sistema sensoriomotor articular

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82 Sistema sensório - motor articular: revisão da literatura Joint sensorimotor system: a literature review Marisa de Cássia Registro Fonseca 1 , Aline Miranda Ferreira 2 , Amira Mohamede Hussein 3 1 Fisioterapeuta; Profa. Dra. do do Curso de Fisioterapia do Depto. de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da FMRP/ USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo) 2 Fisioterapeuta; aprimoranda do Programa de Aprimoramento Profissional em Fisioterapia em Ortopedia e Traumatologia do HC (Hospital de Clínicas) da FMRP/USP 3 Fisioterapeuta da Seção de Fisioterapia do HCFMRP/USP ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Marisa C. R. Fonseca Depto. de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor / FMRP Av. Bandeirantes 3900 Monte Alegre 14049-900 Ribeirão Preto SP e-mail: [email protected] Bolsa FUNDAP APRESENTAÇÃO ago. 2005 ACEITO PARA PUBLICAÇÃO out. 2006 RESUMO: Tradicionalmente, a estabilidade articular é considerada como a perfeita congruência entre ossos durante o movimento, sendo que muitas vezes os componentes atribuídos para esta estabilidade se resumem aos ligamentos e músculos envolvidos na articulação. Embora estas estruturas sejam os maiores estabilizadores de uma articulação, a integridade sensório-motora é primordial para uma estabilidade articular eficaz. Nos últimos anos, estudos têm demonstrado grande quantidade de proprioceptores nos componentes articulares, que fornecem informações aferentes periféricas e se relacionam com níveis do sistema nervoso central envolvidos no controle motor, para manter a estabilidade articular. O objetivo desta revisão, feita nas bases de dados Medline e Lilacs, foi identificar as estruturas e a fisiologia do sistema sensório-motor articular, bem como dos níveis de controle motor da propriocepção articular, e definir o papel do sistema sensório- motor na estabilidade da articulação. Concluímos que, apesar do grande número de pesquisas, os caminhos exatos onde o sistema sensório-motor atua na estabilidade articular permanecem incertos. O acompanhamento fisioterapêutico é pouco relatado nas pesquisas, sem uma demonstração clara de sua contribuição para a recuperação da capacidade proprioceptiva da articulação lesionada ou submetida à cirurgia. DESCRITORES: Estabilidade articular; Literatura de revisão; Mecanorreceptores/ fisiologia; Propriocepção ABSTRACT: Joint stability is traditionally defined as the perfect congruence among bones during movement; the components of such stability are often limited to related ligaments and muscles. Although these structures are the greatest joint stabilizers, motor-sensory integrity is fundamental for an efficient joint stability. In the last few years, studies have shown many proprioceptors in joint components that supply afferent peripheral information and are connected to the central nervous system levels involved in motor control, so as to maintain joint stability. The present review – of book chapters and articles found in Medline and Lilacs databases – sought to identify structures and the physiology of the joint motor-sensory system, as well as the levels of joint proprioception motor control, so as to define the role of the motor-sensory system in joint stability. In spite of a large number of studies, it is still uncertain how and where the motor-sensory system exactly acts in joint stability. Physical therapy is scarcely reported by studies and there is not a clear demonstration of its contribution to joint proprioceptive capacity recovery when joint is injured or undergoes surgery. KEY WORDS: Joint stability; Mechanoreceptors/physiology; Proprioception; Review literature FISIOTERAPIA E PESQUISA 2007; 1 4 ( 3) : 82- 90

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Artigo sobre propriocepção e cinestesia articular

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  • 82 FISIOTERAPIA E PESQUISA 2007; 1 4 ( 3)

    Sistema sensrio-motor articular: reviso da literaturaJoint sensorimotor system: a literature review

    Marisa de Cssia Registro Fonseca1, Aline Miranda Ferreira2, Amira Mohamede Hussein3

    1 Fisioterapeuta; Profa. Dra. dodo Curso de Fisioterapia doDepto. de Biomecnica,Medicina e Reabilitao doAparelho Locomotor da FMRP/USP (Faculdade de Medicinade Ribeiro Preto daUniversidade de So Paulo)

    2 Fisioterapeuta; aprimoranda doPrograma de AprimoramentoProfissional em Fisioterapia emOrtopedia e Traumatologia doHC (Hospital de Clnicas) daFMRP/USP

    3 Fisioterapeuta da Seo deFisioterapia do HCFMRP/USP

    ENDEREO PARACORRESPONDNCIA

    Marisa C. R. FonsecaDepto. de Biomecnica,Medicina e Reabilitao doAparelho Locomotor / FMRPAv. Bandeirantes 3900 MonteAlegre14049-900 Ribeiro Preto SPe-mail: [email protected]

    Bolsa FUNDAP

    APRESENTAOago. 2005

    ACEITO PARA PUBLICAOout. 2006

    RESUMO: Tradicionalmente, a estabilidade articular considerada como a perfeitacongruncia entre ossos durante o movimento, sendo que muitas vezes oscomponentes atribudos para esta estabilidade se resumem aos ligamentos emsculos envolvidos na articulao. Embora estas estruturas sejam os maioresestabilizadores de uma articulao, a integridade sensrio-motora primordialpara uma estabilidade articular eficaz. Nos ltimos anos, estudos tm demonstradogrande quantidade de proprioceptores nos componentes articulares, que forneceminformaes aferentes perifricas e se relacionam com nveis do sistema nervosocentral envolvidos no controle motor, para manter a estabilidade articular. Oobjetivo desta reviso, feita nas bases de dados Medline e Lilacs, foi identificar asestruturas e a fisiologia do sistema sensrio-motor articular, bem como dos nveisde controle motor da propriocepo articular, e definir o papel do sistema sensrio-motor na estabilidade da articulao. Conclumos que, apesar do grande nmerode pesquisas, os caminhos exatos onde o sistema sensrio-motor atua naestabilidade articular permanecem incertos. O acompanhamento fisioteraputico pouco relatado nas pesquisas, sem uma demonstrao clara de sua contribuiopara a recuperao da capacidade proprioceptiva da articulao lesionada ousubmetida cirurgia.DESCRITORES: Estabilidade articular; Literatura de reviso; Mecanorreceptores/

    fisiologia; Propriocepo

    ABSTRACT: Joint stability is traditionally defined as the perfect congruence amongbones during movement; the components of such stability are often limited torelated ligaments and muscles. Although these structures are the greatest jointstabilizers, motor-sensory integrity is fundamental for an efficient joint stability.In the last few years, studies have shown many proprioceptors in jointcomponents that supply afferent peripheral information and are connected tothe central nervous system levels involved in motor control, so as to maintainjoint stability. The present review of book chapters and articles found inMedline and Lilacs databases sought to identify structures and the physiologyof the joint motor-sensory system, as well as the levels of joint proprioceptionmotor control, so as to define the role of the motor-sensory system in jointstability. In spite of a large number of studies, it is still uncertain how andwhere the motor-sensory system exactly acts in joint stability. Physical therapyis scarcely reported by studies and there is not a clear demonstration of itscontribution to joint proprioceptive capacity recovery when joint is injured orundergoes surgery.KEY WORDS: Joint stability; Mechanoreceptors/physiology; Proprioception; Review

    literature

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    INTRODUONossa capacidade de saber (conscien-

    te ou inconscientemente) onde nossosmembros se encontram no espaoquando so movimentados, bem comode conhecer as foras geradas pelosmsculos, provm de receptores loca-lizados nos msculos, pele e nas arti-culaes. Essas percepes sensoriais,Juntas, so conhecidas como capaci-dade proprioceptiva.

    A palavra propriocepo foi intro-duzida por Sherrington1. Deriva dolatim proprius, significando de simesmo, e refere-se aos processos sen-soriais envolvidos na apreciao dapostura e do movimento.

    Para Riemann e Lephart2, a proprio-cepo predomina como o termo maiserrneo no mbito do sistema sensrio-motor. Tem sido incorretamente usadocomo sinnimo dos termos cinestesia,sentido de posio articular, somatos-sensao, equilbrio e estabilidadearticular reflexa. Esses pesquisadoresconsideram o termo somatossensorialmais global, pois inclui todos os meca-norreceptores, termoceptores e infor-maes dolorosas da periferia. Aapreciao consciente da informaosomatossensorial leva sensao dedor, temperatura, tato e s sensaesconscientes das submodalidades depropriocepo.

    Sherrington1 traduz a propriocepocomo um termo usado para a regula-o da postura total (equilbrio postu-ral) e postura segmentar (estabilidadearticular), como tambm para o inciode muitas sensaes perifricasconscientes (sentidos musculares). Por-tanto, a propriocepo corretamentedescreve a informao aferenteoriginada de reas perifricas internasdo corpo, que contribuem para ocontrole postural e estabilidadearticular.

    Nos ltimos anos, estudos tmdemonstrado grande quantidade deproprioceptores nos componentesestticos e dinmicos, que forneceminformaes aferentes perifricasrelacionadas direo do movimento,

    velocidade e posio articular para osistema nervoso central (SNC), o qualpor sua vez converte essas informaesem comandos musculares adequados execuo das tarefas motoras.

    Este estudo consiste na reviso daliteratura acerca das estruturas e dafisiologia envolvidas no sistemasensrio-motor articular e da discussode seu papel para a estabilidadearticular.

    METODOLOGIAFoi realizada uma reviso de livros

    e artigos indexados nas bases de dadosPubmed/ Medline e Lilacs, nos idiomasingls e portugus. Para a busca foramutilizadas as seguintes palavras-chaves:propriocepo (proprioception),mecanorreceptores (mechanoreceptors),sistema sensrio-motor (sensorimotorsystem) ou controle motor (motorcontrol). Foram selecionados 31 artigose 10 captulos de livros que caracteri-zassem e/ou discutissem o sistemasensrio-motor articular.

    RESULTADOSOs estudos selecionados so

    apresentados segundo sua abordagemfocalize as bases fisiolgicas, os nveisde controle motor do sistema sensrio-motor articular e o papel da propriocep-o na estabilidade articular.

    Bases fisiolgicas do sistemasensrio-motor articular

    Considerando a percepo cons-ciente da propriocepo, esta pode sersubdividida em dois tipos: (1) sentidode posio esttica, que significa apercepo consciente da orientaodas diferentes partes do corpo, umasem relao s outras; e (2) o sentidoda velocidade do movimento, tambmchamado de cinestesia ou de proprio-cepo dinmica3. Os dois termos somuitas vezes tratados como sinnimose so usados freqentemente para co-brir todos os aspectos dessa percepo,quer esttica quer dinmica4.

    A avaliao da propriocepo cons-ciente tem conduzido, incontestavel-mente, maioria das confuses arespeito da interpretao desse tipo depropriocepo em indivduos suspeitosde terem decrscimo da informaoproprioceptiva, originada de fontesarticulares, seguida de leso orto-pdica e traumatolgica. necessrioter cautela para diferenciar entre asfontes de propriocepo (musculares,cutneas ou articulares) e as sensaesconscientes de propriocepo2.

    As informaes proprioceptivasinconsciente so crticas para os ajus-tes dos movimentos articulares5. Essasinformaes servem para que certasreas do SNC atuem nos movimentosque esto acontecendo e em seuplanejamento, para ajustar o tnus,fora muscular e a amplitude dosmovimentos6.

    Os sinais proprioceptivos so gera-dos em vrios tipos de receptoressensitivos que residem nos msculos,tendes, fscias, articulaes (cpsulae ligamentos) e pele em resposta aosmovimentos do corpo e tenso nessasestruturas4,7.

    Esses receptores sensitivos, denomi-nados mecanorreceptores, funcionamcomo transdutores biolgicos, capazesde converter a energia mecnica dadeformao fsica em potenciais deao nervosos que geram informaesproprioceptivas8. Um aumento dadeformao codificado por um au-mento na descarga aferente ou peloaumento do nmero de receptores ati-vados. Esses sinais fornecem informa-es sensoriais sobre as foras internase externas que esto atuando na arti-culao, nos msculos e tendes9.

    Embora a descarga dos receptoresvarie de acordo com a distoro me-cnica, os mecanorreceptores tambmpodem basear-se em sua velocidadede descarga. Os receptores de adap-tao rpida param de enviar descar-gas logo aps o incio do estmulo, aopasso que os receptores de adaptaolenta continuam a emitir descargaenquanto o estmulo estiver presente.Uma vez estimulados, os mecanorre-

    Fonseca et al. Sistema sensrio-motor articular

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    ceptores so capazes de se adaptar.Com a estimulao constante, a fre-qncia dos impulsos neurais diminui8.

    Os mecanorreceptores das articula-es respondem deformao me-cnica da cpsula e dos ligamentos.As terminaes de Ruffini, encontra-das na cpsula articular, so ativadasem todas as posies articulares,mesmo em repouso, sendo maissensveis movimentao passiva queativa. So consideradas receptoresesttico e dinmico, segundo suascaractersticas de baixo limiar e adap-tao lenta. Os corpsculos pacinia-nos respondem ao movimento din-mico, pois so inativos no repouso, masativos assim que iniciado o movi-mento. So receptores de baixo limiare adaptao rpida. Os receptores doligamento so semelhantes aos rgostendinosos de Golgi, sinalizandotenso. Tm moderado limiar mec-nico e adaptao lenta. Terminaesnervosas livres so estimuladas maisfreqentemente por estmulos nocivos,sendo receptores de adaptao lentae moderado limiar mecnico2,4,7. Osaferentes associados aos receptoresarticulares so:

    receptores dos ligamentos fibras nervosas Ib;

    terminaes de Ruffini e Pacini fibras nervosas II;

    terminaes nervosas livres fibras nervosas Ad e C.

    A distribuio desses receptores no uniforme numa articulao, podendorefletir a localizao de presses du-rante o movimento. Alguns pesqui-sadores consideram que a maioria dosreceptores articulares so ativadosprximo amplitude completa domovimento e, por essa razo, noproduzem um sinal inteligvel relacio-nado posio da articulao ecinestesia1,6. Essas propriedades daresposta sugerem que os receptoresarticulares podem funcionar comodetectores de limite, cujo papel sina-lizar posies de extrema amplitudeda articulao e, ao fazerem isso,previnem a leso articular10. Essas afir-maes contradizem algumas tcnicas

    de avaliao proprioceptiva do joelhoaps a ruptura ou cirurgia para recons-truo do ligamento cruzado anterior(LCA), j que estas avaliam a sensi-bilidade de posio articular em todasua amplitude de movimento.

    Outros pesquisadores6,11 relatam quemuitos receptores articulares indi-viduais so ativados em toda amplitu-de de movimento; assim, essas infor-maes aferentes sobem at o crtexcerebral e contribuem para a percep-o da posio articular no espao.

    Adachi et al.12 relataram a con-tribuio dos mecanorreceptores LCApara o senso de posio articular. Osautores avaliaram o senso de posioarticular em sujeitos com leso LCAtrs dias antes da cirurgia de recons-truo ligamentar. Durante a cirurgia,recolheram o retalho remanescente doLCA e posteriormente fizeram umaanlise histolgica. Os resultados de-monstraram que os sujeitos com umapopulao maior de mecanorrecepto-res no retalho do LCA tiveram melhorpercepo da posio articular.

    Riemann e Lephart10, em 2002, numareviso de literatura sobre esse tpico,encontraram estudos com modelosanimais mostrando que os mecanorre-ceptores localizados na cpsula articularno parecem ser suficientementeestimulados atravs dos quadrantes demovimento para contriburem subs-tancialmente para a informao proprio-ceptiva consciente, especialmente secomparados aos impulsos originados dereceptores musculares. Mas os autoresalertam que essas evidncias foramcoletadas durante movimentos passi-vos, e pesquisas tm reportado aumen-to na taxa de trabalho dos receptoresarticulares durante movimentos ativos.Para Riemann e Lephart10, a demons-trao da existncia de projees parareas corticais sensoriais e a percep-o consciente depois de uma estimu-lao direta no receptor necessriana determinao da fonte predomi-nante da propriocepo consciente.

    Desse modo, a fonte predominanteou as fontes que contribuem para apropriocepo consciente permane-

    cem abertas para debate. Parte dacontrovrsia pode residir nos dife-rentes mtodos usados pelos pesqui-sadores. Contudo, a plena proprio-cepo depende dos fusos musculares,dos receptores articulares e dos meca-norreceptores cutneos. Essa redun-dncia reflete, provavelmente, a im-portncia da propriocepo para ocontrole do movimento.

    Nveis de controle motor dapropriocepo articular

    Os componentes do sistema soma-tossensorial que contribuem para aestabilidade dinmica articular corres-pondem s reas que modulam o con-trole motor do corpo inteiro. Essescomponentes consistem em um eixocentral e se dividem em trs nveis decontrole motor medula espinhal,tronco cerebral, crtex cerebral eduas reas associativas cerebelo encleos da base ,responsveis pelamodulao dos comandos motores2.

    As reas do eixo central so organi-zadas de forma hierrquica e emparalelo. A organizao hierrquicasegue a rea motora mais baixa nocontrole automtico de atividades mo-toras comuns, enquanto os centrossuperiores podem ativar meios paracontrolar as atividades motoras preci-sas e geis. Alm disso, os nveis su-periores podem regular a informaoaferente, influenciando-as por meio decontroles inibitrios e facilitatriossobre os ncleos sensoriais supridos1,2,5.

    A ativao de neurnios motorespode ocorrer em resposta direta aimpulsos sensoriais perifricos(reflexos) ou comandos descendentesiniciados no tronco cerebral ou nocrtex, ou ambos. Independente dafonte inicial, a ativao muscularocorre pela convergncia de sinais deneurnios motores localizados nacoluna ventral da medula2,5. Hierar-quicamente, o nvel medular operacom um papel integrativo no controlemotor2.

    Um estudo de Solomonow eKrogsgaard13 mostra que a inervao

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    ascendente e espinhal dos mecanor-receptores nas vrias estruturas dojoelho termina na medula espinhal.Conexes sinpticas so amplas parainterneurnios na coluna dorsal damedula com conexo sinptica finalpara os neurnios motores associadoscom a musculatura. Esse arranjoanatmico permite aos mecanor-receptores elicitar vrios reflexos13.

    Shumway-Cook e Woollacott6

    relatam uma pesquisa de Griller em1960, que conduziu experimentos nosquais se seccionaram as razes dorsaisda medula espinhal de gatos, a fim deeliminar as informaes aferentes daperiferia. A medula espinhal foi esti-mulada e conseguiram ativar o padroneural locomotor. Essa pesquisademonstrou que baixos ndices deestimulao repetitiva produzem amarcha; ndices mais altos, um trote;e os mximos, um galope. Isso sugereque movimentos complexos, como alocomoo, podem ser produzidos nonvel da medula espinhal sem asinfluncias ou as informaes aferen-tes supra-espinais.

    Em adio aos reflexos medulares,h projees ascendentes que tra-fegam em paralelo medula e termi-nam sobre vrias estruturas do troncoe crtex cerebral13. As informaessensrias chegam s estruturas supra-espinais, alcanando o nvel conscien-te. Essas vias foram demonstradasexperimentalmente pelo uso de mi-croestimulao de aferentes indi-viduais em humanos14. Atravs dessearranjo em paralelo, cada centro decontrole motor pode diretamente emitircontribuio independente aos co-mandos motores descendentes, dire-tamente sobre os motoneurnios2,6.

    As reas do tronco enceflico regu-lam e modulam diretamente a ativi-dade motora com base na integraoda informao sensorial das fontesvisuais, vestibular e somatossensorial.Atravs dos tratos medial e lateral,levam informao descendente paraa medula espinhal2. O tronco ence-flico desempenha uma funo impor-tante para o controle postural. Umexemplo seriam as reaes geradas

    quando um forte som produzido atrsde algum: mesmo antes de se tornarconsciente esse estmulo, os olhos e aface se voltam para o som e os ajustesposturais sustentam esse movimento15.

    O crtex cerebral responsvelpela interpretao do estmulo sen-srio, incio e controle dos movimentosvoluntrios. O crtex somatossentivo uma rea importante de processa-mento para todas as modalidadessomatossentivas e marca o incio daconscincia do movimento articular.No crtex somatossentivo so integra-das as informaes dos receptoresarticulares, dos fusos musculares e dosreceptores cutneos, para nos darinformaes sobre o movimento emuma determinada rea do corpo6.

    As diferentes reas do crtex motorso especializadas no desempenho dediferentes funes16. O crtex motorprimrio recebe informaes aferentessensoriais de muitas vias e respon-svel pelo processamento de informa-es cinticas, ou seja, pela ativaoe fora muscular, e tambm pela velo-cidade necessria para desempenharo movimento desejado. A rea pr-motora tambm recebe impulsos sen-soriais; entretanto, est mais envolvidacom a organizao e preparao docomando motor. A rea suplementartem um papel importante no plane-jamento de seqncias complexas demovimentos que envolvem vriosgrupos musculares2,6,16. Ento, podemossupor que essas reas do crtex motorparticipam do planejamento e coman-do motor, convertendo informaessensoriais relacionadas direo domovimento, velocidade e posioarticular para estabelecer comandosmusculares adequados execuo dastarefas motoras.

    Duas outras reas associativas docentro superior do controle motor,apesar de no poderem iniciar deforma independente a atividade mo-tora, so essenciais para a execuocoordenada do controle motor. Apercepo final do que est ocorrendono ambiente que nos rodeia atingidadepois que todas essas sensaes sointegradas e interpretadas pelas reas

    de associao adjacentes e vriasreas sensoriais ligadas aos diferentestipos de aferncias sensoriais8.

    O cerebelo, que opera inteiramentenum nvel subconsciente, tem o maiorpapel no planejamento e modificaodas atividades motoras, comparandoo movimento pretendido com omovimento realizado2,6. No cerebelo,os estmulos proprioceptivos chegamatravs do trato espinocerebelar, queemite informaes sobre o comprimen-to muscular, a velocidade de estira-mento, fora aplicada, formando asensibilidade proprioceptiva in-consciente. Por outro lado, outras duasvias espinocerebelares so especiali-zadas para fornecer ao cerebeloretroalimentao (feedback) sobre aatividade nos interneurnios espinhaise nos tratos motores descendentes.Essas vias do trato espinocerebelarnunca alcanam o crtex sensorial,sendo portanto subconscientes. Ocerebelo utiliza informao proprio-ceptiva na manuteno e coordenaodo movimento, elicitando reflexos efacilitando a preciso e controlemuscular5,13.

    Os gnglios da base conectam-secom o crtex pelo tlamo. Essesncleos no recebem somente impul-sos do crtex motor e sensorial, massim de todo o crtex2. Os gnglios dabase participam da comparao entrea informao proprioceptiva e os co-mandos para o movimento, para definira seqncia do movimento e para re-gulao do tnus e da fora muscular.Hallet15 props que a funo dosgnglios da base seria de inibir si-nergias motoras especficas pela viadireta da circuitaria, enquanto a viaindireta inibiria outras sinergias.

    Papel da propriocepo no controlemotor para estabilidade articular

    As informaes sobre a posio,velocidade e direo dos movimentosdas articulaes e do corpo soimportantes fatores para manter ocontrole postural17.

    O processo de manuteno da esta-bilidade articular realizado pela

    Fonseca et al. Sistema sensrio-motor articular

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    relao complementar entre oscomponentes estticos e dinmicos.Ligamentos, cpsula articular, carti-lagem, atrito e geometria ssea dentroda articulao compem os elementosestticos. A contribuio dinmicaresulta dos controles de antecipao(feedforward) e retroalimentao(feedback) sobre os msculos que atra-vessam a articulao. A eficcia dasrestries dinmicas no s se caracte-riza pelas propriedades fsicas ebiomecnicas da articulao, queincluem fora, resistncia (endurance)e alongamento muscular, mas tambmpelo sistema sensrio-motor intacto2.

    O controle neuromuscular a basepara todas as atividades motoras,especialmente em relao eficciadas restries dinmicas na contribui-o do desempenho ao se realizar umadeterminada ao. Riemann e Lephart2,na perspectiva da estabilidade articular,definem o controle neuromuscular comoa ativao inconsciente das restriesdinmicas que ocorrem na preparaoe na resposta ao movimento e so-brecarga articular, com o propsito demanter e restaurar a estabilidade arti-cular. Lephart et al.9 o definem comosendo a resposta eferente do msculo,que transforma informaes neurais emenergia fsica.

    A informao proprioceptiva dispa-rada pelos receptores articulares emusculares desempenha um papelintegrante no controle neuromuscularque, numa tarefa simples, sofre cons-tantes revises e modificaes, basea-das na integrao e anlise do impulsosensorial, comando motor eferente,resultando assim, nos movimentos2.

    Porm, apesar do avano cientificoe tecnolgico de que atualmentedispomos para analisar o comporta-mento motor, muitas dvidas aindapermanecem sem respostas, frente complexidade que constitui a aomotora17.

    Durante o ato de se aproximar deum objeto ou, por exemplo, levantaruma caixa enquanto se caminha, umagrande quantidade de variveis sogeradas. Correspondem velocidade

    linear da extremidade que se move,trajetria linear, velocidade angular decada articulao envolvida no ato,torque muscular gerado em cadaarticulao, torque de interao, entreoutras17. Para ajustar o plano motor,provises devem ser feitas para amarcha quando ocorrem alteraes noambiente externo (por exemplo, pisoirregular) e no ambiente interno (mudan-as no centro de massa devido cargaadicional). Essas provises, que soestimuladas pelos receptores sensoriais,ocorrem em feedback os mecanorre-ceptores detectam a alterao da super-fcie de apoio e em feedforward mu-dana precoce do centro de gravidadea partir de experincias prvias9,10.

    Misailidis17 sugere que, durante aexecuo de movimentos multiarti-culares, devemos considerar a parti-cipao das foras de interao gera-das pelos movimentos de uma articula-o (focal) sobre a outra (no-focal),quando elas so interligadas no mesmosegmento corporal. Essas foras aca-bam gerando torques de interao, quetendem a perturbar o movimento arti-cular das articulaes no-focais.Dessa maneira, de algum modo essestorques devem ser compensados ouintegrados durante um ato motor.

    Essas perturbaes dos movimentosarticulares so percebidas pelosreceptores sensoriais envolvidos naarticulao, que fornecem informa-es ao SNC. Este ltimo apresentaestruturas que participam do controlemotor articular, como j descrito,convertendo as informaes sensoriaisem respostas dinmicas para proteoarticular e conseqente melhordestreza nos movimentos.

    Noble e Prentice18 realizaram umestudo sobre as adaptaes dosmembros inferiores submetidos aalteraes mecnicas durante amarcha. O objetivo do estudo foiavaliar as alteraes cinemticas ecinticas unilaterais dos membrosinferiores de sujeitos saudveis,quando foram adicionados, eposteriormente retirados, dois quilosna coxa dos sujeitos durante a marcha.Observaram que adio e retirada da

    massa requerem um perodo deadaptao, at que a cinemtica arti-cular se normalize durante a marcha.Notaram que essa adaptao cinem-tica foi devida a alteraes dos torquesmusculares dos msculos da coxa,joelho e tornozelo. Os autores conclu-ram que essas mudanas caracterizamuma resposta consistente para adaptaras alteraes mecnicas durante amarcha e garantir a integridade dalocomoo, para prevenir eventuaistropeos e quedas.

    Para Lephart et al.9, o mecanismode antecipao (feedforward) ou pr-ativao muscular, que prepara aarticulao para movimentos e cargasque lhe sero impostas, vem se desta-cando quanto aos mecanismos envol-vidos no controle motor. Afirmam quea pr-ativao muscular exerce diver-sas funes que contribuem para osistema de estabilizao dinmica,por aumentarem os nveis de ativaomuscular e, assim, a rigidez de toda aunidade musculotendnea. Essesaumentos na ativao e na rigidezmuscular podem acentuar drastica-mente a sensibilidade ao estiramentodo sistema dos fusos musculares,enquanto reduz o retardo eletromec-nico necessrio para desenvolver atenso muscular. O aumento da sensi-bilidade ao alongamento e da rigidezpode melhorar as capacidades reativasdo msculo, por proporcionar retroali-mentao adicional e por sobrepor osreflexos de estiramento aos comandosmotores descendentes.

    DISCUSSOMuitos estudos tm demonstrado a

    importncia dos mecanorreceptores nocontrole motor para a estabilidade arti-cular. Com relao articulao dojoelho, para Solomonow e Krogsgaard13

    h evidncias diretas de que os liga-mentos tambm servem como umrgo sensrio-dinmico, que disparaou inicia atividade sinrgica muscular,em adio ao seu papel passivo delimitao do movimento dentro doalcance da estabilidade articular,prevenindo subluxao.

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    Em 1966, Freeman e Wyke19 j evi-denciavam a importncia dos recepto-res articulares. Realizaram um experi-mento onde seccionaram cirurgica-mente os nervos articulares mediais ouposteriores dos gatos, causando umadesaferenciao da articulao do joe-lho sem o desarranjo da estabilidadedinmica. Aps a cirurgia, os animaisexibiam mudanas do plano motorsupra-espinal no controle dos movi-mentos voluntrios. Dessa maneira,puderam constatar o quanto os meca-norreceptores localizados na articula-o tm um papel fundamental no con-trole motor para o desempenho de umaatividade.

    Tm surgido evidncias da exis-tncia de reflexos musculoligamen-tares, atravs da estimulao eltricae mecnica do LCA em joelho deanimais e humanos20-26. A maioria dosestudos sugere que esse reflexo existacom a finalidade de aumentar a esta-bilidade articular, por meio dasrestries dinmicas, quando a arti-culao do joelho exposta a sobre-cargas, evitando assim leso daarticulao.

    Solomonow e Krogsgaard13 exempli-ficaram esse mecanismo de regulaoda estabilidade da articulao do joe-lho. Se o LCA sujeito a grandes forasonde h um deslizamento anterior datbia, alm do limite fisiolgico do li-gamento, os receptores deste dispara-ro contrao dos isquiotibiais, osquais o assistiro, prevenindo o citadodeslizamento anterior e, por contra-o, puxam a tbia posteriormente.

    Duhre-Poulsen e Krogsgaard20

    estudaram a atividade dos msculosda coxa em humanos aps estimula-o eltrica do LCA. Dos oitos pacien-tes avaliados, sete apresentaramvisvel contrao dos msculos isquio-tibiais. Para tanto, foram necessriosno mnimo dois estmulos para evocarqualquer contrao visvel dos ms-culos isquiotibiais, pois um s estmulono provocou qualquer resposta.Quando os msculos flexores do joelhoforam isometricamente contrados porativao voluntria, as respostas mu-

    daram para uma total inibio da ati-vidade dos msculos isquiotibiais emtodos os oito pacientes. A discussodessa pesquisa baseou-se nas evi-dncias de ambas influncias, facili-tatria e inibitria, sobre a atividadedos a-motoneurnios. A latncia dasrespostas variou entre 65 e 95 ms, indi-cando que as respostas foram de ori-gem reflexa e no voluntria. O fatode que no mnimo duas estimulaesforam necessrias para produzir umaexcitao ou inibio, quanto longalatncia, sugere que os reflexos forampolissinpticos, fornecendo ao SNCabundantes possibilidades paramodular a atividade muscular. Norepouso, impulsos elicitados no LCAproduziram ativao dos msculosisquiotibiais, suportando a hiptese deuma automtica sinergia LCA-isquiotibiais. Contudo, com estmulode amplitudes de dois tempos do limiarsensrio, como usado no experimento,essa sinergia s foi presente durante orepouso, mudando para uma inibiodurante a atividade motora.

    A importncia desse arco reflexotambm explicada por Johansson etal.11, comparando a translao tibialanterior quando um sujeito realizamxima contrao isomtrica dosmsculos da coxa e quando os mesmosmsculos esto relaxados. A contraocausa aumento na estabilidade arti-cular, sendo a translao tibial an-terior bem menor se comparada dosmsculos relaxados. Porm, esses auto-res descrevem que esse arco reflexo direcionado trajetria do motoneu-rnio gama, contribuindo para a pr-programao do tnus dos msculosao redor da articulao do joelho eassim, tambm, para a regulao daestabilidade articular.

    Holm et al.27 encontraram que osaferentes sensoriais dos tecidos viscoe-lsticos espinhais, como ligamentos,cpsula articular e disco interverte-bral, so capazes de monitorar as infor-maes proprioceptivas e cinestsicas.Seus estmulos so capazes de desen-cadear a contrao reflexa dos ms-culos multfido e longssimo espinhalpara a estabilizao articular local.

    Entretanto, a aplicabilidade dessesachados na fisiologia normal perma-nece especulativa e incerta. Em rela-o estimulao mecnica, esta temsido criticada como carga alm dafisiolgica. Contudo, mesmo assumin-do que o reflexo musculoligamentarexista, uma questo sua eficinciae contribuio proteo articular,devido ao tempo de latncia e magnitude de resposta ineficaz,especialmente em comparao comos reflexos dos fusos musculares10.

    Na prtica clnica, a investigaoda condio sensrio-motora de umaarticulao lesionada ou tratadacirurgicamente tem sido realizada pelaavaliao cinestsica ou do senso deposio articular28-34. Iwasa et al.28

    analisaram as alteraes do senso deposio articular do joelho de pacien-tes submetidos reconstruo doligamento cruzado anterior (LCA),tendo-os avaliado antes e depois dacirurgia. Houve um decrscimo signi-ficante do senso de posio articularantes da cirurgia, que permaneceu atseis meses de ps-operatrio. Nasavaliaes 18, 21 e 24 meses depoisda cirurgia o senso de posio articularmelhorou significantemente, concluindoque a restaurao cirrgica do LCA me-lhora a funo proprioceptiva conscien-te da articulao do joelho. Mesmasconcluses obtiveram Birmingham etal.29 e Barret30 em seus respectivosestudos. Contudo, MacDonald et al.31,que avaliaram seus pacientes numamdia de 24 meses de ps-operatrio,e Newberg21, que avaliou numa mdiade 15 meses de ps-operatrio, no en-contraram em seus pacientes qualquermelhora do senso de posio articularnos joelhos com LCA reconstrudo,usando como controle o joelho contra-lateral.

    Barden et al.32 avaliaram, por meiode vdeo tridimensional, a capacidadede elevao do membro superior emindivduos com instabilidade multidi-recional do ombro, comparando-oscom um grupo controle. Observaramque sujeitos com instabilidade multidi-recional do ombro parecem ter reduzi-da a capacidade proprioceptiva para

    Fonseca et al. Sistema sensrio-motor articular

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    refinar e controlar a ao motora deelevao do membro superior, quandocomparados ao grupo-controle.

    Ptzol et al.33 estudaram a capaci-dade proprioceptiva do senso deposio articular pr e ps-operatria(de no mnimo 5 anos) de sujeitos cominstabilidade anterior de ombro egrupo-controle. Seus resultados mos-traram que aps uma mdia de 5,9anos, o senso de posio articular me-lhorou significantemente na flexo,abduo e rotao externa.

    Cuomo et al.34 avaliaram a proprio-cepo consciente, senso de posioarticular e cinestesia em sujeitos comosteoartrite severa e artroplastia deombro. Observaram que sujeitos comosteoartrite severa apresentavamgrande deficit na propriocepo domembro, quando comparado ao con-tralateral e ao do grupo controle, e queseis meses aps a artroplastia os resul-tados foram melhores, sem alteraoda propriocepo.

    A propriocepo na articulao doombro tambm foi avaliada por Supraket al.35, que analisaram o senso deposio articular na flexo e elevaono plano escapular em ombros desujeitos sem histria de patologiasnessa articulao. Os resultados norevelaram qualquer diferena napropriocepo entre os planos. Aacuidade do senso de posio articularmelhorou linearmente entre os ngulosde 30 e 90, e entre 90 e 110 di-minuiu. Os autores sugerem que osenso de posio articular pode me-lhorar com o aumento da atividademuscular.

    Alteraes no controle postural tam-bm foram investigadas em sujeitoscom leso do LCA. Bonfim e Barela36

    avaliaram a manuteno da posturaereta com apoio bipodal e unipodal,sobre uma plataforma de fora, emsujeitos submetidos reconstruo doLCA com tempo mdio ps-cirrgicode 19,6 meses. Os resultados revela-ram uma alterao no equilbrio pos-tural no apoio unipodal sobre o membrosubmetido a reconstruo, comparadosao grupo controle. Concluram que a

    substituio do LCA por enxerto temefeito sobre o controle postural ematividades de apoio unipodal sobre omembro acometido, o que pareceocorrer pela reduo das informaessomatossensoriais do joelho.

    Henriksson e colaboradores37 notiveram os mesmos resultados em seusestudos. Avaliaram o controle posturalde sujeitos com reconstruo do LCA,que se mostrou normal, comparado aodo grupo controle. Os sujeitos avalia-dos tinham uma mdia de 36 mesesde ps-cirrgico e todos passaram porum processo de reabilitao queinclua exerccios de estimulaoproprioceptiva e treino de agilidade.Os autores concluram que essesexerccios so importantes componen-tes na restaurao da estabilidadefuncional de joelho com ligamentoreconstrudo.

    Estudos com teste de potencial evo-cado somatossensorial tm sido pro-postos para avaliar as projees dosistema nervoso perifrico e centralquando os mecanorreceptores arti-culares so estimulados externamen-te38,39. Em 1999, Valeriani et al.38

    avaliaram as anormalidades clnicase neurofisiolgicas antes e aps areconstruo do LCA. Usaram testesde senso da posio articular do joelhoe potenciais evocados somatossen-soriais com estimulao do nervo pe-roneal comum. Os resultados demons-traram que, antes da cirurgia os sujei-tos apresentavam um deficit no sensode posio articular e ausncia dopotencial evocado cortical P27. Apsa cirurgia (tempo mnimo de dois anosde ps-operatrio) esses resultados semantiveram. Os autores sugerem quea ausncia do potencial P27 provavel-mente indica reorganizao do SNCpela perda dos inputs aferentes proprio-ceptivos. Entretanto essa reorganiza-o do SNC no foi compensada poroutras estruturas, j que o senso deposio articular no apresentoumelhora.

    Courtney et al.39, em 2005, avalia-ram as mudanas somatossensoriaiscentrais, por meio de teste de potencial

    evocado somatossensorial, alteraesna sinergia dos msculos da coxa e acinestesia em sujeitos com leso doLCA durante a marcha. Os sujeitosforam divididos em dois grupos, os quepraticavam atividade fsica e osadaptados que no praticavam, masmantinham boa fora muscular. Nosresultados, observaram que os sujeitosque praticavam atividade fsicaapresentavam alteraes no potencialevocado somatossensorial (perda dopotencial P27) e alteraes no padrode ativao neuromuscular (precoceativao dos isquiotibiais egastrocnmio), quando comparados aomembro contralateral. Na concluso,os autores sugerem que essasmudanas e o uso do membro emsituaes que provocam instabilidadeda articulao pode capacitar aaprendizagem de uma alternadasinergia para minimizar a instabilidadee otimizar o nvel de funo.

    A capacidade proprioceptiva desujeitos com leso ortopdica etraumatolgica vem despertando cadavez mais interesse na prtica clnica.Supe-se que o treinamento proprio-ceptivo tem uma funo positiva edeve ser includo na recuperao deleso ortopdica e traumatolgica, ten-do em vista os conceitos apresentadosneste estudo, em que o sistema nervosotransforma as informaes aferentes domecanorreceptores articulares ematividade muscular sincronizada aoredor da articulao, garantindo suaestabilidade.

    Em 2005, Fonseca et al.40 mostraramem seu estudo que os sujeitos comleso do LCA com boa fora musculare performance funcional no apre-sentavam dfices na sensibilidade deposio articular, comparando tantocom o membro contralateral quantocom o grupo controle. Os autoresconcluram que os mecanorreceptoreslocalizados no LCA no contribuemefetivamente para a funo proprio-ceptiva do joelho. Vale ressaltar quetodos os sujeitos do estudo realizaramtratamento fisioteraputico aps aleso.

  • 89FISIOTERAPIA E PESQUISA 2007; 14 ( 3)

    REFERNCIAS

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    Uma hiptese que pode ser levan-tada a de que o tratamento fisiotera-putico com exerccios de estimu-lao proprioceptiva pode sensibilizaroutros componentes sensoriais naarticulao e msculos para suprir odeficit dos mecanorreceptores da es-trutura lesionada, mantendo asinformaes necessrias para que o sis-tema nervoso atue na articulao semprejuzos na performance funcional.

    Numa reviso sistemtica, Cooperet al.41 analisaram estudos que rela-tassem os efeitos dos exerccios deestimulao proprioceptiva em sujei-tos com LCA ou no ps-cirrgico dereconstruo desse ligamento. Foramanalisados cinco estudos, sendo quatrofeitos com sujeitos com leso do LCAe um estudo em sujeitos com recons-truo. Encontraram algumas evi-dncias de que os exerccios de esti-mulao proprioceptiva so eficazesem sujeitos com leso do LCA. Os es-tudos analisados demonstrarammelhora na sensibilidade de posio

    articular, fora muscular, autoper-cepo da funo do joelho e nostestes de saltos. Contudo, os autoreschamaram a ateno para o fato deque a reviso foi realizada com umaamostra pequena, pois poucos estudosabordam a interveno desses exer-ccios, sugerindo a necessidade demais pesquisas para avaliar se os exer-ccios de estimulao proprioceptivaso realmente benficos.

    Apesar do vasto interesse nas pes-quisas em estudar o sistema sensrio-motor articular, os resultados destaspermanecem contraditrios, sem al-canar uma representao precisa dasalteraes proprioceptivas aps umaleso ou aps interveno cirrgica.O acompanhamento fisioteraputico pouco relatado nas pesquisas, o quedeve despertar interesse em novas pes-quisas, para evidenciar se exercciosfisioteraputicos especficos so capa-zes de contribuir para a recuperaoda capacidade proprioceptiva daarticulao lesionada ou submetida cirurgia.

    CONCLUSOA presente reviso permite observar

    que a propriocepo articular tem umpapel importante no que diz respeitoao controle motor, j que o sistemanervoso central converte as informa-es relacionadas direo do movi-mento, velocidade e posio articularem comandos musculares adequadosna execuo das tarefas motoras.

    O adequado funcionamento dasestruturas sensrio-motoras articularesdeve ser objetivo de tratamento empacientes com leses perifricas, parapossibilitar que o corpo mantenha aestabilidade esttica e dinmica ne-cessria para que o indivduo exerasuas atividades com o mesmo desem-penho de antes da leso, prevenindorecidivas e instalao de novas leses.

    Mais estudos devem ser incentivadospara demonstrar a eficcia do tratamentofisioteraputico para a recuperao dacapacidade proprioceptiva em sujeitoscom leso ortopdica e traumatolgicaou submetidos interveno cirrgica.

    Fonseca et al. Sistema sensrio-motor articular

  • 90 FISIOTERAPIA E PESQUISA 2007; 1 4 ( 3)

    Referncias (cont.)

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