desde o processo de aquisição

da fala e da linguagem, respeitando-se, é claro, seu desenvolvimento passo a

passo, buscando compreender o mesmo, como um ser integral e verificando

seus avanços e conquistas a cada dia para perceber se estão acontecendo de

forma normal e satisfatória é de extremo valor neste processo de identificação

de dislexia, pois a ajuda e orientação certa, neste caso, poupam sofrimentos e

desmotivações no processo de aprendizagem.

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40

CAPÍTULO III

AÇÕES NEUROPEDAGÓGICAS: PRESSUPOSTOS

PARA UMA EDUCAÇÃO INCLUSIVA DOS DISLÉXICOS

Com o intuito de evidenciar que a neurociência pode trazer contribuições

para o processo de desenvolvimento dos alunos, no caso deste estudo, os

disléxicos. Este capítulo apresenta de forma sintética, abordagens que

ressaltam diferentes aspectos quanto à aprendizagem dos disléxicos e o que

pode ser feito para que os mesmos alcancem os objetivos propostos em sala

de aula, uma vez que, tais abordagens são de grande colaboração para a

prática docente.

Quando se trata de dificuldades de aprendizagem, distúrbios,

transtornos ou algo que possa prejudicar o bom andamento da construção da

aprendizagem do aluno há a necessidade de se pensar em práticas

pedagógicas e, até mesmo avaliativas, que orientem da melhor maneira

possível o trabalho do professor, fazendo com que este alcance seus objetivos

em classe.

Contudo, não só com os alunos disléxicos, com deficiências ou que

apresentem necessidades especiais, deve-se planejar para que as práticas

educacionais se voltem para o aluno. Mais adiante, serão ressaltados alguns

aspectos relevantes que possam colaborar e auxiliar a ação docente no

percurso desafiador da educação inclusiva com foco na dislexia.

Compreender o desenvolvimento do processo educacional nas suas

ações pedagógicas torna-se difícil quando não há o entendimento da

diversidade dos seres que constituem a unidade. É justamente a diferença que

permite a transformação, a troca e o aprendizado do indivíduo ou do grupo a

que pertence, ampliando suas conquistas individuais e sociais.

A este raciocínio cabe a proposta de inclusão que se pretende

alcançar nas escolas regulares, partindo do pressuposto da escola buscar

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41meios de adaptar-se para receber o educando e oferecer-lhe educação de

qualidade que promova seu desenvolvimento.

Ainda nessa perspectiva de acolher o aluno e adaptar-se à realidade

desafiadora, é fato que, não se pode deixar de lado as práticas pedagógicas

que objetivem oferecer o melhor a todos os alunos, por esse motivo pensa-se

atualmente em práticas neuropedagógicas dentro do ambiente escolar que

possibilitem aos profissionais da educação conhecer de forma mais

aprofundada o funcionamento do sistema nervoso e das áreas cerebrais para

assim, atuarem com eficiência.

Todos devem receber cuidados e serviços educacionais que atendam

às suas necessidades e supram suas dificuldades. Para isto, a escola não

pode continuar com uma prática de ensino e uma avaliação colaboradoras da

exclusão. Os professores devem deixar de lado o caminho de ensinar saberes

compartimentados, sem nenhuma conexão entre si, que dificultam ainda mais o

interesse pelo conteúdo e a construção do conhecimento, para buscar meios

que despertem a atenção e o interesse dos mesmos pelos conteúdos

propostos.

Entretanto, o trabalho educativo torna-se um desafio mais complexo,

partindo da realidade do professorado que se considera em sua maioria

despreparado, muitas vezes, leigo no assunto, ou que simplesmente acredita

que o lugar das crianças com alguma diferença das ditas “normais” deve ser

em uma escola especializada.

Para que o trabalho aconteça de forma adequada às necessidades

desses alunos, o preparo do professor é de extrema importância no sentido

deste ser o grande colaborador e o agente mais próximo do aluno. Todavia, o

problema do despreparo acaba por preceder a ação pedagógica e se instaura

na formação docente, pois muitos professores são incapazes de reelaborar o

significado de sua ação e restringem-se ao papel de meros transmissores dos

conteúdos.

A função de reprodutores, entretanto, pode ser superada quando estes

incentivam e fornecem meios para os alunos ultrapassarem os entraves na

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42aprendizagem. De acordo com o CEE nº 5 de 15 de abril de 1998, citado por

IANHEZ e NICO (2002, p. 131 e 132)

“... a educação escolar consiste na formação

integral e funcional dos educadores, ou seja, na

aquisição de capacidades de todo tipo: cognitivas,

motoras, afetivas, de autonomia, de equilíbrio

pessoal, de interrelação pessoal e de inserção

social...

... os conteúdos escolares não podem limitar-se

aos conceitos e sim devem incluir procedimentos,

habilidades, estratégias, valores, normas e atitudes.

E tudo deve ser assimilado de tal maneira que

possa ser utilizado para resolver problemas nos

vários contextos...

... os alunos não aprendem da mesma maneira

nem no mesmo ritmo. O que eles podem aprender

em uma determinada fase depende de seu nível de

amadurecimento, de seus conhecimentos

anteriores, de seu tipo de inteligência...

... se o aluno não aprendeu, o ensino não produziu

seus efeitos, não havendo aqui qualquer utilidade

em atribuir culpa ou responsabilidade a uma das

partes envolvidas. Para recobrar algo perdido, é

preciso sair à sua procura e o quanto antes melhor:

inventar estratégias de busca, refletir sobre as

causas, sobre o momento ou circunstâncias em

que se deu a perda, pedir ajuda. Se a busca se

restringir a dar voltas no mesmo lugar,

provavelmente não será bem sucedida.”

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43Com base nesta afirmação é importante destacar que a ação

pedagógica deve se voltar para esse gosto pela busca e descoberta, onde

cada momento da sala de aula é uma expectativa frente ao novo e

interessante, relacionado ao conhecimento mais profundo do sujeito. Diante de

uma prática pedagógica que motiva a classe ao saber, pesquisando e criando

alternativas para superação, o processo educativo dedica-se a identificar as

barreiras que estão impedindo ou dificultando a aprendizagem dos alunos

disléxicos, como também de toda a turma.

É importante que a classe docente tenha o cuidado de não se fechar

somente à formação pragmática, voltada para o ensino das técnicas que

conduzem a ideia de que “a teoria é muito distante da realidade”, impedindo-os

de serem o que realmente deveriam ser.

Tratando-se de ações neuropedagógicas, é preciso considerar todas

as variáveis que incidem na aprendizagem: as de cunho individual, as que

incidem no ensino (como as condições da escola e da prática docente), as que

inspiram diretrizes gerais da educação, as questões sociais e emocionais, bem

como as relações que se estabelecem entre todas elas.

Sob esse enfoque a ênfase da neuropedagogia deve recair no

desenvolvimento e na aprendizagem do aluno, bem como na melhoria da

instituição escolar, para que esta atenda o sujeito da aprendizagem de acordo

com suas necessidades.

Para que este procedimento ocorra, a escola deve estar disposta a

modificar hábitos arraigados que não estejam funcionando, analisando suas

práticas de forma a executar aquilo que trará proveito satisfatório no processo

educativo, excluindo um trabalho pedagógico que vise o caminho mais fácil e

menos complicado. Cabe também não rejeitar o compromisso com uma prática

pedagógica e avaliativa de qualidade.

Tais ações são necessárias para assegurar o bom êxito do processo

educativo, pensando no aluno em sua totalidade. Afinal, as mudanças para

uma escola inclusiva, em muitos aspectos ainda precisam acontecer. Se a

escola que se quer construir é a da inclusão, então não se pode pensar em

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44modificar apenas estruturas físicas, materiais e recursos, deixando de lado as

práticas efetivas.

Não se pode falar em transformações no âmbito da escola sem atentar

para a formação dos professores, uma vez que muitos deles, como já foi falado

anteriormente, sentem-se despreparados. Quanto a esta questão, a formação

dos professores para atender a diversidade e o desenvolvimento de trabalhos

em equipe são fatores indispensáveis para garantir a inclusão dos alunos

disléxicos, enfrentando e desconstruindo o fracasso escolar.

O inciso III, do artigo 59 da LDB (9394/96), aponta o perfil dos

professores para atender às exigências da escola inclusiva, não só com os

alunos disléxicos, mas para fazer um bom trabalho com todos:

O professor da classe comum deve se capacitar, comprovando que, na

sua formação, foram incluídos conteúdos e disciplinas específicas da área de

Educação Especial, bem como ter desenvolvido algumas competências de

acordo com o exigido na LDB (Brasil, 1996) para:

I – perceber as necessidades educacionais especiais dos alunos;

II – flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento;

IIII – avaliar continuamente a eficácia do processo educativo;

IV – atuar em equipe, inclusive com professores especializados em Educação Especial.

Como está descrito na LDB, para identificar as necessidades dos

alunos é preciso trabalhar, buscando uma prática pedagógica flexível nas

diversas áreas do conhecimento, para o professor perceber em que aspecto ou

área da aprendizagem o aluno está encontrando dificuldades. Também se deve

avaliar todo o processo de aprendizagem para o alcance da eficácia; e ainda é

importante que este professor atue em conjunto com profissionais

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45especializados para conquistar o bom desenvolvimento dos seus educandos

com uma ação educativa de qualidade na sala de aula. Estas são tarefas que

exigem do professor conhecimento adequado e compromisso com o trabalho

educacional, pois não há como separar os dois.

É bom enfatizar que as ações neuropedagógicas e as mudanças no

sistema educativo não são de responsabilidade somente dos professores,

porém estes necessitam de uma formação adequada para lidar com seus

alunos, pois não adianta incluir na prática, e teoricamente não oferecer nada de

proveitoso e satisfatório ao desenvolvimento dos alunos.

Deste modo, faz-se necessário no âmbito deste novo enfoque

educacional que as atividades em classe sejam ministradas de forma

interdisciplinar, respeitando as diferenças, com objetivos bem definidos, dando

a oportunidade de todos os alunos participarem. Também é importante, que a

escola ofereça um apoio pedagógico como suporte ao trabalho do professor,

dependendo das dificuldades que o aluno apresenta.

Diante das diferenças, a educação não deve se esvaziar para que haja

o acompanhamento do desenvolvimento do aluno. Caso isso aconteça, perde-

se o sentido do trabalho e a prática pedagógica se torna nula. Assim, a

aprendizagem precisa ser um processo constante e vivo, pois o

desenvolvimento do aluno está associado ao tipo de trabalho desenvolvido.

Como a educação tem à frente o processo de formação do indivíduo,

as escolas não devem tratar os alunos disléxicos como “cobaias” de suas

experiências. Elas precisam contribuir com o desenvolvimento cognitivo, afetivo

e autônomo desse sujeito, para que este tenha a possibilidade de estar inserido

na sociedade como um verdadeiro cidadão.

3.1 – Ações que fazem a diferença

O melhor ensino possível para uma criança disléxica é na sala de aula

“normal”, juntamente com outras crianças e com um professor que compreenda

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46seus problemas, buscando organizar as aulas de forma a mediar e orientar

quando for preciso.

Preferencialmente o professor deve fazer uso de um programa bem

estruturado de linguagem, usando todos os canais sensoriais (os sentidos)

tanto para a leitura, como também para a escrita, por isso um educador que

conheça o funcionamento cerebral e as áreas que estará trabalhando com

estímulos sensoriais faz toda diferença.

A maioria das crianças tem seu sistema sensório-motor ajustado para

o desenvolvimento e aquisição da linguagem falada e escrita, já as disléxicas

apresentam um canal sensório-motor sem harmonia, o visual, o auditivo, o da

fala e o cinestésico-motor têm como efeito uma certa incapacidade em produzir

um estímulo para uma resposta automática.

Sendo assim, é importante orientar um trabalho voltado para o uso

simultâneo dos sentidos (multissensorial), trabalhando o uso dos olhos,

ouvidos, órgãos da fala, dedos e músculos, envolvendo todos os caminhos

para o cérebro. Deste modo, o disléxico é capaz de usar áreas de força, em

que apresenta maior habilidade, ao mesmo tempo em que exercita as áreas

mais fracas, tendo como objetivo proporcionar o aprendizado de respostas

automáticas duradouras (os nomes, sons e formas de todos os fonemas) e

desenvolver a habilidade de sequênciá-las nas palavras. Este conhecimento a

tornará mais segura, pois conseguirá produzir de qualquer maneira o símbolo

na leitura, escrita ou soletração. O seu sistema receptivo precisa interagir para

isso acontecer.

O ensino dado ao disléxico precisa ser sistemático e cumulativo,

cuidadosamente monitorado e regularmente avaliado de forma a verificar sua

eficiência, para isso as tarefas escolares de disciplinas semelhantes devem ser

apresentadas de diversas maneiras, de modo que cada passo seja trabalhado

sem repetições cansativas antes do seguinte estágio.

O estudante disléxico enfrenta muitos fracassos no seu percurso

escolar, daí a necessidade de valorização dos pequenos progressos

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47conquistados, pois para ele ter um pequeno sucesso restabelece sua

autoconfiança.

3.2 – O papel da escola

Neste processo de aprendizagem do disléxico, vale frisar que a escola

não deve trabalhar sozinha, havendo a suspeita da dislexia em algum aluno, a

mesma deve encaminhá-lo para uma avaliação com um profissional adequado

para realização de vários testes, cabe salientar que a escola será destinada à

parte pedagógica e da docência.

Constatando-se que um aluno é disléxico, a escola deve:

• Encorajá-lo;

• Criar um ambiente acolhedor;

• Atender e respeitar seus limites;

• Pesquisar e estudar, preparando-se para ampará-lo em sua

dificuldade;

• Ter um comportamento paciente, para que possa oferecer a ele

um tempo suficiente para cumprir sua tarefa ou até mesmo

repeti-la várias vezes para retê-la;

• Permitir erros, isso fará com que ele se sinta mais livre para se

expressar e com maior interesse para corrigir seus erros;

• Manter uma relação de troca de experiências e evolução com os

pais e com o responsável que o acompanha;

• Fazer elogios por tentar fazer algo que para ele é difícil, sem

deixá-lo desistir;

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48• Ressaltar as respostas corretas e não as erradas, valorizando

seus acertos;

• Tranquilizá-lo, embora tenha dificuldades de aprendizagem, ele

é inteligente e esperto;

• Não o deixe sentir que o seu valor como pessoa está

relacionado ao seu desempenho escolar;

• Estimular a expressão verbal;

• Dar instruções curtas e simples evitam confusões, uma vez que,

há a dificuldade em memorizar instruções muito demoradas ou

várias atribuições ao mesmo tempo;

• Para a dificuldade com a lateralidade, uma marca qualquer é

necessária, pode ser feito, por exemplo, com o relógio de pulso

ou um anel usado sempre do mesmo lado;

• Aceitar que o aluno disléxico se distraia com maior facilidade

que os demais, posto que a leitura lhe exige um enorme

esforço;

• Usar textos do interesse do aluno disléxico para treinar a

leitura;

• Aproveitar a tecnologia como: gravadores, computadores,

calculadoras, disponibilizando sempre que possível para uso do

professor e dos alunos;

• Ensinar a resumir anotações para sintetizar uma explicação;

• Propiciar o uso da arte que é um veículo de extrema ajuda. Os

traços amplos e os movimentos dos braços, do pulso e da mão

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49• no uso do giz de cera ou da massa de modelar, por exemplo,

desenvolvem a coordenação visuo-motora e a coordenação

motora fina, além de possibilitar a autoexpressão, cria confiança

e satisfação, ajudando na autoestima do disléxico;

• Permitir avaliações orais;

• Evitar testes de múltipla escolha, pois estes descontextualizam

as informações e, muitas vezes, têm um tempo mais reduzido

que os discursivos, com isso para os disléxicos tornam-se mais

difíceis e não demonstram o que realmente aquele aluno sabe.

• Oportunizar um local tranqüilo para a realização de testes e

provas para o disléxico focar sua atenção na atividade que irá

realizar.

O fundamental é oferecer à criança disléxica toda ajuda e amor, pois

suas dificuldades já são bem frustrantes. Não se pode esquecer que ela é

capaz, criativa e muito inteligente, afinal, com certeza, possui outros talentos.

Assim, a escola precisa incentivá-la para que os mesmos sobressaiam.

Para uma pessoa disléxica é valioso explicar-lhe que ela aprenderá a

ler e escrever, mas se lhe for ensinado de forma apropriada. Levá-la com sua

turma à exposições, museus, teatros, atividades esportivas, bem diversificadas

trará muitos benefícios.

É importante para quem tem dislexia saber que, apesar de algumas

diferenças com relação às outras pessoas, ela é amada e traz alegria para a

escola e seus professores, sem contar é claro, que a mesma precisa ter esse

acolhimento, principalmente, de sua família.

O professor deve diversificar a sua maneira de apresentar a matéria

para proporcionar a informação necessária para estímulo intelectual dos

alunos, destacando bem os disléxicos, pois estes não obterão toda a

informação a ser estudada e aprendida apenas por meio de textos. Deve incluir

em suas aulas o uso de filmes, gravações, data show com apresentações

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50ilustradas, debates e outros materiais didáticos que sejam acessíveis ao se

trabalho, não perdendo o foco de que, quanto mais explorado for o conteúdo de

diferentes formas, trará mais benefícios.

O trabalho docente precisa estar pautado na parceria e na cooperação

entre todos os alunos em sala de aula, para que se possa construir um senso

de competência nas crianças disléxicas. Elas podem não ter tanta habilidade

na linguagem e, por isso, precisam superar como os outros alunos as

diferenças individuais, tendo a oportunidade de descobrir seu brilhantismo em

outras áreas.

Todos aqueles envolvidos com a aprendizagem, destacando-se os

profissionais da escola devem ter em mente que, se um indivíduo não pode

aprender da maneira como é ensinado, é melhor ensiná-lo como ele pode

aprender, nem que para isso se utilize diversas formas.

Sabe-se que modificar o paradigma da educação para uma visão mais

inclusiva como meio de auxiliar a aprendizagem do aluno, deixando de lado as

ideias já impregnadas de classificação e punição depende não somente do

corpo docente, pois isso é colocar toda ineficiência de um sistema educativo

sob a responsabilidade de apenas um grupo.

A proposta inclusiva preocupada com a decisão de se optar pelo

melhor para o aluno deve ser aceita e colocada em prática por toda a escola,

chegando até a comunidade, para assim viver no cotidiano escolar o

verdadeiro significado da palavra inclusão.

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51

CONCLUSÃO

Este estudo pretendeu investigar as contribuições da neurociência

para a compreensão da dislexia tendo como objetivos específicos: identificar e

caracterizar a dislexia, explicar as descobertas da neurociência diante da

dislexia e exemplificar ações neuropedagógicas que auxiliem os disléxicos.

Para responder às questões deste trabalho, foi utilizado como

procedimento metodológico pesquisa bibliográfica que auxiliasse as

investigações. Com este trabalho foi possível compreender que a neurociência

oferece subsídios colaboradores para a compreensão da dislexia, favorecendo

o trabalho pedagógico, voltando-se para as reais necessidades dos disléxicos,

em uma interação que facilita e abre os horizontes para uma prática

pedagógica mais consciente e eficiente na sala de aula.

Contudo, estudando a problemática da dislexia com os avanços da

neurociência, é perceptível entender que até hoje nem sempre as escolas têm

exercido um bom trabalho e contribuído para um bom desenvolvimento dos

alunos disléxicos, pois ainda encontram-se obstáculos dentro das instituições

para se realizar o processo de inclusão, uma vez que a própria escola e muitos

professores encontram-se despreparados em termos de informações para lidar

com a dislexia, para organizar suas aulas e uma metodologia adequada que

realmente favoreça o desenvolvimento dos mesmos.

Também é importante abordar que uma prática neuropedagógica

voltada para a mediação entre aquele que é o centro da aprendizagem (o

aluno) e quem possui a tarefa de educar (o professor) pode colaborar de forma

significativa na prática docente e no aperfeiçoamento cognitivo dos educandos

por fornecer meios aos professores para atender às necessidades e

dificuldades da classe, captando minuciosamente os pontos que precisam ser

detalhados e melhor abordados com as devidas adaptações, principalmente

para os alunos disléxicos, facilitando assim seus entendimentos.

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52Todavia, mesmo com toda trajetória histórica da neurociência e suas

descobertas, como foi abordada anteriormente, com o objetivo atual de auxiliar

na educação, ainda é um desafio em construção que precisa ser melhor

estruturado na realidade educacional brasileira.

Entretanto, as modificações na prática pedagógica com uma visão

neurocientífica, estando a serviço do corpo discente, colaboram no sentido de

fazer a inclusão se efetivar mais rapidamente. Pois, se dentro das salas de aula

das escolas comuns estiver presente a preocupação, o incentivo e o respeito

às diferenças no processo educativo, todo o corpo docente, não só a educação

inclusiva, obterá progressos. Assim, o processo educativo, que para muitos é

visto como um instrumento auxiliador da exclusão cederá espaço a uma visão

acolhedora que possibilite ao educando desenvolver-se de forma eficaz para

manter e organizar sua vida em sociedade.

A prática neuropedagógica deve servir também ao professor como

instrumento de melhoria do seu trabalho, dando-lhe possibilidades de progredir

cada vez mais no processo educativo, e assim auxiliar a aprendizagem de seus

alunos de forma satisfatória. Quando no ambiente se conseguir dar à

aprendizagem o significado de estar a serviço do aluno e do professor, o

trabalho educativo se tornará mais completo e favorecerá o desenvolvimento.

Na maioria dos casos a aprendizagem colabora com apenas um percentual da

turma, aqueles que não apresentam dificuldades para aprender, fazendo a

prática pedagógica se perder num vazio, o que não deve ser este o objetivo

das escolas.

Aprender não só para os disléxicos, como também para todo o sistema

educativo implica deste modo, em constante troca de informações, onde ocorre

o dinamismo nas relações e no processo de aprendizagem que ocasiona a

evolução do desenvolvimento do aluno, estando o professor sempre presente

para mediar o processo. Para isto, o professor deve ter consciência do seu

papel e de sua prática pedagógica, utilizando-a como meio de melhorar seu

trabalho na sala de aula, buscando resultados satisfatórios no desenvolvimento

dos seus alunos e no aperfeiçoamento do seu trabalho educativo.

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53A escola deve oferecer a todos o alunos, de maneira geral, condições

ao seu desenvolvimento, para que possam compreender e participar

ativamente das relações sociais e do processo de aprendizagem.

Cabe ressaltar que na educação inclusiva não se pode enfatizar o

aspecto homogêneo que se pretendia alcançar nas classes do passado. Faz-se

necessário hoje, adaptar-se a inclusão. A escola e a sociedade devem inserir-

se nessa nova realidade para atender à sua clientela com eficiência e

qualidade, buscando formas de validar o processo educativo sem comprometer

sua eficiência.

Somente com a produção do aluno e do professor, sendo o aluno

investigador de suas aprendizagens no processo educativo e o professor o

mediador na ação pedagógica de suas aulas e não havendo uma metodologia

que focalize e valorize a reprodução, e sim busca, descoberta, encontros e

desencontros, tornando a atitude de pesquisa importante fator na aquisição dos

conhecimentos, que a construção da aprendizagem se dará de maneira ativa e

terá importância na vida dos educandos.

Assim, o professor necessita na educação inclusiva, alterar sua visão

estática e suas atitudes passivas, transformando sua prática pedagógica em

constatações relevantes diante de suas experiências, criando fundamentações

científicas que permitam utilizar em suas aulas procedimentos adequados aos

alunos, às suas necessidades, de modo a permitir os avanços no

desenvolvimento e, mais tarde, ser um indivíduo participativo na sociedade.

É importante ressaltar ainda que, a prática neuropedagógica na

educação inclusiva também é um desafio, tendo suas diretrizes e repostas

construídas ao longo do tempo com os acertos e erros que tal problemática

permite. Porém para se avaliar e educar os alunos dentro das salas de aulas

deve-se construir um trabalho sério que anseie realmente por transformações

qualitativas e modifique positivamente a trajetória educacional das escolas.

É bem verdade que falta, ainda, por parte de muitos profissionais,

preparo para efetivar um trabalho nas aulas que colabore de forma benéfica ao

desenvolvimento dos alunos disléxicos. Esta realidade precisa ser

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54transformada para que todos os alunos desfrutem de uma educação que lhes

proporcione satisfação e sucesso.

Não há mais como utilizar frente às diferenças uma pedagogia

aprisionada ao mecanicismo que em nada colabora para o processo de

desenvolvimento e que apenas transmite medo e exige reprodução de

conhecimento que, na verdade, como já diz o próprio termo, o aluno não tem o

conhecimento, ele simplesmente repete ou copia, não sendo o centro do

processo de aprendizagem, pois se encontra desarticulado de sua construção.

As pesquisas que já foram realizadas não devem esgotar-se,

precisam a cada momento de renovação para contribuir cada vez mais com a

educação, afinal pensar em uma prática neuropedagógica é algo recente em

nossa sociedade. Sendo assim, expandir essa ideia na educação inclusiva, é

algo que ainda anseia por estudos contínuos e respostas que auxiliem a prática

pedagógica.

Por esse motivo, a questão da neurociência na compreensão da

dislexia, com uma postura mais inclusiva, não se esgota neste estudo; faz-se

necessário continuar tal investigação para se chegar a um trabalho capaz de

estruturar as turmas, onde as diferenças sejam o incentivo para novas

descobertas.

Após a pesquisa bibliográfica foi possível verificar que modificações

nas atitudes e pensamentos dos professores precisam acontecer

concretamente, não somente se pensando na dislexia, mas na educação como

um todo, uma vez que a inclusão precisa fazer parte do sistema educativo.

É interessante enfatizar que lidar com o diferente nem sempre é fácil;

esta relação se não for bem alicerçada, pode prejudicar, muitas vezes, o

processo, pois se não houver a mediação do professor, não há contribuições

relevantes para o bom desenvolvimento do aluno, nem para a melhoria da

prática pedagógica. A falta da interação faz a educação se perder como um fim

em si mesma, sem o dinamismo e a continuidade que precisa ter para alcançar

a eficiência do processo.

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55Pensando na qualidade da educação para os alunos disléxicos,

buscou-se oferecer informações que possam colaborar com a ação educativa

dos professores, uma vez que compreendam a neurociência como

colaboradora da educação inclusiva. Desejando ainda que, o desenvolvimento

deste estudo contribua de forma significativa para o repensar e o ressignificar

da ação das escolas com alunos disléxicos, proporcionando a eles uma

educação de qualidade, longe das premissas do preconceito e das práticas

ineficientes de inclusão e de avaliação, que em nada contribuem para uma

aprendizagem verdadeira.

Para que a neuropedagogia aconteça nas nossas escolas como uma

prática inclusiva e a educação acolha a todos os alunos, apesar de suas

diferenças, os ideais de inclusão precisam tomar forma na realidade, saindo

das discussões teóricas. Para tanto, é preciso deixar claro que, as construções

teóricas são de extrema importância para o bom andamento das situações que

se estabelecem no campo educativo, mas devem acontecer concretamente nas

escolas.

Deste modo, cabe frisar que há pela frente um longo percurso para se

alcançar nas escolas os objetivos almejados; ainda é preciso um trabalho sério

para reformular pensamentos e práticas desarticuladas com a realidade vivida

dentro do espaço educativo, pois se a educação faz parte da vida, esta na

escola não pode parecer algo separado da vivência dos alunos.

Nessa perspectiva de ação, movimento e provocação, o processo de

construção do conhecimento se torna mais interessante e permite ao aluno ser

o investigador de seus conhecimentos, trocando experiências e informações

com o professor que o auxilia.

Desta forma, conceber a aprendizagem escolar do disléxico na

educação inclusiva é colaborar de forma efetiva para a construção das páginas

da educação que precisam ser preenchidas e transformadas, favorecendo um

ambiente satisfatório, consciente, e uma aprendizagem prazerosa.

Espera-se que esta investigação contribua com as devidas

transformações que precisam acontecer no sistema educativo e oriente o

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56trabalho dos professores em direção a uma prática neuropedagógica que

respeite a diversidade e valorize cada espaço do processo de desenvolvimento

dos alunos disléxicos, fazendo-os progredir na vida escolar e social.

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