s.a.r.a. brasil: restituindo o 'mapa topográfico do município de são paulo

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Edição PDF do Informativo AHSP nº37, dez.2014

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  • S.A.R.A. Brasil:

    restituindo oMapa Topogrfico

    do Municpio de So Paulo

    breve histria da aerofotogrametria

    nas cidades do Rio e So Paulo

    na dcada de 1 920

    Separata da

    edio n 37

    dezembro de 201 4

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Prefeitura de So Paulo

    Secretaria Municipal de Cultura

    Fernando Haddad

    Prefeito da Cidade de So Paulo

    Joo Luiz Silva Ferreira

    Secretrio de Cultura

    Alfredo Manevy

    Secretrio Adjunto

    Guilherme Varella

    Chefe de Gabinete

    Afonso Luz

    Arquivo Histrico de So Paulo

    Na capa, detalhe de fotografia area

    vertical atribuda ao levantamento

    realizado pela SARA Brasil, 1 930.

    Escala 1 :5.000.

    Na horizontal, trecho da

    Av.Brigadeiro Luiz Antonio, prximo

    Av.Paulista. Em diagonal,

    esquerda, a Rua Treze de Maio.

    Acervo AHSP

    166.

    222.222.

  • S.A.R.A. Brasil:

    restituindo oMapa Topogrfico

    do Municpio de So Paulo

    breve histria da aerofotogrametria

    nas cidades do Rio e So Paulo

    na dcada de 1 920

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Para citao, adote:

    MENDES, Ricardo.

    S.A.R.A. Brasil: restituindo oMapa

    Topogrfico do Municpio de So Paulo.

    Informativo Arquivo Histrico de So

    Paulo, ano 10, n 37, dez.2014.

    Separata da edio em formato PDF

    2

  • Sumrio

    Apresentao

    Anos 10: para o alto

    As cidades vistas de aeroplano

    Raids areos

    Um novo olhar: fotogrametria

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

    O Rio de Janeiro: a gesto Antonio da Silva Prado Junior

    Mos obra: no ar e nos jornais

    A Revoluo de 30

    Os princpes britnicos no Rio

    So Paulo: de volta ao debate

    Do edital ao contrato

    Os personagens: Umberto Nistri

    Os personagens: os irmos Robba

    Preparando terreno: a constituio da empresa S.A.R.A. Brasil

    S.A.R.A. Brasil: incio das operaes em campo

    Roma, primavera de 1930

    A primeira folha: o Bom Retiro

    No prelo, depois de alguns atrasos

    Mistrios e desafios

    Rumo a uma nova gerao de pesquisas

    3

    7

    9

    18

    27

    32

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  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    201

    Anexos

    Etapas produtivas: Mapa Topogrfico do Municpio de

    So Paulo

    Edital da Prefeitura do Distrito Federal (PDF), 9 de janeiro

    de 1928

    Contrato entre The Aircraft Operating Company e PDF,

    28 de maro de 1928

    Proposta de lei para edital: So Paulo, 1 928

    Edital da Prefeitura do Municpio de So Paulo (PMSP),

    1 6 de agosto de 1928

    Contrato entre S.A.R.A e PMSP, 14 de novembro de 1928

    Notas

    Fontes

    Documentao primria

    Fontes bibliogrficas

    Livros, Peridicos, Internet

    Agradecimentos

    4

    167

    171

    181

    187

    195

    211

    295

    296

    303

    I

    II

    III

    IV

    V

    VI

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

  • Quase 90 anos marcam a realizao no Brasil das primeiras aplicaes

    da aerofotogrametria em grande escala no mbito da gesto urbana com

    a realizao dos levantamentos das cidades do Rio de Janeiro e So

    Paulo. Esta edio do Informativo AHSP, a partir da documentao

    custodiada transferida nos ltimos anos, traa um primeiro painel sobre

    um marco da cartografia paulistana representado pelo Mapa Topogrfico

    do Municpio de So Paulo, contratado pela municipalidade em 1928.

    A contribuio original desta edio inserir essa produo no mbito de

    iniciativas similares como a levada a cabo na antiga Capital Federal, na

    gesto Antnio da Silva Prado Jnior (1926-1930).

    Essas iniciativas definem uma mudana de escala e alcance da aero-

    fotogrametria no Brasil, bem como caracterizam modos de produo em

    parte distintos, com o emprego de restituidores automticos no caso

    paulistano. Tal recurso introduziu ganho de produtividade efetivo no

    setor, respeitados todos os parmetros de preciso, reduzindo equipes e

    tempo de produo.

    Nessa aproximao a esse marco na cartografia paulistana do sculo XX foi

    possvel tambm estabelecer uma cronologia mais detalhada sobre as aes

    da grande empreitada realizada empresa SARA Brasil e apresentar produtos

    remanescentes fotos areas, fotomosaicos e cpias em tela transparente

    para reproduo das pranchas em acervos paulistanos.

    7

    Apresentao

    Logotipo da empresa italiana S.A.R.A.

    em papel timbrado, 1 931 .

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    8

  • Anos 10: para o alto

    A Inglaterra no mais uma ilha, comentrio atribudo ao kaiser alemo

    Guilherme II ao saber da travessia pioneira do canal da Mancha pelo

    aviador francs Louis Blriot (1872-1936), em 25 de julho de 1909, marca

    o fim de uma fase pioneira da aviao. Em menos de cinco anos, o voo de

    aparelhos mais pesados conseguira avanar de percursos curtos, a poucos

    metros do solo, possveis de serem realizados em hipdromos ou campos

    abertos, para vencer um trajeto de quase 40 quilmetros sobre o mar.

    Alberto Santos Dumont (1 873-1 932), figura de destaque no perodo, ,

    no ano seguinte, em 1910, homenageado pelo Aero Club de France

    com busto no campo de Bagatelle, onde h muito pouco, em 1906,

    realizara o primeiro voo com o seu 14-Bis. Se o interesse pela aviao

    torna-se uma febre mundial, acompanhada pela imprensa com des-

    taque, objeto de orgulhos nacionais, a qual no escapariam os jornais

    brasileiros, a presena proeminente do brasileiro Santos Dumont ser

    um estmulo adicional para que essa atualizao ocorra pari passu ao

    circuito internacional.

    A dcada que se segue trar novos desdobramentos para a aviao.

    Primeiro, na Europa e na Amrica, com a tentativa de estabelecer bases

    comerciais para vrios segmentos que se deslumbram desde o incio da

    aviao como o tranporte de passageiros, correio, uso militar etc. O frenesi

    sobre o tema presente na imprensa reflexo e agente importante na

    difuso e no incentivo explorao de potencialidades. A introduo do

    cinema, em paralelo a esse processo, permitir que as notcias ganhem

    nova forma. Cinema e aviao, dois dos traos mais visveis da moder-

    nidade tecnolgica, ganham o mundo.

    Mesmo no Brasil, cujos principais centros urbanos apenas ao final da dcada de1890 comeam a sentir o impacto de novas ofertas tcnicas como a distri-buio de energia eltrica, o transporte urbano com a introduo do9

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    automvel com motor exploso, do bonde eltrico etc, as cidades maisimportantes ainda apresentam traos urbanos que conflitam com o cresci-mento populacional e as novas demandas.

    A exploso populacional nos principais centros brasileiros, notadamente

    no Sudeste, gerada pela intensa migrao estrangeira cria, em paralelo,

    dificuldades de toda espcie e passa a exigir adequaes e regu-

    lamentaes. So Paulo, para ficar num exemplo prximo, v acontecer

    em seu centro urbano aes pontuais da municipalidade, como

    o realinhamento e alargamento de vias principais. A prpria mquina

    administrativa, na velha Repblica, passar por vrias remodelaes,

    titubeantes s vezes, para dar conta das demandas, iniciaticas sujeitas ao

    panorama econmico e poltico local e mundial.

    Os poucos anos que antecedem ao conflito mundial deflagrado em 1914

    so assim um momento em que o interesse pelas conquistas tecnolgicas

    dividem espao com noticirio poltico internacional em grande

    mobilizao.

    A fase pioneira da aviao ganha espao tanto na indstria e no comrcio

    como no comportamento e imaginrio social. Em 1910, Raymonde de

    Laroche (1882-1919) a primeira mulher a receber na Frana, do Aero-

    Club de Paris, um brevet, sua autorizao para voo.

    Cabe ao migrante, engenheiro e inventor prolfico, Dimitri Sensaud de

    Lavaud (1882-1947), realizar em 7 de janeiro de 1910 em Osasco, ento

    subrbio distante da cidade de So Paulo, o primeiro voo na Amrica

    Latina

    1

    . Os jornais do cobertura imediata do fato. Seu avio "So

    Paulo, desenhado por Dimitri e fabricado localmente, exposto em

    teatro no centro da cidade

    2

    .

    Rio de Janeiro e So Paulo, como outras cidades brasileiras, comeam a

    receber tambm os primeiros aviadores estrangeiros que realizam voos de

    1 0

  • demonstrao ou concorrem a prmios. Claro, chegam ainda por terra ou

    mar. Entre tantos visitantes, o cinema, esse parceiro miditico da aviao,

    registra em 1911 , numa produo da Serrador, as experincias realizadas

    pelo italiano Germano Ruggerone em 6 de janeiro no Prado da Mooca.

    Intitulado Ruggerone, os primeiros voos em aeroplano no Brasil, a fita com

    quase 20 minutos exibida no velho Bijou, na Rua So Joo, no dia 13, e no

    High Life, dia 20. Certamente a morte do aviador italiano Giulio Picollo,

    dias antes no Veldromo, em evento em que ambos, participavam atraiu

    mais interessados. As cenas so descritas em parte na imprensa local:

    Alm de outros voos em que o clebre aviador foi acompanhado, v-

    se a arrojada Senhorita Mlle Renata Crespi, filha do capitalista

    Senhor Rodolfo Crespi, que com toda a coragem, deu diferentes

    voltas em redor da pista, o distinto sportman Sr Guilherme Prates,

    Sr Papini Menotti e outros que tambm demonstraram coragem e

    serenidade. () Depois dos voos, apreciam-se as arquibancadas

    cheias de tudo que So Paulo tem de melhor, isto , a elite paulistana

    3

    .

    Anos 1 0: para o alto

    11

    O voo pioneiro de Dimitri Sensaud

    de Lavaud, em Osasco, municpio de

    So Paulo, em aeronave por ele

    desenvolvida o tema do livro

    1910: o primeiro voo do Brasil

    (2010), de Suzana Alexandria e

    Salvador Nogueira.

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Ao cinema, ao raid automobilstico, ao ciclismo e outras novidades vm

    se juntar como novo divertimento as exibies aeronuticas. Os novos

    esportistas, endinheirados ou amantes da velocidade, tornam-se eles

    tambm parte do noticirio.

    Com a incorporao das

    demonstraes de voo

    ao rol dos eventos pblicos,

    surgem ofertas ou referncias

    nova prtica social.

    Em anncio na nova publicao

    A Cigarra, em seu nmero 8, de

    1 de agosto de 1914,

    o representante local do

    "afamado fabricante Zeiss"

    oferece com destaque binculos

    "para corridas, aviao, foot-

    ball, etc", todos estes novos

    costumes incorporados

    ao cotidiano das grandes

    cidades do Sudeste.

    Aqui, detalhe da ilustrao

    do anncio.

    Acervo Arquivo Pblico do

    Estado de So Paulo

  • Logo, outra parceria ganha espao nos jornais: fotografia e aviao. Em

    1912, a capital federal realiza sua primeira semana de aviao e recebe

    entre seus participantes o francs Roland Garros (1 888-1918). O aviador,

    que tivera sua prtica inicial como piloto em 1909 num modelo

    Demoiselle, desenvolvido por Santos Dumont, tem sua participao

    registrada no Cine Jornal Brasil n1

    4

    , exibido nos cines Bijou e High-

    Life em 5 de fevereiro, como descreve a imprensa:

    Titulo dos quadros: () 4. Primeira semana da aviao no Rio.

    5. O Sr. Presidente da Repblica visita os aviadores no hangar

    6. Garros no seu monoplano Bleriot. 7. Conduzindo o monoplano

    para o campo da aviao 8. Voos de fantasia pelo arrojado aviador

    Garros. 9. Do Jockei Clube a Niteri. 10. Sobre a Baa da

    Guanabara. 11 . Evoluo sobre a cidade de Niteri. 12. Do Rio a

    Terespolis, Garros vencedor do prmio de 50:000$000.

    (O Estado de S. Paulo, 6 de fevereiro de 1912, p.9)

    No so as fotos realizadas pelos profissionais da imprensa, carioca e

    paulista, que interessam aqui, mas sim aquelas que ilustram, em 10 de

    fevereiro, a Revista da Semana, peridico carioca, em grande formato, um

    dos principais do perodo

    5

    . Num oferecimento do piloto, a revista publica

    fotos feitas por ele a partir do seu avio Blriot, rumo a Petrpolis.

    O mosaico com 4 imagens constituem, provavelmente, as mais antigas

    imagens areas conhecidas do Rio, capital federal, feitas de aeroplano. Nova

    surpresa, trao contemporneo, surge agora: so pares estereoscpicos que

    revelam a vista das montanhas cariocas, parte da cauda do avio e

    finalmente, Petrpolis, numa tomada que apresenta a cidade serrana em

    forma de mapa, como informa o texto

    6

    .

    As grandes travessias ganham espao na imprensa brasileira j no

    incio da dcada de 1 91 0. Atraindo pilotos estrangeiros e brasileiros,

    estimulados ainda por prmios em dinheiro, prtica presente desde da

    virada do sculo, elas crescem em nmero e distncia a percorrer.

    Anos 1 0: para o alto

    1 3

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    1 4

    O aviador francs Roland Garros envia fotos

    estereoscpicas feitas durante voo do Rio a

    Petrpolis Revista da Semana, publicadas

    na edio de 10 de fevereiro de 1912.

    Das imagens de balo feitas por Botelho em

    1905, bastaram poucos anos para surgir

    nova vertente: o Rio visto do alto.

    Entre as quatro imagens publicadas, apenas

    esta parece cobrir trecho litorneo.

    As demais apresentam trechos serranos e

    a vista da cidade de Petrpolis.

    Acervo Biblioteca Nacional

    Ao lado, detalhe de papel de carta

    com timbre da Escola de Aviao Curtiss.

    Processo 40.667/21 , nov.1 921

    Acervo AHSP

  • Em 1912, por exemplo, o piloto brevetado no ano anterior na Frana,

    o paulista Eduardo Pacheco Chaves (1887-1975), originrio de famlia de

    grandes cafeicultores, realiza o trajeto, ida e volta, de So Paulo a Santos.

    Dois anos depois, em 5 de julho, partindo da Mooca, Edu Chaves, realiza

    em 6 horas o voo, pioneiro, entre So Paulo e Rio de Janeiro, a uma

    velocidade de 80 km/h, alcanando a altitude de 2.000 metros.

    A primeira escola de aviao surge no Rio de Janeiro o Aero Club

    Brasileiro, fundado em 1911 pelo tenente Ricardo Kirk, mas em atividade

    efetiva apenas em 1916. Associaes do gnero se sucedem nos anos

    seguintes, mas as escolas de origem militar marcam presena. Trs anos

    depois, em 1914, tem incio as atividades da Escola da Aviao da Fora

    Pblica, de So Paulo, primeira de carter militar, baseada no Guapira,

    campo do aviador Edu Chaves, ao norte da capital. No mesmo ano surge

    a Escola Brasileira de Aviao EBA, no Campo dos Afonsos, no Rio,

    onde tambm funcionava o Aero Club

    7

    . Em 1916, surge a Escola de

    Aviao Naval

    8

    , tambm no Rio, e trs anos depois a Escola de Aviao

    Militar, do Exrcito, na mesma cidade.

    Em muitas das iniciativas particulares, mas tambm nas militares, participam

    de incio pilotos estrangeiros, muitos dos quais nos anos seguintes tm

    destaque em vrios setores do campo da aviao.

    Anos 1 0: para o alto

    1 5

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Em So Paulo, apenas em 1921 surgem iniciativas particulares para

    estabelecer escolas de pilotagem como a Escola de Aviao Curtiss.

    Tentativas de criao de um aeroclube ocorrem na mesma poca, forma

    de compartilhamento e difuso adotada ento.

    Com a deflagrao da Grande Guerra, em 1914, esse panorama agitado d

    lugar entre ns a um momento de pausa. A reduo do ritmo mundial da

    economia e o esforo de guerra levam a pesquisa e explorao da aviao

    para o campo de batalha. De incio como meio de observao, mas pouco a

    pouco como elemento ativo no bombardeio, ao lado dos grandes dirigveis.

    Mesmo no Brasil, essa nova funo, alm da prpria implantao das

    escolas de aviao militares, tem presena. Em abril de 1914, o aviador

    Cicero Marques, um dos participantes pioneiros da Escola da Aviao da

    Fora Pblica de So Paulo, oferece-se ao Exrcito para participar nos

    combates da Guerra do Contestado (1912-1916), conflito em regio do

    Paran que mescla explorao econmica por grandes grupos e

    resistncia de movimentos populares. O desinteresse do Ministrio da

    Guerra em oferecer um aeroplano adequado frusta a iniciativa. No ano

    seguinte, o Exrcito conta com 2 avies de reconhecimento na regio,

    mas a empreitada ter pouco flego, terminando com a morte em

    acidente areo do Tenente Ricardo Kirk.1 6

    Um Zeppelin manobra sobre Anturpia

    dias antes da queda da cidade frente s

    tropas alems.

    A Cigarra, de 29 de outubro de 1914,

    traz imagem realizada pelo

    correspondente da revista The Sphere,

    de Londres.

    Acervo Arquivo Pblico do

    Estado de So Paulo

  • Anos 1 0: para o alto

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    As cidades vistas de aeroplano

    1919, em 1 de junho, o magazine A Cigarra, revista de maior circulao no

    estado, como se apresenta, anuncia em O Estado de S.Paulo, o lanamento

    na segunda-feira seguinte da nova edio

    9

    que traz com destaque pela

    primeira vez no Brasil" imagens da cidade vista do alto

    10

    .

    Nessa edio, alm de imagens do centro e do Brs, a primeira feita em

    voo do qual participou o prefeito Washington Lus (1914-1919),

    o articulista Delpes comenta o uso estratgico que teve a fotografia na

    I Guerra na observao de tropas e a necessidade de aprimorar a tcnica

    para vencer no s a camuflagem, mas as dificuldades usuais do registro

    fotogrfico areo:

    Mas no foi s contra a dissimulao que teve que lutar a fotografia.

    Forma-se muitas vezes sobre a terra uma espcie de fumaa tnue e

    azulada, invisvel de baixo para cima, mas que, vista do alto,

    assemelha-se a imenso vu estendido sobre a paisagem,

    1 8

    A novidade contamina at mesmo as vinhetas.

    A Cigarra, 6 de julho de 1915.

  • prejudicando a nitidez dos detalhes e tornando necessrio o uso de

    lentes finssimas. E na guerra a artilharia antiarea obriga os avies

    a planarem sempre grande altura, de modo que os aparelhos

    fotogrficos so providos de grande foco para aproximar a objetiva.

    Isso faz com que certos aparelhos, com cerca de dois metros de

    comprimento, mais se assemelhem a um canho do que a uma

    mquina fotogrfica. Torna-se mesmo necessrio o uso da

    telefotografia, que no nem mais nem menos do que uma mquina

    fotogrfica instalada no fundo de um culo de alcance.

    Como a fotografia comum no d ideia exata das dimenses, devido

    perspectiva que aumenta o tamanho dos objetos prximos e

    diminiu o dos mais distantes, os aparelhos so calculados

    rigorosamente, para que as fotografias tiradas de uma certa altura

    corresponda exatamente a uma determinada escala. Ainda mais,

    a mquina tem que fotografar ao mesmo tempo que a paisagem,

    a posio de duas pequenas pendulas de vidro graduadas, que esto

    no interior da cmara escura e que indicam a inclinao lateral e

    longitudinal do aeroplano no momento em que foi tirada

    a fotografia. Essas indicaes, que so indispensveis, tm por fim

    facilitar uma verdadeira arte que a restituio fotogrfica e so

    obtidas por um engenhoso dispositivo formado por pequenas lentes

    que desviam os raios luminosos da objetiva.

    Nas grandes alturas em que voam os avies o frio intenso, s vezes

    de 40 graus abaixo de zero, o que diminui a sensibilidade das

    chapas, tornando-se necessrio aquecer eletricamente o aparelho

    fotogrfico. Existem tambm dispositivios para evitar os fenmenos

    de condensao e tornar automtica a substituio das chapas.

    Porm a ltima palavra o aparelho cronofotogrfico que

    sincronizado ao aeroplano e que comporta uma geratriz de corrente

    eltrica, uma caixa de conexo e um comando mecnico.

    Dispondo-se as engrenagens do aparelho de acordo com a altura e

    a velocidade do avio em relao ao solo, podem obter-se centenas

    de fotografias formando um nico panorama.

    Anos 1 0: para o alto

    1 9

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    As imagens do alto nada tm de inocente nessa descrio, ainda que

    ilustrem uma revista de variedades: so frutos da guerra. As tomadas

    oblquas do centro da cidade, realizadas pelo tenente observador Dorsaud

    (Dorsand), acompanhando os voos dos capites Etienne Lafay e Eduardo

    Verdier, todos participantes de misso francesa de treinamento do Exrcito

    brasileiro, espalham-se pela imprensa. No apenas vistas de So Paulo

    11

    ,

    mas do Rio em especial

    12

    .

    20

    As primeiras imagens da cidade, a partir de aeroplano, surgem em 1919,

    como anuncia A Cigarra, de 1 de junho.

    Aqui, v-se o centro histrico. Na parte baixa, o Teatro Municipal.

    Com destaque, quase ao centro da imagem o Mosteiro de So Bento e

    o novssimo viaduto de Santa Ifignia. Ao fundo, o Parque do Carmo,

    com os bairros do Pari e do Brs, ao fundo.

    Acervo Arquivo Pblico do Estado de So Paulo

  • Tomadas similares, agora em movimento, ganham espao no

    documentrio O Rio em aeroplano, produo da Omnia Filme, a partir

    do avio pilotado, mais uma vez, por Lafay, instrutor na Escola de

    Aviao mantida pelo Exrcito, rara produo cujas imagens foram

    preservadas

    13

    . Exibida nos cines Royal e Central em 20 de setembro de

    1921 , a pelcula comentada pela imprensa:

    Vistas animadas de 50 a 1. 250 metros de altitude. Pela primeira vez

    um operador ousou registrar num filme completo. Os aspectos novos,

    curiosos e originais das belezas do Rio de Janeiro. Glorioso

    documento reunindo a coleo de 14 ascenses: No Campo dos

    Afonsos, a partida Os subrbios e o Instituto de Manguinhos

    Aspectos do cais do porto, arsenal, Ilha das Cobras

    O deslumbramento da baa e os vasos de guerra Avenida Central,

    as ruas do centro, o Monroe, os Arcos, etc Dominando o cume do

    Corcovado e abrindo voo do Corcovado at o Po de Acar.

    Topografia do Flamengo, Glria, Botafogo, Copacabana e as demais

    avenidas beira mar Vises das ilhas Governador, Fiscal,

    Enxadas, Viana e outras.

    (O Estado de S.Paulo, 20 de novembro de 1921 , p.1 3)

    No apenas os voos retomam ento, com o fim do grande conflito

    mundial, mas o panorama de atividades cresce em escala, frente ao pr-

    guerra, e traz novos temas. Entre eles, a discusso de um cdigo do

    ar apresentado pelo [ministro Afrnio] de Mello Franco no congresso.

    Eco raro, considerando a rea de ao, a rplica na nascente imprensa

    especializada em fotografia, ainda de curto alcance, que critica

    a clasula 44 do projeto por proibir o uso, pelos tripulantes ou

    passageiros, de qualquer aparelho fotogrfico ou mquina que sirvam

    para a fixao de imagens. Publicado na Illustrao Photographica,

    em junho de 1919, o foco da contestao garantir a liberdade de ao

    dos profissionais da fotografia, de modo a impedir restries a novos

    usos como a fotografia erea

    14

    .

    Anos 1 0: para o alto

    21

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    O interesse pela aviao cresce aceleradamente. Agora, em um quadro

    mais complexo, com novos agentes. Econmicos por um lado, como

    representantes de fabricantes de aeronaves, escolas etc, e, por outro, novos

    participantes, no mais restritos a interessados originrios da burguesia

    local, mas tcnicos formados nas escolas de aviao, mecnicos e todos

    os demais operadores necessrios para implantar, ainda que de forma

    incipiente, uma estrutura para a aeronutica civil.

    Datam tambm desse perodo longas sries de decretos federais

    concedendo permisses a interessados em estabelecer servios de trans-

    porte de carga e passageiros. Como exemplo, o que faz o decreto

    1 3.567, em 26 de abril de 1919, concedendo a Joo Varzea permisso

    desses servios entre as principais cidades do Brasil e entre estas e

    o estrangeiro

    15

    . Apenas em 1927, porm, comeam a funcionar no pas

    servios regulares

    16

    .

    A aviao como espetculo continua como tema importante na

    imprensa, no cinema, na vida em sociedade. Agora, porm, como

    fennemo de massa, tendo como fundo especial as prprias comemo-

    raes do Centenrio da Independncia.

    O cinema, mais uma vez, pode ser usado aqui para indicar marcos

    simblicos. Em 1920, exibido no Teatro Salesiano, em 2 de outubro,

    a grande produo, em 5 (ou 6) partes, filmada com trs operadores

    Festejos ao Prncipe Aimone. A recepo em So Paulo sua alteza real

    italiana registrada em todos os pontos da cidade visitados pela comitiva,

    da Estao da Luz ao piquenique no Parque Antrtica, e a soberba

    manifestao no campo do Palestra. Sem deixar de mencionar, o que nos

    interessa em especial por introduzir novos personagens: os arrojados

    voos dos aviadores Edu [Chaves] e irmos Robba

    17

    .

    Semanas depois, o cine Congresso, exibe em 19 de outubro o filme, em

    5 partes Os reis da Blgica em So Paulo. Produzido e realizado pelos

    22

  • aviadores italianos Robba e Domingos Bertoni (?-1 924), o filme sucede

    produo similar, da Fox, sobre a passagem das altezas reais pelo Rio de

    Janeiro. Os festejos, na produo carioca, so filmados por 3 operadores,

    um deles Joo Etchebehere, de avio, e outro, A. Junqueira, em auto-

    mvel e no mar

    18

    . A novidade explorada por vrias produes, em

    especial na chegada dos aviadores portugueses Sacadura Cabral e Gago

    Coutinho, em 1922, tema da fita Raid Lisboa-Rio: (. . .) 6 operadores em

    vo pela cidade do Rio multiplicaram os seus esforos com o fim de dar

    ao pblico toda a beleza da realidade

    19

    .

    As tardes de aviao, eventuais antes da Grande Guerra, retomam com

    fora. Os voos realizados no Parque Antrtica ou no Prado da Mooca

    ganham agora espaos prprios: os aerdromos.

    O jornal Rossi Atualidades, produo da Rossi Filme, em sua edio 23,

    exbida em 15 de novembro de 1922, no Cine-Teatro Repblica, entre

    recepes ao Presidente da Repblica, inauguraes de estrada de rodagem

    etc, inclui cenas da tarde de aviao no aerdromo da gentil sota Tereza de

    Marzo. Quase um ms aps, o mesmo jornal Rossi Atualidades, agora na

    edio 25, exibida em 12 de dezembro, destaca entre suas notcias:

    Inaugurao do novo aerdromo dos irmos Robba

    20

    .

    Thereza de Marzo (1903-1986) e Ansia Pinheiro Machado (1904-1999)

    so as primeiras brasileiras a receber licena para pilotagem, em 1922,

    tendo ambas como treinador Fritz Roesler (?-1971 ), com o qual a primeira

    se casar, abandonando a aviao. Ansia ganha fama ao ser pilota

    pioneira a fazer a travessia solo entre So Paulo e Rio em setembro de

    1922, cinco meses aps receber a licena

    21

    .

    Foi no Aerdromo Brasil, no Ipiranga, que Thereza inicia seu treinamento

    com os irmos Robba: Joo e Henrique

    22

    . Logo depois a aviadora

    inaugura seu prprio aerdromo e escola, que tm pouca durao.

    Anos 1 0: para o alto

    23

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    24

    Anesia Machado, sobrinha do General Pinheiro Machado, posa

    com seu instrutor, tenente Reynaldo Gonalves, nas instalaes

    da Escola de Aviao Curtiss, no aerdromo de Indianpolis.

    A Cigarra, 1 5 de fevereiro de 1922.

    Acervo Arquivo Pblico do Estado de So Paulo

  • Na zona norte, Edu Chaves tinha seu campo particular no Guapira

    desde a dcada de 1 91 0, sem mencionar as instalaes iniciais

    do Campo de Marte, tradicional rea na vrzea do Tiet, que recebe na

    dcada de 1 920 as primeiras ocupaes pela aviao. Data do mesmo

    periodo, com o crescimento explosivo do nmero de interessados,

    a implantao do Aero Club de So Paulo, que surge com diferentes

    denominaes na imprensa.

    Os irmos Robba, alm de manter o campo de aviao e as aulas,

    buscam novas oportunidades comerciais. Em fevereiro de 1922, a revista

    A Cigarra registra viagem a Ribeiro Preto de grupo formado por Joo

    Robba, o tenente engenheiro Giuseppe Cornetto e o mecnico, e futuro

    piloto, Vasco Cinquini (1 900-1930), todos apresentados como associados

    ao Aerdromo Brasil. O propsito era avaliar a implantao de rotas

    areas comerciais

    23

    . Os Robba continuariam a procurar novas frentes

    24

    .

    As tardes de aviao so, nesse contexto, um empreitada comercial,

    momento publicitrio por excelncia. Essas aes se mesclam ainda com

    eventos muito prximos como homenagens e participaes em paradas

    militares nas datas nacionais. Um exemplo acontece no domingo, 1 de

    abril de 1923, no Aerdromo Brasil, em homenagem misso fascista

    italiana a So Paulo, como indicam notas sobre o filme O fascismo em

    So Paulo, da Rossi Filme, exibido no Repblica no dia 9 seguinte.

    o tema tambm da produo da Ubirajara Filme, exibida no mesmo

    cinema no dia 16 Uma bela tarde de aviao

    25

    :

    Um admiravel filme tirado em S.Paulo.

    Completa reportagem da grande festa que os aviadores fascistas

    italianos efetuaram h dias no Aerdromo Brasil. (. . .) Chegam ao

    campo as mais distintas famlias da Pauliceia A formidvel

    assistncia daquele dia. - Os primeiros voos Sotas e ases: Thereza

    de Marzo e Fritz Roessler Ansia P. Machado e Reynaldo

    Gonalves O Tenente Musa O conde Matarazzo e o dr. Fonseca

    Anos 1 0: para o alto

    25

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    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Cotching O corajoso aviador Umberto R recebe felicitaes

    Bombas lanadas pelos aviadores explodem em pontos previamente

    marcados O glorioso s fascista R Umberto e seus companheiros

    posam para a Ubirajara Filme. Aprestos para a partida

    A aplicao do paraquedas Alando voo A mil metros de altura

    A dois mil metros Afinal a trs mil metros A grande prova do dia

    Um extraordinrio salto no vcuo! Debaixo do cu de anil de

    nossa ptria cruzam-se, num fraternal abrao, a gloriosa bandeira

    brasileira, o sagrado pavilho da Itlia e o emblema vitorioso do

    'fascismo' de alm-mar!

    (O Estado de S. Paulo, 1 6 de abril de 1923, p.8)

    26

    26

    Amisso a Ribeiro Preto empreendida em fevereiro de 1922 pelo piloto Joo

    Robba, o tenente Cornetto e o mecnico Cinquini registrada na imprensa.

    Aqui, em A Cigarra, do dia 15, mas o mesmo flagrante da equipe junto ao avio

    reproduzido na revista carioca O Malho, do dia 18, ambas notificando

    a inteno de implantao de rotas areas comerciais.

    Acervos Arquivo Pblico do Estado de So Paulo e Biblioteca Nacional

  • Raids areos

    To populares quanto a matriz automobilstica da dcada anterior, os raids

    areos ganham por sua vez nova escala, agora de alcance global. Edu

    Chaves, que realizara a travessia So Paulo-Rio em 1914, completa em

    janeiro de 1921 o raid Rio-Buenos Aires. Em 1923, noutro exemplo,

    o Brasil recebe os aviadores Pinto Martins, brasileiro, e Walter Hinton,

    norte-americano, que fazem a ligao Nova York-Rio.

    Em 1927, os italianos Francesco De Pinedo (1 890-1 933), Carlos Del

    Prete (1 897-1 928) e Vitale Zacchet, realizam voo partindo de Roma e

    percorrendo longo percurso pelas Amricas; no mesmo ano

    o brasileiro Joo Ribeiro de Barros (1 900-1 947), que, com o avio

    Jah, completa a travessia Genova-So Paulo. No ano seguinte,

    o italiano Del Prete realiza a faanha de fazer o percurso sem escalas

    entre Roma e Touros, no Rio Grande do Norte, num total de pouco

    mais de sete mil quilometros. A cidade do Rio de Janeiro, em especial,

    torna-se ponto de passagem obrigatria; ao lado claro de cidades no

    Nordeste, pontos fundamentais para voos vindos da Amrica do Norte,

    Europa e frica.

    Datam do incio da dcada de 1 920 os principais marcos que sinalizam

    o crescente interesse do pblico, talvez os primeiros grandes

    fenmenos de massa da cidade. A recepo nas cidades brasileiras aos

    aviadores portugueses Gago Coutinho e Sacadura Cabral, pioneiros da

    travessia do Atlntico Sul em 1922, ganha dimenses inusuais.

    Antecedendo a chegada do rdio no pas, cuja primeira transmisso

    teria lugar meses depois, a populao acompanha atravs de telegramas

    na imprensa os desdobramentos do raid desde a partida em 30 de

    maro de Lisboa chegada ao Rio em 17 de junho de 1 922.

    A imprensa local, em especial os veculos cariocas e paulistanos que desde

    a dcada anterior tm na fotografia um novo recurso visual, explora o evento.

    Anos 1 0: para o alto

    27

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    28

    A Cigarra faz homenagem a Edu Chaves em

    janeiro de 1921 quando vence o raid Rio-

    Buenos Aires. O Malho, grande magazine

    carioca, exalta em maio de 1927 a tripulao do

    Jah, sob comando de Ribeiro de Barros, ao

    completar a travessia Genova-So Paulo.

    Acervos Arquivo Pblico do Estado

    de So Paulo e Biblioteca Nacional

    Ao lado, multido acompanha as notcias do

    raid do Jah, na porta da redao do jornal

    carioca A Patria. Como de hbito, fotos e

    telegramas de notcias recentes eram expostos

    nas vitrines e entradas dos jornais.

    O Malho, 7 de maio de 1927.

    Acervo Biblioteca Nacional

  • A revista A Cigarra, por exemplo, publica imagem de logradouro da cidade

    de So Paulo tomado pelo pblico logo aps a divulgao da chegada dos

    aviadores ao Rio

    27

    . Festas e comemoraes diversas esperam os aviadores

    portugueses, que se estendem a So Paulo no ms seguinte. Num sbado,

    8 de julho, o Aero Club de So Paulo realiza evento com provas de aviao

    no Prado da Mooca, oportunidade nica para os adeptos e personalidades

    locais tomarem parte

    28

    . L esto o tenente Reynaldo Gonalves, primeiro

    lugar na prova de aterragem de preciso, Edu Chaves, primeiro lugar em

    velocidade, Ansia Machado e Henrique Robba. A Cigarra publica com

    destaque mosaico de fotos dos participantes e inclui ao centro o retrato de

    Joo Robba, primeiro lugar em acrobacia

    29

    .

    Anos 1 0: para o alto

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    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Fenmeno de massa, em sintonia miditica, ser a recepo ao hidroplano

    Jah, em 1927. Comemorando a travessia entre Cabo Verde e Fernando de

    Noronha realizada em 28 de abril, So Paulo recebe o piloto e sua

    equipe

    30

    . O fato atrai grande multido, como descreve, num tom frio, mas

    em excepcional registro, o relatrio da diretoria da The So Paulo

    Tramway, Light & Power, empresa responsvel pelo sistema de bondes

    eltricos e fornecimento de energia eltrica para a capital:

    A maior ocorrncia relacionada com o material circulante ocorreu

    em 1 de agosto, quando mais de 100.000 pessoas sairam para

    receber o hidroavio 'Jah' chegando da Europa. A recepo teve

    lugar no Reservatrio de Santo Amaro, cerca de 16 quilmetros da

    cidade propriamente dita.

    O Trfego cuidadosamente organizou os carros em grupos de

    acordo com as caractersticas da via. Os grupos de carros

    deixariam o Largo da S em determinados intervalos ()

    Os passageiros em vrios carros foram contabilizados ao longo

    do dia numa mdia de 371, sendo 75 no telhado, 155 nos estribos

    e 141 dentro dos veculos. Embora os carros tenham sido

    projetados e construdos para suportar apenas de 65 a 90

    passageiros, transportaram ao longo do dia uma sobrecarga entre

    400 e 500%. O equipamento resistiu maravilhosamente, sem

    qualquer defeito mecnico ou eltrico

    31

    .

    A figura herica do aviador faz parte assim das dcadas de 1910 e 1920 de

    forma nica, expresso individual de uma indstria complexa. oportuno

    comentar, marco importante nessa construo, que menos de um ms aps

    o raid do Atlntico Sul pelo Jah, Charles Lindbergh (1902-1974), realiza

    entre 20 e 21 de maio a travessia entre o estado de Nova York e Paris em

    seu voo solitrio no Spirit ofSt Louis

    32

    .

    Completando esse fenmeno miditico, em especial nas aproximaes

    entre aviao e cinema, seria oportuno comentar o lanamento em 31 de

    30

  • outubro de 1925 do longa-metragem brasileiro: Hei de vencer. Produo de

    grande porte da Guanabara Filme, sob coordenao de Antonio Tibiri,

    tem como operador Lus de Barros (1893-1982), importante diretor nas

    dcadas seguintes.

    O filme de aventuras, realizado no Rio e So Paulo, tem como centro mais do

    que o enredo esperado, as aventuras dos aviadores

    33

    . Com destaque na

    imprensa para a participao dos aviadores Joo Robba, Reynado Gonalves

    e Ansia Pinheiro Machado, todos eles representantes conhecidos do periodo,

    so as acrobacias mirabolantes que ganham espao nos anncios e no cartaz

    com cenas de batalha area. Em 7 de fevereiro, como anuncia a imprensa

    local

    34

    , o ator Antonio Sorrentino salta a 200 metros de altura entre os avies

    pilotados por Joo Robba e Ansia Machado sobre o Campo de Marte!

    Fico e realidade, numa expresso clssica, parecem se misturar, ou

    encontram, talvez, seu ponto de confluncia ideal.

    Anos 1 0: para o alto

    31

    Cena do filme Hei de vencer "apanhada" em pleno voo sobre o Campo de Marte:

    aviao e cinema constituem campo irradiado de valores de uma modernidade tcnica.

    A Cigarra, 1 5 de fevereiro de 1924.

    Acervo Arquivo Pblico do Estado de So Paulo

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Um novo olhar: fotogrametria

    Em menos de quinze anos aps o vo baixo sobre o campo de Baga-

    telle, a aviao constituia-se como espao de grande investimento

    material e simblico. Indo alm do desenvolvimento de aeronaves,

    formao de equipes de uma vasta gama de especialidades e implan-

    tao de infraestrutura civil e militar, novos usos e funes comeam

    a tomar forma.

    A fotogrametria, em aplicao prtica desde as duas ltimas dcadas

    do sculo XIX, no parece ter registro no Brasil at o incio do sculo

    XX. Idealizada a partir da interpretao analtica de fotografias,

    o processo permitia registrar a volumetria de determinados terrenos em

    forma cartogrfica. Realizada a partir de fotos tomadas em pontos

    elevados e mesmo a partir de navios, a fotogrametria tinha uso estabe-

    lecido na Europa e Amrica do Norte.

    No que seu uso fosse desconhecido dos engenheiros e tcnicos brasileiros

    da dcada de 1890. Um exemplo disso a resenha, em 1896, de Louis

    Cruls (1 848-1908), atuante desde meados dos anos 1870 no Observatrio

    Imperial do Rio de Janeiro, sobre a obra de Glio Towne, editada no

    mesmo ano em Paris pela Livraria E. Bertaux. O livro, intitulado Astrono-

    mie, Astrophysique, Godesie, Topographie et Photogrammtrie pratique,

    escrito em dois volumes, recebe apreciao positiva, embora com pequenas

    ressalvas sobre seu carter eminentemente prtico

    35

    .

    Ainda assim o desenvolvimento do campo seria objeto da bibliografia

    tcnica que os engenheiros brasileiros na virada para o sculo XX

    dispunham, como tambm tinham contato em seus programas curri-

    culares. O Brasil, alm disso, interessava a aqueles que pretendiam

    explorar comercialmente o sistema. Ao menos, quanto garantia de

    patentes. Assim, os registros publicados nos Dirios Oficiais, da Unio,

    permitem acompanhar os avanos no setor.

    32

  • Em 26 de dezembro de 1906, por exemplo, Theodor Scheimplug (1865-

    1911 ), domiciliado em Viena, ustria, apresenta, atravs de representante

    legal no Rio de Janeiro, um memorial descritivo sobre novo processo de

    obteno de cartas topogrficas para registro de privilgio de uso no pas.

    Seu processo, objeto de longa argumentao, sem descrio precisa de

    equipamento ou metodologia, busca garantir a preciso no uso de foto-

    grafias obtidas por bales e pipas, como tambm de navios e pontos

    elevados, atravs da determinao exata do ponto de tomada e reti-

    ficao, estabelecendo a transposio da imagem em perspectiva central

    para projeo ortogonal, permitindo ento a gerao de mapas. O processo

    possibilitava a retificao pelos mtodos atuais da fotogrametria

    (anlticos e geomtricos) como do stero-comparador de Pulfrich

    36

    ,

    produzido pela casa Zeiss, de Jena. O privilgio concedido sob o nmero

    4.836 e publicado em 20 de fevereiro de 1907

    37

    .

    Longo perodo, parte devido ao tempo de desenvolvimento das pesquisas e

    parte pelas dificuldades impostas pela Grande Guerra, se estende at novo

    registro do gnero. Em 17 de agosto de 1921 , o Ministrio da Agricultura,

    Indstria e Comrcio, d privilgio de exclusividade por 15 anos a

    Umberto Nistri (1895-1962), oficial do Exrcito italiano, estabelecido em

    Roma, que solicita registro de patente para um novo processo fotogra-

    mtrico para levantar plantas, e um aparelho para esse fim, conforme

    registro publicado em 7 de setembro sob nmero 12.192

    38

    .

    Um memorial extenso explica o conceito do processo e do equipa-

    mento proposto por Umberto Nistri, sendo publicado na edio do

    dia 21 do mesmo ms

    39

    . O sistema, como outros que lhe so con-

    temporneos, introduz uma alternativa, o que veremos adiante, aos

    mtodos empregados pela fotogrametria, de natureza analtica-

    geomtrica, utilizando equipamentos que permitem, numa expres-

    so da poca, a obteno automtica das pranchas cartogrficas

    com curvas de nveis. Associavam-se desse modo ganho de produ-

    tividade e maior acuracidade.

    Anos 1 0: para o alto

    33

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Contribuio promissora para o uso entre ns da fotogrametria ocorre em

    outra esfera, atravs das aes do Estado no setor militar. no Ministrio da

    Guerra, no incio da Repblica, que ato legal cria o Servio Geogrfico.

    Embora seja longo e moroso o processo de sua efetiva implantao, como

    veremos, sua produo conhecida de seus contemporneos

    40

    .

    Sinal disso, artigo publicado em julho de 1927, sobre navegao

    fluvial, que transcreve projeto apresentado Camara Federal por Aaro

    Reis, deputado pelo Par. Seu escopo o servio de navegao e

    a necessidade de intensificao e desenvolvimento do setor nas bacias

    dos rios Paran e Paraguai. Citando fala do deputado, que prev em sua

    proposta o uso de hidroavies, com base em Corumb, fica claro

    o conhecimento das atividades do Servio Geogrfico:

    Alm disso, ser possvel, desde logo, utilizar os avies daquela

    linha, sem prejuzo do trfego regular, e, com pequena despesa, nos

    servios de levantamento topogrfico daquela vasta regio,

    empregando o mtodo 'aero-estreo-fotogramtrico', com tanto

    sucesso e proficincia j aplicado pelo excelente 'Servio Geogrfico

    do Exrcito', que, em pouco tempo, poder-nos- preparar, assim

    a cartografia definitiva do trecho do rio Paraguai sob nossa

    jurisdio e da regio adjacente

    41

    .

    Meses aps a proclamao da Repblica, o decreto federal n 451 -A, de

    31 de maio de 1890, reorganizava o Observatrio do Rio de Janeiro

    42

    e

    subordina-o ao Ministrio da Guerra

    43

    . Cria-se ento o servio

    geographico, cujo regulamento consta daquele ato legal, estabelecendo

    seu perfil como unidade de produo e formao especializada em

    cartografia

    44

    . Meses depois, novo decreto, n 859, em 13 de outubro, cria

    no Observatrio uma escola de astronomia e engenharia geogrfica.

    A proposta do Servio Geogrfico no foi, tudo indica, implantada

    em termos prticos. Suas funes voltam a ser reividicadas em 1 900

    34

  • no mbito das discusses sobre o Projeto da Carta Geral do Brasil.

    H grande nfase nas argumentaes sobre o mapeamento do terri-

    trio quanto s fronteiras e, em especial, na regio do Rio Grande do

    Sul, palco de grandes conflitos enfrentados no sculo XIX com

    os pases platinos.

    Quase duas dcadas depois, em meados da I Guerra Mundial, em 1 91 7,

    tem incio aes efetivas para organizao do ento Servio

    Geogrfico Militar, subordinado, como diversos outros ncleos de

    apoio tcnico, diretamente ao Estado-Maior do Exrcito. Naquele ano,

    em 6 de junho, o decreto n 1 2.503 abre crditos diversos entre eles

    para maquinismos, sendo 1 5:000$ para trabalhos preliminares de

    organizao e execuo do servio geogrfico militar, concernente

    estereofotogrametria e topografia militar, 500:000$. Mais adiante, em

    4 de setembro, o decreto n 1 2.631 destina mais 50$000 para

    trabalhos preliminares de organizao e execuo do servio geo-

    grfico militar

    45

    .

    O setor instalado, em 1917, na antiga fbrica no Morro da Conceio,

    rea central da capital federal, edifcio que se encontra quase em runas,

    mas, ressalva o relatrio, em condies de uso. As atividades se

    encontram organizadas, de incio, em grupos especializados: geodsia,

    topografia, estatstica regional, estereofotogrametria e topografia expe-

    dita. Essa organizao ganha com o tempo novas configuraes.

    Nos anos seguintes pouco se sabe sobre aquela unidade, porm

    46

    .

    Em 1921 , as atividades registradas no relatrio anual indicam

    a ampliao das instalaes com a compra do Palcio do Arce-

    bispado e anexo, no Morro da Conceio. Mais importante, o texto

    registra que somente nesse ano foi possvel receber elementos

    essenciais de trabalho, encomendados no exterior

    47

    . A nfase,

    ento, entre 1 91 7 e 1 921 foram as obras nas instalaes e os traba-

    lhos de instruo das diversas equipes.

    35

    Anos 1 0: para o alto

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    O relato, relativamente extenso, alm da nfase em organizao e

    treinamento, indica um planejamento a mdio prazo, como faz crer

    o tpico Cartografia brasileria. Estudo do seu programa

    48

    . Curto,

    contudo, o texto convive com digresses sobre o uso da fotogrametria,

    que a elegem como a modalidade tcnica que deve predominar nos

    anos seguintes.

    O tpico Mtodos e processos de levantamento assim inicia:

    A experincia tem consagrado sem restrio a fotogrametria (terrestre,

    martima e aeronutica) em todas as suas modalidades, como

    o principal recurso de execuo e elemento primordial de organizao

    do servio geogrfico militar. Cauteloso, porm, o texto aponta que

    frente a uma eventual falta de recursos os mtodos tradicionais, como

    a topografia militar, devem ser mantidos.

    Existe, neste momento, um ncleo especializado em servios de

    aerotopografia, tpico que revela um marco importante: o levan-

    tamenteo areo do Distrito Federal. A nota, quase indireta, surge ao

    informar que a instruo tcnica est sendo ministrada em paralelo

    execuo desse trabalhos.

    Esse levantamento foi feito com 22 voos realizados somente em 16

    dias, nos quais o servio de aviao militar pde dispor de avies

    eficientemente preparados.

    Num percurso areo de 748 km, a uma altura de 2. 500 metros, foram

    expostas 948 chapas fotogrficas tiradas com eixo tico vertical

    cobrindo uma rea de terreno de 1. 345 km

    2

    aproximadamente

    49

    .

    Quase certo, deste primeiro levantamento realizado no Brasil, aplicado a

    reas urbanas em grande extenso, que deveria gerar uma cartografia em

    escala 1 :50.000, pouco mais revelado nos relatrios. Dados como

    equipamentos utilizados, produo de fotocartas controladas, procedimentos

    como retificao, so ignorados. Teriam as equipes condies de realizar

    36

  • 37

    ento a transposio para pranchas cartogrficas ou seriam as fotocartas

    meras referncias para os mtodos cartogrficos tradicionais?

    O relatrio, logo adiante, volta a a afirmar sua previso, aqui de modo

    especfico, que a estereofotogrametria aeronutica ser modalidade

    predominante. Menciona-se ainda a organizao de estudos para

    produo de equipamentos nas oficinas do Servio Geogrfico Militar,

    sem indicar a natureza dos mesmos, como tambm registra-se o estudo

    sobre as caractersitas a satisfazer para um tipo de avio-anfbio

    destinado a essas operaes

    50

    .

    O ano de 1922 traz alguma novidade. H meno direta s instalaes

    transitrias destinadas estereofotogrametria no Morro da Conceio,

    bem como o projeto para um servio, tambm transitrio, de impresso

    cartogrfica

    51

    . Mais importante a meno ao transporte de estereo-

    autografo para o Servio Geogrfico sediado no Morro da Conceio.

    Infelizmente, pela natureza irregular desses relatos, no existem

    referncias concretas sobre o equipamento e seu uso efetivo, agora e nos

    prximos anos pesquisados.

    Oportuna meno, ao relacionar os projetos em andamento, confir-

    mar a organizao efetiva do servio geogrfico militar em 191 8. Entre

    os trabalhos, para 1 922, constam o Preparo dos elementos de trabalho

    (pessoal e material) para o levantamento do Distrito Federal na escala

    de 1 :50.000 com 4 turmas de geodsia, 2 de estereo-fotogrametria, 1 de

    aerotopografia e 1 0 de topografia"

    52

    .

    1 923 e os anos seguintes trazem notcias preocupantes. O longo relato, de

    seis pginas, sobre a unidade revela a continuidade das tarefas e nfase

    sobre treinamento das equipes

    53

    , mas h atraso nas obras das instalaes,

    parcialmente ocupadas ento. As aquisies de material tcnico no exterior,

    que inclui trens estereofotogramtricos, aqui entendido na acepo

    genrica do termo 'trem, enfrentam os atuais preos exorbitantes

    54

    .

    Anos 1 0: para o alto

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    38

    O item Estereofotogrametria revela que o treinamento dos oficiais

    da seo est sendo feito por tcnico especialmente contratado e

    prev para setembro de 1 924 o incio de trabalhos de campo para

    levantamento estereofotogramtrico do municpio de Niteri.

    A seo dedicada aerotopografia, provvelmente responsvel pela

    fase dos voos, realizou em janeiro alguns voos em aparelho

    Caudron, complementares ao levantamento do Distrito Federal, e

    organizou o anteprojeto do Estado do Rio

    55

    . Mais adiante acres-

    centa: Em maro iniciou-se a confeco dos registros de negativos,

    de cpias e de fotocartas referentes aos voos no Distrito Federal,

    servio j ultimado.

    Os anos de 1924 e 1925, como revelam os relatos especficos so

    desalentadores. Os eventos subversivos de julho a Revoluo de 1924

    geram interrupes graves dos servios, embora o tom dos relatrios procure

    atenuar o fato evidente. H perda de praas da unidade e decide-se por investir

    no treinamento dos oficiais. o que ocorre em 1925 quando realizado um

    curso sobre estereofotogrametria. A seo de aerotopografia menciona voos de

    instruo para oficiais no Campo dos Afonsos e experincias com aparelhos

    aerotopogrficos. O destaque dado produo de publicaes, entre elas

    Apontamentos de estereophotogrammetria, quase certo uma das mais antigas

    do gnero no pas.

    A impossiblidade de acesso no momento a relatrios para o perodo de

    1926 e 1933 permite especular sobre eventual recuperao. Sempre,

    claro, a temer as consequncias das revolues de 1930 e 1932 sobre

    a unidade

    56

    . O relatrio para o ano de 1934 desalentador. Trs

    pargrafos apenas so destinados ao, agora, Servio Geogrfico do

    Exrcito. Alm da meno reorganizao geral do Ministrio, sabe-se

    que a 2 Diviso de levantamento, sediada no Rio, ficou sem efetivo.

    Ainda assim, comemora-se a organizao da 1 Diviso, sediada em

    Porto Alegre, regio de fronteira, cuja demanda de servios cartogrficos

    h muito uma prioridade militar.

  • 39

    O pioneirismo do Servio Geogrfico na formao e treinamento de

    equipes estveis para emprego da aerofotogrametria no quadro de suas

    atribuies evidente nos breves relatos anuais do Ministrio da Guerra.

    A correta extenso dos servios e efetiva contribuio so aspectos que

    demandaro esforos para traar um quadro mais preciso sobre o tema.

    Anos 1 0: para o alto

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    40

  • Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

    Em 1928, quando Prefeito da cidade de So Paulo Jos Pires do Rio

    (1 880-1 950)

    57

    , promulgada a lei n 3 .203 , de 1 7 de julho, que o

    autoriza a contratar o levantamento topogrfico do municpio, pelo

    processo que julgar mais conveniente e mediante concorrncia

    pblica, conforme ementa. O texto legal lacnico. Seus quatro

    artigos pouco informam, alm de autorizar a entrar em acordo com

    o governo estadual para eventual parceria no empreendimento. E,

    no houvesse registro alternativo, mascararia assim as discusses e

    proposies por trs dele. Voltemos um pouco mais no tempo,

    fazendo uso dos anais da Cmara Municipal, aos primeiros dias de

    maro daquele ano.

    A sesso da casa legislativa, em 3 de maro, registra a entrada do ofcio

    n 265, do Senhor Prefeito, em que solicita autorizao para contratar

    a empresa Junkers Flugzeugwerk A. G. para realizar o levantamento

    aerotopogrfico do municpio. Segue em anexo ao ofcio a carta pro-

    posta apresentada no dia primeiro

    58

    pelos representantes da companhia

    sediada em Dessau na Alemanha

    59

    . O oficio encaminhado pelos

    responsveis pela sesso para apreciao das comisses de Justia,

    Obras e Finanas.

    O parecer das comisses, datado de 22 de maro, apresentado na

    sesso da Cmara de 14 de abril. Assinado por seis vereadores, entre eles

    Goffredo Teixeira da Silva Telles (1 888-1980)

    60

    , o texto chama a ateno

    pelo debate dos aspectos tcnicos da proposta, no qual a participao

    deste parlamentar parece ser fundamental

    61

    .

    Um embate legislativo, tumultuado, ameaa de incio tomar conta do

    debate, provocado pela forma improvisada do Executivo ao justificar

    a solicitao. Feita a ressalva pelos participantes das comisses, sur-

    presos com o fato, o debate toma outro rumo

    62

    .

    41

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    O texto, em seu conjunto, surpreende por analisar os detalhes, contestar

    e propor novos produtos. E, antes de tudo, por justificar, ele mesmo,

    a necessidade do levantamento topogrfico como instrumento de

    planejamento e controle fiscal, por exemplo, bem como a adoo do pro-

    cesso aerofotogramtrico, que se somam aos adotados nos trabalhos da

    municipalidade.

    No h negar o interesse de um rigoroso levantamento topogrfico

    do municpio.

    Bem o compreenderam sempre os poderes municipais. Para

    a consecuo desse objetivo tendem, h longos anos, os esforos

    louvveis, mas forosamente lentos, da Seo de Cadastro e

    Urbanismo. A planta oficial de So Paulo, fruto de um trabalho

    consciencioso, vai-se esboando por partes, j se achando

    reunidos interessantes elementos de estudo para vrios setores

    centrais da cidade.

    Contudo, no ser exagero afirmar que a tarefa. . . ainda est por

    principiar.

    Ante o vulto do que resta por fazer, bem pequena, de fato, parece

    a obra executada. Por desvelados e altamente proficientes que se

    tenham revelado, em vrias ocasies, os engenheiros daquela

    repartio tcnica, poucos como so eles, e sobrecarregados de

    um exaustivo expediente burocrtico, no lograram at hoje,

    obstar a que a morosidade seja a principal caracterstica de seus

    trabalhos topogrficos. Morosidade, sobretudo, flagrante, em

    confronto com os processos de vertiginosa metamorfose por que

    vai passando a paisagem urbana da capital. Como efeito natural

    dessa lentido, o cadastro da Prefeitura tem o vcio inicial de

    nascer velho. Rigoroso, embora, geometricamente exato, mas

    velho. Enquanto se organizam as plantas trecho por trecho, nos

    escritrios oficiais, as vias pblicas e as construes das reas

    levantadas saem de seus alinhamentos primitivos. Quando

    o trabalho concluido aparece, tarde. As poucas folhas cadastrais42

  • que se acham estampadas j valem como recordao do passado,

    no registrando mais os aspectos atuais de S. Paulo. E, j hoje,

    portanto, quando se quisesse cuidar das folhas ainda inditas,

    cumpriria tambm, como trabalho de igual urgncia, proceder

    reviso das que se davam por feitas.

    No s a escassez dos nossos quadros tcnicos concorre para

    a lentido dos servios cadastrais.

    inegvel que os processos correntes de levantamento

    topogrfico, usados ainda em So Paulo, como o foram, at

    ontem, em todos os pases, no autorizam, pelas dificuldades

    naturais em que esbarram, a esperana de resultados prontos e,

    sobretudo, econmicos.

    Comprovam essa assero as longas testativas (sic) levadas a efeito

    no Rio de Janeiro, desde quase os primeiros tempos da Repblica,

    para o levantamento do Distrito Federal, empresa em que se

    consumiram, sem resultado compensador, quase duas dezenas de

    milheiros de contos.

    Cingir-se, pois, a administrao paulista ao emprego nico do

    teodolito e do taquemetro, quando j hoje o sistema dos

    levantamentos areos permite decuplicar, com muito menor

    dispndio, a rapidez e a eficincia dos processos geodsicos,

    protelar sem motivo um servio de primordial importncia que

    o progresso da capital torna cada vez mais necessrio.

    , de fato, na aerofototopografia que se encontra a soluo prtica

    do problema.

    Compreendeu-o, em bora hora o ilustre sr. Prefeito.

    As comisses regimentais da Camara, sem embargo das objees

    que vo opor proposta do eminente chefe do executivo municipal,

    dirigem-lhe seus aplausos pela iniciativa com que to

    oportunamente suscitou a discusso do assunto.

    (CMSP, Anais 1928, p.21 5-216)

    43

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

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    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Surpreendente acordo e comunho de interesses mereceriam discusso

    prolongada. Dois argumentos podem ser utilizados, por ora, para

    compreender o ocorrido de forma breve. O primeiro, motivo da parte

    inicial deste ensaio, o impacto em si da aviao na sociedade

    contempornea, seja pelos avanos tcnicos, seja pela funo simblica

    dentro da experincia urbana moderna. O segundo diz respeito ao campo

    particular dos estudos de planejamento urbano. Nos anos 10, as estruturas

    oficiais em seus diversos nveis comeam a dar espao a uma gerao de

    especialistas, que iro pensar servios e polticas para as prximas

    dcadas. Para ficar num exemplo de fcil compreenso, basta lembrar

    a figura do engenheiro Francisco Prestes Maia (1896-1965). Atuando de

    incio em setores dedicados viao e obras pblicas nos governos

    estadual e depois municipal, responde por plano de reestruturao da

    capital em larga escala, uma das tantas iniciativas que desde meados

    da dcada de 1910 ocorrem em diferentes configuraes nas cidades do

    Rio de Janeiro e So Paulo.

    Se h acordo no parecer sobre a necessidade do levantamento e sobre

    o mtodo adotado, h por outro lado uma longa srie de contestaes.

    A primeira dela diz respeito ao controle de qualidade que o projeto deve

    respeitar: Um cadastro faz f ou no existe

    63

    . Prossegue o texto apontando

    pontos crticos, que esclarecem tambm aspectos sobre as diferentes etapas

    do processo, que encontraro, na forma final da lei ali proposta,

    detalhamento tcnico pertinente

    64

    .

    Entre os riscos de ordem tcnica, para essa classe de levantamentos,

    existem, por exemplo, o das derivaes que falseiam os planos,

    motivadas pela falta de perpendicularidade dos aparelhos; o das

    inobservncias da altitude prefixada, que determinam erros de escala

    s aparentemente corrgiveis com ampliaes ou redues dos positivos

    fotogrficos, o da inexatido das cotas de nvel ocasionada pela

    insuficincia dos trabalhos de ateli em que se procede 'restituio'

    das chapas, ao preparo das provas e composio das plantas.

    44

  • Sabem quantos se ocupam do assunto que as fotografias do operador

    devem ser obtidas verticalmente, frente ao solo, afim de registrar

    a imagem deste na mesma posio e forma em que ele deve ser

    posteriormente representado na planta. Sabem, alm disso, que

    os negativos fotogrficos no devem apenas seguir-se uns aos

    outros, mas sobrepr-se, recortando-se uns nos outros de modo

    a que a rea abrangida por cada um seja parcial e paralelamente

    recoberta pela area fixada nos negativos vizinhos.

    Qualquer inobservncia desses preceitos elementares, preceitos que

    no s retardam como encarecem notavelmente as operaes,

    conferiria eiva de suspeio aos resultados obtidos.

    (CMSP, Anais 1928, p.216-217)

    Resta assim municipalidade garantir a indiscutvel idoneidade tcnica

    do proponente a Junkers Flugzeugwerk , pois no figura no processo

    qualquer documentao tcnica comprobatria. Exigem ainda os avalistas

    mudanas em vrios tpicos.

    Sobre as coordenadas de referncia de nvel e altitude, por exemplo,

    necessrias para a etapa de triangulao, que a proponente requer,

    o parecer recomenda que os dados sejam fornecidos sem responsa-

    bilidade da municipalidade, frente insuficincia dos trabalhos

    topogrficos executados at hoje (CMSP, Anais 1928, p.21 8).

    A preocupao sobre controle de qualidade nas diferentes fases avana

    em diversos momentos do parecer.

    Parece depreender-se da proposta em apreo que os trabalhos de

    ateli (restituio das chapas, retificaes de escala, operaes com

    o cartgrafo, acerto ageral, acerto de detalhes, passagem tinta,

    redao das plantas, etc. ) sero executados em So Paulo sob

    as vistas dos engenheiros municipais. , porm, indispensvel que

    figure, no contrato, clusula mais precisa sobre o assunto. Alm do

    interesse de um controle direto e fcil desses trabalhos, por parte da 45

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Prefeitura, bvia a convenincia de serem, desde o princpio,

    zelosamente guardados e mantidos em So Paulo os documentos

    originais (chapas, folhas de campo, etc) com que se vo organizar

    as plantas oficiais do municpio.

    J muito que se permita, e isso por falta de oficinas adequadas

    entre ns, a gravao da planta e a tiragem da edio em pas

    estrangeiro.

    (CMSP, Anais 1928, p.21 8-219)

    Por fim, exige-se que o levantamento adote os mtodos da fotografia area

    (fotorestituio e estereofotogrametria), combinados com os sistemas da

    geodsia e topografia comum

    65

    .

    O foco passa agora para a discusso dos produtos finais a serem entregues.

    Contesta-se da proposta original feita pela Junkers a execuo de duas

    plantas: a primeira na escala de 1 :5.000, cobrindo rea de cerca de 12.000

    hectares (120 km

    2

    ), relativa parte central, urbana e suburbana de So

    Paulo; a segunda, na escala de 1 :20.000 abrangendo todo o municpio.

    Como alternativa prope-se, como de maior urgncia, a produo de uma

    planta de urbanismo em escala grande, compreendendo a cidade e

    o subrbio prximo (CMSP, Anais 1928, p.219).

    A primeira verso da lei para o edital, apresentada no parecer, prev apenas a

    produo de um levantamento na escala 1 :2.000, cobrindo rea aproximada

    de 12 a 15 mil hectares (120 a 150 km

    2

    ). Assumiria a contratada o compro-

    misso da realizao de outros levantamentos em escalas a definir, nas

    mesmas condies de tcnica e preo

    66

    .

    Prev-se ainda que as pranchas do levantamento seriam entregues na

    forma de fotocartas, com 10 exemplares cada, alm do mapa-ndice

    67

    .

    A tiragem impressa da transcrio cartogrfica corresponderia a 150

    exemplares por prancha, alm de um verso para decalque permitindo

    assim a obteno de cpias de trabalho por transparncia.46

  • Toda a memria de trabalho seria entregue municipalidade, como

    estabelece o artigo 18 da proposta de lei. Incluem-se a negativos,

    provas, fotocartas, folhas e cadernetas de campo, devidamente

    numerados, catalogados e acondicionados, passando a ser exclusiva

    propriedade municipal, no sendo permitido contratante fornecer a

    terceiro qualquer original ou cpia (CMSP, Anais 1928, p.222).

    Aspecto chave, o custo da proposta ganha relevncia, sem porm ser

    analisado de forma explcita. Revela, porm, na perspectiva deste ensaio,

    aspecto surpreendente. A comisso exige que a proponente respeite

    os preos por hectare sensivelmente mais mdicos apresentados por

    ela na concorrncia pblica para o levantamento do Distrito Federal.

    Ainda assim orienta que o edital no retire a qualquer outra entidade,

    nacional ou estrangeira a possibilidade de concorrer com melhor oferta

    mantidas as garantias de idoneidade tcnica e financeira.

    Ao final da sesso, o vereador Goffredo Telles pede adiamento da

    discusso por oito dias. Aproveitaremos aqui essa pausa para recuperar

    as aes desenvolvidas pelo governo do Distrito Federal para realizar

    o levantamento cartogrfico do seu territrio com o emprego da aero-

    fotogrametria. nesse contexto, novo na historiografia sobre o Mapa

    Topogrfico do Municpio de So Paulo, que ser possvel conhecer

    o horizonte da produo cartogrfica naquele momento histrico no

    quadro de usos e fins propostos.

    O Rio de Janeiro: a gesto Antonio da Silva Prado Junior

    Prefeito nomeado, Antonio da Silva Prado Junior (1 880-1955) assume

    a administrao do Distrito Federal em novembro de 1926, com o incio

    do mandato presidencial de Washington Lus (1 869-1957).

    Engenheiro, de tradicional famlia paulista ligada agricultura cafeeira,

    com grande presena na poltica, filho do conselheiro Antonio Prado

    47

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    (1 840-1929), que fora o primeiro prefeito da capital paulista, Antonio

    Prado Junior exerce seu mandato na administrao do Distrito Federal

    at outubro de 1930, quando irrompe a Revoluo de 1930.

    Reveste-se, com grande expectativa, sua primeira mensagem ao

    Conselho Municipal em primeiro de junho de 1927

    68

    . O quadro apresen-

    tado nesse discurso ao mesmo tempo um balano da situao

    encontrada e um conjunto de aes para sua gesto. Destas aes,

    o primeiro segmento traz um extensa relao de obras virias na cidade,

    mas so dois itens finais do bloco II Obras e Viao, que tm

    relevncia aqui.

    O primeiro Urbanismo diz respeito ao convite feito ao urbanista

    francs Alfred Agache (1875-1959) para realizar algumas conferncias

    afim de desenvolver o interesse pblico pelos problemas de urbanismo,

    criando assim, uma atmosfera favorvel execuo de melhoramentos

    na cidade. (. . .). Entre as conferncias programadas, embora no men-

    cionada na transcrio nos jornais, incluia-se aquela intitulada A fotografia

    area e as plantas da cidade (PAMPLONA, 2014, p.30).

    O Sr. Alfred Agache, arquiteto laureado, secretrio geral da

    Sociedade Francesa dos Urbanistas, e autor consagrado de vrias

    obras sobre a construo e reconstruo de cidades, aldeias e

    cidades-jardins, possui, pelos seus trabalhos executados com xito,

    a autoridade cientfica para nos explicar, no s como o problema de

    urbanismo se apresenta aos tcnicos, mas, tambm, para indicar

    o modo mais prtico de atacar esse problema, passando depois ao

    estudo do plano regulador e, enfim, como dever funcionar,

    no futuro, a direo desse mesmo plano.

    As conferncias do Sr. Agache sero feitas: - umas para o pblico;

    outras para os tcnicos, arquitetos, engenheiros, etc. ; e mais outras para

    as autoridades municipais e funcionrios da diretoria de obras e viao.

    (O Paiz, RJ, 3 de junho de 1927, p.1 )

    48

  • O ltimo item do bloco introduz por fim a proposta daquela que ser

    a primeira cobertura topogrfica de grandes centros urbanos brasi-

    leiros por meio da aerofotogrametria. Ainda em sua fase inicial,

    a transcrio integral do tpico permite identificar os produtos

    programados e agentes envolvidos. A sua gnese, em ao paralela ao

    convite a Agache, e o contexto do discurso do Prefeito indicam

    minimamente a ambio das obras propostas e o investimento em

    instrumentos de apoio.

    Carta Cadastral

    69

    Levantamento estereofotogramtrico

    No sentido de organizar, de modo rpido e exato, a planta

    topogrfica do Distrito Federal com os precisos detalhes,

    compreendendo o assinalamento e a localizao dos prprios

    municipais, entrei em conversao preliminar com o Sr. capito

    Ronald Mac Nell (sic) a respeito do respectivo levantamento pelo

    mtodo estereofotogramtrico com o auxlio de avies.

    O capito Mac Nell prope-se a fornecer, dentro de menos de um

    ano, seis grupos de plantas fotogrficas da rea urbana e

    suburbana do Distrito Federal, de mais ou menos 300 quilmetros

    quadrados nas escalas de 1:2. 000 e de 1:5. 000, bem como uma

    planta fotogrfica de toda a rea do Distrito Federal na escala de

    1:50. 000.

    Excusado me parece encarecer a necessidade e importncia desse

    servio e, em tempo oportuno, uma vez examinada a proposta do Sr.

    Mac. Nell tratarei do assunto em mensagem especial.

    Sobre o capito Mac Nell Ronald Frank Rous McNeill

    70

    , nova

    referncias surgem mais a frente. A presena britnica na aviao ,

    coincidentemente, foco de artigo na imprensa local. O peridico carioca

    Wileman's Brazilian Review, em sua edio de 9 de junho, comenta

    o progresso britnico no setor

    71

    . Entre as reas do setor com crescente

    interesse comercial destacaram-se em 1926 as voltadas para levantamentos

    areos (air survey).

    49

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    O articulista cita expressamente o envio previsto para dezembro de 1927

    de equipe da Aircraft Operating Company (AOC) ao norte da Rodsia,

    ex-colnia britnica hoje dividida entre Zimbawe e Zmbia, para

    registrar 20.000 milhas quadradas quase 52 mil km

    2

    , o equivalente

    rea do estado do Rio Grande do Norte para a Minerals Separation

    Company, bem como preparar mapas de reas selecionadas na regio de

    ocorrncia de jazidas de cobre, em suas 52 mil milhas quadradas.

    O artigo menciona ainda as atividades da Aerofilms Company,

    subsidiria da AOC, com trabalhos de cobertura fotgrafica finalizados

    em 1927 na Inglaterra e futuros contratos na Malsia.

    Com alguma presteza o Prefeito Antonio Prado Junior envia a mensagem

    n 618 ao Conselho Municipal em 31 de agosto de 1927. O texto breve:

    solicita crdito especial at o valor de dois mil contos (2.000:000$000).

    Como justificativa sumria consta a meno comisso organizada em

    1893 pelo Prefeito Cndido Barato Ribeiro (1 843-1910), primeiro a

    ocupar o cargo no Distrito Federal, entre 1892 e 1893. Por sete anos, at

    sua extino, a comisso designada organizou as plantas oras

    existentes

    72

    . Fica expressa na mensagem a adoo na presente proposta

    dos mtodos fototopogrficos pela agilidade e custos reduzidos frente

    aos tradicionais, argumentos que veremos adiante.

    O debate parlamentar foi severo como indicam as notas esparsas na

    imprensa carioca at j aneiro do ano seguinte. No s pelos gastos

    no levantamento ou na contratao de Alfred Agache, mas

    certamente pelo conjunto de obras urbanas propostas. O contexto

    poltico imediato, num primeiro ano de mandato, indica problemas

    a curto prazo.

    Apenas nos primeiros dias de 1928, o oramento municipal aprovado.

    No dia 5 de janeiro, o decreto legislativo n 3.268 autoriza o crdito

    solicitado pelo Prefeito

    73

    . Com agilidade, o edital assinado no dia 9,

    sendo publicado em seguida

    74

    .

    50

  • Com data-limite para apresentao das propostas at 1 5 de fevereiro,

    o edital estabelece os termos para produo do levantamento topo-

    grfico da cidade pela combinao dos mtodos foto-areo e terrestre,

    bem como a reviso da rede de nivelamento. Nota na imprensa

    descreve os principais objetos do edital: Dentre outros servios

    contam-se: a planta topogrfica da cidade, na escala de 1 :1 .000, em

    folhas uniformes da parte central da cidade, e outra de 1 :2.000 para

    a zona suburbana e rural; planta geral e completa na escala de 1 por

    20.000 e, finalmente, a reviso da rede de nivelamento com referncias

    de nivel e demais detalhes"

    75

    .

    Cinco propostas so apresentadas

    76

    , sendo outras duas recusadas, no

    caso a da Compagnie Arienne Franaise, em desacordo com edital, e

    da Companhia Aeronutica Brasileira, que exibiu comprovante de

    depsito de cauo, mas no conseguiu elaborar a tempo sua

    proposta

    77

    .

    Surpreende o nmero de empresas considerando a brevidade do prazo.

    Estavam aptas duas empresas alems: Photogrametric Geselschaft

    M.H.R, de Munique, representada pela Companhia Constructora

    Nacional, e a Junkers Flugzeugwerk A. G, de Dessau, mediada por

    Othmar Gamilischeg (sic). E, por fim, a empresa britnica The Aircraft

    Operating Co. Ltda, de Londres, por Ronald Frank Rous Mac-Neill,

    representante mencionado no ano anterior na mensagem do Prefeito

    como seu contato inicial sobre o servio.

    A notcia chega a So Paulo, sem muito alarde aparente, em registro na

    imprensa do dia 17 de maro, que transcreve telegrama recebido de

    Londres: Anuncia-se que uma firma de avies de Londres, conseguiu o

    contrato para o levantamento de um plano areo, bem minucioso, da

    cidade do Rio de Janeiro e arredores

    78

    . Dias depois, em 28 de maro de

    1928, ambas as partes The Aircraft Operating Co. e o governo do

    Distrito Federal assinavam contrato

    79

    . 51

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

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    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    Oportuno lembrar que a Junkers Flugzeugwerk apresentara

    Prefeitura de So Paulo em 1 de maro de 1 928, proposta de servio

    assemelhado. Seria certamente oportuno empresa a realizao

    concomitante dos servios, considerando a presena de equipe tcnica

    estrangeira, economia de escala etc.

    novamente a mensagem anual do Prefeito na instalao do Conselho

    Municipal, em 1 de junho de 1928, que permitir conhecer um pouco

    mais sobre a deciso final. Atendendo lei orgnica do Distrito Federal,

    Antonio Prado Junior faz o balano da administrao no ano anterior;

    comenta as obras de melhoramentos nas reas do Castelo e no

    Calabouo, regio de expanso do centro urbano, e avana:

    A concorrncia pblica para o levantamento aereofototopogrfico

    da cidade provocou, tambm, severas apreciaes.

    Das cinco propostas apresentadas, a da The Aircraft Operating

    Company Limited, de Londres, foi a nica que pediu preos

    unitrios, em obedincia s disposies do edital de concorrncia e

    que melhor garantia ofereceu para a execuo do servio.

    Acresce que essa empresa foi, tambem, a nica que enviou um

    representante, tcnico idneo, para examinar e estudar 'in loco'

    as condies topogrficas das superfcies a levantar.

    Partidrio das concorrncias pblicas, levo, entretanto, muito em linha

    de conta a idoneidade do concorrente. No poucas vezes deixo mais me

    influenciar por ela do que propriamente pelas diferenas de preos.

    Assim que no vacilei em contratar servio de tamanha

    importncia com a empresa que mais slidas garantias morais

    oferecia

    80

    .

    A mensagem, transcrita pela imprensa local

    81

    , avana detalhando no

    apenas a concorrncia em questo, polmica desde sua apresentao no

    ano anterior, como relaciona os trabalhos encomendados a Alfred Agache.

    52

  • Esse trecho permite compreender a oportuna ao sincronizada das duas

    propostas, embora no necessariamente interligadas

    82

    . , porm, o trecho

    que relata as contestaes ao levantamento topogrfico o mais relevante

    83

    .

    Primeiro aspecto significativo da mensagem reafirmar o uso corrente

    at ento dos levantamentos cadastrais que datavam da gesto municipal

    de Cndido Barata Ribeiro (1 892-1893).

    Segundo dado, de maior interesse, permitir identificar o emprego da

    cartografia resultante dos esforos do Servio Geogrfico em 1921 . E,

    a partir disso, a ocorrncia da crtica comum aos editais realizados

    pelas governos das cidades do Rio e So Paulo em 1928: a eventual

    contratao do Servio Geogrfico Militar para execuo dos

    levantamentos a custos menores.

    (. . .) a acusao principal consistiu em afirmar a existncia de uma

    excelente carta cadastral do Distrito, carta utilizada at pela prpria

    Prefeitura por ocasio do ltimo recenseamento escolar.

    Trata-se, evidentemente, do mapa do Distrito Federal, organizado

    pelo Servio Geogrfico Militar, em escala de 1:10. 000, ampliao

    do original na escala de 1:40. 000, no qual figuram arruamentos

    incompletos e sem denominao, com largura exagerada, em

    relao escala. Esse mapa, a que se chamou pomposamente de

    CARTA CADASTRAL, organizado por diversos processos, inclusive

    o estereofotogramtrico, baseado, justamente, na carta cadastral

    da Prefeitura. No se podia, outrossim, aproveitar o trabalho na

    escala de 1:40. 000, reduzido para a de 1:50. 000, e ampliado para

    1:20. 000 e 1:10. 000, com a representao dos arruamentos.

    ()

    Insinou-se, tambm, que se poderia ser contratado o trabalho em

    questo com o Servio Geogrfico Militar, ignorando-se que, alm

    de outras razes, as funes desse instituto dificilmente

    53

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

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    S.A.R.A. Brasil : restituindo o Mapa Topogrfico do Municpio de So Paulo

    permitiriam o arranjo de uma frmula para tal contrato, sem falar

    na posio em que ele ficaria, sujeitando-se a uma fiscalizao

    tcnica por parte da Prefeitura.

    A mensagem do Prefeito, em contraste com as notas da Prefeitura

    mencionadas anteriormente, permite obter um quadro mais

    completo sobre as propostas. Aspecto relevante, no mencionado no

    momento, diz respeito autorizao dada ao Prefeito para

    a realizao do edital, conforme sua mensagem apresentada em 31

    de agosto de 1 927, que estabece um limite de despesas de 2 mil

    contos. Assim ao comparar os valores, fica evidente que todas

    as propostas parecem extrapolar esse patamar, alm de no obede-

    cerem aos parmetros que exigem preos unitrios. Na sua lacnica

    resposta eventual manipulao da concorrncia o Prefeito acaba

    deixando em aberto espao para futuros embates

    84

    .

    Em resumo, os valores dos oramentos apresentados chegam a superar

    2.900:000$000. o caso da proposta da francesa Compagnie Arienne

    Franaise, que foi desconsiderada por no obedecer aos parmetros do

    edital. Um pouco menos 2.800:000$000 foi o valor solicitado pela

    Enterprises Photo-Ariennes, tambm desconsiderada por ter sido

    a proposta apresentada fora do prazo. Apenas a Junkers teria oferecido

    proposta na faixa de 1 .900:000$000, mas a empresa desistiria do projeto

    durante a fase de anlise das propostas.

    Antonio Prado, infelizmente, esquece em sua mensagem, momento

    to importante para avaliao de sua gesto perante o conselho

    municipal, de apresentar dados sobre os demais concorrentes:

    Photogrammtrie G. M. B. H. e The Aircraft Operating Company

    Limited. Surge a AOC como nica candidata a respeitar a exigncia

    de preos unitrios e com salvaguardas tcnicas e morais. Esse fato

    cobrar seu preo mais adiante.

    54

  • Mos obra: no ar e nos jornais

    A empresa vencedora demonstrar agilidade, seguindo os passos legais e

    tcnicos. O contexto poltico imediato, com contestaes aos projetos e

    concorrncia em questo, e por fim a Revoluo de 1930 criaro a seu

    modo um surpreendente emaranhado de registros na imprensa, permitindo

    hoje um acompanhamento dos servios.

    Em contraste com o levantamento realizado em So Paulo pela empresa

    S.A.R.A. Brasil, possvel recuperar no caso do Distrito Federal relatos extensos

    que indicam a magnitude de recursos tcnicos e humanos envolvidos bem como

    as etapas usuais de desenvolvimento do levantamento desde a preparao da

    rede de nivelamento e tomadas de imagem impresso das cartas.

    Em 13 de maro de 1928, a empresa The Aircraft Operating Company,

    Limited autorizada a operar no Brasil pelo decreto federal 18.156, assinado

    pelo Presidente Washington Lus

    85

    . Trs meses depois, em junho, comeam

    a chegar ao Rio os primeiros membros da equipe e equipamentos.

    No dia 21 de junho desembarca o capito do corpo de aviao do exrcito

    ingls Sidney Henry Holland

    86

    . Acompanha sua chegada o transporte

    pelo mesmo navio Arandora de duas aeronaves Vendace (Vickers),

    equipadas com motores de 350 HP construdos especialmente para a

    misso. Ambos os avies permitem pouso em terra ou mar, sendo um

    deles utilizado como avio reserva. Holland chefiaria a seo de aviao.

    Com cronograma de 3 anos de trabalho, a misso seria coordenada pelo

    o coronel T. T. Behrens, chefe da empreitada, membro do corpo de

    engenharia do exrcito ingls, tendo como subchefe o tenente da armada

    britnica Ernest J. Mc. Atthy. Ambos tinham desembarque previsto para

    o dia 7 de julho. Junto viria o aviador, C. A. Elliot, tenente perito em

    aerofotogrametria, que morara por alguns anos no Rio de Janeiro.

    Completavam a misso mais 12 membros, basicamente agrimensores

    87.

    55

    Prembulo necessrio: Rio de Janeiro

  • Separata do Informativo AHSP n 37: dez.201 4

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    56

    A imprensa carioca reproduz imagens distribudas no

    evento para seus profissionais em novembro de 1928.

    A fotografia area vertical da regio do Morro do

    Castelo, parcialmente removido, exibe ao alto, subindo

    em diagonal, a Avenida Rio Branco, que se prolonga da

    direita a partir do Palacete Monroe. esquerda,

    destacam-se os pavilhes do mercado.

    Gazeta de Notcias, 11 de novembro de 1928, p.3 .

    Acervo Biblioteca Nacional

  • Com o escritrio instalado Rua Silveira Martins, no Catete, a empresa abre

    as instalaes para a imprensa em 10 de novembro, com a presena do

    embaixador da Inglaterra Sir Belby Alston e membros do corpo consular.

    Mac Neill recebe a todos como representante da empresa no Brasil,

    acompanhado do diretor, major Harold Hemming, e o gerente, Coronel

    Behrens. Aos presentes so apresentados exemplos de trabalhos em

    realizao, de carter didtico, numa ao para imprensa que parece indicar

    uma noo precisa de marketing

    88

    .

    Essa noo parece clara se atentarmos a participaes em eventos. Dois dias

    depois, na solenidade comemorativa do dcimo aniversrio do Armistcio,

    realizada no campo do Botafogo Football Club, um dos avies da empresa

    joga ramalhetes de flores naturais sobre a multido. O vento, infelizmente,

    levou as flores para fora do campo, sendo apanhadas pela meninada

    89

    .

    na imprensa paulistana que surge de forma mais detalhada o levan-

    tamento aero-photo-topographico em curso. Longa srie de artigos

    publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, entre novembro e dezembro

    de 1928, faz um balano da administrao Antonio Prado Junior. Um

    deles, no dia 16 de novembro, cobre especificamente o tema. Ilustrado

    com imagem area da Cinelndia, comenta o processo aerofotogramtico

    e as etapas: cobertura de voos, operaes de triangulao, montagem dos

    mosaicos.. . um verdadeiro jogo de pacincia chins. Segundo

    o engenheiro-chefe a primeira vez que no mundo se realiza um

    levantamento () desta magnitude

    90

    .

    A boa relao com a imprensa certamente conveniente empresa como

    tambm s autoridades do Distrito Federal. Um ano depois, em 18 de maio

    de 1929, a visita do prprio Presidente da Repblica Washington Lus e do

    Prefeito Antonio Prado Junior tem por funo verificar o andamento dos

    trabalhos. Acompanham a comitiva, que chega s 9 horas