salomão rovedo "en passant"

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Histórias e estórias de xadrez. Memórias de um jogador de xadrez. Xadrez nos anos 1970. Xadrez no Rio de Janeiro. Interzonal 1979 e outras histórias...

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  • [1]

    Salomo Rovedo

    en passant

    Estrias e

    histrias de xadrez

    Rio de janeiro

    2015

  • [2]

    Salomo Rovedo

    en passant

    Estrias e

    histrias de xadrez

    Rio de janeiro

    2015

  • [3]

    ndice

    Tempo de atirar pedras, pg. 4 * Xadrez, Ricardo Reis

    Comeando no CXG, pg. 7

    Vivendo o jogo, pg. 20

    Flix Sonnenfeld, pg. 25

    Waldemar Costa: Xadrez como religio, pg. 35

    Jos Soares Msculo, pg. 42 * Msculo - Yosupov

    O excntrico Jorge Lemos, pg. 58

    Alm do Reino de Caissa, pg. 70

    O Mestre Alexandru Segal, pg. 72

    O fabuloso N. N., pg. 77

    O Campeo Olcio Gadia, pg. 79

    Torneio Aberto de Nova Friburgo 1980, pg. 85

    Srgio Farias: Mr. Interzonal, pg. 88

    Reflexes en passant, pg. 98

    Um certo Herman Claudius, pg. 101

    El cordobs Lus Bronstein, pg. 104

    Mecking, Mecking, Mecking, pg. 109 * Mequinho - Poluga

    * Belln & Mecking

    * Quase eplogo

    * Dossi Mecking

    As dvidas do esquecimento, pg. 142

    Revistas & Boletins, pg. 148 * Eu e a Revista Jaque

    * Revista Ajedrez 6000

    * Revista Caissa

    * Idel Becker e a revista Caissa

    * Boletins do CXG

  • [4]

    Tempo de atirar pedras

    2015 no CXG

    No considero a nossa memria um elemento que retm por acaso apenas uma coisa e que

    por acaso perde outras, mas sim uma fora que conscientemente ordena e sabiamente exclui.

    Tudo o que se esquece de nossa prpria vida, j estava condenado a ser esquecido. Stefan Zweig

    Pretendo desfibrar a memria do tempo em que andei metido a jogar xadrez.

    Nos anos 1960/1980 eu estudava e trabalhava e, como todo brasileiro, estive envolvido

    em atividades polticas com o objetivo de salvar o Brasil. O foco da minha guerrilha

    potica era a descorrupo da poltica, combate ao empresrio desonesto, reduo dos

    partidos, reforma agrria, etc. Rezava a cartilha do nacionalismo: contra coca cola e

    hamburg, a favor do bife com fritas e outros embates quixotescos.

    Como Pierre Proudhon, considero a propriedade um roubo. Assim, tambm o

    direito autoral, a posse, a patente e outras posses. Tudo que for inventado, criado,

    descoberto pelo homem pertence humanidade e grtis. A vi que todo empresrio

    gatuno, os produtos so desonestos, o objetivo do poltico $$ e poder, brasileiros se

    matando toa, a democracia made in USA dava golpe a torto e a direito, a sociedade

    feudal racista como nos tempos dantanho.

    S no perdi a f: afinal, fui criado na Ilha Rebelde. Buscava a Iluminao,

    esperava o Nirvana. Estava nesse rito quando a PM estourou o colgio, o restaurante

    popular, a UME, o Calabouo, na Av. Beira Mar, bem perto do CXG. E pior: tudo foi

    abaixo para erguer o pavilho da Assembleia do FMI meu inimigo n 1. A foi demais! Mexeu com meus brios paraibanos e maranhenses! Em represlia aceitei o

    emprego de office-boy que meu tio tinha oferecido e fui jogar xadrez.

    Apesar de s ter conseguido recuperar cerca de 70% do que produzi e de falhar a memria eu resolvi juntar este magote de lembranas dos tempos de xadrez... o jogo que me salvou de cair naquele outro xadrez... da maricota, do pau-de-arara, da tortura.

    Rio de Janeiro, Cachambi, 2013/2015

  • [5]

    Xadrez

    Ricardo Reis

    Ouvi contar que outrora, quando a Prsia tinha no sei qual guerra, quando a invaso

    ardia na cidade e as mulheres gritavam, dois jogadores de xadrez jogavam o seu jogo

    contnuo.

    sombra de ampla rvore fitavam o tabuleiro antigo, e, ao lado de cada um, esperando

    os seus momentos mais folgados, quando havia movido a pea e agora esperava o

    adversrio, um pcaro com vinho refrescava sobriamente a sua sede.

    Ardiam casas, saqueadas eram as arcas e as paredes, violadas, as mulheres eram postas

    contra os muros cados, traspassadas de lanas, as crianas eram sangue nas ruas... mas

    onde estavam, perto da cidade, e longe do seu rudo, os jogadores de xadrez jogavam o

    jogo do xadrez.

    Inda que nas mensagens do ermo vento lhes viessem os gritos, e, ao refletir, soubessem

    desde a alma que por certo as mulheres e as tenras filhas violadas eram nessa distncia

    prxima, inda que, no momento que o pensavam, uma sombra ligeira lhes passasse na

    fronte alheada e vaga, breve seus olhos calmos volviam sua atenta confiana ao

    tabuleiro velho.

    Quando o rei de marfim est em perigo, que importa a carne e o osso das irms e das

    mes e das crianas?

    Quando a torre no cobre a retirada da rainha branca, o saque pouco importa.

    E quando a mo confiada leva o xeque ao rei do adversrio, pouco pesa na alma que l

    longe estejam morrendo filhos.

    Mesmo que, de repente, sobre o muro surja a sanhuda face dum guerreiro invasor, e

    breve deva em sangue ali cair o jogador solene de xadrez, o momento antes desse (

    ainda dado ao clculo dum lance para o efeito horas depois) ainda entregue ao jogo

    predileto dos grandes indiferentes.

    Desmoronem cidades, sofram povos, cesse a liberdade e a vida, os haveres tranquilos e

    avisos ardem e que se arranquem, mas quando a guerra os jogos interrompa, esteja o rei

    sem xeque, e o peo de marfim mais avanado pronto a tomar a torre.

    Meus irmos em amarmos Epicuro e o entendermos mais de acordo com ns prprios

    que com ele, aprendamos na histria dos calmos jogadores de xadrez como passar a

    vida.

    Tudo o que srio pouco nos importe, o grave pouco pese, o natural impulso dos

    instintos que ceda ao intil gozo (sob a sombra tranquila do arvoredo) de jogar um bom

    jogo.

  • [6]

    O que levamos desta vida intil tanto vale se a glria, a fama, o amor, a cincia, a

    vida, como se fosse apenas a memria de um jogo bem jogado e uma partida ganha a

    um jogador melhor.

    A glria pesa como um fardo rico, a fama como a febre, o amor cansa, porque a srio

    e busca, a cincia nunca encontra, e a vida passa e di porque o conhece...

    O jogo do xadrez prende a alma toda, mas, perdido, pouco pesa, pois no nada.

    Ah! Sob as sombras que sem querer nos amam, com uma moringa de vinho ao lado e

    atentos s intil faina do jogo do xadrez, mesmo que o jogo seja apenas sonho e no

    haja parceiro, imitemos os persas desta histria, e, enquanto l por fora, ou perto ou

    longe, a guerra e a ptria e a vida chamam por ns, deixemos que em vo nos chamem,

    cada um de ns sob as sombras amigas sonhando, ele os parceiros, e o xadrez a sua

    indiferena.

    O xadrez uma pedra de toque para a inteligncia. (Goethe)

    Certo Prncipe, que jogava ao estilo Philidor, pegou o Rei e disse: Pobre Rei! Qual teu poder? Foges quando eu avano, tuas derrotas se sucedem uma atrs da outra. Eu,

    ao contrrio, tenho exrcitos que levam meu estandarte por todo o mundo. Isto

    reinar! Eu fao a paz, fao a guerra. Ento, prodgio! o Rei de marfim fala: Prncipe, minhas proezas pesam pouco; minha vida no inspira ambies; mas no

    fao nenhum mal e quando me vencem a minha derrota no far verter uma gota de

    sangue sequer! (Ain Pluchonneau)

    Um clube de xadrez o mais oposto a uma igreja qualquer, a um centro de comunho

    espiritual. O xadrez pode chegar a ser um dos meios de se enlaar as pessoas sem

    comprometer, nessa integrao, as suas almas. (Miguel de Unamuno)

    Se os graus de destreza no jogar correspondessem aos do entendimento, os grandes

    jogadores de Xadrez seriam os maiores gnios do mundo. (Jernimo Feijoo)

    um jogo gentil e agudo, e um bom passatempo, embora nele encontre uma falha:

    que pode ser prejudicial saber jog-lo bem, porque para isso teria que gastar muito

    tempo e dedicar tanto estudo como a qualquer outra cincia e ao final de tudo no alcanaria mais do que ser excelente num jogo. (Castiglione)

    Os xadrezistas conseguem com o dilogo de movimentos, a muda comunicao de

    inteligncia necessria ao exerccio da sabedoria e do posicionamento. (Fernndez-

    Braso)

    mais que um jogo. uma diverso intelectual que tem algo de arte e muito de

    cincia. Ademais, um meio de aproximao social e intelectual. Por isso, o xadrez

    deveria fazer parte do programa escolar de todos os pases. O xadrez no domnio

    intelectual o que o esporte na esfera fsica: um meio agradvel de exercitar a parte do

    corpo que se deseja desenvolver. Ademais, o xadrez serve, como poucas coisas neste

    mundo, para distrair e esquecer as preocupaes da vida diria. (Capablanca)

    Compilado de: Jlio Ganzo - Histria General del Ajedrez - Ed. Ricardo Aguilera, Madri, 1966.

  • [7]

    Comeando no CXG

    Mas tudo comeou mesmo foi no perodo em que entrei pela

    primeira vez no Clube de Xadrez Guanabara, cuja sede na Av. Churchill,

    meu caminho cotidiano. O clube estava em ebulio: seu Presidente, o Gen.

    Piancho de Carvalho tinha falecido e havia que arrumar o clube para

    entrar em nova era, sem o esteio que era Piancho de Carvalho. Descobri o

    endereo nas Pginas Amarelas e logo procurei me associar ao clube, sendo

    recebido pelo Pedro, funcionrio antigo que se tornava amigo de todos

    quantos entrassem ali.

    O smbolo que encabea este captulo deveria simbolizar C X C, ou

    seja, na notao antiga dos lances, Cavalo toma Cavalo. Por qu? Segundo

    Flix Sonnenfeld me contou, na verdade o clube nasceu em 1956 com o

    nome Clube de Xadrez Carioca. Na hora de oficializar o registro nos

    cartrios e entidades que representavam o esporte, se descobriu que j

    existia um clube com o mesmo nome. Algum conhece o Clube de Xadrez

    Carioca? Pois ele existe sim, s que nada tem de xadrez. Trata-se do clube

    onde funciona a casa de espetculos conhecida como Sambola, Av. Dom

    Hlder Cmara (antiga Av. Suburbana) no Bairro da Abolio. [Depois

    viria a conhecer o Clube de Xadrez de Nova Friburgo, onde o xadrez a

    nica atividade que no existe],

    Naquela poca o Sambola era de propriedade do empresrio e

    tambm bicheiro Jos Caruzzo Escafura, mais conhecido como Piruinha.

    Os fundadores do o CXG tentaram a liberao do nome, mas foi tudo em

    vo. O Sambola, que em princpio dava espetculos de samba,

    transformou-se em salo para bailes funk, dos mais famosos dos subrbios

    cariocas. Alis, o nome se sofisticou e hoje chamado Sambola Hall.

  • [8]

    Portanto, em no podendo ser Clube de Xadrez Carioca, alterou-se para

    Clube de Xadrez Guanabara, nome do Estado que substituiu a Capital

    Federal. Assim tambm o smbolo sofreu alteraes e ficou C X G, com os

    Cavalos se cruzando, mas primeira vista sem nenhum sentido.

    Como ia dizendo, o Pedro recebia os scios, mas tambm servia de

    sparring para os novatos. Certo dia, vendo que eu em vez de jogar, preferia

    ficar circulando entre as mesas, assistindo s partidas geralmente aquele

    ping violento de cinco minutos ele se sentou ao tabuleiro e me convidou

    para jogar.

    Assim, fui perdendo a inibio e entrei para disputar um ping (quem

    perdia levantava e cedia a vez), mas fui impiedosamente massacrado por

    Henry Levinsphul, fortssimo jogador, contra quem ousei jogar a Abertura

    Larsen! Depois tentei vrias vezes participar do ping, mas voltei a ser de

    novo trucidado, o que me fez abandonar aquela loucura e optar por disputar

    torneios de partidas pensadas. A renncia s disputas de ping foi a primeira

    atitude que tomei em respeito aos princpios que assinalei em linhas gerais

    sobre o que queria do xadrez.

    Com exceo dos torneios de ping realizados aos sbados (chamados

    Rock) que so organizados e distribuem prmios simblicos essa

    prtica sempre causou discusses, atritos, chegando agresso fsica. E

    pior: algumas vezes o chamado mal sbito, que poderia ser infarto, um leve

    AVC, presso alta ou outra doena, que tais extremos de ira e irritao

    incrementam, deixava o jogador prostrado, carecendo de imediato

    atendimento mdico ou mesmo internao para tratamento.

    Essas ocorrncias eram agravadas quando a partida inclua apostas a

    dinheiro. Essa prtica era assim tipo secreta, visto que o regulamento do

    CXG proibia qualquer atividade a dinheiro.

    Nos primrdios o CXG tambm tinha adeptos do jogo de Dama e

    Gamo. Ainda presenciei alguns associados que frequentavam o CXG para

    jogar Dama.

  • [9]

    Uma figura imprescindvel no CXG e para o xadrez da poca era o

    Dr. Jos Carlos de Almeida Soares. Muitas vezes encontrei Almeida Soares

    na Rua So Jos, prximo ao Frum, onde prestava servios jurdicos,

    quase sempre de graa. Andava com algumas pastas na mo e um ou dois

    livros. Era um doador compulsivo, porque todas as vezes que a gente se

    encontrava ele dava jeito de me presentear um livro. Almeida Soares tinha

    sempre uma palavra til ou filosfica sobre a vida, sobre o xadrez.

    No perdia a oportunidade de ser sarcstico nos comentrios sobre

    seus pares, inclusive no xadrez ento soltava grandes gargalhadas, em

    que sobressaam na boca alguns espaos sem dentes. Uma das coisas a que

    ele resistia era o uso da expresso enxadrista (e todas as variantes). Para

    ele a verso exata em portugus seria xadrezista. E tambm: depois da

    unificao dos Estados do Rio e Guanabara, a entidade administrativa

    deveria se chamar Federao Fluminense de Xadrez pois se tratava de

    representar todo o Estado, no somente Carioca ou Metropolitana, como

    se chamou durante algum tempo que refere apenas cidade do Rio de

    Janeiro.

    Almeida Soares, negligente na aparncia, como a maioria dos

    intelectuais de seu tempo, andava com o palet semiamarrotado, gravata

    descuidada, sempre com aspecto mal ajambrado, semblante distrado,

    absorto nos muitos labirintos em que o pensamento se extravia. Sem ter

    nenhum encontro marcado, a gente se esbarrava por ali, nas redondezas do

    Frum, ento arrumvamos tempo e lugar para sentar e conversar. Sempre

    tinha nas mos algum livro, jornal ou revista, ocasio em que muitas vezes

    fui presenteado, sem direito a recusar, com um volume sobre histria,

    poltica ou direito poucas vezes de xadrez.

    Era fcil encontr-lo pelas redondezas da Travessa da Natividade, ao

    lado da Igreja de So Jos, onde tinha o Restaurante Chamego do Papai,

    muito frequentado pelo pessoal do Frum, advogados, assistentes,

    escrives, juzes, promotores, que se acomodavam democrticos nas

    cadeiras espalhadas pelo calado. Outro ponto de encontro dessa turma

    que frequentei algum tempo pelas amizades era o Restaurante Casa

    Urich, tambm na Rua So Jos, onde servia tradicional kassler com salada

  • [10]

    de maionese, to bom quanto o do Bar Luiz ou do Bar Brasil, alm do

    chope na caldereta gelada.

    Almeida Soares, segundo me contou, prestava servios jurdicos,

    quase sempre de graa. Tambm advogava, quando necessrio, pelo CXG.

    A maioria de seus clientes eram pessoas sem recursos, que por qualquer

    motivo estava sendo esbulhado pelos mais espertos. Por isso ele andava

    com vrias pastas de processos nas mos, entre um ou dois livros. Era a

    bondade em pessoa, um doador compulsivo, porque todas as vezes que a

    gente se encontrava queria porque queria me dar algo se no tivesse nada

    mo, decerto me daria bons conselhos e belas frases morais.

    Era doador tambm de seus conhecimentos a novos causdicos que

    sempre o procuravam onde quer que estivesse. No poucas vezes fomos

    interrompidos na rua por um ou vrios de seus alunos, em busca de

    alguma informao ou conhecimento sobre a prtica jurdica.

    Morador de Copacabana, prximo Praa Serzedelo Correia, visitei

    o Almeida Soares algumas vezes, quando tive a oportunidade de conhecer

    melhor sua esposa, dona Dinah Macedo Soares, e sua nica filha. Na praa

    sempre tinha alguns aficionados jogando xadrez e Almeida Soares era

    conhecido da maioria.

    Almeida Soares estava no grupo de jogadores que fazia presena

    constante nos torneios espalhados pelo Brasil, a que me refero em outras

    pginas, junto com Alexandru Segal, Antonio Rocha, Hlder Cmara,

    Hermann Claudius e tantos outros.

    Frequentar o CXG era se candidatar a cartola. Sempre havia carncia

    de gente para administrar o clube. Afinal, o pessoal ia ali para se divertir e

    passar momentos relaxantes do estresse do trabalho ou de casa mesmo. S

    muito tarde me dei conta disso. Quando acordei Claude Fisch e Flix

    Sonnenfeld j tinham me fisgado com aquela conversa mole e fala macia

    que eles tinham.

    Fazer parte da Diretoria do CXG era um exerccio coletivo. Havia

    um revezamento nos cargos, porque no fcil dirigir um clube que est

  • [11]

    sempre deficitrio, cujas despesas so completadas por vaquinhas aqui e

    acol. A mensalidade dos scios no dava para pensar grande. Mesmo

    assim tinha aquele scio fiel, que pagava mensalidade e ainda dava

    algumas contribuies por fora... por conta de sonhar com uma sede nova,

    mais ampla.

    Comecei como ajudante voluntrio, depois fui elevado a Secretrio

    pelo Claude Fisch. Cabia-me fazer as atas das reunies, convocar

    assembleias, redigir ofcios, pregar declaraes e avisos no quadro,

    conclamar os scios a no atrasar a mensalidade, receber e responder

    correspondncia. Quando fui Diretor-Tcnico a minha responsabilidade era

    organizar o calendrio, regulamentos de torneios, botar ordem no pedao:

    fui autor de duas advertncias a scios famosos por jogar a dinheiro.

    Mas quem cuidava da parte tcnica dos torneios era o Bruce Kover,

    um diretor independente, pois tinha amplo conhecimento tcnico e cancha

    com regulamentos internacionais. Uma vez eu e ele batemos boca por

    causa de uma interferncia que fiz na rea tcnica. Por exigncia dos

    jogadores antecipei o incio das rodadas noturnas de 20:30h para 19:30h.

    As partidas duravam em mdia quatro horas, assim as rodadas sempre

    terminavam quase meia-noite. Essa hora fazia muita diferena para quem

    mora no subrbio, anda de nibus, de metr ou trem.

    O Bruce Kover tinha carro e morava no Jardim Botnico, no tinha

    condies de avaliar isso seriamente. Eu mesmo deixei de jogar torneios no

    CXG e no JTC, quando mudei para o Cachambi, porque tinha que pegar

    duas condues altas horas da noite. Nos torneios sob minha direo os

    participantes escolhiam trs membros para atuar como conselheiros. Assim

    aceitei a reivindicao e antecipei o horrio na marra. A opinio dos

    jogadores tem que ser levada em conta. Essa prtica deixou de existir

    porque todo cartola meio ditadorzinho...

    S no fui Diretor-Financeiro porque disso no entendo nada. E o

    CXG tinha um scio que raramente (ou nunca) jogava xadrez, Dr. Moacyr

    Tavares, que sempre mantinha as contas do clube numa ordem impecvel.

    Moacyr, de educao finssima, formado, superinteligente, era nosso

    Ghandi: aquele que harmonizava qualquer desordem financeira, tcnica ou

  • [12]

    terica e muito bate-boca por acaso havido nas reunies. No tinha questo

    para a qual ele no encontrasse a soluo mais harmoniosa possvel,

    sempre em defesa dos interesses do CXG.

    Em matria de jornalistas o CXG estava bem servido. Alm de

    Waldemar Costa, que sempre frequentou o clube e fazia divulgao dos

    eventos em sua coluna do Jornal dos Sports, tnhamos a presena de

    Luciano Nilo de Andrade, decano do xadrez carioca, jornalista e dirigente

    da federao do estado durante muitos anos; de vez em quando surgia do J.

    T. Mangini mestre de xadrez e colunista do Globo tambm do Maia

    Vinagre, Joo Batista Crcio, nossos representantes em Niteri.

    Luciano de Andrade tinha um dos currculos mais respeitveis do

    xadrez carioca: foi diretor do CXG e da Federao de Xadrez do Rio de

    Janeiro, da Confederao Brasileira de Xadrez e sempre compareceu para

    patrocinar eventos, participar dos torneios e jogar ping seu torneio

    favorito era o Rock aos sbados.

    Alm do mais, Luciano era excelente fotgrafo, fazendo o registro

    dos eventos promovidos com belssimas fotografias, muitas das quais eram

    presenteadas ao clube e aos participantes fotografados. Luciano Nilo de

    Andrade continua sendo merecidamente patrocinador e homenageado,

    dando nome a inmeros torneios de xadrez.

    A cabea do CXG naquela poca era sem dvida o Claude Fisch.

    Sem ele a sobrevivncia da associao seria mais difcil. Graas a seu senso

    administrativo o CXG conseguia arrecadar pelo menos o suficiente para

    pagar as contas e se manter ativo, realizando torneios durante todo o ano.

    Alm do mais o clube se mantinha ativo tambm nos vnculos com a

    FEXERJ e a CBX.

    S quem conviveu no clube quela poca pode avaliar o quanto isso

    desgastante. No foram poucos os problemas familiares a que todos ns

    estvamos sujeitos, geralmente causados por essa devoo ao xadrez. No

    bastava passar o dia todo trabalhando, mas tambm noite e aos sbados

    havia o expediente no clube. Isso suficiente motivo para mil divrcios,

    alm do risco de adquirir algumas protuberncias na testa...

  • [13]

    Por causa da minha mania de escrevinhar ressuscitamos o Boletim

    Informativo do CXG. Escrever vcio do qual jamais me livrei. Ali mesmo

    ao lado no Calabouo, onde fiz estudos secundrios, eu e colegas fundamos

    e editamos um Boletim Estudantil que saa mensalmente. Ento, no CXG

    no seria diferente. Depois viriam as colaboraes nas revistas nacionais e

    internacionais.

    Alm das colaboraes nas revistas Jaque e Ajedrez 6000, ponteei

    tambm em algumas publicaes brasileiras, como o Boletim do CXG, na

    revista do Clube de Xadrez Epistolar Brasileiro (CXEB), dirigido por

    Ubirajara Barroso, alm de colaboraes esparsas, como as que foram

    publicadas na Revista Ajedrez Postal Americano, da Confederacin

    Americana de Ajedrez Postal (CADAP), na Argentina.

    Era, na maioria, partidas comentadas e noticirio de conquistas dos

    jogadores brasileiros no xadrez postal. Depois que essa modalidade ganhou

    o suporte do computador no joguei mais torneio postal. Um exemplo do

    que era o Boletim do CXG, que nessa poca ainda era datilografado, depois

    reproduzido e impresso no sistema de estncil a lcool (azul). Como na

    reproduo a seguir.

  • [14]

    CLUBE DE XADREZ GUANABARA

    Fundado em 28 de dezembro de 1956

    Sede Prpria: Av. Churchill, 109/101 - Castelo

    Tel. +55 (21) 2240-2093

    RIO DE JANEIRO (RJ) BRASIL

    Boletim Informativo Rio de Janeiro, 30/julho/77

    Ano IV n 24 Responsvel: Presidente

    Distribuio gratuita

    ****

    XADREZ POSTAL O Brasil cada vez mais se afirma no xadrez

    postal, tanto no mbito interno como organizao, quanto no mbito

    internacional em competies. No ser, pois, otimismo exagerado

    pensar-se em supremacia Continental dentro de pouco tempo, mesmo

    levando-se em considerao a fora patente que a Argentina.

    No mbito interno temos permanente atividade durante todo o ano,

    que consta de torneios de classificao regulador da fora inicial do

    enxadrista; torneios temticos que incrementam e aprofundam os

    estudos tericos; torneios especiais para acesso Categoria Superior;

    Campeonato Brasileiro Individual que rene vrios participantes

    antecipadamente classificados.

    E a Taa Brasil competio que congrega toda a classe de

    enxadristas, sem quaisquer restries, podendo participar jogadores

  • [15]

    do Brasil e do exterior. A Taa Brasil para o xadrez epistolar o que o

    Campeonato Brasileiro para o futebol.

    Na parte internacional o xadrez postal brasileiro tambm se mostra

    ativo, participando da Copa Latino-Americana Individual e por

    Equipes, torneios temticos e Zonais, que classificam para a fase final e

    decisria do Campeonato Mundial da categoria.

    Toda essa enorme atividade coloca o Brasil na 2 fora do continente e

    vem sendo realizada com o memorvel esforo do Clube de Xadrez

    Epistolar Brasileiro CXEB, que, nascido de uma competio postal

    organizada pelo CXG [Clube de Xadrez Guanabara], presidido com

    denodo por Ubirajara de Oliveira Barroso, que tudo faz para elevar

    ainda mais o nome do xadrez brasileiro, levando o jogador epistolar a

    todos os recantos do Brasil e do mundo!

    No presente Boletim damos realce s atividades postais do xadrez

    brasileiro, com artigos e partidas comentadas por vrios especialistas

    do assunto. (Salomo Rovedo - Rio de Janeiro)

    ****

    ESTRIN CAMPEO MUNDIAL Finalmente, depois de vrias

    tentativas e uma longa espera, o sovitico da Armnia Yuri Estrin (*)

    venceu o Campeonato Mundial de Xadrez por Correspondncia. O VII

    Campeonato Mundial, patrocinado pela ICCF - International

    Correspondence Chess Federation terminou em 1975 e desta vez o

    conhecido Mestre russo no precisou explicar por que, apesar de

    favorito, ainda no vencera.

    Os campes anteriores foram Purdy (Austrlia), Schmid (no oficial),

    Ragozin (URSS), OKelly (Blgica), Zagorovsky (URSS), Berliner

    (USA) e Rittner (DDR). Estrin participou de alguns dessas finais e

    coisas incrveis aconteceram impedindo-o de vencer. Mostramos duas

    partidas do atual campeo: A primeira, um exemplo dos azares (?!)

    de Estrin: jogada contra o americano Berliner na final do V

    Campeonato, foi usada a Defesa dos 2 Cavalos, sobre a qual Estrin

  • [16]

    escreveu um livro! A segunda, do ltimo Campeonato, uma variante

    das Trocas da Ruy Lopez, onde tudo correu bem para o terico

    sovitico. (Plnio Lus Nunes Dias - So Paulo)

    ****

    Yuri Estrin-Hans Berliner

    5 Campeonato Mundial ICCF - Final (1965)

    Abertura Italiana: Defesa 2 Cavalos - Variante Ulvestad (C57)

    1. e4 e5 2.Cf3 Cc6 3.Bc4 Cf6 4.Cg5 d5 5.exd5 b5 6.Bf1 Cd4 7.c3 Cxd5

    8.Ce4 Dh4 9.Cg3 Bg4 10.f3 e4 11.cxd4 Bd6 12.Bxb5+ Rd8 13.O-O exf3

    14.Txf3 Tb8 15.Be2 Bxf3 16.Bxf3 Dxd4+ 17.Rh1 Bxg3 18.hxg3 Tb6

    19.d3 Ce3 20.Bxe3 Dxe3 21.Bg4 h5 22.Bh3 g5 23.Cd2 g4 24.Cc4 Dxg3

    25.Cxb6 gxh3 26.Df3 hxg2+ 27.Dxg2 Dxg2+ 28.Rxg2 cxb6 29.Tf1 Re7

    30.Te1+ Rd6 31.Tf1 Tc8 32.Txf7 Tc7 33.Tf2 Re5 34.a4 Rd4 35.a5 Rxd3

    36.Tf3+ Rc2 37.b4 b5 38.a6 Tc4 39.Tf7 Txb4 40.Tb7 Tg4+ 41.Rf3 b4

    42.Txa7 b3 (0-1)

    ****

    Zdenek Necesany-Yuri Estrin

    7 Campeonato Mundial ICCF - Final (1972)

    Ruy Lopez: Variante das Trocas - Gambito Alapin (C69)

    1. e4 e5 2.Cf3 Cc6 3.Bb5 a6 4.Bxc6 dxc6 5.O-O Bg4 6.h3 h5 7.Te1 Df6

    8.hxg4 hxg4 9.Cxe5 Dxe5 10.Dxg4 Cf6 11.Df3 O-O-O 12.d3 Bd6 13.Rf1

    g5 14.Cc3 g4 15.De3 Dh2 16.Bd2 Ch5 17.g3 Bxg3 18.Re2 Cf4+ 19.Rd1

    Bxf2 20.Dxf4 Dxf4 21.Bxf4 Bxe1 22.Re2 Bxc3 23.bxc3 f5 24.e5 Rd7

    25.a4 Th3 26.a5 Tf3 (0-1)

    ****

    (*) Algumas curiosidades sobre o artigo de Plnio Lus Nunes Dias, que s puderam

    ser constatadas hoje, nos tempos da internet:

    O Estrin a que Plnio Lus Nunes Dias se refere chama-se Yakov e no Yuri, ele

    nasceu em Moscou e no na Armnia. A confuso normal: o nome dele era quase

    sempre grafado Y. Estrin, o que em russo remete de imediato a Yuri (Gagrin, etc.).

    Os Campees Mundiais da ICCF, at Yakov Estrin, so:

  • [17]

    1) 1950-1953 C. J. S. Purdy Austrlia

    2) 1953-1956 Lothar Schmid Alemanha (*)

    3) 1956-1959 Viacheslav Ragozin URSS

    4) 1959-1962 Alberic OKelly de Galway Blgica

    5) 1962-1965 Vladimir Zagorovsky

    6) 1965-1968 Hans Berliner USA

    7) 1968-1971 Horst Rittner Alemanha

    8) 1971-1976 Yakov Estrin URSS

    ****

    John Purdy (1906-1979). Australiano, MI FIDE, GM e Campeo Mundial ICCF

    1950-1953, pioneiro do xadrez na Austrlia, editor, redator e colaborador de revistas

    de xadrez. Purdy sofreu um aneurisma quando jogava e suas palavras finais teriam

    sido: "Estou com a partida ganha, s preciso de mais tempo". Porm, o GM Ian

    Rogers diz que as palavras de Purdy foram: "Tenho que anotar um lance", e que ele

    "no tinha posio vencedora. O bisav, o av e o filho de Purdy tambm so

    enxadristas.

    Lothar Schmid (1928-2013). Alemo, GM e rbitro Internacional FIDE, muito

    conhecido por ter sido juiz de importantes matches pelo Campeonato Mundial,

    inclusive Fischer-Spassky, Reykjavk (1972). Por ter vencido o Torneio

    Internacional Dyckhoff-Gedenk (*), Schmid considerado Campeo ICCF 1954-

    1956. Insacivel colecionador de livros, tabuleiros, peas, arte, antiguidades tudo

    sobre xadrez Schmid tinha a maior biblioteca de xadrez particular do mundo!

    Lothar Schmid jogou pela Alemanha 11 Olimpadas de Xadrez.

    Viacheslav Ragozin (1908-1962). Da antiga URSS, GM e rbitro Internacional

    FIDE, Campeo Mundial da ICCF 1956-1959, publicou a Revista Shakhmaty. Alm

    de tudo mantinha ativa a carreira de engenheiro civil. Ragozin foi Vice-Presidente

    da FIDE de 1950 a 1961. A Defesa Ragozin no Gambito da Dama caracterizada

    pelos lances 1. d4 d5 2. c4 e6 3.Cf3 Cf6 4.Cc3 Bb4 (ou por transposio).

    Albric O'Kelly de Galway (1911-1980). Belga, GM ICCF, GM e rbitro

    Internacional FIDE, arbitrou os matches Petrossian-Spassky (1966) e Karpov-

    Korchnoi (1974). Foi o 3 Campeo Mundial de Xadrez ICCF 1959-1962 j que o

    ttulo de Lothar Schmid no oficial. A Variante O'Kelly na Defesa Siciliana

    (Najdorf), 1. e4 c5 2. Cf3 a6, ganhou o seu nome aps estudos e anlises tticas

    feitas por ele. Fazia questo de usar O'Kelly de Galway para atestar as nobres

    origens irlandesas. Ainda bem que no exigia o nome todo: Albric Joseph

    Rodolphe Marie Robert Ghislain O'Kelly de Galway!

    Vladimir Zagorovsky (1925-1994). GM da antiga URSS, que s ficou conhecido

    aps ter sido o 4 Campeo do Mundo da ICCF 1962-1965, mesmo j tendo vencido

  • [18]

    o Campeonato Absoluto de Moscou em 1952. No 5 Campeonato da ICCF ficou em

    quarto lugar, foi Vice-Campeo na 6 edio (1971), ocupou o terceiro lugar no 7

    Campeonato (1975) e novamente Vice-Campeo na edio seguinte (1980).

    Escreveu Romantic Chess Openings (The Tournament Players Collection), Harper

    Collins, 1982.

    Hans Berliner (Berlim, 1929). Alemo veterano jogador de torneios, Berliner foi o

    5 Campeo Mundial ICCF 1965-1968. Norte-americano, de origem alem, GM da

    ICCF e MI FIDE. Foi professor de Cincia da Computao na famosa Carnegie

    Mellon University (CMU), na Pensilvnia (USA). Berliner projetou e dirigiu a

    criao dos primeiros programas de xadrez para computadores.

    Horst Rittner (Breslau, hoje Wroclaw, 1930). Alemo, originrio dessa cidade que

    sofreu violncias, destruio e metamorfoses em perodos blicos, passou de mo

    em mo at ser considerada polonesa ao fim da II Guerra Mundial. Horst Rittner

    GM da ICCF e rbitro Internacional FIDE. Tornou-se conhecido aps ter vencido o

    6 Campeonato Mundial de Xadrez por Correspondncia 1968-1971. Ele tambm foi

    fundador e editor da famosa revista alem Schach.

    Yakov Estrin (1923-1987). MI FIDE e GM ICCF, terico e escritor de xadrez,

    Campeo da URSS em 1962, cinco vezes finalista do mundial, 7 Campeo Mundial

    ICCF 1971-1976. Estrin escreveu vrios livros de xadrez, entre os quais A Defesa dos Dois Cavalos, que passou para o folclore quando Hans Berliner o venceu com essa defesa. Por esse fato, a partida ficou famosa no s xadrez por correspondncia,

    mas no enxadrismo em geral.

    (*)De 1954 a 1957 foi realizado o Torneio Internacional de Xadrez Postal "Dr. Dyckhoff-Gedenk", em homenagem a esse pioneiro da modalidade. Com 1.860

    participantes de 33 naes de todos os continentes, ainda hoje o maior evento de

    xadrez postal j realizado em todos os tempos. Mais de 8.500 partidas foram

    disputadas. Tendo-se a mdia de 30 lances por jogo, o nmero total de movimentos

    superior a um quarto de milho. Isso significa que mais de meio milho de cartes

    de xadrez circulavam entre as fronteiras estaduais e intercontinentais. No s em

    termos de quantidade, o evento tambm foi especial em qualidade: participaram os

    principais mestres de xadrez por correspondncia do mundo, alm dos que no

    puderam jogar, por vrios motivos. O torneio foi vencido por Lothar Schmid (GER),

    que marcou o impressionante escore de 14 pt. em 16 jogos, frente de Alberic O

    'Kelly (BEL) 12 pt. e Julius Nielsen (DEN) 10,5 pt. Compilado de: http://kszgk.com/

    ****

    O Boletim Informativo do CXG de janeiro de 1980 publicou em primeira pgina a

    eleio da nova diretoria nos seguintes termos:

    SALOMO ROVEDO ELEITO PRESIDENTE DO CLUBE

  • [19]

    Em reunio realizada no dia 19 de janeiro p.p. o Conselho Deliberativo do CXG

    elegeu novos mandatrios para dirigir os destinos do Clube no binio 1980/81,

    conforme segue: Presidente: Salomo Rovedo; Vice-Presidente: Antonio Carlos

    Gomes Siqueira; Conselho Fiscal: Antonio Maurcio Rios Horta; Guilherme Xavier

    Wanderley Pires; Mrio Luiz de Castilho (efetivos), Ccero Francisco da Rocha,

    Mrio de Lucena Montenegro, Ermano Soares de S (suplentes). Na ocasio o

    Presidente eleito submeteu apreciao do Conselho os nomes dos membros da sua

    diretoria, que foram homologados por unanimidade: 1 Secretrio: Claude Fisch; 2

    Secretrio: William Mrio Deisley; 1 Tesoureiro: Moacyr Jos Tavares; 2

    Tesoureiro: Zairton Augusto da Cruz; Diretor Tcnico: Warner Bruce Kover;

    Auxiliar do Diretor Tcnico: Luiz Paulo Rosa. Outras decises do Conselho: 1)

    Aprovado o relatrio do Presidente para o exerccio de 1979; 2) Aprovado parecer

    do Conselho Fiscal relativo s contas do exerccio de 1979; 3) Aprovado o Plano

    Oramentrio para 1980 no valor de Cr$ 600.000,00; 4) Aprovada a constituio de

    Comisso para propor reforma dos estatutos, composta dos Srs. Salomo Rovedo,

    Pedro H. Miranda Rosa e Claude Fisch.

    Ao assumir a presidncia do CXG em 1980 procurei agrupar o maior nmero de

    pessoas interessadas no xadrez e que tivessem tempo disponvel. Administrar um

    clube pobre fogo ainda mais sabendo que ningum quer patrocinar um jogo chamado xadrez. Afinal de contas, o que xadrez?

    Tecnicamente falando, porm, existia entre os scios a paixo certa pelo CXG, coisa

    que dura at hoje. um clube de tradio, por isso mantm um grau de popularidade

    e respeito, igual ao Clube de Xadrez So Paulo: ambos so conhecidos no Brasil e

    no exterior. Volta e meia aparece um gringo turista que tem conhecimento do

    endereo CXG e vem jogar um ping. O Boletim Informativo que dava conta das

    conquistas do ano de 1980 estampava na primeira pgina os Nossos Campees.

    Resultados individuais:

    Lus Loureiro Campeo Carioca Roberto Stelling Neto Campeo Carioca Juvenil Joo Csar Rocha Campeo Carioca Infantil Resultados das equipes:

    Equipe A Campe Estadual 1 Tabuleiro - Lus Bronstein

    2 Tabuleiro - Carlos Eduardo Gouveia

    3 Tabuleiro - Herman Belm

    4 Tabuleiro - Lus Loureiro

    Reservas: Mrio Lus de Castilho, Warner Bruce Kover e Michel Bessler

    Equipe B Campe Estadual 1 Tabuleiro - ngelo Bil Ramos

    2 Tabuleiro - Evandro Franklin Quintella

    3 Tabuleiro - Hlio Schechter

    4 Tabuleiro - William Mrio Deisley

    Reservas: Hilton Rios Filho, Sergio Lus de Abreu, Roberto Stelling Neto e Joo

    Csar Rocha

  • [20]

    Vivendo o jogo

    Salomo Rovedo-Wallace Machado

    Torneio de Natal-Clube Militar (RJ)

    O xadrez tem fama de ser jogo digno, recheado de elementos nobres.

    Em si mesmo, jogar xadrez pode ser grandioso, se disputado por pessoas

    dignas. Apesar de ser um esporte notvel pelo que acrescenta a quem

    pratica, impossvel se evitar a aderncia do ambicioso, do vaidoso, do

    egosta. Praticando xadrez conheci muita gente espetacular, humana, cujo

    nvel social some em frente do tabuleiro. Sempre houve no ambiente

    enxadrstico a figura do jogador profissional, para quem o xadrez um

    vcio, um meio de apostar e ganhar dinheiro. So jogadores compulsivos

    para eles at a porrinha serve para arrancar algum dos otrios.

    O jogador de xadrez tem os mesmos defeitos dos outros: tem o

    capoeirista (gosta de passar rasteira); o camel (que usa artimanhas pra

    vender o produto); tem o punguista (distrai o adversrio pra ganhar); o

    ilusionista (que usa mgica no jogo). O elenco grande, igualzinho ao

    cardpio de outras atividades. Alm do prazer de jogar e reencontrar

    amigos, no torneio, esbarro sempre com a turma que reclama da sorte com

    sons inapropriados: tsk, tsk, tsk; que atende o celular; que perturba a

    concentrao pra anotar ou perguntar o lance; que chega atrasado, depois

    joga ping; adversrio que em inferioridade oferece empate!

    Gerolamo Cardano (1501-1576) seria hoje o que chamamos

    porralouca: mdico, matemtico, astrlogo, alquimista, viciado em jogos

    e tambm aquele para quem a tica nada significa. Autor de estudos bsicos

    sobre a Teoria das Probabilidades confessa na autobiografia De Propria

  • [21]

    Vita, que era viciado em jogos de azar, entre os quais o xadrez, que

    praticou por mais de 40 anos. Mesmo sendo catedrtico de matemtica em

    Milo, ele continuou a estudar medicina, astrologia e magia. Cardano traiu

    o seu amigo Niccolo Tartaglia ao publicar a Regra de resoluo das

    equaes de 3 grau, que lhe tinha sido confiada apenas para estudos.

    Tartaglia se tornou inimigo mortal dele: em seus escritos espalhou a fama

    de desonesto e corrupto que Gerolamo Cardano carregou por toda a vida.

    A Teoria das Probabilidades a Lei dos Jogos de Azar, estando

    aqui arrolados: jogo do bicho, roleta, pquer, jogos de dados, gamo, jogos

    de cartas, mega sena, bingo e todas as demais loterias e sorteios.

    O jogador de xadrez tem os mesmos defeitos dos outros: tem o

    capoeirista (gosta de passar rasteira); o camel (que usa artimanhas); tem o

    punguista (distrai o adversrio); o ilusionista (que usa mgica no jogo). O

    elenco grande, igualzinho a outras atividades. Alm do prazer de jogar e

    reencontrar amigos, nos torneios enfrenta-se a turma que reclama da sorte

    com sons inapropriados: tsk, tsk, tsk; que atende o celular; que perturba a

    concentrao do oponente para anotar ou perguntar o lance; que chega

    atrasado e depois joga ping para tentar recuperar o tempo; adversrio que

    em ntida inferioridade oferece empate. E por a vai um sem nmero,

    enfim, de recursos extrajogo so usados para minar a concentrao do

    outro!

    Cardano escreveu O livro dos jogos de azar, que viria a ser o

    sustentculo da Teoria das Probabilidades. No o jogo de azar aquele que

    prima pelo clculo das probabilidades e assim enriquece bancas e

    cambistas? Cardano gastou quase tudo que herdou do pai no vcio do jogo:

    jogar cartas, dados e xadrez, virou sua perdio.

    O estudo da Teoria das Probabilidades dava a ele alguma vantagem

    sobre os adversrios, mas o vcio acabou por roubar de Cardano, o tempo

    valioso, dinheiro e reputao. Em 1533 as coisas correram to mal no jogo,

    que ele penhorou as joias da mulher obras de arte e at a moblia foi pra

    pendura! Em 1570 Cardano foi preso pela Inquisio pela heresia indita de

    ter feito o horscopo astrolgico de Jesus Cristo!

  • [22]

    Ele descreveu a si mesmo:

    A natureza dotou-me de um esprito filosfico e apto para o estudo das cincias; sou engenhoso, elegante, sensual, piedoso, fiel, amigo

    da sabedoria, reflexivo, empreendedor, entusiasta, inventivo. Tudo o

    que aprendi foi por mim mesmo, ardo em desejo de ver milagres, sou

    teimoso, astuto, trabalhador, descuidado, charlato. Sinto desprezo

    pela religio, sou vingativo, triste, traioeiro, gosto de magia, dos

    encantamentos; sinto-me dedicado, sou cruel com os meus, retrado,

    antiptico, severo, zeloso: tais so as grandes contradies do meu

    carter e dos meus costumes.

    Jacques de Thou (1553-1617), que o conheceu, observou a seu

    respeito:

    Cardano teve a ousadia de querer submeter s leis quimricas dos astros o verdadeiro Senhor dos astros, elaborando o horscopo de

    nosso Salvador Jesus Cristo. (...) Enfim, morreu em Roma a 21 de

    Setembro, com 75 anos menos trs dias, tal como tinha previsto, e

    julgava-se que se tinha abstido de ingerir alimentos para que a sua

    prpria profecia acerca da sua morte no fosse falsa.

    Ainda rememorando o meu percurso no xadrez, vejo que ele comea

    nos anos 1960/1970, tempo em aprofundei meus conhecimentos, o que foi

    possvel lendo livros, reproduzindo partidas e jogando torneios de partidas

    rpidas com colegas estudantes do Calabouo, no intervalo das aulas. Logo

    me apaixonei e at hoje tento praticar o jogo.

    Posso dizer que o xadrez me salvou mentalmente muitas vezes nos

    tempos em que cheirar gs lacrimogneo e levar porrada da polcia era

    moda no Rio de Janeiro, no militarismo a gente vivia margem da loucura.

    Jogar xadrez ajudou a passar essa fase sem que fosse necessrio pegar em

    armas, adotar o extremismo ou se alistar em guerrilhas brancalenicas.

    Em compensao nada ganhei da verba milionria que a Comisso

    da Verdade dispende com artistas, polticos, jornalistas, escritores e

    familiares dos perseguidos pela Ditadura. Alm dos cargos

    governamentais com salrios altssimos... Meu sbio av sempre me dizia:

    Quem est na chuva pra se molhar.

  • [23]

    Graas ao xadrez no me suicidei, estou velho e espero morrer do

    modo mais indigno possvel apesar de qu: haver dignidade na morte?

    Se no fosse dessa maneira, penso que, ao adotar os caminhos de meus

    contemporneos, estaria roubando dinheiro pblico, enterrado annimo

    numa cova rasa, arrasando e roubando boas empresas, os lava-jatos da vida,

    embolsando meu latifndio mensalo ou no?

    Quando me meti a jogar xadrez estabeleci alguns princpios, entre os

    quais o mais rigoroso seria parar de jogar, quando o xadrez deixasse de

    trazer diverso, alegria e prazer ou seja, quando comeasse a me

    aporrinhar. No cairia infartado sobre o tabuleiro, como ocorreu a muitos

    jogadores de xadrez relmpago.

    Em vrias ocasies estive nesse limiar, mas os obstculos foram

    superados. Tambm tive por princpio no adotar o tudo pela vitria

    fanatismo que muitos colegas assumem e praticam, transformando o jogo

    em guerra. Para admitir essa prtica foi preciso aceitar as coisas como so.

    Ou seja, assimilar (mas jamais aprovar) o carter do jogador cujo objetivo,

    acima de todos, ganhar a partida a qualquer custo. Esses so predadores,

    faltos de tica, tm o DNA corrompido.

    Joguei muitas partidas em que estive em condies superiores para

    venc-la, outras em que o empate se mostrava clarssimo, pois nenhum dos

    dois conseguiria superar o outro. Porm, usando de recursos, alguns legais,

    mas todos antiticos, os adversrios lograram somar os pontos. Em outras

    partidas estive completamente ganho, mas o sofrimento (ou pseudo

    sofrimento, a malandragem) do adversrio traa o jogador e o eu-bonzinho

    acabava por oferecer empate, aceito com alvio. Nas muitas e muitas vezes

    que a guerra entre o anjo bom e o capeta mau aconteceu, no ntimo, o anjo

    bom sempre levou a melhor...

    Aceitei isso nos outros e em mim como falha humana, defeito de

    carter, no como crime premeditado, porque uma coisa que os jogadores

    no podem apagar a partida em si. No pode ser apagada da sua prpria

    conscincia! Ela existiu, est anotada na planilha, foi assistida por outros

    jogadores e seria transcrita, lida e comentada, de maneira que fica bem

  • [24]

    claro quem tem condies tcnicas para a vitria, derrota ou empate. Em

    muitas ocasies li comentrios em colunas de xadrez sobre partidas tais,

    que eu havia jogado, espantados com o resultado: Como pode empatar

    com Torre a mais? ou Empate? S se for por problema de tempo... E

    muitos outros iguais.

    Mas, como diz o jargo policial: Tudo deve ser investigado,

    nenhuma possibilidade pode ser descartada.

  • [25]

    Flix Sonnenfeld

    Flix Sonnenfeld e eu no CXG

    Flix Sonnenfeld nasceu no Rio de Janeiro em 1910 e viria a ser o

    problemista brasileiro mais consagrado de todos os tempos: conquistou

    ttulos, prmios e menes honrosas em competies no mundo inteiro. Foi

    o primeiro brasileiro rbitro da FIDE, tomou a iniciativa de fundar vrios

    clubes (inclusive o Clube de Xadrez Guanabara), a fim de cumprir a meta

    exigida para fundar a Federao Brasileira de Xadrez e fili-la FIDE.

    Fundou a UBP - Unio Brasileira de Problemistas (1960), cujas atividades

    eram divulgadas no famoso Boletim da UBP. Flix era Economista, mas

    toda a sua vida foi dedicada ao xadrez. Faleceu em 1993 na cidade de

    Miguel Pereira (RJ).

    Certo dia Claude Fisch me perguntou se no queria ajudar a Diretoria

    suprindo a ausncia do Sonnenfeld foi assim que me tornei cartola no xadrez. Encontrei a Diretoria do Clube de Xadrez Guanabara assim

    formada: Claude Fisch (Presidente), Flix Sonnenfeld (Secretrio), Bruce

    Kover (Diretor Tcnico) e Moacyr Tavares (Diretor Tesoureiro), Fiscal da

    Receita Federal, a quem fui apresentado por Claude Fisch.

    Flix Sonnenfeld, alto, sempre esbelto, camisa social por dentro da

    cala, animava as reunies da Diretoria, que geralmente se realizava aos

    sbados, s vezes em dia de semana noite. A experincia e a prtica aliadas altivez germnica encaminhavam as questes sempre de modo pacfico, com solues simples, sem perder o aspecto legal.

  • [26]

    Aps as reunies amos almoar e beber vinho em caneca no Galeto

    Esplanada, esquina de Av. Churchill com Praa Ana Amlia, no prdio da

    Casa do Estudante. Volta e meia Sonnenfeld dava uma escapada para ir ao

    Bob's e de l voltava com um saco de fritas que encharcava na mostarda.

    Ele me induziu a essa prtica, que eu sempre achei abominvel. Mostarda

    com batata frita? S se for alemo, a tem tudo a ver.

    Flix vivia viajando chamado que era para organizar e dirigir

    torneios por todo o Brasil. Essa contnua convocao que lhe era feita tinha

    seus motivos: Flix Sonnenfeld era profundo conhecedor das leis do

    xadrez, juiz reputado pela FIDE e seria o que chamamos hoje de rbitro

    Internacional. Muitas vezes o auxiliei em torneios (ele me fez de aluno) e

    vi com que cuidado ele fazia as fichas individuais de todos os jogadores e

    nelas anotava o adversrio, a cor das peas e o resultado. Depois disso feito

    era fcil montar as prximas rodadas principalmente pelo Sistema Suo, que comeava a se popularizar.

    Ele tambm administrava a Unio Brasileira de Problemistas UBP, sua verdadeira paixo que fundou junto com Jos Figueiredo e dirigiu at passar o basto a seus seguidores. Acredito que a UBP ficou sob a direo

    de Roberto Stelling, estando, pois, em boas mos.

    No intervalo das rodadas do Interzonal de Petrpolis (1973), nos

    sales do Serrano Football Club, Sonnenfeld era visto nos tabuleiros das

    mesas livres, mostrando seus problemas, divertindo participantes e

    enxadristas, sempre com grande plateia em torno do tabuleiro. Entre os GM

    ele era visto principalmente com Paul Keres os dois ficavam horas e horas entretidos diante do tabuleiro, desvendando labirintos, em busca de

    soluo para os enigmas do xadrez. Sonnenfeld tambm mostrava muitas

    composies de outros autores brasileiros e estrangeiros, pois a sua rede de

    conhecimento se estendia pelo mundo do problema sem fronteiras.

    Muitas, muitas vezes nos encontrvamos no CXG e ele me pegava

    para mostrar um problema, contar uma histria. Entre as misses de

    Sonnenfeld tinha uma especial que era fazer as pessoas gostarem de

    problema, de divulgar e popularizar o problema. Aquilo que para ele era

    uma coisa natural, para mim se transformava num labirinto complexo, um

    enigmtico emaranhado do qual no se via o fim. A cincia do Mate

    Ajudado ento me era incompreensvel, principalmente pela ideia: como

    pode as peas pretas forar as brancas a dar mate?

    Esse suicdio alegrico no xadrez nunca me foi entendido

    plenamente. Para mim tratava-se de algo esotrico, emblemtico, de

  • [27]

    sentido figurado, simblico por isso incompreensvel. Mas a insistncia, a f, o nimo que Flix Sonnenfeld carregava consigo para ensinar, divulgar

    e fazer a pessoa gostar de Problemas era frrea assim ele pde deixar um legado. Hoje existe uma populao constituda de milhares de brasileiros

    que so apaixonados por Problemas de Xadrez. Devo a Flix Sonnenfeld o

    pouco conhecimento e o raro interesse que ainda mantenho sobre a arte do

    Problema, que me levou a escrever um conto Mate s cinco cujo enredo inspirado num problema.

    Certa vez no CXG Flix me mostrou um Problema, com o qual segundo ele tinha inventado uma nova pea. Era um problema Direto #2, at certo ponto de fcil soluo, s que para executar o mate que seria dado por Cavalo havia um impedimento: a casa estava ocupada por uma Torre. Matutei, matutei e enfim disse: Mas Sonnenfeld o nico mate que vejo aqui, mas a casa est ocupada. Ele respondeu: Por isso que se chama Problema. Ento, pegou o Cavalo e depositou sobre a Torre: Mate! Essa era a nova pea que ele tinha inventado: a Catorre!! Coisas do

    Flix...

    Quando em 1981 o CXG se programava para comemorar os 25 anos

    de sua fundao, Flix Sonnenfeld aproveitou a ocasio para lanar um

    Torneio Internacional de Composio. L foi toda a equipe acorrer para

    colaborar com o Flix, cujo entusiasmo contagiava a todos. Preparou-se o

    edital, em edio bilngue, fez-se a programao, tudo detalhado para todas

    as categorias de Problemas.

    Os ditos foram envelopados, enviados para a enorme agenda de

    endereos que Sonnenfeld tinha. Aps a divulgao, acorreram

    Problemistas do mundo todo! Era muita carta que chegava, algumas

    pediam resposta, muitos problemas para classificar (e desclassificar),

    descobrir furos, separar por categoria, escolher os mais bonitos e dar a

    premiao. Tenho certeza que ningum (exceto os Problemistas) imagina o

    volume de trabalho que isso provoca. Flix fez o apelo e teve a ajuda de

    todo o problemismo nacional, muita gente acedeu ao chamado de modo

    voluntrio, o edital foi enviado via correio a centenas de revistas,

    publicaes e clubes do mundo todo.

    L pelas tantas vi que no edital aparecia o meu nome como Juiz.

    Recusei: Flix, muita responsabilidade. Entendo muito pouco disso. Com a tranquilidade de sempre ele respondeu: No te preocupes, voc j entende o suficiente. Eu apronto a anlise, voc faz uma reviso e assina

    embaixo. Meu amigo, isso sim que um problema! pensei c comigo. Dois anos depois saiu o Resultado, a premiao e um nmero especial do

  • [28]

    Boletim do CXG bilngue com todos os problemas e solues! O

    pagamento dos prmios foi remetido ao vencedor de cada categoria e

    diplomas de participao foram distribudos a todos os participantes.

    Flix Sonnenfeld tratou do xadrez como cuidou da prpria vida. A

    partir de certo tempo, aproximando-se dos 80 anos, comeou preparar a

    aposentadoria do xadrez e parar de fazer as coisas que a idade no

    permitiria mais daquela forma que era o jeito dele: com entrega absoluta e

    religiosa. Esse preparo espiritual prprio de pessoas cuja esttica de vida

    totalmente diferente da nossa. Quem aqui se prepara para morrer?

    Ningum a gente sempre acredita que amanha ir beber uma cachacinha no Boteco do Tio Osmar...

    Com pensamento na roa, ou melhor, em Miguel Pereira, Flix

    Sonnenfeld se organizou todo: se desfez do que era para ser descartado,

    doou o que era para ser doado, transferiu a UBP para novos dirigentes,

    tirou todo o peso do esquife, para que o corpo fosse leve tambm para os

    amigos. Deixou o seu habitat no bairro do Graja vazio, gavetas, estantes,

    tudo que se relacionasse ao xadrez, o que sobrou cabia numa trouxa. Como

    disse Manuel Bandeira, enfim:

    Quando a indesejada das gentes chegar encontrar lavrado o campo, a casa limpa, a mesa posta, com cada coisa em seu lugar.

    Assim fez Flix Sonnenfeld, com uma esttica de vida sem frescuras,

    seguindo o roteiro milenar herdado de seus ancestrais germnicos. Dentro

    do mesmo esprito, dentro desse fechamento de carreira, Flix Sonnenfeld

    me ofertou, com registro em ata e diploma, o ttulo de Benemrito da UBP,

    apesar das minhas poucas intervenes em torneios de soluo de

    problemas terem sido apenas administrativas e no tcnicas.

    Como se fosse um eplogo

    Em meados de 1988/1989 Flix j estava de malas arrumadas, pronto

    para ir morar em Miguel Pereira. Nessa poca eu estava afastado do xadrez

    de modo que foi um tempo em que raramente nos vamos.

    Claude Fisch havia se mudado para Braslia, Dr. Bruce Kover, alm

    das aulas que dava na PUC e outras universidades, comeou a se dedicar ao

    xadrez postal, Dr. Moacyr Tavares estava aposentado se deliciando com a

    tranquilidade da Tijuca, na Zona Norte, eu desemboquei em novo endereo

  • [29]

    do Cachambi ento aquele time de pessoas que haviam sido unidas pelo xadrez estava se desfazendo.

    As notcias que circulavam eram colhidas aqui e acol. Ainda

    encontrei o Moacyr Tavares almoando prximo Praa Saenz-Pea, vi o

    Bruce Kover dando entrevista na TV Globo, sabia que o Claude Fisch

    estava escondido l pelas bandas de Taguatinga. DF e o Flix Sonnenfeld desfrutando a tranquilidade de Miguel Pereira, a cidade

    fluminense com melhor clima do mundo para viver, segundo avaliao

    internacional.

    Em 1989 Flix Sonnenfeld que sempre foi protegido pelos anjos recebeu em Miguel Pereira e visita de um f: Gil Clber. Comearam a

    trocar Clber ideias, participar de atividades enxadrsticas e assim se

    tornaram amigos. Gil teve o bom senso de ir anotando tudo e, depois, com

    a colaborao do prprio Flix, a iniciar a biografia que viria a ser

    publicada um ano aps o falecimento do nosso Mestre Problemista.

    Na verdade o livro mesmo uma biografia enxadrstica, porque o

    Sonnenfeld sempre conservou a vida ntima bem distante dos outros

    segmentos de sua atividade profissional e particular. Para contar melhor

    essa histria, tomei a palavra do prprio Gil Clber, atravs da introduo

    de seu livro, que ainda se encontra disponvel nas livrarias e que reproduzo

    a seguir.

  • [30]

  • [31]

  • [32]

    Gil Clber

    Editora Cincia Moderna, 2004

    http://www.gilcleber.com.br/

  • [33]

    Pgina de Sonnenfeld na revista Ajedrez 6000

  • [34]

  • [35]

    Waldemar Costa: Xadrez como religio

    Os primeiros dias de janeiro de 2015 me deram a alegria de

    reencontrar Waldemar Costa, jornalista, historiador e romancista que durante dcadas fez parte da equipe do Jornal dos Sports (o cor-de-rosa), de Mrio Filho onde, extra-pauta, assinava uma coluna diria de xadrez,

    sempre carente na imprensa. Editou por anos a Revista Caissa e o

    semanrio Xadrez Expresso. Alm disso, Waldemar Costa ainda encontra

    tempo e joga xadrez, participa da Federao, dirige o Departamento de

    Xadrez do Jacarepagu Tnis Clube e foi co-fundador do Praa Seca

    Xadrez Clube.

    Na sua pgina na internet, (vide abaixo), Waldemar Costa historiou

    os Governantes de Jacarepagu, a Parquia de N. S. de Loreto, recuperou as fotos antigas do bairro em Imagens de Jacarepagu e desvendou o Significado dos nomes das ruas de Jacarepagu. Quer dizer, em http://www.wsc.jor.br se encontra um verdadeiro manancial de

    informaes sobre o bairro de Jacarepagu e adjacncias, onde Waldemar

    Costa nasceu, estudou, cresceu e sempre residiu.

    Como romancista Waldemar Costa j publicou O Estigma da Cruz de Rubis, O Paraso Azul e O Ferrador, este ltimo, por ser romance de poca, daria excelente roteiro para uma srie, filme ou mesmo novela, se

    os diretores no fossem to corporativistas laureando-se mutuamente.

    O xadrez nos uniu em grande amizade e foi visitando a Associao

    Shalom Aleichem, que realizava o Torneio Aberto da Fexerj 2015, onde o

    reencontro se deu. Waldemar Costa divulgava ali a 2 edio do livro

  • [36]

    Epopeia do Campeonato Brasileiro de Xadrez 1927-2008 (Editora Solis 2009), que, por inexplicvel que seja, permanecia engavetado na editora,

    sem distribuio. Antes que apodrecesse Waldemar Costa resgatou a

    publicao que est sendo avidamente comprada pelos xadrezistas e se

    esgotar em pouco tempo. Empresrios brasileiros...

    Para Waldemar Costa a republicao de Epopeia do Campeonato Brasileiro de Xadrez 1927-2008 guarda, no ntimo, outra emoo que no seja o significado do fato em si. que a 1 edio do livro (sada em dois

    pequenos volumes em edio limitada), teve e participao e atuao

    decisiva de dona Lina de Mello Costa, me do autor, que atuou como

    pesquisadora, na editorao e como revisora.

    Alm disso, dona Lina no hesitava em agredir o filho com o indispensvel e rigoroso estmulo, instigando-o persistncia num tempo

    em que no existia internet. Esse trabalho minucioso, de formiga, foi bem

    descrito pelo Campeo Brasileiro de Xadrez, Hermann Claudius van

    Riemsdijk, no Prefcio ao volume.

    Por que os livros feitos moda antiga, isto , em papel, letras e tinta,

    so e sero importantes? Porque as informaes contidas em Epopeia do Campeonato Brasileiro de Xadrez 1927-2008 no se encontra em outra parte, inclusive na internet.

    Precisava ver como os participantes do torneio se aproximaram do

    livro de Waldemar Costa, folhearam as pginas, devorando, comiam as

    informaes enciclopdicas e, por fim, no se importando com a idade da

    pedra do livro de papel, compraram e carregaram como tesouro,

    preciosidade. Em pouco tempo o estoque acabou e no tinha mais nenhum

    Waldemar Costa voltou com a mochila vazia.

    O livro est cheio de informaes histricas, ali esto os campees

    do passado, narrada uma pr-histria do xadrez aqui no Brasil, que

    Waldemar Costa situa no sculo XIX. Tenho c minhas dvidas, pois o

    tabuleiro de xadrez era junto com o baralho pea indispensvel nos bas, porque serviria para distrair a tripulao do estresse de que era vtima

    nas caravelas de antanho. caso para pesquisar...

    Para mim Epopeia do Campeonato Brasileiro de Xadrez 1927-2008 trouxe outras emoes. Li nele informaes, as imagens, as partidas de xadrez e muitas notcias sobre pessoas amigas com as quais tive o prazer

    da convivncia durante a participao dos torneios. Amigos que no esto

  • [37]

    mais entre ns, amigos que esto dispersos pelo sopro dos tempos, cada

    qual levado pelas responsabilidades da vida.

    Entre muitos desses amigos a minha lembrana caiu em Jos Soares

    Msculo, jovem Campeo Brasileiro Juvenil, 5 lugar invicto no 44

    Campeonato Brasileiro de 1978. Alm das qualidades enxadrsticas,

    Msculo tambm era, apesar de jovem, muito responsvel com a tica no

    esporte. Pelo seu talento, Jos Soares Msculo teria pela frente no s o

    ttulo de Grande Mestre, como tambm o futuro como dirigente, capaz de

    elevar com responsabilidade o nome do xadrez brasileiro. Abatido por

    doena grave, Jos Soares Msculo teve a carreira enxadrstica

    interrompida prematuramente...

    E agora que fiquei chateado, triste com essa lembrana, no conto

    mais nada. Quem quiser saber mais ou adquirir Epopeia do Campeonato Brasileiro de Xadrez 1927-2008, entre em contato com Waldemar Costa e corra porque a edio est acabando.

    Conheci o Waldemar Costa num dos dias em que ele aparecia no

    Clube de Xadrez Guanabara em busca de notcias para alimentar a coluna

    de xadrez que mantinha no Jornal dos Sports. O JS era conhecido como o jornal cor-de-rosa, foi fundado por Mrio Filho (irmo de Nlson Rodrigues) autor do famoso livro O negro no futebol brasileiro. Nos tempos em que no havia racismo no Brasil. Mrio Filho d um exemplo claro de como historiadores devem tratar a questo da discriminao ao

    destrinchar a ascenso do negro na sociedade brasileira atravs do futebol e dos esportes em geral.

    Enquanto trabalhou no Jornal dos Sports, por mais de vinte anos,

    Waldemar Costa dava notcia da maioria dos eventos enxadrsticos,

    inclusive os ocorridos no Clube de Xadrez Guanabara.

    Foi no Jornal dos Sports que saiu a notcia dos empates que consegui

    em duas simultneas dadas pelos GM Miguel Quinteros e Eugenio Torre,

    ambas no CXG. Depois de uma capivarada que eu cometi na abertura, o

    GM Eugenio Torre quis me crivar um mate. Defendi o mate e consegui

    rearrumar as peas quando isso ocorre, quem quer dar mate acaba tendo problemas. Estava assim, ele atrapalhado, eu caando a Dama dele, que

    bailava pra l e pra c no centro do tabuleiro. Numa dessas ocasies,

    enquanto ele jogava os demais tabuleiros, Luis Loureiro palpitou: Oferece

  • [38]

    empate, v se ele aceita. No que ele aceitou? J sabe, n? Nunca mais aceito palpite ao Loureiro.

    Na outra simultnea, contra o GM Miguel Quinteros, entramos na

    partida em um final de Torre e Pees. Ele j tinha terminado as demais 21

    partidas, vencendo todas. Exigiu que nosso final fosse a relgio e com

    rbitro. Determinou-se (acho) uns 5 minutos pra acabar a partida e ficamos

    ali cara a cara. Claro que isso era muita presso em cima de mim, capivara

    contra GM, todo mundo em volta tremia pra cacete! Eu tinha um peo a mais, na sexta casa, ele ficou cortando o Rei por trs, l pras tantas dei

    bobeira, ele capturou o peo, igualou tudo e gentilmente falou: Tablas.

    No ano de 1981, Waldemar Costa me convidou para participar como

    convidado do Campeonato do Jacarepagu Tnis Clube, entidade

    tradicional da sociedade da Praa Seca, Rio de Janeiro. A seo de xadrez

    estava sob a direo dele, que organizou o torneio com onze jogadores.

    Entre eles estava o prprio Waldemar Costa, Antnio Souza Lima e

    Abelardo Braga irmo do compositor Braguinha alm de outros fortes jogadores do JTC: Carlos Jamil, Jorge Farah, Srgio Cardoso, Dlcio

    Gama, Wairy Dias, Laucf Migon.

    Para jogar o torneio eu saa do Cachambi com antecedncia, pois

    tinha de pegar duas condues (a rodada iniciava s 19:00h). Em certo

    momento, faltavam trs rodadas para o torneio terminar, esperei o meu

    adversrio por uma hora regulamentar e comuniquei ao Diretor do Torneio,

    reclamando o ponto por WO. Waldemar Costa, por cuja retido boto a mo

    no fogo, me pediu para esperar mais um pouco, pois o atraso se deveria por algum motivo srio (deveria ser a novela da TV Globo). Sempre gentil

    e educado, esperei esse mais um pouco, que demorou mais de uma hora, fazendo com que a partida iniciasse s 21h, coisa totalmente irregular.

    Enfim chegou o meu adversrio, Laucf Migon, bem disposto, de

    banho tomado, barba feita, cheiroso, com a cabea afiada, para enfrentar

    um rival aporrinhado, tenso, por estar duas horas sentado esperando.

    Depois de quatro horas de jogo, perdi a partida, joguei de pretas uma Ruy

    Lopez, lembro bem. No digo que poderia vencer o Laucf, que era bom

    jogador e adversrio temido, mas me senti bem inferiorizado pelas

    circunstncias e no joguei uma partida normal.

    Como o dia se mostrasse mesmo aziago para mim, depois da partida,

    sonolento, estava no ponto do nibus na Praa Seca. J passava de 1h e

    tanto da madrugada, estvamos eu, uma moa e mais trs gatos pingados

    esperando nibus, quando passou um carro em alta velocidade, seguido de

  • [39]

    uma viatura da polcia, em perseguio. Mal o carro circundou a praa para

    entrar na Rua Baronesa, os policiais comearam o tiroteio. Protegidos

    precariamente atrs da coluna de concreto, ouvamos as balas

    ricochetearem, at que os tiros perfuraram os pneus do carro e a polcia

    rendeu os ocupantes. Emocionante, n?

    Depois disso, encerrei o torneio com mais duas derrotas nas ltimas

    rodadas. Tirei do site do merecido Campeo do JTC (no s neste 1981,

    mas em outros anos tambm), meu querido amigo Waldemar Costa, o

    quadro da classificao final.

    Infelizmente no site do Waldemar Costa no consta as partidas

    daquele torneio, algumas das quais bem interessantes. Depois desse

    torneio, participei de outras competies no JTC, a mais destacada foi o

    Torneio do 45 Aniversrio do Clube, em 1984. Ali fiz muitas amizades e

    se parei de ir l foi justo pelo horrio das rodadas, que terminam sempre em

    horas tardias e invade as noites cariocas, cujas emoes so demais para

    este pobre corao...

    Vendo os quadros dos torneios d saudade do Sistema Schuring tambm chamado Todos contra todos ou Robin Round no qual os jogadores se enfrentam entre si, que foi substitudo pelo Sistema Suo

    (sempre os suos!). Esta modalidade de emparceiramento transformou o

    xadrez em competio popular atraindo milhares de jogadores para

    participar seus inmeros torneios, mas perdeu muito em emoo.

    Hoje o xadrez como os demais esportes movimenta cifras milionrias em todo o mundo, estando consolidada a era capitalista e profissionalizando os jogadores, coisa rara no passado, onde os jogadores

    eram filsofos, fsicos, msicos, matemticos, tendo a prtica do xadrez

    como segunda opo.

    Waldemar Costa, bairrista por excelncia, nasceu em Jacarepagu

    (mas diz que nasceu em Rocha Miranda) e ali vive at hoje, sem perder

    nenhuma oportunidade de divulgar a histria de seu lugar. Sobre o bairro j

    publicou vrios artigos, reportagens fotogrficas e os livros O Vale do Marang e Imagens de Jacarepagu.

    Em todo esse labor, que no foi pouco, Waldemar Costa teve uma

    fada madrinha que lhe deu suporte enquanto Deus permitiu que eles

    estivessem juntos: Da. Lina de Melo Costa, que, em se tratando de xadrez

    no era apenas a me, mas a secretria, a incentivadora, a revisora, a

  • [40]

    bibliotecria, a que trazia o cafezinho quando as horas altas da noite o

    trabalho literrio faziam esquecer o tempo.

    Era dona Lina quem atendia as centenas de telefonemas que eu dava

    a Waldemar Costa, era dona Linda quem o defendia quando eu enchia o

    saco dele, pedindo informaes, livros emprestados, comentrios de

    partidas j que o homem uma enciclopdia viva!

    Sorte dele que teve me e cmplice na sua maior paixo, o xadrez.

    Dona Lina foi a pessoa que o acompanhou durante a jornada imprevisvel

    que a vivncia profissional, o xadrez, pio exigente que vicia e escraviza

    quem cai em sua malha. No sendo assim, ento que aprenda a renunciar a

    tudo e conviva silenciosa e solitariamente tentando encontrar a sada do

    labirinto dos 64 escaques...

    Recuperei alguns dados da minha participao no Torneio do 45

    Aniversrio do JTC, do qual Waldemar Costa foi Campeo, com grande

    performance: +9 -2! Abelardo Braga (irmo do compositor Braguinha) e

    Antnio Souza Lima dividiram o vice com 8,5 pts., eu fiquei em 4 lugar

    com 8 pts. Ao ser convidado por Waldemar para participar do torneio, me

    tornei scio do JTC e vrias vezes levei a famlia para se divertir na piscina

    e nas festividades do clube.

    Jacarepagu Tnis Clube - Torneio 45 Aniversrio

    Rio de Janeiro 1984

    PARTICIPANTES 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 pts col Waldemar Costa 1 0 0 1 1 1 1 1 1 1 1 9,0 1

    Abelardo Braga 1 1 0 1 0 1 1 0,5 1 1 1 8,5 2

    Antnio Souza Lima 0 0 1 1 1 1 0,5 1 1 1 1 8,5 3

    Salomo Rovedo 0 1 0 1 1 1 1 1 0 1 1 8,0 4

    Carlos Jamil 1 0 0 0 0 1 0 1 1 1 1 6,0 5

    Jorge Farah Fernandes 0 1 0 0 1 0,5 1 0,5 0 0,5 1 5,5 6

    Dlcio Oliveira Gama 0 0 0 0 0 0,5 1 1 1 1 1 5,5 7

    Srgio Luiz Cardoso Farias 0 0 0,5 1 0 1 0 0 0 1 1 4,5 8

    Wairy Dias Cardoso 0 0,5 0 0 0 0,5 0 1 0,5 0,5 1 4,0 9

    Laucof Migon 0 0 0 0 0 1 1 0 0,5 0,5 1 4,0 10

    Pedro Cardoso Lima 0 0 0 0 0 0,5 0 0 0,5 0,5 0 1,5 11

    Salomo Rovedo-Carlos Jamil

    Ataque Torre - ECO D03

    1. d4 d5 2.Cf3 Cf6 3. Bg5 Ce5 4. Cbd2 Cxg5 5. Cxg5 Bf5 6. e4 dxe4 7. Bc4 e6

    8. C5xe4 Dxd4 9. Cc3 c6 10. 0-0 Be7 11. Bb3 Cd7 12. De2 0-0 13. Cf3 Db6 14.

  • [41]

    Tad1 Tad8 15. Cd4 Bb4 16. Ce4 Cc5 17. Cxf5 exf5 18. Cxc5 Bxc5 19. c3 Txd1

    20. Txd1 Td8 21. Txd8+ Dxd8 22. Bc2 g6 23. Rf1 De7 24. Dxe7 Bxe7 25. Re2

    Rg7 26. f4 f6 27. Rf3 Bd6 28. g3 Rf7 29. h4 b6 30. Bb3+ Rg7 31. Be6 Rh6 32.

    Bd7 c5 33. Be6 (-)

    Ivan Nicolich-Salomo Rovedo

    Abertura Inglesa - ECO A17

    1. c4 Cf6 2. Cc3 e6 3. g3 Bb4 4. Bg2 0-0 5. Cf3 c5 6. 0-0 Cc6 7. a3 Ba5 8. d3

    Bxc3 9. bxc3 d5 10. cxd5 Cxd5 11. c4 Cde7 12. Bb2 Cd4 13. e3 Cxf3+ 14. Bxf3

    Cg6 15. Dc2 e5 16. Tfd1 Te8 17. d4 Df6 18. Bg2 exd4 19. exd4 Bf5 20. Db3 Te2

    21. f4 Tae8 22. Dxb7 Be4 23. Bxe4 T8xe4 24. Tab1 Df5 25. dxc5 Dh3 26. Td8+

    Cf8 27. Txf8+ Rxf8 28. Db8+ Te8 (0-1)

    Waldemar Costa-Salomo Rovedo

    Defesa Petroff - ECO C42

    1. e4 e5 2. Cf3 Cf6 3. Cxe5 Cxe4 4. d4 d6 5. Cf3 Bg4 6. Bd3 d5 7. De2 De7 8.

    O-O Cc6 9. c3 O-O-O 10. Bf4 g5 11. Bg3 h5 12. h3 Cxg3 13. Dxe7 Bxe7 14.

    fxg3 Be6 15. b4 g4 16. b5 Cb8 17. Ce5 Tdf8 18. Bf5 Cd7 19. Cg6 fxg6 20. Bxe6

    Txf1+ 21. Rxf1 Tf8+ 22. Re2 Bd6 23. Bxd5 gxh3 24. gxh3 Bxg3 25. Bf3 Te8+

    26. Rd3 Te1 27. Be4 g5 28. Bg6 Cf6 29. a4 Bf4 30. Rc4 g4 31. hxg4 hxg4 32.

    Ta2 g3 33. Tg2 Rd8 34. Cd2 Cg4 35. Rd3 Td1 36. Be4 Cf2+ (0-1)

    36. Be4 Cf2+

    Manoel Jonis - Salomo Rovedo

    Gambito Benko - ECO A57

    1. d4 Cf6 2. Cf3 g6 3. c4 c5 4. d5 b5 5. cxb5 a6 6. Cc3 d6 7. e3 Bg7 8. Be2 Cbd7

    9. O-O O-O 10. Dc2 Cb6 11. Td1 c4 12. bxa6 Bxa6 13. e4 Cfd7 14. Cd4 Ce5 15.

    Bg5 h6 16. Bf4 Cd3 17. Cc6 Dc7 18. Be3 e6 19. Bxd3 cxd3 20. Db3 Cd7 21.

    Ca4 exd5 22. Tac1 Cc5 23. Cxc5 dxc5 24. Txc5 Bc4 25. Db4 Tfe8 26. exd5 Ba6

    27. Dd2 Dd6 28. b4 Bb7 29. g3 Ta6 30. Rg2 Rh7 31. Dc1 Txa2 32. Txd3 Df6 33.

    Dd1 Txe3 34. Txe3 Dxf2+ 35. Rh3 Dxh2+ 36. Rg4 Dh5+ 37. Rf4 Df5# (0-1)

  • [42]

    Jos Soares Msculo

    Msculo aos 15 anos

    No poderia deixar de falar em Jos Soares Msculo, meu amigo

    chegado, que costumava frequentar o meu modesto apartamento no

    Cachambi e conhecia toda a minha famlia. Msculo por um perodo

    estudou na Universidade Gama Filho e muitas vezes apareceu l em casa

    para almoar comigo, j que o Cachambi fica nas redondezas daquela

    instituio. Quando ele foi a Londres competir no torneio trouxe para mim

    um pster de um artista londrino, que at pouco tempo enfeitava minha

    sala.

    Jos Soares Msculo foi dos jovens a quem sempre o Clube de

    Xadrez Guanabara prestou o auxlio e suporte possveis para que

    evolussem no xadrez. Alis, todos os associados do Clube de Xadrez

    Guanabara que conheciam o Msculo s tinham motivos para gostar dele,

    devido educao, simpatia e entrega com que fazia as coisas.

    Eu tinha conseguido o boletim completo do Campeonato Brasileiro

    de 1975 (Carlos Eduardo Gouveia, Campeo) e estava organizando o

    quadro, fazendo reviso, com vista a public-lo. Msculo me pegou um dia

    fazendo esse trabalho no CXG e ficou observando. Sem muita convico,

    perguntei se ele no gostaria de analisar e comentar algumas partidas. O

    Msculo se entusiasmou e acabou que esse foi um dos melhores trabalhos

    que tive em mos! Infelizmente faltou grana para publicar e o projeto

    gorou.

  • [43]

    H ltima vez que o vi foi no balnerio de Bzios. Ele estava de

    sunga e camiseta na areia, jogando gamo com alguns amigos, na Praia de

    Gerib. Quando ele me viu, se levantou e exclamou abrindo os braos:

    Salomo! Aqui em Bzios!

    Realmente era um dos lugares mais improvveis para a gente se

    encontrar. Msculo se levantou do gamo, ante o espanto geral dos colegas,

    para a gente trocar um abrao gostoso. Perguntei pela sade, ele estava um

    pouco magro, mas escondia os efeitos do tratamento que fazia detrs do

    sorriso sincero. Logo depois de breve conversa empurrei ele de volta, pois

    os amigos estavam esperando.

    Confesso que rever naquele momento Msculo me deixou muito

    emocionado. Tanto que sa dali e fui beber uma gelada, l na ponta da

    praia, num bar ilegal construdo sobre pedras e frequentado por uns artistas

    metidos a besta que s sabiam chamar o garom com xingamento e

    depreciao. Bebi uma cerveja, perguntei ao garom como ele aturava

    aquelas piadas racistas. Ele engrossou o quilo de insultos que carreguei na

    turma, aquilo era uma turma de imbecis metidos a besta, artistas novos

    ricos. Falei para ele no aturar aquelas merdas, paguei e ca fora. Fui

    comer porquinho frito com cerveja gelada, com direito a pagode, na Praia

    do Forte, em Cabo Frio que mais o meu terreiro.

    Msculo foi campeo brasileiro juvenil de 1977, em Volta Redonda

    (RJ), bicampeo em 1978 (Vacaria, RS), ficou em 8 lugar no 43

    Brasileiro de 1977 e em 5 lugar no campeonato do ano seguinte (Natal,

    1978). Como Campeo Brasileiro Juvenil, aos 19 anos ganhou o direito de

    jogar o Campeonato Mundial U20, como chamado, em Innsbruck

    (ustria).

    Jos Soares Msculo sempre foi considerado cria do CXG. Era ali o

    local que ele frequentava para estudar, pescar aulas e conselhos com Olcio

    Gadia, conversar com Carlos Eduardo Gouveia, analisar partidas com o

    professor Maurcio Horta (inclusive de xadrez postal), ver os problemas e

    finais dos mestres Flix Sonnenfeld e Sebastio A da Silva, conviver com

    os amigos, Luismar Brito, Luiz Loureiro e muitos outros enfim.

  • [44]

    Mas no era s o Msculo. Naquela poca o CXG era o celeiro onde

    se reunia um grupo de jovens que viriam a ser bons jogadores e mestres do

    xadrez brasileiro: Jernimo Pimenta, Hermes Amlcar, Otaclio Veloso,

    Cristvo Kubrusly, Luiz Loureiro, Herman Belm, Roberto Stelling,

    Marcos Roland, Alberto Mascarenhas e tantos outros. Jogadores j

    aperfeioados, jogadores jovens, que juntos formavam uma equipe de dar

    inveja, uma verdadeira seleo!

    Depois, com o recrudescimento do xadrez no Tijuca Tnis Clube, a

    fundao da ALEX Associao Leopoldinense de Xadrez, Clube de

    Xadrez de Niteri, alm das sees de xadrez dos clubes de futebol

    Vasco, Flamengo e Fluminense todos procuraram acomodar suas

    necessidades da melhor maneira possvel.

    Com o programa de alunos-atletas da Universidade Gama Filho, esta

    instituio de ensino conseguiu formar esportistas de alto nvel em vrias

    modalidades do atletismo. Fundado em 1939 por Lus da Gama Filho

    (1906-1978), o modesto Colgio Piedade cresceu, gerou faculdades e se

    transformou na UGF em 1972. O sucesso e a fama da UGF se devem,

    tambm, ao fato de ter sido a primeira instituio a ter a coragem, o

    pioneirismo, de abrir um campus e oferecer cursos superiores num bairro

    perifrico do subrbio carioca.

    Oferecendo cursos de graduao e ps-graduao (stricto sensu e

    lato sensu), a Gama Filho cresceu tambm em importncia e qualidade,

    sendo considerada uma das mais importantes instituies de ensino

    superior do pas. Seu corpo discente chegou a contar com cerca de quinze

    mil alunos vindos de todos os cantos. Em volta do Campus se criou um

    mercado direcionado instituio, como pousadas, restaurantes e centros

    comerciais. Basta dizer que tinha um hospital-escola no prprio campus da

    UGF no bairro de Piedade.

    D pena ver hoje todo aquele complexo de edificaes abandonado

    ao tempo, envelhecendo e se deteriorando, deixando equipamentos,

    mveis, construes, restaurantes e lanchonetes tudo sendo carcomido, se

    deteriorando, nem nenhuma expectativa de aproveitamento, ainda que o

  • [45]

    dficit universitrio no pas seja uma constante. esta terra de corruptos e

    corruptores que cria situaes assim...

    Aproveitando esse estmulo, Msculo se inscreveu e foi aluno desde

    o Colgio Piedade (o Aplicao da Gama Filho) at se diplomar em

    Direito. Com esse programa a UGF tambm conseguiu formar sua equipe

    de xadrez, entre os quais formavam Alfredo Pereira dos Santos

    (oficialmente Professor de xadrez do Departamento de Educao Fsica da

    UGF), Lus Loureiro e muitos outros.

    Nessas andanas pela Gama Filho que Msculo sempre achava

    tempo para dar um pit stop no Cachambi, no meu antigo endereo da Rua

    Capito Resende e depois na Rua Baslio Brito. Ali ele fazia uma parada de

    paz, brincava com meus filhos, bebia uma gua gelada, me ensinava

    xadrez, mostrava partidas, via alguma coisa do que eu jogava, lanchava,

    almoava e dava at para tirar uma sesta de vez em quando. Era da casa...

    Duas notas acenderam a luz verde e me obrigaram a escrever mais

    umas lembranas sobre Jos Soares Msculo. Primeiro foi o Waldemar

    Costa que, na Epopeia do Campeonato Brasileiro de Xadrez (Editora Solis

    2009), a respeito do Campeonato Brasileiro de 1977, escreveu:

    Jos Soares Msculo foi o nico dos quatro semifinalistas do Rio de

    Janeiro que conseguiu a vaga para a final do Campeonato Brasileiro de

    1977. Na poca ele era campeo brasileiro juvenil, ttulo conquistado em

    Volta Redonda, e tambm tricampeo carioca juvenil. Msculo teve vida

    efmera, pois morreu de cncer aos 44 anos de idade no dia 15/7/2003. Ele

    nasceu no Rio de Janeiro em 2/6/1959.

    Depois, cavoucando a internet em busca de correo e clareza sobre

    alguns dados, informes para o texto que tento transformar em escrita,

    deparei com a emocionada crnica de Dirceu Viana, tambm ele um dos

    felizardos a privar da amizade sincera e nica que Jos Soares Msculo

    dedicava aos amigos.

  • [46]

    A crnica de Dirceu Viana supriu uma lacuna na minha amizade com

    Msculo: pois foi nesse perodo eu tive de mudar o rumo da vida, novo

    emprego, mudana de endereo, a luta de sempre. O prprio Msculo j

    estava tambm cuidando da vida fora do xadrez e morava em Maca, por

    isso nos perdemos de vista. Agora sei que aquele encontro casual em

    Bzios, a que me referi, se deu pelo fato dele estar morando em Maca,

    pois so cidades prximas.

    Eis um resumo do comovente texto de Dirceu Viana:

    Na ltima sexta-feira recebi uma notcia de rasgar o peito. Colegas do

    xadrez tentavam checar comigo a informao de que um grande amigo

    havia falecido. Jos Soares Msculo era para mim uma espcie de irmo

    mais velho, uma figura alegre, falante e um amigo confivel. Msculo

    faleceu no dia 15 de julho, aos 44 anos.

    Conheci o Z h exatos 20 anos, no Posto 6, em Copacabana. Naquele

    pedao de areia os primeiros craques da seleo de vlei jogavam na rede

    de Tia La. Ao lado, a turma do frescobol. Mais em cima, perto da

    calada, um grupo de funcionrios da Varig e agregados queimavam os

    miolos no tabuleiro de xadrez. Eu comeava no xadrez e quando podia

    arriscava no vlei.

    Naquele ano de 1983 foi sua ltima final de Brasileiro na qual se sentia

    com chances. [Msculo tirou 12 lugar na semifinal e no se classificou]. A

    nova gerao certamente no conheceu Jos Msculo. Eu mesmo tenho

    dificuldades em listar seus resultados. Ele foi bicampeo brasileiro juvenil

    nos fins dos anos 70, esteve entre os dez melhores jogadores do pas, jogou

    torneios na Europa e mais recentemente nos Estados Unidos.

    De brancas dominava a Inglesa e os fianquetos, de pretas, tentou me

    ensinar os segredos da Siciliana Clssica, do Gambito Benko, da Indo-

    Benoni, coisas que nunca entendi. Outra virtude: nunca guardava para si

    estes conhecimentos. S no foi mestre porque foi trabalhar como

    advogado e contador. Os diplomas, porm, no mudaram sua vida.

  • [47]

    O Z foi tambm responsvel pela maior renovao que o xadrez carioca

    conheceu. Foi atravs dele, no fim do anos 80, que vrias crianas e

    adolescentes conquistaram para o Flamengo importantes provas por

    idade, algumas at fora do Brasil.

    Nos ltimos anos nem conversvamos muito sobre xadrez. Sua relao com

    o jogo era atpica para um jovem que havia sido vencedor. Msculo nunca

    deixou de ser um garoto, nas roupas, na fala, nos hbitos. Msculo foi

    tambm comerciante (durante seis anos cuidou da loja do av), flertou com

    o gamo, tentou sem sucesso jogar peteca (sugesto minha, sic!), e l na

    adolescncia teve momentos de surfista. Ele me dizia que o xadrez era

    apenas um meio de alcanar as coisas na vida. Quem era bom no xadrez

    podia ser bom em qualquer rea, por causa da capacidade de

    concentrao.

    Recentemente ele trabalhava como fiscal de ISS no municpio de Maca,

    norte do Rio. Dividia a semana entre a capital e a cidade do petrleo. Seu

    ltimo projeto ligado ao xadrez consistia em montar uma equipe e jogar o

    interclubes com os outros cariocas que viviam em Maca. No fundo ele

    sabia que eram palavras ao vento, o xadrez fazia parte do passado. Os

    bons livros, o tabuleiro, ficaram encaixotados na casa da me, logo ali, a

    poucas quadras.

    O amigo Capi que sempre dava um jeito de soprar a poeira, puxar

    assunto e relembrar aquela poca, quando a vida no nos exigia tanto.

    Bons tempos no voltam mais, ele dizia, sem nenhuma tristeza. No sei Z,

    talvez para voc os bons tempos s estejam comeando. V em paz irmo,

    que Deus o proteja...

    Msculo-Yosupov

    Quando venceu o Campeonato Brasileiro Juvenil em 1977, Jos

    Soares Msculo adquiriu o direito de participar do Mundial Sub 20 na

    cidade de Innsbruck (ustria). Logo eu e o Claude Fisch iniciamos como

    acredito que muitos outros amigos de Msculo tambm o fizeram uma

    conspirao secreta para colaborar com a subsistncia de Msculo em

  • [48]

    terras distantes. Fizemos uma vaquinha que foi oferecida e aceita de

    corao. No me recordo quanto arrecadamos nem isso importante

    agora mas mesmo que tivesse rendido pouca coisa daria alguns a mais

    para ele gastar l fora. Msculo realmente merecia!

    Sobre a participao de Msculo nesse Mundial Sub 20 houve um

    fato que jamais vi divulgado aqui, nem mesmo nas redes de intrigas

    secretas do xadrez. Tudo eu soube atravs da Revista Jaque da Espanha. O

    fato ocorreu na partida Msculo-Yusupov, que acabou sendo o vencedor da

    competio.

    Corria a oitava rodada. A partida J. S. Msculo-Artur Yusupov foi

    suspensa no lance 40, de acordo com as regras da poca. Todos correram

    para seus lugares, tratar de analisar a posio para a concluso da mesma.

    A equipe de apoio de Msculo era formada por Srgio Farias (1935-

    2013), que viria a ser Presidente da CBX em 1978 e mais ningum. Note-

    se que aqui se desenha o mesmo modelo que viria ser denunciado a

    Henrique Mecking no match contra Polugaevsky: o Segundo e Treinador

    ser apenas um inexpressivo Cartola, sendo que Mecking ainda teve o

    suporte tcnico do GM italiano Sergio Mariotti e depois de Juan Manuel

    Belln, da Espanha (ambos de categoria inferior de Mecking).

    Durante as anlises da partida suspensa vieram em socorro de

    Msculo alguns participantes da Amrica Latina: Alonso Zapata

    (Colmbia) que seria o vice-campeo Miguel Bernat (Argentina), Plnio

    Pazos (Equador), Hernn Salazar (Chile), entre outros. Depois da anlise e

    dos estudos mais minuciosos e exaustivos que essa equipe improvisada

    conseguiu fazer imagina a confuso: todo mundo dando palpite chegou-

    se a concluso que a partida estaria empatada. E todos foram comer, beber,

    descansar para a rodada seguinte e para a sesso de partidas suspensas.

    S que o treinador de Yusupov chamava-se Mark Dvoretsky,

    Campeo de Moscou (1973), 5 no Campeonato Sovitico (1974), 1 em

    Wijk aan Zee Masters (1975). Dvoretsky renunciou ao jogo no tabuleiro,

    aos torneios e campeonatos, at mesmo ao ttulo de GM para se aplicar no

    estudo da teoria e, em consequncia, a ser treinador. Dentro de pouco

    tempo sua reputao foi crescendo, pois ele ganhou fama de pegar

  • [49]

    jogadores medianos, com Rating em torno de 2200 e lev-los ao ttulo de

    GM. Ao mesmo tempo muitos GMs o procuravam para aprimorar o

    potencial de jogo e Dvoretsky sempre achava uma tcnica de aplicar seus

    estudos para tornar melhores os j titulados.

    Na realidade, foi o estudo universitrio de pedagogia que serviu de

    suporte para sua didtica e assim ele podia aplicar a metodologia certa ao

    perfil psicolgico de cada jogador. Passaram pelo seu mtodo Garry

    Kasparov, Viswanathan Anand, Veselin Topalov, Evgeny Bareev, Joel

    Lautier, Loek van Wely, entre outros. Artur Yusupov, quando se tornou o

    nmero trs do mundo (atrs de Kasparov e Karpov), declarou que a sua

    ascenso foi devida ao mtodo de ensino de Dvoretsky. Por fim, eles se

    tornaram amigos, scios, publicaram livros em coautoria e juntos fundaram

    uma escola de xadrez.

    Diz a Revista Jaque que a partida parecia realmente empatada, mas

    que Dvoretsky encontrou numa sutileza o rduo caminho das pedras para a

    vitria. O caminho foi no tentar impedir as brancas de coroar o peo

    passado, mas posicionar as peas negras de modo a impedir que a coroao

    redundasse em empate. Nas anlises, ao se constatar que seria um final de

    Rei e Damas, teoricamente empate. Mas na posio final se v que no

    bem assim.

    Campeonato Mundial sub-20

    Innsbruck 1977

    8 Rodada

    J. S. Msculo-Artur