simulação numérica do aquecimento de Água utilizando-se um
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Simulação Numérica do Aquecimento de Água Utilizando-se um Cilindro Ferromagnético
Paulo Tibúrcio Pereira, Universidade Federal de São João Del Rei – UFSJ
Engenharia de Telecomunicações 36420-000, Ouro Branco, MG
E-mail: [email protected]
Luben Cabezas Gómez1, Cristiana Brasil Maia2 Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas
Pós-graduação em Engenharia Mecânica 30535-901, Belo Horizonte, MG
E-mail: [email protected] [email protected] Resumo: Este trabalho apresenta uma breve discussão sobre a transferência de calor entre
um cilindro ferromagnético inserido em um tubo e água escoando no interior deste tubo. Foram utilizados os parâmetros físicos de um chuveiro doméstico para dimensionar um aquecedor elétrico indutivo hipotético. Buscou-se a temperatura da água na saída do aquecedor indutivo. Cálculos analíticos aproximados foram comparados com métodos numéricos. Para simulação do comportamento térmico e hidrodinâmico do escoamento, foram utilizados os softwares ANSYS Workbench, ANSYS CFX e EES. A temperatura da água medida na saída do chuveiro foi comparada com as temperaturas da água calculadas para o aquecedor indutivo.
I. Introdução
A conversão de energia e os projetos de equipamentos para transferência de calor possuem grande importância na engenharia de processos. Nas últimas décadas ocorreu um aumento do custo da energia, exigindo a otimização do seu uso. Assim, a conversão de energia mais eficiente passou a ter uma importância vital.
Dentre os diversos processos de conversão da energia elétrica em calor ressaltam-se, nesse trabalho, os processos que utilizam resistência elétrica e os de indução eletromagnética. Os sistemas elétricos de aquecimento de fluidos podem utilizar corpos submersos como fonte de calor. Nestes casos, para melhorar a eficiência da conversão da energia, torna-se necessária a caracterização do escoamento e do processo de transferência de calor entre o dispositivo eletromagnético e o fluido.
O escoamento de água ao redor de um objeto sólido aquecido no interior de um duto normalmente é turbulento. As equações diferenciais que governam este problema foram resolvidas, no presente trabalho, utilizando-se a técnica de Dinâmica dos Fluidos Computacional (CFD).
II. Caracterização do Problema
Um tubo de seção transversal circular possui, inserido internamente, um cilindro ferromagnético. O cilindro ferromagnético transfere calor para a água escoando ao seu redor. São conhecidas a temperatura e a vazão mássica da água na entrada do tubo. A taxa de transferência de calor é constante e é proveniente de uma indução eletromagnética. A pressão estática na saída também é conhecida. Considera-se que não há fluxo de calor na parede do tubo. A Figura 1 apresenta um esboço desse dispositivo hipotético.
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Figura 1: Dispositivo de aquecimento utilizando indução.
Busca-se o valor da temperatura média da água na saída do dispositivo aquecedor por indução
eletromagnética.
III. Fundamentação Teórica
A solução de qualquer problema físico requer a criação de um modelo matemático correspondente. O modelo matemático deve ser tal que possa ser resolvido, analítica ou numericamente, com tempos de computação não-proibitivos e que os resultados obtidos representem o fenômeno físico em questão. De posse dos resultados analíticos, numéricos e experimentais será possível compará-los [7].
A transferência de calor entre um sólido e um fluido é um fenômeno bastante complexo, neste trabalho em questão envolve os fenômenos de condução e convecção no fluído. Assim, para descrever precisamente esta situação, precisam-se resolver simultaneamente as equações de massa, quantidade de movimento e energia no fluido [11].
As equações de conservação da massa, quantidade de movimento e energia podem ser escritas de forma geral como [7]: Γ Γ Γ (1)
A equação 1 representa a conservação da massa, quando Sφ for igual a zero e φ = 1. As
equações do movimento nas três direções coordenadas são obtidas fazendo-se φ igual a u, v e w com o apropriado termo fonte, que neste caso, inclui o gradiente de pressão. A equação da energia é obtida fazendo-se φ = T, também com o termo fonte apropriado. Γφ representa o produto da difusividade pela massa específica da propriedade transportada em consideração. Para as equações de Navier-Stokes Γφ = µ e para a equação da energia Γφ = k/cp, quando o escoamento é laminar, e é igual a µefetivo e (k/cp)efetivo, quando o escoamento for turbulento [7].
Foram utilizadas técnicas numéricas para resolver as equações de quantidade de movimento e energia no fluido. A turbulência foi tratada através da aplicação dos modelos k-ε e SST (Shear Stress Transport). Estes utilizam duas equações diferenciais parciais de transporte adicionais, além das equações de conservação da massa, da quantidade de movimento e da energia [1] e [7].
Para a abordagem analítica ressaltam-se alguns aspectos sobre escoamento e transferência de calor. O modo de transferência por convecção abrange dois mecanismos. Além da transferência de energia devido ao movimento molecular aleatório (difusão), a energia também é transferida através do movimento global, ou macroscópico, do fluido [3] e [9]. Interessa-se especialmente pela transferência de calor por convecção que ocorre no contato entre um fluido em movimento e uma superfície, quando os dois se encontram em temperaturas diferentes.
A equação de taxa que governa a convecção é a lei de resfriamento de Newton, dada por [3], [5], [6], [8] e [10].
q" = h . (Ts – Tx) (2)
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Na equação anterior, q” representa o fluxo de calor por convecção, proporcional à diferença entre as temperaturas da superfície e do fluido, Ts e Tx, respectivamente. A constante de proporcionalidade h é o coeficiente de transferência de calor por convecção [3], [5], [6] e [8].
Nesse trabalho o escoamento no tubo está completamente confinado. Fazendo um simples balanço global de energia é possível determinar a temperatura média aproximada na saída [4] e [9]. A transferência convectiva de calor total qconv está relacionada à diferença entre as temperaturas na saída e na entrada do tubo. Considerando-se a água como um fluido incompressível e com cp constante pode-se escrever [2] e [4]:
. . , , (3) Onde qconv é a taxa total de transferência de calor no tubo, m é a vazão mássica, cp é o calor específico da água, Tm,o e Tm,i são as temperaturas médias na entrada e saída respectivamente. Esta é uma expressão geral que se aplica independentemente da natureza térmica da superfície e das condições do escoamento no tubo.
Considerando o fluxo de calor q”s constante e distribuído uniformemente na superfície do
cilindro ferromagnético então [2] e [4]:
" . (4) Onde A é a área da superfície do cilindro. Substituindo (4) em (3) obtém-se a equação que determina a temperatura média aproximada na saída:
, , " .. (5)
IV. Resolução Analítica Aproximada
Na Tabela 1 estão especificadas as características físicas do dispositivo hipotético de aquecimento por indução eletromagnética. Foi utilizado o software EES para resolver a equação 5 com os dados da Tabela 1. O resultado do cálculo analítico aproximado está indicado na Tabela 5.
Variável Valor Unidade
Diâmetro do Cilindro Ferromagnético 25 mm
Comprimento do Cilindro
Ferromagnético 50 mm
Diâmetro Externo do Tubo 50 mm
Espessura do Tubo 8,4 mm
Diâmetro Interno do Tubo 33,2 mm
Temperatura da Água na Entrada 25 oC
Vazão Mássica 0,05636 kg/s
Fluxo de Calor Constante 846.490 W/m2
Pressão Estática na Saída 101,3 kPa
Tabela 1: Características físicas do dispositivo de aquecimento por indução eletromagnética.
V. Metodologia Numérica
A solução numérica das equações diferenciais que governam o escoamento foi realizada através da técnica de volumes finitos. Foram utilizados os softwares ANSYS Workbench V8.1 e ANSYS CFX V10.0. O processamento foi realizado em cinco etapas: A. No ANSYS Workbench:
1. Modelamento do domínio do fluido; 2. Verificação da estrutura, confecção da malha superficial e da malha volumétrica;
B. No ANSYS CFX:
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3. Pré-processamento: Definição das condições de contorno e dos modelos hidrodinâmico e térmico;
4. Solver: Resolução e acompanhamento da convergência do problema especificado nas etapas anteriores;
5. Pós-processamneto: Foi visualizado o comportamento das variáveis do problema através de imagens bidimensionais e tridimensionais.
O modelo do domínio do fluido consiste no volume entre dois cilindros concêntricos. O
cilindro interno é um espaço vazio que representa o volume ocupado pelo núcleo ferromagnético que transfere o calor. Na Figura 7 é mostrado o domínio do fluido.
A malha volumétrica 1 caracterizada na Tabela 2 foi utilizada para um teste preliminar. A malha foi refinada gradativamente até que os valores de temperatura na seção de saída não se alterassem com o refino da malha, ou seja, fossem independentes da malha utilizada. A Figura 8 apresenta a malha escolhida.
Figura 7: Modelo do domínio do fluido. Figura 8: Malha volumétrica escolhida. A Tabela 2 apresenta as características das malhas testadas. A Malha 3 foi a escolhida.
Malha 1 Malha 2 Malha 3
Espaçamento do Volume [cm] 0,53 0,3 0,1
Ângulo Mín. [Deg] 2,5 2,5 10
Número de Nós 981 5.630 119.204
Número de Elementos Tetraédricos 3.839 26.406 644.593
Tabela 2: Malhas testadas. A Tabela 3 apresenta as condições de contorno utilizadas.
Tipo Detalhe
Entrada Inlet
Subsônico Taxa de Fluxo de Massa 0,05636 kg/s Direção do Fluxo Normal
Turbulência Média 5% Temperatura Estática 25 ºC
Núcleo Wall Sem Deslizamento
Parede Lisa Fluxo de Calor 846.490 W/m2
Saída Outlet Pressão Estática 1 atm
Subsônico
Tubo Wall Sem Deslizamento
Parede Lisa Adiabático
Tabela 3: Condições de contorno utilizadas.
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A Tabela 4 apresenta os modelos utilizados.
Modelo de Transferência de Calor Thermal Energy
Modelos de Turbulência 1º k – Épsilon 2º Shear Stress Transport
Tabela 4: Modelos do fluido utilizados.
O valor médio da temperatura na saída do tubo, obtida numericamente, foi comparada à solução analítica.
VI. Resultados Encontrados Na Tabela 5 encontra-se um resumo da temperatura de saída média da água.
Tabela 5: Resultados encontrados.
Além deste quadro comparativo o ANSYS CFX possibilitou a visualização bi e tridimensional da velocidade do fluido e da distribuição da temperatura como mostrado nas Figuras 9 a 14.
Figura 9: Velocidade do fluido. Figura 10: Velocidade do fluido na saída.
Temperatura Média na Saída [oC]
Aquecedor Resistivo Valor Medido 42,00
Aquecedor
Indutivo
Cálculo Analítico Aproximado Considerando Área Total 42,63
Mét
odo
Num
éric
o
• Ite
raçõ
es: M
ax. 2
00
• R
esíd
uo A
lvo:
1E
-6
Mod
elos
de
Turb
ulên
cia
k - Épsilon
Mal
has
1 42,73
2 43,84
3 47,04
SS
T
High Resolution
1 42,76
2 44,10
3 48,56
Upw
ind
• Sem Transiente de Turbulência • Convergência Conservativa
1 42,46
2 42,67
3 42,96
• Com Transiente de Turbulência • Convergência Agressiva
1 42,46
2 42,67
3 42,96
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Figura 11: Distribuição da temperatura. no cilindro ferromagnético.
Figura 12: Iso-superfície da temperatura máxima do fluido.
Figura 13: Temperatura na saída utilizando a malha 2.
Figura 14: Temperatura na saída utilizando a malha 3.
VII . Análise dos Resultados
Os valores de temperatura de saída calculados para o aquecedor indutivo aproximam-se do valor medido da temperatura de saída do aquecedor resistivo. Ressalta-se que foi utilizada a mesma taxa de transferência de calor, mas cada tipo de aquecedor (resistivo x indutivo) possui características físicas diferentes.
No cálculo analítico utilizou-se um modelo simplificado do dispositivo de aquecimento indutivo. Essas simplificações visaram evitar as complexas equações diferenciais envolvidas no processo de escoamento com troca de calor, muito embora tenham comprometido a exatidão dos resultados. O cálculo analítico foi realizado com o objetivo de estimar o valor da temperatura de saída.
A utilização do modelo de turbulência SST (Shear Stress Transport) com advecção upwind melhorou a convergência da malha mais refinada. Não foi observado melhoria na convergência da malha mais refinada utilizando o modelo SST com convergência agressiva e com transiente de turbulência.
Nas Figuras 9 e 10 pode-se observar um regime laminar de escoamento na região próxima à superfície lateral do cilindro ferromagnético e turbulências próximas à saída.
Na Figura 11 observa-se um aumento da temperatura no núcleo ferromagnético no sentido entrada-saída. A Figura 12 indica que na saída a temperatura máxima converge para o eixo do
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escoamento. Comparando as Figuras 13 e 14 observa-se na Figura 13 a assimetria na distribuição da temperatura de saída devido à malha 2 estar deficiente.
VIII . Conclusões
Os valores encontrados provenientes do método numérico são mais confiáveis, uma vez que foram levadas em consideração as características físicas exatas do dispositivo trocador de calor, bem como a inter-relação das variáveis envolvidas no processo hidrodinâmico e térmico.
A utilização da malha de 644.593 elementos tetraédricos com ângulo interno maior que 10º
evitou a assimetria da temperatura de saída e a utilização do modelo de turbulência SST com advecção upwind evitou as oscilações numéricas ajudando na convergência da malha mais refinada.
Comparando os valores obtidos pelo método analítico e numérico, conclui-se que os resultados foram satisfatórios.
O trabalho de determinar a temperatura mais correta na saída do dispositivo aquecedor por indução eletromagnética foi facilitado com a utilização de recursos numéricos. Acredita-se que trabalhos de otimização hidrodinâmica e térmica poderão ser facilitados com a utilização destes recursos, auxiliando no desenvolvimento de trocadores de calor e conversores de energia mais eficientes.
Pretende-se, no futuro, variar algumas características físicas do dispositivo aquecedor indutivo para comparações. Os softwares de processamento numérico ANSYS Workbench e ANSYS CFX, utilizados neste trabalho, poderão auxiliar nessas simulações. Referências [1] ANSYS CFX release 10.0. “Tutorial 14 – Conjugate Heat Transfer in a Heating Coil”. 2005. [2] G. F. Hewitt, G. L. Shires and T. R. Bott. “Process Heat Transfer”. CRC Press. 1994. [3] F. P. Incropera e D. P. de Witt. “Fundamentos de Transferência de Calor e de Massa”. LTC Editora S.A.. 1990. [4] S. Kakaç and H. Liu. “Heat Exchangers – Selection, Rating and Thermal Design”. CRC Press. 1998. [5] D. Q. Kern. “Processos de Transmissão de Calor”. Editora Guanabara Koogan S.A.. 1980. [6] F. Kreith. “Princípios da Transmissão de Calor”. Editora Edgard Blücher Ltda. 1977. [7] C. R. Maliska. “Transferência de Calor e Mecânica dos Fluidos Computacional”. LTC Editora. 2004. [8] D. R. Pitts e L. E. Sissom. “Fenômenos de Transferência”. McGraw-Hill. 1981. [9] F. W. Schmidt, R. E. Henderson e C. H. Wolgemuth. “Indrodução às Ciências Térmicas”. Editora Edgar Blücher Ltda. 2004. [10] R. K. Shah and D. P. Sekulic. “Heat Exchangers”. John Wiley & Sons. 1998. [11] H. K. Versteeg and W. Malalasekera. “An Introduction to Computational Fluid Dynamics – The Finite Volume Method”. Longman Scientific & Technical. 1995.
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