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1 1 Sistemas Silvipastoris na Região Sudeste: A Experiência da CMM Rasmo Garcia 1 , Laércio Couto 2 , Carlos Maurício S. Andrade 3 , Antonio de A. Tsukamoto Filho 4 Resumo As pesquisas com sistemas silvipastoris na Região Sudeste iniciaram-se no final da década de 70 e estão concentradas, basicamente, no Estado de Minas Gerais, onde se encontra a maioria das atividades de reflorestamento com Eucalyptus sp., espécie florestal exótica de maior importância comercial no Brasil. Essas pesquisas tiveram dois direcionamentos distintos, de acordo com seus objetivos finais: a) pesquisas direcionadas para a adoção de sistemas silvipastoris eventuais, buscando, principalmente, usufruir os benefícios possíveis de serem obtidos com a integração de animais aos reflorestamentos de Eucalyptus sp.; e b) pesquisas direcionadas para a adoção de sistemas silvipastoris verdadeiros, objetivando desenvolver uma alternativa de uso da terra mais sustentável que os sistemas tradicionais. As pesquisas com sistemas silvipastoris eventuais têm mostrado que a integração de animais aos reflorestamentos de Eucalyptus sp. reduz substancialmente os custos de manutenção da floresta sem prejudicar o crescimento e a sobrevivência das árvores, desde que se observe a altura mínima (2,0 m) das árvores no momento da introdução dos animais no sistema. Tem sido demonstrado, também, que a utilização de leguminosas forrageiras como o Calopogonium mucunoides beneficia a espécie florestal em termos de crescimento em diâmetro e altura. Estudos conduzidos para avaliar a tolerância de gramíneas forrageiras ao sombreamento têm indicado que o Panicum maximum, a Brachiaria decumbens e a B. brizantha são aquelas que têm apresentado os melhores resultados. Nas áreas de topografia acidentada da Zona da Mata de Minas Gerais, a consorciação do eucalipto com a B. decumbens tem proporcionado maior produção de madeira em relação à monocultura de eucalipto, fato este que tem sido atribuído à maior cobertura do solo, reduzindo o escoamento superficial de água e a erosão do solo, e aumentando a infiltração de água no solo e a manutenção da liteira na área. Já na região dos Cerrados de Minas Gerais, tem sido constatado que em sistemas silvipastoris constituídos por eucaliptos e gramíneas forrageiras tropicais, ocorre queda acentuada na produtividade do sub-bosque alguns anos após o seu estabelecimento. Pesquisas conduzidas nestes sistemas têm demonstrado que as principais causas desta redução na produtividade do sub-bosque são o aumento do nível de sombreamento, devido ao crescimento das árvores de eucalipto, e, também, a redução da disponibilidade de N no solo, induzida, provavelmente, pela baixa qualidade da liteira produzida pelo eucalipto. Apesar dos avanços obtidos nas duas últimas décadas, mais pesquisas são necessárias para que a utilização de sistemas silvipastoris na região Sudeste do Brasil seja fundamentada numa base mais sólida de conhecimento. 1 Professor do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, [email protected] 2 Professor do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, [email protected] 3 Pesquisador da Embrapa Acre, Doutorando em Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, maurí[email protected] 4 Doutorando em Ciência Florestal da Universidade Federal de Viçosa, [email protected]

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Sistemas Silvipastoris na Região Sudeste: A Experiência da CMM

Rasmo Garcia1, Laércio Couto2, Carlos Maurício S. Andrade3, Antonio de A. Tsukamoto Filho4

Resumo

As pesquisas com sistemas silvipastoris na Região Sudeste iniciaram-se no final da década de 70 e estão concentradas, basicamente, no Estado de Minas Gerais, onde se encontra a maioria das atividades de reflorestamento com Eucalyptus sp., espécie florestal exótica de maior importância comercial no Brasil. Essas pesquisas tiveram dois direcionamentos distintos, de acordo com seus objetivos finais: a) pesquisas direcionadas para a adoção de sistemas silvipastoris eventuais, buscando, principalmente, usufruir os benefícios possíveis de serem obtidos com a integração de animais aos reflorestamentos de Eucalyptus sp.; e b) pesquisas direcionadas para a adoção de sistemas silvipastoris verdadeiros, objetivando desenvolver uma alternativa de uso da terra mais sustentável que os sistemas tradicionais. As pesquisas com sistemas silvipastoris eventuais têm mostrado que a integração de animais aos reflorestamentos de Eucalyptus sp. reduz substancialmente os custos de manutenção da floresta sem prejudicar o crescimento e a sobrevivência das árvores, desde que se observe a altura mínima (2,0 m) das árvores no momento da introdução dos animais no sistema. Tem sido demonstrado, também, que a utilização de leguminosas forrageiras como o Calopogonium mucunoides beneficia a espécie florestal em termos de crescimento em diâmetro e altura. Estudos conduzidos para avaliar a tolerância de gramíneas forrageiras ao sombreamento têm indicado que o Panicum maximum, a Brachiaria decumbens e a B. brizantha são aquelas que têm apresentado os melhores resultados. Nas áreas de topografia acidentada da Zona da Mata de Minas Gerais, a consorciação do eucalipto com a B. decumbens tem proporcionado maior produção de madeira em relação à monocultura de eucalipto, fato este que tem sido atribuído à maior cobertura do solo, reduzindo o escoamento superficial de água e a erosão do solo, e aumentando a infiltração de água no solo e a manutenção da liteira na área. Já na região dos Cerrados de Minas Gerais, tem sido constatado que em sistemas silvipastoris constituídos por eucaliptos e gramíneas forrageiras tropicais, ocorre queda acentuada na produtividade do sub-bosque alguns anos após o seu estabelecimento. Pesquisas conduzidas nestes sistemas têm demonstrado que as principais causas desta redução na produtividade do sub-bosque são o aumento do nível de sombreamento, devido ao crescimento das árvores de eucalipto, e, também, a redução da disponibilidade de N no solo, induzida, provavelmente, pela baixa qualidade da liteira produzida pelo eucalipto. Apesar dos avanços obtidos nas duas últimas décadas, mais pesquisas são necessárias para que a utilização de sistemas silvipastoris na região Sudeste do Brasil seja fundamentada numa base mais sólida de conhecimento.

1 Professor do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, [email protected] 2 Professor do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, [email protected] 3 Pesquisador da Embrapa Acre, Doutorando em Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa,

maurí[email protected] 4 Doutorando em Ciência Florestal da Universidade Federal de Viçosa, [email protected]

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1. Introdução

Os sistemas silvipastoris, modalidade dos sistemas agroflorestais, se referem às técnicas de produção nas quais se integram os animais, o pasto e as árvores numa mesma área. Tais sistemas representam uma forma de uso da terra onde as atividades silviculturais e pecuárias são combinadas para gerar produção de forma complementar pela interação dos seus componentes.

A idéia de se integrar animais em atividades florestais não é nova. Na Região Oeste dos Estados Unidos, a prática de se colocar os bovinos para realizar o pastejo em áreas de florestas nativas já vem sendo realizada há mais de 125 anos (Roath e Krueger, 1982). Em vários estados daquele país, muitas pesquisas foram conduzidas visando a utilização do sub-bosque como uma forma de aproveitamento pelos animais selvagens e domésticos (principalmente bovinos e ovinos) bem como controlar o desenvolvimento da vegetação herbácea, que em acúmulo se torna um veículo propagador de incêndios nas florestas (Ingram, 1931; Ellison e Houston, 1958; Arnold et al. 1964; Jameson, 1967; Reynolds, 1969; Pearson & Jameson, 1967; Hedrik et al., 1968; Clary, 1975; Woods et al., 1982; Clary e Grelen, 1978; MClean, 1972; MClean e Clark, 1980; Roath & Krueger, 1982; Allen, 1986; Sharrow e Leininger, 1983). Trabalhos envolvendo bovinos sob florestas de pinus (Pinus radiata), na Nova Zelândia, são descritos por Miller, 1975. Nos países da Europa, também, a exploração múltipla silvipastoril se realiza há muitos anos.

O pastejo pelos animais domésticos ou selvagens e a regeneração das árvores e arbustos são compatíveis e benéficos para a produtividade da terra. As grandes áreas de cerrados, campos, caatingas, pantanal e outras formações vegetais já existentes no Brasil vem sendo utilizadas por muitos séculos pelos animais selvagens e domésticos. É um exemplo da própria natureza para o homem, de uma consorciação natural em que espécies arbóreas, arbustivas e herbáceas se misturam num equilíbrio perfeito. Isto, todavia, não quer dizer que a exploração nestas áreas vem ocorrendo da melhor forma e que estudos não necessitam ser conduzidos. É importante o acompanhamento dos mesmos e que o manejador tenha conhecimentos para interpretar as mudanças que ocorrem no meio.

As informações da adoção de uma exploração silvipastoril no Brasil são bastante escassas. Duas décadas atrás, nos anos de 1976 - 1977, no Estado de Minas Gerais, na região do Vale do Rio Doce, no município de Dionísio, iniciou-se na CAF Santa Bárbara Ltda, uma empresa do Grupo Belgo-Mineira, o aproveitamento do sub-bosque das áreas reflorestadas com eucaliptos. Na região, o capim-colonião (Panicum maximum), com crescimento exuberante, constituía a maior parte do sub-bosque de todas as áreas. Em face do seu elevado porte e sem sofrer a necessária pressão de pastejo, o capim-colonião representava um grande risco para ocorrência de incêndios naquelas plantações florestais. Foi a partir daí que, nos anos seguintes, uma equipe de pesquisadores dos Departamentos de Engenharia Florestal, de Zootecnia, de Solos e de Biologia da UFV, propuseram um estudo e conduziram os primeiros trabalhos de pesquisa no Estado de Minas Gerais, procurando verificar os efeitos interativos de alguns componentes do sistema (Couto et al., 1988).

Os trópicos e sub-trópicos apresentam situações totalmente diferentes se comparadas às regiões de clima temperado. Até hoje, poucas pesquisas foram conduzidas no Brasil e o “uso múltiplo” é pouco entendido e estudado. Em 1979, um seminário foi realizado na Costa Rica para discutir e formular um plano para o

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desenvolvimento de sistemas agroflorestais. Foram propostos por Budowski (1978) três caminhos possíveis para combinar qualquer atividade de produção para compor um sistema agroflorestal. A Fig. 1 ilustra os caminhos de associação das práticas de agricultura, silvicultura e a exploração pecuária.

Como exposto anteriormente, a integração do animal às culturas agrícolas e florestais não constitui um sistema novo de atividade agropecuária. O que talvez seja novo é o fato de que a integração do animal à atividade florestal seja capaz de melhorar a produtividade por unidade de área. Em um mundo onde a população cresce rapidamente, sobretudo nos países menos desenvolvidos, o aumento de produtividade da terra torna-se muito importante, uma vez que a área disponível para a agricultura terá seus limites num futuro não muito distante.

Fig. 1. Representação diagramática de associações de componentes do Sistema Agroflorestal.

Três situações podem ser identificadas num sistema silvipastoril: pastejo do sub-bosque natural em florestas e outras vegetações naturais; pastejo em pasto introduzido em floresta plantada, e pastejo de espécies arbóreas forrageiras como complemento do pasto já existente. No primeiro caso os animais são introduzidos em florestas e outros tipos de vegetação natural para o aproveitamento do sub-bosque ali existente e naturalmente estabelecido. Nesta condição os animais fazem uso do pasto pelas suas preferências e mesmo de arbustos, os quais comprovadamente contribuem de maneira significativa na alimentação animal. Esta atividade pode ser vista no Brasil, principalmente na região de cerrados. No segundo caso, onde os estudos provavelmente mais se desenvolveram na aplicação dos sistemas silvipastoris, procura-se estabelecer espécies forrageiras sob árvores de floresta plantada. Um exemplo é o aproveitamento de áreas reflorestadas com eucaliptos, pinus e outras espécies, com o objetivo principal de produzir madeira, carvão ou celulose e nas entrelinhas estabelecer um pasto de gramíneas, leguminosas ou de ambas em consórcio. No terceiro caso procura-se dar aos animais a chance de completar a sua dieta básica, normalmente de extrato herbáceo, com espécies arbóreas. Na América Central,

Sistema Agrossilvipastoril Sistema Agrissilvicultural Sistema Silvipastoril

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várias pesquisas foram conduzidas com espécies arbóreas de reconhecido valor nutricional para os animais e diversos desenhos de plantio de árvores forrageiras foram sugeridos para estabelecimentos de consórcio silvipastoris (Borel, 1989; Baggio, 1988).

A árvore é integrada ao sistema com o objetivo de aumentar a produtividade e qualidade da forragem e ainda promover a sustentabilidade do sistema. Ela é então, uma produtora de forragem e é esperado não só aumentar a produtividade da espécie forrageira herbácea existente na pastagem, mas, também produzir forragem para complementar aquela disponível proveniente do pasto tradicional. Árvores como Leucaena (Leucaena leucocephala) e Gliricídia (Gliricidia sepium) que são leguminosas e de crescimento rápido são exemplos de árvores forrageiras de reconhecido valor nutricional e de melhor adaptação em regiões onde a umidade não é limitante como nas zonas úmidas e sub-úmidas.

1.1. Principais aspectos a serem considerados

Num sistema silvipastoril existem três componentes individuais e básicos que o homem pode manejar de uma certa forma: as árvores, o sub-bosque (pasto) e o rebanho animal. Cada um desses componentes requer cuidados e manejo específico. A seleção da espécie arbórea, da forrageira que compõe a pastagem e dos animais que realizam o pastejo deve ser criteriosa pois os efeitos interativos e os resultados da convivência aparecerão com o tempo. Igualmente importante é o conhecimento das características sócio-econômicas da comunidade e do mercado onde os produtos do sistema poderão ser colocados. Como sustentador do sistema tem-se o componente solo que poderá sofrer mudanças químicas e físicas em função do manejo que será aplicado no sistema. O ecossistema silvipastoril se mantém num estado dinâmico e responde às variações dos fatores extrínsicos como clima e pastejo que são aplicados. A Fig. 2 procura mostrar os componentes do sistema e suas interrelações.

Fig. 2. Representação diagramática de componentes do Sistema Silvipastoril.

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A chuva, a radiação e o nitrogênio atmosférico formam uma parte dos componentes de entrada no sistema. As saídas do sistema se realizam através dos animais que realizam o pastejo, do corte das árvores e das perdas que ocorrem por erosão e lixiviação.

A interação entre os componentes é de grande importância, pois respondem pelo êxito do sistema e fornecem os pontos de intervenção para o manejo. Considerando primeiramente as árvores, os seus efeitos no sistema são marcados pela presença ou não de espécies capazes de realizar uma fixação de nitrogênio no solo, pela forma de crescimento e densidade capaz de interceptar a precipitação e radiação e assim as quantidades que efetivamente chegam ao sub-bosque e ao solo. A desrama ou mesmo o desbaste da floresta resultará em mudanças na qualidade e quantidade dos produtos arbóreos e da mesma forma na qualidade e quantidade de pasto potencialmente disponível. O sistema de pastejo aplicado e a pressão de pastejo controlarão a qualidade e quantidade consumida pelos animais assim como a quantidade de resíduos que chega ao solo. Por último, as árvores exercem um papel muito importante de proteção, melhorando as condições ambientais para os animais, dando-lhes sombra e abrigando-os de ventos. A carga animal poderá resultar em algumas situações, em maior compactação do solo, refletindo no crescimento do pasto e da árvore em decorrência de maior ou menor arejamento e retenção de água. É conveniente lembrar que a aplicação de um sistema silvipastoril nas regiões tropicais úmidas ou secas deve ser vista separadamente uma vez que a árvore e o animal têm características distintas e diferentes nesses dois tipos de ambientes climáticos.

2. Pesquisas na Região Sudeste

Formada pelos Estados do Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, a região Sudeste, localizada entre os paralelos 14°S e 25°S, ocupa 10,85% do território brasileiro e abriga 42,65% da população do Brasil (IBGE, 2000). É a região de maior importância econômica do país, não somente no setor industrial como também na produção agropecuária. A maior parte da região é representada pelos grandes biomas Mata Atlântica e Cerrado, mas também abrange áreas representativas do Semi-Árido brasileiro, na porção norte de Minas Gerais, e do Sub-Trópico brasileiro, ao sul do Estado de São Paulo.

As pesquisas com sistemas silvipastoris na região Sudeste são escassas, sendo que a maior parte está concentrada no Estado de Minas Gerais, onde se encontra a maioria das atividades de reflorestamento com Eucalyptus sp., espécie florestal exótica de maior importância comercial no Brasil.

As pesquisas com sistemas silvipastoris tem sido realizadas sob dois direcionamentos: a) pesquisas direcionadas para a adoção de sistemas silvipastoris eventuais, buscando, principalmente, usufruir os benefícios possíveis de serem obtidos com a integração de animais aos reflorestamentos de Eucalyptus sp.; e b) pesquisas direcionadas para a adoção de sistemas silvipastoris verdadeiros, objetivando desenvolver uma alternativa de uso da terra mais sustentável que os sistemas tradicionais, sob os diferentes pontos de vista.

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2.1. Sistemas silvipastoris eventuais

Os estudos conduzidos por Couto et al. (1988), em floresta de Eucalyptus urophylla com seis anos de idade, e por Almeida (1991), em floresta de E. citriodora durante os dois primeiros anos após o plantio, procuraram avaliar o efeito do pastejo no controle da vegetação do sub-bosque, na compactação do solo e na redução dos custos de manutenção da floresta. Nos dois estudos, a vegetação era constituída, principalmente, pelo capim-colonião (Panicum maximum), o qual representava um grande risco à ocorrência de incêndios na floresta. Os resultados obtidos nestes estudos mostraram que: a) o pastejo promoveu controle efetivo da vegetação do sub-bosque, proporcionando redução dos custos de manutenção da floresta variando de 52 a 93%, em função da categoria e carga animal adotadas; b) não houve compactação do solo capaz de prejudicar o crescimento do eucalipto, sendo seu efeito percebido, apenas, na camada superficial do solo; c) a presença dos animais não afetou o desenvolvimento e a sobrevivência da espécie florestal, apesar da pouca idade das árvores (Quadro 1); e d) o ganho médio diário de peso vivo dos bovinos, durante o primeiro ano do experimento, variou de 0,49 a 0,51 kg/dia (Almeida, 1991).

Para evitar prejuízos ao crescimento e sobrevivência da espécie florestal é recomendável que a entrada de animais no sistema se realize somente quando as árvores atingirem no mínimo dois metros de altura, o que ocorre, no caso do eucalipto, com plantas de aproximadamente um ano de idade (Garcia e Couto, 1997).

Tabela. Efeito do pastejo, realizado do 6º ao 24º mês após o estabelecimento de um povoamento florestal, sobre o crescimento e a sobrevivência das árvores de Eucalyptus citriodora.

Tratamentos Altura (m)

DAP1 (cm)

Sobrevivência (%)

Fitomassa (t/ha)

9 bezerros 5,04 5,7 92,7 29,9

6 bezerros 4,74 5,2 82,8 27,0

9 bezerros + 10 ovelhas 4,59 5,3 90,1 30,3

6 bezerros + 10 ovelhas 5,06 5,4 87,4 32,5

10 ovelhas 5,20 6,0 89,8 33,6

Controle (sem pastejo) 5,42 6,0 88,1 29,7

Fonte: Almeida (1991). 1 Diâmetro a altura do peito.

Nos reflorestamentos com eucaliptos na região dos Cerrados de Minas Gerais, de acordo com Santos (1990), o valor forrageiro da vegetação espontânea do sub-bosque é muito baixo. Assim, o autor procurou avaliar o efeito da introdução de gramíneas e leguminosas forrageiras em uma plantação de E. cloëziana, com dois anos de idade, no desempenho da espécie arbórea e na produção de forragem do

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sistema. A coleta de dados para avaliação do desenvolvimento das árvores de eucalipto foi realizada até 25 meses após a implantação do experimento, enquanto a avaliação da produção forrageira foi realizada até os 15 meses. Os resultados obtidos mostraram que: a) a introdução das forrageiras a partir do segundo ano de idade do povoamento florestal não trouxe nenhum prejuízo para o desenvolvimento das árvores de eucalipto; b) a consorciação com calopogônio (Calopogonium mucunoides) e gramíneas favoreceu a espécie florestal, em termos de crescimento em diâmetro e altura; c) os tratamentos constituídos pelo capim-guiné (Panicum maximum), capim-braquiarão (Brachiaria brizantha) e capim-gordura (Melinis minutiflora) apresentaram produções de matéria seca satisfatórias; e d) a associação do guandu (Cajanus cajan) às gramíneas favoreceu a produção de matéria seca e a cobertura do solo no sistema.

Outra preocupação com os reflorestamentos com eucalipto refere-se à diminuição da capacidade produtiva dos solos sob os reflorestamentos, com o decorrer das rotações. Este fato tem sido atribuído à grande exportação de nutrientes com a exploração das árvores e às perdas de solo decorrentes de processos erosivos que ocorrem nos primeiros anos, antes do reflorestamento cobrir o solo. Assim, alguns estudos foram conduzidos visando avaliar o efeito da consorciação com leguminosas, desde a implantação do povoamento florestal, sobre o desempenho das árvores de eucalipto e sobre as propriedades físico-químicas do solo (Ferreira Neto, 1994; Almeida, 1995). A presença das leguminosas no sub-bosque dos povoamentos florestais também proporciona condições para o estabelecimento de sistemas silvipastoris eventuais, até que a transmissão de luz ao sub-bosque seja insuficiente para o seu crescimento.

Os resultados obtidos nestes trabalhos não mostraram nenhuma mudança significativa nas propriedades físico-químicas do solo, em decorrência da presença das leguminosas, fato atribuído pelos autores ao curto período de tempo avaliado (um ano). Verificou-se que as leguminosas que produziram maior quantidade de matéria seca e que proporcionaram maior cobertura do solo (Calopogonium mucunoides e Cajanus cajan) prejudicaram o crescimento em altura e diâmetro do eucalipto. Os autores atribuíram este fato à competição por água e nutrientes, pois estas leguminosas apresentaram sistema radicular profundo e ramificado. No entanto, estes resultados se referem apenas ao primeiro ano de crescimento do eucalipto, sendo provável que, com o passar do tempo, esses efeitos depreciativos se revertam, compensados pela fixação de nitrogênio e pela melhoria na ciclagem de nutrientes do sistema (Ferreira Neto, 1994).

2.2. Sistemas silvipastoris verdadeiros

O sucesso da exploração de sistemas silvipastoris verdadeiros depende da manutenção do equilíbrio entre os seus componentes. Para isso, torna-se necessário conhecer as interações existentes entre os componentes, principalmente no que diz respeito aos diferentes níveis de requerimento e utilização dos fatores naturais de produção, destacando-se luz, água e nutrientes (Pereira e Rezende, 1997). Embora a utilização de diversas modalidades de sistemas agroflorestais não seja uma prática recente, os estudos a respeito do seu funcionamento o são, de modo que o conhecimento sobre os processos que ocorrem nestes sistemas ainda é restrito. Além disso, estes sistemas apresentam inúmeras possibilidades de utilização de

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diferentes espécies e arranjos, cada um resultando em um conjunto diferente de interações entre seus componentes. Essas interações são também fortemente influenciadas pelas condições ambientais do local (clima e solo). De acordo com Nair (1993), a complexidade e a longa duração dos sistemas agroflorestais tornam difíceis as investigações dos mecanismos e processos, sendo que, sem o conhecimento a respeito desses mecanismos, é impossível generalizar e extrapolar os resultados de um estudo para diferentes condições.

A quantidade de luz disponível para o crescimento das forrageiras no sub-bosque de um sistema silvipastoril verdadeiro pode ser considerada como um fator chave para a sustentabilidade do sistema. Este fator está submetido, basicamente, a quatro tipos de controle: a) espaçamento, por meio da escolha da densidade de plantio e do direcionamento das linhas de plantio do componente arbóreo; b) seleção de espécies arbóreas em função das características de sua copa; c) manejo, por meio da realização de operações de desbaste e desrama; e d) seleção de espécies forrageiras tolerantes ao sombreamento.

O trabalho conduzido por Castro (1996), procurou identificar, entre algumas das espécies de gramíneas forrageiras mais utilizadas nas nossas condições, aquelas que apresentassem maior tolerância ao sombreamento. As seis gramíneas estudadas (Brachiaria brizantha cv. Marandu, Brachiaria decumbens, Melinis minutiflora, Andropogon gayanus cv. Planaltina, Panicum maximum cv. Vencedor e Setaria sphacelata cv. Kazangula), já estabelecidas há cerca de dois anos, foram submetidas a três níveis de sombreamento artificial (0, 30 e 60%). O autor verificou que a produção de matéria seca das gramíneas diminuiu com o aumento do nível de sombreamento, exceto em P. maximum, onde o maior rendimento ocorreu com 30% de sombreamento, e em M. minutiflora e S. sphacelata, cujas produções de matéria seca não foram significativamente alteradas (Fig. 3).

Um fato interessante de se observar é que as espécies mais tolerantes ao sombreamento nem sempre são as mais produtivas num determinado nível de sombra. Isto ocorre devido às diferenças no potencial de produção das espécies. No trabalho de Castro (1996), por exemplo, as gramíneas M. minutiflora e S. sphacelata foram consideradas tolerantes ao sombreamento, pois as suas produções de MS não foram alteradas significativamente pela sombra. No entanto, suas produções de MS a 30% (3,6 e 5,9 t/ha, respectivamente) e a 60% (2,0 e 5,7 t/ha, respectivamente), foram bem inferiores à do A. gayanus, espécie que apresentou uma queda acentuada na produção de MS com o sombreamento, mas que produziu 9,5 t/ha a 30% e 7,0 t/ha a 60% de sombreamento. Portanto, o critério tolerância ao sombreamento não pode ser considerado isoladamente na escolha da espécie forrageira a ser utilizada em um sistema silvipastoril.

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2000

4000

6000

8000

10000

12000

0 30 60

Nível de sombreamento (%)

Pro

duçã

o de

MS

(kg/

ha)

Andropogon gayanusBrachiaria brizanthaBrachiaria decumbensPanicum maximumSetaria sphacelataMelinis minutiflora

Fig. 3. Produção de matéria seca (três cortes) de seis gramíneas forrageiras tropicais, cultivadas sob três níveis de sombreamento (Castro, 1996).

A região da Zona da Mata do Estado de Minas Gerais é caracterizada por apresentar topografia bastante acidentada, com aproximadamente 80% de suas terras com declividade acentuada, limitando o seu uso em atividades agrícolas intensivamente manejadas (Silva, 1999). Os sistemas silvipastoris verdadeiros constituem excelente alternativa de uso da terra para essa região, proporcionando melhor utilização da área, maior diversidade de produção e melhoria das condições ecológicas do sistema. A presença de árvores resultaria em maior estabilização do solo, devido ao sistema radicular mais profundo, evitando deslizamentos de terra, enquanto a presença das gramíneas forrageiras proporcionaria uma rápida cobertura do solo, favorecendo a infiltração de água e evitando a aceleração do processo erosivo.

Silva (1999), conduziu um estudo para avaliar a viabilidade do consórcio de E. grandis, plantado nos espaçamentos 3x2 m, 4x2 m, 5x2 m e 6x2 m, com as gramíneas Brachiaria decumbens e Melinis minutiflora, em áreas acidentadas da Zona da Mata de Minas Gerais. Os sistemas foram implantados em 1991 e avaliados até os seis anos de idade, sendo que não houve pastejo na área durante todo o período. Segundo o autor, o capim-gordura (M. minutiflora) desapareceu da área a partir do final do segundo ano, demonstrando não ser uma espécie adaptada às condições impostas. Os principais resultados obtidos neste trabalho foram: a) a produção de madeira, por área, tendeu a diminuir com o aumento do espaçamento das árvores de

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eucalipto, ao passo que a produção por árvore apresentou tendência inversa (Quadro 2); b) no espaçamento 3x2 m, a produção de madeira no sistema consorciado foi superior ao eucalipto solteiro, indicando que a cobertura do solo proporcionada pela B. decumbens beneficiou a espécie arbórea, provavelmente, devido à redução no escoamento superficial de água e conseqüente redução da erosão do solo, aumento da infiltração de água no solo e manutenção da liteira na área; e c) a disponibilidade de forragem da B. decumbens aumentou com a ampliação do espaçamento das árvores de eucalipto. Com base nos resultados obtidos, o autor concluiu que a utilização de sistemas silvipastoris, constituídos por E. grandis e por B. decumbens, nesta região, constitui-se numa opção viável técnica e economicamente, devendo-se escolher os espaçamentos mais amplos.

Tabela 2. Disponibilidade de forragem da Brachiaria decumbens e biomassa da parte aérea do Eucalyptus grandis, sob diferentes espaçamentos, aos 72 meses de idade, na Zona da Mata de Minas Gerais.

Gramínea Eucalipto Tratamentos

(t/ha) (kg/árvore) (t/ha)

3 x 2 m (solteiro) - 56,6 94,3

3 x 2 m (consorciado) 1,07 73,5 122,4

4 x 2 m “ 1,42 91,0 113,7

5 x 2 m “ 1,33 85,9 85,9

6 x 2 m “ 2,22 116,2 99,3

Fonte: Silva (1999).

2.2.1. O exemplo da Companhia Mineira de Metais - CMM

Um dos poucos exemplos de utilização em larga escala de sistemas silvipastoris verdadeiros com eucalipto, no Brasil, são os chamados sistemas agrissilvipastoris rotativos que vêm sendo implementados pela Companhia Mineira de Metais (CMM), desde 1993, em suas fazendas localizadas no noroeste do Estado de Minas Gerais, região dos Cerrados. Estes sistemas consistem no consórcio de eucalipto com culturas anuais e forrageiras. No ano de implantação do sistema, planta-se o eucalipto, no espaçamento de 10 x 4 m, e o arroz, nas suas entrelinhas. No ano seguinte, cultiva-se soja e, aos dois anos, é feita a introdução das gramíneas no sub-bosque do eucalipto. Do terceiro ao décimo primeiro ano, o sistema é utilizado para a engorda de bovinos por pastejo direto. O eucalipto é colhido aos 11 anos de idade, quando se encerra o ciclo do sistema. Hoje, a empresa já planeja adotar o corte aos 9 anos. Também, no ano 2004 já se projeta o plantio da soja no lugar do arroz no ano de implantação do eucalipto.

Uma das espécies forrageiras utilizadas nas primeiras experiências foi o Panicum maximum cv. Tanzânia-1. De acordo com o relato dos técnicos da CMM, o capim-tanzânia apresentou boa produtividade nos primeiros dois anos após sua introdução no sistema agrissilvipastoril. Desde então, a sua produtividade diminuiu

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progressivamente, passando a apresentar baixa capacidade de recuperação após o pastejo, cobertura do solo deficiente e plantas pouco vigorosas, levando-os a crer que o principal fator responsável por isso seria a redução da transmissão de luz ao sub-bosque do sistema, em função do crescimento das árvores de eucalipto. Andrade (2000) especulou que outros fatores como deficiência nutricional e, ou, efeitos alelopáticos do eucalipto, também poderiam estar contribuindo para diminuir a capacidade de produção do sub-bosque.

Assim, procurando identificar os principais fatores limitando o crescimento do capim-tanzânia, Andrade (2000) conduziu um ensaio NPK em um dos sistemas agrissilvipastoris da CMM, em que a gramínea tinha sido implantada há quatro anos e o eucalipto há cinco anos. Segundo o autor, a hipótese do estudo baseou-se na “lei do mínimo”: caso o principal fator limitante ao crescimento da gramínea fosse a baixa disponibilidade de luz ou efeitos alelopáticos do eucalipto, não haveria resposta da gramínea à fertilização NPK, ou essa resposta seria muito pequena.

Os resultados obtidos mostraram que o crescimento da gramínea estava sendo restringido pela baixa disponibilidade de N no solo, já que esta apresentou elevada resposta à adubação nitrogenada. Em média, a taxa de acumulação de MS obtida nos tratamentos que não receberam adubo nitrogenado foi de 14,0 kg/ha.dia, enquanto nos tratamentos adubados foi de 25,8 kg/ha.dia, o que representou um incremento de 84% em relação aos tratamentos não-adubados. Além disso, as plantas recuperaram sua coloração verde normal e apresentaram-se mais vigorosas, com folhas maiores e mais largas e colmos mais grossos. Entretanto, não houve resposta à aplicação de fósforo nem à de potássio, apesar dos baixos teores destes nutrientes no solo (Andrade, 2000).

O autor concluiu que as principais causas da queda acentuada na produtividade do sub-bosque, no sistema agrissilvipastoril estudado, foram o aumento do nível de sombreamento e, principalmente, a redução da disponibilidade de N no solo. A elevada resposta à adubação nitrogenada mostrou que não havia efeito alelopático do eucalipto sobre as plantas já estabelecidas do capim-tanzânia, que recuperaram seu vigor e coloração normais. Entretanto, segundo o autor, a metodologia utilizada no trabalho não permitiu maiores esclarecimentos quanto à existência de efeitos alelopáticos sobre a germinação e o crescimento das plântulas desta gramínea. Paulino et al. (1987), avaliando o efeito alelopático do eucalipto sobre o crescimento de forrageiras, também não encontraram efeitos alelopáticos do eucalipto sobre o capim-colonião (Panicum maximum), mas constataram interferência negativa, devido à imobilização de N no processo de mineralização da matéria orgânica, refletindo-se sobre o crescimento da gramínea.

Em pastagens exclusivas de gramíneas tropicais, não fertilizadas com nitrogênio, também ocorre redução da disponibilidade de N, com o passar dos anos após sua implantação, conforme demonstrado nos trabalhos de Robbins et al. (1989) e Robertson et al. (1993), na Austrália, e de Piccolo et al. (1994) e Neill et al. (1995), no Brasil. De acordo com Boddey et al. (1997), este processo é também o principal responsável pela degradação das pastagens de Brachiaria spp., Andropogon gayanus e Panicum maximum, estabelecidas nos Cerrados do Brasil e em outras áreas tropicais da América do Sul.

As gramíneas tropicais, assim como o eucalipto, são plantas perenes que possuem elevada eficiência de utilização de nutrientes e, portanto, produzem liteira com baixos teores de nutrientes, principalmente daqueles mais móveis (N, P e K). Desse modo,

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não é de causar surpresa que, em sistemas silvipastoris, nos quais as gramíneas tropicais e as árvores de eucalipto são os componentes principais, os processos decorrentes da adição de resíduos de baixa qualidade sejam muito parecidos com aqueles verificados em pastagens exclusivas de gramíneas tropicais. A liteira produzida pelo eucalipto, neste estudo, confirmou as expectativas quanto à sua baixa qualidade, demonstrada pelos baixos teores de N e P (0,63 e 0,04%, respectivamente) e pelas elevadas relações C/N, C/P e Lignina/N (86, 1360 e 18, respectivamente) (Andrade, 2000).

Esse processo de redução da disponibilidade de N no solo, induzido principalmente pela baixa qualidade da liteira produzida pelo eucalipto, parece não ser uma característica exclusiva do sistema estudado. É provável que também ocorra em outros sistemas silvipastoris compostos por gramíneas e eucaliptos, ou outros componentes com características semelhantes, nos quais não existe fonte externa de N, principalmente quando implantados em solos distróficos e álicos, como os da região dos Cerrados. Szott et al. (1991), discutindo as relações solo-planta em sistemas agroflorestais, afirmaram que, geralmente, a qualidade do liteira é maior e as taxas de decomposição, mais rápidas, em solos mais férteis. Segundo esses autores, exceto para o nitrogênio fixado biologicamente, o potencial dos sistemas agroflorestais para aumentar o estoque de nutrientes nos solos distróficos e álicos dos trópicos parece limitado.

As alternativas existentes para a manutenção da disponibilidade de N em níveis adequados, nestes sistemas, parecem ser: a) aplicação anual de fertilizante nitrogenado ou b) incorporação de plantas leguminosas, de comprovada eficácia na fixação de N atmosférico, ao sistema. Essas alternativas precisam ser avaliadas quanto às suas relações benefício/custo e à viabilidade técnica.

A utilização de leguminosas como componentes do sistema parece ser uma alternativa muito interessante, já que poderia incorporar N ao sistema, acelerando a ciclagem de nutrientes, sem os custos da aquisição e aplicação do fertilizante nitrogenado. A incorporação de leguminosas em sistemas agrissilvipastoris poderia ser feita de três maneiras: a) cultivo de leguminosas herbáceas anuais como a soja, por exemplo, na fase inicial; b) consorciação de leguminosas herbáceas e, ou, arbustivas com as gramíneas, no sub-bosque do sistema; e c) consorciação de leguminosas arbóreas com o eucalipto.

Andrade et al. (2003), também avaliaram a transmissão de luz ao sub-bosque do sistema agrissilvipastoril (Fig. 4). Considerando a média de toda a área do sub-bosque, a transmissão de luz correspondeu a 32% da densidade do fluxo de fótons medida a pleno sol. Na época desta avaliação (maio de 1999) o sol se encontrava inclinado para o Norte, de modo que grande parte da luz solar direta era interceptada pela copa das árvores de eucalipto. Se a avaliação tivesse sido realizada durante o verão, quando haveria menor interceptação de luz pela copa das árvores, devido à menor inclinação solar, é provável que a transmissão de luz ao sub-bosque do sistema agrissilvipastoril estudado estivesse próxima a 50%. Portanto, o espaçamento adotado nos sistemas agrissilvipastoris da CMM (10 x 4 m, com as linhas de plantio orientadas no sentido leste-oeste) pode ser considerado adequado, pois ainda permite boa transmissão de luz ao sub-bosque, cinco anos após a sua implantação. Além disso, existem diferenças marcantes dentro do gênero Eucalyptus com relação à transmissão de luz por sua copa, pois algumas espécies possuem copas mais densas do que outras (Garcia & Couto, 1997); o Eucalyptus urophylla,

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espécie utilizada no experimento relatado acima, está entre aquelas que apresentam copa mais densa e, conseqüentemente, menor transmissão de luz ao sub-bosque.

Um requisito de grande importância quando da elaboração de sistemas silvipastoris, é a escolha de espécies bem adaptadas ao ecossistema da região onde será implantado. De acordo com Stür (1991), espécies forrageiras bem sucedidas em plantações arbóreas devem ser adaptadas não apenas a baixos níveis de luz, mas também ao clima (chuva, temperatura, fotoperíodo), solo (pH, fertilidade, textura, drenagem) e ao manejo (regime de corte ou pastejo, fertilização). A utilização de espécies forrageiras que apresentem boa tolerância ao sombreamento imposto pelo componente arbóreo, mas que não sejam adaptadas às condições edafo-climáticas do local, certamente resultará no fracasso desse sistema. Isto é particularmente importante quando se trata do ecossistema de Cerrado, com suas características peculiares de solos pobres e ácidos, e uma estação seca prolongada e bem definida.

0

20

40

60

80

100

0 1 2 3 4 5 4 3 2 1 0Posição na entrelinha (m)

% d

e pl

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sol

L

N S

O

Fig. 4. Variação espacial da transmissão de luz ao sub-bosque de um sistema agrissilvipastoril com eucalipto (250 árvores/ha), com 5 anos de idade, em maio de 1999 (Andrade, 2000).

Procurando fornecer subsídios para a implantação de novos sistemas silvipastoris verdadeiros na região dos Cerrados, um estudo foi conduzido na CMM para avaliar o desempenho de seis gramíneas forrageiras (Brachiaria brizantha cvs. Marandu e MG-4, Brachiaria decumbens cv. Basilisk, Panicum maximum cv. Mombaça, Hyparrhenia rufa e Melinis minutiflora), puras ou em consórcio com a leguminosa Stylosanthes guianensis cv. Mineirão, em um sistema agrissilvipastoril com eucalipto. O eucalipto foi plantado em novembro de 1996, no espaçamento de 10 x 4 m, cultivando-se arroz e soja nas suas entrelinhas, respectivamente, no primeiro e segundo ano. O experimento foi implantado em novembro de 1998, realizando-se uma gradagem, adubação fosfatada (100 kg de superfosfato simples e 400 kg de fosfato natural de Araxá, por hectare) e plantio das forrageiras em parcelas experimentais de 120 m², nas entrelinhas do eucalipto.

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Aproximadamente um ano após a implantação do experimento (dezembro de 1999), quando o eucalipto estava com três anos de idade, toda a área experimental foi cercada e submetida ao pastejo por bovinos, por 24 horas, com oferta de forragem igual a 10 kg/100 kg de peso vivo. Este procedimento foi repetido em fevereiro de 2000, e teve como objetivo simular a utilização do sistema de uso rotacionado. Em abril de 2000, dois meses após o último pastejo, avaliou-se a disponibilidade de MS, a cobertura do solo e a participação da leguminosa no sub-bosque.

Os sub-bosques constituídos por gramíneas do gênero Brachiaria, independentemente de estarem ou não consorciados com o estilosantes mineirão, foram aqueles que proporcionaram os mais elevados níveis de cobertura do solo (Fig. 5), fato esperado devido à maior agressividade destas gramíneas em relação às demais. Já os capins jaraguá e gordura foram os que proporcionaram os menores níveis de cobertura do solo (variando de 64 a 70%).

0 20 40 60 80 100

Capim-marandu

B. decumbens

Capim-MG4

Capim-mombaça

Capim-jaraguá

Capim-gordura

Cobertura do solo (%)

Gramínea Gramínea + Leguminosa

Fig. 5. Cobertura do solo proporcionada pelo sub-bosque de um sistema agrissilvipastoril, composto por diferentes gramíneas, consorciadas ou não com o estilosantes mineirão (Andrade e Garcia, dados não publicados).

Em dezembro de 1999, um ano após o plantio das forrageiras, a participação da leguminosa no sub-bosque foi maior quando consorciada com os capins gordura e jaraguá, intermediária quando consorciada com os capins mombaça e MG-4, obtendo-se os piores resultados quando em consórcio com a B. decumbens e o capim-marandu (Tabela 3). Na avaliação feita em abril de 2000, após a realização de dois pastejos na área, verificou-se que houve redução da participação da leguminosa em todos os tratamentos, principalmente naqueles com as gramíneas mais agressivas.

Esses resultados mostram que o pastejo, causando pisoteio e desfolha, favoreceu as gramíneas na competição com a leguminosa. Indicam também que há uma estreita relação entre a agressividade da gramínea associada, demonstrada pela capacidade

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de cobertura do solo, e a participação da leguminosa no sub-bosque do sistema; quanto maior a agressividade da gramínea associada, menor a participação da leguminosa no sub-bosque.

Tabela 3. Participação da leguminosa Stylosanthes guianensis cv. Mineirão no sub-bosque de um sistema agrissilvipastoril, em função da gramínea associada.

Participação da leguminosa no sub-bosque1 (%) Gramínea associada

Dezembro de 1999 Abril de 2000

Capim-marandu 18,3 2,3

B. decumbens 21,7 6,3

Capim-MG4 34,0 13,0

Capim-mombaça 35,0 15,7

Capim-jaraguá 40,0 30,0

Capim-gordura 50,0 35,0

Fonte: Andrade e Garcia (dados não publicados).

1 Avaliação visual.

O capim-marandu, a B. decumbens e o capim-mombaça, esse último especialmente quando consorciado com o estilosantes mineirão, foram as gramíneas que apresentaram maior capacidade de produção de forragem nas condições impostas (Fig. 6). O capim-MG4 mostrou-se inferior às outras duas braquiárias avaliadas, porém superior aos capins jaraguá e gordura, que apresentaram a mais baixa capacidade produtiva. Com exceção do capim-marandu e da B. decumbens, em que a participação da leguminosa no consórcio foi muito reduzida, as demais gramíneas apresentaram tendência de maior produção de forragem quando consorciadas com o estilosantes mineirão. Esse resultado é importante, pois demonstra que a presença da leguminosa favoreceu o crescimento da gramínea associada, apesar curto período de tempo do consórcio.

Os resultados iniciais deste trabalho indicaram ser difícil a manutenção do estilosantes mineirão consorciado com gramíneas agressivas como as braquiárias, em sistemas silvipastoris, pelo menos na fase inicial quando o nível de sombreamento ainda é relativamente baixo. É possível que com o passar do tempo, caso a leguminosa consiga se manter no sistema, ocorra diminuição da capacidade competitiva das gramíneas devido ao fato de que o nível ótimo de luz para as espécies C3 é bem inferior ao das C4 (Nelson, 1995).

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0 1000 2000 3000 4000 5000

Capim-marandu

B. decumbens

Capim-MG4

Capim-mombaça

Capim-jaraguá

Capim-gordura

Forragem disponível (t/ha)

Gramínea +LeguminosaGramínea

Fig. 6. Disponibilidade de forragem no sub-bosque de um sistema agrissilvipastoril, composto por diferentes gramíneas, consorciadas ou não com o estilosantes mineirão, em abril de 2000, dois meses após a realização de pastejo por bovinos (Andrade e Garcia, dados não publicados).

A utilização de leguminosas arbóreas parece ser uma excelente opção para manter um balanço positivo de nitrogênio em sistemas silvipastoris com eucalipto, já que seriam mais fáceis de serem mantidas no sistema do que as leguminosas herbáceas. Porém, estudos com este tipo de associação ainda não foram realizados nas nossas condições. No Havaí, alguns estudos têm mostrado que florestas mistas de eucaliptos com leguminosas arbóreas são mais produtivas do que florestas puras de eucalipto (Binkley e Giardina, 1997). O benefício das árvores leguminosas, por meio do fornecimento de N para as gramíneas associadas, também têm sido mostrado em vários trabalhos (East e Felker, 1993; Belsky, 1994; Carvalho et al., 1994, 1997).

3. Viabilidade dos Sistemas Agrissilvipastoris: Um exemplo

A Companhia Mineira de Metais (CMM), por meio de sua divisão Agroflorestal, vem realizando, desde 1993, algumas experiências com a utilização de sistemas agroflorestais, do tipo agrissilvipastoril rotativo, em suas fazendas localizadas no Noroeste do Estado de Minas Gerais, região dos Cerrados. Estes sistemas consideram o plantio de eucalipto com culturas anuais e forrageiras. No ano de implantação do sistema, planta-se o eucalipto no espaçamento 10 x 4 m e o arroz, nas suas entrelinhas. No ano seguinte, cultiva-se soja e, aos dois anos, é feito o plantio das gramíneas no sub-bosque do eucalipto. Do terceiro ao décimo ano, o sistema será utilizado para a engorda de bovinos por pastejo direto. O eucalipto será colhido aos 11 anos de idade, quando se encerrará o ciclo do sistema, destinando-se sua madeira à serraria. As Tabelas 4 a 7 mostram os custos e as receitas do sistema agrissilvipastoril.

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Tabela 4. Custos de implantação e manutenção do sistema eucalipto, arroz e soja.

Ano Atividade Valor (US$/ha)

0 Implantação 357.25

1 1ª Manutenção 41.21

2 2ª Manutenção 64.65

3 3ª Manutenção 66.99

4 4ª a 11ª Manutenção 13.09

Fonte: Oliveira et al. (2000).

Tabela 5. Custos de preparo do solo, plantio, adubação e colheita de arroz e soja.

Ano Prática cultural Valor (US$/ha)

Preparo do solo 78.20

Plantio/adubação 75.78 Arroz

Colheita 30.47

Preparo do solo 107.73

Plantio/adubação 83.52 Soja

Colheita 30.47

Fonte: Oliveira et al. (2000).

Tabela 6. Custos de formação e manutenção da pastagem, aquisição de novilhos e depreciação.

Ano Itens avaliados Valor (US$/ha)

2 Formação da pastagem 93.20

5 a 8 Manutenção 84.05

3 a 11 Insumos 10.03

3 a 11 Mão-de-obra 1.30

3, 5, 7 e 9 Aquisição de novilhos 97.66

3 a 11 Depreciação 9.74

Fonte: Oliveira et al. (2000).

A implantação de sistemas agrissilvipastoris na região do Cerrado mineiro é viável economicamente, desde que pelo menos 5% da madeira do eucalipto seja para serraria e o restante para energia.

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Prejuízo poderá ocorrer se: o preço da terra for superior a US$200.98/ha; a produtividade do eucalipto for menor que 20.86 st/ha/ano; o preço da arroba do boi for inferior a US$16.75; o preço da madeira para serraria for abaixo de US$5.24/st; o preço da saca de arroz e soja forem inferiores a 5.96 e US$6.34, respectivamente; a taxa de desconto for maior que 11,45% ao ano; e se todos os custos de produção aumentarem, simultaneamente, mais que 5,38%.

Tabela 7. Receitas do sistema.

Ano Produto Quantidade/ha Preço de venda

Valor (US$/ha)

0 Arroz (saca) 23.33 9.37 218.72

1 Soja (saca) 25.00 9.84 246.09

5, 7, 9 e 11 Boi gordo (@/ha) 15.00 19.53 292.97

0 Madeira (st/ha)

(desmatamento e destoca) 50.00 1.56 78.12

11 Madeira eucalipto (st/ha)

(serraria) 55.00 9.37 515.62

11 Madeira eucalipto (st/ha)

(energia) 220.00 3.91 859.37

Obs.: Arrobas de carne (15@/ha) obtidas a cada dois anos. Fonte: OLIVEIRA et al. (2000).

Os indicadores econômicos utilizados pela CMM para avaliar o sistema agrissilvipastoril são apresentados no Quadro 8.

Tabela 8. Indicadores econômicos do sistema agrissilvipastoril.

Custo de Capital

11% 12% 12,4% Idade de

Corte (anos) Valor Presente Líquido (VPL) R$/ha

TIR (%)

7 764,67 650,51 607,26 19,88

8 1014,19 868,28 813,24 20,68

9 912,27 753,34 693,25 18,68

O VPL representa o lucro do SAF, por hectare, para uma dada taxa de juros, considerando que haverá apenas um ciclo de corte.

A TIR representa o retorno (ou lucro) percentual anual do capital investido, por hectare.

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O corte do eucalipto está previsto aos nove anos, onde se terá melhor qualidade de madeira em relação aos 8 anos e uma TIR atrativa de 18,68% para uma taxa de juros de 12,40% ao ano.

4. Considerações Finais

Diante da demanda continuada de madeira para diversos fins, e das limitações de uso hoje impostas às reservas naturais pelos órgãos governamentais, o que é bastante correto, os sistemas silvipastoris se apresentam como importantes e viáveis alternativas para suprir tais demandas, ainda gerando receitas adicionais.

Os sistemas agroflorestais pecuários são viáveis em muitas regiões do Brasil. No entanto, não deve ser esperada produtividade máxima dos componentes desses sistemas, e sim a sustentabilidade do ecossistema e a geração de retornos satisfatórios.

As áreas consideradas impróprias para agricultura ou mesmo áreas exclusivas de pastagens, em estado inicial de degradação, podem ser utilizadas e recuperadas por meio de sistemas agroflorestais pecuários. A aplicação desses sistemas poderá ser feita em propriedades pequenas, médias ou grandes, dependendo dos objetivos de cada proprietário, como também as vantagens advindas da exploração serão as mesmas: aumento da biodiversidade, proteção do solo contra erosão, melhoria da fertilidade do solo, diminuição de propagação de incêndios, geração de renda extra, melhor utilização de mão-de-obra no decorrer do ano e oferta de pasto de melhor qualidade no período da seca. A complexidade aparente no estabelecimento e manejo do sistema existe, mas em qualquer atividade sempre existirão impedimentos de naturezas diversas.

A implantação e manutenção de sistemas agroflorestais é viável economicamente, nas diferentes regiões e propriedades brasileiras, desde que as práticas de manejo recomendadas sejam seguidas e os canais de comercialização para os diferentes produtos melhorados.

Não se pode contestar as vantagens da biodiversidade criada pelo plantio integrado de planas herbáceas, arbustivas e arbóreas, exemplo da própria natureza e princípio da sucessão vegetal. Neste início de século, felizmente, começa a ser adotada no Brasil, a exploração de uso múltiplo e com atenção particular para os sistemas agrissilvipastoris e silvipastoris, os quais, sem dúvida, serão as formas de sustentabilidade de muitas pastagens.

Apesar dos avanços obtidos nas duas últimas décadas, mais pesquisas são necessárias para que a utilização de sistemas silvipastoris na região Sudeste e demais regiões do País seja fundamentada numa base mais sólida de conhecimento.

Exemplos como o da CMM, empresa do Grupo Votorantim, na região dos Cerrados de Minas Gerais, demonstram que a importância da utilização de sistemas silvipastoris já está sendo percebida pelos empresários rurais do nosso país. E isso é de grande relevância, pois, além da contribuição para a divulgação dessa modalidade de uso da terra, ampliam-se as possibilidades de realização de estudos mais aplicados, os quais, devido à natureza dos sistemas agroflorestais, são difíceis de serem realizados em estações experimentais.

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