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Tribunal de Contas da União Dados Materiais: Decisão 560/97 - Plenário - Ata 34/97 Publicada também no BTCU 54/97 Processo nº TC Processo nº TC 016.793/96-0 Interessado: Tribunal de Contas da União. Órgão: Tribunal de Contas da União. Relator: Ministro Carlos Átila Álvares da Silva. Representante do Ministério Público: Dr. Lucas da Rocha Furtado. Unidade Técnica: 2ª SECEX. Especificação do "quorum": 1. Ministros presentes: Homero dos Santos (Presidente), Adhemar Paladini Ghisi, Carlos Átila Álvares da Silva (Relator), Marcos Vinicios Rodrigues Vilaça, Paulo Affonso Martins de Oliveira, Iram Saraiva, Humberto Guimarães Souto, Bento José Bugarin e o Ministro-Substituto Lincoln Magalhães da Rocha. 2. Ministros com voto vencido: Adhemar Paladini Ghisi e Bento José Bugarin. Assunto: Administrativo - Representação em tema de aposentadoria. Ementa: Representação. Questionamento sobre a incidência das Súmulas TCU 074 e 106 nas aposentadorias efetivadas com aplicação do arredondamento do tempo de serviço, vigente após a Lei 8112/90, ante decisão prolatada pelo STF, que declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 101 da Lei 8112/90. Conhecimento. Entendimento já firmado pelo TCU sobre a matéria. Não conhecimento da proposição da 2ª SECEX, que sugere a revisão do texto da Súmula TCU nº 106, por se tratar de matéria diversa ao objeto da presente representação. Declaração de Voto: Primeiramente, desejo cumprimentar o ilustre Ministro Carlos Átila pelo brilhante trabalho elaborado com vistas a regulamentar questão assaz delicada e complexa como a que se nos apresenta para exame. As razões que conduziram seu Voto, embasadas na mais atualizada doutrina, demonstram a tendência do pensamento jurídico moderno num Estado Democrático de Direito, como bem consignou S. Exa., ao citar

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Tribunal de Contas da União

Dados Materiais:

Decisão 560/97 - Plenário - Ata 34/97

Publicada também no BTCU 54/97

Processo nº TC Processo nº TC 016.793/96-0

Interessado: Tribunal de Contas da União.

Órgão: Tribunal de Contas da União.

Relator: Ministro Carlos Átila Álvares da Silva.

Representante do Ministério Público: Dr. Lucas da Rocha Furtado.

Unidade Técnica: 2ª SECEX.

Especificação do "quorum":

1. Ministros presentes: Homero dos Santos (Presidente), Adhemar

Paladini Ghisi, Carlos Átila Álvares da Silva (Relator), Marcos

Vinicios Rodrigues Vilaça, Paulo Affonso Martins de Oliveira, Iram

Saraiva, Humberto Guimarães Souto, Bento José Bugarin e o

Ministro-Substituto Lincoln Magalhães da Rocha.

2. Ministros com voto vencido: Adhemar Paladini Ghisi e Bento José

Bugarin.

Assunto:

Administrativo - Representação em tema de aposentadoria.

Ementa:

Representação. Questionamento sobre a incidência das Súmulas TCU

nº 074 e 106 nas aposentadorias efetivadas com aplicação do

arredondamento do tempo de serviço, vigente após a Lei 8112/90, ante

decisão prolatada pelo STF, que declarou a inconstitucionalidade do

parágrafo único do artigo 101 da Lei 8112/90. Conhecimento.

Entendimento já firmado pelo TCU sobre a matéria. Não conhecimento

da proposição da 2ª SECEX, que sugere a revisão do texto da Súmula

TCU nº 106, por se tratar de matéria diversa ao objeto da presente

representação.

Declaração de Voto:

Primeiramente, desejo cumprimentar o ilustre Ministro Carlos Átila

pelo brilhante trabalho elaborado com vistas a regulamentar questão

assaz delicada e complexa como a que se nos apresenta para exame. As

razões que conduziram seu Voto, embasadas na mais atualizada

doutrina, demonstram a tendência do pensamento jurídico moderno num

Estado Democrático de Direito, como bem consignou S. Exa., ao citar

os ensinamentos do eminente jurista, o Professor Almiro do Couto e

Silva, no sentido de se corrigirem as distorções do princípio da

Legalidade da Administração Pública, uma vez que sua origem radica

na proteção dos indivíduos contra o Estado.

2. O efeito "ex nunc" defendido por S. Exa., da declaração de

inconstitucionalidade, proferida pela Suprema Corte Constitucional

em matéria de tamanho alcance social, demonstra a preocupação do

eminente par em caminhar "pari passu" com o pensamento moderno,

dando ênfase à segurança jurídica nas relações entre o Estado e o

indivíduo.

3. Precisamente, por todo o embasamento doutrinário que

conduziu o Voto de S. Exa. é que entendo que este Tribunal deva

reconhecer, também, as situações constituídas após a publicação da

Medida Cautelar que suspendeu a aplicação do arredondamento previsto

no parágrafo único do art. 101 da Lei nº 8.112/90.

4. Tal posicionamento explica-se pela simples razão de que o

servidor, que solicitou a sua aposentadoria nos termos da lei não

apenas vigentes mas exitentes à época de seu requerimento, e a quem

a Administração, reconhecendo o direito conferido pela lei,

aposentou, não deve ser responsabilizado ou apenado pelo Estado. O

fato da Administração haver descumprido a decisão da Suprema Corte

que determinou a suspensão da aplicação do arredondamento do tempo

de serviço, expedindo ato de aposentadoria com base no dispositivo

legal sob cautela, me parece, não lhe retira a eficácia, no sentido

de que todos os elementos necessários à validade do ato

administrativo ali se acham reunidos. Não se trata aqui, ainda, de

decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria, mas

um acautelamento sob o pressuposto implícito, segundo Michel Temer

que venha a ocorrer "lesão irreparável a pessoas, à sociedade, à

ordem, à segurança e à economia pública, de modo a não poder

aguardar-se o julgamento final e a suspensão de eficácia pelo

Senado. Somente será deferida se, no período que medeia entre a

propositura da ação e a eventual declaração de

inconstitucionalidade, puder verificar-se a ocorrência de atos que

impeçam, após a declaração, a recomposição de direitos vulnerados."

É bem verdade qeu o próprio jurista retrocitado entende que a

concessão da liminar, no caso, "é excessão ao princípio segundo o

qual os atos normativos são presumidamente constitucionais. Sendo

excepcional, a sua interpretação é restritiva. A regra é a

não-invalidação apriorística do texto normativo. A concessão da

liminar produz esse efeito antes da declaração definitiva." (Michel

Temer, Elementos de Direito Constitucional, 11ª Edição, Malheiros

Editores).

5. O fato é que a desobediência à determinação do Supremo

Tribunal pela Administração propiciou precisamente o que a medida

cautelar propõe evitar: "atos que impeçam, após a declaração, a

recomposição de direitos vulnerados".

6. Na realidade, não tratamos, neste processo, de situações em

tese, mas de casos concretos já conhecidos por este Tribunal na

apreciação de atos de aposentadoria para fins de registro, de acordo

com a competência constitucional a esta Corte atribuída.

7. Não podemos olvidar que ao servidor, no caso de inativação

por tempo de serviço, apenas é dado o direito de solicitar a sua

aposentadoria, pois a concessão é feita pelo Estado, e, ainda que

maculada pela inconstitucionalidade, não lhe é dado o direito de

retornar à atividade enquanto assim não decidir o Estado.

Ante o exposto, desejo acrescer à decisão oferecida pelo

eminente Ministro Carlos Átila, em seu item 8.1.2, a ressalva de que

as aposentadorias requeridas antes da publicação da liminar, isto é,

antes de 8.4.92, embora em data posterior, são consideradas legais.

Dessa forma, proponho a seguinte redação ao item 8.1.2:

"8.1.2. também não incide a Súmula nº 074 nem a nº 106 nas

aposentadorias com arredondamento do tempo de serviço deferidas

posteriormente a 08/04/92, ressalvadas aquelas cujo requerimento

tenha sido apresentado pelo servidor anteriormente a essa data,

quando se aplicará o item 8.1.1 desta decisão,..."

Este é o meu Voto.

Parecer do Ministério Público:

Processo TC 016.793/96-0

Aposentadoria

Excelentíssimo Senhor Ministro-Relator.

Trata-se de representação a respeito da Questão de Ordem

suscitada pelo Exmº Senhor Ministro HUMBERTO GUIMARÃES SOUTO, na

Sessão Plenária de 30.10.96, Ata nº 43/96 relativa aos processos de

concessão de aposentadoria que envolvam o arredondamento de tempo

de serviço previsto no parágrafo único do artigo 101 da Lei nº

8112/90, declarado inconstitucional em Sessão de 8.4.92, pelo

Supremo Tribunal Federal, na ADIn nº 609-6.

Em atenção à determinação do eminente Ministro-Relator CARLOS

ATILA ÁLVARES DA SILVA, a 2ª SECEX emitiu detalhado Parecer (fls.

10/22), examinando todas as questões jurídicas postas nos autos e

propondo solução para cada um dos pontos questionados.

O Ministério Público, contudo, dissente das proposições

constantes dos subitens 4.5 e 4.8, pelas razões e considerações a

seguir expostas.

O subitem 4.5 cuida da possibilidade de ser aplicada a Súmula

nº 74 do TCU apenas às aposentadorias concedidas com

proporcionalidade mínima após 8.4.92, data do deferimento da Medida

Cautelar requerida na ADIn nº 609-6, quando o inativo não possa

retornar ao serviço, por ter falecido, por ter atingido a idade

limite de 70 (setenta) anos ou outros motivos alheios à sua vontade.

Entende o Ministério Público que essa possibilidade só

encontra respaldo jurídico se for admitida a contagem de período de

inatividade até a véspera do impedimento do retorno à atividade.

Nesse caso, não há necessidade de vincular o cômputo do tempo

de inatividade aos casos de aposentadoria proporcional mínima

(25/30 avos para mulher e 30/35 avos para homem), tendo em vista

que não encontra amparo legal a contagem de período de inatividade

após a data limite de 70 (setenta) anos, após a invalidez ou

falecimento.

Veja-se, por exemplo, o caso de servidor que foi aposentado

após 8.4.92, contando com 29 anos 6 meses e 3 dias e que atingiu a

compulsória um mês depois. Note-se que, mesmo computando-se o tempo

de inatividade até a véspera da compulsória, o interessado

continuará a ter seus proventos calculados proporcionalmente a

29/35 avos.

Verifica-se, portanto, que o inativo continuará a fazer jus à

aposentadoria, sendo necessário, apenas, modificar o fundamento

legal da concessão (no exemplo citado, do art. 186, inciso III,

alínea "c", da Lei nº 8.112/90 para o art. 186, inciso II, da

referida norma).

Quanto à proposição constante do subitem 4.8, que sugere a

revisão do texto da Súmula nº 106/TCU deste Tribunal, dissente o

Ministério Público da 2ª SECEX por se tratar de matéria diversa ao

objeto da presente representação.

Em face do exposto, este representante do Ministério Público

junto ao Tribunal de Contas da União aquiesce às proposições da 2ª

SECEX, exceto quanto às proposições constantes nos subitens 4.5 e

4.8, pelos motivos acima mencionados.

Data da Sessão:

03/09/1997

Relatório do Ministro Relator:

GRUPO II - CLASSE VII - Plenário

TC 016.793/96-0

NATUREZA: Administrativo - Representação.

ÓRGÃO: Tribunal de Contas da União.

EMENTA: Representação. Questionamento sobre a aplicabilidade das

Súmulas do TCU nº 074 e nº 106 nas aposentadorias com

arredondamento do tempo de serviço vigentes após a Lei nº 8.112/90,

ante a declaração de inconstitucionalidade do parágrafo único do

seu artigo 101 pelo Supremo Tribunal Federal "in" D.J. de 16/02/96.

Conhecimento. Entendimento firmado de que, em face da publicação do

deferimento, na ADIn nº 906-6, de medida cautelar que suspendeu a

eficácia do parágrafo único do art. 101 da Lei 8.112/90, "in" D.J.

de 08/04/92, não se cogita da aplicação dessas súmulas nas

aposentadorias que, anteriores à cautelar, são consideradas legais.

Também não incidem nas aposentadorias posteriores à mesma cautelar,

quando não mais vigorava o referido parágrafo único que autorizara

o arredondamento. Não conhecimento da proposição da 2ª SECEX, que

objetiva revisão da Súmula TCU nº 106, por não ser matéria objeto

desta representação.

Este processo se originou da questão de ordem suscitada pelo

eminente Ministro Humberto Guimarães Souto, em Sessão Plenária de

30 de novembro de 1996, nos seguintes termos:

"Submeto à deliberação do Tribunal Pleno a presente questão de

ordem, relativa à possibilidade de aplicação das Súmulas TCU nos

106 e 074 em processos de concessões que envolvam arredondamento de

tempo de serviço, ante decisão prolatada pelo Supremo Tribunal

Federal transitada em julgado, que declarou, ao julgar a ADIn nº

609-6, na Sessão de 08/02/96, a inconstitucionalidade do parágrafo

único do artigo 101 da Lei nº 8.112/90.

Referido dispositivo refere-se ao tempo de serviço para fim de

aposentadoria, nos seguintes termos:

'Parágrafo único. Feita a conversão, os dias restantes, até

cento e oitenta e dois, não serão computados, arredondando-se para

um ano quando excederem este número, para efeito de aposentadoria.'

Como conseqüência da declaração judicial de

inconstitucionalidade desse parágrafo, temos sua exclusão do

ordenamento jurídico, com efeito "ex tunc".

Transcrevo, por oportuno, ensinamento do professor Carlos

Mário da Silva Velloso, nobre Ministro do STF:

'No que toca aos efeitos da declaração de

inconstitucionalidade na ação direta de inconstitucionalidade por

ato comissivo, deve a Constituição prever a possibilidade de o

Supremo Tribunal emprestar efeitos "ex tunc" ou "ex nunc" à

declaração de inconstitucionalidade. Quanto à decisão proferida na

cautelar, os seus efeitos são "ex nunc", quer dizer, contam-se a

partir da decisão. Já a decisão de mérito tem efeitos "ex tunc".'

("In" 'Temas de direito público', Belo Horizonte, Del Rey, 1993, p.

118 -- grifado).

Tendo o referido Acórdão decidido o mérito da questão, entendo

que seus efeitos haverão de retroagir à data de vigência da Lei nº

8.112/90.

Assim, trago aos eminentes Pares a seguinte questão de ordem:

poderá esta Corte de Contas continuar aplicando em processos de

arredondamento de tempo de serviço, para fim de aposentadoria, as

Súmulas TCU nºs 106 e 074?

Penso que não, por tratar-se de decisão judicial, com poder

vinculante "erga omnes".

Ao invés da Súmula nº 106, parece-me aplicável, ao caso, a

Súmula TCU nº 235, "verbis":

'Os servidores ativos e inativos, e os pensionistas, estão

obrigados, por força de lei, a restituir ao Erário, em valores

atualizados, as importâncias que lhes forem pagas indevidamente,

mesmo que reconhecida a boa-fé, ressalvados apenas os casos

previstos na Súmula nº 106 da Jurisprudência deste Tribunal.'

Pelas mesmas razões que acabo de expor, entendo que se torna

incabível a utilização da Súmula nº 074/TCU, que permite a

utilização de tempo não trabalhado para cômputo de nova

aposentadoria, pois poderia ser interpretada como forma de burlar a

decisão do Supremo, aceitando-se então o arredondamento, apenas com

outra denominação.

Essa Súmula, então, deveria ser aplicada apenas na ocorrência

de impossibilidade de retorno à atividade do servidor aposentado,

nos casos de aposentadoria proporcional mínima (25/30 para mulheres

e 30/35 para homens)."

Em face da relevância e da complexidade da matéria, a digna

Presidência julgou conveniente receber como Representação a questão

suscitada para, consoante o disposto no inciso IV do artigo 138 do

Regimento Interno, combinado com o artigo 13 "in fine" da Resolução

nº 64/96, determinar a constituição deste processo, do qual fui

sorteado o Relator, e sobrestar o exame de todos os outros que

versassem igual matéria, até a solução da controvérsia.

Determinei, então, o encaminhamento dos autos à 2ª SECEX para

que instruísse o feito e que o retorno do processo se desse por

intermédio do Ministério Público, dando ensejo a seu

pronunciamento, ao tempo em que também encareci urgência, haja

vista o mencionado sobrestamento.

Dada a complexidade do tema sob exame que, bem por isso,

demandou percuciente estudo para a elaboração dos pareceres que me

precederam, os autos retornaram a meu gabinete no mês de maio do

ano em curso.

Em alentada e judiciosa instrução acerca do arredondamento

previsto no parágrafo único do artigo 101 da Lei nº 8.112/90, cuja

eficácia foi suspensa (decisão em medida cautelar publicada no

Diário da Justiça de 08/04/92) e a inconstitucionalidade declarada

(decisão definitiva publicada "in" D.J. de 16/02/96) pelo Supremo

Tribunal Federal, a Assessora da 2ª SECEX, Drª Cláudia de Faria

Castro, rememora que este Tribunal tem adotado nesta matéria, em

linhas gerais, a seguinte orientação (fls. 10/22):

- as aposentadorias anteriores à medida cautelar (08/04/92)

foram consideradas legais, com ressalva de que o julgamento de

mérito da ADIn nº 609-6 pelo Supremo Tribunal Federal poderia

ensejar o reexame dessas decisões;

- as aposentadorias posteriores à medida cautelar e à decisão

de mérito (16/02/96) foram consideradas ilegais com a aplicação da

Súmula nº 106, facultando ao servidor o aproveitamento do tempo de

inatividade, nos termos da Súmula nº 074, para prosperar a

aposentadoria, ou sua reversão à atividade ou, ainda, aposentar-se

com proventos proporcionais ao tempo restante da exclusão do

arredondamento impugnado, guardada a observância da

proporcionalidade mínima prevista em lei.

No mérito, observa de início as disposições legais que

fundamentaram a Súmula nº 074, com a previsão de aproveitamento do

tempo de inatividade. Tal previsão, desde o advento do Estatuto dos

Funcionários Públicos Civis de 1.939 (art. 82 da Lei nº 1.713), foi

ampliada no art. 80 da Lei nº 1.711/52 e, já agora, mantida no § 1º

do art. 103 da Lei nº 8.112/90.

Nesse contexto cita Ivam Barbosa Rigolin que 'in' 'Comentários

ao Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis' sustenta:

"O § 1º do art. 103 da Lei nº 8.112/90 somente poderá ter

algum sentido se entendido como devendo ser computado o tempo em

que o servidor esteve aposentado numa situação posteriormente

cancelada, para fim de que lhe fosse concedida nova aposentadoria,

dessa vez supostamente correta e por isso apta a ser mantida. De

outra forma, o texto não faz o menor sentido."

Observa que a Súmula nº 074 guarda igual orientação ao admitir

o aproveitamento do tempo de inatividade apenas para compensar

tempo de serviço impugnado nas aposentadorias que, concedidas

mediante o cômputo plausível mas equivocado do tempo de serviço,

foram tardiamente submetidas a exame deste Tribunal, evitando-se,

assim, que a inércia da administração implique ônus para o

servidor, ou até inviabilize seu retorno à atividade para completar

o tempo faltante.

Diante da declaração de inconstitucionalidade do referido

parágrafo único do art. 101 da Lei nº 8.112/90, pelo Supremo

Tribunal Federal, pondera a Srª Assessora, há que se ter cautela na

aplicação da Súmula nº 074, a qual se tornou incabível nas

aposentadorias concedidas em clara afronta àquela declaração cujos

efeitos têm suscitado debates doutrinários no respeitante à

retroatividade. Conquanto convergentes acerca de sua abrangência

"erga omnes', divergem os doutrinadores quanto aos efeitos "ex

nunc" ou "ex tunc". Contudo vem-se consolidando a tendência de se

atenuarem as posições extremadas de ambas as correntes

doutrinárias, em prol da "exigência de um mínimo de certeza e de

estabilidade das relações jurídicas".

Nesse sentido, argumenta, não seria cabível que situações

constituídas sob a égide da lei, ainda não declarada

inconstitucional, viessem a ser "exumadas" para, negando-se a

boa-fé dos envolvidos, proceder-se à revisão de atos praticados

então sob o amparo do direito positivo, até porque "a boa fé

presume-se, e a má-fé comprova-se". Nessa ordem de idéias,

colaciona a opinião de respeitáveis juristas.

Da Professora Regina Maria Maceda Nery Ferrari em sua

monografia "Efeitos da Declaração de Inconstitucionalidade", 3ª

edição, Revista dos Tribunais:

"Vemos, então, que os pontos extremos das duas correntes que

procuram estabelecer a eficácia da sentença que proclama a

inconstitucionalidade devem ser abandonados, já que trazem, em si

mesmos, abalos na segurança e na certeza do direito que constitui a

sua essência.

A lei inconstitucional é, portanto, anulável, já que existiu

validamente até o momento da decisão que assim a considera. Dizer

que a mesma é simplesmente nula, já que inválida desde o início,

como se não tivesse existido e que tal característica foi apenas

constatada através de uma sentença declaratória, é esquecer que

toda lei nasce com a presunção de validade do mundo jurídico, gera

direitos, deveres e efeitos no plano do ser físico, e neste não há

ato humano nulo ou anulável, visto que uma vez praticado, jamais

deixarão de ter sido, 'pois fora do mundo jurídico não há

reversibilidade do tempo". (cit. Pontes de Miranda, Tratado de

Direito Privado).

Do Ministro Leitão de Abreu ("in" RTJ 82/791), à época em que

integrava a Suprema Corte:

"A tutela da boa-fé exige que, em determinadas circunstâncias,

notadamente quando, sob a lei ainda não declarada inconstitucional,

se estabeleceram relações entre o particular e o Poder Público, se

apure, prudencialmente, até que ponto a retroatividade da decisão,

que decreta a inconstitucionalidade, pode atingir, prejudicando-o,

o agente que teve por legítimo o ato e, fundado nele, operou na

presunção de que estava procedendo sob o amparo do direito

objetivo."

...............................................................

"Acertado se me afigura, também, o entendimento de que não se

deve ter como nulo 'ab initio' o ato legislativo, que entrou no

mundo jurídico munido de presunção de validade, impondo-se, em

razão disso, enquanto não declarado inconstitucional, à obediência

pelos destinatários de seus comandos" (RTJ 82/795).

Da doutrina de José Afonso da Silva "in" "Curso de Direito

Constitucional Positivo" (págs. 55/6):

"Problema debatido é o dos efeitos da declaração de

inconstitucionalidade, cujo deslinde depende da solução da grave

controvérsia sobre a natureza do ato inconstitucional: se é

inexistente, nulo ou anulável. Buzaid acha que toda lei, adversa à

Constituição, é absolutamente nula, não simplesmente anulável. Rui

Barbosa, calcado na doutrina e jurisprudência norte-americanas,

também considera que toda medida, legislativa ou executiva, que

desrespeite preceitos constitucionais é, de sua essência, nula.

Francisco Campos sustenta que um ato ou uma lei inconstitucional é

inexistente.

A nós nos parece que essa doutrina privatística da invalidade

dos atos jurídicos não pode ser transposta para o campo da

inconstitucionalidade, pelo menos no sistema brasileiro, onde, como

nota Themístocles Brandão Cavalcanti, a declaração de

inconstitucionalidade em nenhum momento tem efeitos tão radicais,

e, em realidade, não importa por si só na ineficácia da lei."

(grifo da parecerista).

Do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Néri da Silveira, na

Representação nº 1.418/5-RS:

"Se, em linha de princípio, como examinarei adiante, as 'leis

de efetivação' são inconstitucionais, é indiscutível constituir,

entretanto, questão melindrosa a que se refere à proteção de certos

efeitos decorrentes de seu cumprimento. Distintas, na ciência do

Direito, a validade e a eficácia da norma jurídica, - embora

inválida a regra constitucional, poderá, por vez, no plano dos

fatos, ser eficaz, consoante sucede, quando a lei inconstitucional

é cumprida por seus destinatários ou aplicada pela Administração.

Não sem freqüência, há os que opõem, nesse sentido, diante das

circunstâncias, restrições ao princípio de que a lei

inconstitucional é nula "ab initio", e não só a partir da data em

que é assim judicialmente declarada, ou como também se expressou,

entre nós, a fórmula "null and void", írrita e nenhuma. Para quem

dessa forma entende, embora infringente da Constituição, o ato

legislativo assim marcado é um fato eficaz ("it is an operative

fact"), 'ao menos antes da determinação da constitucionalidade,

podendo ter conseqüências que não é lícito ignorar'.

Estabeleceu-se, segundo certa corrente doutrinária, que, 'assim

como, em direito privado, se protege o ato jurídico, em cuja

engendração se insinuou algum vício, mantendo-se-lhe, em parte, os

efeitos produzidos, malgrado a sua anulação pelo órgão judiciário'

no plano do direito público, igual providência cabe quanto ao ato

inconstitucional. Da mesma maneira como se há de tutelar, na esfera

do direito privado, em determinados casos, o ato aparente, entende

essa doutrina, ao não qualificar, desde logo, como nula e nenhuma a

lei inconstitucional, que importa seja estendida aos atos em

desconformidade com a Constituição, praticados com apoio em norma

com tal mácula, certa proteção. Se na ordem privatista, dentre

outras razões, argúi-se a necessidade de proteger a boa-fé dos que

tiveram como perfeito ou regular o ato, que se veio,

posteriormente, a declarar nulo, no direito público, raciocina-se

'com a presunção de legitimidade dos atos que, nessa esfera, são

emanados'."

E a propósito, a Srª Assessora da 2ª SECEX salienta a linha de

raciocínio do ilustre Ministro Carlos Mário da Silva Velloso, na

obra já mencionada pelo eminente Ministro Humberto Souto na

presente questão de ordem, intitulada Temas de Direito Público, Ed.

Del Rey, Belo Horizonte, 1994:

"É que a decisão proferida no controle concentrado de

constitucionalidade tem a natureza de norma, de norma em sentido

negativo, porque ela afasta da ordem jurídica a norma incompatível

com o ato normativo inicial, na linha, aliás, da lição de Kelsen,

citada por Jorge Miranda, no sentido de que 'anular uma lei é fazer

uma norma geral, fazê-la com sinal negativo'.

Destarte, a decisão ou ato praticado com base em norma

inválida, porque assim declarada, em tese, pelo Supremo Tribunal

Federal, também será inválido, mas a declaração dessa invalidez

deverá ser buscada mediante a utilização do processo ordinário e

das ações que integram o que Capelleti denomina de jurisdição

constitucional das liberdades - os remédios ou garantias

constitucionais, que são, na Constituição vigente, o 'habeas

corpus', o mandado de segurança individual e coletivo, o 'habeas

data', o mandado de injunção e a ação popular." (pág. 96/7)

Acrescenta, ainda, que nessa mesma obra (pág. 18), ao

discorrer especificamente sobre os efeitos da decisão de mérito,

Sua Excelência afirma que "a decisão de mérito tem efeitos 'ex

tunc'. Casos há, entretanto, que seria adequado o efeito 'ex

nunc'". Que tais casos, na visão do autor, são aqueles onde a

segurança jurídica, a eqüidade ou razões de interesse público

recomendem a irretroatividade. Aduz também que o insígne Ministro

do STF relembra, ademais (pág. 440), o entendimento assente naquela

Corte Maior no sentido de que "a aposentadoria deve reger-se pela

lei vigente à data de sua concessão".

Nessa lógica, deduz a Srª Assessora: "Ora, se declarar a

inconstitucionalidade de uma lei é 'fazer uma norma geral, fazê-la

com sinal negativo', tal norma não vigia anteriormente ao

deferimento da medida cautelar requerida na ADIn nº 609-6, época em

que foram concedidas aposentadorias, com fulcro no parágrafo único

do art. 101 da Lei nº 8.112/90 cuja constitucionalidade não havia

sido questionada". Logo " as concessões de aposentadorias ocorridas

entre a publicação da Lei nº 8.112/90 e o deferimento da medida

cautelar requerida na ADIn nº 609.6 - publicada em 08/04/92 - não

devem, singelamente, ser consideradas nulas ou ilegais". Segundo

infere das ponderações do Ministro Carlos Velloso, "a invalidez das

aposentadorias em causa só poderia ser declarada em sede de

processo ordinário judicial", conforme a melhor doutrina. E sendo

assim, não há falar, nesses casos, em aplicação da Súmula nº 074.

Por outro lado, tem por inaplicável a referida Súmula nas

hipóteses em que a concessão de aposentadoria, com arredondamento,

ocorreu em data posterior à publicação da medida cautelar. A partir

dela restou suspensa a eficácia do parágrafo único do artigo 101 da

Lei nº 8.112/90 e, nesses casos, não mais se pode presumir a

boa-fé. Uma vez confirmado o entendimento na decisão do mérito da

ADIn nº 609-6, a aceitação do arredondamento implicaria afronta ao

respeitável "decisum".

Tem por correto, entretanto, nessa hipótese, permaneça a

faculdade de o inativo retornar à atividade para completar o tempo

de serviço imprescindível para a aposentadoria na forma

originalmente deferida. Caso assim não queira, ser-lhe-á facultado

aposentar-se com os proventos calculados proporcionalmente ao tempo

restante da impugnação.

Entretanto nas aposentadorias originalmente concedidas com

proventos calculados na proporcionalidade mínima cujo inativo

esteja impossibilitado de retornar à atividade para completar o

tempo impugnado (invalidez, morte, implemento da idade ou em outras

hipóteses excepcionais), afigura-se-lhe viável a aplicação da

Súmula nº 074, ante a impossibilidade de se provar a má-fé do

beneficiário.

No que respeita à Súmula nº 106, considera que os mesmos

fundamentos até aqui expendidos justificam que não se cogite de sua

aplicação, por incabível, nas aposentadorias ocorridas antes da

publicação da medida cautelar (08/04/92), as quais se revestem de

legalidade. Nesses casos, observa:

"3.31. Resta analisar a situação daqueles que se aposentaram a

partir da publicação do deferimento da citada medida cautelar.

Também nestes casos há que se guardar coerência com as conclusões

alusivas à inaplicabilidade, à espécie, da Súmula nº 074, ou seja,

caso o inativo retorne à atividade, para completar o tempo de

serviço necessário à aposentadoria, na forma originalmente

concedida, não haveria valores a restituir, posto que os proventos

que teria percebido indevidamente passariam a constituir mera

antecipação daqueles que receberá, após a regularização de sua

aposentadoria. Embora seja certo que surgirão situações em que

fatos supervenientes ao retorno à atividade implicarão hipóteses

imprevisíveis, "a priori", entendemos que tais ocorrências deverão

merecer tratamento individual, quando e se vierem a se concretizar.

3.32. O mesmo não ocorre nas situações em que o tempo de

serviço computado por arredondamento deva ser expurgado, posto que,

nesses casos, a conversão das aposentadorias integrais em

proporcionais ou a redução da proporcionalidade, desde a concessão,

implicam redução dos proventos pagos até então e conseqüente

existência de importâncias indevidamente recebidas, as quais, a

nosso ver, devem merecer tratamento consentâneo com o princípio

insculpido na Súmula nº 105 desta Corte, no sentido de preservar

situações constituídas anteriormente a alterações na jurisprudência

do Tribunal."

Nessas aposentadorias posteriores à publicação do deferimento

da referida cautelar mas anteriores à publicação da Súmula nº 235

(D.O.U de 03/01/95), entende cabível o benefício da Súmula nº 106,

a teor da Decisão Plenária nº 046/96 no TC 002.202/94-8, (Ata nº

06/96) e do princípio da publicidade consagrado no "caput" do art.

37 da Constituição Federal, conforme ponderou o eminente Ministro

Paulo Affonso Martins de Oliveira no Voto que proferiu na

apreciação do TC 013.668/94-3 (Ata nº 38/96) pelo Plenário:

"16. Conquanto esteja em pleno acordo, no mérito, com o

posicionamento acima esposado, não posso, contudo, deixar de

registrar que, como a Decisão nº 444/94-TCU - Plenário

(Administrativa) somente saiu publicada no Boletim Interno deste

Tribunal, a eficácia pretendida do aludido decisum sobre as

unidades jurisdicionadas ao TCU só se opera no mundo jurídico após

sua respectiva publicação no DOU, o que tão-somente se verificou a

partir da publicação das Decisões nºs 254/94 e 255/94 no D.O.U. de

05/10/94 (Ata nº 33/94), e, de modo cristalino e efetivo, quando da

publicação da Súmula nº 235 da Jurisprudência predominante nesta

Corte (DOU de 03/01/95), que consagrou em definitivo a nova

orientação firmada mediante a Decisão nº 444/94-Plenário."

Admite, então, que poderá ser aplicável a Súmula 235 nas

aposentadorias posteriores a sua publicação, que tenham prosperado

mediante a redução dos proventos à devida proporcionalidade.

Por outro lado pugna pela aplicação da Súmula nº 106 nas

hipóteses em que motivos alheios à vontade do inativo (invalidez,

implemento da idade limite, falecimento) impossibilitem seu retorno

à atividade para completar o tempo de serviço faltante em

decorrência da impugnação, ainda que a concessão seja posterior à

Súmula nº 235, desde que as condições impeditivas do retorno

preexistissem a essa Súmula.

Finalmente, conclui a Drª Cláudia de Faria Castro:

"4.1. Por todo o exposto, a questão suscitada nestes autos, a

nosso ver, não permite solução que consista na simples aplicação ou

não dos preceitos sumulares aqui debatidos. Ao contrário, conforme

resumo apresentado no quadro anexo - que nos pareceu útil elaborar,

devido à complexidade da matéria - seu deslinde estará em que se

faça incidir, nas oportunidade devidas, os dispositivos adequados a

cada situação.

4.2. Em suma, consideramos incogitável a aplicação das Súmulas

nºs 074 e 106 do TCU às concessões anteriores a 08/04/92, data da

publicação da medida cautelar pela qual o Supremo Tribunal Federal

suspendeu os efeitos do parágrafo único do art. 101, da Lei nº

8.112/90 (ADIn nº 609-6), pois tais concessões, efetuadas nos

estritos termos da legislação vigente à data em que ocorreram, não

estarão sujeitas a questionamento, quanto a sua legalidade.

4.3. Em relação às concessões posteriores a 08/04/92, deve-se

ter presente que ocorreram enquanto vigorava a suspensão dos

efeitos do dispositivo legal acima referido, ou seja, quando o

permissivo legal para o arredondamento de tempo de serviço já não

possuía plena eficácia. Com a decisão de mérito proferida na ADIn

nº 609-6, publicada em 16/02/96, o Supremo Tribunal Federal

confirmou a inconstitucionalidade do aludido dispositivo, tornando

definitiva a vedação de se utilizar o arredondamento previsto no

parágrafo único do art. 101 da Lei nº 8.112/90 na contagem de tempo

de serviço, para fins de aposentadoria.

4.4. Diante disso, entendemos que o disposto na Súmula nº 074

do TCU não pode incidir nas concessões posteriores a 08/04/92, pois

tal incidência implicaria aceitação do procedimento previsto na lei

declarada inconstitucional. Entendemos, ainda, em que pesem as

inconveniências administrativas de tal procedimento, que poderá ser

dada, aos inativos que se encontrem nessa situação, oportunidade de

optar entre o retorno à atividade, para completar o tempo

impugnado, ou a exclusão do tempo arredondado, com as conseqüências

daí provenientes, que serão, conforme o caso, a conversão das

aposentadorias integrais em proporcionais ou a diminuição da

proporcionalidade.

4.5. Nada obstante, mesmo em relação às concessões posteriores

a 08/04/92, seria cabível a aplicação da Súmula nº 074 do TCU, a

nosso ver, naquelas deferidas com proporcionalidade mínima em que o

inativo não possa retornar ao serviço, por ter falecido, por ter

atingido a idade limite de 70 anos, por outros motivos alheios a

sua vontade ou em situações excepcionais, cuja ocorrência não se

pode prever.

4.6. Já a Súmula nº 106 desta Corte afigura-se aplicável às

concessões anteriores à publicação da Súmula nº 235 (03/01/95),

pela qual foi alterado o entendimento deste Tribunal, quanto ao

ressarcimento de vantagens indevidas, pagas aos servidores

públicos. Às concessões posteriores à alteração de jurisprudência

desta Corte entendemos aplicável a aludida Súmula nº 235,

ressalvados, somente, os casos em que, pelas razões enumeradas no

item 4.5. acima, haja impedimento de retorno à atividade, anterior

à referida alteração jurisprudencial.

4.7. Neste passo, pedimos vênia para trazer à apreciação do

Tribunal questão relativa à redação da Súmula nº 106, cujo texto é

restrito ao julgamento das concessões pela ilegalidade. A nosso

ver, a aplicação analógica da referida Súmula a situações onde a

concessão era julgada legal decorreu de alteração nos procedimentos

do próprio Tribunal, os quais, à época da aprovação da Súmula em

comento, não incluíam as diligências preliminares que, atualmente,

permitem que os atos irregulares sejam retificados, previamente a

seu julgamento que, dessa forma, pode não ser pela ilegalidade.

4.8. Uma vez cumprida a diligência saneadora do ato, com mais

razão tem cabimento a dispensa de reposição das importâncias

recebidas de boa-fé, até a data do conhecimento, pelo órgão

competente, da recomendação diligenciada preliminarmente pelo

Tribunal. Nesse sentido, embora não seja matéria restrita ao objeto

da presente Representação, consideramos oportuno sugerir a revisão

do texto da Súmula nº 106 desta Corte, de molde a adaptá-lo aos

procedimentos."

Para melhor compreensão da matéria ora examinada, fiz

distribuir o quadro demonstrativo a que se refere o subitem 4.1. da

instrução.

Pelo Ministério Público junto a este Tribunal, o Dr. Lucas da

Rocha Furtado, ao aquiescer as proposições da 2ª SECEX, excetua

aquelas constantes dos subitens 4.5. e 4.8. pelas seguintes razões

e considerações:

"O subitem 4.5. cuida da possibilidade de ser aplicada a

Súmula nº 074 do TCU apenas às aposentadorias concedidas com

proporcionalidade mínima após 08/04/92, data do deferimento da

Medida Cautelar requerida na ADIn nº 609-6, quando o inativo não

possa retornar ao serviço, por ter falecido, por ter atingido a

idade limite de 70 (setenta) anos ou outros motivos alheios à sua

vontade.

Entende o Ministério Público que essa possibilidade só

encontra respaldo jurídico se for admitida a contagem de período de

inatividade até a véspera do impedimento do retorno à atividade.

Nesse caso, não há necessidade de vincular o cômputo do tempo

de inatividade aos casos de aposentadoria proporcional mínima

(25/30 avos para mulher e 30/35 avos para homem), tendo em vista

que não encontra amparo legal a contagem de período de inatividade

após a data limite de 70 (setenta) anos, após a invalidez ou

falecimento.

Veja-se, por exemplo, o caso de servidor que foi aposentado

após 08/04/92, contando com 29 anos 6 meses e 3 dias e que atingiu

a compulsória um mês depois. Note-se que, mesmo computando-se o

tempo de inatividade até a véspera da compulsória, o interessado

continuará a ter seus proventos calculados proporcionalmente a

29/35 avos.

Verifica-se, portanto, que o inativo continuará a fazer jus à

aposentadoria, sendo necessário, apenas, modificar o fundamento

legal da concessão (no exemplo citado, do art. 186, inciso III,

alínea 'c', da Lei nº 8.112/90 para o art. 186, inciso II, da

referida norma).

Quanto à proposição constante do subitem 4.8, que sugere a

revisão do texto da Súmula nº 106/TCU deste Tribunal, dissente o

Ministério Público da 2ª SECEX por se tratar de matéria diversa ao

objeto da presente representação." É o Relatório.

Voto do Ministro Relator:

A Doutrina do Direito é especialmente rica em controvérsia sobre a

declaração de inconstitucionalidade e seus efeitos.

De inequívoca validade, nesse tema, é a doutrina de Almiro do

Couto e Silva, Professor de Direito Administrativo da Faculdade de

Direito da UFRGS, ao analisar o princípio da legalidade da

Administração Pública com a interseção do princípio da segurança

jurídica em monografia publicada na Revista do Direito

Administrativo nº 84 (págs. 47/63), que passo a expor em resumo.

Só relativamente há pouco tempo, observa o eminente jurista,

restou reconhecido que o princípio da legalidade da Administração

Pública, até então tido por incontrastável, encontrava limites na

sua aplicação, porquanto indispensável resguardar a confiança dos

indivíduos nos atos da Administração Pública outorgantes de

vantagens há muito incorporadas a seu patrimônio, praticados

regularmente com a observância de leis.

Salienta a necessidade, modernamente, de se corrigirem as

distorções do princípio da Legalidade da Administração Pública,

resul-tantes do esquecimento de que sua origem radica na proteção

dos indiví-duos contra o Estado, dentro das conquistas liberais

obtidas no final do século XVIII e início do século XIX, e

decorrem, igualmente, da ênfase excessiva no interesse do Estado em

manter o seu ordenamento jurídico.

Na Alemanha, esclarece, é absolutamente defesa a anulação

quando se tratar de ato administrativo que conceda prestação em

dinheiro, que se exaure de uma só vez ou que apresente caráter

duradouro, como são os atos de índole social: subvenções, pensões

ou proventos de aposenta-doria, salvo quando a vantagem tenha sido

obtida pelo destinatário por meios ilícitos, com culpa sua ou que

resulte de procedimento de sua responsabilidade. Nesse caso não

existe a confiança a ser protegida.

No Direito francês, considerando-se a segurança jurídica mais

importante que a própria legalidade, o Conselho do Estado fixou,

desde 1923, o entendimento de que o desfazimento dos atos

administrativos não cabe quando existam direitos deles provenientes

e, de outra parte, o de que os atos maculados de nulidade só

poderiam ter sua anulação decretada pela Administração Pública em

prazo igual ao dado aos particulares para que postulassem, em

recurso contencioso de anulação, a invalidade dos atos

administrativos (120 dias).

O ordenamento jurídico italiano não fixa limite de tempo para

a anulação de ofício dos atos administrativos inválidos. Contudo,

na aplicação do princípio da necessidade de certeza das situações

jurídicas, admite-se, quer na doutrina, quer na jurisprudência, não

serem mais anu-láveis os atos que, embora inválidos, hajam

irradiado incontestadamente seus efeitos por um período de tempo

relativamente longo; há de ser ponderado, por conseguinte, caso a

caso e em correlação com o interesse público.

Portugal igualmente reconhece o valor da segurança jurídica

sobrepondo-a ao princípio da legalidade da Administração Pública,

em caso de ato nulo e até mesmo de ato inexistente nas situações em

que o indivíduo, por longo tempo, tenha ocupado cargo público cuja

investidura resulta de ato juridicamente inexistente.

No Direito norte-americano, no campo específico do Direito

Constitucional, assinala que até mesmo o princípio da eficácia "ex

tunc" da declaração de inconstitucionalidade das leis -- tão

profundamente enraizado na vida dos povos que seguem a técnica do

judicial "review" do Direito norte-americano -- sofre hoje

atenuações ao confrontar-se com situações formadas e

consistentemente definidas sob a égide da lei que se considerou,

mais tarde, incompatível com a Constituição. Prevalece atualmente o

entendimento, nessas hipóteses excepcionais, de que se tais

situações produziram vantagens para particulares, prolongando-se no

tempo até assumir a feição de benefícios duradouramente

incorporados ao patrimônio jurídico dos indivíduos, seria iníquo

que a declaração de inconstitucionalidade as atingisse, tratando-as

como se nunca tivessem existido, conforme era a orientação

tradicional, ou seja, o ato seria inválido ou nulo desde a emissão,

e não apenas a partir da data na qual foi declarado

inconstitucional.

Segundo registra o repositório do Direito norte-americano, o

"Corpus Juris Secundum", em numerosas decisões mais recentes tem

sido sustentado que a regra geral tradicional não é universalmente

verdadeira ou nem sempre absolutamente verdadeira; comporta ela

muitas exceções; é afetada por muitas considerações; uma visão

realista tem erodido essa doutrina; tão amplo princípio deve ser

entendido como temperamentos, e mesmo uma lei inconstitucional é um

fato operativo, pelo menos antes da declaração de

inconstitucionalidade, que deve ter conseqüências as quais não

podem ser ignoradas.

Valho-me, ainda, no exame desta controvertida matéria, da

atualizada e esclarecedora preleção do Professor Carlos Roberto de

Siqueira Castro, Subprocurador-Geral da República -- aposentado,

doutor em Direito Público, Professor Titular de Direito

Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, segundo

monografia publicada na Revista Forense, volume 335 (págs. 18/44),

sob o título "Da declaração de inconstitucionalidade e

seus-efeitos", que exponho em síntese.

Acerca dos vários modelos hoje figurantes nas pautas do

Direito Constitucional Comparado, destaca, no pertinente ao

controle de constitucionalidade das leis, dois sistemas que

historicamente se afirmaram e extremaram nesse sítio da teoria

constitucional: de um lado tem-se o modelo norte-americano

irradiado da Constituição dos Estados Unidos da América de 1787,

designado sistema de controle difuso (cabe a qualquer juiz

pronunciar-se sobre a conformidade da lei com a Constituição); do

outro, o modelo austríaco emanado da Carta Política da Áustria, de

1º de outubro de 1920, denominado sistema de controle concentrado

(a competência para examinar a constitucionalidade das leis é

privativa de um determinado Tribunal).

No controle difuso a sentença que afirma a

inconstitucionalidade da lei é meramente declaratória de

preexistente nulidade absoluta, e seus efeitos, em princípio,

operam "ex tunc". No sistema austríaco, entretanto (controle

concentrado), a sentença tem força constitutiva, ou seja, mesmo em

dessintonia com a Constituição, existe e produz ela seus efeitos

até quando tal dessintonia ainda não for declarada. Os efeitos

operam, pois, "ex nunc" (pro futuro), não se admitindo qualquer

retroatividade.

Todavia observa, citando Cappelletti, que mesmo no controle

difuso é hoje admitido que sejam resguardadas situações onde a

noção de justiça sairia seriamente arranhada caso fosse o princípio

da eficácia "ex tunc" invariavelmente aplicado, sem se atentar para

as peculiaridades de cada caso.

Entre nós, no Brasil, esclarece, o sistema de controle da

constitucionalidade das leis foi, sob a influência norte-americana

e a inspiração de Rui Barbosa, implantado pela Constituição de

1891, em regime de difusão competencial atribuída aos Juízes e

Tribunais Federais e, em grau de recurso, ao Supremo Tribunal

Federal.

O eminente professor explica que "por estas razões históricas

que nortearam na origem a competência recursal do Supremo Tribunal

Federal no campo do controle dito difuso, foi natural que a

doutrina constitucionalista de nosso país estendesse ao mecanismo

de controle concentrado os mesmos consagrados atributos de nulidade

"ab initio" da lei inconstitucional e de retroatividade radical

quando introduzimos o mecanismo da 'representação contra a

inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa, federal

ou estadual', de incumbência do Procurador-Geral da República e

incluída na competência originária da Suprema Corte pela Emenda

Constitucional nº 16, promulgada no ano de 1965, que alterou o

disposto no art. 101, I, alínea 'k', da Carta Política de 1946".

Mas acrescenta: "em que pese à prevalência histórica, até hoje

subsistente, do primitivo modelo norte-americano, de resto já não

mais vigorante na grande nação norte-americana de onde brotou,

inexiste qualquer norma ou princípio de ordem constitucional a

servir de empeço intransponível a que também acompanhemos a

tendência hoje generalizadas na Europa e nos Estados Unidos da

América".

Observa, com efeito, não existir, na Constituição Federal

brasileira de 1988, preceito ou princípio, explícito ou implícito

que cogite dos efeitos temporais emergentes da declaração de

inconstitucionalidade.

Ressalta que o Supremo Tribunal Federal tem dado mostra de

profícua abertura na compreensão temperada dos efeitos do aresto

declaratório de inconstitucionalidade, fazendo-se permeável à

adoção dos efeitos "ex nunc" em determinadas circunstâncias,

notadamente em respeito à coisa julgada, ao princípio da boa-fé e,

de um modo geral, nas situações consolidadas antes da declaração de

inconstitucionalidade, em respeito a estabilidade das relações

jurídicas.

Cita, nesse contexto, o acolhimento da ADIn nº 1.102-2-DF,

quando o Supremo Tribunal Federal conferiu ao respectivo acórdão

efeitos "ex nunc" (pro futuro), evitando-se, assim, inviabilizar o

sistema securitário nacional se os efeitos operassem "ex tunc" no

acolhimento da referida ação direta, que objetivara a

insubsistência, por razões de inconstitucionalidade, de uma das

fontes de custeio da Previdência Social.

Os lúcidos comentários do Professor Siqueira Castro estão

alicerçados, ainda, nas opiniões de Lúcio Bittencourt, Themístocles

Brandão Cavalcanti, Regina Maria Macedo Nery Ferrari, Maria Isabel

Gallotti, Erival da Silva Ramos, Gilmar Ferreira Mendes, entre

outros que cita.

De ser lembrado, finalmente, que esta Corte de Contas tem

observado orientações emanadas do Supremo Tribunal Federal sempre a

partir da data de sua publicação no Diário da Justiça.

De todo o exposto, concordo com os pareceres em que não há

cogitar-se da aplicação das súmulas nº 074 nem da de nº 106 nas

aposentadorias, com arredondamento, vigentes antes da publicação do

deferimento da medida cautelar pelo Supremo Tribunal Federal

(08/04/1992) na ADIn nº 609-6, eis que são atos válidos

considerados legais para efeito de registro neste Tribunal,

concedidas que foram com suporte no ordenamento jurídico

explicitado nas normas de direito positivo vigentes à época.

De igual modo aquiesço ao entendimento de que, após a

publicação do deferimento da referida cautelar (08/04/1992) que

suspendeu a eficácia do parágrafo único do artigo 101 da Lei nº

8.112/90, não mais incide a aplicação da Súmula nº 074 nas

aposentadorias, com arredondamento, consideradas ilegais, pois tal

procedimento, na oportuna observação do eminente Ministro Humberto

Souto, "poderá ser interpretado como forma de burlar a decisão do

Supremo, aceitando-se o arredondamento, apenas com outra

denominação".

Contudo no pertinente à questão da incidência da Súmula nº

074, em caráter excepcional, nas aposentadorias consideradas

ilegais por serem posteriores a 08/04/92 nos casos em que o

servidor, aposentado voluntariamente com o tempo de serviço mínimo

(25 ou 30 anos), esteja impossibilitado de retornar à atividade,

inclino-me pela opinião do Ministério Público. Com efeito a

incidência da Súmula nº 074 nessa hipótese carece de base legal,

além de não produzir efeitos práticos: as aposentadorias por

invalidez ou por implemento de idade independem desse requisito

temporal, podendo então prosperar mediante a alteração do

fundamento legal e o ajuste no cálculo dos proventos; e na hipótese

de falecimento, a pensão aos dependentes corresponderá à totalidade

dos vencimentos do instituidor. (Parágrafos 4º e 5º do art. 40 da

Constituição Federal e art. 215 da Lei nº 8.112/90).

Com respeito à aplicação da Súmula nº 106, há que se observar

seu enunciado, "verbis":

"Súmula nº 106:

O julgamento, pela ilegalidade, das concessões de reforma,

aposentadoria e pensão, não implica por si só a obrigatoriedade da

reposição das importâncias já recebidas de boa-fé, até a data do

conhecimento da decisão pelo órgão competente."

Em que pese ao aspecto social, penso não ser essa Súmula

aplicável nas aposentadorias posteriores a 08/04/1992, pois se

presume o conhecimento da ilegalidade do ato, pela autoridade

competente, independentemente de sua apreciação pelo TCU, em vista

da suspensão da eficácia do parágrafo único do art. 101 da Lei nº

8.112/90 pelo Supremo Tribunal Federal. Não poderia, assim, a

autoridade conceder qualquer aposentadoria com fundamento no citado

dispositivo, após aquela data. Inviável, também nesta hipótese,

presumir-se a boa fé.

Importa notar, nesse sentido, o v. acórdão da Col. 2ª Turma do

Supremo Tribunal Federal, em Recurso Extraordinário relatado pelo

eminente Ministro Francisco Rezek, cuja ementa enuncia:

"Recurso Extraordinário. Efeitos da declaração de

inconstitucionalidade em tese pelo Supremo Tribunal Federal.

Alegação de direito adquirido.

- Acórdão que prestigiou lei estadual à revelia da declaração

de inconstitucionalidade desta última pelo Supremo. Subsistência do

pagamento de gratificação mesmo após a decisão "erga omnes" da

Corte. Jurisprudência do STF no sentido de que a retribuição

declarada inconstitucional não é de ser devolvida no período de

validade inquestionada da lei de origem - mas tampouco paga após a

declaração de inconstitucionalidade."

Do exposto, acolho parcialmente os pareceres da 2ª SECEX e do

Ministério Público e VOTO por que seja adotada a Decisão que ora

submeto a este Plenário.

Decisão:

O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator DECIDE:

1. conhecer da presente representação para considerá-la

procedente, em parte, e firmar a seguinte orientação:

1.1. não se cogita da incidência das Súmulas TCU nºs 074 e 106

nas aposentadorias efetivadas com aplicação do arredondamento do

tempo de serviço, previsto no parágrafo único do art. 101 da Lei nº

8.112/90, vigentes anteriormente a 08/04/92, data da publicação da

decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na medida cautelar

que suspendeu a eficácia do referido parágrafo (ADIn nº 609-6), eis

que tais concessões, efetuadas nos estritos termos da legislação

vigente até a referida data, são atos válidos e por isso

considerados legais para efeito de registro;

1.2. também não incide a Súmula nº 074 nem a nº 106 nas

aposentadorias com arredondamento do tempo de serviço deferidas

posteriormente a 08/04/92, porquanto inválidas dada a anterioridade

da suspensão da eficácia do referido parágrafo relativo ao

arredondamento, devendo, por isso, ser consideradas ilegais,

admitindo-se a possibilidade de o interessado optar entre retornar

à atividade ou manter-se aposentado com proventos proporcionais ao

tempo de serviço restante da exclusão do arredondamento impugnado,

e observado o requisito temporal mínimo previsto em lei;

2. não conhecer da proposição da 2ª SECEX, que objetiva

revisão da Súmula nº 106, por não ser matéria objeto desta

representação.

Indexação:

Súmula; Aposentadoria; Arredondamento de Tempo de Serviço; STF;

Medida Cautelar; Vigência; Inconstitucionalidade; Representação;