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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP FLÁVIA POYARES MIRANDA TUTELAS PROVISÓRIAS DE URGÊNCIA COGNIÇÃO NÃO EXAURIENTE MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL SÃO PAULO 2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

FLÁVIA POYARES MIRANDA

TUTELAS PROVISÓRIAS DE URGÊNCIA – COGNIÇÃO NÃO EXAURIENTE

MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL

SÃO PAULO

2015

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FLÁVIA POYARES MIRANDA

TUTELAS PROVISÓRIAS DE URGÊNCIA – COGNIÇÃO NÃO EXAURIENTE

MESTRADO EM DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Dissertação apresentada à banca examinadora

da Faculdade de Direito da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo como parte

dos requisitos para obtenção do título de

Mestre em Direito Processual Civil sob a

orientação do Professor Doutor Eduardo

Pellegrini de Arruda Alvim

SÃO PAULO

2015

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BANCA EXAMINADORA

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DEDICATÓRIA

“Para ser grande, sê inteiro: nada

Teu exagera ou exclui.

Sê todo em cada coisa. Põe quanto és

No mínimo que fazes.

Assim em cada lago a lua toda

Brilha, porque alta vive.”

Fernando Pessoa.

Dedico este trabalho ao meu Pai, Alfredo José Miranda (in memoriam), meu

Amigo, meu Professor, meu Herói, exemplo de ser humano, com quem sempre pude contar

em todas as horas, quem me ensinou a amar o Direito e a Justiça.

Dedico também a minha Mãe, Magali Poyares Miranda, exemplo de mulher,

quem admiro pela força e coragem, ao meu Irmão, Felipe Poyares Miranda, meu

companheiro, meu amigo inseparável, exemplo de pessoa que aprendeu a superar desafios,

de quem muito me orgulho.

Sem vocês, minha Família, minha vida não faria sentido algum.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço também aos meus Professores, Eduardo Arruda Alvim, Daniel

Willian Granado, José Manoel de Arruda Alvim Netto, Thereza Celina Diniz de Arruda

Alvim, Teresa Arruda Alvim Wambier, que me apoiaram e orientaram.

Aos meus queridos amigos, Jorge Luiz Reis Fernandes, Rogério Aguiar

Munhoz Soares e Rodrigo Ramos, que sempre auxiliaram e incentivaram a seguir em

frente.

Agradeço a toda equipe de Professores e Funcionários da Graduação e do

Mestrado da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, que contribuíram para minha

formação acadêmica.

Não posso também esquecer da minha equipe de trabalho no Tribunal de

Justiça do Estado de São Paulo, que sempre esteve ao meu lado colaborando no exercício

da minha atividade jurisdicional.

Agradeço finalmente a Deus, eis que tudo posso Naquele que me fortalece.

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RESUMO:

Esta dissertação tem por finalidade abordar um dos maiores problemas que

aflige a comunidade jurídica, que é a morosidade da Justiça.

O processo serve para garantir o direito ao devido processo legal, previsto

constitucionalmente, e visar o acesso a uma ordem jurídica justa. Portanto, mister se faz o

emprego de mecanismos para assegurar o direito à tutela jurisdicional qualificada, ao

devido processo legal, com respeito ao contraditório e ampla defesa, à igualdade de

tratamento das partes, sempre presentes no Estado Democrático do Direito.

São abordadas também as mudanças introduzidas pelo Novo Código de

Processo Civil.

As formas de cognição nas tutelas provisórias também são analisadas,

destacando-se a necessidade da entrega da prestação jurisdicional justa e efetiva.

PALAVRAS-CHAVE: Tutelas provisórias de urgência. Cognição não exauriente.

Inafastabilidade do Controle Jurisdicional. Resultado útil do processo.

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ABSTRACT:

This paper aims to address one of the major problems afflicting the legal

community, which is the slow pace of justice.

The process serves to ensure the right to due process, constitutionally

provided, and seek access to a just legal system. Then it is necessary to use mechanisms to

ensure the right to qualified legal protection, due process, regarding the contradictory and

full defense, equal treatment of the parties, always present in the Democratic Rule of Law.

Also addresses the changes introduced by the new Civil Procedure Code.

Forms of cognition in the provisional guardianships are also analyzed,

highlighting the need for the delivery of fair and effective adjudication.

KEYWORDS:

Temporary emergency Guardianship. Not exauriente cognition. Unremovable

Constitutional Control. Useful outcome process.

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Sumário:

Introdução .......................................................................................................... 1

1. Cognição não exauriente ......................................................................... 16

2. Histórico da antecipação da tutela ........................................................... 29

3. Direito Comparado .................................................................................. 43

4. Tutela Provisória ..................................................................................... 60

4.1. Noções gerais ............................................................................... 60

4.2. Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ............... 68

4.3. Características .............................................................................. 81

4.4. Tutela de urgência e tutela de evidência ...................................... 81

4.5. Eliminação da ação cautelar nominada ....................................... 85

4.6. Fungibilidade das tutelas de urgência .......................................... 89

4.7. Requisitos das tutelas provisórias ................................................ 100

5. Tutelas de urgência .................................................................................. 109

5.1. Classificação ................................................................................ 109

5.2. Requisitos. Probabilidade do Direito. Perigo de Dano ou Risco ao Resultado Útil do Processo ...........................................................

110

5.3. Reversibilidade ............................................................................ 113

5.4. Caução ......................................................................................... 121

5.5. Fundamentação adequada ............................................................ 128

5.6. Tutela provisória antes do contraditório ...................................... 130

5.7. Liminar e medida de urgência ..................................................... 130

5.8. Momento da concessão ................................................................ 133

5.9. Iniciativa. Legitimidade. Liminares de ofício. Ativismo Judicial 143

5.10. Cabimento .................................................................................... 154

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5.11. Cautelares nominadas e inominadas ............................................ 156

5.12. Discricionariedade ....................................................................... 157

5.13. Poder geral de cautela .................................................................. 160

5.14. Competência ................................................................................ 161

5.15. Procedimento ............................................................................... 165

5.15.1. Tutela de urgência incidental ................................................ 165

5.15.2. Tutela de urgência antecedente ............................................. 168

5.16. Requisitos da petição inicial ........................................................ 169

5.17. Defesa do réu ............................................................................... 171

5.18. Prazo para dedução do pedido principal ...................................... 172

5.19. Procedimento para dedução do pedido principal ......................... 176

5.20. Indeferimento da medida. Formação de coisa julgada ................ 176

5.21. Antecipação da tutela e modalidades de sentença ....................... 177

5.22. Tutela de urgência satisfativa ...................................................... 184

5.23. Tutela de urgência satisfativa antecedente .................................. 185

5.24. Estabilização da tutela de urgência satisfativa antecedente ......... 187

5.25. Ação para impugnar a estabilização ............................................ 214

5.26. Prazo para ajuizamento ................................................................ 215

5.27. Regras comuns às tutelas de urgência. Extinção das tutelas de urgência antecedentes ........................................................................

219

5.28. Responsabilidade civil pela tutela de urgência ............................ 222

6. Tutela de evidência .................................................................................. 227

6.1. Requisitos da tutela de evidência ................................................. 229

6.2. Conteúdo e legitimação ............................................................... 230

6.3. Casos ............................................................................................ 231

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7. Execução das medidas provisórias .......................................................... 263

7.1. Cumprimento ............................................................................... 264

7.2. Medidas urgentes ......................................................................... 266

7.3. Medidas deferidas com fulcro na tutela de evidência .................. 267

7.4. Provisoriedade ............................................................................. 275

8. Medidas cautelares nominadas ................................................................ 276

8.1. Arresto ......................................................................................... 276

8.2. Sequestro ..................................................................................... 277

8.3. Diferença entre Arresto e Sequestro ............................................ 277

8.4. Arrolamento de bens .................................................................... 277

8.5. Registro de protesto contra alienação de bens ............................. 277

8.6. Medidas cautelares tradicionais ................................................... 277

9. Tutela provisória contra o Poder Público ................................................ 279

9.1. Histórico ...................................................................................... 279

9.2. Doutrina ....................................................................................... 281

9.3. Jurisprudência .............................................................................. 303

9.4. Obrigação de fazer, não fazer e dar coisa .................................... 307

9.5. Matéria Tributária ........................................................................ 310

10. Tutelas provisórias nas ações coletivas ................................................... 311

11. CONCLUSÃO ....................................................................................... 323

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 331

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Introdução:

No exercício da atividade jurisdicional, constantemente são apresentados

pedidos de concessão de cautelares, tutelas antecipadas e outras medidas de urgência,

sendo grande a preocupação com o tema da efetividade processual e a garantia da

aplicação dos princípios e garantias constitucionais do Estado Democrático do Direito. O

presente estudo visa explorar temas mais relevantes das medidas de urgência, conferindo

ao processo verdadeira função instrumental para efetivação do direito material. O Direito é

um todo unitário, formando um universo, e não composto por compartimentos estanques,

por áreas isoladas.

No Processo Civil Moderno revela-se a tendência de deslocamento do eixo

de abordagem para outros enfoques e posturas, preponderando o instrumentalismo

substancial do processo a efetividade da justiça.

E processo efetivo é aquele apto a entregar, com o máximo de proveito e

adequação, a tutela jurisdicional a quem, por meio do processo, resulte merecedor da

resposta do Estado-Juiz, aproximando-se ao máximo da realização que o direito material

atribui a quem o titularize.1

O sistema processual civil na verdade passa ser um instrumento para atingir

as finalidades jurídicas, sociais e políticas da jurisdição e a técnica processual, como meio

para a obtenção de cada um deles e não um fim em si mesmo.

Deve prevalecer o entendimento de que a ação serve para garantir o direito

ao devido processo legal, previsto constitucionalmente, e visar o acesso a uma ordem

jurídica justa. Portanto, mister se faz o emprego de mecanismos para assegurar o direito à

tutela jurisdicional qualificada, ao devido processo legal, com respeito ao contraditório e

ampla defesa, à igualdade de tratamento das partes.

Por outro lado, impõe-se trazer também uma abordagem sociológica da

noção de Direito e Justiça, aplicando-se os princípios constitucionais que regulam a função

jurisdicional, o Estado-Juiz, conciliando a segurança jurídica em face da efetividade da

1 Rogério Aguiar Munhoz Soares. Tutela jurisdicional diferenciada. Tutelas de urgência e medidas liminares em geral, p.68.

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tutela jurisdicional, sendo que ambas devem complementar-se para concretizar as garantias

constitucionais fundamentais.

O apego ao formalismo estéril e o rigorismo na apreciação das medidas de

urgência devem ser evitados, eis que no conflito de interesses tutelados a entrega de uma

prestação jurisdicional justa e célere deve ser o escopo maior, sem que para tanto sejam

solapados princípios basilares.

Considero lapidar o pensamento de José Carlos Barbosa Moreira2 para

quem, de vez em quando, o processualista deve deixar de lado a lupa com que perscruta os

refolhos de seus pergaminhos e lanças à sua volta um olhar desanuviado. O que se passa cá

fora, na vida da comunidade, importa incomparavelmente mais do que aquilo que lhe pode

proporcionar a visão de especialista. E, afinal de contas, todo o labor realizado no gabinete,

por profundo que seja, pouco valerá se nenhuma repercussão externa vier a ter ... O

processo existe para a sociedade, e não a sociedade para o processo”.

Desde sempre o homem se coloca na busca incessante de encontrar

maneiras para solução de conflitos, já que se trata de ser eminentemente social.

Assim é que surgiu o processo, onde o Estado passa a ser o titular da

prestação jurisdicional e o responsável por dirimir as contendas individuais e coletivas

havidas, não sendo possível o exercício da autodefesa.

Jesús González Pérez3 analisa que a autodefesa, antes aplicada pelas

pessoas para assim fazer valer o direito de cada uma delas e que foi motivo para que o

Estado interviesse com uma justiça imparcial para formar o Sistema Judiciário do país, está

retornando, pois com a ineficácia do Poder Judiciário, muitas pessoas escolhem resolver

seus problemas “com as próprias mãos”: “Lãs causas de este resurgimiento de la

autodefensa son muchas y de muy diversa índole. Pero quizá – y sin quizás – ocupe um

lugar preferente la desconfianza y hasta el desprecio del ciudadano hacia justiça que lê

ofrece el Estado”.

2 José Carlos Barbosa Moreira. O juiz e a cultura da transgressão. Revista jurídica, v. 267, p. 12 jan/2000. 3 Jesús González Pérez. El Derecho a La Tutela Jurisdiccional, p.22. Tradução livre: “As causas deste ressurgimento da autodefesa são muitas e muito diversas. Mas talvez - talvez quiçá - ocupem lugar de destaque pela desconfiança e até desprezo para com a Justiça cidadão que oferecida ao Estado”.

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Hobbes, Locke e Rousseau estabeleceram as bases do novo Estado que se

revelou.

Rousseau pondera que somente a vontade geral pode dirigir as forças do

Estado segundo a finalidade de sua instituição, que é o bem comum.

Portanto, o interesse no estudo da matéria teve origem em meu dia a dia

forense atuando por aproximadamente seis anos como Magistrada em Varas Cíveis, bem

como três anos em Varas de Família e Sucessões no Estado de São Paulo, não se perdendo

de vista a minha prévia atuação profissional como Advogada por dez anos.

Obtive o título de Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica

de São Paulo em 1995, e o constante estudo se destina ao aprimoramento da prestação

jurisdicional, fornecendo subsídios para a prolação de decisões justas e adequadas.

O presente trabalho pode contribuir para a solução de casos concretos na

prática e troca de experiências, aprofundando conhecimentos já existentes, dando uma

visão ampla da realidade social, formando um juiz eticamente comprometido com o

desempenho da função de julgar.

O estudo também contribuirá para a segurança no exercício da função.

A troca de ideias é fundamental para que o magistrado possa compartilhar

experiências e enfrentar os desafios da atividade judicante, mantendo-se o equilíbrio.

A morosidade da Justiça é um problema a ser enfrentando em todo o

mundo.

É também um desafio presente nos países da civil law.

A dinâmica do mundo moderno não tolera mais a morosidade do processo,

que poderá em alguns casos fulminar o próprio direito.

O conflito se revela entre o princípio da efetividade processual e o da

segurança jurídica.

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O julgador vive o dilema de antecipar liminarmente um pedido urgente e

provável e sacrificar a segurança do processo, talvez até violando o contraditório e vulnerar

estabilidade da ordem jurídica.

Dispõe o art. 5º, inc. LXXVIII, da CF/88, incluído pela EC 45/04, “a todos,

no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os

meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Contudo, a interpretação deve ser harmônica com outros princípios e

normas constitucionais tais como o do devido processo legal, o da tutela jurisdicional

adequada e o do acesso à Justiça (CF, art. 5º, LIV, LV e XXXV), não havendo como

deixar de estudar o processo civil sem ter a noção dos princípios e garantias

constitucionais.

Eduardo J. Couture4 asseverou que “no processo o tempo é algo mais do

que ouro: é justiça”.

Ada Pellegrini Grinover, Candido Rangel Dinamarco e Antonio Carlos de

Araújo Cintra5 apontam que é “justamente a Constituição, como resultante do equilíbrio

das forças políticas existentes na sociedade em dado momento histórico, que se constituiu

no instrumento jurídico de que se deve utilizar o processualista para o completo

entendimento do fenômeno processo e de seus princípios”, por isso que “o Estado

Brasileiro quer uma ordem social que tenha como base o primado do trabalho e como

objetivo o bem-estar e a justiça sociais (art.193) e considera-se responsável pela sua

efetividade”.

Dessarte, o princípio constitucional da segurança ou da estabilidade da

ordem jurídica deriva o próprio Estado Democrático de Direito, adotado como modelo da

República Federativa do Brasil.

4 Eduardo J. Couture, Proyecto de código de procedimiento civil (con exposición de motivos), p. 37. 5 Ada Pellegrini Grinnover, Candido Rangel Dinamarco e Antonio Carlos de Araújo Cintra, Teoria Geral do Processo, p.79 e 37.

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J. J. Gomes Canotilho6 demonstra que hoje está superada a ideia da

Constituição como concentrado de princípios políticos, cuja eficácia seria de simples

diretivas que o legislador iria concretizando de forma discricionária.

Concordamos com Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e

Daniel Mitidiero7 eis que a adequada distribuição do ônus do tempo no processo e a

percepção da técnica processual só tem sentido se vista na perspectiva da tutela dos

direitos, imprescindíveis para que a administração da justiça civil consiga obter seus fins

de forma idônea.

Segundo Kazuo Watanabe8, tutela antecipada pode ser assim definida:

“O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, inscrito no inc.

XXXV do art. 5º da Constituição Federal, não assegura apenas o acesso

formal aos órgãos judiciários, mas sim o acesso à justiça que propicie a

efetiva e tempestiva proteção contra qualquer forma de denegação da

justiça e também o acesso à ordem jurídica justa. Cuida-se de um ideal que,

certamente, está ainda muito distante de ser concretizado, e, pela

falibilidade do ser humano, seguramente jamais o atingiremos em sua

inteireza. Mas a permanente manutenção desse ideal na mente e no coração

dos operadores do direito é uma necessidade para que o ordenamento

jurídico esteja em contínua evolução”.

Georges Ripert também citado por Ovídio Baptista, que:

"la notion même de droit est en elle-même une notion statique"9, mesmo

porque "les juristes, quelle que soit leur profession, forment un corps de

6 J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, p.43. 7 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil, p.196. E prosseguem: “Com isso, procurou-se uma correção de rumo – e o combate contra a morosidade na prestação da tutela jurisdicional e contra o asséptico processualismo acabaram sendo travados com a colaboração da conjugação da técnica processual com a tutela dos direitos – e especialmente no que agora nos interessa, com a compreensão da tutela dos direitos na perspectiva da tutela antecipatória. (...). Aludir simplesmente a tutelas provisórias e as tutelas sumárias – e aos conceitos correlatos de tutelas definitivas e exaurientes – sem iluminá-las com o conceito de tutela de direitos é perder de vista aquilo que a parte efetivamente foi procurar no processo. É fazer com que o legislador falte com o seu dever de legislar de modo a guiar a ação dos juízes e dos advogados para prestação de uma adequada, efetiva e tempestiva tutela jurisdicional dos direitos”. 8 Kazuo Watanabe, Tutela Antecipatória e Tutela Específica de Obrigações de Fazer e não fazer, p.20. 9 Les Forces Creátices du Droit, Livrairie Genérale de Droit et de Jurisprudence, Paris, 1955, p.1.

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même esprit. Ils ont été instruits par des hommes qui ne doutaient pas de la

nature statique du droit"10.

Há grandes dificuldades para admitir a tutela processual que tenha natureza

essencialmente preventiva.

Não se deve relegar ao oblívio a doutrina clássica da “separação de

poderes”, de Montesquieu.

Da mesma forma, Ovídio Baptista11, citando Thomas Hobbes, que entende

ser o Poder Judiciário um poder subordinado, apenas um órgão do poder, reduzindo-se à

tarefa mecânica de reproduzir as palavras da lei, de modo que a jurisdição não passasse de

uma atividade meramente intelectiva, sem que o julgador lhe pudesse adicionar a menor

parcela volitiva.

Chiovenda, com maestria lapidar coloca em relevo que:

"Nella cognizione, la giurisdizione consiste nela sostituzione definitiva e

obbligatoria dell´atività intellettiva del giudice all´attività intellettiva non

10 Tradução livre: “A própria noção de lei é em si um conceito estático, mesmo porque advogados, qualquer que seja a sua profissão, formam espírito de corpo. Eles foram educados por homens que não questionam a natureza estática do direito”. 11 Neste ponto, vale transcrever o seguinte trecho do já citado artigo do jurista Ovídio Baptista: “No que diz respeito a estas últimas, como seria de prever, ou o sistema recusa-se a atribuir-lhes a natureza de um autêntico "julgamento sobre a lide", para considerá-lo "decisão sobre o processo" não sobre o meritum causae; ou, no primeiro caso, quando se cuida daquele tipo especial de tutela dita cautelar, o paradigma impõe que se o tenha como um "pedaço" do processo principal, parcela que, como na hipótese anterior, igualmente consistirá numa antecipação, à espera de sua confirmação ou rejeição, pela sentença final. Quer dizer, o sistema não pode prescindir de um processo principal, em que a "cognição exauriente" dará ao juiz as condições para descobrir a "vontade da lei". (...) 12. Quem tiver o cuidado de investigar a história do chamado processo cautelar do moderno direito italiano, a partir de Chiovenda, verá que a doutrina nunca se afastou do princípio segundo o qual aquilo que os processualistas peninsulares denominam "provimento" cautelar, não passa de tutela antecipatória de algum efeito da sentença de mérito de um processo satisfativo, construído com plenitude de cognição ou, como se diz no Brasil, com "cognição exauriente", de modo que a tutela que se antecipa possa ser absorvida pela sentença de mérito - que haverá de ser, para o sistema, a última manifestação do julgador - se porventura se confirme ser essa a "vontade da lei"; ou a revogue se o julgador convencer-se de que a aparência do direito que servira de fundamento para a concessão da tutela antecipada, não se confirmar na instrução da causa. A confirmação da liminar será sempre sua reabsorção no conteúdo da sentença de mérito. Aquilo que o sistema tivera por simples decisão interlocutória - algo que não dizia respeito à lide, e sim ao processo, enquanto medida liminar - agora incorpora-se à sentença como uma parcela da lide. O que fora interlocutória torna-se mérito...!”.

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solo delle parti ma di tutti i cittadini nell´affermare esistente o non esistente

una volontà concreta di legge concernente le parti"12.

Na verdade, a tarefa de interpretar nada mais é do que investigar a vontade

da lei.

Para Savigny13 o conceito de ação se reporta às fontes romanas, isto é, a

relação que nasce ao titular do direito no caso de sua violação:

"La relación que de la violación resulta, es decir, el derecho conferido á la

parte lesionada, se llama derecho de acción ó acción”.

Ora, segundo Thomas Hobbes14, pai do positivismo moderno, a missão do

juiz era dar aplicação ao que o legislador dissera ser direito, não se importando com a ideia

de justiça:

"En todos los tribunales de justicia quien juzga es el soberano, que tiene la

representación de la república. El juez subordinado debe considerar la

razón que movió a su soberano a hacer esa ley, a fin de que su sentencia

sea acorde con ella, y entonces será la sentencia de su soberano; en otro

caso es la suya propia, e injusta".15

Feitas estas considerações, infere-se que toda tutela preventiva, segundo

Ovídio Baptista, deva necessariamente apoiar-se num juízo, mais ou menos intenso, de

probabilidade, no qual a certeza matemática cederá lugar aos juízos de verossimilhança.

E prossegue o autor Ovídio Baptista da Silva16 expondo que a atuação

estatal pode variar diante dos casos que exigem prontidão, esboçando que “a emergência

de uma situação não prevista e para cuja proteção sejam insuficientes os instrumentos 12 Giuseppe Chiovenda, Princippi di Diritto Procesuale Civile, p.296. Tradução livre: Na cognição, a jurisdição é a substituição definitiva e vinculativa da vontade das partes, a atividade intelectual é do juiz e não só das partes, mas de todos os cidadãos em afirmar existente ou não existente uma lei concreta. 13 Friedrich Karl von Savigny, Sistema de Derecho Romano Atual, p.10. Tradução livre: “A relação que resulta da violação é o direito conferido à pessoa lesada, chamado direito de ação ou ação”. 14 Thomas Hobbes, Leviathan, p.23. 15 Tradução livre: “Em todos os tribunais quem julga é o soberano, que é a representação da República. O tribunal subordinado deve considerar a razão que moveu seu soberano para fazer tal lei, de modo que a sua decisão está em consonância com ele e, em seguida, será o julgamento de seu soberano; caso contrário, é a sua própria, e injusto”. 16 Ovídio A. Baptista da Silva, Curso de processo civil: processo cautelar (tutela urgência), p.17.

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criados pela lei põe o Estado diante da seguinte alternativa: a) despreza a exigência de uma

proteção imediata, capaz de responder adequadamente à situação de urgência, preferindo

seguir os procedimentos legalmente estabelecidos; b) ao contrário, dá prioridade ao

interesse de proteger desde logo o provável direito exposto a um dano iminente, adotando

alguma medida que lhe dê segurança, sem que o direito por tal modo tutelado seja

reconhecido como realmente existente pelo julgador, resultado este somente alcançável em

demanda satisfativa que venha a ser ajuizada simultaneamente ou em momento

subsequente”.

Prosseguindo, se o magistrado deve imaginar o que possa acontecer no

futuro, a sentença terá de sustentar-se em juízos hipotéticos.

O desafio é justamente este, já que a decisão pode não representar a vontade

do legislador, mas a vontade do magistrado, aí se encontrando a dificuldade da tutela

preventiva.

Norberto Bobbio17 pondera:

“Na maioria das situações em que está em causa um direito do homem [...]

ocorre que dois direitos igualmente fundamentais se enfrentem, e não se

pode proteger incondicionalmente um deles sem tornar o outro inoperante.

Basta pensar, para ficarmos num exemplo, no direito à liberdade de

expressão, por um lado, e no direito de não ser enganado, excitado,

escandalizado, injuriado, difamado, vilipendiado, por outro. Nesses casos,

que são a maioria, deve-se falar de direitos fundamentais não absolutos,

mas relativos, no sentido de que a tutela deles encontra, em certo ponto, um

limite insuperável na tutela de um direito igualmente fundamental, mas

concorrente. E, dado que é sempre uma questão de opinião estabelecer qual

o ponto em que um termina e o outro começa, a delimitação do âmbito de

um direito fundamental do homem é extremamente variável e não pode ser

estabelecida de uma vez por todas”.

E prossegue Norberto Bobbio18, “descendo do plano ideal para o real, uma

coisa é falar dos direitos do homem, direitos sempre novos e cada vez mais extensos, e

17 Norberto Bobbio, A era dos direitos, p.42.

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justificá-los com argumentos convincentes; outra coisa é garantir-lhes uma proteção

efetiva”.

Norberto Bobbio19, refletindo sobre o futuro dos direitos do homem, entende

que foram superados os problemas atinentes à enunciação dos direitos com as Declarações

de Direito e pela incorporação do conteúdo dessas declarações nas modernas constituições

nacionais, bem assim resolveram-se os entraves relativos à fundamentação dos direitos,

diante de um consenso satisfatório acerca de sua validade: “o problema que temos diante

de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de

saber quais e quantos são esses direitos, qual é sua natureza e seu fundamento, se são

direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro

para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam

continuamente violados”.

Fernando da Fonseca Gajardoni20 faz uma reflexão sobre o dilema entre a

celeridade e a segurança jurídica, obtemperando que:

“O processo é um instituto essencialmente dinâmico e, até mesmo por uma

exigência lógica, não exaure o seu ciclo vital em um único momento, sendo

18 Op.cit, p. 63. 19 Norberto Bobbio, A era dos direitos, p. 81. 20 Fernando da Fonseca Gajardoni, O princípio constitucional da tutela jurisdicional sem dilações indevidas e o julgamento antecipadíssimo da lide. O autor ainda aborda que: “O processo, como instrumento destinado à atuação do direito material, não prescinde da aferição das reais circunstâncias da lesão ocorrida para o restabelecimento das coisas em seu status quo ante, até em homenagem a um elementar postulado de segurança jurídica. Em razão disso, impossível que propicie prontamente tutela definitiva. O processo dura, não se pode fazer tudo de uma única vez. “É indispensável se ter paciência. Semeia-se, como faz o camponês; e é preciso esperar para se colher [...]. O slogan da justiça rápida e segura, que anda na boca dos políticos inexperientes, contém, lamentavelmente, uma contradição in adjecto: se a justiça é segura não é rápida, se é rápida, não é segura”. Por outro lado, a excessiva demora do processo, mesmo que se tenha, ao final, uma decisão segura - com a entrega do bem da vida perseguido a quem de direito - gera, nas partes litigantes, principalmente no vencedor da demanda, independentemente de fatores de compensação (juros e correção monetária), inconteste dano marginal. Trata-se de um fator depreciativo, de faceta emocional e material20, do objeto que deveria ser prontamente tutelado pelo processo. Certamente, o grande desafio do processo civil contemporâneo reside no equacionamento desses dois valores: tempo e segurança. A decisão judicial tem que compor o litígio no menor tempo possível. Porém, deve respeitar também as garantias da defesa (due process of law), sem as quais não haverá decisão segura. Celeridade não pode ser confundida com precipitação20. Segurança não pode ser confundida com eternização. Já se colocou que o valor do tempo no processo é imenso e, em grande parte, desconhecido. “Não seria arriscado comparar o tempo a um inimigo, contra o qual o juiz luta sem descanso”. Contudo, não podemos olvidar que a única arma que possui o juiz nessa guerra é o processo, e que sua bandeira é a aplicação correta da vontade concreta da lei, impossível de ser defendida, sem a competente elucidação dos fatos. Brevidade e segurança são forças antagônicas que têm de conviver. Como operadores do direito, o nosso papel é mediar esse constante conflito, fazer com que essas forças se conciliem da melhor maneira possível. Contudo, a humanidade está perdendo essa batalha. Não há relatos, até a presente data, de um só sistema que tenha conciliado tão bem essas forças (celeridade x segurança), a ponto de satisfazer plenamente os jurisdicionados”.

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destinado a desenvolver-se no tempo. O tempo constitui elemento não só

necessário, mas imprescindível em todo processo. Embora os atos

processuais tenham uma certa ocasião para ser realizados, normalmente

não se perfazem de modo instantâneo, mas, sim, desenrolam-se em várias

etapas ou fases21.

A tutela implica no provimento que compõe o conflito material de forma

exauriente e definitiva.

Portanto, o processo nada mais é do que instrumento para que seja

alcançada a efetividade da justiça.

Assim é que, quando o jurisdicionado procura a justiça quer ver sua

pretensão jurisdicional solucionada de forma efetiva e célere.

O acesso à justiça deverá proporcionar a efetiva proteção contra qualquer

forma de denegação da justiça e também o acesso à ordem jurídica justa.

Concordamos com Donaldo Armelin22, para quem “(...) basicamente, o

acesso à Justiça pode ser traduzido como uma questão que passa, inexoravelmente, por

dois problemas subjacentes: a efetividade do processo e a sua socialização”.

E para que isto ocorra, a tutela jurisdicional deverá ser adequada, tempestiva

e efetiva.

Tutela jurisdicional adequada é aquela concedida por meio de um

procedimento adequado, ou seja, um procedimento destinado a solucionar determinada

situação concreta. A tutela jurisdicional deve ser prestada, na medida do possível, de forma

célere. Para que isto ocorra, é imprescindível um número de magistrados razoável e bem

preparados e instrumentos que viabilizem distribuição racional do tempo do processo.

No que tange à efetividade, é preciso que a tutela jurisdicional realize

concretamente o direito e não apenas declare-o.

21 Candido Rangel Dinamarco, Ada Pellegrini Grinover e Kazuo Watanabe. Participação e Processo, p.253-254. 22 Donaldo Armelin, O acesso à Justiça, p.172.

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Antônio Cláudio da Costa Machado23 expõe que parece inegável que a

instituição da tutela antecipatória, além de representar o estrito cumprimento do dever

imposto ao legislador ordinário de construir o justo e devido processo, significa no plano

nuclear da garantia a prevalência do valor efetividade sobre o valor segurança jurídica toda

vez que esta se revele prescindível em razão de circunstâncias como o do fundado receio

de dano irreparável ou do abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do

réu (incs. I e II, do novo art. 273).

José Manoel de Arruda Alvim24 aponta que “a aspiração a um Estado de

bem-estar social conduziu, nos países que já realizaram esse bem-estar, em escala

apreciável, a problemas no campo do processo”.

É preciso ter-se presente que o primado principal da medida liminar, em

cautelar, consiste em ser a mesma algo que possibilita o acesso útil à Justiça, e aí está o

apoio constitucional para a antecipação cautelar.

De nada valeria a garantia de submeter-se ao Judiciário o exame de lesão ou

ameaça de lesão a direito, se não estivesse garantido a utilidade do acesso.

Sem liminares, muitas e muitas vezes, o cidadão poderia até ter sucesso na

demanda, mas não efetivaria a sentença.

O que podemos notar com muita clareza é a judicialização da solução dos

conflitos, pois há crença no direito como forma de desenvolvimento da sociedade, ao lado

de outras formas como a mediação, a conciliação e a arbitragem.

Daí a responsabilidade do julgador em não dar a mais e não outorgar a

menos, ou seja, agir com a preocupação de não esvaziar a ação principal.

A morosidade da duração do processo e a expectativa pela composição do

conflito pode gerar prejuízos graves e sérios.

23 Antônio Cláudio da Costa Machado, Tutela antecipada, p. 65. 24 José Manoel de Arruda Alvim Netto, Anotações sobre as perplexidades e os caminhos do processo civil contemporâneo – sua evolução ao lado da do direito material. In As garantias do cidadão na Justiça. Org. Sálvio de Figueiredo Teixeira, p.170, nota 9.

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João Batista Lopes25 afirma que “[...] as causas da morosidade da justiça são

várias – anacronismo da organização judiciária, falta de recursos financeiros, deficiências

da máquina judiciária, burocratização dos serviços, ausência de infra-estrutura adequada,

baixo nível do ensino jurídico e aviltamento da remuneração dos servidores – e nenhuma

delas, isoladamente, explica o quadro atual de lentidão dos processos. É inquestionável,

porém, que nossa anacrônica organização judiciária é responsável, em grande medida, pela

dissonância existente entre a modernidade de nosso processo e o atraso na distribuição da

Justiça”.

Concordamos plenamente com Luiz Fux, Nelson Néry Jr. e Teresa Arruda

Alvim Wambier quando afirmam que, “Algumas vezes, em busca de mudanças, equívocos

são cometidos e criam-se dificuldades para as partes litigarem em juízo, imaginando-se

sempre a lei como imperfeita, em vez de se atacar diretamente o grande mal que atinge o

processo com sua exagerada duração: a falta de investimento em infra-estrutura do Poder

Judiciário”26.

Aliás, a demora do processo pode inclusive gerar vantagem para um dos

litigantes.

Nelson Nery Júnior27, assevera que, “pelo princípio constitucional do

direito de ação, além do direito ao processo justo, todos têm o direito de obter do Poder

Judiciário a tutela jurisdicional adequada. Não é suficiente o direito à tutela jurisdicional.

É preciso que essa tutela seja adequada, sem o que estaria esvaziado de sentido o

princípio. Quando a tutela adequada para o jurisdicionado for medida urgente, o juiz,

preenchidos os requisitos legais, tem de concedê-la, independentemente de haver lei

autorizando, ou, ainda, que haja lei proibindo a tutela urgente”.

Da mesma forma, Kazuo Watanabe28 aponta que “acesso à justiça é acesso

à ordem jurídica justa, ou seja, obtenção de justiça substancial. Não obtém justiça

substancial quem não consegue sequer o exame de suas pretensões pelo Poder Judiciário

e também quem recebe soluções atrasadas para suas pretensões, ou soluções que não lhe

25 João Batista Lopes, Efetividade do processo e reforma do Código de Processo Civil: como explicar o paradoxo processo moderno – justiça morosa? p. 128. 26 Luiz Fux, Nelson Nery Jr, Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.). Processo e Constituição, p.168. 27 Nelson Nery Jr. Princípios do processo na Constituição Federal, p. 172. 28 Kazuo Watanabe, Acesso à justiça e sociedade moderna. In: Ada Pellegrini Grinover. Participação e processo, p. 135.

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melhorem efetivamente a vida em relação ao bem pretendido. Todas as garantias

integrantes da tutela constitucional do processo convergem a essa promessa síntese que é

a garantia do acesso à justiça assim compreendido”.

Contudo, muito se tem feito ultimamente para combater a morosidade da

justiça, principalmente após o advento do processo digital eletrônico, com a paulatina

eliminação dos processos físicos.

A ideia para solucionar a morosidade é evitar que o processo físico fique

muito tempo aguardando nos cartórios e o impulso oficial é muitas vezes dado por atos

ordinatórios.

Com o processo digital eletrônico, são abreviadas as etapas, imprimindo

maior celeridade.

Podemos afirmar com segurança que com o surgimento do processo judicial

eletrônico haverá uma verdadeira revolução, inclusive com otimização dos espaços que

antes eram destinados a abrigar enorme quantidade de papel.

Estamos participando do projeto de unificação dos Cartórios no Fórum

Cível Central (26ª a 30ª Varas Cíveis Centrais) e com muito otimismo vislumbramos a

possibilidade de entregar mais rapidamente a prestação jurisdicional.

Luiz Guilherme Marinoni29 comentando sobre a urgência afirma que: “A

problemática da tutela antecipatória requer seja posto em evidência o seu eixo central: o

'tempo'. Se o tempo é a dimensão fundamental na vida humana, no processo ele

desempenha idêntico papel, pois processo também é vida. O tempo do processo angustia os

litigantes; todos conhecem os males que a pendência da lide pode produzir. Por outro lado,

a demora processual é tanto mais insuportável quanto menos resistente economicamente é

a parte, o que vem a agravar a quase que insuperável desigualdade substancial no

procedimento. O tempo, como se pode sentir, é um dos grandes adversários do ideal de

efetividade do processo”.

29 Luiz Guilherme Marinoni, Efetividade do processo e tutela de urgência, p.57.

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Porém, imperiosa se faz a mudança de mentalidade de todos os envolvidos

para que realmente possa ocorrer a transformação com o alcance do objetivo último do

processo que nada mais é do que a solução do conflito.

O Poder Judiciário foi concebido para resolver os conflitos de interesses e,

desta forma, o Estado deve proporcionar condições para que se adapte ao mundo moderno,

compatível com a sociedade tecnológica.

A classe jurídica também deverá se adaptar às mudanças, meditando e

evoluindo.

Os juristas devem rever conceitos para fazerem valer os direitos da

sociedade, empregando meios e procedimentos que solucionem os conflitos em pouco

tempo.

Ada Pellegrini Grinover30, afirma, com propriedade, que de nada valem

normas bem compostas e estruturadas sem o suporte dos bons juízes e de uma justiça bem

aparelhada. E ainda aborda a necessidade de seleção de magistrados conscientes da

realidade social:

“[...] o acesso à ordem jurídica justa pressupõe um corpo adequado de

juízes, com sensibilidade para captar a realidade social e suas vertiginosas

transformações. E que isso postula a exigência da mudança da mentalidade

do juiz, inserido que há de ser no corpo social e comprometido com o

objetivo de realização da justiça material. A aderência do juiz à realidade

demanda, por sua vez, um constante aprimoramento, inclusive por

intermédio de estudos interdisciplinares permanentes e, antes ainda, exige

critérios de seleção e métodos de recrutamento que transcendam a avaliação

de conhecimentos puramente técnicos”.

Necessita-se, assim de reforma, não somente do texto codificado, da lei, mas

do conjunto de leis e do modo de agir dos protagonistas do processo, além das partes,

30 Ada Pellegrini Grinover, O Processo em Evolução, p.22 e 25.

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também os advogados, os magistrados, os membros do Ministério Público, e até dos

serviços auxiliares31.

A velocidade na tramitação já é uma realidade positiva, sendo dispensadas

etapas burocráticas e inúteis, que somente contribuíam para aumentar o atraso.

As já conhecidas e tradicionais medidas cautelares do sistema anterior

visavam conservar direitos para que seja efetiva a prestação jurisdicional.

As medidas provisórias podem, portanto, ser conservativas ou satisfativas.

Passaremos a abordar nos capítulos seguintes as tutelas provisórias de

urgência e sua cognição não exauriente, sem, no entanto, menoscabar os princípios

constitucionalmente assegurados do devido processo legal, ampla defesa e contraditório.

31 Roberto Rosas, Direito Processual Constitucional, p.212.

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1. Cognição não exauriente

A cognição não exauriente pode ser entendida como superficial, provisória,

em oposição à cognição plena e profunda, a ser revelada somente por ocasião da sentença.

Previsto no artigo 5º inciso LXXVIII da Constituição Federal, o princípio

da razoável duração do processo nem sempre é observado, impondo-se a necessidade do

emprego de mecanismos de aceleração do trâmite processual para que se evite o

perecimento do direito, com a concessão até mesmo incidental de medidas de urgência.

De outro é o sentir do Código de Processo Civil que se há de aferir nos

eventos narrados fumaça de bom direito e perigo na demora, que se presentes, colocariam

em xeque a utilidade do processo judicial.

O Ministro Teori Albino Zavascki32 aponta que a tutela antecipada exige

mais do que o fumus boni iuris. Ao contrário do processo cautelar, onde há plausibilidade

quanto ao direito e probabilidade quanto aos fatos alegados, na tutela antecipada “exige-se

que os fatos, examinados com base na prova já carreada, possam ser tidos como fatos

certos”. Isso porque, segundo o autor, a verossimilhança quanto ao fundamento de direito

decorre da certeza (relativa) quanto à verdade dos fatos.

O Código de Processo Civil brasileiro de 1973 foi concebido sob o prisma

trinário: tutelas judiciais cognitivas, executivas e cautelares.

Todavia, a enorme quantidade de lides, o sincretismo e a complexidade

material e processual de direitos em discussão, a dinâmica socioeconômica exercem cada

vez maior pressão sobre o Estado a exigir a prestação jurisdicional de forma mais célere,

havendo inclusive necessidade imperiosa de rompimento da sistemática anterior com a

introdução de novos conceitos.

Portanto, a sociedade jurídica clama por princípios de racionalização,

simplificação e velocidade.

32 Teori Albino Zavascki, Antecipação da tutela, p. 73.

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Para Humberto Theodoro Júnior33, “Por se tratar de medida satisfativa

tomada antes de completar-se o debate e instrução da causa, a lei a condiciona a certas

precauções de ordem probatória. Mais do que a simples aparência de direito (fumus boni

iuris) reclamada para as medidas cautelares, exige a lei que a antecipação esteja sempre

fundada em "prova inequívoca". A antecipação não é de ser prodigalizada à base de

simples alegações ou suspeitas. Haverá de apoiar-se em prova preexistente, que, todavia,

não precisa ser necessariamente documental. Terá, no entanto, que ser clara, evidente,

portadora de grau de convencimento tal, que a seu respeito não se possa levantar dúvida

razoável. E inequívoca, em outros termos, a prova capaz, no momento processual, de

autorizar uma sentença de mérito favorável à parte que invoca a tutela antecipada, caso

pudesse ser a causa julgada desde logo”.

Segundo José Roberto dos Santos Bedaque34, acesso à justiça, ou mais

propriamente, acesso à ordem jurídica justa, significa proporcionar a todos, sem qualquer

restrição, o direito de pleitear a tutela jurisdicional do Estado e de ter à disposição o meio

constitucionalmente previsto para alcançar esse resultado. Ninguém pode ser privado do

devido processo legal, ou, melhor, do devido processo constitucional. É o processo

modelado em conformidade com garantias fundamentais, suficientes para torná-lo équo,

correto, justo.

Esta preocupação com a celeridade e a efetividade processual sempre teve

lugar no estudo dos processualistas.

Fernando da Fonseca Gajardoni35 expõe que o mérito da tempestividade na

prestação da tutela jurisdicional, “com efeito, ao lado da efetividade do resultado,

imperioso é também que a decisão do processo seja também tempestiva. É inegável que,

quanto mais distante da ocasião tecnicamente propícia for proferida a sentença, a

respectiva eficácia será proporcionalmente mais fraca e ilusória, pois um julgamento tardio

irá perdendo progressivamente seu sentido reparador, na medida em que se postergue o

momento do reconhecimento judicial do direito; e transcorrido o tempo razoável para

resolver a causa, qualquer solução será, de modo inexorável, injusta, por maior que seja o

mérito científico do conteúdo da decisão. Conforme já se assinalou no passado, para que a

33 Humberto Theodoro Jr., Curso de Direito Processual Civil Brasileiro, p.611/612. 34 José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência, p. 71. 35 Fernando da Fonseca Gajardoni, Técnicas de Aceleração do Processo, p. 47.

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justiça seja injusta, não é necessário que atue equivocadamente. Basta que não julgue

quando deva”.

Rogerio Aguiar Munhoz Soares36 entende que o estudo das tutelas

jurisdicionais diferenciadas é o estudo da busca da forma adequada da prestação da tutela

jurisdicional em face da pretensão deduzida, já que o que se busca atualmente é a plena

realização dos direitos, tendo-se em mira o desenvolvimento das tutelas executiva e

mandamental, que operam no plano dos fatos, mediante a utilização de técnicas que se

valham da sumarização do processo (rito, cognição e provimento), e isto em função ou da

urgência que acometa a causa, ou da sumariedade material (ações sumárias de direito

material), ou de alguma peculiaridade da situação carente de tutela, e por isso isolada pelo

legislador. Na visão do autor, com quem concordamos, hoje, o valor ‘celeridade’ é mais

solicitado pelo jurisdicionado que o valor ‘certeza’, e a perspectiva de Chiovenda encontra-

se momentaneamente superada.

Cândido Rangel Dinamarco37 assim leciona:

“Eis o resultado jurídico-positivo dos clamores da doutrina por uma

Justiça que não seja simplesmente enunciativa de preceitos em provimentos inócuos, mas

que assuma e cumpra efetivamente seu compromisso de propiciar aos litigantes

verdadeiro acesso à justiça. A tutela jurisdicional efetiva não está nas sentenças, mas nos

resultados práticos que elas venham efetivamente a produzir na vida das pessoas”.

Da mesma forma, Nelson Luiz Pinto, em seu artigo “A antecipação de tutela

como instrumento de efetividade do processo e de isonomia processual”38 aponta que:

“As modernas correntes de filosofia do direito, contudo, procuram mostrar

que a atividade de aplicação da lei pelo juiz implica, de certo modo, também uma função

criadora de direito, na medida em que o preceito legal, abstrato como ele é, em sua

formulação genérica, não passa de um projeto de norma reguladora da conduta da pessoa

(natural ou jurídica), projeto que o julgador deve completar na sentença, de modo a

concretizá-lo no caso particular submetido a seu julgamento. (...) A propósito, ressalta

36 Rogério Aguiar Munhoz Soares, Tutela Jurisdicional Diferenciada. Tutelas de Urgência e Medidas Liminares em Geral, p.142. 37 Cândido Rangel Dinamarco, Fundamentos do Processo Civil Moderno, p.600. 38 Nelson Luiz Pinto, A antecipação de tutela como instrumento de efetividade do processo e de isonomia processual, p. 43 – 63.

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Ovídio A. Baptista da Silva que "o caráter substitutivo da jurisdição decorre de um

pressuposto inerente à atividade jurisdicional, que é o fato do monopólio da jurisdição.

Em ter percebido esta óbvia circunstância inerente à função jurisdicional, que a torna

necessariamente substitutiva, posto que aqui a atividade do Estado será sempre

secundária de uma atividade primária dos interessados, que o próprio Estado proibira,

reside o mérito da doutrina de Chiovenda" (Curso de processo civil. 4. ed. São Paulo : RT,

1998. v. 1, p. 41). Podemos dizer que há prestação da jurisdição, assim significando a

definição do direito em relação ao caso concreto pelo Poder Judiciário, tanto nos casos

em que a demanda é extinta sem apreciação do mérito, por falta de pressuposto ou

condição de admissibilidade, como também e principalmente quando é extinta com a

apreciação do mérito. (...) Nessa perspectiva, foi abandonada pela ciência processual a

vetusta idéia no sentido de que a simples prestação jurisdicional, consubstanciada em uma

sentença de mérito, seria suficiente para caracterizar a outorga da tutela almejada pela

parte, passando a agregar a esse conceito as noções de utilidade e efetividade como

elementos dessa tutela. Entendemos, assim, a tutela jurisdicional como sendo o

pronunciamento judicial emanado da autoridade competente dado a favor de quem esteja

amparado no plano do direito material, de modo a ser útil e efetivo, assegurando-lhe a

existência e o exercício. A noção de tutela pode dizer respeito, amplamente, às regras de

conduta que compõem um ordenamento jurídico (direito objetivo), visto que ele deve

encontrar atuação nos fatos, proporcionando a passagem do abstrato para o concreto, do

dever ser para o ser. Em sentido mais restrito, a mesma expressão pode referir-se a

situações jurídicas concretas, que devem ser garantidas por critérios adotados pelo

ordenamento jurídico, motivo pelo qual parece correto admitir maior abrangência à

locução examinada - tutela jurisdicional - para com ela designar não apenas o resultado

do processo, mas igualmente os meios ordenados e predispostos à obtenção desse mesmo

resultado, devendo ser consideradas, neste aspecto, as chamadas tutelas diferenciadas.

Observa Donaldo Armelin que "dois posicionamentos, pelo menos, podem ser adotados a

respeito da conceituação de 'tutela diferenciada'. Um, adotando como referencial da tutela

jurisdicional diferenciada a própria tutela, em si mesma, ou seja, o provimento

jurisdicional que atende a pretensão da parte, segundo o tipo da necessidade de tutela ali

veiculado. Outro, qualificando a tutela jurisdicional diferenciada pelo prisma de sua

cronologia no iter procedimental em que se insere, bem assim como a antecipação de seus

efeitos, de sorte a escapar das técnicas tradicionalmente adotadas nesse particular"

("Tutela jurisdicional diferenciada", Revista da Procuradoria Geral do Estado 23/105,

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São Paulo, jun. 1995). (...) Impende dizer, diante disso, que a tutela jurisdicional não é

apenas o pronunciamento judicial dado em favor daquele que afirma ser titular de um

direito subjetivo desrespeitado por outrem, mas também um pronunciamento que seja

efetivo e útil, sob pena de ser frustrada a pretensão daquele que, em face da violação de

seu direito, busca guarida e proteção junto ao Poder Judiciário. Diante disso é inexorável

a conclusão no sentido de que a eficiência da justiça civil, como valor a ser defendido e

preservado, encontra amparo no princípio constitucional da efetividade da tutela

jurisdicional e constitui elemento essencial do Estado Democrático de Direito”39.

Araken de Assis40 em excelente artigo tratou da execução da tutela

antecipada, merecendo ser destacado que:

“O poder geral de o juiz antecipar os efeitos do pedido, contemplado no

art. 273, suscitou várias e alcantiladas questões. Talvez a maior resida no modo de

efetivar o provimento antecipatório. Equívocos quanto ao objeto da antecipação, ao

momento da entrega do efeito antecipado, à natureza da atividade destinada ao

cumprimento forçado das resoluções judiciais e, até mesmo, uma retórica mais inflamada

do que crítica, turvaram a clareza do ponto. (...)

A par de outras características frisantes, talvez de maior relevo e

profundidade, esta evidencia a radical diferença de funções processuais entre a

39 E o autor prossegue: “A antecipação de tutela apresenta-se, neste aspecto, não apenas como um meio para assegurar o resultado efetivo e satisfatório da prestação jurisdicional, mas também como forma de assegurar o equilíbrio, a igualdade processual, a identidade de armas e de poderes, visando propiciar um verdadeiro contraditório, sem que uma das partes se veja impossibilitada de litigar, assegurando o resultado do processo em razão da desproporcionalidade de condições e de poderes entre os litigantes, em decorrência, principalmente, de pressões econômicas e de ameaças, verdadeira coação do litigante "mais forte" sobre o "mais fraco". Nesse sentido, San Tiago Dantas já advertia para o problema da igualdade na criação da lei, asseverando que "quanto mais progridem e se organizam as coletividades, maior é o grau de diferenciação a que atinge seu sistema legislativo. A lei raramente colhe no mesmo comando todos os indivíduos, quase sempre atende a diferenças de sexo, de profissão, de atividade, de situação econômica, de posição jurídica, de direito anterior; raramente regula do mesmo modo a situação de todos os bens, quase sempre os distingue conforme a natureza, a utilidade, a raridade, a intensidade da valia que ofereceu a todos; raramente qualifica de um modo único as múltiplas ocorrências de um mesmo fato, quase sempre os distingue conforme as circunstâncias em que se produzem, ou conforme a repercussão que têm no interesse geral. Todas essas situações, inspiradas no agrupamento natural e racional dos indivíduos e dos fatos, são essenciais ao processo legislativo, e não ferem o princípio da igualdade. Servem, porém, para indicar a necessidade de uma construção teórica, que permita distinguir as leis arbitrárias das leis conforme o direito, e eleve até esta alta triagem a tarefa do órgão máximo do Poder Judiciário" ("Igualdade perante a lei e due process of law: uma contribuição ao estudo da limitação constitucional do Poder Legislativo". RF 116/364, Rio de Janeiro: Forense, 1948”. 40 Araken de Assis, Execução da tutela antecipada, Datadez nº 37, MAR/ABR de 2007.

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antecipação, consentida na regra transcrita, e aquela originada de medida cautelar.

Também nesta hipótese, e em decorrência de requisitos substancialmente análogos, ao juiz

se mostrará lícito antecipar, liminarmente (art. 804), efeitos do pronunciamento final do

processo. Porém, não se devotando a cautela a satisfazer o direito material da parte, seja

ele qual for limitando-se a assegurá-lo, ainda que sequer exista, o órgão judiciário poderá

adotar qualquer medida apta à semelhante finalidade, com ou sem pedido, e, igualmente,

resolução diferente daquela preconizada no pedido formulado. (...)

Pois bem: o legislador, empregando a expressão "efeitos da tutela

pretendida no pedido", no art. 273, caput, predeterminou o objeto da antecipação,

seguindo a trilha há muito percorrida e conhecida. É verdade que o juiz decidirá mediante

cognição sumária. Entretanto, o efeito desse provimento é de natureza idêntica àquele que

exsurgiria da cognição exauriente - e, de resto, haja vista o princípio da congruência, isto

fatalmente se verificará - e não outro qualquer. Até se pode aludir a qualidades diferentes

e heterogêneas, pois o valor do provimento final, emitido após o normal desenvolvimento

do processo, forçosamente há de ser superior ao da liminar, expedida em exame mais

ligeiro e superficial, porém jamais a diversidades de essência.

Pressupor que seja impossível a provimento calcado em cognição sumária

antecipar força e efeito da sentença decorrente de cognição exauriente, conforme defende

Marinoni, não se respalda em nenhum dado conhecido e objetivo. A inusitada tese

contraria a concepção usual acerca do alcance da técnica de sumarização dos litígios.

Tratando da liminar em ação possessória, materialmente sumária, Ovídio A. Baptista da

Silva identifica na liminar a antecipação "de certos efeitos da correspondente sentença

final de procedência", exemplificando: "Se a ação for de reintegração de posse, a liminar

será executiva; se de manutenção de posse, o que se antecipa é o efeito mandamental da

futura sentença de procedência". Nem se conceberia outra opinião de quem gastou tempo

precioso e energia inaudita para criticar os adversários ideológicos desses provimentos

que, regulando provisoriamente o mérito, melhor se designariam de "sentenças liminares".

Antecipa-se, através de cognição sumária, o efeito resultante do acolhimento do pedido

formulado, e não algo diverso e incongruente com a demanda. (...)

Embora nada de intrínseco ao efeito próprio do elemento constitutivo

impeça sua antecipação, o óbice decorre, na peculiar disciplina vigorante no direito

pátrio, do freio criado no art. 273, § 2.º, vedando ao juiz antecipar quando "houver perigo

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de irreversibilidade". O adiantamento da constituição, positiva ou negativa, é

potencialmente capaz de provocar o chamado periculum in mora inverso. Talvez seja

inviável a restituição ao estado prístino se o juiz antecipar o estado de divorciado, por

exemplo. Também neste passo há exceções, porque nada obsta, em princípio, a

recuperação da capacidade plena, reformado o provimento que interditara o réu (art. 452

do Cód. Civil); todavia, nem todos os efeitos desaparecem retroativamente: os negócios

realizados pelo curador, no interregno, subsistirão à reforma da sentença defluente do

provimento do apelo”. (...)

Destaco que a cognição do magistrado, o qual geralmente está submetido a

carga considerável de trabalho, assim como os advogados, a par de ser determinada por

critérios de classificação, deve guardar relação com a realidade forense, devendo ser

levado em conta não somente o grau de convencimento com o direito alegado, mas

também e principalmente o risco de causar à parte grave ou irreparável dano.

Em casos frequentes, o magistrado, ciente das limitações inerentes a uma

cognição sumária e desprezadas as diferenças quantitativas e qualitativas que se podem

levantar a respeito dos graus de convicção, deve entendê-la como uma cognição adequada

ao caso, diante do que é possível ser feito.

Kazuo Watanabe41 explica: “A justiça precisa ser rente à realidade social.

Essa aderência à vida somente se consegue com o argumento da sensibilidade humanística

e social dos juízes, o que necessariamente requer preparação e atualização. Para a cognição

adequada a cada caso, pressuposto de um julgamento justo, a sensibilidade mencionada é

um elemento impostergável”.

Portanto, identificado o objeto da antecipação, em linhas gerais, será feita a

entrega do bem da vida.

Saliento que não é possível estabelecer, com precisão matemática, o quanto

o magistrado está convencido para conceder a tutela almejada, muito menos ter

conhecimento do grau e profundidade da formação de sua convicção.

41 Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 64.

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Aliás, concordo com Cássio Scarpinella Bueno42 quando afirma: “Cabe

insistir, para afastar qualquer azo de formalismo no enfrentamento da questão, que o traço

divisório entre o fumus boni iuris e a “prova inequívoca da verossimilhança da alegação”

é, com o devido respeito dos que pensam diferentemente, mais teórica do que real [...] Não

há como avaliar, com precisão matemática, qual o grau de convicção do magistrado a

respeito dos pedidos que lhe são formulados e das provas e dos argumentos que lhe dão

embasamento. É impossível reduzir a um simples cálculo aritmético ou a padrões

matemáticos o quanto alguém está convencido [...] É difícil – para não se dizer impossível

–, contudo, graduar os níveis intermediários de quanto se está convencido; quanto uma tese

jurídica é mais digna de acolhimento que a outra ou quanto um argumento é mais plausível

que o outro. Não, pelo menos, em graus exatos, em uma escala rigorosa”.

E prossegue o já citado autor Araken de Assis, invocando Paulo Henrique

dos Santos Lucon:

“Feriu o ponto, com invulgar propriedade, Paulo Henrique dos Santos

Lucon acentuando: "A execução da tutela antecipada em nada difere da execução da

sentença apelada: ambas são fundadas em título provisório. Por isso não há como negar

que a execução provisória é um fenômeno essencialmente único embora tendo nos dois

casos fundamentos jurídicos diversos, já que diferente o objeto sobre o qual se apóia". De

fato, no plano prático há rigorosa simetria de situações”.

Ademais, um importante avanço do Novo Código de Processo Civil é a

inserção do princípio da eficiência, previsto em seu artigo 8º43, sendo certo que a prestação

jurisdicional deverá ser entregue de forma eficiente, solucionando a lide.

Leonardo Carneiro da Cunha44 com clareza explica:

“É possível perceber a existência de, pelo menos, duas perspectivas de

eficiência no sistema processual. Conforme defende Michele Taruffo, a primeira estaria

relacionada com a velocidade dos procedimentos e a redução de custos, de sorte que,

42 Cássio Scarpinella Bueno, Curso sistematizado de Direito Processual Civil: tutela antecipada, tutela cautelar e procedimentos cautelares específicos – vol. 4, p. 138. 43 Art. 8o Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. 44 Leonardo Carneiro da Cunha, A previsão do princípio da eficiência no projeto do novo Código de Processo Civil Brasileiro, p. 65 - 84.

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quanto mais barata e rápida a resolução dos conflitos, maior eficiência seria obtida. Uma

segunda perspectiva da eficiência estaria relacionada com a qualidade das decisões e de

sua fundamentação, conduzindo à necessidade de adoção de técnicas adequadas, corretas,

justas e equânimes. Ambas perspectivas seriam faces da mesma moeda, mas que são vistas

comumente como contraditórias, já que um processo rápido e barato pode acarretar

decisões incompletas ou incorretas, enquanto que a busca de uma decisão justa, correta e

legítima exige um maior dispêndio de tempo e dinheiro. Tal situação costuma impor a

escolha de uma das perspectivas da eficiência, com a exclusão da outra.45

Ao se referir a essa opinião de Taruffo, Dierle Nunes refere-se à primeira

perspectiva como a eficiência quantitativa, denominando a segunda perspectiva

de eficiência qualitativa. Acrescenta, ainda, que a eficiência qualitativa conduz não apenas

à necessidade de técnicas processuais adequadas, corretas, justas e equânimes, mas

também, e sobretudo, democráticas para aplicação do direito, exigindo-se uma atividade

comparticipada entre o juiz e os demais sujeitos processuais.46

A chamada eficiência quantitativa confunde-se, na realidade, com

o princípio da duração razoável e com o princípio da economia processual. Talvez por

isso, Fredie Didier Jr. defenda que o princípio da eficiência seria um novo nome dado ao

princípio da economia processual. Numa perspectiva quantitativa, a eficiência confunde-

se, realmente, com a economia processual e com a duração razoável do processo.

O princípio da eficiência identifica-se com a chamada eficiência qualitativa.

Ovídio A. Baptista da Silva apresenta crítica relativamente à aplicação

do princípio da economia processual, utilizado como fundamento para as intervenções de

terceiro no processo e para as cumulações de demandas. Parece-lhe uma grande

contradição, pois a intervenção de terceiro ou a cumulação de demandas, longe de adiantar

a marcha do processo, resta por retardá-la.47 Em outro texto, Ovídio volta ao tema para,

então, dizer que somente teria sentido tratar da economia processual como fundamento

45 Michele Taruffo, Orality and writing as factors of efficiency in civil litigation. Oralidad y escritura en un processo civil eficiente, p. 185 e ss. 46 Dierle Nunes, Precedentes, padronização decisória preventiva e coletivização – paradoxos do sistema jurídico brasileiro: uma abordagem constitucional democrática. In: ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa (coord.). Direito jurisprudencial. São Paulo: Ed. RT, 2012, p. 256-257, nota de rodapé n. 28. 47 Ovídio A. Baptista da Silva, Demandas plenárias e sumárias. Processo e ideologia: o paradigma racionalista, p. 162-164.

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para as intervenções de terceiro se ela fosse encarada num sentido macro, considerada

como presteza da atividade jurisdicional, resolvendo, definitivamente, o litígio e as

questões correlatas, com o que se evita que as partes tenham de voltar a juízo com novas

demandas que a cumulação elimina.48

Esse sentido macro da economia processual a que se refere Ovídio Baptista

da Silva constitui a chamada eficiência qualitativa. O processo que resolve, a um só tempo,

várias situações jurídicas, é mais eficiente, ainda que, para isso, tenha consumido um

pouco mais de tempo e custo.

Na verdade, há um conflito, nesse caso, entre o princípio da economia

processual (ou da duração razoável do processo) e o da eficiência. Ponderando-os, opta-se

pelo retardamento em prol de uma decisão mais eficiente, que soluciona o litígio de

maneira mais global, evitando novas demandas futuras ou sucessivas. A atividade

jurisdicional estrutura-se de modo a acarretar uma decisão mais completa, mais

abrangente, a evitar sucessivas demandas.

Já se viu que a eficiência e a efetividade não se confundem. Para que se

positive o princípio da efetividade, é preciso que haja comportamentos legislativos e

judiciais necessários ao fiel cumprimento das resoluções jurisdicionais. Nesse sentido, o

sistema processual há de ser provido de instrumentos coercitivos suficientes para forçar o

cumprimento das decisões, com o mesmo resultado prático do adimplemento espontâneo

das normas jurídicas.

É possível que um processo seja efetivo sem ser eficiente, atingindo-se ao

resultado pretendido, mas de forma insatisfatória, demorada ou inadequada. O processo,

por sua vez, será eficiente se atingir o resultado pretendido de modo satisfatório. É

possível, então, que o processo seja efetivo, sem ser eficiente, mas se for eficiente, será

necessariamente efetivo.

A eficiência é uma exigência, como se viu, do Estado Democrático de

Direito, constituindo, ainda, corolário do devido processo legal.

48 Ovídio A. Baptista da Silva, Celeridade versus economia processual. Da sentença liminar à nulidade da sentença, p. 229.

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Como se sabe, o devido processo legal é uma cláusula geral constitucional

e, como tal, ostenta significação semântica, daí se construindo o correlato princípio, que se

concretiza com o estabelecimento de padrões de conduta ou standards necessários à

revelação de um processo adequado.

O devido processo legal não se cinge mais, no contexto contemporâneo, a

um processo com fases detalhadamente descritas e com rígido procedimento, nem

tampouco a um processo que se implemente na prática, ainda que de forma inadequada ou

retardada. O devido processo legal, nesse contexto, há de ser capaz de flexibilizar-se,

adaptar-se ou adequar-se às peculiaridades de cada situação concreta, prestando tutela

jurisdicional diferenciada e sendo, enfim, eficiente.

O devido processo legal conduz a um processo adequado e eficiente. Não

basta o processo ser eficaz e efetivo. É preciso também ser eficiente. Imagine que o juiz

conceda uma tutela antecipada para impor o cumprimento de uma obrigação de fazer

personalíssima. Embora a norma seja eficaz (pois prevê a possibilidade de tutela

antecipada que foi realmente concedida pelo juiz) e efetiva (pois veio a ser cumprida a

medida imposta), este seu cumprimento deu-se depois de muito tempo,

sendo ineficiente, porquanto o juiz determinou uma medida coercitiva inadequada ou

inútil, não sendo criativo na aplicação do disposto no § 5.º do art. 461 do CPC. O meio

executivo deve promover a execução de modo satisfatório.

O princípio da eficiência está relacionado com a gestão do processo e com

o princípio da adequação. O juiz, para livrar-se da rigidez procedimental e para ajustar o

processo às particularidades do caso, deve adaptar o procedimento, mas deve fazê-lo de

modo eficiente.

A eficiência deve, ainda, funcionar como diretriz interpretativa: os

enunciados normativos da legislação processual devem ser interpretados de maneira a

observar a eficiência, permitindo-se que se adotem técnicas atípicas ou, até mesmo, que se

pratiquem negócios processuais.

A eficiência constitui, na verdade, mais uma qualidade do devido processo

legal. O processo devido deve, além de adequado, ser eficiente. O due process of law exige

que o processo seja adequado e eficiente: haverá eficiência, se houver observância do juiz

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natural, da isonomia, da duração razoável, do contraditório, da adequação, enfim, o

processo judicial deve ser adequado e eficiente.

O procedimento em contraditório deve ajustar-se, de modo eficiente, às

peculiaridades da causa, do direito a ser aplicado e das partes envolvidas”.

A técnica empregada para análise da viabilidade de concessão da tutela

provisória é a mesma, isto é, a cognição sumária.

De forma bastante esclarecedora Ada Pellegrini Grinover49 faz

considerações sobre a tutela antecipatória no processo sumário, asseverando que tanto na

tutela de urgência como na de emergência é aplicada a técnica da cognição sumária, eis

que tanto os provimentos antecipatórios ou injuncionais como os cautelares são emitidos

antes de completado o ciclo da cognição exauriente, que parte da premissa da observância

do contraditório nas fases postulatória e instrutória:

“A distinção que se pode estabelecer é a de que a congnição sumária na

tutela de urgência se desenvolve como variante da cognição exauriente para tutela de

direitos, precipitando a definição e satisfação dos direitos presumidos em situações de

direito estrito, como se dá com as antecipatórias específicas e com o pressuposto genérico

de antecipação fincada no propósito protelatório do réu – que corresponde a um dado

processual facilitador da antecipação50.

Já a cognição sumária na tutela de emergência transparece como cognição

residual, ineliminável do ordenamento, para afastar do perigo iminente interesses

relevantes, que não podem de pronto ser satisfeitos como direitos presumidos, porque o

pressuposto do perigo de dano irreparável não corresponde a um dado da suficiência para a

presunção de direitos, mas corresponde a uma infinidade de situações inimagináveis que

podem surgir no caso concreto.

49 Ada Pellegrini Grinover, Tutela Antecipatória em processo sumário. In Tutelas de Urgência e cautelares. Coordenação Donaldo Armelin, p.28. 50 Alcides Munhoz da Cunha, Comentários ao CPC, v.XI, p.375-385.

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Ovídio A. Baptista da Silva, seguindo a trilha de Calvosa, já apontou o

caráter residual, supletivo deste tipo de tutela emergencial que tende a responder às

insuficiências da tutela jurisdicional normada51.

As expressões fumus boni iuris e prova inequívoca da verossimilhança da

alegação não trazem nenhum dado objetivo ou seguro de que haja graus diferenciados nos

juízos de verossimilhança para a tutela de urgência em face da tutela de emergência.

Na verdade, as expressões fumus boni iuris e prova inequívoca da

verossimilhança da alegação são equivalentes e indicam que a tutela de urgência, tanto

quanto a tutela de emergência, compromete-se finalisticamente com juízos de

verossimilhança, sem compromisso com a certificação do direito”.

51 Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil, p.155.

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2. Histórico da antecipação da tutela:

A Revolução Francesa trazendo valores como liberdade, igualdade,

fraternidade e segurança jurídica exerceu forte influência sobre o processo tradicional.

A economia provocou a transformação da sociedade, e consequentemente as

situações de urgência mereceram ser amparadas de forma eficaz.

A Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, instituiu o Novo Código de

Processo Civil, revogando a lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, entrando em vigor no

prazo de 1 (um) ano a partir da data de sua publicação.

A tutela provisória vem prevista no Livro V, artigos 294 a 311, que é

dividido em três títulos: título I que trata das disposições gerais aplicáveis à tutela de

urgência e de evidência; título II que trata da tutela de urgência e é dividido em três

capítulos: capítulo I - disposições gerais; capítulo II do procedimento da tutela antecipada

requerida em caráter antecedente e capítulo III do procedimento da tutela cautelar

requerida em caráter antecedente e por fim o título III que trata da tutela de evidência.

A Lei nº 5.689/73 previa a tutela cautelar no seu livro III, artigos 796 a 889,

especificando os pressupostos próprios para cada provimento cautelar e no artigo 798

dispondo sobre o poder geral de cautela.

O Código de Processo Civil de 1939, Decreto-lei 1.608, de 18 de setembro

de 1939, apenas estipulava os requisitos gerais dos provimentos cautelares no seu artigo

675.

Ao tratar do mandado de segurança como um dos procedimentos especiais

(Título V do Livro IV), o CPC de 1939 autorizava o juiz a determinar liminarmente a

suspensão do ato impugnado quando evidenciados a relevância do direito do autor e o risco

de lesão grave ou irreparável a seu direito52.

52 Art. 324. Findo o prazo para as informações e para a contestação, os autos serão conclusos ao juiz, que decidirá em cinco (5) dias. § 1º Si o juiz verificar que o ato foi ou vai ser praticado por ordem de autoridade não subordinada à sua jurisdição, mandará remeter o processo ao juiz ou Tribunal competente. § 2º Quando se evidenciar a relevância do fundamento do pedido e puder do ato impugnado resultar lesão grave ou irreparavel ao direito do requerente, o juiz mandará desde logo suspender o ato.

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Nas ações de venda a crédito com reserva de domínio53 também havia uma

espécie de antecipação de tutela, consistente na ordem imediata de depósito da coisa

independente da audiência do comprador inadimplente.

Os interditos possessórios também estabeleciam liminares de cunho

antecipativo nas ações possessórias de força nova54.

No Livro V, dos processos acessórios, a lei tratou das medidas preventivas

(Título I), regulando as medidas de cunho cautelar e estabelecendo o embrião do chamado

poder geral de cautela autorizativo da determinação, pelo juiz, de qualquer medida cautelar

além dos casos expressamente previstos em lei, sempre que necessária para neutralizar o

periculum in mora além dos casos expressamente previstos em lei, sempre que necessária

para neutralizar o periculum in mora55.

As cautelares típicas ou nominadas previstas no Código de Processo Civil

de 73 eram o arresto, artigo 813 a 821, o sequestro, artigo 822 a 825, a caução, artigo 826 a

838, a busca e apreensão, artigo 839 a 843, a exibição, artigo 844 e 845, a produção

antecipada de prova, artigo 846 a 851, os alimentos provisionais, artigo 852 a 854, o

arrolamento de bens, artigo 855 a 860, a justificação, artigo 861 a 866, os protestos,

notificações e interpelações, artigos 867 a 873, a homologação do penhor legal, artigos 874

a 876, a posse em nome do nascituro, artigo 877 e 878, o atentado, artigos 879 a 881, o

protesto e a apreensão de títulos, artigos 882 a 887, e outras medidas provisionais nos

artigos 888 e 889.

53 Art. 344. Em caso de móra de pagamento imputavel ao comprador e desde logo provada com o título e respectivo instrumento de protesto, o vendedor poderá requerer previamente a apreensão e depósito judicial da coisa vendida, independentemente de audiência do comprador. 54 Art. 371. Si a turbação ou violência datar de menos de ano e dia, o autor poderá requerer mandado de manutenção ou de reintegração initio litis, provando, desde logo: I – a sua posse; II – a turbação ou violência praticada pelo réu; III – data da turbação ou violência; IV – a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, e a perda da posse, na ação de reintegração. Parágrafo único. Quando a justificação destes requisitos não consistir em documento, poderá o juiz ouvir o réu (art. 31). Contra a União, o Estado ou o Município a medida não será concedida in limine, sem audiência dos respectivos representantes. 55 Art. 675. Além dos casos em que a lei expressamente o autoriza, o juiz poderá determinar providências para acautelar o interesse das partes: I – quando do estado de fato da lide surgirem fundados receios de rixa ou violência entre os litigantes; II – quando, antes da decisão, fôr provável a ocorrência de atos capazes de causar lesões, de difícil e incerta reparação, no direito de uma das partes; III – quando, no processo, a uma das partes fôr impossível produzir prova, por não se achar na posse de determinada coisa.

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Em 1994, seguindo a tendência do Direito Europeu, no Brasil foi

introduzido o instituto da antecipação da tutela, sendo alterado o texto do artigo 273

através da Lei nº 8.952/1994.

Antes de 1994, já havia o artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor, e

as liminares antecipatórias.

O Código de Defesa do Consumidor nasce com o objetivo de garantir e

tornar eficaz direito fundamental previsto pela Constituição da República de 1998. Tem a

missão de proteger os consumidores que se sentem lesados e/ou ameaçados ao contratarem

um serviço ou adquirir produto, como destinatário final. Além deste objetivo, prevê a

possibilidade da antecipação de tutela, que será mais tarde introduzida no Código de

Processo Civil brasileiro.

A doutrina ressalta a importância da Lei nº 8.078/1990, que instituiu o

Código de Defesa do Consumidor. Este código consagra, em seu art. 84, a tutela específica

das obrigações de fazer ou não fazer que seria introduzido no Código de Processo Civil

somente a partir da reforma de 1994.

Portanto, a tutela antecipada situou-se fora do processo de conhecimento,

permitindo-se a possibilidade de remediar situação emergencial, sujeitando-a a requisitos

mais rigorosos do que aqueles presentes nas medidas cautelares.

A antecipação da tutela foi criada pela Lei nº 8.952/94, que deu nova

redação ao artigo 273, do Código de Processo Civil de 1973, restringiu, de certa forma, a

atuação dos juízes, no que tange ao exercício de seu poder geral de cautela, eis que foram

estabelecidos requisitos específicos: a proibição de sua concessão quando exista risco de

irreversibilidade; e fixação de que a execução da tutela antecipada se deve dar nos moldes

da execução provisória, que, como todos sabem, não importa em atos de alienação dos

bens constritos do devedor.

Também foi inserido o § 3º no artigo 461, prevendo a possibilidade de

liminar antecipatória nas ações de obrigação de fazer e de não fazer, sendo regra a tutela

específica.

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A Lei nº 10.444/2002 introduziu o § 6º no artigo 273 prevendo a

possibilidade de julgamento antecipado parcial da lide no que tange aos pedidos

incontroversos, onde a cognição é exauriente e sujeita à coisa julgada.

Daniel Carnio Costa56 em sua tese de Doutorado expôs que:

“O coroamento da filosofia do sincretismo processual ocorreu com a edição

da Lei nº 11.232/05, que transformou o processo de execução de sentença que reconhece a

existência de uma obrigação de pagamento de quantia em dinheiro, em simples fase do

processo de conhecimento que gerou o título judicial. A partir de então, nem mesmo a

execução da sentença condenatória de obrigação por quantia certa pressupõe a instauração

de novo processo.

O conceito do sincretismo processual é importantíssimo na análise da

evolução das tutelas de urgência na medida em que, por um lado, possibilita a execução de

medidas de urgência no curso do processo de conhecimento ou de execução e, por outro,

facilita o manejo das medidas de urgência, abrindo caminho para a criação legislativa de

instrumentos destinados a garantir a efetividade e a utilidade do resultado do processo.

Atualmente discute-se a elaboração de um novo CPC, cujo projeto tramita

no Congresso Nacional, e resta evidente, no que tange às tutelas de urgência, que o novo

Código refletirá a realidade social haurida do mundo pós-moderno, implicando todos os

efeitos das mudanças históricas, das comunicações instantâneas e das relações de massas.

Nesse viés, o reconhecimento da função cautelar autônoma, que culminou

na criação de um processo próprio para que a parte pudesse deduzir uma pretensão

preventiva – representando grande evolução com referência à importância das medidas de

urgência na efetividade da jurisdição –, evoluiu para o entendimento pós-moderno de que

são tão prementes a prevenção e a garantia da efetividade da jurisdição que tornam

anacrônico e desnecessário o estabelecimento de um processo próprio, específico e

separado, para que a parte deduza a pretensão cautelar.

56 Daniel Carnio Costa. As tutelas de urgência ex officio no processo coletivo. 2013. Disponível em http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/9/TDE-2013-04-01T12:20:36Z-13499/Publico/Daniel%20Carnio%20Costa.pdf acesso em 22/09/2105.

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Segundo o projeto do novo CPC, as tutelas de urgência – destinadas a

garantir a efetividade da jurisdição através da neutralização do periculum in mora, seja

pela técnica da antecipação da tutela, seja pela técnica eminentemente cautelar – podem e

devem, de forma prioritária, ser deduzidas no curso do processo de conhecimento ou de

execução em andamento, sem necessidade de instaurar processo próprio e autônomo para o

pedido de urgência, o que sustenta a ideia do sincretismo processual. Apenas no caso de

medidas preventivas e preparatórias, não existindo ação principal em curso, é que se

admite a distribuição de um pedido autônomo para o deferimento da medida preventiva,

que não será considerada ação por não deduzir pretensão autônoma da parte.

Ao lado das tutelas de urgência o projeto cuida das tutelas de evidência, as

quais traduzem hipóteses de antecipação de tutela que não guardam relação com a

neutralização do periculum in mora. São tutelas antecipativas e provisórias deferidas com

base na evidência do direito do autor ou quando se pretenda desestimular a conduta

protelatória do réu.

Vê-se, assim, que a legislação pátria tende a evoluir para a proteção integral

da efetividade da jurisdição, considerando que a dispensabilidade de ação própria para

dedução da pretensão preventiva e assecuratória do resultado útil do processo facilita seu

manejo pelas partes e confere ao juiz maior campo de ação”.

José Carlos Barbosa Moreira57 assevera que: “Se a ordem jurídica

reconhece como valiosa determinada posição subjetiva, deve ministrar a quem nela se

encontre meios de proteção adequados e eficazes, que garantam na prática ao titular as

vantagens a ela inerentes em teoria: será essa uma concepção obsoleta? Está bem que se

diga e se repita que o direito de ação é abstrato e independente do direito afirmado por

quem bate às portas da justiça; que ao aparelho judicial corre o dever de ouvir com atenção

idêntica o postulante que tem razão e aquele que não a tem, até pelo simples e óbvio

motivo de que só depois de ouvi-lo estará em condições de saber se ele a tem ou não. De

nada disso se pode, ao nosso ver, duvidar hoje seriamente. Convém, no entanto, não

esquecer jamais que a máquina judiciária é criada e mantida pelo Estado, e os processos se

realizam com a finalidade precípua de dar razão a quem realmente a tenha; e não apenas

57 José Carlos Barbosa Moreira, Processo Civil e direito à preservação da intimidade. Temas de direito processual. 2ª série. São Paulo: Saraiva, 1988.

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dar-lhe razão, mas de proporcionar-lhe, na medida do possível, tutto quello e proprio

quello ch’egli a diritto de conseguire”.

Ainda que postergado, o contraditório será exercido, não podendo a

concessão da tutela antecipada gerar uma situação irreversível.

Na França, Suíça e Alemanha a antecipação da tutela já estava presente.

Em 1994 chega ao Direito Brasileiro.

Em situações de excepcional gravidade e urgência, havendo confronto entre

a necessidade de acesso ao Judiciário, poderá ocorrer a concessão da tutela ainda que

gerando uma situação irreversível.

Diante da remodelação do ordenamento jurídico, a sociedade ansiava por

um acesso rápido à Justiça, alçado pela Carta Constitucional como garantia fundamental.

A verdadeira função do processo é torná-lo instrumento apto a realização de

objetivos, entregando à sociedade uma solução justa e eficaz.

Em outras palavras, o objetivo da tutela é dar o mais rápido possível aquele

que detém um direito aquilo que deve obter.

Concordamos com Nelson Luiz Pinto58 ao afirmar que “ainda que não

houvesse expressa previsão legal no sentido de ser possível a concessão de tutela

provisória, quer no âmbito cautelar, quer no âmbito da antecipação de tutela, ainda assim

poder-se-ia cogitar a outorga do provimento jurisdicional equivalente, em função das

regras pertinentes à inafastabilidade do Poder Judiciário quanto à apreciação da lesão ou

ameaça de direito (CF, art. 5.º, XXXV) e à garantia do exercício constitucional de petição,

nele incluído o exercício do direito de ação (CF, art. 5.º, XXXIV, a), invocando inclusive,

os princípios constitucionais da isonomia, assim entendida como a paridade de armas para

que haja igualdade processual e, ainda, o princípio da proporcionalidade, na medida em

que não seria razoável sacrificar o direito daquele que tem razão apenas e tão-somente para

se prestigiar o formalismo processual”.

58 Nelson Luiz Pinto. A antecipação de tutela como instrumento de efetividade do processo e de isonomia processual. In: Revista de Processo, n.º 105.

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No que tange à importância do estudo dos princípios jurídicos, Nelson Nery

Jr.59 aponta “o fato é que eles existem e devem ser preservados: sua incidência é que tem

sofrido e deverá continuar sofrendo adaptações, dependendo do grau de desenvolvimento

do sistema jurídico que os adote”.

Eduardo Arruda Alvim60 aduz que “o legislador infraconstitucional

resguardou, como não poderia deixar de ser, o direito de defesa, mas ensejou a antecipação

da tutela se a resposta se mostrar abusiva ou protelatória, afinal a celeridade do processo

também é um importante vetor constitucional a ser observado como se depreende do art.5º

inc. LXXVIII do Texto Maior, que assegura “a razoável duração do processo e os meios

que garantam a celeridade de sua tramitação” (CF/88, art.5º., inc. LXXVIII). Patente, do

quanto foi dito, que ambos os incisos do art. 273 dão efetividade no plano

infraconstitucional a importantes princípios constitucionais do processo que, em última

análise, tem origem comum no princípio do devido processo legal”.

A tutela antecipada era vista, portanto, um novo instituto processual, que

não é cautelar e também não podia ser entendida como decisão de mérito.

Na verdade, é uma decisão proferida em cognição sumária, dentro de um

processo de cognição não exauriente.

O objetivo nada mais é do que antecipar a própria efetividade do processo,

isto é, aptidão do processo para produzir resultados já de início.

No caso da tutela antecipada através do julgamento antecipado parcial, a

cognição não é sumária, porém exauriente.

A primeira, apesar de ter como fundamento apenas um juízo apenas de

probabilidade, tem como função precípua a produção de efeitos imediatos na realidade,

sendo possível inclusive a concessão da antecipação da tutela no momento da prolação da

sentença.

59 Nelson Nery Jr. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, p.26 60 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.414.

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Contudo, se for concedida na sentença, já não há propriamente uma

antecipação da tutela, e a concessão equivale a emprestar um efeito apenas devolutivo à

sentença, permitindo a sua imediata execução.

Teresa Wambier acompanhada por Luiz Rodrigues Wambier61:

“Desde logo, afastamos a objeção, por a considerarmos integralmente

descabida, no sentido de que a antecipação da tutela não poderia ser concedida na

sentença. Evidentissimamente, se pode ser concedida liminarmente, razão de espécie

alguma existe para que não possa ser concedida na sentença, decisão proferida em

momento em que o juiz já tem cognição plena e exauriente dos fatos da causa”.

Donaldo Armelin62, com quem concordamos, a tutela prescinde da “certeza

e segurança resultante de uma tutela lastreada em cognição plena e exauriente”.

Contudo, alguns entendem não ser possível a concessão da tutela antecipada

na sentença, invocando a falta de interesse na medida, já que com a prolação da sentença,

não há motivos para antecipar os efeitos da tutela.

Para Nelson Nery Júnior63:

“a medida pode ser concedida tanto no início da lide quanto no curso do

processo, mas sempre antes da sentença”. E acrescenta: “Proferida a sentença não há

mais interesse processual na obtenção da medida, porque apreciada definitivamente a

pretensão”.

Um dos requisitos é a análise da prova inequívoca da verossimilhança da

alegação.

Para José Carlos Barbosa Moreira64, “Prova inequívoca da verossimilhança

significa que o juiz deve ter elementos concretos - uma prova clara, não necessariamente

61 Teresa Arruda Alvim Wambier, Breves Comentários à 2ª Fase da Reforma do Código de Processo Civil, p.100 e 104. 62 Donaldo Armelin, Tutela jurisdicional diferenciada, p.50. 63 Nelson Nery Jr., Atualidades do Processo Civil, p.58. 64 José Carlos Barbosa Moreira, Antecipação de Tutela Jurisdicional na Reforma do Código de Processo Civil, p.204.

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uma prova escrita - para considerar que é bem mais provável que ao final o autor tenha

ganho de causa, e não o réu”.

No que tange ao risco de irreversibilidade, não é somente aquela de efeitos

fáticos produzidos pela antecipação, mas do provimento em si mesmo considerado.

Luiz Guilherme Marinoni ponderava analisando o Código de Processo Civil

anterior que: “O que o artigo 273 veda quando fala que a tutela não poderá ser concedida

quando houver perigo de 'irreversibilidade do provimento antecipado' - que nada tem a ver,

repita-se, com irreversibilidade dos efeitos fáticos do provimento - são determinadas

declarações e constituições provisórias. (....) Quando o artigo 273 afirma que a tutela não

poderá ser concedida quando houver perigo de irreversibilidade do provimento, ele está

proibindo, por exemplo, a antecipação da constituição de uma relação jurídica de filiação

ou a antecipação da desconstituição de um casamento”65.

A evolução do conceito de tutela antecipada foi exposta por Luiz Rodrigues

Wambier, Flavio Renato Correia Almeida e Eduardo Talamini66, nos seguintes termos:

“Por muito tempo a efetividade do processo civil não seria a adequada,

senão aquela declarada por uma sentença. A concretização do direito material somente

restaria formalizada em sua plenitude pelo ato final de um procedimento, mesmo que para

ultrapassar suas fases seria necessário aguardar anos, culminando com a entrega da

prestação jurisdicional tardiamente. Com a edição da Lei nº 8.952/94, que alterou a

relação ao art. 273 do CPC, foi introduzido no sistema processual brasileiro o instituto da

tutela antecipatória, visando a erradicar a ineficiência do processo diante da declarada e

assumida morosidade do Poder Judiciário, na solução dos conflitos. Afastando os efeitos

da sentença, afastou-se o problema da inefetividade jurisdicional. Seu escopo é a de

tornar a prestação jurisdicional efetiva, sem, contudo, compatibilizá-la com o sentido de

acautelamento. A necessidade dessa efetividade é a contrapartida que o Estado tem que

dar à proibição da autotutela”.

Paulo Henrique dos Santos Lucon67, também citado por Luiz Manoel

Gomes, pondera que o elemento que diferencia as medidas cautelares é, justamente, a

65 Luiz Guilherme Marinoni, A antecipação de tutela, pp.173/174. 66 Luiz Rodrigues Wambier, Flavio Renato Correia Almeida e Eduardo Talamini, Curso Avançado de Processo Civil, p.346.

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aptidão destas em proteger situações antes que se tenha a certeza quanto a existência do

direito reclamado na demanda principal, fundada em uma cognição não exauriente, ou seja,

sem a nota da definitividade. Em sua concepção, “(...) é correto afirmar que a ação cautelar

é um poder ou direito atual quando ainda não declarado, com cognição exauriente, se o

direito material existe”.

A tutela de cognição exauriente assegura o pleno exercício do contraditório,

permitindo a busca da verdade e a certeza, produzindo coisa julgada material.

E prossegue Lucon afirmando:

“Ainda que não haja coincidência entre o objeto do processo principal e a

medida cautelar, essa circunstância não impede de considerar a tutela jurisdicional

cautelar como forma de proteção de direitos. Aliás, o caráter eminentemente jurisdicional

das medidas cautelares funda-se no nexo existente entre a tutela cautelar protegida e a

situação substancial protegida”.

Nesta linha de raciocínio, é possível extrair que a finalidade da cautelar é

assegurar o resultado útil da decisão que será prolatada na demanda principal, a ser

ajuizada (cautelar preparatória) ou já em curso (cautelar incidental).

Neste ponto conveniente esclarecer que se o magistrado poderia antecipar o

provimento da demanda principal, naturalmente poderá o menos, isto é, deferir a cautelar.

Diante do fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação,

admite-se o cabimento da tutela antecipada após o encerramento da instrução.

Algumas observações mostram-se pertinentes, segundo Luiz Manoel Gomes

Junior68:

“a) a utilização de tal faculdade somente deve ocorrer quando estiverem

presentes os elementos necessários para o ajuizamento da demanda principal, caso

contrário a via cautelar é sempre aconselhável, possibilitando a obtenção de maiores

elementos pelo interessado; e

67 Paulo Henrique dos Santos Lucon, Eficácia das Decisões e Execução Provisória, p.167. 68 Luiz Manoel Gomes Junior, disponível em http://www.nacionaldedireito.com.br/doutrina/1188/a-reforma-do-cpc-lei-10444-02-considera-es-iniciais acesso em 19/09/2015.

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b) deverá ser evitada a utilização da cautelar incidental, já que o pedido

pode ser realizado na própria ação principal, contornando a necessidade do ajuizamento

de nova ação, com todos os percalços e inconvenientes mais do que conhecidos.

Aspecto que não pode ser olvidado é que se trata de uma opção da parte.

Em outras palavras, fica a critério do interessado postular a antecipação da tutela (com

natureza cautelar) ou ajuizar medida cautelar autônoma.

Jamais poderá o julgador indeferir o processamento de cautelar com o

fundamento de que o pedido pode ser realizado a título de antecipação da tutela. Se o

litigante entende que haverá maior possibilidade de defender seus interesses em ação

autônoma, ou como forma de evitar tumulto na demanda principal com a execução da

decisão, são questões que ficam em sua margem de discricionariedade.

Já o art. 461-A, em sua nova redação, permitirá a dispensa de instauração

do Processo de Execução, sendo a decisão do juiz recebida com caráter cominatório, em

evidente tentativa de simplificar a atuação jurisdicional, poupando o interessado do

“calvário da demanda executiva””.

Andrea Proto Pisani69, citado por Ovídio A.Baptista da Silva70 apontou que:

"Os institutos de direito material estão destinados, diria que naturalmente, a

mudar de acordo com o surgimento e a diferente avaliação dos interesses em conflito em

relação à fruição dos bens materiais e imateriais. Diferentemente dos institutos materiais,

os institutos de direito processual que visam a garantir a tutela jurisdicional dos direitos

‘nascem, por assim dizer, não apenas com o selo terreno, mas com aquele da eternidade,

que lhes é aposto por seu próprio destino de garantir a realização da justiça’".

Segundo afirma Nelson Luiz Pinto71, “ainda que não houvesse expressa

previsão legal no sentido de ser possível a concessão da tutela provisória, quer no âmbito

cautelar, quer no âmbito da antecipação de tutela, ainda assim poder-se-ia cogitar a

outorga do provimento jurisdicional equivalente, em função das regras pertinentes à

inafastabilidade do Poder Judiciário quanto à apreciação da lesão ou ameaça de direito

69 Ovídio A. Baptista da Silva, Racionalismo e tutela preventiva em processo civil, p.23. 70 p.24. 71 Nelson Luiz Pinto, A antecipação de tutela como instrumento de efetividade do processo e da isonomia processual, p. 51.

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(CF, art. 5º, inc. XXXV) e à garantia do direito constitucional de petição, nele incluído o

exercício do direito de ação (CF, art. 5º, inc. XXXIV, a) invocando inclusive os princípios

constitucionais da isonomia, assim entendida como a paridade de armas para que haja

igualdade processual e, ainda, o princípio da proporcionalidade, na medida em que não

seria razoável sacrificar o direito daquele que tem razão apenas e tão somente para se

prestigiar o formalismo processual”.

O Direito Processual Civil ainda apresenta vertente racionalista sendo

concebido por instrumento puramente formal e abstrato.

Parece óbvio que o direito processual, tentando minimizar o periculum in

mora, na busca da decantada efetividade do processo, cria mecanismos que objetivam

amortecer as situações mais críticas que se configuram durante a espera do almejado

provimento jurisdicional definitivo.

Veremos mais que o Novo Código de Processo Civil, mais especificamente

artigo 305, parágrafo único72, reforça-se a ideia de que há procedimentos distintos,

dispondo que o juiz pode entender que o pedido em questão tem natureza antecipada e não

cautelar, devendo observar o procedimento previsto no artigo 303 do mesmo diploma

legal.

Ora, ao contrário da tutela antecipada antecedente (artigo 304), não há

previsão de consequência, apenas a sua manutenção até decisão definitiva.

Não há o fenômeno da estabilização da medida cautelar, e também não há

extinção do processo.

Logo, o Novo Código de Processo Civil, ao contrário do Código Buzaid,

não dedicou às tutelas provisórias um processo autônomo.

Antes, a lógica estava fundada na divisão da atividade de cognição e de

execução, bem como dos provimentos provisórios dos provimentos definitivos.

72 Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Parágrafo único. Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303.

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Atualmente, a tutela antecipatória encontra-se na Parte Geral, podendo ser

utilizada de forma antecedente ou incidental, no procedimento comum ou qualquer

procedimento diferenciado.

A exposição de motivos do projeto do novo Código de Processo Civil assim

dispõe:

“Extinguiram-se também as ações cautelares nominadas. Adotou-se a regra

no sentido de que basta à parte a demonstração do fumus boni iuris e do perigo de

ineficácia da prestação jurisdicional para que a providência pleiteada deva ser deferida.

Disciplina-se também a tutela sumária que visa a proteger o direito evidente,

independentemente de periculum in mora.

O novo CPC agora deixa clara a possibilidade de concessão de tutela de

urgência e de tutela à evidência. Considerou-se conveniente esclarecer, de forma expressa,

que a resposta do Poder Judiciário deve ser rápida não só em situações em que a urgência

decorre do risco de eficácia do processo e do eventual perecimento do próprio direito.

Também em hipóteses em que as alegações da parte se revelam de juridicidade ostensiva

deve a tutela ser antecipadamente (total ou parcialmente) concedida, independentemente de

periculum in mora, por não haver razão relevante para a espera, até porque, via de regra, a

demora do processo gera agravamento do dano. Ambas essas espécies de tutela vêm

disciplinadas na parte geral, tendo também desaparecido o livro das ações cautelares.

A tutela de urgência e da evidência podem ser requeridas antes ou no curso

do procedimento em que se pleiteia a providência principal”.

Luiz Rascovski73 comenta sobre as alterações do Novo Código de Processo

Civil:

“Outra alteração bastante significativa diz respeito ao novo regramento

da tutela provisória. O Livro V, a partir do art. 294 até o art. 311, une em um só livro o

que antes estava dividido na conhecida tutela antecipada do atual art. 273 e das cautelares,

a partir do art. 798 (sejam típicas ou atípicas).

73 Luiz Rascovski, Apontamentos sobre o Novo Código de Processo Civil, p. 363 - 386.

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Assim, o novo capítulo traz a tutela provisória como gênero, das quais são

espécies: (a) a tutela de urgência e (b) a tutela da evidência. E, dentre as tutelas de urgência

temos a subespécies: (a.1) tutela de urgência cautelar e (a.2) tutela de urgência antecipada.

Ademais, ambas as tutelas de urgência podem ser requeridas de forma

antecedente ou em caráter incidental.

Houve, portanto, uma sistematização dos procedimentos de natureza

cautelar e satisfativa por via de um único gênero. O novo Código de Processo Civil faz

uma unificação, porquanto estabelece os mesmos requisitos para a concessão

da tutela cautelar e da tutela satisfativa (probabilidade do direito e perigo de dano ou risco

ao resultado útil do processo). De modo que, ainda que permaneça a distinção entre as

tutelas, na prática os pressupostos serão iguais.

Além de um regime jurídico praticamente único, outra grande vantagem é a

dispensa de um processo cautelar autônomo. Isto porque a nova legislação processual civil

autoriza que as medidas provisórias sejam pleiteadas e deferidas nos autos da ação

principal. Assim, é substituído o processo cautelar, pela previsão das tutelas de urgência e

tutela de evidência.

Registra-se, então, a extinção de todo o capítulo das cautelares e o

desaparecimento das regras das cautelares nominadas previstas no Código de 1973.

Contudo, ainda que extinto o processo cautelar no novo Código de Processo Civil,

as tutelas cautelares se manterão e poderão ser concedidas tanto incidentalmente, quanto

no início do processo. Neste caso, nos parece nítida a tendência atual do abandono do

formalismo, em prol da efetividade e celeridade processual”.

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3. Direito Comparado

No Direito Brasileiro, optou-se agora por unificar as tutelas cautelares e

antecipatórias.

No Direito Comparado, toda tutela de urgência é unificada sob a

denominação de tutela cautelar, principalmente na Europa.

Giuseppe Tarzia74 explica:

“In Germania, in Francia, in Svizzera, in Belgio, in Austria, in Grecia, in

Italia, da ultimo anche in Spagna, ci si è spinti fino ad ammettere che la

misura di urgenza possa tal volta antecipare la sentenza definitive, cioè,

accordare al richiedente, dal punto de vista degli effetti, la medesima tutela,

che otterrebbe, se riuscisse vitorioso, attraverso la procedura ordinária”.

Frederico Carpi75 pondera:

"A perspectiva não é nova; o que é novo em nossa época é a consciência

nos ordenamentos modernos de que a tutela jurisdicional dos direitos e dos

interesses legítimos não é efetiva se não é obtenível rapidamente".

Chiovenda76 estudou de forma profunda a formação histórica dos processos

civis modernos, e o direito brasileiro não acompanhou a evolução, eis que permanecia

atrelado à tradição ibérica.

No Direito Alemão e no Direito Francês a tutela é um pouco diferente,

diversa do Direito Brasileiro.

Existe diferença substancial entre as soluções, quanto ao aspecto estrutural,

pois naqueles países somente existe uma modalidade de provimentos antecipatórios. Não

há nítida separação entre tutela cautela lato sensu, de um lado, e tutela sumária não cautela,

de outro. A estrutura dos provimentos cautelares naqueles países é mais flexível que no

Brasil e na Itália, pois ou a eficácia do provimento não está subordinada a um prazo

74 Giuseppe Tarizia, Considerazioni Conclusive. Les Mesures Provisoires em Procédure Civile, p.315. 75 Frederico Carpi, La tutela d'urgenza fra cautela, "sentenza anticipada" e giudizio di mérito, pág. 4. 76 Giuseppe Chiovenda, Instituições de Direito Processual Civil, v.1, p.144.

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predeterminado pelo legislador, podendo o juiz fixá-lo, mas o pedido da parte contrária

(ZPO, § 926), ou ele guarda certa independência em relação ao provimento principal, cuja

ausência não faz com que cesse automaticamente sua eficácia.

Em 18 de dezembro de 1930 com o advento do Código de Processo Civil,

verificamos a influência francesa, e, posteriormente, a pós a passagem de Enrico Tullio

Liebman pelo Brasil, o nosso sistema afastou-se das origens lusitanas e aproximou-se da

doutrina italiana.

Discorrendo sobre o assunto, Eduardo Arruda Alvim77 aborda que a maioria

dos sistemas jurídicos reconhece a possiblidade da antecipação da tutela, mas não com a

autonomia específica e dogmática onde esta veio a ter, no art. 273, a configuração de um

instituto amplo sediado no âmbito do processo de conhecimento e com caráter geral; e, no

art. 461, também, com largo espectro. Ainda, em leis especiais, devemos dizer que a

antecipação de tutela já nasceu com as mesmas, a reconhecer que determinados bens

jurídicos demandam a possibilidade, sempre presente e constante, de proteção pronta e

imediata.

Prosseguindo, o autor traça um histórico da evolução do Direito Italiano,

mencionando Elio Fazzalari em Colóquio Internacional sobre Medidas Provisórias

realizado em Milão, propondo que se atribuísse maior poder ao juiz de instrução, ou seja,

‘un potere generalizzato di provvedere in via antecipatoria’ [um poder generalizado de

providenciar em via antecipatória], quando estivesse em face de elementos probatórios

havidos como suficientes, mas isso ‘con tutte le garanzie del contradittorio, e non in modo

sommario’ [com todas as garantias do contraditório, e não de modo sumário].

A Ministra do Colendo Superior Tribunal de Justiça Eliana Calmon78 afirma

que este quadro se agrava no momento em que a sociedade emerge para um regime

democrático e encontra grande desordem nos diversos segmentos sociais, referindo-se,

especificamente, à situação do Judiciário Brasileiro, nos últimos anos, em virtude de um

significativo agravamento da má qualidade da prestação jurisdicional.

77 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.387. 78 Eliana Calmon, Tutela de Urgência, p.11.

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Com clareza lapidar, Araken de Assis79 explica o fenômeno da execução da

tutela antecipada no Direito Comparado, ressaltando as semelhanças entre os institutos:

“Em primeiro lugar, o próprio provimento já outorga o estado jurídico

novo, que é o efeito constitutivo, e imediatamente, prescindido de qualquer atividade

material de cumprimento. Assinala Tomás Pará Filho que do provimento constitutivo

decorre toda a sua eficácia, independentemente de outro processo ou de outra via

executória. Em outras palavras, o efeito constitutivo é instrumento auto-suficiente de

tutela jurisdicional, assegurando, de modo pleno e completo, aduz Italo Andolina, "la

realizzazione delle situazione giuridiche sostanziale dedotte in giudizio”.

“O evoluído e gabado sistema jurídico dos países anglo-saxônicos resolveu

a questão do eventual descumprimento da injunction através de enérgico expediente. De

acordo com Dobbyn, "the only practical force available to the court for enforcement of its

decrees is its ability to impose contempt sanctions on the respondent". Com efeito, o meio

mais eficiente e lesto para induzir partes e terceiros à obediência, indiferentes à imposição

de multas, consiste em colocá-los na prisão até que atendam à ordem.

O direito pátrio privou o órgão judiciário de poderes dessa invejável

amplitude, no âmbito civil, só permitindo, e a título excepcional, a prisão civil do devedor

de alimentos e do depositário infiel (art. 5.º, LXVII). Em lugar do poder amplo poder de

Contempt, o legislador brasileiro preferiu a distante repressão penal, equivalente ao

criminal Contempt norte-americano, específica no caso de recusar ou procrastinar o

cumprimento da ordem de implantar descontos em folha de pagamento (art. 734 do Cód.

de Proc. Civil c/c art. 22, parágrafo único, da Lei 5.478/68), e geral no crime de

desobediência (art. 330 do Cód. Penal), cuja caracterização, relativamente aos servidores

públicos - no conceito lato do art. 327 do Cód. Penal -, oferece invencíveis dificuldades.

De qualquer sorte, sabem todos os interessados, sanção penal constitui ameaça longínqua

e ineficaz. Tem valor simbólico, quanto à confirmação da autoridade judiciária, e efeitos

suasórios”.

Sem embargo de haver algum sacrifício para a segurança jurídica da

prestação jurisdicional, o surgimento da antecipação da tutela foi benéfico para o processo

79 Araken de Assis, Execução da tutela antecipada Datadez nº 37, MAR/ABR de 2007.

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civil brasileiro, eis que foi adotado um poderoso instrumento para a efetividade da tutela

urgente não satisfativa, minimizando os efeitos deletérios do tempo no processo.

No Direito Argentino, não há previsão expressa do instituto da tutela

antecipada.

Luiz Eduardo Boaventura Pacífico80 comenta que ao propugnar a adoção de

ferramentas técnicas na legislação ibero-americana, particularmente na Argentina, Jorge

W. Peyrano discrimina os fenômenos que descreve como urgência intrínseca ou pura

urgência funcional, aquela relacionada com o próprio direito material e esta vinculada aos

danos que o tempo pode causar à eficácia do processo81.

Eduardo Arruda Alvim82 ressalta que no Direito Argentino a mera

verosimilitud é insuficiente, exigindo-se ‘una flerte probabilidad’ a embasar a medida, por

a verosimilitud é o que se requer para as medidas cautelares, propriamente ditas. Segundo

ainda Jorge A. Rojas, o fundamento constitucional para uma construção legal dessa

realidade, atualmente, realizável à luz da disciplina das medidas cautelares, seria o amparo,

tal como consta da Constituição Argentina, no seu art. 43.

Jorge A. Rojas propõe uma reestruturação da medida de amparo, para

preservação de situações que envolvam urgência83.

80 Luiz Eduardo Boaventura Pacífico, Direito processual civil americano contemporâneo, p.31. 81 W. Peyrano, Problemas y soluciones procesales, p.223. Nesse contexto, o processualista refere às raras leis provinciais que incorporaram expressamente a medida autosatisfativa: art.305 do CPC de La Pampa, art. 232, bis, do CPC de Chaco, e art. 5º da Lei 11.529 de Santa Fé cada qual com suas particularidades. É imperioso observar que, na reforma do CPCCN de 1995, introduziu-se uma espécie de tutela antecipada na ação de despejo, desde que haja pedido do autor, o seu argumento seja verossímil e seja prestada caução (art.660, bis). 82 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.405. 83 Jorge A. Rojas, Un "nuevo molde" para el amparo. Disponível em http://www.juridicas.unam.mx/publica/rev/revlad/cont/1/art/art11.htm acesso em 12/09/2015. Como vemos, por entonces no existieron dudas de ningún tipo, ni desde la doctrina ni desde la jurisprudencia, en concebir al amparo como un mecanismo para atender situaciones urgentes que por su excepcionalidad no admitían ningún tipo de dilaciones, y lo que también es cierto, y nuestra realidad nos lo indica, es que los resultados que obtenemos hoy en día resultan magros frente a las posiciones esbozadas. Por ese motivo es que "el nuevo molde" que proponemos para el amparo debe necesariamente sufrir modificaciones que apunten a estructurar36 un verdadero proceso urgente, sin ánimo de que con ello se agote su sistematización que creemos necesaria para la contemplación de sus distintas variantes, toda vez que ha sido elocuente el agotamiento de las viejas estructuras que se han pergeñado para darle un correcto andamiaje; de ahí la importancia que le atribuimos a las formas al comienzo de este trabajo. Esto hace que reiteremos nuestra postura de concebir una estructura monitoria, no para obtener una condena inmediata frente a cualquier tipo de petición, sino para obtener de la jurisdicción una actuación verdaderamente protectoria frente a situaciones que así lo requieran. Reiteramos que ello podríamos lograrlo delimitando el campo de las medidas cautelares al diferenciarlas en esa zona gris a la cual antes nos referíamos, para regular así lo que se denomina

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José Rogério Cruz e Tucci84 informa que no Direito Canadense, a tutela de

urgência encontra expressa previsão nas Regras 40 a 45. Interlocutory Injunction ou

Mandatory Order consubstancia-se num provimento judicial de natureza antecipatória,

norteado pelo princípio da proporcionalidade (balance of convenience), visando a evitar

dano irreparável a um dos litigantes. O famoso caso, muitas vezes invocado sobre esse

tema, é o precedente Metropolitan Stores Ltd. v. Manitoba Food and Commercial Workers

[1987].

No Direito Chileno, Ricardo de Barros Leonel85 explica que quanto às

medidas precautorias, destinadas a “asegurar el resultado de la acción” (art.290), há outras

diretrizes, tendo natureza nitidamente cautelar, sendo possível deduzi-las em qualquer

estado do processo, entre elas, o sequestro do bem litigioso, a nomeação de interventores, a

retenção de bens determinados, a proibição de celebrar atos ou contratos sobre bens

determinados.

usualmente como tutela anticipada o jurisdicción anticipatoria, liberando al juez de toda limitación que importen las causales de prejuzgamiento que eventualmente podrían cercenar su actuación. De tal modo, podríamos lograr de la jurisdicción, frente a la evidencia de los hechos, un "mandato de protección" o "mandato protectorio" que permitiera mantener el principio de igualdad entre las partes en el proceso, para equiparar ante la ley a aquel que haya sido objeto de cualquier tipo de violación -actual o en ciernes- de sus derechos. Contamos para ello con los avances que ha producido la jurisprudencia en la materia, aunque con la salvedad de que en algunos casos se sigue denominando como medidas cautelares (clásicas) a aquellas que requieren otros aditamentos, que debemos añadir a los presupuestos sustanciales tradicionales. Así se ha decidido que: El hecho de que el objeto de una medida cautelar coincida -total o parcialmente- con el objeto de la pretensión principal, no invalida la cautela solicitada. Pero tal circunstancia, sí exige una mayor ponderación de los elementos en que se la funda, pues únicamente cabe hacer lugar a determinado tipo de cautelares ante la certidumbre de que el daño a prevenir reviste el carácter de inminente e irreparable (Cám. Nac. Civ., sala D, 26 de septiembre de 1997, "Bella, Elvira Isabel c/Federación Argentina de Tiro [FAT] s/Amparo", L. L. del 9 de septiembre de 1998, p. 5). Estas pautas novedosas esbozadas por nuestra jurisprudencia son importantes de tomar en cuenta para regular el amparo, como la certeza del derecho invocado o su fuerte probabilidad de certeza, como asimismo la existencia de un daño que resulte irreparable, pues conducen a demostrarnos el exceso de los moldes tradicionales a los cuales antes hacíamos referencia; pero también nos permiten integrar un proceso con partes en igualdad de condiciones, con lo cual la actuación que le cabe a la jurisdicción adquiere, como se aprecia en los precedentes citados, un cariz fundamental. La emisión de un mandato protectorio por parte de la jurisdicción provocaría dos alternativas, como las que plantea el dinamismo de la norma procesal: puede existir oposición del afectado, o no. En el primer caso el proceso a sustanciarse debe restringirse al máximo posible evitando todo tipo de discusión sobre la causa que ha generado esos hechos, centrándola únicamente en la existencia o no del derecho invocado, con lo cual, agotado ese trámite, con la eventual posibilidad de producir algún medio probatorio a esos fines -todo ello dentro de plazos perentorios y breves-, el juez dictaría sin más sentencia, la cual revestiría únicamente el carácter de cosa juzgada formal habilitando al accionado a ocurrir por la vía ordinaria tradicional para revisar todo lo actuado, en caso de tener que discutir la causa que dio origen a los hechos del amparo. En el supuesto de que no exista oposición de parte del afectado, quedaría liberado el juez de tener que sustanciar contradictorio alguno, por lo cual dictaría sin más sentencia confirmando o no, según los hechos del caso, el mandato protectorio que emitió. 84 Op. Cit., p.53. 85 Ricardo de Barros Leonel, Direito Processual Civil Americano Contemporâneo, p.79.

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No Direito Colombiano, Heitor Vitor Mendonça Sica86 ressalta que a

disciplina das medidas cautelares é bastante tímida, seja pela taxatividade de seu

cabimento, ante a falta de norma geral que preveja o poder geral de cautela do juiz, seja

pela ausência de sistematização, revelando-se essencialmente casuística.

Nos Estados Unidos, acrescenta Lionel Zaclis87 que além de várias outras, o

interessado pode pleitear uma tutela de urgência denominada temporary restraining order,

com eficácia de 10 dias, após o seu decurso deve ser requerida sua renovação ou uma

preliminary injunction por meio da qual o juiz ordena que o réu pratique um ato ou se

abstenha da prática de um ato até o final do julgamento. A permanent injunction é uma

decisão que determina ao réu a prática ou abstenção de um aot em caráter permanente.

A Regra 64 das FRCP trata da apreensão de pessoa ou coisa (Seizure of

Person or Property), autorizando penhoras antes do julgamento (prejudgment attachment)

busca e apreensão (replevin), depósito forçado (garnishment), detenção (arrest), sequestro

(sequestration) ou outros eventualmente previstos na legislação de cada estado. Aludidas

regras, que visam promover uniformidade de tratamento ao longo do território nacional,

nestes casos delegam ao poder estadual, sem abrir mão, porém, do direito de estabelecer os

limites das medidas impostas.

Em Portugal, na parte do poder geral de cautela há possibilidade de

concessão tanto de medidas conservativas como antecipatórias, valendo transcrever o

artigo 362 nº 1 do Código de Processo Civil de 2013:

“Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão

grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência

conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a

efetividade do direito ameaçado”.

Assim sendo, no sistema processual civil português há previsão da

providência cautelar e antecipatória sob a égide do mesmo regime, de forma semelhante ao

Novo Código de Processo Civil Brasileiro.

86 Op.cit, p.120. 87 Op.cit, p.199.

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Gláucia Mara Coelho88 prossegue afirmando que no Direito Português, a lei

processual admite a concessão de tutelas jurisdicionais imediatas, que possam configurar

como respostas eficazes a situações em que estão caracterizados o fumus boni iuris

(probabilidade de subsistência do direito alegado pela parte) e o periculum in mora (que

deve ser perceptível, urgente e justificado). Em Portugal, os procedimentos cautelares são

utilizados para antecipar determinados efeitos das decisões judiciais, para prevenir a

violação de direitos grave ou de difícil reparação ou prejuízos, bem como para preservar

determinado status quo, enquanto não for prolatada a sentença definitiva no processo

principal.

Os artigos 381 a 392 regulam o procedimento cautelar comum e são seus

requisitos: a probabilidade séria da existência do direito invocado, o fundado receio de que

lesão grave ou de difícil reparação de tal direito, seja antes da ação principal ser proposta,

seja na sua pendência, a adequação da providência adotada pelo requerente frente a sua

lesão iminente, e a não existência de procedimento cautelar especificado para aquela

hipótese.

O procedimento cautelar, prossegue Glaucia Coelho, é sempre dependente

do processo principal e pode ser ajuizado previa ou incidentalmente, sendo certo que o

julgamento da matéria de fato e a decisão final que venha a ser prolatada no procedimento

cautelar não determina o resultado da ação principal. A liminar concedida perde eficácia se

o requerente não propuser a ação principal no prazo de trinta dias ou se, proposta a ação, o

processo ficar paralisado por mais de trinta dias. Há divisão entre os procedimentos

cautelares típicos ou nominados e os atípicos ou inominados.

No Direito Suíço, José Rubens de Moraes89 informa que o novo Código

incorpora em um único dispositivo (art.257) um importante instituto, sob a denominação

Befehlsverfahren a ser veiculado por meio de procedimento sumário. É possível, ainda, a

grosso modo, uma equiparação do instituto com aquelas hipóteses em que se torna factível

a antecipação da própria tutela jurisdicional a ser concedida sobre a parte incontroversa da

demanda. A opção do legislador suíço foi de conferir ao demandante, o mais rápido

possível, o bem da vida por ele almejado, nos casos em que restar patente a pertinência de

sua pretensão. Se, por um lado, há alguns anos, as tutelas de urgência inauguraram a

88 Op.cit, p.327. 89 José Rubens de Moraes, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.366.

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possibilidade de contraditório diferido, porém necessário, agora, está-se diante do

contraditório eventualmente antecipado.

No Direito Francês, inexistia regulamentação do poder geral de cautela,

sendo posteriormente prevista a possiblidade de concessão de antecipação de tutela.

Explica Ricardo de Barros Leonel90 que no Direito Francês, as ordonance de

référé que rendem ensejo as medidas provisórias normalmente em razão de urgência (art.

484), também não passam em julgado em relação ao objeto do litígio, embora estejam

sujeitas à preclusão, na medida em que não podem ser modificadas senão diante de

circunstâncias novas relativas ao caso (art. 488).

Roger Perrot, citado por Tarzia91 explica:

"Au siècle dernier, elle avait surtout pour rôle d'assurer la conservation des

biens litigieux ou d'aménager temporairement une situation contentieuse en

attendant le jugement définitif. De nos jours, ce rôle premier n'a pas

disparu. Mais une autre fonction s'est developpé que gagne en importance

et qui consiste moins en une mission de sauvegarde qu'en une anticipation

sur la décision définitive. Avec la mesure provisioire on cherche à gagner

du temps et à répondre aux besoins le plus impérieux en devançant

eventuellement le jugement ou l'arrêt que, plus tard rendra le tribunal (ou la

cour)".

Portanto, no Direito Francês, há três modalidades de tutela provisória, isto

é, mesures d'attente (tutela cautelar); mesures provisoires que anticipent sur le jugement

(tutela antecipada); mesures provisoires qui anticipent sur l'execution (tutela antecipada).

Eduardo Arruda Alvim92 salienta que a tutela ressarcitória, em relação às

obrigações de fazer e não fazer, para cuja realização se exigia um processo de

conhecimento e, sucessivamente, um processo de execução para obtenção do que havia

sofrido aquele que tivesse sido vítima da lesão, sofreu mutação pelas ‘astreintes’. A França

90 Ricardo de Barros Leonel, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.138. 91 Roger Perrot, Les mesures provisoires en droit français, in TARZIA, ob. cit., pág. 153 92 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.403.

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tinha e tem no Código Civil, no art.1.142 o seguinte texto: “toda obrigação de fazer ou não

fazer resolve-se em perdas e danos e juros, em caso de descumprimento pelo devedor”.

No direito alemão, as tutelas provisórias encontram-se previstas no ZPO, §

940.

Está prevista a condenação provisória (Befriedigungsvefugung), evitando-se

o perecimento do direito.

Fábio Peixinho Gomes Correa93, comentando sobre o Direito Processual

Civil Alemão, esclarece que se a utilidade da sentença a ser proferida no procedimento

ordinário estiver ameaçada pelo tempo de duração do processo ou por eventos

intercorrentes, a parte pode promover procedimentos especiais de arresto (Arrest) ou de

medidas cautelares (einstweillige Verfügungen), os quais asseguram o resultado do

processo ou temporariamente regulam a relação entre as partes até a sentença de mérito.

Nos casos em que há necessidade de acautelar um direito individual, a parte tem a sua

disposição as medidas cautelares, nas quais devem ser demonstrados a verossimilhança do

direito e o motivo da urgência (§ 935). Da mesma maneira, o juiz pode conceder uma

medida cautelar, para o fim de assegurar a “paz jurídica” (Rechtsfrieden) em relações

jurídicas duradouras (§ 940).94

Eduardo Arruda Alvim95 comentando sobre o Direito Alemão, informa que

há quarenta anos, 6% dos processos cíveis continham medidas de urgência e nas câmaras

de direito comercial, em média 1/3 dos processos são medidas de urgência. Estas medidas

de urgência encontram-se presentes em praticamente todos os tipos de processo. A

execução ou a realização da medida cautelar faz-se salvo raras exceções, da mesma forma

que a execução definitiva.

No Direito Espanhol, explica Heitor Vitor Mendonça Sica96 que as medidas

cautelares devem ser requeridas pelo interessado, sob sua responsabilidade pessoal, não

podendo o juiz conceder medidas cautelares de ofício e tampouco conceder medidas mais

gravosas que as pleiteadas (art.721 da Ley de Enjuiciamiento Civil), salvo em casos

93 Fabio Peixinho Gomes Correa, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.46. 94 Cf. Walter J. Habscheid, La Giustizia Civile in Germania, p.130. 95 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, pp.396/397. 96 Heitor Vitor Mendonça Sica, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.102.

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especiais, as medidas cautelares devem ser requeridas perante o órgão judiciário no qual

tramite a causa, (art.723), as medidas cautelares só poderão ser concedidas nos casos em

que se demonstrarem necessárias para tornar efetivo o provimento final, que poderia se

frustrar por situações possíveis de ocorrer durante o curso do processo (art.726.1 e 728.1 e

2), salvo disposição expressa em contrário, o requerente deve prestar caução (art. 728.3), as

medidas cautelares são provisórias e precárias (art.726.2), sem prejuízo da concessão de

outras, as medidas cautelares específicas estão reguladas no art. 727.97

No Direito Holandês, explica Lionel Zaclis98 que as medidas cautelares

distintas do sequestro, sequestros conservativos, penhoras (executoriale beslagem) e

medidas executivas diversas. As medidas cautelares distintas do sequestro exercem um

papel secundário. O sequestro conservativo, equivalente ao nosso arresto, é de uso

frequente, principalmente no setor da navegação e funciona como instrumento de

cobrança.

José Rogério Cruz e Tucci99 discorre sobre o Direito Inglês, e esclarece que

as cortes inglesas, por força da seção 37 do Supreme Court Act 1981 estão investidas do

poder de proferir decisões interlocutórias de natureza cautelar (interlocutory injunctions).

Atualmente a matéria está prevista na Practice Direction relativa à R.25.1. As

denominadas freezing injunctions (antes chamadas Mareva injunctions) são decisões, in

personam, proferidas inaudita altera parte, que ordenam a indisponibilidade (espécie de

arresto) de bens do réu, para que sobre eles possa recair futura execução. O requerente

deve escudar o pedido num fundamento jurídico e mostrar potencial possibilidade de

dissipação do patrimônio do demandado. A ordem judicial pode ter como destinatário um

terceiro, geralmente uma entidade financeira, que está obrigado a acatá-la100. No âmbito da

União Europeia, inúmeros tratados multilaterais tornam eficazes provimentos judiciais

mesmo no exterior, fora da jurisdição inglesa.

97 São elas: a) o embargo preventivo de bens para assegurar a execução; b) intervenção ou administração judicial de bens; c) depósito de coisa móvel; d) arrolamentos de bens; e) anotação preventiva de demanda em registros públicos; f) ordem de cessar provisoriamente atividade; g) depósito temporário de bens e recursos; e h) suspensão de acordos sociais impugnados. 98 Lionel Zaclis, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.206. 99 José Rogério Cruz e Tucci, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.235. 100 Neil Andrews, English Civil Procedure: a Synopsis, Ritsumeikan Law Review, p.55.

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No Direito Italiano, Luiz Eduardo Boaventura Pacífico101 aborda que o

legislador introduziu a possibilidade de provimentos antecipatórios, os quais não se

confundem com as decisões decorrentes do poder geral de cautela do juiz, previsto no

art.700 do Codice di Procedura Civile. A tutela antecipada abrange três hipóteses: a

ordenação para pagamento de valor não contestado, e a concessão pressupõe pedido

expresso, de um lado e ausência de resistência, de outro, o pedido pode ser apresentado até

o encerramento da instrução, quando às partes é facultada a oportunidade de tecer suas

considerações conclusivas, a ordenação de injunção, quando é possível a obtenção de

provimento condenatório antecipado. Para sua concessão é necessária prova escrita, a

exemplo do procedimento de injunção (monitório). Nas duas hipóteses, a ordenação é

passível de modificação e de revogação a qualquer momento, sendo relevante notar, por

outro lado, que constituiu título executivo mesmo na hipótese de ulterior extinção do

processo sem o julgamento de mérito e ainda a ordenação sucessiva ao encerramento da

instrução. Após o término da instrução, é possível pleitear a concessão de ordenação

antecipatória. Se a parte condenada não se manifestar, em trinta dias da intimação da

decisão, recurso pleiteando a prolação de sentença a ordenação e converte em sentença.

No Direito Italiano, portanto, os provimentos antecipatórios seriam na

verdade uma espécie do gênero cautelar, contendo duas espécies de periculum in mora: (i)

pericolo da infruttuosità e (ii) pericolo de tardività ou ritardo.

O primeiro implica em um provimento conservativo (tipicamente cautelar) e

o segundo uma providência antecipatória.

Andrea Proto Pisani102 explica: “Sinteticamente: mentre alla presenza di um

pericolo c.d. da infruttuosità durante le more del processo, di fatti Che possono impedire la

soddisfazione del diritto contoverso, alla presenza di in pericolo c.d. da tardività la misura

cautelare deve impedire, tramite la técnica della antecipazione della soddisfazione, il

pregiudizio che il perdurare di uma situazione antigiuridica provoca al titolare Del diritto

101 Luiz Eduardo Boaventura Pacífico, Direito Processual Civil Europeu Contemporâneo, p.269. 102 Andrea Proto Pisani, Lezioni di Diritto Processuale Civile, p. 602. Tradução livre: “Em resumo: enquanto a presença de perigo de inutilidade pela demora durante o processo, fatos que podem impedir a satisfação contoverso lei, a presença do perigo de atraso pela medida de precaução destinada a impedir, através da técnica de antecipação da satisfação, prejudicar a continuidade estado. Uma das coisas que faz com que o titular do direito(Tommaseo) . Correspondente a esses dois tipos de aviso pericula , você pode distinguire medidas cautelares em duas grandes categorias: a) medidas de precaução conservadores da situação de fato ou de direito que afetará o futuro julgamento; b) Medidas de proteção lei satisfação antecipatória”.

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(Tommaseo). Corrispondentemente a queste due specie di pericula in mora, è possibile

distinguire i provvedimenti cautelari in due grosse categorie: a) provvedimenti cautelari

conservativi della situazione di fatto o di diritto su cui dovrà incidere la futura sentenza; b)

provvedimenti cautelari anticipatori della soddisfazione del diritto”.

Edoardo Ricci103, tratando da evolução da tutela urgente na Itália, explica

que “as medidas urgentes antecipatórias passaram a ser disciplinadas por uma regra nova,

que é diferente daquela pertencente à tradição jurídica italiana. De fato, atualmente as

medidas urgentes antecipatórias produzem efeitos mesmo na ausência – atual ou futura –

do processo principal”.

Humberto Thedoro Junior104 explicando o provimento cautelar na Itália

expõe que:

“Dessa distinção aparecem os dois tipos de provimento propriamente

cautelar na Itália: (a) aqueles meramente conservatórios das situações de fato ou de direito

sobre os quais incidirá a futura sentença (provimento conservativo); e (b)

aqueles antecipatórios da satisfação do direito (provimento antecipatório).105

O sistema italiano, pois, sob o nomen juris de tutela propriamente cautelar

admite a expedição de medidas judiciais de natureza meramente cautelar (as

conservativas), bem como de medidas verdadeiramente antecipatórias do próprio direito

material.106 Num segundo momento, o direito italiano passou a admitir a edição de medidas

103 Edoardo F. Ricci, In Tutelas de urgência e cautelares, p. 384. 104 Humberto Theodoro Jr., A Autonomização e a Estabilização da Tutela de Urgência no Projeto de CPC, p. 13 - 59. 105 Vullo, op. cit., p. 7, registra “che la distinzione proposta da Calamandrei tra provvedimenti cautelari conservativi e anticipatori (o innovativi) è divenuta patrimonio comune della nostra cultura giuridica”. Proto Pisani, Le tutele giurisdizionali… cit., p. 470: “Sinteticamente mentre alla presenza di un pericolo c.d. da infruttuosità la misura cautelare deve prevenire il danno che può derivare dal verificarsi, durante le more del processo, di fatti lesivi del diritto controverso, alla presenza di un pericolo c.d. da tardività la misura cautelare deve impedire – tramite la tenica della antecipazione della soddisfazione – il pregiudizio che il perdurare di una situazione antigiuridica provoca al titolare del diritto. Corrispondentemente a queste due specie di pericula in mora, è possibile distinguire, si sogliono distinguere, i provvedimenti cautelari in due grosse categorie: aa) provvedimenti cautelari conservativi della situazione di fatto o di diritto su cui dovrà incidere la futura sentenza; bb) provvedimenti cautelari anticipatori della soddisfazione del diritto”. 106 E assim ocorreu em função da interpretação ampla que a doutrina italiana conferiu ao art. 700 do italiano (ao qual se assemelha o art. 798 do CPC brasileiro), que disciplina o poder geral de cautela do juiz: cf. Proto Pisani, Le tutele giurisdizionali… cit., p. 377; e Bove, Lineamenti di diritto processuale civile, p. 16. Também o direito português atual admite que no poder geral de cautela se inserem tanto as medidas conservativas, como as satisfativas, ou antecipatórias (art. 381, n. 1, do CPC (LGL\1973\5) português, com a redação renovada pelos Decretos-leis 329-A/1995 e 180/1996): cf. Theodoro

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antecipatórias dentro do processo de conhecimento107, mas tal perspectiva, segundo a

doutrina, não surtiu os efeitos desejados e chegaram até a causar perplexidade do ponto de

vista teórico.108

Diferentemente do sistema brasileiro,109 em que tradicionalmente o

processo cautelar só combatia o risco do provimento infrutífero, não se podendo conceder

no processo cautelar, medidas antecipatórias do direito material,110 que só aparecem no

direito brasileiro com a antecipação de tutela, concedida não no processo cautelar, mas

como incidente dentro do processo de conhecimento (art. 273 do CPC).111 Com isso, criou-

se, no direito brasileiro, um corte artificial de diferenciação entre cautelar e antecipação de Júnior, Curso de direito processual civil, p. 671. Na mesma obra se vê a notícia de que a visão unitária da tutela de urgência, de modo a compreender indistintamente as medidas conservativas e as satisfativas, é uma tendência de todo o direito europeu, como, por exemplo, se passa na Alemanha, na França, na Suíça, na Bélgica, na Grécia, na Itália e na Espanha (Theodoro Júnior, Curso de direito… cit., p. 676-678). 107 Querzola, Lea, op. cit., p. 146: “Particolari sono poi, per il semplice fatto di situarsi necessariamente all’interno di un processo di cognizione già instaurato, quelle ordinanze, comunemente definite dalla dottrina ‘antecipatorie di condanna’, che il legislatore ha introdotto al duplice scopo di far ottenere alla parte, che apparisse già avere (almeno una certa misura di) ragione ad un dato momento del processo ordinario, un pronto titolo esecutivo, nonché di abbreviare la durata del processo (per esempio, le ordinanze di cui agli art. 186 bis, 186 ter e 186 quarter oltre a quelle di cui all’art. 423 CPC”. 108 Idem, ibidem: “Introdotti con la speranza che potessero costituire la panacea di diversi malli che affliggono l’ormai spossato processo ordinario, queste ordinanze non solo paiono non aver sortito gli effetti sperati dal punto di vista pratico, ma hanno fin da sùbito suscitato diverse perplessità anche dal punto de vista teorico”. 109 Para comparação entre os sistemas brasileiro e italiano, no âmbito da tutela de urgência, conferir Andrade, A técnica processual da tutela sumária no direito italiano, RePro 179/186-194. 110 Theodoro Júnior, Tutela antecipada… cit., p. 131-132: “As mais antigas medidas típicas de urgência foram as providências cautelares, cujo objetivo era tradicionalmente mantido no âmbito da conservação de bens úteis ou necessários à maior eficiência da tutela principal, dita tutela satisfativa. Não se concebia o uso de medidas cautelares sumárias para satisfazer, fora do processo principal, pretensão material do litigante. (…) A evolução da tutela de urgência ocorreu durante muito tempo no âmbito das medidas cautelares. Inicialmente, estas se apresentavam como medidas típicas, tais como o arresto e o sequestro, com destinação à hipóteses taxativamente traçadas pelo legislador. Mais tarde, concebeu-se um poder geral de cautela, a exemplo do art. 700 do atual CPC italiano, do qual derivou o art. 798 do CPC brasileiro de 1973. Com esse poder geral, a tutela preventiva não ficava mais restrita às medidas típicas idealizadas pelo legislador, porque ao juiz se conferia o poder de criar outras providências para afastar o perigo de dano decorrente da demora do processo principal, que se adequassem às particularidades do caso concreto. Este poder criativo, no entanto, não deveria ultrapassar o campo neutro das medidas conservativas”. 111 Antes da reforma processual de 1994, que veio a regular a antecipação da tutela no processo de conhecimento (art. 273 do CPC), não havia qualquer previsão específica no ordenamento jurídico, salvo exceções legalmente reguladas (v.g., liminar em ação possessória ou em mandado de segurança), de concessão de liminares satisfativas, por meio das quais se adiantava ao autor o gozo do direito material no início do processo. Com isso, havia controvérsia na doutrina e jurisprudência a respeito da possibilidade ou não de concessão de medidas cautelares satisfativas, com base no poder geral de cautela do juiz (art. 798 do CPC). Parte da doutrina, valendo-se da definição clássica de processo cautelar, no sentido de que no seu âmbito apenas se poderiam postular medidas de segurança jurídica em relação ao processo principal, para garantir sua eficácia e resultado útil, entendia impossível, por meio da tutela cautelar, do adiantamento do próprio direito material ou uma espécie de execução provisória, no processo cautelar, do objeto do processo principal. Em linha contrária se situava outra parte da doutrina, para quem o art. 798 do CPC autorizaria a concessão de medida cautelar por meio da qual se poderia antecipar provisoriamente a própria prestação jurisdicional objeto da ação de conhecimento.

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tutela que só foi mitigado em 2002, com instituição, pela Lei 10.444/2002, da

fungibilidade entre as duas medidas.112

Fecha-se o parêntesis da explicação preliminar e volta-se ao direito italiano:

surgiu, assim, na Itália, a partir das inovações introduzidas pelo Decreto legislativo 5/2003

e depois consolidadas na vigente Lei 80/2005, a tutela chamada de sumária, prestada

mediante cognição sumária, em processo autônomo ou mesmo dentro dos procedimentos

de cognição plena, suficiente, por si só, a resolver a crise de direito material sem o

sequenciamento e desdobramento necessário do processo de cognição plena.113

Ganha corpo, no âmbito da justiça civil, a mudança de perspectiva da tutela

sumária, que antes era deferida em caráter acessório, para garantir a eficácia ou mesmo

antecipar os efeitos da futura cognição plena, e agora passa a existir por si só, com força

própria para resolver a crise de direito material, dissociadamente da tutela de cognição

plena.

Como aponta parte da doutrina italiana, a tutela sumária atenua ou quebra o

vínculo da instrumentalidade obrigatória e necessária entre a tutela cautelar, provisória, e o

mérito ou o processo de cognição plena, razão pela qual esta última não se torna mais

obrigatória, mas meramente eventual.114

112 A Lei 10.444/2002 acrescentou o § 7.º ao art. 273 do CPC (LGL\1973\5), com a seguinte dicção: “Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado”. Assim, a tentativa é de harmonização das duas tutelas, mediante integração no escopo geral da tutela cautelar, evitando-se que se constituam barreiras intransponíveis entre a tutela cautelar e a tutela antecipatória (cf. Theodoro Júnior, O processo civil brasileiro: no limiar do novo século, p. 94; e Theodoro Júnior, Tutela antecipada… cit., p. 135-136). 113 Menchini, Nuove forme di tutela e nouvi modi di risoluzione delle controversie: verso il superamento della necessità dell’accertamento con autorità di giudicato, Rivista di Diritto Processuale, vol. LXI (seconda serie), n. 1, p. 900: “Le tecniche utilizzate, pur tutte ispirate dalla medesima finalità, sono varie: a volte, è previsto un procedimento sommario con funzione esecutiva, alternativo rispetto a quello di cognizione (art. 19 del Decreto legislativo 5/2003), altre volte, invece, la domanda dichiarativa è proposta, il processo volto ad ottenere l’accertamento del diritto sostanziale è instaurato, ma esso viene meno, in quanto le parti rinunciano al suo svolgimento, accontentandosi delle tutele disposte, ancorché provvisorie e non immodificabili (è questo il caso dei processi possessori e dell’istituto introdotto dall’art. 624, comma 3.º). 114 Consolo, Spiegazioni di diritto processuale civile, p. 25: “Di ampio rispiro sistematico, anche in questo contesto, sono poi le innovazioni contenute nella nuova Lei 80/2005, che incidono sulla stessa struttura della tutela cautelare tramite la rinuncia al requisito della assoluta provvisorietà, e così di riflesso con un ripensamento e una attenuazione – non però una soppressione – della strumentalità, in ordine ai provvedimenti d’urgenza ed agli altri provvedimenti cautelari aventi natura antecipatoria: viene meno l’esigenza che sia resa e tenuta pendente la causa di merito, requisito sin qui tradizionalmente essenziale (…)”.

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A tutela sumária sai da sua condição de mera suplência da tutela de

cognição plena e ganha o palco da justiça civil e passa a constituir autonomamente, ao lado

dos processos de cognição plena, uma alternativa autônoma para a solução mais célere das

crises de direito material, sem, contudo, eliminar-se ou suprimir-se a possibilidade de

escolha da via da cognição plena”.115

No direito europeu a tutela provisória geral serve tanto para conservar como

para regular a situação jurídica material das partes.

Somente não se permitia a liberdade de interferir no relacionamento

substancial litigioso, nos casos de emergência, quando a regulamentação provisória da lide

fosse de tal modo a impedir reversão no julgamento definitivo do mérito, caso se tornasse

necessário julgar a causa, afinal, de modo diverso.

"Il punto essenziale, a meo avviso, è che il regolamento provvisorio non

ostacola il regolamento definitivo, che sarà dato dal giudice del mérito"

(TARZIA, ob. cit., pág. 315).

Donaldo Armelin116 afirma que “O direito processual europeu, apesar da

portentosa produção científica que apresenta, não produziu ainda um sistema jurídico

processual plenamente eficaz em termos de equacionamento da almejada harmonização

entre segurança, rapidez e eficácia. Talvez o vezo cartesiano de partir de princípios para se

chegar às soluções adequadas a praxis seja um dos responsáveis por essa situação. O certo,

porém, é que o sistema processual anglo-americano, muito mais marcado pelo empirismo,

apresenta melhores soluções nesse sentido, a despeito de não contar com a produção

científica do direito europeu”.

115 Como aponta Menchini, op. cit., p. 900, a ideia não é acabar com o processo declarativo de cognição plena, mas simplesmente, criar, ao lado deste, procedimentos mais céleres, como alternativa para aquele que necessita recorrer à tutela jurisdicional: “In funzione di economia processuale, di accelarzione della tutela, di deflazione del contenzioso si sta facendo strada una nuova forma di giurisdizione, che prevede rimedi che non sono sostitutivi del processo dichiarativo, ma additivi rispetto ad esso: la giurisdizione cognitiva o di accertamento non è più snodo necessario per la tutela delle situazione giuridiche sostanziali, ma è, comunque, a disposizione delle parti. Queste possono scegliere tra mezzi diversi in base ai loro bisogni: se ritengono che non sia necessario e neppure soltanto utile l’accertamento con forza di giudicato, ricorrono alle forme speciali non dichiarative e rinunciano a quelle cognitive, evitando di dare vita al processo di merito o di proseguirlo, qualora esso sia stato già instaurato; invece, se considerano non sufficiente la tutela senza stabilità, possono sempre adoperare il giudizio di cognizione”. 116 Donaldo Armelin, Tutela jurisdicional cautelar, p.126.

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Humberto Theodoro Junior117 traz um panorama geral no Direito

Comparado, destacando elementos comuns no direito pátrio, afirmando a necessidade da

generalização do poder cautelar.

117 Humberto Theodoro Jr., Antecipação de Tutela de Medidas Cautelares - Tutela De Emergência, pág. 25. “Cada vez mais se reclamava a generalização do poder cautelar, de modo a dotar o órgão judicial de um poder geral não apenas cautelar no sentido estrito, mas que abrangesse também, e sempre que necessário, a antecipação de satisfação ao direito material da parte, desde que evidente e sob risco de frustração final, para a hipótese de ter de aguardar o esgotamento de todos os trâmites do processo ordinário. No direito europeu, bem antes da reforma de 1964 ocorrida no direito brasileiro, consolidou-se a ampliação do poder geral de cautela, nele incluindo-se, não sem resistências, as medidas urgentes de antecipação de tutela satisfativa. Vê-se, na lição de FREDERICO CARPI, a explicação de que "A perspectiva não é nova; o que é novo em nossa época é a consciência nos ordenamentos modernos de que a tutela jurisdicional dos direitos e dos interesses legítimos não é efetiva se não é obtenível rapidamente" (La tutela d'urgenza fra cautela, "sentenza anticipada" e giudizio di mérito, Relazione in XV Convegno Nazionale, Bari, 1985, pág. 4). As liminares satisfativas deferíveis apenas em alguns processos adrede arrolados pelo direito positivo passaram a ser vistas como privilégios, que se deveriam evitar (GIUSEPPE TARZIA, Les mesures provisoires en procédure civile, Milano, Giuffrè Editore, 1985, "Considerazione Conclusive", págs. 312/313). Evoluiu-se, então, em todo direito europeu, para o rumo de conceber a tutela provisória geral tanto para conservar como para regular a situação jurídica material das partes. Somente não se permitia a liberdade de interferir no relacionamento substancial litigioso, nos casos de emergência, quando a regulamentação provisória da lide fosse de tal modo a impedir reversão no julgamento definitivo do mérito, caso se tornasse necessário julgar a causa, afinal, de modo diverso. "Il punto essenziale, a meo avviso, è che il regolamento provvisorio non ostacola il regolamento definitivo, che sarà dato dal giudice del mérito" (TARZIA, ob. cit., pág. 315). Sobre a possibilidade de utilizar as medidas de urgência para antecipar efeitos do possível julgamento de mérito, dentro daquilo que se denominava "regulamento provisório" do litígio, TARZIA dá seu testemunho de que a idéia assumiu foros de generalidade entre os principais países europeus: "In Germania, in Francia, in Svizzera, in Belgio, in Austria, in Grecia, in Italia, da ultimo anche in Spagna, ci si è spinti fino ad ammettere che la misura di urgenza possa tal volta antecipare la sentenza definitiva, cioè accordare al richiedente, dal punto de vista degli effetti, la medesima tutela, che otterrebbe, se riuscisse vittorioso, attraverso la procedura ordinaria" (ob. cit., pág. 315). Mesmo na França, onde inexistia regulamentação geral do poder de cautela e de medidas provisórias como no direito alemão e no italiano, a possibilidade da antecipação de tutela foi também acolhida, sob a justificativa de existirem questões de mérito cujo retardamento de solução se revela insuportável. Eis como se passou, na França, a evolução da tutela provisória: "Au siècle dernier, elle avait surtout pour rôle d'assurer la conservation des biens litigieux ou d'aménager temporairement une situation contentieuse en attendant le jugement définitif. De nos jours, ce rôle premier n'a pas disparu. Mais une autre fonction s'est developpé que gagne en importance et qui consiste moins en une mission de sauvegarde qu'en une anticipation sur la décision définitive. Avec la mesure provisioire on cherche à gagner du temps et à répondre aux besoins le plus impérieux en devançant eventuellement le jugement ou l'arrêt que, plus tard rendra le tribunal (ou la cour)" (ROGER PERROT, Les mesures provisoires en droit français, in TARZIA, ob. cit., pág. 153). Dentro do quadro evolutivo, o direito francês moderno, segundo a doutrina e a jurisprudência, conhece três modalidades de medidas provisórias: mesures d'attente (modalidade clássica da "tutela cautelar"), por meio das quais se busca resguardar a situação litigiosa do perigo de dano, mas sem avançar no rumo de qualquer julgamento sobre o mérito (arresto, seqüestro, produção antecipada de prova, depósito de bens, etc.); mesures provisoires que anticipent sur le jugement (modalidade moderna de "tutela antecipada"), que produzem resultados provisórios de satisfação imediata do direito do litigante; mesures provisoires qui anticipent sur l'execution (modalidade moderna, também, de "tutela antecipada") que permite ao juiz, antes do trânsito em julgado, autorizar a provisória execução da sentença, ainda pendente de recurso, sempre que considerá-la necessária (ROGER PERROT, ob. cit., págs. 154 e 172). O direito alemão, da mesma forma, agregou às tradicionais medidas cautelares (puramente preventivas), outras que correspondem ao poder que se reconhece ao juiz de assegurar a paz entre os litigantes (ZPO, § 940). Com isso, obtém-se, no plano material, um regulamento provisório determinado pelo julgador para o comportamento das partes em torno do bem litigioso, enquanto se aguarda a solução definitiva da lide. No âmbito dessa atividade de antecipação da composição da lide, o direito tedesco autoriza até mesmo a "condenação provisória" (Befriedigungsvefugung), para evitar que o direito subjetivo da parte se torne nudum jus, pela espera do ganho de causa na sentença de mérito, para só depois ser exercido. Com essa "condenação provisória", a lei germânica quer contribuir para a manutenção da paz jurídica (WALTER J. HABSCHEID, "Les mesures

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O Novo Código de Processo Civil prevê sistemática semelhante ao francês e

italiano, isto é, as medidas de urgência satisfativas obtidas em caráter antecedente

perduram de forma indefinida, independentemente da propositura da ação principal, mas

não se sujeitam à coisa julgada material, cabendo às partes, em juízo de conveniência,

provocar ou não o julgamento definitivo da lide no processo principal.

provisoires en procedure civile: droits allemand e suisse", in GIUSEPPE TARZIA, ob. cit., pág. 46). Da mesma forma, o direito suíço admite medidas provisórias equivalentes às do direito alemão, ou seja: as que visam a garantir o sucesso de uma execução forçada posterior e que se enquadram no campo das medidas cautelares tradicionais; e as que procuram manter a "paz jurídica", compondo provisoriamente a situação jurídica a ser solucionada de maneira definitiva na sentença final (HABSCHEID, ob. cit., pág. 51). Destarte, os sistemas vigentes na Alemanha e na Suíça permitem uma antecipação de tutela de mérito, "em quase todos os casos em que esta seja necessária e desejável" (HABSCHEID, ob. cit., pág. 53)”.

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4. Tutela Provisória

4.1. Noções Gerais

O Estado-juiz pode solucionar o conflito concedendo tutela definitiva ou

provisória.

A tutela definitiva é aquela decorrente de cognição exauriente, assegurados

os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga118

expõem que há a tutela definitiva não-satisfativa, de cunho assecuratório, para conservar o

direito afirmado, neutralizando os efeitos maléficos do tempo, a tutela cautelar.119

No entanto, a tutela definitiva está sujeita a eventual demora, eis que o

processo exige tempo, podendo colocar em risco a efetividade.

A decisão que concede tutela provisória é fundada em cognição sumária,

muito bem definida por Leonardo Greco120e, por ser provisória, pode ser substituída por

118 Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga, Curso de Direito Processual Civil. Volume 2, p.562. 119 Prosseguem os autores: “A principal finalidade da tutela provisória é abrandar os males do tempo e garantir a efetividade da jurisdição (os efeitos da tutela). Serve, então, para redistribuir, em homenagem ao princípio da igualdade, o ônus do tempo do processo, conforme célebre imagem de Luiz Guilherme Marinoni. Se é inexorável que o processo demore, é preciso que o peso do tempo seja repartido entre as partes, e não somente o demandante arque com ele. Esta é a tutela antecipada, denominada no CPC-2015 como “tutela provisória”. A tutela provisória confere a pronta satisfação ou a pronta asseguração”. 120 Leonardo Greco, A Tutela da Urgência e a Tutela Da Evidência no Código de Processo Civil de 2014/2015. Acesso em 07/09/2015. E o autor prossegue: “A cognição sumária também é característica da tutela provisória. Sumária é a cognição que sofre limitações quanto à sua profundidade11, para através de um juízo superficial e incompleto poder extrair rapidamente uma conclusão a respeito da necessidade da medida. Segundo KAZUO WATANABE (Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, 4ª ed., Saraiva, São Paulo, 2012, p. 132), nos procedimentos sumários, sejam ou não cautelares, o legislador prefere a celeridade à perfeição. O mesmo autor, em sua clássica monografia, classifica a cognição, no plano horizontal, quanto ao objeto cognoscível, em plena e limitada ou parcial; e, no plano vertical, quanto à profundidade, conforme a cognição do juiz sofra ou não limitações. Admite, com apoio na doutrina majoritária, que, se a limitação cognitiva do juiz resulta da inércia ou da concordância do requerido, a cognição possa ser considerada exauriente quanto à profundidade, apta a gerar a coisa julgada. Numa posição mais radical, que me parece bastante consistente, PROTO PISANI exige, na cognição exauriente, o efetivo exercício do direito de defesa pelo réu. Independentemente dessas divergências doutrinárias, é pacífico na doutrina que na cognição sumária se forme um mero juízo de probabilidade ou de verossimilhança, ou um juízo sobre a aparência do direito16, em contraposição a um possível juízo de certeza que decorreria da cognição exauriente na jurisdição de conhecimento. Conforme já tive oportunidade de acentuar, no processo judicial, seja ele de conhecimento ou cautelar, poucas são as decisões efetivamente fundadas num autêntico juízo de certeza, ou seja, num juízo de absoluta e incontrastável evidência da existência dos fatos ou de existência do direito reconhecido, pois a certeza do direito é uma ficção imposta pela necessidade de segurança nas relações jurídicas. Por mais completa e profunda que tenha sido a investigação dos fatos ou a análise das questões de direito, normalmente a conclusão do juiz na jurisdição de conhecimento resultará de um simples juízo de maior probabilidade de uma versão e de menor probabilidade de outra e não de um juízo de certeza completa.

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uma tutela definitiva, produzida após cognição exauriente, podendo confirmar, revogar ou

modificar a tutela anteriormente concedida.

E o autor Leonardo Greco prossegue, apresentando a seguinte classificação

das tutelas:

1. Pelo critério da natureza:

1.1.Tutela de urgência

1.1.1. Cautelar.

1.1.2. Antecipada.

1.2. Tutela de evidência.

2. Pelo critério funcional:

2.1. Tutela provisória cautelar.

2.2.Tutela provisória antecipada.

2.2.1.Tutela provisória antecipada de urgência.

2.2.2.Tutela provisória antecipada de evidência.

3. Pelo critério temporal:

3.1. Tutela provisória antecedente.

3.1.1.Tutela provisória antecedente cautelar.

3.1.2.Tutela provisória antecedente antecipada de urgência.

3.2. Tutela provisória incidente.

3.2.1.Tutela provisória incidente cautelar.

3.2.2.Tutela provisória incidente antecipada.

3.2.2.1.Tutela provisória incidente antecipada de

urgência.

3.2.2.2.Tutela provisória incidente antecipada de

evidência.

Não se perca de vista que o conceito de eficácia advém da efetividade.

Assim sendo, o efeito produzido deverá ser adequado e útil para a pretensão deduzida em

juízo.

De qualquer modo, a cognição é considerada exauriente porque no momento da formação da decisão não há mais qualquer argumento ou prova que ainda possa ser trazido à baila para influir utilmente no julgamento”.

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Nesta ordem de ideias, importante salientar que o direito material tutelado

deve estar em perfeita sintonia com o meio, o direito processual (formal), suficiente a

tornar realidade a pretensão deduzida em juízo.

Devem ser harmonizados os princípios da efetividade da jurisdição e o da

segurança jurídica.

A cognição não exauriente pode ser entendida como superficial, provisória,

em oposição à cognição plena e profunda, a ser revelada somente por ocasião da sentença.

Previsto no artigo 5º inciso LXXVIII da Constituição Federal121, o princípio

da razoável duração do processo nem sempre é observado, impondo-se a necessidade do

emprego de mecanismos de aceleração do trâmite processual para que se evite o

perecimento do direito, com a concessão até mesmo incidental de medidas de urgência.

Vale frisar que a medida liminar encontra fulcro processual em duas

naturezas distintas. Uma primeira de origem antecipatória e outra de natureza acautelatória.

Em um e outro caso, a providência inaudita altera pars somente tem lugar

quando a ciência da parte adversária puder colocar em risco a própria eficácia da medida,

ou, em um segundo plano, quando a urgência é de tal forma premente que o interregno

entre a ciência e a decisão judicial provocaria o perecimento do direito a ser tutelado.

Insta considerar que de um lado a antecipação total da tutela requerida, na

esteira da lei depende da demonstração inequívoca de prova, verossimilhança das

alegações, e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou abuso de direito

de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu.

No que tange à prova inequívoca, paira certa dúvida com o conceito de

verossimilhança.

Na verdade, a prova pode ser inequívoca, porém pode não causar

convencimento ao juiz.

121 LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

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Ora, prova inequívoca não é o mesmo fumus bonis iuris do processo

cautelar. Conforme exposto, o juízo de verossimilhança ou de probabilidade, como

preferem alguns, tem vários graus, que vão desde o mais intenso até o mais tênue.

Segundo ensinamentos de Ovídio Baptista122, a tutela cautelar se define da

seguinte forma, é uma forma particular de proteção jurisdicional predisposta a assegurar,

preventivamente, a efetiva realização dos direitos subjetivos ou de outras formas de

interesse reconhecidos pela ordem jurídica como legítimos, sempre que eles estejam sob

ameaça de sofrer algum dano iminente e de difícil reparação, desde que tal estado de

perigo não possa ser evitado através das formas normais de tutela jurisdicional.

Por sua vez, define Humberto Theodoro Jr.123, consiste, pois, ação cautelar

no direito de provocar, o interessado, o órgão judicial a tomar providências que conservem

e assegurem os elementos do processo (pessoas, provas e bens), eliminando a ameaça de

perigo ou prejuízo iminente e irreparável ao interesse tutelado no processo principal; vale

dizer: a ação cautelar consiste no direito de assegurar que o processo possa conseguir um

resultado útil.

Neste ponto convém trazer à colação os ensinamentos de Luiz Guilherme

Marinoni124:

“Decidir com base na verossimilhança preponderante, quando da tutela

antecipatória, significa sacrificar o improvável em benefício do provável. E nem poderia

ser diferente, mesmo que não houvesse tal expressa autorização, pois não há

racionalidade em negar tutela a um direito que corre o risco de ser lesado sob o

argumento de que não há convicção de verdade”.

Para Humberto Theodoro Junior125, no que pertine à medida cautelar

tratando daqueles requisitos citados, informa: “O primeiro é situado no campo da

possibilidade jurídica, e o segundo no do interesse”.

122 Ovídio A. Baptista da Silva, Fábio Gomes. Teoria Geral do Processo Civil, p. 339. 123 Humberto Theodoro Jr., Curso de Direito Processual Civil, v. II, p. 362. 124 Luiz Guilherme Marinoni, Prova convicção e justificativa diante da tutela antecipatória, p.121-139, p.124. 125 Humberto Theodoro Jr., Processo Cautelar, p.72.

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Assim, de forma sucinta, fumus boni iuris seria a aparência do bom direito e

o periculum in mora seria o risco de dano.

Já para Cândido Rangel Dinamarco126, a questão pode ser simplificada da

seguinte forma:

“Alguns mais cautelosos a evitam no trato das antecipações, mas outra

coisa não é o ‘fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação’, que figura

como pressuposto da tutela antecipada (CPC,art. 273, I). Defensor da unidade no trato

das medidas de urgência, não vejo por que distinguir. O periculum in mora é essencial a

todas elas, precisamente porque todas se destinam a debelar os males do tempo-inimigo.

Por isso, todas se reúnem na categoria medidas de urgência.”

O mesmo autor, Cândido Rangel Dinamarco127 esclarece que o decurso de

tempo no processo pode ser nocivo por mais de uma forma, fazendo menção a três delas:

(i) a primeira hipótese é aquela em que o provimento é emitido quando o mal já está

consumado e nada mais se pode fazer (quando, por exemplo, há concessão de segurança

para que o impetrante possa participar de um concurso público depois do concurso já

realizado); (ii) a segunda diz respeito a uma tutela jurisdicional demorada, concedida após

longa espera e muito sacrifício (é o caso, por exemplo, do titular do direito a alimentos,

que permanecesse anos a fio esperando a tutela jurisdicional, recebendo-a somente depois

de muito tempo de injustas privações); (iii) a terceira é a do processo que, em razão do

tempo de tramitação, deixa de dispor dos meios externos indispensáveis para um resultado

útil (tem-se como exemplo o desaparecimento de bem que poderia ser penhorado para a

futura satisfação do credor).

Ao conceder ou não a tutela almejada, deverá o magistrado sopesar os

argumentos deduzidos pelo autor e pelo réu, aplicando-se o princípio da proporcionalidade,

como já esclareceu Arruda Alvim128:

(....) Um critério de que o juiz poderá servir-se será aquele em que sopese a

proporcionalidade entre as posições do autor e do réu, visualizando essas posições ao

126 Cândido Rangel Dinamarco, Fundamentos do Processo Civil Moderno, p.1.418. 127 Cândido Rangel Dinamarco, Nova era do processo civil, p. 56-57. 128 Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, p. 879.

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depois de imaginar os efeitos da antecipação da tutela, tais como incidiriam sobre as

situações de um e de outro”.

Da mesma forma, Marcus Vinicius Rios Gonçalves129:

“Quando o juiz concede a medida, ele o faz em caráter provisório, ciente

de que a decisão poderá ser alterada ao final. Por isso, ao fazê-lo, deve medir as

consequências negativas que resultarão do deferimento da antecipação, e as que

decorrerão do indeferimento. Ou seja, deve sopesar as consequências que advirão de uma

coisa ou outra. Se verificar que as consequências da concessão serão muito mais gravosas

que as decorrentes do indeferimento, o juiz negará a medida. Do contrário, ele a

concederá”.

José Roberto dos Santos Bedaque130 aborda que:

“As várias modalidades de tutelas cognitivas urgentes vem provocando

polêmica entre os processualistas, especialmente por importarem certa mitigação de

determinadas garantias processuais em razão da existência de divergências quanto à

sistematização do instituto.

Em substituição ao longo processo de cognição plena, com todas as

garantias a ele inerentes, surge a ideia de uma tutela mais rápido, com cognição limitada,

que possibilite à parte obter antecipadamente o resultado da atuação jurisdicional.

Afirma-se, mesmo, que o futuro do processo civil será dominado pelos

provimentos urgentes e provisórios. (...)

Já a via da tutela sumária dispensa o contraditório antecipado, podendo a

decisão ser proferida antes, relegado o exercício da ampla defesa a momento posterior. A

iniciativa para que a cognição plena se realize é normalmente ônus daquele que suportou

os efeitos do provimento sumário.

No primeiro momento, a cognição realizada pelo juiz é sumária, porque

parcial, na medida em que ele somente tem acesso a parte dos fatos aqueles deduzidos

129 Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novo Curso de Direito Processual Civil, p. 295. 130 José Roberto dos Santos Bedaque, In Tutela Cautelar e Tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização, p.122/124.

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pelo autor. Também pode ser sumária a cognição, ainda que o contraditório e realize

antes da decisão. Agora, a sumariedade se verifica não mais em razão do conhecimento de

apenas parte dos fatos, mas pela maneira superficial que a atividade cognitiva se

desenvolve.

(...) Todas as tutelas sumárias são precedidas de cognição não exauriente.

Trata-se de elemento comum a todas elas, cuja função é impedir que o tempo de duração

do processo possa comprometer sua efetividade. É a eterna luta do sistema processual

contra o tempo”.

Definindo as espécies de cognição, o Prof. Kazuo Watanabe aborda que "a

cognição é prevalentemente um ato de inteligência, consistente em considerar, analisar e

valorar as alegações e as provas produzidas pelas partes, isto é, as questões de fato e de

direito que são deduzidas no processo e cujo resultado é o alicerce, o fundamento do

judicium, do julgamento do objeto litigioso do processo" (1987, pág. 41).

O mesmo autor, prosseguindo, "se de um lado há exigências próprias do

direito material por uma adequada tutela, há de outro as técnicas e soluções específicas do

direito processual, não somente quanto à natureza do provimento (...), como também no

tocante à duração do processo, à eventual antecipação da tutela, a intensidade e amplitude

da cognição, e a muitos outros aspectos" (1987, pág. 19).

Vê-se, assim, a importância da cognição para a funcionalidade do processo,

e, via de consequência, oportuno se faz apresentar, mesmo que sucintamente, as suas

espécies, dentro da relação entre o sujeito (cognoscente) e o objeto (cognoscível).

O objetivo final do processo é a solução da lide, e para tanto, o juiz aprecia

questões de fato e direito, colimando a entrega da prestação jurisdicional, resolvendo a

lide.

Dessarte, a cognição pode ser estudada no sentido horizontal, quando a

cognição pode ser plena ou parcial; e no sentido vertical, em que a cognição pode ser

exauriente, sumária e superficial.

No plano horizontal (extensão ou amplitude), a cognição vai abordar

questões processuais, condições da ação e mérito.

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Nesse plano, como ensina Kazuo Watanabe131, a cognição pode ser plena

ou limitada (ou parcial), segundo a extensão permitida. Será plena quando todos os

elementos do trinômio que constitui o objeto da cognição estiverem submetidos à atividade

cognitiva do juiz. É o que se dá, com maior frequência, no processo de conhecimento, com

o que se garante que a sentença resolverá a questão submetida ao crivo do judiciário da

forma mais completa possível. Limitada será, por outro lado, quando ocorrer alguma

limitação ao espectro de abrangência da cognição, ou seja, quando algum dos elementos do

trinômio for eliminado da atividade cognitiva do juiz.

Feitas estas considerações, a cognição sumária é uma cognição menos

aprofundada em sentido vertical, sendo que o magistrado terá que apreciar a afirmação do

fato e sua prova, decidindo apenas com mero juízo de probabilidade, solucionando apenas

provisoriamente a lide, não induzindo coisa julgada material, já que não houve análise

profunda do objeto litigioso.

Os princípios da instrumentalidade das formas e fungibilidade das medidas

de urgência também merecem destaque na medida em que a função precípua do julgador é

justamente a pacificação social através da prestação jurisdicional justa, útil e adequada.

Para Galeno Lacerda132, "no exercício desse imenso e indeterminado poder

de ordenar ‘as medidas provisórias que julgar adequadas’ para evitar dano à parte", poderia

o juiz inclusive antecipar provisoriamente a própria prestação jurisdicional objeto da ação

de conhecimento, espécie de cautela essa que, em seu entender, está compreendida na

finalidade do processo cautelar".

O magistrado deve estar preparado para enfrentar os desafios do cotidiano

forense, devendo ser abordada uma visão ampla do Direito, respeitando-se as opiniões

jurídicas divergentes, com adoção de novas soluções para problemas comuns, dirimindo

conflitos e implementando os direitos sociais, proporcionando efetividade ao direito

positivo.

Por fim, nota-se claramente uma tendência de ampla e irrestrita reforma de

todo o aparelho judicial, em busca da efetividade da atividade jurisdicional: “A

preocupação fundamental é cada vez mais com a justiça social, isto é, com a busca de 131 Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, p.41 e 83. 132 Galeno Lacerda, Comentários ao Código de Processo Civil, v. VIII, p.135.

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procedimentos que sejam conducentes à proteção dos direitos das pessoas comuns (...). Um

sistema destinado a servir às pessoas comuns, tanto como autores quanto como réus, deve

ser caracterizado pelos baixos custos, informalidade e rapidez, por julgadores ativos e pela

utilização de conhecimentos técnicos, bem como jurídicos. Ele deve ter, ademais, a

capacidade de lidar com litígios que envolvam relacionamentos permanentes e complexos,

como entre locadores e locatários [ou empregados e empregadores]. Essas características

como se verá, emergem nas formas procedimentais especializadas mais promissoras...”133.

A função cautelar sofre influência de duas forças com direções opostas: de

um lado, o direito à eficácia da sentença e, de outro, o direito à manutenção do status quo.

4.2. Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional

Devemos partir da premissa de que nenhuma lesão ou ameaça de lesão a

direito (individual, coletivo, difuso, público ou privado) pode ser privada da apreciação

pelo Poder Judiciário, conforme preceituado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição

Federal134.

Com maestria singular, Arruda Alvim in Manual de Direito Processual

Civil135 leciona que:

“A evolução das tutelas de urgência implicou, além da alteração de valores

do âmbito do processo – tais como a noção de tutela preventiva do dano, em lugar da tutela

meramente ressarcitória e a sobrelevação da efetivação imediata do direito em detrimento

do valor segurança, que em determinadas situações se revela inútil ou insuficiente à

consecução de uma solução justa – uma alteração no próprio modo de encarar a lei e o

direito. (...) Deste modo, o legislador colocou à disposição do juiz diversos instrumentos

para a completa satisfação do direito material como, por exemplo, a imposição de multa

diária para coagir o réu ao cumprimento da decisão interlocutória que concedeu os efeitos

da tutela antecipada, ou mesmo a determinação de outras medidas necessárias para a real

efetivação das obrigações de fazer e não fazer e de entrega de coisa (i.e., apreender bens,

remover coisas e pessoas, desfazer obras, impedir qualquer atividade nociva à saúde ou ao

meio ambiente, em todas elas até mesmo com apoio de força policial, se não houver o

133 Mauro Cappelletti, Bryant Garth. Acesso à justiça, p. 93. 134 XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; 135 Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, pp.865, 872 e 878.

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cumprimento por parte do réu).136 Aqui também, se ocorrer o fracasso de todas essas

medidas coercitivas, como último recurso, será possível remeter ao Ministério Público

cópia dos autos, com as informações necessárias para propositura de ação criminal por

desobediência à ordem judicial. (...) Com efeito, existe uma fungibilidade dos meios

coercitivos voltados à atuação jurisdicional do pedido imediato feito em relação à tutela de

urgência, a fim de permitir que o magistrado consiga adaptar o tipo de proteção efetiva do

pedido mediato, o qual representa o bem da vida desejado pelo autor. Aí se inclui o uso das

astreintes, bem como o das outras medidas coercitivas acima citadas, capazes de

‘pressionar’ o réu ao cumprimento da decisão judicial que concedeu os efeitos da tutela

antecipadamente (art. 461, §§ 4º e 5º). (...) Como regra geral, a reversibilidade não deverá

ser a solução de perdas e danos ao depois da decisão (sentença ou acórdão), em que se

venha a ‘cassar’ a tutela antecipatória. No entanto, em casos extremos, de perecimento da

pretensão do autor ou de dano que só com a antecipação da tutela pode ser evitado, a

solução que poderá corretamente vir a ser a adotada é a de resolver-se o assunto até

assumindo o risco das perdas e danos. (...) O dilema do juiz será o de, porque o processo

não tem, ainda, condições para a solução final, proteger ou não o autor. Porque deverá

deixar de proteger o autor, se lhe parece que é ao réu que falece razão? E ainda que, a

solução possível, que viria no decorrer da modificação ou alteração da tutela antecipatória,

deverá antecipar a tutela pois que, do contrário, faria com que a pretensão do autor – ao

que tudo indica, fundada, e, correlatamente, não fundada a defesa – viesse a perecer. O que

nos parece, e que dificilmente se poderá propugnar, com acerto, para uma interpretação

que fique aquém daquela que, em casos realmente graves, existia a respeito das chamadas

cautelares satisfativas. Com a adoção deste instituto, o legislador acaba por assumir um

risco mínimo de que a decisão concessiva da tutela possa vir a ser alterada, e o faz

sopesando os valores em jogo”.

Nelson Nery Junior137 também se debruçou sobre o assunto e comenta sobre

o princípio do contraditório ou bilateralidade da audiência nos casos de concessão da tutela

antecipada:

“Não é portanto, a cautelaridade ou satisfatividade do provimento

jurisdicional que dá a tônica ao respeito ou desrespeito ao princípio da bilateralidade da

136 Nesse sentido, v. Luz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel Medina, Breves Comentários à nova sistemática processual civil, vol.1, p.168-170. 137 Nelson Nery Jr., Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, p.140-141.

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audiência. Haveria ofensa ao mandamento constitucional se ao réu, na ação cautelar não

se desse oportunidade de defesa ou de recurso contra a liminar (cautelar ou antecipatória

do resultado) concedida a seu desfavor. O cerne da questão se encontra na manutenção da

provisoriedade da medida, circunstância que derruba, a nosso ver, a alegada

inconstitucionalidade das liminares concedidas sem a ouvida da parte contrária”.

O magistrado deve estar preparado para enfrentar os desafios do cotidiano

forense, devendo ser abordada uma visão ampla do Direito, respeitando-se as opiniões

jurídicas divergentes, com adoção de novas soluções para problemas comuns, dirimindo

conflitos e implementando os direitos sociais.

A evolução da sociedade exige um magistrado preparado não somente na

área jurídica, mas também em outras e diversas áreas, tornando-se presente o conceito da

interdisciplinaridade na formação continuada do conhecimento.

O magistrado não deve se restringir a um mero aplicador do Direito,

desapegando-se de formalismos inúteis.

Deve estar permanentemente atento, melhorando o desempenho com a

frequência em cursos e facilitando o acesso à Justiça.

A eficácia do provimento jurisdicional nada mais é do que a possibilidade

de a decisão produzir transformações no mundo empírico, no plano real e concreto dos

fatos, com o objetivo de gerar a satisfação do titular do direito.

Podemos concluir que também a tutela cautelar tem fundamento

constitucional, a partir da sumarização da cognição.

Arruda Alvim sustenta que há uma tendência universal, também verificada

no Brasil, no sentido de, por meio da lei, “engendrarem-se institutos com essa finalidade de

precipitar no tempo a satisfação da pretensão. A decisão proferida dentro de um sistema,

mais célere, em que se prescinda da audiência, sem lesão às partes, corresponde à ambição

generalizada de uma Justiça mais célere. A demora dos processos é um mal universal. Essa

tendência continuada dos legisladores, de tentarem agilizar a Justiça, tem sido a resposta

correspondente ao grande aumento do acesso à Justiça, mercê do qual o aparato estatal

tradicional, seja tendo em vista o seu tamanho, a sua eficiência, não tem logrado atender

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com a rapidez desejável. As motivações decorrentes do tema do acesso à Justiça tendo em

vista o tempo gasto no processo – maior ou menor interregno verificado entre a

consumação da lesão a determinado patrimônio jurídico e sua recomposição – são as que

informam basicamente a tutela antecipatória do art. 273” (autor citado, in Manual de

Direito Processual Civil, vol. 2, p. 384, 6a ed., São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1997).

Ensina o professor Luís Roberto Barroso138:

“Chega-se, por fim, à argumentação, à razão prática, ao controle da

racionalidade das decisões proferidas mediante ponderação, nos casos difíceis, que são

aqueles que comportam mais de uma solução possível e razoável. As decisões que

envolvem a atividade criativa do juiz potencializam o dever de fundamentação, por não

estarem inteiramente legitimadas pela lógica da separação de Poderes - por esta última, o

juiz limita-se a aplicar, no caso concreto, a decisão abstrata tomada pelo legislador. Para

assegurar a legitimidade e a racionalidade de sua interpretação nessas situações, o

intérprete deverá, em meio a outras considerações: (i) reconduzi-la sempre ao sistema

jurídico, a uma norma constitucional ou legal que lhe sirva de fundamento - a legitimidade

de uma decisão judicial decorre de sua vinculação a uma deliberação majoritária, seja do

constituinte ou do legislador; (ii) utilizar-se de um fundamento jurídico que possa ser

generalizado aos casos equiparáveis, que tenha pretensão de universalidade: decisões

judiciais não devem ser casuísticas; (iii) levar em conta as consequências práticas que sua

decisão produzirá no mundo dos fatos.”

O Professor Eduardo Arruda Alvim139 também entende que os ditames

constitucionais não podem ser menoscabados pela legislação inferior:

“(...) Releva notar que os mandamentos constitucionais tem uma grandeza

que não pode ser diminuída ou atrofiada por lei inferior. Mais ainda, o que

representa direito e garantia individual tem eficácia absoluta140, em

atenção ao disposto no art.60, § 4º, IV da CF/88. E, ainda, as normas

definidoras dos direitos e garantias fundamentais tem aplicabilidade

138 Luís Roberto Barroso, Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito (o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil), p. 11. 139 Op.cit.p.137. 140 Na terminologia de Maria Helena Diniz, exposta em Norma Constitucional e seus efeitos, p.98. A definição que segue é da própria professora: “As normas constitucionais com eficácia absoluta são as intangíveis; contra elas nem mesmo há o poder de emendar”.

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imediata (art.5º, § 1º da CF/88). Tem, pois, eficácia absoluta a regra

consubstanciada no inciso XXXV do art. 5º da CF/88. Esse princípio

projeta-se no campo da legislação infraconstitucional no art.126 do CPC:

‘O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou

obscuridade da lei (...)’, pois, efetivamente, de nada adiantaria assegurar-

se o amplo acesso ao Judiciário se, correlatamente, não se impusesse ao

juiz o dever de sentenciar, ainda que diante da obscuridade da lei”141.

Guilherme Soares de Oliveira Ortolan142 aborda:

“(...) LUIZ ALBERTO DAVID ARAÚJO e VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR143,

tecendo eloqüentes considerações acerca do devido processo legal, aí incluídos

contraditório e ampla defesa, chamam a atenção para a situação, não rara na

prática, de colidir tal princípio com outro, como exempli gratia a efetividade da

tutela jurisdicional:

141 E prossegue o autor: (...) Dispõe a Constituição Federal sobre a garantia da tutela jurisdicional, como visto, no inciso XXXV do art.5º, in verbis: ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’141. Esta regra é essencialmente dirigida ao legislador infraconstitucional, conquanto atinja a todos, indistintamente. Deve-se ter presente, para bem compreender o alcance do dito dispositivo, dentro de cujo quadro funcional, de direitos e garantias, em que se insere o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional em nosso sistema constitucional, que não há espaço para fazer, ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei (CF, art.5º, II). É, pois, necessário conjugarem-se dois princípios, o da inafastabilidade do controle pelo Judiciário de quaisquer lesões ou ameaças de lesão ao de que o Judiciário, ao decidir, está inteiramente submisso à ordem jurídica, a qual, igualmente, estão submetidos todos os jurisdicionados, sendo, portanto, avaliadas as condutas destes lícitas ou ilícitas – sempre à luz dessa pauta descritiva de tais condutas. (...) Se, pois, de um lado, o sistema jurídico, a partir do próprio texto constitucional, exaure as hipóteses do lícito e do ilícito (CF, art.5º., II), de outra parte, como nenhuma lesão de direito pode ser subtraída a apreciação do Judiciário, disto se segue que o acesso ao Judiciário, protegido pela Constituição, justamente pelo princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, normalmente envolverá a utilização de um ‘instrumento idôneo’ à apreciação de uma tal situação, a qual, a seu turno haverá de estar assentada no texto de lei (constitucional, ou não), mercê de cujo lastro aquele que terá acudido a juízo pretende ter razão e, assim, fazer subordinar, pela decisão judiciária, o interesse do demandado ao seu interesse. Por isso é que se pode dizer que esses princípios – ubiquidade e legalidade – articulam-se, formando como que um verdadeiro binômio. É, pois, inafastável o controle jurisdicional. E, no exercício desse controle, o juiz procurará sempre resolvê-lo à luz do direito posto pelo Estado, ou seja, pela pauta de valores que foi transformada em condutas havidas como legítimas pelo direito, de uma parte, e, de outro lado, haverá de excluir as condutas havidas como ilegítimas pelo próprio direito. (...) O Estado de Direito141 pode-se dizer diretamente emergido da teoria da separação de poderes. Nesse contexto, submete-se o Estado ao princípio da legalidade, conforme detectado claramente nos Estados Unidos, no limiar do século XIX, especialmente tendo em vista o controle de constitucionalidade das leis. O direito de ação distingue-se do direito de petição (CF/88, art.5º, XXXV). Este último é um direito político, exercitável em defesa de direito ou contra ilegalidade ou abuso de poder (art.5º. XXXIV, a). Já o direito de ação é um direito público subjetivo, que pode ser exercitado até mesmo contra o Estado. Isso não significa, como já vimos, que haja sempre direito à apreciação do mérito da pretensão, o que depende do preenchimento das condições da ação. No entanto, ainda que seja caso de extinção do processo sem resolução do mérito, será sempre o Judiciário que irá dizê-lo”. 142 Guilherme Soares de Oliveira Ortolan A Antecipação da Tutela Jurisdicional sob o Prisma Constitucional. Juris Síntese nº 43 - SET/OUT de 2003. 143 Luiz Alberto David Araújo d Vidal Serrano Nunes Júnior, Curso de Direito Constitucional, p.199.

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“Essa regra constitucional, tal qual as demais, não é absoluta, pois sempre haverá

de se esmaecer ante a concreta colisão com outras regras e princípios constantes

da própria Constituição. (...) Desse modo, acredita-se que a regra constitucional

deve ser obtemperada sob os parâmetros do princípio da proporcionalidade, que

traduz a justa medida dos institutos jurídicos, ou, por outra maneira, o princípio

de proibição do excesso.”

No mesmo sentido o mister de J. J. CALMON DE PASSOS, desta feita tratando

especificamente da antecipação de tutela em contraposição às garantias

constitucionais oriundas do devido processo legal: “Caso a ampla defesa ou até

mesmo a citação do réu importe certeza da ineficácia da futura tutela, sacrifica-se,

provisoriamente, o contraditório, porque recuperável depois, assegurando-se a

tutela que, se não antecipada, se faria impossível no futuro.”

Por isso que NELSON NERY JUNIOR e ADA PELLEGRINI GRINOVER, em

contraposição a OVÍDIO BAPTISTA DA SILVA, entendem não configurar a

liminar ofensa, mas sim “limitação imanente” do princípio do contraditório.

JOSE CRETELLA NETO, por seu turno, prega o máximo de cautela ante o

instituto, reclamando “que as exceções à audiência unilateral deveriam ser cada

vez mais restritas, sob pena de se cometer injustiça de difícil reparação. Nada

ganha a sociedade, nada ganha a Justiça, quando dedica um dia, uma hora que

seja, a mais, ouvindo o outro lado, para permitir ao magistrado inteirar-se dos

verdadeiros fatos e circunstâncias.”

Ofertando entendimento sob enfoque pouco diverso, ainda nas palavras de

CRETELLA NETO encontra-se apropriado comentário:

“Já a garantia constitucional disciplinada no inciso XXXV do art. 5º da

Constituição Federal diz respeito, apenas, à tutela jurídica definitiva, aquela que

se institui quando do trânsito em julgado da decisão. Execução provisória e

antecipação da tutela são problemas de política processual, sujeitas à opção do

legislador. Conceder ou negar-se a conceder liminares neste ou naquele processo,

por outro lado, jamais podem constituir providências que incidam em

inconstitucionalidade, pois em qualquer dos casos configura-se interferência no

patrimônio ou na liberdade dos indivíduos, com preterição, mesmo que em parte,

das garantias do devido processo legal, de base também constitucional”.

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Uma questão interessante que se coloca é saber sobre a natureza jurídica da

liminar, se esta pode ou não ser considerada matéria constitucional.

E, em caso positivo, a pergunta que se coloca é sobre a possibilidade do

Supremo Tribunal Federal estabelecer a Súmula nº 735144 que nega o cabimento de recurso

extraordinário contra acórdão que defere ou indefere medida liminar:

Ora, o Recurso Extraordinário possui natureza constitucional e objetiva

viabilizar o acesso à justiça.

O Professor Dr. Eduardo Arruda Alvim145 em sua tese de Doutorado expõe

com clareza:

“Também a antecipação de tutela na hipótese do inc. II do art. 273 do

mesmo preceito encontra sua raiz no Texto Supremo, mas o que nos interessa mais de

perto neste capítulo são as semelhanças e diferenças entre a antecipação de tutela com

arrimo na urgência da medida (hipóteses do inc. I do art. 273 e do § 3.º do art. 461) e as

medidas cautelares. Aliás, neste passo, é de ser lembrado o inc. LXXVIII do art. 5.º, nele

introduzido pela EC 45/04, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo,

são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de

sua tramitação”. Com efeito, se o princípio da ubiqüidade, estampado no inc. XXXV do

mesmo art. 5.º e, em última análise, o princípio dos princípios, que é o devido processo

legal, representam a base constitucional sobre a qual se apóia a antecipação de tutela,

tem-se que o inc. LXXVII é ainda mais expresso aos assegurar a todos “meios que

garantam a celeridade” do processo.146-147

144 735 - Não cabe recurso extraordinário contra acórdão que defere medida liminar. 145 http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/processaPesquisa.php?listaDetalhes%5B%5D=3133&processar=Processar 146 Quanto ao art. 5º, LXXVIII, da CF, pertinentes as palavras de Pietro de Jesús Lora Alarcón, Reforma do Judiciário e efetividade da prestação jurisdicional. In: Reforma do Judiciário, sob coord. de André Ramos Tavares, Pedro Lenza e Pietro de Jesús Lora Alarcón, São Paulo: Método, 2005, p. 33: “Observe-se que fortemente atrelada à garantia da tutela jurisdicional ou do acesso à jurisdição encontra-se o ideal de decisão rápida, célere, não por isso menos justa, persuasiva e pacificadora. Assim, não basta o acesso, é preciso a presteza, que tem sido procurada, especialmente aumentando o número de juízes, diminuindo o número de instâncias processuais e adotando procedimentos de urgência”. Para José Augusto Delgado, Reforma do Poder Judiciário – art. 5.º, LXXVIII, da CF. In: Reforma do Judiciário, sob coord. de Teresa Arruda Alvim Wambier et al., São Paulo: RT, 2005, p. 368, “concorrem, como meio de facilitar o acesso do cidadão à justiça, a ação popular, o mandado de segurança coletivo, a ação civil coletiva, a ação monitória, os juizados especiais (Lei 9.099/95), os efeitos da antecipação da tutela (art. 273 do CPC) e o juízo arbitral”.

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A tutela cautelar e a antecipação de tutela, quando calcada no inc. I

do art. 273, podem-se dizer sub-espécies de um gênero maior a que se pode denominar de

tutelas de urgência.148 O que há de comum a ambos os casos é que o magistrado, com base

em cognição sumária do caso,149 profere uma decisão de caráter provisório, que tem por

escopo garantir a efetividade do processo, como expõe com notável clareza Bedaque, em

lição vazada nos termos seguintes: “Todas as tutelas sumárias são precedidas de

cognição não exauriente. Trata-se de elemento comum a todas elas, cuja função é

impedir que o tempo de duração do processo possa comprometer sua efetividade.”150

147 No direito italiano, A Constituição Italiana, após a Legge Costituzionale, 23 novembre 1999, introduziu o princípio do “justo processo”, ao estabelecer em seu art. 111 que o processo deve terminar em “tempo razoável”, in verbis: “La giurisdizione si attua mediante il giusto processo regolato dalla legge. Ogni processo si svolge nel contraddittorio tra le parti, in condizioni di parità, davanti a giudice terzo e imparziale. La legge ne assicuta la ragionevole durata”. Em português: “A jurisdição atua, assim, mediante o justo processo regulado pela lei. Todo processo se desenrola no contraditório entre as partes, em condições de paridade, perante juiz terceiro e imparcial. A lei garante que a sua duração seja razoável”. 148 Oportuno que se destaque que a proposta de inserção do art. 881-C ao CPC, cuja redação consta do esboço de reformulação legislativa por nós tratado na nota de rodapé n.º 116 reafirma a idéia, desenvolvida neste Capítulo, de que a antecipação de tutela calcada na urgência e as medidas cautelares são espécies do mesmo gênero. Veja-se a redação proposta para o art. 881-C: “Art. 881-C. Aplicam-se às medidas antecipatórias, tanto as requeridas em processo antecedente como na pendência do processo principal (art. 273), no que couber, os dispositivos do Capítulo II”. 149 Para Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, pp. 145-148 a cognição sumária é menos aprofundada no sentido vertical. Segundo o autor, o grau máximo de probabilidade é excessivo e inútil ao fim a que se destina essa modalidade de cognição, visto que ela representa “mero instrumento para a tutela de um direito, e não para a declaração de sua certeza”. 150 Cf. José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização), p. 121. E prossegue Eduardo Arruda Alvim: Tanto a liminar antecipatória de tutela, assim como a liminar cautelar, são decisões eminentemente provisórias, proferidas após cognição sumária e, portanto, não devem, como já se disse em diversas passagens deste trabalho, dar ensejo a situações irreversíveis. São decisões provisórias, e por isso mesmo observa com pertinência Bedaque, relativamente à antecipação de tutela: “Para que a eficácia se torne definitiva faz-se necessário o reconhecimento do respectivo direito, o que somente ocorrerá com a tutela final. Aí sim, declarando definitivamente o direito a que os efeitos concedidos antecipadamente se referem (referibilidade), estes assumem também o caráter definitivo”.150 Se é verdade que há traços similares entre o provimento cautelar e a decisão antecipatória de tutela, pois ambos têm por escopo precípuo, em última análise, garantir a efetividade do processo, não se pode desconsiderar as diferenças que há entre ambos, que não se limitam às distinções procedimentais. As cautelares, que têm por escopo proporcionar segurança, garantidora da eficácia futura da decisão, são marcadas pela referibilidade. Isto porque dizem respeito a um outro processo, dito principal. As decisões antecipatórias de tutela, de seu turno, são marcadas por um cunho eminentemente satisfativo. É preciso que se tome cuidado com a expressão “satisfatividade”. Toda providência jurisdicional, em última instância, deve “satisfazer”. Nesse sentido mais abrangente, quase coloquial, a satisfatividade encontra sua raiz na idéia de interesse processual. Deveras, o interesse processual, enquanto condição da ação, é identificável a partir da constatação da necessidade, utilidade e adequação do provimento jurisdicional.150 Para que o pedido cautelar possa ser julgado (procedente ou não), é preciso que haja interesse processual. E, nessa acepção ampla, a medida cautelar também satisfaz”.

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Respeitado entendimento diverso, entendo que a liminar tem natureza

constitucional, mormente considerando o princípio do livre acesso ao Judiciário insculpido

no artigo 5º inciso XXXV da Constituição Federal151.

Nesse sentido, são as orientações de Nery Junior e Nery152:

“XXXV: 19. Direito de ação. Todos têm acesso à justiça para postular tutela

jurisdicional preventiva ou reparatória de um direito individual, coletivo ou

difuso. Ter direito constitucional de ação significa poder deduzir pretensão

em juízo e também poder dele defender-se. O princípio constitucional do

direito de ação garante ao jurisdicionado o direito de obter do Poder

Judiciário a ‘tutela jurisdicional adequada’. Por tutela adequada entende-se a

que é provida da efetividade e eficácia que dela se espera. Caso o

jurisdicionado necessite de atuação pronta do Poder Judiciário, como, por

exemplo, concessão da medida liminar, pelo princípio constitucional do

direito de ação tem ele direito de obter essa limitar. Restrições impostas pela

lei à concessão de liminares não podem obstar a incidência do preceito

constitucional aqui examinado. Assim, a ouvida do representante da

Fazenda Pública antes de decidir-se sobre liminar (art.2º LMC 2º) ou

restrição pura e simples ao cabimento de liminares (LMC 1º) denotam

ofensa ao princípio constitucional do direito de ação. Esses dispositivos

legais infraconstitucionais devem receber ‘interpretação conforme’ à CF

para que sejam compatíveis com o princípio da CF 5º XXXV. Portanto, haja

ou não lei prevendo e regulando concessão de liminares, haja ou não lei

limitando ou restringindo a concessão de liminares, se o jurisdicionado dela

necessitar, deve ser concedida pelo Poder Judiciário, em atendimento ao

fundamento constitucional ora analisado. Isto é tutela jurisdicional

‘adequada’, corolário e desdobramento indissociável do princípio

constitucional do direito de ação. A facilitação do acesso do necessitado à

justiça, com a assistência jurídica integral (CF 5º LXXIV), é manifestação

do princípio do direito de ação. Todo expediente destinado a impedir ou

dificultar sobremodo a ação ou a defesa no processo civil, como por

151 “XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;” 152 Nelson Nery Junior, Rosa Maria de Andrade Nery, Código de processo civil comentado e legislação extravagante, p.127.

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exemplo o elevado valor de custas judiciais, constitui ofensa ao princípio

constitucional do direito de ação [...].”

Da mesma forma, o Ministro Teori Zavaski153 aborda que:

“No direito brasileiro, o poder do juiz de conceder medidas provisórias (o

‘poder geral de cautela’ ou ‘poder geral acautelatório’, nele incluídas

medidas cautelares e antecipatórias) tem sua origem, sua fonte de

legitimidade e seu âmbito de eficácia demarcados diretamente pela

Constituição. É, em suma, um fenômeno de estrutura constitucional e não

simplesmente legal. Em nosso direito, caracterizado pela supremacia da

Constituição e pela viabilidade ampla de controle difuso dessa supremacia,

todo e qualquer preceito normativo sofre inafastável relação de coordenação

e de subordinação para com os preceitos constitucionais. É a Constituição

que dá unidade ao sistema, que estabelece seus princípios basilares, que

baixa as diretrizes e os limites do conteúdo da legislação ordinária. (...) É

comum afirmar-se que a tutela cautelar, e, por certo, também a

antecipatória, é espécie de tutela preventiva, cuja matriz constitucional

estaria no inciso XXXV do art. 5º da Carta, que assegura proteção

jurisdicional não apenas em caso de lesão, mas também em caso de ameaça

a direito. [...] Na verdade, a função jurisdicional acautelatória – chamemo-la

assim para englobar as várias espécies de tutela provisória – justifica-se

constitucionalmente como mecanismo de concretização e de harmonização

de direitos fundamentais em conflito. Sua origem, sua importância, sua

indispensabilidade, sua legitimidade enfim, decorrem, não de um ou outro

dispositivo específico, e sim do próprio sistema constitucional

organicamente considerado, conforme já sustentamos em outros estudos, por

fundamentos a seguir sintetizados.”

Apesar de certa polêmica em torno da natureza jurídica da liminar, podemos

adotar a orientação de que a liminar consiste em garantia constitucional fundamental.

Entre os doutrinadores paira certa tergiversação a respeito da

fundamentação constitucional.

153 Teori Albino Zavascki, Antecipação da tutela, p.60.

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Contudo, o melhor entendimento sustenta a natureza constitucional da

liminar, constituindo-se direito fundamental que deve ser respeitado e cumprido para

garantir a própria utilidade da prestação jurisdicional final (BARROSO, 2003, p. 143), de

sorte que não é cabível, no que tange a esse direito constitucional fundamental,

interpretação restritiva ou que limite o seu campo de aplicabilidade.

Em tese de Doutorado do Professor Eduardo Arruda Alvim acentua que:

“3.1. GENERALIDADES

Tanto os provimentos cautelares, quanto as decisões antecipatórias

de tutela possuem o mesmo berço constitucional, como bem aponta Teori Albino

Zavascki.154 De fato, ao menos quando a antecipação de tutela é concedida com esteio no

inc. I do art. 273, ou com base no § 3.º do art. 461, há, como já dito, um quê de

cautelaridade,155 que se faz também presente na hipótese do art. 804. Em ambas as

hipóteses, colima-se garantir uma prestação jurisdicional eficaz. Tanto num como noutro

caso, a tutela será de urgência e terá como fundamento o “risco de ineficácia do

provimento final”.156

A antecipação de tutela com base na urgência, assim como as

medidas cautelares, visam a dar efetividade ao princípio constitucional do acesso à

Justiça (CF, art. 5.º, XXXV) e,157 em última análise, ao princípio do devido processo legal.

Também a antecipação de tutela na hipótese do inc. II do art. 273 do mesmo preceito

encontra sua raiz no Texto Supremo, mas o que nos interessa mais de perto neste capítulo

são as semelhanças e diferenças entre a antecipação de tutela com arrimo na urgência da

154 Cf. Teori Albino Zavascki, Medidas cautelares e medidas antecipatórias: técnicas diferentes, função constitucional semelhante, In: Revista de Processo, n. 82 ,p. 59 155 Nesse sentido, ver nosso Mandado de segurança no direito tributário, 1.ª ed., 2.ª tir., São Paulo: RT, 1998, pp. 154-157, em que, conquanto nos refiramos às liminares concedidas no bojo do mandado de segurança, concluímos que estas, ainda que possuam no mais das vezes cunho antecipatório, revestem-se de uma certa cautelaridade. 156 Cf. Teori Albino Zavascki, Antecipação da tutela, pp. 168-169. 157 Sobre a íntima relação entre o poder geral de cautela e o disposto no art. 5.º, XXXV do Texto Constitucional, afirma com pertinência James Marins que: “(...) não pode o legislador infraconstitucional pretender cercear o poder geral de cautela conferido aos magistrados, pois, desse modo, ao tolher-se a preventividade da atividade jurisdicional, estar-se-ia comprimindo a dimensão constitucional da garantia individual do acesso à justiça expressada no art.5.º, inc. XXXV da Constituição Federal de 1988 (norma intangível e de eficácia plena)” (Cf. James Marins, Tutela jurisdicional efetiva em matéria tributária no Brasil – aspectos da antecipação de tutela no processo tributário, in: Justiça tributária, São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 309).

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medida (hipóteses do inc. I do art. 273 e do § 3.º do art. 461) e as medidas cautelares.

Aliás, neste passo, é de ser lembrado o inc. LXXVIII do art. 5.º, nele introduzido pela EC

45/04, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a

razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Com efeito, se o princípio da ubiqüidade, estampado no inc. XXXV do mesmo art. 5.º e, em

última análise, o princípio dos princípios, que é o devido processo legal, representam a

base constitucional sobre a qual se apóia a antecipação de tutela, tem-se que o inc.

LXXVII é ainda mais expresso aos assegurar a todos “meios que garantam a celeridade”

do processo.158-159

A tutela cautelar e a antecipação de tutela, quando calcada no inc. I

do art. 273, podem-se dizer sub-espécies de um gênero maior a que se pode denominar de

tutelas de urgência.160 O que há de comum a ambos os casos é que o magistrado, com base

em cognição sumária do caso,161 profere uma decisão de caráter provisório, que tem por

escopo garantir a efetividade do processo, como expõe com notável clareza Bedaque, em

lição vazada nos termos seguintes: “Todas as tutelas sumárias são precedidas de

158 Quanto ao art. 5º, LXXVIII, da CF, pertinentes as palavras de Pietro de Jesús Lora Alarcón, Reforma do Judiciário e efetividade da prestação jurisdicional. In: Reforma do Judiciário, sob coord. de André Ramos Tavares, Pedro Lenza e Pietro de Jesús Lora Alarcón, São Paulo: Método, 2005, p. 33: “Observe-se que fortemente atrelada à garantia da tutela jurisdicional ou do acesso à jurisdição encontra-se o ideal de decisão rápida, célere, não por isso menos justa, persuasiva e pacificadora. Assim, não basta o acesso, é preciso a presteza, que tem sido procurada, especialmente aumentando o número de juízes, diminuindo o número de instâncias processuais e adotando procedimentos de urgência”. Para José Augusto Delgado, Reforma do Poder Judiciário – art. 5.º, LXXVIII, da CF. In: Reforma do Judiciário, sob coord. de Teresa Arruda Alvim Wambier et al., São Paulo: RT, 2005, p. 368, “concorrem, como meio de facilitar o acesso do cidadão à justiça, a ação popular, o mandado de segurança coletivo, a ação civil coletiva, a ação monitória, os juizados especiais (Lei 9.099/95), os efeitos da antecipação da tutela (art. 273 do CPC) e o juízo arbitral”. 159 No direito italiano, A Constituição Italiana, após a Legge Costituzionale, 23 novembre 1999, introduziu o princípio do “justo processo”, ao estabelecer em seu art. 111 que o processo deve terminar em “tempo razoável”, in verbis: “La giurisdizione si attua mediante il giusto processo regolato dalla legge. Ogni processo si svolge nel contraddittorio tra le parti, in condizioni di parità, davanti a giudice terzo e imparziale. La legge ne assicuta la ragionevole durata”. Em português: “A jurisdição atua, assim, mediante o justo processo regulado pela lei. Todo processo se desenrola no contraditório entre as partes, em condições de paridade, perante juiz terceiro e imparcial. A lei garante que a sua duração seja razoável”. 160 Oportuno que se destaque que a proposta de inserção do art. 881-C ao CPC, cuja redação consta do esboço de reformulação legislativa por nós tratado na nota de rodapé n.º 116 reafirma a idéia, desenvolvida neste Capítulo, de que a antecipação de tutela calcada na urgência e as medidas cautelares são espécies do mesmo gênero. Veja-se a redação proposta para o art. 881-C: “Art. 881-C. Aplicam-se às medidas antecipatórias, tanto as requeridas em processo antecedente como na pendência do processo principal (art. 273), no que couber, os dispositivos do Capítulo II”. 161 Para Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, pp. 145-148 a cognição sumária é menos aprofundada no sentido vertical. Segundo o autor, o grau máximo de probabilidade é excessivo e inútil ao fim a que se destina essa modalidade de cognição, visto que ela representa “mero instrumento para a tutela de um direito, e não para a declaração de sua certeza”.

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cognição não exauriente. Trata-se de elemento comum a todas elas, cuja função é

impedir que o tempo de duração do processo possa comprometer sua efetividade.”162

Tanto a liminar antecipatória de tutela, assim como a liminar

cautelar, são decisões eminentemente provisórias, proferidas após cognição sumária e,

portanto, não devem, como já se disse em diversas passagens deste trabalho, dar ensejo

a situações irreversíveis. São decisões provisórias, e por isso mesmo observa com

pertinência Bedaque, relativamente à antecipação de tutela: “Para que a eficácia se

torne definitiva faz-se necessário o reconhecimento do respectivo direito, o que somente

ocorrerá com a tutela final. Aí sim, declarando definitivamente o direito a que os efeitos

concedidos antecipadamente se referem (referibilidade), estes assumem também o

caráter definitivo”.163

Se é verdade que há traços similares entre o provimento cautelar e

a decisão antecipatória de tutela, pois ambos têm por escopo precípuo, em última

análise, garantir a efetividade do processo, não se pode desconsiderar as diferenças que

há entre ambos, que não se limitam às distinções procedimentais.

As cautelares, que têm por escopo proporcionar segurança,

garantidora da eficácia futura da decisão, são marcadas pela referibilidade. Isto porque

dizem respeito a um outro processo, dito principal.

As decisões antecipatórias de tutela, de seu turno, são marcadas

por um cunho eminentemente satisfativo. É preciso que se tome cuidado com a expressão

“satisfatividade”. Toda providência jurisdicional, em última instância, deve

“satisfazer”. Nesse sentido mais abrangente, quase coloquial, a satisfatividade encontra

sua raiz na idéia de interesse processual. Deveras, o interesse processual, enquanto

condição da ação, é identificável a partir da constatação da necessidade, utilidade e

adequação do provimento jurisdicional.164 Para que o pedido cautelar possa ser julgado

162 Cf. José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização), p. 121. 163 Cf. José Roberto dos Santos Bedaque, op.cit, p. 213. 164 Rodrigo da Cunha Lima Freire, Condições da ação: enfoque sobre o interesse de agir, 3.ª ed., São Paulo: RT, 2005, pp. 208-209, conclui que o interesse de agir “se concretiza na utilidade potencial da jurisdição, por ser esta capaz de conferir, pelo menos em tese, uma vantagem ou benefício jurídico efetivo ao autor, bem como ao Estado, tendo em vista o excessivo custo do processo”. Em nosso Curso de direito processual civil, vol. 1, São Paulo: RT, 1998, p. 160, concluímos que o interesse processual é aferível mediante a identificação, no caso concreto, do trinômio utilidade, necessidade e adequação do provimento

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(procedente ou não), é preciso que haja interesse processual. E, nessa acepção ampla, a

medida cautelar também satisfaz”.

4.3. Características

Podemos destacar três características essenciais das tutelas provisórias.

A primeira delas é a sumariedade da cognição, eis que o magistrado lida

com juízo de probabilidade.

A segunda característica é a precariedade, já que a tutela provisória conserva

sua eficácia ressalvada a possibilidade de decisão em sentido diverso, conforme previsão

do artigo 296, parágrafo único do Novo Código de Processo Civil, podendo ser revogada

ou modificada a qualquer tempo165.

Todavia, para ser alterada, modificada ou revogada, exige-se alguma

alteração posterior no estado de fato, eis que a medida é concedida de forma rebusc sic

stantibus.

A revogação é imediata e tem eficácia ex tunc, restabelecendo-se o estado

anterior a sua concessão, a exemplo das execuções provisórias.

A terceira característica é que sendo fundamentada em cognição sumária e

precária, a tutela provisória não se torna imutável e indiscutível pela coisa julgada,

passando pelo fenômeno da estabilização, a ser abordado também neste trabalho, conforme

previsão do artigo 304 do Novo Código de Processo Civil.

4.4. Tutela de urgência e de evidência.

jurisdicional pleiteado. Para Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 19.ª ed., São Paulo: Malheiros, 2003, p. 259, é necessário que a prestação jurisdicional, em cada caso concreto, seja necessária e adequada. 165 Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada. Parágrafo único. Salvo decisão judicial em contrário, a tutela provisória conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo.

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O Novo Código de Processo Civil abarca as tutelas provisórias que tem por

objetivo o combate à demora na tramitação do processo, sendo importante combater os

efeitos deletérios do tempo que podem inclusive fulminar direitos.

O fumus boni iuris representa o direito tutelado pelo ordenamento jurídico e

o periculum in mora é o risco de perecimento deste mesmo direito.

Neste plano são reconhecidos os provimentos representados pelas

tradicionais medidas de urgência – as chamadas cautelares conservativas as antecipatórias

ou satisfativas.

A tutela provisória poder ser satisfativa ou cautelar

Todas as medidas de urgência visam combater o perigo do dano.

A novidade consiste na introdução da tutela de evidência.

Esta nova figura tem por função precípua o combate à injustiça

experimentada pela parte que, diante da evidência do direito material se encontra ameaçada

de perder a oportunidade de fruição do direito diante da resistência injustificada pela parte

adversa.

Na verdade, visa a tutela de evidência a adequação do processo a maior ou

menor evidência da posição jurídica da parte no processo, distribuindo-se de forma

equânime o ônus do tempo no processo.

Nesta linha de pensamento, na tutela de evidência não se tem em mente o

afastamento do perigo do dano mas sim o afastamento da injustiça de manter insatisfeito o

direito subjetivo que merece ser tutelado.

Comentando o artigo 300 do Novo Código de Processo Civil, Teresa Arruda

Alvim Wambier166 aduz que não foi suprimida por completo a diferenciação entre tutela

cautelar e tutela antecipada:

166 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.498.

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“Avulta dessa constatação a noção de que a tutela de urgência é

caracterizada por uma situação de perigo, a qual, no mais das vezes, reside no direito

material, e não no plano do direito processual. Nesse sentido, trata-se de uma definição de

tutela jurisdicional aderente à situação do direito material que ela visa a proteger.

Em palavras simples, pode-se afirmar, como ponto de partida, que só é

possível cogitar de tutela de urgência se houver uma situação crítica, de emergência.

Dessa forma, a técnica processual empregada para impedir a consumação ou o

agravamento do dano – que pode consistir no agravamento do prejuízo ou no risco de que

a decisão final seja ineficaz no plano dos fatos, que geram a necessidade de uma solução

imediata – é que pode ser classificada como tutela de urgência. É pois, a resposta do

processo a uma situação de emergência, de perigo, de urgência. (...)

Noutras palavras, para a concessão da tutela de urgência cautelar e da

tutela de urgência satisfativa (antecipação de tutela) exigem-se os mesmos e idênticos

requisitos: fumus boni iuris e periculum in mora. O NCPC avançou positivamente ao

abandonar a gradação que o CPC/73 pretendia fazer entre os requisitos para cautelar e a

antecipação de tutela, sugerindo-se um ‘fumus’ mais ‘robusto’ para a concessão dessa

última.

Segundo um dos coautores desses comentários, essa diferenciação, mesmo

sob a égide do CPC/73, nunca fez sentido. Tratando-se de tutela de urgência, o diferencial

para a sua concessão – o ‘fiel da balança’ – é sempre o requisito do periculum in mora.

Ou, noutras palavras, a questão dos requisitos autorizadores para a concessão da tutela

de urgência – compreendendo-se a tutela cautelar e a antecipação de tutela satisfativa –

resolve-se pela aplicação do que chamamos de ‘regra da gangorra’.167

O que pretendemos dizer, com a ‘regra de gangorra’, é que quanto maior o

‘periculum’ demonstrado, menos ‘fumus’ se exige para a concessão da tutela pretendida,

pois a menos que se anteveja a completa inconsistência do direito alegado, o que importa

para a sua concessão é a própria urgência, ou seja, a necessidade considerada em

confronto com o perigo da demora na prestação jurisdicional.

167 Leonardo Ferres da Silva Ribeiro, Tutela de urgência: onde estamos e para onde (talvez) iremos. In: Processo Civil em movimento: diretrizes para o novo CPC. Coord. Eduardo Lamy, Pedro Manoel Abreu e Pedro Miranda de Oliveira, pp.330-340.

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O juízo de plausibilidade ou de probabilidade – que evolvem dose

significativa de subjetividade – ficam a nosso ver, num segundo plano, dependendo do

periculum evidenciado. Mesmo em situações que o magistrado não vislumbre uma maior

probabilidade do direito invocado, dependendo do bem em jogo e da urgência

demonstrada (princípio da proporcionalidade), deverá ser deferida a tutela de urgência,

mesmo que satisfativa.

(....) Esclarecida a questão da identidade de requisitos para sua concessão,

não se pode deixar de observar que o NCPC não suprimiu completamente a diferenciação

entre a tutela cautelar e tutela antecipada. Houve, sim, a adoção de um regime jurídico

‘quase’ único, mas não uma total equiparação entre elas. Aliás, tal diferenciação ganha

importância para se avaliar se a medida concedida sujeita-se ou não à técnica de

estabilização prevista no art.304, aparentemente vocacionada somente à tutela

antecipada, e não à tutela cautelar”.

Ovídio A. Baptista da Silva168 afirma que “a cognição exauriente que o

magistrado tivesse de desenvolver, quando ele fosse convocado para prestar a tutela

cautelar, além de supérflua e inútil, seria incompatível com a urgência que se presume,

invariavelmente, como elemento constante para o cabimento da tutela cautelar. Ora, tal

exigência torna inadequado o procedimento ordinário”.

Feitas estas considerações, entendo que não é correto afirmar que foi

suprimida a diferenciação entre tutelas cautelares e antecipadas, apesar de críticas, valendo

destacar a lição de José Roberto dos Santos Bedaque169, para quem “ora, se possuem tantos

aspectos que as aproximam, melhor será tratá-las em conjunto e submetê-las ao mesmo

regime jurídico. Esse parece ser o real interesse no estudo comparativo das espécies de

tutelas provisórias, as de caráter meramente conservativo e as que possuem conteúdo

antecipatório. Dada a similitude existente entre elas, aconselhável recebam o mesmo

tratamento jurídico. Irrelevante considerá-las como modalidades de cautelar ou reservar

essa denominação apenas para as conservativas ou não antecipatórias. Importante, sim, é

determinar sua substância e demonstrar que ambas existem com a mesma finalidade e

possuem características praticamente iguais” (...) “Nessa linha, as tutelas provisórias

devem ser reunidas e receber o mesmo tratamento. Inexiste razão para a distinção entre a

168 Ovídio A. Baptista da Silva, Do processo cautelar, p. 69. 169 José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada, p. 300.

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tutela cautelar conservativa e a antecipação dos efeitos da tutela de mérito. Ambas são

provisórias e instrumentais, pois voltadas para assegurar o resultado final. São técnicas

processuais com idêntica finalidade e estrutura. Não há por que distingui-las.”

4.5. Eliminação da ação cautelar nominada.

Nas ações cautelares e satisfativas existe em comum a presença da aparência

do bom direito bem como a necessidade do afastamento do perigo de dano.

Podemos dizer que a tutela cautelar, agora no novo regime, também

continua sendo meio para preservação de outro direito, objeto da tutela satisfativa.

Daí o seu caráter de referibilidade e temporariedade, eis que sempre será

referente a outro direito, diferente da própria cautela.

Na tutela de evidência, por outro lado, não há necessidade do periculum in

mora.

O elemento comum é, portanto, o fumus boni iuris, sempre presente nas

tutelas provisórias.

O objetivo na tutela de evidência é a proteção ao direito incontroverso e

provado de forma suficiente e satisfatória.

Não podemos confundir tutela de evidência com julgamento antecipado do

mérito.

No Novo Código de Processo Civil houve uma preocupação e um avanço

importante no sentido de aplicar de forma concreta a sumariedade procedimental como

instrumento para a eficácia da tutela, merecendo nosso destaque positivo.

Restou unificado o regime normativo instituído tanto para as medidas

conservativas quanto satisfativas.

Estabeleceu-se um gênero comum da tutela de urgência submetida aos

requisitos do periculum in mora e fumus boni iuris.

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O que se nota apenas quando da aplicação das chamadas tutelas provisórias

uma densidade maior ou menor do fumus boni iuris ou do periculum in mora.

Todavia sem sempre a aparência do bom direito e o perigo da demora são

aplicados com uniformidade, constatando-se na prática certa assimetria.

Explicando melhor, ora é necessário um maior grau de periculum in mora

como nas tutelas que visam preservar o meio ambiente, ou nas ações versando sobre direito

de família, ora é necessário um maior grau de fumus boni iuris como no novo instituto da

tutela de evidência, como por exemplo, nas possessórias e na ordem de pagamento das

monitórias.

Outros casos em que é dispensado o periculum in mora é a reserva de bens

no processo de inventário para pagamento de credores.

Portanto, nas tutelas de urgência há sempre a presença simultânea e

obrigatória dos dois pressupostos, sendo que este binômio assume diferentes níveis de

importância.

Assim é que a princípio podemos defender a ideia da uniformidade de

procedimento.

No Código de Processo Civil de 1973 as medidas cautelares eram elencadas

nos artigos 796 e seguintes, enquanto que as medidas satisfativas estavam previstas no

processo principal no artigo 273.

Cassio Scarpinella Bueno170 propôs critério para diferenciação entre as

hipóteses, que consiste em “verificar em que condições o que se pretende ‘antecipar’

coincide ou não com o que se pretende a final. Na exata medida em que houver

coincidência total ou parcial – a tutela antecipada pode ser concedida total ou parcialmente,

lê-se do caput do art. 273 –, o caso será de tutela antecipada. Na ausência dessa

coincidência, seja ela total ou parcial, a hipótese é de tutela cautelar.”

No Novo Código de Processo Civil constatamos a eliminação da ação

cautelar.

170 Cassio Scarpinella Bueno, Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, Vol. 4, p. 124.

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As tutelas conservativa e satisfativa passam a representar incidente

processual, podendo ser deduzidas na petição inicial ou avulsa na conformidade do artigo

294, parágrafo único do Novo Código de Processo Civil.

É o que Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel

Mitidiero171 denominam “interinalidade”, isto é, o procedimento comum viabiliza a

concentração da atividade de conhecimento e de execução, bem como a prolação de

decisões provisórias e definitivas em seu bojo, constatando-se que o novo Código

abandonou a segmentação da tutela jurisdicional em conhecimento, execução e cautela

originariamente adotada pelo Código Buzaid.

Uma importante diferença merece ser destacada.

O pedido principal, em se tratando de tutela antecedente deve ser formulado

no prazo de trinta dias da efetivação da medida sendo esta de natureza cautelar (artigo

308).

Portanto, o pedido não será feito através do ajuizamento de outra ação como

era no CPC/1973.

Basta a apresentação de petição nos mesmos autos no qual foi deduzido o

pedido de tutela cautelar, sem necessidade de recolhimento de custas processuais.

Há, pois, a extinção da autonomia do processo cautelar, com inspiração

inclusive no Direito Italiano.

Permanece a autonomia apenas aos processos de conhecimento e execução.

171 Luiz Guilherme Marinoni; Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2. Tutela dos Direitos Mediante Procedimento Comum, p.206. E esclarecem: “Isso quer dizer que, como regra, a tutela provisória deve ser postulada dentro do procedimento comum – e isso até mesmo para evitar o problema da indevida duplicação de procedimentos para a prestação da mesma tutela do direito. Se, no entanto, houver necessidade de tutela jurisdicional urgente antes da propositura da ação destinada à tutela definitiva do direito (tutela provisória ante causam), então será admissível a sua postulação na forma “antecedente” (arts.303 a 310). Como regra, portanto, a tutela provisória não dá lugar a um processo autônomo dentro do direito civil brasileiro. É interna ao procedimento comum. É exatamente isso que quer dizer o legislador quando refere que ‘a tutela provisória’ é incidental (art.294). Tendo interesse na sua obtenção, tem o autor de postulá-la na petição inicial. Por essa razão, independe do pagamento de custas (art.295). Deferido ou não o pedido de tutela do direito mediante decisão provisória, o procedimento deve seguir em direção à sentença. Apenas quando requerida de forma antecedente é que a tutela provisória depende do pagamento de custas – como toda e qualquer ação”.

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Reitero por outro lado que a decisão sobre o pedido cautelar não faz coisa

julgada material.

Por outro lado, sendo a medida de natureza satisfativa, o prazo será reduzido

para apenas quinze dias (artigo 303, parágrafo 1º, inciso I).

Dessarte, não há mais necessidade do ajuizamento de ação principal.

Sendo a medida de natureza cautelar, o pedido principal pode ser formulado

em sede de aditamento.

Na hipótese de medida satisfativa, por outro lado, dispõe o artigo 301

“caput” que a petição inicial já deverá indicar o pedido de tutela final, o qual poderá ser

confirmado e complementado no prazo de quinze dias ou em prazo maior fixado pelo juiz

cujo termo inicial é a concessão da medida antecedente (artigo 303, parágrafo 1º).

Feitas estas considerações, no novo Código de Processo Civil, é irrelevante

diferenciar a natureza jurídica da medida se cautelar ou antecipatória.

Da mesma forma, pouco importa se provimento é feito dentro de um

processo prévio, acessório ou incidentalmente ao processo principal.

Uma interessante inovação trazida pelo Código de Processo Civil é aquela

prevista nos parágrafos 1º a 3º do artigo 303.

O dispositivo trata do procedimento para a tutela antecipada satisfativa em

caráter antecedente.

O Novo Código de Processo Civil alterou a regra, extinguindo a regra da

autonomia do processo cautelar.

Por outro lado, autoriza expressamente o requerimento da tutela antecipada

em caráter antecedente.

Prosseguindo, havendo a concessão da tutela antecipada e o aditamento, o

processo prossegue pelo procedimento comum.

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Caso seja determinada a emenda, e transcorrendo “in albis” o prazo, a

consequência será o indeferimento da petição inicial e extinção do processo sem resolução

do mérito.

O importante é a finalidade da medida e não mais o meio, destacando-se a

plausibilidade (evidência) do direito alegado e/ou a urgência que reclama a situação

concreta sob análise.

É possível o deferimento antecipado da tutela (de evidência), não somente

com base na plausibilidade do direito do autor, mas também com enfoque na

jurisprudência uníssona dos tribunais superiores, quando a matéria for unicamente de

direito.

4.6. Fungibilidade das tutelas de urgência

Na Lei 10.444/2002 foi introduzido o parágrafo 7º do artigo 273 do Código

de Processo Civil de 1973172 a fungibilidade entre a medida antecipatória e cautelar.

Portanto, o mais correto é mesmo a flexibilização, eis que a parte não pode

ficar à mercê do subjetivismo do julgador ou mesmo rigorismo.

Em boa hora o Novo Código de Processo Civil expungiu as dúvidas

esclarecendo que as cautelares e medidas antecipatórias são espécies do mesmo gênero.

Fixadas estas considerações, constata-se que houve uma uniformização dos

requisitos para concessão das tutelas de urgência, com muitos pontos em comum.

Não se perca de vista a dificuldade na distinção entre tutela antecipada ou

satisfativa e tutela cautelar, sendo perfeitamente possível a fungibilidade.

Para Humberto Theodoro Junior, “haverá, contudo, situações de fronteira,

que ensejarão dificuldades de ordem prática para joeirar com precisão uma e outra espécie

de tutela”173.

172 § 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. 173 Humberto Theodoro Junior, Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, p. 715.

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Ora, nem sempre as situações da vida cotidiana se encaixam ao que

preceitua o direito positivo.

Por esta razão, não podemos aceitar a rigidez das distinções normativas

entre um e outro institutos, devendo ser evitado excesso tecnicista que vise a distinguir

com rigor a medida antecipatória da medida cautelar pode anular toda a conquista

instrumentalista do processo.

Assim, é “preferível transigir com a pureza dos institutos do que sonegar a

prestação justa a que o Estado se obrigou perante todos aqueles que dependem do Poder

Judiciário para defender seus direitos e interesses envolvidos em litígio”174.

Nesse sentido, Humberto Theodoro Junior175: “Aliás, a pretensão de separar

em campos diversos e bem delineados, as medidas cautelares e as de antecipação de tutela,

é tarefa que apenas o direito brasileiro, ambiciosamente, almejou. No direito europeu –

onde primeiro se sentiu e exaltou a necessidade de incluir nos poderes do órgão judicial o

de, em caso de urgência, permitir não só a prevenção, mas também a satisfação provisória

da pretensão cuja realização se busca na tutela definitiva de mérito – o que se fez não foi

criar uma nova modalidade de prestação jurisdicional a par da cautelar”.

Nessa ordem de ideias, é certo que: “O autor não será prejudicado por haver

feito pedido fora da técnica processual. Caso tenha direito ao adiantamento, é irrelevante

que haja interposto cautelar incidente ou haja pedido antecipação da tutela. O juiz deverá

aplicar a fungibilidade, nada obstante a norma aparentemente possa indicar faculdade:

presentes os requisitos para a tutela de urgência (cautelar ou antecipatória), cabe ao juiz

concedê-la.”176

Alguns doutrinadores questionam a utilidade da diferenciação, entre eles,

José Carlos Barbosa Moreira177, com quem concordamos: “Não será um tanto exagerada

tal preocupação? A ela – já se observou – permanece praticamente indiferente a doutrina

italiana, pouco propensa a reputar absurda a coexistência, na mesma medida, de traços de

acautelamento e de traços de antecipação. O fato é que nem sempre se consegue riscar com

174 Op.cit, p. 715. 175 Ibid, p. 715. 176 Nelson Nery Junior; Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado e Legislação extravagante em vigor, p. 531. 177 José Carlos Barbosa Moreira, Temas de Direito Processual Civil – Oitava Série, p. 102.

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facilidade e exatidão a linha divisória entre os dois terrenos. E, bem pesadas as coisas,

talvez nem sequer valha a pena fazer grandes esforços nesse sentido, sobretudo depois que

a Lei nº 10.444, no §7º que aditou ao art. 273, consagrou autentica fungibilidade entre

providencias cautelares e antecipatórias, autorizando o juiz a conceder àquele título

providência requerida a este outro.”

Cassio Scarpinella Bueno178, assevera que ambas as medidas – antecipatória

e cautelar – são espécies de um mesmo gênero. Existem diferenças, mas que são difíceis de

serem identificadas, não podendo ser obstáculo à prestação jurisdicional, em prejuízo dos

jurisdicionados. Daí porque foi expressamente prevista a fungibilidade entre as medidas

antecipatórias e cautelares.

Nelson Luiz Pinto179, analisando o artigo 798 do Código de Processo Civil,

entende que o dispositivo, além de criar o poder geral de cautela do juiz, ou seja, além de

autorizar o juiz a conceder medidas cautelares não previstas no Código de Processo Civil,

autorizaria também a concessão de medidas diversas das solicitadas, no caso de revelarem-

se estas últimas mais apropriadas ao resguardo do direito invocado: “Sempre que a parte

requerer uma providência cautelar, caso a medida requerida não seja a mais adequada para

a proteção do direito da parte, poderá o Juiz determinar a providência que entender

adequada e suficiente para a proteção daquele direito, não se limitando aos termos do

pedido formulado, senão no âmbito da proteção solicitada pela parte.”

Portanto, a teor do disposto no artigo 305, parágrafo único do NCPC180, uma

vez requerida tutela cautelar em caráter antecedente, poderá o magistrado recebê-la como

satisfativa ou antecipatória, prosseguindo-se pelo rito correspondente, apresentando os

motivos de sua decisão.

Eduardo Arruda Alvim181 aponta a existência de semelhanças ao lado de

discrepâncias, o que levou o legislador a editar o § 7º do art.273 do CPC/73182

178 Cassio Scarpinella Bueno, Tutela Antecipada, pp. 148-157. 179 Nelson Luiz Pinto, Medidas Cautelares – Poder Geral de Cautela do Juiz, REPRO n.º 59, p. 185. 180 Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Parágrafo único. Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303. 181 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.417.

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estabelecendo a fungibilidade plena nos dois sentidos – cautelares e antecipação de tutela,

assumindo que entre as cautelares e a antecipação de tutela, tamanhas eram as

controvérsias existentes (sustação de protesto requer-se como cautelar ou antecipação de

tutela? E a suspensão da exigibilidade do crédito tributário? E a exclusão do nome do autor

dos cadastros de proteção ao crédito, quando a dívida esteja sendo discutida em juízo?),

pode haver a aplicação da fungibilidade. Portanto, havendo dúvida objetiva, não sendo

caso de erro grosseiro, deverá o magistrado relevar sua convicção pessoal e entregar a

prestação jurisdicional, ainda que entenda não ser adequada a medida postulada.

Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga183

entendem que se trata de fungibilidade progressiva, isto é, admitindo a transformação da

tutela cautelar para a tutela satisfativa, sendo admitida também a fungibilidade regressiva,

isto é, a transformação da tutela satisfativa em cautelar (menos agressiva).

Estamos diante, pois, de uma fungibilidade de mão dupla.

Cândido Dinamarco184 também esposa este entendimento, isto é, a

fungibilidade nos dois sentidos, explicando que: “o novo texto não deve ser lido somente

como portador da autorização a conceder uma medida cautelar quando pedida a

antecipação de tutela. Também o contrário está autorizado (...). Não há fungibilidade em

uma só mão de direção. Em direito, se os bens são fungíveis isso significa que tanto se

pode substituir um por outro, como outro por um”.

Leonardo Greco entende185 de extrema importância o aludido princípio até

mesmo para proporcionar equilíbrio entre os interesses em jogo.

182 Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: § 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. (NR) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.444, de 07.05.2002, DOU 08.05.2002, com efeitos a partir de 3 (três) meses após a data de publicação). 183 Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga Curso de Direito Processual Civil, p.616. 184 Cândido Rangel Dinamarco, A reforma da reforma, p.92. 185 Leonardo Greco, A Tutela da Urgência e a Tutela da Evidência no Código de Processo Civil de 2014/2015. E prossegue o autor: “A característica seguinte da tutela provisória é a fungibilidade. A ela se refere expressamente o artigo 298 do Código de 2014/2015, que dispõe: “O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória”. Parece-me que o novo dispositivo tem alcance diverso, conforme se trate de tutela provisória cautelar ou antecipatória. Na tutela cautelar, como

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Entre os doutrinadores, Eduardo Talamini186 também afirma não ser

possível fazer tabula rasa do direito positivado, porém, devemos evitar o desprezo a

elementares princípios de acesso à Justiça, aplicando-se a fungibilidade.

Ousamos, portanto, discordar de Arruda Alvim187, que entende ser a

fungibilidade via de mão única:

na execução (art.821), a adstrição se limita ao pedido mediato, ou seja, ao bem da vida, ao interesse que o autor pretende proteger, ao objeto da tutela, não ao meio de proteção, à providência jurisdicional requerida para alcançá-la. A fungibilidade ex-officio, seja no momento da concessão, seja em sua ulterior substituição, visa a equilibrar os interesses em jogo, resguardando ao mesmo tempo e com o maior alcance possível, o interesse do requerente à tutela pretendida com o interesse do requerido, do qual não deve ser exigido sacrifício maior do que o necessário. O legislador de 2014/2015, mais claro e categórico do que o de 73, não adota redação que pudesse comportar interpretação restritiva da fungibilidade apenas ao momento ulterior, à substituição de tutela anteriormente concedida. Tampouco reproduz exigência expressa de que a concessão de medida cautelar diversa da que foi requerida seja condicionada à menor onerosidade para o requerido. O juízo de ponderação entre o perigo que assola o requerente e o que poderá incidir sobre o requerido caso a tutela cautelar seja deferida deverá ser sempre efetuado pelo juiz, não só para decidir se concede ou não a tutela pretendida, mas também para efetuar a escolha da providência mais adequada e proporcional. Já na tutela antecipatória, de urgência ou de evidência, a adstrição é mais rigorosa. Aqui se trata de apreciação de pedido sobre a atribuição ao requerente, ainda que provisória, de providência de direito material, declaratória, constitutiva ou condenatória. Aqui o juiz não pode conceder providência diversa da requerida, sob pena de violação ao princípio da demanda e de prolação de julgamento extra petita. Parece-me, pois, que na tutela antecipatória, a única interpretação razoável do artigo 298 é a de que o dispositivo não faculta a concessão de providência jurisdicional diversa, mas que, na efetivação ou cumprimento da decisão, tal como na tutela específica do Código de 73, o juiz possa, aí sim, pela sua natureza substancialmente executória, fazer uso dos meios coativos ou sub-rogatórios que lhe pareçam mais adequados e eficazes. A fungibilidade entre as tutelas de urgência, antecipada ou cautelar, também é autorizada pelo artigo 298, e repetida no parágrafo único do artigo 306 na hipótese de cautelar antecedente que o juiz entenda ter caráter de tutela antecipada. Apesar de inexistir previsão expressa de medida antecedente proposta como antecipatória que o juiz entenda ser cautelar, ou de medida incidente que proposta com uma denominação, tenha a natureza da outra, parece-me que o disposto no art. 298 é suficiente para autorizar a fungibilidade entre a tutela cautelar e a antecipada de urgência em qualquer caso. Também entendo possível essa fungibilidade entre a tutela de urgência e a tutela de evidência, embora esta última nunca tenha caráter antecedente, desde que o pedido formulado inicialmente preencha os requisitos da tutela a ser concedida”. 186 Eduardo Talamini, Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer, p.368/369. E prossegue o autor: “Nesses casos, em que há disputa séria e objetivamente exteriorizada acerca da natureza da medida de urgência, parece ser o caso de o juiz, ainda que pessoalmente convencido de que a via adequada era a outra que não a adotada pelo requerente, relevar este aspecto formal e passar à análise dos demais requisitos para a concessão da providência. Os princípios que norteiam tal solução são os mesmos que dão suporte à teoria da fungibilidade em matéria de recursos (efetividade da tutela, instrumentalidade das formas, economia processual, proteção à boa-fé). Desse modo, em certos casos, possibilitar-se-á a antecipação da tutela, apesar de ter sido requerida mediante a instauração de um autônomo processo cautelar, bem como, em situações excepcionais, será viável a concessão da tutela meramente conservativa no bojo do próprio processo principal, a despeito de não se tratar de uma das hipóteses em que isso é expressamente autorizado pela lei. Não se trata de fazer tabula rasa da disciplina positiva, que distingue claramente a via de requerimento e obtenção das duas tutelas de urgência. Se a lei existe e não padece de nenhum defeito de constitucionalidade, cumpre observá-la, ainda que discorde da opção feita pelo legislador. (...) Na proposta de nova reforma processual, está prevista expressamente a fungibilidade – em termos até mais amplos do que os aqui indicados (que são os possíveis no direito vigente) – quando o autor, a título de antecipação de tutela, pedir providência de natureza cautelar”. 187 Arruda Alvim, Notas sobre a disciplina da antecipação da tutela na Lei nº 10.444 de maio de 2002. In Inovações sobre o direito processual civil. Tutelas de urgência, pp.7/8. E prossegue o autor: “O que expressamente veio objetivar o legislador, com o referido § 7º, ao art. 273 é manifestamente que, por defeito de postulação, requerendo antecipação de tutela, mas em realidade, a providência que haveria de ter sido

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“O que se pode dizer, no caso, é que há, expressamente, uma modalidade de

fungibilidade, prevista na lei, na hipótese em que a tutela antecipada

impropriamente requerida poderá vir a valer como medida cautelar, desde que

isso seja possível. A razão de ser dessa fungibilidade – pela letra da lei - ‘de uma

mão só’, i.e., da tutela antecipada para o campo da cautelar, mas não

inversamente, decorre do fato de que pela opinião uniforme os requisitos da tutela

antecipada são mais robustos – pois, há maior intensidade na exigência em

relação à aparência do direito, i.e., verossimilhança é requisito mais denso do que

fumus boni iuris – do que em relação aos da cautelar, ainda que, em rigor e

fundamentalmente, se trate de uma questão de grau. Se os requisitos são

ontologicamente os mesmos, o que se há é de reconhecer que a intensidade, do

mesmo requisito, por ser menor comporta a medida cautelar e não a tutela

antecipada. É nisso que a lei inovou, ainda que na práxis, já houvesse esse

entendimento.

Há de reiterar-se nosso entendimento contrário à hipótese inversa: se requerida

medida cautelar, quando o que caberia, seria a tutela antecipada, seria inviável,

mutatis mutandis, a fungibilidade com finalidade análoga, o que, pela letra da lei,

não resta autorizada? A nossa impressão é a de que em relação à tutela

antecipada para a cautelar, ter-se-á pedido o ‘mais’ restando concedido o

‘menos’. Sendo assim, a hipótese inversa, importaria em que, tendo-se pedido o

‘menos’, mas cabendo o ‘mais’, o juiz concederia o ‘mais’; em rigor, concederia,

nessa hipótese, além do pedido, ou, mais do que o tenha sido pedido. Por essa

razão – que nos parece estar subjacente à regra, de que tratamos – pensamos ser

inviável. Trata-se, assim, de uma fungibilidade numa só direção, sem que se possa

pretender estabelecer reciprocidade. Talvez em casos absolutamente extremos, em

que poderia haver irremissivelmente a perda do direito, se possa vir a fazer

requerida teria sido de natureza cautelar, o juiz deverá deferir a medida cautelar, ‘em caráter incidental ao processo ajuizado’. Em certa escala o erro de forma não tem significação mais expressiva em prejuízo do direito, tendo em vista o disposto do que já constava e subsiste no art. 250, caput do CPC. É claro, todavia, que esse §7º, do art. 273, coloca como inequívoco o dever do juiz de ‘aproveitar’ o requerimento de tutela antecipada e dar-lhe um tratamento substancial de medida cautelar; e, processualmente, resolverá o assunto tal como resolveria um pedido de antecipação, ou seja, nos próprios autos, no que difere do procedimento das medidas cautelares, vale dizer, flexibilizou a solução do problema, determinando o aproveitamento substancial dessa postulação, e, como se disse, esse aproveitamento dar-se-á através do procedimento existente para a tutela antecipada. Em realidade, o que se contém nesse §7º do art. 273, é uma modalidade de ‘fungibilidade’, ainda que na decisão que, ao aplicar esse texto terá por equivocada a solicitação de tutela antecipada. (...) A fungibilidade, no caso, ocorre da antecipação de tutela para a medida cautelar, e – como acentuamos – não inversamente. Isto porque em conformidade com o que decorre da lei, e, do entendimento assente, os requisitos da antecipação de tutela – ainda que em substância possam ser coincidentes – expressam exigência maior da lei comparativamente aos da medida cautelar. Com isso significou o legislador que, pedindo-se o mais o juiz poderá vir a conceder o menos. Mas não inversamente”.

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exceção, ainda que arranhando a letra da lei e o próprio princípio que, no caso, a

informa, que é o referencial do princípio dispositivo”.

Teresa Arruda Alvim Wambier188 com quem concordamos, assevera que:

“Uma reflexão mais madura mostrou-nos ser evidente a inadequação do

pensamento absolutamente rigoroso, que privilegia a coerência e a precisão dos passos do

raciocínio para resolver boa parte dos problemas jurídicos, especialmente problemas

processuais.

Não se trata, de modo algum, nem de pregar e tampouco de

legitimar soluções tomadas à margem do ordenamento jurídico. Trata-se, isto sim, de

enxergar como possíveis, e como mais convenientes em determinados casos, soluções

tomadas não com base na letra da lei, mas com base no sistema: lei, doutrina,

jurisprudência, manejados criativamente.

No próximo sistema são identificáveis “zonas de penumbra”, ou seja,

situações em face das quais se apresenta mais de uma solução possível, legitimada por

parte da própria doutrina, da jurisprudência e da própria lei.

No que diz respeito especificamente ao processo, estas ditas zonas de

penumbra se manifestam quando se admitem, no sistema, dois ou mais caminhos para

chegar a um mesmo lugar. Não são poucas as hipóteses em que se flagram tanto no plano

da doutrina quanto no da jurisprudência discordâncias quanto a qual seria omeio adequado

para atingir determinado fim no processo ou através do processo.

Pensamos que nas zonas de penumbra deve-se optar pela resposta que

privilegie os valores fundamentais, entre os quais se sobressai a operatividade do sistema,

qualidade que deve torná-lo apto a gerar os fins para os quais foi criado.

Justamente nestas hipóteses é que, em nosso entender, deve incidir o

princípio da fungibilidade: casos em que há dúvidas quanto a qual seja o caminho

adequado (= correto) para atingir determinada finalidade por meio de um pedido formulado

188 Teresa Arruda Alvim Wambier, O princípio da fungibilidade sob a ótica da função instrumental do processo, p. 39 - 74.

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perante o Poder Judiciário, dúvida esta cuja existência se percebe por haver divergências

no plano da doutrina e/ ou no da jurisprudência a respeito.

Hoje se tem consciência cada vez mais nítida no sentido de que o processo

foi concebido para “dar” direitos a quem os tem: não para “inventar” direitos e atribuí-los a

quem não os tenha, ou para subtrair direitos de seus titulares. Não deve haver, pensamos,

um “fosso” entre a realidade criada como resultado do processo e a realidade disciplinada

pelo direito material. Ambos os planos devem caminhar de modo absolutamente rente.

Parece-nos tratar-se de uma exigência afeiçoada à mentalidade que

prevalece em nossa época.

Há cinqüenta anos dizíamos, com certa dose de tranqüilidade e

conformismo, que a coisa julgada faz do preto, branco, e do quadrado, redondo. Hoje nos

incomoda, por exemplo, a situação de haver sentença sobre a qual se tenha operado

autoridade de coisa julgada, em que se estabeleceu existir relação de filiação entre A e B,

quando teria sido feito o exame do DNA de ambos, posteriormente e

extraprocessualmente, e teria ficado cabalmente comprovada a inexistência de tal relação.

Imagine-se, por exemplo, que a este resultado só se tenha tido acesso depois de escoado o

biênio decadencial, dentro do qual a ação rescisória poderia ter sido proposta! (art. 495 do

CPC).

Certamente, a reação imediata da grande maioria dos operadores do direito

é, em face dessa situação, a de examinar teimosa e cuidadosamente o sistema para

conseguir encontrar uma solução consistente em aproximar a realidade criada pela

sentença da realidade que se terá efetivamente apurado no mundo empírico.

Evidentemente, não se pode dizer que há condições para que este “fosso”, a

que antes aludimos, deixe de existir, total e completamente. Por outro lado, parece que a

função da doutrina processual contemporânea tem sido, pelo menos em parte, a de

diminuir as dimensões desta distância.

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A constatação no sentido de que raciocínios mais flexíveis podem levar-nos

a melhores soluções, no plano do processo, passa necessariamente pelo desprezo da regra

no sentido de que “não há dois caminhos para levar-se a um mesmo lugar”189.

189 Teresa Arruda Alvim Wambier, O princípio da fungibilidade sob a ótica da função instrumental do processo, p. 39 – 74. E a autora prossegue: Por outro lado, sabe-se que o legislador da versão originária do Código de Processo Civil alistou inúmeras cautelares típicas e nominadas, como o arresto e o seqüestro. Tratou, também, de medidas que não supõem propriamente o periculum in mora para serem concedidas, como a posse em nome do nascituro. E acabou por abranger, sob o título “Processo cautelar”, medidas que, embora nem sempre tenham como requisitos de concessão o fumus boni iuris, antecipam parcialmente os efeitos ou parte dos efeitos da tutela principal, como a separação de corpos. Deve-se, ainda, assinalar que o legislador outorgou ao juiz o poder geral de cautela, que consiste na possibilidade de o juiz conceder à parte, presentes os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, medidas inominadas, não tipificadas especificamente pelo legislador. Cabe, então, perguntar-se se haveria certa margem de fungibilidade entre essas figuras e todas, e em que medida. As questões que se colocam são muitas: será que, pleiteando a parte uma medida cautelar nominada, pode o juiz, se não presentes os pressupostos (específicos, para a concessão daquela providência) alistados no texto da lei, conceder outra, desta vez inominada, mas de idêntica significação no mundo empírico? E o inverso? Formulando a parte pedido de antecipação de tutela, pode o juiz conceder providência de índole cautelar? E vice-versa? A resposta genérica que, num primeiro momento, se pode dar a estas perguntas é a de que razões de ordem formal não devem obstar que a parte obtenha a seu favor provimento cujo sentido e função sejam o de gerar condições à plena eficácia da providência jurisdicional pleiteada ou afinal, ou em outro processo, seja de conhecimento, seja de execução. É indisputável que, como regra geral, nas zonas de penumbra, se decida a favor dos valores fundamentais. Sempre sustentamos posição, agora endossada expressamente pelo legislador (art. 273, § 7.º), no sentido de que nada obsta que certas medidas, antes tidas como cautelares, justamente porque consistem em verdadeira antecipação de parte dos efeitos da tutela pleiteada, e que têm como fundamento fumus e periculum in mora, sejam pleiteadas no bojo do processo de conhecimento, como a separação de corpos ou a sustação de protesto. A separação física dos cônjuges é um dos efeitos indiretos da separação judicial ou do divórcio, e a sustação (definitiva) do protesto é um dos efeitos da ação declaratória de inexistência de débito. Sentido houve em que tenham sido previstas como cautelares, já que à época da concepção do Código de Processo Civil, em sua versão original, não havia a figura da antecipação de tutela, como hoje é concebida. Havia antecipação de tutela, por exemplo, no caso das liminares concedidas em ações possessórias, pois a) consistem na antecipação (provisória) da própria tutela (ou dos efeitos da tutela) que se obterá(ão) (definitivamente) com a sentença; b) independem da demonstração de periculum in mora. Do mesmo modo, encontradiças já eram na jurisprudência as tais cautelares ditas “satisfativas”, que de cautelares só tinham o rito e que se bastavam a si mesmas, não tendo função instrumental, como a busca e apreensão de menores, não restituídos à casa materna pelo pai, depois de escoado o período de férias. E aqui a expressão “satisfatividade” está sendo empregada no sentido de que a medida pleiteada não tem por objetivo preservar a possibilidade de eficácia de outro pronunciamento ou providência. Os fins da medida se esgotam nela mesma. Consideram-se também satisfativas, embora noutro sentido, medidas que geram o mesmo efeito do ponto de vista prático, que poderia ser obtido no processo principal. Essas medidas, embora “coincidam” com o que se quer, não bastam a si mesmas, pois devem ser confirmadas, em face de cognição exauriente. Importante observar, todavia que, na verdade, decisão alguma baseada em cognição sumária ou incompleta deve ser satisfativa, no sentido de gerar, no plano dos fatos, providências irreversíveis. Assim, toda e qualquer liminar, salvo em casos excepcionalíssimos em que deve incidir o princípio da proporcionalidade, deve gerar alterações no mundo empírico passíveis de serem revertidas, nem que seja à custa de reposição do numerário correspondente ao bem lesado. Casos há em que, mesmo que se consume a lesão, com a liminar concedida indevidamente ao autor que não tinha razão, há reversibilidade, já que o bem lesado pode ser reposto por pecúnia. Noutros, isto não ocorre. São, por exemplo, danos ao patrimônio histórico, danos ambientais, danos à saúde. Uma vez ocorridos, não há como repor o status quo ante, pois que se trata de um tipo de dano que não pode ser integralmente recuperado pela via indenizatória. A nós parece que há fungibilidade entre as medidas típicas (nominadas) e atípicas (fruto do poder geral de cautela). Pensamos, por exemplo, que se aquela que vive em regime de união estável pleiteia medida de separação de corpos, pode o

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É impossível fechar-se os olhos à realidade de que o Código de Processo

Civil consiste em lei que vem passando por um profundo processo de reforma e cujas

feições definitivas ainda não se completaram, até porque não houve tempo para que a

doutrina e a jurisprudência “amadurecessem” certos aspectos das novidades e problemas

por estas criados.

Portanto, as zonas de penumbra, que já são incontáveis, tendem a

multiplicar-se na exata proporção da quantidade e da velocidade das alterações que se vão

introduzindo no texto da lei.

Em face desse quadro, pensamos que pode ser absolutamente desastrosa a

insistência em manter o raciocínio orientado exclusivamente pelo método clássico de

pensar.

Selecionamos, neste despretensioso texto, algumas situações, meramente

exemplificativas, em que aparecem, a nosso ver, nitidamente, os inconvenientes de não se

abandonar o raciocínio rigoroso que acabam levando a que se aumente a distância entre os

resultados disciplinados pelo direito material e os que o processo terá produzido.”

Luiz Guiherme Marinoni190, citado por Luiz Manoel Gomes Junior191,

justificando a utilidade do instituto da antecipação da tutela, argumenta que a mesma estará

embasada em uma noção de probabilidade, devendo ser sacrificado o direito menos

provável em prol daquele que se afigura mais provável, sob pena desse último ser violado.

Ao conceder a tutela sumária, o juiz nada declara.

Prosseguindo, o já mencionado Luiz Manoel Gomes Junior aborda que:

“E o fato de ser possível antecipar apenas um dos pedidos, ou parte de um

deles, não afasta a utilidade da medida e nem os motivos justificadores de tal

possibilidade - celeridade e efetividade.

magistrado, entendendo que a postulante não faz jus à utilização da medida tipificada, conceder-lhe a mesma providência com base no poder geral de cautela”. 190 Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da Tutela na Reforma do Processo Civil, p.79-90. 191 Luiz Manoel Gomes Junior, A segunda fase da Reforma do CPC - LEI Nº 10.444/02, pág. 137.

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A terceira e última alteração demonstra uma relevante opção pela

efetividade. Segundo o § 7º do art. 273 do CPC, poderá ser deferida providência cautelar,

ainda que postulada como antecipação da tutela.

Com a devida venia, poderíamos discorrer acerca dos referidos institutos,

porém não se mostra apropriado apontar, de forma exaustiva, os elementos que

diferenciam a antecipação da tutela das cautelares, até pela finalidade do presente

trabalho. Pode-se, contudo, anotar que a finalidade da tutela cautelar é, em sua

concepção, clássica e, tomando-se como parâmetro o Direito Italiano,“(...) assegurar

provisoriamente os efeitos da decisão de mérito (...)”.

Com o advento do Novo Código de Processo Civil, a previsão da

fungibilidade, portanto, encontra-se restrita às hipóteses de tutelas provisórias

antecedentes, conforme disposição do artigo 305, parágrafo único.

Porém, parece óbvio que o legislador também quis contemplar a ampla

fungibilidade entre as tutelas provisórias, aproveitando-se os atos processuais, conforme os

princípios da economia processual e razoável duração do processo.

Logo, em meu ponto de vista, perfeitamente possível conhecer o pedido

formulado de tutela satisfativa como sendo um pedido de tutela cautelar, sendo irrelevante

o momento em que é formulado, seja incidental, seja antecedente.

Ademais, o objetivo fundamental do processo é a solução da lide, com

decisão de mérito192.

Correto o pensamento de Luiz Guilherme Marinoni193 ao advertir que o

legislador está obrigado a construir procedimentos que tutelam de forma efetiva, adequada

e tempestiva os direitos e a prever tutelas que, atuando internamente no procedimento,

permitam uma racional distribuição do tempo do processo, cabendo ao processualista

extrair do sistema processual as tutelas adequadas à realização concreta do direito à

adequada tutela jurisdicional. 192 Art. 317. Antes de proferir decisão sem resolução de mérito, o juiz deverá conceder à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício. Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485. 193 Luiz Guilherme Marinoni, Tutela antecipatória, julgamento antecipado e execução imediata da sentença, pp.20-21.

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4.7. Requisitos das tutelas provisórias

A teor do disposto no artigo 294 do Novo Código de Processo Civil194, a

tutela provisória pode estar baseada na urgência ou evidência.

Podemos destacar entre tantas características, alguns elementos comuns das

tutelas de urgência e tutelas de evidência.

A sumariedade quanto à matéria, isto é, a simplificação do procedimento

como ocorre naqueles especiais como no mandado de segurança, busca e apreensão,

juizados especiais.

A sumariedade quanto ao processo, objetivando atender urgência no caso,

sendo seu elemento distintivo a formação da coisa julgada.

Nelson Nery Jr.195 conceitua coisa julgada material (auctoritas rei iudicatae)

como sendo a qualidade que torna imutável e indiscutível o comando que emerge da parte

dispositiva da sentença de mérito não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário,

nem à remessa necessária.

Logo, na sumariedade substancial verifica-se a formação da coisa julgada,

enquanto que na sumariedade processual tal não ocorre.

194 Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. 195 Nelson Nery Jr., Princípios do Processo na Constituição Federal, págs.56/58. E o autor esclarece: “A segurança jurídica, trazida pela coisa julgada material, é manifestação do estado democrático de direito (CF 1º caput). Entre o justo absoluto, utópico, e o justo possível, realizável, o sistema constitucional brasileiro a exemplo do que ocorre na maioria dos sistemas democráticos ocidentais, optou pelo segundo (justo possível), que é consubstanciado na segurança jurídica da coisa julgada material. Descumprir-se a coisa julgada é negar o próprio estado democrático de direito, fundamento da república brasileira. A lei não pode modificar a coisa julgada material, (CF 5º XXXVI). Da mesma forma, nem a CF pode ser modificada para alterar-se a coisa julgada material, porque essa imodificabilidade é direito constitucional fundamental, vale dizer, cláusula pétrea que não pode ser alterada por emenda constitucional do poder constituinte derivado (CF 1º caput e 60 § 4º). Igualmente, o juiz não pode alterar a coisa julgada (CPC 467 e 471). Somente a lide (pretensão, pedido, mérito) é acobertada pela coisa julgada material, que a torna imutável e indiscutível, tanto no processo em que foi proferida a sentença, quanto em processo futuro. Somente as sentenças de mérito, proferidas com fundamento no CPC 269, são acobertadas pela autoridade da coisa julgada; as de extinção do processo sem resolução do mérito (CPC 267) são atingidas apenas pela preclusão (coisa julgada formal). A coisa julgada material é instrumento de pacificação social. (...) O efeito material mais importante a sentença acobertada pela autoridade da coisa julgada, não mais sujeita à ação rescisória, é revestir-se da presunção iuris et de iure de correção e justiça (unwiderlegbare Vermutung für seine Richtigkeit). Por isso é comum dizer-se que a coisa julgada – não mais impugnável por ação rescisória – faz do preto, branco e do quadrado, redondo”.

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Nas tutelas de urgência e evidência há a presença da sumariedade

processual, não sendo produzida coisa julgada.

Citado por Teresa Arruda Alvim Wambier196, Piero Calamandrei in

“Introdução ao estudo sistemático dos procedimentos cautelares”197 aponta que:

“É também oportuno mencionar que há outras situações, não previstas

nesse dispositivo legal, que também justificam a revogação da cautelar, implicando a

cessação dos seus efeitos. Veja-se, por exemplo, a alteração das circunstâncias fáticas que

autorizaram sua concessão. Isso se dá porque nas medidas cautelares está implícita a

cláusula rebus sic stantibus, permitindo-se, pois, sua alteração e/ou revogação se ocorrer

alteração no quadro fático ou probatório vigente ao tempo de sua concessão.

Por fim, o parágrafo único prevê que ‘se por qualquer motivo cessar a

eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo

fundamento’. Assim, tendo a medida cautelar perdido sua eficácia, não poderá o

demandante novamente deduzir o mesmo pedido, salvo por fundamento novo (nova causa

de pedir).

Com efeito, a ausência de coisa julgada material no pedido cautelar não faz

com que fique sempre aberta ao demandante a possibilidade de renovar seu pleito. Nesse

sentido, vale lembrar a regra contida no art. 505 pela qual ‘Nenhum juiz decidirá

novamente as questões já decididas, relativas à mesma lide’. Mesmo sem a formação da

coisa julgada, há in casu preclusão pro judicato, impedindo-se o juiz de julgar novamente

as questões já decididas”.

Neste ponto ousamos discordar da Professora Teresa Arruda Alvim

Wambier, eis que entendemos não se aplicar a preclusão pro judicato.

Prosseguindo, apresenta-se como marca distintiva das tutelas de urgência e

evidência a provisoriedade, conforme previsto no artigo 296 do Novo Código de Processo

Civil198.

196 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.520. 197 Servanda, 2000, p.122-133.

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A provisoriedade da tutela implica na sua revogabilidade, no termo final de

sua eficácia e na relação entre provimento provisório e definitivo.

Uma breve consideração merece ser feita a respeito do julgamento dos

Embargos de Divergência interpostos no REsp n. 765.105/TO pela Corte Especial do

Colendo Superior Tribunal de Justiça, fazendo prevalecer a tese de que a superveniência da

sentença de procedência do pedido não prejudica o recurso interposto contra a decisão que

deferiu o pedido de antecipação de tutela.

O Ministro Hamilton Carvalhido, Relator e cujo voto foi vencedor,

sintetizou a questão da seguinte forma: “situa-se a divergência em se a sentença de

procedência torna prejudicado o recurso interposto contra a decisão que defere antecipação

de tutela”, valendo destacar:

“[...] a superveniência da sentença de procedência do pedido não torna

prejudicado o recurso interposto contra a decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da

tutela. É que a antecipação da tutela não antecipa a sentença de mérito, mas sim a própria

execução do julgado que, por si só, não produziria os efeitos que irradiam da tutela

antecipada”.

Apesar de vencido, o voto-vista do Ministro Teori Albino Zavascki abordou

interessantes considerações sobre as medidas liminares e os provimentos definitivos,

destacando as características e funções especiais existentes nas duas modalidades de tutelas

de urgência. O fato de tais tutelas serem concedidas com base em um juízo de

verossimilhança e em razão da precariedade que lhes são ínsitas, retira-lhes a aptidão para

gerar coisa julgada, podendo ser modificadas ou revogadas a qualquer momento.

Assim, a principal diferença entre as tutelas de urgência e os provimentos

finais residiria no caráter temporário das primeiras, porquanto são concedidas em caráter

precário e para vigorar por prazo determinado, enquanto os segundos possuiriam a marca

da definitividade, sendo tomadas com base em cognição exauriente. E assim arremata o

Ministro:

198 Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada.

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“É por isso que o julgamento da causa esgota a finalidade da medida

liminar. Daí em diante, prevalece o comando da sentença, tenha ele atendido ou não ao

pedido do autor ou simplesmente extinguido o processo sem exame do mérito. Procedente

o pedido, fica confirmada a liminar anteriormente concedida bem como viabilizada a

imediata execução provisória (CPC, art. 520, VII). Improcedente a demanda ou extinto o

processo sem julgamento de mérito, a liminar fica automaticamente revogada, com

eficácia ex tunc (Súmula 405 do STF), ainda que silente a sentença a respeito”199.

O entendimento ficou assim ementado:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. MEDIDA

LIMINAR. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA JULGANDO A

CAUSA. PERDA DE OBJETO DO RECURSO RELATIVO À

MEDIDA ANTECIPATÓRIA. PECULIARIDADES DO CASO

CONCRETO. 1. As medidas liminares, editadas em juízo de mera

verossimilhança, têm por finalidade ajustar provisoriamente a

situação das partes envolvidas na relação jurídica litigiosa e, por

isso mesmo, desempenham no processo uma função por natureza

eminentemente temporária. Sua eficácia se encerra com a

superveniência da sentença, provimento tomado à base de cognição

exauriente, apto a dar tratamento definitivo à controvérsia, com

força executiva própria (CPC, art. 520, V). O julgamento da causa

esgota, portanto, a finalidade da medida liminar. Daí em diante,

prevalece o comando da sentença, e as medidas de urgência

eventualmente necessárias devem ser postuladas no âmbito do

sistema de recursos, seja a título de efeito suspensivo, seja a título

de antecipação da tutela recursal, providências cabíveis não apenas

em agravo de instrumento (CPC, arts. 527, III e 558), mas também

em apelação (CPC, art. 558, § único) e em recursos especiais e

extraordinários (RI/STF, art. 21, IV; RI/STJ, art. 34, V). 2. Por isso

mesmo, a jurisprudência da Corte Especial, da 1ª Seção e de todas

as Turmas do STJ é no sentido de que a superveniente sentença de

mérito acarreta a perda de objeto de eventual recurso interposto em 199 STJ, Corte Especial, Embargos de Divergência no REsp. 765.105 /TO, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe 09.11.2010.

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face da anterior decisão sobre a medida liminar. 3. No caso

concreto, ademais, a sentença de mérito, pela procedência do

pedido (confirmatória da liminar), já foi inclusive confirmada no

julgamento da apelação. E no âmbito do recurso especial interposto

desse acórdão foi deferida medida antecipatória (de efeito

suspensivo), que assegura ao recorrente, até o julgamento, a

manutenção do status quo, a confirmar, outra vez, a absoluta

inutilidade de qualquer juízo que, a essa altura, o tribunal local

venha a proferir a respeito da medida antecipatória originalmente

deferida. 4. Embargos de divergência providos, sem prejuízo da

medida cautelar deferida no âmbito do recurso especial 936.599

(MC 14.378/TO)”.

Portanto, estando pendente de julgamento o agravo de instrumento, mesmo

que em sede recursal, esse recurso perderá o objeto com o advento da sentença.

A postura se justifica porque a tutela de urgência concedida pelo juiz

singular no início da demanda, se não for revogada durante o procedimento estabelecido

em contraditório, deverá ser confirmada ou rejeitada pela sentença.

Prosseguindo, provisório pois precário, instável, revogável a qualquer tempo

durante o curso do processo.

Todavia, mister se faz a observância do princípio da segurança jurídica, eis

que para modificação da tutela provisória novas circunstâncias deverão surgir.

A tutela provisória vigora até o advento da tutela definitiva, conservando a

eficácia durante a pendência do processo.

Não podemos confundir tutela cautelar com tutela satisfativa, eis que esta

última guarda relação com a tutela satisfativa final, identidade esta total ou parcial, por isso

que se costuma afirmar que a tutela cautelar é referível à tutela satisfativa.

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Nesta linha de pensamento, podem ser modificadas e se sujeitam ao regime

de cumprimento provisório de sentença previsto no artigo 297 do Novo Código de

Processo Civil200.

Prosseguindo o raciocínio a medida poderá ser executada imediatamente e

nos próprios autos, não sendo necessária a prestação de caução, cabendo ao magistrado em

decisão fundamentada determinar ou não que tal ocorra, sendo que esta modalidade de

execução corre por conta e risco do exequente.

Podemos traçar alguns requisitos comuns a todas as tutelas provisórias.

Para simplificar e racionalizar o procedimento, o novo Código de Processo

Civil – Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015, sistematizando o regime das tutelas de

urgência, unifica o procedimento das tutelas cautelar e antecipada, independentemente da

sua natureza.

Em conjunto com a tutela de evidência, que prescinde da urgência, o novo

Código de Processo Civil cria o gênero “tutela provisória”, regulado a partir do artigo 294.

Comentando o artigo 294 do novo CPC201 – Lei nº 13.105 de 16 de março

de 2015, Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lucia Lins Conceição, Leonardo Ferres da

Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello202 abordam que:

“Esse dispositivo inaugura o regime jurídico da tutela no NCPC,

esclarecendo desde logo no caput que o gênero (tutela provisória) pode fundamentar-se

em urgência e evidência. Ambas, conquanto provisórias – ou seja, ainda sujeita a

modificação após aprofundamento da cognição – não se confundem.

A tutela de urgência está precipuamente voltada a afastar o periculum in

mora, serve, portanto, para evitar um prejuízo grave ou irreparável enquanto dura o

processo (agravamento do dano ou a frustração integral da provável decisão favorável),

200 Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória. Parágrafo único. A efetivação da tutela provisória observará as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, no que couber. 201 Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. 202 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.487.

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ao passo que a tutela de evidência se baseia exclusivamente no alto grau de probabilidade

do direito invocado, concedendo, desde já, tudo aquilo que muito provavelmente virá ao

final.

O parágrafo único trata tão somente da tutela de urgência, apresentando

desde já sua divisão em tutela cautelar e tutela antecipada, para depois traçar-lhes a

mesma regra geral quanto ao seu procedimento: ambas podem ser concedidas em caráter

antecedente ou incidental.

Esta é a primeira de muitas disposições do NCPC, que deixam claro que

praticamente se adotou um regime jurídico único para as tutelas de urgência. Já não era

sem tempo. Isso representa uma clara mudança de foco na lei processual que, sob a égide

do CPC;73, trata da tutela antecipada e da tutela cautelar como tipos distintos, sujeitas a

procedimentos e requisitos igualmente distintos, inclusive, com parcela importante da

doutrina pátria preocupada em diferenciá-las conceitualmente, demonstrando com

precisão cirúrgica os diferentes contornos de uma e outra. Com essa opinião, contudo,

não concordamos203.

A tutela cautelar e a tutela antecipada, na terminologia usada pelo NCPC

são espécies do mesmo gênero (tutela de urgência) com muitos aspectos similares. Ambas

estão caracterizadas por uma cognição sumária, são revogáveis e provisórias e estão

precipuamente vocacionadas a neutralizar os males do tempo no processo judicial, mesmo

que por meio de técnicas distintas, uma preservando (cautelar) e outra satisfazendo

(antecipada).

Noutras palavras, a tutela cautelar evita que o processo trilhe um caminho

insatisfatório que o conduza à inutilidade. Por sua vez, a tutela antecipada possibilita à

parte, desde já, a fruição de algo que muito provavelmente virá a ter reconhecido ao final.

Pode-se dizer que na cautelar protege-se para satisfazer, enquanto na tutela antecipada

satisfaz-se para proteger. Cada uma a seu modo, ambas tem a mesma finalidade remota,

ou seja, estão vocacionadas a neutralizar os males corrosivos do tempo no processo204.”

203 Um dos coautores desse trabalho defendeu sua tese de doutoramento propugnando justamente pela adoção de um regime jurídico único para as tutelas de urgência. Leonardo Ferres da Silva Ribeiro. Tutela jurisdicional de urgência: regime jurídico único das tutelas cautelar e antecipada. Tese de doutorado em Direito. PUC/SP, 2010. 204 Cândido Rangel Dinamarco, Nova era do processo civil, p.59.

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Esta unificação tem por objetivo eliminar a dificuldade prática na

postulação da tutela antecipada e cautelar, provocada pela duplicidade de regulação, em

livros e procedimentos distintos.

A técnica da antecipação reclama tratamento diferenciado aos direitos

evidentes e aqueles que estão na iminência de lesão.

Para Chiovenda, somente há jurisdição se houver a possibilidade de

produção de coisa julgada material.

Existe a possibilidade de obtenção da medida provisória de forma

antecedente ou incidental.

O procedimento pode ter como fundamento a urgência ou a evidência.

Não há recolhimento de custas nas medidas de caráter incidental.

Existe a temporariedade e provisoriedade das medidas, que podem ser a

qualquer tempo modificadas ou mesmo revogadas, conservando a eficácia na pendência do

processo.

O poder geral de cautela do juiz ganha destaque, eis que o mesmo se faz

presente em todas as tutelas provisórias, abrangendo as de urgência e as de evidência.

Há o dever de fundamentação e motivação das decisões que concederem,

negarem, modificarem ou revogarem a tutela de natureza provisória.

A tutela provisória deve ser requerida pela parte, não podendo ser concedida

de ofício.

No que tange à competência, será do juiz de primeira instância para

apreciação do pedido principal e na segunda instância da Câmara que apreciar o mérito das

ações de competência originária.

Revendo posicionamento anterior, salvo em hipóteses excepcionalíssimas, a

tutela provisória no Novo Código de Processo Civil não poderá ser concedida de ofício,

devendo ser requeridas pela parte.

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Outrossim, na sistemática anterior, o argumento favorável à concessão de

tutela cautelar de ofício era a proteção ao próprio processo e não somente ao direito da

parte.

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5. TUTELAS DE URGÊNCIA

5.1. Classificação:

Para fins de melhor delimitação do tema, podemos destacar três espécies de

providências cautelares.

Existem medidas cautelares para assegurar bens, pessoas e provas.

Em uma evolução bastante positiva, o Novo Código de Processo Civil ao

contrário do Código de Processo Civil de 1973 não estabelece mais diferença entre

medidas típicas e atípicas, o que assumia grande importância nas medidas típicas e

atípicas.

É permitido ao magistrado adotar qualquer outra medida idônea para

assegurar o direito205.

No que tange ao momento em que são deferidas, as tutelas podem ser

classificadas como antecedentes, isto é, aquelas que são anteriores ao pedido principal e

após sua efetivação o pedido será formulado206. As tutelas também podem ser incidentes,

aquelas que são apresentadas no curso do processo, como incidentes, sendo requeridas por

simples petição207.

Eduardo Arruda Alvim208 acentua que há diferenças não apenas de natureza

procedimental entre a antecipação de tutela e as medidas cautelares, que constituem reflexo

das diferentes finalidades a serem perseguidas por aquele que se utiliza de um ou outro

instrumento, havendo também semelhanças. Ambas são medidas de natureza provisória,

que ao contrário do processo de conhecimento, são geradas para serem absorvidas pela

205 Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. 206 Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo. Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 207 Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental. Art. 295. A tutela provisória requerida em caráter incidental independe do pagamento de custas. 208 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.416.

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decisão final no caso de procedência ou improcedência da ação, resguardando sempre a

utilidade do processo.

Aliás, sempre pairaram dúvidas acerca da natureza das medidas.

5.2. Requisitos. Probabilidade do Direito. Perigo de Dano ou

Risco ao Resultado Útil do Processo.

As tutelas cautelares e as tutelas satisfativas (tutelas de urgência) têm como

requisitos a probabilidade do direito – fumus boni iuris – o risco ao resultado útil do

processo – periculum in mora.

Como se pode perceber, não se estabelece mais a distinção entre aparência

do bom direito e prova inequívoca.

Contudo, há necessidade de distinguir a tutela cautelar conservativa da

tutela antecipatória ou satisfativa, eis que, poderá nesta última ocorrer a estabilização que

não se confunde com coisa julgada, conforme veremos adiante (item 5.24.).

Ora, o objetivo da coisa julgada está atrelado à percepção de quais valores

jurídicos se pretende proteger.

Miguel Reale209, discorre sobre a relação entre as perspectivas teleológica e

a axiológica no Direto: “O fenômeno jurídico se manifesta ou existe porque o homem se

propõe fins. (...) Um fim outra coisa não é senão um valor jurídico posto e reconhecido

como motivo de conduta. Não existe possibilidade de qualquer fenômeno jurídico sem que

se manifeste este elemento de natureza axiológica, conversível em elemento teleológico”.

A finalidade da coisa julgada, é a segurança jurídica, um dos mais

importantes elementos norteadores do Estado Democrático de Direito.

O estabelecimento da coisa julgada proporciona estabilidade e firmeza ao

exercício da jurisdição, para segurança do jurisdicionado.

Assim sendo, da mesma forma que o artigo 5º, inciso XXXV, da CF, prevê

o princípio da inafastabilidade do acesso ao Judiciário, para a apreciação de todas as lesões

209 Miguel Reale, Filosofia do Direito, p. 544.

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ou ameaças de lesão aos direitos subjetivos, a coisa julgada, de outro lado, impede que essa

atividade seja exercida em duplicidade.

Luiz Fux, Nelson Nery Jr e Teresa Arruda Alvim Wambier definem: “O

justo processo é a espinha dorsal que move a idéia mais moderna de acesso aos canais de

jurisdição, congregando as condições mínimas e insuprimíveis sem as quais não será

possível ao Estado aplicar o direito material com justiça no seio das relações em

conflito210.

Este um dos grandes problemas a ser enfrentando.

Ora, a tutela cautelar por não solucionar o litígio, não pode ser objeto de

estabilização, não prescindindo da prestação jurisdicional definitiva.

Reitero que somente a tutela antecipatória pode ser estabilizada.

Destacamos então os dois requisitos para a tutela provisória de urgência, isto

é, o dano potencial – periculum in mora e a probabilidade do direito substancial – fumus

boni iuris.

Basta o juízo de verossimilhança, efetuado sob o prisma da cognição não

exauriente, exercida de forma sumária e provisória.

Humberto Theodoro Junior211 esclarece que:

“Somente é de cogitar-se da ausência do fumus boni iuris quando, pela

aparência exterior da pretensão substancial ou pela total inexistência de

elementos probatórios a sustentá-la, se divise a fatal carência de ação ou a

inevitável rejeição do pedido, pelo mérito”.

O outro requisito, perigo de dano, nada mais é do que a demonstração do

interesse processual na obtenção da composição do litígio, devendo ser demonstrado a

210 Luiz Fux, Nelson Nery Jr., Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.). Processo e Constituição, p.684. 211 Humberto Theodoro Junior, Curso de Direito Processual Civil. Volume 1, p. 610.

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grande probabilidade de risco de grave prejuízo, encontrando-se previsto no artigo 300 do

Novo Código de Processo Civil212.

Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero213

entendem que se o legislador quisesse ser mais preciso do ponto de vista da estruturação do

regime da tutela provisória, e mais permeável às necessidades do direito material que cabe

ao processo cautelar, poderia ter caracterizado a urgência que a fundamenta alçando mão

simplesmente do conceito de perigo na demora e, como é intuitivo, é preciso decidir de

forma provisória justamente porque não é possível conviver com a demora: sem tutela

provisória, capaz de satisfazer ou acautelar o direito, corre-se o perigo desse não poder ser

realizado214.

Presentes os pressupostos, o juiz terá o dever de conceder a tutela

provisória, inexistindo discricionariedade.

No Fórum Permanente de Processualistas Civis foi aprovado o Enunciado nº

143 prevendo que “a redação do art. 300, caput, superou a distinção entre os requisitos da

concessão para a tutela cautelar e para a tutela satisfativa de urgência, erigindo a

probabilidade e o perigo na demora a requisitos comuns para a prestação de ambas as

tutelas de forma antecipada”.

Há, portanto, a necessidade de verossimilhança fática com a constatação de

que existe um grau elevado de probabilidade de que assista razão ao postulante.

Por outro lado, já também a plausibilidade jurídica sendo que o juízo de

verossimilhança não decorre necessariamente das provas carreadas aos autos.

O perigo da demora segundo o conceito legal, o dano ou risco ao resultado

útil do processo.

Além disso, o dano deverá ser irreparável ou de difícil reparação, isto é,

aquele que não será objeto de ressarcimento, como no exemplo do desvio de clientela.

212 Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. 213 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2. Tutela dos Direitos Mediante Procedimento Comum, p.196 214 O “pericolo di tardività” (“periculum in mora”), portanto, é o termo que traduz de maneira mais apurada a urgência no processo.

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Em termos práticos, o deferimento da tutela provisória tem lugar quando

não for possível aguardar o término do processo para a entrega da prestação jurisdicional.

Devemos lembrar também do temor diante de eventual ato contrário ao

direito, sendo então possível a concessão de tutelas inibitórias, reintegratórias ou

ressarcitórias.

Na sistemática anterior, a antecipação da tutela estava fulcrada na existência

de prova inequívoca capaz de convencer o magistrado acerca da verossimilhança da

alegação.

Filiamo-nos ao entendimento de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz

Arenhart e Daniel Mitidiero215 pois o legislador agregou ao conceito de probabilidade uma

função pragmática, autorizando o juiz a conceder tutelas provisórias com base em cognição

sumária, ouvindo apenas uma das partes ou então com base em quadros probatórios

incompletos, isto é, sem que tenham sido obtidas todas as provas disponíveis para o

esclarecimento dos fatos.

5.3. Reversibilidade:

Importante salientar, exatamente como na sistemática anterior, a vedação à

irreversibilidade216.

215 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2. Tutela dos Direitos Mediante Procedimento Comum, p.203. E prosseguem ao afirmar: “A probabilidade do direito que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabilidade lógica – que é aquela que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação desses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder a tutela provisória. Para bem valorar a probabilidade do direito, deve o juiz considerar ainda: (i) o valor do bem jurídico ameaçado ou violado; (ii) a dificuldade de o autor provar a sua alegação; (iii) a credibilidade da alegação, de acordo com as regras da experiência (art.375); e (iv) a própria urgência alegada pelo autor. Nesse caso, além da probabilidade das alegações propriamente dita, deve o juiz analisar o contexto em que inserido o pedido de tutela provisória. Ademais, também no campo da formação da convicção a respeito da probabilidade do direito revela-se o equívoco do legislador em adotar uma terminologia puramente processual para designar a técnica antecipatória. Isso porque é importante diferenciar – para efeitos de avaliação da probabilidade do direito – o caso em que se pede tutela inibitória antecipada (portanto, tutela preventiva contra o ilícito antecipada) dos demais pedidos de ‘tutela provisória’ repressiva. Quando se pede tutela inibitória, objetiva-se evitar a violação de um direito. Nesse caso, somente será possível provar o fato que constitua indício de que a violação futura provavelmente ocorrerá. Tratando-se de tutela inibitória antecipada, o juízo provisório deve ser atinente ao fato que constitui indício de que o fato futuro provavelmente ocorrerá a situação de que o fato temido poderá acontecer antes da atuação da sentença”. 216 § 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

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Em termos práticos, é óbvio que o perigo a demora não pode ser suportado

pelo autor, porém, o requerido não deve ser sacrificado não se perdendo de vista a

possibilidade do periculum in mora inverso.

Na prática, em ações versando sobre direito de família, a provisoriedade não

impede a concessão de medidas satisfativas e irreversíveis.

Contudo, conforme já exposto anteriormente, somente em casos muito

excepcionais poderá ser admitida a concessão de tutela de urgência de caráter irreversível.

O objetivo da tutela cautelar ou antecipatória é eliminar o perigo de dano,

não importando se para o autor ou para o réu.

Na verdade, o periculum in mora pode ser definido como uma via de mão

dupla, devendo ser tutelados interesses das partes de forma equânime.

Há diferença entre a tutela cautelar e a tutela satisfativa, devendo ser

analisadas sob diversos prismas.

Em ambas as situações é requerida uma providência urgente.

O elemento distintivo é justamente a possibilidade de a tutela satisfativa

estabilizar-se quando não for interposto recurso.

Esta possibilidade inexiste quando se tratar de tutela conservativa.

Sob outro prisma, ao conceder uma tutela provisória satisfativa irreversível,

o magistrado acabará por conceder a própria tutela definitiva.

Devemos, contudo, agir com prudência, eis que a vedação não pode ser

considerada em termos absolutos.

Imaginemos o caso de um doente em estado terminal.

O deferimento da tutela em caráter irreversível é necessário para preservar

um interesse maior, eis que há também o grande problema causado pela irreversibilidade

da não concessão da medida.

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Importante frisar que se a tutela concedida com fundamento no artigo 300

tem por escopo o combate ao perigo na demora capaz de produzir o ilícito ou mesmo um

fato danoso, quiçá irreparável, ao provável direito do autor, perfeitamente possível admitir

a concessão da tutela, independentemente de seu caráter irreversível.

O direito postulado deve ser provável, isto é, a probabilidade como visto é

requisito para concessão da tutela.

Deve o direito ser interpretado de forma lógica e razoável, sendo certo que o

direito fundamental à adequada tutela jurisdicional estaria comprometido caso fosse

vedado ao juiz a concessão de tutela antecipada apenas sob o argumento de causar prejuízo

irreversível.

Ovídio A. Baptista da Silva217 denomina casos de “urgência urgentíssima”,

concluindo: “O que, em tais casos especialíssimos, não se mostrará legítimo será o Estado

recusar-se a tutelar o direito verossímil, sujeitando seu titular a percorrer as agruras do

procedimento ordinário, para depois, na sentença final, reconhecer a existência apenas

teórica de um direito definitivamente destruído pela sua completa inocuidade prática.”

Daniel Mitidiero218 explica que a superação da proibição da concessão de

antecipação da tutela cujos efeitos são irreversíveis pressupõe a demonstração de que a

vedação frustrará o direito à tutela adequada, efetiva e tempestiva do direito do autor, a

resistência à superação deve ser tanto menor quanto maior for o perigo de o direito do

autor ser violado igualmente de maneira irreversível sem a antecipação da tutela e quanto

mais importante for constitucionalmente o bem jurídico que se pretende proteger com a

técnica antecipatória, prevalecendo a lógica da tutela do direito provável em detrimento do

direito improvável, sob pena de a ordem jurídica confessar-se impotente diante da ameaça

ou da efetiva violação de direitos.

Ora, devemos ter em mente que o verdadeiro objetivo da tutela antecipada

não é apenas o de obstar a concessão de cautelares satisfativas.

217 Ovídio A. Baptista da Silva, A “antecipação” da tutela na recente reforma processual, in Reforma do Código de Processo Civil, p. 142 218 Daniel Mitidiero, Antecipação da tutela, p.129.

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Na verdade, trata-se de instituto de aprimoramento da atividade

jurisdicional, que tem por função precípua evitar que a demora do processo cause um

prejuízo irreparável a parte autora, que pareça ter razão, assim como nos casos de

apresentação de defesas meramente procrastinatórias.

Discorrendo sobre o assunto na sistemática anterior, Jorge Luiz Souto

Maior219, em excelente artigo procura diferenciar a tutela cautelar da tutela antecipada:

“Tal instituto assemelha-se a uma tutela cautelar, porque se baseia no

mesmo postulado do risco da demora do processo, mas da cautelar, em termos

tradicionais, se diferencia porque busca a satisfação da pretensão deduzida e não apenas

assegurar a utilidade do processo. Não se pode considerá-lo uma cautelar também porque

as cautelares não se executam e, nos moldes da lei, a antecipação está sujeita a execução.

Além disso, a tutela também pode ser concedida em razão de ter o réu apresentado defesa

protelatória, o que não guarda correspondência com o fundamento das decisões de

natureza cautelar.

Por outro lado, não é uma sentença ou uma decisão interlocutória, porque

se baseia em postulados distintos daqueles a que tais decisões se apoiam.

Com efeito, a antecipação que se faz não é da tutela em si, mas dos efeitos

da tutela. A antecipação, portanto, tem por objetivo primordial, produzir efeitos concretos

na realidade.

Trata-se, pois, de um novo instituto processual, configurando-se uma tarefa

inglória a de buscar identificar sua natureza jurídica dentro dos padrões jurídicos

conhecidos.

A tutela antecipada não é cautelar, mas também não é uma decisão de

mérito. Trata-se de uma decisão proferida em cognição sumária, dentro de um processo

de cognição exauriente, que tem por objetivo antecipar a própria efetividade do processo,

ou seja, a aptidão do processo para produzir resultados na realidade. Neste aspecto, aliás,

é interessante ressaltar que não se deve confundir tutela antecipada com julgamento

antecipado da lide. Os pressupostos de tais decisões são distintos. Alguém pode imaginar

219 Jorge Luiz Souto Maior, Tutela Antecipada na Ação Civil Pública Datadez - MAI de 2000.

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que havendo nos autos elementos suficientes para firmar convicção a favor do autor, seria

ilógico conceder a tutela antecipada, pois já se poderia proferir a sentença. Ocorre que a

sentença, para produzir efeitos concretos na realidade, precisa da ocorrência do trânsito

em julgado e, ainda assim, estar sujeita a execução, nos casos de decisão condenatória. A

tutela antecipada, apesar de se basear em um juízo apenas de probabilidade, tem como

função, exatamente, produzir efeitos imediatos na realidade. Desse modo, em termos de

produção de resultados, a antecipação da tutela é mais eficiente que a sentença e, por isso

mesmo, nada impede - e até aconselha-se, quando presentes os requisitos legais - que a

antecipação da tutela seja concedida no momento da prolação da sentença.

Para se deferir a tutela, diz a lei, o juiz deverá verificar se há prova

inequívoca da verossimilhança da alegação.

Prova inequívoca da verossimilhança significa que o juiz deve ter

elementos concretos - uma prova clara, não necessariamente uma prova escrita - para

considerar que é bem mais provável que ao final o autor tenha ganho de causa, e não o

réu220”.

Havia uma certa dificuldade em analisar prova inequívoca como indício de

verossimilhança.

O Professor José Carlos Barbosa Moreira221 esclarece a questão:

“(...) Será equívoca a prova a que se possa atribuir mais de um sentido;

inequívoca, aquela que só num sentido seja possível entender. (...) Em duas

etapas se desdobrará a perquirição do magistrado, diante da prova

produzida. Primeira: é ela ‘inequívoca’, no sentido de que só comporta um

entendimento? Segunda: com esse entendimento, tem ela suficiente força

persuasiva para fazer verossímil (ou provável) a alegação do requerente?”.

A função da prova é o convencimento do juiz.

220 José Carlos Barbosa Moreira, A antecipação da tutela jurisdicional na Reforma do Código de Processo Civil, p.204. 221 José Carlos Barbosa Moreira, Antecipação da tutela: algumas questões controvertidas, Temas de direito processual, pp.80/81.

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Concordamos com a posição de Luiz Guilherme Marinoni222 quando reforça

a ideia de que toda certeza jurídica se resolve em verossimilhança, e o fato de o juiz não

poder descobrir a verdade não dispensa de se convencer a respeito do que se alega em

juízo.

E mais uma vez, concordamos com Kazuo Watanabe223, ao abordar os graus

de convencimento do magistrado na formação da sua convicção: “A convicção do juiz, na

cognição sumária, apresenta todos esses graus. Deve haver adequação da intensidade do

juízo de probabilidade ao momento procedimental da avaliação, à natureza do direito

alegado, á espécie dos fatos afirmados, à natureza do provimento a ser concedido, enfim, à

especificidade do caso concreto. Em razão da função que cumpre a cognição sumária,

mero instrumento para a tutela de um direito, e não para a declaração de sua certeza, o grau

máximo de probabilidade é excessivo, inoportuno e inútil ao fim a que se destina”.

Para decidir ou sentenciar, o juiz deve sempre procurar se convencer.

Para este autor, basta uma verossimilhança preponderante, isto é, certas

situações de direito material em que a prova da causalidade é extremamente árdua.

E prossegue Marinoni224:

“Quanto mais rígida for a interpretação da norma, menor será a sua

possibilidade de abarcar situações particulares, ou seja, menores serão as

chances de o juiz extrair uma interpretação capaz de atender aos casos

concretos. Nessa linha, a rigidez da interpretação da norma poderá entrar

em conflito com a sua própria razão de ser, ou como diz Hart, com as

‘nossas finalidades de ter ou manter a regra’ (the rigidity of our

classifications will thus war with our aims in having or maintaining the

rule).225”

222 Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação de Tutela, p.167. 223 Kazuo Watanabe, Da cognição no processo civil, p. 128. 224 Op.cit. p.175. 225 “To do this is to secure a measure of certainty of predicatabillity at the cost of blindly prejudging what is to be done in a range of future cases, about whose composition we are ignorant. We shall thus indeed succeed in settling in advance, but also in the dark, issues which can only reasonably be settled when they arise and are identified. We shall be forced by this techinique to include in the scope of a rule cases which we would wish to exclude in order to give effect to reasonable social aims, and which the open textured terms of our language would have allowed us to exclude, had we left them less rigidly defined. (H.L. A. Hart. The concept

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Ainda abordando a questão da irreversibilidade, Teresa Arruda Alvim

Wambier226 reitera que a proibição diz respeito à irreversibilidade fática e não jurídica:

“(...) Trata-se, obviamente, de uma irreversibilidade fática e não jurídica.

Explica-se: a decisão, sob o aspecto jurídico, é sempre reversível, bastando para tanto que

seja revogada, cassada ou modificada. Não é essa a irreversibilidade que se cogita na

norma, mas sim a eventual irreversibilidade das consequências da efetivação da tutela de

urgência; essa, sim, deve ser motivo de preocupação ao se pensar na concessão, ou não,

da medida pleiteada. (...)

Justamente por isso, a doutrina e a jurisprudência tem abrandado a

aplicação da norma. Há situações em que, mesmo irreversível, a medida há de ser

deferida. Imagine-se, por exemplo, um requerimento de autorização para uma transfusão

de sangue emergencial a um menor, para salvar-lhe a vida, porque um dos pais, por

questões religiosas, opõe-se227; ou ainda, um pedido para liberação de mercadorias

perecíveis, retidas na alfândega para exame sanitário que, por greve dos servidores, não é

realizada228. Nessas e em outras tantas situações, mesmo diante da irreversibilidade, há de

ser concedida a tutela de urgência.

Nessas situações, os efeitos irreversíveis ocorrerão em qualquer hipótese,

concedendo-se, ou não, a tutela de urgência. Cabe ao juiz, em casos tais, proceder a uma

valoração comparativa dos riscos, escolhendo aquele que causar o menor dos males. É o

que Cândido Rangel Dinamarco denomina de juízo do mal maior.229

Por fim, observe-se que, nessas situações de irreversibilidade, havendo

reforma da decisão, o retorno ao ‘satus quo’ ficará limitado, quando possível, à reparação

pecuniária”. of law. P.126-127). Tradução livre. “Para fazer isso é o de garantir uma certa segurança de previsibilidade ao custo de prejulgar cegamente o que deve ser feito em uma série de casos futuros sobre cuja composição somos ignorantes. Vamos, portanto, de fato conseguir solucionar com antecedência, mas também no escuro, questões que só pode razoavelmente ser liquidados quando eles surgem e são identificados. Seremos forçados por este técnica para incluir no âmbito de um caso de regras que nós desejamos excluir, a fim de dar cumprimento aos objetivos sociais razoáveis , e que os termos de textura aberta da nossa língua nos teria permitido para excluir, se tivéssemos deixado menos rigidamente definido”. 226 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.501. 227 Exemplo dado por José Carlos Barbosa Moreira. Temas de Direito Processual. 8ª Série. São Paulo: Saraiva, 2004, p.82-83. 228 Exemplo dado por Teori Albino Zavascki. Antecipação de Tutela e colisão de direitos fundamentais. In Reforma do Código de Processo Civil. Coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira, p.163. 229 Cândido Rangel Dinamarco, Nova era do processo civil, p.73 e ss.

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A formação do profissional em Direito além de ser tecnicamente adequada,

deve levar em conta premissas éticas, voltando-se para a defesa dos princípios do Estado

Democrático de Direito, comprometendo-se com a solução justa dos conflitos no âmbito de

atuação do Juiz, dando-se enfoque em conhecimentos teóricos e práticos, inserindo-se os

mesmos na realidade forense.

Em não raras vezes, surgem pedidos de liminares e tutelas antecipadas,

sendo extremamente exíguo o tempo para apreciação, sendo inegável a necessidade de

apreciação imediata dos pedidos envolvendo o patrimônio, a saúde, a vida das pessoas.

Não se perca de vista que o conceito de eficácia advém da efetividade.

Assim sendo, o efeito produzido deverá ser adequado e útil para a pretensão

deduzida em juízo.

Nesta ordem de ideias, importante salientar que o direito material tutelado

deve estar em perfeita sintonia com o meio, o direito processual (formal), suficiente a

tornar realidade a pretensão deduzida em juízo.

Convém insistir, devem ser harmonizados os princípios da efetividade da

jurisdição e o da segurança jurídica.

No conflito de interesses deverá prevalecer sempre o juízo de razoabilidade.

Concordamos com Cândido Rangel Dinamarco230 quando expõe: “Como

ficou claro e é notório, o elemento comum de maior significado, existente entre as medidas

cautelares e as antecipatórias de tutela, é a destinação, que ambas têm, a servir de armas na

luta contra a corrosão de direitos por ação do tempo. Daí serem elas enfeixadas na

categoria das medidas de urgência, ou seja, medidas a serem outorgadas no mais curto

lapso de tempo possível, muito mais rapidamente que a tutela jurisdicional plena e

definitiva. Tanto a umas quanto a outras aplica-se a sábia lição de Calamandrei, de que

‘entre fazer logo porém mal e fazer bem mas tardiamente, os provimentos cautelares visam

sobretudo a fazer logo, deixando que o problema do bem e do mal, isto é, da justiça

intrínseca do provimento, seja resolvido mais tarde, com a necessária ponderação, nas

sossegadas formas do procedimento ordinário”.

230 Cândido Rangel Dinamarco, Nova era do processo civil, p. 62

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Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga231 com

propriedade afirmam que há situações, porém, em que o conflito dos direitos fundamentais

é tão significativo, que apenas um deles irá prevalecer, o que implicará em inevitável

sacrifício do outro.

5.4. Caução:

Para minimizar o impacto da concessão da liminar, é possível que o

magistrado exija a prestação de caução, conforme previsto no artigo 300, parágrafo 1º do

Novo Código de Processo Civil232.

No artigo 297 no NCPC233, poderá o magistrado determinar as medidas que

considerar adequadas para efetivação da tutela provisória, e a sua efetivação observará

normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, no que couber.

Analisando a alteração introduzida pelo Novo Código de Processo Civil,

Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero234 afirmam que à

exceção da execução contra a Fazenda Pública, o direito brasileiro completou um arco que

vai desde a previsão de formas rígidas de execução a um sistema que privilegia a

versatilidade e a maleabilidade das técnicas executivas, cabendo ao magistrado determinar

231 Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga, Curso de Direito Processual Civil, páginas 601/602. E mencionam exemplo esclarecedor trazido pelo Ministro Teori Zavascki (in Antecipação de Tutela, 2ª. Edição, 1999, p.98). “Na Justiça Federal, por exemplo, não são incomuns pedidos para liberação de mercadorias perecíveis, retidas na alfândega para exame sanitário que, por alguma razão (greve dos servidores, por exemplo), não é realizado. Nesses casos, a concessão liminar da tutela pedida compromete irremediavelmente o direito à segurança jurídica a que faz jus o demandado (liberada e comercializada a mercadoria, já não há que se falar em seu exame fitossanitário); seu indeferimento torna letra morta o direito à efetividade do processo, porque, deteriorando-se o produto, inútil será sua posterior liberação. Em casos dessa natureza, um dos direitos fundamentais colidentes será sacrificado, não por vontade do juiz, mas pela própria natureza das coisas. Ad impossibilia nemo tenetur. Caberá ao juiz, com redobrada prudência, ponderar adequadamente os bens e valores colidentes e tomar a decisão em favor dos que, em cada caso, puderem ser considerados prevalentes à luz do direito. A decisão que tomar, em tais circunstâncias, é, no plano dos fatos, mais que antecipação provisória, é concessão ou denegação de tutela em caráter definitivo”. 232 Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. 233 Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória. Parágrafo único. A efetivação da tutela provisória observará as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, no que couber. 234 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2. Tutela dos Direitos Mediante Procedimento Comum, p.212.

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todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para

assegurar o cumprimento da ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto

prestação pecuniária235.

Havendo mais de um meio possível, deve o magistrado optar pelo meio

menos restritivo, observando as regras para o cumprimento provisório da sentença.

Além disso, o artigo 301 do NCPC236 também indica uma série de

providências a serem tomadas pelo magistrado para assegurar o direito.

Ao juiz é atribuído o poder geral de cautela, sendo também imposto um

regime de responsabilidade civil objetiva àquele que restou sucumbente na demanda,

cabendo indenizar a parte adversa pelos prejuízos sofridos.

Comentando o artigo acima, Teresa Arruda Alvim Wambier237 com muita

propriedade pondera que:

“Não se pode olvidar, porém, numa perspectiva do modelo constitucional

do processo que, em situações excepcionais, possibilita-se a ‘relativização’

da tipicidade e/ou da adequação da execução, quando for necessário à 235 Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: I - assegurar às partes igualdade de tratamento; II - velar pela duração razoável do processo; III - prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias; IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária; V - promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais; VI - dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito; VII - exercer o poder de polícia, requisitando, quando necessário, força policial, além da segurança interna dos fóruns e tribunais; VIII - determinar, a qualquer tempo, o comparecimento pessoal das partes, para inquiri-las sobre os fatos da causa, hipótese em que não incidirá a pena de confesso; IX - determinar o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios processuais; X - quando se deparar com diversas demandas individuais repetitivas, oficiar o Ministério Público, a Defensoria Pública e, na medida do possível, outros legitimados a que se referem o art. 5o da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, e o art. 82 da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para, se for o caso, promover a propositura da ação coletiva respectiva. Parágrafo único. A dilação de prazos prevista no inciso VI somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular. 236 Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. 237 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.492.

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efetividade da tutela jurisdicional, permitindo-se ao juiz adaptar um modelo

que seja efetivo. Para ilustrar, utilizaremos, a seguir, dois exemplos, ambos

relacionados a uma tutela de urgência.

Pense-se, como primeiro exemplo, na possibilidade de o juiz, diante da

impossibilidade da parte em prestar caução, dispensá-la e mesmo assim

permitir a efetivação de uma tutela de urgência. Tal hipótese, aliás, está

expressamente prevista no § 1º do art. 300.

Como segundo exemplo, pensemos numa situação mais rara e que deve ser

entendida em caráter de ‘exceção da exceção’: uma hipótese de

antecipação de uma condenação de obrigação de pagar, fundada numa

urgência agônica, como a necessidade do custeio imediato de um

tratamento de saúde vital para o paciente. Nessa situação, somente o prazo

de 15 (quinze) dias previsto no art. 523 para ‘pagamento voluntário’ já

teria o condão de conduzir à total ineficácia da medida.

Em casos tais – excepcionalíssimos, por assim dizer – diante da urgência e

dos bens em jogo, é facultado ao juiz afastar-se do modelo executivo

previsto para as obrigações de pagar, utilizando-se do instrumental para

cumprimento das tutelas específicas (obrigações de fazer/não fazer e

entrega de coisa), efetivando a tutela provisória de pagamento per officium

iudicis, com a expedição de mandado de pagamento, sob pena de medidas

coercitivas (multa, configuração de crime de desobediência etc.) ou mesmo

com a adoção de medidas sub-rogatórias, e.g., bloqueio e entrega imediata

de numerário existente em conta-corrente e aplicações financeiras etc.

Não se trata, frise-se, de ‘transformar’ uma obrigação de pagar numa

obrigação de fazer, mas sim de executar uma obrigação de pagar com os

meios executivos previstos em outro modelo executivo, numa verdadeira

fungibilidade de meios executivos.

Essa espécie de fungibilidade, segundo pensamos, está expressamente

permitida no NCPC, quando no art. 139, inciso IV, permite-se ao juiz

‘determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-

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rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial,

inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.

A mesma autora prossegue afirmando sobre a dispensa da caução238:

“Cabe ao juiz, ponderando os bens em jogo e à luz do caso concreto,

afastar qualquer exigência – e aqui expressamente, refere-se à caução –

que tenha condão de impedir ou inviabilizar a tutela de urgência, sob pena

de se violar o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional”.

O Professor Arruda Alvim239, também está dentre os Processualistas que

admitem o cabimento da tutela antecipada quando presente o risco de irreversibilidade

fática, porém apenas nos casos em que seja indispensável à sobrevivência do direito do

autor, ensejando a conversão em perdas e danos:

“Como regra geral, a reversibilidade não deverá ser a solução de perdas e

danos ao depois da decisão (sentença ou acórdão), em que se venha a

‘cassar’ a tutela antecipada. No entanto, em casos extremos, de

perecimento da pretensão do autor ou de dano que só com a antecipação da

tutela pode ser evitado, a solução que poderá corretamente vir a ser

adotada é a de resolver-se o assunto até assumindo o risco das perdas e

danos.”

Logo, para proteger o direito em jogo devemos atentar à preponderância do

interesse público na preservação da força e utilidade do processo, colimando sempre a justa

composição da lide.

A contracautela nada mais é do que a possibilidade de ser imposta, de ofício

pelo magistrado, a caução real ou fidejussória, para o fim de ressarcir eventual prejuízo

causado com a providência sumária imposta.

Na verdade, é um poderoso remédio para tentar minimizar as consequências

de uma medida de urgência adotada antes do contraditório.

238 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.500. 239 Arruda Alvim, Tutela antecipatória (algumas noções - contrastes e coincidências em relação às medidas cautelares satisfativas). In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (Coord.), p.343.

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O autor, no entanto, deverá comprovar os pressupostos e requisitos legais da

tutela emergencial.

Na hipótese de o autor não apresentar condições financeiras de oferecer a

caução, o magistrado poderá dispensá-la.

Compartilhamos o mesmo entendimento de José Maria Rosa Tesheiner e

Lucas Pereira Baggio240 enquanto ressaltam os diferentes graus de convencimento, sendo

que o juízo é sempre de verossimilhança. São três os elementos a serem investigados. O

primeiro é a existência da urgência, a justificar a quebra do procedimento estabelecido para

os casos normais. O segundo é a aparência do direito postulado, o que importa avaliar o

substrato probatório e sua consequência jurídica. O terceiro são os efeitos da decisão,

especialmente no que tange à ponderação de eventuais restrições à esfera jurídica da parte

adversa, considerando, especialmente, a irreversibilidade fática ou fática e jurídica.

E os autores prosseguem afirmando que, com ou sem previsão legislativa, o

juiz se depara com situações em que a urgência exige uma decisão imediata, cujos efeitos

podem não apenas ser faticamente irreversíveis como ser de natureza tal a tornar destituído

de razão prática o prosseguimento do processo. O problema fica mais ainda latente quando

não se abre a possibilidade de ouvir a parte contrária ou interessada atingida pela decisão

de concessão da medida emergencial.

Ora, na maioria dos casos, o autor beneficiado com a concessão da medida

irreversível não terá interesse no prosseguimento do processo. Contudo, o réu poderá

requerer o prosseguimento para obtenção da declaração de injuridicidade da medida

concedida e consumada, resguardando o exercício do contraditório.

Assim, a estabilização da tutela, com força de coisa julgada, por falta de

provocação do réu, poderia, segundo os autores e com quem concordamos, estimulá-lo a

requerer o prosseguimento, no receio de vir eventualmente a sofrer ulteriores

consequências decorrentes da coisa julgada formada em processo que não pode sequer se

manifestar e produzir provas.

Uma controvérsia que surge, diante da omissão legislativa.

240 José Maria Rosa Tesheiner e Lucas Pereira Baggio, Tutela Jurisdicional de Urgência Irreversível in Tutelas de urgência e cautelares, pp.795/796.

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Essa atividade deve sempre levar em conta o direito material postulado, sem

descurar do conflito entre efetividade e segurança.

Para auxiliar na solução do problema do conflito de interesses, Karl

Larenz241 apresenta a seguinte reflexão:

“A ponderação de bens no caso concreto é um método de desenvolvimento

do Direito, pois serve para solucionar colisões de normas – para as quais falta uma regra

expressa na lei –, para delimitar umas das outras esferas de aplicação das normas que se

entrecruzam e, com isso, concretizar os direitos cujo âmbito, como o do direito geral de

personalidade, ficou em aberto”.

Mirna Cianci e Rita Quartieri242, abordando sobre o requisito urgência, bem

apontam que cumpre ao processo, em sua moderna acepção, servir ao papel instrumental,

de modo a conferir o usufruto da justiça e do justo, aqui encarado como método de

agilização da tutela jurisdicional, no sentido do que Cappelletti, muito oportuno,

mencionou ao concluir que “o acesso formal, mas não efetivo à justiça, corresponde à

igualdade apenas formal, mas não efetiva”.243

E as autoras ressaltam que: Esse padrão de destaque à celeridade da

máquina judiciária não figura novidade no sistema processual brasileiro. O Código de

Processo Civil historicamente sempre retratou hipóteses em cuja moldura coube a

abrangência dessa concepção, ora em casos cuja demora tinha como resultado o ensejo à

mais completa inutilidade da prestação jurisdicional, ora quando considerasse prioritário o

gozo do direito, independente da demonstração de irreversibilidade. (...)

Na realidade, a verdadeira distinção de tais tutelas raras vezes veio a ser

detectada na doutrina e, em especial, na jurisprudência, José Roberto dos Santos Bedaque

estabelece uma identidade funcional, considerando ambas cautelares em sentido amplo,

uma vez que destinadas ao idêntico fim de ‘eliminar a colisão entre a segurança jurídica e a

241 Karl Larenz, Metodologia da Ciência do Direito, p.574 e seguintes. 242 Mirna Cianci, Rita Quartieri, A concepção da urgência no processo civil brasileiro in Tutelas de urgência e cautelares, pp.927, 928, 929, 930. 243 Mauro Cappelletti, Bryan Garth, Acesso à Justiça, p.09.

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efetividade da jurisdição’. Cautelar e antecipada são, ademais, estruturadas de maneira

igual, pois provisórias e passíveis de modificação ou revogação a qualquer tempo.244

A partir dessa formulação, o elemento urgência sempre foi considerado

traço comum, capaz de imprimir cognição imediata, à margem da dilação probatória e dos

demais trâmites subsequentes. A propósito, Donaldo Armelin245 menciona que ‘a adoção

da técnica de cognição sumária em processo de autônomo, por inábil a gerar a certeza e

segurança indispensáveis às soluções definitivas e de eficácia panprocessual, deve ater-se

àquelas situações em que a urgência da tutela sobrepõe-se àquelas qualidades jurídicas’.

Conclui a respeito que ‘a exigência de uma cognição plena não é por si só e sempre um

empeço à celeridade da prestação jurisdicional, cujo retardamento tem raízes outras e por

vezes acentuadamente determinantes de sua ocorrência’.

Não se acomoda a cognição exauriente com a tutela cautelar e antecipada, já

que baseadas em juízo de probabilidade e verossimilhança, e não de certeza. Como observa

Dinamarco, ‘para fazer logo, embora com o risco de não fazer tão bem (Calamandrei), é

preciso que o juiz se contente com uma cognição da qual lhe resulte apenas a sensação de

uma probabilidade suficiente, não a sensação de uma certeza tranquila e definitiva246.

A urgência como sinônimo da possibilidade de dano irreparável, todavia,

nem sempre tomou o sentido estrito do termo, abarcando o diploma processual situações

coo a prevista na concessão de liminares na tutela da posse nova, nos embargos de terceiro,

na execução provisória e em medidas esparsas, nas quais a imediata percepção do direito

reclama pressupostos específicos e a urgência decorre da importância que o legislador

conferiu ao tema, numa seara que se resolve, portanto, em questão de política legislativa.

E não apenas no direito objetivo; também empiricamente se verifica a

concessão de medidas liminares sem a preocupação com a demonstração de urgência, mas

apenas diante da tutela de evidência, ainda que não tenha havido incontrovérsia ou abuso

de direito, pressupostos do art. 273, II § 6º do CPC.

244 José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização), p.298. 245 Donaldo Armelin, Tutela jurisdicional diferenciada, p.52. 246 Candido Dinamarco, O regime jurídico das medidas urgentes, p.47.

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Na verdade, o termo urgência revela ‘prioridade’. Frederico Carpi, a

respeito, já afirmava que ‘In termini generalissimi tutti sano che l´urgenza pone due

esigenze fondamentali che influenzano la funcionze e la strutura del processo che ne è

informato: evitare um pregiudizio e, per evitare il pregiudizio, derrogare a regole generali.

Come notava Calamandrei, la lunghezza del processo ordinário può determinare um

pericolo che il provvedimento sai tardivo”.247

5.5. Fundamentação adequada.

Deve o magistrado fundamentar a decisão, até mesmo em observância ao

princípio da segurança jurídica.

Aliás, tal princípio encontra-se insculpido no artigo 93, inciso IX da

Constituição Federal248.

A princípio tal exigência poderia parecer desnecessária, porém, diante da

cognição superficial e não exauriente a necessidade de fundamentação é um poderoso

instrumento para controle da atividade judicial.

Tratando-se de medida excepcional, deverá o magistrado agir com

prudência e cautela, coibindo eventual abuso ou probabilidade de dano.

Outrossim, no artigo 298 do Novo Código de Processo Civil está

expressamente prevista a necessidade de fundamentação da decisão que conceder, negar,

modificar ou revogar a tutela provisória:

“Art. 298. Na decisão que conceder, negar, modificar ou revogar a tutela

provisória, o juiz motivará seu convencimento de modo claro e preciso”.

Para Teresa Arruda Alvim Wambier249, “fundamentação inadequada é o

mesmo que fundamentação inexistente”. 247 Frederico Carpi, La tutela d´urgenza fra cautela, sentenza antecipata e giudizio di mérito. La tutela d´urgenza, p.39. 248 “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação”;

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As decisões que concedem a tutela provisória que se limitam apenas à

afirmar que estão presentes os pressupostos na verdade são carentes de fundamentação e

podem ser questionadas, valendo ressaltar o disposto no artigo 489 do NCPC.250

Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero251, com

quem concordamos, anotam que o juiz deve mostrar as razões que o levaram a deferir ou

indeferir o pedido de tutela provisória, permitindo que as partes possam deduzir eventual

recurso para viabilizar o controle institucional pelo tribunal e o de permitir que a sociedade

em geral possa tomar conhecimento de como é praticada a jurisdição a fim de exercer o

controle social do poder252 e, por essa razão, a fundamentação, quando aliada à publicidade

(arts.93, IX da CF/88 e 11 do CPC), tomando como exemplo a experiência francesa,

constitui eloquente sinal de uma administração democrática da justiça.

Mirna Cianci253 refletindo sobre o Novo Código de Processo Civil, aborda

importantes alterações, no Capítulo que trata das tutelas antecipadas:

“Cabe aqui levar em conta a discricionariedade como atributo da conduta

judicial na concessão de liminares antecipatórias. Há grande debate sobre o tema na

249 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.493. Teresa Arruda Alvim Wambier. Nulidades do processo e da sentença. Cit.p.332-333. 250 Art. 489. São elementos essenciais da sentença: I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo; II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem. § 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. 251 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2. Tutela dos Direitos Mediante Procedimento Comum, p.210. 252 Michele Taruffo, La motivazione della sentenza civile, p.406-407. 253 Mirna Cianci, Tutela Antecipada no Projeto do Código de Processo Civil: Acertos E Desacertos http://anape.org.br/site/wp-content/uploads/2014/01/TESE-72-AUTORA-MIRNA-CIANCI.pdf acesso em 20 de abril de 2015.

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doutrina254, sendo claro buscar fundamentos na teoria do direito administrativo, onde se

considera cabível a atuação na liberdade de escolha entre as diversas opções legislativas,

mediante apreciação subjetiva, mas de modo fundamentado quanto ao exercício dessa

opção, demonstrando os motivos de sua superioridade em relação às demais”.255

5.6. Tutela provisória antes do contraditório

É possível a concessão de tutelas de urgência antes mesmo da instauração

do contraditório.

Outrossim, no Novo Código de Processo Civil da mesma forma que no

sistema anterior, previamente à citação do suplicado é atribuída ao magistrado esta

possibilidade.

Nesta ordem de ideias, registre-se que a audiência da parte contrária poderá

frustrar a expectativa da satisfação do direito invocado, fulminando os direitos em risco.

Logo, de forma bastante eficiente o Novo Código de Processo Civil em

atenção a finalidade preventiva das medidas de urgência permite a concessão sem a oitiva

da parte contrária, não bastando a iminência do dano.

Basta, portanto, a possibilidade da consumação do dano antes de ser

estabelecido o contraditório.

No que tange ao tempo, as medidas poderão ser concedidas em caráter

antecedente ou incidente.

5.7. Liminar e medida de urgência

É comum confundir liminar com medida de urgência. No entanto, algumas

distinções se fazem necessárias.

Liminar representa qualquer medida ou provimento adotado pelo magistrado

no início do processo in limine litis.

254 Teresa Arruda Alvim Wambier, Da Liberdade do Juiz na concessão de liminares e a tutela antecipatória. Aspectos polêmicos da antecipação de Tutela, passim. 255 José Manoel de Arruda Alvim, A argüição de relevância no recurso extraordinário, p.16.

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Portanto, de acordo com o momento cronológico, liminar é concedida no

início do processo.256

A liminar pode ser concedida após justificação prévia, caso o julgador

necessite de melhores esclarecimentos sobre o caso apresentado.

O critério distintivo, portanto, é o temporal diante da sequência de atos

concatenados do processo.

Ora, não implica necessariamente a forma do requerimento seja ele

antecedente ou incidente e a análise da liminar, o pleito pode ser antecedente porém não

liminar, dependendo, assim, de uma justificação prévia.

Há também em algumas situações a necessidade de ser estabelecido o

contraditório prévio.

Importante acrescentar que a liminar pode não corresponder à cautelaridade,

havendo medidas provisórias diferentes da satisfação do direito material e subjetivo da

parte, mas que também asseguram o resultado útil do processo.

Assim é que foram introduzidas em nosso ordenamento alguns provimentos

de antecipação de tutela, tais como aquelas contidas em procedimentos especiais no

mandado de segurança, na ação popular, na ação de inconstitucionalidade, na ação de

nunciação de obra nova, nas ações locatícias, às quais se aplica, no que couber, o Código

de Processo Civil, eis que se trata de dispositivo de natureza geral.

A liminar em mandado de segurança também pode ser considerada uma

verdadeira tutela antecipada.

O mandado de segurança exige o direito líquido e certo, isto é, prova

documental suficiente para revelar a existência do direito. 256 Adroaldo Furtado Fabrício, Breves notas sobre provimentos antecipatórios, cautelares e liminares, p.25. “Como no sentido comum dos dicionários leigos, liminar é aquilo que se situa no início, na porta, no limiar. Em linguagem processual, a palavra designa o provimento judicial emitido in limine litis, no momento mesmo em que o processo se instaura. A identificação da categoria não se faz pelo conteúdo, função ou natureza, mas somente pelo momento da provocação. Nada importa se a manifestação judicial expressa juízo de conhecimento, executório ou cautelar; também não releva indagar se diz ou não com o meritum causae nem se contém alguma forma de antecipação de tutela. O critério é exclusivamente topológico. Rigorosamente, liminar é só o provimento que se emite inaudita altera parte, antes de qualquer manifestação do demandado e até mesmo antes da sua citação”.

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Logo, no mandado de segurança, a afirmação deve ser provada desde logo,

através de prova documental.

Alfredo Buzaid257 conceitua direito líquido e certo como aquele pertencente

à categoria dos direitos materiais, modelado através da técnica da cognição exauriente

secundum eventum probationis.

Prosseguindo, no mandado de segurança, a liminar é deferida com base no

juízo de verossimilhança, e que não será infirmada pelo réu.

Por outro lado, a liminar na cautelar é concedida com base no juízo de

verossimilhança de que a afirmação será demonstrada através de provas.

Fredie Didier Jr.258 citando Teori Zavascki explica:

“Absolutamente correta a lição de ZAVASCKI: “Não há dúvida que a

liminar em mandado de segurança constitui típica hipótese de antecipação

de efeito da tutela, semelhante à prevista no art. 273, I, do Código. Quem

lhe nega esse caráter antecipatório, geralmente parte do pressuposto

equivocado de que antecipação é o mesmo prejulgamento da causa. (...)

Também a antecipação prevista no art. 273, I, do Código de Processo Civil,

não constitui prejulgamento da causa, nem afirma ou retira direito algum, e

nem produz efeitos jurídica definitivos; e ela também tem por finalidade

apenas acautelar direito ameaçado por risco de dano. Tais circunstâncias,

contudo, de modo algum comprometem sua natureza antecipatória, pois o

que fixa tal natureza é o conteúdo da medida, e não a sua finalidade.

Quanto à finalidade, há identidade entre a medida cautelar e a

antecipatória, já que ambas, em última análise e a seu modo próprio, visam

a preservar a utilidade da função jurisdicional. Na espécie do art. 273, I,

para afastar o perigo de comprometimento ao processo, a técnica utilizada

é a de antecipar, em caráter provisório, algum efeito executivo decorrente

da futura sentença, sem que isto, obviamente, importe prejulgamento da

causa”.

257 Alfredo Buzaid, Do Mandado de Segurança, p.86-87. 258 Fredie Didier Jr., A Tutela Antecipatória dos Artigos 273 e 461, CPC, como hipótese de suspensão do crédito tributário, pág. 5.

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Outrossim, o poder geral de cautela é ampliado, admitindo-se também para

cumprir de forma provisória e antecipada a verdadeira pretensão de mérito, como nos

alimentos provisionais, busca e apreensão, representando nítido caráter satisfativo.

Um exemplo bastante citado é a própria cautelar de alimentos provisionais

prevista no art. 852 do CPC. Nas ações de alimentos, essa cautelar, positivada como tal,

tem nítida natureza antecipatória de tutela, eis que está antecipando ou satisfazendo o

pedido principal do autor, inclusive no último caso por serem os alimentos irrepetíveis.

Sob outro prisma, não há como negar que ela também estará servindo ao

processo principal para garantir o sustento do autor até a decisão final do processo

principal. Assim, ela está assegurando ou acautelando a própria subsistência do processo

principal, ainda mais quando essa última não tiver como objeto, ou não somente, os

alimentos. Diante disso, coloca-se a pergunta: qual a real natureza jurídica dessa medida

antecipatória?

Liminar não é sinônimo de cautelar, diferenciando-se apenas quanto ao

aspecto temporal, sendo aquela tomada no início do processo, revestindo-se de natureza

cautelar ou satisfativa.

Reitero que a tutela de evidência não se fundamenta no periculum in mora

porém admite a liminar, desde que haja prova suficiente para concessão desta medida,

sujeitando-se ao mesmo procedimento previsto para as demais tutelas de urgência.

Na tutela de evidência prevista no artigo 311, inciso IV do NCPC, o autor

traz prova documental robusta do fato constitutivo do seu direito, e o réu não opõe prova

apta a gerar dúvida razoável. Ora, se um dos pressupostos é a oitiva do réu, não caberá a

concessão de liminar.

Não se pode alegar violação ao contraditório na hipótese de o mesmo ser

deslocado para um momento posterior, diante da justificativa do perigo da demora.

5.8. Momento da concessão

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A tutela provisória poderá ser concedida de forma antecedente ou incidente,

de acordo com o artigo 294, parágrafo único do Novo Código de Processo Civil259.

A tutela também pode ser contemporânea ao ajuizamento da ação.

Nestas hipóteses, é possível ao requerente limitar-se ao requerimento de

tutela antecipada e indicação do pedido de tutela final, expondo a lide, o direito pretendido

e o perigo de dano ou risco de comprometimento do resultado útil do processo.

Portanto, há três momentos em que se possibilita a concessão de tutela de

urgência a saber: antes da exposição da pretensão principal – tutela antecedente; na petição

inicial – tutela cumulativa e no curso do processo principal – tutela incidental.

Importante mais uma vez ressaltar que somente as tutelas provisórias de

urgência poderão ser requeridas em caráter antecedente, diante do perigo da demora.

Na hipótese de a parte pretender a concessão de tutela provisória fundada na

urgência, o contraditório poderá ser postergado caso a oitiva da parte contrária seja capaz

de colocar em cheque a possibilidade de obtenção do próprio direito do autor, já que a

demora no exercício do contraditório implicará justamente na ameaça que se pretende

afastar, na reiteração do ilícito ou a sua continuação.

O contraditório também será postergado caso a oitiva da parte contrária seja

capaz de colocar em risco a própria eficácia da tutela provisória, já que a atividade desta

será capaz de frustrar o resultado postulado.

Logo, o decurso do tempo e a atuação da parte contrária são elementos que

podem frustrar a tutela sumária, e, portanto, são motivos para postergação do exercício do

contraditório.

A tutela de evidência não pode ser requerida em caráter antecedente.

É possível a postergação do contraditório quando se postula tutela fundada

na evidência.

259 Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

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Há previsão legal da potencial inconsistência da defesa.

A primeira delas é o fundamento do pedido do autor basear-se em

precedentes do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, ou

jurisprudência em incidente de resolução de demandas repetitivas pelos Tribunais de

Justiça ou Tribunais Regionais Federais (art.311, II).

A segunda é a formulação do pedido reipersecutório fundado em prova

documental adequada do contrato de depósito (art. 311, III).

Nestes dois casos o contraditório é diferido, já que inaceitável o autor ficar

aguardando para ver realizado um direito que já se encontra sedimentado ou que encontra

amparo em prova documental suficiente e idônea.

A própria urgência já justifica o requerimento da tutela, não dispondo a

parte de tempo hábil para angariar elementos para formular a pretensão definitiva,

indicando com precisão a causa de pedir de forma integral, podendo fazê-lo

posteriormente.

Sobre a tutela de urgência no processo civil brasileiro, Rogério Aguiar

Munhoz Soares260 traçou as seguintes considerações:

“Um dos pontos pacíficos da doutrina processual tradicional sempre foi o

repúdio aos juízos sumários, lastreados em fumus boni iuris e periculum in mora,

construções estas que se valem muito mais da retórica aristotélica que da lógica cartesiana,

na medida em que descampam do campo das verdades para o campo das meras afirmações.

O próprio Chiovenda acusava os processos sumários de serem

incompatíveis com os princípios e objetivos da civilização moderna, que exigiria um

processo telelogicamente voltado para a descoberta da verdade e, além disso, capaz de

oferecer a indispensável segurança de que as relações jurídicas necessitam para

desenvolver-se. (...)

260 Rogerio Aguiar Munhoz Soares, A Reforma do processo cautelar e a tutela de urgência no direito processual civil. In Tutelas de urgência e cautelares, pp.1001/1002 e 1004.

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O fato é que, até hoje, o racionalismo jurídico, arraigado na mentalidade dos

operadores do direito, acarreta sérias dificuldades na operacionalização de tutelas que se

valham de cognição sumária justamente por tal motivo, vale dizer, pela carência de um

suporte teórico que ultrapasse os limites de um modelo dogmático que já se encontra

superado por um novo paradigma, que aponta no sentido da diferenciação da tutela

jurisdicional. (...)

Evidentemente, tal equívoco, ou direcionamento, age no sentido de

compatibilizar um tipo diverso de tutela com a divisão clássica dos processos, pois, se tais

lides escapam ao processo de conhecimento e não são executivas, lugar melhor para elas

não haveria que o processo cautelar.

Trata-se, especificamente, das tutelas de urgência satisfativas interinais e

autônomas.

Os provimentos de urgência interinais são os voltados a regular questões do

processo em que aparecem incidentalmente. Voltam-se à imediata realização de uma

situação ligada ao processo, consubstanciando medidas provisionais despidas de autonomia

processual, vale dizer, forma de tutela de urgência que antecipa sem assegurar, conferindo

tutela durante o curso do processo, constituindo instrumento destinado à regulação

provisória de questões da lide ou paralelas ao mérito discutido.

Em geral, a doutrina não distingue entre tutela interinal urgente a

simplesmente sumária. (...)

O Tribunal de Justiça de São Paulo teve a oportunidade de julgar apelação

dirigida à reforma de indeferimento de petição inicial em que se discutia a outorga de

posse e guarda de menor a concubino em face de abandono das crianças pela mãe

(concubina).

Assim argumentou o relator: ‘O fato de inexistir ação de separação a ser

incoada (dita principal) imprime à ação ora ajuizada o caráter das tutelas de satisfatividade

autônoma, porquanto esta é o instrumento hábil a satisfazer o direito do apelante, sem,

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contudo, gerar a seu favor coisa julgada material, porque calcada em prova de mera

plausibilidade”.261

A tutela provisória pode ser concedida também por ocasião da sentença,

sendo a execução provisória autorizada262.

Teresa Arruda Alvim Wambier263 explica sobre a possibilidade de

concessão da tutela antecipada na sentença, extirpando eventuais dúvidas:

“Problema interessante que acabou surgindo com a reforma do Código de

Processo Civil foi o consistente em se saber qual o recurso cabível e em que efeitos deva

ser recebido, quando a tutela antecipatória é concedida na sentença.

É o que pode ocorrer, por exemplo, na hipótese de a parte pleitear,

simultaneamente, julgamento antecipado da lide, pela desnecessidade de que sejam

produzidas outras provas que não as documentais já acostadas aos autos, e a providência

antecipatória da tutela.

Desde logo afastamos a objeção, por ser integralmente descabida, no sentido

de que a antecipação de tutela não poderia ser concedida na sentença. Evidentissimamente,

se pode ser concedida liminarmente, razão de espécie alguma existe para que não possa ser

concedida na sentença decisão proferida em momento em que o juiz já tem mais do que

cognição superficial, mas agora cognição já plena e exauriente dos fatos da causa.

É a opinião de Edgard Antonio Lippmann Jr.: “Preambularmente registro

apenas a título de ilustração quanto a incensurabilidade da decisão monocrática que ao

prolatar a decisão definitiva, simultaneamente (no seu corpo) defere pedido de antecipação

261 Apelação Cível nº 231.614-1/6 – São Miguel Paulista – v.u. - rel.Des. Donaldo Armelin. 262 Observa a propósito Teresa Arruda Alvim Wambier que se a tutela antecipada pode ser concedida tanto com base no nº I, quanto com fulcro no nº II do art. 273, do Código de Processo Civil, ‘pode, a fortiori, ser concedida depois da contestação e, na verdade, a qualquer tempo, até na própria sentença, o que deve equivaler, no plano prático, a uma decisão judicial no sentido de que a apelação não seja recebida no efeito suspensivo, passando a sentença a produzir, desde logo, efeitos. Essa necessidade surge, por exemplo, no caso de a tutela antecipatória ser concedida com base no art. 273, II, após a lide, em que não deve haver audiência e o juiz deve, logo, sentenciar’ in ASPECTOS POLÊMICOS DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. Ed. RT, 1997 pág. 538. 263 Teresa Arruda Alvim Wambier, O princípio da fungibilidade sob a ótica da função instrumental do processo, p. 39 - 74.

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de tutela para o fim de tornar exeqüíveis, total ou parcialmente, os efeitos da ulterior

decisão de mérito que lhe seja favorável”.264

Acontece, todavia, que, de regra, a apelação tem efeito suspensivo,

diferentemente do agravo, que, de regra, não o tem. Então tem-se o paradoxo: concedida

liminarmente, é imediatamente exeqüível a providência; ao contrário, concedida por

sentença, só poderia ser executada depois de confirmada a sentença pelo resultado do

julgamento da apelação. Claro está que assim não pode ser.

“Com efeito, de nada valeria à parte requerente obter a antecipação da tutela

pretendida e, ao mesmo tempo, ver impossibilitada sua execução por força de efeito

suspensivo atribuído a eventual recurso de apelação interposto pela parte adversa”.

Paulo Afonso Brum Vaz265, citando Teori Zavascki,266 menciona solução no

sentido de que a antecipação de tutela teria feito nascer um novo inciso no art. 520,

atribuindo efeito meramente devolutivo à apelação interposta contra sentença que julga

procedente a ação e concede a tutela antecipatória, simultaneamente.

Outra solução, proposta por Paulo Afonso Brum Vaz, é a de que deve o

magistrado sempre conceder a antecipação de tutela em decisão separada da sentença,

ainda que o faça no mesmo momento.267

E esclarece os porquês de sua opinião: “Deve o julgador evitar concedê-la

no corpo da decisão definitiva não somente porque há implicações no campo dos recursos,

mas porque a antecipação dos efeitos da tutela e a sentença têm naturezas jurídicas

diversas. A primeira funda-se num juízo de probabilidade, que decorre da verossimilhança

das afirmações feitas pela parte requerente, enquanto a segunda assenta sobre um juízo de

264 Edgard Antonio Lippmann Jr. Aspectos do agravo de instrumento contra antecipação de tutela concedida em sentença definitiva. RePro 92/33. 265 Paulo Afonse Brum Vaz, Antecipação de tutela na sentença e adequação recursal. RePro 92/195-198. 266 Teori Zavascki, Antecipação de tutela, p. 79-82. 267 Athos Gusmão Carneiro, Da antecipação de tutela no processo civil, p. 66, também entende que as decisões devem ser proferidas separadamente, não apenas fisicamente, mas em momentos distintos. Diz que, sendo o caso de antecipar a tutela ao término da instrução do processo, há duas opções para o julgador: “a) se pretende proferir sentença por ocasião da audiência, fará lançar em ata primeiro a decisão de antecipação de tutela, e somente depois tomará os debates orais – art. 454; b) se pretende lavrar por escrito a sentença e entregá-la em cartório, proferirá a decisão interlocutória, e somente após ordenará a conclusão dos autos ou a dilação para oferecimento de memoriais (rectius, razões finais escritas) pelas partes”.

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certeza, típico da cognição exauriente. À provisoriedade do provimento antecipatório opõe-

se a definitividade do comando sentencial”.

Com a devida vênia, não estamos integralmente de acordo com sua opinião

e os argumentos é ele mesmo quem nos fornece. Como pode haver, num mesmo momento,

cognição sumária (= juízo de probabilidade) e cognição exauriente? Pergunta-se

mencionado autor, como que para justificar não poder o magistrado deferir a antecipação

de tutela na sentença. Recomenda que se profiram concomitantemente duas decisões.

Proferir o magistrado simultaneamente decisão interlocutória antecipando a tutela

(agravável) e sentença de mérito, julgando procedente a demanda (apelável), seria, por

assim dizer, cínico. Na verdade, uma solução criativa, mas um pouco “artificial”, para dar

voltas ao problema criado pelo legislador.

Rigorosamente, o problema cujo exame nos propusemos só existe em

decorrência da falta de cuidado do legislador, que permitiu subsistisse no sistema recursal

este paradoxo. Decisões proferidas com base em verossimilhança, de regra, são

imediatamente exeqüíveis. Sentenças, ao contrário, de regra, estão sujeitas a recurso com

efeito suspensivo.

Torna-se, pois, necessária a criatividade da doutrina para nos tirar do

impasse. E a boa vontade dos nossos Tribunais para entender o sentido inequívoco da lei,

que desta vez positivamente não se extrai da sua literalidade!

Propondo também que o juiz profira, embora concomitantemente, duas

decisões, a interlocutória e a sentença, é o texto de Luiz Guilherme Marinoni”.268 (...)269

268 Luiz Guilherme Marinoni, A antecipação da tutela, p. 134. 269 E a autora prossegue: Recentemente (Lei 10.352/2001) foi acrescentado um novo inciso ao art. 520. Nesta nova regra, diz-se que será recebida apenas no efeito devolutivo a apelação interposta de sentença que confirma a antecipação de tutela. Em nosso entender, este dispositivo deve incidir, por identidade de razões, nos casos em que a tutela é antecipada na própria sentença. Este entendimento, embora nos pareça, sem sombra de dúvidas, o mais correto, não conta com o apoio de toda a doutrina nem é o que prevalece em todos os nossos tribunais. Por isso é que, apesar de, em nosso entender, a lei ter resolvido o problema, ainda deve este tópico ser abordado sob a ótica da fungibilidade. Solução que nos parece razoável é a de que, embora possa o juiz conceder a antecipação de tutela na sentença, esta seja considerada, para efeito de recurso, decisão híbrida, contendo uma interlocutória e uma sentença propriamente dita. José Miguel Garcia Medina cita decisão que considerou cabível agravo contra sentença em que se defere antecipação de tutela. Em sua opinião, a solução mais correta para não impedir a imediata eficácia da providência concessiva de antecipação de tutela seria receber a apelação sem efeito suspensivo, em função de pedido formulado com base no art. 558. É que, para se definir qual o recurso cabível, deve-se verificar a natureza jurídica da decisão. A concessão de tutela antecipatória na sentença não lhe altera a natureza, pois se trata, a nosso

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Leva ao mesmo resultado a recomendação no sentido de que o juiz profira

duas decisões, uma interlocutória e uma sentença, embora concomitantemente.

De qualquer modo, o relevante é que aqui se identifique mais uma zona

cinzenta ou de penumbra, para que a parte não seja prejudicada pela falta de unanimidade

da doutrina e da jurisprudência quanto a qual seria a solução mais acertada.

Portanto, o que não pode jamais ocorrer é que a parte não possa executar

desde logo o provimento antecipatório de tutela.”270

ver, de mais uma questão enfrentada pelo referido pronunciamento judicial. Observe-se, ademais, que a concessão de tutela antecipatória na sentença serve para, no mais das vezes, possibilitar a execução imediata da própria sentença, afastando o efeito suspensivo do recurso de apelação que, eventualmente, venha a ser interposto. Nesse contexto, o pronunciamento do juiz que trata dos efeitos da sentença é parte integrante de tal decisão, e não decisão interlocutória autônoma. Observa citado autor na nota 38 de seu trabalho que a concessão de tutela antecipatória na sentença tem por finalidade, justamente, retirar da apelação seu efeito suspensivo, possibilitando a execução da sentença de imediato. Fernando Zeni também trata deste assunto, começando por firmar seu entendimento no sentido de ser perfeitamente possível conceder-se a tutela antecipada na própria sentença: “A princípio, o que se pretendeu com a inclusão deste instituto foi evitar-se o risco de frustração da garantia maior da efetividade da jurisdição. Mas, dado ao seu caráter provisório, na sentença final, reconhece-se a existência apenas teórica de um direito definitivamente destruído pela sua completa inocuidade prática, daí resultando ser possível seu deferimento no corpo da sentença, e, deferida no seu bojo, constitui-se apenas num capítulo da sentença, constituindo, como já frisado, num ato formalmente único. Desta forma, tenho como possível o deferimento no provimento final, à medida que, se deferida liminarmente ou após a contestação, sua execução ocorreria na forma do art. 588 do CPC e, em se tratando de sentença, nada se altera, pois a execução se fará da mesma maneira”. Citando acórdão do TJDF, em abono de sua posição, conclui Fernando Zeni no sentido de que o duplo efeito da apelação não pode abranger a parte da sentença em que se concedeu a antecipação de tutela, pois esta parte da decisão reclama execução imediata. A solução proposta por Teori Zavascki, anteriormente referida, embora pareça a mais sedutora, pode levar a resultados não desejados pelo sistema, no caso de o juiz ter antecipado alguns, mas não todos, dos efeitos da tutela e ter, simultaneamente, julgado inteiramente procedente a ação. A interlocutória, deve ser imediatamente executada, seria, em casos assim, menos abrangente que a sentença. A se optar pela solução sugerida por Teori Zavascki, deve-se limitar a ausência de efeito suspensivo à parte da sentença em que os efeitos da tutela foram antecipados. Em conclusão, parece-nos que a todos assiste, até certo ponto, razão, pois todas as soluções que levam à exeqüibilidade imediata do provimento antecipatório de tutela estão, de certo modo, corretas. Nossa opinião, já referida, é a de que a hipótese de o juiz antecipar o(s) efeito(s) da tutela na própria sentença está abrangida pelo art. 520, VIII. Portanto, o correto é realmente interpor-se apelação sem efeito suspensivo da decisão em que o juiz antecipa a tutela e resolve a lide, nos casos em que haja absoluta coincidência entre as dimensões das decisões, e, nos casos em que não há esta coincidência, a ausência de efeito suspensivo da apelação deve abranger o comando judicial na parte em que a tutela tenha sido antecipada. Cindir esta decisão para efeitos recursais parece-nos também uma boa solução. É a solução proposta por Edgard Antonio Lippmann Jr. em trabalho já referido: “Diante de tão substanciosas considerações inclino-me pela conclusão quanto ao cabimento simultâneo da apelação e agravo de instrumento em situações relevantes fundamentos em sentido contrário”. 270 Como se fez no acórdão equivocadíssimo do TJRJ: “Agravo de instrumento. Antecipação de tutela deferida no corpo da sentença final. Recurso direcionado contra decisão judicial que cinde os efeitos da apelação interposta. Conhecimento do agravo. Ementa: Ainda que o § 4.º, do art. 523, do CPC mencione que, das decisões proferidas após a sentença, o recurso cabível seria o agravo retido, é de admitir-se, em caráter excepcional, o de instrumento, sob pena de reativar-se a interposição de mandado de segurança. A antecipação de tutela, em princípio, e até por orientação prática-processual, deve ser apreciada, por decisão formal fundamentada, antes da sentença final. Se deferida no bojo da sentença, estará sujeita aos efeitos

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Logo, não há impedimento para que o juiz, não convencido incialmente da

presença dos pressupostos necessários para concessão da tutela antecipada, a indefira.

Posteriormente, após a instrução processual, há possibilidade dos

pressupostos estarem preenchidos, autorizando a concessão da tutela, até mesmo na

sentença.

Dessarte, a parte que se sentir prejudicada com a concessão da tutela na

sentença poderá interpor o recurso de apelação, pedindo atribuição de efeito suspensivo,

caso deseje impedir a execução da medida.

Neste ponto, acompanhamos o entendimento de Luiz Guilherme Marinoni,

Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero271 quando criticam a sistemática dos recursos na

apelação. Para os autores, a tutela provisória pode ser concedida na sentença e “é claro que

o racional, em um sistema que trabalha com a técnica antecipatória, seria que a sentença

tivesse eficácia imediata, o que implicaria ausência de efeito suspensivo da apelação”.

Portanto, em meu ponto de vista, perdeu-se uma grande oportunidade de

valorizar a decisão proferida pelo juiz de primeiro grau.

Convém indagar sobre a conveniência de manter a atual estrutura vigente do

duplo grau de jurisdição.

suspensivos da apelação interposta, em decorrência do princípio da unirrecorribilidade. Salvo disposição expressa (art. 498), não se admite contra um mesmo pronunciamento judicial mais de um recurso. Provimento do agravo” (TJRJ – 5.ª Câm. Cív. – AgIn 803/98 – j. 08.05.1998 – rel. Des. Marcus Faver), publ. na íntegra na RePro 95/287. Acertadíssimo o acórdão do TJSP, cuja ementa, em parte, transcrevemos: “Agravo de instrumento. Modificação de guarda de filho. Concessão da antecipação da tutela na sentença. Indeferimento anterior. Inocorrência de apreciação ex officio. Inteligência do § 4.º do art. 273 do CPC. Requisitos atendidos. Recurso conhecido e improvido. A despeito de vigorar em nosso direito processual o princípio da unirrecorribilidade, tal princípio não se aplica no caso de ser concedida a tutela antecipada na sentença, porque o deferimento da medida não será alcançado pelo efeito suspensivo da apelação, de modo que este recurso não tem a amplitude e eficácia necessária para absorver o agravo de instrumento, que, assim, se revela admissível” (TJSP – AI 99.4364/3 – rel. Ruiter Oliva – j. 25.05.1999). 271 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2, p.208. Contudo, prosseguem os autores: “O Código de Processo Civil, porém, perdeu a oportunidade de corrigir essa grave irracionalidade do processo civil brasileiro – a de admitir que decisões fundadas em cognição sumária tenham eficácia imediata e decisões fundadas em cognição exauriente não tenham – e manteve o efeito suspensivo da apelação (art.1012). Daí que, como esse grave defeito persiste em nossa legislação, a saída para outorgar tutela adequada aos direitos está em permitir a possibilidade de tutela provisória na sentença, toda vez que estiverem presentes os pressupostos para sua concessão por sua ocasião. Nada obsta igualmente que a tutela provisória seja prestada em sede recursal. Em suma: enquanto pendente decisão definitiva, estando presentes os pressupostos legais, é possível obter decisão mediante técnica antecipatória”.

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Em regra, o sistema recursal prevê o recebimento a apelação no duplo

efeito, sendo exceção o recebimento apenas no efeito devolutivo, que desde logo permite

dar eficácia imediata à decisão.

A tutela provisória também pode ser concedida em grau de recurso pelo

tribunal, conduzindo à imediata eficácia da sentença.

O requerimento é dirigido ao tribunal e será apreciado pelo relator se já

distribuído o recurso272.

Tratando-se de tutela provisória recursal para concessão de efeito

suspensivo ao Recurso Especial ou Extraordinário, o pleito deverá ser dirigido ao

Presidente ou Vice-Presidente do Tribunal273.

272 Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1o Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: I - homologa divisão ou demarcação de terras; II - condena a pagar alimentos; III - extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado; IV - julga procedente o pedido de instituição de arbitragem; V - confirma, concede ou revoga tutela provisória; VI - decreta a interdição. § 2o Nos casos do § 1o, o apelado poderá promover o pedido de cumprimento provisório depois de publicada a sentença. § 3o O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1o poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação. § 4o Nas hipóteses do § 1o, a eficácia da sentença poderá ser suspensa pelo relator se o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação. 273 Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão: I - a exposição do fato e do direito; II - a demonstração do cabimento do recurso interposto; III - as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão recorrida. § 1o Quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência com a certidão, cópia ou citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que houver sido publicado o acórdão divergente, ou ainda com a reprodução de julgado disponível na rede mundial de computadores, com indicação da respectiva fonte, devendo-se, em qualquer caso, mencionar as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. § 2o Quando o recurso estiver fundado em dissídio jurisprudencial, é vedado ao tribunal inadmiti-lo com base em fundamento genérico de que as circunstâncias fáticas são diferentes, sem demonstrar a existência da distinção. § 3o O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave.

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5.9. Iniciativa. Legitimidade. Possibilidade de concessão de

liminares de ofício. Ativismo Judicial.

Deve ser aplicado o princípio da disponibilidade, isto é, cabe à parte

delimitar o litígio indicando o que pretende em juízo.

Ademais, a parte que alega ter direito a tutela está legitimada a pleitear a

antecipação dos efeitos da prestação jurisdicional.

No Código Buzaid, era possível a concessão de tutela cautelar de ofício.

Contudo, devemos entender a tutela como uma tutela ao direito da parte, e

seu pedido submete-se à regra geral no que tange à exigência de requerimento, salvo em

hipóteses excepcionalíssimas.

Nesta ordem de ideias, não pode o magistrado conceder tutela de ofício.

Concordo com o pensamento de Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz

Arenhart e Daniel Mitidiero274, pois uma forma de conceder ao juiz a possibilidade de ter

um papel mais participativo e atuante no emprego da técnica antecipatória estaria na

viabilização da consulta à parte que poderá se beneficiar da tutela provisória, a fim de que

se manifeste se pretende ou não a sua concessão.

§ 4o Quando, por ocasião do processamento do incidente de resolução de demandas repetitivas, o presidente do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça receber requerimento de suspensão de processos em que se discuta questão federal constitucional ou infraconstitucional, poderá, considerando razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, estender a suspensão a todo o território nacional, até ulterior decisão do recurso extraordinário ou do recurso especial a ser interposto. § 5o O pedido de concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário ou a recurso especial poderá ser formulado por requerimento dirigido: I - ao tribunal superior respectivo, no período compreendido entre a interposição do recurso e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-lo; II - ao relator, se já distribuído o recurso; III - ao presidente ou vice-presidente do tribunal local, no caso de o recurso ter sido sobrestado, nos termos do art. 1.037. 274 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2, p.205. Esclarecem os autores: “Em outras palavras, colaborando com a parte (art.6º), o juiz poderá consultá-la a respeito de seu interesse na concessão de tutela sumária. Com isso, equilibra-se a iniciativa judicial, inspirada na promoção da igualdade entre os litigantes e na adequação da tutela jurisdicional, e o respeito à liberdade da parte, que pode não ter interesse em fruir de decisão provisória ao longo do procedimento, notadamente em face do regime de responsabilidade objetiva a ela inerente (art.302).”

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O resultado pode beneficiar tanto o autor quanto o réu, dependendo de quem

venha lograr êxito, amparado que esteja no direito material.275

Fredie Didier Jr.276 também demonstrou preocupação com a possibilidade

de antecipação de tutela pelo réu, tratando-se de situação incontroversa e ações dúplices,

comentando o dispositivo anterior:

“Os autores nacionais que se debruçaram sobre as leis reformadoras do

Código de Processo Civil, ao comentarem sobre a legitimidade para requerer a

antecipação dos efeitos da tutela prevista no art. 273, em uníssono admitem o

requerimento formulado pelo réu em ações dúplices, pela circunstância óbvia de, nestas,

exercer o réu pretensão contra o autor.

Com efeito, o cabeço do art. 273 dispõe que o juiz determinará a

antecipação dos efeitos da tutela a requerimento da parte, não delimitando. A

possibilidade de o réu pedir tutela antecipatória é pacífica, como pode ser visto nas lições

dos três principais doutrinadores nacionais que escreveram sobre o tema.

Luiz Guilherme Marinoni:

“Também nas ações dúplices é possível ao réu requerer a tutela

antecipatória. O réu, nas ações dúplices, pode formular pedido na própria contestação,

sem necessidade de reconvenção. A ação revisional de aluguel, por exemplo, é uma ação

dúplice, já que o réu pode, na contestação, pedir que a sentença estabeleça periodicidade

de reajustamento do aluguel diversa daquela prevista no contrato revisando ou que adote

outro indexador para o reajustamento do aluguel.” (A Antecipação da Tutela. 5ª edição.

São Paulo: Malheiros, 1999, p. 127)

Teori Zavascki:

“Considera-se parte, para esse efeito, quem está postulando a tutela

definitiva cujos efeitos se busca antecipar, ou seja, o auto, o reconvinte, o opoente, o

275 Flavio Luiz Yarshell, Tutela jurisdicional, p.28. 276 Fredie Didier Jr., Lide de Acertamento - Ação Ordinária Vinculada a Ação de Sustação de Protesto - Natureza Dúplice - Reconhecimento Parcial da Dívida pelo Autor - Antecipação da Tutela em Benefício do Réu, pela Técnica do Julgamento Antecipado Parcial - Execução Imediata da Parcela Incontroversa, Juris Síntese nº 36 - JUL/AGO de 2002.

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substituto processual. Nos casos de ação dúplices, em que a tutela definitiva poderá vir a

ser conferida ao réu, mesmo sem reconvenção, nada impede que, presentes os requisitos

exigidos, venha ele, réu, pedir medida antecipatória em seu favor.” (Antecipação da

Tutela. 2ª edição. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 103)

Antônio Cláudio da Costa Machado:

“Tem importância, na medida em que coloca em evidência, o fenômeno da

duplicidade que, como sabemos, é definido pela possibilidade do réu deduzir pretensão

material contra o autor, por meio de contestação, independentemente de reconvenção. (...)

... a instituição da duplicidade significa o reconhecimento por parte da lei

de que, apesar de figurar no pólo passivo da relação processual, a parte tem poder de

legitimado ativo, vale dizer, autorização para pedir para si uma providência jurisdicional

e não apenas poder de legitimado passivo, que lhe garante somente a prerrogativa de

resistir à pretensão do autor. (...)

A duplicidade da ação é, portanto, o único caso em que se admite que o

réu, sem se transformar em ocupante do pólo ativo de uma relação processual nova e

secundária..., postule a antecipação da tutela.” (Tutela Antecipada. São Paulo: Oliveira

Mendes, 1998, pp. 520/521)

Inquestionável, portanto, a possibilidade de o réu pedir antecipação dos

efeitos da tutela nas hipóteses de demandas dúplices.”

A tutela também pode ser pleiteada pelo terceiro interveniente tanto

satisfativa quanto cautelar. O denunciante à lide pode pedir a tutela. O réu poderá fazê-lo

quando reconvinte e denunciante, em caso de pedido contraposto ou quando for dúplice a

ação.

No caso da tutela provisória de urgência, pleiteada em caráter antecedente, a

legitimidade fica restrita ao autor.

Considerando que os embargos à execução representam uma verdadeira

ação do executado contra o exequente, poderá este pleitear a continuidade do processo

executivo na hipótese de demanda meramente protelatória.

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O substituto processual também pode pleitear a tutela, eis que está

legitimado a defender direito alheio.

Na condição de parte277, o Ministério Público pode pleitear a tutela

provisória e quando for assistente dos incapazes. Como fiscal da lei opina apoiando ou

repelindo a pretensão.

Importante salientar que no Código de Processo Civil de 1973 havia

previsão expressa no sentido de exigir o requerimento da parte tanto nas cautelares quanto

nas tutelas antecipadas.

Era a previsão contida nos artigos 797 e 273 “caput” do CPC/1973278.

A "Constituição-Cidadã", ao mesmo tempo que outorga de forma ampla

direitos sociais e individuais, detalhando os direitos e interesses difusos e coletivos,

transporta ao Poder Judiciário, a missão de corrigir lesões ou das ameaças de lesão a direito

ou interesse, na busca de recomposição.

O processo cautelar vinha sendo utilizado como medidas antecipatórias

satisfativas.

Todavia, cumpria de forma imprópria e precária a função para a qual não

fora concebido.

Comentando essa opção dos operadores do direito José Carlos Barbosa

Moreira279 aduziu que diante do monopólio estatal da jurisdição e da interdição da justiça

privada, onde se impõe aos jurisdicionados a obrigação de submeterem-se ao Estado-juiz,

visando à formulação da norma jurídica concreta (a inexistência de um instituto processual

277 Art. 177. O Ministério Público exercerá o direito de ação em conformidade com suas atribuições constitucionais. Art. 178. O Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam: I - interesse público ou social; II - interesse de incapaz; III - litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana. 278 Art. 797. Só em casos excepcionais, expressamente autorizados por lei, determinará o juiz medidas cautelares sem a audiência das partes. Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: 279 José Carlos Barbosa Moreira, O Novo Processo Civil Brasileiro, p.3.

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adequado não poderia consistir em um castigo, exatamente por estarem os litigantes

submetidos à jurisdição oficial).

Portanto, o processo cautelar era a única saída viável.

Poderá o juiz pode fixar multas, mesmo no que tange às obrigações de

pagar, para cumprimento da tutela antecipada.

Como diz José Roberto dos Santos Bedaque: "Nada obsta, todavia, a adoção

de outras técnicas, principalmente se verificada a insuficiência da execução por

expropriação. A fixação de multa pecuniária pelo descumprimento do provimento

antecipatório constitui providência possível, adequada e útil para conferir maior

efetividade à antecipação"280.

Nesta ordem de ideias, interessante frisar que dependem de execução

apenas as sentenças condenatórias.

As demais são cumpridas por outros mecanismos.

Filio-me ao entendimento de que é possível uma certa flexibilização da

vedação às liminares concedidas de ofício, mormente considerando a matéria sub judice.

Exemplificando, certa vez quando então fui designada para auxiliar as Varas

de Família e Sucessões, deparei-me com um pedido de alimentos de balcão.

A genitora estava acompanhada dos menores e notei que a menina com três

anos de idade apresentava dificuldade para caminhar.

A Funcionária que estava preenchendo o formulário informou que a mãe

estava chorando de forma compulsiva e solicitei sua presença imediata no gabinete.

Conversando com a senhora, pude perceber a gravidade da situação e a

necessidade de pronta intervenção do juízo.

280 José Roberdo dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada. Tutelas sumárias e de urgência, p.328.

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A menina havia sido molestada sexualmente pelo atual companheiro da mãe

que havia acabado de fugir de casa apenas com a roupa do corpo acompanhada das

crianças.

De forma imediata e sem oitiva da parte contrária ou mesmo do Ministério

Público, acionei posteriormente a Defensoria Pública e concedi de ofício não somente os

alimentos em relação ao pai da criança como também determinei o imediato afastamento

do companheiro do lar conjugal, aplicando a então Lei de Violência Doméstica.

Como se pode perceber, no caso telado, não era competência do Juízo da

Família analisar e aplicar medidas previstas na Lei de Violência Doméstica.

A genitora também não formulou pedido formal de afastamento do

companheiro do lar conjugal.

Todavia aguardar tal providência implicaria na fulminação não somente do

direito como também a consumação do risco real de perigo à vida e à saúde das partes.

No momento em que a tutela de urgência foi concedida não havia

oportunidade da oitiva da parte contrária, nem do Ministério Público que depois

manifestou parecer favorável, nem mesmo tempo suficiente para aguardar a presença de

defensor constituído para postular em nome daquela mãe em desespero.

As partes foram encaminhadas para atendimento e o companheiro foi

afastado, eliminando-se assim o perigo iminente de uma tragédia.

Outro caso prático foi o desvio de bens praticados pela neta da interditanda.

A neta, autora da ação de interdição contra a avó materna, afirmou que seu

avô estaria negligenciando cuidados com a esposa que estava doente e já com idade

avançada.

Assim, foi nomeada curadora provisória.

No curso do processo constatou-se que a neta efetuou a transferência de

todo numerário depositado para sua conta pessoal, deixando de pagar os cuidadores e de

comprar remédios para a avó.

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Da mesma forma e independentemente de requerimento, foi determinado o

bloqueio de ativos financeiros da neta inaudita altera pars.

O numerário felizmente foi recuperado e a interditanda pode continuar

recebendo o seu tratamento médico.

Portanto, somente em casos excepcionais é possível a concessão de medidas

liminares de ofício.

No artigo 299 “caput” do Novo Código de Processo Civil281 também há

previsão da iniciativa da parte.

Nesta linha de pensamento, permanece a ideia de que em regra, a tutela de

urgência, seja ela cautelar ou antecipatória, deve ser requerida pela parte, não se perdendo

de vista que há previsão de responsabilidade civil processual objetiva na dicção do artigo

302 do Novo Código de Processo Civil282.

Não se perca de vista que se trata de exigência decorrente da regra da

congruência a proibição de tutelas provisórias ex officio.

Contudo, existem hipóteses em que o pedido se encontra praticamente

implícito, como na fixação de alimentos provisórios na ação de alimentos.283

Ora, para evitar o perecimento do direito, tem o magistrado o dever de

conceder ex officio a tutela provisória.284

Reitero, assim, que no novo Código de Processo Civil subsiste a

possibilidade de concessão de medidas cautelares de ofício, já que não foi eliminado o

atual “poder geral de cautela” previsto no CPC/1973.

281 Art. 299. A tutela provisória será requerida ao juízo da causa e, quando antecedente, ao juízo competente para conhecer do pedido principal. 282 Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se: 283 Art. 4º As despachar o pedido, o juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita. 284 Daniel Francisco Mitidiero, Comentários ao Código de Processo, p.49-50. “envolve questões da própria causa, plantadas evidentemente pela parte”.

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Outrossim, a efetivação da tutela provisória ocorrerá sob a responsabilidade

objetiva do beneficiário da tutela.

Analisando o caso concreto, o objetivo deve ser o esclarecimento do

julgador sobre os fatos alegados pelas partes, eis que vigora o princípio do livre

convencimento motivado.

Ora, o princípio da persuasão racional autoriza a utilização das chamadas

regras ou máximas de experiência na apreciação da prova, sendo oportuno trazermos a

lume os ensinamentos de Stein285:

"Son definiciones o juicios hipotéticos de contenido general, desligados de

los hechos concretos que se juzgam en el proceso, procedentes de la

experiencia, pero independientes de los casos particulares de cuya

observación se han inducido y que, por encima de esos caso, pretendem

tener validez para otros nuevos."

Ainda mesmo em caso de inércia da parte, poderá o magistrado exercer os

seus poderes instrutórios, sendo necessário observar o que dispõem os artigos 130 e 131,

ambos do Código de Processo Civil de 1973286, bem como artigos 370, 371 e 372 do Novo

Código de Processo Civil287.

Há quem sustente ser um verdadeiro prêmio à negligência da parte que

deixa de produzir a prova, e talvez até uma afronta ao espírito da lei.

285 Friedrich Stein, El conocimiento privado del juez, pág. 22. 286 Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento. 287 Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. Art. 372. O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório.

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Contudo, entendo que o sistema de preclusão é perfeitamente compatível

com a possibilidade de produção de provas e deferimento de liminares mesmo “ex

officio”288.

Dessarte, cabe ao juiz, sem perder a imparcialidade necessária e

imprescindível, buscar a verdade real, usando os seus poderes instrutórios sem, no entanto,

solapar os requisitos insculpidos no artigo 333 do Código de Processo Civil acima

mencionado, onde está o Princípio Dispositivo.

Nelson Nery289 aborda que “o poder instrutório do juiz, principalmente de

determinar “ex officio” a realização de provas que entender pertinente, não configura como

exceção ao princípio dispositivo”.

José Roberto dos Santos Bedaque290, citando o Min. Francisco Campos,

aponta que o juiz pode interferir na produção de provas:

“A direção do processo deve caber ao juiz; a este não compete apenas o

papel de zelar pela observância formal das regras processuais por parte dos

litigantes, mas também o de intervir no processo de maneira que este atinja,

pelos meios adequados, o objetivo de investigação dos fatos e descoberta da

verdade [...]. O juiz é o Estado administrando a justiça; não é um registro

passivo e mecânico dos fatos, em relação aos quais não o anima nenhum

interesse de maneira vital. Não lhe pode ser indiferente o interesse da 288 Arruda Alvim em seu artigo Questões Controvertidas sobre os Poderes Instrutórios do Juiz, a Distribuição do Ônus Probatório e a Preclusão Pro Judicato em matéria de Prova in ATIVISMO JUDICIAL E GARANTISMO PROCESSUAL. Coordenadores Fredie Didier Jr., José Renato Nalini, págs.100, 102, 103, 104/105, 106, 109. Escrito especialmente para integrar a coletânea de textos que tratará da temática “Ativismo e garantismo no processo civil comparado”, organizada a partir do seminário com o mesmo nome realizado no final de setembro de 2012 na Escola Paulista da Magistratura, em que se debateu o tema com o processualista espanhol Juan Montero Aroca, aborda a p.106 que: “Em idêntico sentido, a jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de Justiça tem decidido que “O juiz pode, a qualquer tempo, sob prudente discrição, de ofício ou a requerimento da parte, determinar a realização de prova pericial, ou reconsiderar anterior decisão a havia dispensado”. STJ REsp 5268/SP, 4ª T, Rel. Min. Athos Carneiro, DJU 11.11.1991, p.16.149. Ainda: “Não há preclusão para o juiz em matéria probatória, razão pela qual não viola o art.473 do CPC o julgado do mesmo Tribunal que, ao julgar apelação, conhece e dá provimento ao agravo retido, para anular a sentença e determinar a produção de prova testemunhal requerida pelo autor desde a inicial, ainda que, em momento anterior, tenha negado agravo de instrumento sobre o assunto (...). STJ REsp 418.971/MG, 4ª T., Rel. Min. Fernando Gonçalves, j.11/10/2005, DJ 07/11/2005. No mesmo sentido: “A jurisprudência desta Corte é pacífica ao reconhecer que não há preclusão em matéria de provas, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público da efetividade da Justiça. Precedentes. (...) (STJ, EDcl no REsp 1189458/RJ, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª T., j.26/08/2010, DJe 08/09/2010. 289 Nelson Nery Jr. e Rosa Maria Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, p.606. 290 José Roberto dos Santos Bedaque, Poderes Instrutórios do Juiz, p. 10.

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justiça. Este é o interesse da comunidade, do povo, do Estado, e é no juiz

que um tal interesse se representa e personifica”.

Portanto, a matéria também deve ser abordada sob a ótica do princípio da

igualdade tanto formal, é vedado ao ordenamento jurídico estabelecer diferenças entre as

partes; bem como uma igualdade real e proporcional, que consiste em tratar desigualmente

os que são desiguais, como dizia Rui Barbosa291:

“Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria

desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos

conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a

cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se

todos se equivalessem”.

Portanto, para evitar essa situação, ao magistrado é lícito determinar provas

com fundamento em seus poderes instrutórios, expressão do princípio da igualdade real

entre as partes, servindo o processo com verdadeiro instrumento para fazer valer o

princípio da isonomia.

Não se perca de vista que, segundo o já citado José Roberto Bedaque292, “o

processo não é um jogo, em que o mais capaz sai vencedor, mas um instrumento de justiça

com o qual se pretende encontrar o verdadeiro titular de um direito”.

E o mesmo autor prossegue293, devendo o magistrado equilibrar a balança,

determinando a produção de provas necessárias, inclusive para que o litigante menos

favorecido tenha iguais oportunidades:

“(...) a ausência de iniciativa probatória pelo juiz corresponde a alguém

assistir passivamente a um duelo entre o lobo e o cordeiro. Evidentemente,

não estará atendido o princípio da igualdade substancial que, segundo a

moderna ciência processual, deve prevalecer sobre o da mera igualdade

formal. E, em razão dessa passividade do julgador, provavelmente se

291 Rui Barbosa, Oração aos Moços, p.25. 292 Op.cit. página 100. 293 Op.cit. página 103.

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chegará a um resultado diverso daquele desejado pelo direito material. Ou

seja, o objetivo do processo não está alcançado”.

O autor citado, José Roberto dos Santos Bedaque, mencionando

ensinamentos de Teresa Arruda Alvim Wambier que bem define a situação de

desigualdade que deve ser evitada:

“O juiz nesse contexto, seria parcial se assistisse inerte, como um espectador

a um duelo, ao massacre de uma das partes, ou seja, se deixasse de intervir

para tornar iguais partes que são desiguais. A interferência do juiz na fase

probatória, vista sob este ângulo não o torna parcial. Ao contrário, pois tem

a função de impedir que uma das partes venha a vencer o processo não

porque tenha o direito, que assegurava ter, mas porque é economicamente

mais favorecida que a outra. A circunstância de uma das partes ser

hipossuficiente pode levar a que não consiga demonstrar e provar o direito

que efetivamente tem. E o processo foi concebido para declarar, lato sensu,

o direito que uma das partes tenha, e não para retirar direitos de quem os

tem, ou dá-los a quem não tem”.294

Impende ressaltar que o julgador não pode manter postura de absoluta

neutralidade, apenas assistindo a lide posta em juízo e a batalha entre os contendores, mas

sim, deve ser imparcial, isto é, atuar sem interesses pessoais.

Ressalto que imparcialidade não significa que o magistrado ficará inerte,

que apenas observando a lide posta a sua análise, permitindo que o processo funcione

como um jogo em que mais astuto sagre-se vencedor e não o que o direito realmente

assiste.

No moderno direito processual civil, deve prevalecer a figura de um juiz

mais ativo, que saia da sua cômoda situação de ficar apenas na expectativa de produção de

provas e passe a adotar uma postura mais atuante.

De acordo com Luis Roberto Barroso, “a ideia de ativismo judicial está

associada a uma participação mais ampla e intensa do Judiciário na concretização dos

294 José Roberto dos Santos Bedaque, p. 97.

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valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço de atuação do outros dois

Poderes”295.

De acordo com o moderno Direito Processual Civil, o interesse do Estado-

juiz passa de mero espectador passivo do exercício dos ônus e prerrogativas das partes no

processo para assumir uma postura mais ativa, objetivando a realização de um bem maior,

qual seja, a aproximação da certeza a respeito dos fatos, viando aplicação da lei ao caso

concreto e a pacificação social.

O ativismo judicial é reflexo da publicização do processo, havendo uma

cobrança maior da sociedade, devendo o juiz se preocupar em decidir de forma justa.

Contudo, o exercício dos poderes instrutórios não pode implicar em

condutas arbitrárias ou teratológicas.

Daí a necessidade da estrita observância do disposto no artigo 93, inciso IX

da Constituição Federal296.

Mais uma vez convém ressaltar, existem limites aos poderes instrutórios

para concessão de liminares pelo magistrado quais sejam: a) a atividade instrutória e de

concessão de liminares deve ficar restrita a angariar elementos necessários a atender ou

rejeitar o pedido das partes; b) motivação, esclarecendo os motivos que levaram o

magistrado a determinar a realização de cada prova; c) garantia do contraditório e da ampla

defesa, valendo destacar a necessidade da ciência, a participação dos interessados e a

reação; d) vedação a produção de provas por meios ilícitos; d) uma vez constatada a revelia

a presente a verossimilhança do direito do autor, evitar o prosseguimento da atividade

probatória.

5.10. Cabimento

295 Luís Roberto Barroso, Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Disponível em: http://www.oab.org.br/editora/revista/users/revista/1235066670174218181901.pdf. Acesso em: 25/09/2013. 296 “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios: IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;”

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A tutela provisória de acordo com o artigo 318 do Novo Código de Processo

Civil297 é cabível no procedimento comum. É cabível nos procedimentos especiais e nos

Juizados.

Se o procedimento especial não veicular previsão própria, inexiste vedação

legal à dedução do pedido de tutela provisória de urgência, seja ela satisfativa ou cautelar

ou de evidência, uma vez preenchidos seus requisitos, bastando lembrar da tutela

provisória nas ações locatícias298.

A tutela provisória poderá ser pleiteada também em sede de jurisdição

voluntária quando ocorre a nomeação de curador provisório para o interditando, no

procedimento de interdição ou de remoção de curador.

Também podemos cogitar o requerimento de tutela provisória no

ajuizamento de ação versando sobre a possibilidade de insolvência do proprietário,

297 Art. 318. Aplica-se a todas as causas o procedimento comum, salvo disposição em contrário deste Código ou de lei. Parágrafo único. O procedimento comum aplica-se subsidiariamente aos demais procedimentos especiais e ao processo de execução. 298 Art. 59. Com as modificações constantes deste capítulo, as ações de despejo terão o rito ordinário. § 1º Conceder - se - á liminar para desocupação em quinze dias, independentemente da audiência da parte contrária e desde que prestada a caução no valor equivalente a três meses de aluguel, nas ações que tiverem por fundamento exclusivo: I - o descumprimento do mútuo acordo (art. 9º, inciso I), celebrado por escrito e assinado pelas partes e por duas testemunhas, no qual tenha sido ajustado o prazo mínimo de seis meses para desocupação, contado da assinatura do instrumento; II - o disposto no inciso II do art. 47, havendo prova escrita da rescisão do contrato de trabalho ou sendo ela demonstrada em audiência prévia; III - o término do prazo da locação para temporada, tendo sido proposta a ação de despejo em até trinta dias após o vencimento do contrato; IV - a morte do locatário sem deixar sucessor legítimo na locação, de acordo com o referido no inciso I do art. 11, permanecendo no imóvel pessoas não autorizadas por lei; V - a permanência do sublocatário no imóvel, extinta a locação, celebrada com o locatário. VI – o disposto no inciso IV do art. 9o, havendo a necessidade de se produzir reparações urgentes no imóvel, determinadas pelo poder público, que não possam ser normalmente executadas com a permanência do locatário, ou, podendo, ele se recuse a consenti-las; (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009) VII – o término do prazo notificatório previsto no parágrafo único do art. 40, sem apresentação de nova garantia apta a manter a segurança inaugural do contrato; (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009) VIII – o término do prazo da locação não residencial, tendo sido proposta a ação em até 30 (trinta) dias do termo ou do cumprimento de notificação comunicando o intento de retomada; (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009) IX – a falta de pagamento de aluguel e acessórios da locação no vencimento, estando o contrato desprovido de qualquer das garantias previstas no art. 37, por não ter sido contratada ou em caso de extinção ou pedido de exoneração dela, independentemente de motivo. (Incluído pela Lei nº 12.112, de 2009).

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devendo constar na matrícula do imóvel299 conforme previsão introduzida pela Lei nº

13.097/2015, cabendo sua averbação, atendendo-se o princípio da publicidade.

Caberá tutela provisória também no processo coletivo.

5.11. Cautelares nominadas e inominadas

Na sistemática anterior, o enfoque era na tutela cautelar, com a previsão de

medidas que podemos denominar típicas e atípicas.

Ao magistrado era conferido o poder geral de cautela, permitindo a adoção

de providências não necessariamente nominadas, além daquelas específicas

regulamentadas pela lei.

Algumas medidas são tipificadas tais como arresto, sequestro, arrolamento

de bens, registro de protesto contra alienação de bens300.

Porém o magistrado não fica adstrito apenas às medidas elencadas.

Poderá ele, desde que configurados os requisitos do periculum in mora e

fumus boni iuris adotar providências outras.

Para Ugo Rocco os órgãos judicantes desempenham a mesma função de

natureza cautelar, ou seja, a atividade destinada a evitar um perigo proveniente de um

299 Seção II Dos Registros na Matrícula do Imóvel

Art. 54. Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações: (Vigência)

I - registro de citação de ações reais ou pessoais reipersecutórias; II - averbação, por solicitação do interessado, de constrição judicial, do ajuizamento de ação de

execução ou de fase de cumprimento de sentença, procedendo-se nos termos previstos do art. 615-A da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil;

III - averbação de restrição administrativa ou convencional ao gozo de direitos registrados, de indisponibilidade ou de outros ônus quando previstos em lei; e

IV - averbação, mediante decisão judicial, da existência de outro tipo de ação cujos resultados ou responsabilidade patrimonial possam reduzir seu proprietário à insolvência, nos termos do inciso II do art. 593 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil. 300 Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.

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evento possível ou provável, que possa suprimir ou restringir os interesses tutelados do

direito301.

Na verdade, em mais um louvável avanço, o Novo Código de Processo Civil

permite a desvinculação de rigorismos ou condicionamentos para adoção de medidas

cautelares inominadas.

Assim, existe liberdade para utilização das providências necessárias para

solução do conflito.

5.12. Discricionariedade.

Conforme já exposto, o magistrado não tem plena liberdade para conceder

de ofício as tutelas provisórias.

No exercício do poder geral de cautela, as medidas adotadas poderão

assumir conteúdo variado, de acordo com a análise da situação de fato e direito

apresentadas, devendo ser aferida a adequação e capacidade para eliminação do risco

revelado.

O magistrado não está adstrito ao pedido da parte, vigorando o princípio do

narra mihi factum dabo tibi jus, tendo discricionariedade para adotar uma ou outra

solução, fazendo alterações necessárias.

Logo, podemos verificar o poder discricionário que não se confunde com

arbitrariedade, no que tange à apreciação da probabilidade do direito e a finalidade de sua

proteção, bem como a oportunidade de eliminação do perigo do evento danoso, e no que

tange à escolha e determinação da providência adequadas de acordo com o fato concreto.

O magistrado, contudo, não delibera de acordo com juízo de conveniência e

oportunidade, não podendo deixar de praticar o ato, tendo apenas liberdade para interpretar

a lei e aplicar de acordo com o seu conteúdo prático.

Exemplificando, na prática são mais frequentes as seguintes medidas

inominadas lembradas por Humberto Theodoro Junior302: sustação de protesto cambiário,

301 Ugo Rocco, Tratado de Derecho Procesal Civil, p.409.

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suspensão de deliberação societária, proibição de dispor de bens, depósito quando a parte

litigante quiser se desonerar do risco de continuar com a guarda do objeto, proibição de

usar nome ou marca comercial que se confunda com outro, admissão do exercício

provisório de servidão de passagem, suspensão dos efeitos de eleição realizada por

sociedade corporativa, autorização para colheita de lavoura, suspensão do mandato social,

condicionamento de certos atos de administração de bens litigiosos à prévia autorização

judicial, suspensão de atos de disposição do interditando.

No que concerne a ação cautelar inominada de sustação de protesto, apesar

de ser, com frequência, intentada como cautelar, mais se assemelha a uma tutela

antecipada, ainda que o objeto principal seja a nulidade do título executivo, pois

naturalmente um dos efeitos da nulidade do título ao final será justamente a retirada do

nome da parte do cadastro de proteção de crédito.

As dúvidas geradas entre tutela antecipada e tutela cautelar sempre

ganharam corpo pela própria indefinição, inclusive na doutrina, acerca das diferenças, se é

que elas existem, entre os requisitos para concessão de uma ou outra, daí porque, em muito

boa hora, o Novo Código de Processo Civil adotou a unificação dos procedimentos, já que

todas pertencem ao gênero tutelas de urgência.

Na jurisprudência tem sido admitida a discricionariedade no exercício do

poder geral de cautela, conectando essa atividade à de aferição dos requisitos legais

necessários, tendo decidido o STJ que “(..)o poder cautelar do juiz, conquanto não

arbitrário, encerra significativo grau de discricionariedade, que se materializa na

verificação do atendimento aos requisitos do "fumus boni iuris" e do "periculum in

mora"..".303

Resta ao magistrado a discricionariedade de antecipar a tutela pretendida

apenas e tão somente com base no juízo da evidência, plausibilidade ou robustez do direito

alegado.

302 Humberto Theodoro Junior, Curso de Direito Processual Civil, pp. 628/629. 303 RMS 4.035/DF, rel. Ministro Demócrito Reinaldo, Primeira Turma, julgado em 19/09/1994, DJ 10/10/1994, p. 27104

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Lívio Goellner Goron, em artigo intitulado “Repensando as Tutelas de

Urgência e as Fronteiras entre Medidas Cautelares e Antecipatórias”304 aborda a

perspectiva dualista entre tutela cautelar e antecipatória:

“2 Tutela cautelar e tutela antecipatória: perspectiva dualista

A doutrina majoritária no Brasil sustenta que os provimentos cautelares e

antecipatórios correspondem a funções jurisdicionais diversas, o que tornaria legítima a

diferenciação de seus regimes jurídicos. Tal posição contrasta com a clássica formulação

de Calamandrei a respeito dos provvedimento cautelari, ainda seguida por contingente

expressivo da doutrina italiana. O que talvez escape à percepção geral é o caráter recente

desse ponto de vista.

Nos primeiros anos do Código de 1973, ainda sensibilizada pelo prestígio

de Calamandrei, a doutrina brasileira não parecia fazer maior caso da separação entre

provimentos conservativos e antecipatórios. Diante do poder geral de cautela instituído

pelo Código concebia-se ampla liberdade de construção de medidas de urgência, inclusive

de provisórias satisfativas. Mesmo a preocupação com o propalado “inchaço” do processo

cautelar – verbalizada, dentre outros, por José Carlos Barbosa Moreira – devia-se menos a

uma incompatibilidade de princípios com a função antecipatória do que ao desconforto da

doutrina com a inclinação das “cautelares satisfativas” a assumirem uma autonomia que

seria incompatível com a sua natureza instrumental. A afirmação de que o processo

cautelar não foi construído para prestar tutela satisfativa, hoje tomada como senso comum,

apresenta, na realidade, um caráter curiosamente retrospectivo, tendo em vista que a

estrutura da tutela cautelar no Código Buzaid não excluía essa função de forma tão

peremptória. Aliás, a doutrina daqueles primeiros tempos não ignorava o caráter

heterogêneo do Livro III do Código, baseando-se nessa constatação para advertir que a

“essência” da tutela cautelar não residia apenas nas medidas conservativas. Para dizer a

verdade, havia – como ainda há – numerosas medidas satisfativascompartilhando de

espaço no recinto do “processo cautelar”.

Foi o ciclo de reformas dos anos 1990 que forjou no artigo 273 do Código

um instituto até então desconhecido como categoria ampla e geral, levando à reavaliação 304 Lívio Goellner Goron, Disponível em http://www.temasatuaisprocessocivil.com.br/edicoes-anteriores/54-v2-n-1-janeiro-de-2012/160-repensando-as-tutelas-de-urgencia-e-as-fronteiras-entre-medidas-cautelares-e-antecipatorias acesso em 27/09/2015.

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da dogmática tradicional e suscitando o problema da autonomia conceitual da tutela

antecipatória. No processo brasileiro o tema da dualidade das medidas provisórias de

urgência emergiu, substancialmente, dessa intervenção legislativa. Ao encaixar a tutela

antecipatória no Livro I do CPC (artigo 273 e artigo 461, parágrafo 3º) o próprio legislador

sugeriu a exclusão de sua natureza cautelar, dando corpo à doutrina que considerava

superado o alvitre de Calamandrei segundo a qual antecipação e conservaçãosão funções

de um mesmo gênero de tutela provisória. Num primeiro momento, é bom reconhecer, a

autonomia conceitual da tutela antecipatória também representou uma garantia de

imunidade do sistema processual contra a denegação, pelos juízes, das medidas

provisionais-satisfativas de urgência, que era praticada antes da reforma sob o argumento

de que tal ordem de providências seria incompatível com a tutela cautelar.

Nesse cenário a doutrina prevalecente passou a segregar as medidas

cautelares e antecipatórias, isolando as funções de garantia e de antecipação e negando

caráter instrumental à tutela antecipatória. Essa ênfase resultou numa distinção ontológica

– não apenas de grau – entre as duas formas, chancelando a conclusão de que seus

requisitos são substancialmente diversos. Para além de outras diferenças realçadas pela

doutrina, é consenso nessa corrente que a summa divisio entre provimentos cautelares e

antecipatórios permanece em vigor a despeito da introdução de sua “fungibilidade” (CPC,

artigo 273, parágrafo 7º), pois esta ficaria limitada a situações excepcionais de dúvida

objetiva entre as duas formas”.

5.13. Poder geral de cautela.

Ora, conforme já exposto anteriormente, não se pode confundir poder geral

de cautela e discricionariedade com arbitrariedade.

Carlo Calvosa atenta para que a situação que justifica a medida atípica deve

ser suscetível de modificação e estas podem gerar prejuízo, a decisão de mérito será capaz

de compor a lide sem necessidade de proteção ou auxílio da cautelar genérica.305

Sob outro prisma a medida cautelar não poderá ultrapassar os limites que

estabelecem sua característica de provisoriedade.

305 Carlo Calvosa. Il processo cautelare: i sequestri e i provvedienti d’urgenza, p.768.

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Alfredo Araújo Lopes da Costa com clareza explica que a medida deve

restringir-se aos limites do direito cuja realização se pretende assegurar, providências a que

o requerente, mesmo que vencesse na causa principal, não teria direito, não lhe podem ser

concedidas. Não se concede medida preventiva que não possa ser aplicada em execução de

sentença em ação satisfativa. E o autor exemplifica com o restabelecimento da vida

conjugal, a prestação de serviços, a prisão para obrigar a exibição de bens para arresto306.

Importante destacar a previsão contida no artigo 969 do Novo Código de

Processo Civil, permitindo a providência liminar para sustação dos efeitos executivos da

sentença307.

Podemos assim estabelecer como limites ao poder geral de cautela como

somente aquele que puder ser, ao menos aparentemente, merecedor de tutela.

A tutela não caberá quando a situação representar direito natural, não

suscetível de exigência.

Não cabe proteção a mera expectativa de direito, já que ainda não adquirido

o direito.

Contudo, embora incerta ou controvertida a relação jurídica, basta que o

direito invocado seja suscetível de tutela nas vias ordinárias.

Não se pode relegar ao oblívio que após a reforma do Código de Processo

Civil de 1973, aquilo que não podia ser tutelado por intermédio da ação cautelar passou a

ser permitido por intermédio de pedido incidental deduzido no bojo do processo principal.

Mais uma vez merecem nossos aplausos as inovações trazidas pelo Código

de Processo Civil atual, que unificou as tutelas de urgência – sejam elas cautelares ou

satisfativas, ambas como espécie do gênero tutelas de urgência, submetidas aos requisitos

comuns e específicos nos já citados artigos 294 e 300.

5.14. Competência

306 Alfredo Araújo Lopes da Costa, Medidas Preventivas, p.21/22. 307 Art. 969. A propositura da ação rescisória não impede o cumprimento da decisão rescindenda, ressalvada a concessão de tutela provisória.

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De acordo com o artigo 299 do Novo Código de Processo Civil, a tutela

provisória será requerida ao juízo da causa e quando antecedente, ao juízo competente para

conhecer do pedido principal.

Não há mais, portanto ,necessidade de ajuizamento de processo cautelar em

apartado.

Na ação de competência originária de tribunal e nos recursos a tutela

provisória é requerida ao órgão jurisdicional competente para apreciar o mérito, de acordo

com o parágrafo único do artigo 299 do Novo Código de Processo Civil.

Caberá ao relator a apreciação do pedido de tutela provisória nos recursos e

nos processos de competência originária do tribunal, e contra esta decisão cabe agravo

interno308.

Outrossim, o parágrafo único do supracitado artigo 299 trouxe importante

inovação em relação à sistemática anterior, no sentido contrário às Súmulas 634 e 635 do

Supremo Tribunal Federal.

De acordo com a Súmula 634 do Colendo Supremo Tribunal Federal, não

compete ao Supremo Tribunal Federal conceder medida cautelar para dar efeito suspensivo

a recurso extraordinário que ainda não foi objeto de juízo de admissibilidade na origem.

E ainda, de acordo com a Súmula 635 do Colendo Supremo Tribunal

Federal, cabe ao Presidente do Tribunal de origem decidir o pedido de medida cautelar em

recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de admissibilidade.

Logo, o juízo de admissibilidade passou para o próprio tribunal ad quem,

havendo simplificação quanto à concessão de efeito suspensivo.

Em linhas gerais, ao órgão que compete deliberar sobre o cabimento do

recurso, caberá decidir também sobre a medida cautelar.

308 Art. 932. Incumbe ao relator: II - apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal; Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal.

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No que tange aos recursos repetitivos retidos ou sobrestados, subsiste a

exceção, devendo observar a deliberação do Tribunal superior para o caso paradigma.

Na verdade, a solução adotada pelo sistema anterior não parecia ser a mais

correta.

A premissa era de que a apreciação da plausibilidade do direito alegado

apresentava estreita relação com a decisão de admissibilidade recursal.

Não cabia a concessão de tutela provisória e sumária diretamente pelo

Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça antes da análise de

admissibilidade do recurso extraordinário ou especial309.

De acordo com o artigo 1.029, parágrafo 5º inciso III do Novo Código de

Processo Civil, caberá ao Presidente ou Vice-Presidente do tribunal local decidir sobre a

suspensão ou não dos efeitos da decisão recorrida.

Uma consideração merece ser feita quanto ao juízo arbitral, que não se

subordina à hierarquia dos órgãos da jurisdição estatal, que não podem rever as decisões

dos árbitros.

No julgamento do Recurso Especial nº 1.297.974/RJ relatado pela Ministra

Nancy Andrighi, DJE 19.06.2012, ressalta Humberto Theodoro Junior310 decidiu-se pela

impossibilidade de o tribunal arbitral dar cumprimento às medidas de natureza

coercitiva311.

309 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero. Novo Curso de Processo Civil. Vol.2, p.209. “Ocorre, porém, que o direito de suspender a eficácia da decisão recorrida não se liga de modo algum ao juízo de admissibilidade do recurso extraordinário ou do recurso especial que pode ser realizado no tribunal de origem. Liga-se antes ao fato de que o direito de suspender a eficácia da decisão recorrida concerne ao julgamento do recurso pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça. Daí a razão pela qual a solução do direito vigente, nesse ponto, é superior à solução do direito anterior”. 310 Humberto Theodoro Junior, Curso de Direito Processual Civil, pp. 634/635. 311 DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ARBITRAGEM. MEDIDA CAUTELAR. COMPETÊNCIA. JUÍZO ARBITRAL NÃO CONSTITUÍDO. 1. O Tribunal Arbitral é competente para processar e julgar pedido cautelar formulado pelas partes, limitando-se, porém, ao deferimento da tutela, estando impedido de dar cumprimento às medidas de natureza coercitiva, as quais, havendo resistência da parte em acolher a determinação do(s) árbitro(s), deverão ser executadas pelo Poder Judiciário, a quem se reserva o poder de imperium. 2. Na pendência da constituição do Tribunal Arbitral, admite-se que a parte se socorra do Poder Judiciário, por intermédio de medida de natureza cautelar, para assegurar o resultado útil da arbitragem.

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Conforme se expôs anteriormente, vigora o princípio da inafastabilidade do

controle jurisdicional.

Na hipótese de não ser possível a concessão da tutela provisória por parte do

juízo arbitral, é possível recorrer ao Judiciário, não se perdendo de vista que a celebração

do compromisso arbitral implica, como regra, a derrogação da jurisdição estatal, devendo

os autos serem encaminhados prontamente ao juízo arbitral, inclusive e se for o caso, para

reapreciar a tutela concedida.

Cabível também a concessão de tutela provisória em ação rescisória.

Ora, a sociedade urbana de massa rejeita a morosidade judicial provocada

pelas formas tradicionais de tutela, e em razão disso nos vemos diante do fenômeno da

proliferação das medidas cautelares.

A tutela antecipada é espécie do gênero tutela jurisdicional diferenciada,

instituto bem definido por Luiz Orione Neto312, eis que as tutelas jurídicas diferenciadas

devem situar-se como contrapartida do direito à adequada tutela jurisdicional, que

representa, numa análise mais perceptível da realidade, concretização do princípio da

inafastabilidade do controle jurisdicional, inscrito no inciso XXXV do art. 5º da

Constituição Federal, cuja finalidade não é apenas a de assegurar o acesso formal aos

órgãos judiciários, mas sim o acesso à Justiça que propicie a efetiva e tempestiva proteção

contra qualquer forma de denegação da justiça e também o acesso à ordem jurídica justa.

José Roberto dos Santos Bedaque313 aponta que o acesso à justiça, ou mais

propriamente, acesso à ordem jurídica justa, significa proporcionar a todos, sem qualquer

restrição, o direito de pleitear a tutela jurisdicional do Estado e de ter à disposição o meio

3. Superadas as circunstâncias temporárias que justificavam a intervenção contingencial do Poder Judiciário e considerando que a celebração do compromisso arbitral implica, como regra, a derrogação da jurisdição estatal, os autos devem ser prontamente encaminhados ao juízo arbitral, para que este assuma o processamento da ação e, se for o caso, reaprecie a tutela conferida, mantendo, alterando ou revogando a respectiva decisão. 4. Em situações nas quais o juízo arbitral esteja momentaneamente impedido de se manifestar, desatende-se provisoriamente as regras de competência, submetendo-se o pedido de tutela cautelar ao juízo estatal; mas essa competência é precária e não se prorroga, subsistindo apenas para a análise do pedido liminar. 5. Recurso especial provido. (REsp 1297974/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 19/06/2012) 312 Luiz Orione Neto, Liminares no Processo Civil, p.102. 313 José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência, p.71.

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constitucionalmente previsto para alcançar esse resultado. Ninguém pode ser privado do

devido processo legal, ou, melhor, do devido processo constitucional. É o processo

modelado em conformidade com garantias fundamentais, suficientes para torná-lo équo,

correto, justo.

Contudo, com o trânsito em julgado de uma decisão judicial viciada,

possível o ajuizamento de ação rescisória, abrindo-se ao prejudicado um remédio para

sanar o defeito de que padece a sentença nula ou anulável.

A liminar acautelatória e a antecipação podem ocorrer em relação à ação

rescisória, como têm decidido os tribunais modernamente.

Assim, presentes os requisitos do artigo 798 do CPC/73, seria possível o

ajuizamento de ação cautelar genérica em caráter incidenteal à rescisória, com pedido de

sustação da decisão rescindenda.

5.15. Procedimento

O artigo 294, parágrafo único do Novo Código de Processo Civil trata da

tutela provisória, seja ela de natureza cautelar ou satisfativa, sendo possível sua concessão

em caráter antecedente ou de forma incidental.

De acordo com o artigo 303, se a urgência for contemporânea à propositura

da ação, também existe a possibilidade de ser pleiteada a tuela provisória, indicando-se o

direito que se busca proteger do perigo e da demora.

No artigo 305 há previsão da concessão de tutela conservativa ou cautelar de

forma antecedente.

Ao contrário do sistema anterior, não há mais ação cautelar diferente da

principal.

5.15.1. Tutela de urgência incidental

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O pedido será feito no bojo do processo principal, não havendo necessidade

de pagamento de custas314.

Os requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora deverão estar

presentes.

Em atenção ao princípio do contraditório, a parte contrária será ouvida,

devendo oferecer resposta no prazo de cinco dias, podendo o magistrado fixar outro

prazo315.

Via de regra a parte contrária será ouvida e a liminar inaudita altera parte

somente é concedida após a ponderação dos valores em jogo, isto é, quando o risco de

dano for tão grande que a oitiva da parte contrária poderá fulminar o direito.

Ainda assim a parte suplicada terá assegurado seu direito de exercício do

contraditório que não é eliminado.

Faltando a prova pré-constituída poderá ocorrer a justificação prévia.

Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery316 assim definem a

justificação prévia: “Caso o juiz, pelo exame da petição inicial e dos documentos que a

acompanham, não se convença do periculum in mora e do fumus boni iuris, poderá

designar audiência de justificação prévia, via na qual deverão ser produzidas provas.

Havendo perigo de que a ouvida do réu torne ineficaz a medida, para a audiência de

justificação deverá ser intimado apenas o autor”.

William dos Santos Ferreira317 aponta que: “Por outro lado, há uma clara

evolução mundial no direito processual civil, decorrente da publicização do processo,

tornando mais ativa a participação do juiz sobre todo o debate, do que resulta uma mais

ampla valoração da prova e também da sua produção, razão pela qual não pode o julgador

pura e simplesmente indeferir o pleito de tutela antecipada embasado em ausência de

‘prova inequívoca’, quando a parte necessita (e requer!) justamente da realização de provas

314 Art. 295. A tutela provisória requerida em caráter incidental independe do pagamento de custas. 315 Art. 218. Os atos processuais serão realizados nos prazos prescritos em lei. § 3o Inexistindo preceito legal ou prazo determinado pelo juiz, será de 5 (cinco) dias o prazo para a prática de ato processual a cargo da parte. 316 Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil comentado, p. 1189. 317 William dos Santos Ferreira, Tutela Antecipada no âmbito recursal, p. 153

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através de ‘justificação prévia’”. (FERREIRA, William Santos. Tutela antecipada no

âmbito recursal, p. 153).

Acrescente-se ainda que contra a decisão que conceder ou negar a tutela,

caberá recurso de agravo de instrumento.318

Logo, repita-se, o recurso cabível é o Agravo de Instrumento contra a

decisão que concede ou denega as tutelas de urgência e evidência.

Comentando o artigo 296 no NCPC319, Teresa Arruda Alvim Wambier320

expõe que:

“Com efeito, a decisão que concede a tutela provisória tem natureza de

decisão interlocutória, sujeitando-se ao recurso de agravo de instrumento (art.1015,

inciso I), o qual, como se sabe, não tem efeito suspensivo ope legis. Dessa forma, mesmo

com a interposição do agravo de instrumento, enquanto não houver a concessão de efeito

suspensivo ou sua revogação, a decisão continuará produzindo efeitos.

A situação fica um tanto mais interessante quando se pensa na sentença,

contra a qual cabe apelação que prevê, como regra, o efeito suspensivo. O capítulo da

sentença que diz respeito à tutela provisória – seja para confirmá-la, concedê-la ou

318 Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I - tutelas provisórias; 319 Art. 296. A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada. Parágrafo único. Salvo decisão judicial em contrário, a tutela provisória conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo. 320 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.489. E prosseguem os autores: “Assim, no momento em que o juiz prolata a sentença em sentido contrário à tutela provisória, isto significa que, automaticamente, esta deixa de gerar efeitos, não sendo sequer necessário um ato expresso do julgador cassando ou revogando os efeitos da tutela provisória anteriormente concedida. Caso o juiz queira manter a decisão de tutela provisória, mesmo diante da sentença em sentido contrário (solução que se mostra, em tese, possível, notadamente em situações em que há divergência de entendimentos no tribunal e a revogação traria graves prejuízos ao autor), deverá, aí sim, fazê-lo expressamente. No que diz respeito à possibilidade de revogação ou modificação da tutela provisória, impõem-se, para tanto, duas condições: (i) a decisão deverá ser fundamentada e (ii) deverá haver uma ampliação da cognição do juiz ou a abertura de um juízo de retratação por força de algum recurso. A questão trazida no segundo dos requisitos anteriormente listados é controvertida320, mas, a nosso ver, a possibilidade de modificação ou revogação da tutela provisória pelo próprio juiz só se dá mediante recurso que abra a possibilidade de juízo de retratação, ou mediante o surgimento de novos elementos que revelem o não cabimento da medida, sob pena de a atividade jurisdicional tornar-se arbitrária e imprevisível. O processo não se coaduna com incertezas; uma vez deferida a tutela provisória para aquela situação fática, salvo alguma mudança na referida situação, deve surtir efeitos até que seja substituída por outra, proferida com base em cognição mais aprofundada.”

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revogá-la – não estará sujeita ao efeito suspensivo, produzindo efeitos imediatos (art.

1012, inciso V).

Dessa forma, percebe-se que a regra constante do caput, no sentido de que

a tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, só vale quando a

sentença for de procedência do pedido. Uma vez julgado improcedente o pedido, a tutela

provisória deixará de produzir efeitos, mesmo se houver recurso de apelação, porquanto o

comando que a revoga não está sujeito ao efeito suspensivo. A solução não poderia ser

diferente, pois conduziria à absurda situação de dar prevalência a uma decisão

provisória, fundada em cognição sumária, sobre uma decisão definitiva, plasmada de

cognição exauriente”.

5.15.2. Tutela de urgência antecedente

A medida poderá ser pleiteada antes da apresentação do pedido principal em

juízo, tanto na hipótese de cautelar quanto satisfativa.

Há diferença entre medidas antecedentes conservativas e medidas

antecedentes satisfativas, já que aquelas são acessórias do pedido principal.

Sendo a medida conservativa, tal como o arresto, sequestro, busca e

apreensão, a parte interessada apresenta pedido no prazo de trinta dias após a efetivação da

medida deferida em caráter antecedente ou preparatório321, sob pena de cessação da

eficácia322.

321 Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais. 322 Art. 309. Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se: I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal; II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias; III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem resolução de mérito. Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar o pedido, salvo sob novo fundamento.

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No que tange às medidas de urgência satisfativas, poderá ocorrer ou não

autonomia, diante da possibilidade de estabilização da sua eficácia prevista no artigo 304

do Novo Código de Processo Civil323.

Dessa forma, não há necessidade de ficar na dependência de formulação de

pedido principal.

Portanto, os efeitos permanecerão até decisão posterior que reveja, reforme

ou invalide a tutela satisfativa objeto de estabilização.

Atualmente há um procedimento autônomo para concessão da tutela

antecipada e algumas observações devem ser feitas.

Qualquer tutela satisfativa pode ser pedida através de tutela antecipada

antecedente. O pedido está restrito à urgência, daí sendo excluída a tutela de evidência,

embora seja possível em tese, pensando no sistema francês e esta urgência deverá ser

contemporânea, muito embora não se diferencie do perigo da demora das demais tutelas

antecipadas.

5.16. Requisitos da petição inicial

O Novo Código de Processo Civil prevê requisitos diferentes, caso seja a

tutela de urgência conservativa antecedente, conforme disposto nos artigos 305 a 310324.

323 Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso. 324 Art. 305. A petição inicial da ação que visa à prestação de tutela cautelar em caráter antecedente indicará a lide e seu fundamento, a exposição sumária do direito que se objetiva assegurar e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Parágrafo único. Caso entenda que o pedido a que se refere o caput tem natureza antecipada, o juiz observará o disposto no art. 303.

Art. 306. O réu será citado para, no prazo de 5 (cinco) dias, contestar o pedido e indicar as provas que pretende produzir.

Art. 307. Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá dentro de 5 (cinco) dias.

Parágrafo único. Contestado o pedido no prazo legal, observar-se-á o procedimento comum. Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de

30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais.

§ 1o O pedido principal pode ser formulado conjuntamente com o pedido de tutela cautelar. § 2o A causa de pedir poderá ser aditada no momento de formulação do pedido principal. § 3o Apresentado o pedido principal, as partes serão intimadas para a audiência de conciliação ou de

mediação, na forma do art. 334, por seus advogados ou pessoalmente, sem necessidade de nova citação do réu.

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Na petição inicial, deverá haver a indicação da lide e seu fundamento, a

exposição sumária do direito que se visa assegurar, e o perigo de dano ou o risco ao

resultado útil do processo.

A finalidade é a demonstração da viabilidade da ação de mérito, com a

descrição da lide bem como seus fundamentos, com a revelação da causa petendi.

O fumus boni iuris nada mais é do que a possibilidade jurídica de existência

do direito invocado, demonstrando assim as condições da ação.

O periculum in mora corresponde ao receio da lesão.

Estes requisitos não dispensam os demais, a saber, aqueles previstos no

artigo 319 do Novo Código de Processo Civil325.

No que pertine ao valor da causa, este deve corresponder ao benefício

econômico visado, sendo certo que a medida cautelar não representará a mesma vantagem

a ser obtida no final da execução, por exemplo.

§ 4o Não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335. Art. 309. Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se: I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal; II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias; III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem

resolução de mérito. Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar

o pedido, salvo sob novo fundamento. Art. 310. O indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem

influi no julgamento desse, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição. 325 Art. 319. A petição inicial indicará:

I - o juízo a que é dirigida; II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de

inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu;

III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII - a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação. § 1o Caso não disponha das informações previstas no inciso II, poderá o autor, na petição inicial,

requerer ao juiz diligências necessárias a sua obtenção. § 2o A petição inicial não será indeferida se, a despeito da falta de informações a que se refere o inciso

II, for possível a citação do réu. § 3o A petição inicial não será indeferida pelo não atendimento ao disposto no inciso II deste artigo se

a obtenção de tais informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça.

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Prosseguindo, no artigo 310 do NCPC é reconhecida a independência entre

tutela cautelar e tutela satisfativa, sendo certo que o objetivo principal é a eficácia e

utilidade.

Neste ponto há uma aproximação com os atuais requisitos prova inequívoca

da verossimilhança e fumus boni iuris exigidos para as tutelas antecipada e cautelar,

respectivamente.

Não são mais, portanto, exigidos a urgência ou o periculum in mora.

Contudo, não podemos afirmar que é dispensável a urgência.

No artigo 273, inciso II, do CPC/1973 era possível ao juiz antecipar a tutela

pretendida, independentemente da existência do periculum in mora, quando restar

caracterizado o manifesto propósito protelatório ou o abuso do direito de defesa do réu.

Tal opção, aliás, foi praticamente reproduzida no novo CPC.

5.17. Defesa do réu

O prazo para contestação é de cinco dias, sendo que o suplicado poderá

indicar provas que pretende produzir.

Na oportunidade para contestar, o réu deve expor seu direito e caso não o

faça será considerado revel.

O recurso cabível contra a decisão tomada no incidente é o agravo de

instrumento, conforme previsão do artigo 1.015 inciso I do Novo Código de Processo

Civil, havendo possibilidade de retratação por parte do magistrado.

Ora, caso não seja interposto recurso contra esta decisão operar-se-á a

preclusão326.

326 AGRAVO REGIMENTAL INDEFERIMENTO DE PLANO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO PEDIDO DE REFORMA DO RECORRENTE DESCABIMENTO – ENTENDIMENTO INSUSCETÍVEL DE RETRATAÇÃO – Manifesta inadmissibilidade Manutenção da negativa de seguimento Embargos de declaração com nítido caráter infringente desprovido de qualquer figura carente de esclarecimento. Denominação atribuída pela própria parte à peça processual não lhe define a real pretensão material Aplicação do princípio "jura novit curia". Tratamento de reconsideração que não reúne o condão de

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Uma interessante hipótese que se coloca é o pedido de tutela de urgência ser

formulado juntamente com a pretensão de mérito na petição inicial.

Neste caso a contestação abrangerá toda a matéria, sendo também cabível o

mesmo recurso de agravo de instrumento.

A figura do agravo retido deixa de existir, sendo certo que as questões serão

objeto de decisão em conjunto com eventual recurso de apelação, não havendo que se falar

em preclusão.

5.18. Prazo para dedução do pedido principal

Passaremos a analisar agora o prazo para dedução do pedido principal.

Duas são as hipóteses a serem consideradas.

No primeiro caso, na denegação da tutela de urgência, o processo será

extinto, não havendo o ingresso em nova fase de dedução do pedido principal.

A parte poderá formular pedido principal de acordo com o artigo 310 do

Novo Código de Processo Civil, porém em processo novo, não havendo preclusão.

A Professora Teresa Arruda Alvim Wambier de forma bastante didática ao

comentar o artigo 310 do NCPC327 aborda que:

“Conquanto a tutela cautelar no sistema adotado pelo NCPC não tenha

autonomia, ou seja, não seja deduzida por meio de um processo autônomo, ela não

perdeu sua característica essencial de instrumentalidade em relação ao pedido

principal. Se sob a égide do CPC/73 afirma-se que a cautelar serve ao processo

principal, sob a ótica do NCPC, pode-se dizer que ela serve ao pedido principal.

suspender o prazo recursal Preclusão temporal. Ofensa ao princípio da regularidade formal Vedação do processamento. Frustação de análise do mérito e da medida de suspensão da eficácia da decisão interlocutória. Ato monocrático mantido Recurso desprovido. (TJSP – AgRg 2012075-18.2015.8.26.0000 – São Paulo – 8ª CDPriv. – Rel. Salles Rossi – DJe 27.03.2015 – p. 1424). 327 Art. 310. O indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi no julgamento desse, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição.

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A decisão relativa ao pedido cautelar, porque baseada em cognição não

exauriente, não faz coisa julgada, de forma que seu resultado não pode influenciar

o pedido principal. A exceção a essa regra se dá quando, mesmo no pedido

cautelar, há o reconhecimento da prescrição ou da decadência do direito do autor,

gerando uma decisão de mérito apta à formação de coisa julgada. Trata-se de

técnica de economia processual, que permite ao juiz, no palco cautelar,

reconhecer, desde logo, a prescrição ou a decadência relativa à pretensão material

que fundamenta o pedido principal.

O inverso também deve ser considerado, ou seja, arguida a ocorrência de

decadência ou prescrição, pode ser que o juiz a rejeite. Essa hipótese suscita

dúvida na doutrina a respeito dessa decisão ser, ou não, atingida pela coisa

julgada, a impedir que a questão seja novamente alegada pela parte. Entendemos

que a opinião acertada é aquela mais afeta à letra da lei, pela qual não se autoriza,

na rejeição, a formação de coisa julgada, o que somente ocorrerá na hipótese de

reconhecimento”.328

Nesta oportunidade, convém trazer à colação v. aresto do Colendo STJ,

onde se proclamou que "não têm as medidas cautelares a função de proteger o direito da

parte, mas tão-só de garantir a eficácia do processo principal" (STJ, 3ª T., Pet. 324-0-SP,

ac. 25.08.1992, Rel. Min. WALDEMAR ZVEITER, RJSTJ 43/213).

328 “Os fundamentos aduzidos nos itens precedentes levam à conclusão de que não há coisa julgada, no processo cautelar. É que, não tendo havido declaração a propósito da existência ou inexistência do direito do autor, mas apenas da existência ou inexistência do fumus boni iuris e do periculum in mora, não haverá decisão capaz de solucionar a lide em definitivo. Excepcionalmente, contudo, o art. 810 do CPC dispõe que o juiz pode ‘acolher a alegação de decadência ou de prescrição do direito do autor no próprio processo cautelar. Obviamente, assim o fazendo, estará a proferir sentença de mérito que faz coisa julgada. A regra legal referida, como se viu, fala em reconhecimento de prescrição ou decadência do direito do autor. Diante disso, indaga-se se seria possível ao juiz acolher, em ação cautelar antecedente (ou preparatória) a alegação de decadência ou prescrição do direito do réu. Na doutrina, já se respondeu negativamente a esta indagação. Hoje, no entanto, diante da possibilidade de se requerer, incidentalmente, a concessão de tutela cautelar (cf.art.273, § 7º, do CPC), pensamos que nada impede que o autor pleiteie, em uma mesma ação, a declaração da inexistência da dívida, ante a decadência ou a prescrição, e, por exemplo, a sustação de protesto. Obviamente, não se estará mais, neste caso, diante de ação cautelar preparatória, porquanto a medida cautelar será concedida incidentalmente, na ação ajuizada com o intuito de ver declarada a inexistência da dívida. Por outro lado, pode acontecer, ainda que, arguida a ocorrência de decadência ou prescrição, o juiz rejeite tal alegação. Diante disso, põe-se a dúvida de se saber se também esta decisão seria atingida pela coisa julgada, a impedir seja a questão novamente alegada pela parte, em defesa realizada no processo principal. Na doutrina, afirma-se que, com razão, que a letra do preceito legal não autorizaria o entendimento de ocorreria coisa julgada, no caso. O art. 269, IV, diz que se estará diante de sentença de mérito quando o juiz verificar a existência de prescrição ou decadência, e não a inexistência. Ademais, a situação prevista no art. 810 do CPC seria excepcional e, por tal razão, não admitiria interpretação extensiva” (Teresa Arrua Alvim Wambier e José Miguel Garcia Medina. O Dogma da coisa julgada. São Paulo: RT, 2003, p.133-135).

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Podemos citar a busca e apreensão de pessoas ou coisas, já que uma vez

recuperada a coisa ou a pessoa, o direito da parte estará plenamente satisfeito.

Na tutela antecipada existem duas características marcantes a satisfação e a

provisoriedade.

Muito embora existam diferenças aparentes entre tutela antecipada e tutela

cautelar, há situações que encerram dificuldades na distinção, sendo certo que não guarda

relevância prática, mormente considerando a urgência dos casos concretos.

No processo civil moderno, conforme já ressaltado, deve prevalecer o

princípio da instrumentalidade das formas.

Perfeitamente possível, portanto, a concessão de medida diversa, isto é, o

deferimento da cautelar ainda que o caso fosse de tutela antecipada e vice-versa.

No segundo caso, na concessão da tutela cautelar, deverá ser observado o

disposto no artigo 308 do Novo Código de Processo Civil329.

O prazo de trinta dias contado da efetivação da medida, portanto, é

peremptório, não se suspendendo ou interrompendo330.

329 Art. 308. Efetivada a tutela cautelar, o pedido principal terá de ser formulado pelo autor no prazo de 30 (trinta) dias, caso em que será apresentado nos mesmos autos em que deduzido o pedido de tutela cautelar, não dependendo do adiantamento de novas custas processuais.

§ 1o O pedido principal pode ser formulado conjuntamente com o pedido de tutela cautelar. § 2o A causa de pedir poderá ser aditada no momento de formulação do pedido principal. § 3o Apresentado o pedido principal, as partes serão intimadas para a audiência de conciliação ou de

mediação, na forma do art. 334, por seus advogados ou pessoalmente, sem necessidade de nova citação do réu.

§ 4o Não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335. 330 Art. 214. Durante as férias forenses e nos feriados, não se praticarão atos processuais, excetuando-se:

I - os atos previstos no art. 212, § 2o; II - a tutela de urgência. Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os

dias úteis. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais. Art. 220. Suspende-se o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e

20 de janeiro, inclusive. § 1o Ressalvadas as férias individuais e os feriados instituídos por lei, os juízes, os membros do

Ministério Público, da Defensoria Pública e da Advocacia Pública e os auxiliares da Justiça exercerão suas atribuições durante o período previsto no caput.

§ 2o Durante a suspensão do prazo, não se realizarão audiências nem sessões de julgamento. Art. 224. Salvo disposição em contrário, os prazos serão contados excluindo o dia do começo e

incluindo o dia do vencimento.

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Caso não seja observado o prazo para dedução do pedido principal, a

medida perderá automaticamente a sua eficácia, na dicção do artigo 309, inciso I do Novo

Código de Processo Civil.

Todavia, o suplicante não ficará impedido de propor novamente o pedido

através de ação principal com fulcro em novos fundamentos.331

Na hipótese de inércia do autor ao não deduzir o pedido principal no prazo

legal de 30 (trinta) dias, ocorre a extinção da eficácia da medida cautelar deferida.

Assim sendo, não haverá mais perda do interesse de agir na hipótese do não

ajuizamento da principal332.

§ 1o Os dias do começo e do vencimento do prazo serão protraídos para o primeiro dia útil seguinte, se

coincidirem com dia em que o expediente forense for encerrado antes ou iniciado depois da hora normal ou houver indisponibilidade da comunicação eletrônica.

§ 2o Considera-se como data de publicação o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça eletrônico.

§ 3o A contagem do prazo terá início no primeiro dia útil que seguir ao da publicação. 331 Art. 309. Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se: I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal; II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias; III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem

resolução de mérito. Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar

o pedido, salvo sob novo fundamento. 332 Decidiam os Tribunais Pátrios sob a égide do sistema anterior que: “AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA – Liminar deferida. Não propositura da ação principal no prazo de trinta dias: necessidade. Recurso não-provido. O art. 806 do CPC estabelece a obrigatoriedade da parte em propor a ação principal no prazo de 30 dias se concedida liminar requerida em procedimento preparatório e como conseqüência da não-observância deste preceito, impõe o art. 808, I, a cessação da eficácia da medida cautelar. (TRF 2ª R. – AC 98.02.34411-7 – RJ – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Sérgio Feltrin Corrêa – DJU 03.06.2003)” “PROCESSUAL CIVIL – MEDIDA CAUTELAR PREPARATÓRIA – PROVIMENTO JURISDICIONAL POSITIVO – DECADÊNCIA – AÇÃO PRINCIPAL SERÔDIA – EFICÁCIA – CESSAÇÃO – EXTINÇÃO DO PROCESSO – 1- Cessa a eficácia da medida cautelar preparatória, quando não ajuizada a ação principal no prazo decadencial previsto no art. 806 do vigente CPC; 2- o ingresso da ação principal fora do trintídio subseqüente ao provimento positivo de liminar acarreta a extinção do processo cautelar sem exame do mérito; 3- precedentes do STJ; 4- medida cautelar extinta. (TJAP – Proc. 0000638-24.2013.8.03.0000 – (42459) – TP – Rel. Des. Constantino Brahuna – DJ 29.07.2013)” “AÇÃO CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO – PRETENSÃO DE NATUREZA PREPARATÓRIA – POSSIBILIDADE – EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA CASSADA. – A ação cautelar de sustação de protesto possui natureza preparatória, e tem por finalidade assegurar o resultado de um processo principal - Faz-se possível deferir, em sede de ação cautelar, medida de cunho satisfativo consistente na sustação de protesto de título, em face da fungibilidade existente entre medida cautelar e medida antecipatória. Interpretação do art. 273, § 7º, do Código de Processo Civil-A interposição do processo principal no prazo descrito no artigo 806 do Código de Processo Civil impede a extinção do processo cautelar, sem julgamento de mérito. (TJMG – AC 1.0079.08.454007-3/001 – 10ª C.Cív. – Rel. Cabral da Silva – DJe 12.07.2013)” “APELAÇÃO CÍVEL – MEDIDA CAUTELAR PREPARATÓRIA DE BUSCA E APREENSÃO – EXTINÇÃO DA AÇÃO COM BASE NOS ARTS. 806 E 808, INCISO I, DO CPC – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO IMPROVIDO – 1. Não proposta a ação principal no prazo de 30 (trinta) dias contados da efetivação da medida cautelar, cessa sua eficácia a teor dos

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Na hipótese do julgamento de improcedência ou extinção sem resolução de

mérito, também perde a eficácia a medida cautelar.

5.19. Procedimento para dedução do pedido principal

Diante do que foi exposto, podemos vislumbrar a existência de três

momentos para dedução do pedido principal.

Em primeiro lugar, este poderá ser formulado antes da pretensão principal,

conforme faculta o artigo 305 do Novo Código de Processo Civil (tutela antecedente).

Em segundo lugar, o pedido pode ser formulado com a pretensão principal,

conforme previsto no artigo 308, parágrafo 1º do Novo Código de Processo Civil – tutela

cumulativa.

Em terceiro lugar, no curso do processo já instaurado conforme previsão do

artigo 294, parágrafo único do Novo Código de Processo Civil – tutela de caráter

incidental.

Há possibilidade de aditamento e as partes poderão ser chamadas para

comparecimento à audiência de conciliação.

Outrossim, não é possível a renovação da medida cautelar conservativa após

a perda da sua eficácia, a menos que surja fundamento novo333.

5.20. Indeferimento da medida. Formação de coisa julgada.

Sendo indeferida a medida, a parte não estará sujeita ao prazo de trinta dias

previsto no artigo 308 do Novo Código de Processo Civil.

artigos 806 e 808, do ccp. 2. Recurso improvido. (TJES – AC 014000003377 – Rel. Des. José Eduardo Grandi Ribeiro – J. 03.12.2001)”.

333 Art. 486. O pronunciamento judicial que não resolve o mérito não obsta a que a parte proponha de novo a ação.

§ 1o No caso de extinção em razão de litispendência e nos casos dos incisos I, IV, VI e VII do art. 485, a propositura da nova ação depende da correção do vício que levou à sentença sem resolução do mérito.

§ 2o A petição inicial, todavia, não será despachada sem a prova do pagamento ou do depósito das custas e dos honorários de advogado.

§ 3o Se o autor der causa, por 3 (três) vezes, a sentença fundada em abandono da causa, não poderá propor nova ação contra o réu com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa o seu direito.

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Em caso de indeferimento a parte não fica impedida de formular pedido

principal, não havendo influência sobre o seu julgamento.

Apenas na hipótese de reconhecimento de decadência e prescrição a parte

fica impedida de formular pedido principal.

Existe, portanto, uma exceção à regra geral de que a decisão proferida na

cautelar não faz coisa julgada.

Frise-se que a prescrição e a decadência são questões de mérito, havendo

um fenômeno de transformação da medida que antes era provisória e não exauriente em

definitiva e exauriente.

5.21. Antecipação da tutela e modalidades de sentença

Entre as modalidades de sentença temos as declaratórias, nas quais o

provimento jurisdicional se limita a declaração do direito, e as condenatórias,

representando uma atividade cognitiva a ser objeto de outro processo de execução.

Fredie Didier Jr.334 citando Luiz Fux, discorre acerca do processo de

conhecimento:

“O processo de conhecimento, com seu fim precípuo de ‘definição de

direitos’, revelou-se insatisfatório porquanto prenhe de solenidades e ritualismos

capazes de delongar, acima do desejável, o momento da resposta judicial. Esta, por

seu turno, encerrando na ‘condenação’ a sua suposta forma mais enérgica, não

logrou arregimentar a necessária confiança do jurisdicionado na justiça, posto que

a realidade da condenação não transpõe a mera exortação a que o condenado

cumpra a decisão, sob pena - e que pena para o vencedor - de sofrer a execução da

sentença que se propõe a tornar realizável no plano fático o comando judicial. (...)

Consectário dessa centralização dos estudos acerca da inefetividade do

processo foi o surgimento de um novo princípio processual informativo, o da

‘Efetividade’, voltado à observação quanto ao escorreito cumprimento dos

334 Fredie Didier Jr., A tutela antecipatória dos artigos 273 e 461, CPC, como hipótese de suspensão do crédito tributário, pág. 5.

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desígnios da jurisdição através do processo; vale dizer: ‘resposta judicial

tempestiva, adequada e justa’. (...)335

Luiz Fux336 na mesma linha de pensamento, assevera que:

“Malgrado se revele um substitutivo das condutas barbáricas de outrora, o

acesso à jurisdição deve ser excepcional, haja vista que, numa sociedade

harmônica, o ideal, mercê do cumprimento espontâneo do direito, é a própria

autocomposição, que otimiza sobremodo o relacionamento social. Esta é, sem

dúvida, a razão pela qual os diplomas processuais modernos inserem a fase de

conciliação como obrigatória nos processos judiciais, preocupação que levou o

legislador constitucional brasileiro a contemplá-la na Carta Maior. A jurisdição

encerra, em suma, a restauração da legalidade e da justiça como instrumento

eficaz da paz social e da preservação da garantia dos direitos do homem.

A jurisdição não se limita à operação de subsunção do conflito à regra

abstrata reguladora do conflito. Anota-se, em sede doutrinário-histórica, que a

jurisdição compreendia cinco elementos, a saber: notio, vocatio, coertitio, judicium

e executio”337.

335 Para isso, o legislador condicionou a obtenção de tamanha vantagem (antecipação da tutela) à demonstração de pressupostos inafastáveis e plenamente justificáveis. É que, se a parte deseja obter imediatamente aquilo que somente recolheria ao final do processo, deve municiar o juiz tal como o faria até aquele momento. Por essa razão, para obter a antecipação da tutela a parte há de requerê-la munida de prova inequívoca de que ‘não pode’ ou ‘não deve esperar’ o cumprimento das solenidades procedimentais. A parte não pode esperar quando seu direito corre risco de ‘periclitação’ e ‘não deve esperar’ nas hipóteses em que seu direito é líquido e certo, ‘evidente’ mesmo, de tal sorte que incompatível com as delongas da ordinariedade, instituídas que foram para os estados de incerteza. Ora, onde há certeza deve cessar a atividade especulativa do juiz e iniciar a imediata satisfação em prol do autor, posto que, se é o réu que necessita do tempo do processo para provar, ele é que deve suportar o ônus da demora.” 336 Luiz Fux, Tutela jurisdicional: finalidade e espécie, p. 153-168. 337 E prossegue o autor: “(....) Dessa constatação apreende-se o que pretendeu Carnelutti ao afirmar; "Juiz não é só o que julga, mas também aquele que ordena: é aquele, em suma, cuja decisão tem eficácia de uma ordem". As modalidades de tutela variam conforme a natureza do conflito levado ao Judiciário. Há lides de "pretensão resistida" e lides de "pretensão insatisfeita"; vale dizer, há casos em que o Estado-juiz define direitos e outros em que a definição é um prius antecedente à "realização" do direito reconhecido em sentença ou no documento com eficácia equivalente (títulos executivos extrajudiciais). Outrossim, constatada a inexistência de um sistema ideal no qual jurisdicional é a prestação efetivada tão logo apresentado o pedido em juízo, revelou-se mister garantir "condições para a realização da justiça", posto que o objeto do julgado pode sofrer alterações substanciais que influam na solução justa da lide, quer pelo agravamento das condições de fato, quer pela criação de um estado de periclitação do direito da parte, dos bens ou das provas que servirão de elementos de convicção. Concluiu-se a necessidade de dotar a jurisdição de um tertium genus capaz de "assegurar a utilidade prática" das demais formas de tutela e, em "defesa da jurisdição". Previu-se, assim, a "tutela preventiva" ou "cautelar" pela sua finalidade de conjurar o perigo resultante da demora "natural" do processo. Decorre, do exposto, que a tutela jurisdicional apresenta-se sob três modalidades básicas: 1) a tutela jurisdicional de cognição ou conhecimento; 2) a tutela jurisdicional de execução; e 3) a

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Registre-se que não há execução forçada nos provimentos declaratórios nem

constitutivos.

Logo, filiamo-nos ao entendimento de Humberto Theodoro Junior338 pois

segundo o autor, parece ser intuitivo que a declaração de certeza e a constituição de uma

nova situação jurídica apenas podem ser alcançadas pela sentença definitiva de mérito,

após cognição completa e exauriente, não havendo como antecipar provisoriamente o puro

efeito declaratório e constitutivo.

O autor, porém, ressalta a distinção entre o efeito declaratório e constitutivo

e os efeitos práticos que decorre da declaração e da constituição de uma situação jurídica.

Todas as sentenças, inclusive as declaratórias e constitutivas apresentam um

comando ao vencido, ressalta Humberto Theodoro Junior339, reconhecendo-se,

provisoriamente, o direito subjetivo do autor, impondo-se ao suplicado a proibição de agir

de maneira contrária ou incompatível com a facultas agendi tutelada.

Elemento comum, portanto, é o perigo da demora da prestação jurisdicional

que poderá atingir a efetividade da sentença, seja ela condenatória, declaratória ou

constitutiva.

tutela jurisdicional de assecuração ou cautelar. (...) A necessidade de garantir a utilidade prática das tutelas antecedentes de cognição e execução levou o legislador a conceber um tertium genus de prestação jurisdicional, consistente num provimento servil às demais manifestações judiciais, capaz de resguardar as condições de fato e de direito para que a justiça seja prestada com efetividade. Observou o legislador de há muito, que o próprio processo de "amadurecimento" da decisão após a manifestação das partes impunha um lapso de tempo, por vezes prejudicial ao objeto do juízo que, exatamente por isso, fica sujeito a mutações prejudiciais ao julgamento, quer por força de atos maléficos perpetrados por uma parte contra o direito da outra antes do julgamento da causa, quer em função da própria natureza das coisas. (...) Essa constatação conduziu, assim, à criação de medidas múltiplas capazes de evitar o malogro da tutela principal no momento de sua efetivação. As "cautelares" ou medidas assecuratórias surgiram com o escopo precípuo de "servir" ao processo de conhecimento ou de execução. Essa forma de tutela diz-se eminentemente processual porque o interesse tutelado não é "atributivo de bens da vida" senão público de "acessar-se a justiça com efetividade". É certo que de nada adiantaria deferir-se o acesso à justiça sem a garantia respectiva de criação das condições ideais para a prestação jurisdicional, sob pena de resultar em mera divagação constitucional. A tutela cautelar, assim, revela-se a mais importante de todas pela sua própria antecedência lógica, quando uma situação de periclitação sinaliza para a frustração da tutela principal em razão da impossibilidade de prestação da justiça imediata”. 338 Humberto Theodoro Jr., Curso de Direito Processual Civil, pp. 651/652. 339 Op.cit.p.653. E o autor esclarece: “Dessa maneira, é antecipação de tutela a liminar que no mandado de segurança suspende a execução do ato administrativo ilegal ou nulo, assim como é da mesma natureza a liminar que, na ação declaratória de inconstitucionalidade, suspende o cumprimento, provisoriamente, da lei impugnada. É ainda, medida de tutela antecipatória a liminar na ação possessória, bem como as que arbitram aluguel, in limine, nas ações revisionais, ou a indenização nas ações desapropriatórias”.

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A grande preocupação é assegurar a efetividade da prestação jurisdicional,

garantindo um resultado útil ao final.

Kazuo Watanabe340 explica que:

“Qualquer tipo de provimento poderá ser antecipado, inclusive o

condenatório inclusive para pagamento de quantia certa...

Mas, em alguns tipos de ação, principalmente nos provimentos constitutivos

e declaratórios, deverá o juiz, em linha de princípio, limitar-se a antecipar alguns

efeitos que correspondam a esses provimentos, e não o próprio provimento. Por

exemplo, na ação em que se peça a anulação de uma decisão assemblear de

sociedade anônima de aumento de capital, ao invés de antecipar desde logo o

provimento constitutivo, deverá ater-se à antecipação de alguns efeitos do

provimento postulado, como o exercício do direito de voto correspondente segundo

a situação existente antes do aumento do capital objeto da demanda ou a

distribuição de dividendos segundo a participação acionária anterior ao aumento

de capital impugnado etc.

O mesmo se deve dizer em relação à ação declaratória, pois a utilidade da

declaratória está, precisamente, na certeza jurídica a ser alcançada com a

sentença transitada em julgado. Antes do seu julgamento, porém, a parte poderá

ter interesse em obter os efeitos práticos que correspondam à certeza jurídica a ser

alcançada com o provimento declaratório. Isto ocorre principalmente em relação

àquelas ações declaratórias que tenham repercussões práticas, como a ação

declaratória de paternidade em relação aos alimentos, ou que contenha alguma

carga constitutiva, como a de desfazimento da eficácia de um ato nulo, ou a sua

propriedade de, apesar de nulo, produzir alguns efeitos”.

É certo que não cabe a execução antecipada das sentenças puramente

declaratórias, porém admite-se executoriedade provisória ou antecipada de sentença

constitutiva.

340 Kazuo Watanabe, Tutela antecipatória e tutela específica das obrigações de fazer e não fazer, pp.89-90.

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Para Luiz Guilherme Marinoni341, com quem concordamos, nos casos de

sentença declaratória e constitutiva, a tutela antecipatória é genuinamente preventiva e

inibitória, não se confundindo com cautelar. Seu caráter antecipatório está em “ordenar ao

réu não fazer aquilo que somente a sentença final poderá demonstrar ser legítimo fazer”. A

tutela não é cautelar, mas antecipatória, pois se refere ao exercício de um direito material

que ainda será declarado ou constituído.

É possível a antecipação da tutela nas ações constitutivas ou meramente

declaratórias.

São várias as necessidades do direito material, e em razão disso,

consequentemente, variadas as tutelas a serem prestadas para proteção efetiva do direito.

Exemplificando, no caso da iminência da lesão, a tutela será inibitória, se o

direito já foi lesado, a tutela será ressarcitória.

A tutela satisfativa pode ser tutela de natureza preventiva contra o ilítico,

antes de sua ocorrência, continuação ou repetição, neste último caso, tutela inibitória.

As sentenças também são de variados tipos, classificadas em diversas

espécies, tais como declaratórias, constitutivas, condenatórias, mandamentais, executivas.

Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero342

asseveram que a leitura dos artigos 294 a 311 do NCPC é imprescindível, eis que o

legislador deixou de proporcionar uma adequada abertura ao plano do direito material no

tratamento das tutelas provisórias, bastando ver que, a pretexto de retratar os casos de

urgência, o legislador fala em “perigo de dano” e em “risco ao resultado útil do processo”

341 Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, A Tutela Antecipatória nas Ações Declaratória e Constitutiva. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela. São Paulo: RT, 1997, p.270. E conclui o autor: “Há tutelas que dão ao autor, desde logo, aquilo que ele somente poderia obter após a pronúncia da sentença. Tais tutelas não são cautelares, porém antecipatórias.” 342 Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2, p.198. E apontam os autores: “Daí que apenas uma interpretação comprometida com o ideal de ver o processo como meio para a tutela dos direitos – e, portanto, uma orientação que extravasa os domínios meramente processuais – é capaz de bem equacionar aquilo que o legislador preferiu embotar no cimento das construções forjadas no processualismo. É imprescindível, portanto, ler os arts. 294 a 311 na perspectiva da relação entre técnica processual e tutela dos direitos, deixando-se de lado os critérios puramente processuais para sua compreensão. Os critérios processuais – provisoriedade e cognição sumária, por exemplo – são inquestionavelmente importantes, mas são insuficientes para o adequado equacionamento das relações entre direito e processo no Estado Constitucional”.

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(artigo 300), como se inexistissem tutelas contra o perigo de ilícito, como, no entanto,

assegura o artigo 497, parágrafo único343, que refere “para concessão da tutela específica

destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é

irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo” e

como se a tutela com incidência sobre o plano do direito material.

Comentando o sistema processual civil anterior, Humberto Theodoro

Junior344 em excelente artigo abordava que:

343 Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente. Parágrafo único. Para a concessão da tutela específica destinada a inibir a prática, a reiteração ou a continuação de um ilícito, ou a sua remoção, é irrelevante a demonstração da ocorrência de dano ou da existência de culpa ou dolo. 344 Humberto Theodoro Jr., Antecipação de Tutela em Ações Declaratórias e Constitutivas Datadez - FEV de 1999. E com clareza explica: “A execução de que se cogita para justificar a antecipação de tutela, nessa ordem de ideias, é a que se entende no sentido mais amplo do termo, não se confundindo, por isso, com aquele restrito significado de atuação judicial da força do título executivo stricto sensu. Qualquer sentença, mesmo as declaratórias e constitutivas, contém um preceito básico, que se dirige ao vencido e que se traduz na necessidade de não adotar um comportamento que seja contrário ao direito subjetivo reconhecido e declarado ou constituído em favor do vencedor. É a sujeição do réu a esse comportamento negativo ou omissivo em face do direito do autor que pode ser imposto por antecipação de tutela, não só nas ações condenatórias, como também nas meramente declaratórias e nas constitutivas. Reconhece-se, provisoriamente, o direito subjetivo do autor e impõe-se ao réu a proibição de agir de maneira contrária, ou incompatível com a facultas agendi tutelada. Dessa maneira, é antecipação de tutela a liminar que no mandado de segurança suspende a execução do ato administrativo ilegal ou nulo, assim como é da mesma natureza a liminar que, na ação declaratória de inconstitucionalidade, suspende o cumprimento, provisoriamente, da lei impugnada. É, ainda, medida de tutela antecipatória, a liminar na ação possessória, bem como as que arbitram aluguel, in limine, nas ações revisionais, ou a indenização nas ações desapropriatórias. As mais variadas ações, portanto, admitem liminares de natureza antecipatória, tanto em caráter positivo, permitindo ao autor verdadeira execução provisória de seu direito contra o réu, como também em caráter negativo, sujeitando este a vedações e proibições, diante da situação jurídica provisoriamente reconhecida àquele (cf. TEORI ALBINO ZAVASCKI, "Antecipação da tutela e colisão de direitos fundamentais", in SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Reforma do Código de Processo Civil, São Paulo, Saraiva, 1996, p. 158-159). O importante, in casu, é o caráter satisfativo, porque a medida antecipatória se volta diretamente à proteção da pretensão de direito material do litigante e não apenas à defesa de alguma faculdade processual. O risco que se busca eliminar situa-se, por isso, no plano do direito substancial, de sorte que, à falta da providência antecipatória a sentença do processo principal estará, na prática, deferindo tutela a direito subjetivo esvaziado pela perda de objeto. Sendo assim, a lesão irreparável, ou dificilmente reparável, repercutirá diretamente sobre a efetividade da sentença, seja condenatória, declaratória ou constitutiva. "Ciò significa, più semplicemente, che il pregiudizio può concretarsi in un evento esterno od anche interno alla situazione giurídica cautelanda, capace di mettere in pericolo il diritto del quale si invoca la tutela cautelare atipica" (GIOVANNI ARIETA, I provvedimenti durgenza, 2ª ed., Padova, Cedam, 1985, n. 31, p. 121). O perigo que se afasta com a medida cautelar antecipatória não se localiza, outrossim, apenas na situação estática do direito material e de seu objeto imediato. A tutela tem em mira, igualmente, sua fase dinâmica, pelo que pode referir-se à situação jurídica subjetiva do promovente posterior à sentença definitiva (ARIETA, ob. cit., n. 32, p.123). Os que se recusam a admitir tutela antecipatória em ação declaratória argumentam com a impossibilidade lógica de estabelecer-se a certeza em caráter provisório. Para eles a certeza ou existe ou não existe. E se existe, somente pode ser definitiva. Por outro lado, a declaração de certeza seria sempre possível, em qualquer tempo, não havendo propriamente um risco de impossibilitar-se tal tipo de provimento principal. O mesmo aconteceria com o provimento constitutivo, que independe de execução, e não corre risco de frustração pela demora do processo,

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“A antecipação de tutela, muito embora faculte atos executivos à parte,

antes da sentença, não o faz somente para compreender providências que seriam

tecnicamente objeto de futuro processo de execução forçada. Qualquer tipo de processo de

conhecimento pode ter a eficácia de sua sentença sob risco de encontrar um direito

subjetivo material sem condições de atuar praticamente. É possível, portanto, pretender

algum tipo de medida satisfativa que afaste o perigo não de eficácia executiva da

sentença, mas de efetividade dela perante o direito substancial do litigante, que já terá

dispensando, por isso mesmo, a antecipação de tutela. Num raciocínio de lógica pura a tese impressiona. Mas a lógica do direito não é a formal, mas a do razoável. Essa lógica se inspira na busca do justo, revelando-se, por isso deontológica ou pragmática-dialética. "Pragmática porque visa resultados, e a validade do discurso vai ser aferida por sua maior ou menor eficiência. E é dialética à medida que o raciocínio é argumentativo, pesando e selecionando argumentos a favor das diversas soluções possíveis" (DAVID SCHNAID, "A interpretação jurídica constitucional e legal", RT, 733/39; THEODOR VIEHWEG, Tópica e Filosofia do Direito, p. 127). E, como já se expôs, a antecipação de tutela, teleologicamente, não se exaure na garantia da sentença de mérito. Vai mais além para preocupar-se com a plena efetividade da prestação jurisdicional e, nesse plano, cogita não só de efeito imediato no campo da certeza jurídica, inerente à declaração e constituição de direitos subjetivos materiais, como procura garantir ao respectivo titular o reconhecimento de situação jurídica que lhe seja dinamicamente útil. O que virá depois do acertamento jurisdicional também é cogitado pelo direito cautelar, ainda que não seja efeito processual imediato da sentença. Se não é razoável antecipar-se a declaração provisória de certeza, é irrecusável que se pode formar um juízo de verossimilhança a seu respeito e a partir dele analisarem-se atos do titular que seriam legítimos em função da situação pendente de acertamento e que se não assegurados desde logo poderão acarretar-lhe lesão irreparável ou dificilmente reparável. Esses atos não são objeto imediato do processo, mas dependem da situação jurídica nele debatida. TOMMASEO observa que os exemplos extraídos da experiência jurisprudencial revelam que o interesse da parte em obter antecipação de tutela em ação de mero acertamento pode justificar-se enquanto aguarda condições de valer-se do pronunciamento judicial para determinar o próprio comportamento em função da relação substancial sub iudice. "Così, la tutela urgente del mero accertamento si presenta nel suo contenuto più significativo lá dove il recorrente chiede al giudice la valutazione in sede cautelare della legittimità di un proprio atto. Così, il provvedimento d'urgenza può contenere l'anticipata valutazione della nullitá della clausola di un contratto o di uno statuto societario" (FERRUCIO TOMMASEO, I provvedimenti d'urgenza, Padova, Cedam, 1983, p. 259). (...) Outro autor que se ocupou do tema foi FLÁVIO LUIZ YARSHELL, e o fez para demonstrar que embora as sentenças constitutivas "não ensejam (porque dispensam) a prática de atos de execução"..., "a simples vedação à execução definitiva não impede que se antecipe efeitos da sentença constitutiva... (FLÁVIO LUIZ YARSHELL, "Antecipação de Tutela Específica nas Obrigações de Declaração de Vontade, no Sistema do CPC", in TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER, Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela, São Paulo, Ed. RT, 1997, p. 176-177). "A doutrina nacional - a nosso ver, com razão - parece propender no sentido positivo, isto é, admitindo a antecipação da tutela constitutiva. Nesse sentido, CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO observou que "o ato concessivo da tutela pode ter natureza constitutiva, antecipando situações novas desejadas pelo demandante" (A Reforma do Código de Processo Civil, São Paulo, Malheiros, 3ª ed., 1996, nº 105, p. 144). No mesmo sentido pronunciaram-se NELSON NERY JÚNIOR (Atualidades sobre Processo Civil, São Paulo, Ed. RT, 1996, p. 73), ERNANE FIDELIS DOS SANTOS (Novos Perfis do Processo Civil Brasileiro, Belo Horizonte, Del Rey, 1996, nº 7, p. 10)" (ob. cit., p. 174-175). LUIZ GUILHERME MARINONI, quem melhor estudou e explorou o tema entre nós, com muita propriedade, lembra os ensinamentos de TARZIA, para quem não se concebe a executividade antecipada de sentença puramente declaratória, mas é possível cogitar-se de uma executoriedade provisória ou antecipada de sentença constitutiva, tendo em conta o fato de que esse tipo de sentença "cria situações novas", as quais "a executoriedade pode antecipar em relação à coisa julgada". Segundo o autor italiano, sua conclusão se sustenta a partir da premissa de que a executoriedade, - pressuposto da antecipação de tutela - "não eqüivale à idoneidade da sentença para constituir título executivo" (MARINONI, "A Tutela Antecipatória nas Ações Declaratória e Constitutiva", in TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER, Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela, São Paulo, Ed. RT, 1997, p. 270; TARZIA, Lineamenti del Nuovo Processo di Cognizione, Milano, Giuffrè, 1991, p. 186-187). Basta que exista, em face do processo, a perspectiva de criar-se uma situação jurídica, capaz de gerar pretensões práticas para o autor diante do réu.”

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perdido toda capacidade de atuar in concreto pela supressão total ou profunda de seu

suporte fático, enquanto se aguardava a sentença declaratória ou constitutiva”.

5.22. Tutela de urgência satisfativa.

O Novo Código de Processo Civil prevê procedimento especial para a tutela

de urgência satisfativa nos artigos 303 e 304, sendo que uma importante novidade foi a

estabilização da medida provisória satisfativa.

Ernane Fidelis dos Santos lembra que o novo diploma se aproximou do

regime do réferé francês, ao autorizar provimentos de urgência em situações sem qualquer

tipo de resistência ou contestação.345

Logo, a opção brasileira tem clara inspiração no direito francês e no direito

italiano.

Na França, com o référé, é o principal objeto de comparação quando o tema

é a previsão de processos satisfativos autônomos e abreviados.

Na prática, os franceses perceberam que a sumariedade do procedimento

não é geradora de instabilidade, pelo contrário, muitas vezes a atribuição de estabilidade às

decisões provisórias satisfaz completamente as partes no plano fático.

Para Roberta Tiscini346, a instabilidade dos efeitos não é consequência

necessária da simplificação da forma. Aliás, simplificar o procedimento pode ser sinônimo

de satisfação fática.

Rogério Aguiar Munhoz Soares347, observando o ordenamento processual

anterior, afirma que “nosso direito positivo não trata satisfatoriamente de tais demandas,

exatamente porque ignora a sumariedade material, e possui um Código de Processo Civil

quase que totalmente voltado ao tratamento de demandas plenárias, relegando as ‘exceções

à regra’ ou ao Livro dos Procedimentos Especiais, ou ao Livro do Processo Cautelar”.

345 Ernane Fidelis dos Santos, Tutela cautelar e antecipatória. In AURELLI, Arlete Inês, et all. O direito de estar em juízo e a coisa julgada – Estudos em homenagem a Thereza Alvim, São Paulo; RT 2014, p.132. 346 Roberta Tiscini, I provvedimenti decisori senza accertamento, p. 242. 347 Rogério Aguiar Munhoz Soares, Tutela Jurisdicional Diferenciada: tutelas de urgência e medidas liminares em geral, p. 174.

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5.23. Tutela de urgência satisfativa antecedente

Na tutela de urgência satisfativa antecedente, o próprio direito subjetivo

material da parte é protegido, não podendo ficar sujeito às delongas do procedimento.

O magistrado antecipa de forma provisória o próprio julgamento de mérito

concedendo imediatamente o bem jurídico correspondente à prestação do direito material

reclamada como objeto da relação jurídica envolvida no litígio348.

Mais uma vez, convém ressaltar, na tutela de urgência satisfativa a ameaça é

ao direito subjetivo da parte, e não a utilidade do processo.

Portanto, são requisitos da inicial nas tutelas satisfativas antecedentes a

indicação do pedido e da tutela final, com a demonstração do fumus boni iuris, a exposição

sumária da lide e a demonstração do perigo da demora.

Caso não seja amparado, o direito corre risco de perecer.

Na hipótese de não haver recurso contra a decisão, a medida provisória

estabilizar-se-á, extinguindo-se o processo sem resolução do mérito, com a conservação da

medida deferida.

É o que vem disposto no artigo 304, parágrafo 1º do Novo Código de

Processo Civil349.

Na hipótese de recurso contra a decisão concessiva da liminar, haverá

necessidade de emenda.

348 Humberto Theodoro Jr., Curso de Direito Processual Civil, p.647.

349 Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso.

§ 1o No caso previsto no caput, o processo será extinto. § 2o Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a

tutela antecipada estabilizada nos termos do caput. § 3o A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por

decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2o. § 4o Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a

medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2o, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida.

§ 5o O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2o deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1o.

§ 6o A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2o deste artigo.

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Um caso clássico que podemos citar é a necessidade de cirurgia que o plano

de saúde se recusa a cumprir.

Na hipótese, a medida cabível é a tutela satisfativa antecedente, a fim de que

seja imediatamente realizada a necessária cirurgia.

A fundamentação completa será apresentada posteriormente, juntamente

com o pedido principal.

Acredita-se que o suplicado não resista à pretensão, optando, assim, em

juízo de conveniência, pela estabilização da medida.

Ada Pellegrini Grinover350, na justificativa do Projeto por ela apresentado e

arquivado junto ao Senado Federal, expôs que “o que se pretende, por razões

eminentemente pragmáticas – mas não destituídas de embasamento teórico – é deixar que

as próprias partes decidam sobre a conveniência, ou não, da instauração ou do

prosseguimento da demanda e sua definição em termos tradicionais, com atividades

instrutórias das partes e cognição plena e exauriente do juiz, com a correspondente

sentença de mérito”.

Nas medidas solicitadas em caráter incidental, qualquer das partes do

processo estará legitimada a postular.

Na tutela antecipada satisfativa é possível no processo de conhecimento,

sejam eles pedidos condenatórios, declaratórios ou constitutivos.

Com a ampliação do poder geral de cautela, resultados de caráter

satisfativos foram atingidos, principalmente quando o direito material estava sob risco de

perecimento.

350 Ada Pellegrini Grinover, Tutela jurisdicional diferenciada: a antecipação e sua estabilização, pp. 11/37.

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Dessa forma, surgiu a tutela antecipada, prevista na Lei 8.952 de

13.12.1994, que deu nova redação ao artigo 273 do Código de Processo Civil351.

Como já exposto anteriormente, no Novo Código de Processo Civil, há

previsão do gênero – Tutela Provisória – sendo três as espécies de tutelas: as cautelares ou

conservativas, as satisfativas ou antecipatórias e as de evidência.

A diferença entre elas reside no maior ou menor grau dos requisitos legais,

quais sejam, fumus boni iuris e periculum in mora.

A atual tutela satisfativa em muito se assemelha à tutela antecipada prevista

no artigo 273 do Código de Processo Civil de 1973.

5.24. Estabilização da tutela de urgência satisfativa

antecedente.

O Novo Código de Processo Civil, em sensível avanço e inspirado no direito

francês abriu espaço ao fenômeno da autonomização e estabilização da tutela sumária.

351 Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e: I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. (Redação dada ao caput pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994, DOU 14.12.1994, com efeitos a partir de sessenta dias após a data de sua publicação) § 1º Na decisão que antecipar a tutela, o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994, DOU 14.12.1994, com efeitos a partir de sessenta dias após a data de sua publicação) § 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994, DOU 14.12.1994, com efeitos a partir de sessenta dias após a data de sua publicação) § 3º A efetivação da tutela antecipada observará, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, §§ 4º e 5º, e 461-A. (Redação dada ao parágrafo pela Lei nº 10.444, de 07.05.2002, DOU 08.05.2002, com efeitos a partir de 3 (três) meses após a data de publicação) § 4º A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994, DOU 14.12.1994, com efeitos a partir de sessenta dias após a data de sua publicação) § 5º Concedida ou não a antecipação da tutela, prosseguirá o processo até final julgamento. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 8.952, de 13.12.1994, DOU 14.12.1994, com efeitos a partir de sessenta dias após a data de sua publicação) § 6º A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.444, de 07.05.2002, DOU 08.05.2002, com efeitos a partir de 3 (três) meses após a data de publicação) § 7º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado. (NR) (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.444, de 07.05.2002, DOU 08.05.2002, com efeitos a partir de 3 (três) meses após a data de publicação)

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Em linhas gerais, de acordo com o artigo 304 do NCPC, a tutela antecipada

satisfativa se torna estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo

recurso e o § 1º dispõe que o processo será extinto e a tutela de urgência continuará a

produzir seus efeitos concretos.

Não podemos, todavia, confundir estabilização com coisa julgada.

O novo Código de Processo Civil ainda cria a figura da estabilização da

tutela antecipada, que ocorre quando a medida é deferida e não impugnada mediante o

“respectivo recurso” (art. 304)352.

Semelhante à coisa julgada, a deliberação judicial estabilizada permanece

inalterada e eficaz até que seja objeto de ação própria de impugnação, a ser ajuizada no

prazo decadencial de dois anos (§5º)353.

Portanto, houve a imposição de um limite temporal para o desfazimento da

decisão antecipatória.

Logo, não tendo o suplicado se manifestado no sentido do exaurimento da

cognição, qualquer das partes poderá no prazo de dois anos questionar a tutela,

aprofundando o conhecimento sobre a questão.

Como Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero

ressaltam354, o legislador valeu-se da técnica da inversão da iniciativa para o debate, que se

fundamenta na realização de eventual contraditório por iniciativa do interessado –

contraditório eventual, devendo ocorrer o desarquivamento da ação sumária para instruir a

ação exauriente, tratando-se de documento essencial.

352 Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso. 353 § 5o O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2o deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1o. 354 Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil. Vol.2, p.216. E prosseguem os autores: “O legislador é claríssimo ao afirmar que a decisão que concede a tutela antecipada antecedente não faz coisa julgada. Além de dizê-lo expressamente (art. 304, §6º), prevê ainda ação exauriente para o aprofundamento da cognição (art.304, §§ 2º e 5º). Contudo, a questão que fica – apenas aparentemente – em aberto é a seguinte: como qualificar a força da estabilidade depois de transcorridos dois anos sem que tenha sido proposta a ação exauriente? O legislador é igualmente claro – embora não tenha se atrevido a dizê-lo diretamente: se a ‘estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão’ tomada na ação exauriente (art.304 § 6º), então é evidente que, inexistindo ação posterior ajuizada no prazo legal, a estabilidade torna-se ‘inafastável’. Em outras palavras: ‘imutável’ e ‘indiscutível’ (art.502)”.

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Na petição inicial, o autor deverá limitar-se ao requerimento da tutela

provisória satisfativa, indicando o pedido de tutela final.

Posteriormente, poderá emendar o pedido.

Tratando-se de pedido antecedente, o autor deve indicar o juiz competente,

as partes, qualificação e provas a serem produzidas, além do valor da causa.

Em linhas gerais, os fundamentos do pedido abrangem a demonstração de

que o direito efetivamente ampara a pretensão principal – fumus boni iuris e a

demonstração dos fatos que permitem a constatação do perigo de dano – periculum in

mora.

O valor da causa deve levar em consideração a pretensão antecipatória.

O magistrado, ao analisar a petição inicial, poderá deferir ou não a liminar,

podendo determinar a emenda da petição inicial355.

Caso não seja realizada a emenda, o processo será extinto sem resolução do

mérito.

Neste procedimento sumário, de acordo com o Novo Código de Processo

Civil, não há previsão de citação e contestação antes da decisão sobre a medida.

355 Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial

pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.

§ 1o Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo: I - o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de

novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar;

II - o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na forma do art. 334; III - não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335. § 2o Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo, o processo será extinto

sem resolução do mérito. § 3o O aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem

incidência de novas custas processuais. § 4o Na petição inicial a que se refere o caput deste artigo, o autor terá de indicar o valor da causa, que

deve levar em consideração o pedido de tutela final. § 5o O autor indicará na petição inicial, ainda, que pretende valer-se do benefício previsto

no caput deste artigo. § 6o Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional

determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito.

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Sendo deferida a liminar em caráter antecedente, poderá o suplicado

interpor agravo de instrumento no prazo de quinze dias a partir da ciência e em não o

fazendo, a medida antecipatória estabilizar-se-á.

O autor terá o prazo de quinze dias ou outro prazo a ser indicado pelo

magistrado para aditar a petição inicial para confirmação do pedido de tutela final,

possibilitando assim, a transformação da medida provisória em demanda principal, não

havendo necessidade do recolhimento de custas.

Interpretando o artigo 303, parágrafo 1º, Humberto Theodoro Junior356

entende que diante do aparente impasse procedimental, qual seja, a incongruência de forçar

o andamento de uma causa cujo objeto já se encontra extinto, a regra do inciso I do § 1º do

art. 303 deve ser medida tomada após o prazo concedido ao requerido para recorrer, o qual

representa uma oportunidade legal para ser apurada a sua aquiescência ou não ao pedido do

autor.

Portanto, concordamos com o autor citado acima, pois os dois prazos

analisados – o de aditamento e o de recurso – somente podem ser aplicados de forma

sucessiva, e nunca simultaneamente, devendo o dispositivo ser interpretado

sistematicamente.

A designação de audiência somente é possível depois da emenda à inicial.

Na medida conservativa antecedente ou cautelar o prazo para oferecimento

de defesa é de cinco dias, e nesta oportunidade poderá ser questionada a concessão da

liminar.

Na medida satisfativa antecedente ou antecipatória não existe previsão de

contestação em apartado para esta contestação, cujo prazo somente tem início após a

citação do aditamento da inicial.

Contudo, o prazo de resposta do réu não começa a ser contado antes de sua

ciência inequívoca do aditamento da petição inicial do autor, garantindo-se, assim, o prazo

de quinze dias para sua apresentação.

356 Humberto Theodoro Jr., Curso de Direito Processual Civil, p.660.

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Portanto, ou estão presentes os requisitos para concessão da tutela

satisfativa sumária ou não, sendo esta de plano negada, quando então o processo será

extinto sem resolução do mérito.

Não concedida a tutela antecipada, o magistrado determinará o aditamento a

petição inicial em até cinco dias e, não sendo aditada, a petição inicial será indeferida e o

processo extinto sem resolução do mérito357.

Na verdade, não havendo recurso, a medida provisória será estabilizada e o

processo extinto. Caso contrário, não será possível referida estabilização.

Caso não seja realizado o aditamento dentro do prazo legal, o processo

também será extinto.

Realizado o aditamento, será designada audiência de conciliação, citando-se

o réu para comparecimento, e havendo acordo, o mesmo será homologado e o processo

extinto com resolução do mérito.

Em caso negativo, terá início o prazo para contestação e o feito prosseguirá.

Concordamos com Teresa Arruda Alvim Wambier em sua obra coletiva

“Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil”358 ao expor que:

357 Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.

§ 1o Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo: I - o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de

novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar;

II - o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na forma do art. 334; III - não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335. § 2o Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo, o processo será extinto

sem resolução do mérito. § 3o O aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem

incidência de novas custas processuais. § 4o Na petição inicial a que se refere o caput deste artigo, o autor terá de indicar o valor da causa, que

deve levar em consideração o pedido de tutela final. § 5o O autor indicará na petição inicial, ainda, que pretende valer-se do benefício previsto

no caput deste artigo. § 6o Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional

determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito.

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“A opção feita pelo NCPC está em consonância com o direito italiano e o

francês e, segundo nosso entendimento, é a melhor. O instituto da coisa julgada é

incompatível com decisão proferida com base em cognição superficial e, por isso mesmo,

provisória e sujeita a confirmação. O que confere idoneidade para que uma decisão fique

imune à revisão é justamente a profundidade da cognição nela desenvolvida.

Feitos os elogios devidos à opção adotada pelo NCPC, a indagação

interessante a ser feita é a seguinte: se não há coisa julgada, escoado o prazo de dois anos

para a ação prevista no § 2º, respeitados os prazos prescricionais, não poderia qualquer

das partes ajuizar outra ação visando a discutir o mesmo bem da vida, com inegável

repercussão na tutela antecipada estabilizada?

A resposta que se impõe é positiva. O prazo de dois anos encerra a

possibilidade de se ajuizar um ação que reabra a discussão do processo extinto, nos

exatos limites e contornos da lide originária na qual se deferiu a antecipação de tutela.

Passado esse prazo, diante da inexistência de coisa julgada acerca da matéria, nada

impede que qualquer das partes, respeitados os prazos prescricionais pertinentes, ingresse

com uma nova demanda, com cognição exauriente, que diga respeito ao mesmo bem da

vida discutido na ação que foi extinta. Nessa hipótese, não haverá de se falar, obviamente,

em manutenção da mesma regra da ação anteriormente extinta com relação ao ônus da

prova, pois se instaurará uma nova lide, sem qualquer vinculação com aquela outra

extinta, cuja decisão poderá – mas não necessariamente deverá – influir na decisão que

antecipou a tutela. Fechar essa possibilidade seria o mesmo que dar prevalência a uma

decisão de cognição sumária em relação a uma decisão fruto de cognição exauriente e

completa, com o que não podemos concordar”.

Aliás, dentro do prazo decadencial de dois anos a parte poderá ajuizar ação

principal para discutir a matéria de mérito.

Tal solução se justifica, eis que não podemos admitir o mesmo status

processual a uma cognição não exauriente àquele provimento baseado em cognição

exauriente.

358 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.514.

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Comentando a opção legislativa, entendemos da mesma forma que a função

precípua do processo civil no Estado Democrático de Direito é a obtenção de uma decisão

justa, que atenda as finalidades.

A questão que se coloca é se passados os dois anos, seria possível o

exaurimento da cognição?

A resposta parece ser afirmativa, pois perfeitamente possível reavivar o

debate até o decurso dos prazos previstos no direito material de prescrição, decadência e

mesmo supressio.

O interesse maior a prevalecer é mesmo a justa composição da lide, devendo

ser prestigiada a inafastabilidade da ação em sua forma exauriente rumo à formação da

coisa julgada.

Aliás, as próprias partes podem não ter interesse em não se submeter aos

efeitos da coisa julgada material.

Dessarte, são disponibilizados meios mais céleres para solução das

controvérsias, porém sem submeter-se ao manto da coisa julgada.

O direito material poderá ser objeto de rediscussão, podendo modificar a

tutela satisfativa, a teor do disposto no artigo 304 § 3º do NCPC.359

359 Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão

que a conceder não for interposto o respectivo recurso. § 1o No caso previsto no caput, o processo será extinto. § 2o Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a

tutela antecipada estabilizada nos termos do caput. § 3o A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por

decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2o. § 4o Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a

medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2o, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida.

§ 5o O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2o deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1o.

§ 6o A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2o deste artigo.

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Ora, a estabilização da tutela provisória nada mais é do que o emprego da

técnica da ação monitória para situações de urgência, viabilizando a obtenção de resultados

práticos diante da inércia do réu.

Logo, o modelo da ação monitória360 acaba por ser aplicado de forma

genérica.

O instituto foi inspirado no Direito Francês (référé – artigos 485 a 492 e sur

requête – artigos 493 a 498) e no Direito Italiano (provedimenti d’urgenza com

strumentalità attenuata).

Humberto Theodoro Jr.361 traça considerações importantes sobre o sistema

francês, asseverando a necessidade de ser observado o princípio da ampla defesa:

“Poder-se-ia, ainda, na linha evolutiva do instituto, levantar as seguintes

perspectivas, extraídas do référé francês:

360 Art. 700. A ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita

sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz: I - o pagamento de quantia em dinheiro; II - a entrega de coisa fungível ou infungível ou de bem móvel ou imóvel; III - o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer. § 1o A prova escrita pode consistir em prova oral documentada, produzida antecipadamente nos

termos do art. 381. § 2o Na petição inicial, incumbe ao autor explicitar, conforme o caso: I - a importância devida, instruindo-a com memória de cálculo; II - o valor atual da coisa reclamada; III - o conteúdo patrimonial em discussão ou o proveito econômico perseguido. § 3o O valor da causa deverá corresponder à importância prevista no § 2o, incisos I a III. § 4o Além das hipóteses do art. 330, a petição inicial será indeferida quando não atendido o disposto

no § 2o deste artigo. § 5o Havendo dúvida quanto à idoneidade de prova documental apresentada pelo autor, o juiz intimá-

lo-á para, querendo, emendar a petição inicial, adaptando-a ao procedimento comum. § 6o É admissível ação monitória em face da Fazenda Pública. § 7o Na ação monitória, admite-se citação por qualquer dos meios permitidos para o procedimento

comum. Art. 701. Sendo evidente o direito do autor, o juiz deferirá a expedição de mandado de pagamento, de

entrega de coisa ou para execução de obrigação de fazer ou de não fazer, concedendo ao réu prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento e o pagamento de honorários advocatícios de cinco por cento do valor atribuído à causa.

§ 1o O réu será isento do pagamento de custas processuais se cumprir o mandado no prazo. § 2o Constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial, independentemente de qualquer

formalidade, se não realizado o pagamento e não apresentados os embargos previstos no art. 702, observando-se, no que couber, o Título II do Livro I da Parte Especial.

§ 3o É cabível ação rescisória da decisão prevista no caput quando ocorrer a hipótese do § 2o. § 4o Sendo a ré Fazenda Pública, não apresentados os embargos previstos no art. 702, aplicar-se-á o

disposto no art. 496, observando-se, a seguir, no que couber, o Título II do Livro I da Parte Especial. § 5o Aplica-se à ação monitória, no que couber, o art. 916.

361 Humberto Theodoro Jr., A Autonomização e a Estabilização da Tutela de Urgência no Projeto de CPC, p. 13 - 59.

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a) possibilidade de as partes estabelecerem contratualmente a opção pelo

regime do procedimento de cognição sumária, inclusive com o estabelecimento de

presunção de urgência, de modo que todas as medidas derivadas daquele negócio

jurídico seriam submetidas ao procedimento antecipatório, com a urgência

presumida contratualmente pelas partes;362

b) criação de ponte ou passagem (passerelle) entre o procedimento de

cognição sumária e o procedimento de cognição plena,363 de modo que se o juiz

entender que não cabe o procedimento preparatório pode determinar a passagem

imediata para o procedimento de cognição plena.

O tema é dos mais importantes – não obstante as dificuldades e mesmo

críticas a respeito da autonomização e estabilização da tutela antecipada -364 e

merece toda a atenção, como destaca a doutrina italiana, dos estudiosos e

362 Vuitton; Vuitton, op. cit., p. 19-20: “Les parties à un contrat peuvent s’accorder a priori pour sommettre un éventuel litige au juge des référés. (…) La Cour de cassation paraìt aujourd’hui autoriser les clauses qui préconstituent l’urgence en prévoyant indépendamment de son existence réelle au moment où l’ordonnance sera rendue, le recours au juge des référés. Ceci dispense le juge d’avoir à relever l’urgence avant de statuer lorsque cette condition est nécessaire. La Haute Juridiction ne semble plus imposer de celui qui l’invoque en application d’une clause contractuelle la preuve de l’urgence”. Todavia, como destacam Vuitton; Vuitton, op. cit., p. 20-21, a jurisprudência da Corte de Cassação não aceita o contrário, ou seja, que as partes disponham contratualmente a proibição de usar o procedimento do référé: “Cependant, si la Cour de cassation respecte le jeu de la volonté contractuelle, c’est uniquement lorsque celle-ci étend le champ d’intervention et les pouvoirs du juge des référés. En revanche, elle protège ce champ d’intervention des stipulations contractuelles qui auraient pour effet ou objet de le restreindre en privant de pouvoirs le juge des référés dans des circonstances où la loi lui confère normalement. (…) Une telle solution permet d’éviter les abus nés, par exemple, de l’inégale puissance ou compétence des contractants, qui permettrait à la partie de la plus forte de profieter de la faiblesse de son cocontractant en cas d’urgence pour en tirer un avantage indu, sans qu’une juge puisse intervenir avec rapidité e efficacitté”. 363 A respeito do mecanismo denominado, no direito francês, passerelle confiram-se as lições de Vuitton; Vuitton, op. cit., p. 174: “On doit cependant évoquer, même si ce n’est pas à proprement parler une atteinte à l’autonomie du référé, la pratique dite ‘de la passerelle’. Cette partique permet dans l’intérêt des parties, qu’elles le demandent ou que l’urgence le justifie, au juge des référés de renvoyer directement l’affaire devant le juge du fond à la date qu’il fixe. Par application de l’art. 811 du Nouveau Code de Procédure Civile, issu du Décret du 28.12.1998, l’ordonnance du juge des référés emporte saisine de la juridiction du fond, sans qu’une nouvelle assignation ne soit nécessaire, contrairement au régime antérieur. Ce procédé applicable initialement devant le tribunal de grande instance, a été instauré devant le tribunal d’instance par le Décret du 20/2004, instituant l’art. 849-1 du Nouveau Code de Procédure Civile. Et le Décret du 28.12.2005 a étendue cette simplification procédurale au tribunal de commerce par le nouvel art. 873-1 du Nouveau Code de Procédure Civile et au tribunal paritaire des baux ruraux par l’édiction de l’art. 8967 du même Code”. 364 Parte da doutrina italiana aponta que a chamada tutela sumária não seria terapia ou remédio aceitável para melhorar o desempenho da Justiça. Cf. Consolo, op. cit., p. 62: “Non è con la creazione di riti sommari né con il crescente ricorso alla tutela cautelare anticipatoria che quel rischio può essere di per sé debellato, come la storia anche italiana ha mostrato: si tratta di espedienti, non di rado, nocivi, non certo di terapie accettabili”.

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operadores do direito,365 já que não há dúvida, trata-se de ruptura com o sistema

anteriormente vigente e que leva ao repensamento da função do processo366 e das

tutelas sumárias.

Assim, com o novo Projeto do Código de Processo Civil, o direito brasileiro

volta-se para as modernas ideias que surgem no direito europeu, no sentido de

permitir à tutela sumária absorver nova configuração, não só para resolver as

situações de urgência, mas para atuar também em prol da economia

processual, economizando o juízo de cognição plena quando, deferida ou indeferida

a tutela sumária, a parte já tem a percepção que seu direito não é forte o bastante

para ser levado adiante, de modo que só em casos de divergência séria é que se

poderia seguir adiante com o processo de cognição plena.367

Em suma, como aponta autorizada doutrina italiana, a evolução da tutela

sumária para a edição de medidas que, sem transitar em julgado, são hábeis para

solução da crise de direito material sem necessidade de se recorrer ao processo de

cognição plena, é hoje um dado adquirido, de modo que a tutela sumária constitui

importante forma alternativa de tutela dos direitos em relação àquela prestada pelo

tradicional processo de conhecimento.368

Com isso sugere a doutrina comportamento de prudência que, antes de negar

aprioristicamente qualquer tipo de legitimidade da nova tutela, implica trabalhar no

365 Querzola, Tutela cautelare e dintorni… cit., p. 408, aponta o importante papel da doutrina para conferir eficácia aos novos instrumentos de tutela sumária: “Ora, è tutta da verificare la bontà della riuscita, nella prassi applicativa, della pur pregevole ricetta dettata dal legislatore che è intervenuto sulle norme in tema de cautela. Se i risultati concreti della riforma dovessero riverlarsi di gran lunga inferiori alle aspettative, occorerrà che gli operatori (e con ciò intendo legislatore, giudici e dottrina) si mettano di buon grado a cercare di individuare quali ne siano le causa e a studiare i relativi rimedi, perché è nella sede della sommarietà e dell’antecipazione che si giocano le carte della giustizia del futuro”. 366 Cf. Querzola, La tutela antecipatoria… cit., p. 3. 367 Proto Pisani, Verso la residualità… cit., p. 58-59. 368 Querzola, La tutela antecipatoria… cit., p. 182: “Considerando l’argomento di queste righe e tentando un pronostico per il futuro, mi pare si debba riconoscere che, se nella concezione del modello di processo ideale che ispirò il legislatore del 1940 la cognizione piena faceva la parte del leone a fronte di una cognizione sommaria che rappresentava l’eccezionalità dell’ipotesi, la giustizia del futuro (sulla scorta dell’esperienza del nostro passato prossimo) vede un ribaltamento delle posizioni, probabilmente sintomo di un certo svilimento contemporaneo della tensione ideale verso nobili obiettivi, ma non solo. Le esigenze che, storicamente, sono alla base dell’introduzione di tecniche di tutela, e quindi di cognizione, sommaria (individuate, prevalentemente, nell’esigenza di economia dei giudizi, di evitare l’abuso del diritto di difesa da parte del convenuto in mala fede e cha abbia torto, di assicurare l’effettività della tutela giurisdizionale), oggi non solo sono ancora presenti ma, se possibile, straordinariamente accentuate; e la dottrina più autorevole ha affermato come la tutela (e quindi la cognizione) sommaria sia una componente essenziale ed ineliminabile di un sistema di tutela giurisdizionale dei diritti che voglia essere efficiente ed effettivo”.

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sentido de assegurar que esta nova forma de atuação jurisdicional respeite os

direitos de defesa e não viole outras garantias estabelecidas da justiça civil.369

De qualquer modo, não obstante o destaque atual para o momento de

alteração legislativa, cabe sempre reiterar o constante alerta, muito bem destacado

pela doutrina italiana,370 de que a mudança legislativa é importante, mas por si só

não vai eliminar a crise da jurisdição e do processo: é preciso medidas de ordem

administrativa e gerencial, como implementação mais efetiva da informatização e

instituição de estáticas para se apurar os efeitos positivos ou negativos da

modificações, inclusive para permitir a implantação de eventuais correções de

rumo.

Imprescindível, ainda, o engajamento de juízes, promotores, advogados,

serventuários e do próprio Poder Público, de modo a se promover, como aponta a

doutrina brasileira, uma espécie de mudança de mentalidade para melhor sintonizar

os operadores do sistema processual com as ideias e objetivos que gravitam em

torno do novo modelo processual que se busca implementar.371

Diante de todo esse contexto é que se pode esperar que o Projeto de Lei e o

instituto da estabilização da tutela possa colocar o processo brasileiro em caminhos

mais efetivos para busca da implementação, em prol dos usuários do serviço

369 Idem, p. 139: “Mi pare, infatti, assolutamente condivisibile il rilievo dell’autorevole dottrina che, verificata l’evoluzione del sistema delle misure provvisorie verso la definitività e quindi la loro alternatività rispetto alla giurisdizione ordinaria, suggerisce un atteggiamento di prudenza che, lungi dal negare aprioristicamente ed in via di principio qualunque leggittimità al fenomeno, ritenga invece opportuno lavorare nel senso di assicurare che questa giurisdizione alternativa rispetti il diritto di difesa e non violi garanzie fondamentali della giustizia civile”. 370 O alerta é de Consolo, op. cit., p. 62: “Il contenimento della durata del processo è più che altro un fatto di organizzazione di mezzi e soprattutto di uomini, e solo molto secondariamente di ‘riti’ e di nuove norme. Sul piano delle regole, riforme processuali sono talora utili, ma non lo sono meno norme più semplice relative ad adempimenti collaterali (modalità delle notificazioni, fasi di ‘registrazione’ delle sentenze presso gli uffici fiscali) o più attente previsioni sull’accesso alle professioni forensi e sulla produttività degli uffici giudiziari e di tutti i loro componenti. Si tratta di un problema politico, che esige costi e presuppone programmi amministrativi, si avvantaggia di provvedimenti meno demagogici, astratti e confusi di quelli che hanno punteggiato l’ultimo quarto del secolo scorso e il primo scorcio del presente, e al contempo dello svecchiamento di tante abitudini che rendono curiosa la macchina giudiziaria italiana”. 371 No direito brasileiro, Bedaque, Direito e processo: influência do direito material sobre o processo, p. 70: “É preciso, todavia, que tais iniciativas de reformulação não se limitem ao aspecto legislativo do direito processual. Mais importante do que alterar a lei é mudar a mentalidade dos operadores desse ramo do direito, que devem se conscientizar dos verdadeiros objetivos de sua ciência. Parece equivocada a ideia de que todos os males do processo se encontram na legislação”.

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público da Justiça, da nova garantia constitucional da duração razoável do processo

(art. 5.º, LXXVIII, da CF/88, introduzido pela EC 45/2004).”

Na França e na Itália mostra-se suficiente a satisfatividade fática, ainda que

a resolução da questão jurídica seja provisória.

Roberta Tiscini372 esclarece que “accade così che la decisione en référé,

ancorché provvisoria in diritto, diventi definitiva in fatto, esplicando illimitatamente nel

tempo la sua efficacia, data l’inerzia delle parti rispetto alla strada – pur sempre practicable

– del giudizio a cognizione piena”.

Da mesma forma, Alessandro Jommi373: “Così l’ordinanza, provvisoria in

diritto, potrà diventare definitiva in fatto”.

Portanto, não há formação de coisa julgada com o référé.

A preocupação na Europa era com a efetividade jurisdicional, não com a

certificação do direito. Edoardo Ricci374 afirma que “a eficácia da medida urgente de cunho

antecipatório cessa de se manifestar caso seja ulteriormente prolatada decisão contrária” e

assim, a estabilidade garante a regulação fática da situação jurídica, de modo a não ser

necessária uma demanda principal.

Embora extinto o processo, a decisão que concedeu a tutela provisória

satisfativa antecedente estabilizada conservará seus efeitos.

Para que tal ocorra, porém, o autor deve formular a pretensão em caráter

antecedente, e não tenha manifestado, na petição inicial, a intenção de prosseguir o

processo após o deferimento da tutela – pressuposto negativo.

Prevista no artigo 304 do NCPC, passaremos a tratar da estabilização da

tutela antecipada.

Esta sem dúvida é uma novidade no Direito Processual Civil Brasileiro.

372 Roberta Tiscini, I provvedimenti decisori senza accertamento, p.254. 373 Alessando Jommi, Il référé provision: Ordinamento francese ed evoluzione della tutela sommaria anticipatoria in italia, p.72. 374 Edoardo F. Ricci, In Tutelas de urgência e cautelares, p.384.

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Comentando esta inovação, Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lucia

Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello375

com clareza explicam:

“Ao analisar o tema aqui estudado, ganha importância a diferenciação

entre ambas, porquanto a regra da estabilização da tutela de urgência, ao menos numa

interpretação literal, serve tão somente à tutela antecipada, não valendo para a cautelar.

Isso se dá, porque a técnica conservativa empregada pela tutela cautelar,

presume a adoção de uma providência protetiva temporária, que deve ser eficaz até que a

parte possa ser satisfeita pelo pedido principal. Utilizando-se desse raciocínio, fica difícil

imaginar a estabilização de efeitos cautelares. Exemplifica-se como arresto. Como se

justifica que tal medida subsista por tempo indeterminado, retirando o bem da disposição

do devedor, sem permitir, entretanto, a satisfação do direito material do credor?

Assim, a técnica da estabilização volta-se à tutela antecipada e não à tutela

cautelar. O NCPC fará ressurgir a discussão sobre a natureza da medida de urgência

concedida, se cautelar ou satisfativa. Desta vez, com requintes de crueldade: sem o auxílio

da fungibilidade.

Merece também ponderar que, ao que parece, o NCPC previu a

estabilização somente para a tutela antecipada concedida em caráter antecedente. Ao

menos, é o que novamente sugere uma interpretação literal do caput do art. 304, ao prever

‘a tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável.’ Admitindo esse

raciocínio, resulta que a tutela antecipada concedida incidentalmente não tem o condão

de ‘estabilizar-se’, impondo-se o prosseguimento do processo visando a uma decisão final,

apta à formação de coisa julgada material.

A questão é interessante e merece ser discutida. Por que se justifica o

tratamento diferente? Segundo Humberto Theodoro Jr., com quem concordamos, ‘nada

justifica tratamento diverso, pois não há diferença substancial entre a estabilização no

curso do procedimento de cognição plena ou naquele prévio ou antecedente: em ambos os

375 Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lucia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.511.

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casos, a tutela sumária é deferida com base nos mesmos requisitos e cumpre o mesmo

papel ou função.”376

Esta importante inovação encontra-se em harmonia com o princípio da

efetividade, e uma vez estabilizada, a tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto

não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito havida na ação.

Registre-se também que também não haverá estabilização ainda na ausência

de recurso quando o autor não providenciar o aditamento da petição inicial conforme

determina o artigo 303, inciso I do NCPC.

Outra questão que se coloca é na extinção do processo onde foi concedida a

tutela, inexistindo recurso.

A Professora Dra. Teresa Wambier377 comenta:

“A resposta está no § 2º, que prevê que qualquer das partes poderá

demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada

estabilizada. Trata-se de outra ação, com cognição exauriente, movida por aquele que

quer discutir a antecipação de tutela.

Parece-nos, todavia, que essa nova demanda reabre, por assim dizer, a

discussão do processo extinto, aprofundando a cognição até então exercida e, por isso,

não altera a distribuição originária do ônus da prova. Assim, caso seja o réu da ação

extinta a assumir a condição de autor dessa segunda demanda, não haverá a

redistribuição do ônus da prova, de forma que o réu dessa segunda ação (autor da ação

extinta), continuará tendo o ônus de provar o fato constitutivo de seu direito.

376 O exemplo é dado por Eduardo Talamini. (Tutela de urgência e o projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a “monitorização” do processo civil brasileiro. RePro. Vol.209.p.13, São Paulo: RT, jul.2012). E prosseguem os autores: (...) Ainda neste contexto, convém indagar acerca da possibilidade de estabilização da tutela de evidencia (art.311). Na mesma esteira das considerações anteriores, não vemos qualquer razão para que seja tolhida essa possibilidade. Na tutela de evidência, em razão da grande probabilidade do direito em favor do autor, também deve ser permitida a técnica da estabilização, evitando-se com isso o prosseguimento do processo, caso não haja um recurso contra a decisão que a concede. Por tais razões, percebe-se que, a nosso ver o legislador escreveu menos do que queria dizer (minus scripsit quam voluit). A técnica da estabilização, para surtir os efeitos desejados, deve ser interpretada de forma ampla, apta a incidir sobre todas as formas de tutela, tanto na forma antecedente quanto incidental, e ainda na tutela de evidência antecipada. Somente a tutela cautelar deve ficar excluída da técnica da estabilização.” 377 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.513.

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De qualquer forma, uma vez estabilizada, a tutela antecipada conservará

seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito havida

na ação adrede mencionada (§ 3º). Não se nega, porém, ao autor dessa ação mencionada

no § 2º que visa à revogação da antecipação da tutela estabilizada, a possiblidade de

pretender liminarmente (igualmente a título de antecipação de tutela), a suspensão dos

efeitos daquela.

Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que

foi concedida a medida estabilizada, para instruir a petição inicial da ação para discuti-

la. Nesse caso, será prevento o juízo em que a tutela antecipada estabilizada foi concedida

(§4º).”

Eduardo Talamini378 ressalta que a segurança jurídica da coisa julgada pode

revelar-se necessária para a satisfação das partes envolvidas na causa.

Portanto, se o autor desejar prosseguir, deverá informar esta intenção desde

logo, na petição inicial.

A vantagem para o requerido é que poderá simplesmente aceitar a decisão

antecipatória, dispensando a impugnação, diminuindo custos do processo, aplicando-se o

artigo 701, “caput” § 1º do NCPC.

Não é possível que a opção pelo prosseguimento se dê no aditamento379 à

petição inicial, eis que o prazo de quinze dias no mínimo poderá coincidir ou mesmo

superar o do recurso380.

378 Eduardo Talamini, Tutela de urgência no Projeto de novo Código de Processo Civil: a estabilização da medida urgente e a ‘monitorização’ do processo brasileiro, p.26 e 27. 379 Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo. § 1o Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:

I - o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar;

II - o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na forma do art. 334; III - não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335. § 2o Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo, o processo será extinto

sem resolução do mérito. § 3o O aditamento a que se refere o inciso I do § 1o deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem

incidência de novas custas processuais.

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A decisão que conceder a tutela provisória satisfativa deve ser em caráter

antecedente.

É passível de estabilização a decisão que concede a liminar mesmo após a

justificação.

Uma dúvida que pode surgir é se a decisão que concede parcialmente a

tutela poderá ser objeto de estabilização.

Em meu ponto de vista a resposta é positiva, eis que na hipótese, sobrevindo

a inércia do réu, apenas este capítulo decisório será objeto de estabilização, prosseguindo

quanto as demais matérias.

Outrossim, há necessidade da inércia do réu diante da tutela, não podendo

impugnar a decisão, pouco importando se o recurso interposto tempestivamente tenha sido

conhecido ou não.

Fredie Didier Junior, Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga381

discordam de Eduardo Talamini e Leonardo Greco, entendendo que a revelia não seria um

pressuposto necessário.

§ 4o Na petição inicial a que se refere o caput deste artigo, o autor terá de indicar o valor da causa, que

deve levar em consideração o pedido de tutela final. § 5o O autor indicará na petição inicial, ainda, que pretende valer-se do benefício previsto

no caput deste artigo. § 6o Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional

determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito. 380 Art. 1.003. O prazo para interposição de recurso conta-se da data em que os advogados, a sociedade de advogados, a Advocacia Pública, a Defensoria Pública ou o Ministério Público são intimados da decisão.

§ 1o Os sujeitos previstos no caput considerar-se-ão intimados em audiência quando nesta for proferida a decisão.

§ 2o Aplica-se o disposto no art. 231, incisos I a VI, ao prazo de interposição de recurso pelo réu contra decisão proferida anteriormente à citação.

§ 3o No prazo para interposição de recurso, a petição será protocolada em cartório ou conforme as normas de organização judiciária, ressalvado o disposto em regra especial.

§ 4o Para aferição da tempestividade do recurso remetido pelo correio, será considerada como data de interposição a data de postagem.

§ 5o Excetuados os embargos de declaração, o prazo para interpor os recursos e para responder-lhes é de 15 (quinze) dias.

§ 6o O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso. 381 Fredie Didier Junior, Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga, Curso de Direito Processual Civil, p.608.

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203

Ora, o prazo para defesa tem como termo inicial a audiência de conciliação

ou mediação ou o pedido de cancelamento da audiência.382

Na hipótese de não haver composição, desnecessária a designação de

audiência de conciliação ou mediação, e nesse caso o termo inicial para apresentação de

defesa é a intimação do aditamento à petição inicial.

Caso seja apresentada defesa, afastada fica a possibilidade de estabilização,

já que o suplicado não se manteve inerte.

Em nosso entendimento, também não será possível a estabilização na

hipótese de ter sido o réu citado por edital ou por hora certa, bem como preso ou incapaz,

devendo ser-lhe nomeado um curador especial.

Na hipótese de inércia da Fazenda Pública, também existe a possibilidade

de estabilização, aplicando-se o art. 700 §6º do NCPC.

Possível ocorrer também a inércia parcial do suplicado, sendo que os

demais capítulos da decisão são atingidos pela estabilização.

Podemos cogitar a hipótese de o autor não aditar a petição inicial. A

consequência será a extinção do processo sem resolução do mérito. Pode ocorrer, no

entanto, que a tutela seja deferida, mas o autor não adite o pedido e o réu não apresente

impugnação.

Entendemos que neste caso a tutela restará estabilizada.

382 Art. 335. O réu poderá oferecer contestação, por petição, no prazo de 15 (quinze) dias, cujo termo inicial será a data:

I - da audiência de conciliação ou de mediação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição;

II - do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação ou de mediação apresentado pelo réu, quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4o, inciso I;

III - prevista no art. 231, de acordo com o modo como foi feita a citação, nos demais casos. § 1o No caso de litisconsórcio passivo, ocorrendo a hipótese do art. 334, § 6o, o termo inicial previsto

no inciso II será, para cada um dos réus, a data de apresentação de seu respectivo pedido de cancelamento da audiência.

§ 2o Quando ocorrer a hipótese do art. 334, § 4o, inciso II, havendo litisconsórcio passivo e o autor desistir da ação em relação a réu ainda não citado, o prazo para resposta correrá da data de intimação da decisão que homologar a desistência.

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A tutela também poderá ser estabilizada de acordo com a convenção das

partes (art. 190, NCPC)383.

Logo, é possível a estabilização independentemente do requerimento

expresso do autor na petição inicial, bem como na hipótese de revelia, preservando-se o

direito do autor prosseguir o processo para alcançar cognição exauriente com força de

coisa julgada, como preleciona Fredie Didier.

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados

anunciou Enunciados sobre a aplicação do Novo Código de Processo Civil384, valendo

destacar que: “(...) Na estabilização da tutela antecipada, o réu ficará isento do

pagamento das custas e os honorários deverão ser fixados no percentual de 5% sobre o

valor da causa (art. 304, caput, c/c o art. 701, caput, do CPC/2015)”.

Bruno Garcia Redondo385 em artigo intitulado “Estabilização, Modificação

e Negociação da Tutela de Urgência Antecipada Antecedente: Principais Controvérsias”

aborda que o novo Código passou a prever, expressamente, 2 (dois) procedimentos

preparatórios de tutela provisória urgência: o da tutela cautelar requerida em caráter

antecedente (arts. 305 a 310) e o da tutela antecipada requerida em caráter antecedente

(arts. 303 e 304) e destaca controvérsias acerca da estabilização da tutela antecipada

antecedente. Para o autor, a interpretação constitucional mais adequada, à luz das garantias

do contraditório e da ampla defesa, é a de que qualquer ato impugnativo lato sensu do réu,

apresentado dentro do prazo do recurso, deve servir ao condão de impedir a estabilização

da tutela antecedente e a extinção do processo: seja a interposição de agravo de

instrumento, seja a apresentação de sucedâneo recursal (v.g., suspensão de segurança), seja

a propositura de demanda impugnativa autônoma (no caso, apenas a reclamação, já que

ação rescisória seria descabida por ainda inexistir coisa julgada, sendo também descabido

383 Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade. 384 http://www.enfam.jus.br/2015/09/enfam-divulga-62-enunciados-sobre-a-aplicacao-do-novo-cpc/ acesso em 13/09/2015. 385 Bruno Garcia Redondo, Estabilização, Modificação E Negociação da Tutela de Urgência Antecipada Antecedente: Principais Controvérsias, p. 167 - 192.

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mandado de segurança pelo fato de a lei prever agravo de instrumento contra dita decisão),

seja ainda a apresentação, em primeiro grau, de contestação ou reconvenção.

Concordamos com Bruno Garcia Redondo eis que o procedimento

satisfativo autônomo deveria permitir uma formação mais célere de coisa julgada material,

já de imediato ou em até 60 dias (em linha assemelhada à da proposta original de antigo

Anteprojeto de Lei resultante de grupo de estudos do IBDP, formado por Ada Pellegrini

Grinover, José Roberto dos Santos Bedaque, Kazuo Watanabe e Luiz Guilherme

Marinoni), em vez da prolongada provisoriedade que caracteriza as medidas

autosatisfactivas do Direito argentino, a tutela sumária italiana (provvedimenti

d’urgenza com strumentalità attenuata), o référé e requête franceses e o longo prazo de 2

anos que veio a ser adotado pelo Direito brasileiro no CPC/2015:

“O legislador de 2015 perdeu uma excelente oportunidade de consagrar,

expressamente, a possibilidade de utilização da técnica da estabilização (com

extinção do processo) em duas outras esferas: (i) para a tutela antecipada que,

concedida incidentalmente, não viesse a ser impugnada tempestivamente, tal como

ocorre nos Direitos italiano e francês;29 e (ii) para a tutela da evidência, que deveria

ser passível de requerimento em caráter antecedente.30 Consideramos que, com as

necessárias adaptações procedimentais, é possível – de lege lata, em interpretação

sistemática – a adoção da técnica da estabilização (com eventual extinção do

processo) para a tutela antecipada incidental e a formulação de requerimento

antecedente de tutela da evidência, com possibilidade de estabilização de efeitos e

extinção da demanda”.

Outra dúvida levantada pelo autor Bruno Garcia Redondo que provocará

intensas discussões é acerca do ônus da prova na modificação da tutela antecipada

antecedente.

A meu ver, o ônus da prova permanece com o autor, a quem compete provar

o fato constitutivo do seu direito.

Expõe Bruno Garcia Redondo:

“(...) Como explicado anteriormente, inexistindo impugnação recursal pelo

réu contra a decisão que concede integralmente a tutela antecipada antecedente, a

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medida se estabiliza e o processo é extinto (art. 304, caput e § 1.º). A parte que

desejar a revisão, a reforma ou a invalidação da tutela antecipada antecedente

estabilizada, deverá propor uma nova demanda, destinada à modificação da tutela

(art. 304, § 2.º). Após a estabilização da tutela e a extinção do processo, fica

inviabilizada a apresentação de simples petição, nos próprios autos originais, para

formulação de pedido de modificação da tutela estabilizada. É essencial, para tal

finalidade, a propositura de nova ação. Em outras palavras, os efeitos da tutela

antecipada estabilizada ficam conservados enquanto não houver revisão, reforma ou

invalidação da tutela em sede de decisão proferida na ação de modificação (art.

304, § 3.º). A petição inicial da ação de modificação deve ser dirigida, por

prevenção, ao juízo em que a tutela antecipada foi concedida (critério funcional e,

assim, absoluto de fixação de competência), sendo permitido a qualquer das partes,

se os autos processuais forem físicos, requerer o desarquivamento dos autos em que

foi concedida a medida, para que possam ser extraídas cópias destinadas a instruir a

petição inicial da ação de modificação (art. 304, § 4.º). As regras contidas nos §§ 5.º

e 6.º do art. 304 têm sido objeto de intensa controvérsia. O § 5.º afirma que o direito

de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada (§ 2.º) extingue-se após 2 (dois)

anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo (§ 1.º). Já o § 6.º diz

que “a decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos

respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar,

proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2.º deste artigo”.

Esse prazo bienal, previsto para a propositura da ação de modificação, tem

natureza decadencial (não admitindo suspensão nem interrupção) e começa a correr

da intimação, das partes, sobre a decisão que determina o arquivamento dos autos.

A qual das partes cabe o onus probandi nesta nova demanda, destinada à

modificação da tutela estabilizada? Há especialistas que sustentam que o ônus da

prova cabe ao autor da ação de modificação (seja ele o autor ou o réu da ação

antecedente),386 enquanto outros estudiosos defendem que o ônus da prova quanto

aos fatos constitutivos permanece com o autor da ação originária, mesmo que ele

386 Eduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa. Op. cit., p. 125 e ss. Aparentemente também nesse sentido, DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Op. cit., p. 611; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 218; TALAMINI, Eduardo. Op. cit., p. 13-34; e MACHADO, Marcelo Pacheco. Op. cit., p. 233-266.

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venha a ser o réu da ação de modificação.387 A nosso ver, deve ser observada a

regra geral dos incs. I e II do art. 373, cabendo o ônus da prova, quanto aos fatos

constitutivos (delineados na petição inicial da ação de modificação), àquele que

estiver na posição de autor da ação de modificação (seja ele o autor ou o réu do

pedido antecedente), salvo se houver distribuição dinâmica (art. 373, §§ 1.º e 2.º c/c

art. 357, III) ou negócio processual relativo ao onus probandi (art. 373, §§ 3.º e 4.º

c/c art. 190)”.

Outra dúvida é quanto ao momento da revisão da tutela antecipada

antecedente estabilizada.

Também penso que é possível a revisão da tutela anteriormente concedida,

comungando o mesmo entendimento de Bruno Garcia Redondo:

“Proposta a ação de modificação, em qual momento pode ser revista a tutela

antecipada antecedente, até então estabilizada: cabe decisão liminar nesta nova

demanda, ou a modificação pode vir somente na sentença final desta ação? Ora, do

mesmo modo que o juiz se convenceu liminarmente dos argumentos do autor do

requerimento de tutela antecedente, pode o magistrado convencer-se, de início, dos

fundamentos do autor da ação de modificação, de modo a rever a decisão sobre a

tutela antecipada, ainda que provisoriamente, já no início da ação de modificação.

Em outras palavras, a tutela antecipada estabilizada pode ser alterada em qualquer

fase da ação de modificação, tanto liminarmente inaudita altera parte, quanto

incidentalmente no curso dessa nova demanda, como ainda ao final da mesma, na

sentença final, dependendo do momento em que o juiz se convença da presença dos

elementos que devem gerar a modificação da tutela até então estabilizada”.

Outra questão que vem preocupando os doutrinadores, segundo Bruno

Garcia Redondo, é quanto às consequências do esgotamento do prazo de dois anos para

propositura da ação de modificação, surgindo controvérsias:

“Há polêmicas girando em torno das consequências resultantes do

esgotamento do prazo de 2 anos sem a propositura da ação de modificação. Já há,

387 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Op. cit., p. 513; e THEODORO JR., Humberto; ANDRADE, Érico. Op. cit., p. 13-59.

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ao menos, 3 (três) entendimentos sobre o tema. Primeiramente, alguns estudiosos

defendem que, encerrado esse prazo, deixa de caber qualquer ação, seja a ação

rescisória, seja uma demanda autônoma destinada a debater o mérito.388 Outros

especialistas sustentam que inexiste coisa julgada e, por essa razão, não cabe ação

rescisória, sendo possível, porém, a propositura de uma ação destinada a debater o

mérito (formulação de pedido em sentido diverso), dentro do prazo prescricional ou

decadencial do direito material.389 Há processualistas, ainda, que defendem a

formação de julgada material390 e, por consequência, o cabimento exclusivo de ação

rescisória, e não de ação objetivando discutir o mérito.

Há estudiosos que tem defendido que, esgotado o prazo de 2 anos sem a

propositura da ação de modificação, deixa de caber qualquer ação. Seria descabida,

de início, demanda autônoma destinada a debater o mérito (e, no plano prático, a

modificar os efeitos da tutela estabilizada). Também seria descabida ação rescisória

porque, para essa corrente, não haveria formação de coisa julgada material,391 por

alguns fundamentos: a tutela antecedente fundar-se-ia em cognição não exauriente;

a coisa julgada recairia sobre o conteúdo da decisão, e não sobre seus efeitos; e o §

6.º do art. 304 indicaria a impossibilidade de formação de coisa julgada. É nesse

sentido, inclusive, que esses autores têm interpretado o Enunciado 33 do Fórum

Permanente de Processualistas Civis.392

Em sentido parcialmente contrário, há autores que também consideram

inexistir formação de coisa julgada material após os 2 anos sem a propositura de

demanda de modificação, razão pela qual seria descabida a propositura de ação

rescisória. Essa corrente, porém, defende que, pelo fato de não haver coisa julgada

material, seria cabível a propositura de uma demanda autônoma destinada a discutir

o direito material, formulando pedido em sentido contrário (o que, no plano prático,

388 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Op. cit., p. 612; SOUZA, Artur César de. Op. cit., p. 151-186; e OLIVEIRA, Weber Luiz de. Op. cit., p. 225-250. 389 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Op. cit., p. 513-515; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 218; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 790-791; NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Op. cit., p. 864; e TALAMINI, Eduardo. Op. cit., p. 27-29. 390 GRECO, Leonardo. Op. cit., p. 305. 391 OLIVEIRA, Weber Luiz de. Op. cit., p. 225-250. 392 Enunciado 33 do FPPC: “(art. 304, §§) Não cabe ação rescisória nos casos estabilização da tutela antecipada de urgência”.

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poderia ensejar a modificação dos efeitos da tutela estabilizada), cabível durante o

prazo prescricional ou decadencial correspondente ao direito substancial debatido

em juízo. Nesse caso, poderia haver inversão do ônus da prova, que passaria a caber

a quem se apresentasse como autor dessa ação posterior ao prazo de 2 anos para a

ação de modificação.393

Como se vê, ambos os posicionamentos entendem que inexistiria coisa

julgada material após transcorridos 2 anos sem o ajuizamento de ação de

modificação, razão pela qual ambas defendem o descabimento de ação rescisória. A

diferença entre elas é a de que, para a primeira corrente, tampouco cabe uma

demanda destinada a debater o direito material, enquanto a segunda sustenta a

possibilidade da propositura dessa ação dentro do prazo prescricional ou

decadencial previsto na lei material.

Ambos os posicionamentos apresentam alguns inconvenientes.

Para a primeira corrente, após o esgotamento do prazo de 2 anos não haveria

formação de coisa julgada, razão pela qual não caberia ação rescisória. Ocorre que

também sustenta o descabimento de ação destinada a debater o direito material

(formulação de pedido em sentido contrário), pelo prazo prescricional ou

decadencial do direito material. Ou seja, esta corrente sustenta uma imutabilidade

plena e absoluta após os 2 anos, vindo a decisão a tornar-se integralmente

“inimpugnável”. Essa imutabilidade “inominada” não seria “coisa julgada”, mas, na

prática, seria mais forte do que ela. Afinal, a decisão estabilizada não poderia ser

atacada sequer por ação rescisória (sendo, assim, mais forte do que a coisa julgada),

e ainda impediria a propositura de ação autônoma para debater o direito material

(produzindo o mesmo efeito processual da coisa julgada, apesar de não ser coisa

julgada).

Vemos duas incongruências nesse posicionamento: (i) essa estabilidade

fundada em cognição não exauriente ser “superior” à coisa julgada (impedindo, até

mesmo, ação rescisória); e (ii) essa estabilidade, sem ter natureza de coisa julgada,

produzir o efeito de impedir a propositura de ação autônoma destinada a debater o 393 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Op. cit., p. 514.

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direito material. Se assim for, se faz essencial que esses estudiosos, por coerência,

modifiquem seus conceitos de “pressupostos processuais”, passando a incluir, como

requisito de validade (objetivo extrínseco) “negativo” (isto é, impeditivo de

demanda), não apenas a coisa julgada material, mas, também, a “estabilidade”

resultante de tutela antecipada antecedente.

Já a segunda corrente defende o descabimento de ação rescisória (por

também entender que não há coisa julgada material), mas sustenta o cabimento de

uma ação autônoma destinada ao debate do direito material (formulação de pedido

em sentido contrário). O inconveniente dessa posição, a nosso ver, é esvaziar as

regras dos §§ 2.º, 3.º, 5.º e 6.º do art. 304, claras no sentido de que a modificação da

tutela estabilizada somente é possível por meio de uma ação de modificação (§§ 2.º,

3.º e 5.º), que deve ser proposta em até 2 anos (§ 6.º).

Note-se: se couber demanda destinada a debater o direito material mesmo

após 2 anos, ficarão, sem qualquer utilidade, as regras de não menos do que quatro

parágrafos (§ 2.º, 3.º, 5.º e 6.º) do art. 304. Essas regras seriam inócuas, incapazes

de gerar qualquer consequência jurídica ou qualquer sanção (processual) em caso

de seu descumprimento. Afinal, qual seria a sanção por ter sido esgotado, em

branco, o prazo de 2 anos para a ação de modificação da tutela antecipada

estabilizada, se, após esse prazo, fosse possível ajuizamento de ação destinada a

debater o direito material, (no âmbito da qual poderá haver, por consequência

lógica e prática, a modificação dos efeitos da tutela estabilizada)? Não vemos

utilidade em a lei prever um prazo rigoroso para a propositura de uma ação

específica se, caso descumprido aquele prazo e não ajuizada aquela ação, pudesse

ser proposta uma ação aparentemente diferente, em maior até mesmo maior, capaz

de produzir rigorosamente os mesmos efeitos da ação cujo prazo se perdeu.

Importante notar a clareza da redação do § 3.º: “a tutela antecipada

conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão

de mérito proferida na ação de que trata o § 2.º”. Mesma linha segue o § 6.º: “a

decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos

respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar,

proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2.º”. A lei é clara: o

§ 6.º diz que somente se modifica os efeitos da tutela estabilizada por meio de uma

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ação autônoma específica, referida no § 2.º, que deve ser proposta em até 2 anos,

conforme § 5.º.

A redação desses dispositivos impossibilita conclusão no sentido de que,

mesmo após esgotado o prazo de 2 anos, ainda seria cabível ação autônoma

destinada a, do ponto de vista prático, modificar os efeitos da tutela estabilizada.

Ora, se a conjugação das regras dos §§ 2.º, 3.º, 5.º e 6.º leva ao

entendimento de que a tutela antecipada estabilizada somente pode

ser modificada dentro de 2 anos por meio de uma demanda específica, somos

obrigados a concluir que, após o esgotamento desse prazo, fica absolutamente

impossibilitada a discussão do próprio direito material, sob pena burla àquelas

regras, já que o debate do direito material poderia, por consequência inafastável,

levar à modificação (prática e jurídica) da tutela estabilizada, o que está vedado por

aqueles quatro dispositivos. E, como essa inexorável conclusão segue no sentido da

impossibilidade de propositura de ação destinada a debater o direito material,

somos obrigados a denominar como coisa julgada material esse fenômeno que

surge com o esgotamento in albis do prazo bienal.

A nosso ver, não há maiores dificuldades em se sustentar a formação de

coisa julgada material após o encerramento do prazo de 2 anos sem a propositura da

ação de modificação.

A própria regra do § 6.º do art. 304 não impede essa conclusão. Dito

dispositivo não afirma que jamais existirá, a qualquer tempo, coisa julgada material.

Há, ali, uma afirmação simples que não há coisa julgada somente durante o

período de 2 anos previsto para a ação de modificação. Afinal, poderiam surgir

duas dúvidas: (i) se, tendo em vista a não impugnação pelo réu e a extinção do

processo (art. 304, caput e § 1.º), haveria formação de coisa julgada; e (ii) caso

houvesse coisa julgada, se seria descabida uma ação de modificação da tutela,

restando ao réu, apenas o ajuizamento de ação rescisória. O propósito do § 6.º é,

portanto, o de explicar que, apesar da extinção do processo, não há formação de

coisa julgada, razão pela qual ainda cabe, durante 2 anos, a propositura de uma ação

de modificação da tutela em primeiro grau, em vez da propositura de ação

rescisória.

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É nesse sentido que o referido dispositivo diz que não há coisa julgada,

“mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir,

reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos

do § 2.º deste artigo”. A referência a não formação de coisa julgada, acompanhada

do advérbio “mas” conectado ao trecho seguinte, que diz que a estabilidade pode

ser afastada pela ação de modificação, esclarecem que a referência que o § 6.º faz (à

inexistência de coisa julgada) restringe-se ao período em que a ação de modificação

pode ser proposta, isto é, dentro dos 2 anos após a extinção do processo.

Se, dentro dos 2 anos, não há coisa julgada, mas, após o esgotamento in

albis do biênio, a estabilidade se torna imutável (e, por consequência, se torna

vedado debate sobre o direito material), é forçoso concluir que há formação de

coisa julgada material. Afinal, o Teoria Geral do Direito Processual denomina coisa

julgada material o fenômeno que impede a (re) propositura de demandas que

busquem modificar anterior julgamento de mérito.

Alguns dos defensores da não formação de coisa julgada após os 2 anos

baseiam-se no entendimento clássico de que a coisa julgada material seria exclusiva

de decisões fundadas em cognição exauriente. Ocorre que o próprio conceito de

cognição exauriente já é controvertido em doutrina, havendo quem a entenda como

a cognição típica de qualquer sentença (seja terminativa, seja definitiva), sendo

mero sinônimo de juízo de certeza, enquanto outros a veem como a cognição

presente, exclusivamente, na sentença definitiva, que resolve o direito material.

É importante notar que o entendimento que defende que a coisa julgada

material seria exclusiva de cognição exauriente foi firmado sob a égide dos

anteriores Códigos, que não previam essa nova e complexa técnica: estabilização de

efeitos de decisão fundada em cognição não exauriente + extinção do processo +

previsão de prazo de 2 anos para propositura de ação destinada a modificar os

efeitos da tutela estabilizada. Ora, à luz de novas regras processuais, sem

precedentes até então no Direito Processual Civil brasileiro, parece essencial

atualizar-se as lições de então.

Não se nega que a decisão interlocutória, concessiva da tutela antecipada

antecedente seja fundada em cognição não exauriente. Ocorre que ela é,

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inegavelmente, decisão de mérito, pois reconhece e concede o direito material. Se o

réu não apresentar impugnação recursal, ocorre uma estabilização da tutela

antecedente (caput do art. 304), que gera a extinção do processo. A sentença

extintiva deve ser capitulada como solucionadora do mérito (art. 487, I). E, de

acordo com nosso conceito de cognição exauriente, ela é típica e própria de

qualquer sentença, sendo, portanto, capaz de formar coisa julgada (formal, se

terminativa, ou material, se definitiva).

A nova lei optou por conferir, às partes, um lapso de 2 anos dentro do qual,

apesar de proferida sentença definitiva, não há formação de coisa julgada material,

permitindo, durante esse interregno, a alteração dos efeitos da tutela estabilizada

por meio de simples ação de modificação (art. 304, §§ 5.º e 6.º), sem natureza de

ação rescisória. Esse interregno de 2 anos sem formação de coisa julgada material,

apesar de proferida sentença terminativa, deve-se, exatamente, ao fato de decisão

que concedeu a tutela (posteriormente estabilizada) ter sido fundada em cognição

não exauriente. Ora, após esgotado in albis também esse prazo de 2 anos, não

vemos como deixar de concluir que passa a ocorrer uma imutabilidade e

indiscutibilidade do mérito, formando-se, assim, coisa julgada material.

A formação de coisa julgada material após transcorrido in albis o biênio

referido no art. 304 impõe que seja definitiva, e não meramente provisória, a

execução da decisão concessiva da tutela antecipada antecedente.

A conjugação das claras regras dos §§ 2.º, 3.º, 5.º e 6.º do art. 304 leva,

portanto, às seguintes conclusões: (i) após a estabilização da tutela antecipada

antecedente concedida mediante decisão interlocutória fundada em cognição não

exauriente (caput do art. 304) e a extinção do processo mediante sentença definitiva

(art. 304, § 1.º c/c art. 487, I), começa a correr o prazo decadencial de 2 anos (art.

304, § 5.º) – dentro do qual não há formação de coisa julgada material (§ 6.º do art.

304 e Enunciado 33 do FPPC) – para a propositura de ação autônoma destinada à

modificação dos efeitos da tutela estabilizada e ao debate do direito material (§§ 2.º

e 3.º); e (ii) após o transcurso de 0 anos (§ 5.º e 6.º) sem a propositura da referida

demanda (§ 2.º), há decadência do direito de se apresentar a ação de modificação

da tutela e debate do direito material e, ainda, forma-se coisa julgada

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material,394 tornando-se cabível, apenas, a propositura de ação rescisória (desde que

presentes seus pressupostos de cabimento, conforme art. 966), sendo descabida

qualquer ação autônoma destinada a rediscutir o direito material.”

5.25. Ação principal depois da estabilização

Como visto linhas acima, plenamente possível o ajuizamento de ação

principal para cognição exauriente e plena, colimando rever, reformar ou invalidar a tutela

provisória objeto da estabilização.

O objetivo na verdade é o julgamento definitivo de mérito, sendo que aí sim

será produzida coisa julgada material.

Em uma importante inovação, prevê o artigo 304 §§ 2º e 5º a possibilidade

de ação autônoma para impugnar a estabilização.

Faculta-se, pois, ao autor, o ajuizamento da ação para confirmar a decisão

com cognição exauriente e a ser protegida pelo manto da coisa julgada.

O suplicado revel ou inerte também poderá ter interesse em ajuizar esta

ação, rediscutindo a questão.

No sistema jurídico anterior, o autor deveria iniciar o processo para obter a

tutela definitiva.

A parte solicitará o desarquivamento do processo em que foi concedida a

tutela de urgência e a competência para apreciação é funcional, do juiz que concedeu a

tutela.

No sistema atual, na hipótese de tutela provisória satisfativa antecedente, o

requerido tem o dever de ajuizar a ação para tentar reverter a situação, demonstrando a

probabilidade do direito que afirma ter e o risco de dano ou ilícito ou inutilidade do

resultado final.395

394 Da mesma forma, GRECO, Leonardo. Op. cit., p. 305. 395 Leonardo Greco, A Tutela de Urgência e a Tutela de Evidência no Código de Processo Civil de 2014/1015. Disponível em http:www.redp.com.br e acesso em 07/09/2015. E prossegue o autor: “O

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5.26. Prazo para ajuizamento

Outrossim, esta possibilidade não perdura indefinidamente no tempo,

estando sujeita ao prazo decadencial de dois anos conforme previsto no § 5º do artigo 304

do NCPC.

Depois de decorridos dois anos para o ajuizamento da ação para revogação

da tutela, a mesma permanece estabilizada, porém não podemos confundir com coisa

julgada.

Há distinção entre estabilização processual e coisa julgada.

Decorrido este prazo, não será mais possível a rediscussão da antecipação da

tutela.

mecanismo engendrado constituirá extraordinário desestímulo à propositura da tutela antecipada em caráter antecedente, porque ficará prejudicado o pedido principal do requerente pela inércia do requerido, tendo aquele de contentar-se com a decisão concessiva da antecipação que, apesar de estável, não fará coisa julgada, pois revogável por ação de iniciativa do requerido. Detenhamo-nos agora nessa ação revocatória de iniciativa do requerido ou do próprio requerente, se este quiser modificar o conteúdo da tutela antecipadamente concedida e não impugnada pelo requerido. Os §§ 2ᵒ a 5ᵒ do artigo 305 deixam claro que somente por meio dessa nova demanda poderá ser anulada, revogada ou modificada a tutela antecipada estabilizada. Assim, nessa hipótese, de tutela antecipada antecedente estabilizada nos termos do artigo 305, não pode o juiz de ofício revogar a qualquer tempo a tutela provisória, não se aplicando a regra geral do artigo 297, inclusive porque, passados dois anos da ciência da decisão que extinguiu o processo, incorrerá em decadência o direito de propor a ação revocatória (§ 5ᵒ), ou seja, sobrevirá efetivamente a coisa julgada. Parece-me evidente que esse prazo de decadência não se aplica às sentenças determinativas, quais sejam aquelas que dispõem sobre relações jurídicas continuativas, se tiver havido modificação do estado de fato ou de direito (art. 516, I). A propositura de nova demanda não significa necessariamente, em minha opinião, que a decisão antecipada somente possa ser revista a final desse novo procedimento comum, podendo a revogação ser igualmente antecipada, até mesmo liminarmente nessa nova ação ou em procedimento a ela antecedente, se evidenciados o fumus boni juris e o periculum in mora. Afinal, há uma conexão sucessiva entre os dois procedimentos, reconhecida pelo legislador ao considerar prevento para a demanda revocatória o juízo em que a tutela antecipada foi concedida e ao prever que os autos do procedimento antecedente poderão vir a instruir a petição inicial da nova demanda (§ 4ᵒ). Quanto à revogabilidade das demais modalidades de tutela provisória, acobertadas pela regra geral do artigo 297 que a admite a qualquer tempo, ouso recomendar que nas hipóteses de tutela cautelar ou antecipatória, de urgência ou de evidência, possam elas ser revogadas ou modificadas a qualquer tempo independentemente de demanda autônoma, mas sempre a requerimento do interessado, e não de ofício pelo próprio juiz, porque, em qualquer caso, se trata de exercício do poder jurisdicional que, salvo disposição expressa de lei, deve ater-se à provocação do interessado. Não há necessidade de processo autônomo para essa revogação, que poderá ser apreciada e decidida nos próprios autos da medida cautelar ou do processo principal. Entretanto, salvo qualificada urgência, a revogação deverá ser antecedida da indispensável audiência das partes que poderão formular alegações, propor e produzir provas antes de uma definitiva deliberação judicial. A revogabilidade pode resultar de novos fatos e novas provas ou do simples reexame pelo juiz dos fatos e circunstâncias apreciados por ocasião da concessão. Uma noção mais restrita de revogabilidade, que limite a retratação do juízo de concessão ou de denegação ao surgimento de novos fatos ou de novas provas, se, de um lado, conferiria mais estabilidade às relações jurídicas material e processual entre as partes, correria o risco de frustrar o acesso à tutela jurisdicional efetiva de interesses merecedores de proteção, já que não se pode esquecer que, tanto uma quanto outra (a concessão ou a denegação), são o resultado precário de uma cognição incompleta que, por isso mesmo, deve sempre estar sujeita a revisão das suas conclusões.”

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Nem se pode cogitar também de ação rescisória, eis que a tutela antecipada

estabilizada, segundo preleciona a melhor doutrina, não faz coisa julgada material.

Na ação monitória, a ausência de interposição de embargos provoca a

transformação da decisão provisória em definitiva, cabendo ação rescisória para

desconstituição do título.

O mesmo não ocorre no caso de inércia do suplicado na tutela provisória

satisfativa antecedente.

Dessarte, a coisa julgada não alcança questão prejudicial.396

Filiamo-nos ao entendimento de Humberto Theodoro Junior397 para quem

estabelecendo o Código um prazo para o exercício do direito de propor a questionada ação

de revisão ou invalidação, nada mais fez do que criar um prazo decadencial, que tanto pode

ser estabelecido em lei material, como em lei processual, tal como na ação rescisória398.

A competência para apreciação é do juízo que conduziu o processo

originário, aquele que concedeu a medida antecipatória estabilizada.

396 Art. 503. A decisão que julgar total ou parcialmente o mérito tem força de lei nos limites da questão principal expressamente decidida.

§ 1o O disposto no caput aplica-se à resolução de questão prejudicial, decidida expressa e incidentemente no processo, se:

I - dessa resolução depender o julgamento do mérito; II - a seu respeito tiver havido contraditório prévio e efetivo, não se aplicando no caso de revelia; III - o juízo tiver competência em razão da matéria e da pessoa para resolvê-la como questão principal. § 2o A hipótese do § 1o não se aplica se no processo houver restrições probatórias ou limitações à

cognição que impeçam o aprofundamento da análise da questão prejudicial. 397 Humberto Theodoro Jr., Curso de Direito Processual Civil, p.671. 398 Art. 975. O direito à rescisão se extingue em 2 (dois) anos contados do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

§ 1o Prorroga-se até o primeiro dia útil imediatamente subsequente o prazo a que se refere o caput, quando expirar durante férias forenses, recesso, feriados ou em dia em que não houver expediente forense.

§ 2o Se fundada a ação no inciso VII do art. 966, o termo inicial do prazo será a data de descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo.

§ 3o Nas hipóteses de simulação ou de colusão das partes, o prazo começa a contar, para o terceiro prejudicado e para o Ministério Público, que não interveio no processo, a partir do momento em que têm ciência da simulação ou da colusão.

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Trata-se de competência funcional, sendo este o juízo prevento (art. 304 § 4º

do NCPC)399.

A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados –

ENFAM aprovou, entre outros, o seguinte enunciado: “26) Caso a demanda destinada a

rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada estabilizada seja ajuizada

tempestivamente, poderá ser deferida em caráter liminar a antecipação dos efeitos da

revisão, reforma ou invalidação pretendida, na forma do art. 296, parágrafo único, do

CPC/2015, desde que demonstrada a existência de outros elementos que ilidam os

fundamentos da decisão anterior.”400

Weber Luiz de Oliveira também aborda outra matéria que encerra certa

polêmica em artigo intitulado “Estabilização da tutela antecipada e teoria do fato

consumado. Estabilização da estabilização?”401, asseverando que:

“O instituto da estabilização da tutela antecipada, incluído no Novo Código

de Processo Civil por influência doutrinária de Ada Peligrini Grinover, terá o

condão de fazer com que a decisão judicial que conceda uma tutela antecipada

satisfativa mantenha-se incólume, produzindo efeitos se a parte contrária não

agravar de instrumento desta decisão. Prestigia-se a satisfatividade da decisão

judicial e a sua efetividade.

399 Art. 304. A tutela antecipada, concedida nos termos do art. 303, torna-se estável se da decisão que a conceder não for interposto o respectivo recurso.

§ 1o No caso previsto no caput, o processo será extinto. § 2o Qualquer das partes poderá demandar a outra com o intuito de rever, reformar ou invalidar a

tutela antecipada estabilizada nos termos do caput. § 3o A tutela antecipada conservará seus efeitos enquanto não revista, reformada ou invalidada por

decisão de mérito proferida na ação de que trata o § 2o. § 4o Qualquer das partes poderá requerer o desarquivamento dos autos em que foi concedida a

medida, para instruir a petição inicial da ação a que se refere o § 2o, prevento o juízo em que a tutela antecipada foi concedida.

§ 5o O direito de rever, reformar ou invalidar a tutela antecipada, previsto no § 2o deste artigo, extingue-se após 2 (dois) anos, contados da ciência da decisão que extinguiu o processo, nos termos do § 1o.

§ 6o A decisão que concede a tutela não fará coisa julgada, mas a estabilidade dos respectivos efeitos só será afastada por decisão que a revir, reformar ou invalidar, proferida em ação ajuizada por uma das partes, nos termos do § 2o deste artigo. 400 http://www.enfam.jus.br/2015/09/enfam-divulga-62-enunciados-sobre-a-aplicacao-do-novo-cpc/ acesso em 13/09/2015. 401 Weber Luiz de Oliveira, Estabilização da tutela antecipada e teoria do fato consumado. Estabilização da estabilização? pp. 225/250.

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Eventual impugnação desta decisão então estabilizada deverá se dar por

propositura de ação com este objetivo, já que a disciplina do NCPC determina que

somente haverá contestação se a parte autora aditar a petição inicial, pedindo em

tutela final a confirmação do pedido deferido antecipadamente. Se inocorrer

aditamento o processo será extinto sem julgamento do mérito, permanecendo

estabilizada a tutela antecipada.

Dotou-se de prazo de dois anos para que a parte prejudicada demande contra

a outra pedindo a revisão, reforma ou invalidação da tutela antecipada estabilizada,

prazo este que se não exercido faz extinguir o próprio direito de revisão, reforma ou

invalidação. Não foi estabelecido no Projeto se há ocorrência de coisa julgada e,

uma vez que a extinção é do próprio direito e não havendo trânsito em julgado,

incabível se mostra o manejo de ação rescisória.

Diante deste contexto, pesquisou-se se a teoria do fato consumado, antiga

criação pretoriana, poderia ser aplicada a estabilização da tutela antecipada, novel

criação legislativa.

A teoria do fato consumado possibilita que mesmo diante da ausência dos

requisitos legais, possa-se manter a eficácia da decisão satisfativa antecipada em

razão de fundamentos de ordem principiológicos valorativos, fundadas no texto

constitucional e decorrente do sistema processual. Trata-se de legitimação da

jurisdição de adotar posicionamento diverso da delimitação legal, tomando-se como

suportes fáticos do fato consumado o tempo e a realização de procedimentos

irreversíveis.

A possibilidade ou não do que se denominou de estabilização da

estabilização, ou seja, da aplicação da teoria do fato consumado à estabilização da

tutela antecipada satisfativa depende de análise complexa da situação consolidada e

dos tempos passado, presente e futuro, norteando-se pelos bens jurídicos tutelados e

pela influência de qualquer decisão na vida das pessoas.

Entendeu-se que é possível a aplicação da teoria do fato consumado à

estabilização da tutela antecipada desde que demonstrada a inexistência de lesão a

direitos tuteláveis de terceiros, tanto de indivíduos quanto da coletividade e

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públicos, como também da demonstração de que efetivamente se tem presente a

juridicização necessária para o reconhecimento do fato consumado.

Isto porque, sendo o fato consumado um fato jurídico juridicizado pelos

princípios constitucionais e processuais, como os da segurança jurídica, da

estabilidade das relações sociais, da supremacia do interesse público, da dignidade

da pessoa humana, da legitimidade das decisões judiciais, da duração razoável do

processo, da boa-fé, da instrumentalidade da forma, da instrumentalidade do

processo, do resultado, da proporcionalidade, da efetividade e do atendimento pelo

juiz aos fins sociais do ordenamento jurídico e às exigências do bem comum, é

certo que não pode o exercício da jurisdição destituir a parte beneficiária de

situação de fato consolidada pela própria jurisdição e que não causa prejuízo ao

interesse público ou particular.”

5.27. Regras comuns às tutelas de urgência. Extinção das

tutelas de urgência antecedentes

Nas medidas cautelares conservativas, cessa a eficácia da liminar deferida

de forma antecedente no caso de não ser deduzido pedido principal no prazo, ou quando

não for efetivada a medida em trinta dias, ou na hipótese de improcedência do pedido

principal, ou extinção do processo sem resolução do mérito.

O termo inicial do prazo é a efetivação da medida provisória deferida.

Cessa, porém, a eficácia das medidas urgentes satisfativas ou antecipatórias

em caso de provimento do recurso contra a decisão que deferiu a tutela, na hipótese de

sentença que aceite a revisão, a reforma ou a invalidação da medida, e na sentença de

rejeição do pedido principal ou extinção do processo sem resolução do mérito.

A função precípua da tutela de urgência cautelar antecedente é assegurar a

eficácia da tutela definitiva satisfativa e adiantar a tutela definitiva cautelar.

A petição inicial, além dos requisitos genéricos previstos no artigo 319 do

NCPC402 deverá indicar expressamente o requerimento de concessão de tutela provisória

402 Art. 319. A petição inicial indicará: I - o juízo a que é dirigida;

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cautelar antecedente, a ser confirmada em definitivo, a indicação da lide e seu fundamento,

juntamente com a exposição sumária da probabilidade do direito e a demonstração do

perigo da demora.

Caberá ao magistrado então, após detida análise da petição inicial,

determinar a emenda nos termos do artigo 321 do NCPC, indeferir a tutela nos termos do

artigo 330 do NCPC ou deferir a tutela.

Se estiver em termos, o magistrado poderá determinar a justificação prévia,

ordenar o cumprimento da tutela e a citação do suplicado para que no prazo de cinco dias

apresente a defesa que tiver.

Decorrendo in albis o prazo para contestação, resta configurada a revelia403,

presumindo-se como verdadeiros os fatos alegados, sendo então proferida decisão em

caráter definitivo sobre o pedido cautelar.

Se houver contestação, o processo seguirá o procedimento comum404.

Cessa a eficácia da tutela cautelar antecedente se não for a mesma efetivada

no prazo de trinta dias405, presumindo-se que o risco tenha se esvaziado, desde que não seja

por motivo imputável à inércia da parte requerente.

II - os nomes, os prenomes, o estado civil, a existência de união estável, a profissão, o número de

inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas ou no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, o endereço eletrônico, o domicílio e a residência do autor e do réu;

III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII - a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou de mediação. § 1o Caso não disponha das informações previstas no inciso II, poderá o autor, na petição inicial,

requerer ao juiz diligências necessárias a sua obtenção. § 2o A petição inicial não será indeferida se, a despeito da falta de informações a que se refere o inciso

II, for possível a citação do réu. § 3o A petição inicial não será indeferida pelo não atendimento ao disposto no inciso II deste artigo se

a obtenção de tais informações tornar impossível ou excessivamente oneroso o acesso à justiça. 403 Art. 344. Se o réu não contestar a ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor. 404 Art. 307. Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá dentro de 5 (cinco) dias. Parágrafo único. Contestado o pedido no prazo legal, observar-se-á o procedimento comum. 405 Art. 309. Cessa a eficácia da tutela concedida em caráter antecedente, se:

I - o autor não deduzir o pedido principal no prazo legal; II - não for efetivada dentro de 30 (trinta) dias;

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No que tange à revelia, o artigo 307 do NCPC406 informa as consequências

da ausência de contestação.

Uma inovação trazida é a possibilidade de dedução do pedido principal no

prazo de trinta dias da efetivação da cautelar.

O prazo de trinta dias tem início a partir da efetivação da tutela, cabendo ao

autor apresentar o pedido principal, isto é, o pedido de tutela definitiva satisfativa, bem

como indicar a sua causa de pedir, sendo dispensado o pagamento de novas custas

processuais.

O indeferimento da tutela cautelar não repercute sobre o julgamento do

pedido principal e ainda assim, deverá a parte efetuar o aditamento apresentando o pedido,

salvo se houver o reconhecimento da prescrição ou decadência407.

Ora, da mesma forma que no regime anterior, as tutelas cautelar e satisfativa

são autônomas, contendo mérito próprio, com pedido e causa de pedir independentes.

Apresentado o pedido de tutela definitiva satisfativa, haverá intimação das

partes na pessoa do advogado ou sociedade de advogados ou pessoalmente para

comparecer à audiência de conciliação ou mediação, sendo desnecessária nova citação do

requerido.

É possível a cumulação de pedidos cautelar e definitivo, sendo incidental o

pedido de tutela cautelar.

Não havendo conciliação, o requerido poderá contestar no prazo de quinze

dias.408

III - o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo autor ou extinguir o processo sem

resolução de mérito. Parágrafo único. Se por qualquer motivo cessar a eficácia da tutela cautelar, é vedado à parte renovar

o pedido, salvo sob novo fundamento. 406 Art. 307. Não sendo contestado o pedido, os fatos alegados pelo autor presumir-se-ão aceitos pelo réu como ocorridos, caso em que o juiz decidirá dentro de 5 (cinco) dias. Parágrafo único. Contestado o pedido no prazo legal, observar-se-á o procedimento comum. 407 Art. 310. O indeferimento da tutela cautelar não obsta a que a parte formule o pedido principal, nem influi no julgamento desse, salvo se o motivo do indeferimento for o reconhecimento de decadência ou de prescrição.

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222

Prosseguindo, na hipótese de julgamento de improcedência do pedido

principal ou cautelar, ou mesmo de extinção do processo sem resolução do mérito, cessa a

eficácia da tutela cautelar em caráter antecedente.

No caso de procedência do pedido principal, também cessa a eficácia da

tutela cautelar, que perde a utilidade pois o direito já foi realizado.

Não pode a parte renovar o pedido salvo se houver novo fundamento.

5.28. Responsabilidade civil pela tutela de urgência

Seguindo o entendimento de que todos devem agir com boa-fé, aquele que

pleiteia a tutela de urgência, seja ela de natureza cautelar ou antecipatória, deverá

responder em caso de prejuízo ao demandado.

Assim é que o artigo 302 do NCPC409 estabelece a obrigação do autor

responder pelos danos causados com a efetivação da tutela de urgência.

408 Art. 334. Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência.

§ 1o O conciliador ou mediador, onde houver, atuará necessariamente na audiência de conciliação ou de mediação, observando o disposto neste Código, bem como as disposições da lei de organização judiciária.

§ 2o Poderá haver mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 2 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes.

§ 3o A intimação do autor para a audiência será feita na pessoa de seu advogado. § 4o A audiência não será realizada: I - se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual; II - quando não se admitir a autocomposição. § 5o O autor deverá indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição, e o réu deverá

fazê-lo, por petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência. § 6o Havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos

os litisconsortes. § 7o A audiência de conciliação ou de mediação pode realizar-se por meio eletrônico, nos termos da

lei. § 8o O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado

ato atentatório à dignidade da justiça e será sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.

§ 9o As partes devem estar acompanhadas por seus advogados ou defensores públicos. § 10. A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para

negociar e transigir. § 11. A autocomposição obtida será reduzida a termo e homologada por sentença. § 12. A pauta das audiências de conciliação ou de mediação será organizada de modo a respeitar o

intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte. 409 Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se:

I - a sentença lhe for desfavorável;

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223

A eventual indenização será objeto de liquidação nos próprios autos,

seguindo o procedimento comum.

A hipótese versa sobre responsabilidade objetiva e independe de dolo ou

culpa.

Outro ponto que merece atenção especial é a revogação da tutela de

urgência, prevendo o Novo Código de Processo Civil a responsabilidade objetiva do

litigante na hipótese de sua cassação.

Ora, o requerente somente responderá pelo prejuízo que causar ao requerido

com efetivação da medida nas hipóteses previstas e a concessão de tutela provisória não se

sujeita, em regra à prestação de caução, muito embora o juiz possa impô-la nos casos

elencados no artigo 520, IV do NCPC, em levantamento de depósito em dinheiro, prática

de atos que importem transferência de posse ou alienação de propriedade ou outro direito

real, dos quais possa resultar grave dano, aplicando-se as exceções do artigo 521 do NCPC.

Também para ressarcir danos que a parte possa vir a experimentar, nos

casos do artigo 300 § 1º do mesmo diploma legal.

Portanto, o autor do pedido da tutela de urgência deverá indenizar o

requerido prejudicado, sendo certo que este prejuízo somente se consumará no caso da

efetivação da medida.

Teresa Arruda Alvim Wambier et alii410 citando Humberto Theodoro Júnior

explica:

“Para Humberto Theodoro Junior, a hipótese não autoriza qualquer

responsabilidade, na medida em que sua cessação decorre justamente da falta de

execução da medida, não haveria, pois, o que indenizar.”411

II - obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a

citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias; III - ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal; IV - o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão do autor. Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida,

sempre que possível. 410 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.504.

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224

Discorrendo sobre tutelas de urgência e o regime de responsabilização

objetiva do requerente, os autores Alexandre Paulichi Chiovitti e Maurício Giannico412

explicam que é possível ver na prática forense inúmeras liminares concedidas com base em

narrativas falsas, distorcidas, unilaterais ou propositadamente incompletas, trazendo à baila

alguns questionamentos. Nesse contexto, questiona-se de quem seria a responsabilidade

pelos prejuízos causados oriundos de tutelas de urgência deferidas e ulteriormente

revogadas. O Estado e o juiz também seriam responsáveis pelos danos causados ao

demandado? Qual seria a forma adequada para obter eventual indenização? Seria

necessário um processo autônomo? Ou seria possível a liquidação dos prejuízos nos

próprios autos?

Os autores trazem exemplos, como a suspensão da comercialização de

produtos por alegada violação da propriedade industrial, o decreto do despejo e, após a

cognição exauriente, verifica-se a inexistência do direito postulado. Assim, a efetiva

aplicação das regras de responsabilização objetiva do suplicante das medidas liminares é

fato que inegavelmente contribuirá para a limitação de demandas aventureiras e de

demandas pautadas em má-fé processual. Para os autores acima citados, “a disseminação

de uma cultura da real atribuição de responsabilidade aos litigantes que, à margem da boa-

fé ou de forma precipitada, pleiteiam medidas de urgência terá saudável consequência de

amainar a deslealdade processual e os ímpetos voltados à prodigalidade na concessão de

tutelas cautelares ou antecipatórias”.

Prosseguindo, no caso da responsabilização do magistrado, deve ser

observado o disposto no artigo 133 segundo Alexandre Paulichi Chiovitti e Maurício

Giannico, que prevê a responsabilidade pessoal do juiz nos casos de dolo ou fraude no

exercício das funções (art.133, inciso I, CPC/73) ou, na hipótese de recusa, retardamento

ou omissão, sem justo motivo, de providência que deva determinar de ofício (inc. II). Ou

ainda no caso do artigo 1.744 do Código Civil413.

411 Humberto Theodoro Jr., Processo cautelar, p.209. 412 Alexandre Paulichi Chiovitti e Maurício Giannico, Tutelas de Urgência e o regime de responsabilização objetiva do requerente. In Tutelas de Urgência e Cautelares, p.35, 41, 45 e 46. 413 Art. 1744. A responsabilidade do juiz será: I - direta e pessoal, quando não tiver nomeado o tutor, ou não o houver feito oportunamente;

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Alguns doutrinadores, segundo Alexandre Paulichi Chiovitti e Maurício

Giannico, que defendem a tese da responsabilização dos juízes quando demonstrada a

inexistência dos respectivos pressupostos autorizadores para concessão de liminares414.

Ora, não podemos concordar com este posicionamento, sob pena de grave

violação da independência funcional dos magistrados, como bem ressaltam os autores

mencionados no parágrafo acima, esclarecendo que a configuração de eventuais errores in

judicando muitas vezes é fruto de mera interpretação dissonante entre os juízes das

diferentes instâncias. Por força do princípio do livre convencimento motivado (CPC/73,

art. 131), revogações e reformas de decisões ao longo do iter processual são inerentes à

própria essência da atividade jurisdicional, não havendo, por outro lado, qualquer norma a

prever sanção pessoal do magistrado por força de eventual e futura desconstituição de seus

atos, desde que praticados de boa-fé:

“Sustentar o contrário, por fim, teria ainda o nefasto efeito de possivelmente

contaminar a própria pureza e as premissas de imparcialidade e desinteresse na

atuação de magistrados. A perspectiva de terem contra si, a cada liminar deferida,

uma potencial demanda indenizatória à sua espera fulminaria por completo o

equilíbrio do sistema processual e a própria higidez da garantia constitucional de

acesso à justiça (CF, art.5º, inc. XXXV), fazendo com que, na prática, os juízes

limitassem a concessão de liminares aos casos de aberrante ilegalidade, desde que,

ainda, fartamente demonstrada nos autos.

Por tudo isso, há razões de sobra para entender que a responsabilização dos

juízes deverá ficar circunscrita à prova de dolo ou fraude, ou desídia injustificada,

carreando, apenas nessas específicas hipóteses, sua sujeição civil pelos eventuais

danos ocasionados às partes por força da concessão de liminares que,

posteriormente, venham a ser revogadas.

Outra questão tormentosa que se põe diz respeito à concessão de tutelas de

urgência de ofício pelo magistrado, hipótese admitida pela doutrina em situações

excepcionais. Nessas circunstâncias, dada a inércia da parte, entendemos que

nenhuma responsabilidade há de ser imputada à parte autora, tendo em vista a

inexistência de qualquer ato de sua ingerência perante aquela situação”.

414 Sérgio Ferraz, Da liminar em mandado de segurança, p.19.

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Portanto, nos casos de concessão de liminares ex officio, responderá

objetivamente o Estado, eis que decorrente do princípio geral de direito impositivo da

indeclinabilidade do ressarcimento dos prejuízos por aquele que deu causa.

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6. Tutela de evidência

Instituto introduzido com o Novo Código de Processo Civil, a tutela de

evidencia tem por fundamento a pretensão estar amparada na comprovação do direito

material da parte, isto é, sua liquidez e certeza.

Portanto, podemos definir tutela de evidência como a tutela que acolhe o

pedido principal do autor para proteger provisoriamente e independentemente de urgência

o provável direito cuja existência se apresenta indiscutível, conforme disposto no artigo

311 do NCPC.

Ora, a parte já demonstrou quantum satis ter melhor direito que seu

adversário.

Não se confunde a tutela de evidência com julgado antecipado da lide, já

que a medida é deferida de forma sumária e sem audiência da parte contrária.

Sua característica é a provisoriedade.

Luiz Fux415 comentando sobre o instituto asseverou que:

“A expressão (direito evidente) vincula-se àquelas pretensões deduzidas em

juízo nas quais o direito da parte revela-se evidente, tal como o direito

líquido e certo que autoriza a concessão do mandamus ou o direito

documentado do exequente.

São situações em que se opera mais do que o fumus boni juris, mas a

probabilidade de certeza do direito alegado, aliada à injustificada demora

que o processo ordinário carreará até a satisfação do interesse do

demandante, com grave desprestígio para o Poder Judiciário, posto que

injusta a espera determinada”.

A tutela de evidência será incidental, podendo ser requerida em petição

avulsa. Logo, é a qualidade do direito que justifica o seu deferimento.

415 Luiz Fux, Tutela de Segurança e Tutela da Evidência (fundamentos da tutela antecipada), pp.305-306. Há situação de evidência também quando se observa que os fatos são notórios, incontroversos, confessados em outro processo – e todo aquele demonstrado por prova emprestada ou antecipada eficaz (op.cit., p.313).

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Para sua concessão, a tutela de evidência exige um juízo de segurança a

respeito da probabilidade da existência do direito.

Podemos citar como institutos assemelhados à tutela de evidência os

alimentos provisórios, mantidos no artigo 528 do NCPC e na Lei nº 5.478/68 e a liminar na

possessória, porém, há necessidade da presença da urgência.

Comentando sobre as liminares nas ações possessórias, Arruda Alvim416

explica:

“Em realidade, o que está imantado no fato a posse é o fato mesmo, e o que

poderia vir a ser considerado o direito (ao menos, no sentido de que a situação

possessória deve ser objeto de proteção pelo direito), é situação de fato mesma; ou

seja, referimo-nos ao ius possessionis. E é diante dessa situação de fato, que

gravita o juízo possessório, e, isto ganha nitidez, também no juízo preambular,

onde se pode conceder medida liminar de proteção possessória –

independentemente de qualquer cogitação de periculum in mora, estranho a esta

temática – como se vê dos requisitos constantes do art. 927 do CPC. São esses

descritivos de uma sucessão de fatos (e, por certo, a significação desses fatos e o

que a esses diz respeito no plano da posse). Pode-se perceber uma simetria entre o

art. 927 do CPC (ainda que este se refira aos requisitos que hão de estar presentes

para a obtenção de medida liminar) e o que dispõe o art.1.210, §2º (este último, em

relação ao que não pode ser objeto de alegação no juízo possessório). Tanto o art.

927, referido, quanto o art. 1.210, §2º, acabam por traçar as fronteiras possíveis

da discussão sobre a posse. Desta forma, o significado do mandamento do art.

1.210, § 2º é no mesmo âmbito e sentido do art. 927 do CPC; ou seja, podem ser

discutidos, exclusivamente, fatos; e, pelo art.1.210, § 2º, que dispõe: ‘Não obsta à

manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro

direito sobre a coisa’. Com isto, verificamos que se o art. 927 diz respeito aos

elementos que hão de ser trazidos para o juízo que há de ser feito em sede de

pedido de liminar, pelo texto do art. 1.210, § 2º constatamos que – percebida

congruência atinente ao âmbito possível de alegações no juízo possessório – em

todo processo que tenha por objeto ação possessória stricto sensu não há espaço

416 Arruda Alvim, Defesa da posse e ações possessórias, p.20-22.

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para a alegação do direito, em função do qual pudesse ser embasada a situação

possessória. Se alegado, não deverá ser considerado, justamente porque isso não

obsta à solução possessória, em favor de cuja posse deva haver proteção,

independentemente do possível direito que possa estar subjacente à posse do

adversário. Em conformidade com o que estava disposto no art. 923 do CPC, tendo

em vista a revogação da sua segunda parte, pela Lei 6.820, de 16.09.1980, tem-se

que: ‘art. 923. Na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor

como ao réu, intentar ação de reconhecimento do domínio”.

6.1. Requisitos da tutela de evidência

A tutela de evidência não prescinde do ajuizamento da ação principal e a

mesma não pode ser decretada de ofício.

Há possibilidade de concessão in limine litis isto é, quando as alegações de

fato do requerente puderem ser comprovadas apenas documental e cumulativamente e o

pedido estiver fundado em tese assentada em julgamento de casos repetitivos ou em

súmula vinculante.417

Nesta linha de pensamento, podemos afirmar a existência de tutela de

evidência punitiva, prevista no artigo 311, inciso I do NCPC, quando ficar caracterizado o

abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte ou a tutela

documentada, quando há prova documental das alegações de fato da parte, que indicam

probabilidade de acolhimento da pretensão.

Fredie Didier Jr.418 distingue tutela de urgência da tutela da evidência,

informando que:

417 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em

julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de

depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito

do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

418 Fredie Didier Jr, Leonardo José Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga, Rafael Oliveira. Curso de direito processual civil, p.408.

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“a evidência é uma situação processual em que determinados direitos se

apresentam em juízo com mais facilidade do que outros. Há direitos que têm um

substrato fático cuja prova pode ser feita facilmente. Esses direitos, cuja prova é

mais fácil, são chamados de direitos evidentes, e por serem evidentes merecem

tratamento diferenciado”.

6.2. Conteúdo e legitimação

Tratando-se de pedido reipersecutório, caso se funde em prova documental

adequada do contrato de depósito, hipótese em que a liminar consistirá em ordem de

entrega do objeto custodiado sob pena de multa.

É possível também a concessão da tutela de evidência em caráter incidental,

após a contestação, quando evidenciado o abuso de direito de defesa ou manifesto

propósito protelatório.

Outra hipótese é a inicial estar instruída com prova documental suficiente

dos fatos constitutivos do direito do autor, e que o réu não tenha oposto prova capaz de

gerar dúvida razoável.

Na verdade, prestigia-se a parte que tem mais chances de obter êxito na

demanda.

A tutela de evidência pode autorizar a adoção de medida satisfativa ou

conservativa.

Um traço característico marcante é a dispensa do periculum in mora.

Nesta linha de pensamento, a proteção é direcionada à própria usufruição do

direito material envolvido e não a utilidade do processo.

Alguns casos podem ser mencionados, como o arresto de bens, quando não

localizado na fase executiva, o sequestro de receita pública na execução contra a fazenda,

na hipótese de desobediência da ordem cronológica dos precatórios, da separação de bens

do espólio em processo de inventário quando a habilitação de crédito se funda em título

documental, e a solução da habilitação de herdeiro for remetida as vias ordinárias, na

autorização de levantamento do depósito pelo autor na ação consignatória.

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A fungibilidade a princípio somente seria aplicável nas cautelares, já que o

fim visado é a eficácia do processo. O magistrado terá dificuldade em substituir a medida

por outra.

A tutela de evidência pertence às tutelas provisórias e não se confunde com

o julgamento antecipado de mérito419, que é definitivo.

É o autor da demanda principal a parte legitimada a pleitear a tutela de

evidência nos casos de abuso de direito de defesa, de ação de depósito instruída com prova

documental adequada e de qualquer ação em que a petição inicial se apresentar instruída

com prova documental que o réu não consiga opor contraprova suficiente para gerar

dúvida razoável.

Em outras hipóteses, tanto autor quanto réu poderão pleitear a tutela de

evidência, como no manifesto propósito protelatório.

Mais uma vez ressalto que na tutela de evidência é dispensável o periculum

in mora porém é necessário o fumus boni iuris.

6.3. Casos

Em hipótese de abuso de direito de defesa ou manifesto propósito

protelatório, requer a plausibilidade do direito, tutelando-se a verossimilhança e certeza do

direito invocado, após a apresentação de defesa por parte do suplicado.

O artigo 311, inciso I do NCPC prevê a concessão de tutela provisória de

evidência quando ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou manifesto propósito

protelatório da parte.

Prevalece, portanto, a maior consistência de uma das posições jurídicas

assumidas pelas partes no processo, isto é, na visão de Daniel Mitidiero420, se a versão

419 Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:

I - não houver necessidade de produção de outras provas; II - o réu for revel, ocorrer o efeito previsto no art. 344 e não houver requerimento de prova, na forma

do art. 349. 420 Citado por Humberto Theodoro Junior in Curso de Direito Processual Civil, op.cit. p.681.

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mais provável é a do demandante, esse merece a tutela imediata, ainda que provisória, a

fim de que o tempo do processo não seja um peso exclusivamente por ele suportado.421

A versão do autor passa de verossímil a certa, tendo em vista a relutância do

requerido.

É a hipótese da tutela de evidência punitiva, semelhante à litigância de má-

fé.

Tem dupla finalidade, isto é, além da punição, visa assegurar a igualdade

substancial entre os litigantes.

Daniel Mitidiero422 comenta que o único pressuposto necessário para a

concessão dessa tutela antecipatória é que a parte adversa exerça o seu direito de defesa de

maneira não séria, inconsistente.

Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e o mesmo autor Daniel

Mitidiero423 acentuam que, na realidade, o conceito de defesa inconsistente – que tem sua

inspiração no direito francês, em que se subordina a concessão do référé provision à

existência de uma obrigação não sérieusement contestable, art.809 do Code de Procédure

Civile – já seria suficiente para abarcar todas as hipóteses previstas no artigo 311, sendo

esse o conceito para abarcar o conceito de “abuso do direito de defesa” e “manifesto

propósito protelatório” na sistemática anterior, elencadas como hipóteses de concessão de

tutela antecipada não fulcrada no perigo. 421 REPRO 197/43. 422 Daniel Francisco Mitidiero, Tendências em matéria de tutela sumária: da tutela cautelar à técnica antecipatória, p. 41-43. 423 Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, Novo Curso de Processo Civil, Vol.2. Tutela dos Direitos Mediante Procedimento Comum, p.201. E prosseguem os autores: “Na verdade, os fundamentos que estão por detrás da ideia de distribuição do ônus do tempo do processo foram muito mal compreendidos pelo legislador. Bem por isso, perdeu-se a oportunidade para traçar, de modo claro e autônomo, a tutela antecipada em caso de ‘defesa de mérito indireta infundada’. Essa forma de tutela, entretanto, obviamente pode ser concedida com base em abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório da parte. Nessa linha, o art. 311, I, deve ser lido como uma regra aberta que permite a antecipação da tutela sem urgência em toda e qualquer situação em que a defesa do réu se mostre frágil diante da robustez dos argumentos do autor – e da prova por ele produzida – na petição inicial. Em suma: toda vez que houver apresentação de defesa inconsistente. Trata-se, portanto, de uma importante técnica processual voltada à atípica concretização do princípio da igualdade e da paridade de armas entre os litigantes (arts.5º, I, da CF/1988, e 7º do CPC) – destinada, portanto, a colocar em evidência o lado oculto do processo, aquele que não pode ser visto pelo processualista que olha apenas para o plano normativo: o fato de que a resistência indevida no processo não pode ser fonte de vantagens econômicas para quem por detrás dela se esconde, mormente quando o autor depende economicamente do bem da vida, hipótese em que o desprezo pelo tempo do processo e o conseguinte fortalecimento da posição do réu acentua a desigualdade entre as partes, transformando o princípio da igualdade em uma abstração irritante.”

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De acordo com o artigo 489, § 1º, inciso II do NCPC424, tratando-se de

conceito indeterminado, a expressão abuso do direito de defesa e manifesto propósito

protelatório inseridas no artigo 311, inciso I425 do mesmo diploma legal que permitem a

concessão da tutela de evidência serão apreciadas pelo magistrado.

Devemos ter em mente que um dos principais objetivos do Novo Código de

Processo Civil é o combate à morosidade da tramitação do feito, evitando-se atitudes que

possam causar obstáculos ao seu regular andamento.

Teori Zavascki426 esclarece que somente pode ser tipificado como abusivo

ou protelatório o ato que realmente impeça o andamento do processo, implicando em

comprometimento da lisura e celeridade.

O abuso de direto de defesa é atitude endoprocessual, e o manifesto

propósito protelatório é comportamento extraprocessual.

424 Art. 489. São elementos essenciais da sentença:

I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;

II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito; III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem. § 1o Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou

acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com

a causa ou a questão decidida; II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no

caso; III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a

conclusão adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos

determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem

demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. § 2o No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação

efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

§ 3o A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé. 425 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; 426 Teori Albino Zavascki, Antecipação da Tutela, p.78. E prossegue o autor: “É criticável, sob este aspecto, a expressão ‘manifesto propósito protelatório’, cuja acepção literal sugere a possibilidade de antecipar os efeitos da sentença ante a mera intenção de protelar. Na verdade, o que justifica a antecipação não é o propósito de protelar, mas a efetiva prática, pelo réu, de atos ou omissões destinados a retardar o andamento do processo. Nessa compreensão, bem se vê, ‘propósito protelatório’ é expressão que na sua abrangência comportaria, a rigor, também, os ‘abusos de direito de defesa’.

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Contudo, em meu ponto de vista, há instrumentos mais eficientes para coibir

a deslealdade processual, tais como a aplicação das penas de litigância de má-fé.

Portanto, na prática, talvez possamos verificar um certo esvaziamento na

aplicação do aludido instituto.

Exemplifico.

Na hipótese de a parte solicitar uma série de providências inúteis para o

desfecho do litígio, o magistrado poderá julgar antecipadamente a lide conforme

permissivo do artigo 355, inciso I do NCPC427.

A mesma conduta poderá ensejar dupla penalidade, isto é, caberá a

cumulação de sanções processuais, não havendo que se falar em bis in idem, diante do

permissivo legal contido nos artigos 77 §2º428 e 774429 do NCPC.

427 Art. 355. O juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando:

I - não houver necessidade de produção de outras provas; 428 Art. 77. Além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo:

I - expor os fatos em juízo conforme a verdade; II - não formular pretensão ou de apresentar defesa quando cientes de que são destituídas de

fundamento; III - não produzir provas e não praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do

direito; IV - cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criar

embaraços à sua efetivação; V - declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nos autos, o endereço residencial ou

profissional onde receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva;

VI - não praticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso. § 1o Nas hipóteses dos incisos IV e VI, o juiz advertirá qualquer das pessoas mencionadas no caput de

que sua conduta poderá ser punida como ato atentatório à dignidade da justiça. § 2o A violação ao disposto nos incisos IV e VI constitui ato atentatório à dignidade da justiça,

devendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa de até vinte por cento do valor da causa, de acordo com a gravidade da conduta. 429 Art. 774. Considera-se atentatória à dignidade da justiça a conduta comissiva ou omissiva do executado que:

I - frauda a execução; II - se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos; III - dificulta ou embaraça a realização da penhora; IV - resiste injustificadamente às ordens judiciais; V - intimado, não indica ao juiz quais são e onde estão os bens sujeitos à penhora e os respectivos

valores, nem exibe prova de sua propriedade e, se for o caso, certidão negativa de ônus. Parágrafo único. Nos casos previstos neste artigo, o juiz fixará multa em montante não superior a

vinte por cento do valor atualizado do débito em execução, a qual será revertida em proveito do exequente, exigível nos próprios autos do processo, sem prejuízo de outras sanções de natureza processual ou material.

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235

Nesta linha de pensamento, a maior incidência da concessão de tutelas de

evidência será nos casos em que se pretenda o afastamento do efeito suspensivo da

apelação, conforme expõe José Roberto dos Santos Bedaque430.

A tutela de evidência será concedida se as alegações de fato da parte (autor e

réu) puderem ser comprovadas documentalmente e os fundamentos de direito do pedido se

fundarem em tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante.

A prova é aquela documental idônea, desde que demonstre de plano, à

semelhança do mandado de segurança, a viabilidade da pretensão autoral.

Como as demais tutelas, são provisórias.

Interessante observação trazida por Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de

Oliveira e Paula Sarno Braga431 é sobre o litisconsórcio passivo, onde somente um dos réus

pratica abuso de direito de defesa. Se o litisconsórcio passivo é simples, é possível o

requerimento e concessão de tutela provisória sancionatória, somente em relação ao

litisconsorte passivo que praticou o ato protelatório, já que os atos e omissões de um não

prejudicam o outro. Em caso de litisconsórcio unitário, em que ambos os litisconsortes

estão em defesa de um projeto uno e incindível, sendo inviável antecipar provisoriamente a

tutela em prejuízo de um deles, não será possível e adequado antecipar a tutela de

evidência, conclusão com a qual concordo.

Há uma orientação atual do sistema processual em dar importância aos

precedentes jurisprudenciais dos tribunais superiores que emitem as súmulas vinculantes.

O artigo 311, inciso II do NCPC432 contém uma importante inovação e

prestigia os precedentes jurisprudenciais, admitindo a concessão da tutela provisória de

evidência quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente

e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante.

430 José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias de Urgência (tentativa de sistematização), p.327. 431 Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga, Curso de Direito Processual Civil, p.624. 432 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: (...)

II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;

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236

Ora, uma das principais modificações é relativa ao incidente de resolução

das demandas repetitivas como forma de valorização dos precedentes judiciais para

combater a enorme quantidade de feitos que abarrotam o Judiciário.

Através deste instrumento, os processos identificados como relativos à

mesma questão de direito são paralisados, e uma causa chamada paradigma ou piloto é

encaminhada ao Tribunal a fim de que o julgamento da tese comum seja efetuado com

eficácia para todo o conjunto de demandas iguais.

Portanto, o sistema processual brasileiro confere grande ênfase à

jurisprudência sob o argumento de que tal postura possa eventualmente contribuir para

julgamento célere das demandas de massa, garantir maior segurança jurídica e evitar a

dispersão excessiva da jurisprudência provocando insegurança jurídica.

A partir deste amplo acesso ao Poder Judiciário, sem qualquer tipo de

restrição, acabamos por enfrentar uma verdadeira banalização do ajuizamento de

demandas.

O Conselho Nacional de Justiça – CNJ433 fez uma pesquisa e abordou que:

“A quantidade excessiva de ações por magistrado no primeiro grau de jurisdição,

aliada à estrutura deficiente de boa parte das unidades e à má alocação dos recursos

humanos e materiais, compromete a prestação judicial nesse segmento do Poder

Judiciário. É o que apontam as estatísticas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Dados de 2011 do Relatório Justiça em Números demonstram que, enquanto um

juiz da primeira instância tem em média 5.860 processos para julgar por ano

(considerando-se os casos novos mais o estoque), um magistrado do segundo grau

tem 3.026 ações, em média. Na Justiça Estadual, o problema é mais grave – a carga

de trabalho no primeiro grau é de 6.823 processos por magistrado, 178% a mais do

que a do segundo.

No ano de 2011, uma média de 1.548 processos novos foi distribuída a cada juiz

da primeira instância, 17% a mais do que os 1.327 que chegaram às mãos de cada

magistrado do segundo grau. O problema é mais sentido na Justiça Estadual. Cada

433 http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/60887-quantidade-de-casos-novos-por-magistrados-no-1-grau-compromete-julgamento-celere acesso em 28/09/2015.

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juiz dos tribunais estaduais do primeiro grau recebeu em média 1.667 ações novas

para julgar em 2011, 520 a mais que os magistrados da segunda instância –

diferença de 45%.

Para o aperfeiçoamento da primeira instância, um grupo de trabalho criado no

último mês de setembro apresentará propostas para a construção de uma política

permanente”.

O mesmo CNJ divulgou pesquisa informando também sobre a taxa de

congestionamento da Justiça, valendo destacar434 a necessidade da valorização e

priorização do primeiro grau:

“O primeiro grau de jurisdição é o segmento mais sobrecarregado do Poder

Judiciário e, por conseguinte, aquele que presta serviços judiciários mais aquém da

qualidade desejada.

Dados do Relatório Justiça em Números 2014 revelam que dos 95,1 milhões de

processos que tramitaram no Judiciário brasileiro no ano de 2013, 85,7 milhões

encontravam-se no primeiro grau, o que corresponde a 90% do total.

Revelam também que o primeiro grau baixou 23 milhões de processos, a

demonstrar que sua capacidade produtiva anual é de apenas 27% da demanda

(casos novos + acervo) imposta à sua apreciação. Isso demonstra que para dar

vazão ao estoque de processos seria necessário cessar a distribuição por quase 4

anos e, nesse período, baixar anualmente o mesmo número de processos de 2013.

O problema maior está concentrado no primeiro grau da Justiça Estadual, no qual

tramitaram em 2013 cerca de 69,7 milhões de processos, com baixa de 16,4

milhões, ou seja, 23,5% do total.

A realidade do segundo grau é bem mais confortável. Em 2013 tramitaram 6,2

milhões de processos em segundo grau (excluídas as turmas recursais), dos quais

foram baixados cerca de 3,3 milhões (53% do total). No segundo grau da Justiça

dos Estados tramitaram 3,8 milhões de processos e foram baixados 2,1 milhões

(56% do total).

Esse cenário é confirmado por outros indicadores do Relatório Justiça em

Números.

434 http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/politica-nacional-de-priorizacao-do-1-grau-de-jurisdicao/dados-estatisticos-priorizacao acesso em 28/09/2015.

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238

A taxa de congestionamento do segundo grau, computado todo o Judiciário, é de

47%, enquanto que a do primeiro é de 73%, ou seja, 55% superior (variação

absoluta de 26 pontos percentuais).

No primeiro grau da Justiça Estadual (excluídos os juizados especiais), o

congestionamento é de 80%, contra 44% do segundo grau (diferença de 36 pontos

percentuais).

Na Justiça do Trabalho o congestionamento é menor, mas a diferença entre

primeiro e segundo graus é, percentualmente, ainda mais acentuada: apenas 31%

de congestionamento no segundo grau contra 51% no primeiro (diferença de 20

pontos percentuais).

Nessa mesma linha, a carga de trabalho (casos novos + acervo) por magistrado de

primeiro grau, computado todo o Judiciário, também é bem superior à de segundo:

6.386 processos contra 3.148, diferença de 103%.

Essa configuração também é mais grave na Justiça dos Estados, na qual os juízes

de primeiro grau tem carga de trabalho de 7.407 processos contra 2.712 no

segundo, diferença de 173%.

Ressalte-se, que esses dados representam a realidade média dos tribunais, de modo

que o cenário de contradição entre primeiro e segundo graus é ainda mais grave em

diversos órgãos do Poder Judiciário.

O fenômeno da maior sobrecarga de trabalho no primeiro grau se repete em todos

os segmentos do Judiciário, embora seja menor na Justiça Federal, cuja taxa de

congestionamento é mais equilibrada entre primeiro e segundo graus (excluídos os

juizados especiais e turmas recursais): 78% e 67%, respectivamente.

De outro lado, dados do Relatório Justiça em Números igualmente demonstram

que, apesar da excessiva carga de processos, a força de trabalho disponibilizada ao

primeiro grau (servidores) é, proporcionalmente, inferior à dedicada ao segundo.

Como consequência, os servidores de primeiro grau estão mais sobrecarregados.

Basta dizer que, considerando todo o Judiciário, a carga de trabalho por servidor da

área judiciária é de 488 processos no primeiro grau e de 227 no segundo, diferença

de 121%.

Na Justiça Estadual essa desproporção é ainda maior: 545 processos por servidor

de primeiro grau contra 230 de segundo (115%).

A quantidade de servidor por magistrado também confirma essa distorção.

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Apesar de a carga de trabalho sobre os magistrados de primeiro grau ser 103%

superior, o número de servidores da área judiciária por magistrado de segundo grau

é 6% superior: 14 servidores por magistrado no segundo grau e 13 no primeiro.

Essa desproporção é mais acentuada na Justiça do Trabalho, na qual existem 16

servidores por magistrado de segundo grau e apenas 8 por magistrado de primeiro

(100% de diferença). Vale rememorar, a esse respeito, que a taxa de

congestionamento do segundo grau da Justiça do Trabalho é cerca de 20 pontos

percentuais inferior à taxa de primeiro grau (31% contra 51%), a revelar a medida

dessa desigualdade”.

A crítica quanto ao ato de padronizar julgamentos traz em si é quanto ao

risco de se julgar sem se levar em conta as especificidades da causa, a qual pode ter uma

decisão mais efetiva e justa quando julgada individualmente, evidenciando, assim, a

relevância da discussão de tal temática.

Logo, é alarmante o número de processos em tramitação no País.

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240

Alexandre Grandi Mandelli435, discorrendo sobre o incidente de resolução

de demandas repetitivas, aponta que o problema da imensa quantidade de processos é

grande e necessita de uma solução:

“Ainda, importante observar que o relatório do CNJ também mostra que o

Brasil tem 16.108 juízes, média de oito magistrados por 100 mil habitantes. A

média é abaixa se comparada a países europeus. De acordo com o relatório, na

Espanha há 10 juízes para cada 100 mil habitantes; na Itália, são 11 por 100 mil; na

França, 12 por 100 mil; e em Portugal, 17 juízes para cada 100 mil habitantes.

Assim, veja-se que, tendo o Brasil 86,6 milhões de processos no ano de 2009, e oito

magistrados para cada 100 mil habitantes, inegável que a segurança jurídica

também é afastada. Nota-se que impossível a realização, por parte dos magistrados,

de análise pormenorizada dos autos do processo antes de prolatarem suas decisões.

Outro ponto que não pode ser esquecido é o da economia processual. Veja-

se que a massificação de litígios gera um custo elevadíssimo para manutenção de

toda a máquina judiciária que se encarrega de processar tais demandas.

Ou seja, o elevado número de demandas que assolam o País e o método de

trato das demandas repetitivas são um dos grandes problemas que a sociedade

brasileira está a vivenciar. O seu enfrentamento, portanto, não pode ser esquecido e

deve ser objeto de estudos intensos. Portanto, só assim que se poderá rechaçar esse

verdadeiro óbice à concretização dos preceitos constitucionais”.

É sob tal viés que o autor aborda o incidente de resolução de demandas

repetitivas, propondo uma reflexão sobre a viabilidade ou não de sua futura aplicação em

nosso ordenamento, tendo por norte principal a questão utilização automática dos

precedentes sem a reconstrução do histórico de aplicação decisória, ou seja, com as

questões, os debates e as teses que lhes deram origem.

A quantidade de demandas é tão grande, que a Associação dos Magistrados

Brasileiros em 09 de setembro de 2015 inaugurou o chamado “processômetro”, conforme

notícia veiculada no site Conjur436:

435 Alexandre Grandi Mandelli, O incidente de resolução de demandas repetitivas, p.21.

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“A Associação dos Magistrados Brasileiros lançou nesta quarta-feira (9/9),

em Brasília, o Placar da Justiça. Um painel digital que contabiliza quantos

processos correm no Poder Judiciário e quantidade de ações que poderiam

ser evitadas.

De acordo com o painel, cerca de 40% do total de processos do país não

existiriam se o poder público e as empresas de serviços regulados

cumprissem a legislação.

A AMB estima que que um novo processo chegue às varas e fóruns do país

a cada cinco segundos. O Placar da Justiça também vai percorrer os

estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Sergipe, Paraíba, Rio Grande

do Sul e Santa Catarina”.

Em artigo intitulado “As luzes e Sombras do Incidente de Resolução de

Demandas Seriadas no Novo Projeto do Código De Processo Civil”437, Ana Surany

Martins Costa explica que:

“Hodiernamente vive-se na era dos processos massificados, os quais são os

frutos da excitação da litigiosidade por quase qualquer querela, sendo inevitável o

brotar das demandas repetitivas que substitui o diálogo intersubjetivo, partindo-se

direto para o “duelo” judicial seriado.

Nesse ambiente, não se pode esquecer que o estímulo do “acesso à justiça”,

o qual é um dos fins da “terceira onda renovatória” do processo, é fruto de uma luta

histórica e, infelizmente, acabou se tornando um problema funcional, pela ausência

de uma efetiva reforma do Judiciário e de um aparato adequado para fazer frente às

consequências de tal “estímulo”.

É evidente que a massificação geral das relações de consumo e da

interferência do Poder Público no domínio econômico trouxe consigo aspectos

desafiadores para a ciência jurídica, vez que inviabiliza o ideal de celeridade da

prestação jurisdicional, quebrando a garantia constitucional do tratamento

436 Disponível em http://www.conjur.com.br/2015-set-09/amb-inaugura-processometro-brasilia-medir-litigancia?imprimir=1 acesso em 27/09/2015. 437 Ana Surany Martins Costa, As luzes e Sombras do Incidente de Resolução de Demandas Seriadas no Novo Projeto do Código De Processo Civil, Juris Síntese nº 103 - SET/OUT de 2013.

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igualitário para todos perante a lei (art. 5º, caput, da CF/1988 - Constituição Federal

de 1988).

Para aplacar o “furor” da litigiosidade, lançou-se mão de um progressivo

desenvolvimento dos precedentes na processualística brasileira, por meio de

diversas medidas que pudessem contornar a “avalanche” de feitos, tanto nas

instâncias inferiores como nos Tribunais Superiores do País.

É interessante notar que o sistema de precedentes não se iniciou no projeto

do novo CPC - Código de Processo Civil, havendo um processo lento e gradual de

inserção do sistema de precedentes no CPC de Buzaid.

Assim, o CPC de 1973 possui diversos dispositivos que dão ênfase ao

entendimento consolidado na jurisprudência dos Tribunais, e como exemplos disso

mencionem-se: o art. 120, parágrafo único, o qual dispõe que, havendo

jurisprudência dominante do Tribunal sobre a questão suscitada no conflito de

competência, o Relator poderá decidir imediatamente, dispensando o julgamento

pelo colegiado; o art. 518, parágrafo único, autoriza o juiz de primeiro grau a não

receber o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com

súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal; o art. 557

dispõe que o Relator do recurso negará seguimento a recurso quando este estiver

em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo

Tribunal, do STF ou de Tribunal Superior; além disso, o § 1º do mencionado art.

557 dispõe, também, que, se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto

com súmula ou com jurisprudência dominante do STF ou de Tribunal Superior, o

Relator poderá dar provimento imediato ao recurso.

Nos dias atuais, para enfrentar a massificação dos processos, surgiram

diversas medidas, tais como: a súmula vinculante do STF (Emenda Constitucional

nº 45/2004) e o regime de repercussão geral como pressuposto do recurso

extraordinário (Lei nº 11.418/2006; art. 543-A do CPC), além da tramitação

especial, com eficácia cumulativa para todos os recursos oriundos de causas

repetitivas, tanto para o recurso extraordinário (Lei nº 11.418/2006; art. 543-B do

CPC) como para o especial (Lei nº 11.672/2008; art. 543-C do CPC).

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243

Note-se que, na seara das causas seriadas, inovações para abreviar

julgamentos originários e recursais foram criadas para o primeiro e o segundo graus

de jurisdição, com o propósito de adotarem-se mecanismos para permitir a rejeição

liminar das demandas iguais a outras já decididas pelo mesmo Magistrado (Lei nº

11.277/2006; art. 285-A do CPC) e para vedar recurso de apelação contra a

sentença pronunciada em conformidade com súmula do STF ou do STJ (Lei nº

11.276/2006; art. 518, § 1º, do CPC).

Nesse ambiente composto por demandas massificadas, o Projeto de Lei nº

166/2010 criou um incidente a ser instaurado nos Tribunais de Segundo Grau,

cognominado como “incidente de resolução de demandas repetitivas” (arts. 895 a

906)”.

E a autora prossegue, afirmando que o incidente de resolução de demandas

repetitivas desperta a observação de que mais uma vez se valorizam os precedentes

judiciais, os quais na sistemática processual brasileira estão inseridos em uma das

transformações mais amplas por que estão passando tanto os sistemas jurídicos do common

law como os sistemas do civil law.

O vocábulo precedente, do latim praecedente, significa o que precede,

antecedente, deliberação ou procedimento que serve de critério ou pretexto a práticas

posteriores semelhantes.

Juridicamente, o precedente judicial se caracteriza por ser uma decisão

tomada por órgão jurisdicional frente a um ou mais casos concretos deduzidos em juízo,

cujo núcleo essencial tem o potencial de servir como paradigma para julgamentos

posteriores em causas análogas.

Além disso, a doutrina dos precedentes surgiu antes de tudo como uma arma

para defender a independência judicial e limitar os poderes do rei no contexto da justa e

correta interpretação da lei. E, em um segundo momento, surgiu para assegurar a

previsibilidade das decisões judiciais por meio da sua ratio decidendi.

O tema incita a necessidade de garantia da igualdade na medida em que se

deve buscar o estabelecimento de uniformidade nas decisões posto que o fato de haver

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divergência sobre um mesmo “tema” viola a garantia constitucional de tratamento

isonômico.

Assim, preserva-se a igualdade quando, diante de situações idênticas, há

decisões idênticas.

A prova deverá ser documental, ou ao menos documentada e se fundar em

fatos constitutivos do direito.

Nesse sentido, mencione-se que na tradição inglesa:

“[...] o ponto de partida do Common Law significa que a natureza do

material sobre o que se constroem muitas decisões judiciais inglesas difere

radicalmente daqueles sistemas jurídicos cuja base é legislativa. Com efeito, o lugar

de início não se acha num único texto - qualquer que seja sua extensão ou

imprecisão - mas sim em diversos textos, isto é, na reconstrução de decisões que

abarcam um período que com frequência [sic] remonta dois séculos passados e às

vezes períodos maiores. Assim mesmo, a classe do texto de uma sentença inglesa se

distingue fundamentalmente de todo texto legislativo, sendo aquele por regular de

modo discursivo ou argumentativo, no qual o juízo ou os juízes sopesam as

considerações em disputa nos casos prévios para alcançar sua decisão. Inclusive, se

um juiz busca expor o Direito em uma ou várias proposições, essas palavras, por si

sós, carecem de toda força, salvo (inter alia) em seu respectivo contexto jurídico e

fático. Esta reafirma a idéia [sic] de que as resoluções anteriores não são simples

toques num quadro pontual mais amplo (apesar de que um jurista inglês sempre

deve retroceder para apreciar uma área do Direito), porque os textos das sentenças

almejam por si mesmos sua relação com o que ocorreu antes e, em algumas

oportunidades, o que pode acontecer posteriormente. Certamente, muito mais

decisões recentes (“discursos”) dos membros da Câmara dos Lordes buscam

delinear o modelo das proposições jurídicas que respeita o tipo de assunto

submetido ao seu conhecimento, conferindo sentido a diversas decisões anteriores.

(Whittaker, 2008, p. 44 In: Theodoro Júnior; Nunes; Bahia, 2010)”.438

438 Humberto Theodoro Jr., Dierle Nunes, Alexandre Bahia, Breves considerações da politização do Judiciário e do panorama de aplicação no direito brasileiro: análise da convergência entre o civil law e o common law e dos problemas da padronização decisória.

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245

Também deverá haver elevado grau de probabilidade do direito a indicar o

acolhimento da pretensão, já que fundada em tese jurídica firmada em precedente

obrigatório – súmula vinculante ou em julgamento de demandas repetitivas439, os quais

vinculam o magistrado, inclusive para apreciação da liminar a teor do disposto no artigo

311, § único do NCPC440.

Ora, a fixação da ratio decidendi é fruto de amplo debate em torno da tese

jurídica, limitando o debate, sendo difícil demonstrar eventual divergência com o

paradigma selecionado, sendo inútil prosseguir a discussão com base em tese jurídica já

superada.

Há tendência do Colendo Supremo Tribunal Federal em aplicar a teoria da

transcendência dos motivos determinantes, reforçando a relevância da identificação da

ratio decidendi nas demandas de massa:

439 Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade; II - os enunciados de súmula vinculante; III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e

em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos; IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior

Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional; V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados. § 1o Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1o, quando decidirem

com fundamento neste artigo. § 2o A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos

repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.

§ 3o Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

§ 4o A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.

§ 5o Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.

440 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em

julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de

depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito

do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

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246

“(...) afigura-se fundamental a distinção entre ratio decidendi e obter

dictum, tendo em vista a necessidade ou a imprescindibilidade dos argumentos para

formação da decisão obtida (...). Embora possa haver controvérsias sobre a

distinção entre ratio decidendi e obter dictum, é certo que um critério menos

impreciso indica que integra a ratio decidendi premissa que não possa ser eliminada

sem afetar o próprio conteúdo da decisão”.441

É certo que, ainda que haja precedente, a atividade judicante de aplicar a lei

ao caso concreto, bem como julgamento de um caso não implica em mera repetição dos

casos anteriores.

O precedente funciona como verdadeiro ponto de partida que norteará futura

decisão.

Há precedentes com caráter vinculativo e precedentes com caráter

meramente persuasivos. São os Tribunais que estabelecerão a diferença por ocasião dos

julgamentos.

Podemos também analisar o precedente em seu aspecto intrínseco, sendo

que o mesmo veiculará um princípio, contendo a fundamentação, com força vinculante e o

simples dictum, sem força vinculante.

Não podemos admitir que um sistema fundado no stare decisis esteja ligado

umbilicalmente a leituras automáticas e interpretações gramaticais dos precedentes.

Pelo contrário, eis que o Direito é algo dinâmico, construído diariamente.

Ademais, equivocada a prática de repetição mecânica e estática de aplicação automática

sem analisar o caso concreto.

Ana Surany Martins Costa442 continua abordando que um dos métodos de

superação de precedentes é o overruling. Os interessados formulam pedido diretamente à

Corte Judicial emissora do precedente, sendo possível que tal se dê até mesmo de ofício,

441 STF, RE 194.662 ED/BA, 2ª T., voto vista do Ministro Gilmar Ferreira Mendes, julgado em 11.12.2002, DJ 21.03.2003. 442 Ana Surany Martins Costa, As luzes e Sombras do Incidente de Resolução de Demandas Seriadas no Novo Projeto do Código De Processo Civil. Publicada no Juris Síntese nº 103 - SET/OUT de 2013.

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postulando a eliminação ou revisão do precedente, considerando, inclusive, eventual

alteração no mundo fático e jurídico.

A autora cita também o overriding que nada mais é do que a superação

parcial do precedente provocada pela inovação do ordenamento jurídico, a partir da

superveniência de uma regra ou princípio. A diferença, segundo a autora e com quem

concordamos, é que no overruling o precedente judicial é totalmente abandonado, no

overriding, este segue com sua eficácia mantida, contudo restringida a determinado âmbito

de incidência.

Temos, segundo Ana Surany Martins Costa, uma técnica de abertura

sistêmica, capaz de manter atualizada a doutrina dos bidings precedents, impedindo a

eternização de entendimentos por ventura equivocados ou obsoletos em função da

constante evolução axiológica-social.

E a autora, que desenvolveu estudos profundos sobre a matéria, aponta

também o distinguishing, fenômeno batizado pela doutrina norte-americana, sendo uma

forma de se fugir ao rigor dos precedentes, em que se pode mostrar que o caso possui

particularidades que o diferenciam, isto é, para além das similaridades, advoga-se para que

o Tribunal julgue o caso em razão de novas questões jurídicas (ou de particularidades

fáticas) não pensadas/discutidas no precedente).

Humberto Theodoro Júnior, Dierle Nunes e Alexandre Bahia, mencionados

por Ana Surany Martins Costa, apontam que tais técnicas podem ser plenamente utilizadas

no Brasil como forma de se contornar as violações constitucionais na aplicação radical das

súmulas (e da repercussão geral das questões constitucionais e federais).

O problema, segundo os autores, se torna mais grave na aplicação de casos

anteriormente julgados, uma vez que não se faz uma reconstrução discursiva de um caso

do passado para sua aplicação no caso presente a ser julgado.

Os Tribunais, ao julgarem um novo caso, devem respeitar a história

institucional da aplicação daquele instituto (tese ou caso) como um romance em cadeia,

mas permitindo rupturas devidamente fundamentadas e consonante a sua concepção de

integridade.

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A crítica feita por Humberto Theodoro Júnior, Dierle Nunes e Alexandre

Bahia é pesada, porém, justificada, eis que diante da independência funcional e em face da

pressuposição brasileira de que os ministros (e juízes) devem possuir liberdade decisória,

acaba por ser criado um quadro de “anarquia interpretativa” na qual nem mesmo se

consegue respeitar a história institucional da solução de um caso dentro de um mesmo

Tribunal.

Assim cada juiz e órgão do Tribunal julgam a partir de um “marco zero”

interpretativo, sem respeito à integridade e ao passado de análise daquele caso, permitindo

a geração de tantos entendimentos quantos sejam os juízes.

No Brasil, a utilização do aludido “marco zero” se apresenta, inclusive,

quando são utilizadas súmulas e casos passados, isto é, a mera referência a “teses” colhidas

daqueles não garante maior integridade.

Ana Surany Martins Costa443 prossegue afirmando que:

“E uma das utilizações mais preocupantes desse fenômeno é quando da

fundamentação de decisões com base em princípios (como, por exemplo, dignidade

humana), cláusulas gerais (tais como a boa-fé objetiva) e conceitos indeterminados

(como o fundado receio de dano irreparável) nos quais cada juiz promove uma

integração anárquica dos seus conteúdos, mesmo sem respeito ao contraditório.

É lógico que esse quadro pode ser visto como exagerado, no entanto ele

tenta promover um alerta e uma provocação aos pesquisadores e “operadores” em

geral dos riscos de uma padronização decisória sem uma teoria consistente de como

se articularem os precedentes em nosso País.

Não se está a afirmar que há malefícios com a aproximação com o direito

anglo-saxônico e com a jurisprudência sumulada, pois tal proximidade é inevitável

e tem suas indiscutíveis vantagens (agilização e economia processuais). Todavia:

“O que não se pode aceitar é a via da padronização da tutela jurisdicional pura e

simples. Se os enunciados da lei não conseguem aplicação automática e indiscutível

em todos os casos práticos submetidos à decisão judicial, por que isto aconteceria

443 Ana Surany Martins Costa, As luzes e Sombras do Incidente de Resolução de Demandas Seriadas no Novo Projeto do Código De Processo Civil. Publicada no Juris Síntese nº 103 - SET/OUT de 2013.

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com os enunciados jurisprudenciais sumulados pelos Tribunais Superiores? Acaso

os juízes teriam alcançado o milagre que os legisladores confessadamente se

revelaram impotentes de conseguir? É óbvio que a simples literalidade de regras

hipotéticas e generalizantes, sejam elas primárias como as do legislador ou

derivadas como as dos Tribunais, jamais será suficiente para proporcionar aos

litigantes a justa composição dos conflitos prometida pelo Estado Democrático de

Direito. (Theodoro Júnior; Nunes; Bahia, 2010, p. 27)

Assim, mais importante do que padronizar os julgamentos é, conforme

Aristóteles, dar a cada um o seu, ou como Chiovenda, dar ao jurisdicionado tudo

aquilo e exatamente aquilo que ele tenha direito de conseguir, pois

não é pela padronização fria e estéril dos julgamentos que a tanto se

chegará. Muito mais importante será, nesse rumo, a sentença bem e racionalmente

fundamentada, à luz das peculiaridades do caso concreto, em contraditório, ainda

quando se esteja a aplicar enunciados sumulares de precedentes judiciais.

(Theodoro Júnior; Nunes; Bahia, 2010, p. 27)

Ademais, não se pode prever com segurança as consequências do uso futuro

do incidente de demandas repetitivas, posto que hoje é muito escasso o número de

pesquisas empíricas em tal sentido no direito processual brasileiro.

Logo, a par de tais colocações é que se afirma que devemos estabelecer uma

sistemática dos precedentes a partir de uma teoria da decisão judicial por nós

elaborada e assentada em nossa cultura jurídica, para que, dessa forma, o sistema de

precedentes funcione adequadamente no Brasil”.

A autora prossegue destacando pontos positivos e negativos do incidente de

resolução de demandas repetitivas, atualmente previsto nos artigos 976 e seguintes do

NCPC444, porém, desde que possibilite o pleno exercício do contraditório no processo

444 CAPÍTULO VIII DO INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:

I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;

II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica. § 1o A desistência ou o abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente.

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§ 2o Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá

assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono. § 3o A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus

pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente suscitado.

§ 4o É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva.

§ 5o Não serão exigidas custas processuais no incidente de resolução de demandas repetitivas. Art. 977. O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente de tribunal: I - pelo juiz ou relator, por ofício; II - pelas partes, por petição; III - pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição. Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os documentos necessários à demonstração

do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente. Art. 978. O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles

responsáveis pela uniformização de jurisprudência do tribunal. Parágrafo único. O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará

igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente.

Art. 979. A instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade, por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça.

§ 1o Os tribunais manterão banco eletrônico de dados atualizados com informações específicas sobre questões de direito submetidas ao incidente, comunicando-o imediatamente ao Conselho Nacional de Justiça para inclusão no cadastro.

§ 2o Para possibilitar a identificação dos processos abrangidos pela decisão do incidente, o registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro conterá, no mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela relacionados.

§ 3o Aplica-se o disposto neste artigo ao julgamento de recursos repetitivos e da repercussão geral em recurso extraordinário.

Art. 980. O incidente será julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.

Parágrafo único. Superado o prazo previsto no caput, cessa a suspensão dos processos prevista no art. 982, salvo decisão fundamentada do relator em sentido contrário.

Art. 981. Após a distribuição, o órgão colegiado competente para julgar o incidente procederá ao seu juízo de admissibilidade, considerando a presença dos pressupostos do art. 976.

Art. 982. Admitido o incidente, o relator: I - suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região,

conforme o caso; II - poderá requisitar informações a órgãos em cujo juízo tramita processo no qual se discute o objeto

do incidente, que as prestarão no prazo de 15 (quinze) dias; III - intimará o Ministério Público para, querendo, manifestar-se no prazo de 15 (quinze) dias. § 1o A suspensão será comunicada aos órgãos jurisdicionais competentes. § 2o Durante a suspensão, o pedido de tutela de urgência deverá ser dirigido ao juízo onde tramita o

processo suspenso. § 3o Visando à garantia da segurança jurídica, qualquer legitimado mencionado no art. 977, incisos II

e III, poderá requerer, ao tribunal competente para conhecer do recurso extraordinário ou especial, a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que versem sobre a questão objeto do incidente já instaurado.

§ 4o Independentemente dos limites da competência territorial, a parte no processo em curso no qual se discuta a mesma questão objeto do incidente é legitimada para requerer a providência prevista no § 3o deste artigo.

§ 5o Cessa a suspensão a que se refere o inciso I do caput deste artigo se não for interposto recurso especial ou recurso extraordinário contra a decisão proferida no incidente.

Art. 983. O relator ouvirá as partes e os demais interessados, inclusive pessoas, órgãos e entidades com interesse na controvérsia, que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, poderão requerer a juntada de documentos, bem como as diligências necessárias para a elucidação da questão de direito controvertida, e, em seguida, manifestar-se-á o Ministério Público, no mesmo prazo.

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paradigma por todos aqueles que poderão sofrer prejuízos na sua esfera jurídica pela futura

decisão paradigmática.

Contudo, há alguns aspectos pontuais, segundo a autora, que merecem

reflexão, tal como, por exemplo, a previsão de um banco de dados alimentado pelos

Tribunais e administrado pelo Conselho Nacional de Justiça.

A dúvida que se coloca, segundo Ana Surany Martins Costa, é se o registro

será efetivo e bem gerido, sob pena de se ter a multiplicação de um mesmo incidente caso

o cadastro não seja atualizado.

A autora ressalta que o incidente não tem cabimento para questões de fato,

mas apenas de direito, sendo possível a existência de milhares de ações com a mesma tese

jurídica, mas dependentes de provas distintas e não notórias. Em tais casos, resta certo que

a utilidade do incidente pode ficar prejudicada se for levado em conta somente a tese

jurídica.

§ 1o Para instruir o incidente, o relator poderá designar data para, em audiência pública, ouvir

depoimentos de pessoas com experiência e conhecimento na matéria. § 2o Concluídas as diligências, o relator solicitará dia para o julgamento do incidente. Art. 984. No julgamento do incidente, observar-se-á a seguinte ordem: I - o relator fará a exposição do objeto do incidente; II - poderão sustentar suas razões, sucessivamente: a) o autor e o réu do processo originário e o Ministério Público, pelo prazo de 30 (trinta) minutos; b) os demais interessados, no prazo de 30 (trinta) minutos, divididos entre todos, sendo exigida

inscrição com 2 (dois) dias de antecedência. § 1o Considerando o número de inscritos, o prazo poderá ser ampliado. § 2o O conteúdo do acórdão abrangerá a análise de todos os fundamentos suscitados concernentes à

tese jurídica discutida, sejam favoráveis ou contrários. Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada: I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que

tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região;

II - aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986.

§ 1o Não observada a tese adotada no incidente, caberá reclamação. § 2o Se o incidente tiver por objeto questão relativa a prestação de serviço concedido, permitido ou

autorizado, o resultado do julgamento será comunicado ao órgão, ao ente ou à agência reguladora competente para fiscalização da efetiva aplicação, por parte dos entes sujeitos a regulação, da tese adotada.

Art. 986. A revisão da tese jurídica firmada no incidente far-se-á pelo mesmo tribunal, de ofício ou mediante requerimento dos legitimados mencionados no art. 977, inciso III.

Art. 987. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso extraordinário ou especial, conforme o caso.

§ 1o O recurso tem efeito suspensivo, presumindo-se a repercussão geral de questão constitucional eventualmente discutida.

§ 2o Apreciado o mérito do recurso, a tese jurídica adotada pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça será aplicada no território nacional a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito.

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Outra dúvida é a questão da suspensão (ou não) de ações propostas

(distribuídas) após o incidente ser suscitado, posto que é importante saber se as ações

propostas na pendência do incidente devem ou não ter seu seguimento suspenso.

E Ana Surany Martins Costa445 de forma contundente arremata:

“A questão é séria e envolve não só o alcance da celeridade com o

julgamento de várias demandas com uma decisão una. Envolve a credibilidade de o

próprio Poder Judiciário judicar em milhões de processos de forma responsável e

principalmente qualificada, sob pena de cometer “milhões” de injustiças ou

“milhões” de erros judiciários. (...)

A par das colocações lançadas neste artigo, observou-se que o incidente de

resolução de demandas repetitivas teve como berço o modelo alemão de resolução

de ações seriadas (musterverfahren), do qual adquiriu feição própria, possibilitando

não ser confundido com as ações coletivas brasileiras.

A análise do incidente de resolução de demandas repetitivas permite

concluir que ele representa, na prática, um mecanismo de “padronização decisória”,

a qual é muito comum e afeta à família do common law.

É fato que a valorização da jurisprudência tem deixado de ser exceção,

tornando-se uma tendência, a qual enseja a necessidade de uma boa compreensão

da sistemática dos precedentes judiciais pelos “operadores” do Direito, tendo em

vista suas vantagens (tais como a segurança jurídica, isonomia e o julgamento em

um prazo razoável, conforme prevê a Constituição Federal de 1988).

Junte-se a isso que é inegável que a necessidade de respeito à jurisprudência

dominante se torna cada vez mais importante para que se evite o que muitos

chamam de “jurisprudência lotérica”, em uma extrema dependência do resultado do

julgamento a depender do órgão que efetuará o julgamento, comprometendo

seriamente a legitimidade do exercício do poder jurisdicional pelo Estado-juiz.

445 Ana Surany Martins Costa, As luzes e Sombras do Incidente de Resolução de Demandas Seriadas no Novo Projeto do Código De Processo Civil. Publicada no Juris Síntese nº 103 - SET/OUT de 2013.

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Com isso, percebe-se a necessidade de se refletir e discutir se o

“transplante” de um sistema que foi concebido em países com cultura jurídica

totalmente diferente da brasileira dará certo no Brasil, o que abrange a séria análise

do incidente de resolução de demandas repetitivas tal como consta no projeto do

novo CPC.

É fato que se desejam julgamentos em que paire o princípio da igualdade, no

entanto, tal argumento não pode servir de subterfúgio para que nos utilizemos da

tradição dos precedentes judiciais dos países do common law de modo frio,

automático e simples, sem nenhuma reconstrução do histórico de aplicação

decisória e, principalmente, sem se discutir sua cabal adaptabilidade em nossas

terras.

Nesse ponto, recorde-se que não se pode prever com segurança as

consequências do uso do incidente de demandas repetitivas em nosso ordenamento,

vez que hoje é muito escasso o número de pesquisas empíricas em tal sentido no

direito processual brasileiro.

Sob tal ótica é que se afirma que o incidente de resolução de demandas

repetitivas pode ser benéfico ou maléfico.

Tudo dependerá da forma como for utilizado, posto que muitos dos

enunciados da lei não possuem aplicação automática em todos os casos práticos, ou

seja, não será possível “padronizar”, em larga escala, os julgamentos, podendo ser

de bom alvitre o prolatar de uma sentença coadunada com particular

individualidade da causa.

Dessarte crê-se que devemos estabelecer uma sistemática dos precedentes a

partir de uma teoria da decisão judicial por nós elaborada e assentada em nossa

cultura jurídica, para que o sistema de precedentes brasileiro funcione bem.

Acerca das críticas pontuais dirigidas ao instituto do incidente de resolução

de demandas repetitivas, conclui-se que elas refletem o despreparo do próprio

Poder Judiciário, posto que este não se preparou para o numeroso aumento das

demandas no processo de redemocratização.

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Nesse sentido, imagina-se que uma melhor solução seria não apenas

resolver a presente avalanche de processos seriados, tal como é o fim do incidente

de resolução de demandas repetitivas, mas concomitantemente com este criar

mecanismos que alterassem a “cultura” ou “patologia social” que se tornou a

litigiosidade excessiva.

É preciso desencorajar o indivíduo/pessoa jurídica a ingressar em juízo.

A ideia pode até parecer romântica, porém é necessária à recuperação do

“prestígio” e “confiabilidade” no Judiciário, o qual caminha órfão de tais

predicados, sendo, em síntese modernamente, sinônimo do vocábulo “morosidade”.

Tendo em vista a magnitude e repercussão que o projeto do novo CPC tem

desencadeado, não se pode deixar de ponderar que somente a legislação mudará a

cultura jurídica processual já arraigada no Brasil.

Não se pode transmitir à sociedade a falsa impressão de que a criação de um

Código processual novo acabe com a demorada duração das lides.

A questão é delicada e envolve diversos aspectos tais como: a falta de

investimento de recursos orçamentários para o aparelhamento da justiça; falta de

informatização completa dos órgãos jurisdicionais e administrativos do Poder

Judiciário; falta de capacitação, motivação e remuneração dos funcionários da

justiça; quantidade relativamente baixa de Magistrados; ausência de capacitação

específica dos nossos Magistrados para administrar cartórios e secretarias e falta de

padronização da rotina administrativo-cartorária.

E tais problemas de natureza administrativa estão longe de ter um fim

apenas e tão somente com alterações da disciplina processual por uma lei como

obra meramente normativa”.

Outrossim, ressaltamos as grandes esperanças do Novo Código de Processo

Civil, quais sejam, a efetiva colocação em prática da necessidade de observância dos

precedentes judiciais e do incidente de resolução de demandas repetitivas, na tentativa de

diminuir inclusive o congestionamento da justiça.

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Abordando os temas, Aluisio Gonçalves de Castro Mendes e Larissa Clare

Pochmann da Silva em artigo intitulado “Os impactos do novo CPC na razoável duração

do processo”446 abordam que:

“8. Precedentes judiciais

Outro ponto relevante são os precedentes judiciais. Conforme constou no

relatório do Senador Vital do Rêgo, “o respeito aos precedentes jurisprudenciais é

uma das marcas do futuro Código, o que reduzirá o grau de imprevisibilidade

jurídica que impera sobre os atores da vida civil”447.

O art. 926 indica que a jurisprudência dos tribunais deve se manter íntegra,

coerente e estável, além da previsão de que os tribunais devem respeitar seus

precedentes e dar-lhes publicidade.

O atual sistema brasileiro se refere especialmente à jurisprudência ou apenas

a um dos seus instrumentos de exteriorização, a súmula. Entretanto, a evolução do

sistema, tal como vem retratado no novo Código, pressupõe o amadurecimento do

tratamento conferido tanto à jurisprudência quanto aos precedentes. Precedente não

se confunde com jurisprudência, como bem observa Michele Taruffo448 em precisa

diferenciação:

“Quando se fala em precedente se faz normalmente referência a uma

decisão relativa a um caso particular, enquanto que quando se fala da jurisprudência

se faz normalmente referência a uma pluralidade, frequentemente bastante ampla

relativa a vários e diversos casos concretos (…) em regra a decisão que se assume

como precedente é uma só, de modo que fica fácil identificar qual decisão faz

precedente. Ao contrário nos sistemas nos quais se alude à jurisprudência, se faz

referência normalmente a muitas decisões: às vezes são dúzias até mesmo

centenas”.

446 Aluisio Gonçalves de Castro Mendes e Larissa Clare Pochmann da Silva, Os impactos do novo CPC na razoável duração do processo, p. 15 - 25. 447 O relatório do Senador Vital do Rêgo está disponível em: [www.senado.leg.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=157517&tp=1]. Acesso em: 09.01.2015. 448 Michelle Taruffo, Precedente e jurisprudência. RePro 199/142-143.

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A delimitação das razões de decidir (ratio decidendi) e das circunstâncias

essenciais do caso julgado é fundamental para a caracterização dos limites do

entendimento firmado pela corte. Esta operação costuma distinguir, portanto, a

essência da tese jurídica assumida (ratio decidendi) de elementos acidentais (obter

dicta) ao julgamento.

Os precedentes precisam dispor de clareza, solidez e profundidade nos seus

fundamentos, pois, do contrário, dificilmente serão respeitados e seguidos. O

respeito ao precedente decorre e é proporcional, em boa medida, à capacidade de

fundamentação contida nas razões da decisão (ratio decidendi). Devem ter sido

submetidas ao contraditório,449 e a distinção de um caso submetido a julgamento em

relação ao precedente pode ser realizada por qualquer órgão jurisdicional,

independente do precedente invocado.450

Sem adentrar em uma explanação mais detalhada sobre os precedentes,13 no

que tange à duração razoável do processo, do ponto de vista macro, a vinculação ao

precedente judicial pode significar uma celeridade maior, porque, com o

acolhimento dos precedentes judiciais no julgamento, há uma tendência à

coerência, à integridade e à estabilidade dos julgamentos e, como consequência,

também uma tendência à redução do número de recursos, com a diminuição no

tempo de tramitação os processos.

9. Incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR)

O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas está previsto no novo

Código de Processo Civil e terá lugar em demandas que possam gerar significativa

multiplicação de processos baseada em uma questão idêntica de direito, bem como

causar grave insegurança jurídica, devido ao risco de decisões contraditórias. Terá,

portanto, a perspectiva de trazer racionalização e eficiência diante dos conflitos de

massa, evitando que haja ofensa à isonomia e à segurança jurídica nos julgamentos

de questões comuns de direito, material ou processual. As questões submetidas ao

449 FÓRUM PERMANENTE DE PROCESSUALISTAS CIVIS. Enunciado 2 do II Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC). Salvador, 2014. 450 FÓRUM PERMANENTE DE PROCESSUALISTAS CIVIS. Enunciado 174 do III Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC).Rio de Janeiro, 2014.

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incidente serão registradas no Conselho Nacional de Justiça, e não haverá custas

para esse mecanismo.

O incidente poderá, no início, proporcionar uma maior morosidade aos

processos, por sua sistemática processual prever, ao ser instaurado, a suspensão dos

processos individuais ou coletivos pendentes, por até um ano,14 prazo a partir do

qual, nos termos do art. 980, não analisado o incidente, cessa a suspensão, salvo

decisão fundamentada do relator em sentido contrário.15 Porém, em tese, a médio e

longo prazo, o efeito desse novel mecanismo será a racionalização do sistema

processual, já que a tese jurídica firmada em sede de incidente será aplicada, nos

termos da nova previsão legislativa, a todos os processos individuais ou coletivos

que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição

do respectivo tribunal, bem como aos casos futuros, o que poderá proporcionar

celeridade aos processos.”

Na decisão que concede a tutela de evidência, há necessidade de subsumir a

hipótese ao paradigma, inclusive os seus fundamentos, e na decisão que denega a tutela, o

magistrado deverá demonstrar a existência de distinção no caso de julgamento ou

superação deste entendimento, conforme previsto no artigo 489, § 1º incisos V e VI do

NCPC451.

Lucas Buril de Macêdo452 em artigo intitulado “Antecipação da Tutela por

Evidência e os Precedentes Obrigatórios” ressalta que “A regulação dos precedentes

judiciais obrigatórios, estabelecidos em tutela aos princípios da segurança jurídica, da

igualdade e da efetividade, configura um dos maiores avanços do NCPC e precisa ser

tratada com destacada atenção pela doutrina, para que assim consiga-se fornecer o aparato

teórico necessário para seu funcionamento dogmático adequado. De forma similar, a tutela

antecipada de evidência não encontrava permissão expressa no CPC/1973, mas vinha

sendo concedida regularmente pelos órgãos julgadores, em interpretação construtiva,

guiada pela pragmática, de suma importância. A regulação expressa do NCPC é, no ponto,

451 Art. 489. São elementos essenciais da sentença: (...)

V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. 452 Lucas Buril Macedo, Antecipação da Tutela por Evidência e os Precedentes Obrigatórios, p. 523 - 552.

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bastante vantajosa. Muito embora seja possível afirmar, inequivocamente, que o NCPC

avança substancialmente em ambos os temas, o que ensejará benefícios aos jurisdicionados

e à sociedade, não se pode dizer que a coordenação dos temas foi satisfatória, merecendo

certos amparos da doutrina e dos aplicadores. Isso se dá especialmente no que toca à tutela

antecipada de evidência por precedente judicial obrigatório, no que são três as propostas

deste trabalho: a) É indispensável que o dispositivo ao art. 306 seja interpretado no

contexto dos arts. 520, 521, e 522, que constituem o capítulo dedicado ao regime jurídico

dos precedentes judiciais: portanto, não é possível limitar a antecipação de tutela por

evidência apenas aos casos de súmula vinculante e incidente de demandas repetitivas, mas

é imprescindível que se reconheça o direito do jurisdicionado a essa técnica quando

houver qualquer das decisões ou precedentes enumeradas nos incisos do art. 521,

inclusive precedentes do plenário do STF sobre direito constitucional ou da Corte Especial

do STJ sobre direito federal; b) A permissão de antecipação da tutela liminar por

evidência fundada em precedente obrigatório é inconstitucional, pois fere o direito

fundamental ao contraditório que, salvo razões impositivas de igual dignidade ou

especificidades do direito material, deve ser prévio. Não se pode simplesmente dispor do

direito fundamental ao contraditório prévio sem qualquer urgência a impor a imediata

tutela do provável direito, não existindo qualquer prejuízo na espera da resposta do réu

pelo autor; c) O réu, nos casos de pleito de tutela de evidência, deve adstringir sua defesa

ao apontamento de um erro na interpretação do precedente pelo magistrado,

uma distinção fática ou jurídica relevante ou à enumeração de uma nova razão ou

conjectura para a superação da tese, não lhe sendo permitido simplesmente repetir

argumentação já refutada. Neste caso, há patente litigância de má-fé, que deve ser punida.”

E o autor entende pela inconstitucionalidade do dispositivo, eis que estaria

vulnerando o princípio do contraditório: “A previsão permissiva de decisão liminar que

conceda a antecipação da tutela fundada em evidência do direito alegado

é inconstitucional. Ao tempo em que se generalizou a antecipação da tutela, já há 20 anos,

a novidade fez com que os juristas suscitassem, de pronto, a possível inconstitucionalidade

do então recém-chegado dispositivo, pois se estaria violando o princípio do contraditório.

Nesse sentido, a antecipação da tutela apenas seria viável, à luz da Constituição, após a

ouvida do réu. A tese, como cediço, restou vencida, eis que o contraditório, em si, não teria

sido excluído e continuaria a ser aplicado no processo, apenas seria invertida sua lógica:

normalmente seria prévio, mas, na hipótese seria postergado. Como bem se observou, “a

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provisoriedade dessas medidas indica a possibilidade de sua modificação posterior, por

interferência da manifestação da parte contrária, por exemplo”. No mais, essa possibilidade

normativa não infringiria a Constituição pois a própria antecipação da tutela seria a

implementação de outros igualmente importantes princípios constitucionais do processo: a

efetividade e o acesso à Justiça. Ora, nos casos de tutela de urgência, ou se tutela o direito

alegado antecipadamente ou se admite a possibilidade de seu perecimento. Nesta

ponderação, caso a solução adotada fosse a de preservar o contraditório prévio, impedindo

a tutela liminar do direito que sofre com o perigo da demora, estar-se-ia admitindo a

vulneração absoluta, sem a preservação do mínimo essencial, dos princípios do acesso à

justiça e da efetividade do processo. Já na solução contrária, qual seja, a antecipação da

tutela liminar, posterga-se o contraditório, preservando-o ainda que de forma relativizada, e

a efetividade e o acesso à justiça são concretizados. Consegue-se, assim, preservar o núcleo

mínimo de todos os princípios envolvidos: o acesso à justiça, a efetividade do processo e o

próprio contraditório. Da discussão travada naquela oportunidade conclui-se que: embora o

princípio do contraditório exija a possibilidade de defesa normalmente prévia, o que é um

imperativo de extrema relevância, em hipóteses na qual a realização do contraditório acabe

por gerar o grave perigo de eliminação do acesso à justiça e da efetividade do processo, o

que se daria pela impossibilidade ou acentuada dificuldade de tutelar a situação jurídica

material alegada em momento posterior, é juridicamente adequado postergar o

contraditório. Assim, o adiamento do contraditório no procedimento ordinário é justificado

pelo perigo de dano iminente ao bem da vida que se quer ver juridicamente tutelado – e só.

Nos casos de tutela de evidência pura não há qualquer perigo da demora, urgência ou

qualidade da situação material que justifique a postergação do contraditório, direito

fundamental do réu que deve ser preservado quando outras razões de igual dignidade não

imponham o contrário. É dizer: nos casos de evidência sem qualquer urgência, e quando

não exista qualquer peculiaridade material, o autor pode muito bem esperar pela resposta

do réu, que poderá trazer elementos relevantes para elidir a pretensão à aplicação da

técnica processual ou mesmo à tutela do direito, sem qualquer prejuízo, e, logo após a

oportunização de espaço para a defesa, poderá o magistrado conceder a tutela de evidência.

O contraditório é uma conquista relevante dos povos: evita-se, com sua preservação, a

perseguição irracional e a inquisitoriedade injusta, promovendo a possibilidade de defesa

para os sujeitos que tenham seus bens jurídicos afetados pelo exercício de poderes”.

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O artigo 311, inciso II apresenta um equívoco do legislador sobre o tema

precedentes.

Na verdade, a inconsistência da defesa do réu não está no fato da tese do

autor basear-se no julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante e sim no fato

de estar fundamentada em precedente do Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal

de Justiça, ou em Tribunais locais em sede de incidente de resolução de demandas

repetitivas.

Contra a sentença que confirma, concede ou revoga a tutela de evidência

fundada em precedente obrigatório cabe apelação com efeito devolutivo453.

O mérito da apelação é justamente a distinção do caso concreto com o

precedente, ou a sua superação.

453 Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo.

§ 1o Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que:

I - homologa divisão ou demarcação de terras; II - condena a pagar alimentos; III - extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado; IV - julga procedente o pedido de instituição de arbitragem; V - confirma, concede ou revoga tutela provisória; VI - decreta a interdição. § 2o Nos casos do § 1o, o apelado poderá promover o pedido de cumprimento provisório depois de

publicada a sentença. § 3o O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1o poderá ser formulado por

requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o

relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação. § 4o Nas hipóteses do § 1o, a eficácia da sentença poderá ser suspensa pelo relator se o apelante

demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação.

Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. § 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e

discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado. § 2o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a

apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais. § 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o

mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485; II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa

de pedir; III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo; IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação. § 4o Quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível,

julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau.

§ 5o O capítulo da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória é impugnável na apelação.

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O requisito exige que a tutela de evidência esteja fulcrada em elevado grau

de certeza.

Por fim, a tutela de evidência em contrato de depósito passa a seguir o rito

do procedimento comum, sendo que o contrato somente se aperfeiçoa com a entrega de

coisa móvel.

O procedimento especial do contrato foi substituído pelo artigo 311, inciso

III do NCPC.

A liminar deferida no contrato de depósito é nada mais nada menos do que

a antecipação dos efeitos da sentença.

Mais uma vez convém registrar que o Novo Código de Processo Civil

substituiu o procedimento especial do contrato de depósito, passando a regular a matéria de

acordo com o procedimento comum, aplicando-se as regras para entrega de coisa454.

É possível a tutela de evidência quando o autor alega e prova o fato

constitutivo do direito e o réu opõe defesa indireta sem oferecer prova documental.

Deve, portanto, estar configurada a mora ex re, isto é, com o advento do

termo, ou a mora ex persona, através de prova da notificação, sendo concedida a tutela

específica para ordem de entrega do objeto custodiado.

Não cabe a concessão de tutela de evidência para condenação em quantia,

apenas para o pedido reipersecutório.

A obrigação somente será convertida em perdas e danos depois de restar

demonstrada a impossibilidade do cumprimento da obrigação.

O inciso IV do artigo 311 do NCPC trata da tutela de evidência concedida

quando a petição inicial vier instruída com prova documental suficiente dos fatos

454 Art. 498. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

Parágrafo único. Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

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constitutivos do direito perseguido no processo, não havendo oposição, pelo réu, de prova

capaz de gerar dúvida razoável.

Dessarte, a evidência deve ser demonstrada mediante prova exclusivamente

documental, podendo ser utilizada prova emprestada, devendo o autor apresentar esta

prova, inexistindo contraprova por parte do réu, apta a gerar dúvida razoável a respeito do

fato constitutivo do direito do autor ou do próprio direito do autor.

Não havendo outra prova a ser produzida, o caso é de julgamento

antecipado do mérito conforme o artigo 355, inciso I do NCPC.

Destaco também que a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de

Magistrados – ENFAM aprovou, entre outros, os seguintes enunciados: “29) Para a

concessão da tutela de evidência prevista no art. 311, III, do CPC/2015, o pedido

reipersecutório deve ser fundado em prova documental do contrato de depósito e também

da mora. 30) É possível a concessão da tutela de evidência prevista no art. 311, II, do

CPC/2015 quando a pretensão autoral estiver de acordo com orientação firmada pelo

Supremo Tribunal Federal em sede de controle abstrato de constitucionalidade ou com

tese prevista em súmula dos tribunais, independentemente de caráter vinculante. 31) A

concessão da tutela de evidência prevista no art. 311, II, do CPC/2015 independe do

trânsito em julgado da decisão paradigma.”455

455 http://www.enfam.jus.br/2015/09/enfam-divulga-62-enunciados-sobre-a-aplicacao-do-novo-cpc/ acesso em 13/09/2015.

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7. Execução das medidas provisórias

Abordamos que a liminar concedida em casos de tutela provisória seja ela

cautelar ou satisfativa gera um incidente impugnável por meio de agravo de instrumento.

Esta decisão interlocutória não faz coisa julgada, portanto, não decide em

caráter definitivo a lide.

Mais uma vez é importante ressaltar que a tutela antecipada não implica em

julgamento antecipado do mérito.

Seu objetivo principal é eliminar o risco do perecimento do direito.

Para que tal aconteça, são adotadas diversas medidas, tais como mandados

ou ordens, que autorizem a realização prática da determinação judicial, seja ela positiva ou

negativa, dentro do próprio processo de conhecimento.

A sentença de mérito a ser proferida tem por função precípua transformar a

providência provisória em definitiva.

O magistrado adota providências necessárias à realização do direito na

prática, abrandando o princípio nulla executio sine titulo.

Outrossim, a antecipação da tutela sujeita-se às regras que disciplinam o

instituto da execução provisória, assim como nas obrigações de fazer impostas a tal título.

Há também a possibilidade da antecipação parcial de um dos pedidos ou de

parte de um deles.

Nesta ordem de ideias, se um dos pedidos cumulados atende aos requisitos

para a antecipação, não há óbice ao deferimento de tal providência, sendo, portanto, pouco

razoável sua inadmissão.

Aplicando-se o mesmo raciocínio, na hipótese de desmembramento do

pedido, perfeitamente viável o deferimento da tutela parcial.

Exemplificando, há possibilidade de deferimento da tutela nos seguintes

casos: a) na obrigação alimentar, quando da prolação de sentença em investigação de

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paternidade; b) suspensão dos efeitos da negativação do nome do autor, quando o débito

estiver sendo discutido em demandas revisionais; c) entrega de um dos bens quando estiver

sendo disputada a posse ou propriedade de mais de um, dentre vários.

7.1. Cumprimento.

Ao decidir sobre a concessão de liminar em cautelares ou tutelas

antecipatórias, o magistrado já indica de forma concreta a forma de execução desta mesma

liminar, não se limitando apenas a dizer que o credor tem o direito em executar a

providência.

Na verdade, o próprio Estado tem interesse público em preservar a

efetividade de sua função jurisdicional.

A decisão tem natureza mandamental, sem prejuízo das demais medidas de

natureza criminal, sempre colimando a efetividade da prestação jurisdicional, diminuindo

os malefícios da demora, valendo destacar o dever das partes em obedecer prontamente aos

comandos judiciais456.

456 Art. 77. Além de outros previstos neste Código, são deveres das partes, de seus procuradores e de todos aqueles que de qualquer forma participem do processo:

I - expor os fatos em juízo conforme a verdade; II - não formular pretensão ou de apresentar defesa quando cientes de que são destituídas de

fundamento; III - não produzir provas e não praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do

direito; IV - cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criar

embaraços à sua efetivação; V - declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nos autos, o endereço residencial ou

profissional onde receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva;

VI - não praticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso. § 1o Nas hipóteses dos incisos IV e VI, o juiz advertirá qualquer das pessoas mencionadas no caput de

que sua conduta poderá ser punida como ato atentatório à dignidade da justiça. § 2o A violação ao disposto nos incisos IV e VI constitui ato atentatório à dignidade da justiça,

devendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa de até vinte por cento do valor da causa, de acordo com a gravidade da conduta.

§ 3o Não sendo paga no prazo a ser fixado pelo juiz, a multa prevista no § 2o será inscrita como dívida ativa da União ou do Estado após o trânsito em julgado da decisão que a fixou, e sua execução observará o procedimento da execução fiscal, revertendo-se aos fundos previstos no art. 97.

§ 4o A multa estabelecida no § 2o poderá ser fixada independentemente da incidência das previstas nos arts. 523, § 1o, e 536, § 1o.

§ 5o Quando o valor da causa for irrisório ou inestimável, a multa prevista no § 2o poderá ser fixada em até 10 (dez) vezes o valor do salário-mínimo.

§ 6o Aos advogados públicos ou privados e aos membros da Defensoria Pública e do Ministério Público não se aplica o disposto nos §§ 2o a 5o, devendo eventual responsabilidade disciplinar ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz oficiará.

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A ofensa ao comando judicial merece pronta reprimenda a exemplo do

direito anglo-saxônico (contempt of court).

Assim é que podem ser adotadas as astreintes que são sanções econômicas

pelo descumprimento da medida nas obrigações de fazer ou não fazer e entrega de coisa,

podendo ser aplicadas tanto nas decisões provisórias quanto definitivas457.

É possível também a aplicação de multa fixa na hipótese de cumprimento de

obrigação de pagar coisa certa, bem como multas moratórias fixas ou progressivas.

As multas moratórias diferem daquelas aplicadas por ocasião do

descumprimento de ordem mandamental, pois as primeiras consideram o retardamento no

cumprimento da obrigação prevista e as demais se fundam no atentado contra a própria

dignidade da justiça.

Todo provimento declaratório ou constitutivo carrega um preceito ou

comando essencial, contendo uma eficácia positiva dispondo sobre a certeza da relação

jurídica discutida e por outro, uma eficácia negativa, trazendo uma vedação ao requerido

consistente em uma abstenção, um non facere.

§ 7o Reconhecida violação ao disposto no inciso VI, o juiz determinará o restabelecimento do estado

anterior, podendo, ainda, proibir a parte de falar nos autos até a purgação do atentado, sem prejuízo da aplicação do § 2o.

§ 8o O representante judicial da parte não pode ser compelido a cumprir decisão em seu lugar.

457 Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

§ 1o O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que:

I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o

descumprimento. § 2o O valor da multa será devido ao exequente. § 3o A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em

juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte ou na pendência do agravo fundado nos incisos II ou III do art. 1.042.

§ 4o A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado.

§ 5o O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

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Um exemplo que pode ser lembrado é a separação de corpos, efeito

decorrente do divórcio, uma verdadeira antecipação da eficácia do rompimento do vínculo

conjugal.

7.2. Medidas urgentes satisfativas

A finalidade da tutela é evitar o perecimento do direito, conforme já dito

anteriormente, sendo permitidas inclusive a concessão de liminares inaudita altera pars,

permitindo-se o cumprimento do comando judicial, operando-se de forma imediata.

Não se pode relegar ao oblívio a necessidade de evitar a irreversibilidade da

decisão, eis que ao final o provimento poderá não favorecer o beneficiário da medida458.

Entre os Enunciados aprovados pela Escola Nacional de Aperfeiçoamento e

Formação de Magistrados – ENFAM, destacamos que: “25) A vedação da concessão de

tutela de urgência cujos efeitos possam ser irreversíveis (art. 300, § 3º, do CPC/2015)

pode ser afastada no caso concreto com base na garantia do acesso à Justiça (art. 5º,

XXXV, da CRFB)”459.

Uma observação merece ser feita.

Ao se referir a “tutela de urgência” para combate ao “perigo de dano” ou o

“risco ao resultado útil do processo” – artigo 300, houve um pequeno deslize do legislador,

eis que não podemos perder de vista a possibilidade de concessão de tutelas contra ilícito,

tais como as tutelas inibitórias e para remoção do ilícito.

458 Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a

probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou

fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. § 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de

irreversibilidade dos efeitos da decisão. 459 http://www.enfam.jus.br/2015/09/enfam-divulga-62-enunciados-sobre-a-aplicacao-do-novo-cpc/ acesso em 13/09/2015.

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Concordamos, portanto, com Luiz Guilherme Marinoni460 pois a tutela

antecipada se destina não somente a combater o perigo de dano como também o perigo de

ilícito.

Nesta linha de pensamento, a tutela cautelar não é tutela para proteção do

processo, mas sim a tutela do direito da parte461.

7.3. Medidas deferidas com fulcro na tutela de evidência.

As tutelas de evidência não se fundam no periculum in mora mas seguem o

mesmo procedimento das demais tutelas de urgência.

São na verdade provimentos satisfativos antecipados.

Feitas estas considerações, a Comissão do Anteprojeto previu a tutela da

evidência e dispensou para a sua concessão a demonstração de risco de dano irreparável ou

de difícil reparação.

Nesta ordem de ideias, prevista no artigo 311 do NCPC, a tutela de

evidência indica um grau de probabilidade tão elevado que passa a ser evidente.

Outrossim, clara a opção do legislador em tornar a tutela antecipada ou de

evidência definitiva, quando restar incontroverso ao menos um dos pedidos ou parte deles

realizados pelo autor.

O dispositivo análogo, consagrado no § 6º do art. 273462, foi introduzido em

2002 pela Lei nº 10.444 no Código de Processo Civil de 1973.

Paira certa tergiversação na doutrina quanto à hipótese de o pedido restar

incontroverso.

460 Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da Tutela, p.90-91. 461 Carlo Calvosa, La tutela cautelare (profilo sistemático), p.184-192; Ferrucio Tommaseo, I provvedimenti d’urgenza – strutura e limiti della tutela anticipatoria, p.78-122; Ovídio Baptista da Silva, Curso de processo civil, p.17, vol.III. 462 § 6º A tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 10.444, de 07.05.2002, DOU 08.05.2002, com efeitos a partir de 3 (três) meses após a data de publicação)

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A pergunta que se coloca é saber se esta seria, pura e simplesmente, uma

espécie de tutela antecipada.

Em excelente artigo, Eduardo Arruda Alvim463 aborda a raiz constitucional

da tutela antecipada:

“Porém, não é possível, em nome de garantir a efetividade do processo,

fazer letra morta do princípio do devido processo legal, de que são consectários

lógicos, expressamente assegurados no Texto Constitucional, o direito à

bilateralidade da audiência e à ampla defesa.

Ou ainda, por outras palavras, se o princípio do due process of law liga-se

à idéia do processo como instrumento que efetivamente possa proporcionar ao

autor o acesso efetivo e não apenas nominal ao Poder Judiciário, por outro lado

esse mesmo princípio do devido processo legal está ligado à bilateralidade da

audiência, bem como à ampla defesa.

Disso exsurge uma conclusão, de magna importância, qual seja, a de que a

antecipação de tutela calcada na urgência não deve ir além do estritamente

necessário, para que o direito do autor (rectius, afirmação de direito do autor), que

se entremostra como extremamente provável, seja resguardado.

A noção de segurança jurídica pressupõe um iter processual em que sejam

amplamente asseguradas a bilateralidade da audiência e a ampla defesa, o que

necessariamente demanda tempo. Se o fator tempo se coloca como fator de risco à

efetividade da entrega da prestação jurisdicional àquele que muito provavelmente

tem direito, justifica-se, então, com esteio no precitado art. 273, caput, e inc. I, a

antecipação de tutela.

Assim, para a antecipação de tutela, é preciso que tenhamos presente a

posição do réu, que também tem direito ao devido processo legal (CF/88, art. 5.º,

LIV) e ao qual a mesma Constituição Federal, no inciso LV do art. 5.º, assegura a

bilateralidade da audiência e a ampla defesa. Daí decorre, por exemplo, a

463 Eduardo Arruda Alvim, Raiz constitucional da antecipação da tutela, http://www.tex.pro.br/home/artigos/175-artigos-set-2013/6308-a-raiz-constitucional-da-antecipacao-de-tutela#ftn45 acesso em 20 de abril de 2015.

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necessidade de que a antecipação de tutela não gere uma situação irreversível,

porque, se gerasse, viria a ser inócua a defesa que viesse a ser apresentada ou que

pudesse vir a ser apresentada, como didaticamente preceitua o § 2.º do art. 273.

Há situações em que o julgador, diante de um pedido de antecipação de

tutela, pode ver-se diante de um dilema de difícil transposição: ou antecipa a tutela

e gera uma situação potencialmente irreversível ou há um grande risco de

perecimento do direito, objeto da afirmação do autor. Em casos tais, sobretudo

levando-se em consideração os valores envolvidos, a possível irreversibilidade da

situação fático-jurídica não se constitui em entrave intransponível à antecipação

da tutela.

Também na hipótese do § 6.º do art. 273, há uma íntima correlação entre a

hipótese ali contemplada e o devido processo legal. Justifica-se plenamente o

julgamento antecipado parcial da lide, se um ou mais pedidos mostram-se

incontroversos.

Não se trata, propriamente, de antecipação de tutela, mas de hipótese de

julgamento conforme o estado do processo. Não tem aplicabilidade, nesse caso, a

regra do § 4.º do art. 273, quanto à possibilidade de revogação/modificação da

decisão antecipatória de tutela. Não há porque retardar a entrega da prestação

jurisdicional, se o réu, a quem compete o ônus de alegar em contestação toda a

matéria de defesa (ao que se denomina de princípio da eventualidade ou

concentração da defesa), não se opôs a um ou mais pedidos.

Oportuno apontar também que a hipótese estampada no § 6.º do art. 273 –

julgamento antecipado parcial da lide diante de pedido incontroverso – guarda

sintonia também com o preceito estampado no inc. LXXVIII do art. 5.º do Texto

Maior: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável

duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

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Da mesma forma, Mirna Cianci464 entende que a hipótese de incontrovérsia

trata de verdadeiro julgamento antecipado parcial de mérito:

“A versão final do Projeto abandonou, como tutela de evidência, a situação

de incontrovérsia, parcial ou total, que passou a ser objeto não mais de tutela antecipada,

mas sim, de julgamento antecipado parcial de mérito (artigo 363,I do Projeto), do que

exsurgem duas situações: (i) se ao invés de apresentada defesa inconsistente, for omitida

defesa, resultará em incontrovérsia capaz de, ou determinar o julgamento antecipado da

lide ou, considerando o juiz que há necessidade de dilação probatória, examinar antes a

possibilidade, diante da realidade do caso, de antecipação da tutela; (ii) se houver

omissão relativa ao documento capaz de assegurar a evidência (e não apenas

contraprova), poderá também nesse caso ser considerado evidente o direito a que se

reporta”.

E a autora conclui:

“• considerar positiva a mudança projetada, na parte que trata a tutela

antecipada com melhor técnica, permitindo que as consequências de sua

aplicabilidade sejam medidas em razão de sua natureza jurídica.

• Houve omissão no tratamento dos casos do confronto de irreversibilidades

e a solução adequada;

• Houve ainda omissão nos casos de revogação automática da tutela

antecipada em caso de improcedência da demanda;

• Deveria ter sido previsto o contraditório, exceto nos casos em que esse

exercício pudesse comprometer a sua efetividade.

• A inovação mais problemática fica por conta da previsão de concessão

preparatória de tutela antecipada e sua estabilização que, ao contrário de

abreviar o rito, revela-se prenhe de incidentes, capazes de traduzir a

multiplicação de recursos.”

Comentando o artigo 311465 do NCPC, mais uma vez trazemos à colação os

ensinamentos da Profa. Teresa Arruda Alvim Wambier466:

464 Mirna Cianci, Tutela Antecipada no Projeto do Código de Processo Civil: Acertos E Desacertos http://anape.org.br/site/wp-content/uploads/2014/01/TESE-72-AUTORA-MIRNA-CIANCI.pdf acesso em 20 de abril de 2015.

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271

“Tais situações não se confundem, todavia, com aquelas em que é dado ao

juiz julgar antecipadamente o mérito (arts.355 e 356), porquanto na tutela de

evidência, diferentemente do julgamento antecipado, a decisão pauta-se em

cognição sumária e, portanto, traduz uma decisão revogável e provisória.

É pois, com esse foco que se estruturou no NCPC um tratamento

diferenciado para as tutelas de evidência, permitindo-se ao autor, mediante a

demonstração da evidência de seu direito, a antecipação dos efeitos da tutela final

ou mesmo uma tutela conservativa. Por isso mesmo é plausível uma tutela cautelar

ou satisfativa fundada na evidência.

Trata-se de uma tutela provisória, mas não de urgência, porquanto fundada

exclusivamente na evidência do direito, não se cogitando de periculum in mora. O

caput traz, desde logo, esse conceito ao referir que a ‘tutela da evidência será

concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao

resultado útil do processo’. Bem se vê, portanto, que o periculum in mora não é um

requisito para sua concessão. (...)467”

465 Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:

I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; II - as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em

julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; III - se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de

depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; IV - a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito

do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.

466 Teresa Arruda Alvim Wambier; Maria Lúcia Lins Conceição; Leonardo Ferres da Silva Ribeiro; Rogerio Licastro Torres Mello, Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil, p.523/524. 467 E prossegue a autora: “O inciso I tarifa a situação em que fica caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte. Importa, pois, para a configuração da hipótese o mau comportamento do réu que deve se traduzir em abuso do direito de defesa ou o propósito protelatório. A defesa deve ser abusiva, excessiva, anormal, inadequada, com o propósito de frustrar e/ou atrasar a prestação jurisdicional. É interessante observar que o réu pode apresentar defesa técnica adequada e mesmo assim abusar do direito de defesa, que deve ser lido consoante o princípio da ampla defesa, abarcando não só as peças confeccionadas a esse título (contestação, reconvenção, etc.), como também a conduta do réu na defesa de seus interesses. Nesse sentido, a defesa stricto sensu pode até ser adequada, porém ficar evidenciada, por sua conduta, o manifesto propósito protelatório, como, e.g., insistir em discutir matéria já preclusa, repetir alegações indeferidas, fazer reiteradas cargas, repetir recursos que foram inadmitidos. Dessa forma, mercê da defesa procrastinatória apresentada pelo réu, o direito do autor fica ainda mais evidenciado, emergindo maior probabilidade de vitória a sua pretensão. O inciso II diz respeito à situação em que as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante. Nessa situação, pouco importa a atitude do réu. Há necessidade da presença de dois requisitos: (i) que a situação de fato apresentada pelo autor possa ser comprovada apenas por documentos e que ele o faça; e (ii) que a tese jurídica envolvendo a questão já se encontre pacificada, seja em sede de julgamento de casos repetitivos, seja por força de súmula vinculante. O inciso III trata de hipótese

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Mirna Cianci468 aborda que: “A doutrina tem também afastado a

possibilidade de estabilização da tutela nas ações declaratórias e constitutivas, por ser

indispensável, nesses casos, a produção da coisa julgada, sendo de todo incompatível com

a regra que induz a precariedade”.469

Logo, o processo cautelar era concebido como “o instrumento do

instrumento”.

É certo que algumas medidas processuais tidas como cautelares, acabam por

ser satisfativas, isto é, contemplam plenamente o interesse do requerente, sem a

necessidade de instauração ou prosseguimento do processo.

Outros defendem, de forma mais arrojada, esse provimento antecipado se

trata de um verdadeiro julgamento antecipado da lide propriamente dito equiparado

àqueles proferidos com cognição exauriente.

Penso que esta não foi a ideia do legislador na hipótese de pedidos que se

mostrarem incontroversos, caráter definitivo. bem específica: tratar-se de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa. Para explicar essa hipótese, convém esclarecer que o contrato de depósito é regido pelas disposições contidas nos arts. 627 e ss. do CC. De forma resumida, pode-se dizer que o depositário tem por obrigação guardar o bem e conservá-lo, como se seu fosse, se obrigando a restitui-lo, com seus respectivos frutos, ao depositante. (...) O inciso IV, por sua vez, prevê a tutela de evidência quando a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. Exige-se portanto, de um lado, pelo autor, prova documental suficiente, idônea, para a comprovação dos fatos constitutivos por ele alegados; e, pelo réu, ausência de prova capaz de gerar dúvida razoável. Perceba-se que não se trata de incontrovérsia – hipótese tratada pelo NCPC como julgamento antecipado parcial do mérito (art.356) – mas de falta de prova consistente do réu diante de uma prova literal idônea. Presume-se, nesse caso, a inconsistência da defesa, a falta de argumentos verossímeis que possa desdourar a comprovação documental feita pelo autor. Não se cogita, aqui, de intenção procrastinatória ou do abuso do direito de defesa previstos no inciso I, mas tão somente da defesa inconsistente diante da prova literal apresentada pelo autor. É de se admitir, segundo pensamos, que o autor possa se valer da ‘prova emprestada’, ou seja, aquela produzida noutro processo sob o crivo do contraditório, para demonstrar ‘documentalmente’ o fato constitutivo do seu direito. Por fim, o parágrafo único encerra um ponto importante: só é permitido ao juiz decidir liminarmente a tutela de evidência, ou seja, no início do processo, antes da apresentação da contestação, nas hipóteses previstas nos incisos II e III, vale dizer, quando houver prova exclusivamente documental apresentada pelo autor, acompanhada de tese firmada em casos repetitivos ou súmula vinculante, ou quando se tratar de pedido reipersecutório, fundado em prova documental do contrato de depósito. A contrario sensu, as demais hipóteses, tratadas nos incisos I e IV, que se referem à defesa abusiva e/ou procrastinatória e à defesa inconsistente, respectivamente, devem necessariamente ser objeto de análise somente após avaliação da defesa apresentada pelo réu, providência, a nosso ver, acertada, na medida em não é dado ao juiz ‘intuir’ qual será a qualidade da defesa a ser apresentada pelo réu”. 468 Mirna Cianci, Tutela Antecipada no Projeto do Código de Processo Civil: Acertos E Desacertos http://anape.org.br/site/wp-content/uploads/2014/01/TESE-72-AUTORA-MIRNA-CIANCI.pdf acesso em 20 de abril de 2015. 469 Cf Talamini, Tutela de Urgência no Projeto de Novo Código de Processo Civil: A estabilização da medida urgente e a “monitorização” do processo civil brasileiro. Revista de Processo 209, p.16 – jul/2012.

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Permanece a essência da provisoriedade como os demais provimentos

antecipatórios trazidos pelo antigo artigo 273 do CPC/1973.

Devemos ter cautela na hipótese de antecipação do provimento definitivo,

ainda que incontroverso, porém sem cognição exauriente.

Se não, vejamos.

Imaginemos se em um caso que foi concedida a tutela de evidência venha a

ser e depois restar demonstrado as pretensões estavam prescritas.

Seria possível afirmar que esta decisão proferida em sede de cognição

sumária e prescrita, estaria coberta pelo manto da coisa julgada?

Penso ser negativa a resposta.

Na verdade, o processo cautelar original, tal como era concebido tinha

dupla finalidade: acessória e assecuratória.

Ao mesmo tempo visa conservar ou resguardar o resultado de outro

processo, dito como principal.

A sistemática sofreu alteração substancial, perdendo o caráter de

acessoriedade.

Carlos Eduardo de Oliveira Holanda Junior470 abordou a tutela antecipada

no Código de Processo Civil de 1973 e no Novo Código de Processo Civil, esclarecendo

470 Carlos Eduardo de Oliveira Holanda Junior, Breves Considerações sobre a Tutela Antecipada na Atual Sistemática Processual e no Projeto do Novo CPC http://www.mpce.mp.br/esmp/publicacoes/edi001_2012/artigos/03_Carlos.Eduardo.Holanda.pdf. Acesso em 18/09/2015. E prossegue o autor: O instituto sob exame também consiste em espécie de tutela preventiva, pois pode ter por fim evitar dano ou a sua consumação. Tal afirmativa tem fundamento constitucional, como se pode ver na literalidade do artigo 5°, inciso XXXV, da Constituição Federal (1988): “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. (...) Deveras importante também registrar o “novo” instituto da tutela da evidência, que nada mais é do que uma tutela antecipada não fundada na urgência, mas sim na maior evidência do direito veiculado por uma das partes. A tutela da evidência não é instituto realmente novo, posto que já previsto, ao menos parcialmente, na sistemática atual, como se verá abaixo, no entanto sem a nova nomenclatura. Estabelece o artigo 285 do Projeto as hipóteses de concessão da chamada tutela da evidência, em que será dispensada a demonstração de urgência para a concessão de tutela antecipada. Segue abaixo a transcrição do citado dispositivo sobre a tutela da evidência, litteris: Art. 285. Será dispensada a demonstração de risco de dano irreparável ou de difícil reparação quando: I - ficar caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do requerido; II - um ou mais dos pedidos cumulados ou parcela deles mostrar-se incontroverso, caso em que a solução será definitiva; III -

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sobre a necessidade de cumulação de determinados requisitos para a concessão ora

fundados na urgência, ora fundados na inconsistência da defesa do réu, havendo previsão

de um novo instituto, a tutela de evidência:

“A tutela antecipada consiste em espécie de tutela de urgência, provisória e

preventiva. Em regra é tutela de urgência, pois se funda no periculum in

mora, ou seja, o perigo da demora natural da prestação jurisdicional, que

pode acarretar danos irreparáveis ou de difícil reparação ao requerente. A

demora na prestação jurisdicional, na efetivação do direito material violado,

às vezes enseja maiores injustiças do que a resistência injustificada do réu à

pretensão do autor, podendo causar danos irreparáveis ao direito material.

Fundamenta-se nesta ideia a antecipação dos efeitos da tutela. Deve-se

salientar que também é espécie de tutela de urgência a tutela cautelar, pois

a inicial for instruída com prova documental irrefutável do direito alegado pelo autor a que o réu não oponha prova inequívoca; ou IV - a matéria for unicamente de direito e houver jurisprudência firmada em julgamento de casos repetitivos ou súmula vinculante. Parágrafo único. Independerá igualmente de prévia comprovação de risco de dano a ordem liminar, sob cominação de multa diária, de entrega do objeto custodiado, sempre que o autor fundar seu pedido reipersecutório em prova documental adequada do depósito legal ou convencional. (BRASIL, Projeto de Lei n.166, de 08 de junho de 2010) Como se pode constatar pela leitura do artigo 285, todos os seus incisos, com exceção do II, tratam de hipóteses de tutelas de cognição sumária, precárias, pois. O inciso II trata de caso de julgamento final de parte do pedido ou dos pedidos em sede de cognição exauriente, não sendo caso de decisão precária e provisória, e sim de decisão definitiva de mérito. O restante dos casos tratados no mencionado artigo dependem de participação do réu para a sua ocorrência, praticando atos meramente protelatórios, abusando do direito de defesa, tornando evidente o bom direito do autor. Para Marinoni e Mitidiero, à exceção do inciso II, os demais incisos do artigo 285 traduzem uma defesa inconsistente ou previsivelmente inconsistente: Os demais casos podem ser agrupados sem maiores dificuldades sob o conceito de defesa inconsistente. A diferença está em que as situações dos incisos I e III requerem a participação do réu para as suas configurações, ao passo que aquela descrita no inciso IV pode ser configurada inaudita altera parte, já que é possível aferir liminarmente a existência de julgamento de casos repetitivos ou de súmula vinculante a favor da posição jurídica do autor. Em todos estes casos, a defesa ou mostra-se inconsistente ou é previsivelmente inconsistente. (MARIONI; MITIDIERO, 2010, p.109) E continuam os referidos autores: A hipótese do art. 285, I, é a mesma presente no art. 273, II, Código vigente. Rigorosamente, por si só dá conta das demais hipóteses, já que abusa do direito de defesa ou age com manifesto propósito protelatório quem oferece defesa inconsistente. (MARIONI; MITIDIERO, 2010, p.109) Como se pode observar, a denominada tutela da evidência, em que pese mais especificada e mais detalhada no Projeto do novo CPC, nada mais é do que a tutela antecipada não fundada na urgência já prevista no atual Código, em seu artigo 273, inciso II, como hipótese genérica de defesa inconsistente. (...) O instituto da antecipação dos efeitos da tutela, antes adstrito a apenas alguns procedimentos específicos, com a reforma processual de 1994, tornou-se possível em qualquer rito do procedimento comum. Como se pode constatar, hoje o juiz possui um verdadeiro poder geral de antecipação (juntamente com o poder geral de cautela e o poder geral de efetivação), consubstanciado nos artigos 273 (tutela antecipada genérica) e no artigo 461, § 3º (tutela antecipada específica), ambos do Código de Processo Civil, devendo-se valer de referido poder guiado pelo princípio da proporcionalidade, de modo a não causar prejuízos desnecessários a qualquer das partes. O Projeto do novo CPC atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados unifica o tratamento das tutelas de urgência, quer sejam satisfativas, quer sejam assecuratórias, abolindo o livro referente ao processo cautelar, trazendo à baila o instituto da tutela da evidência como espécie de tutela antecipada, visando uma maior celeridade e efetividade no procedimento das medidas de urgência, sem, no entanto, apresentar mudanças substanciais em relação ao atual sistema.

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também se funda no perigo da demora. As distinções entre referidas tutelas,

antecipada e cautelar, será analisada em tópico abaixo. Contudo, deve-se

salientar que nem toda espécie de tutela antecipada será também tutela de

urgência. Quando a tutela antecipada for concedida na hipótese em que

estiver caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito

protelatório do réu, não há que se falar em urgência, consistindo neste caso,

à evidência do direito do autor, em mais uma sanção juntamente com o

artigo 17 do Código de Processo Civil para os atos atentatórios à dignidade

da justiça. A tutela antecipada, assim como a tutela cautelar, também é

espécie de tutela provisória porque é concedida a título precário, podendo a

qualquer tempo ser revogada. É concedida, mas sabe-se que não é definitiva.

Pode-se dizer que efetiva provisoriamente direitos materiais. Possui, pois,

natureza provisória, de modo que poderá ser revogada a qualquer tempo, por

meio de outra decisão interlocutória, quando o juiz verificar a ausência de

seus requisitos. Também deixará de existir na hipótese de extinção anômala

do processo, ou quando do proferimento da sentença de mérito”.

7.4. Provisoriedade.

O procedimento de acordo com o artigo 520 do NCPC corre por inciativa e

responsabilidade do exequente, que se obriga a reparar os danos, fica sem efeito

sobrevindo decisão que modifique ou anule sentença objeto de execução, retornando as

partes ao statu quo ante, se a sentença objeto de cumprimento provisório ou definitivo for

modificada ou anulada em uma parte, apenas nesta parte ficará sem efeito a execução, o

levantamento do depósito em dinheiro, a prática de atos que importem em transferência ou

posse ou alienação de propriedade ou outro direito real dos quais possa resultar grave dano

ao executado dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e

prestada nos próprios autos.471

471 Art. 520. O cumprimento provisório da sentença impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo será realizado da mesma forma que o cumprimento definitivo, sujeitando-se ao seguinte regime:

I - corre por iniciativa e responsabilidade do exequente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido;

II - fica sem efeito, sobrevindo decisão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos;

III - se a sentença objeto de cumprimento provisório for modificada ou anulada apenas em parte, somente nesta ficará sem efeito a execução;

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8. Medidas cautelares nominadas

Da mesma forma que no Código de Processo Civil de 1973, o Novo Código

de Processo Civil apresenta medidas cautelares típicas, veiculando no artigo 301472 um rol

meramente exemplificativo, tais como, arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de

protesto conta alienação de bens, cabendo ao magistrado adotar qualquer outra medida

idônea para assegurar o direito, preservando o seu poder geral de cautela.

Muito embora o legislador não tenha reiterado as hipóteses de cabimento do

arresto, do sequestro, do arrolamento de bens e do registro de protesto contra alienação de

bens, significa que estas medidas cautelares são submetidas a mesmos requisitos de toda e

qualquer medida cautelar: probabilidade do direito – fumus boni iuris – e perigo na demora

– periculum in mora, ou, como consta do Código, risco ao resultado útil do processo.

Ora, os conceitos anteriores foram incorporados exatamente como foram

concebidos na legislação anterior.

8.1. Arresto

Arresto é a apreensão judicial de bens indeterminados do devedor para

assegurar futura execução por quantia certa.

Há possibilidade do arresto de ofício e será feito como forma de preservar a

responsabilidade patrimonial, com a separação de bens suficientes para o pagamento da

dívida.

IV - o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem transferência de posse

ou alienação de propriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultar grave dano ao executado, dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos.

§ 1o No cumprimento provisório da sentença, o executado poderá apresentar impugnação, se quiser, nos termos do art. 525.

§ 2o A multa e os honorários a que se refere o § 1o do art. 523 são devidos no cumprimento provisório de sentença condenatória ao pagamento de quantia certa.

§ 3o Se o executado comparecer tempestivamente e depositar o valor, com a finalidade de isentar-se da multa, o ato não será havido como incompatível com o recurso por ele interposto.

§ 4o A restituição ao estado anterior a que se refere o inciso II não implica o desfazimento da transferência de posse ou da alienação de propriedade ou de outro direito real eventualmente já realizada, ressalvado, sempre, o direito à reparação dos prejuízos causados ao executado.

§ 5o Ao cumprimento provisório de sentença que reconheça obrigação de fazer, de não fazer ou de dar coisa aplica-se, no que couber, o disposto neste Capítulo. 472 Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.

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8.2. Sequestro

Sequestro é medida cautelar destinada a assegurar futura execução para

entrega de coisa e consiste na apreensão de bem determinado objeto da causa, assegurando

sua entrega ao vencedor.

8.3. Diferença entre arresto e sequestro

No sequestro a liminar é deferida para entrega de coisa certa enquanto que

no arresto os bens são indeterminados, neste último a ideia é a preservação do patrimônio

do devedor.

8.4. Arrolamento de bens

A finalidade do arrolamento de bens é a preservação e conservação de bens

litigiosos que correm risco de dilapidação ou extravio.

A medida conservativa a ser adotada pode evoluir de uma simples descrição

do bem até o seu depósito.

8.5. Registro de protesto contra alienação de bens

A função do registro de protesto contra alienação de bens é a prevenção de

responsabilidade, a conservação do direito, a ressalva de direitos.

Não se trata de medida cautelar propriamente, e apenas assegura direitos,

sendo exercido de forma unilateral.

8.6. Medidas cautelares tradicionais

Entre as demais medidas, podemos citar a caução, real ou fidejussória, o

depósito preparatório de ação, a busca e apreensão, o atentado, e demais medidas

provisionais diversas, tais como aquelas anteriormente previstas no artigo 888 do

CPC/73.473

473 SEÇÃO XV DE OUTRAS MEDIDAS PROVISIONAIS Art. 888. O juiz poderá ordenar ou autorizar, na pendência da ação principal ou antes de sua propositura:

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Tais medidas continuam sendo aplicadas, inclusive após o advento do Novo

Código de Processo Civil.

Outrossim, quanto à definição das medidas, entendo que continuaremos a

utilizar os conceitos fornecidos pelo Código de Processo Civil de 1973.

I - obras de conservação em coisa litigiosa ou judicialmente apreendida; II - a entrega dos bens de uso pessoal do cônjuge e dos filhos; III - a posse provisória dos filhos, nos casos de separação judicial ou anulação de casamento; IV - o afastamento do menor autorizado a contrair casamento contra a vontade dos pais; V - o depósito de menores ou incapazes castigados imoderadamente por seus pais, tutores ou curadores, ou por eles induzidos à prática de atos contrários à lei ou à moral; VI - o afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal; VII - a guarda e a educação dos filhos, regulado o direito de visita que, no interesse da criança ou do adolescente, pode, a critério do juiz, ser extensivo a cada um dos avós; (NR) (Redação dada ao inciso pela Lei nº 12.398, de 28.03.2011, DOU 29.03.2011) VIII - a interdição ou a demolição de prédio para resguardar a saúde, a segurança ou outro interesse público.

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9. Tutela provisória contra o Poder Público

9.1. Histórico

O legislador vem limitando a concessão de tutela provisória e execução

provisória contra a Fazenda Pública.

No artigo 5º § único da Lei nº 4.348/1964 não era possível a concessão de

liminar ou execução provisória em sede de mandado de segurança que ordenasse a

reclassificação ou equiparação de servidores públicos, concessão ou aumento ou extensão

de vantagens.

Na Lei 12.016/2009 que trata do mandado de segurança há situações

específicas em que é vedada a concessão de liminar, praticamente repetindo a vedação

anterior.

Podemos citar aqueles contidos no artigo 7º parágrafo 2º da mencionada lei,

isto é, nos casos de compensação de créditos tributários, na entrega de mercadorias e bens

provenientes do exterior, na reclassificação ou equiparação de servidores públicos, na

concessão de aumento ou extensão de vantagens, em pagamento de qualquer natureza.

Saliento que as restrições abrangem as tutelas de urgência atuais previstas

no Novo Código de Processo Civil.

Prosseguindo a abordagem do tema, a Lei nº 8.437, de 30.06.92, dispõe

sobre a concessão de medidas liminares contra atos do Poder Público, especialmente seus

artigos 1º e 2º.

Portanto, não cabe liminar toda vez que providência semelhante não puder

ser concedida em ações de mandado de segurança.

Também não será cabível no juízo de primeiro grau, medida cautelar

inominada ou liminar quando impugnado o ato de autoridade sujeita, na via de mandado de

segurança, à competência originária do tribunal, nem admissível liminar que esgote, no

todo ou em parte, o objeto da ação.

Ao presidente do tribunal compete o conhecimento do recurso, suspendendo

a execução da liminar nas ações intentadas contra o Poder Público, em caso de manifesto

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interesse público ou de flagrante ilegitimidade para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à

segurança e à economia pública, comportando agravo interno no prazo de cinco dias, a

decisão do presidente.

Estas regras também se aplicam à sentença proferida na ação cautelar

inominada proferida contra o Poder Público.

Saliento que a cognição prévia é incompleta, superficial e não exauriente,

carecendo de melhor exame após a instauração do contraditório.

Todavia, cognição sumária e não exauriente não pode se confundir com

arbítrio do magistrado.

A faculdade prevista no artigo 300, parágrafo 2º do Novo Código de

Processo Civil não implica na prodigalização das medidas preventivas, sob pena de ser

maculado o devido processo legal.

Nesta ordem de ideias, entendo que em caráter excepcional poderão ser

concedidas medidas acautelatórias contra o Poder Público, eis que para não ser aplicada

uma norma, não é preciso que ela seja inconstitucional, bastando, tão-somente, que existam

outras normas, princípios ou valores superiores que a ela se sobreponham, não sendo

razoável, então, aplicá-la em prejuízo destes.

No artigo 1.059 do Novo Código de Processo Civil474 está previsto que à

tutela provisória, satisfativa ou cautelar contra a Fazenda Pública, será aplicado o

estabelecido nos artigos 1º a 4º da Lei nº 8.437/1992 e no artigo 7 § 2º da Lei 12.016/2009.

Os pressupostos para sua concessão devem ser cuidadosamente verificados.

Resolvendo questão incidente, o recurso cabível é o agravo de instrumento.

Na Lei nº 2.770/56 houve a proibição da concessão de medidas liminares

em mandado de segurança para desembaraço de mercadoria estrangeira.

474 Art. 1.059. À tutela provisória requerida contra a Fazenda Pública aplica-se o disposto nos arts. 1o a 4o da Lei no 8.437, de 30 de junho de 1992, e no art. 7o, § 2o, da Lei no 12.016, de 7 de agosto de 2009.

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Em 1964, pela Lei nº 4.348, limitou-se a concessão de liminares em

mandado de segurança para reclassificação e outorga de vantagens pecuniárias a

funcionários públicos. Também não se questionou sobre a inconstitucionalidade desse

diploma, senão por vezes isoladas.

Em 1966, a Lei nº 5.021 estabeleceu a só valia da segurança definitiva

quando revista a sentença pelo Tribunal.

Com a entrada em vigor da Lei nº 9.494/1997, foi regulamentada a tutela

antecipada contra o poder público, estendendo-se às tutelas satisfativas em geral.

Sintetizando, resta vedada a tutela provisória contra o Poder Público que

tenha por objeto a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de

aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza (artigo 7º, § 2º da

Lei nº 12.016/2009); medida que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação

(artigo 1º, § 3º da Lei nº 8.437/1992), que na verdade é repetição da vedação quanto à

irreversibilidade, e finalmente, a impugnação de ato de autoridade sujeita, na via de

mandado de segurança, à competência originária do tribunal, ressalvados a ação popular a

e ação civil pública (artigo 1º §§ 1º e 2º da Lei nº 8.437/1992).

9.2. Doutrina

Prosseguindo, importante abordar certas restrições ou vedações impostas à

concessão de liminar em Mandado de Segurança por leis infraconstitucionais.

Ao longo da história, constata-se a estrutura interventiva do Estado

legislador, no que tange à limitação de controle feito pelo Poder Judiciário.

Podemos mencionar várias leis que tentaram limitar a ação do Judiciário

contra atos administrativos.

Na Lei nº 4.348/64, a liminar no mandado de segurança era ampla desde que

preenchidos os requisitos do direito líquido, que é o direito provado, pronto e certo, que é o

direito bom, com isso poderia se conceder liminar contra o Poder Público.

Essa lei limitou exatamente, quando no seu art 5º estabeleceu o seguinte:

"Não será concedida a medida liminar de mandados de segurança impetrados visando à

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reclassificação ou equiparação de servidores públicos, ou à concessão de aumento ou

extensão de vantagens".

Ora, o legislador, através da Lei 4.348/64, já limitou o poder de controle que

poderia ser exercido pelo Poder Judiciário quando disser respeito aos casos mencionados.

Em 1966, nova lei, agora a de 09 de junho de 1966, também, ainda com

relação à liminar em mandado de segurança, assim estabeleceu no seu art 1º, § 4º: "Não se

concederá medida liminar para efeito de pagamento de vencimentos e vantagens

pecuniárias".

Em 1992, a Lei 8.437 criou mais uma forma de limitação ao controle

judicial, dispondo em seu art. 1º: "Não será cabível medida liminar contra atos do poder

público no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou

preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em ação de

mandado de segurança".

Portanto, a vedação no mandado de segurança estendeu-se às ações

cautelares.

E no § 3º desta Lei nº 8.437 ficou estabelecido o seguinte: "Não será cabível

medida liminar que esgote no todo ou qualquer parte o objeto da ação".

A Lei 9.494, de 10 de setembro de 1997, positivou o seguinte: "Aplica-se a

tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do CPC o disposto nos arts. 5º e seu

parágrafo único e 7º da Lei 4.348, de 26 de junho de 1964, e no art. 1º e seu § 4º da Lei

5.021, de 9 de junho de 1966, e nos arts. 1º, 3º e 4º da Lei 8.437, de 30 de junho de 1992".

Logo, a proibição para conceder, para limitar as concessões de liminares em

mandado de segurança, foi, posteriormente, estendida para as cautelares e, por último, para

as tutelas antecipadas.

Portanto, tudo aquilo que não podia ser concedido em mandado de

segurança não poderia ser concedido, de forma alguma, contra o Poder Público.

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Carlos Mario Velloso475 ao pondera que: “não se pode admitir que o

impetrante ingresse em juízo para fazer, no curso sumaríssimo do mandado de segurança,

em que não há dilação, a prova das suas alegações, esta deve ser, aqui, sempre, prova

preconstituída e sempre documental. A prova há de ser documental e os documentos

comprobatórios do fato não podem padecer de dúvida. Se fossem impugnados de falsos,

não seria possível a instauração do incidente de falsidade. Nesse caso não se poderia falar

mais em direito líquido e certo”.

Alguns doutrinadores reputam inconstitucionais os mencionados artigos, já

que representariam limitação ao pleno exercício da jurisdição.

Em artigo, Márcio Louzada Carpena476 aponta que:

“(...) A concessão de medidas cautelares e liminares contra o Poder

Público há muito vem sofrendo constantes censuras legislativas, calcadas

em uma ideologia política ostensiva de reduzir gastos e prejuízos. As

normas básicas que regulam a matéria são praticamente a Lei 8.437, de 30

de junho de 1992, a Lei 9.494 de 10 de setembro de 1997, e a atual Medida

Provisória 1798-1 de 11 de fevereiro de 1999, que alterou os dispositivos

das duas leis citadas.

Em síntese pode-se afirmar que tanto a Lei 8.437/92 quanto a Lei 9.494/97

dirigem-se no sentido de vedar, seja por força de ação cautelar seja por

força de tutela antecipada, respectivamente, a liberação de recursos,

inclusão em folha de pagamento, reclassificação, equiparação, concessão

de aumento ou extensão de vantagem a servidores da União, dos Estados e

do Distrito Federal, e dos Municípios, inclusive de suas autarquias e

fundações. O artigo 2º da MP 1.798-1 salienta claramente que, nestes

casos, somente será executada a medida após o seu trânsito em julgado.

Com isso, tem-se que não caberia, em tese, nenhum tipo de provimento

antecipatório contra o Poder Público.

No entanto, isto não é bem assim. A norma jurídica restritiva não pode ter

uma aplicação indiscriminada, sob pena de causar em determinados casos 475 Carlos Mario Velloso, Direito Líquido e Certo, p.57. 476 Márcio Louzada Carpena, Medidas Liminares no Processo Cautelar Datadez - SET de 1999.

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uma injustiça tal capaz de menosprezar todo o Estado de Direito e violar a

própria Constituição Federal. Aliás, não são poucos os que julgam estas

normas completamente inconstitucionais por vedarem, em última análise, o

útil e eficiente acesso à Justiça. A propósito preconiza MARINONI que "o

direito de acesso à Justiça, albergado no art 5º, XXXV, da CF, não quer

dizer apenas que todos têm direito a recorrer ao Poder Judiciário, mas

também quer significar que todos têm direito à tutela jurisdicional efetiva,

adequada e tempestiva (...). Quer isto dizer que, 'se o legislador

infraconstitucional está obrigado, em nome do direito constitucional, à

adequada tutela jurisdicional, a prever tutelas que, atuando internamente

no procedimento, permitam uma efetiva e tempestiva tutela jurisdicional,

ele não pode decidir, em contradição com o próprio princípio da

efetividade, que o cidadão somente tem direito à tutela efetiva e tempestiva

contra o particular'. Dizer que não há direito à tutela antecipatória contra

a Fazenda Pública em caso de 'fundado receio de dano' é o mesmo que

afirmar que o direito do cidadão pode ser lesado quando a Fazenda

Pública é ré".

Assim sendo, a concessão de liminar é permitida e obrigatória

constitucionalmente quando for indispensável à garantia da efetividade de outro direito

constitucional circunstancialmente mais privilegiado e acossado por ameaça grave e

iminente, na visão de Teori Albino Zavascki.

O tema pode ser dividido sob dois prismas, segundo excelente artigo

intitulado “Restrições à concessão de Liminares”, publicado na Revista Justitia, São Paulo

(56) 168, pp.90/99, da lavra do Ministro do Colendo Supremo Tribunal Federal, Teori

Albino Zavascki, escrito quando então Desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª

Região.

O primeiro, enfocando a legitimidade constitucional da legislação ordinária

que impõe estas restrições.

Em segundo lugar, devemos analisar as restrições impostas pelo sistema

jurídico ao magistrado, para conceder tais medidas.

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A pergunta que se coloca é a seguinte: está o legislador autorizado,

constitucionalmente, a criar restrições legais à concessão de medidas liminares pelo Poder

Judiciário?

Sob outro giro, outra questão que se coloca é em que condições e em que

limites está o Poder Judiciário autorizado a emitir provimentos liminares?

O ponto de partida será a análise das cláusulas constitucionais que

fundamentam e, por isso mesmo, estabelecem os limites da função jurisdicional cautelar.

Os limites servem como orientação à atividade do legislador e do juiz.

O artigo 5º da Constituição Federal entre outras matérias dispôs sobre

direitos e deveres relacionados com a prestação jurisdicional.

De acordo com o inciso XXXV temos positivado que:

"A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a

direito",

Já o inciso LIV dispõe:

"ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo

legal",

Finalmente, o inciso LV assegura que:

"aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em

geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e

recursos a ela inerentes".

Ora, destes dispositivos, podemos destacar o monopólio estatal da

jurisdição, o direito de ação, o direito ao devido processo legal e suas cláusulas, o direito à

estabilidade e segurança jurídica, ou seja, o de ver mantidos intactos a pessoa e o

patrimônio enquanto não esgotado o devido processo legal.

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Partindo-se da premissa de que os direitos explicitamente arrolados na

Constituição decorrem correspondentes deveres, podemos destacar os seguintes direitos e

deveres fundamentais dos que litigam no processo civil:

I - DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO LITIGANTE DEMANDANTE:

a) Direito de ação e de fazer atuar a função jurisdicional – inciso XXXV do art. 5º da CF;

b) Direito à jurisdição útil – decorre, como contrapartida necessária, do monopólio estatal

da jurisdição, consagrado, de modo, implícito, no inciso LIV do art. 5º da CF;

II – DEVERES DO DEMANDANTE:

a) submeter-se à jurisdição, ou seja, é vedada a justiça de mão própria. Trata-se de dever

que decorre também necessariamente do monopólio estatal da função jurisdicional, já

mencionado.

b) submeter-se ao cumprimento das cláusulas do "devido processo legal", vale dizer, ao

demandante assegura-se o direito de acionar a jurisdição, mas sua pretensão somente será

atendida, se for o caso, após esgotada a liturgia do processo, que prevê o direito ao

contraditório e a ampla defesa do demandado. Trata-se de dever imposto pelo inciso LIV

do art. 5º.

III - DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO LITIGANTE DEMANDADO:

a) manter seus bens e direitos, sem restrições, mesmo quando contestados por terceiro,

enquanto não advier decisão final, tomada mediante devido processo legal. É o que se

poderia chamar, numa expressão sintética, de direito à segurança jurídica, consistente, em

concreto, no direito à manutenção do status quo. Trata-se de direito assegurado,

explicitamente, pelo inciso LIV do art. 5º.

b) utilizar todos os meios de defesa previstos na cláusula do devido processo legal,

inclusive produção de provas e interposição de recursos. É o direito ao devido processo

legal, que decorre do inciso LV.

IV - DEVERES DO LITIGANTE DEMANDADO:

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a) submeter-se à jurisdição. Como o demandante, o demandado está submetido,

obrigatoriamente, à jurisdição do Estado;

b) submeter-se, como o demandante, às cláusulas do devido processo legal, acolhendo as

decisões que dele exsurgirem.

Eduardo Pellegrini de Arruda Alvim477 leciona que:

“(...) O sistema processual civil prevê que, em determinadas hipóteses, é

possível ao juiz determinar providências liminarmente, sem a prévia ouvida

da parte contrária.

Tradicionalmente, isto já era possível na seara do processo cautelar. Com

efeito, sendo o processo cautelar um instrumento para dar efetividade ao

processo principal, muitas vezes se faz necessário, em seu bojo, que sejam

determinadas providências sem ser previamente ouvida a parte contrária. É

o que expressamente prevê o art.804. Também é possível, em situações

excepcionais, que sejam proferidas decisões antecipatórias de tutela sem a

prévia ouvida do réu. Nas hipóteses em que há urgência, não é incomum

que a liminar seja concedida sem a prévia audiência da parte contrária.

Entende-se que tal possibilidade não conflita com o princípio do

contraditório e da ampla defesa. Explica-se o porquê.

Quando o sistema prevê a possibilidade de medidas liminares, sem ser

ouvida a parte contrária, é porque há risco de dano irreparável, se não

concedida liminarmente a providência pleiteada. Então, entre dois valores

em pauta – contraditório e efetividade do processo – há o que Nelson Nery

Jr.., baseado em doutrina alemã, denomina ‘limitação imanente à

bilateralidade da audiência’.478 Isso não quer dizer que o contraditório

possa ser afastado. Absolutamente. Tão logo determinada a providência

liminar solicitada inaudita altera parte, esta deverá ser intimada, para

defender-se e, se entender ser o caso, interpor recurso contra a decisão.

Exatamente por isso tais decisões não deverão gerar situações irreversíveis,

477 Eduardo Arruda Alvim, Direito Processual Civil, p.149. 478 Nelson Nery Jr., Princípios do processo civil, p.185.

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pois, se o fizessem, aí sim, seria inutilizado (e não simplesmente adiado) o

contraditório. É o que didaticamente prevê o § 2º do art. 273 do CPC.

Em suma, sacrifica-se provisoriamente o contraditório, em prol da

efetividade do processo (interesse superior da justiça), pois sem a decisão

liminar inaudita altera parte o processo corre o risco de não ser eficaz.

Porém, à parte prejudicada pela decisão será dado o direito de sobre ela se

manifestar, e de interpor recurso à instância ad quem, se entender

necessário. Além disso, há que se considerar que as medidas liminares são,

por excelência, provisórias479, o que corrobora a ideia de que as liminares

inaudita altera parte não colidem com o princípio do contraditório e da

ampla defesa”.

A Ministra Eliana Calmon Alves em artigo “Concessão de Liminares”

aborda que:

“(...) A realidade jurídica expressa no Direito positivo é exercício de

absorção dos valores culturais da sociedade. A Ciência do Direito estuda o

fenômeno da realidade jurídica como manifestação cultural, valorada via

filosofia do Direito, ou sem valoração alguma, pela só observação, via

Sociologia Jurídica. Cabe ao jurista observar o Direito posto, analisar os

valores nele contidos, comparar esses valores com a norma e os fatos e, por

fim, adequar os três elementos: fato, valor e norma.

A preocupação maior nesse trabalho de subsunção é a exata adequação do

Direito à realidade, traduzindo os reais valores da vida. E é ainda maior a

preocupação quando trabalha o jurista com os direitos fundamentais,

também denominados de direitos da personalidade, direitos individuais ou,

como modernamente estão sendo denominados, liberdades públicas.

Na identificação e definição desses direitos, exigem-se critérios precisos,

atentando o jurista para os contornos filosóficos e morais da vida social.

Afinal, trata-se de direitos fundamentais à própria existência e pairam

479 Quanto à provisoriedade das medidas liminares no processo cautelar, ver, por exemplo, o art. 807 do CPC. Conferir, também, nosso Antecipação da tutela cit.p.159 e ss.

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acima do próprio Estado, a quem cabe, por princípio finalístico, dar-lhes

garantia.

Nessa tarefa divergem os estudiosos. Enquanto os positivistas sustentam a

inexistência de direito fora ou acima do Estado, os formalistas, dentro da

mesma ortodoxia, só aceitam como direito o que está contido na ordem

jurídica, fora da qual não há espaço para direito algum.

Contrapondo-se aos extremados positivistas e formalistas, próximo aos

adeptos do direito natural, entende a doutrina moderna, em consenso

universal e espontâneo, que a pessoa humana está no centro dos valores.

Esse valor antecede o próprio direito, muito embora esteja atrelado à

realidade do direito posto.

Se a norma reflete os valores da realidade, tendo como centro de

preocupação a pessoa humana, ressalta-se a importância dos direitos que

buscam garantir a dignidade do indivíduo, direitos esses previstos de forma

implícita ou explícita na Lei Maior, ou até mesmo na Lei Fundamental.

A digressão aqui feita serviu ao direcionamento que se dá a um dos direitos

fundamentais: o direito de obter do Estado a recomposição ou o resguardo

de um direito agredido ou ameaçado.

Ao tempo em que garante o Estado o acesso ao aparelhamento destinado a

aplicar autoritariamente a garantia, também há de preservar a efetividade e

a qualidade da sua atuação”480.

480 E prossegue a Ministra: “A efetividade está ligada ao tempo de entrega da garantia do direito reclamado. Com frequência, a celeridade na prestação jurisdicional é exigida para a sobrevivência do direito. São os chamados direitos instantâneos que, quando agredidos, exigem imediata recomposição via instrumentos de urgência – antecipação de tutela ou liminares, sob pena de perecimento. Sem as tutelas de urgência de nada valeriam os direitos fundamentais, constitucionalmente garantidos, se o tempo, com o seu poder inexorável, consolidasse situação fática que os tornasse inócuos. Sem valor o aparato estatal, se a demora na mobilização do aparelho judicial levar à irreversibilidade o conflito. A solução efetiva deve ser oferecida em velocidade compatível com a realidade geradora do conflito. Daí a importância do tema – liminares -, um dos instrumentos de urgência, para garantia dos direitos fundamentais instantâneos. Sem valor o aparato estatal, se a demora na mobilização do aparelho judicial levar à irreversibilidade o conflito. A solução efetiva deve ser oferecida em velocidade compatível com a realidade geradora do conflito. Daí a importância do tema – liminares -, um dos instrumentos de urgência, para garantia dos direitos fundamentais instantâneos. O Processo e as Urgências A garantia, como tutela do direito, pode ser operada em diversos sistemas de Proteção: jurisdicional, administrativo, político e misto. O mais completo e eficiente é o sistema jurisdicional,

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pela independência e imparcialidade, onde a solução é obtida pelo devido processo legal, princípio inserido no elenco dos direitos fundamentais, na denominada jurisdição constitucional das liberdades. Dentro da moderna visão do devido processo legal, passa o juiz a ser partícipe da relação e, como tal, vincula-se às garantias, institucionalizando-se o sistema que engloba a todos, inclusive ele que, como os demais partícipes, deve manter-se fiel à norma de conduta pré-estabelecida. A fidelidade à lei está ligada à visão principiológica, cuja referência reside nos princípios constitucionais que funcionam como uma espécie de filtro de toda a atividade judicante, de tal sorte que não pode o julgador afastar-se do direito contido na ordem jurídica estabelecida. Essa visão do direito, norteadora das regras interpretativas, proporciona, porém, liberdade ao magistrado para agir no seu mister, de acordo com a lei ou até mesmo fora do texto normativo, se este for insuficiente para solucionar os conflitos e tensões sociais ocorridos nos momentos de rápidas transformações, em que a velocidade do processo legislativo não consegue acompanhar as mudanças sociais. O exercício de aplicação do direito pelos princípios constitucionais é chamado de ativismo judicial, ensejador de uma visão criativa e atualizada dos magistrados, mas exige um certo grau de politização da Justiça. (...)Como instrumentos constitucionais de defesa das liberdades, apresentam-se ambos os processos na modalidade repressiva ou preventiva. Visa o primeiro remover agressão já consumada, e o segundo objetiva preservar um direito ameaçado, evitando que se consuma a agressão. A tutela preventiva, que não se confunde com a tutela acautelatória, visa proteger situação material ameaçada, fazendo o acertamento do direito sem caráter de provisoriedade. Diferentemente, a tutela cautelar é de nítido caráter provisório e objetiva assegurar eficácia ao processo, protegendo, por via de conseqüência, o direito substancial. Na prática, confundem-se as tutelas, porque contêm ambas a possibilidade de atendimento imediato, chamado de provimento liminar. (...) A liminar, por sua natureza cautelar, exige como pressupostos específicos e simultâneos o fumus boni iuris e o periculum in mora, ou seja, fumaça de um direito ainda não certificado e o perigo de que se perca, para o titular, se não atendido de imediato. Na concessão de liminares, age o magistrado com uma larga margem de discricionariedade, o que não se confunde com arbitrariedade. Daí ser imprescindível a rigorosa fundamentação, evitando que o caráter de provisoriedade seja instrumento de arbítrio, para possibilitar a garantia dos direitos fundamentais. A liminar, como medida discricionária, urgente, excepcional e provisória, pode ser alterada a qualquer tempo, durante o curso da ação na qual foi prolatada. (...) A diferença de tratamento quanto à natureza jurídica da liminar, a depender do instituto a que se refira, parece-me hoje superada, ao proclamar a jurisprudência que o provimento definitivo a substituiu, quando positivo, ou extingue os efeitos da antecipação provisória, quando negativa. No âmbito da utilização do mandado de segurança, a orientação jurisprudencial vem do STF que, pela Súmula 405 enuncia: Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária. A concessão da liminar é, como ressaltado, exceção consentida pelo legislador, constituindo-se em medida excepcional e exigindo fundamentação precisa, a demonstrar a necessidade da urgência, a fim de não haver desgaste para o Judiciário, nem atropelo aos princípios maiores do processo, dentre os quais o devido processo legal e o contraditório. (...) Conclusões 1) dentre os direitos fundamentais ou garantias públicas está o direito à efetividade da proteção estatal; 2) a velocidade da vida incompatibiliza-se com a burocrática tramitação do processo, que segue os princípios informadores do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da publicidade e outros, fazendo-se necessário procedimento específico que garanta a efetividade da decisão judicial; 3) na busca da efetividade, foram instituídos, constitucionalmente, procedimentos específicos, dos quais, na área penal, destaca-se o habeas corpus e o mandado de segurança; 4) ao lado da celeridade dos instrumentos constitucionais, que objetivam prevenir infração e afastar ameaça a direito, outorgou-se ao magistrado a possibilidade de, no curso da ação, expedir ordem cautelar para evitar a consolidação de uma situação fática irreversível; 5) embora de natureza preventiva, sem nenhum caráter acautelatório, a liminar concedida no curso das ações constitucionais de garantia tem caráter nitidamente cautelar, caracterizado pela provisoriedade e instrumentalidade; 6) no habeas corpus, assim como no mandado de segurança, há possibilidade de concessão de liminar. Mas, no habeas corpus, a concessão é conseqüência de uma interpretação extensiva, doutrinariamente aceita; 7) a concessão de liminar exige do magistrado visão principiológica e apurada fundamentação, a fim de justificar a aparente violação às regras do devido processo, da ampla defesa e do contraditório; 8) a liminar cede espaço à decisão definitiva, quando positivo o provimento final, mas extinguem-se-lhe todos os efeitos, se negativo, com eficácia retroativa; 9) na atualidade, a obtenção de uma liminar é mais do que uma faculdade do julgador, constituindo-se em direito de obtenção, caso presentes os pressupostos específicos: perigo de aguardar a sentença definitiva; possibilidade evidente da concessão de mandamento positivo, ao final; e 10) a visão principiológica e de ativismo autoriza a concessão de liminares de natureza cautelar, mas essa atividade expõe a magistratura à sociedade que a recebe. Daí a necessidade de controle absoluto, na concessão. Prosseguindo, os juízes devem estar conscientes de que participam de fatos sociais, tendo como papel não o de mero intérprete. A liminar do processo cautelar está situada dentro do poder geral de cautela que tem o juiz (art. 798, do CPC).”

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Ora, o sistema jurisdicional tem como garantia a independência e

imparcialidade.

O conflito será resolvido com a aplicação do devido processo legal, alçado a

direito fundamental.

O magistrado passa a integrar a relação, vinculando-se às aludidas garantias

não podendo delas se afastar.

Portanto, há possibilidade de pronta intervenção do Poder Judiciário para

remoção de uma agressão já consumada, hipótese de atuação repressiva ou a preservação

de direito ameaçado, hipótese de atuação preventiva.

Ademais, quando estamos diante de um pedido de tutela provisória

repressiva, na qual o autor se preocupa com a remoção dos efeitos de um ato ilícito já

praticado, o juízo de delibação provisório deve estar focado na promoção de seu

ressarcimento, ou mesmo evitar o seu agravamento.

A liminar, por sua natureza cautelar, exige como pressupostos específicos e

simultâneos o fumus boni iuris e o periculum in mora, ou seja, fumaça de um direito ainda

não certificado e o perigo de que se perca, para o titular, se não atendido de imediato.

Prosseguindo, ao conceder liminares, age o magistrado com uma certa

margem de discricionariedade, o que não se confunde com arbitrariedade.

Daí ser imprescindível a fundamentação conforme já salientado

anteriormente.

Frise-se que a provisoriedade não poderá jamais servir como instrumento de

arbítrio, única forma de serem garantidos os direitos fundamentais481.

481 Leonardo Greco, A Tutela da Urgência e a Tutela da Evidência no Código De Processo Civil de 2014/2015. “(...) A não exaustividade da cognição não é, entretanto, a única característica da tutela aqui denominada de provisória, porque, conforme já tive oportunidade de acentuar, há procedimentos com essa característica na jurisdição de conhecimento, na jurisdição de execução e na chamada jurisdição voluntária. O Código de 2014/2015 definiu como provisória, a de natureza cautelar ou antecipada (art. 295), de urgência ou de evidência, o que não impede que, em razão da sumariedade da cognição, outros provimentos de cognição não exaustiva nele estejam previstos, como a sentença liminar de improcedência (art. 333), a expedição de mandado de pagamento na ação monitória (art. 716), a homologação da transação ou da arrematação (art.

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No âmbito da utilização do mandado de segurança, a orientação

jurisprudencial vem de entendimento contido na Súmula 405 do Colendo Supremo

Tribunal Federal.482

O Professor Eduardo Arruda Alvim483 com singular clareza aborda o

assunto, entendendo que embora não prevista, a liminar em mandado de segurança é da

essência do mesmo:

“De tudo quanto já se expôs, resulta claro que a liminar, conquanto não

prevista na dicção do Texto Constitucional, é da própria essência do instituto do mandado

de segurança. É o que já disse anteriormente, quanto se apontou para a circunstância de

que, como regra quase absoluta, não se deve condicionar a concessão da liminar em

mandado de segurança à prestação de caução.

Com efeito, se há perigo na demora, decorrente do risco de ineficácia prática

da sentença, se concedida somente a final, a não concessão da liminar leva à inutilidade

dessa mesma sentença e à consequente inutilidade da própria garantia, da óptica do

impetrante. Ou por outras palavras, casos há em que, se não for concedida a liminar isto

conduz à ineficácia da própria medida.

Problema intricado, que suscita maiores controvérsias, seja nos tribunais,

seja no âmbito doutrinário, consiste na indagação atinente à constitucionalidade de

diversos diplomas legais que preveem restrição à possibilidade de concessão de medidas

liminares, especialmente quando ré a Fazenda Pública. Tal problema, aliás, passou em

nosso sentir a ter maior repercussão diante do que dispõe o § 2º, do art.7º, da Lei

12.016;09, segundo o qual ‘não será concedida medida liminar que tenha por objeto a

compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens proveniente do

exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento

ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza”.

E o autor prossegue, reputando “inconstitucionais leis infraconstitucionais

que pretendam limitar as hipóteses de concessão de liminar em mandado de segurança484.

978, § 4º), os provimentos de jurisdição voluntária e que, assim, também possam ser considerados provisórios. 482 Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária. 483 Eduardo Arruda Alvim, Mandado de Segurança, pp.262/272.

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Um dos exemplos mais citados é o da Lei 2.770/56, que veda a concessão de liminares

para liberação de mercadorias, bens ou coisas procedentes do estrangeiro485.486 Tal vedação

hoje também consta do já mencionado § 2º., do art.7º, da Lei nº 12.016/09. A Lei nº

4.348/64, no art.5º., trazia, ainda, outras hipóteses de descabimento de medida liminar em

mandado de segurança, tais como nos casos de reclassificação ou equiparação de

servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens. Conquanto

aludido diploma legal (Lei 4.348/64) tenha sido revogado pela Lei 12.016/09, essa última

veio a prescrever igual restrição em seu art.7º, § 2º.”

Além disso, segundo o que de depreendia do parágrafo único do art.5º e do

art.7º, ambos da Lei 4.348/64 (revogada pela Lei nº 12.016/09), a apelação naquelas

hipóteses era dotada de efeito suspensivo, o que, em nosso sentir, também atritava com a

grandeza constitucional do mandado de segurança. De forma similar, o art. 14, § 3º da Lei

nº 12.016/09 estatui que nos casos em que for vedada a concessão de liminar, a sentença

que conceder o mandado de segurança não poderá ser executada provisoriamente, o que,

pelas mesmas razões, continua a afligir a grandeza constitucional daquela ação.

O dispositivo que consagra o mandado de segurança como garantia

constitucional (inc.LXIX do art.5º) deve ser interpretado em consonância com o inc.

XXXV desse mesmo art.5º., que consagra o princípio de amplo acesso ao Judiciário, desde

que haja lesão ou ameaça a direito.

Com efeito, não se pode tolerar que qualquer dispositivo normativo

infraconstitucional tolha o acesso ao Judiciário, por força do princípio insculpido no art.5º,

inc.XXXV, do Texto Maior. E a esse dispositivo tem-se dado a interpretação mais ampla

possível, no sentido de que ele garante não apenas o formal acesso ao Judiciário, mas o

acesso efetivo a esse Poder. Tal dispositivo é de magna importância, tanto que insuscetível

484 Nesse preciso sentido, Sérgio Ferraz, Mandado de Segurança, 4ª ed., pp.245 e ss.; Celso Bastos, Curso de Direito Constitucional, p.219; Hugo de Brito Machado, Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 6ª ed., p.138. Nelson Nery Jr., Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 8ª ed., p.144, em interessante raciocínio, alude à ineficácia da norma limitadora das liminares em mandado de segurança. 485 Art.1º., da Lei 2.770/56: “Nas ações e procedimentos judiciais de qualquer natureza, que visem obter a liberação de mercadorias, bens ou coisas de qualquer espécie procedentes do estrangeiro, não se concederá, em caso algum, medida preventiva ou liminar que, direta ou indiretamente importe na entrega da mercadoria, bem ou coisa”. 486 O TRF da 5ª Região, todavia, pelo seu Plenário, denegou pedido de medida liminar para liberação de mercadoria estrangeira, invocando a vedação expressa da Lei nº 2.770/56 (MS 3.069-PB, Rel. Nereu Santos, j.20/11/1991, Repertório IOB de Jurisprudência, nº 6, p.99, 1992).

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de alteração, enquanto garantia individual, até mesmo por emenda à Constituição (art.60, §

4º, inciso IV, da CF/88).

Desse dispositivo, defluem diversas implicações de suma importância. Entre

essas, é de se notar que a doutrina reconhece como decorrência do direito de ação (CF/88,

art.5º, XXXV), a atribuição de assistência jurídica gratuita integral aos necessitados

(CF/88, art.5º, LXXIV).487

Com efeito, de pouco ou de nada adianta garantir o direito de ação se não se

assegurar, além disso, a assistência jurídica aos necessitados, pois, caso contrário, aquela

primeira garantia não se mostraria eficaz para uma parcela imensa da população. Assim, a

assistência gratuita aos necessitados aparece como um verdadeiro desdobramento do

direito de ação, como forma de viabilização deste, por assim dizer.

Da mesma forma, não adianta reconhecer o direito de acesso ao Judiciário,

ignorando-se que situações há que exigem a medida liminar, sob pena de o interessado não

poder vir a ter acesso ao bem da vida pleiteado, ainda que obtenha sentença favorável. Por

isso, a garantia da tutela liminar é, igualmente, desdobramento ou explicitação do princípio

constitucional que consagra o direito de ação, daí porque está determinado no inc.XXXV

do art. 5º da Constituição Federal, que a lei não excluirá da apreciação do Judiciário

qualquer lesão ou ameaça a direito.488

Tal raciocínio aplica-se com muito mais razão em se tratando de direito

líquido e certo. De fato, se a lei não pode tolher a apreciação (útil) pelo Judiciário de

qualquer lesão ou ameaça a direito, com muito mais razão não poderá impedir a apreciação

(igualmente útil) de ameaça a direito líquido e certo, ou melhor dizendo, que se apresenta,

após cognição sumária, como líquido e certo.

Não se pode, ademais, interpretar o disposto no inc. XXXV do art. 5º de

forma desarticulada do princípio do devido processo legal, insculpido no art.5º, inc.LIV da

mesma Carta Magna.

487 Nesse sentido, cf.Nelson Nery Jr., Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 8ª ed., p.137; v., também, Rogério Lauria Tucci e José Rogério Cruz e Tucci, Constituição de 1988 e Processo, pp.20 e ss. 488 Athos Gusmão Carneiro, citado por Hugo de Brito Machado, Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 6ª ed., pp.138-139, expõe, com inteiro acerto e invulgar autoridade, que situações há em que a não concessão da liminar leva ao perecimento do direito, o que não é admissível de ser tolerado, em face do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.

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Diz a propósito, com inteira razão, Betina Rizzato Lara: “Em verdade, o que

ocorre no caso das vedações às liminares é uma substituição incorreta do juiz pelo

legislador na tarefa de avaliar os interesses e de verificar sobre o cabimento de uma medida

liminar”.489 Daí porque tais leis são inconstitucionais, não apenas por acutilarem a

grandeza constitucional da garantia do mandado de segurança, agredindo os princípios do

amplo acesso ao judiciário e devido processo legal, mas também por implicarem

verdadeira subversão do princípio constitucional da tripartição dos poderes [rectius das

funções estatais do poder].

Vejamos, por exemplo, a hipótese da MP 375/93. Referida medida

provisória, em seu art.2º., condicionava a concessão de liminar em mandado de segurança

à “audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, ou da entidade

da administração indireta, que deverá ser pessoalmente notificado para manifestar-se no

prazo de setenta e duas horas”, o que obviamente podia levar, em muitas hipóteses, ao

perecimento do direito postulado pela via do mandado de segurança. Na primeira edição

deste trabalho, qualificamos tal exigência como inconstitucional. A mesma consta

expressamente do art. 2º da Lei 8.437/92, e do § 2º do art.22, da Lei nº 12.016/09, quanto

ao mandado de segurança coletivo. Para nós, limitações dessa natureza não podem ser

entendidas como obstativas da concessão de liminares, quando a urgência justifique não

esperar as 72 horas. Isto é, se possível, as 72 horas devem ser atendidas, mas não podemos

emprestar a esse dispositivo um entendimento tal que as 72 horas devem ser respeitadas,

ainda que isso possa implicar o perecimento da afirmação do direito do autor. Intepretação

diferente, para nós, colidiria com diversos preceitos constitucionais, entre os quais o art.5º,

incs.XXXV e LIV. Se necessário for, todavia, a liminar pode ser concedida sem prévia

cientificação da impetração à autoridade coatora [rectius à pessoa jurídica de direito

público presentada pela autoridade coatora]. Esta é a posição que defendemos em outro

trabalho com amparo em decisão do STJ. O § 2º, do art. 22, da Lei 12.016/09, como já

anunciado, também condiciona a concessão da liminar em mandado de segurança coletivo

à prévia oitiva do representante judicial da pessoa jurídica de direito público no prazo de

72 horas. Todavia, dito dispositivo legal, conforme dissemos, deve ser interpretado com os

temperamentos apontados.

489 Cf.Betina Rizzato Lara, Liminares no Processo Civil, p.79.

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Da mesma forma, afigura-se-nos atritar com o Texto Constitucional o

disposto no art.1º da Lei 8.437/92, no sentido do descabimento da medida liminar contra

atos do Poder Público em quaisquer ações de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que

semelhante providência não puder ser obtida via mandado de segurança, em virtude de

vedação legal. Assim, também, o § 5º do art.7º da Lei 12.016/09, que estende as vedações

relacionadas com a concessão de liminares em mandado de segurança, à antecipação de

tutela a que se referem os arts.273 e 461 do CPC. Mesmo porque, quaisquer limitações

impostas por diplomas legais infraconstitucionais ao cabimento de liminar em mandado de

segurança são, segundo nosso entendimento, insofismavelmente inconstitucionais.490 Deste

modo, segundo nossa posição não é possível à lei infraconstitucional restringir as hipóteses

de cabimento de liminar em mandado de segurança. (...)

Assim, a lei infraconstitucional que estatui prazo de eficácia para a liminar

em mandado de segurança é inconstitucional491”.

Não podemos perder de vista que a velocidade da vida não mais sustenta

procedimentos eivados de burocracia, devendo ser observados os princípios informadores

do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da publicidade e outros,

490 Com posição um pouco diferente, Nelson Nery Junior defende que as normas limitadoras de liminares em mandado de segurança não são inconstitucionais, mas sim ineficazes. Diz o autor: “A possibilidade de conceder-se o mandado de segurança liminarmente se deve não ao comando constitucional, que nada diz a respeito, mas a disposição de lei federal. Logo, se outra lei federal dispuser sobre as liminares, diversamente do que dispunha lei federal anterior, estaremos diante do fenômeno da revogação, perfeitamente possível dentro de nosso sistema jurídico. O que há, na verdade, é que essa norma limitadora das liminares em mandado de segurança é ineficaz, não inconstitucional. A rigor, não seria necessário que lei federal permitisse a concessão liminar do mandado de segurança, pois para que a garantia tivesse a efetividade esperada do Texto Constitucional, o juiz poderia concedê-la initio litis, por meio de medida liminar. A lei federal que regulamentou a concessão da liminar no mandado de segurança veio apenas reforçar os poderes do juiz no particular. Na ausência dessa norma sobre liminares, poderia o juiz fazer uso de seu poder geral de cautela e conceder a liminar quando fosse o caso. Consequentemente, mesmo na vigência da lei que proibia a concessão de liminar no mandado de segurança contra ato do governo federal, em face da ineficácia dessa norma, o juiz poderia conceder a medida em face do poder geral de cautela”. (Cf. Princípios do processo civil na Constituição Federal, 8ª ed., São Paulo: RT, 2004, P.144, destaques do autor). 491 Como nós, tendo escrito antes do advento da Lei nº 12.016/09, pensa Arruda Alvim, in verbis: “Em nosso modo de ver, esta lei, neste passo, é inconstitucional, porque segundo a grande regra, na hermenêutica constitucional, os institutos têm na Constituição um conteúdo próprio mínimo. Então, se o legislador constitucional deu o mandado de segurança, nele está ínsito uma especificidade, que é a pronta e eficaz defesa. Se uma lei ordinária torna inócua a providência constitucional, esta lei é inconstitucional’. (...) Corretíssima a observação de Lúcia Valle Figureiredo, “A Liminar no Mandado de Segurança”, in Curso de Mandado de Segurança, p.108: “Ora, o que não tem cabida alguma é se supor que, se o juiz tem excesso de serviço e não pode sentenciar o feito, a liminar pereça, a liminar simplesmente se extinga, ocorrendo a caducidade. Isso é a maior afronta ao texto constitucional. Então, se o Estado não dá a prestação jurisdicional, o jurisdicionado é quem sofre? Quer dizer, se o Estado não dá a prestação jurisidicional, seria passível até de responsabilidade’ (cf. Novo Processo Tributário, p.171).

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fazendo-se necessário procedimento específico que garanta a efetividade da decisão

judicial.

Prosseguindo, os juízes devem estar conscientes de que participam de fatos

sociais, tendo como papel não o de mero intérprete.

Entre nós possível aplicar os pensamentos da Escola do Ativismo Judicial.

A liminar do processo cautelar está situada dentro do poder geral de cautela

que tem o juiz.

É preciso ter-se presente que o objetivo principal da medida liminar, em

cautelar, consiste em possibilitar o acesso útil à Justiça.

Logo, concluímos que a garantia de se submeter ao Judiciário o exame de

lesão ou ameaça de lesão deve garantir a utilidade do aludido acesso.

Sem liminares, muitas e muitas vezes, o cidadão poderia até ter sucesso na

demanda, mas não efetivaria a sentença. Daí a responsabilidade do julgador em não dar a

mais e não outorgar a menos, ou seja, agir com a preocupação de não esvaziar a ação

principal.

Não resta atualmente dúvida quanto à possibilidade de concessão de tutela

provisória em desfavor da Fazenda Pública.

Aqueles que se posicionavam contra esta possibilidade afirmavam que a

remessa necessária492 seria um obstáculo, pois uma decisão provisória não poderia gerar

efeitos imediatos.

492 Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:

I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações de direito público;

II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal. § 1o Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a

remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á. § 2o Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária. § 3o Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido na

causa for de valor certo e líquido inferior a: I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito

público;

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Não concordamos com esta posição, eis que como bem pondera Eduardo

Talamini493, nem mesmo quando a tutela provisória é concedida no bojo da sentença,

submete-se a efeito suspensivo de eventual apelação, o que ratifica que sua eficácia não

resta condicionada a reexame necessário.

O regime de pagamentos por meio de precatórios seria um obstáculo à

antecipação provisória da tutela, já que não permite o pagamento imediato de valores.

Contudo o regime de precatórios somente se aplica a obrigações em dinheiro, não se

aplicando às obrigações de fazer, não fazer e entrega de coisa, sendo plenamente cabível a

concessão de tutelas para ações declaratórias e constitutivas cujos efeitos poderão operar

desde logo.

Outro argumento, a meu ver equivocado, seria invocar a presunção de

legitimidade do ato administrativo e sua auto-executoriedade.

Esta presunção não é absoluta.

Nesta ordem de ideias, nada impede também a concessão de tutela de

evidência contra a Fazenda Pública.

Esse o entendimento de Antonio de Moura Cavalcanti Neto494, com quem

concordamos.

Aponta o autor que:

II - 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas autarquias e

fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados; III - 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e

fundações de direito público. § 4o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em: I - súmula de tribunal superior; II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em

julgamento de recursos repetitivos; III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de

competência; IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do próprio

ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa. 493 Eduardo Talamini, Tutela de urgência e Fazenda Pública, p.43. 494 Antonio de Moura Cavalcanti Neto, A possibilidade de concessão de tutela da evidência contra a Fazenda Pública no projeto de novo Código de Processo Civil. Sobre acreditar ou não no acesso à justiça, p. 381 – 412.

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“Com isso, foi estabelecido o núcleo essencial do referido princípio, que se

desdobra em três aspectos: garantia de amplo acesso ao Poder Judiciário, de apreciação

das alegações formuladas e, presentes os requisitos legais, de efetiva proteção do

direito. Mesmo em um contexto de modernidade líquida, em que os conceitos tornam-se

líquidos e leves, ou seja, sem forma definida e inconsistentes, é indispensável que se

garanta um elemento indissociável de cada instituto. Para Bauman, por exemplo, quando se

trata de justiça, é necessário que o contexto seja de uma democracia que garanta a

tolerância e a singularidade de cada indivíduo. Essa ideia impede que determinados valores

jurídicos fundamentais sejam mitigados pela doutrina, jurisprudência ou qualquer

interpretação dissociada das normas constitucionais.

Por fim, mostrou-se que, mesmo com base no modelo de incidência jurídica

de Pontes de Miranda, a partir da nova abordagem feita por Clarice de Araújo, também é

admitida a concessão de tutela da evidência contra o Poder Público. Essa foi, aliás, a

conclusão do Fórum Permanente de Processualistas Civis, que, por meio do seu Enunciado

35, disciplinou que “as vedações à concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública

não se aplicam aos casos de tutela de evidência”.

Esse é o entendimento que mais se harmoniza com o texto constitucional e

que garante que o princípio do acesso à justiça não tem um conteúdo quando dirigido

contra o particular e outro completamente diferente quando a demanda é movida contra a

Fazenda Pública. O art. 5.º, XXXV, da CF não admite redução indevida da garantia do

amplo acesso à justiça.

Em verdade, entender que não é possível deferir a tutela antecipada da

evidência contra o Poder Público diz respeito a uma crença prévia: acreditar ou não no

princípio do acesso à justiça. Mais do que de direito processual civil, trata-se de

compromisso com a justiça e com a possibilidade de sua realização no caso concreto”.

Para chegar a esta conclusão, Antonio de Moura Cavalcanti Neto ressalta

que é inconstitucional qualquer lei ou interpretação que vede aprioristicamente o acesso ao

Judiciário e, a partir disso, a apreciação das alegações trazidas ao Estado-Juiz com a

consequente proteção efetiva do direito. Em um Estado Constitucional, não é possível

admitir que o acesso à justiça tenha esse núcleo reduzido, sob pena de ferir o ideal mais

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antigo que move o direito, que é a justiça, valendo-se dos ensinamentos de Zygmunt

Bauman, grande sociólogo polonês:

“Zygmunt Bauman é autor de diversos livros que têm, em sua maioria, a

liquidez no próprio título. A repetição do autor não é feita ao acaso. Ele busca durante toda

a sua obra demonstrar que a pós-modernidade, chamada de Modernidade Líquida, quebrou

diversos conceitos fundamentais da modernidade para jogar-nos em um caos em que a

única regra é não ter regra. A referência à liquidez vem exatamente daí, pois o líquido não

tem uma forma predefinida, pelo contrário, se estiver em um cilindro, será cilíndrica a sua

forma, se estiver em um cubo, será cúbica, se estiver em uma esfera, será esférica.

Segundo Bauman, “o que todas essas características dos fluidos mostram,

em linguagem simples, é que os líquidos, diferentemente dos sólidos, não mantêm sua

forma como facilidade”.495 Apesar de partir do conceito de liquidez, não é de física ou

química que o sociólogo irá tratar, pelo contrário, as relações humanas serão o seu objeto

principal de estudo. A sociedade é o seu grande laboratório. E, conforme pensamos, não há

como dissociar o direito de todo esse processo de fluidez indiscriminada.

Outro conceito encontrado na teoria de Bauman é o de leveza. E novamente

é importante ressaltar: nada há de preocupação com o peso do ar. Com essa ideia, o autor

busca demonstrar que o discurso da modernidade é dotado de grande mobilidade e

inconstância. Assim, quanto mais leve for o conceito, mais é possível extrair significados

diversos dele, em contrapartida, pode-se chegar ao esvaziamento da noção inicial,

tornando-o algo supérfluo. (...)

Também não foram as diversas ditaduras que governaram um grande

número de países que demarcaram o início do tempo líquido. Conforme noticia Bauman, a

modernidade líquida “emergiu do derretimento radical dos grilhões e das algemas que,

certo ou errado, eram suspeitas de limitar a liberdade individual de escolher e de agir”.

Com isso, o indivíduo ganha total destaque pelo fato de não pertencer a nenhum grupo

determinado.

A grande jogada da pós-modernidade é exatamente a indeterminação

constante, daí o surgimento de tensões insuperáveis dentro do indivíduo e também na

495 Zygmunt Bauman, Modernidade líquida, p. 8.

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sociedade. Com os conceitos sólidos, tínhamos padrões definidos de conduta; com a

modernidade líquida, tudo torna-se rarefeito e tendente a se diluir. É por isso que a liquidez

exige vigilância incessante, dada a sua inconstância e mutabilidade.

Em uma passagem importante para esclarecer o que é o mal-estar da pós-

modernidade, o referido autor relata que, atualmente, “os padrões e configurações não são

mais ‘dados’, e menos ainda ‘autoevidentes’; eles são muitos, chocando-se entre si e

contradizendo-se em seus comandos conflitantes, de tal forma que todos e cada um foram

desprovidos de boa parte de seus poderes de coercitivamente compelir e restringir”.

O novo poder global não admite cercas ou rígidas definições de vida, para

se inserir na grande rede social atual é preciso ter habilidade para pertencer a todos os

grupos e, no instante seguinte, não pertencer a nenhum. O mais interessante disso tudo é

perceber que os sentimentos humanos mais caros também “entraram na roda” do mundo

líquido. O amor, outrora visto como um porto seguro dentro do universo das relações,

agora pode ser visto como uma espécie de limitação intrínseca à vida humana.

A justiça, que talvez mova a humanidade desde os seus primórdios, também

se liquefaz. Se houvesse um conceito rígido de justiça, por exemplo, o direito internacional

não toleraria mais ditaduras. E, em várias situações, os atores internacionais não só toleram

regimes de exceção, como os incentivam, tudo porque não interessa à modernidade líquida

qual a orientação política de determinada sociedade, mas tão somente qual a sua

capacidade de consumir e, assim, produzir mais consumo. (...)

Adverte o sociólogo que a justiça não pode se tornar somente um festivo e

alegre acontecimento. Por isso, ele assevera que esse ideal é muito mais um movimento do

que um objetivo, é um eterno porvir. E ainda temos outra importante ressalva: para

Zygmunt Bauman, esse ideário humano representa um eterno estado de insatisfação, eis

que é um compromisso perene, uma responsabilidade moral inolvidável496 e que não se

estabelece de acordo com a ocasião. (...)

O universo jurídico, e é isso que se quer demonstrar, não é uma ilha fora do

mundo líquido, de forma alguma. É possível perceber que, mesmo no direito, os conceitos

atualmente são rarefeitos e têm a sua efetividade condicionada à boa vontade dos juízes,

496 Zygmunt Bauman, O mal-estar da pós-modernidade, p.88/89.

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administradores e, em primeiro grau, à decisão política do legislador. Os exemplos são

inúmeros, é suficiente citar apenas alguns para, depois disso, haver o direcionamento ao

que interessa especificamente, que é o princípio do amplo acesso à justiça. O princípio da

fungibilidade recursal é uma demonstração clara do quanto são líquidos os valores no

direito. Existem decisões que entendem que há fungibilidade recursal na interposição de

apelação no caso de julgamento que acolhe parcialmente a exceção de pré-executividade,

outros julgados, em sentido diametralmente oposto, decidem que há erro grosseiro nessa

hipótese. (...)

Não se deve permitir que tais interpretações sejam mantidas sob o manto da

independência do Poder Judiciário, pois isso gera injustiça flagrante. Esse interpretativismo

pressupõe exatamente a liquidez completa dos institutos jurídicos, porque, se houvesse

garantia efetiva de acesso à justiça, ainda que mínima, tal decisão não teria sequer sido

proferida, se fosse não teria sido mantida nas instâncias superiores, se fosse mantida, não

se tornaria uma Orientação Jurisprudencial.

É por isso que, a partir das ideias de Zygmunt Bauman, tal qual acontece

com o ideal de justiça, é possível vislumbrar um núcleo inegociável no princípio do amplo

acesso à justiça. Se, para esse sociólogo, tem-se na democracia o pressuposto fundamental

do conceito de justiça, é na garantia de acesso ao Poder Judiciário, de apreciação e de

efetiva proteção ao direito material, que se localiza o núcleo fundamental do princípio do

amplo acesso à justiça.

Assim, é inconstitucional qualquer lei ou interpretação que vede

aprioristicamente o acesso ao Judiciário e, a partir disso, a apreciação das alegações

trazidas ao Estado-Juiz com a consequente proteção efetiva do direito. Em um Estado

Constitucional, não é possível admitir que o acesso à justiça tenha esse núcleo reduzido,

sob pena de ferir o ideal mais antigo que move o direito, que é a justiça. Mudanças

doutrinárias ou legais não têm o condão de infirmar esse conteúdo mínimo da regra

constitucional. A vontade do Estado, seja manifestada por lei ou, inicialmente, por medida

provisória, não pode se sobrepor a esse conteúdo mínimo do princípio do amplo acesso à

justiça.

Mesmo que os conceitos estejam sujeitos a uma carga valorativa que os

torne líquidos e leves, portanto, sem forma e inconstantes, como definiu Bauman, não é

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razoável admitir que poderá haver limitação quanto ao acesso à justiça que derrube

qualquer um daqueles elementos do espírito e da singularidade dessa garantia. Sobre essa

luta por esse mínimo de solidez, referido autor adverte que “é aqui que a sensibilidade

moral nasce e ganha força, até para se fortalecer o suficiente para suportar o fardo da

responsabilidade por qualquer sofrimento e infortúnio humano, seja o que for que as regras

legais ou pesquisas empíricas possam revelar sobre os seus vínculos causais e a partilha

‘objetiva’ de culpa”.

É por vislumbrar esse conteúdo mínimo do princípio do amplo acesso à

justiça que se defende que as regras legais que impedem a concessão de tutela antecipada

contra a Fazenda Pública não se sustentam diante do texto constitucional. Se não é

admissível transigir quanto à possibilidade de apreciação e efetiva proteção do direito

material, é impossível reconhecer que as vedações são abrigadas pela Constituição

Federal”.

9.3. Jurisprudência

Por ocasião do julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade nº 4, o

Colendo Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da Lei nº 9.494/1997,

sendo, porém, abrandadas as limitações à concessão de tutelas provisórias contra o Poder

Público.

As limitações devem ser interpretadas restritivamente, valendo lembrar que

estão excluídas as verbas previdenciárias497.

Portanto, a vedação à concessão de tutelas provisórias não pode ser

entendida como absoluta.

Eduardo Talamini498 aborda que é perceptível alguma indefinição do

Supremo Tribunal Federal em face das normas proibitivas de tutela urgente, oscilando-se

entre a admissão geral a abstrata dessas proibições e a necessidade de exame das

circunstâncias de cada caso concreto.

497 729 - A decisão na ADC-4 não se aplica à antecipação de tutela em causa de natureza previdenciária. 498 Eduardo Talamini, Tutela de urgência e Fazenda Pública, p.55.

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E essa indefinição é agravada pelas significativas mudanças de composição

por que passou o Supremo nos últimos anos.

Como se pode notar, a Fazenda Pública é de certa forma blindada contra a

concessão de liminares, como a hipótese trazida pelo artigo 562, parágrafo único do

NCPC499.

No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 223-6

MC/DF500 consolidou-se o entendimento de que a vedação é, em princípio, constitucional,

sendo razoável para preservação do interesse público, mas poderá ser afastada em caso de

afronta ao livre acesso ao Judiciário, sendo passível de análise em sede de controle difuso

de constitucionalidade.

499 Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada. Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais. 500 - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE CONTRA A MEDIDA PROVISORIA 173, DE 18.3.90, QUE VEDA A CONCESSÃO DE 'MEDIDA LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA E EM AÇÕES ORDINARIAS E CAUTELARES DECORRENTES DAS MEDIDAS PROVISORIAS NUMEROS 151, 154, 158, 160, 162, 165, 167 E 168': INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE SUSPENSÃO CAUTELAR DA VIGENCIA DO DIPLOMA IMPUGNADO: RAZOES DOS VOTOS VENCEDORES. SENTIDO DA INOVADORA ALUSAO CONSTITUCIONAL A PLENITUDE DA GARANTIA DA JURISDIÇÃO CONTRA A AMEAÇA A DIREITO: ENFASE A FUNÇÃO PREVENTIVA DE JURISDIÇÃO, NA QUAL SE INSERE A FUNÇÃO CAUTELAR E, QUANDO NECESSARIO, O PODER DE CAUTELA LIMINAR. IMPLICAÇÕES DA PLENITUDE DA JURISDIÇÃO CAUTELAR, ENQUANTO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO AO PROCESSO E DE SALVAGUARDA DA PLENITUDE DAS FUNÇÕES DO PODER JUDICIARIO. ADMISSIBILIDADE, NÃO OBSTANTE, DE CONDIÇÕES E LIMITAÇÕES LEGAIS AO PODER CAUTELAR DO JUIZ. A TUTELA CAUTELAR E O RISCO DO CONSTRANGIMENTO PRECIPITADO A DIREITOS DA PARTE CONTRÁRIA, COM VIOLAÇÃO DA GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. CONSEQUENTE NECESSIDADE DE CONTROLE DA RAZOABILIDADE DAS LEIS RESTRITIVAS AO PODER CAUTELAR. ANTECEDENTES LEGISLATIVOS DE VEDAÇÃO DE LIMINARES DE DETERMINADO CONTEUDO. CRITÉRIO DE RAZOABILIDADE DAS RESTRIÇÕES, A PARTIR DO CARÁTER ESSENCIALMENTE PROVISORIO DE TODO PROVIMENTO CAUTELAR, LIMINAR OU NÃO. GENERALIDADE, DIVERSIDADE E IMPRECISAO DE LIMITES DO ÂMBITO DE VEDAÇÃO DE LIMINAR DA MP 173, QUE, SE LHE PODEM VIR, A FINAL, A COMPROMETER A VALIDADE, DIFICULTAM DEMARCAR, EM TESE, NO JUÍZO DE DELIBAÇÃO SOBRE O PEDIDO DE SUA SUSPENSÃO CAUTELAR, ATÉ ONDE SÃO RAZOAVEIS AS PROIBIÇÕES NELA IMPOSTAS, ENQUANTO CONTENÇÃO AO ABUSO DO PODER CAUTELAR,E ONDE SE INICIA, INVERSAMENTE, O ABUSO DAS LIMITAÇÕES E A CONSEQUENTE AFRONTA A PLENITUDE DA JURISDIÇÃO E AO PODER JUDICIARIO. INDEFERIMENTO DA SUSPENSÃO LIMINAR DA MP 173, QUE NÃO PREJUDICA, SEGUNDO O RELATOR DO ACÓRDÃO, O EXAME JUDICIAL EM CADA CASO CONCRETO DA CONSTITUCIONALIDADE, INCLUIDA A RAZOABILIDADE, DA APLICAÇÃO DA NORMA PROIBITIVA DA LIMINAR. CONSIDERAÇÕES, EM DIVERSOS VOTOS, DOS RISCOS DA SUSPENSÃO CAUTELAR DA MEDIDA IMPUGNADA. (ADI 223 MC, Relator(a): Min. PAULO BROSSARD, Relator(a) p/ Acórdão: Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 05/04/1990, DJ 29-06-1990 PP-06218 EMENT VOL-01587-01 PP-00001)

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305

Prosseguindo, a Emenda Constitucional nº 62/2009 vinculou a expedição de

precatório ao trânsito em julgado da decisão judicial, alterando a redação do artigo 100 § 5º

da Constituição Federal501.

Ora, não é difícil concluir que a Emenda acabou por exigir a formação de

coisa julgada para expedição do precatório, situação incompatível com a urgência.

O dispositivo acima deve ser interpretado de forma razoável, valendo

lembrar importante precedente no Recurso Especial nº 834.678/PR502 mencionado por

501 § 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente. 502 PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. EFETIVAÇÃO MEDIANTE EXPEDIÇÃO DE PRECATÓRIO. VIOLAÇÃO DOS ARTS.165; 458, II; 463, II e 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA. 1. A tutela de urgência pressupõe a impossibilidade de cumprimento de liturgias que posterguem a prestação jurisdicional, sendo essa a ratio aferível na gênese do novel instituto. 2. Deveras, a institucionalização dos provimentos urgentes é consectário do princípio da inafastabilidade da jurisdição ou do acesso à justiça, que deve atuar de pronto diante de ameaça ou lesão a direito individual ou coletivo. 3. As regras infraconstitucionais, na sua exegese, devem partir da premissa metodológica da novel constitucionalização do direito, inaugurada pela Carta pós-positivista de 1988. 4. A idéia de efetividade, auto-executoriedade e mandamentalidade ínsita aos provimentos de urgência, cuja situação acautelada reclama satisfatividade imediata, conduzem à conclusão da incompatibilidade com os meios que revelem postergação da efetivação da tutela deferida, como sói ser o recebimento de apelação com efeito suspensivo e, a fortiori, submissão da execução das mencionadas tutelas ao regime de precatório. 5. Sob o ângulo analógico, as quantias de pequeno valor podem ser pagas independentemente de precatório e, a fortiori, entregues, por ato de império do Poder Judiciário, notadamente porque o disposto no caput do artigo 100 da CF/88 não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor, de modo que, ainda que se tratasse de sentença de mérito transitada em julgado, não haveria submissão do pagamento ao regime de precatórios. Precedentes: AgRg no REsp 888325/RS, DJ de DJ 29.03.2007; REsp 853880/RS, DJ de 28.09.2006 e REsp 656.838/RS, DJ de 20.06.05. 6. A possibilidade de graves danos decorrentes da demora da efetivação do provimento antecipatório sub examine revela a incompatibilidade da submissão da tutela de urgência ao regime do precatório, máxime porque a pensão provisória a ser paga pelo Município requerido, até decisão final da ação principal, é imprescindível para fazer face às despesas médicas e terapêuticas da menor, acometida de encefalopatia grave e irreversível, em decorrência de vacinação em posto de saúde do Município de Curitiba. 7. Ademais, o Tribunal local, com ampla e irrestrita cognição acerca dos requisitos ensejadores do deferimento da antecipação de tutela, assentou que: "(...)A verossimilhança que pode ser conceituada como convencimento pelo Juiz da certeza dos fatos colacionados na causa petendi, e assim, entendo a mesma restou demonstrada quando das provas contidas nos autos, eis que as crises de convulsão que desencadearam o processo patológico na menor, tiverem como termo inicial, o dia seguinte à aplicação da vacina no Posto de Saúde do Município, o que indica a existência de nexo causal entre o dano a vacina, entretanto, como bem salientou o eminente Procurador de Justiça "essa é a hipótese mais provável, conforme se infere dos documentos de fls. 53, 58 e 60". (fls. 152) 8. Inexiste ofensa aos arts. 165; 458, II; 463, II e 535, I e II, CPC, quando o Tribunal de origem pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, cujo decisum revela-se devidamente fundamentado. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão. Precedente desta Corte: RESP 658.859/RS, publicado no DJ de 09.05.2005. 9. Recurso especial provido.

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Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga503, no qual foi

determinado o imediato pagamento de pensão provisória a menor portador de encefalopatia

grave e irreversível provocada por vacina aplicada no posto de saúde.

Deverá preponderar sempre a vida e a saúde, assegurando sempre o

princípio da dignidade da pessoa humana, como bem decidiu o Colendo Superior Tribunal

de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 1.069.810/RS504.

Aliás, devemos ter sempre em mente a necessidade da proteção da pessoa,

em todos os seus aspectos, sendo certo que a morosidade da justiça atenta, inclusive, contra

o princípio da dignidade da pessoa humana.

Nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet505, “a dignidade da pessoa humana

(por tratar-se, à evidência – e nisto não diverge de outros valores e princípios jurídicos – de

categoria axiológica aberta) não poderá ser conceituada de maneira fixista, ainda mais

quando se verifica que uma definição desta natureza não harmoniza com o pluralismo e

com a diversidade de valores que se manifestam nas sociedades democráticas

contemporâneas, razão pela qual correto afirmarse que (também aqui) nos deparamos com

um conceito em permanente processo de construção e desenvolvimento. Assim há que

reconhecer que também o conteúdo da noção de dignidade da pessoa humana, na sua

condição de conceito jurídico-normativo, a exemplo de tantos outros conceitos de

contornos vagos e abertos, reclama uma constante concretização e delimitação pela praxis

constitucional, tarefa cometida a todos os órgãos estatais”.

(REsp 834.678/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/06/2007, DJ 23/08/2007, p. 216) 503 Fredie Didier Jr., Rafael Alexandria de Oliveira e Paula Sarno Braga, Curso de Direito Processual Civil, p.640. 504 PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. ADOÇÃO DE MEDIDA NECESSÁRIA À EFETIVAÇÃO DA TUTELA ESPECÍFICA OU À OBTENÇÃO DO RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE. ART. 461, § 5o. DO CPC. BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE CONFERIDA AO JULGADOR, DE OFÍCIO OU A REQUERIMENTO DA PARTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. ACÓRDÃO SUBMETIDO AO RITO DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO 08/2008 DO STJ. 1. Tratando-se de fornecimento de medicamentos, cabe ao Juiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo, se necessário, determinar até mesmo, o sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu prudente arbítrio, e sempre com adequada fundamentação. 2. Recurso Especial provido. Acórdão submetido ao regime do art.543-C do CPC e da Resolução 08/2008 do STJ. (REsp 1069810/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/10/2013, DJe 06/11/2013) 505 Ingo Wolfgang Sarlet, Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5. ed, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 42.

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9.4. Obrigação de fazer, não fazer e dar coisa

No que tange à obrigação de fazer, não fazer e dar coisa contra o Poder

Público, não há necessidade de expedição de precatório.

Algumas observações, porém, se fazem necessárias.

Para concessão de tutelas provisórias em face do Poder Público, há

necessidade de sua prévia oitiva, conforme previsto no artigo 562, § único do NCPC.

É vedada a concessão de tutela provisória nas ações que versem sobre

liberação de mercadorias ou coisas estrangeiras (artigo 1º da Lei nº 2.770/1956).

Da mesma forma, o artigo 7º, § 2º da Lei nº 12.016/2009 e artigo 1.059 do

NCPC também proíbem a tutela provisória para determinar a entrega de mercadorias e

bens provenientes do exterior.

Tal vedação nos parece inconstitucional, eis que fulmina o direito de acesso

ao Poder Judiciário, maculando o devido processo legal.

Podemos lembrar, portanto, de algumas limitações à concessão de tutelas

provisórias nas obrigações de fazer, não fazer e entregar coisa em face do Poder Público,

tais como o ato impugnado por meio de mandado de segurança, sujeito à competência

originária do Tribunal, salvo a hipótese de ação popular e ação civil pública; a proibição de

liminar seja ela cautelar ou antecipada, que esgote o objeto da ação.

Alguns importantes julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça

merecem destaque, sempre assegurando a eficácia do provimento para preservação do

direito invocado506.

506 PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. LIMINAR DE CARÁTER SATISFATIVO. SAÚDE PÚBLICA. DIREITO DO CIDADÃO E DEVER DO ESTADO. DECISÃO ASSENTADA EM DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. É vedada, como princípio geral, a concessão de liminar de caráter eminentemente satisfativo, excepcionando-se as hipóteses de providências médicas urgentes. Quando, porém, a decisão recorrida se fundamentou em preceitos da Constituição Federal, não se pode sequer tomar conhecimento do recurso extremo. (REsp 109.473/RS, Rel. MIN. HELIO MOSIMANN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/03/1999, DJ 06/09/1999, p. 69) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. REINTEGRAÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 2º-B DA LEI 9.494/97.

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Neste sentido, Márcio Louzada Capena507 colaciona interessante julgado:

“MEDIDA CAUTELAR - LIMINAR - DEFERIMENTO INAUDITA ALTERA PARS

- ADMISSIBILIDADE - PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO - EXCEPCIONALIDADE -

Justifica-se a concessão da medida liminar sem audiência da parte contrária sempre que, a par de

prova inequívoca, aliada à plausibilidade jurídica do alegado na inicial, houver perigo de dano

irreversível para o requerente caso a medida não seja deferida de imediato. As restrições legais ao

poder cautelar do Juiz, dentre as quais sobreleva a vedação de liminares contra atos do Poder

Público (art. 1º da Lei nº 8.437/92), consoante orientação do STF (RTJ 132/571), devem ser

interpretadas mediante um controle de razoabilidade da proibição imposta, a ser efetuado em cada

caso concreto, evitando-se o abuso das limitações e a conseqüente afronta à plenitude da

jurisdição do poder judiciário. Agravo de Instrumento - Cautelar Inominada - Liminar

determinando ao Estado o fornecimento de medicamentos a paciente de AIDS -

Imprescindibilidade da medida - Recurso desprovido. O fato de necessitar o agravado, pessoa

pobre e doente de AIDS, de tratamento inadiável, disponível no mercado e que se revela essencial

à preservação de sua própria vida, aliado ao impostergável dever do Estado de assegurar a todos

os cidadãos, indistintamente, o direito à saúde (arts. 6º e 196 da CF/88), justifica a concessão de

liminar impondo ao ente público a obrigação de fornecer os medicamentos capazes de evitar-lhe a

morte (TJSC - AI 97.002945-4 - 3ª C.C. - Rel. Des. Eder Graf - j. 10.06.1997)”.

Podemos colacionar diversos acórdãos que atenuam a exigência da prévia

oitiva do Poder Público na concessão de liminares, sempre visando a preservação de um

bem maior.508

INEXISTÊNCIA. PRECEDENTES. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. REVISÃO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. SÚMULA 7/STJ. 1. Não merece amparo a alegação descabimento da concessão de antecipação de tutela, vez que o presente casu não se enquadra entre aqueles em que é vedada a concessão de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública pela Lei 9.494/1997, já que se trata de reintegração de servidor público (v.g: REsp 688.780/RS, Rel.Ministro FELIX FISCHER, DJ 14/03/2005). 2. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que, analisar os requisitos necessários para a concessão de tutela antecipada - os quais foram reconhecidos pelas instâncias ordinárias -, com a conseqüente reversão do entendimento exposto pelo Tribunal de origem, exige, necessariamente, o reexame de matéria fático-probatória dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, ante o óbice contido na Súmula 7/STJ (v.g: AgRg no AREsp 140.076/GO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, DJe 22/11/2012). 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 418.258/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/12/2013, DJe 16/12/2013) 507 Márcio Louzada Capena, Medidas Liminares no Processo Cautelar. Publicada no Datadez - SET de 1999. 508 “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – FORNECIMENTO DE PRÓTESE DE QUADRIL – LIMINAR CONCEDIDA SEM A OITIVA DO ENTE PÚBLICO – POSSIBILIDADE – HIPÓTESE EXCEPCIONAL – MANIFESTO PERIGO DE DANO DE IMPOSSÍVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO – DIREITO À SAÚDE – "(...) a regra inscrita no art. 2º da Lei nº 8.437/1992 sofre abrandamento em situações nas quais a prévia intimação do ente público para se manifestar sobre a concessão da liminar pode acarretar dano irreparável à vida.. (Superior Tribunal de Justiça, REsp

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Portanto, todas as restrições às medidas liminares ou acautelatórias são de

valor relativo, pois não podem ser adotadas pelo Poder Judiciário quando coloquem em

risco os direitos das pessoas, sob pena de ofensa ao art. 5º, inciso XXXV, da Constituição

Federal, que impede seja excluída da apreciação judicial, não só a lesão, como também

ameaça a direito. Por outras palavras, se devidamente demonstrado o periculum in mora,

746.255/MG, 2ª. Turma, Relator Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJ 20/03/06).PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE LIMINAR CONTRA O PODER PÚBLICO. AFRONTA AS LEIS Nº 8.437/92 E 9.494/97.TESE NÃO ACEITA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS DISPOSITIVOS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO CONCRETO AO ERÁRIO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.REJEIÇÃO. DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL. EXEGESE DO ARTIGO 127, CAPUT DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ESPECIALIZAÇÃO DA PROMOTORIA EM AÇÕES RELATIVAS À SAÚDE.IRRELEVÂNCIA. INSTITUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO É UNA E INDIVISÍVEL, CADA UM DE SEUS MEMBROS A REPRESENTA COMO UM TODO, SENDO, PORTANTO, RECIPROCAMENTE SUBSTITUÍVEIS EM SUAS ATRIBUIÇÕES. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ. AFASTAMENTO. CONVÊNIO FIRMANDO ENTRE ENTES MUNICIPAIS QUE ATRIBUI A RESPONSABILIDADE PELOS PROCEDIMENTOS DE ALTA COMPLEXIDADE AO MUNICÍPIO DE MARINGÁ. RECUSA AO FORNECIMENTO GRATUITO DE PRÓTESE INDISPENSÁVEL À SOBREVIDA DO PACIENTE. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ARTIGO 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DEVER DO ESTADO. PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES PARA A CONCESSÃO DA LIMINAR (FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA). OBSERVÂNCIA DE POLÍTICAS PÚBLICAS QUE NÃO EXIME AO FORNECIMENTO DO EQUIPAMENTO. DEVER DE CUMPRIR NORMA CONSTITUCIONAL. RECURSO DESPROVIDO. (TJPR – AI 0847903-2 – 4ª C.Cív. – Rel. Des. Abraham Lincoln Calixto – DJe 22.01.2013 – p. 444)”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LIMINAR DEFERIDA – AUSÊNCIA DE PRÉVIA OITIVA DO PODER PÚBLICO – NULIDADE NÃO CONFIGURADA – AUSÊNCIA DE ATERRO SANITÁRIO – DANO AMBIENTAL – REQUISITOS AUTORIZADORES DA CONCESSÃO PRESENTES – ASTREINTES – VALOR EXCESSIVO – REDUÇÃO – I- Apesar do artigo 2º da lei nº 8.437/1992 vedar a concessão de liminar sem audiência previa do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, tal vedação não e mais absoluta, máxime quando constatado possível prejuízo a coletividade (DANO AO MEIO AMBIENTE). Precedentes do superior tribunal de justiça. II- A ausência de aterro sanitário no município de quirinópolis acaba por expor a população a diversas doenças e o meio ambiente a uma degradação que poderá vir a ser irreversível no futuro, pelo que entendo demonstrados a plausibilidade do direito, bem como o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. III- A imposição de astreintes trata-se de medida coercitiva de natureza compulsória, cujo valor, fixado excessivamente, deve ser diminuído até mesmo de ofício para valor compatível a espécie, conforme autoriza o artigo 461, paragrafo 6, do código de processo civil, sob pena de configurar a cobrança elevada enriquecimento sem causa. Agravo conhecido e desprovido. Multa diária minorada de ofício. (TJGO – AI 201194507468 – 6ª C.Cív. – Rel. Des. Fausto Moreira Diniz – DJe 05.11.2012 – p. 241)”

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LIMINAR – PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL – PRELIMINAR – ILEGITIMIDADE PASSIVA – LEI MUNICIPAL Nº 1849/98 – RISCO IMINENTE – PERIGO DE DANO IRREPARÁVEL – OITIVA PRÉVIA DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – RELATIVIDADE – RECURSO IMPROVIDO – A preservação e manutenção de imóvel tombado incumbe, subsidiariamente, ao Município, a teor do § 1º da Lei Municipal nº 1.849/98, na hipótese de omissão do proprietário. Assim, até que se apure a efetiva responsabilidade dos demandados, deve o agravante permanecer no pólo passivo da lide - É possível a concessão de liminar em ação civil pública, sem prévia ciência do Poder Público, quando não há prejuízo ou dano ao interesse público e o prazo para o cumprimento da medida é razoável - Presentes os requisitos indispensáveis ao deferimento da liminar requerida, deve ser mantida a r. decisão que a concedeu. (TJMG – AI 1.0015.11.005659-3/001 – 2ª C.Cív. – Relª Hilda Teixeira da Costa – DJe 02.07.2012)”.

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não poderá ser negada a medida liminar para proteger o direito ameaçado, já que, entre a

norma constitucional e a lei ordinária, é a primeira que tem de prevalecer509.

O tempo é inimigo da efetividade da jurisdição.

O Judiciário deverá entregar resposta aos conflitos com prazo razoável, o

que consta do art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal.

9.5. Matéria Tributária

Não compete ao magistrado deferir em caráter liminar a compensação do

tributo, decretando, assim, a extinção do crédito tributário.

O débito somente restará extinto após o trânsito em julgado da decisão.

Dispõe a Súmula nº 212 do Colendo Superior Tribunal de Justiça que a

compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida

liminar cautelar ou antecipatória.

A Lei Complementar nº 104/2001 introduziu o artigo 170-A no Código

Tributário Nacional510, proibindo a compensação antes do trânsito em julgado, restando

vedada a extinção do tributo, porém sendo permitida a compensação.

Por oportuno, é permitida a concessão de liminar ou tutela antecipada para

suspensão da exigibilidade do crédito tributário, conforme dispõe o artigo 151, inciso V do

Código Tributário Nacional511.

509 Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito Administrativo, p.499. 510 Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial. (AC) (Artigo acrescentado pela Lei Complementar nº 104, de 10.01.2001, DOU 11.01.2001) 511 Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: V - a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; (AC) (Inciso acrescentado pela Lei Complementar nº 104, de 10.01.2001, DOU 11.01.2001)

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10. Tutelas provisórias nas ações coletivas

A possibilidade de concessão de tutelas provisórias nas ações coletivas

consiste em grande avanço para proteção dos direitos do cidadão, solucionando um grande

número de conflitos, atendendo-se à finalidade social do processo.

Houve ampliação do rol dos legitimados à defesa dos direitos meta-

individuais conforme previsão do artigo 129, § 1º da Constituição Federal512.

Assim, estão legitimados a pleitear a tutela dos direitos sejam eles coletivos,

difusos ou individuais homogêneos qualquer dos co-legitimados indicados nos artigos 81 e

82 do Código de Defesa do Consumidor.

Devemos ter em mente também que o Código de Processo Civil é lei geral

sobre processo, aplicando-se a toda e qualquer outra ação regulada por lei especial.

Atualmente, e sem pretensão de esgotar o tema, não conseguimos

vislumbrar um sistema processual coletivo devidamente sistematizado, devendo ser

abordado assunto com a visão conjunta entre o artigo 21 da Lei de Ação Civil Pública513 e

os artigos 83514 e 90515 do Código de Defesa do Consumidor, aplicando-se em caráter

subsidiário o Código de Processo Civil.

Rodolfo de Camargo Mancuso516 comentando o artigo 84 do CDC expõe

que: “Em verdade, a hipótese focada no citado §3º do art. 84 do CDC, mais do que um

singelo acautelamento a um direito ameaçado, configura uma antecipação dos efeitos da

tutela pretendida, porque aquele dispositivo não é voltado a ‘assegurar a eficácia prática de

provimento cognitivo ou exercício futuro’ (que constitui a característica principal das

cautelares), mas na verdade por ali se dá um vero adiantamento, ainda que provisório, de

512 1º - A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei. 513 Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor. 514 Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela. 515 Art. 90. Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Código de Processo Civil e da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive no que respeita ao inquérito civil, naquilo que não contrariar suas disposições. 516 Rodolfo de Camargo Mancuso, Manual do Consumidor em Juízo, p. 22.

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todos ou alguns efeitos perseguidos principaliter, à semelhança do que se dá nas liminares

em possessórias, despejo e mandado de segurança.”

Rosa Maria de Andrade Nery e Nelson Nery Jr.517 sobre a tutela lecionam:

“A norma permite que o juiz adiante a tutela de mérito. (...) Somente estará autorizado a

fazê-lo se estiverem presentes, cumulativamente, dois requisitos: a) se for relevante o

fundamento da demanda; b) se houver justificado receio de ineficácia do provimento

final.”

Há, ainda, no microssistema, outros dispositivos que preveem a concessão

de liminar, como o art. 5º, §4º, da Lei de Ação Popular e na Lei de Mandado de Segurança.

O artigo 12 da Lei nº 7.347/85518 (ACP) já previa a possibilidade de

concessão da tutela.

E o artigo 4º do mesmo diploma legal dispõe que “poderá ser ajuizada ação

cautelar para os fins desta Lei, objetivando, inclusive, evitar o dano ao meio ambiente, ao

consumidor, à ordem urbanística ou aos bens e direitos de valor artístico, estético,

histórico, turístico e paisagístico”.

Celso Antonio Pacheco Fiorillo, Marcelo Abelha e Rosa Nery519 apontam

que:

“dentro do sistema da jurisdição civil coletiva (LACP + CDC) para as ações

coletivas destinadas às defesas de direitos coletivos ‘lato sensu’, é possível a

concessão tanto de liminar cautelar quanto antecipatória do mérito. Chegamos a

essa insofismática conclusão pelos diversos mecanismos postos à disposição dos

jurisdicionados. No art. 12 da LACP temos a regra geral para a concessão da

liminar antecipatória do direito, onde se faz mister o preenchimento dos requisitos

do “fumus boni juris” e “periculum in mora”. Também se configura como liminar

antecipatória do direito aquela prevista no art. 84, parágrafo terceiro, do CDC

(ações que tenham por objeto o cumprimento de obrigação de fazer e não fazer),

517 Nelson Nery Jr., Rosa Maria de Andrade Nery, Leis Civis Comentadas, p. 252, comentário 7 ao art. 84 do CDC. 518 Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo. 519 Celso Antônio Pacheco Fiorillo, Marcelo Abelha Rodrigues, Rosa Maria de Andrade Nery. Direito Processual Ambiental Brasileiro, pp. 134/135.

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313

possuindo como requisitos os mesmos mencionados no art. 12 da LACP. Também

há a possibilidade de concessão de liminar antecipatória do direito no sistema da

jurisdição civil coletiva, tendo por base o art. 273 do Código de Processo Civil.

Entretanto, como no inciso I do art. 273 do Código de Processo Civil o grau de

cognição para convencimento do juiz (provas inequívocas para que se convença

da verossimilhança da alegação) é mais vertical que o previsto na jurisdição civil

coletiva, sendo, pois, mais dificultoso para o requerente convencer o magistrado a

conceder a medida, temos que somente com base no inciso II deste mesmo artigo

(fique caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito

protelatório do réu) é que será possível a concessão da liminar antecipatória de

mérito”.

Esclarece José Marcelo Menezes Vigliar520 que a ação civil pública poderá

ensejar todas as espécies de provimentos (sejam de conhecimento, sejam os cautelares, seja

a tutela antecipada, sejam os executivos).

José Rubens Morato Leite521, Celso Antônio Pacheco Fiorillo, Marcelo

Abelha Rodrigues e Rosa Maria de Andrade Nery, elucidam que no sistema da ação civil

pública, destinada à proteção do ambiente, é possível tanto a liminar cautelar como a

antecipatória de mérito. De fato, a regra do art. 12 da LACP é antecipatória de mérito. É

exemplo deste a ação que tem como objeto o cumprimento da obrigação de fazer e não

fazer em que é facultado ao juiz conceder liminarmente a antecipação de mérito, desde que

preenchidos os requisitos do art. 12 mencionado. Ressalte-se, também, que no caso do

cumprimento da obrigação de fazer e não fazer, o sistema da LACP propiciou, conforme já

visto, amplos poderes ao juiz, inclusive com a possibilidade de multa diária cominatória e

que poderá ser deferida liminarmente, observados os pressupostos, de acordo com o

permissivo legal. Além desta possibilidade, é também possível, na ação civil pública, o juiz

conceder a antecipatória de mérito, com fundamento no art. 273 do Código de Processo

Civil. Saliente-se que o instituto da tutela antecipatória se constitui em importante

mecanismo no âmbito da ação civil pública, considerando que o risco da irreparabilidade

do dano é frequente e o abuso do direito de defesa, assim como o interesse protelatório, são

constantes. Quanto à liminar cautelar, está prevista, entre outras, na regra do art. 84, § 5º,

da Lei 8.078/90 e demais cautelares já mencionadas.

520 Jose Marcelo Vigliar, Ação civil pública, p.69. 521 José Rubens Morato Leite, Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial, passim.

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314

Ora, no processo coletivo percebe-se claramente que há uma certa confusão

no que tange aos requisitos para a concessão da tutela antecipada se confundem com os da

tutela cautelar.

As liminares concedidas em processos coletivos produzem efeitos “erga

omnes” ou “ultra partes”.

Arruda Alvim522 abordou a evolução do processo coletivo, anotando que:

“Deve-se, também, ter presente que essas alterações profundas verificadas

no campo do processo – que não se restringem às ações coletivas -, nessas

tem eixo da mais relevante significação; de outra parte, admitidos tais

direitos, assentaram-se sobre uma disciplina de direito material, cujo tecido

normativo já nasceu rígido na proteção desses bens. Subtraiu-se do direito

privado o que nele estava regrado, v.g., como as relações entre comprador

e vendedor, que passou a ser matéria do direito do consumidor,

verificando-se uma migração em direção ao direito público, ou, com mais

profundidade, para um regime jurídico em que preponderam de forma

quase que absoluta, normas de ordem pública ou cogentes. A esta área ou

província do direito, que não é, propriamente direito público, nem privado,

pode-se designar como direito social, regida por normas de ordem

pública”.

Desta afirmação podemos concluir pela necessidade de flexibilizar os

requisitos, considerando, inclusive, a repercussão de tutelas provisórias com grande

alcance, porém sem deixar de ponderar que tais medidas sejam concedidas com prudência

e cautela, preservando o princípio da segurança jurídica.

Eduardo Arruda Alvim523 destaca a importância social da tutela nas ações

coletivas, inclusive a “possibilidade de tutelar esses direitos de forma mais e mais eficaz,

por meio de outorga de legitimidade a determinados órgãos”, havendo uma verdadeira

522 José Manoel de Arruda Alvim Netto, Ação civil pública – sua evolução normativa significou crescimento em prol da proteção às situações coletivas. In: Milaré, Édis (coord.). A ação civil pública após 20 anos: efetividade e desafios. São Paulo: RT, 2005, p.73-74. E continua o autor: “na raiz das modificações operadas no direito obrigacional encontram-se em escala apreciável os mesmos fenômenos que levaram à necessidade de reequacionamento dos instrumentos processuais, motivados aquelas e estes, pelo mesmo valor axiológico: um reequilíbrio dos que defrontam na ordem jurídica”. 523 Eduardo Arruda Alvim, Curso de Direito Processual Civil, p.686.

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simbiose entre a parte processual do Código do Consumidor e a ação civil pública,

conforme disposto no artigo 21 da Lei nº 7.347/85.

Na lição de Ada Pelegrini Grinover524, os interesses sociais são comuns a

um conjunto de pessoas, e somente a estas. Interesses espalhados e informais à tutela de

necessidades coletivas, sinteticamente referíveis à qualidade de vida. Interesses de massa,

que comportam ofensas de massa e que colocam em contraste grupos, categorias, classes

de pessoas. Não mais se trata de um feixe de linhas paralelas, mas de um leque de linhas

que convergem para um objeto comum e indivisível. Aqui se inserem os interesses dos

consumidores, dos beneficiários da previdência social e de todos aqueles que integram

uma comunidade compartilhando de suas necessidades e anseios.

E prossegue a autora expondo que “... novos “corpos intermediários

começam a surgir e a proliferar; novos grupos, novas categorias, novas classes de

indivíduos, conscientes de sua comunhão de interesses, de suas necessidades e de sua

fraqueza individual, unem-se contra as tiranias da nossa época, que não é mais

exclusivamente a tirania dos governantes: a opressão das maiorias, os interesses dos

grandes grupos econômicos, a indiferença dos poluidores, a inércia, a incompetência ou a

corrupção dos burocratas”525.

Ora, os interesses de grupos se encaixam no espaço existente entre o público

e o privado, o que implicou em mudança na divisão da sociedade.

Rodolfo de Camargo Mancuso526 entende que: “Cabe ao Estado “aceitar”

essa entourrage, conviver com ela, deixar que ela lhe facilite a gestão da coisa pública, ao

invés de combatê-la. E, sobretudo, cabe ao Estado ter presente que esses três planos não

formam compartimentos estanques, mas, ao contrário, eles se integram e se influenciam

mutuamente”.

Nesta ordem de ideias, não devemos perder de vista que nas ações coletivas

o julgador possui um instrumento que poderá repercutir em grandes proporções, atingindo

número indeterminado de pessoas, inclusive o Poder Público.

524 Ada Pellegrini Grinover, Significado social, político e jurídico da tutela dos interesses difusos. In: A marcha do processo. Rio de Janeiro: Forense, 2000, pp. 17/23. 525 Ada Pellegrini Grinover, A tutela jurisdicional dos interesses difusos. Apud LENZA, Pedro. Teoria geral da ação civil pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 34. 526 Rodolfo de Camargo Mancuso, Interesses difusos: conceito e legitimação para agir, p.40.

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Mauro Capelletti e Briant Garth527 oportunamente destacam:

“Para que o Poder Judiciário se justifique, diante da necessidade social da Justiça

célere e eficaz, é imprescindível que os próprios juízes sejam capazes de ‘crescer’,

erguendo-se à altura dessas novas e prementes aspirações, que saibam, portanto,

tornar-se eles mesmos protetores dos novos direitos ‘difusos’, ‘coletivos’ e

‘fragmentados’, tão característicos e importantes da nossa civilização de massa,

além dos tradicionais direitos individuais”.

Cristiano Chaves de Farias528 com quem concordamos, ressalta que a

possibilidade de tutela de urgência na ação civil pública serve como efetiva garantia do

pleno exercício da cidadania, evitando que a dignidade humana continue violada enquanto

tramita o processo coletivo, em última análise, atenta a decisão judicial tardia contra as

garantias individuais e coletivas traçadas no plano constitucional e infraconstitucional,

tornando-as letra morta. E o autor prossegue, afirmando que nas ações civis públicas, as

liminares assumem feição extremamente relevante, dada a importância da dimensão do

bem jurídico protegido. A tutela jurisdicional coletiva, nessa ambientação, surge

vocacionada para servir de meio propício para efetividade do processo, protegendo, em

última análise, a própria pessoa humana e seus bens jurídicos essenciais ao

desenvolvimento da vida em sociedade.

Ora, parece muito claro que há pleno cabimento das tutelas provisórias nas

ações coletivas, considerando inclusive os interesses que protegem, bem como diante da

dimensão social, atingindo a sociedade como um todo.

Luciane Gonçalves Tessler529 discorrendo sobre a tutela ambiental, afirma

que: “como a tutela inibitória busca evitar a prática de um ilícito, é fácil imaginar que

pouquíssimos são os casos em que não se fará necessária a prestação jurisdicional de

urgência. Quando se pensa em tutela inibitória ambiental, a importância de provimento

célere, que imediatamente afaste o perigo de violação da norma ambiental, mostra-se ainda

mais evidente”.

527 Mauro Cappelletti, Briant Garth, Acesso à Justiça, passim. 528 Cristiano Chaves de Farias. As tutelas de urgência na jurisdição coletiva: um bosquejo para a sua sistematização (ou garantindo cidadania no plano coletivo através das tutelas de urgência). In Inovações sobre o direito processual civil. Tutelas de urgência, pp.49, 55 e 57. 529 Luciane Gonçalves Tessler. Tutelas jurisdicionais do meio ambiente: tutela inibitória, tutela de remoção, tutela do ressarcimento na forma específica, p.275.

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J. J. Gomes Canotilho530 expõe que na colisão de direitos com dignidade

constitucional (como é o caso do direito do ambiente e do direito de propriedade) a natural

prevalência do interesse público sobre o interesse privado resolve pois tal colisão.

Eduardo Arruda Alvim531 é enfático ao afirmar que “mesmo os interesses

individuais homogêneos, aqueles de origem comum (Código de Proteção e Defesa do

Consumidor, art.81, parágrafo único, inc.III), conquanto sejam interesses individuais

propriamente ditos, assumem uma repercussão tal, decorrente de número expressivo de

pessoas ligadas a essa origem comum, que podem ser tratados coletivamente. Isso permite,

por exemplo, que indivíduos que muito possivelmente não iriam, não fosse essa

possibilidade, ao Judiciário, perseguir seus direitos, possam, uma vez julgada procedente a

ação coletiva, proceder diretamente à liquidação dos seus dados, na forma dos arts. 97 e ss.

do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Resta amplamente facilitado, com isso, o

acesso à Justiça, além do que, como expõe Arruda Alvim, há uma unitariedade de

manifestação judicial sobre uma dada situação de ampla dimensão social, que a muitos

afete (nos casos de interesses ou direitos individuais homogêneos”.

Paulo Bonavides citado por Pedro Lenza532: “Conforme assevera Bonavides,

'dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração

tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam

especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um

determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num

momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade

concreta. Os publicistas e juristas já os enumeram com familiaridade, assinalando-lhes o

caráter fascinante de coroamento de uma evolução de trezentos anos na esteira da

concretização dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas

referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio

comum da humanidade” (Curso de direito constitucional, p. 523 - original sem grifos).

A ação civil pública ambiental, como instrumento de resgate à democracia

que é, enquadra-se no rol dos instrumentos de exercício da cidadania, e deve ser utilizada

de forma coerente e direcionada ao seu real desiderato que, in casu, é a efetiva tutela

530 J. J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional, p. 495. 531 Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, p.195. 532 Pedro Lenza, Teoria geral da ação civil pública, p.29.

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ambiental; destarte, estar-se-á dando passos para se atingir um verdadeiro ‘efetivo

desenvolvimento sustentável’.

Em sua tese de Doutorado, Daniel Carnio Costa533 assevera que:

“O processo coletivo surgiu como verdadeira necessidade frente ao

surgimento de lides com novos contornos, resultado da evolução da própria sociedade, e

que extravasaram os limites meramente individuais.

A crise do processo enquanto instrumento de resolução de conflitos vem

sendo sentida com mais intensidade desde o último quarto do século XX, quando a

evolução social atingiu frontalmente a efetividade desse instrumento estatal de solução de

conflitos.

O processo civil convencional, pensado pelos diplomas legais editados no

século XIX e início do século XX, foi moldado e estruturado para dar respostas a lides

individuais, próprias daquela época.

Todavia, o surgimento da sociedade de massas, a globalização e a revolução

tecnológica transformaram substancialmente a sociedade pósmoderna, evidenciando os

conflitos inclusivos e abrangentes de grandes grupos sociais ou mesmo de toda a

população de determinada região ou país. O surgimento de novos direitos titularizados por

grupos de pessoas e até por pessoas indeterminadas – os chamados direitos transindividuais

– desnudou a ineficiência do modelo individualista de processo pensado no século XIX e

em parte do século XX.

O processo individual tornou-se incapaz de dar respostas adequadas a

conflitos de contornos difusos e coletivos, sendo seguro afirmar que não atendeu às novas

necessidades sociais534.

533 Daniel Carnio Costa, As tutelas de urgência ex officio no processo coletivo. Disponível em http://www.sapientia.pucsp.br/tde_arquivos/9/TDE-2013-04-01T12:20:36Z-13499/Publico/Daniel%20Carnio%20Costa.pdf acesso em 22/09/2015. 534 A necessidade de estar o direito subjetivo sempre referido a um titular determinado ou ao menos determinável impediu por muito tempo que os interesses pertinentes, a um tempo, a toda uma coletividade e a cada um dos membros dessa mesma coletividade, como, por exemplo, os interesses relacionados ao meio ambiente, à saúde, à educação, à qualidade de vida etc., pudessem ser havidos por juridicamente protegíveis. Era a estreiteza da concepção tradicional do direito subjetivo, marcada profundamente pelo liberalismo individualista, que obstava a essa tutela jurídica” (GRINOVER, Ada Pelegrini, et alli. Código Brasileiro de

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A multiplicação de lides individuais que congestionam o Poder Judiciário

em razão da ausência de instrumentos adequados para enfrentar a questão de forma

coletiva, com ganho de efetividade e economia processual, traz o risco de proliferação de

demandas idênticas e de inconsistência nos julgamentos, proferidos por juízes distintos.

Ademais, processos individuais são inadequados para resolver com

efetividade lides transinviduais. A indivisibilidade dos direitos difusos e coletivos torna

inviável sua tutela através de tais processos, pois ainda que a situação de violação ao

direito difuso ou coletivo seja resolvida em relação a uma pessoa individualmente

considerada, o direito em si continua sendo lesado enquanto outras pessoas sofrerem os

efeitos de sua violação.

Mesmo que um cidadão, por exemplo, sinta-se confortável com a decisão

que proibiu uma empresa poluidora de despejar dejetos químicos nas proximidades de sua

residência, o direito ao meio ambiente saudável – que é de todos – continuará sendo

violado caso a mesma empresa passe a derramar os dejetos noutro local, embora distante

da residência do autor da ação individual.

O processo individual, bem se vê, não terá sido eficiente para fazer cessar a

violação ao direito difuso de um meio ambiente saudável. Foi em tal contexto que surgiu o

processo coletivo como forma de instrumentalizar de maneira adequada a resolução de

conflitos transindividuais, com mais efetividade e economia.

Justifica-se, portanto, a existência desse instrumento diferenciado de solução

de conflitos em razão da eficiência no tratamento das lides coletivas.

Por elementar, as dimensões da demanda coletiva impõem uma

interpretação diferenciada do processo coletivo se comparado ao processo individual.

Enquanto este interessa às partes presentes no litígio, aquele interessa a todos os titulares

do direito discutido em juízo, presentes ou não no processo.

A decisão judicial, destarte, vai atingir não apenas ao autor e ao réu, mas a

todos os titulares do direito transindividual e indivisível. A tarefa de garantir o resultado

Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 819).

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útil do processo também ganha dimensão diferenciada, pois ver frustrada a ação deste

instrumento coletivo de resolução de conflitos transindividuais pode representar a

frustração da jurisdição em relação à população como um todo.

Tem-se, de um lado, uma demanda cujos efeitos serão sentidos por grandes

grupos de pessoas, ou mesmo por todas, e de outro lado um processo em que os titulares do

direito não estão presentes em pessoa, contando com um representante presumidamente

adequado.

Isso impõe uma forma de agir mais proativa do magistrado na condução do

processo, destacando-se a importância da tutela do resultado útil da jurisdição e de sua

efetividade, através da utilização das medidas de urgência.

A velocidade da demanda coletiva deve ter tratamento especial, sendo

imperiosa a aceleração do julgamento e a neutralização do risco de perecimento do direito

transindividual discutido em juízo durante o curso do processo.

Percebe-se, portanto, que o papel das tutelas de urgência no processo

coletivo assume relevância ainda maior do que no processo individual/convencional, diante

de sua dimensão diferenciada e da necessidade inarredável de garantir-se sua efetividade e

utilidade, sob pena de gravíssimos prejuízos ao todo social”.

Feitas estas ponderações, não há justificativa plausível para estabelecer

exceção à regra geral, de que a tutela antecipada, também nas lides coletivas, dependa de

requerimento.

Contudo, o magistrado, nas hipóteses em que verificar que, por

excepcionalidade, não houve o requerimento, conceder ex officio a antecipação de tutela.

Nesse sentido v. acórdão do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

TUTELA ANTECIPADA. NECESSIDADE DE REQUERIMENTO.

DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSENTE. 1. Ambas as espécies de

tutela - cautelar e antecipada - estão inseridas no gênero das tutelas de

urgência, ou seja, no gênero dos provimentos destinados a tutelar situações

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em que há risco de comprometimento da efetividade da tutela jurisdicional a

ser outorgada ao final do processo. 2. Dentre os requisitos exigidos para a

concessão da antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do art. 273 do

CPC, está o requerimento da parte, enquanto que, relativamente às medidas

essencialmente cautelares, o juiz está autorizado a agir independentemente

do pedido da parte, em situações excepcionais, exercendo o seu poder geral

de cautela (arts. 797 e 798 do CPC). 3. Embora os arts. 84 do CDC e 12 da

Lei 7.347/85 não façam expressa referência ao requerimento da parte para a

concessão da medida de urgência, isso não significa que, quando ela tenha

caráter antecipatório, não devam ser observados os requisitos genéricos

exigidos pelo Código de Processo Civil, no seu art. 273. Seja por força do

art. 19 da Lei da Ação Civil Pública, seja por força do art. 90 do CDC,

naquilo que não contrarie as disposições específicas, o CPC tem aplicação.

4. A possibilidade de o juiz poder determinar, de ofício, medidas que

assegurem o resultado prático da tutela, dentre elas a fixação de astreintes

(art. 84, §4º, do CDC), não se confunde com a concessão da própria tutela,

que depende de pedido da parte, como qualquer outra tutela, de acordo com

o princípio da demanda, previsto nos art. 2º e 128 e 262 do CPC. 5. Além de

não ter requerido a concessão de liminar, o MP ainda deixou expressamente

consignado a sua pretensão no sentido de que a obrigação de fazer somente

fosse efetivada após o trânsito em julgado da sentença condenatória. 6.

Impossibilidade de concessão de ofício da antecipação de tutela. 7.

Recebimento da apelação no efeito suspensivo também em relação à

condenação à obrigação de fazer. 8. Recurso especial parcialmente

provido.” (REsp 1178500/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,

TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 18/12/2012)”.

Hugo Nigro Mazzilli em artigo “O Processo Coletivo e o Código de

Processo Civil de 2015”535 faz uma crítica severa, afirmando que no tocante ao processo

coletivo, o Código de Processo Civil de 2015 trouxe algumas mudanças claramente

inconstitucionais. Entre essas está a intenção de obrigar os juízes a seguir precedentes fora

das hipóteses admitidas na Constituição; está também a suspensão obrigatória dos

535 Hugo Nigro Mazzili, O Processo Coletivo e o Código de Processo Civil de 2015, p. 331 - 362.

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processos individuais, o que significa impedir o acesso individual à jurisdição enquanto ela

durar; está, enfim, a possibilidade de os tribunais legislarem em tese fora das hipóteses

constitucionais. Além disso, o novo Código não corrigiu os erros da legislação vigente em

matéria de processo coletivo. Em conclusão, o Código de Processo Civil de 2015, no

tocante ao processo coletivo, decepcionou. E o autor prossegue perguntando ser seria caso

de trocar o Código de 1973, destacando a preocupação com os precedentes: “A

preocupação foi tal, que nos arts. 926 e 927 disse que os tribunais e os juízes observarão os

precedentes; no projeto tinha chegado a constar seguirão, mas na versão final

ficou observarão. Se entendermos que observar é levar em conta, creio muito saudável

que o juiz leve em conta os precedentes. Mas se estudarmos o Código de Processo Civil de

2015 em seu todo, veremos que sua pretensão é mais do que levar em conta precedentes –

tanto que caberá reclamação contra a decisão que não siga o precedente (art. 988). O

Código de Processo Civil de 2015 foi influenciado pelo sistema da common law, em

especial pela situação que o direito anglo-saxônico chama de stare decisis. Assim, o novo

estatuto quis valorizar os precedentes para tornar a jurisprudência algo previsível, estável,

seguro. Esses três valores – previsibilidade, estabilidade e segurança – são realmente muito

importantes, e, em alguns sistemas jurídicos, foram elevados à condição de garantia

máxima na prestação jurisdicional”536.

536 E o autor prossegue: “O Código de Processo Civil de 2015 mostrou preocupação com a lide coletiva, isso é fato. Embora não tenha chegado ao ponto que nos parecia necessário de disciplinar o processo coletivo – pois não lhe deu um livro, um título ou um capítulo sequer sobre legitimação para agir, competência, intervenção de terceiros, coisa julgada, recursos, execução, nada disso – não se pode negar que ele se preocupou efetivamente com os conflitos coletivos. Primeiro, porque ele se remeteu expressamente ao sistema da Lei da Ação Civil Pública e do Código de Defesa do Consumidor, como no art. 139, X; quis que os casos repetitivos fossem julgados por meio do incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 976 e ss.); alargou a atuação do Ministério Público nos litígios coletivos que envolvessem a posse de terra rural ou urbana (art. 178, III), o que não é de todo uma novidade, pois o Código de Processo Civil de 1973, em seu art. 82, III, já previa a participação do Ministério Público em conflitos coletivos possessórios; previu a suspensão dos processos individuais nos casos em que a repercussão geral tivesse sido reconhecida (art. 1.037, II); previu também a aplicação da tese jurídica fixada no IRDR a processos individuais e coletivos (art. 985); e, de acréscimo, tinha também previsto a hipótese de conversão da ação individual em coletiva, matéria que acabou vetada pelo Executivo (art. 333)”. A verdade é que, apesar da dita preocupação coletiva do Código de Processo Civil de 2015, houve na verdade ausência de disciplina do processo coletivo. O Código de Processo Civil de 2015 muito bordejou o processo coletivo – ele se remeteu ao sistema da tutela coletiva das leis especiais (art. 139, X), criou o IRDR (arts. 313, IV, 921, I, 928, I, e 976), tentou criar o incidente de transformação da lide individual em coletiva (art. 333, vetado), previu a reclamação da parte ou do Ministério Público para garantir a observância de súmula ou de acórdão proferidos em IRDR e em incidentes de assunção de competência (art. 985, § 1.º, e 988, IV) e se preocupou tanto com o processo coletivo… Então por que o Código de Processo Civil de 2015 não disciplinou adequadamente o processo coletivo? A comissão que elaborou o anteprojeto de que resultou o Código de Processo Civil de 2015 instalou-se em 30.11.2009. Entre suas primeiras deliberações, ficou já assentado que a tutela coletiva seria excluída do anteprojeto por dois motivos: primeiro, porque não seriam incluídos no anteprojeto os procedimentos

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11. Conclusão:

As tutelas de urgência se destinam a aplacar a crise enfrentada pela Justiça,

bastante comprometida pela morosidade.

Como já foi dito, Justiça tardia não é Justiça, devendo surgir mecanismos

destinados a recompor o equilíbrio gerado pela ação do tempo que pode inclusive fulminar

direitos.

previstos em leis especiais. Essa decisão, que já atingia em cheio a disciplina do processo coletivo, foi reforçada por um segundo motivo, que deve ser considerado à luz daquele momento: o PL 5.139/2009, que pretendia dar nova disciplina à tutela coletiva, estava então tramitando no Congresso (foi somente na sessão de 17.03.2010 que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara arquivou esse projeto, alguns meses antes de a comissão do Senado concluir o anteprojeto do Código de Processo Civil). Assim, em fins de 2009, os membros da comissão que elaboraram o anteprojeto do Código de Processo Civil de 2015 devem ter pensado lá com seus botões: como já existe em andamento um projeto específico para disciplina do processo coletivo, e como nós não pretendemos cuidar de procedimentos previstos em leis especiais, nós não vamos disciplinar a tutela coletiva no anteprojeto de novo Código de Processo Civil. Destarte, o Projeto 166/2010, com suas alterações posteriores, mencionou apenas a transformação da ação individual em coletiva (depois vetada) e o incidente de resolução de demandas repetitivas, afora algumas referências esparsas ao processo coletivo… Pois foi essa a razão ostensiva pela qual o Código de Processo Civil de 2015 não tem um livro, título ou capítulo sequer sobre o processo coletivo. E talvez pudesse haver mais uma, de puro conforto: a disciplina cabal do processo coletivo é desafio técnico mais complexo, que sabidamente iria enfrentar forte resistência dos congressistas e até do governo (tanto que o Projeto 5.139/2009 acabou logo depois arquivado em março de 2010, antes, portanto, de concluídos os trabalhos da comissão que elaborou o Projeto 166/2010). Então se invoca o argumento ostensivo, e não se disciplina o processo coletivo no novel sistema processual civil.(...) Se a preocupação do Código de Processo Civil de 2015 eram os valores de estabilidade, segurança e previsibilidade das decisões judiciais, a solução nunca poderia ser a de buscar modelos estrangeiros que não se adaptam ao nosso sistema constitucional. Soluções tais me preocupam bastante, pois essa suspensão de processos individuais, que é coativa, subtrai lesões ou ameaças de lesão a direitos do conhecimento do Poder Judiciário enquanto durar a suspensão, e o efeito geral vinculante das decisões dos tribunais para casos futuros usurpa competências constitucionais. Diversamente do que decidiu o Código de Processo Civil de 2015 que resolveu codificar uma ideia sem qualquer tradição legislativa entre nós, creio que havia, sim, motivos mais do que suficientes para dar disciplina codificada ao processo coletivo, este sim já com tradição legislativa de várias e profícuas décadas de uso entre nós. O fato de que, até antes da conclusão do Projeto 166/2010 o processo coletivo ainda estivesse disciplinado por lei especial era compreensível porque, como vimos, quando o Código de Processo Civil de 1973 fora feito, o processo coletivo ainda não era realidade não só em nosso país, como nem mesmo na Europa continental. Mas em 2010, o processo coletivo já estava altamente presente em nosso dia a dia forense. O Projeto do Código de Processo Civil 166/2010, porém, foi feito a toque de caixa, e se o Código de Processo Civil de 1973 não tem culpa de ter omitido a tutela coletiva, a mesma desculpa não vale para o de 2015. Agora, não: não havia motivo válido para o novo Código de Processo Civil deixar de abordar a única grande novidade que tivemos no processo civil nos últimos anos, que é o processo coletivo, por meio do qual se decidem questões fragmentárias de todo um grupo, classe ou categoria de lesados! Quando começou a tramitação do Projeto 166/2010 no Senado – que originou o Código de Processo Civil de 2015 –, o processo coletivo já era usado a cotio entre nós, e o próprio argumento de que o novo Código não deveria dele cuidar porque o processo coletivo já era objeto de projeto próprio, mesmo esse argumento já não servia mais antes mesmo do fim dos trabalhos da comissão que elaborou o anteprojeto, pois a essa altura, há vários meses, o PL 5.139/2009 já tinha sido arquivado pelo Congresso, arquivamento a que se seguiu um recurso meramente formal, de maneira que não mais havia nem há hoje projeto algum de tutela coletiva em efetivo andamento no Congresso, que pudesse coonestar a omissão a respeito da disciplina da tutela coletiva no Projeto 166/2010.

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Se corretamente utilizadas e aplicadas, as tutelas de urgência proporcionam

a restauração da harmonia, sendo que o processo nada mais é do que instrumento para

atribuir a parte o direito, não prejudicando quem tem razão.

Contudo, as tutelas de urgência devem ser adequadamente utilizadas, sendo

certo que não pode haver efetividade sem que se corram alguns riscos.

Portanto, não somente a concessão da tutela antecipatória pode ensejar

prejuízo como a sua ausência de concessão, já que o magistrado omisso é tão indesejável

quanto aquele que desempenha mal o seu papel.

A lentidão da Justiça deve ser combatida e o Juiz moderno deve assumir a

sua responsabilidade de lidar com uma gama nova de direitos que surge diante da evolução

da sociedade, percebendo o dinamismo do Direito.

Há diversas técnicas de sumarização do processo, principalmente através de

tutela jurisdicional diferenciada, prestigiando a adequação do resultado substancial ao

pedido deduzido.

O objetivo da efetividade nada mais é do que dar o mais rápido possível

aquele que tem o direito exatamente o que espera, sem surpresas ou delongas.

A própria urgência em evitar a instabilidade jurídica implica na adoção de

técnicas de sumarização voltadas à pacificação dos conflitos. O combate à inefetividade do

processo é combater os focos e não as consequências.

O equilíbrio entre a segurança e a certeza no ordenamento jurídico é um

risco ao qual o processo está exposto, podendo acarretar danos.

Em minha opinião, as inovações trazidas pelo novo Código de Processo

Civil, no que diz respeito à tutela provisória, prestigiam os princípios da economia

processual, da instrumentalidade das formas e da celeridade.

Partindo da premissa de que a justiça da decisão está ligada ao nível ou

mesmo profundidade de cognição, cabe ao magistrado exercer a sua função de forma

responsável visando sempre a solução do conflito, ainda que de forma sumária.

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Na visão moderna do processo civil, o magistrado deixa de ser protagonista

do processo, deixando de lançar mão apenas da intuição, sensibilidade, convicção,

equidade, senso ético, para exercer a cognição como uma atividade, técnica, método ou

operação lógica para a valoração dos argumentos e provas suscitados pelas partes, em

verdadeiro ato de inteligência e após a formação de um juízo de valor, decidir as questões

de forma coerente, com auxílio, inclusive, dos litigantes envolvidos.

Esta evolução permite a participação efetiva do jurisdicionado na tarefa

cognitiva, observando-se os princípios do contraditório, da ampla defesa, da isonomia,

sendo prestigiado também o dever de fundamentação das decisões.

Arruda Alvim537 sintetiza:

“Diz-se, como consequência, que a figura do juiz é atualmente orientada

para que as suas decisões sejam ‘funcionais’, ou, mais precisamente, não poderá

descartar desses aspectos existentes, ‘quase que subjugadores’ do seu agir; ou então, em

outros termos, que há de ter em vista as condições sociais e econômicas. Em realidade,

isto, ainda por outros termos, quer dizer que há membros pobres, muito pobres, na

sociedade, que demandam um ‘tratamento do legislador’ e do juiz diferente precisamente

porque a situação real e substancial de tais membros é diferente precisamente porque a

situação real e substancial de tais membros é diferente da de outros (...). Isto conduz à

necessidade de criar-se uma ‘jurisprudência política’, diferente da de outras épocas, mais

estáveis, e agora com o fito de se discriminar, diferentemente de outros tempos, em que a

aplicação dos textos resolvia os conflitos, praticamente todos eles homogêneos”.

Registre-se também ser vedada a autotutela devendo o Estado-Juiz garantir a

efetividade do processo.

É inegável o direito do autor em exercer a tutela jurisdicional através do

direito de ação garantido no artigo 5º inciso XXXV da Constituição Federal e dentro de um

prazo razoável, conforme preceitua o inciso LXXVIII do mesmo artigo: “LXXVIII - a

todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do

processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

537 Arruda Alvim, Tratado de direito processual civil, passim.

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Concordamos com Luiz Guilherme Marinoni538 ao expor que: “a tutela de

cognição exauriente garante a realização plena do princípio do contraditório, ou seja, não

permite a postecipação da busca da ‘verdade e da certeza’. Por isso mesmo, a tutela de

cognição exauriente, ao contrário da tutela sumária, é caracterizada por produzir coisa

julgada material539”.

Pensamos inexistir ofensa à garantia constituciona do devido processo legal,

eis que a estabilização apenas transfere ao requerido contra quem a medida foi deferida o

ônus de propor a ação principal, em assim querendo, para obter decisão de mérito sobre a

questão após amplo contraditório, sem impedir o exercício da ampla defesa.

Outro ponto positivo, a meu ver, é a provável diminuição do número de

processos em trâmite perante o Poder Judiciário, eis que se a parte já possuir medida

adequada e suficiente para satisfação de sua pretensão, não terá interesse em ajuizar ação

para cognição exauriente.

Logo, merece aplauso o legislador ao optar por não conceder autoridade de

coisa julgada material à decisão estabilizada, a exemplo do que ocorre no Direito Italiano,

considerando sempre que o seu deferimento é resultado de apreciação sumária da causa,

em cognição não exauriente, sendo por essa razão mais correto que a medida se estabilize

sem necessidade de propositura obrigatória de ação principal, mas sem adquirir a

intangibilidade própria da coisa julgada. Reitero que enquanto perdurar o direito à revisão

da tutela antecipada concedida, não há formação de coisa julgada.

Por fim, esposamos o mesmo entendimento de Rogério Aguiar Munhoz

Soares540 quando traça um panorama da realidade jurídica que vivemos, sendo “sabido que

o grande veículo da prestação da tutela jurisdicional é o processo, tanto a legislação como a

doutrina e a jurisprudência devem afinar-se para que se possa proporcionar de forma

satisfatória a garantia do acesso à Justiça, nos termos em que está insculpida na

Constituição. Reconhece-se, contudo, a grande distância entre o que pretendia o legislador

constitucional e o que é possível realizar no Brasil. O escasso número de juízes, a falta de

aparelhamento para o atendimento à população, e outras dificuldades, são reflexos 538 Luiz Guilherme Marinoni, Antecipação da Tutela, p.35. 539 V.A. Proto Pisani, “Appunti sulla tutela somaria”, I processi speciali, - Studi offerti a Virgilio Andrioli dai suoi allievi, p.312-313. 540 Rogério Aguiar Munhoz Soares, Tutela Jurisdicional Diferenciada. Tutelas de Urgência e Medidas Liminares em Geral, p.46.

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materiais das dificuldades que o Poder Público encontra para atender à população,

revelando que talvez tenha sido incumbido de tarefas que ainda não possa suportar

devidamente, embora não cessem de se fazer ouvir defesas inconsequentes da adoção

generalizada da responsabilidade objetiva do Estado. Afora os problemas que decorrem do

quadro de crises econômicas estruturais que acometem principalmente os países de

Terceiro Mundo, há também a crise institucional por que passa a Nação, na medida em que

o cidadão comum e mesmo as autoridades constituídas parecem temer a independência do

Judiciário, procurando a todo custo limitar-lhe o poder. No entanto, um Poder Judiciário

independente e imparcial, como estabelece a Constituição Federal (art. 2º), é fator que

sinaliza a saúde de uma democracia que se pretende duradoura”.

Comentando sobre a crise na justiça, Ada Pellegrini Grinover aborda que:

“A crise da justiça está na ordem do dia: dissemina-se e serpenteia pelo corpo social, como

insatisfação dos consumidores da justiça, assumindo as vestes do descrédito nas

instituições; atinge os operadores do direito e os próprios magistrados, como que

impotentes perante a complexidade dos problemas que afligem o exercício da função

jurisdicional; desdobra-se em greves e protestos de seus servidores; ricocheteia, enfim,

pelas página da imprensa e ressoa pelos canais de comunicação de massa, assumindo

dimensões alarmantes e estimulando a litigiosidade latente. A justiça é inacessível, cara,

complicada, lenta, inadequada. A justiça é denegação de justiça. A justiça é injusta. Não

existe justiça541.

As reclamações são várias e tomam grande proporção inesperada, caindo em

descrédito a busca pela justiça.

Merecem aplausos as iniciativas capazes de dispensar formalismos inúteis,

ainda que esse não seja o único motivo comprometedor do acesso eficaz à justiça,

competindo também à administração do Judiciário a tarefa de identificar causas internas e

eliminar as etapas mortas do processo, modernizando o aparelho.

O tão anseado acesso à Justiça, deverá ocorrer com a agilidade e

tempestividade que exige a modernidade, porém deve pressupor a efetividade em todas as

suas acepções, cercada de todas as garantias constitucionais, prestigiando o valor “justiça”,

541 Ada Pellegrini Grinover, O Processo em Evolução, p.20/21.

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traduzido como meio de acesso à ordem jurídica justa, entendida esta como a ordem eficaz,

tempestiva e legal.

A evolução do mundo moderno exige que o magistrado passe de mero

espectador, abandonando a inércia, para ser agente político, na defesa do equilíbrio dos três

Poderes, aplicando o primado constitucional insculpido no artigo 2º da Constituição

Federal542.

Concordamos com Nelson Nery Júnior543, para quem “a busca da celeridade

e razoável duração do processo não pode ser feita a esmo, de qualquer jeito, a qualquer

preço, desrespeitando outros valores constitucionais e processuais caros e indispensáveis

ao estado democrático de direito. O mito da rapidez acima de tudo e o submito do

hiperdimensionamento da malignidade da lentidão são alguns aspectos apontados pela

doutrina como contraponto à celeridade e à razoável duração do processo que, por isso,

devem ser analisados e ponderados juntamente com outros valores e direitos

constitucionais fundamentais, notadamente o direito ao contraditório e à ampla defesa”.

O problema da morosidade existe e deve ser enfrentado com coragem.

A simplificação do processo com eventual mitigação de princípios

processuais constitucionalmente assegurados não é solução para o problema ao meu ver,

uam vez que poderá fomentar o arbítrio acarretando insegurança jurídica e vulneração do

devido processo legal, a pretexto de entregar uma prestação jurisdicional mais célere.

Segundo Teori Albino Zavascki544 o objetivo da sumarização da cognição é

a priorização da efetividade em oposição à segurança, de modo a privilegiar o direito

constitucional da duração razoável do processo em detrimento do direito a ampla defesa e

do contraditório. Não sendo direitos absolutos, sustenta Zavascki que diante de um choque

de princípios, cabe ao magistrado, através de um juízo de valor, ponderar bens e valores,

de modo que prevaleça o mais relevante.

542 Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 543 Nelson Nery Jr., Princípios do processo na Constituição Federal, p. 97. 544 Teori Albino Zavascki, Antecipação de Tutela, pp.38-39.

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Vale também destacar o ativismo judicial, bem abordado por Leonard

Ziesemer Schmitz545, sendo certo que o discurso da postura ativa dos juízes parte do

binômio entre o juiz “burocrata”, frio e alheio à realidade, e aquele que toma partido e,

ativamente, busca um ideal de “justiça”, abordando a opinião de João Baptista Herkenhoff,

que considera o juiz “um poeta, alguém que morre de dores que não são suas, alguém que

vive o drama do processo, [...] alguém que capta os sentimentos e aspirações da

comunidade, alguém que incorpora na sua alma e na própria vida a fome de justiça do

povo a que serve”. E segundo o autor, haveria o juiz distante, alheio, tomado pela

“carência do idealismo e da paixão que tornariam seu ofício uma aventura digna da

dedicação de uma existência”.546

Para Jorge Luiz Reis Fernandes547, a duração razoável do processo e a sua

garantia de celeridade tem previsão constitucional (art.5º, LXXVIII) e além disso o

art.4º548 do CPC/2015 inseriu a duração razoável do processo como um de seus

fundamentos, portanto, um dos objetivos, é que o bem da vida almejado seja entregue ao

jurisdicionado com celeridade, que é o primeiro objetivo da cooperação processual. E o

autor enfatiza, citando José Rogério Cruz e Tucci, asseverando que o processo no Brasil é

lento, sobretudo pela falta de recursos materiais destinados ao Poder Judiciário, no entanto,

o que é mais grave são as dilações indevidas no processo, as quais ocorrem em razão dos

545 Leonard Ziesemer Schmitz, Fundamentação das decisões judiciais, pp.196/197. E Leonard Schmitz sintetiza a questão: “Será mesmo que essa bipolaridade dá conta de explicar as possíveis posturas judiciais? Ou o juiz é passivo, como um servidor público que cumpre um cargo sem ânimo, ou ele chama para si a tarefa de combater situações que lhe pareçam injustas, segundo sua observação privilegiada da realidade? Parece que o argumento do ativismo é sedutor, mas não tem o verdadeiro conteúdo democrático. (...) Os ideais dessa postura judicial não são injustos; e essa sequer é a preocupação das críticas merecidas ao “bom juiz”. O que ocorre, como diz Carlos Maximiliano (in Hermenêutica e aplicação do direito, p.68), é que “o fenômeno Magnaud foi apenas retumbante manifestação de ideologia pessoal; atravessou o firmamento jurídico da Europa como um meteoro; da sua trajetória curta e brilhante não ficaram vestígios. Quando o magistrado se deixa guiar pelo sentimento, a lide degenera em loteria e ninguém sabe como cumprir a lei a coberto de condenações forenses”. 546 Apud Lídia Reis de Almeida Prado. O juiz e a emoção, p.93. 547 Jorge Luiz Reis Fernandes, Os deveres dos sujeitos processuais no processo cooperativo, p.154. E o autor aponta critérios: “O processo de estrutura cooperativa envolve, em tese, uma decisão de mérito célere, ou seja, em tempo razoável. Todavia, a duração razoável do processo é relativa, por isso é necessário fazer uma avaliação acerca daquilo que é razoável, para tanto, são enumerados três critérios, para analisar uma indevida dilação processual, especialmente, porque o processo não se torna lento somente em razão da inobservância de prazos. São elas: a) complexidade da causa; b) comportamento dos litigantes e de seus procuradores; c) da atuação do órgão jurisdicional”. 548 Art. 4o As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

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atrasos, uma demora muito grande entre um ato e outro, o que torna impossível determinar

uma regra para que o processo seja célere.549

Rennan Faria Thamay550 com propriedade salienta que “o princípio da

celeridade551 que é um dos mais buscados em nossa sociedade deve ser interpretado da

forma correta, para que injustiças não aconteçam. A celeridade em um mundo globalizado

e rápido, onde as negociações se dão quase que de imediato, se faz necessária para a

manutenção da realidade que a sociedade massificada de hoje vivencia. A idéia de

processo célere se implantou para que houvesse a superação do velho modelo processual

formalista e lento, que instaurou a morosidade que parecia interminável e invencível, mas

que a partir dessa oxigenação que se deu com Processo Civil, através da celeridade, muita

coisa mudou, alterando-se inclusive a própria noção de tempo em relação ao processo.

Essa implementação da celeridade foi uma vitória que todos os processualistas devem

comemorar. Mas, hodiernamente, a busca por celeridade se tornou desmedida e

desenfreada, prejudicando-se direitos e até mesmo a própria noção de processo, que foi

construída através de delongada experiência forense ao redor do mundo”552.

Finalizando, atualmente devemos prestigiar a instrumentalidade do

processo, uma evolução da teoria abstrata, a qual da mesma forma que reconhece a

autonomia do direito de ação, não a distancia da realidade material que está impregnada no

processo.

Como observa Dinamarco, “para fazer logo, embora com o risco de não

fazer tão bem (Calamandrei), é preciso que o juiz se contente com uma cognição da qual

lhe resulte apenas a sensação de uma probabilidade suficiente, não a sensação de uma

certeza tranquila e definitiva”.553

549 José Rogério Cruz e Tucci, Garantias constitucionais da duração razoável e da economia processual no projeto do Código de Processo Civil, p.199. 550 Rennan Faria Thamay, A democracia efetivada através do processo civil. Disponível em http://www.processoscoletivos.net/~pcoletiv/ponto-e-contraponto/585-a-democracia-efetivada-atraves-do-processo-civil. Acesso em 28/10/2015. 551 Sobre a conceituação deste princípio ver PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil, 6º ed., Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 171 e ss. 552 Ademais, deve-se observar que a celeridade nem sempre garante justiça, por vezes o que se dá é o contrario pois a celeridade, por sua natureza, gera injustiças pela ausência de tempo para solucionar a problemática, afastando a idéia da justiça cidadã, in SANTOS, Boaventura de Souza. Para uma revolução democrática da justiça, 2º ed., São Paulo: Cortez, 2008, p. 24. 553 Candido Rangel Dinamarco, O regime jurídico das medidas urgentes. Revista Forense 356/47.

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