tese info geográfica seguros

187
  Universidade de Aveiro  2006 Departamento de Economia, Gestão e Engenharia Industrial  Manuel Leite Ribeiro Os sistemas de inf ormação geográfica na activi dade das seguradoras Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Gestão da Informação, realizada sob orientação científica da Prof. Dra. Silvina Santana, Professora Auxiliar do Departamento de Economia, Gestão e Engenharia Industrial da Universidade de Aveiro.

Upload: edwinaclima

Post on 04-Nov-2015

40 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

Monitoramento de frota de ambulâncias. Geoestatística.

TRANSCRIPT

  • Universidade de Aveiro 2006

    Departamento de Economia, Gesto e Engenharia Industrial

    Manuel Leite Ribeiro

    Os sistemas de informao geogrfica na actividade das seguradoras

    Dissertao apresentada Universidade de Aveiro para cumprimento dosrequisitos necessrios obteno do grau de Mestre em Gesto daInformao, realizada sob orientao cientfica da Prof. Dra. Silvina Santana,Professora Auxiliar do Departamento de Economia, Gesto e EngenhariaIndustrial da Universidade de Aveiro.

  • o jri

    presidente Prof. Dr. Carlos Manuel dos Santos Ferreira professor associado da Universidade de Aveiro Prof. Dr. Lus Manuel Borges Gouveia professor associado da Faculdade de Cincia e Tecnologia da Universidade Fernando Pessoa Prof. Dra. Silvina Maria Vagos Santana professora auxiliar da Universidade de Aveiro

  • Agradecimentos

    A concluso deste projecto s foi possvel porque foram reunidas as condieshumanas e cientficas necessrias para ultrapassar os mais variadosobstculos encontrados durante a sua realizao. Quero expressar um agradecimento especial minha orientadora cientfica,Professora Silvina Santana, pelo apoio prestado durante a elaborao destetrabalho. Tambm devo agradecer aos meus colegas e professores de Mestrado a oportunidade para partilhar conhecimentos de grande utilidade concretizaodeste trabalho e para a minha vida pessoal. Um agradecimento sincero ao meu amigo de longa data Vtor Amorim, pelatotal disponibilidade em partilhar todo o seu conhecimento nas reas deinteresse para este trabalho e pelo importante apoio moral. Ao meu amigo Jorge Oliveira, pelas excelentes conversas das quaisresultaram muitas sugestes para aplicar neste trabalho. Ao Marco Amaro, ao Eduardo Carqueja e ao Miguel Dias, pela colaboraoque me foi oferecida, nomeadamente na disponibilizao de informao sobreos Sistemas de Informao Geogrfica. De igual modo, agradeo Manuela Barbosa, Suzete Mendona, ao MoreiraGomes, ao Antnio Cimbron e ao Francisco Dias, pela disponibilizao deinformao relativa actividade seguradora, bem como as sugestes,conselhos e crticas sempre construtivas. Aos meus colegas de trabalho, por permitirem a existncia de um ambienteprofissional compatvel com a realizao deste trabalho. Um agradecimento especial devido minha famlia, em geral e minhaEsposa, em particular, sempre dedicada e presente em todos os momentos.

  • palavras chave

    seguros, sistemas de informao geogrfica, anlise de risco, aplices, sinistros, marketing

    resumo

    Nos ltimos anos, tem-se verificado que as seguradoras tm pago avultadasquantias a ttulo de indemnizaes, resultantes de catstrofes de origensnatural e humana. Por conseguinte, as margens de lucro so profundamente afectadas, podendo colocar em perigo a sua prpria sobrevivncia. Torna-se, assim, urgente que estas empresas analisem, determinem e avaliem, compreciso, os riscos associados a eventuais desastres. Por outro lado, a concorrncia que se faz sentir no mercado segurador exigeque as seguradoras conheam, cada vez melhor, os seus clientes actuais epotenciais de forma a oferecer os melhores produtos aos melhores preos e nomomento apropriado, tendo sempre em considerao a exposio ao risco. Desta forma, uma correcta avaliao do risco e um bom conhecimento dosclientes so dois factores essenciais na actividade seguradora. Considerando que grande parte dos dados recolhidos pelas seguradoras temuma componente espacial, legtimo inferir que os Sistemas de Informao Geogrfica (SIG) podem contribuir para uma gesto mais informada econsequente destas empresas. Assim, tendo por base a forte componente geogrfica existente no negciosegurador, o presente trabalho tem como objectivo analisar a aplicabilidade dos SIG na cadeia de valor das seguradoras, nomeadamente nos processosde negcio do marketing, aplices e sinistros e identificar as principaisbarreiras a ultrapassar para utilizar este tipo de sistema. Uma das principais concluses deste trabalho que os SIG proporcionamvantagens competitivas para as companhias de seguros, desde que existamos dados necessrios. Estes dados esto disponveis em Portugal, mas a suaproduo est dispersa por vrias entidades e sem normalizao, o que pode dificultar a respectiva aquisio e integrao. Alm disso, o nvel dedesagregao dos dados est mais apropriado ao planeamento do territrio doque explorao de informao. Esta realidade a principal barreira, a nvelnacional, para a utilizao desta tecnologia em negcios como os seguros.

  • keywords

    insurance, geographical information systems, risk assessment, policies, claims,marketing

    abstract

    In the last few years, we can noticed that the insurance companies have paid large amounts for indemnities resulting from natural and human calamities. Asa consequence, the profit margins are highly affected, which may place indanger the survival of such companies. It is therefore urgent that these societies analyze, determine and appreciate with precision the risks comingfrom eventual disasters. On the other hand, the competence existing in the insurance market requiresfrom the insurance companies a better knowledge of their actual and potential customers in order to offer them the best products at the best prices and at theright moment, but always taking into consideration the risk exposure. This way,a correct estimation of the risk and a good knowledge about customers are twoessential factors in the insurance activity. Considering that most part of the data collected by the insurance companieshas a place reference, it is legitimate to say that the Geographical InformationSystem can help on a more advised and consequent management of thesesocieties. Having as a basis the strong geographical component existing in the insurancebusiness, this work has the purpose to analyze the applicability of the SIG inthe value chain of the insurance companies, namely in the marketing, policiesand claims, and to identify the main difficulties to be faced in order to use thiskind of system. One of the main conclusions of this work is that the SIG can bring competitiveadvantages to the insurance companies, since that all the necessary dataexists. This data is available in Portugal, but its producing is spread overseveral entities and without normalization, which may difficult the respectiveacquisition and integration. Furthermore, the level of the data dispersion ismore appropriated to the territory planning than to the data analysis. This reality is the main barrier at national level for the utilization of this technology inbusinesses like the insurance.

  • i

    ndice ndice de tabelas ................................................................................................................... iii ndice de figuras ................................................................................................................... iv Acrnimos ............................................................................................................................. v Introduo .............................................................................................................................. 1 1. O negcio dos seguros ....................................................................................................... 5

    1.1. Definio ..................................................................................................................... 5 1.2. Histria ........................................................................................................................ 6 1.3. Classificao dos seguros, companhias e mediadores ................................................ 9 1.4. Risco .......................................................................................................................... 12 1.5. Co-seguro e resseguro ............................................................................................... 13 1.6. Tarifa de seguro ......................................................................................................... 15 1.7. Entidades reguladoras ............................................................................................... 16 1.8. Aplice ...................................................................................................................... 17 1.9. Sinistro ...................................................................................................................... 20 1.10. Fraude ...................................................................................................................... 23 1.11. Os ramos de seguros ................................................................................................ 24

    1.11.1. O seguro automvel .......................................................................................... 25 1.11.2. O seguro de incndio e elementos da natureza ................................................. 26 1.11.3. O seguro de roubo ............................................................................................. 29 1.11.4. O seguro de transportes ..................................................................................... 30 1.11.5. O seguro de acidentes de trabalho .................................................................... 31 1.11.6. O seguro de vida ............................................................................................... 34 1.11.7. Outros seguros .................................................................................................. 35

    1.12. Marketing ................................................................................................................ 37 1.13. Resumo .................................................................................................................... 46

    2. Os sistemas de informao geogrfica ............................................................................ 49

    2.1. Definio ................................................................................................................... 49 2.2. Origens e evoluo .................................................................................................... 51 2.3. Componentes ............................................................................................................. 54

    2.3.1. Dados .................................................................................................................. 55 2.3.2. Hardware ............................................................................................................. 56 2.3.3. Software .............................................................................................................. 57 2.3.4. Mtodos e utilizadores ........................................................................................ 59

    2.4. Sistemas de informao relacionados ....................................................................... 60 2.5. A natureza dos dados geogrficos e alfanumricos .................................................. 61 2.6. A representao dos dados geogrficos .................................................................... 63 2.7. A integrao de dados geogrficos ........................................................................... 65 2.8. Entidades relevantes .................................................................................................. 67 2.9. Implementao .......................................................................................................... 70 2.10. Aplicaes ............................................................................................................... 73 2.11. Os SIG na tomada de deciso .................................................................................. 75 2.12. Resumo .................................................................................................................... 79

  • ii

    3. Metodologia utilizada no estudo ..................................................................................... 81 3.1. Metodologia utilizada ............................................................................................... 81 3.2. Mtodo de recolha de dados ..................................................................................... 82 3.3. Modelo de anlise ..................................................................................................... 84 3.4. Resumo ..................................................................................................................... 93

    4. Os sistemas de informao geogrfica no negcio ......................................................... 95

    4.1. Os processos de negcio ........................................................................................... 95 4.1.1. As aplices .......................................................................................................... 96

    4.1.1.1. Avaliao do risco ...................................................................................... 96 4.1.1.2. Simulao ................................................................................................. 105 4.1.1.3. Preveno ................................................................................................. 107

    4.1.2. Os sinistros ....................................................................................................... 112 4.1.3. O marketing ...................................................................................................... 116

    4.2. Os dados .................................................................................................................. 120 4.2.1. Os dados geogrficos ........................................................................................ 124 4.2.2. Os dados do contexto ........................................................................................ 125 4.2.3. Os dados dos seguros ........................................................................................ 130

    4.3. Barreiras utilizao dos SIG ................................................................................. 136 4.4. Vantagens da utilizao dos SIG ............................................................................ 137 4.5. Resumo ................................................................................................................... 139

    5. Discusso e concluso ................................................................................................... 141

    5.1. Discusso dos resultados ......................................................................................... 141 5.2. Limitaes do estudo .............................................................................................. 143 5.3. Sugestes de trabalho futuro ................................................................................... 144

    Referncias bibliogrficas ................................................................................................. 145 Anexo 1 Estatsticas do ISP e APS ................................................................................ 161 Anexo 2 Cartografia automatizada ................................................................................. 162 Anexo 3 Sistemas de projeco e coordenadas .............................................................. 163 Anexo 4 Formatos electrnicos ...................................................................................... 164 Anexo 5 Instituies do SNIG ....................................................................................... 165 Anexo 6 Quadro resumo da anlise SWOT ................................................................... 168 Anexo 7 Zonas CRESTA ............................................................................................... 169 Anexo 8 Sistemas de posicionamento ............................................................................ 171

  • iii

    ndice de tabelas Tabela 1 Ramos definidos pelo ISP .................................................................................. 10 Tabela 2 Exemplo de um sistema de bnus-malus ........................................................... 26 Tabela 3 Actividades profissionais e respectivos coeficientes ......................................... 27 Tabela 4 Critrios de segmentao ................................................................................... 38 Tabela 5 Processos de anlise espacial tpicos de um SIG ............................................... 50 Tabela 6 Ficheiros de negcio com dados geogrficos .................................................... 61 Tabela 7 Vantagens e desvantagens dos modelos raster e vectorial ................................. 65 Tabela 8 Entidades intervenientes na produo estatstica ............................................. 126 Tabela 9 Diviso Administrativa .................................................................................... 129 Tabela 10 Nomenclatura NUTS/Diviso administrativa ................................................ 129 Tabela 11 Sistemas de projeco .................................................................................... 163 Tabela 12 Sistemas de coordenadas ............................................................................... 163 Tabela 13 Formatos electrnicos .................................................................................... 164 Tabela 14 Entidades do SNIG no mbito nacional......................................................... 165 Tabela 15 Entidades do SNIG no mbito regional ......................................................... 166 Tabela 16 Entidades do SNIG no mbito local .............................................................. 166 Tabela 17 Resumo da anlise SWOT ............................................................................. 168

  • iv

    ndice de figuras Figura 1 Hierarquia das necessidades de Maslow .............................................................. 7 Figura 2 Critrios da tarifa de seguros ............................................................................. 15 Figura 3 Ciclo de vida da produo de um contrato de seguro ........................................ 18 Figura 4 Regularizao de um sinistro ............................................................................. 21 Figura 5 Variveis consideradas na tarifa do seguro de acidentes de trabalho ................ 33 Figura 6 Peso dos canais de distribuio nos ramos Vida e No Vida ............................ 40 Figura 7 Exemplos de circuitos de distribuio ............................................................... 42 Figura 8 O modelo SERVQUAL ..................................................................................... 45 Figura 9 Exemplo de geoprocessamento .......................................................................... 53 Figura 10 Esquema de funcionamento de um SIG ........................................................... 54 Figura 11 Mdulo de entrada de dados de um SIG .......................................................... 58 Figura 12 Mdulo de sada de dados de um SIG ............................................................. 58 Figura 13 Sistemas de informao relacionados .............................................................. 60 Figura 14 Representao grfica em formato raster ......................................................... 63 Figura 15 Representao grfica em formato vectorial ................................................... 64 Figura 16 Sistema que integra/converte os modelos raster/vectorial ............................... 66 Figura 17 Aplicaes de um SIG ..................................................................................... 75 Figura 18 Tipos de deciso ............................................................................................... 76 Figura 19 Informao no processo de tomada de deciso ................................................ 76 Figura 20 SIG como ferramenta operacional, tctica e estratgica .................................. 78 Figura 21 Cadeia de valor ................................................................................................ 84 Figura 22 Cadeia de valor estendida ................................................................................ 85 Figura 23 Cadeia de valor dos seguros ............................................................................. 86 Figura 24 Cadeia de valor estendida nos seguros ............................................................ 90 Figura 25 Modelo de anlise ............................................................................................ 92 Figura 26 Identificao de aplices numa rea geogrfica .............................................. 98 Figura 27 Variveis de avaliao do risco para uma zona geogrfica ............................. 99 Figura 28 Distribuio geogrfica de doenas ............................................................... 103 Figura 29 Exemplo das quatro zonas no mapa de risco de avalanches na Suia ........... 109 Figura 30 Distribuio mensal de fogos florestais em Portugal ..................................... 110 Figura 31 Resultado da pesquisa para a cidade de Liverpool ........................................ 119 Figura 32 As fontes dos dados ....................................................................................... 121 Figura 33 Catlogo dos fenmenos da natureza do NATHAN ...................................... 132 Figura 34 Atlas de catstrofes naturais do CATNET ..................................................... 133 Figura 35 Diviso de Portugal continental, segundo as zonas ssmicas APS ................ 135 Figura 36 Estrutura do mercado segurador em Portugal no ano de 2003 ...................... 161 Figura 37 Prmios emitidos em 2003 ............................................................................. 161 Figura 38 Diviso de Portugal segundo o cdigo postal de dois dgitos ........................ 169 Figura 39 Zonas CRESTA segundo o ndice de tarifao para acumulao ssmica .... 170

  • v

    Acrnimos AM Automated Mapping AM/FM Automated Mapping/Facilities Management ANSI American National Standards Institute APS Associao Portuguesa de Seguradores BGRI Base Geogrfica de Referenciao da Informao CAD Computer Aided Drafting CADD Computer Aided Drafting and Design CAE Classificao Portuguesa das Actividades Econmicas CAM Computer Assisted Mapping CATNET Catastrophe Network CGIS Canadian Geographical Information System CNIG Centro Nacional de Informao Geogrfica CNPD Comisso Nacional de Proteco de Dados CRESTA Catastrophe Risk Evaluating and Standardizing Target Accumulations ESRI Environmental Systems Research Institute EUA Estados Unidos da Amrica FEMA Federal Emergency Management Agency FIRM Flood Insurance Rate Map GPLP Gabinete de Poltica Legislativa e Planeamento GPS Global Positioning System ICD International Classification of Diseases IDS Indemnizao Directa ao Segurado

  • vi

    IFADAP Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas INE Instituto Nacional de Estatsticas ISP Instituto de Seguros de Portugal LBS Location Based Services NATHAN Natural Hazard Assessment Network NUTS Nomenclatura de Unidades Territoriais para Fins Estatsticos OGC Open Geospatial Consortium OMS Organizao Mundial de Sade PML Probable Maximum Losses RC Responsabilidade Civil RMS Risk Management Solutions SAD Sistema de Apoio Deciso SDTS Spatial Data Transfer System SIG Sistema de Informao Geogrfica SNIG Sistema Nacional de Informao Geogrfica SWOT Strengths Weaknesses Opportunities Threats TIC Tecnologias de Informao e Comunicao TIGER Topologically Integrated Geographic Encoding and Referencing

  • 1

    Introduo A necessidade de segurana um sentimento que est sempre presente em todos os seres humanos, independentemente da sua origem, raa, cultura ou religio. De facto, desde o incio da sua existncia que o homem ocupa grande parte da sua vida a desenvolver mtodos que o protejam das incertezas do futuro. Um desses mtodos o seguro. A contratao de um seguro surge como uma tentativa de satisfazer a necessidade de segurana que o homem tanto sente. Mediante o pagamento de uma quantia em dinheiro, este transfere parte do risco a que est sujeito para entidades denominadas seguradoras. Estas, por sua vez, comprometem-se a indemniz-lo dos prejuzos decorrentes da ocorrncia de um sinistro. Mas, essa partilha do risco no igual para todas as situaes. Existem caractersticas que, pela sua natureza, determinam as condies do contrato de seguro. Por exemplo, uma habitao junto de um rio pode ter maior probabilidade de sofrer uma inundao quando comparada com uma habitao situada numa zona afastada desse rio. Uma unidade industrial de cortia pode ter maior probabilidade de sofrer um incndio quando comparada com uma unidade industrial de cimento. Estes dois exemplos evidenciam a localizao geogrfica e o tipo de materiais como caractersticas que podem influenciar o clculo do risco associado ao bem seguro e natureza do acontecimento. No entanto, existem muitas outras variveis que uma seguradora pode considerar aquando da assinatura de um contrato de seguro, no sentido de correctamente avaliar a respectiva exposio ao risco. Estas variveis so o resultado de complexas anlises estatsticas baseadas em grandes quantidades de dados provenientes da actividade seguradora ao longo dos anos e do meio envolvente. No incio dos seguros como actividade econmica, o tratamento dos dados consistia numa operao bastante rdua e morosa, uma vez que estes eram objecto de um tratamento manual em todo o seu ciclo de vida. Actualmente, esta tarefa bastante mais simples de executar, dada a evoluo tecnolgica verificada nos ltimos anos. Com efeito, assiste-se a um constante desenvolvimento de tecnologia, nomeadamente nos componentes de hardware e de software, o que traz novas perspectivas de recolha, armazenamento, processamento e distribuio de dados. Exemplos disso so as bases de dados, que permitem armazenar dados do mundo real e os sistemas de gesto de base de dados, que disponibilizam meios para o seu acesso, controlam utilizaes concorrenciais e garantem a respectiva integridade. Por outro lado, como a actividade seguradora gera muitas transaces, resultado do elevado nmero de documentos que possui, tais como aplices, recibos, titulares, pessoas seguras ou sinistros, as companhias de seguros so praticamente obrigadas a possuir sistemas computacionais com capacidades para gerir os dados e as informaes resultantes dessas transaces.

  • 2

    Ou seja, os seguradores tm, sua disposio, ferramentas tecnolgicas capazes de tratar os dados provenientes da sua actividade, de forma automatizada e simplificada, e direccionadas para gerar informao til para o negcio. Esta informao pode ser utilizada em vrias actividades, tais como no clculo das variveis que influenciam e condicionam o comportamento dos contratos de seguros e na definio de estratgias para o desenvolvimento de produtos que satisfaam as necessidades dos clientes. Analisando a informao gerada pela actividade seguradora, verifica-se que existe uma caracterstica que se destaca das outras: a localizao geogrfica. O local onde vivem os clientes, o local onde acontecem os acidentes, o local onde esto os bens seguros e o local onde se vendem os servios so alguns exemplos de informao com tal caracterstica. Assim sendo, aceitvel afirmar que esta dimenso da informao no pode ser ignorada no negcio dos seguros. Existem sistemas de informao convencionais que se tm esforado para representar, de forma alfanumrica, os dados geogrficos. o caso, por exemplo, da representao de um mapa de uma cidade atravs de uma tabela. No entanto, a riqueza dos dados geogrficos dificilmente consegue ser captada apenas com dados alfanumricos. Assim, para poder tratar de forma automtica esta dimenso dos dados, surgem os Sistemas de Informao Geogrfica (SIG). Estes sistemas possuem funes para manipular, analisar e apresentar dados espacialmente referenciados. Ou seja, permitem conjugar dados alfanumricos com dados geogrficos, cujo resultado traduz-se em informao que pode ser utilizada na gesto dos negcios. So vrios os sectores da economia que tm demonstrado um crescente interesse pelos SIG, no s devido s suas funcionalidades mas tambm pela reduo de custos na tecnologia que se tem verificado ultimamente. Apesar de existirem algumas barreiras tcnicas a ultrapassar, tais como a falta de conhecimento sobre os SIG e o acesso dificultado aos dados necessrios para aliment-lo, de se esperar que estes sistemas possam ajudar as empresas, onde se incluem as companhias de seguros, a gerir o seu negcio. Tendo como base estas consideraes, o presente trabalho tem como objectivo estudar, numa perspectiva qualitativa, a aplicabilidade dos SIG nos processos de negcio das seguradoras, nomeadamente na gesto de aplices, sinistros e marketing, levantando quer os benefcios que este tipo de sistema pode trazer para o negcio dos seguros quer as principais barreiras a ultrapassar na respectiva implementao. No seu objectivo fazer um estudo de caso ou um estudo que retrate a realidade em Portugal. Para concretizar este objectivo, foi levado a cabo, atravs de pesquisa bibliogrfica e de entrevistas, um estudo sobre os seguros e os SIG, cujo resultado est estruturado em cinco captulos. O captulo 1 tem como objectivo descrever a actividade dos seguros atravs de conceitos base, dos respectivos processos de negcio e de uma explicao tcnica dos principais ramos de seguros em Portugal, com particular evidncia para a dimenso geogrfica

  • 3

    associada ao negcio. Tambm feita uma pequena abordagem ao marketing com especial enfoque para a actividade seguradora. O captulo 2 tem como objectivo descrever os SIG e como estes se relacionam com outros sistemas de informao. So evidenciadas definies relevantes encontradas na literatura, discutem-se as vrias aplicaes que este tipo de sistema pode ter e a sua utilizao como ferramenta operacional, tctica e estratgica na tomada de deciso. Tambm so descritos os problemas com que uma organizao se depara na implementao de um SIG, bem como os esforos que existem, tanto a nvel nacional como internacional, no sentido de os ultrapassar. O captulo 3 descreve a metodologia utilizada na elaborao deste trabalho e apresenta o modelo de anlise, construdo com base nos dados recolhidos inicialmente, que representa a utilizao da tecnologia SIG nos principais processos de negcio das seguradoras. O captulo 4 analisa a aplicabilidade de um SIG na actividade das seguradoras, nomeadamente nos processos de negcio das aplices, sinistros e marketing. Com base no modelo construdo e na realidade internacional, explorada a utilizao deste tipo de sistema nas diferentes actividades do negcio, so identificados os tipos de dados necessrios para implementar um SIG nos seguros e quais as barreiras que uma seguradora encontra na respectiva adopo. Por ltimo, o captulo 5 apresenta as concluses do estudo e as limitaes encontradas na elaborao deste trabalho. Alm disso, so apontadas perspectivas de evoluo para futuros trabalhos. Como complemento aos captulos que constituem esta dissertao, existem 8 anexos. O anexo 1 apresenta quadros estatsticos sobre a actividade seguradora, nomeadamente na distribuio de valores dos prmios emitidos referentes aos diferentes ramos de seguros. No anexo 2 descrevem-se as tecnologias de cartografia automatizada. No anexo 3 descrevem-se os sistemas de projeco e coordenadas, apresentando alguns exemplos. O anexo 4 foca os principais formatos electrnicos existentes no mercado dos SIG para o arquivo de informao geogrfica. O anexo 5 apresenta as instituies do Sistema Nacional de Informao Geogrfica (SNIG), agrupadas segundo o seu mbito de actuao: nacional, regional e local. O anexo 6 inclui o quadro resumo da anlise Strengths Weaknesses Opportunities Threats (SWOT) para os SIG em Portugal efectuado no trabalho Engenharia e Tecnologia 2000 (E&T2000). O anexo 7 contm imagens sobre as zonas desenvolvidas, para Portugal, pela Catastrophe Risk Evaluating and Standardizing Target Accumulations (CRESTA). O anexo 8 apresenta os sistemas de posicionamento existentes no mundo.

  • 5

    1. O negcio dos seguros Este captulo tem como objectivo explicar os conceitos gerais relacionados com a actividade seguradora, nomeadamente a diviso do negcio por ramos de seguros, a gesto do risco, a tarifao (definio de preos), a gesto de sinistros e o marketing. feita uma pequena abordagem ao nascimento dos seguros como actividade econmica e respectiva evoluo. So abordados os principais termos comerciais dos seguros, os respectivos fluxos de trabalho, so descritos alguns procedimentos especficos dos ramos de seguros, evidenciando a respectiva componente geogrfica, e analisa-se a actividade de marketing no negcio dos seguros.

    1.1. Definio So vrias as definies de seguro que se encontram na literatura. Basicamente, todas tm em comum a partilha do risco entre duas entidades mediante o pagamento de uma quantia em dinheiro como forma de premiar a entidade que aceita o risco. A seguinte definio apresenta os fundamentos essenciais do seguro. Seguro uma operao pela qual transferida para o Segurador a gesto empresarial, organizada em moldes cientficos e baseada em leis estatsticas, de determinados riscos aleatrios, comuns a uma mutualidade de segurados, atravs de contratos bilaterais pelos quais o contratante segurador se compromete, perante o contratante segurado, a liquidar ao(s) beneficirio(s) do contrato prestaes em dinheiro, espcie ou servios, no caso e na medida dos danos originados pela concretizao desses riscos, ou a liquidar em capital ou renda de acordo com o que prvia e convencionalmente tiver sido estipulado em modalidades de natureza no indemnizatria, obrigando-se cada contratante segurado ao pagamento de certa importncia em dinheiro, correspondente sua quota parte na gesto dos riscos em causa e/ou das responsabilidades assumidas (SANTOS, 1991a). De uma forma mais simples, um contrato de seguro o acordo escrito entre uma entidade (seguradora) que se obriga, mediante o recebimento de determinada quantia (prmio ou prestao), a indemnizar outra entidade (segurado ou terceiro) pelos prejuzos sofridos, no caso da realizao de um risco (INSTITUTOCONSUMIDOR, 2002). O conceito de seguro pode ser abordado sob diversas perspectivas, consoante se atenda aos aspectos econmicos e sociais, tcnicos ou jurdicos que apresenta. Do ponto de vista econmico e social, o seguro assenta num elemento fundamental: a mutualidade. O segurado procura, no seguro, uma soluo contra as consequncias do acaso, competindo ao segurador elimin-las. Para tal, o segurador agrupa o maior nmero possvel de pessoas (segurados) numa determinada comunidade. construda uma caixa comum atravs de uma contribuio (quota, prmio) feita pelos segurados, da qual sairo os pagamentos das prestaes prometidas s pessoas afectadas pelo acaso (CAIXASEGUROS, 2005b; SANTOS, 1991a).

  • 6

    O segurador a entidade gestora que administra e reparte os fundos dessa caixa comum. Tambm deve procurar ter uma justia tarifria, isto , determinar o valor mais exacto possvel de cada contribuio, face ao risco e montante seguro. Existe uma repartio equitativa dos prejuzos porque a parte com que cada um participa igual para todos os que tm riscos semelhantes (SANTOS, 1991a). Do ponto de vista tcnico, a actividade seguradora tem a funo de arrecadar os fundos necessrios e suficientes para pagar as indemnizaes resultantes da ocorrncia de sinistros cobertos pelas aplices celebradas com os segurados. A lei dos grandes nmeros, o clculo das probabilidades, a estatstica e a aleatoriedade da ocorrncia de sinistros so factores que regem os seguros (SANTOS, 1991a). Do ponto de vista jurdico, o seguro um contrato bilateral e oneroso. Tanto a seguradora como o segurado tm direitos e obrigaes: a seguradora compromete-se a entregar uma prestao em dinheiro ou em espcie (indemnizao) no caso de ocorrer um determinado acontecimento incerto que origine prejuzo econmico (sinistro), enquanto o segurado se compromete a pagar o respectivo prmio (SANTOS, 1991a). de notar que a existncia do seguro fundamental na economia. De facto, dificilmente uma pessoa ou organizao pode suportar, por si s, o prejuzo resultante de um sinistro, uma vez que seria necessrio constituir um fundo de reserva capaz de responder s solicitaes de um desastre, quando esse capital pode ser investido noutras actividades mais rentveis, tanto para a prpria entidade como para a economia.

    1.2. Histria Desde sempre que o homem procurou defender-se dos perigos conhecidos ou desconhecidos, quer por medidas de proteco fsica, quer solicitando auxlio ao sobrenatural. A ideia do seguro surgiu h milhares de anos. O princpio de armazenar reservas para o futuro ilustrado pelo episdio bblico de Jos e a fome no Egipto. Jos ordenou que se guardassem cereais durante os sete anos de boas colheitas para aliviar a sua falta quando chegassem os sete anos de fome (CASCALHO, 1994). Mas, para compreender o seguro, importante perceber a necessidade psicolgica de segurana. Abraham Maslow sistematizou as numerosas necessidades humanas em cinco nveis hierrquicos, como mostra a Figura 1 (DONNELY et al., 2000). Em primeiro lugar, na base da hierarquia, o homem tende a satisfazer as necessidades de nvel mais bsico (necessidades fisiolgicas, tais como a alimentao, a reproduo ou a respirao). Realizada uma necessidade, o homem passa a sentir-se motivado para a realizao de outra de nvel superior. Analisando a Figura 1, verifica-se que a segurana, situada no segundo nvel, uma necessidade muito prxima da mais bsica. De facto, o homem sempre procurou, e continua a procurar, defender-se dos perigos conhecidos ou desconhecidos. F-lo mediante a associao, em termos de mtuas proteces, em ncleos cada vez mais desenvolvidos,

  • 7

    mais poderosos, desde a famlia passando pelo cl, tribo, cidade ou nao. Aqui, so desenvolvidos mtodos, processos, tcnicas e operaes especficas para enfrentar os perigos actuais ou futuros (SANTOS, 1991a). Auto-realizao

    Necessidades de nvel mais alto; necessidades de realizao crescer e utilizar as nossas capacidades da forma mais criativa e melhor.

    Estima Necessidade de obter a estima dos outros respeito, prestgio e reconhecimento; necessidades de auto-estima; sentido pessoal de competncia e mestria.

    Sociais Necessidades de amor, afecto, sentido de pertena no relacionamento com outras pessoas.

    Segurana Necessidade de segurana, proteco e estabilidade no meio fsico e nas ocorrncias interpessoais da vida diria.

    Fisiolgicas Necessidades bsicas de qualquer ser humano: necessidade de manuteno biolgica, tais como a alimentao, a sede ou o sexo.

    Figura 1 Hierarquia das necessidades de Maslow

    So vrios os exemplos dessas associaes que se encontram desde a antiguidade:

    Na pr-histria, algumas famlias ou tribos praticavam formas de solidariedade e cooperao: na ocorrncia de uma morte, as respectivas consequncias eram repartidas pelos membros do grupo, garantindo a subsistncia dos lesados (NASCIMENTO, 2005);

    No Baixo Egipto, por volta do ano 4500 a.c., de acordo com referncias em papiro da poca, existia uma caixa de auxlio mtuo constituda por pedreiros que se quotizavam, permitindo assim solidarizarem-se perante certos perigos (NASCIMENTO, 2005);

    Na Babilnia, o Cdigo de Hamurabi (1955-1913 a.c.) assinala a existncia de uma conveno a favor dos Drmatas, com a finalidade de desobrig-los da responsabilidade inerente perda de mercadorias que transportavam entre a Caldeia e os pases vizinhos (CAIXASEGUROS, 2005a; NASCIMENTO, 2005);

    Na antiga China, o transporte fluvial era feito em barcas frgeis. Como medida de preveno, cada barca transportava apenas parte da mercadoria de cada comerciante. Assim, em caso de sinistro, apenas estaria perdida uma parte do bem. Este sistema de preveno consiste na fragmentao ou distribuio espacial do risco, como forma de minimizar os prejuzos caso suceda um desastre. Este um processo tcnico ainda em utilizao actualmente e o princpio do co-seguro e do resseguro (COELHO et al., 2005; NASCIMENTO, 2005; SANTOS, 1991a);

    No imprio Romano, os legionrios recebiam penses por incapacidade decorrentes da guerra e por limite de idade. Isto pode ser considerado um princpio dos seguros pessoais e dos seguros de penses (SANTOS, 1991a);

    Entre os Hebreus, foram institudas agremiaes destinadas a socorrer os seus componentes pela perda de animais, promovendo a substituio de camelos ou burros das suas caravanas (EMICREI, 2005; SANTOS, 1991a).

  • 8

    Estes exemplos ilustram que este tipo de associao se foi desenvolvendo e adaptando s necessidades de cada poca: enquanto que no Egipto a preocupao da morte derivava da actividade como pedreiro, o imprio Romano preocupava-se com a morte resultante das batalhas. Ou seja, a necessidade do seguro deriva directamente do desenvolvimento da actividade econmica e das preocupaes sociais da decorrentes. O primeiro ramo do seguro a desenvolver-se foi o Martimo, motivado pela grande expanso do comrcio martimo em Itlia (sculos XIV e XV). Dada a enorme importncia do comrcio martimo em Portugal na poca, foi instituda a sua obrigatoriedade no territrio nacional por D. Fernando. de notar a interveno do Estado na actividade seguradora, ainda hoje existente (ALMEIDA, 1971; COELHO et al., 2005; EMICREI, 2005; NASCIMENTO, 2005). Por sua vez, o seguro contra incndios surgiu aps a ocorrncia de um grande incndio em Londres, em 1666, onde arderam cerca de 13000 casas (MOTORCLICK, 2005; NASCIMENTO, 2005; PORTO, 2005). J o seguro obrigatrio de responsabilidade civil de automveis surgiu na Gr-Bretanha em 1930, motivado pelo tremendo aumento de automveis em circulao. Este aumento motivou inmeros acidentes, sem que os causadores tivessem seguro ou capacidade econmica de suportar os danos. Como tal, foi instituda a obrigatoriedade do seguro (SANTOS, 1991a). Com a revoluo industrial, surgem novas necessidades impostas pelo desenvolvimento tecnolgico e econmico subsequente. O seguro, por sua vez, desenvolve-se de forma acelerada: surgem novos ramos de seguros e novas companhias de seguros, o que contribui para uma maior dimenso da actividade seguradora (CAIXASEGUROS, 2005a). Mas no sculo XVII que o seguro comea a organizar-se com bases tcnicas, que ainda hoje existem, de acordo com os progressos cientficos que se operam no campo da matemtica, em particular no clculo de probabilidades estatsticas. Em Inglaterra, desenvolvida a primeira tbua de mortalidade. Na Alemanha, so feitos estudos sobre a natalidade e a mortalidade. Bernoulli, matemtico suo, define a Lei dos Grandes Nmeros ou Teorema de Bernoulli (MOTORCLICK, 2005; PORTO, 2005; SANTOS, 1991a). Resumidamente, a Lei dos Grandes Nmeros expe-se da forma seguinte: a probabilidade de um certo desvio relativo, por mais pequeno que se queira, tende para zero quando o nmero de lances aumenta indefinidamente (SILVA, 1994). Por outras palavras, a frequncia de determinados acontecimentos, observada em grande nmero de casos anlogos, tende a estabilizar-se cada vez mais, medida que aumenta o nmero de casos observados, aproximando-se dos valores previstos pela teoria das probabilidades (SUSEP, 2005). Este teorema, que permite estabelecer a inclinao de certos fenmenos sobre uma populao e num determinado perodo de tempo, possibilita a elaborao de tabelas, grficos e estatsticas capazes de prever o nmero quase exacto de fenmenos por meio de uma estimativa matemtica. Esta a base do seguro. (JUNIOR, 2005)

  • 9

    A cientificao do seguro nasce com o desenvolvimento da matemtica no sculo XVII, atravs do clculo de probabilidades e estatsticas e acelera-se com a revoluo industrial do sculo XIX. Antes, no existiam elementos estatsticos e apenas se podiam tirar concluses a partir da sensibilidade e da experincia acumulada, nomeadamente atravs de associaes (COELHO et al., 2005; MOTORCLICK, 2005; SANTOS, 1991a). Actualmente, com o crescente desenvolvimento da informtica e dos sistemas de informao, fica mais facilitada a tarefa de trabalhar enormes quantidades de dados, sendo possvel a sua explorao de variadas formas para satisfazer diferentes objectivos. Assim, so implementados mtodos com maior preciso para avaliar o risco, os processos de negcio so adaptados s exigncias dos clientes e so desenvolvidos novos produtos para novos mercados, tendo sempre como base a legislao em vigor e a classificao dos seguros e respectivas entidades.

    1.3. Classificao dos seguros, companhias e mediadores O negcio dos seguros est, tecnicamente, dividido pela natureza dos bens a segurar. Esta diviso conhecida como ramo do seguro. Existe o ramo Vida, que compreende os seguros que cobrem o risco de morte ou sobrevivncia das pessoas e existem os ramos No Vida, que englobam todos os outros seguros. Comercialmente, os ramos tm variadas designaes, havendo, inclusive, companhias de seguros que lanam produtos que incluem vrios ramos. No entanto, existe uma relao directa com a tabela de ramos definida pelo Instituto de Seguros de Portugal (ISP) no plano oficial de contas para as companhias de seguros (Tabela 1). Em Portugal, esto definidos como obrigatrios alguns seguros, como o caso do seguro de responsabilidade civil automvel e o seguro de acidentes de trabalho. Esta obrigatoriedade, que tem sido implementada ao longo dos anos em diversos ramos, est no mbito da componente social, como defesa dos cidados em geral, que o Estado pretende salvaguardar atravs da transferncia de responsabilidade. Por exemplo, no ramo acidentes de trabalho, onde h a morte ou invalidez de um trabalhador, a famlia precisa de ter a sua subsistncia garantida. O seguro deve responder a esta necessidade. J para os seguros de responsabilidade civil, como o caso da componente obrigatria do seguro automvel, a ocorrncia de um sinistro pode provocar leses corporais e/ou materiais a pessoas no responsveis pelo facto, devendo estas ser indemnizadas das respectivas consequncias. Este o mbito dos seguros obrigatrios: proteger a populao em geral. Como forma de completar os seguros obrigatrios, surgem os seguros facultativos. Estes aumentam o leque de oferta das companhias de seguros, onde um indivduo pode transferir parte dos riscos a que est exposto. Enquanto que os seguros obrigatrios so uniformes em todas as companhias de seguros, uma vez que todas seguram os mesmos riscos nas mesmas condies, variando essencialmente no preo e nos servios prestados, os seguros

  • 10

    facultativos possuem uma estrutura livre. Isto , cada companhia define os riscos que pretende suportar e quais as condies de adeso.

    Tabela 1 Ramos definidos pelo ISP

    Grupo Subgrupo Acidentes e Doena Acidentes

    Acidentes de trabalho Acidentes pessoais Pessoas transportadas Doena

    Incndio e outros danos Incndio e elementos da natureza Outros danos em coisas Agrcola Incndio Agrcola Colheitas Pecurio Roubo Cristais Deteriorao de bens refrigerados Avaria de mquinas Riscos mltiplos habitao Riscos mltiplos comerciantes Riscos mltiplos industrial Outros

    Automvel Veculos terrestres Mercadorias transportadas Responsabilidade civil de veculos terrestres a motor Pessoas transportadas

    Martimo e Transportes Veculos ferrovirios Embarcaes martimas, lacustres e fluviais Resp. civil de embarcaes martimas, lacustres e fluviais Responsabilidade civil de veculos ferrovirios Mercadorias transportadas Pessoas transportadas

    Areo Aeronaves Responsabilidade civil aeronaves Mercadorias transportadas Pessoas transportadas

    Mercadorias transportadas Mercadorias transportadas Responsabilidade civil Responsabilidade civil geral

    Responsabilidade civil de produtos Responsabilidade civil profissional Responsabilidade civil de explorao Caadores Outros

    Diversos Crdito Cauo Perdas pecunirias diversas Proteco jurdica Assistncia Seguros diversos

    Vida Seguro de vida Seguro de nupcialidade e seguro de natalidade Seguros ligados a fundos de investimento Operaes de capitalizao

  • 11

    A comercializao de todos estes ramos exercida, no mercado nacional, pelas seguintes entidades (ISP, 2005a):

    Companhias de seguros, tambm denominadas seguradoras, seguradores ou empresas de seguros;

    Sociedades gestoras de fundos de penses e Mediadores.

    Uma companhia de seguros uma instituio que tem por objectivo indemnizar os prejuzos involuntrios verificados no patrimnio do segurado, ou que afectem a integridade fsica das pessoas seguras, mediante o recebimento de prmios. Como cada ramo tem as suas especificidades, tanto a nvel do negcio como a nvel da legislao, as companhias de seguros possuem uma diviso estrutural por ramos de seguros (SILVA, 1994). Alm disso, de acordo com os ramos que exploram, as seguradoras so classificadas como (ISP, 2005g):

    Seguradora do ramo Vida, caso explore apenas o ramo Vida; Seguradora de ramos No Vida, caso explore apenas um ou vrios ramos de No

    Vida e Seguradora mista, caso explore, conjuntamente, o ramo Vida e os ramos No Vida

    de Acidentes e Doena, no podendo explorar outros ramos No Vida. Por sua vez, uma sociedade gestora de fundos de penses uma entidade jurdica particular, que recolhe contribuies de pessoas e empresas, aplicando esses recursos nos mercados financeiros para que, futuramente, a venda dos ttulos, tais como aces, ttulos mobilirios e imveis, financie aposentadorias e penses. Quanto mediao de seguros, esta definida como a actividade remunerada tendente realizao e/ou assistncia de contratos de seguros entre pessoas singulares ou colectivas e os seguradores. Os mediadores de seguros dividem-se em trs categorias (ISP, 2005f):

    Agentes de seguros: pessoas singulares ou colectivas que apresentam, propem e preparam a celebrao de contratos de seguro, com prestao de assistncia aos mesmos. Podem exercer a sua actividade junto de companhias de seguros ou corretores.

    Angariadores de seguros: exercem a mesma funo que os agentes de seguros mas so trabalhadores de seguros. S podem exercer a sua actividade junto da entidade patronal salvo em relao a ramos ou modalidades que esta no esteja autorizada a explorar.

    Corretores de seguros: so pessoas singulares ou colectivas com organizao administrativa e comercial prpria, bem como estrutura econmico-financeira adequada. So mediadores qualificados, com pelo menos quatro anos de actividade como agente, podendo tambm exercer funes de consultadoria em matria de seguros junto dos tomadores, bem como realizar estudos ou emitir pareceres tcnicos sobre seguros.

    A existncia do papel de mediador justifica-se pelo valor que este adiciona ao produto de seguro. Como profissional de seguros que , conhece bem o mercado segurador e sabe o

  • 12

    que h para oferecer. Assim, pode exercer o papel de consultor de seguros, indicando ao cliente o melhor produto, tendo como base as respectivas necessidades (AMORIM, 2005). Mas, independentemente dos ramos ou entidades envolvidas, a contratao de um seguro implica sempre a partilha de um risco.

    1.4. Risco A actividade seguradora gira praticamente toda a volta do conceito de risco. A palavra risco, tal como outras palavras da linguagem dos seguros, pode assumir significados diferentes, de acordo com o contexto em que estiver inserida. Utiliza-se, frequentemente, a palavra risco para definir o objecto a segurar ou o objecto seguro. Por exemplo, a expresso visitar o risco substitui a expresso visitar a fbrica (CERTASEGUROS, 2005; SANTOS, 1991b). No contexto da incerteza, a palavra risco significa a possibilidade de vir a acontecer um evento aleatrio e fortuito causador de prejuzos. Nesta ptica, o risco tem de possuir as caractersticas de acontecimento possvel (caso contrrio no h existncia de risco), futuro (no h necessidade de segurana em relao a eventos j passados), incerto ou aleatrio (desconhece-se quando pode acontecer), casual ou fortuito (deve ser independente da vontade do homem), acidental ou involuntrio (no pode ser desencadeado voluntariamente) e danoso ou prejudicial (deve ter consequncias desagradveis ou provocar prejuzos) (BANDEIRA, 1995; PORTUGALPREVIDENTE, 1990; SILVA, 1994). Por sua vez, a anlise do risco o conjunto de operaes desencadeadas pelas seguradoras aquando da aceitao de um novo seguro e tem como objectivo o conhecimento qualitativo e quantitativo do risco. Os instrumentos essenciais para a anlise e medida dos riscos so as tcnicas estatsticas, a obedincia lei dos grandes nmeros e o clculo de probabilidades (SILVA, 1994). Os dados experimentais, que podem ser considerados estatisticamente, tm origem interna seguradora, fruto do exerccio da sua actividade, ou origem externa, resultante da aquisio junto de entidades alheias actividade seguradora como, por exemplo, o Instituto Nacional de Estatsticas (INE), ou junto de entidades relacionadas com o negcio, como sejam mediadores de seguros. Relativamente mensurabilidade, o risco pode ser caracterizado como objectivo ou subjectivo. Ele objectivo quando pode ser devidamente estudado, isto , quando o risco conhecido na sua frequncia e probabilidade de ocorrncia. Neste caso, podem-se aplicar as tcnicas estatsticas e o clculo de probabilidades para determinar a sua medida. Em contrapartida, o risco subjectivo quando a frequncia com que se realiza muito baixa ou h grande dificuldade de previso e valorizao dos dados. Estes riscos so apreciados apenas pela sensibilidade do analista, no sendo, normalmente, medidos pelas tcnicas cientficas (SANTOS, 1991b).

  • 13

    O risco tambm pode ser caracterizado quanto dimenso da respectiva ocorrncia. O risco ordinrio quando, em princpio, as consequncias danosas no ultrapassam as possibilidades da companhia de seguros de lhes fazer face. o caso da maioria dos seguros que se subscrevem diariamente. O risco extraordinrio quando no possvel a sua aceitao normal e corrente. Isto acontece devido gravidade e alargada natureza dos seus efeitos (SILVA, 1994). H riscos que no so segurveis, quer pela sua natureza, quer pela dificuldade analtica da sua avaliao. o caso da maioria dos riscos subjectivos. No entanto, o risco ser segurvel ou no segurvel varia com o decorrer do tempo. De facto, o progresso tcnico tem vindo a diminuir a quantidade dos riscos no segurveis. A capacidade cientfica em termos de clculo de probabilidades e de estatstica e os mtodos de medida do risco tm-se aperfeioado, transformando riscos subjectivos em objectivos, uma vez que j podem ser medidos (SANTOS, 1991b). Por outro lado, a colaborao internacional tambm tem contribudo para uma melhor anlise do risco. Existem situaes em que a experincia de um pas no suficiente para apreciar um risco com base na lei dos grandes nmeros, uma vez que a ocorrncia de determinados fenmenos muito reduzida. No entanto, a colaborao entre diversos pases, originando dados estatsticos num universo comum e alargado, j possibilita a medida do risco. Em suma, estas classificaes no devem ser entendidas de uma maneira esttica e definitiva. Isto porque a evoluo scio-econmica, poltica, cientfica e tecnolgica provoca alteraes, passando certos riscos a classificarem-se de modo diferente. Alm disso, a prpria internacionalizao do seguro, atravs da prtica do resseguro e co-seguro, permite que muitos riscos no segurveis se transformem em riscos segurveis.

    1.5. Co-seguro e resseguro As seguradoras utilizam diversos processos na gesto da sua carteira de riscos. Um dos mais importantes e tambm mais antigo a fragmentao desses riscos, isto , a diviso do risco por outras entidades. Actualmente, existem dois mecanismos aplicados nesta diviso de responsabilidades: o co-seguro e o resseguro (SILVA, 1994). Com efeito, existem alguns contratos que, pela sua natureza, dimenso ou caractersticas, necessitam da interveno de vrias seguradoras, repartindo o risco nas suas consequncias econmicas, isto , prmio e indemnizaes. Por exemplo, um contrato de seguro para uma plataforma petrolfera necessita de condies de aceitao do risco que no existem num contrato de seguro para uma habitao familiar: os valores envolvidos, em caso de sinistro, tm uma dimenso completamente diferente. Embora existam esforos cientficos para calcular o limite mximo que uma seguradora pode suportar, a verdade que, normalmente, este calculado manualmente em funo das caractersticas da seguradora, tais como capital social, reservas ou carteira de seguros e considerando os dados obtidos pelo clculo das probabilidades (SANTOS, 1991b).

  • 14

    Assim, o co-seguro caracteriza-se pela participao de vrias seguradoras na garantia de um mesmo risco (uma aplice), atravs de um acordo prvio, assumindo cada uma delas uma quota-parte do risco coberto ou do capital garantido: recebem uma parte do prmio pago pelo segurado e indemnizam na mesma proporo (CERTASEGUROS, 2005; SILVA, 1994). Por sua vez, o resseguro consiste no segurador se segurar a si prprio junto de outros seguradores, podendo estes efectuarem novo resseguro noutra entidade e assim sucessivamente. Pode-se dizer que o resseguro o seguro das seguradoras. O resseguro pode ser praticado por empresas especializadas que s exploram o resseguro ou por seguradoras normais. Para alm da diviso do risco, o resseguro tambm procurado para a troca de experincias e para a conquista de novos mercados (CERTASEGUROS, 2005; MENDES, 2005). Na prtica, os seguradores procuram ressegurar-se junto de empresas estrangeiras, no s devido ao princpio da diviso de riscos por reas geogrficas diversificadas, mas fundamentalmente porque o ressegurador pode tornar-se concorrente no plano directo do seguro (SILVA, 1994). Ou seja, o co-seguro criado para uma aplice em particular, em que a companhia que recebe a proposta verifica que no pode suportar financeiramente o capital em risco e procura outras companhias para distribuir proporcionalmente os ganhos e despesas. Por sua vez, o resseguro um contrato feito com vrias entidades, normalmente para um ano civil, em que a companhia de seguros cede uma parte do capital de todas as aplices efectuadas nesse perodo de tempo e que seguram os riscos do tratado. Como contrapartida, as resseguradoras recebem um prmio correspondente ao risco aceite. Enquanto que, no co-seguro, o cliente que contrata o seguro sabe que existem vrias companhias a partilharem o risco, embora o seu relacionamento seja apenas com a companhia lder, no resseguro no h relao directa entre este e o ressegurador e no h conhecimento da partilha do risco. O tomador de seguro sabe apenas que possui um contrato com a companhia de seguros e que esta se compromete a indemniz-lo no caso de sinistro. No sabe que a seguradora, por sua vez, tambm faz vrios contratos com outras entidades, denominadas resseguradoras, para distribuir a responsabilidade. Toda esta distribuio de responsabilidades o resultado de fortes negociaes que tm por objectivo, para qualquer entidade envolvida, a cedncia de um risco ao menor custo. Isto , o cliente contrata um seguro para transferir o risco para uma companhia de seguro e deseja que o valor a pagar seja o menor possvel. Por sua vez, a companhia de seguros tambm partilha, junto de outras entidades, parte do risco e tambm deseja que o valor a pagar seja o menor possvel. Este valor a pagar o prmio de seguro e o resultado da aplicao de vrias regras complexas denominadas tarifas de seguro.

  • 15

    1.6. Tarifa de seguro Uma tarifa de seguro um conjunto de disposies, regras e preceitos, de tabelas de taxas e/ou de prmios que regulamenta ou orienta, basicamente, os principais aspectos ligados produo de um certo ramo ou de determinada modalidade de seguros, na medida em que a sua aplicao resulta no prmio a pagar pelo tomador de seguro (CERTASEGUROS, 2005; SANTOS, 1991a). A definio de uma tarifa obedece a critrios tcnicos especficos que passam por metodologias estatsticas, clculo de probabilidades e clculo da taxa de risco. Alm disso, deve obedecer a critrios genricos (Figura 2), tais como (SANTOS, 1991a):

    Adequao: Tarifas excessivamente baixas originam maus resultados industriais, a consequente descapitalizao e o perigo de falncia das seguradoras. Isto acaba por prejudicar os detentores de capital, os segurados e os prprios lesados. As tarifas tambm no devem ser demasiado elevadas sob pena de o segurado pagar um valor especulativo muito superior ao custo real do produto adquirido;

    Equidade: Os mesmos riscos devem pagar as mesmas taxas ou taxas semelhantes devem corresponder a riscos semelhantes. No equitativo, por exemplo, que o proprietrio de um apartamento residencial pague a mesma taxa de prmio que o dono de uma fbrica de cortia relativamente ao risco de incndio;

    Flexibilidade: No deve existir rigidez na aplicao de uma taxa. Pelo contrrio, deve ser possvel, dentro de certa medida, variar a taxa para determinado tipo de seguro ou de risco, desde que tal seja justificado;

    Estabilidade: A tarifa deve obedecer a uma estrutura de taxas relativamente estvel durante um perodo de tempo suficientemente grande, possibilitando a construo de estatsticas baseadas nos mesmos parmetros;

    Dinamismo: As tarifas devem ser revistas periodicamente. Com efeito, vo-se sucedendo alteraes com o decorrer do tempo que podem reflectir-se no prprio risco, nas despesas administrativas ou noutros componentes;

    Aco preventiva: fundamental que as tarifas tenham uma componente que estimule as medidas de preveno por parte dos segurados. importante recordar que, embora seja paga a indemnizao resultante de um sinistro, este traduz-se sempre em prejuzos para o segurado e/ou para o lesado.

    Tarifa de seguros

    Dinamismo Equidade Adequao Acopreventiva Flexibilidade Estabilidade Figura 2 Critrios da tarifa de seguros

    A definio de uma tarifa implica conjugar vrios factores internos e externos companhia de seguros, sendo que cada um tem uma importncia relativa e nenhum pode ser esquecido. Caso contrrio, as seguradoras comprometem a sua actividade sob pena de no cobrar o devido valor pelo risco aceite ou, pelo contrrio, cobrar em demasia mas afastando potenciais clientes.

  • 16

    De facto, uma incorrecta definio de uma tarifa pode implicar a falncia de uma companhia de seguros e, consequentemente, a no resposta pelas responsabilidades entretanto aceites. Numa tentativa de evitar este cenrio, a actividade seguradora regulamentada por vrias entidades.

    1.7. Entidades reguladoras As empresas de seguros e fundos de penses assumem responsabilidades pelo pagamento de indemnizaes e prestaes que, por vezes, s se concretizam a longo prazo, como acontece, por exemplo, nos seguros de vida. Da que, praticamente em todos os pases do mundo, existam as denominadas "autoridades de superviso de seguros", que vigiam a capacidade das seguradoras e das entidades gestoras de fundos de penses para assumirem e respeitarem os compromissos. Em Portugal, esta entidade o Instituto de Seguros de Portugal (ISP). Juridicamente, o ISP uma pessoa colectiva de direito pblico, dotado de autonomia administrativa e financeira. As suas receitas provm, essencialmente, de uma taxa paga pelas entidades sujeitas a superviso e tem como principal funo a elaborao de normas tcnicas e a participao na feitura de diplomas legais que regulam o acesso e exerccio da actividade seguradora em Portugal (ISP, 2005b). Tambm possui uma funo de superviso que consiste no acompanhamento das seguradoras, mediadores e sociedades de fundos de penses e na vigilncia do cumprimento das normas legislativas que regem o sector. Alm disso, o ISP coopera, a nvel internacional, com diversas organizaes na discusso dos principais problemas que afectam a actividade seguradora e na procura das respectivas solues (ISP, 2005b). Na tentativa de representar e defender os interesses das seguradoras, foi criada, em 1982, a Associao Portuguesa de Seguradores (APS). uma associao patronal, sem fins lucrativos, que rene companhias de seguros e resseguros que operam no mercado nacional, independentemente da sua natureza jurdica ou da sua nacionalidade. Actualmente, a APS representa mais de 99% do mercado segurador, quer em volume de negcios, quer em efectivos totais empregados (APS, 2005a). Como principais objectivos, destacam-se os seguintes:

    Representar e defender os interesses dos Associados a nvel nacional e internacional;

    Promover a cooperao entre Associados e veicular e defender as suas posies comuns;

    Contribuir para a modernizao, o prestgio e o desenvolvimento do sector; Prestar apoio aos Associados, nomeadamente atravs da realizao de estudos

    tcnicos e Organizar e gerir servios de interesse comum para as empresas do sector.

  • 17

    A APS tambm disponibiliza um conjunto de servios de troca de dados entre as seguradoras. Como exemplos dessa informao est o Ficheiro Nacional de Matrculas, onde cada companhia de seguros divulga informao sobre a gesto da sua carteira automvel, permitindo s outras seguradoras fazer uma pr-anlise sobre determinada matrcula ou segurado, e o ficheiro de Sinistros e Fraudes, onde cada seguradora divulga as fraudes detectadas nos processos de sinistro (APS, 2005b). A APS membro de diversos organismos internacionais, entre eles o Comit Europeu de Seguros e a Presse Internationale des Assurances. O Comit Europeu de Seguros tem como principal objectivo representar os interesses comuns das seguradoras europeias atravs do incentivo cooperao entre os membros e da partilha de informao e experincias vividas. Por sua vez, a Presse Internacional des Assurances uma organizao internacional, fundada em 1954 em Paris pela Insurance Press. Os seus principais objectivos so a troca de informao, artigos e documentos relevantes sobre a actividade seguradora, em particular na Europa e nos Estados Unidos da Amrica (EUA). Enquanto que a APS tem como misso apoiar o negcio das seguradoras associadas como empresas, o ISP tem como misso legislar o sector segurador em Portugal. a este organismo que compete elaborar normas tcnicas e supervisionar o comportamento dos operadores, tanto na gesto da carteira actual como na definio de novos produtos/ramos. Apesar desta superviso, as companhias de seguros tm total liberdade para gerir os seus processos de negcio, estando apenas limitadas pelos recursos materiais e humanos de que dispem. De facto, a execuo dos vrios processos inerentes ao negcio que diferencia as seguradoras, uma vez que o conceito base partilhado por todos os intervenientes. Isto , todas as seguradoras aceitam um risco mediante o pagamento de um prmio, sendo esta aceitao materializada num documento designado de aplice.

    1.8. Aplice Basicamente, o incio de todo o processo do seguro est no contacto que um potencial cliente, particular ou organizao, estabelece com a companhia de seguros, atravs de um balco da prpria companhia ou de uma outra entidade que a represente, designada por mediador. Este mediador pode ser um balco de um banco, uma pessoa particular ou uma empresa, sendo que todas estas entidades carecem de um parecer legal para exercer tal actividade. O interesse do potencial cliente prende-se com o facto de pretender segurar um bem, que pode ser um objecto, um ser vivo ou parte deste, contra determinados riscos que possam ocorrer. Uma casa, o respectivo recheio, um automvel, um barco, um avio ou a vida de uma pessoa so exemplos de itens susceptveis de possuir um seguro.

  • 18

    A Figura 3 ilustra um possvel ciclo de vida da produo de um contrato de seguro. O interesse de efectuar um seguro traduz-se numa proposta que, em termos gerais, um documento escrito onde constam dados genricos do contrato, tais como a data da proposta, a assinatura e, por vezes, o montante do prmio que pode ser exacto ou aproximado; os dados pessoais do potencial cliente, tais como o nome, a morada e a data de nascimento; os dados do bem a segurar, tais como o valor em novo, o valor de reconstruo, a designao e a data de construo, e os riscos que se pretende contratar como, por exemplo, o risco de incndio, de roubo ou de inundao. O conjunto destes dados conhecido como condies particulares.

    Figura 3 Ciclo de vida da produo de um contrato de seguro

    A proposta recepcionada pela entidade que representa a companhia e encaminhada para os servios de anlise de risco. Com base nos dados da proposta e outras informaes decorrentes do negcio da prpria companhia ou de entidades terceiras, os peritos de risco, que podem pertencer aos quadros da companhia de seguros e/ou serem especialistas contratados a empresas terceiras, determinam o risco que a proposta representa para a companhia. Desta anlise resulta a aceitao, ou no, da proposta, tendo em conta uma estimativa de lucro por parte da seguradora. Caso a proposta seja aceite, emitida a respectiva aplice e

  • 19

    o potencial cliente passa a ser o tomador do seguro. Tambm pode acontecer o caso de a proposta ter uma aceitao condicionada. Neste caso, a seguradora no aceita a proposta inicial, mas prope alteraes proposta ou s caractersticas do bem a segurar para a concretizao do negcio. Nos ramos com uma anlise mais complexa, como o caso do ramo incndio industrial ou do ramo transportes, a aceitao de uma proposta precedida, na maioria dos casos, por uma anlise de risco presencial. Isto , os peritos de risco deslocam-se at ao local e verificam inmeros aspectos, destacando-se:

    As condies em que se encontram os bens a segurar; A composio do bem, isto , que tipos de material compem o objecto; Os sistemas de preveno existentes, relativamente aos riscos a segurar; A sua localizao geogrfica e As informaes pessoais do tomador de seguro.

    Esta deslocao no terreno permite aos peritos obter informao mais pormenorizada sobre o risco, contribuindo para uma melhor deciso quanto aceitao ou recusa da proposta. Nos ramos com uma anlise mais simples, como o caso do ramo viagens, as companhias de seguros possuem pacotes standards em que os prmios a pagar esto apenas indexados aos capitais seguros. Regra geral, nestes casos no h lugar a uma anlise de risco prvia: os seguros so tacitamente aceites. Na anlise de risco est tambm includa a anlise da acumulao do risco, isto , a concentrao de aplices numa determinada zona geogrfica. Esta situao aumenta a responsabilidade dos seguradores, uma vez que vrios seguros esto dependentes de um nico acontecimento, sendo a localizao geogrfica determinante nesta classificao. Por exemplo, a ocorrncia de um sinistro num porto pode envolver vrias mercadorias de vrios navios ou a ocorrncia de um sinistro numa zona residencial pode envolver vrias habitaes, estando estes objectos seguros na mesma companhia. Outra varivel de entrada na anlise de risco a existncia de uma franquia. Como franquia, entende-se o valor que fica a cargo do tomador de seguro aquando do pagamento da indemnizao (este suporta uma parte do custo). A franquia permite reduzir o prmio, visto que o risco no transferida na totalidade para a companhia de seguros, ficando o tomador de seguro responsvel por uma parte do prejuzo. Uma vez constituda a aplice, esta d origem criao de um ou vrios movimentos, denominados avisos de pagamento de prmios, que o tomador do seguro obrigado a pagar para garantir a vigncia do contrato, regularizando, desta forma, o movimento. S mediante o pagamento que a aplice tem efectiva existncia. O valor a pagar, calculado com base nos dados constantes da aplice, o somatrio de diversas parcelas, tais como impostos, encargos de gesto da aplice e custo de cada risco coberto. Pelo facto de o pagamento dos prmios antecipar o pagamento das indemnizaes (o cliente paga, antecipadamente, um servio que pode no ser prestado a resoluo de um sinistro), uma parte importante das receitas levada constituio de reservas tcnicas. As reservas tcnicas so utilizadas pelas companhias de seguros para adquirir bens

  • 20

    imobilirios, fazer emprstimos, comprar ttulos de crdito ou fazer depsitos bancrios, transformando-se assim em investidores institucionais (SANTOS, 1991b). de notar que uma companhia de seguros um agente econmico activo. Como qualquer outra empresa, rege-se por regras de gesto que lhe definem a necessidade permanente de optimizar os seus resultados (MORAIS, 1993). Como tal, as seguradoras devem possuir mecanismos que lhes permitam vender o maior nmero de contratos possvel. No entanto, tambm devem considerar o risco associado aos contratos, na medida em que a verificao de um risco implica a participao de um sinistro.

    1.9. Sinistro Um seguro s avaliado pelo cliente quando ocorre um sinistro e o participa companhia de seguros. neste momento que so prestados os servios que foram contratados no acto da compra, isto , na assinatura do contrato. O sinistro pode ser definido como qualquer evento susceptvel de fazer funcionar as coberturas (riscos) de uma aplice (SILVA, 1994). A ocorrncia de um sinistro faz activar um conjunto de procedimentos, internos e externos seguradora, para a respectiva regularizao. Aquando da ocorrncia de um sinistro, pode haver a necessidade de recorrer a um servio de assistncia que actua como primeiros socorros. Este servio pode ser prestado quer pela companhia de seguros, quer por entidades terceiras que possuem protocolos com a respectiva seguradora, quer ainda por entidades pblicas. Por exemplo, um sinistro de automvel pode necessitar, como servios de primeira linha, de um reboque para o transporte do veculo paralisado e de uma ambulncia para o transporte dos feridos. Estas entidades so deslocadas para o local do acidente tendo em conta variveis como:

    O local do sinistro; O tipo do sinistro (por exemplo, se automvel ou incndio); A dimenso do sinistro (por exemplo, quantas pessoas e objectos esto afectados) e A necessidade de cuidados mdicos.

    As seguradoras recorrem subcontratao de alguns servios executados no ps-sinistro devido ao elevado custo que representa criar uma rede de prestadores de servios, tais como mecnicos, mdicos, clnicas, hospitais, transporte de doentes ou transporte de automveis. H maiores proveitos, tanto financeiros como de qualidade, em contratar estes servios a terceiros, uma vez que as empresas so especializadas e conseguem, facilmente, contactar os profissionais prestadores do servio. Nos casos em que h subcontratao, as seguradoras funcionam como um mero intermedirio ou canal de distribuio entre o cliente e a empresa que presta o servio, embora o servio seja prestado em nome da companhia de seguros.

  • 21

    A contratao de terceiros tambm benfica para os contratos de seguro cujos servios podem ser executados fora do territrio nacional, isto , com um mbito internacional. As empresas subcontratadas pelas seguradoras pertencem, regra geral, a grupos internacionais ou possuem ligaes com congneres estrangeiras, traduzindo-se numa rede de prestadores de servios a nvel mundial. A Figura 4 retrata um possvel fluxo de trabalho para a seguradora na regularizao de um sinistro. Aps a assistncia de primeira linha, constituda por servios de reboque, servios ambulatrio ou outros, feita a participao do sinistro companhia de seguros. Esta participao, que inclui todos os dados necessrios para a companhia de seguros caracterizar o acontecimento, pode ser feita pelo tomador de seguro ou por pessoas terceiras aplice/seguradora. Aqui, verifica-se que o cliente da companhia tambm o sinistrado/lesado, aquele que reclama o sinistro e recebe a indemnizao, que pode no ser o tomador de seguro, aquele que pagou o prmio da aplice.

    AssistnciaPrimeira linha

    Participao

    Pr-anlise

    Abertura

    Organizao fsicado processo

    Instruo doprocesso

    Instruo internaInstruo externa

    Anlise

    Deciso interna

    Acordo Desacordo

    Discusso

    ReconstituiesArbitragens

    Tribunal AcordosSentenas

    Emisso de recibos

    Indemnizao Reembolso

    Encerramento

    Ocorrncia

    Figura 4 Regularizao de um sinistro

  • 22

    A regularizao de um sinistro um processo que pode ser bastante penoso para as pessoas afectadas. No sentido de tornar todo o processo de sinistro mais simples, a APS criou o conceito Indemnizao Directa ao Segurado (IDS), aplicado exclusivamente ao ramo automvel e s companhias de seguros aderentes a este protocolo. Basicamente, o IDS consiste no facto de o lesado, em vez de se dirigir companhia do responsvel pela ocorrncia do sinistro, se dirige seguradora onde contratou o seguro e onde conhece as pessoas. Esta toma conta da ocorrncia, troca informaes com a outra companhia envolvida no sinistro e paga as respectivas indemnizaes ao sinistrado. Estes pagamentos sero, posteriormente, reclamados companhia responsvel pelo respectivo pagamento, processo este transparente para o sinistrado. um sistema que visa beneficiar todas as partes envolvidas no processo, pois os intervenientes conhecem-se, facto que pode facilitar a comunicao. Aps a recepo da participao, a seguradora inicia um processo de pr-anlise, no sentido de verificar se o sinistro , ou no, enquadrvel nos termos da aplice. So procedimentos tais como verificar se a aplice est em vigor data do sinistro, se no h prmios em dvida ou se a aplice possui as coberturas apropriadas. Estando todos os dados coerentes, feita a abertura do processo. A abertura de um processo d incio a todo um fluxo de trabalho, envolvendo vrias entidades. Destas entidades, destacam-se os peritos de seguros, internos ou externos seguradora, que tm por misso reunir toda a informao til para caracterizar o sinistro. Os peritos so distribudos por reas geogrficas, no sentido de optimizar as deslocaes necessrias, tanto em tempo como em distncias percorridas, uma vez que quanto mais rpida a resposta do perito, mais rpido o incio da reparao. Por sua vez, os peritos tambm podem recorrer aos servios de outras entidades, por exemplo, mdicos ou advogados, especializadas no risco afectado, para verificar a existncia vlida do sinistro, com o objectivo de descartar a hiptese de fraude. No final da instruo, emitido um parecer sob a forma de um relatrio de peritagem. Se o relatrio no apresentar anomalias, a companhia de seguros aceita o sinistro, dando ento incio ao pagamento da respectiva indemnizao ou reparao do bem afectado. Se no h acordo quanto s decises (por exemplo, o lesado no concorda com o valor proposto para indemnizao), a seguradora tenta negociar outra proposta. Caso no seja possvel ultrapassar as divergncias, aberto um processo de contencioso onde o tribunal decidir a responsabilidade de ambas as partes. Para alm do servio executado no momento do acidente, as companhias de seguros podem tambm auxiliar o cliente na escolha dos prestadores de servios para a reparao do bem afectado: qual a melhor oficina para consertar o automvel, qual a melhor clnica ou mdico para tratar a leso, entre outros. As companhias de seguros podem possuir acordos com redes de prestadores de servios, traduzindo-se em vantagens quer para a companhia, que pode beneficiar de preos mais baixos, quer para a pessoa lesada, que pode beneficiar de uma reparao mais rpida.

  • 23

    a conjugao de todos estes servios prestados aps o sinistro que determina o grau de satisfao do cliente perante o seguro adquirido. No entanto, a execuo destas actividades est condicionada a um fenmeno que ameaa o negcio dos seguros e que contribui para um ambiente de desconfiana: a fraude.

    1.10. Fraude O contrato de seguro , em teoria, um contrato de boa f entre duas partes e tem como objectivo dar cobertura a um determinado bem, que pode ser um objecto ou a vida de um qualquer ser. De um lado, o segurado compromete-se a pagar uma quantia para fazer face quilo que deseja segurar. Por outro, a seguradora compromete-se a repor a perda desse bem, mediante o recebimento daquela quantia (CERTASEGUROS, 2005; PONTES, 2005). No desenvolvimento de um produto, a seguradora considera uma srie de variveis e procedimentos que influenciam o preo final a pagar pelo cliente. O poder de compra da populao uma dessas variveis. Se h um grande poder de compra, h uma maior expanso de vendas de seguros. Se h baixo poder de compra, h uma menor venda de seguros. Para alm das poucas vendas, tambm h dificuldades de cobrana e h tendncia para aumentar o nmero de fraudes. A fraude uma mentira ou um acto de m f. um crime que distorce completamente a relao de equilbrio entre a anlise de risco efectuada e o prmio correspondente. O nmero de sinistros no espelha a realidade do risco mas contribui para altos ndices de sinistralidade, isto , seguros efectuados versus sinistros ocorridos (SANTOS, 1991b). Para suportar os custos dos sinistros, as seguradoras acabam por aumentar o valor dos prmios, o que constitui tambm um prejuzo para os segurados em geral, especialmente os bons consumidores. Assim, a fraude mais uma varivel considerada aquando da criao de um novo produto ou tarifa (CONSULTORJURDICO, 2005). Uma das principais causas de fraude nos seguros a sua facilidade de execuo. As fraudes so cada vez mais sofisticadas, dada a utilizao dos meios tecnolgicos de informao e comunicao, o que dificulta a determinao da veracidade do acto. Existem fraudes de diversa natureza, das quais se destacam:

    Sinistros no ocorridos mas participados como tendo acontecido; Sinistros causados propositadamente; Sinistros ocorridos sem a garantia do seguro, mas participados aps se segurar o

    risco, viciando-se as datas do sinistro e incio da garantia; Sinistros participados com descrio das circunstncias diferente da realidade; Sinistro participado vrias vezes e Reclamaes exageradas em relao ao valor real do dano.

    Dependendo, essencialmente, da imaginao dos segurados, muitas outras formas de fraudes podem ser aplicadas aos seguros.

  • 24

    Como tal, algumas companhias de seguros preferem pagar o sinistro, ainda que existam indcios de fraude. Isto porque o custo para provar a fraude pode ser significativamente maior do que o custo da reparao do bem, para alm da forte presso exercida nas seguradoras para a liquidao dos sinistros. A existncia de fraude no se limita a alguns seguros. No limite, todos os produtos vendidos so alvo desta prtica, o que implica que as seguradoras possuam uma poltica de deteco de infractores e tambm de sensibilizao junto dos clientes. Numa tentativa de apoio s companhias associadas, a APS desenvolveu o Ficheiro de Sinistros de Fraudes, cujo objectivo disponibilizar informao sobre as fraudes registadas. Detectar as fraudes e reduzir os sinistros so dois objectivos principais de qualquer companhia de seguros, na medida em que a existncia de fraudes falseia os resultados da carteira de seguros e a existncia de sinistros representa um custo. No entanto, estes objectivos no se podem sobrepor ao de vender mais e melhores produtos. Embora o desenvolvimento de um produto deva considerar a existncia de fraudes, este tambm deve ser produzido no sentido de satisfazer as necessidades dos consumidores e deve obedecer classificao dos ramos de seguros.

    1.11. Os ramos de seguros Um ramo de seguros um conjunto de operaes ou actividades relativas a contratos de seguros da mesma natureza. Como exemplos de ramos h os ramos de incndio, de vida ou de automvel (CERTASEGUROS, 2005; SILVA, 1994). Dada a grande diversidade dos ramos de seguros existentes no mercado (Tabela 1), o cidado comum no consegue, normalmente, determinar que tipos de seguros deve contratar para cobrir todo o seu patrimnio, material e corporal, contra qualquer ocorrncia de riscos. Como forma de colmatar esta lacuna, as companhias de seguros, com o apoio dos mediadores, disponibilizam um servio de consultoria que consiste em analisar o patrimnio e o contexto envolvente e indicar ao potencial cliente os vrios seguros que deve possuir. Este servio tambm funciona como uma forma de incentivar os potenciais clientes para a necessidade de proteco e de segurana que podem ser alcanadas atravs dos contratos de seguro. No entanto, para os seguros facultativos, cabe ao tomador efectuar, ou no, o seguro. Pelos relatrios estatsticos publicados pelo ISP e pela APS (Anexo 1 Estatsticas), verifica-se que alguns ramos tm um forte peso na carteira de seguros das companhias, isto quanto ao nmero de aplices, ao valor dos prmios recebidos e ao valor das indemnizaes pagas. Destes relatrios, possvel constatar que os seguros dos ramos vida, automvel, acidentes de trabalho, roubo e incndio e elementos da natureza (estes ltimos dois ramos esto agrupados na rubrica Incndio e outros danos nas figuras do anexo 1) se destacam dos outros ramos. Um ramo tambm muito particular o ramo de transportes que, embora no tenha um volume de facturao comparvel ao ramo automvel, uma vez que no um seguro de

  • 25

    massas, um seguro muito utilizado, dada a globalizao dos mercados e o consequente transporte de matrias por todo o mundo. Alm disso, um seguro com uma gesto muito complexa, na medida em que h o envolvimento de vrios meios de transporte, pessoas a manipular a mercadoria, pases e diferentes legislaes. De seguida, feita uma breve descrio tcnica destes ramos de seguros, cujo objectivo evidenciar a componente geogrfica que possuem. Dado que os tipos de seguros so em grande nmero e se esgotam apenas na imaginao das pessoas e companhias de seguros (qualquer coisa pode ser segura para qualquer garantia), os ramos a seguir detalhados so os de maior expresso em Portugal.

    1.11.1. O seguro automvel O seguro automvel tem uma componente obrigatria em Portugal: a responsabilidade civil (RC) at certo capital. Como componente facultativa, tem os danos prprios ou um capital para RC superior ao estipulado por lei (ESIA, 2002; MILLENIUMBCP, 2005a; PORTUGALPREVIDENTE, 1990). A RC visa proteger os legtimos interesses das pessoas que, transportadas ou no, possam ser atingidas por prejuzos decorrentes de leses causadas por veculos seguros. Por sua vez, a componente facultativa responde aos danos ocorridos na prpria viatura segura ou aos danos ocorridos no mbito da RC quando o capital afectado e seguro seja superior ao obrigatrio. A obrigatoriedade de segurar recai sobre todas as pessoas que possam ser civilmente responsveis pela reparao de danos patrimoniais e no patrimoniais, decorrentes de leses corporais ou materiais causadas a terceiros por um veculo terrestre a motor. Existem algumas excepes aplicadas aos veculos, como o caso dos veculos de caminho de ferro ou das mquinas agrcolas no sujeitas a matrcula e algumas excepes aplicadas s pessoas, como o caso do Estado Portugus ou Estados estrangeiros (ESIA, 2002). So vrias as caractersticas que podem influenciar a classificao do risco e, por conseguinte, o valor do prmio a pagar, destacando-se:

    A categoria do veculo, determinada atravs da cilindrada, peso bruto, nmero de lugares, transporte de passageiros, mercadorias ou mistos e servio particular ou aluguer;

    O tipos de veculo, como ambulncia, moto cultivadora, empilhador, veculo de higiene urbana ou destinado ao transporte de matrias perigosas;

    A antiguidade do veculo; A quilometragem efectuada num ano; O parqueamento em garagens privadas, pblicas ou na rua; O sexo do condutor; A idade do condutor e A profisso do condutor.

  • 26

    A zona geogrfica, correspondente morada do tomador de seguro, tambm considerada como varivel na tarifao. Algumas companhias de seguros dividem o pas em zonas de risco, considerando zonas como Lisboa ou Porto de alto risco e zonas como o Alentejo de baixo risco. Esta classificao considera factores como a quantidade de viaturas registadas na zona, quantidade de ruas ou ndices de sinistralidade. Numa tentativa de segmentar os segurados e diminuir a sinistralidade, as companhias de seguros implementaram o sistema de bnus-malus. Este sistema assenta em descontos e agravamentos aplicados ao prmio base, mediante o nmero de sinistros ocorridos na vigncia do contrato (ESIA, 2002; MILLENIUMBCP, 2005a). A Tabela 2 ilustra um exemplo de um esquema de bnus-malus. Pela Tabela 2, possvel verificar que, por exemplo, se a aplice est na classe 9 e decorre um perodo de tempo sem sinistros, esta passa para a classe 10 com uma bonificao de 45% (taxa de prmio de 55%). Por outro lado, se ocorre 1 sinistro, a aplice retrocede para a classe 6 e, se ocorrem 3 sinistros, para a classe 3, com um agravamento de 55% (taxa de prmio de 155%).

    Tabela 2 Exemplo de um sistema de bnus-malus Classe atribuda no caso de

    Classe Taxa prmio 1 Sinistro 2 Sinistros 3 Sinistros + 4 Sinistros 10 55 % 6 4 3 1 9 60 % 6 4 3 1 8 65 % 5 2 1 1 7 75 %