subsidiando o debate

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FACULDADE DE ECONOMIA E FINANÇAS IBMEC PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM ADMINISTRAÇÃO E ECONOMIA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM ECONOMIA “Uma avaliação da eficácia do Plano de Retenção de Café de 2000” SÉRGIO MASTRANGELO FERREIRA ORIENTADOR: PROF. DR. EMANUEL AUGUSTO RODRIGUES ORNELAS Rio de Janeiro, 26 de abril de 2007.

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subsidiando o sebate

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Page 1: Subsidiando o debate

FACULDADE DE ECONOMIA E FINANÇAS IBMEC PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM

ADMINISTRAÇÃO E ECONOMIA

DDIISSSSEERRTTAAÇÇÃÃOO DDEE MMEESSTTRRAADDOO PPRROOFFIISSSSIIOONNAALLIIZZAANNTTEE EEMM EECCOONNOOMMIIAA

“Uma avaliação da eficácia do Plano de Retenção de Café de 2000”

SSÉÉRRGGIIOO MMAASSTTRRAANNGGEELLOO FFEERRRREEIIRRAA

ORIENTADOR: PROF. DR. EMANUEL AUGUSTO RODRIGUES ORNELAS

Rio de Janeiro, 26 de abril de 2007.

Page 2: Subsidiando o debate

“UMA AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DO PLANO DE RETENÇÃO DE CAFÉ DE 2000”

SÉRGIO MASTRANGELO FERREIRA

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado Profissionalizante em Economia como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Economia. Área de Concentração: Economia Empresarial

ORIENTADOR: PROF. DR. EMANUEL AUGUSTO RODRIGUES ORNELAS

Rio de Janeiro, 26 de abril de 2007.

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“UMA AVALIAÇÃO DA EFICÁCIA DO PLANO DE RETENÇÃO DE CAFÉ DE 2000”

SÉRGIO MASTRANGELO FERREIRA

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado Profissionalizante em Economia como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre em Economia. Área de Concentração: Economia Empresarial

Avaliação:

BANCA EXAMINADORA:

_____________________________________________________

Professor PROF. DR. EMANUEL AUGUSTO RODRIGUES ORNELAS (Orientador) Instituição: IBMEC - RJ _____________________________________________________

Professor PROF. DR. ALEXANDRE BARROS DA CUNHA Instituição: IBMEC - RJ _____________________________________________________

Professor PROF. DR. LUIS FERNANDO OLIVEIRA DE ARAUJO Instituição: FUCAPE - ES

Rio de Janeiro, 26 de abril de 2007.

Page 4: Subsidiando o debate

FICHA CATALOGRÁFICA

Entrar em contato com a biblioteca no 14º andar, ou através do e-mail: [email protected]

Page 5: Subsidiando o debate

v

DEDICATÓRIA

Àqueles que por anos me incentivaram e cobraram

minha dedicação aos estudos: meus pais e irmão.

Em especial, dedico a minha Filha, Ana Helena, a

minha maior motivação.

Dedico este trabalho também à Ana Paula, meu amor,

companheira e incentivadora.

Page 6: Subsidiando o debate

vi

AGRADECIMENTOS

Agradeço especialmente ao meu orientador, Dr. Emanuel Ornelas,

por toda sua dedicação.

Obrigado especial aos amigos Sérgio Wanderley e Cesar Calmon

que viabilizaram o patrocínio deste curso pela empresa Marcellino

Martins & E. Johnston Exportadores Ltda.

Agradeço também ao Dr. Guilherme Braga, presidente do Cecafé

e a Eduardo Heron pelo esclarecimentos de dúvidas e por

disponibilizarem material referente ao plano, e aos amigos que

pacientemente ouviram as minhas inúmeras explicações sob o

tema deste trabalho.

Page 7: Subsidiando o debate

vii

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo analisar o plano de retenção de café de 2000. Para isso,

utilizamos os dados de exportação, produção, preço internacional e câmbio de 51 países

produtores, para o período de 1976 a 2005. Com base na teoria do cartel, comparamos o

comportamento dos países que participaram do plano de retenção de café com os que não

participaram. Observou-se que no plano de retenção de café alguns produtores tiveram um

incentivo de curto prazo que os levaram a não cumprí-lo. As estimações indicam os seguintes

resultados: i) os não participantes do plano não alteraram o seu comportamento durante o

plano; ii) os participantes do plano aumentaram as suas exportações, contrariando os objetivos

do plano; iii) o Brasil se destacou por ter reduzido as suas exportação durante o plano.

Palavras Chave: Cartel, Café, Conduta, Divisão do Mercado.

Page 8: Subsidiando o debate

viii

ABSTRACT

The goal of this paper is to analyze the effectiveness of the coffee retention plan, through

exports, local production, international prices and exchange rates of 51 producing countries,

in the period between 1976 and 2005. We use the cartel theory to compare the behavior of

Plan countries with Non-Plan countries. We find that during the Retention Plan some Plan

countries did not follow the Plan’s recommendation. The estimations indicate the following

results: i) the Non-Plan countries didn’t change their behavior during the Plan; ii) the Plan

Countries increased their exports during the plan, acting against the Plan’s goals; iii) Brazil

decreased its exports during the Plan.

Key Words: Cartel, Coffee, Conduct, and Market Division.

Page 9: Subsidiando o debate

ix

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Produtividade no Brasil………………………………………………………......26. Figura 2 – Cotação de Café na Bolsa de Nova York (pré – Plano)………….......………......34. Figura 3 – Países participantes e não participantes do plano ………………………………..37. Figura 4 – Participação nas exportações mundiais ………….......………..............................39.

Page 10: Subsidiando o debate

x

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Consumo anual de café………………………………………………………......28. Tabela 2 – Produção de café por país entre 1976 e 1999………….......……...............….......36. Tabela 3 – Países Produtores de Café entre 1976 e 2005 …………………………….....…..38. Tabela 4 – Exportações de café por país, 1976-2005 ………….......………...........................44.

Page 11: Subsidiando o debate

xi

LISTA DE ABREVIATURAS AIC Acordo Internacional de Café

APPC Associação dos Países Produtores de Café

CECAFE Conselho dos Exportadores de Café do Brasil

CONAB Companhia Nacional de Abastecimento

MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

NYBOT New York Board of Trade

IBC Instituto Brasileiro do Café

OIC Organização Internacional do Café

USDA Departamento de Agricultura dos Estados Unidos da América

Page 12: Subsidiando o debate

xii

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO………………………………………………………………………..13

2 REVISÃO DA LITERATURA………………………………………………………..16

2.1 Teoria do Cartel……………………………………….……………………………………..................16

2.2 O Cartel e a Divisão do Mercado...........................................................................................................19

2.3 Determinantes do Sucesso do Cartel……………….…………………………….…………………...21

3 O MERCADO........................………………………………………………………..24

3.1 O Mercado Cafeeiro………………………………….……………………………………...................24

3.2 Histórico das Intervenções......................................................................................................................28

4 O PLANO DE RETENÇÃO DE CAFÉ....…………………………………………..32

4.1 Descrição do Plano…………………..……………….…………………………….………..................32

4.2 Os Participantes do Plano.......................................................................................................................37

4.3 Participação nas exportações mundiais.................................................................................................38

5 RESULTADOS ECONOMÉTRICOS......…………………………………………..40

5.1 As Exportações…………………..……………….…………………………….………........................40

5.2 Especificação das equações a serem estimadas.....................................................................................42

5.3 Análise dos resultados.............................................................................................................................45

6 CONCLUSÃO.........................................…………………………………………..50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..............…………………………………………..52

SÉRIES UTILIZADAS....................................…………………………………………..53

Page 13: Subsidiando o debate

13

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho pretende analisar o comportamento dos países produtores de café no

intuito de avaliar os efeitos do plano de retenção de café, adotado por esses no ano 2000,

como meio de controle da oferta do produto para sustentar os preços. Com esse objetivo,

utilizamos dados para exportação, produção, preço e taxa de câmbio real, com

observações anuais, para o período de 1976 até 20051.

Nossa seleção compreendeu os 51 países produtores e exportadores. Dos 51 países,

23 assinaram o acordo para reter café. De uma forma geral, nosso intuito é gerar uma

comparação entre o período pós-adoção contra o período pré-adoção do plano de retenção

de café e comparar esses resultados entre o grupo de países que assinaram e os que não

assinaram o acordo.

1Todos os dados, com exceção da taxa de câmbio real, aqui utilizados foram obtidos na ICO – International

Coffee Organization. Uma explicação mais detalhada das séries utilizadas está no final deste trabalho em um apêndice.

Page 14: Subsidiando o debate

14

Dois trabalhos se destacam na literatura sob acordos no mercado de café: Bacha

(1992) e Delfim Netto (1959). Em nosso estudo discutiremos o trabalho de Levenstein

and Suslow (2006) que analisa a eficácia dos cartéis.

Bacha (1992) analisa o mercado de café ao longo de sua história com ênfase nos

aspectos institucionais das políticas de intervenção, traçando um panorama das

motivações que levaram o Brasil e os demais produtores a se organizarem em torno de

uma atuação coordenada no mercado internacional de café. Delfim Netto (1959) também

analisa as políticas de intervenção, mas com maior abrangência. Tendo sido pioneiro na

análise do impacto econômico dessas políticas, criou modelos para o funcionamento do

mercado de café e tentou também expurgar os efeitos dessas intervenções. Ele faz em seu

trabalho uma análise detalhada dos diferentes formatos de acordos utilizados no mercado

de café.

Levenstein and Suslow (2006) não foca a sua análise em um mercado específico.

Os autores fazem uma revisão da literatura sob o tema da eficiência dos cartéis e

finalizam destacando as principais características dos cartéis que foram bem sucedidos.

Esse trabalho balizou a nossa escolha do formato utilizado para o tratamento dos dados,

bem como para as hipóteses utilizadas na análise dos resultados.

Os nossos resultados indicam que a maioria dos países que assinaram o plano não o

cumpriu. A exceção foi o Brasil, que reteve o café como previsto. Os outros participantes

do acordo agiram de forma oposta, aumentando a exportação durante o plano. Entre os

resultados encontrados ao se comparar o comportamento dos grupos, os países que não

Page 15: Subsidiando o debate

15

assinaram o acordo não alteraram o seu comportamento, exportando volume de café

compatível com a produção e preço daquele ano. Considerando que esses países não

tinham obrigação de reter café, eles estavam aptos a se beneficiarem da redução das

exportações dos demais países. O Vietnã se destaca no grupo dos não participantes por

ter aumentado as exportações, porém esse aumento foi reflexo de uma tendência já

manifestada.

Este trabalho foi estruturado em seis seções, contando com esta introdução. A

segunda seção apresenta um resumo da literatura sob os cartéis, criando uma estrutura

teórica para tratar o tema proposto. A terceira apresenta as características do mercado. A

quarta e quinta seções apresentam a metodologia aplicada, descrevendo a origem dos

dados, como iremos utilizá-los, os resultados e as análises obtidas para cada equação. A

sexta seção apresenta a conclusão.

Page 16: Subsidiando o debate

16

2 REVISÃO DA LITERATURA 2

2.1 TEORIA DO CARTEL

Nesta seção, faremos uma revisão da literatura com o objetivo de analisar a teoria do

cartel, demonstrando como os participantes conseguem criar arranjos institucionais para

restringir a produção/oferta e aumentar os preços. Infelizmente, a teoria não apresenta

conclusões claras que possam ser aplicadas a todos os casos. Assim, a eficácia de um

cartel é uma questão empírica.

Um cartel é um acordo feito entre competidores de um mercado quanto ao preço

que será cobrado ou a produção ou ambos. Produtores formam um cartel com o objetivo

de limitar a competição e aumentar os lucros, restringindo a produção e aumentando os

preços. A intenção é colocar o preço ao nível do monopolista para maximizar os lucros.

O cartel enfrenta três problemas: coordenação, oportunismo e entrada. Os participantes

devem estar preparados para coordenar o equilíbrio, porém em algumas situações haverá

mais de um equilíbrio que aumenta preços e reduz a produção.

2 Esta seção foi baseada no estudo de Levenstein and Suslow (2006) sob a eficiência dos cartéis.

Page 17: Subsidiando o debate

17

O cartel deve aumentar os lucros de todos os membros e deve conter mecanismos

que distribuam esses lucros entre os seus membros, desenvolvendo uma estrutura de

incentivos através de uma combinação entre monitoramento, recompensas e punição para

prevenir o comportamento oportunista, bem como prevenir a entrada de novos

participantes no mercado. De acordo com Stigler (1964), em um mercado dinâmico as

soluções para esses problemas poderão mudar ao longo do tempo. Para um cartel ser bem

sucedido, ele precisa criar uma estrutura organizacional capaz de solucionar esses

problemas.

O ponto principal é como prevenir o comportamento oportunista. O cartel cria um

“Dilema do Prisioneiro” quando aumenta os preços acima do custo marginal,

incentivando os produtores a romper o acordo. Cada produtor irá querer baixar os seus

preços para aumentar a produção e ganhar uma parcela maior do mercado consumidor e

aumentar no curto prazo os seus lucros. Se cada participante agir dessa mesma forma, o

cartel será desmontado. A interação repetida entre os participantes pode criar incentivos

para esse tipo de acordo. Em repetidas interações, os participantes irão comparar o ganho

do rompimento do acordo no curto prazo (ganho do rompimento) em relação à

expectativa de redução futura do lucro descontado, após o rompimento (custo do

rompimento). Um cartel pode se sustentar se os custos do rompimento forem maiores que

o ganho do rompimento. A decisão de continuar ou romper o acordo irá depender do

lucro esperado do acordo e isso inclui o ganho do acordo e o tempo de interação entre os

participantes.

Page 18: Subsidiando o debate

18

A teoria argumenta que um aumento da concentração do mercado facilita a

formação de um cartel. A concentração aumentaria o ganho individual de todos os

participantes sem aumentar o incentivo para o comportamento oportunista. Se os países

não têm a capacidade de criar um comprometimento de todos os participantes, o país

oportunista irá capturar todo o lucro do monopólio menos epsilon de um período. Um

aumento do número de produtores no mercado significa uma parcela menor do lucro de

monopólio que será dado a cada um. Sendo assim, a taxa de desconto teria de aumentar

na medida em que aumentam o número de participantes para manter o cartel em

equilíbrio. A taxa de desconto afeta diretamente a relação entre os benefícios do cartel e

os custos do comportamento oportunista. A diferenciação em relação a esse modelo

dependerá das especificações do mercado. Custos e tamanho dos participantes podem ter

um efeito ambíguo em relação a estabilidade do cartel.

Os cartéis são instáveis por natureza e o seu surgimento está relacionado a

momentos onde ocorre uma queda acentuada dos preços e dos lucros. Os países decidem

restringir a produção/exportação, mas acordos paralelos optam por “furar” o acordo

principal, levando o mercado a uma guerra de preços. A tentativa de refazer o acordo

permanece, porém sempre haverá a tentação de aumentar a produção quando os preços

estiverem acima do custo marginal. Green and Porter (1984) argumentam que a guerra de

preços é uma das soluções para deter o comportamento oportunista. Deter o

comportamento oportunista seria melhor que entrar em uma guerra de preços com altos

custos para todos os participantes. A guerra de preços ocorre quando os participantes não

são capazes de monitorar perfeitamente o nível de produção dos outros participantes e

não identificam quando esses estão furando o acordo.

Page 19: Subsidiando o debate

19

Um outro aspecto é o custo de organização. Se o cartel é formado repetidas vezes,

provavelmente haverá uma associação de interesse privado já montada com esse intuito.

O custo fixo desta organização será diluído entre os vários participantes e entre os

diversos acordos. Dessa forma, a expectativa é que o cartel seja sempre lucrativo após

comportar todos esses custos. Esses custos fixos dependem do histórico de cooperação e

o número de participantes envolvidos. Qualquer tipo de incerteza em relação ao ambiente

institucional e às mudanças econômicas tornará o acordo mais difícil, aumentando a

complexidade na formulação dos contratos e dos mecanismos de monitoramento. A

capacidade de renegociação é fundamental para reformar o acordo. Quando os

participantes não têm essa capacidade, ocorre a guerra de preços.

Uma última questão a respeito da teoria do cartel é a possibilidade de novos

entrantes. Talvez seja esse o maior desafio do cartel. Quando as firmas decidem

coordenar as suas ações através de um acordo, elas necessariamente criam um incentivo

para a entrada de novos participantes. Isso se torna um problema mais sério quando se

trata de mercados com poucas barreiras à entrada.

2.2 O Cartel e a Divisão do Mercado

O mercado de café tem uma longa história de comportamento anticompetitivo

através de acordos e tentativas de acordos, orquestrados via associações e organismos

internacionais. Dando continuidade ao objetivo principal desta seção, iremos descrever

um arranjo simples entre países que pode configurar um equilíbrio.

Page 20: Subsidiando o debate

20

Dois países que atuam no mesmo mercado (exemplo: mercado americano sendo

abastecido por Brasil e Colômbia)

Mercado

País 1 – Brasil

País 2 – Colômbia

Consideramos 2 países, 1 e 2, com custos marginais simétricos c, enfrentando a

competição de outros países com custos marginais cI desde que c < cI < pM, onde pM é o

preço de monopólio. Se os participantes do acordo seguirem à risca o acordo, eles

maximizam os lucros agregados do setor com p = cI, o lucro agregado do setor (por

período) é Π = ( cI – c) p-1(cI) e p-1(.) denota a função de demanda. De acordo com a

literatura de jogos repetidos3, o preço pM = cI pode ser mantido em equilíbrio se cada um

dos países adotarem essa estratégia. Porém, se um dos participantes tiver utilizado um

preço diferente do acordo no período anterior, será adotado o preço competitivo p = c.

Podemos assumir que, dada a simetria, os dois países dividem o mercado igualmente

(país f obtém sf = ½, f = 1,2). O cartel irá se sustentar se o benefício de cada país em

manter o acordo for maior que o benefício de rompê-lo, vendendo para todo o mercado

em um único período. A sustentabilidade do cartel é dada por:

3 Ver Tirole (1988) e Pindyck & Rubinfeld (1994).

Page 21: Subsidiando o debate

21

1 Π 1 ≥ Π, (1) 2 1 – δ

onde δ é o fator de desconto por período. Essa condição pode ser reordenada como δ ≥ ½.

Pela teoria, com uma taxa de desconto suficientemente alta será obtido o preço de cartel

com pM = cI, que seria suportado em equilíbrio.

2.3 Determinantes do sucesso de um cartel

A primeira questão a ser analisada refere-se às condições do mercado e os efeitos

da capacidade de coordenação dos participantes sobre a viabilidade do acordo4. O

número de participantes pode representar um ponto a favor do acordo. A teoria sugere

que quanto menor o número de participantes, mais fácil será a coordenação, porém essa

relação entre a eficácia do cartel e a concentração não é empiricamente observada de

forma clara. O ponto principal é que talvez vários cartéis com poucos participantes não

sejam formados de maneira explícita, considerando a concentração exógena, pois o cartel

possibilitou que várias firmas sobrevivessem e se mantivessem no mercado. A evidência

é de que a duração do cartel está relacionada à parcela do mercado que os membros do

cartel detêm. Quanto maior a concentração de mercado, menor seria o incentivo para um

acordo explícito, pois ele se tornaria supérfluo. A explicação mais provável para a

prevalência de cartéis em mercado com baixa concentração é a atuação das associações

de interesse privado.

4 Ver Olson (1982).

Page 22: Subsidiando o debate

22

A demanda é um outro aspecto a ser analisado. A expectativa é que o cartel seja

mais comum em mercados onde a demanda é inelástica, dado que o lucro potencial é

maior quando se fixa o preço do produto. Os estudos empíricos citados pelos autores,

embora limitados, confirmam esta expectativa. A questão é como a demanda afeta a

duração do cartel. As flutuações cíclicas afetam, porém se forem previsíveis devem estar

contidas no plano do acordo. O impacto da elasticidade está restrito à capacidade que o

cartel tem de aumentar os preços dado que a demanda é inelástica e existem poucos

substitutos.

O crescimento da demanda, por sua vez, aumenta o “peso” que o participante

coloca no futuro, porém um crescimento muito rápido possibilita o surgimento de novos

participantes. A guerra de preços ocorre normalmente durante um ciclo antecipando de

baixa, de acordo com estudos citados, principalmente na demanda por exportações.

Demanda e preços em baixa aumentariam a pressão para que os participantes adotassem

uma postura competitiva, rompendo o acordo. Geralmente os cartéis são formados

durante esse período de demanda e preços baixos, e os mais frágeis terminam durante

esse período.

Os cartéis bem sucedidos são aqueles que conseguem criar uma organização que

seja flexível e sofisticada para lidar com essas limitações. Essa organização deve

identificar o preço do cartel, coordenar a interação e atualizar as mudanças na demanda e

nos custos. Os cartéis desenvolvem as suas organizações ao longo do tempo através do

aprendizado. Esse aprendizado inclue como monitorar a produção e preços praticados

pelos membros com o objetivo de detectar o comportamento oportunista e principalmente

Page 23: Subsidiando o debate

23

como gerar incentivos para que o cartel seja mais lucrativo que o comportamento

oportunista.

Esses cartéis também criam penalidades para os que não cumprirem o acordo com

práticas excludentes e elaboram uma hierarquia interna para facilitar a comunicação entre

os diversos níveis. Tanto a hierarquia quanto a comunicação são importantes para o

sucesso do cartel, pois em mercados dinâmicos os contratos serão sempre incompletos. A

expectativa dos participantes quanto ao comportamento de cooperação dos outros

participantes tem um impacto significativo para o sucesso do cartel. Essa expectativa é

influenciada pelas interações anteriores e pelo conhecimento de sua conduta e dos

aspectos culturais. Sendo assim, a confiança tem um papel fundamental no equilíbrio de

longo prazo de um cartel.

Monitorar produção e preços através de agências é a forma mais eficiente,

encontrada em cartéis de sucesso. A função principal dessas agências é remover de cada

participante o poder de definir preço, eliminando assim a possibilidade de

comportamento oportunista. Uma forma mais branda seriam auditorias que forneceriam

informação sob o comportamento dos participantes, porém não centralizariam as vendas.

Essas auditorias são feitas pelas associações que coletam e disseminam informações.

Essas associações podem optar por auditorias externas e independentes.

Page 24: Subsidiando o debate

24

3 O MERCADO5 3.1 O Mercado Cafeeiro

O intuito desta seção é caracterizar o mercado de café, destacando as suas

especificidades. O café é um produto agrícola produzido em larga escala no Brasil e em

outros países com clima tropical e subtropical. A sua descrição é relativamente simples.

Existem duas qualidades de café: arábica e robusta. Ambos são produzidos no Brasil,

sendo que o café arábica em maior quantidade. A diferença entre essas duas qualidades

está na “bebida” e no “corpo”. Enquanto o café arábica tem muito sabor e pouco corpo, o

café robusta tem características opostas. Essas características fazem com que a indústria

de torrefação utilize nos seus blends as duas qualidades.

No café arábica há uma diferenciação básica quanto ao processo de preparo do

café após a colheita, dos quais podemos destacar dois: lavado e natural. Os cafés lavados

são aqueles que logo após a colheita passam por um processo de lavagem com água

corrente até o despolpamento. O café natural é aquele que passa por um processo de

5 Esta seção é baseada em relatórios da OIC e em informações contidas em páginas na internet especializadas e nos trabalhos de Bacha (1992) e Delfim Netto (1959).

Page 25: Subsidiando o debate

25

secagem em terreiro de cimento até o despolpamento. O primeiro processo é muito

utilizado na Colômbia e América Central enquanto o segundo é muito comum no Brasil e

em alguns países africanos.

O processo de produção do café é relativamente simples. Sua produção é intensiva

em mão de obra e é caracterizada por uma substancial economia de escala. A utilização

do trabalho tanto durante a colheita como no trato da lavoura é bastante intenso no Brasil

e em outros países produtores principalmente quando comparado a outras culturas

agrícolas. O outro grande insumo são as terras para o plantio do café e recentemente a

utilização de fertilizantes e pesticidas.

O processo de produção tem como fator fixo, no curto prazo, a terra para plantio,

enquanto os outros fatores são variáveis. Os custos marginais em relação aos fatores de

produção variam de acordo com a tecnologia de produção, a capacidade de produção, o

tempo de produção da terra e a capacidade da mão de obra empregada. Um outro fator

importante é o custo da energia, dado que a utilização de novas tecnologias gerou um

aumento significativo da produtividade. A energia representa hoje um fator relevante com

o emprego de máquinas para o trato do café, para colheita e para a secagem. Esse

processo vem diminuindo a utilização do trabalho na produção, mas não configura uma

mudança significativa uma vez que a produção no Brasil e nos demais países ainda é

artesanal.

Esse investimento em tecnologias de produção de café fez com que a produção

total crescesse em um ritmo maior do que aumento da área plantada. Podemos notar no

Page 26: Subsidiando o debate

26

gráfico 1 que a lavoura de café no Brasil é caracterizada por ciclos bianuais, alternando

safras grandes e pequenas de um ano para outro. A produtividade no Brasil mantinha uma

média de dez sacas por hectare de 1992 até 1998. A partir de 1999, a produtividade

passou a ter uma média aproximada de quinze sacas por hectare.

Produtividade

0,0

5,0

10,0

15,0

20,0

25,0

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

Sacas por hectare

Fonte: MAPA - SPC - CONAB

Gráfico 1: Produtividade no Brasil

O café é uma mercadoria de alto valor em relação ao seu peso. Por isso, podemos

assumir que os custos de transporte não representam uma porção significativa dos custos

totais e que o mercado de café não é geograficamente segmentado. Os diferenciais de

preços podem ser corrigidos através da arbitragem do produto.

Page 27: Subsidiando o debate

27

A demanda pelo café é essencialmente dirigida pela indústria de torrefação. Nos

países consumidores, os embarques são feitos basicamente em containeres, enquanto em

países produtores os embarques são feitos basicamente por meio rodoviário. O café não

tem substitutos perfeitos. Concorre diretamente com o refrigerante e o chá, porém o

consumo da bebida segue aspectos culturais. A elasticidade preço da demanda pelo café é

baixa, isto é, uma alteração de preço no produto final afeta pouco a demanda dos

consumidores.

A demanda mundial, estimada em 108 milhões de sacas de 60 kg em 2000, tem

crescido a uma taxa aproximada de 1% ao ano entre 1990 e 2005 (OIC). O crescimento

da demanda sempre esteve concentrado nos mercados desenvolvidos, como América do

Norte, Europa e Japão, porém essas regiões tiveram uma redução no ritmo de

crescimento enquanto os mercados emergentes, incluindo os produtores, começaram a

apresentar um crescimento considerável entre 1991 e 2005 (Tabela 1).

Desde o início da década dos noventa, um significativo processo de consolidação

foi sendo colocado em curso no mercado mundial de café. A produção era dirigida pelos

Estados Nacionais, que tinham uma atuação direta sobre o mercado, regulamentando e

controlando a oferta. Com a desregulamentação do setor e o fim do sistema de quotas,

novos participantes surgiram no mercado e mudaram a composição das parcelas de

mercado, enquanto firmas multinacionais começaram a operar em mercados onde nunca

estiveram.

Page 28: Subsidiando o debate

28

Essas mudanças foram rápidas e redesenharam um mercado que já foi monopólio

do Brasil. A combinação de novos produtores e novos mercados vem dificultando o

surgimento de acordos para controlar a oferta do produto. O mercado de café é

constantemente atingido por choques na oferta, devidos a questões climáticas (secas e

geadas).

Tabela 1: Consumo anual de café

CONSUMO

Ano Países Produtores Países Consumidores Consumo Total

1991/92 22.266 80.596 102.862

1992/93 21.579 77.156 98.735

1993/94 22.928 75.699 98.627

1994/95 22.526 67.602 90.128

1995/96 24.049 73.024 97.073

1996/97 24.361 83.418 107.779

1997/98 25.180 76.719 101.899

1998/99 25.738 79.984 109.436

1999/00 25.608 78.871 117.026

2000/01 26.315 81.865 108.180

2001/02 27.746 80.927 108.673

2002/03 27.346 85.317 112.663

2003/04 27.995 85.837 113.832

2004/05 28.970 86.395 115.365

2005/06 29.574 87.008 116.582 Fonte: OIC

3.2 Histórico das intervenções

Até o fim do século XIX, as exportações do Brasil eram quase que totalmente

representadas pelo café. No final do século passado, o Brasil não mais dependia somente

das exportações de café e o mundo não comprava somente o café brasileiro. Com isso, o

Brasil não só fechou o IBC como também suspendeu o AIC. As políticas de valorização

Page 29: Subsidiando o debate

29

marcaram o século passado com intervenções recorrentes que tentavam suavizar os ciclos

de preços do café.

O objetivo das intervenções era suavizar os ciclos de escassez e excesso de

produção que geram preços altos e baixos. Porém, desde o início das intervenções no

mercado de café os ciclos se tornaram mais amplos, pois a intervenção nos preços

prolongou os ciclos de alta e consequentemente requereu cortes maiores de produção no

futuro. A dominância brasileira no mercado de café sofreu significativamente com esse

padrão de intervenção, pois enquanto o Brasil mantinha aberto o “guarda-chuva” dos

preços altos, novos produtores entravam no mercado.

As críticas feitas contra as políticas de valorização sempre foram focadas na

trajetória declinante da participação brasileira nas exportações mundiais de café. De fato,

o verdadeiro propósito da política de defesa do café, na primeira metade do século

passado, não era maximizar a nossa capacidade de exportar o produto, mas sustentar a

estabilidade macroeconômica através da defesa da taxa de câmbio.

Em 1962 foi criada a OIC, juntamente com um sistema de quotas para dividir o

mercado mundial de café entre os países produtores. Nesse tipo de acordo são

estabelecidas quotas de exportação. Não se faz qualquer tipo de fixação quanto ao nível

dos preços. A característica fundamental desse tipo de acordo é o estabelecimento de

restrições físicas ao comércio. No longo prazo, a instabilidade desse tipo de acordo

advém do fato de que os consumidores, para se livrarem da pressão exercida pelos

principais produtores (reunidos no acordo), procuram diversificar as suas importações,

Page 30: Subsidiando o debate

30

estimulando o desenvolvimento dos pequenos produtores que permaneceram fora do

acordo. Os países que não fazem parte desse acordo estarão sempre se beneficiando do

crescimento do consumo enquanto os países participantes estarão entregando esses

acréscimos de consumo aos que estiverem fora do acordo.

O governo brasileiro tomou a liderança desse processo e paralelamente promoveu

a erradicação de praticamente metade do parque cafeeiro do país, para poder viabilizar o

acordo internacional. Uma vez alcançado novamente a estabilidade do mercado, o Brasil

abandonou no final da década de 1960 o “guarda-chuva” dos preços altos e elaborou uma

política agressiva de preços, a qual tornou o preço do seu café dependente dos preços dos

cafés de seus sócios no acordo internacional.

Em 1975, ocorreu uma geada que destruiu os cafezais do Paraná, mudando

definitivamente a natureza do mercado internacional de café. A Colômbia ganhou espaço

no mercado, enquanto o Brasil, nesse ponto novamente envolvido numa estratégia de

substituição de importações, executava uma repetição das políticas de valorização do

passado. Em 1980, os executores da política brasileira elaboraram uma “estratégia de

reconquista”, com o propósito de recuperar a parcela do mercado perdida desde o início

da década de 1970. Isso marcou o início do fim do AIC, porque a “reconquista”

essencialmente significava que o Brasil não estava mais disposto em cumprir o papel de

“acomodador” no mercado internacional de café.

Desde 2000, o café responde por uma parcela pequena das exportações e dos

impostos do governo federal, de modo que a possibilidade de usar a política externa do

Page 31: Subsidiando o debate

31

produto, seja para manter a taxa de câmbio constante ou aumentar a receita do governo,

simplesmente não é mais viável. Com isso, a desregulamentação levou o país a atuar no

cenário externo sob uma perspectiva setorial onde deve ser determinado o grau de

competitividade externa do Brasil em um mercado livre. Com a redemocratização em

1985, o processo de desregulamentação do setor de café ganhou força, convergindo, em

1989, para a suspensão das cláusulas econômicas do AIC e, em 1990, para o fechamento

do IBC.

Page 32: Subsidiando o debate

32

4 O PLANO DE RETENÇÃO DE CAFÉ

4.1 Descrição do Plano

Em 19 de maio de 2000, o Brasil, juntamente com outros países produtores e

exportadores de café, celebrou em Londres um tratado, denominado Coffee Retention

Plan. Concluíram os representantes dos países participantes daquele tratado que seria

necessário alcançar-se, em uma fase inicial, a retenção de pelo menos 20% do volume de

café exportado por cada país participante, volume esse a ser estocado preferencialmente

em armazéns governamentais.

O café assim retido deveria ser liberado para a comercialização apenas quando a

sua cotação ultrapassasse US$ 105 por cents por libra-peso. O Plano visava interromper

os movimentos de baixas nos preços internacionais que vinham se registrando desde

fevereiro de 1998 (gráfico 2). A recuperação dos preços seria obtida através da contração

da oferta pelos países produtores, via retenções compulsórias de estoques, na proporção

de 20% dos embarques, e pelo encarecimento dos custos da exportação, onerada pela

Page 33: Subsidiando o debate

33

imobilização e carrego dos volumes em retenção. Brasil, Colômbia, países da América

Central e alguns países africanos lideraram esse processo.

No Brasil, a instituição do plano deu-se através da Portaria Interministerial nº.

197, criada em 15 de junho de 2000 pelo Governo Federal, através dos Ministérios de

Estado da Agricultura e do Abastecimento e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

Exterior. A referida Portaria condicionou a emissão dos Registros de Venda (“RV”), a

partir de junho de 2000, ao depósito em armazéns oficiais do equivalente a 20% da

quantia constante do RV. Condicionou ainda a autorização para embarque dos Registros

de Exportação (“RE”) à existência de cláusula que declarasse estar à quantidade

constante do RE amparada em Certificado de Retenção emitido pelo Governo federal.

Com fundamento em tal Portaria, o MAPA editou a Instrução Normativa nº. 4 em

15 de junho de 2000, que determinou algumas regras que deveriam ser respeitadas no

Programa de Retenção de café, dentre as quais merecem destaque as seguintes:

• A CONAB seria a detentora da atribuição exclusiva de estocagem dos cafés

retidos ao Programa;

• Seria instituído um certificado de retenção de café para comprovar a efetiva

estocagem do produto nos termos do Plano de Retenção;

Page 34: Subsidiando o debate

34

• As despesas com movimentação, armazenagem e seguro obrigatório dos cafés

vinculados ao Plano seriam arcadas exclusivamente pelos proprietários

(exportadores);

• A liberação dos cafés estocados seria de competência exclusiva do MAPA, de

acordo com os prazos e condições que viessem a ser determinados pelo Comitê

Coordenador do Plano de Retenção do acordo de criação da APPC.

20.00

60.00

100.00

140.00

180.00

220.00

Feb-98

Apr-98

Jun-98

Aug-98

Oct-98

Dec-98

Feb-99

Apr-99

Jun-99

Aug-99

Oct-99

Dec-99

Feb-00

Apr-00

NY - c/lb

Fonte: NYBOT Gráfico 2: Cotação de Café na Bolsa de Nova York (pré – Plano)

Page 35: Subsidiando o debate

35

Esse tipo de acordo é chamado de estoque regulador. O acordo fixa o limite em

que o mercado pode operar. Se, por excesso de oferta, os preços caem até o limite

estabelecido, o mecanismo de estabilização atua comprando e forma estoque do

excedente; se os preços superam esse limite, o mecanismo atua vendendo o estoque que

foi formado anteriormente. Enquanto os preços se mantêm acima do limite fixado, o

mecanismo regulador permanece inativo. O ponto fundamental para o êxito desse acordo

é a fixação adequada desse limite.

Se o preço de retenção for suficiente para cobrir todos os custos de produção e

permitir um lucro aos produtores, o volume das safras futuras aumentará e os reguladores

terão que dispor de cada vez mais recursos para continuarem retendo o café excedente e

carregando estoques. Em princípio, o limite certo poderia ser encontrado na curva de

demanda ajustada pela freqüência de safra de uma determinada magnitude. Com isso,

seria possível manter os preços acima de um determinado limite.

Analisando a Tabela 2, com os dados da produção dos diversos países entre 1976

e 1999, é possível compreender que apesar da multiplicidade de países produtores de

café, o Brasil tem uma posição de destaque, com aproximadamente 28% da produção

mundial. Uma flutuação da safra brasileira de 30% (sobre a média de longa duração) é

relativamente comum. O Brasil, juntamente com os quatro principais produtores,

compõem mais da metade da produção mundial. A produção brasileira é capaz de criar

instabilidade no mercado, trazendo volatilidade às cotações. Os outros dois países que

apresentaram um desvio padrão alto em relação à média são Costa do Marfim e Vietnã. O

Vietnã começou a produzir café em 1980 e teve uma safra recorde em 1999.

Page 36: Subsidiando o debate

36

Tabela 2: Produção de café por país entre 1976 e 1999

Média Desvio Padrão Máxima Mínima Part . %

Brasil 25.382.083 8.086.990 43.014.000 6.664.000 28

Colômbia 12.298.833 1.843.161 18.222.000 9.399.000 13

Indonésia 6.084.833 1.331.177 8.463.000 3.157.000 7

México 4.614.083 777.911 6.219.000 3.134.000 5

Costa do Marfim 3.963.000 1.234.965 6.321.000 1.951.000 4

Guatemala 3.322.542 816.059 5.120.000 2.361.000 4

Etiópia 3.016.458 440.511 3.888.000 1.794.000 3

Índia 2.828.708 996.993 5.292.000 1.453.000 3

Uganda 2.651.042 575.925 3.439.000 1.829.000 3

Vietnã 2.135.625 2.980.028 11.631.000 0 2

El Salvador 2.575.915 475.625 3.428.000 1.512.000 3

Costa Rica 2.218.042 473.061 2.998.000 1.325.000 2

Equador 1.755.042 371.671 2.376.000 1.186.000 2

Honduras 1.677.375 543.105 2.985.000 651.000 2

Quênia 1.540.292 291.056 2.113.000 882.000 2

Peru 1.358.542 451.872 2.663.000 665.000 1

Camarões 1.412.458 532.216 2.200.000 260.000 2

Congo 1.311.917 385.031 2.093.000 477.000 1

Venezuela 1.017.083 163.481 1.364.000 734.000 1

Papua Nova Guiné 947.000 200.414 1.387.000 633.000 1

Madagascar 954.833 254.294 1.340.000 427.000 1

Filipinas 931.625 176.185 1.395.000 685.000 1

Nicarágua 875.167 258.992 1.554.000 461.000 1

Tanzânia 824.625 103.228 1.062.000 624.000 1

Tailândia 763.375 498.107 1.469.000 102.000 1

Republica Dominicana 796.424 232.913 1.203.000 321.000 1

Haiti 496.583 81.366 697.000 393.000 1

Burundi 482.750 128.808 732.000 285.000 1

Outros 2.700.500 177.397 716.000 22.000 3 Fonte: OIC

Page 37: Subsidiando o debate

37

4.2 Os Participantes do Plano

O plano não contou com a participação de todos os produtores de café. Alguns

produtores assinaram o acordo enquanto outros não se manifestaram. Os participantes do

plano foram aqueles que já formaram uma relação de cooperação em outras situações no

passado. Esse tipo de cooperação foi construído no decorrer dos anos através do reforço

da confiança em cada uma dessas interações. Ficaram de fora do acordo os produtores

que tinham uma participação relativamente pequena no comércio internacional do

produto. Esses pequenos produtores afetavam pouco o preço do produto e seriam

dificilmente coordenados em um plano de retenção.

Quadro 1: Países participantes e não participantes do plano

Países fora do acordo

(28)

Benin, Burundi, Camarões, Republica Central Africana, República Democrática do Congo, República do Congo, Cuba, República Dominicana, Guiné Equatorial, Guiné, Haiti, Índia, Indonésia, Jamaica, Libéria, Malásia, México, Panamá, Papua Nova Guiné, Paraguai, Peru, Filipinas, Serra Leoa, Sri Lanka, Tailândia, Trinidad e Tobago, Vietnã e Zimbábue.

Países do acordo

(23)

Angola, Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Costa do Marfim, Equador, El Salvador, Etiópia, Gabão, Gana, Guatemala, Honduras, Quênia, Madagascar, Nicarágua, Nigéria, Ruanda, Tanzânia, Togo, Uganda, Venezuela e Zâmbia.

Analisando a Tabela 3, vemos que a participação média dos países de dentro do

acordo e dos países de fora do acordo são respectivamente 71 % e 29% tanto na produção

quanto na exportação. Na produção, a menor parcela que os países de dentro do acordo

Page 38: Subsidiando o debate

38

tiveram foi 62% que ocorreu em 2003. Na exportação, a menor parcela dos países de fora

do acordo ocorreu no início da série, em 1976, com 21%. Já a maior parcela ocorreu em

2000, com 38 % das exportações mundiais.

Tabela 3: Países Produtores de Café entre 1976 e 2005

Média Desvio Padrão Máxima Mínima

Em sacas de 60 kg

Produção Dentro do Acordo 66.843.835 9.139.896 85.987.000 42.948.000

Produção Fora do Acordo 28.158.042 7.061.979 41.378.000 16.379.000

Exportação Dentro do Acordo 51.899.813 5.266.837 60.358.134 36.900.502

Exportação Fora do Acordo 21.498.810 6.642.539 33.987.182 11.268.452

Participação %

Produção Dentro do Acordo 71% 4% 77% 62%

Produção Fora do Acordo 29% 4% 38% 23%

Exportação Dentro do Acordo 71% 5% 79% 62%

Exportação Fora do Acordo 29% 5% 38% 21% Fonte: OIC

4.3 Participação nas exportações mundias

Para analisarmos a participação nas exportações mundiais dos países produtores,

iremos utilizar as séries anuais com o volume de exportação. No gráfico 3, vemos a

participação percentual de alguns países e blocos de 1976 a 2005. O Vietnã se destaca

pelo crescimento na sua participação de mercado. Em 1990, ele detinha 1,5% do

mercado, cinco anos depois alcançou 4,5%, e em 2000 respondeu por 13%. A Colômbia

respondeu por 14% das exportações mundiais em 1998 e caiu para 10% em 2000. O

Brasil respondeu por 27% das exportações mundiais em 1999 e reduziu para 21% em

Page 39: Subsidiando o debate

39

2000. Os países da América Central detinham 18% em 1998 das exportações e subiram

para 22% em 2000.

Após o Plano de 2000, o Vietnã manteve a sua participação entre 13% e 16%. A

Colômbia subiu para aproximadamente 12%. O Brasil colheu uma safra recorde em 2002

e aumentou a sua participação para 32%, ficando próximo de 30% nos anos seguintes. Os

países da América Central reduziram a sua participação para 15% em 2002.

Participação Exportações Mundiais - %

0

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

22

24

26

28

30

32

34

75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 00 01 02 03 04 05

Ano

%

A.Central Brasil Colômbia Vietnã

Fonte: OIC

Gráfico 3: Participação nas exportações mundiais

Page 40: Subsidiando o debate

40

5 RESULTADOS ECONOMÉTRICOS

Nesta seção estimamos a exportação dos países utilizando dados em painel. O

objetivo é identificar a conduta dos participantes durante o plano de retenção de 2000, o

resultado efetivo e as suas conseqüências sobre o mercado. O foco da análise são as

exportações, dado que o plano previa exclusivamente a retenção do produto nos países

produtores.

5.1 As Exportações

Segundo dados da OIC, existem 51 países produtores de café. Iremos representá-

los por l = 1, 2,..., 51. Cada um desses países exporta uma quantidade de café que será

representada por q. Cada país, em um período t, exporta a quantidade qlt, que denota a

quantidade de café embarcado pelo país l para ser consumido em países consumidores

neste período. Teremos as exportações totais representadas então por Qlt = ΣLi= qlt.

Page 41: Subsidiando o debate

41

Podemos concluir que a decisão de quanto o país irá vender no mercado

internacional no período t está relacionada com a produção de café no mesmo período.

Uma parte da produção pode ser consumida no mercado interno de acordo com o

tamanho do seu mercado consumidor e uma outra parte pode se tornar estoque em mãos

de operadores locais. O saldo seria então exportado. Podemos considerar que o volume

máximo exportável no período t será: a produção mais os estoques locais menos o

consumo interno.

O preço no mercado internacional no período t também afetará a decisão de

quanto será exportado. Quanto maior o preço, maior será a disposição dos operadores de

venderem o café produzido e os estoques. O câmbio também afeta a decisão dos

operadores, pois quanto maior a desvalorização da moeda, maior será a receita em moeda

local. O preço do café no mercado internacional6 é cotado em dólares americanos e o

câmbio de cada país determinará a receita do produtor em moeda local.

Ao estimar a exportação dos países, utilizando as variáveis que foram descritas,

poderemos isolar a conduta dos participantes. A expectativa quanto à conduta é de que os

participantes do plano tenham diminuído as suas exportações no ano 2000, agindo em

linha com o acordo, enquanto os não participantes aumentassem suas exportações ou as

mantivessem constantes.

6 A produção de café é alterada de acordo com os ciclos de preço. Conforme estudos econométricos feitos por Delfim Netto (1959), a produção responde ao preço com uma defasagem de quatro períodos, ou seja: St = α + α2 Pt-4. Esse processo pode ser descrito como a gradual diminuição da produção em momentos de baixo preço que terão seus efeitos em um momento posterior. O câmbio também terá efeito semelhante.

Page 42: Subsidiando o debate

42

Dois grandes produtores merecem ser analisados separadamente: o Brasil e o

Vietnã. O Brasil produziu aproximadamente 33 milhões sacas de café em 1999, sendo o

principal produtor de café que assinou o Plano de Retenção. O Vietnã produziu

aproximadamente 12 milhões sacas em 1999, sendo o principal produtor a não participar

do Plano de 2000.

Para analisarmos os efeitos do plano utilizaremos dummies para a implementação

do plano de retenção no ano 2000, para participantes do plano e não participantes do

plano. Um outro ponto para identificarmos a conduta dos participantes é extrair as

tendências dos países participantes e não participantes, bem como do Brasil e do Vietnã.

Alguns países ou grupos podem ter aumentado sua exportação em função de uma

tendência que se manifestava e do contrário, alguns países podem ter diminuído as suas

exportações em função de uma tendência de queda.

5.2 Especificação das equações a serem estimadas

A função de exportação em cada país l pode ser escrita onde pt representa o preço

pago pelo café no mercado internacional, Slt é a produção de café no país l no período t,

elt é a taxa de câmbio real do país l no período t, αl é o coeficiente específico do mercado

que será estimado e εlt é o termo do erro econométrico. Começaremos especificando a

função de exportação básica ao nível de mercado na forma logarítmica:

log qlt = α + α2 log Slt + α3 log plt + α4 log elt + εlt (2)

Page 43: Subsidiando o debate

43

Para cada país há 30 observações anuais, de 1976 a 2005. Os dados de produção

são por sacas de 60 kg, os preços são em dólares americanos e o câmbio é em relação à

moeda americana. Todas as variáveis estão em log para capturarmos a elasticidade. A

estimação será feita com efeitos fixos e dados em painel de 51 países produtores.

Na equação I, incluímos as interações da dummy plano de 2000 com a dummy

participantes do plano e a dummy não participantes do plano7. Na equação II, nós

incluímos o Brasil e o Vietnã isoladamente nas interações com a dummy plano 2000 e

excluímo-los do grupo de participantes e não participantes, respectivamente. Na equação

III, nós incluímos a tendência dos grupos de participantes e não participantes e retiramos

as interações da dummy plano 2000 com o Brasil e o Vietnã.

Na equação IV, foram incluídas as tendências do Brasil e do Vietnã. Na equação

V, voltamos a incluir as interações da dummy plano 2000 com Brasil e Vietnã. A equação

VI é a mais completa, pois foram incluídas todas as interações, as tendências por grupo e

pelos dois países em destaque.

7 A dummy plano de 2000 = 1 para o ano 2000. A dummy participantes do plano = 1 para todos os países produtores que assinaram o acordo, e a dummy não participantes dos plano = 1 para todos os países que não assinaram o acordo

Page 44: Subsidiando o debate

44

Tabela 4: Exportações de café por país, 1976-2005 Estimação efeitos fixos

Variável dependente: Log (exportação)

(I) (II) (III) (IV) (V) (VI)

Intercepto -1.212 -1.187 1.541* 2.324** 1.551* 2.326**

(-1.500) (-1.464) (1.719) (2.469) (1.727) (2.468)

Plano de 2000 * Participantes 0.286*** 0.306*** 0.239*** 0.244*** 0.255*** 0.264***

(3.422) (3.591) (3.674) (3.636) (3.835) (3.773)

Plano de 2000 * Não Participantes -0.143 -0.187 0.106 0.115 0.071 0.130

(-1.185) (-1.456) (1.023) (1.085) (0.637) (1.224)

Plano de 2000 * Brasil -0.129* -0.117** -0.215***

(-1.883) (-1.964) (-4.385)

Plano de 2000 * Vietnã 1.064*** 1.043*** -0.303

(3.035) (3.178) (-1.637)

Tendência * Participantes -0.023*** -0.016* -0.023*** -0.016*

(-2.722) (-1.882) (-2.695) (-1,877)

Tendência * Não Participantes -0.061*** -0.061*** -0.061*** -0.061***

(-5.293) (-5.172) (-5.527) (-5.174)

Tendência * Vietnã 0.137** 0.138**

(2.590) (2.593)

Tendência * Brasil -0.008 -0.006

(-1.154) (-0.875)

Log (Produção) 0.760*** 0.759*** 0.747*** 0.713*** 0.746*** 0.713***

(14.784) (14.647) (15.352) (13.746) (15.240) (13.735)

Log (Preço) 0.536*** 0.535*** 0.043 0.055 0.044 0.055

(5.058) (5.068) (0.392) (0.497) (0.400) (0.496)

Log (Câmbio) 0.303*** 0.301*** 0.395*** 0.263*** 0.392*** 0.263***

(3.667) (3.681) (4.498) (4.057) (4.505) (4.048)

Nº obs. 1434 1434 1434 1434 1434 1434

R2 0.84 0.84 0.84 0.85 0.85 0.85

Nota: Estatística t entre parêntesis. Os devios-padrão foram corrigidos por heterocedasticidade

*** significativo a 1%; ** significativo a 5%: * significativo a 10 %.

Preço: preço de referência por qualidade da OIC

Page 45: Subsidiando o debate

45

5.3 Análise dos resultados

Todas as equações tiveram como base a função de exportação básica descrita e,

em todas, a produção teve o coeficiente significativo a 1% com os coeficientes variando

de 0,71 a 0,76. O câmbio também foi significativo a 1% em todas as equações, com o

coeficiente variando de 0,26 a 0,40. Os coeficientes estimados dos preços foram

significativos enquanto não utilizamos a tendência nas equações estimadas, o coeficiente

ficou em 0,54 sem a tendência.

Na equação I, o coeficiente da interação entre a dummy plano 2000 e participantes

do plano foi positivo em 0.29 e significativo a 1%, contrariando a expectativa de que

apresentasse um coeficiente negativo. A interação da dummy plano 2000 e os não

participantes do plano não foi significativa a 10%. Na equação II, o coeficiente da

interação entre a dummy plano 2000 e participantes do plano se manteve positivo em 0,31

e significativo a 1% e o coeficiente do Vietnã foi positivo em 1,06 e significativo a 1%.

Na equação III, os dois grupos mostraram uma tendência levemente declinante e

significativo a 1%. O coeficiente da interação da dummy plano 2000 com a dummy

participantes se manteve positivo no valor de 0,24. As interações da dummy plano 2000

com os não participantes permaneceram não significativos a 10%. Na equação IV, o

Vietnã apresentou uma tendência de alta enquanto o grupo de não participantes, ao qual

ele faz parte (excluímos ele nessa equação), apresentou uma leve tendência de queda,

porém significativo a 1%. O Brasil não apresentou uma tendência com o coeficiente

tendendo a zero e não significativo a 10%. O coeficiente da interação da dummy plano

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2000 com a dummy participantes continuou positivo no valor de 0,24, demonstrando que

se extraindo a tendência, o grupo exportou mais durante o plano de 2000.

Na equação V, o Brasil apresentou um coeficiente de -0,12, significativo a 5%,

enquanto a interação da dummy plano 2000 com a dummy participantes apresentou um

aumento de 0,26, significativo a 1%. Os coeficientes da tendência do grupo de

participantes e do grupo de não participantes continuaram apresentando uma leve

tendência de queda de -0,02 e -0,06 respectivamente, ambos significativo a 1% Na

equação VI, o coeficiente da interação do grupo de participantes foi positivo em 0,26

enquanto o do Brasil foi de -0,22 (ambos significativos em 1%). O coeficiente dos não

participantes não foi significativo. A tendência dos não participantes foi de -0,06 e

significativo a 1% enquanto a tendência do Vietnã foi de 0,14.

Com base nas informações obtidas na tabela 4, podemos destacar alguns aspectos

do Plano de Retenção de 2000 e criar algumas hipóteses a cerca do comportamento dos

países produtores durante a sua implementação. Primeiramente devemos observar os

países que não assinaram o Plano. Não encontramos coeficientes significativos durante o

ano 2000 em relação ao seu comportamento em todas as equações feitas, porém no que se

refere a tendência, o coeficiente foi de -0,06 nas equações III, IV, V e VI e significativo a

1% em todas. O Vietnã se destacou dentro do grupo com uma tendência de 0,14, que

equivale a uma taxa de crescimento de aproximadamente 15% ao ano.8

8 Para encontrarmos a variação percentual dos coeficientes estimados, é necessario calcular a exponecial e

x.

No caso de 0,137, o valor encontrado foi 1,146 que equivale a 15%.

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Assim como os demais produtores que não assinaram o acordo, o Vietnã não

estava obrigado a reter café e operou livremente no ano 2000. O coeficiente encontrado,

na equação II de 1,06 equivale a um crescimento de 190% no ano 2000, conseqüência

direta de uma safra recorde (o ano anterior também foi recorde). Podemos considerar que

o Vietnã como novo produtor e apresentando taxas elevadas de crescimento, não

dispunha de uma estrutura apropriada para estocar café em seu país. O efeito direto do

Vietnã no grupo de não participantes foi o aumento de sua parcela de mercado, que

historicamente esteve em 29% e no ano 2000 foi de 38%.

Entre os países que assinaram o Plano de Retenção, o Brasil se destaca pela

redução das exportações. Na equação VI, o Brasil apresentou o coeficiente de -0,22 e

significativo em 1%, que equivale a uma redução 24% nas suas exportações no ano 2000,

agindo em linha com as diretrizes do Plano. O grupo de participantes teve um

comportamento oposto no ano 2000, em comparação com o seu histórico, em todas as

equações feitas houve um aumento do volume exportado com o coeficiente variando

entre 0,24 e 0,31, que equivalem respectivamente a 27% e 36%. Isso sugere que dentro

do grupo dos participantes, alguns países agiram de forma oposta, beneficiando-se do

preço estável para aumentar a suas vendas no mercado.

O Brasil agiu em linha com o acordo, enquanto os demais países exportaram mais

café que previsto. Podemos sugerir algumas hipóteses para o comportamento desses

países que não cumpriram o Plano, analisando os dados e alguns fatos do mercado

anteriores à implementação do Plano.

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O indicador composto publicado pela OIC superou, após alguns anos de queda, a

marca dos US$ 100 centavos por libra peso em maio de 1994. Os preços dos cafés

arábicas, assim como medido pela OIC, permaneceram acima de US$ 100 centavos por

libra peso até dezembro de 1998, o mesmo ocorrendo para o indicador de preço dos cafés

chamados Naturais. Já para os cafés agrupados no indicador suáveis compilando

basicamente cafés da América Central e México, a quebra da marca de US$ 100 centavos

por libra peso só ocorreu em junho de 1999, enquanto o indicador dos suáveis

colombianos quebrou esse nível de preços somente em julho de 2000.

Em 1995, o cenário, o preço e os fundamentos para os cafés arábicas pareciam

estáveis, com todos os países produtores exportando a totalidade de suas produções

exportáveis e, no caso do Brasil e da Colômbia, escoando estoques de safras

remanescentes. O caso do Brasil é notório e permitiu ao Governo Federal a redução de

expresso volume de estoques. A permanência dos preços do café, assim como medido

pelo indicador composto da OIC, acima de US$ 100 centavos por libra peso por quase

cinco anos e sua abrupta queda desde fins de 1999 têm várias explicações, dentre as quais

podemos destacar duas: desde 1997, reproduziu-se a expectativa, entre maio e novembro

de cada ano, de que o Brasil poderia produzir uma super safra e, desde janeiro de 1999, o

Brasil alterou a estrutura mundial de preços em conseqüência da desvalorização do Real.

Nesse cenário, os demais participantes do plano poderiam considerar a iniciativa

brasileira, em relação ao Plano, com alguma desconfiança. O Brasil tinha reduzido

substancialmente os seus estoques e a desvalorização da moeda daria uma impulsão às

exportações brasileiras e posteriormente na produção. Nos resultados obtidos, o câmbio

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tem um impacto considerável nas exportações, com o coeficiente em torno de 0,24 e 0,40,

que equivale a 30% e 48%, ou seja, uma desvalorização cambial teriam um forte impacto

nas exportações.

Os fatos e o desenrolar dos acontecimentos corroboraram a interpretação acima. O

acordo da APPC foi negociado em maio de 2000, ficando o Brasil para instalar suas

retenção a partir de junho e os demais países (basicamente América Central) a partir de

outubro de 2000. Isso se deve ao fato de que a safra dos Centrais começa em setembro.

Sendo assim, os demais participantes poderiam obter informações sob o comportamento

do Brasil em relação a retenção. Apesar dessa característica, os demais participantes não

cumpriram o acordo, o que indica um incentivo que estes tiveram durante a vigência do

Plano.

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6 CONCLUSÃO

O programa de retenção de café de 2000 foi estruturado de tal forma que não

havia limites estabelecidos quanto ao volume de café exportado. Não havia, tanto na

regulamentação governamental sob a matéria, bem como no texto do Acordo de Retenção

da APPC, qualquer dispositivo que regulasse ou fixasse limites volumétricos. Por outro

lado, como o programa vincula a exportação de café de cada empresa à retenção prévia

de 20%, uma safra muito grande poderia ainda assim gerar um excesso de oferta no

mercado. Além disso, foi introduzida no sistema exportador de café verde duas novas

variáveis: a formação compulsória de estoques e a necessidade de recursos financeiros

em volumes mais significativos.

A principal diferença em relação aos planos anteriores foi o sistema de controle

menos efetivo. Enquanto em um plano anterior, em 1993/1994, o cumprimento foi

praticamente geral, no Plano de 2000 praticamente apenas o Brasil adotou a retenção. O

Brasil serviu de “guarda-chuva” de preço ao seguir rigorosamente o Programa de

Retenção, abrindo uma proteção de preços para os demais, que se aproveitaram da

retração brasileira no mercado e ampliaram as suas vendas.

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No ano de 1999, em regime de mercado livre, o Brasil exportou 23 milhões de

sacas, que corresponderam a 27% do mercado. No período de um ano em que vigorou o

Plano de Retenção, junho de 2000 a maio de 2001, a participação do Brasil caiu para 19

milhões de sacas, ou 21% do mercado. Assim, durante o período de retenção as

exportações globais aumentaram, contra os objetivos do programa, enquanto a

participação do Brasil caiu significativamente e os demais países se beneficiaram.

A retenção se estenderia pelo prazo suficiente para o aumento dos preços

internacionais, de acordo com os objetivos previstos. Contudo, desde a sua implantação

até o seu final, em maio de 2001, os preços caíram. No início, em junho de 2000, a 2ª.

posição de Nova York era de US$ 92,22 cents por libra peso, enquanto ao final, em maio

de 2001, a mesma posição foi de US$ 65,80 cents por libra peso.

O plano não previa sanção para os participantes que não cumprissem o acordo.

Contudo, as auditorias que deveriam ser realizadas para medir o cumprimento não foram

realizadas e nenhum país foi penalizado. A duração efetiva do plano foi de junho de 2000

a maio de 2001. A partir dessa data nem mesmo o Brasil seguiu o Plano e ele foi

oficialmente extinto em novembro de 2001.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BACHA, E.L. Política Brasileira do Café: Uma Avaliação Centenária, Marcellino Martins & E. Johnston Exportadores Ltda. Rio de Janeiro, 1992.

DELFIM NETTO, A. O problema do café no Brasil. Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1959.

GREEN, E., PORTER, R., “Non-cooperative Collusion under Imperfect Price Information”, Econometrica, 1984.

LEVENSTEIN, M.C.; SUSLOW, V.Y. “What Determines Cartel Success?” Journal of Economic Literature, 2006.

NORTH, D.C. Institutions, Institutional change and economic perfomance. New York: Cambridge University Press, 1990.

OLSON, M. The logic of collective action. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1982.

PINDYCK, R.S.; RUBINFELD, D.L. Microeconomia. São Paulo: McGraw Hill, 1994.

STIGLER, G. “A Theory of Oligopoly”. Journal of Political Economy, 1964.

TIROLE, J. The Theory of Industrial Organization. Cambridge: MIT Press, 1988.

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SÉRIES UTILIZADAS

Os dados foram obtidos no site da OIC: http://www.ico.org/historical.asp

O câmbio real foi obtido no site da USDA: www.ers.usda.gov/data/macroeconomics/Data/HistoricalRealExchangeRatesValues.xls

País – Ano

Variáveis: Produção (sacas de 60 kg) – Exportação (sacas de 60 kg) – Preço (c/lb) –

Câmbio Real

Dummies:

Dentro do Plano: igual a 1 para países que assinaram o acordo

Fora do Plano: igual a 1 para países que não assinaram o acordo

Plano de 2000: igual a 1 para o ano 2000

Trend: igual a uma seqüência de 1 a 30 para cada país

Brasil: igual a 1 para o Brasil

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Vietnã: igual a 1 para o Vietnã

Dentro do Plano s/Brasil: igual a 1 dentro do Plano com zero no Brasil

Fora do Plano s/Vietnã: igual a 1 fora do Plano com zero no Vietnã.

Preços:

O site da OIC disponibiliza 5 séries de preço para o café. Os dados são séries

mensais de preço e representam o preço real das exportações de café mundial. Toda

exportação de café feita pelos países produtores recebe um número de referência da OIC.

Esse número só é dado após a informação do valor da exportação. O principal indicador é

o Indicador Composto que não faz referência a qualidade do produto. Os outros quatro

são: Suave Colombiano, Natural, Outros suáveis e Robusta.

Nas equações feitas, optamos por utilizar os preços por qualidade para incluir

qualquer tipo de diferença de preços entre as qualidades. Segue a lista:

Suáveis Colombianos: Colômbia.

Robusta: Angola, Costa do Marfim, Gana, Madagascar, Nigéria, Togo, Uganda Benin,

Camarões, República Central da África, República Democrática do Congo, República do

Congo, Guiné Equatorial, Guiné, Indonésia, Libéria, Filipinas, Serra Leoa, Sri Lanka,

Tailândia, Vietnã.

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Naturais: Brasil, Etiópia, Gabão, Quênia, Ruanda, Tanzânia, Burundi, Cuba, Índia,

Malásia, Papua Nova Guiné, Paraguai, Zimbábue.

Outros Suáveis: Bolívia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Honduras,

Nicarágua, Venezuela, República Dominicana, Haiti, Jamaica, México, Panamá, Peru,

Trinidad & Tobago