revista zoom #21

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Revista Anual do Centro de Estudos do Curso de Relações Internacionais (CECRI) - "O Desconcerto Europeu: Que Afinações?"

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ÍNDICE ZOOM | 2013 | Nº214 Editorial

|O Cidadão em Ação|5 O Desconcerto Europeu: Que Afinações? UmProblema de Falta de Liderança ou de Excessode Protagonismo Individual?8 União Europeia: 'Capital Social' Procura-se9 Breve Reflexão sobre a Europa

|O Euro em Jogo|13 O Euro em Jogo: Que Soluções?15 The Eurozone, Core of a Political Zone17 Bank Bonus Compromise BodIes Ill for theSingle Supervisory Mechanism18 Situação e Perspetivas da União Europeia

|Nacionalismos, Regiões e Integração Europeia|23 Nacionalismos, Regiões e Integração Euroopeia:uma Coexistência Pacífica?25 Europeísmo, Regionalismo y NacionalismoPeriferico

|A UE como Ator Internacional|28 A UE como Ator Internacional: Versatilidadeou Dualidade?29 O Projeto Federal Europeu Prejudica a AçãoExterna da Europa?30 A União Europeia e os Desafios doDesenvolvimento31 A Projeção Global da União Europeia e aParceria Estratégica com Moscovo

33 O Projeto Europeu: Que Vias?

35 De um Mote ao Legado: Um Ano de umaCECRI Inovador

CoordenaçãoAna Ourique NogueiraJonathan da CostaArticulistasAntónio VitorinoConstantino CordalIsabel CamisãoIsabel Estrada CarvalhaisJacques DelorsJoão PintoJonathan da CostaJorge Miguel RibeiroKarel LannooLuís Lobo-FernandesPascal Teixeira da SilvaPedro LimaRita AzevedoSandra Dias FernandesSara RodriguesExecução GráficaFábio AlvesJonathan da CostaGabinete EditorialCECRI – Universidade do MinhoEscola de Economia e Gestão, Gabinete 0.22 – Campus deGualtar- [email protected]ãoCopypageO Centro de Estudos do Curso de Relações Internacionais nãopossui quaisquer direitos autorais sobre as ilustrações apresentadasnesta revista.O cumprimento do novo Acordo Ortográfico nos textos queintegram esta publicação é da inteira responsablidade dos autores.

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Perpetuar o histórico de uma atividade e de uma revista que se definem como espaços,mais ou menos gráficos, de difusão de conceções, pareceres e conhecimentos sobre problemáticasdas Relações Internacionais quer por especialistas da área ou de domínios análogos, quer poralunos. Esta frase poderia resumir a principal motivação ou missão da realização dos Colóquios deRelações Internacionais e, consequentemente, da revista ZOOM, publicação anual do Centro deEstudos do Curso de Relações Internacionais (CECRI), sempre subordinada aos temas abordadosnos Colóquios de Relações Internacionais.Contudo, tal afirmação não seria de todo verdadeira: a importância de realizar os Colóquiosde Relações Internacionais e publicar a ZOOM vai para lá do memorialismo. Continuar estelegado prende-se com uma necessidade sentida pelos estudantes da Licenciatura em RelaçõesInternacionais. A necessidade de, ano após ano, conceber um espaço próprio de expressão econfrontação de ideias, assim como, inevitavelmente, de aprendizagem.Revela ainda a indiscutível capacidade dos estudantes da nossa Licenciatura em edificar essesespaços, com brio e afinco demonstrando uma ousadia e uma força de vontade que, apesar deconstantemente renovadas, definem o espírito do estudante de Relações Internacionais.Assim, os Colóquios de Relações Internacionais e esta revista que, a estes deve a suaexistência e orientação, nunca abandonaram o norte que os motivou desde a sua origem, são provareconhecida da vontade e aptidão dos estudantes da nossa Licenciatura de conseguirem construiralgo e, mais do que isso, de se quererem superar e ultrapassar.

Construir. Superar. Ultrapassar. Estes três verbos caracterizam quase queirrepreensivelmente as necessidades sentidas pelo momento atual vivido pela União Europeia.Urge a necessidade de refletir e discutir sobre esse momento.Um momento de ‘desconcerto’, no qual a pluralidade de vozes deu lugar a uma cacofoniaque torna a harmonia quase impossível de percecionar. ‘Afinações’ são precisas. Sob esse motenasceu esta trigésima-quarta edição dos Colóquios de Relações Internacionais e, porconsequência, a vigésima-primeira edição desta revista que com enorme prazer e orgulho vosapresentamos.Uma revista que esperamos que seja mais do que isso. Que seja como os primeiros acordesque despertam orquestras. Acordemos! Orquestremos! A União também precisa de nós. Façamo-nos ser ouvidos, sem esquecer que escutar também faz parte (porque até os ouvidos educam-se).

Os coordenadores da Revista ZOOM,Ana Ourique Nogueira

Jonathan da Costa

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1. Europaà deriva?

A liderança é umacaracterística essencial de qualquer

governo ou forma de governação, mesmoquando se trata de uma entidade política complexa

como a União Europeia (UE): “a falta de liderança tornarotineira a governação. O seu aspecto político e criativo esmorece [;]

torna-se igual à administração, focando-seApenas na manutenção de um padrão e na repetição do mesmo”(Masciulli, Molchanov e Knight 2009, 4) [minha tradução]. Muito emborao desenho institucional da União preveja um número alargado depotenciais líderes, este papel foi, nos momentos decisivos, exercido comeficácia, permitindo desbloquear os principais obstáculos à acção colectiva.O “segredo” parece ter residido, até aqui, num equilíbrio (mesmo quedifícil) entre fontes estruturais e nacionais de liderança; estas últimasoperando preferencialmente através das instituições europeias (isto é, umaliderança nacional institucionalizada)(1).

Nos últimos anos, porém, elevam-se as vozes dos que criticam umaEuropa à deriva (2). Confrontados com uma crise económica e financeirasem precedentes, os actuais governantes europeus parecem ter-seconcentrado nas soluções de curto prazo que, longe de contribuírem parauma UE mais política e coesa, acentuam as diferenças. O desconcertoeuropeu tornou-se gritante. Um número cada vez maior de cidadãoseuropeus partilha a ideia de que a Europa tem falta de líderes eficientes,capazes não só de ultrapassar a crise económica, mas também de acordarum plano para o futuro da União.2. De um modelo de liderança colectiva a um excesso deprotagonismo individualA natureza híbrida da UE, pensada para englobar num único figurinocaracterísticas intergovernamentais e supranacionais, resulta numadiversidade de protagonistas com grandes interesses em jogo. Em teoria, omodelo da UE foi pensado para assentar num poder difuso entre umnúmero (crescente) de parceiros iguais – os líderes nacionais – e asfigurasque ocupam asa presidências das instituições europeias (3). Trata-sede uma divisão do poder essencialmente horizontal, em vez de vertical,que afasta a UE da estrutura hierárquica tradicional das organizações, eneste sentido, a sua liderança é complexa. Acresce que o alargamento, a

par com oaprofundamento do

processo de integração, levou amudanças nos padrões estruturais do sistema

político da UE que contribuíram para enfatizar adimensão negocial do seu processo de decisão. Significa isto que

na UE a liderança não se esgota (ou não deveria esgotar-se) no acto deinfluência de um indivíduo ou indivíduos, mas é partilhada. Na verdade,neste contexto, a chamada “liderança de personalidade” será difícil (desdelogo pela ausência de uma cobertura mediática genuinamente europeia, epelas barreiras linguísticas) e será, mesmo, contraproducente. Tal nãosignifica que a liderança não seja possível ou desejável no nível europeu.Significa apenas que para ser bem-sucedida não deverá mimetizar omodelo nacional e, por conseguinte, não deverá depender apenas daslideranças nacionais.3. A actual crise: a desvalorização das instituições

O exemplo da atual crise que a UE atravessa ilustra de formaparadigmática a “advertência” acima referida. A aparente viragemintergovernamental do processo de integração colocou a tónica nosgovernantes nacionais (em particular dos chamados Estados grandes).Com efeito, a seriedade da crise abriu uma janela de oportunidade para oexercício de uma liderança política que operasse as necessárias reformas,em especial na governação económica europeia. Devido à suaperformance económica e dimensão, a Alemanha emergiu naturalmentenuma posição de destaque, secundada pelo apoio da França.

A influência franco-alemã está longe de ser uma novidade noprocesso europeu, bastando lembrar as reformas que, em finais dos anos1980 e princípios dos anos 1990, levaram à conclusão do mercadointerno, à UEM ou à união política. Mas entre a Europa de então e a atualexistem pelo menos duas diferenças fundamentais: a Comissão (presididapor Delors) era, à época, um ator influente; ademais, embora HelmutKohl e François Mitterrand tenham tido papéis decisivos, as decisõeseram percepcionadas como fruto de um processo negocial alargado.Na Europa de hoje, a dimensão negocial continua presente (4). Noentanto, a percepção dos cidadãos europeus em relação ao processo dedecisão europeu (sobretudo em matérias relevantes) alterou-sedrasticamente. Na crise europeia, a identificação (potenciada pelos media)da líder de um Estado-membro (Angela Merkel) como a líder da União,distorce um modelo baseado na negociação. As decisões no nível europeusão assim entendidas como ditadas pela Alemanha e só depois endossadaspor alguns dos restantes parceiros europeus. Como consequência, umapercentagem significativa dos cidadãos europeus questiona a autoridadedos percepcionados líderes, ficando mais debilitada a já débil legitimidadepopular da UE.

Acresce que o potencial de liderança das instituiçõessupranacionais, como a Comissão (que deveriam guiar o processo de 5

OO DDeessccoonncceerrttoo EEuurrooppeeuu:: QQuuee AAffiinnaaççõõeess??UUmm pprroobblleemmaa ddee ffaallttaa ddee lliiddeerraannççaa oouuddee eexxcceessssoo ddee pprroottaaggoonniissmmooiinnddiivviidduuaall??

Isabel CamisãoProfessora Auxiliar Convidada da

Universidade de Coimbra

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integração inspiradas pelo valor normativo da própria integração), foifortemente alienado neste processo. No exercício das funções que lhesão atribuídas pelos tratados caberia à Comissão o exercício de uma“liderança sistémica” (Drake 2000, 52) que permitisse colocar o interessegeral acima dos interesses nacionais, quando os estados não querem, ounão podem, chegar a um consenso. No entanto, na gestão desta crise, aComissão parece ter deixado de ser a “burocracia com uma missão”(Cram citada em Drake 2000, 53) para ser apenas a burocracia.4. Notas finais

A construção da UE tem assentado num singular mecanismo departilha de poder entre as instituições europeias, e os governos dosestados-membros (agindo dentro e fora das instituições) que criou umacultura própria de “construção de consensos”. Uma análise histórica daliderança na União, particularmente no que se refere às chamadas“decisões históricas”, tende a evidenciar o papel central das fontesnacionais (particularmente dos grandes Estados). No entanto, atoresinstitucionais, (ou figuras individuais operando através de atoresinstitucionais), conseguiram em momentos-chave do processo deconstrução europeia contrabalançar o excessivo protagonismo de certoslíderes nacionais, o que se revelou decisivo para o avanço da empreitadaeuropeia (5).

Ora, este modelo europeu pensado para privilegiar formascolegiais e colectivas de liderança política tem estado, nesta crise,excessivamente refém da tónica nacional. O “interesse comunitário” hámuito parece ter abandonado os discursos dos percepcionados líderesdesta União, cada vez mais concentrados numa governação reactiva quesirva em primeiro lugar o seu interesse nacional e lhes garanta o votofavorável da opinião pública doméstica. Esta desunião subverte oprincípio basilar da igualdade entre membros da UE, colocando emlados diferentes da “barricada” estados pequenos e pobres e grandes ericos.Como sublinham académicos e antigos líderes urge, pois, mudar o rumodesta liderança pouco ou nada inspirada numa visão comum. Liderar aEuropa é também respeitar os seus valores e ouvir os seus cidadãos. Nãohá nada de mal numa liderança a diversas vozes, desde que falem, senãoem uníssono, pelo menos em harmonia. Só soluções verdadeiramenteeuropeias permitirão ultrapassar o actual desconcerto europeu.

Notas Finais:(1) O Conselho Europeu é o veículo por excelência de uma liderançanacional coletiva.(2) Ver “The EU needs leadership to tackle this crisis, not repeated doses

of austerity” [Consultado em: 12.01.2012]. Disponível em:http://www.guardian.co.uk/commentisfree/2011/jun/22/eu--

leadership--tackle--crisis--austerity. Ver também HelmutSchmidtt bemoans German and EU leadership”.

[Consultado em: 17.01.2012] Acessívelem:

http://www.bbc.co.uk/news/world--europe--

11935115;

e “Por un cambio de rumbo en la política europea” [Consultado em12.08.2012]. Disponívelem:http://internacional.elpais.com/internacional/2012/08/10/actualidad/1344624171_292393.html.(3) O quadro institucional reformado pelo Tratado de Lisboa (TL)confirma esta dispersão do potencial de liderança e de poder na UE.(4) Facto comprovado pela recusa do Reino Unido e da República Checaem assinar o novo “tratado fiscal” (Tratado sobre a Estabilidade,Coordenação e Governação da União Económica e Monetária). Comefeito, a intransigência da posição britânica, secundada pela RepúblicaCheca, (que acabaria por colocar o novo texto jurídico à margem dostratados comunitários) coloca, desde logo, dúvidas sobre o percepcionado(e anunciado) “domínio” alemão sobre os restantes parceiros europeus.(5) Como alguns académicos sustentam, uma parte do sucesso da UE édevido às instituições supranacionais e à liderança que estas (em particulara Comissão) têm sido capazes de exercer.

Referências BibliográficasBUNSE, Simone, MAGNETTE, Paul and NICOLAIDIS

Kalypso, Shared Leadership in the EU: Theory and Reality. [Consultadoem: 21.04.2011]. Disponível em:

www.sant.ox.ac.uk/people/knicolaidis/asser.doc.CAMISÃO, Isabel. 2012. Dilemas de Liderança e Legitimidade naUE: entre Pragmatismo e Inspiração”. In Maria Manuela Tavares

Ribeiro, Isabel Valente e Ana Ribeiro, eds. Europa que Futuro? OlharesPortugueses. Coimbra: CIEDA, pp. 31-45.

DRAKE, Helen. 2000. Jacques Delors: Perspectives on aEuropean Leader. London: Routledge.

MASCIULLI, Joseph, Mikhail A. Molchanov, and W. AndyKnight. 2009. “Political Leadership in Context” in Masciulli, Joseph,

Mikhail A. Molchanov, and W. Andy Knight (eds.), The AshgateResearch Companion to Political Leadership, Farnham Surrey: Ashgate

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OO CCIIDDAADDÃÃOO EEMM AAÇÇÃÃOO

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7OO CCIIDDAADDÃÃOO EEMM AAÇÇÃÃOO

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UUnniiããoo EEuurrooppeeiiaa::''CCaappiittaall SSoocciiaall'' pprrooccuurraa--sseeJonathan da CostaAluno Finalista da Licenciaturaem Relações InternacionaisUniversidade do Minho

Crise.Existirá porventura

palavra que melhorcaracterize o momento atual vivido

pela União Europeia (UE)? Possivelmentenão. E a sinfonia mediática ao redor do termo limita

ou talvez já tenha esgotado grandes originalidades e poéticas.Não podendo ainda fazer questionamentos quanto ao género da

palavra pois a língua não o permite, foco-me então no número. Crise oucrises? A crise ou as crises? Crise do capital? Talvez seja melhor, tendo emconta a discussão a que me proponho, uma alteração de preposição.Descontraia-se a contração. Crise de capital? Qual capital? Desenganem-se os que julgam que há apenas um. Económico? Com certeza.Simbólico? Cada vez mais. Cultural? Creio que não. E social? Viverá a UEuma crise de capital social?Antes de mais, torna-se crucial definir „capital social. Para tal, recorro àdefinição de Robert Putnam. O cientista político norte-americano define„capital social como “características da organização social como redes,normas e confiança social que facilitam a coordenação e cooperação parao benefício mútuo”(1). Assim, a criação de 'capital social' depende dacriação de associações de indivíduos e da manutenção de padrões deenvolvimento e participação social.Num contexto como o da UE, que tipo de 'capital social' a organizaçãodispõe ou pode dispor? Existirão ou poderão existir os padrões deenvolvimento e participação social que a União inevitavelmente necessita?Embora constituída por Estados com distintas culturas políticas e raízeshistóricas e ideológicas, os mesmos possuem uma característica emcomum: o facto de serem democráticos. Todavia, a UE é muitas vezescriticada por algum défice democrático dos seus organismos e da suaorgânica. Uma crítica que, aliás, se tem generalizado nos últimos anos. Ascrises também têm disto. No entanto, ainda mais sintomático que estedéfice democrático é o défice de querer fazer valer a democracia dentroda União. Uma democracia que se paute por uma participação ativa doscidadãos e um debate público plural que espelhem um interesse dasociedade civil em coadjuvar no processo de construção europeia.Discutir se o problema reside nas instituições europeias ou nos cidadãoseuropeus é fazer destes ovo e galinha. Assim, coloco a tónica nascondições que existem para que o cidadão europeu faça uso da suacondição, não se limitando a ser cidadão no papel: o cidadão apenas dos

direitos delivre circulação e

permanência em qualquerterritório da União Europeia ou do

direito de proteção diplomática e consularem países terceiros; e se afirme como um cidadão

com papel.O recente Tratado de Lisboa veio a reafirmar a dimensão da cidadania

europeia e de democracia representativa encetada pelo Tratado deMaastricht, mas vai mais longe, nomeadamente, através da criação deuma plataforma de participação dos cidadãos na definição das políticasda UE, a Iniciativa de Cidadania Europeia. Esta plataforma temproporcionado um alargamento da esfera de debate público, no sentidoem que prevê que, ao reunir um milhão de cidadãos da UE, estes possamsolicitar a intervenção da Comissão Europeia em determinada questão.Se existem ainda mais condições para o cidadão europeu participar davida política da União, porque dificilmente vemos essa realidade sepropagar e efetivar?Podemos assim identificar a causa do problema no nível nacional.Estarão os Estados-membros da UE a fazer a sua parte no sentido depromover uma sociedade civil dinâmica e participativa nomeadamente noque diz respeito a questões europeias? Claramente não podemos colocartodos os Estados-membros no mesmo patamar tendo em conta oesforço dos mesmos em promover uma sociedade civil consciente, críticae, acima de tudo, participativa. Contudo, verifica-se uma epidémicaausência de vontade política dos Estados-membros em trazer a Europapara as mesas menos redondas e para as quatro paredes menos formais.Não sejamos maquiavélicos na busca de razões. Limitemo-nos aoverificar de necessidades e ao perspetivar soluções.A UE vive claramente uma crise estrutural no sentido em que agita osseus pilares de natureza mais económica ou política, no entanto, vive essacrise acima de tudo por não possuir um pilar, central, constituído por'hábitos de coração' e 'hábitos de espírito', aproveitando os conceitosdesenvolvidos por Alexis de Tocqueville, fontes de muitasconcetualizações à volta do termo 'capital social'. Termos esses que nosremetem para o campo das ideias, opiniões, crenças e costumespartilhados. A UE está unicamente alicerçada em gráficos, números,instituições, políticas e políticos. Falta-lhe o pulsar e o pensar que só oscidadãos europeus lhe podem dar. E a estes falta a vontade efetiva dosEstados de, enquanto veias, porventura pouco abertas, conectar a Europacom os Europeus. A conexão é urgente. Procura-se. Façamo-nos serencontrados então.

(1) Putnam, Robert D. 1995. Bowling Alone: America's Declining SocialCapital.http://www.saddleback.edu/faculty/agordon/documents/Bowling_Alone.pdf (consultado em 3 de Abril de 2013).

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BBrreevvee RReeff lleexxããoo ssoobbrreeaa EEuurrooppaaIsabel Estrada Carvalhais

Docente da Universidade do Minho

O convite doCECRI para participarnesta edição da Revista ZOOM,dá-me a oportunidade de aqui trazer umamuito breve reflexão sobre o devir da Europa,ante os múltiplos desafios que em particular a UniãoEuropeia, os seus cidadãos e governantes hoje enfrentam. Osdesafios que aqui assinalo não serão todavia os maisimediatamente perceptíveis, colocando-se bem mais além doquotidiano das evidências políticas e económicas que tanto nosatormentam. Começo assim por sublinhar o desafio damemória.O desafio da memóriaÉ fundamental não esquecer a História, porque a História nãojustificou apenas a importância do Projecto Europeu aquandoda sua emergência há 60 anos, mas justifica hoje porque é eleainda um projecto válido e necessário. Se é certo que houverazões que foram ditadas pelas lógicas políticas e pelasdinâmicas económicas de conjunturas já terminadas, outrasrazões há que pela sua persistência têm cunhado o percurso daHistória da Europa e que justificam porque o projecto europeudeve prosseguir. E o que a História revela como persistente é aEuropa como milenar palco de rivalidades etnolinguísticas, deesgrimas entre impérios, de guerras entre linguagens de Poder,como o nacionalismo e o seu sucedâneo externo, ocolonialismo.Só com o projecto europeu, com a união de forças e devontades a Europa conseguiu nos últimos 60 anos escapar àsentença Schmittiana da guerra como o jus publicumeuropaeum, fazendo não só a gestão colectiva dos seus medos,mas mais do que isso, elevando as suas populações a patamaresnunca alcançados de bem-estar e de dignidade humanas.Sucessivas sondagens de opinião revelam que o cidadão europeunão está (ainda) descrente do projecto europeu.De facto, não obstante registarem-se algumas variações comtendência para a diminuição dessa confiança, os índices deconfiança dos cidadãos europeus nas instituições europeias têm

permanecidobastante estáveis. Faço notar aeste propósito que no Eurobarómetrodo Outono de 2012, a confiança na UniãoEuropeia subiu ligeiramente para os 33%, o que parecepouco mas não é, se atendermos a que os níveis não subiamdesde 2008, no inicio da crise económica e fianceira.Paralelamente, a percentagem de confiança, sendo modesta, éainda assim superior pela oitava vez consecutiva nos estudos doEurobarómetro, à percentagem de confiança depositada nosgovernos nacionais (27%) e nos parlamentos nacionais (28%).Por sua vez, os três indicadores principais relativos às atitudesgerais para com a União Europeia: o apoio à adesão à EU; osbenefícios percebidos dessa adesão e a imagem da UE tambémse têm mantido estáveis e em valores elevados, ou seja, sempreacima dos 45% não obstante os altos e baixos a que não sãoalheios os momentos de crise económica.No entanto, também sabemos que estas atitudes na suageneralidade positivas, tendem a contrastar com oscomportamentos, sendo a abstenção para as eleições do PEexemplo claro desse desfasamento. Recordo por exemplo, oEurobarómetro da Primavera de 2009, onde perante a afirmação‘o que nos une é mais importante que o que nos separa’, oscidadãos portugueses apresentaram das mais baixas taxas deconcordância. Muito em particular no que toca ao combate àpobreza por parte das instituições comunitárias, e numa escalade 0 a 10, em que 10 corresponderia à plena satisfação com aactuação das instituições europeias, os portugueses atribuíamapenas 3,4 pontos à acção da União, o resultado mais baixo numquadro de avaliação em que as pontuações mais altas nãoexcederam os 5,3 pontos, que foram para a actuação da EU nocombate ao terrorismo, segurança alimentar, ambiente e energia.A crítica à actuação da Europa na condução da actual crise sepor um lado revela desencanto, revela também por outro que aspessoas esperaram mais da política europeia do que das políticasnacionais e das suas elites domésticas.Mas esta quase-nota de optimismo sobre o apoio do cidadão aoprojecto europeu implícito mesmo quando o critica – porque nofundo é nele que quer continuar a confiar - não consegue por siafastar a nota negativa da frustração que esse mesmo cidadãosente em relação ao projecto.Em paralelo, assiste-se hoje ao moldar de uma sociedade queparece despreocupadamente cultivar a ignorância das suasgerações mais novas em relação à história, e já agora, em relação 9

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aos domínios científicos que tomam a acção humana comocampo da sua análise. Ora, se a frustração, que é legítima, se aliaà ignorância sobre a História em que nos desunimos e unimos,então, o resultado nunca poderá ser bom para o devir doprojecto europeu.Aos estados, que comungam de diferentes narrativas da históriada Europa, falta-lhes hoje claramente uma linguagem que seassemelhe na força e na eficiência à linguagem do paradigmanacional, mas que simultaneamente seja já ela pós-nacional, e nabase da qual se possam aproximar essas múltiplas narrativas abem de uma ideia de Europa. O projecto europeu parecia sercapaz de providenciar essa linguagem e de fazer essaaproximação de narrativas, criando o espaço para a constituiçãode um demos europeu. Porém, como esta linguagem não chegaa desenvolver-se plenamente, tendo sido isso sim disfarçada pelosucesso do integracionismo económico, agora que os desafiossurgem, vemos a sua ausência e em paralelo o potencial ressurgirde narrativas que no fundo mais não sustentam do que a tristeideia de Schmitt sobre a rivalidade como jus publico europeu. Equanto mais se ignora a História, mais ela ficará ausente, e nessaausência ficará o próprio projecto europeu, incapaz de avançarpara um outro patamar de sentido.É neste cenário portanto, que o desafio da memória se tornaainda mais imperativo. A memória do que fomos e já nãoqueremos ser, é essencial para que se saiba reconhecer o queainda valida a importância do projecto europeu e de que formase lhe quer e deve dar continuidade.O desafio da identidadeO segundo desafio que sublinho é o desafio da identidade. Maisimportante do que saber quem somos, importa que nãopercamos de vista o que queremos ser. Na construção daidentidade europeia tem existido todavia um erro frequente: atendência para colocarmos no reino da excepção toda a nossapraxis política, cultural, ou social que nos agride ou nos agrediu,que nos oprime ou nos oprimiu, que, em suma, nos envergonha.O nacional-socialismo, os fascismos ou os comunismos doséculo XX, são frequentemente alvo deste erro ao seremavaliados como excepções na construção da nossa identidadecolectiva.Da mesma forma, a política fundamentalista que persegue hojeos direitos sociais, e que os requalifica como privilégios sujeitos àdiscricionariedade de quem avalia o mérito, é também elaapresentada como uma excepção temporária, legitimada pela suasuposta inevitabilidade - como se depois de passada a actualcrise, nos venha então no futuro a ser restituída a normalidadedos dias e dos direitos.A atitude de avaliar o que nos anula enquanto cidadãos, eenquanto europeus, como apenas sendo uma excepção, umqualquer lapso no tempo da nossa razão colectiva, um interregnoimposto por uma força maior a que somos obrigados a obedecer,é já por si um enorme erro na construção saudável da identidade,mas que se agrava com o que Zigmunt Baum identificou como operigo maior: o da banalização da excepção, do lapso, dointerregno; ou seja, a aceitação passiva e gradual no nossoquotidiano, de políticas, de discursos, de práticas, em suma, devalores que atentam contra aquela que queremos seja a nossaidentidade europeia, sustentada nas ideias de liberdade,solidariedade e democracia.Mais do que valores, liberdade, solidariedade, democraciainvocam em nós formas de acção que acreditamos serem asmelhores, as mais defensáveis na edificação da praxis do sujeitoconsigo mesmo, do sujeito com o Outro e do sujeito, já cidadão,com a sociedade politicamente organizada em Estado.E no entanto, o que vemos hoje no reino da excepção

banalizada?A Liberdade do sujeito, mitigada a bem de um discurso securitárioque reinventa o Outro na forma de imigrante ilegal, decriminoso e de terrorista difuso;A Solidariedade com o sujeito, a diluir-se num discurso queafiança a necessidade imperativa do refreio da solidariedade abem, note-se do futuro da própria solidariedade.A Democracia, a fragilizar-se ante argumentos falaciosos queinsistem na ideia da acção governativa ineficiente porquecoarctada pelos excessos do debate e da lenta formação deconsensos.A meu ver, a fragilização da democracia ocorre de facto, maspor meio de algo mais perverso: a ideia, recorrente em diversosdiscursos académicos e políticos, de que as elites fazem só o queo povo lhes consente que façam. À luz da lógica que sustentatais discursos, o ónus da responsabilidade pela mediocridade dasdecisões e indecisões das elites passa assim para o cidadão. Maisdo que isso, passa igualmente a ideia de que tudo se explicaafinal pelo funcionamento da própria democracia e que tudofica assim, em certa medida legitimado, porque gerado nosinterstícios da democracia e não de um qualquer outro regime.Tudo estará bem portanto, porque democraticamente gerado.Atira-se desta feita às cordas a ideia de reforma das elites,porque em última instância, é o cidadão quem tem de se elevarde modo a conquistar uma espécie de moralidade pública quelhe permita a ulterior revindicação, então sim, de melhorescondutas por parte das elites que o governam. A imagem daselites como ciosas reprodutoras das regras colectivas quegarantem a sua auto-sobrevivência, é assim substituída pelaimagem elas como quase reféns da qualidade da moral públicado cidadão.A desculpabilização das elites parece ainda ocorrer por via deum outro discurso que aposta no sublinhar das tremendasexigências contemporâneas colocadas às elites governativas, quetêm hoje de decidir num mundo de crescente complexidadejurídica, administrativa, política e económica, presas a timingseleitorais e a regras predatórias do capitalismo global. Ora, aselites que nos governam não podem ser vistas como reféns dastramas que sustentam a presente complexidade societal,porquanto foram elas mesmas que as estimularam, e muitasvezes à revelia da vontade do cidadão.De facto, não se podendo dizer que em democracia o cidadãonão seja chamado a discutir e a construir essas racionalidades,não se pode contudo afirmar que tal ocorra verdadeiramente deigual para igual.Aliás, a exposição do cidadão ao fait accomplit é mais do queprática recorrente nas nossas democracias. Pensemos para tantono universo de medidas que uma vez já tomadas, são entãolevadas à discussão, seja em sede dos nossos parlamentos, dasnossas universidades ou das nossas empresas. Mas a medida jáestá tomada, a acção portanto já está consumada e,assumidamente consumada. Assumidamente porque, note-se,não se diz que o debate vá ainda ser incorporado no fruto final– isso seria a mentira tosca. O que aqui temos é antes a mentirasublimada: isto é, não se mente na exacta medida em que não sediz que o debate seja importante para o moldar da acção, dadecisão final, mas mente-se outrossim ao fazer crer que odebate ainda assim é útil.Cria-se portanto a ilusão do consenso legitimador da acção jáassumida, cria-se a ilusão porque, na verdade, não se pratica odebate como via da construção do consenso mas como via àposterior de concessão de uma legitimidade incorrectamenteconstruída.O cidadão vê-se assim envolvido de forma amplamenteinvoluntária, num desconcertante processo de reconfiguração dalegitimidade das decisões políticas, a qual em circunstânciasnormais de um contexto democrático, também se construiria aolongo do processo de decisão. No presente, a dimensãocomunicacional da legitimidade democrática das decisões

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políticas, padece pois de uma angustiante extemporaneidade, jáque ocorre em larga medida depois da decisão tomada. Poroutras palavras, as decisões políticas da Europa actual não sãoverdadeiramente discutidas pelos e com os cidadãos; nãoemergem de um real confronto de ideias e de interesses. São simapresentadas, ou como fait accomplit, ou como inevitáveis, oque em termos práticos vai dar ao mesmo.O que se espera é que de seguida o cidadão as sancione. Mesmoo caso grego, que tem sido apontado como exemplo do nãofuncionamento do debate à priori, num argumento falacioso queparece assim demonstrar que afinal a discussão à posterior daacção governativa, até será preferível a bem da própriademocracia (porque lhe acrescenta supostamente eficiência),mesmo esse caso, dizia, é sintomático da extemporaneidade emque ocorre o debate democrático face à decisão já assumida.que na verdade, pouco há a decidir na Grécia que já não tenhaficado decidido no passado, em larga medida por via doscomportamentos irresponsáveis das suas elites económicas epolíticas, com a conivência mais ou menos plácida da União.A confiança nas elites políticas desce, também em resposta aestes pseudodebates a que hoje se assiste. É que mesmo quandona posse de informação ou formação limitada, o cidadãoconsegue intuir que o debate político não está a acontecer notempo certo dentro do processo de decisão política; que odebate está afinal substituído pela reacção – reacção ao faitaccomplit, como tantas vezes o demonstram os nossos líderespartidários e as suas bancadas parlamentares.Quando um qualquer líder político se apresenta à pseudo-discussão desprovido já do estatuto de actor-decisor, poucoimporta então se apoia ou se critica a medida governativa; passaa ser tão relevante como qualquer cidadão que se indigna,escreve crónicas, alimenta blogues ou dinamiza tertúlias. Reagemas não decide.O cidadão intui isto mesmo, e é por essa razão quesimplesmente passou a ignorar as reacções (positivas ounegativas) dos actores políticos tradicionais como sãoos partidos políticos e os respectivos líderes, em

torno das decisões que os Governos na Europa vão pondosobre as mesas. Em última análise, o cidadão aprende a ignoraros próprios Governos, porque também eles são mera reacção,jogando o jogo que outros actores globais lhes impõem.ConclusãoO desafio da memória e o desafio da identidade sãoassim dois de outros desafios de fundo que secolocam à Europa e às suas populações, masque me parecem particularmente importantesporque neles se encerram as respostas parao que fomos e não queremos ser, e para oque queremos nos defina comosociedade: a liberdade, asolidariedade, e a democracia. Masse acreditamos que estas devemser as escoras da nossaidentidade colectiva, entãohá que estar atento ao quese passa, pois como nosdisse Ortega eGasset: eu sou eu ea minhacircunstância ese eu não asalvo, nãomesalvo.

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OO EEUURROO EEMM JJOOGGOO

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OO EEuurroo eemm JJooggoo::QQuuee SSoolluuççõõeess??Jorge Miguel Ribeiro

Mestrando em Direitona Universidade do Minho

Face àcrise actual as

interrogações quanto aosistema monetário europeu

sucedem-se, o euro revela as suasfragilidades, a própria viabilidade de todo o projecto

europeu é consequentemente arrastada para o centro dacontrovérsia, veja-se o recente caso do Chipre.

A questão tem uma dimensão alargada, o futuro que queremos para oEuro é o futuro que queremos para a Europa. Irá o projecto europeufracassar? Ou, ao invés, a solução passará por uma maior integração dosEM? Um colapso da UE faria a Europa retroceder décadas, especialmentenuma altura em que concorre com economias em crescendo e em que ummundo globalizado exige novas dinâmicas político-económicas.Tal como sucedeu no continente americano em que, outrora, os estadosamericanos optaram por uma maior integração política e fiscal, deve talsolução, agora, ser preconizada na Europa. A UE necessita de uma novaforça, de se tornar menos governamental e mais comunitária. Porém, estecaminho não se fará sem ter em conta alguns erros de percurso e algumasmudanças necessárias, urge uma “resposta europeia coordenada, emconcertação com os parceiros sociais e a sociedade civil( 1)”O obstáculo surge desde logo com Maastricht (2). Foi o avançoprecipitado para uma união monetária sem que existisse uma verdadeiraunião política e económica que gerou a base de alguns dos problemascom que hoje nos deparámos, o euro apresenta-se como uma moeda semEstado, necessitando de um governo europeu soberano que seja aalavanca da prosperidade e do progresso.O desafio passa por adoptar políticas que tornem a zona euro uma zonamonetária óptima (3), sendo certo que existem três condições necessáriaspara tal: que exista plena liberdade de circulação dos factores produtivos,que exista nesse espaço um orçamento comum forte para permitir utilizaras finanças públicas para estabilizar as economias desse espaço em caso decolapso e que as economias que o compõe tenham um suficiente grau dehomogeneidade. Muito embora os constantes avanços, a UE ainda nãorealizou satisfatoriamente tais condições.Concentro-me aqui, principalmente, na necessidade de um orçamentocomum mais forte (4), capaz de realizar objectivos político-económicos aonível de toda a UE, corrigindo assimetrias existentes entre os EM e,paralelamente, com uma dimensão capaz de possibilitar uma resposta

eficaz estabilizandoas economias nacionais

quando estas sofram choques.Neste caminho será necessário ao contribuinte

nacional tornar-se contribuinte europeu, impondo-se acobrança de taxas europeias (como já propôs a Comissão,

nomeadamente uma taxa europeia de IRC), criando-se um sistema fiscalpróprio. Na verdade, o actual direito fiscal da UE é, não um direitofinanceiro, mas essencialmente um direito económico aplicado àfiscalidade dos EM.São questões preponderantes que reduzirão a carga excessiva que écolocada nos orçamentos nacionais (5) e aumentarão os recursospróprios, tal como já era previsto no Tratado de Roma (art. 201.º).Sublinhe-se também a necessidade de criação de mecanismos de controloe supervisão dos orçamentos nacionais, medida a aplicar igualmente aosector bancário que necessita de um mecanismo forte coordenado peloBCE (6). Veja-se o relatório da Comissão intitulado “Rumo a uma UniãoEconómica e Monetária Genuína” em que são pedra-toque algumasdestas medidas.Inevitável será também um combate aos obstáculos à competitividadefomentando-se políticas de crescimento ao nível tecnológico e dainovação apoiadas em redes transeuropeias de infra-estruturas quecombatam a crescente periferização de países mais débeis. Esse será omeio para o combate ao desemprego, aumentando-se paralelamente osníveis de mobilidade profissional (a tal liberdade de circulação dosfactores produtivos que em cima referia, sendo o factor trabalho umdeles).Todos estes pontos assentando sempre numa base de cooperação (7) enuma união política sólida, apoiada numa democrática transferência depoderes dos governos nacionais para a UE. Contudo “estarão, assim, ospaíses membros da UE e os seus cidadãos dispostos a abandonar, natotalidade, o ciclo-longo de um sistema internacional definido pelacentralidade do Estado soberano?" (8).A questão formulada aquando o tratado de Nice, mantém-sehodiernamente. Urge apelar à consciência de todos os cidadãos (9) de queeste é o caminho a seguir e de que decisões sensíveis são tomadas por umgoverno europeu soberano por eles legitimado.Na base da construção da europa está a grande contradição deste tempo,que não mais pode perdurar, ”querer ser tão fortes como se a Europaestivesse unida e conservar tanta soberania nacional como se ela não oestivesse” (10).Uma nova etapa impõe-se, não deixemos a grande experiência política dahumanidade, que na verdade é ainda uma pequena parte da história daEuropa, cair. 13

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Notas Finais:(1) “Comunicação da Comissão: Europa 2020, Estratégia para umcrescimento inteligente, sustentável e inclusivo”(2) Como escreveu Luís Lobo-Fernandes: “O processo de integraçãoeuropeia suscita um grande número de dúvidas metódicas, e a incertezaconceptual continua a marcar o seu modelo. Mesmo o grandedesenvolvimento da união económica e monetária coroada pelo euro éuma realidade paradoxal, pois na maioria das experiências históricas deintegração a união política precedeu a criação de uma moeda única” in“Da Integração à Governação Europeia: Portugal, Europeização e oCarácter Multi-Sistémicoda UE” e Stijn Verhelst: “when negotiating the Maastricht Treaty,Member States made the mistake of pushing through one pillar of EMU(monetary union), while not putting in place a sufficiently strongsecond pillar (economic union)” in “Banking Union: Are the EMUdesign mistakes being repeated?”(3) Sobre este conceito veja-se a obra “Economia FinanceiraInternacional”.(4) Viviane Reading refere “Fierce argument is raging about whether thefunding given to the Brusselsbudget should be 1% or 1.05% of Europe’s gross domestic product –and then we wonder why it isharder to boost growth here than the USA. In Washington, the USA hasa federal budget that amounts toabout 35% of American gross domestic product! Is it really so surprisingthat there is no crisis ofconfidence in the US dollar, even though the USA has a higher level ofdebt than most countries inEurope (…)” in “Why we need a United States of Europe now”(5) Posição perfilhada por Miguel Poiares Maduro que acrescenta, “Indemocratic terms, such a budget and the new resources would make theUnion accountable not only for what it spends but also for the wealth itgenerates. It would distribute ‘its’ money and not that of the MemberStates. This would have a profound impact on how the EU would beconceived by its citizens” in “A new governance for the EU and theeuro: democracy and justice”. Ver, também o, ainda actual,Relatório SAPIR.(6) Cf. Vitor Constâncio “Towards a European BankingUnion”.(7) Sobre este conceito veja-se o interessante ponto devista de Daniel Innerarity in “El poder cooperativo:otra forma de gobernar”.

(8) Por Ana Paula Brandão e Luis Lobo Fernandes in “O modelo políticoda União Europeia: da ambiguidade construtiva à via neo-federal”.(9) Um fracasso como o do Tratado Constitucional Europeu não sepode repetir, “Precisamos de uma ciência política nova para ummundo completamente novo. Mas não dedicamos a isso umúnicopensamento (…)” citando Alexis de Tocqueville in “Dademocracia na América”(10) Mario Monti e Sylvie Goulard, “A Democraciana Europa: Uma perspectiva de futuro”.

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TThhee EEuurroozzoonnee,,CCoorree ooff aa PPoolliittiiccaallUUnniioonnAntónio Vitorino,Jacques Delors et al.

NOTRE EUROPEJacques DelorsInstitute

It is moreimportant than ever

to push the debate on“political union” forward that was given

a fresh impulse by the crisis rocking the Europeancountries, ahead of the European Council meeting

scheduled for 13 and 14 December and above all of the Europeanelections in 2014.

The multi-faceted crisis currently rocking the countries of Europe and thesolutions devised by the European institutions has, ironically, given a freshimpulse to the debate on “political union”: this phrase is absent from theconclusions of the European Council meeting held in June 2012 but itoccasionally presented as a goal to be achieved in the middle term. It ismore important than ever to push this debate forward on the basis ofseveral key ideas, ahead of the European Council meeting scheduled for13 and 14 December and above all of the European elections in 2014,1.Political union, a partial reality and an indispensable perspectiveThe debate raging over the projects for a “budgetary union”, an“economic union” and a “banking union” generates very highexpectations the European Council of mid-December should notdisappoint. It has the merit of reminding us that the common exercise ofcertain competences is the central issue which must underpin discussionson the “political union”, which must absolutely be put into perspective toensure the setting up of a stable and thriving EMU.To go further, we need to be clear about exactly what the expression“political union” covers, because it is understood in very different waysfrom one European country to the next, with the result that this profu-sion of different meanings has been fuelling a spate of sterile debates, asindeed it was the case with the expression “economic governance”. Thusit needs to be stressed that political union is already a European reality,incomplete and which needs to be deepened, as does the “ Federation ofNation States”(1) which the EU is too.This “European political union” is indeed based on three factors: the EUmember states have decided to exercise certain responsibilities together,and to this end they have set up common institutions, acting under thecitizens’ supervision.Such a political union faces a crucial deadline in June 2014, with electionsthat will not only be electing new MEPs for the European parliament butwill also have to ensure that the President of the new Commission isdesignated in a more democratic manner.

In thisperspective, the political

parties need to start identifying theircandidates and preparing their European

agendas and platforms ahead of these elections. It is byreference to such an event that all supporters of a more efficient andmore legitimate European integration must be mobilised.2. Combining efficiency and legitimacy through “differentiation”The euro zone crisis has already fostered a certain amount of oftenbelated (yet nonetheless welcome) progress of European integration onthe basis of a joint strengthening of the solidarity and supervisionexercised by the EU: the approval of the “European StabilityMechanism” and the adoption of the “Fiscal Compact” are the mostnotable instances of that prog-ress at this stage. All EU countries do nottake part to this progress but those willing to were able to be involved,without being hindered.But above and beyond the present crisis, it is a mat-ter of organisingbetter our “unity in diversity” in order to allow the European people torespond together to a good many of the internal and external challengesthey currently face.In each instance, setting up mechanisms allowing for a sharing of theexercise of sovereignty that is at once both effective and legitimate, tothe benefit of the EU’s member states and of its citizens should be theobjective. An improvement in “functional federalism” already operatingwithin the EU is the most reliable way of achieving this (as opposed tothe notion of a “federal leap”).The drive to combine efficiency and legitimacy must also lead to move to“differentiation” within the EU, as in the past (for instance inconnection with Schengen and with the euro) and as the recent crisisimpels us. The EMU should then be implemented through the enhancedcooperation procedure, i.e on the basis of the current treaties, so as toensure effective dovetail-ing with the functioning of the EU27.3. The euro zone, centre of gravity of European integrationThe current crisis has clearly, and sometimes pain-fully, confirmed theeconomic, financial and political interdependence of euro zone memberstates and citizens, prompting them to act in order to safeguard and tostrengthen it. It reminded us that belonging to the euro zone is based onspecific rights and duties as far as discipline and solidarity are concerned.It also underlined the flaws due to the imbalance between monetaryunion and economic union, and it must now lead to firmly address theconsequences and causes of such an imbalance.This crisis made the euro zone appear like the nat-ural core of anincreased integration, which must be based on parallel continuing actsof solidarity and control: the creation of a European supervision ofbanks under the aegis of the ECB, and extension of the rescue funds tobanks; a partial mutualisation of the issue of the euro zone membercountries’ debt (via “Eurobills” or “Eurobonds”) and a further 15

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strengthening of the Commission’s powers of control and sanction; animprovement of European coordination of eco-nomic and social policiesin order to curb the excesses and abuses that threaten the properfunctioning of the monetary union, through financial incentives offeredto member states within a contractual framework; the creation of a “cyclical adjustment fund” (2) playing the role of an insurance policyamong the members countries…On the institutional level, “euro zone summits” are already held to adoptthe broad guidelines for the euro zone to follow and to reach decisions intimes of crisis. The Commission must play its role to the full in defin-ingthese broad guidelines and in exercising all of the powers conferred on itby the treaties. The European Parliament must remain a crucial player inthe adop-tion of the European legislative and budgetary decisions. In thespirit of article 13 of the “Fiscal Compact”, cooperation betweennational parliamentarians from euro zone countries and Europeanparliamentarians must at last ensure a more open political dialogue andreinforce democratic oversight for the euro zone exec-utive entities.National parliaments must be assigned a more important role in the mainbudgetary decisions of the euro zone when such decisions have animpact on national budgets or when they concern a newbudget for the zone.

** TThhiiss aarrttiiccllee wwaass kkiinnddllyy pprroovviiddeedd bbyy tthhee NNoottrreeEEuurrooppee -- JJaaccqquueess DDeelloorrss IInnssttiittuuttee.. IItt wwaass aallssoo wwrriitttteenn bbyytthhee ppaarrttiicciippaannttss ooff tthhee EEuurrooppeeaann SStteeeerriinngg CCoommmmiitttteeee((EESSCC)) oonn 2244 NNoovveemmbbeerr 22001122 ooff NNoottrree EEuurrooppee ––JJaaccqquueess DDeelloorrss IInnssttiittuuttee,, bbeeyyoonndd tthheeaaffoorreemmeennttiioonneedd aauutthhoorrss -- JJaaccqquueess DDeelloorrss aannddAAnnttóónniioo VViittóórriinnoo..

Final references:(1) “ For a European Federation of Nation States: JacquesDelors’ vision revisited” (book by Gaëtane Ricard-Nihoul),Yves Bertoncini, Synthesis, Notre Europe, April 2012.(2) “ Completing the Euro: A road map towards fiscalunion in Europe”, Tommaso Padoa-SchioppaGroup, Study and Report Nr. 92, Notre Europe -Jacques Delors Institute, September 2012.(3) “ Towards a European EnergyCommunity: A Policy Proposal”, SamiAndoura, Leigh Hancher and Marc Vander Woude, on a proposal by JacquesDelors, Study Nr. 76 Notre Europe,March 2010.

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BBaannkk bboonnuuss ccoommpprroommiisseebbooddeess iillll ffoorr tthhee SSiinnggllee

SSuuppeerrvviissoorryy MMeecchhaanniissmmKarel Lannoo

Chief Executive Officer of the Centre forEuropean Policy Studies (CEPS)

EuropeanParliament has probablywon a Pyrrhic victory with itsposition on bank bonuses. In return, EUmember states got what they wanted withEurope’s implementation of Basel III: no bindingleverage ratio; mortgage risk weightings and capital add-ons tobe determined by member states; and no obligatory consolidatedcapital position for bank-insurance companies. In other words,Banking Union will start out with capital rules that are more likeEmmental cheese than a single rulebook. This is a hugeencumbrance for a well-functioning Single Supervisory Mechanism(SSM), and makes a single resolution mechanism impossible.The EU’s version of Basel III, or Capital Requirements Directive IV(CRD IV), comprising an EU regulation and a directive, makes thenew rules directly applicable in all 27, soon to be 28, EU memberstates and the three states of the European Economic Area: Iceland,Norway and Liechtenstein. The proposals were debated in thetrilogue between the European Parliament, the Commission andwith the EU member states in the European Council for almost tenmonths, after being formally tabled in July 2011. The wholedocument comprises more than 1,000 pages and is of unparalleledcomplexity – accommodating a wide diversity of supervisoryapproaches and banking structures.The original CRD I of 2005, incorporating Basel II, is widely seen asone of the causes of low levels of capital in the European bankingsystem, and the reason for the lack of a buffer to withstand theshocks we have seen in recent years. This Directive allowed largebanks, through internal risk ratings, to have very low absolute capitallevels – even more so for the trading book. It had a generousdefinition of capital and left many implementing options (about141) open to the member states. Some of these elements had alreadybeen corrected in the CRD II and III amendments, however.CRD IV had to be the EU’s incorporation of the global Basel IIIagreement of the G-20, but even the initial Commission proposalleft much to be desired. While CRD IV tightens the definition ofcapital at EU level and comes to higher capital requirements on arisk-weighted basis, it does not, unlike the Basel III deal, introduce abinding leverage ratio, or a minimum core capital ratio.

It alsoallows member

states not to deduct banks’equity participations in insurance

operations. Both elements supposedly ledthe Basel Committee to state that it was non-

compliant with the New Accord.In addition, member states came up with special demands for theirlocal markets, such as with the risk weightings of mortgage loans,which remain as generous as they were under CRD I, or thedetermination of capital buffers.In the context of Banking Union, a dangerous situation is emergingwhereby member states’ regulators may set different capital buffersfor local banks that will be supervised by the ECB.Hence, the ECB will be confronted with a wide array of capitalbuffers for banks, depending on the home country in question. Howto reconcile this with the Single Supervisory Mechanism remains anopen question.The European Parliament probably chose to focus on the easilyunderstandable issue of banking regulation for the benefit of thebroader public: bonuses, a symptom of lax capital standards, ratherthan to win on the causes, i.e. the narrow focus in CRD IV on risk-weighted assets, the zero-risk weighting for local currencydenominated government debt, or the many options left to memberstates. With media coverage in mind, it has now scored an importantvictory over the European Commission and the EU Council, but ithad to accept the many exceptions and exemptions that do not set asufficiently clear rule for the future of European banking.In addition, it may lead the US to state that the EU is non-compliantwith Basel III, at a sensitive time of imminent negotiations on thetransatlantic trade pact.CRD IV will certainly increase the overall levels of capital in theEuropean banking system over time, as is the ambition of Basel III,but with Banking Union in the making it should have been muchmore homogeneous in its implementation, and more straightforwardin its application.Too many backdoors are left open to a standard level of capital tocredit, and too many powers are left in the hands of member states.This also makes it impossible to introduce a single resolutionmechanism, which is the ambition of the European Council.Twenty years after the start of the single market, there is still a longway to go. Or will the ECB manage to make the difference?

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Pascal Teixeira da SilvaEmbaixador da França em Portugal

SSiittuuaaççããoo eePPeerrssppeeccttiivvaass ddaaUUnniiããoo EEuurrooppeeiiaa

A UniãoEuropeia está a

atravessar um período defortes turbulências porque o mundo

está a mudar dramaticamente e rapidamente.Isto afecta directamente a construção europeia cujos

alicerces foram concebidos e colocados há 60 ou 30 anos.A UE vive hoje um paradoxo:

- por um lado, é vista como o “homem doente” do mundo, um continentedeprimido e cercado por dúvidas sobre o seu futuro – demográfico, económico– e, até, sobre a sua identidade;- por outro lado, continua a ser um projecto formidável que permitiuultrapassar séculos de rivalidades e guerras intra-europeias e trazer paz,democracia e prosperidade ao continente europeu depois da segunda guerramundial. Por isso, a Europa continua a ser um modelo que, apesar dos seusdefeitos e dos seus problemas actuais, inspira outras regiões que procuramseguir o seu exemplo (Mercosul, ASEAN, CEDEAO, etc.).A UE enfrenta três desafios: o da prosperidade, o da democracia e o do seulugar no mundo. Nestas três áreas temos que fazer escolhas difíceis, adaptar-nos ao mundo do século XXI preservando, contudo, os nossos valores -inclusive o da solidariedade - em que assentam o modelo social europeu e opróprio projecto europeu. É necessária uma grande vontade política para ofazer e, também, para que se consiga reconciliar a UE com os cidadãos e ospovos europeus. Se não conseguirmos, corremos o risco de desmoronamento ede marginalização.I. ProsperidadeHá dois problemas fundamentais, interligados mas diferentes:No que diz respeito à UE como um todo, há um problema estrutural devido àsrápidas mudanças do mundo globalizado, com a emergência de novaspotências, que pode ser resumido assim: Como é que a Europa, cujasperspectivas demográficas são deprimentes, vai conseguir manter uma criaçãode riqueza suficiente para sustentar o seu modelo social? Dito de outramaneira: será que conseguimos manter este equilíbrio frágil enquanto a Europarepresenta 8% da população mundial, 25% do PIB mundial e 50% dasdespesas sociais mundiais? Repare-se que nenhum país europeu está isentodeste desafio; nem sequer a própria Alemanha, cujas perspectivas demográficassão sombrias, o que explica uma parte do seu comportamento: acumulação deexcedentes e de poupança, receio da inflação e de ter de pagar para os outros(o famoso “moral hazard”).Quanto à Zona Euro, a crise financeira que rebentou nos Estados Unidos em2008 e se espalhou pela Europa, foi reveladora e desencadeadora de doisproblemas graves:

- Contrariamente aoque se esperava, partilhar uma

moeda comum não favoreceu aconvergência das economias. Graças à liquidez

abundante e barata, as divergências foram disfarçadasentre uma Europa do sul, menos competitiva, com défices

externos e endividamento, habituada a fazer os ajustamentos necessários expost por via da inflação e da desvalorização da moeda, e uma Europa do norte,mais competitiva, com excedentes externos e contenções orçamentais, hostil àinflação e adepta de uma moeda forte. O que tornou esta tensão intrínsecainsustentável foi a crise económica que foi combatida por medidas contra-cíclicas que agravaram os níveis de défice e de dívida, tornando, portanto, ospaíses do sul ainda mais vulneráveis, no exacto momento em que a crisefinanceira e a desconfiança nos mercados financeiros tornaram ofinanciamento muito mais caro. Países como a Grécia, a Irlanda, Portugal,Espanha chegaram à beira da asfixia.- O euro foi uma construção incompleta, uma espécie de “capela imperfeita”,como na Batalha. De facto, tem havido uma união monetária mas ela temrevelado vários defeitos : a) um respeito insuficiente pelas disciplinas e umadebilidade dos controlos da política orçamental dos Estados-membros; b) umaausência de união bancária que permitisse, em particular, que os problemas dabanca não contaminassem as finanças públicas (como aconteceu na Irlanda, emEspanha ou no Chipre); c) uma ausência de mecanismos de gestão de crise(devida ao credo original do euro “no default, no exit, no bail-out” que serevelou um “triângulo das Bermudas”, insustentável); d) uma política monetáriavirada unicamente para a estabilidade dos preços.Porém, vale a pena salientar que, comparadas com as dos Estados Unidos, doReino Unido e do Japão, as performances da Zona Euro não são más, antespelo contrário, o que mostra que a crise é sobretudo uma crise de confiança nasolidez e na determinação da Zona Euro.A resposta europeia foi certamente demasiado lenta, insuficientementeambiciosa, por causa da novidade dos problemas que enfrentámos (nãotínhamos imaginado que pudessem acontecer), dos constrangimentos denatureza política e jurídica dentro de alguns Estados-membros e da própriaUnião Europeia que funciona com 27 Estados que são democracias e têm osseus próprios interesses.Posso dizer que, desde que a crise eclodiu, a França tem desempenhado umpapel activo para encontrar soluções e não foi a França que travou oucomplicou o trabalho imenso que a União Europeia tem feito nos últimos trêsanos. O que fizemos foi:1 – Recriar a confiança e completar a União monetária por quatro vias:- A criação de mecanismos de gestão de crise: Fundo Europeu de EstabilizaçãoFinanceira (FEEF) e depois, Mecanismo Europeu de Estabilização (MEE);devo aqui salientar que, apesar do que se ouve às vezes, a solidariedade existeatravés dos resgates sem os quais vários Estados-membros teriam entrado numprocesso de falência;- O reforço das regras e dos procedimentos para a prevenção das crises(semestre europeu, “6 pack”, “2 pack”, Tratado orçamental). Isto foi necessárioporque os mecanismos originais (critérios de Maastricht, Pacto de estabilidade)se revelaram insuficientes e não impediram o ressurgimento de divergênciasmacro-económicas. A finalidade é assegurar mais coordenação nas políticaseconómicas e orçamentais.

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- A implementação de reformas sistémicas. A União bancária foi uma iniciativatardia mas indispensável, incentivada nomeadamente pela França, que visacortar a ligação deletéria entre o risco bancário e os Estados. O Tratado deMaastricht construiu uma moeda sem fundamento financeiro. A Uniãobancária deve assentar em três pilares: uma supervisão única; um mecanismode resolução das crises bancárias que inclua a possibilidade de recapitalizaçãopelo MEE; uma garantia de depósitos. O rumo está certo, mas ainda fica muitopor fazer. Aliás, o saneamento do sector bancário passa também pela separaçãodas actividades bancárias (directiva CRD 4) e a regulação do “shadow banking”(ainda por fazer).- Um alargamento do papel do BCE. O BCE não só trouxe a liquideznecessária para que o sistema financeiro europeu não se asfixiasse (operaçõesLTRO), como também se comprometeu a salvaguardar o euro (declaração deMário Draghi, em Julho de 2012, criação do mecanismo OMT que permite acompra de títulos de dívida soberana dos países mais frágeis no mercadosecundário para que eles possam financiar as suas dívidas de uma maneirasustentável). A inflação não deve ser a preocupação número 1 num contextodeflacionário.Essas medidas são tanto mais necessárias que na zona euro a transmissãomonetária deixou de funcionar e que os mercados inter-bancários estãofragmentados, o que constitui uma negação do mercado único e, para asempresas, uma distorsão grave das condições de concorrência,independentemente dos seus próprios méritos.Por seu lado, os Estados-membros empenharam-se em implementar políticasviradas para a redução dos défices e para travar o endividamento por duasrazões, moral e económica: o endividamento significa transferir para asgerações futuras a nossa incapacidade (i.e. falta de vontade) de não gastar maisdo que se ganha; o serviço da dívida tem um peso cada vez maior nosorçamentos dos estados reduzindo, portanto, os meios para desempenhar asfunções úteis do Estado.2 – Fomentar a competitividade, o crescimento e o emprego numaUnião Europeia que tem 25 milhões de desempregados.A União Europeia dispõe de três alavancas:- O Plano para o crescimento, adoptado em Junho de 2012, com 120 milmilhões de euros (55 mil milhões dos fundos estruturais do QFP 2007/2013,orçamentados mas não gastos; 60 mil milhões de empréstimos do BEI; 5 milmilhões de “project bonds” para fomentar o investimento, tanto mais úteisquanto mais escassos forem os recursos dos vários Estados-membros).- O novo Quadro financeiro plurianual (QFP) para 2014/2020, adoptado emFevereiro de 2013. Ele foi muito criticado, mas o resultado podia ser pior. Oproblema é que muitos países pretendiam, ao mesmo tempo, cortesimportantes e descontos. A França (que é o segundo maior contribuintelíquido, sem descontos) defendia a preservação de uma capacidade de actuaçãoda União Europeia nos domínios da competitividade e da inovação, da políticaagrícola comum (que é uma política de crescimento dado o aumento daprocura agro-alimentar mundial), e da política de coesão (para fomentar aconvergência mas de uma maneira mais eficaz). Se olharmos para os números,no QFP anterior foram efectivamente gastos 860 mil milhões; o novo QFPprevê 910 mil milhões de dotações de pagamento. Uma maior flexibilidade (deum ano para o outro e entre sectores) permitirá a utilização efectiva destemontante, i.e. 50 mil milhões mais do que no QFP anterior.O QFP tem dois defeitos de construção: primeiro, quase não há recursospróprios que não transitem pelos Estados-membros. Daí a reivindicação do“justo retorno” (portanto, os mesmos pedidos de descontos, cheques). AFrança quer que haja outras fontes de recursos próprios como, por exemplo, aTaxa sobre as transações financeiras. Segundo: o orçamento europeu édemasiado rígido dado o seu tamanho (1% RNB). A flexibilização acordadapara o próximo QFP será um passo na boa direcção, mas insuficiente.- O aprofundamento do mercado único. É uma fonte importante decrescimento mas convém: primeiro, restabelecer o mercado único do ponto devista do financiamento (ver acima) e, enquanto isso não acontecer, não trataras empresas dos países periféricos como se elas estivessem numa situação igual;segundo, prosseguir também no sentido de uma harmonização social e fiscal.A União Europeia não pode resumir-se a um conjunto (quase como umespartilho) de regras e constrangimentos que se traduzem por políticas deausteridade sem que haja qualquer convergência nos outros domínios. Ora aUnião Europeia assenta em valores de progresso económico e social.Por sua vez, os Estados-membros comprometeram-se em implementarreformas estruturais, de maneira a a) tornar os mercados dos produtos e osmercados do trabalho mais flexíveis (porque o ajustamento não pode ser feitopor via da inflação – que o BCE não permite – ou da desvalorização – osEstados-membros não têm essa liberdade com o euro), restaurando acompetitividade; b) fazer com que os sistemas sociais (segurança social, saúde)sejam sustentáveis num contexto de envelhecimento estrutural das populações

europeias.Mas a grande questão que se coloca hoje é a de encontrar um bom equilíbrioentre a necessidade de pôr as finanças públicas em ordem e a necessidade,igualmente imprescindível, de fomentar o crescimento. Diz-se que ocrescimento é gerado pelas reformas estruturais e pelo restauro dacompetitividade. Mas, a curto prazo, dado o peso da despesa pública naseconomias europeias, a austeridade orçamental tem efeitos recessivos. E estarecessão pode inviabilizar o próprio cumprimento das metas de redução dosdéfices e das dívidas. Como nas peças de Molière, os doentes correm os riscosde morrer, sim, mas conforme as regras da faculdade! Isto é ainda maisnecessário uma vez que muitos países estão a fazer o mesmo ao mesmo tempo.Há riscos de espiral recessiva colectiva. Portanto, será necessário realismo e bomsenso.Com disse recentemente o Presidente Hollande: “Não há uma receita única esimplista para sair da crise: a que consiste em reduzir ainda mais depressa osdéfices, é perigosa pois conduz à recessão, ao desemprego e ao populismo; a queconsiste em cavar os défices, é impossível pois seria sancionada pelos mercados;a que consiste em defender a saída da zona euro, não é realista”.Portanto, temos que encontrar um conjunto de soluções para sair destescontradições:- É preciso flexibilizar as trajectórias (ritmo e metas) de redução dos défices edas dívidas em função do contexto económico, considerando os déficesestruturais e não as metas nominais. É isto que começa a ser feito em Portugal enoutros países europeus, inclusive nos Países-Baixos que pertence, porém, àEuropa do norte. Lembremos também que o Chanceler Schröder, em 2003,quando estava a fazer reformas estruturais do mercado de trabalho, não hesitouem libertar-se do constrangimento orçamental ao não cumprir com o Pacto deestabilidade !- O ajustamento na Europa tem sido feito de maneira assimétrica pois os paísesdeficitários têm feito esforços muito maiores do que os países excedentários, oque contribui para tornar a sua tarefa ainda mais difícil. Estes últimos deveriamfazer mais (por exemplo salário mínimo na Alemanha), em vez de seguirempolíticas deflacionárias. Eis a ironia da História: aquando da grande depressão,no início dos anos 30, a Alemanha, país deficitário, implementou uma políticadeflacionária e manteve o padrão-ouro, factor de rigidez, o que agravou a suasituação, enquanto a França, país excedentário, também fez a mesma política,dificultando a situação dos países deficitários. Sabemos quais as consequênciasdesse duplo erro.- A questão da taxa de câmbio do euro não deve ser um tabu. No momento emque os países europeus, em particular os mais vulneráveis, tentam compensar,nos mercados fora da Europa, o afundamento da procura interna e oabrandamento da procura oriunda dos parceiros europeus, o nível e as variaçõesda taxa de câmbio do euro podem aniquilar os esforços feitos para melhorar acompetitividade. Há também aqui um aspecto de assimetria: o euro não deve serbarato para o comércio de alguns (países excedentários) e demasiado caro para ocomércio de outros (países deficitários) . É a solidariedade europeia que está emcausa. Aliás, na tensão entre o valor externo (taxa de câmbio) e o valor interno(estabilidade dos preços), um abrandamento da taxa de câmbio não prejudicariaa estabilidade dos preços porque a globalização e a forte abertura do mercadoeuropeu não estão a gerar inflação.A médio prazo temos de aprofundar a UEM e avançar no sentido daquilo a queo Presidente da República chama “integração solidária”. Trata-se de reforçar acoerência, a convergência e a sustentabilidade da UEM com mais integração emais solidariedade, segundo o mote: “tanta solidariedade quanto possível, tantaintegração quanto necessário”. Note-se que a solidariedade não significa apenastransferências entre Estados-membros, mas também solidariedade entregerações, entre territórios, entre empregados e desempregados, entre “haves” e“havenots”.Quais as perspectivas?- A criação de uma capacidade orçamental da Zona Euro seria útil para se teruma ferramenta contra-cíclica para ajudar os Estados-membros onde as políticasde ajustamento têm efeitos recessivos, em particular o desemprego, e paraproporcionar recursos que facilitem a implementação de reformas estruturais noquadro da contratualização dos compromissos dos Estados-membros.- A mutualização de dívidas (i.é. não de todas as dívidas), além dos actuaismecanismos (FEEF, MEE), deve ser o ponto de chegada das políticas detransparência orçamental e será a melhor garantia de que os especuladores nãoexploram, em seu benefício, as diferenças existentes na Zona Euro.- A dimensão social é fulcral porque está no cerne do contrato social nassociedades europeias e do próprio projecto europeu. Como é que podemosconvencer os cidadãos europeus de que eles têm de fazer tantos esforços, se asua situação social está a deteriorar-se? 19

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Portanto, é preciso lidar com o problema do desemprego, em particular dosjovens. A França esforçou-se para que, no futuro Quadro financeiro plurianual,fosse garantida a atribuição de meios ao emprego dos jovens (6 mil milhões deeuros). Mas temos que ir no sentido de uma convergência das normas sociaisbásicas, incluindo a de um salário mínimo europeu.- Uma política da UE tem estado unicamente virada para a protecção doconsumidor. Daí, uma política da concorrência muito rigorosa mas que terá decuidar da protecção dos produtores de duas maneiras: primeira, num contextode aguda competição internacional, não se deve exigir mais às empresaseuropeias do que às suas concorrentes; segunda, deve ser privilegiada umapolítica industrial que visa a criação de fileiras e campeões europeus, emparticular nos sectores de futuro, o que passa, nomeadamente, por umabrandamento das regras sobre as ajudas de estado. Da mesma maneira, asituação particular das empresas dos países em fase de ajustamento deve ser tidaem conta.II. DemocraciaTemos que reforçar a adesão dos cidadãos europeus ao projecto europeu.Porque assistimos hoje a um afastamento crescente entre a União Europeia e osgovernantes, por um lado e os cidadãos, por outro. A UE é vista, por um lado,como uma golilha de normas e regras técnicas que complica a vida aos cidadãose às empresas e, por outro lado, como uma casa de correcção que impõedisciplinas que se traduzem em recessão, desemprego e empobrecimento.Pode dizer-se que a culpa é dos políticos que implementaram políticas erradasou que os cidadãos são enganados ou se enganam mas, em democracia, não épossível fazer política sem os cidadãos. O que se passou em Itália dá que pensar.Mário Monti foi elogiado pelos seus pares e pelas instituições europeias einternacionais mas não convenceu os eleitores. Será que tem de se dissolver opovo italiano ou recomeçar as eleições até que produzam um resultado queagrade a Bruxelas, Frankfurt, Washington e Nova Iorque? Claro que não.Portanto, temos que resolver os problemas de hoje e abrir perspectivasabrangentes e atraentes para conseguir a adesão dos cidadãos e dos povos.O grande desafio com que nos defrontamos é o desafio democrático, tanto maisque quanto mais difíceis e dolorosas forem as decisões, mais legítimas devem seras autoridades encarregadas de as tomar. Claro que, à mesa do ConselhoEuropeu, se sentam chefes de estado ou de governo que são eleitosdemocraticamente pelos seus povos. Mas os quatro dirigentes que incarnam aEuropa, no seu todo, não são eleitos: o presidente da Comissão europeia, opresidente do Conselho europeu, o presidente do BCE e o presidente doEurogrupo.Este desafio é urgente porque a crise alimenta os egoísmos, a todos os níveis:reparem no que se passa em alguns Estados-membros onde algumas regiõesmais ricas já não querem pagar para regiões mais pobres; na Europa, osEstados-membros querem reduzir a factura da solidariedade (a negociação doQFP foi uma triste ilustração disso) e não assumir o “moral hazard” nosmecanismos de resgate financeiro. Na negociação da união bancária, algunsEstados-membros querem regras diferentes para si (um bail-out possível cádentro) e para os outros (só um bail-in lá fora). No plano político isto traduz-sepelo êxito dos partidos populistas, xenófobos, anti-europeístas em muitosEstados-membros (até mesmo na Alemanha com o novo partido “Alternativefür Deutschland” que quer que a Alemanha saia do euro), o que é um sinalmuito preocupante e até assustador.Uma nova ameaça surge na Europa: a divisão entre um norte (eficaz, virtuoso,rico) e um sul (despesista, pouco rigoroso, pobre), acompanhada dedesconfianças e ressentimentos. Falar de inveja do sul para com a Alemanha ousaber que o património das famílias nos países do sul é muito maior do que naAlemanha, é deitar achas na fogueira. É exigido um grande sentido deresponsabilidade a todos os responsáveis públicos para travar essas tendênciasdeletérias.O problema resulta também da falta de consciência política europeia. A taxa departicipação nas eleições europeias é disso testemunha. A ausência de partidostranseuropeus na eleições do Parlamento Europeu contribui para afragmentação do espaço político europeu (assim como o facto de os dirigentespolíticos nacionais culparem a UE pelas reformas dolorosas que eles não têm acoragem de assumir).É preciso um novo contrato entre a União Europeia e os povos e cidadãoseuropeus. E é muito importante que haja uma legitimidade democrática ao níveldos Estados-membros, através dos parlamentos nacionais (neste aspecto, todosos eleitorados são importantes e respeitáveis) e ao nível da União Europeia,através do Parlamento Europeu. Se for necessária uma mudança dos tratados edas instituições, terá de se ver em função do projecto global e do que ele requer.As eleições europeias de 2014 devem ser uma oportunidade para fazermos umareflexão ambiciosa sobre o projecto europeu em todas as suas vertentes: não sóorçamental e financeira, mas também social, industrial, fiscal, comercial, da

juventude.As próximas etapas acentuarão as diferenças entre os 17 (ou mais) membros dazona euro, muito mais integrados, e os restante membros da UE. Aredefinição da articulação entre os primeiros e os segundos, assim como dopapel das instituições europeias (Comissão e Parlamento porque, ao nível doConselho, já temos uma formação própria da zona euro) vai ser o outro grandedesafio.Fala-se muito da Europa a várias velocidades ou da geometria variável que já éuma realidade, não só com o euro, mas também no que diz respeito àcirculação das pessoas – o espaço Schengen. Esta evolução pode parecercontrária ao que foi o espírito original da UE. Mas ela é inevitável, por duasrazões:- primeiro, nem todos os Estados-membros da UE querem avançar ao mesmoritmo, mas uns não devem e não podem impedir os outros de o fazer;- segundo, com os alargamentos, a coesão da UE, em termos de “background”e de visão, tem-se enfraquecido. Quanto maior for a EU, mais geometriavariável haverá.III. Lugar da UE no mundoA complexidade e a dificuldade dos problemas internos não devem fazeresquecer esta questão do lugar da UE no mundo ao qual está directamenteligada. Esta questão pode subdividir-se em duas: a da identidade (as fronteiras,os valores fundamentais) e a da finalidade (zona de livre-câmbio, a grandeSuíça, ou potência no mundo multipolar do século XXI?).Claramente a França escolhe a terceira opção. O que é que isso implica?1. No domínio económico, o mundo está a mudar rapidamente. Assistimos auma redistribuirão da riqueza e do poder a nível mundial. As regras do jogotambém mudam. Portanto, temos que tirar conclusões disso.O proteccionismo já não é, portanto, uma opção realista, sobretudo nummundo em que a interdependência das economias e a complexidade dosprocessos de produção atingiram um nível sem equivalente na história (já aparte importada das exportações atinge os 40 %, que serão 60 % daqui a dezanos). Os nossos países, que querem desenvolver as suas exportações paraapoiar o seu crescimento, estão convencidos disso.Mas a troca tem de ser justa. A teoria das vantagens comparativas, quedemonstrou o benefício que todos os países podem retirar do livre-câmbio, sóé válida se todos aplicarem as mesmas regras. O livre-câmbio não se contentacom o dumping nos seus diversos aspectos (social, ambiental, cambial), nemcom as barreiras não tarifárias e de assimetria das normas (técnicas, sanitárias,securitárias), nem com as ajudas de Estados disfarçados. Ora, a este respeito, aspráticas estão longe de ser transparentes e uniformes. O corpus das regraseuropeias foi, antes de mais, concebido para promover um verdadeiro“mercado comum” dentro da Europa. Ele tem de ser adaptado a um mundoonde os actores são cada vez mais numerosos e heterogéneos.Numa época em que os preconceitos são frequentemente mais aceites do queos factos, há quem fale do espectro da “fortaleza Europa” embora a UE seja aprimeira potência comercial (14,9% das exportações mundiais, 16,1% dasimportações mundiais) e seja também o mercado mais aberto. Em matéria demercados públicos, 90% dos da UE estão abertos às empresas estrangeiras,enquanto só 32% dos americanos, 28% dos japoneses, 16% dos canadianos e0% dos chineses e indianos, o estão (o que representa um ganho a menos de12 mil milhões de euros para as empresas europeias).A Europa deverá, pois, abordar as negociações multilaterais e bilaterais, paradefender e promover os seus interesses e obter aquilo a que se chama, na gíriaeconómica, o “level-playing field”, em particular no que diz respeito às normassociais e ambientais.Um acordo de livre-câmbio entre a UE e os Estados Unidos (cujosintercâmbios representam 40% do comércio mundial) proporcionariaoportunidades de crescimento e reforçaria a relação transatlântica, essencialnum mundo que pende para a Ásia. A França é favorável a este acordo. Mas aEuropa tem as suas particularidades sociais e culturais – quer se trate, porexemplo, das preferências dos seus consumidores em matéria de segurançaalimentar, quer do seu apego à diversidade cultural e, portanto, à especificidadeda produção neste domínio – exactamente como os Estados Unidos, com asua estrutura federal. Um acordo destes deverá ser ambicioso, inovador emutuamente vantajoso.O comércio e a moeda estão ligados entre si. Ainda que o proteccionismo nãoseja reivindicado, os intercâmbios são, mais do nunca, um instrumento aoserviço dos interesses comerciais. Também aqui a Europa não deve contentar-se com uma assimetria prejudicial deixando que o euro seja o resultado daspolíticas de câmbio das outras grandes moedas. É um domínio - assim como odas políticas orçamentais, no plano interno – em que os princípios e osinteresses dos Estados-membros da zona euro devem convergir.

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2. No domínio da política externa e de segurança, há muito para fazer pois omundo é cada vez mais multipolar e continua a ser inseguro e instável.Os Estados Unidos continuam a ser a maior potência, mas já não têm nem avontade, nem o poder de lidar sozinhos com os problemas do mundo. Para eleso centro de gravidade do mundo desloca-se para a Ásia e para o Pacífico. ANATO já não é o eixo e a ferramenta central da sua política internacional. Já nocaso da Líbia, os Estados Unidos tentaram inaugurar uma nova modalidade,“leading from behind”, deixando os Europeus – nomeadamente os Franceses eos Britânicos – fazer o trabalho principal.Neste novo mundo será que a Europa consegue ser um dos pólos? Pensar que aUE pode ser uma grande Suíça, dispensada de tomar parte na gestão das crises ena segurança internacional, porque há outros que o fazem por ela, é uma ilusão.A Suíça está rodeada de países europeus pacíficos e democráticos; a UE tem àsua volta zonas conturbadas.Ora, a UE tem, pelo menos, uma dupla responsabilidade: contribuir para aestabilização da sua vizinhança oriental e meridional.A leste, o alargamento a nove países da Europa central foi fulcral e decisivo,mesmo que este alargamento tivesse sido feito antes de se consolidar ofuncionamento interno da UE. Agora resta a estabilização dos Balcãs ocidentaise da parte europeia da antiga União soviética, a chamada “parceria oriental” querecorre a incentivos significativos se houver progressos (“more for more”).No sul, as revoluções árabes têm desencadeado uma série de recomposiçõespolíticas e sociais que agudizam ainda mais as questões económicas. A UE temum papel crucial porque, o que está em jogo, é o futuro da margem sul doMediterrâneo e a própria segurança da Europa. Cabe-nos inventar um novo tipode relações entre a UE e os países árabes que combine uma necessária vigilânciano que diz respeito aos direitos humanos e aos princípios democráticos(pluralismo, alternância) e uma cooperação renovada assente na abertura dosmercados, na ajuda à educação e formação e numa abordagem equilibrada damobilidade das pessoas.Nas questões de “hard security”, o problema que se coloca na UE resulta datensão entre :- uma abordagem irénica, pós-moderna, não-trágica do mundo. Muitosgovernos e opiniões públicas não estão longe de pensar que o mundo vai evoluircomo a Europa tem evoluído, através da cooperação e das normas;- a realidade de um mundo que não é seguro nem estável; pelo contrário, gerapermanentes tensões, crises e ameaças (proliferação, terrorismo, pirataria,criminalidade organizada, etc.);- os constrangimentos económicos e financeiros que fazem com que asnecessidades em matéria de segurança externa e de defesa sejam vistas comomenos prioritárias e os respectivos orçamentos se tornem variáveis deajustamento.

De facto, os esforços e o empenhamento dos vários Estados-membros não sãoproporcionais à sua riqueza. Alguns esquecem que “noblesse oblige”, ou seja,quando se usufruem vantagens da globalização, há que assumir o peso de lidarcom os problemas decorrentes dessa globalização.A PSDC existe, mas com grandes dificuldades, e as operações da UE lá fora nãoestão à altura do que a Europa deveria e poderia fazer. Portanto, é precisopartilhar uma mesma visão, uma mesma vontade e instrumentos comuns:- Primeiro é necessária uma harmonização da percepção das ameaças e do papelda UE para lidar com elas. O que se tem passado no Sahel é um bom exemplo:foi difícil convencer os Estados-membros de que essa zona era uma bomba-relógio que não dizia respeito apenas à França, à Espanha ou a Portugal.- A vontade precisa de ser reforçada, mas isso não se decreta. A França decidiuintervir no Mali para travar movimentos islamistas que se apoderavam deterritórios cada vez maiores e ameaçavam desestabilizar toda a zona do Sahel; aUE está apenas empenhada numa operação de formação das forças armadas doMali. Essa divisão do trabalho demonstra que ainda não há uma determinaçãopara montar uma operação de viva força; a UE ainda não apropriou de todo oleque de acções militares que as circunstâncias, por vezes, exigem.- Reforçar a mutualização dos meios (o chamado “pooling and sharing”): oconstrangimento financeiro pode e deve ser utilizado como uma alavanca paraque os Europeus progridam no sentido da criação de uma verdadeira defesacomum, pois nenhum país tem a capacidade de fazer tudo sozinho. Aliás, estamutualização é ainda mais necessária para preservar a BITD, a base industrial etecnológica de defesa da Europa.ConclusãoA crise, no sentido de passagem de um estado a um outro, como a definiaGramsci, que a UE está a atravessar é diferente das anteriores porque o que estáem causa é uma dupla transformação:- interna, para retirar todas as consequências da moeda única e alcançar umpatamar de integração sem precedente histórico;- externa, para repensar o lugar, o peso e o papel da UE no mundo globalizado.O status quo não é uma opção. O recuo seria fatal e destruiria tudo o que temsido feito nos últimos sessenta anos. Nunca esqueçamos que a política é a artede tornar possível o que é necessário. É uma responsabilidade enorme para osdecisores políticos, mas também para todos os que pensam o futuro eparticipam na formação da opinião pública. Como dizia o filósofo francêsHenri Bergson: “O futuro não é o que nos vai acontecer mas sim, oque nós fizermos”.

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NNAACCIIOONNAALLIISSMMOOSS,, RREEGGIIÕÕEESSEE IINNTTEEGGRRAAÇÇÃÃOO EEUURROOPPEEIIAA

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NNaacciioonnaalliissmmooss,,RReeggiiõõeess ee IInntteeggrraaççããooEEuurrooppeeiiaa:: UUmmaaCCooeexxiissttêênncciiaa PPaaccííffiiccaa??Pedro LimaMestrando em Gestão naUniversidade CatólicaPortuguesa

Os europeusconduziram a primeiravaga da globalização,derrubaram Impérios, erigindo em seulugar Estados, empunharam as Luzes queabriram caminho à Revolução Industrial e travaramduas Guerras Mundiais que transformaram prosperidadeem cinzas. Reergueram-se dessas cinzas e reinventaram-se, uniram-se na diversidade regional, reconstruindo os pilares identitários detoda uma civilização. Esses europeus parecem não mais ser osmesmos, parecem não mais ser herdeiros de um legado de homenscom visão, um legado de culturas seculares que colocaram de lado aforça das armas e trouxeram para a mesa de negociação a força dosargumentos, da solidariedade, a vontade individual de um futurocoletivo. Assim nasceu e se cultivou uma identidade europeia, no seiode um projeto integracionista que, durante décadas, exerceu umpoder de atração como talvez nenhum outro venha a alcançar. Esseprojeto dá hoje pelo nome de União Europeia (UE) e a suaidentidade somos nós. Mais de 500 milhões de europeus, 27 Estados-membros, 23 línguas oficiais, uma imensa diversidade cultural, umúnico destino - a paz conjunta.Falar de integração europeia implica ter plena noção que estaresulta de uma história forjada na base de nacionalismos, forjada noconvívio (nem sempre pacífico) com diferentes culturas ecivilizações. Diz-nos Milan Kundera que “na Idade Média, a unidadeeuropeia repousava na religião comum. Nos Tempos Modernos, elacedeu o lugar à cultura (à criação cultural) que se tornou narealização dos valores supremos pelos quais os Europeus sereconhecem, se definem, se identificam. Ora, hoje, a cultura cede,por sua vez, o lugar. Mas, a quê e a quem? Qual é o domínio onde serealizaram valores supremos susceptíveis de unir a Europa?” (1) .Hoje, a Europa atravessa uma crise de identidade sem precedentes,fruto da grave crise económico-financeira que se propagou peloglobo e se fez sentir com particular ênfase no velho continente. Estacrise tem impactado profundamente a, nem sempre fácil, relaçãoentre nacionalismo e a identidade europeia. Identidade estapromovida por um incomparável processo de integração à escalacontinental, a UE.Este projeto apaixonante encontra-se ameaçado, consequência dascrescentes divergências quanto às políticas económicas e financeirasa adotar para enfrentar a profunda crise em que mergulhamos.

Amemória pareceter-se desvanecido e opluralismo sucumbe lentamente àdivisionista narrativa política. Não são tanquesde guerra nem armas em punho, é o remexer nas cinzasdo passado, o desenterrar de fantasmas que poderão surtir efeitostão ou mais nefastos quanto as irracionalidades dos discursos deoutrora.As conquistas de décadas de corajosas iniciativas que nosaproximaram e nos fizeram ter consciência dos benefícios de fazerparte de algo que transcende as fronteiras do nosso berço, parecemnão mais ter lugar nos discursos de quem nos lidera.O acanho e atimidez política, assim como a emergência do sector financeiroenquanto “suposto” ator das relações internacionais, e ao qual osEstados parecem haver hipotecado a sua soberania, consubstancia-se no erigir de fronteiras que julgávamos haver já remetido àintangibilidade do principio da “solidariedade de facto”.Principio que Robert Schumann tão efusivamente nos transmitiu a 9de Maio de 1950: «A Europa não se fará de uma só vez, nem deacordo com um plano único. Far-se-á através de realizaçõesconcretas que criarão, antes de mais, uma solidariedade de facto.» (2)Pergunto-me, onde reside a solidariedade numa Europa em que osconstituintes mais bem-sucedidos apontam o dedo à displicência efalta de rigor dos membros mais vulneráveis enquanto fator dedesculpabilização por décadas de cega leviandade na orientação daspolíticas económicas e financeiras da União? Como se poderáresistir ao ímpeto nacionalista quando no seu interior emergeminiciativas e se proclamam discursos que apenas resultam na“maquiavelização” das diferenças intra-regionais que constituem ariqueza e a razão de ser da identidade europeia?Falar em coexistência remete-nos para a assunção de duas realidadesdistintas. Tal não poderia ser mais errado, pois a identidade europeiaresulta da abertura e da pluralidade cultural, a diversidade denacionalismos, uma heterogeneidade que nos sustenta enquanto“unidade maior” e nos homogeneiza enquanto civilização ao longoda história. Esta diversidade cromática é a nossa maior riqueza,fator central para que nos identifiquemos enquanto europeus, semela deixaremos de o ser e corremos o risco de regressar às origens,ao desencantamento. Identificar-nos-emos como europeusenquanto podermos ser fiéis às nossas idiossincrasias, deixaremosde o fazer quando nos tentarem homogeneizar numa realidade quenão nos pertence.A queda dos impérios remete-nos para isso mesmo, o insurgir dasnações contra a homogeneização identitária, e o processo deintegração europeia não deve enveredar pelo facilitismo dahomogeneização, sob pena de sucumbir perante a sua maior força, adiversidade. 23

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Infelizmente, a resposta aos desafios que enfrentamos tem sidonessa direção, da homogeneização alimentada por uma cega crençana teoria económica, assim como por lideranças políticasagrilhoadas pelos calendários eleitorais, colocando acima dointeresse europeu o egoísmo próprio do interesse nacional, mas,mais grave do que isso, o egoísmo próprio do medíocre interessepolítico-partidário. Da Europa Central e Nórdica chegamorientações de “germanização” e de “nordificação” do Sul. Emergeassim uma cega orientação de que é possível reestruturar aseconomias mais vulneráveis tendo por base o exemplar sucesso dealguns, remetendo as especificidades da unicidade para o campo damera dissonância estrutural. Opta-se por subjugar a diversidade quenos sustem - os pilares da identidade europeia - a uma mera linha deorientação política, económica e financeira.Parecem não vislumbrar que ao enveredar pela projeção do “eu” nocomportamento dos demais colocam em causa a “unidade maior”(3), o garante da nossa identidade coletiva, a diversidade de regiões enações que nos constitui e nos identifica aos olhos do mundo. Agrandeza do projeto europeu, aquilo por que todos nos reconhecem,reside na capacidade que sempre tivemos em acolher e integrartodos os que de algum modo se identificam com os demais.

A UE proporcionou-nos uma oportunidade única na história, aoportunidade de derrubar fronteiras sem deixar de ser quemsomos, e de o sermos sem aspirar a que os outros também osejam. Só uma Europa compreensiva e efetivamente solidaria,onde as nações possam declarar o futuro a que aspiram sem queeste lhes seja imposto, poderá ser fonte e raiz de uma verdadeiraidentidade europeia, de uma identidade construída com recursoà diversidade regional e nacional que outrora nos separou masque hoje nos mantém unidos.

Notas Finais:(1) Milan Kundera, in "A Arte do Romance", Editora DomQuixote, 1988.

(2) Robert Schuman, in “Declaração Schuman“, 9 de Maio de1950.(3) Francisco Lucas Pires, in “A Revolução Europeia”,Parlamento Europeu – Portugal, Lisboa, Maio de 2008.

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Constantino CordalDocente da Universidade

de Vigo

EEuurrooppeeííssmmoo,,RReeggiioonnaalliissmmoo yyNNaacciioonnaalliissmmooPPeerriifféérriiccoo

Históricamente,el regionalismo en

Europa ha sido una respuestatanto a las necesidades de los Estados

como a la presión externa ejercida sobre ellos.Los Estados unitarios llegaron a la conclusión de que

era necesaria una articulación espacial promovida medianteplanes y políticas regionales. También aceptaron con un mayor o

menor grado la necesidad de promover el diálogo en el nivel intermedio yganar la colaboración de los gobiernos locales, con sus responsabilidadesreferentes al uso del territorio y a los servicios, y de las élites económicasregionales en la promoción de estrategias de desarrollo; por ello, se haproducido, desde los años sesenta, el establecimiento de planificaciónregional en un número creciente de Estados europeos (Keating, 1993).Para Keating (1993), el regionalismo también ha sido promovido enEuropa como respuesta a reafirmaciones de identidad cultural e histórica.En este sentido, el Estado belga se ha descentralizado progresivamentehasta convertirse en Estado federal; mientras que en el Estado español elreconocimiento de las demandas de Cataluña y País Vasco era unaprioridad desde el final del régimen franquista.De Castro Ruano (1994: 29) cree que el nexo entre “hecho regional” y“nacionalismo" es, fundamentalmente, consecuencia de que el primerotiene como una de sus motivaciones principales, aunque no la única, ladesactivación del potencial conflicto nacionalista. Y ciertamente enalgunos casos la regionalización ha resultado exitosa en tal menester.Aunque, en otros, la regionalización no ha puesto fin al conflicto nacional:"El caso español revela las limitaciones del modelo territorial detransferencia de poderes (esencialmente cuando se aplica a todo elterritorio del Estado) para resolver conflictos étnicamente fundados, ypara aceptar exigencias cuyo último objetivo es la autonomía(ampliamente definida), e incluso la independencia" (Clark, 1992: 20).Al igual que sucede con el concepto de Región, no estamos por tanto anteuna realidad homogénea y uniforme. Loughlin (1996: 148-149) señala tresformas de Regionalismo: 1) el regionalismo igualitario de la ciudadanía delEstado; 2) el regionalismo autonomista moderado; y, 3) el regionalismoseparatista radical. Este último, cuya denominación más acertada es la denacionalismo étnico o periférico, únicamente se percibe, según Loughlin(1996), en dos Estados de la Unión Europea: España (Cataluña, PaísVasco y Galicia) y el Reino Unido (Escocia, Gales e Irlanda del Norte).Loughlin no menciona otros nacionalismos con tintes separatistas comoel flamenco (en Bélgica), el corso (en Francia) o el lombardo (en Italia).

Moreno(1997: 28), en

cambio, no se muestrapartidario de utilizar el término

Regionalismo cuando nos estamosrefiriendo a un Nacionalismo Periférico:

"Regionalismo no es sinónimo de nacionalismo. Laidentidad no implica el mismo grado de compromiso afectivo

que la que genera el nacionalismo. Una región producto de unarestructuración del poder territorial estatal no suscita el mismo nivel dealianza social y autoadscripción entre sus ciudadanos que el de unanación. Ello, no obstante, puede variar a resultas de los procesos desocialización subsiguientes. Cuando los sentimientos regionalistas sesostienen en un basamento étnico propio (etnorregionalismo), sucategorización diferencial con respecto a los lazos afectivos nacionalistas(etnonacionalismo) se convierte en una tarea compleja para el científicosocial. Ello se ilustra con la autotransformación de los partidos políticosregionalistas en nacionalistas".Por otra parte, una mayoría de autores rechaza las hipótesis que ven elregionalismo (o el nacionalismo periférico) como una ideología opuesta aleuropeísmo. Keating (1993: 296) cree que son fuerzas perfectamentecomplementarias, y que resulta plenamente factible ser europeísta y, a lavez, regionalista (o, cabe añadir, nacionalista periférico). Esta teoría hasido corroborada en la práctica en numerosas ocasiones. Aunque, tambiénes cierto que no todos los nacionalistas étnicos o periféricos ven conbuenos ojos el actual proceso unificador europeo representado por laUnión Europea (UE). Su oposición a este proceso viene determinada, enalgunos casos, por su identificación con planteamientos de caráctermarxista. No obstante, podemos afirmar que, hoy en día, la mayoría de losregionalistas y nacionalistas periféricos europeos se encuentranidentificados con el proceso de construcción europea.La evolución del proceso de integración europea parece habertransformado el papel de las Regiones. Ahora, la Región es, en ciertoscasos, "la base natural con la cual se identifica el ciudadano" y, junto conel proceso de integración europea, actúa contra el Estado-Nación comomodelo de organización política (De Castro Ruano, 1994: 94). Ladescentralización de los Estados miembros de la Unión Europea y laafirmación regional han tenido lugar de forma simultánea al proceso deconstrucción comunitaria, y cambiando la estructura de los Estados queforman la UE (De Castro Ruano, 1994).Para Sobrino (2001: 26), la conjunción de la regionalización infraestatal ydel regionalismo interestatal se encuentra en la línea abierta por el Tratadode Maastricht, de diciembre de 1991, pues, de lo que se trata es de"fortalecer una Unión Europea en la que las decisiones puedan sertomadas lo más cerca posible de los ciudadanos y en las condiciones deuna mayor eficacia".El proceso de integración europea puede convertir en aliados políticos ala Comisión y a las entidades regionales; pues, con frecuencia, ambos venen el Estado-nación un obstáculo para elaborar y ejecutar sus políticas.De hecho, en las décadas pasadas, sobre todo en los años noventa, lasRegiones incrementaron considerablemente su participación en laedificación del proyecto común europeo. 25

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Las formas características generalizadas de expresión de esta participaciónregional en la UE son las siguientes:1) Las oficinas regionales situadas en Bruselas, que actúan como gruposde interés y forman parte de la democracia consultiva comunitaria.2) Los partidos políticos regionalistas (o nacionalistas periféricos)representados en el Parlamento Europeo.3) La presencia de representantes regionales en el Comité de las Regiones.Ahora bien, una de las máximas aspiraciones de los regionalistas (ynacionalistas periféricos) de los Estados miembros de la UE a lo largo delos últimos años ha sido la participación directa de sus entidadesregionales en las instituciones comunitarias más poderosas (incluyendo suparticipación en la institución decisoria por antonomasia: el Consejo).Así, la integración europea y la institucionalización regional han venidorepresentando retos de gran importancia para el Estado-nación europeo.Como se ha señalado, en un principio, ambas pueden parecer fuerzascontradictorias, una anhelando el gobierno a gran escala y lacentralización, y la otra buscando la segregación. Pero, en la práctica, surelación es mucho más compleja, a veces conflictiva, y a menudo unen susesfuerzos para superar al Estado-nación (Keating, 1993).Numerosos autores han expresado también su convicción de que lapropia existencia de la UE incentiva, impulsa o favorece la aparición deprocesos descentralizadores en el interior de los Estados miembros, e,incluso, fortalece a las regiones o naciones ya existentes en el seno de losmismos. En algunos casos, como ha dicho Keating (1993), lasdescentralizaciones se producen por razones meramente administrativas yson dirigidas desde las administraciones centrales de los Estados, pero, enotros, son razones políticamente más poderosas, las que promueven lasdescentralizaciones. En éstos, las reivindicaciones descentralizadorasparten de colectividades con una identidad nacional propia, que, con todaprobabilidad, no se darán por satisfechas con la adquisición de un estatusmeramente regional. En este contexto, Petschen (1998) cree convenientereconocer, de alguna manera, a las naciones sociológicas y noexclusivamente a las políticas, es decir, a los Estados. Las reivindicacionesde autogobierno de las primeras parecen plenamente legítimas, y, aunquepor razones empíricas se empezase reconociendo a las naciones políticassolamente, debería establecerse cierta flexibilidad en relación con lasnaciones sociológicas aunque formen parte de un mismo Estado(Petschen, 1998: 68). Así, “la regionalización de Europa ha sido unvalioso instrumento para que las naciones tengan un elemento depotenciación útil y pacífico. En la labor de las regiones europeas, han sidolas que contienen una nación sociológica, aquéllas que han impulsado conmayor denuedo y eficacia el despertar y el engrandecimiento de lasregiones. La Europa de las Regiones puede ser además un medio aptopara el reconocimiento de la Europa de los Pueblos” (Petschen, 1998:69). Por su parte, Marks y Llamazares (1995: 164) están de acuerdo enque el peso político y los recursos institucionales de los movimientosnacionalistas periféricos y regionalistas han aumentado notablemente enlas últimas décadas, de tal forma que objetivos que antes parecíanutópicos, y estaban destinados a reforzar la identidad y solidaridad de losmiembros de estos grupos, más que a su inmediata realización práctica,parecen hoy mucho menos lejanos que en el pasado. Por este motivo, lacreación de una politeya europea fortalece a los movimientosetnoterritoriales que ponen en cuestión a los Estados-nación existentes enEuropa occidental (Marks y Llamazares, 1995: 164).El contexto actual de grave crisis económica puede hacer mella en lasentidades regionales no justificadas políticamente, al ver reducidos susrecursos y su capacidad de prestación de servicios públicos a losciudadanos.

Cabe incluso la posibilidad que se produzca algún proceso derecentralización de competencias, relacionado con la coyuntura de la crisisy el desmantelamiento del Estado de Bienestar en buena parte delcontinente europeo (de manera evidente en los países del sur). Sinembargo, aquellas regiones que poseen un fuerte sentimiento identitariode carácter nacional seguirán desempeñando un papel relevante en losescenarios estatal y europeo. De las denominadas naciones sin Estado,cabe destacar claramente determinados territorios que parecen decididosa incrementar su autogobierno e incluso reivindicar su soberanía en lospróximos años; aunque, siempre dentro del marco de la UE. Nosreferimos a Cataluña y País Vasco en España, a Escocia en el ReinoUnido y a Flandes en Bélgica. Será su ciudadanía quien tenga la últimapalabra en los referendos previstos entre 2014 y 2016.

Referencias bibliográficasCLARK, R., “Democracia española y autonomía regional: el sistema delas Comunidades Autónomas y el autogobierno para las patrias étnicas”,en RUDOLPH, J., y THOMPSON, R., Política etnoterritorial. Desafíosen las democracias occidentales, Pomares-Corredor, Barcelona, 1992.DE CASTRO RUANO, J.L., La emergente participación política de lasregiones en el proceso de construcción europea, Instituto Vasco deAdministración Pública, Bilbao, 1994.KEATING. M., “The Continental Meso: Regions in the EC”, enSHARPE, L.J., The Rise of Meso Government in Europe, London, 1993.LOUGHLIN, J., “Europe of the Regions and the federalization ofEurope”, Publius, nº 26, 1996.MARKS, G. y LLAMAZARES, I., "La transformación de la movilizaciónregional en la Unión Europea", Revista de Instituciones Europeas,Madrid, enero-abril, 1995.MORENO, L., La federalización de España. Poder político y territorio,Siglo Veintiuno, Madrid, 1997.PETSCHEN, S., “Una Europa de Estados, de Pueblos y de Regiones”,Política y Sociedad, nº 28, Madrid, 1998.SOBRINO HEREDIA, J.M., La acción exterior de las ComunidadesAutónomas. Especial referencia a Galicia, Fundación Galicia-Europa,Santiago de Compostela, 2001.

AA UUEE CCOOMMOO AATTOORRIINNTTEERRNNAACCIIOONNAALL

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AA UUEE CCOOMMOO AATTOORRIINNTTEERRNNAACCIIOONNAALL

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AA UUEE ccoommooAAttoorr IInntteerrnnaacciioonnaallVVeerrssaattiilliiddaaddeeoouu DDuuaalliiddaaddee??Rita Azevedo

Aluna Finalista da Licenciatura emRelações Internacionais

"My message to youis that Europeans must focus

on, and act in, the wider world. That isthe kind of Europe which I, as the President of

the Commission, want. An open Europe. A generousEurope, which spreads its drive and determination for change

beyond its borders. A Europe which engages with the world, rather thantrying to avoid it.”

José Manuel Durão Barroso, 2005Nas palavras do actual Presidente da Comissão Europeia, numa conferênciaproferida na London School of Economics, em 2005, é mais uma vezsublinhada a vontade europeia em fomentar compromissos com o mundo, eem fazer da UE um sujeito de cooperação e de parceria global.O processo de construção europeia teve sempre presente a conjunturainternacional do momento. Esta vive, naturalmente, em constante mudança.Para a União Europeia assegurar a sua relevância política enquanto actorinternacional, necessita de se adaptar e de aumentar a sua influência. Em jeitode exemplo, podemo-nos referir ao papel da UE em relação aos países do lesteeuropeu no fim da Guerra Fria. Para estes países, a integração na UE funcionoucomo catalisador da democratização política e liberalização económica. Poroutro lado, a integração destes estados permitiu à UE alargar a sua zona deinfluência. Existe, portanto, uma dinâmica de duplo sentido. Devemos ter emconta as condicionantes externas no processo interno, e o peso crescente daUnião Europeia na cena internacional.Num esforço para a sua concretização, surgem algumas disposições do Tratadode Lisboa, como o estabelecimento do cargo de Alto Representante da Uniãopara os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, representado porCatherine Ashton, assim como a garantia de personalidade legal para a União.Estas disposições do Tratado concederam à UE uma maior visibilidade epermitiram a criação de um cargo que pudesse representar a União a nívelinternacional, salvaguardando a coerência e a unidade da política externaeuropeia. A União Europeia tenta expressar-se a uma só voz desde a suacriação, com a entrada em vigor do Tratado de Roma, em 1958, passando peloActo Único Europeu, em 1987, até à actualidade. Aquando da criação daCooperação Política Europeia em 1993, foram criadas expectativas para umadiplomacia colectiva, suportada em instituições europeias. Para aumentar ainfluência da União Europeia no mundo, esta faz-se representar nos maisdiversos fóruns internacionais. A título de exemplo, a União tem o estatuto desuper-observador na Assembleia Geral das Nações Unidas, estabelece

uma parceriaestratégica com a NATO,

vestindo as suas forças militares comdois capacetes partilhados. Além disso, esta está

presente em vários domínios de intervenção. Entre asmissões de manutenção da paz, e as tentativas de abertura aos

seus vizinhos, a União abre assim o seu leque de eficácia e ascende a umdos mais importantes blocos regionais. A União financiou ainda projectos dedesenvolvimento económico e de manutenção de paz, serviu de intermediáriaem conflitos, e enviou forças policiais para assegurar transições pacíficas empontos conturbados do globo. Para tal, confiou nos efectivos militares dos seus27 Estados-Membros e nas decisões dos seus ministros representados noConselho da União Europeia.A Política Europeia de Vizinhança, lançada em 2003, pretende alargar acooperação económica e comercial com os seus países vizinhos a leste e a sul,fomentando um crescimento económico e ganhos consideráveis deprodutividade.Com vista a aumentar o território político da UE, a União prevê mais umalargamento, concretizado na adesão da Croácia em 2013, e ponderaconstantemente possíveis adesões. A decisão de alargamento funciona comoum gatilho para mais política externa, promovendo legitimidade e um maiorapoio de terceiros.Nas últimas décadas, a União Europeia construiu uma relação positiva com asoutras organizações internacionais, tendo estatuto de membro ou apenasobservador. Na constante dualidade europeia, também os seus Estados-Membros são representados nestas organizações, devendo expressar não só osseus interesses particulares, mas também os da União. Devemos falar assim deuma política externa partilhada, com intenções de funcionar “a uma só voz”,mas com a realidade de existirem 27 vozes diferentes que é necessário conciliar.Outra questão inteiramente relacionada com a presença europeia como actorinternacional, encontra-se em quem representa a UE. Apesar do Tratado deLisboa dar clara preferência ao cargo de Alto Representante da União para osNegócios Estrangeiros e a Política de Segurança e à Comissão Europeia paraoutros domínios, talvez devêssemos ter apenas uma figura a conjugar toda arepresentação.No entanto, esta questão é delicada de ser resolvida pois ainda existem tensõesinternas dentro da organização sobre quem deve representar a UE, sendo queos países com maior poder e influência – como a França, a Alemanha e oReino-Unido – têm grande dificuldade em abdicar de sua voz própria emquestões de política externa, e em conjugarem posições.Para responder à pergunta deste painel, penso que existe tanto uma dualidade deacção como uma versatilidade de assuntos transversais. A União Europeia actuaem quase todos os aspectos requeridos para um actor internacional.Desde a agricultura, aos transportes, passando pelo mercado interno e pelaspolíticas de concorrência. A política externa e o papel da UE no globo énaturalmente influenciada por factores internos. É por isso que, e em momentosde crise, deve-se optar pela chave comunitária, actuando como uma únicaentidade, mas equilibrando sempre as duas velocidades onde a Europa funciona.A aposta deve ser feita na vontade de tornar a UE não só num giganteeconómico, mas em devolver – ou pelo menos não perder – a sua relevância anível político e cultural.

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OO PPrroojjeettoo FFeeddeerraallEEuurrooppeeuu PPrreejjuuddiiccaa aaAAççããoo EExxtteerrnnaa ddaaEEuurrooppaa??João PintoDoutorando em CiênciaPolítica e Relações InternacionaisUniversidade do Minho

Os oradores dopainel ‘A União Europeiacomo Actor Internacional:versatilidade ou dualidade’ dos XXXIVColóquios de Relações Internacionais tiveram umargumento de base comum: há incoerências na PolíticaExterna europeia que resultam de dificuldades de concertaçãointerna. Enquanto Raquel Vaz Pinto focou o ponto de vista institucional,sublinhando as diferenças nas abordagens do Parlamento e da Comissão narelação com a China, Ana Paula Marques apontou para as consequências dasposições divergentes da União Europeia (UE) e dos Estados-membros no seioda OCDE. Bruno Reis, por sua vez, demonstrou que apesar de conquistascomo a Estratégia Europeia de Segurança (ESS), prova da existência de valorescomuns como o multilateralismo, existem ainda grandes dificuldades dealinhamento em matéria de segurança.Qualquer organismo tem como desafio superar a inevitável dualidade presenteentre as suas dimensões externa e interna e a UE não escapa a essa dinâmica.Aqui interessar-nos-emos em aflorar duas das variáveis internas que agem sobrea afirmação da UE como ator internacional, nomeadamente o papel doscidadãos e dos Estados no contexto do federalismo europeu.Após cinquenta anos de grandes sucessos a UE entrou no século XXI comincertezas sobre a sua raison d’être. A dificuldade em agir uniformemente nonível internacional prende-se com a própria indefinição, tanto do cidadãocomum, como das elites decisoras, sobre a essência da estrutura que regulagrande parte das suas vidas. No dia 9 de Maio de cada ano celebram-se asconquistas do passado como o Mercado e Moeda Única, o Espaço Schengen ea abrangência de todo o Acquis Communautaire. Porém, após uma décadamarcada pelos vetos à Constituição em 2005 (1), os alargamentos em massa e ascrises financeiras, agravam-se as dúvidas sobre o futuro do projeto federaleuropeu (Emmanouilidis, 2012: 88).Apesar do pudor em denominar a UE de federação, é certo que estamosperante um tipo de federalismo. Sendo a primeira simplesmente uma forma deEstado, o último pressupõe arranjos ideológicos, históricos e culturais quepoderão desencadear ou não a formação de uma federação (Burgess, 2012:260).A inegabilidade dos bons resultados a vários níveis do modelointegracionista europeu é acompanhada pela negligência da importância dadiversidade das culturas políticas dos Estados-membros. Se para o cidadãoalemão o federalismo é um elemento natural da vida política, para o português éum palavrão estranho e raramente presente nos discursos dos seus decisorespolíticos. Este desajuste é cada vez mais importante, sobretudo após o fossogerado por décadas de integração ao nível das elites sem o devidoacompanhamento dos restantes cidadãos.O ponto-chave nesta questão é a clara ausência de cultura política federal a níveleuropeu. Definida por Michael Burgess (2012: 3) como sendo a “tradição devalores específicos, atitudes, crenças, e interesses que, apesar de apenasvagamente percebidos, estão entrelaçados com princípios federaisestabelecidos”, esta noção é crucial para o estabelecimento de uma federaçãoefetiva. O desenvolvimento de uma cultura política federal não depende apenasde pressões das elites: deve partir da própria população, podendo os estímulosinstitucionais apenas acelerar esse processo. Uma federação não surgeespontaneamente num contexto onde nunca existiu.

Ora, a imposiçãoda ideia federal nocontinente Europeu tem geradoantagonismos que não se devemdescurar. Sem os fantasmas das GuerrasMundiais e da Guerra Fria, os europeus questionam-sesobre a razão de ser da UE.Para que a União ganhe o nível de coesão necessário, será importantetrabalhar primeiramente a perceção que o cidadão comum tem da suaexistência, explicando-lhe os valores do federalismo com vista aoestabelecimento de uma cultura política federal. Como tal os processos dedecisão devem democratizar-se e chegar mais perto dos votantes. O Tratado deLisboa resolveu parte desta questão através do reforço dos poderes doParlamento Europeu. Consequentemente, afirmar que as posições doParlamento e do Conselho perante a China são divergentes é, hodiernamente,mais importante do que em 2007.Uma segunda dimensão desta questão tem que ver com a falta de políticos dedimensão continental capazes de reunir um consenso alargado no seio dasdiversas sociedades civis. Segundo Renard e Biscop (2012: 194), “o problema daUE não é falta de capacidade, mas sim de uma visão estratégica e vontadepolítica”. Ora, sem estes fatores essenciais as disparidades internas tendem aagravar-se. Com perceções da realidade diferentes e necessidades geopolíticaspor vezes antagónicas, os Estados-membros da União terão tendência aconduzir a sua política externa isoladamente, deteriorando a possibilidade deuma estratégia global europeia.Não obstante, as opções atuais parecem garantir a autonomia necessária dentrode um esforço de coesão. A defesa de um multilateralismo efetivo, caracterizadopela cooperação aprofundada, baseada em objetivos comuns e com o intuito deeliminar a competição entre Estados (Renard e Biscop, 2012: 190), procuraalinhar o posicionamento dos membros da União em relação a todos osassuntos de interesse geral. A aposta na versatilidade dos fóruns multilateraisonde a UE ganha dimensão política, com garantia de espaço para reuniões àmargem entre Estados-membros e outros parceiros, garante uma flexibilidadenecessária à coexistência pacífica entre a política externa da União e a dos seusconstituintes.Por sua vez, as Parcerias Estratégicas complementam essa lógica ao permitiremo estreitamento de relações entre a Bruxelas e atores fundamentais para a suaprojeção global. O desenvolvimento de uma política externa não asfixiantegarante a individualidade dos Estados-membros e permite-lhes desenvolver oseu rumo dentro do quadro dos valores europeus.Em conclusão, e retomando o nosso ponto de partida, perante as dificuldadesexistentes ao nível dos seus constituintes e dos cidadãos que neles habitam, aUE deve repensar a sua raison d’être para se consolidar internamente e, assim,ganhar outro peso no contexto internacional. A atual inexistência de umacultura política federal por parte dos cidadãos europeus – situação refletida nasopções dos Estados – impede a União de adquirir a vocação de substituirtotalmente a dimensão externa dos seus constituintes. Bruxelas não é nem deveambicionar ser a capital de uma federação. A diversidade de modelos existentesno quadro do federalismo permite a formulação de um novo, baseado numsistema multinível em matéria de política externa.(1) Rejeitado pelos referendos francês e holandês ao Tratado que Estabelece uma Constituição

para a Europa.BibliografiaBurgess, Michael (2012), In Search of the Federal Spirit. Oxford:Oxford University Press.Emmanouilidis, Janis A. (2012), ‘Europe’s Role in the Twenty-FirstCentury’ in Renard, Thomas; Biscop, Sven, The European Union and EmergingPowers in the 21st Century. Farnham: Ashgate, 83-104.Renard, Thomas; Biscop, Sven (2012),’Conclusion: From GlobalDisorder to an Effective Multilateral Order: an Agenda for the EU’ in Renard,Thomas; Biscop, Sven, The European Union and Emerging Powers in the 21stCentury. Farnham: Ashgate, 83-104. 29

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Sara RodriguesDoutoranda em CiênciaPolítica e Relações InternacionaisUniversidade do Minho

AA UUnniiããoo EEuurrooppeeiiaaee ooss DDeessaaffiiooss ddooDDeesseennvvoollvviimmeennttoo

A UniãoEuropeia (UE) no seu

conjunto (1) é o maior doadorde Ajuda Pública ao Desenvolvimento,

posição que lhe confere um estatuto privilegiadono quadro internacional enquanto ator de desenvolvimento.

O compromisso europeu para o desenvolvimento é manifesto e vemsido reforçado na letra dos tratados. A sua base legal é renovada e reforçada

pelo Tratado de Lisboa que coloca enfâse na redução da pobreza comocorolário das políticas europeias de desenvolvimento. O reconhecimento destanecessidade de fomento das suas políticas de desenvolvimento havia já sidodemonstrado no “Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento” (2005)documento orientador da política de desenvolvimento da UE e, que consagraos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) como catalisadores dosseus compromissos. Em linha com Lisboa, a “Agenda para a Mudança” (2011)reafirma, a necessidade de concertação de esforços na prossecução da redução,e mesmo erradicação, da pobreza, bem como no compromisso de aumentar oimpacto e eficiência das políticas e ações de desenvolvimento.A pouco menos de três anos de 2015 - meta simbólica fixada pela Declaraçãodo Milénio das Nações Unidas propícia à aferição dos progressos em matéria dedesenvolvimento – e, ainda que a prioridade seja a consecução dos ODM edemais objetivos desta meta temporal, o debate sobre o seu pós foi já iniciado.Este debate é crucial para a construção do quadro pós-2015, sendo que destepoderá resultar a conceptualização e estruturação de uma estratégia com adefinição dos cenários e horizontes temporais, objetivos e metas, e para qual aUE pode contribuir substancialmente. Beneficiando da sua privilegiada posiçãode experiente ator de desenvolvimento, recuperando o seu know-how ebackground legal e político, pode estabelecer-se neste quadro comoimpulsionadora do diálogo entre os doadores e beneficiários, destes entre si e,dos demais atores envolvidos.A reflexão europeia sobre os desafios do desenvolvimento para os próximosanos está patente em diversas iniciativas encetadas e que têm como intuitopreparar o contributo da União para o processo já desencadeado pelas NaçõesUnidas a fim de preparar a Agenda Global pós-2015. Contudo o desconcertointerno sobejamente conhecido desperta grandes desafios que obstruem estecaminho e, afetam em larga medida a sua credibilidade.Assim, e apesar dos esforços de coordenação e harmonização, do aquiscommunitaire, e do estímulo para uma ação comum através da condução eorientação das políticas e práticas entre a UE e os seus Estados-Membros, afragmentação e disparidade persiste. Considera-se fundamental que o desígniode Lisboa seja corporizado. O desenvolvimento é, e deve ser, um pilarobjetivo da União.

As suasdebilidades estruturais

e assimetrias não devem sermascaradas, devem antes ser

potencializadas enquanto elemento diferenciador eenriquecedor da sua estratégia de atuação. Em prol da

manutenção enquanto ator internacional, a UE tem de procurarcolmatar as suas inconsistências e incoerências, procurar não ter telhados devidro e fazer as afinações necessárias à superação dos seus desafios internos eexternos.Uma ação coordenada da UE e, dos Estados-Membros, contribuiria para aredução desta fragmentação e para o aumento do seu impacto, permitindo oincremento dos compromissos assumidos bem como fazer face ao atualpanorama político e económico. O quadro internacional alterou-sesignificativamente não só com o despoletar da crise económica e financeira quetem afectado grandemente a União e os Estados-Membros, mas principalmentepela emergência - e reconhecimento - de novos doadores (2) e das dinâmicas aeles associadas que criam um claro contexto de competição para com doadorescomo a UE e, promovem uma reconfiguração da arquitetura dodesenvolvimento.Neste sentido, e ainda que notório o empenho da União na promoção dodebate e o seu compromisso em matéria de desenvolvimento, a UE precisa deengajar nos processos internacionais em pleno. Contudo ser, e querer ser, umator de primeira linha exige à União uma participação coordenada e coerentenos grandes debates, seja junto das Nações Unidas, nos diversos fora e,principalmente junto dos seus pares e demais atores de desenvolvimento.O contributo da UE para o debate revela-se como uma oportunidade parafomentar a conceção de uma nova abordagem na resposta aos desafios dodesenvolvimento, desempenhando um papel pivô no diálogo entre as partespara a elaboração do quadro pós-2015.Diálogo, coordenação e coerência no seio da União – entre as Instituições,Estados-Membros e Sociedade Civil – são assim cruciais para a conquista ejustificação do seu espaço de atuação e suas vantagens comparativas na novaarquitetura de desenvolvimento como ator credível e impulsionador,respondendo assim à sua ambição de líder político e principal doador.

Notas Finais:(1)Considerando os Estados-Membros, EuropAid e os fundos geridos pela

Comissão Europeia. A Comissão é em si responsável por um volume definanciamento anual que a coloca em segundo lugar enquanto doador no

quadro internacional.(2) O crescimento de economias como a China, Brasil, Índia, Rússia, África doSul, entre outros, despoletou a sua intervenção no quadro de desenvolvimento

enquanto doadores, ainda que alguns tenham um duplo papel de doador ebeneficiário.

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Sandra Dias FernandesDiretora da Licenciatura e Mestrado emRelações Internacionais daUniversidade do Minho

AA PPrroojjeeccççããoo GGlloobbaall ddaaUUnniiããoo EEuurrooppeeiiaa ee aaPPaarrcceerriiaa EEssttrraattééggiiccaaccoomm MMoossccoovvoo

A aplicação doTratado de Lisboa, desde

dezembro de 2009, suscitou novasesperanças acerca do desenvolvimento do

projeto de integração europeia, em particular no que dizrespeito à capacidade externa da União Europeia (UE). (1)

Podemos considerar que, até 2014, a UE está a passar por um períodoprobatório do seu “sistema” de política externa uma vez que ensaia novasinstituições, com uma nova legislatura do Parlamento Europeu desde 2009 e umnovo colégio da Comissão Europeia de 2009 a 2014. Este período é submetido,também, a uma crise mais profunda derivada das consequências latas da criseeconómica e monetária no espaço europeu e global, iniciada em meados de2008. Um dos aspetos porventura mais importantes do Tratado de Lisboa foi acriação da Presidência do Conselho Europeu, encarnada por Van Rompuy desdejaneiro de 2010, e a do Alto Representante/Vice-Presidente da ComissãoEuropeia, personificado por Ashton desde dezembro de 2009. Adicionalmente,o novo Tratado extinguiu as presidências rotativas para as relações externas ecriou o Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE). O SEAE procuraracionalizar recursos e criar maior coerência entre as duas instituições quepartilham as pastas relativas à ação externa i.e., o Conselho da União Europeia ea Comissão Europeia. No entanto, a organização deste novo serviço, numedifício recém-construído na rue de la Loi em Bruxelas, tem criado incertezasquanto ao seu valor acrescentado na produção de uma voz unitária da UE emmatérias de política externa, para além da questão da redistribuição dosfuncionários que pertenciam ao Conselho e à Comissão. A Direção Geral de“Crisis management and planning” foi a única exceção uma vez que foidesignada para ser transferida, em bloco, para o SEAE, sob a responsabilidadede Ashton. Na substância, o Tratado de Lisboa, tal como o seu antecessorTratado de Nice, manteve o primado da soberania nacional para as matérias daPolítica Externa e de Segurança Comum (PESC) e para a Política Comum deSegurança e Defesa (PCSD). Esta continuidade verifica-se pela não atribuição denovos poderes à Comissão e ao Parlamento nas duas declarações anexas aoTratado de Lisboa. Deste modo, o Tratado de Lisboa pode ser uma ferramentaútil para aprofundar a política externa europeia mas na medida em que existavontade política suficiente por parte dos Estados membros.Esta última variável, a vontade política, tem sido apontada como o “calcanhar deAquiles” da política externa europeia uma vez que resulta num mínimodenominador comum entre os Estados membros, dificultando ou até travando afeitura da mesma. O caso paradigmático de tal situação verificou-se durante acrise que envolveu a decisão dos Estados Unidos da América (EUA) interviremmilitarmente no Iraque em 2003. Os europeus dividiram-se sobre dar ou nãoapoio ao tradicional aliado americano. (2) Essas divisões ficaram evidentes pelasreações divergentes à decisão norte-americana de travar uma guerra contra oIraque, que começou em março de 2003.

Isso foitambém um forte

indício das lacunas da PESCuma vez que os Estados membros não

atuaram por via dessa política masindividualmente. No contexto da crise política dos anos

2002-2003 concernente à oposição à decisão norte-americana deconduzir uma guerra no Iraque para combater o terrorismo global, a

Rússia alinhou-se com alguns líderes europeus (França e Alemanha) contra aposição dos EUA. Todd analisa a relação estratégica entre os EUA, a Europa e aRússia no contexto da crise do Iraque (ele escreveu um posfácio numapublicação que datava de 2002). Ele argumenta que a oposição alemã lançou omovimento pela autonomia estratégica europeia. Ele observa que as suasprevisões, publicadas em 2002, se materializaram: a aproximação entre a Europae o Kremlin foi necessária devido ao preocupante comportamento militarista deWashington. Ele considera que “[l]es États-Unis se retrouvent donc embourbés en Iraq.Ils vont y perdre des hommes, de l’argent et du temps. Par leur comportement menaçant, ils ontaccéléré l’intégration de l’Europe, et rendu irréversible le rapprochement entre l’Europe et laRussie” (2002: 285-293). Trenin partilha dessa visão e ressalta que a decisãorussa de alinhamento com o ocidente foi apoiada pelo facto de que, desde quechegou ao poder, Putin tem evitado confrontação com Washington e“procurado a Europa ocidental” (2002: 1).No entanto, o facto da UE não ter legitimidade para discutir assuntosconsiderados “hard security” (ao abrigo do Título V do Tratado) e as divisõesentre Estados membros acerca da sua vizinhança (qualidade das políticas epróximos alargamentos) levantam dúvidas aos olhos dos russos acerca dasvantagens de laços mais próximas com uma UE pouco coesa. Só uma Uniãomais forte enquanto ator global pode oferecer algo para a Rússia nestesdomínios. No entanto, apesar do ceticismo russo acerca do projeto europeu, eleé uma parte importante da arquitetura de segurança, principalmente quandooutros canais se foram deteriorando (a relação com os EUA e com aOrganização do Tratado do Atlântico Norte) (3).A desejabilidade de uma relação privilegiada entre a Rússia e a UE extravasa odomínio da segurança stricto sensu. A redistribuição de poderes a nível global e aperda de posições dominantes por atores tradicionalmente influentes colocadesafios sérios às lideranças europeias e russa. Desde o fim da Guerra Fria,Bruxelas e Moscovo têm desenvolvido um quadro institucional único decooperação, com base no acordo de 1997, e a criação de "quatro espaçoscomuns de cooperação”, em 2003. (4) No entanto, apesar da aproximaçãovivida entre os dois maiores vizinhos europeus, a crescente insatisfação acercada concretização de uma verdadeira parceria surgiu de ambos os lados. Acontribuição de especialistas russos para o relatório do “Grupo de Valdai” éilustrativa desta situação. O relatório responsabiliza as duas partes para aestagnação do relacionamento e lança um apelo urgente para a criação de uma“União da Europa” (Karaganov et. Al., 2010). Esta “União” surgiria a partir deuma cooperação mais orientada para os resultados, sendo isto uma condiçãopara que as partes se tornem o terceiro maior ator mundial, após os EstadosUnidos e a China. A não ser que se envolvam em conjunto nessa tarefa,Bruxelas e Moscovo perderiam posição de poder (2010, 18).A interdependência entre a UE e a Rússia é ilustrada pelos dados seguintes. Emmédia, a taxa de exportações da Rússia para a UE entre 1999 e 2005 cresceu23,8%, em comparação com 4,9% para as exportações para os EUA.Relativamente às importações, a taxa foi de 19,4%, em comparação com osEUA com 8,8%. 31

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Em termos absolutos, a UE foi o primeiro parceiro comercial da Rússia,durante este período, muito acima do comércio com os Estados Unidos queficam muito atrás no ranking dos vinte maiores parceiros comerciais. A Rússiaé o terceiro maior parceiro comercial da UE. O comércio com a Chinaapresenta taxas crescentes tanto nas importações como nas exportações(Eurostat e Rosstat 2007, 198-199). Em 2005, a taxa de crescimento rondava os6,4% na Rússia, contra 1,7% para a UE. No mesmo ano, os Estados membrosimportavam 32% de crude da Rússia e 42% de gás. O preço do petróleo emalta é um fator transversal que tem potenciado o crescimento russo. Osindicadores humanos são, por sua vez, preocupantes. A população russarepresenta 2,2% da população mundial, contra 11,3% para a UE, e a taxa defertilidade é de 1,29%, contra 1,52% na UE. A esperança de vida para umhomem é de cerca de 59 anos, contra 76 anos na UE, e a mortalidade infantilatinge valores elevados superiores a 10 por mil nascimentos, semelhantes àstaxas romena e búlgara. As causas violentas de morte atingem também valoresmuito mais elevados do que na UE. As infraestruturas de transporte precisamde ser desenvolvidas. Estas discrepâncias de desenvolvimento coexistem,portanto, com as ligações económicas estreitas. Nessa matéria, ainterdependência energética ocupa um lugar de destaque, de facto, na agendade cooperação (Fernandes 2009b).O alerta que o relatório acima mencionado faz diz respeito não somente àinterdependência existente, a qual justifica per se a constituição de uma parceiraestratégica, mas também à necessidade de potenciar esta interdependência anível político face à perda de relevância global tanto da UE como da Rússia.Nas palavras dos analistas:

“[t]he current position of Russia and the European Union in the global economy andpolitics can be characterized as vulnerable, compared with other large players, such as the

U.S., China or India, while in the near future they might develop a similar weakness withrespect to East-Asian countries and Brazil. An important reason behind the vulnerability isthe high dependence of the whole of Europe on external economic, political and demographic

factors. The opportunities and potential of Russia and the European Union’s positiveinfluence on world events are extremely limited; their influence in other regions of the world is

rather residual, and continues to diminish” (Karaganov et. al 2010, 14).Face a esta constatação, os desafios enfrentados pela UE vão para além dassuas atuais dificuldades internas que apelam, nas palavras de Leonard (2011), acenários de reinvenção dela própria e do seu sistema político. Os desafiosremetem para o lugar que ocupa no mundo e a sua capacidade de influência.Apesar de se ter dotado de um novo aparato institucional com o Tratado deLisboa, os seus plenos efeitos ainda estão por concretizar e a condição davontade política dos Estados membros continua uma variável fundamental. Nocontexto da crise do euro e da crise do modelo europeu, parece fundamental aUE manter um peso político nos fóruns internacionais. No entanto, nasquestões de segurança, a UE nem sempre tem competência atribuída à luz doTratado, o que diminui a sua capacidade em dialogar multilateralmente,nomeadamente com a Rússia. A questão energética ou de controlo dearmamentos nucleares são exemplos disso (Fernandes 2009). A União tambémdefende uma abordagem multilateral às relações internacionais mas a suacapacidade de superar o veto russo no Conselho de Segurança da ONU(Kosovo, por exemplo) ou contar com o Conselho da Europa também élimitada. O poder relativo da UE tem sido uma limitação para desenvolver acooperação com a Rússia, para além do processo de tomada de decisãointergovernamental da PESC e de interesses e abordagens divergentes emrelação à Federação Russa. Adicionalmente, Bruxelas tem procurado aplicaruma política normativa a Moscovo no sentido de criar convergência com osseus princípios políticos, económicos e sociais, a qual tem surtido efeitoscontraproducentes uma vez que o Kremlin não aceita, liminarmente, aquilo queperceciona como lições de moral da UE (5).

A atual crise europeia sobrepõe-se, portanto, a desafios pré-existentesacerca do lugar da UE no mundo, da consolidação de uma política externa,coesa e coerente para além dos domínios económicos e comercias, e de umarelativa autonomia estratégica face aos EUA. Não obstante as dinâmicas deaprofundamento do processo de integração, recentemente encorpadas noTratado de Lisboa, a relação da UE com o maior vizinho europeu afigura-seespecialmente relevante neste contexto. As tarefas vindouras prendem-se nãosó com o modelo interno do projeto europeu mas também com a suarelevância num mundo globalizado em rápida mutação.

Notas Finais:(1) Para uma análise detalhada das alterações introduzidas pelo Tratado deLisboa, ver (Kurpas et al, 2007).(2) Para uma análise da base teórica e doutrinal da intervenção estrangeira norte-americana, e particularmente no Iraque, ver Williams (2007).(3) Sobre esta temática ver (Fernandes 2009).(4) Acerca da relação UE-Rússia, nomeadamente as características institucionais,ver (Fernandes 2012).(5) Acerca da dimensão normativa da política externa da UE e da relação comMoscovo, ver (Tocci 2008).

Referências:Eurostat and Rosstat. 2007. The European Union and Russia. Statistical Comparison

1995-2005. Eurostat. Statistical Books and Rosstat.Fernandes, Sandra Dias. 2012. Multilateralism and EU-Russian Relations: The praxis

of a competitive relationship. Villeneuve d’Ascq: ANRT (ISBN 978-2-7295-8319-4).Fernandes, Sandra Dias. 2009. Time to Reassess the European Security Architecture?

The NATO-EU-Russia Security triangle. EPIN Working Document nº 22 (March).Fernandes, Sandra. 2009b. Decifrar a potência Russa, Relações Internacionais nº21,

(Março): 79-85.Karaganov, Sergei et. al. 2010. ‘Towards an “Alliance of Europe”. Analytical

Report by the Russian Group of the Valdai International Discussion Club’. St.Petersberg, Kizhi-Valaam, Moscow, 31 August-7 September.

http://karaganov.ru/content/images/uploaded/4b4ec04c237e760f0808556999573c53.pdf (accessed 25 February 2011).

Kurpas, Sebastian, et al. 2007. The Treaty of Lisbon: Implementing theInstitutional Innovations. Brussels: CEPS Special Reports.

Leonard, Mark. 2011. Four scenarios for the reinvention of Europe. ECFR 43(November).

Tocci, Nathalie ed. 2008. Who is a Normative Foreign Policy Actor? Brussels: Centrefor European Policy Studies.

Todd, Emmanuel. 2002. Après l’empire. Essai sur la décomposition du système américain.Editions Gallimard.

Trenin, Dimitri. 2002. A Russia-within-Europe: Working toward a new securityarrangement. In Russia’s Security Policy and EU-Russian Relations, Dmitri Trenin,

Stephan De Spiegeleire and Anagela Stent. Brussels: CEPS and IISS.Williams, Andrew. 2007. Reconstruction: The Bringing of Peace and Plenty or Occult

Imperialism? Global Society 21 (4): 539-55

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Page 33: Revista ZOOM #21

OO PPRROOJJEECCTTOOEEUURROOPPEEUU:: QQUUEEVVIIAASS??Luís Lobo-FernandesProfessor Catedrático e Docente daLicenciatura em RelaçõesInternacionaisda Universidadedo Minho

1. Supranacionalismo imperfeitoAntes da presente crise na Europa uma dasinterrogações recorrentes de um número alargadode estudiosos dos assuntos europeus prendia-se com aquestão de saber até que ponto seria possível sustentar umpatamar elevado de integração monetária decorrente da introdução doeuro, existindo graves assimetrias entre os planos económico e político,evidenciadas sobremaneira pela insuficiência institucional ou seja, por um fraconível de coordenação. Sendo patente que os mecanismos políticos de suporte aoeuro eram - e são - manifestamente insuficientes, podemos dizer que partimospara a moeda única com disfuncionalidades consideráveis na arquitecturainstitucional da União Europeia. Amitai Etzioni, no prefácio à sua obra PoliticalUnification Revisited: On Building Supranational Communities, publicada em 2001,designou este problema de halfway supranationality, ou seja, supranacionalidadeimperfeita.(1) Esta incongruência, detectada a partir dos modelos teóricos daintegração, apontava para riscos consideráveis. Ora, a crise económica europeia,mas também política e institucional, é dela testemunho.Noutro plano, a regra clássica dos interesses nacionais reemergiu de forma maisvincada nos últimos anos dentro da União Europeia (UE), com expressões decompetição aberta entre os grandes - um claro eufemismo para a noção maiscrua de um quadro de nova competição entre as potências europeias. Peranteeste cenário as questões mais prementes que se colocam são: Que novosinstrumentos e procedimentos de decisão devem ser empregues? Queautoridade deve ser atribuída às instituições comuns? Quanta integração énecessária e onde deve parar? Enfim, por que desenho de integração optar?2. O tratado de Lisboa: o paradoxo comunitário adensa-seNão se descortinam respostas fáceis para todo este amplo espectro deproblemáticas. Partindo do tratado de Lisboa duas dimensões contraditóriasemergiam de imediato: por um lado, o conteúdo é na sua maior parte “fiel” aosdesenhos anteriores ao preservar as linhas divisórias existentes entre a UE e osseus Estados-membros; por outro, parece sinalizar uma “nova ordem legal”,reduzindo os três pilares a dois, e criando uma União Europeia robustecida. Aoconceder personalidade legal à UE o tratado oferece-nosuma entidade com estatura acrescida. Ademais, a eliminação do terceiro pilaralimenta o carácter “mais supranacional” da União. É perceptível que o tratadode Lisboa propõe um importante aumento da autoridade legislativa doParlamento Europeu (PE). A extensão do processo de co-decisão - doravante aregra geral no processo legislativo - a mais de cinquenta domínios, coloca o PEmais próximo do Conselho relativamente à grande maioria da legislação da UE.O tratado de Lisboa também adopta a Carta Europeia dos DireitosFundamentais como um documento com o mesmo valor legal dos tratados.Pode-se, não obstante, argumentar que tais desenvolvimentos representam maisestilo do que substância.É que o tratado de Lisboa enfatiza de forma bastantevisível tanto os limites da acção da UE como as prerrogativas soberanas dosEstados-membros.

Por exemplo, aimpossibilidade do

Parlamento Europeu em “desalojar” oConselho Europeu e o Conselho de Ministros

dos centros críticos da decisão demonstra a ausência deum sistema completo de “checks and balances” a nível da UE, bem

como a continuidade da afirmação do poder dos executivos nacionais.Segundo Stephen C. Sieberson, tal como acontece com os arranjos anteriores, otratado de Lisboa está permeado de linguagem que sublinha a proeminência eintegridade dos Estados-membros e das suas competências dentro do sistemacomunitário; em particular, de acordo com o chamado principle of conferral(princípio da conferência dos poderes dos Estados) – que está agora maisclaramente articulado – só será permitido à União actuar dentro dos limites daautoridade outorgada pelos Estados-membros. (2) O tratado inclui, assim,garantias consideráveis para os governos nacionais na forma de interpretaçõesmais restritivas da acção das instituições comuns, no sentido de acautelarquaisquer “incursões” da União nas áreas que são prerrogativas dos Estados-membros.Um traço distintivo, e por certo fascinante, da União Europeia é que o seucunho fundacional tem sempre dois lados distintos. A clarificação dascompetências do tratado de Lisboa revela novamente estes dois sentidoscontrários: confirma a propriedade de alguma acção própria da União, massimultaneamente define os limites dessa mesma acção dando maior ênfase aospoderes dos Estados-membros. Neste sentido, o tratado de Lisboa vaiefectivamente em direcções opostas. Poderíamos dizer que tal ambiguidade –que se adensa com o novo enunciado - torna o paradoxo comunitário aindamais acentuado. A “solução” encontrada no tratado constituiu, porém, ocompromisso possível, segundo a esperada lógica do mínimo denominadorcomum.3. Na busca de novas correlaçõesNo plano das teorias da integração europeia sugerimos a necessidade deultrapassar alguma circularidade argumentativa, nomeadamente entre oneofuncionalismo e o intergovernamentalismo, concepções porventurademasiado “estabelecidas”, que têm marcado os estudos europeus, e perguntarse o âmbito e a natureza do processo de integração não terão sidoexcessivamente desfocados. É que o sucesso político do projecto europeudepende em grande medida de uma clarificação do seu objecto e dos seuspróprios limites. (3) A incerteza, as preocupações e mesmo a desilusão aparentede muitos cidadãos europeus perante os contornos da actual crise obriga a umaavaliação rigorosa da evidência empírica disponível. Como assinalou SuzanneBerger, o facto é que a construção europeia privilegia a emergência de ummercado concorrencial em detrimento de uma Europa social (4).Num esforço comparativo importante, Giandomenico Majone discrimina trêsfunções normalmente realizadas pelos estados da Europa ocidental no períodopós-II Guerra: redistributiva (transferência de recursos e garantia do bem estar),estabilizadora (uso de instrumentos fiscais e monetários para assegurar ocrescimento económico, a estabilidade dos preços e níveis de empregosatisfatórios), e regulatória (medidas destinadas a resolver problemas deimperfeição ou de falha do mercado). (5) Ora, das taxonomias referidas é aregulação que o autor considera mais presente na União Europeia, sobretudoem virtude da ênfase colocada na harmonização necessária ao funcionamentoeficaz do mercado interno. O facto de a União Europeia ser bastante menosdesenvolvida nas outras funções distingue-a, assim, do modelo do estado-providência. 33

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A regulação configura-se como um método de decisão política de mais “baixoscustos” e visaria compensar crises de governabilidade a nível interno dosEstados-membros. Com efeito, a delegação de poderes reguladores eminstituições independentes surge em grande medida como uma “solução” pararesolver problemas de ingovernabilidade. A questão política mais difícil residirána forma de conciliar e tornar eficazes os - aparentemente contraditórios -objectivos de independência das agências e de responsabilização pública.Tomando como exemplo o modelo norte-americano, Majone considerava queindependência e responsabilidade podem, no entanto, ser conciliadas através dacombinação de mecanismos de controlo eficazes que garantam a necessáriaautonomia das agências reguladoras (7).Na busca de novas correlações torna-se, assim, imprescindível abrir outrashipóteses sobre o sistema de governação europeia, explorando porventura maisas efectivas dinâmicas internas e menos as versões voluntaristas ou subjectivassobre a integração. Uma das ilustrações mais significativas é precisamente aquase exclusiva concentração do debate, no decurso de 2011 e 2012, nasquestões do chamado “governo económico”, e na correcção das incongruênciasnas políticas económicas e fiscais que visariam responder às necessidades domercado interno, claramente hoje o core central da União Europeia.4. Mais integração? Por que via?Alguns afirmam que os desenvolvimentos - em parte inesperados, diga-se - queestão a processar-se sob a pressão da crise financeira e económica representama consumação do intergovernamentalismo na União Europeia. Mas, numaanálise mais aprofundada, o que se passa é diferente, e na verdade maisintrigante. (8) Temos assistido a um processo em que mais integração emmatéria monetária e financeira parece substituir as estruturas anteriormenteexistentes de coordenação, mas com a particularidade de ser o próprioConselho Europeu através da Alemanha em primeiro lugar e com o presidentedo Conselho Europeu num papel supletivo, a promover essa transformação. (9)Tudo isto adensa o paradoxo comunitário. É que, sendo aparente que aComissão Europeia é afastada, numa medida não despicienda, do centro damatriz institucional, ainda assim, a resultante - que no contexto desta crise énormalmente referida em termos de “governo económico” - não tem umcarácter intergovernamental stricto sensu. A solução que parece ganhar nitidez napresente crise afasta-se, pois, da pura lógica intergovernamental aocomunitarizar a governação económica, embora sob a direcção “única” daAlemanha. Ironicamente, este cenário questiona mesmo a tese do “directórioeuropeu”.A dimensão de centralização no âmbito dos estudos da integração europeiasugere a existência de um aparelho central – supranacional - capaz deestabelecer e implementar políticas comuns e resolver disputas. Ora, o grau decentralização existente na UE tem sido até agora algo fraco, aí residindo partedo problema - o supranacionalismo imperfeito a que se refere Etzioni. Domesmo modo, a profundidade que normalmente mede o nível de coordenaçãoou harmonização política num dado processo de integração é, também, no casovertente manifestamente sofrível, como se tem constatado.5. Um momento hamiltonianoA União Europeia exige um momento hamiltoniano. (10) Referimo-nos à visãode Alexander Hamilton, o mentor do sistema financeiro da nova RepúblicaAmericana que, em 1787, assumiu as dívidas dos membros dos ex-Estados daConfederação Americana (1776-1787), emitiu títulos de dívida públicasuportados por impostos directos e imprimiu uma moeda própria. O resultadoprático ajudou a transformar a jovem nação numa potência económica.Hamilton tinha a noção exacta de que a Confederação tinha um grau limitadode institucionalização, o que tornava muito difícil tomar decisões eficazes eaccionar reformas para o conjunto, condição aquela agravada, ao tempo, porressentimentos quer dentro dos Estados credores, quer dentro dos Estadosdevedores. Acontece que a actual construção europeia ainda é mais imperfeita edesequilibrada, pois existe uma moeda única em funcionamento sem ossuportes institucionais adequados. Uma união monetária robusta requerelementos vitais, tais como um banco emissor de última instância, integraçãoeconómica e bancária, e flexibilidade para lidar com os choques financeiros,transferências fiscais e dívida colectiva. Em bom rigor, à UE faltampraticamente todos estes atributos.6. As virtualidades do neofederalismo internacionalA linha de indagação que enunciamos conduz-nos em pleno para a discussão dofederalismo na integração europeia – uma questão manifestamente difícil e“impopular” nos tempos que correm – mas que constitui, algoinesperadamente, uma forma pragmática de aproximar o problema, e que sereporta conceptualmente à existência de um modelo de foedus (11),ou seja, deligações institucionais mais densas entre os Estados-membros. Em rigor, este éo cenário que já está “em cima da mesa” – através do enunciado do governoeconómico - para resolver o imbróglio a que fazemos face, mas que os actuaisdecisores europeus têm absoluta relutância em sequer soletrar.O federalismo é um conceito politicamente complexo. Para clarificar os méritosdo federalismo talvez seja útil pensá-lo como um oximoro de centralizaçãodescentralizada. Sempre nos pareceu que esta abordagem apreende melhor ariqueza de um sistema de ligações virtuosas onde existe um nível decentralização necessário e funcional, mas cujo carácter fundamental é a suaprópria descentralização. E, é precisamente por isso que o federalismointernacional, ou seja o federalismo entre estados – tal como definido por PaulReuter e Jean Combacau (12) que alertaram para uma distinção crítica

com federalismo interno - poderia ser uma saída virtuosa para os actuais dilemaseuropeus.Segundo estes autores, ao contrário dos modelos de federalismo interno ondeexiste uma entidade soberana única, no caso do federalismo internacional essecenário não ocorre pois, apesar de se agruparem, os Estados mantêm a suaautonomia relativa, traduzindo uma solução de integração pluralística ondeexiste uma garantia real de que nenhum país ou grupo de países dominará osrestantes. Nesta medida, o federalismo internacional pode optimizar o sistemade integração, impedindo qualquer lógica de subordinação. Esta modalidadesuscita de novo, na nossa óptica, a questão de um modelo bicamarário para aUE, onde os Estados-membros estariam representados paritariamente numacâmara alta e o actual Parlamento Europeu se transformaria numa câmara baixa.Tal cenário ganha hoje nova acuidade. (13)7. Nota conclusivaA proposição inicial que evidenciámos sugere que o mencionado hiato (ouacentuado desequilíbrio) entre o grau de integração monetária já atingido e ofraco nível de integração política, era insustentável a prazo e poderia levar aocolapso do projecto europeu. A evidência empírica mostra que esta hipótesetrágica está em aberto. Mas, as soluções políticas e institucionais existem. Falta o"missing link" ou seja, a vontade política das elites europeias para ultrapassar deforma decisiva a loucura em que mergulhámos. É certo que nos encontramosainda no meio da tempestade, pelo que talvez seja cedo para estabilizar umaracionalização mais consequente do conjunto de dilemas a que fazemos face. Anossa visão é a de que o euro e o projecto europeu são indivisíveis. Houve jáacordo embora atípico, por via de um tratado de cariz eminentemente clássico -para uma revisão indirecta do tratado de Lisboa no sentido do aprofundamentoda governação económica.

A União Europeia é um paradoxo empolgante. Não é um Estado, enada leva a crer que se transforme em tal, mas os seus membros

cometeram-se ao longo do tempo a compartilhar as suassoberanias, algo sem paralelo e mesmo revolucionário no seio do

ciclo histórico vestefaliano. Mais centralização ao nível da zonaeuro afigura-se agora imperiosa para ultrapassar uma construção

excessivamente assimétrica, marcada por grandes disparidades emmatéria macroeconómica e fiscal entre os Estados-membros.Chegará a tempo para evitar o abismo e recolocar o projecto

europeu nos carris?

Notas Finais:(1) Cf. Etzioni, Amitai. 2001. Political Unification Revisited: On Building SupranationalCommunities. Lanham, MD: Lexington Books, pp. xxiv-xxxi.(2) Ver Sieberson, Stephen C. 2008. Dividing Lines between the European Union andIts Member States: The Impact of the Treaty of Lisbon. The Hague, The Netherlands:T.M.C. Asser Press.(3) Ver Lobo-Fernandes, Luís. 2012. “ O impacto da UE em Portugal: mito ourealidade? O caso da política de privatização das telecomunicações”, in Guardia,Ricardo Martín de la, y Guillermo Á. Pérez Sánchéz, dir., España y Portugal:Veinticinco Años en la Unión Europea (1986-2011). Valladolid: Instituto de EstudiosEuropeos, Universidad de Valladolid (Secretariado de Publicaciones e IntercambioEditorial).(4) Cf. Berger, Suzanne. 2004. “Entretien avec Suzanne Berger”, Sciences Humaines,Nº 46 – Septembre-Octobre-Novembre, pp. 67-68.(5)Ver, Majone, Giandomenico, ed. 1996. Regulating Europe. London: Routledge, p. 54.(6) Para Majone, op. cit, (1996, 300), a raiz do problema da legitimidade reguladora naEuropa não é o excesso de independência, mas, pelo contrário, a constante ameaça deinterferência por razões políticas.(7) Majone, op. cit., p. 300.(8) Cf. Amato, Giuliano. 2011. “A New Inter-Institutional Interplay after the Treaty ofLisbon?”, The Brown Journal of World Affairs, Spring/Summer 2011, Vol. 17 (Issue2): 139-147.(9) Num desenvolvimento algo surpreendente a França parece ter perdido algumavisibilidade no actual quadro de transição europeia.(10)Ver The Economist, February 11th, 2012, p. 30.(11) Do latim foedus, que sugere ligação. O plural foedera traduz-se normalmente porfederação.(12) Cf. Reuter, Paul, et Jean Combacau. 1980. Institutions et Relations Internationales.Paris: P.U.F., p. 286.(13)Lobo-Fernandes, Luís. 2003. “Por um Sistema Bicamarário na UE”, Expresso, 7 deJunho, p. 30

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De um Mote ao Legado: Um Ano de um CECRI InovadorMais Inovação. Mais CECRI. Era este o mote da nossa campanha em Maio do ano passado. Um moteque transformamos em missão ao longo do nosso mandato e que agora, em que se aproxima o final donosso mandato, orgulhosamente verificamos que de missão passou a obra feita e reconhecida. Inovamos. Opretérito, que aquando da conceção deste texto ainda não o era totalmente, até pode ser nostálgico mas écom certeza e, acima de tudo, reconfortante. O sentimento de conforto que aqueles que bem alto já gritarame sentiram o tempo no futuro, como se o condicional fosse mera gramática, reconhecerão certamente.Uma inovação que combinada com ousadia e obstinação traduziram-se numa marca que a nossa Direçãoherdou e procurou com sucesso afirmar ainda mais. Uma marca que se sentiu em todas as atividades quedesenvolvemos ao longo deste ano letivo, que ficará como um dos mais dinâmicos no que toca a atividade donosso Centro.Os Colóquios de Relações Internacionais, que celebraram este ano, a sua trigésima-quarta edição foram aprincipal evidência dessa marca, desde logo pela temática e, especialmente, pelo tom e pelo desafio a que sepropunham: “O Desconcerto Europeu: Que Afinações?”. Esta edição dos Colóquios será certamenterecordada pela riqueza e transversalidade dos seus painéis e debates, que em grande parte, ficaram a dever-sepela qualidade dos convidados quer nacionais como internacionais.Contudo, outras atividades ‘tradicionais’ do nosso Centro foram assinaladas com essas inovação, ousadia eobstinação que nos movia - a Simulação das Nações Unidas e as tertúlias mensais promovidas pelo nossoCentro. As relações luso-alemãs, os direitos da Mulher com especial foco no caso indiano, assim como, osdireitos LGBTI foram algumas das temáticas que trouxeram dezenas de alunos ou mesmo pessoas externas ànossa Universidade aos auditórios onde as nossas tertúlias foram ocorrendo.Contudo, inovar também pressupõe por vezes inventar. Concebemos assim duas novas iniciativas com o seloCECRI que esperamos ver perpetuadas pelas Direções vindouras: a Semana Aberta do CECRI e o I Ciclo deWorkshops do Centro de Estudos do Curso de Relações Internacionais. Duas atividades que primaram pelasua originalidade, mas acima de tudo, pela sua pertinência no contexto atual.O nosso mandato destacou-se ainda pelas inúmeras atividades que desenvolvemos em parceria cominstituições e projetos internos e externos à Universidade do Minho, dos quais destacamos, com um especialagradecimento, o Núcleo de Investigação em Ciência Política e Relações Internacionais (NICPRI).E se do mote fizemos missão e da missão, obra feita e reconhecida. Fica agora o legado. Esperemos que ainovação continue e que seja possível evoluir através da continuidade. Evoluamos!

A Direção do Centro de Estudos do Curso de Relações Internacionais 2012/2013 35

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