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tema de capa Texto Bruno Contrairás Mateus, Marta Martins Silva eVanessa Fidalgo foto capa Manuel Salvado 0 s primeiros acordes falam de um amor perdido. João Carlos cerra os olhos, põe as mãos nos bolsos, as tira quando as leva ao peito. Asalaestáa meia - luz, a audiên - cia acompanha com chouriço assado, a 7,5 euros, com cerveja, a 1,50, ou vinho, dez euros o jar- ro. quem feche os olhos. "A gente lembra -se de quando era mais pequeno e por isso chora com o fado. O fado canta a vida de toda a gente , toda a gente sen - te " diz Fernando Romão. Tem 82 anos, nado e criado na Travessa da Queimada, ginga com o fado vadio, torce as mãos, limpa as - grimas, grita"Bravo!"Nopassa- do, foi ajudante de camionista, mas agora assenta praça na Tas - ca do Chico, no Bairro Alto, em Lisboa, com uma máquina foto- gráfica a registar todos os que por ali passam - profissionais ou amadores. Não perde o fado - mesmo queofaça chorar -, por- que o fado lhe canta a vida, de di - ficuldades e trabalho. A noite ainda vai no início, mas hão-de passar pelo 'palco' que nãoépal- co, antes um cantinho improvi - sado, as mais variadas vidas. Não recebem cachet - "o fado é vadio quando não se recebe dinheiro em troca" - , mas "o mais importante é cantar ". Pas - sa um técnico reformado do La- boratório Nacional de Enge- nharia Civil que começou a sol- tar o fado na guerra colonial; uma fisioterapeuta, um soció- logo, e até um jovem que trocou as rimas do hip hop, para citar alguns. O senhor Reinado ofe- rece a todos um cartão com o seu telefone, 'lèm 88 anos. Do lugar onde cantou, havia de cantar mais tarde, noite alta, Raquel Tavares , uma das jovens fadistas mais aclamadas da ac- tualidade. Aplaude os amado- res, toca guitarra portuguesa, na mesma sala onde as paredes têm coladas fotografias suas. "Olha eu ali, com 12 anos" - aponta. Vem sempre que pode. "Venho beber desta inspiração, aqui canta- se o fado sem qual- quer pretensão, as pessoas vêm exorcizar as suas vidas." Numa mesa mais recuada, está Bela, do restaurante de Alf ama com o mesmo nome . Veio vibrar com o fado no Bairro Alto, reencontrar amigos e clientes. "Nãoháriva- lidade, damo-nos todos bem." A assistir também está o casal

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Page 1: tema de capa - ClipQuick...tema de capa Texto Bruno Contrairás Mateus, Marta Martins Silva eVanessa Fidalgo foto capa Manuel Salvado 0 s primeiros acordes falam de um amor perdido

tema de capa Texto Bruno Contrairás Mateus, Marta Martins Silva eVanessa Fidalgo foto capa Manuel Salvado

0s primeiros acordes falam de umamor perdido. João Carlos cerra

os olhos, põe as mãos nos bolsos,

só as tira quando as leva ao peito.Asalaestáa meia - luz, a audiên -

cia acompanha com chouriçoassado, a 7,5 euros, com cerveja,a 1,50, ou vinho, dez euros o jar-ro. Há quem feche os olhos. "A

gente lembra -se de quando era

mais pequeno e por isso chora

com o fado. O fado canta a vida

de toda a gente , toda a gente sen -te " diz Fernando Romão. Tem 82

anos, nado e criado na Travessa

da Queimada, ginga com o fado

vadio, torce as mãos, limpa as lá -

grimas, grita"Bravo!"Nopassa-do, foi ajudante de camionista,

mas agora assenta praça na Tas -ca do Chico, no Bairro Alto, em

Lisboa, com uma máquina foto-

gráfica a registar todos os que

por ali passam - profissionais ou

amadores. Não perde o fado -mesmo queofaça chorar -, por-que o fado lhe canta a vida, de di -

ficuldades e trabalho. A noite

ainda vai no início, mas hão-de

passar pelo 'palco' que nãoépal-

co, antes um cantinho improvi -

sado, as mais variadas vidas.

Não recebem cachet - "o fado

só é vadio quando não se recebe

dinheiro em troca" -, mas "o

mais importante é cantar ". Pas -sa um técnico reformado do La-boratório Nacional de Enge-nharia Civil que começou a sol-

tar o fado na guerra colonial;

uma fisioterapeuta, um soció-

logo, e até um jovem que trocou

as rimas do hip hop, só para citar

alguns. O senhor Reinado ofe-rece a todos um cartão com o

seu telefone, 'lèm 88 anos.

Do lugar onde cantou, havia

de cantar mais tarde, noite alta,

Raquel Tavares , uma das jovensfadistas mais aclamadas da ac-tualidade. Aplaude os amado-

res, toca guitarra portuguesa, na

mesma sala onde as paredestêm coladas fotografias suas.

"Olha eu ali, com 12 anos" -aponta. Vem sempre que pode."Venho beber desta inspiração,

aqui canta- se o fado sem qual-quer pretensão, as pessoas vêm

exorcizar as suas vidas." Numamesa mais recuada, está Bela,

do restaurante de Alf ama com o

mesmo nome . Veio vibrar com o

fado no Bairro Alto, reencontrar

amigos e clientes. "Nãoháriva-lidade, damo-nos todos bem."

A assistir também está o casal

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de namorados, estudantes de

Direito, Inês e Afonso. Gostamdeste fado porque "é cantado

por pessoas como as que vemostodos os dias na rua" Pessoas

comuns sem aparato.Namesadetrãs,está um sur -

fista e professor de Educação Fí-sico e ainda um trompetista sue-

co, Bo Nilsson: "O fado canta

uma história triste e, embora eu

não perceba as letras, gosto mui-to." Ao lado, Luisa e Frederich,alemães a morarem em Alzejurhá oito anos: "Não entendemos

tudo, mas acho que o fado canta a

história de Portugal, que no pas -sado eram heróis do mar, e a tris -teza de terem deixado de o ser. É

isso, não é?" - pergunta Frede-rich. Fala de amor e saudade,acrescentamos. "Pois,tambémétriste." É por isso que Eduardo

Jorge, de 6o anos, tem de entrar

na personagem para cantar os

males deamor. "Tenho um casa-mento feliz, de 42 anos, por isso

não canto de experiência."Venha quem vier à Tasca do

Jaime, na Graça, é os pastéis de

bacalhau da dona Lavra que vai

provar (1,20 euros), o vinho do

Ribatejo (seis euros o jarro) e umbomfado amador. "Aos fadistas

e aos guitarristas eu não pago,

aproveito-me deles" - brinca

Jaime, o dono da tasca. "Fies é

que me pagam a mim, porque

têm de consumir. O fadista temnecessidade de cantar ; não vivedo fado." A casa é pequena.Numa mesa, está um póster de

Angelo Freire, o guitarrista deMariza - "ele começou aqui, a

tocar na minha guitarra "garan -

te Jaime, orgulhoso do instru-mento que o seu filho, de 15

anos, j á toca. Pai c filho tambémcantam o fado. Sc c amador, é

preciso é ter alma - " e ser casti -

ço". Lavra, a matriarca, faz

cumprir o silêncio com o baixardas luzes. "Eu tenho que ser

agreste, às vezes. Digo um 'xiv'

para toda a gente se calar. Nãodou porrada às pessoas."

Em Alfama, os recantos ?

"O fado cantaa vida de todaa gente epor isso fazchorar. Todaa gente sente"Fernando Romãofrequentador da Tascado Chico

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? inspiram palavras e devol-vem - nas ao vento com fado. E se

for vadio, é nas ruas que se ouve .

Cecília Casal Ribeiro, empre-gada do Flor dos Arcos, diz quesó canta por brincadeira, mas

ainda à hora de almoço uns tu-ristas brasileiros a desafiaram.

"Canteinaesplanada'acapellaí'No Esquina de Alfama, mistu-

ram-se amadores com profis-sionais. Eduardo Tereso, 6lanos, já cantou 'Gaivota doente'

(Vasco Graça Moura) , entre três

temas. "Não recebo dinheiro. É

só pelo prazer de cantar " conta o

engenheiro mecânico aposen-tado. "Não se pense que é fácil

ser fadista. Há técnicas que uns

copiam e outros estudam."

Tarei de Witte e Miche Foré,um casal belga, regressam todos

os anos a Portugal, desde 2004,"especialmente pelo fado" emAlfama. Miche, 55 anos, até jáchorou. "Nãoseiporquê..."

Foi a paixão que levou Mafaldae Paulo, um jovem casal, a visi-tar este restaurante. Pelo jantar

pagaram 51 euros (vinho, dois

pratos de carne, um pires de

paio, cafés e uma aguardente).Mas foi o fado que os inspirou.Mafalda cantou duas músicas,estreando-se como 'fadista'." Sinto paz na alma com o fado."

Foi uma surpresa que o maridolhe fez. Paulo explica: "Portugal

precisa de uma Amália. E a mi-nha Amália é a minha mulher."

O Café Luso nasceu em 1927,

numa altura em que as casas de

fado eram novidade. Antes disso,

"sobretudo no século XTX, ofado

era escutado em tabernas e ou-tros locais pouco recomendá-

veis, mas também, no contra-

ponto, em meios aristocráticos.

A casa de fado apresentou -

-se como um sítio decente paraos artistas se apresentarem e fa-zeremearreira" - contextualizaa

gerência do Luso -no Bairro Alto

desde os anos 40. Por lá se vive-ram histórias que participaramna História do País e do Mundo.Na altura da II Guerra Mundial,"em virtude da posição neutral

de Portugal, Lisboa tornou-se

entreposto da espionagem inter -

nacional, tanto que entre os boé -mios do Café Luso não era raro

encontrar espiões"

Amália também era presençaassídua. Chegoumesmo a gravarum disco ao vivo no Café Luso,

em 1955. Nessa década, "ofere-

ceu aos funcionários um concer -

to. Na altura, nenhuma outra

casa de fado igualava o cachet

que o Luso lhe pagava, de 1000escudos por noite"

Mas a diva não foi a única pro -

tagonista de histórias que mar-

caram o passado desta casa. "Nadécada de 80, o embaixador do

México ficou arrebatado ao ouvir

ElsaLaboreiro(queaindahojefaz

parte do elenco) , e a embaixatriz

levantou-se, subiu ao palco, reti-rou as travessas do cabelo e quisoferecer as jóias à artista" Celes-

te Rodrigues, que hoje canta noBacalhau de Molho, tambémporlá passou. A irmã de Amália co-

meçou a cantar em 1945. Lem-bra-se de quando as casas de

fado "eram tertúlias, com famí-lias inteiras"

Na noite em que Ada de Castro

se ia estrear como fadista profis -

sional no Faia, a 13 de Março de

1960, foi impedida de entrar,

pelo porteiro, o senhor Raul, norestaurante porque vinha sozi-

nha "e naquela altura uma se-nhora sozinha não podia entrar

numa casa de fados" - conta P-edro Ramos, um dos actuais pro-prietários do Faia, no Bairro Alto.

"Ninguém o tinha avisado, e fi-couaAdadeCastroàporta,àes-pera. 0 porteiro era um homem

previdente. Tinha sempre uma

gravatinha para emprestar aos

clientes, porque naquela altura

para entrar numa casa de fados

convinha usar gravata'! Tam-bém era o senhor Raul que levava

o Carlos do Carmo à escola, ain-da rapaz de calções . Porque nes-

sa altura o Faia, que começou porser Adega da Lucília, em 1 947, erada mãe do fadista. Foi lá que C ar -los do Carmo deu os primeiros

passos na música, "numa brin-cadeira de fim de noite com os

amigos da mãe"

Mariza, quando entrou no Faia

pela primeira vez, terá mesmodito: 'Ah, este é o Faia de que o

Carlos do Carmo tanto fala'" -recorda Pedro. Por lá também

passaram Alfredo Marceneiro,Tristão da Silva e FernandoMaurício, entre tantos outros.

Para a história recente têm con -tribuído Camané, Lenita Gentil,Anita Guerreiro, Ana Marta e Ri-cardo Ribeiro. Naruadas Gáveas,

a Severa, de Júlio Banos Evange-

"As pessoasvêm com tudoe com todoscantar à Tascado Chico"João Carlosapresentador

"Sinto pazna alma como fado"Mafalda Carvalhoestreou-se a cantar ofado no restauranteEsquina de Alfama

Nas casas defado, um jantare espectáculode fado custaentre 40 e 60euros porpessoa

Das raízes af ro-brasileiras aos salões e às tascas

África, Brasil, Lisboa. Adis- ; início do século XIX". Diz ; acompanhado à viola. Nas

cussão sobre as origens do: Nery que "foi em Lisboa ; primeiras gravações, do iní-

fado não está encerrada, \ que a música foi trabalhada : cio do século XX, até pianosmas Rui Vieira Nery -musi-

;até se chegar ao fado, que \se ouvem", conta o musicó-

cólogoe presidente da co- : prosperou entre as déca- ; logo. Certo éo papel demissão científica da candi- : das de 1820-30". Quanto à : Amália na renovação lírica:

datura do fado a património ; guitarra portuguesa, não foi ¦ "Até aí. o fado fazia-se so-

imaterialdaUnesco-de- a primeira escolha. "A qui- bretudo de poetas popula-fende que nasceu "de uma tarraé uma adaptação da res.É ela quem primeiro

dança cantada afro-brasi- l guitarra inglesa, introduzi- canta eruditos como David

leira chamada fado, que ;da nos salões da aristocra- Mourão Ferreira ou Pedro

terá chegado a Lisboa no : cia. No início, o fado era Homem de Mello." j.e.m.

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lista, compõe a história do fado

há 56 anos. Por lá jã passaram"todos os presidentes destepaís" E não só. Richard Nixon,presidente dos EUA entre 1069 e

1974, em visita a Lisboa, pediuparaolevaremaos fados. Aterrouna Severa. Miterrand (ex- presi-dente de França) foi outra das fi -

guras de Estado que ouviram fa -dos na Severa, que também re-cebia Amaria. A fadista "vinhacomer carapauzinhosfntosefa-vas. Antes de começar a cantar,nos dias em que queria cantar e

as pessoas lhe pediam, bebia

meia garrafa de champanhefrancês" - recorda Júlio.

Também pelo Senhor Vinho,fundado em 1975 por José Luís

Gordo, Maria da Fé e AntónioMelo Correia, passaram ao longodos anos nomes sonantes da

canção nacional. Maria Arman-da, Maria da Nazaré, Ada deCastro e Machado Soares, no

passado; Mariza, Aldina Duarte,Ana Moura, Camané, nos últi-mos anos. Também guitarristascomo José Fontes Rocha (acom -

panhou Amália) , Paquito e Pedro

Leal. "Fomos acompanhando a

modernidade, mas o fado nuncaé velho, é o mesmo de sempre,desde que cantado com senti-mento" - diz José Luís Gordo. E

em silêncio. Porque há coisas quenunca mudam. ©

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"É um canto que aceleraa circulação sanguínea"

Nointervalo de

um ensaio,Mafalda Ar-nauth confes-

sa-se numaroda-viva "com tanto traba-lho" " Este é um canto diferente,

pela força e, ao mesmo tempo,contenção. É um canto que ace-

lera a circulação sanguínea" re -

vela quem acredita tero "privi-légio de viver e de construir umacarreira numa época áurea do

fado"porque isso significa tam-bém que, "passada a fase das

dúvidas, uma nova vaga de fa-distas se confirmou'!

A fadista faz uma média de 50concertos por ano, mais de me-tade em Portugal. Acha difícil

cantar o fado sem ter na filiaçãoADN português: "É precisouma sensibilidade muito parti-cular. . ." Ou, como diria o músi-co Jorge Fernando, que acom-

panhou à viola e gravou com

Amália, é preciso ter "caracte-rísticas de carácter que são só

nossas" Nem sempre o País en-tendeu isso mesmo.

Jorge Fernando lembra -se do

tempo em que o fado era "des-denhado" e visto como género

menor. "O 25 de Abril trouxe

coisas boas e algumas más. E a

elite pseudo-intelectual queatirou o fado para um patamarbaixo foi das más. Foi preciso

surgir uma nova geração de jor -

nalistas que soubesse olhá-lo

como outra música qualquer"recorda. Dos tempos que traba-

lhou com Amália, ficou -lhemuito. "Gravou-se dentro de

mim sem que eu tivesse dado

conta, e fez de mim uma pessoadiferente" confessa.

Não viveu esses tempos Katia

Guerreiro - fadista mas tambémmédica. A sua preocupação é o

futuro: "No estrangeiro surgirãomais adeptos, mas a minhamaior esperança reside em Por -

tugal. Gostaria de ver o fado a ser

explicado em escolas, a ser fala-

do com orgulho" Katia acha cu-riosa a paixão que têm pela nos -

sa música os estrangeiros quedecoram letras ou aprendemportuguês para poderem cantar.

Mas não é a mesma coisa.

"Está-nos no sangue, na forma

"A Amálianunca teve deprocurar sítiopara cantar"Estrela Carvasamiga de Amália

"Um fadistade nome podereceber 50 a100€/noite emcasa de fados"Jorge Fernandomúsico

"Comofalecimentode Amália,percebeu-seque tinha idouma granderiqueza"Pedro Moutinhofadista

Um milhão e 800 mil euros em discos vendidos

Tozé Brito, actual presiden-;

Portuguesa, em 2010 o ; da crise que a indústria mu-

te da Sociedade Portugue- i fado ocupou uma fatia de:

sical atravessa: "O público

sadeAutores, defende que :20 por cento do total das : defadonãofazdownloads",o fado é "talvez o mercado

:

vendas de discos portugue- : garante Tozé Brito. Etam-mais dinâmico e valioso" da ses.Tendoemcontaqueo ;

bém gosta de ouvir a sua

indústria musical. "0 fado: segmento nacional factu- ;

música na rádio. "A existên-

representa um terço dos rou pouco mais de nove mi- cia de estações que só pas-

espectáculos realizados in-:

Ihõesdeeuros.ofadocon- ;samfadoé um sinal deste

ternacionalmente.oqueé seguiu render cerca de um momento de ouro", acres-

óptimo".Jánoqueserefere milhão e oitocentos mil eu- :centa Tozé Brito, referindo-

aos discos, segundo dados ros. Os números do suces- ; -se a estações como a lis-

da Associação Fonográfica so têm explicação, apesar '¦ boeta Rádio Amália. v.f.

como vivemos e sentimos "

Talvez tenha sido isso quedespertou, aos 15 anos, Fábia

Rebordão para o fado: "As luzes

apagadas, o timbre das vozes

sem microfone, a tragédia naface de quem cantava. Fiqueifascinada" Passou a pertencer -

-lhe, dando-lhe "verdade"

A tal verdade dos fadistas, de

que fala também Pedro Mouti-nho: " O fado vive das palavras e

das histórias que elas contam. A

interpretação tem de ser sentida,

tem de soar a verdade." Defende

que com o falecimento de Amá-lia Rodrigues, as pessoas seaper-ceberam de que "tinham perdi-do algo de grande riqueza" e co-

meçaram a prestar-lhe mais

atenção, linha sete anos quandoentoou o seu primeiro fado

numa colectividade de Alcân-tara. Ofado,aliás,conheciabem

o caminho para chegar a Pedro

Moutinho. Já antes tinha recla-

mado a voz do seu irmão mais

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velho, Camanc, que muitos

apontam como 'culpado' pelo

despontar de uma época de

ouro.Camanérecusaotítulo. "O

fado renova-se por si e semprehouve novas gerações. Agoratêm é mais visibilidade , até por -

que os portugueses ainda pen-

"Quem diriaque seria ofado a elevaro moral dosportugueses'Marco Rodriguesíadisld

sam assim: "Se lá fora gostam,então também temos de gostar."

"Feliz e satisfeito" Ricardo Ri-beiro admite orgulho pela pró-pria candidatura, "que foi dis-

tinguida por estar muito bemfeita" mas dela espera "maiorcuidado na salvaguarda deste

património" e um "olhar mais

cuidadoso sobre o futuro"Cidália Moreira pertence à ge -

ração dos mestres. Logo ela, queveio do Algarve para Lisboa ain-da menina de 17 anos para cantai

nas casas de fado. E hoje , aos 67,

aindaporláanda.Porisso,Ci- ?

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Quando os aplausos ditavam o melhor fadista

Só sabia cantar seis fados. -toda a vida dedicada aos ; Casa da Imprensa. Nos

E subiu ao palco do Coliseu tapetes de Arraiolos - inter-:

anos anteriores, o público

de Lisboa para três mi! pes- : pretouToiDeusldeAmália. : "levava no farnel pastéis de

soas a ouvirem. Tinha espe- O público levantou-se, nata e coxas de frango! Até

rado a noite toda. Já nem aplaudiu com crescente en- garrafões de vinho. "Era

estava nervosa. Descon- tusiasmo. Gritava: "Ase- bairrismo, porque os vence-

traiu quando o apresenta- nhora venceu ! ", e, como o dores eram ditados pelo

dor da Grande Noite do público era soberano, foi a tempo dos aplausos- o re-

Fado disse: "Falta cantar vencedora de 1988 José La:

corde foram 5 minutos", diz.

duas pessoas, mas os yen- ! Féria organizou a Grande "Perdeu-se o espectáculo

cedores já estão escolhi- Noite do Fado entre 1996 e mais antigo do País" -co-dos." Maria Augusta Costa i 2008 (o último ano), pela meçou em 1953. b.e.m.

dália impõe respeito quandodiz que "gente a cantar o fado há

muita, fadistas há poucos'.'' ' Poucos se podem orgulhar de

ter uma cultura com esta raiz,esta força e riqueza. Não pode-mos descura - Ia e temos o dever

de a levar mais longe" afirma

Carminho, a filha da fadista Te-

resa Siqueira que, aos 12 anos,ficava sentada na mesa da "Bia"

na Taverna no Embuçado.

"Qualquer dia já se fala de

fado na escola! " aspira Ana So-

fia Varela, enquanto CucaRoseta acredita que a distinçãointernacional vai trazer "in-

vestigação e empenho na edu-

cação e na formação, maior di -

namização dos espaços onde

se canta o fado e essencial-mente a promoção e dignifica -

ção do fado e de Portugal portodo o Mundo" Mas é o jovemMarco Rodrigues que apontaas coincidências: "Quem diria

que seria o fado, conotado com

a tristeza e a melancolia, a ele -

var o moral dos portugueses,em pleno século XXI, nummomento de particular con-

tenção e dificuldades. .."

Aos 77 anos, Fernando Alvimconta que foi também daqueles

que aprenderam "o verdadeiro

fado nas casas de fado" Aos 15

anos, via tocar e pedia para tocar.

"Uns anos depois, quem mais

gostei de acompanhar à viola foi

o Carlos Paredes [durante 25

; anos]. As variações do Paredes

: eram improviso atrás de impro-viso '! Passaram todos estes anos

: e Alvim revolve a pergunta:;

"Como é que, tocando instru-

: mentos tão importantes como a

; viola ea guitarra, os guitarristas: passam sempre ao lado? Em 50: anos de carreira, dei a primeira: entrevistatelevisivahâummês."

O máximo que Alvim ganhou

:

foram 2500 euros num espectá-

culo, mas o normal eram 750 ." O; CarlosParedesganhavatrêsve-: zes mais do que eu."©

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Amor e lirismo na

canção de Coimbra

Ascapas negras en-

volvem os om-bros dos fadistas.

O som das guitar-ras prende a alma.

Atarde ainda mal caiue, no cen-tro histórico de Coimbra, na ruado Quebra Costas, ouve -se o

fado numa sala bem composta.Nas paredes, as fotografias re-tratam quem faz a história da

canção de Coimbra.

João Farinha, de 35 anos (na

voz ,licenciado em gestão de em -

presas), Luís Barroso, 37 (na gui-tarra, engenheiro de minas), e

Luís Carlos Santos, 46 (na viola,

bioquímico), entregam -se ao

projecto Fado ao Centro. "Qui-semos proporcionar às pessoasfado ao vivo durante o dia. Este

projecto ê recente, mas temos

tido muita gente interessada,

principalmente estrangeiros"

explica João Farinha, um dos res -

ponsáveis pelo projecto. "Ofadode Coimbra está muito ligado à

comunidadeacadémica. Fala es-sencialmente de amor e é mais li -

rico do que o de Lisboa 1

; explica.

João Farinha encaminha- se

para a parede e olha para a foto

do pai. " Sou filho de fadista. Até

chegar à faculdade, gostava de

rock, pop, heavy metal. Foi na

universidade que nasceu esta

paixão." Luís Barroso trilhou umcaininhosemelhante. "Quando

cheguei de Lisboa para estudar

em Coimbra, trouxe a minha

guitarra eléctrica. Acabei porme apaixonar pelo fado'! O gui-tarrista guarda na memória ummomento único: "Toquei com a

Amália Rodrigues em Coimbra.

Em 1 g 97, ela veio a uma cônsul -

ta e ficou hospedada num hotelda cidade . Também numa brin-cadeira, chamaram-me, umbocado à pressa, porque a D.

Amália queria cantar fado. Foi

um momento único ".

Noutra casa, a acústica de uma

antiga capela recebe todas as

noites a voz de António Ataíde,de 43 anos, na rua Corpo de

Deus. "O projecto Quinteto de

Coimbra nasceu em 2001 para

preencher uma lacuna: faltava

um espaço dedicado à divulga-ção da canção de Coimbra" lem-

braofadista, também sócio-ge-

rentedoÀCapefla.Nas ruas estreitas da Baixa,

uma luz denuncia a entrada do

Diligência. Num ambiente aco-

lhedor, o fadista deambula pelas

mesas. Não é um espaço exclu-

sivo da canção de Coimbra, mas

desde 1972 que se compõe com

clientes regulares. 0 ambiente e

a música agradam a Sebastian

Genovard, Benito Ferrer e Aqus-tia Duran, três espanhóis de

Maiorca. "Este bar é pouco for-mal, ao contrário de outras casas

de fado" sublinha Benito. As

guitarras voltam a trinar. Silên-

cio que se vai cantar o fado. c& ©

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