rótulos narrativos: ficção, não ficção ou “ficção fingida”? a classificação de...

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Revista Eletrônica CoMtempo é uma publicação do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Faculdade Cásper Líbero Revista Eletrônica CoMtempo Av. Paulista, 900 – 5º andar CEP 01310-940 – São Paulo - SP Fax: (011) 3170-5891 Tel.: (011) 3170-5880/3170-5881/3170-5883 http://www.facasper.com.br E-mail: [email protected] Artigo Rótulos narrativos: ficção, não ficção ou “ficção fingida”? A classificação de narrativas no conflito Israel-palestino. Paula Lima Gomes 1 Resumo O artigo discute a classificação narrativa, no contexto Israel-palestino, da historiografia do outro como “ficção fingida” (ISER, 2002), na tentativa de oficializar-se como a Narrativa não ficcional desse conflito. Para tanto, toma como objeto a (des)construção de Morris (2008) em seu texto “O novo livro de Ilan Pappe é espantoso”. Para pensar o conflito propriamente dito, o artigo se baseia nos postulados em disputa de Morris (2008, 2014), Pappe (2008, 2010) e demais complementações, em articulação com outros conceitos basilares, como ficção, “ficção fingida” (ISER, 2002), não ficção e “leitura documentarizante” (ODIN, 2012). Palavras-chave Narrativa. Ficção fingida. Não-ficção. Israel. Palestina. Abstract This article discusses the narrative classification, in the Israeli-Palestinian context, of the historiography of the other as “faked fiction" (ISER, 2002), in an attempt to formalize itself as the one nonfictional Narrative of the conflict. To do so, the (de)construction of Morris (2008) in his text “Ilan Pappe’s new book is shocking". To think about the conflict itself, the article is based on the postulates in dispute of Morris (2008, 2014), Pappe (2008, 2010) and other additions, in 1 Graduada em Publicidade e Propaganda pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestranda em Comunicação Social pelo PPGCOM da Pontifícia Universidade Católica do Minas Gerais. E-mail: [email protected]

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Artigo publicado no volume 6, número 2, do ano de 2014 da revista Comtempo da Casper Libero.

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  • Revista Eletrnica CoMtempo uma publicao do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da Faculdade Csper Lbero

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    Artigo

    Rtulos narrativos: fico, no fico ou fico fingida?

    A classificao de narrativas no conflito Israel-palestino.

    Paula Lima Gomes1

    Resumo

    O artigo discute a classificao narrativa, no contexto Israel-palestino, da

    historiografia do outro como fico fingida (ISER, 2002), na tentativa de

    oficializar-se como a Narrativa no ficcional desse conflito. Para tanto, toma

    como objeto a (des)construo de Morris (2008) em seu texto O novo livro de

    Ilan Pappe espantoso. Para pensar o conflito propriamente dito, o artigo se

    baseia nos postulados em disputa de Morris (2008, 2014), Pappe (2008, 2010)

    e demais complementaes, em articulao com outros conceitos basilares,

    como fico, fico fingida (ISER, 2002), no fico e leitura

    documentarizante (ODIN, 2012).

    Palavras-chave

    Narrativa. Fico fingida. No-fico. Israel. Palestina.

    Abstract

    This article discusses the narrative classification, in the Israeli-Palestinian

    context, of the historiography of the other as faked fiction" (ISER, 2002), in an

    attempt to formalize itself as the one nonfictional Narrative of the conflict. To do

    so, the (de)construction of Morris (2008) in his text Ilan Pappes new book is

    shocking". To think about the conflict itself, the article is based on the postulates

    in dispute of Morris (2008, 2014), Pappe (2008, 2010) and other additions, in

    1 Graduada em Publicidade e Propaganda pela Pontifcia Universidade Catlica de Minas

    Gerais. Mestranda em Comunicao Social pelo PPGCOM da Pontifcia Universidade Catlica do Minas Gerais. E-mail: [email protected]

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    conjunction with other basic concepts such as fiction, faked fiction (ISER,

    2002), nonfiction, documenting reading (ODIN, 2012).

    Keywords

    Narrative. Faked fiction. Nonfiction. Israel. Palestine.

    Introduo

    Realidade e fantasia, verdade e mentira, fico e no fico. Soltas,

    essas palavras podem representar pouco, mas ao inseri-las no conflito de

    narrativas em questo (MORRIS, 2008, 2014; PAPPE, 2008, 2010), possvel

    v-las ganhando significncia. Pois isso que parece estar em disputa no jogo

    classificatrio entre israelenses e palestinos, composto pelo rtulo positivo da

    no fico e pelos rtulos negativos da fico e sua variante dissimulada: a

    fico fingida (ISER, 2002).

    Numa reflexo problematizadora (ISER, 2012; AUG, 1998) sobre os

    termos, logo se v que a fico tem muito de realidade, porm para se legitimar

    como a Narrativa do conflito Israel-palestino2, colocando-a como no fico e

    deslegitimar a narrativa do outro, colocando-a como fico ou fico fingida

    (ISER, 2002), preciso manter as polarizaes, em que uma representa a

    verdade e a outra mentira.

    Rotular e colocar letra maiscula (Narrativa = no fico), minscula

    (narrativa = fico) ou aspas (narrativa = fico fingida, ISER, 2002) sobre si

    e sobre o outro, parece ser, nesse conflito de narrativas, dar-lhe ou retirar-lhe

    legitimidade, o que nesse caso, vale muito. Alm disso, compreender esse

    processo de classificao, tambm, compreender o prprio conflito narrativo

    e at mesmo existencial entre israelenses e palestinos, pois o que se v nas

    terras, parece se ver nos textos.

    2 A utilizao desse termo, equivalente a conflito rabe-israelense (FINKELSTEIN, 2001; SAID,

    2012; MORRIS, 2008) parte do pressuposto de que os atores envolvidos nesse conflito so o Estado de Israel e o povo palestino.

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    Breve contextualizao do objeto

    De junho agosto de 2014, o conflito Israel-palestino parece ter se

    presentificado nas esferas da diplomacia mundial imprensa internacional e

    nacional3, enquanto assunto e dilema global para alm da disputa de terras em

    questo. Mas, por se tratar de uma nfase factual, iniciada nesse ano, com o

    desaparecimento de trs jovens israelenses no dia 12 de junho, faz-se

    necessrio uma breve introduo sobre a historiografia do conflito. O que hoje

    se disputa territorialmente, j foi, em tempos passados, provncia do Imprio

    Otomano (1500-1917) e protetorado britnico (1917-1948) pontos de

    aparente consonncia na histria israelense e palestina para depois, tornar-

    se o territrio (1948-atual) que se conhece. Essa consonncia, pouco presente

    ao voltar-se em outros tempos, levanta assim, a disputa narrativa pela conexo

    histrica de um determinado povo com um certo territrio. Sendo esse, o

    problema maior do qual o conflito deriva: a quem a terra de Israel, ou Palestina,

    pertence? (MORRIS, 2014).

    Na Narrativa do historiador Benny Morris (2014), o direito de

    reivindicao da terra por judeus e palestinos , na teoria, igualmente legtimo.

    Os rabes da Palestina, por terem, desde o sculo VII, residido naquele

    territrio que tornou-se uma rea de maioria rabe com a conquista da

    provncia romana. E os judeus por j terem constitudo seu pas (MORRIS,

    2014) em 70 a.C., antes dos romanos que tomaram sua terra e dos rabes que

    a conquistaram depois e por continuarem vivendo l, durante sculos de exlio,

    mantendo o vnculo ideolgico e psicolgico com sua terra natal histrica

    (MORRIS, 2014). Sendo assim, alm de haver uma conexo histrica

    obviamente muito forte, seno os judeus no teriam voltado (MORRIS, 2014),

    h tambm, segundo o autor, um compartilhamento dessa ideia na maioria do

    mundo cristo4, assim como j houve entre os rabes5 que hoje a negam.

    3 Numa breve pesquisa no site do jornal Folha de So Paulo, foi possvel identificar, a partir das

    palavras-chaves israel e palestina, 141 textos entre 01/01/2014 14/06/2014 e 247 textos (75% a mais) entre 15/06/2014 26/08/2014, perodo bem menor, que engloba o pr-confronto (15/06/2014 07/07/2014) e o prprio confronto. 4 Ali terra deles, palavras do Ministro britnico lorde Balfour, segundo Morris (2014).

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    Ilan Pappe (2010), diferente de Morris, parte da historiografia sionista

    movimento que defendia/defende a criao/existncia do Estado de Israel e

    no da judia, para discutir o conflito e a legitimidade da reivindicao em

    questo. Pois para ele, a histria do projeto sionista a histria de um

    processo colonizatrio iniciado no fim do sculo XIX, que se utiliza da histria

    judaica como base ideolgica, a ponto de estabelecer uma conexo ancestral

    com esse lugar, para substituir o que no encontraram em nenhuma de suas

    ondas colonialistas (1882, 1905, 1917, 1948): uma terra sem povo para um

    povo sem terra slogan sionista cunhado por Herzl6. Segundo a Narrativa de

    Pappe (2010), o que em 1882, carregava um esprito revolucionrio pr-judeu

    foi, a partir de 1905, substitudo por um esprito nacionalista anti-rabe,

    originando o esquema mental do movimento sionista que perdura atualmente.

    Na Narrativa do Ministrio dos Negcios Estrangeiros de Israel, por sua

    vez, a verdade sobre a Cisjordnia (2011) : inicialmente, a Cisjordnia e a

    margem direita do rio Jordo, assim como outras terras, faziam parte do

    Imprio Otomano. Mas com a dissoluo desse Imprio na I Guerra Mundial e

    a redistribuio de suas terras entre as Foras Aliadas, ambas tornaram-se um

    protetorado ingls (1917), destinando-se, no mesmo ano, criao do Estado

    judeu com aval da Liga das Naes e do Ministro britnico lorde Balfour.

    Apesar desse reconhecimento, o Estado de Israel se constituiu em 26% do

    territrio destinado a ele, devido aos ataques de jordanianos, srios e egpcios.

    Em 1947, a ONU reafirmou o direito de constiturem seu pas mas recomendou

    (Resoluo 181) a criao de dois Estados: um judeu e um rabe. A

    recomendao acatada pelos primeiros, reduziu o territrio de Israel a 70% da

    Cisjordnia, com base numa linha de cessar fogo (1949), conhecida depois,

    como fronteira de 19677.

    J na Narrativa dos palestinos, a real verdade sobre a Palestina em

    resposta a Danny Ayalon (STANDUB, 2013) passa pela afirmao da prpria

    5 Ns sabemos que aqui terra dos judeus, mas infelizmente ns vivemos aqui agora e no

    queremos que eles voltem, palavras do prefeito rabe de Jerusalm, 1899 (MORRIS, 2014). 6 Considerado o fundador do sionismo poltico, em 1896 (FIELDER, 2003).

    7 Histria compartilhada por (ISRAEL MINISTRY OF FOREING AFFAIR, 2011): Eugene Restow,

    Arthur Goldberg e Stephen Schwebel todos juristas renomados.

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    existncia dessa nao e de seu povo, que deveria ser uma verdade histrica

    evidente (NASSER apud SAID, 2012), mas que tem sido sistematicamente

    negada. Sendo assim, a histria que deveria ser contada seria: a Palestina,

    territrio que fica entre o Mar Mediterrneo e o Rio Jordo, passou a existir sob

    esse nome em 450 a.C8. e desde ento, tornou-se conhecida assim. Dos

    escritos de Herdoto9 e Aristteles10 da Grcia antiga aos ingleses do sculo

    XIX, que se referiam ao seu protetorado como Mandato Britnico da

    Palestina11, o fato , nessa viso, que a Palestina sempre existiu e que Israel

    foi criado com base na expulso violenta de seus legtimos nativos.

    Dessa maneira, alm de afirmar a existncia da prpria Palestina, Dajani

    e Sawalha (STANDUB, 2013) confirmam a histria que Ayalon prope

    desconstruir: durante a Guerra dos Seis Dias (1967), Israel tomou a

    Cisjordnia dos palestinos; recusou a petio das Naes Unidas de se retirar

    e construiu ilegalmente os assentamentos (ISRAEL MINISTRY OF FOREING

    AFFAIRS, 2011), estabelecendo Narrativas antagnicas e nomenclaturas

    distintas para explicar o mesmo fenmeno. Pois, o que parece estar em disputa

    , primeiro, a hegemonia sobre a verdade dos fatos, que passa pela

    legitimao da prpria Narrativa e a deslegitimao da narrativa alheia e,

    segundo, a homogeneizao representativa do outro seguindo uma certa

    lgica, que pode gerar um ego to fictcio [e at mesmo incompreensvel]

    quanto a imagem que se faz dos outros (AUG, 1998, p. 32, complemento

    meu).

    Entendendo narrativas, Narrativas e narrativas

    8 Fonte (STANDUB, 2013): Robinson, Edward, Physical geography of the Holy Land, Crocker &

    Brewster, Boston, 1865, p.15. 9 Fonte (STANDUB, 2013): David M. Jacobson Bulletin of the American Schools of Oriental

    Research No. 313 (Feb., 1999), pp. 65-74. 10

    Aristoteles and E. W. Webster. Meteorology. [Charlottesville, VA]: InteLex, [200. Print. 11

    Fonte (STANDUB, 2013): Scientific Reporto of British Exploration Fund: http://www.pef.org.uk/

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    Israel conseguiu, com a ajuda de seus aliados (...), montar esta

    explicao complexa, que to complexa que s eles podem

    entender. (PAPPE, 2010).

    Essa complexidade incompreensvel para o outro, que Ilan Pappe

    levanta do mesmo modo que Morris (2008), est diretamente ligada ao

    conceito de fico e a ideia de narrativa trabalhada no artigo. Para Iser (2002),

    Aug (1998) e Lima (2006), a fico, que no exclusividade da literatura

    (LIMA, 2006, p. 279), no o contrrio do real como o saber tcito sugere, pois

    se configura como uma trade de relaes entre real, fictcio e imaginrio

    (ISER, 2002), em que o segundo faz a mediao entre os outros. Sendo assim,

    pode-se dizer que a fico se apropria de elementos do real com relaes e

    sistemas de referncia prprios , aciona e realiza certos imaginrios

    originalmente difusos, fluidos e sem referncia e os articula no texto ficcional,

    sem seguir uma certa normatividade, de maneira a criar uma terceira coisa,

    uma representao, que no a repetio exata de nada, mas que se torna um

    objeto de percepo do mundo, compreensvel a partir desse prprio contexto,

    que lhe confere um predicado de realidade (ISER, 2002).

    Dessa forma, quando Pappe (2010) diz, que a explicao israelense

    sobre o conflito to complexa que s eles podem entender, pode-se inferir,

    que a incompreenso dessa narrativa estaria, sobretudo, na falta de

    compartilhamento do imaginrio pelo outro, pois em termos do real, as

    narrativas israelenses e palestinas aparentemente se apropriam dos mesmos

    elementos, seguindo um certo ncleo narrativo elementar (GUINZBURG,

    apud AUG, 1998), apesar de fazerem selees e combinaes12 distintas,

    que acabam por particularizar a tematizao do mesmo mundo. Mas a

    problemtica principal, em termos de construo do texto ficcional, mesmo que

    no se assumam assim, seria outra, como continua Pappe (2010):

    12

    Lembrando que seleo e combinao so os outros dois atos de fingir de Iser (2002). A seleo, a identificao e apropriao intencional de elementos reais e imaginrios para o texto ficcional, que promovem a transgresso dos sistemas contextuais (ISER, 2002, p. 982) originais. E a combinao, a articulao intencional (em forma e fundo) dos elementos selecionados, que promovem uma transgresso dos espaos semnticos intratextualmente constitudos (idem) no sentido lexical e factual da narrao.

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    No, no . Realmente, ela no complexa! E por isso que a histria to

    importante. Entender a histria no to complexa do que o movimento sionista

    esteve e est fazendo para a populao indgena nativa da Palestina tudo o

    que a histria tem de ser.

    Na expectativa da revelao da fico israelense a partir da histria, que

    a princpio seria um texto no ficcional, Pappe (2010) acaba levantando nessa

    frase, a questo sobre o terceiro ato de fingir de Iser: o desnudamento da

    ficcionalidade (2002). O mundo representado no texto ficcional, como afirma o

    autor e como j se discutiu, no um mundo dado, mas (...) deve ser

    entendido como se fosse (ISER, 2002, p. 972, grifo meu), na medida em que o

    coloca entre parnteses (ISER, 2002), inserindo-o no prprio contexto do

    texto ficcional, ou seja, transformando o mundo representado num objeto de

    encenao (idem) que cria uma iluso de realidade (idem) como toda fico,

    a ponto de parecer verossmil mesmo quando entra em conflito com os cdigos

    interpretativos da recepo. Sendo assim, desnudar, seria retirar os parnteses

    do texto ficcional e faz-lo ser entendido como se fosse fico, como de fato o

    . E isso que Pappe (2010) prope que a histria o faa, j que nesse caso, a

    disputa narrativa entre fices e no fices pode acabar influenciando a

    disputa existencial do prprio conflito Israel-palestino.

    Independente das reflexes tericas introduzidas, que complexificam e

    ampliam o conceito de fico, o fato que o binmio questionado

    anteriormente (real x ficcional) parece ser comumente utilizado por israelenses

    e palestinos, devido, talvez, a um novo regime de fico (AUG, 1998) que

    estaramos submetidos e a outras duas possveis razes. Primeiro, ao fazer

    essa associao com base na definio tcita (ficcional o oposto de real),

    possvel deslegitimar o relato alheio como seno tivesse nenhuma vinculao

    com o real ou como se fingisse ter um vnculo que no tem. Alm disso, essa

    associao permite tambm, legitimar o prprio relato como se fosse a nica

    verdade possvel sobre o conflito. Verdade essa, vale ressaltar, que no

    precisa, em grau algum, ser verdadeiro, mas deve positivamente parece-lo.

    (SCHLEGEL apud LIMA, 2006, p. 284).

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    Para Iser (2002), toda fico naturalmente fingida, na medida em que

    coloca um mundo entre parnteses e o apresenta como se fosse real. Mas

    tambm da sua natureza, desnudar-se e demonstrar que se trata de um

    discurso encenado (ISER, 2002). Por isso, as fices deliberadamente

    fraudulentas, que no se revelam de forma alguma, no intuito de fingir algo que

    no so e assumir o lugar das no fices sem de fato s-las, caracterizaram

    as fices fingidas de Iser (2002) e as narrativas desse trabalho. E nesse

    lugar, que israelenses e palestinos parecem classificar o outro, se colocando

    como o elemento de desnudamento da ficcionalidade alheia, na tentativa de

    tirar os parnteses, ou melhor, as aspas da narrativa do outro. Mesmo que

    essa fico, se assim preferirem classifica-la, seja capaz de demonstrar ou

    revelar uma realidade, sem ser necessariamente alienante como pontua Aug

    (1998).

    Para Iser (2002) e, principalmente, para Odin (2012), o reconhecimento

    dessas classificaes dependem mais do contrato estabelecido entre autor-

    leitor, do que dos signos presentes nos textos que caracterizariam uma fico

    ou uma no fico, mesmo que tais indicaes possam influenciar em seus

    contratos de leitura. No entanto, vale ponderar, que alm dessa questo, as

    narrativas israelenses e palestinas esto inseridas tambm, numa apropriao

    de elementos do real, que podem ser historicamente contestveis e

    deliberadamente realizveis. Em outras palavras, preciso se perguntar at

    que ponto cada um est se remetendo a realidade e fazendo, de fato, o uso de

    Enunciadores reais (ODIN, 2012), atravs das suas historiografias. Mesmo

    que para alguns autores (AUG, 1998; ISER, 2002), o discurso cientfico acabe

    se tornando o que ele prprio critica (fices), devido a sua tendncia

    desmistificante (ISER, 2002) sobre o outro e raramente sobre si.

    No ponto de vista de Iser (2002) e Aug (1998), parece no haver muita

    possibilidade de uma narrativa se constituir como uma no fico genuna, j

    que todas acionam, de uma forma ou de outra, certos imaginrios na

    perspectiva do primeiro ou certos sonhos e fantasias na perspectiva do

    segundo. Assim como no h fices que no remetam que diferente de

    designar a realidade, ao contrrio dos rtulos duros, que israelenses e

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    palestinos conferem a narrativa do outro, para aparentemente, deslegitima-la

    em absoluto. E isso que Odin (2012) relativiza, ao estabelecer um meio termo

    analtico para essas situaes: a leitura fictivizante e a leitura

    documentarizante.

    Para Odin (2012), o importante no a existncia da realidade ou no

    realidade do representado, mas (...) a imagem que o leitor faz do Enunciador

    (p. 14), o que para ele uma operao estritamente pragmtica e externa a

    narrativa. Pois o leitor que constri o eu-origem fictcio (idem) ou o eu-

    origem real (idem), sendo que no primeiro se espera que o autor tenha

    fictivizado o seu papel, [e] que suas asseres no devam (...) ser tomadas

    como afirmaes segundo sua verdade semntica referencial (SCHMIDT apud

    ODIN, 2012, p. 14, complemento meu) e no segundo, que o autor tenha

    documentarizado o seu papel, enquanto Enunciador Real (ODIN, 2012) e que

    suas asseres possam ser tomadas como tais.

    Para as narrativas israelenses ou palestinas promoverem leituras

    documentarizantes (ODIN, 2012), a ponto de serem encaradas como no

    ficcionais, seria preciso, nessa perspectiva, que a recepo tomasse o relato, a

    narrativa, a sociedade, o escritor, o realizador e/ou o responsvel pelo discurso

    como Enunciador real (idem), desde que ele de fato o fosse, ou ento,

    produzi-lo institucionalmente como se fosse, como as instituies miditicas

    internacionais e nacionais parecem fazer acerca do conflito Israel-palestino. No

    entanto, para o autor, no final todo o leitor tem a possibilidade, no importa em

    que momento do filme [ou da narrativa, nesse caso], de se conectar [ou no]

    leitura documentarizante (ODIN, 2012, p. 21, complemento meu), pois as

    compreenses de sentido so diversas e semanticamente exaurveis, como

    diria Iser (2002). Sendo esse, o elemento incontrolvel e criador infinito de

    fissuras dessa disputa narrativa em questo.

    Na perspectiva dos autores acionados (ISER, 2002; LIMA, 2006; AUG,

    1998), essas narrativas tentam se classificar como as Narrativas e rotular o

    outro como as narrativas, j que se tratam de textos que acionam, ao menos

    teoricamente, elementos do real e do imaginrio israelense ou palestino,

    fornecendo, de acordo com a leitura do sujeito, instrues mais ou menos

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    claras quanto a sua ancoragem ficcional ou documental. Criando variaes, por

    exemplo, de narrativas pr-israelenses, como se viu no vdeo do Ministrio dos

    Negcios Estrangeiros de Israel (2011) e como se ver agora no texto de

    Benny Morris (2008), ou narrativas pr-palestinas, como se viu no vdeo de

    Dana Dajani e Lara Sawalha (STANDUB, 2013) e nas palavras de Ilan Pappe

    (2008, 2010). Deixando em aberto, portanto, a converso efetiva (AUG, 2008)

    de uma das narrativas sobre a outra.

    Reflexes sobre um processo classificatrio

    Quem estiver interessado na histria real da Palestina, de Israel

    e do conflito rabe-israelense faria bem em correr firmemente na

    direo oposta [a de Ilan Pappe]. (MORRIS, 2008, complemento

    meu).

    A frase que d incio a esse tpico e fim ao artigo de Morris (2008), O

    novo livro de Ilan Pappe espantoso, sintetiza a tnica do seu prprio texto,

    baseado no aparente desejo de (des)construo13 da narrativa alheia, por meio

    do desnudamento e, assim, da deslegitimao dos postulados de Pappe,

    presentes, especificamente, na obra A History of Modern Palestine: One Land,

    Two Peoples (2006). O intuito dessa anlise, vale ressaltar, no mostrar

    quem est certo ou errado e tampouco qual deles um ou os dois poderia

    ser desnudado, mas investigar o conflito de narrativas em questo, tendo em

    mente o processo classificatrio do texto do outro como fico fingida (ISER,

    2002).

    As divergncias entre Ilan Pappe e Benny Morris, facilmente visveis

    atualmente, j foram, em outro momento, menos presentes ou menos claras.

    Segundo Morris (2008), no fim da dcada de 1980, eles faziam parte, junto com

    Avi Shlaim e Tom Segev, do grupo conhecido como Novos Historiadores.

    Apesar de produzirem algo semelhante, que consistia na reviso da histria do

    13

    A utilizao desse termo, parte do pressuposto que ambos desconstroem a narrativa do outro, ao mesmo tempo em que constroem a sua, numa relao dialtica.

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    conflito rabe-israelense em torno da dcada de 1940, eles mal se conheciam

    e produziam, cada um em sua cidade e instituio, reflexes particulares a

    partir dessa proposta espontnea, que abalou a tradicional narrativa sionista.

    No incio de 1990, Pappe (2011) afirma que a imprensa israelense

    desqualificava os Novos Historiadores por um lado e a Academia, a nvel

    mundial, passava a considerar seus trabalhos por outro. Aps o processo de

    Oslo (1993), o esqueleto dessa nova historiografia, ligada inclusive, ao fato

    (PAPPE, 2011) dos israelenses terem sido enganados pela narrativa tradicional

    ou seja, por uma narrativa hegemnica foi admitida dentro da comunidade

    acadmica, do sistema educacional e da prpria mdia israelense e

    internacional, iniciando um debate acalorado acerca disso. Mas, no incio da

    segunda intifada Palestina (fim de 1990), segundo Pappe (2001), o panorama

    se inverteu por razes polticas e tudo que se relativizou, foi extirpado da

    cultura israelita, promovendo uma completa reverso historiogrfica e,

    consequentemente, o retorno dessa fico fingida (ISER, 2002) que teria sido

    desnudada. Iniciando, provavelmente nesse contexto, o distanciamento entre

    os autores confrontados.

    Para Morris (2008), o que prejudicou o estudo de Pappe, que ele analisa

    desde o seu primeiro livro Britain and the Arab-Israeli Conflict 1948-51

    (PAPPE, 1988) teria sido a permisso (...) que a sua poltica afetasse a sua

    histria (MORRIS, 2008), a ponto de abandonar, talvez de maneira deliberada,

    o tom moderado, brando, uniforme, que evitava a iconoclastia (idem) em

    1988, em prol de um certo fanatismo em 2006, fazendo-o esconder fatos e criar

    histrias com heris e viles. Pois para Morris (2008), Pappe coloca os

    palestinos como vtimas e os sionistas como colonizadores, desconsiderado as

    agresses palestinas e as crticas internacionais sobre a no aceitao de

    acordos. E com base nisso, que o autor inicia, uma (des)construo da obra

    do outro, a partir do que aparentemente ele acredita ser verdade.

    A tabela que detalhar essa questo, se baseia exclusivamente nos

    postulados de Morris (2008). Nesse sentido, preciso ter em mente que ele

    no menciona as referncias sobre as prprias reconstrues e tampouco

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    sobre os fragmentos que coloca entre aspas e diz ser de Pappe (2006). O que

    no invalida, vale ressaltar, a anlise sobre o conflito de narrativas em questo.

    TABELA 1 Mapeamento da (des)construo de Morris

    Histrias de Pappe (2006), segundo Morris (2008)

    Histrias de Morris (2008)

    1929: Ben Gurion preside a Agncia Judaica

    14.

    1935 e 1948: mas ele foi presidente nesses anos.

    Antes de 1936: Stern e Palmach15

    j existem. 1940-1941: mas eles foram fundados nesses anos.

    1934: Alto Comit rabe16

    criado. 1936: mas ele foi criado nesse ano.

    10/1936: Alto Comit rabe declara greve

    geral.

    05/1936 10/1939: mas ela ocorreu em outra

    data.

    1936-39: Alto Comit rabe tenta um acordo com a Agncia Judaica.

    Mas ele nunca tentou isso.

    08/1937: palestinos assassinam o comissrio

    distrital da Galilia, Major Andrew.

    09/1937: mas os palestinos assassinaram o

    civil Lewis Andrews em outra data.

    1946-48: Palmach luta contra os britnicos. 1947-48: mas eles no lutaram nesses anos.

    1947: votao equilibrada na Partilha das Naes Unidas, para criao de dois Estados.

    1947: mas a votao contou com 33 votos a

    favor, 13 contra e 10 abstenes.

    10/06/1948: assinada a primeira trgua. 11/06/1948: mas ela foi iniciada nessa data e nunca foi assinada.

    1948: Legio rabe17

    no se retira da Palestina.

    1948: mas a maior parte dela se retira.

    1948: 1 milho de palestinos se refugiam. 1948: mas foram menos de 300 mil refugiados.

    1948: foras judaicas so mais bem equipadas do que os exrcitos rabes.

    1948: mas elas no eram mais equipadas.

    1969: o moderado Eshkol no aguenta a presso da inflexvel Golda Meir durante as eleies.

    1969: mas ele morreu no exerccio do cargo e Meir, que o sucedeu, concorreu as eleies depois.

    1982: Lbano destrudo por bombardeios areos e mltiplos sobre pequenas reas.

    1982: mas o Lbano no foi destrudo, apesar dos bombardeios, que nunca foram mltiplos.

    Fedaym, grupo de resistentes, tentam recuperar as propriedades tomadas.

    Mas os fedaym, organizados pelo Egito, eram terroristas de inteligncia (MORRIS, 2008).

    H mais, a lista interminvel... (MORRIS, 2008)

    FONTES MORRIS (2008).

    Ao analisar o Mapeamento da (des)construo de Morris (TABELA 1)

    nota-se dois processos: uma (des)construo completa por um lado e uma

    14

    Organizao que representava os judeus antes da formao de Israel (WIKIPEDIA, 2014). 15

    Grupos armados israelenses (NSEIR, 2014). 16

    rgo poltico rabe que existiu durante o Mandato Britnico da Palestina (WIKIPEDIA, 2014). 17

    Fora armada voltada a segurana interna do territrio leste da Palestina (MILITARY POWER, 2014).

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    (des)construo interpretativa por outro. No primeiro, v-se uma contestao

    factual, na maioria das vezes, ligada a datas, nmeros e dados: presidncia de

    Ben Gurion, fundao do Alto Comit rabe e histrias da greve geral, acordos,

    retirada da Legio rabe, assassinato de Andrew, luta contra britnicos,

    votao da Partilha das Naes Unidas, nmero de refugiados (1948), poderio

    das foras judaicas (1948) e existncia de mltiplos ataques areos ao Lbano.

    Mas, em outros casos os postulados de um no parecem se contradizer aos

    postulados do outro:

    Mesmo que Stern e Palmach tenham sido fundados em 1940 e 1941

    (MORRIS, 2008), isso no invalida a possibilidade deles j existirem

    antes de 1936 (PAPPE, 2006, segundo MORRIS, 2008).

    Mesmo que Eshkol tenha exercido seu cargo at sua morte (MORRIS,

    2008), isso no invalida a possibilidade dela ter sido causada por

    presses de Golda Meir (PAPPE, 2006, segundo MORRIS, 2008).

    Diante dos bombardeios ao Lbano em 1982, qual seria o critrio para

    afirmar se eles foram capazes de destrui-lo (PAPPE, 2006, segundo

    MORRIS, 2008) ou no (MORRIS, 2008)?

    Diante da prtica dos fedaym, qual seria o critrio para afirmar se eles

    representavam um grupo terrorista (MORRIS, 2008) ou a prpria

    resistncia palestina (PAPPE, 2006, segundo MORRIS, 2008)?

    Independente dos processos de (des)construo acionados (TABELA 1)

    e da prpria relao, documentarizante ou fictivizante (ODIN, 2012), que ela

    possa estabelecer com seus leitores, interessante notar, que no esforo de

    deslegitimar a narrativa do outro, que Morris (2008) diz ser notadamente

    marcada pela afirmao: isso o que aconteceu (MORRIS, 2008), ele acaba

    se transformando no que mesmo critica, como diz Iser (2002):

    (...) ao tentar dominar a fico, ela se viu forada a reconhecer como

    fices as suas prprias bases, sendo obrigada a abrir mo, face

    crescente ficcionalizao de si mesma, da pretenso de ser uma

    disciplina bsica universal [ou, nesse caso, de ser uma explicao

    bsica universal] (p. 960, complemento meu).

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    Concluses e tensionamentos preliminares

    O pesquisador deve ter um pouco de audcia, alm de rigor cientfico e

    inspirado nisso, que o artigo se prope agora, a algumas concluses e

    tensionamentos preliminares igualmente suscitados pelas leituras e anlises

    terico-empricas , na tentativa de fazer uma articulao da pesquisa

    bibliogrfica com a anlise de discurso, apresentando suas questes principais

    e problematizando o que elas mesmas provocaram.

    Na perspectiva dos autores trabalhados no objeto terico (ISER, 2002;

    AUG, 1998; LIMA, 2006; ODIN, 2012) difcil identificar, a apresentao de

    uma Narrativa com n maisculo, ou seja, uma no fico genuna, que Morris

    (2008, 2014) e Pappe (2008, 2010), dizem sustentar cientificamente. Pois para

    Iser (2002), Aug (1998), Lima (2006) tudo parece ser fico, mesmo que

    esteja passvel a leituras documentarizantes (ODIN, 2012) se o sujeito assim

    quiser.

    A argumentao sobre a inexistncia da no fico genuna

    compreensvel dentro do trip de Iser (2002) realidade, fico e imaginrio ,

    mas no h um consenso sobre pensar as narrativas cientficas a partir dele

    mesmo que o autor justifique essa questo , como o caso de Morris (2008,

    2014) e/ou Pappe (2008, 2010). Ambos podem acionar, em certos momentos e

    de certas maneiras, elementos da realidade e do imaginrio, mas realmente

    no seria possvel analisar quem o faz de forma a constituir uma fico fingida

    (ISER, 2002) ou uma no fico? E at ponto a produo documentarizante ou

    fictivizante de uma narrativa no seria de fato determinante para uma dada

    leitura? Pois, mesmo sabendo que Odin (2012) problematiza essa questo, na

    medida em que discute os Enunciadores reais, ele pareceu bem otimista com

    o campo da recepo, dando uma certa soberania e poder a mesma.

    Os historiadores Benny Morris (2008, 2014) e Ilan Pappe (2008, 2010),

    por sua vez, sustentam a crtica ao outro pela suposta filiao ideolgica ou

    imaginria articulando com o conceito de Iser (2002) com um certo lado do

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    conflito. Mas, se a no fico, que eles mesmos conclamam para si, se

    legitima, sobretudo, pela existncia de Enunciadores reais, em outras

    palavras, pelo rigor cientfico que a Histria lhes exige, at que ponto tais

    vinculaes prejudicam a historiografia a ponto de legitimarem ou

    deslegitimarem uma certa narrativa? E at que ponto, os elementos

    historiogrficos acionados para sustentar tal crtica e/ou teoria tem de fato uma

    vinculao com o real? Enfim, como se poderia mensurar essa questo, a

    ponto de desnudar uma narrativa ou elev-la a no fico, tirando-lhe as

    aspas e colocando um n maisculo?

    Na impossibilidade e na falta de pretenso de responder essas

    perguntas, o artigo se finaliza, ento, com uma compreenso mais clara sobre

    o conflito das narrativas que existem em vrios nveis (ISRAEL MINISTRY OF

    FOREING AFFAIR, 2014; MORRIS, 2008, 2014; PAPPE, 2008, 2010;

    1STANDUB, 2014) e do processo de classificao (narrativa, Narrativa ou

    narrativa), que permeia esse jogo de legitimao e deslegitimao narrativa,

    entendidos aqui, como fico, no fico e fico fingida (ISER, 2002), mas

    que tambm podem ser entendidos a partir de outras categorias.

    Referncias

    AUG, Marc. A guerra dos sonhos: Exerccios de etnofico. Campinas: Papirus, 1998. 127p. FIEDLER, Teja. A quem pertence a terra Santa? Viso judaica, Paran, n 15, jul. 2003. Disponvel em: Acesso em: 03 ago. 2014. FINKELSTEIN, Norman. A Indstria do Holocausto: Reflexes sobre a explorao do sofrimento dos judeus. 3 ed. Rio de Janeiro: Record, 2001. 156 p. HOUAISS, Instituto Antnio. Realidade. In: HOUAISS, Instituto Antnio. Dicionrio Eletrnico Houaiss da Lngua Portuguesa. Verso 3.0. Rio de Janeiro: Editora Objetiva Ltda, 2009. ISER, Wolfgang. Os atos de fingir ou o que fictcio no texto ficcional. In: ISER, Wolfgang. LIMA, Luiz Costa (org.). Teoria da literatura em suas fontes. Vol. 2. 3 ed. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira, 2002. p. 955-987.

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    ISRAEL MINISTRY OF FOREING AFFAIRS. Israel Palestinian Conflict: The Truth About the West Bank. YouTube, 07 de julho de 2011. Disponvel em: Acesso em: 20 jul. 2014. LIMA, Luiz. Um instante com Wolfgang Iser. In: LIMA, Luiz. Histria. Fico. Literatura. 1 ed. So Paulo: Companhia das Letras, 2006. p. 278-291. MILITARY POWER. Soldado da Legio rabe. Military Power, 21 set. 2014. Disponvel em: < http://www.militarypower.com.br/frame4-comb29.htm> Acesso em: 21 set. 2014. MORRIS, Benny. O novo livro de Ilan Pappe espantoso. Viso judaica, Paran, n 70, jul. 2008. Disponvel em: Acesso em: 31 jul. 2014. _____________. Roda Viva | Benny Morris | 23/06/2014: entrevista [jun. 2014]. Entrevistadores: A. Clemesha, M. Guterman, M. Habib, P. Mello, A. Nunes e M. Rabinovici. So Paulo: RODA VIVA, 2014. 1 Vdeo (126 min). Disponvel em: . Acesso em: 03 ago. 2014. NASSER, Salem. Prefcio edio brasileira. In: SAID, Edward. A questo da Palestina. 1 ed. So Paulo: Ed. Unesp, 2012. Prefcio, p. VII-XV. NSEIR, Ghassan. Sionismo e Califado: semelhanas em seus aspectos e modos de atuao. Oriente mdia Culturas da Resistncia, 21 jul. 2014. Disponvel em: Acesso em: 20 set. 2014. ODIN, Roger. Filme documentrio, leitura documentarizante. Significao: Revista de Cultura Audiovisual, So Paulo, ano 39, n. 37, p. 10-30, jan.-jun. 2012. PAPPE, Ilan. Israeli Myths & Propaganda: entrevista [2008]. Haifa: Americans for a Just Peace in the Middle East, 2008. 1 Vdeo (106 min). Disponvel em: Acesso em: 25 jul. 2014. __________. Die ethnische Suberung in Palstina und das Rckkehrrecht der Palstinenser: palestra [nov. 2010]. Stuttgart: Palstina Solidarittskonferenz, 2010. 1 Vdeo (102 min). Disponvel em: Acesso em: 25 jul. 2014. SAID, Edward. A questo da Palestina. 1 ed. So Paulo: Ed. Unesp, 2012. 355 p. STANDUB. The ACTUAL Truth About Palestine in response to Danny Ayalon. YouTube, 06 de novembro de 2013. Disponvel em: Acesso em: 20 jul. 2014. WIKIPEDIA. Agncia judaica. Wikipedia - A enciclopdia livre. Disponvel em: Acesso em: 20 set. 2014.

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