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UMA PUBLICAÇÃO DO OBSERVATÓRIO ASTRONÓMICO DE LISBOA VERSÃO ELECTRÓNICA EM http://www.oal.ul.pt/oobservatorio/ A magnífica nebulosa NGC346, uma maternidade estelar

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UMA PUBLICAÇÃO DO OBSERVATÓRIO ASTRONÓMICO DE LISBOA

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A magnífica nebulosa NGC346,uma maternidade estelar

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FICHA TÉCNICA

O Observatório é uma publicação do Observatório Astronómico de Lisboa, Tapada da Ajuda, 1349-018 Lisboa, Telefone: 213616739, Fax: 213616752;Endereço electrónico: [email protected]; Página web: http://oal.ul.pt/oobservatorio. Edição: José Afonso, Nuno Santos, JoãoLin Yun. Composição Gráfica: Eugénia Carvalho. Impressão: Fergráfica, Artes Gráficas, SA, Av. Infante D. Henrique, 89, 1900-263 Lisboa. Tiragem:2000 exemplares. © Observatório Astronómico de Lisboa, 1995.

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NNNNNESTEESTEESTEESTEESTE ano de 2005 celebra-se o centenário da publicação porAlbert Einstein de alguns dos mais importantes resultados edescobertas científicas de toda a história da humanidade. Einsteindizia que “comparada com a realidade, a ciência é algo de tosco eprimitivo, mas é também aquilo que temos de mais precioso”.

A Ciência é de facto preciosa e por mais do que uma razão.Aquilo que tem sido realçado vezes sem conta são as suas aplicaçõespráticas que permitiram que a espécie humana se tenha libertado demuitas das suas limitações naturais, como a sua força física e estatura.Através da Ciência, o Homem manipula hoje poderes físicos enormes,para o bem ou para o mal. Através das máquinas que constrói, domina ovôo e alcança mesmo outros astros, cura doenças, prolonga o tempo devida, ou envenena o ambiente e destrói a vida. Mas a Ciência é preciosatambém por outras razões, porventura menos presentes no espírito daspessoas. A Ciência permite o treino da racionalidade, permite o treino deuma forma de pensar rigorosa e disciplinada, com efeitos positivos ounegativos tal como no caso das suas aplicações práticas.

A mente humana é complexa. Nela, os aspectos racionais co-existemcom aspectos mais instintivos ou emocionais. Através dodesenvolvimento da racionalidade, o ser humano conseguiu distinguir-se dos outros animais. E é através do raciocínio lógico-dedutivo e dométodo experimental científico, assente em regras claras, que têm sidopossíveis as descobertas científicas. Quando treinamos a mente noraciocínio matemático, desenvolvemos a capacidade de abstracção,de elaborar operações mentais com símbolos. Este treino em raciocíniomatemático-científico, rigoroso como ele é, nem sempre é fácil. Exige,tal como com qualquer treino físico-desportivo, esforço, insistência,empenho, durante algum tempo, até que se notem progressos. É poressa razão que é necessário desenvolver nas crianças e jovens a noçãode que não podem desistir perante algo que é (inicialmente) difícil.

Uma mente que se treina no raciocínio científico (e que não se fecheàs outras dimensões que compõem a vida psíquica humana) trazgrandes benefícios ao seu dono. Confere-lhe a capacidade de análisede situações que caracteriza a inteligência, a capacidade de abstracçãoque lhe permite uma vida psíquica mais rica, e o rigor e a honestidadeque as regras científicas naturalmente exigem. Contudo, há queprecaver de um perigo bem actual: quando as nossas sociedadesesmagam todas as manifestações mais instintivas ou emocionais,elevando a razão a um deus único, criam seres desequilibrados quesofrem pela incapacidade de viverem livremente as suas dimensõesinstintivas e emocionais. A Ciência e a racionalidade são preciosas,das coisas mais valiosas que temos, mas não as únicas. E a maiordádiva da Ciência, tornar-nos seres humanos mais racionais, não deveser desvirtuada pela negligência e repressão das restantes dimensõeshumanas. A Astronomia, através da contemplação e descoberta doUniverso gigantesco, pode porventura ajudar-nos no re-encontro como misterioso, com a fascinação que é ser-se um ser humano, semidolatrar a racionalidade. Tal como afirmei anteriormente: “...acontemplação das leis do Universo, o estudo da Ciência, pode ajudar apreservar uma das dádivas principais que fazem de nós seres humanos:o deslumbramento de sermos tão pequenos e efémeros num Universoque se rege por leis de grande beleza estética, e a consciência de que éum Universo que faz sentido, gostemos ou não do papel que neledesempenhamos.”

João Lin Yun, Director do OAL

AGENDA

O Observatório Astronómico de Lisboa dispõe de umserviço de visitas guiadas ao seu Edifício Central.Marcações para grupos podem ser efectuadas através dotelefone 213616730, fax 213616750, ou através doendereço electrónico [email protected]

O Observatório Astronómico de Lisboa oferece palestraspúblicas mensais, de entrada livre, no Edifício Centralsobre temas de Astronomia e Astrofísica, normalmentena última 6.ª feira de cada mês às 21h30. No final decada palestra e caso o estado do tempo o permita, fazem-se observações de corpos celestes com telescópio. Paramais informações consulte: http://www.oal.ul.pt/palestras/

1919: A RELATIVIDADE E O OAL24 de Junho 2005, 21h30m

pelaDr.ª Elsa Mota

- PRÓXIMA PALESTRA PÚBLICA NO OAL

- VISITAS GUIADAS AO OAL

NA CAPA:

Imagem obtida pelo telescópio espacialHubble de uma população de estrelasembrionárias no interior da nebulosa NGC346, situada a 210 mil anos luz de distância,na Pequena Nuvem de Magalhães. Estasestrelas encontram-se em formação por acçãodo colapso gravitacional de nuvens de gás, nãotendo sido ainda iniciada a fusão nuclear nosseus interiores. Cortesia: NASA, ESA e A. Nota(STScI).

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EEEEERRRRRUPÇÕESUPÇÕESUPÇÕESUPÇÕESUPÇÕES DEDEDEDEDE RAIOSRAIOSRAIOSRAIOSRAIOS-X -X -X -X -X PODEMPODEMPODEMPODEMPODEM AJUDAJUDAJUDAJUDAJUDARARARARAR FORMAÇÃOFORMAÇÃOFORMAÇÃOFORMAÇÃOFORMAÇÃO DEDEDEDEDE PLANETPLANETPLANETPLANETPLANETASASASASAS Nuno Santos CAAUL/OAL

Observações realizadas pelotelescópio espacial de raios-XChandra parecem mostrar que asestrelas semelhantes ao Solproduzem enormes erupções(“flares”) quando ainda são jovens.Este resultado pode ter implicaçõesimportantes para as teorias deformação dos planetas.

A menos que tenhamos umamáquina do tempo, que nospermita viajar até ao passado, aúnica forma que temos paraperceber como seria o Sol pouco tempo após a sua formação éobservar outros jovens “sois”, estrelas ainda em formação ou quese formaram há pouco tempo. Foi exactamente isto que umaequipa internacional de astrofísicos fez.Utilizando o telescópiode raios-X Chandra, observou durante 13 dias consecutivos anebulosa de Orion, uma grande “maternidade” de estrelas que seencontra a cerca de 1500 anos-luz de nós. Os dados recolhidospermitiram estudar a emissão de raios-X em cerca de 1400 estrelasjovens, 30 das quais semelhantes ao Sol.

Os resultados mostram que estas estrelas emitem quantidadesenormes de raios-X provenientes de gigantescas erupções, centenasde vezes mais poderosas do que as observadas nas estrelas mais velhas.Embora este resultado não seja inesperado, mostra que estesfenómenos são muitíssimo mais pronunciados do que os que seobservam hoje no Sol, e ocorrem a uma escala muito maior.

Na realidade, já se sabe há algum tempo que as estrelas jovens sãoparticularmente “activas”. Os fortes campos magnéticos existentes,

catalisados pela grande rotação queestes objectos têm, levam à formaçãode grandes manchas escuras nafotosfera, bem como de outro tipo defenómenos ligados ao magnetismoestelar. Entre estes encontra-se aexistência de poderosas erupções queemitem grandes quantidades departículas carregadas para o espaço.São fenómenos deste tipo, embora emmenor escala, que produzem ascoloridas auroras na atmosfera daTerra.

Mas estas observações têm outras implicações. Hoje élargamente aceite que os planetas se formam em discos de gás epoeira em torno de estrelas jovens. Cerca de metade das estrelasobservadas na nebulosa de orion parecem possuir discos proto-planetários. Ora, as poderosas erupções observadas terãocertamente alguma influência nestes discos, e portanto nosplanetas que neles se formam. Mas qual?

Segundo os astrofísicos, estas erupções bombardeiam os discoscom poderosos ventos de partículas ionizadas. Como resultado,estes adquirem uma certa carga eléctrica, que combinada com oefeito da rotação do disco e dos campos magnéticos produz umagrande turbulência. Esta turbulência pode impedir os planetas quese tenham formado de migrar para regiões mais interiores do disco(ver O Observatório, Vol.10, n.º1, pág 4), acabandoeventualmente por ser “engolidos” pelas estrela. Ou seja, estaserupções podem ser uma espécie de seguro de vida que permite asobrevivência dos planetas.

Ilustração de um disco proto-planetário em torno de umaestrela activa. As enormes erupções têm como consequência oaparecimento de turbulência (direita) num disco inicialmenteuniforme (esquerda), acabando por influenciar a formação eevolução dos planetas. Cortesia de CXC/M.Weiss.

Graças ao observatório espacial Swift, daNASA, foi pela primeira vez detectada comprecisão a posição de uma explosão curta deraios gama, tendo sido possível observar aassinatura desta explosão noutroscomprimentos de onda.

As explosões de raios gama permanecem umdos grandes mistérios da Astronomia, mais de40 anos após a sua descoberta. Foi apenas em1997 que as primeiras distâncias forammedidas a estes objectos, e o seu carácter ex-tra-galáctico provado. Em 1998 uma explosãode raios gama foi pela primeira vez associadacom uma supernova, mas a violência dasexplosões de supernova necessária para geraruma explosão de raios gama é tal que surgiu otermo “hipernova”. Contudo, todo esteconhecimento diz respeito às explosões“longas” de raios gama, com durações quevariam entre dois segundos e vários minutos, e cujas assinaturaspodem perdurar durante semanas noutros comprimentos de onda.

As explosões curtas de raios gama, pelo contrário, podem durarapenas alguns milisegundos, não tendo sido possível atérecentemente observar a “assinatura” destes eventos noutroscomprimentos de onda - o que permitiria localizar e estudar estesfenómenos, que se crê terem uma origem distinta das explosõeslongas de raios gama. Poderemos estar a observar uma colisãoentre buracos negros ou estrelas de neutrões, mas as explosõescurtas de raios gama são de tal modo breves que nenhumaobservação detalhada foi possível até hoje.

O observatório espacial Swift, lançado emNovembro último, foi concebido para estudaras explosões de raios gama, estando equipado,para além do detector de raios gama, comtelescópios de raios-X e ultravioleta/óptico.Após detectar uma explosão de raios gama, oSwift pode apontar os seus outros telescópiospara a região do céu em causa numa questãode segundos, e é esta capacidade que alimentaas expectativas dos astrónomos relativamenteao estudo das explosões curtas de raios gama.

No passado dia 9 de Maio, o Swift detectouuma destas explosões, com uma duração deapenas 50 milisegundos. Menos de um minutodepois, efectuava já as primeiras observaçõesda região da explosão com os seus telescópios:no UV/óptico não detectou nenhum sinal, masnos raios-X foi possível observar um sinal quedesapareceu passados cinco minutos. Apesar

de fraco, este sinal foi suficiente para localizar com precisão aposição da explosão de raios gama, que parece ter tido origemnuma galáxia elíptica, rica em populações estelares idosas, a cercade 2.7 mil milhões de anos-luz. Tal é consistente com a teoria decolisões entre buracos negros ou estrelas de neutrões, já que estesobjectos representam as etapas finais da evolução estelar.

Esta região está agora a ser observada detalhadamente comoutros telescópios, entre eles o telescópio espacial Hubble e otelescópio espacial de raios-X Chandra, esperando-se que de taisestudos possa resultar uma melhor compreensão das misteriosasexplosões curtas de raios gama.

A rapidez do observatório espacial Swiftpermitiu observar, pela primeira vez, aassinatura de uma explosão curta de raiosgama em raios-X, o que possibilitourestringir a sua localização à regiãoassinalada na imagem. Parece que estefenómeno terá acontecido na periferia deuma galáxia elíptica, relativamentebrilhante nesta imagem óptica. Cortesia:Joshua Bloom (University of California,Berkeley) e colaboradores.

UUUUUMAMAMAMAMA NONONONONOVVVVVAAAAA EXPLEXPLEXPLEXPLEXPLOSÃOOSÃOOSÃOOSÃOOSÃO CURCURCURCURCURTTTTTAAAAA DEDEDEDEDE RAIOSRAIOSRAIOSRAIOSRAIOS GAMAGAMAGAMAGAMAGAMA José Afonso CAAUL/OAL

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No passado dia 14 de Janeiro asonda europeia Huygens desceucom sucesso em Titã, enviando asprimeiras imagens nítidas dasuperfície da maior lua de Saturno.Este é um acontecimento que ficarána história da exploração espacialporque tem, ao mesmo tempo, umsignificado científico e simbólico sócomparável ao da chegada dasprimeiras missões soviéticas eamericanas a Vénus e Marte.O sucesso da Huygens mostra, an-

tes de mais, mesmo para quem nãose interessa pelos resultadoscientíficos da missão, ser já possívelaos seres humanos atingir o sistemade Saturno e explorar por meio deengenhos não tripulados essescorpos que distam de nós 10 vezesa distância da Terra ao Sol. Para aEuropa, trata-se de uma enormerealização técnica a nível de

engenharia, operação e coordenação das inúmerasactividades necessárias para levar a bom termo umamissão da envergadura da Huygens. Significa também,desde a entrada da sonda atmosférica da missão Galileuna atmosfera de Júpiter em 1995, o duplicar do nossoalcance no Sistema Solar em apenas 10 anos. E significapor fim, se nos lembrarmos que a Cassini-Huygens éum esforço conjunto da NASA, da Agência EspacialEuropeia e da Agência Espacial Italiana, o sucesso dacooperação internacional como a única maneira deexplorarmos essa zona do Cosmos mais próxima denós que é o Sistema Solar.

Desde a sua descoberta por Christiaan Huygens emMarço de 1655, Titã permaneceu um dosobjectos mais enigmáticos do SistemaSolar. Foi sobrevoado em 1980 e 1981pelas sondas Voyager, mas estas nãoconseguiram observar a superfície,apenas um globo alaranjado e uniformeonde não se conseguia ver nenhumdetalhe. A cor alaranjada é consequênciade numerosas partículas em suspensão naatmosfera que dispersam a luzprincipalmente nos comprimentos deonda do vermelho e do amarelo.

A atmosfera é composta por cerca de98% de azoto e 2% de metano. A brumaé o resultado de uma cadeia complexa dereacções químicas que começa com a

divisão destas moléculas pela luz ultravioleta do Sol(fotólise) e por electrões energéticos da magnetosferade Saturno, gerando moléculas cada vez maiores e maiscomplexas. Estas moléculas, hidrocarbonetos formadospor longas cadeias de átomos de carbono e hidrogénio,formam agregados com dimensões da ordem de 0.1micrómetros, e estes, por sua vez, juntam-se entre siformando agregados maiores. Todas estas partículas,muito semelhantes ao smog que observamos napoluição das grandes cidades, formam a bruma. Elassão transportadas pelos ventos na atmosfera e sãoessenciais para compreendermos a meteorologia de Titã.Tal como a Terra, o eixo de rotação de Titã está

inclinado relativamente ao plano da órbita, o queprovoca uma variação da energia recebida por cadahemisfério ao longo do ano. Actualmente é o hemisférioSul que recebe mais energia do Sol, sendo aí Verão. Aenergia disponível é convertida em correntes de arascendentes onde as condições favorecem a formaçãode nuvens. Uma das primeiras imagens da sonda Cassinimostrava nuvens próximas do pólo Sul, confirmando oque já se suspeitava com base em observações a partirda Terra.Embora o trabalho de análise dos dados ainda esteja a

decorrer, já podemos traçar um balanço dos principaisresultados da missão Huygens.A sonda transportava abordo seis instrumentos destinados à exploração dasuperfície, à caracterização físico-química da atmosferae à medição dos ventos. O instrumento DISR (DescentImager and Spectral Radiometer) foi um dos maisimportantes. Composto por um conjunto de 13 sub-instrumentos, incluindo três câmaras e umespectrógrafo, deu-nos não só as imagens que vimosda superfície, mas também espectros. Um espectro écomo uma radiografia que mostra o que os olhos nãovêem directamente, e dele podemos deduzir, por

exemplo, a composição química daatmosfera e da superfície.Um outro instrumento importante foi o

HASI (Huygens Atmospheric StructureInstrument), cujos termómetros ultra-precisos mediram a temperatura durantea descida até à superfície gélida que estáa 188 graus negativos, a pressão (1.5 barno solo), a condutividade eléctrica epesquisaram (em vão) por vestígios derelâmpagos e trovões.Para a aterragem foi escolhida uma zona

de interface, a 10S, 180W, perto do quese pensa ser um continente, onde se sabiaexistirem vários tipos de terreno. Foi du-rante a descida em pára-quedas que,

HUYGENS MOSTRA NOVO PANORAMA DETITÃ

A superfície de Titã vistapela sonda Huygens em14 de Janeiro. A cor foiajustada a partir deimagens obtidas adiferentes comprimentosde onda de forma asimular o que veria oolho humano nasmesmas condições.Cortesia: ESA/NASA/JPL/University of Ari-zona.

Mosaico de três imagens mostrandouma rede de drenagem, provavelmenteassociada a rios de metano. A zonabranca à direita poderá ser névoa demetano. Cortesia: ESA/NASA/JPL/Uni-versity of Arizona.

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David LuzCAAUL/OAL

enquanto rodava, a câmara captou as imagensque nos chegaram. Ao contrário do que seesperava, a bruma estende-se até à superfície,e só as imagens abaixo de 25 km de altitudetêm alguma nitidez. A 18km de altitude vemosuma rede de drenagem como as queobservamos em sistemas fluviais terrestres,ligada a zonas extensas mais escuras queparecem ser terras baixas. A 8 km de altitudevemos o que parece ser a linha de costa, comuma separação nítida entre um terrenoelevado, mais claro, e terras baixas. Outrasfotografias mostram mesmo indícios de baixios, comleitos fluviais salpicados por possíveis depósitos dealuvião. Os contrastes entre zonas claras e escuras dão-nos pistas importantes para compreendermos a naturezada superfície. O globo de Titã é formado por umamistura de rochas e gelo, mas quase toda a componenterochosa, mais pesada, deve encontrar-se no seu centro.Assim, as áreas mais claras podem ser gelo exposto, eas áreas escuras podem ser depósitos de partículas debruma que caíram lentamente da atmosfera e que, como passar das eras se acumularam no solo. Parte do inte-rior, aquecido pelas forças de maré de Saturno, podeser líquido. Uma das imagens mostra o que podem serextrusões de gelo, água líquida vinda do interior queaflorou à superfície através de falhas e solidificou.O ponto de aterragem da sonda situa-se numa das

zonas mais escuras e é provavelmente um leito lagunarou de rio. A fotografia da superfície mostra umapaisagem preenchida por blocos de gelo arredondados,com dimensões de 15 a 20 cm. Estes seixos têm marcasde erosão na base, como os que se vêem na Terra emleitos de rios, indicando que foram arrastados por algumtipo de fluido que terá moldado a sua forma. Osespectros obtidos indicam claramente a existência degelo misturado com outros compostos, mas ainda nãofoi possível identificar quais. Trata-se provavelmentede uma mistura rica em moléculas complexasprovenientes da bruma atmosférica.A interpretação das imagens ainda está sujeita a de-

bate, mas sabemos que os contrastes entre zonas clarase escuras advêm do relevo ou da composição, mas nãopodem ser atribuídos a sombras uma vez que não háluz directa a chegar àsuperfície. A difusãona atmosfera e aabsorção pelo metanolevam a que só 10%da luz recebida porTitã chegue àsuperfície.A existência de

líquidos na superfíciede Titã era umaconjectura antiga. Àtaxa actual de fotólise,

apenas 10 milhões de anos seriam suficientespara esgotar todo o metano da atmosfera.Como a idade do Sistema Solar é de 4600milhões de anos, teria de haver umreservatório de metano à superfície parareabastecer a atmosfera. Além disso, nascondições de temperatura e pressão do solo ometano é líquido, pelo que poderia formar riose lagos. Assim, as imagens da Huygens vêmconfirmar esta possibilidade, mostrando quehouve num passado recente (à escala depoucos milhões de anos) líquidos à superfície,

mas também levantar outra questão: porque não foramdetectados líquidos directamente? Poderá acontecer quea formação de rios e lagos seja um fenómeno periódicoou episódico, ou simplesmente teremos visitado Titãpouco depois de se ter esgotado o reservatório demetano? Embora não sejam visíveis quaisquer líquidos,um dos instrumentos da sonda detectou a evaporaçãode metano no momento em que esta, aquecida pelafricção com a atmosfera, tocou o solo. É possível que ogelo da superfície seja poroso, como certas rochas, eque esteja embebido em metano, ou que este exista logoabaixo da superfície. A resistência da superfície medidadurante o impacto da sonda mostrou que há uma crostafina e dura, com poucos centímetros, a cobrir umacamada mais mole.A partir do que sabemos, podemos estabelecer um

paralelo entre Titã e a Terra, em que o gelo, a água, ometano líquido e a bruma desempenham o papel darocha, da lava, da água e do aluvião, respectivamente.Às condições de pressão e temperatura de Titã o gelocomporta-se como rocha, e poderá haver vários tiposde gelo. No interior o gelo derrete, e poderá ocorrerum vulcanismo frio que traz água líquida à superfície,solidificando rapidamente. O metano é líquido àsuperfície, podendo evaporar, formar nuvens e chover.A bruma atmosférica acumula-se em depósitos àsuperfície, sendo estes levados pelas chuvas para osrios e lagos. Blocos de gelo que se desprendem dasmargens são arrastados e moldados pela corrente.Com a missão Huygens ainda só começámos a

compreender Titã. Mas já emergiu dos primeirosresultados uma nova visão, de um mundo muito mais

parecido com a Terrado que pensávamos, eao mesmo tempo tãodiferente do nosso ede todas as outras luasgeladas dos planetasgigantes. Como umarepetição de certospadrões gerais danatureza, ao vivo e acores, mas cominfinitas variações.

A baixa altitude é possíveldistinguir terras altas, comuma grande variedade deterrenos, e uma zona baixa,uniforme. Cortesia: ESA/NASA/JPL/University ofArizona.

Panorama de 360o da região à volta do local da aterragem. À esquerda vê-se o que parece seruma zona elevada. Cortesia: ESA/NASA/JPL/University of Arizona.

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RETRATOS DA ESTRELA (QUASE) POLAR

Pedro Raposo OAL

Alpha Ursae Minoris, Polaris, HD 8890, ou simplesmente...Estrela Polar. A estrela que todos conhecem, pelo menos pelonome, e que todos sabem ser indicadora do Norte. Quanto aidentificá-la no céu, e a saber explicar por que é que indica onorte, a disseminação do saber é certamente mais limitada...Porque se avizinham as cálidas noites de Verão,que convidam à permanência ao ar livre e àcontemplação do céu, propomos-lhe, nestaedição, uma actividade de iniciação àastrofotografia, muito simples, para a qual nãonecessitará senão de alguns equipamentostriviais: o mapa do céu da pág. 8 deste boletim,uma máquina fotográfica (de preferência reflex,com objetiva de 50 mm), um tripé, e (salvo sepossuir uma máquina digital) um rolo desensibilidade mais elevada que o usual (200 ou400 ISO). Objectivo: desvendar o “mistério”da estrela polar. Se as horas de ir para a camanão constituírem problema (agora que anoitecemais tarde) esta será uma experiênciainteressante para efectuar na escola, com alunosmais novos, nestes últimos dias de aulas. Dereferir, no entanto, que pode ser realizada emqualquer altura do ano, incluindo no Inverno,em que céu limpo e temperaturas amenas nãosão de esperar, mas anoitece cedo.

Para começar, terá obviamente que saberidentificar a Polar. O truque mais célebre consiste em imaginarum linha que passa por α e β da Ursa Maior e prolongá-la nosentido β - α, até se perfazer, aproximadamente, cinco vezes adistância angular entre estas duas estrelas; encontrará então aPolar (ver ilustração na edição online).

Num local com a iluminação ambiente reduzida tanto quantopossível, monte a sua máquina no tripé, coloque-a em aberturamáxima, e aponte-a para a Polar. Seleccione a pose B e façauma exposição de, pelo menos, uma hora. Aplique umaabertura de 2.8 ou 4 (esta última mais recomendável em locaiscom menos luz). Use um cabo disparador para evitar fazertrepidar a máquina. Pode experimentar exposições de duraçãodiferente. Com alguma sorte, poderá registar eventuaismeteoros (“estrelas cadentes”), com algum azar um aviãodeixará rasto nas suas fotos. Nada disso perturbará, no entanto,o resultado pretendido. Se tudo correr bem, deverá obterimagens semelhantes à imagem. Para poder efectuarcomparações, aplique o mesmo procedimento (com uma horade exposição), já não com a máquina apontada para a polar,mas para o zénite (ponto mais alto do céu) e, com a máquinavirada para Sul, para um ponto a uma altura ligeiramentemaior que a da Estrela Polar. Neste último caso, o objectivo éfotografar estrelas próximas do equador celeste, que mais nãoé do que a projecção do equador da Terra na esfera celeste.Com um pouco mais de rigor, refira-se que a intersecção doequador celeste com o meridiano (linha norte-zénite-sul), paraa latitude de Lisboa, dá-se a uma altura de cerca de 52 grausem relação ao horizonte.

Reveladas as fotografias, e se estas tiverem sido bemsucedidas, chega a altura de as interpretar. Eis algumassugestões de tópicos a abordar numa discussão didáctica:

i) na fotografia centrada na Polar, vemos que as estrelaspróximas descreveram arcos de círculo em torno dela. Há

portanto um movimento aparente de rotação da esfera celesteem torno da Estrela Polar. Trata-se, obviamente, de umaconsequência do movimento de rotação da Terra. Olhandopara os rastos deixados na fotografia, concluiremos que asestrelas que rodeiam a Polar estarão (como esta última) sempre

acima do horizonte: são as chamadas estrelascircumpolares (este efeito será mais notórionuma fotografia que inclua o horizonte).

ii) Se avançássemos para Norte, ao longo doplaneta, o que aconteceria à Estrela Polar?

Apareceria tanto mais alta no céu quantomais a Norte nos encontrássemos. No limite,no Pólo Norte, em que parte do céu averíamos? Neste último caso, praticamenteno zénite. Ora, se alguém pudesse permanecerde pé no pólo norte, estaria alinhado com oeixo da Terra, e teria a estrela polar por cimada sua cabeça. Ou seja, a Estrela Polar coin-cide com a direcção definida pelo eixo daTerra - é como se o eixo apontasse para essaestrela. Daí que, na fotografia, as estrelaspareçam girar em torno da Polar.

iii) O ponto matemático que corresponde àintersecção do eixo da Terra com a esfera celesteé designado por Pólo Celeste (neste caso, PóloNorte Celeste). Se a fotografia for nítida,verificar-se-á que a Polar não permaneceu

exactamente imóvel, mas também se deslocou (uma fotografiade longa exposição, tirada com a máquina acoplada a umtelescópio, revelará de forma inequívoca a trajectória circularda polar). O que significa isso? Que, na verdade, não éexactamente coincidente com o pólo norte celeste. Actualmente,está desviada cerca de 0.8 graus. Na verdade, até já esteve maisafastada. Na época dos Descobrimentos, esse afastamento erada ordem de 3.5 graus. Este desvio variável da Polar em relaçãoao pólo celeste deve-se ao movimento de precessão do eixo daTerra - um movimento semelhante ao de um pião, com umperíodo de cerca de 26 000 anos. Devido a esse movimento, oeixo vai “apontando” para pontos diferentes (o mesmo que dizerque a posição do pólo celeste vai variando). Por conseguinte, aactual Estrela Polar vai deixar de o ser - no ano 14 000, a estrelapolar será Vega, da constelação da Lira. Haver uma Estrela Po-lar que indica o Norte é mero fruto de uma (quase) coincidênciafeliz entre a posição de uma estrela brilhante e o pólo celestenorte. No hemisfério sul, como é sabido, não há nenhuma estrelabrilhante significativamente próxima do pólo celeste.

iv) Na fotografia tirada com a máquina apontada ao zénite,veremos que a curvatura da trajectória das estrelas é muito menosnotória em relação às estrelas próximas do pólo; e na fotografiatirada com a máquina apontada para as proximidades do equadorceleste, veremos trajectórias rectilíneas. Além disso, para tem-pos de exposição iguais, veremos que os traços serão maiores àmedida que nos afastamos do pólo celeste. Ou seja - o movimentoaparente das estrelas próximas do pólo é mais lento, e das estrelaspróximas do equador mais rápido. Alguns traços serão tambémmais conspícuos do que outros - o que se deve à diferença debrilho aparente das estrelas. Utilizando um rolo a cores, serãotambém notadas diferenças de cor nos traços deixados pelasestrelas.

Anglo-Australian Observatory/DavidMalin Images”. Please do not copy ordistribute this image file (except for theBulletin) without our permission.

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PPPPPARAARAARAARAARA O O O O OBSERBSERBSERBSERBSERVVVVVARARARARAR EMEMEMEMEM J J J J JUNHOUNHOUNHOUNHOUNHOVISIBILIDVISIBILIDVISIBILIDVISIBILIDVISIBILIDADE DOS PLANETADE DOS PLANETADE DOS PLANETADE DOS PLANETADE DOS PLANETASASASASASMercúrio: Visível a partir de meados deste mês, logo após o ocaso do Sol, em direcção Oeste. Nos últimos dias do mês,Vénus e Mercúrio terão um encontro próximo, sendo que o auge desta aproximação será no dia 27 poucos graus acimado horizonte em direcção Oeste. A fase de Mercúrio, visível com um bom telescópio, é quase cheia e vai decrescendo aolongo do mês.Vénus: Durante este mês ainda se encontra próximo do brilho solar, ao anoitecer, no horizonte Oeste. Porém, este planetaafasta-se cada vez mais do Sol, tornando-se cada vez mais visível. A fase de Vénus visível com telescópio, é quase cheia.Marte: Também Marte está a tornar-se visível cada vez melhor na direcção Este, pouco antes do nascer do dia. Oaumento evidente da magnitude e tamanho mostra que o planeta aproxima-se da Terra prevendo o início da boa épocade visibilidade deste planeta. A Lua passará pouco a Sul de Marte entre os dias 29 e 30.Júpiter: No início do mês este planeta será visível durante a grande parte da noite, embora vá desaparecendo nohorizonte cada vez mais cedo ao longo do mês. Na noite de 16 para 17 a Lua vai passar próximo de Júpiter.Saturno: Visível no início da noite, junto ao horizonte em direcção Oeste. A melhor altura para observar este planetaserá no início e meio do mês. No final do mês, Saturno desaparecerá no horizonte pouco antes das 22:00.Urano e Neptuno: Visíveis antes do nascer do Sol em direcção Este. O movimento de Urano passará a retrógrado apartir do dia 15. É preciso um telescópio bom e um mapa estelar detalhado para encontrar e observar estes planetas.

Maarten Roos SeroteCAAUL/OAL

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21 de Junho - Hoje ocorre o solstício de Verão. Às 7h46 o Solpassará pelo ponto mais a norte, relativamente ao equador celeste(a projecção do equador terrestre no céu a partir do centro daTerra), da sua trajectória aparente na esfera celeste. É o dia maislongo do ano (e a noite mais curta). A partir desta data, os diasirão lentamente tonar-se mais longos.

Lua Nova 06 Junho - 23hQuarto Crescente 15 Junho - 02h Lua Cheia 22 Junho - 05hQuarto Minguante 28 Junho - 19h

1 - Gigante gasoso do Sistema Solar caracterizado por uma grande manchavermelha.2 - Nuvem de gás e poeira interestelar.3 - Planeta do Sistema Solar com o maior período orbital, cerca de 248 anos.4 - Um dos satélites naturais de Júpiter.5 - Planeta mais próximo do Sol, cuja superfície se encontra cravada de crateras.6 - Galáxia de grandes dimensões, pertencente ao grupo local, que se encontramais próxima da Via Láctea.7 - Nome atribuído a um sistema estelar de duas estrelas ligadas.8 - Este gigante gasoso é o sétimo planeta do Sistema Solar e o terceiromaior.9 - Nome do telescópio espacial que completou este ano 15 anos de existência.10 - Trajecto de um planeta em torno de uma estrela.11 - Camada logo acima do manto da Terra.

12 - A Terra possui um núcleo denso, constituído na sua maioria por este metal.13 - Remanescente fóssil rochoso da formação de planetas, encontrado emabundância entre as órbitas de Marte e Júpiter.14 - Depressão na superfície de um planeta, satélite ou asteróide, causadapelo impacto de um meteoróide.15 - Nome atribuído ao bloqueio parcial ou total, por um corpo celeste, daluz proveniente de outro corpo.16 - Os cometas são constituídos essencialmente por...17 - Camada exterior da atmosfera solar, com extensão de vários milhões dequilómetros, observável a olho nu aquando de um eclipse solar total.18 - Resultado da dispersão de um feixe de luz, como num arco íris.19 - Uma das quatro fases da Lua.20 - Grande conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeiras ligadasgravitacionalmente.

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1 de Junho às 0h16 de Junho às 23h

O CO CO CO CO CÉUÉUÉUÉUÉU DEDEDEDEDE J J J J JUNHOUNHOUNHOUNHOUNHO

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aiD osacO/.csaN osacO osacO .csaN osacO osacO .csaN .csaN

10111203

60 h 41 m 02/ h 65 m

60 h 11 m 12/ h 10 m

60 h 21 m 12/ h 50 m

60 h 51 m 12/ h 50 m

02 h 24 m

12 h 94 m

22 h 72 m

22 h 53 m

22 h 01 m

22 h 42 m

22 h 23 m

22 h 53 m

20 h 24 m

20 h 02 m

10 h 75 m

10 h 73 m

30 h 42 m

20 h 54 m

20 h 60 m

10 h 23 m

32 h 45 m

32 h 81 m

22 h 34 m

22 h 11 m

20 h 70 m

10 h 82 m

00 h 54 m

00 h 01 m

10 h 30 m

00 h 02 m

32 h 04 m

32 h 40 m

(para Lisboa; são necessárias pequenas correcções para outros locais do país. Veja em www.oal.ul.pt para outros dias)NNNNNASCIMENTASCIMENTASCIMENTASCIMENTASCIMENTOOOOO, P, P, P, P, PASSAASSAASSAASSAASSAGEMGEMGEMGEMGEM M M M M MERIDIANERIDIANERIDIANERIDIANERIDIANAAAAA EEEEE O O O O OCASOCASOCASOCASOCASO DOSDOSDOSDOSDOS P P P P PLANETLANETLANETLANETLANETASASASASAS

O mapa mostra o céu como pode ser observado em Portugal (latitude 38º N) nos dias e horas (legais) indicados. Orienteo mapa com a direcção para onde olha virada para si, p.e. se estiver a olhar para o Norte, vire esta página ao contrário.Este mapa pode ser usado igualmente noutros dias e horas de Junho, apresentando-se o céu um pouco diferente.