temas em debate 01 - 1º semestre de 2008

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Os novos velhos TEMAS EM DEBATE Número 1 – São Paulo – 1º Semestre de 2008 Faculdades Integradas Rio Branco – Curso de Jornalismo Vera Jursys

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A revista Temas em Debate é uma publicação elaborada pelos alunos da disciplina Reportagem II do curso de jornalismo das Faculdades Integradas Rio Branco. Nesta edição: os novos velhos

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Os novos velhos

temas em debateNúmero 1 – São Paulo – 1º Semestre de 2008Faculdades Integradas Rio Branco – Curso de Jornalismo

Vera

Jur

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denunciar o agressor, que muitas vezes pode ser seu filho ou alguém da sua própria família”. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, até a metade do ano de 2006, só na Delegacia da Região Central, foram registradas cerca de 17 mil ocorrências.

O idoso no OrienteAs culturas orientais, indígenas

e ciganas têm uma forma diferente de tratar e enxergar o idoso na sociedade. Os ciganos e os índios sempre procuram os mais velhos antes de tomar qualquer decisão. Nessas civilizações há uma tradição que diz que quanto mais velha a pessoa fica, mais conhecimento e sabedoria adquire. Enquanto no Ocidente a chegada aos 40 é vista como uma difícil fase da vida, no Japão é muito comemorada, pois o início da velhice é um momento marcante entre os japoneses.

O músico Marcos Silveira, 34 anos, morou por dois no Japão, na cidade de Yaotsu-cho. O bra-sileiro afirma que a partir do momento que uma pessoa passa dos 40 anos, existem uma série de comemorações. “Ao completar 61 anos, representa o fim do ciclo dos 60, e aos 70 anos é a chamada ‘idade rara’. Quando um japonês chega aos 77 anos, é comemorada a ‘alegre longevidade’, e a chegada aos 88, representa a ‘longevidade do arroz’.” Silveira não morou apenas no Japão como também é casado com uma filha de japoneses.

Quando perguntado sobre as principais diferenças entre o tratamento dos idosos no Brasil e no Japão, Silveira é enfático. “Lá (Japão) eles são cultuados, independentemente da condição não são recriminados. Verdadeiramente são tidos como a cultura viva do País”, afirma.

No Oriente, desde a infância aprende-se a apreciar a figura do idoso e a ouvir seus ensinamentos, diz a socióloga Ligia Maria. “A criança cresce tendo uma didática

já voltada ao aprendizado da própria tradição, tendo no idoso a imagem de um sábio”, afirma.

O historiador e especialista em cultura japonesa, Artur Fernando, ressalta que não se deve condenar os jovens e as pessoas de meia-idade ocidentais por não haver uma valorização dos idosos. “O desrespeito ao idoso no Ocidente não é um fenômeno do século XX e muito menos do XXI. Isso já ocorre há muito mais tempo. É preciso entender que a cultura ocidental sempre valorizou o homem trabalhador. Enquanto ele exerce uma atividade profissional, é importante para a comunidade. No entanto, quando o tempo passa, a idade chega e fisicamente não há mais condições de trabalhar, seu valor vai embora junto com as forças que o permitiam desenvolver uma atividade profissional.”

Dia de Respeito aos IdososNo Japão, no dia 18 de setembro

é comemorado o Dia de Respeito aos Idosos, feriado nacional, uma data muito especial para o povo japonês. O músico Silveira revela que ficou impressionado com a importância que o povo nipônico dá a essa data. “Nunca imaginei que as pessoas poderiam deixar de trabalhar para comemorar o Dia do Idoso. As famílias se reúnem para cultuar os velhos, aproveitam e pedem para que eles contem histórias do passado, aconselhem suas famílias nas decisões a serem tomadas e também nos problemas familiares.”

Em 1999, a Comissão de Educação do Senado Federal instituiu o Dia do Idoso também no Brasil. Qual brasileiro saberia responder quando é comemorado? Lembra do Argos, nosso primeiro entrevistado? Quando perguntado sobre a data comemorativa, o jovem ficou meio desconcertado, tentou desconversar, e retrucou: “Existe mesmo Dia Idoso no Brasil? Nunca tinha ouvido falar.”

Silveira também admite que só descobriu que existia o Dia do Idoso no Brasil após ter voltado do Japão. “Acho uma boa iniciativa do governo. Quem sabe a longo prazo não mude um pouco essa cultura de desvalorização das pessoas da terceira idade.”

No Brasil, o Dia Nacional do Idoso é comemorado em 27 de fevereiro. A data foi estabelecida com o objetivo de trazer uma reflexão sobre a questão da terceira idade no País. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2025, o planeta vai ter mais idosos do que crianças, fato que nunca ocorreu na história. O Brasil ocupará a sexta posição no ranking mundial de populações idosas. Segundo as pesquisas mais recentes, 14,1 milhões de brasileiros têm hoje 60 anos ou mais, cerca de 9,1% da população. A expectativa de vida que atualmente é de 68 anos, em 2025, será de 80 anos.

A aposentada Célia Alves, de 86 anos, desabafa quando perguntada sobre como o idoso é visto e tratado pelas pessoas no cotidiano. “Muitos jovens nos respeitam, oferecem lugar no ônibus, mas infelizmente a maioria não é assim. E não são só os jovens que fazem pouco caso da gente, os mais velhos também nos tratam mal as vezes. Mais ruim que isso, são os atendimentos nos postos do INSS e de Saúde. Acho que para aumentar o respeito pelos mais velhos tem de começar por mudanças no governo. Pessoas que trabalharam a vida toda não têm direito nem a uma aposentadoria digna”, afirma.

Com relação à aposentadoria, os japoneses dependem bem menos do governo que os brasileiros. Silveira relata que no período em que viveu do outro lado do mundo, notou na prática o que sua esposa o contava há tempos. “É comum ver senhores de idade avançada trabalhando, bancando o próprio sustento e ainda com muita disposição. Muitos

também recebem uma espécie de ajuda financeira dos filhos”, conta Silveira. Segundo ele, os idosos japoneses são muito unidos, também no aspecto profissional. “Eles sempre estão juntos não só nas atividades de lazer e na prática de esportes, como também no trabalho. Mas essa vitalidade não é adquirida na velhice, isso é um processo que se inicia desde a infância, que inclui alimentação, prática de exercícios, entre outras coisas. No futuro, proporcionam à pessoa uma velhice ativa”, afirma o brasileiro.

Solução dos problemasQuais atitudes devem ser

tomadas para mudar, ou diminuir, a desvalorização que existe com o idoso no Brasil?

Essa pergunta foi feita a Artur Fernando, historiador e especialista na cultura japonesa. Há anos Fernando estuda as culturas e tradições dos países do mundo todo.

Sua resposta encerra uma idéia que encontra eco entre os educadores. A educação dos mais jovens desde a tenra idade pode ser a chave da mudança. “É complicado mudar uma cultura, até mesmo porque não se trata só do Brasil, mas de quase todo o Ocidente. É evidente que o mundo precisa olhar com mais atenção essa questão do idoso. Mas, falando do Brasil, atualmente já está bem melhor para um idoso viver aqui do que há décadas atrás. Temos de aprender com o passado, por em prática no presente, para mudar no futuro. É mais fácil começar a educar aqueles que viverão num país que terá 15% da população formada por idosos. Mostrar às crianças a importância do idoso na família e sociedade, suas experiências, as lições de vida, coisas que despertem uma admiração da criança pelo idoso. Se conseguirmos através da educação transmitir isso, o país tem tudo para mudar esse panorama no futuro.”

Aprendendo com os japoneses a valorizar os idososJovem brasileiro que viveu no Japão muda sua postura frente ao idoso depois de descobrir sua importância na cultura japonesa

Saulo Ribeiro

estudante Argos Urbanos, de 19 anos, afirma que respeita os idosos desde que também se-

ja respeitado por eles. O jovem diz que as pessoas da terceira ida-de têm de ter seus direitos, mas não podem tratar os demais com inferioridade. “Muitos velhos são mal-educados e aproveitam de seus direitos para abusar dos mais jovens“, comenta. Essa visão não é apenas de Argos, mas faz parte da cultura ocidental.

A socióloga Ligia Maria, da Uni-versidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), acredita que desde os primórdios a sociedade ocidental não foi ensinada a valorizar o idoso. “No Ocidente, o mais importante sempre é o presente e o futuro, não há uma preocupação em aprender com o passado. As pessoas que têm certa bagagem de conhecimento e vivência não são valorizadas como deveriam.”

No Brasil, o Estatuto do Idoso entrou em vigor em janeiro de 2004. Ele garante uma série de benefícios e estipula os direitos das pessoas da terceira idade. Os principais direitos são: gratuidade no transporte coletivo após os 65 anos, descontos de 50% em ingressos de eventos culturais e artísticos, como cinema, teatro, shows, jogos de futebol, entre outros. O Estatuto também proporcionou outras conquistas, como a gratuidade na aquisição de medicamentos e a proibição do aumento dos planos de saúde para clientes como mais de 60 anos.

Mesmo com o Estatuto do Idoso em vigor, existem ainda muitos casos de violência e maus-tratos contra os idosos no Brasil. Para coibir essas ações e garantir os direitos das pessoas da terceira idade, foram criadas em 2002, através de um decreto, Delegacias de Polícia de Proteção ao Idoso, em várias cidades do Brasil. Em entrevista ao site nippobrasil, o delegado Oscar Gomes disse que “o idoso ainda tem dó ou receio de

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expectativa de vida vem au-mentando no decorrer dos anos. Pesquisas mostram que

a cada década a população de ido-sos cresce mundialmente. Fatores psicológicos, sociais e de saúde são influenciados pelo bem-estar e a qualidade de vida.

O aumento da expectativa de vida devido às políticas públicas de saúde, como programas de vacinação contra doenças infecto-contagiosas, controle sanitário e desenvolvimento de pesquisas cientificas, além de programas de medicina preventiva, resultou em uma grande população de idosos e a necessidade de entender os processos de envelhecimento.

A velhice é um fato que transcende a história, sendo que seu sentido e valor variam de acordo com as sociedades. Muitas são as teorias propostas para explicar o envelhecimento e a enumeração das deficiências provocadas pela velhice é encontrada em todas as épocas.

Segundo Erica Verderi, pro-fessora de Educação Física e autora do livro O corpo não tem idade, o envelhecimento não é uma doença, mas um tempo de fragilidade e declínio nas funções corporais, levando às vezes ao aparecimento de doenças. “É um processo di-nâmico, uma fase que é possível manter-se ativo em sua profissão e grupos sociais”, diz. O envelhecimento é um processo individual e que apresenta vulnerabilidade, perda da capacidade de adaptação e expectativa de vida diminuída.

Verderi também acredita que o processo é mais lento ou mais rápido, dependendo do histórico de vida de cada um. São vários os fatores intrínsecos e extrínsecos que exercem poderosa influência nos aspectos motor, cognitivo e sócio-afetivo. Durante o envelhecimento cada indivíduo pauta sua vida de acordo com padrões, normas, expectativas, desejos e valores.

No livro Atividade física na terceira idade, a escritora Mor-gana Meirelles afirma que o envelhecimento é a soma de vários processos que envolvem além de aspectos biofisiológicos, os aspectos biopsicossociais, ocorrendo modificações progres-sivas tanto morfológicas como funcionais, bioquímicas e psicoló-gica e determinando a perda da capacidade de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, cau-sando maior vulnerabilidade e incidência de patologias que podem levar a morte.

Doutora em Educação Físi-ca, Vera Aparecida Madruga Forti, acredita que os padrões de envelhecimento podem ser entendidos sob três aspectos: envelhecimento primário, quando ocorre a diminuição da capacidade de adaptação do indivíduo de forma gradativa; envelhecimento secundário, fenômeno com alte-rações ocasionadas por doenças coronarianas e câncer associado ao envelhecimento; e envelhecimento terciário ou terminal, quando há grande perda física e cognitiva em período relativamente curto de tempo, levando a morte.

Para o aposentado José Men-des, de 73 anos, “com o passar do tempo tudo começa a ficar difícil”. Diabético, sofreu um infarto quando tinha 68 anos que o obrigou a fazer uma cirurgia que retirou metade de seu coração, uma das primeiras no país, resultando numa insuficiência cardíaca. Primeiro foi obrigado a parar de trabalhar e impedido de realizar atividades cotidianas, como carpir o jardim de sua casa ou subir escadas. “Tudo ficou mais demorado”, ressalta.

Especialista em geriatria, o médico Aloysio Amâncio escreveu o livro Clínica geriátrica. Ele afirma que na velhice ocorrem alterações quantitativas e qualitativas dos processos celulares causando queda na capacidade funcional de

órgãos e tecidos. “É possível ainda verificar o início e o andamento do processo de envelhecimento através da observação de alte-rações na pele, da distribuição do tecido adiposo, do aparecimento de atrofias musculares, da marcha insegura e de pequenos passos.”

A memória é de grande importância na vida social do idoso, pois através dela ele adquire segurança, estabilidade e continuidade das ações no meio social, o que está ficando cada vez mais difícil para o marceneiro Oswaldo Gomes, de 78 anos. Orquidófilo por hobby há mais de trinta anos, Gomes gosta muito de exibir suas orquídeas para os filhos, netos e visitas, porém muitas vezes tenta lembrar os nomes das flores, mas não consegue e se irrita. “Tem dias que estou na sala e lembro de fazer alguma coisa no jardim, mas quando chego lá não lembro o que tinha que fazer”. A solução veio de sua neta mais velha. No aniversário de 78 anos de Gomes, ela deu-lhe de presente um gravador de bolso, Agora ele está sempre gravando o que precisa fazer e quando esquece escuta a gravação.

Traumas e acidentesAs principais modificações

corporais estão relacionadas aos músculos e ossos, que acarretam modificações na aparência e pode causar doenças, como a osteoporose e facilitar a ocorrência de quedas.A velocidade de contração e a elasticidade diminuem, a resis-tência dos músculos diminui e os ligamentos endurecem, sobre-carregando as articulações, o que provoca movimentos mais lentos, e menos força muscular nas mãos e nos braços. Dores pelo corpo é a mais freqüente queixa dos idosos.

No idoso a coluna cervical curva-se para frente, a cifose dorsal é aumentada, imobiliza-se a coluna lombar e os membros tendem a fletir ao nível dos cotovelos, dos joelhos e da articulação coxo-

femural, apresentando alterações na postura, mobilidade articular, equilíbrio e marcha devido ao processo de envelhecimento no sistema osteoarticular. A redução da amplitude dos movimentos pode modificar a marcha fazendo com que os idosos se movimentem com passos lentos, curtos e arrastando os pés. Os braços também perdem amplitude de movimento e ficam mais próximos do corpo.

Especialistas em geriatria acre-ditam que a insegurança na marcha pode ser causadora de quedas, falha dos reflexos e desordens da coordenação motora.

Também é freqüente a queixa de idosos sobre crises vertiginosas e sincopais que se caracterizam por sensação rotatória, surdez e zumbido, causadas pelas mudanças posturais bruscas, demonstrando o comprometimento do labirinto ou de suas conexões centrais. Os idosos também sofrem com transtornos visuais que comprometem a inde-pendência e a mobilidade.

A avaliação de cada pessoa que está em processo de envelhecimento é muito importante para identificar estratégias de ação na diminuição dos seus efeitos e na manutenção da qualidade de vida do idoso. Por isso é recomendável fazer exames e consultar um médico regularmente.

A prevenção de traumas e acidentes é de grande importância, pois muitos idosos sofrem quedas, intoxicação com gás de cozinha por esquecer o registro aberto, queimaduras e muitos outros acidentes que podem e devem ser evitados pelas pessoas próximas ao idoso.

O indivíduo idoso deve aprender a lidar com seus diferentes graus de eficácia e perdas relacionadas ao envelhecimento e acreditar em suas potencialidades para envelhecer satisfatoriamente.

Aspectos psicológicosPode haver aceitação ou recusa

da situação da velhice, diminuição

de suas vontades, aspirações e atenção. O idoso pode apresentar desconfiança, irritabilidade e indo-cilidade, além de estreitamento da afetividade. Especialista em geriatria, o médico Aloysio Amâncio afirma “ser importante que durante o processo de envelhecimento as limitações sejam compensadas, para que se desenvolva outra aptidão para se compensar uma limitação, por exemplo, estímulo à alfabetização de um indivíduo com perda auditiva.” Ainda é possível e necessária a intervenção da família para que o indivíduo envelheça com qualidade procurando sempre compensar suas limitações.

A auto-estima e a auto-imagem são modificadas durante o processo de envelhecimento, o entusiasmo é menor, a motivação tende a diminuir, seus valores e atitudes são alterados. Não é o caso da dona de casa Isabel Fernandes Gomes, de 78 anos, que adora receber visitas em sua casa e está sempre disposta a fazer bolinhos de chuvas e pipocas para seus netos. “Acordo cedo todos os dias, cuido da casa, mexo todos os dias do meu jardim, na minha horta, faço comida, passo roupa, só paro para rezar.”

Apoio da famíliaNão se pode evitar o en-

velhecimento, mas deve-se in-fluir na maneira de envelhecer, contribuindo para o bem estar com qualidade em suas atividades e no relacionamento social. Segundo Anita Liberalesso Néri, autora do livro Qualidade de vida no adulto maduro, para avaliar a qualidade de vida do idoso é necessário observar diversos aspectos de natureza biológica, psicológica e sócio-cultural, pois muitos são indicadores de bem estar na velhice como saúde biológica e mental, satisfação, eficácia, status social, relação com familiares e amigos, entre outros. “Durante a velhice é extremamente necessário o apoio da família”, diz.

É possível envelhecer com saúde e qualidade de vidaA intervenção da família é fundamental para que o indivíduo envelheça com qualidade procurando sempre compensar as limitações

Lygia Mara Gomes

A

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crescimento da população com mais de 60 anos de idade, em números absolutos e relativos,

é um fenômeno mundial e está ocorrendo bem mais rápido do que o imaginado.

Segundo o Censo 2000, nos pró-ximos 20 anos, a população com mais de 60 anos deverá representar quase 13% da população total do Brasil.

Conforme dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), até 2025, o Brasil será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas. Daí o alerta ao governo brasileiro para a necessidade de se criar, o mais rápido possível, políticas públicas que preparem a sociedade para essa realidade.

NeuroteologiaNo final do século 20, surgiu a

neuroteologia, campo que estuda o processamento das emoções relacionadas à religião e à espiri-tualidade no cérebro.

Pesquisa realizada com dois mil médicos de diferentes espe-cialidades nos Estados Unidos, constatou que 56% dos profis-sionais entrevistados acredita que a religião e a espiritualidade têm influência positiva na saúde dos pacientes.

Segundo o Projeto de Lei da Câmara n. 57, de 2003, Art. 10: “É obrigação do Estado e da sociedade, assegurar à pessoa idosa a liberdade...”. No parágrafo 1º, item 3, deste artigo, a liberdade compreende a “crença e culto religioso”, ou seja, todo indivíduo é livre para escolher e seguir a religião que melhor lhe convier.

ProjetosNo estado de São Paulo, al-

gumas entidades religiosas criaram projetos de incentivo e contribuição ao envelhecimento saudável dos idosos. Alguns deles contam com atividades físicas, psicológicas e espirituais.

A coordenadora do Grupo da Terceira Idade da IBAB (Igreja Ba-

tista de Água Branca), Silvia Regina Jorge Kivitz, conta como funciona o projeto na sua igreja.

Como surgiu o projeto da ter-ceira idade?

– Esse projeto tem mais ou menos 15 anos e surgiu a partir da visão de uma pessoa, que tinha uma preocupação e um carinho muito grande com os idosos e percebeu que faltava um espaço mais di-recionado a eles. Os encontros eram uma vez por mês. A partir daí, o grupo começou a se fortalecer e começaram a pedir que fosse não só mensal, mas semanal.

Quantas pessoas participam do grupo atualmente e de quanto em quanto tempo são realizadoz os encontros?

– O nosso grupo hoje tem uma média de 35 pessoas. Na sua maioria, o grupo é formado por mulheres, Os homens são poucos. Isso é uma realidade na questão da terceira idade no Brasil. As mulheres manifestam maior interesse, os homens resistem mais.

O encontro é semanal, as terça- feiras, das 14h30 às 17h, na Igreja Batista de Água Branca, localizada na rua Robert Bosch, 116.

De quais atividades os idosos participam?

– O grupo tem atividades físicas, recreativas, culturais e também faz passeios. De modo geral, as atividades favorecem o relacionamento e a amizade. Temos, ainda, atividades que nós chamamos na igreja de devocionais. É o estudo da Bíblia, há um período de oração, de cânticos mais tradicionais que tem a ver até com a história deles.

Na terceira idade ainda é tempo de aprender. O nosso objetivo é que eles tenham um envelhecimento saudável e por isso é importante ter palestras e informações.

Quem pode ser voluntário?– Nós temos uma equipe for-

mada por quatro pessoas, coor-denando o grupo e fazendo as

Espiritualidade contribui para envelhecimento sadioEntidades religiosas de São Paulo promovem palestras e reuniões de idosos para leitura da bíblia visando a espiritualidade

Simone Gusen

O

atividades. Temos também mais uma pessoa que faz a parte da gi-nástica e atividades físicas.

Para ser voluntário desse grupo é preciso ser da igreja e ter uma formação profissional que possa contribuir nas atividades que são desenvolvidas. O que acontece nor-malmente é termos convidados. Eles não são voluntários do projeto, mas sim pessoas que ministram palestras. Por exemplo, é convidado um advogado para falar sobre o INSS, sobre a aposentadoria, como eles podem recorrer. Eles se valem muito dos direitos da terceira idade e querem conhecer todos os benefícios, como da questão de não pagar o transporte, como é que se faz a carteirinha, onde é feita. Eles gostam de saber de seus direitos para poder usufruir.

A sra. acha que o papel das igrejas é importante para a terceira idade?

– Sim. A igreja tem um papel muito importante na vida das pessoas e principalmente na vida dos idosos. A igreja também se beneficia por causa da experiência que eles trazem na sua trajetória

de vida. A igreja tem que se abrir e reconhecer que esses idosos ainda são uma força, que tem muito o que contribuir e valorizá-los como pessoas dignas. A igreja tem uma credibilidade diante deles, então quando a igreja diz que tem um projeto voltado para os idosos, isso chega ao coração deles como algo bom e confiável.

A relação de qualquer igreja é boa e saudável sim, e deve abrir espaço para esses grupo.

Lazer A coordenadora do Grupo da

Melhor Idade Esperança da Igreja São João Gualberto, Aparecida Camargo, também conta como funciona o projeto na sua igreja.

Como surgiu o Grupo da Melhor Idade Esperança?

– O nosso grupo é daqui da paróquia e o padre que saiu toda vida gostou de ter um grupo da terceira idadei, pois ele tem várias pastorais, mas faltava essa. Há cinco anos surgiu o grupo e eu entrei para participar. A coordenadora que estava no momento arrumou emprego e teve de sair e me colocaram como coordenadora. E

eu estou atuando até o momento.Vocês se reúnem de quanto em

quanto tempo?– Tem mês que a gente se reúne

três vezes e tem mês que somente duas. A maioria são mulheres. Os homens não querem ser idosos. O meu principalmente fala “não, vai lá com as suas velhas”.

Quais são as atividades minis-tradas?

– No primeiro encontro do mês a gente se reúne e faz um bingo entre a gente, para ter um lazer dentro do nosso grupo. E, no segundo, são palestras. Às vezes chamo pessoas de fora para falar sobre um determinado assunto. Faço um bailinho da terceira idade com uma banda também de pessoas idosas que vem tocar.

Na verdade, esse grupo nosso a gente mais passeia do que outra coisa. As mulheres já trabalharam a vida toda e agora estão numa idade de estar descansando e não ter de ficar fazendo oficinas e essas coisas. Outros grupos tem tudo, coral e oficinas, o nosso por enquanto não tem nada de muita coisa. É mais passeio mesmo.

Além de atividades físicas e recreativas, Grupo da Terceira Idade da IBAB promove leitura da bíblia.

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centro de Convivência do MO-PI (Movimento Pró-Idosos), pro- move atividades que vêm mu-

dando o comportamento social e cultural das pessoas idosas. Se-gundo a assistente social e ge-rontóloga formada pela PUC-SP, e também coordenadora do MOPI, Lúcia Medina Pupo, de 65 anos, a mudança no comportamentodo do idosos é notável. “Houve uma mudança de hábito, não existe mais vida sedentária. Há uma preocupação com o aprendizado, a dieta equilibrada, a atividade física. Hoje se pensa muito na longevidade”, diz.

Para a coordenadora, a popula-ção idosa ainda sofre preconceitos na sociedade, até da própria família. Segundo ela, as pessoas não aceitam o envelhecimento. “O processo de envelhecimento não habita o inconsciente da gente, a própria pessoa idosa não se aceita, pois o mundo está ligado ao padrão da beleza, da juventude. Já o preconceito nas fa-mílias aparece quando o idoso se arruma para participar dos bailes, principalmente com as mulheres, pois elas se enfeitam, se preparam para as aulas de dança, e muitas vezes são tachadas pelos filhos ou pelos netos de ‘perua’.”

AtividadesO MOPI realiza atividades

que vão desde aulas de bijuteria, informática, pintura a aulas de dança de salão, tango, yoga e ginástica chinesa. As pessoas que freqüentam o local trocam experiências, se conhecem e até se casam. “Normalmente o idoso gosta de atividade física, e também de atividades que proporcionam entretenimento e lazer, como os chás dançantes, porque é uma chance deles saírem do seus ambientes. Muitos moram sozinhos, principalmente as mulheres, e aqui elas formam vínculos, e o nosso objetivo é criar vínculos de amizade. Já tivemos dois casais de

viúvos que se conheceram aqui e se casaram”, revela a coordenadora.

Aprendizado socialA oficina de aprendizagem so-

cial nasceu da necessidade que as coordenadoras do MOPI sentiram nas entrevistas sociais. Muitas pessoas não dominavam a escrita, a leitura e, desta forma, formou-se um grupo com idosos analfabetos, semi-analfabetos e pessoas que pelo desuso da língua desaprenderam. “A alfabetização de idosos aqui é diferente, privelegia a vivência, a troca. A nossa metodologia é a aprendizagem social. Eles passam a se valorizar, a entender o cotidiano a sua volta. Não adianta você achar que a pessoa analfabeta não tem cultura, tem sim, só não tem esco-laridade”, diz Pupo.

Mundo digital As aulas de informática são

muito concorridas no MOPI, uma vez que insere os idosos no mundo digital. Eles se comunicam com parentes por e.mail em outros países, estados, e até geram renda fazendo trabalhos de digitação.

Para a aposentada, Geny Fer-reira Marques, de 75 anos, a aula de informática é uma forma de superar a dificuldade que tem para se relacionar com as pessoas, por conta da perda da audição. “Não escuto direito, então fico com vergonha de perguntar o que a pessoa está falando. Por isso, eu me isolo um pouco. Eu adoro as aulas de informática. Aqui eu me sinto bem e me integro com as pessoas, até comprei um computador.”

PerfilPesquisas feitas pelo próprio

MOPI traçaram o perfil econômico e social das pessoas que participam das atividades promovidas pelo Centro de Convivência. A maior parte dos idosos ganha cerca R$ 500,00 mensais, cursaram o 1º grau incompleto, e estão entre a faixa etária dos 60 e 69 anos. O domínio é das mulheres, com 89%, contra 11% dos homens.

ParceriasO MOPI foi formado em

1975 por um grupo de militantes voluntários. Uma das militantes, Suzana Franklin, observou que na Europa já havia envelhecimento e previu que no Brasil a população idosa também iria crescer.

Em 1978 o Governo do Estado de São Paulo doou um valor para a compra da casa que hoje abriga a sede administrativa do MOPI. Com a morte da Suzana Franklin, o MOPI passou uma época desativado e, na década de 1980, o Rotary Club de São Paulo, do bairro de Higienólopis, assumiu o Centro de Convivência, formando a diretoria executiva.

Além dos rotarianos, o MOPI também tem convênio com a Secretária Municipal de Assis-tência Social, da Prefeitura de São Paulo. Além disso, ele mantém um bazar através de doações de roupas, sapatos, bolsas, que são vendidos a preço baixo nos dias de baile, geralmente aos sábados e domingos. O MOPI cobra uma quantia de R$2,00 aos sábados e R$4,00 aos domingos para ajudar na manutenção e geração de renda da casa.

O MOPI funciona na rua Germaine Burchard, 344, no bairro de Perdizes, em São Paulo. Tel (11) 3672-5904.Para fazer doações ao MOPI ligue para o telefone acima ou acesse o site www.mopi.org.br.

ProgramaçãoPor meio do site do MOPI, é

possível ter acesso à programação de atividades e aos horários de funcionamento dos cursos, que em média têm duas horas de duração. O curso de Informática, por exemplo, é oferecido todos os dias, de manhã e à tarde.

Além disso, é possível saber como chegar ao local.

O MOPI é uma entidade de utilidade pública federal, estadual e muncipal. As atividades são gratuitas.

Espaço de convivência incentiva aprendizado do idoso Atividades do MOPI vão desde aulas de bijuteria, informática e pintura até dança de salão, tango, yoga e ginástica chinesa

Cínthia Kelly Macedo

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Momentos nas oficinas de aprendizagem do MOPI: escrita e música.

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perspectiva de vida na terceira idade que, na década de 1940 não ultrapassava os 40 anos,

hoje já alcança os 65. Dentro de dez anos, será de 80, em média, o tempo estimado de vida dos brasileiros.

Um dos fatores que contribuem para o aumento na perspectiva de vida é a alimentação saudável. Pesquisas recentes realizadas no Japão, Estados Unidos e Europa comprovam que o consumo diário de soja e seus derivados reduz em até 50% os riscos de adquirir câncer de mama e próstata.

Segundo a nutricionista Flávia Azevedo, o segredo da soja está em suas proteínas e no baixo valor calórico do grão. “A soja é rica em fibras, que ajudam dentre outras coisas a manter o bom funcionamento do intestino. Na mulher ajuda a prevenir o câncer de mama, já no homem combate o colesterol e previne o câncer de próstata”.

De acordo com o geriatra Aris-tides de Souza Mendonça, uma refeição equilibrada na hora certa, aliada à pratica de exercícios físicos, é fundamental para a qualidade de vida dos idosos. “Quando somos jovens não nos preocupamos muito com a nossa refeição, nem com horários, nem com que tipo de alimento estamos ingerindo. Devido ao acumulo de atividades diárias, esses detalhes passam desapercebidos. Com o passar dos anos, porém, o nosso organismo começa a sentir os efeitos causados por nossa desatenção. É importante prestar atenção no que se come desde jovem e procurar realizar uma alimentação regrada e completa. Quanto mais colorido for o prato, mais saudável será a refeição. Por isso na hora de se alimentar abuse no colorido na montagem do prato e alie sempre a prática moderada de exercícios, afinal, vida sedentária e saúde não combinam.”

A aposentada Ana Maria Fi-gueiredo, de 75 anos, é vegetariana

e faz caminhadas todas os domingos pela manhã no parque da Água Branca para manter a forma. Diz que sua qualidade de vida mudou depois que abandonou a vida sedentária e o consumo de carnes vermelhas. “Eu tinha uma vida sem graça, sem disposição para nada, abusava na comida e se não tivesse carne na mesa eu não comia. Exercício físico eu nem queria saber, minha vida se resumia em comer, assistir televisão e dormir, até que um dia comecei a sentir cansaço e dores pelo corpo. Procurei então um geriatra e ele me aconselhou a praticar caminhada. Hoje, já faz dez anos que venho a esse parque todos os domingos e há cinco substitui do meu cardápio a carne vermelha pela de soja e posso garantir que a minha qualidade de vida mudou, tenho mais disposição, não sinto dores nem cansaço, estou muito feliz.”

Força de trabalhoOutro fator relevante que

colaborou para o crescimento da perspectiva de vida, segundo Men-donça, foi a “mudança da força de trabalho”. “No passado, a força de trabalho era braçal, com muito desgaste físico, o que acarretava sérios problemas de coluna, dentre outros. Por isso, a perspectiva de vida não ultrapassava a faixa dos 40 anos, principalmente entre os homens. Atualmente a maioria dos trabalhos realizados pelo ser humano é de natureza intelectual, que certamente preserva mais a sua integridade física e prolonga seu tempo de vida.”

O caldeireiro aposentado João Batista do Nascimento, de 78 anos, concorda com o geriatra. “Quando eu trabalhava na caldeiraria, o desgaste físico era enorme, por ser um serviço muito pesado. Hoje, aposentado, sinto no meu corpo os efeitos causados pelos 50 anos de esforços dedicados à minha pro-fissão.”

Para a nutricionista, o aumento

no tempo de vida também se deveu à divulgação pelos meios de comunicação de assuntos rela-cionados à saúde e às mudanças de hábitos de alimentação. “Para os nossos pais e avós, comer em excesso era sinônimo de saúde. Por essa razão, sempre ouvimos frases como ‘veja que criança saudável‘, simplesmente por ela estar gorda. A gordura, no entnato, não significa ser sadio, pelo contrário, a obesidade é uma doença diretamente ligada à hábitos alimentares errados. Os meios de comunicação em geral têm abordado esse problema e a população descobriu que nós somos reflexos do que comemos. Esse é o segredo para uma terceira idade plena de vitalidade.”

Renda familiarO Instituto Brasiliero de

Geografia e Estatística (IBGE) constatou que nas grandes me-trópoles brasileiras, 27% dos idosos mantém seus lares ou são responsáveis por cerca de 30% a 50% da renda bruta familiar.

É o caso do vendedor de pipoca José Malaquias dos Reis, de 60 anos, que sustenta a família. “Em casa somos quatro pessoas, minha mulher, dois netos que moram conosco e eu. Só com a aposentadoria de 500 reais seria impossível sobreviver. A esposa me ajuda fazendo bicos, mas se não saio para vender a situação em casa fica complicada. A cada dia estou em um lugar diferente. Aos finais de semana venho ao parque da Água Branca com meu carrinho de pipocas e durante a semana fico próximo a colégios e faculdades da região. Afinal tenho quatro bocas para sustentar e não é fácil”.

O Brasil possui cerca de 15 milhões de idosos, vivendo em sua maioria concentrados entre os estados do Rio de Janeiro, com 12,8% e Porto Alegre, com 11,8%. No estado de São Paulo, segundo Censo 2000 do IBGE, a população de idosos pode chegar a 1 milhão.

brasil é o segundo maior produ-tor de soja do mundo, responsá-

vel por 24% da produção mundial, perdendo apenas para os Estados Unidos, responsáveis por 41,5%, segundo dados do IBGE.

Os estados do Mato Grosso e Paraná somam, juntos, a maior produção de soja do país, to-talizando 46,18% do cultivo bra-sileiro. Apenas cerca de 10% do produto, porém, fica no mercado interno – os 90% restantes é ex-portado, principalmente para a China, maior consumidora da soja brasileira, para a fabricação do óleo de soja.

O problema do aumento do con-sumo de alimentos à base de soja pelos brasileiros, está relacionado ao alto custo dos produtos. O leite de soja é, em média, 30% mais caro que qualquer leite em pó.

A diferença de preço entre os eles ocorre devido ao processo de fabricação e refrigeração que os ali-mentos à base de soja necessitam para manter a sua qualidade. Es-ses procedimentos encarecem os produtos e as despesas são repassadas ao consumidor final. Isso acaba pesando no bolso dos brasileiros, causando a diminuição da procura pelos alimentos.

Alimentos à base de soja fazem parte da dieta de idosos

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Valor da soja pesa no bolsoO

O vendedor de pipoca José Malaquias dos Reis, de 60 anos de idade.

Consumo só não é maior entre a população idosa devido ao alto custo dos produtos nas prateleiras dos supermercadosCésar Paranhos

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Dona Ana Maria Figueiredo, 75 anos de idade, consome carne de soja.

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prática de atividades físi-cas entre os idosos vem se tornando cada vez mais co-

mum. Envelhecer praticando qual-quer exercício é uma forma de estar bem com a saúde e a longevidade. De acordo com pesquisas cien-tíficas, a participação em um pro-grama de exercícios leva à redução de 25% nos casos de doenças cardiovasculares e 10% nos casos de acidentes vasculares celebrais, doenças respiratórias crônicas e distúrbios mentais.

Foi por essa razão que a pro-fessora de Educação Física, Ondina Scala, montou uma programa voltado para a terceira idade, com diversas atividades físicas. De acordo com ela, a prática de exercícios físicos nessa idade ajuda a melhorar a flexibilidade, a agilidade, a atenção, estimulando a auto-estima e fazendo com que os idosos consigam se livrar de diversos problemas, como as doenças.

A professora dá aulas há 20 anos para terceira idade, e há três anos no Centro de Convivência do Centro Educacional e Esportivo Edson Arantes do Nascimento, conhecido como Pelezão, em São Paulo.

Ela conta que a aula de ginástica adaptada é desenvolvida com base em estudos para que os movimentos possam ser executados com faci-lidade. “Não há uma cobrança in-tensa de atividades, o que existe é uma observação, que se percebe nas queixas”, diz.

A maioria dos idosos que che-gam ao Centro de Convivência é encaminhada pelos postos de saúde. “São pessoas que têm uma patologia e os exercícios podem e devem ser inseridos em suas vidas, fazendo com que eles tenham uma melhora no quadro clínico”, diz.

Os benefícios das atividades físicas são percebidos pelos alu-nos. A aposentada Teresinha Vi-ravelo Borazo, de 68 anos, conta que sempre gostou de praticar

exercícios e descobriu neles uma forma de manter sua saúde em dia. “Eu fiquei muito tempo nessa vida sedentária. Aí, quando os problemas de colesterol surgiram, eu pensei em cuidar de mim. E está dando resultado, estou me sentindo muito bem. Trouxe muitos benefícios”, diz a aposentada.

A prática de exercícios também trouxe bons resultados para a também aposentada Angelina da Silveria Castro e Belo, de 62 anos. Ela conta que os sintomas da osteoporose diminuíram. “Eu já tive reumatismo, ataque de gota e tenho problema na coluna. Fazendo os exercícios, eu melhorei bastante. Gosto do convívio que a gente tem com o pessoal”, diz a aposentada.

Assim como a professora Sca-la, o professor de Capoterapia, An-tonio Luiz Coutinho, que há três anos também dá aula para Terceira Idade no Pelezão, conta que os os idosos sentem-se excluídos, sozinhos e as atividades físicas fazem com que eles se reintegrem à sociedade.

O professor explica que a Capoterapia são os movimentos básicos da capoeira, sempre res-peitando os limites dos idosos, que têm dificuldades de movimentos, como força muscular, equilíbrio, coordenação motora, flexibilidade. Os benefícios dessa atividade são melhorar a capacidade motora e sócio-afetiva, diz o professor.

Com movimentos simples, a Capoterapia não exige performances perfeitas, mas que seja estimulada a capacidade. É o caso de dona Ida, de 69 anos, que adora as aulas e que resolveu fazê-las porque gosta de música e de atividade física. “Eu sei que ainda não tenho coordenação muito boa para fazer determinados movimentos, mas estou adorando”, diz.

Outra atividade que ajuda a melhorar a auto-estima é o treino do Tai Cchi Pain Lin, um exercício que busca movimentos para me-lhorar a saúde e a longevidade

Prática de exercícios físicos aumenta entre os idososO combate às doenças, a melhoria da qualidade de vida e a longevidade são os principais atrativos para a prática de exercícios

Andréa Paes França

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A professora de Tai Chi e vo-luntária Maria Regina Machado, que também faz parte do projeto do Pelezão para a terceira idade, afirma que os benefícios da prática da atividade para o idoso, como

para qualquer outra pessoa, é perceber e tomar consciência do conhecimento do seu próprio corpo, buscando uma atitude muito mais voltada para o fazer do que para o ser. Segundo ela, quando a pessoa

fica idosa, ela não pode fazer muito e se não desenvolver uma consciência de si, não consegue lidar com o desconforto que vai acontecendo com a idade. Por isso, recomenda praticar o exercício.

cuidadoso, gradual e longo é o período de alongamento.

• O tempo de aquecimento é de 10 minutos

• O efeito do aquecimento dura de 20 a 30 minutos

• O aquecimento se inicia com alongamento global e caminhada.

Algumas doenças não são conhecidas pelas pessoas mais velhas, principalmente as ligadas ao ossos, principal meio de locomoção. As doenças mais comuns são:

• Osteoporose é uma doença na qual os ossos se tornam frágeis e sensíveis a fratura. A doença pode progredir sem sintomas até que os ossos se quebrarem.

• Bursite é a inflamação das bolsas sinoviais, em que pequenos balões ficam es-palhados pelas principais articulações do corpo como joelhos, quadris, cotovelos e ombros. Sua função é reduzir o atrito entre os ossos e os tendões.

• Artrose é um processo de-generativo de desgaste da cartilagem, que afeta so-bre tudo as articulações que suportam peso ou as que fazem movimentos em excesso.

A companhia de familiares, amigos ou vizinhos pode motivar a prática de exercícios. Que tal convidá-los?

Dicas de atividades físicas para os idosos o se preparar para fazer uma atividade física, o idoso deve

primeiro submeter-se a uma ava-liação médica e o clínico ou geriatra que o acompanha deve estar apto a liberar e recomendar a atividade física.

Deve-se realizar exercícios:• Somente quando houver bem

estar físico; • Usar roupas e calçados ade-

quados; • Evitar fumo e o uso de se-

dativos; não se exercitar em jejum.

• Escolha uma atividade com a qual se identifique.

• O tempo ideal de aquecimento varia conforme a idade. Quanto maior a idade, mais

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Um ambiente agradável e orientação especializada estimulam a prática de exercícios entre os idosos.

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Lei assegura atendimento preferencial aos idosos

oje em dia nota-se certo pre-conceito contra as pessoas idosas, que muitas vezes são

marginalizadas perante a sociedade, que a julga incapazes de realizar di-versas atividades do cotidiano. No entanto, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de idosos no Brasil – que em 2000 representava apenas 5% da população – corresponderá a 18%, em 2050, o que demonstra que essas pessoas não devem ser discriminadas, já que terão vital importância no futuro do país.

Por isso, o Estatuto do Idoso - aprovado pelo Plenário e redigido no Projeto de Lei da Câmara n. 57, do ano de 2003 – foi proposto, de acordo com o artigo terceiro do Título I, para assegurar que essas pessoas tenham “direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”.

PrioridadeO Título I do Estatuto, nomeado

Disposições Preliminares, descreve, ainda, o que é compreendido pela garantia de prioridade: preferência na formulação e na execução de políticas sociais públicas es-pecíficas; destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção ao idoso; viabilização de formas al-ternativas de participação, ocu-pação e convívio do idoso com as demais gerações; priorização do atendimento do idoso por sua própria família, em detrimento do atendimento asilar, exceto dos que não a possuam ou careçam de condições de manutenção da própria sobrevivência; capacitação e reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia e na prestação de serviços aos idosos; estabelecimento de meca-nismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais

de envelhecimento; garantia de acesso à rede de serviços de saúde e de assistência social locais; e, por último, o atendimento preferencial imediato e individualizado junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à popu-lação.

Atendimento preferencialSegundo o Banco Central do

Brasil, têm direito ao atendimento preferencial em todas as agências bancárias do país, pessoas por-tadoras de deficiência física ou com mobilidade reduzida, temporária ou definitiva; gestantes, lactantes ou pessoas acompanhadas por criança de colo; e idosos, com idade igual ou superior a 65 anos.

Além disso, conforme o artigo primeiro da Consolidação das Re-soluções 2.878, de 26/07/2001, 2.892, de 27/09/2001, e da Circular 3.058, de 05/09/2001, disponíveis no site da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), as instituições bancárias devem oferecer aos idosos: garantia de lugar privilegiado em filas; distribuição de senhas com numeração adequada ao aten-dimento preferencial; guichê de caixa para atendimento exclusivo; ou implantação de outro serviço de atendimento personalizado.

CríticasPara o publicitário Mauro Mena

Teixeira, de 35 anos, o atendimento preferencial é um direito justo, mas “desde que seja para poupar os idosos de esforços físicos, como em ônibus e supermercados ou de dar a prioridade de atendimento para quem possua algum tipo de deficiência física”.

Ele lembra que já cansou de ver idosos aparentemente saudáveis levar ao banco serviços de pessoas não-idosas, que não têm direito ao atendimento preferencial. “Grande parte dos brasileiros, infelizmente, tem essa mentalidade de querer levar vantagem em tudo”, afirma. Mesmo assim, o publicitário não crucifica pessoas que agem dessa

forma, e coloca a culpa na falta de qualidade do atendimento nas agências: “O atendimento público vem caindo significativamente de qualidade. Há demora, falta de preparo e pouca solução. Assim, pessoas optam pelo jeito mais rápido. Mesmo que prejudique outras pessoas. É uma bola de neve que aumenta cada vez mais”, ressalta.

Já o universitário Bruno Aio, de 22 anos, aponta que algumas empresas se aproveitam do direito ao atendimento preferencial para contratar idosos que executam serviços anteriormente feitos por office boys. “Quanto a isso, não há o que fazer. As empresas podem se aproveitar desse artifício, que não é contra a lei, embora eu ache de extrema falta de ética”, diz.

O estudante acredita que a situação é um reflexo do qua-dro de desigualdade social no país e defende os idosos que de-sempenham a função. “Também não devemos criticar essas pessoas. Se elas fazem isso, provavelmente é porque necessitam de uma renda extra para complementar suas apo-sentadorias ou até mesmo porque não possuem uma”, ressalta. Para Aio, o culpado por isso tudo é o governo, que não oferece condições dignas de sobrevivência aos idosos. “A questão vai muito além do certo ou errado”, afirma.

A estudante de Direito Virgínia Fernandes diz que não há nenhuma ilegalidade em pessoas idosas tra-balharem, mas identifica abusos. “Eles estão abusando do direito de ter atendimento preferencial. Quando tal privilégio foi criado, não visava o lucro pessoal dos idosos e sim o conforto e facilidade devido à limitação física”, destaca. “Além disso, as empresas também se aproveitam, encurtando prazos, ganhando um tempo que antes era perdido pelos office boys nas filas. Sem falar que os idosos não pagam transporte, o que também acarreta

menos gastos para o contratante”, destaca.

O publicitário Teixeira conta que, certa vez, estava com muita pressa, mas encarou uma fila gi-gantesca em uma agência. “Eu precisava pagar uma conta e aproveitei o horário de almoço para fazer isso. Para complicar, parecia que todos os office boys da cidade estavam pagando todas as contas do ano naquele momento. Eram quilos de papéis. A única caixa que sobrava, das quatro que trabalhavam, era a que atendia aos idosos. Só que naquele momento não havia nenhum e, mesmo assim, não fui atendido”, afirma.

Para ele, o atendimento pre-ferencial deveria ter horários pré-determinados, que fossem fora do horário de pico nas agências. “As agências deveriam abrir uma hora mais cedo e fechar uma hora mais tarde. Essas duas horas a mais seriam destinadas ao atendimento dos idosos. Desta forma, todo mundo sairia ganhando. Até por-que trabalhar das 10h às 16h é muita moleza para os bancários”, argumenta o publicitário, que ainda sugere outra solução. “Criar bancos exclusivos para as pessoas da terceira idade”.

O estudante Aio concorda com Teixeira e diz que os idosos merecem um bom atendimento e a criação de bancos exclusivos à terceira idade

seria uma “excelente idéia”. “Se isso fosse feito, certamente, não só os idosos seriam atendidos com maior eficácia e qualidade, mas também as pessoas que têm de enfrentar as filas comuns, já que os caixas preferenciais deixariam de existir e passariam a atender a todos”, ressalta.

Por sua vez, Fernandes observa que o grande problema no aten-dimento bancário está na falta de agilidade do serviço. “Todos os caixas deveriam funcionar durante todo o dia. Não faz sentido a agência possuir seis guichês e, durante grande parte do expediente, apenas um ou dois profissionais atenderem ao público. E tem mais: ao invés de um caixa preferencial, deveria haver um apenas para idosos e outro para gestantes, pessoas com crianças de colo etc”, sugere.

O estudante Aio é bem enfático ao dizer que os idosos têm direito ao tratamento preferencial no atendimento, mas o ssitema abre brechas para oportunistas. “É um direito conquistado, isso é fato. Mas alguém que seja responsável por isso precisa encontrar uma maneira de, ao menos, identificar e punir as pessoas que abusam desse direito. Isso prejudica não só nós, pessoas não-idosas, mas também idosos que, de fato, precisam do atendimento preferencial, pela fi-nalidade com que ele foi criado.”

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Idosos com idade igual ou superior a 65 anos, têm direito ao guichê de caixa exclusivo em todas as agências bancárias do paísAndré Salvagno

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or meio do Estatuto do Idoso, que entrou em vigor no Brasil em janeiro de 2004, os idosos

conquistaram vários benefícios que há muito tempo eram almejados.

O Art. 15, do Capitulo IV, por exemplo, diz que “é assegurada a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde - SUS, garantindo-lhe o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para a prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos”.

Ainda de acordo com o Estatuto, no Art. 23, “a participação dos idosos em atividades culturais e de lazer será proporcionada mediante descontos de pelo menos 50% nos ingressos para eventos artísticos, culturais, esportivos e de lazer, bem como o acesso preferencial aos respectivos locais”.

O Estatuto também garante aos maiores de 65 anos a gratuidade nos transportes coletivos públicos urbanos e semi-urbanos, exceto nos serviços seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos serviços regulares. E, ainda, por lei, devem ser reservados 10% dos assentos para os idosos, devidamente identificados com placa de reservado.

Os idosos também têm direito ao acesso livre nos ônibus coletivos, trem e metrô. Mas para que esse acesso seja realmente permitido, é necessário que a pessoa idosa faça uma carteirinha junto à empresa de ônibus. No trem e metrô, o passageiro deve apresentar a car-teira de identidade.

Os idosos também conquistaram o direito a lugares gratuitos em ônibus interestaduais, porém as vagas são limitadas duas por ônibus e as reservas devem ser feitas com antecedência e o aposentado deve comprar que recebe um salário mínimo.

Visando beneficiar mais os idosos, a Secretaria dos Trans-portes Metropolitanos (STM) jun-to com o Metrô e a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), criaram o programa “Em-barque Preferencial” nos trans-portes de São Paulo. A idéia surgiu após várias reclamações feitas por usuários idosos, mulheres grávidas, pessoas com mobilidade reduzida sobre a lotação dos trens nos horários de pico.

Agora eles poderão entrar nos vagões com mais facilidade, conforto e segurança. Os idosos, cadeirantes e mulheres grávidas e pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida terão sempre o primeiro vagão reservado em determinados horários.

Para a aposentada Sofia Cuervo Bittencurt, de 68 anos, a iniciativa é “maravilhosa.” “Não preciso me preocupar quando preciso usar o trem ou o metrô. Eu também tenho uma carteirinha que a Prefeitura de Osasco, a cidade onde moro, fez para mim. Com ela posso andar de ônibus à vontade. Isso foi muito bom, pois agora eu faço uma grande economia quando tenho que sair para resolver alguns problemas”.

“Acredito que esse beneficio é excelente e deve incentivar vários

aposentados e pensionistas como eu a saírem mais de casa. Também é possível conhecer outros lugares, como parques e shoppings, sem gastar dinheiro com a passagem. Finalmente poderemos aproveitar bastante”, completou.

Hoje, com o bilhete único, o idoso desce pela porta traseira do ônibus. Para a aposentada, como alguns idosos têm mais dificuldade para se movimentar, “descer do ônibus pela porta traseira fica mais difícil, além disso, o motorista tem menos visibilidade e é por isso que ocorrem vários acidentes vitimando os idosos. O certo seria que as pessoas com mais idade descessem pela porta da frente, diminuindo com isso os acidentes”.

A aposentada Massaco Nishi-da, de 74 anos, já se acostumou com o benefício. “Tenho minha carteirinha desde quando fiz 60 anos. Porém acredito que deveria haver mais organização no momento da solicitação da carteirinha. Hoje em dia, tem muita burocracia e a fila de espera é enorme. Mesmo assim, posso dizer que aproveito bastante, saio muito, conheço muitos lugares diferentes, visitei várias exposições e o que me deixou mais feliz é que fiz tudo isso sem pagar nada nos transporte que utilizei.”.

“Hoje já não saio como antes, mas posso garantir que poder sair de casa a hora que eu quiser, sem precisar me preocupar com o dinheiro da condução, faz uma diferença e enorme. Acho essa lei muito importante, principalmente porque favorece os aposentados que recebem tão pouco com a aposentadoria”, disse ela.

Apesar de terem conquistado alguns benefícios que facilitaram suas vidas, alguns idosos se sentem insatisfeitos com o tratamento que recebem. Muitos reclamam da falta de educação dos motoristas de ônibus que quando vê um idoso no ponto de ônibus passa direto, fazendo com que o direito do cidadão não seja respeitado.

O Estatuto do Idodos diz que “os idosos devem ser respeitados pelos motoristas de ônibus, que devem atender suas solicitações de embarque e desembarque, aguardando sua entrada e saída com o ônibus parado.”

Descontos em farmáciasAo longo dos anos, os idosos

conquistaram vários benefícios como, por exemplo, desconto em teatros, hotéis, cinemas, cursos e farmácias. Em alguns estabelecimentos, como cinema e circo, o desconto chega até 70%. Tudo para que o idoso tenha uma vida ativa e saia mais de casa.

De acordo com o farmacêutico Deusdete Góes, da Farmácia das Comunicações, “algumas farmácias e frogarias funcionam com descontos através de cartões de fidelidade. O cliente preenche um formulário com os seus dados e dias depois o cartão que proporciona o desconto chega à sua casa. Os outros estabelecimentos não só oferecem esse beneficio para os idosos, mas também para todos os demais clientes”.

Para ele, o desconto em me-dicamentos é justo. “Os idosos ou qualquer outro consumidor não compra medicamento por prazer e

Benefícios incentivam o idoso a sair mais de casaAlém de economizar com passagens de ônibus e metrô, aposentados agora podem desfrutar de mais momentos de lazer

Shirley Frazão da Silva

P sim por uma necessidade. Portanto, os descontos em medicamentos são benéficos para eles e também para os idosos que recebem pouco dinheiro na aposentadoria”, disse

“Tenho os cartões da Drogasil e Drogaraia e quando preciso de algum remédio sempre consigo um bom desconto. É claro que os descontos são de acordo com os remédios. Se preciso de um remédio caro tenho um desconto maior e se preciso de um remédio mais barato os descontos são menores”, disse Bittencurt.

“Na região onde eu moro as farmácias fazem cartões diferentes para idosos e para clientes comuns. No meu caso, antes de efetuar a compra devo apresentar o meu cartão de aposentada. Os descontos não são para qualquer remédio, pois variam de acordo com a especialidade e tipo de produto. Dependendo da farmácia, consigo desconto que varia entre 5% a 50%”, disse Nishida.

Nishida afirma que “não há um limite estipulado pela farmácia no sentido de volume, ou seja, posso comprar quantos remédios precisar. Isso ajuda porque às vezes posso comprar remédios para outras pessoas da família com descontos”,

Mais direitosMais direitos dos idosos, de

acordo com o Estatuto do Idoso:• Ao benefício de prestação

continuada, se tiver idade superior a 67 anos e não possuir outras rendas e sua família não dispuser de meios para assisti-lo;

• Implantar programas edu-cacionais voltados para o idoso, estimulando e apoiando assim, a admissão do idoso na universidade;

• Incentivar o desenvolvimento de programas educativos voltados para a comunidade, ao idoso e sua família, mediante os meios de comunicação de massa.

A aposentada Sofia Cuervo Bittencurt diz economizar com os benefícios.

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ão são apenas estórias de vi-da de nomes conhecidos que merecem ser contadas. Cida-

dãos comuns que chegaram a terceira idade também viveram situações inusitadas, curiosas e intrigantes que os mais jovens pre-cisam conhecer.

Uma delas é a do ex-piloto de avião do falecido ex-presidente do Brasil, Jânio Quadros, Souza Paganelli. Nascido em São Paulo, em 1936, Paganelli tem hoje 72 anos. Desde pequeno sempre gostou de aviões. Conta que admirava os aviões que sobrevoavam o céu da cidade e que colocou na cabeça que quando crescesse seria piloto.Outro fato que o levou gostar tanto de aviões se deu na infância. Aos cinco ou seis anos de idade, viu num jornal uma bela foto de um avião de grande porte que imediatamente lhe chamou a atenção.

Aos 18 anos de idade, resolveu se inscrever no curso de Piloto Integrado de São Paulo, e, após um breve período, recebeu o 738, nome dado na época a uma espécie de permissão para ser piloto de aviões, apenas os de pequeno porte, que sempre foram os preferidos de Paganelli.

No ano seguinte, já com um ano de experiência, começou a prestar trabalho para algumas empresas de médio e pequeno portes, que hoje seriam uma espécie de táxi aéreo. Por dois anos, trabalhou dessa ma-neira.

Nesses dois primeiros anos, conta que passou alguns apuros, pois naquela época a tecnologia dos aviões, mesmo que sendo os de pequeno porte, não era igual a que começou a ter grande evolução a partir da década de 1970.

Um dos apuros que Souza passou foi num dia que o avião estava indo de São Paulo a Campinas, e uma imensa ventania começou a “estremecer” o avião, e Paganelli, juntamente com os passageiros, pensou que iria cair e

começou a rezar em voz baixa para que a viagem terminasse de forma tranqüila e sem contratempos. Fe-lizmente, logo chegaram ao seu destino final.

Outra passagem que Paganelli lembra muito bem foi quando fazia uma viagem de São Paulo a São José dos Campos, quando começou a chover bastante e por pouco o avião não bateu em um outro avião que passava pelo mesmo local, naquele mesmo momento. O piloto disse que por causa das nuvens e da própria chuva forte, quase o pior aconteceu. Mas, mais uma vez, no final das contas, tudo saiu da maneira esperada.

As estórias mais legais e cu-riosas que Paganelli conta, entre-tanto, são as do tempo em que foi piloto de Jânio Quadros, entre os anos de 1959 e 1960. Nessa época, Jânio cumpria seu mandato como deputado federal pelo estado do Paraná, mas havia repassado o cargo, pois em 1960 candidatou-se à presidência da República, no lugar do então presidente Juscelino Kubitschek, o JK. Jânio acabou sendo eleito com seis milhões de votos, algo quase que impossível de acontecer naquela época.

Paganelli pilotou para Jânio quando ele ainda não era presidente do Brasil, mas em algumas con-versas que ele pode ouvir, revela que Jânio já pensava como tocaria

o seu mandato, e algumas coisas ficaram claras. Ele ficaria do lado do povo, custe o que custar, e que se fosse eleito, não se submeteria aos mandos de pessoas influentes daquela época.

Uma viagem bem curiosa que fizeram juntos foi uma vez que o avião partiu de São Paulo rumo a Mato Grosso. Já no finalzinho da viagem, Jânio perguntou a Paganelli: “Posso pilotar um pou-quinho o avião? Sempre tive essa curiosidade de como é pilotar um.” O piloto começou a dar gargalhadas e respondeu: “Melhor não, pois sempre prezei pela segurança de meus passageiros, e, de fato, isso não seria uma boa idéia, pois este avião também é de pequeno porte.” E, então, Jânio retrucou: “Sim, você é quem manda, rapaz!” E, naquela hora, Paganelli pensou consigo mesmo em voz alta: “O Jânio é uma pessoa bem humilde, poderia por ser político ser mais severo, até me xingar, mas respondeu tranquilamente a minha negativa.”

Paganelli relata que na maioria das vezes as viagens foram muito tranqüilas e que Jânio pouco falava de assuntos políticos e sim sobre as coisas normais do dia-a-dia. Ele recorda que Jânio era uma pessoa muito simples, e que mereceu ter chegado onde chegou. Lembra com tristeza do dia 16 de fevereiro de 1992, quando Jânio Quadros veio

a falecer. Disse que ficou bastante emocionado e que nem quis ver muito o noticiário.

Outras estóriasNo ano em que São Paulo

completou 450 anos, a Prefeitura deu início a um bom projeto, que foi o de colher depoimentos dos moradores mais antigos da cidade. Alguns alunos de Jornalismo foram voluntariamente atrás desses de-poimentos e no final obtiveram estórias emocionantes de idosos.

O primeiro depoimento é de Einar Kok, um senhor de 86 anos de idade, filho de ucranianos. Kok conta que a casa onde ele viveu com a sua família, em sua adolescência, em São Paulo, tinha adega, lavanderia, sala de bilhar e quarto de depósito de lenha. Lá, ocoreram as festas de casamento de suas irmãs e de sua filha Edith. Kok, junto com seus amigos, formaram um clube em torno de sua casa. Reuniam-se garotos para corridas, saltos à vara (com bambus) e exercícios de ginástica. Nos feriados, os exercícios eram precedidos por solenidade cívica. O clube foi fechado em 1930, quando um dos colegas de seu Kok, ao saltar com vara, enroscou a perna num varal e caiu. O garoto sofreu fratura exposta muito séria. Anos depois, aquele menino veio a ser governador de São Paulo e era André Franco Montoro.

Dona JúliaO segundo depoimento esco-

lhido por mim foi o de dona Júlia Macedo de Andrade, de 88 anos de idade. Andrade veio para São Paulo quando tinha apenas três anos de idade. Seu pai era italiano e chegou ao Brasil de navio. Atualmente, todos os seus familiares já fale-ceram, ela não teve filhos e por conta disso sente-se muito sozinha. Ela diz ter bastante saudade de seu marido Francisco, jornalista e advogado. Ele escrevia novelas para a Rádio São Paulo e adorava muito trabalhar. Freqüentava fes-tas e lugares chiques. Mas não gostava nem um pouco disso. Para passar o tempo, ela ficava em casa fazendo tricô ou bordando. Muitas fãs mandavam cartas para ele, mas quem as respondia era dona Júlia. Francisco, veio a falecer no dia 20 de agosto, o ano, porém, dona Júlia esqueceu, pois disse que hoje em dia sua memória está mais fraca.

A estória e os depoimentos têm em comum as lembranças das pessoas. Elas voltam ao passado e revivem momentos que marcaram épocas as suas vidas.

São tempos em que as pessoas mostravam claramente que sabiam aproveitar a vida, com atividades que faziam muito bem a elas próprias e a todos que pertenciam a seu convívio social. No meu caso, em particular, todas as conversas e estórias que ouço quando converso com pessoas mais velhas, 99% delas fazem afirmações de que inúmeras coisas de antigamente eram sem sombra de dúvidas melhores do que os dias atuais.

Idosos voltam ao passado e relatam fatos marcantes São relatos de pessoas simples cujas vidas estão recheadas de episódios marcantes que servem de exemplos aos mais jovens

Bruno Santos M. de Almeida

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O aposentado Souza Paganelli, de 72 anos, pilotou para o ex-presidente Jânio Quadros entre 1959 e 1960.

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Dona Júlia Macedo de Andrade.

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inda hoje é comum pes-soas acreditarem que a terceira idade, melhor ida-

de como preferem ser chamados os com mais de 65 anos, é sinônimo de fragilidade, falta de saúde, limitações e acúmulo de doenças. Mas essa visão está superada. Com o avanço da ciência, o uso de medicamentos especiais e a mudança de costumes que aumentam a expectativa de vida o cenário se transformou”. Assim acredita a agência Brasil Viagem, que abre com essas palavras o seu roteiro de Turismo na Melhor Idade.

A justificativa para se investir em roteiros específicos para esse público pode ser observada através de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nos anos de 1980, esse grupo representava algo em torno de 10% da população da época. Na última pesquisa do IBGE, em 2000, a terceira idade representava 14,5% da população, algo em torno de 24 milhões de pessoas e a projeção é de que esse número suba para 34 milhões nos próximos dez anos.

Observando o crescimento da população idosa, era de se esperar também um aumento de mercado nas áreas de consumo desse grupo de pessoas. Um desses casos é o turismo. No inicio do novo milênio, quase nove milhões de idosos percorreram o país de norte a sul por ano, o que representou cerca de 20% do total de viagens domésticas. A expectativa é de que o número de turistas idosos dobre até 2025.

O modo mais simples de ex-plicar o interesse dessa faixa da população pelo turismo, é o fato de que a grande maioria das pessoas com mais de 60 anos já estão aposentadas e possuem uma renda mensal fixa sem a necessidade de trabalhar. Os idososa melhor podem aproveitar os períodos de baixa temporada para viajar, já que nessa

época os custos chegam a ser 40% mais baratos do que durante os meses de alta. Além disso, o fluxo de pessoas é bem menor durante esse período, tornado o ambiente mais adequado para o ritmo tran-qüilo da terceira idade.

Outro ponto interessante no crescimento do turismo na terceira idade, é a conscientização da po-pulação idosa sobre a importância da atividade física e do lazer para se ter uma vida melhor, uma vez que o sedentarismo e a inatividade representam um prejuízo para quem deseja viver com mais saúde.

Viajar estimula o idoso tanto fisica quanto mentalmente, o que é muito importante, pois o turista da terceira idade torna-se mais confiante e passa a lidar melhor com as situações de conflito que existem nessa etapa da vida. Prova disso é o livro Turismo e qualidade de vida na terceira idade, de Romeu Rodrigues de Souza e Heloísa Maria Rodrigues de Souza, que trata das causas e conseqüências do envelhecimento da população, das transformações do corpo com o passar do tempo, das ações que promovem a saúde do idoso e das perspectivas do turismo para a terceira idade. A obra também apresenta sugestões para as agências de viagem, visando um melhor atendimento aos idosos, público que se mostra cada vez mais importante para o turismo.

Incentivos e projetosO programa do Ministério do

Turismo, o Viaja Mais – Melhor Idade, lançado em agosto de 2007, demonstra que o Governo também está vendo a importância do turismo na terceira idade, já que o programa é a primeira aplicação prática do Viaja Mais, que tem como foco fortalecer o turismo no mercado interno. Nesse caso, o Melhor Idade visa estimular as pessoas com 60 anos ou mais. O programa oferece vários benefícios para esse público e também para

aposentados e pensionistas do INSS, com menos de 60 anos.

Os pacotes turísticos oferecidos pelo Viaja Mais – Melhor Idade, possuem preços interessantes pa-ra esse grupo, que partem de R$ 400,00 (rodoviário) e R$ 600,00 (aéreo), e o comprador pode in-clusive contar com a vantagem do crédito consignado. Essa moda-lidade de empréstimo oferece juros abaixo de 1% pela Caixa Econômica Federal e pelo Banco do Brasil, para pagamentos em até 12 meses e com possibilidade de carência de até 180 dias.

As vantagens do programa para os idosos são alguns diferenciais em relação aos pacotes turísticos normais. Um pacote tradicional, em geral, inclui o transporte da cidade de origem ao destino; o traslado de chegada e saída (do aeroporto ao hotel e vice-versa); hospedagem com café da manhã; e, eventualmente, um ou mais passeios pela cidade. Para o Viaja Mais – Melhor Idade, o Ministério do Turismo e o mercado definiram, juntos, um conjunto de medidas para incentivar o consumo do tu-rismo pela melhor idade.

São disponibilizados pacotes turísticos com preços diferenciados, saídas em grupos – incluindo transporte aéreo ou rodoviário –, adaptados para a melhor idade, ou seja, incluindo serviços e passeios diferenciados, cartão de assistência de viagem (com cobertura esta-belecida caso o passageiro tenha um mal súbito e precise de um médico/medicamento, durante a viagem), utilizando equipamentos com infra-estrutura adequada ao público.

Onde irO Brasil é o quinto maior país

do mundo, e, em um lugar tão grande, a dúvida para escolher o destino da viajem aumenta, principalmente para os idosos, que precisam escolher um local que seja de seu interesse e que esteja

adequado a recebê-lo. E com uma alta da demanda de viagens desse público, muitos locais estão se preparando para melhor atender a terceira idade. Mas para se preparar é preciso saber o que essa classe busca, e observando os lugares mais procurados por esse grupo, pode-se dizer que os idosos procuram tranqüilidade e conhecimento em suas viagens, e gostam de passeios históricos e pousadas termais.

A Pousada do Rio Quente Resorts, localizada na famosa re-gião das Águas Quentes, em Goiás, é um exemplo de turismo da melhor idade. Para se ter uma idéia, o complexo recebe todo ano cerca de 300 mil turistas com mais de 65 anos, o que corresponde a 30% do número total de hóspedes que o visitam. O segredo? Bem, muitos acreditam que seja a temperatura das águas que ficam em torno de 37 graus, exatamente a mesma do corpo humano. Assim, a sensação de conforto e relaxamento é enor-me e para o público da melhor idade, essa temperatura é ideal, já que as pessoas com mais idade são mais friorentas do que as jovens porque a temperatura média do corpo humano tende a diminuir com o passar dos anos.

A Estância Hidromineral de Araxá está localizada na região do Alto Paraíba, em Minas Gerais, recebe todos os anos um número surpreendente de pessoas com mais de 65 anos, principalmente por se tratar de uma cidade pequena, que oferece programas com ritmo mais lento e que podem ser seguidos por qualquer tipo de turista. As visitas mais procurada pelos turistas da melhor idade são a Igreja Matriz de São Domingues, considerada uma das mais belas do interior mineiro e o Parque do Cristo, com uma imagem do Cristo Redentor que também oferece opções de lazer e recreação.

Lugares como esses merecem

destaque pois possuem equipes treinadas para lidar com a terceira idade e com todas as necessidades que essas pessoas possam vir a ter. Pensando assim instituições de ensino passaram a criar cursos especializados em atendimento aos idosos. A Universidade de São Paulo (USP) criou o Saúde em Viagens: Antes, durante e depois, um curso visando à prevenção de doenças relacionadas a viagens e turismo, focados na terceira idade.

Outra proposta interessante é apresentada pelo Sesc do Rio Grande do Sul. Através do Centro de Referência do Envelhecimento criou o Viajando com idosos, um curso voltado para guias de turismo. O programa do curso visa a capacitação para o acompanhamento de grupos de idosos em viagens e focaliza a importância do turismo gregário, do convívio social e das relações interpessoais.

DicasVeja abaixo algumas dicas

antes de decicir o roteiro e quais os preparativos que são importantes e que não devem ser deixados para última hora:

* Uma dica para quem quer viajar sem ter nenhum incidente de última hora é resistir às tentações gastronômicas durante a viagem. Principalmente quem deve seguir uma dieta por problemas de saúde deve preferir alimentos mais leves e saudáveis.

* As malas sempre se tornam mais pesadas no decorrer da viagem por causa das compras. Leve somente as roupas necessárias e práticas. Escolha as malas de rodinhas, fáceis de transportar na falta de carregadores.

* Antes da viagem uma con-sulta médica é essencial para que seja avaliado o estado de saúde do viajante. Pessoas com problemas de enfraquecimento devem ser submetidas a um recondicionamento dois meses antes de viajar.

Setor de turismo se prepara para atender melhor os idososAgências de turismo, Governo Federal e universidades se mobilizam para atender às necessidades dos idosos que gostam de viajar

Ricardo Barros

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Page 12: Temas em Debate 01 - 1º semestre de 2008

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quarto da casa de apoio que atende adultos infectados pe-los vírus da aids, em São Pau-

lo, nada lembra o antigo lar da do-na de casa L., de 57 anos. Antes de ocorrer o pior drama de sua vida, ela vivia tranqüila ao lado do marido e nada se comparava à felicidade de acompanhar a vida dos filhos. Hoje compartilha um pequeno cômodo com cinco mulheres vítimas do mesmo algoz: o vírus do HIV. Sem desejo de mostrar a face, a dona de casa tem ânimo apenas para revelar a sua dor. “Há cinco anos a doença destruiu a minha família, o meu marido foi infectado em um relacionamento e o fruto da infi-delidade corre nas minhas veias.”

L. faz parte de uma estatística que tem deixado a classe médica preocupada: o número de pessoas acima dos 60 anos infectadas com o vírus HIV/Aids. No início dos anos de 1980, quando a doença apareceu e fez vítimas em larga escala, sua face sempre foi a de uma doença de jovens, mas, hoje, os números apontam para outra faixa etária: os idosos.

Há pouco tempo, havia a idéia de que as pessoas, ao chegar a velhice, eliminavam o sexo de suas vida. Os estímulos que chegam de todos os lados, entretanto, fazem que os idosos tenham atividade sexual ativa. O problema é que a grande maioria, diferentemente dos jovens, ignoram as medidas preventivas.

De 1996 a 2006, dobrou a ocorrência de aids entre pessoas acima de 60 anos. De acordo com o Programa Nacional de DST e Aids, do Ministério da Saúde, passou de 441 para 1.113 o número de idosos infectados a cada ano. Nas mulheres, na faixa etária dos 60 anos, os registros de contaminação saltaram de 114 para 444. Hoje são 3.702 idosas infectadas. Entre os homens pularam de 327 para 669, perfazendo um total de 7.408 casos.

Para a infectologista Eliane Fonseca, do Centro de Referência e Treinamento e Aids (CRT), em São Paulo, a tendência é a estatística aumentar nos próximos anos, por causa do crescimento da ex-pectativa de vida dos idosos e da inserção dessa faixa etária na sociedade. “Na época de nossos pais, os idosos cuidavam dos netos, hoje eles participam da universidade da terceira idade, de programas culturais, sociais, ou seja, descobriram que estão inseridos na sociedade. Os idosos não são assexuados como pensam os filhos”, afirma.

ProblemasO que fazer para acabar com

a contaminação entre os idosos? Quais as políticas de prevenção? Será que os idosos não têm direito de envelhecer com dignidade e saúde? A medicina busca as suas respostas e as campanhas do combate à aids correm na contra-mão batendo de frente com a publicidade de medicamentos contra a impotência, o anúncio de próteses e a utilização de métodos hormonais. Essas inovações que-braram os tabus que envolviam as pessoas da terceira idade. Hoje os idosos freqüentam baladas, bares da moda e até motéis. “Os idosos foram orientados a associar à prevenção apenas durante o rela-cionamento com a profissional do sexo ou para evitar a gravidez, e, por isso, não se vêem vulneráveis a adquirir Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e Aids”, diz a infectologista.

Ignorando o perigo e caminhan-do na corda bamba, muitos homens acima dos 60 anos vivem sem restrições em busca dos prazeres da existência. Como aconteceu com o aposentado J. G., de 75 anos, que há dois meses faz tratamento para curar uma doença sexualmente transmissível, depois de percorrer uma longa carreira de aventuras amorosas sem proteção. “A idade

não faz a menor diferença, mas é preciso fazer sexo com segurança”, diz. “Agradeço a Deus por não ter me infectado com a aids”.

J.G. escondeu por um bom tempo a DST dos filhos e da esposa, com quem vive há mais de 50 anos, mas logo foi descoberto devido o desconforto da enfermidade. O médico urologista que o atendeu foi orientado pelo paciente a negar qualquer tipo de informação à família. No entendimento do aposentado, a descoberta da doença seria a prova inegável da infidelidade conjugal e um sinal de uma vida sexual ativa.Segundo a infectologista do CRT, esse é um problema observado ao longo do trabalho à frente do Am-bulatório de Aids do Centro: os idosos escondem dos familiares os sintomas das doenças.

“Muitas vezes também as in-fecções oportunistas da aids são confundidas com as enfermidades do envelhecimento. Após cuidadosa investigação e frente aos resultados dos exames, na maioria das vezes os familiares se negam a crer que os pais idosos são vítimas do vírus HIV”, destaca. Para o gerente de Epidemiologia do CRT, Ângelo Tayra, enquanto houver relação sexual sem camisinha haverá risco. “Há 20 anos apenas teve início o processo de divulgação da prevenção contra aids, é dificil para o idoso controlar a conduta sexual”, ressalta.

Perfis dos pacientesNo Ambulatório de Aids do

Idoso do CRT, em São Paulo, cerca de 40 pacientes são atendidos se-manalmente pela infectologista Eliana Fonseca. O perfil dos ido-sos é seguinte: mulheres acima de 60 anos que foram infectadas pelos maridos – a grande maioria conheceu a aids após a viuvez.

Para os médicos, a desarmonia do desejo sexual entre o casal pode ser um ponto de partida à infidelidade masculina. De um lado, a mulher com apetite sexual reduzido por questões hormonais,

e, de outro, o parceiro estimulado pelos medicamentos contra a impo-tência. O resultado? A busca pelo relacionamento extraconjugal.

“Entende-se que há neces-sidade de alargar as fronteiras do diálogo entre as mulheres e de promover respostas para que elas sejam protagonistas da reposta à epidemia de aids”, afirma a infectologista. Para ela, existem fatores que contribuem para a vulnerabilidade feminina à epidemia, como a desigualdade nas relações de poder entre homens e mulheres, o menor poder de negociação das mulheres quanto ao uso de preservativo. “Diante de tal realidade, a moléstia só poder ser controlada por meio de campanhas educativas não apenas voltadas aos jovens, mas a todos os que estão ativos sexualmente”, diz.

CampanhasNo enfoque dado à doença,

temas considerados tabus foram discutidos nas campanhas de aids do Brasil: uma campanha polêmica em que um homem conversa com o próprio órgão genital (1994), homens que fazem sexo com homens (2002), adolescentes do sexo feminino que não se envergonham de comprar o preservativo (2003).

Todas elas foram consideradas ousadas por debater sobre temas considerados tabus. Este ano a campanha resolve alcançar nova-mente os homossexuais para dimi-nuir a incidência da aids nesta ca-tegoria de exposição.

Será que não é momento de uma ação educativa com uma men-sagem de sexo seguro ao idoso, um público que tem se revelado frágil e vulnerável?

Aumenta o número de casos de aids entre os idosos De acordo com Programa do Ministério da Saúde, passou de 441 para 1.113 o número de idosos infectados a cada ano no país

Eteni Barbosa dos Santos Gualberto

O

que apresentaram diminuição na taxa de contaminados para cada 100 mil habitantes em relação a 1996 (de 16,3 para 7,6 e de 6,3 para 4,5, respectivamente) foram Sudeste e Centro-Oeste. Na região Norte, passou de 2,4 para 3,9; no Nordeste, de 2,6 para 2,9 e Sul de 8,4 para 9.

Os casos de aids aumentarm de 17%, entre homossexuais e bissexuais de 13 a 24 anos, se comparado os anos de 1996 e 2006. Entre pessoas de 25 a 29 anos, o crescimento foi de 11%, neste período. Na faixa etária entre 30 e 39 anos houve uma redução na quantidade de pessoas que foram contaminadas pela doença: de 30%, em 1996, para 28%, em 2006.

A aids em números no Brasil e acordo com Ministério da Saúde, existe hoje no Brasil cer-

ca de 600 mil pessoas vivendo com o HIV. De 1980 até junho de 1996, 433.067 pessoas haviam sido contaminadas.

A transmissão vertical do vírus (de mãe para o filho – seja durante a gestação, parto ou amamentação) reduziu de 1.091 casos em 1996 para 530 em 2005, registrando uma queda de 51,5%.

A proporção entre homens e mulheres contaminados se mante-ve. A diferença que chegou a ser de 26,5 casos da doença em homens para 1 de mulher, em 1985, passou para 1,5 em homens para 1 caso em mulheres – mesmo número desde 2003. As únicas regiões

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