soberania banida - liçoes bíblicas cultura cristã 3t2015

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Currículo Cultura Cristã SOBERANIA B AN l DA Se a salvação é de Deus, por que evangelizar? Se Deus me ama, por que eu sofro? Se Deus tudo predetermina, por que somos responsáveis?

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SOBERANIA BANIDA - Se a salvação é de Deus, por que evangelizar? Se Deus me ama, por que eu sofro? Se Deus tudo predetermina, por que somos responsáveis? (lições adaptadas do livro Soberania banida, de McGregor Wright)

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CurrículoCulturaCristã

SOBERANIAB AN l DA

Se a salvação é de Deus, por que evangelizar?Se Deus me ama, por que eu sofro?

Se Deus tudo predetermina, por quesomos responsáveis?

O perigo ronda a Igreja" * "

V

O que é a Soberania de Deus?

Texto básico: Daniel 4.4-37

D Tg 4.6S At 17.24-25T S1104.1-35QHb11.3Q Hb 1.1-4S Lc 21.18

Leitura diáriaHumildes e soberbosSuficiência de DeusCriador e mantenedorCriação ex-nihiloCristo tudo sustentaNos mínimos detalhes

S Rm 11.33-36 Para a glória de Deus

IntroduçãoO tema deste trimestre é muito caro

ao ensino das Escrituras e, consequente-mente, ao legado histórico do protestan-tismo reformado: a soberania de Deus.Buscaremos explicar com clareza o quea Bíblia nos revela sobre esse atributo doCriador. As 13 lições desta revista tratarãode questões como livre-arbítrio, liberdadee autonomia, como se processa nossa sal-vação e, também, do "problema do mal".

Para começar podemos nos perguntar:O que significa Deus ser soberano? Seráque a soberania de Deus tem limites?Como a soberania de Deus se harmonizacom as nossas responsabilidades? Essasquestões são difíceis, mas muito relevan-tes. Para tentar respondê-las, estudaremosa Palavra de Deus com cuidado, buscandocompreender o que o próprio Senhorrevela sobre si mesmo em sua Palavra.

I. Conhecimento e humildade

Não é raro observarmos pessoas que,quando passam a conhecer as doutrinas dagraça, ficam maravilhadas. Infelizmente,algumas, por causa do pecado, após essemomento de euforia, desenvolvem anti-patia e orgulho, chegando a desdenharos irmãos que ainda não chegaram a esseentendimento. Elas julgam-se mais sábiase conhecedoras do que todas as demais,

como se o entendimento alcançado fossepor mérito próprio.

Para evitar que venhamos a cair nesseerro, devemos observar as sábias palavrasda Confissão de Fé de Westminster.

"A doutrina deste alto mistério (...)deve ser tratada com especial prudênciae cuidado, a fim de que os homens, aten-dendo à vontade de Deus, revelada emsua Palavra, e prestando obediência a ela,possam, pela evidência de sua vocaçãoeficaz, certificar-se de sua eterna elei-ção. Assim, a todos os que sinceramenteobedecem ao evangelho, esta doutrinafornece motivo de louvor, reverência eadmiração para com Deus, bem comode humildade, diligência e abundanteconsolação" (III, VIII).

Essa declaração trata da doutrina dapredestinação, mas pode ser utilizada emreferência a todo conhecimento envolvidona doutrina da soberania de Deus. Osformuladores da Confissão já estavamcônscios de que o coração humano podeaté mesmo utilizar as maravilhas da reve-lação de Deus para usurpar a sua glória emajestade. Na verdade, quanto mais nosaprofundamos no estudo das Escrituraspara conhecer o Deus a quem servimos,mais precisaremos vigiar nossas inten-ções e não inflar o nosso ego.

O verdadeiro conhecimento de Deus épara a santidade (Cl 1.9-12). Um coraçãohumilde reconhece suas próprias limita-ções e é alimentado pela graça de Deus;ao mesmo tempo, somos constantemente

"lembrados de que Deus resiste aos so-berbos (Jó 40.Í1; SI 31.23; 94.2; 101.5;138.6; Pv 8.13; 11.2; 15.25; Is 2.12; Dn5.20; Hb 2.4; Tg 4.6; IPe 5.5; Uo 2.16).

Esse entendimento se aplica ao ensinodo conteúdo de toda a revista, por isso,

2 Palavra Viva

sempre que necessário, relembraremosessa aplicação tão imprescindível.

H. O que significa Deus ser soberano?

Daniel 4 traz um bom exemplo do quesignifica Deus ser soberano. No capítuloquatro de Daniel temos o pronunciamentoque o rei Nabucodonosor fez para todoo povo, a respeito da ação de Deus emsua vida (Dn 4.1-3). Resumidamente, elenarra a sua própria história de arrogânciae prepotência, imaginando que, por causado seu esforço e inteligência, o seu rei-nado havia crescido e lhe trazido glória.Tudo isso lhe foi revelado por meio de umsonho, o qual só Daniel poderia compre-ender e interpretar (Dn 4.4-27). Por causadessa altivez e orgulho, o reino foi tiradodo rei e ele foi humilhado (Dn 4.33).

Após o cumprimento da palavra deDeus a Daniel, Nabucodonosor retomouseu entendimento e compreendeu quem éo Deus soberano sobre toda terra e passoua louvá-lo e bendizê-lo (Dn 4.34-37).

Quando dizemos que Deus é soberano,estamos afirmando que ele tem domíniosobre toda a sua criação, ou seja, ele go-verna a tudo e a todos. As palavras de Jóecoam de modo cristalino: "Bem sei quetudo podes, e nenhum dos teus planospode ser frustrado" (Jó 42.2). Com finsdidáticos, podemos verificar a soberaniade Deus na criação e na providência.

A. Soberania na criaçãoGênisis 1.1 revela verdades extrema-

mente importantes para o tema da sobe-rania de Deus.

Primeiro, precisamos compreenderque Deus decidiu criar. O Pai não tinhanecessidade alguma de criar qualquercoisa; ele é autossuficiente e autoexis-tente, não carece de nada (At 17.24-25;Ap 4.11). Quando a Bíblia nos revela queDeus criou, ela está fazendo a importantedeclaração de que nada existe sem ele. Ainiciativa é somente dele, por isso, toda

criação lhe pertence e espera dele o seusustento (SI 104.13,27-28).

Outra inferência importante é quesomente um Deus soberano poderia tercriado tudo o que criou a partir do nada.O termo que a teologia usa é ex-nihilo,que significa que Deus não precisou deajuda, matéria-prima, dicas ou conselhospara sua obra. O poder de sua ordem fazcriar, ele diz e tudo aparece.

Hebreus 11.3 mostra que tudo foi cria-do por Deus, por isso tudo pertence aele. Não há nada nem ninguém em todouniverso, nos céus e na terra, que sejaautónomo ao poder e direção do Senhor.O soberano Deus nos ensina por meio doprofeta Isaías: "Levantai ao alto os olhose vede. Quem criou estas coisas? Aqueleque faz sair o seu exército de estrelas,todas bem contadas, as quais ele chamapelo nome; por ser ele grande em força eforte em poder, nem uma só vem a faltar"(Is 40.26).

O poder criador de Deus nos leva aopróximo ponto, seu poder sustentador.

B. Soberania na providênciaO Deus que cria todas as coisas é o

mesmo que as mantém "funcionando",ou seja, tudo o que Deus criou precisaser providencialmente sustentado por ele.Veja o que o autor aos Hebreus registra arespeito de Cristo: "Ele, que é o resplen-dor da glória e a expressão exata do seuSer, sustentando todas as coisas pela pala-vra do seu poder" (l .3a). O Senhor Jesusé o Deus soberano Criador e mantenedordo universo: "Todas as coisas foram feitaspor intermédio dele, e, sem ele, nada doque foi feito se fez" (Jo 1.3).

A providência de Deus é tão ampla queele sabe quantos fios de cabelo temos (Mt10.30; Lc 12.7) e nenhum deles cairá semo seu consentimento (Lc21.18;At27.34).

Vejam que Deus se importa e controlatodos os eventos considerados grandese também aqueles considerados peque-

nos, insignificantes. A providência doSenhor se estende a todos os eventosdo universo, e isso sem restrições. Naverdade, não existem limites para asoberania de Deus.

Recentemente, alguns autores levanta-ram a tese de que Deus abriu mão de suasoberania para obter relacionamentos ver-dadeiros, mas nas Escrituras não há nenhu-ma indicação de que isso seja verdadeiro, eisso ficará claro a cada lição e a cada temaabordado na revista deste trimestre.

De Génesis a Apocalipse, somos infor-mados de que o Senhor reina, e sempre ofará: "Nos céus, estabeleceu o SENHOR oseu trono, e o seu reino domina sobre tudo"(SI 103.19; cf. Êx 15.18; ICr 29.11; Jó25.2; SI 93.1; 96.10; 97.1; 99.1; Is 37.16;52.7;Lm5.19;Dn7.14,27;Mt6.10,13;Lc1.33; ICo 15.25; Hb 1.8; Ap 11.15; 19.6).

III. Tudo para glória de Deus

. É necessário lembrar que Deus nãogoverna o mundo de maneira desproposi-tada ou aleatória. Podemos dizer que todahistória da humanidade, desde a criaçãoaté sua consumação, é teleológica. Issosignifica que Deus direciona e dirige todaHistória para um fim desejado por elemesmo e, no final das contas, em últimainstância, o que está sendo objetivadoé a sua glória (Rm 11.33-36; Is 43.1-7;63.14; Ef 1.6,12,14).

Precisamos entender como Deus operapara crescermos cada vez mais no seutemor e vivermos de modo que o agrade.O entendimento da doutrina da soberaniade Deus nos leva a glorificar o seu nomee a exaltá-lo cada dia mais.

Devemos crer corretamente para adorá--lo corretamente, de acordo com aquiloque ele revela sobre si mesmo. Se falhar-mos em compreender quem é Deus, comoele age e o que ele deseja, fatalmente,viveremos áe maneira ignorante e medí-ocre, deixando de desfrutar das bênçãos

O que é a Soberania de Deus? 3

que recebem só aqueles que confiam noverdadeiro Deus.

Será que nós conseguiríamos prestarum culto racional a Deus (Rm 12.1-2),como nos é requerido, se não confiásse-mos que todo o futuro está nas mãos dele?Conseguiríamos dizer: "Louvamos-te, óSenhor, porque tu tens somente uma vagaideia de como as coisas acontecerão?"(A soberania banida, R. K. McGregorWright, Editora Cultura Cristã).

Embora essa pergunta pareça esdrúxu-la, muitos cristãos que não reconhecema soberania de Deus na criação e naprovidência pensam exatamente assim.Eles se esquecem de que Deus governao mundo segundo o seu próprio caráter,justo, santo, bom, misericordioso, gracio-so e amoroso. O seu domínio expressa aplenitude do seu caráter, e nada escaparáao seu controle, jamais.

ConclusãoAs Escrituras afirmam de modo exaus-

tivo e variado a soberania de Deus. Asobras da criação e da providência eviden-ciam que Deus é cuidadoso, meticuloso,que somente ele conduz o universo, desdeos menores e mais insignificantes detalhesaté os maiores e mais importantes aconte-cimentos. Tudo concorre para a sua gló-ria, e toda a História está em suas mãos.

Conhecer e reconhecer essas verdadesbíblicas deve nos levar a uma adoração e de-voção sinceras, a fugir do orgulho e cultivara humildade e a modéstia por termos sidoalvos de tão grande graça e misericórdia.

AplicaçãoVocê já meditou sobre a soberania de

Deus? Já refletiu sobre a extensão dessasoberania e no seu domínio? Você temnoção de que tudo pertence ao Criador?Você confia em um Deus verdadeiramentesoberano? Considerando esse tema, existeespaço para ansiedade na sua vida?

O que é livre-arbítrio

Texto básico: Romanos 6.1-14

Leitura diáriaD Gn 1.31 Deus o criou bomS Gn 2.17 Certamente morrerásTRm3.10-18 NemumsójustoQ Rm 3.23 Todos pecaramQ Ef 2.1-3 Em delitos e pecadosS Jo 8.34 Escravos do pecadoSGI5.17 Espírito vs. carne

IntroduçãoQuem nunca ouviu falar em livre-

-arbítrio? A palavra é conhecida, masseu significado pode ser desconhecidopela maioria das pessoas, que a utilizamassim mesmo. O conceito dessa palavraé tão importante que, quando entendidocorretamente, pode causar grande con-fusão. Foi o que ocorreu na época daReforma Protestante. Depois de ter afixa-do nas portas da catedral de Wittenbergsuas 95 teses, Martinho Lutero precisoudebater com Erasmo de Roterdã sobrelivre-arbítrio. Ele até escreveu um livromuito conhecido intitulado A escravidãoda vontade, no qual argumentou contra aIgreja Católica Apostólica Romana e ex-pôs as ideias bíblicas sobre livre-arbítrio.

Para Lutero, era impossível conciliar overdadeiro evangelho da graça de Deuscom a ideia de livre-arbítrio pregada ecrida na Igreja Católica. Por causa disso,Lutero foi excomungado e tratado comoherege, mas, apesar disso, ele abriu asportas para um movimento de retorno àsEscrituras, o que permitiu a compreensãodesse tema tão importante, à luz da Pa-lavra de Deus.

I. O que é livre-arbítrio?

Popularmente, livre-arbítrio é enten-dido como a possibilidade do homem

de fazer escolhas de forma "livre", ouseja, o homem pode fazer o que quiser,e isso o tornaria livre de qualquer influ-ência, até mesmo de Deus. E como seo Senhor não tivesse nada a ver com asnossas decisões diárias. Porém, o termolivre-arbítrio sob a óptica da teologia eda filosofia é muito técnico e restrito.Nesta lição, o que nos interessa é olivre-arbítrio relacionado à Soberania.de_Deus,jia...salvação e como deve serentendido à luzidas Escrituras.

Podemos dizer que livre-arbítrio é_ac_apacidade_que o homem tem de fazerescolhas que podem ser contrárias ounão à sua natureza. O termo arbítrio dizrespeito a julgar, isto é, o homem "teria"a capacidade de avaliar se vai tomaruma decisão contrária à sua naturezaou não, por isso o termo "livre". Useio verbo no futuro do pretérito (teria),porque, na realidade, segundo a Escri-tura, nenhum homem tem livre-arbítrio.O único homem que teve livre-arbítriofoi Adão.

É importante entender que o homemfoi criado segundo a imagem e seme-lhança de Deus, ou seja, em retidão eperfeita santidade. "Eis o que tão so-mente achei: que Deus fez o homem reto,mas ele se meteu em muitas astúcias"(Ec 7.29; cf. Gn 1.27; 2.7; 3.6; SI 8.5;Mt 10.28; Rm 2.14-15; Cl 3.10). Quan-do o homem pecou, perdeu a condiçãode "arbitrar" sobre sua vontade, perdeua possibilidade de escolher entre estasduas alternativas: praticar a vontade deDeus ou pecar.

Para entender isso o esquema criado porAgostinho de Hipona sobre a condiçãodo homem antes e depois do pecado é degrande ajuda.

Antes da Quedao homem era

posse nonpeccare (capaz de

não pecar)posse peccare

(capaz de pecar)

Depois da Quedao homem é

non posse nonpeccare

(incapaz de nãopecar)

Antes de pecar, o homem poderiaobedecer à vontade de Deus e lhe seragradável por meio da sua própria justiçae santidade. Após a Queda, ele tornou-seincapaz de não pecar. A relação entre aliberdade, responsabilidade e soberaniaserá explorada mais à frente, nas liçõesdesta revista. No momento, interessa--nos conhecer a devassidão causada pelopecado para podermos compreender que,após a Queda, o homem conseguiu o quechamamos de "Hvre-agêncicT'.

II. O estrago do pecado

A condição espiritual do homem depoisdo pecado é conhecida como depravaçãototal ou radical.

Primeiro, sobre essa condição, é neces-sário saber que o pecado de Adão atingiutodos os homens em todas as épocas,incluindo até mesmo a criação inanimada(Rm 8.19-21). "... pois todos pecaram &carecem da glória de Deus"(Pon 3.23), Q"... assim como por um só homem entrouo pecado no mundo, e pelo pecado, amorte, assim também a morte passou atodos os homens, porque todos pecaram"(Rm5.12).

Adão era o representante da criaçãodiante de Deus; quando ele pecou, toda acriação caiu com ele. É importante enten-der a extensão do pecado para reconhecerque ninguém está alheio aos seus efeitos,nem mesmo as crianças. Diz o rei Davi:"Eu nasci na iniquidade, e em pecadome concebeu minha mãe" (SI 51.5; cf. Is48.8). Após a Queda, todos os seres hu-manos nascem na condição de pecadores.

O que é ítvre-arb/trio? 5

Segundo, o pecado nos tornou inimigosde Deus. Em sua carta aos Efésios, oapóstolo Paulo diz "... andamos outrora,segundo as inclinações da nossa carne,fazendo a vontade da carne e dos pensa-mentos; e éramos, por natureza, filhos daira, como também os demais" (Ef 2.3).

Tiago registra que "Aquele, pois, quequiser ser amigo do mundo constitui-seinimigo de Deus" (Tg 4.4b; cf. Cl l .21). Aruptura que o pecado causou na comunhãode Deus com o homem tornou esse últimonão apenas desobediente, mas também umpotencial rival da vontade divina.

Terceiro, o pecado matou o homem,afastando-o de Deus. Em Efésios, lemos:"Ele vos deu vida, estando vós mortosnos vossos delitos e pecados" (Ef2.1; cf.Gn 2.17). O profeta Isaías disse: "... asvossas iniquidades fazem separação entrevós e o vosso Deus; e os vossos pecadosencobrem o seu rosto de vós, para que vosnão ouça" (Is 59.2).

A morte espiritual diz respeito à impos-sibilidade que o homem tem de se voltarpara Deus. Há um abismo tão grande en-tre o pecador e o Senhor que é impossívelpara o homem aproximar-se dele.

Em último lugar, o pecado afetou todasas faculdades do ser humano. Isso signi-fica que não há um pensamento, atitude epalavra que não estejam manchados pelopecado; e isso é assustador. As Escriturasrelatam que "Viu o SENHOR que a mal-dade do homem se havia multiplicado naterra e que era continuamente mau tododesígnio do seu coração" (Gn 6.5). Esseretraio não se refere somente à geração dodilúvio. O que o Senhor revela em sua Pa-lavra sobre nossa condição é humilhante:

"... como está escrito: Não há um justo, nemum sequer, não M quem entenda, não M quembusque a Deus; todos se extraviaram, à umase fizeram inúteis; não há quem faça o bem,não há um sequer. A garganta deles é sepulcroaberto; com a língua, urdem engano, venenode víbora está nos seus lábios, a boca, eles a

6 Palavra Viva

têm cheia de maldição e de amargura; são osseus pés velozes para derramar sangue, nosseus caminhos, há destruição e miséria; des-conheceram o caminho da paz. Não há temorde Deus diante dos seus olhos" (Rm 3.10-18).

Alguns apontamentos são interessantes.Perceba que o apóstolo Paulo faz váriascitações do Antigo Testamento, ou seja,essa verdade está presente em toda Es-critura. Note que todos os homens sãocolocados sob o mesmo patamar, e porduas vezes ele afirma "não há um sequer".Agora, veja a lista de pecados que ele co-loca como nossos, pois todos nós estamossujeitos a praticá-los.

Isso significa ser depravado de formatotal, ou radical. Quando observamos anossa vida, podemos até pensar que nãosomos tão maus assim. Mas, de fato, o quea Palavra ensina é que a raiz — por issousamos o termo radicalmente - está con-taminada e compromete tudo o que delaprocede. Essa raiz é o coração. O pecadohabita no coração do homem e, comonosso Senhor Jesus ensinou, "do coraçãoprocedem maus desígnios, homicídios,adultérios, prostituição, furtos, falsos tes-temunhos, blasfémias" (Mt 15.19). Apósa Queda, "Enganoso é o coração, mais doque todas as coisas, e desesperadamentecorrupto; quem o conhecerá?" (Jr 17.9).

Todas as decisões que o ser humanotoma estão permeadas de pecado. O ho-mem não consegue agir contra as rédeasque são o legado de sua carne contami-nada. Por isso, dizemos que o homemperdeu o livre-arbítrio, isto é, ele não temmais a capacidade de arbitrar entre o beme o mal; mas a condição da sua vontade éde livre-agência.

DL Do livre-arbítrio para a livre-agência

A livre-agência pode ser definida comoa capacidade de o homem fazer escolhassomente de acordo com a sua natureza.Se Adão, que foi criado santo e reto, pôde

fazer uma escolha contrária à sua naturezaboa, depois do pecado, todos os homensagem somente - por isso livre-agência -de acordo com a sua natureza, agora deca-ída. Podemos definir a livre-agência entrepré-conversão e pós-conversão. Não éo nosso objetivo, nesta lição, discutir arespeito da salvação do homem - isso seráfeito em lições futuras, mas pretendemosestudar como se dá a livre-agência nessesdois modelos possíveis.

A. Pré-conversãoAntes de crer em Cristo Jesus, como

vimos brevemente, o homem está mortoem seus delitos e pecados e vive em deso-bediência a Deus (Ef 2.1-3). "Pode, acaso,o etíope mudar a sua pele ou o leopardo,as suas manchas? Então, poderíeis fazer obem, estando acostumados a fazer o mal"(Jr 13.23)v Veja a constatação do profetaJeremias. É importante lembrar que ele falapara um povo e em uma época em que nãoexistiam as cirurgias estéticas tão comunsatualmente. É como se ele estivesse dizen-do que, se fosse possível alguém mudar acor da pele, só porque quer, então, alguémacostumado a fazer o mal conseguiriafazer o bem. A situação é de escravidão,servidão: "... todo o que comete pecado éescravo do pecado" (Jo 8.34).

A vontade do homem está condicionadae servilmente sujeita ao pecado que habitanele. Não há nada que o homem caídopossa fazer para, sozinho, desvencilhar--se dessa situação, pois ele está morto emseus delitos e pecados (Ef 2.1). Assim, suavontade não é de maneira alguma livre;ele não pode arbitrar entre o bem e o mal,e segundo a Palavra todo homem desejasomente pecar. Se Deus não usar de suagraça e misericórdia, o homem continuaráfazendo somente a vontade da carne.

B. Pós-conversãoA livre-agência do cristão não é a mes-

ma daquele que ainda não conheceu a

Cristo e foi salvo por ele. Quando Deusnos salva, ele retira de nós o coração depedra—lembre-se, a raiz do problema - ecoloca em nós um novo coração, dispos-to a servi-lo, obedecê-lo e buscá-lo (Ez11.19; 36.26; SI 51.10). Ao mesmo tem-po, ainda estamos presos a nosso estadocorruptível; mas, em sua nova vida, ocristão tem condições de lutar contra opecado e, em Cristo, ser vitorioso sobreos seus inimigos: a carne, o mundo e odiabo (Jo 16.8-11,33; Rm 6.13,18; 8.10,37; Uo 2.13-14; 5.4-5).

Cristo Jesus foi morto "... carregando elemesmo em seu corpo, sobre o madeiro, osnossos pecados, para que nós, mortos paraos pecados, vivamos para a justiça; porsuas chagas, fostes sarados" (lPé 2.24).

Contudo, não dizemos que o cristão voltaa ter livre-arbítrio de Adão, porque aindareside nele o pecado, e seu coração precisaser constantemente fortalecido e preenchi-do pela Palavra e pelo Espírito para que eleobedeça a Deus de modo que o agrade (Gl5.16; Ef 5.15-20; 2Tm 3.16-17; Hb 4.12).

Adão e Eva, antes de pecarem, nãoprecisavam se esforçar para obedecer aDeus, pois tinham sido criados santos ejustos. Quanto ao crente, nascido sob opecado, mas regenerado pelo Espírito deDeus, ele precisa se esforçar para cumprira vontade do Senhor (Êx 19.5; Dt 6.17;At 24.16; Ef 4.3; Hb 4.11; 12.15; Jd 3).Assim sendo, mesmo tendo a capacidadede vencer sua natureza maligna, o crente

O que é livre-arbítrio? 7

tem também uma natureza transformada,e .age de acordo com ela (Gl 5.17). Se-guindo o ensino bíblico, nos novos céuse nova terra, não mais pecaremos (nonposse peccare), assim nossa naturezaestará cativa somente à vontade de Deus.

ConclusãoNo Éden, o primeiro casal, Adão e Eva,

foi criado santo e justo, mas desobedeceue caiu em pecado. A partir daí, todos oshomens nascem sob as correntes do pe-cado, tendo sua vontade sempre cativapelo mal e por este são influenciados;nessa condição, não conseguem por simesmos voltar-se para Deus. No entanto,quando, por meio da ação sobrenatural doEspírito, Deus transforma um pecador eo resgata, este passa a ter o privilégio deobedecer e fazer a vontade do Criador. Anossa esperança, que se encontra forta-lecida pela promessa de Deus, é que umdia seremos totalmente transformados enunca mais pecaremos.

AplicaçãoVocê já tinha considerado que depois

de Adão o livre-arbítrio deixou de exis-tir? Você concorda que as pessoas quenão conhecem a Cristo agem dominadaspelo pecado, como ensinam as Escrituras?Você tem se esforçado para obedecer aDeus em todos os seus caminhos, numaresposta à ação transformadora de Deusem você?

Quem é mesmo o Soberano?

Texto básico: Salmos 145.1-21

Leitura diáriaD Dt 32.4 Obras perfeitasS S1139.13-16 Escrito e determinadoT Ef 1.5-11 Conforme sua vontadeQ Pv 21.1 Inclinando coraçõesQ Êx 7.3,13-14 Entre Deus e FaraóS Rm 1.24-28 Entregues ao pecadoS At 14.16-17 Bondade ao ímpio

IntroduçãoO embate da soberania de Deus é tão

antigo quanto a história da criação. Comovimos na lição passada, Satanás tentou oprimeiro casal oferecendo a ele a possi-bilidade de ser livre do governo de Deus.Milénios depois, a disputa acirrada entreAgostinho, bispo de Hipona e Pelágio, ummonge da Bretanha, também nos ajuda acompreender esse tema tão delicado.

Por volta do ano 400 d.C., Pelágio foi àRoma para tentar refutar as doutrinas ensi-nadas pelo mestre Agostinho. ParaPelágio,crer que o homem depende de uma açãosoberana de Deus para poder obedecê-lolevaria as pessoas à lassidão moral. JáAgostinho pregava a necessidade da graçae da misericórdia do Senhor sobre a huma-nidade condenada pelo pecado. O pelagia-nismo - doutrina baseada nos ensinos dePelágio — foi condenado como heresia nosConcílios de Cartago (418), Éfeso (431) eOrange E (529) (cf. A soberania banida,R. K. McGregor Wright, Editora CulturaCristã), mas os seus argumentos permane-ceram na Igreja Católica e continuam sendoutilizados até hoje, na tentativa de diminuira soberania que Deus exerce no mundo.

I. O governo soberano de Deus

Temos de rejeitar qualquer abordagemque trate da soberania de Deus em detri-

mento dos seus atributos. Já vimos que ogoverno soberano de Deus se estende atudo e a todos. Ele governa o mundo ex-pressando, em cada detalhe, o seu caráter."Eis a Rocha! Suas obras são perfeitas,porque todos os seus caminhos são juízo;Deus é fidelidade, e não há nele injustiça;é justo e reto" (Dt 32.4). O salmista diz:"O SENHOR é bom para todos, e as suasternas misericórdias permeiam todas assuas obras" (SI 145.9).

Tudo o que Deus faz manifesta os seusatributos: amor, bondade, graça, justiça,santidade, etc. Infelizmente nós, às vezes,pendemos a balança mais para um lado doque para o outro, quando as Escrituras nosensinam que Deus não age dividido ou im-pelido somente por um dos seus atributos.

Embora sejamos informados que amisericórdia de Deus dura para sempre(SI 100.5; 106.1; 118.29; 136ss), tambémaprendemos que ele pune o pecador ederrama sua ira sobre o ímpio (Jó 36.13;SI 7.9; 9.16; 17.13; 37.10,28). Quandoaprendemos sobre as obras de Deus, éimportante mantermos o equilíbrio queas Escrituras nos ensinam, para não in-corrermos nesse erro.

Outro aspecto que precisa ser lembradoa respeito do governo soberano de Deusé que ele age através de um plano eterno.Deus não age na História em resposta àsações do homem, pois ele mesmo traçou,desde a eternidade, o curso dessa Históriae, providencialmente, ele executa seuplano na História. Diz a Confissão de Féde Westmínster.

"Desde toda a eternidade e pelo muisábio e santo conselho de sua própriavontade, Deus ordenou livre e inaltera-velmente tudo quanto acontece, porém demodo que nem Deus é o autor do pecado,

Quem é mesmo o Soberano? 9

nem violentada é a vontade da criatura,nem é tirada a liberdade ou a contingênciadas causas secundárias, antes estabeleci-das" (VIII, I).

"Pela mui sábia providência, segundoa sua infalível presciência e o livre eimutável conselho de sua própria von-tade, Deus, o grande Criador de todasas coisas, para o louvor da glória desua sabedoria, poder, justiça, bondade emisericórdia, sustenta, dirige, dispõe egoverna todas as criaturas, todas as açõesdelas e todas as coisas, desde a maior atéà menor" (V, I).

A relação entre a soberania de Deus,a liberdade e a responsabilidade do ho-mem será abordada na próxima lição.O que nos interessa agora é a verdadesegundo a qual Deus planejou, desde aeternidade, de acordo com a sua vontade,"tudo quanto acontece", e que ele "sus-tenta, dirige, dispõe e governa todas ascriaturas, todas as ações delas e todasas coisas, desde a maior até à menor"(Confissão de Fé de Westminster).

O salmista Davi diz: "Os teus olhosme viram a substância ainda informe, eno teu livro foram escritos todos os meusdias, cada um deles escrito e determinado,quando nem um deles havia ainda" (SI139.16), e no salmo 135.6, lemos: "Tudoquanto aprouve ao SENHOR, ele o fez,nos céus e na terra, no mar e em todos osabismos" (SI 135.6).

Paulo também reconhece a soberaniade Deus quando afirma que ele "faz todasas coisas conforme o conselho da suavontade" (Ef 1.11); o próprio apóstoloprovou em sua vida, de várias maneirase em muitas circunstâncias, o domínio doSenhor até mesmo sobre fios de cabelo(At 27.23-24,34).

O governo soberano de Deus é tratadoem muitos textos das Escrituras, tanto noAntigo como no Novo Testamento (cf. Gn45.5; Ne 9.6; SI 145.14-16; Is 45.1-7; Dn4.34-35; Mt 10.29-31; At 2.23; 4.27-28;Rm 11.33-36; Hb 6.17).

II. Concursus

A palavra latina concursus significa,basicamente, cooperação. Nós entende-mos que a ação providencial de Deus naHistória, para realizar o seu plano, ocorrede modo que ele atue por meio de "causassecundárias" e também por "agentes li-vres". Isso significa que Deus não apenas ...supervisiojia,_CjOmo também garante que /

^ ^ '

~bora_asjigõ esjej am realizadas porjouíro .Uma afirmação que exprime essa ver-

dade na Bíblia é a de que Deus dirige,controla ou dispõe o coração dos homenspara realizar a sua vontade: "Comoribeiros de águas assim é o coração dorei na mão do SENHOR; este, segundoo seu querer, o inclina" (P v 21.1); "Ocoração do homem traça o seu caminho,mas o SENHOR lhe dirige os passos" (Pv16.9); "Muitos propósitos há no coraçãodo homem, mas o desígnio do SENHORpermanecerá" (Pv 19.21).

Como há vários exemplos nas Escritu-ras, vamos nos concentrar somente emdois, que nos mostram que Deus dirige,controla ou dispõe o coração dos homenspara realizar a sua vontade, tanto do ímpiocomo do crente.

A. Concursus com o ímpioA direção do Senhor não alcança so-

mente aqueles que estão sob os cuidadosdo Espírito Santo, mas se estende a to-das as suas criaturas, pelas quais Deuscumpre o seu plano eterno. Isso incluiuo perverso.

Lemos nas Escrituras: "Disse o SENHORa Moisés: Quando voltares ao Egito, vêque faças diante de Faraó todos os mi-lagres que te hei posto na mão; mas eulhe endurecerei o coração, para que nãodeixe ir o povo" (Êx 4.21). O Senhorhavia prometido que tiraria o seu povodo cativeiro egípcio, e o faria com mãopoderosa, tanto que reforçou a sua So-berania dizendo a Moisés: "Eu, porém,

10 Palavra Viva

endurecerei o coração de Faraó e multipli-carei na terra do Egito os meus sinais e asminhas maravilhas" (Êx 7.3). O apóstoloPaulo, interpretando de forma inspiradaesse evento, ensina: "... a Escritura diz aFaraó: Para isto mesmo te levantei, paramostrar em ti o meu poder e para que omeu nome seja anunciado por toda a terra.Logo, tem ele misericórdia de quem quere também endurece a quem lhe apraz"(Rrn 9.17-18; cf.Êx 9.16).

A luz dessa verdade, não pensemos queFaraó foi eximido de sua responsabilida-de por não ter ouvido o Senhor. Mesmotendo sido advertido algumas vezes,para que deixasse o povo ir-se, a mesmaEscritura nos diz: "... ainda esta vez en-dureceu Faraó o coração e não deixou iro povo" (Êx 8.32; cf. Êx 7.13-14,22-23;8.15; 9.7). Observe como o concursusfica muito explícito nesse caso. A açãosoberana de Deus sobre Faraó foi muitoclara: ele mesmo disse que endureceriao coração de Faraó. Mas também Faraóendureceu o próprio coração, e não deuouvidos às orientações de Moisés e Arão,o que trouxe graves consequências tantopara si mesmo como para seu reino.

Faja.ó.não.foiJ^obrigado" ou "forçado"a coibir a saído do povo; ele Tez issoporque" quis, pOTquè_era1mau;'pórqu"è~nao'desejava obedecer ao SenhoT%nffètanío"3

Deus estava dirÍgÍndó"fudo para que suavontade soberana fosse realizada, paraisso ele se utilizou atémesmo da.mafâacté.do próprio Par ao.

B. Concursus com o crenteA ação soberana de Deus sobre suas

criaturas estende-se também àqueles quefazem parte do seu povo eleito. Sansãoé um claro exemplo. Para aqueles queduvidam da conversão de Sansão, valelembrar que ele foi colocado entre osheróis da fé do Antigo Testamento, aolado de homens como Abel, Abraão, José,Moisés, Samuel e Davi (Hb 11.2-32).

Sansão nasceu com uma missão bemespecífica, ele começaria a "livrar a Israeldo poder dos filisteus" (Jz 13.5). Paraisso, ele foi consagrado nazireu por seuspais, atendendo a instrução do Anjo doSenhor (Jz 13.5). Quando moço, Sansãointeressou-se por uma filisteia, e desejoucasar com ela. Seus pais o advertiram,mas Sansão explicitou os seus motivos:"Disse Sansão a seu pai: Toma-me esta,porque só desta me agrado" (Jz 14.3).Sansão desejava aquela moça de Timnaconsciente e volitivamente; seu coraçãoestava disposto a desobedecer a Deusporque ele a queria muito. O texto nosdiz: "... seu pai e sua mãe não sabiam queisto vinha do SENHOR, pois este procuravaocasião contra os filisteus; porquanto,naquele tempo, os filisteus dominavamsobre Israel" (Jz 14.4). Veja como o con-cursus está também muito presente nesseevento. O Senhor tinha um propósito mui-to claro, que era livrar Israel dos filisteus;e ele usaria Sansão para isso. Mas nãopense que Sansão, como aconteceu comFaraó, foi obrigado ou constrangido afazer o que fez. Ele desejou aquela moçae para tê-la preferiu desobedecer a seuspais e a Deus.

Isso ocorre conosco. Deus tem umplano eterno e nos dirige e nos usa paracumpri-lo. Nós, contudo, realizamos,fazemos coisas por nossa própria von-tade, somos levados por desejos que orasão bons, ora são maus. Isso não excluinossa responsabilidade nem tira de nós osenso de obediência à Palavra do Senhor.Lembre-se de que o crente anda por aqui-lo que está revelado, e não oculto.

III. Graça comum

É muito comum o pensamento de queaqueles que cometem maldades são aexceção e não a regra. Contudo, temos denos lembrar de que todos os homens têmpotencial para ser muito maus. Basta leralgum jornal ou revista ou assistir a pró-

gramas na tevê para concluir, com certafacilidade, que a maldade do ser humanoé grande. A Palavra de Deus revela quequando os homens são deixados em seuspróprios pecados, eles se afundam cadavez mais na maldade.

Uma das inferências do governo sobe-rano de Deus sobre os homens chama-segraça comum. Por meio dela, Deus res-tringe os efeitos do pecado e confere donsgerais sobre todas as pessoas, tornandoassim a sociedade e a cultura humanapossível mesmo entre os não redimidos(cf. Dogmática Reformada, Herman Ba-vinck, Editora Cultura Cristã).

A graça comum é como um freio, umcabresto, que Deus usa sobre o pecadodo homem. Quando Deus, de acordocom seus motivos e propósitos, soltaesse freio, os homens vão de mal a pior(2Tm3.13).

Romanos 1.24,26,28 deixa muito claraessa verdade: "... Deus entregou tais ho-mens à imundícia, pelas concupiscênciasde seu próprio coração, para desonrarem oseu corpo entre si (...) Por causa disso, osentregou Deus a paixões infames (...) E,por haverem desprezado o conhecimentode Deus, o próprio Deus os entregou auma disposição mental reprovável, parapraticarem coisas inconvenientes".

Perceba que a Escritura ressalta trêsvezes que "Deus entregou" esses homensaos seus próprios pecados. Essa era umalinguagem comum usada para designarum julgamento de Deus sobre pecado-res (At 7.42; Ef 4.19). O Senhor retiradesses homens um senso que os inibe apecar como gostariam. A remoção dessabenevolência faz com que os homens, queamam pecar, e desejam afastar-se cada

Quem é mesmo o Soberano? 11

vez mais de Deus, se lancem aos seusdesejos mais sórdidos e imorais.

A graça comum, contudo, também dizrespeito a uma ação positiva de Deus so-bre a vida de todos os homens, incluindoo ímpio, dando-lhe a possibilidade de seexpressar como imagem e semelhança deDeus. Lucas registra no livro de Atos queDeus "... nas gerações passadas, permitiuque todos os povos andassem em seuspróprios caminhos; contudo, não se deixouficar sem testemunho de si mesmo, fazen-do o bem, dando-vos dos céus chuvas eestações frutíferas, enchendo o vosso cora-ção de fartura e de alegria" (At 14.16-17).

ConclusãoO governo soberano exercido pelo

Senhor ao longo da História revela atotalidade do seu caráter, e está sendoexecutado para o louvor de sua glória.Deus usa os homens para cumprir seuplano, entretanto, os homens agem tam-bém de acordo com a própria vontadee desejo. A graça comum impede que omundo habitado por ímpios seja um lugarde ampla e voraz maldade, uma vez queaqueles que não crêem em Cristo Jesuscomo seu único e suficiente Salvador sódesejam pecar e desagradar a Deus.

AplicaçãoVocê consegue crer que a história do

universo foi divinamente planejada paraa glória de Deus? Você confia no governosoberano do Senhor sobre tudo? Comovocê tem lidado com os desejos que seopõem à Palavra de Deus? Você conseguever a bondade do Senhor atuando até navida do ímpio?

Soberania, responsabilidade eliberdade

Texto básico: Daniel 5.22-23

Leitura diáriaD Gn 3.5 Livres de DeusS Gn 3.8 Fugindo do SoberanoT Jó 38.1-3 Prestação de contasQ Jr 18.1-6 Nas mãos do oleiroQ Rm 1.18-27 IndesculpáveisS Rm 9.20 Quem és tu?S Is 55.8-9 Caminhos inescrutáveis

IntroduçãoComo compreender a relação entre

a soberania de Deus e a nossa respon-sabilidade? De onde deriva nossa res-ponsabilidade? Se Deus decretou tudo esua soberania estende-se a todas as suascriaturas, inclusive o homem, será quesomos verdadeiramente livres? O planode Deus abrange também as nossas deci-sões morais, como o pecado?

Nesta lição buscaremos compreenderessa relação entre liberdade, responsa-bilidade e a soberania de Deus, sempresubmissos às Escrituras.

L Em busca de autonomia

O que o pecador mais deseja é ter au-tonomia e desvencilhar-se do senhorio deDeus sobre sua vida. Mesmo encarando umDeus que se revela absoluto e soberano,o pecado leva o ser humano a não querernem a presença, nem o controle de Deussobre a sua vida. O caso de Adão e Eva,no Éden, revela nossa insatisfação quantoà soberania de Deus em nossas decisões.

A promessa que Satanás fez ao pri-meiro casal foi de torná-los autónomosem relação a Deus. O pecado nos fazrejeitar o senhorio de Cristo sobre nós,ele nos leva para longe da presença doSenhor para que permaneçamos fora deseu domínio. A autonomia é uma ilusão

criada pelo pecado para dar-nos um tipode status que nos faz crer que podemosser iguais a Deus. Ao mesmo tempo, essecenário havia sido decretado e planejadopor Deus:

"A onipotência, a sabedoria inescrutá-vel e a bondade infinita de Deus, de talmaneira se manifestam na sua providên-cia, que esta se estende até à primeiraQueda e a todos os outros pecados dosanjos e dos homens, e isto não por umamera permissão, mas por uma permissãotal que, para os seus próprios e santosdesígnios, sábia e poderosamente os li-mita,-regula e governa em uma múltipladispensação; mas essa permissão é tal,que a pecaminosidade dessas transgres-sões procede tão somente da criatura enão de Deus, que, sendo santíssimo ejustíssimo, não pode ser o autor do pecadoe nem pode aprová-lo" (Confissão de Féde Westminster V.IV).

A permissão de Deus será tratada emuma lição específica. Nesta abordaremosa realidade da providência de Deus quese estende a tudo, da Queda até o pecado.Podem criaturas livres sertão controladase continuarem responsáveis por seus atos?

II. Liberdade e responsabilidade

Considerando o que temos visto, po-demos nos perguntar: Adão e Eva não ti-nham liberdade de escolher? E eu? Tenholiberdade de escolher fazer o que quiser?De fato, o homem tem o que chamamosde liberdade criada, mas ele não tem oque desejaria ter: liberdade autónoma. Aliberdade criada foi instituída por Deus epertence aos seus agentes livres. Isso seharmoniza com as Escrituras na medidaem que entendemos que nossa respon-

sabilidade não deriva de uma supostaliberdade autónoma.

Normalmente associamos a nossa res-ponsabilidade com a liberdade que temosde agir. No entanto, nenhuma criatura deDeus teve essa liberdade, uma liberdadeque a tornasse livre de todas as influên-cias possíveis, principalmente do próprioDeus. A ideia de responsabilidade é a desermos chamados diante de Deus paraprestar contas das nossas ações, omissões,intenções, pensamentos e palavras. ABíblia baseia nossa responsabilidade emquatro pontos.1

1) Somos responsáveis diante de Deusporque somos suas criaturas. ComoSenhor soberano e dono de suas criatu-ras, Deus tem a prerrogativa de chamarqualquer uma delas, a qualquer momento,para responder diante dele sobre suasatitudes. O caso de Jó é um exemplo re-tumbante. Ele e seus amigos passaram umtempo arrazoando a respeito de sua situa-ção, então, diz o texto que "Depois disto,0 SENHOR, do meio de um redemoinho,respondeu a Jó: Quem é este que escure-ce os meus desígnios com palavras semconhecimento? Cinge, pois, os lomboscomo homem, pois eu te perguntarei, etu me farás saber" (Jó 38.1-3). O profetaIsaías registra "Por que, pois, dizes, óJacó, e falas, ó Israel: O meu caminhoestá encoberto ao SENHOR, e o meu direitopassa despercebido ao meu Deus? Nãosabes, não ouviste que o eterno Deus, oSENHOR, o Criador dos fins da terra nãose cansa, nem se fatiga? Não se podeesquadrinhar o seu entendimento" (Is40.27-28). Somos como vasos de barronas mãos do oleiro, e ele tem o direito defazer o que desejar com a massa (cf. Is29.16; 45.9; 64.8; Jr 18.1-6; Rm 9.21).

2) Somos responsáveis porque Deus é onosso ponto de referência moral. Quemregula e delimita o que devemos ser e/ou

1 Cf. WRIGHT, R. K. McGregor, A soberania banida, SãoPaulo: Editora Cultura Cristã, 1998, p. 61-63.

Soberania, responsabilidade e liberdade 13

fazer é o Senhor por meio de sua Palavra.Quando ele diz que somos responsáveispor nossos atos, não há meios de escapar,temos de nos conformar à sua vontaderevelada. "Disse mais o SENHOR a Jó:Acaso, quem usa de censuras contenderácom o Todo-Poderoso? Quem assim arguia Deus que responda" (Jó 40.1-2). Tiagoainda revela:"... qualquer que guarda todaa lei, mas tropeça em um só ponto, setorna culpado de todos. Porquanto, aqueleque disse: Não adulterarás também orde-nou: Não matarás. Ora, se não adulteras,porém, matas, vens a ser transgressor dalei" (2.10-11).

3) Somos responsáveis pelo conheci-mento que temos de Deus. Embora nemtodos os homens tenham conhecimentodo evangelho, todos têm um conheci-mento revelado e inato de Deus. O após-tolo Paulo trabalha com essas questõesna epístola aos Romanos: "... o que deDeus se pode conhecer é manifesto entreeles, porque Deus lhes manifestou" (Rm1.19). Ele diz que os atributos invisíveisde Deus, o seu eterno poder e divindadesão claramente vistos na criação (Rm1.20-23). Isso torna todos os homens in-desculpáveis. Mas Paulo também diz, nocapítulo dois, que os homens têm uma leigravada no coração, que dá testemunho daexistência de Deus, e o Senhor Jesus osjulgará através disso também (Rm 2.12-16). A ideia é que quanto mais conheci-mento temos de Deus, mais responsáveisnos tornamos diante dele.

4) Somos responsáveis porque o propó-sito de nossa vida é a glória de Deus. Aprimeira pergunta do Catecismo Maior deWestminster é: "Qual é o fim supremo eprincipal do homem?". Aresposta: "O fimsupremo e principal do homem é glorifi-car a Deus e alegrar-se nele para sempre".Na verdade, somos responsáveis, somosmordomos das bênçãos que Deus nos dápara cumprirmos o fim para o qual fomoscriados (Rm 11.36; ICo 10.31). Quandovisamos somente a glória de Deus no que

14 Palavra Viva

fazemos, estamos cumprindo o importan-te papel que nos foi legado.

III. Liberdade real

Talvez você esteja pensando que serresponsável dessa maneira não nos dá umaliberdade real, verdadeira. Como podeessa liberdade criada ser, de fato, liber-dade? Como pode Deus controlar todosos eventos da História, nos seus mínimosdetalhes, e ainda assim nos dar liberdade?Há duas respostas para essa questão.

Primeira, poderíamos usar o argumentoda complexidade dos caminhos de Deus.Nem tudo o que Deus faz é revelado. Eletambém não precisa dar satisfação aoshomens, por que faz ou deixa de fazer, oucomo faz. A nós pertencem as coisas re-veladas (Dt 29.29). Devemos nos esforçare estudar diligentemente a Palavra paracompreender as coisas que Deus quis nosrevelar, no entanto, Deus nunca disse quecompreenderíamos alguma coisa plena-mente. Pelo contrário, várias vezes somosadvertidos que os caminhos do Altíssimosão inescrutáveis., mas melhores (Jó 5.9;Is 55.8-9; Rm 8.28; 11.33). É sobre essacomplexidade, mas relacionada à eleiçãoe predestinação, que o apóstolo Paulo diz:"Quem és tu, ó homem, para discutirescom Deus?" (Rm 9.20).

Segunda, poderíamos enfatizar aquelestextos das Escrituras em que o homemfaz o que deseja, segundo a inclinaçãodo seu coração. Já estudamos a respeitoda livre-agência, e como vimos a Bíblianos ensina claramente que homens mauspraticam maldades porque amam maisas paixões de sua carne do que a vontadeDeus. Existem vários exemplos nas Es-crituras, mas escolhemos lembrar o queaconteceu com o rei Belsazar. O livro deDaniel descreve que o rei Belsazar, neto

de Nabucodonosor, deu um banquete aosseus príncipes e decidiu utilizar os uten-sílios de ouro retirados da Casa de Deus(cf. Dn 5.1-4). Então "... apareceram unsdedos de mão de homem e escreviam,defronte do candeeiro, na caiadura daparede do palácio real; e o rei via os de-dos que estavam escrevendo" (Dn 5.5). Ainscrição na parede condenava Belsazarporque ele sabia o que Deus havia feitocom o seu avô Nabucodonosor, masmesmo assim não se humilhou e nemreconheceu a soberania do Deus de Israel(Dn 5.13-23; cfDn 4.1-37).

É assim que a Palavra apresenta arelação entre a soberania de Deus e a res-ponsabilidade. Jamais poderemos afirmarque nosso pecado não é culpa nossa, poisa verdade é que desejamos praticá-lo ete-rnos liberdade para recusá-lo,"... eis que opecado jaz aporta; o seu desejo será contrati, mas a ti cumpre dominá-lo" (Gn 4.7).

ConclusãoO homem criado por Deus foi seduzido

pelo diabo, que o fez duvidar da Palavrado Senhor prometendo-lhe uma liberdadeautónoma, livre da soberania do Altíssimo.Na verdade, Deus nos fez e nos deu umaliberdade criada por ele mesmo, mas estanão anula nossa responsabilidade, pois estáfundamentada em outros fatores bíblicos.Embora criada, a liberdade é real e deve serusada para obedecer e glorificar b Senhor.

Aplicação. Você já pensou que depois do pecado ohomem tem desejado sua autonomia emrelação a Deus? O fato de nossa responsa-bilidade não estar fundamentada em nossaliberdade traz algum dilema para você?Leve cativos todos os seus pensamentosàs Escrituras.

Ninguém é igual a Deus

Texto básico: Isaías 40.12-25; 57.15

Leitura diáriaD Dt 6.4 Único SenhorS1Tm6.16 Luz inacessívelT Êx 3.1-22 Eu SouQTg1.17 Sem variaçãoQ SI 89.6 Sem comparaçãoS 2Pe 1.20-21 Ação do EspíritoS Hb 1.1-4 A última revelação

IntroduçãoHouve um período na História em que

o cristianismo sofreu severos ataquesde um ceticismo patrocinado, principal-mente, pela filosofia. Os homens foramdistanciando Deus de sua vida, deixando--o cada vez mais longe de suas práticasdiárias, por considerarem que o Senhor,muito grande e ocupado, não se importavacom as coisas pequenas e insignificantesdeste planeta. Para ilustrar isso, eles seutilizavam de uma imagem criada por umfilósofo cristão, William Paley, que des-crevia Deus como um grande relojoeiroque "deu corda" no mundo, ao criá-lo, e"deixou-o funcionando" naturalmente,sem a intervenção ou preservação divinas.

Como se constata em Isaías 57.15, asEscrituras harmonizam o ensino de que,embora Deus seja grande, ele não estálonge de cada um de nós. Ele é transcen-dente e imanente. Nesta lição vamos tratarda transcendência de Deus e, na próxima,da sua imanência.

I. Incomparável

O que quer dizer transcendência deDeus? Basicamente, a transcendênciade Deus o descreve como tão separado eindependente da criação que nada há nomundo que possa ser comparado a ele. AsEscrituras conclamam: "Ouve, Israel, o

SENHOR, nosso Deus, é o único SENHOR"(Dt 6.4), e, Deus é "o único que possuiimortalidade, que habita em luz inacessí-vel, a quem homem algum j amais viu, nemé capaz de ver. A ele honra e poder eterno.Amém!" (ITm 6.16).

Deus é transcendente sobre a sua criação.Espaço e tempo são dimensões da ordemcriada; Deus não está dentro nem é limi-tado por nenhum dos dois. Deus criouex-nihilo, "do nada", para a sua própriaglória (Is 43.7) e agora está entronizadoacima da terra (Is 40.22), inteiramenteindependente de sua criação. Ao contráriodos que acreditam que Deus depende desua criação, Deus é autossuficiente. Ele écapaz de realizar a sua vontade e conhecetodos os detalhes acerca do futuro porqueo define e controla (SI 115.3; Is 46.10)(Bíblia de Estudo de Genebra).

Sobre isso, assim nos ensina a Con-fissão de Fé de Westminster: "Há um sóDeus vivo e verdadeiro, o qual é infinitoem seu ser e perfeições. Ele é um espíritopuríssimo, invisível, sem corpo, membrosou paixões, é imutável, imenso, eterno,incompreensível, onipotente, onisciente,santíssimo, completamente livre e absolu-to, fazendo tudo para sua própria glória esegundo o conselho da sua própria vonta-de, que é reta e imutável. É cheio de amor,é gracioso, misericordioso, longânimo,muito bondoso e verdadeiro galardoadordos que o buscam, e, contudo, justíssimoe terrível em seus juízos, pois odeia todopecado; de modo algum terá por inocenteo culpado" (Hl).

Dentro desse entendimento, observa-mos na Palavra que somente o Senhor éimutável. A imutabilidade de Deus define

16 Palavra Viva

a segurança que temos em suas promes-sas. Ele mesmo se apresenta "Eu Sou OQUE Sou" (Êx 3.14). Jesus repete essaspalavras provando ser ele Emanuel, Deusconosco (cf. Jo 8.58). A imutabilidade deDeus é inerente ao seu ser e permeia todasas suas obras. Por isso o apóstolo Tiagoensina que "Toda boa dádiva e todo domperfeito são lá do alto, descendo do Paidas luzes, em quem não pode existir va-riação ou sombra de mudança" (Tg 1.17).Não precisamos temer o que virá, nenhu-ma situação, pois, como temos aprendido,o Senhor é soberano sobre tudo e todos;o que traz ainda mais tranquilidade aocoração do cristão é que Deus nuncafaltará com sua palavra, nunca mentirá e,por isso, nunca nos confundirá, dizendoalgo que não será cumprido (cf. Gn 21.1;Jz2.1;2Sm7.28).

O salmista questiona, de maneira retó-rica, "... quem nos céus é comparável aoSENHOR? Entre os seres celestiais, quemé semelhante ao SENHOR?" (SI 89.6). Àluz dessa verdade, entendemos que todaa criação é derivada e subalterna, ou seja,até mesmo os seres celestiais são merascriaturas de Deus. Não há nada nem nin-guém que possa ser comparado a Deus empoder, força, majestade e glória.

II. Deísmo cristão

Alguns homens que não compreende-ram a transcendência de Deus acabaramcaindo em um extremo que denomina-mos de deísmo. O deísmo surgiu emmeados do século 17 e tem como prin-cipal característica a supervalorização datranscendência de um ser supremo - oDeus das Escrituras - para confiná-locomo a causa primeira de tudo; como noexemplo dado na introdução, do relojo-eiro que deu corda no mundo e o deixoufuncionando, sem a sua supervisão ouintervenção constante.

O deísmo supervaloriza a transcendên-cia de Deus em detrimento de sua imanên-

cia, ou seja, coloca Deus em um patamartão inatingível, separado e distante, quefez surgir dois problemas básicos.

O primeiro problema é que, para odeísmo, Deus não se importa nem seenvolve com os homens. O Senhor esta-ria em seu alto e sublime trono, mas nãoreinaria como as Escrituras ensinam quereina. Nós, contudo, sabemos que não énada disso, pois "nos céus, estabeleceuo SENHOR o seu trono, e o seu reino do-mina sobre tudo" (SI 103.19). O reino deDeus abrange não apenas o seu cuidadoprovidencial sobre tudo, mas o seu envol-vimento com a sua criação.

O deísmo nega esse envolvimento e dizmais: nós só temos a revelação naturalcomo fonte de conhecimento de Deus,o que faz das Escrituras Sagradas umacomposição meramente humana, sem aação do Espírito inspirando seus autores.Isso também vai contra o que a Bíbliaensina: "Toda a Escritura é inspirada porDeus" (2Tm 3.16a), e também "sabendo,primeiramente, isto: que nenhuma pro-fecia da Escritura provém de particularelucidação; porque nunca j amais qualquerprofecia foi dada por vontade humana;entretanto, homens [santos] falaram daparte de Deus, movidos pelo EspíritoSanto" (2Pe 1.20-21).

O segundo problema, derivado do pri-meiro, é que o deísmo nega que os homenspossam se achegar a Deus. Nesse sentido,o conhecimento pessoal e verdadeiro deDeus seria impossível e, ao homem, sórestaria conformar-se a esta vida, ao aquie agora. O apóstolo Paulo, no entanto,afirma "Se a nossa esperança em Cristose limita apenas a esta vida, somos osmais infelizes de todos os homens" (l Co15.19). O deísmo também nega a ne-cessidade da obra e da pessoa de Cristo,ignorando que ele é o Deus encarnado,a maior e mais profunda revelação deDeus (cf. Hb 1.1-4; Jo 14.9); e que Jesusé aquele que nos liga ao Pai, porque éhumano, assim como nós. A Escritura,

Ninguém é igual a Deus 17

no entanto, afirma: "... há um só Deus e diferença entre o Criador e suas criaturasum só Mediador entre os homens, Cristo é imensa. No entanto, o soberano SenhorJesus, homem" (lTm 2.5). se envolve com o mundo criado, tanto

Em resumo, a proposta do deísmo é que enviou seu próprio Filho em favor deque o homem viva como se Deus não pecadores. Não podemos cair na faláciaexistisse, ideia que se aproxima muito do de que Deus está distante,ateísmo. Nós temos de estar sempre aler-tas para não sermos envolvidos com tais Aplicaçãoequívocos e, consequentemente, negar o Você sabia que o Deus a quem vocêpróprio Deus, seus atributos e suas obras. serve é incomparável? Isso significa que

você sempre pode confiar em sua Palavra.Conclusão Embora Deus seja grande e eterno, e me-

As Escrituras são claras no ensino de reça nossa reverência, ele nos ama tantoque o Deus a quem servimos é incompa- que enviou seu Filho para morrer por nós.rável. Ele está assentado em seu trono, e a Que essa verdade o fortaleça a cada dia.

EFEITOS DA TRANSCENDÊNCIA

A crença na transcendência de Deus influencia a nossa atitude religiosa-comportamental.Ela nos leva a reconhecer que:— existe um ser muito acima de nós. O homem não é o mais elevado bem do universo,nem a medida mais elevada de verdade ou de valor. A crença na transcendência é umgolpe no orgulho do humanismo;— esse Deus que está acima de nós não pode ser conhecido, a não ser que ele se deixe en-contrar, ou que se revele. Os conceitos humanos não podem expressar o que ele é, a menosque os conceitos emitidos pelos homens tenham base na própria revelação que Deus fazde si mesmo. Deus vai além do nosso entendimento, mas o que podemos saber sobre eleadapta-se à nossa capacidade de conhecimento, o que espelha de algum modo que ele nosfez, em algum sentido, parecidos com ele; por isso, podemos saber algo a respeito dele;— o abismo que existe entre nós e Deus não é meramente moral ou espiritual, mas meta-físico. Mesmo depois da nossa redenção, continuaremos homens, e não seremos iguais aele. Seremos sempre homens, enquanto ele será sempre Deus. A salvação que Deus nosdá restaura-nos à condição original em que fomos criados, mas nunca nos iguala a ele;— a ideia da transcendência de Deus deve levar-nos a uma enorme reverência para comele. Essa reverência deve ser manifesta inclusive na nossa adoração, porque, quando oadoramos, não o fazemos como filhos do Pai Celestial, mas como criaturas diante doDeus altíssimo e tremendo.

O Ser de Deus, Heber Carlos de Campos, Editora Cultura Cristã

Deus, igual a nós

Texto básico: João 1.1-14

Leitura diáriaD S1113 Transcendência e imanênciaS Is 57.15 Onde Deus habita?T S1145.18 Perto está o SenhorQ Fp 2.5-11 O Deus humildeQ Hb 1.1-4 Resplendor do FilhoS Hb 11.1-3 Pela féS Is 40.21 Desde o princípio

Introdução

Em anos recentes, temos encontradono Brasil ensinamentos até agora inédi-tos aqui. Após o tsunami na Indonésiaem 2004, com mais de 250 mil vítimasoficiais, alguns pastores publicaram tex-tos questionando a soberania de Deus,sugerindo que ele jamais permitiria quetal coisa acontecesse. Na conclusão lógicadesses escritores, Deus não conhece ofuturo, pois, se o conhecesse, ao permitirtais tragédias ele mostraria não ser Todo--Poderoso. Se éTodo-Poderoso, mas nãorefreia tais ações, ele mostra ser mau. Ocerne do problema, na verdade, encontra--se na distorção sobre a imanência deDeus. Nesta lição, estudaremos comoa doutrina da imanência de Deus podeser distorcida, o que gera confusão e nosafasta da verdade da Palavra de Deus.

I. Deus se importa

Qual é o conceito de imanèncial Emresumo, imanência diz respeito ao fatode Deus se relacionar e se importar coma criação. Os conceitos de transcendênciae imanência andam juntos nas Escrituras.Ao mesmo tempo em que Deus é infinito,supremo, único e está além de nós, eletambém se importa com sua criação ea ama. Por isso, providencialmente, oCriador cuida dela.

O salmo 113 é um dos textos que falamdessa harmoniosa relação. Ele nos ensinaque Deus deve ser louvado e bendito demaneira constante, contínua e em todolugar (SI 113.1-3), e o salmista dá algunsmotivos para isso: "Excelso é o SENHOR,acima de todas as nações, e a sua glória,acima dos céus. Quem há semelhante aoSenhor, nosso Deus, cujo trono está nasalturas" (SI 113.4-5).

Esse primeiro motivo mencionado é atranscendência de Deus, que já foi trata-da na lição anterior. O salmista, porém,prossegue: "... que se inclina para ver oque se passa no céu e sobre a terra? Eleergue do pó o desvalido e do monturo, onecessitado, para o assentar ao lado dospríncipes, sim, com os príncipes do seupovo. Faz que a mulher estéril viva emfamília e seja alegre mãe de filhos. Ale-luia!" (SI 113.6-9). O mesmo Deus trans-cendente, que é excelso e incomparável,se preocupa e se interessa pelo desvalido,pelo necessitado e também pela mulherestéril. Essas personagens eram pessoasdesvalorizadas e marginalizadas pelasociedade israelita, mas a atenção queDeus lhes dedica demonstra que o Se-nhor Todo-Poderoso atende àqueles queparecem ser os menores e mais frágeis.

O profeta Isaías também exprime essaverdade de maneira parecida: "... assimdiz o Alto, o Sublime, que habita a eterni-dade, o qual tem o nome de Santo: Habitono alto e santo lugar, mas habito tambémcom o contrito e abatido de espírito, paravivificar o espírito dos abatidos e vivificaro coração dos contritos" (Is 57.15; cf. SI34.18; 145.18).

O conceito de imanência ganha especialimportância para nós porque Jesus Cristo,

o Filho de Deus, sendo o próprio Deus,encarnou para morrer pelos pecadores. Oapóstolo Paulo diz que "... ele, subsistin-do em forma de Deus, não julgou comousurpação o ser igual a Deus; antes, a simesmo se esvaziou, assumindo a formade servo, tornando-se em semelhança dehomens; e, reconhecido em figura huma-na, a si mesmo se humilhou, tornando-seobediente até à morte Q morte de cruz"(Fp 2.6-8).

Não poderia haver meio mais significa-tivo de Deus se envolver conosco do queesse. O evangelista diz que Jesus Cristo,0 Verbo de Deus, ou seja, a Palavra doAltíssimo,"... se fez carne e habitou entrenós, cheio de graça e de verdade, e vimossua glória, glória como do unigénito doPai"(Jo 1.14).

II. Distorções teológicas1

As Escrituras afirmam a imanência deDeus de modo que exige a nossa atenção,para evitarmos distorções teológicas econvicções erradas, como as que seguem.

A. Teísmo abertoDistorcer o conceito da imanência de

Deus e aliar isso à teologia arminiana,leva ao teísmo aberto, ou teologia rela-cional, que ensina, basicamente, que Deusnão pode conhecer o futuro e sendo assimnão pode determiná-lo, porque isso seriauma afronta à liberdade humana.

Diz ainda essa heresia que Deus nãopode conhecer o futuro, pois, conhecen-do-o e não impedindo o acontecimentode catástrofes, então ele deseja o mal etorna-se culpado por isso. Os autores quedefendem a teologia relacional dizem queDeus preferiu abrir mão de sua soberania

1 Os itens B. A identificação de Deus com Sata-nás s C. Á identificação de Deus com o universocriado, e o tópico ///. A importância da doutrinada imanência, foram adaptados do livro O ser deDeus, de Heber C. Campos, publicado pela EditoraCultura Cristã.

Deus, igual a nós 19

para obter relacionamentos verdadeiros,e por isso, prefere manter o futuro emaberto, para deixar o homem escolher"de verdade" se deseja ou não crer nelee/ou obedecê-lo.

Eles exageram o conceito de imanênciaporque, na realidade, moldam um deusà sua própria imagem e semelhança, oqual padece das mesmas dúvidas que osmortais. Seria como dizer que é preferívelcrer em um deus tão ignorante sobre ofuturo, e frágil como nós, que sofre coma mesma intensidade com que sofremose pelos mesmos motivos.

O Deus da Palavra, no entanto, nada tema ver com esse deus retratado pelo teísmoaberto. Deus é poderoso, controla todos oseventos cósmicos (Hb l .2-3; 11.3; SI 24. l;146.6; Is 42.5); conhece e anuncia tudoantes de acontecer (Is 40.21; 41.26; 44.7-8; 45.21; 48.3). Deus não apenas prevê ofuturo, como o determina e garante que elevai acontecer. Só o Deus Todo-Poderosoe onisciente poderia prever e garantir queo futuro predito aconteça de maneira tãoexata e minuciosa.

Em 1933, os chamados "Cristãos Ale-mães" endossavam a atividade de Hitler,entendendo ser os seus atos a manifesta-ção da direção benfazeja e providencialde Deus na História. "Pastores protestan-tes por toda a Bavária concederam umabênção oficial ao nazismo no domingode Páscoa, no dia 16 de abril de 1933.Clérigos coletaram ofertas em homena-gem ao aniversário de Hitler, hastearam abandeira do Reich em feriados nacionaise marcharam em desfiles com suásticasbordadas nas roupas" (David A. Noebel,As diversas cosmovisões de destruiçãono século XX. In: Mal Couch, org. ger.Os Fundamentos para o Século XXI:examinando os principais temas da fécristã, São Paulo: Hagnos, 2009, p. 496).Nesse sentido, em 1934 foi redigidoum documento, com aprovação de 600

20 Palavra Viva

pastores e 14 professores de teologia,que dizia: "Somos muito gratos a Deuspor ele, como Senhor da História, ter-nosdado Adolf Hitler, nosso líder e salvadorem nossa difícil situação. Reconhecemosque nós, de corpo e alma, estamos obri-gados e dedicados ao estado alemão e aseu Fíihrer. Essa servidão e obrigaçãocontêm para nós, cristãos evangélicos,seu significado mais profundo e santoem sua obediência ao comando de Deus"(G.C. Berkouwer, The Providence ofGod, 2a ed. Grand Rapids, Michigan:Eerdmans, 1961, p. 162-163.

B. Aidentificação de Deus com SatanásUm entendimento equivocado da ima-

nência de Deus dificulta a distinção bíbli-ca entre a ação de Deus e a de Satanás,resultando grandes distorções de teoria ede conduta.

Karl Barth menciona dois casos nahistória da Alemanha que evidenciamesse erro. O primeiro teve conexão com aPrimeira Guerra Mundial, quando certoscristãos alemães identificaram a políticade guerra do Kaiser Guilherme comosendo a obra de Deus cumprindo os seuspropósitos. O segundo caso surgiu nadécada de 30, quando alguns cristãos con-sideraram as políticas de Adolf Hitler e donazismo como uma amostra da atividadede Deus no mundo.

Em ambos os casos, "a suposição deque qualquer coisa que ocorre é a vontadede Deus levou cristãos sinceros a endos-sar e a dar apoio ao que era realmentemau e anticristão. Esse é um dos perigosde distorcer a doutrina da imanência deDeus... Quando enfatizamos demasia-damente a imanência em prejuízo datranscendência, Deus se torna, então,um rótulo para as aspirações, os ideais eos valores menos elevados dos homens"(Christían Theology, Millard J. Erick-son, Grand Rapids: Baker Academic, 3a

edição, 2013).

Portanto, para que a ética não sejaprejudicada, é importante ter uma noçãocorreia da imanência de Deus.

C. Aidentificação de Deus com o uni-verso criado

PANTEÍSMOPanteísmo ["Pan" (tudo, todas as coisas)& "Theós" (Deus)], é a doutrina queensina que não há nenhuma realidadetranscendente e que tudo é imanente;por isso, Deus e o mundo formam umaunidade essencial, sendo, portanto, amesma coisa, constituindo um todo indi-visível; daí a negação da transcendênciade Deus visto que ele se confunde coma própria matéria, sendo esta a própriamanifestação de Deus.A Bíblia não confunde Deus com amatéria; antes, afirma que Deus criou amatéria (Gn 1.1) e a sustenta com o seupoder (Cl 1.17; Hb 1.3). Essa distinçãoentre o Deus Criador e a criação é umensinamento fundamental das Escrituras.

Sem um entendimento correio da ima-nência de Deus, podemos cair no sério errodo panteísmo, que afirma ser o mundo umaextensão de Deus; ele, então, passa a pos-suir uma substância física, se confundindocom matéria, a energia física. Quando seaceita um Deus assim, ele perde a suaprópria personalidade, manifestando-sena existência de todas as coisas.

Muitos no passado trabalharam como panteísmo de várias formas. Presen-temente, existem defensores da ideiade que Deus está dentro de nós. Osadeptos da Nova Era e alguns círculosdo neopentecostalismo têm assimiladoesse pensamento herético.

III. A importância da doutrina daimanência

Essa doutrina é essencial para o cristia-nismo, pois se Deus não fosse imanente,ele não poderia relacionar-se conosco,

nem o Verbo poderia encarnar-se pararealizar a nossa redenção. Cremos numDeus separado dos homens, santo, dis-tinto dos pecadores, mas também numDeus que se revela e se envolve com ouniverso por ele criado.

Rejeitamos o deísmo, para o qual Deusestá lá fora e não se envolve com a suacriação. Essa posição nega a imanênciade Deus, nega a doutrina da providênciadivina e a doutrina da personalidade di-vina, nega a doutrina do amor de Deus.Portanto, como cristãos teístas que somos,temos que afirmar a doutrina da ima-nência de Deus, sem, contudo, cair nosmúltiplos erros do panteísmo.

ConclusãoFicamos então com ambas, a transcen-

dência e a imanência de Deus, a partirda Escritura, que ensina: "... assim diz oAlto, o Sublime, que habita a eternidade,o qual tem o nome de Santo: Habito noalto e santo lugar, mas habito tambémcom o contrito e abatido de espírito,para vivificar o espírito dos abatidos,e vivificar o coração dos contritos " (Is57.15). Afirmamos a transcendência deDeus, negando com isso o panteísmo; e,afirmamos a imanência de Deus, partindode um fato real: a Revelação de Deus,negando, portanto, o deísmo. A fé cristãsustenta a criação de todas as coisas pelavontade livre, que nos é inacessível, e

Deus, igual a nós 21

soberana de Deus e, ao mesmo tempo,a manutenção dessa realidade por meiodesse Deus pessoal e que se revela, serelacionando conosco.

A Bíblia ensina estas duas verdades:1) O céu e a terra não podem conter

Deus (IRs 8.27; Is 66.1; At 7.48-49).2) Todavia, ele sustenta os céus e a

terra, estando especialmente próximodaqueles que sinceramente o buscam(SI 139.7-10; Is 57.15; Jr 23.23-24; At17.27-28). Calvino exulta: "A glória denossa fé é que Deus, o Criador do mundo,não descarta nem abandona a ordem queele mesmo no princípio estabelecera".2

Deus não precisa abrir mão de nenhumdos seus atributos porque ele é perfeitoem seu ser, assim como suas obras. Issosignifica que, embora ele não se confun-da com sua criação, soberanamente, eletambém se importa conosco, e provouseu amor por nós entregando seu Filhoamado para morrer por nós, sendo nósainda pecadores.

AplicaçãoVocê conseguiu perceber a grandeza

de Deus por meio do estudo de alguns deseus atributos? Mesmo sendo tão grande,ainda assim nosso Pai olha para nós comolhos de misericórdia, tanto que enviouseu Filho para nos salvar. Agradeça aDeus por tão grande salvação realizadapor ele em nosso favor.

2 João Calvino, O Livro dosSalmos, Vol. l (SI 11.4-5),p. 241.

Só Deus Salva

Texto básico: Atos 4.12

Leitura diáriaD Ef 1.3-14 Obra da TrindadeS Rm 9.6-13 Eleição incondicionalT Ez11.19-20 Novo coraçãoQ Jo 3.1-14 Jesus e NicodemosQ Jo 6.22-65 Predestinação e regeneraçãoS At 16.31 Crê no Senhor JesusS 1 Pé 2.9 Eleitos para proclamar

Introdução

Até aqui abordamos a soberania deDeus em todas as esferas do universo.Vimos que ele dirige e governa a His-tória., tendo-a escrito na eternidade, e seutiliza até mesmo dos homens com sualiberdade criada para concorrer aos seuspropósitos eternos. Agora vamos nosvoltar especificamente à obra de salvaçãode Deus; afinal, não há nada mais sublimee extraordinário para os cristãos do queenxergar, à luz da Palavra, a decisão maisimportante de sua vida.

I. Salvação: escolha de Deus, obra daTrindade

Um dos textos bíblicos que fala maisdetalhadamente sobre a salvação é Efé-sios 1.3-14. O texto está dividido de modoque possamos discernir os papéis quecada pessoa da Trindade assumiu para queDeus realizasse o nosso resgate.

A. A obra do PaiPrimeiro é dito que Deus Pai "nos tem

abençoado com toda sorte de bênção es-piritual". Toda e cada bênção que nos édada vêm das mãos de Deus. A ideia que otexto traz é que não existe nada de bom quepossa nos abençoar à parte do Pai. Outroponto interessante é observar o termo "emCristo". Cristo vai permear esta lição, de-

monstrando que nada feito em nosso favoré na realidade nosso mérito. Deus nos deue derramou tamanhas graças unicamenteporque Cristo é o nosso intercessor e me-diador (Hb 7.22; 8.6; 9.15; 12.24; !Tm2.5);Jesus é o nosso representante diante do Pai.

Paulo também afirma aos efésios que oPai nos "escolheu (...) antes da fundaçãodo mundo (...) e em amor nos predestinoupara ele" (Ef 1.4-5). É impossível negaressas afirmações bíblicas sobre a predes-tinação. O problema não é a compreensãobíblica ou a compreensão intelectual, masa aceitação. Dizer que fomos escolhidose predestinados sem fazer referência àsnossas obras (Pun 9.11-13) é um ultrajepara os que desejam ardentemente confiarem si mesmos - o homem natural caídoem pecado. O propósito da eleição foiestabelecido de maneira muito clara:"para sermos santos e irrepreensíveisperante ele" (Ef 1.4). Isso quer dizer queas Escrituras rechaçam veementemente aideia de que algum eleito possa viver naprática do pecado (Uo 5.18).

O versículo seis nos ensina o propósitoda obra do Pai: "para louvor da glória desua graça" (Ef l .6). O louvor da glória deDeus é o objetivo principal da salvação.Tudo vem acoplado e é dirigido por essepropósito. Deus enviou seu Filho paralouvor da sua própria glória, antes mesmodo que pelo seu amor por nós. Quandocompreendermos que Deus ama mais amanifestação da sua glória, estaremosmais próximos do ensino bíblico a respei-to do seu Ser e das obras que ele realiza.

B. A obra do FilhoContinuando a leitura de Efésios, ve-

mos que o apóstolo Paulo enfatiza o papeldo Filho em nossa salvação (Ef 1.7-12).

Jesus Cristo é o verdadeiro Amado, ouseja, todos nós recebemos o amor de Deuspor meio dele.

A obra do nosso Senhor fez com queobtivéssemos a "... redenção, pelo seusangue, a remissão dos pecados" (Ef l .7).Esse é o cerne da nossa salvação, que nosatinge diretamente. Embora a redençãoefetuada por Cristo Jesus seja cósmica eabranja todo o universo (Ef 1.9-10), demodo particular ela é o derramamentoabundante da graça de Deus sobre nós.

O apóstolo também enfatiza que essaação é "... segundo a riqueza da sua graça"(Ef l .7), dando-nos plena certeza de quetudo que está relacionado à salvação doshomens ocorre pela graça (Ef 2.8-10).

Conforme Efésios 1.11, Deus é o agenteiniciador, mantenedor e concretizadordo seu plano eterno e, mais uma vez, apredestinação é colocada em evidência,garantindo que a obra do Filho foi a rea-lização da vontade do Pai.

C. A obra do Espírito SantoPor fim, somos apresentados à obra

realizada pelo Espírito Santo (Ef 1.13-14). É uma realização do Espírito emnossa vida nos selar. A imagem é de umapropriedade particular chancelada pelopróprio Deus, pelo seu Espírito. Deus estáformando um povo para si, a igreja, com-posta de todos aqueles que foram alvos desua graça durante a História. Esse povo,quando alcançado pelo Santo Espírito, émarcado para revelar essa obra maravi-lhosa por meio de sua santidade (Tt 2.14),e de sua proclamação (IPe 2.9-10).

Outra figura que o apóstolo Paulo usaé a ao penhor. O Espírito Santo, além denos fazer propriedade do Senhor, é a ga-rantia que temos da consumação da obrada salvação em nós, ou seja, aqueles queforam alcançados pela graça, tendo sidoeleitos pelo Pai, resgatados pelo Filho eselados pelo Espírito, não podem perder asalvação. A salvação é uma obra de Deus

SóDeusssIva 23

em nós (Fp 1.6). Novamente, isso não nosleva ao pecado, ao contrário, nos afastadele. O objetivo da obra do Espírito emnós também é muito claro: "em louvor dasua glória" (Ef 1.14). De novo, a glória deDeus é o alvo e o destaque. É por causade sua glória que Deus operou poderosa-mente tão grande salvação.

II. Regeneração e conversão

A regeneração é, basicamente, a pri-meira aplicação da obra de salvação navida do eleito. Ela é o começo porque,na verdade, todo ser humano nasceímpio, morto em seus delitos e pecados(Ef 2.1-3). A obra de salvação passapela santificação temporal e terminarána consumação de todas as coisas. So-mente o poder de Deus, operando pormeio da Palavra e do Espírito, podesobrepujar a incredulidade no coraçãodo homem. O coração do homem é araiz do problema.

Quando Adão caiu, toda a humanidadese desviou com ele, e todo homem passoua nascer pecador e condenado. Somenteuma ação sobrenatural do Espírito podetransformar o coração de pedra, endure-cido pelo pecado, em coração de carne,submisso e confiante em Deus (Ez 11.19-20; 36.26).

Podemos observar pontos importantesna conversa entre Jesus e Nicodemossobre salvação (Jo 3.5-7). Apesar deNicodemos estar falando dos sinais queCristo realizava (Jo 3.2), Jesus enfatizaque somente aqueles que são nascidos doEspírito podem entrar no reino de Deus(Jo 3.5-6), uma transformação que elechama de "nascer de novo" (Jo 3.7). Jesustambém enfatiza a soberania do Espíritoao realizar a sua obra: "O vento sopraonde quer, ouves a sua voz, mas não sabesdonde vem, nem para onde vai; assim étodo o que é nascido do Espírito" (Jo 3.8).

Falando sobre os filhos de Deus, oevangelista João registra:"... os quais não

24 Palavra Viva

nasceram do sangue, nem da vontade dacarne, nem da vontade do homem, mas deDeus" (Jo 1.13). As pessoas só são rege-neradas porque essa é a vontade de Deus.

Assim, a relação entre eleição e rege-neração é total e completa. Nosso SenhorJesus ensina: "Todo aquele que o Pai medá, esse virá a mim; e o que vem a mim,de modo nenhum o lançarei fora [...]Ninguém pode vir a mim se o Pai, que meenviou, não o trouxer; e eu o ressuscitareino último dia" (Jo 6.37,44).

Perceba como Cristo é vigoroso em seuensino. A sua crucificação e ressurreiçãonão apenas possibilitam a salvação, masefetivamente salvam pecadores. Jesus nãotrabalha com probabilidades, ele afirmaenfaticamente que aquele que o Pai lhedá virá a ele, e reforça que "de modonenhum" o lançará fora.

Na conclusão do discurso de Jesus,muitos discípulos ficaram escandalizados,e para dirimir qualquer dúvida a respeitodo que dissera, ele prossegue: "Contudo,há descrentes entre vós. Pois Jesus sabia,desde o princípio, quais eram os que nãocriam e quem o havia de trair. E prosse-guiu: "Por causa disto, é que vos tenhodito: ninguém poderá vir a mim, se, peloPai, não lhe for concedido" (Jo 6.64-65).

Como fica nossa responsabilidade emcrer em Cristo? Recebemos uma ordempara nos entregar e confiar nele de todocoração. Anthony Hoekema nos ajuda acompreender essa relação: "A conversãopode ser definida como o ato consciente deuma pessoa regenerada, no qual ela volta--se para Deus em arrependimento e fé (...)a conversão é obra de Deus e obra do ho-mem. É preciso que Deus nos converta e,ainda assim, nós precisamos nos convertera ele; ambos são verdadeiros" (SalvospelaGraça, Editora Cultura Cristã).

Como lemos nas Escrituras, a conver-são é uma evidência externa da regene-ração. Aqueles que são transformadospor Deus e ganham uma nova disposiçãotêm capacidade de refazer seus caminhos:

"Converte-nos a ti, SENHOR, e seremosconvertidos" (Lm 5.21; cf.Jr 31.18). Dizo Senhor, pelo profeta: "Convertei-vosagora, cada um do seu mau caminho, fazeiboas as vossas ações e não sigais outrosdeuses para servi-los" (Jr 35.15). As exor-tações para converter-se, arrepender-seou crer em Deus sempre enfatizam essaresponsabilidade: "Crê no Senhor Jesuse serás salvo, tu e tua casa" (At 16.31;cf. Ez 33.11; Is 45.22; At 2.3 8). Portanto,não incorramos em erro afirmando que aconversão tem um caráter de dupla ação;sabendo, entretanto, que a regeneraçãoprecede a conversão, pois o estado dohomem que ainda não crê em Cristo Jesusé de morte espiritual. Só Deus pode vivi-ficar as pessoas para que estas voltem-sea ele e desejem amá-lo e adorá-lo.

McGregor Wright escreveu: "O cerneda doutrina da graça irresistível é que nósseríamos totalmente incapazes de abraçarJesus Cristo como nosso Salvador, ou decontinuar em obediência, se Deus não nostivesse dado capacidade — não, a vida -para fazer assim" (A soberania banida,Editora Cultura Cristã).

III. Predestinação e evangelização

Uma das primeiras dúvidas que temosao falar a respeito da soberania de Deus nasalvação é como ela afeta a nossa práticaevangelística. Muitos argumentos falazestêm surgido, questionando a necessidadede pregar o evangelho, já que Deus temos seus eleitos e os salvará de qualquermodo. Na verdade, essas pessoas pade-cem por falta de conhecimento bíblico.

Apredestinação é a maior incentivadorada ação missionária. Isso está tão claro nasEscrituras que o apóstolo Paulo discorrede maneira peculiar e profunda sobre aeleição em Romanos 9. Em Romanos 10,ele ensina que o modo pelo qual Deusdesignou que os eleitos fossem alcança-dos: por meio da pregação do evangelho.Não há contradição nem paradoxo nessa

afirmação. O Deus que determinou os finstambém determinou os meios; e o meioque aprouve ao Senhor utilizar para res-gatar os eleitos que vivem neste mundo,e ainda não foram alcançados, é pura esimplesmente a pregação de sua Palavra:"... a fé vem pela pregação, e a pregação,pela palavra de Cristo" (Rm 10.17).

O apóstolo Pedro também usou o mes-mo argumento: "Vós (...) sois raça eleita,sacerdócio real, nação santa, povo depropriedade exclusiva de Deus, a fim deproclamardes as virtudes daquele que voschamou das trevas para a sua maravilhosaluz" (IPe 2.9).

Não existe maior garantia de salvaçãodo que ter a certeza que ela pertence aDeus (Jn 2.9). Se a salvação dependessedo homem, não teríamos nenhuma es-perança de conversão. Contudo, comoela depende de Deus, da sua graça e dasua misericórdia, temos a certeza de quea Palavra pregada não voltará vazia (Is55.11), mesmo que isso não seja visívelaos nossos olhos (Is 53.1; Jo 12.38).

Motivados por essa verdade, nossosirmãos do passado se envolveram e secomprometeram com as missões, e mes-mo o mau exemplo de Jonas favorece

SóDeujsa/va 25

nosso entendimento. Ele não desejavair pregar em Nfnive porque tinha umacerteza: "Ah! SENHOR! Não foi isso o queeu disse, estando ainda na minha terra?Por isso, me adiantei, fugindo para Társis,pois sabia que és Deus clemente, e mise-ricordioso, e tardio em irar-se, e grandeem benignidade, e que te arrependes domal" (Jn 4.2). Sejamos instrumentos deDeus para alcançar aqueles que estãodestinados à vida eterna (cf. At 13.48).

ConclusãoCompreender que a nossa salvação

é uma obra da Trindade traz riqueza esignificado para nossa vida após nossaregeneração e conversão. Transformadospelo Espírito Santo por meio da Palavrade Deus, temos uma nova vida em Cristopara pregar o evangelho e alcançar oseleitos que ainda vivem nas trevas.

AplicaçãoA compreensão de que a obra de sal-

vação é uma obra da Trindade enriquecea sua fé? Como você entende a relaçãoentre predestinação e evangelização?Quantas pessoas você já tentou levar aCristo por meio da pregação?

Quem Deus salva?

Texto básico: Romanos 9.6-18

Leitura diáriaD Is 53.1-12 Sofrimento de CristoSIW1.21 Salvará a muitosT Rm 8.31-34 Sem acusaçãoQ1Jo2.1-2Q Hb 7.25S Rm10.1S 1 Tm 2.1-6

Advogado dos eleitosSalvar totalmenteSúplica sinceraInvestidos ou não

IntroduçãoA pergunta do título desta lição se

relaciona com outras, formuladas peloscrentes que desejam melhor compreenderas Escrituras e especialmente o que elasensinam a respeito da obra redentora deCristo. São elas: Por quem Cristo morreu?Por toda gente? Se foi por todos, por quetodos não são salvos? Sua morte nãofoi eficaz? Alguma parte do seu sanguederramado foi desperdiçada? Se Cristomorreu só pelos eleitos, isso foi justo?Alguém tem culpa de não ter sido eleito?Se os não eleitos não serão salvos, adiantapregar-lhes o evangelho? E se os eleitosserão certamente salvos, precisa pregar--Ihes o evangelho?

No melhor estilo reformado, vamos àsEscrituras para obter as respostas.

I. Por quem Jesus morreu?

AEscritura ensina a doutrina da (1) ex-piação limitada, também chamada pelaTeologia Reformada de redenção parti-cular ou limitada ("limitada" não comreferência ao poder ou valor da morte deJesus, mas com referência ao número depessoas pelas quais Cristo pagou o preçopela salvação). A expiação limitada deveser distinguida de outros dois ensinamen-tos proeminentes: (2) o universalismo e a(3) redenção geral. Essas três doutrinas

afirmam que o sacrifício de Cristo temvalor infinito. De acordo com os conceitosde redenção geral e expiação limitada, aoferta gratuita do evangelho é concedidaa todos que verdadeiramente ouvem asboas-novas de Cristo. O universalismoafirma que todos são salvos, quer aceitemo evangelho ou não.

Essas três doutrinas podem ser distin-guidas mais facilmente ao se considerardois aspectos diferentes da expiação: (a)A obra de Jesus na cruz por meio da qualele obteve a salvação e (b) a aplicação dasalvação a indivíduos pelo Espírito Santo.

(1) O universalismo afirma que Cristoobteve a salvação para todas as pessoasdo mundo, de modo que todos são salvos.

(2) A redenção geral afirma que, apesarde Cristo ter obtido a salvação para omundo todo, o Espírito Santo aplica a sal-vação somente àqueles que aceitam Cristopela fé, de modo que estes são salvos.

(3) A expiação limitada afirma queCristo obteve a salvação apenas para oseleitos e o Espírito Santo aplica a salvaçãosomente aos eleitos.

Assim, de acordo com a doutrina da re-denção geral, apesar da morte de Cristopossibilitar a salvação do mundo todo(tanto dos eleitos quanto dos réprobos),não garantiu a salvação de ninguém. Paraa doutrina da expiação limitada, porém,o Espírito Santo aplicará a salvação defato a todos aqueles pelos quais Cristomorreu, de modo que todas essas pessoasserão salvas sem dúvida.

As Escrituras dizem que Deus escolheupara a salvação um grande número depessoas (os eleitos) da raça humana de-caída e que enviou Cristo ao mundo parasalvá-las (Jo 6.37-40; 10.27-29; 11.51-52;Rm 8.28-39; Ef 1.3-14; IPe 1.20). Tam-

bem afirmam com frequência que Cristomorreu por grupos ou pessoas em parti-cular, tendo como implicação clara que asua morte garantiu totalmente a salvaçãodesses indivíduos (Jo 10.15-18,27-29; Rm5.8-10; 8.32; G12.20; 3.13-14; 4.4-5; Uo4.9-10; Ap 1.4-6; 5.9-10). Pouco antes doseu sofrimento na cruz, Jesus orou somen-te por aqueles que o Pai havia lhe dado,e não pelo "mundo" (isto é, pelo restanteda humanidade [Jo 17.9,20]).

De qualquer modo, juntamente com adoutrina da expiação limitada é importanteafirmar a oferta gratuita de Jesus Cristo noevangelho. Por certo, todos os que aceitama Cristo pela fé encontram misericórdia (Jo6.35,47-51,54-57; Rm 1.16; 10.8-13). Osque foram escolhidos por Deus ouvem aoferta de Cristo e, ao ouvi-la, recebem ochamado eficaz do Espírito Santo. Tanto0 convite quanto o chamado eficaz sãodecorrentes da morte expiatória de Cristo.Aqueles que rejeitam a oferta de Cristo ofazem por escolha própria (Mt 22.1-7; Jo3.18), de modo que serão responsáveispela própria condenação. Aqueles que re-cebem a Jesus aprendem a ser gratos a elepelo fato de seu sangue tê-los purificadointeiramente de toda a injustiça e sabemque, sem essa obra da sua graça, não ha-veria nenhuma esperança.1

II. Predestinação e expiação

Vejamos como a Confissão de Fé deWestminster apresenta o ensino bíblico aesse respeito:

"Pelo decreto de Deus e para mani-festação da sua glória, alguns homense alguns anjos são predestinados para avida eterna e outros preordenados para amorte eterna.

Esses homens e esses anjos, assimpredestinados e preordenados, são parti-cular e imutavelmente designados; o seunúmero é tão certo e definido, que não1 Essa divisão foi adaptada da Bíblia de Estudo deGenebra.

Quem Deus safva? 27

pode ser nem aumentado, nem diminuí-do" (iii.m,rv).

As Escrituras são enfáticas ao tratar dasoberania de Deus sobre a sua criação,incluindo o homem: "O SENHOR fez todasas coisas para determinados fins e até operverso, para o dia da calamidade" (Pv16.4); "E ainda não eram os gémeos nas-cidos, nem tinham praticado o bem ou omal (para que o propósito de Deus, quantoà eleição, prevalecesse, não por obras, maspor aquele que chama), já fora dito a ela:O mais velho será servo do mais moço.Como está escrito: Amei Jacó, porém meaborreci de Esaú" (Rm 9.11-13).

A Carta aos Romanos traz outras ar-gumentações ainda mais contundentes:"Que diremos, pois? Há injustiça daparte de Deus? De modo nenhum! Poisele diz a Moisés: Terei misericórdia dequem me aprouver ter misericórdia ecompadecer-me-ei de quem me aprouverter compaixão. Assim, pois, não dependede quem quer ou de quem corre, mas deusar Deus a sua misericórdia. Porque aEscritura diz a Faraó: Para isto mesmo televantei, para mostrar em ti o meu poder epara que o meu nome seja anunciado portoda a terra. Logo, tem ele misericórdiade quem quer e também endurece a quemlhe apraz" (Rm 9.14-18).

Note que Romanos 9.13 diz que Deusamou Jacó, mas aborreceu Esaú. O termotraduzido por "aborrecer" é o verbo gregomiseo, que significa "odiar, detestar", ver-bos estes usados em outros textos da Escri-tura (Ap 2.6; Hb 1.9; Jo 12.25). Precisamoslevar nosso pensamento cativo à Escritura,por isso devemos afirmar somente aquiloque ela afirma. Esse texto de Romanos"enfatiza o livre conselho de Deus que éindependente do homem. O amor de Deusé o mistério de sua eleição; seu ódio é oenigma do seu endurecimento"2.

2 KITTEL, Gerhard, FRIEDRICH, Gerhard. TheologícalDictionary ofthe New Testament. Trad. e org. por Geof-frey W. Bromiley, l O vols. Grand Rapids, MI: Eerdmans,1964,4:691.

28 Palavra Viva

Seguindo em sua argumentação, Roma-nos ensina que mesmo que Deus escolhaalguns para a salvação e não escolha ou-tros—portanto, não amando esses últimosa ponto de salvá-los - ele não se torna in-justo. A conclusão do texto é clara: Deusdispensa sua misericórdia a quem desejae também endurece a quem lhe apraz. Ofato de a soberania absoluta de Deus eo seu governo providencial abrangeremtodas as coisas, inclusive as ações e as in-tenções dos homens, está em consonânciacom o domínio que Deus tem também nasalvação, sendo esta sua obra mais subli-me e exclusiva. Entretanto, ela não excluiou anula a responsabilidade do homem.

A relação entre predestinação e expia-ção, explicada na Confissão de Fé deWestminster, diz que o número dos eleitosé "tão certo e definido que não pode sernem aumentado, nem diminuído".

Nesse sentido, Romanos 8.30 afirma:"... aos que predestinou, a esses tambémchamou; e aos que chamou, a essestambém justificou; e aos que justificou,a esses também glorificou". A obra desalvação é completa. Ela tem início naeleição, antes da fundação do mundo (Ef1.4-5), passa pela justificação através obrade Cristo e termina com a glorificação eressurreição no último dia: "... a vontadede quem me enviou é esta: que nenhumeu perca de todos os que me deu; pelocontrário, eu o ressuscitarei no últimodia. De fato, a vontade de meu Pai é quetodo homem que vir o Filho e nele crertenha a vida eterna; e eu o ressuscitareino último dia" (Jo 6.39-40; cf Hb 7.25).

HL Oferta sincera do evangelho

Uma das obj ecoes contra a predestina-ção é que se Deus só salva seus eleitos ese a expiação é limitada e restrita - comovimos acima -, isso diminuiria nossoímpeto na evangelização e impediria quepregássemos a toda e qualquer pessoaesperando de forma sincera que se con-

vertessem. Alguns chegam a dizer que adoutrina da eleição limita os propósitosde Deus, que deseja salvar a todos (Ez18.27,32; 33.11; l Tm 2.3-4).

Devemos lembrar que quem prega amensagem precisa sinceramente desejar aconversão de seus ouvintes, como ensinaRomanos 10.1: 'Irmãos, a boa vontade domeu coração e aminha súplica aDeus afavordeles [judeus] são para que sejam salvos".

Desde o capítulo 9, do qual já tratamosbrevemente, o Senhorvemnos ensinandoa relação entre a soberania de Deus e apredestinação, e como estas se entrela-çaram na história do povo judeu. No ca-pítulo l O, Paulo expressa um sentimentoparticular, ainda que inspirado, sobre suacondição de pregador do evangelho. Ele,que muitas vezes foi perseguido e mal-tratado pelos judeus (At 9.23; 13.45,50;14.2,5,19; 17.5), não apenas tinha boavontade no coração, como também supli-cava a Deus para que eles fossem salvos.O contexto torna esse ensino ainda maisbelo. Mesmo tendo certeza de que Deusse agradou em salvar somente os seuseleitos, o apóstolo demonstra compaixãoe misericórdia, orando e agindo para queos seus compatriotas fossem salvos. Issonos mostra que nossa motivação e nos-sas ações evangelísticas e missionáriasnão dependem de sabermos quem sãoos eleitos.

A ordem que recebemos é para fazerdiscípulos de todas as etnias (Mt 28.19),indiscriminadamente; a obra de salvaçãonão é de nossa alçada, ela é uma prerro-gativa divina.

Sendo assim, como devemos interpretaros textos que dizem que Deus deseja queos homens se convertam e se arrepen-dam? Analisemos brevemente algunsdeles. Os textos citados em Ezequiel 18e 33, como todo e qualquer texto da Es-critura, precisam ser analisados dentro doseu contexto. Em Ezequiel 18, vemos queo povo estava desvirtuando as palavras eo ensino do Senhor (Ez 18.25), por isso

o profeta precisou relembrá-los de que aresponsabilidade é pessoal e intransferí-vel — lembremos que aquele povo estavareclamando do cativeiro e colocando aculpa nos pecados de seus antepassados(Ez 18.1-2). A palavra e o desejo deDeus para o seu povo é que aqueles quefazem parte da aliança e andam nos mauscaminhos se convertam (Ez 18.23). A leiexigia a morte de transgressores, e Deusnão tem prazer em disciplinar seus filhos;pelo contrário, ele deseja que seus filhosrefaçam seus caminhos, não se extravieme vivam (Hb 12.1-13).

Vejamos ITimóteo 2.1-6 e a sua inter-pretação: "Antes de tudo, pois, exortoque se use a prática de súplicas, orações,intercessões, ações de graças, em favor detodos os homens, em favor dos reis e detodos os que se acham investidos de auto-ridade, para que vivamos vida tranquila emansa, com toda piedade e respeito. Istoé bom e aceitável diante de Deus, nossoSalvador, o qual deseja que todos os ho-mens sejam salvos e cheguem ao plenoconhecimento da verdade. Porquanto,há um só Deus e um só Mediador entreDeus e os homens, Cristo Jesus, homem,o qual a si mesmo se deu em resgate portodos: testemunho que se deve prestar emtempos oportunos".

Note que o texto começa estabelecendoum padrão: devemos orar insistentementepor todas as pessoas, inclusive os reise aqueles investidos de autoridade. Énecessário lembrar que na época em queo apóstolo Paulo e Timóteo viviam, asperseguições poderiam vir exatamente

QuemDeujja/va? 29

do Império Romano. Como os cristãosdeveriam reagir? Com súplicas, em favordeles mesmos, para que vivessem "vidatranquila e mansa".

O texto ensina claramente que deve-mos orar e que Deus deseja salvar atéas pessoas investidas de autoridade, quenos perseguem; em outras palavras, Deusdeseja que todas as classes de homens se-jam salvas e se tornem alvos do seu amorem Cristo que "... a si mesmo se deu emresgate por todos".

A expressão "todos os homens" nãocarrega um sentido universal e indiscrimi-nado, mas estabelece um contraste entreaqueles que são investidos de autoridadee aqueles que não são.

ConclusãoA morte de Cristo Jesus na cruz é

substitutiva, ou seja, ela de fato expia ejustifica o pecador, não apenas torna issouma possibilidade. Dessa forma, apenasos eleitos são alcançados e salvos. Isso,no entanto, não contraria a verdade de quedevemos orar e pregar para que todos seconvertam; essa é a nossa responsabilida-de, mesmo que não saibamos quem sãoos eleitos do Senhor.

AplicaçãoO seu discernimento sobre a eficácia da

morte de Cristo foi aprofundado? Vocêdeseja sinceramente que as pessoas aquem você prega o evangelho sejam sal-vas? Em suas orações você pede para queisso aconteça mediante a sua pregação?

Salvos para sempre

Texto básico: Romanos 8.31-39

Leitura diáriaD 1 Pé 1.5-7 Pelo poder de DeusS 1 Jo 5.11-13 Garantia da vida eternaT Jo 10.28 Jamais perecerãoQ Hb 12.14 Segui a santificaçãoQ1Ts5.23 Deus vos santifiqueS Rm 6.1-14 Mortos para o pecadoS 1Sm 15.22 Prazer na obediência

IntroduçãoDurante o seu ministério terreno, Jesus

escolheu doze discípulos que deveriamsegui-lo e aprender sobre ele e sua mis-são de salvar pecadores perdidos (Lc19.10). No entanto, um desses doze otraiu, entregando-o às autoridades paraque ele fosse preso e, por consequência,morto. Olhando para nossos dias, vemosmuitos que diziam seguir a Cristo, masdesistiram, ficaram pelo caminho ou setornaram causa de tropeço e escândalopara a verdadeira igreja.

Diante desse cenário, devemos nosperguntar: A doutrina da perseverançados santos é de fato bíblica? A experiêncianão tem negado essa parte das Escrituras?

I. O que significa perseverar até o fim?

A perseverança dos santos é um dospontos bíblicos resgatados pela Reformaque mais sofre ataques. Inicialmente, énecessário entendermos o que a perse-verança ou segurança eterna dos crentesnão é. Como explica Anthony Hoekema,a perseverança dos santos "não significaque todo frequentador de igreja, ou mes-mo todo membro dela, irá perseverar atéo fim em sua fé, ou que qualquer pessoaque tenha feito uma pública profissão defé esteja eternamente segura, ou ainda quequalquer que nos pareça um verdadeiro

crente jamais desistirá da fé" (Salvos pelaGraça, Editora Cultura Cristã).

O que significa perseverar até o fim estáclaramente demonstrado na Confissão deFé de Westminster. "Os que Deus aceitouem seu Bem-Amado, os que ele chamoueficazmente e santificou pelo seu Espírito,não podem cair do estado de graça, nem to-tal nem finaknente; mas com toda a certezahão de perseverar nesse estado até ao fim,e estarão eternamente salvos" (XVH.I).

A segurança da salvação eterna, na ver-dade, não procede de força ou capacidadede qualquer homem, pois os crentes são"guardados pelo poder de Deus, median-te a fé, para a salvação preparada pararevelar-se no último tempo" (IPe 1.5).É importante salientar que os crentesverdadeiros podem, de alguma forma, tera sua fé abalada ou até mesmo cair emgraves pecados (Mt 26.70,72,74), mas oque sustentamos, à luz da Palavra, é quenós não seremos demovidos da fé "nemtotal, nem finalmente", como registra aConfissão de Fé de Westminster.

As Escrituras nos dão certeza da nossasalvação: "... quem ouve a minha palavrae crê naquele que me enviou tem a vidaeterna, não entra em juízo, mas passouda morte para a vida" (Jo 5.24); "... Deusnos deu a vida eterna; e esta vida está noseu Filho. Aquele que tem o Filho tem avida; aquele que não tem o Filho não tema vida. Estas coisas vos escrevi, a fim desaberdes que tendes a vida eterna, a vósoutros que credes em o nome do Filho deDeus" (Uo 5.11-13; cf. Mt 18.12-14; Jo3.16,36; 6.35-40; IPe 1.3-5).

Embora essa verdade seja encontradaem diversos textos das Escrituras, duaspassagens em particular são fundamen-tais para a sua compreensão. A primeira

está em João 10. O tema principal dessecapítulo é demonstrar que Jesus é o ver-dadeiro bom Pastor. Ele ensina que assuas ovelhas o conhecem e ouvem (Jo10.3-6); ele as apascenta, em contrastecom os mercenários (Jo 10.7-18), quefogem quando vem o perigo. Então, Jesusprecisou confrontar os seus inimigos nomeio da multidão (Jo 10.19-42) e a certaaltura do seu discurso, ele afirmou quehavia dois grupos distintos, um deles erao das suas ovelhas (Jo 10.26), que o Pailhe dera (Jo 10.29; cf. Jo 6.40-45), paraesse grupo ele disse: "Eu lhes dou a vidaeterna; jamais perecerão, e ninguém asarrebatará da minha mão" (Jo 10.28).McGregor Wright comenta que:

"Este verso assinala três coisas a res-peito das ovelhas. Primeira, elas possuemvida eterna agora, não apenas uma possi-bilidade de uma vida futura eterna. Segun-da, elas nunca poderão perecer (jamaisperecerão); finalmente, ninguém podearrancá-las das mãos seguras do Filho.A expressão ninguém deve presumivel-mente incluir as pessoas salvas, Satanáse qualquer outro possível candidato paradesafiar o poder guardador do Bom Pas-tor. Estas três coisas sozinhas garantem asegurança eterna daquelas ovelhas" (A So-berania Banida, Editora Cultura Cristã).

Outro texto esclarecedor é Romanos 8.O apóstolo Paulo começa afirmando queaqueles que estão em Cristo não padecemmais da condenação (Rm 8.1-8). Talvezsó esse versículo fosse suficiente para de-monstrar que somos guardados por Deusaté o fim, mas ele continua apresentandoas benesses por sermos filhos de Deus(Rm 8.9-17). Por sermos filhos de Deus,ele nos concedeu misericordiosamenteuma herança eterna, embora ainda sofra-mos com as tribulações (Rm 8.18-30).Como filhos e herdeiros de Deus, emCristo, temos a certeza de que a obra desalvação e preservação será completa emnós: "... aos que predestinou, a esses tam-bém chamou; e aos que chamou, a esses

Salvos para sempre 31

também justificou; e aos que justificou,a esses também glorificou" (Rm 8.30).

Como se estivesse respondendo a inda-gações sobre essa certeza, Paulo conclui:"Que diremos, pois, avista destas coisas?Se Deus é por nós, quem será contra nós?[...] Quem nos separará do amor de Cris-to? Será tribulação, ou angústia, ou perse-guição, ou fome, ou nudez, ou perigo, ouespada?" (Rm 8.31,35). Então, o apóstolonos dá a plena certeza da salvação eternados crentes, expressa de maneira enfáticae clara: "... eu estou bem certo de que nema morte, nem a vida, nem os anjos, nemos principados, nem as coisas do presente,nem do porvir, nem os poderes, nem aaltura, nem a profundidade, nem qual-quer outra criatura poderá separar-nos doamor de Deus, que está em Cristo Jesus,nosso Senhor" (Rm 8.38-39). Isso incluidizer que nem aqueles que são salvos têmcondições de desejar ou lutar contra a suaprópria salvação eterna. Essa verdadeficará mais evidente com as explicaçõesdo próximo tópico.

II. Santificação necessária

Aqueles que desejam deturpar a dou-trina bíblica da segurança dos crentesutilizam argumentações falazes; dizem,por exemplo, que essa doutrina nos levaa uma vida de pecado, pois os crentes seacomodariam no pecado se soubessemque nunca perderiam a salvação.

A Palavra do Senhor, porém, revelaque Deus não levará para a eternidadeninguém que ele não tenha santificado naterra: "Segui a paz com todos e a santifica-ção, sem a qual ninguém verá o Senhor"(Hb 12.14). Isso, no entanto, não exclui anossa responsabilidade em buscar e viverde forma que agrade ao Senhor, por isso,dizemos que a santificação tem duplaação: de Deus em nós e nossa, que é umaresponsabilidade pessoal e intransferível.

Talvez o texto que expresse isso demodo mais transparente seja Efésios 5.18:

32 Palavra Viva

"... não vos embriagueis com vinho, noqual há dissolução, mas enchei-vos doEspírito". O verbo "encher", nesse tex-to, poderia ter sido traduzido por sedeenchidos, significando que há uma res-ponsabilidade, pela força do imperativo,e uma ação soberana do Espírito em nospreencher. O Espírito é soberano, "sopraonde quer" (Jo 3.6-8), é o próprio Espíritodo Deus altíssimo, que faz morada emnós (Jo 14.16-17) e nos auxilia em nossafraqueza (Rm 8.26-27).

A. Deus nos santificaA obra de Deus é completa e sua Pala-

vra registra que a nossa santificação é umarealização dele em nós: "O mesmo Deusda paz vos santifique em tudo; e o vossoespírito, alma e corpo sejam conservadosíntegros e irrepreensíveis na vinda donosso Senhor Jesus Cristo" (ITs 5.23);"Santifica-os na verdade; a tua palavraé a verdade" (Jo 17.17; cf. Ez 20.12; Hb2.1 l;2Co 3.18).

É importante salientar que o termo"santificar" tem dois significados. San-tificar pode significar "separar paradeterminado uso, consagrar — quanto oprocesso pelo qual todos os crentes pas-sam entre sua regeneração e sua salvaçãofinal, seja através de sua morte ou da voltade Cristo. Esses conceitos, contudo, nãosão excludentes, pois Deus nos separoupara que "todos cheguemos à unidade dafé e do pleno conhecimento do Filho deDeus, à perfeita varonilidade, à medidada estatura da plenitude de Cristo" (Ef4.13). Essa manifestação de Deus emnós, por meio de sua Palavra e do seuEspírito (At 20.32), garante "que aqueleque começou boa obra em vós há decompletá-la até ao Dia de Cristo Jesus"(Fp l .6). Se não fosse a ação e o poder doSenhor em nós, não conseguiríamos nemmesmo nos arrepender de nossos pecados:"Ou desprezas a riqueza de sua bondade,e tolerância, e longanimidade, ignorando

que a bondade de Deus é que te conduzao arrependimento?" (Rm 2.4).

B. Devemos nos santificarA santificação é apresentada nas Escri-

turas como uma responsabilidade e deverde cada cristão. Em Hebreus 12.14 aordem é para que sigamos a santificação,isso significa "seguir zelosamente"1, oque demonstra a importância e o interessedaquele que pratica a ação.

E impossível haver um crente alcançadopela graça, regenerado, que tenha experi-mentado verdadeiramente a fé salvadorae que não deseje ser santo (IPe 1.16). Eleagora odeia o pecado, e está morto paraele: "... quanto a ter morrido, de uma vezpara sempre morreu para o pecado; mas,quanto a viver, vive para Deus" (Rm6.10). Isso dá sentido à exortação: "Nãoreine, portanto, o pecado em vosso corpomortal, de maneira que obedeçais às suaspaixões" (Rm 6.12).

Muitas vezes, a santificação experimen-tada pelos crentes é dolorosa (l Co 9.27),ela é fruto de uma batalha "sangrenta"(Hb 12.4), por isso, as exortações à vi-gilância, que vemos na Bíblia, são tãorecorrentes e urgentes: "Vigiai, pois, atodo tempo, orando, para que possaisescapar de todas estas coisas que têm desuceder e estar em pé na presença do Filhodo Homem" (Lc 21.36). Não há confusãoalguma em sermos exortados a perseve-rar até ao fim, mesmo que saibamos queé Deus que realizará essa obra em nós:"Aquele (...) que perseverar até ao fim,esse será salvo" (Mt 24.13; cf. Dt l .36; Js14.9; IRe 11.6; Pv 23.17; At 13.43; Rm2.7; Hb 12.7; Tg 5.11).

A marca dos verdadeiros cristãos al-cançados pela graça é uma vida repletado fruto do Espírito, "amor, alegria, paz,

1 Cf. KITTEL, Gerhard, FRIEDRICH, Gerhard. Theologí-cal Dictionary ofthe New Testament. Trad. e org. GeofireyBromiley). 10 vols. Grand Rapids, MI: Wm. B. EerdmansPublishing Company, 1964,2:230.

longanimidade, benignidade, bondade,fidelidade, mansidão, domínio próprio"(Gl 5.22-23). Os ensinos de nosso SenhorJesus corroboram essa verdade: "... cadaárvore é conhecida pelo seu próprio fruto.Porque não se colhem figos de espinheiros,nem dos abrolhos se vindimam uvas" (Lc6.44). Não há vida com Deus para quemnão obedece a sua Palavra: "Tem porventu-ra, o SENHOR tanto prazer em holocaustose sacrifícios quanto em que se obedeça àsua palavra? Eis que o obedecer é melhordo que o sacrificar, e o atender, melhor doque a gordura de carneiros" (ISm 15.22).

As advertências do Espírito nas Es-crituras são severas para alguém queafirma ser um cristão genuíno, mas nãoobedece aos mandamentos do Senhornem se esforça para ter uma vida desantidade: "Não vos enganeis: de Deusnão se zomba; pois aquilo que o homemsemear, isso também ceifará" (Gl 6.7);"Tornai-vos, pois, praticantes da palavrae não somente ouvintes, enganando-vos

Silvos para sempre 33

a vós mesmos" (Tg 1.22); "Toda árvoreque não produz bom fruto é cortada elançada ao fogo" (Mt 7.19).

ConclusãoA perseverança dos santos ensina que

a obra divina de salvação dos eleitosé completa. Deus nos elegeu antes dafundação do mundo; ele alcançou-nos namorte e ressurreição do seu Filho atravésda operação do Espírito Santo em nós,e agora nos leva ao lar celestial. Aindaassim, somos chamados à obediência,portanto, que possamos nos revestir dasboas obras, que são próprias aos que têmsido zelosos pelas boas obras (Tt 2.14).

AplicaçãoVocê já havia pensado que a segurança

da sua salvação está nas mãos de Deus?Você tem se esforçado para perseverar atéao fim? Você tem lutado diligentementecontra o pecado? Cuidado, pois de Deusnão se zomba.

Mas a Bíblia diz que,

Texto básico: 2Timóteo 3.16-17

Leitura diáriaD Tt 1.1-2 Deus não menteS 1 Tm 1.15 Digna de toda aceitaçãoT Js 24.15 Escolhei a quem servirQ Ap 3.14-22 Estou à porta e batoQ Ap 22.17 Aquele que desejaS Jo 3.14-16 Todo aquele que crerS Ef 2.8-9 Dom de Deus

IntroduçãoAs lições estudadas até aqui podem ter

sido suficientes para você entender a dou-trina da soberania de Deus sobre todas ascoisas e sobre a sua salvação, mas, talvez,você tenha ficado com algumas dúvidas,principalmente sobre determinados textosdas Escrituras que parecem contradizer oque vimos. Será que a Bíblia ensina duasposições completamente diferentes, e decerto modo excludentes?

Nesta lição, vamos estudar algumas pas-sagens controvertidas que, à primeira vis-ta, parecem contraditórias. Mas veremos,no final, que a Bíblia não se contradiz.

I. A autoridade das Escrituras

A autoridade da Palavra de Deus sig-nifica que a Bíblia reflete o caráter dopróprio Senhor, como uma revelaçãopreposicional de sua vontade para o ho-mem. Então ela não se contradiz, porque opróprio Deus não se contradiz (2Tm2.13;Tt 1.2; l Jo 5.9; ITs 2.13; Jo 16.13-14; Lc1.3-4; Em 15.4).

Tudo o que a Bíblia ensina é verdade:"Santifica-os na verdade; a tua palavra éa verdade" (Jo 17.17); "As tuas palavrassão em tudo verdade desde o princípio,e cada um dos teus juízos dura parasempre" (SI 119.160). O conceito dessasverdades tem sido diluído e mal entendido

em nossa sociedade, fazendo com queas pessoas de nossa época aceitem, semgrandes dificuldades, contradições explí-citas. No entanto, lembremos que todocristão é chamado para destruir fortalezasintelectuais e anular sofismas (2Co 10.4).Isso só será possível se reconhecermosque, no mundo, existe verdade e mentira,acerto e erro.

Partamos do pressuposto que a Bíblianão pode conter "versículos católicos","versículos calvinistas" ou "versículosarminianos"; o ensino da Bíblia é único,verdadeiro, harmónico e digno de todaaceitação (lTm 1.15).

Se o problema não está nas Escrituras -e cremos que nenhum cristão verdadeirodeveria imaginar isso — ele estará naqueleque lê e interpreta a Palavra de Deus.Todo leitor da Bíblia é, ao mesmo tempo,seu intérprete, não há como alguém seaproximar do texto santo sem interpretá--lo. Essa interpretação, no entanto, nuncaé isenta, pois a pessoa lê de acordo comseus pressupostos. Entenderemos melhoro que quer dizer a palavra "pressuposto"separando o prefixo "pré" do radical"suposição" — pré indica "aquilo que éanterior, o que vem antes". Suposição éaquilo que você crê a respeito de algo.Logo, pressuposto quer dizer "aquilo emque alguém crê sobre algo, antes mesmode interpretá-lo", derivando o nosso con-ceito de cosmovisão (visão de mundo).

Essa explicação é necessária para de-monstrar que nenhum de nós interpretaa Bíblia de modo "livre". É por issoque, com um mesmo texto, obtemosconclusões diferentes. Mas existemregras hermenêuticas que precisam serrespeitadas ao interpretarmos as Escri-turas. Nós não interpretamos um salmo

da mesma maneira que uma carta, porexemplo. Cada género literário tem seuconjunto de regras para se compreendero que está escrito.

H. Interpretando as Escrituras

A hermenêutica é a disciplina que nosajuda dando regras gerais de interpreta-ção. Podemos dividir os textos bíblicospor temas específicos, ou também porgénero literário, para compreender maisacuradamente as passagens analisadas.Os textos também podem ser divididosde modo que possamos juntar, dentro deduas categorias maiores, passagens quese refiram a esses temas gerais.

A. Textos sobre a escolha do homemNormalmente, pessoas que têm pressu-

posições arminianas sobre a liberdade dohomem enxergam os textos que falam arespeito da decisão do homem como re-ferência ao seu livre-arbítrio. É como setodas as vezes em que o homem tomasseuma decisão ele o fizesse sem interferên-cias, de maneira espontânea, sem umacausa anterior.

Nenhum de nós nega que o homemefetivamente faz escolhas e tem liberdadepara fazê-las. O homem desfruta de umaliberdade criada, que é limitada, mas éreal. Sendo assim, todos os textos queapresentam uma necessidade de escolhada parte do homem (Js 24.15,22; 2Sm24.12; SI 119.30,117) não estão dizendo,em hipótese alguma, que os homens queescolheram servir ao Senhor o fizeramsem a interferência ou sem a ajuda doPai. Os eleitos são regenerados e res-pondem ao chamado do Espírito Santoem fé e obediência, e essa reação à obrado Espírito em seu coração é como umaresponsabilidade do homem alcançado.

Dois textos em especial precisam sertratados com mais profundidade aqui.Ambos do livro de Apocalipse. Em 3.20,Jesus diz: "Eis que estou à porta e bato;

Mas a Bíblia diz que... 35

se alguém ouvir a minha voz e abrir aporta, entrarei em sua casa e cearei comele, e ele comigo". E preciso observarque o texto não diz que Jesus está baten-do na porta do coração de alguém. Nãohá inferência explícita ou implícita, notexto ou no contexto, que nos permitadizer isso. Além disso, o texto é umacomplementação a um chamado aoarrependimento para uma igreja: "Eu re-preendo e disciplino a quantos amo. Sê,pois, zeloso e arrepende-te" (Ap 3.19).Consideremos ainda que a palavra "cear"diz respeito principalmente à comunhão(cf. l Co 5.11; Mt 22.1-14). Juntandoessas ideias, podemos dizer que aquelesque se arrependessem dos seus pecados,na igreja de Laodiceia, voltariam a tercomunhão com Jesus, e se isso nãoacontecesse, ele viria com disciplina.Assim, fica fácil entender que o texto éuma exortação a crentes abastados finan-ceiramente, mas omissos e preguiçososna obra do Senhor (Ap 3.14-17). Jesusnão está batendo no coração de todas aspessoas esperando que elas abram aportapara poder salvá-las.

Em Apocalipse 22.17, temos: "O Es-pírito e a noiva dizem: Vem! Aquele queouve, diga: Vem! Aquele que tem sedevenha, e quem quiser receba de graça aágua da vida". Lendo superficialmente,poderíamos imaginar que o texto dá totalcondição para pensar que "quem quiser"refere-se a qualquer pessoa de formaindiscriminada, e essa poderia realizar aação autonomamente, isto é, sem ajudamesmo de Deus. Em uma tradução literal,o texto diz simplesmente "aquele quedeseja", referindo-se a uma pessoa quetem sede, e se desejar, ela pode receberde graça a água da vida.

A pergunta que fazemos é: Quem podedesejar essas coisas? Quem poderia rece-bê-las? Obviamente, aquele que foi tiradoda morte espiritual pela obra do Espírito(Ef 2.1-10), pois antes disso ele não tinhadesejo de Deus (Pon 3.11). Agora, com

36 Palavra Viva

um novo coração, pode desejar o Senhore desfrutar de sua presença.

B. Textos sobre "todos"Os versículos mais utilizados pelos ar-

minianos (os que defendem a autonomiahumana na salvação) são os que dizemque a obra de salvação alcança a todos:"... Deus amou ao mundo de tal maneiraque deu o seu Filho unigénito, para quetodo o que nele crê não pereça, mas tenhaa vida eterna" (Jo 3.16, cf. Mt 7.24; 10.32;19.29; Jo 12.46; At 2.21; 2Co 5.1). Paraos arminianos, uma das "leituras" dessetexto poderia ser: "... Deus amou a todasas pessoas indiscriminadamente de umamaneira surpreendente, ele deu o seu Fi-lho unigénito, para que todo aquele quequiser crer nele não pereça, mas tenha avida eterna". Na verdade, essa compreen-são está longe do texto inspirado.

As palavras de Jesus, dentro do seucontexto, são suficientes para entenderque "de tal maneira" está fazendo refe-rência ao levantamento da serpente debronze no deserto (Jo 3.14-15; cf. Nm21.4-9). Da mesma maneira como Deuslevantou a serpente no deserto para salvaro povo de seu pecado, o Filho do Homemdeveria ser levantado para a remissão dospecados do seu povo. Como diz o texto"todo aquele que nele crê" não perecerá,mas quem são aqueles que crêem, e quemsão os que não crêem? O próprio Jesusresponde, em outras passagens, a essa

pergunta: "Ninguém pode vir a mim se oPai, que me enviou, não o trouxer" [...]"Mas vós não credes, porque não soisdas minhas ovelhas. As minhas ovelhasouvem a minha voz; eu as conheço, e elasme seguem. Eu lhes dou a vida eterna;jamais perecerão, e ninguém as arreba-tará da minha mão" (Jo 6.44; 10.26-28).Só crerá no Filho aquele que o Pai der econduzir, de forma soberana, a Cristo.

ConclusãoA autoridade da Escritura deve ser

reconhecida. Ela é o registro da vontadede Deus para nós, o que ele deseja queconheçamos e sigamos. Porque procededo próprio Deus, e sendo inspirada peloSanto Espírito, ela não se contradiz e nemrevela verdades mutuamente excludentes.Seu ensino é uno, harmónico e santo, etodos que a interpretam devem fazê-lo domodo correio; todas as inconsistênciassão atribuídas à dificuldade do pecadorde entender o livro santo.

AplicaçãoNegar a autoridade das Escrituras seria

o mesmo que a negar o caráter de Deus.Quando você lê a Palavra de Deus, buscaferramentas para compreender o que estálendo? Você já procurou ajuda de alguémpara compreender alguma passagem emque tenha encontrado dificuldade? A Es-critura deve ser entendida no âmbito dopovo de Deus.

Deus permite?

Texto básico: Atos 4.23-28

Leitura diáriaD Tg 1.12-18 Todo dom perfeitoS Mt 26.24 Predição e puniçãoT Lm 3.38 O bem e o malQ2Sm24.1-10 Deus incitouQ Fp 2.13 O querer e o realizarS Pv 6.16-19 Odeia e abominaS Hb 1.9 Odiaste a iniquidade

IntroduçãoComo explicar as ações malignas no

mundo? Esta lição, e as próximas, tratarãode uma questão mais complexa: o relacio-namento entre Deus, os homens e o mal.Vamos buscar respostas nas Escrituras,sabedores de que aquilo que foi reveladonos pertence, e aquilo que não foi reveladopertence somente ao Senhor (Dt 29.29).

I. Modelos equivocados

A discussão sobre o relacionamentoentre Deus e o mal é antiga. Ao longoda História essa discussão foi ganhandocorpo e chegou até nós de maneira quepodemos colocá-la em "cercas" maiores,sob "guarda-chuvas" mais amplos de po-sicionamentos. Obviamente os modelosque abordaremos, a seguir, não esgotam atotalidade nem a particularidade de cadaum, mas ajudam a categorizar e identificarpadrões de pensamento.

A. O mal como privaçãoAqueles de tradição arminiana nor-

malmente se alinham a essa ideia. Elesentendem que, pelo fato de Deus serbom e ter criado tudo de maneira boa eperfeita, a corrupção e a degradação dascoisas criadas foram produzidas pelopecado, que pertence somente às criatu-ras de Deus, como homens e anjos, por

exemplo, e que esses últimos agiram demodo totalmente livre.

Quem pensa assim certamente tentapreservar os textos das Escrituras que en-sinam que o pecado é gerado no coração dohomem e Deus é a fonte de todo bem (Tg1.12-18). Assim, dizem eles, tudo o que ébom procede de Deus e tudo que é mal nãoprocede dele. Essa visão, embora pareçaser boa, pois tenta preservar Deus de serconsiderado mau, falha por não reconhecera sua soberania e o seu plano eterno.

Se Deus realmente fosse somente oagente iniciador e sustentador de coisasboas em sua criação, como ele teria con-trole sobre as más? Será que ele poderiafazer uma promessa e garantir que elafosse cumprida? O diabo seria um concor-rente de sua vontade? Haveria uma guerracósmica entre o bem (Deus) e o mal (Sa-tanás)? Não é isso que a Bíblia ensina. Amorte de Cristo Jesus na cruz foi o eventomais cruel, injusto e desumano realizadona história do mundo, e ele foi claramenteprometido por Deus e cumprido nos seusmínimos detalhes (Is 53.1-12; Lc 22.3-6;Mt 26.20-25,53-54,74-75; 27.9-10; Mc15.27-28).

B. Permissão divinaSendo uma derivação do modelo an-

terior, a ideia de permissão divina tentaexplicar, de maneira um pouco maisprofunda o relacionamento de Deus como pecado do que a ideia do mal comoprivação. Diz Paul Helm:

"Mesmo que a privação [do mal] nãofaça sentido, ela ainda admite o caráterimpecável de Deus, em virtude do qualele não poderia realizar uma ação má;ele não poderia (na frase que se tornoucomum) "ser o autor do pecado". Então,

38 Palavra Viva

como o pecado acontece, se a providênciade Deus está no controle de todas as coi-sas, e ele não pode produzir o pecado? Aresposta para isso é a permissão de Deus.Deus permite o pecado" (A Providênciade Deus, Editora Cultura Cristã).

Podemos entender a permissão divinade duas maneiras: geral e específica. Apermissão geral é como se Deus fosse opresidente de uma empresa. Ele sabe tudoo que acontece, direciona os acontecimen-tos, envolve os funcionários para que suavontade seja realizada, mas ele não estáefetivamente controlando ninguém. Essavisão falha por querer manter a liberdadedos agentes em detrimento da determina-ção de Deus. A questão é que ela, logica-mente, também não encaixa e não faz jusao que ensina a Palavra de Deus.

A permissão também pode ser vista demaneira específica, isto é, em uma situa-ção de pecado ou mal, Deus simplesmentepermite que ela aconteça porque ele nãoage para impedi-la. Sendo Todo-Poderoso,Deus poderia evitar que determinado malfosse praticado, mas não o faz porque tempropósitos (fins) sábios e santos. Talvezalguém pergunte: Permitir o mal nãoseria tão mal quanto praticá-lo? Se Deuspode evitar que algo aconteça, mas não ofaz, sua bondade não estaria comprome-tida, mesmo que seus fins sejam santose justos? E por isso, que precisamos deum modelo fundamentado nas Escrituras.

II. Compatibilismo

Na lição 3 aprendemos que o relacio-namento entre Deus e o homem se dáde uma maneira a que denominamos deconcursus. O compatibilismo seria umaaplicação do concursus, principalmenteno que diz respeito ao relacionamento deDeus com o pecado e com o mal.

O compatibilismo procura manter as ver-dades da soberania de Deus e da respon-sabilidade e liberdade do homem juntas,sem prejudicar qualquer um dos pontos.

Deus é ampla e exaustivamente soberano,ele dirige e dispõe de tudo e de todos pararealizar os seus planos. Quanto aos agentesmorais, que são livres e responsáveis, elesrealizam o plano eterno de maneira que aculpa pelos seus erros seja só deles porqueeles desejaram praticar o mal.

As pessoas que não concordam comessa visão dizem que, desse modo, o ho-mem seria somente uma marionete, umrobô nas mãos de Deus. Na verdade, essaé mais uma daquelas argumentações semsentido —já expusemos algumas nas liçõesanteriores. O fato é que os adversários docompatibilismo precisam levantar espan-talhos para a não aceitação das verdadesdas Escrituras. Então, vamos relembrarnovamente o que a Palavra ensina.

A. A participação de Deus no malNa próxima lição abordaremos de ma-

neira específica o "problema do mal".Por enquanto, vamos relembrar o ensinobíblico de que Deus tem participaçãona maldade dos homens, embora essaparticipação seja diferente com relaçãoà bondade que eles praticam. Nós assu-mimos que Deus está por detrás tanto dobem como do mal, mas de uma maneiraque o mal é realizado pelos agentes li-vres - que desejam realizar o mal —, e oSenhor utiliza a instrumentalidade dessesagentes secundários para a realização doseu propósito soberano.

Alguns textos das Escrituras são muitoclaros a esse respeito: "Sucederá algummal à cidade, sem que o SENHOR o tenhafeito?" (Am 3.6b); "Acaso, não procededo Altíssimo tanto o mal como o bem?"(Lm 3.38); "Eu formo a luz e crio as tre-vas; faço a paz e crio o mal; eu, o SENHOR,faço todas estas coisas" (Is 45.7; cf. SI105.25; Rm 9.18; Pv21.1; 2Ts 2.11).

B. A ação do homem no malNão é porque Deus determina e utiliza

o homem para realizar o seu plano que

o homem fica isento dos seus erros. Narealidade, todos os homens agem deforma livre e são responsáveis pelos seusatos, sem compulsão ou coerção; elesrealizam o que desejam. Dois exemplospodem ser analisados aqui. O primeiro serefere ao censo realizado pelo rei Davi.O texto começa dizendo, claramente, oque aconteceu: "Tornou a ira do SENHORa acender-se contra os israelitas, e eleincitou a Davi contra eles, dizendo: Vai,levanta o censo de Israel e de Judá" (2Sm24.1). Por enquanto, diremos que Deus fezisso por meio de Satanás (ICr 21.1), napróxima lição retomaremos esse assunto.

Embora Deus, soberanamente, de formadireta ou indireta, tenha "incitado" o reiDavi a levantar o censo; o autor da açãofoi somente de Davi. Joabe, comandantedo exército, ainda tentou demover o reidessa ideia (2Sm 24.3-4; l Cr 2L3), poiso censo demonstraria o poder bélico deDavi, tornaria orgulhoso o seu coraçãoe faria com que tanto o povo como o reiconfiassem mais nesse último do que nopoder do Senhor (ISm 14.6; Is 31.1).Depois de nove meses o rei recebeu orelatório (2Sm 24.8). Diz apassagem que"Sentiu Davi bater-lhe o coração, depoisde haver recenseado o povo, e disse aoSENHOR: Muito pequei no que fiz; porém,agora, ó SENHOR, peço-te que perdoes ainiquidade do teu servo; porque procedimui loucamente" (2Sm 24.10). A sobera-nia de Deus estava agindo de forma ativa,mas Davi foi culpado pelo seu pecado;ele reconheceu seu erro e arrependeu-se.

Outro texto é Atos 4.23-28. Depoisde ouvir o relato dos apóstolos sobre aproibição de pregar o evangelho, a igre-ja reunida orou adorando ao Senhor epedindo a ele que lhes concedesse maisintrepidez para pregar a palavra (At 4.29).Mas o que eles afirmam é que os homensmaus se ajuntaram contra Jesus. Dentreesses homens, estava Herodes, PôncioPilatos, gentios e gente de Israel. Comodiz Heber Carlos de Campos:

Deus permite? 39

"Alguns detalhes da traição de Cristoforam até planejados cuidadosamente,como é o caso da ação dos fariseus emembros do Sinédrio. Nenhum deles fezcoisa alguma contrária à sua natureza.Eles fizeram tudo o que estava de acordocom as disposições dominantes da almadeles. O prazer deles foi cuspir em Jesus,dar-lhe bofetadas, zombar dele, prendê--lo, açoitá-lo, sentenciá-lo à morte e, porfim, serem instrumentos malignos da suaexecução na cruz [...] Todas essas coisasforam feitas voluntariamente, sem seremforçados por nada de fora a fazerem oque fizeram. Simplesmente, eles deramouvidos à sua própria natureza" (A Pro-vidência, Editora Cultura Cristã).

Aqueles homens se ajuntaram "... parafazerem tudo o que a tua mão e o teu pro-pósito predeterminaram" (At 4.28). Deusprovidencialmente não apenas planejouesses acontecimentos, como conduziuesses homens para fazerem tudo isso.Ainda assim, eles são completamenteculpados por seu pecado, sua increduli-dade e sua maldade.

Hl. Todas as ações de todos os homense anjos

Provavelmente, você já compreendeuque a permissão a que nos referimos nãoé aquela que simplesmente "deixa ascosias acontecerem", como se Deus nãoestivesse envolvido no processo. Por isso,a Confissão de Fé de Westminster ensina:

"A onipotência, a sabedoria inescrutá-vel e a infinita bondade de Deus, de talmaneira se manifestam em sua providên-cia, que esta se estende até a primeiraQueda e a todos os outros pecados dosanjos e dos homens, e isto não por umamera permissão, mas por uma permissãotal que, para os seus próprios e santos de-sígnios, sábia e poderosamente os limita,e regula, e governa em uma múltipla dis-pensação, mas essa permissão é tal, quea pecaminosidade dessas transgressões

40 Palavra Viva

procede tão somente da criatura e não deDeus, que, sendo santíssimo e justíssimo,não pode ser o autor do pecado nem podeaprová-lo" (V.IV).

Para fins didáticos, dividimos o compa-tibilismo da seguinte maneira: atos bonsdos homens bons, atos bons dos homensmaus, atos maus dos homens bons e atosmaus dos homens maus. Observe o qua-dro a seguir:

Atos bons doshomens bons

Fp2.13;Jo 8.32,34,36;

G15.13;!Pe2.16;2Co7.1Atos maus doshomens bons

Gn 37.11, 18-19;45.5-8; 50.15-21

Atos bons doshomens maus

Is 44.24-26;45.1-7;

2Tm 1.16-18

Atos maus doshomens maus

Jr 25.9-14; 5 1.20-24; 52.4-30;He 1.3-13

Por homens bons queremos dizer aque-les que são regenerados e habitados peloEspírito; por homens maus são aquelesque estão distantes de Deus e vivemdeliberadamente pecando, tendo umcoração escravo dos seus prazeres. Poratos bons daqueles que são regeneradosdeve-se entender a obediência à Palavra,o produzir e praticar o fruto do Espírito.Nos homens maus, os atos bons têm outrosentido: embora suas intenções nuncasejam puras, eles produziram algumaconsequência boa cujos efeitos foram be-néficos. Os atos maus, dos homens maus,referem-se somente ao processo natural

da sua natureza caída (cf. A Providência.,Editora Cultura Cristã).

É necessário, portanto, cultivar a hu-mildade e reconhecer que mesmo queos ensinos das Escrituras sejam muitos eclaros, essa doutrina é bastante complexa,e de certo modo, misteriosa. Há pessoasque não crêem dessa maneira e tememapontar Deus como o "autor do pecado"ou "compactuando com o mal". A Confis-são sabiamente enfatiza a responsabilida-de moral do homem, que vive por aquiloque está revelado, ou seja, embora Deustenha todo esse envolvimento nas ações eintenções dos homens, nós devemos viverpelo que Deus, que é bom e justo, diz, etemer sua disciplina e justa condenação,pois ele odeia o pecado (Uo 2.15-16; Pv6.16-19; Hb 1.9).

ConclusãoO relacionamento de Deus com o mal

e com os homens é complexo. Todavia,as Escrituras nos oferecem respaldo parapensar sobre esse tema de modo que en-xerguemos o compatibilismo nas açõessoberanas de Deus e na responsabilidadede cada homem. Ninguém está alheio aopoder providencial de Deus, e ele serácada vez mais glorificado por meio daverdade registrada em sua Palavra.

AplicaçãoComo você enxergava a permissão de

Deus? Como a compreende agora? Porque o compatibilismo é uma propostamais bíblica? Você teme apresentar aDeus exatamente como ele é revelado nasEscrituras a outras pessoas?

Deus e o problema do mal

Texto básico: Isaías 45.1-7

Leitura diáriaD Dt 32.4 O caráter de DeusS Lc 22.24 Compatibilismo na traiçãoT He 1.1-13 Não contemplas o malQ Ne 9.1-37 Rebelião contra DeusQ Jd 6 O estado originalS 1Rs 22.5-40Espírito mentirosoS Pv 21.1 Nas mãos de Deus

Introdução

Na lição passada começamos a abor-dar o tema do relacionamento de Deuscom o mal. Isso é importante porque odilema entre um Deus totalmente bom ea existência da maldade no mundo temsido usado como objeção ao Criador.Aqueles que não crêem no Deus do cris-tianismo costumam dizer que a presençado mal no mundo prova que Deus não éo Todo-Poderoso ou não existe. Seria issomesmo? O mal coloca em xeque tudoo que a Bíblia ensina sobre o poder e abondade de Deus?

I. O mal como um problema

Talvez, a primeira pergunta a ser feitaé se a maldade é realmente um problema.Pode parecer estranho, mas a respostadepende da referência escolhida paraanalisar a questão.

O mal é um problema, primeiro porqueele fere a santidade de Deus. O pecado éa transgressão da lei, e a lei foi promul-gada aos homens para mostrar o carátersanto do Senhor. Embora Deus não estejadebaixo da lei, pois foi ele mesmo quema criou, ele não fere os princípios da leiporque ela expressa de forma preposi-cional o seu caráter: "Eis a Rocha! Suasobras são perfeitas, porque todos os seuscaminhos são juízo; Deus é fidelidade, e

não há nele injustiça; é justo e reto" (Dt32.4). Talvez você esteja argumentandoque uma descrição como essa não per-mite pensar que Deus tenha decretadoo pecado. Na realidade, há uma grandediferença em Deus ter decretado o mal eele realizar o mal: "... o Filho do Homem,na verdade, vai segundo o que está deter-minado, mas ai daquele por intermédio dequem ele está sendo traído!" (Lc 22.22). responsabilidade é dos agentes livres,eles fazem o mal porque desejam, e Deuso predeterminou desde a eternidade.

Segundo lugar, o mal é um problemaporque Deus nunca aprova o pecado.Novamente, o fato de Deus ter decretado opecado não significa que ele o aprove: "Tués tão puro de olhos, que não podes ver omal e a opressão não podes contemplar; porque, pois, toleras os que procedem perfida-mente e te calas quando o perverso devoraaquele que é mais justo do que ele?" (He1.13). Deus odeia o pecado, tanto que con-dena e condenará todos os que o praticareme não se arrependerem. Da mesma sorte,Deus tolera os vasos de ira e os pecadosque cometem (Rm 2.4; 9.22-23) até o diadeterminado para sua condenação.

Terceiro, o mal é um problema porqueele é a rebelião de criaturas que devemprestar honra somente a Deus. A rebe-lião é caracterizada principalmente porum desejo de autonomia e insatisfação.Quando nos referimos a Deus, quem fariaalguma objeção ao seu governo? Quemteria coragem de afirmar que não está sa-tisfeito com a sua bondade, amor, graça emisericórdia? Vejamos o que as Escriturasregistram: "Recusaram ouvir-te e não selembraram das tuas maravilhas, que lhesfizeste; endureceram a sua cerviz e na suarebelião levantaram um chefe, com o pró-

42 Palavra Viva

pósito de voltarem para a sua servidão noEgito" (Ne 9.17a); "Declara-os culpados,ó Deus; caiam por seus próprios planos.Rejeita-os por causa de suas muitas trans-gressões, pois se rebelaram contra ti" (SI5.10). A ideia é que ninguém nunca tevequalquer motivo para rebelar-se contraDeus, mas mesmo assim, ao desejaremfazer o mal e seguirem em dkeção opostada soberania do Pai, as criaturas se levan-taram contra ele.

Todavia, como já mencionamos, o malnão precisa ser necessariamente vistocomo um problema em relação a Deus.O Criador não se esquiva do mal presenteno mundo: "Sucederá algum mal à cidade,sem que o SENHOR o tenha feito?" (Am3.6); "Acaso, não procede do Altíssimotanto o mal como o bem?" (Lm 3.38b);"Eu formo a luz e crio as trevas; faço apaz e crio o mal; eu, o SENHOR, faço todasestas coisas" (Is 45.7; cf. SI 105.25; Rm9.18; Pv 21.l;2Ts 2.11).

II. Os agentes do mal

Deus não pratica o mal nem pode serculpado por ele porque os agentes livrespertencem a Deus e cumprem o seu pro-pósito. Esses agentes fazem todo o malde modo que somente eles são culpados;porque desejam pecar suas almas têmprazer em pecar. Entretanto, isso nãoexclui o decreto eterno de Deus e nem asua direção nas ações e omissões dessesagentes. Essa é a parte mais complexa edifícil de entender, mas é assim que asSagradas Escrituras registram.

Vamos analisar alguns exemplos parademonstrar isso de forma .mais clara. Osagentes livres que praticam o mal deter-minado por Deus podem ser anjos caídosou homens malignos.

A. Agentes angelicaisPor seres angelicais, queremos dizer to-

dos os que foram criados bons e santos porDeus, mas "não guardaram o seu estado

original (...) abandonaram o seu própriodomicílio" (Jd 1.6; 2Pe 2.4). Dentre essesagentes está incluído o próprio Satanás,como veremos a seguir.

O primeiro exemplo é encontrado emIReis 22.5-28. O capítulo inicia narrandouma aliança que Josafá, rei de Judá, fezcom Acabe, rei de Israel, para pelejaremcontra a Síria, por Ramote-Gileade (IRs22.1-4). O intento do Senhor Deus, con-tudo, era que o rei Acabe subisse à pelejapara ser derrotado (cf. IRs 22.20). Para queisso acontecesse, foi necessário que umespírito mentiroso proferisse, por meio dosquatrocentos profetas que supostamenteserviam ao Senhor, uma palavra mentirosae ao mesmo tempo de encorajamento:

"Zedequias, filho de Quenaana, fez parasi chifres de ferro e disse: Assim diz o SE-NHOR: Com estes escornearás os siros atéde todo os consumir. Todos os profetas pro-fetizaram assim, dizendo: Sobe a Ramote--Gileade e triunfarás, porque o SENHOR aentregará nas mãos do rei" (IRs 22.11-12).

Esse ser angelical, que pertence aoexército celestial do Senhor (IRs 22.19),apresentou-se para enganar o rei como umespírito mentiroso na boca dos seus profe-tas e tendo a promessa feita pelo próprioDeus de que ele prevaleceria (IRs 22.21-22). Deus não tenta a ninguém e nem éfonte de tentação (Tg 1.13), por isso ele usaos seus agentes na condução da História.

Outros exemplos são encontrado em2S amuei 24.1 e l Crónicas 21.1. Essestextos são paralelos, mas revelam demaneiras diferentes o mesmo evento.

Em 2Samuel 24.1, lemos: "Tornou aira do SENHOR a acender-se contra osisraelitas, e ele incitou a Davi contra eles,dizendo: Vai, levanta o censo de Israel ede Judá". Em l Crónicas 21.1, "Então,Satanás se levantou contra Israel e incitoua Davi a levantar o censo de Israel".

A pergunta que logo surge é: Quem in-citou Davi? Deus ou Satanás? A respostaé que Deus o fez através de Satanás. Paraque fique claro, levantar o censo era um

pecado muito grave, era fazer uma loucuraem Israel (2Sm 24.10; l Cr 21.8). O SenhorDeus estava irado contra Israel e, por meiode Satanás, incitou Davi a levantar o censopara que todo o povo sofresse as consequ-ências desse pecado (2Sm24.11-17).

Também não podemos nos esquecer dorelato dos evangelhos: "A seguir, foi Jesuslevado pelo Espírito ao deserto, para sertentado pelo diabo" (Mt 4. l; Mc l. 12-13;Lc4.1-2).

O propósito soberano do Senhor se cum-prirá, e ele pode até mesmo utilizar suascriaturas para concretizá-lo. As criaturas,por sua vez, agem de forma livre, segundoa sua natureza, e são total e completamen-te culpadas por seus atos pecaminosos.

B. Agentes humanosDeus age não apenas por meio de seus

agentes morais livres e celestiais, mas tam-bém aqueles que são criados à sua imageme semelhança. Um caso explícito é o do reiNabucodonosor. O Senhor chamou esse reiímpio de "meu servo" (Jr 25.9) porque elecumpriria um de seus propósitos contraas terras de Judá "... e os destruirei total-mente, e os porei por objeto de espanto,e de assobio, e de ruínas perpétuas. (...)Toda esta terra virá a ser um deserto e umespanto; estas nações servirão ao rei deBabilónia setenta anos" (Jr 25.9,11).

Nabucodonosor, sendo um agente livre,decidiu invadir Judá. Nessa empreitada,ele cometeu as maiores atrocidades (Jr52.4-30), ele obedeceu a seus desejos,cumpriu tudo aquilo que agradava à suaalma. No entanto, o concursus operava demaneira harmónica e perfeita. As Escritu-ras dizem: "Como ribeiros de águas assimé o coração do rei na mão do SENHOR; este,segundo o seu querer, o inclina" (Pv21.1).

O profeta Jeremias também relata: "Tu,Babilónia, eras meu martelo e minhas ar-mas de guerra, por meio de ti, despedaceinações e destruí reis; (...) Pagarei, anteos vossos próprios olhos, à Babilónia e

Deus e o problema do mal 43

a todos os moradores da Caldeia toda amaldade que fizeram em Sião, diz o SE-NHOR" (Jr 51.20,24). Nesse texto vemosclaramente que Deus utilizou um agentelivre para cumprir os seus propósitos.Após a realização desse concursus, aque-les que cometeram as iniquidades foramcastigados por Deus. Isso só foi possívelporque Deus é soberano e o homem, res-ponsável por suas ações.

O Pai é justo e nunca deixa o pecadopassar impunemente, embora no textoDeus diga na primeira pessoa que tenharealizado as ações de despedaçar e des-truir. Poderiam ser citados ainda exem-plos como o do rei Ciro (Is 45.1-7) e deJudas Iscariotes (Jo 17.12; Mt 26.24).

III. Deus criou o mal?Essa, com certeza., é uma das questões

mais complexas. Já vimos que as Escri-turas não trazem qualquer tipo de censurano relacionamento que Deus tem com omal. Nada está fora dos planos e do con-trole de Deus. A administração soberanaque o Senhor Deus exerce sobre o mal eos seus agentes considera a totalidade doseu caráter, como temos argumentado emlições anteriores. Poderíamos assegurarque isso significa que Deus foi o agenteinicial do mal? Diz a Confissão de Féde Westininster que "a pecaminosidadedessas transgressões [dos anjos e homens]procede tão somente da criatura e não deDeus, que, sendo santíssimo e justíssimo,não pode ser o autor do pecado nem podeaprová-lo" (V.IV).

O ensino bíblico a respeito de que Deusnão poder ser o autor do mal é claro, poisisso significaria que ele precisaria praticaro mal para que este viesse a existir. O quenós lemos nas Escrituras é que "Viu Deustudo quanto fizera, e eis que era muitobom" (Gn l .31). Nós assumimos que todacriação, tanto aquela dos céus quanto a daterra (Gn 1.1), incluindo os anjos, serescelestiais, e tudo o mais, foi feita nos seis

44 Palavra Viva

dias da Criação. O relato do Génesis focano que foi criado na terra; pouca coisa nosé dita sobre a criação dos céus, por isso, opecado deve ter ocorrido após o sexto diada criação, pois tudo que o Senhor haviacriado era "muito bom".

Tanto o diabo quanto seus anjos foramcriados em retidão, mas não preservaramem manter o seu estado original (Jd 6). Ohomem e a mulher também foram criadosem santidade e retidão, mas caíram (Gn3.1-24). Assim, quando olhamos a Pala-vra de Deus, percebemos que mesmo queo Senhor tenha decretado a existência domal, ele não é o agente do mal e do peca-do, mas ele tem total controle e domíniosobre ambos.

Talvez Isaías 45.7 seja um testemunhocontrário ao que temos afirmado: "Euformo a luz e crio as trevas; faço a paze crio o mal; eu, o SENHOR, faço todasestas coisas". No entanto, em uma análisemais profunda do texto, percebemos que apalavra traduzida por mal (rah) tem umagama de significados muito grande, comopor exemplo, "má qualidade, inferior" (cf.Gn41.20); "descontentamento" (Gn28.8)e também "desastres" (Gn 44.34). Assim,analisando o texto de Isaías, e o contexto,uma tradução aceitável seria "faço a paz

e crio a calamidade", pois o profeta estádestacando as obras do Senhor tanto soba óptica dos benefícios como daquilo queenxergamos como malefícios. Este não éo mal moral, o pecado.

Concordamos e declaramos juntamentecom a Confissão de Fé que o mal pertencesomente aos agentes morais livres criadospor Deus - estes sim desejam o mal ecaem —, e reafirmamos que essa situaçãofoi decretada desde antes da fundação domundo e providência de Deus concorre aolado da responsabilidade de cada criatura.

ConclusãoO problema do mal existe dentro da

perspectiva de que ele fere os atributos eo caráter de Deus. Segundo as Escrituras,Deus se relaciona com o mal porque oprojetou e o controla totalmente; mas elenão é autor nem criador do mal, porquetudo que ele fez e continua realizando é"muito bom".

AplicaçãoVocê tem receio de afirmar a verdade bí-

blica de que Deus se relaciona com o mal?Por quê? Você percebe que a soberania deDeus deve ser estudada, considerando oseu caráter por completo?

A Soberania de Deus e osofrimento do crente

Texto básico: Romanos 8.18-25

Leitura diáriaD SI 73 Invejando o ímpioS Hb 12.4-13 Disciplina os filhosT 2Tm 1.8 Parte dos sofrimentosQ Jo 15.20 Perseguição garantidaQ1 Pé 1.3-12 Sofrimento e glóriaS Rm 8.28 Tudo cooperaS Jo 6.40 Ressurreição garantida

IntroduçãoPor que o cristão sofre? Se ele é amado

por Deus desde antes da fundação domundo, salvo de sua ira certa e preser-vado para viver a eternidade no paraíso,qual seria a necessidade de ele sofreraqui? Essa pergunta ganha mais pesoprincipalmente se considerarmos o tipode teologia que ensina vitórias sobre osmales, curas de doenças e prosperidadefinanceira. Qual seria a razão de o crentesofrer? Nós não temos todas as respostas,mas as Escrituras nos dão claras indica-ções de algumas.

L Sofrimento do cristão

Um dos pontos que talvez cause maistristeza para alguns crentes é que elessofrem tanto ou até mesmo mais do quealguns ímpios. Esse não é um problemanovo. Tanto o rei Davi (SI 37) quantoAsafe (SI 73) expressaram a agonia doservo de Deus que contempla a prosperi-dade daqueles que não servem ao Senhor:"Não te indignes por causa dos malfeito-res, nem tenhas inveja dos que praticama iniquidade" (SI 37.1); "... pouco faltoupara que se desviassem os metis passos.Pois eu invejava os arrogantes, ao ver aprosperidade dos perversos" (SI 73.2-3).O salmista relata que para os ímpios nãohá preocupações, pois seus corpos são sa-

dios; além de eles não se cansarem comoos outros mortais (SI 73.4-5).

Já aqui nós vemos um problema comumaos que sofrem: inveja. Quando os cristãosdesviam os seus olhos da providência deDeus, e do futuro que aguarda tanto a elescomo aos ímpios, se estes não se arrepen-derem, nasce um desejo pecaminoso emseu coração. Como veremos mais à frente,o cristão deve manter os seus olhos fitosnas promessas de Deus, para não cederà pressão, principalmente em relação àspromessas que se referem à eternidade.

O cristão também pode sofrer por causada disciplina de Deus. Esse sofrimentosó está reservado aos seus filhos, porqueele deseja que estes vivam em santidade,conforme declara Hebreus 12.4-6: "...na vossa luta contra o pecado, ainda nãotendes resistido até ao sangue e estais es-quecidos da exortação que, como a filhos,discorre convosco: Filho meu, não menos-prezes a correção que vem do Senhor, nemdesmaies quando por ele és reprovado;porque o Senhor corrige a quem ama eaçoita a todo filho a quem recebe".

Vemos repetidas vezes Deus disciplinaro povo de Israel por considerá-lo filho:"Sabe, pois, no teu coração, que, comoum homem disciplina a seu filho, assimte disciplina o SENHOR, teu Deus" (Dt8.5; cf. 2Rs 19.3; Jó 5.17; Pv 3.11; Jr5.3; 6.8). Nem todos os de Israel eramde fato israelitas (Rm 9.6), ou seja, nemtodos os indivíduos da nação de Israeleram verdadeiramente filhos de Deus,mas a disciplina atingia a todos indis-criminadamente. Deus agia para que osseus filhos pudessem ser quebrantados ese voltassem para ele em arrependimento.O objetivo de Deus na administração dedisciplina aos seus filhos é sempre o bem;

46 Palavra Viva

ele "... nos disciplina para aproveitamen-to, a fim de sermos participantes da suasantidade" (Hb 12.10b).

Também podemos colocar nesse bojoo sofrimento que todo cristão passa porsua fidelidade a D eus. Escrevendo ao seudiscípulo Timóteo, o experiente Paulodiz: ccNão te envergonhes, portanto, dotestemunho do nosso Senhor, nem do seuencarcerado, que sou eu; pelo contrário,participa comigo dos sofrimentos, a favordo evangelho, segundo o poder de Deus"(2Tm 1.8; 2.3). Mais à frente, o apóstolonos dá certeza de que uma vida compro-metida com os valores do reino de Deusnos reservará problemas: "... todos quan-tos querem viver piedosamente em CristoJesus serão perseguidos" (2Tm 3.12).

Jesus Cristo foi também enfático narelação que há entre segui-lo e sofrer asconsequências dessa decisão: "Lembrai--vos da palavra que eu vos disse: não éo servo maior do que seu senhor. Se meperseguiram a mim, também persegui-rão a vós outros; se guardaram a minhapalavra, também guardarão a vossa"(Jo 15.20). Enquanto vivenciamos umarealidade de pregações que prometemtodos os prazeres desta vida aos que seentregarem a Cristo Jesus, as promessasde sua palavra seguem na direção oposta.

II. Sofrimento e glória

Quando deixam de olhar as Escrituraspara encontrar o consolo que vem deDeus, os cristãos sofrem ainda mais emmeio a seus padecimentos. As promessasque Deus faz com respeito aos sofrimen-tos dos seus filhos são fortalecedoras.Vejamos algumas delas.

A. O sofrimento na vida do crente épassageiro

Escrevendo aos nossos irmãos, oapóstolo Pedro afirma que eles deveriamexultar por causa do plano de salvação queDeus concedeu, "... embora, no presente,

por breve tempo, se necessário, sejais con-tristados por várias provações" (IPe 1.6b);e ainda "sofrimentos iguais aos vossosestão se cumprindo na vossa irmandadeespalhada pelo mundo" (IPe 5.9).

Com certeza, os sofrimentos do crenteestão condicionados, no máximo, a esta vida.Talvez julguemos que anos afio de afliçõesseja muito tempo para aqueles que passampor elas, mas o que são 70 ou 80 anos compa-rados com a eternidade? Por isso o apóstoloPedro descreve que essas amarguras são "nopresente" e "por breve tempo".

Uma das confianças mais maravilhosasque o evangelho proporciona àquele quecrê é que toda agonia limita-se somentea esta vida. Nos novos céus e na novaterra não teremos motivos para sofrer: "...lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e amorte já não existirá, já não haverá luto,nem pranto, nem dor, porque as primeirascoisas passaram" (Ap 21.4).

Pedro ainda usa outra condicional, "senecessário". Com certeza, nós podemosafirmar que nem tudo na vida do crenteé sofrimento. Deus tem proporcionadomomentos bons e de alegria, concedendo--nos graciosamente muito mais do quepedimos ou pensamos (Ef 3.20). Alémdisso, nós ainda temos o consolo de saberque não sofremos sozinhos (cf. IPe 5.9).Isso significa que em suas lutas qualquercristão pode contar com o apoio irrestritode seus irmãos, e a igrejapode se regozijarna verdade de que sempre haverá compre-ensão e ajuda por parte daqueles que têmsido trabalhados pelo mesmo Espírito deDeus. Por essas razões, o apóstolo Pedropôde concluir: "... o Deus de toda a graça,que em Cristo vos chamou à sua eterna gló-ria, depois de terdes sofrido por um pouco,ele mesmo vos há de aperfeiçoar, firmar,fortificar e fundamentar" (IPe 5.10).

B. O sofrimento na vida do crenterevela a glória futura

O binómio sofrimento /glória é claronas Escrituras, porque o que aconteceu

a Cristo Jesus é um paradigma daquiloque também acontecerá conosco. Assim,temos registrado, através dos profetas doAntigo Testamento, "... qual a ocasiãoou quais as circunstâncias oportunas,indicadas pelo Espírito de Cristo, queneles estava, ao dar de antemão teste-munho sobre os sofrimentos referentesa Cristo e sobre as glórias que os segui-riam" (IPe 1.11). Jesus Cristo padeceutudo aquilo que era necessário tendo acerteza de que seria glorificado depoisde sua obra e, próximo à sua crucifica-ção, ele "... levantou os olhos ao céu edisse: Pai, é chegada a hora; glorifica ateu Filho, para que o Filho te glorifiqueatí"(Jo 17.1).

Da mesma forma, podemos viver nestaterra conscientes e esperançosos de que"... os sofrimentos do tempo presente nãopodem ser comparados com a glória a serrevelada em nós" (Rm 8.18). Veja comoé interessante perceber que a Palavra deDeus redireciona nossos pensamentos àscertezas do futuro enquanto passamospor sofrimentos nesta vida. Isso não éescapismo e nem fuga da realidade, pelocontrário, é a própria realidade futura que,filtrando nossa visão do presente, faz-nosesperançosos e jubilosos aguardando oque está reservado para nós.

Nós não somos chamados à inércia notempo presente, ao contrário, devemostrabalhar e nos esforçar tendo convicçãodo que nos aguarda. Por isso o apóstoloPaulo termina o capítulo 15, no qual tratada ressurreição, assim: "... meus amadosirmãos, sede firmes, inabaláveis e sempreabundantes na obra do Senhor, sabendoque, no Senhor, o vosso trabalho não évão" (ICo 15.58). Enquanto estivermosnesta vida, não devemos ansiar o porvirchateados ou tristes; Pedro nos inspira:"... alegrai-vos na medida em que soiscoparticipantes dos sofrimentos de Cristo,para que também, na revelação da suaglória, vos alegreis exultando" (IPe 4.13,minha ênfase).

A Soberania c/e Deus e o sofrimento do crente 47

m. Soberania, sofrimento e confiança

Nestes roteiros de estudo, procuramosenfatizar as verdades apresentadas nasEscrituras a respeito da soberania deDeus e como ela se relaciona com toda asua criação, especialmente com os sereshumanos. Procuramos também, à me-dida que estudávamos, fazer aplicaçõespráticas para compreender como essasdoutrinas têm a ver com a nossa vida.

Esta seção continua mantendo esse cará-ter prático. Esperamos em Deus que tudoaquilo que vimos tenha servido para a edi-ficação do povo de Deus e para conduzira igreja a uma vida mais santa e piedosa.

Como temos afirmado, Deus tem diri-gido a história do universo conforme osseus santos propósitos, e isso diz respeitonão apenas aos homens do passado, masà nossa própria história. Tudo o que pas-samos, todas as coisas que vivenciamos,as experiências boas e ruins, procedemda poderosa mão do Pai.

Provavelmente, para chegar aondechegou, você já tenha passado pelo valeda sombra da morte (SI 23.4), e a reali-dade que o cerca pode estar minando asua confiança no amor e no cuidado deDeus por você. Perdas dolorosas, angús-tias nos relacionamentos, depressões ouconsequências produzidas pelo medo epela ansiedade podem estar corroendoo seu relacionamento com o Senhor, ecom aqueles que estão próximos a você.Nós desejamos que você seja encorajadopelas Escrituras somente. Não há nadaque o homem diga ou faça, e não hánada fora da Bíblia, que possa ajudá-lo.Se você não concorda, saiba que em umperíodo razoavelmente curto os sintomassó vão piorar, porque esses conselhosou indicações dos seres humanos serãomeros paliativos para a dor da alma, quesó encontra descanso em Deus.

Destacamos duas promessas muitopreciosas que recebemos de Deus. Aprimeira é: "Sabemos que todas as coisas

48 Palavra Viva

cooperam para o bem daqueles que amama Deus, daqueles que são chamados se-gundo o seu propósito" (Rm 8.28) - essapromessa tem a ver com o nosso sofri-mento. Deus está garantindo que todasas coisas cooperam para o nosso bem.Ele não está garantindo que compreen-deremos tudo por que passamos, nemque nos alegraremos com tudo, mas quetudo está cooperando para o nosso bem.Se essa promessa estiver firme e bemarraigada em seu coração, você terá êxitoem levar a vida de maneira mais piedosae temente a Deus.

A outra promessa diz respeito ao futuroglorioso: " a vontade do meu Pai é quetodo homem que vir o Filho e nele crertenha a vida eterna; e eu o ressuscitareino último dia" (Jo 6.40). Essa promessa émaravilhosa, pois nos apresenta a garantiade que não permaneceremos na morte.Mais do que isso, à semelhança do nossoSenhor, ressuscitaremos para viver plenae eternamente com ele e com todos aque-les que creram em seu nome. Por isso, nãodevemos temer aqueles que podem mataro corpo ou nos fazer mal porque isso é o

máximo que eles podem fazer (Lc 12.4).Como pertencemos a Deus, e estamosassegurados nas suas mãos, o futuro deglória é certo e verdadeiro.

As coisas que padecemos servem parapreparar o nosso caráter e fortalecer a nos-sa fé, transformando-nos à semelhança denosso Senhor Jesus Cristo. Não deixemosque os sofrimentos desta vida retirem denós a esperança de um futuro glorioso.

ConclusãoOs sofrimentos que os crentes enfren-

tam são reais e têm vários motivos; elesdemonstram a glória futura e devem des-pertar em nós uma confiança inabalávelna providência e no amor que Deus tempor nós, concedendo-nos condições deviver no tempo presente sensata, justa epiedosamente (cf. Tt 2.12).

AplicaçãoPor quais motivos você tem sofrido?

Será que você sofre mais por causa dasconsequências dos seus pecados ou porter uma vida piedosa? Você confia naspromessas de Deus?

Conselho de EducaçãoCristã e Publicações

Clodoaldo Waldemar Furlan (Presidente)Domingos da Silva Dias (Vice-presidente)Alexandre H. M. de Almeida (Secretário)André Luiz Ramos, Anízio Alves Borges

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Haveraldo Ferreira Vargas

EDITORCláudio António Batista Marra

EDITOR ASSISTENTEEduardo Assis GonçalvesMárcia Barbutti de Lima

PRODUTORAMariana P. Anjos

ISSN 2317-4455

SOBERANIA BANIDASe a salvação é de Deus, por que evangelizar?

Se Deus me ama, por que eu sofro? Se Deus

tudo predomina, por que somos responsáveis?

(Lições adaptadas do livro Soberania banida,

de McGregor Wright, Editora Cultura Cristã)

AUTORIA DAS LIÇÕES DO ALUNOAndré Scordamaglio (1-13), Hermisten M. P.

da Costa é coautor das lições 5 e 6

AUTORIA DAS LIÇÕES DO PROFESSORMõnica Gonçalves da Silva Rodrigues

REVISÃOElvira Castanon e Michele Cunha

EDITORAÇÃO

Alessandra Moreno

CAPAIdeia Dois

Sumário

l. O que é a Soberania de Deus?,

2.0 que é livre-arbítrio 4

3. Quem é mesmo o Soberano? 8

4. Soberania, responsabilidade e liberdade.... 12

5. Ninguém é igual a Deus 15

ó^Deus, igual a nós 18

7. Só Deus Salva ...............22

8. Quem Deus salva? 26

9. Salvos para sempre 30

10. Mas a Bíblia diz que 34

11. Deus permite? 37

12. Deus e o problema do mal 41

13) A Soberania de Deus e o

sofrimento do crente......... .45

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