sincronia e diacronia

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Texto sobre os conceitos saussurianos de sincronia e diacronia.

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    Instituto Federal de Educao, Cincia e Tecnologia de Roraima

    Campus Boa Vista

    Diretoria de Graduao

    Licenciatura em Letras Espanhol e Literatura Hispnica Lingustica I: Fundamentos epistemolgicos

    Prof. Miguel Linhares

    SINCRONIA E DIACRONIA UNIDADE III1

    1. Resumindo a dicotomia

    Como vimos na primeira unidade, a grande inovao das ideias de Ferdinand de

    Saussure foi chamar a ateno dos linguistas para o fato de que desde a consolidao do

    mtodo histrico-comparativo no se vinha estudando a lngua, mas a mudana da

    lngua, posto que, como o prprio nome do mtodo assinala, o estudo tinha natureza

    histrica. As leis fonticas evidenciam a regularidade da mudana de um estado a outro,

    mas e as leis que regem o funcionamento da lngua? Saussure as postulou, mas antes

    ps uma condio: necessrio distinguir o estudo da mudana da lngua e o estudo da

    lngua. Ilustremos a questo.

    Em latim a primeira pessoa do pretrito perfeito do indicativo do verbo facere

    [fakere] feci [feki] e a terceira pessoa fecit [fekt]. As formas portuguesas, fiz e fez, derivam das latinas, de modo que podemos montar o seguinte quadro:

    feci fecit

    fiz fez

    Se estudarmos estes fatos na direo vertical, observaremos que o /k/ latino

    se torna fricativo e sonoro em portugus /z/, o que se pode corroborar com outros

    inmeros casos, como uicinus [wikins] > vizinho; que o /i/ longo de feci atraiu o /e/ tnico para o seu ponto de articulao, /e/-/i/ > /i/-/i/; que o /i/ e o // finais (junto com o /t/) se elidem neste contexto fontico, como tambm acontece em pace- [pake] > paz. De forma resumida, temos a descrio da mudana destas formas do latim para o

    portugus, mas... como funcionam?

    Para observarmos as leis do funcionamento interno necessrio, neste caso,

    atentarmos para os fatos na direo horizontal, e mais, um par por vez. Assim, se

    compararmos feci ~ fecit com outros verbos da mesma classe nos mesmos tempo e

    modo e nas mesmas pessoas, como fui [fi] fui ~ fuit [ft] foi ou tenui [tni] tive ~ tenuit [tnt] teve, constataremos que comparando par por par se repetem os segmentos fec-, fu- e tenu-, e comparando par a par se repetem os segmentos -i e -it.

    Ora, pelos significados conclui-se que fec-, fu- e tenu- so as razes que carregam os

    significados de fazer, ser e ter, enquanto que -i e -it so afixos que carregam os significados respectivos de primeira pessoa e terceira pessoa, ambas no singular. Assim,

    com a raiz do perfectum (os tempos de ao acabada) de qualquer verbo latino podemos

    construir as formas da primeira e terceira pessoas do singular do pretrito perfeito do

    1 Esta unidade corresponde ao terceiro captulo, pgina 94, da primeira parte do Curso de lingustica

    geral (doravante CLG), de Ferdinand de Saussure, que est contido na apostila de Lingustica I:

    Fundamentos epistemolgicos.

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    indicativo: se a raiz do perfectum de pr posu-, ento pus posui e ps posuit; se a

    raiz do perfectum de poder potu-, ento pude potui e pde potuit.

    Em portugus se observarmos todos os exemplos que j foram dados: fiz ~ fez,

    fui ~ foi, tive ~ teve, pus ~ ps, pude ~ pde, constataremos que (e para tal so precisos

    conhecimentos de fontica) que eles tm em comum uma alternncia entre uma vogal

    alta na primeira pessoa, /i/ ou /u/, e uma vogal mdia na terceira, /e/ ou /o/, ou seja, /i/ ~

    /e/ e /u/ ~ /o/. por isto que com o verbo trazer h quem diga truxe ~ troxe; embora a

    gramtica normativa proscreva estas formas como erradas, no so nada mais nada

    menos que um ajuste a esta forma de se opor a primeira e a terceira pessoas no pretrito

    perfeito do indicativo em portugus.

    Quando explicamos como as formas latinas feci e fecit deram as formas

    portuguesas fiz e fez fizemos lingustica evolutiva ou diacrnica, e quando explicamos

    a estruturao primeiro das formas latinas e depois das formas portuguesas fizemos

    lingustica esttica ou sincrnica.

    Para fazer lingustica diacrnica preciso observar os fatos em duas pocas

    diferentes, no caso que descrevemos temos o latim como era falado no perodo clssico

    no registro culto e o portugus como falado hoje. Poderamos perfeitamente abordar a

    mudana do portugus antigo para o portugus moderno ou do portugus falado no

    sculo XV para o falado no sculo XVI, e outras inmeras situaes.

    Por outro lado, o estudo sincrnico prescinde de um s e mesmo perodo. No

    nosso caso, primeiro descrevemos como se opem a primeira e a terceira pessoas do

    singular do pretrito imperfeito do indicativo no latim clssico e depois no portugus

    contemporneo. Perceba que para descrever as formas portuguesas fiz ~ fez do ponto de

    vista diacrnico foi preciso recorrer ao latim, que a lngua da qual deriva o portugus,

    mas do ponto de vista sincrnico no foi preciso sequer mencionar o latim.

    Assim como preferiu a lingustica da lngua (langue) lingustica da fala

    (parole), por estar na lngua a regularidade subjacente variao, Saussure defendeu o

    estudo sincrnico porque por ele o linguista chega ao conhecimento do sistema que faz

    funcionar a lngua, somente por ele evidencia as oposies que constituem esse sistema.

    Ora, se o sistema lingustico um sistema de oposies, ento feci e fiz, dum lado, e

    fecit e fez, doutro, no so elementos de um sistema, primeiro, porque nem sequer

    coexistem (para fiz e fez existirem foi preciso que feci e fecit deixassem de existir;

    lembre-se de que o latim uma lngua morta), depois porque tm os mesmos valores:

    primeira e terceira pessoas do pretrito perfeito do indicativo. Ou seja, justo o

    contrrio do que acontece a feci e fecit, dum lado, e fiz e fez, doutro, que coexistiram ou

    coexistem e se opunham ou se opem, um com o valor de primeira pessoa e o outro

    com o de terceira pessoa.

    A seguir voc pode complementar a sua leitura dos captulos terceiro e quarto do

    CLG e deste comentrio com as definies de sincrnico e diacronia dadas pelo

    Dicionrio de Lingstica organizado por Jean Dubois [ dybwa], traduzido e publicado pela editora Cultrix. Uso a edio de 2006.

    2. Sincrnico

    1. Qualificam-se de sincrnicos os estudos que visualizam a lngua num momento dado,

    como um sistema estvel (estudo, pesquisa, lingstica sincrnicos), os fatos que so

    estudados como elementos de um sistema que funciona num momento dado e

    considerados como estveis (fatos, dados sincrnicos).

    2. O estudo sincrnico da lngua aplica-se a um estado determinado (num momento

    dado do tempo). Este estado pode ser, s vezes, muito recuado: pode-se fazer uma

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    descrio, um estudo sincrnico do latim ou do grego antigo, desde que estes estudos se

    situem num momento do passado e no levem em considerao a evoluo da lngua.

    Observe-se, contudo, que as hipteses que se podero formular sero injustificveis na

    medida em que no se poder submet-las ao julgamento dos locutores nativos.

    a F. DE SAUSSURE que cabe o mrito de haver insistido na importncia do

    estudo sincrnico, na descrio, em lingstica. A sincronia ser para ele que a

    perspectiva segundo a qual uma lngua considerada num momento dado como

    constituindo um sistema, quer o conjunto de fatos de lngua estudados assim, ou

    situados num momento determinado do tempo e concebido como formando um sistema,

    quer, de uma maneira mais geral, a disciplina que se ocupa da discrio lingstica. F.

    DE SAUSSURE ilustrou a oposio diacronia/sincronia utilizando a imagem de um jogo

    de xadrez. Durante uma partida de xadrez, a disposio das peas se modifica a cada

    lance, mas a cada lance a disposio pode ser inteiramente descrita a partir da posio

    em que se encontra cada pea. Pela conduta do jogo, num momento dado, pouco

    importa saber quais foram os lances jogados anteriormente, em que ordem eles se

    sucederam: o estado particular da partida, a disposio das peas podem ser descritos

    sincronicamente, isto , sem nenhuma referncia aos lances precedentes. Se seguirmos

    F. DE SAUSSURE, o mesmo ocorrer para as lnguas; elas se modificam constantemente,

    mas poderemos explicar o estado em que elas se encontram num dado momento.

    Podemos tomar, como exemplo, o caso da passagem do latim para o portugus.

    Em latim, as diferentes terminaes indicam as relaes que as palavras mantm numa

    frase. Um estudo sincrnico deste sistema poder, ento, ser feito, tendo em conta os

    elementos tais como eles se apresentavam, por exemplo, no 1. sculo a.C. O estado de

    lngua poder ser delimitado, tomando-se textos correspondentes, por exemplo, a uns

    trinta anos. Supor-se- que entre 60 a.C. e 30 a.C. no houve variaes dignas de nota.

    No , pois, a natureza dos enunciados analisados que faz que o estudo seja sincrnico,

    mas o enfoque destes enunciados pela lingstica que minimiza (ignora) as diferenas

    entre um ponto no tempo e outro (estudo sincrnico) ou, ao contrrio, os reala (estudo

    diacrnico). Tomando a imagem do jogo de xadrez, pode-se dizer que as peas podem

    ser as mesmas, mas que suas posies sobre o tabuleiro mudam. s vezes, preciso ir

    mais longe: pode-se perguntar se, no fundo, no existe a supresso, por exemplo, de

    certas peas (a imagem do tabuleiro permite visualiz-la) ou a adio de outras (o que a

    imagem do tabuleiro de xadrez interdita). Assim, para o francs falado moderno, a

    distino entre o singular e o plural no mais marcada pela introduo de um -s, como

    at o fim do sculo XVI, mas pela forma do artigo definido, o modo como se faz a

    concordncia verbal, a ligao antes de uma palavra que comea por uma vogal. Os

    falantes de uma lngua no conhecem, em geral, (salvo algumas excees), a histria da

    lngua que falam. O passado no tem, pois, nenhuma importncia para a compreenso

    do sistema (embora R. JAKOBSON tenha insistido na importncia dos remanescentes

    diacrnicos num estado de lngua). Eles comeam a aplicar certas regras imanentes

    (levando em conta o grupo social no qual comeam a falar) ao conjunto de frases

    utilizadas pela comunidade na qual vivem.

    A descrio sincrnica toma para si a tarefa de enunciar claramente e de modo

    sistemtico o conjunto de regras tais como elas funcionam, num momento dado, na

    lngua a ser estudada. No que toca a alguns membros de uma comunidade lingstica

    voltados para os estados anteriores da lngua, ou seus conhecimentos especializados

    modificam seu comportamento verbal, e ento sua lngua diferente daquela praticada

    pela comunidade, devendo ser estudada como tal; ou ento no tm nenhuma incidncia

    e, portanto, nenhum interesse para o estudo a ser efetuado.

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    De todos os modos, a lngua de uma comunidade lingstica determinada, num

    momento dado, no jamais uniforme, e a evoluo lingstica no consiste na

    substituio de um sistema de comunicao homogneo por outro sistema igualmente

    homogneo.

    Pode-se dizer, pois, que, de todos os modos, os dois mtodos comportam certa

    simplificao, que minimiza os desvios e que necessria no estado atual da pesquisa.

    3. Diacronia

    A lngua pode ser considerada como um sistema que funciona num determinado

    momento do tempo (sincronia) ou ento analisada na sua evoluo (diacronia); pela

    diacronia, seguem-se os fatos de lngua na sua sucesso, na sua mudana de um

    momento a outro da histria: para F. DE SAUSSURE, diacronia primeiro um dos pontos

    de vista que o lingista pode escolher e que, de maneira fundamental, se ope a

    sincronia. Nessa perspectiva, todo estudo diacrnico uma explicao histrica do

    sistema sincrnico e os fatos diacrnicos so as mudanas sofridas pela lngua.

    A diacronia tambm a sucesso de sincronias que, no esprito de F. DE

    SAUSSURE, a nica que pode explicar de forma adequada a evoluo da lngua.

    Chama-se igualmente diacronia o carter dos fatos lingsticos considerados na

    sua evoluo atravs do tempo, ou ento a disciplina que se ocupa desse carter (a

    lingstica diacrnica).

    Os problemas da diacronia so complexos. Ela constata primeiro as mudanas

    que se produzem e as localiza no tempo. Mas quase no possvel fazer nesse domnio

    um trabalho rigoroso sem pr em seu lugar cada etapa historicamente constatada, pela

    qual um fonema, por exemplo, sem integrar o fato no sistema tal como ele funcionou

    num dado momento.

    A importncia da diacronia na lingstica do sculo XIX deve-se ao fato de que

    a evoluo da lngua tendia a no ser mais que um meio de conhecer a histria dos

    povos. A distino rigorosa entre sincronia e diacronia , pois, uma reao contra essa

    perspectiva historicista da lingstica. Essa distino tem tambm fins metodolgicos.

    Pode-se objetar que o falante conhece mal ou ignora a histria da sua lngua e que, por

    conseguinte, o conhecimento dos estados anteriores no permite compreender o

    funcionamento do sistema considerado sincronicamente. Assim, o fato de que chegar

    venha do lat. plicare, dobrar, tem influncia alguma no emprego atual da palavra; assim, a explicao etimolgica segundo a qual testa remonta a uma palavra latina que

    significa bilha, e que no latim tardio passou a designar a caixa craniana, uma simples curiosidade, sem grande importncia para o funcionamento atual da palavra

    testa (testa-de-ferro). Da mesma forma, a investigao das causas de evoluo leva

    muitas vezes a fatos extralingsticos que, tampouco, explicam o estado atual. Enfim,

    indagou-se se toda pesquisa sobre os antigos estados de lngua podia levar a alguma

    certeza, na medida em que o pesquisador no tem a competncia lingstica dos falantes

    da poca que ele estuda. Em sentido inverso, pode-se sustentar que no h sincronia sem

    diacronia. Esta ltima est sempre subjacente num dado estado de lngua, que seria a

    cada momento cheio do passado e cheio do futuro, sem que se possa afirmar que a

    lngua se tenha estacionado num momento. Assim, depois da Segunda Guerra Mundial,

    encontravam-se na Crsega trs termos para designar caneta: pinna, porta-pinna e a palavra tomada do francs porte-plume. Os avs serviam-se do primeiro, os pais, do

    primeiro e do segundo (dando ao primeiro um valor melhorativo), os netos, do segundo

    e do terceiro (dando ao segundo um valor melhorativo). No h, pois, num dado

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    momento, um nico, mas vrios sistemas que entram em concorrncia e que projetam,

    assim, a diacronia num estado sincrnico.

    Os estruturalistas funcionalistas negam-se hoje a manter o postulado da distino

    absoluta entre a diacronia e a sincronia, a no ser por motivos metodolgicos: com

    efeito, a evoluo de um sistema A para um sistema B, que lhe posterior, s pode ser

    descrita como transformao da estrutura sincrnica A numa outra estrutura sincrnica

    B; , com efeito, a organizao geral do sistema que est em causa quando se fala, por

    exemplo, de fonologia diacrnica e esta no pode ser feita sem o conhecimento prvio

    dos estados sincrnicos.

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    EXERCCIOS

    1. Assinale com a letra S o que caracteriza a sincronia e com a letra D o que

    caracteriza a diacronia:

    ( ) Estuda os fenmenos lingusticos em um determinado estado de sua evoluo, seja

    no presente seja no passado.

    ( ) Estuda os fatos lingusticos em suas transformaes atravs do tempo.

    ( ) Estuda o modo como a lngua funciona.

    ( ) Interessa-se pela evoluo e suas causas.

    ( ) Descreve-se a relaes internas da lngua.

    2. Um estado de lngua vem a ser:

    a) Ausncia de transformao durante um perodo;

    b) Perodo em que uma lngua sofre transformaes consistentes;

    c) Perodo em que uma comunidade lingustica admite certa variao.

    3. A lingustica que se ocupa de valores e relaes coexistentes :

    a) Lingustica diacrnica;

    b) Lingustica sincrnica;

    c) Lingustica histrica.

    4. Estabelea as corretas atribuies:

    a) Diacronia

    b) Sincronia

    ( ) Prospectiva e retrospectiva

    ( ) Homem homens

    ( ) Fatos sucessivos

    ( ) Fatos simultneos

    ( ) Homine- > hom > homem

    5. Complete corretamente as lacunas com as palavras diacrnico e sincrnico.

    a) A lngua um sistema do qual todas as partes podem e devem ser consideradas em sua solidariedade: __________ b) Os fatos __________, quaisquer que sejam, apresentam uma certa regularidade, mas no tm nenhum carter imperativo; os fatos __________, ao contrrio, se impem

    lngua, mas nada mais tm de geral. c) Na perspectiva __________, ocupamo-nos com fenmenos que no tm relao alguma com os sistemas, apesar de os condicionarem.

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    ORIENTAES PARA A REDAO DAS RESPOSTAS

    Redija as suas respostas com a fonte (tipo de letra) Times New Roman ou Arial com tamanho 12 e espaamento simples entre as linhas.

    Preste ateno ao uso do negrito e do itlico: o negrito serve, por exemplo, para ressaltar o ttulo, e o itlico, para assinalar palavras soltas.

    Na primeira pgina da sua resposta redija o cabealho com o seu nome centralizado, pule duas linhas e redija o ttulo em negrito no modo justificado:

    Resposta dos exerccios. Pule uma linha e redija suas respostas. No caso da

    primeira, escreva a sequncia de esses e ds. No caso da segunda e da terceira,

    reescreva a alternativa correta. No caso da quarta, escreva a sequncia de s e

    bs. No caso da quinta, reescreva os enunciados com a resposta correta.

    Insira a numerao das pginas no canto inferior direito.

    Salve o seu documento com o formato .doc. Se redigir o documento no Word 2007 e salv-lo automaticamente, ficar com o formato .docx, e eu no poderei

    l-lo. Salve o documento com o seu nome e o numeral romano corresponde

    unidade, neste caso II.

    Cada questo vale um ponto, atribudo objetivamente. Os exerccios devem ser entregues impreterivelmente at segunda-feira.