trabalho sociologia politica primeiro bimestre

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  • UniversidadeFederalRuraldoRiodeJaneiroProgramadePsGraduaodeCinciasSociaisemDesenvolvimento,

    AgriculturaeSociedade

    Disciplina:SociologiaPoltica

    A ao coletiva em diferentes perspectivas analticas

    Fabricio Tel

    1. Introduo

    Este trabalho tem por objetivo discutir os diferentes caminhos possveis para se

    analisar a ao coletiva, construdos ao longo do desenvolvimento das cincias sociais,

    especialmente na Europa e nos Estados Unidos. Busca-se identificar os conceitos

    utilizados por cada corrente de pensamento, a maneira como se concebe a ao coletiva

    e como so tratadas as possibilidades de ao para o sujeito poltico.

    Nesse contexto, este trabalho est baseado na anlise de trs paradigmas

    diferentes: o primeiro deles o pensamento marxista, cujo conceito principal o de

    classe social e sobre o qual trata o segundo item; o segundo paradigma a teoria dos

    novos movimentos sociais, que prope o estudo da ao coletiva no mais a partir da

    classe social, mas a partir da identidade coletiva, conforme tratar o terceiro item do

    trabalho. At aqui o centro das discusses estava localizado na Europa. Contudo,

    durante as dcadas de 1960 e 1970, surge no Estados Unidos um grupo de cientistas

    sociais que mudou o foco do debate e apresentou uma proposta nova para o estudo da

    ao coletiva, como ser visto no ltimo item deste trabalho.

    2. O pensamento marxista, o sujeito poltico e as possibilidades de ao

    coletiva

    O marxismo uma corrente de pensamento que foi capaz de influenciar tanto

    estudos sociolgicos, filosficos, econmicos e polticos, quanto foi capaz de servir de

    base para a prpria ao poltica de atores sociais como sindicatos e partidos polticos.

    Tanto assim, que esse paradigma considerado por alguns estudiosos da sociologia

  • poltica o modelo clssico dos estudo dos movimentos sociais e da ao coletiva

    (ALEXANDER, 1998). Nesta seo do trabalho analisam-se, inicialmente, as

    contribuies de Marx e Gramsci, como os principais tericos do conceito de classe

    social, e posteriormente discutem-se as tentativas de atualizao deste conceito

    propostas por Thompson e Eder.

    2.1 As classes sociais em Marx

    De acordo com Karl Marx, a ao coletiva era entendida como a ao

    direcionada revoluo, ou seja, promoo de uma mudana radical na estrutura da

    sociedade em que o proletariado, enquanto classe social desprovida dos meios de

    produo, tomaria o poder da burguesia e implantaria a ditadura do proletariado, em que

    todos os bens e capitais seriam distribudos igualmente a fim de construir uma

    sociedade sem classes, que seria a sociedade comunista (MARX, 1948/1998).

    Para construir esse argumento, o autor parte do pressuposto de que as classes

    sociais se estabelecem a partir do lugar que ocupam no contexto da produo: os

    detentores do capital necessrio para produzir constituiriam a classe dominante

    (burguesia) e os que possuam to somente a fora de trabalho seriam a classe dominada

    e a luta de classes se desenvolveria a partir disso. Essa forma de conceber as classes

    sociais rendeu a Marx a principal crtica sua teoria, qual seja a do determinismo

    econmico, que impedia o indivduo de desenvolver qualquer ao para alm daquelas

    determinadas pela estrutura econmica em que se encontrasse.

    Analisando-se, porm, a obra O 18 Brumrio de Luis Bonaparte (MARX,

    1852/1982)1, percebe-se certa ambiguidade na forma de teorizar sobre a ao das

    classes sociais, pois nesse texto, a ao dos sujeitos no totalmente determinada pela

    estrutura tal como em outras obras do autor, mas conforme as escolhas dos mesmos

    diante das diferentes possibilidades, especialmente no que se refere ao da burguesia

    em relao ao Estado, visto que, em um dado momento ela decidiu que a busca pelo

    poder do Estado j no era mais a melhor estratgia. Essa constatao, portanto, vai

    1 Essetexto(MARX,1852/1982)constituiumaanlisedeconjunturaarespeitodolevantedooperariadoocorridoemdiversospasesdaEuropaem1848,tambmchamadodeprimaveradospovos.Estetrabalhoestfundamentalmentebaseadonestaobra.

  • contra a teoria determinista de Marx que concebe o Estado unicamente como um

    aparelho atravs do qual a burguesia exerce o domnio sobre a sociedade (MARX,

    1848/1982).

    Para alm dessa complexificao, nessa mesma obra o autor insere na discusso

    o papel de outras classes sociais, alm das bsicas burguesia e proletariado, como o

    campesinato, o lumpem-proletariado e a pequena-burguesia, ou seja, a sociedade no

    to simplesmente dividida em duas classes sociais antagnicas. H a formao de outras

    coletividades e agrupamentos que interferem no comportamento social e poltico uns

    dos outros.

    A viso de Marx sobre o campesinato, tal como a questo do determinismo

    econmico, foi e motivo de muitas crticas, uma vez que, para o autor, o campesinato

    estaria fadado ao desaparecimento em funo do avano do capitalismo no campo o

    qual iria, necessariamente, transformar os camponeses em proletrios.2 Esse pressuposto

    levava a uma perspectiva pessimista em relao ao coletiva do campesinato,

    enquanto classe social, a ponto de esta classe ser considerada pelo autor como um

    amontoado de pessoas sem organizao, tal como um saco cheio de batatas, que remete

    a uma massa amorfa, sem participao poltica.

    Tambm em O 18 Brumrio de Luis Bonaparte (MARX, 1852/1982), essa

    questo complexificada, pois neste texto, o autor considera a existncia de

    camponeses conservadores e revolucionrios, deixando claro que a dinastia de

    Bonaparte representava, no o campons revolucionrio, aquele que lutava para fugir de

    sua condio social, a pequena propriedade3, mas o campons conservador, que

    objetivava manter-se na propriedade. Ainda assim, porm, os camponeses considerados

    revolucionrios no teriam capacidade suficiente para agir politicamente com

    autonomia. Eles deveriam ser liderados pelo proletariado, que seria seu dirigente

    natural, cuja tarefa era derrubar o regime burgus.

    2 Esseprocesso, de fato, ocorreu comboa parte docampesinato emgrandeparte domundo,pormnocomtodoocampesinato,noemtodososlugares.Apesardoavanodocapitalismo,aproduoagrcolafamiliarconseguiusereproduzir,integrandose,maloubem,dinmicaprodutivacolocadaporestenovomododeproduo.

    3 ParaMarx,ocamponsrevolucionrioera,emltimainstnciaaquelequelutavaparadeixardesercampons,ouseja,quesejuntavaaoproletariado,poisesseseriaobrigatoriamente,emfunodoavanodocapitalismonocampo,oseudestinofinal.

  • Nessa mesma anlise a respeito do campesinato, o autor aproveita para deixar

    mais claro o seu entendimento sobre classe social:

    Na medida em que milhes de famlias vivem em condies econmicas de existncia que as separam pelo seu modo de viver, pelos seus interesses e pela sua cultura dos das outras classes e os ope a estas de modo hostil, aquelas formam uma classe. Na medida em que subsiste entre os camponeses detentores de parcela uma conexo apenas local e a identidade dos seus interesses no gera entre eles nenhuma comunidade, nenhum unio nacional e nenhuma organizao poltica, no formam uma classe (MARX, 1852/1982, p. 503).

    Os critrios de definio de uma classe social, portanto, no so apenas

    estritamente econmicos. Marx leva em considerao a questo da coeso e da

    capacidade das pessoas de, ao identificar interesses em comum em oposio a interesses

    de outras pessoas ou grupos, organizarem-se de modo a lutar para que esses interesses

    coletivos sejam alcanados.

    Em relao ao lumpem-proletariado a viso de Marx era ainda mais pessimista.

    Considerava-o como a escria da sociedade., os vagabundos, aqueles que no trabalham

    e no se esforam para faz-lo. O desprezo do autor a essa classe talvez possa ser

    explicado pelo fato de que ele considerava que o lumpem atrapalhava a ao poltica do

    proletariado, uma vez que sustentava o poder de Luis Bonaparte, que lhes dava abrigo

    na Sociedade 10 de Dezembro4. Era, portanto, um grupo sem articulao poltica, mas

    utilizado politicamente por outrem.

    Essa anlise de conjuntura feita por Marx (1852/1982) nos impede de

    reduzirmos a dinmica poltica disputa por interesses, porque evidencia logo no incio

    do texto a fora da influncia da tradio nas aes dos sujeitos polticos: A tradio de

    todas as geraes mortas pesa sobre o crebro dos vivos como um pesadelo

    (1852/1982, p. 417), ou seja, quando as pessoas pensam estar fazendo algo novo, na

    verdade esto copiando algo j feito por outras pessoas no passado. Nesse sentido, no

    haveria possibilidade de inovao em termos de ao poltica, uma vez que o sujeito

    estaria condicionado a agir de acordo com as circunstncias estabelecidas pela estrutura,

    ou seja, a partir da posio de classe.

    4 DataemqueLuisBonaparteforaeleitopresidentedaFranaem1851.

  • Ao mesmo tempo, porm, o texto nos possibilita pensar a classe em movimento,

    isto , como ela se constitui e se comporta a partir de contextos concretos, tal como se

    percebe na anlise feita pelo autor a respeito das disputas por interesses entre orleanistas

    e legitimistas no interior da classe burguesa. Os primeiros defendiam os interesses do

    capital industrial urbano, ao passo que os ltimos representam os latifundirios5, cujos

    objetivos polticos e econmicos eram distintos. Assim, se toda a ao coletiva fosse

    determinada pela posio de classe, no haveria sentido a existncia dessas disputas. Da

    mesma forma, se assim o fosse, o proletariado deveria ter se organizado e lutado contra

    a burguesia, fato que Marx procura identificar porque no aconteceu, uma vez que os

    proletrios no estavam atuando, de fato, naquele contexto.

    Nesta obra est muito presente a permanente tenso entre agncia e estrutura, tal

    como se identifica no seguinte trecho: Os homens fazem sua prpria histria, mas no

    a fazem segundo sua prpria vontade, em circunstncias escolhidas por eles prprios,

    mas nas circunstncias imediatamente encontradas, dadas e transmitidas (MARX,

    1852/1982, p. 417). Em outras palavras, isto significa que o sujeito poltico tem

    possibilidade de agncia, pois ele que faz sua prpria histria, porm o leque de

    opes de ao limitado pela estrutura.

    Por fim, destarte este tensionamento constante entre possibilidade de ao

    inovadora consciente e determinao da ao pela estrutura, pode-se dizer que o cerne

    do pensamento marxista, no que se refere ao coletiva, est centrado no conceito de

    classe social, ou seja, a partir dela (portanto, coletivamente) que, de modo autnomo

    ou no, os sujeitos se organizam e atuam politicamente, sendo suas aes orientadas

    majoritariamente pelas determinaes da materialidade estrutural-econmica.

    2.2 A ao poltica em Gramsci

    Antnio Gramsci foi um dos tericos marxistas que mais se destacaram dentro

    dessa corrente de pensamento. Seu principal objetivo foi enfatizar a possibilidade de

    ao poltica por parte das classes sociais, de modo a superar o determinismo

    econmico que caracterizava o marxismo. Para tanto, argumentava que a dominao de

    5 Entendidoscomoumafraodaclasseburguesa.

  • uma classe sobre outra no se dava apenas atravs da relao capital-trabalho, mas

    tambm atravs da hegemonia, ou seja, pela imposio de uma viso de mundo.

    Desse modo, o autor procura entender como se d o processo de difuso do

    modo de pensar (ideologia6) da burguesia ao proletariado e como este toma para si essa

    nova forma de conceber o mundo como se fosse sua, sendo que, na verdade, ela foi

    imposta de cima para baixo. Em ltima instncia, o objetivo entender as contradies

    entre o pensar e o agir que as pessoas vivenciam no cotidiano, uma vez que isso que

    lhes coloca em uma situao de subalternidade7. O que lhe motivou a realizar esta

    reflexo foi o fato de o fascismo italiano ter conseguido se tornar hegemnico junto ao

    operariado daquele pas, visto que no foi a partir de um golpe de Estado que o fascismo

    conseguiu triunfar, mas atravs da construo da hegemonia. Como se deu esse

    processo era o que Gramsci queria entender.

    Para construir seu argumento, Gramsci parte da ideia de que a filosofia no

    algo restrito aos intelectuais, ao contrrio, ela estaria na linguagem, no senso comum, na

    religio, portanto todos seriam filsofos, ainda que inconscientemente, ou seja, sua

    inteno era destacar que a habilidade do pensamento e da reflexo no era um

    privilgio da classe hegemnica. Os grupos subalternos tambm teriam essa capacidade.

    Com isso, queria dizer que a forma como as pessoas pensam, refletem e concebem o

    mundo um fato poltico, isto , no se poderia separar a filosofia da poltica.

    O autor, porm, na sequncia do texto (GRAMSCI, 2001), diferencia filosofia de

    senso comum, dando primeira uma conotao de pensamento crtico e autnomo, e ao

    segundo uma conotao de pensamento genrico, difuso, disperso, como que acrtico e

    desprovido de reflexo8. A superao do senso comum seria possvel, ento, a partir da

    filosofia da prxis, ou seja, quando as pessoas passassem a pensar de forma crtica: (...)

    6 AideologiaparaGramsci(2001)osignificadomaisaltodeumaconcepodemundo(), se manifesta implicitamente na arte, no direito, na atividade econmica, em todas asmanifestaesdavidaindividuaisecoletivas(2001,pp.989).Esteconceitonotocentralnateoriagramsciana,talcomoonateoriadeMarx.AcentralidadedopensamentodeGramsciestnoconceitodehegemonia.7 Interessanteanalisarqueopensamentogramscianoconsideraasclassesemmovimento,porissoascaracteriza,namaioriadasvezes,enquantorelaoenotantocomoalgoemsi,ouseja,aoinvsdefalardasclassessubstantivadas(burguesia,proletariado),eleconcentrasuaanlisenacondioemqueseencontram(hegemonia,subalternidade)(MEDEIROS,1992).8 Nemtodosessestermosforamutilizadospeloautor.Estosendoutilizadosnestenumatentativa de externalizar de maneira mais clara a interpretao feita a partir da leitura deGramsci(2001).

  • no se trata de introduzir ex-novo uma cincia na vida individual de 'todos' , mas de

    inovar e tornar 'crtica' uma atividade j existente (GRAMSCI, 2001, p. 101). Por isso

    que o autor deixou claro no incio que a habilidade do pensamento no era um privilgio

    dos hegemnicos.

    Compreendendo o estabelecimento desta filosofia da prxis como um

    condicionamento fundamental para o processo revolucionrio, o autor chama ateno,

    ento, ao papel do intelectual orgnico para o processo de aguar as pessoas

    compreenso crtica de si mesmas e do mundo, ou seja, percepo de que o modo

    como esto concebendo o mundo um modo de pensar imposto pelas classes

    hegemnicas e no o seu prprio.

    O intelectual orgnico central para a compreenso da proposta gramsciana.

    No se trata do intelectual ligado institucionalizao da educao formal, ou do

    contexto acadmico, mas daquela pessoa oriunda das prprias classes subalternas e que

    foi capaz de pensar um pouco mais criticamente sobre o seu mundo. Ele no

    necessariamente precisa ter passado pela escolarizao, visto que a questo no o

    saber formal, mas a concepo de mundo. Alm isso, o intelectual orgnico que

    Gramsci prope no um indivduo apenas, mas uma coletividade de pessoas. So as

    pessoas que constituiro a liderana do processo revolucionrio. Para isso, tero que

    ajudar as pessoas que ainda no adquiriram a viso critica do mundo, a faz-lo.

    O que est em jogo nisso tudo a luta pela construo da hegemonia por parte

    das classes subalternas. Nesse sentido, Gramsci chama ateno para o papel do partido.

    Seria atravs dele que se daria esse processo de elaborao de novas intelectualidades

    integrais e totalitrias e de unificao da teoria (intelectualidade orgnica) com a

    prtica (massas) (GRAMSCI, 2001). Interessante destacar ainda que a proposta

    gramsciana que esse processo se d sempre de maneira coletiva, ou seja, sua nfase

    est na construo de uma vontade coletiva a fim de chegar Revoluo e, nesse

    contexto, ao partido caberia a funo de cristalizador e difusor dessa vontade.

    Todo este conjunto de aes polticas, tratadas at o momento, teriam seu lugar

    na Sociedade Civil. Nela que deveria se dar a construo da hegemonia (das classes

    subalternas) a partir da ao do partido. A Igreja, a imprensa e outras formas de

    organizaes e entidades tambm eram, para Gramsci, consideradas partidos e, portanto,

  • tambm fariam parte da Sociedade Civil. Este conceito era compreendido de maneira

    diferente por Gramsci em relao a Marx, que o colocava como sendo parte da

    estrutura, ou seja, do mundo do trabalho e das relaes materiais. A perspectiva

    gramsciana, por sua vez, considera que a Sociedade Civil est na superestrutura, isto ,

    no plano ideolgico, cultural, intelectual.

    Nesse contexto, as escolas e o Estado tambm estariam inseridos nessa arena de

    disputas pela construo da hegemonia. A escola seria um dos principais espaos de

    consolidao e difuso de valores e onde se estabelecem as bases do senso comum nas

    pessoas e o Estado atuaria como educador no sentido da construo de uma

    determinada concepo de mundo. Um de seus principais instrumentos seria o uso do

    direito, de modo que quem no se ajusta s leis, reprimido pelos diversos aparelhos

    estatais e assim vai se consolidando a hegemonia das classes dominantes (GRAMSCI,

    2002).

    Em suma, a principal contribuio terica de Gramsci foi o desenvolvimento do

    conceito de hegemonia, que possibilitou pensar a luta de classes a partir de uma

    perspectiva no mais apenas econmica, mas tambm no plano dos valores e da viso

    de mundo. Em Gramsci, as classes sociais parecem ter mais possibilidade de ao

    poltica, ou seja, sua ao coletiva, apesar de ser fortemente influenciada pela estrutura,

    no determinada por ela. O caminho da Revoluo passaria, ento, pela tomada de

    conscincia crtica por parte das classes subalternas, para deixarem de ser dominadas e

    passarem a disputar a construo da hegemonia na Sociedade Civil.

    2.3 A formao das classes sociais em Thompson

    Edward Thompson foi um historiador ingls do sculo XX que contribuiu

    significativamente para o debate a respeito das classes sociais. Sua obra est baseada no

    objetivo de compreender como se deu o processo de formao da classe operria inglesa

    desde antes da Revoluo Industrial. Para ele, o conceito de classe no poderia ser

    entendido como uma categoria prvia, estrutural e universal, tal como o era no

    pensamento marxista tradicional, mas como um fenmeno histrico que pode ser

    demonstrado nas relaes humanas (THOMPSON, 1987).

  • Com vistas a compreender melhor o pensamento do autor, destacou-se um trecho

    de sua obra, que sintetiza grande parte de sua teoria e sobre o qual ser desenvolvido o

    raciocnio neste item do trabalho:

    A classe acontece quando alguns homens, como resultado de experincias comuns (herdadas ou partilhadas), sentem e articulam a identidade de seus interesses entre si, e contra outros homens cujos interesses diferem (e geralmente se opem) dos seus (THOMPSON, 1987, p. 10).

    A primeira ideia que se apresenta no trecho a de que a classe um

    acontecimento que se situa no tempo. Ela no uma estrutura permanente que existe

    independente da ao das pessoas. Nesse sentido, as classes poderiam ou no existir.

    Elas seriam construes sociais em processo, ou seja, as classes no so estticas, mas

    esto em um constante fazer-se: so definidas pelos homens ao viverem sua prpria

    histria (THOMPSON, 1979, p. 34), de modo que s existe classe, porque as pessoas

    se comportam repetidamente de modo classista.9

    O segundo ponto, ligado ao primeiro, que a classe resultado de experincias,

    uma vez que a partir delas que os indivduos formulam sua viso de mundo. Para o

    autor, no bastava falar em explorao. H que se compreender como ela

    experienciada pelos indivduos, ou seja, de forma semelhante a Gramsci, a subjetividade

    dos sujeito poltico ganha importncia fundamental para a compreenso da ao

    coletiva. Alm disso, a noo de experincia est estritamente ligada cultura e

    conscincia de classe, que, de acordo com o pensamento thompsoniano, se manifesta

    nas tradies, nos sistemas de valores, ideias e formas institucionais (THOMPSON,

    1987, p. 10).

    Por fim, o terceiro elemento que se destaca no trecho a dimenso relacional,

    isto , uma classe existe em uma relao, que, na maioria das vezes de oposio a

    outra. E isto s possvel quando as pessoas identificam e articulam interesses em

    comum e passam a se identificar umas com as outras como pertencentes a um grupo

    social que possui caractersticas e objetivos iguais ou semelhantes.10 Geralmente, o que

    9 Nesse caso, o autor est assumindoexplicitamente sua simpatia ao empirismo e aohistoricismocomoperspectivasanalticasmaisadequadasaoestudodasclassessociais.

    10 Nocontextodaformaodaclasseoperriainglesa,esseprocessoteriaocorridoentre1780a1832,quandoostrabalhadoresinglesespassaramasentirumaidentidadedeinteresses

  • motiva esse processo seriam as relaes de produo. Esta forma de pensar, portanto,

    a que mais aproxima Thompson de Marx, uma vez que as caractersticas elencadas at o

    momento o distanciam.

    Analisando-se ainda outros elementos do pensamento thompsoniano, destaca-se

    sua crtica ao fato de o marxismo dar demasiada ateno ao conceito de classe em

    detrimento da noo de luta de classes. Thompson, por sua vez, defendia que no

    prprio processo de luta de classes, que os indivduos se percebem enquanto classe: a

    classe e a conscincia de classe so sempre as ltimas, no as primeiras fases do

    processo histrico real (THOMPSON, 1979, p. 37). Para o autor, haveria uma confuso

    terica que seria derivada de uma compreenso errnea de que as classes existem

    independentemente das relaes e lutas histricas e que elas lutam porque existem, no

    lugar de compreender que elas existem porque lutam.

    Thompson questiona, portanto, um dos pressupostos centrais do pensamento

    marxista, qual seja, a universalidade da luta de classes baseada em uma estrutura pr-

    determinada. Em funo disso, h quem diga que Thompson no era um marxista e

    outros que afirmam o contrrio. No entanto, apesar de utilizar uma conceituao

    diferenciada, com um papel importante dado s questes culturais, tal como fazem os

    tericos do novos movimentos sociais, a partir da noo de classe social que o autor

    desenvolve seu raciocnio:

    Espero que nada do que eu tenha escrito anteriormente tenha levado compreenso de que eu acredito que a formao de classes independente de determinados objetivos, que se pode definir classe como uma formao cultural, etc. (THOMPSON, 1979, p. 38).

    Para alm da rotulao marxista ou no, o que importa que Thompson

    contribuiu significativamente para o debate sobre as classes sociais e sua teoria ajudou a

    aproximar o marxismo da empiria e atentou para a importncia de valorizar as

    realidades concretas e as experincias vivenciadas pelos sujeitos no seu fazer poltico.

    2.4 Klaus Eder e o debate sobre as classes mdias

    entresiecontraseusdirigenteseempregadores(THOMPSON,1987).

  • Klaus Eder um autor alemo contemporneo que se props a discutir a

    pertinncia da continuidade do uso da categoria classe social para o estudo da ao

    coletiva, em um contexto em que a teoria dos novos movimentos sociais (como ser

    visto no item seguinte) j havia sido formulada. Ele se colocou, portanto, diante de duas

    perspectivas analticas no raro conflitivas entre si: o modelo clssico cujo ponto de

    partida era o estudo da ao coletiva a partir das classes e o paradigma dos novos

    movimentos sociais para quem a categoria classe j no dava mais conta de explicar a

    ao coletiva no contexto ps-60, em virtude do surgimento de um considervel nmero

    de movimentos sociais que no representavam classes sociais, mas grupos identitrios

    que se formam a partir da etnia, da gerao, do gnero, da opo sexual, etc.

    Diante disso, Eder utilizou elementos tericos de ambas as perspectivas para

    desenvolver uma reflexo sobre a ao coletiva realizada pelas classes mdias na

    contemporaneidade, tendo como inteno ltima, porm, a defesa de uma abordagem

    mais prxima do modelo clssico. Assim, dentro do que ele chamou de explicao

    tradicional da ao coletiva, aquela baseada nas classes, o autor identificou dois

    modelos diferentes de explicao: o modelo socioestrutural, que considera a ao

    coletiva como resultado da prpria estrutura de posio de classe, e o modelo cultural,

    que concebe a ao coletiva como resultado da conscincia que os atores tm de sua

    posio de classe (EDER, 2002).

    A fim de superar a dualidade entre o objetivismo socioestrutural e o subjetivismo

    cultural, Eder utilizou o conceito de habitus proposto por Bourdieu, uma vez que ele

    permite levar em conta tanto a influncia externa da estrutura, quanto a conscincia

    interna do sujeito. O intento do autor apontar para a presena de um habitus pequeno-

    burgus (ou de classe mdia) nos novos movimentos sociais. Para ele, a pequena

    burguesia aquele grupo que no conseguiu se tornar burguesia, de fato, e que, ao

    mesmo tempo, no precisou se tornar proletariado. Ela no tem a propriedade dos meios

    de produo, mas tem poder (capital) cultural por estar inserida no setor dos servios e

    por ter mais contatos com os donos do capital industrial e financeiro. Ento, ela se sente

    na necessidade de se colocar simbolicamente parte das classes mais baixas (EDER,

    2002, p. 240). Para o autor,

  • o dilema do habitus pequeno-burgus consiste em sua incapacidade de no se identificar nem com a posio objetiva ou com a identidade coletiva da (alta) burguesia, nem com a posio objetiva ou identidade coletiva do proletariado. O protesto pequeno-burgus permanece amarrado dentro dos limites desse dilema (EDER, 2002, p. 244).

    O autor chama ateno em seu texto para o radicalismo que caracteriza essa

    forma de ao coletiva e que se expressa a partir de trs maneiras: 1) a partir da

    moralidade, que seria o principal tema do protesto coletivo pequeno-burgus11; 2) a

    partir dos problemas gerados pela crise do Estado de bem-estar social e pela frustrao

    em relao ao sistema de partidos polticos e burocratizao; e 3) a partir da crise na

    sociedade industrial e sua lgica orientada produo (EDER, 2002).

    Nesse contexto, o autor se questiona a repeito do grau de importncia que a

    categoria classe social continua tendo, uma vez que ela foi criada para analisar as

    sociedades industriais europeias no sculo XIX. Por que a classe deveria ser importante,

    afinal? Qual seria a abrangncia terica desse conceito? Ele continuaria sendo til para

    compreendermos as sociedades contemporneas, caracterizadas como sendo ps-

    industriais? A resposta dada por Eder (2002) a essas questes caminha no sentido de

    dizer que o que acabou foi uma forma especfica de conflito de classes, aquela

    organizada em torno da contradio entre capital e trabalho, no o conflito de classes

    enquanto um fenmeno social. Ao contrrio, estaramos diante de um novo tipo de

    conflito, que se diferencia do tradicional, mas que mantm antagonismos de classe.

    Dito de outra forma, o autor reconhece que os novos movimentos sociais so,

    antes de tudo, movimentos culturais que transcendem o campo das relaes industriais

    (EDER, 2002, p. 282), mas a definio de um novo campo de conflito social no

    implica necessariamente que esse campo no esteja mais ligado possibilidade de

    conflito de classes e, portanto, a um novo tipo de estrutura de classes (EDER, 2002, p.

    282). Um elementos dicotomizador destacado pelo autor para evidenciar o que est

    propondo a ideia de excluso dos meios sociais de realizao da identidade, ou seja, os

    que possuem tais meios e os que no possuem.

    interessante notar que, para chegar a essa proposio, o autor no utilizou o

    conceito marxista tradicional de classe, que parte da posse ou no dos meios de

    11 A essa forma de ao coletiva, preferida da pequena burguesia, o autor denomina cruzada moral. O radicalismo pequeno-burgus , fundamentalmente, de natureza moral (EDER, 2002, p. 255).

  • produo. O conceito de classe que ele utiliza para desenvolver seu raciocnio baseado

    em um conjunto de interesses, normas e valores partilhados por um grupo de pessoas,

    de modo a estar relacionado a uma estrutura de oportunidades sociais e orientao

    cultural do grupo, o que implica fazer uma anlise estrutural dos dados culturais (...)

    (EDER, 2002, p. 278). Os conflitos de classe, portanto, so baseados em elementos

    simblicos socialmente construdos por cada coletividade. Seu pensamento, nesse

    sentido, aproxima-se da proposta thompsoniana, que questiona o uso do conceito de

    classe como uma categoria prvia e natural.

    No que se refere ligao entre classe e ao coletiva, Eder defende uma teoria

    estruturalista da agncia, admitindo seu prprio posicionamento como um paradoxo

    pois quanto mais as estruturas sociais produzem cursos de ao que tenham efeitos

    sobre estruturas e at at mesmo criam estruturas, menos a estrutura tem um efeito

    determinante (EDER, 2002, p. 261). De maneira semelhante a Gramsci, Eder defende

    o estruturalismo, mas d nfase para o fato de que a estrutura no invarivel e que a

    ao coletiva criativa pode promover transformaes na estrutura.

    Assim, ao avaliar a ao coletiva na contemporaneidade, Eder afirma: (...) com

    os novos movimentos sociais, as classes mdias tornaram-se, pela primeira vez, um

    elemento constitutivo de uma emergente nova estrutura de classe (EDER, 2002, p.

    268), ou seja, houve uma transformao na velha estrutura de classes, mas a sociedade

    segue organizada em uma estrutura classista. O autor prope, portanto, no o abandono,

    mas uma reviso da velha teoria de classes, uma vez que a maior parte da populao

    atualmente faz parte das classes mdias, j que no modelo tradicional, apenas uma

    pequena parcela da sociedade era constituinte da pequena burguesia. A nova classe

    mdia entendida por Eder, ento, como chave de acesso a novas formas de incluso

    universal de diferenas e a novas formas de conflito de classe emergentes nas

    sociedades ps-industriais (EDER, 2002, p. 273).

    Em suma, a contribuio de Eder para os estudos a respeito da ao coletiva

    pode ser sintetizada na sua tentativa de atualizao da teoria das classes sociais no

    contexto ps-industrial. Em outras palavras, seu objetivo foi mostrar que, ainda que os

    novos movimentos sociais no se identifiquem como classistas, a categoria classe ajuda

  • a compreender os conflitos antagnicos entre os grupos e, portanto, deve ser readequada

    ao contexto atual.

    3. As teorias dos novos movimentos sociais: novos temas ou novas

    abordagens metodolgicas?

    Este item discutir os principais argumentos e problematizaes levantados

    pelos tericos do paradigma dos novos movimentos sociais. Os principais nomes desse

    grupo so Alain Touraine, na Frana e Alberto Melucci, na Itlia. Esta nova abordagem

    terica surgiu a partir da emergncia, nos anos 1960, de um conjunto de movimentos

    sociais, cujo elemento aglutinador e motivador no era mais a relao capital-trabalho

    no contexto da produo, mas uma diversidade de outros condicionantes sociais e

    culturais, que formariam uma identidade coletiva.

    Um dos principais exemplos desses novos movimentos sociais foi o movimento

    negro nos Estados Unidos: o que gerava a condio de subalternidade aos negros no

    era o fato de no possurem capital ou serem pobres, mas o fato de serem negros. A

    propriedade dos meios de produo no impedia um negro de ser considerado

    socialmente inferior. Tais evidncias levaram os estudiosos desses movimentos

    concluso de que o conceito de classe j no seria mais adequado para se analisar a ao

    coletiva na contemporaneidade. Alm do movimento negro, outros exemplos podem ser

    citados para ilustrar situaes semelhantes, tais como os movimentos feministas,

    estudantis, pacifistas, ambientalistas, indgenas, dentre outros.

    3.1 A contribuio de Alain Touraine

    De maneira geral, normalmente se atribui a Touraine a proposio do conceito

    de novos movimentos sociais. De acordo com o autor, movimento social seria uma

    categoria de natureza histrica, ligada sociedade industrial, de modo que no serviria

    mais para se analisar o contexto atual, caracterizado por ele como sendo ps-industrial.

    A globalizao, nesse sentido, remeteria ideia de que s vale pena estudar os

    movimentos sociais capazes de transcender o territrio nacional (TOURAINE, 2006).

  • Uma das principais contribuies tericas de Touraine foi a defesa de uma

    perspectiva analtica que parte do sujeito poltico, que se coloca a partir do ponto de

    vista dos atores, isto , dos atores que so, ao mesmo tempo, conscientes do que tm

    em comum, ou seja, dos mecanismos de conflitos e dos interesses particulares que os

    definem uns contra os outros (TOURAINE, 2006, p. 20). A ao coletiva, portanto, no

    uma consequncia da estrutura, mas das relaes sociais que se estabelecem no nvel

    micro. A importncia maior dada ao processo de construo do ator organizado, isto ,

    como os indivduos se articulam para se construrem como ator organizado. O

    movimentos social, portanto, o ponto de chegada e no o ponto de partida.

    Apesar de estarmos na sociedade ps-industrial, Touraine considera que ainda

    importante se falar em movimentos sociais:

    Ainda que seja, provavelmente, mais fecundo partir da hiptese de que os movimentos sociais propriamente ditos desapareceram e foram substitudos, de um lado, por puros movimentos histricos e, de outro, por movimentos culturais e sociais, parece-me indispensvel recusar essa concluso perigosa e manter todos os mecanismos intermedirios, ainda que fracos, que impeam um completa separao entre movimentos sociais propriamente ditos e movimentos nascidos da gesto dos processos de transformao histrica (TOURAINE, 2006, pp. 27-8).

    A categoria novos movimentos sociais pode ser questionada, nesse sentido,

    porque os entendimentos de novo e velho no so definies precisas e podem ser

    compreendidos de maneiras diferentes, dependendo do contexto, tanto que o prprio

    Touraine faz uso da categoria movimento social, chamando ateno para o fato de que

    ela no pode ser aplicada a qualquer tipo de ao coletiva, conflito ou iniciativa poltica.

    Um movimentos social, na sua concepo, seria uma ao coletiva que coloca em

    causa um modo de dominao social generalizada (TOURAINE, 2006, p. 18).

    Em suma, a obra de Touraine uma das que mais d importncia ao papel do

    sujeito na construo da estrutura: a sociedade construda por indivduos, cuja

    conscincia permite-lhes agir coletivamente em busca de um objetivo comum, atravs

    da formao de um ator poltico, a que se chama movimento social.

    3.2 A viso de Melucci sobre a ao coletiva

  • De maneira semelhante a Touraine, Melucci tambm critica profundamente as

    teorias deterministas que consideram os movimentos sociais como produtos da

    estrutura, resultados de foras naturais ou leis necessrias da histria. Ao contrrio,

    partindo do que chamou de uma teoria da ao, Melucci prope pensar os movimentos

    sociais como uma ao coletiva dotada de uma autonomia prpria, ou seja, como um

    sistema de aes que se manifesta, no como resposta a uma crise, mas como expresso

    de um conflito.

    Nesse sentido, os conflitos sociais, em sua concepo, mobilizam atores q

    buscam ser sujeitos de sua ao atravs de uma atribuio de sentido e de uma produo

    de significados autnomos em relao ao espao e ao tempo (MELUCCI, 2001). A

    partir da nfase na capacidade humana de refletir, destaca-se a possibilidade de o ser

    humano promover mudanas na sociedade, o que faz as pessoas se reconhecerem como

    capazes de produzir ao, de modo que a prpria identidade de grupos e indivduos

    construda por eles mesmos. De fato, uma das preocupaes tericas de Melucci era a

    compreenso de como se dava o processo de construo dessa identidade coletiva em

    que os atores produzem uma definio interativa e partilhada que diz respeito s

    orientaes e ao campos da sua ao (MELUCCI, 2001, p. 158).

    Uma das principais contribuies do autor foi a desmistificao da ideia de

    movimentos sociais12 como personagens unidos em torno de um interesse nico. Sua

    compreenso aponta para diversidades e conflitos internos aos movimentos de modo a

    chamar ateno para o fato de que a unio demonstrada oficialmente pelas organizaes

    apenas aparente. Por detrs dela, h um conjunto de divises e diferenas que

    complexificam a anlise, de modo que o campo analtico da ao de um movimento

    social depende do sistema de relaes no qual tal ao coletiva se situa e ao qual se

    refere (MELUCCI, 2001, p. 38), ou seja, o ator coletivo entendido uma unidade

    socialmente construda com uma multiplicidade diversa de interesses em seu interior.

    Assim, a unidade de um movimento deve ser sempre vista como um produto e no

    como um dado ou um ponto de partida.

    12 ParaMelucci(2001),movimentosocialumacategoriaanaltica,noumacoisa.Nopossuiumaessnciasubstancial,assimcomonoapossuemascategoriasatorpolticoeconflitosocial.Socategoriasqueseutilizaparamelhorcompreenderarealidadesocialnoquetangeaocoletiva.

  • Melucci (2001) chama ateno para a importncia de se analisar as redes de

    relaes, ou seja, o lugar onde acontecem as negociaes, interaes entre os

    indivduos, influncias recprocas e a produo de quadros cognitivos e motivacionais

    para a ao. Nesse sentido, o conceito de identidade coletiva visto no como uma

    essncia, mas como uma relao. O autor a considera como

    uma definio interativa e compartilhada, que vrios indivduos produzem acerca das orientaes da ao e campo de oportunidades de vnculos no qual ela se coloca: interativa e compartilhada significa construda e negociada atravs de um processo repetido de ativao das relaes que ligam os atores (MELUCCI, 2001, p. 69).

    Essa forma de ao poltica, dotada de conscincia, conforme o entendimento do

    autor, viabilizada pelas caractersticas sociais da contemporaneidade que dispe aos

    indivduos recursos simblicos que estendem o seu potencial de individualizao, isto

    , de autonomia e de auto-realizao (MELUCCI, 2001, p. 72). Todavia, essa ao

    poltica tambm possui limites, por exemplo, o fato de que os processos decisrios nas

    sociedades complexas precisam funcionar por meio de representao. No possvel

    que cada indivduo fale por si mesmo em funo da grande quantidade de pessoas que

    existem no mundo. necessrio que se forme um grupo e que se delegue a um

    representante a funo de falar em nome do grupo (MELUCCI, 2001).

    De acordo com Melucci (2001), h momentos de latncia e momentos de

    visibilidade nos movimentos sociais. O primeiro refere-se ao dia a dia das pessoas que

    fazem parte de cada movimento; o segundo diz respeito aos perodos de mobilizaes e

    atos pblicos em que os movimentos se tornam mais visveis. Os movimentos

    contemporneos passam constantemente de um momento para outro e, nesse sentido, o

    autor destaca a imbricao de um momento com o outro, ou seja, a mobilizao envolve

    interesses e benefcios que esto relacionados ao cotidiano dos indivduos.

    Numa tentativa de caracterizao dos movimentos sociais contemporneos,

    Melucci (2001) elenca algumas condies necessrias para uma organizao ser capaz

    de exercer com sucesso a representatividade poltica de algum grupo. So elas: uma

    certa difuso dos recursos cognitivos (o conhecimento adquire importncia fundamental

    pois ele fornece aos atores conscincia sobre sua ao); falta de desequilbrios de poder

    (as decises no podem ser tomadas de maneira autoritria por uma pessoa que

  • concentre o poder); espaos de auto-reflexibilidade (tal como props Gramsci (2001)

    com o conceito de filosofia da prxis); auto-gesto dos recursos econmicos (no deve

    haver determinao externa ao movimento na gesto dos recursos); e, por fim os

    movimentos devem adotar uma orientao transitria (a organizao deve ser vista

    como um instrumento que se utiliza para alcanar determinados objetivos e no como

    uma estrutura imutvel eternamente).

    Em se tratando da relao sujeito-estrutura, Melucci (2001) parte do pressuposto

    de que os indivduos tm a possibilidade de escolher caminhos diversos dentro de um

    leque limitado de opes. Assim, a ao coletiva definida pelo autor como uma

    orientao finalizada que se constri por meio de ralaes sociais, no interior de um

    campo de possibilidades e limites que os atores percebem (MELUCCI, 2001, p. 157).

    destaca-se nesse trecho a insistncia do autor em enfatizar a conscincia e a atribuio

    de sentido ao que os sujeitos praticam, porque eles percebem e so cientes das

    limitaes e das possibilidades que lhes so colocadas. Ao mesmo tempo, Melucci

    (2001) registra sua preocupao em no cair no extremo do construtivismo e, nesse

    sentido, aponta para a necessidade de se evidenciar que o processo de construo da

    ao coletiva ocorre sempre dentro de limites.

    Diante desse conjunto de argumentos, percebe-se a importncia da contribuio

    terica de Melucci para os estudos sobre a ao coletiva. Sua obra oferece suporte

    analtico para pesquisadores que pretendem enfatizar elementos normalmente invisveis

    e/ou informais que constituem e caracterizam os movimentos sociais de um modo geral.

    Ademais, sua perspectiva compreensivista de anlise contribui para a apreenso do

    sentido que os sujeitos atribuem s aes que praticam no que diz respeito sua

    participao nos movimentos sociais e, desse modo, ajuda na compreenso do prprio

    processo de construo da ao coletiva e das organizaes de representao poltica

    como um todo.

    4. Contribuies e limites da sociologia americana para pensar a ao

    coletiva

  • Este captulo se prope a discutir as principais contribuies dos autores que

    forjaram uma nova abordagem terica para o estudo dos movimentos sociais, dentre

    eles, Charles Tilly, Sidney Tarrow, Doug McAdam e David Snow. Nesse grupo, Tilly o

    mais antigo dos autores. Ele se destaca por ter iniciado sua carreira estando ainda mais

    prximo de uma perspectiva estruturalista, ao focar sua ateno em grandes questes

    como, por exemplo, tentar entender como o mundo se transforma, atravs de quais

    processos, etc. Aos poucos, porm, especialmente a partir dos anos 1990, Tilly, junto

    com Tarrow e McAdam, foi se aproximando da sociologia europeia e da perspectiva dos

    novos movimentos sociais ao dar ateno especial ao papel da cultura e das identidades

    para a compreenso da ao coletiva (BRINGEL, 2012).

    Uma das principais contribuies de Tilly para os estudos da ao coletiva foi o

    conceito de repertrios de ao coletiva (ou repertrios de contestao) que designa o

    conjunto de performances desenvolvidas pelos movimentos sociais, que prprio de um

    determinado perodo, ou seja, a estratgia utilizada pelo conjunto dos movimentos

    sociais de um contexto histrico especfico a fim de externalizar suas demandas e torn-

    las evidentes. O exemplo mais usual de repertrio a realizao de greves, por ser a

    forma de ao coletiva que se tornou um repertrio marcante da atuao dos

    movimentos sociais no sculo XIX. Um repertrio um modo de ao que se repete no

    tempo. Ele influencia os indivduos de tal forma que funciona quase como que uma

    determinao estrutural, de modo que movimentos sociais que surgem so influenciados

    por movimentos j existentes a seguir o mesmo caminho, utilizando os mesmos

    mtodos de luta. Nesse sentido, as mudanas de repertrios so geradas por mudanas

    estruturais que influenciam os atores a adotarem uma nova forma de comportamento,

    que, por sua vez, vai gerar um novo repertrio de ao, em ltima instncia, um novo

    modo de ser (TARROW, 2009).

    Tilly tambm reconhecido internacionalmente por sua capacidade de relacionar

    a Histria com a Sociologia. Ao invs de analisar as diferentes formas de confronto que

    ocorreram ao longo da histria, Tilly buscava analisar as diferenas entre os confrontos

    a fim de identificar os elementos que se repetiam de modo a viabilizar uma possvel

    generalizao terica a respeito dos movimentos sociais ao longo do tempo e do espao.

    Em sua obra From mobilization to Revolution, de 1978, lanou mo das noes de

  • interesse de mobilizao e de oportunidades para a produo de aes coletivas,

    bem como outras trs categorias importantes: organizao, mobilizao e ao coletiva.

    Todos esses conceitos foram melhor aprofundados nos trabalhos em conjunto com

    Tarrow e McAdam, ou ainda por Tarrow (2009) particularmente, tal como ser visto na

    sequncia.

    Em suas obras mais recentes, (TILLY, 2005; McADAM; TARROW; TILLY,

    2001; TARROW; TILLY, 2008) o autor assumiu uma perspectiva que denominou

    relacional, ou seja, passou a buscar entender como as relaes, interpessoais, a partir

    das transaes interpessoais13 se transformam em identidades, criam e transformam

    fronteiras sociais e acumulam agrupamentos sociais. Ele chama ateno para o fato de

    que a identidade reside nas relaes com os outros, ou seja, o eu/ns se reconhece

    enquanto tal na relao que estabelece com o ele/eles. Alm disso, as pessoas, grupos

    e lugares assumem tantas identidades quanto forem as relaes que estabelecem com

    outros indivduos, grupos ou lugares, de modo que seu entendimento de identidade

    algo totalmente relacional (TILLY, 2005). Nesse sentido, as manifestaes e os

    movimentos sociais, no so vistos pelo autor como aes apenas, mas como interaes

    coletivas marcadas necessariamente por desigualdades hierrquicas entre grupos de

    pessoas desprovidas de poder e grupos de poderosos (McADAM; TARROW; TILLY,

    2009).

    Outro autor de destaque Sidney Tarrow, que, em ltima instncia, elaborou

    uma sistematizao das ideias lanadas previamente por Tilly, especialmente no que se

    refere ao conceito de confronto poltico, a partir do qual Tarrow desenvolveu seu

    raciocnio:

    (...) as pessoas se engajam em confrontos polticos quando mudam os padres de oportunidades e restries polticas e ento, empregando estrategicamente um repertrio de ao coletiva, criam novas oportunidades que so usadas por outros, em ciclos mais amplos de confronto (TARROW, 2009, p. 38).

    Tarrow compreende por estruturas de oportunidades polticas como um

    conjunto de indcios de quanto surgir um confronto poltico, colocando em

    movimento uma cadeia causal que pode levar a uma interao sustentada com

    13 Paraoautor,umarelaoconstitudaporumasriedetransaesentreduaspartes,quepodeviraestabelecerumarelaodeamizade,rivalidadeeassimpordiante(TILLY,2005).

  • autoridades e, portanto, a movimentos sociais (TARROW, 2009, p. 39). a prpria

    mudana nas oportunidades e restries polticas que abre a possibilidade de as pessoas

    se engajarem no confronto poltico. As situaes mais comuns de oportunidades

    polticas so aquelas em que os oponentes encontram-se enfraquecidos.

    Um confronto poltico pode ou no levar construo de um movimento social,

    o qual existe quando h um confronto poltico em que as aes dos participantes esto

    organizadas em redes sociais com quadros culturais consensuais orientadas para tais

    aes, havendo o estabelecimento de polos antagnicos em conflito. Nesse sentido, um

    movimento social tem o poder de acionar uma ao coletiva. Todavia, no tem o poder

    de control-la. Ele aciona pessoas sobre as quais ele no tem poder de controle.

    Quando um confronto se amplia, forma-se um ciclo de confronto, ou seja, a

    fase do conflito acentuado que atravessa um sistema social: com uma rpida difuso da ao coletiva de setores mais mobilizados para outros menos mobilizados; com um ritmo rpido de inovao nas formas de confronto; com a criao de quadros interpretativos de ao coletiva, novos ou transformados; com uma combinao de participao organizada e no-organizada; com sequncia de fluxos intensificados de informao e de interao entre os desafiantes e as autoridades (TARROW, 2009, p. 182).

    Dois exemplos de ciclos de confronto dados pelo autor so as revoltas do

    operariado europeu de 1848, tambm conhecido como a primavera dos povos em que

    houve uma difuso da insatisfao dos trabalhadores em diversos pases e irrompeu-se

    uma onda de greves e barricadas contra a explorao do patronato, o que foi objeto de

    estudo do prprio Marx (1848/1982), como visto na primeira parte deste trabalho. Outro

    exemplo a luta por direitos civis iniciada pelos movimentos negro, feminista e

    estudantil, especialmente nos Estados Unidos e na Europa, durante a dcada de 1960.

    Tarrow tambm d ateno especial dimenso simblica para a compreenso

    da ao coletiva. Para ele, o maior dilema dos movimentos sociais fazer a mediao

    entre smbolos herdados, que so familiares, mas levam passividade, e os novos, que

    so eletrizantes, mas podem ser estranhos demais para levar ao (TARROW, 2009,

    p. 140). Existiria, portanto, uma relao entre a formao de smbolos e os conflitos de

    interesses, o que, por sua vez, subjacente transformao do confronto em movimento

    social. Assim, surgem questes tais como: os smbolos so criados a partir do qu?

    Como as pessoas interpretam os smbolos? Qual a relao entre os smbolos e a

  • formao da identidade coletiva? Como os movimentos sociais conseguem produzir a

    unidade poltica em meio a um contexto de grande diversidade de identidades? Enfim,

    Tarrow se prope a entender como o discurso simblico se materializa no processo de

    luta e como a dimenso simblica interfere no confronto poltico.

    O recebimento da mensagem de tais smbolos e a interpretao dos mesmos no

    tempo e no espao por diferentes sujeitos sociais constitui uma cultura poltica prpria

    que, por sua vez, est relacionada ao conceito de quadros interpretativos da ao

    coletiva que foi desenvolvido com maior profundidade por David Snow: um conjunto

    de crenas e significaes orientadas para a ao que inspiram e legitimam as atividades

    e campanhas dos segmentos organizativos de um movimento social14 (SNOW, 2001, p.

    28). Ao aderir a um movimento, os atores passam a enquadrar de uma maneira

    alternativa a realidade que o cerca. Objetivamente, o que era visto como desgraa ou

    fatalidade reenquadrado e passa a ser visto como injustia social ou transgresso

    moral. essa mudana de viso da realidade que condiciona a possibilidade de

    mobilizao. Por si s, ela no mobiliza, mas condio para os atores se mobilizarem.

    Esse processo chamado por Snow de alinhamento do quadro interpretativo,

    no qual o movimento social promove uma adaptao dos quadros de significados das

    pessoas mudando de tradicional para uma nova forma baseada nos valores do

    movimento. Inicialmente, os movimentos sociais apenas ampliam ou abrem o quadro

    interpretativo das pessoas para novos valores. Depois procuram transform-los de fato,

    o que constitui a fase mais desafiadora, pois justamente a transformao dos valores

    dos atores que condiciona o sucesso do movimento. Sobre essa questo, portanto,

    Tarrow conclui: (...) os smbolos culturais no esto automaticamente disponveis

    como smbolos mobilizadores, mas exigem agentes concretos para transform-los em

    quadros interpretativos de confronto (2009, p. 157).

    Tarrow descendente da tradio terica da mobilizao dos recursos

    inaugurada por Mancur Olson, porm sua tentativa foi de superao dos limites dessa

    abordagem. De acordo com Tarrow, nem tudo pode ser explicado a partir da escolha

    14 Ospressupostos tericos que sustentamessa interpretaoprovmdas contribuiesdadaspelaEscoladeChicago,atravsdointeracionismosimblico,especialmenteaobraFrameAnalysisdeErwinGoffman.

  • racional dos indivduos. H elementos que independem da vontade ou racionalidade e

    influenciam as escolhas dos atores e, nesse ponto a teoria olsoniana limitada.

    A outra abordagem da qual Tarrow se aproxima a culturalista. Os conceitos de

    repertrio, enquadramento interpretativo, identidade coletiva e difuso foram

    desenvolvidos pelo autor a partir das contribuies dadas pelos estudiosos dessa

    perspectiva terica. Todavia, tal como o fez em relao abordagem racionalista,

    Tarrow evidenciou limitaes da perspectiva culturalista, por exemplo, a explicao de

    tudo a partir da produo de significados, sem considerar as influncias externas como

    as oportunidades e restries oferecidas pela realidade.

    Em sntese, Tarrow se props a mostrar como as oportunidades polticas

    provocam respostas discursivas e a analisar o que as pessoas escolhem quando agem

    coletivamente. Sua abordagem parece apresentar-se como uma sada coerente para o

    dilema clssico das cincias sociais da tenso entre sujeito e estrutura, pois procura

    levar em conta tanto a dimenso subjetiva dos indivduos, atravs do conceito de

    quadros interpretativos da ao coletiva, quanto a dimenso objetiva da realidade,

    atravs dos conceitos de oportunidades e restries polticas. Ao mesmo tempo que

    analisa a racionalidade dos atores, sua capacidade de ler e interpretar o mundo que os

    cerca e, a partir disso, fazer escolhas a respeito de qual a melhor maneira de atuar,

    Tarrow no deixa de considerar os elementos que existem mesmo que esses atores no

    queiram que eles existam, ou seja, as determinaes econmicas, as hierarquias de

    poder, as limitaes humanas, dentre outros elementos.

    Uma das principais contribuies da sociologia americana para o estudo da ao

    coletiva talvez esteja sintetizada na obra Dynamics of Contention (McADAM;

    TARROW; TILLY, 2001), na qual os autores, a partir de uma abordagem relacional e

    comparativa, focam a ateno nas interaes entre os atores polticos, os quais so

    entendidos pelo autores como conjuntos de pessoas e relaes entre pessoas, cuja

    organizao interna e conexes com outros atores polticos mantm uma continuidade

    no tempo e no espao.

    Nesse livro os autores se propem a explicar o confronto poltico partindo da

    anlise dos mecanismos e processos15 que se repetem a fim de identificar quais so as

    15 Osautorescompreendempormecanismoumaclassedelimitadadeeventosquealterarelaes entreconjuntos especficos deelementos emcaminhos idnticos ousimilares numa

  • sequncias causais recorrentes que possibilitam compreender como surge e como

    acontece um confronto poltico, o qual entendido pelos autores como interaes

    coletivas, episdicas e pblicas entre demandantes e seus objetos, em que o Estado

    constitui-se como um ator integrante dessa interao e em que, quando realizadas as

    reivindicaes, elas afetam os interesses do grupo que recebe as reivindicaes.

    Para desenvolver o raciocnio os autores lanam mo do conceito de episdios,

    ou seja, uma srie contnua de confrontos. O objetivo do uso desse conceito pensar

    comparativamente atravs da identificao de semelhanas (uniformidades recorrentes)

    e diferenas entre os diferentes conflitos que ocorreram em lugares e momentos

    histricos distintos, a fim de apreender os mecanismos causais que explicam o

    surgimento e o desaparecimento dos confrontos e, em ltima instncia, desenhar um

    panorama terico a respeito da ao coletiva a nvel geral. Desse modo, os episdios so

    utilizados como ferramentas de descrio, ao passo que os mecanismos e processos so

    utilizados como instrumentos de explicao.

    O foco central do livro a busca por mecanismos e processos explicativos em

    substituio s variveis criadas pelos prprios autores no incio de suas carreiras, como

    oportunidades, restries, mobilizao de estruturas, repertrios, enquadramento, dentre

    outras, que formavam o que esto denominando agora de agenda clssica dos

    movimentos sociais. Tilly, Tarrow e McAdam (2001), portanto, inauguram uma nova

    agenda de estudos para o campo da ao coletiva, cuja marca distintiva a abordagem

    comparativa e relacional.

    5. Consideraes finais

    Este trabalho objetivou apresentar as contribuies tericas de trs das principais

    abordagens analticas para o estudo da ao coletiva: a perspectiva marxista, como foco

    no conceito de classe e nas determinaes estruturais; a dos novos movimentos sociais,

    que enfatiza a dimenso cultural e identitria, portanto a subjetividade dos atores; e a

    sociologia americana, mais especificamente, a teoria das oportunidades polticas. Esta

    variedade de situaes. () Processos so sequncias regulares de tais mecanismos queproduzemtransformaessemelhantesqueleselementos(McADAM;TARROW;TILLY,2001,p.24).

  • ltima, talvez por ser a mais recente, parece se apropriar dos elementos principais das

    perspectivas anteriores e sintetizar uma abordagem que leva em conta a estrutura,

    especialmente a partir dos conceitos de repertrio e oportunidades, mas no deixa de

    analisar a subjetividade dos atores individualmente, como eles fazem escolhas e se

    colocam diante da realidade conflitiva, fundamentalmente a partir do conceito de

    quadros de interpretao.

    Ressalta-se que essa rotulao das abordagens demasiado simplista e foi

    utilizada aqui apenas com o objetivo de facilitar o raciocnio. Como este prprio

    trabalho demonstrou, no marxismo tambm houve autores preocupados com a

    subjetividades dos atores e os culturalistas tambm no ignoram por completo as

    limitaes estruturais da ao social, mas existem tendncias gerais que diferenciam

    uma abordagem da outra. Dependendo do tipo de movimento social que se quer estudar,

    uma abordagem pode ser mais til do que outra no sentido de fornecer os instrumentos

    necessrios para analisar um conjunto ou outro de elementos que constituem

    determinada realidade. O ideal que o pesquisador esteja aberto utilizao das

    ferramentas oferecidas por cada abordagem, na medida em que elas so teis,

    independentemente de suas preferncias poltico-ideolgicas.

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