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4TRANSPORTE COLETIVO XTRANSPORTE INDIVIDUAL

4.1 Vantagens e desvantagens do transporte privado

As vantagens

O uso do carro particular é, em geral, muito mais cômodo do que otransporte coletivo. Os principais motivos do maior conforto do carro são osseguintes:l Total liberdade na escolha do horário de saída.l Total liberdade na escolha do percurso.l Viagem de porta a porta.l Em geral, menor tempo total de viagem, devido à maior velocidade, menorpercurso e menor distância de caminhada.l Viagem direta, sem necessidade de transbordo.l Possibilidade de transportar volumes médios de carga, como alimentos, roupas,eletrodomésticos, etc.l Possibilidade de fazer paradas intermediárias durante a viagem para realizaroutras atividades.l Não necessidade de espera pelo veículo de transporte.l Viagem realizada com total privacidade, pois o carro é quase uma casa móvel,onde se pode fazer muitas coisas estando o mesmo em movimento ou parado.l Grande conforto interior, proporcionando deslocamento com comodidade emcondições de chuva, neve, frio, vento, etc.l Sensação de importância ao viajante, pois o carro é considerado símbolo destatus social.

A motocicleta também reúne a maioria dessas vantagens, mas apresentaalguns inconvenientes: falta de segurança, inexistência de privacidade e descon-forto ou impossibilidade de uso em condições climáticas adversas: chuva, neve,frio e vento forte.

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Comparada à motocicleta, a bicicleta apresenta maior segurança emrazão da menor velocidade e, em muitas cidades, da utilização de vias e faixasexclusivas nas rotas de grande movimento. A necessidade de esforço físicopara a locomoção pode ser positiva ou negativa, dependendo da situação.As desvantagens

As principais desvantagens do transporte por carro particular para ousuário são as seguintes:l Necessidade de investimento na compra do veículo.l Maior custo dos deslocamentos, embora o desembolso direto seja apenas parte dototal (grosso modo entre 20% e 30%).l Necessidade do pagamento de estacionamentos e pedágios.l Risco de acidentes e roubos.l Necessidade de dirigir (ação extremamente desagradável em condições de trânsitointenso).

O maior problema do uso massivo do automóvel reside, no entanto, nasmuitas conseqüências negativas para a comunidade, que são as seguintes:l Congestionamentos que provocam aumento dos tempos de viagem, aumentodo número de acidentes, irritabilidade dos usuários, aumento dos custos dasviagens, aumento da contaminação atmosférica, degradação da via, prejuízo aotransporte público realizado junto com o trânsito geral, etc.l Poluição da atmosfera com substâncias tóxicas, prejudicando a saúde dos sereshumanos e de todas as outras formas de vida.l Necessidade de grandes investimentos de recursos públicos na expansão emanutenção da infra-estrutura viária e dos sistemas de controle do tráfego, emdetrimento de outros setores de maior relevância social, como saúde, habitação,educação, etc.l Ocorrência de um grande número de acidentes que causam perdas de vidas,lesões graves que impedem as pessoas de levar uma vida normal e um grandeônus financeiro para a sociedade com o tratamento dos feridos, perdas de diasde trabalho, perda de valor dos veículos envolvidos nos acidentes, etc.l Consumo desordenado de energia, com comprometimento do desenvol-vimento sustentável, pois a maioria da energia consumida no transporte é de-rivada do petróleo e, portanto, finita.l Desumanização da cidade � fenômeno associado aos seguintes fatos:descaracterização da estrutura física das cidades devido à grande área consumidapor vias expressas, obras viárias e estacionamentos; degradação da vizinhança

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próxima a grandes vias e obras viárias em decorrência da poluição visual,sonora e atmosférica; espalhamento exagerado das cidades, aumentando ostempos de viagem por todos os modos de transporte; deterioração e esvazia-mento das regiões centrais, onde tradicionalmente se concentravam as ativi-dades de comércio, serviços e lazer, e que eram centros de convivênciademocráticos em virtude do fácil acesso de todas as classes sociais (a área cen-tral é o lugar mais fácil de alcançar por transporte público, pois, em geral, asviagens são diretas e a somatória das distâncias percorridas partindo de todasas regiões da cidade é próxima do mínimo); mudanças nos relacionamentos hu-manos em virtude do isolamento das pessoas dentro dos carros; dificuldade delocomoção a pé devido às grandes distâncias entre as atividades e à necessidadede travessia de vias com grande movimento; etc.l Ineficiência da cidade, uma vez que é muito maior o custo da infra-estrutura(implantação e manutenção do sistema viário e da rede de serviços públicos) e dotransporte nas cidades onde predomina o uso do carro, devido ao grande númerode vias expressas e obras viárias (viadutos, pontes, trevos, túneis, etc.) e ao fatode as cidades tornarem-se espalhadas, reduzindo a �economia de aglomeração�.Dessa forma, nos núcleos urbanos onde é massivo o uso do carro, o custo-cidade aumenta, dificultando a sustentabilidade econômica � o que significaimpostos municipais mais altos, dificuldades no atendimento das necessidadesbásicas da população no tocante à expansão e manutenção da infra-estruturae dos serviços públicos e, também, maiores custos de deslocamento em razãodas maiores distâncias.4.2 Vantagens e desvantagens do transporte público

As vantagens

O transporte público coletivo urbano apresenta muitas característicaspositivas. As principais são as seguintes:l É o modo de transporte motorizado que apresenta segurança e comodidadecom o menor custo unitário � em razão disso, o modo motorizado de transportemais acessível à população de baixa renda.l Contribui para a democratização da mobilidade, pois muitas vezes é a únicaforma de locomoção para aqueles que não têm automóvel, não têm condiçõeseconômicas para usar o carro, não podem dirigir (idosos, crianças, adolescentes,doentes e deficientes), não querem dirigir, etc.l Constitui uma alternativa de transporte em substituição ao automóvel, parareduzir os impactos negativos do uso massivo do transporte individual: congestio-namentos, poluição, consumo desordenado de energia, acidentes de trânsito,desumanização do espaço urbano e perda de eficiência econômica das cidades.

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l Também como alternativa ao automóvel, diminui a necessidade de investi-mentos em ampliação do sistema viário, estacionamentos, sistemas de controledo tráfego, etc., permitindo maiores aportes de recursos em setores de maiorimportância social: saúde, habitação, educação, etc.l Proporciona uma ocupação mais racional (eficiente e humana) do solo nascidades.l Propicia, quase sempre, total segurança aos passageiros.

Para enfatizar a importância do transporte coletivo no combate aos con-gestionamentos e ao uso indiscriminado de energia automotiva, a seguir sãocitados alguns valores comparativos entre o transporte por automóvel e porônibus (o modo público mais utilizado).

Diversos estudos apontam que o consumo de espaço viário por passa-geiro transportado é de 10 a 25 vezes maior no transporte por carro emrelação ao ônibus, dependendo o valor do tamanho e da lotação dos coletivos,do cômputo ou não do espaço ocupado pelos carros para estacionar e dotempo que permanecem estacionados, etc.

Quanto à questão do estacionamento, estudos realizados mostram queno caso de um edifício de escritórios, se todas as pessoas que ali trabalhamutilizassem carros, seria necessário construir um outro edifício 20% maior paraatender à demanda por estacionamento.

A Figura 4.1 ilustra a excessiva ocupação do espaço viário nas viagenspor automóvel em relação ao transporte por ônibus e a pé.

No tocante ao consumo de energia por passageiro transportado,inúmeros estudos mostram que o consumo no transporte por carro é entre 5e 10 vezes maior que no transporte por ônibus, também dependendo o valordo tamanho e da lotação dos ônibus e das condições de operação.

Os resultados também são bastante favoráveis ao ônibus no que concer-ne à poluição atmosférica. A emissão de poluentes depende muito do tipo eda qualidade do combustível utilizado e da eficiência dos dispositivosveiculares antipoluentes. Alguns estudos, no entanto, apontam que a emissãode poluentes por passageito transportado é de 5 a 10 vezes maior nos carrosem relação aos ônibus.

No tocante à segurança no trânsito, o transporte por ônibus tambémganha do carro com grande vantagem.

O problema da poluição sonora, sério nos ônibus convencionais movidosa diesel, foi superado com o desenvolvimento tecnológico por meio doencapsulamento do motor e de outros aperfeiçoamentos.

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Carro A pé ÔnibusFigura 4.1 Visualização do espaço viário ocupado para transportar cerca de 70 pessoas

em diferentes modos de transporte urbano. Fonte: Vuchic (2000).

Sobre a questão da ocupação do espaço urbano pelo transporte, valereproduzir a opinião de dois especialistas americanos:l Camp Oakley: �A cidade que quiser resolver o problema da locomoção de seushabitantes com automóveis ampliará cada vez mais as áreas centrais de circulaçãoe estacionamento, até o extremo em que não existirão mais os edifícios; aí, deixaráde existir também a cidade� (Branco, 1981).l John Volpe (em 1975): �Fifty years ago we needed mass transit because most

americans cannot afford a car. Today we need it even more because mostamericans can afford a car�. Tradução livre: �Há 50 anos nós necessitávamosde transporte público em virtude de a maioria dos americanos não possuirautomóvel. Hoje nós precisamos ainda mais desse tipo de transporte, devido ao fatoda maioria dos americanos possuir automóvel� (UTRB, 1978).

As desvantagens

Os principais inconvenientes do transporte público para os usuários são:l Rigidez dos horários de passagem, que constitui um problema sério nas linhasde baixa freqüência.l Total falta de flexibilidade no percurso.l Necessidade de caminhar ou utilizar outro meio de transporte para completara viagem, a qual não é de porta a porta.l Desconforto de caminhadas e esperas em condições climáticas adversas: neve,chuva, frio, sol, calor excessivo, vento forte, etc.

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l Em geral, maior tempo de viagem, devido à menor velocidade média, maiorpercurso e maior distância de caminhada.l Necessidade de transbordo para uma parcela significativa de usuários.l Geralmente, impossibilidade de fazer paradas intermediárias durante a viagempara realizar alguma atividade.l Impossibilidade de transportar carga.l Necessidade de esperar o veículo de transporte.4.3 Mobilidade e distribuição modal nas cidades

A quantidade de viagens urbanas realizadas (índice de mobilidade) e adistribuição das viagens entre os vários modos de transporte (distribuição modal)dependem do nível de desenvolvimento sócio-econômico do país e da cidade, dotamanho e da topografia da cidade, do clima, da cultura, da existência ou não depolíticas de restrição ao uso do transporte individual, da disponibilidade, custoe qualidade do transporte público e semipúblico, da facilidade para locomoçãoa pé e de bicicleta, etc.

Em geral, quanto maior o desenvolvimento sócio-econômico do país eda cidade, maior o número de viagens realizadas (índice de mobilidade). Con-tudo, a expansão dos meios de comunicação (telefone, fax, internet, etc.)leva, em geral, a uma redução no número de deslocamentos, pois tornamdesnecessárias muitas viagens.

Nos Estados Unidos, considerado o país do automóvel, o carro é respon-sável por cerca de 85% das viagens urbanas. Nas cidades da Europa, essa por-centagem é menor: grosso modo, algo entre 30% e 60%, sobretudo por razõesculturais e históricas � quase todas as médias e grandes cidades da Europa têmsistema de transporte público sobre trilhos (metrô, pré-metrô e bonde) deexcelente qualidade, grandes espaços para pedestres nas regiões centrais (cal-çadões e praças), ciclovias e ciclofaixas para bicicletas e calçadas adequadas paraos pedestres.

Nas cidades dos países pobres, o transporte público (sobretudo ônibus emicroônibus) e semipúblico (peruas/vans e microônibus) são os modos maisusados: aproximadamente de 50% a 90% das viagens motorizadas.

Nos países muito pobres, as motocicletas e as bicicletas, em razão dosbaixos custos de aquisição e operação, têm grande participação no transporteurbano. Em muitas cidades dos países asiáticos e em Cuba, esses modos, em

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conjunto, chegam a ser responsáveis por cerca de 20% a 50% das viagensurbanas. A motocicleta, por apresentar muitas das vantagens do carro, tema preferência de muitas pessoas com menor poder aquisitivo em relação aotransporte público e semipúblico.

Alguns países desenvolvidos, como Holanda, Suécia, Dinamarca, Ale-manha, etc., têm grande tradição no uso da bicicleta como modo de trans-porte urbano. Em algumas de suas cidades, as viagens realizadas por bicicletachegam a 30% ou mais em relação ao total.

As viagens a pé, em muitas cidades de países não desenvolvidos, chegama ser superiores a 40% do total de viagens realizadas. Embora predominemdistâncias curtas nessas viagens, muitas pessoas pobres, por absoluta falta decondições para pagar pelo transporte, chegam a caminhar cerca de duas horaspara atingir os seus locais de trabalho.

Entre 50% e 60% do transporte urbano motorizado no Brasil é realizado portransporte público (95% por ônibus e os outros 5% por metrô e trem). A outraparte por veículos particulares (carros e motocicletas).

A preferência das pessoas é pelo modo de transporte mais confortável: ocarro. O transporte público ou semipúblico é utilizado quando ocorre uma oumais das seguintes situações: restrição econômica pessoal, impossibilidade dedirigir, existência de transporte público de boa qualidade, trânsito congestionado,dificuldade de estacionamento, custo elevado de acesso (pedágio) eestacionamento, restrições impostas pelo poder público ao uso do carro,conscientização da comunidade em relação aos problemas provocados pelo usomassivo do carro, etc.

A seguir são reproduzidos e comentados alguns valores sobre a distri-buição modal no transporte urbano de diversas cidades.

A Tabela 4.1 mostra o resultado da pesquisa realizada por GEIPOT(1981) em oito cidades brasileiras de porte médio típicas, bem como os valo-res médios associados.

Como era esperado, nas cidades econômica e socialmente mais desen-volvidas, o percentual de viagens motorizadas por carro é maior que nas cidadesmenos desenvolvidas, nas quais os modos ônibus e a pé são os mais utilizados.

Campinas, Bauru, Caxias do Sul e Ribeirão Preto, cidades mais ricas, sãoas que apresentaram maiores índices de utilização do carro. Caruaru, cidadepobre, é a que tem maior percentual de deslocamentos a pé � tão pobre quemesmo o percentual de viagens por ônibus é baixo.

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Tabela 4.1 Distribuição modal do transporte urbano em cidadesmédias brasileiras. Fonte: Geipor (1985).

Cidade Carro Ônibus A pé Táxi Outros

Campo Grande 20,6 30,8 43,8 2,4 2,4

Caruaru 13,9 9,1 73,9 1,3 1,8

Juiz de Foraa 32,0 64,0 – 2,0 2,0

Ribeirão Preto 27,3 28,0 34,6 0,2 9,8

Campinas 34,7 36,2 26,8 0,7 1,6

Bauru 31,5 22,7 42,6 0,5 2,6

Pelotas 21,2 35,7 33,9 1,2 8,0

Caxias do Sul 29,8 26,5 41,6 0,7 1,4

Média 25,6 27,0 42,5 1,0 3,9

(a) Não incluída na média por não conter a parcela relativa ao modo a pé.

Na Tabela 4.2 são reproduzidos dados da distribuição modal no transporteurbano em algumas cidades do mundo, transcritos de Vasconcellos (1996).

Tabela 4.2 Distribuição modal do transporte motorizado em algumascidades do mundo. Fonte: Vasconcellos (1996).

Cidade Ônibusa Tremb Carro Táxi Outros

Bogotá 80 – 14 1 5

Bombaim 47 34 8 10 –

Buenos Aires 50 10 24 1 15

Jakarta 56 – 23 1 20d

Karachi 70 6 3 7 13

Manila 75 – 16 2 8

Rio de Janeiro 64 11 24 2 –

San José 75 – 21 2 2

Santiago 60 8 20 3 9

São Paulo 43 12 43c – 2

Seul 50 13 18 17 2

(a) Ônibus e lotações, (b) metrô e trem suburbano, (c) inclui táxi, (d) motocicleta e motonetas.

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Os valores relativos a ônibus na Tabela 4.2 referem-se ao total dos modosônibus regulamentado e lotação (microônibus e perua/van fazendo transportedesregulamentado). Em São Paulo e no Rio de Janeiro, a participação daslotações no total de viagens é pequeno, mas nas outras cidades citadas é o modopreponderante.

Outros dados citados por Vasconcellos (1996) sobre a distribuição modalem diferentes países e cidades são mencionados a seguir.

O uso de bicicleta de duas e três rodas no transporte urbano é bastanteintenso nos países asiáticos e em Cuba. Pesquisas realizadas em cinco cidades daÍndia apontam o transporte por bicicleta como responsável por valores entre12,8% e 53,6% do total de viagens urbanas. Em Nova Délhi, é responsável por17,3%. Também é grande o uso de motocicletas e similares nas cidades dospaíses pobres. Nas cidades de Jakarta, Bancoc, Manila e Kuala Lumpur sãoresponsáveis por cerca de 20% das viagens urbanas.

Síntese sobre a distribuição modal: nos países ricos é grande o uso do auto-móvel no transporte urbano de passageiros; nos países pobres é maior a par-ticipação do transporte coletivo por ônibus, microônibus e lotação; percursosmaiores a pé e uso intenso de bicicletas são mais comuns nas cidades dos paísespobres e em alguns países do norte da Europa, onde o uso da bicicleta faz parteda cultura nacional.4.4 Ações empregadas para reduzir o uso do carro

Em razão dos graves problemas provocados pelo uso massivo do carro,muitas cidades de maior porte têm implementado medidas para diminuir ouso de veículos particulares nas viagens urbanas, forçando uma distribuiçãomodal mais balanceada e, assim, reduzindo o número de veículos-quilômetropercorrido (VKP).

Algumas dessas ações são:l Melhoria do transporte público coletivo, sobretudo com a implantação delinhas de metrô, pré-metrô ou ônibus com tecnologia diferenciada.l Implementação de serviços de transporte público de qualidade superior porônibus, microônibus ou vans, nos quais os passageiros viajam sentados e asviagens são mais rápidas, pois são expressas (diretas) ou semi-expressas.l Subsídio à tarifa para tornar a passagem por transporte público mais barata.l Implementação de medidas que proporcionam prioridade ao transporte públicocoletivo nas vias, com o objetivo de diminuir o tempo de viagem por esse modode transporte, visando melhorar a qualidade e reduzir o preço, pois com a maior

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velocidade a frota necessária resulta menor. As principais ações nesse sentidosão: faixas segregadas ou exclusivas e preferência nos semáforos.l Proibição da circulação de parte da frota de carros nas horas de pico ou durantetodo o período em alguns dias da semana, com o controle realizado com base nodígito final da placa do veículo. Esse sistema é conhecido como rodízio de veículose vem sendo utilizado em muita cidades grandes: São Paulo, Brasil, Bogotá,Colombia, Santiago, Chile, Cidade do México, México, etc.l Tarifação viária, por intermédio da cobrança de pedágio para os veículos queingressam na região central, como, por exemplo, em Cingapura, Cingapura(desde 1975), Oslo, Noruega, Seul, Coréia do Sul, e Londres, Inglaterra. EmLondres, o controle é feito por câmaras de televisão e um sistema informatizadoque faz a leitura das placas dos veículos com base nas fitas e confronta com asplacas dos veículos que pagaram o pedágio (as formas de pagamento são várias:pela internet, por telefone, em agência bancária, pelo correio, etc., e podem serfeitas posteriormente até um prazo-limite, quando então é cobrada uma pesadamulta). Outra forma de cobrança é utilizada em Cingapura, usando sensoresnas vias de acesso à região central e cartões inteligentes (dotados de chips)recarregáveis nos veículos. Por meio de ondas eletromagnéticas, o chip docartão é identificado pelo sensor e o total de crédito de viagens armazenadosé reduzido de uma unidade. Evidentemente, os proprietários devem recarregaros cartões previamente.l Proibição do acesso de automóveis a algumas áreas comerciais localizadas naregião central das cidades.l Incentivo à integração automóvel-transporte público, criando áreas de estacio-namento com preço reduzido ou gratuito junto a estações e terminais detransporte público, qualquer que seja o modo.l Incentivo ao uso compartilhado do automóvel (carona programada ou carpool).l Incentivo ao transporte fretado de trabalhadores e escolares por meio de perua/van, microônibus ou ônibus.l Incentivo ao transporte a pé e por bicicleta, por intermédio das seguintesmedidas: adequação de calçadas, implantação de semáforos para pedestres,construção de passarelas para pedestres na travessia de vias muito largas comgrande movimento, implantação de ciclovias (vias separadas) ou ciclofaixas(faixas exclusivas nas ruas) para bicicletas, construção de estacionamentos parabicicletas junto aos principais pólos de atração de demanda e às estações detransporte público, etc.l Criação de grandes áreas comerciais e de prestação de serviços bem atendidaspor transporte público e com acesso restrito a pedestres e ciclistas, etc.l Proibição de estacionamento em vias com grande movimento, exigindo que osusuários utilizem estacionamentos privados pagos.

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l Aumento do preço dos estacionamentos nas vias públicas centrais.l Conscientização da população acerca da importância para a comunidade deusar menos o carro e mais o transporte público ou semipúblico e a bicicleta,sobretudo nas viagens por motivo de trabalho e estudo.

No âmbito do urbanismo, um estratégia importante para reduzir aquantidade de viagens e a distância percorrida nas cidades e, portanto, o númerode veículos-quilômetro percorrido (VKP) é o rearranjo na ocupação e no usodo solo. Nesse sentido podem ser citadas as seguintes ações:l Incentivo ao desenvolvimento de subcentros comerciais e de serviços nos bairros,favorecendo a polinuclearização da cidade e a descentralização das atividades.l Estímulo à implantação de indústrias e centros de distribuição de produtospróximos a núcleos habitacionais, a fim de reduzir a distância de viagem dostrabalhadores desses setores da atividade econômica.

Essas ações urbanísticas visam substituir a mobilidade pela acessibilidade,pois, na maioria das vezes, o desejo das pessoas não é viajar, mas chegar aos locaisonde desenvolvem as atividades de trabalho, estudo, compras, lazer, etc.

Duas ações em nível de gestão urbana contribuem para melhorar otrânsito nos períodos de maior movimento. A primeira é o reescalonamentodos horários de funcionamento das empresas conforme a categoria: bancos,escolas, comércio, firmas prestadoras de serviços, etc. O reescalonamento visaatenuar os picos de tráfego, pela melhor distribuição das viagens no tempo,evitando a superposição das mesmas. A segunda é a transferência do abasteci-mento feito por caminhões para o período noturno.

Outra ação que contribui para reduzir o número de viagens é o incentivoà aquisição e ao uso do sistema de telecomunicações. Diversos estudosapontam que o número de viagens per capita diminui quando o acesso asistemas de telecomunicações aumenta.

O transporte é, em geral, uma atividade para atingir outros fins, razãopela qual o melhor é que não necessite ser realizado. Quando necessário, deveapresentar baixa impedância, isto é, rapidez, conforto, pequena distância decaminhada, baixo risco, etc. No extremo, pode-se dizer que o transporte commaior comodidade é aquele que não necessita ser realizado � o que correspondeà filosofia do �não-transporte�.4.5 Uso racional do carro

À medida que um país experimenta um maior desenvolvimento sócio-econômico, é inevitável que ocorra um aumento do índice de motorização

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(número de veículos por habitante), pois a posse do veículo (carro ou moto)constitui uma comodidade da qual poucas pessoas abdicam. A título de ilus-tração, a Tabela 4.3 mostra os índices de motorização de alguns países.

Tabela 4.3 Índices de motorização. Fonte: Vuchic (2000).

País Veículos por mil hab

Cuba, Índia e outros países pobres < 100

Brasil e Grécia 100-200

Portugal 200-300

Dinamarca, Japão, Espanha, Holanda, Noruega e Finlândia 300-400

Bélgica, Inglaterra, Áustria, França, Suécia e Austrália 400-500

Itália e Estados Unidos > 500

O fato de as pessoas possuírem automóvel não significa, contudo, que outilizam de maneira intensa. O índice de utilização expresso pela quilometragemmédia anual percorrida por veículo depende de outros fatores: nível de renda,qualidade e preço do transporte público e semipúblico, restrições ao uso doautomóvel e conscientização da população sobre a importância para a comu-nidade de usar menos o carro e mais o transporte público, semipúblico e a bici-cleta, sobretudo nas viagens por motivo de trabalho e estudo. Para ilustrar ofato, a Tabela 4.4 mostra a quilometragem média anual dos veículos em algunspaíses.

Tabela 4.4 Índices de utilização do carro. Fonte: Vuchic (2000).

País Quilometragem anual por veículo

Cuba, Índia e outros países pobres < 6000

Portugal 6.000-7.000

Bélgica e Brasil 7.000-8.000

Áustria, Itália e Holanda 8.000-9.000

Finlândia, Alemanha, Noruega e Suíça 9.000-10.000

Suécia, França, Dinamarca e Inglaterra 10.000-11.000

Estados Unidos 17.000-18.000

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Como reduzir o uso do carro, sobretudo nos horários de pico, é impor-tante para a qualidade de vida da população e a eficiência da cidade, muitasdas grandes cidades do mundo têm investido na melhoria do transportecoletivo, do transporte a pé e por bicicleta e aplicado medidas para reduzir ouso do carro particular (proibição de transitar nos horários de pico ou mesmodurante todo o dia na forma de rodízio, cobrança de pedágio para acesso àregião central, etc.), implantado estacionamentos para carros e bicicletasjunto a estações e terminais de transporte público, etc.

Para mostrar o sucesso dessas ações em muitos países, a Tabela 4.5apresenta a porcentagem de viagens urbanas realizadas por carro em algunsdeles. Como se pode observar, em muitos dos países desenvolvidos da Europa,ainda que o índice de motorização seja alto, o uso do carro no transporteurbano é consideravelmente menor em relação aos Estados Unidos.

Tabela 4.5 Repartição modal no transporte urbano. Fonte: Vuchic (2000).

País % das viagens por carro

Cuba, Índia e outros países pobres < 30

Suécia, Suíça e Áustria 30-40

Alemanha, Itália, Dinamarca, Holanda, França e Brasil 40-50

Inglaterra 60-70

Canadá 70-80

Estados Unidos 80-90

4.6 Considerações finaisComo as cidades devem ser voltadas para o homem, o sistema de trans-

porte urbano deve valorizar os modos que permitem o contato com outraspessoas e com a natureza. Nesse sentido, é preciso priorizar os modos públicose o trânsito de pedestres e bicicletas, sem impedir o uso racional do carro, poisa excessiva supressão do tráfego de automóveis prejudica a alta mobilidadepessoal oferecida por esse modo, com as suas inúmeras contribuições às ativi-dades comerciais, sociais, culturais e recreativas. Por oferecer grande mobili-dade, o carro multiplica as oportunidades de moradia, emprego, estudo, etc.

Assim, o caminho para um transporte urbano adequado está em um sis-tema balanceado � sistema multimodal integrado (sistema intermodal) � com

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os diversos modos utilizados de maneira racional. Um transporte urbano ba-lanceado confere às cidades um caráter humano, ao contrário das cidadesonde prepondera o uso do carro. Um transporte balanceado é conseguido comincentivo ao uso dos transportes público e semipúblico, da bicicleta e domodo a pé, associado a restrições e/ou desincentivo ao uso do carro.4.7 Questões

1. Quais as vantagens e as desvantagens do uso do carro, considerando as pessoasindividualmente? E considerando a comunidade?2. Idem em relação ao transporte público coletivo.3. A motocicleta e a bicicleta apresentam as mesmas vantagens e desvantagens docarro?4. Citar valores mostrando o melhor desempenho do transporte por ônibus con-vencional em comparação ao carro.5. Considerando apenas o transporte motorizado e agrupando carro e táxi, como sedistribuem as viagens nas cidades relacionadas na Tabela 4.1? Desconsiderar osvalores referentes ao item �Outros�.6. Considerar que a coluna �Outros� da Tabela 4.2 refere-se a motocicletas,bicicletas e similares. Calcular o percentual de viagens pelos modos privado epúblico (inclua táxi como modo público) e comentar os resultados obtidos.7. Quais as principais ações empregadas para reduzir o número de viagens urbanaspor carro nas cidades?8. Que ações em nível de gestão urbana contribuem para reduzir o fluxo de veículosnos horários de pico? Comentar.9. Comentar a relação: aumento da utilização de sistemas de telecomunicação xquantidade de viagens diárias per capita.

10. No âmbito do urbanismo, que ações podem ser empregadas para reduzir onúmero de veículos-quilômetro percorrido (VKP) nas cidades?11. Comentar a afirmação: o melhor transporte é aquele que não necessita serrealizado.12. Comentar a relação entre o índice de motorização e a renda per capita de umpaís/cidade.13. Muitas cidades com renda per capita semelhante apresentam repartiçõesmodais no transporte urbano bastante diferentes. A que fatos isso pode seratribuído?14. Qual o caminho para um transporte urbano adequado?