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SUPERAÇÃO DO VITALlSMO E O IMPARÁVEL DESENVOLVIMENTO DA SíNTESE ORGÂNICA FÁTIMA PAIXÃ0 1 ,* E MARlEnE M. PEREIRA 2 A síntese orgânica representou um marco capital na História da Química, conduzindo ao fim da filosofia vitalista que considerava que as substâncias constitutivas dos animais e das plantas eram de natureza diferente dos corpos minerais, não obedecendo às mesmas leis, nem podendo ser feitas em laboratório. Quase dois séculos volvidos, a filosofia emergente é, agora, a de uma síntese verde, ambientalmente mais sustentável. Se o ano de 1789, com a publicação do Tratado Elementar de Química, de Lavoisier, marca, verdadeiramente, o nascimento da Química moderna, o desenvolvimento desta ciência, a partir do século XIX, foi assombroso para a humanidade. No início desse século, a diferença entre Química Mi- neral e Química Orgânica, que dava à segunda o domínio das substâncias cuja origem era um ser vivo, animal ou planta, era codificada numa filosofia vitalista que atribuía exclusivamente à vida, através de um criador, a possibi- lidade da existência de tais materiais que não poderiam ser feitos em labo- ratório [1, 2]. Berthollet e, ao mesmo tempo, Lavoi- sier, mostraram que as substâncias orgânicas, afinal, contém elementos conhecidos como o carbono, o hidro- génio, o oxigénio e, por vezes, o azo- to ou mesmo outros elementos. Cerca de 1811, Gay-Lussac e Thénard rea- lizaram algumas análises quantitati- vas em corpos orgânicos e, em 1823, Chevreul isolava e identificava com- pletamente a composição dos ácidos gordos de origem animal e da glice- rina [1]. O resultado prático imediato foi a substituição da candeia de sebo pela vela de estearina. Seguiram- se, entre outras, as identificações da morfina (extraída do ópio e com forte acção analgésica), da quinina (extraí- da da chinchona e usada nas águas ':Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico de Castelo Branco; E-mail: [email protected] a Departamento de Quimica, Rua Larga, 3004-535 Coirn- bra, Universidade de Coimbra QUíMICA 120 - JAN/MAR 11 tónicas), da estricnina (extraída da noz vómica e conhecido veneno para ratos) ... Os métodos de análise orgâ- nica foram desenvolvidos depois de 1830, por Liebig. Tratava-se apenas, nestes processos, de decompor as substâncias e de reconhecer os seus constituintes; a reconstituição, ou seja, a síntese, permanecia impraticada e, segundo as ideias vitalistas, imprati- cável. Assim, se os compostos orgâni- cos não podiam ser feitos em labora- tório e precisavam de uma força vital, seria legítima a dúvida relativa a que leis obedeceriam tais corpos. A res- posta viria a estar, afinal, no percurso da Química Orgânica, no seu desen- volvimento ao longo do século XIX. Um passo largo no caminho do de- senvolvimento da Química Orgânica foi dado por Berzelius (1779-1848), químico sueco, experimentalista notá- vel que levou a cabo inúmeras análi- ses e descobriu o selénio e o tório e isolou o cálcio, o silício, o vanádio e o zircónio. Em 1826, publicou a pri- meira tabela de pesos atómicos com quarenta e dois elementos e de uma extraordinária precisão. A ele se deve a utilização das representações dos símbolos pela primeira letra ou pelas duas primeiras do nome em latim da substância simples e a introdução das noções de isomeria e de polimeria. Si- multaneamente ao estudo, em 1823, em Paris, por Liebig, do fulminato de prata, o alemão Wohler, no laboratório de Berzelius, em Estocolmo, ao ana- lisar o cianeto de prata, encontrou a mesma fórmula química. Berzelius, alertado, dispôs-se a repetir exausti- vamente as análises até que cedeu à ideia de que corpos diferentes po- diam ter a mesma composição quími- ca, ou seja, serem isómeros entre si. Em 1827, este químico explicava as diferenças das propriedades dos dois compostos como resultado de duas diferentes forças vitais. E, sempre guiado pelo seu paradigma, desco- briu, ainda, a catálise, uma combina- ção na qual um certo corpo saía das reacções tal como entrara. O maior inimigo de Berzelius foi o francês Dumas (1800-1884), a quem se chama, com grande frequência, o fundador da Química Orgânica, e com quem aquele se viria a cruzar nas polémicas das interpretações te- óricas que opunham o vitalismo eo 'atornisrno naturalista. Dumas tornou- se ilustre pelos trabalhos sobre o ál- cool metílico, o anil, o álcool amílico, os amidos, os adubos, ou seja, no do- mínio então privilegiado da Química Orgânica. E se Dumas foi o pai da Química Orgânica, estava reservado a Woh- ler a execução da primeira síntese orgânica que teve lugar no mundo. Em 1824, este químico sintetizou o ácido oxálico a partir de substâncias minerais e, no ano de 1828, seria sin- tetizada a ureia sem necessidade de rins ou, sequer, de qualquer ser vivo. Apesar disto, Berzelius continuava, ainda, firme na defesa do vitalismo e considerava as novas teorias emer- gentes como perigosas extrapolações filosóficas. Na sua ideia, mesmo que 39

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SUPERAÇÃO DO VITALlSMO E O IMPARÁVEL DESENVOLVIMENTODA SíNTESE ORGÂNICA

FÁTIMA PAIXÃ01,* E MARlEnE M. PEREIRA2

A síntese orgânica representou um marco capital na História da Química, conduzindo aofim da filosofia vitalista que considerava que as substâncias constitutivas dos animais e dasplantas eram de natureza diferente dos corpos minerais, não obedecendo às mesmas leis,nem podendo ser feitas em laboratório. Quase dois séculos volvidos, a filosofia emergenteé, agora, a de uma síntese verde, ambientalmente mais sustentável.

Se o ano de 1789, com a publicaçãodo Tratado Elementar de Química, deLavoisier, marca, verdadeiramente,o nascimento da Química moderna,o desenvolvimento desta ciência, apartir do século XIX, foi assombrosopara a humanidade. No início desseséculo, a diferença entre Química Mi-neral e Química Orgânica, que davaà segunda o domínio das substânciascuja origem era um ser vivo, animal ouplanta, era codificada numa filosofiavitalista que atribuía exclusivamente àvida, através de um criador, a possibi-lidade da existência de tais materiaisque não poderiam ser feitos em labo-ratório [1, 2].

Berthollet e, ao mesmo tempo, Lavoi-sier, mostraram que as substânciasorgânicas, afinal, contém elementosconhecidos como o carbono, o hidro-génio, o oxigénio e, por vezes, o azo-to ou mesmo outros elementos. Cercade 1811, Gay-Lussac e Thénard rea-lizaram algumas análises quantitati-vas em corpos orgânicos e, em 1823,Chevreul isolava e identificava com-pletamente a composição dos ácidosgordos de origem animal e da glice-rina [1]. O resultado prático imediatofoi a substituição da candeia de sebopela vela de estearina. Seguiram-se, entre outras, as identificações damorfina (extraída do ópio e com forteacção analgésica), da quinina (extraí-da da chinchona e usada nas águas

':Escola Superior de Educação, Instituto Politécnico deCastelo Branco;E-mail: [email protected]

a Departamento de Quimica, Rua Larga, 3004-535 Coirn-bra, Universidade de Coimbra

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tónicas), da estricnina (extraída danoz vómica e conhecido veneno pararatos) ... Os métodos de análise orgâ-nica foram desenvolvidos depois de1830, por Liebig. Tratava-se apenas,nestes processos, de decompor assubstâncias e de reconhecer os seusconstituintes; a reconstituição, ou seja,a síntese, permanecia impraticada e,segundo as ideias vitalistas, imprati-cável. Assim, se os compostos orgâni-cos não podiam ser feitos em labora-tório e precisavam de uma força vital,seria legítima a dúvida relativa a queleis obedeceriam tais corpos. A res-posta viria a estar, afinal, no percursoda Química Orgânica, no seu desen-volvimento ao longo do século XIX.

Um passo largo no caminho do de-senvolvimento da Química Orgânicafoi dado por Berzelius (1779-1848),químico sueco, experimentalista notá-vel que levou a cabo inúmeras análi-ses e descobriu o selénio e o tório eisolou o cálcio, o silício, o vanádio eo zircónio. Em 1826, publicou a pri-meira tabela de pesos atómicos comquarenta e dois elementos e de umaextraordinária precisão. A ele se devea utilização das representações dossímbolos pela primeira letra ou pelasduas primeiras do nome em latim dasubstância simples e a introdução dasnoções de isomeria e de polimeria. Si-multaneamente ao estudo, em 1823,em Paris, por Liebig, do fulminato deprata, o alemão Wohler, no laboratóriode Berzelius, em Estocolmo, ao ana-lisar o cianeto de prata, encontrou amesma fórmula química. Berzelius,

alertado, dispôs-se a repetir exausti-vamente as análises até que cedeuà ideia de que corpos diferentes po-diam ter a mesma composição quími-ca, ou seja, serem isómeros entre si.Em 1827, este químico explicava asdiferenças das propriedades dos doiscompostos como resultado de duasdiferentes forças vitais. E, sempreguiado pelo seu paradigma, desco-briu, ainda, a catálise, uma combina-ção na qual um certo corpo saía dasreacções tal como entrara.O maior inimigo de Berzelius foi ofrancês Dumas (1800-1884), a quemse chama, com grande frequência,o fundador da Química Orgânica, ecom quem aquele se viria a cruzarnas polémicas das interpretações te-óricas que opunham o vitalismo e o'atornisrno naturalista. Dumas tornou-se ilustre pelos trabalhos sobre o ál-cool metílico, o anil, o álcool amílico,os amidos, os adubos, ou seja, no do-mínio então privilegiado da QuímicaOrgânica.

E se Dumas foi o pai da QuímicaOrgânica, estava reservado a Woh-ler a execução da primeira sínteseorgânica que teve lugar no mundo.Em 1824, este químico sintetizou oácido oxálico a partir de substânciasminerais e, no ano de 1828, seria sin-tetizada a ureia sem necessidade derins ou, sequer, de qualquer ser vivo.Apesar disto, Berzelius continuava,ainda, firme na defesa do vitalismo econsiderava as novas teorias emer-gentes como perigosas extrapolaçõesfilosóficas. Na sua ideia, mesmo que

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com o tempo se conseguisse produ-zir, com corpos inorgânicos, váriassubstâncias de composição análoga àdos produtos orgânicos, esta imitaçãoincompleta seria demasiado restritapara que se pudesse esperar produzircorpos orgânicos, tal como se conse-guia, na maior parte dos casos, confir-mar a análise dos corpos inorgânicosfazendo a sua síntese. Outros, comoGerhardt, embora considerassem assínteses realizadas por Wohler de-vidas ao acaso e não significativas,começavam já a considerar apenascomo momentânea a impossibilidadeda síntese orgânica.

De facto, a síntese da ureia mar-cou uma data capital na História daQuímica, sistematicamente eviden-ciando as incapacidades explicativasdas pretensões vitalistas. Contudo, al-guns dos mais convictos, mantinhama ideia de que o cianeto de amónio,com o qual se sintetizara a ureia,podia encerrar forças anímicas queseriam incorporadas na nova ureiaobtida. Finalmente, químicos comoKolbe e Berthelot sintetizariam com-postos orgânicos directamente a partirdos elementos químicos, os mesmosque também entravam nos compostosminerais, afastando, assim, a ideia dequalquer força anímica que separassea Química Orgânica da Química In-orgânica.

Podemos dizer que a intensa activida-de experimental que se desenvolvianos mais diversos domínios deu umprecioso contributo para ultrapassaras teorias vitalistas que começavama causar mais entraves do que a pro-porcionar avanços, por esse precon-ceito da impossibilidade da sínteselaboratorial de compostos orgânicos.Não é, efectivamente, desprezável oefeito retardador que estas ideias cau-saram na evolução da Química.

Na mesma caminhada ao longo doséculo XIX, logo no ano de 1801,Proust enunciara a lei das propor-ções definidas, constatando que umacombinação química determinada te-ria sempre a mesma composição. Talideia foi rebatida por Bertholet paraquem a composição quantitativa deuma combinação não era constante,mas antes dependente das quantida-des de reagentes intervenientes na

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reacção, pelo que as substâncias nãose combinariam numa proporção fixa(uma tal constatação advinha de errose imprecisões experimentais). Com oafã experimental de Berzelius, a pro-posta de Proust viria a triunfar.

Em muitas situações experimentaisconstatava-se, afinal, que, com fre-quência, dois elementos, ao combi-narem-se, davam lugar a mais queum composto. É Dalton quem analisaponderadamente estes processos eenuncia, em 1804, a lei das propor-ções múltiplas. Mas, se as leis pon-derais haviam sido estabelecidas, nãose tinha dado qualquer explicação sa-tisfatória sobre "a que é que elas sedeviam" e é aqui que entra a imagina-ção de Dalton para integrar essas leisponderais numa teoria que as expli-casse. Este químico retomou a ideiade constituição atómica da matéria,naturalmente que, desde logo, coma diferença introduzida pelo intervalotemporal que a separava da filoso-fia grega. Na nova proposta teórica,tudo se podia explicar considerandoque um determinado composto, semqualquer distinção pela sua natureza,se formava, sempre, pela união domesmo número de átomos de cadaum dos elementos que o integravam.Como cada tipo de átomo tinha umpeso constante, as relações em pesoeram inevitáveis.

É a partir de 1850 que a hipóteseatómica vai sendo progressivamenteadmitida e que adquire rapidamenteum conteúdo preditivo em todos osdomínios da Química, sem excepção.Digamos que a admissão e consolida-ção da teoria atómica representou, naQuímica, um segundo grande avanço,como que uma segunda revoluçãoquímica [3]. É, afinal, no ambiente ex-perimental da Química Orgânica que anova teoria acaba por sair reforçada,ao mesmo tempo que renova tambémesse domínio.

Kékulé (1829-1896), por meados doséculo XIX, já não podia dispensar ainterpretação atómica. Este químicoteve o mérito de tornar precisas cer-tas noções que se encontravam aindamuito vagas, voltando à organizaçãoda matéria e à organização dos áto-mos nas moléculas. Explicou a isorne-ria como reorganização dos átomos

nas moléculas e retomou a noção devalência, de um novo ponto de vista.O carbono tetravalente (descobertoem 1858 por Kékulé e por Couper si-multaneamente) conduz à riqueza doscompostos orgânicos. Sete anos de-pois, Kékulé imaginava a representa-ção hexagonal do benzeno onde nemtodas as valências do carbono esta-vam saturadas. Este ciclo fechadoteve como consequência um númerofantástico de derivados: a naftalina,sintetizada por Aronheim, o alfa-naftoldescoberto por Fitting, o estudo da an-tracina, da antraquinona, da piridina e,em geral, de todos os alcalóides.

Foi Wurtz (1817-1884) quem se fez,em França, profundo defensor do ato-mismo. Dumas, Saint-Claire Deville eBerthelot combateram, abertamente,o colega químico. Este último, nomeincontornável na epopeia da QuímicaOrgânica realizava em 1851 a síntesedo álcool metílico, primeira etapa deuma longa série de outras sínteses,das quais a do acetileno viria a ser amais memorável. Pela primeira vez,carbono e hidrogénio, na presençaum do outro, combinavam-se para darorigem ao acetileno. Estudou ainda aesterificação dos álcoois puros atra-vés dos ácidos, processo a que sedeve o éter sulfúrico da desinfecçãodas feridas e das anestesias. O seuespírito recusava-se, ainda, contudo,a admitir a hipótese atómica em quejá se baseavam todos os cálculos daindústria química.

Mas os vitalistas não conseguiam tra-var a carreira de Wurtz. Do laboratóriode Liebig este passou para a Facul-dade de Medicina de Paris e daí paraa Sorbonne, em 1875. Além da obrateórica em que se bate pelo atornis-mo, enriqueceu a Química Orgânicacom a síntese das aminas em 1849 edo glicol em 1856. A sua obra foi com-pletada por Karl Friedel (1832-1899)que, ouvindo Pasteur que ensinavana universidade de Estrasburgo so-bre os mistérios da cristalografia, seinteressou pela Química com as suaspesquisas sobre as cetonas e os al-deídos. Um tal trabalho valeu-lhe acondecoração da Legião de Honra.Sucedeu a Wurtz na cátedra de Quí-mica Orgânica da Sorbonne. Em 1877publicava um novo método geral desíntese dos hidrocarbonetos e das ce-

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tonas. Ao sintetizar a amilbenzina pormeio de um original processo de catá-lise com o cloreto de alumínio, Friedeldeu um impulso a toda a indústria quí-mica dos corantes e dos produtos far-macêuticos, ao mesmo tempo que be-neficiava a indústria da petroquímica.

A nova teoria atómica da matéria abri-ra caminho à noção de peso atómicoe sua determinação experimental,que seria base da classificação doselementos, em meados do século, darealização de um enorme e variadotrabalho experimental, do desenvolvi-mento dos diferentes ramos da Quí-mica e, afinal, do conhecimento daestrutura da matéria e da superaçãoda distinção entre matéria viva e ma-téria mineral.

Reforçando o atomismo e baseando-se no conceito de valência, a Química

Orgânica foi, com a Síntese, conduzi-da a um estado de desenvolvimentoque atingiu um ponto sem retorno. Oséculo XIX foi, como não podíamosdeixar de realçar, a era das grandessínteses que alcançaram todo o seuesplendor no século XX com o desen-volvimento massivo da síntese de po-límeros para novos materiais.

Os milagres dos químicos orgânicosforam as sínteses do plástico, dossilicones, das vitaminas, das horrno-nas, dos antibióticos ... Mas, podemosconsiderar que no século XXI o para-digma mudou e, da síntese orgânicatradicional, que centrava o seu estudomais na optimização dos rendimentosdo que na economia atómica e mini-mização de resíduos, existe uma filo-sofia emergente de síntese limpa/ver-de e ambientalmente sustentável que

ALlDADES CIENTíFICAS

,

O oxigénio é considerado o patinhofeio da ressonância magnética nucle-ar biomolecular. Apesar de ser um áto-mo chave na estrutura de proteínas eácidos nucleicos, a análise de outrosátomos importantes como carbono,hidrogénio, nitrogénio e fósforo é con-sideravelmente mais comum, já queos espectros l7O-NMR apresentam,tipicamente, resoluções reduzidas. Noentanto, num esforço de promover ooxigénio ao seu merecido lugar, inves-tigadores desenvolveram um métodoque possibilita um modo mais práticode obtenção de espectros 170-NMRde biomoléculas, com resoluçõesmuito superiores às conseguidas an-teriormente. O post-doc Jianfeng Zhue o espectroscopista NMR Gang Wuda Queen's University, em Kingston,Ontário, desenvolveram o procedi-mento referido (J. Am. Chem. Soc.,DOI: 10.1021/ja1079207). Wu e cola-boradores já tinham anteriormente re-portado o uso de campos magnéticosultra-fortes para a análise pioneira decomplexos proteína-ligantes por es-pectroscopia l7O-NMR em fase sólida

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PROMOVENDO O OXIGÉNIO

(Angew. Chem.lnt. Ed., DOI: 10.1002/anie.201 002041). Todavia, neste novotrabalho, foi desenvolvida uma técni-ca designada por transição centralde quadrupolo NMR que permite aextensão da análise 170-NMR de altaresolução a biomoléculas em soluçãoaquosa.

Ambos os estudos possibilitam o al-cance de níveis de resolução semprecedentes para 170-NMR, e o novométodo faculta um aumento de trêsordens de magnitude do limite de ta-manhos das biomoléculas acessíveisa análise NMR, em relação aos tra-balhos anteriores. Wu salienta que omais importante é o recurso à análiseem solução, porque possibilita o estu-do das moléculas biológicas no seumeio natural, em alternativa a uma es-trutura cristalina rígida. A execução de170-NMR revela-se problemático, por-que o 170 é um núcleo quadrupolar,que gera linhas espectrais NMR alar-gadas e de interpretação difícil. Zhu eWu lidaram com esta questão atravésda aplicação de campos magnéticosespecialmente intensos e do enfoque

recorre a processsos catalíticos maisselectivos e menos energéticos, sol-ventes alternativos menos poluentese, especialmente, já a reacções semsolvente [4, 5].

REFERÊNCIAS

[1] J. Rosmorduc, De Tales a Einstein.

História da Física e da Química, Edito-rial Caminho, Lisboa, 1983.

[2] H.W., Salzberg, From Caveman to

Chemist. Circumstances and Achieve-

ments, American Chemical Society,Washington, 1991.

[3] S. Esteban Santos, Introducción a la

Historia de la Química. UNED, Madrid,2001.

[4] G.w.v. Cave, C.L. Raston, J.L. Scott,Chem. Commun., (2001) 2159-2169.

[5] F.M.Silva, P.S.B.Lacerda, J. Jones Jú-nior, Quimica Nova 28 (2005)103-110.

em apenas um tipo de transição ener-gética NMR, designada por transiçãocentral. Estas estratégias, conjugadascom a tendência das biomoléculas detamanho elevado se movimentaremlentamente em solução (o que tendea minimizar o alargamento do sinal),permitiram uma redução das largurasdos sinais, aumentando significativa-mente a resolução do espectro.

A transição central de quadrupoloNMR pode ser usada no estudo deefeitos de ligação em deslocamentosquímicos de oxigénio, formação deintermediários de reacção contendooxigénio, ligações de ligandos comoxigénio a biomoléculas (como a liga-ção de oxalato a ovotransferrina, queconsiste no objecto de um novo estu-do). Wu e seus colaboradores prevê-em que a nova técnica seja aplicável acomplexos proteicos até 500 KDa.

(Adaptadodo artigo de 03/01/2011 de StuBorman: ElevatingOxygen,

Chemical & EngineeringNews, http://pubs.acs.org/cen/news/89/i011890 1notw4.html)

Paulo Brito ([email protected]) InstitutoPolitécnica de Bragança

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