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Súmula n. 134

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Súmula n. 134

SÚMULA N. 134

Embora intimado da penhora em imóvel do casal, o cônjuge do executado

pode opor embargos de terceiro para defesa de sua meação.

Referência:

CPC, arts. 669, parágrafo único, e 1.046.

Lei n. 4.121/1962, art. 3º.

Precedentes:

REsp 4.472-AM (3ª T, 30.10.1990 — DJ 26.11.1990)

REsp 13.479-SP (4ª T, 31.10.1991 — DJ 09.12.1991)

REsp 15.379-RJ (4ª T, 20.04.1993 — DJ 08.08.1994)

REsp 39.703-SP (3ª T, 28.02.1994 — DJ 18.04.1994)

Segunda Seção, em 26.04.1995

DJ 05.05.1995, p. 12.000

RECURSO ESPECIAL N. 4.472-AM (90.0007763-0)

Relator: Ministro Waldemar Zveiter

Recorrente: Banco Nacional de Crédito Cooperativo S/A

Recorrida: Alegria Salam de Araújo

Advogados: Antônio Zacarias Lindoso e outros, e Paulo Ramos de

Resende

EMENTA

Processual Civil. Execução. Penhora. Bem imóvel do casal. Meação.

Mulher casada. Embargos de terceiro. Art. 1.046, § 3º, do CPC, de 1973.

I - Embora intimada da penhora, pode a mulher casada defender

sua meação, de imóvel de propriedade do casal, através dos embargos

de terceiro, na forma preconizada no art. 1.046, § 3º, do CPC, em

execução, por dívida do marido.

II - No regime do CPC de 1973, este artigo dispõe, expressamente,

a equiparação do cônjuge a terceiro quando defende sua meação.

III - Precedentes do STF.

IV - Recurso conhecido pela letra c a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas:

Decide a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,

conhecer do recurso especial, mas lhe negar provimento, na forma do relatório e

notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do

presente julgado.

Brasília (DF), 30 de outubro de 1990 (data do julgamento).

Ministro Nilson Naves, Presidente

Ministro Waldemar Zveiter, Relator

DJ 26.11.1990

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

388

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Acórdão da Segunda Câmara do colendo Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, que negou provimento à apelação interposta pela ora recorrente, sumariado pela seguinte ementa (fl s. 79-82):

Embargos de terceiro. Mulher casada. Penhora de bem do casal por dívida do marido. Defesa da meação.

Não se confi gura a carência de ação da mulher casada, que, intimada da penhora de imóvel pertencente ao casal, em execução de título de dívida assinado unicamente pelo marido, comparece a juízo para defender a sua meação através de embargos de terceiro.

Infundada a argüição de inépcia da petição inicial dos embargos de terceiro, que omitiu a qualifi cação do embargado, se este contestou a ação e se identifi cou como o sujeito passivo da relação processual.

Com amplo respaldo na legislação e na jurisprudência, é assegurado à mulher casada o direito de livrar da constrição judicial a meação, que lhe é devida em imóvel pertencente ao casal, em execução de título de dívida contraída pelo marido, sem a sua outorga.

Recurso desprovido.

Recurso extraordinário, com argüição de relevância da questão federal, no qual se alega que o acórdão recorrido teria negado a vigência dos arts. 282,

II; 284; 295, VI; 592, IV; e 669, § 1º, todos do CPC, bem como, divergido da jurisprudência fi rmada no Pretório excelso (fl s. 84-90).

O extraordinário, convolado, ipso jure, em recurso especial (art. 105, III,

a e c, da Constituição), para exame da matéria infraconstitucional deduzida na argüição de relevância, foi admitido, apenas, pelo fundamento da alínea c, por despacho do nobre Presidente daquela Corte (fl s. 93-94).

Devidamente processado, subiram os autos a este Superior Tribunal de Justiça.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): O extraordinário, convertido,

ipso jure, em recurso especial, para exame da matéria infraconstitucional contida

na argüição de relevância.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 389

Como lido no relatório, alega o recorrente que o Acórdão recorrido teria negado a vigência dos arts. 282, II; 284, 295, VI; 592, IV; e 669, § 1º, todos do Código de Processo Civil, bem como, divergido do entendimento fi rmado na jurisprudência do Pretório excelso.

Quanto à pretensa violação aos dispositivos apontados, não se confi gura, eis que não foram eles sequer mencionados ou discutidos na decisão recorrida e nem suprida a omissão através de embargos declaratórios. Nesse particular, restou não prequestionada a matéria, o que impõe a incidência do enunciado das Súmulas n. 282 e 356 do egrégio Supremo Tribunal Federal. Por isso, inadmissível o recurso pela letra a, do permissivo constitucional.

Quanto ao dissenso jurisprudencial, logrou demonstrá-lo o recorrente, a teor do disposto do art. 255, parágrafo único, do RISTJ. Examino, pois, o especial pelo fundamento da letra c.

O ponto em que se controverte a quaestio juris é a viabilidade dos embargos de terceiro previstos no art. 1.046, § 3º, do CPC, para defender sua meação, quando a mulher casada for intimada da penhora de bem imóvel do casal, na execução, não tendo oferecido embargos do devedor.

A matéria não é pacífi ca, mas estou, no caso presente, em que a melhor orientação é a que admite os embargos de terceiro, em casos tais.

Dispõe o art. 1.046 da lei processual civil:

Art. 1.046. Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer lhes sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargos.

§§ 1º e 2º — omissis

§ 3º Considera-se também terceiro o cônjuge quando defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua meação.

Da leitura desse § 3º não vejo como se possa negar à mulher casada mesmo

quando intimada da penhora, sem que tivesse opostos embargos de devedor, o

direito de defender, na qualidade de terceiro, sua meação.

A propósito, lecionava Pontes (“Comentários ao Código de Processo Civil,”

Forense, Tomo XV, 1977, p. 21):

O cônjuge que não tem de sofrer execução, ou qualquer outra constrição dos seus bens, por dívidas do outro cônjuge, ou por motivo objetivo dos bens, ou das

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

390

dívidas, é terceiro, para se legitimar, ainda que esteja ele a conviver com o outro. Tudo se decide no plano da efi cácia quanto a ele. Se a dívida é incomunicável, os próprios bens comuns não podem sofrer constrição por dívidas do outro cônjuge.

Asseverou, ainda:

A primeira regra jurídica sobre a legitimação ativa do terceiro é a de que somente pode embargar como terceiro quem não tomou parte no feito (art. 1.046: “não sendo parte no processo”). (Obra citada, p. 23)

Mais adiante, ressaltou:

“A respeito dos cônjuges, pode ocorrer a comunhão de bens, de todos, de alguns ou de um só. Para os embargos de terceiros, surgiu o problema de se saber se havendo bem ou bens comuns, a posição jurídica do cônjuge havia de ser sempre a de litisconsorte, ativo ou passivo, razão para as medidas que levassem à mesma sorte. Todavia, tem-se de atender haja constrição em que o cônjuge não foi posto como autor ou como réu...” “... No art. 1.046, § 3º, o Código de 1973 foi explícito: considera-se também terceiro o cônjuge que defende a posse (lato sensu!) de bem ‘de sua meação”. (obra citada, p. 81)

Nessa mesma trilha de entendimento, Th eodoro Júnior:

Das quatro questões acima, merece revisão a que diz respeito ao remédio processual. À luz do que agora dispõe o art. 1.046, § 3º, do novo Código Processo Civil, entendemos que a posição da mulher casada continua sendo de terceiro mesmo quando intimada da penhora. Isto porque pela natureza do direito que vai ser discutido (tutela à meação), que nada tem a ver com o mérito da execução proposta contra o marido, a mulher sempre pode pretender, como terceira, a impossibilidade de serem os seus bens atingidos pela constrição judicial. A questão resolve-se, segundo a melhor doutrina, pelo reconhecimento da possibilidade de a mesma pessoa poder simultaneamente ser parte e terceiro num só processo. Basta que sejam diferentes os títulos jurídicos com que se apresente a pessoa no processo principal e nos embargos (13). A mulher quando se integra na execução do marido em razão da penhora, é chamada para o processo não para discutir sua responsabilidade, mas apenas porque não pode haver excussão de bens imóveis sem a citação dela (tanto que a mulher não meeira, casada em regime de separação de bens, também tem de ser intimada da penhora sobre imóvel do marido). Já quando defende a meação, a mulher se bate por um direito próprio que não foi cogitado para a solução da demanda intentada contra o marido. E, assim, perfeitamente lícita a utilização dos embargos de terceiro por ela para excluir a responsabilidade de sua meação pelas dívidas do marido (14). (Processo de Execução, 14ª edição, 1990, pp. 153-154)

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 391

Continuando, ressaltou, ainda:

Equipara-se ao terceiro a parte que, posto fi gure no processo, defende bens que, pelo título de sua aquisição ou pela qualidade em que os possuir, não podem ser atingidos pela apreensão judicial (art. 1.046, § 2º).

Considera-se, também, terceiro o cônjuge quando defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua meação (art. 1.046, § 3º). A propósito, deve ser repelida a jurisprudência que se vem formando no sentido de que a mulher casada não pode embargar de terceiro quando, na execução do marido, recaindo a penhora sobre imóvel, for ela citada para a ação.

Afi rmar, como alguns julgados, que o § 3º do art. 1.046 só se aplica no caso de não ser citada a mulher após a penhora, é tornar letra morta o disposto pelo Código e reduzir à inutilidade um texto expresso em lei. Isto porque se só a mulher que não é parte (vale dizer, que não foi citada) pudesse opor os embargos de terceiro, sua posição já estaria compreendida no caput do art. 1.046, tornando excrescência sem sentido o § 3º. E não se pode deixar de anotar que é princípio universal de hermenêutica que a lei não contém palavras ou dispositivos inúteis.

Por que então a inclusão do referido § 3º prevendo a legitimidade do cônjuge para embargar, justamente depois da afi rmação do parágrafo anterior de que mesmo a parte (executado) se equipara a terceiro nas circunstâncias especiais ali mencionadas?

Parece-nos claro que, levando em consideração a diferença de título jurídico invocável pela mulher, baseada na irresponsabilidade patrimonial pela dívida do marido, o Código teve a evidente intenção de reconhecer à esposa, em qualquer tempo, a qualidade de terceiro para demandar a exclusão de seus bens da injusta apreensão judicial. Pouco importa a intimação ou não da penhora, portanto (43) (Vide Cap. XIII, n. 07).

Numa só hipótese a mulher casada não poderá interpor embargos de terceiro em defesa da meação ou dos bens reservados: é quando a ação for proposta diretamente contra ela, na qualidade de litisconsorte, sob a afi rmação, na inicial, de que se trata de dívida contraída pelo marido a bem da família (art. 10, parág. único, n. III). É que nesse caso, a questão da responsabilidade da meação ou dos bens reservados já, de início, integra o objeto da lide, de maneira que não poderá ser subtraído ao alcance do julgamento da causa principal. Aqui, sim, estará a mulher jungida a defender-se apenas nos embargos de devedor. (obra citada, pp. 368-369)

Nesse mesmo sentido, confi ra-se acórdão do Pretório excelso, proferido

quando do julgamento do RE n. 95.351-RS, Relator Sr. Ministro Néri da

Silveira, cuja ementa está assim posta:

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

392

Recurso extraordinário.

Execução. Penhora. Bens do casal. Meação. Embargos de terceiro. Embora intimada da penhora, pode a mulher do executado defender sua meação, mediante embargos de terceiro, nos termos do art. 1.046 e seus parágrafos e no prazo do art. 1.048, ambos do Código de Processo Civil vigente. No regime do Código anterior, o Supremo Tribunal Federal fi rmara entendimento no sentido de que, intimada da penhora em ação contra o marido, a mulher casada não podia valer-se de embargos de terceiro para defender sua meação. No regime do CPC de 1973, o art. 1.046, § 3º, torna expressa a equiparação do cônjuge a terceiro, quando defende sua meação.

2. Recurso extraordinário não conhecido. (RTJ 105/274)

De igual RREE n. 79.415-PE e 93.473-PR (RTJs 78/831 e 100/401).

Do exame, defl ui que, consoante a legislação, a doutrina e a jurisprudência,

é, também, meio processual adequado, para defender a mulher casada sua

meação, de bem imóvel penhorado por dívida do marido, em execução, os

embargos de terceiros.

Tais os fundamentos pelos quais conheço do recurso, mas nego-lhe

seguimento.

RECURSO ESPECIAL N. 13.479-SP (91.0016001-6)

Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo

Recorrente: Banco do Brasil S/A

Recorrida: Luciana Silva Alves Pimenta

Advogados: Yocio Saito e outros, e Elison de Souza Vieira e outro

EMENTA

Processo Civil. Execução. Penhora de imóvel. Intimação do cônjuge.

Embargos de terceiro. Precedentes. Recurso desprovido.

Não obstante intimada da penhora (CPC, art. 669), pode a

mulher casada, na defesa da sua meação, autorizada pelo art. 1.046, §

3º, CPC, utilizar-se da via dos embargos de terceiro.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 393

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos, em que são partes as acima indicadas:Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do relatório e notas taquigráfi cas constantes dos autos, que fi cam fazendo parte integrante do presente julgado.

Brasília (DF), 31 de outubro de 1991 (data do julgamento).

Ministro Athos Carneiro, Presidente

Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator

DJ 09.12.1991

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Ao admitir o apelo, o eminente

Presidente do Tribunal de origem registrou com fi delidade a matéria versada

nos autos, verbis:

1. Contra a r. decisão que indeferiu preliminar de ilegitimidade da mulher casada, intimada da penhora realizada em execução, para ajuizar embargos de terceiro, foi interposto agravo de instrumento (fl . 13).

À unanimidade de votos, a egrégia Terceira Câmara negou provimento ao recurso (fl s. 90-91).

Socorre-se da via especial o vencido, com fulcro no art. 105, inciso III, letra c, da Constituição Federal, apontando divergências com os julgados in RTJ 94/460 e RTs 474/217 e 491/180. Pugna o recorrente pela decretação de carência dos embargos de terceiro, por corresponder a intimação da penhora em execução, à citação na ação de conhecimento, conforme estabelecem os arts. 213 e 669 do Código Civil, tornando-se a recorrida parte na ação, como litisconsorte passiva necessária.

Intimada, deixou a recorrida de apresentar contra-razões (fl . 103).

2. Merece prosperar a irresignação.

Logrou o recorrente demonstrar a divergência jurisprudencial quanto ao tema em debate. Dos trechos transcritos, verifica-se guardarem pertinência com a matéria aqui decidida, afeiçoando-se à hipótese dos autos, eis que, nos julgados paradigmas, o entendimento é no sentido de valer como citação a intimação da mulher após a penhora, tornando-se ela parte, passando a integrar o litisconsórcio passivo necessário, não tendo legitimidade para oferecer embargos, como terceiro.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

394

Contrariamente ao neles decidido, a conclusão alcançada pelo v. acórdão guerreado é no sentido de não se tornar litisconsorte o cônjuge no processo de execução, pela simples intimação da penhora sobre bem comum do casal, estando plenamente legitimado a ajuizar embargos de terceiro, diante do disposto no art. 1.046, § 3º, do Código de Processo Civil.

3. Isto posto, defi ro o recurso especial.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo (Relator): Conheço do recurso pelo

dissenso pretoriano, mas lhe nego provimento.

Ao fundamentar o acórdão recorrido, na qualidade de Relator, afi rmou o

Professor Ricardo Arcoverde Credie, com o aval dos seus pares:

O cônjuge não se torna liticonsorte, no processo de execução, pela simples intimação de penhora sobre bem comum do casal.

Ao invés, está plenamente legitimado, mercê do disposto no art. 1.046, § 3º, do CPC, ao ajuizamento de ação de embargos de terceiro, vez que, pela mera cientifi cação de um ato processual, não passará a sofrer também a execução.

O recurso repristina tese de há muito superada pela jurisprudência de nossas Cortes de Justiça, desmerecendo prosperar.

Por isso o seu não provimento.

Se ocorre ou não litisconsórcio na matéria, ainda não se pacificaram

doutrina e jurisprudência. Mas é inegável que a maioria se inclina pela

possibilidade do cônjuge embargar de terceiro não obstante intimado da

penhora que tenha recaído sobre bem imóvel.

No REsp n. 4.472 da Terceira Turma, ementou-se:

Processual Civil. Execução. Penhora. Bem imóvel do casal. Meação. Mulher casada. Embargos de terceiro. Art. 1.046, § 3º, do CPC, de 1973.

I - Embora intimada da penhora, pode a mulher casada defender sua meação, de imóvel de propriedade do casal, através dos embargos de terceiro, na forma preconizada no art. 1.046, § 3º, do CPC, em execução, por dívida do marido.

II - No regime do CPC de 1973, este artigo dispõe, expressamente, a equiparação do cônjuge a terceiro quando defende sua meação.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 395

III - Precedentes do STF.

IV - Recurso conhecido pela letra c a que se nega provimento.

Do corpo do voto condutor daquele aresto unânime, do Relator, Sr.

Ministro Waldemar Zveiter, extrai-se:

A matéria não é pacífica, mas estou, no caso presente, em que a melhor orientação é a que admite os embargos de terceiro, em casos tais.

Dispõe o art. 1.046, da Lei Processual civil:

Art. 1.046. Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer lhes sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargos.

§§ 1º e 2º — omissis

§ 3º Considera-se também terceiro o cônjuge quando defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua meação.

Da leitura desse § 3º não vejo como se possa negar à mulher casada mesmo quando intimada da penhora, sem que tivesse opostos embargos de devedor, o direito de defender, na qualidade de terceiro, sua meação.

Após transcrever Pontes de Miranda, citando também os precedentes do

excelso Pretório lançados em RTJ’s 78/831 e 100/401, trouxe S. Exa. a ementa

do RE n. 95.351-RS (RTJ 105/ 274), de que Relator o Sr. Ministro Néri da

Silveira, verbis:

Execução. Penhora. Bens do casal. Meação. Embargos de terceiro. Embora intimada da penhora, pode a mulher do executado defender sua meação, mediante embargos de terceiro, nos termos do art. 1.046 e seus parágrafos e no prazo do art. 1.048, ambos do Código de Processo Civil vigente. No regime do Código anterior, o Supremo Tribunal Federal fi rmara entendimento no sentido de que, intimada da penhora em ação contra o marido, a mulher casada não podia valer-se de embargos de terceiro para defender sua meação. No regime do CPC de 1973, o art. 1.046, § 3º, torna expressa a equiparação do cônjuge a terceiro, quando defende sua meação.

Esta, sem dúvida, a melhor orientação, como se vê, dentre outros, em Paulo

Furtado (“Execução”, Saraiva, 2ª edição, 1991, n. 160), Humberto Th eodoro Jr.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

396

(“Processo de Execução”, Leud, 7ª edição, Cap. XIII, n. 7 e Cap. XXIV, n. 12),

Hamilton de Moraes e Barros (“Comentários”, Forense, vol. IX, 1ª edição, p. 295),

J. R. Gomes da Cruz (“Ajuris”, 18/1967) e Ernane Fidélis dos Santos (“Manual”,

Saraiva, 1ª edição, n. 1.202), sendo deste último a lição que se transcreve:

Recaindo a penhora em bens imóveis, também deverá ser intimada a mulher do devedor, a qual poderá embargar como substituta processual do marido, também no prazo de dez dias. Os embargos não são para defesa de direito próprio, mas como se fora do marido, podendo a mulher alegar, por exemplo, nulidade do título, pagamento, transação, etc. Para defesa de bens seus, reservados ou de sua meação não responsável (Lei n. 4.121/1962, art. 3º), quando não executada como devedora, poderá embargar como terceira, ainda que intimada da penhora (art. 1.046, § 3º), até cinco dias depois da arrematação, adjudicação ou remição (art. 1.048).

Recaindo a penhora em bens reservados da mulher, o marido será também intimado com os mesmos direitos de defesa (art. 669, § 2º).

Em tais casos, em razão da necessidade do litisconsórcio, o prazo de embargos se inicia após a última intimação (art. 241, II, c.c. o art. 598).

Em suma, desprovejo o recurso.

VOTO

O Sr. Ministro Athos Carneiro: Também acompanho o eminente Relator.

Frisaria até que a mulher, intimada da penhora, poderá oferecer embargos à

execução alegando, por exemplo, que a execução é nula, não está embasada em

título de natureza executiva. E pode, ao mesmo tempo, apresentar embargos de

terceiro para defesa, digamos, de sua meação, ou para argüir que aquele bem

é bem reservado seu, de sua propriedade exclusiva. Tudo depende, pois, do

conteúdo dos embargos, a classifi cá-los como embargos do devedor ou como

embargos de terceiro.

VOTO-VOGAL

O Sr. Ministro Fontes de Alencar : Sr. Presidente, também acho que nada

obsta a que a mulher venha a Juízo trazendo embargos de terceiro.

Acompanho o Sr. Ministro-Relator.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 397

RECURSO ESPECIAL N. 15.379-RJ (1991/0020685-7)

Relator: Ministro Bueno de Souza

Recorrente: Econômico S/A Crédito, Financiamento e Investimentos

Recorrida: Paulina Brasão Borges Teixeira

Advogados: Sônia Regina de Carvalho Mestre e outro, e Walbert André

e outros

EMENTA

Processual Civil. Embargos de terceiro. Mulher casada. Ônus da

prova.

1. Admite-se a utilização pela mulher casada da via dos embargos

de terceiro, como meio de defender sua meação no patrimônio comum

do casal, afetado por ato de constrição judicial determinado em autos de

ação de execução, decorrente de dívida de terceiros avalizada somente

pelo marido; cabendo-lhe, contudo, comprovar que a transação não foi

benéfi ca para a família.

2. Precedentes desta Turma.

3. Peculiaridades do caso concreto.

4. Aval dado pelo marido à sociedade anônima da qual era

diretor-industrial.

5. Alegação, não elidida, de que o empréstimo foi tomado para

saldar dívida da empresa com banco pertencente ao mesmo grupo

fi nanceiro da mutuante e exeqüente.

6. Sociedade anônima, presumivelmente não familiar, onde

os diretores podem ser acionistas, não acionistas ou simplesmente

empregados.

7. Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta

Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

398

taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso. Votaram com

o Relator os Senhores Ministros Athos Carneiro, Sálvio de Figueiredo e Barros

Monteiro. Ausente, justifi cadamente, o Senhor Ministro Fontes de Alencar.

Brasília (DF), 20 de abril de 1993 (data do julgamento).

Ministro Athos Carneiro, Presidente

Ministro Bueno de Souza, Relator

DJ 08.08.1994

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Bueno de Souza: Econômico S/A Crédito Financiamento

e Investimento interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, inciso

III, alíneas a e c da Constituição Federal, contra decisão da egrégia Primeira

Câmara do Tribunal de Alçada Cível do Rio de Janeiro, assim ementado:

Embargos de terceiro. Mulher casada. Meação. Sua exclusão da penhora, em execução por aval do marido. O só fato de destinar-se o numerário assim obtido ao giro da empresa de que é o varão diretor, não faz presumir que da operação tirou proveito a mulher. Provas e presunções cabíveis.

Sustenta o recorrente que o v. acórdão recorrido contrariou o disposto no

art. 3º da Lei n. 4.121/1962, e art. 333, I, do Código de Processo Civil, além de

apontar dissídio de jurisprudência relativo ao ônus da prova.

Admitido o recurso, apenas pela alínea c, subiram os autos a esta Corte.

VOTO

O Sr. Ministro Bueno de Souza (Relator): Sr. Presidente, para maior

esclarecimento da espécie, tenho por oportuno transcrever os principais

fundamentos do v. acórdão recorrido (fl s. 96-97):

Realmente, o só fato de se destinar o numerário, assim obtido, ao giro dos negócios da empresa de que é o varão diretor, e ainda que dela tire ele o sustento de sua família, disso não se infere que da operação tenha sua mulher tirado proveito.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 399

Para que tal se dê, necessário é que se trate de empresa familiar, e não porque seja ela a fonte de seu sustento, mas porque representa normalmente a fonte de sua fortuna.

Em verdade, é de se presumir que à mulher aproveite a operação de que se vale seu marido para a captação de recursos, sendo válida também essa presunção quando intervém ele como avalista de operação destinada a levantar recursos para sua empresa familiar.

Tal não ocorre, entretanto, quando intervém ele como avalista de terceiros — atuação presumidamente “de favor” — e ainda quando esse terceiro seja a empresa de que é ele diretor, mesmo porque é fato notório, nos meios bancários especialmente, a exigência de que na operação intervenha como avalista o diretor da empresa contratante.

Se, naqueles casos, a presunção é de que seja a operação proveitosa à mulher — cabendo-lhe demonstrar o contrário — nestes, prevalece a presunção contrária de seu nenhum proveito com a operação. E tal presunção não cede, nem mesmo em consideração do fato de prover o avalista o sustento da família com os ganhos obtidos na empresa avalizada, já que tais ganhos têm por fundamento sua atividade profi ssional e não a prestação do aval.

Aliás, não é fato provado que só de sua atividade de diretor da empresa tire o avalista o sustento da família e, ainda que tal se desse, provável é que tais ganhos obtivesse ele, ainda antes da operação em causa, e que os obteria ainda sem que ela se consumasse.

Assim, não é à embargante que caberia fazer “prova-negativa-de- proveito”, como quer o embargado-apelante, e sim a ele é que caberia fazer a prova positiva — que dos autos não se contém.

Tal “prova-de-não-proveito” — repita-se — da mulher só se exige quando seja a dívida contraída pelo marido, em caráter pessoal, ou para sua empresa familiar, mas não quando contraída a benefício de terceiros, ou até mesmo a proveito da empresa, da qual até prova em contrário, é ele mero garante.

Presunção não é uma criação absolutamente imaginária, que se possa instituir como regra, à revelia do que normalmente ocorre. Ela é uma abstração da realidade, que se recomenda preservar.

Assim, como normalmente ocorre benefi ciar-se a mulher com os recursos obtidos pelo marido, para si ou para a empresa de que tenha sua família participação predominante, compreende-se que deva sua meação responder pelas operações destinadas à obtenção de tais recursos.

De igual forma, como normalmente ocorre não se benefi ciar a mulher com os recursos obtidos por terceiros, com o aval de seu marido, compreende-se que pelas operações correspondentes não deva sua meação responder.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

400

E na condição desses terceiros — a cujos interesses se tem por alheia a mulher — está a sociedade anônima, empresa constituída em sociedade de capital, da qual seja o avalista um dos diretores, ainda que se deva ressalvar a hipótese — aqui não confi gurada — de se comprovar ser tal empresa de natureza familiar, inobstante a modalidade de sua constituição formal.

E posto que normalmente ocorre não se constituírem em sociedades anônimas as empresas familiares — que costuma adotar a forma das sociedades por cotas de responsabilidade limitada — da mulher de seu avalista não se há de exigir “prova-de-não-proveito”, que no caso se presume.

Prova cabal, entretanto, se haveria de exigir da parte interessada na infi rmação dessa verdade presumida. E tal prova não se fez.

Primeiramente, cumpre-nos anotar que a debatida quaestio juris sobre o

ônus da prova foi resolvida por ocasião do julgamento do REsp n. 4.370-MG,

em sessão de 05.11.1991 (DJU 03.02.1992), vencidos os eminentes Ministros

Athos Carneiro (Relator Originário) e Fontes de Alencar.

Eis o teor da ementa do referido acórdão majoritário, redigida pelo não

menos eminente Ministro Sálvio de Figueiredo:

Processo Civil. Execução. Embargos de terceiro. Meação. Mulher casada. Ônus da prova. Orientação majoritária da Turma. Precedentes. Recurso não conhecido.

I - Segundo orientação da Turma, fi rmada nos precedentes REsps n. 1.164-GO e 3.263-RS, é lícito à mulher casada pleitear a exclusão da sua meação quando a dívida foi contraída apenas pelo marido. Incumbe-lhe, no entanto, o ônus de provar que o empréstimo não foi contraído em benefício da família.

II - Unânime é o entendimento da Turma de que a exclusão da meação se faz em cada bem do casal e não na totalidade do patrimônio do casal.

Contudo, naquela assentada, apesar de acompanhar os votos vencedores,

preocupado com as peculiaridades de futuros casos concretos, proferi voto-vogal

onde ressaltei o seguinte:

... penso que não há necessidade de se fi xar determinado critério, como, aliás, há pouco decidimos em recurso, do qual V. Exa. foi Relator o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo, ressaltando que não podemos nos desvincular das bases empíricas da demanda, na medida em que estas possam e devam ser consideradas, em sede de recurso especial. Os enunciados jurisprudenciais não podem e não devem assumir feições dogmáticas e abstratas, porquanto a jurisprudência, precisamente, se incumbe de ajustar os enunciados abstratos da lei a realidades concretas.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 401

Assim, peço vênia ao eminente Ministro Fontes Alencar para adentrar este terreno, porquanto temos necessidade de fi xar critério e, embora este não deva ser, necessariamente, entendido como critério rígido (poderá ceder em face de situações concretas), é, contudo, necessário para assegurar a coerência de nossas decisões.

Já no tocante, propriamente, ao ônus da prova do benefício decorrente da transação de que se origina o débito e que dá motivo à constrição de bens, verifi co duas difi culdades, a da mulher, de efetuar a prova negativa (aquela que a doutrina designa como prova diabólica), como vai a mulher provar que, de tal ou qual transação, não resultou proveito para o casal? É uma prova que pode apresentar difi culdades insuperáveis. Por outro lado, temos que, para o credor, também é extremamente difícil provar fatos concernentes à vida do casal, penetrando na intimidade da vida da família a ponto de demonstrar que a transação tenha sido benéfi ca (ou não) para a família, é algo que nem sempre será realizável, por parte do credor. Mas, ponderando as razões de conveniência social, entendo que este ônus (de provar que não tenha havido benefício para a família) deve fi car com a mulher, porque como quer que seja, ela é conhecedora dos fatos que dizem respeito à vida da família. Assim, não lhe será absolutamente impossível trazer a juízo aqueles aspectos concretos da vida familiar que, examinados pelo juiz, possam levar à compreensão de que a operação fi nanceira de que se trata não redundou em benefício do casal.

Assim entendendo, penso que a jurisprudência resguarda também a intimidade da família contra invasões de terceiros, a ela estranhos.

Compreendo que, no mundo de hoje, a presença da mulher é muito mais atuante nos diversos setores da vida social, e, portanto, a difi culdade da prova de fato negativo pode ser superada, na maioria dos casos, pelo maior e mais intenso envolvimento da mulher (envolvimento que a lei encoraja), nos negócios da família. É menos diabólica, portanto, a prova do fato negativo pela mulher, do que a prova a cargo do credor, de que esta ou aquela transação tenha (ou não) redundado a benefício da família.

Compreendo que se trata de optar por um dos critérios, pois ambos contam com excelentes argumentos.

Peço respeitosa vênia ao Eminente Ministro Presidente, que tem sufragado o entendimento de que o ônus deva ser do credor, mas penso que, entregando à esposa este ônus, a Justiça passa a esperar esclarecimentos quanto aos fatos, a partir das fontes mais apropriadas para sobre eles se pronunciar.

Muito embora continue fi el a esse entendimento, volto minha atenção para

as peculiaridades da causa e dos autos. Assim, sem adentrar ao vedado reexame

de provas, extraio da petição da embargante-esposa este tópico (fl s. 38-39),

verbis:

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

402

À fl . 27 o embargado sustenta que a quantia teria trazido benefício à família do casal, dizendo:

É de se presumir, portanto, que os negócios por ele promovidos, bem como os encargos por ele assumidos — como representante legal e titular da fi nanciada — sejam efetivados no interesse da família.

O executado não é titular da Empresa. Esta é uma sociedade anônima com Diretoria legalmente eleita, tendo a presidi-la o Senhor Expedito Cursino Alves que detém a representação legal da sociedade, conforme faz prova a inclusa Ata das Assembléias Gerais Ordinária e Extraordinária (fotocópia juntada).

A importância exeqüenda foi tomada ao exeqüente para cobrir empréstimo anterior feito ao mesmo e não saldado. Como vemos, foi empréstimo para pagamento de empréstimo, isto é, a Financeira do Banco Econômico emprestou o dinheiro à Empresa para que esta pagasse empréstimo anteriormente contraído com o Banco Econômico S/A, da qual a exeqüenda é controlada.

Assim, douto julgador, o dinheiro jamais foi retirado do Banco. Simples jogo de lançamento bancário retirou o dinheiro da conta-corrente da Empresa para a conta da Financeira exeqüenda.

A própria Financeira, MM. Dr. Juiz, traz aos autos à fl. 30 dos autos dos Embargos do Devedor o extrato do movimento da referida conta em que se observa o crédito da importância de Cz$ 662.000,00 e a retirada, pelo próprio Banco, de Cz$ 750.451,15 e mais Cz$ 29.640,00, quantias essas que correspondem ao principal e demais consectários.

Quer dizer, o dinheiro nunca saiu do banco! (veja-se a fotocópia anexa, extraída da fl . 30 dos autos dos Embargos do devedor).

Está provado, portanto, que o dinheiro jamais poderia ter beneficiado a Embargante ou à sua família.

Tais alegações não foram sufi cientemente contraditadas pela fi nanceira-

exeqüente, que se limitou a aduzir o seguinte (fl . 48):

A própria Embargante, às fl s. 37-44 e 46 cuidou de comprovar o alegado pela Embargada, ou seja, que o casal, formado pela Embargante e o Executado, possui outros bens, além do imóvel penhorado, e de que o Executado é, conforme ata de fl . 45, o diretor industrial da sociedade fi nanciada.

Cabia à Embargante, assim, elidir a presunção de que, sendo o Executado diretor daquela pessoa jurídica, da qual retira o sustento para a família, o produto do fi nanciamento não a benefi ciou, o que, data venia, não foi feito.

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 403

Feitas essas considerações, ante a demonstração de que o empréstimo foi

tomado para saldar dívida com banco pertencente ao mesmo grupo fi nanceiro

da mutuante e exeqüente (ora recorrida), tenho como elidida pela varoa, neste

peculiaríssimo caso, a presunção de que a dívida contraída pelo marido tenha

benefi ciado sua família.

Ademais, e principalmente, tal como bem frisou o douto voto condutor

do v. acórdão recorrido, a mutuária é sociedade anônima, presumivelmente não

familiar, onde os diretores, como se sabe, podem ser acionistas, não acionistas ou

simplesmente empregados da avalizada.

Por derradeiro, observo que as demais conclusões do v. acórdão recorrido

foram construídas à luz do soberano exame de matéria fática da espécie, sendo,

agora, inviável sua reapreciação e redefinição em sede de recurso especial

(Súmula n. 7-STJ).

Eis por que, ante as peculiaridades do caso concreto, tão bem sublinhados

no douto voto do Relator da apelação, não conheço do recurso.

É como voto.

VOTO

O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo: Tenho ponto de vista no tema, já

externado em mais de uma oportunidade, que coincide com o entendimento

majoritário da Turma. A respeito, trago à colação a ementa de um deles,

concernente ao REsp n. 3.263-RS (DJ 09.10.1990):

Processo Civil. Execução. Meação da esposa. Entendimento predominante. Ônus da prova. Recurso conhecido pelo dissídio mas desprovido. Voto divergente na tese.

I - Na exegese da legislação que rege a exclusão da meação da mulher casada no bem penhorado, em execução movida contra o seu marido, prevalece o entendimento segundo o qual a esposa não responde pela dívida, contraída apenas pelo marido, se provar que a mesma não veio em benefício do casal.

II - Demonstrada a inexistência de vantagem, assegura-se o benefício legal.

III - Em se tratando, no entanto, de aval do marido, presume-se o prejuízo da mulher, salvo se o marido for sócio da empresa avalizada.

Assim colocada a questão, acompanho o Ministro-Relator pelas

peculiaridades do caso concreto, salientadas em seu voto.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

404

Peço vênia apenas para fazer uma ressalva — e não sei se nisso divirjo do

em. Relator. S. Exa. ao fundamentar o seu voto no caso presente, assinalou que

a mulher não fi caria dispensada do ônus da prova, em se tratando de sociedade,

apenas quando essa fosse em caráter familiar. Tenho entendido, todavia, que

não apenas nesse tipo de sociedade, de caráter familiar, mas também naquelas

em que o marido for sócio com participação acentuada na sociedade, razão pela

qual, em princípio, a dúvida seria contraída no interesse da própria família, dada

a sua condição de sócio em posição proeminente.

No caso presente, no entanto, conforme salientado, e reiteradamente, trata-

se de uma sociedade anônima, razão pela qual me coloco de acordo com o Sr.

Relator.

VOTO

O Sr. Ministro Athos Carneiro: Acompanho o voto do eminente Relator;

aliás, vou além, porque entendo que se a mulher nada assinou, a sua meação em

princípio não responde pela dívida. Ora, se se pretende que a execução recaia

também sobre a meação da mulher, é necessário que o credor comprove que a

dívida fora contraída em benefício da família. Isto é uma questão de fato, e o

colegiado de origem demonstrou não ser a hipótese, maxime em se cuidando de

dívida proveniente de aval.

Por esses motivos — e com mais razões ainda —, não conheço do recurso.

RECURSO ESPECIAL N. 39.703-SP (93287036)

Relator: Ministro Nilson Naves

Recorrente: Multibanco S/A

Recorrida: Patrícia Trajan Vilela Junqueira

Advogados: Antônio Carlos Gonçalves e outros, e George Washington

Tenório Marcelino e outros

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 405

EMENTA

Ação de execução. Penhora sobre bem imóvel do casal. Intimação.

Embargos de terceiro, intentados pela mulher em defesa da meação.

É também terceiro o cônjuge quando defende a sua meação, segundo

o art. 1.046, § 3º, do Código de Processo Civil. Conquanto intimada

da penhora, é lícito à mulher casada defender sua meação mediante

os embargos. Precedentes do STJ: REsps n. 4.472 e 13.479. Recurso

especial conhecido pelo dissídio mas improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira

Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas

taquigráfi cas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial, mas

negar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Eduardo

Ribeiro, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos. Ausente, ocasionalmente, o Sr.

Ministro Costa Leite.

Brasília (DF), 28 de fevereiro de 1994 (data do julgamento).

Ministro Eduardo Ribeiro, Presidente

Ministro Nilson Naves, Relator

DJ 18.04.1994

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Nilson Naves: Trata-se de recurso especial, fundado na

alínea c, art. 105-III da Constituição, interposto por Multibanco S/A contra

este acórdão:

O conjunto probatório demonstra que o agravante ajuizou ação de execução por título extrajudicial contra Matrinchã Agropastoril Ltda e seus avalistas José Marcos Junqueira Vilela e Wander José Vilela Junqueira. No curso da ação foram arrestados bens imóveis, e a embargada, por ser casada sob o regime de comunhão de bens com um dos executados-avalistas, ajuizou embargos de terceiro objetivando livrar sua meação.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

406

Nos termos do art. 568, I, do Código de Processo Civil, são sujeitos passivos na execução, o devedor, reconhecido como tal no título. No caso, a emitente e os avalistas.

A agravada não é parte na ação de execução: seu nome não consta do título ou na inicial execução, e como tal, nos termos do art. 1.046 do Código de Processo Civil, tem legitimidade para promover embargos de terceiro.

Nos termos do art. 3º, da Lei n. 4.121/1962, “Pelos títulos de dívida de qualquer natureza, fi rmados por um só dos cônjuges, ainda que casados pelo regime de comunhão universal, somente responderão os bens particulares do signatário e os comuns até o limite de sua meação”.

De acordo com o § 3º do art. 1.046 do CPC, a mulher casada, apesar de intimada da penhora, tem legitimidade para defender sua meação por embargos de terceiro.

Anota Theotonio Negrão, que se a penhora recaiu sobre bem de sua meação, próprio, reservado ou total, a mulher casada “poderá apresentar embargos de terceiro no prazo do art. 1.048 (RTJ 81/825, 84/1.020, 93/878, STF-RT 514/268), sendo irrelevante que haja sido intimada da penhora (RJTJESP 98/350). Nestes, pleiteará que sua meação ou os seus bens sejam excluídos da penhora, mas não poderá discutir o débito (RTJ 101/800, RTFR 137/135), porque esta é matéria a ser deduzida em embargos do devedor” (“Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor”, R.T., 20ª edição, p. 451).

Bem andou o douto magistrado, Dr. Luiz Sérgio Pieroni, ao afastar a ilegitimidade de parte.

Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso.

O Presidente Osvaldo Caron, do 1º Tribunal de Alçada Civil do Estado de

São Paulo, assim admitiu o recurso:

Recurso especial interposto contra v. acórdão da egrégia Oitava Câmara (fl s. 222-224), cujo relatório se adota, no qual se alega divergência jurisprudencial como os julgados in RTJ 55/732, 94/460, RTs 491/180, 621/70 e JTACSP 98/76, 61/46 e 82/76.

Sustenta o recorrente a ilegitimidade da recorrida para defender sua meação via embargos de terceiro, uma vez que tornou-se parte no processo de execução proposto contra seu marido, em razão de ter sido intimada da penhora. Afi rma que a intimação da mulher do executado, no caso dos autos, elidiu a admissibilidade dos embargos de terceiro. Junta cópias reprográfi cas às fl s. 244-262.

Houve contra-razões às fl s. 279-285.

O recurso merece prosperar.

No tocante aos julgados publicados nos JTACSPs 98/76, 61/46 e 82/76, cumpre salientar sua condição sine qua non, para efeito de comprovação do dissenso

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 407

interpretativo, não serem os julgados arrolados oriundos do Tribunal prolator da decisão impugnada, e esse é o caso.

Nesse sentido, a própria redação do permissivo constitucional e a da Súmula n. 13 do colendo Superior Tribunal de Justiça.

Com relação ao aresto inserto na RT 621/70, não se vislumbra a dissidência pretendida, pois neste discutiu-se a inadmissibilidade dos embargos de terceiro propostos por mulher casada visando exclusão de sua meada, por não comprovado que as dívidas não reverteram em proveito da família, hipótese não abordada no v. acórdão hostilizado.

Entretanto, no atinente aos julgados in RTJs 55/732, 94/460 e RT 491/180, verifica-se que cumpridos os requisitos sumulares e regimentais, restou demonstrada a divergência jurisprudencial, porquanto nestes observou-se a inviabilidade dos embargos de terceiro, tendo em vista a intimação da mulher casada para a realização da penhora, enquanto o v. acórdão deixou expresso possuir esta legitimidade para defender sua meação de embargos de terceiro, apesar de intimada de penhora.

Isto posto, defi ro o recurso especial.

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): Semelhantemente ao acórdão

recorrido, valho-me das anotações de Th eotonio Negrão, quanto ao art. 1.046 do

Código de Processo Civil:

Art. 1.046: 20. Não há dúvida de que, se a execução foi movida, desde o início, contra o casal, a mulher casada poderá embargá-la (como devedora) e discutir o débito ajuizado.

Mas as opiniões divergem, se a mulher foi apenas intimada da penhora em execução movida contra o marido (art. 669, § 1º). Uns entendem que pode embargar a execução (RTJ, 100/401), porque se tornou litisconsorte passiva (RTJ, 94/460), aplicando o CPC ant.; outros, que não pode, porque não é devedora, e sim o marido (RTJ, 88/656, RT, 650/107, com voto vencedor bem fundamentado, JTA 109/213).

Se não foi intimada da penhora em bem imóvel, também não há acordo quanto ao remedium juris a ser utilizado. Há quem sustente que deve oferecer embargos de terceiro (RTJ, 94/1.251). Segundo pensamos, porém, pode embargar a execução, alegando nulidade, por falta de sua intimação, ou discutindo o débito, sem prejuízo da oposição de embargos de terceiro, se verifi cada a hipótese do art. 1.046, § 3º.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

408

Em qualquer caso, se a penhora recaiu sobre bem de sua meação, próprio, reservado ou dotal, poderá apresentar embargos de terceiro, no prazo do art. 1.048 (RTJ, 81/825, 84/1.020, 93/878, STF-RT, 514/268), sendo irrelevante que haja sido intimada da penhora (RJTJESP, 98/350). Nestes, pleiteará que sua meação ou os seus bens sejam excluídos da penhora, mas não poderá discutir o débito (RTJ, 101/800, RTFR, 137/135), porque esta é matéria a ser deduzida em embargos do devedor.

Em resumo, nada obsta a que, conforme o caso, a mulher intervenha no processo, ao mesmo tempo, como parte e como terceiro, com base em títulos jurídicos diversos (cf, art. 1.046, § 2º). Neste sentido: RTJ, 100/401, 105/274. Contra: RTJ, 79/329.

Caso típico de embargos de terceiro é o que se funda no art. 3º do Estatuto da Mulher Casada (Lei n. 4.121, de 27.08.1962): “Pelos títulos de dívida de qualquer natureza, fi rmados por um só dos cônjuges, ainda que casados pelo regime de comunhão universal, somente responderão os bens particulares do signatário e os comuns até o limite de sua meação”.

Enfi m, a matéria é complexa. Solução ideal será o conhecimento dos embargos de terceiro como embargos à execução (v. nota 9), e vice-versa (v. art. 736, nota 10), desde que, em qualquer das hipóteses, no prazo para a respectiva oposição. Se a petição articular, ao mesmo tempo, matéria pertinente a ambos, deverá, de preferência, ser processada como embargos do devedor, se no prazo destes, fi cando ressalvada à mulher a possibilidade de, ulteriormente e por peça diferente, opor embargos de terceiro, cujo prazo é mais dilatado (cf. arts. 738 e 1.048). — in 22ª edição, p. 541.

2. Mas, aqui entre nós, defi niu-se a questão em favor dos embargos de

terceiro, intentados pela mulher casada. Na jurisprudência da Casa encontrei o

seguinte, por suas ementas:

Processual Civil. Execução. Penhora. Bem imóvel do casal. Meação. Mulher casada. Embargos de terceiro. Art. 1.046, § 3º, do CPC, de 1973.

I - Embora intimada da penhora, pode a mulher casada defender sua meação, de imóvel de propriedade do casal, através dos embargos de terceiro, na forma preconizada no art. 1.046, § 3º, do CPC, em execução, por dívida do marido.

II - No regime do CPC de 1973, este artigo dispõe, expressamente, a equiparação do cônjuge a terceiro quando defende sua meação.

III - Precedentes do STF.

IV - Recurso conhecido pela letra c a que se nega provimento. (REsp n. 4.472, Terceira Turma, Sr. Ministro Waldemar Zveiter, DJ 19.11.1990).

SÚMULAS - PRECEDENTES

RSSTJ, a. 4, (9): 383-410, julho 2010 409

Civil. Execução. Embargos de terceiro.

Embora tenham as instâncias ordinárias dito da ilegitimidade da esposa, intimada da penhora, para o exercício dito da ação de embargos de terceiro, em defesa da meação, em execução por dívida contraída pelo marido, em franca contrariedade ao § 3º do art. 1.046 do Código de Processo Civil, não se conhece do recurso especial, tendo em vista que subsiste o acórdão, tanto quanto a sentença, por haver decidido o mérito dos embargos de terceiro e sobre essa parte da decisão não versa o recurso. (REsp n. 9.443, Terceira Turma, Sr. Ministro Dias Trindade, DJ 10.06.1991).

Processo Civil. Execução. Penhora de imóvel. Intimação do cônjuge. Embargos de terceiro. Precedentes. Recurso desprovido.

— Não obstante intimada da penhora (CPC, art. 669), pode a mulher casada, na defesa da sua meação, autorizada pelo art. 1.046, § 3º, CPC, utilizar-se da via dos embargos de terceiro. (REsp n. 13.479, Quarta Turma, Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo, DJ 09.12.1991).

A favor dos embargos de terceiro, em casos que tais, o Sr. Ministro Sálvio

de Figueiredo apresentou, no REsp n. 13.479, as opiniões de Paulo Furtado,

Humberto Theodoro Jr., Hamilton de Moraes e Barros, J. R. Gomes da Cruz e

Ername Fidélis dos Santos.

3. Relativamente à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (período

anterior à Constituição de 1988), vejam-se as RTJ’s 100/401 e 105/274, em

acórdãos com essas ementas:

Mulher casada. Embargos de terceiro.

O art. 1.046, § 3º, do Código de Processo Civil conferiu ao cônjuge a qualidade de terceiro quando defende a posse de bens dotais, próprios, reservados ou de sua meação. Com essa disposição fi cou placitada a orientação segundo a qual a mesma pessoa física ou jurídica pode ser simultaneamente parte e terceiro no mesmo processo, se não diferentes os títulos jurídicos que justifi cam esse duplo papel. Assim se a mulher quiser opor-se à dívida contraída pelo marido, a intimação da penhora lhe possibilitará o exercício dessa pretensão nos próprios autos da lide; se, no entanto, pretender afastar a incidência da penhora sobre sua meação é na posição de terceiro, estranho à res in iudicio deducta, que deverá agir, tal como qualquer outro terceiro. Recurso extraordinário conhecido pela letra d do permissivo constitucional e desprovido. (Sr. Ministro Soares Muñoz)

Recurso extraordinário.

Execução. Penhora. Bens do casal. Meação. Embargos de terceiro. Embora intimada da penhora, pode a mulher do executado defender sua meação,

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

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mediante embargos de terceiro, nos termos do art. 1.046 e seus parágrafos e no prazo do art. 1.048, ambos do Código de Processo Civil vigente. No regime do Código anterior, o Supremo Tribunal Federal fi rmara entendimento no sentido de que, intimada da penhora em ação contra o marido, a mulher casada não podia valer-se de embargos de terceiro para defender sua meação. No regime do CPC de 1973, o art. 1.046, § 3º, torna expressa a equiparação do cônjuge a terceiro, quando defende sua meação.

2. Recurso extraordinário não conhecido. (Sr. Ministro Néri da Silveira)

4. Conheço do recurso especial, porque comprovado o dissídio, mas lhe

nego provimento.