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Compreensões sobre a influência da publicidade em práticas de consumo
Sara F Almeidaa*, Ingritt C Moreira b, Diego M Novarettic, Amadeu J M
Logarezzid
aAssociação Kooperi – Coletivo Autogestionário para Promoção de Práticas Solidárias,
Rua Victor Manoel de Souza Lima, 297, São Carlos, São Paulo, Brasil.
bDepartamento de Botânica, Universidade Federal de São Carlos, Rodovia Washington
Luís, km 235 – SP-310, São Carlos, São Paulo, Brasil. [email protected]
cPrograma de Pós-Graduação em Engenharia Urbana, Universidade Federal de São
Carlos, Rodovia Washington Luís, km 235 – SP-310, São Carlos, São Paulo.
dDepartamento de Engenharia de Materiais, Universidade Federal de São
Carlos, Rodovia Washington Luís, km 235 – SP-310, São Carlos, São Paulo, Brasil.
* Autor para correspondência: + 16 3116 9588 + 16 8111 8385.
Palavras Chave: mídia, capitalismo, São Carlos.
Título abreviado: Influência da publicidade no consumo
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ABSTRACT
In modern society the last decades, the consumerism, defined as degrading practice of
humanity itself is great support in advertising to set up and gear essential for the
organization of the capitalist system of society. Authors state that advertising exerts a
strong power of manipulation on consumers are taken to buy in the reckless, and often
compelling. This study aimed investigate opinions and perceptions about the possible
influence of advertising on consumption choices and practices of daily life. Twenty-one
interviews were conducted under the guidance of a semi structured script, developed
from a theoretical reference previously raised by the researchers. Data analysis was
performed at two different times: pre-analysis and participatory analysis of the data,
when seven respondents participated in a dialogue on evaluation results. The results
indicated that the main the interviewees to realize that are influenced by the advertising
on their practices of consumption, but not usually reflect critically on this fact.
Concluded that opening up spaces for dialogue to deal with complex issues enhances
critical reflection about attitudes and actions in the field of consumption.
RESUMO
Na sociedade moderna das últimas décadas, o consumismo, caracterizado como prática
degradante da própria humanidade encontra grande suporte na publicidade para
configurar-se como engrenagem essencial do sistema capitalista de organização da
sociedade. Autores afirmam que a publicidade exerce forte poder de manipulação sobre
as/os consumidoras/es, que são levadas/os a comprar de forma irrefletida e, muitas
vezes, compulsiva. A presente pesquisa visou investigar opiniões e percepções sobre a
possível influência da publicidade em escolhas e práticas de consumo cotidianas. Foram
realizadas 21 entrevistas sob a orientação de um roteiro semi-estruturado, elaborado a
partir de referencial teórico previamente levantado pelos pesquisadores. A análise dos
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dados foi feita em dois momentos distintos: pré-análise e análise participativa dos
dados, quando sete entrevistadas/os participaram de um diálogo avaliativo dos
resultados. Os resultados indicaram principalmente que as/os entrevistadas/os percebem
que são influenciadas/os pela publicidade em suas práticas de consumo, porém não
costumam refletir criticamente sobre esse fato. Concluiu-se que a abertura de espaços de
diálogo para tratar de assuntos complexos potencializa a reflexão crítica acerca de
posturas e ações no campo do consumo.
INTRODUÇÃO
O consumo como prática ontológica dos seres vivos (Logarezzi, 2006), portanto
necessária à manutenção da vida na Terra, é um tema complexo, já que abrange em sua
apreciação múltiplas dimensões da vida humana: ambiental, política, econômica,
cultural e psicológica. Com a modernidade, sobretudo em sua fase mais recente – neste
final e início de século –, a prática de consumo ganhou proporções degradantes tanto à
natureza quanto à própria sociedade e esse fato fez com que o consumo ocupasse
posição central nos debates da educação ambiental e de outras áreas do conhecimento
que se ocupam da crise ambiental, entre autoras/es que passaram a considerar a
sociedade capitalista também como a “sociedade de consumo” (Padilha, 2006).
Segundo as análises marxistas apresentadas por essa autora, a “sociedade de consumo”
apresenta características cada vez menos democráticas, já que os indivíduos e as
coletividades não consomem de forma homogênea. Sob esse ponto de vista, o consumo
pode ser considerado como campo de diferenciação de classes. Ademais, no contexto
capitalista o consumo também contribui para um processo alienador dos indivíduos em
relação à sua prática, principalmente no que tange à influência da publicidade exercida
sobre os consumidores (Padilha, 2006).
Furnival (2006) cita com nitidez em seu tópico intitulado “Necessidades e desejos e o
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papel da mídia no consumo”, a intencionalidade da área da comunicação em influenciar
vontades e necessidades das/os consumidoras/es. Assim, a publicidade possui como
fundamento a criação de novos arquétipos e símbolos que os indivíduos devem adotar.
Para além deste pensamento, a publicidade impõe novos territórios aos quais algumas
pessoas aderem: o “território das marcas” (Quessada, 1999, apud Padilha, 2006).
Na ordem capitalista os indivíduos se identificam por meio do consumo e tal
comportamento é mediado pela manipulação dos signos via publicidade (Baudrillard,
1995, apud Padilha, 2006). Surge assim a necessidade de igualar-se aos outros, como
forma de pertencimento a grupos, mesmo que tal atitude obrigue a sociedade a caminhar
em sentido contrário à individualidade, mergulhando cada vez mais em um mundo
massificante e alienado (Padilha, 2006). No entanto, ainda para a autora, os indivíduos
se auto-manipulam, ou seja, percebem a influência exercida pela publicidade em suas
práticas de consumo e justamente essa percepção promove força de transformação.
Nesse sentido, a presente pesquisa teve como objetivo a investigação da possível
influência da publicidade sobre escolhas de consumo cotidianas consumidoras/es de
diversas inserções sociais. Os resultados obtidos permitiram uma melhor compreensão
sobre a possibilidade dessa influência, a partir das percepções das/os participantes da
pesquisa e, ainda, possibilitaram maior aprofundamento sobre o tema, de forma
dialógica, crítica e reflexiva, já que os dados obtidos foram analisados e debatidos
participativamente com os sujeitos da pesquisa.
Para os autores do presente artigo, tratar as questões relacionadas às práticas de
consumo por meio de processos participativos e dialógicos faz-se necessário na medida
em que, segundo Freire (1996), os sujeitos sociais trazem consigo conhecimentos e
experiências de vida que, uma vez dialogados, possibilitam a reflexão crítica e
transformadora de concepções e práticas cotidianas, particularmente aquelas travadas no
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campo do consumo. Dessa forma, acredita-se que “cidadãos consumidores” possam
tornar-se “consumidores cidadãos” (Portilho, 2003) e que o consumo, prática essencial
ao ser humano, permeie-se de atitudes mais sustentáveis, social e ambientalmente.
METODOLOGIA
O consumo foi tomado como tema central desta pesquisa e, para tanto, foram adotados
como principais referenciais teóricos os trabalhos desenvolvidos por Padilha (2006),
Furnival (2006) e Logarezzi (2006). Os procedimentos para a coleta, a organização e a
análise dos dados tiveram a pesquisa qualitativa (Lüdke & André, 1986) como
orientação metodológica básica. Foram realizadas 21 entrevistas semi-estruturadas a
partir de um roteiro previamente elaborado com base nesses referenciais e em duas
perguntas de pesquisa: 1) “Os consumidores têm consciência da possível influência da
publicidade em suas práticas de consumo?”; 2) “Como percebem essa influência?”. De
acordo com as questões levantadas, elaborou-se o roteiro que foi dividido em 3 blocos
de perguntas: 1) Dados gerais das/os entrevistadas/os; 2) Perfil do/a consumidor/a e 3)
Traços da possível influência da publicidade.
O público participante foi escolhido de modo a contemplar certa diversidade em relação
às condições socioeconômicas das pessoas entrevistadas. Acreditou-se que com isso
poderiam ser observadas diferentes realidades, enriquecendo a análise dos dados.
Com a intenção de promover a compreensão das causas dos hábitos consumistas para
transformá-las, optou-se por analisar e discutir os dados de forma participativa, tal como
propõe o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e
Responsabilidade Global (1992), assumindo-se que a educação ambiental tem como
ações: “1) promover a compreensão das causas dos hábitos consumistas; 2)
transformar os sistemas que os sustentam e 3) transformar nossas próprias práticas”.
Como expõe Freire (1970, apud Brandão, 2008) “a participação na avaliação traz força
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para a possibilidade de concebê-la como processo educativo”. Desse modo,
convidadas/os as/os participantes, sete delas/es analisaram e discutiram os dados com
as/os autoras/es, coletivamente.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A presente discussão desenvolve-se a partir da análise das 21 entrevistas realizadas,
sendo que a média de idade dos sujeitos entrevistados foi de 27 anos e a distribuição de
sexo foi de 14 mulheres e 7 homens. Das 21 pessoas, 8 possuíam curso superior, o que
corresponde a 38% do total. Já em relação a seus bairros, embora um número
significativo de participantes residisse em bairros periféricos de São Carlos-SP (Cidade
Aracy, São Carlos VIII e Cruzeiro do Sul), a maioria ficou distribuída em bairros
considerados de classe média.
O meio de comunicação mais acessado, de acordo com os dados coletados no bloco de
questões sobre o perfil do consumidor, foi a televisão, na medida em que 20
entrevistadas/os (95%) utilizam regularmente esse meio e apenas um participante
relatou distanciamento do mesmo. Dez pessoas (48%) disseram ouvir rádio, 16 (76%)
acessam internet e lêem jornais e revistas.
Constatou-se que a inserção de meios como a internet e meios impressos está atrelada à
condição socioeconômica, enquanto a televisão atinge todas as camadas sociais, assim
como afirma Padilha (2006), fazendo com que a publicidade televisiva ganhe estatuto
preponderante.
Nesse bloco, sobre o perfil do consumidor, foi investigado ainda o acesso ao Programa
de Orientação e Proteção ao Consumidor (PROCON), revelando que mais da metade
das/os entrevistadas/os (57%) nunca utilizou o serviço. Em relação aos direitos do
consumidor, 12 pessoas (57%) afirmaram conhecê-los, porém a diversidade de
exemplos citados, apenas nove exemplos, foi pequena em relação à complexa legislação
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vigente, composta por 115 artigos.
Para a questão aberta que apresentava uma situação de escolha entre dois bens de
consumo de mesma função, foi perguntado o que levava a/o entrevistada/o a optar por
um produto ou outro. 17 (81%) pessoas indicaram ser o “preço” o principal critério de
escolha do produto, seguido por qualidade, preferência ligada ao gosto, custo-benefício,
estética, marca, durabilidade e quantidade.
16 (76%) entrevistadas/os disseram possuir pelo menos um sonho de consumo,
destacando-se que, entre esses, nove (56%), citaram a casa própria. Assim, é possível
pensarmos que a casa própria pode ter se tornado um ideal de realização, como a grande
solução dos problemas dos indivíduos em idade adulta. Essa realização passaria também
pelo desejo de estabilidade familiar, liberdade, independência, identificação e
individualização em relação ao espaço doméstico. Nesse sentido, de acordo com Padilha
(2006, p.101), a publicidade baseia-se em falsas idéias que vendem objetos mutáveis e
consumíveis massivamente como se fossem únicos. E na maioria das vezes, como se
fossem a fórmula mágica para a realização de um sonho.
Já em relação à percepção de ser ou não consumista, 12 pessoas (57%) alegaram não
ser, enquanto 8 (38%) assumiram-se como consumista. Foi questionado o porquê de os
entrevistados se considerarem consumistas ou não. Uma das justificativas mais
apresentadas para considerar-se consumista foi “sofro influência das propagandas”.
De acordo com o IDEC (2005), pode-se chamar de “consumismo” a expansão da
cultura do “ter” em detrimento da cultura do “ser”. O consumo invade diversas
esferas da vida social, econômica, cultural e política. Neste processo, os serviços
públicos, as relações sociais, a natureza, o tempo e o próprio corpo humano se
transformam em mercadorias e essa ocorrência vem tomando proporções desastrosas ao
homem e ao planeta, pois o consumo passa a ser encarado mais como um direito ou um
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prazer, do que como uma atividade de atendimento a necessidades da vida em
sociedade, o que deve, portanto, incluir deveres de cidadão. Ainda para Logarezzi
(2006) a “sociedade de consumo”, que caracteriza o mundo contemporâneo, difunde o
consumo como atividade central na vida das pessoas, colocando em risco os próprios
interesses dos indivíduos que compõem essa sociedade, sobretudo quando procura ditar
comportamentos, criar necessidades, valorizar a competição, a obsolescência etc.
Algumas questões foram realizadas para traçar a possível influência da publicidade.
Como exemplo, para a questão sobre as propagandas que chamam mais atenção das/os
entrevistadas/os, obteve-se grande diversidade de resposta, sendo necessária a
categorização das mesmas em dois blocos: 1) Propagandas que focam o produto
veiculado (viagem, cosméticos, shows etc.); 2) Propagandas que focam características
gerais (humor, ironia, inteligência etc.) (Figura 1).
Figura 1. Categorias das propagandas que mais chamaram a atenção das/os
entrevistadas/os.
As propagandas que mais chamam a atenção são aquelas com traços de humor,
HumorísticasInteligentes
IrônicasExóticas
EsportivasCríticas
Propagandas com animaisPropagandas com históriaPropagandas com música
Propagandas com naturezaPropagandas religiosas
Propagandas com famíliaNenhuma
52
1111111
3111
Foc
o na
car
acte
rístic
a tip
ológ
ica
Viagem / Turismo
Promoção de produtos domésticos
Pessoas bonitas / Apelo sexual.
Propagandas de roupas
Propagandas de cosméticos
Propaganda de shows / Bandas musicais
Conservação do ambiente
1
1
2
2
1
1
1
Foc
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que
é v
eicu
lado
s
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corroborando a tese de Padilha (2006) sobre a idéia do poder que a “indústria cultural”
exerce sobre os consumidores. Segundo a autora, esse poder aloca-se na capacidade da
indústria cultural em conferir um caráter de divertimento para tudo, quando seus
instrumentos (televisão, rádio, revista e cinema comercial) tornam-se válvulas de escape
para as/os trabalhadoras/es que exercem tarefas mecanizadas e cansativas.
Interpeladas/os sobre se já tinham feito compra de produto veiculado por propaganda
que lhes chamaram atenção, 15 (71%) responderam que sim, admitindo perceber a
influência da publicidade em suas escolhas e práticas de consumo. Por outro lado, 6
entrevistadas/os (29%), disseram não ter adquirido nenhum bem de consumo veiculado
em propaganda.
De acordo com Padilha (2006), a atuação da publicidade é fundamental para o processo
consumista, não devendo ser entendida como um poder inconsequente e está distante de
ser apenas uma arte inofensiva. Pelo contrário, tem o poder de manipulação das
consciências em favor do sistema capitalista, que não pode prescindir da ampliação
constante e ilimitada da produção.
Na sequência, foram apresentadas 3 distintas propagandas impressas aos sujeitos da
pesquisa, sendo que a propaganda 1 era de uma marca de celular, a 2 de uma marca de
automóvel e a 3 de uma marca de protetor solar (Figura 2).
Figura 2. Propagandas 1, 2 e 3 (da esquerda para a direita) que foram mostradas ás/aos
entrevistadas/os.
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A intenção dessa etapa da entrevista foi de captar falas que demonstrariam as
percepções e os sentimentos das/os entrevistadas/os em relação às publicidades
visualizadas. Nesse sentido, para a primeira propaganda obtivemos algumas frases
interessantes, com destaque para as seguintes: “As pessoas se preocupam muito com o
celular.”, “Falta de respeito com os outros.”, “Virou sinal de status e não de
necessidade”. Para a publicidade da marca de automóvel duas frases chamaram a
atenção dos pesquisadores: “Sinto a sensação da potência do carro, do poder, da
liberdade.” , “Eu sinto que isso aqui (carro) tá muito distante, tá até meio que indo
embora, da minha realidade talvez. É mais para uma classe mais privilegiada, tanto é
que está distante, indo embora, de costas.”, “Aguça o sonho das pessoas, mas a
imagem está o contrário da frase”. No caso da publicidade da marca de protetor solar,
as frases destacadas foram: “Acho que o que passam nessa propaganda é que se você
usar esse produto, você vai ficar lindo (...) É a ilusão. Passa bastante ilusão.”, “O que
chamou a atenção foi a praia.”, “Esse já me interessa mais pela ação anti-
envelhecimento. Me atrai mais. É o tipo de propaganda que me chama a atenção, em
especial porque o verão está chegando”.
Como afirma Boniface (1976, apud Padilha, 2006) as/os consumidoras/es não adquirem
apenas objetos ao consumir, e sim adquirem valores, cabendo à publicidade a
veiculação destes valores. Ainda, segundo o mesmo autor, é possível enumerar seis
grandes mitos ligados à publicidade, estes carregados de valores implícitos, transmitidos
através das propagandas, tais como: “o mito da brancura, o da limpeza, o da juventude,
o do frescor, o do novo e o do natural”. Complementando este raciocínio, Padilha
(2006) afirma que para um produto ser consumido ele deve suprir oito necessidades
básicas das/os consumidoras/es: “alimentar o narcisismo do consumidor; dar-lhe
segurança emotiva; garantia que ele merece ter aquilo; inscrevê-lo na sua época; dar-lhe
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um sentimento de poder; de autoridade; de autenticidade e de criatividade”.
Na propaganda 1, o produto a ser vendido é um celular, no qual o foco da propaganda,
além de o produto em si, é a frase que o anuncia: “Imagine avançar com estilo”. Nesta
propaganda constatou-se uma série de mitos e necessidades das apontadas por Boniface
e Padilha, como: alimentar o narcisismo e dar um sentimento de poder a partir da
expressão “avançar com estilo”. Além disso, confere ao/à consumidor/a certa
segurança emotiva e autenticidade ao apresentar a palavra “estilo”, criando a sensação
de autoridade.
Na propaganda 2 os mesmos apelos se repetem. O produto exposto é um automóvel e a
frase que o apresenta é: “Quem disse que não se pode ter tudo na vida?”. Como início
de análise o que chamou a atenção foi o fato de a propaganda afirmar que “querer é
poder”, ignorando o preço supostamente elevado do produto em questão, ou seja, só não
compra o carro quem está desatualizado ou então quem não quer. Além disso, confere
ao/à consumidor/a um sentimento de poder e de autoridade, inscrevendo-o/a na
atualidade de possuir esse produto.
Na propaganda 3 encontramos, em primeiro plano, um casal bronzeado na praia e, em
segundo plano, o produto em si. Muitos são os apelos apresentados que são passíveis de
análise: 1) de erotização com a exposição, em primeiro plano, do casal com trajes de
banho e com corpos definidos de acordo com o padrão de beleza difundido em função
de interesses do mercado; 2) alimentar o narcisismo do consumidor e principalmente o
ideal de juventude ao frisar, em três momentos, a “ação anti- envelhecimento” do
produto. Ainda, há o apelo de inscrever o/a consumidor/a na atualidade por ser um
produto que se diz desenvolvido a partir de uma “inovação tecnológica”.
Para a questão sobre o sentimento de influência das propagandas na compra de
produtos, 18 entrevistadas/os (86%) disseram já ter sentido tal influência, enquanto 3
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(14%) responderam que não. Contudo, 100% das/os entrevistadas/os afirmaram que a
publicidade pode enganar as/os consumidoras/es, apesar de quatro participantes (20%)
não reconheceram que já foram enganadas/os. Um/a delas (5% do total) não soube
responder e 17 (80%) perceberam e reconheceram já ter sido enganadas/os pela
publicidade.
Foram destacados alguns relatos de experiência sobre a percepção de terem sido
enganados por propagandas: “Elas aumentam, mas não inventam”, “Deve ter um
controle sobre o que elas dizem”, “Os produtos podem não fazer, mas forçam as
escolhas”, “Compro sabendo que estou sendo enganada, mas não lembro de nenhuma
específica”, “Nem sempre o que se vê na propaganda é o resultado final. Comprei
achando que iria ficar igual ao da propaganda”.
Todos estes dados que indicam a percepção das pessoas sobre a influência da
publicidade em suas práticas de consumo, dando consistência às palavras de Padilha
(2006), quando afirma que: “Na verdade, existe a possibilidade de interpretação de que
as pessoas se auto-manipulam e que, justamente por saberem que são enganadas é que
se pode ter esperanças de alguma transformação. Assim, se as pessoas realmente não
soubessem que participam desse engodo, não haveria nenhum tipo de “salvação”.
Finalmente, na análise participativa dos dados, foram obtidos os seguintes resultados: 1)
promoção de reflexão crítica sobre as propagandas mostradas na entrevista e 2)
promoção de uma maior percepção entre os participantes de que a publicidade pode
influenciar suas escolhas de consumo.
Durante essa análise participativa e dialógica dos dados das entrevistas, foram feitas
importantes reflexões acerca da degradação socioambiental e da contribuição que os
atuais padrões de consumo vêm dando para a manutenção e o agravamento desse
cenário global, atrelados ao potencial da publicidade em fortalecer esse modelo de
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consumo.
CONCLUSÕES
A presente pesquisa e os dados gerados por ela são ainda iniciais, considerando-se a
complexidade da questão abordada neste estudo. No entanto, permitiu aos autores tecer
algumas discussões acerca da possível influência da publicidade nas práticas de
consumo cotidianas e, assim, compreender melhor como essa influência se pode se dar.
Os resultados obtidos nos blocos 1 e 2, referentes aos Dados Gerais dos Entrevistados e
ao Perfil do Consumidor evidenciaram características relacionadas às condições
socioeconômicas, tais como: bairro onde moram, escolaridade, profissão e mídias mais
acessadas. Essas características foram consideradas relevantes à análise dos dados, que
indicaram a percepção ou não da influência da publicidade nas práticas de consumo dos
participantes, pois acredita-se que algumas características das/os entrevistadas/os, tal
como sua escolaridade, podem estar associadas à criticidade na percepção acerca da
possível influência da publicidade em suas escolhas de consumo.
Em consonância com essas afirmações obtidas nos blocos 1 e 2 supracitados, estão os
resultados obtidos pelo bloco referente aos Traços da Possível Influência da
Publicidade. Pôde-se concluir que a publicidade possui forte poder de persuasão sobre
as escolhas e práticas de consumo das/os entrevistadas/os, na medida em que
perceberam e admitiram essa influência no decorrer da entrevista. Porém, verificou-se
que nem mesmo a constatação por parte das/os entrevistadas/os de que são
influenciadas/os e, por vezes, enganadas/os pela publicidade, ocasiona mudanças nos
hábitos e posturas dessas/es consumidoras/es.
Dessa maneira, os indivíduos em geral parecem seguir consumindo sob a lógica
capitalista, sem reconhecerem-se como parte de um coletivo maior, capaz de gerar
transformações na realidade de alienação e massificação a que são condicionadas/os.
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Portilho (2003) afirma que desenvolveu-se um conceito de cidadania distante da
consciência de pertencimento em relação à coletividade. Em lugar do cidadão formou-
se o consumidor, que aceita ser chamado de usuário, num universo em que alguns são
mais cidadãos que outros, dentro de um modelo de cidadania desigual e estratificado.
Enfim, ficou clara a potencialidade transformadora de se tratar temáticas complexas
como a do consumo e da publicidade por meio de processos mais dialógicos,
participativos e democráticos, em que as pessoas encontram espaços de reflexão crítica
sobre seu papel na sociedade e os impactos no planeta daí decorrentes, reconhecendo-se
capazes de transformar e superar situações de alienação e massificação a que tendem a
estar submetidas em suas práticas de consumo cotidianas.
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Fórum Global. 1992. Tratado de educação ambiental para sociedades sustentáveis e
responsabilidade global. Rio de Janeiro: 6 p
AGRADECIMENTOS
Agradecemos à professora e aos professores da Aciepe “Educação ambiental –
politizando e ambientalizando a ação socioeducativa” / Ufscar, Haydée Torres de
Oliveira, Rodolfo Antônio de Figueiredo e Amadeu Logarezzi, pela oportunidade
de realizarmos a presente pesquisa e o apoio nas discussões teórico-metodológicas.