revista raiz #11

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Jorge Amado 100 anos

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Page 1: Revista Raiz #11
Page 2: Revista Raiz #11

Conheça mais os tons e cores de Ranchinho.

RANCHINHO Conheça mais os tons e cores de Ranchinho.

A ARTE VISIONÁRIA DE

A SENSIBILIDADE FALA MAIS DO QUE UM MILHÃO DE PALAVRAS

Ele tem um talento artístico extraordinário.Agora, sua história e sua obra estão descritos nesse livro.

Ricamente ilustrado com dezenas de obras do artista Texto dos experts Antônio Fernando Franceschi, Oscar D´Ambrósio e Roberto Rugiero.

MINISTÉRIO DA CULTURA, ASSOCIAÇÃO RAIZ E GALERIA BRASILIANA APRESENTAM

RANCHINHO

Nas melhores livrarias ou no portal Raiz: www.revistaraiz.com.br

Realização

Page 3: Revista Raiz #11

Amigos da RAIZ.

A edição 11 da RAIZ. apresenta muitas ideias e caminhos para se pensar a nossa cultura e a nossa identidade. São tantas as perspectivas abor-

dadas, que vamos descrevê-las acompanhando o sumário da revista, para que juntos possamos entender seus múltiplos desenvolvimentos.

Começamos com nossa religiosidade, misturada nas procissões católicas dos europeus, nas festas de matriz africanas e na fé em santos não-canô-

nicos, traduzidas em belos retratos cearenses e pernambucanos. Partindo daí vamos para o Fórum Internacional de Gestão Cultural na USP em São

Paulo, para discutir a cultura como um bem social, fora dos meandros mercantilizadores e achatadores de diferenças e possibilidades.

Continuando em São Paulo vamos o Instituto Tomie Otake acompanhar uma exposição ímpar que se inicia, trazendo para o mesmo local 10 artis-

tas da maior significância para nossa arte popular oriundos de 8 estados brasileiros. Eles vem para expor e dialogar diretamente com o público, sem

intermediários ou tradutores. E nós agraciados com o texto sempre elegante e profundo de Maria Lucia Montes.

Dos nosso artistas populares, vamos homenagear os 100 anos de Jorge Amado, com mais um texto marcante, este de Gustavo Rossi, que nos

apresenta o grande legado desse autor popular e erudito na definição do povo brasileiro. Nossa negritude aceita pelo endosso do autor.

Das letras vamos para os bits com a ocupação digital do espectro eletromagnético acima de nossas cabeças e que, as tecnologias digitais nos per-

mitem utilizar, assim como já fazemos no mundo da Internet. Seguimos com a potencialização das redes para o Fora do Eixo, que tem feito escola

e realizado um dos trabalhos mais sérios na geração de um economia colaborativa.

Daí mergulhamos em nossa identidade com a apresentação de uma das coleções mais belas da nossa arte popular, a coleção Gambarotto. Indo

direto para Iguape, em São Paulo, onde o carnaval é mais do que uma festa popular.

Em uma edição, focada na formulação de políticas para a cultura, abordamos dois casos de sucesso de metodologias inclusivas; através dos

trabalhos do Instituto Olga Kos e da Associação Cultural Cachuera! O primeiro, incluindo portadores de deficiência intelectual através da arte e

do esporte; o segundo, trazendo os folguedos para o entendimento e consumo ampliado dos centros urbanos. Continuando vamos para o novo

MinC, já mais rodado agora, que apresenta seus diferenciais no debate sobre a Economia Criativa e na análise das gestões de Gilberto Gil a Ana de

Hollanda, a dobrada da MPB, que mudou e pretende mudar a Cultura do país.

Para se divertir, rótulos de cachaças históricos e iconográficos para o deleite do olhar. Continuando nosso entretenimento nada como escutar a

música analógica do Acervo Origens, com os melhores LPs da música brasileira. Pegando a estrada vamos conhecer a rede de Turismo comunitário,

que com muito conforto oferece uma experiência diferenciada aos viajantes.

E para terminar, nada como um bom cafezinho. Ainda mais se misturado em uma receita tradicional com o caldo de cana.

Nunca experimentou? Não sabe o que está perdendo.

Boa leitura!

Edgard Steffen Junior

Page 4: Revista Raiz #11

EXPEDIENTEEDITOR-CHEFE: Edgard Steffen Junior

EDITORA ASSISTENTE: Thereza Dantas

JORNALISTA: Cleber Erik da Silva

PROJETO GRÁFICO: Uirá Peixeiro

DIREÇÃO DE ARTE: Uirá Peixeiro e Igor Busquets

VÍDEOS: Célia Harumi Seki

VINHETA: Rodolfo Nakakubo

INTERNET: Leo Flauzino

ADMINISTRAÇÃO: Marcela Carvalho Campos

COLABORADORES: Jefferson Duarte, Marcelo Feitosa, Maria Lucia Montes,

Gustavo Rossi, Sérgio Amadeu, Ney Hugo, Tatiana Oliveira, Rafael Vilela, Cris

Albuquerque, Diego Dionísio, Katia Gomes, Yves Barros, Marcos Linhares,

Raquel Gonçalves

APOIO INSTITUCIONAL

Este é um projeto com o apoio da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei nº 8.313/91)

COLABORADORES

Jefferson Duarte apaixonado e disseminador da cultura

popular brasileira. Nasceu em Cascadura subúrbio do Rio de

Janeiro, mora atualmente em São Paulo. Cenógrafo autodi-

data por ofício, foi responsável pelas exposições: Na Terra de

Macunaima; 100 anos de Cordel - a história que o povo conta;

O Chão de Graciliano; Choro do Quintal ao Municipal; Estação

Cartola; Cariri Sertão Cultura; Sertão Brasil – uma viagem pelas

veredas do Rosa, Memorial da Inclusão – Mostra permanente

da Secretaria estadual da pessoa com deficiência; A Arte nos

tempos do café; entre outras. Hoje está à frente da Celophane

Cultural como produtor, cenógrafo e blogueiro.

Gustavo Rossi graduação em Ciência Sociais pela Unesp

(Araraquara) e Mestrado e Doutorado em Antropologia Social

pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Autor do livro

As cores da revolução: a literatura de Jorge Amado nos Anos 30.

JORNALISTA RESPONSÁVEL: Thereza Dantas – MTB 22.194

RAIZ É UMA PUBLICAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO RAIZ. COM APOIO DA EDITORA CULTURA EM AÇÃO.

E-MAIL: [email protected]

PORTAL RAIZ.: www.revistaraiz.com.br

AGRADECIMENTOS AOS PARCEIROS DA 11ª EDIÇÃO DA REVISTA RAIZ:

Acervo Zélia Gattai, Fundação Casa de Jorge Amado, Acervo Origens,

Muda Cultural, Celophane Cultural, Egeus Laus, Museu Afro Brasil.

IMPRESSÃO E ACABAMENTO: RR Donnelley

Diego Dionísio jornalista e assessor de comunicação com

atuação há 10 anos na cultura popular brasileira, Pesquisador,

membro da Comissão e Paulista de Folclore com especialização

em inventário de Patrimônio Imaterial pela Crespial/Unesco.

Raquel Gonçalves é jornalista, formada pela Universidade

Federal do Ceará - UFC. Mestre em Comunicação e Semiótica

pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC

SP.  Membro fundador do extinto grupo Tr.e.m.a. (Território

de Expressão no Mundo Anônimo) que atuou na cidade de

Fortaleza com intervenções e produções alternativas de comu-

nicação. Trabalhou no caderno de cultura do jornal O POVO,

em Fortaleza. Desde 2009 mora em São Paulo. Possui um blog

jornalístico de viagem. www.estradadosventos.blogspot.com`

Page 5: Revista Raiz #11

SUMÁRIO

O que rola de bom em nossa cultura

Esculturas de Isabel Mendes da Cunha

Espectro Commons e Pós Ocuppy

Livros, filmes, DVDs e CDs de RAIZ

Jorge Amado

Instituto Olga Kos, Cachuera, MinC e a nova economia criativa

A rede do Turismo comunitário

Tradição e teimosia

O engenheiro da arte popular e o Carnaval vivencial de Iguape

Vem tudo do vinil

Pipoca ali, aqui

Cachaça não é água

Café caiçara

Arte e transformação social em ação

ACONTECE......................6

RAIZ DA QUESTÃO...........32

BENS DE RAIZ....................74

VERSO...............................

12

68

POLÍTICAS.........................52

VIAGENS...........................88

PROSA..............................

20

PATRIMÔNIO....................40

MÚSICA............................82

CULTURA DIGITAL............28

ENSAIOS...........................

COMIDAS.........................98

PONTOS DE CULTURA.....102

Page 6: Revista Raiz #11

FESTA SANTAO

povo brasileiro é um povo que tem fé, ele se apropria, se adapta, se transforma, transcende e

pronto. Um povo misturado que colocou no mesmo caldeirão as procissões católicas dos euro-

peus, as festas de matriz africanas e a fé em santos não-canônicos. Estes movimentos populares,

religiosos ou não, estão espalhados por todo o Brasil.

Mas é no Nordeste que esta fé se revela com mais força como por exemplo os seguidores de

Antônio Conselheiro em Canudos e o fenômeno Padre Cícero em Juazeiro. Um fantástico e ferrenho imagi-

nário de devoção e um relacionamento íntimo, corpo, suor, lágrimas e sangue com o sagrado. As regras são

criadas, as formas de expressão são próprias, mas a fé é única e inabalável.

O Fotógrafo, carioca de nascença e pernambucano de coração, Marcelo Feitosa, lançou-se em duas

romarias de regiões distintas do Nordeste – Juazeiro do Norte, sertão do Ceará, terra sagrada do líder político/

religioso Padre Cícero e o Morro da Conceição, uma procissão da “bandeira” no meio da região metropolitana

de Recife. Seu objetivo era conhecer de perto, juntinho enfronhado estas manifestações, trazendo um retrato

crítico e profano desta força que move essa gente, desta fé cega e impressionantemente verdadeira expressada

nos olhos, mãos e símbolos carregados por estes devotos.

A curadora da exposição Andrea Vizzotto destaca: “Tanto no ambiente rural quanto no urbano, observa-

mos práticas religiosas semelhantes, em que tradição e modernidade interagem em hibridismos que buscam

novos sentidos para as suas práticas.”

A “Festa Santa” de Feitosa fez parte da exposição do MAP “Caminhos do santo”, em 2010, no Recife. Se-

gundo Marcela Wanderlei, curadora e coordenadora do MAP “...a mostra compôs um mapa sobre a temática

no nordeste, evidenciando particularidades e expressando diálogos na representação de um universo religioso

(re)elaborado.”

No meio desta “Festa Santa” o fotógrafo nos empresta seu olhar crítico destacando outras manifestações

de fé contemporânea onde Xuxa e Michael Jackson desfilam lado a lado com Cícero e Conceição. A Curadora

reflete em seu texto de apresentação: “Afinal, é o seu olhar que dessacraliza o ritual de fé dos romeiros ou é o

conceito que não consegue explicar a vivência do sagrado e do profano entre esses romeiros?”

A Festa em Madureira:

Agora será a vez de Madureira, subúrbio do Rio de Janeiro, receber esta procissão de fotos, participar desta “Festa Santa”. Os

moradores da terra do Samba são pessoas que, de imediato, vão se identificar com o tema. O subúrbio carioca tem como grande

parte da população imigrantes nordestinos, desta forma, a identificação destas manifestações típicas das suas regiões, do seu

povo, elevam sua identidade a patrimônio cultural da humanidade.

Festas como a de Nossa Senhora da Penha, Iemanjá, São Sebastião e São Jorge, mesmo vindas de tradições europeias mistu-

radas às tradições dos povos afrodescendentes, mostram esta aproximação, este “(re)conhecimento” de uma fé que não é só do

homem do Nordeste e sim das “gentes” brasileiras.

Marcelo Feitosa nasceu no Rio de Janeiro (RJ), onde vive atualmente após um período morando em Recife (PE). Começou a

fotografar ainda jovem, nos anos 1980. Fotógrafo independente, trabalha com jornalismo e é repórter fotográfico associado à

FENAJ (Federação Nacional dos Jornalistas).

Entre os prêmios que recebeu, destacam-se o Prêmio SENAD de fotografia 2009, em Brasília, e o IV Prêmio Pernambuco Nação

Cultural 2010.

Participou de todas as edições da Mostra Recife de Fotografia e também de outras mostras de arte, tais como a I Mostra de Vi-

deoarte do Memorial Chico Science, dentro da programação do SPA das Artes 2009, e a Semana de Artes Visuais do SESC Santa

Rita (Recife). Ainda em 2009, participou da exposição “Caminhos do Santo”, realizada pelo Museu de Arte Popular da cidade do

Recife (MAP), em 2010, participou da exposição “Além da Imaginação”, realizada pelo Centro Europeu de Curitiba (PR), em 2011

foi finalista do concurso internacional Prix Photo Web, promovido pela Aliança Francesa e em 2012 realiza sua primeira exposição

individual, no SESC Madureira – RJ, com o projeto Festa Santa.

Possui imagens no acervo dos Museus Oscar Niemayer (MON), em Curitiba, e na Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico

de Pernambuco (FUNDARPE). Atualmente trabalha na cobertura jornalística de eventos para diversas agências de notícia e é pro-

fessor da escola de fotografia Beco Limon Fotografia.

Serviço:

“Festa Santa” – Fotografias de Marcelo Feitosa

Curadoria - Andrea Vizzotto

SESC Madureira

Rua Ewbanck da Câmara, 90. Tel.: (21) 3350-7744.

www.sescrio.org.br

A partir do dia 06 de Março3a a 6a, 13h30 às 21h30. Sábados,

domingos e feriados, 9h30 às 17h30.

7

Por Jefferson Duarte

Fotos Marcelo Feitosa

acontece

Page 7: Revista Raiz #11

acontece

A CULTURA ALÉM DO MERCADO

O Centro de Estudos Latino-

-Americanos sobre Cultura

e Comunicação (CELACC )

é um núcleo de pesquisa

interdepartamental criado

na Escola de Comunicação e Artes (ECA)

da Universidade de São Paulo em 1996 e

está vinculado à Pró-Reitoria de Pesquisa

da USP. Com linhas de pesquisa que tra-

tam da Construção Teórica em Cultura

e Comunicação, da Cultura e Comuni-

cação na Integração Latino-Americana

e do Turismo e Identidade Cultural, a

CELACC promoveu em São Paulo no

mês de março, um encontro internacio-

nal para discutir a cultura como um bem

social, saindo um pouco do discurso (e

prática) neoliberal de que a cultura é

uma mercadoria que obedece as regras

do Mercado.

A partir do princípio de que a cul-

tura é vista como um direito dos seres

humanos e a diversidade cultural como

um patrimônio a ser defendido pelos

Poderes Públicos, segundo a Convenção

Mundial de Proteção à Diversidade Cul-

tural da Unesco, a CELACC promove de

21 a 23 de março o Fórum Internacional

de Gestão Cultura no Teatro Eva Hertz,

no Conjunto Nacional, em São Paulo.

Para pensar a gestão cultural nesta di-

mensão social e política, necessária para

que ela não se torne meramente uma

prática heterônoma, subordinada aos

grandes monopólios da indústria cultural

e sim articulada com projetos políticos

de construção de espaços do efetivo

diálogo intercultural, foram convidados

diversos nomes da meio acadêmico, do

setor privado, gestores públicos e ativis-

tas da área cultural.

Programação

O evento iniciou-se no dia 21 de mar-

ço, ás 19h, com Cerimônia de Abertura

com as presenças do ex-ministro da

Cultura, Juca Ferreira e o ex-secretário

de Políticas Culturais do Ministério da

Cultura nas gestões de Gilberto Gil e

Juca Ferreira, Alfredo Manevy , mediados

pelo jornalista Juarez Xavier. O evento

contou com a performance de João Bá e

banda, no show “João Bá 80 Anos” no

Cine Livraria Cultura.

No dia 22 de março seguiram a

mesa “Geopolítica da cultura” com o

sociólogo Fábio Kobol e Ángel Mestres

(Espanha), um dos autores de “Con-

trole social da Administração Pública”,

mediada pelo jornalista Silas Nogueira

no Teatro Eva Herz. A tarde o antropó-

logo Frederico Brabosa e a engenheira

venezuelana especializada em Gestão

Cultural e Cooperação Internacional,

Maria Claudia Rossel, participaram da

mesa “O papel do gestor cultural na pro-

moção da diversidade cultural”, mediada

pela jornalista Bernadete Toneto. Ainda

no dia 22 de março, a mesa “O gestor

e as políticas públicas e privadas de

promoção à cultura” contou com a pre-

sença do historiador e ex-secretário de

Programas e Projetos Culturais do MinC

na gestão Gilberto Gil/Juca Ferreira,

Célio Turino e o pesquisador musical e

músico Benjamim Taubkin, mediados por

Wilton Garcia.

No último dia, 23 de março, a mesa

sobre “Cultura e economias criativas”

sob a mediação Juliana Oliveira, teve a

presença da especialista em Economia

Criativa & Desenvolvimento Sustentável,

Lala Deheinzelin e da arquiteta argentina

Silvina Martinez, no Teatro Eva Hertz.

Duas mesas fecharam o Fórum Inter-

nacional de Gestão Cultural: “Cidades,

economias criativas - Agenda 21 da

cultura” com as presenças do historia-

dor espanhol Luís Pablo Milanez e da

coordenadora de Cultura e Educação do

Instituto Asas, Juliana Nolasco; e a mesa

“Culturas periféricas”, que tratou dos

fenômenos culturais que ocorrem nas

periferias da sociedade e contou com as

participações do Eleilson Leite, da Agen-

da da Periferia/ONG Ação Educativa, e

Leandro Hoehne, da Rede Livre Leste,

sob a mediação da Fabiana Amaral

no Teatro Eva Hertz. Os organizadores

anunciaram ainda uma mesa virtual.

O Aquecimento Fórum será uma mesa

redonda, composta por membros da or-

ganização e convidados, com o objetivo

de iniciar, no espaço virtual, algumas das

discussões que foram tratadas no encon-

tro. O Aquecimento Fórum foi transmiti-

do ao vivo pelo portal Terra.

Serviço:

Fórum Internacional de Gestão Cultural aconteceu de 21 a 23 de março

Programação: forumigc.com/forum/imprensa/apresentacao-imprensa.pdf

No Teatro Eva Hertz, Conjunto Nacional, Avenida Paulista, 2073 - São Paulo/SP

Site oficial: www.livrariacultura.com.br/teatro

9

Por Redação

Fotos Divulgação

Page 8: Revista Raiz #11

acontece

BRINQUEDOS POPULARES DO NORDESTE BRASILEIRO

Foto

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açã

o

Caminhando num dia enso-

larado e sem nuvens pelo

paisagismo de Burle Marx,

contornando as marquises

de Oscar Niemeyer no Parque

do Ibirapuera, chegamos ao Museu Afro

Brasil. O verde do parque pulsa aos olhos

e as exposições que encontramos lá nos

arrebatam o olhar.

O Museu Afro Brasil tem o seu encanto na

composição entre o entorno, a arquitetura e o

conteúdo, que apresenta ao público paulista-

no, de maneira consistente e bela.

Pelo comando de Emanoel Araújo o Museu

Afro Brasil tem impresso, desde 2004, diversi-

dade temática e conhecimento acumulados,

sempre numa apresentação esmerada. Soma-

-se a isso, a moldura do vistoso conjunto ar-

quitetônico da década de 50, o Pavilhão Padre

Manuel da Nóbrega. Um museu pulsante, que

traz para São Paulo renovados ares estéticos.

Passamos pela porta de entrada, vemos

uma lojinha com pegada étnica, daí temos

que escolher entre as exposições temporárias

e o acervo no último andar. Como nosso

destino eram os brinquedos populares

fomos pela esquerda. Foi então que mer-

gulhamos no sertão nordestino brasileiro,

apresentado com uma plasticidade nunca

vista para o tema, na exposição: “O sertão:

da caatinga, dos santos, dos beatos e dos

cabras da peste”. Deixando o cheiro de

couro e terra para trás seguimos para nosso

destino: “Brincar com Arte – O Brinquedo

Popular do Nordeste”.

Uma explosão lúdica de cores, formas,

materiais e maneiras de interagir, sintetizada

nas mil peças-brinquedos apresentadas. Sepa-

rada em painéis temáticos, que chamam nos-

sa atenção pelo volume de obras. Da atração

inicial somos impactados pela visão particular

de cada peça. Pião, pipa, pula-corda, empurra

aro, bolinha de gude, carrinho, caminhão,

barcos, foguetes, mamulengos, mulher gorila,

bichos, roda-gigante e muito mais.

Nas brincadeiras populares o dinheiro

não significa necessariamente a falta de

recursos. Que o digam os múltiplos objetos

apresentados para a felicidade de nossos

olhos e das crianças que querem brincar.

Aqui, uma sandália de tiras vira um singelo

barco e um pássaro carrega um coelho em

seu voo imaginário.

A exposição “Brincar com Arte” é

fruto da coleção de David Glat, curador

do Museu do Brinquedo Popular na Bahia.

Como ele mesmo nos conta: “Comecei

curiosamente comprando brinquedos em

feiras nas minhas viagens como fotógra-

fo profissional. Quando me dei conta, o

volume era grande”. Partindo daí para a

profissionalização de sua coleção, comple-

tou e catalogou seu acervo, que foi exposta

parcialmente, com sua face nordestina, no

Ibirapuera, em São Paulo.

Serviço:

Exposição: Brincar com Arte – O Brinquedo Popular do Nordeste

Aconteceu de janeiro a abril de 2012

Local: Museu Afro Brasil – Avenida Pedro Álvares Cabral, s/n - Parque do Ibirapuera, portão 10, São Paulo

Fone: (11) 3320-8900 ramal 8921

Site: www.museuafrobrasil.org.br

Acervo David Glat

11

Por Redação

Fotos Acervo Associação RAIZ

Page 9: Revista Raiz #11

Foto

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ão

do que tradicionalmente ali se exibe: arte ”popular”. No

entanto, um crítico como Eduardo Subirats há muito nos fez

reconhecer que a classificação – ou desqualificação – de um

conjunto de obras de arte sob a designação de “popular”

não se baseia em categorias estéticas, mas na identificação

do meio social de proveniência de seus criadores. Um meio

politicamente colonizado, economicamente depauperado

e delimitado por barreiras étnicas quase intransponíveis.

“A arte popular não é branca. Tampouco cristã. Ou não é

suficientemente cristã”, ele nos alerta, chamando a atenção

para os seus vínculos com uma compreensão mística da

natureza, deuses perseguidos e comunidades espoliadas,

o que associa sua criação a um universo desdenhosamente

chamado de “superstição” e não “cultura”. Seu pouco valor

mercantil “é uma consequência de sua sub-valorização

artística e intelectual”, ele conclui.

TEIMOSIA DA IMAGINAÇÃOEXPOSIÇÃO, LIVRO E DOCUMENTÁRIO TRAZEM A OBRA E O PENSAMENTO DE

CADA UM DESTES MESTRES DA ARTE DE RAIZ

O Instituto Tomie Ohtake abriu seu espaço para

uma grande exposição da arte do povo brasi-

leiro. Teimosia da Imaginação reúne obras de

10 artistas de diferentes partes do Brasil com

linguagens plásticas diferenciadas, da cerâmi-

ca de dona Isabel Mendes e do falecido Mestre Galdino à

pintura de Nilson Pimenta e Aurelino dos Santos, passando

pela escultura em madeira de Antonio de Dedé, Francisco

Graciano, José Bezerra, Cícero Alves dos Santos – o “Véio”

– Jadir João Egídio e Getúlio Damado. De Minas Gerais a

Pernambuco, do Mato Grosso à Bahia, de Alagoas, Ceará e

Sergipe ao Rio de Janeiro, algumas das melhores criações da

arte popular brasileira estarão ali representadas.

Exposições como esta não são frequentes nos museus e

galerias de arte. Para a arte do povo, o direito de acesso a

esses espaços requer um insidioso adjetivo que a distingue

Jadir - escultura em madeira

13

Por Maria Lucia Montes

Fotos Divulgação

prosa

Page 10: Revista Raiz #11

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ão

Assim, exilada do grande circuito artístico, conhecida apenas em um círculo restrito de colecionadores e galeristas – na Galeria

Estação ou na Brasiliana em São Paulo, na Karandash em Maceió, na Paulo Darzé em Salvador, na Pé de Boi ou, como uma

admirável exceção, no Museu do Pontal no Rio de Janeiro – raramente essa arte do povo pode ser apreciada em conjunto, como

ocorre nas tradicionais coletivas em torno de correntes estéticas ou períodos históricos. Às vezes ela pode figurar em grandes

mostras híbridas de “cultura popular” em algum evento de repercussão internacional – a Eco 92, a Mostra do Redescobrimento,

ou o ano do Brasil na França – quando então, curiosamente, é chamada a representar, para os outros, uma “verdadeira” identida-

de nacional... À parte isso, porém, raramente tais obras são vistas em conjunto como criação de artistas com identidade própria. A

exposição do Instituto Tomie Ohtake felizmente é exceção a essa regra.

Trata-se, além disso, de uma mostra inédita também por outra razão. Ela nos oferece não só obras a serem vistas, mas uma

oportunidade de apreciá-las da perspectiva de seus criadores. Uma série de vídeos produzidos pela TalTV resultou em entrevistas

editadas para o catálogo da mostra, contando com apresentação de Rodrigo Naves. Mas, por uma vez, será possível ver essas

obras não só pelo olhar do crítico, e sim tal como vistas e entendidas pelos próprios artistas. Uma exposição, portanto, para se ver

e ouvir, porque é aí que se desvenda o significado da “teimosia da imaginação” que, apesar de tudo, sustenta sua arte.

Mestre Gaudino - escultura

Cícero - escultura em miniatura

15

prosa

Page 11: Revista Raiz #11

e trabalho árduo a serviço dessa dádiva

que é sua imaginação criadora.

A imaginação é uma referência

onipresente, quando falam de sua obra.

Seguindo uma trilha que o Instituto

do Imaginário do Povo Brasileiro vem

buscando explorar como via de acesso

a essa arte, foi preciso buscar outros

parâmetros estéticos para entender o

significado da imaginação que esses

artistas invocam e mapear o imaginário

que atravessa seus trabalhos, de lingua-

gens e formas de criação tão diferencia-

das. A obra de Gaston Bachelard sugeriu

a “ruptura epistemológica” necessária

para nos distanciar das categorias esté-

ticas tradicionais e reunir esses artistas

numa base comum. Seu conceito de

“imaginação da matéria” forneceu o

roteiro, ao focar o embate entre a mão

que trabalha e a matéria que lhe resiste

Quase todos esses artistas invo-

cam seu pouco ou nenhum estudo e a

experiência de um passado de trabalho

duro no meio rural ou em ocupações

urbanas humildes e mal remunera-

das, antes de se descobrirem – serem

descobertos! – como artistas. Louceiros,

roceiros, lidadores de gado, pedreiros,

carroceiros, seguranças, vendedores

de ferro velho – eis o que se encontra

nesse universo. Muitos aprenderam

nesses ofícios o domínio de seu material

e dos instrumentos de sua arte, que

manejam com admirável maestria. E,

como tradição de família, muitos trans-

mitem generosamente aos filhos, netos

e vizinhos o ensino de sua arte. Mas a

criação ela própria é, para eles, quase

sempre, um dom, quando não fruto de

uma revelação mística, ao que se acres-

centa, depois, uma vida de dedicação

Foto

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ão

se expressa não só a poética própria de

um artista, mas toda uma estética, uma

metafísica, uma ética, uma filosofia, uma

linguagem, ideias, valores e sentimentos

que conformam uma visão de mundo.

Isso é o que nos revela a palavra desses

artistas, sem a qual passaríamos ao largo

do significado mais profundo de suas

obras. E é também o que valida por si

mesma essa arte, para além da legitimida-

de que lhes conferem as categorias estéti-

cas de nosso próprio universo cultural.

Contudo, ao assim revelar esse imagi-

nário de formas arcaicas que permanecem

na longa duração da história, a palavra

desses artistas não nos permite esquecer

que eles estão firmemente ancorados na

realidade contemporânea em que vivem,

cujas agruras conhecem de perto e das

quais a arte em parte os redime. Sendo

a criação o trabalho que lhes garante o

ganha-pão, muitas vezes parece não ter

sentido para eles a distinção entre artesão

e artista que, para nós, deveria ser eviden-

te. Mas nem por isso deixam de perceber

o valor que a circulação no mercado de

arte agrega à sua obra. Muitos trafegam

com desembaraço nesse universo onde se

sabem valorizados por críticos e curadores

como Lélia Coelho Frota e Janete Costa,

que tanto os prestigiaram durante toda a

sua vida, e também colecionadores como

Paulo Vasconcelos, Roberto Rugiero,

ou, dócil, se amolda à ideia do artista,

fazendo brotar daí a sua criação. Terra,

água, fogo e ar, os quatro elementos aos

quais, na filosofia pré-socrática, se atri-

buía a origem, a forma e o movimento

do mundo, são a matéria imaginária de

que trata Bachelard, percorrendo terri-

tórios de poesia, devaneios e sonhos: A

poética do espaço, O ar e os sonhos, A

Terra e os devaneios do repouso, A água

e os sonhos, A psicanálise do fogo... As-

sim também se pode entender a matéria

com que trabalha a imaginação desses

artistas, nela encontrando as formas que

sugere ou às vezes impõe à sua arte.

Vindas da profundeza de um idioma

em que, desde tempos imemoriais, todas

as culturas construíram suas cosmolo-

gias e narraram seus mitos, são imagens

arcaicas que desenham os contornos da

imaginação da matéria. E nessas imagens

“Quem disse que artistas populares

são “ingênuos” ou “primitivos”

distantes de nós?”

Antônio de Dedé - esculturas Getúlio - escultura com reciclados

17

prosa

Page 12: Revista Raiz #11

“O arcaísmo do imaginário que sustenta a sua criação não é, pois, o oposto da modernidade contemporânea em que vivem.”

Foto

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ão

João Maurício de Araújo Pinho e tantos

outros galeristas como Vilma Eid ou Maria

Amélia Vieira. E, mais ainda, embora

ignorem tudo sobre o funcionamento das

modernas tecnologias de informação e

comunicação, alguns conhecem até mes-

mo o valor de um site na internet para

a divulgação e reconhecimento de seu

trabalho, como José Bezerra e Francisco

Graciano. Todos têm também consciência

da circulação de suas obras no mercado

internacional e alguns até já participaram

de exposições no exterior... Quem disse

que artistas populares são “ingênuos” ou

“primitivos” distantes de nós?

O arcaísmo do imaginário que sustenta

a sua criação não é, pois, o oposto da

modernidade contemporânea em que

vivem. Ele representa o legado de uma

força criadora que seu talento soube

re-apropriar, permitindo-lhes escapar

da condição de miséria a que pareciam

condenados, e é também o que define o

significado profundo dessa teimosia da

imaginação que os distingue de modo

próprio como grandes artistas e admirá-

veis seres humanos.

Nilson Pimenta – pintura

Serviço:

Exposição “Teimosia da Imaginação, dez artistas brasileiros”

Curadoria: Germana Monte-Mór e Rodrigo Naves - de 30 de março a 13 de maio – de terça a domingo, das 11h às 20h

Instituto Tomie Ohtake - Av. Faria Lima, 201, Pinheiros - SP

Fone: (11) 2245-1900

Livro “Teimosia da imaginação – dez artistas brasileiros” (edição bilíngue)

Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro e Editora WMF Martins FontesPrefácio: Rodrigo Naves - Textos: Maria Lucia Montes - Fotos: Germana Monte-Mór

Quanto: 120 reais

Documentários “Teimosia da imaginação – dez artistas brasileiros” - Exibição na TV Cultura

De 04/04 a 02/05, às quartas-feiras, às 23h30, e reprise aos domingos, às 15h.

Estreia 04/04 - reprise 08/04

JOSÉ BEZERRA – Coisas Que Esses Olhos Me Mostram - VÉIO – Sertão Esculpido na Madeira

Estreia 11/04 - reprise 15/04

MANOEL GALDINO – Tudo é Folclore - FRANCISCO GRACIANO – Eu Olho e Eu Vejo

Estreia 18/04 - reprise 22/04

AURELINO - Sombra Viva - IZABEL MENDES – Mãos que Moldam um Mundo

Estreia 25/04 - reprise 29/04

ANTONIO DE DEDÉ – Dias Transparentes - NILSON PIMENTA – A Caminho de Tudo

Estreia 02/05 - reprise 06/05

JADIR JOÃO EGÍDIO – Caso Com a Madeira - GETÚLIO DAMADO – A Arte é Reciclagem

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IMAGINAÇÃO NACIONAL E AS CORES DO BRASIL

“ASSINATURA DAS MAIS MARCANTES JÁ SURGIDAS NA HISTÓRIA CULTURAL E LITERÁRIA BRASILEIRAS, O NOME DE JORGE AMADO (1912-2001) LOGROU ACUMULAR UMA COMBINAÇÃO RARA DE FORÇA E RECONHECIMENTO SIMBÓLICOS...”

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Por Gustavo Rossi

Fotos Acervo Zélia Gattai / Fundação Casa de Jorge Amado

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A ssinatura das mais marcan-

tes já surgidas na história

cultural e literária brasilei-

ras, o nome de Jorge Ama-

do (1912-2001) logrou

acumular uma combinação rara de força

e reconhecimento simbólicos, a qual

contribuiu decisivamente para investi-lo

de poderes quase mágicos no que diz

respeito à sua capacidade de fazer coa-

gular, de pronto, imagens e sentimentos

caros a certa noção de brasilidade. Elo-

quente neste sentido, foram as homena-

gens prestadas ao escritor neste carnaval

de 2012, ano em que se comemora o

centenário de seu nascimento. Lem-

brada em algumas das principais festas

carnavalescas do país, como as do Rio de

Janeiro, de São Paulo e, evidentemente,

Salvador, a data serviu de mote para que

Jorge Amado e suas criaturas se (con)

fundissem nas ruas e nos sambódromos

como personagens de um único espe-

táculo lúdico das ficções sociais sobre o

Brasil, sua morenidade e seu legado afri-

cano. Amado e sua obra mimetizariam e

celebrariam a nação em suas dimensões

mais autênticas e profundas, como

tão bem explicitou o samba-enredo da

agremiação paulistana Mocidade Alegre:

“É magia... / Na mistura das raças surgiu

/ A pele morena, linda é a cor do Brasil

[...] Eternizado, é coroado Obá de Xangô

/ Jorge... Orgulho da nação / Amado...

Em cada coração / Feliz, o povo canta

em oração” .

Decerto, não há nada de aleatório

ou natural nesta magia evocatória que

faz surgir e “coroar” um Jorge Amado e

um Brasil “eternizados” pela “oração”

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como um vetor representativo de cultura

e civilização para a formação do caráter

nacional. Um outro Brasil estava sendo

imaginado: só que agora, a partir de

chaves de leitura menos recalcadas

e mais desembaraçadas dos antigos

jargões deterministas e biologizantes,

hegemônicos no século XIX. De outra

parte, subjacente a este ambiente

efervescente de interesses (literários,

etnográficos, políticos etc.) que inci-

diam sobre a população negra, estava a

estruturação de um Estado igualmente

empenhado em incorporá-la ao corpus

de representações de sua

memória pública. Durante tanto

tempo um desterrado, um es-

trangeiro em sua própria terra,

o negro passava a ser amalga-

mado a um tipo de discurso

que, solenizado nas comemora-

ções cívicas e encampado pelas

políticas culturais promovidas

pelo Estado varguista, buscava

exaltar não apenas uma história

do congraçamento entre as raças

formadoras do país como também a

singularidade e a homogeneidade de

seu povo miscigenado.

redentora da “mistura das raças”. Gros-

so modo, pode-se dizer que a carreira

de Jorge Amado e a visão positiva da

mestiçagem são feitos que se embara-

lham. Ou melhor dizendo, constituem

fenômenos que ganharam

feição e substância em um solo

comum de transformações da

sociedade brasileira destravadas,

sobretudo, pela chamada Revo-

lução de 30: momento em que,

nas palavras do crítico Antonio

Candido, a cultura brasileira foi

disposta numa “configuração

nova” [...], projetando na escala

da Nação fatos que ocorriam

no âmbito das regiões” . Nessa “con-

figuração nova”, o negro, considerado

por séculos um dos principais obstáculos

para o progresso, começava a ser visto

“Nessa “configuração nova”, o negro, considerado por séculos um dos

principais obstáculos para o progresso, começava a ser visto como um vetor

representativo de cultura e civilização para a formação do caráter nacional.”

“… a nação nunca está no passado, ela se

constrói a partir das lembranças e dos

esquecimentos dos agentes do presente.”

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A carreira de Jorge Amado foi se

construindo em fina sintonia com este

movimento de “ida ao povo” que sin-

gularizou os intelectuais de sua geração,

cujos esforços de busca e pesquisa por

uma literatura e um Brasil autênticos

justificaram muitos dos romances do

período . Por uma conjunção de fatores

biográficos, sociais, políticos e regionais,

Amado esteve em condições de ofere-

cer um produto próprio e original num

momento em que, de um lado, a figura

Foi, deste modo, em meio aos dilemas políticos e estéticos associados às suas posições e aliado à apropriação destes

estoques simbólicos sobre o Brasil e a Bahia, que Amado iniciou a modelagem de um projeto literário que encontrou no negro e na cultura afro-brasileira um de seus repertórios

mais persistentes, expressivos e vigorosos.

do intelectual engajado se convertia no

modelo de excelência, e, de outro, a

demanda por retratos e diagnósticos da

realidade do Brasil, de seu cadinho étnico

e de seus regionalismos aumentava a

fim de suprir um mercado editorial em

expansão. Autor precoce, com pouco

mais de vinte de anos Amado já gozava

de prestígio como escritor de romances

proletários e membro combativo do

Partido Comunista Brasileiro (PCB), se

destacando por um texto que aliava ro-

bustez de estilo e forte apelo ideológico.

Ao mesmo tempo, interessado em invo-

car o PCB como mandatário legítimo dos

interesses dos proletários e explorados, o

escritor plasmava na ficção uma repre-

sentação de povo nutrida de sua terra

natal, Bahia. E mais especificamente, a

“Roma Africana”, Salvador , um espaço

extremamente caro para o imaginário

nacional e que, já na década de 1930,

se transformava, mesmo internacional-

mente, num modelo paradigmático para

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opressivos e vigorosos. Uma modelagem

que certamente não foi homogênea no

decorrer de sua longa produção, mas

que, mesmo sob diferentes roupagens e

com distintas motivações, sempre flertou

com certa utopia nacional-popular –

populista diriam alguns –, chancelada

e sacralizada pelo código da mistura

racial: seja como quadro do PCB entre

as décadas de 1930 e 1950, quando o

povo emergia colado a uma narrativa de

nação em perigo, a qual precisava ser

protegida do imperialismo e dos inimigos

estrangeiros, seja a partir do momento

em que, ao abandonar a militância, sua

se divulgar a ideia de como o Brasil teria

encontrado soluções harmônicas nas

relações entre brancos e negros, sendo a

larga miscigenação que ali se processou

um dos elementos centrais para muitos

argumentassem em favor da suposta

ausência de preconceito racial entre nós.

Foi, deste modo, em meio aos dilemas

políticos e estéticos associados às suas

posições e aliado à apropriação destes

estoques simbólicos sobre o Brasil e a

Bahia, que Amado iniciou a modelagem

de um projeto literário que encontrou

no negro e na cultura afro-brasileira um

de seus repertórios mais persistentes, ex-

obra, perdendo a sisudez da lingua-

gem ideológica, se abriu à fabulação de

um Brasil da festa, mais carnavalizado,

sensual, feminino e picaresco. Não é

demais lembrar que, em 1945, quando se

candidatou a deputado federal pelo PCB,

foi sob o slogan de “romancista do povo”

e não dos proletários que ele se elegeu.

Assim como foi em nome do povo que

Amado buscou infundir coerência e

unidade tanto estética quanto programá-

tica a sua obra, evidentemente, cheia de

ranhuras, mudanças e descontinuidades.

Inútil perguntar, se, de fato, a nação

brasileira corresponde ou não à utopia

popular defendida por Amado, sacraliza-

da e “eternizada” por ele sob código da

mistura, da morenidade e da harmonia

racial. Até porque, a nação nunca está

no passado, ela se constrói a partir das

lembranças e dos esquecimentos dos

agentes do presente. Como observa

Benedict Anderson, não havendo um

“criador original da nação, sua biografia

nunca pode ser escrita de uma forma

evangélica, ‘avançando no tempo’ ao

longo de uma cadeia generacionista

de procriações. Essa modelagem [...] é

marcada por mortes que, numa curiosa

inversão da genealogia convencional,

começam num presente originário. A

segunda Guerra Mundial gera a Primeira

Guerra Mundial; de Sedan vem Auster-

litz; o antepassado no Levante de Var-

sóvia é o Estado de Israel” . Em síntese,

menos do que essências culturais inefá-

veis pertencentes a tempos longínquos,

são as experiências e as políticas identitá-

rias travadas contemporaneamente que

irão conformar quais as cores, as mortes,

os martírios, os passados e os esqueci-

mentos através dos quais a sociedade

brasileira imaginará seus destinos como

povo e nação.

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Page 17: Revista Raiz #11

CULTURA DIGITAL: PIPOCA ALI, AQUI“PIPOCA ALI, AQUI, PIPOCA ALÉM / DESANOITECE A MANHÃ / TUDO MUDOU”

O Brasil passa por mudanças no mundo da Cultura

Digital. Se durante os mandatos do governo Luiz

Inácio Lula da Silva iniciou a ideia de Cultura

Digital partilhando a vida política do país com

programas de adesão ao Software Livre, a criação

de editais de fomento, discussões sobre Banda Larga, Direito

Autoral e projetos e programas que prevêem a criação de

redes e telecentros, o que acontece na gestão Dilma Rouceff é

a popularização dessa onda digital.

Antes era o analógico, agora somos cada vez mais digitais

Se a digitalização da matéria aconteceu de forma progressiva

ao longo da nossa história , os avanços da Cultura Digital no

tecido social brasileiro caminham cada vez mais rápido com a

adesão ora alegre, ora desconfiada dos brasileiros. A medida

que avançamos na relação com as máquinas estabelecemos

várias alterações no nosso modo de vida, com as novas tecnolo-

gias estas mudanças estão ocorrendo de forma violenta na área

da Informação e na foma de se obter Conhecimento. Segundo

o IBOPE (Instituto Brasileiro de Opinião e Pública e Estatística) de

cada dez brasileiros, oito participam de alguma rede social. O

brasileiro já é o segundo país com mais usuários no Twitter supe-

rando o Japão, alcançando a marca de 33,3 milhões de usuários.

O processo começou no século 19 quando surgiram as

máquinas que iniciaram a escrita a distância: o telégrafo e

telefone. A fotografia, cinema e a televisão garantiram o

armazenamento, a reprodutibilidade e a distribuição das ima-

gens. Mas a partir do desenvolvimento dos computadores, a

produção da escrita, imagens e sons passam por um sofisticado

sistema de decodificação que transformam sua forma física e

a estética. Agora estamos diante de processos de desterri-

torialização e biopoder tecnológico, conceitos defendidos

por intelectuais do porte do espanhol Javier Bustamante, e

prática de diversas pessoas em bairros periféricos dos gran-

des centros, aldeias indígenas e quilombos do país. Hackers

não são bichos papões segundo o professor e comunicador

Messias Bandeira da UFBA (Universidade Federal da Bahia),

mas uma figura com importante papel social. Com direito ao

novo verbo “hackear “, que é a ação de apropriação social

da tecnologia, Bustamente e Bandeira defendem a figura e a

ética do hacker.

Pipoca ali, aqui, pipoca além

Essas mudanças estão provocando uma efervercência de

festivais, congressos e encontros pelo país. O tradicional

Campus Party em São Paulo, já na quinta edição, ganhou

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Textos e Fotos por Thereza Dantas

(trecho da música Pipoca Moderna)

cultura digital

Page 18: Revista Raiz #11

status nos meios de Comunicação e

mantém espaços para a cobertura das

atividades “desse estranho mundo” nos

programas de TV e revistas da impren-

sa tradicional. Os nerds agora estã na

moda. O pragramador de linguagem

Java, Marcus Vinicius Bastos, exibia feliz

a camiseta “NERD sim, e daí?” pelo

Anhembi durante o encontro Cam-

pus Party desse ano. “Essa foi minha

primeira participação no evento, espero

participar novamente”, contou o estre-

ante no evento.

Já o Festival Internacional de Cultura

Digital, em sua terceira edição, mudou

de cidade. O coordenador Claudio

Prado não viu nenhum problema em

planejar em São Paulo, sede da Casa de

Cultura Digital que organiza o even-

to, e produzí-lo nas dependências do

MAM (Museu de Arte Moderna) e Cine

Odeon, no Rio de Janeiro. “As mudan-

ças ocorreram por questões financeiras

e políticas. Mas o Rio de Janeiro tem um

fator aglutinador que vai ampliar a par-

ticipação das pessoas da área da Cultura

Digital. Estamos crescendo na produ-

ção de conteúdos e vamos aumentar

essa produção na próxima edição que

também ocorrerá no Rio”, avisa Claudio

Prado. O Festival Internacional de Cultura

Digital tem uma programação voltada às

questões filosóficas e comportamentais

da Cultura Digital. Para o gerente de

tecnologia da MSYSTelecom, Eric Viana,

a Campus Party cumpre uma função de

apresentar as novidades do mercado

das novas tecnologias: “há uma entrada

maior de empresas privadas que, creio

eu, estão ali para buscar novos talentos

para seus quadros de colaboradores ou

para passar a imagem de inovadoras ao

estar num evento que trata de futuro.”

Mas não é só no eixo Rio/São Paulo

que se discute Cultura Digital. O Rio

Grande do Sul tem tradição e proprieda-

de sobre o assunto com a organização

do Fórum Internacional de Software

Livre que em 2012 produzirá sua décima

terceira edição no mês de setembro na

capital gaúcha. Milhares de pessoas par-

ticipam das discussões e desconferências

que contam com a participação de diver-

sos políticos. Aliás, a Cultura Digital não

é uma cultura desprovida de opiniões e

atividades políticas – e em alguns casos

partidários. Durante o Fórum Mundial

Social Temático que ocorreu no início de

2012 em Porto Alegre, aconteceu o Co-

nexões Globais 2.0, que reuniu militantes

e ativistas das redes sociais. Nas contas

dos organizadores mais de 10 mil pes-

soas participaram dos debates sobre “os

limites e rumos da democracia represen-

tativa na era da internet” e que contou

com a particpação de representantes dos

movimentos Occupy Wal Street e o M15

(movimento dos indignados espanhol).

Occupy internet

Os poderes do ativismo digital

invadem os diálogos das telenovelas e

instituições públicas e privadas que in-

vestem em encontros, editais e concur-

sos para conquistar um público (consu-

midor) crescente. Se cinco em cada dez

brasileiros já utilizam o e-commerce não

é de estranhar que dentro do ciberes-

paço também se movimentem grupos

promovendo todo o tipo de campanhas

humanitárias e políticas. Para Pablo

Capilé , um dos integrantes do Co-

letivo Fora de Eixo, o crescimento da

participação das pessoas é a consequ-

ência dessas mudanças. “Está surgindo

uma geração digital que quer discutir

música, audiovisual, literatura. Há uma

coalização de espaços – virtual e real

– onde a mobilização ecooa com mais

força.”, avalia.

O encontro Digitália – Congresso

Internacional de Música e Cultura

Digital , organizado pela Audiosfera,

que aconteceu em fevereiro de 2012

em Salvador (BA) sob os cuidados de

Yemanjá, discutiu de políticas públicas à

transumanização, de Direitos Autorais às

novas plataformas para divulgação gra-

vação, arquivo e divulgação da música.

Sob o guarda-chuva da Cultura Digital

novas posturas diante do sistema polí-

tico, econômico, artísticos, filosóficos

e estéticos estão mudando as relações

pessoais no mundo real. Para Capilé

“semânticamente é interessante manter

o nome Cultura Digital mas o ciberes-

paço é só uma extensão do mundo real,

um espaço para ativismo através dos

auto-mobilizadores.”

Serviço:

Campus Party: www.campus-party.com.br/2012/index.html

Festival de Cultura Digital: www.culturadigital.org.br

Fórum Internacional de Software Livre: www.softwarelivre.org/fisl12

Conexões Globais 2.0: www.conexoesglobais.com.br

Digitália – Congresso Internacional Música e Cultura Digital: www.digitalia.com.br

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cultura digital

Page 19: Revista Raiz #11

“Há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia”, escreveu Shakespeare em Hamlet. Ele nem imagi-

nava que uma delas seriam as ondas eletromagnéticas. O chamado espectro eletromagnético é um espaço de radiação

que contém desde as ondas de rádio, o infravermelho, a luz visível e até os raios gamas. Como era de se esperar, os

Estados e o Capital desde o princípio perceberam que era fundamental tomar conta deste espectro como um espaço que

deve ser controlado para fins políticos, militares e ideológicos, de um lado, e, principalmente econômicos, de outro.

Durante anos o espectro não interessou aos produtores de cultura e aos comunicadores populares, pois seu domínio parecia

muito técnico e distante da criação cultural. Foi com o movimento de rádios livres e comunitárias que muitos artistas e ativistas

das artes perceberam que seria importante ocupar um pedaço deste espaço não-visível, mas fundamental para transmitir ideias e

conteúdos pelas ondas de rádio.

Se consultarmos a Wikipedia veremos que as “ondas de rádio são um tipo de radiação eletromagnética com comprimento de

onda maior (e frequência menor) do que a radiação infravermelha. Como todas as outras ondas eletromagnéticas, viajam à veloci-

dade da luz no vácuo. Elas são geradas naturalmente por raios ou por objetos astronômicos.” O importante é notar que as ondas

de rádio podem ser produzidas artificialmente e servem para transportar nossas mensagens. Por que elas não podem ser usadas

livremente? Eis a questão?

No início do século XX, o uso deste espectro foi completamente estatizado. Interesses políticos e econômicos confluíram para

declarar o espectro um espaço estratégico e escasso. Isto quer dizer que somente o Estado deveria decidir quem poderia utilizá-lo.

Com o controle do espectro, buscava-se controlar a comunicação. O uso militar era evidente, mas as finalidades comerciais tam-

bém ficaram claras para a maioria da população. Depois do estupendo sucesso do rádio, a utilização do espectro para transmitir

imagens e sons gerou uma revolução na comunicação de massas.

Não vamos esquecer que as ondas eletromagnéticas são também denominadas ondas hertzianas e popularmente conheci-

das como ondas de radiofrequência ou simplesmente ondas de rádio. Ainda recorrendo a Wikipedia é importante ressaltar que “é

comum dividir as ondas hertzianas em faixas de frequência, que variam entre as frequências de 30 quilohertz (muito baixas) a 300 mil

mega-hertz (extremamente altas). Essas bandas de frequências são classificadas em grupos, e estes grupos são comumente chamados

por: onda curta, onda média e onda longa. Dentro destes segmentos, encontram-se as estações de radiodifusão, serviços de comuni-

cação aérea, marítima, telegrafia etc.”

Há 3 tipos básicos de apropriação do espectro eletromagnético no mundo atual. Todos eles são definidos dentro de um território

nacional pelo seu Estado. O primeiro é a concessão de uso exclusivo de determinadas frequências por um certo tempo, para um

UM ESPECTRO RONDA AS ONDAS DE RÁDIOE ATORMENTA O PODER ECONÔMICO ...

ESPECTROCOMMONS

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Texto Sérgio Amadeu

Foto Divulgação

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ulg

ão

raiz da questão

Page 20: Revista Raiz #11

A interferência é um problema maior

para o rádio receptor do que para o

transmissor. Pense em uma sala com 50

pessoas. Se todas falarem ao mesmo

tempo em voz alta, dificilmente conse-

guiremos ouvir o que cada pessoa está

dizendo. Existe um ruído que logo se ins-

tala em nossos ouvidos. Nossos aparelhos

receptores analógicos são incapazes de

separar exatamente as vozes que quere-

mos ouvir naquela sala. O aparelho digital

não tem este problema. Devido ao modo

como a transmissão digital é realizada,

podemos separar exatamente qual canal

de TV queremos assistir ou qual estação

de rádio queremos ouvir, se a transmissão

e a recepção forem digitalizadas e opera-

das por softwares de rádios transmissores

e receptores inteligentes.

determinado agente, em geral, uma

empresa. Este é o modelo empregado no

Brasil. A Globo, a Record, o SBT, entre

outras empresas de radiodifusão rece-

bem o direito de explorar determinado

pedaço do espectro. O segundo tipo é

o da privatização de faixas do espectro.

Desse modo, o Estado venderia, em

leilões, determinadas frequências em

todo território nacional ou em partes do

mesmo. Assim, uma empresa poderia

comprar e ser dona, por exemplo, da

faixa de 2 a 2,5 Ghz, tal como podemos

comprar um terreno em uma cidade. Por

ser proprietária privada e não conces-

sionária do Estado, este segundo tipo

representa a privatização efetiva do es-

pectro. Já o terceiro tipo denomina-se de

espectro aberto. Trata-se de transformar

o espectro em uma via pública, tal qual

uma avenida ou rodovia. É praticamente

o oposto da privatização das frequências

de radiodifusão.

Alguns argumentariam que seria

impossível permitir que todos utilizas-

sem o espectro livremente porque o

ruído destruiria nossas possibilidades de

comunicação. Isto seria verdade, com o

uso de tecnologias analógicas. Com as

possibilidades trazidas pelos aparelhos

digitais, não há mais sentido técnico em

controlar privadamente esse que deve

ser um bem público tão relevante quan-

to a água ou o ar. Rádios inteligentes,

operados por software, podem transmitir

suas programação em pacotes de bits.

Tal como ocorre na Internet, cada pa-

cote de bits é parte de uma mensagem

maior que é remontada no aparelho

destinatário da mesma. Para isto, os

pacotes possuem um cabeçalho que

permitem identificar sua origem, seu

destino e sua aplicação, no caso de um

programa de rádio ou TV, o cabeçalho

do pacote pode dizer qual é o nome

do evento, jornal, novela ou filme que

está sendo transmitido.

Já os aparelhos receptores digitais

são completamente diferentes dos

aparelhos analógicos. São máquinas

de processamento de bits, são peque-

nos computadores. Basta você ob-

servar seu aparelho celular. Ele é um

pequenino computador com um rádio

digital receptor e um rádio digital

transmissor. Quando alguém liga para

o seu celular, exceto por defeito da

Operadora de Telecomunicação ou do

aparelho, a comunicação é realizada,

mesmo que você esteja fora da sua

cidade. É possível alguém interferir na

sua comunicação e realizar escutas

na sua frequência, mas independente

disto, entre milhões de telefones celu-

lares, sua ligação é realizada, isto quer

dizer que seu aparelho é encontrado

entre milhões de opções existentes. O

aparelho ao lado não recebe a ligação

que é para o seu aparelho, pois a

comunicação digital é inteligente e

realizada por software e por máquinas

de processar informações.

Com isso, não precisamos definir que

a rádio X deva ocupar somente uma

determinada frequência. Ela deve trans-

mitir o programa com aparelhos digitais

homologados pelos órgãos fiscalizado-

res. Se uma dada frequência, tal como

em uma estrada, ficou congestionada, a

transmissão logo mudará de faixa, assim

como mudamos de pista. Os rádios

receptores que ficam o tempo todo esca-

neando o espectro também mudam de

frequência e encontram os pacotes de

bits daquele programa que nos interessa.

Isto ocorre quando nos locomovemos

com telefones celulares e mudamos de

antena de transmissão. Tecnicamente é

cada vez mais trivial.

Podemos utilizar o espectro, as ondas

de rádio, como uma grande via aberta e

democrática, como um espaço comum,

um commons. O impede disto acontecer?

Primeiro, os interesses econômicos que

pretendem manter a situação de “escas-

sez” do uso das ondas eletromagnéticas

típicas do mundo industrial. Os radiodifu-

sores acreditam que seus impérios ruiriam

com a abertura do espectro. Pensam que

sucumbiriam com a dispersão de verbas

publicitárias diante de tanta concorrência,

o que pode não ser verdade. Na Internet,

os grandes grupos de comunicação de

massa perderam espaço para outros gran-

des grupos de comunicação digital, basta

ver o Google e o Facebook. Isto ocorreu,

principalmente, pela incapacidade de

senhores como Murdock entenderem e

aceitarem a comunicação em rede e o

direito da cópia dada pelas novas tecnolo-

gias. Não foi resultado só da quantidade

de concorrentes.

Segundo, as burocracias especializa-

das do Estado estão comprometidas com

grandes grupos econômicos, pois con-

sideram que isto é o melhor para o seu

país. Terceiro, as autoridades políticas

nascidas no mundo pré-informacional

tem dificuldade de aceitar a liberdade

comunicacional distribuída. Isto não quer

dizer que o uso do espectro não seria

regulamentado. Ao contrário, tratar o

espectro como um espaço comum exigi-

rá uma grande fiscalização dos aparelhos

transmissores para que cumpram as

regras definidas. Mas isto também ocor-

re nas estradas com os carros. Ninguém

é impedido de dirigir, desde que tenha

condições de passar em um exame para

obter uma carteira de habilitação e que

cumpra as regras de trânsito. Falando

por analogia, acontece atualmente no

mundo do espectro eletromagnético que

temos estradas onde só podem passar

carros de uma determinada marca e

apenas em uma direção.

Temos oportunidade de começar a

mudar esta situação. Um passo inicial é

montarmos o movimento pelo espectro

aberto, pela liberdade das ondas de rá-

dio. O segundo passo é nos prepararmos

para transformar em espaço comum as

faixas de frequência que serão liberadas

quando o sinal da TV analógica não for

mais transmitido. Os radiodifusores e as

operadoras de telecomunicação estão

juntas na defesa do modelo atual de uso

do espectro, pois isto lhes dá um enorme

poder econômico e por conseguinte um

gigantesco poder político.

A luta pela democratização das

comunicações precisa chegar ao espec-

tro, do contrário ela será um trabalho

incompleto. Quando nossas lideranças

perceberem, a comunicação quase que

totalmente digitalizada estará sob o

controle de um reduzido oligopólio de

telecomunicação transnacional. A pior

censura é a do capital. A censura e a

manipulação políticas são combatidas

nas disputas públicas pelas mudanças de

governo. Não se muda a gestão e a dire-

ção de empresas sem termos suas ações,

sem termos capital. Por isso, não vamos

perder a oportunidade de democratizar

radicalmente nossas comunicações, a

fronteira é o espectro.

Sergio Amadeu da Silveira - Pro-

fessor da UFABC e membro do Comitê

Gestor da Internet no Brasil. É membro

do Conselho Científico da ABCiber (As-

sociação Brasileira de Pesquisadores de

Cibercultura). Foi presidente do Instituto

Nacional de Tecnologia da Informação.

35

“Temos oportunidade de começar a mudar

esta situação. Um passo inicial é montarmos o movimento pelo espectro aberto,

pela liberdade das ondas de rádio.”

“Foi com o movimento de rádios livres e comunitárias que muitos artistas e ativistas das artes perceberam

que seria importante ocupar um pedaço deste espaço não-visível, mas fundamental para transmitir ideias e

conteúdos pelas ondas de rádio.”

raiz da questão

Page 21: Revista Raiz #11

37

Por Ney Hugo e Tatiana Oliveira

Foto Rafael Vilela

PÓS OCUPPY:E AGORA?OS NOVOS TEMPOS DE MOBILIZAÇÃO ONLINE

CHEGAM ÀS RUAS E ABREM ESPAÇO PARA

UMA DEMOCRACIA RESSIGNIFICADA

Foto

: Ra

fae

l Vile

laraiz da questão

Page 22: Revista Raiz #11

E a descentralização de informações

neste contexto tem feito com que se

levante uma sucessão de “Pós” mani-

festados espontânea e proativamente,

como o pós partido, pós rancor, pós

marca, entre muitas

outras pós-relações-

-sociais-obsoletas,

em uma formação de

conhecimento livre,

aliada a reflexões

históricas e ações

pragmáticas que

geram uma nova

consciência social,

mais autônoma e

propositiva, trazendo

muito mais resultados no campo das

transformações do que o velho modelo

de sabotagem-teórico-ideológica.

Serviço:

Para conhecer mais o Coletivo Fora do

Eixo acesse: foradoeixo.org.br

Como explicar a engrenagem

de uma rede que em cinco

anos alcançou centenas de

cidades brasileiras e outras

dezenas de localidades na

América Latina, usando como maior

ferramenta a arte, as trocas solidárias e

a cultura digital? São perguntas como

estas que (re)estruturam diariamente o

Fora do Eixo, uma rede elaborada a partir

de iniciativas autogestionárias no campo

da cultura e do compartilhamento de

tecnologias sociais.

A rede iniciou os trabalhos em quatro

cidades no final de 2005, tendo a música

como carro chefe, ao buscar relações de

mercado favoráveis às iniciativas solidárias

que desafiassem a indústria fonográfica.

Ao longo de sua trajetória, a conexão

entre agentes locais se expandiu e as

tecnologias alternativas geraram novas

possibilidades de cadeias produtivas

sustentáveis. Consequentemente, outras

temáticas artísticas e sócio-culturais

passaram a ser compreendidas como

pauta prioritária, como o meio-ambiente,

a homo-afetividade e o esporte.

Atualmente, os agentes integrados ao

Fora do Eixo têm forte presença no am-

biente virtual, onde sistematizam e ope-

racionalizam a rede, superando distâncias

e diferenças sócio-político-culturais. Cada

vez mais autônomos e auto gestores,

eles apontam para novas formas de

protagonismo e, para isso, sistematizam

suas ações através de quatro simulacros:

Banco, Partido, Universidade e Mídia,

que desafiam e desconstroem modelos e

cópias do sistema vigente.

Assim, o Banco FdE, por exemplo,

planeja, sistematiza e mapeia ações

da rede que gerem sua própria susten-

tabilidade, além de pautar a troca de

serviços e tecnologias sociais, como

o Card, moeda complementar criada

como alternativa à renda em espécie.

Já o Partido se apresenta como uma

mobilização diferenciada da política

partidária, passando a ser uma prática

cotidiana que expresse a ciência do re-

lacionamento, favorecendo o encontro

de pontos de convergência de ativistas

do Brasil e do mundo que lutam por

melhores políticas sociais.

Neste campo de diálogo, foras do

eixo de todo o país se encontram virtual

e presencialmente em Congressos, Fó-

runs, Festivais e mobilizações urbanas

que intentam uma espécie de “Occupy

permanente”. Como

exemplo há as Casas

Fora do Eixo, onde os

moradores, desafiados

por sua própria desterri-

torialidade e desapego,

se dedicam ao movi-

mento social em igual

acesso ao caixa coletivo

da sede onde vivem e

trabalham, laborato-

riando novos processos

de articulação e formação livre.

Também caminham favoráveis a este

movimento os avanços da internet e

sua interface multi-midiática que faz

com que as fronteiras entre emissor e

receptor se fundam e deixem o espaço

de “espectadores” desta produção.

Novos sujeitos de uma Democracia

2.0 surgem a todo momento e de

todo lugar, potencializando a difusão

e o surgimento de novos mediadores

de cultura, que descentralizam cada

vez mais as ferramentas e as técnicas

utilizadas, como é o caso da Mídia FdE,

outro simulacro da rede.

Para que se firmem tais pilares, a

UniFDE - Universidade Fora do Eixo -

prioriza a formação livre e empírica que

complementa os quatro simulacros base

da rede, colaborando com trocas de

informações, conhecimentos, tecno-

logias sociais e experiências, em busca

da autonomia do sujeito e de respostas

mais digitais na construção de sua pró-

pria história.

39

“Atualmente, os agentes integrados ao Fora do Eixo têm forte presença

no ambiente virtual, onde sistematizam e operacionalizam a rede, superando distâncias e

diferenças sócio-político-culturais.”

“A rede iniciou os trabalhosem quatro cidades no final de

2005, tendo a música como carro chefe, ao buscar relações de

mercado favoráveis às iniciativas solidárias que desafiassem

a indústria fonográfica.”

Foto

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la

raiz da questão

Page 23: Revista Raiz #11

Foto

: Cris

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e

Uma coleção construída no contato direto com os artistas e seus ateliers

RICCARDO GAMBAROTTO O ENGENHEIRO DA ARTE POPULAR BRASILEIRA

41

Da Redação

Fotos por Cris Albuquerque e Acervo Associação RAIZ.

patrimônio

Page 24: Revista Raiz #11

Foto

: Ace

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Ass

ocia

ção

RAIZ

.

Vista parcial da Coleção Gambarotto de arte popular brasileira

“Conheci vários trabalhos indígenasde todo o mundo, e nada se

compara em qualidade, variedade e acabamento artístico do que os realizados pelos índios brasileiros”.

(Riccardo Gambarotto)

Riccardo Gambarotto é enge-

nheiro de produção, formado

pela Poli USP, e consultor cor-

porativo dos mais qualificados

do mercado. Foi presidente de

empresas e ajudou outras grandes com-

panhias a obterem resultados positivos,

mesmo nas situações críticas em que mui-

tas delas se encontravam. A excelência

de sua ação pode ser medida na fusão de

sua consultoria, a MGDK, com a ame-

ricana Monitor, do papa do marketing

Michael Porter, no final dos anos 90.

Riccardo, além da paixão por carros,

tem uma das coleções de arte popular

brasileira das mais significativas em

número e qualidade das peças. Coleção

elogiada por muitos, entre os quais, a

saudosa Lélia Coelho Frota, que notou

o olhar estético do engenheiro na

composição geral de seu acervo. Foi a

sua coleção e o seu conhecimento da

nossa arte popular um dos inspiradores

da Revista RAIZ., projeto que participou

desde a sua criação e que ajudou, como

ninguém, a colocar de pé.

A coleção Gambarotto de arte

popular brasileira não foi construída na

compra à distância das peças, mas no

contato direto com os artistas populares,

que o colecionador visitou em inúmeras

viagens por todo país. Muitos deles,

Riccardo ajudou de maneira recorrente.

Caso de Joel Gaudino, filho do famoso

mestre Manuel Gaudino do Alto do

Moura em Pernambuco, que o olhar do

engenheiro já reconhecia e, que agora,

o mercado começa a comprar e qualifi-

país. Nos conta Riccardo: “Conheci vá-

rios trabalhos indígenas de todo mundo,

fui algumas vezes ao Museu Nacional

de Arte Indígena Americana (National

Museum of the

American Indian)

de Washington, nos

EUA; nada se com-

para em qualidade,

variedade e acaba-

mento artístico que

são realizados pelos

índios brasileiros”.

A riqueza encon-

trada nas múltiplas

estantes em que o

colecionador guarda suas aquisições; a

arte indígena armazenada com esmero,

envelopadas em mapotecas e estantes

car. Também João Borges de Timon do

Maranhão, que se considera piauiense,

uma vez que está a apenas uma ponte

do estado vizinho; são peças de bar-

ro que guardam as

expressões faciais e a

alma dos personagens

que representa em

técnica apurada. Com

predileção por escul-

turas em seus vários

materiais, excepcional-

mente encontramos

pinturas nas prateleiras

repletas de obras, que

por acaso ou não, vem

de ex-escultores, como o Mestre Zé do

Carmo de Goiana, Pernambuco. O acer-

vo colecionado por Riccardo só muda

de escopo quando falamos em arte indí-

gena. A sua coleção de arte plumária e

objetos é de tirar o fôlego. Mais uma vez

a curadoria revela a qualidade excepcio-

nal dos cocares, vestimentas, máscaras,

arcos, flechas, tacapes e bordunas,

utensílios; de muitas tribos e regiões do

Foto

: Cris

Alb

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e

43

patrimônio

Page 25: Revista Raiz #11

José Celestino - escultura em madeira

Mestre Gaudino - cerâmica

Índios Marubo - cerâmica

“O rico ou o novo rico temvergonha de colocar

‘coisa de pobre’ na parede. Temos em nossa arte popular amelhor relação custo-benefício

em se tratando de mercado,mas muitos ainda preferem

colocar coisas duvidosas nas suas casas por puro preconceito”.

(Riccardo Gambarotto)

Foto

: Cris

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rqu

e

desumidificadas; nos revelam um mundo

de beleza e energia que empolga o olhar,

colocando a questão de como ainda

pouco nos conhecemos “gigantes pela

própria natureza”. O desconhecimento

sobre nossa arte popular não assusta o

colecionador. Como ele mesmo nos diz:

“O rico ou o novo rico tem vergonha

de colocar ‘coisa de pobre’ na parede.

Temos em nossa arte popular a melhor

relação custo-benefício em se tratando

de mercado, mas muitos ainda preferem

colocar coisas duvidosas nas suas casas

por puro preconceito”.

As obras em 3D que compõe o seu

acervo são um painel dinâmico da arte

brasileira atual e criativa, uma vez que

a coleção Gambarotto só adquire peças

de artistas vivos. Grande parte dos

estados brasileiros estão representados

nas dezenas de milhares de quilôme-

tros percorridos pelo colecionador, em

sua busca pela arte do povo. Do Alto

do Moura em Pernambuco ao Vale

do Jequitinhonha nas Minas Gerais,

encontramos o rosto de Riccardo Gam-

barotto em fotografias que decoram

muitos dos ateliers que frequentou,

mostrando a intimidade do engenheiro

com os autores e a cultura brasileira.

Construindo sua coleção o engenheiro

vai armazenando nossa memória. A

memória da uma arte que saindo da

pobreza expande sua estética por novos

patamares da imaginação. O cenário

que contemplamos nas paredes repletas

de obras na casa de Riccardo, de certa

forma se configura na casa de todos

nós brasileiros.

Foto

: Cris

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45

patrimônio

Page 26: Revista Raiz #11

Foto

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go

Dio

nísio

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atia

Gom

espatrimônio

COM BONECÕES DO ZÉ PEREIRA, BLOCOS DO BOITATÁ, LITRÃO,

GALO E BANHO DA DOROTHÉIA, AS RUAS TOMBADAS DO CENTRO

HISTÓRICO DO MUNICÍPIO GANHAM MOVIMENTO, CORES E

MUITA ANIMAÇÃO, LEVANDO FOLIÕES DE TODAS AS GERAÇÕES

NUM GRANDE FESTEJO POPULAR CULTURAL.

CARNAVAL NA TERRA DO BOM JESUS, PATRIMÔNIO VIVO DE IGUAPE

47

Por Diego Dionísio

Fotos Diego Dionísio e Katia Gomes

Page 27: Revista Raiz #11

Praça central de Iguape, SP

Foto

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Foto

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go

Dio

nísio

e K

atia

Gom

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Os blocos e cordões tem

ganho as ruas no carnaval

brasileiro. Já famoso no

Nordeste, explodiu este

ano no Rio de Janeiro e

em São Paulo ganhando até expressão

midiáticas. O carnaval de rua, com

bonecos, cabeções e marchinhas, foi

destaque em todo país.

Em muitas cidades do Estado de São

Paulo acontecem os cortejos carnavales-

cos e as saídas dos blocos de ruas que

mantêm traços dos antigos entrudos.

Na Estância Turística de Iguape,

localizada no Vale do Ribeira no Estado

de São Paulo, em frente às edificações

do século XVII, XVIII e XVIII acontece um

carnaval de rua singular, espontâneo

próprio da identidade regional expres-

sado nos blocos de tradição e bonecos

gigantes num pulsar intensivo para um

público circulante no cinco dias de folia,

mais de 100 mil pessoas de todas as

gerações e classe sociais.

A cidade, fundada em 1538, con-

templada pela beleza natural da Mata

carnavalescos: perucas, máscaras e as

camisas dos blocos. Como um torcedor

de time de futebol que veste sua camisa

para mostrar o amor e a dedicação ao seu

time, dias antes do carnaval os moradores

da terra do Bom Jesus desfilam a camisa

de seu bloco anunciando a hora de festar.

Para participar do carnaval a regra é sim-

ples: basta colocar a fantasia, ou a camisa

de seu bloco e entrar na folia.

Ao meio dia da sexta feira de carna-

val, de longe é possível ouvir os tambo-

res do Zé Pereira – bloco tradicional em

Atlântica, banhada pelo Rio Ribeira e o

mar do litoral sul, desde 2009 é tomba-

da como patrimônio cultural do Brasil

pelo Instituto do Patrimônio Histórico

Artístico Nacional – IPHAN. Além de suas

edificações, várias manifestações cultu-

rais, como a festa de São Benedito, Festa

de Bom Jesus de Iguape, Santíssima Trin-

dade e o carnaval tradicional remanes-

centes do passado, sobrevivem ao tempo

e são consagradas como referência da

memória do povo ribeirinho.

Neste período de carnaval, as ruas

pacatas do Centro Histórico, que abriga

quase 700 edificações tombadas como

patrimônio material ganham cores, movi-

mentos e música. De trás das paredes das

casas, o intangível ganha forma e o patri-

mônio imaterial da cidade se materializa

nos blocos nos quais, durante vários

meses, comunidades trabalharam para

preservar o festejo popular, a segunda

maior manifestação cultural da cidade.

O comércio central, que geralmente

vende lembranças do Santuário do Bom

Jesus de Iguape, dá foco aos artifícios

49

patrimônio

Page 28: Revista Raiz #11

Mestre Zé Alfaiate, um dos Patrimônios Vivos de Pernambuco.

Rio Ribeira

Foto

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Corso da folia carnavalesca Bonecos gigantes

com seus barcos para a pesca do robalo.

O cenário é surpreendente. Os primeiros

raios de sol fazem do mar pequeno uma

aquarela de nuances azuis projetadas na

água e no céu, e um prateado nas ondas

provocadas pelos barcos.

Na quarta de cinzas, o dia acorda

com mais preguiça, mais quieto. Na

pequena rodoviária de Iguape, pessoas

de várias regiões do Estado, ainda com

purpurinas, dormem encostadas em suas

malas. Ligações para Presidente Pruden-

te, São Paulo, Santo, Sorocaba, Pinda-

monhangaba são feitas pelas pessoas

que esperam o ônibus chegar. É hora de

voltar para casa.

A pacata cidade volta a ter seu ritmo

natural, moradores nas praças, pescado-

res voltando do mar, reverberações sobre

o carnaval, a saída do Boi, o colorido

Galo e o quanto foi animado o festejo.

Os moradores de Iguape se despedem

dos amigos, familiares e visitas, os

convidando para Via Sacra. O sagrado

e o profano caminham juntos o tempo

todo na terra de Bom Jesus. E por trás

das janelas moradores descansam para o

próximo festejo.

Blocos:

“Litrão”, do bairro Guaricama,

onde tem um tradicional bar do senhor

“Belo” e que há 20 anos é homena-

geado com uma garrafa alegórica de

5 metros, que no meio do caminho vai

distribuindo a cachaça tradicional prepa-

rada pelos moradores e conhecida popu-

larmente como “paletó vermelho”.

“Chaleira”, um dos blocos mais anti-

gos que há 80 anos carrega a identidade

de vários carnavais da cidade é esperado

pelos foliões por trazer os carros e as

temáticas mais criativas do carnaval

“A corda”, formado pelos foliões com

todos os tipos de instrumentos, baldes e

panelas, que por volta das 5h da manhã

transitam pelas ruas segurando uma

corda, cantando e gritando “acorda”.

O processo dinâmico dos movimentos

culturais populares permite o surgimen-

to de novos blocos e alegorias, como o

“Kai e Sara”, que neste ano completou

10 anos levando um público com perfil

mais jovem.

várias regiões do Brasil – turistas, comer-

ciantes e moradores começam a embalar

na marchinha cantada há gerações:

“Viva o Zé Pereira, viva o Zé Pereira, viva

o Zé Pereira no meu carnaval”. O bloco

formado por um conjunto percussivo de

bumbos, caixas, taróis, pratos e instru-

mentos de sopro é acompanhado do

bonecão Zé Pereira e Dona Juritica, há

quase 40 anos.

Num processo contínuo de preserva-

ção e salvaguarda dos bens materiais e

imateriais da cidade, o Departamento

de Cultura e a Casa do Patrimônio da

cidade fomentam tradição do carnaval,

oferecendo uma oficina de produção de

Bonecões com todo o processo de em-

papelamento, pintura e costura para um

grupo de jovens da cidade. Resultante

desta ação, seis novos bonecos acompa-

nharam o Zé Pereira, nos quatro dias de

festa encantando crianças e adultos.

Anoitece e o Centro Histórico fica

lotado. Os 20 blocos começam a fazer

sua passagem pelas ruas em torno do

Santuário do Bom Jesus e o público

acompanha dançando, pulando e brin-

cando o carnaval. Uma lei municipal per-

mite a execução apenas de marchinhas

e canções produzidas pelos moradores

facilmente embalados pelos foliões.

Dentre os blocos há uma expectativa

para o Boitatá. Os bois no carnaval apa-

recem em várias regiões do Brasil e não

seria diferente em Iguape. Dias antes

de sua saída, a comunidade se reúne

diariamente numa esquina onde abriga

a grande estrutura do Boi de quase 10

metros de comprimento e dois de altura.

E neste local uma prévia do carnaval

acontece. Um aparelho de som instalado

na calçada toca repetidamente o hino

do boi que numa estrofe fala: “Vem me

abraçar, vem me beijar, vem de novo,

atrás do Boitatá vou te beijar de novo.”

No dia de sua saída para o cortejo, os

moradores mais antigos ficam pelas cal-

çadas, ansiosos para a passagem do Boi-

tatá. O berrante toca e a cada mugido,

gritos e aplausos são exaltados pelos foli-

ões. À medida que o grande boi passa, a

multidão se reveza para encostar no boi

pois, segundo a tradição, o contato trará

sorte no ano e este revezamento segue

até o final do seu cortejo.

O bloco seguinte, também muito

esperado, é o Banho da Dorothéia, que

tem origem em Santos e se espalhou

para todos os municípios do litoral

paulista. Trata-se de um grande cortejo

de homens e mulheres travestidos e

fantasiados, tendo como figura central

um homem de noiva grávida ao lado de

seu noivo.

Durante o cortejo, param num sobra-

do de uma família tradicional de Iguape

e na varanda diante da multidão é reali-

zado o casamento. O cortejo, de quase

quatro horas, termina com o banho da

Dorothéia no mar pequeno, onde os

foliões também se banham.

São muitas as manifestações popu-

lares que se mostram vivas nos quatro

dias de carnaval. Tem ainda os blocos do

“Litrão”, da “Chaleira” e do “A corda”.

O processo dinâmico dos movimentos

culturais populares permite o surgimen-

to de novos blocos e alegorias, como o

“Kai e Sara” e outros. O cenário para

encerramento é a varanda do sobrado

onde a Dorothéia casou. Os músicos

tocam as últimas canções, formando um

grande bloco diversificado de foliões.

Ao lado desta efervescência cultural,

das ruas cheias e dos blocos e marchi-

nhas, na rua paralela ao Centro Históri-

co, ainda no escuro, pescadores passam

51

patrimônio

Page 29: Revista Raiz #11

A INCLUSÃO DE VERDADE DO INSTITUTO OLGA KOS

Por Edgard Steffen Junior

Fotos Divulgação

53

políticas

Page 30: Revista Raiz #11

meio milhão de brasileiros. Amor que é

revelado nos resultados das atividades

do Instituto, que hoje é o que mais em-

prega no mercado de trabalho portado-

res de deficiência intelectual.

A Síndrome de Down é uma doença

genética, causada por uma alteração

cromossômica. Ocorre quando crianças

nascem dotadas de três cromossomos

21, e não dois, como é o padrão. Isso

leva à produção exagerada de pro-

teínas, que acaba por desregular a

química do organismo de seus porta-

dores. No Brasil, acredita-se que ocorra

um caso em cada 500 nascimentos, isso

quer dizer, que nascem quase 10 mil

bebês com a síndrome por ano, segun-

do a Associação dos Pais e Filhos com

Síndrome de Down.

As diferenças sempre nos

proporcionam fortes

emoções. Muitas vezes

provocam sentimentos de

inquietude, tantas vezes

nos afastam daquilo que não conside-

ramos semelhante. “Narciso acha feio o

que não é espelho”?

Não é o caso do Instituto Olga Kos.

Aqui as diferenças são a razão de existir

e são tratadas com muito amor. Amor

estruturado em metodologias inclusivas,

onde a arte e o esporte proporcionam

novos patamares de vida. Amor expres-

so pelo respeito e a consideração pelo

outro. Amor feito de puro carinho aos

portadores da Síndrome de Down. Amor

às eternas crianças dessa síndrome que

atinge, em número estimado, quase

Sem olhar as limitações geradas

pela síndrome, o Instituto Olga Kos

vai em busca da superação de seus

alunos. Ampliando os horizontes de

seus espíritos pela arte e de seus corpos

pelo esporte. Ou vice-versa, ou tudo

junto, num diálogo constantemente

avaliado pelos próprios impactados

nas atividades do Olga Kos. Esse é o

grande legado do Instituto: abolir as

fronteiras limitantes, reconhecer como

pares as diferenças, sem preconceitos

ou discriminações, com muito respeito

e crença na superação mútua, sempre

dispostos à mudar para se atingir o

melhor resultado.

Nas atividades que envolvem a arte

são dois projetos: “Pintou a Síndrome

do Respeito” e “Resgatando Cultura”.

Oficinas de arte do Instituto Olga Kos

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ção

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ulio

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reira

políticas

Page 31: Revista Raiz #11

O primeiro com oficinas de arte e o

segundo pela publicação de livros de

artistas contemporâneos. No Esporte

são aulas de Karate-do e Taekwondo.

Ambos ativando as atividades motoras e

cognitivas das crianças, jovens e adultos

portadores atendidos pelo Olga Kos.

“Pessoas com deficiência intelectual

engordam, tem colesterol, cáries, não

terão sempre por perto pessoas que

adivinhem o que elas querem. Precisam

ter sentimento de posse e pertencimento,

como qualquer pessoa sem deficiência,

mesmo porque se relacionam com o

mundo e, como em uma via de mão du-

pla, é necessário que ao menos conheça-

mos as leis que regem esta via. Em outras

palavras, o mundo deve ser apresentado

à elas, bem como devemos ser apresen-

tados ao seu modo de interagir com o

mundo”, diz a psicóloga Paula Ayub, que

atua no Instituto.

Na busca pela autonomia de seus

alunos desenvolveu-se uma metodologia

própria, realizada por equipe multidiscipli-

nar formada por psicólogos, pedagogos,

artistas plásticos, produtores de mídia,

mestres em artes marciais, professores de

educação física e médicos, que medem

as evoluções e corrigem rotas, sempre em

busca da segurança e da autoconfiança

dos alunos portadores do Down. Como

nos diz, Wolf Kos, presidente do Instituto:

“Construímos, desconstruímos, recons-

truímos o todo. E ai, a imaginação voa

livre e solta, liberando frustrações e amar-

ras dos meninos, a alma viaja com ela”.

A metodologia é única e vem sendo

reconhecida com o Prêmio Cultura e

Saúde Nota 100 e a Ordem do Mérito

Cultural, do Ministério da Cultura; como

também o 2° Prêmio Brasil de Esporte

e Lazer de Inclusão Social, promovido

pelo Ministério do Esporte. Tudo começa

com o chamado ‘Aquecimento’, onde

trabalha-se a interação e a socializa-

ção dos alunos. Depois vem a fase da

‘Produção’, copiar aqui é proibido e os

sentimentos são expressos em cores e

formas livres. Para fechar o ‘Encerra-

mento’ com a releitura de tudo que foi

feito. Pinturas são rasgadas e coladas em

novos suportes, tudo feito coletivamente

por todos participantes. A cada aula é

rememorada a atividade anterior, no en-

cerramento todo trabalho é relembrado

e avaliado. Por isso, os saltos são rápidos

e visíveis em períodos tão curtos como o

ciclo de oficinas artísticas com dois meses

de duração.

Em mais um diferencial, que mostra o

respeito e a consideração que o Instituto

Olga Kos tem por seus alunos, muitas

atividades de arte são ministradas por

artistas renomados como Gustavo Rosa,

Inácio Rodrigues, Sara Bellz, Marysia

Portinari, Eduardo Iglesias e Isabelle Tuch-

band. “Uma experiência libertadora, uma

forma de soltar as próprias amarras!”,

diz Gustavo Rosa sobre a sua experiência

nas oficinas. O testemunho de uma das

mães atendidas pelo Instituto é revelador:

“Nunca tinha visto o Cadu dar risada an-

tes”. O riso foi uma conquista do menino

antes irritadiço, que só fazia resmungar,

ficava de canto e não se enturmava. A

participação nas oficinas, transformou a

personalidade do Cadu. Revelou-se como

artista e hoje, de bem consigo mesmo,

“Construímos, desconstruímos, reconstruímos o todo. E ai, a imaginação voa livre e solta, liberando frustrações e

amarras dos meninos, a alma viaja com ela”. (Wolf Kos)

“Na busca pela autonomia de

seus alunos desenvolveu-se

uma metodologia própria”.

Trabalhos dos alunos das oficinas de arte

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ção

57

políticas

Page 32: Revista Raiz #11

orienta até os colegas menos habilidosos.

Esses artistas anônimos do Down e seus

mestres reconhecidos no mundo das artes

são publicados em livros, que são promo-

vidos em exposições ao término de cada

módulo das artes da colagem, aquarela,

fotografia e reciclagem.

No esporte não é diferente. Os alunos

passam por uma bateria de exames,

mudam de faixa ao final de cada período

e fazem apresentações em vários locais

como federações de artes marciais,

festivais, eventos internacionais, feiras de

esporte e faculdades de educação física.

Dos muitos exemplos, citamos o do me-

nino Denis, um aluno que quando entrou

nas oficinas do Olga Kos só falava duas

palavras: vô e mãe. Hoje, Denis conta até

dez em japonês e não perde uma aula

que o mestre Sérgio ministra semanal-

mente. O caratê é a sua paixão.

Nascido em 2007, hoje o Instituto

Olga Kos conta em seu quadro 42 pesso-

as trabalhando regularmente. O inves-

timento inicial foi originado da coleção

de arte contemporânea brasileira doada

à causa pelo casal Wolf e Olga Kos, sim

ela dá o nome ao Instituto. Foram os

leilões de obras de Aldemir Martins, Volpi,

Antonio Peticov, Djanira, Di Cavalcanti,

Emanoel Araújo, Mario Gruber, Lasar

Segall, Tunga, Atos Bulcão e tantos outros

grandes artistas, que geraram o capital

que viabilizou as atividades do Instituto.

Hoje, o trabalho já disseminado conta

com inúmeros patrocinadores: Bancos

Bradesco e Daycoval, Eternit, Volkswa-

gen, Siemens, Tecnisa, entre outras

empresas. Mas, Wolf Kos quer mais. Quer

que o incremento de patrocínios permita

à dispersão do Instituto e de suas ações

para todo país. “Nossos projetos pode-

riam estar em todos os estados do Brasil.

Só não estão por falta de mais recursos”,

explica Wolf.

A atuação do Instituto Olga Kos na

capital São Paulo e nos municípios de

Guarulhos e Diadema, no ABC paulista, já

contemplou milhares de alunos. Gerou a

felicidade dos portadores da síndrome e

o conforto de suas famílias. O Instituto é

um exemplo de uma ação inclusiva com

resultados efetivos. Seus participantes

saem fortalecidos, as famílias satisfeitas,

uma produção artística gerada com qua-

lidade e beleza, portadores da síndrome

de Down empregados e a construção de

uma tecnologia que permite replicação.

Pois como questiona o casal Wolf e Olga:

“Se não o fizermos, quem o fará? Que

herança pretendemos deixar”? E pedem

com o mesmo entusiasmo que promo-

vem em sua atuação e presença constan-

tes no dia-a-dia do Instituto: “Abracem

essa causa”.

Hoje, Denis conta até dez em japonês e não perde uma aula que o mestre Sérgio ministra

semanalmente. O karatê é a sua paixão.

Aulas de taekwondo e karatê e do Instituto Olga Kos

Foto

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ivul

ga

ção

59

políticas

Page 33: Revista Raiz #11

O DIÁLOGO DO CACHUERA

Da Redação

Fotos Yves Barros

A Associação Cultural Cachuera!, comandada por Paulo Dias, tem realizado um mergulho profundo na discussão e

entendimento da identidade brasileira e de suas culturas tradicionais. Com pesquisa notadamente musical, realizada

desde o início dos anos 90, o Cachuera busca a formação de público para um incentivo ao consumo e, a decorrente,

perpetuação dessas culturas. A metodologia desenvolvida respeita sobremaneira o artista e suas manifestações indivi-

duais ou coletivas, procurando revelar as idiossincrasias inerentes às obras apresentadas, sempre num diálogo constan-

te com os ouvintes.

A pesquisa do Cachuera se transmuta em shows, oficinas e workshops promovidos em seu privilegiado espaço no bairro das

Perdizes, em São Paulo. O respeito pela nossa cultura e sua gente começa na sede do Cachuera, com estúdio de gravação, salas de

aula, biblioteca, computadores e palco caprichados para bem receber os folguedos e seus protagonistas. Nesse processo, revela a

formação histórica e cultural dos grupos e artistas, através da exposição e debate dos contextos e características próprias das ativi-

dades apresentadas. O diálogo revela, sem medos ou rodeios, aquilo que o público desconhece ou não tem o entendimento devido.

No Cachuera você pode assistir um show de jongo, aprender a dançar, ouvir suas histórias e tudo termina na comida coletiva dos

terreiros do batuque. Não folcloriza o jongo, ao contrário, revela seu valor e maneira de ser, dando voz aos jongueiros. O legal é que

o público pode interagir e se inserir nesse processo, degustando e participando das atrações do palco e das oficinas do Cachuera.

“1.800 horas transcritas e indexadas de som digital, 10.000 fotografias e 900 horas de vídeo, mantidos em reserva

técnica climatizada. Soma-se a esse material, coletado em 140 localidades brasileiras, uma discoteca, uma videoteca

e uma biblioteca com cerca de 3.700 títulos”

61

Foto

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ves

Barro

spolíticas

Page 34: Revista Raiz #11

Iniciando suas atividades decanas com

o jongo do sudeste do Brasil, em especial

no paulista Vale do Ribeira, o Cachuera

também promove encontros internacio-

nais e a música erudita, em sua busca

constante de empoderar a nossa cultura

e fomentar à sua disseminação, em uma

troca constante entre ideais e estéticas.

No Cachuera assistimos o jongo do

Tamandaré, o pianista cubano Harold

Lopez-Nussa, acordes de Bach entoando

as antigas catedrais, a Festa do Divino e

seus cortejos, ladainhas, música, dança e

o oferecimento de refeições, entre tantas

atrações. Tudo é feito para ser, além de

consumido, entendido. Mesmo que isso

possa demorar um pouco, pois para o

Cachuera o tempo sempre joga a seu

favor, que diga o extenso acervo musical

coletado e produzido nesses vinte anos.

O acervo da Associação conta com

1.800 horas transcritas e indexadas de

som digital, 10.000 fotografias e 900

horas de vídeo, mantidos em reserva

técnica climatizada. Soma-se a esse

material, coletado em 140 localidades

brasileiras, uma discoteca, uma vide-

oteca e uma biblioteca com cerca de

3.700 títulos, voltada para os estudos

afro-brasileiros e africanos, sociologia,

antropologia, folclore, música, religião,

arte popular e temas afins.

O Cachuera também possui significa-

tivo catálogo de produtos que compar-

tilha, da sua produção a comercializa-

ção, com as comunidades tradicionais

populares; objetos de sua pesquisa e

relacionamento. São 15 CDs, 4 DVDs e

4 livros versando sobre os mais varia-

dos temas: caixeiras do divino, velhas

guarda do samba paulista, capoeira,

quilombolas, congado mineiro e tantas

outras manifestações culturais e artís-

ticas. Mas, para a Associação Cultural

Cachuera! o mais importante é o

processo, onde o diálogo transparente

estabelecido se traduz no cuidado com

os produtos gerados e comercializa-

dos. Com consistência e dinamismo

o Cachuera promove agora o finan-

ciamento coletivo (www.movere.me )

da 13° edição da sua tradicional Festa

do Divino, com as caixeiras da família

Menezes do Maranhão.

Paulo Dias é a potência da Associação,

um militante ativo na defesa dos interes-

ses do Cachuera. Paulo é pianista erudito

de formação e percussionista de coração,

com destaque ao trabalho que realiza com

o grupo Anima, músicos que promovem

o diálogo entre o erudito e o popular.

Sempre presente no cotidiano da Associa-

ção, Paulo Dias é símbolo de uma luta de

muitas dificuldades pela falta de recursos,

fruto do desconhecimento e até do pre-

conceito sobre a temática popular aborda-

da. Mas isso motiva o guerreiro que nos

conta: “Dentro dessa visão positivista do

progresso, em que só o pensamento racio-

nal é que consegue enxergar e interpretar

a realidade, tudo o que é da religião, das

tradições orais populares é excluído”.

Lutando com esse (des) entendimento,

arremata: “Com o Cachuera, através da

assimilação de conteúdos informativos, a

pessoa vai, gradativamente, mergulhando

em uma determinada tradição popular, até

chegar a ter contato com a comunidade; a

gente prepara as pessoas para isso”.

Serviço:

site da Associação Cachuerawww.cachuera.org.br

Blog da Associação Cachuerawww.cachuera.org.br/cachuerablog

site do Grupo Animawww.animamusica.art.br

“Dentro dessa visão positivista do progresso, em que só o pensamento racional é que consegue enxergar e

interpretar a realidade, tudo o que é da religião, das tradições orais populares

é excluído”. (Paulo Dias)

63

Foto

s: Y

ves

Barro

s

políticas

Paulo Dias

Page 35: Revista Raiz #11

O MINC DE GIL A ANADa Redação

Fotos Acervo Associação RAIZ.

Américo José Córdula Teixeira é o atual Diretor de Estudos e Monitoramento, da Secretaria de Políticas Cultu-

rais do MinC (SPC) e, como o Secretário da pasta Sérgio Mamberti, remanescente da administração anterior

da era Lula/Gil nesse ministério. Ator de profissão tem se especializado na gestão pública, sendo um dos

membros mais atuantes e presentes nos grandes debates e eventos culturais por todo país. Nascido em

Pernambuco, filho de artistas, desde criança dialoga com nossas manifestações de raiz, fruto da sua criação

nesse estado pródigo pela riqueza de expressões da nossa cultura popular.

Américo, em uma conversa com a RAIZ., debateu com a elegância de sempre, a trajetória que o MinC tem percorrido

entre as duas gestões do PT no governo do país. E defende que; embora os ministros Gilberto Gil, Juca Ferreira e Ana de

Hollanda, não serem filiados ao Partido dos Trabalhadores; são as bases lançadas pelo programa petista para a cultura

“A imaginação a serviço do Brasil” o direcionamento percorrido pelo MinC desde as eleições de 2002. Nele, defende

Américo, a questão da identidade do povo brasileiro já aparece como a nossa maior alavanca cultural. Portanto, conclui,

o que temos hoje é uma continuidade transparente da política cultural para o país de valorização simbólica e cidadã de

nossa cultura.

Na abertura do documento “A imaginação a serviço do Brasil” essa questão já é colocada. “A valorização da cultura

nacional é um elemento fundamental no resgate da identidade do país. É preciso, pois, abrir espaço para a expressão de

nossas peculiaridades culturais (inclusive de corte regional), sem que isso se confunda com um nacionalismo estreito, mas

sim articulado e aberto às culturas de todo o mundo”. Mais a frente expressa com contundência: “A lógica da homoge-

neização nos oprime”.

Detalhando o processo Américo relata: “Gil vem a ampliar esse Programa, como figura midiática e com uma inteligên-

cia privilegiada, carrega com doses de tropicalismo a universalização e ampliação dos conceitos apresentados no Progra-

ma Cultural do PT. Nesse movimento surgem o Programa Cultura Viva e os Pontos de Cultura, a Secretaria da Diversidade

Cultural, atendendo segmentos que ainda não estavam consolidados ou representados como os índios, o LGBT, os qui-

lombolas, os ciganos, o hip-hop, entre outros. Foi a apresentação e explosão de manifestações, artistas e conceitos, que

estavam calados, reprimidos. A Cultura ganhou status e voz e, junto com essa repercussão, mais verbas”. Foram deixadas

para o Congresso Nacional nove pautas para resolução e aprovação, com destaque para: o Vale Cultura (PL 5798/09), o

Sistema Nacional de Cultura (PEC 416/05), o Plano Nacional de Cultura (PL 6835/06), a cultura entre os direitos sociais

previstos na Constituição (PEC 49/07), o percentual mínimo de 2% de verbas para a cultura (PEC 150/03).

“Na gestão atual de Ana de Hollan-

da, o foco é estabelecer processos e

consolidar as conquistas”, diz Américo.

A pedido da Presidenta Dilma Roussef,

todos os programas e políticas foram

consolidados por pasta, para o melhor

gerenciamento dos vários Ministérios. Na

ocasião existiam mais de 300 projetos

para avaliação do Planalto. No Ministério

da Cultura as várias plataformas foram

agrupadas no Plano Nacional de Cultura

(PNC), que depois de múltiplos debates

online e presenciais foi consolidado pelo

Conselho Nacional de Política Cultural

(CNPC). O PNC formulou uma política

ousada em metas, com direcionamento

para o próximos 10 anos. Estruturados

em mecanismos de diálogo para muitos,

pois enumera Américo: “Somos atual-

mente 198 milhões de habitantes, temos

212 milhões de celulares, 75 milhões de

pessoas com acesso a internet, 1 milhão

de indígenas com 180 línguas diferentes,

50% de afrodescendentes, 3500 quilom-

bos , 600 mil ciganos...”.

“Com essas 53 metas, aprovadas na

reunião do CNPC de 29 de novembro

de 2011, pretende-se aumentar, entre

outras coisas, a quantidade de espaços

culturais, privilegiando municípios meno-

res ou territórios de cidadania, superar

em mais que o dobro o número de livros

lidos fora da escola e implementar proje-

tos de apoio à sustentabilidade econômi-

ca da produção cultural local”.

As metas propostas tem uma grande

amplitude e apontam o longo caminho

a percorrer. Citamos alguns exemplos

como: 100% de bibliotecas públicas e

70% de museus e arquivos disponibi-

lizando informações sobre seu acervo;

participação da produção audiovisual

independente brasileira na programação

dos canais de televisão, na seguinte pro-

porção: 25% nos canais da TV aberta,

20% nos canais da TV por assinatura;

4,5% de participação do setor cultural

brasileiro no Produto Interno Bruto (PIB);

15 mil Pontos de Cultura em funciona-

mento, compartilhados entre o governo

federal, as Unidades da Federação (UF)

e os municípios integrantes do Sistema

Nacional de Cultura (SNC). Como vemos

a perspectiva apresentada é da constru-

ção de uma política pública de Estado

para nossa cultura, que se perpetue

independente dos governantes.

Objeto de uma das 53 metas, o Siste-

ma Nacional de Cultura (SNC) está com

andamento acelerado, gerenciada com

dedicação pelo secretário José Roberto

Peixe da Secretaria de Articulação Institu-

cional (SAI). Conta atualmente com o

envolvimento de quase 900 municípios

de 18 estados da federação. A meta

para o Sistema Nacional de Cultura é de

100% de impacto em 10 anos. Pois, é

o SNC a plataforma de diálogo com os

vários setores e segmentos, a serem re-

presentados pela capilaridade municipal.

A Raiz. esteve em Osasco, São Paulo,

conversando com o Secretário de Cultura

Luciano Jurcovichi Costa, mais conhecido

como Luciano Lub, que recentemente

finalizou o processo de implantação do

Sistema Municipal de Política Cultural

(ComCultura), célula atuante do SNC.

Num processo que partiu de diálogos

setoriais, com às várias manifestações

culturais e artísticas da cidade debatendo

suas questões e seus anseios em assem-

bleias e reuniões, que culminaram num

diálogo com o poder legislativo local. O

processo normatizou o funcionamento

deliberativo desse Conselho representa-

tivo da cultura de Osasco. Foram eleitos

oito representantes da classe artística e

dois da sociedade civil, representando as

Centrais Sindicais e a Educação; todos

com seus suplentes. Num processo que

mobilizou as artes e a cultura local geran-

do uma pauta comum acordada.

Como posiciona Américo: “Um pro-

jeto indígena, cigano, é distinto de um

projeto de teatro, de música, de livro, de

audiovisual. Há especificidades e é pre-

ciso ter pessoas com essa noção, entre

elas os conselheiros da comissão, para

que se possa dar pareceres e entender

essas necessidades”.

Américo Córdula coloca, que uma

grande diferença entre as gestões do

Ministério da Cultura está no mundo

hoje conectado, onde o uso de celulares

e Internet está largamente disseminado.

Todas as discussões, projetos e levanta-

mentos estão disponíveis online. Finaliza:

“Mas temos muito que aprender ainda

na utilização desse ferramental tecno-

lógico e digital pra alavancagem das

atividades que hoje realizamos e, com

o Plano Nacional de Cultura, estarão

caminhando na direção do futuro”.

65

políticas

Américo Córdula, diretor MinC

Luciano Lub, Secretário de Cultura de Osasco, SP

Page 36: Revista Raiz #11

A NOVA ECONOMIA CRIATIVADO MINC

Da Redação

Fotos Acervo Associação RAIZ.

A maior novidade da gestão de Ana de Hollanda, no Ministério da Cultura da presidenta Dilma Roussef,

foi a criação da Secretaria da Economia Criativa (SEC) com Cláudia Leitão, socióloga especialista em po-

líticas públicas à frente da pasta. O Brasil, mundialmente reconhecido por sua cultura rica e diversa, não

conta até agora com a contrapartida econômica merecida; nem leis que regulem, à luz das dinâmicas

próprias da cultura, suas atividades. Assim, é grande a esperança depositada nessa nova Secretaria.

No site do SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) a economia criativa é definida como

“um novo modelo de gestão e negócios baseado no bem intelectual, e não no industrial ou agrícola”. Ainda no mes-

mo site, alguns dados mundiais, retirados da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento

– UNCTAD apontam, que em 2008, apesar de queda de 12% no comércio global, os serviços e bens da economia

criativa cresceram até 14%”. Valério Benfica, diretor da Regional do MinC São Paulo, esclarece de maneira direta: “O

artesanato, uma economia que sustenta muitas famílias e regiões do país, se baseia na agregação do valor criativo a

materiais pouco nobres como: barro, conchas, sementes, casca de árvores, restos de madeira, etc.”. Ou nas palavras

de Cláudia Leitão: “A economia criativa é, portanto, a economia do intangível, do simbólico”.

O potencial dessa gestão é o tema da conversa travada com a Secretária da SEC, que fala com entusiasmo e co-

nhecimento de causa sobre o potencial criativo do país, da economia que gera e que pode ser incrementada geome-

tricamente. Cláudia Leitão é Doutora em Sociologia pela Université de Paris V e professora do Programa de Pós-Gra-

duação em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceará (UECE), onde lidera o Grupo de Pesquisa

sobre Políticas Públicas e Indústrias Criativas. Foi Secretária da Cultura do Estado do Ceará no período de 2003 a

2006, quando imprimiu grande dinâmica a rica cultura cearense através de um Plano Estadual, cujo lema era “Valori-

zando a diversidade e promovendo a cidadania cultural”. Nesse período, realizou diversas reformas na formulação e

avaliação das políticas para a cultura cearense. Destacou-se pela implementação do Sistema Estadual de Cultura, que

lhe rendeu o primeiro lugar do Prêmio Cultura Viva, do Ministério da Cultura, na categoria Gestão Pública.

Duas palavras aparecem com constância no discurso de Cláudia, inspirada no seu guru de cabeceira, o economista

Celso Furtado: regionalização e transversalidade. A experiência como Secretária de Cultura do Ceará despertou o seu

olhar para as diferenças regionais, como fundamentais para não achatar o conhecimento, nem dizimar as diversi-

dades. “A infra-estrutura para o circo é

completamente diferente daquela para

se desenvolver softwares. Assim como, o

artista do sul do país confronta realida-

des bastante diferenciadas daqueles do

norte, por exemplo”, diz a Secretária do

SEC. Para se regionalizar as ações, grande

montante de informações precisam

ser levantadas, pois são múltiplos os

entendimentos necessários. E foi essa

a sua primeira ação, o mapeamento

e o levantamento de dados que eram

praticamente inexistentes e que, ainda

de forma embrionária, começam a tomar

consistência. Cláudia conta: “Pratica-

mente tínhamos somente dados sobre o

carnaval como perspectiva, tivemos que

iniciar do zero, da própria metodologia

para os levantamentos”.

Na transversalidade da economia

criativa está sendo realizado intenso in-

tercâmbio com os demais ministérios, em

particular os da Educação, Turismo, Desen-

volvimento Social, Ciência e Tecnologia,

Esportes, Relações Exteriores e Trabalho.

Pois, diz a Secretária: “Como dissociar nos-

so turismo das culturas que o abraçam, ou

a criação de softwares do nosso desenvol-

vimento tecnológico?”. A transversalidade

articulada pela SEC vai agora para as insti-

tuições de crédito, agências de fomento e

órgãos bilaterais, leia-se: BNDES, SEBRAE,

IBGE, UNESCO, entre outros.

Para o desenvolvimento das ações da

SEC foram definidos quatro eixos que de-

vem orientar as políticas públicas definidas:

diversidade cultural, inclusão social, sus-

tentabilidade e inovação. Cláudia pontua:

“A geração de princípios norteadores são

balizadores importantes para dar transpa-

rência e um norte claro para as múltiplas

ações desejadas, vamos entender que se

trata de uma atividade nova e inovadora,

sem referências anteriores para se orientar

as políticas”.

Esses princípios vão ser o guia dos

cinco desafios colocados como metas pela

SEC: o levantamento de informações e

a articulação ao fomento, anteriormente

citados. Como também, a educação para

competências criativas, com a forma-

ção e especialização de profissionais;

infra-estrutura para a criação, produção,

distribuição e consumo de bens e serviços

criativos; a criação de marcos legais, sejam

tributários, previdenciários, trabalhistas ou

da propriedade intelectual. Valério Benfica

cita o exemplo dos marcos regulatórios do

audiovisual na França, que na disputa com

a indústria Hollywoodiana mantém, ainda

que em menor proporção, sua reserva de

mercado significativa para sua economia e

perpetuação como cultura: “Lá o mercado

publicitário deixa um percentual para um

fundo de investimento, que retorna para os

próprios realizadores, sem falar nas cotas

de exibição de filmes franceses nos cine-

mas do país”. Aqui no Brasil basta lembrar

o lançamento do filme “Harry Potter e as

Relíquias da Morte: Parte 2 “, quando mais

de 70%, das nossas pouco mais de duas

mil e quinhentas salas de exibição, passa-

vam somente este filme.

Cláudia Leitão arremata: “O Ministério

da Cultura retoma a difícil tarefa de repen-

sar, de reconduzir, de liderar os debates e

a formulação de políticas sobre a cultura e

o desenvolvimento no Brasil, com a missão

de transformar a criatividade brasileira em

inovação e a inovação em riqueza: riqueza

cultural, riqueza econômica, riqueza

social”. Algumas iniciativas concretas no

apoio ao empreendedor cultural já come-

çam a sair do papel: o Criativa Birô, cujo

papel é se tornar uma casa do empreen-

dedor criativo brasileiro, oferecendo todos

os serviços para que ele possa se tornar

autônomo e pensar seu projeto de susten-

tabilidade de uma forma ampla: ambiental,

social e econômica.

Nós, artistas e arteiros, estamos torcen-

do para que a cultura não seja somente

um eterno potencial, mas efetivamente

uma atividade viva e rentável para os mi-

lhares de brasileiros, que embora criativos,

vivem com grandes dificuldades para gerar,

produzir e distribuir sua cultura. Cultura

brasileira que é nosso diferencial competi-

tivo mundial, tão admirada por todos que

se encantam com nossas múltiplas formas,

cores, sotaques, sabores e jeitos de se en-

xergar e dialogar com o mundo moderno.

Serviço:

Site da SEC MinCwww.cultura.gov.br/site/categoria/politi-

cas/economia-criativa-2/

Site da Regional São Paulo MinC www.cultura.gov.br/site/categoria/repre-

sentacoes-regionais/regional-sp/ -

Site do Sebrae – Cultura e Entreteni-mento/www.sebrae.com.br/setor/cultura-e-

-entretenimento

67

políticas

Cláudia Leitão, Secretaria de Economia Criativa do MinC

Valério Benfica, Diretor da Regional do MinC São Paulo

Page 37: Revista Raiz #11

Marvada, pinga, parati ou ‘água que passarinho não bebe’ são alguns dos sinônimos conhecidos da cachaça, desti-

lado da cana de açúcar e tradicional bebida dos brasileiros desde os tempos coloniais. A comunicação visual cria-

da para as garrafas de cachaça traduzida em seus rótulos, também apresentam uma farta e divertida diversidade.

Os rótulos da nossa cachaça tem sido objeto de pesquisa nos últimos anos, por conta do vivo interesse desper-

tado pelos pesquisadores e historiadores da nova história material focada nos temas da vida cotidiana dentro do

contexto das histórias da vida privada. E se por um lado, os rótulos da cachaça contam a própria história do Brasil, já que não há

grande acontecimento que não tenha sido homenageado em alguma marca de cachaça (fundação de Brasília, Copa do Mundo,

etc.); por outro, o design contemporâneo tem aprofundado seu olhar para a nossa cultura material popular como reação à unifor-

midade das estéticas ocidentais transnacionais.

Alguns desses rótulos podem ser conhecidos na exposição Rótulos de Cachaça, que passou por São Paulo no Instituto Tomie

Ohtake, em fevereiro de 2011. Os rótulos contam fatos da nossa história, mostrando um Brasil profundo (e nem sempre visível),

mas inscrito e enraizado solidamente na cultura popular brasileira. Na exposição, o público pode ver exemplares de rótulos desde

de 1940 do acervo de Egeu Laus, gestor cultural, designer e pesquisador de Memória Gráfica Brasileira, curador da exposição que

acontece agora no Centro Cultural Laurinda Santos Lobo, no bairro de Santa Teresa no Rio de Janeiro.

CACHAÇANÃO É ÁGUA

“ Por um lado, os rótulos da cachaça contam a própria história do Brasil já que não há grande

acontecimento que não tenha sido homenageado em alguma marca de cachaça.”

69

Da Redação

Fotos Divulgação

ensaio

Page 38: Revista Raiz #11

Estética da cachaça

Segundo Egeu Laus: “são cerca de

2 mil rótulos em arquivo digital e 600

originais em papel.”Onde podemos

conhecer a estética que trazem em seu

bojo todas as influências, ao mesmo

tempo: indo do barroco e o rococó

para a pop art e o psicodelismo. São

um excelente material para os estu-

dos de experimentação da colagem

moderna, iniciada nas artes plásticas

nas primeiras décadas do século 20 e

reforçada na música popular dos anos

60, e que, com o advento das ferra-

mentas digitais tem proporcionado uma

extrema facilidade nas apropriações,

citações, mashups, misturas e inclu-

sões utilizando formas e imagens

populares, construindo uma iconografia

pós-moderna de grande impacto visual

no design contemporâneo.

Não são poucos os rótulos desenha-

dos pelo próprio “alambiqueiro”, o pro-

dutor da cachaça. O rótulo da cachaça

manteve com características artesanais

até o final do século XX constituindo-se

num dos grandes exemplos do que co-

nhecemos como design vernacular. Se

o vernacular é aquilo que se construía

“O rótulo da cachaça manteve com características artesanais até o final do século 20 constituindo-se num dos

grandes exemplos do que conhecemos como design vernacular.”

“à margem” do conhecimento erudito

os rótulos de cachaça contribuem, no

mundo globalizado, para um olhar ao

local e ao regional, compreendendo

que o erudito e o popular são faces da

mesma cultura. Na entrevista concedi-

da a RAIZ., o curador Egeu Laus conta

um pouco sobre as dificuldades que os

colecionadores encontram para manter

e organizar seus acervos.

71

ensaio

Page 39: Revista Raiz #11

RAIZ.: Quando iniciou seu interesse

pela coleção dos rótulos? E quantos

rótulos fazem parte do seu acervo?

Egeu Laus: Minha pesquisa sobre

rótulos começou há mais ou menos

10 anos. Tenho em formato digital

cerca de 2 mil rótulos e uns 600 origi-

nais em papel.

RAIZ.: Você afirma que os rótulos

mostram um Brasil profundo. Poderia

explicar isso?

Egeu Laus: Brasil profundo no sentido

de expressão do design vernacular ou

seja o design produzido popularmente

por artistas anônimos (o trabalho gráfico

de nenhum rótulo é assinado). É um dos

poucos trabalhos gráficos de expressão e

feitura popular inseridos na era da repro-

dutibilidade técnica (as capas dos livrinhos

de literatura de cordel é outra). Por outro

lado, os rótulos de cachaça costumam

homenagear todos os grandes momentos

da história do Brasil (Copa do Mundo,

inauguração de Brasília, etc) e são a visão

popular desses acontecimentos. Mostram

também uma enorme gama de paisagens

rurais e urbanas das cidades do interior

onde se fabricam as cachaças, além de

uma impressionante fauna e flora deste

Brasil profundo, distante dos grandes

centros urbanos.

RAIZ.: Quando as indústrias no Brasil

começaram a se preocupar com o design

de seus produtos?

Egeu Laus: Preocupação no sentido

do design estratégico aliado ao marketing

como abordado pelos grandes escritó-

rios de design contemporâneo somente

nos últimos 10, 20 anos, mas ainda em

pequena escala frente ao universo de

cerca de 40 mil produtores no Brasil hoje.

Embora a primeira cachaça engarrafada

tenha surgido possivelmente na virada do

século 19 para o século 20.

RAIZ.: Quais são as cachaças que não

mudaram seus rótulos?

Egeu Laus: Existem centenas de

cachaças com rótulos ainda próximos

aos originais principalmente as que tem

uma abordagem “all-type” (somente

texto). Mas o surgimento da impressão

offset em substituição a impressão tipo-

gráfica (e antes a litografia) ocasionou

mudanças mesmo que pequenas no

design dos rótulos.

RAIZ.: Quais as dificuldades de se man-

ter um acervo, ou uma coleção particular?

Egeu Laus: As coleções são mantidas

por seus colecionadores, de modo geral,

“É um dos poucos trabalhos gráficos de expressão e feitura popular inseridos na era da reprodutibilidade técnica.”

de forma bastante amadora. Faltam

abordagens sistematizadas, com acon-

dicionamento apropriado por técnicas

museológicas e um registros das infor-

mações mais profissionalizado. No caso

dos rótulos de cachaça, que eu saiba,

apenas o acervo da Fundação Joaquim

Nabuco, recebe um cuidado profissional,

e talvez, justamente, por estar numa

instituição com recursos e pessoal para

este fim. No entanto, sem esses abnega-

dos colecionadores amadores espalha-

dos por todo o Brasil (e são milhares!)

muito da nossa história visual já estaria

perdida. A recomendação que faço é

que instituições, entidades e centros

culturais de modo geral se interessem

mais pelo tema e realizem exposições

com curadorias apropriadas, trazendo

para o universo desses colecionadores

o conhecimento de abordagens mais

corretas para a manutenção e guarda de

suas coleções e por outro lado, trazendo

para a população esse riquíssimo legado

da nossa cultura.

Serviço:

Rótulos de Cachaça - exemplares de

rótulos desde de 1940 do acervo de

Egeu Laus.

De 2 de janeiro a 26 de fevereiro – de

terça a domingo das 10h as 19h.

No Centro Cultural Laurinda Santos Lobo - Rua Monte Alegre, 306 - Santa

Teresa, Rio de Janeiro.

Fone (21) 2242-9741

Para mais informações sobre a

exposição: [email protected]

73

ensaio

Page 40: Revista Raiz #11

Lançado em março pela Secretaria Municipal de Cultura

da Prefeitura do Rio de Janeiro, o documentário

“Cacau do Pandeiro – O mundo na palma da mão”

apresenta a trajetória artística de Carlos Lázaro da

Cruz, nas artes conhecido como “Cacau do Pandeiro”,

percursionista baiano que dá nome ao projeto integrado pelo

filme, com direito a uma mostra fotográfica, oficina coordena-

da pelo artista e palestras.

Mestre de nomes importantes da MPB, como Carlinhos

Brown e Juliana Ribeiro, entre outros artistas, as turnês nacionais

e internacionais de Cacau do Pandeiro já o colocaram no mesmo

palco, com estrelas como J. Veloso, Dona Ivone Lara, Elza Soares,

entre outros “pesos pesados” das artes musicais, entre os quais

figura Frank Sinatra. Produzido pela produtora baiana de audio-

visual Cabeça Feita, o documentário sobre o artista, todo rodado

na Bahia, tem direção de Márcio Santos.

Como fazer um documentário?

Tudo começou em 2009, quando três professores - Ar-

mando Alexandre Castro, Marcus Leone Coelho e Peterson

Azevedo - que fazem parte da equipe pedagógica da TV

Anísio Teixeira , ligada à Secretaria da Educação do Estado da

Bahia, resolveram registrar, por meio do audiovisual, a vida do

excelente percussionista baiano que não tem o devido reco-

nhecimento. O que começou como uma brincadeira, no final

custou R$100 mil reais, pagos pelos próprios autores, e dois

anos e meio de produção.

Aos 83 anos, Cacau do Pandeiro é um virtuoso, cuja

versatilidade não encontra fronteiras: sua atuação e talento

profissionais podem ser comprovados, tanto em gêneros

musicais mais tradicionais, como em grupos que experi-

mentam novas propostas estéticas. Nascido e criado na lo-

calidade de Vila Matos, no boêmio bairro do Rio Vermelho,

em Salvador (BA), cidade onde reside. “O principal motivo

de eu aceitar o convite para dirigir este documentário foi a

chance de homenagear um profissional de tamanha com-

petência e relevância para música do Brasil. E a possibilida-

de de fazer isso enquanto o personagem ainda está vivo,

coisa muito difícil de acontecer em nosso país” afirma o

diretor Márcio Santos.

Serviço:

Documentário: Cacau do Pandeiro – O mundo na palma da mão

DVD: a venda em abril/2012

Mais informações: (71) 88138251

e-mail: [email protected]

RARA PERCUSSÃOCACAU DO PANDEIRO – UM DOS MAIS NOTÁVEIS PERCURSIONISTAS

BRASILEIROS - CHEGA AO RIO DE JANEIRO COMO DOCUMENTÁRIO,

MOSTRA FOTOGRÁFICA, PALESTRAS E OFICINAS.

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Da Redação

Fotos: Peterson Azevedo

bens de raiz

Page 41: Revista Raiz #11

Adélia Borges é uma jor-

nalista especializada em

arte popular brasileira.

Jornalista pela ECA-USP,

foi na direção editorial da

revista Design e Interiores, de 1987 a

1994, que passou a se especializar em

design. Professora de história do design

na Fundação Armando Álvares Penteado

(Faap) e na Escola São Paulo, é autora

ou co-autora de mais de 10 livros. Seus

artigos, textos para catálogos ou capí-

tulos de livros de sua autoria já foram

publicados – além de português – em

alemão, coreano, espanhol, francês,

inglês, italiano e japonês.

Desde o início dos anos 1990 Adélia

realiza exposições e projetos culturais,

em vários locais do Brasil e do exterior.

De 2003 a 2007 dirigiu o Museu da

Casa Brasileira, em São Paulo. Em 2008,

coordenou a equipe encarregada da

elaboração do projeto conceitual do Pa-

vilhão das Culturas Brasileiras, que ocupa

o edifício projetado no início dos anos

1950 por Oscar Niemeyer, no Parque do

Ibirapuera. Em 2010, foi curadora-chefe

da Bienal Brasileira de Design.

`No novo livro “Design + Artesana-

to: o caminho brasileiro” ela faz uma

radiografia da revitalização recente do

objeto artesanal brasileiro. Ela decorre

da aproximação dos campos do design e

do artesanato, atividades que até então

eram vistas como em oposição e que

hoje se complementam. Em comuni-

dades espalhadas pelo país, iniciativas

marcadas pelo empreendedorismo e pela

inovação social trazem um novo impulso

ao desenvolvimento sustentável local.

Esse fenômeno vem ocorrendo, sobre-

tudo, desde meados dos anos 1990, e a

autora acompanha suas manifestações

desde então, o que lhe permite anali-

sar acertos e equívocos dos caminhos

percorridos e fazer indagações para o fu-

turo. “Não há um procedimento padrão

ou receituário para as ações de revita-

lização do artesanato – e nem poderia

ser de outra forma, já que diferentes

situações exigem diferentes respostas”,

diz Adélia Borges no livro.

Cerâmicas com motivos de pinturas

rupestres no Piauí; cuias feitas de massa

de papelão reciclado e fibras de bana-

neira em Minas Gerais; sementes de

urucum utilizadas como corante de te-

cido no Amazonas; o avesso e o direito

com igual importância em um tapete de

nozinhos no Rio de Janeiro; flores feitas

de couro de peixe no Mato Grosso do

Sul; bolsas e cestos feitos de capim-

-dourado em Tocantins; a fauna local

transformando-se em peças originais

no Rio Grande do Sul. Esses e muitos

outros casos, seus alcances, potenciali-

dades e riscos, são o objeto da instigan-

te análise de Adélia Borges. O público

potencial da publicação é amplo, en-

globando as pessoas que se interessam

pelo design e pelo artesanato como

expressões culturais e também aqueles

que apostam no poder de transforma-

ção decorrente do empreendedorismo

social e da economia solidária.

DESIGN + ARTESANATO:O CAMINHO BRASILEIRO DE ADÉLIA BORGES

A CURADORA, ESCRITORA E PROFESSORA DA HISTÓRIA DO DESIGN,

ADÉLIA BORGES, LANÇOU NO DIA 2 DE FEVEREIRO O LIVRO DESIGN +

ARTESANATO: O CAMINHO BRASILEIRO PELA EDITORA TERCEIRO NOME.

Com quase três décadas de dedicação

ao estudo do design, Adélia Borges

faz uma análise meticulosa das ações

desenvolvidas em todo país e contribui

para enfraquecer o preconceito que

atribui conotação de inferioridade ao

que é feito à mão e de superioridade

ao que é projetado pelo intelecto.

Sobre o futuro do artesanato, Adélia

Borges é categórica ao discordar dos

que apregoam seu fim há décadas. “Os

prognósticos de desaparecimento não

se confirmaram. Há vários indícios, ao

contrário, de que o lugar do artesanato

na sociedade contemporânea está se

expandindo”, escreve a autora.

Fartamente ilustrado, o livro tem 240

páginas e edições em português e in-

glês. O patrocínio é do Banco Nacional

de Desenvolvimento Econômico e Social

(BNDES) e da agência de publicidade

Leo Burnett Taylor Made (LBTM), com

apoio do Ministério da Cultura por meio

da Lei Rouanet.

Livro: Design+artesanato: o caminho brasileiro – de Adélia Borges

Editora: Terceiro Nome

Formato: 240 páginas, 21 x 27 cm

Edições separadas em português e inglês

Quanto: R$ 80

Site oficial de Adélia Borges: www.adeliaborges.com

Site oficial da Editora Terceiro Nome: www.terceironome.com.br

Serviço:

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Da Redação

Fotos: Divulgação

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Page 42: Revista Raiz #11

OS 100 ANOS DA SANFONADO REI LUIZ GONZAGA O

grupo Falamansa, uma

banda conhecida dos

forrozeiros, lança mais um

novo trabalho, desta vez ao

lado de grandes nomes da

música brasileira. “As sanfonas do rei” -

Tributo aos 100 anos de Luiz Gonzaga”,

pela Deckdisc, será lançado no mês de

abril, para homenagear o centenário do

nosso eterno “Rei do baião.

O Falamansa completa 14 anos em

2012 e, para comemorar com chave de

ouro, buscou no fundo do baú gravações

de Luiz Gonzaga ainda muito pouco divul-

gadas, mas com enorme riqueza musical

e temática como: ”Indiferente” (Severino

Ramos-Luiz Guimarães), “Xote ecológico”

(Luiz Gonzaga-Agnaldo Batista), “O fole

roncou” (Nelson Valença-Luiz Gonzaga),

“Alegria pé de serra” (Dominguinhos-

-Anastácia); unidas aos grandes sucessos

já consagrados na voz do rei como “Sa-

biá” (Luiz Gonzaga-Zé Dantas), “Súplica

Cearense “(Gordurinha-Nelinho), “Pense

n’eu” (Gonzaga Júnior), “Qui nem giló”

(Humberto Teixeira-Luiz Gonzaga), essa

última com participação especial dos

“Meninos do Morumbi”, um projeto

social de crianças que tem, desde 2007,

ligação com o Falamansa.

O disco conta ainda com as parti-

cipações de grandes nomes da nossa

música como: Elba Ramalho numa

releitura de “Sanfoninha choradeira”

(Luiz Gonzaga-João Silva), que ela mesmo

havia gravado com o rei na década de

80; do inigualável Dominguinhos, um dos

grandes responsáveis pela continuidade

da história musical de Luiz Gonzaga, que

marca sua presença na animada “Nem se

despediu de mim” (Luiz Gonzaga-João

Silva) e Jorge du Peixe, vocalista do Nação

Zumbi, que solta a voz no “pout pourri”

de forró e maracatu” Erva Rasteira/A

Festa “(Gonzaga Júnior).

O lado tradicionalista do disco fica

por conta do Trio Nordestino cantando o

baião “Amei a toa” (João Silva-Joquinha

Gonzaga), e do carismático Trio Virgu-

lino no xote “Bom? Pra uns” (Onildo

Almeida-Juarez Santiago). Completam as

participações do disco, o grande com-

positor e músico Miltinho Edilberto e a

talentosíssima Janaína Pereira da banda

Bicho de pé, cantando “Serena no mar”

(Sivuca-Glorinha Gadelha). O CD tem até

o “dueto digital” entre o Falamansa e

o homenageado, que faleceu em 1989,

com a música “A hora do Adeus” (Luiz

Gonzaga), e a composição inédita “As

sanfonas do rei” (Tato), música tributo ao

eterno Rei do Baião.

Homenageado no carnaval carioca

pela vitoriosa Unidos da Tijuca, o nosso

rei do forró merece o CD “As sanfonas

do rei” - Tributo aos 100 anos de Luiz

Gonzaga” produzido pelo Falamansa. É

uma justa troca de energias dos alegres

forrós e a oportunidade dos jovens co-

nhecerem um dos maiores músicos brasi-

leiros de todos os tempos: Luiz Gonzaga!

CD: As sanfonas do rei - Tributo aos 100 anos de Luiz Gonzaga do grupo Falamansa.

Site oficial: www.falamansa.art.br

Teaser: http://migre.me/8tz2Q

Serviço:

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Da Redação

Fotos Divulgação

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Page 43: Revista Raiz #11

benz de raiz

OS CAMINHOS DO AÇÚCARMAIS UM LIVRO DO ANTROPÓLOGO RAUL LODY, INTÉRPRETE CONSAGRADO

DA OBRA DE GILBERTO FREYRE.

Serviço:

Livro: Caminhos do Açúcar de Raul Lody

Editora: Topbooks com o apoio da Fundação Gilberto Freyre

disponível nas melhores livrarias de todo país.

Oaçúcar sempre esteve

presente na economia bra-

sileira, desde os primórdios

tempos coloniais. As nossas

primeiras cidades, Olinda

de Duarte Coelho em Pernambuco e

São Vicente de Martim Afonso de Sousa,

em São Paulo, já nasceram ao redor dos

engenhos da cana de açúcar no início da

nossa construção civilizatória a partir de

1530. De uma economia cercada da mono

cultura da cana, muitas outras economias

derivam; os doces, a cachaça, a culinária,

as máquinas, os animais, os costumes e

tantos. Os olhares eruditos não poderiam

deixar de focar esse período e essa cons-

trução da nação brasileira, em especial,

Gilberto Freyre numa busca amplificada do

povo nordestino: afro, português, mouro,

índio e acima de tudo, brasileiro.

Prescrutando o trabalho de Gilberto

Freire, o antropólogo Raul Lody vem

acrescentando um fôlego único sobre

sua vasta obra, nos brindando com

novidades a cada novo olhar publicado.

Como diz o próprio Lody em texto publi-

cado para Associação dos Restaurantes

da Boa Lembrança: “Gilberto Freyre ofe-

rece em sua obra civilizatória inúmeras

opções para provar em textos consis-

tentemente bem temperados, gostosos,

como um diversificado e sedutor cardá-

pio das relações sociais, da formação da

cultura brasileira. Assim, profundamente

inspirado em Açúcar de Gilberto Freyre,

venho realizando sistemático trabalho de

antropologia do sabor desde a década

de 1970, vendo, vivendo e provando

pratos, inteirando-me dos cotidianos das

festas, da religiosidade, pois experimento

e gosto é o meu projeto brasileiro, com-

prometido com o povo brasileiro”.

“Caminhos do Açúcar. Ecologia, gas-

tronomia, moda, religiosidade e roteiros

turísticos a partir de Gilberto Freyre” é o

mais novo fruto desse percurso. O livro

dialoga sobre a multiculturalidade da

comida, da estética, das manifestações

religiosas e populares. Além de outros

temas da obra de Gilberto Freyre, como

o Regionalismo, a Tropicologia, e a

Ecologia do açúcar nos cenários sociais

do Nordeste. Destaca também a nossa

profunda relação com continente africa-

no, em especial, o legado deixado pelas

culturas do Magreb – norte da África.

Parece de grande ousadia uma

abordagem tão amplificada em assuntos

e temas. Mas, Raul Geovanni da Motta

Lody é um antropólogo, museólogo e

professor com rara formação e energia

para replicar de forma lúdica e científica

as coisas do povo brasileiro; da culinária

ao cabelo afro, do artesanato à arte

sacra, tudo é tema para seu desenvolvi-

mento. Formado em Etnografia e Etno-

logia pelo Instituto de Antropologia da

Universidade de Coimbra, especializado

no Laboratório Etnográfico desta Univer-

sidade e ainda no Instituto Fundamental

da África Negra, em Dakar; com douto-

rado em Etnologia pela Universidade de

Paris; é membro da Academia Brasileira

de História, da Academia Brasileira de

Belas Artes, do Instituto Geográfico e

Histórico da Bahia, dentre outras atri-

buições e participações. Na Revista RAIZ

e suas atividades, Raul já esteve várias

vezes presente, nos brindando com sua

simpática sabedoria.

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Da Redação

Fotos por Jorge Sabino

Page 44: Revista Raiz #11

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VEM TUDO DO VINILPROJETO ACERVO ORIGENS, DE CACAI NUNES, RESGATA A FORÇA

MÚSICAS LIGADAS A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL BRASILEIRA

83

Por Marcos Linhares

Fotos Divulgação Acervo Origens

música

Page 45: Revista Raiz #11

música do litoral do Paraná, do interior

do Rio, coco, maracatu, chorinho, enfim,

músicas que não costumam ter tanto

espaço e que, de comum, estão todas

gravadas em vinil e disponibilizadas no

portal Acervo Origens.com.

Por acaso

O DJ relembra que tudo começou

sem o menor planejamento: Em 1996,

ele começou a produzir uma festa cha-

mada “Origens”, em um bar de Brasília.

Ali, ele mesclava de tudo: uma banda de

pífanos brasiliense (Ventoinha de Canu-

do), uma de Samba de Coco (Raízes de

Arcoverde), uma de Samba Chula (Os

Filhos da Pitangueira, de São Francisco

Imagine a cena, uma ligação, e uma

voz trêmula e chorosa do outro lado

da linha: “Cacai, aqui é Carlos, falo

da Argélia, você não me conhece,

mas ouvi em seu programa Acervo

Origens, na internet, uma música que

meu pai tocava no interior do Nordeste

quando eu era pequeno. Foi uma emo-

ção única. Obrigado!”. Esse é apenas

um dos muitos casos que acontecem

regularmente com o DJ, pesquisador e

violeiro caipira pernambucano, radicado

em Brasília, Cacai Nunes. Filho de pianis-

ta, desde 2006, ele tem entrado na vida

das pessoas e compartilhado músicas,

vídeos e fotos, de artistas de música

regional brasileira, em grande maioria

forró, acrescido de samba de roda,

Os gramofones de Jacob do Bandolim

Em uma das apresentações que fez

pelo mundo como violeiro caipira - ele

já se apresentou por meio do Itamaraty,

entre outros países, na Suíça, na Áustria,

na Itália, na Alemanha-, Cacai Nunes

deparou-se com uma loja de gramofones

(foto). Impressionado, entrou na loja e

qual não foi a surpresa quando percebeu

que também vendiam vinis, usados de-

monstrar os produtos. Em meio a tantos,

encontrou e prontamente adquiriu dois

tesouros do Acervo Origens: Um disco

de 10 polegadas, de 1955, de Jacob

do Bandolim (Jacob Revive Músicas de

Ernesto Nazareth) e um LP clássico que

mesclou atabaques e afoxés, agogôs,

do Conde/BA), com mais outra brasi-

liense, de Tambor-de-Crioula (Boi de Seu

Teodoro). “O impressionante foi a recep-

tividade. Os grupos, tocando e dançando,

manifestações culturais brasileiras, em um

bar bem no coração da capital federal,

em pleno Setor Bancário Sul, e a alegria

era indescritível”, relembra o músico.

Nessa época, falece um grande coleciona-

dor de discos de Brasília, Oscar Henriques.

“Esse cara foi o fundador da União do

Vegetal, na cidade. E nunca imaginei que

eles gostassem tanto de forró, o que o

levou a ter uma bela coleção”, afirma Nu-

nes. Pronto, estava fisgado o jovem que

amava o rock e viola. Ele já tinha uma

mini-coleção de discos do pai - de Luiz

Gonzaga, Clara Nunes, Sivuca -, daí, virou

comprador, colecionador de vinis raros,

daqueles com tiragem pequena feita por

artistas sonhadores e obstinados, que

apesar das poucas posses, se arriscavam

a colocar a voz e a arte nos chamados

“LPs” e a ganhar o mundo, mesmo sem

saber ou ter tamanhas pretensões. “Co-

mecei a me relacionar com pessoas de

Salvador e Minas que também coleciona-

vam esse tipo de música, e criamos, sem

querer, uma rede informal, que acabou

até fazendo que eu fosse usar meu

acervo em grandes festas no Rio e em

Sampa”, recorda. Hoje, o Acervo Origens

conta com cerca de três mil unidades,

fruto da pesquisa criteriosa de Nunes, não

só em Brasília, mas pelo Rio, São Paulo,

Nordeste e até, Paris. Quem diria?

“Hoje, o Acervo Origens conta com cerca de três mil unidades, fruto da pesquisa criteriosa de Nunes, não só em Brasília, mas pelo Rio, São Paulo, Nordeste e até, Paris.”

85

música

Page 46: Revista Raiz #11

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sobre o tema. E com isso, o trabalho

segue firme, disseminando a diversidade

da boa música. “Muitos blogs, até com

boas propostas já abriram e fecharam.

Em nosso caso, não trabalhamos com

CDs e não compartilhamos trabalhos no-

vos e recém-lançados. Tudo vem do vinil,

somos fiéis a isso”, alega o produtor.

Rádio

O Acervo Origens cresceu, ganhou

adeptos e além do Blog, ganhou as

ondas do rádio e quem quiser pode

sintonizar o programa que vai ao ar aos

sábados, às 19h, na Rádio Nacional FM

Brasília 96,1mhz, e às 20h, na Nacional

AM Brasília 980khz, passando também

na Rádio Nacional da Amazônia. “Che-

gamos na rádio e tive que sistematizar

o trabalho. Agora, conto com ajuda

para digitalizar e escrever os textos do

programa. Mas, vale tudo para encontrar

e divulgar esses artista desconhecidos e

que merecem carinho. O Acervo Origens

está no coração assim como a viola está

no peito”, finaliza Cacai Nunes.

Serviço:

Site oficial do Acervo Origens:

www.acervoorigens.com

Acesse Acervo Origens no no Facebook,

no Twitter e no soundcloud.com:

soundcloud.com/acervo-origens

saxofones e pandeiros, o segundo LP da

dupla Baden Powell/Vinícius de Moraes,

de 1996, “Os Afro-sambas”. Apesar da

aquisição, o músico avisa logo: “Mas

também tenho raridades do forró, como

discos do Dorival Caymmi das praias de

Pernambuco, o Gilvan Chaves, da déca-

da de 1950. Em geral, esses discos estão

inflacionados nomercado, e giram em

torno de R$ 400 a R$ 500”, explica.

Reabertura de mercado

O fato é que mesmo sem pretender,

Cacai Nunes e o Acervo Origens, além

de outros diletantes defensores e disse-

minadores da música regional brasileira

têm feito com que artistas que já haviam

parado de se apresentar e outros que

estavam quase desconhecidos, tenham

voltado à ativa. “Percebi depois, que

cantores como o forrozeiro Edson Duarte

(AL), e o terceiro trio em atividade mais

antigo do Brasil (criado em 1967), o Trio

Nordeste (PB), estejam no mercado com

força e agenda.

Esses entre tantos outros, acabaram

voltando a tocar em festas e à alegria

de poder se apresentar”, comemora o

pesquisador.

Ecad

Cacai Nunes procurou o Ecad para ver

se haveria problema em disponibilizar as

músicas do Acervo Origens para down-

load, mas foi tranquilizado já que não há

ainda, segundo eles, legislação específica

Alguns exemplos da milhares de men-

sagens que o Acervo Origens recebe:

borgi disse...

“Os “blogs” são o exemplo de como

a iniciativa privada derruba a burocracia

insana que enterra a música brasileira.

Em 40 anos O MIS não reeditou este

Lp assim como muitos outros. Aí está

ele, facilmente em MP3. Parabéns é

pouco pra vocês”

Leonel Laterza disse...

“Sem palavras! Lindo mesmo. Vou

baixar já! Um recado pro Cacai: PARA-

BÉNS! A IMPORTÂNCIA DESSE SEU ACER-

VO E DO SEU TRABALHO É INFINITA!”

Querco disse...

“Cacai, parabéns pelo blog, pelo

trabalho no programa de rádio e pelo

carinho que você dispensa para com a

música caipira do nosso Brasil.

Se um dia o grande Raul Torres foi a

pedra fundamental dessa música que

Cacai Nunes em seu escritório

é parte do nosso DNA, você hoje é do

mesmo modo importante por querer e

trabalhar para que ela perdure.”

moodyxadi disse...

“Maravilhoso álbum que, junto com

“brincadeiras de roda...”, meu filho de

1 ano e 8 meses ouve e vibra sem parar!

Parabéns pelo resgate!”

luizinho disse...

“Sou Rosariense, hoje moro em Sao

paulo mais nao esqueço da minha raiz,

curti muito o bumba mee boi, e ainda cur-

to é pena que sempre nas festas juninas

não posso ir a minha cidade querida Rosa-

rio, a terra do bumba meu boi quem sabe

este ano irei curti-lo, abraços Luiz rocha”

giovanna disse...

“que coisa incrível é visitar este espa-

ço tão democrático...salve toda energia

que ronda este trabalho !! muito obriga-

do !! Giovanna Tamires - Rondônia”

Stenio disse...

“Pô, Cacai! Teu trabalho é de suma

importância para o descobrimento

culrural do país. Que Deus te ilumine

sempre mais.”

Amanda disse...

“Cacai, parabéns blog, pelos pro-

jetos, e principalmente, pelo teu som.

Você torna minhas andanças por SP

muito mais felizes! Não há metrô em

horário de pico que apague a alegria

da tua música! Obrigada”

Kleber disse...

“Parabéns, já baixei todos os pro-

gramas e minha vida se encheu de luz

e vida novamente...”

Fabricio disse...

“Acervo inacreditável, parabéns

mesmo de verdade... Os melhores dos

melhores estão aqui, ótimo trabalho.

Desde já mais um seguidor...

87

música

Page 47: Revista Raiz #11

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A REDE DO TURISMO COMUNITÁRIO

Texto e Fotos por Raquel Gonçalves

PRAINHA DO CANTO VERDE E PONTA GROSSA.

DOIS PARAÍSOS CEARENSES REFERÊNCIAS NACIONAIS NO

DESENVOLVIMENTO DO TURISMO COMUNITÁRIO E SUSTENTÁVEL.

Duna em Ponta Grossa, município de Icapuí

89

viagens

Page 48: Revista Raiz #11

Anoitecer em Porto Alegre

E ntre as dunas, os moradores

silenciam e se escondem em

suas casas quando o sol ain-

da queima. À medida que ele

baixa e a areia esfria, a vila se

movimenta. Quando os últimos raios

colorem a paisagem antes de apagar-

-se, quase todas as portas das casas se

abrem e a paisagem se transforma. O

pescador prepara a tarrafa no alpen-

dre de casa, a meninada joga bola

ameaçando os espetinhos do jovem

churrasqueiro, o padeiro aguarda os

clientes deitado na rede. De passagem

pela região, o circo Imperial já aciona

as caixas retumbantes que lhes garan-

tem o público do espetáculo noturno.

O vento forte do final da tarde atenua

o calor do dia e dá boas vindas a todos

que chegam à aconchegante Prainha

do Canto Verde, localizada a 120km

de Fortaleza, capital do Ceará.

O atrativo desse tipo de turismo são

lugares com tranquilidade, o sossego, a

natureza e, principalmente, o cotidiano

da vida local. Quem escolhe esta tímida

vila de 1.050 habitantes para descan-

sar e se deliciar com os frutos do mar,

certamente não procura os exageros e a

subserviência do turismo tradicional. Os

moradores da Prainha do Canto Verde

desenvolveram um modelo de turismo

coerente com os anseios da comunida-

de. Não se vende terreno para estrangei-

ros, o planejamento e a gestão dos servi-

ços prestados são de responsabilidade da

organização comunitária, o turismo não

representa a principal atividade econô-

mica da vila. Desta maneira, moradores

buscam a sustentabilidade sócio-ambien-

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“O atrativo desse

tipo de turismo são lugares com tranquilidade, o

sossego, a natureza e o cotidiano da

vida local.”

pousada com até 5 apartamentos paga

o valor máximo.

O Conselho fornece a capacitação

necessária para viabilizar a inclusão da-

quele morador interessado na atividade

desejada e auxilia na construção do esta-

belecimento. “Desenvolvemos atividades

em benefício de todos. Já tivemos parte

do nosso dinheiro arrecadado aplicado

na merenda escolar, no posto de saúde,

na organização da Festa dos Idosos, em

casas soterradas. Agimos de acordo com

a demanda da comunidade”, explica o

coordenador de Turismo, Antônio Aires.

A infra-estrutura da Prainha do Canto

Verde é simples, mas sempre supriu a

demanda turística anual de forma satis-

fatória. Com o crescimento gradual anu-

almente, a necessidade de investimentos

fala alto. “Seria interessante construirmos

Hospedagem, alimentação, serviço

de guia, passeios de Bugue possuem

percentuais diferenciados de contribuição

para o Conselho de Turismo. O recolhi-

mento varia de R$5 a R$50 por mês. Um

condutor de trilha, por exemplo, paga o

valor mínimo. Já aquele que possui uma

tal, garantindo a geração e distribuição

equitativa da renda, a valorização da

produção e da cultura local. O traba-

lho na comunidade, que começou em

1998, hoje é referência nacional quando

o assunto é o Turismo Comunitário. A

Prainha se destaca entre as experiências

nacionais pelo seu caráter pioneiro.

Desde os anos 80 os moradores desta

vila lutam em defesa de suas terras

contra a especulação imobiliária, com

um vasto histórico de conquistas. Atual-

mente, são centenas de pesquisadores,

estudantes e turistas de várias partes do

Brasil que visitam o local para conhecer a

maneira como essa comunidade encon-

trou de preservar a cultura e a natureza.

Qualquer morador pode construir seu

próprio estabelecimento ou se juntar

ao grupo de prestadores de serviço.

Praia de Redonda, município de Icapuí. Ao final da enseada, avista-se a Ponta Grossa, praia com dunas, falésias e sítios arqueológcos.

91

viagens

Page 49: Revista Raiz #11

criando o Instituto Terramar, ONG atuante

em defesa dos povos do mar.

Todas as sugestões dos moradores

para a comunidade são analisadas em

assembleias e avaliadas. “Nós já come-

çamos a ter uma demanda de visitantes

maior que o número de pousadas que

possuímos. Quando isso acontece, nós

desocupamos algumas casas para rece-

ber os visitantes e apresentar nosso tra-

balho. Mas precisamos melhorar nossa

estrutura. Por exemplo, não possuímos

um restaurante noturno. Este serviço

ainda está nas mãos dos proprietários

das pousadas que acabam cozinhando

para os hóspedes”, avalia Antônio Aires.

Nem tudo são flores

Desde 2009, quando a comunidade

finalmente conseguiu a assinatura do

decreto de criação da Reserva Extrativista

um estacionamento na entrada da cidade

para diminuir o fluxo de carros na vila”,

sugere René Scharer. O suíço, que mora

na comunidade desde 1992, foi peça

fundamental na organização da comunida-

de, conseguindo financiamentos internacio-

nais para projetos, articulando encontros e

“Desenvolvemos atividades em

benefício de todos. Agimos de acordo com a demanda da comunidade.”

Antônio Aires, coordenador de

Turismo.

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Falésias coloridas em Ponta Grossa.

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Paredão de falésias em Ponta Grossa, município de Icapuí

para a comunidade. “Uma atividade não

elimina a outra. O turismo precisa da

atividade da pesca artesanal para o peixe

chegar até o turista fresquinho”, explica

Eliabe Crispyn, coordenador do Turis-

mo Comunitário de Ponta Grossa que,

atualmente, ocupa um cargo técnico na

Secretária de Turismo da Prefeitura de

Icapuí. “Nós hoje sabemos exatamente

o que queremos. Nós temos muitos

exemplos no entorno de comunidades

que deixaram de ser protagonistas de

seus negócios para serem funcionários

de grandes empreendedores”, desabafa.

Arqueologia de várias cores

Arqueologia, história, sossego, tran-

quilidade, turismo responsável e frutos

do mar. Se estes temas lhe interessam,

sua parada é em Ponta Grossa. Come-

çando pelo paladar, a dica é o desbunde

– RESEX (processo que se estendia desde

2001), algumas dissidências locais apare-

ceram. De acordo com René Scharer, as

desavenças internas surgiram princi-

palmente quando um empresário da

região que não possuía a documentação

regulamentada de seu terreno teve sua

propriedade ameaçada, depois de perder

uma ação de usucapião na justiça. Ele

tentou convencer alguns moradores de

que a RESEX seria prejudicial para os mo-

radores, alegando que a Associação teria

entregado as terras da comunidade para

o governo. “Estas brigas internas não

afetarão o desenvolvimento do Turismo

Comunitário da Prainha do Canto Verde.

Nossas conquistas vêm de anos de traba-

lho e já estão bem consolidadas.

A maioria dos moradores percebe que

este empresário está agindo por interes-

se próprio e não em nome da comunida-

de”, destaca otimista René Scharer.

Companheiros de luta

Em parceria com as lideranças da

Prainha do Canto Verde, a comunidade

de Ponta Grossa se espelhou no exemplo

pioneiro e, desde 1998, também desen-

volve o Turismo Comunitário e Susten-

tável. Localizada a 200 km da capital,

Ponta Grossa é uma das 13 comunida-

des litorâneas do município de Icapuí.

Possui 240 moradores e guarda um areal

colorido de histórias. Há quem diga que

naquelas terras Vicente Pinzón chegou

ao Brasil antes do marco oficial de Pedro

Álvares Cabral, em 1500.

Com uma infra-estrutura modesta, a

praia de Ponta Grossa oferece um servi-

ço de qualidade, com moradores extre-

mamente hospitaleiros. Com a defasa-

gem da pesca e o aumento da demanda

de visitantes, o Turismo Comunitário

apareceu como uma solução sustentável

93

viagens

Page 50: Revista Raiz #11

entram no circuito com pratos requinta-

dos a preços jutos. Vale a pena conferir.

Para descansar o corpo no fundo da

rede, a pedida vai para a Pousada Refú-

gio Canaã (R$ 60, o casal). A proprietária

Dona Santana, 57 anos, recebe os turis-

tas com sorriso no rosto. Ela adora jogar

conversa fora, mas avisa logo àqueles

que querem tirar o sossego da comuni-

dade: “Se vier ligando som alto, fazendo

bagunça, pode parar. Se não arruma a

malinha e vai embora”, dispara Dona

Santana. Além dos quartos, a pousada

também disponibiliza chalés individuais

com camas de casal e solteiro, frigobar,

ventilador e varanda espaçosa.

Durante o dia, não deixe de fazer o

passeio de jangada (R$10 por pessoa),

com direito a demonstração da pesca

artesanal e mergulho com peixes e

corais. Aproveite o fim de tarde para

gastronômico que o Festival da Lagosta

proporciona aos amantes do crustáceo.

Em novembro de 2011, ele chegou a

sexta edição, atraindo turistas de vários

estados. Todos os restaurantes da Praia

Com a defasagem da pesca e o aumento da demanda de

visitantes, o Turismo Comunitário

apareceu como uma solução

sustentável para a comunidade.

Prainha do Canto Verde, município de Beberibe.

Jangada na praia de Ponta Grossa, município de Icapuí

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pela construção de um museu em Ponta

Grossa. Arqueólogo por natureza, Josué

visita os sítios diariamente e afirma sem

medo: “Sou especialista na área, mas

acadêmico nunca. Eu não preciso disso.

Aprendi no campo!”, orgulha-se.

Parte do material coletado por

Josué já foi catalogado pelo IPHAN

(Instituto do Patrimônio Histórico e

Artístico Nacional). Objetos como

cachimbos indígenas, fragmentos de

cerâmica, ponta de lança, pedras las-

cadas, moedas e até talheres marcam

a presença indígena e a passagem

holandesa pela região. “Eu encontrei

peças aqui que já estão catalogadas

no Museu Nacional. Mas meu sonho é

construir o museu de Ponta Grossa”,

partilha. Vale um dedo de prosa com

esse sábio homem Icapuiense.

tes dos sítios arqueológicos que existem

na região. O passeio pode ser feito pela

orla do município de Icapuí (64km), indo

até a divisa do estado do Rio Grande do

Norte ou em direção a praia de Canoa

Quebrada, passando por fontes naturais

de água doce, coqueirais, labirinto e

esculturas de falésias. O problema é que

muitos bugueiros de Canoa Quebrada

vendem os passeios até a Ponta Grossa

passando por cima das dunas, garantin-

do “emoção” aos turistas e degradando

a natureza. Apesar da mobilização da

comunidade, infrações como estas ainda

são comuns na região.

Visite a casa de Josué Pereira Crispim.

Este homem de 53 anos já soma 30 de

escavações arqueológicas e mais de 2 mil

objetos encontrados. Ele guarda a histó-

ria do município de Icapuí num quarti-

nho de sua humilde casa e segue na luta

fazer a trilha ecológica e admirar o pôr-

-do-sol do alto das falésias. Com guias

locais capacitados, a trilha ecológica (R$

30) tem 1km de extensão e dura cerca

de 1h20, passando pelas dunas e sítios

arqueológicos. O guia Ozéas Ferreira, 37

anos, explica que apesar de ter muitas

subidas e descidas, o caminho está todo

sinalizado. “Eu falo um pouco da cultura

local, fauna, flora, da luta pela preser-

vação. Adoro meu trabalho!”, conta. A

trilha termina na beira da praia, no pé da

duna. Sugiro uma pausa para o banho

nas piscinas naturais que se formam em

volta das pedras quando a maré está

baixa. Inesquecível!

Embora o passeio de Bugue esteja

entre os atrativos de Ponta Grossa, é

necessário cuidado na hora de contratar

o serviço. Assegure-se de que o bugueiro

é da Ponta Grossa e irá respeitar os limi-

Peças encontradas nos sítios arqueológicos de Ponta Grossa

por Josué Crispim, município de Icapuí.

Conhecido como Nem, apelido de infância, o pescador Júlio prepara a

rede na Prainha do Canto Verde, município de Beberibe.

Talheres de prata compõem os objetos do “mini-museu” do

colecionador arqueólogo Josué Crispim

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95

viagens

Page 51: Revista Raiz #11

Anoitecer em Porto Alegre

Cada vez mais o Turismo

Comunitário se fortalece

graças às redes de integra-

ção entre as experiências

espalhadas pelo Brasil e pelo

mundo. A Prainha do Canto Verde integra

a Rede Cearense de Turismo Comunitário

(TUCUM), que conta com mais 12 comu-

nidades em todo o estado. Os roteiros

paradisíacos são bastante econômicos.

Vale a pena conferir!

A pousada Sol e Mar, uma das pionei-

ras da Prainha, oferece seis apartamentos

confortáveis com frigobar, ventilador,

rede, camas de casal e solteiro (R$ 60,

casal). Mas o ponto forte do aconchego

da Aila e do João, os proprietários, são

as varandas no primeiro andar. O vento

constante dispensa qualquer ar condicio-

nado. Perfeito para embalar o descanso na

rede. O café da manhã é regado de sucos,

frutas, café, leite, pão, queijo e tapioca

com manteiga. Tudo de dar água na boca.

Durante o dia, a indicação é caminhar

na praia, tomar banho de mar e almoçar

no restaurante da Pousada Recanto da

Mãezinha, na beira da praia. O cardápio

variado oferece peixes, camarões e lagos-

tas frescas. O Peixe ao Molho de Manga

(R$ 40) é uma iguaria da casa e agrada

aos paladares mais exóticos. Serve bem 2

pessoas e acompanha salada, arroz e fa-

rofa. Outro prato suculento é a tradicional

Moqueca de Arraia, servida com leite de

coco. A arraia desfiada vem macia e bem

temperada, sem uma espinha sequer.

Vale a pena experimentar como tira gosto

(R$ 15) ou como prato principal para 2

pessoas (R$ 30), acompanhando arroz,

farofa e salada. A Pousada Recanto da

Mãezinha também tem boa estrutura e

é ótima pedida para quem quer usufruir

de apartamentos com ar condicionado e

piscina (R$100, casal).

No final da tarde, se ainda tiver dis-

posição para uma trilha sobre as dunas,

espere o sol baixar, contrate um guia (R$

25) e siga para a lagoa do Córrego do

Sal. A caminhada dura cerca de uma hora

e a recompensa é garantida. O oásis no

meio das dunas possibilita uma paisagem

deslumbrante. Se preferir, alugue um Bu-

gue (R$ 100, para 4 pessoas) e aproveite

o passeio com duração de 2 horas.

Para o jantar, encomende uma Peixada

a Aila (R$ 30, para 2 pessoas), acom-

panhado de pirão e arroz branco. O

peixe vem regado no delicioso caldo de

SOMBRA E ÁGUA FRESCA

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legumes cozidos. Ela fará com dedicação

e capricho, enquanto você toma uma cer-

vejinha (R$ 4, 600ml) na varanda da casa.

O local ainda é o único que oferece uma

cerveja gelada até perto de meia-noite, se

tiver movimento.

As redes consolidam as experiências

de Turismo Comunitário, legitimando

e divulgando as iniciativas por meio da

internet. Além da Rede Tucum, outras

organizações mapeiam as iniciativas. No

Brasil, a Rede Brasileira de Turismo Soli-

dário e Comunitário (TURISOL) consolida

experiências de várias partes do país,

promovendo a integração entre comu-

nidades ribeirinhas de Santarém – PA,

quilombolas de Itacaré – BA, assentamen-

to em Quixadá – CE, artesãs de Coqueiro

do Campo – MG, desde 2003.

No contexto sul-americano, a Bolí-

via possui o Plano Nacional de Turismo

integralmente dedicado ao fomento do

Turismo Comunitário desde 2006. Em

níveis continentais, merece destaque a

Rede de Turismo Comunitário da América

Latina (REDTURS) que congrega iniciativas

de 13 países.

Redes

www.tucum.org (Brasil)

www.turisol.org.br (Brasil)

www.redturs.org (América Latina)

www.tusoco.com (Bolívia)

www.turismocomunitario.ec (Equador)

Experiências brasileiras

www.prainhadocantoverde.org (Ceará)

www.acolhida.com.br (Santa Catarina)

www.aldeiadoslagos.com (Amazonas)

www.viverde.com.br (Amazonas)

www.fundacaocasagrande.org.br (Ceará)

www.mamiraua.org.br (Amazonas)

www.projetobagagem.org (São Paulo)

www.graosdeluzegrio.org.br (Bahia)

www.saudeealegria.org.br (Pará)

www.redecananeia.org.br (São Paulo)

Linha do horizonte em Icapuí.

Serviço:

97

viagens

Page 52: Revista Raiz #11

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Beber chicaras de café durante

o dia é um hábito dos bra-

sileiros. Importante iguaria

da nossa culinária e principal

produto de exportação produ-

zida no país durante muitos anos, o café

dominou a paisagem da região Sudeste

e gerou um curioso casamento: o café

coado no caldo de cana.

O café caiçara como é conhecido o

café coado no caldo de cana, é muito

apreciado na região que abrange os

litorais sul carioca, paulista e paranaense.

Para o casal Marineli Mendonça Viana

e José Luiz Barros Gonçalves, o Kinho,

o café caiçara tem gosto de tradição

familiar. “O café caiçara é uma receita

da minha mãe, a Dona Patica”, explica Ki-

nho. De família caiçara de Paraty, o Kinho

é um comerciante que já trabalhou com

O DOCE CAFEZINHO CAIÇARA

verduras e hoje vende café caiçara na

barraca com seu nome na Feira Municipal

de Paraty, cidade do litoral sul fluminense.

Durante vinte anos o casal cuidou de

uma quitanda nesse endereço mas com

o crescimento da cidade e o surgimento

de supermercados, veio a necessidade

da mudança no perfil do ponto comer-

cial. Hoje a Barraca do Kinho é o lugar

onde se encontram os moradores de

99

Texto e Fotos Thereza Dantas

comidas

Page 53: Revista Raiz #11

Paraty para tomar o café caiçara e provar

a poçoca de banana da terra com tou-

cinho e o cuscus. “São comidas típicas

da nossa gente e que são ótimas para

saborear no meio da manhã ou no final

da tarde”, explica Marineli.

Nessa sociedade quem raspa e moe

o caule da cana é o Kinho e quem coa,

é a Marineli. “Tem alguns cuidados para

se fazer o café caiçara. Primeiro ao ferver

o caldo da cana é importante retirar a

borra, senão você não consegue coar.

E é bom esquentar o pó de café numa

chapa antes de coar”, avisa a comercian-

te. Segundo Marineli, o ato de esquentar

o pó do café na chapa o deixa mais

gostoso e espalha um perfume pela Fei-

ra. Mas há um outro segredo: o uso de

pouco pó de café. “Se colocar muito pó,

a pessoa não percebe o sabor do caldo

da cana”, avisa Marineli.

E de onde veio a ideia de unir o

caldo da cana com o café? “Nos tem-

pos antigos muitos não tinham como

comprar o açúcar mas tinham canas

plantadas nas fazendas e sítios. Era só

moer, ferver e adicionar o café e já saia

assim: bem docinho”, explica Marineli.

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Etapas do preparo do café caiçara

Receita do Café Caiçara

Ingredientes

2 caules médios de cana-de-açúcar

uma colher e meia de sopa de café

Modo de preparo

Raspar oa casca dos caules e moer num moedor de cana de açúcar. Ferver o caldo da cana numa panela e após a fervura retirar

a borra com uma escumadeira. Colocar o pó do café no coador de pano e jogar o caldo de cana fervente. Esperar coar e servir.

Serve quatro pessoas.

101

comidas

Page 54: Revista Raiz #11

103

É ARTE PÚBLICA! Da Redação

Fotos: Divulgação

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E TÁ NA RUA

Page 55: Revista Raiz #11

105

O grupo e ponto de cultura

Tá Na Rua há trinta e dois

anos reflete sobre a realida-

de política, social e cultural

da sua cidade e sobre o

papel do artista na sociedade. Sempre se

colocando como resistência aos modelos

capitalistas de produção – onde tudo

está a venda e tudo tem seu preço. Com

isso o grupo desenvolveu uma arte que

se faz e se produz para todos, sem dis-

tinção de classe e nenhuma outra forma

de discriminação, podendo assim ocupar

todo e qualquer espaço, e com plena

função social de organizar o mundo.

Chegamos ao que entendemos como

Arte Pública, que não é e nem pode ser

produção do Poder Público. Não é! Mas

cabe ao Poder Público reconhecer sua

existência e importância. E como faz

com as Artes Privadas, criar para elas Po-

liticas Públicas de estímulo e amparo. É

isso que a Prefeitura da Cidade do Rio de

Janeiro, através da Secretaria de Cultura,

em uma atitude extremamente moder-

na e contemporânea, está fazendo ao

apoiar projetos que vão ao encontro

direto da população carioca.

O projeto Arte na Praça é resultado

dessas reflexões. E com uma linguagem

profundamente ligada às raízes popu-

lares brasileiras, e mais especificamente

à cultura carioca, nos programamos

para acompanhar o calendário litúrgico

da cidade. Com muito teatro e muita

festa, ocuparemos as praças levando

um pouco das nossas crenças, da nossa

ancestralidade, dos nossos problemas e

principalmente do nosso enorme amor

pela nossa cidade maravilhosa. Nossas

trouxas já estão prontas! E até outubro

de 2012, estaremos circulando pelos

quatro cantos da cidade, com os espetá-

culos: “Auto de Carnaval”, “A Revolta

de São Jorge Contra os Invasores da

Lua”, “Antônio de Lisboa e a Sereia do

Fundo do Mar” e “Cosme e Damião”.

Serão ao todo vinte apresentações.

Gostaríamos de convidar a todos

para o grande lançamento do projeto

que será no dia 02 de março às 16hs na

Cinelândia, e contará com a presença

de representantes da Saúde Pública e o

grupo teatral Cia Brasileira de Mystérios

de Novidades. E para abrir os festejos,

o grupo irá apresentar o seu “Auto de

Carnaval”. Espetáculo de cordel que

conta a história das festas carnavalescas

desde suas origens remotas no homem

das cavernas, passando pelos rituais dio-

nisíacos, pelo carnaval venezianos, até o

carnaval em todo Brasil.

A arte pública se realiza no contato

direto do artista ou de sua obra com a

população, sem distinção de nenhuma

espécie. Neste sentido o teatro de rua é

a modalidade que mais se aproxima de

um conceito antigo e moderno do que

pode ser a Arte Pública. Venha conferir!!

“Não podemos vender o melhor que temos para dar” Amir Haddad.

Projeto Arte na Praça 2012

Confira a programação completa que acontece durante o ano nas ruas e praças do Rio de Janeiro no site: www.tanarua.art.br

Serviço:

Metodologia de uma cartografia

Em cada visita foi aplicado um

questionário para o coordenador ou o

responsável pelo grupo, e questioná-

rios para aqueles que participavam de

ao menos uma das atividades desses

grupos. Os contatos com os grupos

inicialmente se basearam em três tipos

de listas públicas:

- lista dos Pontos de Cultura do MinC,

- a lista de Entes e Agentes Culturais da

Secretaria de Cultura do Distrito Federal,

- as listas das Administrações Regionais

do Distrito Federal.

Para Raoni Machado, mudanças meto-

dológicas devem acontecer. “Sabemos que

não foram identificados todos os espaços,

tampouco todos os grupos atuantes nas

cidades do DF. A partir de 2012, o mape-

amento será feito de uma nova forma,

mais dinâmica e democrática. Buscaremos

aperfeiçoar esta ferramenta, já disponível

em nosso site www.redecandanga.com em

sua versão interativa, para que haja o auto-

-mapeamento desses grupos. Através do

preenchimento de um rápido formulário,

ou pelo envio de informações para o email

[email protected], os grupos serão

identificados no mapa virtual”, avisa.

desenvolvidas. Seja pelo aumento do

número de pessoas que visitarão os

espaços e participarão das atividades,

seja pelas possibilidades de novas opor-

tunidades no campo da economia da

cultura. Por fim, o Estado, que terá um

instrumento eficiente para subsidiar a

elaboração de políticas públicas e ações

pertinentes ao campo cultural da região.

Desenvolvida pelo Ponto de Cultura

“Artéria – Cultura e Cidadania”, a

Cartografia da Cultura Candanga

em sua primeira versão, em 2009,

mapeou e diagnosticou um objeto

amostral de 39 grupos e 75 equipa-

mentos culturais. Na segunda versão,

em 2011, chegou a 59 grupos e com

o mesmo número de equipamentos.

A Cartografia da Cultura

Candanga é um mapa

das entidades culturais

da capital federal do país

para orientar brasilienses,

turistas, governos e estudiosos sobre os

seus processos e atuação. Seu objetivo

fundamental é mapear os grupos e as

entidades ligadas ao fazer cultural em

Brasília e extrair diagnósticos do setor,

para o melhor entendimento de como

esse fazer cultural se organiza e se articu-

la, para uma visualização qualificada da

rede formada por esses atores e agentes.

Segundo Raoni Machado, coordena-

dor do mapa cultural; “o desenvolvimen-

to deste projeto permitirá o acesso às

informações detalhadas sobre o cenário

cultural da cidade e a cadeia produtiva,

com as possibilidades que se abrem no

campo das associações e empreendi-

mentos”. Com isso, ganham todos. O

grande público, composto por mora-

dores da região e turistas, que terão

oportunidade de conhecer os grupos,

as informações detalhadas e as ativida-

des culturais desenvolvidas na região;

assim como, os grupos e as associações,

que terão os seus trabalhos divulgados,

potencializando as atividades por eles

O MAPA DA CULTURA

CANDANGADa Redação

Fotos: Divulgação

Page 56: Revista Raiz #11

107

RAIZ.: Os dados culturais incluem infor-

mações do DF e as cidades satélites, quais

são as áreas que merecem mais atenção?

Teatros, salas de cinema ou oficinas?

Raoni Machado: Na primeira edição

foram mapeados 39 grupos e associações

culturais e 75 equipamentos culturais, e na

segunda edição ampliamos o mapeamen-

to para 59 grupos e associações. Segundo

Frederico Soares, geógrafo que fez o

seu mestrado na Universidade de Brasília

sobre a Catografia da Cultura Candanga

e teve participação fundamental na sua

construção metodológica, entre os dados

que chamam atenção, na primeira edição,

observa-se que, do total de grupos mapea-

dos, mais da metade possuem atividades

de ensino voltadas para o teatro, mas ape-

nas 14% dos entrevistados indicaram uma

frequência mensal ou semanal ao teatro,

e o restante dos entrevistados indicou que

raramente vão ao teatro ou que nunca

foram ao teatro.

O padrão de resposta que indica que

a maior parte dos entrevistados nunca foi

ou raramente frequenta um equipamento

cultural se repete quando relacionado

a outras atividades de formação. Ou

seja, normalmente, os entrevistados que

participam de alguma atividade ligada ao

audiovisual nunca ou raramente foram ao

cinema, assim como pessoas ligadas ao

desenvolvimento de artesanato nunca ou

raramente foram a museus (incluindo aí

centros culturais). Assim, a pesquisa indica

que esses grupos mapeados possivelmen-

te são a única forma de contato que os

entrevistados possuem com algum tipo

de atividade cultural. É claro que toda in-

O coordenador Raoni Machado

respondeu algumas perguntas via e-mail

para a revista RAIZ.

RAIZ.: Como surgiu a necessidade

da impressão da Cartografia da Cultura

Candanga?

Raoni Machado: A publicação da

Cartografia, também disponível de forma

interativa e com registros audiovisuais dos

grupos culturais mapeados em nosso

portal (www.redecandanga.com), é

importante como veículo de informações

para turistas e para as pessoas do DF

e entorno que ainda não conhecem o

portal. Esta é uma estratégia para divul-

gação do nosso portal Rede Candanga,

além de ser um mapa cultural útil de

ter sempre em mãos para quem quiser

conhecer o universo cultural da região.

Esta nova metodologia, segundo o

coordenador, é mais econômica e pode

atingir um número maior de atores e

instituições culturais. “Frente à pesquisa de

campo e aplicação presencial de ques-

tionários, essa ação é mais econômica,

permite maior alcance em menos tempo e,

principalmente, é sustentável, no sentido

de permitir a atualização periódica dos

dados, uma vez que o setor cultural é

extremamente dinâmico: muitos grupos

nascem, outros fecham as portas, mudam

de endereço, alteram suas atividades,

passam a atuar em novos projetos, enfim,

é preciso utilizar uma metodologia que

dê conta de captar este dinamismo, assim

como criar indicadores, que apreendam

as especificidades de cada segmento ou

circuito cultural, muitas vezes sem um

respaldo metodológico”, avalia.

ainda não sabemos. Mas eu considero

uma tentativa válida.

Primeiramente em âmbito federal e,

hoje, em todos os âmbitos, o Programa

Cultura Viva, tendo os Pontos de Cultura

como carro-chefe, é um exemplo desta

mudança de paradigma de que faláva-

mos. A proposta de “desvendar o Brasil

Profundo”, “de massagear os pontos

vitais, adormecidos, do corpo cultural do

país”, idéias sempre reforçadas pelo ex-

-Ministro Gil e o então Secretário da Ci-

dadania Cultural, Célio Turino, idealiza-

dores do Programa, nunca tiveram tanta

força no universo político da cultura. O

modelo de gestão também é algo ino-

vador em diversos pontos, por exemplo,

na tentativa de aproximação da gestão

política e econômica entre Estado e

sociedade civil, que prevê a gestão de

dinheiro público ao longo de 3 anos pelo

Pontos; no forte papel desempenhado

pelo Conselho Nacional dos Pontos de

Cultura – CNdPC nas decisões políticas

tomadas com relação aos Pontos; na

utilização dos Pontos de Cultura para

implementação de outras ações gover-

namentais, inclusive advindas de áreas

outras que não a cultura; na utilização,

por parte da sociedade civil, dos Pontos

como canais de comunicação com o

Estado; entre outras.

Claro que existe uma grande distância

entre a poesia dos conceitos, a inovação

da proposta de gestão e a realidade.

Os aperfeiçoamentos são necessários,

e o próprio ministério vem reconhecen-

do isso, impulsionado pelas pesquisas

elaboradas pelo IPEA que, apesar de

formação relacionada a esse trabalho deve

levar em consideração que essa não é uma

pesquisa amostral e que esses dados refle-

tem apenas a realidade dos entrevistados

(363 no total, na sua maioria estudantes

entre 12 e 24 anos).

A baixa frequência nesses espaços está

associada a fatores sociais de maior den-

sidade, como a segregação socioespacial

que concentra equipamentos (principal-

mente museus, centros culturais e teatros)

no Plano Piloto, Região Administrativa

distante da residência de grande parte dos

entrevistados. A concentração de equipa-

mentos culturais no Plano Piloto é o inverso

da distribuição da população, já que a

maior parte da população encontra-se na

região que abrange Taguatinga, Ceilândia,

Samambaia, Riacho Fundo e Recanto das

Emas. É justamente na região de maior

população que estão localizados os agen-

tes mapeados com maior articulação, ou

seja, com maior comunicação com outros

grupos, o que, dentro da uma concepção

de rede, é fundamental para o dinamismo

do setor. Os de maior articulação desta

rede são os Pontos de Cultura.

RAIZ.: Vocês afirmam que há mudanças

na relação do Estado com a Cultura. Você

poderia citar alguns exemplos nas esferas

municipais, estaduais e federal?

Raoni Machado: Sabemos que desde

a gestão do Gil, iniciada em 2003, cresceu

o entendimento das dimensões simbólicas,

econômicas e cidadãs como parte das va-

riadas práticas culturais. Essa compreensão

ampliada do conceito de cultura, dentro do

âmbito político-governamental, demandou

novos modelos de gestão, onde os concei-

tos de participação social, gestão compar-

tilhada, formação de redes, mapeamento,

etc., ganharam mais força. A formulação

e implementação de políticas culturais

parece, enfim, que ganhou uma maior vin-

culação com a realidade, transformando a

forma de fazer política desde um escritório

na esplanada, distante e desinteressada das

dinâmicas e especificidades das realidades

culturais que compõem o universo das cul-

turas brasileiras. Esta proximidade com a

realidade obriga, também, à transversa-

lidade das políticas. Na prática, sabemos

que cultura não se desvincula de educa-

ção, de saúde, de cidadania, enfim, está

permeada e permeia todos os fatores da

vida das pessoas. Logo, uma política que

quer ser efetiva, deverá considerar isso.

Os PPAs, desde o ano passado passaram

a incorporar esta visão, permitindo que

um ministério aloque ações e recursos

em outros ministérios, aumentando a

integração entre eles e com suas res-

pectivas vinculadas. O resultado efetivo,

“Existe uma grande distância

entre a poesia dos conceitos,

a inovação da proposta

de gestão e a realidade”

Page 57: Revista Raiz #11

109

processo lançando mais editais por ano;

de iniciar uma integração concreta entre

as esferas nacional e distrital do Estado

por meio da plataforma SALIC WEB, do

Ministério da Cultura; e preocupação

por ampliar e aumentar o fomento da

cadeia produtiva por meio da divisão

dos editais em ações da cadeia produ-

tiva (Apoio ao Registro e à Memória,

Apoio à Montagem de Espetáculos,

Apoio à Difusão e Circulação, Apoio

à Manutenção de Grupos e Espaços,

Apoio à Criação e Produção; e Indica-

dores, Informações e Qualificação); a

preocupação por escutar os segmentos

em avaliações coletivas do fundo, com a

participação da sociedade civil.

As perspectivas que se abrem com a

implementação do Sistema Nacional de

Cultura e das metas do Plano Nacional

de Cultura que permeiam os exemplos

acima, são animadoras. Os desafios são

enormes, mas, como vocês podem ver,

eu sou otimista. Acredito na construção

política feita nos últimos nove anos,

apesar de alguns câmbios de concep-

ção durante o caminho, que servem,

também, para amadurecer a crítica e

aumentar a definição dos objetivos a

serem alcançados.

RAIZ.: A criação de redes - virtuais e

presenciais - tem dado bons resultados

na relação com o Estado?

Raoni Machado: Acho que a palavra

rede tem sido uma das mais faladas no

universo cultural. A disseminação da

ideia, por vaga que pareça e por polêmi-

não incluir os aspectos intangíveis da

experiência de ser um ponto de cultura,

apontam para modificações necessárias.

A reivindicação por marcos legais

que facilitem a prestação de contas e

contratação de serviços é um dos temas

mais discutidos. Outra forte reivindicação,

mais ampla, mas ainda tocante ao marco

legal, se refere à legislação que rege o

funcionamento de organizações não-

-governamentais que, ao se basearem

em contextos externos, não se adequam

à realidade do setor cultural brasileiro, tal

como a determinação pela proibição da

remuneração dos membros da direção de

uma OnG. A articulação em rede, apesar

de ser um dos conceitos originários dos

Pontos e do Programa Cultura Viva,

é um outro ponto fraco. O MinC tem

tentado compartilhar responsabilidades

e aumentar a capilaridade do Programa,

passando para as secretarias estaduais a

responsabilidade pela implementação dos

pontos e de sua articulação em rede. Mas

existe muito por fazer. Vejo este proces-

so, apesar das críticas feitas, não sem em-

basamento, como um amadurecimento

para ambos os lados, Estado e sociedade

civil organizada. Todas estas propostas

são muito recentes. Acho fundamental

o momento de avaliação e a posterior

correção de distorções.

No nível distrital, universo que conhe-

ço mais de perto, a reestruturação do

Fundo de Apoio à Cultura – FAC – trou-

xe avanços, ao meu ver, para região do

Distrito Federal: a ideia de dinamizar o

do distorções de poder. Os conceitos

citados muitas vezes não são alcançados

plenamente, nem mesmo por grupos

anarquistas da sociedade civil, quanto

mais pelo Estado. Acho que a sociedade

civil tem mesmo que forçar as mudan-

ças, somando-se e organizando-se, mas

também precisa entender a dificuldade

que é incorporar estes conceitos na dinâ-

mica do Estado, que é mais rígida. Digo

isso para o caso brasileiro, onde, por in-

cipiente que seja, existe uma intenção da

inclusão social nos processos de decisão

política. Em outros contextos, como o

que levou à primavera árabe, o embate

mais radical foi necessário.

Acho que o diálogo entre socieda-

de civil e Estado é tímido e precisa ser

ampliado. O Estado precisa se apropriar

das discussões sobre rede, dos modelos

de redes para as suas ações e criar os

meios para escutar a sociedade orga-

nizada. A sociedade precisa qualificar

as críticas, compreendendo a dinâmica

do Estado. Acho que esse é o caminho

para o diálogo construtivo e para as

necessárias mudanças.

ca que seja, é interessante, mas eu acho

que precisa haver maior alinhamento

deste conceito por parte do Estado.

Muito vezes escutamos a palavra rede

sem saber do que trata: pode ser um

grupo de email, uma lista de contatos ou

um grande número de pessoas, grupos

e/ou instituições em comunicação cons-

tante. Outras vezes, o conceito é muito

bem construído e na prática aquilo não

acontece. O conceito ou a discussão

sobre, uma vez que existem uma grande

pluralidade de conceitos, ainda não está

bem apropriada pelo Estado.

No campo das redes, o Estado pre-

cisa aprender muito com a sociedade

civil, afinal foi em seu interior que elas

nasceram, muito antes, inclusive, de

terem este nome. As redes estão por aí,

crescendo em diversidade e em número

de pessoas. As redes estão cada vez

mais em rede. Essa foi uma relação entre

pessoas que os meios de comunicação,

principalmente na internet, onde é pos-

sível a contra-hegemonia, consolidaram.

Não tem volta. O Estado vai precisar lidar

com isso, inclusive apropriando concei-

tos para aumentar a efetividade de suas

ações. Quer dizer, executar as suas ações

em rede é fundamental para o Estado.

Por isso o Sistema Nacional de Cultura é

tão interessante e parece apontar para

resultados expressivos.

Diversos princípios da teoria e da

prática das redes podem eventualmente

ameaçar as gestões de governo pelo

poder político descentralizado que têm:

horizontalidade, gestão compartilhada,

transversalidade, livre adesão, autono-

mia, enfim, são conceitos revolucionários

que precisam mesmo ser estudados e

trabalhados cuidadosamente, evitan-

“No campo das redes o

Estado precisa aprender

muito com a sociedade civil, afinal foi nela que nasceram

as redes.”

Para ter acesso a Cartografia da Cultura Candanga entrar em contato com a Artéria – Cultura e Cidadania

Fone: (61) 3964-0661

Emails: [email protected] / [email protected] / [email protected]

Site: www redecandanga.com

Registro audiovisual dos grupos mapeados: www.redecandanga.com/cartografia.

Serviço:

Page 58: Revista Raiz #11

111

Alguns projetos se destacam, inclusive

pela magnitude dos recursos que rece-

berão. O Programa Cultura Viva terá um

total de R$ 46 milhões, sendo R$ 35 mi-

lhões dedicados ao empenho da segun-

da e da terceira parcelas dos convênios

em andamento; outros R$ 11,6 milhões

se voltarão ao edital Pontões de Cultura.

Mas o fundo alavancará um leque

amplo de rubricas, que vão da economia

criativa ao patrimônio, passando pela

A primeira reunião da Co-

missão do Fundo Nacional

da Cultural (FNC), realizada

no dia 6 de março, possibi-

litou que a ministra Ana de

Hollanda anuncie os investimentos do fundo

neste 8 de março com mais de 50% dos

seus recursos já com destinação definida.

Assim, do orçamento de R$ 256 milhões

do FNC em 2012, nada menos que R$ 133

milhões (ou 51,95%) já têm rumo traçado.

Da Redação

Fotos: Divulgação

MINC DÁ INÍCIO AOS INVESTIMENTOS DO FUNDO NACIONAL DE CULTURA DE 2012

área do livro e leitura e financiamento de

microprojetos e outras (veja planilha com

áreas e valores).

Economia Criativa – No que se refere

ao Projeto Criativas Birô, que evidencia o

avanço da Economia Criativa como um

dos temas do MinC, o FNC reservou R$

16 milhões para as 12 unidades que se-

rão instaladas das cidades-sede da Copa

do Mundo de 2014. Os Criativas Birô são

voltados ao atendimento e suporte téc-

nico de profissionais e empreendedores

criativos. Chegam no momento em que o

Brasil dá um salto em função dos projetos

relacionados ao Plano de Aceleração do

Crescimento que impactam diretamente

o cenário do Mundial de futebol.

No âmbito da Funarte, os micro-proje-

tos culturais para a Bacia do São Francisco

receberão R$ 16,8 milhões. Serão 1.050

projetos contemplados com R$ 15 mil

cada para o desenvolvimento das suas

propostas. O programa engloba um total

de 500 municípios na região do rio.

Na área do livro e leitura, foram

reservados pelo FNC cerca de R$ 10,5

milhões. A maior parcela –R$ 5 mi-

lhões– ficará para o edital de incentivo a

feiras do livro de estados e municípios.

O programa Bolsas de Tradução, de in-

ternacionalização da literatura brasileira,

dedicará R$ 1,5 milhão; a promoção

do livro brasileiro na Feira de Bogotá

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Ministra da Cultura Ana de Hollanda

Page 59: Revista Raiz #11

113

Suas decisões servem para subsidiar a

aprovação final pelo MinC.

A Comissão é presidida pela ministra

Ana de Hollanda. Dela também fazem

parte secretários e presidentes das

instituições vinculadas do Sistema MinC

(Funarte, Ibram, Iphan, Casa Rui Barbo-

sa, Fundação Cultural Palmares, Ancine

e Fundação Biblioteca Nacional).

(Colômbia), que homenageará o Brasil e

cuja abertura ao público será em 18 de

abril, terá R$ 1 milhão.

R$ 16 milhões para o Pelourinho – O

FNC destinou também recursos para a

recuperação de imóveis no Pelourinho,

no centro histórico de Salvador. Dos

111 casarões sob risco de desabamen-

to, 70 se inserem em área tombada

pelo Instituto Nacional do Patrimônio

Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Para este ano já estão destinados R$

16,9 milhões para contratação das

obras de estabilização dos imóveis.

Adicionalmente, o MinC está rece-

bendo cerca de R$ 300 milhões para as

Praças dos Esportes e da Cultura, que

fazem parte do PAC. “Isso é importante

para que possamos entender que o re-

curso para esse programa não compete

com os recursos de nosso orçamento.

Pelo contrário, é um fator que agrega,

uma importante conquista, pois o valor

representa mais do que o orçamento

total do FNC”, afirma o secretário-execu-

tivo do MinC, Vitor Ortiz.

A Comissão do Fundo Nacional da

Cultura (CFNC) é responsável por apre-

ciar e orientar os processos públicos de

seleção de projetos, avaliar as progra-

mações específicas, políticas nacionais

e setoriais, entre outras atribuições.

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importante dentro da cultura afro-

-brasileira e da cena musical paulistana.

Participando múltiplos eventos como a

noite de premiação da Mostra Interna-

cional de Cinema Negro, ‘Colombia Y

Brasil a Una Solo Voz”, comemorações

dos Aniversários da cidade de São Paulo,

Parada GLBT, Congresso Internacional

de Psicoterapia Corporal, recepção da

Delegação de Mali em Diadema, exposi-

ção de Pierre Verger no Masp, encontro

Quilombos do Brasil e, principalmente,

do carnaval de rua paulistano.

Mulheres tocando tambo-

res e homens dançando

os orixás parece uma

inversão de valores, mas

não é.

O Ilú Obá De Min – Educação, Cultura

e Arte Negra é uma entidade feminina

atuante, Ponto de Cultura com vários

projetos em andamento como oficinas,

aulas, cineclubes, banda afro e outros.

Fruto de um trabalho desenvolvido ao

longo de vinte anos de pesquisa, tendo

como base as culturas de matriz africana

e afro-brasileira. O objetivo é preservar e

divulgar a cultura negra no Brasil, man-

tendo diálogo cultural constante com o

continente africano através dos instru-

mentos, dos cânticos, dos toques no

processo de fortalecimento das mulheres

na sociedade.

Criado por Beth Beli e Adriana

Aragão, esta, uma rara mulher que

tem a permissão de tocar os tambores

sagrados dos cultos afro-brasileiros dos

terreiros em São Paulo. O grupo Ilú Obá

De Min vem se firmando como nome

Da Redação

Fotos Acervo Associação RAIZ.

ILÚ OBÁ DE MIN, A FORÇA DAS MULHERESPARA A CULTURA NEGRA

Os perna de pau do Ilu Obá De Min

Page 60: Revista Raiz #11

O Ilú Obá De Min realiza hoje cinco projetos:

Bloco Afro Ilú Obá De Min: para divulgar as tradições percussivas, musicais e

coreográficas africanas e afro-brasileiras a partir de oficinas de rua para mulheres.

Banda Ilú Obá De Min: de pesquisa musical. Composta por 30 mulheres ritmistas

tocando djembês, alfaias, ilús, agogôs e xequerês.

Corpo de baile Ilú Oba De Min: com seu trabalho voltado para a dança.

Ilú na Mesa ciclo de palestras e debates: voltado à promoção do debate sobre temas

voltados para educação, cultura e arte negra.

Triunfo das Heranças Africanas: para divulgar e dialogar com os inúmeros grupos

culturais brasileiros com ações voltadas para as culturas de raiz africana.

O carnaval é o momento onde todas

as atividades do Ilu Obá De Min conver-

gem, em suas saídas para interação com

a cidade e o público. Torna assim possí-

vel, o envolvimento de muitos na alegria

genuína do carnaval nas ruas do centro

de São Paulo, sob um prisma diferente

de arquitetura, espaço, ocupação.

Realizando um trabalho sério e com-

prometido, o Ilu Obá De Min não para

de crescer seus participantes e suas

atividades. Este ano o grupo mal cabia

nas ruas centrais da cidade com seus

adereços, batuques e pernas de pau,

cercado pela multidão que se divertia

e conhecia um pouco mais de nos-

sa cultura afro, pela voz e mãos das

mulheres do Ilú, como a entidade é

carinhosamente chamada.

Ilú Obá De Min - Educação, Cultura e Arte NegraAlameda Eduardo Prado, 342 - Campos Elíseos

São Paulo/SP

Fone: (11) 3222-5566

Site: www.iluobademin.com.br

O Ilú Obá De Min recomenda: www.criola.org.br

www.palmares.gov.br

www.planalto.gov.br/seppir

www.cultura.gov.br

www.amulherada.org.br

www.casadeculturadamulhernegra.org.br

www.sec.rj.gov.br/atabaquevirtual

www.cedefes.org.br/new

Serviço:

Os orixás representados

A bateria de mulheres

Page 61: Revista Raiz #11

O tambor de crioula, o maracatu, o carnaval de rua, o cordel.

A Arte e a Cultura de do nosso Brasil vem que cada canto, de cada gueto,

vem do sertão, vem do artesão mineiro, da escritora baiana, do

cordel pernambucano, da pintora catarinense, vem da Raiz do nosso país.

E da Raiz., vai pra todos os lugares. Onde existir alguém

conectado vai haver um artista brasileiro em destaque,

seja nas páginas impressas da Raiz., no Portal, no tablet ou nas redes sociais.

A #NovaRevistaRaiz vai trazer muito mais informação,

dicas e acesso a uma cultura genuinamente brasileira.

O QUE É DE RAIZ TAMBÉM ESTÁ NA REDE

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