textos de rabbi yehuda ashlag

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A árvore da vida (do livro de ARI "A árvore da vida" Primeira Parte) Compreendam que antes das emanações serem emanadas e as criaturas criadas A pura luz superior preenchia toda existência, E não havia lacuna, tal como atmosfera vazia, um oco, ou buraco Mas tudo estava preenchido com pura luz, sem limites. E não havia tal parte como cabeça, ou cauda, Mas tudo era pura luz, suave luz, uniforme e igualmente equilibrada, E era chamada Luz Sem Fim. E quando por Sua simples vontade, veio o desejo de criar o mundo e emanar as emanações, Para trazer à luz a perfeição de Seus feitos, Seus nomes, Suas designações Que foram a causa da criação dos mundos, Ele então Se restringiu, no meio, Precisamente no centro, Ele retraiu a luz, E a luz afastou-se para os lados em volta do ponto central. E lá restou um espaço vazio, um vácuo Cercando o ponto central, E a restrição foi uniforme Em volta do ponto central De forma que o espaço O circundava. Então, após a restrição, Tendo formado um vácuo e um espaço, Precisamente no centro da Luz Sem Fim, Formou-se um lugar, Onde os seres emanados e criados pudessem existir. Então da Luz Sem Fim pendeu uma única linha Estendendo-se abaixo nesse espaço E através dessa linha, Ele emanou, formou, Criou todos os mundos. Antes que esses quatro mundos viessem a ser Havia um infinito, um nome, em unidade magnífica e oculta,

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Page 1: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

A árvore da vida(do livro de ARI "A árvore da vida" Primeira Parte)

Compreendam que antes das emanações serem emanadas e as criaturas criadasA pura luz superior preenchia toda existência,

E não havia lacuna, tal como atmosfera vazia, um oco, ou buracoMas tudo estava preenchido com pura luz, sem limites.

E não havia tal parte como cabeça, ou cauda,Mas tudo era pura luz, suave luz, uniforme e igualmente equilibrada,

E era chamada Luz Sem Fim.E quando por Sua simples vontade, veio o desejo de criar o mundo e emanar as

emanações,Para trazer à luz a perfeição de Seus feitos, Seus nomes, Suas designações

Que foram a causa da criação dos mundos,Ele então Se restringiu, no meio,

Precisamente no centro,Ele retraiu a luz,

E a luz afastou-se para os lados em volta do ponto central.E lá restou um espaço vazio, um vácuo

Cercando o ponto central,E a restrição foi uniformeEm volta do ponto central

De forma que o espaçoO circundava.

Então, após a restrição,Tendo formado um vácuo e um espaço,Precisamente no centro da Luz Sem Fim,

Formou-se um lugar,Onde os seres emanados e criados pudessem existir.

Então da Luz Sem Fim pendeu uma única linhaEstendendo-se abaixo nesse espaço

E através dessa linha, Ele emanou, formou,Criou todos os mundos.

Antes que esses quatro mundos viessem a serHavia um infinito, um nome, em unidade magnífica e oculta,

Que mesmo os anjos mais próximos ao Sem Fim não são capazes de atingirPorque não há mente capaz de percebê-Lo,

Pois Ele não tem lugar, nem limite, nem nome.

Autor: Rabbi Ytzhak LuriaTradução para o inglês: Luiz Oliveira

Page 2: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

Não há ninguém além do Criador

Está escrito que "não há ninguém além do Criador", o que significa que não há nenhum poder no mundo capaz de fazer alguma coisa contra Sua Vontade.

E se o homem vê que há coisas neste mundo, que negam o domínio do Alto, é porque Ele quer assim.

E considera-se uma correção, chamada "a esquerda rejeita e a direita acrescenta", significando que aquilo que o lado esquerdo rejeita é considerado uma correção. Isso significa que há coisas no mundo, que por princípio estão destinadas a desviar a pessoa do caminho correto, e mantê-la distanciada da santidade.

O benefício dessas rejeições é que através delas a pessoa recebe a real necessidade e um completo desejo pela ajuda de Deus, pois vê que de outra forma está perdida.

Não apenas ela não progride em seu trabalho, como vê ainda que regride, e que lhe falta a força para sequer observar a Torá e as Mitzvot, mesmo que não seja em Seu nome. Porque somente se superar genuinamente todos os obstáculos, acima da razão, ela pode observar a Torá e as Mitzvot.

Mas nem sempre ela tem a força para ir acima da razão, porque se ocorresse o contrário, Deus proíba, ela seria forçada a se desviar do caminho do Criador, e não agir pelo Seu nome.

A pessoa sempre sentiu que o fragmento é maior que o total, o que significa que há mais descidas que ascensões. Ela não vê uma finalidade para esses apuros, e sempre se sente excluída da santidade, porque vê que é difícil para ela observar até mesmo uma insignificância, se não agir acima da razão, mas nem sempre ela é capaz de agir assim. E qual será o fim de tudo isso?

Então essa pessoa entende que ninguém pode ajudá-la, a não ser o próprio Deus. Isso faz com que ela dirija um pedido sincero ao Criador para que abra seus olhos e coração, e a aproxime da eterna adesão a Deus. Ela compreende, então, que todas as rejeições que ela experimentou vieram do Criador.

Isso significa que as rejeições que ela experimentou não aconteceram por sua culpa, ou por que não era capaz de prosseguir, mas sim porque essas rejeições são para aqueles que verdadeiramente querem se aproximar de Deus. E para que essa pessoa não se satisfaça com apenas um pouco, mais precisamente, para que não permaneça como uma criança sem conhecimento, ela recebe ajuda do Alto, de modo a que não seja capaz de dizer que "graças a Deus, ela observa a Torá e pratica boas ações, e portanto, o que mais ela poderia pedir?"

Só se essa pessoa tiver um verdadeiro desejo, ela receberá ajuda do Alto. E lhe são mostradas constantemente as suas faltas no estado presente, isto é, são-lhe enviados pensamentos e opiniões que trabalham contra seus esforços. Isto é para que ela veja que ela não está unificada a Deus. E quanto mais ela supera, mais percebe o quão longe da santidade ela se encontra, por comparação aos outros, que se sentem unificados a Deus.

Mas essa pessoa, por outro lado, sempre tem suas queixas e exigências, e não consegue justificar o comportamento do Criador, nem o modo como Ele age com relação a ela. E isso vai lhe provocando dor, porque ela não se sente unificada ao Senhor, até que chegue a sentir que não tem participação nenhuma na santidade.

Page 3: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

E embora ela seja ocasionalmente despertada pelo Alto, e isso momentaneamente a reavive, logo ela cai novamente em um abismo. Porém, é isso que lhe faz compreender que somente Deus pode ajudar e realmente atraí-la para mais perto.

A pessoa sempre deve tentar se aproximar do Criador, isto é: tentar fazer com que todos os seus pensamentos se refiram a Ele. Isso quer dizer que mesmo que ela esteja no pior estado, do qual não possa haver uma grande queda, ela não deve abandonar Seu domínio, isto é, não deve pensar que há outra autoridade que o afaste de entrar na santidade, e que tenha o poder de beneficiar ou ferir.

Portanto a pessoa não deve pensar que é o poder do Outro Lado (sitra achrah), que não lhe permite praticar boas ações e seguir os caminhos de Deus, mas sim, que tudo isso é determinado pelo Criador.

Como dizia o Baal Shem Tov, aquele que afirmar que há outro poder no mundo, isto é, conchas, está num estado em que "serve a outros deuses", ainda que não pense, necessariamente, em cometer o pecado da heresia; mas se ele pensa que há outra autoridade e força, que não o Criador, desse modo ele está cometendo um pecado.

Além disso, aquele que diz que o homem tem sua própria autoridade, ou seja, aquele que diz que ontem ele mesmo não quis seguir os caminhos de Deus, esse também se considera como tendo cometido o pecado de heresia. Isso significa que ele não acredita que somente o Criador conduz o mundo.

Quando a pessoa comete um pecado, certamente deve se lamentar por isto e se arrepender por tê-lo cometido, mas aqui também nós devemos colocar a dor e a lástima na ordem correta: aquilo a que ela atribuir a causa do pecado, é nesse ponto que ela deve se arrepender.

A pessoa então deve se arrepender e dizer: "eu cometi esse pecado porque o Criador me lançou abaixo da santidade, em um lugar imundo, no lavatório, onde está a imundície". Isso é o mesmo que dizer que o Criador lhe deu um desejo e um apetite por se divertir e respirar o ar de um lugar mal-cheiroso. (E também se pode dizer, como está nos livros, que às vezes o homem encarna no corpo de um porco, e então ele recebe um desejo e o apetite por manter-se com coisas que ele já teria decidido que eram lixos, mas agora ele novamente quer se reavivar com elas).

E também, quando a pessoa sente que está em um estado de ascensão, e sente algum prazer no trabalho, ela não deve dizer: "agora eu estou em um estado em que compreendo que é valioso servir a Deus". Melhor seria que soubesse que agora o Senhor a notou, e por isso a atraiu para Si, o que é a razão pela qual ela sente prazer no trabalho. Ela deve tomar o cuidado de nunca abandonar o domínio da santidade, nem dizer que há outra força operando, além do Criador. (Mas isso significa que a questão de encontrar favor aos olhos do Senhor, ou o oposto, não depende do homem, mas sim, que tudo depende de Deus. E o homem com sua mente superficial não consegue compreender por que o Senhor agora gosta dele e após, não gostará).

E igualmente quando a pessoa lamenta que o Criador não a traz para perto, ela também deveria ter cuidado para não se queixar por ter sido distanciada do Criador, pois fazendo assim ela se torna um recipiente para seu próprio benefício, e aquele que recebe é separado do Criador. Melhor seria que ela lamentasse o exílio da Presença Divina, isto é, por infligir tristeza à Presença divina.

Page 4: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

A pessoa deveria tomar como exemplo a ocasião em que algum pequeno órgão está dolorido. A dor é sentida principalmente no coração e na mente, que são a generalidade do homem. E certamente a sensação de um simples órgão não se assemelha à sensação da completa estatura da pessoa, onde a maior parte da dor é sentida.

Igualmente é a dor que a pessoa sente quando ela é distanciada do Senhor, já que o homem é apenas um órgão da Presença Divina, pois a Presença Divina é a alma de Israel em geral. Assim a sensação de um simples órgão não se assemelha à sensação da dor em geral. Isso significa que a Presença Divina lamenta que haja partes dela mesma que estejam distanciadas, e que ela não pode ajudar. (E esse pode ser o significado das palavras: "quando o homem lamenta, a Presença Divina diz: isto está mais leve que a minha cabeça"). E se o homem não relaciona a ele mesmo a tristeza de estar distanciado de Deus, ele é salvo de cair na armadilha do desejo de receber para si mesmo, que é a separação da santidade.

O mesmo se aplica quando alguém se sente um tanto mais próximo da santidade. Quando ele está feliz de ter merecido favor aos olhos do Senhor, ele precisa dizer que o centro de sua alegria é que agora há alegria na Presença Divina, por ter conseguido trazer seu próprio órgão para mais perto, e não rejeitá-lo.

E o homem se alegra por ter sido dotado com a capacidade de agradar à Presença Divina. Do mesmo modo, a alegria que um indivíduo sente, é apenas uma parte da alegria que o total sente. E através desses cálculos ele perde seu individualismo, e evita cair na armadilha do Outro Lado, que é o desejo de receber para si mesmo.

Todavia, o desejo de receber é necessário, pois é isso o que constitui uma pessoa, e nada existe numa pessoa além do desejo de receber que lhe é atribuído pelo Criador. De qualquer forma, o desejo de receber prazer deve ser corrigido para adquirir a forma de doação.

Isso quer dizer que o prazer e a alegria, sentidos pelo desejo de receber, devem ter a intenção de transmitir contentamento ao Alto, em razão do prazer que acontece abaixo. Pois esse foi o propósito da criação, de beneficiar Suas criações. E isso é chamado à alegria da Presença Divina acima.

Por essa razão, o homem deve buscar conselho sobre como ele pode causar contentamento acima. E certamente, se ele recebe prazer, o contentamento será sentido acima. Assim, ele deve ansiar por estar sempre no palácio do Rei, e por ter a capacidade de lidar com os tesouros do Rei. E isso certamente causará contentamento acima. Conclui-se que seu inteiro anseio deve ser em prol do Criador.

Autor: Rabbi Baruch AshlagTradução para o inglês: Luiz Oliveira e Eduardo Franco

Como sair das quedasMensagem enviada pelo Rav aos estudantes (grupo internacional):

O estado de “queda” e como sair deleEm todos os seus artigos o Rabash escreve que a coisa mais importante é criar um

estado, em que a grandeza do Criador seja a coisa mais importante do mundo para nós.

Page 5: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

No momento em que algo exterior entra em nossos pensamentos e desejos, nós precisamos imediatamente controlar todos os pensamentos e desejos (que nos são enviados) do nosso próprio modo, voltando-nos para a imaginação da grandeza do Criador, Sua singularidade, a conexão com Ele, e Suas ações.

Em qualquer situação na vida, imediatamente nós precisamos dizer: “Veja o que o Criador está fazendo comigo”, de modo a restaurar a conexão com o Um, com Aquele que está fazendo isto.

O que nos acontece é similar a um aprendizado e treinamento. Às vezes parece à pessoa que isto é assim: que é o fim do mundo, que não há saída, que o mundo ao redor é tão triste. Mas depois, aprendendo e praticando, nós vemos que não é assim, que são apenas exercícios, dados a nós pelo Alto, e que esses exercícios são muito específicos e totalmente justos. Nós só conseguimos compreender isto após algum tempo, e só então nós conseguimos avaliar o quanto era necessário esse treinamento, no nível que precede a correção.

Assim, tanto quanto possível, nós precisamos manter nosso caminho, apegando-nos constantemente ao Propósito para nosso avanço, mantendo nossa cabeça erguida. Se alguém recebe condições tais, em que ele vê que está indo para o fogo e não há nada que possa fazer quanto a isto, então isto é dado para que a pessoa compreenda que ela não é o mestre em coisa alguma.

Tais condições não podem ser evitadas, nem há como escapar delas, mas podem ser abreviadas, de modo que passem rápido e menos dolorosamente. Por isso nós devemos nos voltar para o grupo, para os amigos, para o trabalho comum, para estudar mais, ler e fazer tudo o que seja possível.

Se alguém deixa de sentir o Criador, isso não significa que esteja no estado de declínio. A pessoa precisa voltar-se ao livro, ao trabalho, ao grupo, e após algum tempo ela verá a melhora. Mas cada estado deve ser percebido como uma ascensão ao próximo nível.

Se estiver na época da alma se corrigir, isto não pode ser evitado. Cada tentativa de escapar prolongará o sofrimento.

No declínio, a pessoa se identifica com o desejo de receber. Ela não sente o que faz, ela está imersa nesse desejo de receber, e este, está no completo controle. O poder do desejo de receber é simplesmente quando a pessoa e seu egoísmo, o desejo de receber, tornam-se uma única coisa. (Então) ela não pode nem mesmo sentir que isto é o desejo de receber; não compreende que isto é mau.

Um segundo de mal-estar, numa má condição, significa culpar o Criador pelo que Ele faz comigo e ao mundo à minha volta. Isso empurra a pessoa para longe do Criador, impede que ela entre no Mundo Superior. Vocês precisam fazer qualquer coisa para mudar sua atitude quanto a isto.

Está absolutamente errado esperar até cair completamente, de modo que mais tarde, possamos começar a subir. Esse é o caminho do sofrimento: esperar e sofrer! O caminho da Cabala é imediatamente, assim que você sentir que não está na conexão mais próxima possível com o Criador, definir essa condição como declínio e fazer todos os esforços para ascender.

Page 6: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

É necessário agarrar imediatamente a possibilidade de ascensão; não é necessário permanecer em declínio por mais do que um segundo. No momento em que eu começo a experimentar a separação, mesmo uma porção minúscula, eu devo me reconectar imediatamente, e essa conexão será mais forte do que antes. As quedas não devem durar mais do que um segundo. Como dizia o Rabbi Zusha: ele tinha quatrocentas ascensões e quedas em dez minutos.

Vamos presumir que uma pessoa esteja num mau estado. Depois de chegar em casa, e sentir-se triste, vazio, aborrecido, aí é que começam todas as tarefas. O que fazer? Comece a sorrir, e a ação seguirá a mudança no pensamento e na intenção – você vai ver.

Comece a sorrir contra a sua vontade. Comece a dançar. Meu Professor costumava dançar. Ele costumava entrar nesses estados... Eu testemunhei isto; eu não podia acreditar que um Cabalista fosse pensar em algo semelhante: há ocasiões em que ele não conseguia se levantar, mover um dedo. Ele se trancava numa sala e começava a dançar. Ele sabia dançar? Ele pulava no mesmo lugar – isso é uma dança? E assim ele saía desses estados. Por isso eu digo: sorriam. Comecem sorrindo, e seus pensamentos mudarão. Nós fazíamos esses exercícios com ele.

O que mais nos ajudava? Feche seus olhos. Você está se sentindo mal neste mundo; você não quer olhar para isso? Feche seus olhos. Mantenha seus olhos fechados por mais ou menos cinco, ou dez minutos. Quando você abrir os olhos, você verá que não há nada mal, afinal de contas. Por que? Um novo desejo apareceu, você compreendeu que você precisa de algo, que algo está faltando. Você mudou o desejo, você fez seu corpo pensar sobre mudar de desejo.

Você começou a ver, e você não via, antes. E você recebeu uma imagem completamente diferente. Quando a pessoa está sozinha, é possível forçar a si mesma a sair de condições que tais, por meios puramente psicológicos. Praticar esportes, nadar, qualquer coisa que você possa imaginar. Não permaneça num mau estado, nem mesmo por um minuto. Mas o meio mais eficaz é, definitivamente, o ambiente. Mude o ambiente.

Não esqueçam nem por um momento que a queda é necessária para a futura ascensão, e o desejo de receber aumenta para que possamos ir além dele. Vocês não podem ascender (elevar-se) a menos que primeiro caiam no nível mais baixo. E quando nós caímos nesse nível, nós percebemos que isso é um estado de espírito (a mood drop...), e que (esse nível) está totalmente sob o poder do desejo de receber.

É necessário sairmos desse estado de espírito decadente, abandonar os pensamentos que nos confundem e nos empurram para a separação – dizer a nós mesmos que nós não estamos sozinhos, e conectarmo-nos com o grupo, com os pensamentos do grupo; doarmo-nos ao grupo novamente, dedicarmo-nos ao grupo. Ou desligar nossa mente e começar a fazer algum trabalho pelo grupo: publicação de livros, disseminação, qualquer coisa, não importa o quê exatamente, há muito trabalho a ser feito. Faça isso sem pensar, como se você não sentisse nada, como se você tivesse tomado uma pílula que eliminasse a dor, que desligasse a sua mente. E fazendo assim, é possível sair desse estado rapidamente.

Não resmunguem para si mesmos, não se aprofundem nisto, e não permitam pensamentos críticos sobre esse assunto, nem analisem essas condições, que não têm nada a ver com o espiritual.

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Autumn Congress 2003, Lesson of October 17

Em qualquer momento em que a pessoa sinta o mal, ele ou ela não avança, mas ao contrário, sobrecarrega-se, empurra-se para baixo. Desse modo, a pessoa desperdiça tempo e prolonga seu caminho. Nada de bom resulta disso. Se em vez de uma auto-análise sobre quem você é, o quanto você é mau etc., você puder tomar um drink com os amigos, fazer um lanche, e falar sobre o Propósito pelo menos um pouco (sobre quem você é, para o quê você existe), isso é muito mais eficaz que todos os seus sofrimentos, para não dizer mais agradável. Não esqueça isso.

(Spring Congress 2004, Lesson on April 8, "The Giving of Torah") Quando uma pessoa cai, ela pára de sentir o Criador, Seu governo. A pessoa

mergulha em sensações do que acontece com ela e com seu desejo de receber, em seu Kli de recepção. Então ela somente pode ser curada do mesmo modo que uma pessoa doente, quando outros tomam conta dela. Assim, se uma pessoa não está conectada ao Criador, somente as pessoas à sua volta podem tirá-la de sua condição de “morta”. As pessoas em volta podem dar à “pessoa doente” meios que a ajudem a tornar-se “saudável”, e recuperar a conexão com o Criador.

O Rabash sempre disse que a diferença entre uma pessoa e um grupo é imensa. Para sair da queda ela deve trancar-se na sala, dançar e cantar ali. E é isso que o grande Cabalista costumava fazer – mesmo que as quedas pudessem ser muito profundas. Foi assim que o Rabbi Shimon caiu no estado chamado “Shimon do mercado”.

O grupo tem uma grande vantagem – ele nunca fica caído. É como participar de um círculo. Todos estão pulando para cima e para baixo – um está pulando para cima, o outro está descendo, e então vice-versa. Juntos, eles mantêm o nível comum que pode crescer constantemente. Quedas acontecem, mas são imediatamente compensadas pelas ascensões. Você está incluído em mim, eu estou incluído em você, e todos nós estamos no estado em que é vantajoso que cada um possa receber uma queda por um segundo e imediatamente obter ajuda dos outros.

Spring Congress 2003, Lesson on October 17.

Nós já dissemos que “um prisioneiro não se liberta da prisão sozinho”. Para que mais eu precisaria de um grupo, senão para me ajudar num momento difícil? A verdade é: eu não sou um herói. O grupo entra em cena em momentos assim – quando estamos caídos no chão. Então meus amigos precisam se aproximar de mim, me empurrar para fora, forçar-me, fazer-me voltar ao estudo, ou me trazer fisicamente para as aulas – em geral, fazer tudo que seja possível para me sacudir, me pressionar, até que esse período em mim tenha acabado. Eles não devem me excluir; eles precisam esperar até que isso passe. É muito simples. Em regra, o que puxa a pessoa de volta é um estudo intensivo, nem mesmo de artigos ou cartas, mas TES.

Quando uma pessoa está em ascensão, ela se empenha na circulação, mas quando ela está em queda, ela não é capaz disso. Mas o que faz a pessoa em seu trabalho normal, nas épocas de ascensões ou quedas? Ela continua a trabalhar? O mesmo se aplica aqui: a pessoa deve continuar seu trabalho. Ninguém lhe diz para pôr seu coração, sua alma nisso, para trabalhar além de seu próprio desejo. Ela precisa trabalhar usando suas mãos e

Page 8: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

pernas. Sua cabeça. Mecanicamente. Uma organização bem estruturada tem a vantagem de rapidamente tirar a pessoa de uma queda, e isso é porque a pessoa tem que realizar algum trabalho ali.

A essência de uma organização bem estruturada é que cada pessoa, segundo suas habilidades, tempo, energia etc. esteja no lugar (cargo) em que ela possa promover circulação com mais eficácia. Fazendo assim, ela está se desenvolvendo do modo mais eficaz.

É o Criador que dá à pessoa as quedas e ascensões. Ele também precisa ajudar a pessoa a (lidar) com isso. Não importa em que espécie de estado meus amigos estejam. Isso não me impede de estar alerta. Como se eu estivesse no pelotão de ataque, eu preciso me preocupar somente com uma coisa: como salvar a todos. Outros cálculos se apresentam aqui – mas este, vem primeiro. Se eu começar a conferir os estados e propriedades dos outros, eu abandono aquilo de que fui incumbido.

Morning lesson, October 25, 2004.

Como ajudar um amigo em declínio? 1. Pense nele e peça (ao Criador) por sua recuperação. 2. Escreva a ele sobre suas tentativas de cuidar dele. 3. Peça que ele responda às suas questões sobre estudo ou outros problemas; procure interessá-lo em alguma coisa, mostra a ele que você precisa da sua ajuda. 4. Dirija-se a ele; descreva para ele a grandeza do atributo de doação e a inferioridade de nosso estado atual; diga a ele que não há ninguém mais feliz na Terra do que uma pessoa que se liberta do pensamento sobre si mesma. 5. Descreva para ele o quanto você aprecia sua contribuição para o grupo. 6. Certifique-se de que cada pessoa sempre tenha uma responsabilidade no grupo (escrever, traduzir, ou outros tipos e trabalho; preferivelmente deve ser uma tarefa de responsabilidade, da qual os outros membros do grupo dependam). 7. Pense menos em si mesmo. Boa sorte.

Autumn Congress, October 1, 2004 "Particular Governance of the Creator"

Não devemos aceitar a indiferença e o pesar, que nós recebemos com o propósito de que possamos compreender ainda melhor a importância do Propósito de dEle, na direção de Quem nós estamos indo. Isso é feito deliberadamente pelo Alto. Mais além, isso acontece de acordo com a lei que funciona entre aqueles que se amam: um deles quer ver se o outro o ama, e então age como se distanciasse, de modo a permitir ao outro que se aproxime, que expresse o seu amor. Sem obstáculos, sem a distância, a direção do estado de paixão não pode se desenvolver e crescer.

Nós recebemos o fardo e a indiferença como uma oportunidade de aumentar nossa paixão pelo espiritual. Se nós os aceitarmos, isso significa que nós não usamos a oportunidade que nos foi dada. De que outro modo nós poderíamos avançar? Assim, “tudo o que estiver em suas mãos e em seu poder de fazer, faça!” – apenas não aceite esses estados.

Morning Lesson, October 25, 2004.

Se alguém não sentir sua responsabilidade com relação a todos os demais, ela não terá a força para vencer todas as circunstâncias e obstáculos que se agravam. Somente se

Page 9: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

a pessoa compreende que, por não vencer (essas circunstâncias), ela faz com que todos os outros caiam; somente se ela não quiser isto, porque ela já experimenta um pouco do despertar; (somente se ela sentir) a responsabilidade por cooperar na garantia mútua com todos os demais – (somente por causa) desse sentimento ela receberá ajuda do Alto, que a cada ocasião, vai alterar seu estado. A pessoa receberá um despertar, uma mudança do Alto, somente se ela pensar sobre sua responsabilidade com relação ao grupo. Disso, ela extrairá forças.

Morning Lesson, October 25, 2004.

Onde quer que eu esteja, para onde quer que eu fuja como uma criança, guiada por toda espécie de desejos que despertam em mim a toda hora, o grupo pode me controlar e me dirigir constantemente. Nenhuma outra força pode sustentar uma pessoa. O grupo é como Ima Ilaya (a Mãe Superior), que eu construo. Estou construindo o Superior – este é o propósito. O propósito é atingir o Criador – construir a unidade das almas, o Kli para alcançar o propósito, e o Kli que recebe o propósito.

Respostas

Quando o homem observa objetivamente as situações à sua volta e a condição humana, ele obtém uma verdadeira apreciação da criação. A existência do Criador tem implicações para nós, segundo os Cabalistas, que realizaram a capacidade inerente de se comunicar diretamente com Ele, e se Ele controla tudo e criou as situações da vida em que nos encontramos constantemente, então a coisa mais sensata a fazer é estarmos permanentemente unidos a Ele, e quanto mais perto, melhor.

Mas se tentarmos mesmo e tivermos sucesso nesse feito, então, já que o Criador está oculto de nossas percepções, sentiremos como se estivéssemos suspensos no ar, sem nenhum suporte. Pois sem ver, sentir, ou ouvir, sem nenhum impulso sensorial, estaríamos como antes, gritando na selva.

Por que, então, o Criador nos fez de um modo que não podemos percebê-Lo? E ainda, por que Ele se esconde de nós? Por que, mesmo quando o homem apela a Ele, Ele não responde, mas prefere nos afetar de um modo oculto, velado por trás da natureza e de outras pessoas?

Se ele quisesse nos corrigir, isto é, corrigir Seu próprio “erro” na criação, ele teria feito isso há muito tempo, abertamente ou não. Se ele Se revelasse a nós, nós todos O veríamos e apreciaríamos com os sentidos e a inteligência com que Ele nos dotou, e certamente, então poderíamos saber o que fazer e como fazer no mundo que Ele criou, supostamente para nós.

E mais ainda, paradoxalmente, assim que o homem se esforça para atingir o Criador, para senti-Lo, para se aproximar Dele, ele sente seu anseio pelo Criador sumir, desaparecer. Mas, se o Criador nos dá todas as nossas experiências, por que Ele despreza aqueles que querem percebê-Lo com toda a vontade, e até mesmo coloca vários obstáculos em seu caminho de tentativas de perceber seu Criador?

As tentativas do homem de se aproximar do Criador, e a recusa do Criador, e a Sua imposição de sofrimentos sobre aqueles que O procuram, podem continuar por anos!

Page 10: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

Ocasionalmente, no auge do desespero, a pessoa pode sentir que o orgulho e a arrogância de que segundo lhe disseram, ela deveria se livrar, são infinitamente mais características do Criador!

Ao contrário da afirmação de que o Criador é piedoso, especialmente com aqueles que O procuram, o homem não recebe resposta às suas lágrimas e apelos. Se nós podemos mudar algo em nossas vidas, isso significa que Ele nos deu livre escolha, mas não, conhecimento suficiente para evitar os sofrimentos de nossa existência e desenvolvimento.

E se não há livre escolha, o que então pode ser mais cruel do que nos fazer sofrer insensivelmente por décadas no mundo cruel que Ele criou? É claro, essas tristezas podem prosseguir indefinidamente, pois se o Criador é a causa de nossa condição, nós temos muito a criticar e a culpá-Lo, o que nosso coração faz, se ele sente desse modo.

Pois se o homem está descontente com alguma coisa, ele culpa o Criador apenas se sentindo desse modo, mesmo que não se dirija a Ele de fato, mesmo se ele não acredita na existência do Criador: pois o Criador vê tudo o que se passa no coração do homem.

Cada um de nós tem razão no que mantém, seja o que for, porque mantemos aquilo que estamos percebendo no momento, com nossos sentidos, e analisando com nossa própria inteligência. Aqueles que têm vasta experiência de vida sabem o quão drasticamente seus pontos de vista mudaram ao longo dos anos.

Não se diga que estávamos errados antes e agora estamos certos, porque nosso ponto de vista atual também está errado, como veremos amanhã. Assim, as conclusões que tomamos em qualquer situação são corretas para essa situação em particular, mesmo que estejam em direta oposição a nossas conclusões, tiradas em outras situações.

Pelos mesmos sinais, não podemos raciocinar sobre outros mundos, ou suas leis, ou julgá-los tendo por base nossos critérios usuais – os critérios de nosso mundo. Nós não possuímos inteligência sobrenatural, ou percepções, ou conceitos, e assim não podemos julgar e emitir julgamento, pois erramos constantemente mesmo dentro dos limites de nosso próprio mundo.

Somente aquele que possui qualidades sobrenaturais pode julgar o sobrenatural. Se ao mesmo tempo ele também possui qualidades terrenas, ele pode ao menos descrever o sobrenatural para nós. Tal pessoa somente pode ser um Cabalista – uma pessoa de nosso mundo, criada com as mesmas qualidades que cada um de nós, mas simultaneamente dotada pelos céus com outras qualidades que o capacitam a nos falar sobre o que está acontecendo nesse outro mundo.

É por isso que o Criador permitiu a alguns dos Cabalistas que revelassem seu conhecimento para uma vasta camada da sociedade, de modo a ajudar os outros a aprender como se comunicar com Ele. Os Cabalistas nos explicam, em termos que podemos compreender, que a estrutura e o funcionamento da mente no mundo espiritual, sobrenatural, são baseados em leis contrárias às nossas.

Não há muro separando nosso mundo do mundo sobrenatural, espiritual. Mas o fato de que o mundo espiritual é, conforme suas propriedades, um anti-mundo, o coloca muito além de nossa percepção, pois desde que nascemos em nosso mundo, isto é, adquirimos sua natureza, esquecemos completamente tudo sobre nossa anti-condição passada. Naturalmente, o único caminho para o homem perceber esse anti-mundo é adquirir sua

Page 11: Textos de Rabbi Yehuda Ashlag

natureza, sua razão, suas qualidades. Como e em que precisamos mudar nossa natureza para a oposta?

A lei básica do mundo espiritual é o absoluto altruísmo. Como o homem pode adquirir essa qualidade? Os Cabalistas sugerem que nós façamos uma transformação dentro de nós mesmos. Somente esse ato interno pode tornar o homem capaz de perceber o mundo espiritual e começar a viver em ambos os mundos. Esse ato é chamado “fé acima da razão”.

Em nosso mundo nós somos guiados apenas por nossa razão em tudo o que fazemos. Somente a razão, isto é, o cálculo puramente egocêntrico, “razoável”, constitui a base de todos os nossos desejos e ações. Nossa razão calcula a quantidade de prazer que experimentamos e compara essa quantidade com a quantidade de sofrimento causada pelos esforços feitos para atingir aquele prazer; subtrai uma da outra e produz o resultado desejado: se devemos nos esforçar na direção do prazer o preferir a paz. Essa aproximação “razoável” do ambiente é chamada “fé conforme a razão”, quando a razão determina a fé.

Freqüentemente o homem age sem nenhum cálculo do benefício ou do esforço, como por exemplo um fanático, ou uma pessoa condicionada a agir de determinada forma. Tais atos “cegos” são chamados “fé abaixo da razão”, pois eles são determinados pela obediência cega a decisões tomadas por outra pessoa, em vez da razão ou do cálculo. Ou ainda, os atos do homem são ditados por sua educação, que se tornou sua segunda natureza, a um tal ponto, que ele tem que fazer um esforço para evitar agir do modo como foi condicionado, e assim age automaticamente pela força do hábito. Cada um de nós faz muitas coisas por uma razão similar.

O mundo espiritual é um mundo altruísta. Todos os desejos e atos que existem lá são ditados não pela razão do homem, ou o egocentrismo, mas pela fé, isto é, pelo sentimento do Criador.

A transição do viver de acordo com as leis de nosso mundo para o viver de acordo com as leis do mundo espiritual requer o encontro de duas condições. Desprezando completamente os argumentos da razão, o homem se encontra, como antes, desprovido de base para as suas ações, sentindo falta de qualquer apoio. Suspenso no ar, ele se agarra ao Criador com ambas as mãos – somente o Criador determinará suas ações. Por assim dizer, o homem substitui sua própria cabeça pela do Criador, e age contrariamente à sua própria razão; ele coloca o desejo do Criador acima do seu. É por isso que seu comportamento é chamado “fé acima da razão”.

Tendo cumprido isto, o homem começa a perceber tanto o nosso mundo quanto o espiritual, e descobre que ambos funcionam de acordo com a mesma lei espiritual da “fé acima da razão”.

Esse desejo por parte do homem, de suprimir sua razão e ser guiado apenas por seu desejo de se doar ao Criador, é o vaso espiritual no qual ele recebe todas as sensações e realizações espirituais. A “capacidade” desse vaso, isto é, a capacidade da razão espiritual do homem, é determinada pela capacidade dessa razão terrena, egocêntrica que ele está tentando suprimir.

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Parta aumentar a capacidade do vaso espiritual humano, o Criador gera constantemente obstáculos cada vez maiores no caminho da “fé acima da razão”, intensificando gradualmente seus desejos egocêntricos e dúvidas acerca do domínio do Criador. Isso permite ao homem vencer gradualmente esses obstáculos, e então desenvolver desejos altruístas cada vez mais poderosos, aumentando a capacidade de seu vaso espiritual e percebendo cada vez melhor o Criador, no mundo de sua semelhança com Ele.

Se o homem pode agarrar mentalmente o Criador com ambas as mãos, isto é, ignorando a abordagem crítica da razão e se regozijando com o fato de que tal oportunidade tenha se apresentado, e se ele consegue suportar essa condição ainda que seja por um instante, ele verá o quão maravilhoso é esse estado, pois é nesse estado que ele terá atingido a verdade real e eterna, que não mudará amanhã, como suas crenças anteriores mudaram, porque então ele estará unido com o Criador eterno e observará todos os eventos através somente dessa verdade.

Como foi mencionado antes mais de uma vez, o progresso somente é possível através de três linhas paralelas simultaneamente, em que a linha da direita é a fé, e a esquerda o conhecimento e a compreensão. Essas duas linhas estão em disparidade, pois são reciprocamente contraditórias. Assim, o único meio de equilibrá-las mutuamente é uma linha intermediaria, feita ao mesmo tempo das duas outras linhas, a direita e a esquerda, que é a linha daquele comportamento espiritual em que a razão é usada somente de acordo com a força da fé.

Sobre todos os objetos espirituais, na ordem em que foram feitos pelo Criador, pode-se dizer que são compreendidos Nele. Tudo no universo, que está compreendido no Criador, existe somente em relação às criaturas, e tudo isso é produto da criatura original chamada Malchut. Ou seja, todos os mundos e todas as criaturas, tudo, exceto o Criador, é somente uma única criatura – Malchut, chamada a raiz, a fonte de todas as criaturas, que então decresce em muitas partes menores dela mesma.

E todas elas, tomadas em conjunto, são chamadas Sh”chinah. E a luz do Criador, Sua presença, Ele mesmo preenchendo a Sh”chinah, é chamado Shochen.

O tempo necessário para que todas as partes da Sh”chinah sejam completamente preenchidas é chamado o tempo da correção. Durante esse tempo, as criaturas fazem correções em suas partes da Malchut – cada uma na parte respectiva com que foi criada.

E até o momento em que o Criador possa estar completamente unido com as criaturas, isto é, até que ele Se revele inteiramente a elas, até que o Shochen preencha a Sh”chinah, a condição da Sh”chinah, ou as criaturas de que consiste, é chamada o banimento da Sh”chinah (do Criador), pois nessa condição não há perfeição nos mundos superiores; e assim também em nosso mundo, o mais inferior de todos, no qual cada criatura precisa também se tornar totalmente consciente do Criador, embora estejam todos ocupados satisfazendo os pequenos desejos de nosso mundo e seguindo cegamente as exigências de sua própria carne.

E essa condição da alma é chamada Sh”chinah em cinzas, em que todos vêem os prazeres puramente espirituais como invenção ou nonsense, e essa condição é chamada o sofrimento da Sh”chinah.

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Todos os sofrimentos humanos têm origem no fato de que o homem é compelido pelo Alto a rejeitar completamente todo o senso comum e a proceder cegamente, colocando a fé acima da razão.

Quanto mais razão e conhecimento ele possua, quanto mais forte e mais inteligente ele seja, mais difícil será para ele percorrer o caminho da fé, e correspondentemente, piores serão os seus sofrimentos na rejeição do senso comum.

De modo algum, ele, que escolheu esse modo particular de desenvolvimento espiritual, pode concordar com o Criador. Em seu coração ele amaldiçoa a necessidade de um tal caminho e nem por auto-sugestão ele consegue justificar o Criador. E ele não pode suportar tal condição de não ter apoio de nenhuma espécie, até que o Criador o ajude e lhe revele o inteiro quadro da criação.

Quando o homem sente que está em um estado de elevação espiritual, que todos os seus desejos estão focalizados somente no Criador, essa é a melhor época para se aprofundar nos livros apropriados da Cabala, de modo a tentar entender seu significado profundo. Embora ele possa sentir que não consegue entender nada apesar de seus esforços, assim mesmo é necessário se aprofundar na Cabala uma vez após outra, centenas de vezes, e não dar vazão ao desespero, a cada vez que não consegue entender alguma coisa.

O sentido desses empreendimentos está em que os esforços do homem para compreender os mistérios da Cabala são sua prece para que as manifestações do Criador se revelem a ele, para que o Criador satisfaça seus anseios. A força da prece é determinada pela força dos anseios.

Há uma regra: o esforço gasto em atingir alguma coisa aumenta o desejo para atingir essa coisa, e a força desse desejo é determinada pelo sofrimento causado pela indisponibilidade daquilo que desejamos. A prece é o próprio sofrimento, não expresso em palavras mas apenas sentido no coração.

Partindo daí, podemos entender que somente após um esforço extenuante para atingir o que deseja, o homem pode rezar tão sinceramente, que receberá isto.

Se durante suas tentativas de se aprofundar na leitura, o coração da pessoa ainda não está livre de pensamentos externos, então a mente não será capaz de se devotar exclusivamente aos estudos, pois a mente obedece ao coração.

Para que o Criador ouça a prece, ela precisa vir do coração dos corações, isto é, todos os desejos da pessoa precisam estar concentrados nessa prece. E é por isso que é preciso se aprofundar no texto centenas de vezes, mesmo sem entender nada, somente para atingir um verdadeiro desejo, para que o Criador possa ouvi-lo.

O verdadeiro desejo é aquele que não deixa espaço para nenhum outro desejo.Ao mesmo tempo, enquanto estuda a Cabala, a pessoa estuda as ações do Criador e

assim, aproxima-se Dele, e gradualmente torna-se merecedora de compreender aquilo que está estudando.

A fé, isto é, a consciência do Criador, precisa ser tal que a pessoa sinta que está na presença do Rei do universo. Então, sem dúvida, ela será imbuída do necessário sentimento de amor e temor.

Até que ela atinja uma tal fé, a pessoa precisa sempre se esforçar adiante, pois é somente esse sentimento que lhe dará o direito à vida espiritual e evitará que ela afunde

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no egocentrismo, e novamente se torne uma caçadora de prazeres. A necessidade dessa consciência do Criador precisa ser permanente, até que se torne um hábito, como a necessidade permanente do ser amado, que faz a vida sem ele intolerável.

Tudo o que cerca o homem, propositalmente, obscurece essa necessidade, pois experimentar prazer vindo de alguma coisa instantaneamente reduz a dor do vazio espiritual.

Assim, enquanto goza os prazeres de nosso mundo, é vital evitar que esses prazeres obscureçam a necessidade de perceber o Criador e assim, roubem da pessoa as sensações espirituais.

Em geral, a compulsão interna para perceber o Criador é peculiar apenas do homem, e nem mesmo de todos aqueles que têm a aparência externa de homem.

Essa compulsão tem origem na necessidade do homem de entender o que ele é, e de compreender a si mesmo e seu propósito no mundo, a fonte de sua origem. É a busca por respostas sobre nós mesmos que nos leva à compulsão de procurar a fonte da vida.

Essa compulsão faz com que não poupemos esforços para resolver todos os mistérios da natureza, não deixando nenhum mistério sem solução, sejam em nós mesmos, seja em nosso ambiente. Mas apenas o anseio por perceber o Criador é verdadeiro, pois Ele é a fonte de tudo e, acima de tudo, Ele nos criou. Assim, mesmo se o homem estivesse sozinho em nosso mundo, ou estivesse em outros mundos, sua busca por si mesmo ainda assim o levaria à busca pelo Criador.

Há dois caminhos para a percepção da influência do Criador sobre Suas criaturas. O caminho da direita representa o controle pessoal do Criador sobre cada um de nós, independentemente de nossas ações.

O caminho da esquerda representa o controle do Criador sobre cada um de nós, conforme nossas ações, ou em outras palavras, punição pelos maus atos e recompensa pelos bons.

Quando o homem escolhe a época de estar no caminho da direita, ele precisa dizer a si mesmo que tudo o que acontece, acontece somente pela vontade do Criador, de acordo com Seu plano, e nada depende do próprio homem. Nesse caso ele não tem faltas nem méritos, todas as suas ações são determinadas pelos anseios que ele recebe do exterior.

Ele precisa então agradecer ao Criador por tudo o que recebeu Dele. E, compreendendo que o Criador o guia à eternidade, o homem pode sentir amor pelo Criador.

Qualquer progresso somente é possível sob a condição da correta combinação dos caminhos da direita e da esquerda, exatamente na distância média entre eles. Mesmo que o homem comece corretamente, do ponto inicial correto, mas não saiba como checar regularmente e corrigir sua direção, é certo que ele se desviará da direção correta.

Mais ainda, se ele se desviar que seja um milímetro, a qualquer ponto de sua jornada, então, mesmo que ele mantenha o movimento na direção correta, seu erro aumentará a cada passo e ele se distanciará cada vez mais de seu objetivo.

Antes de descer as escadas espirituais, nossa alma é parte do Criador, Seu ínfimo ponto. Esse ponto é chamado à raiz da alma.

O Criador coloca a alma no corpo de forma que a alma, estando no corpo, possa ascender e elevar os desejos corporais, e fundir-se ao Criador novamente.

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Em outras palavras, a alma é posta no corpo, o que é o nascimento d uma pessoa em nosso mundo, de forma a que, vencendo os desejos do corpo e apesar deles, possa ascender mesmo durante o tempo de vida da pessoa ao nível que possuía antes de descer ao nosso mundo.

Superando os desejos da carne, a alma ascende ao mesmo nível espiritual do qual desceu, e experimenta prazeres muito maiores do que tinha em seu estado inicial, sendo parte do Criador, e isso se transforma em um volumoso corpo espiritual 620 vezes maior que o ponto original que era antes de descer ao nosso mundo.

Então, em seu estágio completo, o corpo espiritual consiste de 620 partes, ou órgãos. Cada parte, cada órgão, é chamado um mandamento. A Luz do Criador, que deriva do próprio Criador, que é a mesma coisa, e preenche cada parte da alma, é chamada Torá.

A verdadeira estrada para esse fim corre ao longo do caminho intermediário, que representa a fusão em um único conceito dos três elementos seguintes: o próprio homem, o caminho que ele precisa percorrer, e o Criador.

De fato, todos os três objetos da criação estão presentes: o homem, esforçando-se por retornar ao Criador; o Criador – o objetivo pelo qual o homem está se esforçando, e o caminho segundo o qual o homem pode alcançar o Criador.

Como foi dito muitas vezes, ninguém existe realmente, somente o Criador, e nós somos somente Suas criaturas, dotadas com um senso de nossa própria existência. O homem começa a compreender e perceber isto claramente durante sua ascensão espiritual.

Todas as nossas percepções, ou melhor, as percepções que vemos como nossas próprias, não são nada além de respostas aos Seus atos, produzidas em nós por Ele, isto é, no fim, nossos sentimentos são apenas aquilo que Ele quer que nós sintamos.

Mas até que o homem atinja o completo entendimento dessa verdade, ele vê os três objetos da criação – ele mesmo, o caminho que o conduz ao Criador, e o Próprio Criador – como três objetos separados, em vez de um único total.

Porém, uma vez que o homem tenha atingido o estágio final em seu desenvolvimento espiritual, isto é, ascendido ao mesmo nível do qual sua alma desceu, mas desta vez carregado com desejos carnais, ele aceita o Criador completamente em seu corpo espiritual que abrange a totalidade da Torá, a total luz do Criador, e o Próprio Criador. E então os três objetos que estavam separados na percepção do homem – o homem, seu caminho e o Criador – fundem-se e tornam-se um único objeto: o corpo espiritual preenchido com luz.

Assim, para garantir seu avanço correto, o homem precisa checar a si mesmo regularmente, enquanto prossegue em seu caminho, para ter certeza de que ele se esforça por todos os três objetos, até então separados em sua percepção, com um desejo igualmente poderoso desde o início, como se os unisse em um mesmo nesse estágio inicial, o modo como ele deve vê-los no fim de seu caminho sendo e o modo como eles são agora, mesmo que ele ainda não consiga vê-los assim devido à sua própria imperfeição.

Se ele se esforça por um deles mais do que pelos outros, ele imediatamente se desvia do verdadeiro caminho. O modo mais fácil de checar se ele está no verdadeiro

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caminho é esforçar-se para compreender as características do Criador, de modo a tornar-se um com Ele.

Se eu não for por mim, quem será? E se eu for só por mim, eu não serei nada. Essa afirmação contraditória reflete a atitude do homem através de seus esforços para atingir seu objetivo: por um lado, o homem precisa sustentar que não há ninguém para ajudá-lo a não ser ele mesmo e agir com a certeza de que seus bons atos serão recompensados e seus maus atos serão punidos, que todas as suas ações têm conseqüências diretas, e que ele mesmo é o construtor de seu próprio futuro. Mas por outro lado ele precisa dizer a si mesmo, “Quem sou eu para desafiar minha própria natureza, por mim mesmo? Mesmo assim, ninguém mais pode me ajudar”.

Mas se tudo acontece de acordo com o plano do Criador, então para que servem os esforços do homem? O fato é que, como resultado do trabalho do homem, baseado no princípio da recompensa e castigo, ele adquire do alto a compreensão do domínio do Criador e ascende a um nível de consciência em que ele vê claramente que é o Criador que rege tudo e que tudo está previsto.

Mas primeiro ele precisa atingir esse estágio, e até que ele o faça, ele não consegue afirmar que tudo está sob o poder do Criador. E até que ele chegue a esse estágio, ele não consegue viver ou agir segundo suas leis, pois não é assim que ele vê o mundo ser regido, isto é, o homem só precisa agir de acordo com as leis de que tem consciência.

E somente como resultado dos esforços do homem em seu trabalho, baseado nos princípios de recompensa e punição, ele merece a completa confiança do Criador e o direito de ver o quadro real do mundo e o modo como ele é regido. E somente então, mesmo que ele veja que tudo depende do Criador, ele se esforça para encontrar o Criador.

Não é possível expelir pensamentos e desejos egoístas do coração e deixá-lo vazio. Somente preenchendo o coração com anseios espirituais, altruístas, no lugar de

desejos egoístas, é possível substituir os antigos desejos por aqueles opostos e eliminar o egocentrismo.

Aquele que ama o Criador certamente sentirá repulsa pelo egocentrismo, pois ele sabe por sua própria experiência o dano causado por qualquer uma de suas manifestações, mas não vê meios de se livrar disto e compreende quase claramente que isto está além de seus poderes, pois foi o próprio Criador que deu essa característica às Suas criaturas.

O homem não consegue se livrar do egocentrismo por seus próprios esforços, mas quanto mais clara for sua compreensão de que o egocentrismo é seu inimigo e assassino espiritual, mais forte será sua aversão por ele, e então isto levará o Criador a ajudá-lo a derrotar esse inimigo, de modo que mesmo o egocentrismo servirá ao seu propósito de elevação espiritual.

Lemos no Talmud: “Eu criei o mundo somente para os completamente justos ou os completamente pecadores”. Que o mundo tenha sido criado para os justos é compreensível, mas não é compreensível por qual razão o mundo não foi criado para aqueles que não são nem completamente justos, nem completamente pecadores, mas sim para aqueles que são completamente pecadores – é realmente possível que o Criador tenha feito o universo inteiro para eles?

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O homem vê, involuntariamente, o domínio do Criador, do modo como lhe parece: bom e gentil, se é agradável para ele, ou mau, se ele está sofrendo. Isso é, o homem considera o Criador bom ou mau, dependendo de como ele perceba nosso mundo.

Assim, há somente duas alternativas para a percepção pelo homem do domínio do Criador sobre o mundo: ou ele percebe o Criador, e neste caso tudo lhe parece maravilhoso, ou ele pensa que o domínio do Criador sobre o mundo não existe, e que o mundo é governado pelas forças da natureza. E mesmo que ele compreenda com sua razão que não é assim, são as emoções do homem, e não a razão, que determinam sua atitude perante o mundo, de modo que ele se considera pecador, devido à disparidade entre suas emoções e sua razão.

Ele entende que a vontade do Criador é o nosso prazer, o que somente é possível aproximando-se do Criador, e assim, ele se sente distanciado do Criador, e vê isso como o mal, e se considera um pecador.

Mas se o homem se sente tão baixo que desde a profundidade de seu coração ele apele ao Criador para que o salve, para que Se revele a ele e então lhe dê o poder de escapar da prisão do egocentrismo e penetrar no mundo espiritual, então o Criador o ajuda instantaneamente.

E nosso mundo e todos os mundos superiores foram criados em condições tais que o homem, tendo mergulhado até ser completamente pecador, apele ao Criador e ascenda até ser completamente justo.

O homem somente se torna merecedor de perceber a grandeza do Criador após ter-se livrado de toda vaidade e ter compreendido sua própria impotência, e a baixeza de seus anseios.

E após ele ter-se livrado de seu orgulho superficial, quanto mais ele valorize sua proximidade com o Criador, melhor ele irá percebê–Lo, pois ele poderá encontrar mais nuanças e manifestações na revelação do Criador, e sua admiração evocará sentimentos de alegria em seu coração.

Assim, se ele vê que ele não é de forma alguma melhor que todos os outros à sua volta, que não mereceram a atitude especial do Criador, com a qual ele é favorecido, que não têm idéia da intercomunicação com o Criador, e nem mesmo aspiram a perceber o Criador e compreender o significado da vida e do avanço espiritual, enquanto ele de algum modo mereceu essa atenção especial pela qual o Criador o lembrou do significado da vida e de seu vínculo com seu Autor, se ele pode apreciar o quão única é essa atitude do Criador com relação a ele, ele experimenta infinita gratidão e alegria. E quanto melhor ele possa apreciar essa especial boa sorte, quanto melhor ele possa agradecer ao Criador, quanto mais nuanças e sentimentos ele possa experimentar em cada ponto particular e instante de seu contato com o Superior, quanto melhor ele possa apreciar a grandeza do mundo espiritual que se revela a ele, assim como a grandeza e o poder do Criador onipotente, mais forte será a confiança com que ele antecipa sua futura unificação com o Criador.

Contemplando a vasta diferença entre as características do Criador e Sua criação, é fácil concluir que eles somente podem ser compatíveis sob a condição de que o homem erradique completamente de sua natureza o egoísmo. Se este for o caso, então se poderá dizer que ele não existe mais e assim, nada o separa do Criador.

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O homem pode penetrar na vida espiritual e inalar o ar espiritual somente se ele sente que sem vida espiritual ele estará morto, do mesmo modo como o corpo morre quando a vida o abandona, e então, ardentemente ele deseje viver.

Mas por quais meios o homem pode ascender a um tal nível, em que a completa eliminação de todo o auto-interesse e preocupação consigo mesmo, e o anseio por doar tudo de si mesmo se tornem o único objetivo de sua vida, a um ponto tal que, sem atingir seu objetivo, ele se sinta como se estivesse morto?

A ascensão a esse nível acontece gradualmente e se baseia no princípio da contração: quanto mais esforços o homem faça em sua busca por um caminho espiritual, no estudo, em suas tentativas de imitar artificialmente os objetos espirituais, mais ele se convencerá de que ele é incapaz de atingir isto por ele mesmo.

Quanto mais ele estude as obras importantes para seu desenvolvimento espiritual, mais complicado seu material de estudo lhe parecerá. Quanto mais esforçadamente ele tente agradar seus superiores e colegas estudantes, se ele de fato estiver avançando espiritualmente, mais claramente ele sentirá que todas as suas ações são produzidas pelo egocentrismo.

Tais resultados são produzidos pelo princípio “bata-o até que ele esteja pronto”: o homem pode se livrar do egocentrismo somente se ele compreende que o egocentrismo o está matando, por mantê-lo à retaguarda da verdadeira vida, eterna e preenchida com prazer. A aversão do homem pelo egocentrismo, expele o egocentrismo do seu coração.

O mais importante é o desejo de se doar inteiramente ao Criador, baseado na compreensão da grandeza do Criador (dar-se ao Criador significa romper com seu próprio ego e vontade). Nesse momento o homem deve estar completamente consciente daquilo pelo que realmente vale a pena trabalhar neste mundo: valores transitórios ou eternos. Pois nada do que tenhamos criado permanece para sempre, tudo passa. Somente estruturas espirituais tais como pensamentos, atos, sentimentos altruístas são eternos.

Isto é, enquanto se esforça por imitar o Criador em seus pensamentos, desejos e esforços, o homem está, de fato, construindo o edifício de sua própria eternidade.

Porém, seguir o caminho de doar-se ao Criador somente é possível se você compreender a grandeza do Criador. Assim como em nosso mundo, se nós consideramos alguém grande, nós ficaremos felizes em prestar um serviço a essa pessoa e sentiremos que na verdade é essa pessoa que nos fez um favor aceitando algo de nós, em vez do contrário, e nos deu algo, em vez de tomar algo de nós.

Esse exemplo nos mostra como um objetivo interno pode substituir qualquer ato mecânico externo – dar o tomar – por um oposto. Assim, quando maior o homem considere o Criador, mais prontamente ele Lhe doará seus pensamentos, desejos e esforços, mesmo sentindo que ele está obtendo algo do Criador, e não dando a Ele alguma coisa; obtendo uma oportunidade de prestar um serviço – uma oportunidade que somente é doada a alguns poucos merecedores em cada geração.

Isso significa que o principal objetivo do homem é elevar o Criador a seus próprios olhos, isto é, adquirir fé em Sua grandeza e poder, pois esse é o único modo de escapar da prisão do egoísmo e penetrar nos mundos superiores.

Como foi dito no artigo anterior, a razão pela qual o homem experimenta dificuldades excessivas quando ele deseja seguir o caminho da fé sem preocupação

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consigo mesmo, é o sentimento resultante de estar separado de todo o mundo e suspenso no vazio, sem senso comum, razão ou experiência prévia que lhe dêem apoio, e de ter abandonado seu ambiente, família e amigos em prol de unir-se com o Criador.

A única razão para tal sensação é a falta de fé no Criador, isto é, falta de sensação do Criador, Sua presença e Seu domínio sobre todas as criaturas, isto é, falta do objeto da fé.

Mas assim que o homem começa a sentir a presença do Criador, ele está pronto a doar-se inteiramente ao Seu poder e a seguir seu Criador cegamente, pronto a desintegrar-se completamente Nele, rejeitando a razão, de um modo completamente natural.

É por isso que o principal objetivo do homem é sentir a presença do Criador. E é por isso que vale a pena doar toda a nossa energia e todos os nossos pensamentos à intenção de perceber o Criador, porque imediatamente, ao experimentar isto, desejaremos a unificação com o Criador, de todo o nosso coração.

E é por isso que devemos devotar todos os nossos pensamentos, ocupações, desejos e tempo a esse único objetivo. Essa percepção do Criador é fé!

Esse processo pode ser acelerado, se o homem considera esse objetivo importante. E quanto mais importante isto seja para ele, mais rápido ele atingirá a fé, isto é, a percepção do Criador. E quanto mais importante for a percepção do Criador, mais forte ela será, até que se torne sempre presente no homem.

Sorte é um tipo especial de regra divina que o homem não pode influenciar de modo algum. Mas foi dada ao homem, pelo alto, a responsabilidade de esforçar-se para atingir uma modificação em sua própria natureza, e após isto, o Próprio Criador, tendo apreciado os esforços do homem, o modifica e o eleva acima de nosso mundo.

Antes que o homem faça qualquer esforço, sua atitude deve ser a de que ele não pode contar com nenhuma força divina, força ou alguma atitude especial dirigida a ele pelo alto, mas precisa mergulhar nos negócios, pensando que se ele não fizer isto, ele não atingirá aquilo pelo que está procurando.

Mas depois que seu trabalho, estudo ou qualquer outro esforço esteja concluído, ele precisa pensar que tudo o que ele tenha atingido aparentemente como resultado de seus esforços, ele teria atingido de qualquer modo, mesmo sem fazer nada, porque isso foi preordenado pelo Criador.

Assim, aquele que deseja compreender o verdadeiro domínio, precisa desde o início tentar conciliar essa contradição em sua própria vida.

Por exemplo, de manhã o homem precisa começar sua rotina diária de estudo e trabalho, deixando completamente para trás todos os pensamentos sobre o domínio divino do Criador sobre o mundo inteiro e cada um de nós. E trabalhar como se o resultado final dependesse só dele.

Mas quando o trabalho estiver terminado, ele não deve assumir que o que quer que ele tenha atingido é resultado de seus esforços mas precisa compreender que, mesmo que ele tivesse ficado na cama o dia inteiro, ainda assim ele teria chegado ao mesmo resultado, porque esse resultado já havia sido designado pelo Criador.

Assim, uma pessoa que queira se esforçar para viver uma vida de verdade, por um lado precisa obedecer às leis da sociedade e da natureza, assim como todos os demais, mas por outro, precisa acreditar no absoluto domínio do Criador sobre o mundo.

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Todos os nossos feitos podem ser divididos em bons, neutros ou maus. A principal tarefa do homem é elevar seus desejos neutros ao nível de bons, acrescentando mentalmente à sua execução a sua consciência do absoluto domínio do Criador.

Por exemplo, um homem doente, embora esteja plenamente consciente do fato de que sua cura está completamente nas mãos do Criador, ainda assim precisa receber uma prescrição comprovada de um médico renomado e agir como se somente a capacidade do doutor pudesse ajudá-lo a vencer sua doença.

Mas tendo tomado os remédios estritamente de acordo com as ordens do doutor, e tendo-se recuperado, ele precisa acreditar que ele se teria recuperado de qualquer forma devido somente à ajuda do Criador. Assim, embora agradeça ao doutor por seus esforços em seu benefício, ele precisa ao mesmo tempo agradecer ao Criador. E assim ele transforma um ato neutro em um ato espiritual. E fazendo assim com relação a todos os seus atos neutros, ele gradualmente espiritualiza todos os seus pensamentos.

Os exemplos e explicações dados acima são necessários para os que não compreendem, pois situações similares tornam-se estorvos em seu caminho para a elevação espiritual, principalmente porque eles pensam que conhecem os princípios do domínio, tentam fortalecer artificialmente sua crença na onipresença do domínio divino e, em vez do trabalho duro, em vez de fazer um esforço para demonstrar sua fé no Criador, ou simplesmente por preguiça, eles assumem, mesmo sem ter começado a trabalhar, que tudo está no poder do Criador e por isso seus esforços não são necessários. E pior ainda, fechando seus olhos em alegada fé cega, eles esquivam-se das questões sobre fé, e evitando ter que responder a essas questões, roubam de si mesmos qualquer chance de avanço espiritual.

Em nosso mundo, “ganharás o pão com o suor de teu rosto”, mas uma vez que o homem tenha ganhado alguma coisa, é duro para ele admitir que o resultado não dependeu de seu esforço ou habilidades, mas foi o Criador que fez tudo por ele. Porém ele precisa se esforçar para fortalecer sua fé no absoluto domínio do Criador sobre ele, “com o suor de seu rosto”.

Mas é devido a essas tentativas e esforços para assimilar a aparentemente contraditória natureza do domínio divino, que tem origem em nossa cegueira, - precisamente, do choque que essa contradição provoca, tornando difíceis de entender a aproximação das ações que nos são requeridas, que aquele que está tentando compreendê-las cresce e experimenta novas sensações espirituais.

Tudo o que existia antes do início da criação era o Criador.A criação começou quando o Criador individualizou uma certa parte de Si mesmo,

doando a ele, no futuro, certas características dessemelhantes a Ele mesmo.Dotando essa parte com um senso dela mesma, o Criador a extraiu de Si mesmo.

Esse ponto é nosso “ego”. Mas já que não existem lugar ou distância, a distância das características é percebida por esse ponto como um ocultamento do Criador, isto é, ele não pode senti-Lo, pois há escuridão entre eles, gerada pelas características egoístas desse ponto.

Quando esta vasta distância é sentida pelo homem? Especificamente quando o Criador quer atraí-lo para mais perto de Si. Se o Criador não quer atraí-lo para perto de Si, ele não sente nenhum abismo, nem nenhuma distância entre ele e o Criador.

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O abismo negro percebido pela parte são, de fato, os problemas diários, preocupações, sofrimento trazido por dificuldades financeiras, ou doenças, ou família – resumindo, problemas da vida comum, devidos a tudo o que o Criador construiu no ambiente da parte, de modo a poder influenciá-la através desse ambiente. Como e por quê?

Para mostrar ao homem que, para salvar-se do sofrimento, ele precisa se livrar do egocentrismo, o Criador, através de seu ambiente o traz a uma condição de miséria tão insuportável – crianças, trabalho, dívidas, doenças, problemas na família – que para ele a vida parece um fardo acima de toda resistência, como resultado de seu desejo de atingir alguma coisa, e então a única coisa que ele quer é não querer nada, isto é, não ter interesses pessoais, evitar todos os desejos egoístas, porque eles trazem tal tormento.

Assim, o homem não tem outra saída senão pedir ao Criador que o salve do egocentrismo, pois somente assim ele pode escapar de todos os seus problemas, pois é seu próprio egocentrismo que lhe traz todos os sofrimentos.

E é por isso que Rabbi Ashlag escreveu em seu Prefácio ao livro “Talmud Esser Sfirot” (Seção 2): “Mas se você ouvir com seu coração a uma famosa questão, tenho certeza de que todas as suas dúvidas sobre se você deve estudar a Cabala desaparecerão sem deixar traço”.

E isto é assim porque essa questão, vinda diretamente do coração do homem, e não de sua inteligência ou aprendizado, essa questão que clama em seu coração é sobre a vida, sobre seu significado, sobre o significado de todos os seus sofrimentos que muitas vezes são maiores que seus prazeres, sobre uma vida tão dura que a morte parece uma libertação fácil e uma salvação, sobre uma vida em que não há fim para os remoinhos de dor até que nós finalmente a deixemos, completamente exaustos e devastados. E quem, no fim, aproveita tudo isso, ou a quem eu agrado assim, ou o que mais eu espero desta vida?

E embora cada um de nós seja subconscientemente incomodado por essa questão, incessantemente, às vezes ela nos atinge de surpresa, deixando-nos loucos, tornando-nos incapazes de fazer qualquer coisa, fragmentando nossa mente, mergulhando-nos num abismo de desespero e na compreensão de nossa própria insignificância – até que tenhamos sucesso em bloquear isto de nossa mente e em encontrar novamente a solução tão conhecida de todos, e prosseguir existindo, assim como ontem, e flutuar na correnteza da vida, sem pensar nisso muito profundamente.

Mas como foi mencionado antes, o Criador dá ao homem tais sensações com o propósito de fazê-lo gradualmente compreender que todos os seus infortúnios, todas as suas angústias têm origem no fato de que ele tem um interesse pessoal no resultado de suas ações, que seu egocentrismo, isto é, sua essência, sua natureza, faz com que ele aja “para seu próprio bem”, e que por isso ele está constantemente sofrendo porque seus desejos não são realizados.

Porém, se o homem se livrasse de todo interesse pessoal em qualquer coisa, ele instantaneamente se libertaria de todos os grilhões de sua essência e observaria tudo o que o cerca sem nenhuma dor ou angústia.

O método para se libertar da escravidão do egocentrismo encontra-se na Cabala. E o Criador propositadamente colocou entre Ele e nós, entre Ele e o ponto em nosso coração,

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nosso mundo e toda a sua miséria, de modo a trazer cada um de nós à compreensão da necessidade de nos purgar do egocentrismo, a causa de todas as nossas mágoas.

Deixar para trás sua mágoa e perceber o Criador – a fonte do prazer – somente é possível sob a condição de um verdadeiro desejo, por parte do homem, de livrar-se de seu egocentrismo. No mundo espiritual um desejo é igual a um ato, pois verdadeiros desejos, de todo o coração, são realizados imediatamente.

Mas o Próprio Criador leva o homem a uma resolução firme e final de livrar-se de todo interesse pessoal em qualquer uma das situações da vida, fazendo-o sofrer tanto nessas situações que ele só tem um desejo – deixar de sofrer, o que somente é possível se ele não tiver nenhum interesse pessoal, egoísta, nos resultados de todos os problemas da vida em que ele está envolvido.

Mas onde, então, está nosso livre arbítrio, nossa liberdade de escolha – que caminho tomar, o que escolher na vida? Sim, o Próprio Criador induz o homem a escolher uma certa solução.

Colocando-o numa situação carregada de tal miséria que a morte parece preferível a esta vida, mas sem lhe dar a força para acabar com isso e escapar do sofrimento, e então, em meio a angústia insuportável, fazendo brilhar de repente a luz da única solução, como um raio de sol através de densas nuvens – nem morte, nem escape, mas libertação de todo interesse pessoal no resultado de qualquer assunto mundano. Essa é a única solução, somente isso pode assegurar paz e repouso do sofrimento insuportável.

E certamente, não há liberdade de escolha nisto, porque o homem é forçado a essa escolha por uma compulsão de escapar do sofrimento. E o livre arbítrio e a liberdade de escolha se manifestam na continuidade do caminho escolhido, uma vez que o homem tenha vencido seu estado depressivo, e fortalecido sua própria determinação, procurando uma saída do terrível estado em que ele estava até então, dessa vez por si mesmo, em ação, já que o objeto de todos os seus pensamentos tornou-se “na intenção do Criador”, pois viver “na sua própria intenção” traz sofrimento. E esse trabalho incessante de controle sobre seus pensamentos é chamado o trabalho de purificação.

O sofrimento em razão do interesse pessoal deve ser tão agudo que o homem sinta-se pronto para “viver com um pedaço de pão e um gole de água, e dormir no chão nu” – nada além de extirpar de si mesmo o egocentrismo, o interesse pessoal na vida.

E se ele tiver atingido a condição interna que o capacita a sentir-se feliz fazendo isto, então ele entra numa esfera espiritual chamada “o mundo futuro”, ou “o mundo vindouro”.

Autor: Rabbi Baruch AshlagTradução para o inglês: Luiz Oliveira e Eduardo Franco

Perfeição e o Mundo

Como nós sabemos que a essência dos mandamentos do Criador está no amor, damos o máximo de atenção e compaixão a todas as pessoas na sociedade, assim como fazemos a nós mesmos. Vamos tentar ver se nós pudermos levar isto à fé.

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Talvez também seja possível verificar isto na prática. Acho que o leitor apreciará minha antipatia por filosofias vazias. Nossa geração sabe melhor que as outras como essas falsas filosofias podem ser implementadas na prática. Então, milhões de pessoas podem sofrer só porque se prova que algumas idéias teóricas, tomadas como base, são falsas ou enganosas e então, a teoria inteira pode desmoronar...

É possível que, estudando o mundo e suas leis, tendo por base nossas conclusões sobre os fatos, cheguemos à conclusão de que é necessário obedecer às exigências do Criador.

Quando observamos a ordem existente na natureza, ficamos maravilhados com o incrível controle que se evidencia (tanto no micro quando no macrocosmo). Tomemos por exemplo algo que está próximo de nós – o próprio homem.

Uma célula do pai vai para um lugar seguro, protegido no interior da mãe. Lá ela recebe tudo o que precisa para crescer e se desenvolver. Nada pode feri-la até que ela nasça e se torne um organismo separado. Mesmo após, a natureza dá aos pais o sentimento necessário pelo seu bebê. Assim a criança fica absolutamente segura do amor e cuidado daqueles à sua volta...

Da mesma forma que o homem, os animais e as plantas tomam um grande cuidado com suas proles e suas próximas gerações. Porém, depois que o novo organismo, o novo indivíduo nasce. Ele precisa começar a lutar pela sobrevivência, o que se intensifica com o passar do tempo. Isto está em flagrante contraste com o calor e cuidado com que ele foi rodeado no início. Essa surpreendente contradição relativa ao controle neste mundo ocupou a mente da humanidade desde os tempos antigos, e também, provocou a criação de várias teorias.

EVOLUÇÃO. Esta antiga teoria não julgou necessário resolver a contradição. O Criador fez o mundo e controla todas as coisas. Sendo, como crêem os evolucionistas, sem sentimentos ou pensamentos, Ele criou as espécies de acordo com leis físicas estritas. Após terem aparecido, as espécies se desenvolveram de acordo com a evolução, aderindo ao estrito princípio da "sobrevivência do mais forte". De acordo com essa teoria, o Criador é chamado "natureza", enfatizando-se assim sua falta de sentimentos e emoções...

DUALISMO. Nós sabemos que a incrível sabedoria da natureza ultrapassa largamente as possibilidades do homem. Assim, predizer e "programar" criações e organismos futuros deve incluir algum tipo de preparo. Assim também o lado que está doando (natureza) deve ter intelecto, memória e sentimentos. Porque é impossível sustentar que todos os níveis da natureza sejam governados somente pelo acaso.

Essa seqüência de pensamentos deu origem à idéia da existência de duas forças... Uma positiva, e a outra, negativa. Elas têm intelecto e sentimentos e dotam dessas qualidades tudo o que é criado por elas. O desenvolvimento dessa teoria do dualismo deu origem à criação de algumas outras:

"Vários Deuses": analisando as ações da natureza e selecionando-as de acordo com diferentes traços de caráter, apareceram algumas religiões (como a dos gregos antigos), com vários deuses. De acordo com essa crença, cada um desses deuses controla um certo poder, um certo campo...

A falta de controle (incontrolabilidade). Recentemente, com o surgimento de novos instrumentos e métodos tecnológicos, muitos cientistas descobriram uma ligação entre

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vários campos em nosso mundo. Assim a teoria das "várias forças" controlando o mundo foi abandonada e surgiram algumas idéias novas. Basicamente, a idéia é que precisa haver uma força que nos una e sabiamente controle o mundo inteiro. Como a humanidade é tão pequena e desprezível, comparada a essa força, nós, a humanidade, fomos na verdade deixados por nossa própria conta...

Porém, apesar de todas as diferentes teorias sobre a criação deste mundo e seu controle, a humanidade ainda sofre. E o homem ainda não entende por que a natureza o tratou com tanta ternura e carinho enquanto ele estava no ventre materno, mas tornou-se tão impiedosa depois. À medida que ele envelhece, parece que ele precisa de ainda mais cuidados da natureza. E surge uma questão: se nós não somos a verdadeira razão da crueldade da natureza contra o mundo vivente.

Todas as ações da natureza são interligadas. Assim quando nós quebramos uma de suas regras, o sistema inteiro se desequilibra. Não importa se nós falamos da natureza como um "líder" ou sobre o Criador ter um plano, um objetivo certo e uma grande sabedoria.

Natureza e Criador (o que não é importante, em princípio) agem sobre nós de acordo com certas leis e regras. Nós precisamos segui-las já que são objetivas e obrigatórias. (Incidentalmente, de acordo com a Cabala, o valor numérico da palavra "Elokim" – Deus é igual ao valor numérico da palavra "Tevah" – Natureza. Isso demonstra a ligação entre nós e o Criador através das leis da natureza). É importante para nós compreender as leis da natureza. Nós sabemos que se não guardarmos essas leis, vamos sofrer. É bastante óbvio que o homem precisa da companhia de outras pessoas. Se alguém subitamente decidisse se isolar da sociedade, ele se condenaria a uma vida cheia de sofrimento, e não seria capaz de se prover de todas as coisas de que precisa.

É a própria Natureza que faz o homem viver em sociedade, com outras pessoas como ele. Dentro desta vida ele se envolve em duas operações. Ele "obtém" da sociedade tudo o que precisa. Como resultado ele precisa "doar", assegurar a sociedade com sua produção, seu trabalho. Aquele que quebra um desses compromissos também provoca desequilíbrio e merece ser punido pela sociedade. Quando alguém é culpado de "obter" excessivamente (por exemplo, o roubo!) a punição vem imediatamente. Quando por outro lado, alguém se recusa a "doar" de si mesmo para a sociedade, a punição não acontece. Assim essa condição de "doação" dos nossos talentos e habilidades para a sociedade nem sempre é respeitada.

Por outro lado, a Natureza age como um juiz punindo a humanidade de acordo com seu desenvolvimento. De acordo com a Torá, a substituição das gerações em nosso mundo significa apenas o surgimento e o desaparecimento dos corpos das pessoas. A alma, por outro lado, que preenche o corpo, é o principal "Eu" da pessoa. Ela transporta seus desejos, caráter, pensamentos, escritos em um veículo material – as células do cérebro. Essa alma não desaparece, apenas muda de veículo. O número de almas é limitado (constante) e suas voltas, suas descidas ao nosso mundo "vestidas" em novos corpos é o que nos dá uma nova geração de pessoas.

Assim, quanto às almas, todas as gerações, desde a primeira até a última, podem ser consideradas uma geração. Sua vida avança no tempo desde o nascimento da humanidade alguns milênios atrás. Ela prosseguirá até a morte da humanidade e não

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importa quantas formas diferentes cada alma tomará em corpos diferentes. A morte não afeta a alma porque ela é feita de "material superior", assim como cortar nosso cabelo ou unhas não afeta nosso corpo e sua vida.

Ao criar e nos dar seus mundos, o Criador nos deu uma tarefa: precisamos nos esforçar e convergir para Ele. Isso deveria ser feito através do desenvolvimento espiritual, unindo-nos e nos elevando. Mas surge uma grande questão: se a humanidade deve obedecer à vontade do Criador. A Cabala mostra um quadro completo dos modos como somos controlados, e o resultado é surpreendente. Resulta que, seja pelo livre arbítrio, seja através do sofrimento, ao final alcançaremos a mesma conclusão. Isso pode acontecer nesta vida ou na próxima, ou pode acontecer pela influência de forças físicas, sociais ou econômicas. Cedo ou tarde cada um de nós e ao final o total da humanidade teremos que aceitar a idéia: a meta e propósito da Criação devem ser a meta e o propósito de nossa vida!

No fim de todas as gerações, cada um alcançará essa meta. A única diferença é o caminho escolhido para alcançá-la. A pessoa que se esforça por essa meta será beneficiada em dobro: ela recebe prazer dessa "convergência" para o Criador e isso acontece em vez do sofrimento. O dramático é que a humanidade ainda não imagina todos os infortúnios que precisará enfrentar. Como nós sabemos, a meta pela qual devemos nos esforçar já está fixada e as leis da Torá são inalteráveis. E assim, seja por nosso próprio sofrimento pessoal, ou por alguma catástrofe global periódica, cada um de nós é atraído para a idéia correta. Nós temos que seguir os mandamentos do Criador. Nós precisamos nos libertar do egoísmo, da inveja, e desenvolver sentimentos de compaixão, ajuda e amor mútuos...

Autor: Rabbi Michael Laitman Tradução para o inglês: Luiz Oliveira y Eduardo Franco

A essência da sabedoria da Cabala

A Cabala ensina a correlação entre causa e efeito de nossas fontes espirituais. Estas fontes se interligam de acordo com regras perenes e absolutas objetivando gols maiores - o entendimento do Criador por todas suas criações que existem neste mundo.

De acordo com a Cabala, ambos, a humanidade como um todo e cada uma das pessoas que a compõem devem alcançar o seu ponto mais alto na compreensão do objetivo e do programa da criação em toda a sua plenitude. Em cada geração houve pessoas que por constante auto-determinação e treinamento alcançaram determinados níveis espirituais. Em outras palavras, enquanto ainda subiam a escada, conseguiram chegar ao topo.

Esteja em quaisquer dos mundos, do micro ao macro, qualquer objeto material e suas correspondentes ações são controladas pelas forças espirituais que permeiam todo nosso universo. Pode-se representar figurativamente como se o universo se apoiasse sobre uma rede tecida por essas forças.

Para exemplificar, tomemos o menor dos organismos vivos, cujo único objetivo é manter a sua existência por um tempo suficientemente longo para procriar a próxima

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geração. Quantas forças e complexos sistemas agem neste organismo! E quantos destes sistemas o olho do homem e sua limitada experiência deixou de tomar conhecimento. Multiplicando estas forças pelo número enorme de criaturas vivas que existiram em nosso mundo - significando o universo e os mundos espirituais - obteremos apenas uma vaga e remota idéia sobre as forças e vínculos espirituais que nos controlam.

A grande variedade de forças espirituais podem ser imaginadas como dois sistemas iguais e interligados. A única diferença entre eles é que o primeiro sistema vem do Criador e desce através todos os mundos até chegar ao nosso. O segundo sai do nosso mundo e sobe todo o caminho de acordo com as regras já estabelecidas e que agiram sobre o primeiro sistema.

O primeiro sistema é chamado pela Cabala de "A Ordem da Criação dos Mundos e do Espírito". O segundo é chamado " A Compreensão ou os Passos da Profecia e Espírito". O segundo sistema supõe que aqueles que querem alcançar o pináculo deverão agir de acordo com as leis do primeiro sistema, e é exatamente o que é estudado na Cabala. Porém, no mundo espiritual o principal fator do descobrimento e entendimento não é o tempo, mas sim a pureza do espírito, do pensamento e do desejo.

No mundo material há muitas forças e fenômenos que não sentimos diretamente. Por exemplo, eletricidade, ondas magnéticas, etc. O efeito de suas ações, seus nomes, são corriqueiros até para as crianças. Apesar de nosso conhecimento sobre a eletricidade ser limitado, nós aprendemos a valer-nos deste fenômeno para suprir algumas de nossas necessidades. Nós o chamamos pelo nome com a mesma familiaridade como chamamos o pão de pão e o açúcar de açúcar.

Analogamente, todos os nomes na Cabala parecem dar-nos uma noção real (material) para um objeto espiritual. Mas se pensarmos a respeito, não é somente a respeito do objeto espiritual que não temos nem mesmo a mais vaga idéia; não temos a menor noção sobre o Criador em Si, assim como não temos noção sobre qualquer objeto, mesmo aqueles que sentimos com nossas próprias mãos.

O fato é que não sentimos o objeto em si, mas sim as nossas reações a sua ação e influência. Estas reações nos dão o que parece ser conhecimento, apesar de que o objeto em si, sua essência permanece oculta. E ainda mais, não conseguimos compreender a nós mesmos!! Tudo o que sabemos sobre nós mesmos restringe-se apenas as nossas ações e as nossas reações.

Ciência, como instrumento de pesquisa sobre nosso mundo é divida em duas partes; o estudo das propriedades da matéria e o estudo de sua forma. Em outras palavras não há nada em nosso universo que não consista de matéria e forma. Por exemplo, se tomarmos uma mesa, como combinação de matéria e forma, então a matéria é a madeira e o portador da forma é o formato de uma mesa. Um outro exemplo; a palavra mentiroso, onde a matéria é o homem que transporta a forma, a mentira.

A parte da ciência que se dedica ao estudo da matéria é baseada em experiência. Alicerçada nas experiências científicas, chegas-se a conclusões. Porém a parte da ciência que estuda a forma, sem a ligação com a matéria, em especial com as formas que nunca tiveram ligações com a matéria (por exemplo, comunismo como um ideal) não pode ser baseada em experiências. Isto porque, em nosso mundo, não ha tal coisa como forma sem matéria.

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A separação entre forma e matéria somente é possível em nossa imaginação. Portanto, neste caso, todas as nossas conclusões são baseadas apenas em premissas teóricas. Toda a alta filosofia pertence a esta categoria de ciência e a humanidade tem freqüentemente sofrido por causa das conclusões sem fundamento. A maioria dos cientistas contemporâneos desistiram de usar esta metodologia de estudo pois não ha certeza quanto a veracidade de suas conclusões.

Explorando o mundo espiritual o homem por si descobre que estes mesmos sentimentos são somente desejos divinos para que ele se sinta desta forma. Ele se sente como um objeto de existência isolada e não como uma parte integrada ao Criador, e que tudo no mundo que o circunda não passa de uma ilusão da ação das forças espirituais sobre nós.

Esclarecerei este ponto através de um exemplo:Era uma vez um homem pobre que vivia num pequeno vilarejo. Ele tinha uma

carroça com uma parelha de cavalos, uma casa e uma família. De repente um infortúnio se abateu sobre ele. Os cavalo caíram, a mulher e os filhos morreram e a casa desabou e, por causa de seus pesares e tristeza, ele morreu logo após. E aí a decisão a ser tomada na corte suprema; o que dar para esta alma sofrida e atormentada para assegurar a sua felicidade. Decidem então dar-lhe a impressão que está vivo, que tem sua família junto a si, sua casa e seus cavalos. Fazem com que ele sinta-se feliz com seu trabalho e com sua vida.

Estes sentimentos são sentidos da mesma forma como sentimos um sonho; tudo o que vivenciamos num sonho, durante o mesmo, aparenta ser verdadeiro. É somente nossos sentimentos que criam a imagem daquilo que nos circunda. Então como é que podemos distinguir ilusão da realidade....

Cabala como ciência mundana também é dividida entre estudo da matéria e da forma. Possui porém, uma qualidade notável que demonstra a sua superioridade sobre as demais metodologias científicas. Aquela parte que trata do estudo da forma sem matéria é totalmente fundamentada em controle experimental, de sorte que pode ser testada e verificada.

O Cabalista, tendo ascendido ao nível espiritual do objeto estudado, se atina à todas as qualidades do objeto em questão. Donde, dentro dele, ele sente uma plena compreensão e pode tratar praticamente com os diferentes tipos de forma antes que de sua corporificação material. É como se ele estivesse observando todas nossas ilusões como um observador externo.

A Cabala, assim como qualquer outra ciência, vale-se de certos símbolos e terminologia para descrever objetos e ações. A força espiritual, o mundo, a sfira são chamadas pelo mesmo nome que é usado para o mesmo objeto controlado por esta força em nosso mundo. Já que toda força ou objeto material tem uma correspondente força ou objeto espiritual que controla suas ações, há um ajuste perfeito entre o nome utilizado no mundo material e sua raiz espiritual - a fonte. Donde, dar um nome à objeto espiritual é somente possível à um Cabalista que tenha alcançado um alto nível de percepção.

Alcançando o mesmo nível do objeto espiritual e ele pode ver as influências e a maneira que este influi em nosso mundo. Os Cabalistas escrevem seus livros e transmitem o seu conhecimento usando esta linguagem. Essa linguagem é extremamente precisa. É

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baseada na fonte espiritual do objeto material e não pode ser alterada. A ligação entre o objeto e sua fonte espiritual e imutável. Esta forma é bem diferente do nosso uso quotidiano da linguagem. Nossa língua mundana, de uso quotidiano, está gradualmente perdendo sua precisão, pois é ligada somente à forma externa. A simples compreensão primária da linguagem não é o bastante. Mesmo se soubermos o nome de um objeto material de nível mais baixo, ainda assim não conseguiríamos entender sua forma espiritual mais elevada. Somente se soubermos a sua forma espiritual podemos compreender e ver a sua implementação material; a sua ramificação.

Isto nos traz a conclusão. Primeiramente é essencial compreender a fonte espiritual do objeto material. Temos que estar ciente de sua natureza e propriedades. Somente então podemos passar às ramificações em nosso mundo e estudar a sua interação. Esta é a única forma de verdadeiramente compreender a linguagem da Cabala.

Porém aí então levanta-se uma pergunta natural. Como pode um principiante dominar esta ciência quando não consegue nem mesmo compreender seu professor. A resposta é muito simples. Somente é possível quando nos alçamos espiritualmente acima deste mundo. E isto é somente possível se nos livrarmos de todos os traços de egoísmo material e aceitarmos os valores espirituais como os únicos. Somente o desejo e paixão pelo espiritual em nosso mundo; esta é a chave para o mundo mais elevado.

Autor: Rabbi Yehuda Ashlag

A Liberdade

“Entalhado (charut) nas pedras” Não pronuncie “entalhado” (charut), mas sim “liberdade” (cherut). Para mostrar que eles estão livres do anjo da morte (Midrash Shmot Raba, 41)

Essas palavras precisam ser explicadas. Porque qual é o tema da recepção da Torá relacionado com a libertação da morte? Além disso, uma vez que eles tenham atingido um corpo eterno que não pode morrer, através da recepção da Torá, como eles poderiam perdê-lo novamente? O eterno pode tornar-se ausente?

Liberdade da Vontade

Para entender esse conceito sublime – “libertação do anjo da morte”, devemos primeiro entender o conceito como ele normalmente é compreendido pela humanidade.

É um ponto de vista comum que a liberdade seja uma lei natural, que se aplica a todos os seres vivos. Então, podemos ver que animais que caem em cativeiro morrem quando sua liberdade lhes é tirada. E isso é uma prova de que a providência não aceita a escravidão de nenhuma criatura. Não é à toa que a humanidade lutou, nos últimos séculos, antes que tivesse atingido uma certa porção de liberdade individual.

Ainda assim, o conceito expresso pela palavra “liberdade”, permanece obscuro. E se nós nos aprofundarmos na essência dessa palavra, não sobrará quase nada. Porque antes

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que você procure pela liberdade individual, é preciso considerar que qualquer indivíduo, por si mesmo, tem essa qualidade chamada liberdade, o que significa que ele pode agir de acordo com sua livre escolha.

Prazer e Dor

Porém, quando examinamos os atos de um indivíduo, somos levados a considerá-los compulsórios. Ele é compelido a praticá-los, sem liberdade de escolha. De um certo modo, ele é como um ensopado, cozinhando no fogão; ele não tem outra escolha além de cozinhar. A

Providência atrelou a vida com duas correntes: prazer e dor. Os seres vivos não têm liberdade de escolha entre prazer e dor, e a única vantagem do homem sobre os animais é que ele pode almejar por um objetivo longínquo. Ou seja, ele pode aceitar uma certa porção de dor, em prol de um futuro benefício ou prazer, a ser atingido após algum tempo.

Mas na realidade, aqui não há mais do que um cálculo aparentemente comercial. Isso significa que o futuro benefício ou prazer parece maior do que a dor ou agonia atual, que a pessoa sente neste momento. Trata-se apenas de dedução, aqui: que a dor seja deduzida do prazer a que se aspira, e ainda sobre algum extra.

Então, somente o prazer é planejado. E assim, pode acontecer que a pessoa se sinta atormentada, porque não encontrou o prazer que esperava, o extra que esperava, por comparação à agonia que sofreu, e por isso, está em déficit. Isso é calculado como os comerciantes fazem.

E após tudo, não há diferença entre o homem e o animal. E assim sendo, não há nenhuma liberdade de escolha, mas somente uma força impulsionadora, atraindo em direção a qualquer prazer transitório, e rejeitando circunstâncias dolorosas. E a Providência conduz as pessoas cada lugar que ela escolhe por meio dessas duas forças, sem perguntar sua opinião sobre o assunto.

Mesmo a determinação da espécie de prazer ou benefício são inteiramente alheias à livre escolha individual, mas sim, seguem o desejo de outros. Por exemplo: eu me sento, visto, falo, como. Eu não faço tudo isso porque quero sentar desse modo, ou falar desse modo, ou me vestir desse modo, ou comer desse modo. Eu faço assim porque outros querem que eu me sente, vista, fale ou come desse modo; isto é, de acordo com os desejos da sociedade, e não por minha própria livre escolha.

Além disso, na maioria dos casos, eu faço essas coisas contra minha vontade. Pois eu me sentiria muito mais confortável se me comportasse de um modo simples, sem carregar nenhum fardo. Mas eu estou acorrentado, em cada movimento, aos sabores e maneiras dos outros, que compõem a sociedade.

Então, digam-me, onde está a liberdade de escolha? Por outro lado, se eu partir do pressuposto de que não há liberdade, então nós somos como máquinas, criadas e operadas por forças externas, que as fazem agir como agem. Isso significa que nós todos estamos encarcerados na prisão da providência, a qual, usando essas duas correntes, nos empurra e puxa conforme sua vontade, para onde ache melhor.

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Resulta que aparentemente, não existe uma coisa tal como o egoísmo neste mundo, já que ninguém é livre e nem se sustenta nos próprios pés. Eu não sou o dono dos meus atos, e eu não sou quem os pratica conforme minha vontade, mas eu sou manipulado pelo alto, de um modo compulsório, sem que minha própria opinião seja considerada. Assim, extinguem-se a recompensa e o castigo.

E isso é muito estranho para os ortodoxos, que acreditam na Sua providência, e podem confiar n”Ele e acreditam que Ele deseja apenas o bem em cada ato. É ainda mais estranho para aqueles que acreditam na natureza, pois como foi dito, todos nós estamos encarcerados pelas correntes da natureza cega, sem consciência ou cálculo. E nós, a espécie escolhida, únicos em mente e conhecimento, tornamo-nos um brinquedo nas mãos da natureza cega, que nos desvia, quem sabe para onde?

A Lei da Causalidade

Vale a pena tomar algum tempo para compreender algo tão importante, ou seja, como nós existimos no mundo, em termos “egoístas”, de modo que cada um de nós olhe para si mesmo como um ser único, agindo de acordo com sua própria vontade, independentemente de forças exteriores, estranhas e desconhecidas. E como esse ser, egoísta, revela-se diante de nós?

Sabe-se que há um vínculo geral entre todos os itens da realidade, que se reúnem sob a lei da causa e efeito. E como o total, assim é cada item, por si mesmo. Isso significa que cada criatura no mundo, dos quatro tipos – inanimado, vegetativo, animado ou falante, está subjugada pela lei da causa e efeito.

E, além disso, cada forma particular de um particular comportamento que uma criatura assume enquanto está neste mundo, é impulsionada por causas antigas, obrigando-a a fazer essa específica mudança de comportamento, e não outra. E isso é evidente para todos os que examinam o comportamento da natureza, sob um ponto de vista puramente científico, sem sombra de dúvida. De fato, precisamos analisar isso, de modo a que possamos examinar a questão por todos os aspectos.

Quatro Fatores

Tenham em mente que tudo aquilo que se manifesta nos seres do mundo, precisa ser compreendido não como existência que surja da ausência, mas como existência que surge da existência, ou seja, que um ente tenha sido extraído de sua forma anterior e tenha assumido sua forma atual.

Assim, precisamos compreender que em cada manifestação no mundo há quatro fatores, que juntos, causam essa manifestação. São eles:

A. O leito. B. O condutor de causa e efeito, relacionado com os próprios atributos do leito, que

permanecem inalterados. C. A causa e efeito internos, que mudam como resultado do contato com forças

exteriores.

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D. A causa e efeito das forças externas, agindo sobre elas, desde o exterior.

E eu vou explicar um por um.

O primeiro fator: o leito; o primeiro tema.

A. O “leito”, ou seja, o primeiro tema, relativo a esse ser. Pois “não há nada novo sob o sol”, e qualquer evento que ocorra no nosso mundo, não é existência surgida da ausência, mas

sim, existência surgida da existência. Isto é uma entidade que foi extraída de sua forma anterior, e assumiu outra, diferente da primeira, e essa entidade é descrita como “leito”.

Nisto reside a força destinada a ser revelada e determinada no fim da formação dessa manifestação. Assim, isto certamente é visto como sua a causa primária.

O segundo fator: a causa e efeito que se vinculam a si mesmos.

B. Este é um condutor de causa e efeito, que se relaciona ao próprio atributo do leito, que não se modifica. Tome por exemplo uma espiga de trigo que apodrece no chão, e como resultado disso, crescem várias outras espigas de trigo. Então, essa fase de apodrecimento é

considerada “o leito”. Isso significa que a essência do trigo foi extraída de sua forma anterior, que é a forma de trigo, e tomou a forma de trigo apodrecido, que é a semente, que nós chamamos “leito”, que agora foi privada de qualquer forma.

Agora, após apodrecer no solo, ela merece revestir-se de outra forma, que é a forma de várias espigas de trigo, destinadas a crescer desse “leito”, que é a semente.

E todos sabem que esse leito não está destinado a tornar-se cereal, ou aveia, mas somente pode ser comparado à sua forma anterior, que não lhe foi retirada, sendo a mesma espiga de trigo. E embora ela se modifique em certo grau, tanto em qualidade como em quantidade, pois na forma anterior havia somente uma espiga, e agora há dez ou vinte espigas, e em sabor e em aparência também, a essência da forma de trigo permanece inalterada.

Então, há um condutor de causa e efeito, ligado ao próprio atributo do “leito”, que nunca muda, pois cereal nunca vai emergir de trigo, como dissemos. Isso é chamado o segundo fator.

O terceiro fator: a causa e efeito internos.

C. Trata-se do condutor da causa e efeito do leito que se modifica sob o encontro de forças externas de seu ambiente. Ou seja, concluímos que de uma espiga de trigo, que apodrece no solo, emergirão várias espigas, talvez maiores e melhores do que antes da semeadura.

Assim, é preciso que haja mais alguns fatores envolvidos aqui, que tenham colaborado com a força oculta do ambiente, chamada “o leito”. E por causa disto, as

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adições em qualidade e quantidade, que estavam ausentes na forma anterior de trigo, agora se tornaram aparentes.

Esses são os minerais e os materiais no solo, a chuva e o sol. Tudo isso funciona sobre o “leito”, transferindo de suas forças e acrescentando à força do próprio leito, pois através da causa e efeito, produziram a multiplicação da quantidade e a qualidade nessa manifestação.

Precisamos compreender que esse terceiro fator vai ao encontro do interior do leito, porque a força oculta no leito os controla. Pois em última análise todas essas modificações pertencem ao trigo e não a outra planta. Assim, nós as determinamos como fatores internos. Porém, elas diferem do segundo fator, que é imutável, em todos os aspectos, enquanto o terceiro fator muda tanto em qualidade quanto em quantidade.

O quarto fator: causa e efeito através de forças exteriores.

Este é um condutor de causa e efeito através de fatores externos, que agem desde o exterior. Isso significa que eles não têm relação direta com o trigo, tal como os minerais, a chuva, ou o sol, mas sim, são fatores que são estranhos a isto, assim como plantas próximas, ou eventos externos tais como granizo, vento etc.

E você encontra quatro fatores que se combinam ao trigo durante seu crescimento. E cada situação particular a que o trigo é submetido durante esse tempo, está condicionada aos quatro fatores; a qualidade e a quantidade de cada estado é determinada por eles. E assim como retratamos quanto ao trigo, acontece em cada manifestação no mundo, mesmo no que se refere a pensamentos e idéias.

Se por exemplo, imaginarmos algum estado conceitual em um certo indivíduo, tal como o estado da pessoa ser ou não religiosa, ou extremamente ortodoxa, ou não tão extrema, ou intermediária, nós compreenderemos que esse estado é determinado no homem pelos quatro fatores acima.

Posses hereditárias

O primeiro fator é o leito, que é a primeira substância. Pois o homem foi criado como existência da existência, o que significa, desde as mentes dos progenitores. Resulta assim que em uma certa extensão, ele é como uma cópia de um livro, o que significa que quase todos os assuntos que foram aceitos e alcançados pelos antepassados também são copiados.

Mas a diferença é que isso é uma forma abstrata - assim como o trigo semeado, que é considerado uma semente até que tenha apodrecido e perca sua forma anterior. Assim é o caso da gota de sêmen, da qual o homem nasce: não há nada nela da forma de seus antepassados, mas sim uma força abstrata.

Pois as mesmas idéias que eram concebidas por seus antepassados, tornaram-se meras tendências nele, chamadas instintos ou hábitos, mesmo que ele não saiba por que ele faz o que faz. Pois elas são de fato forças ocultas que ele herdou de seus antepassados,

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e assim, desse modo, não apenas as posses materiais vêm a nós através da herança de geração em geração.

E daqui emergem várias tendências que encontramos nas pessoas, tais como a tendência a acreditar, ou criticar, a tendência a se apegar à vida material, ou o desejo por ideais, levar uma vida sem exigências, ser mesquinho, cordato, insolente ou tímido.

Pois todos esses aspectos que aparecem nas pessoas não são sua propriedade, que eles tenham adquirido, mas mera herança que lhes foi dada por seus ancestrais. Sabe-se que na mente do homem há um lugar especial, onde residem essas tendências. Ele é chamado

a “medula oblongata”(o cérebro estendido), ou o subconsciente, e todas as tendências encontram-se ali.

Mas porque os conceitos de nossos ancestrais, adquiridos através de suas experiências, tornaram-se meras tendências em nós, eles são vistos como o trigo semeado, tendo sido despojados de sua forma anterior, permanecendo apenas forças potenciais, destinadas a tomar novas formas. No que se refere ao nosso assunto, essas tendências estão destinadas a tomar a forma de idéias, que são assim consideradas a primeira substância, e esse é o fator primário, chamado leito. Nele residem todas as forças das tendências únicas que o homem herda de seus progenitores, definidas como herança ancestral.

Tenham em mente que algumas dessas tendências vêm numa forma negativa, o que significa o oposto daquelas que estiveram em nossos ancestrais. É por isso que dizem: “tudo o que está oculto no coração do pai torna-se evidente no filho”.

A razão para isto é que o “leito” despe-se de sua forma anterior para adquirir uma nova. Assim ele está próximo a negar as formas dos conceitos de seus ancestrais, como o trigo que apodrece no solo despe-se da forma que existiu no trigo. Porém, ele ainda depende dos outros três fatores.

A Influência do Ambiente

O segundo fator é um condutor direto de causa e efeito, relacionado com o próprio atributo do leito, que não muda. Isso significa que, como esclarecemos quanto ao trigo que apodrece no solo, o ambiente no qual o leito repousa - compreendendo o solo, minerais, chuva, o ar e o sol, - age sobre a semeadura, como dissemos, numa longa cadeia de causa e efeito, através de um longo e gradual processo, passo a passo, até que ele amadureça.

E o leito retomou sua forma anterior, ou seja, a forma do trigo, mas em qualidade e quantidade diferentes. E seu aspecto geral permanece completamente inalterado, pois nem cereal nem aveia crescerão dele. Ele muda em seu aspecto particular em quantidade, pois de uma espiga, resulta uma dúzia ou duas dúzias de espigas, e em qualidade, que é melhor ou pior do que a forma anterior do trigo.

O mesmo acontece com o homem, pois ele, como um “leito”, é colocado em um ambiente, ou seja, a sociedade. E ele é compelido a ser influenciado por ela, assim como o trigo por seu ambiente, mas o leito não é nada além de uma forma crua. Então, como

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resultado de seu contato com o meio circundante e o ambiente, ele é influenciado por esses fatores através de um processo gradual, ou uma cadeia de situações, uma a uma, como causa e efeito.

Por essa ocasião, as tendências incluídas em seu leito tomam a forma de conceitos. Se por exemplo, alguém herda de seus ancestrais a tendência a ser mesquinho, quando ele crescer construirá para si mesmo conceitos e idéias, que concluem decisivamente que é bom ser mesquinho. Então, embora seu pai fosse generoso, ele pode herdar dele a tendência negativa para a mesquinharia, pois a ausência é tão hereditária quanto a presença.

Ou alguém pode herdar de seus ancestrais a tendência para ter a mente aberta. Ele constrói para si mesmo idéias e extrai delas a conclusão de que é bom ter a mente aberta. Mas onde ele encontra essas frases e razões? Ele as toma do ambiente, inconscientemente, pois essas opiniões e gostos foram implantados nele em um processo de causa e efeito.

E isso acontece de modo que o homem veja essas opiniões e gostos como dele mesmo, como se ele os tivesse adquirido através de seu próprio raciocínio. Aqui também, assim como acontece com o trigo, há uma parte inalterável do leito que é aquela em que as tendências hereditárias permanecem assim como eram nos antepassados. Este é o segundo fator.

O Hábito torna-se uma Segunda Natureza

O terceiro fator é um condutor direto de causa e efeito, que o leito atravessa sofrendo modificações. Pois como as tendências hereditárias tornaram-se, no homem, como conceitos, por causa do ambiente, elas tiveram que operar nas direções definidas por esses conceitos. Por exemplo, um homem mesquinho por natureza, no qual essa tendência, por influência da sociedade, tenha-se tornado um conceito, pode entender a mesquinharia através de alguma definição razoável.

Vamos supor que ele se defenda desse comportamento e assim, não terá necessidade de outras pessoas. Resulta que ele atingiu uma escala de mesquinharia, por algum tempo, quando esse temor estava ausente, mas que ele será capaz de abandonar esse traço. Resulta que ele melhorou a tendência original que ele herdou de seus antepassados. E às vezes, alguém é capaz de extirpar completamente uma má tendência. Isso se faz pelo hábito, que tem a virtualidade de se tornar uma segunda natureza.

Nisso, a força do homem é maior do que a de uma planta. Pois o trigo só pode mudar em sua parte privada, enquanto o homem tem a capacidade de mudar através do poder das causas e efeitos ambientais, mesmo nas partes genéricas, ou seja, extirpar inteiramente uma tendência e transformá-la no seu oposto.

Fatores externos

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O quarto fator é um condutor direto de causa e efeito que afeta o leito, por forças completamente alheias a ele, e opera sobre o leito desde o exterior. Isso significa que essas forças não estão relacionadas com o comportamento do crescimento do leito, ou que ajam diretamente sobre ele, mas sim, que operam indiretamente. Por exemplo, assuntos monetários, tarefas diárias, ou os ventos etc., que por si mesmos têm uma ordem de situações completa, lenta e gradual, ao modo de “causa e efeito”, que modificam os conceitos do homem para melhor ou para pior.

Então, estabeleci os quatro fatores naturais, de modo que cada um dos pensamentos e idéias, que vêm à nossa mente, não é nada além de seus produtos. E mesmo que a pessoa sente e medite o dia todo, não será capaz de adicionar ou talvez alterar o que esses quatro fatores lhe dão. Qualquer adição que ela possa fazer será em quantidade: se uma grande mente, ou uma pequena, mas em qualidade ela não pode acrescentar coisa alguma. Pois esses fatores determinam o caráter, a forma da idéia e a conclusão obrigatória, sem perguntar nossa opinião. Assim, estamos nas mãos desses quatro fatores, como barro nas mãos do oleiro.

Livre escolha

Porém, quando examinamos esses quatro fatores, concluímos que embora nossa força não seja suficiente para enfrentar o primeiro fator, que é o “leito”, nós ainda temos a capacidade e a livre escolha para nos defendermos contra os outros três fatores pelos quais o leito muda em suas partes individuais. Às vezes, ele se modifica em sua parte genérica também, o que lhe dá uma segunda natureza.

O Ambiente como um Fator

Essa proteção significa que nós sempre podemos melhorar, no que se refere à escolha de nosso ambiente, que são os amigos, os livros, os professores e assim por diante. Como uma pessoa que tenha herdado de seu pai algumas espigas de trigo: ela pode fazer crescer, dessa pequena quantidade de espigas, dúzias de espigas, através de sua escolha do ambiente para o “leito”, que será um solo fértil, com todos os minerais necessários e o material que nutre o trigo abundantemente.

Há também a questão do labor na melhoria das condições ambientais, para servir às necessidades da planta em seu crescimento, pois o sábio escolherá as melhores condições e encontrará bênção em seu trabalho, enquanto o tolo aceitará o que quer que veja adiante, e poderá tornar a semeadura uma maldição, no lugar de uma bênção.

Portanto, todo o seu agradecimento e seu espírito dependem do ambiente no qual ele semeie o trigo. Mas uma vez que ele tenha semeado no local escolhido, sua forma é absolutamente determinada pela medida em que o ambiente seja capaz de ajudar.

Esse é o caso de nosso tópico, pois é verdade que o desejo não tem liberdade, mas é condicionado pelos quatro fatores acima. E o desejo é obrigado a pensar e a examinar

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como eles sugerem, privado de qualquer força de análise ou de mudança, assim como o trigo em seu ambiente.

Porém, há liberdade para o desejo, para que escolha inicialmente um ambiente tal como livros e guias, que lhe tragam bons conceitos. E se a pessoa não fizer isso, mas se quiser, ao contrário, entrar em qualquer ambiente e ler qualquer livro que lhe caia nas mãos, ela estará propensa a cair em um mau ambiente, ou a perder seu tempo com livros sem valor, que são abundantes e fáceis de encontrar, e que lhe conduzem a concepções tolas, a fazem pecar e ser condenada. Ela certamente será punida, não por causa de seus maus pensamentos e atos, sobre os quais ela não tem escolha, mas porque ela não escolheu um bom ambiente, pois como vimos, nisto há definitivamente uma escolha.

Assim, aquele que se esforça para escolher continuamente um ambiente melhor torna-se merecedor de bênção e recompensa. Mas aqui também, não por causa de suas boas ações ou pensamentos, que vêm a ele sem que ele tenha escolhido, mas por causa de seu esforço para adquirir um bom ambiente, que lhe traz esses bons pensamentos e ações. Como disse o Rabbi Yehoshua Ben Prehya: “Constitua um Rabino e compre um amigo para si mesmo”.

A Necessidade de Escolher um Bom Ambiente

Assim vocês podem entender as palavras do Rabbi Yossi Ben Kasma (Avot 86), que em resposta a uma oferta para viver em outra cidade, sendo pago por centenas de moedas de ouro, respondeu: “Mesmo que vocês me dessem todo o ouro e prata e jóias do mundo, eu só viveria em um lugar de Cabala”.

Essas palavras parecem ser sublimes para a compreensão de nossas mentes simples, pois como pode ser que ele tenha desistido de centenas de moedas de ouro que lhe seriam pagas por uma coisa tão simples, tal como viver em um lugar em que não havia discípulos de Cabala, enquanto ele mesmo era um grande sábio que não precisava aprender de ninguém? De fato, um grande mistério.

Mas como vimos, isto é algo simples que precisa ser observado por todos nós. Pois embora todos tenham “seu próprio leito”, as forças não se revelam abertamente, mas sim, através do ambiente em que a pessoa está, de modo semelhante ao trigo semeado no solo, cujas forças só se tornam aparentes através do ambiente, que é o solo, a chuva e a luz do sol.

Então, o Rabbi Yossi Ben Kasma concluiu corretamente que se ele deixasse o bom ambiente que ele havia escolhido e penetrasse em um ambiente potencialmente nocivo, ou seja, um lugar sem discípulos de Cabala, não somente seus conceitos anteriores seriam comprometidos, mas todas as forças, contidas em seu leito, que ainda não se haviam revelado em ação, permaneceriam ocultas. Isso, porque elas não estariam sujeitas ao ambiente correto, capaz de ativá-las.

E como esclarecemos acima, somente no que se refere à escolha da pessoa pelo ambiente, seu domínio sobre si mesma pode ser medido, e por isso ela merece prazer ou punição. Assim, não é tão estranho que um homem sábio como o Rabbi Yossi Ben Kasma tenha escolhido o bem e rejeitado o mal, e não tenha sido tentado por coisas materiais e

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corpóreas, como se deduz daqui: “quando uma pessoa morre ela não leva consigo nem ouro, nem jóias, mas apenas boas ações e Cabala”. E assim advertiram nossos sábios: “Constitua um Rabino e compre um amigo para si mesmo”, no que se inclui a escolha dos livros, como mencionamos. Pois somente nisso a pessoa pode ser repreendida ou recompensada, ou seja, em sua escolha pelo ambiente. Mas uma vez que ela tenha escolhido esse ambiente, ela está em suas mãos, assim como barro nas mãos do oleiro.

O controle da mente sobre o corpo

Alguns sábios contemporâneos, após meditar sobre o tema acima, e tendo visto que a mente humana não é mais que um fruto que se desenvolve a partir dos eventos da vida, chegaram à conclusão de que a mente não tem controle sobre o corpo, mas somente os eventos da vida, impressos nos tendões físicos do controle cerebral, que ativam o homem. E a mente humana é como um espelho que assume as formas à sua frente, de modo que embora o espelho seja o veículo dessas formas, ele não pode ativar ou mover as formas que se refletem nele.

Assim é a mente. Embora os eventos da vida, em todos os seus fatores de causa e efeito, sejam vistos e reconhecidos pela mente, a mente é completamente incapaz de controlar o corpo, de colocá-lo em movimento, ou seja, de aproximá-lo do bem ou afastá-lo do mal, porque o espiritual e o físico são absolutamente distanciados um do outro. E não é possível que haja uma ferramenta intermediária entre eles, que torne a mente capaz de ativar e operar o corpo material, como discutimos extensamente.

Mas quando eles se combinam, eles também são capazes de romper com o exterior. Porque a imaginação do homem lhe serve como um microscópio serve ao olho, sem o qual ele não pode ver nada nocivo por causa de sua proporção minúscula. Mas uma vez que ele tenha visto o fator nocivo através do microscópio, o homem pode se distanciar dele.

Resulta que é o microscópio que leva o homem à ação, para que se distancie do fator nocivo, e não o sentido, pois o sentido não é capaz de detectar esse fator. E nessa medida a mente controla completamente o corpo do homem, para distanciá-lo do mal, e aproximá-lo do bem. Isto é, em todos os lugares em que o atributo do corpo falha em reconhecer o fator como benéfico ou nocivo, ele precisa da inteligência da mente.

Além disso, já que o homem conhece sua mente, como uma conclusão verdadeira tirada das experiências da vida, assim ele pode aceitar a mente e o conhecimento de uma pessoa confiável, e aceitar isto como lei, embora os eventos de sua vida ainda não tenham revelado a ele essas concepções. É como uma pessoa que pede conselho a um médico e o obedece, embora não entenda nada com sua própria mente. Então, a pessoa usa as mentes das outras pessoas, assim como usa a sua própria. Como esclarecemos acima, há dois modos pelos quais a Providência assegura que o homem chegue a um objetivo bom e firme; são eles:

O caminho da agonia, e O caminho da Cabala

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Toda a clareza no caminho da Cabala está vinculada a isto. Pois essas claras concepções que foram reveladas e reconhecidas após uma longa cadeia de eventos nas vidas dos profetas e outros homens de Deus, vêm ao homem que as utiliza plenamente, e se beneficia delas como se esses conceitos viessem dos eventos de sua própria vida. Então, vocês podem ver que a pessoa se libera de todos os sofrimentos que precisa experimentar antes de desenvolver uma mente clara, por si mesmo. Assim ela se poupa tanto do tempo quanto do sofrimento.

Isso pode ser comparado a um homem doente que não obedeça às ordens do médico, antes de entender por si mesmo como esses conselhos poderiam curá-lo, e assim começa a estudar medicina. Ele morrerá de sua doença antes que aprenda a sabedoria da medicina.

Assim é o caminho da agonia, versus o caminho da Cabala. Pois aquele que não acredita nos conceitos que a Cabala e a profecia o aconselham a adotar, mesmo que não compreenda por si mesmo, precisa chegar a essas concepções por si mesmo - ou seja, seguindo a somente cadeia de causa e efeito dos eventos da vida, que são experiências muito rápidas, de modo a desenvolver o sentido de reconhecimento do mal nelas, como vimos, sem a possibilidade de escolha; mas se a pessoa trabalha em adquirir um bom ambiente, ele pode guiá-la para esses bons pensamentos e ações.

A Liberdade do Indivíduo

Agora chegamos a um entendimento abrangente da liberdade do indivíduo. Porém, isso se refere somente ao primeiro fator, o “leito”, que é a primeira substância de todo ser humano, isto é, todas as características que herdamos de nossos ancestrais, pelas quais diferimos uns dos outros.

Pois mesmo quando centenas de pessoas partilham o mesmo ambiente, de um modo que os outros três fatores ajam igualmente sobre elas, não se encontrarão duas pessoas que partilhem o mesmo atributo. Isso é porque cada uma delas tem seu próprio leito. É como o leito do trigo, que embora mude consideravelmente em razão do poder dos três outros fatores, ainda retém a forma preliminar do trigo e nunca assumirá outra forma.

A Forma Geral do Progenitor Nunca se Perde

Assim é que cada “leito”, que tome a forma preliminar do progenitor e assuma uma nova forma como resultado dos três fatores que lhe foram adicionados, e que, como resultado disto tenha se modificado substancialmente, ainda retém a forma geral do progenitor e nunca adotará a forma de outra pessoa que seja parecida, assim como a cevada nunca parecerá com o trigo.

Então, cada leito representa uma longa cadeia em si mesma, formada por centenas de gerações, e o leito inclui as concepções de todas elas. Mas elas não se revelam nele do

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mesmo modo como apareceram em seus ancestrais, ou seja, na forma de idéias, mas somente como formas abstratas. Assim, elas existem nele na forma de forças abstratas, chamadas “tendências” ou “instintos”, sem que ele saiba suas razões ou por que ele faz o que faz. Então, nunca haverá duas pessoas com o mesmo atributo.

A Necessidade de Preservar a Liberdade do Indivíduo

Saibam que está é a única verdadeira posse do indivíduo, que não pode ser prejudicada ou alterada. Pois afinal, essas tendências no leito vão se materializar e tomar a forma de conceitos, quando cada indivíduo se desenvolver e atingir uma mente própria - como resultado da lei da evolução que controla essa cadeia e a empurra adiante. Aprendemos, além disso, que cada tendência emerge para se transformar em um conceito sublime, e valor imensurável.

Assim, aquele que elimina uma tendência de um indivíduo e a erradica, causa para o mundo a perda desse conceito sublime e maravilhoso, que está destinado a se materializar no fim da cadeia, pois essa tendência nunca mais estará em nenhum outro corpo, mas somente naquele, em particular.

Assim nós compreendemos que quando uma tendência particular toma a forma de um conceito, ela não pode mais ser definida como boa ou má. Mas essas distinções podem apenas existir enquanto são ainda tendências, ou conceitos imaturos, e de modo algum elas podem ser reconhecidas quando tomam a forma de verdadeiros conceitos.

Do que foi dito, aprendemos o quão terrível é o erro em que incorrem essas nações que forçam seu domínio sobre as minorias, privando-as de liberdade, da capacidade de viver suas vidas através das tendências que herdaram de seus ancestrais. Elas são consideradas nada menos que assassinas. Mesmo aqueles que não acreditam em religião e em uma condução poderosa podem entender a necessidade de preservar a liberdade do indivíduo, além de preservar os sistemas da natureza. Pois nós podemos ver que toda nação que tenha desmoronado, desmoronou somente em razão da opressão das minorias e indivíduos, que assim se rebelaram contra ela e a arruinaram. Assim fica claro para todos que não pode existir paz no mundo se não respeitarmos a liberdade de cada indivíduo. Sem isso, nunca haverá paz, e prevalecerá a ruína.

Então, definimos claramente a essência do indivíduo com a máxima precisão, após a análise de tudo o que ele toma do público geral. Mas agora precisamos enfrentar a questão: onde, afinal, está o próprio indivíduo? Pois tudo o que dissemos até agora, pode-se tomar como a propriedade do indivíduo, herdada de seus ancestrais. Mas onde está o próprio indivíduo? Onde está aquele que é o sucessor, que exige que guardemos sua propriedade?

Porque apesar de tudo o que foi dito até agora, ainda não encontramos a posição do “self” no homem, que o colocará, perante seus próprios olhos, como uma unidade independente. Mas afinal, o que eu preciso fazer com o primeiro fator, que é uma longa cadeia, composta de milhares de pessoas uma após a outra, de geração em geração, que apresentam a imagem do indivíduo como a de um sucessor? E o que eu preciso fazer com os outros três fatores, compostos de milhares de pessoas, postas uma diante da outra em

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uma geração? A conclusão final é a de que cada indivíduo não seja mais do que uma máquina coletiva, esperando por ser utilizada pelo coletivo, como lhe parece apropriado. Isto significa que ele se tornou sujeito a duas espécies de coletividade:

A. Da perspectiva do primeiro fator, ele se tornou sujeito a uma enorme coletividade, das gerações passadas, postas uma após a outra;

B. Da perspectiva dos outros três fatores, ele se tornou sujeito de sua coletividade contemporânea.

E isto de fato é uma questão universal. Por isso há muitos que se opõem ao método natural acima, embora reconheçam sua validade. E eles o substituem por métodos metafísicos, ou dualismo, ou transcendentalismo, de modo a criar para si mesmos a imagem de algum objeto espiritual, e como ele se encaixa no corpo ou na alma. E é essa alma que aprende e que opera o corpo, e que é a essência do homem, seu “self”.

Talvez essas interpretações possam tornar as coisas mais fáceis para a mente de uma pessoa, mas o problema é que elas não têm solução científica para dizer como é possível para um objeto espiritual, ter qualquer espécie de contato com átomos físicos, e levá-los a qualquer espécie de movimento. E a sabedoria dessas interpretações não ajuda as pessoas a encontrarem uma ponte que elas possam atravessar essa ampla e profunda fissura que se estende entre a entidade espiritual e o átomo corpóreo. Então, a ciência não ganhou nada com todos esses métodos metafísicos.

O desejo de receber: existência a partir da ausência

Nós precisamos somente da sabedoria da Cabala para nos movermos um passo além daqui, de um modo científico. Pois toda a sabedoria dos mundos está incluída na sabedoria da Cabala. Nós aprendemos, no tema das “luzes e vasos espirituais”, que a principal novidade, do ponto de vista da criação, é que Ele criou existência a partir da ausência, o que se aplica a um único aspecto, definido como o “desejo de receber”. Todos os outros aspectos da totalidade da criação não são, definitivamente, novidade, pois eles não são existência a partir da ausência, mas existência a partir da existência. Isto é, que eles foram extraídos diretamente da Sua essência, como a luz emana do sol. Aí também, não há novidade, pois a substância do sol se estende além, em direção ao exterior.

Mas o desejo de receber, porém, é uma completa novidade. Isto é, antes da criação, não existia uma tal coisa na realidade, porque Ele não tinha nenhum aspecto de desejo de receber, pois Ele precede todas as coisas, então de quem Ele poderia receber? Assim, esse desejo de receber, que Ele extraiu como existência desde a ausência, é novidade completa. Mas todo o resto não apresenta nenhuma novidade com relação a isto que é chamado a “criação”. Então, todos os vasos e os corpos, tanto dos mundos espirituais quanto dos físicos, são considerados substância espiritual ou material, com a natureza de “desejar receber”.

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Duas Forças no Desejo de Receber: a Força da Rejeição e a Força Atrativa

E vocês precisam ver além, que nesta força, chamada o “desejo de receber”, nós distinguimos duas forças:

A força atrativa, e A força da rejeição.

A razão para isso é que cada corpo, ou vaso, definido pelo desejo de receber, é de fato limitado, tanto na qualidade daquilo que ele irá receber quanto na quantidade. Assim, toda a quantidade e qualidade que estão fora dos seus limites, parecem ir contra a sua natureza, e por isso ele as rejeita. Então, esse “desejo de receber”, embora seja considerado uma força atrativa, é compelido a tornar-se também uma força de rejeição.

Uma Lei para todos os Mundos

Embora a sabedoria da Cabala não mencione nada de nosso mundo corpóreo, há somente uma lei para todos os mundos. Assim, para todas as entidades corpóreas em nosso mundo, significando tudo neste espaço, seja inanimado, vegetativo, animado, um objeto espiritual ou corpóreo, se quisermos distinguir o único, o próprio aspecto de cada uma delas, como elas se diferenciam umas das outras, mesmo na menor das partículas, consistem em nada mais do que um “desejo de receber”, que é toda a sua forma particular, do ponto de vista da novidade da criação, limitando-a tanto em quantidade quanto em qualidade, o que induz a presença da força atrativa e da força de rejeição.

Qualquer coisa além dessas duas forças interiores é considerada uma doação da Sua essência. E essa doação é igual para todas as criaturas, pois sendo extensão da existência desde a existência, a criação não traz novidade para ela. E ela não pode ser atribuída a nenhuma unidade particular, mas somente para coisas que sejam comuns a todas as partes pequenas ou grandes da criação. Pois cada uma dessas partes recebe dessa doação de acordo com seu desejo de receber, e sob essa limitação, define-se cada indivíduo ou unidade.

Então provei, por evidências, e de modo científico, o self (ego) de cada indivíduo, com provas sujeitas à crítica completa e científica por todos os lados, mesmo no que se refere ao sistema dos fanáticos materialistas automáticos. Daqui por diante não precisamos mais daqueles métodos estropiados, mergulhados em metafísica.

E naturalmente não faz diferença se essa força, o desejo de receber, é resultado e fruto da estrutura que foi materializada através da química, ou se essa estrutura é resultado e fruto dessa força. Pois sabemos que o principal é que somente essa força, impressa em todo ser e átomo do “desejo de receber”, dentro de suas limitações, é considerada a unidade, naquilo em que se separa de seu ambiente. E isso permanece verdadeiro tanto para um único átomo quanto para um grupo de átomos, chamado um corpo.

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Todos os outros aspectos, onde há algo além dessa força, não se referem de modo algum a essa partícula ou grupo de partículas, nem sob o aspecto de sua individualidade, nem em geral, o que é a doação, estendida a ela desde Deus, onde há uma matéria coletiva para todas as partes da criação, sem distinção de corpos criados especificamente.

Agora nós entenderemos o assunto da “liberdade do indivíduo” de acordo com a definição do primeiro fator, que nós chamamos de “leito”, em que todas as gerações prévias, que são os ancestrais desse indivíduo, imprimiram sua natureza. E como esclarecemos, o significado da palavra individual não é nada além das limitações do “desejo de receber”, impresso em seu grupo de partículas.

Então vocês podem ver que todas as tendências que o indivíduo herdou de seus ancestrais não são nada mais que limitações de seu “desejo de receber”, tanto pelo lado da força atrativa que existe nele, quanto pelo lado da força de rejeição que existe nele, que aparecem diante de nós como tendências para a mesquinharia ou generosidade, para combinar-se ou permanecer separado e assim por diante.

Por causa disto, essas tendências realmente são seu self (ego), lutando por sua existência. Então, se nós eliminarmos mesmo uma única tendência desse indivíduo particular, será como se nós tivéssemos arrancado um órgão de seus ossos. E isso também é considerado uma genuína perda para toda a criação, porque não há outro como ele, nem nunca haverá, em todo o mundo.

Após termos esclarecido suficientemente o direito do indivíduo de acordo com a lei natural, vamos nos voltar para observar o quanto isso pode ser posto em prática, sem comprometer a teoria da ética e da cidadania. E o mais importante: como isso pode ser corretamente aplicado por nossa santa Cabala.

Seguindo a maioria

Nossas escrituras dizem: “seguir a maioria”. Isso significa que onde quer que haja uma disputa entre o coletivo e o individual, nós somos obrigados a agir de acordo com o desejo do coletivo. Então vocês vêem que o coletivo tem o direito de expropriar a liberdade do indivíduo.

Mas nos deparamos com uma questão diferente aqui, ainda mais grave que a primeira, pois essa lei aparentemente faz a humanidade regredir, em vez de progredir. Porque enquanto a maioria da humanidade ainda está não desenvolvida, e os desenvolvidos são sempre uma pequena minoria, isso quer dizer que se você seguir o desejo da coletividade, que são os não desenvolvidos, e aqueles do coração apressado, as opiniões e desejos dos sábios e desenvolvidos, que são sempre a minoria, nunca serão levados em conta. E assim, sela-se o destino da humanidade para a regressão, pois ela não será capaz de dar sequer um único passo adiante.

No entanto, como foi dito no ensaio “A Paz”, sobre a “obrigação de respeitar as leis da natureza”, que já que estamos ordenados pela Providência a ter uma vida social, nós nos tornamos obrigados a observar todas as leis que lidam com a manutenção da sociedade. E se nós subestimarmos sua importância, mesmo numa extensão mínima, a natureza vai se vingar de nós, não importa se compreendamos ou não a razão da lei.

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E podemos ver que não há outro acordo para viver dentro de nossa sociedade, senão “seguir a maioria”, o que põe todas as disputas e tribulações da sociedade em ordem. Então, essa lei é o único instrumento que dá à sociedade o direito de existir. Por isso, essa lei é considerada um dos preceitos naturais da providência, e nós precisamos aceitá-la e guardá-la meticulosamente, mesmo quando não entendermos.

Este é como todos os outros preceitos (Mitzvot) na Torá, que são todas as leis da natureza e de Sua providência, que vieram a nós de cima para baixo. E já descrevi como toda a inflexibilidade que detectamos na conduta da natureza neste mundo, acontece somente porque é estendida e tomada de leis e condutores dos mundos superiores, espirituais.

Por isso, vocês também podem entender que as Mitzvot na Torá não são mais do que leis e condutores, estabelecidos nos mundos superiores, que são as raízes para todos os condutores da natureza neste mundo, como duas gotas numa piscina. E assim provamos que a lei de “seguir a maioria” é a lei da providência e da natureza.

O Caminho da Torá e o Caminho do Sofrimento

Ainda assim a questão sobre a regressão, que resultou dessa lei, ainda não foi resolvida. E de fato estamos preocupados em encontrar caminhos para consertar isto. Mas a providência, por si mesma, não falta por causa disso, pois ela já envolveu completamente a humanidade de dois modos: o “Caminho da Torá”, e o “Caminho do Sofrimento”. E isso, de um modo tal, que é uma garantia do contínuo desenvolvimento e progresso da humanidade na direção do objetivo, sem nenhuma reserva. De fato, obedecer a essa lei é um compromisso natural e necessário.

O Direito da Coletividade de Expropriar a Liberdade do Indivíduo

Então precisamos perguntar além, pois as coisas se justificam quando os assuntos envolvem temas entre duas pessoas. Pois então nós podemos aceitar a lei de “seguir a maioria”, através da obrigação da providência, que nos instrui a zelar pelo bem-estar e pela felicidade de nossos amigos. Mas a lei de “seguir a maioria” mantém-se válida na Torá em assuntos que envolvem discussões entre o homem e Deus, embora esses assuntos pareçam ser irrelevantes para a existência da sociedade.

Assim, a questão permanece: como podemos justificar essa lei, que nos obriga a aceitar a opinião da maioria, que é, como vimos, não desenvolvida, e a rejeitar e anular a opinião dos desenvolvidos, que são sempre uma pequena minoria?

Mas como demonstramos, as Mitzvot e a Torá somente foram dadas para purificar Israel, o que significa o desenvolvimento em nós do sentido de reconhecimento do mal, impresso em nós no nascimento, e que de modo geral se define como nosso amor próprio, e para chegarmos ao puro bem, definido como o “amor pelo próximo”, que é uma etapa para o amor a Deus.

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E os preceitos entre o homem e Deus caem nesse critério, por serem instrumentos da virtude que separa o homem do amor próprio, que é nocivo à sociedade. Fica óbvio então que os tópicos da discussão relativa aos preceitos entre o homem e Deus, relacionam-se com o problema do direito da sociedade a existir. Então, eles também se enquadram no plano geral de “seguir a maioria”.

Agora podemos entender o condutor da discriminação entre Halachah (lei judaica) e Agadah (espécie de literatura judaica). Porque somente na Halachah há a lei do “individual e coletivo, sendo a Halachah o coletivo”. E isto não é assim na Agadah, porque os temas da Agadah estão acima dos assuntos relativos à existência da sociedade; pois eles tratam exatamente do assunto da condução do povo em temas relativos ao homem e Deus, naquela mesma parte em que a existência e felicidade física da sociedade não têm conseqüência.

Então, não há justificativa para que o coletivo anule a opinião do indivíduo, e “todo homem fez o que julgava justo a seus próprios olhos”. Enquanto no que se refere às Halachot (ritual judaico, leis que lidam com assuntos específicos), que lidam com a observação dos preceitos da Torá, elas caem sob a supervisão da sociedade, pois não pode haver outra ordem senão a lei de “seguir a maioria”.

A Sociedade deve obedecer a Lei de “Seguir a maioria”

Assim chegamos a um claro entendimento da afirmação da liberdade do indivíduo. Porque de fato é de se perguntar aonde o coletivo tomou o direito de expropriar a liberdade do indivíduo e negar-lhe a coisa mais preciosa da vida, a liberdade. Aparentemente, não há mais do que força bruta aí.

Mas como esclarecemos acima, trata-se de uma lei natural e um decreto da providência, pois como a providência nos compele a conduzir uma vida social, é óbvio que cada pessoa é obrigada a assegurar a existência e o bem-estar da sociedade. E isto somente pode acontecer pela imposição da conduta de “seguir a maioria”, e ignorar a opinião do indivíduo.

Então vocês podem ver que esta é a origem de todo o direito e a justificação para que o coletivo tenha que expropriar a liberdade do indivíduo, contra a sua vontade, e colocá-lo sob a sua autoridade. Assim se entende que no que se refere aos assuntos que não dizem respeito à existência da vida material da sociedade, não há justificativa para que o coletivo roube e abuse da liberdade do indivíduo de forma alguma. E se o coletivo fizer isso, será considerado assaltante, ladrão, que prefere a força bruta a qualquer direito e justiça no mundo, porque aqui não se aplica a obrigação do indivíduo obedecer ao coletivo.

Em Espiritualidade, “Seguir o Indivíduo”

Resulta que no que se refere à vida espiritual, não há obrigação natural para que o indivíduo se submeta à sociedade de modo algum. Ao contrário, aqui se aplica uma lei

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natural sobre o coletivo, para que se submeta à autoridade do indivíduo. E está explicado no artigo “A Paz”, que há dois modos pelos quais a providência nos formatou e nos cercou, de modo a nos conduzir à finalidade. Eles são:

A. O caminho do sofrimento, que impõe sobre nós o desenvolvimento, sem levar nossa opinião em consideração.

B. O caminho da Torá, que nos desenvolve conscientemente, sem nenhuma agonia ou coerção.

E já que o mais altamente desenvolvido na geração é definitivamente o indivíduo, resulta que quando pessoas comuns desejam se libertar da terrível agonia, e adotar o desenvolvimento consciente, que é o caminho da Torá, eles não têm escolha além de se submeter, a si e à sua liberdade física, à disciplina do individual, e obedecer às ordens e remédios que essa disciplina lhes oferecerá.

Então vocês podem ver que em assuntos espirituais a autoridade do coletivo é contrariada, e a lei de “Seguir o indivíduo (desenvolvido)” é aplicada. Pois é fácil de ver que os desenvolvidos e educados em cada sociedade são sempre uma pequena minoria. Resulta que o sucesso e o bem-estar da sociedade está nas mãos de uns poucos.

Assim o coletivo é obrigado a observar meticulosamente a opinião dos poucos, para que não pereça neste mundo. Pois é preciso saber com absoluta certeza que as opiniões mais desenvolvidas e verdadeiras nunca estão nas mãos da autoridade coletiva, mas sim nas mãos dos mais fracos, ou seja, nas mãos de uma minoria impossível de identificar. Pois toda a sabedoria e tudo o que é precioso, vem ao mundo em pequenas quantidades. Assim nós somos advertidos a preservar as opiniões de cada indivíduo, por causa da inabilidade do coletivo de dizer o que é certo ou errado entre eles.

A crítica traz sucesso, a falta disto causa degeneração

Além disso precisamos acrescentar que a realidade oferece aos nossos olhos uma extrema contradição entre os assuntos físicos, e os conceitos e idéias relativos ao assunto acima. Pois o tema da unidade social, que pode ser uma fonte para toda a alegria e sucesso, é praticado somente entre corpos, e assuntos corporais nas pessoas, e a separação entre eles é a fonte de toda calamidade e infortúnio.

Mas no que se refere a conceitos e idéias, é o completo oposto. Isso quer dizer que a unidade e a falta de crítica é considerada a fonte de todas as falhas e o maior obstáculo para todo o progresso e fertilização didática; pois extrair as conclusões corretas depende principalmente da multiplicidade de desacordos e separação entre opiniões. Quanto mais contradições haja entre opiniões, quanto mais crítica, mais o conhecimento e a sabedoria aumentam e os assuntos se tornam mais apropriados ao exame.

A degeneração e declínio da inteligência têm origem somente na ausência de crítica e desacordo. Pois é evidente que toda a base para o sucesso físico está na medida da

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unidade da sociedade, e a base para o sucesso da inteligência e do conhecimento, é a separação e o desacordo entre os seus membros.

Resulta assim que quando a humanidade tiver sucesso no que se refere ao sucesso dos corpos, quer dizer, trazendo-os para o grau de completo amor ao próximo, todos os corpos no mundo se unirão em um único corpo e um único desejo. E somente então toda a felicidade destinada à humanidade será revelada em toda a sua glória. Mas para que isso possa acontecer, precisamos tomar o cuidado de não aproximar demais as opiniões das pessoas, pois isso poderia acabar com o desacordo e a crítica entre os sábios, pois o amor do corpo traz consigo o amor à mente. E se a crítica e o desacordo desaparecerem do mundo, todo o progresso em conceitos e idéias cessará também, e a fonte do conhecimento no mundo secará.

Esta é a prova da obrigação de cautela com a liberdade do indivíduo no que se refere aos conceitos e idéias. Pois o total desenvolvimento da sabedoria está baseado nessa liberdade do indivíduo. Então, somos advertidos a preservar muito atentamente cada forma entre nós, a que chamamos “indivíduo”, que é a força particular de uma única pessoa, genericamente chamada “o desejo de receber”.

Herança ancestral

Todos os detalhes que esse desejo de receber inclui, nós definimos como “o leito”, ou o Primeiro Fator, cujo significado inclui todas as tendências e costumes herdados de seus ancestrais, que descrevemos como uma longa corrente consistente de milhares de pessoas que já estiveram vivas, que permanecem uma no topo da outra, pois cada uma delas é uma gota essencial de seus ancestrais. E essa gota, que cada um de nós recebe, traz consigo as posses de seus ancestrais, em sua “medula oblongata” (o cérebro estendido), também chamado subconsciente. Então o indivíduo diante de nós tem em seu subconsciente todos os milhares de heranças espirituais de todos os indivíduos que aparecem nessa corrente, que são seus ancestrais.

Então, assim como diferem as faces das pessoas, diferem suas opiniões. Não há duas pessoas na terra cujas opiniões sejam idênticas, porque cada pessoa tem uma posse grande e sublime, que ela herda de seus ancestrais, da qual os outros não têm nem mesmo uma pequena parte.

Assim, todas essas posses são consideradas a propriedade individual, e a sociedade é advertida a preservar seu sabor e espírito, e evitar que o ambiente os esmaeça, e a preservar a integridade da herança de cada indivíduo. Então, a contradição e a diferença entre os indivíduos permanecerão para sempre, de modo a assegurar a crítica e o progresso da sabedoria por toda a eternidade, pois isso é o real benefício e o eterno desejo da humanidade.

A após temos chegado a uma certa porção de reconhecimento da individualidade do homem, que nós determinamos como uma força e um “desejo de receber”, como o ponto essencial do simples ser, nós também esclarecemos, com todas as suas fronteiras, a medida da propriedade original de cada corpo, que definimos como “herança ancestral”. E isso significa que todos os poderes das tendências e dos atributos vieram a esse “leito”

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por herança, que é a primeira substância de todo homem, a gota preliminar de sêmen de seus antepassados. Agora, podemos esclarecer os dois aspectos do desejo de receber.

Dois aspectos: A) A força potencial, e B) A força efetiva

Para começar, precisamos entender que essa individualidade, que nós definimos como o “desejo de receber”, embora seja a própria essência do homem, não pode existir na realidade nem mesmo por um segundo. Por isso ela é chamada de força potencial, ou seja, antes que ela se torne efetiva, ela somente existe em nosso pensamento, o que significa que somente o pensamento pode defini-la.

Mas de fato, não pode haver nenhuma força efetiva no mundo que esteja adormecida e inativa. A força somente existe no mundo quando é revelada em ação. Do mesmo modo, vocês não podem dizer sobre uma criança que ela tem muita força, quando ela não pode levantar nem mesmo um pequeno peso, mas é possível dizer que essa criança, quando crescer, terá muita força.

Porém, nós dizemos que essa força que nós encontramos no homem quando ele cresce já estava presente em seus órgãos e em seu corpo quando ele era uma criança; a força estava oculta, não era aparente.

É verdade que em nossas mentes nós podemos determinar “a força futura”, e é assim, porque a mente o afirma. Porém, no corpo da criança, atualmente, de fato não há nenhuma força, pois nenhuma força é revelada pelas suas ações.

Da mesma forma, com o apetite: ele não aparece na realidade do corpo humano, quando os órgãos não podem comer, ou seja, quando ele está saciado. Mas mesmo quando a pessoa está saciada, há a força do apetite, embora esteja oculta no corpo. Após algum tempo, quando a comida tiver sido digerida, o apetite reaparecerá, e se tornará, de força potencial, em força efetiva.

Porém, uma tal determinação de uma força potencial, que ainda não foi revelada, é uma elaboração do pensamento; isso não existe na realidade, porque quando saciados, nós sentimos com certeza que a força do apetite desapareceu e se vocês a procurarem, não a encontrarão de modo algum.

Resulta que não podemos estabelecer uma força potencial como algo que exista por si, mas somente como um predicado. Isso quer dizer que quando a ação acontece na realidade, nesse momento a força é revelada no interior da ação.

E que seja por meio da dedução, nós necessariamente encontraremos aqui duas coisas, um sujeito e um predicado: a força potencial e a força efetiva, em que o apetite é o sujeito e a figura imaginária do prato é o predicado e a ação. Na realidade, porém, eles aparecem como um só. E nunca ocorrerá que uma pessoa sinta apetite sem imaginar o prato que ela deseja comer, de modo que esses são dois aspectos da mesma coisa. A força do apetite precisa ser erguida dessa imagem. Nós chamamos a essa ação de “desejo”, o que significa a força do apetite revelada na ação da imaginação.

E assim também no que se refere ao nosso tópico, o desejo geral de receber, que é a própria essência do homem. Ele se revela e existe somente revestido nas formas dos objetos que são prováveis de receber. Pois então ele existe como o sujeito, e em nenhum

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outro modo. Nós chamamos essa ação de Vida, o que significa a Subsistência do Homem, ou seja: a força do Desejo de Receber se reveste e age no interior dos objetos desejados. E como explicamos, essa medida de revelação é a medida de sua vida, no ato que chamamos Desejo.

Duas criações: A) O Homem, e B) a Alma Viva

Do exposto, podemos entender claramente o verso: “E o Senhor formou o homem do pó do solo, e soprou em suas narinas o sopro da vida; e o homem tornou-se uma alma (Nefesh) viva (Chayah)” (Gen. 2,7). Aqui encontramos duas criações:

A) o próprio Homem, e

B) a própria alma viva.

E o verso diz que o homem foi criado, como poeira do solo, isto é uma coleção de partículas nas quais reside a essência do homem, significando seu “desejo de receber”. Esse desejo de receber está presente, como esclarecemos, em cada partícula da realidade, da qual emanam os quatro tipos: inanimado, vegetativo, animado e falante. Nesse aspecto o homem não se diferencia de nenhuma das outras partes da criação, como o verso diz: “pó do solo”.

Mas vimos que essa força, chamada o Desejo de Receber, não pode existir sem revestir um objeto desejado e agir nele, uma ação chamada Vida. E assim chegamos a que, antes que o homem tivesse chegado às formas humanas de recepção do prazer, que diferem daquelas de outros animais, ele era considerado como uma pessoa sem vida, morta. Isto é assim porque seu desejo de receber não tinha lugar para revestir e expor suas ações, que são as manifestações da vida.

E está dito: “e soprou em suas narinas o sopro da vida”, que é a forma geral de recepção apropriada para o homem. As palavras “sopro da” em hebraico assumem o significado de “valor”, e a origem da palavra “sopro” é entendida do verso: “O espírito de Deus me fez, e o sopro do Todo-Poderoso deu-me vida” (Job, 33,4). A palavra alma (Neshamah) tem a mesma estrutura das palavras “ausente” (Nifkad), “acusado” (Ne”esham) e assim por diante.

E o significado das palavras “e soprou em suas narinas” é que ele inseriu em si mesmo uma alma (Neshamah) e uma apreciação da vida, que é a soma total das formas que valem a recepção, segundo seu Desejo de Receber.

Então essa força, o desejo de receber, que se continha em suas partículas, encontrou um lugar para se revestir de uma forma e agir, o que significa, naquelas formas de recepção que ele atingiu do Senhor, e essa ação, como dissemos, é chamada Vida.

E o verso conclui: “e o homem tornou-se uma alma viva”. Isto quer dizer que, no momento em que o desejo de receber começou a agir na medida daquelas formas de recepção, a vida instantaneamente se revelou nele, e ele “tornou-se uma alma viva”. Porém, antes de atingir essas formas de recepção, embora a força do Desejo de Receber

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tenha sido impressa nele, ele ainda é considerado um corpo sem vida, porque não há lugar para que a ação venha a ser.

E como dissemos acima, embora a essência do homem seja apenas o Desejo de Receber, ele ainda é considerado a metade do total, porque ele precisa se revestir numa realidade que surja em seu caminho. Por essa razão, o desejo de receber e a imagem de sua posse são de fato a mesma coisa, pois de outro modo ele não teria o direito de existir nem mesmo por um momento.

Assim, quando a máquina do corpo está em seu auge, ou seja, até a meia-idade, seu “ego” mantém-se erguido em toda a altura que lhe foi impressa no nascimento. Por causa disso ele sente em si mesmo uma grande quantidade de desejo de receber, ou seja, ele quer atingir riqueza, honra ou qualquer coisa que surja em seu caminho. Isso é por causa da perfeição do “ego” humano, que atrai formas de estruturas e conceitos, de que se reveste, e se sustenta através delas.

Mas, quando a metade da vida tiver transcorrido, começam os dias de declínio, que por definição são seus dias de morrer. Isto é porque a pessoa não morre em um instante, assim como foi trazida à vida. Em vez disso, essa vela, sendo o seu “ego”, enfraquece e morre pouco a pouco, e com ela morrem as imagens e as posses que ele quer receber.

Daqui por diante a pessoa começa a deixar de lado muitas das posses com que sonhou em sua juventude, e também as maiores posses, conforme os anos vão passando, até que em seus dias de velhice, quando a sombra da morte paira sobre ela, a pessoa se encontra em “tempos sem pedido”. Isso é assim porque seu desejo de receber, que é seu “ego”, enfraquece e morre e tudo o que sobra é uma minúscula centelha, oculta do olhar, o que significa que não é revestida de nenhuma expectativa de benefício. Assim não há pedido e esperança nesses dias, para nenhuma espécie de recepção.

Então, provamos que o desejo de receber, junto com a imagem do objeto que se espera receber, são uma única coisa. E sua revelação é igual, sua estatura é igual, e assim a duração de seus dias. Porém, aqui há uma distinção significativa, na forma de rendição, na época do declínio da vida. Pois essa rendição não é resultado de saciedade, mas de desespero. Quer dizer que quando o “ego” começa a morrer, durante o tempo do declínio, ele sente sua própria fraqueza e a aproximação da morte. Assim ele deixa de lado e desiste dos sonhos e esperanças de sua juventude.

Observem cuidadosamente a rendição devida à saciedade, que não causa tristeza e não pode ser chamada de “morte parcial”, mas como um operador que cessou de operar. De fato o abandono causado pelo desespero é pleno de dor e tristeza, e por isso pode ser chamado de “morte parcial”.

A libertação do Anjo da Morte

E agora, após tudo o que aprendemos, encontramos uma maneira de compreender as palavras de nossos sábios em seu verdadeiro significado, quando eles disseram: “Entalhado (charut) nas pedras. Não pronuncie entalhado (charut), mas sim, “liberdade” (cherut), pois eles foram libertados do anjo da morte. Pois como foi dito nos artigos “A Revelação da Divindade” (Matan Torá) e O Vínculo (Ha”arvut), antes da recepção da Torá,

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eles se propuseram a dar fim a qualquer propriedade privada, na medida em que se expressa pelas palavras “Um Reino de Sacerdotes” (Mamlechet Cohanim), e eles se propuseram a assumir o propósito da criação, de ascender a Ele em equivalência de forma, e como Ele doa e não recebe, eles doarão e não receberão, o que é o maior grau de adesão, expresso pelas palavras Nação Santa, como se diz no final do artigo “O Vínculo”.

E assim conduzi vocês a compreender que a essência do homem, seu próprio ser, definido pelo desejo de receber, é somente a metade, e não pode existir senão revestindo-se em alguma imagem de benefício ou em esperança de um benefício. Pois somente então nossa matéria está completa, e pode ser chamada a Essência do Homem.

Resulta que quando os Filhos de Israel atingiram completa adesão, nessa santa ocasião, seus vasos de recepção tinham sido completamente esvaziados de todos os benefícios mundanos, e tinham ascendido a Ele em equivalência de forma. Isso significa que eles não tinham nenhum desejo de possuir algo para si mesmos, mas somente na medida em que eles pudessem doar contentamento e que seu Autor pudesse se deliciar com eles.

E quando seu desejo de receber se revestiu da imagem desse objeto, ele se revestiu e se vinculou a ele em uma completa unificação. Assim, certamente eles se libertaram do anjo da morte, pois a morte é necessariamente um aspecto de ausência e negação da existência de um certo objeto. Mas somente enquanto há uma centelha que deseja existir para seu próprio prazer, pode-se dizer que essa centelha não existe, mas sim que está ausente, e morta.

Mas se não houver uma tal centelha no homem, mas todas as centelhas de sua essência se revestirem da forma de doação de contentamento ao seu Autor, então ele não estará ausente nem morto. Pois mesmo quando o corpo se anula, ele somente se anula sob o aspecto da recepção de auto-gratificação, no qual o desejo de receber está revestido, e não tem direito de existir senão através dessa recepção.

Porém, quando a pessoa anseia pelo propósito da criação, e Deus tem prazer nela, pois Sua vontade está sendo cumprida, a essência do homem se reveste do contentamento do Criador e ele atinge total imortalidade, assim como Ele. Resulta que agora ele atingiu a liberdade do anjo da morte. Como se diz no Midrash: “Liberdade do anjo da morte”. E na Mishnah: “Entalhado (charut) nas pedras”. Não pronunciem “charut” (entalhado), mas sim “cherut” (liberdade), pois não há homem livre, senão aquele que estuda a Cabala.

Matan Torá“Ama ao próximo como a ti mesmo (Levítico 19, 18 )”

Rabbi Akiva diz: “esta é uma grande regra na Torá”

1) Essa afirmação exige explicação. Porque a palavra lei (a palavra lei em hebraico também significa total – Chaim Ratz) indica uma soma de detalhes que, quando reunidos, formam o total acima. Portanto quando ele diz, sobre a mitzvah “ama ao próximo como a ti mesmo”, que esta é uma grande regra na Torá, devemos entender que todas as outras

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612 mitzvot (preceitos) na Torá, com todas as suas interpretações, não são mais nem menos que a soma dos detalhes inseridos e contidos nessa única mitzvah de “ama ao próximo como a ti mesmo”. Isso é surpreendente, porque pode ser dito quanto aos preceitos entre o homem e seu próximo, mas como é possível que esse único preceito dê fundamento a todos os preceitos entre o homem e o Senhor, que são a vasta maioria?

2) E ainda que nós nos esforcemos para encontrar um modo de conciliar suas palavras, vem-nos um segundo dito, ainda mais notável, sobre um convertido que se apresentou a Hilel e pediu-lhe: “Ensina-me toda a Torá enquanto eu fico num pé só”. E ele respondeu: “nada que você odeia, faça ao seu amigo (a tradução do Aramaico para “ama ao próximo como a ti mesmo”) e o resto significa: vá estudar”. Apresenta-se então uma clara lei (Halacha), que em todos os 612 preceitos e todos os escritos na Torá não há nenhum preferível ao “ama ao próximo como a ti mesmo”, porque eles somente procuram interpretar e permitir-nos observar o preceito de amar ao próximo sem reservas, pois ele diz especificamente: “o resto significa: vá estudar”. Isso quer dizer que todo o resto da Torá são interpretações desse único preceito, que não pode ser completo senão pelos outros.

3) Antes que nos aprofundemos no âmago disto, precisamos observar esse preceito cuidadosamente, como nos foi dito: “ama ao próximo como a ti mesmo”. A expressão “a ti mesmo” nos diz que é preciso amar ao amigo na mesma medida em que você ama a si mesmo, e de modo algum menos do que isso. Quer dizer que você precisa constantemente estar alerta para satisfazer as necessidades de cada um da nação israelita, assim como você está alerta para satisfazer às suas próprias. Isso é completamente impossível, pois não são muitas as pessoas que podem satisfazer suas próprias necessidades durante o dia de trabalho, assim, como se pode dizer a elas que satisfaçam os desejos da nação inteira? E nós não podemos de modo algum pensar que a Torá exagera, pois ela nos avisa para não adicionar nem subtrair, para demonstrar que essas palavras são leis que nos foram dadas com extrema precisão.

4) E se isso ainda não for o bastante para vocês, deixem-me dizer que a simples explicação desse preceito de amar seu companheiro é ainda mais severa – pois nós devemos colocar as necessidades de nossos amigos à frente das nossas próprias, como nossos sábios escreveram quanto ao versículo “porque ele está feliz contigo (Deuteronômio, 15, 16)”, que se refere ao escravo hebreu: “se ele tiver só um travesseiro, e se ele dormir com esse travesseiro e não o der ao seu escravo, ele não observa “porque ele está feliz contigo”, pois ele se deita em um travesseiro e o escravo, no solo. E se ele não se deitar no travesseiro, mas também não o der ao escravo, esta é a lei sodomita. Portanto, contra a sua vontade, ele deve dar o travesseiro ao escravo, enquanto o mestre dorme no chão”.

Também encontramos a mesma instrução na frase sobre a medida do amor ao próximo, pois aqui também se compara a satisfação das necessidades do amigo com a satisfação das próprias necessidades, como no exemplo “porque ele está feliz contigo”, relativo ao escravo hebreu. Assim aqui também se ele tem apenas uma cadeira e seu

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amigo não tem nenhuma, há um veredicto de que se ele se sentar na cadeira e não a der ao seu amigo, ele descumpre o mandamento de “ama ao próximo como a ti mesmo”, porque ele não satisfez as necessidades de seu amigo como ele satisfaz as suas próprias. E se ele não se sentar na cadeira, nem a der ao seu amigo, isso é tão ruim quando a regra sodomita. Assim ele precisa deixar que seu amigo se sente na cadeira enquanto ele fica de pé, ou senta-se no chão. Entende-se que esta é a lei relativa a tudo o que está ao seu dispor, que seu amigo não tem. E agora vamos ver se esse preceito é de algum modo praticável.

5) Primeiro nós precisamos entender por que a Torá foi dada à nação israelita e não a todos os povos no mundo. Será que há, D”us proíba, algum nacionalismo envolvido aqui? Naturalmente, apenas uma pessoa insana poderia pensar assim. De fato nossos sábios examinaram essa questão, e isso é o que eles querem dizer com as palavras: “D”us a deu a todas as nações e línguas, e eles não quiseram recebê-la”.

Mas o que eles acham surpreendente é por que então, nós fomos chamados o povo escolhido, como está escrito: “o Senhor vosso D”us vos escolheu (Deuteronômio 7,6)”, se não havia outra nação que quisesse isso? Além do mais, pode ser que o Senhor tenha vindo com a Torá em Suas mãos para negociar com esses povos selvagens? Uma tal coisa nunca foi ouvida antes e é completamente inaceitável.

6) Mas quando nós entendermos completamente a essência da Torá e das mitzvot que nos foram dadas, e o seu propósito, como nossos sábios nos instruíram, que é o propósito da grande criação que está diante de nossos olhos, então compreenderemos tudo. Pois o primeiro postulado é que não há ato sem propósito. E não há exceção aqui, a não ser para os seres humanos mais humildes, ou para as crianças. Assim, é certo que o Criador, cuja exaltação está acima de nossa compreensão, não praticaria um ato grande ou pequeno sem um propósito.

Sobre isso, nossos sábios nos dizem que o mundo foi criado apenas para o propósito de observar Torá e mitzvot, ou seja, como aprendemos de nossos sábios, que o objetivo do Criador desde quando Ele criou Sua criação, é revelar Sua Divindade a outros. Porque a revelação de sua Divindade atinge a criatura como uma prazerosa generosidade, sempre crescente, até que atinja a medida desejada. E assim os humildes se elevam com verdadeiro reconhecimento e tornam-se a carruagem para Ele, e ascendem a Ele até que encontrem sua plenitude final: “nem os olhos viram um D”us além de Ti (Isaías 64,3)”. E por causa da grandeza e glória dessa perfeição, nem a Torá nem a profecia exprimiram uma única palavra de exagero aqui, como dizem nossos sábios: “Todos os profetas não fizeram suas profecias, senão para os dias do Mashiach, para o mundo vindouro, nem o olho viu um D”us além de Ti”.

Essa perfeição está expressa na Torá, na profecia e nas palavras de nossos sábios, pela simples palavra “adesão”. Mas pelo uso comum dessa palavra pelas massas, ela perdeu quase todo o seu conteúdo. Mas se você detiver sua mente sobre essa palavra somente por um instante, você será inundado por sua maravilhosa dimensão, pois você poderá imaginar a exaltação do Criador e a humildade da criatura, poderá perceber o que

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significa adesão das criaturas com o Criador e por que nós atribuímos a essa palavra o propósito da inteira criação.

Portanto o propósito da inteira criação é que as humildes criaturas sejam capazes, através da observação da Torá e das mitzvot, de elevar-se mesmo acima, até que alcancem a adesão com seu Criador.

7) Mas aqui vêm os Cabalistas e perguntam: Por que nós já não fomos criados nessa elevada dimensão de adesão, desde o início? Que razão Ele teria para nos dar esse fardo e o labor da criação, e a Torá e as mitzvot? E eles responderam: “Aquele que come aquilo que não é seu, tem medo de olhar na sua face”, ou seja, aquele que come e tem prazer naquilo que vem do labor de seu amigo tem medo de olhar na sua face, porque assim ele se torna mais e mais humilhado até que perca toda a humanidade. E porque aquilo que emana da Sua perfeição não pode ser falho, Ele nos deu lugar para ganhar nossa própria exaltação, através de nosso trabalho em Torá e mitzvot.

Essas palavras são extremamente profundas e eu já as expliquei em meu livro Panim Me”irot and Mashbirot para a Árvore da Vida na primeira divisão, e no livro Talmud Esser haSefirot – Reflexão Interna, Parte 1. Aqui eu as explicarei resumidamente para que todos as entendam.

8 ) É como um homem rico, que escolhe um homem no mercado e o alimenta, e dá-lhe ouro e prata e tudo o que ele deseje todos os dias, e a cada dia o cobre com mais presentes do que no dia anterior. Finalmente o homem rico pergunta: por favor, me diga, todos os seus desejos foram satisfeitos? E o homem pobre do mercado responde, não ainda, pois como seria prazeroso e maravilhoso se todas essas posses e coisas preciosas viessem a mim através de meu próprio trabalho, como vieram a você, e eu não estivesse recebendo a caridade das suas mãos. O homem rico disse então: nesse caso, nunca nasceu uma pessoa que pudesse satisfazer seus desejos.

Isso é natural, porque por um lado ele experimenta um grande prazer e aproveita as coisas mais e mais, na medida em que o homem rico as dá, mas por outro lado, é duro para ele tolerar a vergonha da excessiva bondade com que o rico o agracia. Isto porque há uma lei natural, de que o receptor sinta vergonha e impaciência ao receber presentes gratuitos do doador, como resultado da compaixão ou piedade. Daqui deriva uma segunda lei, de que nunca haverá ninguém capaz de satisfazer completamente as necessidades de seu amigo, porque ao fim não poderá dar a ele a natureza e a forma da auto-possessão, que somente se atinge com a desejada perfeição.

Mas isso se refere somente às criaturas, enquanto que, quanto ao Criador, é completamente impossível e inaceitável. E é por isso que Ele preparou para nós a labuta e a preocupação com Torá e mitzvot, para produzirmos nossa exaltação por nós mesmos, porque então a delícia e o prazer que d’Ele, vêm a nós, ou seja, tudo o que está incluído na adesão com Ele, serão nossas posses, que vieram a nós através de nossos próprios esforços. Então nós nos sentiremos como os proprietários, sem o que, não é possível haver a sensação de plenitude.

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9) De fato nós precisamos examinar o coração e a fonte dessa lei natural, e quem é que gerou o flagelo da vergonha e impaciência que nós sentimos quando recebemos caridade de alguém. É uma lei reconhecida pelos cientistas, que cada ramo traga a mesma natureza de sua raiz, e que todos os comportamentos da raiz, o ramo também deseje, procure e anseie. E por outro lado, todos os comportamentos que não estejam na raiz, seu ramo se distancia deles e não consegue tolerá-los, e é prejudicado por eles. Essa lei se encontra entre cada raiz e cada ramo, e não pode ser quebrada.

Agora se abre perante nós a porta para compreender a fonte de todos os prazeres e dores que subsistem neste mundo. Pois como o Senhor é a raiz de suas criações, tudo o que subsiste nEle e se estende a nós, diretamente dEle, nós sentimos como prazeroso, delicioso, porque nossa natureza está próxima à nossa raiz.

Comportamentos que não subsistam nEle, e que não se estendam diretamente dEle, de acordo com a própria polaridade da criação, são contra nossa natureza e difíceis para nós de tolerar. Por exemplo, nós amamos descansar e odiamos nos mover muito, de modo que nós não fazemos nem um único movimento se não for para atingir o repouso. Isto é porque nossa raiz é imóvel, em constante repouso, e nenhum movimento existe nEle, D”us proíba. Assim, o movimento também é odiado por nós, e contrário à nossa natureza.

Pelo mesmo raciocínio, nós amamos a sabedoria, a força e a riqueza, porque tudo isto subsiste nEle, que é nossa raiz. E assim nós odiamos seus opostos, tais como a tolice, a fraqueza e a pobreza, porque não subsistem nEle, e por isso nos são intoleravelmente odiosos e nocivos.

10) É isto que nos dá o intolerável sabor da vergonha e impaciência quando recebemos caridade de outros, por meio da caridade, porque no Criador não existe, D”us proíba, nada parecido com a recepção de favores, porque de quem Ele poderia receber? E como esse elemento não existe em nossa raiz, nós o sentimos como repulsivo e asqueroso. Por outro lado, nós sentimos delícia e prazer com cada doação que fazemos aos outros, pois nosso comportamento subsiste em nossa raiz, que é benevolente.

11) Agora encontramos um modo de investigar o propósito da criação, que é a adesão com Ele em sua verdadeira aparência. Essa exaltação e adesão, que está garantida a vir a nós através de nosso trabalho em Torá e mitzvot, não é mais nem menos que a equivalência dos ramos com sua raiz, da qual cada bondade, prazer e sublimidade torna-se uma extensão natural - como dissemos acima, esse prazer está somente na equivalência de forma com o Criador. E quando nos equalizamos a cada comportamento que está em nossa raiz nós sentimos delícia, e tudo o que não está em nossa raiz torna-se intolerável, repugnante ou consideravelmente doloroso para nós. E nós naturalmente achamos que nossa única esperança depende de nossa equivalência com nossa raiz.

12) Essas são as palavras de nossos sábios quando perguntaram: “Por que D”us se importaria se alguém corta (*para matar o gado) na garganta ou no pescoço?” – Afinal, as mitzvot foram dadas para purificar o povo, e essa purificação significa a purificação do corpo sombrio, que é o propósito que emerge da observação das mitzvot.

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“Uma mula selvagem se transformará em homem” (Jó, 11,12), porque quando ele sai do âmago da criação, ele está em extrema imundície e baixeza, ou seja, uma multiplicidade de amor próprio que está impressa nele, de quem cada movimento gira somente em torno de si mesmo, sem uma partícula de doação aos outros.

Nessa situação ele está na mais extrema distância da raiz, na outra extremidade, pois a raiz é toda doação sem nenhuma ínfima sugestão de recepção, enquanto o recém-nascido é totalmente recepção para si mesmo, sem nenhuma ínfima sugestão de doação. Por isso essa situação é considerada como o ponto mais baixo e corrupto, que é nosso mundo humano.

Na medida em que ele cresce, ele recebe de seu ambiente porções de “doação aos outros”, dependendo dos valores e do desenvolvimento de seu ambiente. E então ele é iniciado em Torá e mitzvot pelo propósito do amor próprio, para recompensa neste mundo e no próximo, o que é chamado não para o Seu nome, porque ele não pode ser acostumado de outra forma.

Quando ele cresce mais alguns anos, ele é ensinado como deve observar mitzvot em Seu nome, o que significa, com uma especial intenção, somente para trazer contentamento ao seu Criador, como disse o RAMBAM: “não se deve dizer a mulheres e crianças para observar Torá e mitzvot pelo Seu nome, porque não podem suportar isto. Somente quando crescem e adquirem conhecimento e sabedoria pode-se lhe dizer para trabalhar pelo Seu nome”. E como disserem nossos sábios: “de não pelo Seu nome, a pessoa vem a pelo Seu nome”, o que é definido como a intenção de dar contentamento ao seu Criador, e não por nenhum amor próprio.

Através do remédio natural do estudo de Torá e mitzvot pelo Seu nome, que o doador da Torá conhece, nossos sábios disseram: “o Criador disse: eu criei a má inclinação, e criei a Torá como tempero”, que a criatura desenvolve e marcha adiante em degraus da supra citada exaltação, até que ela perca todas as reminiscências de amor próprio e todas as mitzvot em seu corpo aflorem, e ela desempenhe todas as suas ações somente para beneficiar, de modo que até mesmo a necessidade que ela receba flua na direção da doação, ou seja, para que ela possa doar. E isso é o que nossos sábios disseram: “as mitzvot não foram doadas senão para purificar o povo com elas”.

13) Há duas partes na Torá: 1) mitzvot entre o homem e D”us, e 2) mitzvot entre o homem e seu próximo, e ambas almejam a mesma coisa – trazer a criatura ao propósito final de adesão com Ele.

Além disso, mesmo o lado prático de ambas é realmente um e o mesmo, porque quando alguém pratica um ato pelo Seu nome, sem nenhuma mistura de amor próprio, ou seja, sem encontrar nenhum benefício para si mesmo, então a pessoa não sente nenhuma diferença em estar trabalhando pelo amor de seu próximo ou pelo amor do Criador.

Isto é porque é uma lei natural para qualquer ser que qualquer coisa fora de seu próprio corpo seja considerada irreal e vazia, e qualquer movimento que a pessoa faça para amar seu próximo, ela o faz pela luz que retorna, e receberá alguma recompensa que finalmente virá a ela e lhe servirá para seu próprio bem. Portanto, tal ato não pode ser considerado “amor ao próximo”, porque é julgado pelo seu fim, e é como o aluguel, que ao final não é pago. Porém, o ato de alugar não é considerado amor ao próximo.

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Mas fazer qualquer espécie de movimento tendo como causa somente o amor aos outros, ou seja, sem uma partícula de luz em retorno, e nenhuma esperança de qualquer espécie de autogratificação é completamente impossível. Sobre isto, diz-se no Zohar que “todo ato de misericórdia que eles praticam é apenas para si mesmos”.

Isso significa que todas as boas ações que eles fazem, seja para seus amigos ou para seu D”us, não são por causa de seu amor pelos outros, mas por causa de seu amor por si mesmos. E isso é assim, porque isto (*o amor ao próximo) é completamente anti-natural.

Assim, somente aqueles que observam Torá e mitzvot estão qualificados para isto, porque treinando-se para observar Torá e mitzvot para dar contentamento ao seu Criador, a pessoa gradualmente se separa do âmago da criação natural e adquire uma segunda natureza, que é o supra-mencionado amor ao próximo.

Foi isto que trouxe os Cabalistas do Zohar a excluir as nações do mundo do problema de amar ao próximo, quando disseram que “cada ato de misericórdia que eles praticam é apenas para si mesmos”, porque elas não estão envolvidas em observar Torá e mitzvot em Seu nome, e o tema de sua adoração a seus deuses é por confiar na recompensa neste mundo e no próximo. Portanto, sua adoração aos seus deuses é por causa de seu amor próprio, e eles nunca praticarão nenhuma ação que esteja fora dos limites de seus próprios corpos, e então não serão capazes de se elevar nem mesmo um fio de cabelo acima de sua natureza básica.

14) Portanto podemos ver claramente que para aqueles que observam Torá e mitzvot em Seu nome, não há diferença entre as duas partes da Torá, nem mesmo no lado prático, porque antes que pratique isto, a pessoa é compelida a sentir qualquer ato de doação, seja quanto ao próximo seja quanto a D”us, como de um vazio inconcebível. Mas através de grande esforço, lentamente a pessoa se eleva e adquire uma segunda natureza, e então chega ao propósito final, que é a adesão com Ele.

Neste caso, é razoável pensar que a parte da Torá, que lida com a relação entre o homem e seu próximo, é mais capaz de trazer a pessoa ao objetivo desejado, porque o trabalho em mitzvot entre a pessoa e o Senhor é fixo e específico e a pessoa se acostuma a ele facilmente, e tudo o que é feito por hábito já não é mais útil, enquanto as mitzvot entre a pessoa e seu próximo se modificam, são irregulares, são exigências constantemente renovadas para onde quer que a pessoa se volte. Assim sua virtude é muito mais eficiente e certa, e sua intenção é mais próxima.

15) Agora podemos entender as palavras de Hillel HaNassi para Giora, que a essência da Torá é: ama ao próximo como a ti mesmo, e as demais seiscentos e doze mitzvot são apenas interpretação disto. E mesmo as mitzvot entre o homem e D”us também são consideradas uma qualificação para esta mitzvah, como disseram nossos sábios: “A Torá e as mitzvot não foram dadas para outro objetivo além de purificar Israel com elas”, o que é a purificação do corpo, até que a pessoa alcance uma segunda natureza definida por seu amor ao próximo, ou seja, o único preceito de “Amar ao próximo como a si mesmo”, que é o objetivo final da Torá, após o que a pessoa imediatamente atinge a adesão a D”us.

Mas não se deve ficar surpreso pelo fato de isto não estar definido nas palavras: “E amarás o Senhor teu D”us com todo o teu coração e com toda a tua alma e com toda a

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tua força” (Deuteronômio 6,5). Isto é porque de fato, com relação ao homem, que ainda está dentro da natureza da criação, não há diferença entre amar a D”us e amar ao próximo, porque nada além dele mesmo é real para ele. É por isso que aquele prosélito pediu a Hillel HaNassi para explicar-lhe o objetivo desejado pela Torá, para que ele atingisse seu objetivo com facilidade e não precisasse percorrer um longo caminho, como ele disse: “ensina-me toda a Torá enquanto eu fico num pé só”. Assim Hillel definiu a Torá para ele como amor ao próximo, porque seu objetivo está mais próximo e se revela mais rápido, já que é à prova de enganos e tem exigências.

16) Nas palavras acima encontramos um modo de compreender nosso conceito anterior (itens 3 e 4) sobre o preceito de “amar ao próximo como a si mesmo”, e como a Torá nos compele a fazer algo que não pode ser feito.

De fato, vejam que por essa razão a Torá não foi dada aos nossos santos pais – Abraham, Isaac e Yakov, mas somente após o êxodo do Egito, e após eles terem se tornado uma nação de seiscentas mil pessoas de vinte anos de idade ou mais. Pois então a cada membro da nação foi perguntado se concordava com o trabalho exaltado, e uma vez que eles aceitaram em fazê-lo em seus corações e almas, e disseram “nós faremos e ouviremos” (Êxodo, 24, 7), então tornou-se possível observar o total da Torá, e o que antes era considerado impossível tornou-se possível.

Porque é certo que se seiscentas mil pessoas abandonarem seu trabalho pela satisfação de suas próprias necessidades, e não se preocuparem com nada além de cuidar para que seis amigos nunca sintam a falta de coisa alguma, e mais ainda, que elas observem isto com um poderoso amor em seus corações e em suas almas, no completo significado do preceito de “ama ao próximo como a ti mesmo”, então está além de qualquer dúvida que nenhum homem da nação precisará se preocupar com seu próprio bem-estar.

Por isso ele se torna completamente livre de assegurar sua própria sobrevivência e pode, com facilidade, observar o preceito de amar ao próximo como a si mesmo, obedecendo a todas as condições expostas nos itens 3 e 4. Afinal, por que ele se preocuparia com sua própria sobrevivência quando seiscentos mil amigos amorosos e leais estão prontos, com grande cuidado, a assegurar que nada lhe falte em suas necessidades?

Assim, uma vez que todos os membros da nação concordaram, eles imediatamente receberam a Torá, porque agora eles eram capazes de observá-la. Mas antes que eles se tornassem uma completa nação, e certamente durante a era de nossos pais, que eram únicos na terra, eles não estavam qualificados para observar verdadeiramente a Torá em sua forma desejável. Isto é porque com um número pequeno de pessoas é impossível até mesmo começar o assunto das mitzvot entre o homem e seu próximo, na extensão de amar ao próximo como a si mesmo, como explicamos nos capítulos 3 e 4. É por isso que eles não receberam a Torá.

17) De tudo o que foi dito, podemos compreender uma das frases mais surpreendentes de nossos sábios: a que diz que todos em Israel são responsáveis uns pelos outros, o que parece ser completamente injustificado, pois se alguém pecar, ou

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cometer alguma maldade que desagrade ao seu Criador, e não tenha proximidade com Ele, como é possível que o Senhor responsabilize a todos nós? Está escrito: “Os pais não serão levados à morte pelos filhos... todo homem deve ser levado à morte por seu próprio pecado” (Deuteronômio 24, 16). Assim, como é possível dizer até mesmo sobre aquele que seja um completo estranho, de quem você não sabe nada, nem sobre seu paradeiro, que você é responsável por seus pecados?

E se isso não for o bastante para você, nossos sábios dizem: “Rabbi Elazar, o filho do Rabbi Shimon, diz: como o mundo é julgado pela sua maioria, e o indivíduo é julgado por sua maioria, se ele pratica uma mitzvah, ele faz o mundo inteiro justo, e se ele comete um pecado, ele faz o mundo inteiro pecador, como foi dito: um pecador causa a perda de muito bem”.

Portanto o Rabbi Elazar, filho do Rabbi Shimon, fez-me responsável pelo mundo inteiro, já que ele pensa que todos no mundo são responsáveis uns pelos outros e cada pessoa traz mérito ou pecado para o mundo inteiro. Isso é surpreendente de fato.

De acordo com o que foi dito acima, podemos entender as palavras dos sábios de um modo muito simples, pois mostramos que cada uma das 613 mitzvot refere-se à única mitzvah de “ama ao próximo como a ti mesmo”. E concluímos que tal estado somente pode existir em uma nação em que todos os membros concordem com isto.

Autor: Cabalista Rabbi Yehuda Ashlag Trandutor (para o inglês): C. Ratz Revisão: J. Karsen, C. Williamson

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