teoria geral e história do pensamento jurídico apostila 3º e 4º bimestres - 2011

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TEORIA GERAL E HISTÓRIA DO PENSAMENTO JURÍDICO Prof. José E. Melhen - 3º e 4º bimestres - 2011 1 Direito Romano Conceito É o conjunto de normas e princípios que regeram a sociedade romana desde suas origens (754 aC) até 565 dC (morte do Imperador Justiniano). O Direito Romano não é um ponto, é uma linha. É a evolução de um direito desde a fundação de Roma até a morte do Imperador Justiniano, um direito que influenciou quase todo o mundo ocidental e vastas extensões do oriente. São 13 séculos de um evolver constante. Aspectos puramente históricos pouco serão abordados. O enfoque do curso será em torno das instituições de Direito Privado Romano. História Externa e Interna do Direito Romano História Externa – corresponde à análise das instituições políticas, das fontes de cognição e jurisprudência romanas. Alemães e italianos preferem chamá-la História do Direito Romano. História Interna – refere-se ao estudo das Instituições de Direito Privado. Alemães e italianos preferem chamá-la Instituições de Direito Romano. Períodos da História Externa 1) Período Real – das origens de Roma à queda da realeza em 510 aC 2) Período Republicano – 510 aC a 27 aC, quando o Senado investe Otaviano – futuro Augusto – no poder supremo com a denominação de princeps

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TEORIA GERAL E HISTÓRIA DO PENSAMENTO JURÍDICO Prof. José E. Melhen - 3º e 4º bimestres - 2011

1

Direito Romano

Conceito

É o conjunto de normas e princípios que regeram a sociedade romana desde suas

origens (754 aC) até 565 dC (morte do Imperador Justiniano).

O Direito Romano não é um ponto, é uma linha. É a evolução de um direito desde a

fundação de Roma até a morte do Imperador Justiniano, um direito que influenciou

quase todo o mundo ocidental e vastas extensões do oriente.

São 13 séculos de um evolver constante.

Aspectos puramente históricos pouco serão abordados.

O enfoque do curso será em torno das instituições de Direito Privado Romano.

História Externa e Interna do Direito Romano

História Externa – corresponde à análise das instituições políticas, das fontes de

cognição e jurisprudência romanas. Alemães e italianos preferem chamá-la História

do Direito Romano.

História Interna – refere-se ao estudo das Instituições de Direito Privado. Alemães e

italianos preferem chamá-la Instituições de Direito Romano.

Períodos da História Externa

1) Período Real – das origens de Roma à queda da realeza em 510 aC

2) Período Republicano – 510 aC a 27 aC, quando o Senado investe Otaviano –

futuro Augusto – no poder supremo com a denominação de princeps

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3) Período do Principado – 27 aC a 285 dC, com o início do dominato por

Diocleciano

4) Período do Dominato – 285 dC a 565 dC, data em que morre Justianiano

Períodos da História Interna

1) Direito antigo ou pré-clássico – das origens de Roma à Lex Aebutia, de data

incerta, compreendida aproximadamente entre 149 ou 126 aC.

2) Direito clássico – 149 ou 126 aC até o término do reinado de Diocleciano em 305

dC

3) Direito pós-clássico – 305 dC até a morte de Justiniano, em 565 dC.

3.1) Chama-se Direito Justinianeu o direito vigente na época em que reinou

Justiniano, de 527 a 565 d C.

Direito Pré-clássico (754aC a 149 ou 126aC)

Características:

A base jurídica de tal período era ius civile, aplicável somente aos cidadãos

romanos e baseado nos costumes antigos e na Lei das XII Tábuas (apresentada

em 12 tábuas de bronze no Fórum Romano em 499 aC).

Vai da criação de Roma até o começo das guerras púnicas (séc. III aC).

Sociedade simples, rústica e agrícola. Logo, o direito era extremamente formal e

solene.

A jurisprudência era monopolizada pelos pontífices (igreja), os únicos autorizados a

emitirem pareceres jurídicos.

Havia, portanto: formalismo, rigidez, materialismo e uma constante atuação dos

jurisconsultos na construção do ius civile.

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Formalismo/materialismo – não importava a vontade de quem praticava o ato, mas

sim que ele cumprisse a observância da forma.

Ex. formalismo = Digesto, liv. XLI, tít. 1, fr. 5, pr 1

Se usasse o termo uites (videiras), ao invés de arbores (árvores), como estabelecia

a lei, somente por isso perderia a ação.

Ex. materialismo = uma obrigação contraída em virtude de coação ou dolo, era

válida desde que tivesse havido a estrita obediência às formalidades legais.

Nessa época, como dito, o direito traduzia-se no chamado ius civile (normas

costumeiras e raros preceitos legais, notadamente da Lei das XII Tábuas,

aplicáveis aos cidadãos romanos) e desenvolveu-se pela atuação dos

jurisconsultos (no início, pontífices, depois, juristas leigos).

Partindo de normas costumeiras e de preceitos da Lei das XII Tábuas, os

jurisconsultos romanos, com emprego de técnicas jurídicas vão criando o direito.

A atividade criadora da jurisprudência não era arbitrária. Os juristas somente

podiam criar direito mediante a adaptação de normas costumeiras ou legais

existentes às novas exigências sociais.

Direito Clássico – (149 ou 126 aC até 305 dC)

Roma está mais evoluída, especialmente no comércio, tornando-se uma cidade

cosmopolita.

Antigos agricultores agora estão dominando o mundo por conta das conquistas

romanas. Essa evolução, especialmente a comercial, passa a exigir um direito civil

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mais flexível, mais atuante, sem a rigidez e os entraves do passado. O direito

alcança o porte de maior exatidão e grandeza.

As três características do Direito Pré-Clássico entram em decadência.

Formalismo é substituído por celeridade.

A maior parte das inovações e aperfeiçoamentos do direito foi fruto da atividade

dos magistrados e jurisconsultos que, em princípio, não podiam modificar as regras

antigas, mas que, de fato, introduziram as mais revolucionárias modificações para

atender às exigências práticas de seu tempo.

O pretor era um magistrado que tinha por incumbência funções relacionadas com a

administração da justiça. Cuidava da primeira fase do processo entre particulares,

verificando as alegações das partes e fixando os limites da demanda, para remeter

o caso posteriormente a um juiz particular. Incumbia a esse juiz verificar a

procedência das alegações diante das provas apresentadas e tomar sua decisão.

Havia pretor para os casos entre cidadãos romanos (pretor urbano) e havia

também, a partir de 242 aC, o pretor para os casos que figuravam estrangeiros,

chamado pretor peregrino. Isso porque o ius civile aplicava-se exclusivamente aos

cidadãos romanos e no final do século III aC Roma era um centro comercial ao

qual afluíram estrangeiros de diversas nacionalidades. Surgiu então a necessidade

de se disciplinar juridicamente as relações comerciais dos estrangeiros entre si, ou

com os romanos.

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O pretor, como magistrado, tinha um amplo poder de mando, denominado

imperium, poder do qual ele se utilizou especialmente a partir da edição da Lex

Aebutia, no século II aC.

As diretrizes que o pretor ia observar eram publicadas no seu Edito, ao entrar no

exercício de suas funções. Como o cargo de pretor era anual, os editos sucediam-

se, acumulando-se experiências valiosíssimas.

Ius praetorium est, quod praetores introduxerunt adiuvandi vel supplendi vel

corrigendi iuris civilis gratia propter utilitatem (O direito pretoriano é aquele que os

pretores introduziram para secundar, ou suprir, ou corrigir o direito civil, tendo em

vista o interesse público).

Outra característica do período: originariamente a interpretação do Direito cabia

aos sacerdotes. A partir do século IV aC, esse monopólio sacerdotal da

interpretação cessou, passando ela a ser feita também por leigos. Tal atividade

jurisprudencial contribuiu grandemente para o desenvolvimento do Direito Romano,

especialmente pela importância social que os juristas tinham em Roma. Os juristas

de maior destaque

O método dos jurisconsultos romanos era casuístico; eram avessos às abstrações

dogmáticas e às especulações e exposições teóricas.

Em 367 aC cria-se o cargo de pretor urbano, magistrado encarregado da jurisdição

civil. Suas decisões constituem o chamado ius honorarium: honos, honra. Aplicava,

completava, supria e/ou reformava as regras do antigo ius civile. É um direito

eminentemente jurisprudencial.

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Também nessa época surge o ius gentium, aplicável aos estrangeiros (peregrinos)

e aos cidadãos romanos. Isso ocorre em virtude da evolução comercial em Roma.

Em 242 aC: cria-se o cargo de pretor peregrino, juiz para os estrangeiros de cuja

atividade resultou o ius gentium.

O imperador Augusto (27 aC/14dC) introduziu o ius respondendi ex auctoritare

principis, que conferiu a jurisconsultos mais conhecidos e apreciados o privilégios

de darem pareceres sobre questões de direito em nome do próprio imperador.

Tais pareceres vinculavam o juiz da causa, por ocasião do julgamento. Se

houvessem pareceres contrastantes e de igual peso, o juiz estava livre para decidir.

Direito Pós-Clássico

É a época da decadência em quase todos os setores.

Deixam de existir os grandes jurisconsultos, os sistematizadores da Ciência

Jurídica.

Surgem, então, os compiladores. Vive-se do legado dos clássicos que, porém, teve

de sofrer uma vulgarização para poder ser utilizado na nova situação caracterizada

pelo rebaixamento de nível em todos os campos.

O direito passa a ser elaborado pelo Estado.

Nesse período, pela ausência do gênio criativo, sentiu-se a necessidade de fixação

definitiva das regras vigentes, por meio de uma codificação que os romanos, em

princípio, desprezavam.

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A partir do século III dC (230dC) ocorre a vulgarização do direito romano, ou seja,

sua expansão por todas as províncias do império. O Direito romano perde seu

caráter nacional e transforma-se em direito universal, embora com prejuízo do

pensamento e da técnica jurídica da época clássica.

Justiniano, atento a isso, resolve salvar o direito romano, mediante uma técnica,

até então, avessa ao pensamento romano: a compilação. Daí resultou o que se

denominou no século XVI dC “Corpus Iuris Civilis”.

Justiniano, portanto, empreendeu grandiosa obra legislativa, mandando colecionar

oficialmente as regras de direito em vigor na época. Encarregou uma comissão de

juristas de organizar uma coleção completa das constituições imperiais (leis

emanadas dos imperadores) que foi completada em 529 dC e publicada sob a

denominação de Codex (não possuímos tal texto).

Em 530 dC Justiniano determinou que se fizesse uma seleção das obras dos

jurisconsultos clássicos, encarregando de tal tarefa Triboniano, que convocou uma

comissão para proceder ao trabalho. 3 anos após estava confeccionado o Digesto

(ou Pandectas). Os codificadores tiveram autorização de alterar os textos

escolhidos, para harmonizá-los com os novos princípios vigentes (interpolações).

Paralelamente à codificação do Digesto, Justiniano mandou preparar uma nova

edição do Codex, que foi publicada em 534 dC.

Além dessas obras, Justiniano incumbiu Triboniano, Teófilo e Doroteu de

elaborarem um manual para estudantes, que foi modelado na obra clássica de

Gaio (séc. II aC). Tal manual foi denominado Institutas e foi publicado em 533 dC.

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De 535 a 565 dC Justiniano publicou um grande número de novas leis, chamadas

novallae constitutiones (ou novelas de Justiniano).

Assim, o Codex, o Digesto, as Institutas e as Novelas formaram o chamado

Corpus Iuris Civilis, codificação que preservou o Direito Romano para a

posteridade.

A palavra Direito pode ser tomada em 2 acepções:

direito objetivo (norma agendi)

direito subjetivo (facultas agendi)

Direito Objetivo

Significa, primeiramente, a norma agendi, a regra jurídica.

É o conjunto de normas gerais e abstratas impostas coercitivamente para

disciplinar a conduta dos homens em sociedade.

Ex. Direito Civil Brasileiro, Direito Romano (complexo de normas).

A regra jurídica contém, além do mandamento regulamentador da conduta humana

(norma agendi), uma outra disposição: a de estabelecer as conseqüências para o

caso de transgressão da norma (sanctio).

Direito Subjetivo – é a faculdade de agir, a possibilidade de exigir um

comportamento alheio. Ex. direito de crédito em face de outrem; direito à

tranqüilidade quando esta é violada.

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A sanção (sanctio), em caso de violação da norma jurídica, pode ser de 2 tipos:

Nulidade (restitutiva) - prevê a invalidade/ineficácia do ato. Ex. menor impúbere

vender bem imóvel sozinho, sem representante.

Penalidade (punitiva) - prevê uma pena para o transgressor. Ex. cobrar dívida já

paga.

Lex Perfecta - quando a norma jurídica estabelece a sanção de nulidade do ato

praticado. Ex. venda efetuada por pródigo interditado.

Lex Minus Quam Perfecta - é a regra cuja sanção comina uma punição. Ex.

demandar dívida já paga.

Lex Imperfecta - falta sanção, não comina a nulidade do ato infringente nem

qualquer penalidade. Ex. Lex Cincia, de 204 aC, que proibia a doação além de um

certo valor.

Lex plus quam perfecta – prevê a sanção e a nulidade do ato. Ex. Lex Julia de vi

privata, de 17 aC, previa que se o credor tomasse um bem do devedor à força para

a satisfação de seu crédito, ele deveria devolver o bem e perdia o crédito.

Divisões do Direito Objetivo

Quanto à forma: ius scriptum/ius non scriptum

Ius scriptum – é o direito representado pela lei, senatusconsulto, constituições

imperiais, edito dos magistrados e respostas dos jurisconsultos.

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Ius non scriptum - é o direito consuetudinário, baseado nos costumes.

Quanto à fonte: ius civile/ius honorarium/ius extraordinarium

Ius civile – Ex. costume, lei, senatusconsulto, respostas dos jurisconsultos e

constituições imperiais.

Ius honorarium – Pretor. Ex. Edito dos Magistrados.

Ius extraordinarium – direito elaborado pelo Imperador e seus funcionários. Ex.

Constituições Imperiais.

Quanto à extensão: ius comune/ius singulare

Ius comune – aplicava-se às pessoas, coisas e relações jurídicas em geral.

Ius singulare – aplicava-se a uma certa categoria de pessoas, coisas e relações

jurídicas.

Ex. para as formalidades testamentárias valia o ius comune, para as formalidades

testamentárias dos militares valia o ius singulare.

Quanto ao interesse: ius publicum/ius privatum

Ius publicum – é o que diz respeito ao interesse do Estado Romano. Tinha caráter

cogente. Ex. As partes não podiam alterar os elementos essenciais para a

caracterização de um contrato de compra e venda: res, pretium e consensus.

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Ius privatum – é o que diz respeito ao interesse dos particulares. Tinha caráter

dispositivo. Ex. partes convencionam, em um contrato de compra e venda, que o

vendedor fica isento de responder por vícios ocultos.

Subdivide-se em: ius civile, ius gentium e ius naturale.

Ius civile – é o direito aplicável aos cidadãos romanos.

Ius gentium – é o direito aplicável com relação a cidadão romano (quirites) e

estrangeiro ou estrangeiro e estrangeiro dentro de Roma. Geralmente normas

consuetudinárias aplicáveis a todos os povos.

Ius naturale – é um conjunto de normas ditadas ao homem pela sua própria

natureza racional, e em conformidade com a justiça. É um direito universal.

Fontes do Direito

Fonte, em termos jurídicos, é um termo utilizado para designar o lugar de onde

nasce ou brota o Direito. É uma metáfora para designar os meios de produção do

Direito.

Costume

Era uma fonte exclusiva no Direito pré-clássico

É a observância constante e espontânea de determinadas normas de

comportamento humano na sociedade.

Leis e Plebiscitos

As leis e plebiscitos eram manifestações coletivas do povo.

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As leis (leges rogatae), eram tomadas nos comícios, de que só participavam

cidadãos romanos (populus romanus). Os comícios eram convocados pelos

magistrados para deliberar sobre texto de lei por eles propostos.

Os plebiscitos (plebiscita), forma anômala de fonte de direito, eram decisões da

plebe, reunida sem os patrícios. Ganharam validade a partir da edição da Lex

Hortensia, em 286 aC.

Senatusconsulto

Eram deliberações/pareceres do Senado sobre questões a eles submetidas por um

magistrado (tal opinião não vinculava o magistrado).

Constituições Imperiais

Eram disposições do imperador que não só interpretavam a lei, mas, também, a

estendiam ou inovavam. As denominações variavam, conforme o conteúdo ou

natureza delas:

Edicta: ordenações de caráter geral;

Decreta: decisões do imperador, proferidas num processo;

Rescripta: respostas dadas pelo imperador a questões jurídicas a ele propostas por

particulares em litígio ou por magistrados;

Mandata: instruções dadas pelo imperador, na qualidade de chefe supremo, aos

funcionários subalternos.

Edito dos Magistrados

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O pretor promulgava seu programa ao assumir o cargo, relevando como pretendia

agir durante o ano de seu exercício. Essa atividade normativa manifestava-se

através do edito, como era chamado aquele programa.

O pretor criava normas jurídicas, ao lado das normas do direito quiritário. Essas

novas normas pretorianas não podiam derrogar o direito quiritário, mas existiam

paralelamente a ele.

Embora houvesse a mudança anual dos magistrados, o edito passava a conter um

texto estratificado, fruto da experiência dos antecessores, formando o chamado

edictum traslaticium. Inovações também podiam ser introduzidas pelo novo pretor,

mediante o edito chamado repentinum.

Em 130 dC foi editada, por ordem do Imperador Adriano, foi feita uma compilação

dos editos, obra do jurista Sálvio Juliano, o chamado Edito Perpétuo.

Jurisprudência

É o resultado da experiência dos jurisconsultos na emissão de pareceres do Direito

que inovava e criava novas normas, partindo das existentes, por meio da

interpretação extensiva destas, haja vista a necessidade de interpretação das

regras simples e rígidas.

Tal interpretação pertencia em um período remoto de forma exclusiva aos

pontífices. Posteriormente esse monopólio foi quebrado e os leigos (prudentes)

também puderam exercer a atividade de jurista.

Ex. Lei das XII Tábuas conheceu uma regra que punia com a perda do pátrio poder

o pai que vendesse por 3 vezes seu filho. A partir da interpretação dessa regra,

criou-se o instituto da emancipação: o pai vendia ficticiamente seu filho a um amigo

de sua confiança que libertava o filho logo após a venda. Este retornava à casa de

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seu pai, que, posteriormente o vendia novamente. Após a terceira venda o filho

libertado já não retornava a sujeição do pai.

O imperador Augusto (27 aC/14dC) introduziu o ius respondendi ex auctoritare

principis, que conferiu a jurisconsultos mais conhecidos e apreciados o privilégios

de darem pareceres sobre questões de direito em nome do próprio imperador.

Tais pareceres vinculavam o juiz da causa, por ocasião do julgamento. Se

houvessem pareceres contrastantes e de igual peso, o juiz estava livre para decidir.

Norma Jurídica

Aplicação da Norma Jurídica

A norma jurídica contém disposições abstratas a serem aplicadas aos casos

concretos que a vida apresenta.

Sua aplicação pressupõe o conhecimento perfeito, seguro e completo de dois

elementos:

a norma jurídica abstrata; e

os fatos concretos.

Interpretação – é o ato pelo qual procura-se estabelecer o verdadeiro sentido e

alcance de seu texto, avaliando as palavras do texto da norma para conseguir

obter-se seu significado verdadeiro e certo. A interpretação é uma atividade

indispensável à aplicação da norma abstrata ao caso concreto.

Espécies:

Quanto à fonte:

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1) Autêntica - é a que se faz mediante uma nova norma jurídica.

2) Doutrinária - é a feita por meio do trabalho dos cultores do Direito. Pode basear-

se no exame gramatical, lógico-sistemático ou histórico do texto e de sua origem.

Quanto ao método:

1) Gramatical – consiste em examinar e determinar o sentido que resulta de cada

uma das palavras contidas na norma e sua construção sintática; determina o

significado das palavras do texto da lei;

2) Lógico-sistemática – consiste na análise do pensamento do legislador,

determinando a conexão das diferentes palavras da lei de forma a que se descubra

a razão da lei, os antecedentes que a motivaram e o sentido que se lhes atribuiu,

tudo isso mediante o confronto da norma interpretada com outras que fazem parte

do mesmo sistema jurídico.

Quanto aos resultados:

1) Declarativa - quando confirma o sentido da norma; verifica-se que o espírito da

lei corresponde à sua letra;

2) Restritiva - quando restringe o sentido da norma; verifica-se que a letra da lei era

mais ampla do que o seu espírito (ela disse mais do que pretendera), e, então,

restringe-se a norma para não aplicá-la a casos que, à primeira vista, estavam

compreendidos em seu texto.

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3) Extensiva - quando estende o sentido da norma; verifica-se que a letra da lei era

mais restrita do que seu espírito (a lei dissera menos do que pretendera), e, então,

a estendia para abranger casos que, aparentemente, estavam excluídos de seu

texto.

A arte de bem interpretar a norma jurídica é a grande virtude do verdadeiro jurista

In Claris Cessat Interpretatio - trata-se de brocardo errôneo: para chegar-se à

conclusão de que não há necessidade de interpretação é preciso uma

interpretação prévia (!).

Em caso de ausência de preceito normativo para aplicar ao caso concreto, recorre-

se ao uso da analogia. Analogia é método de integração da norma, não de

interpretação.

Analogia – aplicação de uma norma diferente semelhante em caso de ausência de

norma para regular o caso concreto, presumindo-se a vontade do legislador.

Espécies:

1) Analogia Legis - quando se estende a aplicação de determinada regra a fatos

nela não previstos.

2) Analogia Iuris - é o processo de se criar uma nova norma para ser aplicada a um

caso concreto, com base nos princípios gerais do sistema jurídico vigente.

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Com relação ao pleno conhecimento do caso concreto, existem várias espécies de

provas admitidas para comprovar a existência dos fatos:

documentos;

testemunhas;

depoimento pessoal das partes;

perícias

etc.

Entretanto, por certas vezes o Direito contenta-se em aceitar como verdadeiro um

acontecimento provável, mas não provado (presunção) ou até mesmo com fatos

inverídicos (ficção).

Presunção (Praesumptio)

É a aceitação como verdadeiro de um fato provável, de uma simples alegação sem

necessidade de prova do fato. P. ex. a legitimidade do filho é presumida quando ele

é nascido entre 180 e 300 dias depois da convivência conjugal.

A presunção pode ser:

Simples (praesumptium iuris tantum) – é a que admite prova em contrário. No

exemplo da paternidade presumida, o marido pode apresentar contra-prova. Aceita-

se uma situação provável como verdadeira, dispensando-se a comprovação. Daí

decorre à parte interessada a produção da prova contrária para derrubar a

presunção (inversão do ônus da prova).

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Absoluta (praesumptio iuris et de iure) - não admite prova em contrário. Ex. 1)

Presumia-se ilegítimo o filho nascido além de 300 dias após a dissolução da

sociedade conjugal pela morte do pai. Ex. 2) veracidade da coisa julgada.

Ficção

É diferente da presunção, pois nela o direito considera verdadeiro um fato

inverídico. Ex. 1) considerava-se o nascituro como já nascido, sempre que se

tratava de resguardar seus interesses; 2) considerava-se que o cidadão romano

que fosse feito prisioneiro por algum inimigo fora do território de Roma e em seu

poder falecia como tendo morrido antes de ser capturado.

Eficácia da Norma Jurídica no Tempo e no Espaço

Princípio da Territorialidade – a lei aplicava-se a todas as pessoas, nacionais ou

estrangeiras, residentes em Roma.

Princípio da Personalidade – a lei aplicava-se somente aos cidadãos romanos.

O Direito Romano baseava-se no princípio da personalidade; aos estrangeiros

aplicava-se o ius gentium.

Início de eficácia da norma jurídica

Inicia-se normalmente com sua promulgação, salvo se ela dispuser diferentemente

a respeito da data em que deva entrar em vigor.

Irretroatividade das Normas

A regra geral do direito romano era a da irretroatividade da norma jurídica; as

normas deveriam dispor para o futuro, não para o passado. Entretanto, a norma

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poderia ter efeito retroativo caso o legislador assim o quisesse e desde que

houvesse disposição expressa nesse sentido.

Em caso de retroatividade deveriam ser respeitados o ato jurídico perfeito, o direito

adquirido e a coisa julgada.

Ignorantia legis neminem excusat

A regra jurídica em vigor é aplicável a todos. A ignorância dela não isenta ninguém

de suas sanções (iuris ignorantia cuique nocere).

Exceções à regra:

menores de 25 anos;

mulheres;

soldados;

camponeses (rustici).

Cessação de eficácia da norma jurídica

A norma jurídica deixa de produzir seus efeitos quando termina sua vigência, se o

prazo estiver nela estipulado. Não havendo estipulação de prazo, revoga-se a

norma por uma que lhe seja contrária (lex posterior revocat priori).

A revogação pode dar-se também pelo costume: 1) por norma contrária por ele

introduzida ou 2) pelo desuso.

Sujeitos de Direito

São as pessoas que possam ter relações jurídicas.

Pessoa natural é a pessoa humana.

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TEORIA GERAL E HISTÓRIA DO PENSAMENTO JURÍDICO Prof. José E. Melhen - 3º e 4º bimestres - 2011

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Personalidade é a qualidade de sujeito de direito.

Pessoa Física

É o homem. Sua existência se inicia com o nascimento.

O nascituro não é ainda pessoa, mas é protegido desde a sua concepção e durante

toda a gestação.

O direito romano conheceu essa proteção: considerava o nascituro como já

nascido (ficção), para fins de reservar-lhe vantagens.

O feto tem que nasce com vida e forma perfeita. Não são pessoas o nati-morto, o

aborto e o monstro.

Extingue-se a pessoa física com a sua morte.

O Direito Romano desconhecia a morte presumida pelo desaparecimento por muito

tempo de uma pessoa.

Capacidade Jurídica de Gozo (ou de direito)

É a aptidão, a idoneidade do homem para ser sujeito de direitos e obrigações.

Requisitos:

1) ser livre (status libertatis);

2) ser cidadão romano (status civitatis);

3) ser independente do pátrio poder (status familiae, sui iuris paterfamilias).

Liberdade (Status libertatis)

Os homens podiam ser livres ou escravos.

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Eram livres aqueles que não eram escravos. Escravos não podiam ser sujeitos de

direito; eram apenas objeto de relações jurídicas. Não podiam ter direitos ou

obrigações, nem tampouco, relações familiares no campo do direito.

Eram escravos:

1) os inimigos capturados na guerra;

2) os estrangeiros que pertencessem a um país não reconhecido por Roma, caso

caíssem no poder dos romanos. O mesmo se dava com o cidadão romano que

caísse em mãos do inimigo.

Ius postliminii - O cidadão romano que se tornava prisioneiro de guerra do inimigo,

ao voltar à pátria, recuperava automaticamente a liberdade e todos os direitos que

tinha antes de ser capturado.

3) nascimento: era escravo o filho de escrava, independente da classe social do

pai.

4) pena, ou por insolvência.

5) o filiusfamilias vendido pelo pai fora do território de Roma.

Conteúdo da escravidão:

O escravo não podia ser sujeito de direitos, por faltar-lhe capacidade jurídica de

gozo.

Não podia ter direitos;

Sua união conjugal não era considerada casamento;

Não havia relação de parentesco entre ele, sua mulher e seus filhos;

Não tinha patrimônio (tudo o que adquiria pertencia ao seu dono).

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Entretanto o direito romano sempre reconheceu a personalidade humana do

escravo, distinguindo-o das demais coisas do patrimônio do seu dono (persona

servilis).

Daí:

podia participar do culto religioso da família;

seu túmulo era considerado lugar sagrado;

proibiu-se o dono de seviciar o escravo a partir do período imperial.

podiam impetrar a proteção dos magistrados;

na República o escravo poderia ter um pequeno pecúlio cedido por seu dono para

ele gerir, porém legalmente tal pecúlio continua na propriedade do dono.

A condição de escravo era permanente. O escravo sem dono não se tornava livre.

Continuava escravo, escravo sem dono (res nullius).

A atribuição de liberdade ao escravo fazia-se, ordinariamente, por meio de um ato

voluntário do dono e se chamava manumissão. Havia, contudo, a possibilidade do

escravo obter a liberdade por disposição legal.

Manumissio Vindicta

Era a utilização de um processo judicial em que se discutia a questão da liberdade.

O problema vital da liberdade de uma pessoa era objeto de um processo, que se

chamava vindicatio in libertatem ou vindicatio in servitutem.

Era necessário que a pessoa, de cuja liberdade se tratasse, fosse defendida por

um terceiro, cidadão romano, capaz, chamado defensor da liberdade (adsertor

libertatis).

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As partes no processo eram o dono e o defensor da liberdade. A questão era

resolvida pelo juiz a quem o pretor remetia o caso para a decisão.

O dono geralmente pedia a um amigo que intentasse uma vidicatio in libertatem

perante o pretor, como defensor da liberdade. Quando o defensor declarava sua

fórmula, alegando que o escravo era livre, tocava-o ao mesmo tempo com a

vindicta (varinha), sinal de poder. O dono não contestava e o silêncio dele era tido,

processualmente como uma confissão ou admissão da veracidade das alegações

da outra parte.

O pretor declarava o escravo livre, sem remeter o caso ao juiz.

Manumissio testamento (ou alforria testamentária)

O testador podia determinar no seu testamento que, com sua morte, o escravo

fosse livre.

Posteriormente esse procedimento foi simplificado, passando a ser apenas uma

declaração solene perante o pretor.

Manumissio censu

Processava-se mediante a inscrição, com autorização do dono, do nome do

escravo na lista dos cidadãos livres da idade. A lista era elaborada pelos censores

a cada 5 anos.

Além desses modos de alforria, o pretor reconhecia outros, sem solenidades. Tais

eram a alforria perante testemunhas (manumissio inter amicos), por escrito (per

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epistulam), fazendo-se sentar o escravo à mesa (per mensam), colocando-se-lhe o

chapéu (per pileum).

O escravo libertado se chamava liberto.

Ficavam livres, por lei:

escravos velhos e doentes expostos pelo dono;

escravo que delatasse o assassino de seu dono;

escravo que vivesse em liberdade por mais de 20 anos.

Cidadania (status civitatis)

Em princípio, o direito romano, tanto público quanto privado, valia só para os

cidadãos romanos (quirites).

Os estrangeiros (peregrini) não tinham a capacidade jurídica de gozo no

concernente aos direitos e obrigações do ius civile; a eles só se aplicavam as

regras do ius gentium.

A cidadania romana era adquirida pelo nascimento de justas núpcias ou mesmo

fora delas, se mãe fosse cidadã no momento do parto.

Os filhos nascidos a partir da união entre cidadão romano e estrangeiro seguiam a

condição de estrangeiro.

Adquiria-se, também, a cidadania romana pela alforria quiritária.

Perdia-se a cidadania pela perda da liberdade.

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Situação Familiar (status civitatis)

A organização familiar romana distinguia entre pessoas sui iuris (paterfamilias),

independentes do pátrio poder, e pessoas alieni iuris (filiusfamilias), sujeitas ao

poder do paterfamilias. A independência do pátrio poder não tinha relação com a

idade; o paterfamilias era o ascendente do sexo masculino mais velho da família.

Sui iuris – “de direito próprio”

Alieni iuris = “de direito allheio”

Os alieni iuris não eram absolutamente incapazes. Podiam votar e ser votados para

as magistraturas (ius suffragii e ius honorum) e, servir nas legiões. Podiam casar-se

desde que obtivessem o consentimento do paterfamilias.

Tudo o que o alieni iuris adquirisse, adquiria para o paterfamilias.

Ao contrário, o paterfamilias geralmente não respondia pelas obrigações

assumidas pelo filiusfamilias.

Capitis Deminutio

A situação da pessoa, quanto à capacidade jurídica de gozo, era determinada pelos

3 estados: o de liberdade, o de cidadania e o de família. Mudando-se qualquer um

desses requisitos, mudava-se a situação jurídica da pessoa.

A capitis deminutio podia ser :

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1) maxima - perda da liberdade; pela guerra (feito prisioneiro por inimigos – pelo ius

postliminii sua situação era de pendência), por punição (fur manifestus), por dívidas

(direito pré-clássico);

2) media - perda da cidadania; o cidadão passava à condição de estrangeiro por

exílio voluntário ou por punição do Estado.

3) mínima – alteração no familiar (emancipação, adoção ou conventio in manum).

Outras causas restritivas da capacidade

As mulheres não tinham capacidade para direitos públicos e sofriam restrições no

âmbito do direito privado.

Não tinham direito ao pátrio poder, nem à tutela, e não podia participar dos atos

solenes na qualidade de testemunha.

Pessoa Jurídica

São organizações destinadas a uma finalidade duradoura, que são consideradas

sujeitos de direito.

Pode ser de 2 espécies: corporação (universitas personarum), que é a associação

de pessoas, e fundação (universitas rerum), que é um conjunto de bens,

destinados a uma determinada finalidade.

A característica essencial das pessoas jurídicas é terem elas personalidades

distintas da de seus componentes, bem como terem patrimônio e relações de

direito distintas das de seus membros.

Eram corporações:

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o Estado Romano (populus romanus) e seu erário;

as organizações municipais e as colônias;

Associações de caráter privado – exigia-se autorização do senado e,

posteriormente, do imperador para seu funcionamento; tinha que conter, no

mínimo, três membros.

As corporações eram reguladas por seus estatutos.

As fundações começaram a surgir na época cristã, sendo conferida personalidade

jurídica a um determinado patrimônio vinculado a certas finalidades (fins altruísticos

em geral).

Extinguia-se a pessoa jurídica quando sua finalidade era preenchida ou quando o

senado, e mais tarde o imperador, revogava a respectiva autorização para

funcionar.

Nas corporações privadas, o motivo de extinção era o desaparecimento de todos

os seus membros. A fundação extinguia-se pela perda da totalidade do patrimônio.

Objeto de Direito

É aquilo sobre o que incide o poder do titular do direito, do sujeito da relação

jurídica.

Ex.:

- No direito de propriedade o objeto é a coisa, sobre a qual o titular tem as

faculdades de usar, gozar e dispor;

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- No direito de família o objeto poder ser o pátrio poder do pai sobre o filho;

- No direito das obrigações o objeto é uma prestação que o credor pode exigir do

devedor (dar, fazer ou não fazer algo).

Na parte geral estuda-se, tão somente, as coisas em sentido amplo.

Conceito jurídico de coisa (res) – é aquilo que pode ser objeto de um direito

subjetivo patrimonial. É tudo aquilo que for suscetível de apropriação e possa ser

mensurado economicamente.

No Direito Romano havia diferença entre res e pecúnia:

Pecunia – abrange coisas que estão dentro do patrimônio de alguém.

Res – abrange coisas que estão dentro e fora do patrimônio de alguém.

Classificação das coisas

Critérios

Coisas consideradas em si mesmas:

corpóreas / incorpóreas

móveis / imóveis

fungíveis / infungíveis

consumíveis / inconsumíveis

simples / compostas / coletivas

divisíveis / indivisíveis

Coisas em relação às outras coisas:

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principais / acessórias

Coisas quanto à sua comerciabilidade:

in commercio / extra commercium

in patromonio / extra patrimonium

Coisas quanto à ordem econômica-social romana

res mancipi / res nec mancipi

1) Coisas consideradas em si mesmas:

Coisas corpóreas e incorpóreas

Coisas corpóreas – são as perceptíveis aos sentidos do ser humano (quae tangi

possunt), que podem ser vistas e tocadas.

Ex. um escravo, uma casa.

Coisas incorpóreas – são as que as que são imperceptíveis aos sentidos do ser

humano (quae tangi non possunt), que não podem ser vistas ou tocadas. Ex. os

direitos (iura).

Importância dessa distinção: só as coisas corpóreas são suscetíveis de posse (a

posse de direitos surge apenas no período pós-clássico), bem como de certos

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modos de aquisição da propriedade, como a tradição (traditio) e a usucapião

(usucapio)

Coisas móveis e imóveis

Coisas móveis – são as que podem ser deslocadas de um lugar para o outro sem

alteração na sua substância ou na sua forma.

Ex. um livro, uma mesa.

Coisas imóveis – são as que não podem ser deslocadas de um lugar para o outro

sem alteração na sua substância ou na sua forma. Ex. uma casa, um prédio.

Consideram-se imóveis o solo e tudo aquilo que natural ou artificialmente a ele se

agrega.

Semoventes – são as que podem deslocar-se de um lugar para outro com força

orgânica própria. Ex. os animais, os escravos.

Atenção: no Direito Civil contemporâneo o navio e o avião são considerados, para

fins de hipoteca, como bens imóveis (cf. art. 1.473, § único, do Código Civil e

legislação especial).

Importância dessa distinção: 1) necessidade de observância de formas especiais

para a transferência do direito de propriedade sobre imóveis; 2) diversidade de

prazos para a usucapião, conforme se trate de móveis ou de imóveis.

Coisas fungíveis e infungíveis

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Coisas fungíveis – são aquelas que podem ser substituídas por outras da mesma

espécie, quantidade ou qualidade. São consideradas pelo seu gênero e não pela

sua individualidade (genus nunquam perit). Ex. um saco de arroz, dinheiro.

Coisas infungíveis – são aquelas que não podem ser substituídas por outras da

mesma espécie, quantidade ou qualidade. Não são consideradas pelo seu gênero,

mas, sim, pela sua individualidade. Ex. o cavalo Argento, premiado em várias

corridas de biga no Circus Maximus.

Importante – se alguém compra um escravo qualquer entre vinte escravos do

vendedor, o escravo, na hipótese, é coisa fungível; mas se adquire um escravo

determinado, então ele será coisa infungível.

Importância dessa distinção: no direito das obrigações, se a o empréstimo for de

coisa fungível, tem-se o mútuo; se for de coisa infungível, tem-se o comodato.

Coisas consumíveis e inconsumíveis

Coisas consumíveis – são as que se consomem imediatamente com o seu uso

normal. Ex. um alimento, dinheiro.

Coisas inconsumíveis – são as que não se consomem imediatamente pelo seu uso

normal. Ex. um livro, um carro.

Importante: 1) frutas normalmente são coisas consumíveis, porém, se emprestadas

para uma exposição, tornam-se inconsumíveis (comodatum ad pompam vel

ostentationem); 2) livro é coisa inconsumível, porém, se exposto em estante de

livraria, torna-se consumível.

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Coisas simples, compostas e coletivas

Coisa simples – é aquela que forma um todo orgânico. Ex. um animal.

Coisa composta – é aquele que forma um todo mecânico. Ex. um carro, um avião.

Coisa coletiva – é aquele que forma um todo ideal, que é constituída por várias

coisas simples, mas consideradas na sua totalidade. Ex. um rebanho, uma

biblioteca.

Importância dessa distinção: 1) quanto à reivindicação das coisas compostas e

coletivas (reivindica-se o todo, não cada coisa, uma a uma); 2) sendo substituídas

as coisas que as formam, nem por isso as coisas compostas ou coletivas mudam,

juridicamente, de identidade.

Coisas divisíveis e indivisíveis

Coisas divisíveis – são as que podem ser divididas de modo que as partes

fracionadas, embora quantitativamente menores do que o todo, conservem a

essência e as funções sociais e econômicas dele. Ex. um terreno.

Coisas indivisíveis – são as que não podem ser divididas sem prejuízo de sua

função econômica-social; se divididas importam na destruição da coisa. Ex. um

animal, um escravo.

Importância dessa distinção: na divisão de uma coisa comum (co-propriedade).

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2) Coisas em relação a outras coisas

Coisas principais e acessórias

Coisa principal – é aquele que existe por si própria, sem necessidade da existência

de outra coisa. Ex. dívida.

Coisa acessória – é aquela cuja existência está subordinada à coisa principal, pode

ser ou não parte da coisa principal. Ex. juros e correção monetária em uma dívida.

Entre os acessórios destacam-se os frutos, os produtos, as benfeitorias e as

pertenças.

Fruto – é o que a coisa frugífera periodicamente produz e que, destacado dela, não

lhe acarreta dano ou destruição. Ex. cria dos animais, frutas, leite, lã etc.

Em relação à coisa frugífera, os frutos pode ser:

a) pendentes – se ainda ligados à coisa frugífera;

b) separados – quando já foram destacados da coisa frugífera;

c) percebidos – são os que separados da coisa frugífera, foram apropriados por

alguém com a intenção de faze-los seus);

d) percipiendos – são os que poderiam ter sido percebidos, mas ainda não o foram;

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e) existentes – os que se encontram, no estado em que foram separados da coisa

principal, junto a quem dela os destacou);

f) consumidos – os que não mais se encontram com quem os destacou da coisa

frugífera, ou porque os consumiu, ou porque os transferiu a outrem.

Frutos civis – rendimentos que a coisa periodicamente produz, como, p. ex., juros e

aluguéis.

Frutos industriais – surgem pela intervenção humana, em razão da atuação do

homem sobre a natureza. Ex. produção de uma fábrica.

Produtos – são utilidades que se retiram da coisa, reduzindo-se paulatinamente a

quantidade, porque não se reproduzem de forma periódica. Ex. pedras, minérios,

metais preciosos etc.

Benfeitorias – despesas efetuadas com a coisa para conservar, melhorar ou

aumentar seu uso.

Podem ser:

a) necessárias – são as que têm por fim evitar que a coisa se deteriore (ex.

construção de um telhado novo, quando o antigo estiver ruindo).

b) úteis – são as quando visam aumentar a fruição da coisa (ex. construção de uma

garagem).

c) voluptuárias – são as de mero luxo. Ex. construção de uma piscina.

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Importante: construção de uma piscina em uma escola de natação é considerada

benfeitoria necessária.

Pertenças (instrumenta) – são acessórios que conservam sua individualidade e

autonomia, tendo apenas com a coisa principal uma subordinação jurídico-

econômica. Ex. máquinas de uma fábrica, molduras dos quadros, os instrumentos

de trabalho destinados ao cultivo de terra estão ligados a ela, embora conservem

certa autonomia.

3) Coisas quanto à sua comerciabilidade

Coisas in commercio e coisas extra commercium

Coisas in commercio – são as suscetíveis de ser apropriadas por um particular. Ex.

tudo aquilo que não for extra commercium (critério da exclusão)

Coisas extra commercium – são as insuscetíveis de ser apropriadas por um

particular. Classificam-se em coisas de direito divino (res divini iuris) e coisas de

direito humano (res humani iuris)

As res divini iuris subdividem-se em:

a) res sacrae (coisas sagradas) – são as coisas consagradas aos deuses

superiores. Ex. templos e objetos destinados ao culto.

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b) res religiosae (coisas religiosas) – são as coisas consagradas aos deuses

subterrêneos (acreditava-se que os mortos continuavam a viver em espírito nas

suas sepulturas e tinham necessidades dos vivos). Ex. sepulturas.

c) res sanctae (coisas santas) – são as coisas que, embora não sejam

consagradas aos deuses, eram de tal importância que se achavam sob a proteção

deles. Ex. portas e muros das cidades.

As res humani iuris subdividem-se em:

a) res communes omnium (coisas comuns a todos) – são aquelas que a natureza

coloca à disposição de todas as pessoas, e que, em virtude da sua extensão, não

podem ser propriadas, no todo, por ninguém. Ex. ar atmosférico, mar.

b) res publicae (coisas públicas) – são as que o Estado, a quem pertencem, coloca

à disposição de todos. Ex. ruas, praças.

c) res universitatis (coisas da coletividade) – são as que pertencem, não aos

cidadãos individualmente, mas às cidades.

Coisas in patrimonio e coisas extra patrimonium

Coisas in patrimônio – são as que, em dado momento, encontram-se no patrimônio

de alguém.

Coisas extra patrimonium – são aquelas que, em dado momento, não encontram-

se no patrimônio de alguém. Ex. res nullius, res derelictae.

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Patrimonium – no direito moderno significa o conjunto de direitos patrimoniais e

obrigações de uma pessoa (ativo e passivo). No Direito Romano o patrimônio era

somente o ativo, excluía-se as obrigações desse conceito.

4) Coisas quanto à ordem econômico-social romana

Res mancipi e res nec mancipi

Res mancipi – eram as coisas mais importantes para os romanos (povo agrícola e

guerreiro por excelência); para se lhes transferir a respectiva propriedade,

requeriam a prática das formalidades da mancipatio e in iure cessio. Ex. terrenos

itálicos, animais de tração e carga (bois, cavalos, mulas e asnos; camelos e

elefantes não), escravos e as 4 servidões rústicas mais antigas que eram via, iter,

actus e aquaeductus. As demais coisas eram res nec mancipi.

Res nec mancipi – podiam ser transferidas pela simples entrega, sem formalidades

(traditio). Ex. imóveis nas províncias, carneiros, cabras, moedas.

Importância dessa distinção: 1) quanto à observância de solenidades na aquisição

da propriedade; 2) mulheres podiam alienar, sem intervenção tutorial, as res nec

mancipi.

FATOS JURÍDICOS EM SENTIDO AMPLO

Ato Jurídico

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Sua doutrina não é obra dos romanos.

Fatos – são eventos de toda espécie.

Podem ser:

Simples – sem conseqüências jurídicas. Ex. apertar a mão de um colega.

Jurídicos – produzem conseqüências jurídicas. Ex. espancar o colega.

Podem ser lícitos ou ilícitos conforme sua conformidade com a regra jurídica.

Fato ilícito (delito) é fato jurídico também.

Ato jurídico é uma manifestação de vontade que visa à realização de determinada

conseqüência jurídica. É também chamado negócio jurídico.

Forma – era mais observada no Direito Pré-clássico. Os atos jurídicos do direito

quiritário (ius civile), exigiam formalidades complicadas, de cuja observância

dependia a validade do ato e seu conseqüente efeito jurídico.

Posteriormente a forma foi perdendo lugar para a intenção das partes.

Capacidade de Agir (de fato)

Era pressuposto da validade da manifestação de vontade.

Nem toda e qualquer pessoa tinha capacidade de agir. Esta capacidade dependia

da idade, do sexo e da sanidade mental perfeita.

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39

Os púberes, varões, perfeitamente sãos, tinham plena capacidade.

Quanto à idade a divisão era determinada pela puberdade, que era adquirida:

aos 14 anos pelos varões e

aos 12 anos pelas mulheres.

Os púberes em princípio, tinham completa capacidade de agir; os impúberes não.

Estes se dividiam em

infantes: menores de 7 anos (absolutamente incapazes) e

infantia maiores: dos 7 anos até a puberdade (tinham capacidade restrita de agir).

No caso dos infantes, era o tutores que agiam por eles. Os atos jurídicos eram

praticados em nome do próprio tutor, mas no interesse dos infans. No final do

exercício do cargo o tutor deveria prestar contas.

No direito pós-clássico surgiu a regra de que os menores de 25 anos só podiam

praticar atos jurídicos que os favorecessem, mas para obrigar-se precisavam

sempre da assistência do curador.

Daí:

Venia aetatis

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40

Os imperadores concediam em casos especiais, um favor legal chamado venia

aetatis, que conferia a pessoas individualmente determinadas a capacidade de agir.

Essa concessão só seria possível no caso de varão com pelo menos 20 anos de

idade e no caso de mulher com pelo menos 18 anos de idade.

Essas regras valiam tanto para os sui iuris quanto para os alieni iuris. Os primeiros

passariam a adquirir para si e os segundos adquiriam sempre para o paterfamilias.

Sexo

As mulheres estavam sob tutela perpétua; sua situação era semelhante à dos

impúberes infantia maiores.

A insanidade mental tornava absolutamente incapazes os loucos de todo o

gênero. Os surdos-mudos tinham capacidade limitada (não podiam praticar atos

verbais) e os pródigos sofriam restrições semelhantes às dos impúberes infantia

maiores.

Classificação dos Atos Jurídicos

Unilaterais

Quando seus efeitos jurídicos se verificam pela declaração de vontade de uma só

pessoa. Ex. testamento, aceitação de herança, alforria de escravo.

Bilaterais

Quando seus efeitos jurídicos se verificam a partir da vontade parte de 2 pessoas.

Ex. compra e venda.

Mortis Causa

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São os atos praticados para ter efeitos jurídicos quando do falecimento de uma das

partes. Ex. testamento, codicilo.

Inter Vivos

São os atos praticados para ter efeitos jurídicos em vida. Ex. compra e venda,

doação.

Onerosos

São os que têm como objeto uma contraprestação de valor igual à prestação. Ex.

compra e venda, doação com encargo.

Gratuitos

São os que não têm como objeto uma contraprestação. Ex. doação.

Causais

São aqueles cujo fim prático está intimamente ligado ao ato e aparece claramente

no próprio ato. Ex. compra e venda.

Abstratos

São aqueles e que prevalece a forma externa do ato, sendo irrelevante o fim

prático a que se destina. Ex. mancipatio, in iure cessio, stipulatio.

Atos do ius civile X atos do ius honorarium – depende da origem dos institutos.

Ex. mancipatio e in iure cessio são do ius civile; pacta pretoria são acordos

sancionados pelo pretor.

Atos do ius civile X atos do ius gentium – compra e venda consensual poderia

ser praticada por cidadão romano e por estrangeiro; mancipatio, com suas

formalidades, só poderia ser praticada por cidadão romano.

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Vícios dos Atos Jurídicos

O ato jurídico é uma manifestação de vontade, visando determinadas

conseqüências jurídicas.

Pressupõe a vontade interna e sua exteriorização clara e perfeita.

Se, no entanto, houver discrepância entre a vontade interna e sua manifestação,

surge então o problema da eficácia ou ineficácia do ato jurídico.

Nestes casos o ato pode ser nulo (não tendo efeito jurídico nenhum), ou anulável (o

ato pode se tornar sem efeito, mas existe enquanto não for anulado pelo juiz a

pedido do interessado).

O ato inicialmente viciado não se convalida com o decurso do tempo (quod initio

vitiosum est, non potest tractu temporis convalescere).

Simulação e Restrição Mental

A discrepância entre a vontade interna e sua manifestação externa pode ser

voluntária.

Se as partes são concordes nesse fingimento existe a simulação.

A simulação pode ser:

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absoluta - quando as partes não querem ato nenhum, mas declaram externamente

querê-lo. Ex. emito um título de crédito em favor de um amigo para,

aparentemente, desfalcar meu patrimônio, prejudicando, assim, meus credores.

relativa - quando as partes concordes praticam um determinado ato, querendo

realmente ato diverso do praticado. Ex. finjo vender um carro à minha amante,

quando, em verdade, estou praticando doação.

O negócio simulado só é válido perante terceiros; entre as partes prevalecerá o ato

dissimulado.

Só no caso de ser evidente a simulação é que ela acarreta a nulidade do ato (ex.

teatro, cinema, novela).

A restrição mental é a simulação unilateral; uma parte faz declaração divergente de

sua vontade interna. Como não pode ser conhecida pelos outros, ela não influi na

eficácia do ato, que permanece válido.

Erro

Erro é o falso conhecimento de um fato.

Diferente do erro é a ignorância. O erro é o falso conhecimento acerca de um fato;

a ignorância, o total desconhecimento sobre o fato.

Para que o erro tenha o efeito de invalidar o ato é preciso que se refira a um

elemento essencial do ato jurídico (error essencialis), oriundo de uma atitude

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escusável do agente (error probabilis) e real (causar, de forma efetiva, prejuízo a

quem o alega).

Os erros que acarretavam a nulidade do ato eram:

erro quanto ao negócio (error in negotio) - quando a discrepância se referia à

própria essência do ato. Ex. penso que estou alugando a minha casa, quando na

verdade a estou vendendo.

erro quanto à pessoa (error in personam)- quando a divergência se referia à

identidade de uma das partes ou de pessoa que fosse elemento essencial ao ato.

Ex. penso estar me casando com Maria, pessoa saudável, quando, na verdade,

estou me casando com Maria, portadora de HIV.

erro quanto ao objeto (error in corpore) - quando recaia na identidade física do

objeto. Ex. penso estar comprando lote no centro da cidade, quando na verdade

estou comprando um lote localizado na periferia.

erro quanto à substância (error in substantiam) - era o que se relacionava com as

qualidades essenciais do objeto o ato. Ex. compro vinagre pensando ser vinho.

Ocorrendo qualquer desses erros, referentes a elementos essenciais do ato, este

era NULO.

O erro podia existir com relação a outros elementos do ato, que os romanos não

consideravam essenciais. O ato era considerado válido.

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O erro quanto à qualidade (error in qualitate) e à quantidade (error in quantitate)

não invalidavam o ato. Ex. comprar vinho estragado pensando ser vinho bom;

querendo comprar 100 litros, comprar 1000.

O erro ainda podia consistir numa ignorância da regra do direito (error iuris).

Normalmente ninguém pode ignorar a lei: ignorantia iuris neminem excusat.

Exceções: as mulheres, os menores de 25 anos, os soldados, os caipiras (rustici).

Dolo

É o comportamento malicioso de alguém, com o fito de enganar a outra parte,

falsificando a verdade, para tirar disso vantagem própria.

Modalidades:

Dolus bonus - é a astúcia ou artifício empregado para a realização de um negócio,

mas que é tolerado socialmente, porque a opinião comum não os considera capaz

de influir, de modo decisório, na vontade da pessoa. P. ex. o vendedor que exagera

quando descreve as qualidades do produto que está vendendo.

Dolus malus - são manobras ardilosas conducentes a induzir alguém em erro. O

sujeito é enganado por um terceiro P. ex. omito a verdade para que determinada

pessoa celebre determinado negócio jurídico comigo.

Dolo recíproco (torpeza bilateral) - ocorre quando ambas as partes procedem com

dolo uma para com a outra. P., ex. compro um carro que sei ser roubado e pago

com dinheiro falso. Neste tipo de conduta, as partes não podem pleitear a anulação

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do negócio, pois o Direito não admite que alguém se beneficie com sua própria

torpeza.

Coação

É a pressão empregada sobre determinado indivíduo para obrigá-lo a prática de um

ato. O Direito antigo não levou em conta isso, pois preocupava-se mais com a

forma (tamen coactus volui). O pretor Otávio em 80 aC introduziu regra para

invalidar atos praticados sob coação.

Espécies:

Coação física (vis absoluta) - é a coação física. O indivíduo coagido fica

praticamente sem o mínimo poder de resistência frente ao coator. P. ex. dois

sujeitos seguram uma pessoa e um terceiro pega em sua mão assinando um

contrato: é irresistível.

Coação moral (vis compulsiva) - é a pressão psíquica exercida contra uma pessoa

para que realize ou deixe de realizar determinado negócio. Compõe-se de dois

elementos, a saber: ameaça; temor que a ameaça gera ao coacto. A ameaça deve

ser injusta, efetiva, séria, atual e o mal deveria ser maior que o decorrente da

realização do negócio jurídico.

Há possibilidade de opção. P. ex. “assine o contrato ou te mato...” – posso

escolher: assinar e viver, ou não assinar e morrer. O negócio é anulável porque,

embora viciada a vontade, ela existiu (tamen coactus volui).

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O pretor concedeu uma ação, a in integrum restitutio, para anular os efeitos de tais

atos e restabelecer a situação anterior.

Conteúdo dos Atos Jurídicos

Os elementos dos atos jurídicos podem ser: essenciais, naturais ou acidentais.

Essenciais - são os elementos do conteúdo do ato jurídico sem os quais este não

pode existir. Ex. o preço na compra e venda.

Naturais - são os elementos naturalmente incluídos num ato jurídico, porque a

ordem legal os considera como normalmente fazendo parte deles, conforme seu

tipo. Ex. responsabilidade do vendedor pelos vícios redibitórios da coisa.

Acidentais - são cláusulas que as partes acrescentam livremente ao ato; não são

necessárias para a realização do ato. São: condição, termo e modo.

Condição

É a cláusula acidental por meio da qual a vontade das partes faz depender os

efeitos do ato jurídico de um evento futuro e incerto. Ex. dar-te-ei R$1.000,00 se o

navio chegar da Europa.

Requisitos:

1) arbítrio das partes;

2) evento futuro;

3) incerteza quanto à verificação do evento.

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A condição pode ser:

Potestativa - quando o evento depende da vontade de uma das artes. Ex. Se você

casar.

Casual - quando o evento depende exclusivamente do acaso. Ex. Se chover.

Mista - quando o evento depende em parte da vontade de uma das partes e em

parte do acaso. Ex. Se você casar com Tícia.

Suspensiva - suspende os efeitos do ato , para que ele só tenha eficácia quando o

evento futuro e incerto se verificar.

Resolutiva - o ato tem eficácia imediata, cessando ela com a verificação do evento

futuro e incerto.

O Direito Romano somente conheceu a condição suspensiva: a resolutiva, como

instituto, é do direito intermédio e moderno.

Quando o evento da cláusula condicional se verifica, o ato passa a ser considerado

puro, como se nunca tivesse estado sujeito à condição.

O problema que surge é o de saber quando começa a eficácia do ato: se no

momento inicial da prática do ato condicionado (ex nunc) ou no momento da

verificação do evento (ex tunc).

O direito romano considerava os efeitos do ato condicional produzidos ex nunc; o

direito moderno considera-os produzido ex tunc.

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Quando o evento previsto na cláusula definitivamente não se verifica, o ato é

considerado como se nunca tivesse existido.

Termo

É a cláusula que subordina os efeitos de um ato jurídico a um evento futuro e certo.

Pode se verificar em data certa ou incerta (termo certo ou incerto).

Termo suspensivo (dies a quo) - quando determina que os efeitos do ato se

iniciem a partir da verificação do evento futuro e certo.

Termo resolutivo (dies ad quem)- quando determina que os efeitos do ato cessem

a partir da verificação do evento futuro e certo.

Modo

É a cláusula acessória que se junta eventualmente aos atos jurídicos gratuitos e

que consiste em impor ao destinatário da liberalidade uma obrigação que não influi

na eficácia do ato.

Os efeitos jurídicos do ato de liberalidade independem do cumprimento ou não da

obrigação modal. O ato é juridicamente válido e eficaz ab initio.

No negócio modal, não se subordinam os efeitos do ato ao cumprimento da

obrigação.

No direito romano clássico havia meios legais indiretos para constranger o

favorecido pela liberalidade a cumprir a obrigação a ele imposta.

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Representação

É o instituto jurídico pelo qual uma pessoa, o representante, manifesta sua própria

vontade com a finalidade de substitui outra, a do representado, mas visando a que

as conseqüências da sua manifestação redundem em favor da pessoa

representada e não da do representante.

Age por conta e em nome de outrem: representação direta ou perfeita. Era

estranha ao direito romano.

O direito romano só conhecia a representação indireta ou imperfeita, pela qual o

representante agia em seu próprio nome, mas no interesse do interessado. Nesse

caso o ato produzia efeitos para o representante, que por sua vez, ficava obrigado

a transferi-los ao representado, com base na relação jurídica entre eles existente.

O direito romano só conhecia a representação direta no campo da aquisição da

posse: tanto o procurador como o tutor podiam adquirir a posse e a propriedade

como representantes diretos.

A representação podia basear-se:

na regra jurídica – tutor, curador, syndicus de uma pessoa jurídica;

na vontade das partes – acordo de vontades (procurador)

na vontade unilateral do representante - gestão de negócios: alguém que se

encarrega espontaneamente de tratar de negócios alheios.

DIREITO DAS COISAS

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OS DIREITOS REAIS E SUA CLASSIFICAÇÃO

Os direitos patrimoniais distinguem-se em:

direitos reais;

direitos pessoais.

Direitos reais:

há relação entre o titular do direito e a coisa: existe o exercício de um poder direto

e imediato;

são exercidos de maneira erga omnes (sujeito passivo universal); ninguém pode

turbar o exercício desses direitos.

Direitos pessoais:

o poder do titular atua sobre uma pessoa (devedor), que lhe deve uma prestação

de conteúdo econômico;

são exercidos inter partes: relação somente entre o titular do direito (credor) e uma

pessoa (devedor) determinada ou determinável, a quem incumbe dar, fazer ou não

fazer algo.

Características dos direitos reais

atribuem ao titular poder direto sobre a coisa;

são direitos absolutos: todos têm o dever de abstenção da prática de atos que

turbem o titular deles;

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estão protegidos por ações reais (actiones in rem) que se intentam contra quem

quer que tenha turbado sua utilização;

outorgam ao titular o direito de seqüela = perseguir a coisa nas mãos de quem quer

que a detenha;

dão ao titular o direito de preferência = poder de afastar todos aqueles que

reclamem a coisa com base em direito pessoal ou real posterior ao dele

(especialmente nos direitos reais de garantia);

constituem um numerus clausus = só são direitos reais os criados pelo Direito; são

sempre típicos, os particulares não podem criar direitos reais novos.

CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS REAIS

Direito de propriedade (o mais amplo deles)

Direitos reais sobre coisas alheias:

2.1) Direitos reais de gozo: a) servidões prediais, b) servidões pessoais: b1)

usufruto, b2) uso, b3) habitação e trabalho de escravos e de animais, c) superfície

e d) enfiteuse.

2.2) Direitos reais de garantia: a) fidúcia cum creditore, b) penhor e c) hipoteca.

SISTEMÁTICA DE EXPOSIÇÃO E ESTUDO

Posse – não é um direito, mas um fato. Seu estudo deve ser preliminar ao dos

direitos reais porque a posse é elemento de grande importância na aquisição de

direitos;

Propriedade – o mais amplo dos direitos reais;

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Direitos reais sobre coisas alheias, na seguinte ordem:

3.1) servidões prediais;

3.2) usufruto e direitos análogos (uso, habitação, trabalho de escravos e de

animais);

3.3. superfície e enfiteuse;

3.4. fiducia cum creditore, penhor e hipoteca.

POSSE

Conceito – é o poder de fato, juridicamente protegido, que se exerce sobre uma

coisa.

É diferente da propriedade, pois esta não é poder de fato, mas, sim, poder de

direito.

Em geral posse e propriedade se apresentam reunidas; via de regra o proprietário

também é possuidor da coisa. Mas, existem casos em que a propriedade e a posse

estão separadas: 1) alguém se apropria de um terreno alheio (o usurpador terá a

posse e o proprietário terá o direito de propriedade).

Elementos da posse

corpus (elemento objetivo) – contato material com a coisa ou atos simbólicos que

representam esse contato; subordinação física da coisa a alguém;

animus (elemento subjetivo) – intenção de possuir a coisa.

Os dois elementos têm que existir simultaneamente.

Teorias sobre a posse

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Teoria subjetiva (Savigny) – a posse se caracteriza pela conjugação de corpus e

animus. Não precisa ser o contato físico, mas ter sempre a coisa à sua disposição.

Ex. veículo em estacionamento.

Teoria objetiva (Ihering) – a posse se caracteriza pelo corpus (animus já está

incluído no corpus). A posse seria a exteriorização da propriedade. O corpus não

seria o contato físico com a coisa, mas a conduta de dono.

CC/2002 adotou a teoria objetiva (art. 1196)

Relevância jurídica da posse:

na aquisição da propriedade (usucapião, ocupação, tradição);

na reivindicação (o ônus da prova é de quem não está na posse);

proteção jurídica contra turbação.

Tem posse aquele que possui a coisa com intenção de tê-la como própria, com

animus rem sibi habendi. Isso independe do possuidor ralmente ter ou não ter

direito de comportar-se como dono da coisa. Se for possuidor, terá direito contra

turbação indevida.

Quem exerce a propriedade reconhecendo que a coisa é de outrem não é

proprietário, mas, sim detentor. O detentor não possui proteção jurídica, seu poder

de fato é destituído de conseqüências jurídicas.

Ex. de detentor: filiusfamilias, escravos, as pessoas que tinham uso ou guarda da

coisa (locatário, depositário, comodatário, usufrutuário).

Distinções:

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Possessio civilis – indicava a posse que reunia as condições necessárias à

usucapião (posse ad usucapionem).

Possessio – designava a posse protegida pelos interditos (ad interdicta), que reunia

corpus e animus possidendi.

Possessio naturalis – refere-se à posse destituída de proteção jurídica (detenção);

é mera relação de fato com a coisa sem intenção de assenhorar-se dela (ex.

filiifamilias, escravos, locatário, depositário, comodatário, usufrutuário, ladrão).

MODALIDADES DE POSSE

Além da distinção entre possessio (ad interdicta), possessio naturalis (detenção) e

possessio civilis (ad usucapionem), a posse apresenta, ainda, outras espécies:

possessio bonae fidei – é aquela em que o possuidor ignora que esteja lesando o

proprietário da coisa. Quanto ao esbulho ou turbação da posse o possuidor de boa-

fé é protegido contra todos, inclusive contra o proprietário. Se ele perder

acidentalmente a coisa, não dispõe de meio jurídico para reaver a posse. Se à

pose de boa-fé reunirem-se os elementos necessários para adquirir a propriedade

por usucapião tal posse passa a ser um direito e é protegida mesmo em caso de

perda acidental, pela actio Publiciana. Ex. proprietário de res mancipi que adquiriu

a coisa por simples tradição e, após decurso de prazo da usucapião a perde;

possessio malae fidei – é aquela em que o possuidor sabe que está lesando o

proprietário da coisa, sendo protegida pelos interditos possessórios contra

terceiros, mas não dando margem à usucapião;

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possessio iusta – é aquela que não foi obtida mediante violência (vi),

clandestinidade (clam) e precariedade (precario). É protegida pelos interditos

possessórios contra todos, inclusive contra o proprietário (mas cede à ação

reivindicatória deste)

possessio iniusta – é a posse que foi obtida mediante violência (vi), clandestinidade

(clam) e precariedade (precario). Só é protegida contra terceiros, e não contra

aqueles de quem se adquiriu a posse mediante a utilização de vi, clam aut precário;

possessio ex iusta causa (posse decorrente de causa jurídica, justo título) – é

aquela que se funda em uma relação com o possuidor anterior que seria, por si

mesma, capaz de justificar a aquisição da propriedade (ex. doação, compra e

venda, legado);

possessio ex iniusta causa (posse decorrente de causa não-jurídica) – se funda em

uma causa injusta capaz de impedir a transferência da propriedade.

COMPOSSE – várias pessoas possuindo uma mesma coisa ao mesmo tempo. Ex.

condomínio.

INÍCIO DA POSSE

Direito pré-clássico – era necessário a conjugação de 2 elementos: um elemento

de natureza puramente material (senhoria de fato sobre a coisa) e outro de caráter

jurídico (causa possessiones).

Direito clássico – a posse se inicia quando se conjugam o corpus e o animus: ato

material vinculado a uma certa vontade.

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- Demandando a posse a existência de vontade, há certas pessoas que, carecendo

dela, não podem iniciar a posse por si mesmas. Ex., no direito clássico, o infante e

o escravo.

- No direito justinianeu permitiu-se que o infante, com autorização do tutor, e os

infantia maiores, ainda sem tal autorização, pudessem iniciar a posse.

- Embora seja o próprio possuidor que inicie por si a posse, admitiu-se, no direito

clássico, que o paterfamilias a iniciasse desde que tivesse conhecimento disso, por

intermédio de um filiusfamilias ou de um escravo. Posteriormente, permitiu-se que

o pater iniciasse a posse sobre uma coisa por meio de terceiros que não

estivessem submetido ao seu poder, mas tivessem a qualidade de seu procurator.

No direito justinianeu ampliou-se esse rol incluindo, inclusive, o gestor de negócios.

Importante: o detentor NÃO pode transformar a detenção em posse sob a alegação

de que passou a ter o animus possidendi (ex. locatário não podia, por si mesmo

adquirir a posse do imóvel alugado).

MEIOS JUDICIAIS PARA A PROTEÇÃO POSSESSÓRIA

A tutela da posse tem origem pretoriana e é exercida através dos interditos

(medidas judiciais para proteger ou recuperar a posse em caso de turbação e

esbulho).

São 2 as espécies de interditos que protegem a posse:

interdicta retinandae possessionis causa (destinados à conservação da posse) –

suas espécies são os interditos uti possidetis e utrubi; e

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interdicta recuperandae possessionis causa (destinados à recuperação da posse) –

suas espécies são os interditos unde vi, de precario e de clandestina possessione.

Ambas espécies resolvem questões relativas à posse sem se ater ao problema da

propriedade. Num interdito possessório pleiteado pelo possuidor contra o

proprietário da coisa, este não podia defender-se alegando seu direito de

propriedade. Para que o proprietário fizesse valer esse direito, precisava de mover

contra o possuidor uma ação reivindicatória.

Interditos retinendae possessionis causa: uti possidetis e utrubi. Ambos são: 1)

proibitórios – o pretor proibia que se fizesse alguma coisa; e 2) duplos – a proibição

se dirigia a ambas as partes (possuidor e turbador).

Interdito uti possidetis – destinava-se à proteção de coisas imóveis. Só protegia o

possuidor cuja posse não fosse violenta, clandestina ou precária (vi, clam aut

precario).

Como apenas a posse não violenta, clandestina ou precária era protegida pelo

interdito uti possidetis, daí decorria que ele, que normalmente era destinado à

conservação da posse, podia, excepcionalmente, acarretar a recuperação da posse

em favor de quem fora dela esbulhado. Com efeito, se o possuidor vi, clam ou

precario, molestado pelo antigo possuidor que ele esbulhara e que tentara

recuperar a posse, requeresse ao pretor um interdito uti possidetis contra o

esbulhado, este poderia opor uma exceptio vitiose possessionis e, demonstrado o

vício da posse, recuperaria a coisa.

Interdito utrubi – destinava-se à proteção de coisas móveis. Não se aplicava à

posse violenta, clandestina ou precária. Protegia apenas o possuidor que, no ano

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em curso, tivesse estado mais tempo na posse da coisa (o que não era levado em

consideração no interdito uti possidetis).

Como o escravo ficava na posse daquele que o possuía a maior parte do ano em

que era requerido o interdito utrubi, isso quer dizer que esse interdito (embora

incluído entre os retinendae possessionis causa) podia ser usado, indistintamente,

para conservar ou recuperar a posse. Se alguém era possuidor e outrem o turbava

na posse da coisa móvel, pelo interdito utrubi sua posse seria conservada, pois o

outro não chegara a entrar nela; se, porém, o terceiro conseguisse despojar o

possuidor da coisa, tornando-se possuidor dela, mesmo sem violência,

clandestinidade ou precariedade, o antigo possuidor, se se utilizasse de imediato

do interdito utrubi, recuperaria a posse, por ter possuído a coisa, no decorrer

daquele ano, mais tempo do que o novo possuidor.

Interditos recuperandae possessionis causa: unde vi, de precario, de clandestina

possessione.

Interdito unde vi – destinado a reintegrar na posse aquele que dela fora despojado

violentamente. Era utilizado apenas quando se tratasse de imóveis (se fosse

móvel, caberia o interdito utrubi).

Se desdobrava, conforme a natureza da violência, em: 1) vis cottidiana – se se

tratasse de violência comum; 2) vis armata – se se tratasse de violência incomum.

Interdito de precario – o precarium era uma convenção pela qual alguém permitia

que outrem entrasse, precariamente, na posse de coisa de sua propriedade. É

mero detentor. Ex. locatário, caseiro, comodatário. Caso o precarista se negasse a

devolver a posse da coisa, cabia tal interdito.

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Interdito de clandestina possessione – servia para que o desapossado obtivesse a

recuperação da posse de imóvel ocupado clandestinamente por terceiro.

PROPRIEDADE

É o mais amplo dos direitos reais.

Traduz como um poder jurídico absoluto e exclusivo exercido pelo sujeito de direito

sobre uma coisa.

É o poder jurídico (dominium) coexistente ou não com o poder de fato (possessio).

A propriedade é um direito; a posse, um fato.

Pode ser encarada sob 2 aspectos:

positivo – é o direito de usar, gozar e dispor de uma coisa;

negativo – é um direito exercido erga omnes (sujeito passivo universal)

LIMITAÇÕES À PROPRIEDADE

O poder jurídico do proprietário sobre a coisa é, em princípio, ilimitado, mas

limitável.

Tais limitações podem ocorrer:

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1) pela vontade do proprietário – o proprietário voluntariamente restringe a

amplitude do seu direito, destacando e concedendo a outrem certa parcela deste.

Ex. Direitos reais sobre coisas alheias (de gozo e de garantia);

2) pelo interesse público – visam proteger o interesse público (Estado ou

particulares que gozem de proteção pública).

Limitações de interesse público:

1) o proprietário de um terreno ribeirinho deve tolerar o uso público da margem;

2) a manutenção de estradas marginais ao terreno fica a cargo do proprietário;

3) há várias proibições de demolição de prédios sem autorização administrativa,

estabelecidas no período imperial.

4) No séc. IV d.C., uma constituição imperial concedeu ao descobridor de jazida o

direito de explorar a mina em terreno alheio, mediante indenização a ser paga ao

proprietário.

Limitações no interesse particular:

1) os frutos caídos no terreno vizinho continuam de propriedade do dono da árvore.

O vizinho tem que tolerar que este os recolha dia sim, dia não;

2) o vizinho deve suportar a inclinação dos ramos numa altura superior a 15 pés,

podendo, entretanto, cortá-los até essa altura.

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3) o fluxo normal das águas pluviais deve ser suportado também.

Também:

- Inalienabilidade de 1) terreno dotal, 2) bens do pupilo, 3) coisa litigiosa.

- Prática de atos emulativos

- Seviciar escravos

Uma vez cessada a limitação, a propriedade automaticamente recupera a sua

inteireza. Este fenômeno se chama, modernamente, elasticidade da propriedade.

CO-PROPRIEDADE

É possível que o direito de propriedade pertença a mais de uma pessoa

simultaneamente.

No condominium cada co-proprietário tem direito a uma parte ideal da coisa (quota-

parte).

Origem: 1) vontade das partes; 2) incidentalmente (herança); 3) lei (invenção).

A coisa não é dividida entre os proprietários, mas cada um deles tem direito, na

proporção de sua parte, a cada uma das parcelas componentes da coisa inteira.

O direito de propriedade de cada um está limitado pelo direito do outro co-

proprietário.

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Ius accrescendi – Extinguindo-se a propriedade de um dos condôminos, tal

propriedade passará a pertencer aos demais.

Ius prohibendi – qualquer um dos co-proprietários pode vetar disposição dos

outros, não prevalecendo a vontade da maioria contra a minoria.

Actio communi dividundo – meio judicial para conseguir a divisão da propriedade.

A divisão poderia ser:

1) pela fragmentação da coisa (caso isso fosse possível);

2) pela adjudicação a quem oferecesse o maior lance (o adjudicatário ficava com a

obrigação de pagar a cada um dos proprietários, em dinheiro, a partes que lhes

coubesse).

AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE

O direito de propriedade adquire-se em conseqüência de determinados fatos

jurídicos. Estes são os modos de aquisição da propriedade.

Os modos de aquisição da propriedade podem ser pelo:

1) Ius civile

2) Ius gentium

3) Inter vivos

4) Mortis causa

5) Originários

6) Derivados

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Modo originário – não há relação entre o adquirente e o proprietário precedente. Do

mesmo modo inexistia tal relação quando a coisa era res nullius.

Modo derivado –se fundam na transferência do direito de propriedade pelo dono ao

adquirente. O direito do adquirente dependerá do dono precedente, continuando a

existir todas as limitações que eventualmente tiver (seqüela): nemo plus iuris ad

alium transferre, quam ipse haberet (D. 50,17,54)

MODOS ORIGINÁRIOS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE

1) Ocupação (occupatio) - tomada de posse de uma coisa in commercio, que não

está sob o domínio de ninguém, e gera o direito de propriedade dela. Ex. animais

selvagens, ilhas nascidas no mar, res hostium, res derelictae, res nullius.

2) Invenção - Tesouro é coisa preciosa desaparecida por tanto tempo que seu dono

tornou-se desconhecido. Pertencerá em partes iguais ao descobridor (inventor) e

ao proprietário do terreno onde foi achado. Excetuam-se os casos em que o

inventor foi mandado à procura do tesouro pelo próprio dono do terreno, ou em que

foi procurado e achado com expressa proibição do dono. Nestes casos, o tesouro

pertencerá integralmente ao proprietário.

3) União de coisas. Acessão (acessio).É a junção material de duas ou mais coisas.

O direito do proprietário da coisa principal estende-se ao todo. A coisa principal

absorve a acessória.

Inaedificatio – construções.

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Satio – sementes.

Inplantatio – plantas e árvores.

Aluvião (alluvio): é o acréscimo do terreno pelo depósito de cascalho.

Avulsão (avulsio): é a junção ao terreno, de uma porção de terra arrancada de

outro terreno por força natural.

Álveo Abandonado (alveus derelictus): o leito do rio desviado, que acresce aos

terrenos ribeirinhos, dividindo-se ao meio.

Ilha (insula in flumine nata) formada nos rios, que se divide da mesma forma entre

os proprietários ribeirinhos.

Ferruminatio – solda de metais.

Textura – tecedura.

Scriptura – escritura.

Pictura – pintura.

Confusio – mistura de líquidos homogêneos.

Commixtio – mistura de sólidos homogêneos.

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4) Especificação (specificatio) - É a confecção de coisa nova com material alheio. A

coisa nova só pertencerá ao especificador se não for mais possível reduzi-la à sua

forma primitiva. Tal aquisição de propriedade não exclui a obrigação do adquirente

de indenizar o proprietário da matéria "especificada".

5) Aquisição de frutos - os frutos, em regra, pertencem ao proprietário da coisa que

os produz. Há casos em que os frutos são de propriedade de pessoa diversa

daquele. Assim ocorre no caso do enfiteuta, do possuidor de boa-fé, do

usufrutuário.

O locatário também pode perceber os frutos da coisa locada, desde que isso tenha

sido acordado no contrato de locação.

MODOS DERIVADOS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE

1) Mancipatio – é um ato solene. Processava-se da seguinte forma:

Na presença de 5 testemunhas (cidadãos romanos púberes) e de um porta-balança

(libripens), aquele que vai adquirir a propriedade (mancipio accipiens) de uma res

mancipi (se for coisa móvel, deve estar presente no ato; se imóvel, representada

por uma parte, como, p. ex., uma telha, um torrão de terra), pronuncia a seguinte

fórmula:

“Digo que tal coisa é minha conforme o direito dos quirites, e que o comprei com

este bronze e esta balança de bronze” (negócio per aes et libram)

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Em seguida, batia num dos pratos da balança com uma peça de bronze

(raudusculum), e entrega essa peça, a título de preço à pessoa do alienante

(mancipio dans).

2) In iure cessio – aplicava-se não só para res mancipi, mas, também, para res nec

mancipi. Surgiu depois da mancipatio.

Consiste num processo fictício de reivindicação: o adquirente, diante do

magistrado, reivindica a coisa que deseja adquirir; dada a palavra ao alienante, ele

não contesta a reivindicação feita pelo adquirente; diante dessa confissão simulada

o pretor adjudica a coisa ao adquirente.

3) Traditio – é a simples entrega sem formalidades: posse qualificada pela intenção

de transferir a propriedade.

Traditio longa manu – consiste na entrega simbólica da coisa. Ex. indicar do alto de

um morro os limites de um terreno que se transfere.

Traditio brevi manu – o detentor converte-se em possuidor só pela intenção das

partes. Ex. Fulano detém uma casa pertencente a Beltrano a título de locação.

Beltrano vende a casa a fulano.

Traditio ficta (constitutum possessorium) – o possuidor converte-se em detentor, só

pela intenção das partes. Ex. Fulano é proprietário de um a casa está morando

nela. Depois, vende-a a Sicrano, mas continua morando nela como locatário.

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USUCAPIÃO (USUCAPIO)

Funda-se essencialmente, na posse, por tempo prolongado, que transforma uma

situação de fato em um direito, visando eliminar as incertezas nas relações

jurídicas.

Requisitos da usucapião no direito clássico:

1) coisa suscetível (res habilis) de dominium ex iure Quiritium.

Excluem-se desse modo de aquisição:

a) res extra commercium;

b) terrenos provinciais;

c) coisas roubadas (res furtivae), enquanto não voltarem às mãos de seu legítimo

dono.

d) coisas cuja posse fora obtida por violência (res vi possessae).

2) posse (possessio civilis) – intenção de ter a coisa como própria.

3) Iustus titulus ou iusta causa usucapiones – ato jurídico precedente em que a

posse se baseia e que, por si só, justificaria a aquisição da propriedade.

Se o ato de transferência fo viciado, não se transfere a propriedade.

São os casos de:

a) Transferência por quem não é dono ou por pessoa incapaz de agir;

b) Vício formal do ato de transferência (traditio ao invés de mancipatio).

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4) Boa-fé do possuidor (bona fides) – convicção do agente de que a coisa

legitimamente lhe pertence.

É sempre presumida (iuris tantum).

5) Decurso do prazo (tempus) – 2 anos (terreno); 1 ano qualquer outra coisa.

A perda da posse interrompe o prazo do usucapião (usurpatio).

Recuperando-se a posse, inicia-se novo prazo.

Contra o herdeiro continua a correr o prazo iniciado com o de cujus. Os adquirentes

a título particular foram equiparados aos herdeiros para essa finalidade.

PRAESCRIPTIO LONGI TEMPORIS

É um meio de defesa processual, concedido ao possuidor contra quem lhe exigisse

a coisa por meio de ação reivindicatória.

Paralisava a pretensão do autor contra o réu, em virtude de possuir este

pacificamente a coisa durante um determinado prazo.

Era muito mais comprido do que o do usucapião: 10 anos quando ambas as partes

moravam na mesma cidade (inter praesentes) e 20 anos em caso contrário (inter

absentes). Exigia-se justo título e boa-fé.

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PRAESCRIPTIO LONGISSIMI TEMPORIS

Considerando a evidente negligência do proprietário que, durante tempo excessivo

não usasse do seu direito contra o possuidor, os imperadores do último período

entendiam que tal proprietário deixava de merecer a proteção judicial. Tal extinção

da ação reivindicatória opera-se sem exigência de boa-fé, nem de justo título por

parte do possuidor. Este, porém nunca será proprietário; terá contra o proprietário

um meio de defesa processual.

REFORMA DA USUCAPIÃO POR JUSTINIANO

A praescriptio longi temporis transformou-se em modo de aquisição da propriedade,

aplicável apenas aos imóveis. Exigia boa-fé e justo título, sendo o prazo de 10 anos

inter praesentes e o de 20 anos inter absentes.

A usucapio era o nome do modo de aquisição dos móveis sujeita aos mesmos

requisitos do período anterior, e seu prazo foi aumentado para 3 anos.

A praescriptio longissimi temporis, por sua vez, passou a ser também um modo de

aquisição da propriedade, pelo decurso do prazo de 30 anos, sem justo título, mas

com boa-fé do possuidor.

PERDA DA PROPRIEDADE

Podia se dar:

1) Pela extinção;

2) Pelo perecimento da coisa;

3) Pelo abandono (derelictio) da coisa, com a intenção de não mais a querer;

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4) Pela transferência do domínio a outrem, ou aquisição originária feita por outra

pessoa.

PROTEÇÃO DA PROPRIEDADE

A propriedade é um direito absoluto e exclusivo; o dono é protegido contra toda e

qualquer interferência alheia que turbar o exercício de seu direito.

A proteção se efetua por meio de determinadas actiones in rem.

REI VINDICATIO

É o meio processual de proteção contra a lesão do direito de propriedade na sua

totalidade.

Era a ação do proprietário quiritário que não possuía a coisa, contra aquele que a

possuía, mas não era proprietário.

O autor na reivindicação alegava ter o direito de proprietário quiritário, violado pelo

réu, que exercia a posse, situação essa incompatível com aquele direito de

propriedade na sua plenitude. O réu, por sua vez, ao defender-se, negava a

alegação do autor, que ficava obrigado a provar o seu direito.

Em caso de modo originário seria fácil provar o direito; em caso de modo derivado

era mais difícil, pois era necessário demonstrar o justo título do alienante e de seus

antecessores: o direito do adquirente depende do direito do alienante. Nesse

sentido era muito útil a usucapião.

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A finalidade da rei vindicatio era a de obter a restituição da coisa, com seus frutos,

pelo ilegítimo possuidor.

Tratando-se de réu que possuía boa-fé, só deviam ser restituídos os fruto

separados a partir da litisconstestação de ação reivindicatória.

Após este momento, o possuidor não mais podia alegar a sua boa-fé, pois, pela

impugnação feita pelo autor na fase inicial do processo, passava a ter ciência de

que a coisa não lhe pertencia de direito.

No que se refere às benfeitorias, as feitas pelo possuidor de boa-fé deviam ser

indenizadas pelo proprietário, se necessárias ou úteis.

Ius retentiones – O possuidor de boa-fé podia reter a coisa até receber a

indenização, o possuidor de má-fé não tinha direito a qualquer indenização. Era

instituto do direito clássico.

Ius tolendi – surgiu no direito justinianeu: permitia que em determinados casos a

partes retirassem a coisa acessória junta a título de benfeitoria, caso isso pudesse

ser feito sem deterioração da coisa principal.

ACTIO NEGATORIA

É o meio processual de defesa contra lesão parcial do direito de propriedade.

Tratava-se de ação do proprietário possuidor, contra quem, alegando ter um direito

real sobre a coisa, violava-a, parcialmente, o exercício do direito de propriedade

daquele.

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O autor teria que provar seu domínio; o réu teria que provar o seu direito real que

limitasse o do proprietário.

DIREITOS REAIS SOBRE COISA ALHEIA

A propriedade é um direito absoluto e exclusivo que uma pessoa tem sobre uma

determinada coisa: é o mais amplo dos direitos reais, pois compreende as

faculdades de usar, gozar e dispor da coisa.

É oponível erga omnes.

Existem, porém, direitos reais que são oponíveis contra todos que conferem à outra

pessoa que não o proprietário da coisa uma parcela de poder jurídico de dono

sobre ela, limitando, assim, a propriedade.

São os chamados direitos reais sobre coisa alheia.

Tais direitos dividem-se em duas categorias:

Direitos reais de gozo: a) servidões prediais; b) servidões pessoais; c) superfície; e,

d) enfiteuse.

Direitos reais de garantia: a) fidúcia; b) penhor; e, c) hipoteca.

Servidões prediais e servidões pessoais

Na servidão predial um imóvel serve a outro; na pessoal, um bem serve uma

pessoa.

Semelhanças:

ambas são direitos reais sobre coisas alheias;

modos de constituição, extinção e defesa.

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Diferenças:

Prediais

visam à utilidade objetiva de um imóvel (prédio dominante) em contraposição a

outro que lhe serve (prédio serviente);

vinculam-se permanentemente ao imóvel em cujo benefício existem, sendo seu

titular a pessoa que for proprietária dele (pouco importa a mudança do titular do

domínio).

2) Pessoais:

visam ao benefício pessoal de um determinado indivíduo;

são inseparáveis da pessoa a quem favorecem e não duram de forma permanente,

mas, no máximo, até a morte do seu beneficiário.

Conceito de servidão predial

É um direito real sobre coisa alheia que acarreta limitação no uso de um imóvel

(serviente) em favor de outro (dominante).

O titular é o proprietário do prédio dominante, estando o proprietário do prédio

serviente obrigado, em favor daquele, a não fazer algo no imóvel ou deixar que ele

o faça.

Princípios que regem as servidões prediais

1) a servidão predial se estabelece para beneficiar objetivamente um imóvel e não

uma pessoa: não se altera a servidão pela mudança do proprietário do prédio

dominante;

2) o prédio serviente deve ter condições objetivas para que seja possível a

utilização permanente (constante) da servidão predial: não pode ser constituída

para benefício passageiro (momentâneo) em favor do prédio dominante;

3) prédio dominante e prédio serviente devem ser vizinhos (não é necessário que

sejam contíguos, podem ser separados por via pública);

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4) ninguém pode constituir servidão sobre imóvel que lhe pertença, mas, tão

somente, sobre coisa alheia;

5) a obrigação imposta ao proprietário do prédio serviente somente pode consistir

num “não fazer” ou num “tolerar” e não num “fazer”;

6) a servidão predial é indivisível: ela surge ou se extingue por inteiro e não

fracionadamente;

7) no direito clássico, o proprietário do prédio dominante não podia alienar, dar em

usufruto, penhor ou arrendamento a servidão de que fosse titular; no direito

justinianeu admitiu-se a alienação, se consentida no título constitutivo da servidão

ou se houvesse o assentimento do proprietário do prédio serviente, e que fosse

dada em usufruto ou em penhor a servidão predial rústica.

Espécies de Servidões Prediais

As servidões poderiam ser de vários tipos, os mais comuns eram:

1) Rústicas (prédios com atividades rurais) (mais antigas)

Autorizavam o dono do prédio dominante a fazer alguma coisa que deveria ser

tolerada pelo dono do prédio serviente (ex. servidão de passagem).

Mais antigas:

a) de passagem:

Iter - passagem à pé, a cavalo ou em liteira; (espécie de cadeirinha coberta,

sustentada por dois longos varais e conduzida por duas bestas ou dois homens,

um colocada à frente e o outro atrás)

Actus – passagem com rebanhos ou carros;

Via – acumulação dos direitos decorrentes do iter e do actus.

Aquaeducto – água.

Mais recentes:

Servitus aquae haustus – dava o direito de tirar água do prédio serviente;

Servitus pascendi – atribuía o direito de apascentar gado no imóvel serviente;

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Servitus arenae fodiendae – dava o direito de tirar areia do prédio serviente.

b) Urbanas

As servidões prediais urbanas são mais recentes do que as mais antigas servidões

prediais rústicas.

São constituídas em favor e no interesse de uma construção e têm caráter negativo

com relação ao proprietário do prédio serviente (obrigação de não-fazer).

Agrupam-se em três categorias:

1) servitutes aquarum (servidões de água):

servitus stillicidii

servitus fluminis

Ambas davam o direito de fazer escoar água da chuva, diretamente ou por meio de

conduto, para o prédio serviente.

2) servitutes parietum (servidões de paredes):

servitus tigni immittendi – atribuía o direito de colocar trava no muro ou na parede

do imóvel serviente;

servitus proiciendi – dava o direito de avançar sobre o imóvel vizinho balcões,

galerias ou telhados;

3) servitutes luminum (servidão de luzes):

servitus altius non tollendi – dava ao proprietário do imóvel dominante o direito de

exigir que o vizinho não fizesse construções que ultrapassassem determinada

altura;

servitus ne luminibus, ne prospectui officiatur – dava ao proprietário do prédio

dominante o direito de exigir do vizinho que não fizesse construções que

diminuíssem a luz ou a vista do imóvel dominante.

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Modos de constituição das servidões prediais

Direito pré-clássico

Em princípio só existiam servidões rústicas, que eram res mancipi. Assim,

constituíam-se pelos modos de aquisição de propriedade dessa categoria:

mancipatio e in iure cessio.

Podiam surgir por usucapião, o que foi abolido pela lex Scribonia (posterior a 69

aC).

Posteriormente, no início do Principado, as servidões passaram a ser consideradas

coisas incorpóreas e não puderam mais ser constituídas pelos modos de aquisição

da propriedade em que a posse fosse elemento essencial: traditio e usucapião.

Direito clássico – é preciso distinguir entre os modos de constituição das servidões

sobre imóveis itálicos do das servidões sobre imóveis provinciais.

Imóveis itálicos:

1) in iure cessio – proprietário do prédio que será o dominante intenta contra o

proprietário do prédio que será o serviente uma vindicatio servitutis ficticia e, não se

defendendo este, surge para aquele o direito de servidão predial;

2) mancipatio – somente para as quatro servidões prediais mais antigas: iter, via,

actus e aquaeductus;

3) deductio – cláusula incluída no ato de alienação (mancipatio ou in iure cessio)

reservando para o alienante uma servidão sobre a coisa alienada em favor de outro

prédio seu;

4) adjudicatio – feita pelo iudex numa ação divisória, constituindo servidão em favor

dos prédios divididos entre as partes;

5) legado per vindicationem – constituía servidão em favor do legatário ou

reservava a servidão, para o herdeiro, sobre o imóvel destinado ao legatário.

Imóveis provinciais

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Não era possível constituir sobre eles servidão com base no ius civile. Assim, os

magistrados das províncias, com base no ius honorarium, protegiam situações

idênticas às decorrentes da servidão.

Para constituí-las utilizavam-se de pactos e estipulações (acordos seguidos de

pena em caso de inadimplemento).

Era possível, ainda, que os pactos e estipulações (pactionibus et stipulationibus)

fossem utilizados em Roma e na Itália para a constituição das chamadas servidões

pretorianas, porque estavam sob a tutela do pretor.

Direito justinianeu:

Mancipatio e in iure cessio desapareceram.

Persistiram o legado, a adjudicatio e a deductio.

Desapareceu a distinção entre imóveis itálicos e provinciais, razão pela qual os

pactos e estipulações passaram a ser o modo mais comum para a constituição das

servidões inter vivos.

Surgem 2 novos modos de constituição:

traditio servitutis – adquiria-se a servidão predial pelo fato de o proprietário de um

imóvel tolerar expressamente o exercício de determinada servidão pelo prédio

vizinho.

praescriptio longi temporis – ocorria quando o proprietário de um imóvel, em favor

deste e por longo tempo (10 anos entre presentes e 20 entre ausentes), houvesse

exercido, poder sobre o imóvel vizinho sem oposição do proprietário.

Exercício da servidão predial

Constituída a servidão predial o proprietário do prédio dominante pode exercer

todas as faculdades que integram o conteúdo desse direito.

Entretanto:

deve causar o menor transtorno possível ao prédio serviente;

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deve realizar todas as obras (inclusive reparos) indispensáveis ao exercício do seu

direito.

Extinção das servidões

Operava-se pela ocorrência de um os seguintes fatos:

destruição do prédio dominante ou serviente;

mudança na situação de um dos prédios que torna impossível o exercício da

servidão (ex. prédio serviente passa a ser coisa fora do comércio);

renúncia à servidão pelo seu titular;

não-uso da servidão (2 anos no período clássico; 10 entre presentes e 20 entre

ausentes no período justinianeu), quando se tratar de servidões que ser exercem

por atuação positiva de seu titular (ex. servidão de passagem);

usucapio libertatis – ocorre quando, tratando-se de servidões cujo titular tem o

direito de impedir que o proprietário do prédio serviente faça alguma coisa, este

pratica ato que lhe é proibido, e o titular da servidão, nos mesmos prazos

assinalados para o “não-uso” não se opõe a esse ato;

confusão – quando o proprietário do prédio dominante torna-se proprietário do

prédio serviente ou vice-versa.

Proteção judicial das servidões

vindicatio servitutis (semelhante à rei vindicatio) – ação pela qual o autor afirma o

seu direito contra qualquer proprietário do prédio serviente que negue a existência

da servidão.

Justiniano denominou tal ação como actio confessoria.

Servidões que não gozassem de proteção pelo ius civile eram protegidas pelo ius

honorarium (actio in rem utilis), inclusive a posse das servidões por meio de

interditos.

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SERVIDÕES PESSOAIS

São direitos reais sobre coisa alheia estabelecidos em favor de determinada

pessoa.

Usufruto, uso, habitação, trabalhos de escravos e animais.

Característica: por proporcionarem maior gravame sobre a propriedade alheia,

sofriam limitação no tempo (não eram perpétuos).

Usufruto – direito a usar e gozar de uma coisa alheia: usus + fructus.

É limitado no tempo, não pode ser perpétuo.

Dura, no máximo, até a morte de seu titular (usufruto vitalício). Se o titular falecer

antes, extingue-se.

Pessoa jurídica – máximo 100 anos (limite da vida humana).

Partes:

1) Nu-proprietário – está despido de algumas de suas faculdades de titular do

domínio, tem a esperança de ter a coisa de volta (daí a limitação temporal).

2) Usufrutuário.

Deveres do usufrutuário: 1) usar a coisa e perceber seus frutos de forma prudente

e cuidadosa, sem alterar sua substância (bono viri arbitratu); 2) devolver a coisa

findo o prazo; e, 3) prestar caução para assegurar a devolução da coisa no estado

em que foi recebida.

Dever do nu-proprietário – tolerar o uso e gozo de seu bem pelo usufrutuário, sem

efetuar qualquer tipo de interferência.

Ius alienis rebus utendi fruendi, salva rerum substantantia

Daí:

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a coisa não podia ser modificada nem para melhor nem para pior:

se a coisa perecesse ou ficasse de tal modo alterada em sua substância o usufruto

estava extinto;

só podia recair, via de regra, sobre coisa inconsumível (há exceções).

Era direito intransferível, porém seu uso poderia ser cedido de forma gratuita ou

onerosa.

Quase-usufruto (usufruto irregular) – surgiu no início do Principado por obra de um

senatusconsulto, permitindo o usufruto sobre coisa consumível.

O usufrutuário passava a ser dono da coisa, tendo que devolver outra de mesma

espécie, quantidade e qualidade (genus nunquam perit).

USO – direito de usar coisa alheia, não podendo, inicialmente, perceber seus

frutos. Posteriormente admitiu-se a percepção dos frutos para a satisfação das

necessidades do seu titular e sua família.

Não podia ser alienado ou cedido.

HABITAÇÃO, TRABALHO DE ESCRAVOS E DE ANIMAIS

Habitação – direito de usar uma casa como moradia (habitá-la).

Trabalho de escravos e de animais – direito de usar serviços de escravos ou de

animais de carga.

SUPERFÍCIE E ENFITEUSE

Eram institutos que suprimiam quase que por inteiro o direito do proprietário sobre

a coisa, pois conferiam ao seu titular direitos muito amplos.

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Superfície

Era o direito de usar e gozar, por longuíssimo prazo um terreno urbano alheio para

fins de construção, contra o pagamento de um foro anual ao proprietário do terreno.

A construção sempre pertenceria ao proprietário do terreno por acessão

(superficies solo cedit), mas o superficiário tinha um direito real oponível erga

omnes (utendi, fruendi et abutendi).

Era alienável a título gratuito e oneroso, e transferia-se aos herdeiros.

Enfiteuse

Era o direito de usar e gozar por tempo ilimitado, de um prédio rústico alheio, para

cultivo, contra o pagamento de um foro anual ao proprietário.

Os direitos do enfiteuta são quase iguais ao do proprietário :

1) pode transformar o terreno, modificando-o substancialmente, mas não

deteriorando-o;

2) adquire os frutos pela separação;

3) seu direito é alienável e se transfere aos herdeiros;

4) pode gravá-lo por servidão, ou empenhá-lo.

5) tem a posse do terreno (possessio ad interdicta).

Direitos do proprietário:

1) percepção do foro anual (cânon);

2) expectativa de recuperar a inteireza de seu domínio caso a enfiteuse se

extinguir;

3) laudêmio, que era a percentagem de 2% do preço pela alienação do direito da

enfiteuse, devida pelo alienante ao proprietário;

4) preferência, em caso de venda.

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Extinguia-se a enfiteuse (aplica-se também à superfície):

1) Pela destruição da coisa;

2) Reunião na mesma pessoa, das qualidades de titular da enfiteuse e do domínio;

3) Renúncia;

4) Ou como pena por não pagar o enfiteuta durante 3 anos o foro anual, ou não

avisar o proprietário para que ele pudesse exercer o seu direito de preferência em

caso de venda da enfiteuse.

Direitos Reais de Garantia

Utilidade: garantir o cumprimento de uma obrigação assumida.

Garantias reais X Garantias pessoais:

pessoal, uma pessoa se responsabiliza a pagar ao credor, caso o devedor não o

faça;

real, uma coisa fica vinculada para tal fim.

É acessório: pressupõe uma relação obrigacional principal.

Cessando a obrigação principal, extingue-se a garantia também.

Fiducia Cum Creditore

É a garantia de uma obrigação principal por meio da transferência da propriedade

de uma res mancipi ao credor.

Efetuava-se por meio da mancipatio ou in iure cessio com cláusula (pactum

fiduciae) adjeta, conforme a qual o credor se obrigava a devolver a coisa

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retransferindo a propriedade, logo após receber o que lhe era devido pela

obrigação principal garantida.

Efeitos:

1) O credor tornava-se dono da coisa, com a obrigação de devolve-la após o

cumprimento da obrigação principal.

2) Durante a fidúcia ele tinha todos os direitos de proprietário.

3) Inicialmente, caso o devedor não pagasse a dívida, o credor ficava dono da

coisa (podendo receber mais ou menos do que a obrigação principal), daí instituiu-

se o pactum ut vendere liceret (pacto de poder vender a coisa). Se a dívida não

fosse coberta o devedor continuava obrigado pelo restante.

Desapareceu no período pós clássico.

Pignus

Transferência da posse da coisa dada em garantia ao credor, que tinha nesta

qualidade, a proteção possessória contra qualquer turbação alheia, inclusive por

parte do dono.

O credor não podia dispor juridicamente da coisa, mas a tinha em seu poder de

fato, assegurando-se a possibilidade de, por meio dela, obter o pagamento da

dívida caso o devedor não o fizesse.

Efeitos:

1) Só tinha o direito de possuir a coisa (a partir da constituição do penhor, com a

traditio).

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2) não comportava mais de um penhor sobre a mesma coisa.

Anticrese

É o acordo que previa que os frutos da coisa penhorada pertencessem ao credor

pignoratício. Percebia os frutos até sua soma atingir o montante da obrigação

principal.

Se credor hipotecário usasse a coisa empenhada sem expressa autorização

cometia furto.

Lex comissoria – cláusula acessória que estabelecia que a coisa passaria a ser de

propriedade do credor pignoratício caso o devedor não cumprisse sua obrigação.

Ius distrahendi – cláusula acessória que autorizava o credor pignoratício a vender a

coisa para satisfazer-se de seu crédito.

No séc. IV dC a lex Comissoria foi proibida, restando apenas o ius distrahendi a ser

aplicado no penhor e na hipoteca. Se não houvesse comprador o credor poderia

pedir a adjudicação da coisa ao imperador (impretatio dominii).

Hipotheca

É a garantia real estabelecida pelo simples acordo, sem que a respectiva

propriedade ou posse da coisa passasse ao credor. A coisa dada em garantia

ficava vinculada simplesmente pelo acordo, tendo o credor um direito oponível

contra todos de, por meio dela, obter satisfação do seu crédito, se não liquidado

pelo devedor.

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A coisa não era entregue ao credor, como na fidúcia ou no penhor.

Efeitos:

1) tinha o direito de possuir a coisa após o inadimplemento da obrigação principal.

2) comportava mais de uma hipoteca sobre a mesma coisa, observando-se a regra

do prior in tempore, potior in iure (credor mais recente ficava com o execedente).

3) admitia subrogação ao credor mais recente caso esse se oferecesse a pagar o

débito ao credor mais antigo (ius offerendi).

DIREITO DAS OBRIGAÇÕES

Esfera de direitos da pessoa:

Patrimoniais: reais e pessoais (obrigacionais)

Personalidade.

Direitos reais:

há relação entre o titular do direito e a coisa: existe o exercício de um poder direto

e imediato;

são exercidos de maneira erga omnes (sujeito passivo universal); ninguém pode

turbar o exercício desses direitos.

Direitos pessoais:

o poder do titular atua sobre uma pessoa (devedor), que lhe deve uma prestação

de conteúdo econômico;

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são exercidos inter partes: relação somente entre o titular do direito (credor) e uma

pessoa (devedor) determinada ou determinável, a quem incumbe dar, fazer ou não

fazer algo.

Os romanos faziam essa dicotomia no plano processual: actio in rem e actio in

personam.

Conceito de Obrigação

É a relação jurídica pela qual alguém (devedor, sujeito passivo) deve realizar uma

prestação (dar, fazer ou não-fazer) de conteúdo econômico, em favor de outrem

(credor, sujeito ativo).

D, 1, 3, 13, pr.

Obligatio est iuris vinculum, quo necessitate adstringimur alicuius solvendae rei

secundum nostrae civitatis iura (A obrigação é um vínculo jurídico pelo qual

estamos obrigados a pagar alguma coisa, segundo o direito de nossa cidade).

Paulus, D. 44, 7, 3 pr

Obligationum susbstantia non in eo consistir, ut aliquod corpus nostrum aut

servitutem nostram faciat, sed ut alium nobis obstringat ad dandum aluquid vel

faciendum vel praestandum (A essência da obrigação não consiste em nos tornar

proprietários ou em nos fazer adquirir uma servidão, mas em obrigar alguém a nos

dar, fazer ou prestar alguma coisa).

Elementos essenciais na obrigação

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sujeitos ativo e passivo

vínculo existente entre eles (liame subjetivo)

objeto da relação jurídica

Sujeitos – são as partes na obrigação (com personalidade jurídica).

Ativo – credor, titular do direito de crédito.

Passivo – devedor, aquele a quem incumbe o dever jurídico de conteúdo

patrimonial.

Vínculo – é o liame que une as partes na obrigação.

Em princípio era material, o devedor respondia com seu próprio corpo, podendo ser

reduzido à condição de escravo através da manus injectio (actio per manus

injectinem), ação pela qual o credor podia vender o dever como escravo, além do

Rio Tibre.

Tábua Terceira, da Lei das XII Tábuas, lei n. 9:

“Tabula Tertia – De rebus creditis – 9: As si plures erunt rei, tertis nundinis parteis

secanto; si plus minusve secuerunt, se fraudEsto: Si volent, uls Tiberim peregre

venumdanto”

Se são muitos os credores, é permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o

corpo do devedor em tantos pedaços quantos sejam os credores, não importando

cortar mais ou menos; se os credores preferirem, poderão vender o devedor a um

estrangeiro, além do Tibre”.

A partir do século IV aC (326 aC), com o advento da Lex Poetelia Papiria, não mais

se admitiu a execução pessoal, passando a execução a ser patrimonial: o

patrimônio do devedor, e não o seu corpo, respondia pelo cumprimento da

obrigação.

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Objeto – é a prestação: dar, fazer ou não fazer algo.

Dar – obriga o devedor a transferir a propriedade de uma coisa ou um direito real

limitado sobre uma coisa. Ex. compra de geladeira.

Fazer – implica na realização de um ato qualquer que não transfira direito ao

credor (ex. construir um muro) ou de omitir-se, não fazer (não construir acima de

certa altura, cláusula de confidencialidade etc.).

Requisitos para a validade da prestação:

ser possível física e juridicamente – ex. física: coisa que nunca existiu ou que não

pode mais existir, ato impossível de ser praticado por qualquer homem; jurídica –

coisa fora do comércio.

ser lícita – não atentar contra o direito objetivo nem contra os bons costumes

(licitude X legalidade). Ex. compra e venda de drogas, prostituição.

ser determinada ou determinável – no momento da formação da obrigação deve-se

saber qual será a prestação (determinada) ou ao menos estabelecer uma

circunstância que irá, posteriormente, determina-la (determinável). Ex. o cavalo X

ou toda minha produção agrícola.

ter caráter patrimonial – ser passível de avaliação em dinheiro, para eventual

indenização por perdas e danos.

OBRIGAÇÃO E RESPONSABILIDADE: diferenças

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Obrigação: surge da vontade dos indivíduos ou da lei e deve ser cumprida

espontaneamente.

Responsabilidade: surge quando a obrigação não é cumprida espontaneamente.

Alemanha: Schuld (débito) e Haftung (responsabilidade): Brinz

Uma existe, via de regra, seguida da outra, mas há exceções:

débito sem responsabilidade – dívida de jogo, dívida prescrita (é obrigado, mas não

é responsável).

responsabilidade sem débito – fiador (é responsável, mas não é obrigado, o

obrigado é o inquilino).

MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES

Quanto ao objeto:

genéricas

específicas

alternativas

facultativas

divisíveis

indivisíveis

Quanto aos sujeitos:

ambulatórias (propter rem)

parciais

solidárias

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Quanto ao vínculo:

civis

honorárias

naturais

QUANTO AO OBJETO

Genéricas – têm por objeto coisa determinada pelo seu gênero, quantidade, ou

qualidade (5 sacas de café): genus nunquam perit. O devedor não se exonera do

cumprimento da obrigação por ter a coisa perecido, pois pode substituí-la.

Específicas – têm por objeto coisa específica (Teoria Tridimensional do Direito

autografada por Miguel Reale). Se a coisa perecer, resolve-se em perdas e danos.

Alternativas – são aquelas em que o devedor, para liberar-se, deve realizar uma

dentre duas ou mais prestações previstas no vínculo obrigacional (ex. ou o cavalo

X ou cavalo Y). Não havendo determinação expressa, a escolha cabia ao devedor.

Facultativas – o devedor está obrigado a realizar apenas uma prestação, mas a ele

é facultado liberar-se da obrigação efetuando outra prestação. Ex. entrega o cavalo

X ou paga multa de R$ 10.000,00.

Diferenças entre alternativa e facultativa:

Facultativa – apenas 1 prestação é devida, é facultado liberar-se efetuando

outra prestação (multa)

Alternativa – há duas ou mais prestações, mas o devedor se desobriga realizando

aquela em que recair a escolha.

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Divisíveis – quando a prestação pode ser fracionada sem alterar sua função

econômico-social. Ex. entrega de 100 sacas de café.

Indivisíveis – quando a prestação não pode ser fracionada sem alterar sua função

econômico-social. Ex. entregar um cavalo, não revelar um segredo

(confidencialidade).

QUANTO AOS SUJEITOS

Ambulatórias (propter rem, de sujeito variável) – são aquelas em que a posição de

credor ou devedor compete a quem se encontre em determinada relação com uma

coisa ou uma pessoa. Ex. escravo comete delito, IPTU.

Parciais – são aquelas em que cada credor tem o direito (pluralidade de credores)

ou cada devedor está obrigado (pluralidade de devedores), à parte da prestação e

não a toda ela (fracionamento em quotas-partes). Ex. devedor deve R$ 100,00 e

falece, deixando patrimônio para 2 herdeiros: cada um deles estará obrigado a

pagar, de sua quota parte no patrimônio recebido, R$ 50,00.

Solidárias – cada credor tem o direito (pluralidade de credores) ou cada devedor

está obrigado (pluralidade de devedores) à prestação inteira.

Ativa – entre credores

Passiva – entre devedores

Fontes da solidariedade:

Lei (delito, dívida deixada por de cujus) ou vontade das partes (contrato ou

testamento).

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A solidariedade não se presume.

Requisitos da solidariedade:

pluralidade de credores ou de devedores;

identidade de prestação (devedores) ou de pretensão (credores);

deve surgir de forma única, instantânea, sem intervalos.

QUANTO AO VÍNCULO

Civis – gozam de proteção jurídica e são sancionadas pelo ius civile.

Honorárias – gozam de proteção jurídica e são sancionadas pelo pretor (ius

honorarium).

Naturais – são despidas de proteção jurídica, embora, uma vez cumpridas,

produzam efeitos jurídicos.

Uma parte não pode exigir da outra, mas uma vez cumprida não é permitido repetir

o indébito. Ex. dívida prescrita, obrigação assumida por alieni iuris.

EFICÁCIA JURÍDICA OBRIGACIONAL

Responsabilidade por inadimplemento

Quem se obriga deve necessariamente cumprir a prestação a que se obrigou, deve

adimplir o débito.

Cumpre-se, portanto, a obrigação, pelo adimplemento, pagamento, solução,

liquidação.

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O inadimplemento gera uma pretensão para o credor em face do devedor: devedor

poderia ser processado (actio in personam) para cumprir compulsoriamente a

obrigação.

Causas de inadimplemento:

Dolo, culpa, caso fortuito e força maior

Dolo – intenção, vontade livre e consciente de produzir um resultado lesivo a

outrem, má-fé.

Culpa – não tem intenção de prejudicar outrem, mas o faz por imperícia,

negligência ou imprudência.

Culpa leve – negligência leve segundo o critério do homo medius

(bonuspaterfamilias)

Culpa lata – negligência absurda, exorbitante, inescusável segundo o critério do

homo medius (bonuspaterfamilias)

Caso nem o homem mais prudente e cauteloso pudesse evitar, estaríamos diante

do caso fortuito e da força maior.

Caso fortuito – evento necessário e inevitável (irresistível) decorrente de

acontecimento da natureza, sem qualquer intervenção da vontade humana, que

impossibilita o cumprimento da obrigação. Ex. enchente destrói ponte e o devedor

não pode entregar a coisa ao credor; raio mata cavalo, incêndio etc.

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Força maior – evento necessário e inevitável (irresistível) decorrente de atuação

humana, que impossibilita o cumprimento da obrigação. Ex. Seqüestro, assalto,

coação absoluta etc.

Em ambos os casos existe ausência de culpabilidade do devedor, que fica isento

de pagar indenização por perdas e danos ou, conforme o caso, de cumprir a

obrigação.

Modernamente não há diferenças na doutrina, pois e eficácia é a mesma para

ambos os casos.

Regras:

Devedor só responde por dolo próprio e não por culpa quando se tratar de

obrigações provenientes de contrato em que ele não lucra (só a outra parte lucra).

Ex. depósito gratuito.

Devedor responde por dolo e por culpa nas obrigações provenientes do contrato

em que ele lucra (ex. comodato, locação etc.)

Culpa lata era equiparada ao dolo para os casos em que o devedor não tivesse

vantagem no negócio (ex. depósito gratuito);

No mandato e na gestão de negócios havia responsabilidade do devedor, além do

dolo, pela culpa leve, mesmo que a obrigação fosse tão somente no interesse

exclusivo do credor.

Não havia responsabilidade por caso fortuito ou força maior, exceto em caso de

mora e, também dos hoteleiros e transportadores, que respondiam por força maior.

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MORA

É o atraso no cumprimento da obrigação, a delonga, a procrastinação.

Credor e devedor podem estar morosos: atraso na aceitação ou no pagamento.

Mora do devedor

Ocorre quando o credor, por motivo a ele imputável, não paga a dívida no

vencimento.

Direito clássico – não necessitava interpelação para constituir devedor em mora;

Direito justinianeu – necessitava.

Conseqüências:

Aumento de responsabilidade do devedor – responde por dolo, culpa, caso fortuito

e força maior. No período imperial admitiu-se que o devedor pudesse provar que a

coisa pereceria ainda que estivesse nas mãos do credor. Ex. enchente em estábulo

de ambos.

Pagamento de juros e devolução de frutos adquiridos durante a mora.

Tudo isso ocorria para colocar o credor em uma posição análoga àquela em que a

mora não tivesse ocorrido.

Mora do credor

Ocorre quando o credor não aceita a prestação oferecida pelo devedor na data do

seu vencimento.

Conseqüências:

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Diminui responsabilidade do devedor (só dolo) e aumenta a responsabilidade do

credor;

Indenização pelas despesas efetuadas e danos ocorridos durante a mora.

Purgação da mora:

Com o pagamento ou aceitação da prestação devida mais eventuais indenizações.

Fontes das obrigações:

Contrato – acordo de vontades

Quase-contratos – sem acordo de vontades (ex. gestão de negócios)

Delito – ilícito doloso

Quase-delito – ilícito culposo

Modernamente são fontes das obrigações: lei, contrato, ato unilateral, ato ilícito e

títulos de crédito.

Garantia das Obrigações

O inadimplemento de uma obrigação poderia ser, de um lado, voluntário do

devedor, que se recusava a cumpri-la, ou, por outro, por incapacidade física ou

econômica do mesmo. O interesse do credor era garantir-se frente a essas

possibilidades. As garantias eram as figuras jurídicas de proteção ao credor.

Garantias eram relações jurídicas acessórias que poderiam ser acrescentadas a

uma obrigação principal a fim de reforçar-lhe o vínculo ou assegurar-lhe o

cumprimento.

Características:

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Eram: 1) acessórias; 2) voluntárias (surgiam a partir da manifestação da vontade

das partes).

Não confundir com as garantias legais, que eram dadas pelo próprio patrimônio do

credor (Lex Poetelia Papiria)

Reforço das obrigações

Arras - era um sinal, a entrega de uma coisa ou uma quantia em dinheiro, com o

objetivo de confirmar a celebração do contrato ou para garantir o seu cumprimento.

Arras confirmatórias - representavam uma confirmação da realização do contrato

(direito clássico).

Arras penitenciais – a parte que rescindia unilateralmente o contrato perderia o

valor das arras:

Rescisão por parte de quem deu – perderia em favor do outro;

Rescisão por parte de quem recebeu – deveria devolver em dobro.

b) Multa Contratual (cláusula penal) (“poena conventionalis”), era a cláusula

inserida no contrato, por meio da qual o devedor obrigava-se a pagar uma

indenização pecuniária, pré-fixada, em caso de inadimplemento da obrigação, a

título de pena. Representava o acerto preliminar, líquido e certo das perdas e

danos, dispensando uma ação judicial para sua determinação.

Garantias Reais

Eram garantias que atribuíam ao credor um direito real sobre coisa pertencente ao

devedor. Poderiam ser:

a) Fidúcia - consistia na transferência de uma coisa do devedor ao credor com a

inserção de uma cláusula que obrigava o credor a retransferir a propriedade da

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coisa quando houvesse o pagamento da dívida; isto é, quando houvesse o

cumprimento da obrigação principal.

b) Penhor - garantia real que consistia na transferência atual da posse de uma

coisa do devedor ao credor. O credor tinha a posse, mas o devedor continuava

proprietário. O credor pignoratício tinha o direito de possuir sem o direito ao uso da

coisa. Segundo um acerto entre as parte, o credor poderia colher os frutos da

coisa, como forma de abatimento da dívida ("anticrese").

ius distrahendi - direito de vender a coisa em nome do proprietário, caso a dívida

não fosse paga.

lex comissoria - direito de tomar a coisa para si como proprietário em caso de não

pagamento.

c) Hipoteca - seguia, em linha gerais, os princípios do penhor. No entanto,

transferia ao credor o direito real em potência, no caso de não ser paga a dívida, de

tomar a posse da coisa e vendê-la em nome do proprietário/devedor.

Garantias Pessoais

Eram aquelas que geravam um aumento de pessoas responsáveis pelo

cumprimento da obrigação. Poderiam ser:

a) Solidariedade Passiva - beneficiava o credor que poderia cobrar a obrigação

integral de qualquer um dos devedores.

b) Fiança - contrato acessório pelo qual um terceiro (devedor acessório ou fiador)

juntava-se ao devedor principal, obrigando-se pelo cumprimento da obrigação caso

este não fizesse. Do fiador somente seria exigida a obrigação caso o devedor não

a cumprisse. Historicamente a fiança foi instituída por três formas de contratos

verbais, (“stipulatio”) que adquiriam força jurídica através de palavras solenes:

* “Sponsio” - cidadãos romanos e latinos;

* “Fideipromissio” - estrangeiros, e

* “Fideiussio” - que não era limitada por lei, como as outras duas, aplicava-se a

todos os tipos de contrato e era transmissível aos herdeiros.

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O fiador tinha alguns benefícios:

“beneficium excussionis” (exigir que o devedor principal fosse acionado primeiro),

“beneficium divisionis” (concedido aos co-fiadores que responderiam apenas por

sua cota da dívida) e

direito de regresso (satisfeita a dívida principal pelo fiador, surgia para ele, “ipso

iure”, automaticamente, o direito de regresso contra o devedor principal).

c) Mandato de Crédito - era o Mandato de dar em Mútuo uma determinada quantia

a um terceiro. Deixando o mutuário de cumprir a obrigação, o mutuante

(mandatário) poderia cobrar do mandante as despesas que teve. Dessa forma, o

mandante exercia uma função análoga à do fiador.

Transmissão das Obrigações

O Direito Romano não entendia os credores e devedores como sendo substituíveis,

como entende hoje o Direito Moderno.

Consideravam as relações obrigacionais como sendo intransferíveis.

Entretanto, as exigências do comércio forçaram a criação de institutos que

permitissem essa transmissão. Seguindo a evolução, esses instituto foram:

a) “Delegatio” - permitia que o credor passasse uma prestação, devida por um

devedor, a outrem. Para isso fazia uma Novação da Obrigação (“novatio”). Dessa

forma, criava-se uma nova obrigação, idêntica à anterior, feita entre o devedor e o

novo credor, por ordem do antigo credor (“delegatio activa”). Com a nova obrigação

cessavam os efeitos da obrigação originária, inclusive suas garantias.

Operação semelhante transmitia uma obrigação de um devedor a outro (“delegatio

passiva”).

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As duas formas somente poderiam ser realizada pela “stipulatio”.

b) “Procuratio in Rem Suam” - o credor fazia-se representar por um procurador, um

mandatário especial, incumbido de agir em interesse do mandante no processo

contra o devedor (“mandatum agendi”).

O mandante renunciava à ação pela qual exigia a prestação de contas do

mandatário, que, desta forma, mantinha para si a prestação percebida.

c) “Actiones Utiles” (actiones ficticiae) - eram baseadas na ficção que credor,

legalmente, cedia seu direito a outrem; era uma ficção, pois o direito estrito não

permitia essa transmissão.

Poderia ser feita tanto a título gratuito quanto oneroso e o crédito era cedido nas

mesmas condições que existiam antes.

Extinção das Obrigações

Formas de extinção dependentes da vontade das partes:

a) “Solutio” - era o pagamento da obrigação, seu modo natural de extinção. O

adimplemento da obrigação extinguia o liame entre o devedor e o credor.

b) “Compensatio” - a compensação pressupunha a existência de mais de uma

obrigação entre as partes, sendo elas, ao mesmo tempo, credor e devedor uma da

outra. Tais obrigações recíprocas extinguiam-se pela compensação quando

equivalentes, continuando devido o excedente não compensado. Não se

processava “ipso iure”, era necessário que as partes a convencionassem.

c) “Novatio” - a novação era a extinção da obrigação com sua substituição por uma

nova, com o mesmo conteúdo da anterior, com prestação idêntica. Apesar disso, a

nova prestação necessitava algum elemento novo que justificasse a novação. A

novação extinguia “ipso iure” a obrigação antiga com todos os seus acessórios

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d) Acordo entre as partes - quando as partes, de comum acordo e livremente,

decidiam extinguir a obrigação. Isso poderia acontecer, p. ex., com a remissão da

dívida do devedor pelo credor.

Formas de extinção independente da vontade das partes:

As obrigações também poderiam ser extintas independente da vontade das partes.

Para o Direito Romano esses casos eram:

1) Impossibilidade - quando o cumprimento se torna impossível, exceto se a

impossibilidade for causada pelo devedor.

2) Morte - em certos casos, a morte das partes extinguia a obrigação.

3) “Capitis Deminutio” do devedor, exceto nas obrigações ex delicto.

4) “Confusio” - a confusão é representada quando credor e devedor passam a ser a

mesma pessoa; é o caso do herdeiro universal de seu credor.

5) “Concursus Duarum Causarum Lucrativum” - pelo cumprimento de uma de duas

obrigações a título gratuito, com o mesmo objeto. Como o objeto é o mesmo, o

cumprimento de uma das obrigações extingue a outra. Ex. alguém nomeia seu

herdeiro de determinada coisa a quem também faz doação, para entrega futura da

mesma coisa. Morrendo o testador antes de vencido o prazo para entrega da coisa

doada, o herdeiro recebe como tal a coisa, extinguindo-se a obrigação.

6) Prazo - pelo decurso do prazo de vigência convencionado pelas partes ou

determinado por lei.

7) Condição Resolutiva - pela verificação da condição resolutiva nas obrigações

sujeitas a essa espécie de condição.

8) Obrigação Acessória - a extinção da obrigação principal extingue a acessória.

9) Ordem Legal - quando uma ordem legal extingue uma obrigação a título de

penalidade. Quando, por exemplo, o credor se apossa de bens do devedor.

CONTRATOS

Conceito

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Modernamente, o conceito é o ato jurídico bilateral que tem por finalidade produzir

conseqüência jurídicas.

No Direito moderno, todo o contrato gera uma obrigação.

No Direito Romano, o simples acordo não gerava uma obrigação: era preciso um

fundamento jurídico de ordem objetiva, a "causa civilis" (forma ou entrega da

coisa), que elevava o ato jurídico a um "contractus".

Contratos formais

O Direito Romano primitivo somente conheceu os contratos formais: o "nexum" e a

"stipulatio". Ambos eram compostos por cerimônias formais semelhantes à

"mancipatio", que criavam um vínculo entre credor e devedor.

"nexum" - empréstimo que transferia a propriedade de um objeto, principalmente

dinheiro, com a obrigação de devolvê-lo (per aes et libram: 5 testemunhas, balança

e portador, objeto, prática de atos formais e simbólicos). Semelhante à mancipatio.

"stipulatio" – além da transferência da propriedade do objeto, cria a obrigação de

devolver outro tanto de mesma espécie, quantidade e qualidade (genus).

Era promessa solene de uma prestação com caráter sacramental.

Spondere = prometer.

Com o desenvolvimento da sociedade romana e do comércio, os dois tipos de

contrato acabaram por ficar ineficientes:

"nexum" caiu em desuso;

"stipulatio" continuou em vigor, sendo classificada como um contrato verbal.

Alguns poucos atos, por influência grega, passaram a ser documentados, sendo

chamados de contratos literais.

Requisitos dos contratos

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Genéricos – existem em todo e qualquer contrato.

Capacidade e legitimação das partes

Manifestação de vontade isenta de vícios;

Objeto lícito, possível, determinado ou determinável.

Específicos – existem em determinado contrato (ex. o preço na compra e venda).

Contratos Reais

São aqueles que, para se perfazerem, necessitam, além do acordo de vontade das

partes contratantes (conventio), da efetiva entrega de uma coisa com a

subseqüente obrigação de restituí-la.

a) "Mutuum" (mútuo) - era a entrega, com a transferência da propriedade, de uma

coisa fungível, especialmente dinheiro, com a obrigação para aquele que recebe de

devolver a mesma quantidade, no mesmo gênero e qualidade.

Partes – mutuante (credor) / mutuário (devedor).

Características:

Era unilateral: só gerava obrigações para uma das partes.

Só se realizava após a entrega da coisa, transferindo a posse e a propriedade.

Não previa a entrega de juros, que deveriam ser convencionados em uma contrato

em separado, por meio da "stipulatio". A ação do credor contra o devedor para

compeli-lo à devolução era a "condictio creditae pecuniae", no caso de dinheiro, e a

“condictio triticaria”, no caso de outra coisa fungível.

b) "Commodatum" (comodato) - contrato real sobre bens infungíveis onde o

comodante transferia ao comodatário apenas a detenção da coisa, durante um

prazo determinado ou para um uso específico.

Partes – comodante (credor) / comodatário (devedor)

Características:

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Era bilateral imperfeito: gerava obrigações para o comodatário e direito para o

comodante;

mas, poderia gerar obrigações para este se a coisa causasse ônus ao comodatário.

Normalmente, o uso da coisa deveria ser o natural e específico, mas poderia ser

determinada qual a forma que o comodatário usaria a coisa. Caso o uso fosse

diferente do natural, ou do que foi previsto, entendia-se que houve um “furtum

usus”.

c) "Depositum" (depósito) - contrato real pelo qual o depositante cedia uma coisa

para o depositário a fim de guardá-la, conservá-la e devolvê-la em seu estado

original.

Partes – depositante (credor) / depositário (devedor)

Características:

Era bilateral imperfeito, gerando obrigações apenas para o depositário de devolver

a coisa.

No entanto, caso o depósito da coisa gerasse algum ônus, o depositante

responsabilizava-se por ele.

Caso houvesse algum dano à coisa o depositário responderia apenas por dolo,

mas não por culpa.

O depositário não poderia usar a coisa sob o risco de responder por “furtum usus”.

d) "Pignus" (penhor) – entrega de uma coisa para servir de garantia real de uma

obrigação e para ser restituída ao extinguir-se a obrigação garantida. O credor do

contrato principal dava uma coisa, móvel ou imóvel, para o devedor do principal a

título de garantia.

Partes:

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Credor pignoratício /devedor pignoratício

Características:

Bilateral imperfeito: o credor pignoratício tinha a obrigação de devolver a coisa

dada em penhor, podendo exigir a restituição dos ônus que a coisa lhe causasse.

Era desvinculado do contrato principal.

Contratos Consensuais

São aqueles que, para se constituírem, dependem tão somente do consentimento

(consensus) das partes, não gerando a transferência da propriedade, posse ou

detenção. Poderiam ser:

a) “Emptio Venditio” (compra e venda) – as partes se obrigavam a trocar

mercadoria por dinheiro.

Partes: comprador e vendedor

Características:

Bilateral perfeito e oneroso, onde um acordo de vontades estabelecia a obrigação

de uma parte entregar a outra um coisa, em troca de um pagamento em dinheiro.

Objeto: qualquer coisa, inclusive coisas futuras, que ainda não existiam, mas viriam

a existir (“emptio rei speratae”).

Obrigações do vendedor:

1) entregar a coisa e garantir sua posse mansa e pacífica, até o momento que o

comprador pudesse adquirir a propriedade da coisa por usucapião.

2) pelos riscos da evicção: quando outra pessoa, alheia ao negócio, provasse ser o

verdadeiro proprietário da coisas; isso obrigava ao vendedor indenizar o comprador

em dobro (tinha caráter penal).

3) vícios redibitórios, aqueles que não eram percebidos em uma análise superficial,

para os quais cabiam as ações: “actio redibitoria” (que, até seis meses depois,

desfazia o negócio) e “actio quanti minoris” (que, até um ano depois, reduzia o

preço da coisa).

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A responsabilidade por evicção e vícios redibitórios poderia ser excluída

expressamente pelas partes.

Obrigações do comprador:

Pagar o preço e receber a coisa comprada.

Com o pagamento, “ipso iure”, transferia-se a propriedade do dinheiro.

O vendedor respondia por dolo e por culpa, uma vez que lucrava com o contrato:

não respondia em caso fortuito ou de força maior.

No Direito, em geral, para a coisa que desaparecia prevalecia a regra de que “res

perit domino” (a coisa perece para o dono).

No entanto, no Direito Romano, prevalecia a regra “periculum est emptoris” (risco

do comprador): o vendedor pode exigir o pagamento da mesma forma.

b) “Locatio Condutio” (locação) - era o contrato de locação.

Bilateral perfeito e oneroso.

Era o contrato mediante o qual uma parte (locador) colocava à disposição de outra

(locatário) uma coisa, ou um serviço ou a execução de uma obra. Aplicava-se a três

tipos de contratos diferentes, definidos pelos estudiosos modernos:

1) locação da coisa - (“locatio conductio rei”) cessão temporária do uso e gozo de

uma coisa mediante o recebimento de um aluguel.

2) locação de serviço - (“locatio conductio operarum”) colocava-se à disposição de

outrem os próprios serviços contra o recebimento de um salário.

3) empreitada - (“locatio conductio operis faciendi”) alguém obrigava-se a produzir

uma determinada obra, mediante a retribuição em dinheiro.

Tanto o locador quanto o locatário respondiam por dano ou culpa.

c) “Societas” - contrato que obrigava as partes a cooperar em uma atividade lícita,

visando fins lucrativos.

Não representava a formação de uma pessoa jurídica distinta de seus membros,

mas apenas um liame obrigacional entre as partes.

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A cooperação das partes era sempre temporária, dissolvendo-se:

quando os fins fossem atingidos;

quando se tornasse impossível atingir tais fins;

quando vencesse o prazo de sua existência;

pela dissolução consensual dos sócios;

renúncia de um dos sócios (se tivesse existência pré-fixada);

insolvência do sócio;

capitis deminutio;

morte.

Era um contrato bilateral perfeito.

d) “Mandatum” (mandaTo)- era o contrato mediante o qual uma parte se obrigava a

praticar um ato gratuitamente, mediante as instruções do mandante. Era válido

para qualquer ato, material ou jurídico, desde que lícito.

Partes: mandante (credor) / mandatário (devedor)

Era bilateral imperfeito, gerando obrigações apenas para o mandatário e

obrigações secundárias para o mandante caso o ato causasse algum ônus durante

sua execução.

"Pacta" (pactos)

O simples acordo não gerava obrigações no direito romano, só gerando aquele que

tinha uma "causa civilis" (elemento objetivo: forma ou entrega da coisa). A

convenção foi chamada de pacto, em contraposição ao contrato como fonte de

obrigação. Poderiam ser:

a) “Pacta Adjecta” - convenções acessórias que acompanhavam um contrato,

modificando-lhe ou ampliando os termos. Por exemplo, venda a contento.

b) “Pacta Praetoria” - eram aqueles que se encontravam tutela jurídica pela

atividade do pretor.

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c) “Pacta Legitima” - aqueles que não estavam compreendidos nas classes

anteriores, aos quais era concedida tutela jurídica por decisões imperiais.

Doação

A doação não era um contrato no direito romano. Era simplesmente uma causa,

que justificava um ato jurídico qualquer, ex. remissão de dívida.

Um ato que tivesse por finalidade consensual entre as partes enriquecer uma à

custa da outra era doação.

No direito justinianeu a convenção entre doador e donatário passou a ser

considerada pacto legítimo, dispensando-se a prática de outro ato jurídico: bastava

o acordo para vincular as partes.

Quase-Contratos

Quasi (latim) = como se fosse

São obrigações decorrentes de atos lícitos que não se traduzem em acordo de

vontades, em contraposição aos contratos, onde o acordo de vontades prévio

existia.

Os quase-contratos mais importantes eram: 1) gestão de negócios; 2)

enriquecimento sem causa.

1) Gestão de Negócio - assemelhava-se ao contrato de mandato. Era o liame

obrigacional, que gerava conseqüências jurídicas, pelo qual alguém, o gestor de

negócio, se prontificava, espontaneamente e de boa-fé, a praticar determinada

atividade no interesse de outrem, o dono do negócio, sem, no entanto, estar

incumbido de praticar tal ato.

Requisitos:

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gestão de negócio alheio – era o elemento objetivo da relação, alguém tomava a

frente em negócio alheio, praticando um ato ou uma série de atos. O negócio deve

ser alheio, não próprio.

Animus negotia aliena gerendi – era o elemento subjetivo, a intenção de obter

resultado em favor de um terceiro, não importando que ele saiba ou não quem é o

dono do negócio;

Negotium utiliter coeptum – a atividade do gestor deve ser útil ao dono do negócio:

deve ser uma atividade semelhante àquela que um indivíduo normal teria tido em

proveito próprio;

Espontaneidade da gestão – se não for espontânea não é gestão, é mandato.

Importante:

- se a gestão ocorreu contra proibição expressa do dono do negócio, o gestor não

possui meios judiciais para rever o dinheiro que gastou proveito do dono do

negócio. Exceção: se a proibição ocorreu dolosamente, depois do gestor ter

efetuado as despesas;

- embora não haja acordo de vontades, as obrigações entre as partes

assemelhavam-se àquelas decorrentes do contrato de mandato.

Obrigações do gestor:

conduzir a gestão até seu término (inclusive se o dono do negócio falecesse);

restituir ao dono do negócio, após o fim da gestão, as coisas objeto dela, bem

como entregar-lhe todas as vantagens advindas da gestão (ex. frutos), cedendo-lhe

todas as ações surgidas com a gestão;

agir com diligência (o gestor respondia até por culpa leve);

Obrigações do dono do negócio:

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ressarcir o gestor das despesas e prejuízos havidos com a gestão;

liberar o gestor das obrigações contraídas no interesse do dono do negócio.

2) Enriquecimento sem Causa – ocorre quando uma pessoa, sem que haja causa

jurídica, se enriquece em prejuízo de outrem. Ex. pagamento indevido, receber

prestação sem que haja causa jurídica.

Nos casos de enriquecimento sem causa concedia-se uma condictio (ação

abstrata) acompanhada de denominação referente ao caso concreto. Ex. condictio

indebiti.

A condictio sancionava a obrigação de restituir decorrente do enriquecimento ilícito.

Condictio indebiti – sancionava a obrigação resultante do pagamento indevido. Ex.

alguém efetuava prestação para liberar-se de uma obrigação que não mais existia

entre as partes (dívida paga etc.)

Requisitos:

que tenha havido cumprimento da prestação para extinguir a suposta relação

obrigacional;

que a prestação seja indevida porque:

a obrigação nunca existiu, ou se existiu, está extinta;

a prestação realizada não é objeto da relação obrigacional existente.

que o adimplemento da prestação ocorra de erro de fato escusável;

que o credor esteja de boa-fé, pois, se estiver de má-fé, configura-se o furto, daí a

ação cabível é a condictio furtiva.

O credor tem que estar de boa-fé e só responde pelo que efetivamente se

enriqueceu com o pagamento indevido.

Condictio causa data causa non secuta – era cabível quando o pagamento fosse

realizado tendo em vista uma contraprestação ou um evento a ser realizado

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posteriormente e tal contraprestação ou evento não ocorressem. Ex. dote dado

antecipadamente, quando o matrimônio não se realizou.

Condictio ob turpem causam – era concedida quando alguém realizava prestação

para que o credor não praticasse ato desonroso para o devedor, ou para que

cumprisse seu dever jurídico. Se o devedor participasse do ato torpe, não era

cabível o uso da condictio: ninguém pode alegar sua torpeza em benefício próprio.

Condictio ob iniustam causam – tem por fim a restituição do que foi dado a alguém

em virtude de uma causa reprovada pela lei. Ex. pagamento em virtude de coação.

Condictio sine causa – sanciona obrigação decorrente de enriquecimento sem

causa que ocorre quando alguém entrega a outrem dinheiro ou coisa para a

obtenção de finalidade que não existe ou não pode se realizar (ex. manumitir

homem que é livre).

Delito

É o ato jurídico ilícito, que contraria o Direito.

No Direito Romano, juntamente com os contratos, os delitos eram fontes das

obrigações.

Delitos no Direito Moderno

É a violação da norma jurídica estabelecida no interesse coletivo. O infrator é

perseguido em nome da sociedade, por um representante do Estado. O infrator

deve ser punido por ter violado uma norma, assim como deve ressarcir os prejuízos

que porventura tenha causado.

Delitos no Direito Romano

Historicamente a punição aos delitos passou por um claro processo de evolução:

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a) vingança privada.

b) vingança privada baseada na "Pena de Talião".

c) Arbitramento facultativo - a vítima poderia abrir mão de uma vingança em nome

de uma indenização pecuniária.

d) Arbitramento obrigatório - o Estado proibia a vingança provada, obrigando as

partes a um acordo pecuniário.

e) Punição estatal - o crescimento do aparato estatal fez com que este, em nome

da coletividade, assumisse a punição dos infratores.

Contudo, em Roma o Estado não tinha estrutura para punir todos os delitos, que

eram divididos em:

a) "Crimina" (Delitos Públicos) - violação das normas jurídicas de relevante

importância social, cuja iniciativa da ação cabia exclusivamente ao Estado, com

uma pena pública imposta pelo poder estatal. Eram delitos públicos:

* Incêndio.

* "Parricidium" - o homicídio de um homem livre.

* "Perduellio" - traição contra o Estado.

b) "Delicta" (Delitos Privados) - violação de normas de interesse individual, onde

cabia somente ao lesado apresentar-se ao poder público (pretor) dando início a um

processo. Os delitos privados eram aqueles cometidos contra o indivíduo ou contra

seu patrimônio. A ação, pedida pelo ofendido, impunha uma pena privada ("poena

privata"), que era convertida em um valor pecuniário, que em alguns casos poderia

ser o dobro ou o triplo do valor do dano. Os delitos privados poderiam ser:

* "Ius Civile" - furto, roubo, injúria ou dano injustamente; ensejavam "actiones

poenales", com o estabelecimento de uma pena pecuniária que ao mesmo tempo

representava punição e uma satisfação ao ofendido.

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1) Furto - subtração fraudulenta de coisa pertencente a outrem, contra a vontade

do dono.

Os dois elementos básicos eram: 1) a subtração e a 2) fraude, a consciência que

se estava lesando alguém ("animus furandi").

A noção de furto também existia para os casos de uso indevido da coisa de outrem

“furtum usus” (furto do uso), como no caso do depósito e do comodato.

Inicialmente a vítima poderia, caso colhesse o ladrão em flagrante (fur manifestus),

mata-lo ou reduzi-lo à condição de escravo. A punição, em uma fase posterior do

Direito Romano, consistia na imposição do pagamento de uma multa pecuniária a

qual, segundo o caso, era o dobro, triplo, ou quádruplo do valor da coisa furtada.

2) Roubo - subtração fraudulenta de coisa pertencente a outrem, qualificada pelo

uso da violência. A pena era o quádruplo do valor da coisa.

3) Dano injustamente causado (damnum iniuria datum) - introduzido pela lex

Aquilia, um plebiscito de 267 aC, que ganhou força de lei através da edição da lex

Hortensia.

Quem matasse um animal ou escravo alheio ficava obrigado a pagar o maior valor

que a coisa tivera no ano anterior.

Quem ferisse um animal ou escravo alheio, ou mesmo causasse dano em coisa

alheia, ficava obrigado a pagar o maior valor que a coisa tivera no último mês.

O dano deveria ser causado corpore corpori datum: por ato positivo consistente em

estrago físico e material da coisa corpórea. Ex. deixar um animal fugir ou morrer de

fome não caracterizava o damnum iniuria datum.

A mais leve culpa era relevante para ensejar a condenação: in lege Aquilia et

levíssima culpa venit (D. 9, 2, 44, pr).

Indenização: dano efetivo e material (damnum emergens) e lucro cessante.

4) Injúria - era toda a ofensa ilícita causada à pessoa, no sentido físico ou moral,

ativa ou passivamente. Os elementos básicos eram 1) a ofensa e 2) o dolo.

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5) Dolo - quando uma das partes faz a outra incidir em um erro através de um

comportamento malicioso. Contra essa parte cabia a “actio de dolo”, para obter o

ressarcimento do dano sofrido.

6) Coação - era compelir alguém à pratica, de certo modo, a determinado ato

jurídico. A violência poderia ser física (vis absoluta) ou moral (vis compulsiva). À

parte ofendida cabia uma ação penal (“actio quod metus causa”) contra o autor da

violência.

* "Ius Honorarium" - os pretores criaram, paralelamente ao "ius civile" uma série de

situações delituosas que ensejavam "actiones factum".

Quase-Delitos

Eram obrigações decorrentes de fatos que não implicavam a culpa do devedor. Ele

ficava devendo mesmo sem ter causado, voluntário ou involuntariamente, o fato.

Os quase-delitos geravam ações, cujas mais importantes eram:

a) “Si iudex litem suam fecerit” – refere-se ao juiz que por agir dolosamente ou

negligentemente, sentenciou mal, prejudicando uma das partes litigantes. Por meio

da ação que lhe era concedida, a vítima obtinha a condenação do juiz para

ressarci-la do prejuízo sofrido.

b) “Effusum et deiectum” - ação do pretor contra o morador do prédio de onde fosse

atirado em via pública alguma coisa líqüida ou sólida, causando dano a alguém.

c) “Positum et suspensum” - ação do pretor também contra o morador do prédio,

quando um objeto fosse colocado em um terraço, teto, ou qualquer outro lugar

externo que ameaçasse com a queda as pessoas que passassem na rua.

d) “Receptum nautarum, cauponum stabulariorum” - ação do pretor contra

hoteleiros e transportadores por furto sofrido por seus passageiros ou hóspedes,

qualquer que fosse o autor do furto e independente de culpa.

DIREITO DE FAMÍLIA

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É a parte do Direito Privado que trata das relações familiares dos indivíduos e, por

conexão, das suas relações patrimoniais na qualidade de membro de uma família.

Tais relações distinguem-se em:

Pátrio Poder;

Matrimônio;

Tutela e Curatela.

Direito de Família no Direito Romano – complexo de normas relativas ao poder

do paterfamilias: o único com plena capacidade jurídica, poder esse com caráter

unitário e que se funda em vínculos (não necessariamente de sangue).

Família: acepções (dicotomia de Ulpiano: D., 50, 16, 195, 2)

Familia communi iure (sentido amplo) – conjunto de pessoas que descendiam de

um parente comum e sob cujo poder estariam se ele fosse vivo.

Familia proprio iure (sentido estrito) – conjunto de pessoas que se encontravam

sob o poder de um paterfamilias.

Categorias de pessoas na familia proprio iure:

Paterfamilias – não está subordinado a nenhum ascendente do sexo masculino.

Era sui iuris.

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Filiifamilias – pessoas livres que estão sob o poder do paterfamilias (ex. mulher in

manu, seus filhos e filhas, noras in manu, netos e netas, e respectivas mulheres in

manu). Eram alieni iuris.

Para ser paterfamilias bastava não ter ascendente do sexo masculino. Pai é chefe,

não genitor.

Mulher não podia chefiar a família: se não estivesse sob o poder de ninguém era

persona sui iuris.

Espécies de parentesco:

Agnatício – se transmite apenas pelo paterfamílias: membros de uma família

ligados por um paterfamilias comum (filho, pai e avô). Dele você descende.

Cognatício – se propaga pelo sangue, tanto por via masculina, quanto feminina

(família em sentido amplo). Pessoas descendentes do mesmo tronco ancestral

que, entretanto, não descendem umas das outras (irmãos, primos, tios).

Inicialmente era usado para fins de impedimento matrimonial. Dele você é parente

de sangue.

Com a evolução do Direito Romano notou-se a prevalência do parentesco

consaguíneo, abolindo-se o agnatício.

Graus de parentesco

Linha – é a série de pessoas que descendem umas das outras (linha reta), ou que,

embora não descendam umas das outras, derivam de um antepassado comum

(linha colateral).

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Avô e neto = linha reta

Irmãos são parentes na linha colateral, pois não descendem uns dos outros, mas

de um antepassado comum: o pai.

Grau – é a distância que vai de uma geração à outra.

Pai é parente em 1.º grau do filho.

Avô é parente em 2.º grau do neto.

Para saber o grau parentesco entre dois parentes em linha reta:

- basta descer (ou subir) de um deles ao outro, contando-se os graus que há entre

ambos.

Avô em relação ao neto é parente em linha reta em 2.º grau.

Determinação de grau de parentesco entre 2 parentes em linha colateral:

- contam-se os graus partindo-se de um deles, subindo-se até o antepassado em

comum, e descendo-se ao outro.

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Ao lado do parentesco agnatício e cognatício, há a afinidade (adfinitio), que é o

vínculo, decorrente do casamento, que existe entre um dos cônjuges e os parentes

cognados dos outros.

- Os afins de um cônjuge não são afins dos afins do outro cônjuge: ex. maridos de

2 irmãos não são afins entre si.

A afinidade se extingue quando se dissolve o matrimônio, embora persista, na

linha reta, somente para efeitos de proibição do casamento (ex. casar com sogra).

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Importante: cônjuges NÃO são parentes entre si.

Meios de integração à família romana

Aut natura aut iure

Natura – pelo nascimento: filhos e descendentes em linha reta até o infinito,

gerados em núpcias legítimas pelo paterfamilias ou pelos seus descendentes

masculinos.

In iure – conventio in manum, adoptio.

ADROGATIO, ADOPTIO, CONVENTIO IN MANUM

A adoptio distingue-se em:

adrogatio – ato pelo qual se agrega a uma família quem é paterfamilias de outra,

com todos os seus dependentes, inclusive patrimônio (ativo e passivo). Caso algum

credor do adrogado se sentisse prejudicado ele poderia reclamar ao pretor e agir

contra o adrogado como se não houvesse realizada a adrogatio.

adoptio stricto sensu – possibilitava que viesse a fazer parte da família o indivíduo

sujeito a outra (alieni iuris). O ato realizava-se perante o magistrado mediante uma

reivindicação simulada. Direito justinianeu: adotante deveria ter 18 mais que o

adotado.

Diferenças:

Adrogatio – 1) pessoa sui iuris que passa a ser alieni iuris em outra família; 2)

subordinação simultânea de todos os dependentes do paterfamilias adrogado

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Adoptio – 1) pessoa alieni iuris: continua a ser alieni iuris, mas em outra família.

Conventio in manum – vem a fazer parte da família a mulher do paterfamilias ou de

um de seus descendentes.

Mulher do paterfamilias – in loco filiae: está em lugar de filha com relação ao

paterfamilias.

Mulher de um dos descedentes do paterfamilias – in neptis loco: está em lugar de

neta com relação ao paterfamilias.

Modos: 1) confarreatio; 2) coemptio; 3) usus.

Confarreatio – cerimônia religiosa na qual os cônjuges comiam juntos um pão de

farinha de trigo (farreum).

Coemptio – compra fictícia (mancipatio) da mulher, por causa de matrimônio.

Usus – aquisição da manus sobre a mulher passado um ano. (posse do estado de

casado).

Atos correspondentes e contrário que libertavam a mulher da manus: disfarreatio,

remancipatio e trinoctii usurpatio.

Trinoctti usurpatio – verificava-se quando a mulher abandonava por três noites

consecutivas a casa do marido.

PODER DO PATERFAMILIAS

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O poder do pater tinha conteúdo unitário: abrangia e unificava toda a família

romana com efeitos pessoais e patrimoniais.

Tal poder compreendia:

patria potestas – poder sobre os filhos e netos dos filhos masculinos;

manus – poder sobre as mulheres casadas com o mesmo paterfamilias ou com um

seu descendente;

Os poderes do pater sobre seus dependentes resumiam-se no ius vitae ac necis,

no ius exponendi, no ius vendendi e no ius noxae dandi.

Ius vitae ac necis – é o direito de vida e morte sobre seus dependentes.

Ius exponendi – é o direito de abandonar o filho infante.

Ius vendendi – é o direito de vender os filhos a outro paterfamilias como escravos.

Limitação da Lei das XII Tábuas: se o pai vendesse o mesmo filho por 3 vezes

perdia o pátrio poder sobre ele.

Ius noxae dandi – quando o filho cometia um delito o pater poderia optar: indenizar

o prejudicado ou entregar o filho à parte lesada.

Outros poderes:

nomear tutor por testamento aos filhos, casá-los e contrair por eles esponsais. No

direito clássico o casamento e os esponsais exigem a vontade dos filli.

reivindicar os filhos e a mulher de quem quer que os detenha injustamente

(vindicatio filli aut uxoris).

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Importante:

O paterfamilias é a única pessoa capaz de direitos e obrigações do ius civile.

Daí:

Todas as aquisições feitas pelos dependentes, quer direitos reais, quer

obrigacionais, pertencem ao pater. Em suma: redundam em benefício do pater os

efeitos vantajosos de qualquer ato praticado pelos filli.

Pecúlio dos filli – o pater concedia a livre administração aos filli de um pequeno

patrimônio em dinheiro ou em coisas, do qual, todavia, ficava sempre proprietário o

pater.

Peculium castrense – conjunto de bens adquirido pelo filiusfamilias no serviço

militar. Ex. soldo, presa, donativo.

Peculium quasi-castrense – conjunto de bens adquirido pelo filiusfamilias no

exercício de uma função ou cargo público.

Bona adventicia – conjunto de bens adquiridos pelo filiusfamilias através de

herança materna.

Lucra nuptialia – conjunto de bens adquiridos pelo filius famílias através do

matrimônio.

- No período imperial os filli soldados têm o gozo e podem dispor do pecúlio

castrense em testamento.

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Depois de Constantino: 1) os filhos têm o mesmo direito com relação ao pecúlio

quasi-castrense; 2) sobre bona adventicia e lucra nuptialia: têm a plena

propriedade.

Actio adiecticie qualitatis – eram concedidas pelo pretor aos terceiros com relação

aos atos praticados pelo filli. Eram formuladas de modo que o pater fosse

condenado conjuntamente.

Espécies:

actio de peculio et de in rem verso – o pater responde pelas obrigações contraídas

pelo filho dentro dos limites do pecúlio e até o montante da soma eventualmente

trazida pelo filho para o patrimônio do pai;

actio quod iussu – era exercitada contra o pater que mandou ou consentiu que o

filho fizesse um negócio;

actio exercitoria e actio institoria – concedida ao terceiro contra o paterfamilias do

preposto ao comércio marítimo e ao comércio terrestre, e que em tal qualidade

contraíra obrigações;

actio tributoria – com a qual os credores obtêm exatamente pro rata o peculium do

filusfamilias insolvente, que com eles contratou.

Aquisição e perda do poder de paterfamilias

Quando o indivíduo vem a fazer parte de um família, cai sob o poder do pater.

O pater adquire o poder sobre:

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1) filhos gerados de justas núpcias;

2) mulheres casadas com ele ou com seus filhos cum manu.

3) filhos naturais (fora do casamento) não estão sob o poder do pater, mas podem

vir a fazer parte por legitimação, pelo subseqüente matrimônio de seus pais ou por

concessão imperial, ou por ter o pai lhe dado patrimônio suficiente para que ele

exercesse o cargo de decurião (membro do senado da cidade, curia, responsável

pela cobrança de impostos.

Adrogação, adoptio e conventio in manum originam o poder do pater.

No Direito romano o pater perdia o poder sobre o grupo familiar somente pela

morte.

Para esses efeitos a capitis deminutio (máxima, média e mínima) equiparava-se à

morte.

Emancipação dos filhos – pela venda fictícia do filho como escravo por 3 vezes (Lei

das XII Tábuas). Para netos e filhas bastava uma única venda.

Posteriormente, no Baixo Império, com o desaparecimento das formas solenes, tal

sistema caiu em desuso e foi susbtituído pela emancipatio Anastasiana (concessão

imperial) e pela declaração do pai feita, com o consentimento do filho, perante o

magistrado.

Casamento

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O matrimônio romano diferia totalmente do matrimônio moderno. Não se confundia

como “conventio in manum”, o poder do marido sobre a esposa. Era apenas a

união duradoura entre o marido e a mulher.

“Conventio in Manum”

Era um ato jurídico formal pelo qual o marido adquiria o poder sobre a esposa ou

sobre a esposa de seus “filii familia”, que entrava para a família na mesma

condição.

Era formalizado de três maneiras:

a) “Confarreatio” - cerimônia religiosa formal com a presença de testemunhas.

b) “Coemptio” - cerimônia que simulava uma compra e venda da esposa através

do “mancipatio”.

c) “Usus” - o usucapião do marido sobre a mulher (após 1 ano).

No Direito Clássico essas formas caíram em desuso, prevalecendo o matrimônio

“sine manu”, onde não havia o poder marital sobre a mulher.

“Matrimonium”

O casamento em Roma era visto mais como uma instituição social do que como

um instituto jurídico. Era caracterizado socialmente, sem qualquer formalidade. Era

uma situação social de fato, que surgia independente de qualquer ato jurídico,

mas que gerava conseqüências jurídicas. Em Roma não era necessário um ato

jurídico onde os cônjuges declarassem sua vontade: consensus facit nuptias.

O fato social matrimonial possuía, tal qual a Posse, dois elementos:

a) “Honor Matrimonii” - elemento objetivo dado pela convivência condigna entre o

casal.

b) “Affectio Maritalis” - elemento subjetivo dado pelo consenso, pelo desejo de

duas pessoas permanecerem juntas.

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O casamento não era indissolúvel, mas pressupunha que o casal tivesse intenção

de permanecer junto para sempre.

No casamento cum manu havia a disfarreatio e a remancipatio (formas solenes).

No casamento sine manu havia o divortium communi consensu (ato bilateral) e o

repudium (ato unilateral).

Uma outra forma de dissolução do matrimônio era a “capitis diminutio maxima” ou

morte de um dos cônjuges.

Esponsais

É a promessa de contrair matrimônio. Fazia-se no direito romano antigo, por uma

estipulação em que se utilizava o verbo spondere (prometo). Daí o nome sponsalia.

No Direito Clássico considerou-se desprovida de sanção jurídica no que diz

respeito à obrigação de se casar ou pagar multa por não se casar, porém, havia

efeitos secundários, como a pena de infâmia para os que celebrassem esponsais

simultâneos com várias pessoas.

Requisitos

Os requisitos para o casamento eram:

a) Idoneidade física - ter mais de 14 anos para os homens e mais de 12 para as

mulheres.

b) “Conubium” - capacidade jurídica para contrair bodas: ser livre e cidadão

romano (capacidade de fato e de direito).

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Escravo não poderia se casar, sua união era mera relação de fato, desprovida de

conseqüências jurídicas (contubernium).

c) Consenso - manifestação da vontade dos nubentes e do “pater familias”, caso

não fossem “sui iuris”.

Impedimentos matrimoniais

a) loucura, por implicar a falta de capacidade de fato;

b) existência de liame matrimonial, visto que o casamento romano era estritamente

monogâmico;

c) consangüinidade entre os nubentes na linha reta sem restrições e na linha

colateral até o 3º grau;

d) parentesco adotivo enquanto existente;

e) diferença de classes;

f) condição de soldado em campanha;

g) relação jurídica entre tutor e sua pupila;

h) governador de províncias e de outros magistrados com mulheres residentes no

território onde exerciam jurisdição.

Regime Patrimonial

Era um dos efeitos patrimoniais do casamento romano.

O casamento “sine manu” não apresentava nenhum efeito patrimonial para os

cônjuges:

a mulher continuava vinculada à sua família anterior;

o marido nem ao menos poderia fazer doações para ela.

Já o casamento “cum manu” tinha conseqüências jurídicas patrimoniais.

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No caso da mulher ser “alieni iuris” nada mudava quanto a seus bens; ela apenas

mudava de “pater familias”, sem nada levar para a nova família agnatícia.

No caso dela ser “sui iuris” ela sofria uma “capitis deminutio minima”, passando seu

patrimônio para o “pater familias”. Ao perder seu “status familiae” suas dívidas

extinguiam-se.

Dote

O “dos” era uma quantidade de bens que o pai da noiva dava para o noivo por

ocasião do casamento. O dote significava inicialmente uma contribuição do pai da

noiva para ajudar o marido com o sustento de sua filha, uma vez que ela ia para o

casamento sem levar nada caso fosse “alieni iuris”, e perdendo seus direitos

hereditários na sucessão do pai.

Posteriormente o dote passou a ter outra finalidade: era uma espécie de reserva

patrimonial da mulher caso se separasse, perdendo o vínculo com o novo “pater

familias”, ou caso o marido morresse.

O “dos” podia ser:

a) “Dos Profecticia” - dado pelo “pater familias” da noiva para o marido.

b) “Dos Adventicia” - dado por qualquer outra pessoa, até mesmo pela noiva caso

ela fosse “sui iuris”.

c) “Dos Recpticia” - dado por um terceiro, que não o “pater familias”, com a

reserva de recebê-lo de volta caso houvesse a separação do casal.

Qualquer tipo de bem, ou de direito real, poderia ser dado em dote, até mesmo

transmitindo obrigações, ou perdoando dívidas do noivo.

O dote era transmitido de duas formas:

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a) “Dotis Datio” - quando se transmitia a propriedade de qualquer coisa para o

noivo.

b) “Dotis Promissio” - quando o constituinte do dote fazia uma promessa de

doação para o noivo através de uma “stipulatio”.

No caso da morte da mulher o dote ficava para o marido, exceto no caso de “dos

recepticia”.

No caso da morte do marido, ou da separação, era necessária a devolução do dote

à esposa; os frutos do dote ficavam com o marido.

Para determinar o valor dessa devolução havia a “dos aestimatia”, que podia ser

feita por ocasião do casamento, ou não: o marido sempre devia aquele valor em

dinheiro.

O marido no caso de devolução do dote respondia por culpa e dolo:

os bens alienados por ele tinham que ser devolvidos, exceto se os bens tivessem

perecido ou danificados sem culpa dele.

Em alguns casos cabia ao marido o direito de retenção de parte dos bens dotais:

punição da mulher que cometera faltas;

proteção dos filhos.

Doação entre cônjuges

Era vedada.

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Considerando isso, bem como a situação desfavorável da mulher na relação

sucessória, fazia-se uma doação antenupcial para garantir a subsistência da

mulher caso o casamento se dissolvesse sem culpa desta.

No direito pós-clássico Justiniano permitiu a doação durante o casamento (donatio

propter nuptias): os bens ficavam prometidos à mulher e com cláusula de

inalienabilidade (imóveis).

Tutela / Curatela

Ambos institutos tinham por finalidade cuidar dos interesses de uma pessoa que,

sozinha, não poderia tomar conta de seus negócios:

diziam respeito à capacidade para a prática de atos jurídicos.

Semelhanças:

o mesmo magistrado trata da tutela e da curatela;

tutor e curador têm obrigação de aceitar o cargo e para ele há iguais motivos de

escusa;

a actio negotiorum gestorum diz respeito a ambos.

Diferenças:

tutela e curatela concernem a diferentes classes de pessoas;

tutor não pode ser nomeado por ato especial, como geralmente se dá com o

curador;

curador não pode ser testamentário.

Tutela

Visava proteger os interesses da família, dos herdeiros, aplicando-se aos casos

normais de incapacidade (idade, sexo etc.).

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Espécies:

Tutela impubernum – pela morte do pater os filhos tornam-se sui iuris e adquirem

capacidade. Se isso ocorrer quando o filho ainda é impúbere, é necessário que

alguém, no interesse da família, exerça algum poder sobre ele, suprindo-lhe e

integrando-lhe a vontade deficiente.

Tutor / Pupilo

Segundo o modo de nomeação, o tutor poderia ser:

Testamentário – nomeado para o filho impúbere, no testamento do pater prevalecia

sobre o legítimo.

Tutor Legitimus” – era nomeado por lei, quando faltava designação de tutor

testamentário. Geralmente era o parente agnado mais próximo ou os gentiles

(pessoas pertencentes a diversas famílias que procedem de um antecessor comum

com o mesmo apelido de família).

Parentesco agnatício – se transmite apenas pelo paterfamílias: membros de uma

família ligados por um paterfamilias comum (filho, pai e avô). Dele você descende.

São tutores legítimos do liberto o patrono e seus filhos, o que recebeu em

mancipação um filius cujo pater depois morreu.

No direito justinianeu são os parentes de sangue.

c) “Tutor Datius” – é o tutor escolhido pelo magistrado em falta de tutor

testamentário e legítimo.

A tutela dos impúberes cessa:

pela morte do tutor ou do pupilo;

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pela capitis deminutio (na tutela legítima), que rompe o vínculo agnatício;

em caso de tutor infiel (podia ser removido).

2) Tutela mulierum – a mulher sui iuris (sem ascendente masculino, nem casada

cum manu) está sujeita à tutela perpétua. Exceções: vestais (sacerdotisas),

mulheres com filhos (ingênuas – 3 filhos; libertas – 4 filhos).

No direito justinianeu tal instituto desapareceu.

Poderes e responsabilidades do tutor

Auctoritatem interponere – o tutor prestava cooperação para integrar a vontade

deficiente do pupilo que pretende praticar um ato relativo ao seu patrimônio. É

prestada pessoalmente no momento da realização do ato.

Sem ela o pupilo só pode praticar atos que melhorem sua situação econômica.

2) Negotia gerere – tutor administrava os negócios do pupilo como se fossem

próprios, assumindo para si as obrigações e adquirindo direitos.

Em princípio os poderes do tutor eram ilimitados. Posteriormente exigiu-se outorga

judicial para que ele pudesse praticar certos atos (venda de imóveis e móveis

preciosos).

Com Justiniano, passou-se a exigir o emprego de capitais com os produtos das

vendas.

Tutor mulierum não tem gestão, só autorictas.

Caução – ao iniciar seu cargo, o tutor legítimo deveria prestar caução ou stipulatio

em virtude da qual se obrigava a bem administrar os bens do pupilo.

Sanções contra o tutor

Crimen suspecti tutoris – delito de que qualquer pessoa pode acusar o tutor, para

se conseguir sua destituição. Acarretava a infamia do tutor.

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Actio rationibus distrahendis – ação para separação das contas contra o tutor que

havia subtraído bens do pupilo. Acarretava o pagamento em dobro do valor dos

bens subtraídos.

Actio tutelae – surgiu no final da República, tem caráter mais geral. É proposta pelo

próprio pupilo no fim da tutela. Acarretava a infamia do tutor. Tutor deveria ser

diligente, agir como se fosse em seu próprio negócio.

No direito justinianeu o pupilo tinha hipoteca legal sobre os bens do tutor para

garantir seus créditos.

Iudicium contrarium da actio tutelae e actio negotiorum contratia – tutor fazia

valer contra o pupilo, tornado púbere, as pretensões decorrentes da gestão da

tutela.

Curatela

Protegia o patrimônio de pessoa em determinada condição de incapacidade

natural: ex. loucura, prodigalidade, menores de 25 anos.

Tinha as mesmas regras da tutela.

A curatela poderia ser:

a) “Cura Furiosi” – se o indivíduo que por ocasião da morte do pater se torna sui

iuris for louco, o adgnado mais próximo administrará seu patrimônio. Em sua falta

cabe aos gentiles.

b) “Cura Prodigi” – o adgnado mais próximo ficava encarregado da administração

dos bens do pródigo, que ficava com a capacidade de agir limitadas, precisando

sempre a autorização do curador.

“Cura Minorum XXV annorum” – curador deveria intervir na conclusão dos atos

praticados pelos menores de 25 anos, para impedir que os mesmos fossem

enganados.

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Venia aetatis – favor imperial que surgiu com o Imperador Constantino por meio do

qual os varões de 20 anos e as mulheres de 18 poderiam eximir-se da tutela.

O curador era responsável pela sua administração, mediante a actio negotiorum

gestorum: direta (contra ele); contrária (contra o curatelado).

Outras espécies de curadores

Curator ventris – nomeado para garantir os bens do nascituro chamado a suceder.

Curator bonorum – administravam os bens dos prisioneiros de guerra, do ausente

por motivo oficial, do devedor insolvente que, para evitar a infamia, cedeu os bens

aos credores.

Curador de herança jacente – herança ainda não aceita pelo herdeiro.

DIREITO DAS SUCESSÕES

O conceito de sucessão é o da substituição de uma pessoa por outra em uma

relação jurídica.

Pode corresponder a atos:

a) "Inter Vivos" - são os atos jurídicos cujos efeitos se produzem, ou cessam,

entre os vivos.

b) "Mortis Causa" - são os atos jurídicos cujos efeitos só ocorrem após a morte

daquele que expressa a vontade.

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Também pode ser classificada como:

a) Universal (“sucessio in universum ius”) - transmissão do conjunto de direitos e

ações do defunto (coisa coletiva).

b) Singular (“successio in in singulas res) = transferência de determinados direitos

e obrigações ao sucessor.

Sucessão Moderna

Modernamente, a sucessão dá-se:

por disposição de última vontade; ou,

em virtude da lei, que podem ocorrer simultaneamente.

Contudo, a disposição de última vontade esbarra no interesse dos herdeiros

legítimos. O patrimônio de alguém divide-se em parte disponível (50%) e parte

legítima (50%). A ordem de chamada dos herdeiros é:

descendentes, ascendentes, cônjuge, parentes colaterais (até 4° grau) e o Estado.

Necessários são os descendentes e os ascendentes.

Assim, a sucessão pode ser:

a) Testamentária - pode ocorrer ou não, tendo que respeitar os herdeiros

necessários, se os houver. Não os havendo o testador pode dispor da totalidade de

seus bens.

b) Legítima - quando o indivíduo morre sem deixar testamento. Toda a sucessão

dá-se pelo processo determinado em lei.

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Sucessão em Roma

As fontes apresentam muita confusão entre a sucessão legítima e a testamentária,

tornando difícil o entendimento de qual forma prevalecia.

A evolução do instituto foi no sentido de, cada vez mais, respeitar o direito dos

herdeiros legítimos.

Período Pré-Clássico – prevalecia a noção da soberania da família e não da

transmissão patrimonial. Com a morte do “pater familias” não ocorria a cisão da

família; ele era substituído por alguém, designado em testamento, que o substituía

à frente da família, assumindo também a titularidade do patrimônio.

Período Clássico – a sucessão passou a ter um caráter mais patrimonial.

Os filhos adquiriam a herança, mas, principalmente, a plena administração dela.

A liberdade para testar começou a entrar em choque com a defesa da família. A

evolução durante esse período possibilitou o fortalecimento da sucessão legítima.

HERANÇA (HEREDITAS )

Podia ser entendia de três formas:

1) o processo sucessório em geral; 2) o conjunto de bens; e, 3) o direito subjetivo

dos herdeiros.

De forma geral, era entendida como o universo de relações jurídicas (direitos e

obrigações) transmissíveis.

Não eram transmissíveis: servidões pessoais (uso, usufruto), contratos e

obrigações personalíssimas (mandato e sociedade), obrigações delituais e a posse.

O resto do patrimônio era plenamente transmissível.

Herança Ativa - quando os direitos do “de cujus” eram maiores que suas

obrigações.

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Herança Passiva (“damnosa hereditas”) - quando os direitos eram menores que as

obrigações.

Os herdeiros podiam ser:

a) Necessários - (“sui heredes”) as pessoas livres que com a morte do

“paterfamilias” tornavam-se “sui iuris”. Também eram os escravos alforriados em

testamento e nomeados como herdeiros (instituto surgido apenas no direito pós-

clássico).

b) Estranhos - (“heres extraneus”) todo os outros.

ABERTURA DA SUCESSÃO (DELATIO HEREDITATIS )

Abertura é uma coisa, aquisição é outra.

Abria-se a sucessão pela morte do de cujus (princípio da saisine, art. 1784, CC);

oferecia-se, então, a possibilidade ao sucessor de adquirir a herança.

sucessão legítima era a originária, baseada na lei; a testamentária surgiu depois,

baseada na vontade do de cujus (is de cujus hereditate agitur)

a liberdade de testar (sucessão testamentária) podia prejudicar descendentes e,

por isso, foi restringida no direito mais evoluído:

1. passou-se a exigir que o testador mencionasse seus parentes mais próximos,

nomeando-os herdeiros ou deserdando-os = exigência formal.

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2. mais tarde, uma participação real na sucessão foi exigida: terceira forma de

sucessão = contra o testamento (sucessio contra tabulas)

A sucessão testamentária derrogava a legítima:

herdeiros legítimos podiam concorrer com base nas regras da successio contra

tabulas.

O testamento posterior derrogava anterior.

AQUISIÇÃO DA HERANÇA (ACQUISITIO HEREDITATIS )

Se fazia 1) automaticamente (ex vi legis) ou 2) por expressa manifestação de

vontade.

sui heredes (aqueles que se tornavam sui iuris pela morte do paterfamilias e os

escravos alforriados em testamento e nomeados herdeiros) adquiriam a herança

automaticamente = o filho (heres suus et necessarius) e o escravo (heres

necessarius) eram herdeiros necessários, adquirindo a herança sem

manifestação de vontade de aceitá-la e contra eventual manifestação de não

aceitá-la.

no caso de herança passiva, pretor amenizou a situação dos herdeiros

necessários: concedeu facultas abstinendi aos filhos e o beneficium separationis

aos escravos

Herdeiros extranei (heredes voluntarii), só adquiriam herança com expressa

manifestação de vontade de aceitá-la (aditio hereditatis) – havia três formas de

aceitação:

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1) cretio = formalística e solene, mediante pronunciamento de formulário verbal.

2) pro herede gestio = aceitação tácita pela prática de atos relativos à herança.

3) aditio nuda voluntate = aceitação sem formalidades.

Importante: o heres extraneus podia renunciar à herança sem qualquer

formalidade, o que não ocorria com o sui heres.

“HEREDITAS JACENS” E “USUCAPIO PRO HEREDE”

quando a sucessão era aberta mas ainda não era aceita (só no caso de heres

extraneus), o patrimônio do de cujus ficava sem dono = herança jacente (hereditas

jacens) – patrimônio em situação de pendência, transição

em relação à herança jacente, havia a usucapio pro herede = posse, durante um

ano, de coisa pertencente à herança gerava propriedade – adquiria-se a posição de

herdeiro e, com isso, toda a herança

esse usucapião não exigia iustus titulus nem bona fides

os clássicos o apelidaram de improba usucapio, condenando esse instituto; mais

adiante, Marco Aurélio aboliu-o, sendo considerado crimen expilatae hereditatis

“HEREDITAS – BONORUM POSSESSIO”

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hereditas era um instituto quiritário (ius civile), regido pelos costumes

a bonorum possessio era a posse dos bens hereditários deferida pelo pretor (ius

honorarium)

a questão referente ao título do herdeiro decidia-se mediante uma actio in rem, que

era a hereditatis petitio = iniciativa cabia ao não-possuidor contra o possuidor; em

caso de incerteza intervinha o pretor

interdictum quorum bonorum = concedido pelo pretor, possibilitava ao herdeiro

(considerado herdeiro pelo magistrado) entrar na posse dos bens hereditários de

quem os retivesse indevidamente

tal posse concedida pelo pretor só era definitiva pela usucapião; antes de decorrer

o prazo, porém, o herdeiro quiritário podia exigir a herança e ganhava a causa =

nessa fase, a bonorum possessio era sem efeito contra o ius civile

mais tarde, o pretor criou novas regras que prevaleciam sobre o direito quiritário = a

bonorum possessio passou a ter força contra o ius civile.

SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA

(“SUCESSIO SECUNDUM TABULAS”)

Testamento é ato unilateral, formal, para o caso de morte do testador, pela qual

este nomeia seu sucessor (herdeiro)

era sua revogável até a morte do testador

CAPACIDADE DE TESTAR

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tem que ter testamenti factio activa (capacidade jurídica de testar)

não tinham capacidade de fazer testamento:

1) alieni iuris, pois não tinha patrimônio (exceto peculium castrense – serviço militar

- e peculium quasi castrense – serviço público = pecúlio era uma parte do

patrimônio da família entregue à administração direta do alieni iuris)

2) latini Juniani (escravos alforriados por modos pretorianos ou contra disposições

restritivas da lei), que morriam escravos, cujo patrimônio passava para o patrono,

como pecúlio

3) mulheres (no direito antigo)

4) intestabiles (punidos por se negarem a depor na qualidade de testemunhas)

5) incapazes de fato (impúberes, loucos, pródigos)

CAPACIDADE DE HERDAR

tem que ter testamenti factio passiva

só cidadãos romanos livres (ou escravos que, por meio do testamento que os

tornava herdeiros, fossem alforriados)

mesmas regras se aplicam aos herdeiros legítimos

não tinham capacidade de herdar:

1) peregrini

2) intestabiles

3) durante certa época, mulheres com relação à herança de cidadão de primeira

classe;

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4) incerta persona (ex. quem nasceu após o ato de disposição de última vontade, a

pessoa jurídica).

FORMAS DE TESTAMENTO

1 – TESTAMENTUM PUBLICUM

a) perante comício;

b) perante exército.

2 – TESTAMENTUM PRIVATUM

a) forma clássica era a per aes et libram = uma aplicação da mancipatio: testador

mancipava seu patrimônio a uma pessoa de sua confiança (familiae emptor), que

se obrigava a transferi-lo à pessoa designada pelo testador

b) mais tarde pela mancipatio familiae = com sete testemunhas, o testador

nomeava, oral e solenemente seu sucessor (validade decorria dessa formalidade

oral = nuncupatio); mais tarde redigia documento escrito (servia de prova = tabulae)

- pretor ainda considerava válido o documento de testamento com forma perfeita,

mesmo sem a nuncupatio (formalidade verbal) = bonorum possessio secundum

tabulas

CONTEÚDO DO TESTAMENTO

1) designação do herdeiro; testamento tinha que se iniciar com essa formalidade,

de outra forma, era nulo; Justiniano modificou esse formalismo.

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devia se referir a determinada pessoa = era inválido quando se referia a incerta

persona

dependia do testador escolher um ou mais de um herdeiro; quando escolhia mais

de um, podia determinar as respectivas quotas e caso não fizesse isso, herdariam

eles partes iguais.

testador podia nomear substituto a seu herdeiro = substitutio vulgaris

pai podia nomear herdeiros de um filho ainda impúbere, no caso do filho morrer

antes de atingir a puberdade e o poder de testar = substitutio pupillaris

Justiniano concedia também a nomeação de herdeiros para filho púbere, desde

que louco = substitutuio quasi pupillaris

TESTAMENTOS INVÁLIDOS

testamentos nulos ab initio:

a) quando testador não tinha testamenti factio activa

b) quando faltava alguma formalidade essencial

c) quando testador desrespeitava a legítima de seus descendentes

testamentos se tornavam ineficazes:

a) quando nascesse um filho do testador, após feito o testamento em que este não

mencionava filho superveniente

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b) quando testador perdia, após feito o testamento, sua capacidade de testar (por

capitis deminutio ou adrogatio)

c) quando os herdeiros não aceitavam a herança

d) quando o testamento era rescindido

revogava- se o testamento:

a) pelo contrarius actus nos testamentos formais

b) quando um nono testamento era feito pelo testador

c) pela destruição voluntária do documento do testamento.

SUCESSÃO LEGÍTIMA

(“SUCESSIO AB INTESTATO”)

Era a sucessão que se operava na ausência, invalidade ou revogação do

testamento. Operava-se pela lei

Sistemas de vocação hereditária:

Ius civile – baseava-se exclusivamente no parentesco agnatício;

Ius honorarium – corrigiu o ius civile favorecendo os cognatícios;

Direito pós-clássico – fez prevalecer exclusivamente o parentesco cognatício.

SUCESSÃO LEGÍTIMA NO DIREITO QUIRITÁRIO

Era baseada no parentesco agnatício

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1.ª classe da ordem de vocação hereditária: sui ou sui heredes (herdeiro por si

próprio, que tinha direito inerente dos descendentes sobre os bens familiares)

sui = descendentes sujeitos ao pátrio poder do de cujus e as mulheres casadas

cum manu, fazendo parte integrante da familia proprio iure. Exceção: quem tivesse

saído da família (emancipação, casamento cum manu, adoção)

sui sucediam em partes iguais e independente do grau de parentesco com o de

cujus.

o sui de grau mais distante tomava o lugar de seu ascendente (filhos tomam lugar

do pai e dividem entre si a herança pertencente a este) = princípio da

representação ou da sucessão por estirpe. 3 filhos e mulher = 1/4 para cada. 3

filhos e 2 netos (filhos de 1 filho já falecido) = filhos ¾, netos 1/8 cada um.

- sucessão dos agnados colaterais - era feita por cabeça (per capita), em partes

iguais.

- sucessão dos gentiles desaparecera no fim da República

Importante: abertura da sucessão aconteceria somente uma vez; se ninguém

aceitasse ela ficaria jacente ou vacante

SUCESSÃO LEGÍTIMA NO DIREITO PRETORIANO

Foram criadas regras mais favoráveis aos parentes cognatícios

pretor efetuou correções no ius civile através da bonorum possessio

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bonorum possessio sine tabulis

1) pretor estendeu a ordem de vocação hereditária a determinados parentes

consangüíneos (cognati) não contemplados para o efeito de sucessão no sistema

de ius civile;

2) introduziu a abertura sucessiva, na ordem da vocação hereditária, da sucessão

legítima (não aceitando os parentes mais próximos a herança, abria-se novamente

a sucessão para o grau mais distante e para a classe subseqüente)

na primeira classe eram chamados pelo pretor os liberi = sui + sui fictícios

(descendentes que já tinham saído da família agnatícia pela mancipatio ou pela

conventium in manum praticada pelo paterfamilias)

na segunda classe estavam os legitimi = herdeiros designados pelo direito

quiritário, ou seja, os agnados (sucessão dos gentile desaparecera nessa época)

como terceira classe tinham os cognati = parentes cognatícios da linha materna

até o sexto grau (ou sétimo)

por último herdava o cônjuge sobrevivente de um matrimônio sine manu

SUCESSÃO LEGÍTIMA NO DIREITO JUSTINIANEU

reforma definitiva foi feita por Justiniano = Novela 118

- se baseava no princípio cognatício

na primeira classe estavam os descendentes

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na segunda classe estavam os ascendentes e os irmãos germanos (que tinham

ambos os progenitores em comum) e respectivos sobrinhos

na terceira classe estavam os irmãos consanguinei ou uterini (que tinham só um

genitor em comum) e seus filhos

na quarta classe estavam os cognados, sem limite de grau

na falta desses herdeiros aplicava-se a bonorum possessio unde vir et uxor =

defere-se a herança ao cônjuge sobrevivente

havia abertura de sucessão consecutiva para os graus e classes mais remotas

herança definitivamente sem herdeiro (bona vacantia) passava ao Fisco = adquiria

loco heredis

SUCESSÃO NECESSÁRIA

(“SUCESSIO CONTRA TABULAS”)

sucessão necessária de certos membros da família, ligados pelos liames mais

diretos e íntimos de parentesco

luta de dois princípios:

1) respeito à última vontade do testador

2) preocupação de garantir as melhores condições econômicas possíveis aos

parentes mais estreitamente ligados (testador tinha responsabilidades decorrentes

dos laços familiares)

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SUCESSÃO NECESSÁRIA FORMAL NO DIREITO QUIRITÁRIO

nos tempos históricos havia total liberdade do testador; mais tarde, surge um certo

direito originário dos sui sobre os bens do testador, já que ele tinha obrigação legal

de mencionar os sui no testamento, intitulando-os herdeiros ou deserdando-os

no caso de preterição (falta de menção no testamento):

1) se fosse filius sui, o testamento seria nulo; abria-se a sucessão ab intestato

2) tratando-se de outros sui (filhas ou netos), o testamento era válido, mas os

preteridos recebia sua parte

3) tratando-se de postumus suus (suus havidos após feito o testamento – podia

ser filho, filha ou neto do testador), o testamento era inválido; abria-se sucessão ab

intestato

pela bonorum possessio contra tabulas:

(1) o pretor estende a sucessão necessária aos liberi (sui + sui fictícios);

(2) pretor dá uma faculdade ao preterido para obter a parte que lhe caberia como

herdeiro ab intestato (legítimo)

SUCESSÃO NECESSÁRIA MATERIAL

havia meio judicial colocado à disposição dos parentes mais próximos para

impugnar sua deserdação injusta, feita em testamento = querela inofficiosi

testamenti (desrespeito ao officium pietatis)

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testamento em que se nomeavam estranhos como herdeiros, em detrimento de

familiares mais próximos, ofendia o officium pietatis = liame moral que liga entre si

os parentes

se considerado inofficiosum, o testador era equiparável ao louco, pois sua última

vontade era motivada por ódio injustificável

descendentes, ascendentes e irmãos podiam pedir a invalidação do testamento

que não lhes deixasse, no mínimo, um quarto da parcela da herança a que teriam

direito pela ordem de vocação legítima

tribunal examinava os motivos da deserdação ou da preterição

quando invalidado o testamento, os herdeiros deserdados ou preteridos tinham

direito à sua parte legítima na herança; disposições testamentárias continuavam

em vigor na parte não invalidada

pela mesma forma podia ser invalidada a doação ou dote constituídos pelo

testador, antes de seu testamento, quando tais atos prejudicassem o direito dos

herdeiros legítimos

REFORMAS DE JUSTINIANO NA SUCESSÃO NECESSÁRIA

reformas pela Novelas 115 e 118:

unificou-se a sucessão formal e material e determinaram os motivos justos para a

deserdação

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titular da portio legitima tinha a querela à sua disposição quando nada recebia =

invalidava a nomeação dos herdeiros, na medida em que prejudicasse seus direitos

titular da portio legitima tinha uma actio ad supplendam legitimam quando recebiam

menos do que lhe cabia = pedir a diferença

COLAÇÃO

(“COLLATIO”)

Ao se partilhar a herança entre vários herdeiros com direito à parte legítima, tinha

que se considerar os bens patrimoniais por eles adquiridos antes da abertura da

sucessão, daí a utilidade da colação.

colação tinha a finalidade de assegurar a igualdade na participação dos

descendentes no patrimônio familiar

1) collatio bonorum vel dotis na bonorum possessio unde liberis: liberi = sui +

sui fictício; filhos emancipados têm vantagem sobre os sui, pois podem ter

patrimônio próprio.

para igualar as partes do filhos, o pretor exigia do filho emancipado que trouxesse à

colação o patrimônio por ele adquirido após a emancipação e antes da abertura da

sucessão.

esse tipo de colação foi desaparecendo, pois aumentou a capacidade dos alieni

iuris de adquirir patrimônio próprio

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2) collatio descendentium: obrigação de conferir tudo que fora recebido a título

gratuito, em vida do de cujus

Justiniano estendeu a colação, além da sucessão legítima, à sucessão

testamentária.

nesta última fase, a colação é considerada condição legal à sucessão = sucessor,

para poder adquirir a herança, deviam conferir os bens recebidos a título gratuito e,

se não os conferisse, não podia recebê-la

A colação se fazia:

(1) in natura = entregando-se à massa o bem recebido, para que, depois, se

realizasse a partilha entre os herdeiros;

(2) per imputationem = deduzindo da quota do herdeiro o valor da liberdade

recebida do de cujus

SUCESSÃO SINGULAR

(“SUCCESSIO SINGULARIS MORTIS CAUSA”)

sucessão titulo singulari se opõe à sucessão universal

sucessão universal = transmitia-se a herança, no todo ou em parte, contendo

sempre um complexo de direitos e obrigações relativas à herança; sucessão

singular = transferia-se ao sucessor designado pelo testador somente

determinados direitos destacados da herança (legados e fideicomisso)

LEGADO (LEGATUM )

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Era a disposição testamentária a favor de pessoa individualmente designada,

referente a determinado bem da herança.

pelo legado diminuía-se a parte ativa da herança deixada ao herdeiro

legado devia ser feito em forma solene, de maneira imperativa, ficando seu

cumprimento a cargo de um herdeiro testamentário

originariamente só podia ser estipulado no testamento; mais tarde, podia ser

estipulado também em codicilo (codicillus = apêndice do testamento, ato contendo

disposições para o caso de morte, sem nomear herdeiro)

como o legado podia prejudicar o herdeiro, ele tinha direito a um quarto, no mínimo,

do valor líquido da herança (lex Falcidia)

regras básicas:

legado dependia da nomeação de herdeiro

legado representava uma diminuição da herança dos herdeiros testamentários

era recebido por intermédio de um dos herdeiros

legatário não era sucessor do testador; só recebia algo da herança

legatário não respondia pelas dívidas da herança

o legado pressupunha saldo positivo da herança

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modalidades do legado:

1) legatum per vindicationem = legado do tipo real = pelas formas solenes,

expressas no testamento, conferia ao legatário, direta e imediatamente, o

respectivo direito real; legatário tinha a seu dispor a rei vindicatio para exigir a coisa

do herdeiro

2) legatum per damnationem = legado do tipo obrigacional = obrigação do

herdeiro para com o legatário, que tinha a seu dispor uma actio ex testamento (que

era uma actio in personam), para haver do herdeiro o legado

3) legatum per praeceptionem = legado do tipo real

4) legatum sinendi modo = legado do tipo obrigacional

FIDEICOMISSO ( FIDEICOMISSUM )

Era a disposição de última vontade, a título universal ou singular, expressa sob a

forma de solicitação ou pedido feito ao sucessor

podia ser feito em testamento ou num codicillus

originariamente, dependia exclusivamente da boa-fé do onerado = era uma

obrigação moral

na maioria dos casos era a entrega da quota hereditária ou bem de um legado ao

fideicomissário

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mais tarde, foi permitido ao fideicomissário propor ação para obter o que lhe fora

deixado em fideicomisso

com a evolução do instituto, passou a ser uma das formas preferidas de disposição

de última vontade

prescindia de toda e qualquer formalidade

servia de disposição de vontade às mais variadas finalidades, dando ampla

liberdade ao testador para formular sua última vontade

No direito justinianeu, os institutos do legado e do fideicomisso fundiram-se.