sobre a ignorancia ou direito · a ignorancia e o contiecimento, porque nesta existe uma relação...

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ESTUDO SOBRE A IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO A CMA DAS SCRSTITUI~~ES DA FACULDADE DE DIREITO NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA PELO Dr. Jose Pereira de Paiva Pilta COIMBRA Tmpronsn da Universidade 4871

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Page 1: SOBRE A IGNORANCIA OU DIREITO · a ignorancia e o contiecimento, porque nesta existe uma relação qualquer, positiva ou negativa, entre o pensamento e o objecto, mas naquella nenhuma

ESTUDO

SOBRE

A IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO

A CMA DAS S C R S T I T U I ~ ~ E S DA FACULDADE DE DIREITO

NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

PELO

Dr. Jose Pereira de Paiva Pilta

COIMBRA Tmpronsn da Univers idade

4871

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Como candidato As substituiçcjes ordinarias da faculdade de Direito lia IJniversidade de Coimbra, deviamos, segundo as disposições do artigo 1 i do Regulamento de 22 de agosto de 1866, apresentqr uma dissertação inipressa sobre niateria juridica da nossa livre escolha.

Tain numerosas e vastas são as repartições da sciencia juridica, que não era certamente a falta de pontos interessantes, que nos embaraçava a esco- lha; mas ao contrario a grande cópia d'asstimptos nos trouxe indeciso por alguin tempo sobre aquella repartiqão, a que dariamos pi.eferencia.

Reflectiildo porem que os esforços de nossos insigiies jiirisconsultos conveiyein principalmente para o estudo das doutrinas do nosso Codigo Civil, deixkmos-nos ir na corrente de t%o ab~lisados nies- tres, e resolvemos definitivamente restringir a es- collia do assuinpto ao Codigo Civil.

'i'inliniiios feito já tiin estudo particular sol~i~e o artigo 8 do niesmo Codigo, no qual se consagra o principio da não retroactividade da lei, e agora para theiiia d'este trabalho escollienios outro principio

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n b menos interessante tanto n8 theoria conio na yrrictica, a ignorancia da lei ou erro de direito, objecto do artigo 9 do mesmo Codigo.

Beni coriliecemos, e ainda mal, que nRo tracta- mos o assunipto como pedia a sua gravidade, e como era desejo nosso.

No entretanto não teremos feito pouco, ee con- seguimos chamar a attenflo de melhores engenhos sobre a intelligencia da doutrina, consignada no pre- sente artigo, e sobre a sua verdadeira applicação 4s variadas liypotheses do direito civil.

O nosso traballio, com quanto nRo tenha divi- scies geraes, pode todavia considerar-se dividido eni duas partes. Na primeira tractainos do erro de di- reito segundo os principios geraes da sciericia, c segundo alguns dos principaes Codigos antigos e modernos; e na segunda procuramos expor rr doutri- na do nosso Codigo sobre esta importante materia.

Se este trabalho tem lacunas, como cremos, pos- sam ellas ao menos ser suppridas pela discuss8o oral, a que elle 8 destinado, assim como pela bene- volencia de nossos julgadores e leitores.

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DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO

Da ignorancia oii erro em geral

Ignorancia define-se geralmente a privação ou ausencia de qualquer conhecimento, e erro o juizo falso que se toma por verdadeiro. A dil'ferença pois entre ignorancia e erro é bem visivel; porque na ignorancia não ha relação algu- ma entre o pensamento e o objecto, ou não ha conliecimeii- to; e no erro affirina-se alguma relação entre o pensamento e objecto, embora essa relação não seja conforme com a re:ilitlade: numa palavra, o erro P um conhecimento, e a ignorancia a falta de qual(luer conliecirnento, verdadeiro ou falso. E assim entre a ignorancia e o erro da-se a mesma differença que entre a afiirmaqão e a riegaçáo, visto que na ignorancia nega-se o conhecimento, e no erro afirma-se.

Porem ainda que o erro se tlistingua da iqriorancia, por- que afirma o conliecirnento que a ignorancia exclue, tem todavia um carncter negativo; porque affirmao conhecimenlo, mas riso em todas as suas determinações. O conhecimento determina-se como verdatle e como erro, e por isso o erro não é todo o conhecimento, mas o conliecimento opposto ;i

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8 DA IGNORANCJA OU ERRO DE DIREITO

verdade. Numa palavra assini como a ignorancia e a exclusão de lodo o coriliecimento, assim lambem o erro i: a exclusão de algum conhecimento, o \lertlacleiro; visto que o erro e a negação da verdade. I'ortarito se o erro se manifesta sob a forma de afirmaqão, coiisitleratlo em relação a ignorancia, assume todavia o clir;icter negativo, quando se considera como opposto da ~ e r d a d e . h ignoraricia prcsuppfie o conhe- cinierito, assim como o eisro 1)rcsiipl)fic: a vcrdatle, porque a neçação não pode co~ic-eI)ei~-si~ bcm ;i aBirniacáo, pois uma negaçáo que não negasse alguma cousa positiva deixaria de ser verdadeira negação.

Considerada a ignorancia em quanto ao sujeito e ao obje- cto, não offerece outra differença senão, que nem todo o objecto pode ser ignorado, visto que não ha ignorancia total ou absoluta; pois d'outra sorte tambem não poderiamos explicar o conhecimento: mas olhada pelo lado da relação entre o pensamento e objecto, i: capital a differença entre a ignorancia e o contiecimento, porque nesta existe uma relação qualquer, positiva ou negativa, entre o pensamento e o objecto, mas naquella nenhuma absolutamente, visto que a sua essencia consislr, na negação tle toda e qualquer re- laçao enlre o espirito e o1)jec.l~.

No c\rro (IA-sc atjuclla relação, mas 6 uma relação riega- tiva, ariormal, qiie tiao corresporide a essencia objectiva (Ias cousas; pois ai'fii*ma o qiie devia negar-se, ou nega o que devia afrirrnar-se.

Como o objecto (Ia ignoraricia i! a negação do conheci- mento, c, o nhjecto tlo erro e a sua altirmaç'io, segue-se que tanto a ignoraricia como o erro porlilni te r as mesmas de- lerminacóes que o cor~hecimento. 0i;i o conhecimento, se- guriclo as funcções do pensamento, tlrtcrmina-se como noçáo, como juizo c como raciociriio: 1030 nós podemos ignorar nocões, juizos ou raciocinios, assim como as noções, jiiizos e raciociriios podem ser falsos ou erroneos, isto e, materia dos nossos erros.

Deve porem notar-se que, implicando todo o erro affir-

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DA IGNORANCIA OI: ERRO D E DIREITO 9

mayáo, c portanto jiiizo, não pode ter por objecto senão noqóes determinadas, e ii'io noqões irideterminadas, ou aquel- Ias qiie se criunciam simplcsinente, sem que o nosso espi- rito afirme ou negue :ilguma çousa d'ellas, riem a mesma existencia objectiva.

E por isso que Aristoleles poili:~ dizer que os termos, conkideratlos em iibslracto, conio no trvactado clas calesoriae, não expriniem erro iieni verdade.

Da ignorancia do Direito Natural

Dadas estas noções geraes sobre ignorancia e erro, vamos agoraexaminar a influencia da ignorancia e do erro na de- tertniria$áo e applicação c10 rlireilo.

O ilireito t! racional ou positivo; o por isso ex;imiiiare- mos a qiicslão 1)rimeiro no dominio tlo dircilo ~)liilosol)liico.

Senilo o tlircito racion;tl tima idCa cla razao, c a r;izáo lima f;iciiliinilc essenciiil ;i natureza humana, e 1)orlaiito commum ;i totlos, segiic-se que ri20 podemos negar nu homem o co- rihei*imcnto tlo direito sem negarmos o mais hcllo attribu- to, cnm que Ilivina Providencia approiivc nrlornal-o. A idCa (10 tlircito e clo justo caristituc um futido commum a totlas as iiilclligencias humanas, e liortaiilu iiáo pode ne- 6';"-w a ningiiem. Atlmittir a ignorancia do direito nos seres r;icionaes, era cxaucloral-os oii r(:haixal-os tla catliegoria de pessoas i plana das cousas. Sib os liomons, cm todas as sitii:ições tla vida, julgam da juslica oii injiistiqa tlas suas acçóes, assim como das leis positivas, i: ljorquc elles têm gravaílas na sua consciencia as id6as (10 direito e do justo; pois rl'outra sorte taes juizos seriam absolutamente impos- siveie.

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10 DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO

E m todo o juizo particular lia a distinguir a materia e a forma; a materia pode ser fornecid;~ pela experioiicia, mas a forma não; porque, sciido a foi-ma coridi~áo n priori de todo o juizo particular, f,iz-se irnpossivel a formado d'um primeiro juizo, scm :i ~~rccxisteii(:ia ila rorma tl'cssc juizo. Ora a forma dos 11os4o.s juizos moracs $20 as idoas (10 bem, do direito e ilo justo, e se lodos os I iom~ns Iormam taes juizos, como nos mostra a observayão, 6 porque estas idêas são o patrimonio cornmiim de totlas 3s intelligericias.

Não ha pois ser algum raciorial, rio I I E O (I't~sta f;lci~lda- de, que possa :~llegar ignorancia do dircito iiatur-al, sem rieçar o seu caracter de ser racional. É Iiroprio (10s seres racionaes não obrarem sem motivos, r osscs motit~os são n expressk tla lei, a que se consideram obrigados em cada um dos casos particulares da vida. Aqiielle individuo qiie não souber dar a razão (Ias suni tlrtermiriayões não pode reputar-se um ente racion;il, porque 6 tán impossivel de- terminar-se qualrjuer scrn inoti\os, como absurclo obrar, ignorantlo os inotivos das süiis acyões.

$Ias se o principio do direito c iiriivers;il, como o prova a universalidade clo juizo que totlos os Iiomrns rio uso da siia razão fazem iccrca das suas acqões e iI,is Iris positi- vas, a clivcrsidade e ale a o l ~ l ~ i ) > i ~ á o tl'cstcs luizos coriven- ccm-nos da riecessidatle qiie Ii;i de delcriniiiar o principio do direito; pois que, se todos Lkin a idea tlo dircito, nem todos o concebem tlo rnesmo inodo, coino se prova pela diversidade de opiriiões Acerca (10 que B direito e do que e justo.

-4 ditlersidade de usos e costumes, e a variedade de in- stituições entre os povos, ainda que fosse maior do que ê sealmenic, bem longe de provar a ignorancia, ou ausericiii tia itlêa do direito, ao contrario prova qiie os povos tem conhecimenlo c10 direito; mas riem todos o conlic~cem tlo mesmo modo.

E riem admira que entre os povos não Iiaja maior arcordo acerca do direito e do justo, quando n6s 17cmos os homens

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DA IGSOI<ANClA 01- EI<RO DE DIREITO 1 1

itliistrados di\riilidos em diversas escholas sobre a origem e legitimidade do direito, entendendo uns que o crilerio do direito csth na razão, outros ria historia, uns na lei, outros na educac:ão, e oiitros 113 iontade divina ou Iiinnaria, outros no prazer, na iitilitla(le 1)crn cnteridida o u no iiitrresse do maior riuiriero, e outros ;iincla na sympattiia.

Mas esta ( l i \ orsitlatle clc opinioes sobre o \ t~i~tl;iileiro cri- terio tlo tlireito ri20 ;icciisa a igrioraiicia tlo iiitbsiiio direito, mas o seu conheciin[into, embora erroneo, porcliie a igno* rancia exclue o coriliccimento sob todas as forrn;is, e por coiiseguiritc tanil)cin sob a forma tl'opinião. 1)'oiitle se con- clue que, se ria pliilosopliia cio direito airitla se comrnettem muitos erros, não tia tod;ivia igriorancia sobre os seus prin- c i p i o ~ fundameiitaes, porque, se tal igriorancin sc (lesse, todos os jiiizos moracs verdadeiros ou falsos seriam impossiveis, juizos rluc, segundo temos visto, são feitos por todos os ho- mens no uso de razáo.

Alguns costiiinam fazer distincção entre ignorancia ven- c i ~ ~ e l e ignorancia in\erici\~~l, e enlrc principias primarios e priiicipios remotos ou secundarios tla lei natural.

NOS porem eiiteiidemos que toda a ignorancia e inven- civel no moinerito em que stb 11ractic;i o acto, porque, se o agcntc susl)eitasse tl;i sua ignoraricia, deixava (lu ser,igno- rarite. Rl:is ;iiiicla por oiilir~ I;i~lo rios parccc que similharite tlistiiicção não tcm furitlainrrito algiiin, c que aquclles qiie 3 Tuem coiifunclem a i,nriorarici;i coiii o crro; pois que todos potlem errar sohrc a ~erdiidcira riiitureza do direito e do justo, mas não podem ignorais estas iifSas; visto que são i d h s geraea e eternas, concebidas pela razão a priori.

Que se dA erro sobre a nofio clo tlireito e tlo justo, não pode negar-se, visto que a diversitlnde do jiiizos e bem clara, mas o que resta saber i: se e w erro spr;i eucusa~e l naquelles qiie o coinmetiein. S e ;i iii.11 i i i . 1 ~ 7 0 i 1 uni dever, e contlição para o cumprimento de iotlo.: os de\-cres, i! evib dente que qiiem não sabe, podendo e deverido saber, não pode eximir-se (Ia reponsabiliclacle pelas obriga@es que dei-

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12 DA IGNORANCIA 0 1 7 ERRO DE DlIU3ITO

xou de ciimprir por falta de instr i ic~io. .4 acqão ou omis- são practicadas por erro podem ser impiitatlas, náo porclue stbjani voluntarias em si, mas ~iortjilo niiiitas vexe5 o Foram na causa, como succede cjuariclo o açerilc potlentlo c de- vendo instruir-se despresou ;I iristi-iicyao. Alas se esta in- strucq5o era irnpossivcl, conio se vci4ic;i rio caso em que todos us hornens de cer t ;~ rcgiCo pcbnsarii n ol~r;rni ilo me- smo modo, em tal c:iso não ~)oilc~ a Falta clc iiistritc~30 con- siderar-se como volurrtaria, rwm (J agente C: respoiisa\el pelas acções mas que practicar por boas.

Direito positivo

Corno nem todos os homens concordam entre si sobre as n o ~ ó e s do direito e do justo, e como ainda qric concordas- sem, muitas vezes faltariam ao ciimpri~iit~iito das suas obri- garõcs al)solutas, dcminados pclas l);iisGes, oo arrastados pelo iriteresse, por isso os princípios clo tlirriio natural, para se toriiarem certos e efficazes, d o rrtluzidos ás regras ge- racs obrigatorias para todos os membros da sociedade que formul;~ estas regras.

Não hasta porem formular os principios do direito em regisas positivas para que estas regras se,jam obser-vadas pelos povos. E necessario que elles as coriliec;am, e como elles ri30 as possam conhecer serião por meio da pu1)licaçáo quc se faca rl'ellas, segue-se que toda :i I c ~ i l)ositi\la pirra obrigar, (leve ser ~~ulilicada primoiranicrite. ,\ necessidade da piil~licayCo clas Icis po>iti\as h láo vihivrl, que não ha povo algum na Iiistorin que tivtlsse a louca pretençáo de exigir a ot)serv;ii~citi (Ias suas lei.;, sem rluc ao menos tijresse prociiraclo leval-ah ao coiiliecirncrilo de todos pelos meios

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DA IGNORANCIA ou ERRO DE DIREITO 13

que julgava mais acteqiiatlos a este fim. O systema adoptado na publicaç~o das leis nos diversos tempos e entre os di- icrsos povos i: que tem \ariatio com os progressos siicces- sivamerite realisados nas fornins da manifestação dos nossos pensamcritos, mas a necessidade da manifestação tia mente tfo legislador, e a pul)licação das providencias por elle atlopla- das para o bem commiim dos povos a quem dirige, é que sempre foi e lia de ser reconhecida, porque pode facilitar-se e simplificar-sr a jiri1)licação das leis, mas nunca sc 1)otIera presciridi~. tl'ella, I)orque o legislador não tein outro meio de fazer conliecer R sua \oiitatle, senão a manifestac:50 ex- terna, scja qiia1 for n f o r n ~ ~ i ~ioi ' quti ella se faça. O pre- @o, 3 gravura, a e~c.i.il)ta, a imprerisa, a aflixal:áo, tBm sido OS meios eniprrgados j;i sucaccssiva, já siinultaneamente na p1hlica~5o tlas leis. Seja ~iorein qual for o meio, pelo qual se procure l e ~ a r a lei ao conhecimento dos povos, é sempre absolut;irneiite iieressni io qiie as leis sejam conhecidas para podcrem obrigar.

Mas se a Iri não potfe obrigar antes da sua publicação, ~ ~ o r q i l e não aind;~ conliccitln, segue-se que deve obrigar tlepois de sufficientcmerite pi.omulçada, porque o mesmo i! publicar a lei, que tor~ial-a conl-iecida pelos povos.

Com efreito, se a lei n5o obriga antes da publicaçao, porqiie ri50 O ainda cor~hecidn, c sc n pilblicação da lei tem por fim lcval-;i ao conlit~cinicrito (10s subditos, segue-se lo- gicameiite tjiie a Ici clcliois (Ia sua ~)ublicaq?io deve presii- mir-se ronliecitln, e qiic 1150 iodo lidmittir-se ignorancia tla Ici quarido terili;\ sido suficicntcmente publicada, isto é, (luando o Icgislatlor tenlia feito a promulgação da lei segundo o systemn anteriormente estabelecido, o11 segundo aquelie rl11c Ihc pareça mais accommodado ao fim da piiblicaçilo tlas leis.

A ignoraricia da lei depois de publicada não pode attri- 1)iiir-se scnáo a uma de duas causas, ou 6 negligencia dbs subclitos em se instruirem Acerca da cxistencia da lei e das suas proscrip~õcs, ori i imperfeição do systema adoptado

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14 DA IGNORANCIA 01' ERRO DE DIREITO

para a publicaqão das leis, e em qualquer dos casos o meio de evitar o inconveniente resultante de qualquer das duas causas não e permittir a ignorancia tl~i lei, mas reformar o systema da publicação. O legislador qiie adrniltisse a alle- gação da ignorancia d'uma lei depois de publicnda, ou au- c tor isa~a com este facto a indolencia c iiicliria dos subdi- tos em tomarem o devido ronhecimento das leis promul- gadas, ou confirmava elle proprio a ini1)erfeic;ão do systema seguido na ~~romulgação (Ias leis. S e o fim da publicac;ão das leis i! o coriliecimento tlns mesmas, da parte dos sub- clitos, i: logico tluc. prcstatlos os meios, se repiitein preen- cliidos os fins. A s i m como riao pode admitiir-se, ou niellior, exigir-se tlos suhtlitos o c~oiiliecimeiito (Ias leis arites da sua pufilicacáo, tanibem iiáo pode nem deve admittir-se a igno- rancin t ln Ici deljois tle put~licatla, porque tla publicação deve resultar o coriliecirnento da mcsrna, como a consequen- cia resiilta tlo principio, e portnrilo ailriiittii* a ignorancia i! riegar a publicn$io, ou pelo merios a siia sufliciericia, o que o legisladnr náo pode fazer sem contr,itlic.qão ou sem grande (lesar. Finalmerite a ignoraiicia da Iv i ~)ublic;itla tia de im- putar-se ou ;i negligencia dos siil)tlitob, oii i insiilficiencia do legislador. Ora iião deve atlmittir-se a igriornncia no pri- meiro caso, porque as leis não devem relevar, mas censii- rar as omissões çulposas dos homens, e no segundo, por- que se o meio 6 insuffiçierite, aperfeiçoe-se, mas iião se inutilisc assim.

Ainda porein que estes principios sejam verdadeiros e as cons~qiiericias rigorosas, est5o hem longe de sc realisar na practica cin toda a sua exteiisáo. Com efffeito o conhecimento da lei ctcpois rle publicada ser6 um principio, ou antes uma consequencia logica e necessaria, qiie resiilta do facto da publicayáo, mas este principio oii coiiic~qiiencia não passar8 muitiis vezes d'urna simplrs lic<;3o Icg;il. que a ordem pii- blica pode reclamar, rnas cuja realitli~ile b formalmente des- mentida pelos fac.tos. Neste ponto 1150 lia perfeito accordo tla lopica com a liistoria. Se o raciocinio nos leva a (lar por

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DA IGNORANCIA OU ERRO !#R -1TO 1 6

conhecida uma lei publicada, a observação nos moslra que nem todas as leis piiblicadas são ou podem ser conhecidas de todos os subditos. O conhccimcnto das leis, por mais perfeito que peja o systema de siia publicnqão, serA sempre urn ver- dadeiir9 impossivel moral. Quando pois se estabelece qiie a ningk~em e permittido ignorar as leis que jA tiverem sido publicadas, não se quer dizer que todos conhecem realmente as leis, porque seria negar os factos, ou a realidade, mas despresando-se os casos particulares, attende-sc siimente á regra geral, oii antes attende-se As exigericias da orderri so- cial, porque se se estabelecesse o principio contrario, isto e, que a totlos era pcrinittiila 3 ignorancia das leis, iiirida tlepois tla sua p~il)lic;ição, seria não sU iriutilisar absolrita- mente os i~ffeitos logicos da piiblicayáo, mas tambem em- Ilaraçar çiS;iv~incrite n acção da jiistica, protrahir a execiição (Ias leis, esigindo, como condição cla sua observancia, o co- nhecimento indi~idiial das leis. O legislador, quando pro- rnulgn alguma lei, náo se dirige a cada um dos cidadãos individrialmente considerados, mas falla ao corpo moral da ria~ão, e por isso feita a publicay3o e preencliidos todos os requisitos exigidos para que as leis se reputem promulga- das, segundo o systema anteriorme~ilr estabelecido, ou s e gurido o rnotio prescripto na mesma lei, totlos sem excepção ficam obrigados ;i observancin das siias presci~ipções.

Alguns auctores, atlmittinclo o principio geral tle que a igno- rniicia t l ~ lei, tlepois da poblicaqáo tl esta, a ~iiriguem npro- veita, enlendem todavia que sirriilliaritr I ) I iiicipio esusceptivel rle algunias modifica-iies ri:] pi.;iciicn. .lssirn quando por força maior, como guerra oii pestc, Iiuiivcr moti10 para crer que ns suhrlitos tle ccitta proviricia rião potlem ter conhecimento (Ias leis puhlicadas por estii occasião, deve aclmittir-se-lhes a allegaçáo da ignorancia das leis. Outros opinam ainda que aos subtlitos, que ao tempo (Ia promul~açáo d'algum:~ lei se acha\larn auscrites crn p;iiz extrangeiro, se deve admit- tir a ignorancia rl'esliis leis. Oirtros firialrnerite ensinam tam- bem que o ~iriricipio gei';il, consagratio em todas as legis-

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16 DA IGNORANCIA or ERRO DE D I I ~ I T O

lações dos povos cultos, de que a ignoraricia tla lei a nin- guem aproveita, deve entender-se sUmente das leis codifi- cadas, e não das leis dispersas c extra\ ;igantes. Salvo porem o respeito devido aos auctores d'estas ul~iiiióes, parece-nos que o principio fica ainda de pk, quer porque a primeira d'estas opiniões, bem longe de destruir o principio antes o confirma, quer porque as duns ultimas opiniijes lios náo parecem admissiveis. Com eflciio sendo o fuiitlameiito tla primeira excepçáo a irnpossil~iliilatlt: da public*;içáo da lei, a ignorancia cl'esta dcke adrnittir-se, porcluc a sua piil~li- cação riáo sc fez regular e geralineiite. Ern cluanto i se- gunda opinião, parece-nos que o subditu, quc e s t a ~ a fbrii do seu paiz ao tempo da piiblicaçáo de nlgiiiiia lei, tlere, quando regressar ti patria, tomar conliecim~nto tlas lcis vi- geiites, embora tenham sido publicadas cluiniitt! a sua au- sencia. Demais, se as leis d'iirn paiz sobre certas rnaterias obi,igam aiiitla os 11i.oprios estrangeiros, apezar de náo terem sido publicadas em seus respccti\ios paizes, nenhuma razáo plausivel ha para que o membro do estado, que a lei rege, pretenda eximir-se do cumprirnento das obriçaqões impos- tas por esta, tomando por pretexto da sua içnoraricia o facto da sua ausencia ao tempo da publicaçáo da lei. Em quanto ti terceira, cntendenios que sendo a publicação rlas Iris, o não a siia coclifica~áo, a eoritliçfio exiçitla para quc cllas possam ol)i*ignr, riáo tem logar a distincçáo eiiliBe leis co- tlificatlas e ri50 codificatlas, e qac tanto uinas como outras pelo hcto clc tcrem sido legilirnarnentc publicatlas, obrigam indc~~~:rieleiitemcritc da siia codificac;áo. Rccoiilicceiiios qiic. as Iihis cntliliciitlas potlern coiisultar-so rnnis fiicilmuiitc, c rllie a sua ignorancin mereçe mcnos desc.iill~:i do que a igiin- r;iricia elas leis extravngarites, riins teiido clslas tambein sido ~)~iI~licadas, scnrlo o contiecimc:nto das leis urna (.onscqiicn- cia iogicni e necessaria rla sua ~)ublicat.ão, 1150 pode admit- tir-sc a ignorancia tlas lcis, isto 6: o seli n io coiiliecimento, sem negar o facto da sn;i publicação. M;iis ndmissircl lios pnrccc a tinutrina elos que tlistingueni criti-c tlircilo l)atisio

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DA IGKOHAACIA oc ERRO DE D I H E I T ~ 17

e direito subsidiario, e admittem a ignorancia d'este, rejei- tando a tl'aquelle; porque, achando-se aquelle pela maior parle escripto em lingua extranha, mais dittiril se torna o seu corihecimeiito.

Consitl~r;itln ii quest2o da ignorancia ilo direito 5 luz tios principias, \cjainos como ella tem sido resolvida nos prin- cipaes codiços das nacões cultiis. Comecemos pelo romano, porque n. sua legislaçáo ainda Iiqje i: clcsignacla pelo cpitheto de direito comrniim, dniido assim a cntendeis cjue totlos os povos niodernos que estiveram soh o dominio dos romanos se rcçeritm pelas suas leis tliiraiile inuilos seciilos, e que ainda 110,je a sua iiiflneiicia riãd foi tle todo ariniillada com a ~~ublicação dos ço(ligos modernos, porque aquelles mesmos que rejeilam o clireilo roniano como subsidi:irio o tiveram por uma das suas priricil~aes fontes.

Direito romano

Não lia talvez, em todas as variadissimas instituiçóes do direito isomario, iiin ponto inais intrincado, e sobre o qual os inter1;rc:tes tenham segiiitlo opiniões mais divergentes, do que o da ignorancia ou erro do tlircito. São militas as de- cisões ile casos particuliires em ni;itoria dc erro ou igno- ranciii tlo direito, poucas ;is dispoçiq5es geracs, e estas ainda eni coritradicçáo com a maior partc tlas decisões parbicu- lares.

Os romanos riso ailmittiarn em geral a ignorancin ou erro tlo direito. E exorcssn a I,. 12, Cod., de juris et fact. igno- w n t . , onde se 16 o brgu iiite: Constitzltione.i pn'ncipzim nec igi2orare guemqltam, nec dissimulare pemziui~n~ts . , e n L. 9 . I) , , h. t . Hegula, estjuris quidenl i~noranttntri crtr'que nocwe,

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fncti vero ignorantircrrr non nocere.. . et ibi: sciaa, ignoran- rio114 facti, non juris prodesse. Esta regra porem não era '20 intlexivcl, que não tiverzsrl alg-mas excepções, deduzi- (Ias ji da cliversa materia das relaçoes juritlicas, ja da idade, i6 do sexo e condi(;2o das Ijrssoas. E 6 na determinaçáo 110s casos particiilares, qiie os ~iirisconsultos romanos ex- cliiiram da applicaqfio rla regra geral, que consiste a ver- (ladeira dif'ficuldado da in:rtcisia, e ein cuja determinaçáo se encontra uma graritlc tliver~itlatle tle opini0es entre os in- 1erl)rctes. Qiic os jurisconsiillos romanos faziam um grande numero cI'excel)c6es ao principio dc que ju r i s ignornntiam ctriqiie noçere, se deixa ver clarameritc (Ias palavras que 1)alilo accrescciita, depois de ter exposto a regra geral sobre ;I materi;) sujeita, as qiiaes palavras são as seguintes: Vi- rloo))~zrs iyittcr ifi qtdibus spec*ii~b.rcs locum habere possit. Os rornalios, tlistiriguinrlo ctiidaclos;imente a igriorancia de direito da igno~iricia de facto, e. estabelecendo sobre otna e oiitra (luas ibegr:is oj)postas, deviam necessariamente fundar-se eiri razóes tarnberii oppostas, porque orirle lia diversidade de decisfio rrao pode Iinver de motlo alguiri idenlitlade de ra- zões. Or;i, se nós potlermos atinar com a verdadeira razão, porque os jui~isconsiilios romanos tractaram com mais des- favor o erro de dircilo, tlo que o erro de facto, e se acliar- inos que as razões, em que se fundaram para estabelecer tliias regras o~)posi;is sobre ;r ignorancili dc direito e sobre ;i igiioraiic.ia tlc facto, 1120 procedem eiii todas as hypottie- ses que se possam in~agin;ri, ~)ndercnios em certos casos iiiverter ns rrgras, r clizci. tliie eni ;ilguris casos aproveila a igriorancia cle tlircito c cliit: erii alguns outros não apro- \cita a ignor;iiicia de facto, porque irivertidas as razões [ião podem tleixai- tle irivcrter-se as regras.

Ora qual serii a razáo, pela qual a ignorancia de direito ein geral r140 sprobeita, e pela qual aproveila o erro de hc.to Y

Responde o jurisconsullo Neracio na L. 3, D., h. t.: ln ovnni parte error in jure non eodc>m loro, q2l0 facti igao-

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DA IGNORANCJA OU ERRO nE DIREITO 19

raatia, haberi debebit: cum jus Jinittcm et possit esse, et de- beat : facti interpretatio plwumqcle etiana prtcde~issimos f a l h ~ . Como o direito pOSSi1 e deva ser definido e certo, por isso a ignorancia de direito em geral náo pode escu- sar-se, e como o conhecimerilo dos factos possa escapar ainda aos mais bem a\is;iclos (prudentissimo.\), por isso a ignorancia de facto eni gclral riitbrece mais desculpa, do que a ignorancia de direito, visto que t: mais facil saber-se o direito, do que os facio. Mas, se os factos fossc3m publicos e notorios, de sorte que a sua igriorancia revelasse lima gracde incuria, nesse caso r150 deveri attender-se a igiio- rancia d'elles, porque 1130 milita jti a mesma razão da sua dificuldade e complicaqão, prudentissimos non fallat eorum interpretatio. E náo si, o que se tlediiz, á contrario senso& da r a ~ á o , com que o jurisconsullo Neracio jtistifica a igno- rancia tle facto, mas tambem o quc i: formalmente reco- nhecido por l'aulo nas seguintes palavras: Sed fhcti igno- rantia ita demum cuiqtce nnn nocet, si nora (i surnmn ne- gligentia objiciatur: qnid enirn, si omnps in cicitnte s~r'ant, quod ille solus ignorat? Et recte I,nb~o definit: scientiam neque curiosissirnt, nep/ie negligent/s.\l~r~~ horninis accipien- dum: verum ejirs, qrri pnm rena, de lr ,q~nt~r ir,prti~rntlo, no- tam habere possit. L. 9, D., h. t.

Da mesma sorte, argumentando a contrario S P I I C I I sobre a ignorancia de direito, se em alguma especie náo procetler a razão, rm que se funda a parte (Ia regra rjric lhe diz re- speito, a decisáo deve ser diversa. E dc\e notar-se que esta conclusão náo se dediiz shmente a contrario sensu, mas deduz-se tamhem do examc particular rle catla uma das es- pecics, em que os juriscon~iiltos romnrios ri30 admittiam o erro cle clireito, porque todas est:is espccies, srguntlo observa Savigny, se referiam a pontos claros e certos de direito. E por isso nos pontos dii~idosos. . e q11v rram diversamente resolvidos pelas principars seitas de jiirisconsultos, se admit- tia o erro de direito; pois, se qualquer Iiavia seguido a opi- nião d'uma da@ seitas de Sabinianos ou Proculeianos, não

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1)odia o juiz acciisal-o de surnma negligencia em saber o direito. Alem cle que o jurisconsulto Labeáo, interpretando a parte da regra - jul-is ignorantiam non prodesse-julga que clln deve ser entendida nestes termos: Si j~~risconsulti copiain Iraberet, vel sua prudentia instruc.tus sd: ut, cui fa- cile sit scire, ei detrimento slt jrrris ignorantia: quod raro nccipiendum est.

Vemos pois a ri-iodificaçáo qiie Labeáo faz a parte da regra jttris ignorantiam non l~rodesse. Para que a ignoran- cia de direito não iii)roveite a alguem C: necessario que elle tivesse jiirisconsultos a cliiem consultar, ou ao menos que tivesse scicncia propri;~, snn prudentin instrzcctirs sit, de ma- neira qiie ;i içnorancia de direito s i ) venha a prejudicar dquelle que Cacilmcntc podia saber, c/li facile sit scire, e depois air~da accrescenta: quod vnro nccipiendarn est.

Do exame dos divci.sos fii~iclaineritos, em que assentam as duas partes tla regra, 1)odemos pois deduzir que, sendo o direito obscuro e duvidoso, apr-oveita a sua ignorancia, segundo o direito romano, e ao contrario que, sendo os factos publicos e notorios, não deve aproveitar a sua igno- rancia.

Esta 6 a doutrina ensinada pelo illustre Savigny, com a qual nos conformamos inteiramente.

Não t! porem a doutrina tlos interpretes. Estes, funclanclo-se nas LL. 7 , 8, D., de juris et fact.

ignorant., e ria 1,. 1 1, Cod. 11. t., estabeleceram outras re- gras: Vejamos o que tlizem estas leis, para compreliender- mos iricll~or coiiio os intcrpretes, generalisando as mas tlis- posifões, formularam as regras peracJs que ensinam em seus cornmen(arios.

I , . 7, I ) . dc jiiris et fuct. ignornr/t.: Jtcris iqnorantin non ! ) I odcat adq~iirrre t~) lenr~bus: suutn ro~.o petentiblis non nocet.

L. 8 , L)., eotl.: 1jrror facii trr trlcir~ bzia ~lutdern in dum- nis, 2'rl cc ~nl~eirdiis obest: j~rris uulern errar neç foeminis in compcndirs prodest . í:aetrriiv/ om~tiõus jzcris errar ir& dnrnnis arnittendae rei suae notL nocet.

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DA IGXORANCIA OP ERRO !>E DlREITC) 9 t

L. 11, Cod., h. t.: Qrtanzois in lucro nec fi~cneinis jlus ighurantibus secbveniri solent.. . . . . I

Da combinação d'estas disposições parece deduzir-se que o erro de facto aproveita a todos indistinctamente, quer se tracte de realisar um beneficio, quer dc evitar ama perda: que o erro de direito aproveita Bs mulheres para evitar qual- quer damno, mss n io para realisar algiini Iiirro, e que si) aproveita aos homens no damno a?uittendn~ roi S I I ( I O . Mas estes principios não podem :idmittir-se, n5o s6 pela diffi- culdatle que 11a na practica em se distingiiir o ilnmno do lucro, e moi principalmente 0 damno r e i svnr nrnit~oncine do seu contrario rei suae janz amissne, mas aintla ~ m r q u e s e encontram militas decisóes particulares em mnnirrst:~ con- tradicção com estes principios, das quaclç sc infere e\ iden- temente que os jurisconsultos romanos liao pretenderam dar-lhe o caracter de generalidade, que lhe thin (lado os in- terpretes do direito romano.

& ta0 dificil a tliçtinccáo entre lucro e damiio, feita pelos iriterpretes, que o insigne Goyena, nos seus (=n?t~r,r~ntn~.ios concordancias e rnotit-os do Codigo Civil osj)nl?nl, dilclara franciimcnte nao comprehender similhante distincyão. Com effeito, não s0 a determinação das idêas de lucro e danino dependem da consideraçáo do tempo, em que p re t~ndrmos avaliar o damno o11 o lucro, mas ati! muitas vezes evitar um damno se r i realisar um lucro, assim como deixar de realisar um beneficio ser5 soffrer um damno. ,.2 distincção pois de lzicro captando e de dnn~no ritnncl'o, alem cle ser opposta a varias decisões paiticalares c10 direito romano, i! aintla extremamente difficil de r-ealisar na practica. E tanto csta dif icult1;tde não é uma \5 apprehensão do nosso espia rito, que, a respeito da solatio indrbiti, temos ~ i s l o os i r i -

ter1)retea suslentarem opiniões oppostas, fun~l;itlns rirsla mesma distincçáo, entendendo uns que, quem repete o que pagou indevidamente, pretende evitar a pcr.tl;~ do que e seu, e seguindo outros que, tendo perdido já o direito A cousa pelo facto do pagamento, ainda que indevido, pretende adqui-

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22 I),\ I(iWOI{AK(:lA OIT EllRO DE DIREITO

rir ou rcalisar um beneficio: eis como, seguindo o mesmo principio, se potle sustentar indifferentemente que o erro de direito se uppóe ou riáo opp8e 3 i11l1eti~ão do que se pagou indevidamente.

As leis romarias fazem tambem excep-áo a favor de certas pessoas, As qiiaes, segundo a propria exl~i-assão d'estas leis, era peirnittido içrioriir o direito. Est;is pessoas eram os me- nores, as miillieres, os riisticos e os soICl;~dos. Mas O favor das lcis romarias, concedido a estas pessoas, não era egual para todas. Os menores podiam allrgar :i ignorancia de di- reito em todos os casos, excepto Iiavendo dolo; as mulhe- res erarri lanibeni equiparadas aos menores, mas depois, por umti coristitiiiráo dos imperadores Leão e Anthemio, foram-llies rcdu~iclos os pri\ ilcgios que gosavam cm materia de içnoraricia de direito, cleclarando os dictos imperadores que, b i 11er ignorantinrn juris damnzl~ri aliqlcod rirca jus vcl sztb.\tantrnnl srtnnb paliantla, in his trrntum casibus, in ptcibus pruc~teritarrlm legrlm attctoritas er, (~rrnlieribus) suf: fragatccr, subavniri. L. 13, C o d . , dc j~rris at fact. ignorantza. A rizão tl'esta dccição ericon1r;i-se nas primeiras palavras da citada lei: IYO pns.$int lhceat rr~ulieribus onlncs .~1os con- tractus rclraçmre, zn his, quae praetermiserint. vcl igno- ra~er in t stalnirrrus: etc.

0 s niesinos soldatlos e rustico.; tnmbem náo podem in- vocar o erro tle direito em todo5 os casos, rnas sbmente nos expressanierite declarados nas leis.

Codigo Civil Francez

No codigo civil francez, assim como em alguns dos que a tiverain por fonte, não se encontra disposição geral, em

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IBA IGNORANCIA 01; ERRO DE DIREITO '23

que se declare positivamente que o erro tle clii.ciio i 1 riin- guem aproveita, como succede rio rlireito romano, e ainda em alguns codigos modernos.

Goyena, fallando da omissáo d'esta regra em alguns dos codigos modernos, inclusivamente no Codigo Civil Francez, exprime-se nos termos segiiirites: (1 los otros Cbdigos mo- dernos, incluso el Francks, callaii sobre este punto, que tal vez consideren resuelto por su primer arliculo. o

Na ausencia pois de principio geral sobre o erro cle di- reito, para conhecermos o systema do Codigo Civil Francez sobre esta materia, precisamos de soccorrer-nos as suas rlis- posições cspeciaes a este respeito.

Estas disposiçóes referem-se priricipalmenie aos contra- ctos, ao pagamento indevido, h confissão jridicial e i trans- acção.

Segundo o Codigo Civil Francez, o erro produz a riul-

lidade do coiitracto, se recahir sobre a propria suhstancia da musa, que for objecto d'este; mas, se recatiir sobre a pes- soa, com quem julgamos contractar, náo C! causa de nulli- dade, menos se a consideração d'esta pessoa fosse a cama da conveiiç50.

É assim que dispõe o artigo 11 10: aL'erreur n'est une cause de riulliti: de Ia convention, que lorsqa'elle tombe sur Ia suhstance iriême de Ia chose q~ii c.n est I'objet.

«Elle n'est poirit uiie rnilse tlc riullitc) lorsqu'elle ne tomlie que siir 12 personiir ave(- 1';irliielle ori n intention de contracter, h moins que I;) corisiili~r;ition tlo wtte personne nc soit Ia cause principale cle Ia coritentiori.~

Vemos pois que o Cotligo Civil I:rancez, regulando a in- fluencia do erro sobre a riullidaclc (10s contrartos, faz dis- tincção entre erro de substancia e crro de pessoa, mas 1-130 distingue o erro de direito do erro do facto. Ora. se onde a lei riáo distiriçue tarnbem niís não devemos distinguir, segue-se que, segundo o Codigo Civil Francez, tarito o erro de direito, como o erro de facto, produz a nulliùade da con- vençáo, recaliindo sobte ti propria substancia cla cousa que

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2 .% D h ICNOI{ANCIA OI! a R R 0 DE DIREITO

for ot~jecto da mesma convenção, e q~ir, versando o erro sobre pessoa, sbmente produzird a niillidade tlo contracto, se a consideraqão d'cssa pessoa tiver sitlo ;i cztijsa principal do contracto.

Náo i: sh a generalidade do artigo 4 4 $1 O do Codigo Civil Fraricez que nos auctorisa a equiparar o rrro de direito ao erro de facto; e tambeni o silencio do mesmo Codigo sobre a igrior;irici;l ou erro tle direilo nas disposii.í,c.s prelimina- res, silencio quc n5o pode certamente atti9il)uii.-se a esque- cimento ou tlescuitlo tle seus redactoi.es, r: irid ida a corisidera- (50 dos casos parliciilnres, em qiie o mPsino Cotligo expres- s;inicntc rcjciLi o erro tlc direito, como ii;r confissão judicial e na transaccão.

E verdatlc qiie alguns commentritlores, fieis ás tradições do tlireito rornrino, pretcritlcrarn siistcnlar qiio a tlisposição clo artigo 4 110 devia ser entendida segiirido o cspirito do direito romano, c qiie por conscguirite o erro de direito nurica potleria sei. equiparado ao erro tle Itictn; todavia esta tloulrina riso tem sido segiiid;~ pelos corninentaclores mo- dernos, como contraria ti lettra e espirito do Codigo Civil Francez.

O mesmo codigo p ~ r m i t l e tainbem a repetição do que se pagou por erro. quer o erro seja de facto, quer seja de direito. E bcni claro o artigo ,1235: «Toat payement sup- pose une dette: ce qui a kiB pay9 sans être d i l e s t sujet a rkpetion. »

Mas se o Codigo Civil Francez em m a t ~ r i a de contra- ctos, e cm iiiateria de paganiento feito iritlc\itlamente, não faz distincqao entre er ro de direito c erro tle facto, jh assim riáo succcde em materiri de confis55o jutlicial e de trans- ac~fio, porque nciihuni tl'estes actos potl(1 anriiillar-se por erro de direito, posto qoe possam anriii1l;ir-sr ambos por erro de facto.

-4ssim o dispõem os artigos seguintes: Art. 4356: ((11 (I'aveu judiciaire) ne peot Stre rkvoqué,

a moins qu'on nc prou\le qu'il a kt6 Ia silite d'une orrezn-

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DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIRELTO 25

de fait. I1 ne pourrait 8tre reroqub sous prbtexte &une crreur de droit . »

Art. 20521 ~El les (transactions) ne peuvent 6tre atta- qubes pour cause d'erreiir de droit.. . .. . »

Codigo Civil da Liiisiana

Nenlium dos codigos modernos B mais rico de preceitos sohre o erro de direito e sobre o erro dc facto, do que o Codigo Civil da Luisiana.

Alem da disposição generica tlo :irligo 7: n .Après Ia pro- rnulgation, personne ne pourra pre tendre ignorante de Ia lei)), contem mais vinte e seis artigos (184 4-1840) con- sogratlos no erro, suas divisões o rfTeitos.

Nos ar t ips 1814.-182 7 divide o erro em erro de facto e erro de tlireito, defirir: um e oiitro, e determina os seus effeitos em geral. Segundo este corligo, o erro em relação aos contractos t: de duas especies: I ." erro de facto; !2."erro tle direito (182 4).

Chama-se erro de facto o que se dB, quer por se igno- rar o que realmente existe, quer por se acreditar na exis- tencin do que não 6 (1815).

Cliama-se erro dc direito o que consiste em tirar falsas coiisequcncias legaes da existencia de factos, de que estamos bem informados (I 116).

aI'odemos estar em erro sobre todos os factos e todas as circumstancias relativas a um contracto; mas não C toda a especie de erro que o impede tle ser valido. O erro, para produzir este effeito, d e ~ e versar sobre d'algum ponto que fosse uma causa principal da convenção, quer a respeito da I)esso:I, com quem se contracta, quer a respeito do obje- elo do mesmo contracto~ (1817).

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26 DA IGNORAX(:TA OU ERRO DE DIREITO

Seguidtimeiite occiipa-se (105 eHoitos do erro sobre o mo- tivo clo coritrarto (iirt. 11 18-1 827), sohre a pessoa com a qual se conlrncta (art. 18"L-11834), e cm fim sobre a natureza e objecto do cnntr;icio (ai t. 18:15-1839).

Mas todas estas espcc-is. perlericem ao orro de facto, de que ri30 nos Iropozcnioa traciar, e por isso passaremos jA a examinar as disposições do citado codigo sol)re o crro de direito.

.40 erro de direito i: consagrado s6 um artigo (1840), di\ idido porem em seis numeros.

Scguntlo a disposição inicial do artigo I860 tlo citado codigo, tanto o erro de direito, como o erro de facto im- pede a validade do contracto, quando este erro k a sua causa principal, salvo as modificações e restricções seguintes:

1 ."Ainda que a parte podesse ignorar o seu direito, se pelo coritracto feito neste erro cumprisse iiina obrigação niitural, d'onde possa inferir-se a presumpc.50 dc que o con- tracto fora celebrntlo em conseqricncia (!'esta obrigação, e não por erro cle direito, tal erro iiáo poclera ser allegado pzra o fazer anriullar;

2." Um contracto, cujo objecto fosse cvitar um proces- so, não pode rescindir-se por erro de direito:

3." Ningiiein pode pre\lalecor-sr: rl'iim erro de direito para adquirir, posto que possa iri\oc.al-o para evitar uma perda, oii para recuperar o que loi dado o11 pago neste erro. O erro, em qiie est:i um possuidor sohre o vicio do seu ti- tulo, não lhe pode servir para prescrever;

4." Não potlemos allegar o erro de direito contra a eon- fissão judicial ~l'rima divida, ainda que possa oppor-se-lhe o erro cle faclo;

5." Niriguem pode reclamar contra uma promessa ou contra um contracto que tlestroe rim direito adqriirido por prescripção, a pretexto de não se conliecer a lei relativa ;i prescripçao:

6." Se uma parte, podendo prevalecer-se d'uma excepção que teria destruido uma obrigaqáo natiii*al t: ao inesmo

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DA IGNOHANCIA 01' ERRO DE DIREITO 27

tempo uma obrigação perfeita, fizer por erro de direito um contracto ou promessa, que desli-ua osta excel)ç'io, ella pode reclamar contra este erro. Mas se a excepção não podease destruir senão a obrigação perfclita, sem affectar a obriga- ção natural, não poderia ser invocado o erro cle direito para fazer restabelecer a excepção.

Alem d'estas disliosi.0es sobre o erro tanto de direito como de facto, encontramos lios respectivos logares outras disposições sobre o mesmo objecto. Assim sobre o paga- mento fr~ito indevidameiite teinos o artigo 2280, que diz o seguinte: ((Celui que a paye par erreur, se croyant de- biteur, a le droit de riipeter ce qii'il a pay8.o

O priricipio pois adoptado por este codigo sobre o erro de direito, 8 -que o erro de direito produz a nullidade do contracto, quando tiver sido a causa principal do me- smo contracto. .4s mesmas rriodificaçfies feitas a este prin- cipio nos varios nuineros d'este artigo, são antes diversas apl)licac.ões do ~)rincipio a differentes casos particulares, do c]ueverdadeiras reslric~ões ou excepções feitas ao dicto principio. Assim r150 pode allegar-se o erro de direito, para annullar um conti-açlo feito para siitisfazer a uma obriga- c-áo natural, ainda que fosse feita por erro de direito, por- que iiestc caso resume-se que a causa do corltracto fbra a obrigação natural e não o erro de direito. O mesmo a re- speito (Ia prescripqão.

.4inda que este codigo em alguns pontos se afastasse do direito romano, não esqueceu todavia a metaphysica dis- tiiicção de lucro qzcaerendo et damno vitando, que tanto tem dado que pensar aos interpretes do direito romano.

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28 DA IGNORANCIA OU ERRO D I DIREITO

Projecto do Codigo Civil Hespanhol

Nenhum dos codigos modernos tractou o erro de direi10 com tanto rigor como o Projecto do Codigo Civil Hespanhol.

luao contem uma unica disposicão, na qual se admitta expressamente o erro de direito, e pelo coiiirario encerra algumas que o excluem terrninaiitemcnle. Neste ponto imi- tou, se é que não cxcetleu, o direitn rornario.

Segondo o Projecto do Codigo Civil Hespariliol, não sb se estabelece o principio geral de que a ignorancia das leis a ninguem aproveita, mas declara-se ainda terminantemente que os contractos não potlcm rescindir-se pois erro de di- reito, ncin repetir-se o que por similharite erro se houver pago. Em qua~ito i trrinstici.30 e confissão judicial abraçou a doutrina dos outros codigos, náo admittindo tambem a res- cisão d'estes actos por erro de direito.

I? o que se deduz expressamente (10s seguintes artigos: ,4rt. 2. aLa ignorancia de las leys no sirve de escusa.D Art. 988. aNo es válido el consentimiento prestado,

virtude tle instrumentos falsos, O por error, ni el arrancado per violencia, intimidacion 6 dolo. n

Art. 989. ((Para que e1 error invalide e1 consontimienlo ha de ser de Iiecho y debe recaer sobre Ia sustancia de Ia cosa rlue fuere objecto de1 contracto, no sobre Ia persona coo quien se contrata; A no ser que Ia corisideracion de esta hubiere sido 13 causa principal de1 contrato. El error tlc derecho 110 anula el contrato. El error material de ari- mbtica solo dti Iiigar ;i su reparaci0n.n

Art. 1088: «Cuando por error de hecho se. paga ti otro lo que no se le tlebe, se observari lo dispuesto en Ia sec- cion 11, capitulo I, titulo XXI de este i i b r o . ~

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DA IcxORAKcIA Ou Eltito DE DIItEITo e9

Art. 1895. ~ C u a n d o por error de liecbo, se paga otro lo que no se le debe, queda este obligado ci Ia restitilcion.~

Art. 1727. eLa transacion en que intervenga error, dolo, violencia o falsedad d e documentos, esta sujeta a lo diçpuesto en e1 articulo 888.

aSin embargo, no podri una de Ias partes oponer e1 error de hectio ;i Ia otra, sicmpre que esta se haya aparta- do, por Ia transacion, de un pleito comenzado, 6 haya di- sistido tle intcntarlo, se pntlia hacerlo sin temeridade.^

Art. 4231: «La confesion jiidicliale liace plena f~? contra e1 confesante; rio puede dividirse en prejuicio suyo, ni é1 puede revocarla, i no probarse que ha sido e1 resultado de un error de heclio.>)

Conio venios pois, o Projecto do Codigo Civil Hespanhol não admitte o erro de direito em nenhum dos casos, em que imlilicita ou explicitamente C: admittido pelos outros codigos.

Codigo Civil Italiano

Como no Cotligo Civil Fraiicei., neste codiço tainbem náo se encontra disposiç3o geral s o l m o erro de direito, mas nos casos particulares, cm que o erro de direito costuma ser admittido ou rejeitado j i implicita jti explicitamente, B mais franco e mais claro, do que o Codigo Civil Francez.

O Cotligo Civil Ilaliano ailmitte n rescisão dos contractos por erro de tlircito, qiiantlo o erro tiver sido a sua causa principal, ns~irn como a repetição tlo pagamento feito inde- vidamenk, aintlzi que o pagamento tenha sido feito por erro de direito. Sao esl)rps.;os os seguintes artigos:

1108. ((11 consenso non k valido, si fu d;rto per crrorc, estorto con violenza o caispito çon t lo lo .~

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30 DA IGNORANCIA O r ERRO DE nlltEIT(3;

1409. al 'errore (li diritto produce Ia nulliih de1 con- tratto solo rliiantlo nc 6 Ia causa uriica o principal.^

11~10. L'errore di fatto non protliice Ia niillità de1 con- tratto, se non qu;intlo catle sopra Ia soslanza tlelle cosa che ne forme l'oggetto.

eNun protliice Ia nullità quando cade solianto sulla pcr- sona colla tlualc si i: contratio, eccctto che Ia considerazion della persoria colla quale s'intentle contrattare, sia Ia causa principale clella convenzionc. n

4237. [(Ogrii pagamento prewppone un debito: cib che t! pagato scnza essere dovuto, 6 r ipctibile.

«La ripctizione non i! animessa rigi~artlo alle obliçazioni naturali che si sono volunt;iriamente so~ldisfatte.»

Art. ,1772: aLe traiisazione hanno fra le parti l'autoriih di une sentenza irrerocabile.

uNon possono impugnarsi per causa di errore (li tliritlo nt: pci. causa di lesione: ma deve esserc corretto l 'rrrorc di calcolo. »

1360. u L ~ confessione giudizi;il o stragiurlizi:ile nori 1)iiÒ

essere divisa in damrio di chi I'hn fatta. aNon piib rivocarsi, quarido non si provi ch' essa fo Ia

conscguenza di un errore cli fallo. aNon può ritratarsi sotto pretesto di i111 errorc (li di-

ritto. u -4 doutrina do Codigo Civil Italiano sobre o erro dc di-

reito i, como acabamos de ver. a mesma do Codigo Civil Fraiicez, exposta porem com mais clareza.

Depois d'esta rapida revista sobre os corligo- civis eslran- geiros, u n i o s examinar as disposições tlo nosso sobrc a me- sma materia.

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DA IGSOIIAKCIA O r ERRO DE DIREITO 3 f

Codigo Civil Portuguez

O nosso Codigo Civil tamhem formuloii o principio geral cle que a ignorancia das leis a ningiiem aproveita. É uma das tlisposições d o arliso 8. que diz assim: ~Ninguem pode eximir-se tle curnprir as obrignc;óes iinpostas por lei, com o pretexto da ignornncia d'esta ... D

O mesmo principio acha-se expressamente formulatlo em alguns dos codigos inoderiios. Citaremos os seguintes:

Cod. Civ. Hespanliol, art. 2: a1,a ignorancia de 1;)s legs no sirke de escusa.))

Cod. Cik. da Luisiana, art. 7: ~ A p r k s Ia promulgation persorine ne pourrat prbtenclre ignorante de Ia l o i . ~

Corl. Civ. da Baviera, art. 2: ~L'ignoranco tle Ia loi ne peut profiter que tlans des cas specifies, ou quand i1 y a eu impossihilit8 ile Ia connaitre.))

Cod. Civ. da Austria, art. 7: aNul ne peut pretexter cause tl'ignorance de Ia 1oi.u

O Codigo Civil da Prussia, nos artigos 14-1:i, permitte ao juiz admittir n escusa da ignorancin dos actos anterior- mente perrnitlidos, se por outra parte não houver negli- gencia rio contraventor.

Todas estas disposiqócb.; >ão a consagração da celebre maxinia dos romanos, consignada na L. 9 , D., de jziris et fnct. ignorant.: Regula esl, jwis quidem ignwanliam cttique nocel-e, façti ver0 ignorantiam non nocere.

O nosso codigo porem, estabelecendo no artigo 9 o prin- cipio de que ningiiem pode eximir-se de cumprir as obri- gayões impostas por lei, com o pretexto rla igriorancia d'esta, náio fez iririovaçZio algumn na nossa legislaçilo anterior, por- que, alem das t radicõ~s constantes do direito romano, ti-

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3% DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO

nhamos a Lei de 9 de setembro de 1749 , segundo n qual não se deve i-elevar a ignoraricia tlo que a todos se faz pu- blico e notorio. Tiriliamos lambem a Ord. Ptiilipp. I,. 11, til. 98, a qual insci.evendo-se: Corno El-Rei pode lirar os oficios da Justiça e da Fazerida sem ser obrigado a satis- fação, d i ~ rio final: E para se não poder allegar ignorancia, o declaramos por esta nossa Ordenaç3o. k correlativa n esta Ordcnaçiío a ~lanoelina, I,. 1, lil. 76 , que, inscrevendo-se quasi do mesmo rnoclo, conclue pela forma seguinte: ((porem Fizemos d'isso esta Ley. e Ortlenacam, 1)ci';l se riom poder alegiiar ignorancia. P

V&-;e pois que os nossos reis riáo adrnitiiam tgnoran- cia das leis ou ordenações que publicdvam. li o tliie se tlc- duz aiiitla mui claramente da forrriula, usaila ri;i promul- çaçáo dns antigas ordenações: ;:E para que ~er iha ii noticiii de toilos e iiingiieni possa allegar içriorarici;~: Mando ao meu Chanceller inUr a faça publicar ii:i Cliancellaria, na forma costumada, etc.» (Lei de 6 de 1narc.o de 11686).

A redacçáo do artigo e que j;i tem dado loçar a inter- pretaçóes menos exactas, as quaes o sr. conselheiro Dias Ferreira no seu Coinmentario ao Codiyo Civil, pag. 1 7 , pre- tende desciilpar pela introrluccáo tlo eslylismo nas leis.

O sr. Bruschy, toiiiantlo o teririo pretexto como opposto de realidade, pretendeu sustentar no seu Manual de Direito Civil I'ortztgzrez que, se 3 ignorancia fosse real, e não simples pretexto, devia admiltir-se :I nll~gação da ignorancia. visto que o artigo fall,i si) (Ia ignoi*:iiicia como um pretesto, e não como um f ~ c t o real. Mas siiniil~~irite doutrina riáo potlc sus- tentar-se em l'are do artigo 9 do Codigo Civil. e contraria 1120 si, ao espirilo, 1113s nind,~ ;i letra do citado artigo. Qiierii riáo \ C n força c propriedritlc: tld p a l a ~ r a prelexto? Admit- tido o principio cle que a lei ~,ublicatla C Ici conhecitla, segue-se necess;iri;in~erite (]I](' 3 ignorancia tla lei publicaila Si a dissirrtulação do seu coriliecimcwto, ri20 i) \ crdadcirii ignorancia, rn:is ~)i-etesto d'elld. lgriorancia da lei e corihe- cimenlo tla mesma lei são cousas conti8arias: uiua exclue a

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oiitra. Qiiem acceitar pois o coriliecirrienlo da lei, não porle deisiir de r-epritar 3 ignorancia corno prc t~xto , cscoçitado para se exirriir ;i obsc;r~\:~rici,i di i rtitL>r,ia lei.

Deve I)oi3ein iioiar-se qucl ciii :ilgliris çotligos estitangci- r& se enipl,egou o terriic) co i~ rc~p» i i~ l iwl ao ttlrrrio yretm- to, que iisou o auctur tlo Coiligo Civil. Pr'8lendr.e ct pretclr-ter s40 os tt:rnlos usados rios cocligos tla -4ustria e t l i i 1,uisia- ria, A cetisura pois do illiisire ço~rriiieiitatlor, feila ao 311-

c;@r do Cotligo Civil, cahe cgualiiic~iile aos redactores (1'3- quelles dous cotliços esti~:ingeiros; pois tamberri não adop- tararn a venertintla ptiraseologia tlo tlii-eito rornaiio - jliris (gyorut~lian~ cziiqrte nocer8e - que os i i ~ ~ s ~ o s trxcttidistas con- ht~uirani - a igrtoiiiricia da Iri a iiiriguem altro\eita. Mas ~ i á o 6 ,cri nos codiços estraitgeiros que o terrno pretexto tem a sua jristifiça~ão, ttimbcm em algiins diplomas passados nos bons tclmpos tlii I I O S S ~ litt(~r;ltl~ra se aclilim Y O C ~ I ~ U ~ O S syno- riirnos clo termo prplrrtg, clmpi.egatlo pelo Codir:o Civil. C~l~ireiilos para cxeriil)lo o til\!. de 1 :I de Ilç~eiiibro iIc 1615, o qual lia sua prornulga@o empr(lgou OS t~ r ino4 srg~iiiites: «E 1uri1 que ido vcrilia i noliçia tle totloh, ti ~ i i ~ r i l i i i i i i (bossa l~rctender ig orancia. D

Nbs ncliamos muito proprio e iriuito sigoilicatiw o termo pelexlo, de qiie uso11 o tiuctor rlo Cotligo Civil, e riem sn- 1)qinos d'outro mais sjntlietico qiic enccrre, como csle, a disposicão da I t i e a siia ~ 1 ~ 3 ~ ) . K5o se atlmitte a ipiioi.aii- cia da lei, porque a ignori+ricia t!,t I(1i 1130 i* inais do ilutt iirn ],rctesto, irj\oc;ltlo por quibin 1)i-ctriiclc esiriiiin-se a» cum- ~ ~ n n ~ e r i l o das 01)riga~ões inil~ost;i\ ri:\ rric3snia Ici. I< coiri el- fcilo, atlmittida a l)i-csriiiip~io jrirlj rt tie j z i ~ c sol~rc o co- ~ilit~cirritl~ito tlii lei (Ie~~idarrieiilc 1)i o~nuI~:~(l: i , :I : i l l ~ ~ i 1 ~ 5 ~ 1 (!:I igrior,iiiciu d'c3sl;i 1iicsrii:i 114 liati putle tleii\:ii. clc (*oii~iili~- i'd~'-be corno (irri ~rctc\Lo, isto c. cciiiici iirii;i igiioiarici,~ lili- gida, oii tlissiriiul;ic.;lt) tlu corilic~ciiiic~ii!o tla Ici.

hlas, se a igiior,i:icia 1190 aprcn (liia cjuaritlo o mci o I re- lcxilo, parcce que tle\e al)ru\ci!aia cjiiantlo wjii urriii iseiili- dade, isto e, ijuantlo atl~ii:llc tliict a ;illega 1\30 tinge, 1130

3

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3 4 DA I(;NOIIANCI.i 01' Ii'lt110 DE DIREITO

mente, náo pretende enganar o juiz; mas realmente igno~ rava a lei, ciija rriolnç30 se lhe imputa. fi a conclusb qire o Sr. Rruscliy d r t l u ~ n contrario senstt da tloutrina do art. 9, e que o Sr. corisellieiro Uiiis I:~i'i'r~ir3, rcjoilarido, tlisculpa todavia pc31a m6 redaccão tlo :li ligo. NOS. como não notamos este vicio ria rrclaccáo, t;~rnl)eni iiao ~)oilcrnoi: coin tal fiin- damento tlisculpai. n iiilerj~ictat:;io do Sr. Briiscliy, iricri- niinriridn o iri>i$iie ;iiictor do Codiço Civil. T ; i m l ~ ~ m não temos coriio f;!lsa n cloutrina (10 sr. llriisrhy, deduzida a con!rrrrlo senxct tl:i tlisl~osicão do presente artigo, mas conio rncrios Irk$itirn;i. 0 s ar-çumentos ( r co~ l t ía r io senszr, t i o procorii.;atlo.; por nlgiins interpretes, são extremamente ~)flrigosos, ~)ori;iie raras veios a ol~posisáo entre a propo- sirao t ln Ici e a pi-oliosi~30 tlcdrizitla n contrario sensu 6 iiirin oppo5i-áo realiiieiile contraria, de sorte que exclua a oiiti~i, o não possam ndmittir-se as tlrias pmposiq'Ses, sem toisnar a Ipi coiltradicioria comsigo mesma. E d'aqui se vê quanta priidencia de \c lia\cr no iiso dos argumentos a co?/tl-ario scnsn, visto corno, s~?çuiido mostramos, sO serao verdadeiros, qiiarido as duas propositões forem manifesta- niente contrarias, ou tnt;iiineiitc repiignaiites.

f3 verdatle que no c:iso siiji~ito parece haver esta oppo- sicão entre a proposicão da lei e a proposição deduzida pelo sr. Bruscliy a contrario smslr, porque uma neça o que outra aflirma. A igrioranria, conio pretexto, não aproveita, diz o Cotligo; logo al~ro\eit;i, não sendo pretexto, mas rea- lidade, tliz o sr. Briiscliy, ou mais sim[il~~smente ainda: a nZo-igiiorancia ri50 apro\eita, logo apro~ei ta a içnorancia. Estas ~)roposisões são amhas verdadeiras cbm these, porque, náo ~ ~ ) t l c i i d o ser obser~acla a lei ignoratl:~, e poderido pelo conti ;i1 i , ) :,cl-o a lei snl)iilti, segue-se qiie ;I ig1101'311cia C um obstaculo ao cumpi-iinerito tla lei, mas n n2o-ignor;iiicia ou o coiilict~imento, em \ez do ser ohstaciilo B cnntlir.ão, e como i~nposs"i~ilrnri~ nzilla est obligntto, stlgiie-se tjiie nciitiiima lei pocle ser cuniprida, sem d'clla se tcr cc>riliecimerito. Kesta psrtc: pois ri50 pode deixar de lia\ c r perteito accordo entre

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I ~ A IGSOIIANCIA 01' E I ~ I ~ O »E nr>isrTo 36

o sr. Rruscliy e o :iiictor tlo Codigo Civil, mas podem dis- cortlar rios princi[>ios, como rios pnrcce qrie (liscordam; e eis a r;izão, pnitliio tlisscmos 1i:i Iloriro cluc a concliisZo do si.. Bi.iiai.liy. posto qiie Icgitiriia, riao erd \ei.d;idt~ir;i, por- quesse clctluz tle ~)rincipios co~itesta\~eis.

Com efreito o codigo, rião atlmittirirlo ignorancia das su;~:, disposiqões, para schr cnrisrquentc, riecessitriamente lia tle considerar a sua alleçacáo com» um prelcxlo e não coiiio nma realitlarlc; e portanto riao 1)oilc acceiiar a coriclusão do sr. Uruscl~!., porqrie náo atfmittt: n materia da conclii- sBo; nias, se a adniittisse, n8o potlia tleixar tle atlniittir tam- Irem a sua doutrina. 113s se elft\ctitainfwtc: se cl:í oii não ignoraricia (Ias Icis proniulgadas, jB o clisscnins noi1ti.a parte. t'otle ni3gar-sti a ignor:iricia p i L a scl 1130 rccoriliccer tis su;is legitimas coiisc~clueiici:is, oii ~ i t i i l t ' corifess;ir-se, e ri30 sc lho acrcitnrcni as con;orliiciicitis, ~)or* cor~si(lei~açÕ~s de or- dem social e iiiici~rl$sc liiiblico. Ktis procedemos do s~guni lo motlo, ~)oi,iliico jliiIg:~mos mais fin;irico c mais sinrcro. Quem w g a a ignoraiici;~ da lei, para IIitl riáo arccitar as conse- qurncias, assimelliar-se-ia ao iiiscirii:iio que l'eçli;l~se OS olhos para n e y r a esistericia clo sol, cujos raios Ih'os tivessem ofi'eiitliílo. ouem, confessantlo a ignorancia da lei. não a admitte como causa esciisanle da cibser~ancia da lei, cur- va-se ao jugo da necessidade da ordem social, mas não mente h sua consciencia, nem infi.iiige as le is da loçica.

Ignorancia das obrigações

Viirgatlo o :iriil_io tl;is ccnsiirns rjiie so I l i ~ t6m feito. \;irnos 110s tani1;eiri iiri:il!sal-o o talvez censiii.:il-o, para que alguerri depois tariibcm se occupc? de nOs. São sempre uteis

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36 DA 1GNOIIANCIA O r ERRO nI3 DIREITO

e vantajosas estas discussúcs, quando a ellas preside a boa fh; porque sáo o meio mais seguro de apurar a verdade.

O Cotligo diz no art. 9: ccn'iriyiiern pode eximir-se de curnpi'ir as obrigafies impostas por lei. com o pretexto da ignorancia d'esla ... )) Sabemos ji qual o legitimo fundamento de similharite tli>l~osit:ão, e que o principio geral que ella ericcrr:i, achando-se jA çorisagrado eni varios textos do di- reito romano, t e n ~ sido expressamente formulado ou pelo menos ol)scrvado mais ou menos fielmente em totlos os codiços rnodcrnos.

Brin a juslificação d'este principio offerece difíiculdades, pois que, segiindo temos mostrado, C: elle uma consequen- ciia rict.essari;i d'oiitro priricipio superior e tamhem incon- tcstavcl. a sdbcr: que a lei publicada C: lei conliecida, aliis nao teria sido ~~roninlgacla, oii tcntlo-o sido, 1130 o foi sufíi- cieriteinerite; mas a acceitaçiio d'aqrielie ~,i-irrcipio cm todas as suas c'oiisccluericias, a StiiI applicacão a to(las as varia- dissim,is Ii!l~otlii~~es qoc se apreseritam nas rclacões ordi- riarias (Ia vida, constitue certameiito um dos pro1)lemas mais intrincatlos da sciericia da 1egisIac;;iu e tla jurispruclericia.

As opiniões varias e ati! oppoatas (10s commeiitadores sobre as dis1)osiqóes do direito romano neste ponto, a falta de coricorcltincia cluc aiiicla hoje se riota eritre as disposiçóes dos dibcrsos rodigos sobre ti ijuestão, provam de sobejo a gravissiina ililiicultlntle tla maleria, e qEe nenhum legisla- dor, irilcrprete ou jiiri~cc~risullo se pode vangloriar de ter atinado com a soluyáo t l e d e problema.

O nieiriio iiiiclor tlo Cutligo, rio pmieclo primitivo, em segtiitla ao 11riirc.ij)io sol~retliçto, ti ri li,^ posto o cleviclo corre- cli\o, tlisl)on(lv que os casos ern clue hssc permittido invo- car o cri c i tlc ilirt~iio, seriam cnpre.sciiricntcb tlibcl;~t-ados na loi. A o pr: dn i cgi a virilia logo a cxcepy50, I);ir,i corifirmar mais uina vez o sal)iclo aputticgma de quc n3o lia regra sem excepqáo. E: \crrl,itle quc esta disposiçiio náo npparece hoje rio Cotligo, o que pouco iinporla, porque Iii ficaram expres- somentc declaratlos os casos em que i! licito invocar o erro

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DA IGNOHANCIA OIJ ERRO 1)E DIREITO 37

de direito. O artigo, oriilc se dispunha sobre os casos, em que era permittitlo iiivoc,ar o erro tle direito, foi suliprimido por inutil, porque, ileclarailos estils casos nas materiaa respe- c,tivas, 5: evidente que esi;is tlisposicõcs deviam guardar-se, ainda tluc tiao estivessem saiic:cioii:idos por disposicão geral. Firialrnonle rlcsnl~l~itreceu a disposiçfio gerierica, quc consa- gra\ a as esreprões, mas estas ficarnin.

Pode totl;ivia dizer-se que o artisi) 10 i10 Prqjecto do Codigo r130 fazia excepfrao ao artigo 9, porqrie esle fallava (Ia igrior;iricia da lei, e :iquelle do erro tle clireito, cousas que I)arciSem distinctas. Mas a isto retlai.guirnos 116s que em materi:\ tle Ic.,nislação erro e ignorarici;i são synonimos, por- q i ~ e o crro procetle da ignor;incia, ou, como dizem outros, o erro ri30 senão uma içnorancia incompleta.

Ainiln assim talvez que as duas tlisposições do Projecto tlo Cotligo podessem sustelilar-se, e clw uma fossc comple- mento da outra.

O Codigo estabelece que ninguem 1)otle eximir-se de curnprir as ol~rigaq'oes impostas por Ici sol) pretexto da innorancia d'esin; mas o Cocligo oii a lei, como t5 sabido, A o impõe siimriite obrigacfies, pois ianiiiein conci:ile (li- rritos, segunrlo d expresso em varios artigos arileriores. «So o Iionieni i: suuceptivel tle dii.eilos e ok)r~ig;tcóos, )) diz o artigo 1. ((Se os tlireitos c obriga!:óes se liiiiitain ;is [,ela- qõos reci1)rocas dos cidadãos enlre si, corno iiieros particu- lares, ou eritre os cidadãos e o estatlo em clueslões cle pro- priedatle oii de direi tos puramente iritli~icluaes, csscs tlireitos e obrigac0es constituem a capacitlatle civil dos citlatl3os, denoiniiiailí-se direitos E obrigaqfies civis e ia0 regidos pelo ciireiio pr.iv;itlo, coiitido rio Codigo Civil, excepto na parte que b reguliirla por lei especial)), segiirido dispõe o ai-t. 3. ((Estes direitos e ohrigaqóesderivarn. etc., ai-t. h. «:i lo i civil reconhece e ospcl'cifica todos estes (lireitos e obrigacúes, inaritem e assegiira a fi.uição d'aqiiclles c o cuml)i~iinento d'estas, etc., ; ~ i . t . 5.

Ora o Codigo, dizendo no artigo 9 que ninçnem pode

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38 ~),i I'NOR i x ~ 1 . i C)( ERRO I)E DIREITO

tbaimir-sc tlc çum1)rir 3s obi~iga~oes impostas por Iri, com o pretexto da içnor;inci~i tl'esta, piircce ter em \lista sdinente :i ignoraiicia das obrigayões, e esqiiecer c,oinplet.ainente a igr~or;~ricia tlos tlireitos; esqiiecimento tarito rilerios tlescul- ~n\icl , quanto nos artigos antecedentes iinlia S;illntlo tle di- reitos c obrigac;ões, segiiritlo mosiriimos. S e i i porque os tirimctris sejam iniiis sollicitos em conhecer (10s seus direi- tos, tlo que das suas olirigapóes, que o Coiligo dispõe no artigo 9, em,foriii;i tle aviso, que n lo inrioc:erila a violacão das obrigafles poia clle impostas, ;iintla si111 pretexto cle igiiorancia? Concor~clainos quc seja :issirii, qut: se preterida niais facilmente a içiioraiicia das ohriga~Ties, tlo que a clos (lireitos de caila um, e que por isso a igrioraricia (Ias obri- gações seja inerios atteiitlivel por niais crassa: mas sendo iiiiiegarel rliic, por mais diligente (41" seja o hoinein no pro- seguimento tlc st:iis rlireilos, sempre Ilie é possivel ignorar algiim tl'elles, c iiáo os iisar ou cci~lel-os; por isso faz-se mister detcriniriar os elfeitos da ignorancia ou erro de tli- reito sol)rc. a siia acquisiçáo, conservação e perda. Creinos cl11e o artigo 10 do f)rojecto legislava para o caso da igno- raacia dos nossos direitos, ao passo que o artigo 9 do Co- digo legisla para o caso dn içrioraiicia das nossas obriga- çOm. E ainda .que este artigo (10 Pi."jecto fosse eliniinado do Codigo, como ficaram expressamerite declaraclos os ca- sos cm qiie o erro dr: direito 1,otle aproveil;ir, em nada a supl)ress2o d'aquclle artigo altqrou a t1oiitriri:i rlo Projecto.

110 quc deixamos exposto parece-rios 1)otlt:r t:tjiit:liiir que para ;ipi-ct*iar de\rid;rniente os effeilos (Ia igiiui~;iiicia da lei tlcverri clistiiiguir-se a igrioraaiici;i il;is obrig;ii~Oc~s impostas por lei tl;r igiiorancia dos tlireitos, cliie clla i~cçoiilieee e as- scffura. E esta tlistincç30t alcni ilo i.;icioii;il, i? ainda fun- tl;itl;i ria lei: por(lLie o ariigo 9 i10 Cotligo tracts exclusiva- iilclite tl;i igi~oi.;iiic:ia das ol)i.igaçõt!s iielle impostas. Da igno- i.nrici;i oil c)i.i*o sii1)i.e os nossos clireitos ii.acta cni varias t l i s~os i~ócs tlispt:i~saq~'clo iricsiiio C;utligo.

A igiioraiicia das ol)rigações iinpostas por lei, não se

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admitte, porque a lei depois de publicada reputa-se conlie- cida. Se a alleg;icão da ignorancia das obrigações impostas por lei f6sse ciiusa escus;irite da siia observancia. não sO a pulilica~ão da Iri scria nl)~olutaineiite iriulil, porque nem a força ohrigatoria da I P ~ resultava do facto (13 sua publi- c a ~ ã o , mas do conliecimerito iritli~itlual tlc cada cidadão icerca da lei e das suas disposi(:úes; nem a sua observa- ção seria iiniforme, pois, exigindo-se o conliecimento indivi- dual da lei como condição dn sua observancia, ngo porle exigir-se tanihem o seu cumprimento senão á medida que for senclo conliecida.

Parece-nos pois que a disposição do artigo 9 do Codigo Civil, e m quanto se refere as obrigacões impost;ts por lei, consagra um pr*iiicipio logico e riecessario.

I,rigico, porcliic i: uma simples consequencia da publica- ção da lei, qiio (leve preceder a sua esecu-50; necessario, porcyuc sem elle a execuç3o (Ias leis não seria prompta nem geral, como B forçoso que soja para a manutenq-o d;i ortlom soci:il.

Assiin, impondo o artigo 1.56 do Codigo C i ~ i l ao con- jugc sobrevivo a obiiç;i(.ao de 18eqiiercr clerilro de sossenta dias c.oritados desde o fallecimento (10 outro conjuge, que se proccdn a inveiitario (10s bens que perloiicerem ao rne- rior, ou que dcvercrn ser rcpa~titlos coin elill, sob pena tle 1)ercler o usufructo (10s ben. ilo fillio, ri80 potle o corijiige qiie fiill;ir a esto preceito, escnpar ;i ])cn:i (l;i lei, porque, sc?guritlo a disl)o3iy5o gcincil ilo artigo '3, rião Ibc iiliro\eita a igrioraricia (1;) I1.i.

Asiliin, segiindo o arti;o 256, « O lutor k obrigado a de- clarar no iiiveritario o que o menor Ilie deve; se o não li- zer, não poclc.i<.i rlui:ir o pagamento diirante a tutela, e sr, o exigir dcpois, rlevcrá provar que antes d'isso náo tivera conliecimerito dCi divida. )I

Ora i! possi\tbl que o tutor n5o tcnlia coritteciinento d'esta c l i sposi~~o, c qiic rltbiue por isso cle tlecl;ti*;ii. iio iriventario o que o menor Ilie dwe; mas ri20 importa, porque, segundo

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$0 DA IGNOIIANCIA OU ERRO DE DIREITO

31clisposi@o tlo artigo 9 , 1120 poclc exigir o pagamento da tllviila tlurante a tutela, e airidii depois h 1)ieciso mostrar qtio riáo tirilia corilicciiricrito da tli\itla ao tempo da feitnra d0 inreritiirio.

~ldiriitle-se a ignoraricia tlo Fdclo dii divida, [nas ri80 a i~rioraritiia (Ia I(4.

Assiin a iiií'i~acq3o tltis tlisl)osicóes coiitidns nos artigos ,1058 c 1070, qtier tla parte dos contratantes, quer da parte do iniriisiro tlo sacramento ori tlo oflicaiiil do rcgisto ci~lil, srljcita os iiifr;iclorcs 6s Ilerias decl:iradns na lei, sem que 11oss:i :i~ro\ciinr-llics a allogiiy~o (Ia ignorancia das dietas (lisl~osic*Tir~.

cajlrcssc, o arligo 9 , que náo pormiltr! qiie nlgucm lrit~sn o\irnis-se dc cunipr-ir as 0111 igrifõcs impostas por lei, rorn o ~ ~ r e t c x l o tla ignorancia d'tbslii.

I'otlei~iarrios mil1 tiplicar os oxernplos iridefinidamcnte, mas os j;i citados hastam pnia mostr:ir a appliciic.30 assaz fre- c l u ~ ~ i t e do principio consign;itlo no art. !I tlo Cocligo Ci\il.

Coiisiderarido porcni o artigo sol) :i rela-?o (!os seus ef- I'eitos oii da siia sancfáo, parcce-rios t:riiibcn~ qiie :i siia rc- dac~Lio 1130 foi (Ias mais felizes, porclue, corno cstii sctliçi- do, contrailii, os fiictos. $: bom resl)citar os jrincipios, mas com tarilo que as coiiclusóes rião sthjnrn iiiexcqniveis e con- trarias ti realidade.

E o que succetle, srguntlo nos parcce, com a conclusão exposta no artigo 9. ((RTingurm 1)oilc cxirriir-sc de c~iniprir as olwigaqõcs imposliis por Ici, coiii o pntexto da içnoran- ciii t17csiu», porqiie a ignoriiricin (13 1 ~ 1 pril~licada não tle\.e admittir-se.

Ora tt claro que riingiiem :illega :i il,riioritiiçia da lei para se eximir ao cuml~rimcnto (Ias suas prescripqões. Qnom o pt'etcntlesse, daria tristc dociinirnto tla sua iiicolierrlncia; pois porte algiicm tlizcr (liir igricti'ii i] lei para rião ;r ciim- lli'ir? Nrste caso, allrgiir igrioi~arit~in 6 conlrntlizer-SI?, i! iille- gíir n ignorancia c10 qiie se sr11)e; e i i r ~ l , i \ ia 6 cste o sentido geherico do citado iirtigo - J)iir;i v' tblimir clc cumpI'ir as

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DA ICNORANCIA 01' ERRO !)E DIREITO t 1

ohrigac,õcs impostas por lei, n5o se ntltniltc o 1tretr.tio da sua ignoraricia.- ,4 içrioranci:c tln Ici allcap,i-sc drl~ois do facto da sua transgrcssáo. e 1130 anirs. [)oiacliic <i i i i \ ocoyáo (13 igiioranria nnlcrior ao f,ictn. c coriin esciiscj dtr s i i ~ pr;i- cticn, não potle admittir-se seni coiiii-ndicrão.

h 5 0 6 (ltl ciiniprir n c)l)i*igayão qiie prcttwili: r\iiriir-se t [ u t ~ i n l l ~ g ~ a igiior;i~~ci;i, l )orq~i t~ , r130 ~~otlerido : i I ~ ~ i e r n cbumlli ir ;ir; SUAS ot)rig:i~O~a ~~retfii'il;is pnr :ic'tns ~)r rs t~i i tes ou Tiitiirn;, t:imbcm 1130 (;irrce tlc srlr exemplo tlo ciimpri- rncnto d'cll;is, porclui? í1i.i,i c\c1nilic50 i; iim siriiples elkito cla ortlcm riatur:il 113s coi~s,\s. Ningiirrn pode ~)ois eximir-se de ciirii~)i ir o que náa curripi~iii, clii:il~liit~i~ r111r fossc a causa, culpei ori (1010, 1)ois scri:i um: ~,rc~trns;io :ibsiirrla; mas pode prcttllider suhii nliir-se :is coiitcqirfJiitnin-, Icgncs, rcçiiltantes tln nao-rxci-iic;io i l , ib sii:it r~lii icnt-Goi., fiintlnndo-se em que, ignor:irido :i Ici ( J I I I ~ IIir iriij)~i:ilia t : i ch obriga-õrs, riso devia c-ohsiderar-sc srijeito a cll;is, ncni 6s conscclriencias da falta cld seti ciiiiipi'irnriito.

I'nrcrc-nos pois qiie o n r i i p fics:ii.i,i riinis claro se fosse concebido nos scgiiiiitrs tcrmris: c(Siiigric~rri p o d ~ escapar 6 sanqão (Ia Ici com o prrtrl\to tl:i ignor:iricia do edicto e sahccão (Ia mesma lei.))

Como qiier qne for, cstr i: ccio!amentc o \crdndeiro sen- tido do nrliçn $1 (10 Codigo (:i\ il; isto é, a alleg7~5o dn igno- riiiici;i t l ; ~ lei n5o escusa ningucrn (13 sua sar~cqáo, (I~IUII~IO clla tcnlin sido vinl,!da.

Ora n s;inc~5o tl,i I t l i mnnifost:i-<c scil~ a forma triplice (13 s:iric(fio p(>nn1 [)rol)i'i:imcritc tlict;), isto 6 , da responsa- l)ilitl,iilo penal, d'i aaiicy5o ou r r ~ ~ ~ o i i s n ~ ~ i l i t l ~ ~ t i ~ cicil, c da iiullitlntlc rlos at*los contr:irios i s ~)rr*cri l i~fics da lei. Estas trcs snncc6es liorlcm verificar-se j;i siiniill:inca, jii separa- d;ln~i.rite, como se 1)oclo o l ) ~ < ~ \ : i r O I I ~ \,iiio< t-;~.:os. No me- qrnn (:r~tligc) Ci\ 11, na secç3o clnp ir,\ci8o\ 1 % r13 o!Tensn e rtlp;ii ; 1 ~ 3 o tios tlireitos civis, f,iI!a-si~ (1:) rc~pcii~t:il)ilitlndc civil coriricbun com a rcs~)onsabiliil~iilc ciiiiiiri;tl, oii dn responsa- biilidatlc civil sbmerile.

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Dcsci iminatlos ~rnis os diversos effeitos que a violaçiio da lei pode prorlnzir para o agente, ciinipre-rios examinar se a igiiorancia (1;) lei viol:tda tolhe os clTtitos da sua vio- lac,ão, tle sorte rliie o transgressor, allegari(lo a ignorancia eni rliit? 1iihor:i~a iicerca tla Ici, náo iricori.:~ na responsahi- lidatic civil nerri na c.ririiiiiiil, ncin o acto assim practicatlo na pm:r tle riiillitlarle.

~S;il,t:mos qii;ies os pi.iricil)ios qoc rle\.em rcgiilar estes casos. A Ici estii pi.ri!iiulgacla; c pt,i~tarito, serido iransgrcdi- da, subiiii?lte iniinetli;itamentc o transgressor :i peiia iiiiptista na mcsrria, o u iiiis 11ic~)osi~óes çeraes, qiialiluer qrie sc:j;i a ii;itui3cz:i (Ia 1)(>11:llitlad~, rcs~ionsabilitlade civil, rcsporisabi- litl;itl~: t~riiiiiii:il. oii simplclsmerite n nrillidade do aclo con- tr:irio ;is iircscrip!:i~es da Ici. Es1.e~ 930 os princil)ios que c!staI)r?locc:mos; ~ q j a m o s porem se as Icis positivas os tra- duzem.

Em qti:irilo I rcsponsabilirl;ide civil, lemos o ;irt. 9 qrie, não atlniiltirido a esempcSo do cumprimento t1;is obriga@es imposiiis por lei, com o pretest,oda ignoranria iI'est:i. t:imbem não esirrie da responsabilidade. (liri que alsiicni lia,ja iricor- rido pclo n3o ciimprimc?nto cl'estas ohri2;iqõrs.

Solirr a responsnt~ilitI:idc, criniinal legisla o art. 42 rio Codigo I'enal rios lermos seguintes: ((-4 ignorancia da Ici penal náo se c,onsidcra como caiisa jiistificativa ilo crime)); alem do que, o artigo !> tlo Codigo Ci\:il pela çerieralidatle (Ia si i :~ tlisliosic5o 6 tiimlrcm applicavel ao ciiso da rcs1)on- s:ibiliil;idr! criminal, vislo qoc esta scgriotlo ;i tlis[iosiq5o tlo iirt. Y3(i(i tlo Cotligo Civil « E seiiq)i.t: ;ic,c~m~);inliac!a dii re- sporisal)iliil;ide civil.

13ni quarito ;i pena tle ~iiillitlatli:, inlligitlíi :)os ;ictns prii-

cticatlos corilra a ~ ) r e s c r i p ~ ã o das It~is, tcnios i) :irligo ,!O do Corligo Civil, onilt! se decl;ira miii t~rininniitr~iiic~iitt! qiie os actos 1)i';ictiir:adoç coritra a tlisposiclo tla Ici, cliici7 ~~i.oliibi- tiva, quer ~w(:cciiti~a, envolvcm ririllidade, c;ilvo rios c:isos em que a nii!sm;i lei ordenar o coritriirio. E ;iiritl;i q u e esta nullidade possa s3ii;ir-se, quando a lei infringida não f ~ r de

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DA UGNORARCIA O C EKHO I)E DIltEIT0 43

ordem e interesse piiblicos; e SU por conseotitnento dos in- tr:ressados, e nfio a pretexto de ignor;incia das suas dispo- s ioes , como tinha loçar por direito romano em alguns casos (Savigny, obr. cit. n.' 11).

O Cotligo, como acabamos rle wr, não rlistinpiie se os actos pr,ictic:i(los coritra a I1.i tivc~riiril oii náo por caiisa a ignorancia d:i lei, e por isso sempre qiic srl;liri conlrarios a lei, e sempre qiic cst:i náo oi*tlPii~ o c.oriti.ario, ilibvcin cstes actos consitlcrar-se nullos. ainil:i qrie :i causa (1'1 S L I ~ illega- liclade fosse a igrioraricia da lei qiir: os r~giil;i\~;i.

Esta tlouti<ina deduz-se rião a0 i1;i Icttra ( l i ) ;ii.t. 10, mas tambern (10 ~~r incipio gcr,il corisigri;itlrj no art. !I.

Corn c~lTt:ito, :i lei, que prcstnrcve cer1;i.: soli~iriiiitl;tdes para a celel~rliyáo tl'algum 3 ~ 1 0 jiii*irlico, impõe ao iiicsrno trmpo ;I obrigaçáo de se guartl;irem :is çol~iriiiirlailrs prescriptas, pois d'outro motlo sei.i;l 3 ICI illiilil: mas como segundo a disposifão do arliso !) niiipiiem po 11) rsimir-se de ciimprir a i sbrign~fieoeu inilio>ta.; por lei, çorn o 1)rctesto tl i i ignoran- cia d'esta, seguc-sc iIue tamhem náo pode eximir-se cle observar as sol~rririitl;id~s, prescriptas pela lei para a c.clle- braqáo (10s actos luritlirfis, c (liir, tl2i\;irirlo de observar c s h i solcmriirl:iili~.;, lic.$i o ;irto nullo, cnil)or;i kt: ~,ri.tcrida ;illcyair a ignor~iricia dCi Ici [);ira s:iriar a nullitlarlc ~rro\enicrilc rln siia iriot)ser\ancin. A lei só rcconliece uni nieio tle sanar as riiillidatles dos actos pratblicados rontra a lei, o consenti- mento tlos iriteress:itlos; e ainda i: nchcessario que a Ici in- fririgitla 1130 seja CIC ordcni r: interesse ~)iilrlicos, pois de rnriirario iiclm o p rop iu coriscntimrrito das p;irtc.s pode sanar a nu1litl;idc.

OS e\t:rriplos s8o freqiienles n;i Iri c na practicn. Assirn, sequncto o :ii*i ig~i 10!)7, as con\ eriyi)t3s ante-

nirpciars ri>o teriio vali~l:iili~, SI: i150 Sorern celi~hr:itl;is por escriptiir;~ ~iiit~lic.a. i\ ipiiorniicia tl'ed a tlisposiq;to riao 1)orle suipprir :i i i ~ i l l i t l ; i i l ~ ie~iilt;intc tl l i siia iriol)~ei.\;iricia.

Assirn o coiilr,icio tlc compra e verit1;i de I)tlris immnhi- l iw i~s sera sempre rt:duzido a eacril~to particular, ou es-

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44 DA IGNORANCIA 01: EItRO DE DIREITO

criptura publica, conforme o valor (10s bens excctler ou 1150 a ciiicoenta mil reis (Cotl. Civ. ait. 1500). A coinpr:) e venda de bens immot~iliarios feita por outrii form:i i': ii~iIl;i, aintla qiie os contralicritcs por ignorancia da lei dcisassem dc n recluzir a escripto particular ou a escripti1i.a publica, conforme o v:ilor dos bens.

Qlicrn riao [~o:lr, ou tiao snhc ler, n5o pode tcslai- t:in tcs- tamerito c,c.rraclo (Cotl. Civ. ;irt. 4964, $' un. c art. ,l!)S3). O test;inicnto cerrado pois, feito pai' estas pcs.;o;~s, ia iiullti, ainda qiic igriorcm a siia iricap:iciilnde 1iai.a tesiai. por osia for1n:i.

Fai.il tios cisn miilliplict~i~os excin1,los coml,ro~ntivos tl'esta doiiti.i[ia; 1113s 11% o Lirenios, porque OS ~p»~iç ta( los l);~st:iiil para mostrar a verdaile practica (10 ~)riiicipio tlo art. 9 e cla sua :i~il,liciyão i tlisposiq3o do art. 10.

Antes tle pnssarnios ao sogriiido oorito, que nos ~bi'ol)o- zcinos tractar, isto k , aos effeitos il:i ignorancia dos nossos direi tos eriteridenios dever fazer airitla uma observação sot)i.e a igrioraricia das riossas obrigaqfi~s, a qual nos it suggeritla ~)di;i corifrontii!:ão da tloutrina, que ternos exl)eiitlido, coni as regras do direito romano sobre a ignoraricia o11 erro tlc dirtliio.

Seç~indo n doulrina qiie deixamos exposta, ti igrioriiricia da lei ;i iiinguem esime íla resporisiibiliclacle civil, e tarnbem criminal, em que liver incorisido pela viola~5o clns ol~riga- @es impostas por lei. Ora a resl)onsabilitlarl~: civil c.iirisiste na obrigaqão, ern qiic sc constitue o aiictoi tln fiicto oii omissão, de restituir o Icsntlo ao estado antcrioi' li lesão c de satisfazer ;ir; ~)erilas e d;ininns ciue Ilie 1iaj;irn causado (Cod. Civ. ;ir!. 4364); e por isso quem allepa a ignoran- cia da lei para se eximir íla resl)ons;ihilitInde ila siia iraris- gressáo, pretcritle ciii rniiilos caso.; vi li ir i i r i i i i perila; e d r n o srgiiiiito iirlrit~!li: tlii:cito, riii opiniáo tlr: ;ilgriris intcr- I 'i'eti"s, ; I ignor;~iicin oii i:rro ile ilii.cjito pi~tle sei. irivocada util.meritit, ijiiiiiitlo se ~ ~ r c t i ~ o d e evitar lima perda, segue-se que lia riiaior l)wte dos casos devia aproveilar-nos a igino-

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h A IGNOHANCIA OU BRRO DE DIREITO 4 b

rwcia ilas nossas obrigaq7ie.s para n2io incorrermos na re- spoiisabilidatle provcnieiitc da sua inexecução, visto que ella irnporl;~ em geral alguma perd;t, ou dimiriuicão do nasso patrirrioiiio.

Erii lace porem dos sãos priricipios e da lei que nos rege não é ailrnissivel' similliaiile tlieoria. No entretanto julga- mos conveniente esta confrontac.%o, para fazermos sobre- s:iliir n doiilriria do Codigo Ci\il c 110s pliilosophos moder- lios sobre as vellias tlistiricçóes do.; inlerprctes do cliraito romaiio, 4s quncs algiins codigos motlcrnos não souberam ainda subirahir-se.

Ignorancia dos nossos direitos

A i p o ~ r n c i a (10s riossos direitos pode resultar j i do facto quc os l)r~odiiz, como se ignorassemos o p ~ - ' ssamen to il'uina I)esson, ciij;i succeasáo a lei nos defere; jli da exis- teiicia ou disposic2o da mesma lei, que nos oulhorga o di- rcilo, coino, se snl)eritlo que certa J)t?SSoil ó fallecida, igno- rariios toclli~ia que a Ici 110s fiiz Iiertleiro clleçt;i pessoa.

bl;is ri ignorancia lambem porle tloiu-se no caso coiitrario. Tari10 ;i 1120-c~islerlciri colno a exislencia tio direi10 jlodem ser objecto tla igiiorancia. ,4szim como nOs podemos deixar de exercer um direito quc igiioravarnos ter, ta~nbein por igno- ra11ci;i i,odernos prctteiider um tlii,eito que 110s nfio perten- ce. 12 porem tle rrotar cluc t'm iiml)os estes casos a igno- rancia i.evela-se-nos nrilcs sob ;i hibnia tle erro, do qiie tle ignorancia propriamente dizta; o que riada faz ao nosso caso, pois quc jti riolgmos que i;noi8anci;i e erro tomam os j iiriscorisullos como syrioiiirrios.

O que to(1;lvin ( I c ' v ~ (lis~iiiguir-se i! O caso da ignorancia do riooso direito du caso &i igriorançia da sua náo-esisten-

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4.6 DA IGNORANCIA OL ERRO DE DIREITO

cia; ou, se assim podemos dizer, a ignorancia negativa da ignorancia positiva, 11ois qiiem Iahora na (irimcira, d ~ s c o - nliece iini Jireiío que Ilie assiste; e quem labora na çrçrinda, jrilga ter urii direito ( j ~ i ( ~ Ilie não pei-tence.

Este segliiido caso de ignorancin, como nos parccc, cori- funde-se com a ignoraiicia das iios~;as obrigafóes, c por isso rios rel~ostamos ao que jd tlisscmos a respeito d'estas.

I ics l ; i -~io~ portanto o psiinrii-o, que vaiuos examinar. Acontece ;ilgurnas vexes que algriem, sil.jrito ;I uma obri-

gaqão i ia t~i i -~l , iiáo O est i todavia ;I obr.igal.20 civil; o que a lei, sem tollicr o ciimprimento esporitanco d'aqiicllri, per- milte elidir o cumprimento d'esta por rricio d'cxcepqão. Este caso vesiíicti-st; r~i.incil)aliiicrtie ria prrsci-ipcão.

I? pussi~el pois que algiicm, sentlo deriinr1tl;ido ~icllo pa- ganicrito tl'iiiria (li\ ida o11 l , i b l ; i f3iili-ega de alg~iina pivprie- dade, ~~oclcritlo cliilir 3 ~)i~cièii(:ãu (lu cructor com a excepyão da prcxsipqão, rião a olrcroc;~, por ~gnosar a lei que lhe coriceile esta f;~cnlcl;idc, u Irazo dil ~ir'esciipqáo, a duração da posse, oii (1'1 não exijiencia cla d i ~ i d a esigivel, ou a exis- lencia de cliialqi~er contli-áo n~cessaria para a prescrip~ão, e por isso ,i? preciso sabes se o devecloi~ ou ~)ossiiitlor, tenilo pago a divida cxiçida, oii restituido a propricrlritle tleman- dada, pode repetil-a depois com o fundamerito do que a lei lhe permittia oppor a preteiic;ão tlo credor o11 proprietario a excepçáo de prescripqáo, rnas que deixara de a oppor, porque ao t en~po da proposicáo da acqáo ignorava n exis- teiicia rl'cstn faculdade.

O nosbo cotiigo náo e omisso a este respeito; pois, se nos fiilta a espribss;io tld letra, tcmos o seli espirito, que re- s o l ~ e a rjiicstSo pclo lado negativo.

Se atteiitlcrrno% ao morlo, por que o Corligo se exprime no art. 503, eiii que deline a prescrili~ao i. faz a divisáo da mesma, Ilarece qiic a decisáo d'esie ~ioiito (lcvia scr a%r- ina t i~a , poi.cluc, (Iizcrido o Çodiao que pelo facto da posse se adqiiiserii coiis,is c direitos, iissirn como se extingiiem obri- çawes, dU, a eritender que o possuidor da cousa se consti-

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DA IGNORINCIA OU ERRO DE DIREITO 47

tue legitimo senhor d'ella, logo que tenha decorrido o praso exigido para a prescrij)çáo, e a posse seja acompanliada das rnnis condições retlueridas para este efl'eito; e que o tlevetlor se tlesoner;i cla obrig;iqáo, iamhem findo o praso (13 prescripc;Tio. Ora serido assim, o possuitlor ou (levedor, restituindo a profiriedarli: e ;i divitla prescriptas, pagaram o que j i nao deviam, visto que 11 prescripy5o extingue a obrigacá0 do devedoi*, e attribuc a ~)ropried:ide ao possuidor q s o jure; c por isso deve permiliir-se-lhes n repetição da ~)ropricdarle oii da divitla paga iiitlevidaniente. S e conswl- taimos o art. 758, a soluqáo d'esta i1riestáo parece-nos airicla tluc de\ c ser a mesma; porrlue, segundo as diq)osições tl'este artigo, se alguerii erro de hcto oii de direito pagou o que rea lm~r i t e nao tlrl\.in, pode repetil-o rios tcrmos do me- sino Cotligo; ni:i> i; calaro (luc no ca\o presei~lc, tanto o pos- suidor t l ~ çousn, cnrrio o tleveilor (!;i oIirigayGo, pagaram o que 1120 tli:vin!n por erro tlc tlireito, porclue a lei attr.ibuia ao ~ ~ ~ s s i i i t l o r n 1mq)riedadc da cowa rei\rintiicada, assim corrio exoiiclrava o clevedor da o1)rig;r~ão exigida.

Coni11iri.irido porem estcs artigos com outros c10 mesmo Codigo, ternos para niis que elle 1130 [~erniiite a repetição (10 que foi pago, por se igiiorar a ~irescril,c,.áo.

Ern ~~i'irnciro logar parece-nos tliie i natureza da prc- scripcuo riso quadra a soluyáo ol)l)osr:l. A proscrip~50, como meio de defeza, segundo o Cotligo ebtabelecc iio ;i1 tigo 514 sb pode ser allegatla por l ic i d'exct~pyáo; e por isso não I! um iiieio tlireclo e ordinario tle eliilir a pretenção do au- ctor, nins ~ii i i l i l t~~rncnte um meio iiidirecto e exti,aordiiia- rio, coiicetliclo 1 ) o I ~ lei, para (lar m;iior estabilidatlc :i-pro- priedatle, c coi[ar o eiisejo de litigios, sempre fiiiicbstos para os iritercbssc,s 1n:iteri;les e nloraes (Ias I)<irles e para o progresw c Ii~~imoiiia social. I)'oritle pai*ece tletlli/ir-se cliie a prescripf5o n3o ~)roduz os seus ~ffeilos i l ~ s o j i i rc , como alguns thin protcntlitlo, mas que (leve ser in\oc;irl<l pelas l ) x r t s e ejulgada ~ )o i ' serilcri~a I m a Ilies aproveitar. Nem os mesmos juizes podem supprir ex oficio a prescripção, se

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88 DA IGNORARCIA 01: E I ~ H O DE DIREITO

não for esta iri\oc.acla pelas parles, como se estabelece no artign 545 (!o Cocligo Civil.

O nr~:,iiiirir>rito coiiti'orio ci noss;i opiriiáo, de(luzido dos termos gcríies em quc: e culcrbirlo o artigo 758 , parece- nos ter a siia resposta no me$i;io artigo.

Este artigo pc:rniiltc~ repetir. sii:iiente cliianclo alguern 1)ag:i o que n5o t l e~c ; porem rio ilosso caso, i;irito o posuuitlor corno o de~etloi ' pagain o qiic tlibteir~, milito embora po- dessem siiblraliir-se ao pagamcnlo, inioi-aiitlu a prescripção; e por isso ~ ~ ~ ~ ~ ' c ~ i ~ o s q u c O caso tlm questão não deve com- ~)relieritler->c rias tliq)o>ici-,cs tlo ,irtigo 758.

Aintla qlie não tenios tlii.posicáo expressa no Cotligo, IIRO o jii1;~inos totla\id oiiiisso, I)orsclue, segundo a clisposição silt)ii(Ii;iria corisignatla rio :irligo 16, as clueslQes sobre (li- rcitos e olirigacões que tiao 1)oclcrcrn sei. resol\litlas, nem pelo leito ila Ici, nem pelo sei1 crl)irito, nem pelos casos analogos pise\rcriidos cin outras leis, devem ser clecit1id;is pelos psincipios geitaes do (lireito iiatiiral, seguntlo as cir- çuiiistaricias tlo caso. OI'Y se 1130 temos testo da lei, para este caso, temos o espirilo do Cotligo, tarito eni rnateria de prescripç% coino no caso analogo da rcpetiç5o do paga- mento indevido, ;i cjual tiao tem logar, quantlo realmente se d c \ e o quo sc p:igon, cmbora podcsse deixar de p;igar-se por ( I i spo~i~2o tl;i lei, coirio no caso sujeito. Na falta porem de tcx~o, tlo e5j)ii ito do Codigo, e de casos analogos prere- nidOs erri oiiti os Icis, t1evc~ri;imos então rccorrcra aos priii- cil)ios çci'aes de direito nnliirnl, terido sempre em vista as c ~ i ~ ~ u r i i ~ ~ a i i c i ~ ~ ~ 110 caso, as cjiilies poclein c tle\eni muitas vczes moclrficcir o rigor (10s ~)r~iriril)ios ,!l~\lr;ictos. Illds se consultar- mos os principios geiacs tlt: tliieilo ri:i~ui-al, c os applicctmos no cabo prescnlc, ;I rioasa ~lttc,iGío 6 ;iiilcla a mesma, porque qstcs podcr lo 1)crmitlir cjue algucrn possa pre\alecer-se dri oircumstaricin cutei~ioi' clo lenipo para reter um direito, ou cxorienr-se d'uriia obrigação, niah iião p , ~ i . ~ auclorisar a repeti<;áo da que se pagou coino realmente devido, e i n h r n a lei civil perinittisse a excepçso da prescripçáo contrQa n

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DA ~GNORANCIA oc E n n o DE DIREITO 49

exigencia do auctor. Haveria sò um caso, em que os prin- c ip io~ çeraes de direito riatural permittiriarn a repetiqáo do qiie se tivesse pago, em mnsequenci:~ ale riáo se ter alle- gado a prescripqso; mas neste caso a repeti(;áo B impowi- vel, porque, alem da p r e s c r i p ~ ã ~ , não ha outro titulo.

Este caso tem logar, cluarirlo a prescrip(q90 1130 se allega como meio de atlquirir, mas como srippriinento i falta de prova; quando o possuidor, sendo leçilirrio senlior da cousa, não pode apreseritlir out1.o tilulo senão a siia posse. Neste caso pagou o qiie realmente não devia, mas, como não usou tlo uiiico meio aue tirilin para defender o seu direito i cousa, tam\)ciii depois' r150 pode mostrar* que ;I cousa lhe perten- cia por outro titulo; e por isso náo a pode i-c3petir, riem a iitulo de prescripc;áo, purque não usou d'ella em tempo competenlc, nem por oiilro tilulo qualquer, vislo que Ilie falta.

.4 nossa opinião é ainda consagrada pelo direito romano e pelo Codigo da Luisiaria, art. 11840, os quaes, posto não sejani Ic~gislaçáo subsidiaria, segundo a disposiçáo expressa ilo artigo '16 do Codigo Civil, I I ~ O 430 todavia para despre- zar, corno I'ruclos tla experiencia, qi ie i: :i mestra da vida.

Em direito romano esta rliiest50 tirilia uma solução mui fiicil pela tlihtiiicyão eritre oh~~iç;icfit~s rintrii-nes e civis, a qual ri20 alqmrcre cl;ii~nrnriiir: rio rioxso Co~ligo, posto que PSSS;~ t;il\ tjz tl(~tlu~ii '-se c io ;i(l\'erhio 1.ea1111ente que o Co- tiiço ernprcga rio ar tiço 850.

Scguntlo csta (listincçáo que r150 era piiramenle theo- rica, pois que tinlin bastante irnportancia na practica, as leis rornanns ri30 permittiani repelir o quc era devido na- turalmente, posloque o não fosse civilineritc.

Temos fallaclo da prescripçio a respeito do prescribente, mas a questão que tractamos tamhem pode olliar-se pelo lado da pessoa, contra a qual corre a prescripçáo.

Nesia matei-ia estabelecenios o principio de que a pres- 4

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.", 0 1)A IGSOHAÃCU Ol' EIIHO DE MREITO

cril)c;io tlo direito ou (I;] obrigas50 corre contra o igrioran- te. .2ssim se rjunlquer. ignorando ser o proprietario cl'algiima cousi, oii c.i.cdor d';~lgiiiii:~ ol)rig3~ao, deixar correr o !)raso legal tla /ir csi.1 ipc;Go, >cri1 reclaniar iiina ou outra, a todo o tPrnjio ( I U ~ tt3itlin coiiheciineiilo tlo direito qiie Ilic assiste corno ~~rol~r ic i i i i~ io ou como credor, poclr i~ilcritar a acçao tl t : rei\iiitlic;i~áo ou tle p;igameIi!o cniitra o possuidor ou tlcvedor; mas, se estes Ilie oppozrrem a t b \ ; ( a ~ l y á o de pre- scril~y50, náo pode defender-sc com a igiior niicai i i etn que Iaborava, poriliic, segundo diz I'aulo na I , . 9, fi .5, D. de juris et fcicti iglroralrt., « I W C strtliis soler,c. .\itcçlcrri, sed er- rmut ib t i s . » JIiis, sc toinar conhecimento c10 seu tlireito ainda antes t ln [)rcsci~il)q90 acabada, 1)otle fazer valcr o seu di- reito, I)oi8quc 1150 si) o ilireito tiao esta pi*osrripto, inas nem elle í: ol)rigatlo n dar a r;izáo, porque o ri80 tem demnnclado liti iii3is !CI~I I )O, «... ~ ( 1 2 1 ~ ~ 1 i-ero pct~ntibus non ~zoc .r~ (jfiris ig~zorantitr), tliz a L. 'i, L)., tit. cit.

O erro de tlireilo pode ainda coiisitlerar-se nas suas re- Iações com a boa Ié, que se exige no possuidor, taiito para acquisi~5o rlos fructos, como par;] a prescripcão.

NUS tlistii-iguirernris chdc. clous casos, porclue nos parece que os el'feitos (10 crr80 sobre catl:i urn tl'elles sáo dii'ferentes.

A igrioraricia o11 erro, em que <ilguem estii Acerca tle qual- quer Ici ou facto, t: o que sc cliaina boa fc: a ignorancia ou erro pois é o funtlamento da boa fk. facil portanto tlctluzir tl;i dcfiriicáo tle boa f(. a defini(;ao tla possc de boa fk, e clo scu coritrnrio a cle posse ile mi fk. O Codigo define talito iim;i como outra, e por isso vejamos estas definitões, que terri pelo riienos o curilio tla legalidade.

c(r)osse tlc I J U ~ 1k j! a(lile113, que procede de titulo, cujos vicios 11%) s io conlieciclos i10 ~iossiiidoi~. Possc tle r11A fk k a ( IUC s': da na IiypoLliese iiivci,s3 (Cotl. Civ. art. 476).

O titiilo cin qiie o tlireito hc Iiiricla pode ser valido ou riiillo; c a nulli~ldtlt~ tlo titiilo pode ser conhecida ou igno- r-atla clo actliiireiitc. Qtiando esta nullitlade e ignoratla pelo posuitloi., a siiii l iuse clih-se dc boa ri:; e se i: conhecida

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tl'cllc, a l~ossc C clc mA Si:. Ora n nullitladc tlo tilulo pode pro\ir cle \;iri:ia causas: j i da natiir.t.za (10 objecto do di- reito, j i dn iiii*;il~;ic~itl;itle das parttls, j;i do defeito da forma tlo acio. ];i (Ia iiicoiiipctcncin c10 proprio ;tcto. Todas estas c;iusas se ;icliam tlcfiriitlas na lei civil, e por isso içnoral-as importa o mesiiio qiie ignorar a lei; mas se a lei não deve ser ignoratla, tarribem não deke admittir-se a ignorancia tl'estas tliversns cauias tle nulliclade do titulo da posse.

Assim, nem o.; alirrieiitos devidos por direito de familia nem a 1ier;iri~a tlp pessoa viva, ainda que Iiaja consentimento cl'ella, podem ser objecto de compra e veiida. (Cod. Civ. art. 15.56). A compra e ~ e n d a que \.ersar sobre estes obje- ctos i: 1)ois nulla, e incapaz de trarisferir dirciio algum para o compratlor. S e tomar posse do objecto da compra, a posse prot-eclc tle titulo vicioso, :i qual scrd tlc boa ou de mA fk, seg~intlo o vicio for coriliecido oii igriorado (10 possuiclor.

O inenoi' ( 1 1 1 \iiitc a iim ;irmos e incapa~ cle uxercer di- reitos civis, e os seus actos e corilractos nZo [~oilcni consli- tnil-o cIn obiigaç3o jiii.itlica, esccpto nos c;ihos e\pressa- nierite dcclai.atlos lia lei. Celetiraritlo pois alc~uni coritracto que iião seja esl)rcssamente excel~tuado ria lei, este con- tracto nZo obritra o menor para com o o~ i i ro esiipulante, 9 posto que este iique ohrigado para com aquellc. (Cod. Civ. :irtt. 98 c 99). O quc comjtrar os bens do menor, 11'70 os [)ossuepor titulo \alitlo, mas por titulo riiillo: e sri,;i pos- siiiclor de I~oa oii tle iri;i fb, scguritlo a nullitlade lili. tl'ellc coriliccitla ou ignoracla.

Nao m mil li ti mos mais cucmplos. -4 J~oa f4 asseiita sobre o erro ;icci8c.i do vicio ein cjuo 1,ihora o titulo tla posse, o qual 1)otle ser cle direito ou de Sacio, segilritlo o seu ohje- çto 6 n lei o11 rilgum facto. .4ssim, quem toin,i o maior por menor, o Iiorneni castitlo l)oi' Iioiricni solteiio, erra :icci.cn tlo fiiclo; mas quem, sd)eriilo que certo inclivitluo k menor, igriora clric a lei dccltirn iiiillos os trctos practicatlos sorri n iriterveriyáo do tulor e iormalidacles legaes, erra acerca tlo direito. Egualirienlc, quem souber que certo iodividuo 6 ca-

. .

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5 a DA IGxoiiANcIA ou Ermo DE DIHEITo

sado, mas ignorar que as leis lhe vedam a alienação de bens db raiz sem o consentimento da niulher, erra Acerca do direito, etc.

O que resta pois saber 6 se o cri-o de direito excluiríl ou não a boa fk. Entendemos qiic o principio de que a ignorancia de direito a ningiiem aprovcil:r, náo deve appli- car-se a esta Iiypothese em todo o seu i-igor.

Com effeito, se não deve arlmittir-se igriorancia de direi- ta, tambem nS0 deve admitlir-se a boa fb baseada nesta cspecie de ignorancia, porque, excluindo a ignorancia o co- nhecimento, e presumindo-se sempre o conhecimento da lei, é evidente que não pode admittir-se a boa fé baseada na ignorancia, a qual se supy~óe riao eaistir. Mas a univer- salidade do conliecimento (ia lei, seritio um impossivel mo- ral, segiindo dissemos, riao pode admitlir-se serião como rima d'estas íiccões legnes, impostas pela natureza das cousas c pelo jogo das necessidades da ortlern e interesse social; e por isso a urriversalidade. tla ma f6, resultante (10s actos practicados coiilra a lei. não tcrii mais re;ilitlade do que a universalidade do conliecimento da lei. Sendo assim, a boa 18, baseada rio erro de direiio, pode dar-se, e dando-se 11ede a crlriitlaile se náo confunda com a mri fe. Uma cousa porem ile\c notar-se, e i? que, nSo se presumindo a igno- rancia tla lei, Lambem náo deve presumir-se a boa fé, ba- seada eni ta1 igi~orancia; por isso ao que a a l l~ga r incumbe pro\'al-a, visto cjue lem contra si uma presumpqão jtcris et de jurr. Ao contrario, se a boa fk se basear em erro de facto, corrio o filcto r130 se presume, a prova da hoa fé náo incumbe neste caso ao que a allega, porque tem a pre- sumpção a seu favor, mas iiiciim1,e provar a sua ma fh ao que impugna a I~oa fk, mostrando qae elle não podia igno- rar o facto em cilja ignoranciii pretende basear a sua boa fk. Eis a differenya que pomos entre a boa fé baseada no erro ile direito c a boa le baseada no e r ro dc facto.

Mas, se a boa fe baseada na igriorancia de tlireilo 6 suf- ficiente, para que o possuidor faça seus os í'ructos e gozo

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DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIRElTO 5 3

de todas as vantagens que as leis concedem aos possuido- res cle boa fé, nTio e todavia suficiente para a prescripção; não porque o erro na prescripção se,ja exclusivo da boa fé, mas porque para a l)rescripf30 trhr logar se exige que a posse seja fundada em justo tilulo, que o Codigo define qualquer iilodo legitimo de adquirir indepencleritemente do direito do transmiltente.

Comparando a definiç50 de boa fC com a de justo titulo, vemos que nem a boa fe implica o j i~sto titiilo, nem o justo titulo implica a boa fe, antes a boa fi? se pode dar ainda na falta de justo litulo, e vice versa. O titulo, para ser justo, requer todas as condições de ~alitlade, esccl)to a do direito na pessoa tlo transfererite; e por isso se a lgu~rn adquirir por algum modo legilimo qualquer objecto cli: pessoa que elle saiba não ser o verdadeiro scnhor, poçhiir! o dicto obje- cto em ma fk, mas com justo titulo, scgiiritlo a no(:ão tlo Codigo. Pclo contrario, se alguem atl(luirir algoma cousa do seu legitimo senhor, mas sem as hrmnlirlatles legaes, por ignorar as prescripções da lei a tal respeito, pode pos- suir em boa fe, mas com titiilo injuslo.

O mesmo Codigo reconhece a independencia reciproca entre a boa f6 e o justo titulo, quando declara que a boa fe sempre se presume, rnas não o justo titulo. (Cit. Cotl. artt. 478 t: 519).

O erro de direito pois e obstaculo ;i l)rcscrip~ão, não porque seja exclusivo da boa i;, mas porque 6 excliisivo do justo titulo, condiçáo da prescripcão ordinaria. (Cit. Cod. artt. 517, 518, 526, 528).

XII

Contractos

Tendo mostrado alguns effeitos c10 erro sobre a pregcri-

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p@o, passamos a examinar a mesma inateria sobre os cott- tractos. Nesta parte iião nos faltnni ilisposi~ões expressas do Codigo; sò 13 preciso determiritir o sei1 verdadeiro aen- tido, o que aliás não é cousa iacil.

O princil~io gornl, formul;~tlo pelo Codigo, é que o con- sentimento ~)rcsl:itlo por erro protluz a iiullidadc do cori- tracto, nos tcrriiii.; tlccl;ii';itlos no mesmo Coifigo.

Este [)i'iric.ipio cni gtbr:il i: verdadeiro, reconliecido j6 elos isumanos iluniiilo t1i~i;im: (c culn non crmscnlinnt qzii errent. Oziid cnim tntrt co/rttnaritrnl conscnsrti est qttnrn error qzii irnl~critiu~th detc!lit?» I,. 15, D., d~ jtri-isdict; ((crror enim le- ~iyrrtorf~na nnn habet cuttsclnsunz. a L. 2, L). pr. dc jud.; <cnulln ost c~rirn ~~olunttrs crrantls.)) 1,. 20, I ) . cic nqtrn pklv. «No~z vide~rtur, qrri er3rcint, vonsentire. » I,. 1 16, $ 2, de H. J. «cunh crrantis vo1untn.s nztlla sit. )) I,. 8, C. !i. t. « czlm nullus sit errantis consmtsirs. I,. 8, C. h. t.

Nso sendo I)oi8em totlo o erro ~sclusi\ lo d:i vontade, não ~)odi! dizer-se absolutamente que iodo o erro produza riul- lirladc (10s contractos. Siiriilhante principio, alem de pouco nncto , sorin Tunestissimo na prartic:~, jti pela quebra do vinculo coritractiial, jii pelo grantk numero de litigios, a que daria loçar a su;i al)plica[ão strirta. Ora a clifliciilclade (Ia ii1;iteria náo esta em ilemoristrnr a \erclncle tlo principio -que o erro em geral cscluc o corisentimento-porque a siia vrrdade E: da primeira in tu i~ão; mas esta ria sua applica- çáo, visto que, riáo poilcn(lo ntlmittii -so em toda a sua en- tensão, E: necesiario estabelecer rcgi-as, segunclo as quaes deve fazer-se esta iipplicay50, o11 ilelei~minar as excepções que deva soffrer lia practica.

I? o que tem fcito totlos os codigos: 1n:ls a > ,SLI;IS disposi- taões não sso iiriiformca, taltez pela tlilriculda~le (1n materia. illgiiris, como salicnios jii, clistinpem 1)rimeiramente o erro de direito tlo erro clc kicto, conçitlerarido este e náo aquelle como c:iusn de niillitlndc r10 contracto.

Corno porem já expozemos noutra parte as disposi~ões (10s; principaes codigos modernos sobre este objecto, por isso

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DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO 86

nos limitamos a esta observação, passando a examinar o systema adoptado' pelo nosso Codigo.

S e o confrontarmos com os Cotligos estrangeiros, vere- mos logo que elle contem algumas tlisposiqóes qiie 1150 se encontram naquelles. O nosso Cndigo, tentlu assentado o principio qiic o consentimento prcstatlo por erro roilu luz a niillirladc, tlcclarti lios artigos segiiirites os termos em que isto tcm logar. Pllcnciniin as ibspecies tle crro seguintes: erro sobre a causa clo contracto, erro sobre o ohjecto oii as qua- lid;rdes do ohjecio tlo contr:icto, erro sobre a pessoa, com quem ou em consitIcra!.51~ tlt? querri se contracta, e r ro com- miim c geral, e crro tle ciilculo aritlimetico ou de escripla, (Cil. Cod. nrtt. 6 5 7 , 664 c (iti5). Feitas estas varias clistin- cyóes, ileterrninii o Codigo quaes os clTeitos d;is varias es- pecies de erro, rlue elle reconhece, sobre a validatle dos contractos. .\hsiin o erro cominum e geral n3o ~)roduz nul- litlade, e o sirriples erro cle calculo aritlimetico ou cle es- cripta só dti direito h sua rectifica~ão. (Cod. Civ. art. 664. e 665).

O Codigo, para determinar qual seja o effeito das outras especics de erro, distingue primeiro o erro sobre a causa em erro de direito e erro de facto; e em Iiarmonia com esta nova distincção cstahelece tres regras, rlne completam 3 theoria do mesmo Codigo ficerc I I tos effeitos tlo rrro sobre os coritractos. Estas tres regras, que fazem o objccto ilos ;irtt. 6 5 9 , 660 e 66.1, s3o relativas, a primeira ao orro de direito Acerca da causa do contraclo (art. G5!)), a scgiiritla ao erro dc facto sobre a causa (art. 6 6 0 ) , a terceira ao erro sobre o objecto tlo contracto, ou sobre as qualidades do mesmo objecto (art 664) . Falta a regra para determi- 1131' OS effeitos do erro sobre a pessoa, com quem o11 em considcraqáo de quem se coritracat;i (iirt. 6 5 7 , n." 3j; mas para este C ~ S O 1130 lia regr~i es~~ccial: porrjue o cri-o, ver- sando sobre a pessoa com qiiern se contract~r, é equil,ariiilo ao erro sobre o oh j~c to oii wbrc as qualidatles do mesmo objecto, c os seus cffeitos regiiliirri-se pela disposição do

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56 DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO

art. 661 ; e, dizendo o erro respeito a alguma pessoa que não figure no contracto, e equiparado ao erro de facto sobre a causa do contracto, e regula-se pela disposicão do art. 660 do Codigo Civil.

Posto isto, estabeleçamos as regras: 1.' O erro de direito Acerca da causa produz nullidade,

salvo nos casos em que a lei ordenar o contrario; 2." O erro de facto ácerca da causa si) produzira nulli-

dade, se o contratiente criganado hoiiver cupressamente de- clarado que sO em razso tl'cssa causa contraclAra, e se esta declarayãn houver sitlo e~pressamente acceitada pela outra parte. (Cit. Corl. :irt. (;(;O).

3." O erro sobre o ol~jecto rlo coritracto, oii sobre as qiialidacles do mrsmo ol~lot.io, sri protlui. iii~llidatle, havendo o enganado t1ccl;irado oii ~)rosantlo-se pt1lab circumstancias egualmeritc conlic~~itlas t l ; ~ outra parir1, que çti por essa r;izão e pnr nenhuma outra contraclara. (Cit. Cotl. art. 661).

Esta regra terceira ])ouro tlifforc tla segiiritta; stimentc dA mais extcrisáo aos clTilitos tlo crro sol)rc o ot)jccto tlo contracto, oii so l~re as clrialirladcs do mesrno ol!jecto, do tlrie ao erro tle f;it*ln sobre ;I cx:iiisa tlo t~oiilr;ic.Lo. ciri tl~iaiilo riso exige que a tleclara(-áo ;ii9i1rc.a (11, objct-to tlo cnntrticto, ou tlas qualid;itles do mesiiio iil)jecto, f'cita prlo coritr;iliente enganado, sqja esprcssammprite ncceilt: prla otitr;~ [);irte, ou suppre a falla tl'aquell;~ deçlara(;áo pel;is circ-iirnstancias do mesmo contraclo, cgualmentc conl~ecitl;is (]:i outra parte; o que parece n3o t r r logar a respeito clo erro tlc fiicto iiccrça da causa do contracto.

Ha ainda um principio superior, que (loiiiiria totln a rria- teria de erro, formulado pele Codigo, aol)lic.arel ao erro proveniente de dolo ou de mA fi! de uin dos co~itrahentes, ou de terceiro que teriha interesse iio coritracto.

Esta espccie tle erro protluz a ~iullidade do contracto. (Cod. Civ. art. 663).

Atk aqui temos apresentado simplesmenle a classificação de erro, feita pelo Codigo, e lemos exposto as suas regras para

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DA IGNORANCIA O 1 ERRO DE DIREITO 87

determinar os effeitos do erro sobre os contractos. Como o objecto do nosso trabalho náo k toda a materia de erro, mas stimente o erro de clireito, por isso, abrindo mão das otitras especies, passemos a exaniinar a doutrina do Codigo sobre o ohjecto do presenlc trabalho.

J i sal)emos que o erro clc direito, segundo o nosso Co- digo, C uma tleterminaçáo do erro sobre a causa do con- tracto, \isto cjiie o Codiço tlivirle o rrro sohre a causa do contracio em erro de ilireito e erro i I i3 facto.

Ora a tloutriria do Cotliço sobri: o crro de direito em rnateria clc contracios 01Tttrece-nos algiiiis rcBl)aros, os quaes versam sohre ;I tlistiricq30 do erro tle dircilo e erro de fa- cto, privativa tlo erro t l t l I-ausa. sohrc a verdadeira noçáo da causa. c sobre a neccsbitlade e applicaç5o d:i regra eor- resl~oritlcrite.

O Cotligo, tlistiriguiticlo stinierite o erro tlr cailia em erro tle direito e crro rle facto, parece excluir esta distincção tlo erro sobre o ol)jcc.io oii sobre as qiialiil;itlcs do ob,jecto do contracto, c ilo crro sobre a pessoa, com qiirni se con- tracla, ou em consitlcraq30 da qual se contracota, o que e menos exacto; pois que todo o erro, seja qual for o seu objecto cspeciiil, se deterinina em çpral como erro dc facto oii erro tlc direito; e por isso as outras e q r r i e s de erro admittitlas p ~ l o Codigo, a1t.m da do erro sol)rt, ;i causa do contraclo, liao cle neccssarilimerite pertencci. no erro tle di- reito, oii ao erro de facto, porque n2o ba conceber-se erro algum, qiie não seja erro de dtreito ou (IP facto.

Parece-nos pois que a dislincçGo entre crro de clireito e erro tlc facto, applicavel sbmente ao erro sohre a causa, e menos exacta, visto que as outras especies tle erro tambem se determinam do mesmo modo.

Potlcri talvez dizer-se-nos que as outras especics dc erro, alem tlo crro sobre a causa, c u r i ~ i ~ l ~ ~ r a - a s o Cotligo como erro tlu facto, e qiie o erro tlc tlirrilo se c30ml)rehentle sob a clenominaç30 tfe erro de causa: mas então hão de admit- tir tambem uma de duas cousas, ou que o erro de causa,

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sendo o uriico susceptivel de distinguir-se em erro tle facto e erro de direito, abrange todas as outras e s~~oc ics de erro, quando versa Acerca do direito, oii que as outras especies d e erro nunca podem Yersar icerca do tlireito; c nenhum dos membros d'esta disjiinc~ão pode admiltir-se; o primei- ro, porque então confundem a parte com o todo, isto é, o erro cle direito com o erro de causa, a especie com o ge- nero; e, como o erro de causa tambem pode ser er ro de facto, não ha razão para se excluii~cm as outras especies de erro, quando versam Acerca clo facto, e não quando versam Acerca do direito.

Se o erro de causa não se clistinguisse em erro de facto e erro cle direito, n5o havcria talvez iricoriveiiiente, antes vantagem, em designar todas as especies d r erro de direito por iim;i sb 11111 ase - erro sobre a caiisa, -- ainda que esta expressfio fosse impropria, porque o erro de facto tambem pode ser causa (10 contracto. O segiindo, porque não ha es- pecic ;ilgiima de erro que não possa determinar-se como erro de lacto ou erro de direito. A clistincção pois do erro cle causa em erro de direito e erro de facto, posto que exacta nesta relafão, rião 6 plena, porque applica A especie scimentc o que t le~in aifirmar-se do genero, visto que todo o erro é necessariainrntr~ vrro de direilo oii de facto.

Como j;i notiirnos, similhante distincfão n5o se. encontra nos cotligos estrangeiros. Não a combatemo.; poi- isso, mas pelas razões qiie produzimos. Coellio tla Rocelia i: o iir1ic.o auctor, oritle ericontranios a iiistincfáo(10 erro sutlrc a cniisa, em erro cie hcto e erro de direito; mas se e-i;) foi ;i fonle da tlisposicáo do Codigo, como julgamos, seriiirrios clur :{o insigne a~ictor das Institnic.óes r10 »irrito Cil.11 sc altrit)ii;tin doutrinas qiie n5o erisinoii. E verdade qiie C o ~ l h o r1,1 Ro- cha faz a distiriccáo que faz o Codigo no nri. 667; mas o conceito tlo ol~jilrto cl'esta distinccTio k que ri5o tein a me- sma estensao para este insigne ailrtor e para o Codigo. Diz o citado auctor, na not. D, ao $ 100, pag. 67, sobrc o erro de direito, relpondendo A pergunta: (jiinndo tem loçar a

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DA IGNORANCIA 011 ERRO DE DIREITO 59

al legação do erro?: S e qrialquer :icto jiit-idico 6 i.epro\~ado pelas leis, ou lhe falta alçiima solemnidade essencial, póde annullar-se por esse iuntlamerito, sem riecessitlade de re- correr A ignorancia ou erro. Tem porem logar esta que- stio, rluaritlo o cri-o ckritron como motivo do coiiseritimen- to, ou, o qric vai o niesirio, quando sc erroii ri:^ cncrsn da obriga~áo: e aqui 6 que tem logar a distiric~ao entre erro iie f i~cto e o r o de ílrrc'ito.))

Esta tloutrina e e s ~ c t n , porque f i ~ l l i j c10 erin tle causa em gcral, c disiingue este cliri orro tle facto c erro cltb (lireito, corno o Corligo Civil; m;is a ilistnnci:i clnti.tn n iloiitriria d'cste e ;i d'acl~~dlle ó iriirncns;~. O Codigo aliplicoii ;i espccic o que Cocltio d:t Hcic.lia com iniiis rigoi. logiro npl)licoii no genero. Coellio da 1locli;r 1130 consitlcr;~ o erro so1)ri: a causa de iobrigaqáo, como iirri;i especie tle clr*ro opposta n outras espccies, mas corisitlcra-a corno gener ,iIis;i~40 rlo erro, visto que totlo o coriseritimento prestado por crro tem por causa esse mesmo erro, e neste sentido podia dizer: « e aqui i! que tem logar a tlistiiicç2o entre erro de facto e erro de direi- to» , porque se collocnu num ponto de \ ista sriperior; mas o Cotligo, coiisiilrrari(1o o crro de c;iusa como uma especie de erro opposta n oiitras clspecies, poilia eff'ccli\ ;imcilte dizer t;irnbcni que o erro de rnus;i sc tlislingue eiii er,i.o de faclo c erro tlc direito, 1)orrlue a especie contcm o gcriclro na sud comprchensáo, m:is para sei. conseqiiente dc\.in applicar a tlicta tlistiricyáo iis oiitras especies de erro, porque todas ellas podcni tamlicm ser consitlerailas rlehaixo do ponto d e ~ i s t a tlo facto ou tlo (liroito.

Passemos tla ilistiriccGo ;i noção tlc causa. O que se eritcritle aqui por causa do contracto? &' tliffiçil accrlar com a nocio que o auctor ligou li pa-

lavra cnusn, porque esta p a l a ~ r a emprega-se iirn viiriadis- sinias ;iccepções. A mesina difficiiltlade tem reconhecido os comnicntadores ao Codigo Civil Fi.nricez em tlèterminar a verdadeira nogáo de coiao, ijuc este codigo ernIJrega, ma8

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60 DA IGNORrlh'CIA OU ERRO DE DIREITO

para significar relação juriclica diversa, porque falla da causa do contracto como condiciio da sua validade.

Segundo Demolombe, a causa da obrigação pode ser de- terminativa e pinal, c/liciente ou inlpulsiva, e diz que a pri- meira deve distinguir-se cuitiadosamente das du:is restantes.

a.4 causa final, segundo o mesmo auctor, C! o fim inl- ,mediato que, a parte qiie se obriga, se propóe conseguir obrigando-se. »

Esta causa não é identica p:tra toclos os contractos, mas diversifica segundo os contractos são synallagmaticos, uni- laleraes ou beneficios.

({NOS contractos synnllagmaticos a obrigar80 tlc cada parte tem por causa a obrigacáo tla outra»; cl'oritlc se sep ie que lia tantas causas distinctas, quantas as ol)riga.i?es, e que a causa da obrigação se confiinde com o ol~jcclo d'esta obri- gação.

«Nos coritractos unilsteraes. a causa (ia obrigação contra- hida por uma (Ias partes 6 o facto ou a Ilromessa (Ia outra.)) Nesta relaqáo 6 necessario não confundir, como nos con- traclos synallagmaticos, a causa com o objecto.

«O objecto, 15 qicid drtrrlitr. » «h causa, i: cttr debeatza.» «Xos coritractos beneficos, a causa final P a intenção de

exercer uma lihernlidatle ou de prestar um servico. «Causa efricicrite ou formal k o elemento ~c r ; ido r do cnn-

tracto; L; O que faz com que o contracto sc! forme, e seja capaz tle produzir acqáo em juizri.))

l'or direito romano ;I causa cflici~riti: dos contractos con- sistia, segundo a sua natureza e importancia, no consensu, re, verbis et litteris. Hoje podemos Oizer qiie a causa efi- ciente de todos os conlractos 13 o consentimclnlo.

((Quanto 6 causa impulsiva, diz o auctor citado, não e senão o motivo, que leva cada uma d:is partes do seu lado a cwtractar; o motivo do contracto, dizemos n6s, ctsr contra- xit, e não o motivo da obrigaçáo, cur promisit.))

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DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO 6 1

«Em duas c,ousas se differença da causa final: 1.' que ella não C: um elemento intrinseco e constituitivo da obri- gação; 6 pelo contrario extrinseco e exterior; 2 . V u e 6 re- lativa e pessoal a cada um dos contrahentes em particular.

Ora feila esta distincçáo, pergunta-se de que especie de causa fitlla o Codigo no artigo 6577 S e C! d a causa final: o erro sobre causa confunde-se com o erro sobre o objecto nos contractos synallagmaticos, com o erro sobre o facto ou promessa tia outra parte nos contractos unilateraes, ou com a iritenc,ão de fazer unia liberalidade ou de prestar um serviço nos contractos beneficos.

S e da causa eficiente, confunde-a com o consentimento e labora numa petição ilc principio. Se C! finalmente tln causa imnpitlsiva qiie intenta fallar, confunile-a com o ino- tivo do contracto, dli mais imlinrtancia aos effeitos do erro sobre o motivo do conlracto, clo ' I I I ( ~ 11enhunl outro codigo. Ainda ;is\ini parece-nos que o Cocliço se refere i causa zm- ptclsica. segundo o modo pclo qual se exprime no art. 660.

Aleni tl'islo, consultanilo a historia do nosso direito, ella nos ensina que a causa e o mesmo que o m o t i ~ o . Coelho da Rocha, traciando da modalidade dos actos juridicos, e contando entre os elcmcntos nccirlentaes dos mesmos actos a causa, diz no $ 108 das suas Inslituiróes do tlir.~ito Ci- vil: Eritencle-se por caiisa a expressão clo motivo, que in- duziu uma 1)cssoa a dar, ou 1)romctter uma coiisa a outro. E m geral a causa, ainda que seja falsa, não prejudica o efTeito do acto; escepto: 1." se C! enunciada em forma de condiy50; 2." provando-se que interveio erro, e que o pro- miltente n50 prometteria, se conhecesse a falsidade. Parece- nos pois que esta C: a nocão de causa, a que se referem os artigos 657 , 658 , 659 e 660 do Codigo Civil.

Determinada a nocão de causa, vejamos a influencia que o erro dc direi10 acerca d'ella eserce sobre as rrlac,ões con- tractuaes.

Segundo a disposição do artigo 659 do Codigo Civil, o

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69 DA IGNORAKCIA OU ERRO I)E DIRRITO

erro de direito Acerca da causa do contracto produz a niil- lidade do mesmo, salvo rios casos em que a lei ordenar o coritrario. Este artigo encerra um 1)rincipio go1;11, rnas salva as escepç6es que deva soffrer ria siia applicayiÍo, iis qiiaes devem ser exl)ressa~neiite tleclaradns na lei, e ri30 podem ampliar-se a oulros casos, posto que arialogos, seguritio a regra estabclecicla no artigo 1'1. O principio estabelecido pelo Ccidi~o, quc o erro de direito sobre a causa do con- tracto r)ro(l(~z a siia niillidade, parece-nos razoavel, porque desde o rnomcJriio em que o erro foi causa rleterminativa do consentimento, pouco importa que o erro seja tle facto ou de direito, porque larito itm como outro surprehendem o conserititnerito. Confrontando porem a dis[)osic?ío do Codigo sobre o erro cle tlireilo coni o erro de facto d ) r e a causa, parece-nos tjuc tracla com mais rigor o erro tle facto, do que o erro de direi to; pois que este protlirz ;i riullidatlc tlo contracto sem coiidições, e aquel!e, para protliizir este ef- feilo, esige quc n contrahente enganado tenlia declarado expressamerite. que SB em razáo d'essa cniisn conlractsra, e que esta tleclara~80 tenha sido expressamrnte acceita pela outra parte. No erro de direito sobre a causa não sc exige declaração alguma da parte do contrahente que se diz eii- ganado.

Não 6 porem o effeito que o Codigo attribue ao erro de direito sobre os contractos que nos embaraça; i. a sua prova.

Com el'feito o erro de tlireito não se presume, e porisso, celebrarido alçuem iim corilraclo em que reriiiricie :I algum tlireito que julgava não prrlencer-llie, tlevc pi c~iimir-se qtic a renuncia do tlireito fbra voluntaria, e n;?o rrioti\acla por erro, \isto que o erro náo s e presiime.

A tleclara~5o do contrabente,,cluc se iliz erigarinclo, não d e ~ e fazer pro\ a 3 *eu favor, porque, estab~lec~ido sirnilliantc principio, ~iuircos coritractos subsistiriam.

Serti r~ecesstirio porstanto attenrler 3 iialureza do conli'a- cto, 3s circurnstancias que o revestem, e 3 condiçlo dos

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prbprios contrahentes, para acceitnr como verdadeira a de- claraçáio do erro, em qiie o contraheiite pretende ter cahi- do. A lei, attenta a varierladc de casos, qutl 1)o'lern dar-se, não formula preceitos ao juis, mas c l i a i \ ~ 3 \ii,i tlecisão ao priidente arbitrio do mesmo juiz.

Assim, pela legislaçio anterior ao Codigo Civil, o conjuge sobrevivo succeclia ao corijuge fallecitlo só na falta de her- deiros ate ao decimo g r iu , mas pelo Codigo Civil a soc- ces~áo legal do conjuge, sobrc\~iro ao outro corijuge, tem jogar na falta de herdeiros ate ao quarto grau. Ora na transição do anligo para o novo direito, e po~s i \~e l que o cor~juge solirevi\o fizesse corn OS Iiertleisos do defuncto, aleni do qiini.to grau, algiim contracto sobre a herança do mesmo, iio (lua1 o conjuge ,sobrevi~o fosse prcjudicado, coino por esem1)lo. coiiilirnndo ou trocaniio, por outrus, bens que a lei Ilic coiicc~li,~, ])os ignorar n disposicão da lei que lhe deferia a hcrnnça tlo conjuge fallecido. Neste caso, provado quc a causa do coritracto fora o erro de direito, em que estava o conjuge sobrevivo, e não :i iriterição de beneficiar os Iicrtleiros do outro conjuge, todo o contracto com os preterididos herdeiros do conjuge ~,redefiincto, no qual o conjuge sobrevivo renuncie por erro de direito a qualquer parte da herança, deve reputar-se nullo, em conformidade com a disposição do artigo 659.

Resta-nos esaniinar a segunda parle do artigo, isto 8, as excepç6es ii regra geral cstnbelecida na primcira parte.

O Cotligo não designa as excepções, contenta-se com as indicar pela formula sacramental, concebida nos seguintes termos: - salvo nos casos em que a Ici ordenar o contra- rio.- E necessario pois percorrer o Codigo, artigo por ar- tigo, em busca (10s taes casos, em que a lei expressamente determina que o erro de direito ticerca da causa não pro- duz a niillidade do contracio, ou de algum outro acto ja- ridico.

Attestamos que procedemos a esta e~ifiitlonlia busca, e que apenas ericontramos Ires artigos, que possam referir-se

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64 DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO

ao erro de direito, um expressamente, e é o artigo 17115, o qual diz qiie a trans:ic!.io nfio pode ser rescindida por erro de direito; nutro talvez implici/arnciilc, c 6 o artigo 97/16, o qual diz: A invocação tle uma causa, quer falsa, quer \crclatlcir;i, contraria A lei, produz sempre a ~iiilli~lade da disposição: mas este caso, ainda qiic >e refira ao erro de direito, eritra na regra geral; outro firialmerite, u con- trario sensu, e t! o artigo '1243, o qual diz clue a corifissão sG pode ser re~ogada por erro tlc facto. Se são ou não estes casos, da trarisacc3o e d ; ~ confissáo jiitlicial, os ence- ptuados no artigo G59, i: o quc1 ritis n5o sal~emos; não en- conlriinos outros. E note-se que, para encontrbarmos estes dous casos, ainda foi preciso recorrer d confissiío, que não

um contracto, mas um meio de prova. Falta-rios outra applicaqáo importante dn erro de direi-

to. fi ao pagmeninto feito indeviclamente. Era 01)jecto tle grande questão entre os interpretes de direito romano, o saber, se podia r-epetir-se o que se pagou por erro de di- reito, porque por erro iIe facto n3o liavia duvida. A opinifio mais geralmente seguida cstasa pela negativa.

0 s nossos praxistas anligos scçuiam o direito romano, que interpretavam segundo a hermeneutica d'aquelles tem- pos, e portanto diziam que sbmente podia repetir-se o que foi pago por erro de facto.

Mello Freire, a quem cabe a Itonra de ter redirzido a nossa legislaç50 civil a s~s tc ina , fundando-se ria aiictoritlade de Scliilt. E.rercit. ad. tit. Ile cond. inndetvit. 5 ,YXil'X711, ,YX.YII& X\í1711: segiic a opirii3o de que pode repetir-se tambeni o qiic se pagoii por erro tle direito. L t repetitur qunrnziis debitltn~ sit soltifum errore jtrris; nam qui cof~di- cil, semper agit de damno zrtnndo, 11bi e/.rm juris non nocel; ncquq~'rofwto, jure cicilz' R, nzano, ~t I'ontif2cio una cum vere Patrio ti2 foro recepto, eoqu~ rn peregrina lingua des- triplo. jus /iniluvl est, zit Akratirts loqtritur in 1. 2. De jlcr. et fact. ignoitrr~t., et ita ordincrtunz. ui nqzrovis cive sciri possit, eique illius ignorantia imputari. A mesma doutrina

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DA IGNORANCIA OU ERRO DE DIREITO 65

foi seguida pelos modernos, taes como IAohão, Corrêa Telles, Liz Teixeira e Coelho da Rocha.

O Codigo tambcm ahracou a opiriiáo de que deve per- inittir-se a repetição do que se pagou por erro de direito, assim como por erro de facto. É expresso o art. 758, o qual diz assim: Quando, por erro de facto ou de direito, nos termos dos artigos 657 e seguintes, alguem paga o que realmente não deve, pode recobrar o que houver dado nos seguintes termos. Estes termos referem-se ao modo da re- stituiçio, reparação de perdas e damnos e, A indemnisação por bemfeitorias.

FIM.

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INDICE

Pag . . . . . . . . . . . . . . . . . . . J Da ignorancia oii rrro em geral 7

. . . . . . . . . . . . . . . . 1J Da ignorancin do Direito Natiiral 9

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111 Direito positivo 12

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . JV Direito romano 17

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . V Codigo Civil Franccz 22

VI Codigo Civil da 1.iiisiana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

VI1 Projecto do Codigo C i ~ i l Ilespanhol . . . . . . . . . . . . . . 28

VI11 Codigo Civil Italiano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

IX Codigo Civil Portiigiiez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

X Ignorancia das ot>rigaròes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35

XI Jgnorancia dos nossos direitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45

XJI Contractos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53