um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÁO PAULO PUC-SP ISA GABRIELA DE ALMEIDA STEFANO Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada em problemas MESTRADO EM DIREITO São Paulo 2007

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Page 1: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÁO PAULO

PUC-SP

ISA GABRIELA DE ALMEIDA STEFANO

Um novo método de ensino jurídico: a

aprendizagem baseada em problemas

MESTRADO EM DIREITO

São Paulo

2007

Page 2: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÁO PAULO

PUC-SP

ISA GABRIELA DE ALMEIDA STEFANO

Um novo método de ensino jurídico: a

aprendizagem baseada em problemas

Mestrado em Direito do Estado

Dissertação apresentada à banca examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título de

MESTRE em Direito Constitucional,, sob

orientação da Professora Doutora Maria Garcia

São Paulo

2007

Page 3: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Banca Examinadora

___________________________

___________________________

___________________________

São Paulo, ____ de _____________ de 2007.

Page 4: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

AGRADECIMENTOS

Esse trabalho teve a participação de pessoas importantes sem as

quais ele não seria possível.

Agradeço aos meus pais por estarem presentes em todas as fases

de minha vida, dando suporte e amor, além de ensinarem os valores que

realmente importam na vida. Foi pelo incentivo de vocês que esse trabalho tornou-

se realidade.

À minha querida irmã e ao meu cunhado, que sempre me ouviram

e me socorreram nos momentos de aflição, bem como a querida prima Norma

Romano Santos, que abriu as portas de sua casa e me abrigou durante a época

em que eu viajava para estudar.

Na vida profissional sempre temos pessoas que nos guiam e são

mestres tanto pelos ensinamentos como pela atenção, carinho e motivação,

assim, sou grata ao Oswaldo Peregrina Rodrigues que sempre acreditou em meu

potencial e me deu oportunidades que colaboraram para meu crescimento.

À querida professora e orientadora Maria Garcia, que é um

exemplo de profissional do Direito e de vida acadêmica. Com sua paixão traz a

magia do conhecimento para os alunos, que saem de suas aulas com entusiasmo

de perceber que a todo instante o aprendizado está presente.

Page 5: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

“A educação consiste em ensinar aos homens não

aquilo que devem pensar, e sim a pensar.”

Clavin Coolidee

“Meus alunos ficam consternados quando digo:

dentro de 10 anos, estará provado que metade do

que vocês aprenderam na faculdade de medicina

estava errado. E o problema é que nenhum dos

seus professores sabe qual é essa metade.”

Dr. Sydney Burwell, Diretor da Harvard Medical

School

Page 6: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

RESUMO

A educação é a base da sociedade, pois somente através dela as

pessoas são capazes de evoluir, conviver em comunidade e desenvolver sua

capacidade física, moral e intelectual.

Nosso sistema de ensino jurídico é o mesmo há décadas e

atualmente demonstra que não é capaz de cumprir com suas finalidades, ante o

baixíssimo número de bacharéis aprovadas no exame da OAB para o exercício da

profissão de advogado.

O aprendizado deve decorrer da busca do aluno, e não de aulas

em que o professor já traz o conteúdo que será ministrado e o aluno anota e

decora, sem, muitas vezes, perceber a importância daquilo para a vida prática.

O ensino só será eficaz quando o aluno “aprender a aprender” e

puder visualizar a aplicabilidade daquele estudo para sua vida prática e social,

pois assim a busca pelo saber torna-se mais interessante e necessária.

Acreditamos que a aprendizagem baseada em problemas ensina

o aluno a buscar o conhecimento sem a necessidade da presença de um

especialista que repasse informações. Além disso, permite visualizar desde o

início como o estudo ali direcionado encontra-se presente na vida prática e social.

PALAVRAS- CHAVE: aprendizagem baseada em problemas - ensino de direito -

relação ensino-aprendizagem.

Page 7: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

ABSTRACT

The education is the base of a society, therefore through it the

people are only capable to evolve, to coexist in society and to develop its physical,

moral and intellectual capacity.

Our system of legal education is the same has decades and

nowadays it demonstrates that it is not being capable to fulfill with its purposes,

before low number of people who are approved in the examination of the OAB to

exert the lawyer profession.

The learning must elapse of the search of the pupil and not

through lessons where the professor already brings the content that will be given

and the pupil writes down, decorates without, many times, to perceive the

importance of that for the practical life.

Education will only be efficient when the pupil to learn to learn and

will be able to visualize the applicability of that study for its practical and social life,

therefore the search for knowing becomes more interesting and necessary.

We believe that the learning based on problems makes possible

the pupil to learn to search the knowledge without the necessity of the presence of

a specialist who the view information, as well as, since the begginnig already to

visualize as the study directed there meets present in the practical and social life.

KEY- WORDS: problem based learning - law teaching - teaching learning relation.

Page 8: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................ 1

1. EDUCAÇÃO E ESCOLA..................................................................................... 4

2. A IMPORTÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR NA EDUCAÇÃO............ 17

2.1 SISTEMA EDUCACIONAL..................................................................... 20

3. A EDUCAÇÃO NO BRASIL................................................................................ 26

4. O ENSINO SUPERIOR E ALGUNS PROBLEMAS... ......................................... 64

4. 1 O QUE É APRENDER............................................................................ 77

4. 2 O QUE É ENSINAR................................................................................ 82

5. A APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS: CARACTERÍSTICAS E

PROCESSOS..........................................................................................................

88

5. 1 AS BASES COGNITIVAS DA APRENDIZAGEM BASEADA EM

PROBLEMAS...............................................................................................

95

6. CURRÍCULO NO PBL......................................................................................... 98

7. A CONSTRUÇÃO E NARRATIVA DE PROBLEMAS......................................... 108

7. 1 GRUPO TUTORIAL.......................................................................................... 111

8. COMO AVALIAR OS ALUNOS........................................................................... 118

CONCLUSÕES........................................................................................................ 126

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................ 129

Page 9: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

INTRODUÇÃO

O sistema educacional de nossas universidades, especialmente

na área jurídica, está clamando por mudanças, basta observar os altos índices de

erros profissionais e especificamente o baixo número de aprovados no exame da

OAB. Atualmente a educação é considerada mera fonte de lucro em que as

instituições de ensino não se preocupam mais com o saber, mas tão-somente em

lotar salas de aula com um professor que ali despeja informações. Além disso, o

método de ensino é o mesmo de décadas.

Infelizmente verificamos que nosso sistema educacional, muitas

vezes não está em conformidade com o previsto no art. 205 da Constituição

Federal:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da

família, será promovida e incentivada com a colaboração da

sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu

preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o

trabalho. (grifo nosso)

A grande maioria das instituições de ensino está formando

verdadeiros robôs, pessoas que se acostumaram a decorar o que é dito, simples

autômatos, que não sabem como aplicar na prática seus aprendizados. Em

síntese, formam pessoas totalmente desqualificadas para o trabalho e para o

exercício da cidadania.

A grade curricular muitas vezes é fixa para todas as faculdades

sem observar as necessidades regionais que aquela determinada sociedade

precisa. O estudo não foca a sociedade a que os profissionais se destinarão, mas

fica, tão somente, baseado nas doutrinas e ensinamentos preestabelecidos.

Verifica-se que o objetivo do professor passa a ser de informar e não de formar

pessoas aptas a trabalharem para a sociedade.

Page 10: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Nossa proposta é estudar a “aprendizagem baseada em

problemas” (APB ou PBL), novo método de ensino cujo objetivo é que os alunos

aprendam a aprender, sejam independentes na busca do saber e aprendam a

pensar, para que no momento de exercer a profissão saibam como lidar com as

dificuldades sozinhos, resolvendo os problemas com eficiência.

No capítulo 1 iremos verificar a educação e a escola, passaremos

por seu conceito e evolução histórica. Interessante observar os tipos de educação

e percebermos como ela era até antes da Constituição de Weimar

No capítulo 2 abordamos a Constituição de Weimar desde seus

antecedentes históricos até sua formação e discorreremos sua importância para

as Constituições posteriores e sua influência na educação.

No capítulo 3 tratamos da evolução educacional no Brasil desde a

época colonial até os dias atuais, o que nos permite verificar nossa história

educacional em relação à importância dada por nossos sistemas de governo.

No capítulo 4 cuidamos das dificuldades que estão presentes em

nosso sistema de ensino e que fundamentam uma nova abordagem metodológica.

No capítulo 5 discorremos sobre a aprendizagem baseada em

problemas, suas características e processos, que de forma sucinta traz a idéia da

nova metodologia proposta nesse trabalho.

No capítulo 6 apresentamos uma revolução quanto à forma de se

estabelecer o currículo. Oferecemos uma proposta completamente diferente da

tradicional, em que os alunos aprendem determinados assuntos e não matérias. O

aprendizado é em blocos e sempre multidisciplinar.

No capítulo 7 cuidamos do ponto fundamental do estudo, qual

seja, a forma de elaboração dos problemas, que é a base de toda metodologia

aqui apresentada.

Por fim, no capítulo 8 tratamos da forma de avaliação dos alunos,

Page 11: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

que deve ser vista como o momento de verificar se todo o processo de

aprendizagem está funcionando, e não como um momento de acerto de contas

com o aluno.

A nosso ver o presente estudo será de grande importância para o

ensino, sobretudo o ensino jurídico, pois até o momento nenhuma faculdade de

Direito no Brasil conseguiu adotá-lo da maneira aqui abordada

Page 12: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

1. EDUCAÇÃO E ESCOLA

Para que possamos desenvolver nosso trabalho, julgamos de

fundamental importância apresentar o conceito e uma breve análise histórica da

educação. Somente através da educação se alcança o desenvolvimento do ser

humano e de um povo. Contudo, nem sempre a função educacional foi exercida

pelas escolas, tendo ocorrido grandes mudanças para chegar ao ensino que

temos hoje.

A palavra educação apresenta vários conceitos que foram dados

por estudiosos:

1. ato ou efeito de educar(-se). 2. processo de desenvolvimento da

capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano

em geral, visando à sua melhor integração individual e social (...).

3. os conhecimentos ou aptidões resultantes de tal processo;

preparo. 4. o cabedal científico e os métodos empregados na

obtenção de tais resultados ; instrução, ensino (...) 6.

aperfeiçoamento integral de todas as faculdades humanas. 7.

conhecimento e prática dos usos de sociedade, civilidade,

delicadeza, polidez, cortesia1.

Podemos perceber a abrangência não apenas do sentido

intelectual da educação, mas também sua importância social, pois habilita a

pessoa a se portar no seio de uma dada sociedade.

Conforme o Dicionário de Filosofia:

Educação. Em geral, designa-se com esse termo a transmissão e

o aprendizado das técnicas culturais, que são as técnicas de uso,

1 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da Língua Portuguesa. 3. ed. Rio de

Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 718.

Page 13: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

produção e comportamento, mediante as quais um grupo de

homens é capaz de satisfazer suas necessidades, proteger-se

contra hostilidade do ambiente físico e biológico e trabalhar em

conjunto do modo mais ou menos ordenado e pacífico2.

Para esse conceito, a educação é apresentada como um conjunto

de técnicas que o ser humano aprende ao longo de sua vida possibilitando o

desenvolvimento e convívio de pessoas de um mesmo grupo. Por todos estarem

em um mesmo ambiente criam-se certas características específicas desse grupo,

que precisam ser transmitidas para suas gerações.

Abbagnano entende que a cultura são as técnicas transmitidas, e

a educação seria o modo pelo qual se transmite a cultura. Afirma esse autor que

uma sociedade não pode sobreviver se a sua cultura não é transmitida de geração

para geração; as modalidades ou formas de realizar ou garantir essa transmissão

chama-se educação.3

Através da transmissão da cultura é possível ocorrer a evolução

do homem, que está sempre aprimorando aquilo que lhe foi ensinado e que lhe dá

a capacidade de pensar e de criar.

O sentido da educação, como se concebe presentemente, provém

da tentativa de combinar e equilibrar esses dois elementos de

direitos individuais e deveres sociais, de desenvolvimento pessoal

e de serviço social. O sentido da educação atualmente encontra a

sua significação total neste processo de relacionar o indivíduo com

a sociedade, a fim de assegurar o desenvolvimento da

personalidade e o bem-estar social (...) A educação tem sido

definida como preparação para a cidadania, como ajustamento à

sociedade, como preparação para a vida social, como aquisição da

herança da raça (...) É o processo de conformar o indivíduo a dado

padrão ou tipo social, de tal modo que as capacidades inerentes

2 ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 305. 3 ABBAGNANO, Nicola, Op. cit., p. 306.

Page 14: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

sejam desenvolvidas, sua maior utilidade e felicidade alcançadas,

e, ao mesmo tempo, conservando o supremo bem-estar da

sociedade4.

Segundo Gabriel Chalita:

Educação é um conceito mais amplo do que o ensino, é mais

abrangente, e significa um processo continuado de aprendizagem -

um aprender a aprender que não termina com os ciclos de ensino

previstos na Constituição Federal ou na Lei de Diretrizes e Bases

da Educação5.

A educação é muito abrangente em seu contexto, pois se inicia no

momento em que o ser humano nasce e começa a ter contato com outras pessoas

de sua sociedade. Pode ser também específica, quando realizada nos centros

acadêmicos em que aprendemos a ciência em si, ou seja, a educação intelectual.

Ressaltamos que aprender a falar, dançar, andar, escrever, rezar,

e todas as outras coisas que fazem parte do nosso cotidiano é educação, e por

isso ela pode ser dividida em duas: educação causal (natural/ informal) e

educação formal (intelectual).

A educação causal visa a transmissão dos costumes de um povo,

isto é, suas crenças, o convívio, o trabalho realizado para sobrevivência. Aprende-

se a conviver, em vez de continuar apenas a viver juntos6. Nesse contexto

verificamos que a educação causal não pretende ensinar a pensar e a aprender,

pois a criança praticamente copia o adulto.

Chalita afirma ainda que não se experimentou para a educação

informal nenhuma célula social melhor que a família, pois é na família que se 4 MONROE, Paul. História da educação. 19. ed . São Paulo: Editora Nacional, 1988. p. 370. 5 CHALITA, Gabriel. Educação: a solução está no afeto. São Paulo: Editora Gente, 2001. p. 259. 6 DEWEY, Jhon. Democracia e educação. 3. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1959, p. 6.

Page 15: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

forma o caráter7.

Os conhecimentos adquiridos por meio da educação causal são

utilizados habitualmente, ou seja, são postos em prática. Podemos afirmar que se

tornam feições características, pois existem com tal profundidade de significação

que se prendem a seu emprego nas urgentes necessidades de cada dia8.

A educação causal era utilizada pelos povos primitivos, mas

conforme os grupos sociais foram evoluindo, foi necessária a criação de um

modelo de educação mais específico, que buscasse o conhecimento intelectual.

Em razão disso, entendia-se que a criança precisava de conhecimentos

específicos para que pudesse copiar o adulto:

A aptidão para participar eficazmente da atividade dos adultos

dependerá, por isso, de uma preparação anterior, na qual tenha

em vista esse fim. Surgem então os fatores especiais – as escolas

– e a matéria determinada – os estudos9.

Esse tipo de educação é teórica e técnica, pois nem sempre

utilizamos todos os conhecimentos adquiridos, por isso não é possível visualizar

sua ocorrência na vida prática. Nesse cenário, a educação causal permaneceu,

estando presente em qualquer povo, e a ela somou-se a educação formal, que

cuidaremos a seguir.

A educação formal é transmitida por meio da escola, onde o aluno

aprende progressivamente, construindo uma seqüência de informações que o

possibilitará a entender o todo. Essa espécie de educação é necessária para o

progresso de uma sociedade desenvolvida, pois ministra a educação técnica por

profissionais especializados no assunto, facilitando o aprendizado dos elementos

que não estão tão presentes em nossa rotina.

7 CHALITA, Gabriel. Op. Cit. p. 17. 8 CHALITA, Gabriel. Op. Cit. p. 9. 9 CHALITA, Gabriel. Op. Cit. p. 8.

Page 16: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

A educação causal ou informal e a formal se completam, confrome

se depreende dos ensinamentos de Anísio Spínola Teixeira:

A escola não surge como instituição destinada a substituir a

influência direta da sociedade, nas suas formas de participação

educativa, pela família, pelo trabalho em comum, ritos comuns e

recreação em comum; mas, sim, como uma instituição específica

para a formação de especialistas da tradição escrita, a latere, e

sem prejuízo daquela influência social direta, quanto à participação

e integração de todos na comunidade10.

Desse modo, verifica-se que a educação é composta por várias

fases: a) natural: há o contato com a vida em sociedade, por meio da qual

aprende-se seus costumes e modo de convivência; b) escolar: visa ensinar o

processo básico de aprendizagem, geralmente seguido por supervisão docente; e

c) individual: o indivíduo é quem vai dirigir seu conhecimento, exercendo sua auto-

determinação, mantendo ou adquirindo novos experiências.

Quanto à evolução histórica da educação, julgamos oportuno

analisar a educação primitiva, na Antiguidade e no período Contemporâneo, pois

são as fases que mais afetam o nosso objeto de estudo.

A educação dos povos primitivos era baseada na imitação dos

conhecimentos das gerações passadas.

Nos primeiros anos de vida esta imitação é inconsciente. A

criança, nas tribos selvagens e bárbaras, brinca com imitações, em

miniatura, dos instrumentos usados pelos adultos. (...) O segundo

estádio dessa educação, realizada pela imitação, é consciente.

Ambos, menino e menina, participam das atividades dos adultos e

aprendem por imitação, porque se passa a exigir deles o trabalho.

10 TEIXEIRA, Anísio Spinola. Educação no Brasil. São Paulo: Editora Nacional, 1969. p. 60.

Page 17: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Esta exigência por parte do adulto não tem o objetivo de educar a

criança, mas, sim, o de obter o trabalho11.

Isso ocorre porque neste período buscava-se apenas a

sobrevivência do povo sempre em harmonia com o ambiente.Maria Lúcia de

Arruda Aranha destaca que o homem desse período tem pouca consciência do

passado, como forma de vida a ser conservada, ou do futuro, como promessa de

maiores oportunidades que as do presente. Ele vive no presente, por isso a

ilimitada tendência para modificações, e o caráter acidental das mesmas12.

Na Antiguidade, principalmente na Grécia, a educação começa a

valorizar o desenvolvimento individual, passando de uma concepção mítica para o

pensamento racional e filosófico13, conforme ensinamos de Maria Lúcia de Arruda

Aranha:

Na época arcaica são introduzidas novidades que transformam a

visão que o homem tem de si próprio: a escrita, a moeda, a lei e a

pólis, culminando com o aparecimento do filósofo (...) os gregos

atingiram um grau de consciência de si mesmos que não ocorrera

antes em lugar algum. Uma nova concepção de cultura e do lugar

do indivíduo na sociedade repercute na educação bem como nas

teorias educacionais.

A educação passa então a ser considerada o berço da civilização

ocidental, exercendo sua influência ainda nos dias de hoje.

A educação grega, também conhecida como educação liberal,

permitiu que o homem buscasse livremente seu desenvolvimento em todos os

aspectos da personalidade. No entendimento de Paulo Monroe, é a educação

11 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 2. 12 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 8. 13 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da educação. São Paulo: Moderna, 1989. p. 35.

Page 18: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

digna do homem livre, que o habilita a tirar proveito de sua liberdade ou dela fazer

uso14.

Surge nesse momento a noção de paidéia :

É a formação do homem através do contato orgânico com a

cultura, organizada em curso de estudos, com o centro dedicado

aos studia humanitatis, que amadurece por intermédio da reflexão

estética e filosófica e encontra na pedagodia – na teorização da

educação subtraída à influência única do costume- seu próprio

guia”15

Isso tornou possível ao homem se conhecer de forma ampla,

possibilitando-o expressar-se livremente, sempre em busca da vida feliz e bela tão

aclamada por Aristóteles. O ser humano está em constante busca pela sua

realização e seu crescimento máximo como homem, ou seja, em busca da razão

de viver.

Nessa época teve início a valorização do saber pelo saber, além

disso, a educação era tida como uma forma de preparação para a cidadania.

Ainda nesse período os homens começaram a querer entender os fenômenos

naturais. Conforme Franco Cambi:

Delineia-se também uma cultura mais crítica em relação ao saber

religioso e mitopoiético e mais técnicocientífica, que exalta a

dimensão livre e o livre exercício da razão próprio de cada

indivíduo e disposto a submeter à análise qualquer crença,

qualquer ideal, qualquer princípio da tradição16.

14 Paulo Monroe afirma que: “nenhum outro período há, até o século XVIII, tão cheio de sugestões

para o educador presente”. 15 CAMBI, Franco. História da Pedagogia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1999. p. 49. 16 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 85.

Page 19: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

E continua:

É uma educação que se liga à palavra e à escrita e tende à

formação do homem como orador, marcado pelo princípio do

kalokagathos (do belo e do bom) e que visa cultivar os aspectos

mais próprios do homem em cada indivíduo, elevando-o a uma

condição de excelência, que todavia não se possui por natureza,

mas se adquire pelo estudo e pelo empenho17.

Com o homem procurando conhecer a si próprio, nasceu o

conceito moral de personalidade:

Pela realização da sua própria natureza, cada um executaria as

coisas pelas quais a vida vale a pena ser vivida; a ciência, a arte, a

filosofia, a religião, são meios para esse fim, e devem ser

realizados subordinando-se a ele. Dessa forma, a

responsabilidade moral e a liberdade moral, - liberdade sob a lei e

pela lei, contida em nossa própria natureza, - foram concebidas,

em primeiro lugar pelos gregos – e por eles aplicadas a todos os

indivíduos18.

O ensino passou a ser direcionado e era ministrado pelos sofistas,

que eram professores gregos, raramente filhos de Atenas, que viam os defeitos da

organização educacional existente na pólis e ofereciam aos jovens da cidade a

educação pela qual todos clamavam e que os preparavam para uma carreira de

engrandecimento pessoal na vida política e social da época19. Eles visavam

ensinar: o pensar, o falar e o agir.

Influenciaram de forma significativa o método da educação uma

vez que o estudo de gramática e retórica a que se surgiu, logo mais, o de outras

matérias, inverteu a velha ordem do método que fez da educação um processo de

17 CAMBI, Franco Op. Cit. p. 86. 18 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 28. 19MONROE, Paul. Op. Cit., p. 54.

Page 20: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

instrução teórica. A educação tornou-se, nitidamente um processo escolar voltado

para fins intelectuais, isto é, individuais20.

Os sofistas foram os criadores do sistema de aprendizagem

programado. A partir deles o docente passa a receber remuneração pelo ensino,

tornando-se um profissional que oferece ao mercado o seu produto, que é o

ensino.

Baseado no princípio básico dos sofistas, lançado por Protágoras,

“o homem é a medida de todas as coisas”, Sócrates empregava um método de

ensino cujo objetivo era estimular o indivíduo a estar em constante

amadurecimento de si próprio, sempre em busca do conhecimento, seja através

do mestre, seja ele mestre de si. Ele aplica a maiêutica (operação de trazer para

fora) e o diálogo feito com um mestre que instiga a busca pelo saber. Isso ocorre

por meio de um diálogo em que as partes, opondo seus pensamentos, buscam

uma unidade que será cada vez mais rica (dialética). Sócrates traz para o ser

humano a idéia de que o autodomínio e a autodireção são tarefas contínuas21.

Por entender que o aprendizado não se obtém pela simples

escuta, vale dizer, o mestre fala e o aprendiz absorve aquilo que lhe foi dito,

Sócrates discorda dos sofistas. Para ele o aprendizado é construído com a

dialética, ou seja, uma conversa entre duas pessoas em que se desfaz verdades

que na realidade são contraditórias, tudo em busca de conclusões corretas.

Ele traz a paidéia como problematização e como pesquisa,

relacionando-a à formação da alma individual, posto que o indivíduo deve realizar-

se em conformidade com sua liberdade e universalidade.

Para Monroe as principais contribuições de Sócrates foram:

20 MONROE, Paul Op. Cit., p. 57. 21 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 88.

Page 21: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

1º ) o conhecimento possui um valor prático moral, isto é, um valor

funcional, e conseqüentemente é de natureza universal e não

individualista;

2º ) o processo objetivo para obter-se conhecimento é o da

conversação; o subjetivo, é o de reflexão e organização da própria

experiência;

3º) a educação tem por objetivo imediato o desenvolvimento da

capacidade de pensar, não apenas de ministrar conhecimentos22.

Embora tenha sido discípulo de Sócrates, Platão acreditava que

as pessoas não eram iguais, por isso deveriam ocupar diferentes lugares dentro

da sociedade. Para ele somente alguns eram capazes de adquirir conhecimentos.

Conforme as idéias de Platão, cabe ao Estado o dever de educar.

Para ele a educação da mulher deve ser semelhante ao do homem e os estágios

superiores da educação deveriam ser atingidos pela capacidade de cada um e

não pela sua riqueza. Além disso, os detentores do conhecimento seriam

admitidos como o corpo supremo dos magistrados23.

Platão acreditava que o ser humano tinha uma alma que tudo

conhecia, mas que havia se degradado ao encarnar, pois o corpo possui uma

alma irracional.

A alma intelectiva é superior, mas o corpo tem também uma alma

irracional, de natureza inferior, dividida em duas partes: uma

irascível, impulsiva, localizada no peito; outra concupiscível,

localizada no ventre e voltada para os desejos de bens materiais e

apetite sexual (...) aprender é lembrar (...) todo conhecimento é

22 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 62. 23 ARANHA, Maria Lucia Arruda. Op. Cit., p. 51.

Page 22: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

esforço para se lembrar do que a alma contemplou no mundo das

idéias e se esqueceu ao encarnar-se24.

Além das idéias pioneiras, Platão desempenhou papel

fundamental ao organizar o currículo escolar grego baseado na educação liberal.

No entendimento de Monroe, Platão formulou a primeira concepção de educação

liberal ao considerar que todas as matérias de estudos não têm valor prático

senão como disciplina mental, ou seja, como meio para o desenvolvimento da

capacidade de pensamento pelo uso do método dialético25.

Para Platão e Sócrates a finalidade da educação era o

conhecimento, e aquele que o possuía adquiria a virtude.

Por sua vez, Aristóteles foi um dos filósofos gregos que mais

influenciou a educação nas épocas posteriores. Ele acreditava que o homem

deveria buscar o conhecimento para a conquista da sua felicidade e do bem

(razão). Como método de ensino procurava a verdade na experiência da espécie

considerando sua consciência histórica. Sobre esse tema julgamos oportuno o

entendimento de Monroe:

Para Aristóteles, o método dialético de Platão, que procurava a

verdade na pura especulação, alcançava apenas verdades de

valor formal; ele, ao contrário, procurava a verdade na experiência

da espécie, aperfeiçoando desta forma o método indutivo, o qual

aplicava tanto objetiva como subjetivamente (...). Aristóteles, antes

de qualquer filósofo, procurou o sentido dos termos e dos fatos na

consciência da humanidade. Depois procurou a confirmação pelo

processo introspectivo (...) é considerado pai da ciência moderna

por ter aplicado tal método a campos completamente novos de

investigação26.

24 ARANHA, Maria Lucia Arruda Op. Cit., p. 51-52. 25 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 65. 26 MONROE, Paul Op. Cit., p. 69.

Page 23: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Conforme Aristóteles, a educação deveria ser realizada pelos pais

e pelo Estado. Ele também criou o método da lógica formal, que delimita a

compreensão precisa dos processos de análise e síntese, indução, dedução e

analogia, ajudando a desenvolver o método lógico de pensar27.

De todas as inovações trazidas pela educação grega, Franco

Cambi considera que os seguintes aspectos foram essenciais para a educação

ocidental:

1. a noção de paidéia, que universalizou e tornou socialmente mais

independente e finalizado para o sujeito-pessoa o processo de

formação, entendido como um formar-se universalizando-se e

desenvolvendo a própria humanitas, por meio de um comércio

estreito, constante e pessoal com a cultura e sua história;

2. a pedagogia como teoria, tornada autônoma por referentes

históricos contingentes e destinada a universalizar e tornar

rigoroso (no sentido racional) o tratado dos problemas educativos:

nasce um saber da educação no sentido próprio, com todos os

riscos da abstração, de teorismo, de normativismo que isto

comporta;

3. a problematização da relação educativa, que supera o nexo

pedagodo-pais e docente-discente, relação autoritária e formalista,

abstrata e geralmente impessoal, para, ao contrário, delinear essa

relação como eminentemente espiritual, quase um segundo

nascimento, que faz do mestre o interlocutor fundamental de um

processo de formação, enquanto torna íntimo e envolvido em

primeira pessoa nesse processo28.

O período contemporâneo tem início com a Revolução Francesa

de 1789. A partir desse momento algumas questões, antes desconsideradas ou

relegadas a segundo plano, são alçadas à categoria de destaque, como: 27 ARANHA, Maria Lucia de Arruda. Op. Cit., p. 55. 28 CAMBI, Franco Op. Cit., p. 102-103.

Page 24: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

dinamismo social, ideológico e político, tendo como primado os princípios da:

liberdade, igualdade e fraternidade.

Busca-se uma sociedade mais justa, equilibrada e democrática,

que assegure os direitos do cidadão:

Nasce um organismo político-social novo que reclama participação

e responsabilidade social, civil e política por parte de todos,

desenvolvendo também oportunidade entre os homens, ao realizar

(pelo menos em teoria) a igualdade de oportunidades (...) é uma

época da educação social que dá substância ao político (enquanto

a política é governo dos e sobre os cidadãos), mas que também se

reelabora segundo um novo modelo teórico, que integra ciência e

filosofia, experimentação e reflexão crítica29.

O entendimento desse período é o de que a educação é

fundamental para que a sociedade se desenvolva, bem como para que o cidadão

possa efetivamente exercer sua cidadania e, ainda, que goze de melhor convívio

social.

Em 1919, com a Constituição de Weimar, a Alemanha apresenta a

escola com o fundamento sociológico e a estrutura que aplicamos hoje. Logo,

desde esse período a educação é concebida como dever do Estado, que deve

oferecê-la para todos e com qualidade mínima.

A grande contribuição da educação sociológica 30 consiste no fato

29 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 380. 30 Os sociólogos estão em busca do estudo da interação social das pessoas dentro de diferentes

organizações da vida, que entender como um grupo de pessoas se unem e convivem em busca de

um fim comum que possibilitará a perpetuação daquele determinado grupo de pessoas. É esse o

sentido que o sociólogo Emile Durkheim tem sobre educação: “A educação é a ação exercida,

pelas gerações adultas, sobre as gerações que não se encontrem ainda preparadas para a vida

social; tem por objetivo suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos,

intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu conjunto, e pelo meio especial a

Page 25: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

dos sociólogos considerarem a educação como o processo pelo qual se perpetua

e desenvolve a sociedade. Eles encaram a matéria através do estudo da estrutura

social, das atividades sociais, das necessidades sociais, e consideram a finalidade

da educação como sendo a preparação do indivíduo para participação com êxito

nas atividades econômicas, políticas e sociais de seus companheiros. Paul

Monroe diz ser extraordinário interesse pelas matérias de estudo, adequadas a

cada estágio da educação, desde o jardim da infância até a universidade, e isto é

resultado da influência sociológica. Nota-se, pois, que a ampliação dos sistemas

da escola pública baseou-se na idéia de educação universal e gratuita seguiu-se,

como conseqüência necessária, a aceitação destes princípios contemporâneos31.

Depreende-se do exposto que a época contemporânea foi a

principal influência para os dias de hoje, e nosso sistema educacional está

baseado nas inovações advindas desse momento histórico.

que a criança, particularmente, se destine.” Emile Durkheim A educação, sua natureza e função.

In: Educação e Sociologia. 12 ed. São Paulo: Melhoramentos, 1978. p. 41.

A educação sociológica passa a verificar quais são os estudos necessário para o desenvolvimento

do grupo, nesse sentido a educação visa formar uma pessoa que pense e considere o meio social

em que vive com vistas a trazer maiores benefícios a seu sistema social. 31 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 335-336.

Page 26: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

2. A IMPORTÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO DE WEIMAR NA

EDUCAÇÃO

Antes da Primeira Guerra Mundial a educação era fragmentada,

isto é, não havia uma grade pedagógica a ser seguida e, em regra, o ensino era

ministrado pela igreja.

Na Europa a educação era basicamente uma função dos

mosteiros cristãos, que foram os primeiros docentes nas universidade alemãs

(Fundação da Universidade de Praga, de língua alemã, 1348)32.

O ensino era diferenciado conforme a classe social do indivíduo.

Os nobres recebiam educação privilegiada, eram orientados por preceptores

particulares ou em internatos chamados de “seminário dos nobres”. Eles

aprendiam línguas estrangeiras, ciências e história, além de equitação, caça,

esgrima e dança.

A educação do povo, porém, confiada essencialmente à Igreja,

ocorre mais freqüentemente no interior de institutos de

beneficência onde somente poucos alunos dos grupos populares

recebem uma educação exclusivamente instrumental, limitada à

aprendizagem de técnicas elementares como ler e escrever. Com

relação a este tema, se, por um lado, deve-se registrar a

insuficiência do espaço concedido pelas organizações religiosas à

educação das massas, por outro, não pode ser esquecida a

omissão dos poderes públicos no que se refere a este problema33.

32 BECKER, Horst Bahro Willi. Educação, pesquisa e desenvolvimento: o sistema de ensino,

ciência e pesquisa na República Federal da Alemanha. Tradução de Pedro Georgen. Brasília:

Coordenação do aperfeiçoamento de pessoal de nível superior - CAPES, 1979. p. 20. 33 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 296.

Page 27: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Muito se critica o ensino pela religião, pois, freqüentemente visa o

estabelecimento de dogmas e a submissão do pensamento. Há quem entenda

que as igrejas são formas sociais de impor idéias que impedem o exercício livre da

razão34.

O ensino era feito à base de punições físicas como chicotadas,

reguadas na palma das mãos, socos na orelha e suspensões. Nota-se que não

havia a menor preocupação com a qualidade do ensino ou com o ser humano em

si. Buscava-se tão-somente um sistema de opressão.

No aclamado drama “O filho”, o escritor Walter Hasenclever traz a

seguinte afirmação do filho para o pai:

Lembro-me perfeitamente da época em que tu me ensinavas a

gramática grega a chicotadas! Era sempre bem antes de eu me

deitar, quando eu estava de pijama, de maneira que a correia

chegava mais perto de minha pele!35.

Embora não fosse permitido por lei o sistema de castigos

corporais era apoiado pela mentalidade dos pais:

Os professores conservadores, apoiados por essa vox populi, não

hesitavam em reclamar diversas vezes, por ocasião de

conferências e congressos pedagógicos, o retorno oficialmente

reconhecido da sacrossanta chibata36.

Mesmo antes da reforma educacional da Alemanha, Kant já se

manifestava sobre a importância de uma reforma educacional:

34 TRILLA, Jaume; Elena Cano e outros. El legado pedagógico del siglo XX para la escuela del

siglo XXI. Barcelona: Grão, 2001. p. 154. 35 Apud RICHARD, Lionel. A república de Weimar. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. p.

164. 36 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 165.

Page 28: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

O homem só pode tornar-se verdadeiro homem mediante a

educação, e ele é tal como ela faz. Deve-se notar que ele só pode

ser educado por outros homens que, por sua vez, foram educados.

Se um ser superior tomasse conta de nós, veríamos tudo o que o

homem pode vir a ser. Se pelo menos uma experiência fosse feita

com a ajuda dos poderosos ou com as forças colaborativas de

muitas pessoas, poderíamos conhecer o ápice da capacidade

humana. É extremamente penoso para o filósofo e para o

filantropo constatar como os poderosos na maioria das vezes só

pensam em si próprios e não tomam parte no importante

experimento sobre a educação para fazer a humanidade

aproximar-se de sua perfeição37.

Ainda nessa fase de transição, entre a reforma estatal e a

educacional, Johabb Gottlieb Fichte lembra a importância da educação em que

cada cidadão deveria, através do desenvolvimento integral de suas capacidades,

encontrar o seu lugar na sociedade e tornar-se um cidadão, responsável pelo

Estado38.

A partir dos ideais socialistas é feita uma importante alteração na

mentalidade educacional, assumindo grande importância temas como, a busca da

igualdade entre os homens e a ordenação racional e orgânica da sociedade.

Nasce um organismo político-social novo que reclama participação

e responsabilidade social, civil e política por parte de todos,

desenvolvendo também oportunidade entre os homens, ao realizar

(pelo menos em teoria) a igualdade de oportunidades (...) é uma

época da educação social que dá substância ao político (enquanto

a política é governo dos e sobre os cidadãos), mas que também se

37 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 362. 38 BECKER, Horst Bahro Willi. Op. Cit., p. 21.

Page 29: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

reelabora segundo um novo modelo teórico, que integra ciência e

filosofia, experimentação e reflexão crítica39.

O Estado passa a controlar o sistema educacional, uniformizando-

o e fixando critérios pedagógicos. Além disso, começa a busca por professores

qualificados e retira-se da igreja a função pedagógica que até então era por ela

controlada e exercida.

A renovação das regras de convivência social, que devem ser

alimentadas pelo princípio da solidariedade, a transformação no

sentido liberatório das várias instituições sociais (família, fábrica,

Estado) e a projeção de uma harmoniosa sociedade ideal implicam

também uma profunda mudança do homem-cidadão, do ideal

antropológico que é colocado na base dessa sociedade

renovada40.

É nesse contexto que nasce o pensamento célebre segundo o

qual todo homem, e não somente poucos privilegiados, têm direito ao pleno,

autônomo e múltiplo desenvolvimento da personalidade41.

Para que se alcance a educação efetiva é necessário que se

tenha liberdade, pois o aprendizado pressupõe que a pessoa assimile a idéia e

não apenas a decore. O decorado não tem importância, não possibilita o

pensamento, tampouco o real entendimento. O ato de decorar não instiga o

pensar sobre as conseqüências e as razões daquele ensinamento. Sobre isso

leciona Edgar Morin:

Qualquer conhecimento opera por seleção de dados significativos

e rejeição de dados não significativos: separa (distingue ou

disjunta) e une (associa, identifica); hierarquiza (o principal, o

secundário) e centraliza (em função de um núcleo de noções-

39 MONROE, Paul. Op.Cit., p. 335-336. 40 MONROE, Paul. Op. Cit., p. 477. 41 CAMBI, Franco. Op. Cit., p. 380.

Page 30: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

chaves); estas operações, que se utilizam da lógica, são de fato

comandadas por princípios supralógicosde organização do

pensamento ou paradigmas, princípios ocultos que governam

nossa visão das coisas e do mundo sem que tenhamos

consciência disso. Para isso é preciso, antes de mais nada, tomar

consciência da natureza e das conseqüências dos paradigmas que

mutilam o conhecimento e desfiguram o real42.

2.1 SISTEMA EDUCACIONAL

A Constituição de Weimar mostrou grande preocupação com a

reestruturação do sistema educacional, e por isso trouxe regras específicas

inseridas no sistema dos direitos e deveres fundamentais, reservando ainda um

livro específico para tratar dos assuntos da educação: Livro IV - Educação e

Escola. O art. 120 traz uma disposição muito importante para o nosso objeto de

estudo:

Art. 120. A educação das jovens gerações, com vista a fazer-lhes

adquirir as qualidades físicas, intelectuais e sociais, é o dever e o

direito natural dos pais; a sociedade política vigia o modo como

eles o cumprem.

Com toda expectativa pela mudança, começou então a busca pelo

desenvolvimento pleno da criança, notadamente de sua personalidade,

permitindo-se a exploração máxima de sua potencialidade.

Graças à efervescência revolucionária e às transformações

sociais, florescem tentativas inspiradas nesses princípios. Em

muitas cidades, instituições escolares experimentais aparecem.

Em Hamburgo, quatro escolas públicas, contando com mais de

42 MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Porto Alegre: Sulina, 2005, p. 10-11.

Page 31: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

seiscentos alunos, são organizadas com base numa relação de

camaradagem entre alunos e mestres. A figura do mestre se

apaga, os alunos aprendem a contar com seus próprios recursos.

Graças a essas novas relações fraternas, a educação não é mais

ministrada do alto de uma cátedra; passa a ser adquirida através

da vida grupal, em liberdade43.

A partir deste momento meninos e meninas passam a ser tratados

como seres iguais, permitindo-se a convivência na mesma sala de aula. Agora a

escola era a mesma para todos, norteada pela idéia de responsabilidade e de

solidariedade, pois ambos os sexos trabalham juntos e encorajam-se uns aos

outros.

Ganha corpo a idéia de que as crianças deviam descobrir na

escola a sua própria verdade, sem copiar os adultos, numa atmosfera de

camaradagem com os educadores e na convivência mista44. Não se aprova mais a

imputação de ideais políticos e religiosos, o objetivo é apenas o conhecimento

livre.

Na seqüência selecionamos alguns artigos da Constituição de

Weimar que mais se relacionam o assunto tratado:

Art 142. A ciência e o ensino são livres, cabendo ao Estado seu

fomento45.

Art 143. As instituições públicas devem atender à educação da

juventude, sendo sua criação feita em colaboração pelo Império,

Estados e Municípios. A formação dos professores deverá ser

normatizada de modo homogêneo buscando princípios que se

apliquem à mais alta cultura. Os professores das escolas públicas

43 RICHARD, Lionel. Op. Cit. p. 167 44 Idem 45 Tradução livre.

Page 32: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

possuem os mesmos direitos e obrigações que os funcionários do

Estado46.

Esse dispositivo demonstra a grande importância dos professores,

determinando que sua formação deverá ser homogênea e buscar princípios da

mais alta cultura. Além disso, estabelece que eles tenham os mesmos direitos e

obrigações que os funcionários do Estado. Em síntese, visa a máxima qualificação

dos professores para que o ensino tenha a mais alta qualificação cultural.

Art 144. Toda a organização escolar será sujeita à inspeção do

Estado (Reich), podendo este delegá-la aos municípios. A

inspeção escolar estará a cargo de funcionários tecnicamente

preparados e dependentes de uma direção central47.

O Estado passou a se preocupar com a unificação da escola.

Todos deveriam seguir um conteúdo programático e as aulas começavam após a

Páscoa.

Art 145. O ensino é obrigatório para todos nos primeiros oito anos

em que haverá escolas nacionais. Haverá escolas

complementares para o ensino até os 18 anos. Em ambas o

ensino e o material escolar são gratuitos48.

Art 146. A instrução publica deve estruturar-se de modo orgânico.A

escola média e o colegial devem estar baseados na escola

elementar que é comum a todos. Para o ingresso nas escolas

deve-se analisar apenas os talentos e aptidão do aluno, não

podendo ser analisada sua situação sócio-econômica e nem sua

religião49.

O ingresso na escola dependia unicamente das qualidades

46 Tradução livre. 47 Tradução livre. 48 Tradução livre. 49 Tradução livre.

Page 33: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

culturais, como se depreende da leitura do trecho abaixo:

Meninas de longas tranças, como impunha a moda, tagarelavam

sem pudor com seus colegas rapazes, seus iguais. Não obstante,

no meio desses grupos novos e variados, as diferenças sociais,

mantidas, eram perceptíveis pelo comportamento, pelas roupas.

Os jovens filhos de burgueses eram reconhecidos pela cabeça

quase raspada, com larga mecha de cabelos conservada bem no

alto do crânio, dividida por uma risca em duas partes

cuidadosamente simétricas. Os outros usavam cabelos muito

curtos, às vezes quase raspados, sem modismo. A preocupação

das mães era vê-los limpos. Sem piolhos50.

Os arts. 147, 148 e 149 também apresentam preceitos de suma

importância:

Art 147. Admite a criação de escolas particulares, mas necessitam

de autorização do Estado para funcionarem, elas devem ter, no

mínimo, o mesmo padrão de qualidade das públicas, não podem

fazer distinção entre seus alunos e manter uma situação jurídica e

econômica de seus professores. Na falta de qualquer destes

requisitos será negada sua abertura51.

Art 148. Em todas as escolas deverão trabalhar nas bases da ética

educacional, com espírito patriota dando a necessária aptidão

pessoal e profissional, inspirando-se no espírito da nação alemã e

da concórdia entre as nações. Durante o ensino deve-se respeitar

as opiniões divergentes. Os direitos e os deveres cívicos e o

50RICHARD, Lionel. Op. Cit. p. 172. 51 Art 147 “As escolas privadas deverão obter do Estado autorização para seu funcionamento e

estão submetidas às suas leis. Deverão possuir os mesmos padrões das escolas públicas, nas

metas, instalações, objetivos e qualificação de seus funcionários garantindo que não haja

tratamento diferenciado aos alunos em razão de sua riqueza. Só se autorizará escola privada

primária se não houver uma pública para uma minoria de pessoas que solicitaram uma escola para

seus credos ou se a comunidade reconhecer como necessária.” Tradução livre

Page 34: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

ensino profissional são matérias obrigatórias nas escolas. A todos

os alunos será dado uma constituição em sua formatura52.

Art 149. O ensino religioso como obrigatório, salvo nas escolas

leigas ou de confissão livre. Cabe ao Estado seu controle. Os

professores têm o direito de não ministrarem as aulas religiosas e

de não participarem das festas religiosas se assim for de sua

vontade. O mesmo se dá com os alunos. Nas universidades

manter-se-á a faculdade de Teologia53.

Mesmo buscando uma harmonia, são nítidas as diferenças entre

as universidades:

A teologia protestante, o direito, os estudos de alemão eram

geralmente considerados como de direita, enquanto a sociologia e

a psicologia passavam por derem de esquerda. Heidelberg e

Frankfurt tinham a reputação de universidades liberais, enquanto

em Berlim, de acordo com rumores inteiramente fundados,

dominava a direita mais conservadora... O corpo universitário, na

sua maioria, rejeitava a democracia parlamentar. E, curioso

paradoxo, era protegido por ela. Graças ao artigo 142 da

Constituição, que garantia a liberdade da arte, da ciência e do

ensino, a maioria dos professores de direito, de história ou de

filosofia julgavam que tinham liberdade para, do alto de sua

cátedra, externar aos estudantes suas opiniões, que eram anti-

republicanas54.

Carlos Cury traz três constatações sobre essa primeira

normatização constitucional da educação:

A primeira constatação é o elevado número de artigos (nove) no

capítulo referente à educação. E mais: eles são analíticos, com

52 Tradução livre. 53 Tradução livre. 54 RICHARD, Lionel. Op. Cit., p. 186.

Page 35: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

uma intensidade de redação por vezes minuciosa. A educação

escolar goza da garantia constitucional. A seguir, pode-se

assinalar quatro grandes idéias que dominam o conjunto destes

artigos. Primeira: investir em educação é apostar no presente e no

futuro do Reich uma vez que ela é considerada peça estratégica

no soerguimento da nação. Daí o detalhismo na própria

Constituição. Segunda: busca-se uma democratização da

educação escolar, via sistema nacional, que contemple a escola

primária única, gratuita e obrigatória para todas as classes sociais

e para todos os cidadãos alemães sem quaisquer discriminações.

Terceira: a busca de um acordo mínimo em torno da questão do

ensino religioso, penosamente obtido. Criou-se, pois, uma

multiplicidade institucional de escolas públicas: umas com regime

laico, outras com regime confessional e outras com regime

interconfessional. Finalmente, tem-se a presença forte do Estado

no sentido de ser ele o titular da educação escolar. Só ele tem a

capacidade jurídica de inspecionar estabelecimentos, de autorizar

a abertura de escolas privadas, de restringir a amplitude da

liberdade de ensino e de interferir na educação religiosa55.

55 CURY, Carlos Roberto Jamil. A constituição de Weimar: um capítulo para a educação.

Campinas: Educ. Soc. v. 19, n. 63, 1998. p. 86.

Page 36: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

3. A EDUCAÇÃO NO BRASIL

Para entendermos como funciona o atual sistema educacional é

fundamental verificar como nossas Constituições anteriores trataram do assunto,

pois nossas leis nada mais são do que a evolução de idéias e acontecimentos

ocorridos no passado, o que permitem a atualização e melhora na garantia dos

direitos presentes.

Na época do Brasil Colônia os portugueses queriam dominar os

índios, submetê-los à sua cultura e transformá-los em católicos, para isso era

fundamental educar estas pessoas.

Para que fosse possível concretizar essas ambições os jesuítas

resolveram pregar a fé católica através da catequese que incluía em seus

ensinamentos a leitura e a escrita.

Claudino Piletti afirma:

Os jeusuítas logo compreenderam que não seria possível

converter os índios à fé católica sem, ao mesmo tempo, ensinar-

lhes a leitura e a escrita. Por isso, ao lado da catequese,

organizavam nas aldeias escolas de ler e escrever, nas quais

também se transmitiam o idioma e os costumes de Portugal.56

Entretanto, o ensino não passava de lições básicas, não era

finalidade da Coroa Portuguesa ministrar um verdadeiro conhecimento que

possibilitasse o desenvolvimento do raciocínio lógico e questionador.

O conteúdo era somente para garantir a submissão dos índios e

incutir a crença católica.

56 PILETTI, Claudino; PILETTI, Nelson. Filosofia e história da educação. 15. ed. São Paulo: Ática,

2001, p. 166.

Page 37: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

A leitura, a escrita e o cálculo eram, de fato, os conteúdos próprios

da instrução, que davam a base para a compreensão das

Sagradas Escrituras. Ter acesso aos catecismos, livros e cantos

religiosos, realizar o complicado cálculo dos dias e das festas

religiosas, entender e acompanhar ativamente os ritos e os

sacramentos era tudo o que se esperava da instrução do gentio.

Isso os civilizava, pacificava, tornando-os súditos da Coroa e filhos

de Deus57.

A educação era ministrada pela Igreja e também pela própria

família. Os padres foram os primeiros professores que tivemos no Brasil e eram

chefiados por Manoel da Nóbrega. A primeira escola brasileira foi montada em

Salvador e tinha como mestre o irmão Vicente Rodrigues.

Passada a primeira fase de alfabetização, os padres começaram a

ministrar cursos superiores de Humanidades, Teologia e Filosofia, mas para que

se recebesse o diploma era necessário que os estudos fossem terminados em

Portugal.

Esse método foi absoluto durante 210 anos, de 1549 a 1759, mas

com a chegada de Marquês de Pombal os jesuítas foram expulsos e o ensino

tornou-se um verdadeiro caos, pois os próprio jesuítas eram os responsáveis pela

educação. Com a saída deles não havia número de professores suficientes.

José Luiz de Paiva Bello leciona que:

No momento da expulsão os jesuítas tinham 25 residências, 36

missões e 17 colégios e seminários, além de seminários menores

e escolas de primeiras letras instaladas em todas as cidades onde

havia casas da Companhia de Jesus. A educação brasileira, com

isso, vivenciou uma grande ruptura histórica num processo já

implantado e consolidado como modelo educacional. Com a

57 XAVIER, Maria Elizabete; RIBEIRO, Maria Luisa; NORONHA, Olinda Maria. História da

Educação: a escola no Brasil. São Paulo: FTD, 1994, p. 43.

Page 38: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

expulsão saíram do Brasil 124 jesuítas da Bahia, 53 de

Pernambuco, 199 do Rio de Janeiro e 133 do Pará. Com eles

levaram também a organização monolítica baseada no Ratio

Studiorum.

Desta ruptura, pouca coisa restou de prática educativa no Brasil.

Continuaram a funcionar o Seminário Episcospal, no Pará, e os

Seminários de São José e São Pedro, que não se encontravam

sob a jurisdição jesuítica; a Escola de Artes e Edificações Militares,

na Bahia, e a Escola de Artilharia, no Rio de Janeiro.

Os jesuítas foram expulsos das colônias em função de radicais

diferenças de objetivos com os dos interesses da Corte. Enquanto

os jesuítas preocupavam-se com o proselitismo e o noviciado,

Pombal pensava em reerguer Portugal da decadência que se

encontrava diante de outras potências européias da época. Além

disso, Lisboa passou por um terremoto que destruiu parte

significativa da cidade e precisava ser reerguida. A educação

jesuítica não convinha aos interesses comerciais emanados por

Pombal. Ou seja, se as escolas da Companhia de Jesus tinham

por objetivo servir aos interesses da fé, Pombal pensou em

organizar a escola para servir aos interesses do Estado58.

A educação estabelecida por Pombal passou a ser laica e de

responsabilidade da Coroa Portuguesa. Ela não era homogênea e cada professor

ministrava suas aulas de forma diversa. Isso foi mudado pelo Alvará de 28 de

junho de 1759, que estabeleceu aulas régias de latim, grego e retórica.

Ante a desordem estabelecida, Portugal tentou reestruturar o

sistema de ensino e em 1772 o sububsídio era uma taxação, ou um imposto, que

incidia sobre a carne verde, o vinho, o vinagre e a aguardente. Mesmo que exíguo,

nunca foi cobrado com regularidade e os professores ficavam longos períodos

58 BELLO, José Luiz de Paiva. História da educação no Brasil. Disponível em:

http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb14.htm. Acessado em 27/05/2007.

Page 39: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

sem receber vencimentos. Além disso, os professores geralmente não tinham

preparação para a função, já que eram improvisados e mal pagos. Eram

nomeados por indicação ou sob concordância de bispos e se tornavam

”proprietários vitalícios” de suas aulas régias59.

Com a vinda da família real para o Brasil houve uma melhora no

ensino com a criação das primeiras universidades: Academia Real da Marinha,

Academia Real Militar, Medicina, Economia. Nessa época também foi organizada

a primeira biblioteca do país, formada por acervo particular da família real.

Isso decorreu da necessidade de ter pessoas capacitadas, bem

como de formar uma elite brasileira.

Dom João teve a intenção de criar um sistema educacional público

e uniforme, mas a situação econômica não permitiu que a idéia fosse

implementada, pois, além de ser muito inovadora, a estrutura requeria

investimentos altos.

Antônio Chizzotti leciona:

O projeto elaborado por Conde de Barca, Gal. Francisco de Borja,

Gastão Stockler reproduziu o ideário de Condorcet, dividindo a

instrução pública em quatro graus: as pedagogias, que

compreendiam o ensino elementar primário; os institutos, que

acrescentavam às pedagogias os conhecimentos necessários aos

agricultores, artistas, operários e comerciantes; os liceus, que

ministravam os conhecimentos científicos; e as academias, que

desenvolviam os conhecimentos das ciências abstratas e os

estudos das ciências morais e políticas. O projeto, pela sua

inspiração liberal, pelo risco de se reformar uma massa letrada e

um sistema que nem Portugal, nem a própria França possuíam,

contrastava com os interesses da Coroa. Por outro lado, o erário,

59 Ibidem.

Page 40: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

exaurido de todas as formas pelas cortes, não teria condições de

implementar plano tão amplo60.

A situação da colônia não era boa, seja economicamente ou

socialmente. Os impostos eram muito altos e havia pouco investimento para o

progresso do Brasil, pois a maior parte do dinheiro, se não tudo, era enviado para

Portugal para sustentar a Coroa. Um reflexo dessa situação era o completo estado

de penúria em que viviam agricultores, senhores de pequenos ofícios e artesãos.

Nesse momento surgiu uma corrente nacionalista organizada pelo

partido liberal brasileiro, formado por intelectuais que se espelhavam na

Revolução Francesa e advogavam a independência do Brasil.

Em 1822, Dom Pedro declarou a independência do Brasil e

convocou uma assembléia constituinte61 para a formação de nossa primeira

Constituição, que foi outorgada em 25 de março de 1824.

A constituinte era formada por 53 deputados, em sua maioria

bacharéis em Direito formados na Europa. Entre eles ainda havia médicos,

matemáticos e clérigos. Apesar de muitos debates e idéias a constituinte foi

dissolvida62 e Dom Pedro I enviou um projeto de Constituição e formou uma

comissão com 10 integrantes para elaborá-la. A nova Constituição concedeu 60 Chizzotti, Antônio. A constituinte de 1823 e a educação. In: FÁVERO, Osmar. A educação nas

constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed, Campinas: Autores Associados, 2001, p. 38. 61 Na tentativa de estruturar uma educação e sem recursos suficientes ela promoveu um concurso

em que: “1º será reputado benemérito da pátria e como tal reconhecido com a Ordem Imperial do

Cruzeiro, ou nela adiantado se já tiver, aquele cidadão que até o fim do corrente ano apresentar à

Assembléia melhor tratado de educação física, moral e intelectual para a mocidade brasileira; 2º

uma comissão composta de sete cidadãos de conhecida literatura e patriotismo, nomeados pela

Assembléia, decidirá qual dos tratados oferecidos merece a preferência; 3º não havendo

concorrência e aparecendo um só tratado, ainda assim verificar-se-á o premio determinado pelo

parágrafo primeiros se a comissão julgar digno.” Chizzotti, Antônio. Op. Cit, p. 39 62 “A constituinte de 1823, com todos os arrazoados patrióticos e exultantes, em seis meses de

trabalho produziu mais discursos veementes e oradores esfuziantes sobre a instrução, que

diretrizes fundamentais para a educação nacional.” Ibidem. p. 50

Page 41: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

amplos poderes ao imperador, instituiu um Estado Unitário, e seu sistema de

alteração era semi-rígido.63

As normas referentes à educação previam:

Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos

Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança

individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do

Imperio, pela maneira seguinte.

...........................................................................................................

...............

XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos.

XXXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os

elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.

Com a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889,

houve a queda da Monarquia e junto dela a Constituição de 1824. Foi preciso criar

uma assembléia constituinte para a elaboração da nova Constituição, que foi

promulgada em 24 de fevereiro de 1891, e instituiu a República Federativa dos

63 Art. 1. O IMPERIO do Brazil é a associação Politica de todos os Cidadãos Brazileiros. Elles

formam uma Nação livre, e independente, que não admitte com qualquer outra laço algum de

união, ou federação, que se opponha á sua Independencia.

Art. 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organisação Politica, e é delegado privativamente

ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que

incessantemente vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia dos mais

Poderes Politicos.

Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade

alguma.

Art. 178. É só Constitucional o que diz respeito aos limites, e attribuições respectivas dos Poderes

Politicos, e aos Direitos Politicos, e individuaes dos Cidadãos. Tudo, o que não é Constitucional,

póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinarias.

www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao24.htm. Acessado em 27/05/2007

Page 42: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Estados Unidos do Brasil. Criou um Estado independente com a estrutura e forma

de governo baseada na vontade do povo.

Carlos Roberto Jamil Cury nos lembra da fala de Benjamin

Constant:

O nós, isto é o poder de fato do governo provisório nascido do

fato do golpe militar e um futuro poder de direito legitimado pelo

voto popular e expresso em uma Assembléia Constituinte. 64

Durante o governo provisório criou-se a Secretaria da Instrução

Pública, Correios e Telégrafos com o intuito de integração nacional, tornando o

Estado presente em todas as áreas.

Em 30/10/1891 foi criado o Pedagogium que equivaleria

atualmente à Capes a ao Inep. Ao cuidar do assunto Cury afirma:

Foi empreendida a Reforma da Instrução Pública Primária e

Secundária no Distrito Federal, com vários artigos dignos de

estudo; foi selada a existência de escolas livres e criada uma

espécie de Protoconselho Nacional de Educação. Também

mediante este ministério foi empreendida a Reforma do Ensino

Superior, possibilitando as faculdades ‘livres’ e ‘oficiais’, bem como

a criação do Conselho de Instrução Superior do Distrito Federal65.

Houve a separação do Estado e da Igreja, que passou a ser de

âmbito privado, e estabeleceu-se a plena liberdade de crença, bem como o

casamento civil passou a ser o reconhecido.

64 Cury, Carlos Roberto Jamil. A educação e a primeira constituinte republicana. In: Fávero, Osmar.

A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2ª ed, Campinas: Autores Associados, 2001.

p. 70. 65 Ibidem. p. 72-73

Page 43: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Essa Carta ainda garantia a livre manifestação do pensamento

sem dependência da censura, mas vedava o anonimato. Permitia o livre exercício

de qualquer profissão moral, intelectual ou industrial.66

As principais normas sobre educação foram:

Art 34 - Compete privativamente ao Congresso Nacional:

...........................................................................................................

...............

30º) legislar sobre a organização municipal do Distrito Federal bem

como sobre a polícia, o ensino superior e os demais serviços que

na capital forem reservados para o Governo da União67.

Art 35 - Incumbe, outrossim, ao Congresso, mas não

privativamente:

1º) velar na guarda da Constituição e das leis e providenciar sobre

as necessidades de caráter federal;

2º) animar no Pais o desenvolvimento das letras, artes e ciências,

bem como a imigração, a agricultura, a indústria e comércio, sem

privilégios que tolham a ação dos Governos locais;

3º) criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados;

4º) prover a instrução secundária no Distrito Federal68.

66 Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no País a

inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos

termos seguintes:

§ 12 - Em qualquer assunto é livre a manifestação de pensamento pela imprensa ou pela tribuna,

sem dependência de censura, respondendo cada um pelos abusos que cometer nos casos e pela

forma que a lei determinar. Não é permitido o anonimato.

§ 24 - É garantido o livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial. 67 Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao91.htm.

Acessado em 27/05/2007.

Page 44: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Art 72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros

residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à

liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos

seguintes:

...........................................................................................................

.............................

§ 6º - Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos

públicos.

Chama a atenção a proibição do analfabeto votar. Acreditava-se

que com essa proibição o poder público teria maior interesse em erradicar o

analfabetismo para ter um eleitorado maior69.

Com a liberdade de ensino e sua laicidade (as escolas públicas

não poderiam ter posição religiosa) o ensino passou a formar pessoas capacitadas

a enveredarem pelo ensino superior.

O grande retrocesso presente nesta Carta Constitucional é a não

previsão do ensino gratuito, posto que previa somente a competência para legislar

sobre a educação, sem colocá-la como responsabilidade do Estado. O direito à

educação era um direito individual conquistado por esforço próprio e

progressivamente, em conformidade com o mérito de cada um.

Cabia aos Estados e Municípios o encargo do ensino público

primário. A União tinha a função de estimular o desenvolvimento das primeiras

68 Ibdem.

69 Art 70 - São eleitores os cidadãos maiores de 21 anos que se alistarem na forma da lei.

§ 1º - Não podem alistar-se eleitores para as eleições federais ou para as dos Estados:

1º) os mendigos; 2º) os analfabetos; 3º) as praças de pré, excetuados os alunos das escolas militares de ensino superior; 4º) os religiosos de ordens monásticas, companhias, congregações ou comunidades de qualquer denominação, sujeitas a voto de obediência, regra ou estatuto que importe a renúncia da liberdade Individual.

Page 45: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

letras e criar instituições de ensino secundário e superior nos Estados.

João Batista Herkenhoff cuida da educação legislada:

Como essa Constituição adotou o principio de que caberiam aos

Estados todos os poderes ou direitos não reservados à União,

ficou entendido que às esferas estaduais, em matéria de

educação, competiria: a) legislar sobre o ensino secundário e

primário; b) criar e manter instituições de ensino superior e

secundário, sem prejuízo de que também o Governo Federal

pudesse fazê-lo; c) criar e manter as escolas primárias70.

Esta Constituição foi um marco por trazer limites de atuação ao

Estado tornando-o de intervenção mínima garantindo direitos civis, mas não trouxe

nenhum direito social.

Cury observa que:

A constituinte avançou no sentido da defesa da plenitude dos

direitos civis, ampliou um pouco os direitos políticos e omitiu-se (ou

mesmo negou) os direitos sociais (...) Já no terreno específico da

educação escolar, além dos pontos anteriormente assinalados, é

possível dizer que a educação teria sido o único direito social

insinuado no campo de direitos civis. Mas, mesmo isto, com a

hegemonia do liberalismo oligárquico, será ancorado na dimensão

do virtus, própria do esforço individual de cada qual. Assim, não

haverá educação obrigatória exatamente porque a oportunidade

educacional será vista como demanda individual71.

70 Apud. Maliska, Marcos Augusto. O direito à educação e a constituição. Porto Alegre: Sergio

Antonio Fabris Editor, 2001. p. 23-24 71 CURY, Carlos Roberto Jamil. A educação e a primeira constituinte republicana. In: FÁVERO,

Osmar. A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed, Campinas: Autores

Associados, 2001. p. 79.

Page 46: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

As idéias de Estado social nasce após a Segunda Guerra Mundial

sob a influência da Constituição de Weimar e da Constituição Mexicana de 1919.

Em 1930 houve uma importante revolução no Brasil quando os

governos de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul e da Paraíba não apoiaram a

indicação de Júlio Prestes, feita pelo presidente Washington Luiz, e Getulio

Vargas foi derrotado nas urnas.

Essa derrota quebrou a tendência de alteração no poder entre

Minas Gerais e São Paulo, pois os paulistas haviam ficado no poder por duas

vezes seguidas.

Insatisfeito com a situação, Vargas lidera um golpe que o conduz

à Presidência da República.

Nessa época já havia a idéia de um Estado social que garantisse

direitos fundamentais aos cidadãos. Em termos mundiais, o mundo estava

passando por uma grave crise econômica com a quebra da bolsa de valores de

Nova York em 1929.

Todo este contexto, agravado por duas guerras mundiais e pela

Depressão, levou a uma relativa desarticulação da economia

mundial, tornando factíveis e abrindo espaços para a execução de

projetos nacionalistas, que levassem os distintos países a resolver

os impasses existentes. Isto significou que cada país procurou

proteger-se exportando mais, importando menos e expandindo

seus mercados internos, levando assim ao acirramento da luta

entre as economias nacionais72.

O Brasil superou a crise mundial priorizando seus próprios

72 BRITO, Silvia Helena Andrade de. A educação no projeto nacionalista do primeiro governo

Vargas (1930-1945). Disponível em:

http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/artigos_frames/artigo_101.html. Acessado em

01/06/2007.

Page 47: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

produtos, o que contribuiu para o desenvolvimento industrial, que fortificou os

sindicatos e as idéias sociais.

Com o crescimento e desenvolvimento do país é dada mais

importância à educação. Em 14 de novembro de 1930 é criado o Ministério da

Educação e Saúde, liderado pelo Ministro Francisco Campos73.

Em 1932 houve o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova feito

por grandes intelectuais da época como, Antonio de Sampaio Dória, Anísio S.

Teixeira, Cecília Meirelles e outros, que afirmavam:

Se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de

suas condições econômicas, é impossível desenvolver as forças

econômicas ou de produção, sem o preparo intensivo das forças

culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção e à

iniciativa que são os fatores fundamentais do acréscimo de riqueza

de uma sociedade. No entanto, se depois de 43 anos de regime

republicano, se der um balanço ao estado atual da educação

pública, no Brasil, se verificará que, dissociadas sempre as

reformas econômicas e educacionais, que era indispensável

entrelaçar e encadear, dirigindo-as no mesmo sentido, todos os

nossos esforços, sem unidade de plano e sem espírito de

continuidade, não lograram ainda criar um sistema de organização

escolar, à altura das necessidades modernas e das necessidades

do país. Tudo fragmentário e desarticulado (...) o educador, como

o sociólogo, tem necessidade de uma cultura múltipla e bem

diversa; as alturas e as profundidades da vida humana e da vida

73 “As principais medidas tomadas por Francisco Campos na pasta da Educação e Saúde Pública

datam de abril de 1931. Nessa ocasião foi assinado um decreto que afirmava ser preferível o

sistema universitário ao das escolas superiores isoladas e que estabelecia, como exigência para a

fundação de uma universidade, a existência de três unidades de ensino superior - as Faculdades

de Direito, Medicina e Engenharia ou, no lugar de uma delas, a Faculdade de Educação, Ciências

e Letras.” Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos30-37/ev_inteest_mec.htm.

Acessado em 01/06/2007.

Page 48: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

social não devem estender-se além do seu raio visual; ele deve ter

o conhecimento dos homens e da sociedade em cada uma de

suas fases, para perceber, além do aparente e do efêmero, o jogo

poderoso das grandes leis que dominam a evolução social, e a

posição que tem a escola, e a função que representa, na

diversidade e pluralidade das forças sociais que cooperam na obra

da civilização (...) À luz dessas verdades e sob a inspiração de

novos ideais de educação, é que se gerou, no Brasil, o movimento

de reconstrução educacional, com que, reagindo contra o

empirismo dominante, pretendeu um grupo de educadores, nestes

últimos doze anos, transferir do terreno administrativo para os

planos político-sociais a solução dos problemas escolares (...) É

evidente que as diferentes camadas e grupos (classes) de uma

sociedade dada terão respectivamente opiniões diferentes sobre a

concepção do mundo, que convém fazer adotar ao educando e

sobre o que é necessário considerar como ‘qualidade socialmente

útil’. O fim da educação não é, como bem observou G. Davy,

‘desenvolver de maneira anárquica as tendências dominantes do

educando; se o mestre intervém para transformar, isto implica nele

a representação de um certo ideal à imagem do qual se esforça

por modelar os jovens espíritos’ (...) Mas, do direito de cada

indivíduo à sua educação integral, decorre logicamente para o

Estado que o reconhece e o proclama, o dever de considerar a

educação, na variedade de seus graus e manifestações, como

uma função social e eminentemente pública, que ele é chamado a

realizar, com a cooperação de todas as instituições sociais. A

educação que é uma das funções de que a família se vem

despojando em proveito da sociedade política, rompeu os quadros

do comunismo familiar e dos grupos específicos (instituições

privadas), para se incorporar definitivamente entre as funções

essenciais e primordiais do Estado74.

74 Disponível em: www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb07a.htm. Acessado em 01/06/2007.

Page 49: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Esse documento foi fundamental para a reestruturação do sistema

educacional, pois denunciava a desordem do sistema e impunha a educação

como um dever do Estado e direito de todos. Logo, cabia ao poder público criar

um plano geral e uniforme de educação.

Em 1933 Getúlio convoca eleições para formar a Assembléia

Constituinte que, em 16 de julho de 1934, promulga a nova Carta Constitucional.

A Constituição de 1934 é um marco em nosso País por ter

quebrado com a tradição liberal democrática prevista nas outras Cartas.

Apresentava os ideais de um Estado social em conformidade com a já promulgada

Constituição Alemã de 1919. Outros pontos importantes trazidos pela nova ordem

são: direitos e garantias fundamentais, justiça eleitoral, família, educação e

cultura.

Ao encontro do manifesto ela traz a educação como direito de

todos e dever da família e dos órgãos públicos, ela se torna um direito social, isto

é, subjetivo e público. Diante disso, seus beneficiários podem exigir da autoridade

encarregada que cumpra com o preceito constitucional.

É o que dispunha o dispositivo abaixo:

Art 149 - A educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela

família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-

la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que

possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação,

e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da

solidariedade humana75.

Apesar de o Estado ter responsabilidade no oferecimento da

educação, esse dever é mitigado, pois é dividido com a família. Assim, só terá

direito a exigir o ensino público a pessoa que demonstrar ser de família sem

recursos suficientes para arcar com a educação particular.

75 www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao34.htm Acessado em 01/06/07

Page 50: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

A educação foi estruturada de maneira uniforme em todo o país,

competindo à União legislar fixando suas diretrizes e fiscalizar sua execução.

Voltou a previsão da gratuidade, passando a ser obrigatória e assegurada,

inclusive aos adultos. Quanto ao ensino privado, para que tivessem autorização de

dar diplomas, as escolas particulares deveriam estar em conformidade com os

preceitos exigidos constitucionalmente. Mesmo trazendo princípios que deveriam

estar presentes nos currículos escolares foi garantida a liberdade de cátedra76.

Nesse sentido previa o art. 150:

Art 150 - Compete à União:

a) fixar o plano nacional de educação, compreensivo do ensino de

todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e

fiscalizar a sua execução, em todo o território do País;

b) determinar as condições de reconhecimento oficial dos

estabelecimentos de ensino secundário e complementar deste e

dos institutos de ensino superior, exercendo sobre eles a

necessária fiscalização;

c) organizar e manter, nos Territórios, sistemas educativos

apropriados aos mesmos;

d) manter no Distrito Federal ensino secundário e complementar

deste, superior e universitário;

e) exercer ação supletiva, onde se faça necessária, por deficiência

de iniciativa ou de recursos e estimular a obra educativa em todo o

País, por meio de estudos, inquéritos, demonstrações e

subvenções.

Parágrafo único - O plano nacional de educação constante de lei

federal, nos termos dos arts. 5º, nº XIV, e 39, nº 8, letras a e e , só

76 Art 155 - É garantida a liberdade de cátedra.

Page 51: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

se poderá renovar em prazos determinados, e obedecerá às

seguintes normas:

a) ensino primário integral gratuito e de freqüência obrigatória

extensivo aos adultos;

b) tendência à gratuidade do ensino educativo ulterior ao primário,

a fim de o tornar mais acessível;

c) liberdade de ensino em todos os graus e ramos, observadas as

prescrições da legislação federal e da estadual;

d) ensino, nos estabelecimentos particulares, ministrado no idioma

pátrio, salvo o de línguas estrangeiras;

e) limitação da matrícula à capacidade didática do estabelecimento

e seleção por meio de provas de inteligência e aproveitamento, ou

por processos objetivos apropriados à finalidade do curso;

f) reconhecimento dos estabelecimentos particulares de ensino

somente quando assegurarem. a seus professores a estabilidade,

enquanto bem servirem, e uma remuneração condigna.

O Conselho Nacional de Educação era o responsável pela

elaboração do plano nacional de educação, que devia ser aprovado pelo Poder

Legislativo. O referido órgão podia exercer função deliberativa acerca dos

assuntos educacionais de forma independente, mas essas decisões para serem

válidas dependiam de posterior aprovação.

Art 152 - Compete precipuamente ao Conselho Nacional de

Educação, organizado na forma da lei, elaborar o plano nacional

de educação para ser aprovado pelo Poder Legislativo e sugerir ao

Governo as medidas que julgar necessárias para a melhor solução

dos problemas educativos bem como a distribuição adequada dos

fundos especiais.

Page 52: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Parágrafo único - Os Estados e o Distrito Federal, na forma das

leis respectivas e para o exercício da sua competência na matéria,

estabelecerão Conselhos de Educação com funções similares às

do Conselho Nacional de Educação e departamentos autônomos

de administração do ensino.

Outra inovação importante foi a previsão da vinculação de

percentuais do orçamento da União, Estados, Distrito Federal e dos Municípios

para a manutenção do desenvolvimento dos sistemas de ensino:

Art 156 - A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez

por cento, e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte

por cento, da renda resultante dos impostos na manutenção e no

desenvolvimento dos sistemas educativos.

Parágrafo único - Para a realização do ensino nas zonas rurais, a

União reservará no mínimo, vinte por cento das cotas destinadas à

educação no respectivo orçamento anual.

E ainda:

Art 157 - A União, os Estados e o Distrito Federal reservarão uma

parte dos seus patrimônios territoriais para a formação dos

respectivos fundos de educação.

§ 1º - As sobras das dotações orçamentárias acrescidas das

doações, percentagens sobre o produto de vendas de terras

públicas, taxas especiais e outros recursos financeiros,

constituirão, na União, nos Estados e nos Municípios, esses

fundos especiais, que serão aplicados exclusivamente em obras

educativas, determinadas em lei.

§ 2º - Parte dos mesmos fundos se aplicará em auxílios a alunos

necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar,

bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, e para

vilegiaturas.

Page 53: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Ademais, as escolas oficialmente consideradas idôneas eram

imunes a qualquer tributo77. Nesse conceito estavam protegidas tanto as escolas

públicas como as privadas.

A matéria de ensino religioso voltou para a grade da escola

pública, mas por ser um País laico sua freqüência era facultativa78.

Por fim, o constituinte se preocupou com o ensino de qualidade e

para garantir que fosse alcançado valorizou o professor, prevendo garantias ao

docente, conforme se pode extrair do seguinte artigo:

Art 158: É vedada a dispensa do concurso de títulos e provas no

provimento dos cargos do magistério oficial, bem como, em

qualquer curso, a de provas escolares de habilitação,

determinadas em lei ou regulamento.

§ 1º - Podem, todavia, ser contratados, por tempo certo,

professores de nomeada, nacionais ou estrangeiros.

§ 2º - Aos professores nomeados por concurso para os institutos

oficiais cabem as garantias de vitaliciedade e de inamovibilidade

nos cargos, sem prejuízo do disposto no Título VII. Em casos de

extinção da cadeira, será o professor aproveitado na regência de

outra, em que se mostre habilitado.

Edvaldo Machado Boaventura destaca:

A vida constitucional brasileira, de 1823 a 1988, vai se

aperfeiçoando com a promulgação de textos constitucionais.

Avanços e retrocessos da educação se efetivam em períodos e

momentos fortes (...) a gratuidade da educação primária que surge 77 Art 154 - Os estabelecimentos particulares de educação, gratuita primária ou profissional,

oficialmente considerados idôneos, serão isentos de qualquer tributo. 78 Art 153 - O ensino religioso será de freqüência facultativa e ministrado de acordo com os

princípios da confissão religiosa do aluno manifestada pelos pais ou responsáveis e constituirá

matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais.

Page 54: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

resplandecente na Carta outorgada por Pedro I e desaparece na

Constituição revisada por Ruy Barbosa79.

Apesar de a Constituição de 1934 ser a primeira a garantir direitos

sociais, a situação do País não permitiu que suas normas tivessem tempo de

serem efetivamente aplicadas e sua incongruência com a realidade do país fez

com que surgissem inúmeras crises.

Havia uma luta entre os partidos políticos com ideologias em

busca do poder e, para não sofrer golpes, Getúlio Vargas dissolve a Câmara e o

Senado e revoga a Constituição de 1934.

A alegação dada para fundamentar tal conduta foi:

Por outro lado, as novas formações partidárias, surgidas em todo o

mundo, por sua própria natureza refratária aos processos

democráticos, oferecem perigo imediato para as instituições,

exigindo, de maneira urgente e proporcional à virulência dos

antagonismos, o reforço do poder central80.

Em 1º de novembro de 1937 é outorgada mais uma Constituição,

dessa vez com notória falta de legitimidade por não ter sido elaborada por uma

Assembléia Constituinte eleita pelo povo, sendo fruto de um golpe que instaurou a

ditadura.

Essa Carta concentrou o poder nas mãos do Poder Executivo, por

isso seu representante podia legislar através de decretos. Ainda limitou as

garantias e a liberdade dos cidadãos.

No campo da educação ela não teve grande relevância, havendo

na realidade um retrocesso às previsões da anterior. Essa Constituição apenas

79 A educação na Constituinte de 1946. In Fávero, Osmar (org). A educação nas constituintes

brasileiras, 1823-1988. 2ª ed. Campinas: Autores Associados, 2001. p. 192 80 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 23. ed, São Paulo: Malheiros,

2004, p. 82.

Page 55: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

previa a obrigatoriedade, sempre com vistas ao desenvolvimento da moral e do

adestramento físico81.

Deixou de fazer menção à vinculação de receitas para serem

aplicadas na educação e previu um regime de cooperação entre indústria e Estado

para proporcionar o ensino profissionalizante82.

Ao final da Segunda Guerra Mundial os brasileiros estavam

descontentes com a Constituição a eles imposta e queriam uma redemocratização

do País. Muitos protestos são feitos e uma das reivindicações era sufrágio

universal, secreto e direto.

Uma das principais manifestações contra o Estado Novo imposto

por Vargas foi o chamado “Manifesto dos Mineiros” que ficou conhecido como a

81 Art 130 - O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém, não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da matrícula, será exigida aos que não alegarem, ou notoriamente não puderem alegar escassez de recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar.

Art 131 - A educação física, o ensino cívico e o de trabalhos manuais serão obrigatórios em todas as escolas primárias, normais e secundárias, não podendo nenhuma escola de qualquer desses graus ser autorizada ou reconhecida sem que satisfaça aquela exigência.

Art 132 - O Estado fundará instituições ou dará o seu auxílio e proteção às fundadas por associações civis, tendo umas; e outras por fim organizar para a juventude períodos de trabalho anual nos campos e oficinas, assim como promover-lhe a disciplina moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento, dos seus deveres para com a economia e a defesa da Nação.

82 Art 129 - A infância e à juventude, a que faltarem os recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais.

O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é em matéria de educação o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais.

Page 56: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

primeira manifestação pública organizada do período83.

Para conter as reivindicações, Vargas decreta que as eleições

seriam realizadas em outubro. Após as eleições Getúlio vê-se obrigado a

renunciar e o governo é entregue ao presidente do Supremo Tribunal Federal,

José Linhares. Após as eleições, o presidente escolhido foi o General Eurico

Gaspar Dutra.

Em 1º de fevereiro de 1946 a Constituinte inicia seus trabalhos e

em 18 de setembro de 1946 promulga a Constituição da República dos Estados

Unidos do Brasil.

Essa nova Carta inspirou-se nas anteriores de 1891 e de 1934,

reestruturou o equilíbrio entre os três Poderes, trouxe um rol dos direitos

fundamentais.

A educação foi tratada no Título “da família, educação e cultura”,

no Capítulo II “da educação e da cultura”. Essa Constituição traz o direito à

educação e prevê como responsáveis a família e o Estado, cabendo ao poder

83 Maria Victória Benevides aponta que sua importância decorreu: “1) de seu caráter precursor, por

ser a primeira manifestação ostensiva, coletiva e assinada, organizada por membros das elites

liberais, até então ausentes em qualquer contestação pública; 2) de seu significado regional, no

sentido de ser uma resposta dos mineiros ao que percebiam como a espoliação do poder político

de Minas Gerais a partir da ascensão de Getúlio Vargas, o que confirma a importância das

tradições regionalistas na política brasileira; 3) da reação do governo, recorrendo a sanções contra

os signatários (demissão ou aposentadoria dos cargos), o que foi objeto de grande repercussão

em todos os setores da oposição ao regime; 4) da vinculação entre os principais articuladores do

manifesto como movimento conspiratório que desembocaria na criação da União Democrática

Nacional (UDN) em torno da candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes às eleições de 1945.”

Apud. OLIVEIRA, Romualdo Portela de. A educação na Assembléia constituinte de 1946. In:

FÁVERO, Osmar. A educação nas constituintes brasileiras: 1823-1988. 2. ed. Campinas: Autores

Associados, 2001. p. 154- 155.

Page 57: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

público o principio de se buscar a solidariedade humana84.

O ensino é um direito social e subjetivo dos educandos, cabendo

ao Estado ditar as normas bases para sua implementação85. Faticamente, no

entanto, o o Brasil ainda não tinha meios de assegurar a todos os brasileiros o

ensino e por isso nem todas as pessoas em idade escolar tinham acesso à

educação.

Para aumentar o número de escolas e proporcionar a um maior

número de pessoas o ensino, autorizou-se a criação de escolas particulares que

deveriam obedecer as normas legais impostas.

Art 167 - O ensino dos diferentes ramos será ministrado pelos

Poderes Públicos e é livre à iniciativa particular, respeitadas as leis

que o regulem86.

Nota-se que o constituinte preocupou-se em trazer os princípios

educacionais constitucionais e continuou com a separação do Estado e Igreja,

autorizando o ensino religioso facultativo.

Art 168 - A legislação do ensino adotará os seguintes princípios:

I - o ensino primário é obrigatório e só será dado na língua

nacional;

II - o ensino primário oficial é gratuito para todos; o ensino oficial

ulterior ao primário sê-lo-á para quantos provarem falta ou

insuficiência de recursos;

III - as empresas industriais, comerciais e agrícolas, em que

trabalhem mais de cem pessoas, são obrigadas a manter ensino

primário gratuito para os seus servidores e os filhos destes; 84 Art 166 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Deve inspirar-se nos

princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana 85 Art 5º - Compete à União: XV - legislar sobre: d) diretrizes e bases da educação nacional. 86 Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm

Page 58: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

IV - as empresas industrias e comerciais são obrigadas a ministrar,

em cooperação, aprendizagem aos seus trabalhadores menores,

pela forma que a lei estabelecer, respeitados os direitos dos

professores;

V - o ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas

oficiais, é de matrícula facultativa e será ministrado de acordo com

a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz,

ou pelo seu representante legal ou responsável;

VI - para o provimento das cátedras, no ensino secundário oficial e

no superior oficial ou livre, exigir-se-á concurso de títulos e provas.

Aos professores, admitidos por concurso de títulos e provas, será

assegurada a vitaliciedade;

VII - é garantida a liberdade de cátedra87.

Essa Carta também propôs a vinculação da renda de impostos

para garantir o fomento da educação e a descentralização de competência

legislativa. Cada órgão político teria seu sistema de ensino. Isso possibilitou que

os Estados organizassem seus próprios sistemas educacionais desde a pré-

escola até o ensino superior.

Art 169 - Anualmente, a União aplicará nunca menos de dez por

cento, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nunca

menos de vinte por cento da renda resultante dos impostos na

manutenção e desenvolvimento do ensino.

Art 170 - A União organizará o sistema federal de ensino e o dos

Territórios.

Parágrafo único - O sistema federal de ensino terá caráter

supletivo, estendendo-se a todo o País nos estritos limites das

deficiências locais.

87 Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm

Page 59: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Art 171 - Os Estados e o Distrito Federal organizarão os seus

sistemas de ensino.

Parágrafo único - Para o desenvolvimento desses sistemas a

União cooperará com auxílio pecuniário, o qual, em relação ao

ensino primário, provirá do respectivo Fundo Nacional.

Foi garantida a liberdade de cátedra aos professores e a

vitaliciedade aos concursados. Além disso, estabeleceu-se que não haveria a

incidência direta de impostos sobre sua remuneração88

Em 31 de março de 1964 ocorre o golpe militar e o presidente

eleito é destituído.

José Luiz Paiva Bello analisa as conseqüências do período militar

para a educação:

Depois do golpe militar de 1964 muitos educadores passaram a

ser perseguidos em função de posicionamentos ideológicos.

Muitos foram calados para sempre, alguns outros se exilaram,

outros se recolheram a vida privada e outros, demitidos, trocaram

de função.

O Regime Militar espelhou na educação o caráter anti-democrático

de sua proposta ideológica de governo: professores foram presos

e demitidos; universidades foram invadidas; estudantes foram

presos, feridos, nos confronto com a polícia, e alguns foram

mortos; os estudantes foram calados e a União Nacional dos

Estudantes proibida de funcionar; o Decreto-Lei 477 calou a boca

de alunos e professores; o Ministro da Justiça declarou que

88 Art 187 - São vitalícios somente os magistrados, os Ministros do Tribunal de Contas, titulares de

Ofício de Justiça e os professores catedráticos.

Art 203 - Nenhum imposto gravará diretamente os direitos de autor, nem a remuneração de

professores e jornalistas.

Page 60: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

"estudantes tem que estudar" e "não podem fazer baderna". Esta

era a prática do Regime89.

Com isso, a Carta veio a sofrer inúmeras alterações através de

emendas, culminando com o Ato Institucional n. 4, que convocou a reunião

extraordinária do Congresso Nacional. Em 24 de janeiro de 1967 foi promulgada

mais uma nova Constituição, entrando em vigor em 15 de março do mesmo ano.

A Constituição de 1967 caracteriza-se por ser um retrocesso

democrático. Sua primordial preocupação era garantir a segurança nacional e dar

maiores poderes à União e ao Presidente da República, por isso não causa

espanto que tenha retirado a previsão dos porcentuais destinados à manutenção e

desenvolvimento da educação.

José Afonso da Silva afirma:

Sofreu ela poderosa influência da Carta Política de 1937, cujas

características básicas assimilou (...) Reduziu a autonomia

individual, permitindo suspensão de direitos e de garantias

constitucionais, no que se revela mais autoritária do que as

anteriores, salvo a de 1937 (...) avançou no que tange à limitação

do direito de propriedade, autorizando a desapropriação mediante

pagamento de indenização por títulos da dívida ativa pública, para

fins de reforma agrária90.

Carlos Castello Branco relata os fins almejados durante a

elaboração do projeto:

As fontes inspiradoras e coordenadoras do projeto do Governo são

hoje visivelmente duas: ao Ministro da Justiça, Sr. Carlos Medeiros

Silva, coube consolidar os princípios institucionais do movimento

revolucionário e sugerir sugestões referentes à estrutura dos três

Poderes; ao Ministro Roberto Campos coube ajustar o texto aos 89 BELLO, José Luiz Paiva Op. Cit., p.87 90 SILVA, José Afonso da. Op. Cit., p. 87.

Page 61: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

princípios de seu programa de ação econômica, que se projetam

assim para o futuro através de uma formulação que aspira à

estratificação91.

Para assegurar o regime militar e os ideais da revolução, a nova

Constituição tolheu a liberdade de expressão e relegou a educação à segundo

plano, cuidando do tema em seis artigos:

Art 168 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na

escola; assegurada a igualdade de oportunidade, deve inspirar-se

no princípio da unidade nacional e nos ideais de liberdade e de

solidariedade humana.

§ 1º - O ensino será ministrado nos diferentes graus pelos Poderes

Públicos.

§ 2º - Respeitadas as disposições legais, o ensino é livre à

Iniciativa particular, a qual merecerá o amparo técnico e financeiro

dos Poderes Públicos, inclusive bolsas de estudo.

§ 3º - A legislação do ensino adotará os seguintes princípios e

normas:

I - o ensino primário somente será ministrado na língua nacional;

II - o ensino dos sete aos quatorze anos è obrigatório para todos e

gratuito nos estabelecimentos primários oficiais;

III - o ensino oficial ulterior ao primário será, igualmente, gratuito

para quantos, demonstrando efetivo aproveitamento, provarem

falta ou insuficiência de recursos. Sempre que possível, o Poder

Público substituirá o regime de gratuidade pelo de concessão de

bolsas de estudo, exigido o posterior reembolso no caso de ensino

de grau superior;

91 CASTELLO BRANCO, Carlos. Os militares no poder. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1977, p.

609.

Page 62: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

IV - o ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá

disciplina dos horários normais das escolas oficiais de grau

primário e médio.

V - o provimento dos cargos iniciais e finais das carreiras do

magistério de grau médio e superior será feito, sempre, mediante

prova de habilitação, consistindo em concurso público de provas e

títulos quando se tratar de ensino oficial;

VI - é garantida a liberdade de cátedra92.

Prevê a igualdade de oportunidades ao tratar da educação como

direito de todos, o que foi um grande avanço na época. Aumentou a

obrigatoriedade de ensino fundamental para oito anos, sendo oferecido

gratuitamente. Para os demais graus a gratuidade era reservada ao aluno que

comprovasse falta de recursos, sob a condição de apresentar bom rendimento.

Houve a expansão das universidades no Brasil, mas elas ainda

não eram suficientes para receber todos os alunos interessados em cursá-las, e

nesse momento surge o vestibular como critério de seleção de alunos.

Art 169 - Os Estados e o Distrito Federal organizarão os seus

sistemas de ensino, e, a União, os dos Territórios, assim como o

sistema federal, o qual terá caráter supletivo e se estenderá a todo

o País, nos estritos limites das deficiências locais.

§ 1º - A União prestará assistência técnica e financeira para o

desenvolvimento dos sistemas estaduais e do Distrito Federal.

§ 2º - Cada sistema de ensino terá, obrigatoriamente, serviços de

assistência educacional que assegurem aos alunos necessitados

condições de eficiência escolar93

92 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm.

Acessado em 07/06/2007

Page 63: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Trouxe a responsabilidade das empresas em proporcionar

educação para os filhos menores de seus empregados, bem como curso de

aprendizagem aos trabalhadores:

Art.170 - As empresas comerciais, industriais e agrícolas são

obrigadas a manter, pela forma que a lei estabelecer, o ensino

primário gratuito de seus empregados e dos filhos destes.

Parágrafo único - As empresas comerciais e industriais são ainda

obrigadas a ministrar, em cooperação, aprendizagem aos seus

trabalhadores menores.

O crescente descontentamento de estudantes, trabalhadores e

progressistas religiosos pressionou o governo, que reagiu editando os atos

institucionais e uma importante emenda constitucional, a n. 1/69.

A educação não foi muito afetada por essa emenda, mas retirou-

se mas teve uma perda significativa com a exclusão da importante menção à

igualdade de oportunidades. A Constituição passou a ser denominada

Constituição Federativa do Brasil.

Na matéria educacional as principais alterações foram: imposição

da idade dos filhos dos trabalhadores com direito ao ensino primário gratuito dos

sete aos quatorze anos, instituição do salário educação, obrigatoriedade das

empresas proporcionarem o preparo de empregados qualificados, restrição à

liberdade de cátedra que não poderia ter idéias subversivas94.

93 Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao67.htm.

Acessado em 07/06/2007

94 Art. 154. O abuso de direito individual ou político, com o propósito de subversão do regime

democrático ou de corrupção, importará a suspensão daqueles direitos de dois a dez anos, a qual

será declarada pelo Supremo Tribunal Federal, mediante representação do Procurador Geral da

República, sem prejuízo da ação cível ou penal que couber, assegurada ao paciente ampla defesa.

Page 64: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Por fim, temos a Constituição de 1988, que, conforme José Afonso

da Silva, trouxe grandes inovações:

Sua estrutura difere das constituições anteriores. Compreende

nove títulos, que cuidas: 1) dos princípios fundamentais; 2) dos

direitos e garantias fundamentais, segundo uma perspectiva

moderna e abrange dos direitos individuais e coletivos, dos direitos

sociais dos trabalhadores, da nacionalidade, dos direitos políticos

e dos partidos políticos; 3) da organização do Estado, em que,

estrutura a federação com seus componentes; 4) da organização

dos Poderes: Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder

Judiciário, com a manutenção do sistema presidencialista,

derrotado o parlamentarismo, seguindo-se um capítulo sobre as

funções essenciais à Justiça, com ministério público, advocacia

pública (da União e dos Estados), advocacia privada e da

defensoria pública; 5) da defesa do Estado e da instituições

democráticas, com mecanismos do estado de defesa, do estado

de sítio e da segurança pública; 6) da tributação e do orçamento;

7) da ordem econômica e financeira; 8) da ordem social; 9) das

disposições gerais. Finalmente, vem o Ato das Disposições

Transitórias95.

Por toda sua estrutura a Constituição de 1988 ficou conhecida

como Constituição Cidadã, por formar um Estado Democrático de Direito e por dar

fundamental importância aos direitos sociais tratando-os de maneira aprofundada.

Sofreu grande influência da Constituição alemã que tem a

concepção do Estado social quando trata da obrigatoriedade da prestação de

direitos sociais que traz ao individuo garantias de exigir deste prestações positivas

como a educação, saúde, previdência demais direitos sociais.

Baseou-se, também, na Constituição francesa que dispunha:

“toda sociedade na qual não esteja assegurada a garantia dos direitos nem

95 SILVA, José Afonso da. Op. Cit., p. 82.

Page 65: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

determinada a separação de poderes não possui Constituição96.

Prevê em seu art. 6º:

Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho a

moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à

maternidade e à infância, assistência aos desamparados, na forma

desta Constituição.

José Afonso da Silva assim se manifesta sobre esses direitos:

São prestações positivas proporcionadas pelo Estado, direta ou

indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que

possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos

que tendem a realizar a igualização de situações sociais desiguais.

São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade97.

A educação é tratada como um direito social por ser responsável

pela preparação para a cidadania (que é um dos fundamentos da República

Federativa do Brasil, previstos no art. 1º) e para a formação de recursos humanos

que permitirá garantir o desenvolvimento social construindo uma sociedade livre,

justa e solidária.

Nina Ranieri afirma:

A Constituição Federal, ao definir o dever do Estado com a

educação (arts. 205) e o seu comprometimento com o

desenvolvimento nacional e com a construção de uma sociedade

justa e solidária (art 3º) individualiza a educação superior como

bem jurídico, dado o seu papel fundamental na formação de

recursos humanos nas áreas da ciência, pesquisa e tecnologia

(art. 218, § 3º), e no desenvolvimento do País. Para garanti-lo,

franqueia a atividade à iniciativa privada, dentro dos limites fixados

96 MALISKA, Marcos Augusto. Op. Cit., p. 40. 97SILVA, José Afonso da Op. Cit., p. 285.

Page 66: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

na lei; permite a vinculação de receita tributária para a manutenção

e desenvolvimento do ensino público ( art 165, IV); concede

autonomia às universidades (art. 207); garante gratuidade do

ensino nos estabelecimentos oficiais (art. 206); e encarrega o

Estado de assegurar padrão de qualidade, bem como acesso aos

níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,

segundo a capacidade de cada um (art. 208, V), numa atuação de

permanente colaboração entre a União, Estados, o Distrito Federal

e os Municípios (art. 211)98.

Podemos verificar que apesar de a educação não vir

expressamente prevista no título dos direitos e garantias fundamentais, faz parte

desses direitos por ser verdadeiro direito fundamental do ser humano, pois é pela

educação que o homem conquista sua dignidade, liberdade e igualdade.

A dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o

conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o

direito à vida. Concebido como referência constitucional

unificadora de todos os direitos fundamentais (...) Daí decorre que

a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos a

existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da

justiça social (art 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa

e seu preparo para o exercício da cidadania (art 205) etc, não

como meros enunciados formais, mas como indicadores do

conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana99.

Mesmo não estando expressa no art. 5º, o direito à educação é

um direito fundamental, conforme se depreende das lições de Maria Garcia sobre

direitos fundamentais:

98 RANIERI, Nina Beatriz. Educação Superior, Direito e Estado: na Lei de Diretrizes e Bases. São

Paulo: Edusp. p. 24 99 SILVA, José Afonso. Op. Cit. p. 109

Page 67: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Todos os direitos e garantias diretamente vinculados a um dos

cinco direitos fundamentais básicos constantes do art 5º, caput.

(...) assim vinculados diretamente ao direito à vida, os direitos

sociais constantes do art. 6º (a educação, a saúde, o trabalho, o

lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade

e à infância, a assistência aos desamparados)100.

Por ser um direito fundamental e essencial para o ser humano, a

educação deve proporcionar seu desenvolvimento, sempre em busca do aumento

de sua capacidade integral.

Desta forma, pode-se afirmar que a educação é um processo de

informação e de formação física e psíquica do ser humano para uma existência e

coexistência. É um direito individual que é, ao mesmo tempo, social101.

Regina Maria Fonseca Muniz:

A educação, como um dos direitos humanos, tendo origem no

direito natural, deve ser assegurada de maneira primordial.

Considerada apenas como um direito social, deve ser mais que

isso. Ínsita no direito à vida, é instrumento fundamental para eu o

homem possa se realizar como homem. Santo Tomás De Aquino,

o homem tem sede de saber. Seu potencial para aprender só se

transformará em ato no momento em que lhe forem propiciadas

todas as condições necessárias para tal. E isso só é possível

através da educação. É a consagração desse direito102.

Ao tratar deste direito, o constituinte estabelece os princípios da

100 Garcia, Maria. Mas, quais são os direitos fundamentais? In Revista de Direito Constitucional e

Internacional. Caderno de Direito Constitucional e Ciência Política. n. 39. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2002. p, 122 101 GARCIA, Maria. A nova lei de diretrizes e bases da educação nacional. In: Revista de Direito

Constitucional e Internacional. Caderno de Direito Constitucional e Ciência Política. n. 39. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 1988. p. 59. 102 MUNIZ, Regina Maria Fonseca. O direito à educação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 79.

Page 68: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

universalidade e da uniformidade, ou seja, a União é quem disciplinará as normas

gerais sobre educação, devendo sempre observar os princípios educacionais

constitucionais, pois o constituinte trouxe expressamente princípios que jamais

podem ser descumpridos. Trata-se de balizas, diretrizes que o legislador deverá

observar para a regulamentação das normas infraconstitucionais. O art. 206 prevê

que o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

a) Igualdade

Refere-se ao inciso I, igualdade de condições para acesso e

permanência na escola (visa que não haja qualquer discriminação para o ingresso

nas escolas e universidades, não deve haver privilégio de uns em detrimento de

outros).

O presente dispositivo trata da igualdade material, isto é, aquela

que equipara a todos perante os bens da vida, Ritinha Alzira Stevenson

Georgakilas leciona:

A igualdade material ou substancial deve ser entendida como o

tratamento uniforme de todos os homens e a sua equiparação no

que se refere à concessão de oportunidades. Estas devem ser

iguais, segundo a proposta da igualdade material ou substancial,

para todos os habitantes de determinado Estado na proporção dos

bens da cultura103.

Ela proporciona a igualdade de oportunidades.

A igualdade formal é a igualdade perante a lei, ela deve ser

aplicada de forma igualitária a todas as pessoas. Nada mais é do que a igualdade

jurídica abstrata, que trata todos como se estivessem nas mesmas condições. O

exemplo deste princípio é a previsão constitucional do art. 5º, caput, primeira

parte, que diz que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer

103 Apud. GUERRA, Renata Rocha. Princípios constitucionais do ensino. Dissertação. São Paulo:

PUC, 1996. p. 103.

Page 69: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

natureza

A igualdade formal vem perdendo espaço para a igualdade

material, pois essa visa a efetiva equiparação dos seres humanos mediante

constatação de desigualdades fáticas, utilizando a lei como instrumento de

concretização da igualdades.

O Estado deve oferecer escola para os necessitados e também

material escolar, transporte, alimentação e ensino especial para os deficientes.

Somente dessa maneira teremos a efetiva aplicação da igualdade104.

Maliska afirma:

O direito de igualdade gera direito subjetivo de exigir que, na

hipótese de situações idênticas, ocorra o tratamento isonômico.

Como o princípio também vincula as escolas privadas, nestas

pode ser admitido qualquer tipo de apadrinhamento ou distribuição

de benefícios, de forma desigual. Mesmo se tais benefícios não

provierem do Estado, mas da própria escola, esta não possui o

direito de arbítrio105.

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o

pensamento, a arte e o saber (deve haver liberdade para a manifestação da

104 Em decorrência de tal postulado a Constituição trouxe as seguintes normas:

Art 208, III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

Art 212, § 4º - Os programas suplementares de alimentação e assistência à saúde previstos no art. 208, VII, serão financiados com recursos provenientes de contribuições sociais e outros recursos orçamentários.

105 MALISKA, Marcos Augusto., Op. Cit., p. 174.

Page 70: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

educação).É um dos objetivos fundamentais da República, pois a Constituição

prevê em seu art 3º, I, construir uma sociedade livre, justa e solidária (grifamos).

Apesar de ser um direito previsto pela Carta sabemos que não há

direitos absolutos e por essa razão ele pode ser restringido.

O direito livre de aprender é restringido quando o Estado se obriga

e também obriga os pais a colocar as crianças na escola para que, pelo menos,

completem o ensino fundamental. Não há liberdade de colocar ou não o filho na

escola, trata-se de um dever da família, que poderá escolher onde seu filho

estudará.

Tratando do assunto, Maliska ressalta que qualquer restrição ao

direito de liberdade deve ser ponderada, ou seja, deve-se verificar meios pelos

quais a restrição seja mínima possível e seus efeitos atinjam o máximo

pretendido106.

Esse direito engloba a liberdade de ensino dos professores,

liberdade do aluno na compreensão e no pensar científico, em outras palavras, é a

liberdade de aprender e ensinar107.

José Afonso da Silva entende que:

A fórmula empregada agora é mais compreensiva porque se dirige

a qualquer exercente da função de magistério, a professores de

qualquer grau, dando-se liberdade de ensinar, e mais ainda porque

também abrange a outra face da transmissão do conhecimento, o

outro lado da liberdade de ensinar, ou seja, a liberdade de

aprender assim como a liberdade de pesquisar (modo de aquisição

do conhecimento)108.

106 Ibidem, p. 175. 107 A Constituição com base nesse princípio garante no art. 218: O Estado promoverá e incentivará

o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica. 108 SILVA, José Afonso da, Op. Cit., p, 248.

Page 71: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

A sociedade só avança com a descoberta de novas técnicas, e

para que isso seja possível é preciso inovar, pesquisar, ter liberdade para criar e

inventar. A educação é responsável pelo avanço da nação. Quanto às

descobertas, Olivier Reboul leciona:

A invenção, que não pode ser programada: não se inventa por

encomenda; só pode ser fecunda se assumir o risco de ser livre de

toda a instrução dos poderes e de todo o constrangimento de

aplicação, ou até de êxito109.

III - pluralismo de idéias, de concepções pedagógicas, e

coexistência de instituições públicas e privadas de ensino. Vidal Serrano Nunes

assim se manifesta sobre o assunto:

Pois somente por meio de várias opções pedagógicas pode, tanto

quem oferece como quem recebe o ensino, escolher o que melhor

lhes atende, e a coexistência de escolas públicas e privadas, que

descarta tanto monopólio estatal (que cercearia as liberdades já

consagradas) como a atuação exclusiva da iniciativa privada110.

Através dele se possibilita a prática da tolerância, pois nosso país

é composto por diversas classes sociais, políticas, econômicas, culturais que

coexistem, não sendo possível estabelecer uma hegemonia nacional, uma vez

que cada região possui necessidades específicas. Está intrinsecamente ligada à

noção de democracia que, por sua vez, aceita as divergências de pensamento,

crenças, concepções pedagógicas e políticas.

Com todo esse pluralismo e como o Estado não é capaz de

proporcionar o ensino para todos, autorizou-se a criação de escolas privadas que

deverão observar o cumprimento das normas gerais da educação nacional e ter

autorização, além disso, a qualidade dessas escolas passa pelo crivo de

109 REBOUL, Olivier. A filosofia da educação. Lisboa: Edições 70, p. 37. 110 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional.

São Paulo: Saraiva, 2004, p. 445.

Page 72: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

avaliações do poder público.

Como a educação é um direito social, há o interesse estatal em

controlá-la, por isso a escola particular sofrerá intervenção do Estado.

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais:

significa que as escolas que forem públicas não poderão cobrar de seus

discentes, mesmo que estes possuam renda para fazê-lo.

Tal princípio sofre exceção prevista no art. 242:

Art. 242. O princípio do art. 206, IV, não se aplica às instituições

educacionais oficiais criadas por lei estadual ou municipal e

existentes na data da promulgação desta Constituição.

V - valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma

da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e

ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos.

É fundamental valorizar os profissionais do ensino para que

tenham dignidade no trabalho e sintam-se estimulados a desempenhar de maneira

satisfatória a atividade docente.

Para Maliska:

Condições adequadas de trabalho compreendem não só as

instalações físicas do estabelecimento de ensino, mas também e,

principalmente, os instrumentos, colocados à disposição do

professor para desempenhar um bom trabalho. Os instrumentos

são as bibliotecas, os laboratórios, enfim, os diversos meios de

que necessitam os diversos níveis de educação111.

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei.

Sobre esse aspecto pontua Marcos Maliska: 111 MALISKA, Marcos Augusto Op. Cit. p. 185

Page 73: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Viver em uma sociedade democrática é participar dela

democraticamente, é o cidadão, em seu ambiente de vida, poder

dar a sua contribuição, participando, dando idéias, para melhor

solucionar os problemas112.

Assim, pais, alunos e professores devem ser convocados para

participar da política de ensino, do projeto pedagógico, bem como opinar sobre as

necessidades e peculiaridades da escola.

O debate acerca dos rumos da educação é de interesse de toda a

sociedade:

A Universidade não é um corpo isolado. Ela se integra numa

comunidade maior que é a sociedade civil. Influi e é influenciada

por esta. E hoje, especialmente, com os contínuos e vertiginosos

progressos da ciência e da técnica, a abertura e a comunicação

entre ambos são cada vez mais importantes. Pedir ao estudante

que se limite ao estudo das disciplinas curriculares e se afaste dos

problemas da sociedade significa condenar à marginalização os

futuros dirigentes da nação e, ao mesmo tempo, privar a

coletividade da contribuição inestimável das críticas e sugestões

de um setor particularmente capaz de acelerar as transformações

necessárias a uma sociedade em mudança113.

VII - garantia do padrão de qualidade. Esse princípio é dos mais

importantes, pois assegura o direito à igualdade. Não podemos ter ensino

diferenciado para pessoas que possuem a mesma capacitação, é dever das

escolas ministrarem o ensino com seriedade, sempre com vistas ao

desenvolvimento do conhecimento e do pensar. Não é admissível que pessoas na

mesma situação tenham ensinos diversos em que se finge que aprende e finge

que se ensina, é necessário que haja o máximo de seriedade no conteúdo

ministrado e que ele seja suficiente para capacitar o aluno em sua vida social e

112 MALISKA, Marcos Augusto. Op. Cit., p. 216. 113 MONTORO, Franco. Estudos de Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 1995. p. 237

Page 74: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

profissional.

O poder público chama para si a responsabilidade de oferecer aos

mais necessitados condições de estudar em escolas com a mesma qualidade das

particulares, a fim de que todos tenham a mesma oportunidade de se desenvolver.

O Estado traz apenas um conteúdo mínimo a ser ministrado nas

escolas, mas estas podem ampliar o plano pedagógico nacional adequando-o à

realidade local. O art. 26 da LDB114 permite a complementação do conteúdo por

parte dos estabelecimentos de ensino.

Toda escola deve ter uma base mínima que será igual para todas,

mas nada impede que elas acrescentem conteúdos a serem ministrados. É

importante que o ensino tenha qualidade, pois em nada adiantaria ter padrões

mínimos se o que se leciona não é absorvido pelos alunos. É direito do aluno

exigir a qualidade do ensino e função do Estado fiscalizá-lo para garantir escolas

de qualidade.

Rubem Alves faz o seguinte relato sobre a qualidade:

Todos os seres vivos cuidam da qualidade. Peixe foge da água

poluída, passarinho não faz ninho em chaminé de fábrica, cachorro

não come comida estragada. O nenezinho, ignorante de tudo o

mais, sabe distinguir entre leite bom e leite ruim (...) o que é bom

dá prazer. O que é ruim faz sofrer (...) Sapiência é isto: o

conhecimento do bom sabor que traz felicidade ao corpo. E sábio,

no sentido etimológico, é o provador, degustador, aquele que,

havendo se diplomado na cozinha de Babette, põe a comida na

boca e diz: ‘Delicioso! Está bom para ser servido’ (...) Assim são

nossas escolas, que ensinam tudo sobre fogo, panelas,

114 Art 26 - Os currículos do ensino fundamental e médio devem ter uma base nacional comum, a

ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte

diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia

e da clientela. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/LEIS/L9394.htm

Page 75: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

ingredientes, condimentos, reações, transformações, mensurações

– mas em nenhum lugar ensinam a arte suprema sem a qual não

se faz comida boa: a arte de degustar. Nas escolas forma

cozinheiros castrados em língua (...) A vida é uma grande cozinha.

Quem aprendeu a sabedoria da cozinha aprendeu a sabedoria

necessária para se viver. E a sabedoria da cozinha é esta: que

tudo o que se aprende, que se sabe que se faz tem por objetivo

esse momento supremo de felicidade e prazer. Controle de

qualidade é controle de prazer. Gestão de qualidade é gestão de

prazer. Qualidade total é prazer total115.

Por meio da observância desses princípios será possível alcançar

a finalidade prevista no dispositivo a seguir:

Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da

família, será promovida e incentivada com a colaboração da

sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu

preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o

trabalho. (grifo nosso)

Os princípios devem ser obedecidos, pois não são meros

conselhos, mas sim nortes que estruturam o sistema constitucional. Nesse

sentido, Celso Antônio Bandeira de Mello pontua:

Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma.

A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um

especifico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de

comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou de

inconstitucionalidade, conforme o escalão do principio atingido,

porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão

de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu

arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque,

ao ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustém e alui-se toda a 115 AUTOR, Conversa com quem gosta de ensinar (+ qualidade total na educação). 4. ed.

Campinas: Papirus, 2001, p. 127- 134 .

Page 76: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

estrutura neles esforçada116.

Infelizmente a finalidade e os princípios educacionais não têm sido

respeitados. O que vemos são pessoas portadoras de diplomas e títulos e

totalmente desqualificadas para o exercício de sua profissão, em nada

contribuindo para a melhora da sociedade.

José Afonso da Silva afirma que:

A grande expansão dos cursos jurídicos no País, demonstra que o

Conselho Nacional de Educação não é nada rigoroso no autorizar

o funcionamento desses cursos (...) essa situação acaba gerando

um geométrico e crescente aumento de cursos jurídicos, muitos

dos quais sem qualquer substancia, criando uma legião de

bacharéis desesperados, em prejuízo não só de si próprios, como

da coletividade e da imagem dos operadores do direito,

especialmente os advogados117.

E continua:

Ora, o baixíssimo nível de aprovação nesse Exame (cerca de 15%

dos candidatos) vem demonstrando a precariedade do ensino

jurídico na maioria das Faculdades de Direito do País. Isso é

confirmado pelo programa OAB Recomenda118.

É por essa razão que propomos um novo método de ensino na

área jurídica. Trata-se de método que vem sendo aplicado com sucesso na

Medicina, cumprindo com as finalidades e princípios constitucionais acima

mencionados.

116 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Elementos de Direito Administrativo. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 1980. p. 230. 117 Ética Acadêmica. In: RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes; BERARDI, Luciana Andréa Accorsi. Estudos

de direito constitucional em homenagem à professora Maria Garcia. São Paulo: IOB- Thomson,

2007. p.209-211 118 Ibidem, p. 211.

Page 77: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

4. O ENSINO SUPERIOR E ALGUNS PROBLEMAS

O ensino superior vem apresentando diversos problemas e parte

deles já é percebido há muito tempo. Embora no ensino tenhamos muitas

questões locais, para os fins desse estudo vamos destacar as dificuldades que

estão presentes de modo universal, isto é, independentemente da região.

O problema do ensino jurídico já foi relatado na literatura por Eça

de Queirós, em sua obra O conde de Abranhos:

Têm alguns espíritos, ávidos de inovação, ainda que no fundo

sinceramente afeiçoados aos princípios conservadores,

sustentando que o sistema da sebenta (como, na sua jovial

linguagem, lhe chama a mocidade estudiosa) é antiquado. Eu

considero, porém a sebenta como a mais admirável disciplina para

os espíritos moços. O estudante habituando-se, durante cinco

anos, a decorar todas as noites, palavra por palavra, parágrafos

que há quarenta anos permanecem imutáveis, sem os criticar, sem

os comentar-ganha o hábito salutar de aceitar, sem discussão, e

com obediência, as idéias preconcebidas, os princípios adotados,

os dogmas provados, as instituições reconhecidas. Perde funesta

tendência – que tanto mal reproduz – de querer indagar a razão

das coisas, examinar a verdade dos fatos; perde enfim funesto

hábito de exercer o livre-exame – que não serve senão para ir

fazer um processo cientifico a venerandas instituições, que são a

base da sociedade. O livre-exame é o principio da revolução. A

ordem o que é? – A aceitação obediente das idéias adotadas. Se

se acostuma a mocidade – a não receber nenhuma idéia de seus

mestres, sem verificar se é exata – corremos o perigo de os ver,

mais tarde, não aceitar nenhuma instituição do seu país sem

verificar se é justa. Temos o espírito da revolução – que termina

pelas catástrofes sociais. Hoje, destruído o regime absoluto, temos

Page 78: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

a certeza que a Carta liberal é justa, é sábia, é útil, é sã. Que

necessidade há de examinar, discutir, verificar, criticar, comparar,

pôr em dúvida? O hábito de decorar a sebenta – produz mais tarde

o hábito de aceitar a Carta. A sebenta é a pedra angular da Carta!

O Bacharel é o gérmen do Constitucional119.

O texto transcrito evidencia muito dos problemas que ainda hoje

são encontrados, como professores que não ensinam o aluno a pensar ou que só

aceitam o posicionamento que julgam correto, alunos que são acomodados a

decorar e fazer o que o professor manda sem o menor questionamento e que no

futuro são reprodutores fiéis do que decoraram, currículos escolares

desatualizados que seguem a mesma tradição como se a necessidade de hoje

fosse a mesma de outrora.

Versando sobre o assunto afirma José Afonso da Silva:

A grande expansão dos cursos jurídicos no País demonstra que o

Conselho Nacional de Educação não é nada rigoroso no autorizar

o funcionamento desses cursos (...) essa situação acaba gerando

um geométrico e crescente aumento de cursos jurídicos, muitos

dos quais sem qualquer substancia, criando uma legião de

bacharéis desesperados, em prejuízo não só de si próprios, como

da coletividade e da imagem dos operadores do direito,

especialmente os advogados120.

Para esse autor o baixíssimo nível de aprovação no Exame de

Ordem, que atualmente é cerca de 15% dos candidatos, demonstra a

precariedade do ensino jurídico na maioria das Faculdades de Direito do país. Isso

119 Apud. AGUIAR, Roberto A. R. de. Habilidades: ensino jurídico e contemporaneidade. Rio de

Janeiro: DP&A editora, 2004. p. 179-180. 120 Ética Acadêmica. In: RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes; BERARDI, Luciana Andréa Accorsi. Estudos

de direito constitucional: em homenagem à professora Maria Garcia. São Paulo: IOB- Thomson,

2007. p.209-211.

Page 79: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

é confirmado pelo programa “OAB Recomenda”121.

A par desse cenário, advogamos em prol de um novo método de

ensino na área jurídica, que vem sendo aplicado na Medicina e tem demonstrado

cumprir com as finalidades e princípios constitucionais acima mencionados.

Nosso estudo tem como ponto de partida as evidências que

cercam a atividade docente. Na maioria das vezes a docência é exercida como

profissão secundária a outra profissão principal. Uma das causas é a forma da

composição do quadro docente, pois a maioria das escolas de Direito busca

formar seu corpo docente com profissionais cuja atividade principal é a profissão

de advogado, juiz, promotor, procurador ou delegado, e muitos desses

profissionais não têm a capacitação pedagógica necessária.

José Afonso da Silva critica as faculdades particulares nesse

aspecto ao afirmar que a seleção de professores, em sua maioria, é feita entre

profissionais sem titulação acadêmica e por meio de contratação, segundo

escolha e critério de seus proprietários, de sorte que seus corpos docentes são

precários e instáveis122.

Nesse sentido, Gustavo Smizmaul Paulino pondera:

Lamentavelmente, os cursos jurídicos notabilizam-se pela pouca

exigência acadêmica no que se refere ao corpo docente.

Freqüentemente, o professor de Direito é um profissional da ativa

que leciona para complementar sua renda ou porque o status de

professor de Direito pode gerar-lhe dividendos em marketing

pessoal. É comum a prática entre faculdades de Direito agraciar,

por exemplo, juizes, promotores, delegados e procuradores do

Estado ou advogados famosos com uma cadeira. É certo que

muito desses profissionais se dedicaram (e ainda se dedicam) com

esmero no ensino superior, sendo importante referência intelectual

121 Ibidem. p. 211. 122 SILVA, José Afonso da. Ética Acadêmica. p. 217.

Page 80: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

e profissional para os estudantes. Mas isso, por si só, não afasta a

realidade de contratações sem o mínimo de aptidão para o

trabalho educacional que exige outras habilidades além de saber

redigir petições ou ditar sentenças. Muitos fizeram e ainda fazem

da sala de aula palco da auto-idolatria, de exercício descomedido

da autoridade jurídica, entre outras práticas perniciosas num

verdadeiro desserviço educacional a pretexto de estarem

mostrando os bastidores do Direito e de como na prática a teoria é

outra. Certamente, a valorização e a profissionalização do corpo

docente com ênfase na vocação para o magistério superior são

fundamentais para a recuperação da vitalidade que o curso de

Direito há muito tempo deixou de demonstrar123.

Como conseqüência dessa dupla atuação profissional, os

professores geralmente possuem pouco tempo para a atualização, e quando o

fazem em regra são autodidatas. Raramente fazem um curso de pedagogia para

que saibam como lidar com esse processo tão complicado e fascinante que é a

educação, o que gera insegurança ao ensinar, verificado em atitudes auto-

protetoras como comunicação muito formal, exagerado nível de exigência nas

provas, emprego de ironia, sarcasmo, tudo visando manter sua autoridade e auto-

estima. Também pode ocorrer o inverso: atitudes humildes, facilitação demasiada

nas provas e trabalhos e tolerância à indisciplina124.

Não pode haver bom ensino jurídico se o corpo docente não

dispõe de um bom preparo acadêmico, para o exercício de suas

elevadas funções (...) até porque os compromissos do professor

de direito se estendem além da sala de aulas, incluindo a tarefa de

educar para a cidadania, capacitar para o exercício ético da

123 Das razoes da crise do ensino do Direito: subsídios para o exame da possibilidade de um saber

emancipatório. Dissertação Mestrado. PUC: São Paulo, 2004. p. 65. 124 BORDENAVE, Juan Díaz; PEREIRA, Adair Martins. Estratégias de ensino-aprendizagem. 25

ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2004, p.16.

Page 81: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

profissão, preparar para os desafios profissionais, incutir a chama

da busca no justo espírito do estudante de direito125.

É necessário valorizar o professor como tal, incentivar a pesquisa

e a atualização. O docente é aquele que está disposto a constantemente buscar o

aprendizado e ver no aluno uma pessoa que ali está para compartilhar

conhecimento e aprender. Ele deve ter ciente que na sala de aula sua função é de

professor, e não qualquer outra que exerça fora dali.

Segundo Freire e Shör:

Não há docência verdadeira em cujo projeto não se encontre a

pesquisa como pergunta, como indagação, com curiosidade,

criatividade, assim como não há pesquisa em cujo andamento

necessariamente não se aprenda porque se conhece e não se

ensine porque se aprende126.

Os problemas do ensino jurídico não são atuais, mas nos parece

que ainda hoje eles permanecem os mesmos. A citação de José Eduardo Faria foi

feita em 1987, no entanto, parece ter sido feita ainda hoje:

As Faculdades de Direito (...) funcionam como meros centros de

transmissão do conhecimento jurídico oficial e não, propriamente,

como centros de produção do conhecimento jurídico. Neste

sentido, a pesquisa nas Faculdades de Direito está condicionada a

reproduzir sabedoria codificada e a conviver respeitosamente com

as instituições que aplicam (e interpretam) o direito positivo. O

professor fala de códigos e o aluno aprende (quando aprende) em

códigos (o conhecimento jurídico tradicional é um conhecimento

125 SILVA, José Afonso da. Ética acadêmica. p. 218 126 Apud. MELLO, Reynaldo Irapuã Camargo. Ensino Jurídico: formação e trabalho docente.

Curitiba: Juruá, 2007. p. 24.

Page 82: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

dogmático e as suas referencias de verdade são ideológicas e não

metodológicas)127.

Outros problemas podem surgir, como: falta de integração entre os

programas das diversas disciplinas ocasionando a repetição dos temas e erro de

seqüência cronológica; falha no planejamento do conteúdo programático, que

prevê carga horária insuficiente para a quantidade de matéria, ocorrendo apenas o

cumprimento de parte da grade de temas; os programas são confeccionados sem

prévia pesquisa de necessidades e condições da região onde está localizada a

faculdade, havendo pouca aplicação no desempenho profissional. Versando sobre

o assunto adverte Rubens Approbato Machado:

As deficiências do ensino, aliadas a grades curriculares defasadas,

a corpos docentes descomprometidos com a eficiência dos cursos,

a interesses meramente mercantilistas ensejadores da profusão de

cursos e de muitas de suas extensões sem a necessária

capacitação, a flagrante falta de formação e de informação dos

alunos, são alguns dos motivos de um despreparo gritante de uma

ponderável parcela dos operadores do Direito128.

Ainda mais grave é a fragmentação dos conhecimentos, conforme

salienta Edgar Morin:

Há inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave entre os

saberes separados, fragmentados, compartimentados entre

disciplinas, e, por outro lado, realidades ou problemas cada vez

mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais,

transnacionais, globais, planetários.Em tal situação, tornam-se

invisíveis: os conjuntos complexos; as interações e retroações

127 FARIA, José Eduardo A reforma do ensino jurídico. Porto Alegre: Fabris, 1987. p. 34. 128 Apud. José Afonso da Silva. Ética acadêmica, p. 212.

Page 83: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

entre partes e todo; as entidades multidimensionais; os problemas

essenciais129.

Embora seja uno, o Direito é didaticamente dividido em matérias

para facilitar o aprendizado: civil, penal, constitucional, comercial, tributário,

consumidor, trabalho e processual. Essa divisão, no entanto, faz com que o

discente não consega relacioná-las, tampouco harmonizá-las com outras ciências.

Edgar Morin também trata do assunto:

A supremacia do conhecimento fragmentado de acordo com as

disciplinas impede freqüentemente de operar o vínculo entre as

partes e a totalidade, e deve ser substituída por um modo de

conhecimento capaz de apreender os objetos em seu contexto,

sua complexidade, seu conjunto130.

Sem dúvida esse é um dos principais motivos pelo qual o aluno

não sabe resolver os casos práticos ou elaborar petições e recursos. Sabemos

que quando o cliente procura o advogado ele espera que o profissional tenha

conhecimento global da área jurídica. Ao advogado cabe verificar a situação

econômica e psicológica do cliente ao narrar os fatos.

Elizete Alves afirma:

O discurso educacional tradicional tem como vertente a formação

integral, todavia, na prática é invertida, voltada ao individualismo

de cada disciplina, impedindo a formação do cidadão crítico,

consciente de sua participação social e política, sem a base sólida

da formação global voltada ao desenvolvimento de suas

129 MORIN, Edgar. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8. ed. Rio de

Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p. 112. 130 MORIN, Edgar Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2004. p.

14.

Page 84: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

potencialidades, habilidades e competências e continua: é urgente

a busca por caminhos de integração do conhecimento científico

quebrando o paradigma da desconexão e da fragmentação, da

visão ortodoxa e conservadora, herança de um positivismo jurídico

que pautou a formação pedagógica até o final do século passado,

quando a interpretação por partes significativa uma forma bem

mais simples de entender o mundo e seus fenômenos131.

O ensino superior é estruturado em disciplinas132, que, por sua

vez, são os componentes dos departamentos, os quais formarão o corpo do curso

de Direito. Nota-se, todavia, que as informações são transmitidas sem considerar

o ser humano, a quem todo esse conhecimento se destina e aquele que sofrerá

seus efeitos.

Para que o ensino cumpra com suas finalidades deve-se atentar

para a responsabilidade da instituição de ensino:

A responsabilidade da universidade na formação do profissional do

Direito está fundamentada na qualidade do curso e isso abarca um

bom projeto pedagógico que priorize a interdisciplinaridade, que

propicie a inserção do profissional no mercado de trabalho, com

destaque, não pelo simples fato de ter um diploma, mas, sobretudo

pela capacidade de argumentação e de percepção crítico-

construtiva do fenômeno jurídico, qualificação do corpo docente,

131 ALVES, Elizete Lanzoni. A interdisciplinaridade no ensino jurídico: constuição de uma proposta

pedagógica. In: MANDARO, Dilsa; ALVES, Elizete Lanzoni; SANTOS, Sidney Francisco Reis dos.

Ensino Jurídico interdisciplinar: um novo horizonte para o Direito. Florianópolis: OAB/SC, 2005, p.

18-19 132 “Disciplina significa um conjunto de conhecimentos específicos de conteúdos de formação e

estrutura cognitiva, com objeto próprio de investigação e metodologia de desenvolvimento.”. A

interdisciplinaridade é “a inter-relação entre as disciplinas, considerando seus objetivos e

metodologias próprias para a estruturação de um conhecimento compartilhado. Exemplo: a relação

entre Psicologia, Direito e Serviço Social para atendimento ao público em um Núcleo de Prática

Jurídica, com a aplicação dos conhecimentos inerentes a cada uma das áreas envolvidas.”

Ibidem. p. 21-22

Page 85: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

grade curricular adequada, biblioteca, pesquisa, extensão,

atividades complementares, núcleo de prática, mas isso significa

parte do processo de excelência, pois nada faz sentido sem o

interesse efetivo do aluno no aproveitamento da estrutura

educacional proporcionada133.

Embora primordial, buscar a natureza humana não é suficiente

para a ampliação do conhecimento, pois devemos ter em mente que o saber e a

cultura do ser humano iniciaram-se com o primeiro pensador da espécie. Desse

modo, o conhecimento se faz por meio de processo dinâmico, evolutivo e de

acumulação progressiva, pertencendo a toda a humanidade, pois se formou

graças a incontáveis seres humanos que existiram em distintos espaços temporais

e geográficos.

O ensino do direito não se restringe apenas a normas jurídicas e

sua interpretação, pois, como ciência, o direito visa a sociedade, que, por sua vez,

é composta por inúmeros conceitos: religião, moral e costumes. Além disso, a

sociedade também é influenciada pela posição geográfica e seus elementos

decorrentes: clima e meios produtivos. Nesse sentido, ensinar o direito sem

associá-lo à realidade tem como resultado um ensino-aprendizagem de

característica reducionista, fria e desumana, pois não avalia as condições

individuais e sociais a que se dirige.

Esclarece Roberto Aguiar:

As extensões, salvo as exceções raras de sempre, não prestam

serviços às comunidades, não estimulam as práticas da cidadania,

não tematizam questões importantes para a sociedade, não se

manifestam diante de injustiças e problemas que afligem as

diversas regiões, o país e o mundo, não estimulam práticas

multidisciplinares, contentando-se em repassar temas da

internalidade dogmática do direito, ou questões que vêm sendo

133 Ibidem. p. 26.

Page 86: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

discutidas há séculos, mas que propiciam palco para egos que

necessitam constantemente de um pente para não se dissolverem

em nidificação (...) Ante esse paradoxo de formar profissionais

práticos, mas referidos a um mundo inexistente, a concretude local

e os problemas que ela traz são olimpicamente esquecidos, como

objetos da ação jurídica. Assim, em regiões com graves problemas

ambientais, o direito ambiental não consta do currículo; nas que

apresentam problemas minerários, o direito da mineração é

ignorado; nas regiões com grave conflito rural, o direito agrário não

é tocado. É como se o direito existisse independentemente das

sociedades que tem de normar. Se não houver uma inserção das

escolas no contexto onde estão, certamente elas não terão

qualquer importância social para a comunidade, a não ser a

alimentação de um orgulho beócio pra existir uma faculdade no

local134.

Há preciso ser feito o eterno questionamento do ”por que?”. Vale

dizer, quais os fundamentos e fatos sociais que clamaram por uma norma

jurídica? Quais as conseqüências sociais e individuais que dela decorreram? Elas

respeitam os princípios fundamentais da dignidade humana, a condição humana?

As aulas são demasiadamente expositivas, sem a participação do

aluno, com poucas aulas práticas marcadas ainda por escasso ou deficiente uso

de recursos audiovisuais. Normalmente o acervo da biblioteca é desatualizado e

há baixa proporção de livros para o número de alunos, sem contar a ausência de

indicação bibliográfica pelos professores, horário de atendimento incompatível e

instalações incômodas. É preciso implementar o debate entre docente e discente,

sempre no sentido de questionar como a matéria ministrada se aplica na

sociedade e quais são as relações interdisciplinares relacionadas ao tema.

Para Camargo Mell, toda prática pedagógica encontra suas

dimensões significativas uma vez que é uma ação educativa. Portanto, ensinar

134 AGUIAR. Roberto A. R. de. Op. Cit. p. 182-183.

Page 87: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Direito é mais do que proferir lições em sala de aula é despertar a consciência

jurídica do acadêmico135.

Quanto aos alunos critica-se:

Muito numerosos para as instalações disponíveis e em turmas

bastante heterogêneas; demasiadamente exigentes em relação ao

professor, de quem esperam receber tudo esmiuçado;

irresponsáveis e imaturos; muitos ingressam em determinadas

faculdades sem autêntica vocação, apenas por serem da região ou

por terem passado no vestibular. Por esta razão estão

desajustados e desinteressados; passivos apesar do desejo de

independência; sem hábito de estudar ou de pensar por sua conta;

sem base suficiente para os estudos universitários; valorizam

excessivamente as notas e diploma e muito menos aprender136.

Já com base na deficiência do aluno, as escolas e universidades

passaram a adotar a idéia de que não se deve reprovar o aluno para evitar sua

evasão. Essa idéia é inclusive a adotada pelo Ministério da Educação, que não

aceita reprovações no ensino fundamental, resultando em alunos analfabetos e

com diploma. Regis Morais assim se manifesta:

A grande evasão escolar, pode dever-se, em parte, a exigências

intelectuais elitistas e promotoras pela erudição; mas, com muito

mais verdade, ela esconde nossas conhecidas precariedades

econômicas e financeiras. Ocorre, no entanto, que as escolas

freqüentemente tentam evitar os abandonos em massa diminuindo

suas exigências no ensino mediante formas de avaliação que não

se constrangem a aprovar inclusive os que não estudam e não

produzem. Isso é muito mais expediente de sobrevivência

institucional do que intento de promoção do ser humano. Como o

ensino de 2º grau nem sempre é levado a sério, com extraordinária

135 Op. Cit., p. 64. 136 BORDENAVE, Juan Díaz Op. Cit., p.18.

Page 88: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

exigência material escolar e livros descartáveis mas um tanto sem

empenho real de ensino, chegam às universidades inúmeros

alunos mal preparados e incultos; isto é, o 2º grau empurra para a

universidade uma responsabilidade terrível, pois esta deverá

colocar profissionais no mercado – coisa muito mais delicada do

que promover para um grau seguinte e lavar as mãos -, e o meio

acadêmico vê-se em dificuldades para cumprir sua tarefa. Ora,

ante um quadro como este, as universidades têm que desenvolver

recursos de apoio ao aluno mal preparado, a fim de proteger a

sociedade de futuros maus profissionais e evitar humilhações que

recairão sobre o individuo formado, tendo nas mãos sua

habilitação mãos não contando com a habilidade

correspondente137.

A maioria das faculdades faz uso do vestibular para o

recrutamento de seus alunos. Essa técnica avalia os conhecimentos que o aluno

adquiriu durante os ensinos fundamental e médio, e os mais capacitados são

aprovados. A nosso ver essa seleção é mais eficaz para as faculdades públicas,

pois na rede particular há elevado número de faculdades, com considerável

número de vagas que, para a maioria, torna-se apenas uma mera

formalidade.Não se pode desconsiderar que a instituição de ensino particular visa

lucro, por isso a maior parte dos inscritos ingressa na ensino superior.

A maioria dos alunos apresenta deficiências dos ensinos

fundamental e médio, como vocabulário limitado e incapacidade de interpretação.

Por conseqüência, não compreendem os termos e significado das normas e por

isso passam a copiar ao invés de criar, ou seja, não conseguem aplicar o

conhecimento aprendido. Para José Afonso da Silva a questão se revela mais

grave, quando se sabe que o ensino médio no País sofre de crise crônica de

qualidade, de sorte que os candidatos ao ensino superior carecem de formação

adequada para o bom desempenho dos respectivos cursos, e conclui relatando

sua experiência docente: 137 MORAIS, Regis. A universidade desafiada. Campinas: Editora da Unicamp, 1995. p. 49.

Page 89: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Tínhamos, porém, grande dificuldade, especialmente nos dois

primeiros anos, porque os estudantes que ali ingressavam eram

profundamente mal preparados (...) Lembro-me de um senhor que

era açougueiro, dono do açougue, que resolveu conquistar um

diploma de direito, mas não tinha a menor condição, porque era

semi-analfabeto (...) Sem ser muito rigoroso, assim mesmo não

tive outro remédio senão reprová-lo (...) isso era, de fato, penoso

também para o professor que sabia que aquele aluno tinha

despendido recursos financeiros e tempo para freqüentar a escola.

Mas, por outro lado, aprová-lo seria dar-lhe uma ilusão de

conhecimento e capacidade que ele não tinha (...) Fiquei aliviado,

porque me pareceu que se aquele aluno continuasse como

açougueiro prestaria melhor serviço à coletividade do que

malformado em Direito138.

A revista Exame constatou em recente publicação:

Há muito tempo sabemos que as deficiências do Brasil na

educação afetam a distribuição de renda e o crescimento pessoal

dos indivíduos. Com a pesquisa ficou claro que essas deficiências

também provocam a perda de competitividade do país em relação

a economias com as quais disputa o mercado global (...) Há seis

meses, Elizabeth Cerqueira Leonetto, diretora de recursos

humanos da Fnac, tenta, em vão, encontrar alguém qualificado em

literatura para uma das lojas de São Paulo e destaca que é

lamentável e frustrante ver universitários que não sabem escrever,

falar em público e trabalhar em equipe139.

Também se nota dificuldades na avaliação, pois geralmente se

dedica a medir a capacidade de retenção do aluno, e não seu crescimento

integral. A falta de monitores, de auxiliares de ensino e de material didático para

138 SILVA, José Afonso da. Ética acadêmica, p. 221-226. 139 Salomão, Alexa. O preço da ignorancia. Revista Exame. Ano 40, n. 19 27/09/2006. São Paulo:

Editora Abril, p. 21-24.

Page 90: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

os professores agrava esse quadro. Convém anotar que as avaliações não estão

sendo satisfatórias para medir a absorção do conhecimento e a capacidade de

raciocínio dos alunos e isso pode decorrer da pouca freqüência com que é

aplicada (semestralmente). O formato da prova também compromete a avaliação,

pois não exige raciocínio, mas mera memorização. Esse tipo de prova é

ultrapassado, especialmente porque o conhecimento não pode ser medido em um

único dia, sem contar as manobras incríveis dos alunos para “colar” sem que o

professor perceba.

Nessa esteira leciona Roberto Aguiar:

(...) as avaliações se estruturam como farsas, como formalidades

de professores amedrontados pelas direções das escolas, que

temem a perda de alunos e que acreditam que o processo

educacional se traduz por um contrato sinalagmático de compra e

venda a prazo entre um pagador-estudante que deve saldar seus

compromissos financeiros pontualmente para adquirir o direito de

receber o diploma, quando da quitação de todas as prestações. O

resultado dessa concepção na avaliação é o de nada ser exigido,

ou, se exigido, não reprovar. Aos alunos, nessas relações, não

cabe reclamar de professores medíocres, mas tão-somente

daqueles que exigem, isto é, daqueles que quebram o pacto da

mediocridade140.

No nosso entendimento esses são apenas alguns pontos gerais

que clamam por solução para melhorar o ensino.

4.1 O QUE É APRENDER?

A palavra aprender deriva de apreender, que pode ter os

seguintes significados:

140 SILVA, José Afonso da. Ética acadêmica Op. Cit., p. 188.

Page 91: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

1. tomar conhecimento de; 2. reter na memória, mediante o

estudo, a observação ou a experiência ; 3. tornar-se apto ou capaz

de alguma coisa, em conseqüência do estudo, observação,

experiência e advertência141.

Para Platão o aprendizado deve-se à associação das coisas entre

si, pela qual a alma pode, após haver captado alguma coisa, captar também a

outra que a esta se encontra vinculada, ou seja, aprender é relembrar142. Dessa

feita, há aprendizagem quando o homem adquire uma capacidade diversa da que

possuía, ganha novas experiências, emoções e conhecimentos.

A sociedade desenvolve-se pelo aprendizado, por isso tudo o que

o homem conquistou e aprimorou é decorrência direta deste fenômeno. Segundo

Olivier Reboul, tudo o que torna o homem humano, tal como a linguagem, o

pensamento, os sentimentos, as técnicas, as ciências, as artes e a moral, o

homem tem porque aprendeu. Para ele o fim da educação é permitir a cada um

realizar a sua natureza no seio de uma cultura que seja verdadeiramente

humana143, e prossegue afirmando:

A palavra estudo, que designa uma maneira de aprender, distinta

ao mesmo tempo da informação (aprender que) e da

aprendizagem (aprender a), um ensino e uma investigação que

valem por si mesmo e progridem pelo outro. Ora qual a meta do

estudo? (...) ver-se-á que este fito se resume numa só palavra:

compreender, aprender porquê144.

O aprendizado ocorre quando o sujeito tem verdadeiro interesse

participando da busca pelo saber. Ele conhece a importância e a finalidade do

objeto apreendido e se interessa por perceber sua necessidade. Depois de

141 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2.ed.. Rio de

Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p.148. 142 Apud. ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Forense, 2000. p. 75. 143 Op. Cit., p. 20- 24 144 REBOUL, Olivier. Op. Cit., p. 140.

Page 92: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

aprendido algo buscamos a competência, ou seja, saber como aplicar o saber e

como adaptá-lo a situações imprevistas145. Mas, como se aprende?

Há muitas teorias que tratam da aprendizagem, mas nenhum

consenso sobre qual deve ser usada, ficando a critério de cada pessoa seguir a

que lhe for mais conveniente. Podemos dizer que nessas teorias encontramos

basicamente três filosofias: a comportamentalista (behaviorismo), a cognitivista

(construtivismo) e a humanista, as quais foram seqüencialmente construídas. No

entanto, nem sempre é possível enquadrar determinada teoria da aprendizagem

em uma única corrente filosófica.

De qualquer forma, temos de ter sempre em mente que na

educação há pelo menos dois sujeitos, e fim do ensino, ou pelo menos seu objeto,

é o aluno. O objeto da formação é a função social146, assim, devemos sempre

respeitar os limites do discente para que o aprendizado seja efetivo.

O Comportamentalismo surgiu no início do século XX nos Estados

Unidos, como uma reação à mentalidade psicológica que predominava na Europa.

Sua principal característica é o foco nos comportamentos observáveis e

mensuráveis do sujeito, isto é, nas respostas que ele dá aos estímulos externos. A

idéia básica mais recente é a de que o comportamento é controlado pelas

conseqüências: se a conseqüência for boa para o sujeito, haverá uma tendência

de aumento na freqüência da conduta, logo, se for desagradável, a freqüência de

resposta tenderá a diminuir. Isso significa que a manipulação de eventos 145 Olivier traz que: “a competência, para lá da transmissão e da espontaneidade, é o acto que

buscávamos. Supõe duas coisas. Em primeiro lugar, que o espírito humano é, à partida, capaz de

aprender, que possui no estado implícito as regras que lhe permitem utilizar e, antes de mais,

assimilar os saberes lingüísticos, matemáticos, éticos e outros, saberes pelos quais o espírito é

‘humano’, a aptidão para os adquirir, pois é isso o que o define como espírito. A competência

supõe também que os saberes não constituem uma bagagem inerte, mas uma forma dinâmica; a

competência do jogador de xadrez não se reduz a conhecer as regras, nem sequer a reter um

grande número de jogadas típicas; consiste em encontrar de cada vez a melhor solução, já que as

regras e os modelos não passam de auxiliares.” Op. Cit., p. 45-46. 146 Ibidem, p. 18.

Page 93: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

posteriores à exibição do comportamento permite, a princípio, que se possa

controlá-los. E isso acontece sem a necessidade de se recorrer à hipóteses sobre

quaisquer atividades mentais entre o estímulo e a resposta dada.

Conforme Marco Antonio Moreira:

Esta idéia fundamentou todo um enfoque tecnológico à instrução

que, durante muito tempo, particularmente nas décadas de

sessenta e setenta, dominou as atividades didáticas em qualquer

matéria de ensino. Grande parte da ação docente consistia em

apresentar estímulos e, sobretudo, reforços positivos

(conseqüências boas para os alunos) na quantidade e momento

corretos, a fim de aumentar ou diminuir a freqüência de certos

comportamentos dos alunos.As aprendizagens desejadas, isto é,

aquilo que os alunos deveriam aprender, eram expressas em

termos de comportamentos observáveis. Os objetivos

comportamentais definiam, da maneira mais clara possível, aquilo

que os alunos deveriam ser capazes de fazer, em quanto tempo e

sob que condições, após a instrução. A avaliação consistia em

verificar se as condutas definidas nos objetivos comportamentais

eram, de fato, apresentadas ao final da instrução. Se isso

acontecia, admitia-se, implicitamente, que havia ocorrido

aprendizagem147.

O Cognitivismo surge praticamente na mesma época de

nascimento do Behaviorismo, em contraposição a este, mas também como uma

reação à mentalidade da época que se ocupava basicamente de estudar o que as

pessoas pensavam e sentiam,. Enfatiza exatamente aquilo que é ignorado pela

visão behaviorista: a cognição, ou seja, o ato de conhecer. Para os behavioristas a

psicologia deve ocupar-se daquilo que as pessoas fazem, omitindo, por

irrelevante, qualquer discussão sobre a mente. Para os cognitivistas, o foco deve

estar nas variáveis inerentes entre estímulos e respostas, nas cognições e nos

147 MOREIRA, Marco Antonio. Teorias de aprendizagem. São Paulo: EPU. 1999. p. 14.

Page 94: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

processos mentais superiores (percepção, resolução de problemas, tomada de

decisões, processamento de informação, compreensão). Em síntese, o foco deve

estar na mente, mas de maneira objetiva, científica, e não especulativa.

Depreende-se que a filosofia cognitivista trata principalmente dos

processos mentais, ocupando-se da atribuição de significados, da compreensão,

da transformação, do armazenamento e do uso da informação envolvida na

cognição. Na medida em que se admite, nessa perspectiva, que a cognição se dá

por construção, chega-se ao Construtivismo, tão apregoado nos anos noventa.

O Construtivismo é uma posição filosófica cognitivista

interpretacionista. É cognitivista porque se ocupa da cognição, de como o

indivíduo conhece, de como ele constrói sua estrutura cognitiva. É

interpretacionista porque supõe que os eventos e objetos do universo são

interpretados pelo sujeito cognoscente. O ser humano tem a capacidade criativa

de interpretar e representar o mundo, não somente responder a ele148.

O Construtivismo observa o aluno como sendo capaz de realizar

sua própria estrutura cognitiva de forma livre, sem arbitrariedade. Assim, deixa de

enxergá-lo como um mero receptor de informações.

O Humanismo passa a ter a concepção do aluno como pessoa

(sentimentos, pensamentos e ações) e não como objeto, visa à auto-realização e

o crescimento pessoal.

Joseph Novak tem o seguinte entendimento:

A aprendizagem significativa, que subjaz a integração construtiva

de pensar, sentir e agir, engrandecendo o ser humano. Quer dizer,

o aprendiz é visto como um ser que pensa, sente e age de

maneira integrada, mas é a aprendizagem significativa que torna

148 Ibid. p. 17.

Page 95: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

positiva esta integração, se modo a levá-lo à auto-realização, ao

crescimento pessoal149.

Apesar de grandes filósofos terem se dedicado ao estudo do

processo de aprendizagem, nos deteremos apenas aos ensinamentos de John

Dewey, por ser o que está mais está ligado ao nosso objeto de estudo.

Dewey traz a importância do experimento para o aprendizado,

argumentando que a experiência é um processo bifásico, pressupõe que se aja

sobre algo e que sofra as conseqüências dessa ação. Assim, atividades mentais

ausentes nos planos anteriores passam a fazer parte desse agir e sofrer reação.

Para que possam ser consideradas como experiência é

necessário que as ações sejam acompanhadas de percepção consciente da

mudança ocorrida e de seu reflexo sobre nós, tornando-se, assim, um

aprendizado. É o que ele chama de “aprender da experiência:

Não há aprendizagem genuína em processos divorciados da

experiência, onde se memorizam fatos sem perceber

relacionamentos, gerando um conhecimento superficial e

destituído de significado pessoal para o ser que aprende. A

aquisição de significado torna-se, assim, o elemento vital para que

uma experiência seja educativa. E para que isso ocorra o ato de

reflexão deve, necessariamente, estar presente150.

O princípio da continuidade ou continuum experimenta é usado

para discriminar entre experiências com valor educativo e sem esse valor. Ele

nada mais é do que a idéia de que toda experiência modifica quem a faz e por ela

passa. Segundo esse princípio a modificação afeta, queiramos ou não, a

qualidade das experiências subseqüentes, pois é outra, de algum modo, a pessoa

que vai passar por essas novas experiências. Isso significa que toda e qualquer

149 Apud. MOREIRA, Marco Antonio. Op. Cit., p. 18. 150 MAMEDE, Silvia; et al. Aprendizagem Baseada em Problemas: anatomia de uma nova

abordagem educacional. Fortaleza: Hucitec, 2001. p. 60

Page 96: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

experiência toma algo das experiências passadas e modifica de algum modo as

experiências subseqüentes151.

Desse modo, a cada nova experiência podemos dizer que se tem

uma nova pessoa que exibirá novas atitudes emocionais e intelectuais reagindo de

forma diferente a cada nova situação. O processo de aprendizado torna-se cíclico

e eterno, pois sempre estaremos diante de novas experiências, e a experiência

anterior converte-se em um instrumento para que se possa entender a nova

experiência, e assim sucessivamente.

Outro princípio fundamental trazido por Dewey é o da interação,

segundo o qual a experiência se realiza em meio a coisas e na coletividade,

considerando-se sempre a cultura acumulada da espécie, ou seja, há uma

interação do indivíduo com o ambiente. Dessa forma, o aprendizado ocorre dentro

de um contexto, pois quando isso não acontece há um conhecimento morto:

A matéria em foco foi aprendida isolada de um contexto; foi

armazenada em um compartimento estanque. Quando se pergunta

o que dela foi feito, qual o seu destino, a resposta é que ainda se

encontra no compartimento especial em que foi originalmente

estocada. Se recorressem as mesmas condições em que aquele

conhecimento foi adquirido, seu resgate tornar-se-ia possível. Mas

como foi adquirido de forma segregada, desconectado do resto da

experiência, torna-se indisponível nas condições reais de vida152.

Segundo Dewey a motivação genuína para aprender nasce

somente quando o objeto da aprendizagem identifica-se em algum grau com a

auto-expressão do sujeito153. Nesse contexto, podemos dizer que aprender não é

apenas decorar, mas saber como e quando utilizar o conhecimento adquirido,

estar sempre procurando aprender, principalmente de maneira aberta, 151 DEWEY, Jhon. Experiência e educação. 3, ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1979.

p. 26. 152 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 65. 153 Ibid p. 71.

Page 97: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

transdisciplinar, envolvendo tudo o que nos cerca, porque sempre estaremos

diante de ações desconhecidas e precisaremos saber e aprender como com elas

lidar. A grande questão, no entanto, não é apenas aprender a aprender, mas

também aprender a desaprender para realizar uma nova construção sobre o

conhecimento que evolui de forma dinâmica.

4.2 O QUE É ENSINAR

Ensinar significa ministrar o ensino de alguma coisa, transmitir

conhecimentos, instruir; lecionar, educar154. Diferentemente da definição do

dicionário da língua portuguesa, quando pensamos sob o ponto de vista

pedagógico a palavra ensinar adquire outros significados, pois ensinar não é

transmitir conhecimentos, mas criar as possibilidades para sua produção ou a sua

constrição. Pelo contrário, é preciso que desde o início do processo fique cada vez

mais claro que, embora diferentes entre si, “quem forma se forma e reforma ao

formar, e quem é formado forma-se e forma ao ser formado”155.

Bittar faz a seguinte distinção entre educação e ensino:

(...) a educação envolve todos os processos culturais, sociais,

éticos, familiares, religiosos, ideológicos, políticos que somam para

a formação do indivíduo. Trata-se de vislumbrar na educação,

nesse sentido, a formação e o desenvolvimento das faculdades e

potencialidades humanas, sejam psíquicas, sejam físicas, sejam

morais, sejam intelectuais por quaisquer meios possíveis e

disponíveis, extraídos ou não do convívio social (...) ensino

representa uma relação mais pontual, que se destaca de um

154 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Op. Cit. p. 660 155 FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29. ed. São

Paulo: Paz e Terra, 1996, p.22-23.

Page 98: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

processo de aprendizado direcionado e direto, em que se podem

detectar dois pólos relacionais, a saber, o educador e o educando

(...) o ensino é apenas um capítulo da educação de uma pessoa156.

Cabe ao professor instigar nos alunos o gosto pelo conhecer, a

dúvida, o aprender questionando e sempre pesquisando. No aprendizado não se

deve impor, mas sim permitir que o indivíduo eleja um sentido que norteie sua

existência.

Para Paulo Freire saber ensinar não é transferir conhecimentos,

mas criar possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.

Na mesma linha segue Olivier Reboul:

Educar não é fabricar adultos segundo um modelo, é libertar em

cada homem o que o impede de ser ele mesmo e lhe permite

realizar-se segundo seu gênio singular (...) Assim, parece-nos que

o fim da educação é permitir a cada um realizar a sua natureza no

seio de uma cultura que seja verdadeiramente humana157.

A imposição traz em si mais um adestramento do que educação,

pois retira da pessoa o direito de pensar e de criar. Paulo Freire chamada esse

tipo de educação de “bancária”, na medida em que visa apenas o “depósito” de

conhecimentos, violando a característica própria do homem que é compreender e

transformar o mundo, e não simplesmente se adaptar a ele, como fazem os

animais.

Cabe observar que nesse tipo de educação a percepção do

mundo transmitida e imposta é apenas a do professor, não havendo a

preocupação com a do aluno, o que causa grande conflito e desinteresse pelo

156 BITTAR, Eduardo C. B. Direito e ensino jurídico: legislação educacional. São Paulo: Atlas, 2001.

p. 15-16 157 REBOUL, Olivier. A filosofia da educação. Lisboa: Edições 70, p. 22 – 24.

Page 99: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

aprendizado158.

Podemos traçar as seguintes características da educação

bancária: a) atribui importância suprema ao "conteúdo da matéria" e,

conseqüentemente, espera que os alunos o absorvam sem modificações e o

reproduzam fielmente nas provas; b) seu objetivo fundamental é produzir um

aumento de conhecimentos do aluno, sem a preocupação com ele como pessoa

integral e como membro de uma comunidade; c) como conseqüência natural, o

aluno é passivo, grande tomador de notas, exímio memorizador, preferindo

manejar conceitos abstratos a resolver de forma original e criadora os problemas

concretos da realidade em que vive.

Nessa linha:

Na educação superior, é necessário repensar a formação dos

profissionais comprometidos com a sua realidade de atuação.

Deve-se romper com o modelo tradicional de educação, centrado

158 DUARTE JUNIOR, João Francisco. Fundamentos estéticos da educação. São Paulo: Cortez.

1981, p. 55-56.

Page 100: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

no professor especialista em determinada área do conhecimento,

que só se preocupa com o repasse de informações159.

No mundo atual não basta a imposição de conhecimentos certos e

determinados, pois isso só funciona em uma sociedade imutável como a primitiva.

Em uma sociedade em constante mutação a educação deve a facilitar a mudança

e a aprendizagem. Nessa linha é o ensinamento de Carl Rogers:

O único homem educado é aquele que aprendeu como aprender,

como adaptar-se à mudança; o homem que tenha compreendido

que nenhum acontecimento é seguro, e que somente o processo

de buscar o conhecimento dá uma base para a segurança160.

Para que tenhamos um ensino efetivo é fundamental que haja um

processo para o dia da aula como: preparação da aula determinando seus

objetivos, estratégias de ensino e o conteúdo a ser dado.

A relevância de um conteúdo é determinada por diversos fatores,

entre eles as características psicossociais dos alunos, seu grau de

desenvolvimento intelectual, a aplicabilidade dos objetos de

conhecimento ensinados, a capacidade do aluno estabelecer

relações entre o conteúdo ensinado, as necessidades de seu dia-

a-dia e o contexto cultural dos alunos43.

Podemos dizer que o processo de ensino consiste em planejar,

orientar, controlar a aprendizagem do aluno. Somente isso não basta, é

fundamental que haja a conscientização dos professores para que saibam como

se portar na sala de aula, sendo capazes de instigar a vontade do saber nos

159 MELLO, Reynaldo Irapuã Camargo. Op.Cit., p. 21. 160 ROGERS, Carl R. Freedom to learn. Columbus, Ohio, Ch. E. Merril, 1969. 43 MORETTO, Vasco Pedro. Prova: um momento privilegiado de estudo não um acerto de contas,

4. ed. Rio de Janeiro: DP&A. 2004. p.17.

Page 101: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

alunos. Diante disso, Rogers161 traz as características que devem estar presentes:

O facilitador deve ser uma pessoa real, autêntica, vivencial, no

sentido de ser e viver os sentimentos e pensamentos de cada

momento.

Ele deve apreciar e respeitar o estudante.

O facilitador deve saber escutar com empatia, isto é, colocando-se

no lugar de quem lhe fala.

Sobretudo, deve confiar sinceramente na capacidade potencial do

estudante de crescer e aprender, se lhe for propiciado um clima de

liberdade e apoio.

O professor deve sempre estar pesquisando, atualizando-se para

ensinar, pois somente assim as aulas terão maior conteúdo e o

professor terá maior confiança em si mesmo, o que traz a

possibilidade de participação dos alunos com perguntas e

possibilidade de expor seus pensamentos.

Com base no que foi exposto, para que o ensino jurídico possa ser

eficaz devem ser observadas as seguintes recomendações dadas por Álvaro de

Melo Filho:

1) os métodos de ensino devem aguçar o raciocínio jurídico e

desenvolver a autonomia intelectuais; 2) à didática jurídica

compete transfundir o discente de espectador passivo em partícipe

ativo do processo de aprendizagem inovadora do direito; 3)

necessidade de ensinar o aluno a pensar os códigos e os fatos

jurídicos relevantes, nunca a pensar apenas com os códigos,

evitando o desvalioso ensino cosmético e piedosamente superficial

de um direito que é dado e não construído; 4) a questão medular

está em implodir uma educação jurídica conservadora em que

predominam a patologia da interpretação literal e retrospectiva das 161 Op. Cit.

Page 102: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

leis e manuais jurídicos, bem como o pedantismo retórico, acrítico

e a-histórico na imposição de um saber jurídico empacotado onde

a eloqüência muitas vezes substitui o argumento preciso, o

raciocínio jurídico ou o pleno domínio da matéria, sem habilitar o

aluno a aprender a aprender; 5) o exclusivismo da aula expositiva

ou do monólogo estereotipado deve ceder espaço às aulas

dialogadas, às técnicas audiovisuais e aos recursos

teleiformáticos, sem descurar dos seminários e debates; 6) os

excessos no uso da aula expositiva inibem qualquer processo

metodológico emancipatório; 7) citando João Baptista Villela,

acredita que a aula jurídica deve proporcionar ao futuro

profissional a instrumentação capaz de levá-lo a operar o direito

segundo uma visão heraclitiana, isto é, sob o signo de um

constante devenir; 8) por isso é de suma relevância que as figuras

do professor informador e aluno-ouvinte sejam substituídas pelo

professor – animador e aluno-pesquisador, pois, o problema

fundamental da pedagogia jurídica é muito mais a questão de

consciência do que de conhecimento; 9) ataca os métodos de

ensino que levam à miopia dos alunos obrigados à repetição

mecânica de verdades escravas, conduzidos por professores

pedantes, petulantes em seu dogmatismo e portadores de um

falso cientismo fundado na eloqüência devaneadora; 10) destaca a

dimensão problematizadora do ensino do direito162.

Em razão do exposto no presente capítulo, acreditamos que o

método da Aprendizagem Baseada em Problemas é o mais adequado para o

ensino, principalmente para o ensino jurídico, pois a universidade deve ser um

local que proporcione a troca de idéias entre professor e alunos, considerando

ambos como seres humanos que trazem em si uma bagagem de experiências

anteriores, possibilitando o conhecimento técnico, cultural e geral.

Mario Osório Marques afirma:

162 Apud. AGUIAR, Roberto A. R. de. Op. Cit., p. 232-233.

Page 103: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Dessa forma, conversar sobre as próprias experiências de vida e

sobre sues prévios saberes é realizar a interlocução de saberes,

dos quais faz a educação, é aprender enquanto reconstrução dos

saberes anteriores, é imprimir, assim, vida nova e novos

significados de face aos dinamismos da sociedade e da cultura, à

ampliação dos horizontes que se abrem como desafios ao

entendimento compartilhado e à ação solidária de todas nas

comunidades em que vivem163.

5. A APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS:

CARACTERÍSTICAS E PROCESSOS

A metodologia da “Aprendizagem Baseada em Problemas” - ABP

(Problem Based Learning - PBL) foi implantada no final da década de 1969 na

Universidade de McMaster, no Canadá, tendo sido aplicada pela primeira vez por

Howard Barrows, professor da faculdade de medicina. Pouco depois foi

empregada na Universidade de Maastricht, na Holanda. Entretanto, a Harvard

Business School, desde a década de 30 aplica problemas como forma do

processo de aprendizagem164.

No Brasil, as primeiras instituições a implantarem o método foram

a Faculdade de Medicina de Marília, em 1997, e a Faculdade de Medicina da

Universidade Estadual de Londrina (UEL), em 1998.

A grande diferença entre o “novo” método e o aplicado em

Harvard é o momento da aplicação dos problemas. Em Harvard a discussão de

casos ocorre somente nas fases finais do curso, ou seja, nos primeiros anos os

163 Apud. Reynaldo Irapuã Camargo Mello . Op. Cit., p. 6.8 164Shashidhar Venkatesh Murthy. Experience with Problem Based Learning in MBBS course at Fiji

School of Medicine. Disponível em: http://www.fsm.ac.fj/PWS/Resources/General/Article-

PBL%20at%20FSM-%20shashi-final.doc

Page 104: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

alunos têm aulas ministradas da forma tradicional que conhecemos: método

expositivo. Logo, somente após terem aprendido grande parte do conteúdo

curricular é que os alunos passam a problematização. A Universidade de

Mcmaster, por sua vez, trabalha com uma concepção diferente

Na aprendizagem baseada em problemas, todo o conhecimento

necessário para a solução do problema era adquirido depois que

os estudantes começavam a trabalhar com a situação

problemática. Em outras palavras, a confrontação com o problema

desencadeava o processo de aprendizagem, constituindo-se no

aspecto central de todo o programa curricular.2

O PBL baseia-se na aprendizagem resultante da orientação para a

solução de problemas e, para que esse processo seja eficaz Schmidt elenca seis

componentes centrais: o problema, os grupos tutoriais, o tutor, o estudo individual,

a avaliação do estudante e os blocos ou unidades por meio dos quais currículo é

estruturado165.

Além dos componentes supracitados, o PBL apresenta as

seguintes características: a) é centrado no aluno estimulando seu raciocínio

crítico; b) desenvolve-se em pequenos grupos tutoriais; c) apresenta problemas

em contexto jurídico; d) é um processo ativo, cooperativo, integrado e

interdisciplina; e) é orientado para a aprendizagem do adulto.

Os estudos acerca da metodologia do ABP têm se enriquecido

com os conhecimentos sobre a gênese do processo cognitivo, da

aprendizagem do adulto e da fisiologia da memória, ressaltando-se

a importância da experiência prévia e da participação ativa como

2 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 52.

165 MAMEDE, Silvia. Op. Cit p.29

Page 105: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

pontos fundamentais para a motivação e a aquisição de

conhecimentos166.

Estimula no aluno a capacidade de aprender a aprender, de

trabalhar em equipe, de ouvir outras opiniões, ainda que contrárias às suas, e o

induz a assumir um papel ativo e responsável pelo seu aprendizado. Além disso,

objetiva conscientizar o aluno do que ele sabe e do que precisa aprender,

motivando-o a buscar informações relevantes. Outro ponto fundamental do PBL e

que tem sido alvo de elogios é o aprimoramento na capacidade de dialogar e de

discutir dos alunos:

O diálogo é um processo pelo qual os estudantes procuram se

entender um ao outro, levando assim a definições e significados do

problema, comuns aos membros do grupo. O objetivo não é haver

concordância ou discórdia no grupo, e sim se há entendimento dos

vários pontos de vista. Portanto, ouvir efetivamente e pensamento

crítico são habilidades cruciais (...) A discussão é usada com o

propósito de se chegar à decisão ou à conclusão do problema.

Para que a discussão seja efetiva, deve seguir o diálogo167.

A aplicação da PBL possibilita que o aluno aprenda a buscar as

respostas que necessita, relembrando o que foi apreendido ao longo de sua vida e

o que foi ministrado pelo professor. Além disso, esse método estimula o

autoaprendizado, ponto fundamental para a carreira jurídica, pois sabemos em

nosso país as leis mudam constantemente. Desse modo, esse item é

indispensável para a formação de um bom profissional, pois ele deverá atualizar-

se ininterruptamente, adequando-se às mudanças legais, sociais, econômicas e

ambientais.

No sistema jurídico romano-germânico a lei é a principal fonte do

Direito, por essa razão a maioria das escolas jurídicas preocupa-se em estudar

166 http://www.famema.br/pbl/manuais/guia2003.pdf. Acessado em 20/07/2005. 167 CUNHA, José Carlos Silveira. Op. Cit., p. 12.

Page 106: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

somente as normas e interpretá-las, utilizando o raciocínio dedutivo, que parte de

uma verdade universal para uma singular.

Manifestando-se sobre esse sistema de ensino, Harriet Christiane

Zitscher faz uma comparação com o sistema alemão:

Apesar de – como todos os outros sistemas romano-germânicos –

empregar método dedutivo na aplicação do direito, o sistema

alemão prefere um sistema misto. Neste sistema, nas aulas se usa

muito o caso, tanto abstrato, construído, quanto o concreto,

extraído da vida forense (...) Mesmo que o método alemão de

ensino seja baseado predominantemente no caso concreto,

verifica-se traços dedutivos na aplicação do Direito, também por se

tratar de uma inclinação genérica para o pensamento abstrato e

sistemático dominante na Europa Continental. Também há

elementos dedutivos no ensino do Direito. O ensino baseia-se no

caso, mas não deixa de apresentar ao aluno o sistema do Direito.

Não é como no sistema da common law, cujos métodos são

prevalentemente dedutivos168.

Na mesma linha, José Carlos Silveira Cunha faz importante

apontamento em prol do PBL:

Ele satisfaz três critérios importantes para que se promova um

aprendizado ótimo. Primeiro, ele utiliza um ambiente onde os

estudantes estão imersos em uma atividade participativa prática,

na qual o aluno recebe feedback de outros estudantes e do tutor.

Segundo, o estudante recebe orientação e suporte de seus amigos

e instrutores, ou seja, o aprendizado é multidirecional, incluindo

outros estudantes, instrutores e professores. Terceiro, o

168 Metodologia do ensino jurídico com casos – teoria & prática: com exemplos do direito do

consumidor e do direito civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004. p. 30

Page 107: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

aprendizado é funcional, baseado em resolver um problema

real169.

O processo inicia-se com a apresentação de um problema como

uma descrição neutra de fenômenos ou eventos da realidade, que devem ser

explicados pelos estudantes, em termos de seus processos, princípios ou

mecanismos subjacentes170.

Não há dúvida de que a simulação é fundamental para o ensino,

pois o professor deve estimular os alunos por meio de casos que sejam o mais

próximo possível da realidade deles, gerando interesse na resolução do problema.

Ao se depararem com o caso concreto, os alunos delimitam as bases de estudo

relevantes e partem para a pesquisa em livros, revistas e monografias.

A finalidade, portanto, é estimular o desenvolvimento dos alunos

para o autoaprendizado e para a pesquisa, posto que eles precisam buscar

materiais para a resolução de cada caso concreto apresentado. Nesse sentido

declara Howard Barrows:

Seu papel é proporcionar aos estudantes oportunidades de

desenvolver seu pensamento e habilidades de estudo, e guiá-los a

estudar com maior número de materiais em busca de alcançar o

conhecimento que precisam171.

Em síntese, pretende-se que o aluno seja capaz de descobrir seus

erros, desenvolver autodisciplina e notar seu desenvolvimento.

Cabe ressaltar que os alunos não possuem informações

anteriores, ou seja, o ponto de partida é o problema que será estudado por meio

169 Problemas em “Problem –Based Learning”. Revista Ponto e Vírgula. São Paulo: Fmusp. Índice

n. 44, junho de 1998. p. 11. 170 Schmidt. Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 29-34. 171 BARROWS, Howard S. How to design a problem based curriculum for the preclinical years. New

York: Springer Series on Medical Education. v. 8. p. 31. Tradução livre.

Page 108: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

de grupos tutoriais com o número de 8 (oito) a 10 (dez) alunos no máximo e um

facilitador, que é o professor. Isso é fundamental para a eficiência do método, pois

permite que os alunos e o professor verifiquem quais são os conhecimentos que o

aluno já possui, estimulando e exigindo da memória matérias e assuntos

anteriormente vistos. Por essa razão o aluno não se restringe às mesma

informações, ao notar quais já estão presentes ele vai em busca dos pontos

falhos.

Isso proporciona um efetivo aprendizado, pois sabemos que

comumente acredita-se ter “aprendido” determinado assunto, mas na verdade não

se consegue visualizar sua importância, tampouco sua aplicabilidade. Infelizmente

essas situações são freqüentes e a título ilustrativo citamos o seguinte exemplo:

nas primeiras aulas do curso de Direito o professor cuida do tema “interpretação

da lei”. Esse tema é muito distante da realidade do aluno e por isso ele

simplesmente o decora. Posteriormente, na aplicação da lei, percebe que ela só

se concretiza pela interpretação e então nesse momento ele se dá conta de que o

tema, na verdade, é primordial. Como resultado, ele terá de estudar novamente o

assunto, porque no momento em que foi abordado na faculdade sua importância e

aplicabilidade não foram notadas.

O ser humano tem maior capacidade de aprendizado quando

aplica e associa o que se está aplicando, por essa razão é que não pode ser dada

a matéria anteriormente ao problema, este deve instigar o aluno a resolvê-lo.. Mais

uma vez é Howard Barrows quem lança luz sobre o tema:

Isso permite aos estudantes perceberem quanto conhecimento já

possuem para resolver o problema e como este pode ser resolvido

com as informações e habilidades coletadas entre eles (…) O

conhecimento considerável está armazenado no cérebro e só virá

para a mente através de associações, discussões ou com

questionamentos (…) Como resultado, cada aluno percebe qual

informação não precisa ser estudada em detalhes. Isso permite a

eles concentrarem os estudos nas áreas que realmente precisam

Page 109: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

de reforço (…) nenhum de nós percebe o que realmente sabemos

e o que precisamos nos aprofundar, tal percepção só ocorre

quando nos envolvemos com uma tarefa que precisamos resolver

(…) Qualquer pessoa lê com maior interesse quando o estudo

torna-se relevante à questão ou à área em que estamos buscando

respostas e quando estamos curiosos sobre fatos172.

O grupo tutorial é de fundamental importância, pois é nele que o

problema será analisado, traçando-se os objetivos da aprendizagem. Após esse

encontro os alunos devem buscar a solução do problema individualmente, visando

a coleta de novas informações.

A análise bibliográfica fica a critério do aluno. Depois os alunos

reúnem-se novamente no grupo tutorial para a discussão do problema. Pode ainda

ocorrer reuniões antes da resolução do problema para que se verifique como o

estudo do grupo está sendo conduzido.

Para que haja uma boa funcionalidade é necessário que os grupos

sejam pequenos, pois isso facilita a aprendizagem com a participação obrigatória

de todos os membros. Quando cada um expõe os conhecimentos adquiridos há

cooperação e aprendizado mútuo.

Em temas de grande complexidade pode ser feita uma aula

interativa com um especialista no assunto. Esse formato diferencia-se do

tradicional também quanto à atuação do professor, que não leciona, mas interage

com os alunos provendo o debate e a solução das dúvidas. Silvia Mamede

destaca a importância da discussão em grupo:

Contribui ainda para estimular o interesse nos temas relacionados

ao problema e ajuda no desenvolvimento de habilidades próprias

do trabalho em grupo, tais como a capacidade de apresentar e

172 BARROWS, Howard S. Op.Cit., p. 58-59.

Page 110: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

sistematizar idéias, de coordenar uma discussão, de compatibilizar

interesses individuais e coletivos173.

Nota-se que a interatividade provocada pela discussão em grupo

amolda-se perfeitamente à área jurídica, pois o profissional do Direito lida com o

poder de argumentação e a capacidade de sistematizar o raciocínio e, não raro,

precisa expor suas idéias perante grande número de pessoas.

O currículo tradicional é estruturado em espiral, e no PBL é em

unidades com blocos temáticos. Desse modo, cada bloco tem um tema específico

que será estudado por meio de vários problemas relacionados entre si. Ressalte-

se que os problemas são interdisciplinares, o que facilita o aprendizado e a futura

aplicação prática, assim, tudo o que for relacionado a determinado assunto deve

ser aprendido simultaneamente, independentemente da matéria. Exemplo: um

problema que trate do tema “propriedade” deve necessariamente abordar

questões afetas ao processo civil, ao direito civil e ao direito constitucional.

Depreende-se, pois, que esse método não pode ser usado

isoladamente para determinadas disciplinas, devendo ser aplicado do primeiro ao

último dia de aula, posto que se for fragmentado deixa de ser um método de

ensino.

5.1 AS BASES COGNITIVAS DA APRENDIZAGEM BASEADA EM

PROBLEMAS

Hodiernamente verificamos significativas e sucessivas mudanças

na legislação, fator que dificulta e até inviabiliza o ensino teórico. Diante disso,

para que haja o ensino efetivo é necessário que o aluno “aprenda a aprender”, ou

seja, aprenda a estudar, a se atualizar e a interpretar, e não se limite a 173 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 30.

Page 111: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

simplesmente decorar o que foi ensinado, sobretudo em um período em que os

conhecimentos adquiridos hoje provavelmente serão ultrapassados amanhã. Esse

cenário é o mesmo da Medicina, que evolui a cada dia com novas descobertas.

Por isso acreditamos que a experiência positiva das Faculdades de Medicina

citadas nesse estudo indica que essa metodologia de ensino também será muito

eficaz no ensino jurídico.

Considerado o criador da presente metodologia, Barrows propôs

que os estudantes deveriam “aprender” no sentido mais extenso da palavra:

(...) estender ou aprimorar a sua base de conhecimentos, para se

conservarem atualizados nos seus eventuais campos da medicina

e para proverem uma atenção apropriada para os problemas

novos ou únicos que eles podem enfrentar no seu trabalho. Isso é

aprendizagem auto-direcionada. Vários componentes integram

essa habilidade. (...) Um componente é a formulação apropriada

de necessidades de aprendizagem, para determinar os melhores

recursos, em termos de eficiência e de disponibilidade, para

satisfazê-las. Um outro componente é o uso apropriado dos

recursos disponíveis (...). A auto-aprendizagem não está concluída

até que os conhecimentos e as habilidades recém-adquiridos

através do estudo individual estejam apropriadamente codificados

na memória para uma subseqüente recuperação e uso. O ensino

na maioria das escolas médicas não enfatiza essas habilidades174.

.Sem dúvida o ensino jurídico também não enfatiza o aprendizado

efetivo. Com a aplicação do PBL, pretende-se que o aluno seja capaz de explicar

os fenômenos que ocorrem no caso concreto, bem como seus princípios e leis.

Dessa feita, por não haver uma preparação prévia do aluno, espera-se que ele

seja capaz de explicar e questionar quais os pontos a serem estudados,

baseando-se tão-somente em bom-senso, conhecimento prévio e raciocínio

lógico. Dessa forma, o aluno estará continuamente relembrando o que sabe e

174 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 82.

Page 112: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

questionando o que precisa ser aprendido, ou seja, está sempre aplicando o que

aprendeu. Nessa esteira acrescenta Silvia Mamede:

É uma forma de aprendizagem colaborativa, na qual uma

construção ativa de conhecimento, mais do que simplesmente um

processamento, é o foco das atividades. É também uma forma de

aprendizagem contextual, porque princípios, idéias e mecanismos

não são estudados em abstrato, mas no contexto de uma situação

concreta, que pode ser reconhecida como relevante e

interessante175.

Convém salientar que um dos princípios da psicologia cognitiva

consiste em afirmar que o conhecimento não pode ser transferido, vale dizer, deve

ser uma capacidade do aluno adquiri-lo, pois as estruturas cognitivas nele já se

encontram, e sua porção de conhecimento pré-existente determinará em que grau

alguma coisa nova pode ser aprendida.

Nota-se que o grau de conhecimento prévio é fundamental para o

PBL, pois é o referencial do aluno. Exemplo: ao fazer uma pesquisa o aluno

estudará de acordo com os livros que supram suas necessidades. Isso não ocorre

nas aulas dispositivas, em que o conteúdo dado é o mesmo para todos, devendo

haver imediato entendimento para que se possa compreender o assunto que for

ministrado na seqüência.

Bransford e Johnson destacam a prévia apresentação do

problema com a seguinte situação: sugerindo a leitura de um texto para um grupo

de pessoas com a instrução de que deveriam relembrá-lo em seguida, nota-se que

os que leram sem ter acesso ao título têm maior dificuldade de relembrar do que

aqueles que leram com o título. Segundo os autores, isso ocorre porque o título do

texto ativa ou cria um contexto através do qual a nova informação poderia ser

relacionada ao conhecimento já existente, resultando numa memória superior176.

175 Op. Cit., p. 87. 176 Ibid., p. 91.

Page 113: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

A apresentação do problema faz com que o aluno sinta a

necessidade de aprender, tornando o aprendizado mais instigante e interessante.

Isso dá a idéia de necessidade ao aluno, causando a motivação intrínseca, ou

seja, ele deseja aprender por uma vontade interna, e não por uma recompensa,

como passar na prova, que seria a motivação extrínseca. Diante disso, não

poderíamos nos refutar dos ensinamos de Schmidt ao cuidar da psicologia

cognitiva, tema intimamente relacionado ao nosso objeto de estudo:

A psicologia cognitiva é a ciência, um ramo da psicologia que

estuda a cognição, o processo mental que hipoteticamente está

por detrás do comportamento. É uma das disciplinas da Ciência

cognitiva. Está área de investigação cobre diversos domínios,

examinando questões sobre a memória de trabalho, atenção,

percepção, representação de conhecimento, raciocínio,

criatividade e resolução de problemas177.

Dessa leitura, verificamos que o PBL está fundamentado em três

princípios da psicologia cognitiva:

1. O PBL ativa o conhecimento prévio do aluno, uma vez que ele

precisa usar esse conhecimento para direcionar o problema proposto. O

conhecimento prévio pode ser o principal determinante da natureza e da

quantidade de informação nova que pode ser processada.

2. Ao discutir o caso os alunos trabalham com o conhecimento

que foi apresentado inicialmente e a ele acrescenta o novo conhecimento. Nesse

cenário, criam novas associações entre conceitos e fazem múltiplas ligações

cognitivas entre os velhos e os novos aprendizados. Quanto maior o número de

associações, melhor será a capacidade de recuperação das informações

armazenadas na memória dos estudantes.

3. O PBL oferece problemas semelhantes às situações reais, logo,

177 Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Psicologia_cognitiva.

Page 114: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

o problema e sua resolução dão ao estudante pistas para aprender a solucionar os

problemas similares que surgirão na prática profissional. Esse norte é essencial

para acessar o conhecimento prévio embutido em nossa memória178.

178VARGAS, Lúcia Helena Mendonça. A bioquímica e a aprendizagem baseada em problemas.

Revista Brasileira de ensino de bioquímica e biologia molecular. v. 1/2001. Disponível em:

http://www.sbbq.org.br/revista/artigo.php?artigoid=5. Acessado em 22/07/2005.

Page 115: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

6. CURRÍCULO NO PBL

O currículo baseado em um método PBL tem por objetivo

apresentar o conteúdo ao aluno de modo integrado e, ao mesmo tempo,

integrador de conhecimentos. A nosso ver, é indispensável para que o processo

de aprendizagem efetivamente ocorra.

O PBL não é apenas um método, mas uma maneira de aprender,

mas todo o seu potencial como abordagem educacional é intrinsecamente

dependente do desenho do currículo. A par desse contexto, passamos a seguir ao

estudo do currículo.

A palavra currículo vem do latim curriculum de currere, que

significa correr. Desse modo, um de seus significados refere-se à série de cursos

que o estudante tem de percorrer.

W. H. Kilpatrick assim manifesta-se sobre o assunto:

Currículo é uma sucessão de experiências escolares adequadas a

produzir, de forma satisfatória, e contínua reconstrução da

experiência, sendo o papel do professor preparar o ambiente para

que esta sucessão se faça de tal forma que promova o

desenvolvimento dos alunos e os faça atingir os fins de

autodireção, no redirecionamento de suas capacidades,

potencialidades e atividades179.

O Documento n. 28, da Série de Estudos e Documentos da

UNESCO, de 1968, oferece a seguinte definição:

Currículo são todas as experiências, atividades, materiais,

métodos de ensino e outros meios empregados pelo professor ou 179 Disponível em: http://www.serprofessoruniversitario.pro.br/ler.asp?TEXTO=1704. Acessado em

23/07/2005

Page 116: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

considerados por ele para alcançar fins de educação, em que se

vê uma preocupação que se envolve com uma totalidade de

situações: os fins que serão perseguidos; como serão as

experiências em seu tipo, qualidade a número; natureza das

atividades desenvolvidas pelos educandos e mestres; tipos,

qualidade e variedade de materiais empregados ou utilizados na

situação ensino-aprendizagem; métodos, recursos, instrumentos,

técnicas etc.180.

O planejamento do currículo deve ser realizado em conjunto pelos

professores e por especialistas, a fim de delimitar o objetivo da universidade com

seus alunos e qual o tipo de profissional que deseja formar. Aqui é preciso que se

verifiquem as necessidades locais para que matérias específicas sejam incluídas

com o fulcro de satisfazes as necessidades sociais.

Antônio Carlos Gil coloca:

O planejamento curricular é de natureza multidisciplinar, envolve a

direção do estabelecimento de ensino, seu corpo docente e

também especialistas na área. Seu resultado é concretizado em

planos, que definem os objetivos que a faculdade espera atingir, o

perfil do profissional que pretende formar e as estratégias a serem

adotadas para favorecer o processo ensino-aprendizagem181.

A Portaria n. 1889/94 estabeleceu o conteúdo mínimo que dos

cursos de Direito, lembrando que em virtude do princípio da qualidade não se

pode suprimir nenhuma matéria, mas é permitido aumentar o rol de assuntos a

serem abordados.

Paulo Luiz Neto Lôbo discorre:

Nunca é demais lembrar que se cuida de conteúdo mínimo e de

diretrizes curriculares gerais, como bem explicitou a emenda da

180 UNESCO, Documento n. 28, Serie Estudos e Documentos. Paris: 1958. 181 GIL, Antônio Carlos Metodologia do ensino superior. São Paulo: Atlas, 1997, p. 35.

Page 117: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Portaria n. 1.886. Constituem ossatura comum de todos os cursos

jurídicos existentes no país. O conteúdo mínimo dos cursos (ou

currículo mínimo, como é denominado) é igual para todos. Por seu

turno, o currículo pleno resulta do conteúdo mínimo acrescido das

matérias e atividades definidas no projeto pedagógico de cada

curso, mercê de sua autonomia didático-científica182.

Dessa feita, ainda que a direção do curso opte em lecionar

somente o currículo mínimo, deve ministrá-lo de forma interdisciplinar, sempre em

busca da relação entre os conteúdos e diferentes disciplinas.

O conteúdo mínimo é subdividido em matérias fundamentais,

profissionalizantes e parte prática. A seguir transcrevemos a relação das

primeiras:

I. Fundamentais (5): introdução ao direito, filosofia, sociologia,

economia e ciência política;

II. Profissionalizantes (10): direito constitucional, direito civil, direito

administrativo, direito tributário, direito penal, direito processual

civil, direito processual penal, direito do trabalho, direito comercial

e direito internacional183.

Conforme Eduardo Bittar, a interdisciplinaridade, a prática jurídica,

a pesquisa e as aulas curriculares devem estar harmonizadas por meio da grade

curricular, que, por sua vez, deve proporcionar ensino de qualidade e estrutura de

formação fundamental184.

Com base nas lições de Ten Cate185, descrevemos a seguir os

182 O novo conteúdo mínimo nos cursos jurídicos. In. Catalano, Pirangelo; et al. Seminário

Internacional sobre ensino jurídico. Rio de Janeiro: Consulex, 1996. p. 36. 183 Ibidem. p. 37. 184 BITTAR, Eduardo C. B. Direito e ensino jurídico: legislação educacional. São Paulo: Atlas, 2001

p. 96. 185 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 115.

Page 118: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

dez passos para o desenho do currículo:

1. Descrição da justificativa do currículo;

2. Elaboração dos objetivos gerais do currículo;

3. Análise do perfil da clientela;

4. Estabelecimento dos princípios educacionais aplicados ao

currículo;

5. Estruturação do currículo;

6. Descrição das unidades do curso;

7. Elaboração do sistema de avaliação dos alunos;

8. Descrição do modelo de organização do currículo;

9. Estabelecimento do processo de gerenciamento do currículo;

10. Montagem do sistema de avaliação do curso.

O item 3 refere-se aos conhecimentos e habilidades prévios dos

estudantes. O item 4 diz respeito aos princípios constitucionais e pedagógicos

adotados pelo curso. Dessa feita, não pode haver a convivência simultânea de

vários métodos de ensino, pois isso confundi o aluno e gera um caos pela

ausência de delimitação das regras. Logo, se a opção for pelo PBL todos os

professores devem seguir as regras dessa sistema de ensino. O item 5 indica

como será distribuído o conteúdo programático ao longo dos anos. A estruturação

deve observar a interdisciplinaridade e exigir o conhecimento adquirido nos anos

anteriores

O desenho do currículo parte da formulação de três perguntas: 1)

Quais as necessidades dos potenciais usuários dos serviços prestados pelo

treinado, ou seja, quais as necessidades da comunidade?; 2) Por que é

Page 119: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

necessário o desenvolvimento desse currículo em particular nessa instituição de

ensino?; 3) De que maneira ele difere de outros cursos sobre o mesmo

assunto?186.

No primeiro passo de respostas fica estabelecido o ponto 1 dos 10

passos justificando-se as necessidades do presente currículo para os alunos e

para a sociedade em que que estão inseridos, o que causará sua eficiência na

futura aplicação profissional. A título exemplificativo citamos duas situações a) a

importância social na área cível pode ser facilmente constatada em algumas

cidades do interior que possuem forma específica de venda de gado, baseada nos

costumes da região; b) a importância do erro de proibição pode ser verificada pelo

caso do argentino que vem ao Brasil e usa lança perfume sem saber que essa

substância é proibida, pois em seu país o uso é permitido.

No passo 2 são estabelecidos os objetivos gerais do currículo,

para tanto alguns ponto são levados em consideração, como, a análise das

tarefas, as necessidades dos alunos (verificado no passo 1) e entrevistas com

eventuais empregadores.

Wiers afirma que a descrição clara dos objetivos serve para, pelo

menos, três finalidades:

Primeiro, os objetivos servem como guia para o seguimento dos

passos para o desenho do próprio currículo. Segundo, os

potenciais alunos devem conhecer antecipadamente o que se

espera deles antes de passar por determinado currículo. E

terceiro, os próprios empregadores também devem ter uma noção

sobre o que o currículo se propõe187.

Nesse momento deve-se verificar os graus de importância e de

dificuldade dos temas, para que se possa priorizar os mais relevantes e

estabelecer o tempo a ser gasto com cada assunto. Tanto a importância como a 186 MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p. 116. 187 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p., 117.

Page 120: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

dificuldade deve receber um número de 1 a 5, que servirá como guia para a

decisão de inserir ou não determinado tema no currículo.

O passo 3 é fundamental no PBL, pois tem como característica a

abordagem centrada no aluno. Nesse momento verifica-se a habilidade do aluno e

suas necessidades educacionais para que então possa ser formado o currículo.

Nesse ponto também se considera a informação anteriormente obtida para que o

currículo possa ser eficiente na posterior contratação profissional dos recém-

formados.

No passo 4 nota-se uma das maiores diferenças entre o PBL e os

demais métodos de ensino. Convém salientar que no PBL encontram-se os

seguintes aspectos: centrado no estudante, baseado em problemas,

multidisciplinar, baseado na comunidade, eletivo e sistemático. O quadro abaixo

apresenta as distinções entre o ensino tradicional e o PBL188

a) Centrada no

estudante/

centrada no

professor

Na abordagem centrada no estudante, ele é

estimulado a estabelecer os seus próprios

objetivos de aprendizagem, enquanto que na

abordagem centrada no professor, o próprio

professor decide o que vai ser ensinado.

b) Baseada em

problemas/

Baseada em

informação

Na abordagem baseada em problema, os

estudantes adquirem conhecimentos,

habilidades e atitudes pela análise e

resolução de problemas. Na abordagem

baseada na informação, a ênfase é na

transmissão da informação (aulas teóricas)

188 MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p., 121.

Page 121: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

c) Integrada

(multidisciplinar)/

Baseada em

disciplinas

(especialidades)

No ensino integrado diversas disciplinas são

abordadas conjuntamente (ex. sistemas do

corpo humano-respiratório, neurológico; ciclo

de vida - saúde da criança, saúde do adulto).

Na segunda o ensino é baseado em

disciplinas isoladas (ex. anatomia, fisiologia)

d) Baseada na

comunidade/

Baseada em

hospital

Na primeira abordagem o ensino é centrado

na comunidade, como no centro de saúde

comunitário. Na segunda o hospital é o

principal lócus do ensino.

e) Eletivo/

Padrão

Em programas eletivos é dado tempo para o

estudante escolher o que estudar e se

aprofundar. No currículo padrão todos os

estudantes têm de cumprir todo o programa e

não tem tempo para estudar o que é de seu

maior interesse

f) Sistemática

(planejada)/ Não

planejada

No currículo sistemático as atividades

educacionais são planejadas e registradas.

Na outra abordagem as atividades

educacionais são realizadas sem uma

sistematização (ex. acompanhamento do

atendimento em um ambulatório).

No passo 5 é feita a estruturação do currículo. Todas as

informações anteriormente colhidas devem ser integradas nesse momento.

Page 122: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Estabelece-se o que o curso irá oferecer, os objetivos gerais, a estrutura geral, o

cronograma, além da introdução à metodologia adotada, à biblioteca e outros

recursos de aprendizagem, como sistema de avaliação do aluno e do curso.

Nesse caso não se pode fazer a estruturação por disciplinas por

ser contrário ao método por nós proposto, devendo-se estruturar por módulos ou

blocos com fim de aprendizado voltado para a multidisciplinaridade189. Assim,

nesse passo os docentes das várias disciplinas devem reunir-se para estruturar o

modo pelo qual cada assunto será trabalhado, para que se construa a unidade do

módulo.

O passo 6 é muito parecido com o passo 5, posto nele também

ocorre o desenho das unidades do curso. São estabelecidos os objetivos gerais da

unidade, os métodos de ensino-aprendizagem, o modo de avaliação do aluno e da

unidade, os recursos de aprendizagem (bibliografia indicada e sugerida, vídeos) e

o cronograma da unidade.

O passo 7 consiste na elaboração do sistema de avaliação dos

alunos. Também se diferencia do método tradicional e dada sua grande relevância

cuidaremos detidamente desse assunto no capítulo 8 (oito).

O passo 8 refere-se à descrição do modelo de organização do

currículo:

Um formato muito utilizado pelas escolas que utilizam o PBL é

conhecido como gerenciamento matricial, no qual há dois tipos de

grupos distintos dentro da organização: os departamentos

permanentes, representando as várias disciplinas ou campos do

conhecimento, e as equipes temporárias responsáveis pelas

atividades curriculares. Pode haver equipes temporárias para

diferentes unidades do currículo, e também para atividades

curriculares específicas, tais como avaliação ou desenvolvimento 189 Aqui cabe uma frase de Jacques Labeyrie: “Quando não se encontra solução em uma

disciplina, a solução vem de fora da disciplina”.

Page 123: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

institucional. É recomendado que as equipes temporárias sejam

organizadas em um projeto específico, tenha um orçamento e seja

coordenada por um diretor com responsabilidades executivas. O

diretor do projeto deve ser apoiado por um comitê curricular

composto por pessoas que ocupem posições-chave dentro do

curso. O coordenador do curso deve articular com os diversos

departamentos a participação dos seus docentes em vários

projetos190.

O passo 9 refere-se ao processo de gerenciamento do currículo,

em que deve haver a comunicação entre todos os envolvidos, seja quanto ao

desenho do currículo ou quanto à execução, visando evitar falhas como,

esquecimento, sobreposição e repetição no ensino de determinado tema.

Por fim, o passo 10 cuida da montagem do sistema de avaliação

do curso. Essa avaliação deve ser completa, vale dizer, envolver alunos,

professores e a sociedade.

Dessa forma, verifica-se que no currículo dirigido ao preparo de

um profissional generalista, em regra o ponto de partida são as condições,

características e causas mais prevalentes na região onde o aluno vai atuar, bem

como nas práticas e habilidades que aquele profissional costuma desempenhar

tradicionalmente na região. A esfera cognitiva do currículo PBL deve garantir ao

aluno o estudo das situações necessárias para sua capacitação, como procurar o

conhecimento por si mesmo ao deparar-se com uma situação problema. Além

disso, o currículo PBL deve internalizar essa atitude no aluno como parte de seu

comportamento como profissional.

O currículo PBL deve sofrer revisões permanentes a partir da

retroalimentação feita à comissão de currículo pelos tutores e monitores de

estágios, bem como pelas avaliações cognitivas e de habilidades. A comissão de

currículo deve ter caráter permanente e seus membros devem ser submetidos a

190 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 126.

Page 124: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

rodízio regular juntamente com os demais membros da escola. Geralmente a

substituição não é total, é apenas parcial, mas paulatinamente, após determinado

período, toda a comissão será substituída. Esse método de substituição

proporciona a convivência de membros experientes com novos membros, sem

contar a continuidade do trabalho de revisão permanente do currículo191.

Neto Lôbo afirma que para ser satisfatório e cumprir com suas

finalidades, o curso de Direito deve atingir uma tríplice função a ser considerada

para a elaboração do currículo:

(...) a) formação fundamental e sócio política que forneça ao aluno

uma sólida base humanista e de capacitação crítica; b) formação

técnico jurídica, que o capacite ao exercício competente de sua

profissão, reconhecendo que as disciplinas dogmáticas admitem

espaço à reflexão crítica; c) formação prática, oferecendo-lhes os

meios para aplicar os conhecimentos obtidos192.

191 KODJAOGLANIAN, Vera Lucia, BENITES, Clarice Cristina Andrade, MACARIO, Irma et al.

Inovando métodos de ensino-aprendizagem na formação do psicólogo. Psicol. cienc. prof. [online].

mar. 2003, v. 23, n. 1. Disponível em: <http://pepsic.bvs-

psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98932003000100002&lng=pt&nrm=iso>. ISSN

1414-9893. 192 Op. Cit., p. 38.

Page 125: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

7. CONSTRUÇÃO E NARRATIVA DE PROBLEMAS

O problema apresentado aos alunos geralmente consiste na

descrição de certo fato que é observado como um fenômeno, ou, ainda, situações

ou eventos que precisam de explicações. Tem por finalidade ativar a motivação

intrínseca do estudante, pois mostra a relevância do tema.

Na formação dos problemas pretende-se que os alunos tentem

resolvê-lo com base em seus conhecimentos prévios, aprendendo a trabalhar em

grupo de forma interativa, em que cada um irá expor o que sabe. Além disso, cabe

ao aluno analisar o que precisa ser estudado para que possa dar a solução

adequada e aprofundar-se no tema.,

O resgate dos conhecimentos prévios do aluno possui as

seguintes finalidades: a) complementar o conhecimento se este possuir

fundamento e não for completo; b) reforçar o conhecimento se este já for

adequado; c) substituir o conhecimento, ou seja, aprender a desaprender, se este

possuir erros em seu conceito e definição.

O problema deve ser formulado de maneira a contemplar no

mínimo duas disciplinas, pois se trata de um método multidisciplinar. Assim, o

aluno é estimulado a buscar a resposta,ante as diversas informações disciplinares

e as diferentes fontes.

O problema não pode se limitar aos aspectos do conteúdo

disciplinar. Na área jurídica há situações que envolvem o comportamento humano,

social, a moral, a ética, a economia, ou seja, além da matéria jurídica ainda há o

aspecto humanístico, social, intelectual, psicológico, enfim, a ciência deve ser

exercida por meio da transdisciplinariedade.

Conforme Edgar Morin, em sua evolução muitas vezes a ciência

utiliza-se de conceitos de outras áreas, mas que são também aplicados naquele

Page 126: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

caso porque o todo é uno e a divisão de disciplinas serve apenas para facilitar o

ensino:

(...) têm o propósito de insistir na espantosa variedade de

circunstâncias que fazem progredir as ciências, quando rompem o

isolamento entre as disciplinas: seja pela circulação de conceitos

ou de esquemas cognitivos; seja pelas invasões e interferências;

seja pelas complexificações de disciplinas em áreas

policompetentes; seja pela emergência de novos esquemas

cognitivos e novas hipóteses explicativas; e seja, enfim, pela

constituição de concepções organizadoras que permitam articular

os domínios disciplinares em um sistema teórico comum193.

O problema deve apresentar um título capaz de direcionar os

alunos para o interesse central a ser estudado. Além disso, o texto não deve ser

extenso, devendo ser claro e evitando situações ambíguas. Recomenda-se que

tenha perguntas para conduzir a discussão ao tema definido, vale dizer, quanto

mais preciso for, menos desvio do assunto e dispersão no debate haverá. Desse

modo, devem apresentar as seguintes características:

1) ser pertinente no nível de conhecimentos adquiridos

anteriormente pelos estudantes;

2) motivar os estudantes para aprofundar novas temáticas;

3) ser adequado aos conteúdos que serão abordados;

4) dirigir os estudantes para atingir um número variável de objetos

didáticos do curso (Majoor GD);

5) estimular um processo caracterizado pela coleta e interpretação

dos dados, a formulação do problema, o desenvolvimento de

hipóteses, a estratégia de pesquisas194.

193 MORIN, Edgar. Op.Cit., p. 112. 194 Apud. MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 151.

Page 127: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Para a criação do problema Harriet Christiane Zitscher faz a

seguinte sugestão:

Primeiro escolhe-se um caso interessante da jurisprudência

(preferivelmente da última instancia), que trate de um problema

típico da matéria. Depois, adaptam-se os fatos do acórdão a um

caso para os alunos. Se for necessário, é possível e até útil alterar

os fatos ou somar-lhe algumas circunstancias para abranger

melhor a área do Direito tratada, a fim de que os alunos possam

descobrir as soluções passo a passo195.

Depreende-se que criar um problema apropriado para uma classe

de PBL é um componente crítico que determina se a aprendizagem será ou não

bem sucedida. Diante disso, convém ressaltar que as variáveis principais a

considerar incluem: a) escolher um problema relevante; b) verificar se a cobertura

do problema inclui a idéia geral e habilidades básicas; e c) assegurar que a

complexidade apresentada imite situações vida real196.

A relevância é ponto fundamental para que os alunos tenham

motivação, para isso é importante que os problemas tratem de assuntos atuais e

corriqueiros, que realmente estão presentes no cotidiano. Entretanto, os objetivos

de estudo devem estar interligados e serem capazes de estimular a aquisição de

conhecimentos, pois a aprendizagem será conduzida através do texto. A seguir

elencamos dois exemplos de problemas práticos:

Exemplo 1: João lê o jornal a seguinte afirmação: o direito à vida é

assegurado no Brasil. Sua prima vem a sofrer um estupro que resulta em

gravidez. Diante disso ela se socorre de um advogado que informa que ela poderá

fazer o aborto. João fica confuso e procura um advogado para verificar qual a

atitude correta diante da lei, a fim de evitar que sua prima venha a cometer um

195 Op. Cit., p. 41 196 http://edweb.sdsu.edu/clrit/learningtree/PBL/Choosing_PBL_problem.html

Page 128: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

crime.

Exemplo 2: Pedro pede a seu amigo João que seja fiador em seu

contrato de aluguel. João aceita, mas diz que a única propriedade que tem é a

casa em que mora com seus três filhos. Posteriormente Pedro deixa de pagar os

aluguéis e o credor cobra de João penhorando sua casa. Essa solução é permitida

em nosso ordenamento?

Os problemas devem sempre ser atender ao conteúdo

programático do módulo a que pertencem, e necessariamente deve haver uma

seqüência lógica entre eles, para que possam abordar diferentes etapas do

processo a ser aprendido.

Por fim, Silvia Mamede lança luz sobre o tema ao descrever os

quatro tipos de problemas que podem ser formulados:

1) descritivo: o texto apresenta um evento de forma neutra e os

participantes têm de aprofundar o tema explicando e/ou

fornecendo um sentido aos eventos;

2) explicativo: neste caso, diferentes aspectos têm de ser

explicitados em termos do processo, deixando claros os

mecanismos causais. Trata-se de estabelecer relações de causa-

efeito ou mecanismos seqüenciais que permitem explicar a

evolução;

3) obstáculo do processo: o problema está construído ao redor de

um personagem, que tem de realizar uma ação, mas não sabe

como;

4) dilema: o texto apresenta duas opções, duas possíveis

propostas de intervenção e os participantes têm de escolher uma

argumentando as razões da escolha. Por dilema entende-se

sobretudo a discussão ao redor de um problema ético. Os

Page 129: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

participantes, neste caso, expressam considerações baseados em

seus próprios valores morais e éticos197.

7.1 GRUPO TUTORIAL

O grupo tutorial é formado por até 10 (dez) alunos, sendo que

dentre eles haverá ainda a escolha de um coordenador e de um relator, bem como

de um facilitador que trabalhará na resolução do problema.

O papel do tutor ou facilitador é ser o parceiro e o estimulador dos

estudantes na busca de novos conhecimentos. Ele orienta a discussão visando

estabelecer os objetivos a serem alcançados e estimular a discussão. O tutor

jamais deve dar a resposta pronta ao aluno, nem mesmo aulas expositivas sobre o

tema. Cabe a ele ajudar o aluno a aprender a descobrir os objetivos de

aprendizagem no problema, a buscar informações relevantes e a trabalhar em

grupo. As perguntas que os alunos devem ter em mente para solucionar o

problema são: quem? O quê? De quem? Por que?

O facilitador deve assegurar que todos do grupo participem de

forma igualitária, bem como estimular a participação daqueles que são mais

tímidos para que desenvolvam sua habilidade de oratória e exposição do

pensamento. Ele deve sempre manter o processo de aprendizagem e evitar que

ocorram desvios, focando a discussão em conformidade com o problema. Em

termos práticos, o facilitador deve estimular o pensamento crítico e profundo sobre

o tema, deve ainda fazer perguntas que estimulem o exercício reflexivo sobre a

relevância, profundidade e aplicabilidade do tema, além de detectar os pontos

positivos e negativos do grupo, como a contribuição de cada membro e se há

participação mútua.

197 Op. Cit., p. 147-150.

Page 130: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

O tutor também exerce outras funções dentro da dinâmica de

grupo, como lidar com eventuais problemas de relação interpessoal dos alunos,

assegurar que todos estejam envolvidos e notar o desenvolvimento do grupo

como um todo.

Ele não precisa ser um especialista no assunto, basta ter pelo

menos três qualidades: a) possuir um razoável conhecimento sobre o tema em

estudo; b) ter disponibilidade para envolver-se com os estudantes de maneira

autêntica (congruência social); e c) ter habilidade para expressar-se numa

linguagem inteligível para os alunos (congruência cognitiva)198.

A função dos alunos, por sua vez, é participar ativamente da

discussão, contribuindo com seus conhecimentos e experiências anteriores na

primeira reunião, Nas reuniões subseqüentes eles devem contribuir com os novos

conhecimentos e referências bibliográficas complementares encontradas. Além

disso, os alunos devem respeitar os colegas permitindo que todos expressem

suas opiniões, sabendo o momento de intervir, e deve colaborar para o bom

desenvolvimento do grupo.

Dentre os alunos serão escolhidos um coordenador e um relator,

que exercerão um papel importante no grupo tutorial. O coordenador tem o dever

de contribuir para que o grupo tutorial funcione de maneira eficiente e efetiva,

mantendo o tema em discussão e assegurando a participação de todos, evitando

que haja a monopolização por parte de alguns. Nota-se que algumas de suas

funções confundem-se com a do facilitador, mas isso é para que se garanta o

efetivo aprendizado e que não haja distorções.

O relator deve anotar a lista de objetivos de aprendizagem

definidos no Encontro de Análise do Problema e as referências bibliográficas, bem

como relatar as discussões ocorridas no grupo tutorial. Recomenda-se que as

anotações sejam feitas em um quadro para que todos possam acompanhar.

198 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p.182.

Page 131: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Ao final do ciclo de cada problema, o grupo deve escolher um

novo coordenador e um novo relator, em sistema de rodízio.

A seguir abordaremos o tratamento dado pela Universidade

Federal do Ceará ao procedimento da tutoria e reunião dos grupos para a solução

dos problemas199.

a) Encontro de análise do problema

1. Explicar o ciclo básico do PBL: encontro de análise do

problema; levantamento bibliográfico e estudo; encontro de

monitorização bibliográfica e resolução do problema; encontro de

resolução do problema e avaliação do trabalho em grupo.

2. Esclarecer que o grupo está no encontro de análise do

problema, explicando a finalidade dessa atividade: a partir de troca

de conhecimentos e experiências prévias, o grupo deve analisar o

problema e identificar o que necessita aprender para se tornar

capaz de resolvê-lo (formular objetivos de aprendizagem). Depois,

deve buscar os recursos de aprendizagem necessários para atingir

os objetivos. Escolher um coordenador e um relator.

3. Distribuir o texto do problema e dar tempo para leitura.

4. Pedir aos participantes para identificarem termos que precisam

ser esclarecidos e facilitar a formulação de uma definição

apropriada. Se o grupo não conseguir nenhuma definição

aceitável, a definição deve se constituir em objetivo de

aprendizagem. Questões-chave a serem formuladas: a) Existe

algum termo nesta história que necessita ser esclarecido? b) Em

caso positivo, algum membro do grupo pode contribuir para este

esclarecimento?

199Disponível em: http://www.medsobral.ufc.br/pbl/pbl.htm. Acessado em 20/07/2005

Page 132: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

5. Pedir a um participante para ler em voz alta o problema e a

instrução.

6. Ajudar o grupo a definir o problema, ou seja, identificar a idéia

central que o constitui e que precisa ser explicada ou resolvida.

7. Estimular o grupo a uma chuva de idéias sobre o problema,

assegurando que cada membro do grupo tenha oportunidade de

contribuir para a discussão. Incentivar a troca de conhecimento e a

ativação de experiências prévias, para que o grupo defina os

diferentes elementos constitutivos do problema. Questão-chave a

ser formulada: à luz do seu conhecimento e da sua experiência, o

que você comentaria a respeito deste tema?

8. Perguntar a cada participante o que ele gostaria de aprender

para conseguir uma melhor compreensão do problema e fazer

sugestões apropriadas para sua resolução.

9. Ajudar os participantes a enunciar apropriadamente os objetivos

de aprendizagem e solicitar que escrevam a lista no quadro. A lista

dos objetivos específicos do problema deve ajudar o tutor a guiar a

relevância dos objetivos identificados pelos participantes.

10. Esclarecer quais são as responsabilidades de cada um no

processo de aprendizagem: cada participante deve identificar,

através da pesquisa bibliográfica, o material de aprendizagem

relevante (artigos, capítulos de livros, etc.), aconselhando-se,

quando necessário, com o tutor.

11. A lista dos objetivos de aprendizagem definidos pelo grupo é

anotada pelo relator.

Lembrar aos alunos a finalidade do próximo encontro e enfatizar a

importância de que cada participante estude todos os objetivos de

aprendizagem.

Page 133: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

b) Encontro de monitorização bibliográfica e discussão do

problema

1. Explicar o propósito do encontro:

a) compartilhar os materiais de aprendizagem coletados,

selecionados ou desenvolvidos por cada membro do grupo e

escolher os mais relevantes para o estudo subseqüente;

b) discutir o problema e identificar dúvidas ou pontos a serem

aprofundados no próximo encontro;

c) estar atento ao desenvolvimento do trabalho do grupo.

Acompanhar o processo de trabalho em grupo e identificar

aspectos positivos a serem reforçados e fragilidades que

necessitem de reforço para o desenvolvimento de habilidades

necessárias para o trabalho efetivo do grupo.

2. Pedir ao grupo para reler a tarefa estabelecida pelas instruções

do problema. Solicitar ao relator que leia os objetivos específicos

determinados pelo grupo no encontro de análise do problema

3. Pedir a cada membro do grupo para sumarizar a) o que ele fez

até agora para coletar e selecionar material relevante e comentar

as dificuldades encontradas; b) quais os materiais ele sugere para

os outros membros do grupo estudarem;

4. Pedir ao grupo para avaliar o material selecionado, se é

relevante e suficiente. Caso contrário, enfatizar a importância da

pesquisa bibliográfica complementar.

5. Encerrada a discussão sobre os materiais de aprendizagem,

iniciar a discussão do problema (e não dos objetivos de

aprendizagem).

Page 134: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

6. Relembrar que o grupo deve permanecer atento à necessidade

de pesquisa bibliográfica complementar para a solução do

problema.

7. Incentivar os participantes a fazerem suas apresentações

esquematizando-as no quadro. Questão-chave a ser formulada:

com base no que você aprendeu durante este período, como você

solucionaria o problema?

8. Procurar sempre levar o participante a justificar suas propostas

com as evidências encontradas nas referências bibliográficas

estudadas. Questões-chave a serem formuladas: a) por que você

acha que está medida ou proposta deve ser adotada? b) você

pode explicitar como isso seria realizado? c) Vocês identificam

alguma contradição ou divergência entre as várias proposições

feitas pelos membros do grupo? Se sim, como solucioná-las.

9. A cada passo ou medida proposta, procure envolver os outros

participantes, pedindo a cada um por vez.

10. Procure evitar que a discussão se faça unicamente a partir das

experiências individuais dos participantes ou do bom senso. Faça

com que os participantes justifiquem suas intervenções com os

novos conhecimentos teóricos adquiridos, sempre procurando

fazer com que eles se reportem às referências bibliográficas

estudadas.

11. Quando o grupo chegar a uma solução de consenso para o

problema, solicite que os participantes façam uma síntese dos

principais tópicos e identifiquem pontos que precisam ser

aprofundados.

12. Relembrar o propósito do próximo encontro, o de resolução do

problema. Esclarecer que o Encontro de resolução do problema

incluirá também um acompanhamento do processo de trabalho em

grupo. Explicar as finalidades dessa atividade: identificar aspectos

Page 135: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

positivos a serem reforçados e fragilidades que necessitem de

reforço para o desenvolvimento das habilidades necessárias para

se trabalhar efetivamente em grupo.

c) Encontro de resolução do problema

1. O procedimento é basicamente o mesmo do encontro anterior,

tendo agora o objetivo de aprofundar a discussão incluindo os

temas escolhidos.

2. Peça ao relator para ler os pontos que foram listados no

encontro anterior para que sejam aprofundados.

3. Verifique com os alunos a bibliografia que foi utilizada e inicie a

discussão sobre o problema inserindo os temas citados.

4. Peça aos membros do grupo para comentarem e discutirem as

apresentações dos colegas.

5. Orientar a construção da árvore temática.

6. No encerramento do problema (10 minutos) é feita uma

avaliação a respeito do desenvolvimento das sessões de tutoria.

Cada aluno avalia a sua participação, a dos colegas e do tutor,

objetivando-se o melhor desempenho individual e do grupo.

Page 136: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

8. COMO AVALIAR OS ALUNOS

A avaliação pode ser feita de diversas formas, e em nossa cultura

o meio mais utilizado é a prova, que pode ser escrita, oral ou de múltipla escolha.

A prova é necessária para que se identifique os erros e acertos que estão sendo

cometidos e para avaliar se os objetivos e metas estão sendo alcançados.

Entretanto, a forma com que é realizada nem sempre permite a efetiva percepção

da aprendizagem, pois geralmente o professor pede ao aluno exatamente aquilo

que foi dado em sala de aula e se espera que o aluno tenha aprendido como se

fosse um acumulador de informações. O professor pergunta, mas já tem em sua

cabeça a resposta que considera correta.

Vasco Pedro Moretto afirma:

Nessa visão de ensino, o aprender tem sido visto como gravar

informações transcritas para um caderno (cultura cadernal) para

devolvê-la da forma mais fiel possível ao professor na hora da

prova200.

As provas das linhas tradicional têm as seguintes características:

a) explorar de forma exagerada a memorização, ou seja, visa

apenas verificar o acúmulo de informações que o aluno é capaz de reter, sem se

preocupar com o que foi realmente compreendido, é por essa razão que a maioria

das pessoas não se lembra do que “aprenderam” nos anos anteriores, pois foi

somente uma memorização de conteúdos sem significados;

b) falta de parâmetros para a correção, deixando grande

arbitrariedade em poder do professor, ou seja, só é correto aquilo que o professor

espera que o aluno responda;

200 MORETTO,Vasco Pedro. Op. Cit. p. 94

Page 137: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

c) utilização de palavras de comando sem precisão de sentido no

contexto, por exemplo: comente, discorra, dê sua opinião, o que você sabe sobre

e como você justifica. Todos esses comandos fazem com que qualquer resposta

que o aluno dê esteja correta, pois parte de pontos de vista internos. Para maior

precisão é necessário que o professor estabeleça a linha da resposta que espera,

como exemplifica o trecho abaixo:

No estudo que fizemos sobre filosofia da educação, afirmamos

que, para haver o desenvolvimento do indivíduo para a cidadania,

é preciso que ele conheça seu contexto social. Além disso, que ele

tenha um profundo conhecimento de si mesmo. Nos debates que

fizemos em aula, citamos uma frase atribuída a Sócrates:

conhece-te a ti mesmo. Partindo da frase e das discussões feitas

em aula sobre o assunto, explique o significado da frase no

contexto da filosofia da educação 201.

Assim, o aluno sabe o que se espera dele e que a resposta será

analisada dentro de um contexto específico: a filosofia da educação. Sobre esse

aspecto destaca Silvia Mamede:

De uma forma genérica, pode-se afirmar que deve existir uma

relação quase linear e direta entre os objetivos de aprendizagem,

métodos instrucionais e métodos de avaliação dos estudantes. Se

um sistema de avaliação de estudantes não se porta de modo

congruente com os objetivos de aprendizagem, os resultados

dessa avaliação podem ser contraditórios e ambíguos 202.

A avaliação no PBL para que seja eficaz deve estar em

conformidade com a filosofia do novo método, com seus processos inovadores. A

avaliação não pode ser um mero acerto de contas do professor com o aluno, deve

ser feita com o propósito de melhorar a aprendizagem do educando. Ela deverá

prover informações os objetivos alcançados e se os alunos estão tendo progresso.

201 MORETTO,Vasco Pedro. Op. Cit p. 107. 202 MAMEDE, Silvia. Op. Cit., p. 185

Page 138: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Através das informações obtidas será possível observar a forma

pela qual ocorre o ensino, o ritmo das atividades, a relevância do conteúdo e o

nível dos alunos. A instituição deve analisar também se o tutor está conduzindo os

grupos tutoriais da forma adequada.

Não pode haver uma única forma de avaliação, é preciso que

todos os estudantes tenham a oportunidade de demonstrar seu empenho no

aprendizado, por isso convém que o aluno não seja avaliado em apenas um dia

determinado. No PBL é necessário que a avaliação seja constante, ou seja,

sempre se deve atentar ao progresso do aluno desde o primeiro dia de aula, sua

participação nas discussões em sala, material que traz para complementar os

assuntos, e não apenas o que ele escreve em um único dia pré estipulado, o dia

da prova.

Todos os participantes do processo educacional devem estar

conscientes do modo pelo qual se realiza a avaliação, que deve ser feita com

ética, a fim de demonstrar, de forma confiável, o desempenho do aluno sem seja

retirada sua individualidade, pois o aprendizado não é igual para todos.

Ao tratar das disposições básicas para a educação, a LDB traz a

seguinte previsão no art 24, V:

Art. 24.........................................................................................

V - A verificação do rendimento escolar observará os seguintes

critérios:

a) avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com

prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos

resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas

finais.

Discorrendo sobre o ensino contínuo afirma Sonia Maria Nogueira

Balzano:

Page 139: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Um processo contínuo pressupõe acompanhamento e controle

constante da aprendizagem, de modo a prevenir as dificuldades,

agindo de imediato sobre elas, por meio de recursos pedagógicos

adequados, capazes de identificar suas causas e de enfrentá-las.

Sobre o sentido dinâmico ou contínuo da avaliação, Lucese afirma

que ‘não existe avaliação sem ação, a não ser por exercício de

nominalismo: avaliar é ver, julgar e agir, num ciclo ininterrupto203.

É exatamente nos termos da lei e da Constituição que o PBL atua.

Ele tem um processo de avaliação contínuo em que o docente está avaliando a

evolução do aluno, e sempre que uma falha for detectada pode ser prontamente

corrigida. Como o sistema fundamenta-se na auto-aprendizagem permite-se que o

aluno aprimore suas deficiências ao focar o estudo nas áreas que possui mais

dificuldades.

Uma avaliação eficiente precisa ser abrangente, ou seja, ter

variedade de procedimentos:

Testes de múltipla escolha e de respostas curtas são úteis para a

mensuração da compreensão e aplicação do conhecimento

aprendido, mas ensaios e outros projetos escritos são necessários

para avaliar a habilidade de organizar e expressar idéias. Assim,

uma imagem completa do que foi aprendido pelo aluno requer o

uso de diferentes procedimentos de avaliação204.

Com base nos ensinamentos de Silvia Mamede205, descrevemos a

seguir os três tipos de avaliação mais abordados pela literatura

1) Avaliação de situação: pretende avaliar quais são os

conhecimentos que o estudante possui ao iniciar o curso, com a finalidade de 203 Do direito ao ensino de qualidade ao direito de aprender com qualidade – o desafio da nova

década. In: LIBERATI, Wilson Donizeti. Direito à educação: uma questão de justiça. São Paulo:

2004. p. 154. 204 BORDENAVE, Juan Díaz. Op. Cit. p. 269. 205 Op. Cit. p. 190-192.

Page 140: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

observar se ele será capaz de atingir aos objetivos de aprendizagem, conforme

relata a autora:

O uso de pré-testes sobre os objetivos do curso, técnicas

observacionais, entre outros, podem auxiliar na determinação –

não só para o curso atual, mas inclusive para as futuras turmas –

da posição do estudante na seqüência e no modo instrucionais

mais benéficos.

2) Avaliação formativa: monitora o processo de aprendizagem

durante a instrução. Deve ser feita por módulos e preparada em conformidade

com cada um deles.

Devido ao fato de que a avaliação formativa é direcionada para a

melhoria ensino-aprendizagem, os resultados tipicamente não são utilizados para

a obtenção de notas para o curso. Entretanto, quando se verifica que o estudante

possui reiterados problemas de aprendizagem, deve ser feita uma avaliação

diagnóstica para verificar se a dificuldade é do aluno com o método educacional,

ou se ele tem problemas de ordem comportamental, psicológica, cognitiva ou

mesmo problema físico.

3) Avaliação somativa ou certificativa: verifica se foram atingidos

os objetivos ao final da instrução. Tem como principal objetivo a avaliação dos

estudantes para a verificação de seu aprendizado e para obtenção de notas.

No PBL não se usa a prova como meio de teste porque isso limita

as habilidades dos alunos nas resoluções dos problemas que é de grande

importância metodológica.. Para a citada autora, os mecanismos de avaliação

tradicionais, como os testes de múltipla escolha, são considerados inapropriados,

uma vez que podem desencorajar os estudantes a autodeterminar o conteúdo de

sua aprendizagem e estudar com foco no teste206.

206 MAMEDE, Silvia. Op. Cit. p. 193.

Page 141: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

Os métodos de avaliação orientados por processo estruturam suas

estratégias avaliativas nas habilidades de comunicação dos

participantes nas sessões tutoriais, na aceitação da

responsabilidade para a aprendizagem, no processo de aprender a

aprender, na seleção e uso apropriado de recursos de

aprendizagem e no desenvolvimento de habilidades de resolução

de problemas207.

A avaliação deve englobar um todo: participação, desempenho,

interesse e apreensão do conteúdo. O aluno está em constante avaliação e a

vantagem é que o professor pode ir notando as falhas e corrigindo-as durante o

processo de aprendizagem

Objetivando um caráter elucidativo, descrevemos na seqüência o

método de avaliação da UEL (Universidade Estadual de Londrina) 208, que tem

quatro tipos de avaliação: modular, progressiva, de habilidades e informal:

a) Avaliação modular: ocorre ao fim de cada módulo temático.

Refere-se ao conteúdo desses módulos e tem por finalidade principal avaliar a

qualidade do módulo. Um módulo temático deve conduzir os alunos a

determinados objetivos de conhecimento. O núcleo central do módulo temático

são os problemas desenvolvidos para a abordagem dos temas. Um bom problema

deve ensejar uma boa discussão no grupo tutorial, de modo que, ao final da

discussão, os alunos elejam objetivos de aprendizado adequados ao

conhecimento do tema em estudo.

b) Avaliação progressiva: ocorre a intervalos regulares. Tem por

finalidade avaliar a progressão dos conhecimentos do aluno. Um dos modelos de

avaliação progressiva é a aplicação de uma prova comum a todos os alunos do

207 Idem, ibdem. 208 http://www.uel.br/ccs/pbl/AVALIA.HTM

Page 142: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

curso, independentemente de sua série, com um número fixo de questões que

versem sobre toda a medicina. Um bom parâmetro para determinar a

profundidade dessas questões e o balanceamento das disciplinas na prova é o

perfil determinado pelo currículo e as exigências legais vigentes no país para a

graduação. Em um currículo PBL é fundamental que o aluno receba

retroalimentação quanto ao seu desempenho nessas avaliações, assim como ao

desempenho relativo de seus parceiros de série. Sua colocação entre esses

parceiros permitirá a ele avaliar com propriedade se seu estudo está adequado ou

inadequado, bem como quais áreas de conhecimento ele precisa melhorar.

c) Avaliação de habilidades: constitui-se da observação metódica

do desempenho do aluno na realização das habilidades esperadas para sua série.

Um método (OSCE - Objective Structured Clinical Examination) é a gincana entre

situações preparadas para o desempenho destas habilidades. Para cada situação

há uma banca que dispõe de um fluxograma de desempenho preparado para

aquela situação específica. Essa avaliação geralmente requer um grande esforço

do corpo docente, razão pela qual é feita com menos freqüência do que a

avaliação progressiva ou a avaliação dos módulos temáticos.

d) Avaliação informal: além das três avaliações descritas, há ainda

a avaliação informal permanente feita pelos tutores e pelos monitores nos grupos

tutoriais e nas práticas. Esta avaliação tem por objetivo verificar o interesse, a

conduta e a responsabilidade. Também há uma avaliação permanente do curso

que é desenvolvida pelos alunos por meio de suas representações nos colegiados

diretivos da escola e na Comissão de Currículo.

Na Faculdade de Medicina de Marília a avaliação ocorre já no

inicio das tutorias. Ao final de cada tutoria ocorre uma auto-avaliação, na fala

inicial, e posteriormente o membro do grupo levanta dados positivos ou negativos,

de forma individual, a cada membro do grupo tutorial, inclusive o tutor.

Ao final do módulo, por escrito e em impresso adequado, o tutor

irá classificar individualmente cada discente. Os conceitos serão: suficiente ou

Page 143: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

insuficiente, que indica a reprovação do aluno. Essa avaliação feita pelo docente

será conhecida pelo aluno, que verificará todos os argumentos positivos ou

negativos a ele referidos. Os discente também avaliam o tutor em relação aos

mesmos critérios, e seus formulários escritos também conterão os aspectos

positivos ou negativos do docente, bem como se ele foi suficiente ou insuficiente

ao grupo tutorial.

As provas escritas e as teóricas realizadas ao final de cada

módulo não são formuladas e nem aplicadas pelos tutores, mas sim por um grupo

denominado de “grupo de avaliação”. Os discentes realizarão as provas escritas

ou práticas com a avaliação final de “suficiente” ou “insuficiente”. O discente será

considerado suficiente se responder de forma adequada a todas as questões

formuladas. Caso seja insuficiente, o discente será submetido a nova prova, que

versará apenas sobre os temas em que demonstrou insuficiência. Exemplo: se um

aluno do módulo de direito constitucional não se qualificar no tema de controle de

constitucionalidade, ele será reexaminado somente sobre quanto a esse assunto.

Diante disso, depreende-se que o aluno não pode ser considerado

“meio” qualificado para determinada área do conhecimento, tal como ocorre nas

universidades e escolas que possuem média final 5,0 (cinco), ou média 7,0 (sete)

para não fazer exame. O ser humano deve dominar a área do conhecimento que

será objeto de sua atuação profissional. Não formamos “semi-profissionais”, mas

também não formamos “super-especialistas”.

Por fim, não é somente o conteúdo material que deve ser

examinado, pois o aluno precisa ser capaz de analisar os aspectos biológicos,

psíquicos e mentais de cada ser humano envolvido no problema da questão.

Podemos perceber que embora existam diversas formas de

avaliação, todas têm como fundamento a mesma base. Importante notar que esse

tipo de avaliação pode, também, ser usado no método tradicional, não sendo

aplicado somente ao PBL.

Page 144: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

CONCLUSÕES

Embora por meio de um processo lento e cumulativo, verifica-se

que desde seus primórdios a humanidade reuniu extensas informações às quais

denominamos conhecimento. Devido à sua natureza, o ser humano necessita de

conhecimento para as mais variadas funções, desde obter elementos que

satisfaçam sua necessidade biológica, até a proteção frente à biosfera que habita.

Além disso, como ser pensante que é, pelo conhecimento o ser humano relembra

seu passado, vive plenamente seu presente e é capaz de pensar de forma

abstrata seu futuro, buscando respostas para sua existência e a manutenção da

vida.

Posteriormente, com suas necessidades básicas já satisfeitas, o

ser humano procurou explicações, por meio da filosofia, para os fenômenos que

despertam nossa admiração ou nos causam espanto.

Vimos que o conhecimento está em franco desenvolvimento e o

que hoje é uma verdade, amanhã deixa de ser, passando a uma nova forma de

pensar. Isso decorre da evolução inerente a todas as ciências, sobretudo a ciência

jurídica. Por essa razão o ensino deve ser capaz de estimular o aluno a estar

sempre em busca das respostas e não ter o professor como a fonte única de

informação. Nosso sistema legal é diariamente alterado, o que nos impõe a

constante atualização.

Apesar dessa realidade, constatamos que no Brasil ainda não há

uma faculdade que utilize do método da aprendizagem baseada em problemas.

Nota-se que o ensino é baseado na transmissão do conhecimento pelo professor.

Verificou-se que o ensino tradicional foi o que proporcionou nossa

formação e ainda é metodologia mais utilizada no mundo científico, muito embora

não se mostre suficiente. Esse método demonstrava-se efetivo para a época em

Page 145: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

que os conhecimentos eram limitados, pois pouco se conhecia da física, da

química, da medicina, enfim de todas as áreas do conhecimento. O estudo do

Direito, nessa perspectiva anterior, reportava-se aos grandes filósofos, ao estudo

da história do direito pátrio, estrangeiro e, da sociologia.

A sociedade, apesar de dinâmica, possuía limitações diversas,

desde o número populacional até a ausência de tecnologia, o que gerava um

corpo de conhecimentos jurídicos com objetivos mais restritos que na atualidade.

Ao nosso entender, o método tradicional era um instrumento relativamente

adequado para o ensino – aprendizagem da sociedade até os anos 60-70.

Com o aumento do volume do conhecimento, da tecnologia, das

necessidades sociais e humanas frente à manutenção de sua sobrevivência digna

e humanizada, os conteúdos a serem conhecidos, sua multidisciplinaridade,

transdisciplinaridade, tornaram-se imensos, por isso afirmamos que a mudança

radical dos conceitos que regem a sociedade é o principal agravante do quadro de

ensino e aprendizagem.

Os conhecimentos adquiridos pelo homem ao longo do tempo

devem ser valorizados em qualquer ensino escolar, e isso não exclui as

universidades. Por isso acreditamos que a tarefa primordial da universidade é

preservar uma identidade cultural. Nesse cenário, entendemos que seria

absolutamente válido o ensino de uma língua em via de desaparecimento, não

porque é útil, mas porque, sendo inútil, corre o risco de para sempre se perder.

Em suma, a universidade é a memória intelectual e crítica de uma sociedade.

Além disso, é fundamental o estímulo à reflexão e associação de

ciências entre si, pois a interdisciplinaridade que, infelizmente, é mais proclamada

que praticada, não é uma opção, é o meio de sobrevivência da universidade.

Precisamos ter o “todo” como nosso objeto do conhecimento, a

relação do ser humano com toda a vida, sua responsabilidade. A faculdade de

Direito deve habilitar seu aluno a perceber quais são os valores e interesses que

Page 146: Um novo método de ensino jurídico: a aprendizagem baseada

nossa sociedade busca. Temos que aplicar o Direito em prol da maioria, em

conformidade com o objetivo da solidariedade previsto em nossa Constituição,

coibindo a aplicação dos conhecimentos para a prática de lobbies.

Com o avanço das descobertas científicas e a vigorosa criação

legislativa em nosso país, faz-se necessário capacitar profissionais que avaliem

criticamente a aplicação de seus esforços na sociedade, bem como tenham

consigo o compromisso social de estarem sempre atualizados, para que possam

exercer adequadamente o papel esperado pela sociedade. Para tanto, é preciso

que saibam desenvolver de forma autônoma o aprendizado ao longo de suas

vidas profissional.

A nosso ver o método de aprendizagem baseada em problemas

(ABP - PBL) não é a última fronteira para o ensino – aprendizagem. Esse método

visa fornecer ao estudante um instrumento que lhe permita a atualização continua

de sua profissão futura, tendo como ponto de partida a natureza humana, que é

apenas um fragmento da natureza global, em suas feições biológica, psíquica e

social, que anseia a felicidade e a dignidade para a sua existência.

Acreditamos que o presente método é o mais adequado a cumprir

a finalidade estabelecida na Constituição Federal de garantir o pleno

desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho.

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