sindicato

26
REVISTA NOVATIO IURIS 86 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 O ADICIONAL DE PENOSIDADE À LUZ DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Katiuscia Wagner do Nascimento 1 RESUMO O adicional de penosidade é uma modalidade de indenização que será destinada a todo tipo de atividade que, embora não cause efetivo dano à saúde do trabalhador, possa tornar a sua atividade profissional mais sofrida. O adicional de penosidade, mesmo que esteja previsto na norma constitucional, até o presente momento, não está regulamentado e, desta forma, não gera efeitos no mundo jurídico. Além disso, o trabalho penoso fere um dos princípios constitucionais fundamentais: o da dignidade da pessoa humana. Palavras-chave: Trabalho penoso. Constituição.Dignidade Humana. ABSTRACT The painful additional is a modality of reparation that will be destined to all kind of activity that, although do not cause effective damage to worker health, can become his professional activity more agonized. The painful additional although be previewed in the constitutional norm, until the present moment are not regulated, and this way do not beget effects in the judicial world. Besides, the painful work injure one of the constitutionals principles: the human person’s dignity. Key-words: Work Painful. Constitution. HumanDignity. INTRODUÇÃO O tema proposto inicia-se pela busca do conceito de trabalho, propondo- se averiguar quais os meios de trabalho existentes, bem como se há diferença entre o trabalho manual e o intelectual, pois o trabalho não engloba apenas a capacidade física da pessoa, mas também, a intelectual. Neste sentido, 1 Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais (FEEVALE). Advogada. Pós-graduada em Direito do Trabalho, Previdenciário e Processo do Trabalho (FEEVALE). Cursando Especialização em Direito do Consumidor e Direitos Fundamentais (UFRGS).

Upload: priscila-torres-proenca-calado

Post on 08-Sep-2015

214 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

jurisprudencia do adicional penoso

TRANSCRIPT

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    86 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    O ADICIONAL DE PENOSIDADE LUZ DO PRINCPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

    Katiuscia Wagner do Nascimento1

    RESUMO O adicional de penosidade uma modalidade de indenizao que ser destinada a todo tipo de atividade que, embora no cause efetivo dano sade do trabalhador, possa tornar a sua atividade profissional mais sofrida. O adicional de penosidade, mesmo que esteja previsto na norma constitucional, at o presente momento, no est regulamentado e, desta forma, no gera efeitos no mundo jurdico. Alm disso, o trabalho penoso fere um dos princpios constitucionais fundamentais: o da dignidade da pessoa humana. Palavras-chave: Trabalho penoso. Constituio.Dignidade Humana.

    ABSTRACT The painful additional is a modality of reparation that will be destined to all kind of activity that, although do not cause effective damage to worker health, can become his professional activity more agonized. The painful additional although be previewed in the constitutional norm, until the present moment are not regulated, and this way do not beget effects in the judicial world. Besides, the painful work injure one of the constitutionals principles: the human persons dignity. Key-words: Work Painful. Constitution. HumanDignity.

    INTRODUO

    O tema proposto inicia-se pela busca do conceito de trabalho, propondo-se averiguar quais os meios de trabalho existentes, bem como se h diferena entre o trabalho manual e o intelectual, pois o trabalho no engloba apenas a capacidade fsica da pessoa, mas tambm, a intelectual. Neste sentido,

    1 Graduada em Cincias Jurdicas e Sociais (FEEVALE). Advogada. Ps-graduada em Direito do Trabalho, Previdencirio e Processo do Trabalho (FEEVALE). Cursando Especializao em Direito do Consumidor e Direitos Fundamentais (UFRGS).

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 87

    tambm ser verificado se o trabalho pode ter como condies a proteo dignidade da pessoa humana, vida e sade do trabalhador.

    Aps, se delinear acerca do conceito do termo penoso e sero explicadas quais so as atividades consideradas penosas, j que muitos operrios laboram em atividades que lhe causam dor, molstia, incmodo, aflio, fadiga, sacrifcio, entre outros.

    Alm disso, ser analisado o adicional de penosidade, eis que, apesar de estar previsto na Constituio Federal, no h um conceito expresso, somente a determinao do seu pagamento. Por isso que se faz necessria a normatizao da matria, a fim de serem obtidas a realizao plena da norma constitucional e uma uniformizao da jurisprudncia ptria.

    Assinala-se, neste sentido, que algumas atividades de trabalho acarretam prejuzo fsico e psicolgico aos trabalhadores, mas, quando tais prejuzos passam a prejudicar a vida e a sade dos obreiros, se faz necessria a existncia de um salrio justo, a fim de compensar determinadas leses, causadas pelas atividades relacionadas ao vnculo empregatcio.

    O trabalho essencial ao homem, entretanto o trabalhador no pode ser tratado em desconformidade com o princpio da dignidade da pessoa humana. Desta forma, o presente trabalho pretende analisar o que so atividades penosas e demonstrar em quais circunstncias o trabalhador ter direito a receber o pagamento do adicional de penosidade, bem como definir o princpio da dignidade da pessoa humana luz do adicional de penosidade, justificando, atravs de jurisprudncias, os diversos contextos que se tm dado ao adicional, sem nenhum critrio legal.

    Imperativo, tambm, verificar se o trabalho penoso uma espcie de assdio moral, determinado pela prpria estrutura empresarial, e no por ato pessoal de um superior hierrquico edescrever quais normas regulamentadoras abordam acerca do trabalho penoso.

    Assim, para a aplicao do adicional de penosidade, se faz necessria a existncia de norma reguladora, especialmente, com o objetivo de criar o conceito do termo, bem como fixar o(s) percentual (is) do adicional de penosidade.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    88 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    1 CONCEITO DE TRABALHO

    Antes de abordar o conceito de trabalho penoso, deve-se esclarecer o que a palavratrabalho significa.No final do sculo XIX, a participao da Igreja Catlica na soluo do problema social tomou sentido mais direcionado com a Encclica Rerum Novarum de 15 de maio de 1891, da autoria do Papa Leo XIII. Ele acredita que deve ser considerado o trabalho, na teoria e na prtica, no uma mercadoria, mas, um modo de expresso direta da pessoa humana. Para a grande maioria dos homens, trabalho a nica fonte dos meios de subsistncia. Por isso, a sua remunerao no pode deixar-se merc do jogo automtico das leis do mercado; pelo contrrio, deve ser estabelecida, segundo as normas da justia e da equidade que, em caso contrrio, ficariam profundamente lesadas ainda, mesmo que o contrato de trabalho fosse livremente ajustado por ambas as partes2.

    A palavra trabalho deriva da palavra latina tripalus (trs paus) que, no latim popular, designava um dispositivo ainda hoje chamado tronco, usado para ferrar animais de grande porte, tal como os bois e os cavalos. Da o verbo tripaliare, que significa torturar [...]3

    A primeira forma de trabalho que tivemos conhecimento foia escravido, na qual o trabalhador era obrigado a trabalhos forados, ininterruptos, sem hora de descanso, sem salrio e realizado sobre presso psicolgica e emocional4.

    De acordo com Plato e Aristteles, o trabalho abarcava apenas a fora fsica, e a dignidade de uma pessoa estava nas suas palavras e no, no seu esforo fsico, sendo o trabalho rduo realizado pelos escravos. As atividades mais aristocrticas ficavam a cargo dos filsofos. Alm disso, enfatiza-se que, naquela poca, quem laborava no era digno, mas somente quem usava a mente5.

    Por isso, o trabalho adveio de algo relacionado com o sofrimento, o castigo e a penosidade, surgindo a mo-de-obra escrava, no havendo, portanto,

    2 SUSSEKIND, Arnaldo. Instituies de Direito do Trabalho. 13. ed. So Paulo: LTr, 1992. 1 v, p. 90.3 MARQUES, Christiani. A proteo ao Trabalho Penoso. So Paulo: LTr, 2007, p. 19.4 MARAL, Patrcia Fontes. Direito do Trabalho: curso didtico. Braslia: Vestcon, 2009, p. 17.5 Ibidem, p. 17-18.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 89

    preocupao com a dignidade humana. Contudo, o trabalho condio essencial vida da pessoa humana, devendo-se respeitar a integridade do trabalhador em seu dia-a-dia, para no ferir a dignidade da pessoa humana6.

    Ainda, segundo Christiani Marques:

    o trabalho no somente o emprego da fora fsica, mas, tambm, a atividade de pesquisar, investigar, dirigir, planejar e tantas outras funes que se multiplicam com a criao e produtividade do ser humano. a forma fundamental de subsistncia, mais simples e elementar. Trabalha-se com a fora fsica e intelectual; esses dois elementos esto sempre juntos, porm pode ocorrer preponderncia de um, a ponto de se dizer que o trabalho manual ou intelectual. E isso no cria qualquer diferena em termos de proteo7.

    J Karl Marx aduz8 que [...] tudo o que a pessoa faz para manter-se, para desenvolver-se pessoalmente e para manter e desenvolver a sociedade trata-se de uma atividade obrigatria, englobando o trabalho assalariado, o trabalho produtivo individual, o trabalho domstico e o trabalho escolar.

    Assim, pode-se considerar o trabalho como uma atividade manual, intelectual ou artistica, frequentemente penosa, com a finalidade de satisfazer as necessidades humanas.

    1.1 Conceito de penoso atividades penosas

    No se tem a pretenso, no presente trabalho, de esgotar o tema no que se refere conceituao do trabalho penoso, mas to-somente traz-lo reflexo dos operadores do direito, mostrando a necessidade da normatizao, a fim de proteger o trabalhador, conforme o legislador constituinte quis assegurar.

    O tema foi trazido pela primeira vez na Constituio Federal de 1988, no art. 7, inciso XXIII, e, at o presente momento, encontra-se sem regulamentao, sendo que a doutrina e a jurisprudncia consideram o direito em questo como uma norma constitucional de eficcia limitada.

    6 Ibidem, p. 20-21.7 MARQUES, op.cit., p. 21. 8 MARX, Karl. O capital. Bauru: Edipro, 1998, p. 107.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    90 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    Para Jos Pinto, conforme os dicionrios, penoso significa doloroso, difcil, que incomoda. O que tudo indica que a finalidade do legislador foi de reparar os riscos de certos trabalhos, que se alinham numa zona difusa entre a insalubridade e a periculosidade, sem expor todas as descries identificadoras de nenhuma delas, mas expondo a sade ou a condio fsica do empregado a uma ameaa de dano em potencial, que justifica a proteo indenizatria9.

    Sendo assim, o trabalho penoso o acerbo, rduo, amargo, difcil, molesto, trabalhoso, incmodo, laborioso, doloroso e rude.

    Pode ser considerado penoso o trabalho com aparelho eletrnico, de alta preciso, tais como microscpios, rdios, relgios, televisores, computadores, vdeos, fornos de micro-ondas, refrigeradores, bem como o labor com pinturas artesanais de tecidos e vasos, em indstria, bordados microscpios, restaurao de quadros, de esculturas danificadas pelo tempo, por pessoas ou pelo meio ambiente, lapidao, tipografia fina, gravaes, reviso de jornais, revistas, tecidos, impressos. Diante disso, a atividade penosa exige ateno constante e vigilncia acima do comum10.

    Christiani Marques11, que se dedicou ao estudo aprofundado acercado tema, devido sua fundamental importncia quanto proteo do trabalho penoso, objetivou estabeleceu parmetros entre a violao do princpio dignidade da pessoa humana do trabalhador, o meio ambiente do trabalho e a periodicidade da incidncia da atividade penosa, para somente, ento, estudar os limites, as proibies e os critrios de remunerao.

    Moacir Motta da Silva, em trabalho publicado na LTR 54-10/1213, sob o ttulo Atividade Penosa, uma figura sob a tica da Justia do Trabalho, vaticina a respeitodo adicional de penosidade que:

    considerada atividade penosa, para efeitos do disposto no art. 7, XXIII, da Constituio Federal, o trabalho realizado sob um ou mais dos seguintes agentes patognicos: trabalho sob rudo ou vibraes; temperaturas de trabalho anormais; trabalho sob ar comprimido; atividades submersas;

    9 PINTO, Jos Augusto Rodrigues. Tratado de Direito Material do Trabalho. So Paulo: LTr, 2007, p. 426. 10 CRETELLA JUNIOR, Jos. Comentrios a constituio brasileira de 1988. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense-Universitria, 1990. 2 v., p. 975-976. 11 MARQUES, Christiani. A proteo ao trabalho penoso. So Paulo: LTr, 2007, p.64

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 91

    ambientes de trabalho sujeito a gases e vapores; trabalhos em condies de umidade anormais; trabalhos que exijam esforo fsico para levantamento de pesos; trabalhos que demandam concentrao mental, acuidade auditiva e acuidade visual perfeitas12.

    Eduardo Gabriel Saad assevera, neste sentido, que a legislao preexistente no se ocupava das atividades penosas. Os exercentes desta tero de esperar a lei regulamentadora para perceber o adicional da remunerao mencionada no inciso indicado13.

    Georgenor de Sousa Franco Filho, no seu trabalho,Significado do Trabalho Penoso, publicado no livro Direito do Trabalho e a Nova Constituio, apud Eduardo Saad, assevera que o trabalho penoso h de ser o desgastante, o exaustivo, o fatigante, o que demanda excessiva fora fsica do obreiro, o executado em situaes excepcionais que refogem aos dois primeiros, mas que no se pode considerar como trabalho normal14.

    Nesta perspectiva, Christiani Marques conceitua o trabalho penoso como sendo:

    Aquele relacionado exausto, ao incomodo, dor, ao desgaste, concentrao excessiva e imutabilidade das tarefas desempenhadas que aniquilam o interesse, que leva o trabalhador ao exaurimento de suas energias, extinguindo-lhe o prazer entre a vida laboral e as atividades a serem executadas, gerando sofrimento, que pode ser revelado pelos dois grandes sintomas: insatisfao e a ansiedade15.

    Sob este aspecto, no h como se desvincular o trabalho penoso do surgimento de doenas, da mesma forma como se faz com a insalubridade, sendo distintos os fatos geradores que podem estar relacionados ao agente de risco ambiental, qumicos, fsicos e biolgicos. So aqueles associados s inadequaes, s condies fsicas e psicofisiolgicas dos trabalhadores e de

    12 CABRAL, Adelmo de Almeida. Adicionais no direito do trabalho.So Paulo: LTr, 1994, p.45-46.13 SAAD, Eduardo Gabriel. Constituio e direito do trabalho. 2. ed. So Paulo: LTr, 1989, p.147.14 Idem, ibidem.15 MARQUES, Christiani. A proteo ao trabalho penoso. So Paulo: LTr, 2007, p. 64.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    92 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    seu ambiente de trabalho, abrangendo neste o mobilirio e a organizao do trabalho16.

    Nesse diapaso, o vocbulo penoso aquele que causa incmodo ou sacrifcio, e um exemplo a proibio do trabalho da mulher em atividades penosas, pela sua fragilidade17.

    Assim, as atividades penosas so aquelas que trazem o esgotamento, o cansao, o desgaste, a fadiga, bem como a demanda excessiva de fora fsica e mental. Gera ao trabalhador o direito de perceber os denominados adicionais de penosidade. E pelo sentido reles da palavra penosa, o constituinte almejou aduzir a ampla extenso situada entre a insalubridade e a periculosidade, visando a legitimar indenizaes aos obreiros que se expem

    a riscos imensos, passando por sofrimentos e incmodos profundos18.

    So exemplos de atividades penosas: motoristas, cobradores, bancrios, telefonistas, operadores de telemarketing, digitadores, metrovirios, trabalhadores em jornada de turno ininterrupto de revezamento, piloto de avio de caa, atos executivos, mercado financeiro, magistrio, pois estas atividades

    causam dano psquico ao trabalhador19.

    O trabalho penoso pode, assim, ser inclusive considerado uma espcie de assdio moral, visto que considerado toda e qualquer conduta que pode se dar por falta de dignidade, integridade fsica ou psquica do trabalhador20.

    Portanto, penoso o que causa dano psquico, ou seja, fere o psicolgico do indivduo, e so as atividades penosas as que fazem o trabalhador sentir sofrimento, afetando a sua dignidade.

    16 PITTA, Ana Maria Fernandes. Hospital: dor e morte como ofcio. 3. ed. So Paulo: Hucitec, 1994. p. 88.17 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentrios sobre a constituio do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. So Paulo: Saraiva, 1989. 2 v., p. 507.18 BULOS, UadiLammego. Curso de direito constitucional. 5. ed., rev. atual. So Paulo: Saraiva, 2010, p. 799. 19 MARQUES, Christiani. A proteo ao trabalho penoso. So Paulo: LTr, 2007, p. 64-86. 20MARAL, Patrcia Fontes. Direito do trabalho: curso didtico. Braslia: Vestcon, 2009, p. 148.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 93

    2 LEGISLAO BRASILEIRA E NORMAS REGULAMENTADORAS

    Os adicionais tm definio de algo que se acrescenta, ou seja, um acrscimo salarial, decorrente da prestao de servio do empregado em condies mais gravosas21. Como j mencionado, o adicional pelo trabalho penoso foi tratado pela primeira vez na Constituio Federal de 1988, no Ttulo II, dos Direitos e Garantias Fundamentais, Captulo II, dos Direitos Sociais, no art. 7, no qual o legislador assegurou ao trabalhador as condies mnimas de trabalho.

    Os adicionais, de modo geral, esto previstos no artigo 7, incisos IX, XVI e XXIII, da Constituio Federal (CF) de 1988, e nos artigos 61, 73, 198 e pargrafo nico, 199 e 469 da Consolidao das Leis do Trabalho (CLT),22 nas quais se apresenta sob as formas de adicional de transferncia em atividades penosas.

    O inciso XXIII, da Constituio Federal de 1988, diz que ficou estabelecido o adicional de remunerao para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei. As Constituies anteriores a 1988 no faziam referncia ao trabalho penoso, somente sobre os adicionais de insalubridade e periculosidade, que j possuem regulamentao.

    Os adicionais de remunerao, tambm chamados de adicionais do salrio, so parcelas que complementam o salrio do trabalhador, compensando maior esforo deste, em decorrncia de condies de trabalho mais desgastantes do que as normais23.

    Desde a promulgao da CF/88, foram apresentados Cmara dos Deputados em Braslia diversos textos de Projetos de Lei, os quais esto relacionados abaixo. Observa-se, assim, a inexistncia de relacionamento direto entre definies sugeridas para o termo penosidade e o acometimento

    21 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 24. ed. atual. at 12-12-2007. So Paulo: Atlas, 2008, p. 229.22 CARRION, Valentin. Comentrios Consolidao das Leis do Trabalho. 26 ed.. Saraiva. 2000, p. 46.23 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentrios Constituio do Brasil: Promulgada em 5 de outubro de 1988. So Paulo: Saraiva, 1989. 2 v., p. 497.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    94 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    de doenas, paralelamente, ao seu relacionamento a condies de trabalhos adversas sade.

    A cmara dos deputados tem registros, desde 1993, de vrios Projetos de Lei que tratam de algumas atividades profissionais como penosas. Foram elaborados mais de 60 Projetos de Lei, porm alguns, com proposio inativa24, arquivados25ou em trmite.

    Em trmite, se encontra o Projeto de Lei n 1015/88 do Deputado Federal Paulo Paim, que traz, no art. 1, o conceito de atividades penosas:

    Sero consideradas atividades penosas aquelas que, por sua natureza, condies ou mtodos de trabalho, exijam dos empregados esforo e condicionamento fsicos, concentrao excessiva, ateno permanente, isolamento, imutabilidade da tarefa desempenhada em nveis acima dos limites de tolerncia fixados em razo da natureza e intensidade do trabalho a que esto submetidos.26

    Da mesma autoria, restou elaborado outro Projeto de Lei, n 7.083/02, que conceitua as atividades de motoristas e cobradores de transportes coletivos urbanos como penosas, como se v no art. 3, pargrafo nico: Atividades penosas so aquelas que, por sua natureza, condies ou mtodos de trabalho, expem os empregados a condies de estresse e sofrimento fsico e mental.27

    O Projeto de Lei n 7.097/0228, do Deputado Federal Arnaldo Faria de S, que cria o Cdigo Brasileiro de Segurana e Sade no Trabalho, estabelece vrias regras para proteo sade do trabalhador, com obrigaes para

    24 Projetos de Lei ns. 258/75, 326/83, 589/72, 863/72, 1.109/73, 2.128/74, 2.921/76, 37/79, 61/83, 76/91, 77/91, 142/91, 258/75, 319/88, 346/91, 470/91, 624/91, 675/91, 716/83, 738/75, 773/91, 846/79, 76/91, 77/91, 142/91, 258/75, 319/88, 346/91, 470/91, 624/91, 675/91, 716/83, 738/75, 773/91, 846/79, 944/91, 1.038/88, 1.041/88, 1.048/75, 1.072/91, 1.366/75, 1.546/89. 25 Projetos de Lei ns. 5.166/01, 3.435/92, 3.523/97, 5.351/01. 26 Projeto de Lei apresentado em 11.10.98. Atualmente, est aguardando proposio sujeita apreciao do plenrio e tramita em conjunto com o Projeto de Lei n 1003/88, entre outros. 27 Projeto de Lei apresentado em 6.8.02. Atualmente, est aguardando proposio sujeita apreciao do Plenrio e tramita em conjunto com o Projeto de Lei n 1.113/88. 28 Projeto de Lei apresentado em 6.8.02. Atualmente, aguardando parecer pela Comisso de Trabalho, de Administrao e Servio Pblico.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 95

    empregadores, fiscalizaes e mtodos. Ao tratar das atividades insalubres, perigosas e penosas, trouxe o conceito de atividade penosa no art, 29: Sero consideradas atividades penosas as operaes que, por sua natureza, condies ou mtodos de trabalho, produzam situaes antiergonmicas acentuadas aos trabalhadores, a serem definidas pelo CONSEST29.

    A Deputada Federal ngela Moraes Guadagnin elaborou um Projeto de Lei Complementar n 317/02 que define as atividades exercidas sob condies especiais como prejudiciais sade ou integridade fsica dos segurados e regulamenta a concesso de aposentadoria especial aos 15, 20 ou 25 anos de trabalho, em razo do exerccio de atividades consideradas insalubres, penosas e perigosas. Assim, preconiza o art. 1, 2, do seu projeto, como conceito de atividade penosa, o seguinte: Atividades penosas so aquelas que, por sua natureza, condies ou mtodos de trabalho expem a condies de estresse e sofrimento fsico e mental, nos termos estabelecidos no regulamento30.

    Em 08 de dezembro de 2009, a senadora Serys Slhessareko (PT-MT) apresentou o projeto de Lei n 552/2009, elaborado por ela, que acrescenta normas especiais de tutela do trabalho na CLT. A proposta regulamenta as atividades exercidas por trabalhadores sob radiao solar a cu aberto, as quais sero consideradas penosas. O trabalho, exercido nessas condies, poder acarretar o pagamento do adicional de penosidade ao trabalhador no valor de 30% sobre o salrio, sem as incorporaes resultantes de gratificaes e prmios. Com a aprovao, ser acrescida uma nova Seo no Captulo I do Ttulo III da Consolidao das Leis do Trabalho CLT. O projeto de lei encontra-se na Comisso de Assuntos Sociais (CAS) do Senado Federal,

    A ausncia de regulamentao traz prejuzo ao trabalhador, na medida em que este deixa de receber a proteo ampla, prevista na Carta Magna, a fim de resguardar os seus direitos a ter um trabalho que lhe d a dignidade que todo ser humano precisa.

    No se pode deixar de considerar a Norma Regulamentadora 18 (NR-18) que, por sua vez, inovou ao tratar das Condies e Meio Ambiente de

    29 CONSEST Conselho Nacional de Segurana e Sade no Trabalho. 30 Projeto de Lei que tramita em conjunto ao Projeto de Lei Complementar n 60/99, na Comisso de Seguridade Social e Famlia.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    96 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    Trabalho na Indstria da Construo, no qual se enquadra o Adicional de Penosidade que o adicional que deve ser pago ao trabalhador que trabalha em condies de penosidade.

    No Brasil, o adicional de penosidade pode ser visto e inserido nos contrato de trabalho de vrias maneiras. Como no se tem um conceito nico do que penosidade, cada empresa ou empregador enxerga este adicional de maneira diversa, como, por exemplo, em acordos coletivos31.

    Desta forma, se o empregador concorda em pagar determinada categoria de empregados o adicional de penosidade, por meio de um acordo coletivo, no h qualquer vedao legal neste procedimento.

    Temos, ainda, a Lei n 8.112, de 11 de dezembro de 1990, que dispe sobre o regime jurdico dos servidores pblicos civis da Unio, das autarquias e das fundaes pblicas federais sobre os adicionais, em especial, sobre a penosidade, fazendo previso, no art. 71, que devido o adicional aos servidores em exerccio em zonas de fronteira ou em localidades cujas condies de vida o justifiquem, nos termos, condies e limites fixados em regulamento.

    Diante disso, nota-se que o adicional de penosidade poder ser estabelecido para todos os trabalhadores, independente do sexo, tendo em vista que, no inciso XXX, do art. 7 da CF, resta preconizada a proibio de diferenciao de salrios, de exerccio de funes e de critrios de admisso por motivo de sexo32.

    Outro aspecto importante diz respeito s medidas de proteo criana e ao adolescente quanto a determinados tipos de atividades laborais que possam causar prejuzos integridade fsica ou moral. No entanto, h um problema em relao regulamentao do que sejam atividades penosas, alm da definio do mbito das proibies dessas atividades33.

    Neste contexto, leciona Jos Augusto Rodrigues Pinto que:

    31 SINDICATO. Disponvel em: http://www.sindicato.com.br/act/PautaUniaoeLuta0708.pdf. Acessado em: 03 ago. 2010.32 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentrios Constituio do Brasil: Promulgada em 5 de outubro de 1988. So Paulo: Saraiva, 1989. 2 v., p. 507/508. 33 BASTOS, op. cit., p. 508.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 97

    [...] tendo disposto a Magna Carta que todos eles (os adicionais de risco) sero devidos na forma da leie considerando no haver lei anterior disciplinar penosidade, conclui-se que a efetivao dessa garantia depender de sua regulamentao, infelizmente devida pelo legislador ordinrio at hoje [...]. Falta, pois, ter-se at mesmo uma definio do que seja penosidade [...]34.

    Destarte, infelizmente, ainda no temos uma norma concreta para a concesso do adicional de penosidade, apesar do voto a favor nesse sentido em relao ao projeto de Lei n 552/2009. Todavia, podemos embas-lo com amparo na jurisprudncia, nas normas regulamentadoras, bem como nos acordos coletivos.

    O adicional de penosidade dever ser regulamentado, eis que se trata de um direito fundamental do trabalhador, conforme j disciplinava Jorge Miranda: [...] as constituies mais recentes contemplam direitos que sobressaem ora a qualidade genrica do homem enquanto homem, ora a do cidado, ora a do trabalhador [...].35

    Assim, se faz imperativa a regulamentao do adicional de penosidade, principalmente porque laborar em atividades penosas vai contra o princpio fundamental: o da dignidade da pessoa humana.

    3 PRINCPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

    H inmeros princpios gerais que tm importncia no Direito do Trabalho, sendo o grupo principal composto de trs planos de diretrizes. Em um dos planos, esto tanto o princpio da dignidade da pessoa humana quanto as vrias diretrizes associadas a esta basilar, tais como: o princpio da no discriminao, o princpio da justia social e o princpio da equidade36.

    Princpios informam, orientam e inspiram regras legais, alm de sistematizarem e darem organicidade a institutos, e existem os que so comuns ao Direito em geral. H de se destacar que ningum poder alegar

    34 PINTO, Jos Augusto Rodrigues. Tratado de direito material do trabalho. So Paulo: LTr, 2007, p. 426.35 MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 3. ed. Lisboa: Coimbra, 2000, p. 87.36 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. So Paulo:LTr, 2002, p. 73.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    98 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    a ignorncia do Direito e, por isto, deve-se respeitar a dignidade da pessoa humana37.

    Ao Estado, incumbe velar para que as relaes de trabalho sejam reguladas, de acordo com a justia e a equidade e, para que, nos ambientes de trabalho,no seja lesada, nem no corpo nem na alma, a dignidade da pessoa humana38.

    Por esse aspecto, oportuno referir que a CLT incluiu princpios gerais do direito entre as fontes que a Justia do Trabalho e as autoridades administrativas devem recorrer, para sanar omisses no campo das relaes de trabalho. Embora a Carta Magna no revele expressamente os princpios relacionados ao direito do trabalho, o artigo 1 referiu, em seu inciso III, a dignidade da pessoa humana39.

    Foi a Constituio Federal de 1988 a primeira a tratar do princpio da dignidade da pessoa humana, enquanto fundamento da Repblica e do Estado Democrtico de Direito, embora a primeira referncia do tema possa ser encontrada na Constituio de 1934, que se reportava necessidade de que a ordem econmica fosse estabelecida de maneira que permitisse a todos a existncia digna40.

    Quando a Constituio Federal apregoa a dignidade da pessoa humana, est aplicando um cogente de justia social, um valor constitucional supremo. Desta forma, o primado consubstancia o espao de integridade moral do ser humano, independentemente de credo, raa, cor, origem ou status social. O seu contedo envolve, tambm, valores materiais, que dizem respeito renda mnima, sade, alimentao, lazer, moradia, etc. Diante disso, cristalino o carter instrumental do princpio, j que propicia o acesso justia de quem se sentir prejudicado pela sua inobservncia41.

    37 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 24. ed. atual. at 12-12-2007 So Paulo: Atlas, 2008, p. 59.38 SUSSEKIND, Arnaldo. Instituies de direito do trabalho. 13. ed. So Paulo: LTr, 1992. 1 v, p. 9139 Idem., p. 127. 40 MARTINS, Flademir Jeronimo Belinati. Dignidade da pessoa humana. Curitiba: Juru, 2006, p.47. 41 BULOS, UadiLammego. Curso de direito constitucional. 5. ed., rev. atual. So Paulo: Saraiva, 2010. p. 499.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 99

    A Constituio um acordo de vontades que no apenas diz respeito aos seres humanos, individual, coletiva e difusamente, mas tambm, aos inmeros fatores e seres que implicam a edificao de um ser-estar digno no mundo42.

    Segundo Ingo Wolfgang, o princpio da dignidade da pessoa humana pode ser realizado em vrios graus, bem como h a necessidade de se resolver eventuais tenses entre a dignidade de diversas pessoas43.

    O doutrinador citado ainda apregoa que a liberdade de desenvolvimento da personalidade humana e o imperativo de promoo das condies possibilitadoras desse livre desenvolvimento constituem j corolrios do reconhecimento da dignidade da pessoa humana como valor no qual se baseia o Estado. Alega tambm que a dignidade da pessoa humana engloba respeito e proteo da integridade fsica e emocional (psquica), em geral, da pessoa. Assim, para a preservao da dignidade da pessoa humana, torna-se indispensvel no tratar as pessoas de tal modo que lhes torne impossvel representar a contingncia de seu prprio corpo como momento de sua prpria, autnoma e responsvel individualidade44.

    A falta de um espao apropriado para o exerccio da atividade profissional acaba danificando seriamente os pressupostos bsicos para uma vida com dignidade. O reconhecimento jurdico-constitucional da liberdade de greve e de associao e organizao sindical, da jornada de trabalho razovel, do direito ao repouso, alm das proibies de discriminao nas relaes de trabalho foi decorrncia de reivindicaes das classes trabalhistas, em razo do alto grau de abuso e degradao que caracterizava as relaes entre capital e trabalho, resultando em condies de vida e trabalhado manifestamente indignas, situao que atualmente ainda no foi superada em expressiva parte dos Estados que integram a comunidade internacional45.

    42 MORAIS, Jos Luis Bolzan de. As crises do Estado e da Constituio e a transformao espacial dos direitos humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 66-67. 43 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituio Federal de 1988. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 75-76.44 Idem, p. 88.45 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituio Federal de 1988. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 92-94.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    100 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    Em uma relao de trabalho, diante de uma sociedade materializada e permissiva, fcil conduzir o ser humano como objeto. Pode-se averiguar tal situao, quando se remunera uma condio agressiva dignidade humana sem, ao menos, considerar outros elementos para a tentativa de melhor bem-estar. Se j h um critrio remuneratrio, no h o que se preocupar com a dignidade da pessoa humana. Porm, aqui est o maior equvoco, visto que a tica, a moral e o tratamento dignos merecidos por todos esto sendo esquecidos46.

    O princpio da dignidade da pessoa humana pode ser consagrado como um limite autnomo ao poder constituinte dos Estados-membros, ou seja, um limite explcito, tambm conhecido como expresso, o qual vem previsto de forma taxativa na Constituio Federal. Desta forma, decorre da manifestao constituinte originria, sendo de observncia obrigatria pelos agentes do poder constituinte decorrente, que deve acat-lo incondicionalmente. Por isso, o princpio ventilado traz proibio material47.

    A dignidade da pessoa humana da pessoa concreta, na sua vida real e quotidiana, ou seja, o homem e a mulher, cujos direitos fundamentais a Constituio enuncia e protege. Cada pessoa tem de ser compreendida em relao s outras, e a Carta Magna cita,por diversas vezes, a qualidade de vida ligada efetivao dos direitos econmicos, sociais, culturais e ambientais, bem como dos direitos,das liberdades e da garantia dos trabalhadores48.

    Uadi Lammgo Bulos, ao falar sobre princpio da dignidade da pessoa humana, diz que este preconiza o seguinte: Sendo fundamento da Repblica Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana, o exame da constitucionalidade de ato normativo faz-se considerada a impossibilidade de o Diploma Maior permitir a explorao do homem pelo homem49.

    Neste diapaso, tambm so os ensinamentos de Flademir Jernimo Belinati Martis:

    46 MARQUES, Christiani. A proteo ao trabalho penoso. So Paulo: LTr, 2007. p. 43.47 BULOS, UadiLammego. Curso de direito constitucional. 5. ed., rev. atual. So Paulo: Saraiva, 2010. p. 418. 48 MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 3. ed. Lisboa: Coimbra, 2000, p. 180-195. 49 Ibidem, p. 500.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 101

    A dignidade deve acompanhar o homem desde o seu nascimento at a sua morte, posto que ela da prpria essncia da pessoa humana. Assim, parece-nos que a dignidade um valor imanente prpria condio humana, que identifica o homem como ser nico e especial e que, portanto, permite-lhe exigir ser respeitado como algum que tem sentido em si mesmo50.

    Assim, decorre do princpio da dignidade da pessoa humana que o exerccio do trabalho inalienvel e irrenuncivel, sendo um princpio fundamental e um dever a ser garantido, atravs de polticas sociais e econmicas que visem diminuio do risco no meio ambiente do trabalho, bem como de doenas e acidentes. Trata-se da defesa de valor mximo, que a prpria vida51.

    Dessa forma, trata-se de direitos fundamentais de liberdade e igualdade outorgados aos trabalhadores, com intuito de assegura-lhes um espao de autonomia da pessoa. Assinala-se tambm que o direito ao trabalho (trabalho em condies dignas) constitui um dos principais direitos fundamentais da pessoa humana, temtica que, todavia, no poder ser desenvolvida. Portanto, o conceito de dignidade elaborado no sentido da promoo e preservao de uma vida saudvel, uma vida boa52.

    A dignidade efetivamente estabelece qualidade intrnseca de cada pessoa humana que a faz destinatria do respeito e da proteo tanto do Estado, quanto das demais pessoas, evitando-se, desta forma, que ela seja alvo no s de quaisquer situaes desumanas ou degradantes, como tambm lhe garantindo o direito de acesso a condies existenciais mnimas53.

    Ainda, sobre o princpio da dignidade da pessoa humana, leciona Paulo Umberto Stumpf:

    Sua manuteno atual, como princpio moral e norma constitucional, representa o compromisso de uma sociedade em defender e promover o que se pode designar como ncleo

    50 MARTINS, Flademir Jeronimo Belinati. Dignidade da pessoa humana. Princpio constitucional fundamental. Curitiba: Juru, 2006, p.47. 51 MARQUES, Christiani. A proteo ao trabalho penoso. So Paulo: LTr, 2007, p. 45.52 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituio Federal de 1988. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 94. 53 Ibidem, p.127.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    102 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    irredutvel do ser humano, pois a se fundamenta a identidade de cada pessoa, a sua participao e pertena comunidade poltica. Ao mesmo tempo, significa rejeio a qualquer prtica que possa menosprezar a pessoa humana, como tal, expondo a sua dignidade inalienvel e indisponvel condio desigual perante os outros, a desconsiderar a sua estatura de pessoa humana que no pode ser reduzida a simples meio ou objeto de outras finalidades, ou, por fim, evitando e garantindo que a pessoa no seja privada das condies materiais necessrias para sua digna manuteno54.

    Portanto, o princpio da dignidade da pessoa humana, alm de impor um dever de respeito, atribui condutas positivas, tendentes a efetivar e proteger a dignidade dos indivduos55.

    4 JURISPRUDNCIA

    O Tribunal Superior do Trabalho tem entendido que o adicional de penosidade, destinado remunerao das atividades penosas, pode ser pago, simultaneamente, aos adicionais de insalubridade e periculosidade e no, alternativamente. Grande parte dos julgados faz referncia aos trabalhadores que atuam na rede ferroviria, profissionais da sade e para quem trabalha com menores infratores.

    J, no ano de 1996, a jurisprudncia dominante era no sentido de que, se for constatada a existncia de insalubridade e penosidade, o trabalhador deve receber as duas vantagens, pois o direito ao adicional penoso j teria se incorporado ao seu contrato de trabalho (TRT da 2 Reg. (So Paulo), AC. 4 T. 02960182663, DOESP 12.04.96, Rel.: Jos de Ribamar da Costa)56.

    Atualmente, o entendimento no mesmo sentido, ou seja, havendo labor sob condio insalubre e tambm sob condio penosa, h prejuzo imediato e mediato sade e vida do trabalhador e, por isto, a contraprestao pelo labor em tais condies deve ser o pagamento dos dois adicionais.

    54 STUMPF, Paulo Umberto. O princpio constitucional da dignidade humana. Belo Horizonte: O Lutador, 2010, p. 140-141.55 SARLET, op. cit., p. 113.56 PRUNES, Jos Luiz Ferreira. Trabalho perverso: insalubridade, periculosidade e penosidade no direito brasileiro do trabalho. Curitiba: Juru, 2000, p. 699.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 103

    So, portanto, perfeitamente acumulveis os adicionais, at porque h fatos geradores diversos, e inexiste qualquer determinao legal neste sentido da no acumulao, conforme deciso atual no tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul57.

    O Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul protege quem labora na Fundao de Proteo Especial do Rio Grande Do Sul FPE, eis que os trabalhadores esto em contato permanente com menores infratores, tornando a atividade penosa no grau mximo (40%)58.

    Ainda, com relao cumulao de adicionais com o de penosidade, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho afirma que,no artigo 193, 2, da Consolidao das Leis do Trabalho, no obsta o percebimento cumulado de adicional de insalubridade e de penosidade, tendo em vista que o mencionado dispositivo consolidado apenas faculta ao trabalhador opo pelo adicional de insalubridade em detrimento do acrscimo salarial decorrente de periculosidade, sem possuir, assim, relao com o adicional de penosidade. No se vislumbra, por conseguinte, impedimento ao pagamento simultneo dos adicionais de insalubridade e penosidade59.

    O Tribunal Regional do Trabalho, 2 Regio, considera penoso o trabalho dos operadores de telemarketing, na medida em que sofrem de tendinites, por laborar em teclados de computador, e tambm por mesclar ao trabalho braal alguma elaborao intelectual. Afirma que atinge digitadores e advogados, atendentes de call centers e secretrias, porque o esforo repetitivo no precisa estar desvinculado do pensar, da reflexo, da elaborao intelectual, para se configurar em plenitude. Assim, a atividade desses trabalhadores penosa em vrios aspectos, com o atendimento telefnico em situao de aberta hostilidade, funcionando como potencializador da penosidade60.

    57 TRT da 4 Reg. Rio Grande do Sul, 00757-2008-023-04-00-0 RO/REENEC, Fl.19, 14/04/2010, Rel. Maral Henri Figueiredo. 58 TRT da 4 Reg. Rio Grande do Sul, 0003100-85.2009.5.04.0009 RO/REENEC, 14/04/2010, Rel. Beatriz Renck. 59 TST, Primeira Turma, PROCESSO N TST-RR-1819/2001-049-03-00.3, 21/10/2009, Ministro Rel. Lelio Bentes Corra.60 TRT da 2 Reg. So Paulo, ACRDO N: 20100576960, 28/06/10, Desembargador Rel. DAVI FURTADO MEIRELLES.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    104 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    Tambm o Tribunal Regional de So Paulo 2 Regio nomeia o adicional de penosidade como adicional de risco, afirmando ser cabvel para aqueles trabalhadores porturios e, embora no haja previso legal ou normativa para o pagamento do adicional de risco, houve negociao coletiva, fixando critrio especfico de pagamento da remunerao dos trabalhadores avulsos61.

    No Tribunal Regional de Esprito Santo, 17 Regio, entendeu-se, igualmente, que o adicional de risco e de penosidade devido a todos os trabalhadores que desenvolvem as suas atividades em rea porturia, no importando se isto ocorre em portos organizados ou privativos, e que desenvolvam as suas atividades em rea porturia, contnuas ou descontnuas. Isto porque a Norma Regulamentadora n 29, que trata da Segurana e Sade no Trabalho Porturio, dispe, expressamente, que as regras ali inseridas devem ser aplicadas a todos os trabalhadores porturios62.

    No mesmo diapaso, o Tribunal Regional da Bahia, 5 Regio, entendendo que os trabalhadores avulsos porturios tm o direto de receber o adicional de risco, tendo em vista que a operao porturia exige que os servios tenham grande produo, e praxe o uso de mquinas e equipamentos pesados63.

    No Tribunal Regional do Maranho, 16 Regio, empregados s conseguem o adicional de penosidade, trabalhando com digitao, com esforo repetitivo, pelo argumento de que se h norma coletiva com previso de adicional de penosidade para aqueles trabalhadores que exercem atividade de digitao. Presume-se, desta forma, que tal adicional constitui uma compensao pelo esforo repetitivo desempenhado durante toda a jornada. Por isso, s devido o adicional de penosidade ao obreiro que no possui diversas atribuies. preciso exercer, exclusivamente, a funo de digitador64.

    61 TRT da 2 Reg. So Paulo, ACRDO N: 01757.2008.446.02.00-5, 18/08/10, Desembargadora Rel. CNDIDA ALVES LEO. 62 TRT da 17 Reg. Esprito Santo, ACRDO N: 00387.2007.013.17.00.2, 24/02/10, Desembargador Rel. CLAUDIO ARMANDO COUCE DE MENEZES. 63 TRT da 5 Reg. Bahia, ACRDO N: 00092-2006-034-05-00-1, 19/11/09, Desembargador Rel. ESEQUIAS DE OLIVEIRA. 64 TRT da 16 Reg. Maranho, ACRDO N: 00303-2007-015-16-00-9-ROPS, 22/02/08, Desembargador Rel. JAMES MAGNO ARAJO FARIAS.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 105

    J o Tribunal Regional do Paran, 9 Regio, configura o adicional de penosidade como uma forma de indenizao por parte do empregador, principalmente, no carregamento de peso excessivo, sem que aquele tivesse adotado medida para eliminar os riscos sade do obreiro, com fundamento de que o trabalho penoso viola a Conveno n 127 da Organizao Internacional do Trabalho (Artigo 3 - No se dever exigir nem permitir a um trabalhador o transporte manual de carga, cujo peso possa comprometer sua sade ou sua segurana.), que dispe sobre o peso mximo a ser suportado pelos trabalhadores, incorporada ao ordenamento jurdico nacional pelo Decreto n 67.339/197065.

    O Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, 3 Regio, se manifesta a respeito da compensao do adicional de penosidade com o adicional de periculosidade, entendendo no ser possvel compensar os valores pagos a ttulo de adicional de penosidade com aqueles apurados, em razo do adicional de periculosidade, por inexistir amparo legal. Constituiria inovao, o que vedado pelo 1 do art. 879 da CLT66.

    O Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais, 10 Regio, Distrito Federal e Tocantins, entendem que, quando o adicional de penosidade est previsto em norma coletiva, no est sujeito compensao67. O mesmo Tribunal aplica, ainda, o valor de 50% a ttulo do adicional de penosidade e ainda nomeia quais so os trabalhos considerados penosos, tais como: serventes, ajudantes, auxiliares, vigias; operador de martelete, operador de betoneira, auxiliar de topografia; operador de bate-estaca, apontador, almoxarife, armador, pedreiro, carpinteiro, graniteiro, trabalhadores da rea administrativa; profissionais especializados, encarregado de equipe; encarregado geral; montador e lanador de cabos de linha de transmisso68.

    65 TRT da 9 Reg. Paran, ACRDO N: 06518-2007-020-09-00-7, 22/07/10, Desembargador Rel. UBIRAJARA CARLOS MENDES. 66 TRT da 3 Reg. Minas Gerais, ACRDO N: 00515-1997-094-03-00-6, 27/10/04, Desembargador Rel. PAULO ROBERTO SIFUENTES COSTA. 67 TRT da 10 Reg. Distrito Federal e Tocantins, ACRDO N: 00475-2009-821-10-00-4, 04/12/09, Desembargador Rel. Braz Henriques de Oliveira. 68 TRT da 10 Reg. Distrito Federal e Tocantins, ACRDO N: 00624-2009-821-10-00-5, 17/11/09, Juiz Rel. Grijalbo Fernandes Coutinho.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    106 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    J o Tribunal Regional do Trabalho de Recife, 6 Regio, aduz que, como no h lei em vigor no ordenamento jurdico ptrio que trate das atividades penosas, pode ser contemplado em instrumento coletivo (CF/88 art. 7, XXVI)69.

    Em relao ao trabalhador porturio, o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho do Cear da 7 Regio que, se h uma negociao coletiva, se faz vlida a estipulao em norma coletiva de trabalho que prev percentual incidente sobre o valor da diria bsica diurna da atividade, por escalao e efetiva prestao de servios, visando a cobrir eventuais e potenciais riscos, decorrentes da penosidade das atividades porturias, tendo em vista que a Lei n 8.630/93 outorgou s negociaes coletivas a estipulao das condies de trabalho do trabalhador porturio avulso70.

    O Tribunal Regional do Trabalho do Par e Amap, 8 Regio, aduz que devido o adicional de penosidade, quando objetiva repor o maior desgaste fsico dos empregados que trabalham em turno ininterrupto de revezamento, no percentual de 15% sobre o salrio-bsico, acrescido do adicional de tempo de servio, conforme clusula do acordo coletivo. Faz, ainda, uma reflexo, tratando que o adicional de penosidade foi mencionado na Carta Magna de 1988, no art. 7, inc. XXIII, que lhe atribuiu a mesma natureza jurdica dos adicionais de periculosidade e insalubridade, objetivando compensar o trabalho em condies mais desgastantes para a sade do trabalhador e recebendo idntico tratamento dos outros dois adicionais, embora ainda esteja pendente de instituio, atravs de lei ordinria.

    Tambm o Tribunal leva em considerao a relao entre a penosidade e a ergonomia, apontada por Wladimir Martinez, que considera penosa a atividade produtora de desgaste no organismo, de ordem fsica ou psicolgica, em razo da repetio de movimentos, de condies agravantes e, em geral, de presses e tenses prximas do indivduo, com a peculiaridade de no deixar sinais perceptveis aps o descanso, a no ser por algumas sequelas sedimentadas.

    69 TRT da 6 Reg. Recife, ACRDO N: 01173-2008-122-06-00-3, 10/06/09, Juza Convocada ALINE PIMENTEL GONALVES. 70 TRT da 7 Reg. Cear, ACRDO N: 0077300-28.2008.5.07.0005, 15/01/09, Desembargador Rel. CLAUDIO SOARES PIRES.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 107

    Dessa forma, conclui o Tribunal em comento que o adicional de penosidade possui a mesma natureza jurdica do adicional de periculosidade, mas um no deve compor a base de clculo do outro, a fim de evitar o bis in idem, que importa em enriquecimento ilcito e, por isto, somente o salrio bsico e o adicional por tempo de servio devem compor a base de clculo do adicional de penosidade. Enfatiza-se ainda que ele no pode repercutir sobre a base de clculo do adicional de periculosidade, o que vedado, inclusive, pela aplicao analgica do 2, do art. 193 consolidado.

    Assim, decidiu por excluir as diferenas de adicional de periculosidade decorrentes da incidncia do adicional de penosidade, bem como os reflexos sobre frias com 1/3, gratificaes natalinas e FGTS71.

    O Tribunal Regional do Trabalho da 8 Regio, acima referido, tambm entende que o adicional de penosidade integra a remunerao para todos os efeitos legais72, bem como os seus reflexos73.

    O Tribunal Regional do Trabalho de Campinas/SP, 15 Regio, decidiu pela condenao do empregador no adicional de penosidade para aqueles trabalhadores que laboram cortando cana de acar, sob o argumento de que o trabalho de corte da cana-de-acar, face sua penosidade, tem propiciado desgaste fsico e psquico do trabalhador, de tal monta que, em muitos casos, chegou a levar at a morte por exausto, verbis:

    Dados apontam que o cortador de cana, atualmente, corta em mdia 15 toneladas por dia. E sabido que o cortador faz um conjunto de movimentos envolvendo torcer o tronco, flexo de joelho e trax, agachar e carregar peso, sendo certo que, se ele vier a cortar 15 toneladas por dia, efetua aproximadamente 100 mil golpes de faco com cerca de 36 mil flexes de pernas. Dada a forma de remunerao do cortador (por produo) e o nfimo valor pago por metro de cana cortada, o trabalhador se v obrigado a laborar muito alm do que deveria para auferir um salrio mensal razovel. E, para agravar a situao, no se pode desconsiderar

    71 TRT da 8 Reg. Par e Amap, ACRDO N: 00384-2004-110-08-00-4, 23/02/05, Juza Presidente e Relatora ELIZABETH FTIMA MARTINS NEWMAN. 72 TRT da 8 Reg. Par e Amap, ACRDO N: 00451-2004-101-08-00-0, 28/03/08, Desembargadora Relatora ODETE DE ALMEIDA ALVES. 73 TRT da 8 Reg. Par e Amap, ACRDO N: 0019400-05.2009.5.08.0109, 09/06/10, Desembargador Relator JOS EDLSIMO ELIZIRIO BENTES.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    108 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    que so extremamente ruins as condies em que o trabalho

    desenvolvido. Desta forma, sendo induvidoso o fato de que o servio do cortador de cana enquadra-se como penoso, no se pode deixar sem a proteo devida o trabalhador que presta servios nestas condies. E, neste contexto, considerando-se

    que, na Constituio Federal de 1988, os direitos fundamentais foram erigidos sua mxima importncia, sendo que o princpio da dignidade da pessoa humana foi adotado como fundamento da Repblica do Brasil, conforme dispe em seu art. 1, III,

    indiscutvel que a autonomia das relaes de trabalho encontra

    limites na preservao da dignidade da pessoa humana. Sendo assim, procurando valorizar o trabalhador e proteg-lo, o operador do direito, ao verificar que o sofrimento deste se agiganta diante da

    penosidade do trabalho, h de ponderar, no exame da postulao, que, para corrigir essa situao, necessrio o deferimento do pagamento da hora extraordinria cheia74.

    O Tribunal Regional do Trabalho do Maranho, 16 Regio, entende, por sua vez, em conceder o adicional de penosidade no percentual de 10% para os trabalhadores que, alm de digitadores, laboram com tratamento de dados, bem como porque tal adicional consta em conveno coletiva75.

    Por fim, o Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte,

    21 Regio, instrui, afirmando que h previso constitucional, como direito

    fundamental, o adicionalde remunerao ao trabalho considerado penoso, insalubre e periculoso (art. 7, XXIII). Afirma, ainda, a falta de regulamentao

    em lei especfica, e, por isto, o juiz deve utilizar meios adequados, para aplicar o

    direito e socorrer-se da analogia, da equidade, dos costumes ou dos princpios gerais do direito, conforme disposio na Lei de Introduo ao Cdigo Civil. Diante disso, aplica o adicional de penosidade.76

    74 TRT da 15 Reg. Campinas/SP, ACRDO N: 0094700-52.2009.5.15.0052, 30/04/10, Desembargador Relator LORIVAL FERREIRA DOS SANTOS. 75 TRT da 16 Reg. Maranho, ACRDO N: 00513-2007-004-16-00-3, 05/06/08, Desembargador Relator JOS EVANDRO DE SOUZA. 76 TRT da 21 Reg. Rio Grande do Norte, ACRDO N: 95.883, 28/07/10, Juza Relatora LYGIA MARIA DE GODOY BATISTA CAVALCANTI.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 109

    5 CONCLUSO

    Entende-se que os elementos, caracterizadores das condies de risco, embora inerentes natureza das prprias funes, dependem essencialmente de fatores ou aes externas ao prprio exerccio profissional, enquanto os que caracterizam as situaes de penosidade esto intrinsecamente ligados execuo da atividade.

    As condies de trabalho tornam-se penosas, quando exigem uma sobrecarga fsica ou psquica, diferentemente das que so insalubres, quando as condies ambientais ou os meios utilizados no exerccio da prpria atividade podem ser nocivos para a sade do trabalhador.

    Por outro lado, o risco, a penosidade e a insalubridade no so condies inerentes s prprias profisses ou atividades profissionais, mas, sim, dependentes das condies concretas do seu exerccio, pelo que devem ser, prioritariamente, eliminadas ou diminudas, atravs da aplicao das tecnologias e dos mtodos de preveno constantes da legislao em vigor sobre segurana e sade no trabalho ou daquelas que se vierem a viger.

    Reconhecendo-se, no entanto, que nem sempre pode ser evitada a persistncia dessas condies desfavorveis, os projetos de lei que tramitam hoje no Brasil determinam a atribuio de diversos tipos de compensaes a serem aplicadas, em funo da avaliao feita por entidades competentes, do respectivo grau de gravidade e da frequncia e durao da exposio dos trabalhadores em cada caso concreto.

    Atualmente, houve votao favorvel ao Projeto Lei n 522/09, para aplicar o adicional de penosidade no percentual de 30% sobre o salrio para aqueles trabalhadores que laboram sob radiao solar a cu aberto, no qual seria acrescentada uma nova Seo no Captulo I do Ttulo III da Consolidao das Leis do Trabalho CLT.

    O principal fundamento para a aprovao do referido projeto foi no sentido de que muitos trabalhadores tiveram agravados os riscos de desenvolver cncer de pele, tendo em vista que a incidncia dos raios ultravioletas est cada vez mais agressiva na Terra, e as pessoas de todos os fototipos devem estar protegidas, quando expostas ao sol.

  • REVISTA NOVATIO IURIS

    110 FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012

    Diante disso, imprescindvel proteo aos trabalhadores ao laborarem em condies penosas, eis que, embora o dinheiro no seja capaz de indenizar o desgaste da integridade fsica de uma pessoa, ele pode e deve responder pelos acrscimos das despesas com sade.

    Assim, para alm do suplemento remuneratrio, admitem-se outras formas de compensao, nomeadamente, a adaptabilidade da durao e dos horrios de trabalho, e, neste sentido, a legislao laboral internacional faz frequentemente apelos em relao s situaes de trabalho desgastantes, ao aumento do tempo de repouso, atravs da concesso de perodos suplementares de frias e ainda benefcios especficos no regime de aposentadoria.

    A realidade nos mostra a nfima valorizao social do trabalho braal e desqualificado. Entende-se que as condies, impostas aos trabalhadores em seu ambiente de trabalho, impedem a pessoa de ter tempo para as suas demais atividades, alm de macular a sua subjetividade, esvaziando as suas motivaes, a autoestima, autoimagem e honra, contribuindo para o seu colapso como ser humano.

    Poderamos, ento, considerar o trabalho penoso como sendo aquele que, por fora da natureza das prprias funes ou de fatores ambientais, isto pe, os que provocam uma sobrecarga fsica ou psquica ao trabalhador.

    Portanto, necessrio e urgente que se faa um amplo debate entre a sociedade, os operadores do direito e os legisladores, para, inicialmente, definir a expresso trabalho penoso e elencar, taxativa ou exemplificativamente, quais trabalhadores se enquadrariam para ter direito ao adicional de penosidade, bem como verificar a extenso da aplicao do princpio da dignidade da pessoa humana.

    REFERNCIAS

    BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentrios a constituio do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. So Paulo: Saraiva, 1989. 2 v.

    BULOS, UadiLammego. Curso de direito constitucional. 5. ed., rev. atual. So Paulo: Saraiva, 2010.

  • FADERGS

    FADERGS - v.4, n. 2, ago.-dez. 2012 111

    CABRAL, Adelmo De Almeida. Adicionais no direito do trabalho.So Paulo: LTr, 1994.

    CARRION, Valentin. Comentrios consolidao das leis do trabalho. 26. ed. So Paulo: Saraiva, 2001.

    CRETELLA JUNIOR, Jos. Comentrios a constituio brasileira de 1988. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense-Universitria, 1990. 2 v.

    DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho.So Paulo: LTr, 2002.

    DIESAT. Insalubridade:morte lenta no trabalho. So Paulo: Obore, 1989.

    MARAL, Patrcia Fontes. Direito do trabalho: Curso didtico. Braslia: Vestcon, 2009.

    MARQUES, Christiani. A proteo ao trabalho penoso. So Paulo: LTr, 2007.

    MARTINS, Flademir Jeronimo Belinati. Dignidade da pessoa humana. Curitiba: Juru, 2006.

    MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 24. ed. atual. at 12-12-2007 So Paulo: Atlas, 2008.

    MARX, Karl. O capital. Bauru: Edipro, 1998.

    MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 3. ed. Lisboa: Coimbra, 2000.

    MORAIS, Jos Luis Bolzan de. As crises do Estado e da Constituio e a transformao espacial dos direitos humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.

    PINTO, Jos Augusto Rodrigues. Tratado de direito material do trabalho. So Paulo: LTr, 2007.

    PITTA, Ana Maria Fernandes. Hospital: dor e morte como ofcio. 3. ed. So Paulo: Hucitec, 1994.

    PRUNES, Jos Luiz Ferreira. Trabalho perverso: insalubridade, periculosidade e penosidade no direito brasileiro do trabalho. Curitiba: Juru, 2000.

    SAAD, Eduardo Gabriel. Constituio e direito do trabalho. 2. ed. So Paulo: LTr, 1989.

    SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituio Federal de 1988. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

    STUMPF, Paulo Umberto. O Princpio constitucional da dignidade humana. Belo Horizonte: O Lutador, 2010.

    SUSSEKIND, Arnaldo. Instituies de direito do trabalho. 13. ed. So Paulo: LTr, 1992. 1 v.