temporao_penello
TRANSCRIPT
Saúde em Debate v.34 n.85 abr./jun. 2010
Cebes
CARLOS GENTILE DE MELLO
ISSN 0103-1104
CENTRO BRASILEIRO DE ESTUDOS DE SAÚDE CEBES
DIREÇÃO NACIONAL (GESTÃO 2009-2011)
NATIONAL BOARD OF DIRECTORS (YEARS 2009-2011)
Presidente: Roberto Passos Nogueira
Primeiro Vice-Presidente: Luiz Antonio Neves
Diretora Administrativa: Lenaura de Vasconcelos Costa Lobato
Diretor de Política Editorial: Paulo Duarte de Carvalho Amarante
Diretores Executivos: Ana Maria Costa
Guilherme Costa Delgado
Hugo Fernandes Junior
Lígia Giovanella
Nelson Rodrigues dos Santos
Diretores Ad-hoc: Alcides Miranda
Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira
CONSELHO FISCAL / FISCAL COUNCIL
Ary Carvalho de Miranda
Assis Mafort Ouverney
Lígia Bahia
CONSELHO CONSULTIVO / ADVISORY COUNCIL
Agleildes Aricheles Leal de Queiroz
Alcides Silva de Miranda
Alberto Durán González
Eleonor Minho Conill
Ana Ester Melo Moreira
Eymard Mourão Vasconcelos
Fabíola Aguiar Nunes
Fernando Henrique de Albuquerque Maia
Julia Barban Morelli
Jairnilson Silva Paim
Júlio Strubing Müller Neto
Mário Sche,er
Naomar de Almeida Filho
Silvio Fernandes da Silva
Volnei Garrafa
SECRETARIA / SECRETARIES
Secretaria Geral: Mariana Faria Teixeira
Pesquisadora: Suelen Carlos de Oliveira
Estagiária: Debora Nascimento
A Revista Saúde em Debate éassociada à Associação Brasileirade Editores Cientí5cos
SAÚDE EM DEBATE
A revista Saúde em Debate é uma publicação quadrimestral editada pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
EDITOR CIENTÍFICO / CIENTIFIC EDITOR
Paulo Duarte de Carvalho Amarante (RJ)
CONSELHO EDITORIAL / PUBLISHING COUNCIL
Alicia Stolkiner – UBA (Argentina)
Angel Martinez Hernaez – Universidad Rovira i Virgili (Espanha)
Carlos Botazzo – USP (SP/Brasil)
Catalina Eibenschutz – UAM-X (México)
Cornelis Johannes Van Stralen – UFMG (MG/Brasil)
Diana Mauri – Universidade de Milão (Itália)
Eduardo Maia Freese de Carvalho – CPqAM/FIOCRUZ (PE/Brasil)
Giovanni Berlinguer – Universitá La Sapienza (Itália)
Hugo Spinelli – UNLA (Argentina)
José Carlos Braga – UNICAMP (SP/Brasil)
José da Rocha Carvalheiro – FIOCRUZ (RJ/ Brasil)
Luiz Augusto Facchini – UFPel (RS/Brasil)
Maria Salete Bessa Jorge – UECE (CE/Brasil)
Paulo Marchiori Buss – FIOCRUZ (RJ/Brasil)
Rubens de Camargo Ferreira Adorno – USP (SP/Brasil)
Sônia Maria Fleury Teixeira – FGV (RJ/Brasil)
Sulamis Dain – UERJ (RJ/Brasil)
EDITORA EXECUTIVA / EXECUTIVE EDITOR
Marília Fernanda de Souza Correia
INDEXAÇÃO / INDEXATION
Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde - LILACS
História da Saúde Pública na América Latina e Caribe - HISA
Sistema Regional de Informaciónen Línea para Revistas Cientí5cas de América Latina, el Caribe, España y Portugal - LATINDEX
Sumários de Revistas Brasileiras - SUMÁRIOS
ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA
Avenida Brasil, 4036 – sala 802 – Manguinhos
21040-361 – Rio de Janeiro – RJ – Brasil
Tel.: (21) 3882-9140, 3882-9141
Fax.: (21) 2260-3782
Site: www.cebes.org.br
www.saudeemdebate.org.br
E-mail: [email protected]
Apoio
Ministério da Saúde
Rio de Janeiro v.34 n.85 abr./jun. 2010
ÓRGÃO OFICIAL DO CEBES
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
ISSN 0103-1104
EDITORIAL / EDITORIAL
APRESENTAÇÃO / PRESENTATION
DEBATE / DEBATE
187 Determinação social da saúde e ambiente emocional facilitador: conceitos e proposição estratégica para uma política pública voltada para a primeira infânciaSocial determinants of health and the enabling emotional environment: concepts and a strategic framework for a public policy focused on early childhoodJosé Gomes Temporão, Liliane Mendes Penello
DEBATEDORES / DISCUSSANTS
201 Estratégia em defesa da criança saudável: cogestão e não-violência como postura existencial e políticaStrategy in favor of healthy children: co-management and nonviolence as existential and political attitudeGastão Wagner de Sousa Campos
204 Um grande avançoA big step forwardOsmar Terra
RÉPLICA / REPLY
208 Vinculo como suporte ao ambiente facilitador à vida: uma questão de saúde públicaBond as a support for favorable environment to life: a matter of public healthJosé Gomes Temporão, Liliane Mendes Penello
ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES
Pesquisa211 Matriciamento: a representação social da Equipe de Saúde da Família
Specialized orientation: the representation of the Family Health TeamAnnaiza Freitas Lopes, Renata Amanda Azevedo de Brito, Fátima Luna Pinheiro Landim, Mônica de Oliveira Nunes, Patrícia Moreira Collares
Pesquisa219 Beirando a vida, driblando os problemas: estratégias de bem viver de famílias em situação de risco e
vulnerabilidadeIn the edge of life, getting around the problems: strategies of well-being of families at risk and vulnerability situationMaria Jacqueline Abrantes Gadelha, Raimunda Medeiros Germano
Pesquisa227 Perfil da ampliação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde no Brasil
Pro!le of the expansion of Community Agents Program in Brazil José Roberto de Magalhães Bastos, Ricardo Pianta Rodrigues da Silva, Angela Xavier, Sabrina Pulzatto Merlini,
Taís Ferreira Pimentel
Pesquisa236 Doença crônica: comparando experiências familiares
Chronic disease: comparing familial experiencesNoeli Marchioro Liston Andrade Ferreira, Giselle Dupas, Carmem Lúcia Alves Filizola, So8a Cristina Iost Pavarini
Opinião248 Potencialidades e obstáculos para a consolidação da Estratégia Saúde da Família em grandes centros urbanos
Potentialities and challenges of the family health strategy consolidation in major urban centers of BrazilLigia Giovanella, Maria Helena Magalhães de Mendonça, Sarah Escorel, Patty Fidelis de Almeida, Márcia Cristina Rodrigues Fausto, Carla Lourenço Tavares de Andrade, Maria Inês Carsalade Martins, Mônica de Castro Maia Senna, Maristela Chitto Sisson
Ensaio 265 Análise do discurso da propaganda de medicamentos no Brasil
Discourse analysis of medicine advertisements in BrazilViviane Ramalho
Ensaio274 Medicalização e consumo: um olhar sobre a saúde na contemporaneidade
Medicalization and consumption: a look over health in contemporaneityJurema Barros Dantas, Ariane Patrícia Ewald
Pesquisa288 Política de medicamentos excepcionais no Espírito Santo: a questão da judicialização da demanda
#e exceptional drug policy in Espírito Santo: the matter of access by juridical approach Maria José Sartório, Ronaldo Bordin
Ensaio299 Perspectivas democráticas e suas condições de possibilidade: interseções entre a participação política no SUS e a
gestão em saúdeDemocratic prospects and their conditions of possibility: intersections between political participation in SUS and health managementFrancini Lube Guizardi, Felipe de Oliveira Lopes Cavalcanti
Pesquisa310 Gênese de um conselho local de saúde
Genesis of a local health councilRenata Mota Rodrigues Bitu Sousa, Carlos Botazzo
Pesquisa321 Conselho Municipal de Saúde de Ampére: avaliando o controle social
Ampére city’s Health Council: evaluating social controlLuciane Maria Pedot Belini, Samuel Jorge Moysés
Opinião328 Que proteção social para qual democracia? Dilemas da inclusão social na América Latina
Which social protection for which democracy?Dilemmas of social inclusion in Latin America Sonia Fleury
Pesquisa349 Avaliação da qualidade de vida de idosos renais crônicos sob tratamento hemodialítico
Evaluation of the quality of life of elderly chronic renal disease patients undergoing hemodialytic treatmentFabiana de Souza Orlandi
Pesquisa356 Enfermagem e espiritualidade na terminalidade: percepção dos ministros religiosos
Nursing and spirituality in terminal patients: perception of the religious ministersJoseane de Souza Alves
Revisão365 Uma revisão sobre a compreensão da realidade expressa na assistência em saúde mental segundo a teoria social crítica
A review on the express understanding of reality in mental health care in the second critical social theorySilvia Maria de Oliveira Mendes
Pesquisa384 Ensino de Odontologia e o Sistema Único de Saúde
Education of Dentistry and the National Health SystemGustavo Nicolini Fernandes, Newton Cesar Balzan, Maria Alice Amorim Garcia
MEMÓRIA / MEMORY
396 Especial “In memoriam”Carlos Gentile de Mello
RESENHA / CRITICAL REVIEW
397 P, Izabel C. Friche. Reforma Psiquiátrica – as experiências francesa e italiana. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2009Marina Bittencourt
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 175-180, abr./jun. 2010
EDITORIAL 175
O ano eleitoral de 2010 começará o8cialmente no segundo semestre,
mais precisamente depois da Copa do Mundo. Da parte das candi-
daturas presidenciais pré-lançadas até o presente, pouco se ouve de maneira
objetiva e clara sobre os rumos e proposições a respeito da política social.
O assunto também não é cobrado pela grande mídia e aparentemente não
seria objeto de grandes alterações nas agendas dos dois concorrentes com
maiores chances eleitorais.
Mas esse consenso por aparência e omissão das questões-chave da política
social é enganoso. Há indícios muito fortes de que o tema dos direitos sociais,
com suas inevitáveis implicações 8scais, esteja sendo evitado agora para somente
aparecer claramente em 2011. Viria no bojo de uma proposta de mudanças
fortes na Seguridade Social e no Sistema Tributário, de forma a restringir ainda
mais o núcleo da política social fundamentada em direitos sociais. E nos primei-
ros seis meses de um novo mandato presidencial, o Congresso costuma aprovar
em geral tudo que venha do Executivo, recém-legitimado pelas urnas.
É preocupante observar o tratamento que vem sendo dado ao tema dos
direitos sociais. Da parte da candidatura o8cial, houve declarações explícitas de
simpatia com o tema. Mas, por outro lado, várias manifestações e entrevistas do
atual Presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), tido como
provável futuro coordenador de política econômica da candidata ao governo,
já emitem sinalizações de duas prioridades – uma Reforma Previdenciária de
teor restritivo a alguns direitos constitucionais (a preocupação sub-reptícia é
quanto ao vínculo do salário mínimo a benefícios sociais) e uma Reforma Tri-
butária em moldes parecidos com o projeto o8cial de 2008 do Governo Lula.
Nenhum sinal por aqui de redistribuição de renda ou igualdade social como
rumo à política social e à reforma tributária.
Por outro lado, da parte do principal candidato de oposição, leem-se
declarações enfáticas de apoio ao Sistema Único de Saúde (SUS) e, agora,
até mesmo à reforma agrária. Mas quando consultamos várias manifestações
dos seus áulicos e con8dentes em assuntos 8scais ou ainda da mídia que lhe é
Política social e eleições
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 175-180, abr./jun. 2010
EDITORIAL176
generosamente favorável, há uma espécie de senha-chave que assim se expres-
sa: “reduzir gastos correntes do orçamento a qualquer custo”. O observador
desavisado perguntará: que tem isto a ver com política social?
Ora, na atual con8guração dos direitos sociais já regulamentados, os
“Benefícios Monetários” das políticas sociais estão essencialmente vinculados a
direitos e correspondem a 15,5% do PIB nas “Contas Nacionais” de 2006 (as
mais recentes publicadas em detalhe); e os “Benefícios em Espécie” – serviços
públicos gratuitos oferecidos aos cidadãos – representam 8,6% neste mesmo
ano. Esse conjunto de “Benefícios Monetários” e serviços públicos, ou “Bene-
fícios em Espécie”, na linguagem das Contas Nacionais, já somam cerca de ¼
do Produto Interno Bruto (PIB). Os recursos que 8nanciam esses benefícios
são quase integralmente categorizados nos orçamentos públicos como gastos
correntes. Daí, havendo restrições a direitos, desvinculações constitucionais,
congelamentos ou outros truques para “restringir os gastos correntes”, fatalmente
seriam afetados os benefícios sociais e os salários do funcionalismo.
Para manter o estatuto da política social e viabilizar a melhoria da qualida-
de na prestação dos serviços universais (SUS e educação básica, principalmente)
ou incluir parcelas expressivas da população ainda não incorporadas aos sistemas
públicos – Previdência e Assistência, Política Agrária, Habitação etc. – não há
como fazê-lo “reduzindo gastos correntes”. Nem mesmo congelando esses gastos
em algum ano isso é possível, como espertamente foi proposto no Projeto de
Reforma Tributária do governo Lula.
Há fatores demográ8cos, epidemiológicos e de riscos sociais associados a
uma geração de direitos sociais (seguridade social), de pretensão universal, que
não estão congelados, mas, ao contrário, tendem a crescer. Há também uma
geração de novos riscos sociais e ambientais associados às mudanças climáticas
que fatalmente alimentarão demandas futuras por novos serviços públicos de
proteção social. Essas demandas tendem a crescer e precisariam contar com re-
cursos, simultaneamente associados ao crescimento da economia e melhoria.
Universalizar direitos sociais numa sociedade altamente desigual como
a nossa requer compreensão clara de que isso é política social redistributiva.
Integra um modelo de sociedade e de economia com pretensão a um estilo de
desenvolvimento fundado no paradigma da igualdade. Mas isso não se faz sem
uma reforma tributária redistributiva e também requer política social organizada
e planejada com horizonte mínimo de uma década.
Isso tudo não está nas agendas políticas das candidaturas principais, nem
das mídias, nem do “consenso da opinião pública”. Precisa ser explicitado e
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 175-180, abr./jun. 2010
EDITORIAL 177
discutido na campanha eleitoral e fora dela, para que não tenhamos a ingrata
surpresa de ver “reformas” implementadas na política social e tributária em
2011 que se ponham na contramão da construção dos direitos sociais.
O processo eleitoral e a formação de opinião pública, sob intenso controle
dos partidos e dos meios de comunicação de massa, não são bons aliados para
esclarecer questões essenciais sobre política social. Há que se ter criatividade e
ousadia para colocar essas questões nas agendas políticas do Estado, dentro e
fora das arenas convencionais da política.
DIRETORIA NACIONAL
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 175-180, abr./jun. 2010
EDITORIAL178
The 2010 electoral year will o�cially begin in the second half of the year,
precisely after the World Cup. Very little has objectively and clearly
been heard on the directions and propositions regarding social policy from
the pre-announced presidential candidates till the moment. �e subject is
not requested by the press either, and apparently would not be subject of
great alterations in the agenda of the two candidates with more electoral
advantage.
But this consensus on appearance and omission of social policy’s key-
matters is deceiving. �ere is strong evidence that the social rights theme,
together with its inevitable 8scal implications, is being avoided now to clearly
arise only in 2011. It would be intrinsic to a proposal of strong changes in
the Social Security and in the Tributary System as to restrict even more the
core of the social policy which is founded on social rights. And during the
8rst six months of a new presidential mandate, the Congress usually ap-
proves everything that comes from the Executive, recently legitimated by
the electors.
It is disturbing to observe the treatment that has been given to the theme
of social rights. �ere have been explicit declarations of sympathy with the
theme from the o�cial candidacies. On the other hand, many manifestations
and interviews from the current president of the Brazilian Development Bank
(BNDES, acronym in Portuguese), who is considered to be a likely future
coordinator of economic policy of the government candidate, already show
two priorities – a reform of the social security with a purport restrictive to
some constitutional rights (the hidden preoccupation concerns the bond of
minimum wage with social bene8ts); and a tributary reform which looks like
the 2008 o�cial government project of president Lula mandate. �ere is no
sign of income redistribution or social equality as a road to social policy and
tributary reform.
On the other hand, emphatic statements supporting the National
Health System (SUS, acronym in Portuguese) and even the agrarian reform
Social policy and elections
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 175-180, abr./jun. 2010
EDITORIAL 179
have been read from the main opposition candidate. But when we inquire
many manifestations on 8scal issues of their representatives and con8dents,
or even the press which is generously favorable to such candidate, there is
a kind of password, which is expressed as follows: “to reduce the current
expense budget by any means”. �e unadvised observer may ask: what does
it have to do with social policy?
Well, in the current con8guration of the regularized social rights, the
“Monetary Bene8ts” of social policies are essentially bonded to rights and
account for 15.5% of the gross domestic product in the “National Accounts”
of 2006 (the most recent ones being published in details); and the “Cash
Bene8t” – free public services o�ered to citizens – account for 8.6% in the
same year. �is assemblage of “Monetary Bene8ts” and public services, or
“Cash Bene8ts” in the National Accounts’ language, currently sums ¼ of the
gross domestic product (GDP). �e resources that 8nance these bene8ts are
almost integrally categorized in the public budget as current expenditures.
In this manner, as there would be restrictions to rights, constitutional dis-
sociations, freezings and other arti8ces to “restrict the current expenditures”,
the social bene8ts and functionalism salaries would be severely a�ected as a
consequence.
To maintain the social policy statute and enable the improvement
of the quality of universal services (mainly SUS and basic education) or
include expressive portions of the population that are not included in the
public systems yet – social security and assistance, agrarian policy, housing
and others – is not possible by “reducing current expenditures”. Not even
freezing these expenses in any year makes it possible, as smartly proposed in
the Tributary Reform Project of Lula government.
�ere are demographic, epidemiological and social-risk factors which are
associated with the creation of universally-intended social rights (social security)
and that are not frozen, but rather tend to grow. �ere is also the generation of
new social and environmental risks associated with climatic changes that will
fatally promote future demands for new social protection public services. �ese
demands tend to grow and need to rely on resources simultaneously associated
with the growing and improvement of the economy.
To universalize social rights in a society highly unequal like ours requires
a clear comprehension of the fact that this is a redistributive social policy.
It comprises a model of society and economy that seek a style of develop-
ment based on the paradigm of equality. But this can not be done without
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 175-180, abr./jun. 2010
EDITORIAL180
a redistributive and tributary reform, and requires a social policy organized
and planned aiming at no less than one decade.
�ese issues are not present in the politics agenda of the main candi-
datures, nor of the press, nor of the “public opinion consensus”. It should
be explicit and discussed in and out the electoral campaign; in this man-
ner, people will not have the unappreciative surprise of watching “reforms”
implemented in social and tributary policies that oppose the building of
social rights in 2011.
�e electoral process and the formation of the public opinion, under
intense control of the parties and means of mass communication, are not
good allies to clear up essential matters on social politics. �ere has to be
creativity and audacity to put these issues on the agenda of State policies, in
and out the conventional political 8eld.
THE NATIONAL DIRECTORATE
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 181-186, abr./jun. 2010
APRESENTAÇÃO 181
Este é o último número da Saúde em Debate vinculado ao projeto
“Reforma Sanitária em Debate”, responsável pela edição dos últimos
números da publicação. Nesse período, a revista passou por um processo
intenso de reformulações. Houve transformações na sua identidade visual,
em seu conteúdo e em sua periodicidade. Voltou a ser editada regularmente,
foi indexada em outras bases de dados e, a partir deste ano, mudou a sua
periodicidade de quadrimestral para trimestral.
A capa é dedicada a Carlos Gentile de Mello, autor do primeiro livro
editado pelo Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), Saúde e Assis-
tência Médica no Brasil, em 1977. Neste número, reproduzimos o texto, em
sua homenagem, publicado originalmente na Saúde em Debate no. 17, de
1989, na ocasião de seu falecimento.
Iniciamos este número com o artigo de debate de autoria de José Gomes
Temporão e Liliane Mendes Penello, no qual os autores propõem uma política
pública de saúde para a primeira infância, fornecendo as bases conceituais
e políticas da “Estratégia Brasileirinhas e Brasileirinhos Saudáveis”, recente-
mente lançada pelo Ministério da Saúde. Na sequência, o artigo é debatido
por Gastão Wagner de Sousa Campos, que considera a iniciativa ousada e
inovadora, e Osmar Terra, que fala do avanço que o texto traz para a com-
preensão sobre a importância do chamado “ambiente emocional facilitador”
para o desenvolvimento inicial, considerando-o no contexto da determinação
social da saúde. Os dois textos foram replicados pelos autores.
O cuidado à família é um dos temas mais importantes no campo da
saúde, o que é possível constatar pela quantidade e qualidade dos artigos
submetidos à revista e pelo conjunto de textos tratando dos temas aqui publi-
cados. Annaiza Freitas Lopes et al. apresentam os resultados de uma pesquisa
na qual discutem a representação social da Equipe de Saúde da Família em
Fortaleza, a partir do matriciamento promovido pelos Centros de Atenção
Psicossocial (Caps). A pesquisa de Maria Jacqueline Abrantes Gadelha e Rai-
munda Medeiros Germano analisa as estratégias utilizadas pelas famílias em
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 181-186, abr./jun. 2010
APRESENTAÇÃO182
situação de risco e vulnerabilidade no âmbito da Estratégia Saúde da Família.
José Roberto Bastos et al. apresentam a pesquisa que realizaram sobre o de-
senvolvimento do Programa de Agentes Comunitários de Saúde no período
de 1998 a 2007, demonstrando o seu grande crescimento em todas as regiões
do país. Outra pesquisa muito importante, de Noeli M.L.A. Ferreira et al.,
faz uma re�exão sobre a experiência de famílias com um membro portador
de doença crônica. O bloco é complementado pelo artigo de opinião de Ligia
Giovanella et al. sobre os fatores que condicionam a efetiva implementação
da Estratégia Saúde da Família em grandes centros urbanos.
A preocupação com os vários aspectos relacionados à política de me-
dicamentos é abordada nos textos de Viviane Ramalho, um ensaio sobre
os sentidos “potencialmente ideológicos” na propaganda de medicamentos
no Brasil, e de Jurema B. Dantas e Ariane P. Ewald, que analisam a relação
entre o consumo e o fenômeno da medicalização e a forma como tal relação
reposiciona a noção de saúde. O tema dos medicamentos neste número é
encerrado com a pesquisa de Maria José Sartório e Ronaldo Bordin que, a
partir da análise das demandas judiciais no Espírito Santo, revelam aspectos
importantíssimos sobre a questão da judicialização no país.
Outro tema que sempre está na agenda do Sistema Único de Saúde
(SUS) é o da participação e controle social. O ensaio de Francini L. Guizardi
e Felipe O.L. Cavalcanti propõe que pensemos a participação política como
uma atividade de luta e construção de saúde em si mesma. Renata M. R. B.
Sousa e Carlos Botazzo investigam o modo como se articula o discurso de
participação da comunidade na constituição de um conselho da unidade de
saúde da família. A pesquisa de Luciane M.P. Belini e Samuel Jorge Moyses
nos leva a re�etir sobre alguns aspectos relacionados aos Conselhos de Saúde
que necessitam urgentemente serem transformados, sob risco de perderem seu
caráter de controle social do SUS. Sonia Fleury, em “Que proteção social para
qual democracia: dilemas da inclusão social na América Latina”, discute “os
ônus que os sanitaristas de esquerda assumiram ao encarregar-se de implantar
reformas dos sistemas de saúde na América Latina em contextos de transição
à democracia marcados pela ausência de hegemonia e pelos acordos que res-
tringem as possibilidades de implementar as políticas universais projetadas
pelo movimento sanitário.”
Na parte 8nal da revista, estão publicados artigos sobre temas variados,
tais como a pesquisa de Fabiana de Souza Orlandi sobre avaliação de quali-
dade de vida de idosos renais crônicos em hemodiálise, a pesquisa de Joseane
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 181-186, abr./jun. 2010
APRESENTAÇÃO 183
de Souza Alves sobre o cuidado da enfermagem em relação às necessidades
espirituais do paciente terminal a partir da percepção de ministros religiosos,
o artigo de revisão de Silvia M.O. Mendes sobre a aplicação da teoria social
crítica no campo da saúde mental, e a pesquisa de Gustavo N. Fernandes et
al. sobre a formação do cirurgião-dentista visando à sua atuação no SUS.
A resenha deste número, elaborada por Marina Bittencourt, é sobre o
livro Reforma Psiquiátrica – as experiências francesa e italiana, de autoria de
Izabel F. Passos.
Boa leitura!
Paulo Amarante
Editor Cientí8co
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 181-186, abr./jun. 2010
PRESENTATION184
This is the last issue of the journal Saúde em Debate which is bound to the
project “Sanitary Reform in Discussion”, responsible for the edition of
the last issues. In this period, the journal went through an intense process of
reformulations. �ere were some changes in its visual identity, in its content
and periodicity. It is being regularly edited again, was indexed in other data-
bases and, from this year on, has a new periodicity: it is now quarterly.
�e cover is dedicated to Carlos Gentile de Mello, the author of the
8rst book edited by Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), Saúde e as-
sistência médica no Brasil, in 1977. In this issue, a text is reproduced in honor
to the author, which was originally published in Saúde em Debate issue 17,
1989, on the occasion of his passing.
�e present issue is initiated with the debate article by José Gomes
Temporão and Liliane Mendes Penello, who propose a public health policy for
the 8rst infancy, providing the conceptual and political bases of the campaign
“Estratégia Brasileirinhas e Brasileirinhos Saudáveis”, recently launched by the
Ministry of Health. Following, the article is debated by Gastão Wagner de
Sousa Campos, who considers it an audacious and innovative initiative, and
by Osmar Terra, who speaks of the advance that the text provides for the
understanding of the importance of the “enabling emotional environment”
in the early development, considering it in the context of social determina-
tion of health. Both texts were replied by the authors.
�e family care is one of the most important themes of the health 8eld,
which may be veri8ed by the quantity and quality of the articles submitted for
the journal and by the assemblage of papers dealing with the themes gener-
ally published in the journal. Annaiza Freitas Lopes et al. present the results
of a research in which the social representation of the family health team of
Fortaleza is discussed based on the matrix-based strategies promoted by the
Centers for Psychosocial Care (Caps, acronym in Portuguese). �e article
by Maria Jacqueline Abrantes Gadelha and Raimunda Medeiros Germano
analyzes the strategies used by the families in risked and vulnerable situations
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 181-186, abr./jun. 2010
PRESENTATION 185
in the scope of Health Family Strategy. José Roberto Bastos et al. present a
paper on the development of the Community Health Agents Program in the
period comprising 1998 to 2007, demonstrating its growth in all regions of
the country. Another important article, by Noeli M.L.A Ferreira et al., brings
a re�ection on the experience of families of chronic disease patients. �is the-
matic text group is complemented by the opinion article by Ligia Giovanella
et al., who discuss the factors that condition the e�ective implementation of
the Family Health Strategy in urban centers.
�e concern about the many factors related to the medication policy
is discussed in the articles by Viviane Ramalho, an essay on the “potentially
ideological” meaning of the Brazilian medication publicity, and by Jurema B.
Dantas and Ariane P. Ewald, who analyze the relation between the consump-
tion and the phenomenon of medicalization, as well as how such relation
repositions the notion of health. �e theme of medication in this issue is
closed with the research by Maria José Sartório and Ronaldo Bordin which,
from an analysis of the judicial demands in Espírito Santo, Brazil, reveals
important aspects about the matter of judicialization in the country.
Other themes which are always in the agenda of the National Health
System (SUS, acronym in Portuguese) are the social participation and social
control. �e essay by Francini L. Guizardi and Felipe O.L. Cavalcanti pro-
poses that we make a re�ection on political participation as an activity of
combat and construction of health itself. Renata M.R.B. Sousa and Carlos
Botazzo investigate how the discourse of community participation in the con-
stitution of a council for the Family Health Unit is articulated. �e research
by Luciane M.P Belini and Samuel Jorge Moyses leads the reader to consider
some aspects related to the Health Councils which need urgent transforma-
tion, otherwise they may lose their characteristic of SUS social control. In
“Which social protection for which democracy? Dilemmas of social inclusion
in Latin America”, Sonia Fleury discusses “costs that the left sanitarians as-
sumed with the responsibility to held the reforms of health care systems in
Latin America during the processes of transition to democracy, marked by
the absence of hegemony and by agreements that restrict the possibilities of
implementing universal policies projected by the sanitary reform.”
In the 8nal section of this issue, articles on varied themes are published:
the paper by Fabiana de Souza Orlandi that approaches the assessment of
quality of life of the elderly population with chronic renal disease under
hemodyalisis treatment, the article by Joseane de Souza Alves on the nursing
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 181-186, abr./jun. 2010
PRESENTATION186
care with regard to the spiritual necessities of patients with terminal illnesses
based on the perception of religious ministries, the review article by Silvia
M.O. Mendes on the critical social theory put into practice in the mental
health 8eld, and the research by Gustavo N. Fernandes et al. on the profes-
sional formation of dental surgeons aiming at their performance in SUS.
�e review of this issue, elaborated by Marina Bittencourt, is about
the book Reforma Psiquiátrica – as experiências francesas e italiana, written
by Izabel F. Passos.
Enjoy your reading!
Paulo Amarante
Scienti8c Editor
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
DEBATE / DEBATE 187
Determinação social da saúde e ambiente emocional facilitador:
conceitos e proposição estratégica para uma política pública voltada
para a primeira infância
Social determinants of health and the enabling emotional environment: concepts and a
strategic framework for a public policy focused on early childhood
José Gomes Temporão 1
Liliane Mendes Penello 2
RESUMO Os autores propõe uma política pública de saúde para a primeira
infância, discutindo os Determinantes Sociais da Saúde e o Desenvolvimento
Emocional Primitivo e sugerindo que sua inter-relação de!ne padrões pessoais
de convívio social e de saúde. Utilizaram o modelo de Dahlgreen e Whitehead e
o pensamento de John Bowlby e Donald Winnicott para a resposta ao desa!o de
assegurar a promoção da saúde e um ambiente saudável à mulher e à criança de zero
a seis anos. Con!gurou-se a ‘Estratégia Brasileirinhas e Brasileirinhos Saudáveis –
primeiros passos’ para o desenvolvimento nacional, proposta do Ministério da Saúde,
de caráter transversal e intersetorial visando à redução das desigualdades, promoção
de saúde, cidadania e democracia desde as etapas mais precoces da vida.
PALAVRAS-CHAVE: Política de saúde; Determinação social da saúde,
Desenvolvimento emocional primitivo; Saúde materno-infantil
ABSTRACT #e authors proposed a public health policy for early childhood, discussing
the social determinants of health, and the early child development and suggesting that
their inter-relationship de!nes personal standards of socialization and health. #ey
used the Dahlgreen and Whitehead model and the ideas of John Bowlby and Donald
Winnicott to answer the challenges for ensure the promotion of health and a healthy
environment for women and children from zero to six years old. #e strategy ‘Healthy
little Brazilians - !rst steps towards national development’ was proposed by the ministry of
health, a transversal and intersectorial initiative in order to reduce inequities, promoting
health, citizenship and democracy since the earliest stages of life.
KEYWORDS: Public policies; Health policies; Social determinants of health;
Early child development; Maternal and childhood health policies
1 Médico; Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Ministro de Estado da Saúde do Brasil. [email protected]
2 Médica; Mestre em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz); Coordenadora do Comitê Técnico Consultivo da Estratégia Brasileirinhas e Brasileirinhos Saudáveis (MS/Fiocruz). [email protected]
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
188voltada para a primeira infância
I N T R O D U Ç Ã O
Estranhos assuntos esses, tão marginais às cha-
madas questões nacionais em que se centra o
debate político. É que eles fervilham no pré-sal
da existência humana, a camada mais submer-
sa, talvez a mais rica. (Oliveira, 2010).
A concepção ampliada de saúde adotada contem-
poraneamente considera que, para uma vida rica em
qualidade, é muito pouco para o homem ser apenas
são. Torna-se necessário agregar à ausência de doenças a
intensidade de experiências de vida e expressões de cria-
tividade que permitam a superação dos fatores geradores
de mal-estar e sofrimento que limitam e desquali8cam o
viver. Hoje, estamos convencidos de que a potência ou a
capacidade individual para manejar com maior autono-
mia as questões vivenciais estão vinculadas a experiências
relacionais dos primórdios da vida, quando são de8nidos
padrões pessoais do viver e do conviver.
Argutos observadores do desenvolvimento emocio-
nal primitivo, John Bowlby e Donald Winnicott, tra-
balhando no campo da pediatria, psicanálise e etologia
em meados do século passado, indicavam a importância
destas considerações na formação de padrões adaptativos
à vida, repercutindo desde cedo na liberdade de cada ser
humano para usufruir a sua própria experiência de vida.
Insistiram, então, na adoção de um conceito ampliado
de saúde que incluísse também os aspectos psicológicos.
Bowlby havia sido convidado para assessorar a Organiza-
ção Mundial de Saúde (OMS) na área de saúde mental
de crianças sem lar, em 1950, e Winnicott, trabalhara
como voluntário atendendo crianças afastadas de seus
pais e famílias durante a Segunda Grande Guerra. Essas
experiências marcantes foram incorporadas às suas obras,
sustentando valiosas teorias no campo da psicanálise, e
in�uenciando muitos outros autores, para o trabalho
com um dos temas que queremos aqui discutir, associado
à determinação social da saúde, que é o desenvolvimento
emocional primitivo e os cuidados com a primeira infân-
cia e sua relação com políticas públicas de saúde.
Com o conceito de ambiente facilitador do cresci-
mento e amadurecimento dos seres humanos, sugeriu-se
que o ambiente inicial da vida de um novo ser coincide
com o corpo-mente da mãe, incluindo sua própria
condição de existência, suas redes de sustentação, suas
fantasias e desejos, suas construções imaginárias ou
reais como ambiente de suporte para o 8lho. A ideia
da ‘mãe su8cientemente boa’ como aquela capaz de
apresentar intuitivamente ao seu 8lho aquilo que ele
necessita como provisão rumo ao seu crescimento e
amadurecimento, incluindo as possíveis falhas nesse
caminho, chama atenção para o fato de que a provisão
ofertada pela mãe biológica pode ser executada por uma
8gura substituta através de vínculo amoroso, criativo e
não-burocrático.
Para o autor, nesta fase de desenvolvimento do
lactente, o amor só pode ser efetivamente expresso em
termos de cuidado neste ambiente favorável à con-
8abilidade. A mãe su8cientemente boa é o ambiente
facilitador para a efetivação do processo maturacional
da criança pequena, provendo chances à criança de se
tornar uma pessoa real, em um mundo real, e de crescer
de acordo com seu potencial herdado. Em relação ao
amadurecimento, compreende-se como um processo
jamais 8nalizado e sempre ‘adaptativo’ do ponto de vista
evolucionário, que tem sido considerado importante
indicador de saúde que contribui decisivamente para o
desenvolvimento social:
A base para uma sociedade é a personalidade
humana total [...] não é possível que as pessoas
consigam ir mais além na construção da socie-
dade do que de seu próprio desenvolvimento
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
189voltada para a primeira infância
pessoal. (Winnicott, 1989, p. 193 ).
É neste sentido que propõe uma compreensão
bastante peculiar do desenvolvimento da personalida-
de humana total, sua constituição sempre frente a um
‘outro’ com o qual estabelece vínculos sugerindo uma
con8guração em círculos que se amplia e se expande
desde o desejo e o corpo da mãe até a participação social
mais ampla.
Considerando a importância do Desenvolvimento
Emocional Primitivo na de8nição e con8guração de
padrões de saúde para a vida, um grande esforço para
atender às recomendações da Comissão Nacional de De-
terminantes Sociais da Saúde (CNDSS) e da OMS, no
sentido da produção de ações, estratégias e políticas vol-
tadas para a primeira infância, vem sendo desenvolvida
pelo Ministério da Saúde (MS), desde 2007, a ‘Estratégia
brasileirinhas e brasileirinhos saudáveis, primeiros passos
para o desenvolvimento nacional’ (EBBS).
A EBBS surgiu com a rica discussão em torno da
formulação do Programa de Aceleração do Crescimento
na Área da Saúde (PAC/Saúde, 2007) visando a apro-
fundar e integrar as reformas sanitária e psiquiátrica bra-
sileiras articulando-as a um padrão de desenvolvimento
nacional comprometido com crescimento, bem-estar e
equidade no acesso à saúde do povo brasileiro. Dessa
iniciativa, resultou o ‘Mais Saúde’, Plano de Metas do
Ministério da Saúde (Brasil, 2010) constituído em
torno de sete grandes eixos, dentre os quais, a Promoção
da Saúde. Nesta oportunidade, 8cou muito clara nossa
expectativa em revigorar o trabalho a partir da área
da saúde por um projeto civilizatório e, dentro dessa
perspectiva, produzir saúde, cidadania e democracia,
tornando-se fundamental considerar a constituição de
nossos cidadãos, desde as etapas mais precoces da vida.
Em decorrência disso, foi produzido no âmbito do
Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas
em Saúde da Secretaria de Atenção à Saúde do MS,
com participação de todas as Secretarias do MS, o
documento-base para desenho da EBBS.
O Brasil possui 14.210.000 crianças na faixa etária
de zero a quatro anos – o que corresponde a 7,59%
da população total (Brasil, 2008). De acordo com o
Censo Escolar de 2007, apenas 17,1% das crianças de
até três anos estão matriculadas em creches, enquanto
77,6% das crianças de quatro a seis anos frequentaram
pré-escola. Portanto, mais de 80% das crianças meno-
res de três anos estão sendo educadas e cuidadas em
ambiente doméstico, pelos progenitores (em geral, a
mãe) ou por um cuidador substituto. Por essa razão,
decidimos trabalhar pela maior interação e ampliação
das ações de saúde com novas ofertas voltadas para a
Primeira Infância, em sintonia com o relatório 8nal
da CNDSS que sugere intervenções que adotem como
referência os princípios e estratégias da ‘promoção da
saúde’, estabelecidos numa série de seis Conferências
Internacionais (Ottawa, Adelaide, Sundsval, Jacarta,
México e Bancoc), entre 1986 a 2005. Destaca-se a
primeira delas, na qual foi lançada a Carta de Ottawa,
com o objetivo de contribuir para o combate e a supe-
ração de problemas geradores de iniquidades na área e
desenvolvimento saudável dos cidadãos. O documento
reconhece que paz, educação, moradia, alimentação,
renda, ecossistema estável, justiça social e equidade
são requisitos fundamentais para a saúde dos povos
identi8cando como condições-chave para promover a
saúde o estabelecimento de políticas públicas saudáveis,
a criação de ambientes favoráveis, o fortalecimento das
ações comunitárias, o desenvolvimento de habilidades
pessoais e a reorientação dos serviços de saúde.
Essa iniciativa do Ministério da Saúde vem fortale-
cer um conjunto de esforços em todo o país para articula-
ção, interação e desenvolvimento de ações voltadas para
a saúde da mulher, especialmente durante a gravidez, e
da criança de zero a seis anos, etapa da vida designada
como primeira infância, o que, no Brasil, corresponde
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
190voltada para a primeira infância
ao momento anterior à entrada obrigatória da criança
no ensino fundamental (Brasil, 2002).
A Portaria GM 2.395 de 7 de outubro de 2009,
veio instituir a EBBS considerando marcos legais,
contribuições institucionais e experiências nacionais e
internacionais bem-sucedidas: a Constituição Brasileira; o
Estatuto da Criança e do Adolescente; as Políticas Nacio-
nais de Atenção Integral à Saúde da Mulher, da Criança
e Aleitamento Materno, de Saúde Mental, da Atenção
Primária, o Planejamento Familiar, a Política Nacional
de Humanização, dentre outras, aprovadas no Conselho
Nacional de Saúde (CNS) e na Comissão Intergestores
Tripartite (CIT); o Compromisso Brasileiro com os Ob-
jetivos do Milênio (ODM) (especialmente o 4º, voltado
para a Redução em 2/3 da mortalidade de menores de
5 anos até 2015), o Pacto pela Vida (Portaria GM 325,
2008), o Pacto Nacional pela Redução da Mortalidade
Materna e Neonatal (PR, 2004), o Compromisso para
Acelerar a Redução das Desigualdades na Região Nordeste
e Amazônia Legal, 8rmado entre os Governos Estaduais
e Federal; Pastoral da Criança, OMS, Organização Pan-
Americana da Saúde (OPAS), Fundo das Nações Unidas
para a Infância (Unicef), Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Or-
ganizações Não-Governamentais e Redes de Instituições
voltadas para o Cuidado com a Primeira Infância, Ex-
periências Nacionais e Internacionais exitosas e Políticas
Públicas Regionais e Nacionais de setores outros que não
a Saúde, mas neste campo e na perspectiva intersetorial.
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) foi designada para
a Coordenação Técnica da EBBS.
A EBBS traz como preocupação central não
apenas o desa8o de trabalhar nacionalmente pela
articulação e interação das múltiplas iniciativas nesse
campo sabidamente multissetorial, o que já torna essa
proposta bastante ousada, mas também a necessidade
de prover novas ofertas de cuidado na perspectiva de
fortalecimento dos vínculos entre os pais, suas crianças
pequenas e a rede social que os cerca, considerando
estágios precoces do desenvolvimento humano, com
intervenções sobre uma série de determinantes que
incidem sobre o chamado ‘ambiente facilitador’, tal
como o descrevemos acima.
Questão que se torna ainda mais importante, diante
da chamada transição dos cuidados na infância, fenômeno
observado em todo o mundo, relacionado com alguns
progressos no sentido da igualdade de oportunidades para
as mulheres – nos países da Organização para a Coope-
ração e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mais de
dois terços de todas as mulheres em idade ativa trabalham
atualmente fora de casa – o que merece ser festejado, mas
que passa a representar, com as pressões econômicas cres-
centes, preocupações para milhares de mães: as pressões
laborais não re�etem novas oportunidades, mas novas
necessidades. Se o cuidado com as crianças pequenas
era um assunto predominantemente privado e familiar,
agora tornou-se, em grande medida, uma atividade que
decorre fora de casa e em que os governos e as empresas
privadas estão cada vez mais envolvidos, pois uma grande
parte delas passa seus primeiros anos de vida não nas suas
casas com as respectivas famílias, mas em algum tipo de
estrutura de cuidados à infância. E embora esse não seja
o quadro predominante da realidade brasileira, sabe-se
que um quarto das famílias em nosso país vive de um
salário feminino. Em artigo publicado no jornal O Glo-
bo, de 2 de maio 2010, Rosiska Darcy de Oliveira traz à
tona temas tangenciados e con8denciados na sociedade,
como as escolhas sobre a maternidade, as condições da
gravidez e do parto, as leis que tolhem ou propiciam
liberdades, o temor atávico da violência sexual. Todas
essas questões tornadas realidade para o corpo feminino
a�igem as mulheres, uma vez que elas sabem habitar
um corpo cujo destino é desdobrar-se em outros. Ainda
segundo a articulista, respeito e escuta é o que aspiram as
mulheres para que possam efetivamente contribuir com
reformas modernizadoras de estruturas de acolhimento
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
191voltada para a primeira infância
que tornem a vida familiar viável, e não o ponto cego das
relações sociais.
Nesse sentido, tem sido necessário recorrer a uma
compreensão mais cuidadosa do que são e como atuam
os determinantes sociais da saúde e como podemos pen-
sar, neste âmbito, as intervenções sobre as tendências à
integração psíquica e ao ambiente facilitador.
DETERMINAÇÃO SOCIAL E TENDÊNCIAS À
INTEGRAÇÃO PSÍQUICA NA PRODUÇÃO DE
SAÚDE: APROXIMANDO CONTRIBUIÇÕES,
ARTICULANDO AÇÕES DIFERENCIADAS
NAS PRÁTICAS DE SAÚDE
Apesar da preponderância do enfoque médico
biológico na conformação inicial da saúde pública como
campo cientí8co em detrimento dos enfoques sociopo-
líticos e ambientais, observa-se, ao longo do século 20,
uma permanente tensão entre essas diversas abordagens.
A própria história da OMS oferece interessantes exemplos
dessa tensão, observando-se períodos mais centrados em
aspectos biológicos, individuais e tecnológicos intercalados
com outros em que se destacam fatores sociais e ambientais.
A de8nição de saúde como um estado de completo bem-
estar físico, mental e social e não meramente a ausência
de doença ou enfermidade, inserida na Constituição da
OMS no momento de sua fundação, em 1948, é uma
clara expressão de uma concepção bastante ampla da saúde
para além de um enfoque centrado na doença. Observa-se
este trecho do relatório da segunda sessão da Comissão de
Especialistas em Saúde Mental da OMS:
O mais importante princípio a longo prazo
para o trabalho da OMS, na promoção da
saúde mental, em contraste com o tratamento
de distúrbios psiquiátricos, é o estímulo à in-
corporação no trabalho de saúde pública, da
responsabilidade pela promoção da saúde física
e mental da comunidade. (WHO, 1951).
Já a Conferência de Alma Ata, no 8nal dos anos
1970, e as atividades inspiradas no lema ‘Saúde para
Todos no Ano 2000’ recolocam em destaque o tema
dos determinantes sociais. No Brasil, trouxe elemen-
tos decisivos para a sustentação da Reforma Sanitária
Brasileira, num período ditatorial de nossa história
recente, em que diferentes e importantes atores, como
representantes de instituições de ensino, assistência,
órgãos de classe, partidos políticos, sociedades médicas
e de especialistas da saúde e outros representantes da
sociedade civil discutiam sua relação com o regime
democrático. ‘Democracia e Saúde’ passa a ser o tema
em debate e a discussão prosseguirá ampliando-se para
a compreensão de que ‘Democracia é Saúde’.
Nos anos 1980, o predomínio do enfoque da saúde
como um bem privado desloca novamente o pêndulo
para uma concepção centrada na assistência médica
individual, a qual, na década seguinte, com o debate
sobre as Metas do Milênio, novamente dá lugar a uma
ênfase nos determinantes sociais, que se a8rma com a
criação da Comissão sobre Determinantes Sociais da
Saúde da OMS, em 2005 (WHO, 2008).
Segundo a Comissão Nacional sobre os Determi-
nantes Sociais da Saúde do Brasil, os DSS, são aqueles
econômicos, culturais, psicológicos, comportamentais
entre outros, que in�uenciam a ocorrência e a distri-
buição na população dos problemas de saúde e seus
fatores de risco.
A CNDSS escolheu o modelo de Dahlgreen e
Whithead (CNDSS, 2008), para balizar as interven-
ções sobre os DSS e promover a equidade em saúde
contemplando os diversos níveis que devem incidir
sobre os determinantes proximais (vinculados aos com-
portamentos individuais), intermediários (relacionados
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
192voltada para a primeira infância
às condições de vida e trabalho) e distais (referentes à
macroestrutura econômica, social e cultural). A escolha
deste modelo foi justi8cada por sua simplicidade, por
sua fácil compreensão para vários tipos de público e pela
clara visualização grá8ca dos diversos DSS. E serviu de
base para orientar a organização de suas atividades e os
conteúdos do seu relatório 8nal.
MODELO DE DAHLGREN E WHITEHEAD
E A IMPORTÂNCIA DO AMBIENTE
FACILITADOR NA PRODUÇÃO DA SAÚDE: A
CONTRIBUIÇÃO DE DONALD WINNICOTT
Este Modelo inclui os DSS dispostos em diferentes
camadas, segundo seu nível de abrangência, desde uma mais
próxima aos determinantes individuais até uma camada distal
na qual se situam os macro determinantes (Figura 1).
Em relação ao tema em questão, interessa particu-
larmente discutir as duas primeiras: os indivíduos estão
na base do modelo, com suas ‘características individuais
de idade, sexo e fatores genéticos’ que exercem in�uência
sobre seu potencial e suas condições de saúde; o ‘compor-
tamento e os estilos de vida individuais’ estão situados
no limiar entre os fatores individuais e os DSS, já que
os comportamentos dependem não apenas de opções
feitas pelo livre arbítrio das pessoas, mas também dos
DSS, como acesso ao trabalho, habitação, informações,
possibilidades de acesso a alimentos saudáveis e espaços
de lazer, entre outros.
A EBBS apoia-se na ideia de que a integração do
ser humano ao ambiente social em que vive é prece-
dida de múltiplas experiências do chamado ‘ambiente
facilitador’ de origem e, conforme anteriormente co-
locado, este ambiente resulta da interação de fatores
genéticos, psicológicos, sociais, econômicos e culturais.
Considerar, portanto, as repercussões destes fatores na
F 1 - Modelo de Dahlgren e Whitehead
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
193voltada para a primeira infância
relação mãe-bebê ou cuidador-bebê e seus efeitos sobre
a saúde de ambos, incluindo a saúde mental, é tarefa
que nos cabe enquanto pro8ssionais e gestores da área
da Saúde, trazendo para a saúde pública o desa8o de
formulação de um modelo de determinação de saúde
que apresente muito claramente a articulação entre
seus determinantes sociais e as tendências à integração
psíquica do sujeito.
Assim, a EBBS, ao eleger o Ambiente Emocional
Facilitador como um dos pilares de sustentação das
ações que propõe para os cuidados com a primeira
infância, sugere que se busque a explicitação do
componente psicológico dentro dos modelos que
já o consideravam na determinação da saúde sem,
entretanto, aprofundá-lo. Outra possibilidade, de
adotar para esta compreensão ampliada a proposta de
Winnicott, que sugere uma con8guração em círculos
que se ampliam e se expandem desde o desejo e o
corpo da mãe, o ambiente facilitador, à participação
social mais ampla (Figura 2).
Para exempli8car, no caso do Modelo de Dahlgren e
Whitehead (CNDSS, 2008), pode-se destacar a camada
situada no limiar entre os fatores individuais e os DSS, já
que os comportamentos dependem não apenas de opções
feitas pelo livre arbítrio das pessoas, como também de
DSS, para que mais claramente possamos perceber que,
embora os autores nos alertem para a questão fundamental
de como os comportamentos dos indivíduos se expressam
na relação com a sociedade, não explicitam que há um
momento, não tão curto assim em termos de tempos de
vida e impactos na produção de saúde, em que ‘ainda não
existe um indivíduo’ capaz de optar e manejar seu livre
arbítrio. O motivo, diria Winnicott (1983, p. 40) é que
“há um momento do desenvolvimento humano em que
não se pode falar em um bebê, a não ser que a ele esteja
vinculada sua mãe ou 8gura que a substitua!”
Essa peculiaridade experimentada pelos seres
humanos, no que diz respeito à sua constituição como
sujeito, desde estudos recentes que demonstram a
importância das experiências intraútero, das vivências
da gravidez da mulher e suas consequências na saúde
física e mental do bebê até a constatação nos primór-
dios da vida de que há uma dependência absoluta do
lactente em relação a um ‘outro’ para existir, leva-nos
a reconhecer que existem etapas do desenvolvimento
deste novo ser, nas quais ele não existe por si só. Isso
quer dizer que, na etapa de dependência completa, que
se associa aos primeiros meses de vida, não há como
F 2 - O papel da saúde mental na construção da cidadania
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
194voltada para a primeira infância
falar do bebê sem associá-lo à sua mãe ou a quem
cuida dele. Para Mahler, Pine e Bergman (1977), o
nascimento biológico do homem e o nascimento
psicológico do indivíduo não coincidem no tempo.
O primeiro é um evento bem delimitado, dramático
e observável; o último, um processo intrapsíquico de
lento desdobrar:
O processo de separação/individuação normal
começa em torno do quarto, quinto mês e vai
até o trigésimo, trigésimo sexto [...] caminhan-
do de um período simbiótico até a aquisição
pela criança de um funcionamento autônomo
na presença da mãe e da prontidão em termos
de desenvolvimento para a funcionamento
psíquico independente, gerador de prazer.
(p. 15).
Essa citação nos ajuda a sustentar o porquê de
consideração tão destacada para esta etapa da vida, a
caminho da individuação para o desenvolvimento saudá-
vel: o �orescimento da capacidade para andar e afastar-se
mantendo certo controle sobre ir e vir, desenvolvimento
da linguagem, utilização do pronome ‘eu’, reconhecer e
nomear o outro, diferenciação e identidade de gênero,
dentre outros de igual magnitude na constituição do
ser humano.
A aproximação entre as constatações anteriores
e a observação de que os modelos de determinação
da saúde estudados pela CNDSS tendem a considerar
seus determinantes a partir de um ‘indivíduo e suas
inter-relações – o que signi8ca, como vimos, um longo
caminho já percorrido em termos de crescimento e
desenvolvimento pessoal – nos alerta para a existência
de um ‘tempo-espaço epidemiológico’ relacionado à
etapa da dependência completa e relativa de um ser
humano em relação a outro, que pode se constituir como
ambiente facilitador ao crescimento. Este, resguardado
num período da vida chamado primeira infância, não
encontra correspondência, em termos de suas peculia-
ridades e necessidades de cuidados e intervenções, nos
modelos teóricos de determinação social da saúde. No
discurso de abertura do XVIII Congresso Mundial de
Epidemiologia e do VII Congresso Brasileiro de Epi-
demiologia, que trouxe como tema “A epidemiologia
na construção da saúde para todos: métodos para um
mundo em transformação”, o Ministro da Saúde do
Brasil faz a seguinte a8rmação:
No campo da promoção da saúde o desa!o
para os epidemiologistas é o de produzir co-
nhecimentos para a compreensão dos atuais
determinantes da saúde: o entendimento de
que múltiplos aspectos materiais e imateriais
con!guram o espaço/ território investigado,
engendrando praticamente todas as dimensões
da existência humana, demandam novos
discursos e abordagens que alcancem aprofun-
dar a perspectiva multi ou transdisciplinar,
incorporando dimensões não comumente
utilizadas nos estudos epidemiológicos. Estas
transformações que trouxeram novos ele-
mentos para se pensar a relação entre espaço,
tempo, saúde e doença, são fundamentais
para melhor compreensão da proposição de
determinantes da saúde e estabelecer como
estes se expressam no adoecer e morrer [...].
(Temporão, 2008, p. 10).
Essa abordagem nos levou à sugestão da constitui-
ção da saúde atrelada à constituição dos sujeitos em seu
crescimento rumo à cidadania, ou seja, uma con8gu-
ração em que se pode de fato incluir o ambiente facili-
tador ao pensar o processo saúde-doença, expandindo
sua compreensão para além dos resultados expressados
na maneira pela qual em uma determinada sociedade e
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
195voltada para a primeira infância
um dado contexto histórico, se organizam a produção
e o trabalho.
As descobertas das neurociências vieram con8rmar
as constatações dos autores que trabalharam com base
na psicologia e na psicanálise o desenvolvimento emo-
cional primitivo, reiterando a importância da inclusão
da promoção da saúde mental quando se trata de saúde
pública. Para Damásio (2004):
Elucidar a neurobiologia dos sentimentos e das
emoções que os percebem altera a nossa visão
do problema mente-corpo, um problema cujo
debate é central para a compreensão daquilo
que somos. A emoção e as várias reações com
ela relacionadas estão alinhadas com o corpo,
enquanto os sentimentos, estão alinhados com
a mente. (p. 15).
Porém, o mais interessante desta contribuição à
nossa proposição se dá quando ele questiona o valor
prático desta nova perspectiva. Diz ele:
O êxito ou o fracasso da humanidade depende
em grande parte do modo como o público e
as instituições que governam a vida pública
puderem incorporar essa nova perspectiva da
natureza humana em princípios, métodos e
leis capazes de reduzir o sofrimento humano
e engrandecer o seu 6orescimento. (Damasio,
2004, p.16).
Mais ainda nos coloca aspectos éticos de grande
relevância, discutidos no curso “As interfaces das clínicas
da primeira infância”, organizado pela Comissão de
Saúde Primária da Associação Brasileira de Neuropsi-
quiatria Infantil (Abenepi, 2009), pois a individuação
em processo supõe um sujeito por vir e, mesmo onde
aparentemente não existe sujeito, como na criança que
ainda não fala, nos casos de autismo, na criança intimi-
dada, deve-se supor uma subjetividade à espera de ser
interrogada. Assim, a escuta da pequena criança e seus
cuidadores é uma questão ética que sustenta o direito
da criança de constituir-se como sujeito, especialmente
se esta construção estiver enfrentando impasses. E esta
constatação só ocorrerá se pais ou cuidadores atentos,
incluindo pro8ssionais de saúde, estiverem presentes e
implicados, capturados por um interesse especial nesta
criança, opondo-se sempre à ideia de que o corpo do
bebê seja tomado e lido como um puro organismo, pois
não há humano sem vida psíquica. E essa presença cons-
tante e experiente junto ao bebê possibilita o suporte à
construção de seu aparelho psíquico, permitindo que o
cérebro ofereça sua plasticidade neural à inscrição dos
processos simbólicos. Diz-se, assim, que os pais são os
primeiros e imprescindíveis mestres do cérebro.
O desenho de qualquer modelo deve expressar,
portanto, esta compreensão fundadora em termos de
determinação de vida e saúde. Conforme podemos
observar na Figura 2, sugere-se uma con8guração em
que a mãe, vinculada ao seu bebê, representa com seu
corpo e sua mente o ambiente inicial da vida do 8lho, o
primeiro território vivencial; e se ela mesma, como indi-
víduo, encontra-se exposta a toda série de determinações
sociais, como mostram os diferentes modelos, ela passa a
representar o ambiente total a ser considerado, cuidado
e protegido – por um dado espaço de tempo e objeto de
eleição de ações promotoras de saúde. Aqui, podemos
oportunamente agregar a proposição de Milton Santos
sobre as noções de “espaço e território” onde se produz
saúde ou doença: o espaço é aquilo que resulta da relação
entre a materialidade das coisas e a vida que as animam e
transformam. A con8guração territorial é uma produção
histórica resultante dessas relações. As ações provêm das
necessidades humanas: materiais, espirituais, econômicas,
sociais, culturais, morais, afetivas. Sistemas de objetos e
de ações interligam-se. A dimensão da comunicação no
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
196voltada para a primeira infância
meio ‘técnico-cientí8co-informacional’ produz-se tam-
bém através da circulação de palavras, imagens, rumores,
afetos. Os elementos simbólicos contribuem de modo
signi8cativo para a con8guração territorial e, certamente,
para o processo do adoecer individual e coletivo. Isto nos
leva a pensar que o processo saúde-doença seja equacio-
nado em seus determinantes sociais.
Entretanto, tratando-se de uma contribuição de
Winnicott à compreensão da relação entre a determinação
social e o desenvolvimento emocional primitivo do bebê,
por meio da conformação deste ambiente facilitador ao
crescimento saudável, torna-se fundamental registrar que
o autor não utiliza o conceito ‘determinação’ como uma
imposição da natureza que independe do concurso de
outros fatores para sua concretização. Plastino (2009) fala
em tendências ou linhas de força que a natureza imprime
ao homem, favorecendo o movimento espontâneo da vida,
a autopoiese, a autocriação subjetiva e a criação. Não se
tratando de determinações, as tendências requerem acon-
tecimentos históricos para virem a ser, ou se atualizarem.
Neste contexto de um ambiente favorável, o infante hu-
mano atinge a integração, personalização e realização, de
forma absolutamente criativa e original. Assim, somente
cada sujeito sabe dizer das vicissitudes de seu sentimento de
existir, de ser real ou da ausência deles, todos fundamentais
em sua vida, demarcando a diferença entre saúde e doen-
ça. Também a ideia de ‘modelo’, como algo terminado e
reproduzível, não se adéqua ao pensamento de Winnicott.
Para exempli8car, basta recuperar sua participação e com-
partilhamento na produção dos famosos ‘rabiscos’ que
expressavam tão intensamente a emergência de conteúdos
psíquicos de seus pacientes na atualização de questões de
sua história. Então, mais à vontade poderíamos falar em
con8guração e arranjo de tendências que possibilitam a
integração psíquica e seu papel na produção de saúde como
uma construção plasticamente e estruturalmente mutável
mediante interação, integração e realização destas mesmas
tendências num dado ambiente.
Recentemente, descobriu-se como um lar estável,
qualquer que seja sua conformação em termos de 8guras
parentais, não apenas capacita as crianças a encontrarem
a si mesmas e aos outros, mas também faz com que elas
comecem a se quali8car como membros da sociedade
num sentido mais amplo. Isso se deve ao desenvolvimen-
to da capacidade de identi8cação com estes mesmos pais
e, em seguida, com agrupamentos cada vez maiores, e
começa quando a mãe ‘entra em acordo’ com seu bebê.
O pai, aqui, é o agente protetor que liberta a mãe para
que ela se dedique ao bebê.
A ressaltar, a lembrança de que estas são funções
que podem ser, a partir de um dado momento, desem-
penhadas ou não pela mãe ou pai biológicos, incluindo
outros familiares, vizinhos, babás ou educadoras de
creches e pré-escola capazes de prover continuidade no
cuidado. E a continuidade do cuidado representa, se-
gundo Bowlby (2002) e Winnicott, característica central
do conceito de ambiente facilitador:
é unicamente pela provisão ambiental (presença
da mãe ou ausência dela por tempo que não se
prolongue para além da capacidade do bebê em
manter viva sua imagem) que o bebê em estado de
dependência pode ter uma continuidade em sua
linha de vida. (Winnicott, 1989, p. 48).
Falhas nesse aporte, em termos de características
essenciais da vida familiar e sentidas pela criança como
privação, estão na gênese da tendência e do comporta-
mento antissocial (Winnicott, 1987).
REPERCUSSÕES NAS PRÁTICAS
Com esta compreensão, as estratégias de atenção
à saúde da mulher só estarão completas se passarem a
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
197voltada para a primeira infância
incluir ações que considerem as vicissitudes de manejo
das questões vivenciadas na gravidez, no pós-parto e
estendendo-se pelo menos até o 8nal do primeiro ano de
vida do bebê, quando é fundamental cuidar de proteger
este “ambiente facilitador” para uma vida saudável e um
desenvolvimento pleno. Da mesma forma, as estratégias
e políticas voltadas para a saúde materno-infantil devem
aperceber-se da importância das ações nos primórdios
da vida, que não só venham trazer a sua garantia, mas
também quali8cá-la. Destacadamente, apontamos para
a importância da detecção precoce da depressão materna
como evento sentinela, ou seja, aquele su8cientemente
estudado e comprovado como provocador de determina-
das patologias, que precisa ser registrado e acompanhado
em sua remissão e evolução. Mitos como a ‘maternidade
ideal’ e o ‘instinto materno’ precisam também de aco-
lhimento e escuta para sua necessária desconstrução. A
Estratégia de Saúde da Família e as ações, programas e
políticas de suporte ao trabalho e renda, assim como o es-
tímulo à produção de redes sociais, o vínculo fortalecido
com equipamentos sociais como as creches e as escolas
voltadas para a criança até seis anos junto a seus fami-
liares e os dispositivos culturais guardam possibilidades
imensas de abrigar trabalhos efetivos sobre o ambiente
facilitador e os determinantes sociais da saúde.
Para a construção da metodologia da EBBS e de
um Plano de Metas para sua implantação, utilizamos
todos os dispositivos ofertados pela Política Nacional
de Humanização do SUS (PNH), exemplar no que diz
respeito à ideia do que é uma política pública de natureza
transversal. Mais ainda, esta política inicia a proposição
ousada de buscar o humano que se revela no espaço da
micropolítica de atenção dentro de e constituindo o
nosso SUS, que até então só parecia poder apresentar,
mesmo que orgulhosamente, sua macroestrutura. Desde
os anos 1990, com a proposta da reforma da reforma
(Campos, 2006), explicitava-se esta necessidade de
aprimorar a Reforma Sanitária Brasileira, incluindo
este aspecto do trabalho intenso a ser realizado sobre a
potência dos vínculos entre os principais atores do SUS
para a produção de saúde.
Além disso, buscou-se conhecer por revisão biblio-
grá8ca e visitas in loco as estratégias já implantadas ou
em processo de implantação em nosso país consideradas
também exemplares nesta perspectiva. Tomamos, assim,
como marcos referenciais o Programa Primeira Infância
Melhor (PIM) do Estado do Rio Grande do Sul, o Mãe
Coruja Pernambucana, o Mãe Curitibana (ver sites rela-
cionados), a Experiência de Sobral (CE) (Silva, 2007) e
outros, que fazemos questão de citar pelo pioneirismo,
ousadia e trabalho árduo para efetivação de propostas
desta magnitude.
CONCLUSÕES
Sabemos como problemas complexos nos colocam
em condição de ação sempre aquém das necessidades e
sempre aproximativa do ponto de vista da e8cácia, exi-
gindo ciência, ação racional e, ao mesmo tempo, criação,
arte, razão estética. Nesse sentido, duas questões surgi-
ram de imediato, nos desa8ando para a construção da
Estratégia: como efetivar a articulação e transversalização
entre as diversas ações pretendidas? Como assegurar a
inclusão de novos desa8os na agenda, como a promoção
de saúde inovando na inclusão de intervenções sobre o
ambiente facilitador?
A resposta a este desa8o de prover ações em defesa
do ambiente facilitador ao crescimento, desenvolvi-
mento e amadurecimento da criança vinculada à seu
cuidador no período da primeira infância nos convoca
à disponibilização de novos enfoques que enriqueçam as
políticas públicas já instituídas voltadas principalmente
para as mulheres e crianças, mas também para os ho-
mens, para a saúde mental, com contribuições da PNH,
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
198voltada para a primeira infância
do trabalho de construção de Redes e, principalmente,
da Atenção Básica, lócus privilegiado da maioria das
ações através da Estratégia de Saúde da Família exitosa
em nosso país. A possibilidade de oferta de novas com-
preensões e novos aportes procedentes de áreas a8ns,
assim como a formação e a capacitação dos pro8ssio-
nais de saúde, cuidadores e gestores nesta nova lógica
e aportes 8nanceiros para essa iniciativa ampliada com
novos esforços intersetoriais, certamente, ocupa todas
as linhas e entrelinhas deste artigo, e está relacionado
a um ponto relevante do debate político da reforma
do setor saúde: o enfrentamento da desigualdade e da
iniquidade. Sabemos que não se constrói um projeto
político nesta área que assegure de forma sustentável e
permanente o acesso universal aos bens e serviços e que
garanta os direitos do cidadão sem a decisão política de
assegurar os recursos necessários para o 8nanciamento
do sistema de saúde que possibilite investimentos na
infraestrutura, na aplicação de novas tecnologias, na
manutenção de quadros de pro8ssionais de qualidade e
no fomento ao desenvolvimento cientí8co e tecnológico.
Para alcançar este objetivo, é preciso que a saúde seja
pensada e priorizada nos planos de desenvolvimento
como componente estratégico e não como um agente
secundário. Tal posição recoloca as bases sobre as quais
os determinantes de saúde devem ser equacionados. A
desigualdade social, quando manifestada no campo da
saúde é, portanto, a expressão mais perversa do modelo
de desenvolvimento e não será plenamente solucionada
sem que outras variáveis sejam de fato equacionadas.
Uma re�exão bastante interessante que envolve a
luta de toda a sociedade pela redução das iniquidades
pode ser tomada do artigo inédito “Ambiente facilitador
e a Determinação Social da Saúde”, de Penello (2009).
Examinando do ponto de vista psicanalítico a relação
entre democracia e liberdade, a autora busca sua asso-
ciação ao ambiente facilitador para o desenvolvimento
do indivíduo em e para a sociedade em que vive, assim
como a sua repercussão/determinação sobre a própria
saúde e dos demais. Utiliza como suporte a esta re�exão
a seguinte proposição:
A democracia é uma aquisição de uma dada
sociedade, que num certo momento conta com
maturidade su!ciente no desenvolvimento emo-
cional de uma proporção de indivíduos que a
compõem, a ponto de existir uma tendência em
direção à criação, à recriação e a manutenção
da máquina democrática. (Winnicott, 1989,
p. 192).
Sobre democracia, parece possível encontrar um
conteúdo latente importante quando é usado o termo: a
relação de uma sociedade democrática com a maturidade
de seus membros saudáveis. Se partirmos da observação
psiquiátrica individual, maduro é o indivíduo normal,
saudável, que age de acordo com sua idade cronológica
e seu contexto social, com um grau apropriado de de-
senvolvimento emocional.
Algumas categorias básicas da máquina democrá-
tica são o voto livre e secreto não só para que as pessoas
escolham lógica e ilogicamente, mas também para que se
livrem e removam seus líderes. E essa escolha permitirá
mais ou menos celeremente a caminhada do projeto/
processo civilizatório de uma dada cultura. Essa capa-
cidade de in�uência de cada um sobre o todo, e deste
sobre todos e cada um, é característica importante do
desenvolvimento de uma sociedade, estando relacionada
à possibilidade de amadurecimento da personalidade
individual ao longo da vida e dependente de todos
os equipamentos que esta mesma sociedade coloca à
disposição de seus cidadãos para este 8m. Em seu livro
Desenvolvimento como Liberdade, Amartya Sen (2000)
enfatiza a importância de eliminar todas as privações de
liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das
pessoas para exercerem sua condição de cidadão.
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
199voltada para a primeira infância
Portanto, se democracia é maturidade, matu-
ridade é saúde, e se saúde é desejável, então vamos
trabalhar para sua promoção, reconhecendo que um
de seus fatores essenciais repousa no homem comum,
na mulher comum e no lar comum dos brasileiros
– devendo esse fator ser seriamente considerado no
desenho de políticas públicas para a área.
A questão de saber se as crianças de hoje vão
ganhar ou perder com as mudanças em curso no
ambiente de cuidado na primeira infância não de-
penderá exclusivamente, como sabemos, da área da
saúde (Unicef, 2008). Iniciativas como a criação da
licença parental estendida com aceitação e compre-
ensão da sua importância pela maioria da sociedade,
a disponibilidade, acessibilidade e qualidade dos
serviços ofertados nas áreas da educação e assistência
social, diante da realidade de cada país, com as cores
do município onde acontece o dia a dia das pessoas,
o trabalho de consciência sanitária a ser realizado
em diferentes mídias, a continuidade de programas
de erradicação da miséria e da fome como o Bolsa
Família, entre outros, deverão necessariamente se
articular a todas as ações de saúde nesta perspectiva.
E, então, a formação de pessoal e sua capacitação
ganha destaque para que possa trabalhar devida-
mente motivado, bem remunerado e respeitado pela
comunidade. As provas provenientes dos países da
OCDE até agora sugerem que não há atalhos ou
opções de baixo custo que não comprometam o
futuro das crianças (Bennet, 2008). Na ausência de
políticas específicas e bem financiadas destinadas a
proporcionar serviços de qualidade às crianças vul-
neráveis, é provável que a transição para os cuidados
fora de casa contribua para alimentar a espiral das
desigualdades. E se quisermos evitar que esta pos-
sibilidade se torne realidade, os governos federal,
estadual e municipal deverão construir políticas
transversais especialmente voltadas para o cuidado
com a primeira infância. É com esta compreensão e
responsabilidade que trabalhamos na perspectiva do
setor saúde pelo crescimento da Estratégia Brasilei-
rinhas e Brasileirinhos Saudáveis – primeiros passos
para o desenvolvimento nacional.
R E F E R Ê N C I A S
Bennet, J. Políticas da infância para crianças de zero a
três anos em países da OCDE. In: Ciclo de Seminários
Internacionais Educação no Século XXI: modelos de
sucesso. Rio de Janeiro, SENAC/Departamento Nacional,
2008.
Bowlby, J. Apego: a natureza do vínculo. São Paulo: Mar-
tins Fontes, 2002.
Brasil. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Aten-
ção primária e promoção da saúde. Brasília, DF: Conass,
2007.
______. Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de De-
mogra!a e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS, 2006).
Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2008.
______. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Mais
saúde: direito de todos: 2008-2011. 3. ed. Brasília, DF:
Ministério da Saúde, 2010.
Campos, G.W.S. A reforma da reforma: repensando a saúde.
3ª Ed. São Paulo: Hucitec, 2006.
Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da
Saúde (CNDSS,2008). As causas sociais das iniqüidades
em saúde no Brasil. Relatório Final. Brasília/Rio, 2008.
Damásio, A. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciên-
cia dos sentimentos. São Paulo: Companhia das Letras,
2004.
Mahler, M.S.; Pine, F.; Bergman, A. O nascimento psico-
lógico da criança: simbiose e individuação. Rio de Janeiro:
Zahar Editores, 1977.
Saúde em Debate, Rio de Janeiro, v. 34, n. 85, p. 187-200, abr./jun. 2010
200voltada para a primeira infância
Oliveira, R.D. Quem diria. In: Jornal O Globo, rio de
janeiro, 2/5/2010.
Penello, L. O ambiente facilitador e a determinação social
da saúde. (Artigo inédito, 2009, mimeo)
Plastino, C.A. A dimensão constitutiva do cuidar. In: Maia,
M.S. (Org.) Por uma ética do cuidado. Rio de Janeiro: Gara-
mond, 2009. p. 53-88.
Sem, A. Desenvolvimento como Liberdade. São Paulo: Com-
panhia das Letras, 2000.
Silva, A.C. Saúde da família, saúde da criança: a resposta de
Sobral. São Paulo: Aderaldo & Rothschild, 2007.
Temporão, J.G. Política de Saúde e a Medicina no Brasil:
desa8os e perspectivas. Trabalho apresentado à Academia Na-
cional de Medicina como parte dos requisitos para concorrer
à cadeira de número 56. Brasília, DF: 2009.
______. A epidemiologia na construção da saúde para todos:
métodos para um mundo em transformação. Discurso proferido
na abertura do XVIII Congresso Mundial de Epidemiologia e
do VII Congresso Brasileiro de Epidemiologia, Porto Alegre,
2008, mimeo.
Unicef. A transição dos cuidados na infância. Florença: Centro
de Pesquisa Innocenti da Unicef, 2008. (Innocenti Report
Card n° 8).
Winnicott, D.W. Tudo começa em casa. São Paulo: Martins
Fontes, 1989.
______. Privação e delinqüência. São Paulo: Martins Fontes,
1987.
______. O ambiente e os processos de maturação: estudo sobre
a teoria do desenvolvimento emocional. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1983.
World Health Organization (WHO). Relatório da se-
gunda sessão da Comissão de Especialistas em Saúde Mental,
Technical Report n° 31, Genebra, 1951.World Health
Organization (WHO). Closing the gap in a generation: health
equality through action on the social determinants of health:
Final Report of the Comission On Social Determinants of
Health. Geneva: WHO, 2008.
S I T E S R E L A C I O N A D O S
Governo do Estado de Pernambuco. Projeto Mãe Coruja
Pernambucana. Disponível em <http://maecorujape.blogspot.
com/>. Acesso em 10 de Abril de 2010.
Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Programa
Primeira Infância Melhor Disponível em <http://www.pim.
saude.rs.gov.br/> Acesso em 10 de Abril de 2010.
Secretaria Municipal de saúde de Curitiba. Programa
Mãe Curitibana. Disponível em <http://www.curitiba.pr.gov.
br/publico/secretaria.aspx?idf=483&servico=33>. Acesso em
10 de Abril de 2010.