the pact of the wolves - visionvox.com.br · que estavam envolvidos em um famoso julgamento de...
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Sinopse
Blanka, uma garota de 16 anos de idade, ganhou uma bolsa de estudos
numa escola centenária, fundada num local de um Convento e orfanato
que estavam envolvidos em um famoso julgamento de bruxas do século
XVII. Na noite de orientação ela é perseguida pelos Lobos, um grupo de
estudantes de origem misteriosa. Blanka tenta escapar dos ameaçadores
estudantes, ela se depara com o corpo de uma mulher morta, assim
começa uma investigação que a leva de volta ao passado negro da
escola. Com a ajuda do namorado de sua colega de quarto, um ex-
assistente na escola com uma extraordinária capacidade de assaltar
lugares, e um estudante universitário que também é perseguido pelos
Lobos, Blanka viaja através de indícios e documentos históricos, com
uma capacidade quase psíquica.
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Prólogo
Desde o começo dos tempos havia deslizado pelos corredores. O lugar era
escuro como a noite, mas seus olhos estavam cientes de todas as tonalidades em
cada canto, cada fresta entre as lajes de pedra. Poderia distinguir cada cheiro - o
odor que se alternava entre o pó de velhos e novos, um odor estranho. Uma e outra
vez ele tentou se levantar, finalmente fazendo o seu caminho como de costume, em
quatro pés.
A partir do som que fez a auto-execução pela frente em ambas as pernas,
parecia ter percebido que embora ele estivesse engatinhando, era mais rápido,
muito rápido, o que o Ser aparentemente não conseguia ver bem no escuro.
Laboriosamente Ser andou ao longo das paredes, ocasionalmente tropeçando,
gritando com fúria toda vez que o fazia.
Para a batida de sua falta de ar, suas garras clicaram na pedra, que de
repente já não era áspera e fria, mas muito suave. Em torno de seu corpo, o espaço
estava sendo expandido para um infinito que refrigerava até o osso. De vez em
quando parecia estar flutuando no vazio, ou em um daqueles sonhos que muitas
vezes você lançou um feitiço. Quando ele dormia, seu mundo era fragmentado em
cores, imagens e rostos grotescos, até que começou com o terror, arranhões, pois
neste mundo de sonho que tinha arranhado o ferro. Eu podia sentir o cheiro do
sangue e do despertar do cheiro de mofo na cova de sua família, onde ele dormia.
Havia marcas de unhas nas paredes e em torno dele.
E, no entanto este lugar sem limites não parecia ser uma ilusão. Eu não
conseguia entender os sons agradáveis que Ser fazia, mas alguns eram familiares e
me fez sentir bem. Ser ainda foi em frente, inclinou-se correndo tão rápido que, no
final, parecia voar sobre o chão liso, animado com o comprimento da sala. O mundo
cheirava diferente aqui extremamente agudo- e todos os sons eram brilhantes.
Quando ela se abaixou e passou o nariz no chão liso, sendo chamado de volta.
— Vem! — Ser conhecia essa palavra muito bem, mas da boca do estranho
para Ser não soa como uma ordem, mas sim como uma carícia. — Venha, venha
comigo! — Defendeu a voz, e de repente se virou e se inclinou sobre ele,
envolvendo-o em um abraço. Senti o medo de Ser agarrado a si mesmo até que
seus músculos começaram a tremer e ele fechou os olhos com medo. Estranhas
imagens extravagantes bombardeavam-no. Ainda assim, foi puxado na vertical. Ele
resmungou, porque foi atingido por uma estranha sensação - talvez até mesmo
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perigosa. Balançando-se e se dobrando, ficou lá curvado sobre Ser sentindo sua
pulsação.
— Venha comigo! — Ele repetiu. Sentiu o cheiro da pele, agradável e
estranhamente familiar. Ele caiu de novo. Sussurrando, soava incompreensível que
penetrou sua consciência. Mas Ser pareceu não ouvir, arrastando e arrastando
pelos pés, foi se tornando mais e mais forte. A luz cintilou no chão e paredes. Ser
gritou e se arrastou para trás tão rápido que ele bateu numa coisa clara, dura, e
deu um grito de dor. Uma voz cresceu, houve gritos, passos. Algo esbarrou em seu
ombro. Pela primeira vez em sua vida, morderia uma mão, mas seus dentes só
moderam o ar, por causa da luz ofuscante. Houve um baque, algo se apreendeu de
Ser e jogou-o no chão. Sons da dor e duras palavras vinham e iam, e alguém gritou
para Ser, que, como ele, estava agachado no chão. Ser gritou algo e depois houve
outro golpe.
— Venha! — Esta palavra, desta vez era uma ordem. Assobiou,
arreganhando os dentes. Seus olhos piscando pela luz refletida no chão e passou
por cima de um objeto liso e transparente, então, de repente pousou sobre eles.
Eles viraram a cabeça e fugiram. No momento seguinte o seu mundo foi
despedaçado pela dor. Os dentes foram enterrados no pescoço e ombro. Ser gritou
uma última vez. O cheiro de sangue em torno dele. Então tudo ficou em silêncio.
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Capítulo 1
Blanka
Blanka estava congelando. Apesar de ser meados de abril, ela não havia
levado uma jaqueta. Havia esperado estar em constante movimento, não
esperando ao redor da esquina mais afastada do campo a beira do bosque.
A escola era uma silhueta irregular contra o céu noturno. Um semicírculo de
tochas, presas por suportes de ferro, iluminavam as árvores atrás dela.
Duas figuras camufladas com capas escuras, carregando tochas, haviam
simplesmente, aparecido e levado longe um segundo grupo de estudantes.
Agora havia somente quatro deles à esquerda – duas outras garotas, que já
haviam emparelhado, permaneciam um pouco afastadas deles; Blanka e um garoto
pálido com cabelo loiro, alguém que ela não havia notado esta manhã na cerimônia
de boas vindas.
— Se vê como eles estivessem sendo levados a uma execução, não é assim?
— disse o garoto pálido, abrindo o fecho de sua jaqueta.
Blanka envolveu seus braços ao redor de si e observou a pequena procissão
até que tudo que pôde ver foram dançantes pontos de luz. A última coisa que ela
queria era uma conversação. Já devia ter passado da meia noite e estava exausta.
Memórias dos passados dias corriam por sua cabeça: a longa viagem de trem, a
cerimônia de boas vindas, passando sua primeira noite sozinha em seu novo
quarto na ala de dormitórios das garotas da Escola Internacional Europa.
— Se as coisas continuam assim, todavia estaremos aqui amanhã pela
manhã. — comentou o garoto, tratando de seguir a conversa. — Se houvesse
sabido que estaríamos congelando nossos traseiros deste modo, teria chegado um
dia mais tarde.
As luzes das tochas descoloriram na distância. — O tipo que nos mostrou
nossos quartos hoje disse que o passeio turístico vai ao cemitério dos órfãos. —
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continuou o garoto. — O velho cemitério do bosque costumava pertencer ao
Convento. — Nervosamente, passou as mãos por sua jaqueta outra vez. — Aposto
que alguns idiotas vão saltar de detrás das lápides e gritarão “Boo!” com trajes
estúpidos. Tudo é tão patético.
Blanka olhou o prédio da escola outra vez, tratando de imaginar ao
Convento que havia estado ali há séculos, ao invés da existência do moderno
prédio, de teto plano e com muitas janelas. O folheto havia mostrado um velho
desenho do prédio original.
Agora os únicos que recordavam a história desse lugar, era o velho
cemitério de órfãos com a capela Belverina, e os objetos expostos no museu do
Convento. E, desde logo, toda essa conversação da medieval Sociedade de Lobos, a
qual só pode pertencer os estudantes mais velhos. Coisa de meninos pensou
Blanka.
— Em que matéria você está se especializando? — perguntou o garoto.
— Matemática - probabilidades e estatísticas.
— Oh, então pode falar. — ele deu um sorriso inclinado. — Registraram-me
para o curso especial de artes. A propósito, meu nome é Jan.
— Oh!
— Estou te incomodando?
-— O que te faz pensar isso? — ela soltou. Inclusive quando falou, lamentou
ser rude. Depois de seu aniversário, esse maldito aniversário de dezesseis quando
tudo havia ido mal, que tudo poderia provavelmente ir mal a sua vida, ela parecia
ter se esquecido de como falar com outras pessoas. Jan imediatamente se calou, e
fingiu estudar as árvores. As duas garotas se moveram um pouco mais longe, então
poderiam mandar mensagens de texto sem interrupções.
Passou outra meia hora em silêncio antes que os pontos de luz começassem
a dançar outra vez. Cinco figuras estavam vindo sobre a campina até eles. Dois
estavam usando máscaras de lobo, e as outras usavam trajes medievais. Uma delas
reluzia de um brilhante amarelo e vermelho a luz da tocha.
— Por que há tantos agora? — sussurrou Jan.
— Quatro para nos dominar e um para agitar a faixa. — respondeu Blanka.
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Jan soltou um riso nervoso. — Deve parecer gracioso agora, mas no
caminho para cá, conheci um estudante universitário, ele costumava vir a essa
escola.
— Bom, claramente sobreviveu ao passeio turístico noturno.
— Ele não mencionou esses mascarados. Ele só disse que os Lobos estavam
todos loucos e que deveria ter cuidado. Eles arrastaram um garoto que havia
enrolado com eles fora de seus quartos uma noite, colocaram-no em um saco, e o
jogaram no rio.
— Quê?
— Tenho certeza de que ele não estava exagerando. — Jan baixou sua voz a
um sussurro, como se as figuras se aproximando pudessem ouvi-los. — Resultou
que o saco era fácil para abrir e o rio tinha só um metro ou dois de profundidade,
mas ainda assim...
Blanka tremeu. A noite parecia ainda mais fria. — Que aconteceu depois?
— Ele não pôde provar que os Lobos haviam feito isso. Todos eles tinham
desculpas, e o diretor naquele tempo acreditou neles.
— Relaxe. — disse Blanka. — É só um passeio turístico, no folheto o faziam
soar como uma atração turística. Uma vez ao redor do campus, na velha casa
sensorial, e ao cemitério, isso é tudo.
— Silêncio! Sem falar!
Blanka e Jan giraram ao redor. Pontiagudos caninos brilharam na luz das
tochas, e órbitas vazias os olharam.
Um garoto alto, com uma máscara de Lobo deu um passo até eles. Levava
uma lança na mão e sua capa de pele estava surrada e fedida, como se houvesse
estado em um sótão úmido por um longo tempo. Algo sobre ele deixou claro que
ele era o que o resto seguia. Outra figura mascarada, usando um traje de sacerdote
verde escuro e uma máscara de ferro, também havia saído do bosque e, agora,
estava ao seu lado. Blanka por pouco retirou um comentário depreciativo, sua
entrada misteriosa havia tido efeito e ela não se sentia tão valente. Quanto tempo
poderiam ter estado esses dois se escondendo e observando o bosque atrás deles?
Há esta hora os demais haviam cruzado o prado e formaram um círculo perto dos
quatro recém chegados.
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— A quem levaremos? — grunhiu o da túnica colorida. De seu cinto
pendurava o que parecia ser um longo osso, de cor clara do qual os buracos haviam
sido perfurados a intervalos regulares. Isso poderia ter sido uma flauta. Houve um
som de tilintado quando ele saltou para frente e deu a Blanka um rude empurrão.
— Hey! — ela gritou em protesto, dando um passo para trás. Ela sentiu o
fôlego de outra das figuras mascaradas na parte de trás de seu pescoço e saltou. Ela
examinou os olhos azuis claro.
— Hmm, nós pegaremos esses dois do fundo, e este pequeno. — declarou
um deles. — Assustar-se-á de outro modo, sozinho na escuridão! — era uma vez
feminina, e seu traje confeccionado sobre o hábito de um monge, exceto pela larga
vara que ela repetidamente golpeava contra sua mão. Blanka lembrou algo.
Poderia ser ela a garota de cabelo curto que lhe havia designado seu quarto? Ao
redor da máscara branco gesso, dava-lhe a seu rosto uma expressão severa,
tranças obscuras sobressaiam.
— Então, você volte ai – e vocês! — rugiu o garoto que havia empurrado a
Blanka, apontando sua flauta de osso às garotas e a Jan.
Como se pela ordem, os demais inclinaram suas cabeças para trás, e
começaram a uivar, apertando o círculo e levantando suas tochas de modo
ameaçador.
— Calma. — se queixou Jan. Ele ajustou sua jaqueta outra vez, e se uniu as
duas garotas. O círculo desapareceu quando dois dos Lobos tomaram seus lugares
a direita e a esquerda deles. Eles assentiram aos demais e partiram com os três
novatos através do prado até a escola. Jan olhou para trás e vacilou por um
momento, mas quando viu a Blanka estendendo a mão a sua mochila como se fosse
se unir ao grupo, então deu a volta e alcançou aos outros.
— Onde pensa que vai? — a monja perguntou de maneira ameaçadora,
dando um passo a frente de Blanka. Batendo, batendo a vara. — Não podemos
levar mais de três pelo passeio turístico. Antes que Blanka pudesse responder, os
outros haviam formado uma barreira diante dela. Involuntariamente, ela pegou
sua mochila. O garoto alto, o com a lança, deu um passo fora da linha e andou em
um círculo ao seu redor.
— Não é tanta a diversão por estar aqui sozinha, verdade? — murmurou. Os
outros riram, como se o ordenasse.
— O que você pensa que está fazendo? — Blanka perguntou com
indignação, sua voz um pouco mais estridente do que teria gostado.
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O líder estendeu sua mão para acariciar seu cabelo preto.
— Uma verdadeira Branca de Neve. — zombou. Seus olhos escuros
brilhavam detrás de sua máscara de Lobo. Sua voz parecia familiar a Blanka...
— Sei de você. — disse ela. — Esta tarde nos levou através da escola. É
Joaquim.
— Aqui só sou uma coisa... Teu pesadelo. — fez uma pausa para dar efeito -
Blanka.
— Estou impressionada. — respondeu zombeteira. — Levou muito tempo
para você aprender os dez novos nomes de memória?
— Sabemos muito mais sobre você. — lhe sussurrou Joaquim. — Você vem
de um pequeno povoado do lado de nada, lê muitas histórias de detetives, e quer
cursar psicologia na universidade. É boa em matemática – mas não o
suficientemente boa para esta escola. E quando tenhamos terminado contigo,
entenderá por que.
Desde a batida em seus dedos, Blanka se deu conta do quão forte que estava
segurando as alças de sua bolsa. Os Lobos estavam em silêncio agora, só uma
parede de boca, as manchas de sombra e as línguas de fogo. Aproximou-se um
pouco mais. A monja se apoderou de seu bastão com firmeza. Blanka se obrigou a
responder com calma.
— Incrível. — disse a Joaquim, olhando-o no rosto. — Inclusive pode ler as
listas de designação dos quartos. Quanto tenha terminado com essa farsa, pode
finalmente partir?
Ninguém respondeu. O silêncio era asfixiante. Então a monja maneou seu
bastão e, com um grito de guerra, deu um salto para frente. Pegou o pau tão rápido,
que Blanka teve apenas tempo de raciocinar. A arma se deteve justo diante de seu
nariz.
— Nariz quebrado. — sussurrou a monja. Rápida como o raio, deu outro
giro e obrigou Blanka para um lado com um golpe fingido. — Costas! — os demais
Lobos riram. O coração de Blanka estava correndo como em uma maratona, e
sentia como se os joelhos fossem de borracha. Já não era uma brincadeira.
—Tem medo? — sussurrou o menino com a flauta de osso. — Você deveria!
- Blanka tragou saliva.
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— Cinco contra um. — respondeu ela. — Ao que parece, são vocês os que
têm medo. — a monja ria.
Joaquim deu um passo à frente. — Bom, vamos ver quão valente você é de
verdade. — ao sinal dele, seus seguidores pegaram as tochas de seus participantes.
Deixando só uma em seu lugar.
— Voltaremos. — disse em voz baixa. — E então veremos quem tem a boca
grande aqui. Ou você vai correr direto para casa da mamãe? — riu, deu a volta e
partiu. Obedientes, os Lobos o seguiram.
— Dez minutos, Joaquim. — chamou Blanka depois deles. — Não vou
esperar mais que isso. — ninguém se virou.
Blanka se deixou cair sobre a grama fresca e tratou de respirar com calma.
Levou um bom tempo. Não até que os Lobos estiveram longe de vista começou a se
sentir irritada. Por que se deixou intimidar por ela?
Evidentemente, assustar aos novos estudantes era parte do programa. Bom,
sem dúvida esses disfarces tão estranhos não eram de seu agrado. Abraçou as
pernas e pôs sua cabeça sobre os joelhos. Tão logo como ela fechou os olhos, viu o
rosto de seus pais.
Precisamente ontem a haviam levado até a estação. Através da janelinha do
trem que havia visto seus infelizes rostos, se tornar cada vez menores. De certo
modo, parecia que havia sido há anos, porém a sensação de perda era, todavia,
intratável.
Quando Blanka abriu os olhos, só via escuridão. Devia ter dormido. A tocha
só havia desaparecido, fazia ainda mais frio e as pernas estavam adormecidas.
Atordoada, esfregou os olhos, buscou no bolso e pegou seu relógio do bolso. A lua
crescente estava parcialmente escurecida por uma nuvem de luz, e em sua luz fraca
só se podia adivinhar a posição dos ponteiros do relógio. Ela havia estado sozinha
durante quase uma hora. Blanka lutou contra o impulso de gritar de raiva. Os
Lobos simplesmente a haviam deixado para trás! Como poderia ter sido tão
estúpida como para esperar na beira do bosque como um cachorro bem adestrado?
Nem sequer havia se surpreendido por terem levado as tochas com eles. Claro:
desempenhavam esse truque com o último estudante, e hoje passou a ser ela.
Pouco a pouco ficou de pé e esfregou os joelhos esticados.
— Idiotas. — resmungou ela. Com passos inseguros cruzou o gramado, em
direção aos prédios que apenas se distinguiam. Os arbustos pareciam sombras que
espreitam ao lado da rota principal, mas o rangido dos sapatos no cascalho era
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reconfortante. Por último, Blanka alcançou o estacionamento dos visitantes e
correu pelo caminho de pedra até a porta principal.
Diretamente na frente dela estava à antiga casa solar, que havia sido
construída nos início do século XX. Hoje em dia, servia como dormitório dos
meninos. Blanka recordou que o dormitório das meninas estava à direita deste
prédio, no mesmo edifício da biblioteca, e se dirigiu até a estrutura de vidro. A
porta estava fechada – claro. Olhando ao redor, Blanka descobriu uma entrada
lateral à esquerda, onde estava a campainha e o porteiro.
Teria que levantar alguém para conseguir entrar no interior do prédio. O
sensor de luz acendeu de forma automática, sobressaltando-a. Blanka vacilou, e
logo fez soar a campainha. Esperando uma voz cansada, e sem nenhuma expressão
no outro extremo, apoiou-se contra a porta e quase caiu de bruços sobre o umbral.
Olhou estupefata, ao corredor escuro que tinha aberto diante dela. A porta estava
aberta!
Nenhuma voz chegou através do comunicador. Bom, ao menos não se
afogaria na vergonha de ter que explicar o que estava fazendo aqui, às duas da
manhã.
O corredor passava pelos banheiros do vestíbulo da biblioteca. As portas de
vidro brilhavam pretas como a água do pântano. Aqui, em terreno seguro, Blanka
sentiu a volta do esgotamento. Ela só queria dormir. Sentiu um puxão no pescoço.
Por ali deveria ter uma porta ou janela aberta. Blanka se deteve e aguçou o ouvido
na escuridão. Por suposto que podia escutar algo – todo mundo escuta ruídos na
escuridão. Este lhe recordou a uma lamúria metálica distante. Blanka conteve a
respiração e esperou. O ruído cessou, e em seu lugar, imaginou, sentiu um
movimento nas sombras a sua direita.
— Olá? — gritou tentando. Silêncio. Sem dúvida, o interruptor de luz
deveria estar em algum lugar perto das portas. Ela bateu com a mão contra a
superfície dura, que estava mais perto do que esperava. Seus dedos tocaram pela
primeira vez o vidro frio, e logo metal, e, por último, papel tapete liso. Ao final
encontrou o interruptor. A luz fluorescente piscou. As mesas de leitura brilharam
entre as cadeiras desertas.
Blanka soltou um suspiro de alívio, seguiu seu caminho passando as mesas,
e foi até a escada que conduzia ao segundo andar. Lembrava-se bem, o cômodo
principal da biblioteca estava à direita, e à esquerda estavam as escadas que
conduziam a casa.
Enquanto corria, quase não se deu conta do objeto no chão – uma capa
enrugada de algum tipo. Parecia como se alguém acabasse de jogá-la sem cuidado.
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Mas, havia algo envolto nela? Blanka se deteve para dar uma olhada mais de perto.
Deu-se conta dos dedos que sobressaiam de uma das mangas largas. E meio
escondido debaixo da volta do pescoço para baixo, rodeada de cabelo cinza escuro,
uma bochecha estava tocando o chão de pedra. Com uma expressão de assombro
suave, azul, os olhos abertos olhando o vazio.
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Capítulo 2
Madame Lalonde
A diretora Marie-Claire Lalonde tinha a situação sobre controle. Havia
dito ao jovem detetive que se sentara na cadeira que estava mais próxima de seu
escritório, amavelmente, mas tão firme que não havia lugar para objeções. A luz
solar entrava, a lhes saudar na sala através da grande janela, e poderia cegar.
Cada vez que ele levantava a vista de seu caderno para perguntar a Blanka à
seguinte pergunta, ele entrecerrava os olhos. Blanka, por outro lado, estava
sentada na esquina sombreada, perto da porta. A cadeira era um tanto baixa como
para ser cômoda. A sala, em si, tinha um ar de sérias discussões e importantes
decisões. Normalmente, só os estudantes estariam sentados aqui, recebendo uma
reprimenda de Madame Lalonde. Logo de uma noite em vela, Blanka se sentia
desfocada e desequilibrada, mas, pelo menos, já não tinha frio, agora que Madame
havia colocado uma xícara de chá em suas mãos. O detetive não se via muito mais
desperto do que ela estava.
— Excelente. — disse finalmente, pondo seu lápis dentro do bolso de sua
camisa. —Acho que isso é suficiente por agora. — com algo de esforço, tirou um
cartão amassado de sua bem manuseada agenda. — Aqui está meu telefone para
contato. — a cadeira rangeu quando se inclinou para Blanka.
— Obrigada. — disse Madame Lalonde, interceptando e tomando o cartão
rapidamente. O detetive franziu o cenho, mas não fez objeções. Pela primeira vez,
Blanka acreditou ter visto um pingo de emoção em seu rosto. Parecia claro que não
lhe importava particularmente Madame Lalonde. A diretora não se sentou,
permaneceu parada com o cartão ainda em sua mão. Em verdade, Blanka estava
agradecida nesse momento pelas autoritárias maneiras desta alta e assombrosa
mulher. O detetive ficou de pé.
— Se pensar em algo mais, ligue para mim. — disse ele, olhando para
Blanka diretamente. — Carsten Seibold, tudo está no seu cartão. — na palavra
‘seu’, a qual enfatizou, dirigiu um olhar de soslaio a diretora.
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— Farei isso. — Blanka conseguiu dizer. — Obrigada.
— Bom, então estou indo. Agora se cuide.
Quando ele ofereceu sua mão para um aperto – uma mão que saiu de uma
ampla que era um tanto larga demais – seu estômago se sacudiu. Ela teve que
forçar a si mesma a lhe dizer adeus. Madame Lalonde estava olhando atentamente
cada um dos movimentos do detetive – como se estivesse assustada de que ele
pudesse tirar uma arma e levar Blanka para fora. A porta se fechou, e tudo
terminou. Blanka soltou um suspiro de alívio e se enterrou mais em sua cadeira.
Seus dedos estavam batendo por culpa do calor da xícara.
— Pelo menos beba um pouco mais. — disse Madame Lalonde. Ela se
moveu até onde o oficial de polícia havia sentado. Diferentemente dele, ela não
entrecerrava os olhos, ainda que a luz do sol estivesse chegando direto ao seu
rosto, destacando cada pequena linha. Obediente, Blanka levou a xícara aos lábios e
sorveu.
— Sinto que você tenha tido que passar por isso. — disse Madame depois de
uma longa pausa. — E no seu primeiro dia em minha escola. — Blanka estava a
ponto de responder, mas a diretora continuou. — Bom, pelo menos pude te
oferecer o maior apoio que tenhamos disponível. Aqui, no Colégio Europa
Internacional, nós temos a sorte de ter relações próximas com a Universidade.
Você sabe que, por suposto, nossos cursos opcionais são dados, em parte, pela
associação de professores dali. Um deles é um grande psicólogo, Dr. Hasenberg, e
ele estão aqui, no colégio, pelo menos uma vez por semana. Assim que se você
quiser...
—Não, obrigada. — disse Blanka. — É amável de sua parte oferecer, mas
posso dar conta do que passou ontem à noite. Só estou esgotada. — Acaso ela
passando por um naufrágio emocional?
Madame Lalonde franziu o cenho. Blanka teve o pressentimento de que ela
estava analisando suas palavras, colocando-a na luz e retorcendo e adiantando,
como um médico olhando uma placa de raios-X. Ela fez um esforço para lhe
devolver o olhar à diretora com indiferença. Os olhos de Madame não eram azuis,
mas um não usual círculo preto contrastava fortemente com a íris. Era um olhar
hipnotizante e, espantosamente intenso.
— Entenderia se você quiser voltar para casa por um tempo logo depois
desse choque. — disse finalmente a diretora. Sua voz soava cálida e compreensiva.
— Se você quiser, pode voltar em algumas semanas. — A xícara se sentia como um
peso de chumbo nas mãos de Blanka. Sua casa passou diante de seus olhos: seu pai
inclinado sobre um rádio que havia desmontado, com sua testa profundamente
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enrugada; sua mãe voltando para casa do trabalho, pálida, mas se movendo
energicamente, com os cômodos sapatos que usava tarde nos corredores e no
restaurante do Hotel Mountain View. Esta imagem parecia alheia a ela nesse
momento, e não se sentia como em casa. Ela lembrou as palavras de Joaquim. —
Você não é boa o suficiente para essa escola. — afirmações como essa não
deveriam incomodá-la, não a ela, a Blanka de quem ela tanto se orgulhava de que
não chorava. De todas as formas, as lágrimas repentinamente encheram seus olhos.
Ela revirou nos bolsos de seu jeans até que tirou um lencinho amassado. Pelo canto
do olho, viu que Madame Lalonde estava ficando de pé, e no momento seguinte
sentiu uma mão em seu ombro.
— Se você não se sente bem para continuar estudando depois deste
incidente, nós podemos atrasar sua solicitação por seis meses. Você nem sequer
teria que solicitar de novo, tua beca seria simplesmente adiada até que...
— Não! — a palavra escapou de maneira mais violenta do que ela queria.
Ela se aferraria a esta oportunidade que o colégio estava lhe dando. Para surpresa
de Blanka, a diretora riu.
— Não quebre a pobre xícara! Ninguém quer te mandar para longe daqui,
começando por mim. Estou contente de admitir uma estudante tão boa. Tenho que
ler tua solicitação cuidadosamente. Está interessada em fazer psicologia na
universidade?
Blanka assentiu.
— Bom, acredito que você tem o que precisa. Tua determinação de
permanecer aqui, por um lado, demonstra-me que você não se retrai facilmente. —
Madame Lalonde sorriu e, repentinamente, parecia muito agradável. Seu cabelo
cor de caramelo brilhou com a luz matutina do sol. — Sabe, estava segura de que
você ficaria. Quase nunca me equivoco em minha avaliação dos novos estudantes.
— com estas palavras, ela voltou a seu escritório. Blanka escutou o rangido de uma
gaveta sendo aberta. Madame Lalonde continuou falando enquanto pegava uma
grande quantidade de papéis. —Você é muito brilhante, isso esta claro. Mas, às
vezes, tem a língua muito mordaz. Estou certa? Acho que você no fundo é um tanto
diferente. — seus olhos eram suaves e amáveis. — Eu era muito parecida com você
quando era jovem. Tenho certeza de que se encaixará muito bem aqui.
— Bom, não é isso que acham os Lobos. — as palavras simplesmente
saíram. — É verdade que uma noite eles jogaram um estudante no rio?
Os olhos de Madame Lalonde se tornaram sérios novamente.
— Quem te disse isso?
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— Um estudante novo, ele escutou isso a caminho daqui.
Madame Lalonde suspirou e empurrou uma mecha perdida de seu cabelo
para trás da orelha.
— Sim, essa história tem dado voltas durante bastante tempo, é uma lenda
urbana persistente. — disse. —Ainda que, em todo tempo que levo sendo diretora
aqui, nunca recebi uma queixa como essa. O que é mais difícil, eu posso imaginar
como alguém pode ter, supostamente, raptado um estudante de sua peça e
transportado até o rio sem ser visto.
— Além do mais, quase não posso imaginar como alguém, supostamente,
pode seqüestrar um estudante de seu quarto e carregá-lo até o rio sem ser visto. —
ela suspirou. — E com respeito aos Lobos... Bom, eu não posso dizer que aprovo
tudo o que fazem. Eles têm seus próprios rituais especiais, seu código de conduta, e
suas... Provas de valor, como qualquer outra associação de estudantes. Eles
pertencem à escola tanto como as exibições no museu e os castanheiros velhos no
parque. Eles têm sido uma tradição há mais de cinqüenta anos. — sorriu de novo.
— Até agora, cada estudante encontrou seu lugar aqui... Sempre que eles cheguem
com o poder necessário para permanecer. Mas não estou preocupada por isso
nesse caso. Se tiver algum problema com os Lobos, sempre pode vir até mim e
buscar ajuda.
Maravilhoso, pensou Blanka. Agora sou uma fofoqueira!
— Outra coisa que devo lhe dizer. — Madame Lalonde continuou. —É que
decidi te colocar com os estudantes na classe superior, ao invés de com os novos
estudantes. Caitlin O’Connell te ajudar| a se adaptar. Ela vem da Inglaterra e, logo,
vai ter seus exames finais. Ela estará no quarto contigo em seu dormitório.
— Eu não preciso de nenhuma ajuda. — Blanka protestou. — Não estou
doente... Topei com um corpo morto na noite anterior. Eu não me esquecerei.
— Claro. Mas tenho certeza de que gostará de Caitlin. Matemática é um de
seus temas mais forte.
Blanka olhou com interesse. Bom, isso era diferente. Bebeu o último gole de
seu chá, e assentiu.
— Está bem. — disse tratando de sorrir. — Por agora, ao menos. Mas há
algo mais... — tragou saliva e se fez a pergunta que o detetive Seibold não havia
respondido. — A mulher morta... — viu a diretora ficar rígida ligeiramente. — Ela
quebrou o pescoço quando caiu, não?
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Madame Lalonde apoiou os cotovelos sobre a mesa.
— Pelo que sabemos agora, sim, parece que sim. — disse finalmente.
— O detetive Seibold é da brigada de homicídios?
— Sim. No caso de uma morte súbita como esta, o primeiro que fazem é
comprovar se pode ter sido um assassinato. Sobretudo porque não temos a menor
idéia de quem era a mulher, nem como se meteu no prédio.
— A porta estava aberta.
— Eu sei. Você disse ao detetive Seibold. Bom, ela não poderia tê-la
quebrado.
— O que poderia estar buscando?
— Tem alguma ideia de quanto vale uma página de nossa crônica do século
XVII do Convento? — ela parecia estar lutando para recuperar a compostura. — No
entanto, não é nosso problema. É trabalho da polícia, e ninguém além da polícia
deve averiguar o que aconteceu.
Com estas palavras, a diretora fechou a gaveta de sua mesa com força.
Houve uma batida na porta que fez Blanka pular.
— Entre. — disse Madame Lalonde, sua voz demorou a voltar. Um homem
alto entrou. Quando se deu conta de que a Sra. Lalonde não estava sozinha,
arqueou as sobrancelhas.
Blanka o havia visto antes. Ele era o tratador, lembrou um velho rabugento
que parecia que havia bebido demais durante os últimos trinta anos. As veias finas
em seu nariz vermelho brilhavam de uma cor púrpura escura. Ainda assim, tinha
uma jaqueta esportiva e a olhou fixamente.
Blanka nunca havia visto um tratador com uma jaqueta esportiva antes. Mas
então, nada em absoluto nessa escola parece normal?
— As cadeiras e as lâmpadas estão aqui. — grunhiu. — Você tem que
assinar a folha de entrega. E o eletricista quer saber onde colocar as luzes.
— Claro. — exclamou a Sra. Lalonde. — Blanka, por favor, desculpe-me
alguns minutos.
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Com passo rápido, a diretora saiu do escritório. Blanka ouviu o molho de
chaves que o tratador levava atado à cintura, tilintando a cada passo. Sem olhos
sobre ela, por fim, a tensão começou a se desvanecer. Perguntando-se quanto
tempo poderia demorar à Sra., ela retrocedeu o braço, apontou e jogou o tecido
enrugado sobre a gaveta de papéis para o lado.
Blanka se levantou e se aproximou da mesa. Olhou pelo canto do olho para a
porta entreaberta, mas, para seu alívio, não escutou passos. Assim que se escondeu
atrás da mesa, pegou o pano e o levantou de novo. Assim que era assim que se via o
mundo desde a perspectiva da Sra. Lalonde. Desde aqui se podia ver não só todo o
escritório, mas também parte do corredor, e (através da janela) a entrada principal
e o parque. Se houvesse estado sentada em sua cadeira na noite anterior, haveria
visto os Lobos saírem em busca de novos estudantes. Era muito mais interessante
o ponto de vista de Blanka, no entanto, a pilha de papéis sobre a mesa da Sra.
Lalonde. Blanka notou um desenho que parecia um diagrama geométrico com
ramificação. Só quando se aproximou foi um pouco mais consciente de que era
uma espécie de árvore genealógica. Ela deixou a xícara vazia e, inclinou-se para ver
melhor. Ao invés de nomes, escreveram abreviaturas, assim como símbolos que se
viam muito científicos. Os princípios da associação eram fáceis de reconhecer: as
conexões se mostram por dois anéis entrelaçados. Para Blanka pareciam a
intersecção de conjuntos matemáticos. Cada intersecção formava um filho... E em
um só lugar, inclusive dois filhos.
— Dr. Florian Hasenberg. — observou em forma abreviada na borda da
página. Blanka escutou o som de chacoalhar das chaves se aproximando. Pulou, e
tropeçou com algo brando e sem forma.
Surpreendeu a si mesma antes de cair, agarrando a borda da mesa para se
apoiar. Sacudiu o objeto que havia agarrado com o pé.
Era um bolso de couro com cor. Agachou rapidamente e o empurrou de
novo para onde havia se apoiado na mesa. A pele era tão suave como uma jaqueta
de camurça e em boas condições, ainda que não fosse nova. Algo na lapela lhe
chamou a atenção... Entrelaçadas iniciais queimadas no couro: um ‘M’ e um ‘J’.
Um instante depois, Blanka estava sentada em sua cadeira de novo, seu
coração sobressaltado. A diretora e o zelador entraram no cômodo em um
segundo.
— O Sr.. Nemec te levará ao seu dormitório agora. Blanka será hóspede de
Caitlin O’ Connell, pelo momento.
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O homem estudou a Blanka, e logo assentiu. Seu olhar viajou na mesa, como
atraído por um imã. Blanka se ruborizou. Sua taça estava justo ao lado dos
documentos da Sra. Lalonde.
Soou o telefone.
— Lalonde. — a diretora respondeu. Sua expressão foi prática, mas então
seu olhar caiu em Blanka, e sua voz se fez mais amigável. — Claro. Um momento,
por favor. — ela sorriu alentando a Blanka. — É o seu pai. Ele disse que não pode
se comunicar contigo em seu celular.
Blanka se levantou e sacudiu a cabeça.
— Diga a ele que estou bem, e que vou ligar para ele. Por favor! — por uns
longos segundos olhou suplicante nos olhos da estranha Sra. Lalonde. Havia um
sentimento desconhecido, mas não desagradável de proximidade. Madame
Lalonde duvidou um instante, logo assentiu com a cabeça e agarrou o bocal.
— Vem comigo. — grunhiu o Sr. Nemec. Deu a volta e saiu do lugar.
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Capítulo 3
Caitlin
Caitlin vinha da costa irlandesa, perto da cidade de Dingle. Não encaixava
com o estereótipo de garota ruiva irlandesa em nada, mas tinha curtas mechas
castanhas e olhos verdes que brilhavam como minerais de cor clara. As
apresentações foram amistosas, sim um pouco frias, mas depois que o Sr. Nemec se
foi, Caitlin parecia aliviada e, deu-lhe a Blanka um genuíno sorriso.
— Bem vinda ao seu novo reino. — indicou Caitlin para a estreita cama, uma
mesinha e uma cômoda. Não exatamente elegante, mas tampouco desconfortável.
Através da estreita janela, Blanka podia ver o estacionamento dos visitantes, e ela
olhou para a colina atrás dele, onde o cemitério dos órfãos se encontrava. Um
arrepio recorreu sua coluna.
— Os quartos nesse prédio eram originalmente muito maiores, mas desde
que estamos recebendo mais e mais estudantes, eles têm tido que renovar a ala de
ensino. — disse Caitlin. — Os quarto estão divididos em dois e muitos deles têm
porta conectora. Alguns dos estudantes moviam suas cômodas para bloquear a
porta, mas Jenna, a garota que se mudou há três semanas, e eu normalmente a
deixávamos aberta durante o dia.
E mais, no meio da parede a esquerda havia uma simples porta de madeira.
Blanka deixou sua pesada mochila e sua mala e, seguiu Caitlin ao quarto seguinte.
Era como entrar em outro mundo. Uma colorida colcha de retalhos cobria a cama,
com um desgastado crocodilo de pelúcia jogado sobre ela. Ao redor da janela havia
luzes em forma de corações vermelhos, e toda a parede estava coberta de fotos,
cartões e lembranças, todas presas no papel de parede com tachinhas. Uma era de
Caitlin com dois garotos, os quais tinham os mesmos olhos verdes que ela.
Tinha seus braços ao redor de cada um e estavam rindo para a câmera. —
Meus irmãos, Aidan e Paul. — disse Caitlin com evidente orgulho. — E nessa foto
aqui, essa é minha irmã mais nova, Kathy. Essa é minha mãe e esse meu pai, e essa
é minha amiga Deirdre. Quando terminar aqui, vou para o Trinity College em
Dublin. Deirdre ia solicitá-lo. Talvez fossemos capazes de conseguir trabalho como
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professora na mesma escola. — suas palavras se repetiam na cabeça de Blanka. O
quarto de Caitlin a intimidava, tão cálido, acolhedor e seguro. Havia presentes de
sua família em todas as partes.
Nunca saberia que sua porta dava a um corredor iluminado por luzes
fluorescentes e, não no salão da casa de seus pais em Dingle.
— Você não tem nenhuma foto da sua família? — perguntou Caitlin, quando,
um pouco mais tarde, Blanka pendurou um pôster do sistema solar em sua parede.
— Não. — disse Blanka, um pouco brusca demais.
— Ou do seu namorado? — os olhos de Caitlin brilharam. — Você deve ter
um!
Blanka pressionou os lábios e negou com a cabeça. Isso era tudo o que
precisava; que sua companheira de quarto lhe lembrasse sobre Alex.
— Sinto. Disse algo errado? — Caitlin não renunciava. — Vocês romperam?
— O que mais você quer saber? — soltou Blanka. — O número do meu
sapato?
Supunha-se que soava como uma brincadeira. Caitlin olhou-a pensativa,
mas não perguntou mais nada. Blanka conteve as lágrimas, sem desempacotar suas
coisas, e começou sua nova vida.
Não era tão fácil como ela imaginava que seria. Tão logo fechou os olhos, viu
a mulher com roupa amassada. Essa primeira noite em sua nova, muito branda
cama, Blanka várias vezes pegou a si mesma passando os dedos pelo pescoço,
perdida em seus pensamentos.
Quão grave tinha que ser uma queda para quebrar o pescoço? Inclusive
depois de todos os ruídos dos quartos vizinhos e do corredor terem se acalmado,
as fórmulas, números e cálculos que normalmente se mandava para dormir não
estavam funcionando. Contar não ajudava, tampouco, nem visualizar números
imaginários, os quais se acendiam brevemente nos cantos mais escuros de sua
imaginação e, logo desvaneciam de novo. Nem inclusive pensar nos problemas com
seus pais poderia lhe distrair da mulher de cabelo cinza. Seu rosto continuava
voltando, seus lábios se moviam quando tratava de dizer algo a Blanka.
Blanka repassou cada detalhe do rosto dessa estranha em sua cabeça,
alguém a quem só havia visto por um momento. Parecia importante mantê-la viva.
Tinha uma covinha na bochecha, devia se sentir agradável quando sorria. Mas sua
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testa estava marcada por linhas de preocupação. O que a havia trazido a biblioteca
do colégio? Blanka não podia evitar a memória dessa mão aparecendo de sua
manta, a mão de uma mulher mais velha, com unhas mordidas até deixá-las
estragadas, como de um velho nervoso.
Apesar da investigação, o novo semestre no Colégio Internacional Europa
começou como estava planejado. Só a biblioteca estava fechada. Cada vez que
Blanka olhava fora da janela para o estacionamento, um carro da polícia estava ali.
E pelos primeiros dias, Blanka era novidade para seus companheiros. Mais de uma
vez ela notou os estudantes murmurando entre si e assentindo para ela. Porém ela
não tinha muito tempo para se sentir incomodada.
Sua carga acadêmica era muito forte. Às vezes Blanka invejava a Caitlin por
ter terminado já a maior parte de seus estudos, com apenas os exames finais por
fazer. As horas em aula pareciam voar rápidas, mas a montanha de livros que,
aparentemente, tinha que dominar antes dos primeiros exames preliminares em
algumas semanas, não se fazia menor.
Ainda que houvesse uma série de matérias obrigatórias que apenas
interessaram a Blanka, o curso de teoria de probabilidade foi uma revelação. O
professor, o doutor Kalaman, dava a impressão de ser estrito e brilhante, e cada
frase que pronunciava era absolutamente clara. Disse que veio da Áustria, mas
seus antepassados provinham de Mogadíscio. Blanka o seguiu rapidamente ao
longo dos caminhos de histogramas, polígonos de frequências e a distribuição da
função, ainda que tropeçasse com alguns dos novos conceitos, passou muitas horas
em sua mesa depois da aula tratando de por em dia.
Pela primeira vez em várias semanas, ela tinha o sentimento de que, ao
menos poderia agarrar um pouco da tela solta de sua vida e, agarrar-se a ela, ainda
que só por uma ponta...
Caitlin se surpreendeu ao saber o tanto que Blanka estava estudando, era
completamente alheia a chamada no telefone no corredor – um ruído agudo que os
residentes dos estudantes, muitos deles pregados pela nostalgia, podiam ouvir
através das paredes, inclusive em sonho. O pai de Blanka conseguiu chegar a ela
uma vez, mas a conversa foi forçada e cuidadosamente amigável coisa que
arruinou o estado de ânimo de Blanka por um dia inteiro.
Cada vez que estava fora, Blanka olhava furtivamente aos grupos de
estudantes mais velhos que gostavam de passar um tempo na entrada da cafeteria,
mas nos primeiros dias não viu Joaquim ou a qualquer outro dos Lobos.
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Ao final da semana, no entanto, deu-se conta de que Simon Nemec entrava
na cafeteria com uma alta pilha de papéis. Uma menina da equipe de voleibol de
Caitlin caminhou até Blanka com o polegar apontando para trás sobre seu ombro.
— Ouviu? — lhe perguntou casualmente. — Descobriram como a mulher
morreu.
Blanka parou o que estava fazendo. Desde certa distância podia ver os
estudantes que rodeavam o quadro de anúncios na frente da cafeteria. Uma garota
protestou quando Blanka ficou ao seu lado. Ela sentia os cotovelos em suas costas,
mas, finalmente, foi à frente da multidão e pôde ler o artigo do jornal copiado. — A
mulher morta foi identificada como Annette Durlain, de 54 anos de idade, de Brest,
em Bretaña. — um estudante de pé perto de Blanka lia em voz alta. — Seu
passaporte e pertences foram encontrados em um armário na estação ferroviária.
Na tarde de sua morte, a mulher havia visitado o Museu do Convento do Colégio
Internacional de Europa com um grupo de turistas. — Em vários lugares foi citado
o detetive Seibold. — Por que a mulher estava na Escola Internacional de Europa
naquela noite não foi determinado. Sua morte. — continuava o artigo. — Foi
causada definitivamente por uma queda pela escada. A investigação chegou à
conclusão que não se tratava de mais nada.
— Assim que foi um acidente, depois de tudo. — disse um garoto que se
meteu com dificuldade perto de Blanka. Atordoada, Blanka caminhou para trás até
que esteve de novo de pé longe do grupo. Um acidente. A palavra soava tão mal,
como se alguém houvesse dito ‘cesta’, mas na realidade queria dizer ‘coma’.
Blanka empurrou as mãos em seus bolsos e começou a caminhar para fora.
Junto à entrada estava pendurado um letreiro anunciando o novo calendário de
voltas pelo museu do Convento. Nessa escola realmente não perdem muito tempo
pelos mortos desconhecidos.
— Hey Blanka. — apesar de que havia corrido de uma maneira justa para
alcançar a Blanka, Caitlin não estava sem fôlego. Suas mechas ainda estavam
molhadas do banho. — Acabo de ouvir. — ela sorriu e afastou o cabelo do rosto.
Parecia que sua companheira de quarto, todavia, levava o aroma de magnésio em
pó e as bolas de couro gastas do ginásio. — Isso significa que a biblioteca será
aberta de novo amanhã. — Caitlin continuou. — Graças a Deus. Estava começando
a pensar que ia ter que estudar trancada em meu quarto até o exame.
Blanka se deteve bruscamente. — Isso é tudo que importa? — ela rompeu.
— O que acontece?
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— É um milagre que ninguém tenha se dado conta de que é uma pessoa, não
só ‘o corpo morto’, ou a razão para que você não possa ir { biblioteca. — Caitlin
olhou para Blanka com assombro, e logo levantou as mãos.
— Sinto muito, não me dei conta de que você estava levando tão a sério. Que
diabos você quer que façamos? Fazer um funeral para ela?
— Isso seria melhor que nada.
Caitlin fez uma careta e sacudiu a cabeça. Pela primeira vez, Blanka viu um
flash de ira em seus olhos verdes. — Blanka, você sabe, eu não sou um monstro,
mas... Assim, a mulher teve um acidente. É trágico, e terrivelmente triste, mas... A
vida continua para nós. A escola é difícil, as demandas que fazem sobre nós são
ainda mais difíceis, e quando você tiver feito seu primeiro exame verá que não
podemos nos permitir o luxo de desperdiçar nem um único dia. Essa é a forma que
é. Gostaria que fosse um pouco menos estressante, mas não é.
Blanka olhava o chão. Ela realmente quis tentar morder Caitlin, dizer-lhe
que poupava a conferência, mas ela tomou fôlego e se segurou.
— Não sou estúpida. — disse ela silenciosamente. — Acredite ou não, já
notei que as aulas, todavia, estão sendo seguradas. Mas simplesmente não posso
ver... Ela estava no museu pela tarde, porém ela morreu depois da meia noite. O
que ela fez no meio?
— Pelo visto perseguição a fantasmas. — foi à resposta seca.
— Quê?
Caitlin estendeu os braços. — Maddalina de Trenta. — disse de modo
dramático. — Seu vestido de bruxa está pendurado no museu.
— E?
— E ela frequenta esse lugar. Não quero te causar pesadelos, mas houve
estudantes e professores que juraram que alguém os seguia. Alguns inclusive
dizem ter escutado os pobres meninos órfãos chorando. Logo está o gemido, o
arrastar, e o uivo, o conjunto de acordo. — Caitlin abriu os olhos e continuou: — Se
soubesse a freqüência com que um ou outro diz que a bruxaria está diante dessa
caixa de vidro, como se tratasse de um santuário. Uma vez uma mulher da
sociedade se chamou ‘Novas Bruxas’ e tratou de se esconder no museu para que
pudesse passar uma noite junto à túnica de Maddalina. Louco, não? — ela riu. — O
homem, que deveria ir à Irlanda e passar a noite em algum castelo.
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A mulher que ia se esconder na biblioteca até o anoitecer e, logo descer para
estar perto do vestido da bruxa no sótão?
— Ela teve a má sorte de aprender de maneira difícil que as escadas não
estão iluminadas pela noite.
— Eu vou dizer. Não fecham o museu pela noite?
— Sim, claro. No entanto, outras pessoas quebraram o fecho
Blanka ficou em silêncio. A mulher morta não havia tido nenhum tipo de
ferramenta com ela ou escondida por baixo de sua roupa. Blanka deixou passear o
olhar de novo na notificação com o horário de abertura do museu. Deixa ir
sussurrou-lhe uma voz muito singela em sua cabeça.
Simplesmente faça sua tarefa, o resto não é da sua incumbência. Blanka
escutou essa voz por duas ou três batidas do coração, depois chegou a uma
decisão. Portanto, está encantado este lugar, pensou. E Annette Durlain
simplesmente caiu pela escada?
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Capítulo 4
Dança do cajado
Depois desses dias memoráveis, o fim de semana para Blanka parecia
como estar em uma ilha de tranqüilidade com um mar tormentoso cheio de sonhos
estranhos, sonhos nos quais Annette Durlain vinha e tratava desesperadamente lhe
dizer algo. Sábado de manhã no prédio da escola estava tudo deserto, mas fora
havia pessoas em todas as partes. Um fluxo constante de carros estacionava na
sessão de –visitantes -; pais, irmãos e irmãs chegavam para as visitas de fim de
semana. Blanka sentiu uma pontada de tristeza quando viu uma garota correr até
seu pai e abraçá-lo.
Olhou seu relógio. Quatro horas mais até o tour ao museu do Convento. Em
frente à casa senhorial, onde os garotos tinham seus quartos, os primeiros turistas
estavam sendo levados até os prédios. Um grupo foi admirar as colunas de cada
lado da porta, que dava ao prédio a aparência de um templo. As pessoas
apontavam até a estátua de pedra, uma imponente mulher que olhava as pessoas
com o rosto solene.
Blanka carregou sua mochila cheia de livros e, dirigiu-se ao banco do
parque pelo bosque de castanheiras. Caitlin havia tido razão em uma coisa:
ninguém aqui pode se permitir o luxo de desperdiçar nem uma única hora. Blanka
teria seu primeiro exame preliminar, de história, em duas semanas. Os livros
pesavam sobre seu ombro enquanto passava pelo espaço aberto para esportes. O
sol de maio há tempo havia esfumado a névoa da manhã. A pista laranja brilhava e
a área que servia de campo de futebol e atletismo estava deserta. Blanka acelerou o
passo, caminhando rapidamente pela linha que contornava a cancha de esportes.
Um barulho, agudo como o chiado de um chicote, interrompeu seus pensamentos.
O som provinha da direita – de trás do arbusto ouviu outro barulho. Um rouco
grito atravessou o ar. Blanka apertou sua mochila. Duvidou antes de se aproximar
do arbusto. Estendeu a mão e, pouco a pouco, empurrava os galhos para os lados.
Parte da mata apareceu, e um pedaço de tela enroscada. Ela se inclinou mais para
frente e, olhou através da brecha quase perdendo o equilíbrio. Aterrorizada,
retrocedeu. Um galho machucou seu pé. De repente, tudo teve sentido: à noite no
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parque, assobiando o pau diante de seu rosto, o medo – e a mulher morta. Blanka
respirou fundo e secou o suor de sua testa.
— Covarde! — repreendeu a si mesma. A curiosidade ganhou sobre seu
medo. Seu coração batia com força. Ela se aproximou da brecha de novo.
Sem as máscaras e peles, os Lobos quase não se viam tão ameaçantes.
Joaquim estava praticando tenazmente. Aterrissou cada golpe com perfeição. A
contra gosto, Blanka teve que admitir que ela admirasse sua coordenação e
movimentos rápidos. Sua companheira, uma garota loira, esquivou habilmente do
movimento de Joaquim, saltando para um lado. Outros dois Lobos se uniram
formando um círculo e rodeando a Joaquim, como se fossem capturá-lo. Parecia ser
a promulgação de um antigo ritual. Com os olhos virados, Blanka observou aos dois
novos lutadores, um garoto loiro magro e um menino pálido com o cabelo preso
em um rabo de cavalo. Era ele o que havia usado a máscara de ferro? Um quinto
lutador, um que Blanka não havia se fixado no princípio, era uma garota com pecas.
Seus movimentos pareciam mais brincalhões, como a dança.
Evitou o empurrão do cajado de Joaquim, torcendo a distância. Seu cabelo
de cobre fluiu atrás dela, dando voltas, e roçou no ombro de Joaquim. Um ruído
surdo. Blanka estremeceu involuntariamente. O golpe havia aterrissado. Joaquim
se dobrava de dor evidente. Aturdido, olhou a dançarina do cajado. Em um instante
sua cara ruborizou de ira. Ela lhe devolveu o olhar e se deteve. Os outros Lobos
pareciam ter se convertido em pedra. Blanka conteve a respiração. O jogo havia
terminado. O vento levou as palavras de Joaquim, Blanka poderia seguir o que
estava acontecendo, vê-lo endereçar-se pouco a pouco.
A jovem ruiva pegou seu bastão firmemente. Deu um passo para trás e
golpeou o chão com sua arma. Ela gritou a modo de resposta, mas Blanka só
escutou as últimas palavras:
—... Junto com ele nunca mais.
Blanka se fundia mais e mais pela abertura do arbusto. Até seus ombros
roçavam com a verde parede de arbustos. As pontas das folhas faziam cócegas em
suas bochechas. A garota de cabelo escuro se aproximou e sussurrou algo a ruiva.
Os outros dois Lobos permaneceram ali, sem saber o que fazer. A ruiva sacudiu a
cabeça com violência. A garota loira tratou de tocar seu braço em um gesto
conciliador, mas ela o afastou com a mão. Curiosamente todos os ruídos ao redor
haviam desaparecido. Blanka já não ouvia nenhum riso, nem o canto dos pássaros,
nem sequer o sussurro das castanheiras.
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A ruiva se retirou. Joaquim, com os ombros caídos, viu-a partir. Através do
arbusto, seu rosto se marcava com folhas verdes. Tinha uma expressão que Blanka
nunca haveria esperado: parecia assustado.
Os olhos dos Lobos silenciaram conjuntamente. Blanka tragou saliva.
Teria gostado de afastar o arbusto e advertir a garota, mas já era tarde
demais.
Foi ao mesmo tempo, quatro contra um. A ruiva habilmente se esquivou de
uns tantos golpes, mas então ela gritou e caiu, ofegando. Seu rosto sardento se
distorcia pela dor. Blanka podia ver uma marca de cor vermelha brilhante em seu
braço direito.
Os Lobos se colocaram ante ela em formação de batalha. Blanka tinha medo
de que a atacassem de novo, mas, de repente, deixaram seus cajados caírem.
Joaquim lambeu os lábios, para se concentrar.
A ruiva contemplou seus rostos escuros, perdida sem saber o que fazer. Fez
uma careta, e logo gritou com raiva. Por último, levantou, pegou seu bastão e se
afastou.
Correr com a pesada mochila não foi fácil. Blanka ofegava no momento em
que o estacionamento apareceu de novo em sua vista. Seu desejo de estudar havia
esfumaçado completamente. Para evitar as quadras de esporte, havia tomado o
caminho mais longo de volta, rodeando a casa senhorial. O último que queria era
ser descoberta pelos Lobos. Ao ver um casal de turistas, sentiu-se um pouco
melhor.
Sentir-se-ia melhor na segurança de seu quarto. Olhou sua janela. O dia
parecia mais frio de repente. O repentino rugido de cascalho a surpreendeu, mas
suprimiu seu forte impulso de correr. O certo é que Joaquim estava atrás dela, com
seu cajado de briga na mão, ela deu a volta.
A ruiva estava claramente tão surpreendida quanto Blanka. Sua bolsa de
esportes pendurada em seu ombro esquerdo – e ela também levava três cajados de
prática, cada um de diferente tamanho, debaixo de seu braço esquerdo. Blanka
notou os hematomas em seu braço direito, que já começavam a azular. Agora, a
menina levantou seu braço lesionado e limpou a boca e o nariz com o dorso da
mão. Seus olhos estavam inchados, como se estivesse chorando todo o caminho.
— O que você faz aqui?— perguntou a garota calmamente.
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— Estudando. — respondeu Blanka. — E você? O que fez para que te
deixassem ir?
Indicou os machucados e a garota resmungou como se acabasse de receber
outro golpe no mesmo lugar.
— Eu vi o que aconteceu. — disse Blanka em voz baixa. —Estão te
pressionando. Por que não quer seguir fazendo o que eles querem, não?
A menina lhe lançou um olhar venenoso.
— Assim que agora você se intromete em nossos assuntos?
— É interessante que depois da surra você continue falando ‘nossos
assuntos’. Que foi o que você não queria continuar fazendo?
— Não é da sua conta.
— Tem algo a ver... Comigo?
Sem prévio aviso, o braço da garota lampejou. Antes que pudesse entender
o que estava sucedendo, o cajado voava até ela. Instintivamente, ela o agarrou. As
palmas de suas mãos se machucaram pelo impacto, mas o cajado se mantinha
firmemente em suas mãos. Sua boca secou pelo choque.
— Boa reação. — comentou a garota deixando sua bolsa.
Blanka podia ver uma etiqueta de linha área e seu nome nela: Sylvie Kay.
— O que foi isso? — perguntou.
— O cajado é mais pesado do que parece, não?— isso não era certo, e
Blanka se deu conta de quão fortes e delicadas deviam ser as mãos de Sylvie para
fazer girar o cajado tão grande com tanta rapidez.
Com um movimento suave, a garota pousou os outros dois cajados no chão,
pegou o mais curto com a mão esquerda e, fez-lo girar em um círculo com graça ao
redor de sua cabeça.
— Não vai ajudar correr e se esconder. — ela disse seriamente. — Se quiser
permanecer nessa escola, não terá outra opção além de lutar.
— Novamente com você? Por quê? Não tenho nada a ver com você. — Sylvie
riu amargamente.
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— Nada em absoluto. — disse e jogou o braço para trás, pronto para tomar
impulso.
Blanka reconheceu que isso era uma lenta execução que devia praticar. Isto
lhe deu tempo suficiente para lhe arrebatar o bastão e deter o ataque. O cajado de
Sylvie ressoou contra a madeira, e Blanka podia sentir as sacudidas em cada
articulação de seus dedos. Ela deu um passo para trás e deixou cair o cajado.
— Eu não quero. — disse com firmeza. — Estou aqui para estudar...
Sylvie franziu os lábios com desdém e se apoiou em sua arma. Blanka
decidiu entrar em algo mais.
— Deve informar isso para a Madame Lalonde. — disse. —Não sei o que não
quer fazer, mas tem direito a encher o saco, se quiser, posso lhe dizer o que vi...
— Madame? UF. Agora me sinto muito melhor. — respondeu Sylvie, sua voz
jorrando em sarcasmo. — Não cometamos um erro com isso. Ela não pode
suportar perdedores. É muito agradável, certeza, mas trata de ir a ela e demonstre
que é um caso problema ou uma covarde. Não há espaço para eles em uma escola
de elite. Alguma vez você se perguntou por que dois terços dos estudantes não
passam no exame preliminar?
Blanka segurou seu bastão com força. Dois terços?
Sylvie soltou uma gargalhada quando viu seu rosto. Quando continuou, sua
voz soava dura: — Só nós estamos aqui claramente: ninguém ‘me detém’. Quando
pratica obtém contusões. Entendeu?
Quase se deu conta antes, mas Sylvie já havia se movido e Blanka notou uma
forte dor em seu braço.
— Está louca? — chorou Blanka. Não havia sido um golpe muito forte, mas
sua pele estava pulsando de todos os modos. Antes sabia o que fazia, agora
inclusive havia lhe tirado o bastão e a atacou. Sylvie se deteve como uma esperta,
em um movimento que quase não prestou atenção. Blanka teve problemas para
raciocinar, o cajado voava pelo ar tão rapidamente. Soou um chiado. Os dois
bastões cruzados flutuaram no ar.
— Assim é melhor. — disse Sylvie. —Você tem bons reflexos. Só podia usar
minha mão esquerda, como agora, você pôde inclusive...
Blanka abaixou seu bastão e o deixou cair nos pés de Sylvie.
— Não é o meu. — respondeu. — Você está realmente louca.
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— É sua decisão, mas, nesse caso, mantenha sua porta fechada. — Sylvie riu.
— De fato, será melhor que feche todas as portas que encontrar.
— Oh, tenho certeza que Joaquim romperá todas as portas se precisar. —
Blanka ainda não encontrava o tom depreciativo que estava buscando.
— Quem está falando de Joaquim?— perguntou Sylvie em voz baixa. Deu a
Blanka um último sorriso e pegou os bastões. — Desfrute do tour. — disse,
deixando Blanka estupefata de pé no estacionamento, enquanto observava como
Sylvie se afastava.
Ao redor de vinte turistas se acumularam na porta do sótão do museu. A
maioria deles folheava um folheto, não muito diferente do cartão de informações
dos estudantes. Havia também um diagrama da fundação do antigo Convento, e
uma foto aérea do cemitério dos órfãos. Ao se dar conta que a mulher que havia
morrido também esperava na porta, Blanka se sentiu como um escorregadio
ladrão em um quarto proibido. Cautelosa. Passo os dedos sobre as marcas
vermelhas na parte inferior do braço, logo se converteria em uma mancha roxa. Os
Lobos estavam planejando algo, disso tinha certeza. A sociedade não era tão
inocente como dizia Madame. Como sabia Sylvie que queria fazer o tour? Caitlin
havia sido a única pessoa com quem havia falado disso. Pode que Caitlin...? Blanka
estremeceu e puxou a manga de sua jaqueta até cobrir a marca vermelha. Ao seu
lado, dois turistas estavam falando em voz baixa, em francês e muito rápido. Uma
grande lente de câmera pendurava do pescoço de um homem apontando
diretamente para Blanka. Rara vez em que ela havia se sentido tão exposta.
Quando um rítmico tilintar, todas as conversões morreram. Blanka se transladou
diretamente atrás do casal francês.
O Sr. Nemec deu a volta na esquina e olhou para o grupo de turistas.
Reconheceu Blanka imediatamente e, ergueu as sobrancelhas. Na luz fluorescente
do corredor, o velho parecia um fantasma: suas bochechas pareciam fundidas e
havia uma barba desigual, onde a navalha de depilar havia se perdido. Em silêncio,
passou por entre o grupo e abriu a porta.
O lugar em que entrou tinha um teto baixo e as paredes cobertas por painéis
de luz com cheiro de madeira. O assoalho do piso era tão velho que, em alguns
lugares, havia se inclinado pelo peso de incontáveis passos. As cores da madeira
utilizada no assoalho eram de distintos tipos e seguiam um padrão de figuras
geométricas. Blanka não podia deixar de ver as intersecções e eclipses. As colunas
dividiam o lugar em uma pequena zona principal e um corredor a rodeando, a
arquitetura, provavelmente, supõe-se que se lembre de um Convento claustro.
Os turistas ficaram em silêncio e olharam ao seu redor, surpreendidos. Ao
longo das paredes havia filas de caixas de vidros. Na parede, frente à entrada,
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pendurava o fragmento de uma velha e impressionante porta, a entrada original do
Convento, decorada com m alivio de talhado intricado. Dos doze turistas que
haviam olhado, seis ficaram e o lado esquerdo da porta estava perdido.
O Sr. Nemec era um guia de turista muito dotado. Com uma voz monótona
soltou a informação.
— Em 1641, deu-se a Maddalina de Trenta a liderança do Convento de
Belverina. A maioria dos documentos dessa época foi destruída depois do juízo das
bruxas e a dissolução da Ordem e, o orfanato seguiu o fato. O único que resta é uma
parte da transcrição original da prova da abadessa. Ademais, a fundação de
Maddalina de Trenta conseguiu comprar com proprietários privados alguns dos
tesouros de arte que, alguma vez, foram usados nesse Convento. Igual este, por
exemplo... — indicou uma vitrine, nela havia uma mala com um desenho estriado
em ouro.
O casal francês buscava nas folhas de um dicionário pequeno. Um jovem
casal murmurava entre si, sorrindo sobre a pronunciação confusa de Nemec.
Blanka olhou ao porteiro e chegou à conclusão de que, provavelmente, havia
estado bebendo.
— E aqui se vê o vestido da bruxa. — continuou. — Maddalina de Trenta o
usava durante os interrogatórios. — com essas palavras, deu a volta até a parede. O
efeito havia sido bem calculado, e um murmúrio recorreu o grupo. Blanka
estremeceu. Na calça, havia um usado tecido grosso que estava iluminado. Fios de
nylon quase invisíveis estavam pendurados. Nos lugares onde, no vestido, deveria
estar o pescoço e o peito, havia um encaixe de metal que brilhava através da tela
surrada que faziam parecer que havia um corpo. Parecia que uma mulher invisível
levava essa longa túnica. Onde se encontrava a área dos pés, havia um papel com
uma estreita escritura. — A transcrição do interrogatório. — enquanto o Sr. Nemec
explicava, outra luz se acendeu, iluminou uma máscara de ferro, com chifres e
aberturas de ferro no lugar dos olhos. Tinha uma remota semelhança à máscara
que um dos Lobos havia usado aquela noite.
— Olhem a agulha ao lado da máscara da vergonha. — disse o porteiro. —
Foi usado para provar as bruxas. Marcas. Se um preso acusado tinha uma marca de
nascimento ou um lunar, seus acusadores cravam uma agulha nisso. Se o acusado
não sentia dor e não sangrava, em seguida o declaravam como uma bruxa. —.
Nemec sorriu com frieza, ele estava olhando com a boca aberta. — Esta agulha é
original daqui, por certo, é uma mecânica obra mestre e teve clara sua intenção de
enganar. Quando se pressiona nela, retrai-se em seu eixo, sem dor, nem sangue.
Blanka tentou de novo imaginar a mulher que havia morrido nesse mesmo
lugar. Havia lido essas palavras? E, se é assim, que queriam dizer com elas? Blanka
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se perguntou se ela como Blanka, havia olhado a transcrição do interrogatório e
havia tentado decifrar as palavras entrelaçadas.
—... Ele perguntou a Maddalina de Trenta (sim ela) Sua pessoa havia sido
rainha das bruxas de (nos bailes de bruxas) entre as bruxas e os Feeds1
Tratando de que o Sr. Nemec não a visse, Blanka pegou seu bloco de notas e
copiou as palavras, exatamente iguais a como foram escritas. Ela olhou duas vezes
para estar segura de que Feeds realmente tinha dos – E - s. Justo quando estava
terminando, uma sensação de formigamento recorreu à parte posterior de seu
pescoço, isso a fez levantar os olhos de seu caderno e olhar ao redor. A princípio
estava assustada, porque acreditou ver o garoto com o cabelo cobre esbranquiçado
dos Lobos, mas logo suspirou de alívio. Era só um turista, um que não tinha notado
antes. Era alto e magro, o turista havia colocado suas mãos nos bolsos de sua
jaqueta de couro. Seu cabelo loiro brilhava com a luz da vitrine. Estava buscando o
olhou lado, mas tinha um fingido interesse.
Blanka rapidamente voltou ao traje da bruxa, mas desta vez ela não olhou a
exibição, mas sim se fixou no reflexo do vidro. Podia ver o casal francês atrás dele,
estava olhando sobre seu ombro – e a esquerda estava o garoto com a jaqueta de
couro. Blanka supôs que devia ter uns dezoito anos.
Não se via como alguém que passasse seu tempo livre olhando uma amostra
história. E ela no caminho certo: como se ele houvesse estava esperando por ela
para se mover, voltou a olhá-la de novo. No reflexo, ela pôde ver seu rosto sério e
estreito, os lábios curvados. Com uma estranha intensidade examinou Blanka dos
pés a cabeça, como se a estivesse memorizando. Ela foi para um lado, evitando seu
olhar. Quem está falando de Joaquim? As palavras de Sylvie ressoaram em sua
cabeça. Inquieta, cravou seus olhos nos vidros da caixa, que havia sido selado com
silicone.
Havia estado Annette Durlain aqui também, observada por um estranho?
Blanka se deu conta que em algumas partes o silicone parecia novo – transparente
e intocado como sorvete fresco. Um turista se aproximou, empurrando Blanka um
pouco. Agradecida, ela se abaixou, escondendo-se atrás do vidro, e examinou a
borda do manto da bruxa.
Deu-se conta de algo bem no fundo. Franziu o cenho e se inclinou mais para
frente. Perto da dobra desfiada podia ver uma mancha escura. Poderia ser uma
1 Feeds: a palavra está mal escrita, Feeds com dois E não tem significado (ao menos não segundo o
contexto do livro). É por isso que mais abaixo aparece que Blanka se questionou se tivesse dois E. No
entanto, a palavra feds em espanhol significa federais.
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Capítulo 5
Sonhos
O som da chaleira despertou Blanka com um sobressalto. Sua camiseta
estava grudada ao seu corpo, e ela estava tremendo. A lâmpada de leitura, que ela
havia acendido de noite, todavia estava ligada. O sonho que havia tido havia sido
inclusive pior que as outras noites. A mulher na roupa enrugada parecia querer lhe
dizer algo desesperadamente, mas não pôde graças a Joaquim. Ele estava rugindo,
brigando com seu bastão de luta. Por um momento Blanka pensou que, todavia,
podia ver a máscara de ferro da vergonha que lhe sussurrava segredos no ouvido,
logo essa imagem desapareceu também, deixando-a sozinha em suas úmidas e
retorcidas folhas.
Seus livros de matemática descansavam no chão como um pássaro com suas
asas estendidas. Ela escutou os pássaros no cemitério dos órfãos e, lentamente,
deu-se conta que já era de manhã. Pareceu-lhe estranho que não pudesse detectar
nenhum movimento no quarto de Caitlin. Só a água fervia, como se a chaleira
houvesse sido ligada por uma mão fantasma. Normalmente Blanka podia escutar o
bater dos pés de Caitlin na escuridão, e logo o gorjeio da água quando ela
depositava a água mineral de sua garrafa na chaleira – ela nunca usava a água da
torneira para o chá.
Blanka olhou para a porta que conectava os quartos, a qual estava um pouco
aberta. Não havia movimento. Com um clique, o interruptor da chaleira passou a
posição off. O borbulhar se deteve. Um momento depois ela escutou o som do
alarme de Caitlin, que ela ligava também nos finais de semana, assim não perderia
o café da manhã. A luz se mostrou através da abertura por baixo da porta. Aliviada,
Blanka seguiu os passos de sua companheira enquanto foi até a chaleira. Um
segundo depois, ela podia ouvir Caitlin colocando água nos copos. Ela girou para
fora da cama.
— Oh, bom dia. — Caitlin sempre parecia especialmente bem pela manhã.
Suas bochechas eram rosadas e seu cabelo alvoroçado pelo gel. Ela abriu os olhos
com assombro. — Você está horrível! Está doente? Seus olhos estão inchados...
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Blanka forçou um sorriso torcido.
— Dor de cabeça. — ela disse. — Então agora tem controle remoto para a
cafeteira?
Caitlin alcançou o encaixe da parede e alcançou a Blanka uma pequena
caixinha de aspecto estranho, todavia ainda unida ao encaixe. Blanka se sentou na
cama de Caitlin e a girou uma e outra vez em suas mãos.
— Rádio operador com temporizador. — disse Caitlin. — Jan o instalou
ontem, enquanto você estava no museu.
— Jan quem?
— Você sabe quem é ele!
— O garoto que está na minha sala?
Caitlin assentiu. — Ele é agradável. — ela disse com um sorriso de
cumplicidade.
— Desde quando você perde tempo com meninos?
— Meninos? Jan tem dezenove.
Blanka olhou desde o temporizador, assombrada.
— De verdade? Ele parece que tem quatorze. Quantas vezes ele teve que
repetir um ano?
Caitlin parou de rir. — Pergunte você a ele! E, por certo, ele me disse que
acha você bem agradável. Eu acredito que ele se decepcionou por você não estar
aqui ontem.
— Sério? Bom, eu penso que ele é como um estranho. Por que um fenômeno
da arte construiria interruptores como esses?
— Como eu disse, pergunte você. Está tudo BEM falar com as pessoas,
Blanka!
— Sim, você é um bom exemplo disso! — escapou com um tom forte
demais, e Blanka lamentou seu tom imediatamente.
— Que se supõe que isso significa?
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— Disse a Sylvie que ia ao tour do museu?
Agora Caitlin estava realmente perplexa.
— Era um segredo? Não, não disse a Sylvie. Mas umas tantas garotas no
meu time de vôlei sabiam que eu ia estar sozinha no meu quarto porque você ia ao
tour. Por que está me interrogando?
— Estou tendo sonhos ruins.
— Não mude de tema. O que está acontecendo?
Agora a voz de Caitlin soava cortante. Blanka se deu conta que havia
chegado muito longe. Resistindo a urgência de começar a gritar com sua
companheira, ela se recompôs.
— Nada. — murmurou.
— Não tente me enganar! Desde que foi a esse tour apenas disse uma
palavra. — Caitlin se sentou na borda da cama, e passou uma xícara de chá quente
a Blanka. — É muito sério, Blanka. — ela disse gentilmente. — Não estou tratando
de dizer como você deve viver sua vida, mas não te vejo feliz. Há algo que eu possa
fazer?
Blanka olhou sua companheira de quarto pensativamente. Ela na verdade
parecia preocupada. Envergonhada, ela pôs um pouco de seu cabelo para trás da
orelha, e começou a lhe dizer o que ela havia estado esperando.
— Se eu te digo, promete que não vai tratar de me persuadir para ir à
Madame Lalonde?
— É sobre os Lobos, não é? Está tendo problemas com eles?
— Eles parecem ter problemas comigo.
Ela disse a Caitlin tudo sobre o que havia visto no campo de esportes e,
algumas de suas conversas com Sylvie. Ela não disse nada, mas, sobre as
advertências de Sylvie, o machucado em seu braço, ou o estranho garoto de jaqueta
de couro.
— Então é isso. — disse Caitlin aliviada. — Por que não me dissesse ontem?
Certeza que teria dormido melhor. Eu já sei sobre o argumento. Era sobre o festival
medieval. Cada agosto, a cidade se converte em um mercado medieval e os Lobos
normalmente dão uma demonstração de briga de bastões. Sylvie não quer fazer
parte disso desta vez, ela deu para trás. Muito estresse com a escola.
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— E então eles bateram nela?
— Escute; os Lobos têm suas próprias regras, e eles dão um jeito em seus
mal entendidos do jeito deles.
— Sim, essa parece ser à maneira da escola. Todo mundo tem que olhar por
si próprio.
— E só alguém tão espinhoso como você diria isso. — respondeu Caitlin
com um sorriso. — Você acha que todo mundo está ai fora para te pegar. E você
não se dá conta que há pessoas aqui que você agrada de verdade, e não as deixa se
aproximar.
— E o resto de vocês não parece notar nada – uma mulher cai das escadas e
morre, e daí? Um estudante é ferido, só porque quer dar para trás em uma coisa
medieval, então? Eles têm suas próprias regras. Há alguém aqui que se preocupe
pelo que acontece com as outras pessoas?
Para sua surpresa, Caitlin pôs seu braço ao redor do ombro de Blanka.
— Eu me preocupo pelo que acontece contigo. — ela disse. — Esta não é
como as outras escolas. Aqui todos nós temos que aprender a solucionar nossos
próprios problemas. É duro ao princípio, eu sei. Mas só para te reassegurar, sim, os
Lobos estão loucos. Alguns, se por acaso, são agradáveis. Tobias, o garoto que usa a
máscara de músico, saiu por um tempo com Jenna, a garota que vive no seu quarto.
Caitlin riu. — O que você quer que eu te diga? Que ele a forçava para que
uivasse baixo à lua com ele? Isso é idiota, os Lobos são apenas uma sociedade, nada
mais. Jenna e Tobias têm algo, e ele rompeu com ela. Mas isso não foi precisamente
a falta dos Lobos, mais de Tobias, porque ele saía muito seguido com uma garota
de sua turma de química.
— E Joaquim?
— Bom atleta. Algumas vezes um pouco arrogante e tem um fusível curto,
como ontem. Mas não é o trabalho dele proteger a Sylvie. Todos nós temos que
fazer nossas decisões.
— Quantos Lobos estão aqui juntos? — perguntou Blanka depois de poder
falar tudo isso.
— Joaquim, claro. Tanya, Tobias, Martin e Sylvie. Esse é o grupo inteiro.
— Tem algum... Garoto loiro no grupo, um que veste uma jaqueta de couro?
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Caitlin franziu o cenho. — Hmmm... Não que eu tenha me dado conta. Talvez
algum dos novinhos, mas em alguns casos eles estão aqui apenas pela competição
de bastões. — seu rosto se suavizou. — Escuta; eu não acho que os Lobos querem
algo com você. Mesmo com o que eles fizeram no primeiro dia, não foi nada
pessoal. Eles escolhem a alguém para incomodar no primeiro dia. Se eu fosse você
não me preocuparia em nada por isso. Só fique ali por algumas semanas mais. E, se,
todavia, você continua sendo incomodada, logo vem e me conta ok? Prometo. Não
irei correr para a madame. — ela olhou diretamente a Blanka. — E um dia, você
terá que me dizer o que a sua mãe fez de tão terrível para que você precise
inventar desculpas cada vez que ela liga.
Blanka piscou. —Você pensa que eu dei uma volta, ou não?
Caitlin riu e lhe deu um empurrão amistoso. — A princípio tinha medo do
que você fazia. — admitiu. — Madame é genial, mas porque sou a presidente
estudantil ela faz que eu me encarregue dos casos problemas. Mas qualquer um
que tenha passado o que você passou teria sonhos ruins. — Caitlin bocejou e olhou
o relógio do rádio. — Vamos! Se não nos apressarmos, não vamos tomar café. —
ela se levantou com um pulo e abriu uma caixa, a qual rugiu em sinal de protesto.
Blanka tomou um gole de chá e olhou o líquido âmbar. Cheirava a laranja e
baunilha.
A biblioteca se supunha que voltaria a abrir na manhã de terça. Blanka
estava tão impaciente que apenas podia se concentrar em sua aula. Tão logo como
o sino soou, ela pegou suas coisas e foi a primeira a sair da sala. Hoje os corredores
lhe pareciam particularmente largos. Os outros estudantes foram diretamente para
a cafeteria, mas Blanka se virou no corredor que se dirigia dos laboratórios de
biologia à entrada principal do colégio, e desde ali, rapidamente cruzou o terreno
até a biblioteca. Por cima da alta porta dupla estava pendurava uma placa de aço
polido, gravado com o tema do colégio: Porta Post Portam – um convite para tratar
de abrir mais portas de conhecimento. Blanka passou pela porta ao ar livre. De
repente, sentiu uma mão em seu ombro. Ela deu a volta aterrorizada.
— Sinto muito. — ofegou Jan. — Eu não queria te assustar. Não me ouvisse
chamando?
Blanka suspirou fundo. — Não. O que foi?
Ele pôs a mão em seu bolso e tirou um pedaço de papel amassado.
— Do Mrs. Catalon. Saiu com tanta pressa que não a ouviu nos chamar de
volta. Folha de trabalho – previsto para depois de amanhã.
— Ok, obrigada.
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Jan olhou como Blanka dobrava o papel e, distraidamente, o colocou em sua
mochila.
— E que? — ele perguntou. — Como você está?
— Bem. Por quê?— ia ser isso uma conversa amistosa, de companheiro de
aula a companheira de aula?
— Caitlin disse que você... Esteve perguntando por mim.
De repente tudo de Blanka caiu, e quase gemeu em voz alta. Duas almas
solitárias que estavam destinadas a se encontrar. Que inteligente plano de Caitlin.
Em algum lugar longe no corredor, uma porta se fechou.
— Na verdade, eu só estava perguntando sobre esse temporizador que você
fez para a chaleira.
Ele não estava nem surpreendido nem decepcionado. — Não é nada
especial. Improvisei algo na aula.
— Está fazendo curso de oficina também?
Jan sorriu. Ele, todavia aparentava quatorze, ainda que tivesse um novo
corte de cabelo.
— Não, só o curso de projeto-arte. Chama-se ‘Volte a Metrópole’. Estamos
construindo um modelo desta cidade de cinema mudo.
De repente ficou sério, e olhou ao seu redor ansiosamente. Ele se aproximou
um pouco mais perto dela. Blanka se deu conta de que ele não era mais alto que
ela. — Na verdade... Eu queria-te dizer que sinto, eu te abandonei durante o tour de
meia noite. Eu realmente achei que você estava atrás de mim. Se houvesse sabido
que eles iam te deixar ali, teria voltado.
— Está bem. — respondeu Blanka. — Não se preocupe, precisa de muito
mais que isso para me intimidar.
Jan a olhou duvidoso. — Isso eu espero. — disse. —Eles não parecem
particularmente gostar de você.
— Bem observado. Você realmente tem dezenove anos?
— Sim, isso é correto.
— Por que você está só no décimo ano?
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— Isso é um interrogatório? — perguntou incomodado. — Estive um tempo
fora do colégio.
— Esteve... Doente?
— Sim, algo assim.
— E agora está interessado em arte.
— Na verdade só em argila. — ele sorriu, inclinou-se mais próximo, e
sussurrou: — Eu não tinha um forno grande em casa.
Ele lhe deu uma piscadela, deu meia volta e se dirigiu pelo corredor vazio. O
celular de Blanka começou a vibrar no bolso de sua jaqueta. Ela o pegou e viu que
era sua mãe.
Ela estava segura de que não se renderia facilmente! Blanka olhou a calça
até que o telefone vibrou pela décima quinta vez. Logo desligou o aparelho,
colocou-o com força no bolso e secou os olhos com a manga. O hematoma em seu
braço doía. Uma vez mais ela sentia esse embotado sentimento de vazio.
As paredes da biblioteca estavam escuras do pó que a polícia havia utilizado
para comprovar marcas digitais. Uma nota na porta de vidro avisava que as
renovações estavam em progresso. Enquanto Blanka entrava no lugar com as
mesas de leitura, seu estômago se revolveu e ela sentiu como se estivesse em uma
montanha russa. Cada rastro da mulher morta havia sido erradicado. As escadas e
a grade de aço já haviam sido esfregadas e limpas, e o chão de pedra brilhava.
Blanka olhou a mancha onde a mulher havia jazido, e procurou em sua mochila por
um longo tempo desnecessário. Finalmente se armou de valor e passou olhos
baixos, mantendo-se tão longe como podia da atual mancha.
O primeiro piso da biblioteca estava como o colégio, banhado em luz, e suas
paredes de vidro e aço polido davam ao lugar a aparência de um moderno edifício
de escritórios. As cadeiras estavam desenhas ergonomicamente e, as luzes de
leitura pareciam braços estendidos de robôs.
Sentindo-se como uma intrusa, Blanka preencheu sua solicitação para o
laboratório de idiomas e, obteve seu cartão de usuário para as estações de trabalho
do computador. Ela podia sentir sua caderneta com as notas que havia feito sobre
Annette pressionando contra ela. Deu um passo perto da fachada de vidro que
dava para a larga escada e as mesas de leitura abaixo. A direita da máquina de
bebidas, uns quantos estudantes estavam usando algumas mesas como uma
cafeteria. Um garoto loiro levando uma jaqueta de couro não estava entre eles. Ela
contemplou a mancha ao pé das escadas. Por um momento, imaginou que podia
43
ver a linha de uma figura, e estremeceu. Como pôde Annette Durlain ter caído tão
lentamente pelos degraus? Ela havia aterrissado no chão a direita do lado da grade
– não teria se agarrado automaticamente nelas ao pegar a si mesma? Blanka olhou
ao redor, e quando esteve certa de que ninguém a estava olhando, pegou sua
caderneta e desenhou a escada. Ela desenhou uma linha do corpo de Annette
Durlain, indicando sua posição no que ela podia lembrar.
Detrás dela apareceram corredores de estantes de aço, aparentemente
intermináveis. Lentamente Blanka voltou. “Idiomas”, leu em um letreiro, atr|s
“Francês III”. Uma biblioteca cheia de livros de colégio. Annette Durlain havia
estado escondida ali durante sete horas. Blanka pôs seu lápis na mochila e
começou a caminhar pelos corredores, imaginando a Annette Durlain buscando um
lugar para se esconder. Não haveria sido fácil. As estantes estavam em ângulos
retos com a parede, e você podia ver através delas. Inclusive na área de salas de
estar, apenas havia um lugar onde você seria invisível. Uma estreita porta conduzia
a uma escada, mas estava bloqueada. Não era provável que Annette Durlain tivesse
uma chave. Uma e outra vez Blanka pegou seu caderno e anotou as esquinas que
ofereciam alguma proteção da vista. No outro extremo, uma ampla porta estava
entreaberta. Blanka ignorou o sinal de “Privado” e entrou na sala contigua.
Cheirava a barris de madeira velha.
Era outra sala cheia de livros. Blanka passeou acima e abaixo, corredor por
corredor. As obras de Freud estavam aqui, e outros clássico psicológicos, como as
teorias C. G. Jung. Blanka se deu conta do tapete desgastado e se deteve. Algumas
das estantes estavam em rodinhas – e um deles estava um pouco fora do lugar.
Havia um buraco evidente onde uma rodinha havia pressionado uma vez o tapete.
Silenciosamente Blanka caiu de joelhos, e se aproximou sobre o lombo dos
livros. Detrás deles havia só uma parede – mas era possível empurrar a estante
para o lado e se esconder atrás? Ela lutou para puxar a estante para frente. Podia
movê-la apenas um centímetro por vez. O resultado foi decepcionante. A parede de
trás estava recém pintada. Ela podia ver um remanente de fita adesiva no
interruptor de luz. Obviamente a estante havia sido movida só pelas renovações.
Blanka se sentou no chão e contemplou as filas inferiores de livros na estante
adjacente. “O Mecanismo dos Psicotrópicos Selecionados” era o título em um dos
mais grossos. Cuidadosamente pegou o livro e começou a folheá-lo. Centenas de
termos técnicos. Se você ler crendo, pode imaginar ao homem como um kit de
construção química. Só havia que equilibrar as substâncias, os hormônios, ao fluxo
de adrenalina; tudo seguido de um plano que poderia ser calculado. O luto era
quantificado. Ou não?
Ela fechou o livro com um golpe e ergueu o olhar. Podia ouvir algo! Sentou-
se e escutou imóvel, até que pôde distinguir o som, um choramingar. E vinha direto
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do corredor ao lado. Blanka se arrastou mais próximo da estante. Através do
buraco deixado por seu livro podia ver jeans escuros. Algo soou, apareceu um
joelho, logo o buraco ficou as escuras e, de repente, ela estava olhando a cara de
Simon Nemec.
— Pensei que era você. — lhe disse com voz rouca. O forte cheiro a menta
de seu fôlego não acabava de cobrir o cheiro do álcool. Ele desapareceu e surgiu de
novo ao redor da quina. A jaqueta esportiva que sempre usava estava esfregada
nos cotovelos e parecia lamentável a dura luz do meio dia. Pega no ato, Blanka
ficou de pé.
— O que você está fazendo? — grunhiu.
Blanka se apoderou de seu caderno com firmeza e mostrou um sorriso
inocente.
— Procurando? — disse em voz baixa. — Não estamos autorizados a
permanecer na biblioteca?
Em silêncio se olharam. Os olhos de Nemec estavam ligeiramente
vermelhos, como se tivesse um resfriado.
— Não há nenhuma razão para que você esteja aqui. Isso é parte da
biblioteca de referência, unicamente para os da faculdade.
— Onde diz isso?
— Nas normas da biblioteca que, obviamente, você não leu. E o cartaz que
diz ‘Privado’? Lesse isso? — Blanka sentiu que seu sorriso de confiança se derretia.
— Eu chamo isso de espionagem. — disse Nemec. — E não ache que não me
dei conta de que você estava no escritório da Sra. Lalonde. — Nos entendemos?
O coração de Blanka deu uma volta. O olhar que lhe deu Nemec devia ter um
aspecto patético, para que lhe provocasse um sorriso triste. Vacilante, Blanka
assentiu.
— Bem. — inclinou-se para frente e apontou o caderno que Blanka segurava
fortemente. — E agradeça que eu não confisque suas anotações. — disse. — Aposto
que iria encontrar algumas coisas que não tem nada a ver com sua tarefa, certo?
Só então Blanka se deu conta da bandagem sobre a mão direita.
— O que você fez na mão? — perguntou em voz baixa.
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Nemec cruzou os braços e olhou a Blanka. — Resvalei. Trabalhando nas
renovações.
— Você é surdo?
— Por que quer saber?
— Geralmente as pessoas destras têm mais probabilidades de machucar a
mão esquerda.
— Suponho que pensa que é muito inteligente. — disse. — Se realmente
quer parecer inteligente, então voltará rapidamente à área dos estudantes.
***
Os sonhos chegaram como ladrões na noite, subindo por sua cama e
entrando em seu cérebro. Em lugar da túnica da bruxa, às vezes era a mãe de
Blanka a que estava na vitrine, uma boneca de cera triste. Ela levava o uniforme
vermelho e branco do restaurante de Mountain View, que sempre a fazia parecer
um pouco pálida demais.
Annette Durlain, envolvida em seu casaco, estava de pé junto à vitrine. Um
rosto se refletia no vidro, Blanka havia esperado ver os traços de Nemec, mas, para
seu horror, deu-se conta de que era o garoto da jaqueta de couro. Não se atrevia a
olhar para a esquerda, direto em seus olhos. Em troca, viu no reflexo como buscava
no interior de sua jaqueta e tirava a agulha brilhante de uma bruxa. Via-se como
uma adaga. Blanka gritou e correu a vitrine, mas um muro de calor a deteve em
seco. Os traços de sua mão começaram a se derreter e gotejavam como pele de cera
de cores em seu uniforme. Blanka gritou, mas sua voz soou chiada, como uma
porta. De repente, um vermelho e quente sol brilhou junto a Blanka.
Tinha rosto e parecia um antigo gravado de cobre cobrando vida. Os raios
piscaram e, só então, Blanka viu o leão. O animal era gigantesco, tão grande como o
sol. Blanka tropeçou para trás e chocou contra uma parede quente. O leão se
agachou e saltou. Suas garras entraram no sol, e enterrou seus caninos na esfera
brilhante, mordendo-o como se fosse uma presa. O cheiro acre da besta e a fuligem
estavam por todas as partes. O garoto da jaqueta de couro ergueu a afiada adaga.
Annette Durlain se dobrou sobre si mesma com terror. O Sol gritou.
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Blanka acordou sobressaltada e pressionou o interruptor de luz com os
dedos escorregadios pelo suor. Não passou nada. A sala continuou sendo um
buraco preto. Só o som do interruptor da lâmpada de leitura, que Blanka manteve
pressionado, perturbou o silêncio. Obviamente, o foco havia se apagado. Blanka
limpou as mãos no lençol e ficou na escuridão. Passou um momento tratando de
respirar com calma.
O silêncio no dormitório era opressivo. Blanka deixou para trás a roupa de
cama, e sentiu que, em seu caminho até a porta, seus joelhos tremiam. Por sorte, só
havia baixado as persianas até a metade na noite anterior. Pouco a pouco podia
distinguir o contorno da cadeira, a porta, e junto a ela a mais ligeira revisão do
interruptor da luz do teto. Quando fez um clique nele, fechou os olhos com força,
esperando uma luz brilhante. Não aconteceu nada. Um corte de energia – e tinha
que ser agora! A incerteza chegou de novo, ao fazer seu caminho de volta a sua
mesinha, esperando que suas chaves estivessem ali. Sim. As chaves fizeram um
ruído enquanto as pegava e buscou a pequena lanterna LED adjunta ao cadeado.
Através da ampla brecha entre a persiana e o parapeito da janela, podia ver uma
parte do estacionamento. Ela deu um suspirou e ficou imóvel, sem respirar, com
suas chaves nas mãos. Alguém estava ali, meio se afastando dela.
Blanka se inclinou para frente sobre a mesa. As bordas irregulares das
chaves se cravaram em sua palma. Estava sonhando. Todavia devia estar
sonhando! Debaixo da janela se encontrava Annette Durlain. A figura ficou ali –
preta e sombria apenas distinguível na noite cinzenta do cascalho do
estacionamento. Blanka olhou em seu esforço por distinguir o perfil. A borrada
sobra parecia estar mudando de forma. Poderia ser uma mulher com um casaco,
sim – mas, de repente, o fantasma parecia um homem em uma capa escura. —
Nemec?— se perguntou. Os Lobos? Como se houvesse sentido o olhar de Blanka, o
fantasma virou a cabeça preta para as costas e olhou para cima, à direita, a janela
de Blanka. No mesmo momento em que Blanka sentia como se ela tivesse a visão
de um gato. Parecia lógico que agora ela poderia ver o que estava usando – um
hábito de monge? Ela sentiu mais que ouviu uma voz ressoando dentro dela, como
um eco. Não houve palavras, só um sentimento, uma certeza de que algo estava se
aproximando – uma batalha, um... Perigo? A sombra de um braço negro se elevou
no ar, como se o fantasma a agitasse para ela.
Blanka se jogou para o lado tão rapidamente que bateu a canela com a cama.
A coisa não pode tê-la visto nesse quarto escuro. No entanto, seu coração batia
como louco. Esperou vários minutos, durante o que lhe pareceu um dia inteiro, e só
então se atreveu a dar uma olhada cuidadosa na janela – desde a mesma borda,
para que pudesse se retirar de vista rapidamente. A figura havia desaparecido. Só
um raio lhe chamou a atenção. E havia algo que poderia ter sido um cigarro aceso.
Blanka se fundiu em sua cama e se cobriu com o lençol. Agora estava segura de que
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alguém estava fora de sua porta. Joaquim e os demais – o garoto da jaqueta de
couro, a estavam esperando para arrastá-la até o rio. Talvez fosse um dos Lobos.
Levantou e se arrastou até a porta. Uma vez ali, pôs a orelha contra a madeira e
escutou.
Supostamente, pareceu-lhe ouviu um ruído de raspado. A maçaneta da
porta se sentia fria ao tato. Logo se moveu debaixo de sua mão. Alguém estava
pressionando para baixo a maçaneta da porta! Blanka retirou a mão como se
houvesse se queimado com ela. Sem fôlego enquanto observava a maçaneta em
movimento. Alguém estava comprovando se a porta estava fechada com chave. A
chave caiu de sua mão e caiu sobre o tapete com um suave tilintar. Nesse momento
as luzes se acenderam de novo. Surpreendida, Blanka retrocedeu e bateu no sofá,
perto da porta.
Foi muitos milhares de batidas de seu coração mais tarde, ou isso pareceu,
que ela se atreveu a pegar seu guarda chuva, para usá-lo como arma se necessário.
Mas a maçaneta da porta não se moveu mais. Silenciosamente, Blanka pegou o
chaveiro e abriu a porta com a chave. Guarda - chuvas em mãos, ela se aproximou
pela porta. No corredor vazio, a tela digital do relógio da parede brilhou e, então
saltou de novo a hora. 03h48min AM.
48
Capítulo 6
Santa Apolônia
Blanka tinha construído uma montanha de livros em seu lugar na mesa
de leitura da biblioteca. Post-its2 amarelos colados fora das páginas. Em dois dias
ela teve que lidar com o seu projeto de Biologia, e amanhã ela iria escrever o
primeiro exame preliminar, de história. História não a preocupava, mas agora que
a professora de Biologia dela, Sra. Catalon, havia deixado potenciais de ação e os
nervos para trás, e se mudou para genética, Blanka sentiu como se dois anos de
matéria tivessem sido espremidos em quatro semanas.
Ela se inclinou para trás e olhou através dos corredores nas cabines de
computadores. Em vinte minutos, o computador da biblioteca que tinha reservado
estaria livre. Uma garota loira dentuça estava lá agora, clicando através de um
banco de dados. Suspirando, Blanka dobrou-se sobre suas notas de novo e as leu
pela centésima vez. Ela tinha que fazer isso! Não havia dois caminhos sobre isso –
se ela queria ficar na escola, ela tinha que passar nos exames preliminares. Mas as
palavras se recusavam a encontrar o caminho para sua cabeça; elas escorregavam
dela e se desvaneciam. Era impossível se concentrar. De novo e de novo ela sentia
como se ela estivesse segurando a porta dela com a mão e quando ela fechava os
olhos, o fantasma ondulava para ela.
Novamente ela percorreu todas as possibilidades que ela havia pensado até
agora: era Jaqueta do couro, e seus olhos pregaram uma peça nela no escuro. Ele
tinha Annette Durlain na consciência dele e no museu do Convento ele tinha
selecionado Blanka para ser a sua próxima vitima. Ou era Tanya, atuando como
vigia enquanto os outros Lobos tentavam tirar Blanka fora de seu quarto e arrastá-
la para o rio. Ou Maddalina de Trenta?
— Ridículo! — sussurrou Blanka, abaixando seu lápis. Ela esfregou os olhos
fortes e estrelas vermelhas explodiram por trás de suas pálpebras. Os
pensamentos dela correndo em círculos: Annette Durlain e Jaqueta de couro,
2 Post-its – Papel pequeno para anotar recados.
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Jaqueta de couro e os Lobos, os Lobos e Joaquim, Joaquim e Blanka... Nada fazia
nenhum sentido. E, no entanto, ela tinha o pressentimento que havia uma conexão.
Exausta, ela pressionou as palmas nos olhos dela. Ela viu a mulher de cabelo cinza
descendo as escadas, passo a passo. Annette Durlain se virou e olhou para Blanka.
Nas sombras o seu rosto parecia uma máscara.
Ela sorriu, abriu os braços amplamente e caiu para trás. Blanka deu um pulo
e abriu os olhos dela. Na biblioteca tudo estava silencioso. Exausta, ela levantou-se
e foi até um das janelas quase abertas. O ar fresco era bom. Da parte de baixo ela
podia ouvir o grito de júbilo de uma equipe de voleibol, depois de uma explosão de
curta distancia do apito do arbitro. Blanka encostou a testa quente contra a janela e
olhou para o caminho, e da cobertura ao lado dela.
Ela tinha que falar com Sylvie o mais rápido possível.
Uma figura andando pelo caminho diminuiu, depois parou. Rapidamente
Blanka recuou e então atentamente olhou pra fora da janela de novo. Ela não
precisava ter se importado; a pessoa possivelmente não poderia reconhecê-la de lá
– a fachada de vidro matizado agiu como um espelho.
O olhar concentrado e furtivo com o qual Jaqueta de Couro examinava o
prédio perturbou Blanka ainda mais. Ele virou pra cima seu colarinho desgastado
como se estivesse frio, e um cigarro pendia no canto da boca dele. Depois de um
minuto que pareceu durar para sempre, ele seguiu seu caminho e desapareceu de
vista.
Ela só se sentiu segura de novo quando ela esteve de volta em sua carteira
de leitura atrás das pilhas de livro, que a separava do seu redor como uma
fortaleza. Ela estava prestes a puxar o grosso texto de biologia para ela quando ela
parou. Já não estava mais aberto no mesmo lugar. Alguém de passagem deve ter
causado um esboço que tinha virado as paginas. Então ela olhou para os outros
livros dela. As anotações coladas tinham desaparecido, ou tinham sido postas em
lugares diferentes nos livros. Uma importante obra de referencia sobre a genética
tinha desaparecido. Com um súbito sentimento de naufrágio na barriga, Blanka
rapidamente levantou a parte superior da página de suas anotações.
Páginas vazias sorriram ironicamente para ela. Ela levantou-se e olhou ao
redor. Alguns estudantes haviam saído. Atrás dela, no computador, a menina com
os dentes sobressalentes estava arrumando suas coisas. Blanka se afundou na
cadeira e olhou sobre os livros dela de novo. Um deles ela definitivamente não
havia trazido para a mesa. Era grosso e ligeiramente amarelado, o seu título
indicava que continha as lendas dos santos.
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Um papel se sobressaia de dentro das paginas, obviamente marcando uma
passagem. Ela o abriu. A passagem descrevia o martírio de Santa Apolônia. - Todos
os dentes de Apolônia foram quebrados fora por seus cruéis torturadores. - Blanka
engoliu em seco e olhou para a figura da mártir, que estava segurando uma pinça e
um dente na mão. Alguém tinha usado uma caneta para sublinhar as palavras -
quebradas fora. Mas o que a assustou mais ainda foi o fato de que alguém havia
colorido os cabelos da santa de preto, o que fez parecer estranhamente com
Blanka.
Caitlin quase deixou a garrafa de refrigerante cair com choque quando
Blanka correu para o quarto.
Blanka nem sequer mostrou qualquer surpresa ao ver Jan sentado na cama.
— O que está errado? — chorou Caitlin, pulando.
— Meus projetos se foram! — arfou Blanka. — Roubados! — ela soltou fora
toda a história. Jan ouviu por um tempo em silêncio, depois levantou e saiu sem
uma palavra.
— Alguém está apenas pregando uma peça em você! — Caitlin disse
suavemente.
—Besteira! Alguém está muito sério sobre isso. E este lugar marcado no
livro, isso é uma provocação-ameaça!
— Blanka se acalme!
— Eu não sei se isso foi Joaquim ou não, mas alguém esta tentando me
assustar. Talvez o cara na jaqueta de couro faça parte disto, também.
—Que cara?
—Ele tem estado me observando. Ele pode mesmo ter estado debaixo da
minha janela uma noite recentemente.
—Quando?
— O dia antes de ontem. Houve um corte de energia. — disse Blanka. — E
havia alguém no estacionamento. No meio da noite. Ele estava olhando para a
nossa janela.
Caitlin fez uma cara, obviamente cética.
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—É verdade! — insistiu Blanka. — Eu não contei a você, mas ele estava lá
como se estivesse procurando algo.
A pausa que se seguiu cresceu desconfortável, e Blanka realmente
arrependeu-se de ter contado a Caitlin sobre isso. Caitlin olhou para ela de perto.
Blanka quase podia ler os pensamentos dela.
— Eu não sonhei isso. — ela disse com ênfase. — Alguém estava lá. Então o
quê? Talvez ele estivesse na balada e estava voltando tarde da cidade. Talvez ele
seja o namorado de uma das garotas do nosso prédio e ele estava jogando
pedrinhas na janela dela.
— Às quatro da manhã?
Caitlin pressionou os lábios dela juntos.
— Pense sobre isso. — ela disse finalmente. — Quem estava na biblioteca?
Joaquim?
Blanka sacudiu a cabeça dela.
— Outro dos Lobos?
—Não.
Caitlin estava em silêncio.
— Você não acredita em mim, acredita? Você acha que eu sou louca.
Caitlin hesitou.
— Sim, é claro que acredito em você. — ela disse vagarosamente. No
momento que Jan veio voando de volta para o quarto e jogou um punhado de
artigos e livros sobre a cama. Papéis se espalharam em todas as direções.
—Isso estava no seu lugar.
Desnorteada, Blanka encarou os papéis. Eles eram suas anotações.
—Eles tinham sumido. — ela gaguejou. Caitlin e Jan perguntaram,
—E onde está o livro sobre santos? — ela perguntou, conseguindo
funcionar.
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— Eu posso provar para você, alguém desenhou uma gravura de mim. Isso
foi uma ameaça!
— Não havia livro sobre santos lá. — disse Jan calmamente. — Eu mesmo
olhei debaixo da mesa.
— E os outros livros? Veja; as notas coladas foram todas removidas.
—Hmm. — disse Jan. — Você vem de uma vizinhança respeitável, não é? De
onde eu venho pessoas muitas vezes se dão uma vantagem, para fazer a vida da
concorrência mais difícil. Você tem sorte de suas anotações ainda estarem aqui.
— Isso não faz nenhum sentido! — Blanka disse.
— Se você me pergunta isso faz. — respondeu Jan. — Não deixe suas coisas
estendidas por ai como isso. Obviamente você não está lidando muito bem com o
stress aqui. — Caitlin cutucou-o nas costelas. Jan sorriu se desculpando e agarrou
sua jaqueta.
—Ok, eu peguei isso. — ele disse. — Vejo vocês!
Houve uma pausa desconfortável enquanto os passos de Jan recuavam
baixo no corredor. Blanka pegou suas anotações e as folheou página por página.
— Aqui! — ela chorou. — Duas paginas estão faltando e é claro que isso tem
que ser as com minhas classificações, e toda a bibliografia. Quem poderia sumir
com a pilha inteira e depois colocar tudo de volta, exceto por duas páginas?
Caitlin levantou-se e sorriu para ela tranquilizadoramente. Nesse momento
Blanka odiou seu sorriso “estudante-presidente.” — Dê outra olhada. — disse
Caitlin. — Talvez você tenha se esquecido de pegar estas páginas, ou você as
colocou no lugar errado.
— Eu pareço como se fosse caduca? Eu as tinha comigo!
— Você sabe como você tem se parecido para mim pelos últimos dois dias?
Como alguém que veio de outro planeta. Você não só insiste para que ambos
bloqueiem nossas portas...
— Há uma razão para isso!
— Qual razão? Aff, Blanka! Volte pra terra!
Caitlin cruzou os braços. Seu sorriso tinha desaparecido. Blanka se afundou
na cadeira, pegou seu chaveiro e olhou para a chave da gaveta. Ela abriu a gaveta
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tão grosseiramente que todas as suas notas deslizaram para frente, pousando
contra a borda da frente da gaveta. Furiosamente, ela pegou os papeis e pastas e os
jogou em cima da cama. Caitlin assistiu em silêncio enquanto ela procurava através
da pilha.
— Sem anotações. — Blanka disse finalmente. — Eu não deixei as duas
páginas aqui.
— Eu vi suficiente. — disse Caitlin. — Se você realmente acha que os Lobos
querem empurrar você no rio ou assustar você embora, então nós devemos ir à
Madame Lalonde agora mesmo.
— Definitivamente não. — rebateu Blanka, levantando-se. — Nenhuma
palavra para Madame! Ou assim eu posso muito bem ir direto para casa! Promete
Cait?
Sua amiga olhou para ela duvidosa, mas finalmente ela assentiu.
— Prometo. Ei, onde você está indo?
— Procurar por Sylvie.
— Sylvie? Ela não vai estar de volta por dez dias.
—O quê? Por quê?
— A mãe dela está doente. Ela foi para casa. — disse Caitlin.
— Bem, que coincidência. — as palavras escorregaram fora antes que
Blanka pudesse pará-las.
Os olhos de Caitlin brilharam. Ela olhou como se quisesse sacudir Blanka
para fazê-la ver o sentido. — Ela teve permissão e mesmo assim registrou a
ausência dela no escritório. E esta manhã ela pegou um táxi para a estação. Isso
não tem muito a aparência de uma morte violenta, não é?
— Ok, ok. — Blanka virou-se para ela, saltando pra cima. — Não se
preocupe a lunática com complexo de perseguição esta agora indo pacificamente
para a biblioteca para pegar a jaqueta dela!
Nada havia mudado lá. Uma vez mais Blanka repassou cada etapa em sua
cabeça, tentando lembrar que tinha estado na sala. Dentuça estava agora sentada
lendo no canto, ocupada fazendo anotações. Umas poucas outras mesas estavam
vazias, e Blanka queria saber se os membros dos Lobos poderiam ter estado ali
sentados, e ela não tinha notado eles. Tudo estava o mesmo de sempre, exceto que
54
agora ela sentia uma ameaça espreita a cada canto. Com um calafrio ela deixou a
sala e foi para o banheiro.
Enquanto ela procurava por sua jaqueta, ela notou uma figura parada de
trás da grande parede de vidro no segundo piso. Simon Nemec estava parado bem
no topo do corredor, entre duas prateleiras onde ele não poderia ser visto da
cafeteria. Ele apenas estava parado lá, encarando as escadas. O rosto dele estava
vermelho, e os cantos de sua boca pendendo pra baixo como aqueles palhaços
tristes. Ele ergueu o braço e limpou os olhos dele com suas luvas. Blanka levou
alguns segundos para entender o que ela estava vendo. O velho zelador estava
chorando.
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Capítulo 7
A Besta
O corredor em frente dos escritórios da escola estava deserto.
Nervosamente, Blanka parou em frente da porta de Madame Lalonde e esperou. A
mensagem que ela havia encontrado colada na porta dela depois da escola estava
agora flácida e amassada, ela tinha remexido demais nisto. A última vez que ela
esteve nesse corredor, ela tinha notado o grande mapa do mundo preenchendo
quase todo o espaço entre as duas portas. Era pontilhado com inúmeras bandeiras
pequenas.
Cada bandeira azul representava um estudante, e cada bandeira vermelha,
um professor. Os nomes foram impressos com marcadores pretos. Marie-Claire
Lalonde veio de Alsacia e muitos estudantes vieram da Áustria, Holanda e
Alemanha. A professora de química de Blanka veio de Londres; outros professores
vieram da França, Polônia e Eslováquia. Mas havia também bandeiras perto de
Odessa e em Kiev.
O olhar de Blanka vagueou em direção a Espanha, para uma pequena
bandeira em Madrid. — Joaquim Almán. — ela leu. — Ah, Blanka, venha aqui! —
disse Madame alegremente, enquanto ela abria a porta. A diretora estudou Blanka
atentamente. Ela fez seu caminho de volta para sua mesa de trabalho e cruzou suas
mãos na frente dela.
— Eu pedi a você que viesse aqui por uma razão especial, Blanka. — ela
começou indo direto ao ponto. — Bem, na realidade por mais de uma razão, mas eu
espero poder te explicar a primeira rapidamente. Sua colega de quarto Caitlin tem
trazido minha atenção que haja algum atrito entre você e alguns outros estudantes
mais velhos. — os olhos de Blanka arregalaram-se em descrença.
— Antes que você fique irritada com Caitlin, sim, ela me contou. Como você
sabe, eu pedi a ela para manter um olho em você, para ter certeza que você está
estabelecendo-se de forma correta.
— Contando-lhe coisas sobre mim pelas minhas costas?
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— Na escola, é um costume para alunos mais velhos tomarem de conta dos
mais novos. — Madame insistiu. — Caitlin estava preocupada com você, isso é
tudo. Eu compreendo que você acredita que alguém roubou seus trabalhos na
biblioteca.
Blanka tentou se afundar mais baixo em sua cadeira. — Eu perdi duas
páginas de anotações. — ela admitiu hesitantemente.
— E o que faz você suspeitar que fossem os membros dos Lobos?
Blanka estava sem palavras. Caitlin tinha realmente derramado os feijões.
Finalmente ela clareou sua garganta.
— Não suspeito realmente. — ela disse — Eu só tenho o sentimento que os
Lobos não gostam de mim particularmente, isso é tudo. — ela tinha dito isso
cuidadosamente o suficiente?
Madame Lalonde se levantou e foi para a janela. Houve uma breve pausa.
Blanka se pegou nervosamente amassando os dedos dela de novo. Por um
momento ela esteve tentada a dizer tudo para a Madame- sobre o aviso de Sylvie,
os pesadelos, e a suspeita dela que a morte de Annette Durlain não havia sido um
acidente. Mas ela sabia como isso iria soar. — Você não pertence a esta escola. —
ecoou a voz de Joaquim. Mas talvez a diretora pudesse acreditar nela. Ela engoliu
em seco e procurou pelas palavras certas.
— Basicamente, eu acredito que todo mundo é responsável por escolher o
caminho dela própria. — Madame falou de novo, e Blanka teve que ouvir.
— Isso também significa que todo mundo procura depois pelos seus
próprios assuntos e cientes de que as aulas na escola podem ser muito mais
difíceis. Depois, na Universidade, ou trabalhando em uma grande firma ou em
algum lugar, você irá achar que a Escola Internacional Européia tinha preparado
você bem para a vida profissional e as... Armadilhas da carreira.
Blanka fechou a boca de novo. Sylvie estava certa. Madame era astuta e
menos compassiva do que parecia, mas também, mais bem sucedida e perspicaz.
Agora mesmo Blanka teria dado qualquer coisa para ela e para satisfazer as
demandas da escola. — Independentemente. — continuou Madame. — Nós iremos
olhar dentro da questão: perguntar aos estudantes, encontrar quem estava na
biblioteca neste horário, falar com os empregados...
— Não. — Blanka disse com uma voz firme. — Não, isso foi engano meu. Da
próxima vez eu vou prestar mais atenção nos meus pertences.
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O sorriso apreciativo que Madame deu a ela a fez sentir, entretanto como se
ela tivesse acabado de ter sido aristocrata.
— Bom. Então é isso. — disse a diretora. — Vamos ao Segundo ponto. — ela
bruscamente abriu a gaveta e tirou um papel e maneou na mesa para que Blanka
pudesse lê-lo.
— Seu teste de história, marcado. — disse Madame. — Olhe para isso no seu
lazer.
Blanka levantou-se e pegou o papel. Através da capa transparente a marca
parecia como 30%. Isso deve ser um truque da luz! Incredulamente Blanka virou a
capa. Isso não era truque. Blanka leu o nome dela ao lado e correu o olhou sobre as
primeiras poucas linhas do teste. Era próxima a caligrafia dela, demasiado
pequena, mas as respostas não eram as que ela lembrava ter escrito. Erros
surgiram e ela obviamente perdeu completamente duas questões, embora ela
tivesse absoluta certeza de ter lido as perguntas cuidadosamente. Ela continuou a
folhear. Cada marca vermelha era como um golpe físico. Ela mesma encontrou o
lugar onde ela havia cometido um engano e tinha atravessado a primeira letra da
linha. Era claramente a sua escrita. Ela estava ficando louca?
— Bem? — perguntou Madame Lalonde.
— Eu... Eu não sei. Ontem eu pensei...
A garganta de Blanka estava como se uma mão estivesse fechando-se ao
redor. Apenas não chore! Não agora! Se ela admitisse agora que ela estava ficando
louca, ela seria posta no próximo trem e mandada pra casa, isso era certeza. E nada
poderia ser pior que ter que voltar para casa.
Madame Lalonde suspirou e de repente parecia cansada. Ela pressionou o
nariz como se estivesse tentando se livrar de uma dor de cabeça.
— Como você pode imaginar, não é apenas minha decisão você ficar na
escola. — ela disse quietamente. — E apenas os melhores ficam aqui. Você pode
ser um gênio em matemática, mas se você não fizer mais esforço em outras
matérias, isso não vai importar.
— Eu sei.
— Contudo, você ainda tem a chance de compensar por esse pobre
resultado nas próximas duas provas. Use isso para pegar o que você havia perdido.
Eu espero que você faça mais esforço no futuro. Se houver outra razão pela qual
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você não esta se concentrando nos estudos para os exames, você deve me dizer.
Você sabe que eu realmente quero que você fique.
A intimidade entre elas estava novamente de volta. Blanka sentia como se
uma mão quente estivesse acariciando o cabelo dela. Era um estranho sentimento
que a confundia e ao mesmo tempo lhe dava força.
— Eu acredito que você tem bastante talento, Blanka. Você tem bolsa de
estudos de Maddalina da Fundação Trenta, faça alguma coisa disto!
Blanka sentiu-se um pouco de culpada quando a face cansada e desbotada
de sua mãe passou diante dela. Ela nunca a teria encorajado assim. Ela não teria
ficado feliz que Blanka estivesse.
Indo para um internato – mesmo em sua despedida, ela mal tinha dito uma
palavra. E durante a completa jornada para a escola, Blanka tinha tido a
expectativa do telefone dele tocar, mas ele tinha permanecido em silêncio, morto,
como palavras não pronunciadas entre eles.
— Mas eu na verdade, chamei você por causa de uma coisa completamente
diferente. — disse Madame. — Como você sabe aqui na Escola Internacional da
Europa nós fazemos uso de nossos contatos com universidades o mais cedo
possível. Nós oferecemos aos estudantes que estão realmente interessados em um
campo particular de estudo um programa muito especial. Eles podem trabalhar
com professores na área escolhida em um projeto de tutoria por um período de
oito semanas. Isso significa que eles são introduzidos cedo para os fundamentos do
seu futuro campo de estudos e podem ter uma noção real do que isto implica. No
final do projeto, eles recebem uma avaliação geral do seu mentor. — seu sorriso se
tornou mais amplo. — Eu era capaz de persuadir Dr. Hasenberg que você deveria
se aproximar dele em relação a tal projeto. Desde que, é claro, você melhore sua
média, mas eu não tenho nenhuma dúvida a esse respeito. O que você acha?
Blanka pegou uma respiração e assentiu tonta.
— Maravilhoso! — exclamou Madame. — Então escreve isso abaixo; Terça
feira, 5 da tarde. Você sabe onde é o escritório do Dr. Hasenberg? Ele estará
esperando você.
Blanka tinha acabado de chegar a seu quarto quando houve uma batida na
porta de ligação. Caitlin não podia esconder os sentimentos dela.
As bochechas dela queimaram enquanto ela tentava um sorriso de
desculpas.
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— Bem, bem, Sherlock Holmes em pessoa. — disse Blanka friamente.
O sorriso de Caitlin mudou para uma triste careta. — Eu sinto muito, Blanka
eu não pensei que Madame iria fazer grande caso disto.
— Como você se atreve a contar a alguém sobre a minha vida particular?
O rosto de Caitlin ficou ainda mais vermelho. — Madame me pegou e me
questionou todo tipo de perguntas.
—Você tem alguma ideia do que fez para mim? Eu pareço uma idiota
histérica!
— Ela realmente me bombeou por informações. — insistiu Caitlin. — Mas
ela poderia ter perguntado para qualquer um. Dê uma boa olhada em si mesma,
Blanka. Obviamente, a coisa sobre a mulher morta tomou mais de você do que você
percebeu. Além disso, eu sempre estou tendo que criar desculpas por você para os
seus pais quando eles ligam. Sobre o que é tudo aquilo?
— Eu não quero falar sobre isso. — devolveu Blanka. — Essa foi a ultima
vez que eu irei confiar em você! — Eu nunca mais te direi nada de novo. — ela
pegou o casaco dela e invadiu passando a pasma Caitlin pelo corredor. De cabeça
baixa, ela se apressou escada abaixo. Enquanto ela andava, ela olhou para o relógio,
se ela corresse, ela poderia conseguir pegar o ônibus para cidade. Tudo que ela
queria era dar o fora daqui! Ela correu para a esquina e esbarrou bem em Jan. Com
um barulho alto a mochila dele caiu no chão. Chaves de fenda e pedaços de metal
derramando-se no chão de pedra. Jan ficou mortalmente pálido com a visão do
conteúdo de sua mochila.
Ele se virou para ela. — Por que você não olha pra onde está indo?
— Eu poderia te perguntar a mesma coisa. Eu estou tentando pegar o
ônibus.
Ele amaldiçoou e se curvou pra baixo rapidamente pegando seu
equipamento.
Relutantemente, Blanka o ajudou a colher as coisas dele. Ela ergueu um
pouco um par de alicates.
— Dê isso pra mim! — ele disse através dos dentes cerrados. — Você não
quer perder o seu ônibus. Eu cuido disso.
Blanka assentiu e pulou. Ela deixou o prédio da escola em uma corrida,
cascalho sendo pulverizado a cada passo. Ela foi para a parada de ônibus e não
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parou para recuperar o fôlego ate que o terreno da escola estivesse bem longe
atrás dela. A corrida pareceu boa, mas enquanto ela estava próxima do ponto de
ônibus, ela viu o ônibus se dirigindo distante na curva. Péssimo. Sentindo-se
incerta, ela olhou para trás. Vidraça brilhando ao sol.
O edifico agachado ali como se estivesse à espreita, e as elegantes vigas
curvadas da fachada pareciam um sorriso malicioso. O celular dela tocou. O
número de Caitlin iluminando o display. Relutantemente ela o virou fechando. Por
um capricho, ela decidiu andar pela cidade.
Algum lugar entre três e cinco quilômetros, ela podia lidar com isso.
Mas logo depois que ela levantou-se começou uma garoa. Blanka levantou
os ombros e andou o mais rápido que ela pôde. Carros zuniam passando por ela, e
depois ela ouviu o som de uma motocicleta se aproximando. Pelo canto do olho
Blanka pode ver a moto diminuir e depois acelerar de novo. E desaparecer depois
da curva com um alto rugido.
Perto de uma hora depois ela estava lá. A estrada levava a um distrito
residencial no subúrbio, e enquanto ela procurava por um ponto de ônibus um
ônibus local veio, o qual ela pegou na cidade velha. A cidade era estranha, uma
praça no meio, um pilar medieval comemorando a peste, um pouco da cidade
antiga intacta, com áreas cada vez mais modernas em torno dela como os anéis de
crescimento de uma arvore. As coisas mais impressionantes eram a igreja de São
Jorge e enormes prédios da universidade, que se situavam próximo ao centro.
A chuva tinha parado, e no sol de verão as fachadas medievais das casas
brilhavam como uma pintura antiga.
Turistas sentados em cafés, as câmeras sentadas nos lugares vazios ao lado
deles. Estudantes estavam circulando de bicicleta ou caminhando rumo à
universidade para a tarde de palestras; mochilas nos ombros. Blanka seguiu um
grupo deles ao longo de uma pequena rua para a praça do mercado, parou para
contemplar o gentil rosto de Maria acima do pilar medieval, e depois se apressou
para alcançar. Duas ruas depois eles estavam na universidade. Blanka ficou parada
e assistiu eles atravessarem a praça. Uma ampla escadaria leva a entrada. Distante
Blanka assistiu os estudantes desaparecerem através da pesada porta de madeira.
Se ela não conseguir melhorar seu empenho, essa porta estaria fechada para ela.
Um sentimento de perda bateu nela, contudo nada tinha mudado ainda.
Um som metálico de clique a trouxe para a realidade. Ela olhou a direita
dela. A poucos passos longe dela estava Jaqueta de couro, acendendo um cigarro.
Uma rajada de vento soprou em seus cabelos loiros e puxou o colarinho virado pra
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cima de sua jaqueta de couro. Um capacete preto assentado na mochila dele que
estava jogado no chão.
— Olá, Branca de Neve.
Sem uma palavra ela virou e correu de volta pelo caminho que ela tinha
vindo. No final da praça do mercado ela olhou para trás. Ele não estava seguindo
ela. Quando ela rumou para o centro da cidade, ela ainda estava quase correndo, as
mãos dela fechadas em punhos dentro dos bolsos da jaqueta.
Ele estava em pé, respirando com dificuldade, em frente a um dos cafés,
esperando por ela. Por um momento ela ficou confusa. Ele teria voado?
Olhando envergonhado, ele ergueu a mão.
— Hey, eu sinto muito por aquilo. — ele disse. — Foi bem estúpido da
minha parte. Eu não pretendia assustar você.
—Como você...
—... Cheguei aqui? Atalho. Pelo Beco Pelargus. Minha residência estudantil
fica lá, é mais rápido que ir pelo longo caminho ao redor da via da Praça do
Mercado. Eu pensei que você estivesse voltando para o ônibus.
Por um momento, eles olharam um para o outro. Blanka percebeu que ele
tinha olhos cinza azulado e que ele parecia como se ele não tivesse pegado muito
sol recentemente.
— Meu nome é Nicholas. — ele disse finalmente. — Nicholas Varkonyi.
— Você parece já saber meu nome. Você tem me espionado, eu vi você na
escola.
Ele sorriu nervosamente e deu de ombros. Ele não podia esconder os
sentimentos dele melhor que Caitlin. Com essa observação, um pouco da confiança
de Blanka retornou.
—Está certo. — ele disse. —Eu tenho te espionado, por que eu tenho que
falar com você, por favor.
— Você é um dos Lobos, certo? — ela disse desafiadoramente. Ele franziu o
cenho. — Interessante você ter dito isso. — ele olhou ao redor um pouco casual
demais. — Eu posso te pagar uma xícara de café? Eu não quero discutir esse tipo de
coisas em uma área aberta. A Besta esta logo ali. — com um sorriso irônico ele
acrescentou. — Tem muitas pessoas lá. E tem janelas também.
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Blanka ainda hesitava, mas quando algumas gotas caíram no rosto dela, ela
desistiu. Ela procurou dentro do bolso da jaqueta, entretanto, e ligou o telefone de
novo.
Alguém tinha ido a grandes distancias para fornecer café no estilo dos
antigos filmes preto e branco. Fotos granuladas de estrelas de cinema maiores que
a vida, penduradas acima das mesas laçadas. Na figura central um príncipe com
cabeça de predador que parecia felino estava retratado em frente a cenário de
conto de fadas. Em um nicho de cobre estavam penduradas gravuras de monstros
do mar, lobisomens e demônios voadores. Nervosamente, Blanka sentou e esperou.
Ela não tirou a jaqueta dela e balançou a cabeça quando Nicholas perguntou se ela
queria pedir alguma coisa. O nervosismo dele era contagioso. Curiosamente, ela se
sentia como se estivesse em um primeiro encontro com alguém que não sabia
como impressioná-la. Os movimentos dele eram precisos, mas agitados. Com um
movimento prático ele tirou um cigarro fora da carteira e, como um mágico, ele o
balançou entre os dedos antes de acendê-lo.
— Você tem que fazer isso? — perguntou Blanka.
Ele olhou para ela sem expressão, e depois a surpreendendo, imediatamente
pegou o cigarro e amassou a ponta no cinzeiro.
— Então, o que você quer? — ela perguntou.
Nicholas pegou uma profunda respiração e umedeceu os lábios dele. —
Primeiro eu irei responder à sua outra pergunta, não, eu não sou um dos Lobos. Eu
sou um estudante aqui.
— Você parece ser bem jovem para um estudante.
— Dezoito é muito jovem?
— Isso depende; vocês graduam cedo para a Escola Internacional da
Europa?
— O que você quer dizer?
— Bem, eles se formam um ano mais cedo lá e por causa opcional tardes de
seminários, você pode fazer um exame de avaliação quando você começa a
universidade e pular os cursos introdutórios. Isso economiza tempo.
— Não. Eu não tenho nada a fazer com a sua escola. Eu sou novo aqui na
cidade, como você. — ele hesitou antes de continuar, escolhendo cuidadosamente
as palavras. — Eu não sei exatamente como começar. Suas anotações desaparecem,
63
livros são perdidos, e bastante curiosamente, você é sempre a que pega a
informação errada. Algumas vezes testes que você escreveu somem, e o seu nome
desaparece da lista de freqüência. Isso soa familiar pra você de algum modo?
Blanka cruzou os braços e recostou-se.
— Isso é o que eles estão fazendo comigo, de qualquer forma. — adicionou
Nicholas. — Eu não sei por você, mas eu estou só esperando por armadilhas de
arames para eu tropeçar nas escadas.
— Isso soa familiar. — admitiu Blanka depois de um tempo.
O rosto de Nicholas pareceu se iluminar com alívio.
— Mas o que os Lobos estão fazendo na universidade? — perguntou Blanka
ceticamente.
— Muitos estudantes europeus passam a frequentar esta universidade,
como você sabe. Se eles eram membros dos Lobos quando eles estavam na escola,
eles ficam na sociedade enquanto eles estão na universidade.
— Entendo. E o que você quer de mim?
Ele hesitou, como se procurando pelas palavras certas.
— Bem. — ele começou finalmente. — Eu pensei que nós podíamos formar
um tipo de grupo de auto-ajuda e fazer um pouco de pesquisa. Mas eu não sou um
estudante da escola e não tenho acesso às notas dos Lobos.
— E você estava procurando por eles na noite dos visitantes?
Ele olhou para ela o rosto em branco. — Eu não tenho a menor idéia sobre o
que você esta falando. — ele disse.
Blanka deu a ele um olhar suspeito e não respondeu.
— Então, você está dentro? — Nicholas perguntou depois de uma pausa.
— Eu pareço com alguém que bisbilhota ao redor e põe sua graduação em
risco? De jeito nenhum! Encontre outra pessoa!
Ela estava a ponto de se levantar quando ele agarrou o pulso dela. Os dedos
dele estavam frios. — Você não percebe que você irá definitivamente arruinar sua
graduação se você continuar andando para as armadilhas deles. Eles querem você
fora, assim como eles me querem fora. E eles estão sérios sobre isso.
64
Ele procurou dentro do casaco, tirou o livro fora, e o jogou sobre a mesa. —
Eu ouvi que você estava procurando por um livro sobre santos.
Blanka sentou de volta na cadeira. Ela teve que fazer um esforço para pegar
o livro e olhar debaixo da letra ‘A’. O retrato de Santa Apolônia olhou para ela, com
o cabelo de Blanka. Mesmo os sublinhados a seguir as palavras ainda estavam lá.
— Uma ameaça muito clara. — Nicholas disse. — Mas você não poderia
provar nada. Não existem livros sobre santos listados no catálogo da biblioteca,
existem? Você nunca poderá provar nada.
— Como você sabe isso? — sussurrou Blanka. — E você sabia que eles me
chamam de Branca de Neve.
— Oh. — ele disse, dando um passo atrás. — Sem mágica ai. É na realidade é
suposto ser uma piada. — surpresa, ela viu que ele estava corando ligeiramente. —
Bem, você tem uma pele clara. E com esse cabelo preto, também...
— Não minta para mim. — Blanka silvou para ele.
— Alguém me disse.
— Quem?
Ele levantou a mão dele defensivamente. — Acredite nisso ou não, a história
chegou ao redor.
— E onde você conseguiu o livro?
— Eu simplesmente olhei no departamento teológico. — Nicholas sorriu e
tamborilou com os dedos contra a mesa. Mas seu sorriso murchou. — Você não
confia em mim.
— Pouco antes de o livro aparecer, eu vi você em frente à biblioteca. Quem
diria que você não havia posto o livro lá você mesmo?
— Ninguém. — ele respondeu. — Você tem apenas a minha palavra. Eu
estava procurando por você aquele dia na biblioteca, porque eu queria falar com
você, você vê, tem alguma coisa a mais.
Ele se inclinou para frente. — Quando eu estava no trem vindo para aqui,
alguém me contou uma história sobre como os Lobos jogaram alguém dentro do
rio.
— Eu sei dessa estória. Então?
65
— Isso realmente aconteceu, dezenove anos atrás. Era um estudante e ele se
afogou.
— O que?
— Um acidente. — Nicholas continuou quietamente. — Se você quer
acreditar nisso. De qualquer forma, eles nunca foram responsabilizados por isso.
Ninguém foi acusado. Estranho, você não acha? E eu vou te dizer mais uma coisa.
Foi você quem encontrou o cadáver da mulher um mês atrás, não foi?
Blanka endureceu. — Está certo.
— Você acredita que a morte de Annette Durlain foi um acidente?
De repente a boca de Blanka estava tão seca que ela poderia dificilmente
por para fora a sua resposta. Ela olhou diretamente dentro dos olhos de Nicholas.
—Não. — ela respondeu.
Ele quase sorriu e depois assentiu. — Eu também. Você percebeu alguma
coisa? Qualquer coisa? Havia algum sinal de lesão?
— Apenas leia o jornal da semana passada. Há mais informações lá do que
eu sei sobre ela. Por quê?
Ele brincava com seu isqueiro. — Você promete que não vai falar demais? A
história é um pouco, delicada. Se isso vier à tona, que eu falei com você, eu sou
torrado. Você não irá contar a ninguém? De acordo? — ele estendeu a mão para
ela.
Blanka vacilou, mas eventualmente apertou a mão dele.
— Bom. — ele disse, unindo seus dedos juntos como um professor.
— Oficialmente ela tropeçou e caiu lá em baixo por acidente. E eu também
conheço a história sobre loucos que são fascinados com bruxas que eles querem
passar uma noite do lado de um robe de bruxa. Isso pode até mesmo ser verdade.
Mas há um detalhe que poderia mudar toda a coisa ao redor.
— Ela não quebrou o pescoço?
— Oh, sim, ela quebrou. Apenas... Ela tinha uma ferida, pouco mais de duas
polegadas quadradas. Um pedaço de pele estava faltando.
— Uma ferida. Então o que? Isso não prova nada.
66
— Isso aconteceu depois da morte dela. Não é muito esperto, huh?
Blanka prendeu a respiração. Ela sentiu como se o café estivesse
embrulhando. Os monstros do filme pareciam estar sorrindo.
— Como você sabe disso?
Ele apontou para o peito dele.
— Acadêmico de medicina. — ele disse. — Ordenado pelo Instituto de
Medicina Forense, relatórios envoltos por mentiras, fofocas nas salas de espera.
— Você bisbilhota em relatórios que não são da sua conta?
— Não, eu tiro fotocópias dos relatórios.
Houve uma curta pausa, e Blanka de repente sentiu frio. Até agora, as
suspeitas dela tinham sido apenas um jogo na própria mente dela, mas agora
estava se tornando assustadoramente real.
Poderia ser realmente assassinato?
— Os Lobos. — ela disse quietamente. E mentalmente adicionou; ou Nemec?
— Você acha possível que eles tenham alguma coisa a ver com isso? —
Nicholas perguntou.
— Eles são estudantes. Por que eles iriam matar alguém?
— Para se livrar de testemunhas? Ganância? Ou vingança? Isso pode ter
sido encomendado por mais alguém. Nós iremos descobrir. Então, você está
dentro?
Blanka sacudiu a cabeça e pulou pra cima.
— Onde você está indo?
— Pra longe daqui! — ela replicou afiadamente.
— O que está errado? Foi alguma coisa que eu disse?
— Você tem que ir a policia!
— Eu não confio neles. Você não leu o que disseram no jornal? Ninguém
mais está ou foi envolvido!
67
— Já ouviu falar de investigações sigilosas? É muito provável que a policia
tenha conhecimento sobre a descoberta há séculos e só dar ao assassino uma falsa
sensação de segurança.
Nicholas ergueu as mãos em um gesto conciliatório. — Ótimo fim de
conversa. Mas, por favor, separe um tempo para pensar sobre isso. Na
Universidade não há documentação sobre Lobos, e eu não tenho acesso aos
documentos na Europa.
— Eu não vou pensar nisso de qualquer forma, eu estou partindo.
— Eu posso ligar para você? Dê-me algum jeito de contatar você, o número
da escola, ou qualquer coisa que você preferir.
— Não.
Ela rasgou um pedaço da embalagem do cigarro, rabiscou algo em cima, e
empurrou o recado para ela.
— Meu número de celular. Por favor, apenas leve isso com você, Ok? Apenas
para o caso.
68
Capítulo 8
Estigma Diabolicum
A sala completa estava sofrendo enquanto a Sra. Cartalon tentava apagar
um particularmente belo diagrama no quadro com um pedaço quebrado de giz.
Hoje, para Blanka estava sendo mais difícil do que o habitual seguir as explicações
da Sra. Cartalon. Pela primeira vez em semanas se sentia muito estimulada
novamente. A densa névoa que havia envolvida ao redor de seus pensamentos
tinha desaparecido.
Com sua caneta escrevia pequenos círculos e flechas na margem de seu
caderno. Simon Nemec esteve chorando. Choraria um assassino por sua vitima?
Havia ali uma real conexão entre ela e o Lobo? Blanka mal podia esperar que a
campainha para o intervalo do almoço tocasse.
Os poucos estudantes que vieram da cidade e viviam em casa saltaram em
suas bicicletas e se afastaram, para não regressar até próximo as três em ponto
para as aulas da tarde.
Blanka correu até o edifício da biblioteca. Ela estava com sorte A sala de
computação estava livre; apenas alguns poucos estudantes mais antigos, como
Caitlin preparando-se para fazer seus exames finais em três dias, estavam
dispersos pela sala, inclinados sobre suas anotações. Blanka sentou-se em um dos
computadores e se conectou. Levou uma eternidade até que pôde entrar com sua
senha no site de busca: “Simon Nemec”. Nada encontrado. “Annett Durlain”
tampouco existia na internet, nem sequer nas páginas francesas onde acrescentou
“Brest”, a busca. Em “Joaquim Alman”, estavam apenas os resultados e os quadros
do torneio esportivo, mas Blanka encontrou várias páginas de um F. Alman. Ela
abriu a função de busca da imagem e esperou. Apareceram três imagens e Blanka
soube imediatamente que ele era o pai de Joaquim. Claro, ele era calvo e usava
óculos redondos, mas a expressão facial, a boca e os olhos eram idênticos. As fotos
provinham de instituições de caridade com as quais estava envolvido, mas nenhum
dos artigos mencionava como tinha realmente ganhado o dinheiro. Blanka
imprimiu algumas páginas, logo procurou o catálogo virtual da biblioteca e entrou.
“Maddalina de Trenta”. Isso obteve 28 respostas, das quais foi capaz de eliminar
facilmente 24. Os últimos quatro, no entanto, eram interessantes: cópias impressas
da crônica do Convento, assim como o registro completo do julgamento de bruxas,
69
uma curta história da escola-não muita mais que um folhetim, escrito em 1961 e
também um ensaio sobre Saint Belverina. Algo, pelo menos. Embaixo das palavras
chaves da história da cidade encontrou apenas diretórios atuais e anuários
escolares. Blanka anotou a localização dos livros e começou uma nova busca.
Usando as palavras de busca “Lobos”, obteve 159 respostas no departamento de
biologia. Uma vez mais limitou sua busca combinando com conceitos como
“Associação estudantil”, “Sociedade”, “Idade Média”, o nome da cidade e encontrou
um só livro. Era o mesmo livro, o que contava a história da escola. Com um suspiro
de alivio, fechou o programa e olhou seu relógio. Ainda tinha tempo. Os
companheiros de infortúnio de Caitlin mal levantaram o olhar quando Blanka se
aproximou a escrivaninha de saída.
— Gostaria de ver isso, por favor. — disse à bibliotecária assistente atrás do
balcão, uma estudante cujo cabelo brilhava com um alaranjado escandaloso. Ela
provavelmente estava ganhando um pouco de dinheiro extra, trabalhando na
biblioteca. “N. Kuhlmann” estava impresso no crachá de identificação na gola da
camisa. Enrugando a testa, Ela estudou a informação que Blanka havia escrito no
papel.
— Se isso é uma M e este garrancho aqui é um 49, então temos o livro no
depósito. Apenas emprestamos livros como esse quando há uma razão para isso.
Para o que você precisa?
— Projeto de história. — mentiu Blanka sem vacilar. Ela mordeu os lábios.
Funcionaria?
— Ah, certo. — a estudante sorriu. — Deveria ter falado logo. Então, preciso
de uma nota do seu professor. Está com você?
Blanka engoliu a saliva e negou com a cabeça. — Queria propor o tema e
fazer um pouco de investigação antes do tempo. Conseguirei a nota amanhã e a
trarei.
N.Kuhlmann franziu o cenho e examinou Blanka. —É a garota nova, não? A
que compartilha um quarto com Caitlin O ’Connel?
Blanka confirmou e se preparou para a próxima pergunta. No lugar disso, a
garota empurrou um formulário para ela. — Aqui, preenche o cartão, vou
conseguir o livro para você.
— Obrigada. — disse Blanka, surpresa. — Vou trazer a nota amanhã, então...
70
A garota ficou de pé e agitou a mão descartando. — Não se incomode. —
disse. — Enquanto estiver bem com Madame, então está bem comigo.
A crônica do Convento estava xerocada página por página. As sombras cinza
indicavam que o original tinha estado amarelo ou sujo. Apenas umas poucas
páginas estavam reproduzidas em cor. A escrita negra corria sobre o amarelo-
marrom e por vezes havia uma página com letras iniciais esplendidamente
ilustradas. Com esforço Blanka pode decifrar muito bem as linhas compostas em
alemão. Em uma nota no rodapé da página, um tradutor bem intencionado tinha
traduzido as linhas em latim a um desastroso alemão. Desafortunadamente a
escrita era tão pequena que em meia hora o pescoço de Blanka estava tão tenso
como fosse feito de madeira.
O Convento havia sido a casa da ordem por quase 150 anos. Foi nomeado
por Saint Belverina. Blanka já conhecia sua imagem pelo museu. — Belverina foi
tirada de sua casa na Inglaterra pelos Vikings e vendida a corte do rei de Neustrien
como uma escrava em 641— leu Blanka. —Tida em alto estima por sua sabedoria,
subiu rapidamente a uma alta classe e foi particularmente afetuosa com os meninos
da corte. Depois da morte do rei, Belverina se converteu em assessora do herdeiro do
trono de dez anos. Adquiriu uma grande riqueza, fez doações a orfanatos e fundou
Conventos. Por volta de 675 foi assassinada cruelmente depois de uma conspiração
da aristocracia. — a descrição continuava dizendo que Saint Belverina havia sido
considerada a santa protetora dos meninos até esse dia. Um cachorro estava
sentado junto dela como um símbolo de lealdade. Bem, isso era interessante, mas
realmente não contribuía em nada para Blanka seguir adiante. O cachorro tinha
pouco a ver com um Lobo: Na imagem se parecia muito mais com um cervo
sentado sobre suas patas traseiras. Algumas páginas mais adiante, Blanka
descobriu os inventários com relação à limpeza do Convento. Para o momento do
julgamento das bruxas, onze mulheres tinham estado vivendo no Convento. A
última entrava foi feita em fevereiro de 1651; nas páginas seguintes, o tradutor
tinha escrito um resumo do julgamento das bruxas. Blanka fechou o livro com um
estalo e olhou o relógio. Nove e cinqüenta. Se quiser terminar a sua tarefa de física
antes das aulas da tarde, melhor que se apressasse.
Ela se inclinou sobre a sua mochila e recolheu seus livros. Sozinha agora se
deu conta de como a biblioteca tinha ficado silenciosa. Sem roubos de papel, sem
aclarações de gargantas. Sem passos. Blanka olhou para cima e congelou. Joaquim
estava na frente dela. Todos os outros estudantes haviam ido. Inclusive a estudante
da mesa de pedidos tinha ido.
— Olá Blanka. — disse Joaquim. Seu sorriso não era mais quente do que
uma bola de neve.
71
— Parabéns. — respondeu.
— Conseguiu lembrar-se do meu nome depois de tudo. — ela esperou que
ele não pudesse ouvir seu coração martelando pelo medo. — Onde estão teus
gorilas? — perguntou, quando a pausa se fez mais longa.
Seus olhos tinham uma cálida cor âmbar escura em um estranho contraste
com seu estilo violento. Estava pálido e parecia cansado. — Quem você acha que é?
— disse em voz baixa.
— Quem vocês, garotos, acham que são? — lhe respondeu.
— Bons estudantes. — lhe respondeu bruscamente. — E uma perdedora
como você simplesmente vem e consegue um projeto de mentores. Sabe que
normalmente tem que estar em seu segundo ano do colégio para conseguir um? E
só com uma média de pelo menos 80 %.
— Quem te disse? — ela respondeu com calma.
— Hasenberg. — foi à resposta. — Ele é o meu mentor. Quer dizer, era, até
ontem.
Blanka estava pasma.
Joaquim a olhou com ódio, seu lábios apertados,
— Não foi idéia minha. — respondeu. — Não sabia nada sobre as regras.
— Não deixarei que ninguém se meta no meu caminho.
— Certo. E a melhor forma de lidar com isso é roubar minhas notas. Muito
esperto Joaquim.
— Disse a Madame essa mentira? — sussurrou. — Estou começando a
entender! Sua puta mentirosa.
— Ei! Presta atenção no que você fala.
Ele baixou sua voz até um sussurro de advertência. — Oh, estou muito
assustado. — deu um passo para a gente e ficou tão perto dela que teve que
inclinar a cabeça para trás para olhá-lo nos olhos. — Vai correr até a Madame e
chorar nos seus ombros?
72
Blanka retrocedeu, tropeçando dolorosamente com a beira da mesa.
— Cuidado. — disse ele. — Algo poderia acontecer com você.
— Não seria a primeira. — disse com esforço.
— E só apenas isso deveria te fazer pensar. — respondeu de maneira
uniforme.
— O que está tentando fazer? Bater-me como fez com Sylvie?
Sua pergunta não o desconcentrou em nada. Divertido, meio que sorriu. —
Não batemos em ninguém. O que fazemos é lembrá-los o seu devido lugar.
— Deixe-me em paz. — ela sussurrou, afastando-se dele. Com toda a sua
força o golpeou com sua mochila cheia de livros. Ele se queixou e sua mão saiu
disparada para frente, mas Blanka se esquivou por baixo e correu. No corredor em
frente à porta ela quase se chocou como o assistente, que deu um salto com um
grito de surpresa.
Com o batimento doloroso em sua mandíbula, Blanka se deu conta que tinha
estado apertando os dentes todo o tempo. Abriu a porta e correu até as escadas. Do
piso de baixo chegava o abafado murmúrio de vozes.
Já na grande escada. Ela estaria cheia de gente! Um golpe vindo de um lado,
golpeando-a nas pernas, desde baixo. Enquanto estava caindo, teve um repentino
pensamento de que não poderia ter sido Joaquim. Ela caiu nas escadas. Tudo
parecia estar ocorrendo em câmera lenta. Ela se sentiu como se estivesse vendo
com os olhos de Annette Durlain: Ela era consciente de cada único passo e podia
ver com absoluta claridade que a qualquer momento ela os derrubaria. Algo a
agarrou no dolorido ombro e a jogou para trás, logo dois braços se envolveram ao
redor dela e a levaram para o dormitório pelas escadas.
— Isso quase saiu, mas, Blanka Neves. — disse Tanya sarcasticamente.
Atordoada Blanka a olhou. Seu ombro ainda doía, Tanya tinha torcido seus braços
nas costas. E um bastão foi colocado pressionando sua garganta.
— Deixa o projeto! — disse Tanya suavemente e muito claro. — Se não
deixar, me assegurarei de que faça. E te garanto uma coisa: Vai doer.
— Você não irá longe com isso. — disse Blanka com os dentes apertados.
— Quer apostar? — respondeu Tanya.
73
Um silvo cortou a ar. Joaquim apareceu do nada.
A cor desapareceu do seu rosto quando viu Blanka sobre as escadas. De
repente ele parecia indefeso e assustado.
— É suficiente. — disse com a voz rouca. — Deixe-a ir.
De repente Tanya afrouxou seu agarre e retirou o cajado. Tão rapidamente
quanto pode, Blanka se arrastou longe das escadas: não até que ela sentiu a sólida
parede que começou a se levantar devagar.
Joaquim e Tanya ficaram cara a cara.
— Está indo longe demais. — lhe sussurrou.
A garota o olhou sem compreender. — Mas, disse... Por quê? — havia
desconformidade em sua voz. De repente Blanka podia ver através de Tanya. O que
mais ela podia fazer por Joaquim?
— Por que. — foi à resposta áspera. — Deixe-a em paz, ok? — não se
dignando a olhar para trás se virou e foi embora, seus ombros pareciam ter um
grande peso.
Tanya deu a Blanka um olhar de dor e vingança em igual proporção. Ela
baixou sua voz até um sussurro. — Não tenha nenhuma idéia estúpida, ninguém
vai acreditar em você.
— Madame o fará.
— Madame precisa de dinheiro. O pai de Joaquim não é só o presidente da
fundação do colégio. Ele é a fundação. O que pensa que é mais importante para ela,
seu colégio ou alguém como você? Quem é Blanka? Alguma bastarda cujo os pais a
deixaram como lixo?
Ela recolheu o bastão de prática e se apressou atrás de Joaquim. Blanka a
viu ir, atordoada. Uma onda de náusea a invadiu. Por um momento ela pensou que
a ia derrubar. Ela se fundiu na grama, envolveu seus braços em torno de seus
joelhos e se sentou ali, tremendo.
Pela primeira vez ela estava contente que Caitlin não estivesse lá. Era mais
fácil chorar quando ninguém estava no quarto ao lado, Blanka estava gelada,
embora fizesse cerca de 30 graus lá fora. Foram as ultimas palavras de Tanya que
74
doeram mais. Quanto sabia sobre Blanka? Com os dedos acalmados procurou no
bolso lateral de sua mochila. Finalmente seus dedos encontraram a suave e
estragada borda da sua carteira. Ali estava - O número de Nicholas, rabiscado em
seu pacote de cigarros. Blanka apertou a pasta em sua mão. Deveria ligar depois de
tudo? De um salto se levantou, fechou a porta e a porta que se ligava ao quarto de
Caitlin, deixando a chave nela. O telefone tocou exatamente oito vezes antes que
alguém o atendesse.
Blanka vacilou. — Olá. — disse por fim.
— Blanka? — sua satisfação ao receber sua ligação a fez se sentir bem.
— É que para ser honesto, não pensei que ligaria.
— Eu tampouco, até agora pouco. Onde está?
— Residência estudantil Pelargus, na cozinha. Meu trabalho não começa até
as quatro. E onde você está?
Ela duvidou. — Acabo de voltar da Biblioteca. — disse vagamente.
Houve uma pausa.
—E?
— Não há nada ali sobre os... Lobos. Mas continuarei procurando!
— Certo. — outra pausa. — Blanka... Está tudo bem?
Blanka respirou fundo. Por um momento esteve tentada a lhe contar tudo, mas
logo retrocedeu e obrigou a si mesma a falar com calma. — Tenho. Nicholas, ontem
você me perguntou se podia imaginar que os Lobos podiam ter algo a ver com a
morte de Annette Durlain.
Ele não disse nada.
— Bem. — continuou ela. — Posso imaginar isso, com toda claridade.
Ela escutou um click no fundo e imaginou Nicholas brincando nervoso com
seu isqueiro.
— Blanka?
75
— Humm?
— Sem acontecer algo, liga-me, posso ir à escola a qualquer momento.
— Isso não é necessário.
— Tem certeza? Ontem não falava como se tivesse resfriada. Ou como se
estivesse chorando. Aconteceu algo?
— Escuta Nicholas, não preciso de um protetor. Vou te conseguir essa
informação, mas fica fora dos meus assuntos, Ok?
— E você me escuta. — respondeu ele. — Não sou psicólogo, mas não tenho
que ser para ver como é. Quer fazer tudo sozinha. Deus! Não acha que ninguém
deva te ajudar! Não é isso?
— Não é assunto teu Sr.Freud. — furiosa, desligou. Desse jeito, se sentia um
pouco melhor.
Pouco antes da meia noite a luz do quarto de Caitlin finalmente apagou.
Blanka esperou outra meia hora, logo se arrastou até a porta que conectava os
quartos, meteu a colcha no espaço embaixo desta e sentou em sua escrivaninha. A
luz da lâmpada de sua mesinha de cabeceira iluminava um amarelo rosado, um
gesto de reconciliação de Caitlin. O farfalhar da folhas da crônica eram tão fortes no
silencio que tinha certeza que Caitlin acordaria.
Tudo foi muito rápido. Desde a primeira acusação até o ponto quando a
última pilha de cinzas humanas tinha voado e o Convento era conhecido como um
lugar que deveria ser evitado, um lugar do diabo, quase uns três anos haviam
passado em 1651. No entanto a “policia das bruxas” havia tido tempo para fazer
seu trabalho a fundo. Tudo tinha começado quando a noviça Maria e dois dos
órfãos maiores haviam sido acusados de bruxaria. Foi dito que utilizaram magia
para atrair chuva, arruinaram a colheita e visitarão uma praga de ratos sobre o
moinho depois de uma disputa com o moleiro.
Maddalina de Trenta, Regina Maria Sängerin, uma ajudante Abadessa3 sobre
o nome de Katharina, e outras Monja estavam em uma lista secundária.
A acusação logo se estendeu aos empregados do Convento; o jardineiro
Hans Haber, um boiadeiro chamado George Kastellus e outros ao serviço do
Convento, como Theophast Mittenmann e Bernd Gerber Halgfuss. No total de vinte
3 Abadessa é uma superiora de um monastério.
76
e quatro pessoas haviam sido presas e acusadas, das quais seis eram. “Filhos de
bruxas”, garotos do orfanato que eram apegados ao Convento. No. “Julgamento das
bruxas”. O cronista ao que parece havia deixado sua imaginação dar sua inspiração.
“Levaram a cabo o velho e conhecido julgamento das bruxas com Regina
Maria Sängerin, ao que ela foi jogada dentro da água com mãos e pés atados depois
de que ela flutuava como uma balsa de madeira, além disso, Hilderbranter klara foi
posta em uma grande escala, na qual era notável grande mulher gorda pesava
menos de uma onça.”
Blanka tirou seu bloco de anotações e escreveu. - O julgamento da água –
estudante afogado?
O informe mais longo dado pelo assistente documentava os procedimentos
do interrogatório da Abadessa. A acusação e o interrogatório dos seis “filhos de
bruxa.” Também foi documentado mais meticulosamente. Eles foram acusados de
utilizar a magia para fazer dano e de contribuir para a profanação do pão da
comunhão.
“A filha dos Millers foi infectada e lesada pelos garotos bruxos que se
mantinham acusados”.
Fez-se referência a um “Estigma Diabolicum” sendo provado em uma
ocasião. O final foi o mesmo para todas as Monja Belverina, o pessoal do Convento
e os garotos órfãos: “... E todas as bruxas e os conspiradores receberam fogo eterno
por seus pecados.”
Regina Maria Sängerin e a gorda Hilderbranter Klara foram as primeiras a
serem acorrentadas as estacas da fogueira. As celebrações públicas se
prolongaram por mais de duas semanas. A última foi a “bruxa rainha”, Maddalina
de Trenta, quem se encontrou com a morte no pátio de seu próprio Convento, ante
os olhos daqueles que uma semana antes haviam sido seus amigos e conhecidos. A
documentação do caso terminava com a última nota do rodapé da página do
secretário:
“Quando examinaram sua cela, encontrarão uma toga de pele, a qual ela
costumava vestir quando saia a seu típico baile de bruxas”.
Blanka se deteve em seco. Uma toga de pele, isso não encaixava. Salvo por
esse detalhe, era um julgamento clássico e se descartava a mais exuberante
imaginação de seu autor, parecia quase impessoal. Blanka voltou às páginas e
examinou ligeiramente cada página novamente. Ela viu novamente a palavra
“Estigma Diabolicum”. Para ter certeza do significado, leu a explicação no rodapé da
77
página: “Uma marca, pelo geral no forma de uma marca de nascimento, que o diabo
faz no corpo da bruxa”. No caso de Maddalina de Trenta, a marca do diabo tinha
estado embaixo do quadril direito. Blanka levantou os olhos do livro ao seu
despertador. Uma e meia.
Apesar da hora, Nicholas levantou ao primeiro toque. Sua voz soava
ofegante, como se estivesse sentado junto ao telefone todo o tempo, esperando sua
ligação.
— Nicholas?
— Sim!
— Temos que nos encontrar. Preferencialmente logo cedo.
— Certo. — soava infinitamente aliviado. — Encontrou alguma coisa?
— Um “Estigma Diabolicum.” — disse ela.
78
Capítulo 9
A Espada do Carrasco
Ela o reconheceu de imediato através da janela do café, apesar da
distância. A tensão em sua postura o fazia sobressair, inclusive sem sua jaqueta de
couro. De repente, ela estava simplesmente feliz de que estivesse ali. Hoje usava
uma camiseta preta que ressaltava sua esbelteza. A fumaça do seu cigarro bailava
nos raios oblíquos do sol da tarde.
Com exceção de Nicholas e uma idosa lendo o jornal. La Bête estava vazia. A
maioria das pessoas estava sentada nas salas com ar condicionado na praça do
mercado. Os turistas se acumulavam em torno de um guia turístico como um
enxame de abelhas ao redor de sua rainha, girando suas cabeças para o pilar e a
torre da igreja, em busca de todo o mundo como um corpo de ballet bem ensaiado.
Nicholas pareceu sentir que alguém se aproximava: olhou ao seu redor
antes que Blanka pudesse chamá-lo. Logo apagou seu cigarro no cinzeiro e se
levantou.
— Olá! Obrigada por vim. — deram-se as mãos formalmente e se sentaram.
Durante uns incômodos segundos olharam um ao outro. Os olhos de Nicholas eram
como um céu tormentoso.
— Não parece ter dormido bem. — comentou.
— Nem você. — respondeu ela. Por um momento sentiu-se tentada a lhe
dizer sobre o incidente da escada.
— Aconteceu algo novo? — perguntou.
— Ontem meu livro de anatomia desapareceu sem deixar rastro e não tenho
registro da minha inscrição para o seminário. — assegurou. — Isso significa que
poderia perder o semestre.
— Acha que está percebendo isso agora? — ela podia dizer olhando-o que
ele se sentia incomodo ali sentado, cuidadosamente olhou ao seu redor e moveu a
cabeça. — Dá no mesmo. — parecia-se com ele agora. Deslizou sua cadeira
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próxima a dele, para poder falar sem serem ouvidos. O empregado atrás do balcão
sorriu enquanto olhava o sussurro do casal.
Sentar tão perto de alguém era muito incomum para Blanka. De repente ela
percebeu o muito que tem mantido distância das pessoas ao seu redor nas últimas
semanas. O cabelo de Nicholas cheirava a xampu e uma mecha loira caia sobre sua
sobrancelha.
— Estigma Diabolicum. — sussurrou.
— O que é tudo isso?
— Apenas uma suposição. Maddalina de Trenta tinha uma marca de
nascimento. E faltava um pedaço de pele na mulher morta na biblioteca.
Ela se inclinou para frente. — Leu o laudo da autopsia da ferida?
Lentamente deixou que sua mão deslizasse até seu lado direito para baixo,
justo debaixo de onde o cinto se acentuava em seu quadril.
Blanka assentiu. — Do mesmo modo que Maddalina! — sussurrou. — Eu
não sei a forma de sua marca de nascimento, mas acho que pode ter sido uma
marca, uma tatuagem, ou algo assim no lugar de ser uma marca de nascimento?
Vamos supor que a mulher morreu com a mesma marca de Maddalina de Trenta.
Logo o seu assassino poderia ter tirado um pedaço de pele para que ninguém
soubesse que havia pertencido a um... Grupo.
Nicholas ficou pálido. Blanka não disse nada, tirou um cigarro com gesto
nervoso. Esqueceu-se do fósforo, no entanto.
— Então se prepara. — disse. — Porque encontrei algo mais, também... O
laudo da autopsia desapareceu.
— O que?!
— Eu fui tirar cópias hoje... E então vi que tinha sido mudado. Não havia
nada lá sobre o pedaço de pele que faltava. Apenas o pescoço quebrado e uns
arranhões. A policia não está investigando mais, Blanka. O caso está fechado...
Oficialmente foi um acidente. — os olhos de Nicholas se refletiam na janela da
cafeteria, viam-se como um retângulo de cores claras, com lados curvados. — Isso
significa. — acrescentou. — Que pode haver mais pessoas envolvidas... Um médico,
ou inclusive vários médicos, que silenciariam um assassinato. Talvez inclusive o
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médico que com quem trabalho. — Blanka viu que suas mãos se distraiam com o
cigarro, girando e girando, até que finalmente se dispôs a sair.
— Vamos. — disse em voz baixa.
Um pouco mais tarde estavam caminhando pelo parque da cidade. Alguns
estudantes tinham colocado uma rede de vôlei entre as árvores e jogavam
vigorosamente. Blanka e Nicholas cruzaram a grama em silêncio e se sentaram no
banco do parque pelo Duckpond. Blanka sentou-se com seus joelhos encolhidos,
apoiou seu queixo sobre eles e se olhou na superfície da água como um espelho.
— O estudante que se afogou. — disse depois de um tempo. — Sua morte
poderia estar relacionada com o julgamento das bruxas. No registro existe um
conto de um julgamento pela água. Poderia ser um ritual... Talvez um castigo, ou
inclusive um teste de valor. Temos que conseguir uma lista dos membros dos
Lobos. Todos os nomes que figuram desde a fundação da sociedade. Se
examinarmos o suficiente, tenho certeza que encontraremos o nome de Annette
Durlain. As associações de estudantes devem ter todos os anuários de idade e fotos
em suas salas de reuniões...
— Não perca seu tempo. — Nicholas a interrompeu. — Eles não têm salas
de reuniões. E eu não acredito que os Lobos tenham uma tabela periódica. Nunca
utilizam uma sala, nem sequer da associação do carnaval. Nem sequer tem as atas
das reuniões na sala de O’ Deen Oliver debaixo da cafeteria, onde se discutem os
planos da formação do futuro e o custo dos trajes e novos indicados para a festa
medieval da cidade, mas estranhamente, nenhuns dos Lobos se reunirão ali
naqueles tempos.
Blanka pensou no fantasma, em seus pesadelos e em Simon Nemec
chorando.
— Não posso descrever exatamente. — disse evasiva. — Algo ameaçador.
Agora, Nicholas estava olhando tão inseguro que decidiu mudar de assunto
rapidamente.
— Esquece. Em algum lugar deve haver mais informação sobre os Lobos...
Talvez no museu da cidade? Li que há um arquivo dali.
Ela olhou seu relógio. — Ainda tenho uma hora e meia antes da minha aula
da tarde. E sobre sua conferência?
Nicholas vacilou. — Bom. — disse por fim. — Se sairmos logo, tudo bem.
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O museu da cidade estava ao lado da antiga prefeitura. Era um moderno
edifício pouco atrativo que tinha um aspecto fora de lugar ao lado da meio
reforçada fachada da prefeitura. Blanka e Nicholas passaram empurrando alguns
turistas japoneses, que olhavam o relógio, fascinados esperando que os sinos
tocassem a cada hora.
No museu fazia frio e podiam sentir o cheiro de cimento novo e pintura
fresca. O interior parecia como se o edifício originalmente tivesse sido uma galeria.
As suaves luzes caiam das clarabóias circulares do vidro esmerilado. As exposições
eram mostradas em modernas estruturas de aço e vidro. Havia uma sessão com
artefatos da idade do bronze, moedas romanas e o molde de gesso do esqueleto de
um cavalo. Blanka quase tinha que correr para manter o ritmo de Nicholas.
Desenhos de guerreiros celtas e pontas de lanças brilhavam ao redor. O frio era
bom, embora a repentina mudança de temperatura tenha deixado Blanka
atordoada.
— Esse é o caminho para a idade média e começo dos tempos modernos,
por ali. — sussurrou Nicholas.
Blanka assentiu e o seguiu pela reprodução da porta da cidade. Á primeira
vista, as exibições pareciam com aquelas no museu do Convento.
— Na parte de trás existe um modelo do Convento original. — disse
Nicholas em voz baixa. Seus passos quase não faziam barulho no polido piso cinza.
Blanka foi de uma vitrine a outra, encontrando selos artesanais e documentos,
retratos de anciãos do grêmio, rodas giratórias e um berço decorado com
incrustações de prata as quais estavam entronizadas como o trabalho de um
artesão em um pedestal de aço. Ao final da sala de exposição se encontrou com um
pequeno corredor. Obviamente o arquiteto quis criar a atmosfera de uma viagem
de descobrimento, pela passagem se chegava a um beco sem luz.
Blanka se aproximou e entrecerrou os olhos para ler o texto. “Exibição
especial”, leu no cartaz. “Bruxas, carrascos, torturadores – 1 de março a 31 de
agosto.” Perguntou-se se esperava por Nicholas, olhou ao redor, mas ele não estava
à vista. Então entrou sozinha no corredor e dirigiu-se para o canto sombrio. Uma
corroída porta apareceu à vista. Enfrente de sua quadrada janela tinha uma grade
de ferro. Apenas quando Blanka estava em pé diretamente na frente dela se deu
conta que era só uma fotografia na porta branca. Blanka pressionou o cabo para
baixo, entrou e esteve parada em frente de uma câmara de tortura. A palha rangia
sobre seus pés e as paredes estavam formadas por grosseiros blocos talhados em
pedra, como as paredes de um castelo. Imitações de tochas iluminavam a
habitação. As caixas de vidro, era onde se refletia a luz pestanejante, era a única
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recordação de que isto era um museu. Blanka enxugou a testa, apesar do frio,
estava suando, e olhou ao redor. Nem todas as exposições eram desta cidade:
algumas eram empréstimos de Tubingrn, Rothenburg e Munster.
O maior valor desta coleção era uma cadeira angular reclinável cujo assento e o
encosto estava coberto de pregos de ferro.
Justo quando Blanka estava para ir embora, seu olhar caiu sobre uma
exposição no canto. Era uma espada com cortes em forma de dentes com uma
muito reta e não muito ampla lâmina. A sua direita estava um documento
amarelado. Blanka se moveu mais perto e leu o que estava escrito. A espada tinha
pertencido a Johann Feverlin, carrasco da cidade até a sua morte em 1654. Uma
pequena nota de agradecimento indicava que a espada pertencia agora à família e
só havia sido colocada à disposição do museu pela duração da exposição. O
documento dizia que Johann Geord Feverlin havia dado evidência de sua
qualificação para ser carrasco da cidade em cinco de setembro de 1646. A data era
interessante: O carrasco viveu na cidade até o tempo exato de Maddalina. O nome
da família que tinha emprestado a espada à exposição, no entanto, não foi assinado.
Blanka tirou seu bloco de anotações e escreveu as datas. A poucos passos dela se
encontravam documentos que lhe resultavam familiares – isso é correto, era parte
dos documentos que tinha lido ontem. Página por página examinou rapidamente
os registros do interrogatório. Nada novo estabeleceu depois de um tempo,
decepcionada. As mesmas orações, as mesmas seqüências de eventos, as mesmas
lacunas. Finalmente alcançou a fotografia da página do registro que estavam em
frente da túnica da bruxa no museu do Convento.
“... Ele perguntou a Maddalina de Trenta se ela havia sido rainha das bruxas
ali (no baile das bruxas) entre as pessoas bruxas e demônios.“
Decepcionada, Blanka ficou de pé, virou a cabeça para trás e massageou o
seu dolorido pescoço com a mão esquerda. —Demônios. — dizia. — Não Feends.
— como no museu. Quando ela tentou voltar às páginas do seu bloco muito rápido,
uma página rasgou com um som horrível. Ali estava: A oração que tinha copiado,
palavra por palavra, no museu da escola. Era idêntica a que estava na foto, salvo
pela ortografia desta única palavra.
Blanka estava tão absorta comparando o original e a foto que ao principio
não notou que havia mais alguém na sala agora. Não foi até que escutou uma
respiração, pressionou o bloco contra seu peito e instintivamente se escondeu
atrás da cadeira de tortura. O aroma de cera para móveis e madeira velha invadiu
seu nariz.
83
Era Nicholas, certamente. Tinha suas mãos nos bolsos e olhava ao redor
com expressão preocupada. Blanka aclarou a garganta e ficou de pé. Nicholas
saltou. — Cara, então é aqui onde você está.
Blanka lhe fez sinais para se aproximar. — Dá uma olhada nisso. —
sussurrou ela, o empurrando contra a parede.
Nicholas comparou a frase no bloco com a fotografia várias vezes e assoviou
suavemente através de seus dentes.
— Ou o documento original na sua escola é falsificado ou o documento foi
fotografado. — confirmou.
— Tive a sensação ontem que a crônica está incompleta. Tudo parecia muito
suave, como um julgamento modelo para um livro de texto sobre a caça as bruxas.
Mas em um parágrafo mencionava que Maddalina de Trenta tinha uma manta de
pele que supostamente usava quando levava a cabo seus rituais diabólicos. Isso
simplesmente não concorda com a fotografia. Tenho a sensação que falta uma
parte importante dos documentos...
—... Ou pelo menos que tenha duas versões do registro dos interrogatórios.
— disse Nicholas terminando sua frase.
Eles encontraram as únicas fotos e documentos que se referiam aos Lobos
na seção “História da cidade”. Toda a parede se estabeleceu como uma página do
gigantesco álbum familiar. As fotos estavam em marco simples e mostravam a
cidade em diferentes períodos, a virada do século, depois da segunda guerra
mundial e em 1960. Naturalmente, a casa Solarenga também tinha sido fotografada
antes de ter sido reformada era vista como um obscuro templo cinza de um filme
mudo. Além disso, havia uma lista enumerada com os nomes das pessoas que
fizeram doações para apoiar a restauração dos edifícios antigos e do cemitério dos
órfãos. O cemitério foi protegido como um monumento histórico por cerca de
cinqüenta anos. Entre os patrocinadores, um Dr. Alman estava catalogado –
certamente, o pai de Joaquim era um ativo partidário da escola e seguramente
também de todo os pertences dela. Blanka leu através da lista, nome por nome, até
que se encontrou com um ao final que conhecia muito bem.
— Carsten Seibold. — sussurrou ela. — Esse é o policial que me interrogou
depois que encontraram a mulher morta.
— Isso não prova que ele está conectado com os Lobos, significa apenas que
deu dinheiro para a restauração. Mas, poderia também explicar porque a
investigação foi abandonada tão de repente.
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Nicholas assinalou uma fila de pequenos quadros. Eram fotos das
associações e instituições da cidade, os Vintners e a sociedade de embelezamento,
o grupo que promovia os trajes tradicionais e a associação de música. Finalmente,
quase junto à porta, havia cerca de uma dezena de fotos dos Lobos. As primeiras
datavam de 1955; nelas os trajes pareciam pesados e grosseiramente costurados.
Durante as últimas décadas os trajes mudaram, se adaptando a moda do dia. Em
1972 o cabelo da monja estava em um coque e o homem usando uma máscara de
Lobo tinha costeletas. Os rostos silenciosos pareciam sorrir a Blanka e a Nicholas
com conhecimento.
— Eles se viam como uma inofensiva associação de carnaval. — disse
Blanka, com decepção.
— Ultima tentativa. — murmurou Nicholas.
No hall de entrada a empregada do museu estava inclinada sobre seu
teclado. Ela não se deu conta dos dois visitantes até que Nicholas aclarou sua
garganta. Fascinada, Blanka visualizou uma enorme verruga perto da comissura da
boca da anciã.
— Meu nome é Klaus Jehle. — disse Nicholas. — Do jornal da universidade,
Attempto.
Ele tirou um cartão laminado. A Sra. levantou suas sobrancelhas.
— Estou fazendo uma investigação para um artigo sobre o festival medieval.
— Nicholas continuou. — E estou particularmente interessado na história dos
Lobos. Não encontrei nada sobre isso no museu.
A mulher olhou o cartão e sua expressão tornou-se um pouco mais
agradável.
—Não terá muita sorte aqui.
— Não tem arquivos. Vocês têm os documentos da livraria da cidade aqui
ou não?
Arrependida, a mulher moveu sua cabeça e alcançou uma caneta e papel. —
Não temos quase nada da história da escola ou dos Lobos aqui. — ela escreveu um
par de nomes no papel e procurou brevemente no computador antes de
acrescentar o número telefônico. — O melhor lugar para procurar é a biblioteca da
universidade, ou melhor,, na escola internacional Europa. Darei-lhe alguns nomes.
85
— ela sorriu para Nicholas, a verruga se movendo em direção a orelha como
resultado. — Cumprimente a Srta Nyen. Ou pode perguntar a alguns dos Lobos
diretamente.
— Boa idéia. — disse Nicholas sem nenhuma sombra de ironia. — Muito
Obrigado.
Ele encobria bem sua decepção, mas Blanka não podia resistir em fazer
mais uma pergunta.
— Porque não tem nenhum dos documentos originais?
O sorriso da Srta. Nyen se tornou mais agradável. — Bem, se você leu a
história do museu no terceiro andar com cuidado, poderia saber inoportunamente,
o arquivo foi quase completamente destruído por um incêndio elétrico em 1954.
Por sorte a escola tinha copias dos documentos do Convento assim como umas
quantas páginas originais da crônica do Convento.
— Muito Obrigado. — disse Nicholas pegando o papel. — Vou trazer uma
cópia do arquivo para você logo que sair.
Fora, no lobby do prédio eles foram golpeados por uma onda de calor, uma
prova do que os esperaria na quadra do mercado.
— Desde quando seu nome é Klaus Jehle? — perguntou Blanka.
— Desde que o real Klaus, que vive no meu andar, me emprestou sua
identificação. Hey, o que há de errado?
Blanka chegou ao seu limite. Deu a Nicholas um olhar suspeito.
— Eu só me sinto menos e menos segura sobre o que eu deveria acreditar.
— ela disse. — Está mentindo para mim? É um jornalista ou não?
Nicholas ficou boquiaberto. — De onde tirou isso? — lhe perguntou
aborrecido. — The gulag? Por que é tão suspeito?
— Só quero saber onde estou ficando.
Ele jurou, deu a volta e a deixou ali de pé. A porta do museu dançava aberta
contra seu rosto. Blanka alcançou a maçaneta de aço e empurrou a porta com toda
a sua força. Aliviada, ele viu que Nicholas estava de pé nas escadarias. Ele não a
olhou enquanto ela corria até ele.
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— O que você quer eu te mostre? — gritou-lhe de repente. — Passaporte?
Identificação escolar? Registro da universidade?
— Não, eu só queria saber...
Ele moveu sua cabeça vigorosamente. — Seria bom se apenas pudesse
acreditar em mim. — com essas palavras ele tirou sua carteira e pegou uma foto.
— Não sou um jornalista. Se meu pai tivesse alguma coisa a dizer, eu seria
um pedreiro como ele. Este é ele, em frente ao seu negócio, em Hemmor, no norte
da Alemanha.
Ele sustentou a foto para ela. Um homem delgado parado em frente a uma
loja de trabalho, sorrindo para a câmera. Ele quase não tinha cabelo em sua cabeça,
ainda assim a semelhança era impressionante. Nicholas virou a fotografia.
— Sandor Varkonyi. — esta dizia com a estampa de uma companhia.
— Meu pai vive em Kecskenét na Hungria. Pode imaginar quanto lhe custou
me enviar a essa universidade aqui? Não vou deixar que os Lobos me tirem isso.
— Sinto muito, eu só pensei...
— Exatamente. — replicou Nicholas ironicamente.
— Você pensa, esse é o problema. Pensa demais!
Ele afastou a foto e estudou o pedaço de papel que a Sra. do museu lhe havia
dado. — Sra. Klass, essa é a bibliotecária na universidade. Falei com ela semana
passada. E ela não pode me ajudar. O que há sobre esse nome?
Blanka olhou o papel. — Natalie Kuhlmann, é a estudante que é responsável
do armazém na livraria da escola. E já fui procurar sobre isso.
— Não foi de muita ajuda. — destacou Nicholas.
— Ainda tem o carrasco.
— Qual carrasco?
— Na exposição especial tem uma espada de um carrasco. Esta pertence ao
carrasco Johann Georg Feverlin. Ele viveu na época exata da caça da bruxa de
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Belverina. — ela baixou a voz. — Diz na nota que a espada vem de uma coleção
primada. Temos que se capazes de encontrar a quem pertence, talvez a um
descendente do carrasco. Eles devem saber algo sobre isso ou devem ter alguns
documentos dessa época.
Um sorriso assomou pelo rosto de Nicholas. Ele lhe deu uma cotovelada
como apreciação. — Nada mal!
— Você acha que a Sra. verruga nos dá o endereço?
— Pode ter certeza disso. — Nicholas tirou sua carteira e colocou o papel
nela. Quando esteve aberta, Blanka se deu conta de uma boa quantidade de cédulas
de cem euros.
— Ganhou no bingo?
Nicholas rapidamente fechou a carteira. — Algo assim. — disse se
desculpando. — Saquei um cheque hoje. Tem alguma idéia de quanto custa um
quarto no Pelargus?
Voltou a olhar Blanka. — Não tem que ir a aula? Se você se apressar pode
alcançar o ônibus das três e trinta.
Blanka colocou a mochila no ombro. — Nos falamos pelo telefone!
— Tome cuidado! — ele lhe disse. — E me liga, não importa quão tarde seja.
Meu telefone está ligado todo tempo.
— O mesmo sobre mim. — ela disse de volta.
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Capitulo 10
Engramas
Nesta Terça feira em particular, nem mesmo Dr. Kalaman podia atrair
Blanka para o campo da teoria da probabilidade. Incapaz de se concentrar na aula,
ela folheou suas notas. ‘”Sylvie” foi sublinhado duas vezes na margem. Em alguns
dias, quando ela voltasse para escola, Blanka teria que se apossar dela.
Blanka não tinha visto os outros Lobos desde o incidente nas escadas e a
noite ela não só tranca a porta, mas também empurra as costas da cadeira contra a
maçaneta da porta.
— O que diabos você esta fazendo aqui? — Caitlin chamou, quando Blanka
entrou no quarto depois do seminário da tarde. — Você não tem aquele
compromisso com o Dr. Hasenberg?
— Oh, merda! — Blanka girou sobre os calcanhares e correu. Faltavam dois
minutos para as cinco quando ela finalmente alcançou o laboratório de línguas.
Pulando duas escadas de cada vez, ela correu para o terceiro andar. Ela ignorou a
pontada em seu lado e bateu.
Dr. Hasenberg tinha cabelo castanho claro encaracolado e parecia
demasiado jovem para ser um professor universitário de psicologia. Blanka
adivinhou que ele tinha apenas trinta. — Bem na hora. — ele disse, fingindo não
notar o quão sem fôlego ela estava. — Entre e sente-se!
A sala era escassamente mobiliada, as duas poltronas azuis não poderiam
fazer justiça ao que poderia ter sido uma agradável área de estar. Uma pesada
estante preta tomou quase uma parede inteira. Atrás das portas de vidro brilhante
os livros pareciam tristes detentos de uma instituição de vidro. Hasenberg
simplesmente não pertencia a uma sala que exalava essa aura de administração
sóbria. A porta para a outra sala estava entreaberta, e atrás disso uma secretária
estava digitando no computador.
— Água? Suco de laranja?
89
— Não, obrigada. — disse Blanka, tentando respirar normalmente. Dr.
Hasenberg colocou para si mesmo um copo de água e se sentou, encarando-a,
imitando o jeito que ela estava sentada. Blanka quase sorriu. Estava ele copiando
sua postura para fazê-la sentir que ele era confiável?
Ela cruzou as pernas para o outro lado e cruzou os braços.
Hasenberg deu um leve sorriso. — Madame Lalonde me disse que você quer
fazer universidade de psicologia?
Cara, ele definitivamente estava indo direto aos negócios. — Sim, é por isso
que eu estou pegando os cursos extras de matemática do Dr. Kalaman.
— Estatísticas serão de grande ajuda para você. — ele disse, colocando as
pontas dos dedos juntas, do jeito que Nicholas tinha feito no café. — Por que você
decidiu fazer psicologia?
— Por que você fez? — ela rebateu. Houve uma pausa. Blanka se sentiu
desconfortável. O psicólogo não dava a impressão de que gostava muito de sua
nova estudante.
— Mais ou menos por acaso. — Hasenberg finalmente respondeu. — Eu
tinha começado a estudar medicina até que eu percebi que mesmo um médico não
é nada mais do que um psicólogo, ou um xamã, se você quiser. — as teclas na outra
sala batiam tranquilamente, fazendo Blanka sentir-se com sono. Ela ainda estava
sem fôlego. O caderno com as pistas que ela tinha escrito para conversar estava em
sua bolsa. Ela tinha que ganhar tempo para reunir seus pensamentos.
— Você quer dizer que um médico também deve ser um bom psicólogo, e
vice versa?
— Isso certamente não machuca. — respondeu Dr. Hasenberg. — Mas eu
acredito que nem um psicólogo ou um médico pode curar o paciente. Ele cura a si
mesmo. Os rituais e símbolos são o mais importante. Não importa se é a máscara
de um xamã ou um jaleco branco, uma lança ou um estetoscópio, é confiar nas
habilidades do curador que cura uma pessoa. Há quanto tempo você que ser uma
psicóloga?
— Desde sempre. — Blanka respondeu. A mentira saiu de seus lábios com
uma facilidade surpreendente. Na verdade, ela só tinha escolhido “psicologia”
depois de aprender que ela teria melhores chances de ganhar uma bolsa de
estudos se ela já tivesse uma meta de carreira definida em mente.
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Hasenberg acenou. — Já fez algum trabalho sério nisso?
— Eu li alguns ensaios, do Jung.
— Bom. Eu gostaria de te dar uma lista de livros hoje, para trabalhar nas
próximas duas semanas. Você não tem que memorizá-los, não se preocupe, mas
você deve lê-los cuidadosamente e pensar sobre eles. Nós vamos falar sobre eles
em nossa próxima reunião.
— E então você vai decidir se você quer ser meu mentor?
— Nós dois iremos tomar essa decisão. Olhe para isso como uma
oportunidade, não um dever. Você está interessada, não está?
Blanka pensou sobre o aviso de Tanya e levantou o queixo
desafiadoramente. — É claro!
— Bom. Você tem alguma pergunta?
— Qual sua especialidade?
Dr. Hasenberg recostou na poltrona. — Investigação Trans-geracional. —
ele disse. — O que simplesmente significa examinar os mecanismos que controlam
uma família por gerações e expor suas interconexões. Membros de uma família são
muitas vezes subordinados uns aos outros, ou mutuamente dependentes, de forma
incomum. Por isso, alguns problemas ou eventos ocorrem de novo e de novo. Se
um avô morre em um acidente, algumas vezes acontece de ter mais acidentes na
próxima geração. Isso é só um exemplo geral, é claro.
Sua voz era agradável, quase hipnótica. A falta de sono de Blanka estava se
tornando notável. Todo o escritório parecia envolto em uma aura tranquila e suave
como o algodão. — Pode-se dizer que passamos não só os nossos genes, mas
também as nossas tragédias e golpes do destino. — ele continuou. — Nós
lembramos coisas por gerações, mesmo que só inconscientemente. Você não deve
interpretar o momento: você deve olhar para o padrão. — Blanka de repente
percebeu que ela tinha ficado tão tensa que suas têmporas palpitavam. Ela estava
começando a ganhar uma dor de cabeça. As palavras do Dr. Hasenberg a
assustaram. Ela viu os pais diante de seus olhos, e atrás deles, sombras
ameaçadoras, fantasmas, estendendo a mão para ela. As mãos do Dr. Hasenberg
estavam relaxadas, segurando seu copo; ele parecia um pouco com um santo. Seu
sorriso parecia ser uma máscara. Quando ele olhou diretamente para Blanka, no
entanto, ela pensou ter visto um flash de aborrecimento em seus olhos. Ele
levantou o copo e bebeu profundamente.
91
Blanka clareou a garganta. — Eu... Eu estou mais interessada em psicologia
clínica e Psicotrópicos. — ela disse.
— Ah! A abordagem biológica: responsabilização, neurotransmissores no
cérebro, bioquímica, também é um interessante tópico. — ele admitiu
prontamente. — Essa é a coisa grande, cada disciplina científica em última fase
serve para a investigação do espírito humano. Se você decidir depois que você
prefere ser uma neurologista ou bioquímica, você pode rastrear Engramas, por
exemplo.
— Engramas?
— Eles são os traços que eventos importantes deixam no cérebro. Você
pode rastreá-los e desse jeito pesquisar o jeito que a consciência e memória
funcionam.
— Sim... Isso soa interessante.
Ele torceu a boca em um sorriso frio.
Blanka pensou em Joaquim. — Você teve conexões com os Lobos quando
era jovem?
Ele olhou para ela, perplexo. — O que faz você perguntar isso?
— Eu estou só interessada. Estou escrevendo uma dissertação sobre as
histórias locais. Mais cedo você falou sobre xamãs e curandeiros. Se você sabe tudo
sobre rituais xamânicos, você deve saber algumas coisas sobre os Lobos também.
Eles têm uma longa tradição, afinal de contas.
— Eu sinto que não posso ajudá-la com isso. Eu tomei parte na procissão
apenas uma vez, como porta-bandeira. Quando eu tinha dezesseis ou dezessete.
— Então, você veio para a Escola Internacional Europa.
— Sim, e eu fui para a universidade local também.
— Você sabe o que as fantasias significam exatamente? — Blanka continuou
perguntando. — As máscaras, as lutas, eles devem todos ter um significado
simbólico.
— Não um muito espetacular, em termos psicológicos. — disse o Dr.
Hasenberg, suprimindo um bocejo. — O Lobo é um animal arcaico. Em muitas
92
culturas as pessoas acreditam que são descendentes do Lobo e conectados com seu
espírito. Ele é um animal totem4. Nossas roupas de Lobo aqui são provavelmente
apenas um remanescente dos tempos pagãos, como as máscaras de carnaval da
área que você veio.
Dr. Hasenberg sorriu levemente, olhou para o seu relógio, e se levantou. —
Bom; Blanka. Eu vou só achar aquela lista de literatura básica pra você. — com
essas palavras ele pegou uma folha impressa da gaveta de sua mesa. Então, ele
folheou seu diário. — Duas semanas, mesmo horário?
— Sim... Mas... Tem mais uma coisa.
— Você tem outra pergunta?
— O que está acontecendo com Joaquim Almán? Eu não quero tomar o lugar
dele.
Dr. Hasenberg levantou abruptamente. — O que faz você pensar que é isso
que está acontecendo? — ele rebateu friamente. Na sala ao lado a digitação havia
parado. — Joaquim não está no seu projeto? Se é por que razão outros estudantes
terminaram seus projetos cedo não é algo que você deva se preocupar. Deixe essas
decisões para nós. Você não está tomando nada de ninguém.
Blanka ainda sentia como se estivesse tentando manter o equilíbrio na
corda bamba balançando.
Dr. Hasenberg olhou para ela, pensativo. Todo traço de gentileza tinha
deixado seu rosto. — Eu vou ser honesto com você Blanka. Se dependesse de mim,
eu teria atrasado o seu projeto de tutoria por pelo menos um ano. Mas Madame
Lalonde esta convencida que você consegue organizar seu tempo suficientemente
bem para lidar com tudo isso. Ela pensa muito de você, mesmo com suas notas
nesse momento sendo muito abaixo da expectativa. — essa acertou fundo. — Mas
eu também acredito. — ele continuou com uma civilidade que soou forçada. — Que
você tem o que é preciso. Aqui está sua lista. — ele entregou a folha de papel. —
Não se surpreenda quando você encontrar obras ai que se relacionam mais com a
filosofia, ou mesmo física. Eu gosto de dar aos meus estudantes uma perspectiva
global. E há também livros na lista que não estão nas prateleiras abertas. Por favor,
peça ao Sr. Nemec para achá-los para você, ele sabe onde os livros reservados
estão. Hoje se você puder.
4 Escultura de madeira. Divindade para alguns povos.
93
Blanka achou que era estranho que o Sr. Nemec estava encarregado das
coleções especiais, mas ela já tinha começado a suspeitar que ele fosse muito mais
do que apenas um zelador.
* * *
Em exatamente uma hora os estudantes iriam para o refeitório para o
jantar. Mas agora os corredores estavam tão vazios que a escola parecia nada mais
que uma memória. Os passos de Blanka clicaram no chão de linóleo. Hasenberg e
Nemec, ela repetiu mentalmente. O que eles têm a ver um com o outro? Ela desceu
as escadas, virando em direção aos laboratórios de línguas. Ela nunca tinha notado
esse leve eco antes. Ela podia ouvir seus passos só uma fração de segundo depois.
Soava como se alguém estivesse correndo atrás dela. Blanka parou. Agora estava
um silêncio morto de novo. Calmamente continuou. O eco ainda estava lá. E lá tinha
outra coisa, um click, mas não de saltos. Abruptamente ela parou novamente e
escutou. Diretamente atrás dela alguém deu outro passo. Blanka agarrou sua
caneta como uma arma e se virou. O corredor estava vazio; ela não podia ouvir
nada a não ser a própria respiração. Cuidadosamente deu um passo para trás,
então outro. Lá. Alguém ou alguma coisa estava farejando o ar, como se tivesse
tentando achar o cheiro da Blanka, e então lá tinha três clicks, um após o outro.
Uma presença a cercando, tão perto que ela sentia como se alguém estivesse
parado exatamente em sua frente. Imaginou que uma respiração passava por sua
mão, e gritou. O farejar parou e Blanka estava lá sozinha, sentindo como se um
vento gelado tivesse tomado conta dela.
* * *
— Ele te dilacerou? — perguntou Caitlin. Ela estava deitada na sua cama no
meio de uma avalanche de livros. Depois de amanhã ela faria o primeiro de seus
exames finais, e mesmo Caitlin, sempre tão relaxada, estava pálida ante a idéia e
não tinha apetite.
— Dificilmente. — respondeu Blanka, se jogando na cadeira de leitura de
Caitlin. Ela ainda estava gelada, e quando ela esfregou seus braços inferiores sentiu
arrepios.
— E? — sua amiga persistiu, sem olhar para cima de seus livros.
— Ele me deu uma lista de livros que eu preciso pegar na biblioteca.
94
— Oh, então eles serão certamente livros especiais que você só poderá
pegar com o Igor.
— Igor?
— Nemec, ele não te lembra do servo do Frankenstein?
Gradualmente Blanka estava encontrando seu caminho de volta a realidade.
Aquela presença deve ter sido uma corrente de ar, ela disse a si mesma, somente a
imaginação pregando peças.
— Vamos ver! — disse Caitlin, estendendo a mão pela lista. Blanka hesitou
um momento longo demais. Caitlin franziu e deixou a mão cair.
— Já chega! — ela chorou. Seus olhos verdes brilharam. Ela pulou da cama e
foi até Blanka. — Quantas vezes eu tenho que dizer que sinto muito? Eu não tive a
intenção de espionar você. Nunca mais vou falar sobre seus pesadelos de novo,
embora eu me preocupe, e você fala enquanto dorme. E eu vou ser uma boa garota
e trancar minha porta, então você vai se sentir mais segura. Mas não importa se eu
fizer; você não confia em ninguém, não é? — no limite, ela correu os dedos pelo
cabelo e suspirou. — Desculpe. — ela disse suavemente. — Eu não tive a intenção
de te atacar. É só. . . Eu estou muito ferida por causa dos exames, de qualquer
maneira. E eu não sou muito boa em lidar com essa atmosfera estranha entre nós.
Blanka nunca tinha visto Caitlin de tão baixo astral. As palavras de Nicholas
vieram à cabeça, e ela se envergonhou de sua falta de confiança.
— Desculpe Caitlin. Sem mau humor de agora em diante.
Caitlin relaxou visivelmente e sorriu hesitantemente para Blanka. Ela estava
pronta para dizer algo mais quando seu celular tocou. Blanka foi para seu próprio
quarto. Ela deitou na cama e fechou os olhos. Podia ouvir a conversa abafada de
Caitlin através da porta. Não podia ouvir muito realmente, mas não soava como se
Caitlin estivesse falando com um membro de sua família. Alguns minutos depois
Caitlin enfiou a cabeça através da porta. Blanka nunca esteve tão aliviada de ver
um sorriso.
— Eu indo me encontrar com Jan no café da biblioteca. — disse Caitlin. —
Você quer vir para a biblioteca comigo?
* * *
95
Hoje todas as mesas de leitura estavam ocupadas. Com uma sensação
incomoda na boca do estômago, Blanka olhou em volta procurando pelos Lobos,
mas não podia ver nenhum deles. Ela podia olhar para baixo e para a área de café
através da fachada de vidro por trás da estante contendo os dicionários. Caitlin
estava sentada em uma mesa com Jan, sorrindo. Esses dois obviamente têm muita
coisa pra conversar. Blanka observou-os por um tempo, em seguida juntou sua
coragem e foi procurar por Simon “Igor” Nemec. Sua esperança secreta de que ele
não estaria lá foi esmagada. Ela mal tinha deixado a seção de línguas quando ele se
aproximou dela. Um cheiro acentuado de pimenta flutuava para Blanka. Pelo
menos seus olhos não estavam vermelhos hoje.
— A lista do Dr. Hasenberg? — ele rosnou, antes que ela dissesse qualquer
coisa.
Ela assentiu e estendeu-a para ele.
Ele deu uma olhada na direção da folha. — Não preciso disso. — ele disse,
indicando para que ela o seguisse. Ela observou seus ombros rígidos, parecia que
ele estava tentando manter seus ouvidos fechados com eles. Ele a guiou passando a
seção de psicologia; então passando a de física, metafísica, e biologia, veio a seção
de historia, e finalmente chegaram a um canto da parte mais antiga da biblioteca, a
mesma área que Nemec tinha expulsado Blanka em seu ultimo encontro. Nemec
parou e começou a tirar livros das prateleiras. Ele parecia estar seguindo uma
bem-praticada rotina. Por quantos estudantes esses volumes passaram antes dela?
Nemec empilhou os livros e colocou em uma prateleira perto da seção de
psicologia. Então, pegou uma parede larga de prateleiras e simplesmente virou de
lado. Blanka ficou de boca aberta. Então! Tinha uma porta atrás das prateleiras, ela
só tinha olhado o canto errado quando Nemec a tinha flagrado. A porta não era
visível, imagine, tinha o papel de parede como a parede. Nemec tirou seu chaveiro.
Seus dedos tremendo um pouco, ele pegou uma chave lisa e abriu a porta. Atrás da
porta surgiu um buraco negro. Um leve cheiro de couro e poeira atingiu as narinas
de Blanka. Uma hedionda luz fluorescente piscou ligada, cintilando. Nemec entrou
na sala e soltou a maçaneta da porta. Com um rangido áspero e, em seguida, um
gemido, a porta se fechou atrás dele. Blanka pegou a estante mais próxima e
segurou-se firmemente. Como um flash de fotografia, Blanka de repente viu a si
mesma no saguão da biblioteca um momento antes de encontrar o corpo da
mulher. Só tinha escuridão, e um som. Esse som. Um momento mais tarde Nemec
voltou do pequeno quarto.
— Aqui. — ele disse, colocando toda a pilha de livros nos braços dela. O
curativo em sua mão direita não parecia mais tão novo. À vista de suas mãos
musculosas Blanka imaginou essas mãos matando Annette Durlain. Não entre em
96
pânico, ela avisou a si mesma. O barulho só significa que mais alguém além de
Annette Durlain deve ter estado na biblioteca. Nemec, ou outro alguém.
— Você tem feito essa turnê pelo museu por muito tempo? — ela
perguntou.
Os olhos de Nemec estavam lacrimejantes e amarelados. Para surpresa dela,
ele sorriu brevemente. — Um quarto de século. — ele respondeu. — E não fica
mais excitante conforme os anos passam.
— Você ainda se lembra de alguns dos visitantes?
— Você quer dizer Annette Durlain, não é? Não, criança. Você acha que eu
noto todo rosto?
Ele suspirou profundamente e, de repente parecia nada mais que um
lamentável velho homem que havia em algum lugar, de alguma forma, perdido seu
apego pela vida.
— Então você não a conhecia?
Ele balançou a cabeça cansada.
— Então por que você está tão triste?
— A vida ás vezes é o suficiente para fazer você chorar, você não acha?
Blanka abaixou o olhar e olhou para o livro no topo da pilha. Na capa estava
estampada uma pintura: um leão que tinha mordido o sol.
— Esse... Livro está realmente na lista? — ela perguntou em uma voz fraca.
— É claro.
— É sobre o que?
— O leão que comeu o sol. — ele disse. — O símbolo mágico da pedra
filosofal. É um livro sobre Faust, que praticava as artes negras, e seus experimentos
em alquimia.
* * *
97
A carga de livros pressionava fortemente os quadris de Blanka enquanto ela
descia as escadas para a saída. O sol da tarde tinha colocado um véu dourado sobre
a grama e banhado a mansão em uma luz irreal que enfatizou seus contornos
afiados. Com passos rápidos Blanka correu ao longo da parede para um pequeno
caminho, um lugar onde não havia nada além de hera e cantaria. Aqui ela tomou
tempo para recuperar o fôlego. O medo que ela sentia dos Lobos, que fez ela
ansiosa e irritada dentro do prédio da escola, desapareceu aqui fora como se por
mágica. Aliviada, ela pegou seu celular.
— Nicholas, sou eu!
— Por que você esta falando tão baixo? Onde você tá?
— Atrás da mansão, eu precisava de ar.
— Eu ia te ligar em um segundo, de qualquer maneira. A Sra. do museu
suspeitou e não vai me dar o endereço do Feverlin. Eu passei praticamente a noite
inteira na Internet da cafeteria, mas os Feverlin que eu achei lá não parecem ser os
que nós estamos procurando. Amanhã vou pegar o telefone de novo.
— Você pode se poupar do problema. — ela abaixou a voz para um
sussurro. — Eu sei onde Annette Durlain estava procurando. Eu tenho certeza
agora que ela não estava sozinha na biblioteca! E se eu estou certa, nós podemos
também encontrar as crônicas que são supostas não existir.
— Onde?
— Em um pequeno quarto especial na biblioteca. Eu só não sei como entrar
ainda. O quarto é trancado e eu não acho que tenha uma janela.
— Entendi. — disse Nicholas. — Hora do plano B.
98
Capitulo 11
Sombras
Caitlin estava muito nervosa para beber seu chá pela manhã. Sua caixa de
lápis caiu de sua mão pela terceira vez, quando ela checou para ver se tinha todas
as suas canetas e lápis, e se todos funcionavam ou estavam apontados.
— Qual é o primeiro assunto? — perguntou Blanka.
Caitlin rolou os olhos. — História, duas horas. Então uma pausa. Então
prova oral de Francês e Espanhol. E então esta tarde, Física.
— Eu tenho certeza que você vai escrever as melhores respostas de sempre
e entrar no Colégio Trinity de Dublin espetacularmente. Você consegue!
— Se eu fizer a prova do jeito que eu me sinto, eu vou estar de volta em casa
em Dingle em uma semana, me candidatando para um emprego na lavanderia do
O’ Reilly. Obrigada do mesmo jeito! — Caitlin abraçou Blanka em um rápido adeus.
E pegou a bolsa. No momento seguinte ela tinha ido. Blanka ouviu vozes no
corredor e passos rápidos desaparecendo na distancia. As tensões da manhã
desapareceram, e seu cansaço voltou. Ela esfregou os olhos e rastejou de volta para
cama. Ela ainda tinha dez minutos antes de ter que sair - e enquanto ela ouvia as
explicações da Sra. Lincoln sobre novos aspectos da gramática do Inglês, Caitlin iria
suar sobre sua prova igual a todos os dezesseis outros estudantes. Outros deveres
esperavam Blanka, de qualquer maneira. Acima de tudo ela tinha que se acostumar
com a idéia de que esta noite ela estaria arriscando seu futuro na Escola
Internacional Europa. Ela deve ser louca. Nervosamente ela olhou pro seu
despertador e verificou seus cálculos. Mais dezessete horas até ela encontrar
Nicholas. O momento era perfeito, todos os professores e estudantes estavam se
concentrando nos exames. Nicholas e ela não podiam ter esperado por uma melhor
distração. Ela fechou os olhos e imaginou a rota que iria tomar esta noite.
Nenhum dos Lobos apareceu durante todo o dia. Aquilo surpreendeu
Blanka no começo quando ela estava na mesa de leitura na biblioteca, mas depois
lhe ocorreu que para alguns alunos deve ser atribuída a tarefa de manter a área do
exame quieta. Blanka tentou, sem sucesso, se concentrar em seu dever de casa.
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Hoje as fórmulas e diagramas pareciam sinais enigmáticos, cujo significado ela mal
podia se lembrar. A falta de sono e os sonhos a preocuparam. Eu só tenho que
agüentar mais um dia, ela disse a si mesma. As respostas estavam quase ao alcance.
Uma parecendo-perturbada Caitlin correu no andar de baixo. Ela estava seguindo
cinco outros estudantes, que pareciam tensos do mesmo jeito. Como se consciente
do olhar da Blanka, de repente ela olhou para cima. Ela sorriu e levantou o polegar.
* * *
Os minutos estavam rastejando, mas lentamente do que Blanka jamais
pensou que fosse possível. Por uma hora ela não tinha feito nada alem de encarar
seu celular e o relógio. Felizmente Caitlin tinha estado tão exausta que apesar de
seu nervosismo sobre os exames do dia seguinte ela tinha dormido rapidamente.
Finalmente os números mudaram. Uma hora em ponto. Blanka calmamente
levantou e deslizou seu celular no bolso. Sem fazer nenhum som ela abriu a porta e
saiu para o corredor. Porque ela tinha passado a ultima hora no escuro, seus olhos
tinham se ajustado a escuridão; ela pode passar pelas portas até a porta de vidro
no final do corredor. Em algum lugar ela ouviu uma descarga; luz aparecendo em
uma abertura embaixo da porta. Blanka se apressou, saindo do quartos das garotas
e atrapalhando-se para baixo na escada. O alcove sobre a escadaria principal
estava escuro. Blanka parou no lugar que eles tinham marcado e olhou para as
sombras.
— Nicholas? — ela sussurrou. Um ruído áspero respondeu. Coração
batendo mais rápido, ela ficou parada, ombro direito pressionado a fria pedra da
escadaria. Então ela ouviu alguém limpar a garganta silenciosamente. Blanka
estava tão aliviada que suas pernas quase fraquejaram. — Nicholas! — com os
dedos frios ela sentiu procurando a pequena lanterna que ela tinha tirado de seu
chaveiro.
— Não. — disse uma voz. Blanka pulou para trás; a lanterna escorregou dos
dedos e acertou o chão. — Se você ficar ai, qualquer um no parque poderá te ver
através do vidro. Vem comigo!
— Jan?
Uma sombra passou veloz, acenando para ela. Blanka procurou pela
lanterna. Alguma coisa clicou na escuridão, em seguida ela ouviu um estalo que
soava como algo elétrico ligando. Uma dobradiça de porta mal oleada rangia
baixinho.
100
— Vamos! — sibilou a voz. Com joelhos de geléia Blanka começou a se
mover. A porta para sala do mapa, que estava normalmente fechada, estava aberta.
No momento seguinte uma lanterna acendeu. Um cone de luz passou rapidamente
sobre mapas e caixas de papelão surradas. Blanka piscou. Jan estava usando uma
camisa longa e calças track5 que enrolava em volta das pernas.
— Dentro ou fora! — ele disse.
Ela engoliu em seco e entrou. A porta se fechou com um estalo. Jan colocou a
lanterna numa prateleira e colocou uma mochila no chão. Ela sacudiu.
— O que você esta fazendo aqui? — sussurrou Blanka. Ele riu meio
sonolento, e remexeu na bolsa. Blanka olhou pro seu cabelo desgrenhado. A
camiseta amassada que ele tava usando que provavelmente era seu pijama. Ele
tirou algo da bolsa que parecia uma escova elétrica sem a escova anexada.
— Eu vejo. — disse Blanka sarcasticamente. — Você esta planejando se
mudar para cá.
Então, seu celular vibrou. Na tentativa de pegar o mais rápido possível, ela
quase derrubou.
Ele está ai? — sussurrou a voz do Nicholas.
— Você o enviou aqui?
Ela ouviu o suspiro de alivio que ele soltou do outro lado do telefone. —
Obrigado Deus! Então tudo esta funcionando, ouça, eu não posso fugir. Mas Jan
sabe o que fazer.
— Você não esta falando sério! Pelo amor de Deus, você não podia ter me
contado antes?
Jan pousou um dedo de aviso nos lábios.
— Desculpe. — sussurrou Nicholas, genuinamente arrependido. — Eu juro
que tem uma boa razão. Eu explico depois.
— Tudo bem. Então tenha uma boa noite! — estalou Blanka, pressionando o
botão para encerrar a ligação. O display ficou branco.
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101
— Bem, eu acho que o querido Niki deu a nós dois uma surpresa. — disse
Jan, bocejando.
De novo ele abaixou e remexeu na bolsa. — Que tipo de chave Igor usou? —
ele perguntou.
— Por que você quer saber?
Jan levantou a escova de dentes. — Chave universal. — ele disse
calmamente. — Mas eu tenho que saber que anexo eu preciso.
— A escova de dentes é uma chave?
Jan assentiu. — Abridor de portas. Claro que eu modifiquei um pouco, de
outra forma que as rotações seriam muito lentas. Você pode usar isso para escovar
seus dentes também, é claro. — ele adicionou ironicamente.
— Chave achatada. — disse Blanka. — Mais ou menos do mesmo tamanho
da minha pequena lanterna aqui, com rotinas longitudinais.
— Tipo padrão de segurança. — disse Jan, adicionando ironicamente, —
Bem, tão segura quanto às outras portas neste prédio. — fascinada apesar de si
mesma, Blanka assistiu ele selecionar e anexar um metal e deslizar os aços
remanescentes dentro do bolso da calça.
— Você realmente construiu isso?
— Claro, eu também construí o controle elétrico para sua chaleira lembra?
— Eu pensei que você era um artista.
— O que você acha que eu faço na sala de artes, bagunça no barro?
— Não, mas primeiro de tudo, a sala de artes é mais longe que os quartos e a
sala do zelador do que qualquer outro e segundo, tem um forno de alta potencia lá.
Blanka estremeceu. — E a sua escova de dentes funciona em uma trava de
segurança?
— Claro, é só fixar este anexo no buraco da fechadura e ligar. A vibração
gira o tambor de aço e click! A porta abre.
— Por que construir algo assim?
102
Jan encolheu os ombros e empurrou a mochila em baixo de uma prateleira.
— Eu tenho uma coisa sobre portas trancadas.
Na luz da lanterna ele realmente pareceu ter dezenove. Pela primeira vez
ela notou quão forte ele era.
— Você perdeu dois anos de escola. Você estava... em uma casa, ou alguma
coisa assim?
— Escola reformatória. Um ano por apropriação indébita. Eu perdi o outro
ano porque eu repeti. — ele sorriu docemente. — Hey, o gato comeu sua língua?
— Não... Eu...
— Ah, você não esperava isso nessa respeitável escola? Nunca ouviu falar
das cotas?
— As bolsas de estudos para alunos desfavorecidos?
Jan riu baixinho. — Ninguém nunca colocaria isso desse jeito, claro, soa
muito como descriminação. Se você olhar para isso dessa maneira, Madame
comprou minha liberdade, sim. Eu fiquei surpreso comigo mesmo que eu era tão
bom em física. Foi uma chance de me livrar do meu padrasto. Mas é claro, aqui eu
tenho condições especiais. Todos os pais tiveram que assinar um formulário
dizendo que eles concordavam em que eu pudesse estar aqui. — ele sorriu
ironicamente. — Os seus também.
Blanka estava estupefata. — E a Caitlin? Ela sabe?
— Claro. — ele respondeu logo, adicionando um pouco de mau humor, —
Pelo menos ela não fez disso grande coisa que nem você.
— Por que você...
Jan rolou os olhos e levantou os braços dramaticamente. — Oh Deus, não
essa pergunta de novo. — ele sussurrou. — Por quê? Por quê? Por que... Nada é
mais fácil do que arrombar carros. Porque ganhei dinheiro, porque o clima era
bom. Não faço idéia. Porque eu sou um perdedor? Você me diz, é a sua
especialidade, não é, explicar as pessoas o que faz eles fazerem as coisas.
— Eu não posso ser uma boa psicóloga. Eu pensei que você só fosse um
covarde.
103
— Oh, você não errou por muito nisso. — ele respondeu calmamente. — Eu
sou bastante covarde. Mas uma porta é só uma porta. — ele puxou sua camisa
nervosamente e olhou suplicante para Blanka. — Você não vai contar para a Cait
nada sobre esse pequeno passeio?
— Eu prometo. — respondeu Blanka. — Contanto que você não conte a ela
também!
— Vamos apertar as mãos nisso! — eles apertaram. — Vamos, precisamos
nos apressar.
— Espera um minuto. — ela sussurrou, agarrando o braço dele para puxar
ele de volta da maçaneta da porta. — Nicholas e você? Como vocês se conhecem?
— Nicholas é realmente um cara legal. Estudante de medicina com dinheiro.
Nós realmente só nos conhecemos de vista. A moto dele é um amontoado de
ferrugem. Eu soldei algumas conexões para ele e dei a ele algumas informações,
sobre você também.
— Então foi você que contou a ele sobre o livro dos santos. — Blanka disse.
— O que ele esta pagando pela ação desta noite?
Jan estalou a língua e sacudiu a cabeça. — Isso é informação confidencial!
Mas o livro que você quer parece ser importante.
* * *
Parecia assustador, andar de noite pelos corredores que ela só conhecia
pelas horas do dia. Jan foi na frente com uma passada tão firme que parecia que ele
podia enxergar na escuridão. Ele freqüentemente tinha que parar e esperar que
Blanka sentisse seu caminho até ele pela parede. Ele liderou Blanka à biblioteca
através de escadas na parte de trás que ela nunca tinha visto. Com um click, a porta
abriu sob as mãos experientes de Jan e eles entraram na biblioteca por uma ala
lateral. Luz da lua brilhava através das persianas e jogava um liquido pálido de luz
nas mesas de leitura e nas prateleiras.
— Em que seção é a porta? — sussurrou Jan. Blanka pegou os rolamentos
na escuridão, reconhecendo as estantes tortas contendo os dicionários, e sentiu
seu caminho para frente. Finalmente a parede com a porta estava a sua frente. Com
a força deles combinada eles puxaram a prateleira pro lado. Jan ajoelhou na frente
104
da fechadura. Por um momento a luz da lanterna dele brilhou ligada, então apagou
imediatamente. Teve um click, então uma rápida vibração, que para Blanka parecia
tão alto como uma serra circular. Assustada, ela olhou em volta, mas nada estava se
movendo. Com um ruído arrastado a porta abriu para dentro. Rapidamente eles
entraram e fecharam a porta cuidadosamente para que não trancasse.
Imediatamente a luz florescente ascendeu. Jan tirou sua mão do interruptor de luz.
— Não tem perigo, não tem janelas. — ele sussurrou, sorrindo para cara
horrorizada dela.
Os olhos dele estavam brilhando. Ele olhou em volta do pequeno quarto
ansiosamente. Se Blanka antes se perguntou o que poderia fazer Jan arriscar
perder sua chance de provar a si mesmo, estava claro a ela agora que ele vivia para
momentos assim: por controle, sigilo, o sentimento de ser capaz de ir onde
nenhuma porta poderia bloquear seu caminho.
— São muitos livros. — ele disse. — Eu espero que você saiba o que ta
procurando.
O quarto era maior do que parecia a primeira olhada. O que fazia parecer
menor eram as prateleiras cheias de livros, em que duas fileiras de livros ficavam
um atrás do outro. Bem no final estava uma antiga maquina de copias. Blanka não
podia pensar em nenhuma ordem lógica. O lugar parecia o cérebro de um cientista
louco que não podia distinguir entre o que era importante e o que não era. Alguns
livros tinham as costas decoradas com escritas douradas; outros tinham sido
novos uma década atrás, mas agora tinham tomado uma coloração marrom-
amarelada. O olhar da Blanka caiu sobra uma linha de amareladas crônicas e
anuários.
Em cada capa o ano foi dado: o primeiro dizia “1649-1700.” No próximo
livro estava “1701-1750,” continuando do mesmo jeito subindo ate o ano 2000.
Uma hora mais tarde Blanka estava perto do desespero. Ela estava achando
somente estatísticas sobre a localidade, listas de casas, as contas de varias
associações e créditos, as relações do corpo de bombeiros voluntários, e todos os
feixes de gravuras de cobre. Nenhum sinal da historia do Convento - e nenhum
sinal dos Lobos. Incansavelmente ela procurou fila após fila. De novo e de novo Jan
teve que suprimir um suspiro quando a poeira subia ao nariz. Cuidadosamente eles
se asseguravam de colocar os livros no mesmo lugar de onde tinham vindo
combinando-os com as marcas deixadas na poeira. Finalmente, quando eles tinham
chegado aos trabalhos de referencia medica, Blanka colocou a mão sobre um livro
fino, usado com uma ligação de papelão firme. Cuidadosamente ela tirou. As pontas
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já estavam enrolando e o livro estava desmoronando. Blanka colocou no chão
gentilmente, ajoelhou diante do livro, e começou a folheá-lo página por página.
— Aqui tem alguma coisa! — ela sussurrou. Era um livro de registro do
clube dos Lobos, só três anos de idade, mas melhor que nada. Quando ela começou
a ler, entretanto, ela estava desapontada. Todas as despesas para novos trajes
estavam listadas em mínimos detalhes, e as contas de uma loja de carnaval
estavam grampeados na borda. Então, havia uma programação de treino e
coreografia para a dança da vara. As últimas entradas eram os nomes dos
membros e contatos na Associação de Carnaval local.
— Merda. — ela murmurou. — Isso não pode estar certo. — novamente ela
olhou o livro página por página, mas lá não tinha nada para ajudá-la. Aqui e ali
alguém tinha rabiscado alguma coisa na margem, tinha talvez estado conversando
no telefone e rabiscando no caderno. Um destes artistas tinha tentado desenhar
uma figura humana. Blanka inclinou-se mais sobre o livro.
— Jan. — sussurrou Blanka. — O que você acha que é isso?
Ele ajoelhou ao lado dela e olhou pro desenho.
— Peitos. — ele disse. — Alguém devia estar tentando desenhar a
namorada.
— E abaixo disso, o que é isso? — Blanka apontou para um símbolo que
tinha sido parcialmente riscado.
— Hmm. A namorada dele deve ter tido uma tatuagem. Você precisa da
foto? — Blanka assentiu. — Melhor pegar os nomes também.
— Você tem uma câmera digital com você?
— Não.
— Merda. — disse Jan, igual à Caitlin quando ela estava tendo um dia ruim.
— Nicholas iria trazer a câmera. Mas espera um minuto, nós não precisamos de
uma!
Ele já tinha pulado em pé e ligado a maquina de Xerox. Sussurrando a
maquina começou a aquecer. Blanka levantou e olhou ao redor para a porta.
— Alguém vai ouvir isso! — ela sussurrou. Jan colocou a idéia de lado.
106
— Não se preocupe. Não vai demorar muito.
— E o contador? E se alguém perceber que o contador aumentou?
Jan deu um meio sorriso. — Abracadabra. — ele disse, puxando um pedaço
de madeira. — É uma maquina velha. É um contador mecânico, sem coisas digitais.
Tudo que eu tenho que fazer é interromper o pulso métrico.
Blanka assistiu inquieta como Jan abriu o painel frontal da maquina,
removeu o acoplamento de metal do mecanismo contador, e colocou o pedaço de
madeira em posição. Depois de copiar o livro sem pressa, ele tirou o palito de novo
e cobriu o cabo exatamente do jeito que era antes. Blanka pegou a pequena pilha
de folhas e rapidamente enfiou embaixo da blusa.
Quando eles desligaram a luz novamente, ambos estavam completamente
cegos. Os dedos deles se encontraram acidentalmente na escuridão, e sem
nenhuma palavra eles deram as mãos enquanto sentiam seu caminho para frente
juntos. Luz da lua brilhava nos braços de metal das lamparinas de leitura, e
gradualmente as mesas e cadeiras emergiam da escuridão. As prateleiras nos
corredores como gigantes de pedras. Metafísica, Física, Química: Blanka contou-as
mentalmente. Juntos eles deslizaram entre as prateleiras em uma passagem lateral.
Lá eles tiveram que se separar para que eles pudessem caminhar em fila única.
— Espera Jan! — ela sussurrou.
Ele parou e virou. — O que?
— Eu vou voltar para o meu quarto através da escada principal. É... Mais
perto.
Uma sombra encolheu os ombros. — Tudo bem. — ele respondeu
calmamente. — Eu estou saindo no caminho de volta. Eu te vejo depois!
Ele se abaixou e desapareceu na escuridão. Blanka esperou até seus passos
furtivos desaparecerem na distância. Então, pernas como geléia, ela seguiu o rastro
de Annette Durlain. Tinha ela achado o que queria nessa sala? Tinha ela pego isso e
tido isso com ela no caminho para as escadas? Blanka respirou profundamente e
rastejou ao redor das prateleiras. Ela deu quatro, cinco passos em direção a
escadaria principal, então congelou. O som de passos atrás dela parou-a
instantaneamente. Blanka hesitou então se virou. Desde quando tem uma cadeira
nesse corredor? Se esforçando, ela tentou ver mais claramente. Sem duvida sobre
isso, a cadeira... Estava levantando! As pernas da cadeira deixaram o chão e a coisa
toda se tornou uma sombra balançando tão alta quanto um homem. Nemec?
107
Blanka ouviu um som de raspagem, e o fantasma se moveu. Respiração estranha
fluía através das lacunas na estante como fumaça. No topo de uma fileira de livros
Blanka pode ver a figura girando ao redor, e uma cabeça sombria se voltando para
ela. O corpo dela reagiu instintivamente. Ela correu em direção a porta. Tarde de
mais ela percebeu que a figura que pulou nela no momento seguinte era sua
própria imagem na porta de vidro. Sem saber como chegou lá, ela encontrou-se
entre duas estantes novamente. Os músculos dela doíam. As costas de livros
cavando em suas omoplatas. Então alguma coisa acertou-a na cabeça. Os joelhos
dela cederam, e tudo ficou preto.
* * *
Tinha sido um dos pesadelos dela? Esmalte dental brilhou ao luar. Saliva
quente pingava em sua mão. Uma dor enorme perfurou seu couro cabeludo. Ela
lutou para abrir os olhos e tentou achar seu abajur. Mas tudo que ela achou foi a
base de metal de uma estante. Ela abriu os olhos na escuridão e viu os pálidos
olhos do fantasma encarando ela. No momento seguinte estava em cima dela. Uma
mão cobriu sua boca e sufocou seu grito. Um raio de luz apareceu do nada.
Atordoada, ela piscou e não tentou se defender quando alguém colocou a mão em
sua testa. Isso até foi bom, porque a dor diminuiu. — Você está sonhando. —
murmurou uma voz, e ela afundou aliviada.
A próxima coisa que ela estava ciente era o tapete da biblioteca arranhando
seu rosto e a luz da lua ainda brilhando entre as persianas. Atordoada, ela olhou ao
redor e uma onda de choque bateu. O que ela pensou que era saliva pingando era
seu próprio sangue, na linha do cabelo seu couro cabeludo estava latejando, e
quando ela cuidadosamente sentiu o lugar, ela sentiu um pequeno corte, que já
estava formando uma casca. Presumivelmente tinha vindo do livro que tinha caído
em sua cabeça e agora descansava no chão, um pouco para o lado: Obras Completas
de Shakespeare, Volume IV. Ela deve ter batido na estante, e o livro caiu e a acertou
na cabeça. O corte em sua têmpora veio do canto da capa dura. Ela tocou a
camiseta e deu um suspiro de alivio. As copias ainda estavam ali!
Ela teve que lutar para ficar de pé e colocar o pesado livro de volta na
prateleira. Então ela se dirigiu as escadas, pernas tremendo, esperando ouvir a
qualquer momento uma voz atrás dela ordenando que ela parasse.
* * *
108
Talvez fosso porque ela ainda estava tonta: quando ela entrou em seu
quarto, ela tropeçou na cadeira que ela tinha anteriormente colocado ao lado da
porta de conexão. Antes que ela levantasse, ela ouviu a voz sonolenta de Caitlin. —
Blanka? — luz apareceu em baixo da porta, e no momento seguinte a porta abriu.
Quando Caitlin viu Blanka, seus olhos se arregalaram. — Oh, Meu Deus!
— Shh! — disse Blanka. — Calma! Está tudo bem.
— Está tudo bem? Você esta sangrando! Onde você esteve? Quem fez isso?
— então Caitlin subitamente colocou a mão sobre a boca. — Foi o... Joaquim quem
fez isso?
— Não. — Blanka disse exasperada. — Ninguém fez nada comigo. Eu
tropecei.
Alguém bateu na parede.
Caitlin abaixou a voz. — Você tropeçou no meio da noite? Não me venha
com besteiras, Blanka, você está de sapatos, e você não dorme vestida assim! O que
eles fizeram com você?
— Ninguém fez nada comigo!
Caitlin examinou o corte, e os fios de cabelo grudados. — Isso é o suficiente.
— ela disse. — Nós estamos indo ver a Madame, agora! Alguma coisa esta
acontecendo, e esta claro que você não pode lidar com isso sozinha.
— Sem chance! — Blanka agarrou os pulsos de Caitlin. — Me escuta. Se nós
reportarmos isso, eu vou ser jogada fora. A única coisa que vai me ajudar agora é
um álibi. Eu não posso te contar o que aconteceu, mas é possível que Nemec vá
bater na minha porta nos próximos minutos, e então. Por favor! Diga a ele que você
não acha que eu tenha saído do quarto. — suplicante ela continuou. — Alguma
coisa grande esta acontecendo, mas eu não posso te contar tudo. Eu vou até a
Madame assim que eu tiver mais provas. Por favor, só confia em mim.
Caitlin se soltou e deu um passo para trás. Pensativamente esfregou os
pulsos e olhou Blanka.
— Prova? — ela perguntou desconfiada. — Do que?
— Não posso dizer.
109
— Eu sou sua amiga!
— Você é? — as palavras saíram. Instantaneamente ela se arrependeu.
Caitlin olhou como se Blanka tivesse estapeado ela.
— Você ainda não confia em mim. — ela disse. — O que você pensa que eu
sou? Você realmente acha que eu só quero fazer você parecer mal para Madame
Lalonde? Deus. Existem melhores maneiras que eu poderia ter feito isso! Qual seria
a razão? Eu só quero terminar a escola aqui e voltar para Irlanda. Isso é tudo.
O silencio de Blanka fez Caitlin ficar com mais raiva.
— Você não consegue imaginar alguém simplesmente querendo ser sua
amiga, não é? — ela sibilou. — O que eu tenho que fazer para fazer você confiar em
mim? Algum tipo de prova?
Blanka levantou a cabeça e olhou Caitlin nos olhos. — Sua camiseta. — ela
disse, gesticulando em direção a cintura dela. — Puxe para cima.
Caitlin olhou para ela como se ela tivesse finalmente perdido a cabeça, então
ela cruzou os braços, pegou os lados e puxou a camiseta por cima da cabeça.
Irritada ela jogou a camiseta em cima da cama. Ela ficou parada lá, vestida apenas
em roupa intima. Sua pele era perfeita. — Então? — ela perguntou, esticando os
braços para o lado. — O que você está procurando?
Blanka pegou a camiseta e entregou para Caitlin. Ela se sentia idiota. Ainda
assim, ao mesmo tempo, ela estava completamente aliviada.
— Eu pensei que talvez você tivesse uma tatuagem. — ela disse se
desculpando.
— Sei. — disse Caitlin sarcasticamente. — Bem, eu não tenho. Então agora
você vai me dizer o que aconteceu com você?
Blanka considerou o quanto ela deveria contar a ela. Finalmente ela puxou
as copias com os nomes. Rapidamente ela contou a Caitlin sobre as ameaças dos
Lobos e sobre Nicholas, que estava tendo os mesmos problemas que ela. Ela não
contou sobre o forjado relatório da autopsia ou seu encontro com Jan.
— E esta noite eu estava na sala de livros do Nemec, para descobrir mais
sobre os Lobos. Mas tinha alguma coisa na biblioteca, eu acho que o Nemec me viu.
Talvez ele esteja reportando isso agora. Se ele está, amanha eu posso arrumar as
malas e ir para casa.
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Os olhos de Caitlin tinham diminuído para fendas. — Então você invadiu,
uma sala que tem uma fechadura de segurança?
Blanka segurou a respiração.
Caitlin de repente parecia ter mordido um limão. — Merda! — ela disse.
Sem olhar sua amiga, ela foi para seu quarto e bateu a porta atrás dela. Poucos
segundos depois Blanka ouviu-a no telefone. Ela estava sussurrando, mas mesmo
assim, Blanka estava feliz de não estar no lugar do Jan.
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Capitulo 12
Maddalina DE TRENTA
Blanka estava deitada na cama na escuridão, esperando ouvir como
chamavam em sua porta a qualquer momento. O corte, que ela havia curado como havia podido, havia se tornado uma crosta, mas ainda palpitava com cada batida de seu coração. Passaram as seis da tarde, logo as sete, e não aconteceu nada – e, por último, as sete e meia, Caitlin se dirigiu até seu próximo teste de maratona, com os olhos inchado. Blanka olhou seu celular. Onze chamadas perdidas de Nicholas. Justo quando estava a ponto de devolver a chamada, o telefone tocou em sua mão.
— Graças a Deus! — exclamou Nicholas. — Tudo de acordo com o plano?
Por que você não ligou? — Porque estou deitada na minha cama com um corte na cabeça, e hoje vão
me expulsar, não tenho certeza, mas acho que Nemec me viu. — Um corte? Apesar de estar furiosa com ele, era bom escutar que se preocupava mais
por ela, que pelas coisas com Nemec. — Alguém me jogou no chão? — Quem?
— Shakespeare. Nicholas vacilou um momento. — Sua primeira aula não começa até os próximos vinte minutos. Nós nos
vemos! — Não. — gritou, e imediatamente abaixou o tom de voz. — Não, estou bem,
um livro acaba de cair sobre a minha cabeça. Espero que a tua desculpa seja igual de original.
— Olha pela janela. — respondeu de forma seca.
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Blanka se levantou, ignorando a ligeira tontura que sentiu quando o fez, e deixou seu celular entre a orelha e o ombro. Foi um duro trabalho subir a persiana nessa posição contraída. Os raios de sol matutinos bateram em seu rosto. Piscou e olhou para o estacionamento. Reconheceria esses ombros encurvados em qualquer lugar. Quando ele a viu, saudou-a, um sorriso de alívio se formou em seu rosto.
— Bom ao menos você pode ficar de pé. — disse. — E agora olha, o que
passou ontem a noite... Houve um ruído enquanto ele colocava o celular no bolso, agachou-se e
subiu a perna direita da calça. Uma bandagem ficou a vista. Toda sua canela parecia uma pintura abstrata com uma grande variedade de tons vermelhos e azuis. Nicholas levou o celular para a orelha: — Maldita estrada. — disse, encolhendo os ombros. — Na curva da direita perto do último semáforo. Eu estava vindo para cá. Um carro parou e me levou para a emergência.
— Bem vindo ao clube. — respondeu Blanka secamente. — Por sorte a moto ainda funciona. — disse. — Quando acha que vamos
poder nos ver? — Não sei. Eu... Pergunto-me se devo ir a Madame. Olhou para a janela em silêncio. Blanka escutou sua respiração em seu
ouvido. — Não temos nenhuma prova. — lhe lembrou. — E se a polícia realmente
está envolvida em tudo isso? — Eu sei. — respondeu Blanka bruscamente. Na pausa que se seguiu, ela o
sentiu acendendo um cigarro nervosamente. — Você decide. — disse ao final. — Conte a diretora, e vão nos pegar. Logo,
seguramente ambos perderemos nosso lugar nessa cidade. Ou poderíamos terminar com isso.
Olharam-se nos olhos mutuamente através da distância. — De todos os modos, há uma boa notícia. — disse ele em voz baixa. — Eu,
aliás, Jehle, eu tenho um encontro com uma Sra., a qual seu marido tinha um avô que se chamava Heinrich Feverlin.
*** Na realidade, nada poderia sair mal. Os três abandonaram a escola no
sábado depois do café, e cruzaram o estacionamento. Era um fervedouro de atividade. As portas dos carros se abriam, e os pais saíam com bolsas grandes e
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pacotes, entregando aos filhos e filhas a jaqueta que lhes prometeram os livros ou a pilha de CDs. O ar brilhava com as famílias, mas hoje Blanka não teve tempo de deixar que isso arruinasse seu estado de ânimo. Seguiu com um olho aberto por Simon Nemec. Não havia ido à biblioteca, e ninguém havia falado com ela todo o dia. Nenhum professor a havia chamado com uma expressão séria ao escritório. Isso era horripilante.
— Para de mexer no cabelo. — lhe sussurrou Caitlin. Blanka se deu conta,
agora, de que estava brincando com uma mecha de cabelo que estava sobre a crosta e o hematoma. Jan caminhava junto a Caitlin, em silêncio, como um cachorro que havia sido surrado. A tensão entre os dois era tão insuportável que o ar ao redor deles parecia carregado de eletricidade. Pelo menos o teste de Caitlin havia ido muito bem. Pela noite havia repassado e adivinhou que havia respondido oito das dez perguntas corretamente. Agora se sentia segura de si mesma, e furiosa com Jan. O dia ia ser qualquer coisa, menos um passeio romântico. Os três em fila cruzaram o estacionamento em silêncio e se dirigiram até a parada de ônibus. Como sempre que saía da escola, Blanka sentia que tirava um grande peso dos ombros. Ao dar a volta na esquina, em direção a porta, ela quase tropeçou com Madame Lalonde.
— Ui! — disse Madame. Usava um traje de cor verde escuro, que ressaltava
a cor de seus olhos, e tinha uma pequena maleta em mãos. Quando viu a Blanka, um sorriso se desenhou em seu rosto.
— Oh! Blanka! Bom dia. — Bom dia. — responderam Blanka juntas. — Alegro-me te encontrar. Vi no programa que mais uma vez, não vai ver os
seus pais? Blanka assentiu com a cabeça, e reprimiu o impulso de alisar o cabelo. — Vamos à piscina. — disse Caitlin. Madame ergueu as sobrancelhas. — É uma pena. Se soubesse antes que
tinha planos... Vou a Bruxelas até quarta, mas pedi ao Dr. Hasenberg que falasse contigo. Há um almoço hoje. Alguns dos outros psicólogos da universidade estarão lá, também. Pensei que você poderia estar interessada em se unir a eles.
Blanka teve a sensação de que a diretora a havia encontrado fora. Sua bolsa
de natação estava em sua mão, como uma mentira tão pesada como chumbo. E o fato de que Madame a deixasse aqui com os Lobos e Simon Nemec a fazia se sentir ainda mais incomodada. Caitlin enganchou seu braço com o dela.
— Obrigada pela oferta. — Blanka disse finalmente. — Mas nem sequer
comecei a ler os livros da lista que o Dr. Hasenberg me deu.
114
Madame Lalonde começou a rir. Blanka se deu conta de que ela se via cansada, e tinha olheiras debaixo dos olhos.
— Você pensa em tudo. Tem razão, já te enchemos de suficiente
conhecimento com isso. Caitlin pode lhe falar sobre isso, não é Caitlin? Caitlin sorriu um pouco amável demais. A porta do táxi se fechou em um
golpe. O motorista se apressou em abrir o porta malas, e Madame pôs suas coisas. Despediu-se de Blanka e entrou no táxi.
— O que vai fazer em Bruxelas? — sussurrou Blanka a Caitlin. — Até onde eu sei, ela vai dar uma palestra sobre o conceito da escola, e
buscar mais patrocinadores. — respondeu Caitlin. Jan olhou para o táxi que se afastava; interessado. — Bom, parece que você está bem com Madame Lalonde. — disse ele. No momento, pensou Blanka sombriamente.
***
Nicholas estava esperando na parada de ônibus, segundo o combinado, com um capacete em cada mão.
— Assim que é ele. — murmurou Caitlin para ela. — Agora entendo! Blanka se incomodou ao dar-se conta de que ruborizava. — Obrigada pelo
álibi. — disse ela com força. — Volte pelas cinco. — Chegaremos tarde. — se queixou Nicholas, passando-lhe o capacete. —
Vamos ver, ai é onde você se machucou? Ela assentiu em silêncio, e deixou que Nicholas se aproximasse, e penteasse
o cabelo de sua testa. — Auch. — disse. — Foi um grande livro. Acha que vai conseguir usar o
capacete? — Claro! — ele a olhou por um momento que pareceu durar para sempre, e
logo sorriu. Pegou o capacete e o pôs cuidadosamente, enquanto Nicholas subia na moto. Levou um tempo para ele mover sua perna machucada e se instalar em seu lugar.
Foi uma sensação estranha, subir na moto atrás de Nicholas. Sem lhe
perguntar, ele pegou as mãos delas e pôs ao redor de si, até que ela o segurou por
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cima do quadril. A moto sacudiu uma vez, então a força centrífuga a atraiu para trás, e rugiu pela estrada principal, saindo da cidade em direção ao oeste.
A viagem durou mais de uma hora. Foram mais de 60 km pela estrada até a
próxima cidade, e logo a rota continuou através de várias aldeias. Cada uma menor que a anterior. Os caminhos pioraram também, até que finalmente Nicholas e Blanka conduziram por algo só ligeiramente melhor que um caminho de carros. Um cartaz que dizia “Kosrow” estava preso profundamente na terra.
— É o número quatro, de High Street. — disse Nicholas, uma vez que tinha
tirado o capacete e sacudido o cabelo, que estava empapado pelo suor. Olharam ao seu redor e viram uma casa branca.
*** A mulher que lhes abriu a porta não se parecia, em nada, com uma viúva em
duelo. Tinha uma linha profunda de rugas entre os olhos e, o cabelo cacheado tingido de preto azulado. Blanka supôs que teria uns cinquenta anos. Usava lápis labial de cor vermelho escuro, que fazia jogo com sua blusa vermelha e preta. Nicholas sorriu encantadoramente.
— Boa tarde, Sra. Meyer. — disse, estendendo a ela o passe de imprensa. —
Klaus Jehle. Falei com a Sra. pelo telefone. Essa é Martina Huber, que está fazendo as entrevistas comigo.
O rosto da mulher se iluminou de imediato. — Que bom. Venham. — sua voz suave os pegou de surpresa, tendo em vista
seu aspecto severo. Eles seguiram a Sra. Meyer através de um longo e estreito corredor, pintado
de um azul discreto, fotos coloridas olhavam acusadoramente aos intrusos. Havia um cheiro peculiar vindo da sala. Tão rápido como entraram no pequeno cômodo, Blanka se deu conta de onde vinha: nas paredes estavam penduradas dezenas de cabeças de animais dissecados e aves. Ela podia ver cervos, camurça, a cabeça de um javali e vários faisões. Máscaras africanas feitas de madeira haviam sido penduradas entre eles, um estranho contraste com os móveis modernos, tapeçaria em couro e caixas de vidro.
— Querem um pouco de suco de laranja? — perguntou a Sra. Meyer.
Nicholas lhe agradeceu, e assentiu com a cabeça, o que lhes daria tempo para inspecionar o lugar com gosto.
— Oh, encontrou as máscaras. — disse a Sra. Meyer, regressando a sala com
uma bandeja. — Sim, o avô de meu marido, pode-se dizer que viajou muito, era marinheiro e viveu na África durante muito tempo. Meu marido... — fez uma breve pausa, quase imperceptível. — Herdou a propriedade há uns vinte anos. — ela
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sorriu e pôs a bandeja sobre a mesa de cristal diante do sofá. — Sirvam-se! Estão os dois na universidade?
Blanka negou com a cabeça. — Eu ainda estou na escola, mas quero ser
jornalista. — Ah, em que escola você está? — High School em Lessing Ammring. — respondeu Nicholas por ela. — Não conheço. Meu enteado, do primeiro matrimônio de meu marido, está
acostumado a ir a Escola Internacional de Europa. Não está longe da universidade. Uma excelente escola, você deveria tratar de ir para lá, Martina.
Blanka aclarou a garganta. — Pensarei nisso. Talvez no próximo ano. — Faça. É uma oportunidade única na vida. Meu enteado foi diretamente
dali à Londres, onde estudou administração de empresas. O Sr. Sandor, o diretor nesse momento, realmente fez muito por nós. Como agradecimento, meu esposo deu a Fundação Maddalina de Trenta alguns dos documentos originais da propriedade.
Nicholas e Blanka trocaram um olhar rápido. — O que está cursando exatamente na universidade? — a Sra. Meyer se
virou para Nicholas. — História. — respondeu prontamente. — Nesse momento estou
empenhado na história da cidade no século XVII. Isso significa que estou trabalhando em uma parte de sua história familiar.
— A história da família de meu marido. — a Sra. Meyer o corrigiu
seriamente. — Bom, como te disse pelo telefone, não tenho certeza de se meus papéis serão de alguma ajuda. Poderia ter mais sentido para você solicitá-los direto a Fundação. Mas estarei encantada em lhe mostrar os documentos que consegui encontrar, de todos os modos. Já viu as costas do carrasco e o certificado de carrasco, claro.
— Tenho certeza de que pode nos ajudar. — disse Nicholas, sorrindo para
ela. — Muito obrigado! Sinto se causei algum problema. A Sra. Meyer sorriu. — Estava arrumando, de todos os modos. A casa vai ser vendida logo.
Trouxe tudo o que pude encontrar nesse momento, mas não há muito, só uns poucos documentos e fotos. Meu marido e eu nunca nos preocupamos com os documentos. Bom, olha se pode ser útil. — com essas palavras se levantou e saiu ao corredor. Ouviu-se como se abrisse uma gaveta no cômodo ao lado.
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— Portanto, uma vez mais não são os documentos originais. — sussurrou Nicholas. A impaciência o fazia soar cortante. As máscaras e os olhos de vidros dos animais pareciam olhá-los enquanto esperavam. Por último, a Sra. Meyer voltou para a sala, trazendo um pacote com restos e papéis em pastas plásticas. Justo em cima de tudo havia um caderno gasto.
— Aqui. — disse pondo o monte sobre a mesa. — Esses estão no sótão há
mais de vinte anos. Meu marido não podia tirar nada. Dê uma olhada, e se precisar de algo ou tiver qualquer pergunta, é só me chamar. Vou estar ao lado, em meu estúdio.
Agradeceram a ela, e esperaram que deixasse a sala. Logo se lançaram sobre
os documentos. O pó fazia que seu nariz coçasse, fedia a ratos e madeira velha. A Sra. Meyer estava certa, não havia muito ali. Havia uns antigos bilhetes de banco, e com eles vários documentos sobre as compras da granja no século XIX. Na caixa haviam fotos numeradas mostrando vários prédios da cidade, ao decorrer do século. Blanka reconheceu a fachada da universidade, a antiga prefeitura, várias ruas da antiga cidade, e finalmente a casa senhorial. Impacientemente abriram caminho até documentos mais recentes. Cópias de passaportes apareceram entre papéis velhos. Finalmente Blanka alcançou a caderneta.
Heinrich Feverlin. Estava escrito na primeira página. — Esse deve ser o avô
da Sra. Meyer. O papel estava tão seco que parecia que se converteria em pó ao primeiro
toque. Cada página estava estritamente escrita a mão, mas pelo menos era legível. Obviamente o Sr. Feverlin havia usado o caderno para as contas da casa, para registrar o que recebia e gastos mensais. Mas de trinta páginas continham só contas. Blanka folheou mais, e deu um começo.
— Nicholas! Tem algo aqui! Chegou tão perto dela que seu cabelo acariciou sua bochecha. — Copiou os registros do carrasco antes que desse ao colégio. Os registros
originais! Johann Georg Feverlin havia sido um homem honesto, e temeroso de Deus
também. Em cada página rezava a Deus tantas vezes que depois de três páginas Heinrich Feverlin havia começado a usar apenas abreviaturas para anotá-las. Talvez sua fé em Deus fosse tudo o que o carrasco podia se aferrar em 1651, depois do juízo de Belverina.
Com dedicação em corpo e alma, havia gravado um interrogatório atrás do
outro, cada detalhe inquietante. Em sua versão Maddalina e suas Monja não eram o tipo de bruxa que tratavam aos trancos e pedradas. Tratavam como algo muito pior.
Nicholas pegou uma máquina digital.
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— Assim o fez Bernhard Haussman Kohlbauer Swear antes do exorcismo na
noite de 24 de abril, de caminho a seu campo, o qual se encontra só a dois Versts6 do Convento, quando viu ao demônio em forma de um terrível monstro surgindo das muralhas. A besta havia sussurrado e desaparecido com um horrível estrondo.
Bernhard Kohlbauer não era a única testemunha. Na mesma noite vários
fazendeiros da zona disseram que haviam visto o monstro. Ohann Georg Feverlin também mencionou os relatos de outras testemunhas, que juravam que chamas haviam disparado do corpo da besta, seu rosto estava deformado, e estava bebendo sangue das ovelhas. As primeiras “histórias de bruxas” circularam: as pessoas viram luzes no Convento pela noite, e alguns dos meninos órfãos que viviam no Convento tiveram febre. Assim que, as pessoas se dispuseram a buscar o monstro. Não encontraram na verdade a besta dentro ou perto do Convento, mas o Convento foi queimado de todas as formas, só as muralhas e o prédio principal ficaram em pé. Gradualmente houve mais e mais rumores sobre as Monja, até uma multidão se propor a buscar nas ruínas.
Encontraram os cálices com pé de ungüentos que costumavam usar quando
saíam. Leu Blanka. Dos quais mais paus com caras selvagens e grotescas, e uma flauta de osso humano, na que um flautista poderia tocar.
A câmera fazia clique baixo, conforme Nicholas fotografava página depois
de página. — Finalmente, as duas Monja tiveram que enfrentar as acusações de que
haviam sido associadas ao Diabo. Regina Sängerin admitiu em 16 de julho que havia, inclusive, desejado invocar o Monstro com o flautista. Não admitiu quem era o músico, e os empregados masculinos do Convento caíram em suspeitas, e foram interrogados pouco depois.
— Acredito que Hans Huver era um flautista bruxo e tocou a flauta de osso.
— Esse é o jardineiro. — disse Blanka. — Li sobre ele. E aqui menciona
Georg Kastellus, o vaqueiro, também. — com os dedos trêmulos, passou a última página. Arrastamos a Rainha Bruxa ao Moinho, e quando vimos baixo sua camisa, seu corpo nu, tinha a marca do Diabo... A seguinte seção estava equipada com um símbolo que o avô da Sra. Meyer havia copiado cuidadosamente. ... Uma marca do Diabo cortejando, queimando com seu beijo.
— Essa é a marca. — disse Blanka. A marca parecia com a cabeça de um Lobo, sal e cola de plumas se estendia
atrás dela, como o ondular das chamas. — E alguns dos meninos órfãos a tinham também. — acrescentou Nicholas.
— Olha, aqui está a acusação contra eles.
6 Unidade de longitude russa. 1 verst = 3500 pies ou 1,06 km.
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— A filha dos Millers foi infectada, e aleijada por meninos acusados
permanentemente de bruxos. Dois dos filhos das bruxas foram presos e logo queimados na fogueira. Blanka
e Nicholas leram a última frase contendo o fôlego. Nicholas abaixou a câmera. — Não acredito. — sussurrou. Talvez a escritura do carrasco nos documentos originais tenha sido instável, suas palavras, a qual havia copiado seu descendente claramente, informaram de uma grande comoção e terminava com as frases: A Rainha Bruxa e dois dos outros acusados desapareceram. Meu servente estava vigiando aos prisioneiros, golpeado acordado, são marcas ou feridas.
Nesse ponto os registros se desfizeram como o avô do Sr. Feverlin anotou
com total naturalidade. No inferior da página estava a data em que a cópia havia sido feita: 7 de setembro de 1924.
Blanka e Nicholas se olharam. — Maddalina de Trenta não foi executada. — Nicholas disse o que ambos
estavam pensando. — Ela escapou e o jardineiro, e o vaqueiro estavam com ela. — E por alguma razão se supunha que isso se mantinha em segredo. —
acrescentou Blanka. O som da porta se abrindo a fez pular, e rapidamente deram a volta. A Sra.
Meyer entrou na sala. — Foi a algum lugar? Oh Martina, não se sente bem? Está muito pálida. — Não, eu estou bem. — respondeu Blanka, apressando-se em chegar às
fotos. — Encontramos uma imagem da antiga casa senhorial na Escola
Internacional de Europa. — O avô de meu marido estava muito interessado no prédio.
Aparentemente estava enfeitiçado. — a Sra. Meyer riu. — Nesse momento ele se uniu a um grupo que estava interessado em hipnose e visões fantasmagóricas. Mas aparentemente não se encontrou com suficientes espíritos por ai. — agora ela parecia quase brincalhona. — Outros, salvo talvez a variedade alcoólica, imagino. De todas as formas, depois da guerra a Fundação Maddalina de Trenta comprou o prédio, acho a escola, e também restaurou o cemitério dos antigos órfãos. Se quiser perguntarei ao meu enteado. Provavelmente saiba mais sobre a história do colégio.
Nicholas se inclinou para pegar a fotografia. Como se por casualidade seu
olhar caísse sobre seu relógio. — Oh, Deus, está ficando tarde. — disse. — Sra. Meyer, muito obrigado por
tudo. Acho que temos informações suficientes. Foi uma grande ajuda. — sem mais,
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pulou e alcançou seu capacete. Blanka sorriu para a Sra. Meyer em tom de desculpa. Parecia grosseiro ir tão de repente. Uns poucos minutos depois estavam sentados na moto, dizendo adeus com a mão a Sra. Meyer.
— Envia-me uma cópia do artigo! — gritou atrás deles. O sol da tarde caía baixo no céu. Nicholas acelerava e Blanka tratou de não
pensar o que passaria se fizessem mal uma curva. Não muito longe da estrada o rio serpenteava. Quando ainda estavam há poucos quilômetros da cidade, Nicholas reduziu a velocidade e parou em um estacionamento para carros.
Silenciosamente desceu e se aproximou da margem do rio. Ali se sentaram
no chão, um ao lado do outro, e olhavam a água. — Ok. — disse Nicholas depois de um momento. — Temos a Maddalina, o
flautista Hans Haber e Kastellus, o vaqueiro, que se supunha que iam ser queimados na fogueira.
— E vários órfãos. — acrescentou Blanka. — E não esqueça os monstros. — continuou Nicholas, com sua linha de
pensamento. — Vamos ver; os Lobos têm: uma monja, um gaiteiro, uma bruxa, uma menina e o Lobo.
Blanka assentiu com a cabeça. — E Joaquim joga ao monstro. — Os Lobos conhecem a verdadeira história? — Claro. — sussurrou Blanka. — A crônica original sobre o juízo da bruxa
não foi queimada. Alguém escreveu uma nova versão, é por isso que o juízo parece tão superficial e peculiar, para que ninguém pudesse comprovar se era autêntico, então queimaram a crônica supostamente original com exceção de alguns inofensivos fragmentos, dos quais é impossível averiguar toda a história. O resto são apenas cópias. Aposto que a Fundação está por trás disso.
— Falsificar a história. — concluiu Nicholas. — Agora temos que encontrar
quem estava a cargo dos arquivos municipais da Fundação antes do incêndio. — Não só antes do incêndio. — respondeu Blanka. — Os Lobos existem
desde a época de Maddalina, é que ninguém sabia deles até a fundação oficial da sociedade. Eles estavam ali o tempo todo, e sua implicação sempre foi para as coisas que eram ilegais, ou estavam muito adiante de seu tempo. — aclarou a garganta e citou: — A filha do moleiro foi infectada pelos meninos das bruxas. Isso poderia ser através da hipnose ou sugestão, talvez com a ajuda de drogas. Experimentos que deviam ser considerados como obra do diabo. Mas as Monja estavam interessadas nesse tipo de coisa e, obviamente, sabiam o que estavam fazendo. E nas notas de Feverlin diz também que os que no tempo de Maddalina
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eram cálices e ferramentas foram encontrados. Talvez fossem ferramentas para fazer ouro. A alquimia era uma ciência proibida na Idade Média. Poderiam ter sido acusados de bruxaria os que participavam dela.
— Entendo. — murmurou Nicholas. Blanka observava dois patos perseguindo um ao outro na água. Ela se sentiu
mal ao pensar de volta na guarida dos Lobos de hoje. — Blanka, que há de errado? — a voz de Nicholas interrompeu seus
pensamentos. Só então se deu conta de que tinha as mãos apertadas em punhos, e que lágrimas corriam por seu rosto. — Que há de errado? — Nicholas repetiu em voz baixa, mas só podia negar com a cabeça. Ele fez a única coisa possível, dada as circunstâncias, e pôs seu braço ao redor do ombro dela. Durante um momento ficaram olhando a água, até que Blanka chegou a uma decisão.
— Nicholas. — disse. — Tenho que te contar algo. Ela começou pelo princípio: pela conversa com seus pais em seu décimo
sexto aniversário, que havia conduzido a uma fuga no meio da noite, até que ela havia se dado conta na parada de ônibus de que não tinha dinheiro, nem ideia de para onde ir. Logo falou de Alex, que havia terminado com ela porque não entendia o que havia mudado tanto. Ela lhe disse da beca que havia sido anunciado em sua escola, sobre o exame e sua transferência a Escola Internacional de Europa.
Finalmente chegou a seus pesadelos, nos que Annette Durlain a advertia, e
suas suspeitas sobre Nemec. Por último lhe falou de seu último encontro com Joaquim e Tanya.
— Por que não me disse antes? — perguntou Nicholas. — Gostaria de ter
esses dois tipos e o chicote por uma polegada de suas vidas. Eles não tentaram nada disso comigo até agora. — aproximou-a mais dele. — E agora você se sente culpada por não defender a si mesma, certo? Pelo amor de Deus, Blanka!
— Seus pais estão preocupados. — disse em voz baixa, depois de um
momento. — Mesmo que tenham adotado você, ainda são seus pais. Ou não te parece assim?
— Sim. Mas desde que os conheço, parecem tão alheios a mim. Como
podiam pretender todos esses anos... Sinto-me como se houvessem mentido para mim durante toda minha vida. E não me diriam nunca se eu não houvesse descoberto acidentalmente. Nem sequer sei quem foram meus verdadeiros pais.
— Sei o que os meus eram. — disse Nicholas. — Mas não é uma ajuda, já que
estão mortos. Pelo menos você não está sozinha. — vacilou antes de continuar. — Minha mãe morreu quando eu tinha cinco anos. Estava muito jovem, apenas vinte e seis. E meu pai... Faz só alguns meses.
— Eu sinto muito. — sussurrou Blanka.
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Nicholas fez um gesto desdenhoso e olhou o rio. — Eu deveria ter te dito há
muito tempo. Sinto não ter dito toda a verdade. — aclarou a garganta. — Eu... Eu não quero compaixão.
Blanka conteve as perguntas que estavam em sua língua e manteve o
silêncio.
***
— Diabos, onde você estava? — Caitlin a repreendeu. — Achei que estava presa em algum lugar!
— Sinto muito. — Blanka deslizou rapidamente para o quarto, e jogou a
bolsa de natação sem usar na cama. — Fomos a uma cafeteria na cidade depois de ver algo.
— Teu celular estava desligado. Blanka se deu conta dele em sua jaqueta. — A bateria está descarregada. —
disse contrita. — Não o ouvi tocar. — Encontrou algo? Blanka assentiu com a cabeça, aproximou-se de sua amiga e a segurou pelos
ombros. — Caitlin, pode chamar Jenna? A garota que queria estar com Tobias? — Jenna? — questionou Caitlin. — O que ela tem a ver com isso? — Tenho que averiguar se Tobias tem uma tatuagem no quadril. Jenna tem
que saber, a menos que ela não tenha feito nada com ele durante todo o ano, além de pegar flores.
— Quer que eu a chame agora? — Por favor, Caitlin. Como mais posso averiguar? Devo fazer um buraco nas
paredes da ducha? Ou derramar café sobre a calça de Tobias e esperar que fique nu na minha frente?
— Não. — disse Caitlin secamente. — Eu realmente não poderia ser
responsável por isso. — logo cruzou os braços e deu um sorriso de lado. — Hmm, portanto os Lobos têm uma tatuagem, certo. De verdade achava que eu era uma deles?
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Sacudindo a cabeça foi até seu quarto, pegou seu celular e olhou o número de Jenna.
— Jenna? Oi, sou eu, Caitlin, escuta... Um momento depois, Blanka pegou o celular. A voz de Jenna soava muito
distante, e um pouco separada do corpo. Rapidamente explicou a Blanka o que ela queria saber. Jenna vacilou.
— Quer algo com Tobias? — perguntou bruscamente. — Eu sugiro que você
fique longe dele. — Eu só quero saber se tem uma tatuagem. Jenna vacilou de novo. Blanka mordeu o lábio com impaciência. — Sim, tem. — respondeu Jenna em uma voz cansada. — Era uma espécie
de prova de coragem para ser aceito no grupo... — Uma prova de coragem? Outra pausa. — Sim. Eles tatuam a marca em si. Com uma antiga agulha. Ele me mostrou
uma vez. Muito mal, não? E justo onde mais dói. — Entre o osso do quadril e o umbigo, um pouco mais perto do quadril. — Sim, como sabe? — Como é a marca? — É um perfil de uma cabeça de Lobo, com pêlos longos e um pouco dessa
língua horripilante. Por que você quer...?
— Obrigada Jenna. — disse Blanka rapidamente, devolvendo o celular a
Caitlin.
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Capitulo 13
Ele
Ele tinha achado a Presença, não existia mais nenhuma duvida; estava
aqui. A estranha e ainda tão familiar Presença, que continuava escorregando pra
longe dele e que Ele se sentia compelido a perseguir depois. Os pensamentos dele
eram calmos, e Ele passava garras sobre suas crostas de sangue. Por muitas horas
Ele tinha estado flutuando entre imagens e pedra, rastejando em círculos,
constantemente agitado pelas cores que podia sentir e cheirar como ondas de
tormento. Mas agora tudo estava parado, exceto pelo estranho cheiro próximo.
Eles estavam respirando no tempo um do outro! Ele apreciou a sensação da
respiração fluindo, sentiu o estranho calor, e podia ouvir o confortante som de
sangue pulsando.
***
Blanka levou um longo tempo para realizar que não estava mais sonhando.
O quarto estava escuro. Ela não tinha fechado totalmente as cortinas, assim o cinza
pálido da luz do estacionamento brilhou pelas frestas. A jaqueta azul dela,
pendurada na porta, parecia um intruso de pé em uma postura ameaçadora. Ela
tinha sonhado com um hipnotizador, lembrou-se, fechando os olhos novamente. E
sobre máscaras. Ao lado dela alguma coisa estava respirando.
***
Respirando profundamente, Ele absorveu o cheiro do longo pêlo preto. Os
olhos dele pegavam cada sombra. Nenhuma luz deslumbrava a Ele e nenhuma cor
lhe causava dor; tinha apenas um objeto angular onde algo estava deitado, algo que
cheirava seco e um pouco afiado. Quando Ele olhou mais de perto, reconheceu o
que os outros chamam de Payper. Era maldoso, cortava. Perto da entrada da
caverna pendia um ser mole com dois braços vazios. Era azul, azul claro.
125
***
Blanka abriu os olhos novamente e encarou a escuridão. Estranhamente, ela
lembrou nesse momento do cachorro na fazenda do avô. Ele era um cão muito
velho e lamentavelmente cheirava a pêlo mofado e um pouco úmido. Quando ela
piscou, as imagens da primeira parte do sonho passaram por ela de novo. O que ela
viu a aterrorizou; crianças sujas que tinham horror queimado em seus olhos. Olhou
ao redor e se descobriu em um calabouço. Tinha que ser um calabouço, enquanto
ela estava sentada entre as crianças. Podia ver traços de sangue nas paredes onde
os dedos deles tinham arranhado.
E então estava lá novamente, a máscara dos lobos. — Joaquim! — ela
murmurou, mexendo-se em sua cama.
A imagem se moveu com ela. Ela piscou para se livrar disso, mas ficou
perante seus olhos como um pesadelo que não deixaria sua vitima em paz. O Lobo
levantou a mão e removeu a máscara. Ela se preparou para o sorriso de desprezo
de Joaquim.
Mas era Nicholas. Ele olhou-a seriamente. — Pelo menos você não está
sozinha. — ele disse; indo para sua garganta.
Ela o deixou tocá-la e ele não traiu sua confiança. Ele delicadamente
acariciou sua pele.
Blanka sentiu sua mão e recuou, duras crostas de sangue raspavam em sua
palma. Ela estendeu a mão para o rosto de Nicholas e sentiu o cabelo emaranhado.
Endireitou-se com um salto, olhos arregalados. Alguma coisa estava
respirando ao lado dela na cama. Caitlin? Foi seu primeiro pensamento, mas então
notou o cheiro. Uma escura, manchada abertura estava onde a boca deveria ter
estado. Moveu-se, ficando maior e maior, grande demais para um sorriso humano.
Apesar da escuridão, ela podia ver seus dentes.
***
Ela não sabia por que sua garganta doía e porque a luz estava brilhando em
seus olhos. Foi só quando ficou sem ar que parou de gritar. Podia sentir sua jaqueta
pressionada contra suas costas e realizou que estava em pé com as costas contra a
porta, encarando uma cama vazia. Onde a coisa tinha estado não tinha mais nada
126
lá, apenas um amontoado de travesseiros que na escuridão parecia um corpo
deitado.
A cadeira bloqueando a porta ainda estava no mesmo lugar que ela tinha
colocado na noite anterior. O rosto preocupado de Caitlin apareceu. Com um olhar
ela compreendeu a situação.
— Você estava sonhando. — ela disse. — Foi só um sonho.
A luz acendeu no corredor e passos começaram a soar. Houve uma batida na
porta de Caitlin. Gradualmente rostos sonolentos dos estudantes dos quartos
próximos apareceram na porta. Eles mal ouviram o que Caitlin dizia a eles. Em vez
disso, eles estavam olhando Blanka como se ela fosse maluca.
127
Capítulo 14
Segredos
Blanka acordou com um crocodilo de pelúcia em seus braços. Ela levou
um tempo pra perceber que estava deitada na cama da Caitlin. Sua amiga tinha os
olhos inchados. Presumivelmente ela, como Blanka, tinha ficado acordada no
escuro, escutando.
— Como você se sente?
— Melhor. — murmurou Blanka. Qualquer coisa era melhor do que deitar
ao lado da coisa cheia de dentes respirando.
Depois de Caitlin ter ido tomar banho, Blanka levantou também.
Nervosamente, ela foi para porta de ligação. Teve que se forçar a abri-la. A cama
estava exatamente como ela tinha deixado na noite passada. Estava certa de que
não tinha sido um caso de pesadelos, ou um sonho. A estranha presença tinha sido
real. Ela devia chamar a Sra. Meyer, ela seria capaz de descobrir mais sobre os
fantasmas que assombram a antiga casa senhorial.
Silenciosamente, Blanka achou suas roupas e tentou afastar os restos do dia
anterior.
Antes de sair, pegou as copias e documentos e colocou no fundo de uma das
gavetas da mesa de Caitlin. Levou a chave com ela. Haveria tempo pra explicações
essa tarde.
***
Não tinha sinal de nenhum dos Lobos. Por dias agora eles parecem ter sido
sugados pela terra. Jan acenou para ela a distancia, enquanto eles passavam um
pelo outro no corredor em seu caminho para diferentes classes. Blanka não foi
para a sala de Física para fazer a ligação, em vez disso encontrou um canto vazio na
escada e pegou seu celular. Discou errado por duas vezes antes de conseguir.
128
— Meyer. — uma quieta, estranha voz finalmente respondeu. Blanka estava
tão confusa que ela quase deu seu verdadeiro nome. Deteve-se bem a tempo.
— Bom dia. Aqui é Martina Huber, da revista da Universidade. — ela
começou. — Eu gostaria de falar com a Sra. Meyer. Nós estivemos ai ontem. É sobre
o artigo...
Na pausa que se seguiu, Blanka ouviu a mulher do outro lado da linha tomar
uma respiração profunda e clarear a garganta. — Sra. Meyer... Não está disponível.
— ela disse numa voz pior.
— Eu devo tentar de novo depois?
A mulher hesitou novamente. — Não... Você... A Sra. Meyer... Morreu ontem
de repente, de insuficiência cardíaca. A polícia esteve aqui e o médico esta só
preenchendo o relatório da morte. Eu sou vizinha dela. Se suas notas ainda estão
aqui, você pode pega-las na minha...
Blanka desligou o telefone e apertou-o contra seu peito. Sra. Meyer, esbelta
e vigorosa, mal tinha 50 anos, morreu de insuficiência cardíaca. Esse pensamento
era tão estranho quanto o próximo era aterrorizante: quem tinha sabido sobre a
visita deles a ela? Só ela, Nicholas, Jan e Caitlin. Poderia Jan ter sido comprado
pelos Lobos?
Como se seus pensamentos tivessem ecoado por todo o prédio como uma
sirene de aviso, ela viu um grupo de estudantes virando o canto do corredor.
Tanya! Ela estava falando com outra garota, mas podia virar a cabeça a qualquer
minuto e ver Blanka.
Blanka deslizou em direção a parede. Uma maçaneta cravou em seus
quadris. Ela procurou com as mãos e fugiu para dentro da sala. O cheiro forte de
chão limpo invadiu seu nariz. Segurando a respiração, esperou até as vozes dos
estudantes sumirem na distancia. Só então ousou acender a luz. Era uma sala de
armazenagem com um carrinho de limpeza. Um sino claro anunciou o começo das
aulas. Blanka pegou seu celular com dedos úmidos.
— Caitlin... Centro de Empréstimos... Nicholas... — ela passou pela pequena
lista de números de telefone. Depois de uma pequena hesitação, pressionou o
botão. Estava tremendamente aliviada quando alguém atendeu.
— Alô, Mamãe? — ela sussurrou. No outro lado, a secretaria eletrônica
ligou. Blanka lutou contra as lágrimas enquanto ouvia a voz da mãe. Como sempre,
soava gentil e bastante monótona. Ela se sentiu bem em ouvi-la, embora a saudade
129
de repente enchesse Blanka e ela se sentiu ainda mais solitária. Desligou sem
deixar uma mensagem e ligou pro Nicholas. “O assinante que você esta chamando
não esta disponível no momento”, disse uma metálica voz feminina.
Blanka não deliberou por muito tempo. Apressou-se para o corredor e correu.
***
O ônibus até a cidade pareceu demorar uma vida. Por todo o caminho,
Blanka sentiu que estava sendo vigiada. Várias vezes ela se virou, mas havia apenas
um velho homem tão absorto em seu jornal que tinha provavelmente perdido sua
parada. Finalmente a porta abriu com um chiado.
No tempo que ela chegou à residência em Pelargus Alley, Blanka estava
engasgando para respirar. Tentou ligar para o celular do Nicholas mais uma vez,
soltando as rédeas de seus piores medos: Nicholas sequestrado ou assassinado. Ela
não conseguia achar o nome dele na entrada da residência, mas então percebeu
que era apenas para o correio. Os pais de Nicholas estavam mortos.
Presumivelmente ele não tem ninguém para escrever para ele. Ela lembrava que
ele vivia no terceiro andar, então correu escada acima. Musica cresceu em um
corredor estreito. Blanka foi de porta em porta. Nem toda porta tinha um nome
nela: alguns estudantes tinham feito sua marca com pôster e desenhos. No final do
corredor, alcançou uma pequena cozinha, onde um estudante usando calções e
uma camiseta amarrotada estava espalhando geléia em um pedaço de pão.
— Oi! — chamou Blanka. — Eu estou procurando por Nicholas Varkonil!
O estudante se virou devagar e olhou em sua direção. Depois de alguns
segundos ele pareceu registrar a pergunta.
— Nicholas? Não conheço. Mas se você quer dizer Niko, ele mora no andar
de cima, número 319.
Niko não era Nicholas e não conhecia ninguém com esse nome. Ninguém
conhecia Nicholas. Ele não existe, sua descrição nem mesmo chega perto de
nenhum dos estudantes morando na residência. Depois de meia hora Blanka
estava de volta a cozinha, pálida e tremendo.
— Hey, senta por um segundo. — disse o estudante. Um pouco de geléia
estava preso no canto da boca dele. Blanka sentou-se sobre a cadeira oferecida e
130
acenou, como se estivesse aturdida, quando ele perguntou se ela gostaria de um
café.
— Ele é seu namorado? — o estudante perguntou educadamente. — Parece
que ele realmente levou você para um passeio.
A simpatia na voz dele assustou-a. Percebeu que ele estava certo. Nicholas
tinha mentido para ela. Mas por quê? Febrilmente percorreu todas as
possibilidades. Ele tinha se mudado e não tinha contado a ela. Ele tinha dado a ela
um nome falso... O nome!
— Klaus Jehle. — ela disse. — Ele escreve para Attempto. Ele vive aqui, pelo
menos?
O estudante levantou as sobrancelhas e umedeceu os lábios. — No outro
final do corredor, tem um apanhador de sonhos na porta dele.
Blanka abandonou seu café e se apressou para fora da cozinha. Ela bateu
energicamente na porta. Para seu alivio ouviu movimento do outro lado da porta.
Molas rangeram; algo tiniu, e então a porta abriu. Um jovem homem com longos
cabelos negros estava olhando pra ela.
Blanka hesitou. — Olá. — ela finalmente conseguiu dizer. — Você... Você é
Klaus Jehle?
Ele cruzou os braços e olhou para ela, sério. — Sou eu. — ele disse
laconicamente. — O que quer?
— Eu estou procurando por Nicholas. Nicholas Varkonyi. — sua coragem
falhou quando ela o viu enrugar a testa. — É sobre o cartão de imprensa da
Attempto. - ela adicionou.
Finalmente sua expressão se iluminou. — Esse Nicholas, achou?
— Você perdeu?
— É. Um mês atrás. Ou alguém o roubou. — ele olhou para ela desconfiado.
— Me conte mais. — ele comandou. — O que você que de mim?
— Nada. Desculpe, eu cometi um erro. — ela se virou e correu pra fora.
— Hey, espera! — ela ouviu Klaus Jehle gritar atrás dela, mas não se virou.
131
Parada na frente da residência, o sol cegou-a, Blanka esfregou as mãos
úmidas e olhou em volta, Pelargus Alley com suas pequenas casas de madeira e as
pedras do calçamento histórico parecia uma imagem congelada no tempo, atrás de
uma fachada na qual um abismo se abria. O rosto da mulher morta apareceu nele, e
agora as características da Sra. Meyer também. Blanka teve que encostar-se à
parede para não perder o equilibrio. Ela queria gritar. Maldição, como ela pôde
deixar alguém enganá-la tão facilmente!
A manifestação noite passada tinha sido um aviso contra Nicholas? Agora
até o sonho com a máscara estava começando a ter sentido.
Ela estava em perigo; essa era a única coisa que ela tinha certeza. Nicholas
estava usando uma máscara, mas o que estava por trás dela? Desesperadamente
revirou seus bolsos a procura de dinheiro e achou algumas notas. Muito pouco
para simplesmente ir até a estação e comprar uma passagem para casa. Depois de
amanhã Madame iria retornar de Bruxelas. Era hora de colocar as cartas na mesa.
De repente não importava para ela se poderia ficar na escola ou não. Só queria uma
coisa: estar segura, correr para longe e se esconder, esquecer o desapontamento e
o medo. Naquela hora o celular tocou. Nicholas.
Fúria encheu Blanka. Seus dedos doeram, ela pressionou o botão Falar
muito forte.
— Me deixe em paz. — ela disparou. Algumas pessoas passando viraram
para olhá-la.
— O que está errado?
— Eu acabei de sair da sua casa. Pense sobre isso. — com satisfação ouviu-o
lutando para respirar.
— Ouça... Eu posso explicar.
— Nunca mais me ligue de novo!
— Blanka, espere... Por favor! Eu descobri mais alguma coisa. Nós temos
que ir...
O display ficou preto. Blanka tinha desligado seu celular.
***
132
Finalmente o ônibus virou a esquina. Blanka, que havia encontrado um local
tranquilo em um banco de jardim à sombra de uma casa, levantou-se e limpou as
lagrimas do rosto. Evitou olhar para La Bête, onde Nicholas e ela tinham
conversado pela primeira vez.
Freadas, o ônibus parou e deu um assobio. No momento seguinte Blanka
ouviu um arquejo atrás dela. Alguém colocou a mão em seu ombro. Blanka virou e
socou. Nicholas tropeçou para trás, as mãos dele pressionadas no rosto. Sangue
escorrendo entre seus dedos.
Atrás de Blanka o ônibus saiu. Por um instante ela se viu girando sobre os
calcanhares e correndo até ele. Ele parou, ela entrou, e saiu. Da janela de trás podia
ver Nicholas ficando cada vez menor, finalmente desaparecendo. Mas o momento
passou, e ela ainda estava parada no mesmo lugar.
— Ai merda. — gemeu Nicholas. — Você tem um lenço?
Blanka balançou a cabeça. Estranhamente, a raiva tinha sumido. O que
sobrou foi só o medo. Nicholas amaldiçoou de novo e levantou a camisa para parar
o sangramento do nariz.
— Não, bota a cabeça para trás. — disse Blanka.
Ele a encarou. — Muito obrigado. — murmurou embaixo do canto de sua
camisa. — Merda, se eu soubesse que você ia me acertar tão forte...
— Então você ia fazer o que? — ela respondeu asperamente. — Você iria me
jogar na frente do ônibus? — ele levantou os olhos, espantado. — É isso que você
fez com a Annette? — ela chorou. — Empurrou-a?
— Hey, você é louca? — ele rugiu.
Ela se puxou para longe dele e fechou a mão em um punho. — Eu não sei
que tipo de jogo você está jogando ou quem você é. — ela continuou mais
calmamente. — Mas você não é Nicholas e você não vive na residência. E aposto
que nenhum professor colocou os olhos em você em uma universidade, tampouco.
Ele suspirou e de repente pareceu desapontado. — Você está certa. — ele
admitiu. — Exceto pela primeira parte. Eu realmente sou Nicholas.
Ele enfiou a mão no bolso de sua jaqueta de motoqueiro e tirou sua carteira.
A carteira de motorista parecia genuína. Nicholas Varkonyi estava escrito. Sua
cidade natal era dada como Kecskenét, Hungria. E era verdade também que
133
Nicholas tinha feito dezoito só há alguns meses atrás. — Por favor, me deixe
explicar. — ele apelou. — Eu venho querendo te contar isso por um longo tempo. E
tem mais uma coisa. Liguei para a casa da Sra. Meyer hoje. Ela está... Morta!
Blanka, ainda suspeitando, deu mais um passo para trás. — Eu sei.
Confuso, ele franziu a testa, em seguida, olhou em volta como se estivesse
com medo de que alguém o tivesse seguido. — Me de cinco minutos em La Bête. —
ele implorou. — É campo neutro.
— Você mentiu para mim! Toda a história sobre os Lobos fazendo da sua
vida um inferno era mentira. Você comprou minha confiança com mentiras!
Ela se odiou por soar tão patética.
Envergonhado, ele abaixou a cabeça. — É; isso é verdade. — ele disse quase
inaudível. — Você parecia tão... Difícil para mim, Blanka. No começo não gostava
muito de você. Era tão fria. Como se o mundo não fosse bom o suficiente para você.
Eu estava só tentando achar uma maneira de me aproximar de você.
— Bem, isso funcionou muito bem.
— Eu sei. Desculpe-me. Não queria te envolver mais do que eu precisasse -
cinco minutos, Blanka. Por favor!
***
Nicholas apertou o pano molhado que a garçonete tinha lhe dado em volta
de seu pescoço. Seu nariz vermelho brilhava no rosto de giz branco.
Blanka recostou e cruzou os braços. — Um minuto já passou. — ela disse.
— Ok, Ok. — ele disparou. — Não dá para deixar a arrogância uma vez? —
ele se recompôs e continuou. — Eu não sou um estudante de medicina. Só disse
isso para você falar comigo. Eu tinha o pressentimento de que você seria capaz de
me contar mais sobre a escola do que Jan. Ele disse que os Lobos não te deixavam
em paz então eu pensei... — ele deu de ombros.
— Então, você é um jornalista, depois de tudo. — disse Blanka.
134
Ele sacudiu a cabeça. — Eu só terminei a escola ano passado. Então meu pai
ficou doente. Eu cuidei dele. Nós não temos família restando, só um distante primo
dele na Hungria. Nós vivemos lá por um tempo.
Ele clareou a garganta e procurou pelas palavras certas por um longo
tempo. Blanka esperou enquanto ele descartou o pano, rodou distraidamente ao
redor o seu maço de cigarro, tirou um cigarro, e acendeu.
— Meu pai teve um derrame. — ele disse roucamente, soprando a fumaça.
— Ele não conseguiu resistir. Morreu um dia depois do meu aniversario de dezoito
anos. — de novo clareou a garganta e piscou algumas vezes. — Bem... Eu tinha que
limpar a casa. E achei cartas da minha mãe. Eu tinha cinco anos quando ela morreu.
Mas ainda posso me lembrar do seu sorriso. Ela era uma contadora de historias,
até meus três anos eu acreditava que ela realmente era a Rainha das Nuvens e
tinha caído na oficina do meu pai quando o cavalo a jogou, e no ano seguinte eu
estava convencido de que meu pai era um viajante e ela uma princesa da Pérsia.
Ela descreveu para mim em muitos detalhes como meu pai a tinha carregado para
fora do palácio do mau Sultão. Todas essas histórias são quase mais reais para mim
do que minha verdadeira infância. — ele deu uma tragada no cigarro e em seguida
o apagou. — Ela me fez acreditar que nós tínhamos que nos esconder do Sultão.
Aquela era a única razão para nós vivermos na Hungria, e meu pai ter um bigode,
assim ele não seria reconhecido. Desde que sou capaz de me lembrar, tenho
sentido como se estivesse sendo seguido, e venho tentando manter um baixo perfil.
Loucura, huh? Ela tinha milhares de histórias como aquela, e mais, eu não sei quem
ela realmente era.
Blanka ainda não estava certa se podia confiar nele. — E as cartas? — ela
perguntou.
Nicholas pareceu acordar de um sonho de olhos abertos. — As cartas, sim.
Ela tinha conhecido meu pai enquanto ele estava vivendo em Budapeste e ela
estava lá paras as férias. Por um tempo eles escreveram um para o outro, e então
ela veio se juntar a ele na Hungria.
— Eles se casaram?
— Ela não queria, embora ele constantemente pedisse. Ela... Ela tinha sido
casada antes, com um homem que tinha conhecido enquanto ainda estava na
escola. O casamento era bem infeliz. Descobri isso por causa de uma das cartas.
Nicholas parecia como se estivesse de repente ficado com febre.
135
Seus olhos estavam brilhando. Depois de uma pausa continuou. — Pouco
tempo depois do casamento ela quase morreu. — ele disse calmamente. — Por
que... Por que seu antigo marido tinha batido nela. Quando ela o deixou, ele
ameaçou segui-la e matá-la, não importando onde ela estivesse. Ela escreveu tudo
isso para meu pai, e eu não entendia até umas semanas atrás porque ela estava
sempre tão triste e inquieta. Acho que ela realmente passou o resto da vida se
escondendo deste homem. Talvez não bem o bastante.
— Nicholas... Isso é terrível.
Ele concordou com a cabeça e tirou outro cigarro do maço. — Ela estava
sempre com medo de que alguma coisa fosse acontecer comigo. Depois de ler suas
cartas descobri o endereço de retorno e fui lá. Eu só queria saber de onde ela tinha
vindo e talvez falar com pessoas que a conheceram. Bem, achei o endereço, mas um
casal tinha vivido na casa por trinta anos. Eles nunca tinham ouvido falar da minha
mãe. Continuei procurando, mas não achei. Foi como se ela nunca tivesse existido.
— ele suspirou. — E então tive uma ultima idéia. — ele disse. — No meio das
cartas dela tinha uma foto. Sentei no computador e procurei por prédios que
pareciam com o que estava no fundo da foto. E eu achei. Então vendi tudo que tinha
herdado e vim para cá.
— É por isso que você tem tanto dinheiro.
— Você ficaria surpresa com o que é possível se você entregar uma nota de
dez euros. O assistente de patologia encontra arquivos ocultos, Jan constrói
ferramentas e age como espião, e até mesmo a moça da limpeza na delegacia sabe
para onde olhar. Mas nada ajudou. Eu ainda não sei quem ela realmente era. Ela
não está em nenhum registro. Mas eu cruzei com outro nome.
— O estudante.
Nicholas confirmou. — Ele se afogou exatamente na mesma época que
minha mãe estava aqui.
— Me mostre a foto. — implorou Blanka.
Ele hesitou por um longo momento. Parecia achar muito difícil deixar
Blanka dar uma olhada dentro de sua vida. Ele pegou sua pasta novamente.
Cuidadosamente abriu um compartimento no lado e tirou uma pequena foto. As
cores tinham desbotado. Blanka pensava que tinha sentido um estalo entre seus
dedos quando a pegou. Ela olhou para a foto e entendeu. As paredes da mansão
não tinham sido restauradas e pintadas em cor clara como hoje, mas ela teria
reconhecido isso entre milhares de edifícios. Mas muito mais interessante era a
136
garota parada na frente da casa. Ela estava usando um uniforme como os que
Blanka tinha visto em velhas fotos no museu. Cabelo loiro claro caia em seus
ombros. Ela parecia séria e um pouco triste, seu sorriso só para o fotógrafo. No
entanto você podia ver que ela tinha uma covinha na face. Em seus braços
carregava uma mochila de couro clara, com duas iniciais gravadas a fogo no couro.
— Como sua mãe morreu? — sussurrou Blanka.
— Ela foi a Estocolmo para visitar um amigo. Afogou-se em um acidente de
barco.
— O corpo dela foi encontrado?
Ele olhou-a com espanto, ficando ainda mais pálido. — Não. — ele disse. —
Depois de dez anos ela foi declarada morta.
— Qual era o nome dela?
— Klara.
— Klara Varkonyi?
— Klara Schmied. Ela insistiu que eu tivesse o sobrenome do meu pai.
Blanka o que foi.
Ela colocou a cadeira mais perto e colocou um braço ao redor do Nicholas.
— Ouça. — ela sussurrou. — Eu realmente espero que esteja errada, mas eu já vi
essa mochila antes.
— Onde?
— Estava no chão do escritório da Madame Lalonde. Um dia depois... Que a
mulher morta foi encontrada.
Seus olhos estavam tão arregalados que cada uma de suas íris parecia uma
perfeita bola cinzenta de mármore. — Isso significa que a Madame tem a mesma
bolsa?
— Isso significa que ela pode muito bem ter sido uma única e mesma bolsa.
— Blanka corrigiu. Ela odiou a si mesma por ter que dizer a ele a verdade. —
Também significa que elas podem também ter sido a mesma pessoa... Sua mãe e
Annette Durlain. — ela apontou para a foto pousada na mesa em frente a eles. —
Eu não posso dizer se é o mesmo rosto. Mas a mulher morta tinha olhos azuis, e
137
uma covinha. Ela tinha cabelo cinza-escuro, mas cabelo pode ser tingido. Ela não
queria ser reconhecida quando entrou na escola como turista.
Nicholas não parecia tê-la ouvido corretamente. Pedaços de tabaco caíram
na foto e Blanka notou que ele estava esmagando o cigarro em sua mão. — Isso é
impossível. — ele disse. — A mulher morta tinha 54 anos. Minha mãe só faria 40
hoje.
— Passaporte forjado, falsa data de nascimento. E claro ela se fez parecer
mais velha, um bom disfarce.
— Não. — ele sussurrou. — Não. É impossível. Eu... O relatório da autópsia...
— então ele empurrou a mão de Blanka para longe e saiu do café.
Blanka tirou algum dinheiro do bolso de sua jaqueta, colocou na mesa, e
correu atrás de Nicholas. Para seu alivio ele não tinha corrido para longe. Ele
estava em pé a alguns metros de distância no beco, encostado contra a parede da
casa, respirando pesadamente. Alguns passos à frente e ela estava ao lado dele,
agarrando seus ombros.
— Vamos andar um pouco. — ela disse. — Me mostre onde você vive!
***
O lugar que Nicholas estava realmente vivendo era de longe menos
confortável do que a residência dos estudantes. Era à beira da parte antiga da
cidade, em um grande, pouco atraente bloco de apartamentos. Nicholas tropeçou
através de uma estreita porta traseira e arrastou-se até uma escadaria
interminável. O quarto era nada mais que um pequeno sótão com uma janela torta.
Havia duas malas no chão e um fogão estava empoleirado em uma caixa de papelão
de cabeça para baixo no canto. O sol havia transformado o pequeno espaço em uma
fornalha. Blanka imediatamente foi até a janela e com algum esforço abriu-a.
Nicholas afundou-se sobre o colchão sob o teto inclinado e enterrou a cabeça nos
braços.
— É impossível. — ele disse finalmente. — Isso significaria... Que minha
mãe ainda estava viva quando eu vim para a cidade. Nós podemos ter passado ao
lado um do outro no mercado...
— Nicholas, talvez eu esteja errada. — Blanka disse suavemente.
138
— A mulher na foto parece a mulher que você viu?
Blanka desistiu de tentar ser tranquilizadora. — Eu só a vi por um momento
muito breve, eu não posso dizer ao certo. Mas estou quase certa de que era ela.
Sinto muito mesmo!
— Por que ela nunca nem sequer me deixou saber que estava viva? Mesmo
depois da morte do meu pai...
— Ela deve ter querido te proteger. Não se esqueça da tatuagem, ela era um
dos Lobos. Ela ate mesmo forjou a própria morte para não poder ser encontrada.
Ela não queria se casar e insistiu que você tivesse o nome do seu pai. Ela mesma
usou o nome Schmied, um nome que é bastante comum. Em outras palavras, fez
tudo o que podia para tentar cobrir todos os seus traços e qualquer conexão entre
vocês dois.
— Ela podia ter removido a tatuagem.
— Bem provável que ela tenha tentado isso. Jenna me disse que os Lobos
fazem as tatuagens à mão, isso geralmente significa que elas são muito mais
profundas na pele. A marca é na maioria das vezes, ainda clara mesmo depois da
tatuagem removida. Os Lobos, pelo menos, seriam capazes de reconhecer a marca.
Você nunca notou uma tatuagem ou cicatriz?
Nicholas tinha se acalmado um pouco. Seu rosto definido, ele sentou
encarando a parede. Depois de um tempo balançou a cabeça. — Eu só tinha cinco
anos! Quando fomos para o lago, ela usava um maiô. Não, eu não me lembro de ter
visto nada.
Partículas de poeira dançavam nos raios de sol, e do exterior os barulhos da
rua alcançaram o quarto. A vida continuou impassível e indiferente. Blanka sentia
como se estivesse presa em um bloco de gelo.
— Tem alguma coisa nessa escola. — ela sussurrou. — E não são apenas os
Lobos, eles parecem estar possuídos. Não pense que eu sou louca, mas estou
começando a achar que eles praticam bruxaria. Pense nisso: por séculos os Lobos
têm experimentando, primeiro com alquimia, depois com hipnose. Mas sempre
aqui. Talvez seja um lugar ritualístico.
— E a bolsa da minha mãe está no escritório da Madame Lalonde. Isso
significa que ela está envolvida.
139
Blanka pensou por um segundo, então balançou a cabeça. — O jeito que me
parece é que a policia está envolvia nisso, e alguns médicos estão envolvidos
também. Eles oficialmente declararam o assassinato como sendo um acidente. Se
Madame sabe sobre isso, faria sentido ela esconder a bolsa da policia. E também,
ela está tentando achar novos patrocinadores para a escola agora mesmo. Se o pai
de Joaquim tem alguma coisa a ver com o assassinato, isso iria fazer sentido
também: ela vai ter as finanças da escola em ordem antes de entregar a evidência.
Nicholas correu as mãos pelo cabelo. — Nós vamos invadir o escritório dela.
— ele disse prontamente. — Hoje. Eu vou ligar para o Jan.
— Não! — disse Blanka, quase gritando. — Isso seria muito perigoso. Se os
Lobos mataram a Sra. Meyer, então eles vão estar me vigiando muito mais de perto
agora. Não, nós vamos esperar ate a Madame voltar.
— Você realmente acha que essa é uma boa idéia?
— São apenas dois dias.
Nicholas olhou para ela cheio de duvidas. Finalmente acenou em acordo.
— Eu vou dormir aqui. — ela disse. — Eu não seria capaz de ter um segundo
de sono na escola. Está tudo bem com você se eu for à escola mais uma vez? Só vou
pegar minhas coisas. Estarei de volta em uma hora. — ela sentou na cama ao lado
de Nicholas e o abraçou. Ele hesitou por um momento, então a abraçou de volta.
— Sem mais segredos?
— Sem mais segredos. — sussurrou Nicholas.
***
Um nebuloso, incolor céu atrás da escola deu um efeito de uma fotografia
em preto e branco. Hoje os prédios parecem aterrorizantes em sua modernidade.
Depois de hesitar brevemente, Blanka entrou na escola. Dentro, seus passos
aceleraram até que ela estava subindo correndo a escada para o seu quarto. Rostos
surpresos passaram por ela. Finalmente estava em sua própria porta, procurando
freneticamente por suas chaves. Ela não notou o envelope até que destrancou a
porta. O carimbo do escritório da escola estava estampado nele. Blanka abriu o
envelope e leu a carta. Uma intimação por causa de suas ausências injustificadas.
140
Em seu quarto, tudo estava como ela tinha deixado. Ela tinha esperado encontrar
suas gavetas saqueadas. Com um suspiro de alivio olhou o relógio.
Caitlin estaria de volta em uma hora. Blanka abriu a porta de ligação e
entrou no quarto de sua amiga. Olhou ao redor sem acreditar. Caitlin tinha ido
embora. Não só Caitlin... Tudo que tinha pertencido a Caitlin. O colchão nu em cima
da cama. As cadeiras; mesa; cômodas estavam abandonadas contra a parede. Os
pequenos buracos nas paredes, dos pôsteres de Caitlin, eram a única evidência de
que ela tinha sequer vivido ali. Por um estranho momento Blanka pensou que sua
amiga nunca sequer tinha realmente existido. Puxou seu celular do bolso e ligou de
volta. Antes que pudesse discar o numero de Caitlin, ela notou que tinham uns dez
bips, avisando-a que tinha perdido varias ligações. Todas de Jan. Coração batendo
ansiosamente, Blanka esperou Caitlin atender. Houve um clique, em seguida uma
voz mecânica anunciou que o assinante não podia ser alcançado.
— Merda! — a palavra saiu. Seus olhos se encheram de lágrimas. Procurou
em seu bolso por um lenço de papel. Alguma coisa caiu no chão com um barulho. A
chave para a mesa de Caitlin. Blanka engoliu as lágrimas, pegou a chave, e
aproximou-se da gaveta. Ainda estava trancada. A chave girou facilmente. Blanka
puxou a gaveta aberta. Estava vazia.
***
Ela podia ver que era Jan ligando. No entanto, quando atendeu, ela nunca
teria reconhecido. A voz dele soava fina e preocupada. — Blanka! Ao menos, você
falou com a Caitlin?
— Não, eu nem mesmo sei o que está acontecendo. As coisas dela se foram
e...
— Ela não passou no exame.
— O que?
— Está na lista no quadro de avisos. Eu achei que ela não estava
respondendo o telefone porque estava frustrada, mas ai alguém da classe dela
disse que ela foi embora esta tarde. — ele pausou, lutando para respirar. — Não
acredito nisso, ela nem mesmo me disse adeus. E que ela não passou...
— Não pode ser verdade. -—disse Blanka, terminando a frase.
141
— Onde ela está?
Morta? Pensou Blanka. Ela correu do quarto vazio, bateu a porta de conexão
fechando atrás dela, e se recostou contra a porta. Agora sinos de alarme soavam na
voz do Jan. — Blanka, você está chorando?
— Claro que eu estou chorando. — Blanka respondeu acidamente. — Eu
arrestei-a para dentro disso... Merda!
— Arrastou-a? O que você quer dizer? Você está no seu quarto? Eu já estou
indo ai!
Blanka deslizou pela porta lisa e envolveu seus braços em volta dos joelhos.
Após o choque, ela levou um minuto para pensar em ligar para Nicholas. — Eu
tenho certeza que ela não voou de volta para a Irlanda assim, sem dizer a ninguém.
— ela gaguejou no telefone. -—Ela ainda deve estar em algum lugar na escola.
Nicholas pensou por um momento. Ela estava impressionada que ele
pudesse permanecer tão calmo. — Nós vamos procurar por ela, está noite.
142
Capítulo 15
Metrópoles II
— A lanterna. — sussurrou Jan. Quando feixe de luz passou por sua face,
Blanka podia ver suas bochechas brilhando. Ele estava aparafusando um
adaptador no abridor de seu armário, enquanto Nicholas, seguindo suas
instruções, desenrolava um cabo.
Nicholas estava mancando um pouco. Quando eles escalaram pela janela do
laboratório de Química, passando pelo sistema de alarme, com a ajuda de Jan, ele
tropeçou e bateu em sua perna machucada novamente. Era agora 02h30min da
manhã.
Havia levado a Jan mais que meia hora para desarmar o sistema de alarme
na porta para a área do escritório. Finalmente a porta abriu com um zumbido. O
equipamento que Jan estava usando hoje não era um pequeno abridor de porta, era
uma máquina de aparência estranha que tinha alguma semelhança com um mix. No
feixe fraco da lanterna Blanka viu fios e as superfícies irregulares de solda das
chapas de metal, segurando várias conexões.
Com este único arquivo, rastejaram ao longo da passagem seguindo para o
escritório da diretora e a sala dos professores. Eles pararam na frente da porta da
Madame. Jan assentiu para eles e indicou a Nicholas para conectar o cabo.
— Você tem certeza que nós precisamos invadir o escritório dela? — ele
sussurrou.
Blanka assentiu.
— Os arquivos da escola estão em sua sala, e há uma porta de ligação ao
escritório da escola.
— Mas Caitlin não estará lá.
143
— Não, mas nós precisamos de um ponto de partida. Deve haver uma
planta ou um calendário lá. Alguma coisa. E... — disse. — Talvez também haja
algum rastro da mãe de Nicholas. Jan passou a mão sobre a testa e empurrou um
pino do buraco da fechadura. A máquina zumbiu novamente, então houve um
barulho estridente.
— Merda! — sussurrou Jan.
— O que está errado?
Cuidadosamente ele puxou o pino para fora novamente. Um arranhão
brilhava no metal.
— Chave errada. — ele resmungou. Ele alcançou o bolso de sua calça e
pegou um pino muito mais forte.
— Não tenha medo. — ele disse suavemente. — Alguma coisa vai quebrar
em um momento. Afastem-se.
Obedientemente Blanka deu um passo para o lado. No próximo momento
houve um zumbido alto, então houve silêncio, até que eles ouviram um rangido
terrível. A porta se abriu. Blanka encarava com horror o buraco e as lascas de
madeira.
— A porta está quebrada. — Nicholas declarou.
— E daí? — Jan se virou para ele. — Eu gostaria de queimar o lugar com eles
dentro! Eles fizeram alguma coisa com Caitlin e você está se preocupando com uma
porta?
Nicholas levantou suas mãos. — Ei, acalme-se. — ele disse. — Não grite
desse jeito aqui!
Blanka esticou sua mão e a colocou-a no ombro de Jan. — Está tudo bem,
Jan. Nós a encontraremos.
Ele assentiu e secou as mãos em suas calças.
— Nós vamos entrar, ou o que?
144
— Sim, Vamos lá! — Blanka decidiu. Como sombras eles entraram no
escritório e empurraram a poltrona para frente da porta. Nicholas baixou as
persianas. Somente então ousaram ligar a pequena lanterna novamente. O feixe de
luz vagou sobre as estantes de livros e foi refletido nas brilhantes lombadas dos
grossos livros. Não foi muito antes de Jan ter a primeira gaveta da mesa de
Madame aberta. A diretora era uma pessoa excepcionalmente organizada. Tudo,
cada folha de papel e cada lápis, estava colocado meticulosamente. Blanka sentiu
culpa por bisbilhotar. Eles encontraram apenas cadernos contendo registros de
contabilidade, recibos de livros na gestão financeira, e um cartão de cópias.
— Para o escritório. — sussurrou Blanka. Na penumbra o rosto de Nicholas
a fez pensar em uma máscara da morte de cera.
No escritório eles tinham muito mais por onde procurar. Montanhas de
arquivos e papéis soltos empilhados na borda da gigantesca mesa. Blanka tirou a
segunda lanterna e começou a examinar.
— Talvez nós devêssemos começar com o computador. — disse Nicholas
depois de algum tempo.
Jan, que estava procurando em uma gaveta de mesa, levantou-se
subitamente, chocando seus ombros contra a cadeira.
— Encontrei alguma coisa. — ele sibilou. Em severo triunfo ele levantou
uma pasta. — Aqui!
Eles se amontoaram na luz e encararam as longas fileiras de números.
— De acordo com esta lista, Caitlin tem uma nota ainda pior em matemática
que Michael Cline. — Blanka declarou.
— Eles a mataram! — Jan explodiu.
— Não tire conclusões precipitadas. — disse Blanka, puxando Jan para cima
pelo braço. — Rápido, para o escritório de Hasenberg!
Ela não queria admitir que estivesse começando a perder a coragem. Ela se
sentiu ainda mais nervosa quando eles adentraram o domínio de Hasenberg.
— O que nós estamos esperando? — sussurrou Nicholas.
145
Jan pegou sua máquina e a plugou. Aqui a procura foi mais difícil. Dentro
dos gabinetes havia mais compartimentos, cada um com sua própria fechadura. Na
maioria dos casos, eram fechaduras especiais, e Jan, xingando, tentou diferentes
pinos até que elas finalmente cederam aos dentes de aço de seu arrombador de
fechaduras. Blanka encontrou dúzias de esboços que pareciam com diagramas
geométricos. Ela os reconheceu facilmente; eles eram árvores genealógicas. Atrás
dela, ouviu o ruído de um painel de vidro quebrando. Jan xingou silenciosamente.
— Blanka! — o grito abafado à fez virar rapidamente. Nicholas estava em pé
no meio da sala. A princípio ela pensou que ele estava balançando, mas então
percebeu que era a lanterna, que ele tinha colocado em cima da mesa. A lanterna
rolando para frente e para trás como se estivesse bêbada. Não foi até que o feixe de
luz deslizou para trás que ela reconheceu que Nicholas tinha tirado um
compartimento da prateleira com o vidro quebrado.
— A bolsa!
Atordoado, Jan inclinou-se para a luz. — Que tipo de bolsa?
— A prova. — respondeu Nicholas friamente, Blanka podia ver sua face
enrugando. Ela pulou e foi até ele. A bolsa ainda parecia suave e quase familiar.
Juntos eles a colocaram cuidadosamente no chão.
— M. J. — Nicholas leu alto, e calmamente as iniciais. — Há uma pista para
seu nome real.
Blanka resistiu à tentação de alcançar o fecho. A bolsa pertencia a Nicholas
agora. Cautelosamente, ele tocou a frente. Seus dedos deixaram marcas escuras na
camurça. O fecho abriu com um tinido suave. Nicholas virou a bolsa e a esvaziou no
chão. A mulher morta não carregava muito com ela: uma faca com cabo de marfim
e uma câmera antiquada de 35-mm. Nicholas abriu o reservatório e balançou sua
cabeça. — Sem filme. — ele sussurrou. Em um bolso lateral havia várias folhas de
papel grosso. Nicholas os desdobrou e os colocou no tapete. Cuidadosamente ele os
alisou.
— Um mapa. Você sabe do que ele é?
Blanka passou por Nicholas para olhar o mapa tão rapidamente que seus
joelhos ficaram quentes. Era uma planta de um edifício enorme. Apenas uma sala
no lado leste lhe parecia vagamente familiar. Era do lado de fora do edifício,
separada por uma longa passagem. Umas poucas linhas indicavam escadas.
146
— A sala separada é o porão do museu. — ela disse calmamente. — Está
praça aqui é o Mostruário com as vestes da bruxa. E a praça pequena é o pedaço da
porta do velho Convento que está pendurado na parede.
— Uma porta? — sussurrou Nicholas.
— A porta atrás da porta. — Blanka corrigiu. — Porta Post Portam; o lema
da escola. A porta conduz a uma construção embaixo da escola.
Nicholas riu suavemente e balançou sua cabeça. Você estava certa. — ele
disse roucamente. — A escola, os professores, os estudantes, tudo é apenas um
pretexto. Madame e as bolsas de estudo, os professores, todos eles bonecos em um
teatro de fantoches. O mundo real está abaixo da superfície. E minha mãe sabia
disso.
— Ei! — veio um sussurro agudo de Jan do outro canto da sala. — Dêem
uma olhada nisso!
Blanka e Nicholas pularam juntos. Jan atirou com força uma pasta
transparente na mesa. Acusatoriamente ele a iluminou com a lanterna.
— Aqui está o teste de Caitlin. Sem nota. Eu aposto que era A+.
— A nota atrás da nota. — disse Nicholas. — A porta atrás da porta.
— Alguém deve ser malditamente bom em copiar caligrafias. — disse
Blanka. — Talvez a mesma pessoa que escreveu a nova versão da crônica do
Convento. — e, ela adicionou para si mesma, escreveu seu exame de história
bagunçado.
A escada traseira que Jan usou para conduzi-los para o museu do Convento
era íngreme e estreita. Quando eles adentraram o corredor novamente e Blanka
viu uma luz vermelha piscando, ela quase desistiu de ter esperança. — Este é um
sistema de alarme realmente grande. — ela sussurrou.
— Há um como este no museu da cidade. Você acha que pode lidar com
isto?
Ela não podia ver a expressão de Jan, mas ela podia dizer pela maneira que
ele encolheu os ombros que ele estava à altura do desafio.
147
Sem outra palavra ele pegou algo de seu bolso. Houve um clique, e então a
luz vermelha enfraqueceu, finalmente apagando completamente. O feixe de luz
acendeu.
Espantada, Blanka olhou para Jan. — Você tem um controle remoto para o
sistema de alarme?
— E para a câmera de vídeo sobre a porta. — ele respondeu.
— E o que está na gravação agora?
— A imagem parada de um museu vazio. — Jan respondeu secamente.
Blanka e Nicholas estavam atônitos quando eles viram Jan entrando como
se estivesse seguindo seu percurso diário para a escola
As vestes da bruxa cintilaram misteriosamente no feixe de luz da lanterna.
A luz suspensa acendeu. Blanka e Nicholas recuaram, encolhendo-se contra
a parede. Jan, que estava parado ao lado do interruptor de luz, olhou para eles em
deleite.
— O que está errado? — sua voz ecoou. — Ninguém está aqui, é
hermeticamente selado. Assim está OK ter as luzes acessas.
— Você vem muito aqui, não é? — Nicholas estava pálido. Blanka tomou sua
mão, que parecia fria e seca.
— Pode ser. — Jan aproximou-se de um revestimento de madeira que tinha
uma ranhura quase imperceptível nele. Habilmente ele o segurou e levantou uma
ponta. Cabos grossos e medidores de energia ficaram a mostra.
— A caixa de distribuição elétrica principal da escola. — ele disse. — Vocês
vêem os fusíveis de cerâmica?
Blanka estava de olhos arregalados. — O corte de energia que teve no outro
dia. — ela disse. — Foi você?
148
— Aconteceu apenas uma vez. — ele respondeu. — Então eu o tive sob
controle. De que porta você estava falando? A velha ruína lá atrás?
***
O fragmento da velha porta do Convento na parede elevava-se na frente
deles como o entalhado e escurecido dente de um dragão. Blanka teve que se
forçar para apenas tocar a madeira antiga. Nicholas e Jan a apanharam pelas
bordas
— Na contagem de três. — comandou Nicholas. A porta rangeu um pouco
em seus suportes de ferro, mas mal se moveu. Então, quando suas mãos estavam
ficando escorregadias pelo suor, ela começou a se mover com um guincho. Todo o
tempo Blanka teve o sentimento de que os apóstolos de madeira na porta estavam
olhando-os com censura. Uma vez ela até pensou que ouviu um grito fino através
da parede, a voz de Caitlin? O guincho se tornou um rangido quando a porta
subitamente deslizou para fora de seus suportes e girou para o lado,
surpreendendo-os.
— Uma dobradiça. — Jan confirmou calmamente. — E um sistema
hidráulico. Cara, nós apenas precisávamos levanta e empurrar! — atônitos; Blanka
e Nicholas olharam para o que devia ser parede. Em vez disso havia uma estreita
porta de metal.
— A porta atrás da porta. — sussurrou Blanka.
— Sem chance. — Jan disse, com um olhar profissional para a fechadura.
— Fechadura de segurança de última geração. Eu não posso abri-la com
minha chave mestra.
— Isto significa que nós temos que desistir? — Nicholas perguntou
irritadamente.
Os olhos de Jan cintilaram. — Parece que eu estou desistindo? — ele estalou
suas juntas, encarando a fechadura com se ela fosse seu inimigo. — Para isso eu
preciso de Metrópoles II, da sala de arte.
149
***
Os traços da planta estavam firmemente fixados na memória de Blanka
quando ela ouviu passos e um som surdo. Ela pulou de alívio. Passou o último
quarto de hora, sentada com as costas contra a parede, decorando a planta. Apenas
a parte central foi desenhada corretamente, ela não poderia dizer se as passagens
indicadas nos lados levavam a outras salas ou eram apenas saídas. O rosto
vermelho de Nicholas apareceu. Juntos, ele e Jan arrastaram uma máquina para a
sala. Parecia algo saído de um filme de ficção científica. Um emaranhado de cabos e
tubos rígidos pendurados por cima do ombro de Jan. Cuidadosamente eles
depositaram a máquina. Nicholas se levantou e estendeu a perna ferida.
— A coisa é feita de chumbo. — ele resmungou.
— Aço. — Jan o corrigiu. — Isto funciona a 3000 libras por polegada
quadrada. Se fosse chumbo, os cabos iriam voar por todos os lados.
— Então isto funciona por pressão?
— Claro que sim. Você conhece a serra para cortar metal que os bombeiros
usam? Este é o mesmo princípio. Um motor elétrico usa 400 volts de corrente
alternada e uma bomba de pressão de óleo, que cria pressão. Você pode abrir
qualquer coisa muito bem com isto. E como é um sistema hidráulico, não faz
barulho algum. Eu testei várias vezes sobre a fonte de alimentação do forno. — ele
enfiou a mão no bolso da calça e puxou uma peça cilíndrica de metal. Rapidamente
o empurrou no buraco da fechadura da porta principal do museu e usou uma
pequena chave para travá-la.
— Fechadura especial de ligação para fechaduras de segurança. — ele
explicou. — Sem esta chave ninguém pode abrir a porta. Nós não queremos
qualquer visitante surpresa no museu do Convento esta noite, não é?
Depois que Jan tinha desparafusado os painéis da frente e do lado da
Metrópole II, o bloco parecia com uma bateria de carro com alavancas e cilindros
aparafusados nele. Blanka olhou sobre as duas alavancas hidráulicas que estavam
vagamente remanescentes de um par de tesouras. Jan procurou por grossos cabos
e mangueiras de pressão. Ele calmamente começou a encaixar sua máquina e
anexar cabos de energia embaixo dos fusíveis de cerâmica. Nicholas sentou-se
junto a Blanka e passou-lhe um tecido, no qual vários objetos duros estavam
embalados.
150
— Eu só tenho minha navalha comigo. — sussurrou Nicholas. — Mas, tenho
certeza que será a melhor, estavam na sala de arte.
Sentindo um arrepio, Blanka olhou as lâminas afiadas dos estiletes visíveis
no tecido.
Jan notou seu rosto preocupado e sorriu. — Nada pode dar errado. — ele
explicou, indicando sua máquina Metrópoles. — O motor se auto desliga se for
necessário. A prova de idiota. Dê-me uma mão, Nick!
Levou alguns minutos para posicionar a máquina apropriadamente na
frente da porta. Com intensa concentração, Jan comprimiu as alavancas entre a
porta e a moldura de metal.
— OK! — ele gritou.
Blanka esperou a qualquer minuto ouvir uma explosão ensurdecedora e
sentir estilhaços entrando em suas costas. Em vez disso houve um feio rangido
metálico. Pouco depois a porta, inclinava completamente fora de forma, se
abriu. Nicholas assobiou apreciativamente.
— Há realmente escadas. — sussurrou Jan.
O cheiro que emanava do eixo da escada estreita da passagem secreta era
remanescente da profunda adega onde garrafas de vinho entraram em seus sonhos
empoeirados de festas de Natal e vidros tinindo.
Blanka não podia deixar de pensar Caitlin, amarrada e maltratada, sendo
arrastada para este sepulcro. Ela pegou um estilete em sua mão direita e a lanterna
na mão esquerda. Em cada passo os papéis que ela tinha deslizado sob sua
camiseta no escritório do Dr. Hasenberg roçavam sua pele.
Blanka contou cada degrau. Atrás dela podia ouvir Nicholas respirando
rápido. De uma escada para a próxima o ar ficava mais frio. As paredes da
passagem pareciam estar ficando cada vez mais juntas. Blanka imaginou que ela
podia ouvir o eco de sua própria pulsação. Finalmente o fim das escadas entrou em
visão. Panturrilhas doendo, eles adentraram um corredor ainda mais
estreito. Blanka fechou os olhos, mentalmente traçando a rota deles até então,
trabalhando da distância aproximada ao número de escadas, e relacionando-os
com o comprimento dos corredores na planta.
151
— Trinta metros diretos para frente e depois à direita. — disse ela
calmamente.
O corredor era tão estreito que eles só podiam passar em fila
indiana. Blanka foi à primeira tentando não pensar no que poderia encontrar. O
corredor estava revestido com madeira e cheirava a verniz fresco. Uma leve brisa
roçou as bochechas de Blanka na passagem, em algum lugar devia haver um ar-
condicionado.
Continuaram, seguindo a curva de outro corredor. Subitamente
terminou. Blanka parou tão abruptamente que Nicholas colidiu com
ela. Silenciosamente Blanka deixou o feixe de luz de sua lanterna vagar para
cima. Estavam parados em frente a uma passagem de pedra. Esculturas em relevo
delimitavam porta dos dois lados, esculturas de Lobos caçando.
— Isto é velho. — sussurrou Blanka. — Deve ser ainda mais velho que o
Convento de Maddalina.
Silenciosamente eles caminharam pela porta e adentraram uma catedral
subterrânea. A graciosa abóbada gótica elevava-se acima deles, projetada de uma
maneira que a tornava capaz de suportar um grande peso. Intimidados, eles
olharam ao redor.
— Então é aqui para onde Maddalina e outros fugiram. — sussurrou. — Eles
simplesmente desapareceram, por uma passagem secreta para um Convento
subterrâneo.
— Próximo onde? — Jan urgiu.
Blanka fechou os olhos e visualizou a planta. — Na parte de trás do lado
direito algumas passagens ramificam.
De olhos arregalados, correram pelas passagens de pedra onde esculturas
antigas se colocavam em nichos. Estas não eram figuras de santos, mas os rostos de
mortais que pareciam máscaras da morte cinzelada. Em uma bifurcação no
corredor, Blanka olhou para um nicho e recuou em horror.
— Oh meu Deus! — sussurrou Nicholas. Duas caveiras estavam sorrindo
para eles.
152
Blanka virou o feixe da lanterna para o teto. Uma raiz se projetava entre
duas pedras. — O cemitério de órfãos está acima de nós. — disse ela.
— Errado. — veio a seca resposta de Jan. — O cemitério é aqui embaixo.
Ele apontou para outros nichos, onde várias caveiras repousavam como em
uma catacumba.
— Se não há cadáveres lá em cima nos caixões, então o que há neles? —
sussurrou Nicholas.
— Eu não poderia me importar menos. — respondeu Jan. — Onde está
Caitlin?
O medo na voz dele infectou Blanka. O corredor ficou novamente mais largo
e tornou-se uma sala oval. Parando todos de uma vez, eles tropeçaram e seguraram
um no outro. Várias pesadas portas de madeira apareceram no trêmulo feixe de luz
da lanterna. Elas eram pequenas e quase quadradas, pouco mais de um metro de
altura. Sinalizou a parte superior de uma porta à direita dos corredores. Poderia
haver qualquer coisa por trás delas: quem sabe uma câmara de sepultamente, uma
passagem, o inferno, ou - uma prisão. O ferrolho da pesada porta estava fechado
pelo lado de fora. Antes que Blanka pudesse detê-lo, Jan correu para a porta e
bateu na madeira
— Caitlin? — ele chamou suavemente. Houve um barulho estrondoso, e
então alguém se moveu no outro lado da porta.
Cada fio de cabelo do corpo do Blanka arrepiou-se. — Não, Jan! — ela gritou,
correndo para a porta. Jan girou ao redor. Não foi senão até que viu o chão, que
Blanka percebeu que Jan tinha empurrado-a rudemente para o lado e que ela
estava caindo. Ela mal sentiu o impacto. O ferrolho deslizou de volta com um som
de raspagem.
— Caitlin! — Jan gritou, abrindo a porta de uma vez.
***
Naquele momento, que pareceu ser eterno, Blanka aprendeu duas
coisas. Um, que levou apenas uma fração de segundo para ser catapultada para
153
fora do mundo de fórmulas e hipóteses para sempre. A outra, que a realidade pode
ser pior do que qualquer pesadelo. A criatura que rastejava para fora de sua sala
para a luz da lanterna não podia ser real. Membros pálidos tateavam seu caminho
sobre a pedra. Brilhantes olhos de fenda eram cercados por dobras predatórias e a
boca tornava-se cada vez mais ampla. O feixe de luz se moveu sobre a face
grotesca.
Apavorado pela luz, o monstro soltou um grito estridente e depois saltou
para o lado com um movimento repulsivamente ágil. Garras raspavam sobre pedra
como giz sobre um quadro negro, e então todos os sons cessaram, até mesmo a
respiração ofegante.
A criatura tinha descoberto Blanka. Por um momento, o tempo parou. Por
um momento confuso Blanka pensou que ela podia ver dois Nicholas - o que ela
conhecia e que ela tinha sonhado com a máscara, a máscara de Lobo, uma máscara
que agora mostrava os dentes triunfantemente.
Nicholas levantou-se no mesmo instante que a criatura, e então as sombras
vieram. Com uma batida aborrecida a lanterna de Blanka caiu no chão e se
apagou. Blanka virou e correu. Sua própria respiração ofegante batia em seus
ouvidos, abafando as vozes de Jan e de Nicholas, que pareciam cada vez mais e
mais distantes. Mas o barulho raspando atrás dela era muito mais alta, a respiração
bruta cada vez mais próxima.
Blanka gritou quando bateu seu ombro contra uma parede, sentiu um arco,
a parede de um corredor, e um crânio que rolou debaixo das suas mãos e quebrou
com um estrondo seco. A criatura era mais rápida do que ela, muito mais
rápida. Em sua mente podia ver que a perseguia, saltando como um leão. Ao longe
havia um lampejo de luz. Quando Blanka sentiu o toque quase amoroso de garras
na parte traseira de seu joelho, ela esqueceu a luz e apenas correu. Então ela sentiu
dois braços se envolvendo em torno dela e uma mão enfaixada como a de uma
múmia pressionando-lhe os lábios dolorosamente contra seus dentes. Ela
entrecerrou os olhos na escuridão, mas o monstro parecia ter desaparecido
— Você o assustou. — uma voz áspera sussurrou em seu ouvido. O cheiro
de álcool era insuportável.
— Se eu deixar você ir, você vai ser mais prudente? — perguntou Simon
Nemec.
Blanka moveu-se contra sua mão, esperando que ele interpretasse o
movimento como um aceno de cabeça. Ele a soltou. Próximo, um fósforo foi
154
acesso. Preocupado, Nemec franziu a testa, mas não estava olhando para
Blanka. Seu olhar foi atraído pelo som de choro. Blanka estendeu a mão para a
parede irregular, dominou seus nervos, e virou-se, tremendo. O monstro estava
encolhido contra a parede, se balançando para trás e para frente, como se tentasse
aliviar uma dor.
— Você o chutou. — Nemec a repreendeu.
— É que... É que me atacou. — Blanka respondeu.
Ela observou com perplexidade quando o zelador se inclinou e acariciou
confortavelmente o cabelo emaranhado da criatura com sua mão enfaixada. O
monstro ergueu a cabeça e olhou para Blanka desapontadamente. Tinha olhos
azuis, pelo que ela viu. Não eram os olhos de um predador. Como uma pessoa cega
que finalmente entende o que tinha tocado, percebeu o que o monstro era. Tinha
estado procurando por ela o tempo todo, havia sentido seus pensamentos e
finalmente a tinha encontrado. E era um ser humano. Um jovem rapaz. Sua pele era
muito pálida, como se não tivesse visto o sol por muitos anos. Suas unhas eram
longas, calejadas. Seu ombro carregava vários cortes mal curados com o padrão de
uma teia de aranha. Sua cabeça pendia para frente, fazendo-o parecer ainda mais
com um animal. O que Blanka pensou como dobras predatórias, eram
tatuagens. Tinha linhas pretas que representavam um animal com presa,
desenhados em seu rosto, dando-lhe o aspecto de um Lobo. O jovem olhou para
Blanka e contorceu seu rosto. Doía-lhe vê-lo tentando sorrir para ela. Seus molares
brilharam. Blanka sentiu-se tão enjoada que deslizou pela parede e cobriu o rosto
com as mãos. Parecia que há muito tempo atrás alguém abriu os cantos da boca do
homem para fazê-lo parecer mais com um animal.
— Quem fez isso com ele? — Blanka sussurrou.
Nemec encolheu os ombros, pegou uma vela de um nicho ao lado da porta e
a acendeu com o fósforo que apagava.
— Maddalina, Hans Haber, Joaquim, todos nós. — sua voz tremia. — E isto
significa que eu também.
— Os Lobos, então. — ela disse. — E você é um deles.
— Sim, e às vezes não. — retornou Nemec. Apreensivamente ele olhou ao
redor. — Não no momento, caso contrário você não estaria parada aqui me
fazendo perguntas.
155
Eu terminaria como ele? — Blanka respondeu amargamente. — O que ele
fez?
O rosto de Nemec suavizou-se quando olhou para o menino. — É o seu
destino. Ele não conhece mais nada, Blanka. Ele é uma criança Lobo; ele cresceu
sem contato humano. Luz o fere, mas no escuro ele pode até mesmo distinguir
cores. Quase não sente calor e frio. Seus sentidos são mais apurados do que os
nossos, estão tão finamente sintonizados que pode até mesmo ver as cores dos
nossos pensamentos.
— Isso significa que vocês o prenderam aqui quando ele era apenas uma
criança! — arfou Blanka. — Vocês são todos loucos!
O olhar de Nemec parecia arder em seu rosto sombrio. — De certa forma
isto o faz mais livre do que qualquer um de nós. — ele sussurrou. — Ele não sabe
quem ou o que ele é. Ele é um Lobo, com todas as capacidades de um homem. Com
toda a intuição e os poderes que a maioria dos homens perdeu há séculos. Você
não o sentiu, Blanka? A presença dele está em toda parte!
Blanka olhou para o homem-Lobo. Pensar a esgotou; sentia como se todo
seu corpo estivesse tremendo. — Então ele é um... Médium. — ela sussurrou.
Nemec balançou levemente e estendeu a mão na parede para se firmar. —
De certa forma, sim. — disse ele, sua voz áspera. — Ele pega os nossos
pensamentos subconscientemente. Em sua mente, ele pode ir aonde quiser. — ele
riu como se tivesse feito uma piada.
— Você está bêbado? — o tom Blanka era acusatório.
Imediatamente Nemec tornou-se sério de novo. — Aqui em baixo é o único
lugar onde é possível pensar com clareza. — ele rosnou. — Pensamentos
desaparecem na neblina, e os outros não podem compreendê-los.
— Podem os Lobos?
Algo parecido com orgulho iluminou seu rosto. — O dom de
Belverina. Tivemos uma vez e vamos tê-lo novamente. Por séculos eles tentaram
tirá-lo de nós, mas os Lobos estão aprendendo, estão aprendendo novamente e
transformando-se a si mesmos...
156
O homem-Lobo soltou um som suave.
Simon Nemec congelou. — Ele os ouve. — ele sussurrou. — Eles estão indo
para a sala de reunião. — Blanka não recuou quando ele a agarrou pelos
ombros. Ele não parecia mais consciente de sua mão machucada. — Eles não
devem encontrar você! — ele a empurrou rudemente e fugiu. Sem parar para
pensar, ela tropeçou atrás dele, pelos corredores escuros, parecia à mesma rota
que ela tinha tomado a caminho daqui. O redondo feixe de uma lanterna confirmou
o seu palpite. Nemec quase caiu quando viu dois vultos, vindo ao longo da
curva. Blanka poderia ver os olhos de Jan brilhando, arregalados de medo.
— Não faça perguntas. — ela sibilou. — Vamos!
O homem-Lobo estava correndo ao lado dela em quatro patas; ela podia
sentir a respiração dele em sua mão. Nemec estava voltando para a sala de onde
eles tinham libertado o Lobo poucos minutos antes, correndo tão rápido que sua
jaqueta ondulava por trás dele. Ele empurrou a porta aberta. — O que vocês estão
esperando? — sussurrou Nemec. — Eles não vão te procurar aqui!
Blanka hesitou, olhando nos olhos lacrimejantes do zelador. Ela podia ouvir
passos se aproximando a distância. Imaginou Joaquim e os outros Lobos chegando
mais perto.
— Venha! — ela ordenou a Nicholas e Jan. Eles se entreolharam
duvidosamente, mas Blanka pegou suas mãos e os arrastou atrás dela. O homem-
Lobo fez um som lamentoso e não se moveu uma polegada. Só quando ele viu
Blanka entrar que seguiu. Nemec deslizou o ferrolho do lado de fora.
— Você está louca? — sussurrou Jan.
— Cale a boca, caso contrário, estaremos acabados! — Blanka
ordenou. Cheirava a sala de estar da Sra. Meyer - de peles de animais e couros
curtidos. Exceto que o cheiro era cem vezes mais forte. Eles mal podiam ouvir
qualquer coisa através da porta: apenas múrmuros e a voz irritada de Nemec em
resposta. Assustados, eles esperaram, encolhendo-se juntos. Depois de um tempo
Blanka levantou a cabeça e olhou em volta. A luz veio de uma pequena lâmpada em
um nicho. Peles de animais estavam no chão, e alguns estavam enrolados contra a
parede. Tudo ao redor, as paredes estavam cobertas de marcas de arranhões que
pareciam estranhas pinturas de caverna. Quantas horas o homem-Lobo deve ter
passado à procura de uma maneira para sair da prisão?
157
A porta se abriu e Nemec deslizou para dentro da sala. — Venham! Eu vou
lhes mostrar o caminho.
— Não sem Caitlin! — sibilou Jan.
Nemec olhou para ele com espanto, em seguida caiu em uma gargalhada
rouca. — Vocês vieram aqui por causa da garota irlandesa?
— Ela está desaparecida.
Nemec fez um gesto desconsiderado. — Ela foi para casa. Eu mesmo a levei
ao aeroporto. Ela foi informada que Blanka estava sendo expulsa também.
— Por quê?
— As cópias foram encontradas no quarto dela. Ela foi negligente o bastante
para dizer que elas pertenciam a você; Blanka. Qualquer um que invada a sala de
livros e faça cópias corre o risco de ser expulso.
— E você tinha a chave para o quarto de Caitlin?
— Oh, não. — Nemec respondeu ansiosamente. — Não eu. Eu não tenho
quaisquer chaves para os quartos dos estudantes. Mas neste caso nenhuma chave
era necessária. Você foi bastante inteligente em trancar seu quarto, Blanka. Foi
Caitlin quem se esqueceu disto desta vez.
— Como você sabe que eu tranquei meu quarto? — a boca de Blanka estava
apertada. — Oh. — ela disse; tudo fazendo sentido agora. — Era você, na noite que
a energia acabou. Você tentou entrar no meu quarto!
— Eu apenas chequei para ver se a sua porta estava trancada. É melhor
manter as portas trancadas quando os Lobos decidirem fazer a batalha.
— Tinha a chave da gaveta!
— Não é difícil abrir uma gaveta como aquela, com um pedaço de arame,
por exemplo.
— Você está mentindo para nós! — gritou Jan.
158
O encolhido homem-Lobo rosnou e se endireitou. Nicholas rastejou para
longe tão rápido quanto pode, para manter a maior distância possível entre ele e o
Lobo.
— Ele não está mentindo, Jan. — disse Blanka.
— Dê-me uma razão do por que eu deveria confiar nele. — retornou Jan.
— Eu não lhes darei razão alguma. Eu apenas os tirarei daqui, nada mais. —
disse Nemec.
— Annette Durlain confiou em você, não é? — as juntas de Nicholas
estavam brancas, ele estava segurando o estilete muito fortemente.
Nemec virou lentamente em sua direção.
— Talvez ela fosse chamada de Klara Schmied, também. — Nicholas
adicionou.
— Você a matou?
O homem-Lobo estava absorto, olhando para Nicholas.
— Bem? — Nicholas arfou. — Você a matou?
O homem Lobo começou a mostrar seus dentes em imitação à raiva de
Nicholas.
Blanka teve que desviar o olhar.
— Eu não sei o que você quer dizer. — disse Nemec friamente.
— Eu quero dizer à mulher que foi encontrada morta no pé das escadas.
Nemec e Nicholas se olharam por um longo tempo.
— Meret Johanna Vargas. — murmurou Nemec finalmente. — Nós a
chamávamos apenas de Johanna. Não, eu não a matei. Eu nunca teria feito isto.
Nunca! — ele ficou em silêncio e fez um som que soou como um soluço sufocado.
159
— O que ela estava procurando? — perguntou Blanka calmamente.
Nemec suspirou e secou seus olhos com as costas de sua mão. Limpou sua
garganta e apontou para o homem Lobo, que tinha parado de mostrar seus dentes.
— O filho dela. — ele disse suavemente. — Ela queria resgatá-lo. Eu estava
mantendo guarda... Aquela noite era o momento perfeito. Os Lobos estavam
distraídos, levando os novos estudantes ao redor. Nós apenas tínhamos que
esperar até que o cemitério de órfãos estivesse vazio. Mas Johanna...
O estilete caiu no chão.
— Isto não é verdade. — sussurrou Nicholas. — Eu sou o único filho dela.
Blanka deu um passo em direção a ele. Agora o incidente em seu quarto
estava fazendo sentido – o Lobo e Nicholas. Nemec segurou sua cabeça em suas
mãos e deslizou pela parede até que estivesse sentado no chão de pedra.
— Então é verdade. — ele disse a Nicholas. — Ela me contou sobre você. Eu
apenas nunca acreditei.
— Ela me abandonou por causa dele. — disse Nicholas. Blanka esperava que
ele ficasse chateado, talvez desabar completamente, mas ele estava muito calmo.
— Ela lhe deixou para proteger você. — Nemec o corrigiu. — Foi difícil para
ela fazer isto. Mas ela conseguiu fazer-se invisível. Quando fugiu todos esses anos
atrás, até eu pensei que estava morta.
— E ela simplesmente deixou o Lobo… filho dela… para tr|s? — perguntou
Blanka.
Nemec riu amargamente. — Ela mesma era apenas uma criança. Ela tinha
dezessete quando engravidou. De um estudante.
Aquele que se afogou. — sussurrou Nicholas.
Nemec assentiu. — Era contra as regras dos Lobos, por que ele não era um
de nós. Johanna era descendente de uma linhagem direta de Maddalina e Hans
Haber.
160
De repente Blanka sentiu-se estúpida. Lembrou-se de todas as horas que
passou meditando sobre as crônicas do julgamento da bruxa. As respostas
estiveram bem na frente de seu nariz o tempo todo! — Então as freiras realmente
tiveram seus filhos. — ela percebeu. — Os filhos das bruxas. E onde você poderia
esconder crianças sem que ninguém percebesse? Em um orfanato.
— Oh, havia órfãos genuínos também. — disse Nemec.
— Maddalina não era estúpida. Mas isso não ajudou. As crianças que não
foram condenadas e mortas na época do julgamento das bruxas deixaram a cidade
e se espalharam por todo o mundo. Mas os Lobos os procuraram - e ainda estão
procurando hoje. Por todo o mundo. E muitas vezes, eles as encontram. — ele
sorriu sombriamente. — Exceto por Johanna. Johanna era a melhor de todas. Ela
tornou-se invisível. E seu segundo filho parece ter herdado esse talento dela.
— O que os Lobos fizeram com ela? — Nicholas perguntou com uma voz
inexpressiva. Ele ainda não podia arrancar o seu olhar do Lobo. — Como... Ele... —
ficou em silêncio. O rapaz de pele clara o encarou de volta.
— Por séculos, houve um Lobo vivendo dentro destas paredes. Ele tem que
estar aqui. É um lugar antigo, um lugar místico, um que mantêm a alma de muitos
séculos. Enquanto o Lobo viver, também o fazem os Lobos, e suas memórias da
morte. Mas o Lobo envelheceu. Seus pensamentos começaram a desaparecer. O seu
fim se aproximava. Antes que pudesse ser morto, um novo Lobo deve ser
escolhido: o filho de Johanna. Por muito tempo ela não queria aceitar. Achava que
poderia simplesmente dizer "Não, obrigada" e sair. Então, quando o namorado dela
se afogou, ela compreendeu. — Nemec suspirou. — Ela não conseguiu salvar seu
filho, mas ela fugiu. Para nós, estava morta. Ela se escondeu. Se mudava e trocava
de identidade tão freqüentemente que ela própria muitas vezes mal reconhecia seu
rosto no espelho. Mas nunca esqueceu seu filho-Lobo. Passou anos fazendo todos
os preparativos, preparou trilhas e criou rotas de fuga. E quando ela me contatou
há um ano e me disse que estava pronta para vir buscá-lo, eu... — ele engoliu em
seco.
—... Ajudou-a. — Blanka terminou sua frase. — Você mandou a planta. O
momento era perfeito. Ela tingiu os cabelos, fez-se parecer mais velha, e foi ver as
exposições, disfarçando-se de turista. Era o dia que os novos alunos chegariam;
bom momento de novo, porque isso significava que os Lobos estavam
ocupados. Ela não deixou a escola, ela permaneceu no prédio.
— Foi uma loucura. — sussurrou Nemec. Com dificuldade, ele se levantou
do chão e limpou a boca. — Eu dei a ela as chaves da porta do museu, e ela foi e
161
pegou seu filho. Mas quando estava prestes a fugir... — ele balançou a cabeça como
se estivesse tentando expulsar a memória. — Eu não sabia que os Lobos tinham
trancado a saída para o cemitério dos órfãos. Ela virou-se e ia fugir pela sala de
exposição.
— Onde os Lobos a encontraram e a mataram. — terminou Blanka. — Eles
fizeram isso com o homem-Lobo? — ela perguntou, apontando para os cortes em
suas costas.
— Ele correu para a vitrine. Embora tivesse febre e a ferida não estivesse
curada, não podia abandonar Johanna, ele procurou por ela, e a encontrou, em seus
pensamentos, Blanka.
— É por isso que eu ouvia passos.
Nemec assentiu. — Ecos, um monte de pessoas com o dom de Belverina os
ouviu. Este é um local antigo. Talvez eles sejam realmente ecos do passado. Este
tipo de assombração geralmente ocorre com alguém que não tem consciência de
estar causando tais incidentes. E a capacidade profética geralmente é
particularmente forte em tais pessoas.
— Por que você mesmo não o libertou? — sussurrou Nicholas.
— Eu não sou como Johanna. — respondeu Nemec com resignação. —
Nunca fui. Eu só posso ser diferente quando estou bêbado. Quantas vezes você
pode ficar bêbado? E onde eu poderia o ter levado? Onde eu mesmo poderia ir? Sou
um Lobo. Eles me encontrariam, onde quer que eu esteja. — ele hesitou. — De
qualquer maneira, eu só estaria indo de uma prisão para outra. Eles me têm em seu
poder. Forjar documentos não é um crime de menor importância, especialmente
quando você está falando sobre os contratos.
— Você é aquele que forjou as crônicas, e alguns exames. Tudo sob as
ordens dos Lobos.
— Não tudo. — ele sorriu amargamente. — Eu forjei seus exames assim
você não seria aceita. Eles escolhem apenas os melhores.
— Você roubou minhas anotações assim você poderia praticar minha
caligrafia. E assim os Lobos não suspeitariam e você enfaixou sua mão assim não
ocorreria a alguém que você podia escrever exames forjados nesta condição.
162
O homem-Lobo levantou sua cabeça e escutou. — Vão. — Nemec urgiu. —
Levem-no com vocês, talvez vocês tenham mais sorte do que Johanna!
Blanka foi até o homem-Lobo e acariciou seus cabelos. Ela não sabia se ele
entendia suas palavras, mas ele saberia o que ela queria dizer. — Venha comigo. —
disse ela suavemente.
***
A chama da vela de Nemec flutuou na frente deles na escuridão como um
farol. Tão silenciosamente quanto possível eles seguiram seu caminho através das
passagens. O homem-Lobo teve menor dificuldade. Moveu-se tão rápido e
seguramente em quatro patas que surpreendeu Blanka. As passagens se
estreitaram novamente. Eles atravessaram duas câmaras e chegaram finalmente a
uma estreita escada de metal que subiu abruptamente.
— Lá em cima. — Nemec ordenou.
Sem hesitação, Blanka agarrou o corrimão e se impulsionou para cima.
Acima de sua cabeça, ela descobriu uma escotilha fechada com ferrolho. Quando
olhou para baixo, viu os seus quatro rostos olhando para ela. Nemec gesticulou
impaciente. Blanka assentiu e estendeu a mão para o ferrolho. Como se só de
pensar fizesse acontecer, ele abriu. Confusa, afastou sua mão. A escotilha se
abriu. O rosto de Joaquim apareceu. Pensando rapidamente, Blanka estendeu a
mão e agarrou seu pescoço. Joaquim balançou um pouco, mas não caiu. Algo duro
acertou a mão de Blanka, mandando pontadas de dor por seu ombro. Os rostos
abaixo dela começaram a girar, e ela caiu.
***
Cordões cortavam seus pulsos. De vez em quando Tanya a socava entre as
omoplatas, fazendo-a seguir. Blanka havia perdido todo o sentido de onde estavam
há muito tempo. Seu caminho foi muito longo para seu reconhecimento. As
contusões em suas costelas e pernas, onde Nicholas e Nemec a tinham segurando
quando caiu, pulsavam. O pano que Joaquim tinha usado para vendá-la estava
esmagando seus gLobos oculares. A cada passo, dor pulsava no local em seu
pescoço onde o bastão de Tanya tinha pousado. A sala onde ela estava sendo
163
bruscamente empurrada parecia desagradavelmente fria. O assoalho rangeu sob
seus pés. Finalmente, a procissão parou. Houve sussurros, resmungos surpresos, e
o deslocamento de cadeiras.
— Quem é esta?
Blanka aguçou seus ouvidos. Era a voz de uma mulher, uma voz suave que
ela conhecia muito bem. — Sra. Catalon?
Ela ouviu passos apressados, em seguida a venda foi removida. Por um
momento, tudo estava embaçado. Eles ainda estavam no Convento subterrâneo,
mas em uma parte nova. Cerca de cinqüenta pessoas estavam reunidas na sala. Era
brilhantemente iluminada; um candelabro de cristal pendia acima de uma grande
mesa de pedra negra polida. Documentos estavam espalhados perto de umas
poucas telas de computador. No fundo Blanka podia ver estantes enormes que
preenchiam toda a parede. Lá estavam eles: crônicas, livros antigos,
arquivos. Inúmeros arquivos. A Sra. Catalon deu a Blanka um sorriso amigável,
como se tivesse acabado de convidá-la para um café aqui.
— Blanka! Que coincidência. Nós estávamos justamente falando de você.
Houve murmúrios renovados.
— Então esta é ela! — disse um homem mais velho.
— O par dos que invadiram. — a voz de Joaquim se fez ouvir.
Blanka olhou por cima do ombro. Além de Joaquim e Tanya, apenas os
outros dois Lobos estavam atrás dela. Tobias se adiantou e colocou os celulares de
Blanka e Nicholas, junto com o mapa mostrando a planta, sobre a mesa.
— Quem é o garoto? —Sra. Catalon perguntou.
Nicholas saltou quando Tanya puxou para baixo a sua venda. Nemec estava
parado não muito longe deles, logo ao lado do Lobo, que estava agachado em seus
pés, chorando enquanto escondia os olhos da luz. Jan não estava em lugar algum.
Partiu, Blanka pensou amargamente. Oh bem, pelo menos ele conseguiu fugir.
— Klaus Jehle da revista da universidade Attempto. — Nicholas se
apresentou calmamente.
164
— Este é o nome do estudante que se encontrou ontem com a Sra. Meyer. —
uma mulher bradou.
— Bem, bem, é a Sra. Nyen. — disse Nicholas friamente. — Você vai lá por
conta própria para matar a Sra. Meyer? O que ela fez? Chamou você nos arquivos
da cidade e lhe disse que ela tinha registros de Heinrich Feverlin?
Os murmúrios renovados correram ao redor da sala. A Sra. Nyen ficou tão
pálida que sua verruga se levantou de sua pele como um furúnculo preto-
azulado. Gradualmente Blanka reconheceu algumas das outras pessoas que
estavam na sala. À direita, na parte de trás da mesa sentava-se Sylvie. Sua mão
segurando a caneta ainda pairava sobre o papel preenchido pela metade, com
escrita. Ela estava ganhando tempo? A menina baixou os olhos. Ao lado da mesa
estava um homem alto, calvo, com óculos redondos; Dr. Almán, pai de Joaquim.
— Nemec ia levá-los para a saída norte com o Lobo. — disse Tanya.
Um gemido correu pela multidão. O pai de Joaquim andou depressa e
arrastou Nemec para frente. O velho zelador caiu de joelhos. O corte em sua testa
que Joaquim lhe tinha dado com a bengala, começou a sangrar novamente. Raiva e
pânico estavam refletidos nos rostos dos espectadores. Blanka pensava que a
multidão estava prestes a avançar em Nemec e linchá-lo.
— O que você estava pensando? — rugiu o pai de Joaquim. O homem-Lobo
abaixou-se e correu para Nemec.
— Pare! — gritou Blanka.
No momento seguinte ela caiu no chão, gemendo. Joaquin a tinha atingindo
nas costelas com seu bastão.
— Cale-se, Branca de Neve. — ele disse.
— Deixe-a em paz! — o rosto de Nicholas estava distorcido pela
raiva. Tobias e Tanya tiveram que recorrer a todos os seus truques de luta para
contê-lo. Não foi até Tobias bater nas pernas dele que conseguiram forçá-lo a ficar
de joelhos.
— Afastem suas armas. — resmungou o Dr. Almán. — E soltem-no. — três
bastões caíram no chão imediatamente; apenas Joaquim hesitou. A linha de Lobos
mais velhos olhou para ele ameaçadoramente.
165
— Eles invadiram. — Joaquim se defendeu. — Pela velha seção! Eles iam
levar o Lobo embora. O Lobo!
— Joaquim. — advertiu o Dr. Almán suavemente. Sob o olhar rigoroso do
seu pai, Joaquim parecia ficar menor. Finalmente, ele se inclinou e cuidadosamente
colocou seu bastão no chão.
— Professor Wieser. — a voz de Nicholas ecoou no silêncio. Um homem
mais velho em um terno cinzento olhou para cima. — E os Srs.es da patologia. —
Nicholas continuou. — Então vocês estão envolvidos nisto também. Não é de se
admirar que a morte de Johanna Vargas fosse declarada como um acidente.
O nome que Nicholas tinha falado pairava no ar como um eco. Do rosto
horrorizado de Sylvie, Blanka poderia dizer que Nicholas tinha acabado de cometer
um grave erro. Em cinco passos rápidos o professor estava ao lado dele, segurando
as amarras em torno de suas mãos e empurrando seus braços para cima. — O que
mais você sabe? — perguntou Wieser. Nicholas gemeu. Blanka gritou quando viu
uma faca brilhar na luz.
— Isso é o suficiente! — as palavras não foram altas, mas eram afiadas. A
mão de Wieser congelou no ar e depois caiu. Todos os olhos foram à porta. Blanka
piscou. Todos os Lobos - jovens e adultos - pareciam crianças pegas com a mão no
pote de biscoitos. Blanka sentia-se como se o chão se movesse sob seus pés.
Marie-Claire Lalonde entrou no silêncio, em pleno comando. Ela estava
usando um vestido sob medida que lembrava um hábito de freira. Seu cabelo no
comprimento do quadril fluía solto sobre os ombros, fazendo-a parecer
surpreendentemente semelhante ao retrato de Belverina.
— Dê-me a faca. — ela ordenou. O professor se afastou de Nicholas e deu-
lhe a arma, que ela pegou com um aceno de cabeça. Atrás dela, o Dr. Hasenberg
apareceu na porta. Quando ele viu Blanka, ele amaldiçoou. Madame foi para o meio
da sala, onde Nemec e o Lobo estavam sentados. Com um gesto gracioso, abaixou-
se para o zelador, levantando seu queixo com uma mão. Nemec deixou; suas mãos
atadas pressionadas dolorosamente contra suas costas.
— Você ia nos trair e deixar o Lobo partir, Simon? — ela perguntou
gentilmente. — Por quê?
166
As pálpebras de Simon tremeram. — Porque isso não é certo, Marie-Claire.
— respondeu ele com voz rouca. — Um homem é um homem. Eu não entendi por
um longo tempo, até que você me mostrou o que é ser trancado aqui dentro.
A diretora suspirou e se levantou. — Oh, Simon! — ela não deu a ordem
para desamarrá-lo, virando em vez disso para Blanka. Os Lobos assistiram em
silêncio enquanto Madame se aproximava dela e levantava a faca. Estranhamente,
Blanka não estava com medo. A diretora cuidadosamente cortou suas
amarras. Então ela andou para frente de Blanka e delicadamente tomou seu rosto
nas mãos. Seu sorriso era um pouco triste. Blanka engoliu em seco. Contra sua
vontade, ela reconheceu quanto tempo tinha desejado por esse contato. Neste
momento ela tanto odiava quanto amava Madame.
— Por que você não veio a mim? — perguntou a diretora com repreensão
suave. — Eu disse para você vir a mim se alguma vez estivesse preocupada.
Blanka se virou. — Mas você estava em Bruxelas. — disse ela. Então ela
acrescentou com desdém. — E eu pensei...
Madame Lalonde gargalhou. — Sim, muita gente pensa isso. O Lobo alfa
nunca é aquele que morde e ameaça. O Lobo alfa conduz e resolve conflitos. Ele só
mostra os dentes quando necessário. — com estas palavras, ela se virou e bateu em
Joaquim diretamente no rosto com toda a sua força. Sua cabeça se voltou
bruscamente e ele se dobrou. — Dê-me a pele. — ela sussurrou. Joaquim fungou,
mas teimosamente sacudiu a cabeça. Em um passo decidido, a diretora estava ao
lado dele, forçando-o ao chão. Ele lançou um olhar suplicante para o pai, mas o Dr.
Almán cruzou os braços e não se mexeu.
— Isto é contra as regras. — Joaquim arfou.
— José! — advertiu Madame.
Sr. Almán ficou pálido. Os Lobos assistiram com a respiração
suspensa. Mesmo assim, Blanka pensou ter visto um movimento quase
imperceptível. Finalmente, o Dr. Hasenberg quebrou o silêncio.
— Ela ainda não está pronta. — ele disse.
— Eu ainda sou aquela que decide isto. — a diretora o corrigiu
rispidamente. — Eu sei mais que qualquer um de você. E bem?
167
O professor, os médicos e a Sra. Nyen, todos foram ficar ao lado de
Madame. Dr. Almán e os jovens Lobos ficaram para trás. Sylvie não tinha se movido
de sua cadeira atrás da mesa. De olhos arregalados, ela olhou para o Dr. Hasenberg,
que ainda estava de pé entre as duas linhas de batalha. O psicólogo respirou fundo
e fechou os olhos por um momento.
— Tudo bem. — disse ele finalmente, se movendo para o lado de Madame
Lalonde. Os olhos de Dr. Almán brilharam de raiva. Relutantemente, passou por
seu filho, tomando o pelo de Lobo de seus ombros. Tanya e os outros Lobos
recuaram. Blanka assistiu com horror como Madame tomou a pele de Lobo e a
estendeu para ela.
— É destinada a ser sua. Você nos encontrou e mostrou que é melhor do
que ele. E eu não esperava outra coisa.
De repente Blanka percebeu por que Joaquim e os Lobos a
odiavam. Madame tinha deixado claro desde o início que os dias de Joaquim como
chefe dos Lobos jovens estavam contados. Sem estar ciente disso, desde o primeiro
dia Blanka era a intrusa que foi preferida acima de todos eles e ameaçou o status
de Joaquim.
— Eu não pegarei a pele. — ela disse.
Dr. Hasenberg riu.
A diretora lançou a ele um olhar irritado. — Ela pegará. — ela respondeu. —
Eu posso sentir. Ela é como eu quando era mais jovem. E está em melhor comando
de seus pensamentos que a maioria das outras pessoas aqui. Quando a mandei
partir, foi capaz de resistir a mim. Eu! — ela olhou para Blanka. — Eu a chamei
enquanto estava dormindo e ela acordou e veio à janela. — imagens começaram a
se formar diante dos olhos de Blanka. Teve que piscar. O fantasma do lado de fora
da janela! Então, ela não tinha se enganado quando vira o hábito de freira. — Você
estava sonhando. — sussurrou a voz suave de Madame em seu ouvido. — Você viu
o passado. Apenas aqueles de nós com dons de Belverina vêem os ecos do
passado. Você é uma de nós, Blanka.
— Não! — gritou Blanka, se afastando.
Os Lobos mais velhos riram.
168
— Oh sim. — Madame insistiu. — Todos nós somos filhos de
Belverina. Séculos atrás, Maddalina, Hans Haber e os outros dois presos fugiram
para as catacumbas com seu Lobo. As crianças foram expulsas e espalhadas pelos
quatro cantos da terra. Durante muitos anos, os herdeiros de Belverina viveram
aqui, no subsolo, só saindo à noite para conseguir comida na floresta. É assim que
eles sobreviveram. Durante décadas, agora nós temos que encontrar os
descendentes dos filhos das bruxas. Ao longo das gerações eles acabaram por
todos os lugares. Então para conseguirmos encontrá-los mais facilmente, nós
fundamos a Escola Internacional da Europa. E você, Blanka, é algo de especial. —
ela baixou a voz. — Você é descendente de Regina Sängerin e do homem-Lobo que
viveu dentro destes muros no tempo de Maddalina.
Blanka sentiu como se não houvesse oxigênio suficiente na sala. Ela estava
ficando tonta. — Eu não sou um de vocês. — gritou ela. — Vocês matam, e mantêm
seres humanos como animais! — ela fez um gesto em direção ao homem-Lobo.
— Deixe-me explicar. — disse o Dr. Hasenberg, dando um passo à
frente. Suas maneiras eram tão amáveis e compreensivas que Blanka teria gostado
de cuspir em seu rosto.
Ela desviou o olhar com repugnância. Nicholas virou o rosto pálido em
direção a ela por um momento. Ela notou que ele estava debruçado para frente e
pendia a cabeça, como se quisesse esconder o rosto sob a sombra de seu cabelo.
Blanka entendeu. Claro, ele também era um descendente dos Lobos.
— A Ordem que existia séculos atrás era Cristã apenas na aparência. —
explicou Dr. Hasenberg. — Belverina é nossa antepassada. Ela nunca foi uma santa
Cristã. Ela tinha o dom. Segunda Visão. O poder da sugestão, telepatia e o controle
do pensamento. Mas pessoas com habilidades especiais são logo traídas. Seus
alunos e descendentes aprenderam de seu trágico destino. — ele levantou as
mãos. — E que lugar melhor para os Lobos se esconderem do que no meio de um
rebanho de ovelhas? Ninguém procuraria por Lobos, os pagãos e controladores de
pensamento entre as ovelhas do Sr.. — os Lobos murmuraram em aprovação. — Os
herdeiros de Belverina podiam montar suas câmaras subterrâneas e ocultar seu
verdadeiro caráter em hábitos de freiras e aventais de jardinagem, sem medo de
perseguição ou descoberta. Seus filhos nasceram aqui, e este é o lugar onde eles
aprenderam a usar suas habilidades. Eles fizeram experiências com a alquimia e
magia e aproveitaram, e continuam a aproveitar até hoje, a melhor de todas as
ciências. Porta Post Portam; nós conseguimos empurrar outras portas atrás da
última porta do consciente. E a viagem está longe de terminar. Claro, não é fácil
encontrar todos os seus descendentes. Como eu disse antes, os nossos
169
antepassados também chegarão a nós. Ainda hoje existem muitos órfãos entre os
descendentes.
— Todos os estudantes são descendentes Belverinos? — perguntou Blanka
— Oh não. — outro homem falou. Ele parecia muito familiar para
Blanka. Ela se lembrou de ver sua foto no jornal uma vez. É claro, ele era o
prefeito. — Entre todos os mil alunos, há três, no máximo, que têm o dom, —
explicou ele. — Mas isso ainda não significa que eles possam usá-lo ou são
realmente adequados para serem aceitos em nossa sociedade. — ele deu um
sorriso satisfeito, aparentemente muito orgulhoso de ser um dos escolhidos. —
Talvez você tenha notado as perguntas hipotéticas em nossos testes de
aplicação. Elas têm a intenção de nos dar uma idéia se o aluno tem este talento
intuitivo especial. Aqueles com o dom não são necessariamente descendentes de
Belverina, e eles vêm de todo o mundo. É nossa missão encontrá-los.
— Mas mesmo os alunos sem o dom são úteis para nós. — Madame
acrescentou. — Nós temos uma rede de pessoas que não conhecem a nossa
verdadeira missão. Pessoas que fazem carreira, para si mesmas, e depois estão no
lugar certo, pessoas que tomam decisões.
— Como Caitlin? — perguntou Blanka. — Ela deveria ajudar vocês a
recrutar a próxima geração, quando ela fosse uma professora?
— Controle os pensamentos dos outros e você irá controlar seus feitos. —
Madame respondeu com um sorriso.
— Vocês manipulam pessoas!
Madame Lalonde ficou séria. Ela se inclinou tão para frente que Blanka pode
ver o anel escuro ao redor de sua íris. — “Manipular” soa como forçar. — ela
sussurrou. — “Conduzir delicadamente” é a melhor maneira de expressar. Quem
dirige a flecha, você ou seus pensamentos? Você arma o arco, aponta a flecha na
direção certa, e pensa no destino que você gostaria de acertar. O pensamento conta
Blanka. Vamos supor que você pudesse se infiltrar nos pensamentos de um
arqueiro. Ele não mira o alvo, ele mira para o lado e perde o torneio. Então você
teria ganhado, sem deixar vestígios, sem trapacear. Apenas usando pensamentos!
— E então você pode fazê-lo pensar em mirar para uma pessoa. O que seria
um assassinato perfeito? — Blanka respondeu bruscamente.
170
— É possível. — respondeu Madame, sorrindo. — É muito mais difícil de
influenciar os pensamentos de uma pessoa nessa direção. Estamos apenas
começando a entender essa disciplina, mas estamos trabalhando nisso, acredite em
mim.
Mais imagens inundaram a mente de Blanka. Ela se lembrou de como
Nicholas havia mentido para ela. Subitamente era fácil odiá-lo. Muito
fácil. Atordoada, ela enxugou os olhos, e depois outro sentimento ficou em
vantagem: a raiva.
— Não tente isto comigo! — ela sibilou para Madame.
A diretora riu. — Vê: sentido de Lobo. Você tem tanto talento, Blanka. Você
deveria aprender a usá-lo.
— E quanto a ele? — o Lobo homem se pressionava mais perto de Simon
Nemec.
— Nosso membro mais importante. — disse Dr. Hasenberg. — Ele é tudo
para nós, o nosso médium, o nosso foco, nosso confidente. Sem ele, não somos
nada. Ele é a nossa memória, nossa alma. Nós somos descendentes dos Lobos,
chame- o de nosso Totem, se desejar.
— Uma análise altamente civilizada, Professor Hasenberg. — Blanka
zombou. — E ainda assim vem da boca de um bárbaro e assassino. Vocês todos são
assassinos!
— Nós temos que nos proteger. — respondeu Dr. Hasenberg friamente.
— Nós mesmos e nossa história; muito freqüentemente outros assassinos
tomaram as vidas dos nossos Lobos.
— E para que Johanna teve que morrer? — gritou Blanka. — Ela era um de
vocês! — desdenhosamente deixou seu olhar vagar sobre seus rostos. Ninguém
desviou o olhar. Apenas Sylvie olhou para baixo. — Talvez Maddalina e os outros
fossem mártires que lutaram para o conhecimento. — continuou Blanka. — Mas
isso não justifica em nada o que vocês estão fazendo hoje, nada mesmo! Vocês não
são os mártires que fingem ser!
171
O rosto de Dr. Hasenberg foi ficando vermelho e ele respirava com
dificuldade. Estava prestes a dizer algo, mas Madame Lalonde o parou com um
aceno de sua mão.
— Eu não aprovo o assassinato de Johanna. — explicou. — Foi um
acidente. Joaquim e outros... — seu tom de voz ficou astuto —... Descobriram por
acaso que ela estava tentando fugir com o Lobo pela sala de exposição.
— Nós descemos para preparar uma pequena surpresa para você no museu.
Joaquim e Tanya queriam assustá-la. — disse Sylvie calmamente, depois se calou
novamente quando Madame olhou para ela.
A diretora continuou. — Um bastão atingiu Johanna no lugar errado. Os
Lobos não querem nos dizer de quem o golpe mortal veio, e nós respeitamos seu
silêncio. Remover a marca de Lobo foi um ato de pânico também. Mas nós não
expulsamos ninguém, certo, Simão? Em nossa sociedade, erros acontecem, e nós
estamos aqui para proteger uns aos outros.
— Isso é porque vocês não vieram me pegar para o teste de coragem. —
disse Blanka aos Lobos. — Vocês tinham que tirar Johanna do caminho. Vocês iam
escondê-la no quarto de Nemec até Madame decidir o que fazer?
— Sim, e nós conseguiríamos isso se você não tivesse entrando no nosso
caminho! — Tanya disse com rancor.
— Por que vocês não a levaram para o porão?
— Porque a porta estava fechada. — respondeu Sylvie para Tanya. —
Johanna a trancou atrás dela. Nós não sabíamos que ela ainda tinha a chave com
ela. Ligamos para o Dr. Wieser e ele nos disse para esconder o corpo na biblioteca,
de lá há uma passagem direta para o estacionamento. Ele iria buscá-la durante a
noite.
— Você tem uma escolha. — disse Madame suavemente, segurando a pele
de Lobo para Blanka novamente. — Aceite sua missão. Nós não somos assassinos,
nós oferecemos a pessoas como Jan uma chance, e Caitlin também, ela vem de uma
família pobre. Pagamos seus estudos para ajudar as crianças e jovens em todo o
mundo. — ela baixou a voz ainda mais. — Infelizmente, como sempre acontece;
quando você está tentando fazer o bem, alguns sacrifícios devem ser feitos. Você
condenaria alguém por entrar em pânico e atirar em um assaltante que estava
tentando matar a sua família? A morte de Johanna foi um acidente.
172
O olhar de Blanka caiu sobre o rosto infeliz de Joaquim. Seu pai, para quem
ele nunca seria bom o bastante, havia se afastado dele. Blanka engoliu e olhou para
a diretora. Ela ainda era Madame. Sua Madame. Havia um enorme caroço em sua
garganta.
— Se eu decidir me juntar a vocês, o que vai acontecer com ele? — ela
perguntou, apontando para Nicholas. — Ele não é um de vocês, mas ele sabe de
tudo agora. Vocês o deixarão ir?
O silêncio ameaçador foi resposta o bastante. Blanka endireitou os ombros e
deu um passo para trás, seu coração batendo descontroladamente.
— A morte da Sra. Meyer não foi um acidente. — disse ela calmamente. — O
aluno não se afogou por acidente. E ninguém merece o destino desse menino. Quão
bárbaros vocês têm que ser para mutilar uma pessoa assim? Eu nunca serei um de
vocês, Madame. Para mim vocês são todos assassinos. E isso inclui você.
O grito foi abafado, mas Blanka ainda o sentiu soando em seus ouvidos. Os
Lobos viraram. Simon Nemec estava ajoelhado ao lado do homem-Lobo. Seu rosto
estava contorcido de dor. Pedaços de bandagem e cordas penduradas em seu
pulso. Em seu punho, que não mostrava nenhum sinal de lesão, ele segurava o
estilete de Blanka. Como se em câmara lenta, sangue escorria e pingava no chão. A
voz rouca de Nemec parecia ricochetear nas paredes.
— Isto tem que chegar a um final. — ele disse a Madame. — E chegou a um
final... Agora.
O homem-Lobo estava deitado curvado no chão. Sangue espalhado no
assoalho.
— Corra! — gritou Blanka para Nicholas. No mesmo instante Nemec ergueu
sua arma novamente. Sylvie pulou, e papéis voaram da mesa. Tanto Blanka quanto
Nicholas correram em direção a Nemec.
As lâmpadas no candelabro de cristal piscaram. No momento seguinte
Blanka estava em pé na escuridão, tão escura como piche. Suas mãos agarraram o
braço do homem-Lobo. Com toda sua força ela tentou puxá-lo para cima, mas
mesmo assim, seu braço era tão pesado quanto chumbo. Um cotovelo bateu em seu
queixo com força total. O braço deslizou fora de seu alcance, e no momento
seguinte ela estava nadando desorientadamente em um mar de corpos. Houve um
173
estrondo e, em seguida um som terrível de desmoronamento. Faíscas voaram
como se um monitor de computador tivesse caído no chão. Blanka correu às cegas
para a escuridão e tropeçou em um pedaço de bastão deixado no chão.
— Blanka? — a voz estava logo ao lado dela. No momento seguinte um
isqueiro acendeu. A luz trêmula da chama iluminou o rosto de Nicholas.
— Ele está morto! — gritou Blanka. — Nós temos que sair daqui!
Como em um pesadelo, Dr. Almán apareceu na frente deles. Balançando o
bastão de Joaquim. Então a chama apagou-se novamente. Blanka procurou pelo
bastão a seus pés e o agarrou sem pensar. A madeira estava rachada. O golpe rinha
deixado suas mãos dormentes.
— Para a porta! — ela gritou para Nicholas. Torcendo para que não
atingisse Nicholas por engano, ela levantou o bastão e bateu novamente. Alguém
gemeu. O candelabro piscou novamente, duas, três vezes. Parecia para Blanka que
ela estava olhando para inúmeras imagens separadas. Uma delas foi a do Dr.
Almán, lentamente se levantando. Outra foi de Sylvie agarrando os braços de Tanya
assim que ela estava prestes a correr para Blanka.
— Vão! — gritou Sylvie. Então a luz se apagou com um grande estrondo
final. Alguém agarrou o braço de Blanka e a arrastou em direção a parede.
— Aqui, Nick! — chamou uma voz. Era Jan! Blanka esbarrou na soleira da
porta e tateou seu caminho para fora. Gritos acometidos de pânico e um choque
atingiram o corredor. Havia o cheiro de plástico queimado. O isqueiro de Nicholas
deu apenas luz suficiente para desviar a tempo de evitar bater a cabeça no teto do
corredor de pedra onde inclinava. Sem qualquer forma de se orientarem, eles
tropeçaram pelo corredor, se perderam, e tomaram passagens laterais que às
vezes parecia familiar, mas eram mais freqüentemente completamente novas para
eles. Novamente e novamente ouviram gritos e passos batendo. Em uma curva Jan
recuou e farejou.
— Merda! — ele sussurrou. — Alguma coisa está queimando aqui também.
— então seu rosto se iluminou. — Um plano! — ele pegou o isqueiro de Nicholas e
o segurou na frente dele. Blanka podia ver um ventilador tão alto quanto um
homem, preenchendo completamente o final da passagem, criando sucção quando
virava. A chama do isqueiro piscou e apagou. A voz de Jan estalou.
— Nós estamos em um túnel de ventilação.
174
— Devemos pular pelo ventilador, um de cada vez?
— Não seja estúpida. Sempre há uma passagem de manutenção perto de um
ventilador.
De mãos dadas, eles tatearam ao longo da parede até Jan acender o isqueiro
no abrigo de sua mão. Na frente deles havia uma porta com um grande
ferrolho. Juntos, eles o empurraram para abrir. Nicholas tossiu. Fumaça ardeu os
olhos do Blanka. A sucção bateu a porta atrás deles com um baque ensurdecedor.
Após alguns minutos aparentemente intermináveis Jan parou novamente.
— Um mastro e ferros de escalar. — ele gritou. — Vamos para cima!
Blanka sentiu o metal enferrujado. Tossindo, arrastava mão sobre mão por
cima do mastro. Deve ter sido colocado há pelo menos dez metros de profundidade
no solo. Com sua perna ferida Nicholas levou uma eternidade para conseguir
chegar encima. As mãos de Blanka estavam arranhadas e doloridas quando ela
finalmente viu a luz acima dela. Jan levantou uma grade, empurrou-a de lado, e a
ajudou, então finalmente Nicholas, para se puxarem sobre a borda de mármore liso
para o chão de pedra. Ofegantes, eles lutaram para respirar. Em algum lugar
próximo, as aves estavam gorjeando.
Atordoada, Blanka abriu os olhos e viu um anjo gordinho entre nuvens de
algodão sorrindo para ela beatificamente como um homem embriagado. Incrédula
ela piscou e ergueu a cabeça. Escondido atrás da decoração de flores e um altar,
uma grade levantava-se diante deles, e através de um portal gótico atrás dela eles
podiam ver o céu da manhã sobre o cemitério dos órfãos.
— Nós estamos na capela de Belverina. — Jan percebeu. — Um túnel de ar
que está classificado como monumento histórico. Muito inteligente. — ele pegou a
bolsa de Nicholas, que estava carregando todo o tempo, de seu ombro, se levantou,
e escalou sobre a grade. — Venham! Vamos! Não vamos ser pegos novamente.
Amaldiçoando, Nicholas lutou para ficar em pé. Blanka pegou seu braço e
puxou-o junto com ela. Laboriosamente eles correram passando pelas lápides para
o parque. Enquanto andava, Blanka olhou para trás e estremeceu. O cemitério
parecia o palco montado para um filme malfeito de horror. Ondas de fumaça, se
levantando de várias sepulturas e da capela começou a cobrir a cena como um
nevoeiro. À distância a sirene de um carro de bombeiros gemeu.
175
A primeira coisa que Blanka viu quando a escola estava à vista foi o vidro
das janelas da biblioteca explodindo. Chamas se lançando ao céu, como um
prenúncio do sol, que logo iria se levantar. Alunos e professores estavam se
aglomerando na entrada, pálidos de medo e congelando em camisetas, roupões de
banho e pijamas. Um dos carros de bombeiros freou de forma tão acentuada que o
cascalho da entrada da garagem se espalhou em todas as direções.
— Como você apagou o candelabro? — murmurou Nicholas. Jan olhou para
ele, olhos arregalados.
— Eu não fiz coisa alguma com o candelabro. — disse ele. — Eu apenas os
encontrei quando as luzes se apagaram. — subitamente ele cambaleou. Blanka o
pegou a tempo, e o ajudou a sentar-se no chão. Sua pele estava fria do choque. —
Talvez o rolamento tenha se rompido. — ele murmurou. — Então o motor se
sobrecarregou. Havia madeira em todo lugar do museu... Mas isso não pode estar
certo. Eu tinha colocado um fusível nele!
— Não foi você. — disse Blanka em voz alta. — O incêndio podia ter
começado por todo o tipo de razões. Havia velas queimando lá embaixo, e eu vi
faíscas quando o monitor caiu!
— Mas todos eles podem estar presos!
— Você não acha que havia apenas uma entrada, não é? — perguntou
Nicholas friamente.
176
Capítulo 16
Descendentes de Belverina
Carten Seibold não tinha tempo para um banho. Não barbeado, ele sentou
encarando Blanka, olhando para as impressões das fotos digitais de Nicholas.
— Ok, então. Você estava fazendo pesquisa para um trabalho de história e
descobriu que alguém tinha forjado o registro do julgamento da bruxa. Até aí eu
entendo. Mas em que isso tem a ver com o incêndio.
— Não tenho idéia, — respondeu Blanka. — Eu lhe contei tudo que eu sei.
Seibold olhou para ele suspeitosamente e franziu o cenho. — Agora, por que
eu não acredito totalmente em você?— ele suspirou profundamente e tomou outro
gole de café. — Você é obrigada a responder minhas perguntas, você sabe disso, eu
espero? — ele disse mais severamente.
Blanka assentiu.
— Deve ser um incêndio muito incomum, — continuou Carten Seibold. —
Ou nós temos aceleradores envolvidos. Nós encontramos fechaduras invioláveis na
porta do museu.
— Eles falaram isso no noticiário de hoje sim, — respondeu Blanka
suavemente. Ao pensamento do pânico na sala de reunião, dos gritos e rostos, ela
sentiu-se mal de novo pelo pesar e horror
Seibold assentiu e passou as mãos pelo cabelo, agitado. — Ok. Você tem meu
cartão?
— Não. Madame Lalonde não deu para mim na última vez.
Ele a olhou por tanto tempo que ela começou a se sentir desconfortável.
Finalmente ele alcançou e pegou um cartão. Depois de um momento de
consideração ele pegou uma caneta e rabiscou um número na parte de trás.
177
— Meu número do celular. Ligue-me a qualquer hora se você pensar em
qualquer outra coisa.
Blanka assentiu e tentou um sorriso. Ela achou difícil. O rosto de Sylvie
flutuou diante de seus olhos. Não podia segurar suas lágrimas. O detetive Seibold
pegou uma caixa de lenços da gaveta e entregou a ela sem uma palavra. Ele
esperou até que ela estivesse no controle novamente.
— Eu tenho uma pergunta para você. Detetive Seibold, — ela disse
suavemente. — Eu percebi no museu da cidade que você doou ao cemitério de
órfãos. Por quê?
Ela conseguiu pegá-lo de surpresa. Para sua surpresa ele parecia
constrangido.
— Era o desejo de minha avó. Depois da guerra ela e meu avô costumavam
se encontrar no parque do cemitério. Significava muito para ela. E quando ela
morreu, eu doei parte do que herdei para a restauração. — o sorriso dele ficou
mais amargo. — Hum. Se eu soubesse que estava financiando passagens secretas e
túneis de um culto... — ele a olhou rapidamente. — Você sabia?
— Não.
Ele fez um gesto de desprezo, dando-se por vencido. — OK, OK. Então... —
lentamente levantou-se, avançando para apertar a mão dela. — Não creio que nos
veremos novamente em breve. Espero que você fique na cidade.
***
Nicholas e Jan já estavam esperando em La Bête. O café estava deserto
novamente, os turistas preferiam ir às ruínas da escola e ao cemitério dos órfãos
para competir com as estações de notícias internacionais por uma foto espetacular
das operações de salvamento.
— Então? — perguntou Nicholas sem nem cumprimentá-la primeiro.
Blanka afundou em uma cadeira e balançou a cabeça. — Eu não acho que ele
seja um deles.
O alívio deixou a expressão de Nicholas suave e um pouco triste. Choque
ainda era evidente em seu rosto. Blanka segurou sua mão debaixo da mesa.
178
— Vamos esperar e ver o que Seibold faz com a informação, — disse Jan, sua
voz rude. — Não confio em ninguém nesta cidade, de qualquer maneira. Vou
embora.
— Você vai para casa.
— O que eu faria lá? Não, eu vou me esconder. A última coisa que preciso é
ter meu nome aparecendo em algum relatório policial. — nervosamente,
tamborilava a mesa com seus dedos. Suas bochechas estavam côncavas e
profundos círculos sob seus olhos o faziam parecer mais velho. O Jan
despreocupado e frio havia desaparecido. — Caitlin disse que eu deveria pegar o
próximo vôo para Dublin, mas acho que seria melhor pedir carona. E talvez eu
pudesse fazer trabalhos ocasionais para pagar a balsa.
— Você tem falado com Caitlin? — exclamou Blanka. — Minha mãe estava
totalmente histérica por que ela tinha ligado em casa perguntando por mim. — Ela
está no fim da corda. Mas ela não é a única. — apalpou o bolso lateral de sua
jaqueta. — Estou morrendo para ver o que ela dirá quando vir seu exame final.
— Mas não será mais útil para ela, — murmurou Nicholas.
— Caitlin pode fazer qualquer exame, em qualquer escola, — respondeu Jan.
— Você contou tudo a ela? — perguntou Blanka.
— Absolutamente não, — disse Jan com ênfase. — Isto é seu trabalho. — ele
se levantou, bateu na mesa em despedida, e partiu.
Eles o observaram pela janela do café enquanto ele passava pelo mercado,
ombros levantados, em direção a rua principal. Diretamente na frente do pilar
central estava uma equipe de noticiário televisivo, perguntando aos transeuntes
por seus comentários. Um homem velho estava balançando sua mão
dramaticamente. Blanka teve a sensação de estar assistindo o show de mímica em
uma grande tragédia.
— Nossa história, — disse Nicholas desanimadamente. Colocou a bolsa de
sua mãe na mesa e tirou os registros que tinham resgatado do escritório do Dr.
Hasenberg.
— Sua história. — ele empurrou uma árvore genealógica diante de Blanka.
—“Ba” - está é sua abreviação. E aqui está sua linha hereditária, sobre os homens
179
Lobo. — com uma voz amarga ele adicionou. — Herdeiros de Belverina. Pelo
menos nós dois sabemos de onde nós viemos.
Blanka estudou os símbolos e linhas. Na parte inferior direita o Dr.
Hasenberg tinha anotado a profissão que os Lobos desejavam para Blanka. —
Neurologista. — ela leu, — Aposto que eles também têm uma para você. Passei
minha vida pesquisando ondas cerebrais e Engramas7.
Cuidadosamente ela alisou o papel. Lá estavam os nomes de seus pais
biológicos. Ambos tinham morrido no mesmo dia, um ano após o nascimento de
Blanka. Estranhamente, o pensamento de sua mãe, sua mãe usando o uniforme de
seu restaurante. Afetou-a muito mais. Pela primeira vez em meses ela podia pensar
na palavra “casa” sem soar falso ou amargo. Nicholas deu-lhe um olhar de soslaio.
— O que?
— Admita. Na sala de reunião você acreditou em Marie-Claire por um
momento.
Ela baixou os olhos. — Apenas por um momento. Ela realmente estava
convencida sobre o que estava fazendo. Ela acreditava que era uma pessoa boa!
— Você sente falta dela, não é?
Blanka ficou em silêncio.
— Sem mais segredos, — advertiu Nicholas suavemente. — Nós
prometemos isto um ao outro.
Ela teve que limpar sua garganta para falar. — Eu gostava dela. — não era
toda a verdade.
Nicholas afastou o olhar e avaliou o grande relógio da Câmara Municipal.
Blanka ainda estava surpresa que o tempo continuava como se a noite
anterior nunca tivesse acontecido. A porta se abriu e o vento levou as fotos das
instruções para o café.
Subitamente Nicholas tomou Blanka em seus braços e repousou sua testa no
ombro dela. Pareceu incrivelmente bom tê-lo tão perto. — Tenho que te dizer
outra coisa. — ele disse. — Eu não acho que esteja morto.
7 Na neuropsicologia, Engramas é uma forma como as memórias são hipoteticamente guardadas devido
a mudanças biofísicas ou bioquímicas no cérebro.
180
— Pare! — Blanka suplicou. Virou a cabeça e olhou nos olhos de Nicholas.
— Eu o toquei, ele não se moveu. Não deu sinal de vida.
A voz Nicholas ficou ainda mais silenciosa. — Ele se foi. Quando a luz
acendeu, ele não estava deitado onde tinha caído. Talvez ele estivesse apenas
ferido e inconsciente.
— Mesmo se ele não estivesse no mesmo lugar, o que isto provaria? Os
outros o arrastaram. Ou quando você quis olhar o corpo algo o bloqueou. Depois de
tudo, nós não sabíamos em que lugar do quarto nós estávamos.
Ela podia sentir que seus braços, ainda a seguravam, quando começou a
relaxar.
— Você provavelmente está certa. — ele disse. — Mas eu continuo
pensando sobre isso. Havia outras saídas, não é?
— Eu não sei dizer, Nicholas. A planta baixa apenas mostrava a velha seção
do prédio subterrâneo.
— Mas se haviam… outras saídas. Você percebe o que isto significaria para
nós?
Blanka olhou para suas mãos e lutou contra a sensação de terra firme, que
ela tinha acabado de pisar, estava começando a tremer novamente.
Por um longo tempo ficaram sentados em silêncio, ambos escutando os ecos
de suas próprias histórias.
Três cadáveres foram identificados até agora, — o jornalista da televisão
falou para a câmera. Marie-Claire Lalonde, a diretora da Escola Internacional
Europa, José Almán, o presidente do conselho da Fundação Maddalina de Trenta, e o
Doutor Wolfgang Polnoga, Prefeito da cidade. Mas outros mestres da escola e
professores da universidade são suspeitos de serem membros do assim chamado,
suposto culto.
— Oi! — alguém chamou os dois, — Eu posso lhes fazer algumas perguntas?
Assustados, olharam para cima.
181
Um jovem rapaz estava parado em frente a eles segurando um microfone. —
Eu sou do Attempto e estou fazendo uma matéria sobre o caso Maddalina de
Trenta. O que vocês acham...
— Nada, — disse Blanka, puxando Nicholas de sua cadeira. — Nós não
somos daqui.
182
Epílogo
Vermelho! Acordou tremendo. Por seu corpo inteiro sentia medo, medo
que estava rastejando por entre seus membros deixando uma trilha pegajosa,
como um grupo de lesmas que já haviam sido comidas e nas quais ainda sonhava
algumas vezes. Com uma sacudida levantou sua cabeça e aspirou o ar. Olhando
para os machucados coloridos, cem tipos diferentes de verde, marrom, e preto
úmido na tão resplandecente luz na entrada da caverna. E de novo e de novo o
vermelho de seus pensamentos, o ardente vermelho quente, vibrante coisa no qual
havia fugido. As vozes e barulhos, e resmungos de pensamentos medonhos que o
inundaram. Em sua memória eles se tornaram tão barulhentos que ele rugiu de
medo. Expôs seus dentes e engatinhou mais para dentro da caverna para seu
refúgio. A caverna cheirava a musgo e casca de árvore, e em suas pedras se sentia
bem, familiar e seguro. Seus ferimentos recentes, agarrados pelos dentes afiados e
fortes dos Outros, estava doendo. E então ali estava outra imagem. Venha! dizia a
gentil voz. Havia perdido ela, mas em algum lugar, na distante sombra de seus
próprios pensamentos, sentiu sua gentil presença, bem próximo. Consolado, fechou
os olhos e esperou.
Não era muito mais tarde, quando as cores fortes se tornaram em
confortáveis sombras acinzentados, rastejou para fora, encolhendo-se de medo. O
ar em torno de si movia como se estivesse vivo e gritou de angústia. Mas então
farejou o ar e ousou dar o primeiro passo. À distância, o silêncio era assustador, e
ainda algo começou a se mover. Ninguém chamou de volta, ninguém estava lá para
orientar ou conduzir adiante. Nenhum pensamento perturbou sua paz. Apenas as
sombras e a grande quantidade de cheiros familiares, sedutores e horríveis vieram
na mesma hora. Seus passos se tornaram mais rápidos. Leve, levemente pequenos
arbustos, como pêlo molhado, correram por baixo de seus pés. Seu coração batia
loucamente, mesmo assim não se sentia mais cansado, apenas uma estranha
intoxicação flamejante. O restante de medo que sentira havia desaparecido, e a dor
que sentira estava apenas pulsando vagarosamente, como uma memória turva. A
distância o perfurou como uma gentil mão a caminho do chão.
E então correu.
Correu.
183
Fim...
Tradução
Josy
Thays
Dani
Nichole
Josanias
Anna
Kinha
Revisão
Hay Nichole
Revisão
Final
Kinha
Formatação
Hay Nichole
184
Skoob
http://www.skoob.com.br/usuario/mostrar/155912
Blog
http://traducoesafterdark.blogspot.com/
Comunidade
http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=100455503
"All Creatures of the night get together After Dark"