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Anais do VIII Fórum de Pesquisa Científica em Arte. Curitiba: ArtEmbap, 2011. ISSN 1809-2616 SÍNDROME DE DOWN E ENSINO DE ARTE: POSSIBILIDADES DA TECNOLOGIA COMO MEDIADORA Helene Paraskevi Anastasiou 1 [email protected] Neli Klix Freitas 2 [email protected] Resumo: Este relato apresenta um recorte de uma pesquisa maior, na qual investigamos o ensino de Arte para pessoas com síndrome de Down e na qual empregamos diferentes metodologias e técnicas. Aqui apresentamos dados e atuações junto aos participantes da pesquisa, em que se utiliza a tecnologia como mediadora nesse aprendizado pretendido. Palavras-chave: Síndrome de Down; Ensino de arte; Tecnologia. Abstract: This report refers to a crop of a larger research, in which we investigate the art teaching for people with Down Syndrome and where we employ different methodologies and techniques. In here we present data and performances with the research participants, where technology is utilized to mediate this desired learning. Key words: Down Syndrome; Art teaching; Technology. UM RECORTE Este artigo apresenta um recorte de uma pesquisa de mestrado, realizada com a metodologia de pesquisa-ação, que investiga o ensino de Arte em ambiente não-formal para pessoas com Síndrome de Down, acima da idade escolar. Para a conceituação da pesquisa-ação foram estudados e utilizados os autores Barbier, Andaloussi e Thiollent. Andaloussi afirma que a função desta metodologia é a de diagnosticar 1 Helene Paraskevi Anastasiou - Possui graduação em Escultura (Bacharelado) pela EMBAP-Curitiba, PR. É aluna regular do Mestrado em Artes Visuais PPGAV UDESC, bolsista CAPES. A pesquisa de Mestrado envolve a produção de pessoas com síndrome de Down, em ONGs. 2 Neli Klix Freitas - Possui doutorado em Psicologia, formação em Arte, e é orientadora da primeira autora no Mestrado-PPGAV/UDESC. É líder do Grupo Memórias Sociais, Percepção, Imaginação, Processos Cognitivos e Imaginativos do diretório dos pesquisadores do CNPq. É docente permanente do PPGAV/UDESC. Desenvolve pesquisa sobre ensino e aprendizagem em arte, trazendo os resultados através de narrativas verbais e visuais de autistas e pessoas com síndrome de Down. Pesquisa também sobre dimensões estéticas presentes na formação de professores e memórias sociais de instituições, cidades e famílias. Desenvolve pesquisa também com jovens em situação de risco social, visando à educação do olhar para espaços e contextos da cidade e à apreciação estética do cotidiano.

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Anais do VIII Fórum de Pesquisa Científica em Arte.

Curitiba: ArtEmbap, 2011. ISSN 1809-2616

SÍNDROME DE DOWN E ENSINO DE ARTE: POSSIBILIDADES DA TECNOLOGIA COMO MEDIADORA

Helene Paraskevi Anastasiou1 [email protected]

Neli Klix Freitas2 [email protected]

Resumo: Este relato apresenta um recorte de uma pesquisa maior, na qual investigamos o ensino de Arte para pessoas com síndrome de Down e na qual empregamos diferentes metodologias e técnicas. Aqui apresentamos dados e atuações junto aos participantes da pesquisa, em que se utiliza a tecnologia como mediadora nesse aprendizado pretendido. Palavras-chave: Síndrome de Down; Ensino de arte; Tecnologia. Abstract: This report refers to a crop of a larger research, in which we investigate the art teaching for people with Down Syndrome and where we employ different methodologies and techniques. In here we present data and performances with the research participants, where technology is utilized to mediate this desired learning. Key words: Down Syndrome; Art teaching; Technology. UM RECORTE

Este artigo apresenta um recorte de uma pesquisa de mestrado, realizada com a

metodologia de pesquisa-ação, que investiga o ensino de Arte em ambiente não-formal para

pessoas com Síndrome de Down, acima da idade escolar.

Para a conceituação da pesquisa-ação foram estudados e utilizados os autores Barbier,

Andaloussi e Thiollent. Andaloussi afirma que a função desta metodologia é a de diagnosticar

1 Helene Paraskevi Anastasiou - Possui graduação em Escultura (Bacharelado) pela EMBAP-Curitiba, PR. É aluna

regular do Mestrado em Artes Visuais – PPGAV – UDESC, bolsista CAPES. A pesquisa de Mestrado envolve a produção de pessoas com síndrome de Down, em ONGs. 2 Neli Klix Freitas - Possui doutorado em Psicologia, formação em Arte, e é orientadora da primeira autora no

Mestrado-PPGAV/UDESC. É líder do Grupo Memórias Sociais, Percepção, Imaginação, Processos Cognitivos e Imaginativos do diretório dos pesquisadores do CNPq. É docente permanente do PPGAV/UDESC. Desenvolve pesquisa sobre ensino e aprendizagem em arte, trazendo os resultados através de narrativas verbais e visuais de autistas e pessoas com síndrome de Down. Pesquisa também sobre dimensões estéticas presentes na formação de professores e memórias sociais de instituições, cidades e famílias. Desenvolve pesquisa também com jovens em situação de risco social, visando à educação do olhar para espaços e contextos da cidade e à apreciação estética do cotidiano.

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uma situação e promover uma ação que abrange acompanhar, observar e conferir sentido a

ela própria, buscando alcançar objetivos comuns ao grupo (ANDALOUSSI, 2004, p. 86). Assim,

nesta pesquisa, trabalhou-se em conjunto, o grupo e a mediadora, buscando alguns elementos

de superação de seu ser atual, da construção do conhecimento, da realidade e de sua própria

inserção neste processo.

Para localizar o leitor passamos a descrever alguns elementos sobre a síndrome de

Down. Segundo Kozma (2007) refere-se à síndrome descoberta pelo médico John Langdon

Down, em 1866, que a descreveu como um conjunto distinto de características, como cabelos

lisos, nariz pequeno, face alargada. Down foi o responsável pela denominação de mongolismo,

pela semelhança física entre estas pessoas. Por um longo tempo, nomenclaturas depreciativas

também foram empregadas associando a síndrome de Down a pessoas infelizes, ou incapazes,

referenciando a palavra down a algo negativo, e não ao nome do médico que a descreveu.

Schwartzman (1999) explica que não se sabe ao certo as causas da síndrome de Down,

mas a idade materna tem sido considerada entre os estudiosos como um fator relacionado à

probabilidade de ter um bebê com esta síndrome. É comum encontrar uma descrição física

minuciosa de pessoas com a síndrome de Down: face levemente alargada, ponte nasal mais

plana do que a usual, nariz menor, olhos levemente inclinados para cima, mas há poucos

estudos e pesquisas sobre como aprendem e se desenvolvem.

Segundo Freitas e Teixeira (2011) mesmo que tenham características físicas

específicas, geralmente, as pessoas com síndrome de Down possuem mais semelhanças do

que diferenças com a população em geral. Não há um padrão estereotipado e previsível para

todas as pessoas com síndrome de Down, uma vez que tanto o comportamento, quanto o

desenvolvimento não dependem exclusivamente da síndrome, mas sofrem influências de

fatores sócio-culturais.

Tais características são mais importantes para o diagnóstico e para os médicos.

Constata-se que, mesmo diante de causas genéticas, fatores ambientais têm importância

fundamental no desenvolvimento de pessoas com essa síndrome (SCHWARTZMAN, 1999).

Em nossa pesquisa, buscamos fundamentação sobre o desenvolvimento humano no

aporte teórico de Vygotsky (1984). Segundo o autor, o desenvolvimento humano não é

compreendido como a decorrência de fatores isolados que amadurecem, nem tampouco de

fatores ambientais que agem sobre o organismo controlando seu comportamento, mas sim, de

trocas recíprocas que se estabelecem durante a vida entre indivíduo e meio, cada um deles

interferindo um sobre o outro. Nessa dinâmica, Vygotsky pontua a importância da mediação.

Ressalta ainda que há uma relação de reciprocidade entre desenvolvimento e aprendizagem.

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Oliveira (1997, p. 26), retomando Vygotsky, escreve que o autor distinguiu dois tipos

de elementos mediadores: os instrumentos e os signos. Refere que, “ao longo do

desenvolvimento do indivíduo, as relações mediadas passam a predominar sobre as relações

diretas”. Os elementos mediadores são os instrumentos e os signos.

O instrumento é um elemento interposto entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ampliando as possibilidades de transformação da natureza. [...] O instrumento é feito ou buscado especialmente para um objetivo. Ele carrega consigo, portanto, a função para a qual foi criado e o modo de utilização desenvolvido durante a história do trabalho coletivo. É, pois, um objeto social e mediador da relação entre o indivíduo e o mundo (OLIVEIRA, 1997, p. 29).

A autora explica que, quando ocorre a internalização, os instrumentos passam a ser

signos psicológicos, orientados para dentro do indivíduo, e auxiliam no controle consciente das

suas ações. Essa explicação corrobora a noção de representação mental e significa que o

sujeito não necessita ver o objeto que já internalizou, sendo capaz de lembrá-lo mesmo

quando está ausente. Tal processo ocorre com o advento da linguagem e está relacionado com

as interações sociais e com a cultura, com os significados. Ambos, signos e instrumentos são

elementos mediadores. Para entendermos a importância da mediação no processo de

aprendizagem, destacamos o conceito de Vygostky acerca dos níveis de desenvolvimento, as

possibilidades de aprendizagem desses indivíduos e o papel do mediador.

Retomamos os níveis do desenvolvimento descritos por Vygotsky, como o “nível de

desenvolvimento real” (o que a pessoa é capaz de fazer sozinha), o “nível de desenvolvimento

potencial”, ou seja, o que a pessoa é capaz de fazer em conjunto ou com a ajuda do Outro. A

distância entre um nível e outro é a chamada “zona de desenvolvimento proximal”, na qual as

funções ou conhecimentos e aptidões dos indivíduos estão em processo de aprendizagem.

Ressaltamos a importância da mediação na aprendizagem, que se dá no contato com o meio

social, seus objetos e significados e principalmente no contato com o outro (REGO, 1995, p. 95).

Entendemos que a tecnologia pode ser mediadora na atualidade como uma forma de

entrar em contato com o outro, de um modo que se expande e está cada vez mais acessível a

um número maior de pessoas. A partir dessas considerações percebemos a importância de

pensar e pesquisar a respeito de seu uso no ensino de Arte.

Freitas (2007, p. 2) refere Lèvy (1993) e expõe o pensamento do autor sobre os três

grandes momentos da história do conhecimento. O primeiro valoriza a oralidade, o segundo

refere-se à escrita e o terceiro é o “pólo mediático e informativo no qual adentramos na

segunda metade do século XX”. Neste terceiro momento, a tecnologia ocupa um espaço

privilegiado.

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Assim, a tecnologia traz uma nova possibilidade, na qual a oralidade pode ser substituída

ou enriquecida com imagens, com a cybercultura, que amplia a velocidade de circulação das

informações.

Examinando a literatura, é possível encontrar pesquisas sobre o emprego da tecnologia

no ensino, com enfoques e objetivos distintos. Nesta pesquisa, a tecnologia foi utilizada como

mídia de reprodução e produtora de imagens, possibilitando aos participantes explorarem essa

linguagem, como outra forma de se comunicar.

Segundo Freitas (2007, p. 2), os efeitos da tecnologia em nossa sociedade só podem

ser vistos com o sujeito implicado nesta realidade, e nessa perspectiva não há espaço para “a

transmissão de conhecimentos sem a presença dos signos, dos símbolos e da cultura,

considerados como agentes mediadores e ferramentas úteis no processo de aquisição do

conhecimento”.

Esta citação aborda o processo de construção do conhecimento, que implica a presença

do aluno, do professor como mediador, dos signos, da sociedade e da cultura, sendo que o

professor não pode desconsiderar estas questões.

Nos encontros realizados, buscou-se sempre utilizar a tecnologia como mediadora das

percepções do entorno e das vivências dos participantes como base para a construção do

conhecimento. Ao levar a tecnologia como possibilidade para o grupo trabalhar, observou-se

um grande interesse e vontade por parte dos participantes de experimentar e explorar o

material.

A arte abre possibilidades para esses objetivos para pessoas com síndrome de Down.

Como colocam Freitas e Anastasiou (2008, p. 5), o fazer em arte não responde a fórmulas ou

aprendizagens pré-estabelecidas, por se tratar de um saber aberto que, mais do que configurar

um pacote de conhecimentos acumulados, gera uma relação significativa em cada momento,

com particularidades e especificidades da realidade. Este fazer em arte em relação com os

acontecimentos do mundo implica um sujeito criativo, em diálogo com experiências

complexas, que produzem tanto uma transformação na pessoa que cria, como no contexto em

que está inserida.

Assim, buscamos pesquisar também como o docente no ensino de arte e a sociedade

em geral podem atuar para aprender a conviver e trabalhar com a diversidade dos grupos e

das experiências. Vivenciar e participar de um processo com pessoas que têm síndrome de

Down pode exigir uma mudança no olhar. Pensar no tempo necessário, respeitar o processo e

a percepção de cada um é crucial.

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A VIVÊNCIA

O recorte da pesquisa desse artigo foi composto por nove encontros. Quatro

encontros foram utilizados para trabalhar a fotografia, quatro para trabalhar a filmagem e um

para o fechamento das atividades.

O grupo iniciou com sete participantes, sendo quatro do sexo feminino e três do sexo

masculino. Seis deles têm mais de 18 anos, e apenas uma tem 16 anos. A de 16 anos entrou na

pesquisa com o consentimento, apoio e incentivo familiar e foi admitida principalmente por

sua motivação pessoal e familiar, apesar de estar ligeiramente abaixo da idade legal para ser

considerada adulta. Cumpre salientar também que a pesquisa observou os preceitos éticos

recomendados com todos os participantes.

As informações dos participantes foram recolhidas nos registros e com funcionários da

ONG Amigo Down3, com a autorização da direção da instituição. Para utilização das imagens e

realização da pesquisa foi assinado pelo participante e seu responsável o Termo de

Consentimento Informado.

Inicialmente foi conversado com o grupo sobre como funcionava o equipamento

(máquina fotográfica e filmadora) e algumas possibilidades para se trabalhar a fotografia e a

filmagem. Foram levadas ao grupo filmagens e fotografias de pequenos animais (insetos),

orvalho, pessoas e algumas imagens que trabalhavam a perspectiva para criar ilusões, o que os

interessou bastante.

Para iniciar o recolhimento de imagens, visando ações de trabalho com a perspectiva e

criação de ilusões, o grupo se organizou para que todos tivessem sua vez com os aparelhos

(câmera filmadora e fotográfica). Começaram então a explorar as possibilidades dos

equipamentos, com o auxílio da pesquisadora.

Figura 1 – Imagem retirada de uma filmagem da participante Iracema, utilizando a mão do colega para conseguir o efeito desejado.

3 Esta ONG está Localizada em São José, região metropolitana de Florianópolis e atende pessoas com

Síndrome de Down oferecendo cursos, palestras e atendimento médico.

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Segue a conversa que acontecia durante o recolhimento desta imagem:

Iracema: Por que a minha mão não está aparecendo aqui?

Pesquisadora: Porque tem que colocar a mão na frente da lente.

Iracema: Oh, parece mesmo, olha aqui professora, olha aqui!

Pesquisadora: Olha que legal! Deu certinho.

Iracema: Deu certinho, né?

Pesquisadora: Deu certinho, viram?

Durante essa conversa a participante procurava enquadrar a sua mão e o colega que

aparecia no fundo do terraço da ONG no mesmo quadro da filmadora para conseguir o efeito.

Com um pouco de auxílio ela entendeu o funcionamento do enquadramento, demonstrando

satisfação ao perceber que conseguiu realizar o efeito pretendido.

Figura 2 – Imagem retirada de uma filmagem da participante Iracema utilizando a própria mão e conseguindo novamente o efeito desejado.

Quando passada a vez do uso do equipamento para o outro participante (Uilson), ele

demonstrou o desejo de ter uma câmera sua. O grupo ajudou no aprendizado procedimental

com opiniões sobre o que ele deveria filmar. Neste momento ocorreu o seguinte diálogo:

Uilson: Eu vou comprar uma filmadora.

Pesquisadora: Ah, então vamos aprender a usá-la. O que você quer filmar?

(Um colega se posiciona no fundo do terraço enquanto ele segura a câmera e experimenta

apontá-la em várias direções).

Iracema: Anda! Filma lá! (Diz a participante, se referindo ao Osmar que estava

ajudando ao se voluntariar para ser filmado pelo colega).

Uilson: Espera. (Enquanto tenta se ajustar ao uso da câmera e apontar para o colega,

conseguindo a imagem e o foco desejado), o que aparece na fotografia abaixo.

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Figura 3 – Imagem retirada da filmagem de Uilson. Nesta imagem, o participante consegue focar o filme e retratar o colega que posa para ele.

Enquanto a câmera passava de um para o outro, eles se organizaram para que todos

tivessem vez, e negociaram seu tempo enquanto ajudavam um ao outro ensinando aos colegas

como segurar a câmera, captar as imagens e conseguir efeitos diferentes com o uso da

perspectiva. Embora eles não usassem a palavra “perspectiva” conseguiram efetivar o

exercício no qual buscaram o efeito causado pelo distanciamento de uma pessoa da câmera e

a aproximação da mão em uma única imagem.

Outro exercício proposto para o grupo foi procurar algo que eles apreciassem ou

achassem bonito e filmar de perto, buscando a beleza das coisas pequenas, detalhes das

imagens que lhes interessassem e possibilidades de textura. Os participantes passearam pelo

terraço da ONG, com a câmera em mãos, procurando e focalizando várias imagens que

atendessem à atividade proposta.

Alguns recortes das imagens obtidas nesse processo podem ser observados a seguir:

Figura 4 – Recorte de imagem recolhida por Iracema na atividade proposta.

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Figura 5 – Recorte de imagem (árvore) recolhida por Iracema na atividade proposta.

Figura 6 – Recorte de imagem recolhida por Osmar na atividade proposta.

Figura 7 - Recorte de imagem recolhida por Osmar na atividade proposta.

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Para exemplificar a atividade, a pesquisadora filmou o olho de uma das participantes,

mostrando como apenas um detalhe de uma pessoa (um olho), pode tornar-se uma imagem

de força e interesse.

Podemos observar nas imagens acima, que os participantes buscaram seus próprios

exemplos no ambiente à sua volta, nas plantas, cabelos, no corpo.

Nos encontros em que foi trabalhada a fotografia com o grupo, o objetivo era que eles

conseguissem capturar imagens que avançassem para além da ideia que tinham de fotografia,

como registro de pessoas fazendo poses caseiras, e buscassem uma alternativa estética. Assim

foi proposto que eles buscassem outras imagens, outros focos (ou não-focos), trabalhando o

tema e o enquadramento.

A princípio, o grupo se manteve dentro do que já costumava fazer em casa com suas

câmeras domésticas e de celular. Seguiram para imagens “sem pose”, mais naturais do próprio

grupo e sua movimentação e, finalmente, conseguiram buscar outros focos e possibilidades

dentro da fotografia, como aparece nas imagens a seguir:

Figura 8 - Fotografia em momento inicial do recolhimento.

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Figura 9 - Fotografia de momento de descontração.

Figura 10 - Fotografia da mediadora recolhida pelo grupo, espontaneamente.

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Figura 11 - Mudança no olhar: fotografia em momento final dos encontros.

Figura 12 - Fotografia de detalhe do símbolo da ONG.

A pesquisadora atuou também como mediadora durante a coleta das fotografias.

Mediar, segundo Vygotsky (1984) é interpor um elemento intermediário em uma relação, que

deixa de ser direta, como na concepção de estímulo-resposta, e passa então a ser mediada.

Segundo o autor (1984), o professor é um mediador.

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Estas premissas de Vygotsky coincidem com a pesquisa-ação. Oliveira (2005) explica

que a pesquisa-ação é recomendada quando o aporte teórico de Vygotsky é empregado.

O ENCERRAMENTO

Para encerrar os encontros, foi solicitado ao grupo que cada um falasse ou desenhasse

sobre como se sentiram durante o processo, o que perceberam e o que mais aproveitaram.

Evidenciamos em algumas verbalizações e nas imagens produzidas o aproveitamento dos

encontros e assimilação de conceitos apresentados, como podemos observar nas transcrições

abaixo:

Iracema (descrevendo seu desenho): Olha, aqui é um símbolo (mostrando um coração

desenhado), aqui é a fotografia (mostrando um desenho de uma pessoa e se referindo à

atividade de fotografia realizada com o grupo), a filmagem (mostrando o desenho de uma

árvore).

Mediadora: Aquela árvore que você filmou, é isso?

Iracema: É isso. Mas eu quero dar um título, pode?

Mediadora: Claro, deve.

Iracema: Professora, acho que vou botar assim, “filmagem, os símbolos e fotografia”,

será que dá?

Figura 13 – Desenho do símbolo de Iracema.

Figura 14 – Desenho da fotografia de Iracema.

Figura 15 - Desenho da filmagem de Iracema (se refere à imagem da Figura 5).

Podemos perceber pela verbalização e pelos desenhos da participante Iracema que ela

retrata e identifica, através do desenho, as atividades realizadas, apreende o conceito de

símbolo e consegue descrever verbalmente as etapas percorridas no processo em que está

localizado esse recorte.

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Osmar (mostrando seu desenho): Olha, aqui, primeiro de tudo é aquela foto da Amigo

Down (o participante mostra seu desenho do símbolo da ONG que ele fotografou na atividade

das fotos).

Pesquisadora: Ah, a foto que você tirou do símbolo da Amigo Down (que aparece em

uma placa na porta da ONG).

Figura 16 – Desenho da fotografia tirada por Osmar.

Osmar fala que gostou de fotografar o símbolo da ONG, de pinçar a pessoa com o dedo

(fala e mostra com o gestual como foi realizada a filmagem com o uso da perspectiva, que

aparece na Figura 1 desse artigo).

As atividades foram realizadas em grupo, em interação com a pesquisadora. Vygotsky

(1984) expõe que a aprendizagem é uma construção que se dá em interação social. Assinala

para a importância da família, da escola, das instituições, da sociedade e da cultura no

desenvolvimento humano, na apropriação do indivíduo como sujeito que aprende e cria. Em

sua concepção teórica sobre criatividade e imaginação Vygotsky (2005) expõe que a atividade

criadora pode ser evocatória ou combinatória. No primeiro caso aparece o que está

armazenado na memória e, no segundo, o sujeito faz combinações com os conteúdos

armazenados e com outros, que aprende em interação social. Nas fotografias apresentadas e

nos desenhos aparecem as combinações realizadas pelos participantes da pesquisa. Foram

capazes de transferir o que vivenciaram nas fotografias para os desenhos e diálogos. A

interação com a mediadora foi importante, tanto que foi fotografada espontaneamente pelos

participantes. Pode-se observar também a aprendizagem do grupo nas produções realizadas.

Outros elementos, como o acolhimento da ONG e seu papel para o grupo também são

evidentes, e aparecem na fotografia e nos desenhos.

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CONSIDERAÇÕES COMPLEMENTARES

Este relato refere um recorte de uma pesquisa maior, na qual investigamos o ensino

de arte para pessoas com síndrome de Down sendo que ressaltamos aqui a tecnologia.

Percebemos pelas imagens apresentadas alguns elementos acerca de possibilidades desse

ensino com o uso da tecnologia como elemento de mediação.

A tecnologia, o manuseio da câmera, a interação do grupo e a mediação foram os

destaques nesse relato. Afirmamos, no contato com o grupo, a importância de respeitar o

tempo de cada um e de todos, de oferecer diversas possibilidades de expressar a apreensão do

conteúdo proposto e que, junto com essa expressão de conteúdo vem toda a carga da história

de vida dos participantes.

A interação do grupo também se revela fundamental no aprendizado, sendo

observado em vários momentos em que um ensina o outro, dá ideias e, ao falar sobre sua

percepção, facilita o processo de aprendizado, sendo este um dos objetivos da mediação.

Os participantes aprenderam o uso e manusearam a filmadora, seu emprego para a

criação de imagens, com o uso de um novo conceito, como o de perspectiva, e a busca de

novos focos de interesse em relação à fotografia.

A participação foi vivenciada com interesse, com gosto, foi prazerosa, ampliando a

integração e a colaboração entre os participantes, levando a uma satisfação visível com a

produção obtida. Destacamos o percurso ao trabalhar com os novos conceitos e com as

tecnologias mediadoras da experiência, ampliando a zona de desenvolvimento proximal para o

nível real, pois efetivaram com autonomia ações para as quais, no início do processo,

solicitavam a ação direta da pesquisadora. Esse comentário, bem como a mediação, as

interações sociais, o desenvolvimento e a aprendizagem, corroboram o aporte teórico de

Vygotsky e permitem considerar que a tecnologia pode e deve ser empregada nas aulas de

Artes. Com os participantes, todos com síndrome de Down, ficou evidente a aprendizagem, até

mesmo o desejo de seguir as aulas com o manuseio do equipamento e a mediação da

pesquisadora.

REFERÊNCIAS

ANDALOUSSI, Khalid. Pesquisas-ações: ciências, desenvolvimento, democracia. Trad.: Michel Thiollent. São Carlos: EdUFSCar, 2004.

FREITAS, Neli Klix. Novas tecnologias, educação, formação de professores e construção do conhecimento. Revista: Ibero-Americana de Educación, n. 57, v. 3, 2007. Disponível em: <http://www.rieoei.org/deloslectores/2179Freitas.pdf>. Acesso em: 18 abr. 2012.

Anais do VIII Fórum de Pesquisa Científica em Arte.

Curitiba: ArtEmbap, 2011. ISSN 1809-2616

FREITAS, Neli Klix: TEIXEIRA, Rosanny Morais. Linguagem e Desenho: formas de comunicação e de expressão do pensamento em pessoas com síndrome de Down e com autismo. In: FREITAS, Neli Klix; RAMALHO, Sandra Regina; NUNES, Sandra Conceição. Proposições Interativas III: Arte, Pesquisa e Ensino. Florianópolis: UDESC, 2011, p. 73-91.

FREITAS, Neli Klix; ANASTASIOU, Helene Paraskevi. Desenho e Inclusão Sócio-educativa: Diálogos com a Arte. In: Anais do VI Fórum de Pesquisa Científica em Arte, Curitiba, ArtEmbap, p. 5, 2008. Disponível em: <http://www.embap.pr.gov.br/arquivos/File/Forum/anais-vi/08HeleneAnastasioueNeliFreitas.pdf>.

KOZMA, C. O que é Síndrome de Down. In: STRAY-GUNDERSEN K (Org). Crianças com Síndrome de Down: guia para pais e educadores. Porto Alegre: ARTMED, 2007.

OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: Aprendizado e Desenvolvimento: um processo sócio- histórico. São Paulo: Scipione, 1997.

REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995.

SCHWARTZAN, José Salomão. Síndrome de Down. São Paulo: Mackenzie, 1999.

VYGOTSKY, Lev Seminovich. Psicologia Pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, 1984.

_____. Art y Imaginación en la Infancia. Madrid: Akal, 2005.