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TEMA 01: CONSÓRCIO PÚBLICO. POSSÍVEL DESVIRTUAMENTO DA FINALIDADE

PREVISTA NA LEI DOS CONSÓRCIOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NÃO

ENQUADRADOS NA DEFINIÇÃO DE “SERVIÇOS PÚBLICOS”.

Os consórcios públicos devem ser utilizados quando a pessoa jurídica pública não possa

ou tenha dificuldades de executar sozinha o serviço, tornando-se possível ou mais

eficiente tal execução mediante a conjugação de esforços. O Consórcio não pode se

apresentar como uma autêntica empresa de consultoria municipal, contemplando a

prestação de serviços que integram a rotina operacional dos entes municipais, não se

enquadrando como “serviços públicos”, nem guardando relação com os objetivos

estabelecidos no decreto regulamentador da Lei dos Consórcios.

- DA ANÁLISE DOS FINS CONSORCIAIS

O art. 1º da Lei n.º 11.107/05 estabelece de forma inaugural, o principal objetivo dos

Consórcios quando anuncia que esta “lei dispõe sobre normas gerais para contratação de

consórcios públicos visando à realização de objetivos de interesse comum” (grifo

nosso), chamando atenção, inclusive, em seu art. 2º, que os objetivos serão

“determinados pelos entes de Federação que se consorciarem, observados os limites

constitucionais”, e neste caso o art. 241 da CARTA DE OUTUBRO traz vetores que

devem ser seguidos quando na realização de consórcios públicos:

Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (grifo nosso)

Nesta direção, o dispositivo constitucional de forma inequívoca crava a “gestão associada

de serviços públicos” como maior desiderato dos Consórcios Públicos, e neste caso

importante recorrermos a doutrina administrativista com o fito de auxiliar na análise acerca

do alcance do termo “serviços públicos”, abaixo conceituado:

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“todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado”

1.

“toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material, destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo”.

2

Todos conceitos retromencionados guardam assento comum na medida em que sinalizam

que prestação estatal deve objetivar a satisfação de necessidades coletivas; atendidas

estas, portanto, estar-se-ia diante de um típico serviço público, podendo, portanto, ser

gerido de forma associada.

Nesta toada, portanto, não haveria óbice para a criação de consórcios públicos para

prestação de serviços nas áreas da saúde (hospitais intermunicipais), educação pré-

escolar e de ensino fundamental (escolas intermunicipais), saneamento (usinas

intermunicipais de tratamento e reciclagem de resíduos urbanos, estações intermunicipais

de tratamento de água e esgoto etc), transportes coletivos (concessão de serviços de

transportes coletivos prestados em nível intermunicipal), fornecimento de energia elétrica

(intermunicipalização da concessão do serviço de fornecimento de energia elétrica),

iluminação pública (intermunicipalização do serviço de iluminação pública), porque todos

estes serviços guardariam estrita observância com os interesse coletivos; ao passo que

atividades que são meramente operacionais e que se integram à rotina

administrativa da máquina pública, sobretudo aquelas que integram a atividade

meio do município, não poderiam ser objeto de consórcios públicos.

As atividades/serviços meio se revestem de interesse institucional, como por

exemplo, serviços de publicidade, propaganda, limpeza de prédios públicos,

contábeis, advocatícios, consultoria diversas, treinamento, capacitação, visando,

1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28. ed. atual., Malheiros: São Paulo,

2003, p 319. 2 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15.ed. ref. ampl. e atual..

São Paulo: Malheiros, 2003, p 612.

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portanto, o aperfeiçoamento institucional, mas, de outro modo, dissociados do

principal objetivo dos Consórcios: a satisfação dos interesses coletivos.

Logo, o leque de serviços prestados estabelecidos no dispositivo contratual supracitado

deve guardar correlação direta com os objetivos estabelecidos no art. 3º do Decreto nº

6.017/07 que “dispõe sobre normas gerais de contratação de consórcios públicos”:

DA CONSTITUIÇÃO DOS CONSÓRCIOS PÚBLICOS Seção I - Dos Objetivos

Art.3o Observados os limites constitucionais e legais, os objetivos dos consórcios públicos serão determinados pelos entes que se consorciarem, admitindo-se, entre outros, os seguintes: I - a gestão associada de serviços públicos; II- a prestação de serviços, inclusive de assistência técnica, a execução de obras e o fornecimento de bens à administração direta ou indireta dos entes consorciados; III - o compartilhamento ou o uso em comum de instrumentos e equipamentos, inclusive de gestão, de manutenção, de informática, de pessoal técnico e de procedimentos de licitação e de admissão de pessoal; IV - a produção de informações ou de estudos técnicos; V - a instituição e o funcionamento de escolas de governo ou de estabelecimentos congêneres; VI - a promoção do uso racional dos recursos naturais e a proteção do meio-ambiente; VII - o exercício de funções no sistema de gerenciamento de recursos hídricos que lhe tenham sido delegadas ou autorizadas; VIII - o apoio e o fomento do intercâmbio de experiências e de informações entre os entes consorciados; IX - a gestão e a proteção de patrimônio urbanístico, paisagístico ou turístico comum; X - o planejamento, a gestão e a administração dos serviços e recursos da previdência social dos servidores de qualquer dos entes da Federação que integram o consórcio, vedado que os recursos arrecadados em um ente federativo sejam utilizados no pagamento de benefícios de segurados de outro ente, de

forma a atender o disposto no art. 1o, inciso V, da Lei n

o 9.717, de 1998;

XI - o fornecimento de assistência técnica, extensão, treinamento, pesquisa e desenvolvimento urbano, rural e agrário;

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XII- as ações e políticas de desenvolvimento urbano, sócio-econômico local e regional; e XIII- o exercício de competências pertencentes aos entes da Federação nos termos de autorização ou delegação.

Retornando ao debate quanto ao espectro de alcance da expressão “serviço público”,

Maria Sylvia Zanella Di Pietro com eloquência ímpar a define como:

“[…] toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público”

3. (grifo nosso)

Juarez Freitas, por sua vez, conceitua “serviço público” como o conjunto de atividades

essenciais, assim consideradas pelo ordenamento jurídico, prestadas diretamente pelo

Poder Público ou mediante delegação executória “lato sensu”, tendo em vista atender ao

interesse geral e sob regime dos princípios constitucionais de Direito Administrativo4.

Portanto, se pode depreender, à luz dos conceitos supra firmados, que serviço público é

todo o serviço de interesse comum prestado pelo estado, fruível e mensurável de

forma individual pelos administrados.

Tais características acima citadas possibilitam, quanto aos serviços públicos, a cobrança

de tarifas e preços públicos pelos consórcios públicos, uma vez que essa cobrança

somente é possível quando incide em serviços de interesse comum que possam ser

fruídos e, portanto, mensurados de maneira individualizada, que não se amoldam aos

serviços prestados por alguns consórcios já existentes nos municípios da Bahia,

tais como: gestão administrativa, financeira, contábil, jurídica, consultoria, assessoria e

assistência técnica, tecnologia da informação, capacitação e treinamento, auditoria

operacional em situação de emergência e calamidade.

3 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p 99.

4 FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos. 3º ed. rev. e amp.. São Paulo: Malheiros,

2004.

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O Decreto nº 6.017/07 em seu art. 2º define o alcance da expressão “serviço público”:

“XIV - serviço público: atividade ou comodidade material fruível diretamente pelo usuário,

que possa ser remunerado por meio de taxa ou preço público, inclusive tarifa”.

É imperioso ainda registrar que o referido Decreto regulamentador da Lei nº 11.107/05 –

Lei dos Consórcios fulmina qualquer controvérsia acerca dos objetivos primários dos

Consórcios associando, ao utilizar expressões como: “taxa”, “preço público” e 'tarifa” a

serviços públicos que são apenas possíveis de concretizá-los, mais uma vez

asseverando, quando guardam correlação com ATIVIDADE FIM. Nesta direção, cumpre

registrar o magistério da renomada administrativista Odete Medauar, que afirma

categoricamente que “as atividades-meio não se incluem na acepção técnica de

serviço público”:

“[...] diz respeito a atividade realizada no âmbito das atribuições da Administração, inserida no Executivo. E refere-se à atividade prestacional, em que o poder público propicia algo necessário à vida coletiva, como por exemplo: água, energia elétrica, transporte urbano. As atividades-meio, por exemplo: arrecadação de tributos, serviços de arquivo, limpeza de repartições, não se incluem na acepção técnica de serviço público”5. (grifo nosso)

Desta forma, os Consórcios, à luz da Lei nº 11.107/05 e Decreto nº 6.017/07, devem estar

associados a uma ação estatal visando a SATISFAÇÃO DOS INTERESSES COLETIVOS,

que se concretizam através de SERVIÇOS PÚBLICOS, pautados, por sua vez, em

AÇÕES TIPICAMENTE ESTATAIS, que integram, portanto, a ATIVIDADE FIM do ente.

É forçoso concluir, portanto, que o art. 241 da Carta de Outubro e a Lei dos Consórcios

visaram, de forma incondicionável, que estes fossem utilizados, consoante as célebres

lições de Maria Sylvia Zanella Die Pietro6, “quando a pessoa jurídica pública não pudesse

ou tivesse dificuldades de executar sozinha o serviço, tornando-se possível ou mais

eficiente tal execução mediante a conjugação de esforços”.

5 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora

Revista dos Tribunais, 2000, p 368. 6 Conforme artigo extarído do sítio http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-6-JUNHO-2006-

MARIA%20SILVIA.pdf. Acesso em 18.10.2016.

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TEMA 02: CONSULTA. POSSIBILIDADE DE ANULAÇÃO DE JULGAMENTO

REALIZADO PELA CÂMARA SOBRE AS CONTAS ANUAIS DO PREFEITO.

EXERCÍCIO DE 2008. FUNDAMENTAÇÃO. CASSAÇÃO DE VEREADOR NO PERÍODO

CONCOMITANTE AO JULGAMENTO DAS CONTAS. ILEGALIDADE DA CASSAÇÃO.

RECONHECIMENTO PELO PODER JUDICIÁRIO.

- Do enfrentamento jurídico7

A atual Presidente da Câmara Municipal de xxxxxx solicita que este Colegiado de Contas

ofereça um pronunciamento acerca da possibilidade daquele Poder Legislativo proceder à

anulação administrativa, ou seja, interna corporis, do julgamento levado a efeito em data

de xxxxxx por aquela Edilidade em relação às contas anuais do Chefe do Poder Executivo

Municipal relativas ao exercício de xxxxx, as quais resultaram aprovadas pela Câmara em

epígrafe naquela ocasião, em contrariedade ao Parecer Prévio desta Corte de Contas,

que as havia rejeitado.

A pretensão de anulação do julgamento das aludidas contas pela Câmara se acha

fundamentada na alegação de que a sua legalidade teria sido maculada pois o

julgamento teria sido realizado logo após a cassação do Vereador xxxxxx através de

Decreto Legislativo n.º xx/xxxx, ato de cassação este cuja ilegalidade foi reconhecida

através de decisão judicial proferida pelo Juízo da Comarca de xxxxxx no Mandado de

Segurança n.º xxxxxxxx impetrado pelo Edil cassado, e cujo transito em julgado já se

perfez, consoante certidão que anexa às fls. xxxxxx.

É sabido que a este Tribunal de Contas, em desincumbência à sua missão constitucional

(art. 31, § 1º da Cf) de auxiliar o Poder Legislativo Municipal a exercer o controle externo

do Município, compete, dentre outras tantas, a atribuição de apreciar, ou seja, emitir

parecer prévio sobre as contas anuais dos chefes do Poder Executivo municipal (art. 91, I

7 Texto adaptado com base no parecer emitido pela Assessoria Jurídica do TCM/BA.

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da Carta Estadual c/c art. 1º, I da Lei Orgânica do TCM).

Igualmente sabido é que o pronunciamento técnico de caráter opinativo (parecer prévio)

produzido pelo Tribunal de Contas em face das contas anuais do prefeito resulta de uma

apreciação absolutamente técnica, que subsidiará o julgamento político a ser realizado

pela Câmara Municipal, conquanto a Constituição Federal (art. 31, caput) estabeleceu que

é do Legislativo Municipal a prerrogativa de exercer o controle externo do Município.

Tal premissa se acha consagrada pelo teor da disposição inserta no art. 31, § 2º da Lei

Magna, segundo a qual “O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas

que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois

terços dos membros da Câmara Municipal.”.

Por isso, percebe-se, sem dificuldades, que no que se refere à apreciação das contas

anuais do Prefeito, a competência deste Tribunal de Contas se exaure com a emissão do

correspondente parecer prévio, e a sua subsequente submissão ao crivo do Poder

Legislativo Municipal, obviamente, após esgotadas todas as oportunidades de defesa e

recurso admissíveis no âmbito desta Corte.

O consectário lógico que se extrai do tratamento conferido pela Constituição à espécie, é

o de que a partir do momento em que o Tribunal de Contas se desincumbe da

competência de submeter ao Poder Legislativo Municipal o parecer prévio ofertado em

face das contas do Prefeito, esgota-se a atuação da Corte em relação ao assunto,

cabendo ao Legislativo Municipal julgar as contas, mantendo ou não a recomendação

contida no parecer prévio do Colegiado de Contas.

Dentro deste contexto imposto pela Constituição Federal, se afigura nítido que não cabe

ao Tribunal de Contas se imiscuir nos desdobramentos do processo de julgamento

realizado pelo Legislativo Municipal em face das contas anuais do Chefe do Poder

Executivo, e manifestar-se acerca da legalidade e legitimidade da deliberação da Câmara.

Todavia, é indene de dúvidas que a deliberação do Poder Legislativo Municipal acerca

das contas anuais do Prefeito não escapa ao controle do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV

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da CF), razão pela qual poderá a decisão legislativa ser revista na Instância Judiciária,

mas não no que diz respeito ao seu mérito, eis que em tais situações a apreciação do

Judiciário está limitada à verificação da observância de aspectos formais e materiais

atinentes à legalidade do ato, e cuja ausência possam implicar na sua nulidade.

No caso vertente, infere-se da leitura da Decisão Liminar trazida aos autos às fls. xxxx,

que o objeto do Mandado de Segurança do qual sobreveio aquela Decisão consistiu na

presença de nulidades no processo administrativo que motivou o ato de cassação

(Decreto Legislativo n.º xx/xxxx) do Vereador xxxxx, vícios os quais conduziram o

Judiciário local a determinar a suspensão dos efeitos do aludido Decreto Legislativo de

cassação, e a consequente recondução do vereador cassado ao exercício do mandato.

Nota-se, assim, que a Decisão Judicial proferida no Mandado de Segurança tratou e

reconheceu tão somente a ilegalidade da cassação do Edil, e determinou a restituição do

seu mandato. A Decisão não adentrou ao mérito da legalidade da sessão legislativa em

que se deu a deliberação sobre as contas anuais do Prefeito no exercício de 2008, e

tampouco reconheceu nulidade da correspondente deliberação da Câmara em relação

aquelas contas. E de outro modo não poderia ser, já que este fato sequer integrou o

objeto da lide apreciada naquele Mandado de Segurança.

Ou seja, o único ato cuja ilegalidade foi reconhecida pela mencionada Decisão Judicial

foi o Decreto Legislativo de cassação do Vereador. Todos os demais atos administrativos

praticados pelo Poder Legislativo Municipal no período em que esteve cassado o Edil

sequer foram questionados no Mandado de Segurança do qual adveio aquela Decisão

Judicial.

Nesse trilho, verifica-se que a Decisão Judicial proferida no multicitado Mandado de

Segurança não tem o condão de legitimar a ora pretendida anulação da deliberação

tomada pela Câmara em apreço em relação às contas anuais do exercício de 2008,

porquanto dita Decisão Judicial não tratou da legalidade da deliberação da Câmara que,

anuindo com o Parecer Prévio desta Corte, rejeitou aquelas contas.

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Nesse espectro, na medida em que exorbita a competência deste Tribunal de Contas

imiscuir-se no julgamento efetuado pela Câmara Municipal sobre as contas anuais do

Prefeito, e, considerando que a deliberação tomada pelo Poder Legislativo em relação

àquelas contas, em que pese se dê no âmbito de um processo político, também opera a

coisa julgada administrativa, e por isso mesmo também é alcançada pelo princípio da

imutabilidade estatuído à cláusula pétrea do art. 5º, XXXVI da Norma Fundamental,

pensamos que a pretensão ora apresentada pela missivista acerca da anulação daquele

julgamento poderá, acaso assim entenda necessário a dirigente da Câmara Municipal, ser

submetida à apreciação pelo Poder Judiciário, por ser a instância competente para

apreciar a possibilidade de anulação do julgamento, evidentemente, acaso

comprovadamente este tenha se dado com vício de essência formal ou material que

acarrete a sua nulidade absoluta.

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TEMA 03: REDUÇÃO PELO PODER JUDICIÁRIO DE VALORES RELATIVOS ÀS

MULTAS E RESSARCIMENTOS ORIUNDOS DE DECISÕES EXARADAS PELOS

TRIBUNAIS DE CONTAS. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL

ATRIBUÍDA ÀS CORTES DE CONTAS PARA APLICAÇÃO DE PENALIDADES

PECUNIÁRIAS.

A autorização constitucional concedida aos Tribunais de Contas, para aplicação de

penalidades no exercício do poder fiscalizatório, impossibilita acordos judiciais de redução

do valor nominal das penalidades indicadas nas decisões exaradas pelos respectivos

órgãos de controle, sobretudo, nos casos, de AÇÕES DE RESSARCIMENTO (Débito),

em face da sua natureza compensatória.

Ab initio, cabe considerar que o Poder Judiciário, conforme Termo de Acordo apensado às

fls. xx/xx, promovera redução do valor nominal do ressarcimento imputado ao vereador,

em decisão exarada por esta Corte de Contas, o que se revela, constitucionalmente

indevido, tendo em vista os motivos a seguir descritos.

Enfrentando a matéria de fundo, consubstanciada pela redução ofertada pelo Poder

Judiciário, verifica-se que o referido procedimento não encontra amparo constitucional,

uma vez que não cabe anistia, isenção, remissão, redução ou até mesmo extinção

de dívidas oriundas de penalidades pecuniárias constantes em decisões exaradas

no âmbito das Cortes de Contas, decorrentes do exercício fiscalizatório atribuído

constitucionalmente às mesmas. Não se pode olvidar, inclusive, que estas que gozam de

autonomia institucional, facilmente identificável no dispositivo constitucional abaixo

transcrito:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: […] VIII- aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário;

[…] § 3º As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo.

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Não é demais salientar que quanto à aplicação de MULTA e imputação do

RESSARCIMENTO, estas se encontram resguardo no inciso II do art. 71 e art. 73 da Lei

Complementar n° 06/91 – Lei Orgânica do TCM, que estabelece a referida imputação em

casos de infração de natureza financeira ou de outra natureza:

Art. 68 - Verificada a ocorrência de débito, resultante de irregularidade em processo de prestação de contas, o Tribunal de Contas dos Municípios definirá a responsabilidade individual ou solidária pelo ato de gestão inquinado e ordenará a notificação do responsável para, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da publicação da mesma, apresentar defesa ou recolher a quantia devida. (grifos nossos)

Art. 71 - O Tribunal de Contas dos Municípios poderá aplicar multas cujos valores encontrem-se dentro dos limites de multas fixados, anualmente e no mês de dezembro pelo Tribunal Pleno, para vigência no exercício subsequente, aos responsáveis por: II - ato praticado com grave infração à norma legal ou regulamento de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial; […] Art. 73 - As infrações às leis e regulamentos relativos à administração financeira, orçamentária, contábil, operacional ou patrimonial, poderá sujeitar os seus autores às multas previstas nesta Lei, independentemente de outras sanções de natureza disciplinar, civil ou criminal. […] Art. 76 - Nos casos de ilegalidade da despesa, irregularidade de contas ou descumprimento de suas decisões, o Tribunal de Contas dos Municípios poderá, ainda, adotar as providências abaixo relacionadas, na conformidade do caso: […] III - determinar: c) o ressarcimento imediato do patrimônio público municipal, corrigido monetariamente e acrescido dos juros de lei; (grifos nossos) ci)

No caso analisado por esta Unidade Jurídica, os valores envolvidos se referem a devida

promoção de RESSARCIMENTO aos cofres públicos por vereador, imputação essa que

tem uma função meramente COMPENSATÓRIA, visando, precipuamente, a reparação

dos prejuízos causados ao patrimônio público por atos ilícitos, atos de improbidade

ou meros atos de gestão ilícita de dinheiro público; o que legitima, mais uma vez

asseverando, a cobrança dos valores por este Tribunal de Contas.

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No âmbito ainda do compêndio normativo interno desta Corte de Contas, cumpre

considerar as claras determinações contidas na Resolução TCM n° 1125/05, que

disciplina “dispõe sobre os ressarcimentos, no âmbito do Tribunal de Contas dos

Municípios, a serem efetuados por gestores municipais, ou responsáveis”:

Art. 1º O gestor, ou o responsável, a quem for imputado débito terá de ressarcir a importância devida, corrigida monetariamente e acrescida de juros legais, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados do trânsito em julgado da decisão, não sendo admitido parcelamento a qualquer título.(grifo nosso)

O ressarcimento de valores se reveste de uma consequência patrimonial-

compensatória da aplicação de uma penalidade, e devem incorporar de imediato, o

disponível da entidade, cuja a análise das contas à época redundara na

determinação do RESSARCIMENTO; cabendo, de outro giro, ressalte-se, em caso

de não realização deste, a cobrança judicial pelo executivo municipal, conforme

expressa previsão contida no art. 4° da Resolução TCM retromencionada.

Art. 4º Não havendo o ressarcimento do débito, no prazo estabelecido, o Tribunal encaminhará ao Ministério Público o título executivo (Deliberação) com vistas à correspondente execução judicial, sem prejuízo das providências de cobrança judicial a serem adotadas pelo chefe do Poder Executivo.

A referida redução oferecida pelo Poder Judiciário viola também outro dispositivo

constitucional, que afasta uma possível prescrição nos casos de AÇÕES DE

RESSARCIMENTO, conforme se verifica abaixo:

Art. 37. […] § 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento. (grifo nosso)

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Desta forma, se depreende, de forma inequívoca, que a ressalva constitucional eleva o

RESARCIMENTO a um patamar quase inalcançável, a afastar a possibilidade de

Prescrição, e neste caso, imperioso concluir que a manutenção do seu valor nominal

(tendo em vista a redução deste pelo Poder Judiciário através de Acordo Judicial), assim

como a subsequente correção e atualização dos valores referentes aos ressarcimentos a

serem promovidos pelos gestores se mostram indispensáveis para que os valores

retornem aos cofres públicos considerando a perda aquisitiva da moeda.

No âmbito doutrinário, releva notar as célebres lições do Prof. LUIZ BERNARDO DIAS

COSTA, quanto a competência sancionadora dos Tribunais de Contas:

[…] a competência cognominada de sancionadora, onde se atribui aos Tribunais de Contas a possibilidade de aplicação de multas àqueles Administradores Públicos que incorrem em irregularidades ou ilegalidades, é fundamental para garantir o ressarcimento de prejuízos causados, bem como inibir tais transgressões.

8

Cumpre ressaltar, mesmo não sendo o objeto de discussão deste parecer, que no caso

de MULTA, esta se revela em um importante mecanismo na consecução dos valores

constitucionais pelos Tribunais de Contas, pois de nada adiantaria instituí-los, fixar-lhes as

competências, sem dotá-los de um poder sancionador, tendo em vista a necessidade do

Estado de garantir a execução das obrigações que fixou. Nesta direção, assevera

CASTARDO:

O interesse em punir o agente que agiu com interesses egoísticos e lesou o patrimônio público, dentro do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, no qual se apuram fatos que levaram à conclusão determinante da imputação de débito ou multa, é da sociedade, não de um ente político

9.

8 COSTA, Luiz Bernardo Dias. Tribunal de Contas: evolução e principais atribuições no Estado

Democrático de Direito. Belo Horizonte: Fórum, 2006. p.108. 9 CASTARDO, Hamilton Fernando. O Tribunal de Contas no ordenamento jurídico brasileiro.

Campinas,SP: Millennium Editora, 2007. p.102.

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Desta forma, a autorização constitucional concedida às Cortes de Contas impossibilita a

redução do valor nominal do débito/ressarcimento ou até mesmo da multa, previstos

nas decisões exaradas pelos respectivos órgãos de fiscalização nos casos, sobretudo, de

AÇÕES DE RESSARCIMENTO, em razão da sua autonomia, requisito este, que forma

lapidar é tratado pelo Prof. JOSÉ PEREIRA DE CASTRO:

Trata-se, portanto, de órgão de estatura e dignidade constitucionais, imprescindível na estrutura republicana e democrática do Estado, independente e autônomo, ao qual compete a fiscalização de todos os atos e condutas dos gestores da vida coletiva, e que, em virtude de sua singular posição na tessitura institucional do Estado, é tido como detentor de competência política, a par dos demais órgãos de cúpula do Estado. Diga-se: os gestores da vida e dos bens pertencentes à coletividade prestam contas ao Tribunal de Contas, demonstrando, diante deste órgão específico, como, quando, onde e, mais importante, por que agiram.

10

Não obstante o que fora acima afirmado, o fato é que as decisões dos Tribunais de

Contas que impõem multa e determinam ressarcimento pelos responsáveis por

ilegalidade de despesa ou irregularidades de contas têm eficácia de título executivo e têm

natureza jurídica de multa administrativa, que se não executada pelos órgãos legitimados,

dão interesse processual para que os Tribunais de Contas recorram ao Judiciário para

que se executem suas decisões, dando máxima efetividade ao texto constitucional.

Ainda, consoante prescreve o § 6º do art. 150 da vigente Carta da República, que a

concessão de qualquer subsídio ou isenção, de crédito presumido, anistia, remissão e

redução de base de cálculo, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser

efetivada mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule

exclusivamente as matérias enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, o

que não se aplica às penalidades pecuniárias aplicadas pelos Tribunais de Contas, visto

que as sanções apresentam natureza administrativa, não tributária, e tem rito próprio, não

sendo alcançada pelo controle tributário de nenhum ente estatal.

10

DE CASTRO, José Ricardo Parreira. Tribunal de Contas e Cidadania. Revista do Tribunal de

Contas do Município do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n.47, p.19-25.

Page 16: TEMA 01: CONSÓRCIO PÚBLICO. POSSÍVEL … · “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material, destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível

Por fim, assim, as aplicações pecuniárias administrativas aplicadas pelos Tribunais de

Contas (débito/ressarcimento ou multas) não se confundem com as multas civis, penais

ou até mesmo tributárias, e no caso desta Corte de Contas, regular-se-ão as multas e os

ressarcimentos através das Resoluções TCM nº 1.124/05 e 1.125/05, respectivamente.

Esta Nota Técnica visa colaborar com a Presidência, Conselheiros, Ministério

Público de Contas e técnicos deste tribunal na busca de decisões que se coadunem

com a Jurisprudência e Doutrina pátrias, e com vistas ao atendimento das

premissas estabelecidas na Constituição Federal de 1988.