sentença da simulação de ambiente

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 Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra Av. Fernão Magalhães, 227-3º. 3000-176 Coimbra 239853480 Fax: 213506005 E-mail: [email protected] Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra TRIBUNAL ADMINISTRATIV O DE CÍRCULO DE COIMBRA N.º PROCESSO 839728 *** AÇÃO ADMINISTRATIVA AUTOR: Jó Neves Pereira, CC N.º 17623940, casado e residente na Rua das Gaivotas, n.º 15, Lisboa.  ENTIDADES DEMANDADAS: Brisa do Abismo    Estradas de Portugal, SA - Sociedade Comercial Anónima, com sede na Rua das Tulipas, n.º 4, Freguesia de São Doming os da Rama, do Concelho de Oeiras, pessoa coletiva número 5383401. Ministério das Infra-Estruturas, pessoa coletiva de direito público, com sede na rua Campos do Pragal, Praça da Portagem, código postal 2809-013, Almada, Portugal. Acordam no Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra. *** I. SANEAMENTO I.1. Da competência do tribunal É competente o t ribunal onde ocorreu o dano, nos termos, e, para os efeitos do art.º 18°/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante, CPTA.

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Tribunal Administrativo de Círculo de CoimbraAv. Fernão Magalhães, 227-3º. 3000-176 Coimbra

239853480 Fax: 213506005E-mail: [email protected]

Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra 

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE COIMBRA

N.º PROCESSO 839728

*** 

AÇÃO ADMINISTRATIVA

AUTOR: Jó Neves Pereira, CC N.º 17623940, casado e residente na Rua das Gaivotas, n.º 15,

Lisboa. 

ENTIDADES DEMANDADAS:

Brisa do Abismo  –  Estradas de Portugal, SA - Sociedade Comercial Anónima, com sede

na Rua das Tulipas, n.º 4, Freguesia de São Domingos da Rama, do Concelho de Oeiras, pessoa

coletiva número 5383401.

Ministério das Infra-Estruturas, pessoa coletiva de direito público, com sede na rua

Campos do Pragal, Praça da Portagem, código postal 2809-013, Almada, Portugal.

Acordam no Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra.

***

I. SANEAMENTO

I.1. Da competência do tribunal

É competente o tribunal onde ocorreu o dano, nos termos, e, para os efeitos do art.º 18°/1

do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, doravante, CPTA.

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239853480 Fax: 213506005E-mail: [email protected]

Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra 

Atendendo ao princípio  pro-actione, e, nos termos, e, para os efeitos do art.º 14°/1 do

CPTA, o processo é oficiosamente remetido por via eletrónica.

O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa remeteu o processo nos termos acima

referidos.

Logo, é competente o Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra por se tratar de

uma matéria da jurisdição administrativa, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 1°/1 e 4°/1 f) e

h) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, doravante, ETAF.

É ainda competente em:

- Razão da matéria, nos termos, e, para os efeitos do art.º 44°/1 do ETAF.

- Razão da hierarquia, perante os juízes administrativos de tribunal de círculo, nos termos, e, para

os efeitos do art.º 44° do ETAF.

- Razão do território, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 18°/1 e 14°/1, ambos do CPTA.

I.2. Do Autor

O tribunal considera que o autor tem:

- Personalidade judiciária, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 8°-A/1 e 2 do CPTA, e do art.º

11° Código de Processo Civil, doravante, CPC, ex vi art.º 1° CPTA.- Capacidade judiciária, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 8°-A/1 e 2 do CPTA, e do art.º 15°

CPC , ex vi art.º 1° CPTA.

- Legitimidade ativa, nos termos, e, para os efeitos do art.º 9°/1 do CPTA.

- Patrocínio judiciário, nos termos do art.º 11° do CPTA.

- Interesse processual, nos termos do art.º 30°/1 e 3 CPC, ex vi 1° CPTA.

I.3. Dos Réus

São réus:

Ministério das Infra-Estruturas e Brisa do Abismo, Estradas de Portugal.

E o tribunal considera que os réus têm:

- Personalidade judiciária, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 8°-A/1 e 2 do CPTA e do art.º

11°CPC, ex vi art.º 1° CPTA.

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Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra 

- Capacidade judiciária, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 8°-A/1 e 2 do CPTA, e do art.º 15°

CPC, ex vi art.º 1° CPTA.

- Legitimidade passiva, nos termos, e, para os efeitos do art.º 10°/1 do CPTA.

- Patrocínio judiciário, nos termos do art.º 11° do CPTA.

- Interesse processual, nos termos do art.º 30°/1 e 3 CPC , ex vi 1° CPTA.

I.4. Da Coligação

A coligação é possível, e, admissível, nos termos, e, para os efeitos do art.º 12°/1 a) do

CPTA.

I.5. Da falta de pressupostos

 Não foi indicada a forma de processo na Petição Inicial, configurando-se numa exceção

dilatória, nos termos, e, para os efeitos dos art.º 78°/2 d) e 89°, ambos do CPTA.

O processo deve seguir a forma da Ação Administrativa (a antiga Ação Administrativa

Comum), nos termos, e, para os efeitos do art.º 37°/1 i), j) e k) do CPTA.

 Não se conhecem mais exceções dilatórias, nulidades relativas, outras questões préviasou incidentais, que obstem ao conhecimento da causa.

***

II. RELATÓRIO:

Jó Neves Pereira, CC Nº17623940, casado e residente na Rua das Gaivotas, n.º 15,

Lisboa, interpôs a presente ação administrativa, nos termos do disposto no art.º 37°/1 i), j) e k),

do CPTA.

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Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra 

Contra,

Brisa do Abismo – 

 Estradas de Portugal, SA - Sociedade Comercial Anónima, com sedena Rua das Tulipas, n.º 4, Freguesia de São Domingos da Rama, do Concelho de Oeiras, pessoa

coletiva número 5383401.

Ministério das Infra-Estruturas, pessoa coletiva de direito público, com sede na rua

Campos do Pragal, Praça da Portagem, código postal 2809-013, Almada, Portugal.

Para tanto, o A. alega em síntese que:

a)   No dia um de Novembro de dois mil e quinze, sofreu um acidente de viação quando

se encontrava a conduzir o seu carro, modelo Mini Cooper, matrícula GU-41-84, na auto-

estrada KA-14, que estabelece a ligação entre as localidades de Montemor-Já-Um-Pouco-

Careta e a Foz da Figueirinha;

 b)  O A. dirigia na auto-estrada na velocidade de cinquenta quilómetros por hora;

c)  O acidente foi causado por um buraco existente na auto-estrada, decorrente do

aluimento da via, no qual alega ter caído no mesmo enquanto se encontrava a conduzir;

d)  O surgimento de tal buraco em virtude do aluimento da via tem como causa o facto

de a auto-estrada não ter sido objeto de uma prévia avaliação de impacte ambiental por

 parte das autoridades competentes;

e)  O A. sofreu danos patrimoniais, decorrentes dos montantes despendidos com a

reparação do carro e com o não facto de não ter auferido três meses de salário;

f)  O A. sofreu danos não patrimoniais, decorrentes do facto de o A. ter contraído um

empréstimo de nove mil euros e zero cêntimos junto de familiares para fazer face às

despesas do acidente, e, assim, ter exposto a sua situação financeira.

Com base, designadamente, na referida fatualidade, e, partindo do entendimento que a

ausência de uma prévia avaliação de impacte ambiental, relativamente à auto-estrada KA-14,consubstancia uma omissão por parte do Estado, que deveria ter procedido à realização da mesma;

e, que o acidente em questão foi causado por uma situação de líquidos na via não resultantes de

condições climatéricas anormais.

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O A. vem sustentar, em resumo que:

- O Estado não cumpriu os seus deveres de vigilância e fiscalização, no período em quea auto-estrada se encontrava em construção, o que consubstancia uma situação de

responsabilidade civil extracontratual do Estado, nos termos do art.º 7º/1 da Lei n.º 7/2007;

- A omissão do Estado da realização de uma prévia avaliação de impacte ambiental

consubstancia uma situação de responsabilidade civil extracontratual do Estado, nos termos do

art.º 7º/1 da Lei n.º 7/2007;

- O acidente em questão, por ter ocorrido numa auto-estrada concessionada, e, ter sido

causado pela existência de líquidos na via não resultantes de condições climatéricas anormais,origina uma situação de responsabilidade civil extracontratual da Concessionária Brisa do

Abismo  –  Estradas de Portugal, SA, nos termos do art.º 12º/1 c) e 12º/3 da Lei n.º 24/2007.

Em consequência, o A. pede que o tribunal proceda à:

- Condenação solidária dos réus no pagamento de uma indemnização por danos

 patrimoniais no valor de trinta e três mil e quinhentos euros e zero cêntimos, sendo que dezassete

mil euros e zero cêntimos são a título de danos emergentes, e, dezasseis mil e quinhentos e zero

cêntimos, são a título de lucros cessantes;

- Condenação solidária dos réus no pagamento de uma indemnização por danos não

 patrimoniais, no valor de dez mil euros e zero cêntimos;

- Condenação do Estado à reparação do buraco decorrente do aluimento da via, na auto-

estrada KA-14;

- Condenação do Estado, relativamente à auto-estrada KA-14, à realização de avaliaçãode impacte ambiental.

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O Ministério das Infra-Estruturas, devidamente citado, contestou, alegando, em

síntese que:

a)  O Ministério das Infra-Estruturas celebrou com a Brisa do Abismo  –  Estradas de

Portugal, SA, um contrato de concessão de auto-estrada KA-14, a ser construída pela

concessionária, que iria estabelecer a ligação entre Montemor-Já-Um-Pouco-Careta e a

Foz da Figueirinha;

 b)  O Ministério das Infra-Estruturas ficou encarregue de proceder ao acompanhamento

da construção da obra; c)  A construção da auto-estrada em questão revestiu-se na altura de caráter urgente, em

virtude da necessidade de viabilização de ligação entre as duas regiões supramencionadas, que se apresentam como dois importantes pólos da economia Portuguesa; d)  Tal urgência fez com que tenha apresentado um requerimento de dispensa da

construção da auto-estrada do procedimento de avaliação de impacte ambiental, nos

termos do art.º 4º do Decreto-Lei n.º 151/2013, em virtude de se tratar de uma situação

excecional enquadrável no art.º 4º/1 do respetivo diploma; e)  O pedido de dispensa de avaliação de impacto ambiental foi objeto de decisão

favorável, mediante despacho conjunto do Ministro do Ambiente e do Ministro

responsável pela tutela do projeto; f)  Foram observados os deveres de vigilância no que toca à construção da obra, por

 parte do Ministério das Infra-Estruturas, pois foram realizadas avaliações periódicas da

obra durante a fase de construção; g)  O surgimento do buraco na auto-estrada, na sequência do aluimento da mesma,

deveu-se à ocorrência de um motivo de força maior, em virtude de ter sido encontrado,

no sistema de canalização subterrâneo da auto-estrada, um animal morto que impediu o

escoamento das águas; h)

 

A ocorrência de um motivo de força maior implica que se exclua a responsabilidade

civil extracontratual do Estado, nos termos do art.º 11º/1 do Decreto-Lei n.º 67/2007. 

Com os fundamentos devidamente expostos, o Réu conclui que a ação deve ser julgada

improcedente, e, em consequência, indeferidos os pedidos nela formulados a seu respeito,

devendo deles ser absolvido o Réu. Contudo, o Réu pede que, em caso de condenação no

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 pagamento de indemnização por danos patrimoniais, a mesma seja reduzida para o montante de

quatro mil euros e zero cêntimos.

A Brisa do Abismo  –   Estradas de Portugal, SA, devidamente citada contestou,

alegando em síntese que:

a)  O A. não provou a ocorrência do acidente;

 b) A Ré celebrou com o Estado um contrato de concessão de obra pública;

c) Relativamente à obra da auto-estrada KA-14, foi requerida a dispensa da mesma do procedimento de avaliação de impacto ambiental, nos termos do art.º 4º do Decreto-Lei

n.º 151-B/2013, tendo a dispensa sido deferida por despacho conjunto do Ministério do

Ambiente e do Ministério da tutela do projeto, nos termos do art.º 4º/1 do mesmo Decreto-

Lei;

d) O motivo que justificou o pedido de dispensa foi o de se tratar de uma obra cuja

construção era urgente, tratando-se da necessidade de construção de uma via de circulação

rápida para potencializar o acesso rápido do Corpo de Bombeiro à região da Foz da

Figueirinha, em virtude do elevado risco de incêndio existente na mesma;

e) Na sequência da dispensa de AIA, foram impostas, no licenciamento, determinadas

medidas de minimização dos efeitos ambientais, que foram cumpridas pela Ré;

f) A ré cumpriu os deveres resultantes do caderno de encargos na construção da auto-

estrada, e realizou a construção da obra com a devida diligência;

g) O aluimento de uma zona da auto-estrada KA-14, que originou o buraco, deveu-se

ao rompimento de uma conduta de escoamento;

h) As condutas de escoamento existentes na auto-estrada KA-14 são da

responsabilidade única e exclusiva do Estado, que se destina à realização do saneamento

 básico da região;

i) No contrato de concessão celebrado entre o Estado e a Ré, estipulou-se que a mesma

não se poderia envolver em diligências atinentes ao saneamento da zona onde se situaria

a auto-estrada;

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 j) A área de saneamento onde se deu o aluimento da via já havia sido objecto de uma

licença ambiental, após a realização do procedimento de avaliação de impacte ambiental.

Com os fundamentos devidamente expostos, a Ré conclui que a ação deve ser julgada

improcedente, e, em consequência, indeferidos os pedidos nela formulados a seu respeito,

devendo deles ser absolvido a Ré.

***

III. DOS FACTOS:

III.1 Factos provados:

Com relevância e interesse para a decisão da causa consideram-se como provados os

seguintes factos:

1- 

A ausência de um contrato de seguro no que toca ao carro do autor;2-  O projeto da auto-estrada AK-14 foi dispensado de avaliação de impacte ambiental

 por despacho conjunto do Ministro do Ambiente e do Ministro da tutela do projeto em

causa;

3-  A existência do buraco na auto-estrada AK-14, resultante do aluimento da via;

4-  A realização de saneamento da zona onde se situa a auto-estrada AK-14, anterior à

construção da mesma, por parte do Estado;

5-  O Ministério das Infra-Estruturas realizou as avaliações periódicas da obra durante a

fase de construção.

III.2. Factos não provados:

Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou.

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III.3. Motivação:

A convicção do tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, não impugnados,que foram enunciados ao longo da matéria fatual considerada como provada, assim como no

depoimento prestado pela testemunha Pedro Alves Cabral (Comandante do Corpo de Bombeiros

da sede do Distrito de Coimbra).

Para além dos meios de prova apresentados pelas partes, o Tribunal procedeu a uma

inspeção judicial da zona onde ocorreu o aluimento da estrada, nos termos do art.º 490º/1 do CPC,

com o fim de esclarecer se, previamente à obra, tinha havido saneamento da zona onde a mesma

se situa. Para tal, nos termos do art.º 492º/1 do CPC, fez-se acompanhar de um técnico em matéria

de saneamento, com o fim de auxiliar o Tribunal a chegar a uma conclusão acerca de tal questão.

***

IV. DO DIREITO:

IV.1. Do pedido da distribuição do ónus da prova

A parte A. submeteu a este tribunal um pedido de distribuição dinâmica do ónus da prova

 por considerar que, seguindo as regras gerais de direito probatório, a sua pretensão se revelaria de

 probatio diabolica.

 No ordenamento jurídico português não existe, em honra ao princípio da legalidade, uma

tal possibilidade. Ao contrário da opção que surge ao juiz, nos termos do art.º 373º do CPC

 brasileiro (Lei n.º 13.105, de 16 de Março de 2015), em Portugal, o Direito não oferece uma tal

discricionariedade.

Ainda se poderia questionar se o inciso “presunção legal, dispensa ou liberação do ónus

da prova”, do art.º 344/1 do Código Civil, doravante, CC, (português), não permite ao A. ver o

seu pedido proceder. Não é, porém, esse o sentido da expressão.

Como salientam Pires de Lima e Antunes Varela, “há (...) dispensa ou liberação do ónus

da prova sempre que a lei considera certo um facto, quando se não faça prova em contrário. (...)

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veja-se um caso de liberação do ónus da prova no artigo 1260º/2 (...) ”  –  in Código Civil anotado

(vol. I), 4ª edição, 2011, Coimbra Editora, Coimbra.

 No fundo, dispensa-se a prova quando há presunção legal do facto a provar. Ora, não é

de todo o que acontece no caso porque o A. funda o seu pedido em probatio diabolica.

Assim, nega-se uma distribuição dinâmica do ónus da prova que viola os art.º 342º a 344º

do CC português negando-se, consequentemente, provimento ao pedido de distribuição dinâmica

do ónus da prova.

IV.2. Da responsabilidade civil do Estado

A responsabilidade civil do Estado pode ser definida como o “conjunto de circunstâncias

da qual emerge, para a administração e para os seus titulares de órgãos e trabalhadores, a

obrigação de indemnização dos prejuízos causados a outrem” no exercício da função

administrativa” , (cfr. MARCELO R EBELO DE SOUSA  e A NDRÉ SALGADO MATOS;  Direito

 Administrativo Geral –  tomo III  (2010), pág. 477).

IV.2.1. A não realização dos deveres de vigilância

Comum a todos os tipos de responsabilidade civil administrativa é a verificação de um

facto por parte da Administração Pública, podendo ser positivo ou negativo.

O A. vem a este processo sustentar que o Estado não cumpriu os seus deveres de

vigilância e fiscalização, no período em que a auto-estrada se encontrava em construção, o que

consubstanciaria uma situação de responsabilidade civil extracontratual do Estado, nos termos do

art.º 7º/1 da Lei n.º 7/2007.

Embora não tenha sido provado a sua existência, compreende o tribunal que esses deveres

emanam tipicamente do contrato público de concessão, pelo que a alegada responsabilidade civil

do Estado será contratual. Tal não impede o tribunal de analisar o pedido do A. mediante o

 princípio iura novit curia.

Assim, sendo o contrato público fonte de obrigações bilaterais, o não cumprimento de

uma dessas obrigações consubstancia uma omissão suscetível de preencher o primeiro requisito

da responsabilidade civil, assim como o segundo  –  a ilicitude  – , uma vez que o contrato público

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fará parte do bloco de legalidade a que a Administração se encontra vinculada. Contudo, uma vez

que é convicção deste tribunal a efetiva realização de avaliações periódicas por parte do

Ministério das Infra-Estruturas, o primeiro requisito da responsabilidade civil contratual

administrativa não se verifica, pelo que a pretensão de qualquer indemnização a esse título fica

 prejudicada, uma vez que todos os pressupostos deste instituto  –  facto, ilicitude, culpa, dano e

nexo de causalidade  –  são cumulativos, implicando um efeito cascata contagioso para todos os

requisitos quando um não se verifique.

IV.2.2. Responsabilidade pelo risco

Poder-se-ia equacionar a responsabilidade administrativa pelo risco, embora apenas de

 prima facie. De fatco, a Administração Pública deve fiscalizar as obras públicas, pelo que uma

não fiscalização periódica da auto-estrada, já depois de inaugurada, poderia ser suscetível de

 preencher o facto, i.e., o primeiro pressuposto da responsabilidade pelo risco.

Decorre do art.º 11.º/1 da Lei n.º 67/2007 que o facto deve decorrer de um serviço ou

coisa especialmente perigosa. Esta qualificação deve ser avaliada casuisticamente e gera alguma

discordância na doutrina. De facto, se acompanharmos FREITAS DO AMARAL na sua tipificação

exemplificativa de serviços especialmente perigosos (cfr. Curso de Direito Administrativo volume II  (2013), pág. 741.), resultará uma conceção restrita desse perigo qualificado. Já para MARCELO

R EBELO DE SOUSA  e A NDRÉ SALGADO MATOS, esse perigo decorre de “circunstâncias

especificamente atinentes à prossecução da atividade administrativa” ( cfr. op. cit. pág. 505).

O presente tribunal coloca-se ao lado deste segunda conceção e, no presente processo,

considera preenchido o primeiro requisito da responsabilidade pelo risco.

 No entanto, dado não se ter provado a verificação de um acidente, não está preenchido o

 pressuposto relativo ao dano, pelo que este tipo de responsabilidade civil administrativa também

não se encontra preenchido (assim como qualquer outro, uma vez que o dano é pressupostocomum a todos os tipos).

IV.3. Da avaliação de impacte ambiental

Foi provado durante o processo o preenchimento do âmbito de aplicação do Decreto-Lei

n.º 151-B/2013 (Regime Jurídico da Avaliação de Impacte Ambiental  –   doravante, RAIA).

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Resulta também provado a existência de dispensa de avaliação de impacte ambiental (art.º

4.º RAIA).

A dispensa de AIA funda-se sempre numa situação excecional. Trata-se de um conceito

indeterminado, insuficientemente densificado pela lei. É certo que a Comunicação da Comissão

Europeia  –  Clarification of the Application of the Article 2(3) of the EIA Directive  –  densifica o

conceito, mas deve ser valorada politicamente e não normativamente.

Acompanha-se o parecer do Ministério Público quando considera que este conceito

indeterminado confere à Administração Pública “um espaço de liberdade (…) na apreciação das

 situações de facto que poderão, ou não, preencher a previsão da norma”. Ou seja, este conceito

indeterminado confere à Administração uma margem de livre apreciação que não foi sindicada

nos presentes autos.

Havendo despacho de dispensa de AIA, resulta clara e justificada a não realização de

AIA.

IV.4. Da responsabilidade civil da R. BRISA

 No que toca à pretensa responsabilidade objetiva da R. Brisa do Abismo  –  Estradas de

Portugal, SA, é de aplicar o regime previsto na Lei n.º 24/2007. O seu âmbito de aplicação, nostermos do seu art.º 2º/1, considera-se verificado. A BRISA, nos termos do Decreto-Lei n.º 294/97,

com a última alteração com a Declaração de Retificação n.º 16-B/2009, é a concessionária da

auto-estrada KA-14 (Cláusula I/1, j) do Anexo ao citado Decreto-Lei).

A responsabilidade objetiva nos termos da Lei n.º 24/2007 dá-se nos termos do seu art.º

12º. Ora, será necessário verificar-se uma das situações nele elencadas, o que não ocorre. De

qualquer forma, a única prova que parece ser legalmente admissível para acionar a

responsabilidade objetiva é a que consta no nº. 2 do citado artigo, isto é, verificação no local por

autoridade competente, o que também não aconteceu como aponta a R. BRISA na sua contestação

(art.º 9º da citada peça).

 Não é assim, porém, que a jurisprudência tem vindo a interpretar (vide, Ac. TRP de

11/1/11, P. 4196/08.5TBSTS.P1, no sentido de que “a presunção de incumprimento com que o

nº 1 do referido art.º 12º da Lei n.º 24/2007 onera a concessionária vale sempre que ocorra

alguma das hipóteses previstas nas suas alíneas, independentemente do juízo que a respeito das

causas do acidente seja emitido pela autoridade policial”).

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Tribunal Administrativo de Círculo de CoimbraAv. Fernão Magalhães, 227-3º. 3000-176 Coimbra

239853480 Fax: 213506005E-mail: [email protected]

Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra 

Segue este tribunal o sentido da jurisprudência citada. Não obstante, a ocorrência de um

acidente com o lesado no A. da presente ação não foi provado por qualquer outro meio de prova.

Assim, não estão reunidos os pressupostos probatórios, nem substanciais, para acionar a

responsabilidade objetiva da concessionária.

Mais se diga que, segundo a Base XXVIII/1 do atualizado Decreto-Lei n.º 294/97, a

BRISA só responde pelo objeto concessionado, nos termos legais, mas já não por ocorrências que

lhe são alheias, como o pretenso rebentamento da canalização de saneamento anterior à

construção concessionada.

 Não se provou qualquer dos pressupostos da responsabilidade aquiliana, nos termos do

art.º 483º do CC.

 Nega-se provimento ao pedido de responsabilizar, quer subjetiva quer objetivamente a R.

BRISA.

***

V. DECISÃO

 Nestes termos, e com fundamento no  supra exposto, julga-se improcedente a presente

ação, e, em consequência, absolvem-se os réus dos pedidos.

***

Custas pelo Autor.

Registe-se e notifique-se.

***

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Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra 

Lisboa, ao 5 de junho de 2016.

Os juízes de Direito

Gonçalo de Andrade Fabião

 Isabel dos Santos

 Mariana de Sá Vilaça e Moura

Telmo Rodrigues

Vitória Pontes