síndrome de léri-weill – da deformidade de madelung ao...

30
Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao diagnóstico genético Léri-Weill dyschondrosteosis – from the Madelung deformity to the genetic diagnosis Filipa Neiva 1 , Sofia Martins 2 , Cíntia Castro-Correia 3 , Carla Costa 3 , Miguel Leão 4 , Manuel Fontoura 5 1 Interna de Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de Braga 2 Assistente Hospital de Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de Braga 3 Assistente Hospital de Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de S. João 4 Assistente Hospital de Genética, Serviço de Genética Médica, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 5 Professor Doutor, Chefe de Serviço de Pediatria, Serviço Pediatria – endocrinologia pediátrica, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto Correspondência: Filipa Neiva › Rua Dr. José Maria Brandão, n.º 30, 3.º esquerdo › 4710-504 BRAGA › [email protected] RESUMO A baixa estatura afecta aproximadamente 2% das crianças e representa um dos motivos mais frequentes da consulta de endocrinologia pediátrica. A heterogeneidade genética responsável pela baixa estatura sofreu um grande avanço com a descrição do gene SHOX (short stature homeobox-containing gene). A proteína codificada, loca- liza-se exclusivamente no núcleo de algumas células, e está envolvida na regulação do desenvol- vimento, diferenciação e organogénese, com uma expressão limitada no espaço e no tempo. A expressão fenotípica é variável, com mais de 50 mutações do gene descritas. Mutações hetero- zigóticas do gene SHOX foram relatadas em casos de Síndrome de Leri-Weill (SLW). Os autores descrevem o caso clínico de um adolescente enviado à consulta por baixa estatu- ra. O estudo hormonal efectuado e a pesquisa de mutações para o gene FGFR3 foram nega- tivos. O aparecimento da deformidade de Madelung em radiografia dos membros superiores levou ao pedido do estudo molecular do gene SHOX. Foi detectado um padrão anómalo na região PAR1 com deleção dos exões 1-5 do gene confirmando-se a hipótese clínica de SLW. O estudo do gene SHOX deve ser considerado em alguns casos no estudo da baixa estatura. PALAVRAS-CHAVE Baixa estatura; gene SHOX; Síndrome de Léri-Weill. ABSTRACT Short stature affects approximately 2% of children, representing one of the most frequent disor- ders attending at endocrine pediatric consult. The genetic heterogeneity responsible for the short stature suffered a significant advance with the description of the SHOX gene (short stature homeobox-containing gene). This gene encodes a nuclear protein involved in the development, differentiation and organogenesis with an expression limited in time and space. Phenotypic expression is variable, with more than 50 mutations described. Heterozygous SHOX mutations were shown to cause Léri-Weill dyschondrosteosis (LWD). The authors report the clinical case of a male teenager seeking our consult for short stature. The hormonal study and mutational analysis of the FGFR3 gene were negative. Molecular study for Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01 23 ... 27 © 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 23

Upload: others

Post on 27-Jun-2020

4 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Síndrome de Léri-Weill – da deformidade deMadelung ao diagnóstico genéticoLéri-Weill dyschondrosteosis – from theMadelung deformity to the genetic diagnosis

Filipa Neiva1, Sofia Martins2, Cíntia Castro-Correia3, Carla Costa3, Miguel Leão4, ManuelFontoura5

1 Interna de Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de Braga2 Assistente Hospital de Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de Braga3 Assistente Hospital de Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de S. João4 Assistente Hospital de Genética, Serviço de Genética Médica, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto5 Professor Doutor, Chefe de Serviço de Pediatria, Serviço Pediatria – endocrinologia pediátrica, Faculdade de Medicina da Universidade do Porto

Correspondência: Filipa Neiva › Rua Dr. José Maria Brandão, n.º 30, 3.º esquerdo › 4710-504 BRAGA › [email protected]

RESUMO

A baixa estatura afecta aproximadamente 2% das crianças e representa um dos motivos mais

frequentes da consulta de endocrinologia pediátrica.

A heterogeneidade genética responsável pela baixa estatura sofreu um grande avanço com a

descrição do gene SHOX (short stature homeobox-containing gene). A proteína codificada, loca-

liza-se exclusivamente no núcleo de algumas células, e está envolvida na regulação do desenvol-

vimento, diferenciação e organogénese, com uma expressão limitada no espaço e no tempo. A

expressão fenotípica é variável, com mais de 50 mutações do gene descritas. Mutações hetero-

zigóticas do gene SHOX foram relatadas em casos de Síndrome de Leri-Weill (SLW).

Os autores descrevem o caso clínico de um adolescente enviado à consulta por baixa estatu-

ra. O estudo hormonal efectuado e a pesquisa de mutações para o gene FGFR3 foram nega-

tivos. O aparecimento da deformidade de Madelung em radiografia dos membros superiores

levou ao pedido do estudo molecular do gene SHOX. Foi detectado um padrão anómalo na

região PAR1 com deleção dos exões 1-5 do gene confirmando-se a hipótese clínica de SLW.

O estudo do gene SHOX deve ser considerado em alguns casos no estudo da baixa estatura.

PALAVRAS-CHAVE

Baixa estatura; gene SHOX; Síndrome de Léri-Weill.

ABSTRACT

Short stature affects approximately 2% of children, representing one of the most frequent disor-

ders attending at endocrine pediatric consult.

The genetic heterogeneity responsible for the short stature suffered a significant advance with the

description of the SHOX gene (short stature homeobox-containing gene). This gene encodes a

nuclear protein involved in the development, differentiation and organogenesis with an expression

limited in time and space. Phenotypic expression is variable, with more than 50 mutations

described. Heterozygous SHOXmutations were shown to cause Léri-Weill dyschondrosteosis (LWD).

The authors report the clinical case of a male teenager seeking our consult for short stature. The

hormonal study and mutational analysis of the FGFR3 gene were negative. Molecular study for

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

23 ... 27

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 23

Page 2: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO24

INTRODUÇÃO

O crescimento estatural é determinadopor factores ambientais, hormonais e gené-ticos1. A baixa estatura afecta aproximada-mente 2% das crianças, representando umdos motivos mais frequentes da consulta deendocrinologia pediátrica2,3.

A primeira descrição de baixa estaturapor encurtamento mesomélico (antebraço eperna) foi efectuada em 1929 por LeriWeill4. Desde essa data outras entidadescom encurtamento predominante do referi-do segmento têm sido descritas. O Síndromede Leri-Weill (SLW) é uma delas e afecta asquatro extremidades. É um síndrome dis-plásico de hereditariedade dominante e assuas características clínicas são: encurta-mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação cubital distal, fusão prematura dasepífises, metacarpos e metatarsos curtos.Uma característica clínica e radiológica é oencurvamento do rádio e a deformidade deMadelung (desvio externo e dorsal do rádio,com subluxação do cúbito distal) que setorna evidente na maioria dos casos duran-te a adolescência e é mais frequente nasmulheres5.

A heterogeneidade genética responsávelpela baixa estatura sofreu um grande avan-ço com a descrição em 1997 (Rao et al eEllison et al) do gene SHOX (short staturehomeobox-containing gene)1,2,3,5. Este geneestá localizado na região pseudoautossómi-ca dos cromossomas X e Y, é composto por 6exões e codifica um factor de transcrição de293 e 225 aminoácidos (SHOXa e SHOXb,respectivamente)1. A proteína codificada,

localiza-se exclusivamente no núcleo dealgumas células3, e está envolvida na regu-lação do desenvolvimento, diferenciação eorganogénese, com uma expressão limitadano espaço e no tempo5. A expressão fenotí-pica é variável3, com mais de 50 mutaçõesdo gene descritas (www.shox.uni-hd.de)6.Dados iniciais sugerem envolvimento dahaploinsuficiência do gene na etiologia dabaixa estatura idiopática (OMIM 604271) ebaixa estatura no Síndrome de Turner,enquanto que a perda homozigótica dogene foi relacionada com a displasia meso-mélica de Langer (OMIM 249700).Mutações heterozigóticas do gene SHOX

foram relatadas em casos de SLW (OMIM127300). A incidência estimada de muta-ções no gene SHOX está entre 1:2000 –1:5000 na população geral e entre 1:40 –1:150 na população com baixa estatura1.Estão descritas mutações do gene SHOX em55-100% dos indivíduos com SLW, a maio-ria com deleções completas do gene7.

DESCRIÇÃO DO CASO CLÍNICO

Adolescente do sexo masculino, enviadoà consulta de Endocrinologia Pediátrica aos12 anos por baixa estatura. Filho único depais não consanguíneos. Antecedentes fami-liares de acidente vascular cerebral da mãeque na data da primeira consulta tinha 39anos (altura 160 cm), e de baixa estatura nafamília do pai, nomeadamente o pai (nadata da consulta 46 anos, altura 160 cm) e oavô paterno com baixa estatura e encurta-mento dos membros inferiores.

SHOX gene was undertaken after observation of Madelung deformity in the arm radiograph. An

abnormality in the PAR1 region with deletion of exons 1-5 in SHOX gene confirmed the LWD diag-

nosis. Studying the SHOX gene should be considered in certain cases in the workup of short stature.

KEYWORDS

Short stature, SHOX gene; Léri-Weill dyschondrosteosis.

Page 3: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 25

Fruto de uma gestação vigiada, semintercorrências. Nasceu por parto eutócicode termo, com asfixia perinatal, necessitan-do de reanimação após o nascimento(Apgar 2/5/7). Apresentava ao nascimentoum peso de 3380 g (Percentil (P) 50), compri-mento 49 cm (P10) e perímetro cefálico 35cm (P50). O crescimento ponderal evoluiuno P75 e o estatural no P10.

Na primeira consulta, aos 12 anos, tinhauma estatura de 142,2 cm (P3-10), um pesode 48 kg (P50-75) e perímetro cefálico de 53cm (P50). Ao exame objectivo apresentavafácies incaracterística, sem dismorfias, comencurtamento mesomélico dos membrossuperiores e inferiores. Sem outras alteraçõesrelevantes ao exame objectivo. A velocidadede crescimento (VC) no último ano tinhasido de 5,3 cm/ano (P50). Com uma idade dematuração óssea de 12 anos, um volumetesticular de 8 ml bilateralmente, e pêlopúbico no estádio 3 (Tanner). A estaturaalvo calculada a partir das alturas dos pais[Estatura do pai + (estatura da mãe + 13) /2±6,5] foi de 166,5 cm (com uma variaçãoentre mais ou menos 6,5 cm). Efectuou estu-do hormonal (T4 livre, TSH, 17-hidroxipro-gesterona, LH, FSH) que estava normal. Ahipótese de se tratar de uma baixa estaturafamiliar foi considerada e o adolescentemanteve seguimento na consulta.

Repetiu estudo analítico cerca de 12meses depois, apresentando IGF1 500 ng/ml(valor referência 152-540 ng/ml); IGFBP35,8 mg/l (valor referência 2,1-6,2 mg/l), LH,FSH e testosterona em níveis concordantescom o estádio Tanner apresentado. A veloci-dade de crescimento nos últimos 12 mesestinha sido 6,2 cm/ano (P<3). Aos 15 anos e2 meses, com envergadura de 84 cm e seg-mento inferior com 70 cm (relação segmen-to superior/inferior = 1,2) por suspeita dehipocondroplasia foram pedidas as muta-ções mais frequentes do gene FGFR3.Nenhuma das mutações (Asn540Lys;Asn540Thr, Asn540Ser, Ile538Val, Lys650Asn,Lys650Met, Lys650Gln) foi encontrada noreferido gene. Realizou radiografia do esque-

leto: diminuição do comprimento dos ossoslongos dos membros inferiores e superiores,apresentando deformidade de Madelung(fig. 1). Por este motivo foi pedido estudomolecular do gene SHOX realizado em labo-ratório comercial (GENDIA, Antuérpia,Bélgica) (www.gendia.net). No estudo foidetectado um padrão anómalo com deleçãoheterozigótica dos exões 1 a 5 do gene SHOX

e na região vizinha PAR1. A deleção destaextensão é considerada patogénica de acor-do com os critérios da MutaDATABASE(www.MutaDATABASE.org) e assim foi con-firmado o diagnóstico de síndrome de Leri-Weill (SLW).

Actualmente com 17 anos, altura 157cm e peso 60 kg, Tanner 5, relação segmen-to superior/inferior 1,76. Foi orientado paraconsulta de Genética Médica para estudodos pais e aconselhamento genético.

COMENTÁRIOS

O diagnóstico de SLW é fundamental-mente clínico e radiológico. Está confirma-do que o gene SHOX é a principal causa doSLW, porém não se pode excluir a influênciade outros genes. Assim, a presença de alte-rações específicas do gene SHOX confirmamo diagnóstico, mas a sua ausência não oexclui5. A baixa estatura ocorre nos primei-ros anos de vida e geralmente o crescimen-to pubertário é pouco ou nada afectado7.Em geral, deve suspeitar-se de uma altera-ção no gene SHOX nos pacientes com: a)baixa estatura “idiopática”, especialmente

FIGURA 1: Deformidade de Madelung.

Page 4: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO26

se estatura abaixo da estatura-alvo fami-liar, b) “baixa estatura familiar” especial-mente se predominante no sexo feminino e,c) crescimento desproporcional dos antebra-ços e pernas1.

A mutação do gene SHOX pode, comodescrito anteriormente, dar origem a múlti-plos fenótipos mesmo dentro da mesmafamília1. O fenótipo está dependente dadeficiência do produto génico funcional enão do tipo de mutação génica5. A deformi-dade de Madelung pode não ser evidenteaté à adolescência sobretudo no sexo mas-culino, e é geralmente precedida por sinaisradiológicos1, com aconteceu no caso clínicodescrito. Foram utilizados para o cálculodos percentis, os gráficos de crescimento(altura, peso, perímetro cefálico e velocida-de de crescimento) de Tanner eWhitehouse7,8, uma vez que são estes os uti-lizados na consulta de endocrinologiapediátrica do hospital. Estes gráficos apre-sentam a vantagem de contemplarem asvariações ocorridas no crescimento durantea puberdade e incluírem o P3 que corres-ponde a – 2 desvios padrão9.

A altura alcançada pelo adolescenteestá ligeiramente abaixo da estatura alvoprevista (166,5 com variação de mais oumenos 6,5 cm), mas de acordo com estaturamédia alcançada pelos doentes com SLW(155 cm, no sexo masculino1). Apesar deainda não ter sido efectuado o estudo gené-tico aos progenitores, o facto de o pai e avôpaterno apresentarem baixa estatura emembros curtos aponta para uma possíveltransmissão paterna do gene mutado.Dados recentes demonstram que a maioriados alelos SHOX mutados nos casos esporá-dicos são transmitidos pelo pai, este fenó-meno foi também observado em estudo pré-vio sobre mutações SHOX em pacientes combaixa estatura inexplicada7. O efeito dahormona de crescimento neste síndrome évariável e são necessários mais estudos queapoiem ou revoguem a sua utilização7.Outras actuações possíveis são a cirurgiacom correcção da angulação rádio-cárpica,

alargamento ósseo em caso de dor, transtor-no funcional ou hipocrescimento patológi-co5. Neste caso não se preconizou qualquertipo de tratamento.

Por se tratar de um síndrome de trans-missão dominante, o aconselhamentogenético é importante. O estudo dos paisdeve ser efectuado para avaliar se estavariação é herdada ou de novo.

Page 5: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Leka SK, Kitsiou-Tzeli S, Kalpini-Mavrou A,Kanavakis E. Short stature and dysmorphologyassociated with defects in the SHOX gene.Hormones (Athens). 2006;5(2):107-18.

2. Rappold G, Blum WF, Shavrikova EP, et al.Genotypes and phenotypes in children withshort stature: clinical indicators of SHOX haploin-sufficiency. J Med Genet. 2007;44(5):306–13.

3. Rao E, Blaschke RJ, Marchini A, Niesler B,Burnett M, Rappold GA. The Leri-Weill andTurner syndrome homeobox gene SHOX enco-des a cell-type specific transcriptional activator.Hum Mol Genet.2001;10(26):3083-91.

4. Leri A, Weill J. Une affection congenitale et syme-trique du development osseuse: la dyschondros-teose. Bull Soc Med Hop. 1929;53:1491-4.

5. Llano-Rivas I, Fernández-Toral J, Navarro-Vera I.Discondrosteosis de Leri-Weill. Mutación engen SHOX y expresividad variable. An Pediatr(Barc). 2011;74(6):405-8.

6. Niesler B, Fischer C, Rappold GA. The humanSHOX mutation database. Hum Mutat.2002;20(5):338–41.

7. Binder G, Renz A, Martinez A, et al. SHOXHaploinsufficiency and Leri-Weill Dysch -ondrosteosis: Prevalence and Growth Failure inRelation to Mutation, Sex, and Degree of WristDeformity. J Clin Endocrinol Metab.2004;89(9):4403-8.

8. Tanner JM, Whitehouse RH, Takaishi M.Standards from birth to maturity for height,weight, height velocity and weight velocity:British children 1965. Part II. Arch Dis Child.1966;41(220):613–35.

9. Wright CM, Booth IW, Buckler JM, et al.Growth reference charts for use in the UnitedKingdom. Arch Dis Child. 2002;86(1):11–4.

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 27

Page 6: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação
Page 7: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

29 ... 35

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 29

Hiponatrémia e Macro-adenoma da hipófise Hyponatremia and Pituitary Macroadenoma

Ana Araújo1, Pedro Soares1, Míriam Magalhães1, Clara Brito1, Diana Fernandes1, LuisaTeixeira1, Leonel Pinto2, Renato Saraiva3

1 Interno em Formação Específica de Medicina Interna, Serviço de Medicina 1, Centro Hospitalar Leiria - Pombal2 Assistente em Medicina Interna, Serviço de Medicina 1, Centro Hospitalar Leiria - Pombal3 Director de Serviço, Serviço de Medicina 1, Centro Hospitalar Leiria - Pombal

Correspondência: Ana Araújo › Hospital de Santo André – Leiria › Serviço de Medicina 1 › Rua Olhalvas – Pousos 2410-197 LEIRIA ›

[email protected]

RESUMO

A regulação do equilíbrio natrémico é mediada entre outros por osmoreceptores hipotalâmi-

cos que controlam os mecanismos da sede e da secreção de hormona anti-diurética.

Qualquer lesão ou compromisso do hipotálamo ou da hipófise anterior podem alterar este

balanço. Os autores descrevem o caso clínico de uma doente de 61 anos que se apresentou

ao serviço de urgência com manifestações neurológicas em contexto de uma hiponatrémia

grave cuja investigação médica levou ao raro diagnóstico de insuficiência adrenal secundária

a um macroadenoma da hipófise. Nestes casos, a hiponatremia resulta principalmente da

diminuição de efeito de feedback negativo dos glicocorticóides sobre a hormona anti-diure-

tica e/ou da diminuição da filtração glomerular devido ao hipocortisolismo.

PALAVRAS-CHAVE

Hiponatremia; Macroadenoma da hipófise; Insuficiência adrenal secundária.

ABSTRACT

Regulation of sodium level is mediated by several mechanisms, including hypothalamic osmore-

ceptors which control thirst and excretion of anti-diuretic hormone. Any injury or impairment of

the hypothalamus or anterior pituitary may alter sodium balance. The authors describe a case of

a patient of 61 years who presented to emergency department with neurological manifestations

in a context of severe hyponatremia whose medical research led to the rare diagnosis of adrenal

insufficiency secondary to a pituitary macroadenoma. In these cases, hyponatremia results main-

ly from decreased negative feedback effect of glucocorticoids on the anti-diuretic hormone and /

or decreased glomerular filtration due to hypocortisolism.

KEYWORDS

Hyponatremia; Pituitary macro-adenoma; Secondary adrenal insufficiency.

INTRODUÇÃO

O sódio é o catião extracelular dominan-te, não atravessa a membrana celular livre-

mente pelo que assume um papel extrema-mente importante no equilíbrio osmótico.De facto, a sua homeostase é vital para onormal funcionamento das células. O seu

Page 8: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO30

nível sérico normal varia de 135-145 mEq/L.A hiponatremia (HN), definida como umnível sérico inferior a 135 mEq/L, é conside-rada grave quando inferior a 125 mEq/L1. Éum distúrbio electrolítico frequente e sinalde doenças relativamente comuns como ainsuficiência cardíaca, a insuficiência renalou a cirrose hepática. Raramente se apresen-ta como primeira manifestação de macroa-denoma da hipófise2. Os adenomas hipofisá-rios são os tumores intracranianos mais fre-quentes nos adultos3 e são responsáveis pelamaioria das síndromas de hipo ou hipersecre-ção de hormonas hipofisárias4. Desenvolvem-se a partir de células epiteliais pituitárias erepresentam cerca de 10-15% de todos ostumores intracranianos. São chamados demacroadenomas quando têm diâmetrosuperior a 10 mm e de microadenomasquando menores3. A sua origem ainda nãoestá completamente esclarecida. No entan-to, a teoria mais plausível assenta numatransformação neoplásica monoclonal dascélulas pituitárias4. De facto, a naturezamonoclonal da maioria dos tumores hipofi-sários e a sua falta de resposta ao retrocon-trolo negativo das hormonas produzidaspelos órgãos-alvo reforçam esta hipótese3.Em regra geral, são benignos, sendo rara aneoplasia maligna com metastização. Amorbilidade e a mortalidade que lhes estãoassociadas, relacionam-se essencialmentecom as complicações resultantes do efeito demassa por compressão das estruturas vizi-nhas e da disfunção endócrina3. As altera-ções hormonais observadas dependem dotipo de célula que está na origem da neopla-sia. Existem tumores lactotrofos, somatotro-fos, corticotrofos, tirotrofos, gonadotrofos oumesmo pluri-hormonais. De referir que 30%não são clinicamente secretores, chamadosde não-funcionantes4.

CASO CLÍNICO

Doente de 61 anos, do sexo feminino,com antecedentes de hipertensão arterial,

diabetes mellitus tipo 2, dislipidemia, obesi-dade grau I, otosclerose do ouvido esquerdoe síndroma depressiva que recorreu ao servi-ço de urgência (SU) por tonturas, desequilí-brio, cefaleias, náuseas, vómitos, disartria esonolência com uma semana de evolução.Tratava-se de uma doente medicada diaria-mente com 300 mg de acarbose, 120 mg degliclazida, 1500 mg de metformina, 2,5 mgde indapamida e 10 mg de escitalopram.

Aquando da observação, apresentava-se sonolenta, desorientada e disártrica.Apirética, não eram evidentes sinais de rigi-dez da nuca. Com prova de Romberg estávelna linha média, sem evidência de marchaatáxica sendo que o restante exame neuro-lógico sumário apenas objectivou discretonistagmus do olhar conjugado horizontalbilateral sugerindo uma síndroma vertigi-nosa periférica. Hemodinamicamente está-vel, exibia uma auscultação cardio-pulmo-nar normal, não se observavam edemasperiféricos, alterações da pele, pilosidade oudistribuição da gordura corporal em relaçãocom o género e a idade.

Numa primeira abordagem, realizouno SU, análises de rotina englobandohemograma, função renal, hepática, iono-grama e doseamento da proteína C reacti-va que revelaram uma HN grave de 113mmol/L e uma hipocaliémia de 2,3mmol/L, um electrocardiograma (ECG) quenão demonstravam alterações de ritmo euma tomografica axial computorizada(TAC)-crânioencefálica (CE) que levantou ahipótese de uma lesão expansiva selar esupra-selar (fig. n.º 1).

Posteriormente internada no Serviço deMedicina 1, realizou doseamento da osmo-laridade sérica e estudo da urina das 24horas com doseamento da microalbuminú-ria, depuração da creatinina e ionogramacom intuito de averiguar etiologia das alte-rações iónicas acima descritas (quadro n.ºI). Este evidenciou uma perda urinária desódio importante. A interpretação das osmo-laridades séricas e urinárias revelou umaexcreção de água inadequadamente baixa.

Page 9: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 31

Foi também sujeita á realização de uma res-sonância magnética nuclear (RM) da regiãoselar (fig. n.º 2) que confirmou uma lesãoexpansiva com crescimento supra e infra-selar medindo cerca de 2,0 x 1,6 cm que nasua extensão inferior condicionava erosão dopavimento selar, exercendo superiormenteefeito de massa sobre o quiasma óptico e quelateralmente envolvia parcialmente ambasas carótidas internas sem envolvimento dosseios cavernosos. Perante o diagnóstico ima-giológico de macroadenoma da hipófise, foifeita a sua caracterização hormonal comestudo dos seus eixos (quadro n.º II) quedemonstrou défice de somatotrofina, hipogo-nadismo hipogonadotrófico e hipocortisolis-mo secundário. O macroadenoma não reve-lou ter características secretoras, estando asso-ciado a deficiência de vários eixos mas sem

FIGURA 1 FIGURA 2

Doseamentos Valores de Referência Apreciação

Sumária da Urina

pH:7

Leucócitos: 15/µL

Nitritos: Negativo

Proteinas:

Glicose: Negativo

Eritrócitos: Negativo

Bilirrubina: Negativo

Urobilinogénio: 2 E.U./dL

Acetona: Negativo

pH:7

Até 75/µL

Negativo

Negativo

Negativo

Negativo

Negativo

Até 2 E.U./dL

Negativo

Proteinúria

Urina das 24h

Na+: 327 mmol/L

K+: 100 mmol/L

Microalbuminúria: 429 mg/24h

Depuração da creatinina: 115,7 ml/min

Osmolaridade urinária: 286,7 Osm/L

40-220 mmol/L

25-125 mmol/L

<30 mg/24h

61 -166 ml/min

Variável

Perda renal de Na+

Nefropatia de provável etiologia

diabética, sem alteração de função

depurativa do rim

Osmolaridade sérica 282 Osm/L 280-295 Osm/L Normal

Osmolaridade Urinária >

Osmolaridade Sérica

Concentração Urinária inadequada:

baixa excreção de água

QUADRO I

Page 10: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO32

pan-hipopituitarismo. A hiponatrémia foientão facilmente enquadrada no contexto deinsuficiência corticosupra-renal secundária. Alesão demonstrada e caracterizada do pontode vista hormonal, interessou avaliar o graude compressão sobre o quiasma óptico e estru-turas vizinhas pelo que foi submetida a umacampimetria (fig n.º 3) que evidenciou defeitoarciforme superior do campo visual direito.

O tamanho e defeito visual incipientemas detectável consistiu critério para resse-ção transesfenoidal. A doente além de medi-cada com hidrocortisona (15 mg diários)com regressão da hiponatrémia, foi orienta-da para uma consulta de neurocirurgia.

DISCUSSÃO

A hiponatrémia resulta de uma altera-ção no balanço da água e cursa com hipo-osmolaridade. A regulação deste equilíbrioé mediada por osmoreceptores hipotalâmi-cos que perante alterações da osmolalidadeplasmática determinam modificações naingestão e excreção de água através domecanismo da sede e secreção de hormonaanti-diurética (HAD). Qualquer compromis-so do hipotálamo ou da hipófise posteriorpode comprometer este mecanismo5.

A osmolaridade sérica baixa que nor-malmente acompanha a hiponatremia levapassagem de água do espaço intravascularpara o espaço intracelular cerebral. Este pro-cesso baseado no equilíbrio osmótico resultaem hiperhidratação celular e consequenteedema cerebral. A severidade das manifes-tações neurológicas relaciona-se directa-mente com o grau de hidratação celular6. Osprimeiros sintomas incluem naúseas, mal-estar mas podem rapidamente evoluir paraconvulsões, coma ou até paragem respirató-ria por hérnia tentorial posterior com com-pressão do tronco cerebral1. No entanto, é de

FIGURA 3

Doseamentos Valores de Referência Apreciação

Somatotrofo IGF1 35 µg/L 135 -449 µg/L Défice de Somatostatina

Godanotrofo FSH 2,4 UI/L

LH 0,4 UI/L

Estradiol 9,0 pg/mL

Progesterona 0,29 ng/mL

16.7 –114 UI/L

10,87 –58,6 UI/L

<20pg/ml

0,10 –0,78 ng/mL

Hipogonadismo

hipogonadotrófico

Trireotrofo T3L 4,2 pmol/L

T4L 8,7 pmol/L

TSH 1,72 µUI/mL

Prova TRH:

TSH 0’ 1,7 µUI/mL

20’ 8,2 µUI/mL

60’ 1,8 µUI/mL

1,34 –2,73 mol/L

7,9 –14,4 pmol/L

0,34 –5,6 µUI/mL

Incremento

5 µUI/mL

Função Tiroideia normal

Corticotrofo ACTH <5ng/mL

Cortisol 1,9 µg/dL

Prova Tetracosactídeo:

Cortisol 0’ 2,4 µg/dL

Cortisol 20’ 9,7 µg/dL

Cortisol 60’ 15 µg/dL

9 –52 ng/L

5 –25 µg/dL

Duplicação aos 20’

e >20 µg/dL

Hipocortisolismo hipocorticotrófico

(secundário)

Lactotrofo Prolactina 22,3 ng/mL 2,74-19,64 ng/mL Ligeiro aumento

QUADRO II

Page 11: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 33

referir que a hiponatrémia crónica associa-se a mecanismos compensatórios que limi-tam o edema cerebral, permintindo que ospacientes se mantenham assintomáticos atévalores natrémicos de 115-120mEq/L.Abaixo desses valores, exibem sintomasfrustes e inespecíficos como fadiga, náuseas,tonturas e distúrbios da marcha7,8,9 em con-cordância com o caso clínico apresentado.Interessante, salientar, que por razões malesclarecidas, as mulheres pré-menopaúsicastem menor capacidade de adaptação pas-sando rapidamente de sintomas benignoscomo cefaleias e náuseas para paragem res-piratória10. Perante uma situação de hipo-natremia crónica, é necessário fazer a repo-sição de sódio de forma lenta. O sistema deadaptação cerebral em curso, protector fren-te ao edema dificulta o tratamento podendomesmo complicá-lo com mielinólise hipe-rosmótica11.

A hiponatrémia sintomática como pri-meira manifestação de tumor hipofisário érara. Aparece essencialmente em doentescom mais de 70 anos, o que torna peculiaro caso exposto2. A hiponatrémia é nessescasos devida á insuficiência corticosupra-renal secundária que ocorre em 30% dosmacroadenomas12. Ocorre por diluição eresulta principalmente da diminuição deefeito de feedback negativo dos glicocorti-cóides sobre a HAD e/ou da diminuição dafiltração glomerular devido ao hipocorti-solismo.

Em análise do caso exposto é interessan-te relembrar que as alterações iónicas expli-cam-se parcialmente pela terapêutica comdiuréticos. De facto, a indapamida aoactuar na porção inicial do tubo contorna-do distal leva a deplecção de volume (comconsequente elevação de HAD e reabsorçãoproximal de sódio), deplecção de sódio porinibição directa da reabsorção no tubo con-tornado distal e deplecção de potássio(saída de ião intracelular para espaço extra-celular para manter carga eléctrica doscompartimentos). De referir também quepelo seu mecanismo de acção, a indapami-

da agravou a hiponatrémia secundária ainsuficiência adrenocortical ao contrário doque seria de esperar com os diuréticos daansa que interferem na capacidade deretenção da HAD5. De facto, os resultadosurinários confirmam a deplecção urináriade sódio e sugerem pelo facto de a osmola-ridade urinária ser superior a osmolaridadesérica, incapacidade renal em excretarágua. A realização de TAC-CE no SU foi oponto de partida para o estudo de outracausa para o desequilíbrio hidro-electrolíti-co observado e a hipótese de lesão hipofisá-ria mostrava-se verossímil.

O tamanho da hipófise varia com aidade, sexo, e estado fisiológico do indiví-duo13. A RM da sela turca é o exame comple-mentar de escolha para avaliar a glândulapituitária e caracterizar a extensão de umadenoma14. No entanto, a campimetria éessencial na avaliação e monitorização dodoente. A expansão do tumor, ao ultrapassara sela turca, pode comprimir o quiasma ópti-co ou mesmo invadir o seio cavernoso e ápexorbitário com perda progressiva da visão4.

A avaliação da actividade hormonal dosadenomas hipofisários passa pelo dosea-mento das hormonas que estão na depen-dência do eixo hipotálamo-hipófise mastambém na realização de provas endócrinasdinâmicas. Sabe-se que por exemplo o dosea-mento de cortisol sérico e urinário tem sensi-bilidade e especificidade limitada no diag-nóstico de insuficiência adrenal secundária15.As provas efectuadas posteriormente aointernamento em serviço de Medicina, foramrealizadas no serviço de Endocrinologia dosHospitais da Universidade de Coimbra apóssuspensão de terapêutica previamente insti-tuída. As provas efectuadas foram da hormo-na de libertação de tirotropina (TRH) e dotetracosactídeo.

A Hormona estimuladora da tiróide(TSH) é uma hormona produzida e libertadapelos tirotrofos. A sua secreção é dependenteda acção hipotalâmica (através da TRH) edas hormonas da tiróide. O teste com TRH éútil na avaliação da reserva hipofisária e

Page 12: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO34

pode-se realizar em casos de suspeita dehipotiroidismo de causa central (tumores,pós cirurgia ou radioterapia, e outras causasde hipopituitarismo). A administração de200 μg de TRH endovenosa (ev) deve nosindivíduos normais levar ao aumento deTSH, de 5UI/l ou de cerca de dez vezes o valorbasal dentro de quinze ou trinta minutos16.Nos casos de lesão hipofisária, a resposta ébaixa enquanto que na lesão do hipotálamoé observada uma resposta normal ou exage-rada. Contudo, refere-se que alguns indiví-duos com doença hipofisária podem respon-der à TRH e que os idosos ou indivíduosdeprimidos podem evidenciar resposta ina-dequada e de difícil interpretação16. Os resul-tados obtidos foram perfeitamente normais.

A prova do tetracosactídeo visa a estu-dar o eixo hipotálamo – hipófise – córtexsupra-renal. Apresenta boa sensibilidade eespecificidade quando comparado com oteste de tolerância de insulina18. Consiste naadministração ev ou intramuscular de 250μg de corticotropina ou tetracosactídeo composteriores doseamentos de cortisol aosvinte e sessenta minutos. Um valor plasmá-tico basal ou após estimulação superior ouigual a 20 μg/L torna pouco provável odiagnóstico de insuficiência adrenal.Valores inferiores a 9 μg/L indicam a neces-sidade de corticoterapia15. Os valores iniciaisbaixos de ACTH e de cortisol na doenteforam fortemente sugestivos de hipocortiso-lismo secundário. Enquadrados num con-texto clínico de encefalopatia metabólicagrave motivaram a administração de hidro-cortisona pelo que a prova do tetracosactí-deo efectuada depois desta atitude terapêu-tica tornou-se de difícil interpretação. Desalientar que os valores após estimulaçãomantiveram-se no entanto inferiores aovalor de corte de 20 μg/L.

CONCLUSÃO

O edema cerebral é a causa das manifes-tações neurológicas da hiponatrémia6,19,20,

sendo a gravidade dos sintomas directamen-te proporcional a rapidez de instalação dodistúrbio electrolítico. O interesse deste casoreside no facto da hiponatremia ter sido aprimeira manifestação da insuficiência dacortico-supra-renal secundária ao macroa-denoma hipofisário. As alterações hidro-electrolíticas observadas na avaliação ini-cial da doente podiam perfeitamente teremsido enquadradas num caso de iatrogeniasecundária a indapamida. A realização deTAC-CE é que orientou o diagnóstico descre-vendo uma massa selar. Este caso exemplifi-ca a importância muitas vezes esquecida daabordagem sistematizada da hiponatrémiaassim como da pesquisa de causas maisraras. De facto, o tratamento específico, diri-gido e atempado melhora significativamen-te o prognóstico dos doentes.

Page 13: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 35

BIBLIOGRAFIA

1. ht tp : / /emedic ine .medscape.com/ar t i -cle/242166-clinical (22/04/2011)

2. Veja J, et al. Hiponatremia sintomática comoforma de presentación clínica de un macroade-noma hipofisario. Comunicación de três casos.Rev Med Chile, 2009;137:1607-1612

3. ht tp : / /emedic ine .medscape.com/ar t i -cle/123223-overview (22/04/2011)

4. Kasper DL, Braunwald E, Fauci AS, Hauser SL,Longo DL e Jameson JL.. Harrison’s Principles ofInternal Medicine, 16tª Edição, 2005,McGraw-Hill, p2080-2084.

5. Abreu F, de Sousa FT e Prata MM. Hiponatrémia:abordagem clínica e terapêutica. MedicinaInterna 2001;8: 37-48.

6. Rose BD Post TW. Clinical Physiology of Acid-Base and Electrolyte Disorders, 5ª edição,2001, McGraw-Hill, p716-720 e p761-764.

7. Ellis, SJ. Severe hyponatraemia: Complicationsand treatment. QJM, 1995;88:905-909.

8. Sterns RH, Cappuccio JD, Silver SM, Cohen EP.Neurologic sequelae after treatment of severehyponatremia: A multicenter perspective. J AmSoc Nephrol, 1994;4:1522-1530.

9. Chow KM, Kwan BC, Szeto CC. Clinical studiesof thiazide-induced hyponatremia. J Natl MedAssoc 2004; 96:1305.

10. Ayus JC, Wheeler JM, Arieff AI. Postoperativehyponatremic encephalopathy in menstruantwomen. Ann Intern Med, 1992;117:891-7.

11. Lien YH, Shapiro JI, Chan L. Study of brain elec-trolytes and osmolytes during correction ofchronic hyponatremia. Implications for thepathogenesis of central pontine myelinolysis. JClin Invest, 1991;88:303-309.

12. Dorin RI, Qualls CR, Crapo LM. Diagnosis ofAdrenal Insufficiency. Ann Intern Med,2003;139:194-204.

13. Coronho V, Petroianu A, Santana EM, PimentaLG. Tratado de endocrinologia e cirurgia endó-crina, 1ª Edição, 2001,Guanabara-koogan,p761-772.

14. Tella OI, Herculano MA, Delcello R, Aguiar PH.Adenomas hipofisários produtores de ACTH,aspectos neurocirúrgicos. Arq Neuropsiquiatr,2002;60(1):113-118.

15. Alves M, Souto SB, Neves C, Carvalho Braga De Medina JL. Protocolo de diagnostico e trata-mento de insuficiência supra-renal aguda. Rev

Port Endocrinologia, diabetes e metabolismo,2008;1:23-29.

16. Spencer CA, Schwarzbein D, Guttler RB, et al.Thyrotropin (TSH)-releasing hormone stimula-tion test response employing third- and fourth-generation TSH assays. J Clin EndocrinolMetab, 1993;76:494-498.

17. Snyder PJ, Jacobs LS, Rabello MM, Sterling FH,et al. Diagnostic value of thyrotrophin-relea-sing hormone in pituitary and hypothalamicdiseases. Assessment of thyrotrophin and pro-lactin secretion in 100 patients. Ann InternMed, 1974; 81:751-757.

18. Agha A, Tomlinson JW, Clark PM, Holder G andStewart PM. The long-Term PredictiveAccuracy of the short Synacthen (corticotrop-hin) Stimulation Test for Assessment of theHypothamic-Pituitary-Adrenal axis. The Journalof clinical Endocrinology & Metabolism,2006;91(1):43-47.

19. Yeates KE, Singer M, Morton AR. Salt andwater: a simple approach to hyponatremia.CMAJ, 2004;170:365-367.

20. McManus ML, Churchwell KB, Strange K.Mechanisms of disease: Regulation of cell volu-me regulation in health and disease. N Engl JMed, 1995;333:1260-1267.

Page 14: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação
Page 15: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

37 ... 40

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 37

Tuberculose da glândula tiroideia em doentecom doença de GravesTuberculosis of the thyroid gland in a patientwith Graves’ disease

Maria Raquel Carvalho1, Catarina Guimarães2, Zulmira Jorge3, Dolores López Presa4,Isabel do Carmo5

1 Interna Complementar de Endocrinologia; Serviço de Endocrinologia Diabetes e Metabolismo; Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar

Lisboa Norte (CHLN) - EPE 2 Interna Complementar de Pneumologia; Serviço de Pneumologia; Centro Hospitalar de Coimbra - EPE3 Assistente Hospitalar; Serviço de Endocrinologia; Hospital de Santa Maria, CHLN-EPE4 Assistente Hospitalar; Serviço de Anatomia Patológica; Hospital de Santa Maria, CHLN-EPE5 Directora de Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo; Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN) - EPE

Correspondência: Maria Raquel Carvalho › Serviço de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo › Avenida Professor Egas Moniz › 1649-035

LISBOA › [email protected]

RESUMO

A tuberculose tiroideia é uma entidade clínica rara, que ocorre geralmente em contexto de

infecção sistémica por Mycobacterium tuberculosis. A apresentação clínica é variável mas, na

maioria dos casos, apresenta-se como uma massa cervical anterior.

Apresentamos o caso de uma mulher de 30 anos com doença de Graves em quem foi iden-

tificado granuloma tuberculoso na histologia da peça de tiroidectomia total.

A partir de uma breve revisão da literatura, chamamos a atenção para os aspectos particula-

res deste caso clínico.

PALAVRAS-CHAVE

Tuberculose; Granuloma; Tiróide; Hipertiroidismo.

ABSTRACT

Tuberculosis involving the thyroid gland has been infrequently reported and it usually occurs when

there is a systemic Mycobacterium tuberculosis infection. The clinical presentation is quite vari-

able but It usually presents as an anterior cervical mass.

We present the case of a 30-years-old woman with Graves’disease in whom the diagnosis of thy-

roid tuberculosis was made in the histopathologic exam of the thyroid gland.

We describe a brief literature review and enphasize the particular aspects of this clinical case.

KEYWORDS

Tuberculosis; Granuloma; Thyroid; Hyperthyroidism.

Page 16: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO38

INTRODUÇÃO

Em Portugal, a prevalência de tuberculo-se é de 23/100000 habitantes1. A infecção daglândula tiroideia por Mycobacterium tuber-

culosis é muito rara, mesmo em países emque a tuberculose é endémica. A glândulatiroideia pode ser infectada por via hemato-génea, por disseminação linfática ou porextensão directa a partir de nódulos linfáti-cos adjacentes infectados2. A apresentaçãoclínica é variável mas, na maioria dos casos,apresenta-se como uma massa cervicalanterior3. O diagnóstico é feito com a identi-ficação microbiológica ou pelos aspectos his-tológicos4. Quando não existe concentraçãosuficiente de bacilos, pode não conseguir-seidentificar o microorganismo. Este facto nãoimpede o diagnóstico, desde que os achadoshistológicos sejam específicos5.

O diagnóstico correcto é muito impor-tante para que se possa instituir terapêuticamédica específica e, nalguns casos, evitar oprocedimento cirúrgico.

Descrevemos o caso de uma doente comdoença de Graves em quem foi diagnostica-da tuberculose tiroideia no exame anatomo-histológico da peça de tiroidectomia total.

CASO CLÍNICO

Doente de sexo feminino de 30 anos,caucasiana, residente em comunidade ciga-na, sem antecedentes médicos relevantes.

Apresentava queixas de palpitações,hiperdefecação, hipersudorese, intolerânciaao calor, polifagia e perda ponderal de 3kgdesde os dois meses anteriores. Negavafebre, dor cervical ou outras queixas.

O exame objectivo evidenciou: bócioligeiro, sem nódulos ou massas anómalascervicais palpáveis, ausência de exoftalmia,frequência cardíaca de 95 bpm.

A avaliação bioquímica revelou: TSH <0,01 µU/mL (V.R.: 0,4-4,5 µU/mL), FT4 4 ng/dL(V.R.: 0,9-1,7 ng/dL), FT3 12 pg/mL (V.R.: 2-4,4pg/mL), TRAbs 13,2 U/L (V.R.: < 1,5 U/L).

A cintigrafia tiroideia com !!mTc (fig. 1)mostrou hipercaptação difusa do radionuclí-deo e a ecografia uma glândula difusamen-te aumentada, com margens regulares eheterogeneidade difusa do parênquima, semnódulos e sem adenomegalias cervicais.

A doente iniciou terapêutica com antitiroi-deus de síntese (propiltiouracilo) que mantevedurante dezoito meses. Passados doze meses adoença recidivou. Laboratorialmente: TSH <0,01 µU/mL (V.R.: 0,4-4,5 µU/mL), FT4 5,59ng/dL (V.R.: 0,9-1,7 ng/dL), FT3 13,4 pg/mL

FIGURA 1: Cintigrafia tiroideia com 99mTc

FIGURA 2: Granuloma epitelióide com necrose caseosa central

FIGURA 3: Granuloma epitelióide com necrose caseosa central

Page 17: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 39

(V.R.: 2-4,4 pg/mL), TRAbs 16,9 U/L (V.R.: < 1,5 U/L). Eco cervical sobreponível à ante-rior, nomeadamente sem evidência de ade-nopatias.

A doente foi proposta para terapêuticadefinitiva, tendo-se optado pela tiroidecto-mia total. O exame histológico da peça ope-ratória mostrou: “aspectos típicos da doen-ça de Graves e dois granulomas com necro-se caseosa central”. A pesquisa de microor-ganismos por métodos histoquímicos foinegativa (fig. 2 e fig. 3).

Nesta altura, foi encetada marcha diag-nóstica no sentido de avaliação de infecçãosistémica: prova tuberculínica 12 mm, teler-radiografia do tórax sem alterações pleuro-parenquimatosas, exame directo (Ziehl-Neelsen), PCR e culturas de expectoração,urina e sangue negativas para Micobacterium

tuberculosis, VS 14 mm/1ªh, ecografia abdo-minal sem alterações.

Foi, portanto, estabelecido o diagnósticode tuberculose tiroideia, sem evidência deenvolvimento sistémico.

A doente foi tratada com antibacilaresdurante nove meses.

COMENTÁRIO

Embora a infecção por Mycobacterium

tuberculosis seja relativamente frequente epossa localizar-se em qualquer órgão doorganismo, o envolvimento da glândulatiroideia é raro e a sua real incidência é des-conhecida. Postula-se que a glândula sejarelativamente resistente a esta infecção6.Esta “resistência” dever-se-á à acção bacteri-cida do material colóide, ao elevado fluxosanguíneo condicionador de um ambientealtamente oxigenado e finalmente à altaconcentração de iodo7. É mais frequente emmulheres de meia-idade8.

A tuberculose tiroideia pode ocorrer nocontexto de doença sistémica ou a glândulapode estar infectada de forma isolada3,9-10.Na nossa doente não foi identificada infec-ção em qualquer outra localização.

Na série publicada por Ozekinci et al11

onde os autores reviram mais de 800 peçasde tiroidectomia, são descritos os aspectosfundamentais e específicos da histologia datuberculose tiroideia, que encontrámos nanossa doente – necrose caseosa com granu-lomas. Nesta mesma série, em cinco doentesfoi diagnosticada tuberculose tiroideia ape-nas no exame histológico, à semelhança doque aconteceu na nossa doente.

A forma mais frequente de apresentaçãoda tuberculose tiroideia é sob a forma denódulo tiroideu isolado mas outras formasde apresentação como tirotoxicose, bóciodifuso, abcesso tiroideu e mesmo hipotiroi-dismo, já foram descritas10. O seu diagnósti-co é difícil e só raramente é considerado pré-operatoriamente, sobretudo em doentes semevidência de doença sistémica5.

Da revisão da literatura, não encontrá-mos outros casos de tuberculose tiroideiaem doente com doença de Graves. Emboraas manifestações clínicas da tuberculosetiroideia possam assemelhar-se às do hiper-tiroidismo, o quadro clínico e os achadosbioquímicos e histológicos descritos nanossa doente são inequivocamente diagnós-ticos de doença de Graves, o que o tornaespecialmente invulgar. Acreditamos que,neste caso, o diagnóstico de tuberculosetiroideia foi incidental na análise histológi-ca da tiroideia, mas permitiu que a terapêu-tica específica fosse instituída.

Parece-nos importante considerar estediagnóstico na avaliação histológica deuma peça de tiroidectomia, mesmo naausência de quadro de infecção sistémica,sobretudo em países com alta prevalênciade infecção por Mycobacterium tuberculosis eem doentes pertencentes a grupos de risco.

Page 18: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO40

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Relatório do Observatório Nacional dasDoenças respiratórias 2009, Portugal.

2 Kang M, Ojili V, Khandelwal N, Bhansali A.Tuberculous abcesso f the thyroid gland: areport of two cases. J Clin Ultrasound 2006;34: 254-7.

3 Tan KK. Tuberculosis of the thyroid gland – areview. Ann Acad Med Singapore. 1993; 22(4):580-2.

4 Bradley Paulino da Silva, Eurico GurgelAmorim, Elizabeth João Pavin, Antonio SantosMartins, Patrícia Sabino de Matos, DeniseEngelbrecht Zantut.Wittmann. Primary thyroidtuberculosis: a rare etiology of hypothyroidismand anterior cervical mass mimicking carcino-ma. Arq Bras Endocrinol Metab. 2009 53/4

5 Andrius Simkus. Thyroid tuberculosis. Medicina2004; 40: 201-4.

6 Barnes P, Weatherstone R. Tuberculosis of thethyroid gland: two case reports. Br J Chest1979; 73: 187-91.

7 Madhusudhan KS, Seith A, Khadgawat R, DasP, Mathur S. Tuberculosis of the thyroid gland:magnetic resonance imaging appearences.Singapore Med J. 2009 50(7): 235-8.

8 Abdulsalam F, Abdulaziz S, Mallik A, 2005Primary Tuberculosis of the Thyroid Gland. KMJ37: 116-118.

9 E Bulbuloglu, H Ciralik, E Okur, G Ozdemir, FEzberci, A Cetinkaya. Tuberculosis of the thy-roid gland: review of the literature. WorldJournal of Surgery, vol 30, 2, 149-55; 2006.

10 Ines Zendah, Hafaoua Daghfous, Sonia BemMrad, Fatma Tritar. Primary tuberculosis of thethyroid gland. Hormones. 2008; 7 (4): 330-3

11 Ozekinci S, Mizrak B, Saruhan G, Senturk S.Histopathologic diagnosis of thyroid tubercu-losis. Thyroid 2009 Sep; 19(9):983-6.

Page 19: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

41 ... 46

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 41

Hiperplasia Congénita da Supra-renal:quando o mesmo genótipo tem diferentesfenótipos…Congenital adrenal hyperplasia: when the samegenotype have different phenotypes…

Carolina Cordinhã2, Sofia Morais2, Rita Cardoso1, Lina Ramos3, Adelaide Taborda2, Alice Mirante1

1 Unidade de Endocrinologia Pediátrica do Hospital Pediátrico de Coimbra2 Serviço de Neonatologia, Maternidade de Bissaya Barreto – Coimbra3 Serviço de Genética Médica do Hospital Pediátrico de Coimbra

Correspondência: Carolina Cordinhã › Hospital Pediátrico de Coimbra › Avenida Afonso Romão › Santo António dos Olivais › 3000-602

COIMBRA [email protected]

RESUMO

A hiperplasia congénita da supra-renal (HCSR) engloba um grupo de patologias de transmissão

autossómica recessiva, resultantes da deficiência de uma de cinco enzimas, necessárias para a

esteroidogénese no córtex supra-renal. Podem considerar-se duas formas principais: a forma

clássica (que inclui as formas perdedora de sal e virilizante simples) e a forma não clássica.

Os autores descrevem o caso de uma menina com diagnóstico pré-natal de HCSR. A irmã,

actualmente com cinco anos de idade, apresenta o diagnóstico de HCSR forma virilizante

simples, efectuado aos 3 anos de idade por virilização dos genitais externos. O estudo mole-

cular efectuado confirmou a presença em heterozigotia composta das mutações patogénicas

g.999T>A e g.1762_1763insT do gene CYP21A2 compatível com deficiência de 21-hidroxi-

lase (associada mais frequentemente à forma virilizante simples).

A gravidez actual foi vigiada, tendo a mãe iniciado terapêutica com dexametasona oral às 8

semanas de gestação. O estudo molecular efectuado por amniocentese às 16 semanas de

idade gestacional, confirmou a presença das mutações anteriormente descritas num feto com

cariótipo 46, XX, pelo que a mãe manteve terapêutica até ao final da gravidez.

O parto foi eutócico às 38 semanas, e o recém-nascido apresentava genitais externos de con-

figuração feminina normal. Nas primeiras horas de vida, apresentou um quadro clínico de

sépsis, pelo que iniciou antibioterapia endovenosa e hidrocortisona 30mg/m2/dia. Ao 11º dia

de vida apresentou hiponatrémia acompanhada de hipercaliémia pelo que iniciou terapêuti-

ca com fludrocortisona (50 µg/dia) e suplemento oral de sódio. A evolução clínica foi favo-

rável, com melhoria franca do estado geral e recuperação ponderal progressiva.

A crise adrenal pode ocorrer nas formas virilizantes simples, em que existe um menor com-

promisso da actividade enzimática, nomedamente da produção de aldosterona. Neste caso

o factor desencadeante foi a sépsis neonatal.

PALAVRAS-CHAVE

Hiperplasia Congénita da Supra-renal; Défice de 21-hidroxilase; Perda de sal; Diagnóstico

pré-natal.

Page 20: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO42

INTRODUÇÃO

A hiperplasia congénita da supra-renal(HCSR) engloba um grupo de patologias detransmissão autossómica recessiva, resul-tantes da deficiência de uma de cinco enzi-mas, necessárias para a esteroidogénese nocórtex supra-renal. A forma mais frequenteresulta do défice de 21-hidroxilase e é res-ponsável por mais de 90% dos casos1.

Esta enzima é responsável pela conver-são de 17-hidroxiprogesterona (17HOP) em11-desoxicortisol - precursor do cortisol, epela conversão da progesterona em desoxi-corticosterona - precursor da aldosterona.Assim, este défice enzimático resulta nadiminuição da síntese do cortisol, que porum mecanismo de feed-back negativo doeixo hipotálamo-hipófise-supra-renal origi-na um aumento da secreção de hormonalibertadora de corticotrofina (CRH) e de cor-

ticotrofina (ACTH) com consequente esti-mulação da supra-renal. A hiperplasiasupra-renal resultante conduz à acumula-ção de precursores de cortisol, imediata-mente anteriores ao bloqueio, com desviopara a via de produção dos esteróidessexuais com aumento dos androgénios.

A produção de aldosterona poderá estarmais ou menos comprometida, consoante ograu de deficiência de 21-hidroxilase, resul-tando assim num espectro clínico de gravi-dade variável. Podem considerar-se duasformas principais: a forma clássica (queinclui formas perdedora de sal e virilizantesimples) e a forma não clássica1-3.

A forma clássica é um dos distúrbioshereditários mais comuns, com uma inci-dência global estimada de 1:16000 nadosvivos, variável de acordo com a raça e áreageográfica1,3. Esta forma é a mais grave ecursa com ambiguidade sexual no recém-

ABSTRACT

Congenital adrenal hyperplasia (CAH) represents a group of autosomal recessive disorders result-

ing from the deficiency of one out of five enzymes of adrenal steroidogenesis. There are two main

clinical varieties: the classic (including the salt-losing and simple virilizing) and the non-classic

variety.

The authors present the clinical case of a girl with prenatal CAH diagnosis. Her five year old sister,

had a CAH diagnosis (a simple virilizing form) done at the age of three years because of signs of

virilization. The genetic testing revealed two pathogenic mutations g.999T>A and

g.1762_1763insT of CYP21A2 gene most frequently associated with the simple virilizing form of

the disease.

This was an uneventful pregnancy and the maternal dexamethasone therapy was initiated at 8

weeks of gestation. The prenatal diagnosis confirmed the presence of the same mutations in the

fetus with a 46, XX karyotype and the treatment was maintained till the end of the pregnancy.

The child was born at 38 weeks with normal feminine external genitalia. In the first few hours pre-

sented with clinical signs of sepsis being treated with antibiotics and hydrocortisone 30mg/m2 per

day. On day eleven because she presented with hyponatremia and hyperkalemia fludrocortisone

(50 µg per day) and sodium were added. The clinical evolution was favorable.

The adrenal crisis can happen in the simple virilizing forms under stress which was the case of the

neonatal sepsis in our girl.

KEY-WORDS

Congenital adrenal hyperplasia; 21-Hydroxilase deficiency; Salt-losing; Prenatal diagnosis.

Page 21: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 43

nascido (RN) do sexo feminino; a produçãoandrogénica excessiva condiciona grausvariáveis de virilização in utero, desde sim-ples clitoromegália a genitais externos feno-tipicamente masculinos3. Nos RN do sexomasculino, os genitais externos não sãogeralmente afectados, embora possa verifi-car-se hiperpigmentação escrotal ouaumento das dimensões do pénis.

Cerca de 75% dos pacientes com aforma clássica têm uma produção inade-quada de aldosterona (formas com perda desal). Esta deficiência de mineralocorticóidemanifesta-se habitualmente como umacrise perdedora de sal, entre a primeira e aterceira semanas de vida, embora a hiper-caliémia isolada possa já estar presenteentre o terceiro e o quinto dia e a hiponatré-mia entre o quarto e o sétimo dia de vida.Clinicamente caracteriza-se por um quadrode náuseas, vómitos, anorexia, letargia,choro fraco, dificuldades alimentares, máevolução ponderal e desidratação, podendoocorrer hipotermia, arritmias, hipotensão echoque. Analiticamente caracteriza-se porhiponatrémia, hipercaliémia, hipoglicemiae acidose metabólica1,3.

Além das formas perdedoras de sal, acrise adrenal pode ocorrer na forma virili-zante simples, em que existe um menorcompromisso da actividade enzimática,nomeadamente da produção de aldostero-na. Esta situação poderá ocorrer em situa-ções de stress (infecção, febre, diminuiçãoda ingesta de sal).

A forma não clássica, menos severa é deapresentação mais tardia, fora do períodoneonatal. Manifesta-se por sinais de excessode androgénios mas sem ambiguidade geni-tal no RN. Na infância pode ser causa depuberdade precoce (com aceleração do cresci-mento e avanço da idade óssea), podendocomprometer a estatura final pelo encerra-mento epifisário prematuro. Em adolescentese em mulheres adultas pode ser responsávelpor hirsutismo, acne, irregularidades mens-truais e infertilidade sendo que alguns indiví-duos afectados permanecem assintomáticos2,3.

A anomalia bioquímica característicada forma clássica de HCSR é o aumento dosníveis séricos de 17HOP.

O gene responsável pela deficiência em21-hidroxilase (CYP21) está localizado em6p21.3. sendo que próximo do gene funcio-nal localiza-se um pseudogene (CYP21P ouCYP21A) com variadas mutações, incompa-tíveis com uma normal expressão do gene;esta disposição genómica particular e o ele-vado grau de homologia entre os dois genes(superior a 90%) predispõe a mutações dogene funcional por conversão génica ou pordeleção no contexto de recombinaçãohomóloga e crossing-over desigual1-3.

Existe uma boa correlação genótipo -fenótipo nas formas mais graves, o quepode não acontecer nas restantes, nãosendo por isso fácil predizer o fenótipo apartir da mutação específica identificada.

A terapêutica com glicocorticóides temcomo objectivos reduzir a hipersecreção deCRH, ACTH e androgénios, optimizandodessa forma o crescimento e permitir umamaturação sexual normal protegendo acapacidade reprodutora.

Pela semi-vida curta e efeito supressordo crescimento mínimo, a droga de escolhana infância é a hidrocortisona oral 15-25mg/m2/dia, dividida em três tomas diárias.Em situações de stress ligeiro a moderado(febre) a dose de manutenção deve serduplicada ou triplicada1,3,5-8.

A terapêutica com mineralocorticóide,apesar de geralmente desnecessária duranteo tratamento com doses de stress de hidro-cortisona revela-se benéfica nas formas come sem perda de sal, ao reduzir os níveis deACTH e as necessidades de glicocorticóide. Adroga de escolha é a fludrocortisona 0,05 a0,3 mg/dia1,3,5-8.Quando se confirma perdade sal, a reposição com suplementos de clo-reto de sódio é mandatória nos primeirosdois anos de vida (1-3 g/dia, equivalente a17-51 mEq/dia)1,3,5-8.

A avaliação da terapêutica é efectuadapela monitorização dos níveis séricos deACTH, 17HOP, DHEA, androstenediona e

Page 22: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO44

actividade da renina plasmática.A abordagem destas situações requer a

intervenção de uma equipa multidisciplinarexperiente (Endocrinologista Pediátrico,Geneticista e nas situações de ambiguidadesexual Cirurgião/Urologista Pediátrico ePsicólogo), não só pela complexidade quecomportam como pela envolvência psicos-social e cultural, que geralmente condicionainterferência significativa na dinâmicafamiliar.

Os autores descrevem o caso clínico deum RN com diagnóstico pré-natal de HCSR,com genótipo semelhante ao da irmã mascom diferente manifestação fenotípica.

CASO CLÍNICO

Apresenta-se o caso clínico de um RN dosexo feminino, fruto da segunda gestaçãode um casal jovem e não consanguíneo,cuja irmã, actualmente com cinco anos deidade, apresenta o diagnóstico de HCSRforma virilizante simples, efectuado aos trêsanos de idade por virilização dos genitaisexternos. O estudo molecular efectuadoconfirmou a presença em heterozigotiacomposta das mutações patogénicasg.999T>A e g.1762_1763insT no geneCYP21A2 compatível com deficiência de 21-hidroxilase (associada mais frequentementeà forma virilizante simples). Foi submetidaa clitoroplastia de redução e vulvovagino-plastia aos quatro anos.

A gravidez actual foi vigiada, tendo amãe iniciado terapêutica com dexametaso-na oral às 8 semanas de gestação. As serolo-gias foram negativas e as ecografias pré-natais foram descritas como normais. Oestudo molecular efectuado por amniocente-se às 16 semanas confirmou a presença dasmutações anteriormente descritas num fetocom cariótipo 46, XX, pelo que a mãe man-teve terapêutica até ao final da gravidez.

O parto foi eutócico, às 38 semanas degestação sem referência a factores de riscoinfeccioso perinatal. Nasceu hipotónica,

mas sem necessidade de reanimação e comsomatometria adequada à idade gestacio-nal (peso: 3785g (P75), comprimento: 51 cm(P75) e perímetro craniano: 37,5 cm (P90-95).Apresentava genitais externos de configura-ção feminina normal, sem qualquer sinalde virilização.

Foi internada às oito horas de vida naUnidade de Cuidados Intensivos Neonatais(UCIN) por quadro de hipotonia, dificulda-des nas mamadas e hipoglicémia (glicémiacapilar: 40 mg/dL).

À entrada na UCIN constatada febre(temperatura axilar 38ºC), estando hemodi-namicamente estável. Encontrava-se hipo-tónica, com choro débil e com fraca mobili-dade espontânea mas reactiva à manipula-ção. Ao exame objectivo verificou-se aindapalidez cutânea, gemido e polipneia porperíodos, com auscultação pulmonar nor-mal. Analiticamente apresentava PCR de2,3 mg/dL, com hemograma e ionogramasem alterações significativas (Quadro I). Foiinstituída antibioterapia com Ampicilina(100 mg/Kg/dia) e Gentamicina (4mg/Kg/dia) e iniciou terapêutica com hidro-cortisona 30 mg/m2/dia.

Verificou-se uma estabilização cardiorres-piratória progressiva (FiO2 máx 23-25% paraSpO2 ≥ 92% apenas nas primeiras sete horasde internamento). Iniciou alimentação ente-ral no segundo dia de vida, com boa tolerân-cia mas manteve dificuldades alimentarescom fraca sucção, associada a perda ponde-ral (peso mínimo aos sete dias de 3390g,menos 10% do peso de nascimento).

Cumpriu oito dias de antibioterapia

D1 D2 D4 D9 D11

Glicose (mmol/L) 1.9 3.8 3.6 4.1

Ureia (mmol/L) 2.9 2.9 3.0 4.0 5.4

Creatinina (mmol/) 86 90 55 52 58

Na+ (mmol/L) 138 141 146 133 131

K+ (mmol/L) Hemolisada 4.3 4.1 5.8 5.9

QUADRO I: Evolução analítica em função dos dias de vida.

Page 23: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

tendo sido a hemocultura negativa. Ao nonodia de vida a avaliação analítica revelousódio 133 mmol/L e potássio 5,8 mmol/L.Atendendo ao ganho ponderal insuficiente eà subida da caliémia, foi colocada a hipóte-se de se tratar de uma forma clássica deHCSR perdedora de sal. A D11 verificou-sehiponatrémia (sódio 131 mmol/L), com cor-tisol baixo, 17OHP, testosterona e androste-nediona aumentadas e aumento da activi-dade da renina plasmática (Quadro II).

Iniciou então terapêutica com fludrocor-tisona (50 μg/dia) e suplemento oral desódio (11 mEq/Kg/dia). A evolução clínicafoi favorável, com melhoria franca do esta-do geral e recuperação ponderal progressi-va. Teve alta para o domicílio aos 18 dias devida, sob terapêutica com hidrocortisona,fludrocortisona e NaCl, a mamar ao seiomaterno de forma competente e com pesosemelhante ao peso de nascimento.

Nas consultas de seguimento tem apre-sentado boa evolução ponderal com iono-grama sérico e doseamentos hormonaisadequados.

DISCUSSÃO

A HCSR é a causa mais comum de ambi-guidade sexual. A avaliação do RN comambiguidade genital deve ser tão precoce

quanto possível, dada a necessidade dediagnosticar atempadamente HCSR, entida-de clínica potencialmente fatal nas formasperdedoras de sal.

O diagnóstico pré-natal deve ser ofereci-do aos casais identificados como heterozigo-tos. Nestes casos, apesar de ainda ser con-troverso, pode ser oferecido o tratamento àmulher grávida com dexametasona, deven-do ser iniciado o mais precocemente possí-vel (sempre antes das 10 semanas e prefe-rencialmente antes das sete a oito semanasde gestação), de forma a suprimir a produ-ção androgénica fetal, impedindo a viriliza-ção fetal1,3-7. No entanto, a segurança do tra-tamento a longo prazo não está completa-mente estabelecida, devendo ter-se em con-sideração os potenciais efeitos adversos daterapêutica para a mãe (aumento excessivode peso, estrias, edema, Síndrome deCushing) e para o feto (aborto espontâneo,morte fetal tardia, restrição de crescimentointra-uterino, esteatose hepática, sépsis, máprogressão ponderal pós-natal, hidrocefa-lia, agenesia do corpo caloso, atraso dodesenvolvimento, dificuldades de aprendi-zagem)1,3-7.

A maternidade central em que foi segui-da a gravidez do nosso caso clínico efectuaeste tipo de terapêutica, sendo oferecida aospais a possibilidade de determinação dosexo fetal no sangue periférico após as 8semanas. A terapêutica é descontinuada seo feto for do sexo masculino. O diagnósticomolecular é feito por biópsia de vilosidadescoriónicas ou amniocentese e a confirma-ção do défice de 21-hidroxilase implica acontinuação do tratamento até ao final dagravidez nos fetos do sexo feminino.

A família descrita é paradigmática emdiversos aspectos respeitantes ao diagnósti-co e abordagem da HCSR por défice de 21-hidroxilase.

A presença de um caso índex permitiu arealização do tratamento e diagnóstico pré-natal acima descritos com bons resultadospara a nossa doente (impedindo a viriliza-ção fetal) o que se verifica em cerca de 70 a

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 45

D2 D11 D26 D66

17OHP (ng/mL)N: 7-77

240 18,3 1,82

Testosterona Total (ng/dL)N: 20-64

95.1 <20 ---

Androstenediona (ng/mL)N: 0.2-2.9

9.5 1,0 <0,3

DHEA-SO4 (µg/dL)N: 5-111

20.8 <15 <15

ACTH (pg/mL)N: 10-60

50.2 52.1 21.4 10

Renina activa (µUI/mL)N: 4.4-46.1

267 > 500 > 1000 > 2500

QUADRO II: Evolução dos doseamentos hormonais com referênciaaos valores normais.

Page 24: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO46

85% dos fetos femininos afectados3-7.No entanto os autores discutem se a

ocorrência de sépsis neste caso poderá estarassociada à corticoterapia prévia.

Este caso é também ilustrativo da varia-bilidade de expressão fenotípica da doença,dada a não correlação entre as manifesta-ções clínicas e as mutações em causa. Assim,e apesar do mesmo diagnóstico molecularem ambas as irmãs (compatível com aforma virilizante simples), o quadro clínicofoi distinto. Como já anteriormente descritona literatura, pretendemos com este caso cli-nico salientar o facto da crise adrenal poderocorrer nas formas virilizantes simples emsituações de stress e que neste caso o factordesencadeante foi a sépsis neonatal.

É fundamental que, para além de man-ter uma vigilância clínica e laboratorial cui-dadosas dos pacientes, se faça a confirma-ção molecular nos mesmos e se realize estu-dos de heterozigotia nos progenitores e fami-liares em risco que permita um aconselha-mento genético adequado e opções reprodu-tivas. Principalmente em países que, talcomo Portugal, não efectuam rastreio neo-natal desta patologia o conhecimento ante-cipado do risco de recorrência é muitoimportante1-3,6.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Speiser PW, White PC. Congenital AdrenalHyperplasia. N Engl J Med 2003; 349:776-88

2. Merke DP. Genetics and clinical presentation ofclassic congenital adrenal hyperplasia due toCYP21A2 (21-hydroxylase) deficiency. Acessívelem www.uptodate.com. Last update data:Janeiro 2008

3. Antal Z, Zhou P. Congenital adrenal hyperpla-sia: diagnosis, evaluation, and management.Pediatrics in Review. 2009;30:e49-e57.

4. Merke DP. Diagnosis of classic congenital adre-nal hyperplasia due to CYP21A2 (21-hidroxilase)deficiency. Acessível em www.uptodate.com.Last update data: Outubro 2007

5. Merke DP. Treatment of classic congenitaladrenal hyperplasia due to CYP21A2 (21-hydroxylase) deficiency in infants and children.Acessível em www.uptodate.com. Last updatedata: Abril 2008

6. Joint LWPES/ESPE CAH working group.Consensus statement on 21- HydroxylaseDeficiency from the Lawson Wilkins PediatricEndocrine Society and The European Societyfor Paediatric Endocrinology. J Clin EndocrinolMetab 2002;87(9):4048-4053

7. American Academy of Pediatrics: Section onEndocrinology and Committee on Genetics.Technical Report: Congenital AdrenalHyperplasia. Pediatrics 2000;106(6):1511-1518

8. Houk CP, Levitsky LL. Management of theinfant with ambiguous genitalia. Acessível emwww.uptodate.com. Last update data:Fevereiro 2008

9. Study of a kindred with Classic CongenitalAdrenal Hyperplasia: diagnostic challenge dueto phenotypic variance. Chin D et al. J ClinEndocrinol Metab. 83 (6): 1940-45.

10. Wedell A, Thilen A, Ritzen EM, Stengler B,Luthman H. 1994 Mutational spectrum of thesteroid 21-hydroxylase gene in Sweden: impli-cations for genetic diagnosis and associationwith disease manifestation. J Clin EndocrinolMetab.78: 1145-1152.

11. Wilson RC, Mercado AB, Cheng KC, New MI.1995 Steroid 21-hydroxylase deficiency: geno-type may not predict phenotype. J ClinEndocrinol Metab.80: 2322-2329.

12. Bormann M, Kochhan L, Knorr D, BidlingmaierF, Olek K. 1992 Clinical heterogeneity of 21-hydroxylase deficiency of sibs with identical21-hydroxylase genes. Acta Endocrinol

(Copenh). 126:7-9.

Page 25: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

47 ... 52

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 47

Hepatic glycogenosis as a cause of hepato-megaly in children and adolescents withtype 1 diabetes mellitusGlicogenose hepática: causa de hepatomegáliaem crianças e adolescentes com diabetes mellitustipo 1

Tânia Russo1, Bruno Arroja2, Cristina Amado3, Filipe Silva4, Ester Gama5

1 Interna da Formação Específica em Pediatria, Serviço de Pediatria, Hospital de Santo André, EPE, Leiria, Portugal2 Interno da Formação Específica em Gastrenterologia, Serviço de Gastrenterologia, Hospital de Santo André, EPE, Leiria, Portugal3 Assistente Graduada do Serviço de Patologia Clínica, Hospital de Santo André, EPE, Leiria, Portugal4 Assistente Hospitalar do Serviço de Gastrenterologia, Hospital de Santo André, EPE, Leiria, Portugal5 Assistente Graduada do Serviço de Pediatria, Hospital de Santo André, EPE, Leiria, Portugal

Correspondência: Tânia Russo › Av. Dr. Fernando Ricardo Ribeiro Leitão, 13-1º Direito Massamá 2745-772 QUELUZ › Portugal ›

[email protected]

SUMMARY

Secondary hepatic glycogenosis is an underrecognized complication of long-standing type 1 dia-

betes. It has been described as the first cause of hepatomegaly in children and adolescents with

type 1 diabetes and poor metabolic control. It must be distinguished from other causes of

hepatomegaly and elevated liver enzymes such as nonalcoholic fatty liver disease. The authors

report the case of a fifteen-year-old male with type 1 diabetes for 4 years and not compliant to

treatment who presented with hepatomegaly and elevated liver enzymes. Other possible causes

were excluded. Liver biopsy confirmed periodic acid-Schiff-positive deposits of glycogen in cyto-

plasm and nuclei. During follow-up, a correlation between better metabolic control and reduction

in liver size and enzyme levels has been shown. In most cases secondary glycogenosis is reversible

with adequate glycemic control. The performance of liver biopsy remains a matter of controversy.

KEY-WORDS

Glycogenosis; Glycogen; Diabetes mellitus type 1; Hepatomegaly; Child.

RESUMO

A glicogenose hepática secundária é uma complicação subdiagnosticada da diabetes mellitus

tipo 1 de longa duração. É descrita como primeira causa de hepatomegália em crianças e ado-

lescentes com diabetes mellitus tipo 1 de longa duração e mau controlo metabólico. Deve ser

diferenciada de outras causas de hepatomegália e elevação das enzimas hepáticas, como

esteatose hepática não alcoólica. Os autores descrevem o caso de um rapaz de 15 anos com

diabetes tipo 1 com 4 anos de evolução e má adesão à terapêutica, que surgiu com hepato-

megália e elevação das enzimas hepáticas. Foram excluídas outras causas possíveis. A biópsia

hepática confirmou a presença de depósitos citoplasmáticos e intranucleares de glicogénio

positivos na coloração por PAS (periodic acid-Schiff). Verificou-se correlação entre períodos de

melhor controlo metabólico e diminuição das dimensões hepáticas e dos níveis enzimáticos. A

Page 26: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO48

INTRODUCTION

Diabetes mellitus (DM) is a systemic dis-ease which may cause several hepaticchanges. Non-alcoholic fatty liver disease(NAFLD), which comprises steatosis andsteatohepatitis (NASH), occurs mostly in type2 diabetes and is associated with obesity andinsulin resistance1-5. Secondary hepaticglycogenosis has been considered a rare con-dition; yet, it has been described as the firstcause of hepatomegaly in children and ado-lescents with poorly controlled long-standingtype 1 diabetes, although it can also occur inpatients with type 2 diabetes1-3,6,7. The impor-tance of distinguishing between NAFLD andsecondary glycogenosis is that the formermay progress to irreversible fibrosis and cir-rhosis, whereas the latter has a better prog-nosis, being reversible upon optimization ofglycemic control1-7.

We report the case of a 15 year-old malewith poorly controlled type 1 diabetes whopresented with hepatomegaly and elevatedtransaminases.

CASE REPORT

A 15-year-old boy with type 1 DM pre-sented at one of his regular visits at our hos-pital with hepatomegaly extending 3 cm

below the right costal margin and elevatedtransaminases. Diabetes had been diag-nosed at the age of eleven, but soon after thediagnosis he started to evidence poorglycemic control [glycosylated hemoglobinfraction (HbA1c) 8,2-11,0%] with frequentepisodes of hyperglycemia. He often skippedinsulin administrations and needed highdoses of insulin due to excessive food intake.Three years after diagnosis, his blood testsrevealed hyperlipidemia for the first time[total cholesterol 232 mg/dL, low-densitylipoprotein (LDL)-cholesterol 104 mg/dL andtriglycerides 443 mg/dL).

The patient referred no symptoms andhad no history of alcohol or narcotic abuseor regular use of any other medicationbesides insulin. The family history was unre-markable. He appeared well nourished, hisweight was 66 kg (75th percentile), theheight was 169,5 cm (between 25th and50th percentiles) and the body mass index(BMI) was 23,0 kg/m2 (between 75th and85th percentiles). He had a normal pubertaldevelopment. There were no other remark-able findings on physical examination.

By then, he was on multiple daily injec-tions (MDI) treatment with premeal lisproinsulin and neutral protamine Hagedorn(NPH) insulin before breakfast and before sup-per (insulin sensitivity factor 15 mg/dL,insulin-to-carbohydrate ratio 3 U/1 exchange)at a total dose of 1,4 U/kg/day.

glicogenose hepática secundária é reversível mediante controlo glicémico adequado. A indica-

ção para realização de biópsia hepática não é consensual.

PALAVRAS-CHAVE

Glicogenose; Glicogénio; Diabetes mellitus tipo 1; Hepatomegália; Crianças.

ABBREVIATIONS

DM, diabetes mellitus; NAFLD, non-alcoholic fatty liver disease; NASH, non-alcoholic steatohepa-

titis; HbA1c, glycosylated hemoglobin fraction; LDL, low-density lipoprotein; BMI, body mass

index; MDI, multiple daily injections; NPH, neutral protamine Hagedorn; AST, aspartate transami-

nase; ALT, alanine transaminase; GGT, gamma-glutamyl transferase; PAS, periodic acid-Schiff.

Page 27: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

On laboratory examination, completeblood count was normal and transaminaseswere elevated [aspartate transaminase (AST)343 U/L, alanine transaminase (ALT) 384U/L]; HbA1c was 10,8%. Abdominal ultra-sound demonstrated enlarged liver with reg-ular contour and homogenously reflectiveechostructure, suggesting moderate steato-sis, and also homogenous splenomegaly.

Because of persistence of poor metaboliccontrol (in spite of insulin treatment with 1,7U/kg/day), hepatomegaly and further rise oftransaminases (AST 1236 U/L, ALT 925 U/L),he was admitted in our Pediatric ward forinvestigation and optimization of glycemiccontrol, with collaboration of the Gastroen -terology Department. The following hypothe-ses were considered: non-alcoholic steatohep-atitis (NASH), hepatitis (viral or auto-immune) and metabolic or infiltrative hepat-ic disease. Liver function tests except fortransaminases and gamma-glutamyl trans-ferase (GGT) were within reference range(Tables I and II). Viral serologies and autoim-munity antibodies were negative (Table II).Metabolic disorders such as hemochromato-sis, Wilson's disease and alpha-1 antitrypsindeficiency were ruled out (Table II).

Subsequent diagnostic work-up includedan abdominal ultrasound with Doppler thatgave no additional information, and a percu-taneous liver biopsy which showed moderateto severe homogenous macrovesicular steato-sis (60-70%) without fibrosis and a largenumber of hepatocytes with periodic acid-Schiff (PAS)-positive intranuclear glycogendeposits (Figure 1). Hepatic copper was with-in normal range (9,0 µg/g of dry liver; refer-ence range <50 µg/g). At this point hepaticglycogenosis secondary to poor glycemic con-trol was the most likely diagnosis.

Under a tight control of food intake andsupervised insulin treatment, there was agradual improvement of glycemic valueswith lower insulin dose requirement andreduction of lipid and liver enzymes levels(Table I). Hepatomegaly decreased progres-sively until it was no longer detected on

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 49

TABLE I: Evolution of laboratory tests performed during first hospi-tal admission, demonstrating reduction of the levels of liver enzy-mes and lipids.

AST(U/L)

ALT (U/L)

GGT(U/L)

Chol(mg/dL)

TG(mg/dL)

Day 1 541 549 NP NP NP

Day 5 426 503 290 252 296

Day 9 175 291 235 178 152

Referencerange

10 – 47 14 – 72 15 – 73 <201 35 – 160

TABLE II: Results of laboratory investigations.

ResultsReferencerange

Liver tests

ALP (U/L) 155 130 - 525

Total bilirubin (µmol/L) 11 0 - 24

Albumin (g/dL) 4,7 3,9 – 5,0

Prothrombin time (sec) 11,45 C = 13,35

Viral serologies

HAV, HBV, HCV Negative

EBV, CMV, HSV 1 and 2Negative for acute

infection

Autoimmunity tests

ANA Negative

ASMA Negative

Anti-LKM antibody Negative

Anti-LC1 antibody Negative

SLA Negative

AMA Negative

Other tests

Lactic acid (mmol/L) 2,3 0,7 – 2,1

Ammonia (µmol/L) 4 9 – 33

Alpha-1 AT (mg/dL) 99 93 – 220

Copper, serum (µg/dL) 143 70 – 140

Copper , urine (µg/L) 8,6 2,0 – 80,0

Ceruloplasmin (mg/dL) 50 22 – 58

Iron (µmol/L) 25,9 8,8 – 32,4

Ferritin (ng/mL) 242 20 – 250

TIBC (µmol/L) 66,9 46,8 – 82,7

Transferrin saturation (%) 38,7 20,0 – 50,0

ALP – alkaline phosphatase; C – control; HAV – hepatitis A virus; HBV – hepa-titis B virus; HCV – hepatitis C virus; EBV – Epstein-Barr virus; CMV – cytome-galovirus; HSV – herpes simplex virus; ANA – antinuclear antibody; ASMA –anti-smooth muscle antibody; LKM – liver-kidney microsomal; LC1 – livercytosol 1; SLA – soluble liver antigen; AMA – anti-mitochondrial antibody;Alpha-1 AT – alpha-1 antitrypsin; TIBC ¬– total iron binding capacity.

AST – aspartate transaminase; ALT – alanine transaminase; GGT – gamma-gluta-myl transferase; Chol – total cholesterol; TG – triglycerides; NP – not performed.

Page 28: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO50

physical examination on the 9th day after

admission. He was discharged home on the

12th day after admission.

Since the diagnosis, the patient has had

periods of reasonable metabolic control

interspersed with others of poor metaboliccontrol, in spite of optimization of insulintreatment (insulin glargine as basal insulinand lispro as premeal insulin, institutedseven months after initial signs), which he isstill not compliant to. Those periods of betterglycemic control are accompanied by reduc-tion in liver size and liver enzyme levels(Table III), although maintaining palpablehepatomegaly and hepatic steatosis patternon abdominal ultrasound.

DISCUSSION

Secondary hepatic glycogenosis is char-acterized by accumulation of glycogen inthe cytoplasm and nuclei of hepatocytes. Itis associated with long-standing type 1 DMand poor metabolic control. Two possiblemechanisms have been implicated: repeat-ed episodes of hyperglycemia and adminis-tration of high doses of insulin1,3,7,8.

Glucose enters the hepatocyte via pas-sive diffusion, independent of insulin1-5,8.Once in the cell, it is converted into glucose-6-phosphate by glucokinase and is therebytrapped in the hepatocyte, increasing itsintracellular concentration4,5,9. Subsequently,it is transformed into glycogen via glycoge-nesis2,9. Glycogen synthase, the rate-limitingenzyme in this process, is enhanced byexcessive amount of insulin administered tocope with hyperglycemia, and also by highcytoplasmic glucose4,5,7. On the other hand,in case of insufficient insulin, as occurs indiabetic ketoacidosis, lipolysis is promoted,

TABLE III: Laboratory test results during follow-up in the period ofbest and worst metabolic control (respectively 12 and 18 monthsafter onset of symptoms). There is correlation between lowerHbA1c and lower levels of liver enzymes.

Best control Worst control

HbA1c (%) 8,8 10,2

AST (U/L) 133 929

ALT (U/L) 175 1384

GGT (U/L) 168 783

HbA1c – glycosylated hemoglobin fraction; AST – aspartate transaminase;ALT – alanine transaminase; GGT – gamma-glutamyl transferase.

FIGURE 1: Liver histology. (A) Macrovesicular steatosis (hematoxylinand eosin). (B) Enlarged nuclei (arrows) with peripherally displacedmaterial suggesting accumulation of substance inside (hematoxylinand eosin). (C) Abundant cytoplasmic and nuclear (arrows) glycogendeposits demonstrated by periodic acid-Schiff stain.

Page 29: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos ClínicosREVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO 51

which accounts for hyperlipidemia1. Ketonebodies stimulate synthesis of cortisol, whichfurther enhances hyperglycemia and lipoly-sis1. The balance between glycogenesis andglycogenolysis, essential for determining anormal level of hepatic glycogen, is dis-turbed by frequent hypoglycemia andhyperglycemia often seen in poorly con-trolled diabetic patients2,9.

Glycogen hepatopathy may manifestclinically by abdominal pain, early satiety,hepatomegaly and occasionallysplenomegaly1,3. The short stature, delayedsexual development and cushingoidappearance which characterize Mauriacsyndrome, not present in our patient, arisein response to elevated cortisol alreadydescribed1,4,5,9. The intracellular accumula-tion of glycogen causes cell lesion and con-sequent rise of transaminase levels of vari-able range (50 – 1600 U/L)1,9. It is not usual-ly accompanied by abnormalities in otherliver function tests, such as albumin or pro-thrombin time1,5. All these changes arereversible after optimization of metaboliccontrol, in a period varying from 2 to 14weeks2,4,5,9. Although this was never achievedin our patient, we verified correlationbetween periods of improved control andreduction in liver size and levels of liverenzymes. Therefore, in face of the risk ofhepatic glycogenosis and NAFLD, screeningfor liver enzymes, particularly transaminas-es, is recommended in a patient with type 1DM with hepatomegaly, dyslipidemia orpoor metabolic control.

The investigation of hepatomegaly andraised transaminases presenting in a type 1diabetic child or adolescent should rule outdiseases such as viral hepatitis, auto-immune or toxic hepatitis, hemochromato-sis, Wilson’s disease and other metabolic orinfiltrative hepatic diseases4. Clinical dataare usually enough for excluding primaryglycogen storage disease5,7.

The performance of liver biopsy remainsa matter of controversy in the literature.Some authors defend its absolute need for

distinction between hepatic glycogenosisand NAFLD, which is impossible on clinicalgrounds, and for information on prognosis3.Others prefer delaying this invasive proce-dure until diagnosis of secondary glycogeno-sis is supported by reversal of the clinicaland laboratory findings upon attainment ofa correct metabolic control1,2,4,7. Consideringthe lack of consensus about this issue andthe fact that our patient never achieved alasting euglycemic period, we decided to per-form liver biopsy, which allowed definitivediagnosis by demonstrating accumulationof glycogen in cytoplasm and nuclei ofhepatocytes. Characteristically, fibrosis andnecrosis are absent or insignificant1,5,9.Concomitant steatosis has been reported inthe literature in 10 to 50% cases1,7,9. In thiscase, given the presence of hyperlipidemia,coexistence of steatosis was not surprising,which might worsen prognosis.

In summary, this case report contributesto emphasizing the importance of second-ary hepatic glycogenosis as a possible underrecognized entity in children and adoles-cents with poorly controlled type 1 diabeteswho present with hepatomegaly and raisedtransaminases. Unlike NAFLD and otherhepatopathies, it has a good prognosis andis reversible after optimization of metaboliccontrol.

Page 30: Síndrome de Léri-Weill – da deformidade de Madelung ao ...repositorio.hospitaldebraga.pt/bitstream/10400.23/114/1/Síndrome d… · mento mesomélico, cubitus valgus, sublu-xação

Casos Clínicos REVISTA PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO | 2011 | 01

© 2011 – SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENDOCRINOLOGIA, DIABETES E METABOLISMO52

REFERENCES

1. Bastardas MF, Barba MM, Cumeras AR, LeónMC, Canadell MG, Fernández DY, et al.Hepatomegalia por depósito de glucógenohepático y diabetes mellitus tipo 1. An Pediatr(Barc) 2007; 67: 157-60.

2. Abaci A, Bekem O, Unuvar T, Ozer E, Bober E,Arslan N, et al. Hepatic glycogenosis: a rarecause of hepatomegaly in type 1 diabetes mel-litus. J Diabetes Complications 2008; 22: 325-8.

3. Rubio-Rívas M, Montero-Alía P, Ordi-Ros J,Labrador M. Glucogenosis hepática y diabetes[letter]. Med Clin (Barc) 2005; 125: 279.

4. Munns CF, McCrossin RB, Thomsett MJ, BatchJ. Hepatic glycogenosis: reversible hepatome-galy in type 1 diabetes. J Paediatr Child Health2000; 36: 449-52.

5. Chatila R, West AB. Hepatomegaly and abnor-mal liver tests due to glycogenosis in adultswith diabetes. Medicine (Baltimore) 1996; 75:327-33.

6. Hudacko RM, Manoukian AV, Schneider SH,Fyfe B. Clinical resolution of glycogenic hepa-topathy following improved glycemic control.J Diabetes Complications 2008; 22: 329-30.

7. Cuthbertson DJ, Brennan G, Walsh S, Henry E.Hepatic glycogenosis: abnormal liver functiontests in type 1 diabetes [letter]. Diabet Med2007; 24: 322-3.

8. Martocchia A, Risicato MG, Mattioli C,Antonelli M, Ruco L, Falaschi P. Association ofdiffuse liver glycogenosis and mild focalmacrovesicular steatosis in a patient with poor-ly controlled type 1 diabetes [letter]. InternEmerg Med 2008; 3: 273-4.

9. Torbenson M, Chen YY, Brunt E, CummingsOW, Gottfried M, Jakate S, et al. Glycogenichepatopathy: an underrecognized hepaticcomplication of diabetes mellitus. Am J SurgPathol 2006; 30: 508-13.