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Revista Moçambicana de CIÊNCIAS DE SAÚDE Autor da obra: Silvério Salvador Sitoe Artista plástico profissional, natural de Panda, Província de Inhambane Volume 1 Número 1 Março 2014 ISSN: XXX-XXX

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Revista Moçambicana deCIÊNCIAS DE SAÚDE

Autor da obra: Silvério Salvador SitoeArtista plástico profissional, natural de Panda, Província de Inhambane

Volume 1Número 1Março 2014ISSN: XXX-XXX

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FICHA TÉCNICARevistaMoçambicanadeCiênciasdeSaúdePublicaçãooficialdoInstitutoNacionaldeSaúdedeMoçambique

Editora Chefe: Ana Olga Mocumbi

Equipe EditorialAna Olga Mocumbi,EditoraJose Braz Chidassicua,ChefedoSecretariadoEditorialJacinto Nhancale,GestordePáginaWebFernando FumoeAntonio Júnior,GestãodeArquivosAlfredo Estado José,MarketingeRelaçõesPúblicasJucunú Elias,AssistênciaEditorialMaria Chissano,Secretária

Comité EditorialIlesh Jani, Sónia Enosse, Esperanca Sevene, Nilsa de Deus, Eduardo Samo Gudo, Eusébio Macete, Francisco Mbofana, Jahit Sacarlal, Carla Carrilho, António Prista, Emília Noormahomed, Moshin Sidat, Nafissa Bique, Milton Ozorio Morais

Editores ConsultoresJoão Schwalbach, Rassul Nalá, Steven Gloyd, Pedro Alonso, Nuno Lunet, Julie Cliff, Ricardo Thompson, Elena Folgosa

Apoio Técnico:FundaçãoOswaldoCruz(FIOCRUZ)Revisão Linguística:CentrodeLínguas,UniversidadePedagógicaPatrocínio:MinistériodaSaúde(MISAU)eInternationalAssociationofNationalPublicHealthInstitutes(IANPHI)

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EDITORIAIS

Renascimento da Publicação Científica Oficial do Instituto Nacional de Saúde(Ana Olga Mocumbi)...................................................................................................................5 Investigação em Saúde em Moçambique: Sucessos e Desafios(Ilesh V. Jani)...................................................................................................................................7

ARTIGOS ORIGINAIS

Arte, Ciência e Saúde num só(Silvério Salvador Sitoe)..............................................................................................................9

Cancro do Colo do Útero – da Infecção pelo Vírus do Papiloma Humano às Estratégias de Prevenção e Controlo em Moçambique(Carla Carrilho, Nuno Lunet)....................................................................................................11

Telemedicina no Diagnóstico de Doença Linfoproliferativa num Contexto de Recursos Limitados (Sérgio Chicumbe, Jamila Jorge Lizo, Simão Balate, Massimiliano De Bortoli)........................................................................................................17

Assimetrias na Pesquisa em Saúde, Publicada na Revista Médica de Moçambique (Júnior A, Nhancale J, Fumo F, Brás J, José A, Mbofana F, Mocumbi A)...............................................................................................................................23

Hipereosinofilia na População Escolar dum Distrito Endémico para Fibrose Endomiocárdica no Sul de Moçambique (Ana Olga Mocumbi, Tiago José, Yolanda Cachomba, Patrícia Silva)......................................................................................31

Validação do Método ELISA com Antígenos de Cysticercus cellulosae para o Imunodiagnóstico da Cisticercose (Noormahomed E. V, Nhancupe N, Zalis M., Assane Y, Buene T, Banze L, Afonso S.M.S, Guthrie C, Schooley R.T, Cappuccinelli P, Colombo M.)................................................................................................37

ARTIGO DE OPINIÃO

Saúde, Estilo de Vida e Urbanização em Moçambique: Problemas e Perspectivas(Antonio Prista, Silva Magaia, Carla Silva-Matos, Albertino Damasceno)................45

SUMÁRIO

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RESUMOS (Português)

Critérios de Diagnóstico Ecocardiográfico de Cardiopatia Reumática – Directrizes Baseadas em Evidência (Ana Olga Mocumbi).......................................................57

Inquérito Demográfico e de Saúde (IDS), Moçambique 2011(Celso Inguane)......................................................................................................................................58

How Point-of-Care Testing Could Drive Innovation in Global Health(Ilesh V. Jani e Trevor F. Peter).............................................................................................................59

Inquérito Nacional de Prevalência, Riscos Comportamentais e Informação sobre o HIV e SIDA em Moçambique (INSIDA 2009) (Mussagy Mahomed, Carlos Botão, Acacio Sabone, Francisco Mbofana, Peter Young)..............................................59

RESUMOS (Inglês)

World Heart Federation criteria for echocardiographic diagnosis of rheumatic heart disease an evidence-based guideline(Ana Olga Mocumbi)............................................................................................................................61

Demographic and Health Surveys (DHS), Mozambique 2011(Celso Inguane)......................................................................................................................................62

How Point-of-Care Testing Could Drive Innovation in Global Health(Ilesh V. Jani e Trevor F. Peter)..............................................................................................................63

National Survey on Prevalence, Behavioural Risks and Information on HIV and AIDS in Mozambique (INSIDA 2009) (Mussagy Mahomed, Carlos Botão, Acacio Sabone, Francisco Mbofana, Peter Young)..............................................63

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 5

EDITORIAIS

Renascimento da Publicação Científica Oficial do Instituto Nacional de Saúde

Ana Olga Mocumbi, MD PhDEditora-InstitutoNacionaldeSaúde,AvEduardoMondlane/SalvadorAllende1008C.P.264,Maputo,Moçambique

Tel:+25821431103Email:[email protected]

Adisseminaçãoderesultadosdepesquisareali-zadaemMoçambiqueéumdosmandatosdoIns-titutoNacionaldeSaúde.EstainstituiçãotemtidoumpapelfulcralcomoimpulsionadordaproduçãocientíficanaáreadesaúdeemMoçambique.Alémdisso, joga um papel fundamental na divulgaçãodos resultadosdepesquisa realizadanopaís atra-vésdaediçãodaRevistaMédicadeMoçambique,publicadaentre1982e2010.Porquestõesconjun-turaisarevistafoieditadadeformaintermitenteaolongodos28anosdeexistência, sendo sobretudoalimentadapormanuscritosapresentadosnasJor-nadasNacionaisdeSaúde.Outraformadarvisibi-lidadeápesquisaemsaúderealizadaemMoçam-biqueéaorganizaçãocadadoisanosdasJornadasNacionaisdeSaúde,actualmentenasua14ªedição.

AsJornadasNacionaisdeSaúdeconstituemummomentoúniconavidadas instituiçõesacadémi-casedepesquisamoçambicanas,cominteressenaáreadesaúde.Umaanálisedoconteúdodestasreu-niõescientíficasdesdeo seu lançamento foiapre-sentadanasúltimasJornadasNacionaisdeSaúde.1Osautoresanalisaramoslivrosderesumodeseteedições das Jornadas Nacionais de Saúde, realiza-dasentre1976e2009.Otrabalhodemonstrouqueatéaoiníciodadécada90asjornadastinhamumcaráctermuitoviradoparaproblemasnacionais,deacordo com o modelo social, político e económi-codessaaltura.ConcluiuaindaqueaaberturadeMoçambiqueparaomundoeoaumentodequa-dros qualificados no sector saúde, aumentou da

quantidadeequalidadedos trabalhosdepesquisasubmetidosásJornadas,inclundomesmoprojectoscientíficosmulticêntricoscomenvolvimentodain-dústriafarmacêutica.Estanovarealidadefoicom-provadanasXIVJornadasNacionaisdeSaúde,quedecorreramem2012,naqualfoisubmetidoumnú-merorecordedetrabalhos,quepermitiuorganizarumprogramacientíficofinalincluindo284comu-nicaçõesorais.Paraalémdissoforamapresentados112postersversandováriostemasdeinteresseparamédicos,enfermeiros,farmacêuticos,endermeiros,biólogos,cientistassociaiseoutrostécnicostraba-lhandonosectordasaúde.Umaanálisedostítulosdo trabalhos apresentados mostrou que cerca de2/3dascontribuiçõesforamnaáreadedoençasin-fecciosasendémicas(20%sobreinfecçãopeloHIVe15%sobresaúdematerno-infantil)e14%dostra-balhosapresentadostinhamcomotemaaanálisedesistemasdesaúde.Verificou-secontudoumafracapercentagemdetrabalhosdepesquisaemciênciasbásicas(1.9%).

Existe uma tradição de pesquisa e publicaçãona área de saúde testemunhada pelo número depublicaçõesenvolvendocientistasmoçambicanosaque podemos ter acesso numa busca ao pubmed.Estapublicaçãodeproduçãocientíficanacionalemrevistasinternacionaiséestimuladapelainexistênciadumarevistacientíficanopaís.Comaintroduçãode programas de pós-graduação na área de saúdenas Universidades Moçambicanas e expansãoda formação de profissionais de saúde de nível

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superior em Moçambique espera-se um aumentoda pesquisa científica na área da saúde. Exige-sepor isso que se criem vias para disseminação dosresultados desta pesquisa, nomeadamente atravésde publicação em revistas com qualidade e rigorcientíficosreconhecidos.

A revitalização da publicação científica oficialdo Instituto Nacional de Saúde, com um âmbitoalargado e política editorial reformulada, mais doqueumveículodedisseminaçãode resultadosdepesquisa intramural,pretende fornecerácomuni-dadecientíficanacionalumaplataformaparaadis-seminaçãoderesultadosdepesquisacientíficabá-sica,clínicaeepidemiológicaemciênciasdesaúdeeafins.

Orenascimentodarevistacomumanovadesig-nação-Revista Moçambicana de Ciências de Saúde(RMCS)– visa abarcar as diversas áreas de saúdehumana, através de uma abordagem interdisci-plinar dos aspectos relacionados com promoçãodesaúdepública,prestaçãodecuidadosclínicosegestãoderecursos,comparticularenfoqueemdo-enças endémicas e negligenciadas com relevânciaparaospaísesdelínguaoficialportuguesa.Acur-to prazo pretende-se evoluir para uma versão emformatoelectrónico(online)demodoamassificaroacessoáinformaçãopelosprofissionaisdesaúdeemtodoopaís.Amédioprazoespera-sequeapu-blicaçãoalcanceumnívelderigorequalidadecien-tíficos que permitam submetê-la a indexação embases de referências bibliográficas internacionais.ParaatingirestesambiciososobjectivosoInstitutoNacionaldeSaúde juntounoComitéEditorialdaRMCScientistaseespecialistasdediferentesáreasdosabertrabalhandoeminstituiçõesdepesquisaeacadémicasnacionais.ConvidouaindaparaoCo-mitédeEditoresConsultores Internacionaisespe-cialistasinternacionaisderenomecomexperiênciadetrabalhooupesquisaemMoçambique.

A revista terá secções permanentes designada-menteEditoriais,ArtigosdePesquisaOriginal,Ar-tigos de Revisão, Descrição de Casos, Resumo dePolíticaseRevisãodePublicações.Serãoaindain-cluídassecçõesdecarácter intermitentetaiscomo

EducaçãoContínua,Comunicaçõesbreves,SaúdeeCultura,bemcomoumespaçoparaOpiniões,De-bateseControvérsias.

A RMCS prioriza pesquisa operacional e detranslaçãocomrelevâncianocontextomoçambica-no, sem contudo descurar a pesquisa laboratorialbásica, apesquisanocontexto regional e aaplica-çãodetecnologiasdeinformaçãonaprocuradeso-luções inovadorasparaossistemasdesaúde.Umaatençãoespecialserádadaásecçãoderesumosdepolítica,umespaçoparaaapresentaçãodeevidên-ciacientíficacrucialparaatomadadedecisõespelosfazedoresdepolíticas.Destemodoarevistaesperapromover uma cada vez maior utilização dos re-sultadosdepesquisanamelhoriadaqualidadedosserviços e na definição de políticas de saúde. Domesmomodo,asecçãodestinadaarevisãodepubli-caçõesprocurarádirecionaraatençãooscientistaspara publicações com reconhecido potencial paracausarimpactonaprestaçãodecuidadosdesaúde.Resumindo,arevistapretendeserumaplataformapara o estabelecimento de diálogo científico e en-trecientistasefazedoresdepolítica,incentivandoapesquisaeprocuradosaberportodososprofissio-naisdesaúdeeinvestigadoresdeáreasafins,atodososníveisdonossoSistemaNacionaldeSaúde.

AEducaçãoContínuateráenfoqueemaspectosligadosaodesenhodeprotocolos, implementaçãode projectos de pesquisa e escrita de artigoscientíficos.SeéverdadequetemhavidoumaumentoprogressivodonúmerodecientistasmoçambicanoscomgraudeMestreeDoutornaáreadasaúde,apublicaçãodenovosaberquepossaserconsumidolocalmente está ainda aquém do recomendável.Há por isso necessidade de fomentar a escrita epublicaçãoderesultadosdepesquisarealizadaemMoçambiqueepormoçambicanos.Pensamoscoma RMCS contribuir para este fim, e daí o nossolema:“Submeta um artigo e contribua assim para a visibilidade da ciência em Moçambique”.

Referência Bibliográfica1. LivroderesumosdasXIVJornadasNacionaisdeSaúde,

InstitutoNacionaldeSaúde2012

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 7

Investigação em Saúde em Moçambique:Sucessos e Desafios

Ilesh V. Jani, MD PhdDirectorGeral-InstitutoNacionaldeSaúde,C.P.264,Maputo,Moçambique

Tel:+25821431103Email:[email protected]

As duas últimas décadas registaram um de-senvolvimento sem precedentes da investigaçãocientífica em saúde em Moçambique. Em parte,estedesenvolvimentofoicatalisadopeloamadure-cimentodeumsistemadeciênciaetecnologianoPaísqueprovidenciaumamatrizdesuporteparaarealização de investigação científica de qualidade.AcriaçãodoMinistériodaCiênciaeTecnologia,aadopçãodeumaestratégianacionaldeciência,tec-nologiaeinovação,aimplementaçãodoestatutodoinvestigadornafunçãopública,acriaçãodoFundoNacional de Investigação, e o estabelecimento daAcademiadeCiênciasdeMoçambiquepodemserapontados como alguns dos passos sistémicos demaiorimpacto.

Alguns avanços mais específicos para o sectorsaúdeforamalcançadosatravésdaimplementaçãodoplanoestratégicodoInstitutoNacionaldeSaú-de para o período 2010-2014, do estabelecimentodoComitéNacionaldeBioéticaparaaSaúdeassimcomodevárioscomités institucionaisdeética,dofortalecimento da capacidade reguladora do De-partamentoFarmacêuticodoMinistériodaSaúde,e especialmente pelo surgimento a nível nacionaldevárioscursosdeMestradoemáreasafinsàsaú-dehumanaeanimal.Adicionalmente,onúmerodeinstituições nacionais de ensino superior e de in-vestigaçãocientíficacresceusignificativamenteemtemposrecentes.Étambémnotáveloaparecimentomassivo de organizações não governamentais na-cionais e internacionaisque realizam investigaçãocientíficasobresaúde.Noentanto,oambientena-cionaldeinvestigaçãoemsaúdetemsidocaracteri-zadoporescassacolaboraçãoentreas instituições

e grupos de pesquisa nacionais, assim como pelaausênciadeumaagendanacionaldepesquisaemSaúdeedemecanismosformaisdeincorporaçãodeprioridadesnacionaisnainvestigaçãorealizadanoPaís.

Moçambiqueéumdospaísesafricanoscomomenor número absoluto de pesquisadores e como menor índice de pesquisadores por habitante.1O crescente número de cursos de Mestrado a ní-velnacional,o(esperado)aumentodonúmerodeprogramas de Doutoramento em universidadesmoçambicanaseacrescentevisibilidadeda inves-tigaçãocientíficanoPaís irãocertamente levaraoincremento do número de pesquisadores profis-sionaisemMoçambique.Noentanto,avelocidadedestecrescimentoirádependerdevários factores,especialmentede incentivosdoGovernoàpráticadaInvestigaçãoemsaúdeeàincorporaçãodeevi-dênciacientíficaempolíticasdesaúde.

No contexto global, autores africanos contri-buemcomapenasumaproporçãoínfimadepubli-cações científicas e patentes. Mesmo no contextoafricano,Moçambiquenãoocupaumlugardedes-taquecomoprodutordeconhecimentocientífico.1Noanode2012,abasePubMedregistouumtotalde 115 publicações sobre Moçambique: 28% comum primeiro ou último autor de uma instituiçãomoçambicana,18%comumsegundoautordeumainstituição moçambicana, 33% com um autor deuma instituição moçambicana numa posição semdestaquenalistadeautorese21%semnenhumau-tordeuma instituiçãomoçambicana.Estesdadosilustramqueosinvestigadoresnacionaistêmpoucoprotagonismonadefiniçãodainvestigaçãoemsaú-

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de realizada no País. Estes dados podem tambémserumareflexãodaincipientecapacidadecientíficadosinvestigadoresnacionais,dofracodomíniodaescritaemlínguainglesapelospesquisadoresmo-çambicanos, da pouca relevância dada pelas ins-tituições nacionais às publicações científicas e dopapel subalterno que as instituições nacionais de-sempenhamnamaiorpartedapesquisaqueenvol-vecolaboraçõesinternacionais.

A relevância nacional da investigação em saú-derealizadanoPaíseousodaevidênciacientíficaparainformarpolíticasnosectorsaúdesãooutrasáreasquemerecemanálise.Existemexemplosbemconhecidos de resultados de investigação realiza-daanívelnacionalqueinfluenciarampolíticasdoServiçoNacionaldeSaúdeeatépolíticasdesaúdea nível global. Infelizmente, actualmente não estádisponívelinformaçãosistemáticasobreapropor-çãodepolíticasdesaúdeouprotocolosclínicosdoServiço Nacional de Saúde que são resultantes deevidênciacientíficageradaanívelnacional.Mesmoassim,éevidentequeapenasumapequenafracçãoda investigação em saúde realizada no País infor-madeformaefectivaaspolíticasnosector.Ofor-talecimento gradual das instituições que realizaminvestigaçãocientífica,aaproximaçãodestasàsne-cessidades do País, a eventual aprovação e opera-cionalizaçãodeumaAgendaNacionaldePesquisaemSaúde,eoreconhecimentocadavezmaiorpeloMinistériodaSaúdedovalordaevidênciacientíficaproduzidalocalmenteserãofactoresdeterminantesparaoestabelecimentodapráticadeMedicinaedeSaúdePúblicaBaseadasemEvidência.

Dados fidedignos sobre gastos com investiga-ção e desenvolvimento em Saúde não existem noPaís.Noentanto,ésabidoqueagrandemaioriadasinstituições de ensino superior e de investigaçãocientífica têm sido cronicamente subfinanciadas.Algumas instituições, ou melhor dito, alguns in-vestigadores, têmconseguidocaptarfinanciamen-tos internacionais para a execução de projectos.Estetipodefinanciamentopossibilitaarealizaçãodepesquisadequalidadeepromoveavisibilidadeglobaldepesquisadoresmoçambicanos,masgeral-

mentecontribuiapenasdeformaténueparaaca-pacitação institucional.Poroutro lado,umapartesignificativa deste tipo de financiamento desequi-libraabalançadainvestigaçãorealizadaafavordeagendasdepesquisanãonacionais,emdetrimen-todeprojectosdeinvestigaçãoedesenvolvimentotecnológico estratégicos para o País. No entanto,naausênciadeoportunidadesdefinanciamentoanível nacional (o Fundo Nacionalde Investigaçãosendoaúnicaexcepçãode relevo), as instituiçõesnacionais que realizam investigação científica emSaúdedeverãoinvestirnaplanificaçãoestratégicaenoaperfeiçoamentodautilizaçãodefundosdepro-jectos específicos para o estabelecimento gradualdecapacidadestécnico-científicas,infraestruturasesistemasdegestão.Mesmosobascondiçõesactuaisadversas, deve ser possível a construção de insti-tuiçõestécnico-científicasquesejamcompetitivas,sustentáveis, solidárias epromotorasdedesenvol-vimentonacional.

Emsumário, a investigaçãoemsaúdeemMo-çambique realizou avanços notáveis em temposrecentes.Noentanto,fraquezasdeváriasnaturezaspersistememáreaschavesdosistemadeinvestiga-ção,incluindonacoordenação,emrecursoshuma-nos, no financiamento, em definições estratégicassobreasprioridadesnacionais,natraduçãoefectivadosresultadosdepesquisa,enacooperaçãonacio-naleinternacional.Ainvestigaçãocientíficaalber-gaumpotencial transformadorsobrea saúdedospovos.NonossoPaís,osprimeirospassosforamjádadosnadirecçãocertaeumsucessoincipientejáévisível(oprimeironúmerodestarenascidaRevistaéumexemploconcretodestesucesso).Aperseve-rança e o realismo dos investigadores e das insti-tuições técnico-científicas serão dois ingredienteschavesdolongoprocessoparaatransformaçãodainvestigaçãoemsaúdenumelementoindispensáveldasociedademoçambicana.

Referências1. Irikefe V, Vaidyanathan G, Nordling L, Twahirwa A,

Nakkazi E, Monastersky R. Science in Africa: The viewfromthefrontline.Nature2011;474:556-9.

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Arte, Ciência e Saúde num só

Silvério Salvador Sitoe(autordaobraedotexto)*Artístaplásticoprofissional,naturaldePanda,ProvínciadeInhambane,concluiuoCursodeDesenhonaFaculdadedeEducaçãodaUniversidadeEduardoMondlane,em1985.Em2012concluiuograudelicenciaturaemartesvisuaisnoInstitutoSuperiordeArteseCultura–ISArC.SitoeparticipouemváriasExposiçõesdentroeforadeMoçambiqueepossuiváriasobrasemcolecçõespúblicaseparticulares,emMoçambiqueenoutrospaíses.DirigiuaAssociaçãoNúcleodeArtenosanosde2006e2007,tendopor

duasvezesganhooprémioPintordoAnoemMoçambique.

Aartee saúdecaminham juntosdesdeapre-história quando o homem primitivo tinha quetomar várias iniciativas para a sua sobrevivência.Osdesenhosencotradosemváriasgrutasatestamacrençasegundoaqual,antesdepartirparaacaça,esteacto,eraprimeiromaterializadoartisticamentenasrochas.Comocaminhardosséculos,osartistas,com o seu talento, tornaram se participantes dosavançosnaciênciaenasaúde.Noclassisismoporexemplo,artistascomoLeonardodaVincieMiguelÂngelo fizeram desenhos minuciosos sobre aanatomia,partindodaobservaçãodiretadocorpohumano. Esta atitude teve muitos benefícios paraaciênciadesaúde.Poroutrolado,aarteinterveiodesdelogonasmaisvariadasformasdepreservaçãodasespécies.

Outras formas da simbiose arte e saúde vãosurgindo.Aarteterapia,muitodivulgadanoiníciodosec.XIX,defendeautilizaçãodasferramentasqueaartedispõeparaobemdasaúde.Nesseprocesso,o paciente e o terapeuta interagem na produçãoe fruição das imagens e símbolos produzidos,resultando daí a escolha do melhor caminho quepermitaaossujeitosampliaroconhecimentodesiedosoutros,aumentaraauto-estima,lidarmelhor

com sintomas, stress e experiências traumáticas,desenvolverrecursosfísicos,cognitivos,emocionaisedisfrutardoprazervitalizadordofazerartístico.

A arteterapia sustenta o uso do desenho,escultura, performance, entre outras modalidadesartísticas,paraestabelecerumacomunicaçãomaiseficazcomooutro.Elasustentaqueacriatividademelhora a troca de códigos e símbolos deinteraçãoentreointerioreoexteriordopaciente,despoletandoummaiorfluxodeinformaçõesúteisparamelhoraraqualidadedevidadosquedelaseservem. Donald Woods Winnicott psicanalista epediatra,sustentaqueacriatividadeéfundamentalnoscuidadosdesaúde.Aartetemqueestarsemprepresentenapesquisa,divulgaçãoepromoçãodoscuidadosdesaúde.

Como diria Albert Einstein (apoud JuliaCameron): “Imaginação é mais importante queconhecimento”.

Referências 1. Wikipédia,Aenciclopédialivreacedidaa25/7/2013

2. CameronJ. (1995).TheArtist’sWay.ASpiritualPathtoHigherCreativity.PanBooks.London

ARTIGOS ORIGINAIS

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Cancro do Colo do Útero – da Infecção pelo Vírus do Papiloma Humano às Estratégias de

Prevenção e Controlo em Moçambique

Carla Carrilho1, Nuno Lunet2

1Departamento de Patologia, Faculdade de Medicina, Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique; Serviço de AnatomiaPatológica,HospitalCentraldeMaputo,Moçambique

2DepartamentodeEpidemiologiaClínica,MedicinaPreditivaeSaúdePública,FaculdadedeMedicina,UniversidadedoPorto,Portugal;InstitutodeSaúdePúblicadaUniversidadedoPorto(ISPUP),Portugal.

ResumoEmMoçambique,ocancrodocolodoúterocorrespondeacercadeumterçodoscasosdecancronamulher,reflectin-doaelevadaprevalênciadeinfecçãopeloVírusdoPapilomaHumano(Human papillomavirus–HPV).Actualmente,todasasprovínciassãoabrangidasporumprogramaderastreioporinspecçãovisualdocolodoúteroapósimpreg-naçãodeácidoacético,sendoestaaprincipalestratégiapopulacionalparaaprevençãoecontrolodocancrodocolodoúteronopaís.AvacinacontraoHPVpoderáviraconstituir-secomoumaferramentaessencialparaaprevençãodestecancroemMoçambique,depoisdeultrapassadososconstrangimentosfinanceiroselogísticosquenãopermiti-ramaindaasuainclusãonoPlanoNacionaldeVacinação.Nestecontexto,orastreiocontribuiráparaodiagnósticoetratamentoprecocesdoscasosqueocorramemmulheresnãovacinadasounãopreveníveisporvacinação.

Palavras-Chave: Cancrodocolodoútero;VírusdoPapilomaHumano;HPV;Prevenção;Vacina;Rastreio.AbstractInMozambique,cervicalcanceraccountsforapproximatelyone-thirdofallcancersamongwomen,reflectingthehighprevalenceofinfectionwithHumanpapillomaviruses.Currently,allprovincesarecoveredbycervicalcancerscreeningusingvisualinspectionwithaceticacid,andthisisthemainpopulation-basedstrategyforpreventionandcontrolofcervicalcancerinthecountry.TheHPVvaccinemaybeanessentialtooltopreventcervicalcancerinMozambiqueinthefuture,althoughitisnecessarytoovercomethefinancialandlogisticconstraintsthatdidnotyetallowitsinclusionintheNationalVaccinationProgram.Nevertheless,screeningwillremainanessentialtoolfortheearlydiagnosisandtreatmentofcasesnotpreventablebyvaccinationoroccurringamongnon-vaccinatedwomen.

Key-Words: UterineCervicalNeoplasms;HumanPapillomavirus;PreventionandControl;Vaccines;MassScree-ning;EarlyDetectionofCancer.

Ocancrodocolodoúteroéaterceiraneoplasiamalignamaisfrequentenamulheremtodoomun-do, estimando-se que em 2008 tenham ocorridocercade530milnovoscasose275milmortesporestecancro(1).Maisde85%doscasosincidentesedosóbitosporcancrodocolodoúteroocorremempaísesemdesenvolvimento,onde,emmuitasregi-ões,éocancromaisfrequentenamulher(1).

Asdiferençasgeográficasnaincidênciadocan-crodocolodoúteroreflectemdiferençasregionais

nafrequênciadeinfecçãopeloVírusdoPapilomaHumano (Human papillomavirus – HPV), actu-almente considerada uma causa necessária para aocorrênciadestecancro(2),assimcomonaspolíti-casderastreiopopulacional(3).

A infecção por HPV como determinante de cancro do colo do útero

Dosváriosfactoresderiscoparacancrodocolodo útero, aqueles que se associam ao processo de

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cancerizaçãodeformamaisconsistenteencontram-se ligados ao comportamento sexual da mulher eseusparceirossexuais(2).Osmaisfrequentementedescritosincluemaidadeprecocedaprimeirarela-çãosexual,oelevadonúmerodeparceirossexuaiseaexistênciadeoutrasdoençasdetransmissãosexu-alprévias.Oriscoémaiselevadoquandooparceirosexual masculino tem antecedentes de condilomaoucancrodopénis,múltiplasparceirassexuais,ca-samentoanteriorcomumamulhercomcancrodocolouterino,ounãoécircuncidado(2,4).

Estes factos reflectem o envolvimento de umagenteinfecciosotransmitidosexualmentenaetio-patogeniadocancrodocolouterino.Actualmenteestábemestabelecidoqueocancrodocolodoúteroécausadopela infecçãoporHPV(2,5), sendoestaadoençadetransmissãosexualmaisfrequentenasmulheres; a prevalência de infecção em mulherescomcitologianormaléde12%nomundoede24%naAfricasubsaariana(6).

Existem mais de 120 tipos de HPV descritos,dosquais40estãoassociadosainfecçõesdotractoanogenital(7).Cercade15tiposdeHPV(HPV16,18,31,33,35,39,45,51,52,56,58,59,68,73e82),classificadoscomosendodealtorisco,têmsidoas-sociadosacarcinomas invasoresdocolodoúteroesuaslesõesprecursorasdealtograu(8).Ostipos16e18sãoosmaisfrequentementedetectadosemcasos de carcinomas invasores (em cerca de 70%doscasos),seguidosdostipos45,31,33,35,52e58(8-10).OstiposdebaixoriscomaisfrequentementedetectadossãoosHPV(6e11),associadosalesõesintraepiteliaisdebaixograu,incluindocondilomas.

O desenvolvimento do carcinoma invasor docolo do útero é um processo de múltiplas etapas,envolvendo um estádio precursor pré-invasor (le-são intraepitelial ou neoplasia cervical intraepite-lial–CIN),quese iniciacoma infecçãoporHPVdealtorisco.Cercade80%dasinfecçõesporHPVsãotransitóriaseregridemespontaneamenteaofimdeumadoisanos,ecercade20%resultamemne-oplasiaintraepitelial.Apenasumapequenapercen-tagemdasmulheresinfectadasdeformapersistentecomtiposdeHPVdealtoriscoapresentaneoplasiaintraepitelialpersistenteeapenascercade0,2a4%progride para carcinoma invasor (11). Estima-se

queaprogressãodaslesõesin situparacancroin-vasordemore10a15anos(11).

Apesar da infecção ser necessária para aocorrênciadecancrodocolodoútero,aprogressãopara carcinoma invasor depende de diversos co-factores, incluindo persistência da infecção portiposdealtorisco,altacargaviral,usoprolongadode anticonceptivos orais (12), multiparidade (13),tabagismo (14), co-infecções por Herpes vírus eChlamydia trachomatis (15,16)eimunodeficiênciadequalquertipo,incluindoporHIV(17).

O cancro do colo do útero e a infecção por HIV

Ocancrodocolodoúteroéconsideradoumaneoplasia definidora de SIDA (18). As mulherescominfecçãoporHIVtendemadesenvolvercan-crodocolodoútero10a15anosmaiscedoqueasmulheresnãoinfectadas,eosníveisdelinfócitosTCD4+abaixode200células/mm3associam-seaes-tádiosmaisavançadosdadoençanomomentododiagnóstico(17).

AprevalênciadeinfecçãoporHPV,incluindoainfecçãopormúltiplostiposeportiposdealtorisco,edeachadoscitológicosanormais,émaiselevadaemmulherescominfecçãoporHIV,especialmentenasqueapresentammaiorcargaviraldoHIV(17,19,20).Contudo,emváriosestudosrealizadosemÁfrica,oestadorelativamenteàinfecçãoporHIVnão se associouadiferenças significativasnapre-valênciadeinfecçãoporHPVdostipos16e18emmulherescomcancrodocolodoútero(21,22).

Prevenção e controlo do cancro do colo do útero

O rastreio por citologia cervical (e.g.: testede Papanicolaou) permite a detecção precoce etratamento do cancro e de lesões pré-invasorase tem sido a principal estratégia de prevenção/controlo do cancro do colo do útero nos paísesmaisdesenvolvidos.Aimplementaçãoderastreiosorganizadosdebasepopulacionalcontribuiuparadiminuições acentuadas das taxas de incidência emortalidade por carcinoma invasor em diversaspopulações(23),apesardorastreiooportunistaser

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 13

ainda predominante em muitos dos países maisdesenvolvidos(24).

Contudo, o rastreio populacional baseado nacitologia cervical não é facilmente implementávelem países com baixos recursos, nomeadamentepelos elevados custos associados à organizaçãodosprogramasepelanecessidadedegrandeapoiolaboratorial.Ainspecçãovisualdocolodoúteroapósimpregnaçãodeácidoacéticoa3-5%(VIA)permitevisualizar zonas aceto-brancas correspondentes alesões cervicais, com sensibilidade semelhante oumaior do que a do teste de Papanicolaou, apesardeaespecificidadesermaisbaixa,sendoutilizadacomo alternativa em diversos Países (25-28). Estatécnicapodeserrealizadaporpessoalparamédicodevidamente treinado, sem apoio laboratorial,tendo também a vantagem do resultado ser dadoa conhecer no mesmo momento à paciente e depermitirotratamentonomesmodia.

A detecção da infecção por HPV através detécnicas moleculares rápidas tem sido igualmentesugeridacomopossívelmétododerastreiocomboarelaçãocusto-eficáciaemsubstituiçãodacitologiacervical nos países de baixos recursos (23). NaÍndia,orastreiopordetecçãodeHPVumaúnicavez em mulheres com mais de 30 anos reduziu aincidência e a mortalidade de cancro invasor em50%(29).

A utilização de vacinas profilácticas contraa infecção por HPV tem sido apontada como aestratégia mais promissora para a prevenção docancro do colo do útero (10,30,31). Atualmenteestão disponíveis dois tipos de vacinas, umabivalente,contraostiposdeHPV16e18,eoutratetravalente,quetambémconfereprotecçãocontraostipos6e11(23).Estasvacinastêmdemonstradoalta imunogenicidadeeefectividadenaprevençãode lesões precursoras cervicais de alto grau bemcomo de lesões vulvares, perianais e vaginais, emmulheresseminfecçãoporHIV(31-33).Contudo,aindanãosãoconhecidosefeitosdavacinaalongoprazo(34).

Estas vacinas estão limitadas por seremespecíficas de tipo, conferindo protecção apenasrelativamente à infecção por subtipos que sãoresponsáveisporcercade70%doscasosdecancro

docolodoútero(9).Noentanto,avacinabivalenteparececonferirprotecçãocruzadacontraainfecçãopor HPVdos tipos 31, 45 e 52, enquanto a vacinatetravalente parece conferir protecção cruzadacontra os tipos 31 e 59 (35,36), o que poderácontribuirparaumacréscimodecercade10%naproporção de casos potencialmente preveníveis(23).OsestudosrealizadosemindivíduosinfectadosporHIVdemonstraramelevada imunogenicidade(seroconversãoempelomenos95%dosvacinados)esegurançadavacina(37,38).

Apesar de vários estudos realizados em Áfricateremdemonstradoumaltoníveldeaceitabilidadeda vacina (39,40), o seu preço elevado, mesmotendo diminuído nos últimos anos, constitui umimportanteobstáculoàvacinaçãogeneralizadadapopulação elegível, especialmente nos países debaixosrecursos.Adicionalmente,oregimedetrêsdoseseavacinaçãonaadolescência,foradaidadedas restantes vacinas que integram os programasnacionais de vacinação (31) colocam desafiosadicionais à implementação desta estratégia. Avacina está incluída nos programas nacionais devacinaçãoem28paíseseestáimplementadaanívelsub-nacional, através de doações, em pelo menos17paisesemdesenvolvimento(17).

Apesardopotencialparaavacinaçãocontribuirde forma importante para a diminuição da cargade doença associada ao cancro do colo do útero,será necessário manter um sistema de rastreiopopulacional durante pelo menos três décadasapós a introdução da vacina (3). Esta estratégia énecessária para detectar e tratar precocementeas lesões precursoras que resultam de infecçõespor HPV que existiam antes da vacinação, ou deinfecçõesporgenotiposoncogénicosnãocobertospelavacina(cercade30%doscancrosdocolodoútero)(3,9).

AvacinaçãocontraoHPVtipos16e18eoras-treioatravésdotestemoleculardebaixocustonumaúnicarondaparadetecçãodoHPVpareceserumaestratégiapromissoraemtermosdecusto-eficáciae uma oportunidade para prevenir as mortes porcancrodocolodoúteronaÁfricasubsaariana(23),dependendodosrecursosexistenteseacapacidadelocaldeorganizaçãoedeimplementação.

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Cancro do colo do útero e infecção por HPV em Moçambique

Moçambique situa-se numa das regiões commaiselevadafrequênciadecancrodocolodoúte-ro.Asprimeirasestimativasde incidêncianopaísreferem-seàpopulaçãodeLourençoMarques(ac-tual Maputo), entre 1956 e 1961 (41). A taxa deincidênciadecancrodocolodoútero foide18,6por100.000(taxadeincidênciaajustadaparaaida-de,populaçãopadrãomundial:29,1por100.000),correspondendo a 21,3% dos casos de cancro namulher. Mais recentemente, uma análise dos ca-sosregistadospeloServiçodeAnatomiaPatológi-ca (SAP)doHospitalCentraldeMaputo (HCM),no período de 1991 a 2010, mostra que o cancrodocolodoúterocorrespondeacercadeumterçodoscancrosdiagnosticadosnaCidadedeMaputoentreasmulheresadultas,sendoomaisfrequentenestegrupopopulacional(42).NaCidadedaBeira,deacordocomoregistodecancrodebasepopu-lacional(RegistoOncológicodaBeira),em2010ocancro do colo do útero foi a neoplasia mais fre-quente,correspondendoa34%doscasosdecancro,nasmulheres(43).

Relativamente à infecção por HPV, um estudorealizado na população da área rural da Manhiçademonstrouumaprevalênciade infecçãode40%,sendo que em 41% dos casos houve infecção pormúltiplos tipos de HPV. Os tipos de HPV maisfrequentes foram os tipos 35 (30%); 58 (17%); 16(13%)e33(13%).Aprevalênciadelesãointraepi-telialfoide12%(44).

Noestudoqueavaliouamaiorsériedecancrosinvasores em Moçambique, observou-se infecçãoporHPVem100%doscasos,estandoostipos16e18presentesem47%e31%doscancros,respec-tivamente(45).EmmulheresinfectadasporHIV,aprevalênciadeHPVdostipos16e18emcancrosinvasoresfoi40,8%e26,5%,respectivamente(21).

Prevenção e controlo do cancro do colo do útero em Moçambique

Em Moçambique, até 2009 o rastreio do can-cro do colo do útero era efectuado por citologia

cervical, contemplando uma pequena minoria demulheresqueseapresentavamaconsultasdegine-cologiaenastrêscidadescomserviçodeanatomiapatológica.SeguindoasprioridadesconstantesnoPlano Estratégico Nacional para as Doenças NãoTransmissíveisdoDepartamentodeDoençasNãoTransmissíveis (DDNT) do Ministério da Saúde(MISAU) (47), foi recentementeelaboradooPro-gramaNacionaldePrevençãodoCancrodoColodoÚteroedaMama(48).Paraocolodoútero,esteProgramaébaseadonadetecçãoprecocedaslesõescervicaisatravésdaVIA,emmulheresentreos30e55anos,incluindoasinfectadaspeloHIV.Olança-mentodoProgramaocorreuem2009eaprimeirafasedeimplementaçãoteveinícioem2010comacriaçãode10unidadesbásicasderastreioe7uni-dadesdereferênciaem5províncias.Actualmentetodasasprovíncias sãoabrangidaspeloprogramaderastreio(49).

A vacina contra o HPV poderá constituir-secomo uma ferramenta essencial para a prevençãodocancrodocolodoúteroemMoçambique,de-pois de ultrapassados os constrangimentos finan-ceiroselogísticosquenãopermitiramaindaasuainclusãonoPlanoNacionaldeVacinação.Contudo,apesardopotencialdavacinaçãoparareduzirain-cidênciadocancrodocolodoúteroalongoprazo,éessencialmanterorastreioduranteváriasdécadas,de modo a diagnosticar e tratar precocemente oscasosqueocorramemmulheresnãovacinadasounãopreveníveisporvacinação.

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 17

Telemedicina no Diagnóstico de Doença Linfoproliferativa num Contexto de Recursos Limitados

Sérgio Chicumbe1 MD, MPH & TM, Jamila Jorge Lizo2 MD, Simão Balate3, Massimiliano De Bortoli4MD,PhD

1MédicoClínicoGeral,InstitutoNacionaldeSaúde,Correioelectrónico:[email protected];telefone:+2588242312502MédicaClínicaGeral,HospitalRuraldeChókwe3AgentedeLaboratório,HospitalRuraldeChókwe

4MédicoOncologistaPediátrico,InstitutodeOncologiaPediátricadoHospitalUniversitáriodePádova,Itália

ResumoOsautoresreportamumcasodeLeucemiaLinfoblásticaAguda-L1daclassificaçãoFrancesa–Americana–Britânica,numacriançamoçambicanacujodiagnósticoespecíficofoiconfirmadoatravésdeconsultaporviaelectrónica,realizadaporumhospitalruralemMoçambiqueeporumoncologistapediátriconumoutrocontinente.Acriançade7anosfoiadmitidaaohospitalcomumquadrogravedeanemia,descompensaçãocardiorrespiratóriasecundária,febre,diarreia,linfadenopatiascervicais,hepatoesplenomegaliaeleucócitemiade120x103/mm3(84.4%linfócitos). Apesar de o Hospital Rural em Moçambique dispor de recursos limitados, foi feito um diagnósticodefinitivoecéleregraçasatrocadeimagensdoesfregaçodesangueperiféricodopaciente,sistematicamentegravadascomrecursoaumacâmarafotográfica.Asconsultasàdistânciautilizandomeioselectrónicospermitiramparaalémdodiagnóstico,aformaçãoemserviço,dopessoallocalatravésdasorientaçõessobrecondutasessenciaisparacorrectaestabilizaçãoclínicadopaciente.Estecasosugereatelemedicinacomoummecanismopotencialdeapoiodoshospitaisespecializadosaoshospitaisrurais,ajudandojovensprofissionaisnomanejodecasoscomplexos.Asuaaplicaçãodeveserestudadaparaorientaroseuusocorrecto,informadoeextensivo.

Palavras-Chave: Telemedicina,LeucemiaLinfoblasticaAguda,Chókwe,Moçambique.AbstractThisisareportofacaseofacutelymphoblasticleukemia-L1French-American-Britishclassification,inaMozambicanchild,whosespecificdiagnosiswaspossibleandconfirmedthroughelectronicconsultationbyapediatriconcologistfromanothercontinent.The7yearoldchildwasadmittedtohospitalwithsevereanemia,secondarycardiacdecompensation,fever,diarrhea,cervicallymphadenopathy,hepatosplenomegalyandwhitebloodcellsof120x103/mm3(84.4%lymphocytes).DespitethefactthatruralhospitalsinMozambiquehaveextremelylimitedresources,aspecificdiagnosiswasmadethroughexchangeofsystematicallyrecordedpicturesofpatient’speripheralbloodsmears.Theconsultationbydistancealsoallowedin-servicetrainingoflocalstaffbysharingguidelinesonessentialconductsforproperclinicalstabilizationofthepatient.Thiscasesuggestsapotentialmeanstodeliversupportfromspecializedhospitalstoruralhospitals,helpingyoungprofessionalsinmanagementofcomplexcases.Itsapplicationshouldbestudiedtoguideproper,informedandpossiblyanextensiveuse.

Apresentação do caso

EA,desexomasculino,7anosdeidade,pesando18kg,foiinternadonoHospitalruraldeChókwe,Moçambique, através dos serviços de urgências,vindotransferidodoCentrodeSaúdedeMabalane,acercade95kmdedistância,comdiagnósticodeanemiagrave.

A mãe referiu que havia duas semanas que acriançaapresentava febrealta,mal-estargeral, as-tenia, diarreia aquosa de médio volume, de coramarelada, sem muco nem sangue. No início dossintomasacriançafoimedicadanocentrodesaúdelocal,comfármacosquedesconheciaenãotraziaadocumentaçãodasprescrições.

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Umasemanaapósoiníciodoquadro,acriançapiorouapresentandodificuldade respiratória,des-coloraçãodaspalmaseplantasdospés,enoretor-noaocentrodesaúdefoitransferidaparaoHospi-taldeChókwe.

A mãe referiu ainda que ao longo do últimoano,acriançatevedoisepisódiosdedoençafebril,cujotratamentonãosoubeespecificar.Negouqueacriança tevequaisquer internamentosprévios,pa-tologianoperíodoperinatalenosprimeirosanosdevida.Negoutambémdoençamaternareconhe-cível,patologiainfecto-contagiosaoufebrilduranteagravidezeperiparto.Nãoapresentoudocumen-taçãodaspossíveis imunizações feitasouocartãodesaúdedacriança.Negouaindacontactointrado-miciliarcomcasode tuberculosepulmonarenãoreconheceunenhumcontactoextradomiciliar.

Exame objectivo à admissãoOestadogeraldacriançaeragrave,comdisp-

neiaemrepouso,observando-setiragemintercos--setiragemintercos-tiragemintercos-tal,frequênciarespiratóriaemrepousode66ciclosporminuto,frequênciacardíacade160porminutoe temperatura axilar de 380C. O peso para idadeestavaentreospercentís3e10daversãocorrentedocartãonacionaldesaúdedecrianças.Acrian-ça apresentava-se com marcada palidez mucosa-palmo-plantar;múltiplas linfadenopatiassubman-dibular, retro mandibular, latero-cervical e supraclavicularbilateralmente,decercade3x3cmcada,superfícies lisas, consistência duro-elástica, indo-lentes, densas mas não coalescentes, móveis entresieemrelaçãoaosplanosprofundosesuperficiais.Oslinfonodoslaterocervicaisesquerdoserammaisproeminentes,emnúmeroedensidade,formandoem conjunto uma tumoração de 8x7 cm. A pelesobregângliossubmandibulares,àesquerda,apre-sentavaescarificaçõesincisivasemcicatrização.Oslinfonodosdasregiõesaxilareseinguinaisnãoesta-vamaparentementeaumentados.

A auscultação cardíaca revelou primeiro e se-gundotons,bembatidos,umterceirotomeumso-proejectivonaáreaaórticadeintensidade2-3/6.Oabdómenestavaligeiramentedistendido,dolorosoàpalpaçãoprofunda,massemorganomegáliaspal-páveis.Oexameneurológicosumáriofoinormal.

Tratamento efectuado Foi feita transfusão de 270 ml de concentrado

deglóbulosvermelhoslogoapósaadmissão,mais180mlduranteointernamento.Foiprescritaase-guintemedicação:Amoxicilina(500mg)comácidoClavulâmico(125mg)acada8horas,porviaoral;Paracetamol(250mg)quandotivessefebre;einfu-sãodeNaCla0,9%nadosede50ml/kg/dia.

Evolução imediata após internamentoDuranteointernamento,acriançaevoluiucom

dejecçõessanguinolentas(segundodia,durouumdia) e manteve-se estacionária em relação à febre(temperaturasaxilaresde39-40ºC).Acriançamos-troumelhoriadadispneiaedossinaisdeinsufici-ênciacardíacapoistornou-seautónomaparacami-nharealimentar-se,porémmantevetaquicardia.Oseuestadomentalmanteve-senormal.

Exames auxiliares de diagnóstico

Osexamesdelaboratórioefectuadosnaadmis-sãosãoapresentadosnaTabela.Osresultadosmaisrelevantes foram a evidência de anemia severa,marcadaleucocitoseeplaquetopênia.

Resumo dos relatórios dos exames imagiológicosA ecografia abdominal realizada ao 30 dia após

o internamento mostrou: hepatomegaliadifusanor-moecogênicaenormoestrutural(lobocaudadode7,6 cm de comprimento); esplenomegalia difusanormoecogênica e normoestrutural (10,5 cm decomprimento); ausência de linfadenopatias intraabdominal;ausênciadederramepericárdioaocor-tecoronaldocoraçãonaabordagemsubxifoideia;ausênciadederramepleuralbilateralmente;avesí-culabiliar,pâncreas,rins,bexigasemalterações;osureteresecanaisbiliaresvirtuais;ausênciademas-sasnoretroperitoneu.

Radiografia do Tórax Antero PosteriorOparênquimapulmonardireitonãomostrava

alterações relevantes; notou-se uma cardiomegá-lia- índexcardio-toráxicode0.75,comoslimitesdasilhuetamaldefinidasàesquerda;visualizou-seopacidades peri-hilares arredondadas de limitesirregularese imprecisos.Asrestantesáreasdopa-rênquimapulmonaresquerdonãomostraramalte-

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 19

raçõesrelevantes.Atraqueiafoidefinidaporumatransparência em forma colunar na linha média,não mostrando alterações aparentes de posição emorfologia(Figura).

Esfregaço de sangue colhido por micropunção ca-pilar, ao 40 dia de internamento: O esfregaço de sangue foi corado com Giem-

saeasampliaçõesmenores(10xe40x)realçaramabundantes células ‘tipo linfócitos’. Na ampliaçãomaior(100x),apóspercorrervárioscampos,notou-se escassez de neutrófilos. Os glóbulos vermelhospredominantemente aparentavam normocitose ehipocromia. As células da linhagem de linfócitoseram abundantes, de dimensões variáveis e geral-mente maiores do que o normal, com citoplasmarelativamenteabundante,núcleosgrandesealgunsvacuolizados,oquesugeriutratar-sedelinfoblastos(80%),empercentagemmuitomaiorqueo limitemínimodaOrganizaçãoMundialdaSaúde(20%)edaFrench-American-British(30%)paradefiniçãode Leucemia Linfoblástica [1, 2]. Visualizaram-sealguns Linfócitos com morfologia madura (20%),istoé,denúcleoesferóide,hipercrómico,homogé-neonasua tonalidadevioleta,decontornosregu-lares,ocupandoatotalidadedocitoplasma.NãosevisualizouPlasmodium sp.

Várias imagensdamicroscopia foramsistema-ticamente gravadas, percorrendo-se cerca de 100campos microscópicos. As imagens foram envia-dasporcorreioelectrónicoparaodepartamentodeOncologia Pediátrica da Universidade de PádovaemItália,semdadosidentificadoresdopaciente.Orelatóriosobreoestudomorfológicodoesfregaçodesangueperiférico,feitoporumespecialista,indi-cou:“LeucemiaLinfoblásticaAguda(LLA)compa-tívelcomL1daFAB”.OrelatórioindicouaindaqueadiferenciaçãodaslinhagensLinfoidedaMieloidea um nível “padrão ouro” só podia ser efectuadapelademonstraçãodosantígenosCD3(LinhagemTdeLLA)ouCD19(LinhagemBdeLLA)porci-tometriadefluxo.

Diagnósticos estabelecidosPrimário/Subjacente:LLA-L1daFAB.Secundários e Sindrómicos: i) Anemia Grave

Normocítica Hipocrômica; ii) Trombocitopênia

severa; iii) InsuficiênciaCardíaca; iv)HemorragiaGastrointestinalTransitória.

Tratamento Efectuado e EvoluçãoManteve-seaantibioterapia,obalançodahidra-

tação,otratamentoantipiréticoefez-setransferên-ciadocasoparaoHospitaldereferência.

Discussão

Diagnóstico diferencialAevoluçãorelativamenteagudaeaausênciade

linfadenopatiasparaalémdaregiãohilar,cervical,retroesubmandibular,não foi favorávelaodiag-nósticodeleucemiascrónicas.Nafaixaetáriadestacriança,aLLAéamaiscomum.Ademais,amor-fologiadascélulassugeriumaiorprobabilidadedetratar-sedaLLA,emconcordânciacomopiniãodoespecialistadeumcentrolocalizadonumpaíscomlargaexperiênciaemestudosdedoençashematoló-gicas.Porém,reconhece-sealimitaçãonadiferen-ciaçãodaslinhagensLinfoidedaMieloidepoisistorequeroutrastécnicasavançadascomosejaacolo-raçãopormieloperoxidaseparaestudodamedulaósseaedoesfregaçodesangueperiféricoecitome-tria de fluxo. Assim, a possibilidade de LeucemiaMieloblásticanãopodeserexcluídadefinitivamen-te,masaprobabilidadedesê-loémuitobaixa.Aoníveldonossohospitalrural,estastécnicasavança-dasdecoloraçãonãopodiamserefectuadas.

Aexclusãodeumapossível septicemia (bacte-rianaoufúngica)foiimpossívelnocontextoapre-sentado. Há probabilidade que as duas entidadesnosológicaspudessematécoexistir.Afebrecontí-nuaerafavorávelàqualquerdasinfecções.Háain-daqueconsideraradiferenciaçãocom febre rela-cionadaalisetumoral.Aaltacontagemdeglóbulosbrancos(>100x103células/mm3)émuitofavorá-velàocorrênciadesíndromede lise tumoral,quequando confirmada, deve ser tratada como umaemergênciahematológica [2,3].Poroutro lado,acontagem manual de neutrófilos indicou neutro-pénia severa, o que propicia condição favorável àsepticemia, fungêmia ou mesmo alguma infecçãofocaldifícildeidentificar.Defacto,aseveridadedasinfecçõeséinversamenteproporcionalàcontagemdosneutrófilos.Aindisponibilidadedosexamesde

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funçãorenal,hepática,ionograma,culturasmicro-biológicas,impediratambémumavançodiagnósti-comaisfundamentado.SendoasinfecçõesacausamaiscomumdemortedepacientesemtratamentodeLLA[1-3],enocontextodeaimportanteneu-[1-3],enocontextodeaimportanteneu-,enocontextodeaimportanteneu-tropénia,fizemosodiagnósticodiferencialmaisfa-vorávelaoriscodesepticemiapeloqueacoberturaantibióticafoiiniciada.

A malária foi também uma hipótese conside-randoqueestaéendémicaecomtransmissãoes-távelemMoçambique,sendopredominantementecausadaporPlasmodium falciparum.Otesterápi-doantigênicoeapesquisamicroscópicaexcluíramestainfecção.

Aindanoquadrodepossíveisinfecçõeseapesardatumoraçãocervical,decidiu-sepelaexclusãodatuberculosedashipótesesdiagnósticas.Obviamen-tequeaexclusãodatuberculoseaumnível“padrãoouro”careceudebiopsiaganglionarecultura.Con-tudo,aapresentaçãomultiganglionarbilateraléin-comumparatuberculoseganglionarnospacientesseronegativosparaHIV.Alémdisso,oquadroima-giológico tóraco-abdominal não foi sugestivo delesõestípicasouatípicasdetuberculosepulmonar,abdominal,pneumonianemdederramepericárdi-co(ecografiaeraio-X).

Acardiomegaliafoicompatívelcomumadilata-çãosecundáriaàinsuficiênciacardíaca.Amelhoriado quadro dispneico após transfusão e o quadroradiológico em sí foram indicativos. Com a com-pensação da anemia, melhorou-se a insuficiênciacardiorespiratória,?adefactoautonomiadacrian-çaparadeslocar-seealimentar-seodemonstram,oqueadicionalmentefundamentaafavordecardio-megaliapordilatação.

Oestadodeconsciêncianormaleaausênciadequaisquersinaisneurológicospatológicos,tornarampoucoprovávelodiagnósticodeafecçãomeníngeapor células leucêmicas, infecção ou hemorragiaintracraniana, apesar de serem complicaçõespossíveisdeocorrer.Porémopacientetinhariscode a qualquer momento apresentar manifestaçõesrelacionadas.

Plano e conduta estabelecidasFoi feita compensação da disfunção resultan-

te da anemia severa e insuficiência cardíaca comtransfusão cuidadosa de concentrado de glóbulosvermelhos. Caso a hematoquezia persistisse, seriaindicadaatransfusãodeplaquetaseplasma.

Garantiu-seumbalançohidroelectrolíticoatra-vésdeinfusãoendovenosadesorofisiológiconumvolumecontroladonadosede50ml/kg/dia,evitan-do-seassimsoroscontendoK+.Aviaoralfoienco-rajadalogoqueacriançamelhorou,evitando-seso-brecargahídricaqueérelativamentefácildeocorrerpela via endovenosa. Fez-se cobertura antibióticadadoaoestadodeimunodepressãosecundáriaqueécomumnoscasosdeLLA.Preferiu-seaviaoralparaaantibioticoterapiaeoutrostratamentosparaseevitaremportasdeentradadeinfecções.Porém,peranteumquadrodefebrecontínua,eseahipóte-sedesíndromedelisetumoralfosseforteouentãoatendênciafossedeagravamentodopaciente,esta-riaindicadootratamentoendovenosoeassociaçãodeprednisolona(dosescrescentesde20-40-60mg/m2/dia) ou dexametasona, prescrição de flucona-zol para prevenir infecções fúngicas e aciclovir seaparecessem errupções herpéticas ou de varicela-zoster[2,3].Geralmentehátambémanecessidadedealupurinoledemercaptopurina(quenãoesta-vamdisponíveis)[2].AassociaçãodeanfoteracinaBlipossomalétambémtambémrecomendadaparatratarfungêmia[1-3].

O caso carecia de tratamento da patologia debase (LLA) que é geralmente feito em quatro ci-clos de quimioterapia, nomeadamente: indução,consolidação, manutenção e profilaxia de afecçãomeníngea.AfasedeInduçãohabitualmenteenvol-vefármacoscomovincristina,antraciclina,ciclos-fosfamida, L-asparginase, prednisolona, em regi-mes de 4 ou de 5 fármacos durante 4-6 semanas.Geralmentearemissãoéconseguidanestafaseem65-85%dospacientes,sendoarapidez indicadoradeprognóstico[3].Emboraaindahajaalgumacon-[3].Emboraaindahajaalgumacon-.Emboraaindahajaalgumacon-trovérsiaemrelaçãoàsobrevivênciadospacientesesobrearemissãoprolongadaentreostratadosso-mentecomumafase,otratamentodeconsolidaçãotem mostrado benefícios, usando-se citosina ara-binósido em combinação com antaciclina ou epi-podofilotoxina [2,3].Aeficáciado tratamentode

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manutençãoéaindamaisdebatidaeobjectodees-tudosempesquisasclínicascontroladas,porém,vá-riosestudoscontroladosdefase2semtratamentodemanutençãotêmmostradoresultadosinferioresem relação aos constróis históricos [2]. Diferindoda Leucemia Mieloblástica Aguda, a Linfoblásticafrequentemente cursa com afecção meníngea, so-bretudonomomentoderecrudescência,portanto,aquimioterapiaintratecaléessencial[2,3].

Dada à falta de condições no nosso Hospitalrural para um tratamento adequado da LLA, pla-nificou-se a transferência do caso, já estabilizado,paraHospitalCentraldeMaputo,comobjectivodeoferecer-semelhorabordagemporhematologista/oncologista,visando:i)biopsiaganglionar;ii)exa-me histopatologico da medula óssea; iii) estudosserológicos para Vírus Epstein-Barr, HTLV, CMV,Vírus B19; iv) estudos imunofenotípicos (Linfo-blasticaBouT?)-poisosrespectivosprognósticoselinhasterapêuticasmaisaconselháveispodemserdiferentesev)iniciodequimioterapiadaLLA.

O contexto de medicina rural em MoçambiqueNapráticaclínicanaszonasruraisdeMoçam-

biquesuspeitardeleucemiapodeserrelativamentefácil se as contagens de linfócitos forem extrema-mentealtas.Contudo,mesmoconsiderandoqueadisponibilidadedeaparelhosdehemogramaécres-cente,aindaépoucoprovávelquesealcanceodiag-nósticonosológicodefinitivofacilmenteedeformarápida,comonocasoaquiapresentado.Agrandemaioriadopessoaldesaúdecolocadoaonívelruralnão temexperiênciaparaumestudomorfológicofiáveldascélulaspatológicassanguíneasoudeumaspiradomedular.

É um facto que principais doenças na rotinado internamento pediátrico no Hospital Rural deChókwe são as infecções respiratórias (broncop-neumonia/pneumonia),amaláriacomplicada,malnutrição,SIDAesuascomplicações.Grandepartedoinvestimentodiagnósticoecurativoenfocataisdoenças.Diferentemente,nocasodedoençastidascomo“nãorotineiras”,asdeforoespecializado,talcomooéaLLAaquidiscutida,atendênciaactualédediagnósticostardios.Alémdisso,paraoscasos“nãorotineiros”quaseinvariavelmenteconsulta-se

antes um “médico tradicional”, causando atrasosnaadmissãoaohospital.Asescarificaçõessobreoslinfonodosdacriançasugeriamtalconsultaàme-dicinatradicional.

Aexperiênciadetrabalhoaquiapresentadaen-fatizaque,mesmocomosescassosrecursos,épos-sível melhorar a assistência a casos complexos. Apartilha electrónica de imagens sistematicamentecaptadascomoocorreunestecaso,épotencialmenteextensívelaexamesafrescoecoradosparamicoses,examescitológicosdelíquidosdeterceirosespaços,achados bacteriológicos e parasitológicos duvido-sos, imagensdinâmicasdeecografia, traçadospa-tológicosdeelectrocardiogramas, imagensderaioX, etc... o que ajudaria nas decisões e aumentariaa qualidade assistencial em locais remotos. Outrobenefíciodatelemedicinaéaobtençãodeorienta-çãosobreasatitudesatomarparaestabilizaçãodoquadroclínicoemelhoriadadescompensaçãodopaciente,garantindoadequadatransferênciadopa-cienteparacentrosespecializadosdistantes.

Nocasoqueaquireportamos,enquantoopro-cesso de estabilização decorreu, não houve ne-nhumatrasonosestudosdediagnósticoconcretorecorrendo-seà telemedicina.Oprognósticoparao caso era reservado, considerando o quadro clí-nico à admissão, a considerável distância entre acasadopacienteeoHospitalCentraldeMaputo,ascondiçõessociaiscomunsnaszonasruraisemMo-çambique,factosquepodemcondicionartodasasfasesrequeridasparao tratamentocompleto.Nãorecebemosaretroinformaçãodaevoluçãodocasoapóstransferência.Opotencialdatelemedicinanapediatriatemsidodiscutido[4-6].Ainteracçãoen-[4-6].Ainteracçãoen-.Ainteracçãoen-treespecialistasdistantesepessoalmédiconaszo-nas rurais,quehoje sãoamplamente servidasportecnologia electrónica, deve ser explorada comoummecanismopotencialparaapoionomanejodecasos complexos pelos profissionais de saúde daszonasrurais.

Referências1. Langmore M, Wilkinson IB, Rajagopalau S, editors.

Oxford Book of Clinical Medicine. 6th ed. New York:OxfordUniversityPress;2004.

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2. Seiter K. Acute Lymphoblastic Leukemia. http://emedicinemedscapecom/article/207631-overviewacessed03/02/2009[serialontheInternet].2009:Availablefrom: http://emedicine.medscape.com/article/207631-overview.

3. Richard E. Behrman, Robert M Kliengman, JensonHB, editors. Nelson Text Book of Pediatrics. 17 ed.Philadelphia,TheUSA;2003.

4. Brandling-Bennett HA, Kedar I, Pallin DJ, Jacques G,

GumleyHJ,KvedarJC.DeliveringHealthCare inRuralCambodia via Store-and-Forward Telemedicine: A PilotStudy.Telemedicineande-Health.2005;11(1):56-62.

5. WoottonR.RecentAdvanceTelemedicine.BMJ[serialontheInternet].2001;323:Availablefrom:http://www.bmj.com/cgi/content/extract/323/7312/557.

6. Wootton R. Telemedicine and developing countries-successfulimplementationwillrequireasharedapproach.JournalofTelemedicineandTelecare.2001;7(1):1-6.

Hemograma Valor

Contagem Manual de Células no Esfregaço Sanguíneo

GB (x103/mm3) 120 -

Ly % 84 98

Ne % - 2

Eo % - 0

Ba % - 0

GV (x106/mm3) 1,5 -

VCM (fl) 93 -

HGB (g/dl) 4,7 -

HTC % 15,9 -

CMCH (pg) 27,6 -

PLT (x103/mm3) 11 -

Pesquisa Microscópica de Plasmodio sp

Não se detectou

Teste Rápido para P.falciparum

Não Reactivo

Teste Rápido de HIV (Determine®)

Não Reactivo

Bioquímica Plasmática

Não Disponível

 

Tabela:ResultadosdeExamesLaboratoriaisnaAdmissãodoPacienteaoHospital

GB-Glóbulosbrancos;Ly-linfócitos;Eo–Eosinofilos;Ba-Basofilos;Ne-Neutrofilos;GV-Glóbulosvermelhos;HGB-Hemoglobina;HTC-Hematócrito;VCM-VolumeCorpuscularMédio;CMCH-ConcentraçãoMédiadeHemoglobina;PLT-Plaquetas

Figura:Radiografiadotóraxpóstero-anterior,mostrandocardiomegália

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Assimetrias na Pesquisa em Saúde, Publicada na Revista Médica de Moçambique

Júnior A, Nhancale J, Fumo F, Brás J, José A, Mbofana F, Mocumbi A AutorparaCorrespondência:AntónioJúnior-InstitutoNacionaldeSaúde

MinistériodaSaúde,Av.EduardoMondlane/SalvadorAllendeCaixaPostal264,Maputo–Moçambique

[email protected]

ResumoIntrodução:ARevistaMédicadeMoçambique(RMM)foiapublicaçãocientíficaoficialdoInstitutoNacionaldeSaúdedeMoçambiqueentre1982e2010.FoirealizadoumestudodescritivoretrospectivodosartigospublicadosnaRMMcomoobjectivodeanalisarastendênciasdepublicaçãoemsaúdeemMoçambique.Metodologia:ParacadanúmerodaRMMpublicadoforamcolhidosdadossobreadatadeedição,otipodeartigo,olocalemquedecorreuapesquisa,afiliaçãodoprimeiroautor,osassuntosabordadosporartigoeaformadefinanciamento.Foramdefinidostrêsperíodos:I(1982-1988),II(1993-1999)eIII(2003-2010),tendoemcontaasinterrupçõeshavidasnaediçãodarevista.Resultados:ARMMpublicou28númerosdosquais3nãoforamconsideradosparaanáliseporseremsuplementoscontendoapenasresumosdecomunicaçõesapresentadasemJornadasNacionaisdeSaúde.Os25númerosanalisadoscontinham177artigos,dosquais143(80,7%)eramdepesquisaoriginal.AmaiorpartedostrabalhospublicadosforamrealizadosnaProvínciadeMaputo:21artigosnoperíodoI,50noperíodoIIe12noperíodoIII.OsprimeirosautoresdosartigospublicadosnaRMMerampesquisadoresdoMinistériodaSaúdeedoInstitutoNacionaldeSaúde,tambémlocalizadosemMaputo,tendopublicado51e50artigos,respectivamente.OsautoresconcluemqueseregistouumpredomíniodepesquisasrealizadasemMaputo,porautoresprovenientesdeinstituiçõeslocalizadastambémnestaProvíncia.Ostemasmaisabordadosforamasdoençasparasitáriaseasaúdematerno-infantil.ARMMfoieditadacomfrequênciairregular,tendoopicodeproduçãoocorridonoperíodoII.Demodoagarantirregularidadenaediçãoequalidadecientíficaosautoresrecomendamacriaçãodemecanismosdeauto-sustentabilidadedarevista.

Palavras-Chave: RevistaMédicadeMoçambique;PesquisaemSaúdeAbstractTheMozambicanMedicalJournal(MMJ)wastheofficialpublicationoftheNationalHealthInstitutebetween1982and2010.Weperformedaretrospectivestudytoevaluatethetrendsofhealthresearchpublicationbythisjournal.Foreachpublishedjournalwecollectedinformationonthedateofedition,typeofarticlesincluded,siteofresearchdescribed,affiliationofthefirstauthor,subjectofresearchandhowtheeditionwasfunded.Threeperiodsweredefinedtakingintoaccountinterruptionsthatoccurredinthepublicationofthejournal:periodI(1982-1988),II(1993-1999)eIII(2003-2010).TheMozambicanMedical Journalpublished28editions;of these,3werenot considered foranalysis as theyweresupplementscontainingonlyabstractsofcommunicationspresentedattheNationalHealthCongress.The25editionsconsidered for analysis had 177 articles of which 143 (80.7%) presented the results of original research. MaputoProvincehadthegreaternumberofarticlespublished:21duringPeriodI,50duringPeriodIIand12inthelastPeriod.FirstauthorsfromtheNationalHealthInstituteandtheMinistryofHealth,bothlocatedinMaputo,wereinfirstandsecondplace,publishingrespectively51and50articles.It is concluded that there was asymmetry of the work published at the Mozambican Medical Journal, regardingauthorshipandplaceimplementationofresearch.ThevastmajorityofstudieswereperformedinMaputoProvince.Mostpublishedarticlesweretheresultofstudiesonparasiticdiseasesandmaternalandchildhealth.TheeditionsoftheJournalwereirregular;thepeakofpublicationswasduringPeriodII.Thereisneedtofindmechanismstoachieveregularityofeditionsandsustainabilityofthisscientificjournal.

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Introdução

A Revista Médica de Moçambique (RMM) foicriadaem1982comafinalidadedepublicarpro-duçõestécnico-científicasnaáreadasaúdeemMo-çambique.Estarevistatinhaporobjectivoprincipalpublicarartigosinéditossobrepesquisasrealizadasem Moçambique, de modo a contribuir para ummaior conhecimento e desenvolvimento da saúdenestepaís.1

ARMMfoiaúnicapublicaçãocientíficanaáreada saúde em Moçambique no período pós-inde-pendência, tendo a sua edição sido interrompidaem2010.AsuaproduçãoeradaresponsabilidadedoInstitutoNacionaldeSaúde(INS)emcumpri-mento dum mandato do Ministério da Saúde naárea de disseminação de resultados de pesquisasrealizadas no País. O presente estudo teve comoobjectivoanalisaras tendênciasdepesquisaepu-blicaçãocientíficanaáreadasaúdeemMoçambi-queatravésdosartigospublicadosnaRMMentreosanos1982e2010.

Metodologia

Foi realizado um estudo descritivo retrospec-tivodosartigospublicadosnaRMMentre1982e2010.Foramconsideradosparaoestudo todososnúmerosdaRMMpublicadosexistentesnaBiblio-tecaNacionaldeSaúdeenoArquivoHistóricodeMoçambique.Osnúmerosinexistentesnestesrepo-sitóriosforamsolicitadosaarquivosparticularesdeprofissionaisdesaúde.

ParacadanúmeroeditadodaRMMforamco-lhidos os seguintes dados: data de edição, tipo deartigos(original,revisãodeliteratura,revisãosiste-mática),ProvínciasdeMoçambiqueemquedecor-reu a pesquisa (considerando a divisão territorialseguinteporprovíncias:Maputo,Gaza,Inhambane,Manica,Sofala,Tete,Zambézia,Nampula,Niassa,Cabo Delgado), afiliação do primeiro autor, áreastemáticaseformadefinanciamento.

As instituições de origem dos autores foramclassificadasdaseguinteforma:MinistériodaSaú-de (Direcções Nacionais ou Departamentos doMinistériodaSaúde),InstitutoNacionaldeSaúde(INS),UniversidadeEduardoMondlane-Faculda-

dedeMedicina,HospitalCentraldeMaputo,Hos-pitalCentraldeNampula,DirecçõesProvinciaisdeSaúdeeoutrasinstituições.Osartigosforamtam-bém classificados de acordo com a área temática,tendoostemassidodivididoscomoseindicaase-guir: saúde materno-infantil, doenças infecciosase transmissíveis, doenças crónicas, determinantessociais, cirurgia, estudos laboratoriais e recursoshumanos. As doenças infecto-contagiosas foramsubdivididas em doenças parasitárias (incluindomalária), Vírus de Imunodeficiência Adquirida(HIV),Tuberculose,Lepra.

Como forma de facilitar a análise e tendo emcontaas interrupçõesdarevistaao longodotem-po,foramidentificadostrêsperíodosdeexistênciada RMM: I (1982 a 1988); II (1993 a 1999); e III(2003 a 2010). Os dados colhidos foram introdu-zidosnumabasededadosutilizandoopacotees-tatísticoEpiinfoversão5.ParaaanáliseestatísticaosdadosforamexportadosparaopacoteestatísticoSPSSversão20.Osdadossãoapresentadosemfre-quênciasrelativaseabsolutas.

Resultados

Noperíodoentre1982e2010forampublicados28 números da RMM, Dos 28 números editados.Destestrês(10,7%)nãoforamconsideradosparaaanáliseumavezquecontinhamapenasresumosdeJornadasNacionaisdeSaúde.Assim, foramanali-sados25números,umdosquaiscorrespondendoaumnúmerotemático,quecontinhamnototal177manuscritos.

Tipo de artigos: Nostrêsperíodosemanálisefo-rampublicados143artigosoriginais(80,7%)e28artigos de revisão (15,9%). Os restantes 6 (3.4%)eram comunicações. Os dados referentes a distri-buiçãodosartigospelostrêsperíodosconsideradossão apresentados na Figura 1. O período II tevemaiordiversificaçãodotipodeartigospublicados,tendo ainda registado o maior número de artigosoriginais.Dos28artigosderevisão,8eramrevisõessistemáticas;noperíodoIIInão foipublicadone-nhumartigoderevisãosistemática.

Áreas de pesquisa:NoperíodoIforampublica-dos 58 artigos, dos quais dois artigos em ciências

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biomédicasbásicas(3,5%),20artigoscomresulta-dosdepesquisaclínica(correspondentesa34,5%),31 artigos sobre temas de saúde pública (53,4%).Cincoartigos(8,6%)entraramnaclassificação“ou-tros”. No período II a revista publicou 83 artigos,teve47artigosdepesquisaclínica(correspondentesa56,6%)e32artigosdesaúdepública(38,6%);dos4artigosrestantes,3eramcomunicaçõesbrevese1,umestudodeciênciasbásicas.OperíodoIII,noqualforampublicados36artigos,12(33,3%)eramartigosresultantesdepesquisasclínicas,12depes-quisa em saúde pública, 10 sobre recursos huma-nos(equivalentesa27,8%),umdepesquisabásica(2,8%)eumacomunicaçãocurta.

Local de pesquisa: NoperíodoIforampublicadosartigosreferentesapesquisasrealizadasemtodasasProvínciasdeMoçambique,exceptuandoadaZam-bézia. No período II não foi publicado na revistaqualquer artigo reportando estudos nas provínciasdeCaboDelgadoeInhambane,enquantonoperío-doIIIapenas5provínciastiveramartigospublicados(Sofala,Tete,CaboDelgado,NampulaeMaputo).

AProvínciadeMaputofoiolocalondedecor-reu maior parte dos estudos cujos artigos forampublicados na revista - 83 (46,9%). Estes artigosestavam distribuídos da seguinte forma: 21 noperíodoI,50noperíodoIIe12noperíodoIII.Porordemdecrescente,asoutrasProvínciascommaiorrepresentaçãoemtermosdeartigospublicadosfo-ramNampula(10),Sofala(6),Tete(6)eManica(5)(Figura 3).

Quarenta e sete artigos publicados foramdesignados “outras pesquisas nacionais”, porquenão faziam menção ao local de pesquisa, erampesquisasrealizadasemtodoopaísouenglobandovárias províncias, ou eram estudos sobre testesde diagnóstico. Finalmente, 8 artigos relatavamresultados de pesquisa realizada fora do país eforamclassificadoscom“outros paises”.

Afiliação dos autores: Pesquisadores doMinistério da Saúde e do Instituto Nacional deSaúde foram os primeiros autores de 51 (28,8%)e 50 (28,3%) artigos, respectivamente. Seguiram-seautoresdoHospitalCentraldeMaputocom22(12.4%) artigos e da Faculdade de Medicina daUniversidadeEduardoMondlanecom21(11.9%).

Adistribuiçãodosprimeirosautoresporinstitui-çãonos trêsperíodos foiaseguinte: (1)MinistériodaSaúde18artigosnoperíodoI,19noperíodoIIe14noperíodoIII;(2)InstitutoNacionaldeSaúde18,24e8artigosnosperíodosI,IIeIII,respectivamen-te;ospesquisadoresdoHospitalCentraldeMaputoforamosprimeirosautoresde9artigosnoperíodoI, 12 no período II e 1 no período III. A Faculda-dedeMedicinadaUniversidadeEduardoMondla-neocupouaquartaposiçãoemnúmerodeautores,com3artigosnoperíodoIe9artigosemcadaumdosperíodosseguintes.Seguiram-seporordemde-crescenteautoresdaDirecçãoProvincialdeSaúdedeMaputo(com4artigos)edaDirecçãoProvincialdeSaúdedeNampula(com2artigos).Vinteenovear-tigostiveramcomoprimeiroautorpesquisadoresdehospitaisdistritais eprovinciais (designados“outrasnacionais”) e instituições e Organizações Não Go-vernamentaisInternacionais(designados“outrasin-ternacionais”).Osdadosreferentesaestadistribui-çãosãoapresentadosnaFigura 4.

Áreas temáticas: O temas mais abordados nosartigos publicados foram os de doenças parasitá-rias,com51(28.8%)artigosdosquais22sãosobremalária.Seguiu-seasaúdematerno-infantilcom29(16.4%)artigos.Dozeartigosdescreveramresulta-dosdeestudosnaáreasocial.

No primeiro período os assuntos mais abor-dados nos artigos foram doenças parasitárias (20artigos; 34.5%), saúdematerno-infantil (9 artigos;15,5%), doenças crónicas (7 artigos; 12,1%) e ci-rurgia (5 artigos; 8,6%). No segundo período adistribuiçãoporassuntofoisimilar,nomeadamen-te doenças parasitárias (27 artigos; 32.5%), saúdematerno infantil (13; 15,7%), doenças infecciosas(9artigos;10,8%),determinantessociais(7artigos;8,4%)eHIV/SIDA(6artigos;7,2%).Noúltimope-ríodo foram publicados 10 artigos sobre recursoshumanos(27,8%),seguindo-seartigossobresaúdematerno-infantil(8;22,2%)edoençascrónicas(4;11,1%)(Figura 5).

Periodicidade da revista: O período II teve omaiornúmerodeediçõesdaRMM-14números,equivalentesa50.0%dototal.Noanode1994fo-ram produzidos quatro números do volume 5 daRMM, seguindo a periodicidade trimestral indi-

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cadanapolíticaeditorial.OperíodoIIIregistouomenornúmerodeedições,tendosidopublicados5números(Tabela 1).

Suplementos: AolongodasuaexistênciaaRMMproduziu3suplementos.Ossuplementosde1994e1997consistiramemlivrosderesumosdecomuni-caçõesapresentadasnasIXeXJornadasNacionaisde Saúde, organizadas pelo Instituto Nacional deSaúde em parceria com a Faculdade de MedicinadaUniversidadeEduardoMondlane.Osuplementode2010foiumacolectâneadeartigossobrerecur-soshumanos,tendosidoconsideradoumnúmerotemáticonaanálisedosdados.

Financiamento: AsediçõesdaRMMduranteoperíodo I não identificavam na ficha técnica o fi-nanciador ou patrocinador da mesma. A revistafoifinanciadapelaOrganizaçãoMundialdaSaúde(OMS)duranteoperíodoII.NoperíodoIII,junta-ram-seàOMS,oCentrodeMaláriaeDoençasTro-picais;o InstitutodeHigieneeMedicinaTropicaldePortugal;aUniversidadeNovadeLisboa;aFun-daçãoparaCiênciaeTecnologiadoMinistériodaCiência,TecnologiaeEnsinoSuperiordePortugal;eoInstitutodeMedicinaTropicaldeAntuérpia.

Discussão

OperíodoIIfoioqueapresentouomaiornú-mero de edições da RMM. Neste período forampublicados quase metade dos artigos (83; 48,5%),foram abordados vários assuntos e houve maiordiversidadenotipodeartigos.Contudo,estefoioperíodoemqueapercentagemdeartigosoriginaisfoiamenor.

Ao longo dos 28 anos de existência a revistasofreu duas longas interrupções: a primeira entre1989e1992,easegundanoperíodoentre2000e2002.Aperiodicidadetrimestralindicadanapolí-ticaeditorialfoiconseguidaapenasporumano,em1994.NosanosrestantesapublicaçãodaRMMfoiirregularouinexistente,oqueexplicaonúmerore-duzidodeediçõesemrelaçãoaonúmerodeanosdeexistênciadarevista.Associadaàirregularidadedeediçãohouvenumeraçãoinadequadadosvolumesem alguns anos (Tabela 1). Pelo facto de o nossoestudo ser descritivo retrospectivo, não é possível

especular sobre os motivos da irregularidade depublicação.Elapoderáestar ligadaquerafaltadesubmissãodecontribuiçõesquerainsuficiênciadefinanciamento.

Verificou-seumatendênciaparamaiornúmerodeartigosdepesquisadorestrabalhandoeminsti-tuições localizadas na Provínica de Maputo. EstadistribuiçãoassimétricadosartigosemrelaçãoaolocaldeorigemdeestudospodeserexplicadapelagestãocentralizadadoEstadonoperíododeexis-tênciadarevistaeàlocalizaçãodemaiornúmerodepesquisadores e trabalhadores especializados nasinstituiçõescentraislocalizadasnacapitaldoPaís.2Poroutrolado,durantegrandepartedaexistênciadaRMMlocalizava-senaCidadedeMaputoaúni-cainstituiçãocomcursosuperiorparaprofissionaisdaáreadesaúdenoPaís,aFaculdadedeMedicinadaUniversidadeEduardoMondlane.

Algunsdadosdonossoestudosãopreocupan-tespoismostrammuitofracapublicaçãoemcertaszonasdoPaís.Entre1982e1988nãoforampubli-cadosestudosrealizadosnaProvínciadaZambézia,asegundamaispopulosadopaís.3Deigualmodo,noperíodoseguintenãohouvepublicaçãodearti-gosrelativosàpesquisarealizadanasProvinciasdeInhambaneeCaboDelgado.Estecenárioagravou-se no último período, registando-se um númeromaiordeprovínciassemqualquertrabalhopubli-cado:Inhambane,Zambézia,SofalaeNiassa.Umaexplicação para esta situação pode ser a falta deprofissionaiscomcapacidadeparaelaboraçãoeim-plementaçãodeprotocolosdepesquisa,bemcomodepesquisadorescomconhecimentoeexperiênciadeescritadeartigoscientíficosnestasregiões.Éso-bejamenteconhecidaagrandeescassezderecursoshumanosnaáreadesaúdee/oucomexperiênciaempesquisacientíficaemalgumasdessasprovíncias4.

OsdoisúltimosperíodosdeexistênciadaRMMforam caracterizados pela publicação de 3 suple-mentos(Tabela 1),queconsistiramemcolectâne-asderesumosapresentadosnasJornadasdeSaúde(suplemento1de1994,suplemento2de1994esu-plemento1de1997).5,6,7NoúltimoanodaRMM(2010)onúmerotemáticosobrerecursoshumanosconstituiuaúnicaediçãoanual.Apesardetersido

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 27

designada“suplemento”,estaediçãocorrespondeuaumnúmerotemáticosobrepesquisarealizadanoPaísparasubsidiaroPlanoNacionaldeDesenvol-vimentodeRecursosHumanos,comovemreferen-ciadonoseueditorial.8

Oimpactodafaltadepriorizaçãodaeducaçãodecientistasnaáreadesaúdeempaísesemdesen-volvimento,easconsequênciasdafugadecérebrosparapaísesdeelevadarenda,temsidodescritopordiversosautores.9Afracaproduçãocientíficaregis-tadanosprimeirosanosdacriaçãodarevistapodeestarassociadaàconjunturasocial,políticaeeco-nómica do País, caracterizada por uma “fuga” deprofissionaisdosectordasaúdeapósaIndependên-ciaNacionaleduranteaguerracivilqueperdurou16anos, terminandoem1992.PodemigualmentetercontribuídoparaafaltadesucessodaRMMosproblemas de ordem económica associados a estafasedoPaís,eàsmudançasnacomposiçãodoseucorpoeditorial.

OaumentodepublicaçõesnoperíodoIIpodeser reflexo da estabilidade político-social atingidacomoAcordoGeraldePazem1992,comoérefe-ridonoeditorialdaRMM,vol4,nº3.10Nesteedito-rialélançadoumapeloaosprofissionaisdosectordasaúde,principalmenteaoscolocadosnaszonasperiféricas,paraquerealizempesquisatendocomofinalidade impulsionarodesenvolvimentodosec-tor.Todavia,osdadosobtidosdaanálisedoperío-dosubsequentecorrespondemàfasededeclíniodarevista,caracterizadoporumareduçãononúmerode artigos publicados, periodicidade irregular deediçãodarevista,edecréscimodonúmerodepro-vínciascomartigoscientíficospublicados.

ARMMteveumpredomíniodepublicaçãodepesquisaclínicaedesaúdepúblicanostrêsperíodosemestudo, tendocomoáreas temáticasprincipaisas doenças parasitárias e saúde materno-infantil.Tal predomínio coincidiu com a política editorialdarevistaecomapolíticadeextensãodosCuida-dosdeSaúdePrimáriosassumidapeloMinistériodaSaúde,naqualtantoosprogramasdecontrolodegrandesendemiascomoosde saúdematerno-infantil eram os mais robustos. Na verdade, parteconsiderável dos esforços do Sistema Nacional de

Saúde era direccionada à prevenção das doençastransmissíveisacimareferidas,11cabendoaoInsti-tutoNacionaldeSaúde,atravésdasuapublicaçãocientífica,veicularpartedessesesforços.

Apublicaçãodeartigosdecaráctersocialeaná-liseeconómicanaáreadesaúdefoimuitoreduzida,oquenãocorrespondeaopadrãoaqueseassisteem várias partes do mundo. Com efeito, conside-ra-se hoje pertinente a pesquisa social na área dasaúde,dadaaimportânciadefactoresculturais,so-ciais,económicosepolíticosnosdeterminantesdesaúde.12Namaiorpartedospaísesassiste-seaumaprogressivatransiçãodomodelobiomédicoparaomodelosocialde saúde,coerentecomadefiniçãodesaúdepelaOrganizaçãoMundialdeSaúde.13

O nosso estudo não aprofundou as causas dasinterrupçõesnaediçãodarevista.Contudo,amu-dança de financiador indicada nas fichas técnicasdaRMMsugerequeestaspossamterestadoligadasa factoreseconómicos.Apesarda formadefinan-ciamentodarevistapoderinfluenciarconsideravel-menteasuapolíticaeditorial,talfactonãoressaltadaanálisedescritivapornósrealizada.Nãoforamencontradas grandes diferenças no tipo de temasabordadosaolongodostrêsperíodosdeexistênciada revista. Contudo, considerando que Moçambi-que é um país com fracos recursos existe o riscode revistas científicas para divulgação de resulta-dosdepesquisaemsaúdepoderemtornar-seumacolecção de publicações do interesse de agênciasfinanciadoras, sem qualquer ligação às priorida-dessanitáriasnoPaís.Porisso,mesmoseaRMMconseguiu manter coerência entre as prioridadesnacionais de saúde e os temas publicados, é im-portantegarantiraindependênciaeditorialatravésdeauto-sustentabilidadefinanceiraalongotermo.Destemodo,poder-se-áassegurarregularidadedeedição,isençãoeabrangênciadarevista.

Conclusões

A RMM publicou maioritariamente artigosde pesquisa original, descrevendo resultados depesquisa realizada sobretudo na Provincia deMaputo.Amaiorpartedosprimeirosautoresdos

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artigos publicados eram oriundos de instituiçõesdereferênciaouorganismoscentraislocalizadosnaCidadedeMaputo:MinistériodaSaúde, InstitutoNacional de Saúde, Faculdade de Medicina daUniversidade Eduardo Mondlane e HospitalCentraldeMaputo.

OperíododemaiorvitalidadedaRMMfoien-tre1993e1999,alturaemqueaperiodicidadedasediçõesaproximou-semaisdoestipuladonapolíti-caeditorialeregistou--semaiordiversidadeenú-merodeartigospublicados.Verificou-seumaten-dênciaparamaiorpublicaçãodepesquisaclínicaeemsaúdepúblicaversandoasdoençasparasitáriasendémicaseasaúdematerno-infantil.

Os autores sugerem formas de recuperação decustosdeproduçãodarevistacentíficadoInstitutoNacionaldeSaúdeeacçõesparapromoverapubli-caçãodetrabalhosdepesquisarealizadaemtodasaszonasdoPaísdemodoagarantirarepresentati-vidadeeasustentabilidadedestapublicação.

Referências1. NormasdePublicação.Revista Médica de Moçambique.

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6. Revista Médica de Moçambique.1994;5(Suplemento2).7. Revista Médica de Moçambique.1997;7(Suplemento1).8. Sidat M, Fernandes B, Mussa A, Ferrinho P. Recursos

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13. Gil AC, Licht RH; Santos BR. Por que fazer pesquisa qualitativa em saúde? Caderno de Pesquisa em Ciências da Saúde.2006;1(2).

Figura 1: Tipo de manuscritos publicados da Revista Médica de Moçambique distribuídos pelos três períodos,mostrandoclaropredomíniodeproduçãonosegundoperíodosobretudodeartigosresultantesdepesquisaoriginal.

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Figura 2: Distribuição de manuscritos por período e tipo de pesquisa, mostrando que a maior parte dos artigospublicadosforamdaáreaclínicaeduranteosegundoperíododarevista.

Figura 3: Distribuição do local de trabalho dos primeiros autores dos manuscritos publicados, mostrando maiornúmerodeartigosdaProvínciadeMaputo.

Figura 4: Instituiçõescujosautorescontribuiramcomoprimeirosautoresnosmanuscritospublicadosnostrêspe-ríodos.Denotarqueumgrandenúmerodeautoresveiodequatroinstituições:InstitutoNacionaldeSaúde(INS),MinistériodaSaúde(MISAU),HospitalCentraldeMaputo(HCM)eFaculdadedeMedicinadaUniversidadeEduradoMondlane(UEMMEDICINA).

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Figura 5: DistribuiçãodostemasabordadosnosmanuscritospublicadosnostrêsperíodosdeexistênciadaRevistaMédica,mostrandopredomíniodeartigossobredoençasparasitárias,SaúdeMaternoInfantileMalária.

 

Anos     volume   Números   Suplemento  

1982 1 1; 2

1983 1 3

1984 2 1

1987 3 1; 2; 3

1988 4 1

1993 4 2; 3; 4

1994 5 1; 2; 3; 4 1; 2

1995 6 1-2; 3-4

1996 7 1

1997 7

1

1999 7 4

2003 8 2

2006 9 1

2008 9 2

2009 10 1

2010 10

1

Tabela 1:VolumesenúmerosregistadosdaRevistaMédicadeMoçambique.Note-seairregularidadenasedições,bemcomoafaltadeconcordânciaentreovolumeeoano.

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 31

Hipereosinofilia na População Escolar dum Distrito Endémico para Fibrose

Endomiocárdica no Sul de Moçambique

Ana Olga Mocumbi1,2, Tiago José3, Yolanda Cachomba3, Patrícia Silva4 1InstitutoNacionaldeSaúde,2InstitutodoCoração,3CentrodeSaúdedeInharrime,4HospitalCentraldeMaputo

AutorparaCorrespondência:AnaOlgaMocumbiMDPhD-UniversidadeEduardoMondlaneHospitalCentraldeMaputo,DepartamentodeMedicina

Email:[email protected]

ResumoAhipereosinofiliaéconsideradaumfactoretiológiconapatogénesedafibroseendomiocárdica,umacardiomiopatiadecausadesconhecidacomelevadaprevalênciaemInharrime.Comopartedumestudodeestabelecimentodeumacoorteparaestudodeincidênciadefibroseendomiocárdicanessedistrito,fez-seumaamostraaleatóriadapopulaçãoescolardeInharrimeobtidapormétododeconglomeradoadoisníveis.Umaemcada5criançasavaliadasporecografiafoisujeitaàcolheitadesanguepararealizaçãodeleucogramacomcontagemdeeosinófilos.Contagensdeeosinófilosiguaisousuperioresa1.5x109/Lforamconsideradashipereosinofiliasevera.Duzentas e noventa e seis crianças foram avaliadas ecocardiograficamente. Destas, 71 foram submetidas a examessanguíneos.Sessentaecincotinhamecografiacardíacanormale6apresentavamsinaisecocardiográficosdefibroseendomiocárdica.Acontagemmédiadeeosinófilosfoide1.2X109/L(±0.9).Apercentagemmédiadeeosinófilosfoide14.5%(±9.0;range0-44).Apercentagemmédiadeeosinófilosdesgranuladosfoi15.8%(±14.3;variandode0a52), enquantoamédiadapercentagemdeeosinófilosvacuolizados foide7.8%(range0-45).Nãohouvediferençasignificativa na presença de hipereosinofilia severa entre raparigas e rapazes. Os níveis de eosinófilos circulantesnas6criançascomfibroseendomiocárdicaa1.5x109/L(±0.9)nãoforamdiferentesdosencontradosemcriançassem miocardiopatia da mesma população a 1.1x 109/L(± 0.8); p=0.54. Não houve diferença significativa de idade(p=0.69),dacontagemdeleucócitos(p=0.99)oudecontagemdeeosinofilos(p=0.54)entreparticipantescomesemmiocardiopatia.Emresumo,a frequênciadehipereosinofilia severanapopulaçãoescolardistritode Inharrimeéelevada tantoemcrianças sem cardiomiopatia como naquelas com sinais ecocardiográficos de fibrose endomiocárdica, indicando anecessidadedeseinvestigarassuascausasnestapopulaçãoinfantil.

Palavras-Chave: Hipereosinofilia,Estudocomunitário,FibroseEndomiocárdicaAbstractHypereosinofiliaisconsideredanetiologicfactorinthepathogenesisofendomyocardialfibrosis,acardiomyopathyofunknownoriginhighlyprevalentinInharrime.Aspartofestablishmentofacohortfordeterminationofincidenceofendomyocardialfibrosisarandomizedsampleofprimaryschoolstudentswasobtainedthroughclusteringattwolevels.Everyfifthchildsubmittedtotransthoracicechocardiographyhadperipheralbloodtakenforleukogramandeosinophilcount.Hypereosinophiliagreaterthan1.5x109/Lwasconsideredsevere.Two hundred ninety-six children were studied by echocardiography. Of these 71 had blood taken for exams: 65hadnormalheartand6hadechocardiographicsignsofendomyocardialfibrosis.Themeaneosinophilcountinthispopulation was 1.2X109/L (± 0.9). The mean percentage of eosinophils was 14.5% (± 9.0; range 0-44). The meanpercentageofdegranulatedeosinophilswas15.8%(±14.3;range0-52),whilethemeanofvacuolizedeosinophilswas7.8%(range0-45).Therewasnosignificantdifferenceinthepresenceofseverehypereosinophiliabetweenboysandgirls.Thelevelsofcirculatingeosinophilsofthe6chilrenwithendomyocardialfibrosis,at1.5x109/L(±0.9),didnotdifferfromthatfoudninchildrenwithoutcardiomyopathy(1.1x109/L(±0.8); p=0.54).Therewasnosignificantdifference in age (p=0.69), leucocyte count (p=0.99) or eosinophil count (p=0.54) between participants with andwithoutcardiomyopathy.

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In conclusion, there is high frequency of severe hypereosinophilia in school children from Inharrime districtindependentofthepresenceofcardiomyopathy.Thereisneedtoinvestigatethecausesofthisfindinginthepopulation.

Key-words:Hypereosinophilia,CommunityStudy,EndomyocardialFibrosis

Introdução

Oseosinófilossãoconsideradosumfactoretio-lógiconapatogénesedaFibroseEndomiocárdica1,umamiocardiopatiarestritivadecausadesconheci-dacomelevadaprevalêncianapopulaçãogeraldoDistritodeInharrime,nosuldeMoçambique2.Estamiocardiopatiaafectasobretudocriançaseadoles-centes de algumas regiões pobres dos continentesafricano,sul-americanoeasiático.Emfasesavança-daséextremamenteincapacitanteeestáassociadaa elevada morbilidade, por arritmia, insuficiênciacardíacaetromboembolismo.

Níveis elevados de eosinófilos circulantes têmsidoencontradosemdoentescomfibroseendomio-cárdicaassistidosemhospitais,afectandoentre10e30%dospacientesnomomentododiagnóstico3.Porestemotivo,algunsautoresconsideramestado-ençaumavariantedoSindromaHipereosinofílicoencontrado em climas temperados4. Em Moçam-bique a associação entre FEM e hipereosinofilia étambémencontrada;quase2/3dospacientescomFEMassistidosemhospitaisdereferênciaapresen-tamhiperosinofilianomomentododiagnóstico5.

ArelaçãocausalentrehipereosinofiliaeFEMécontroversa. Considerando a hipótese da hipero-sinofilia seromecanismopatogénico,a lesãocar-díaca fibrótica diagnosticada por ecocardiografia,resultariadumalesãoeosinofílicaagudadoendo-cárdio.Omecanismobásicode lesãocardiotóxicapelo eosinófilo foi demonstrado em experiênciasquemostraramlesãonascélulascardíacasderatosinduzidasporproteínasbásicasgranularesdoeosi-nófilohumano6.

Nahipótesederelaçãocausalentreasparasito-seseafibroseendomiocárdicaascontagensdeeo-sinófilosteriamopicoduranteafasedemigraçãodelarvas,eretornariamposteriormenteaonormal.Existiriaportantoumarelaçãoinversaentreosní-veiscirculantesdeeosinófiloseaduraçãodossinto-masdefibroseendomiocárdica,oquejáfoidescrito

emestudosclínicosrealizadosnaNigérianosquaissesugeriuqueahipereosinofíliaseriainduzidaporparasitas7.

Ahipótesederelaçãocausalentreeosinofiliaefibrose endomiocárdica é difícil de confirmar nasregiõesendémicasparaestacardiomiopatiaporqueosdoentesapresentam-setardiamenteàsunidadessanitárias, muitas vezes quando já existem lesõescrónicas fibróticas estabelecidas. Assim, aprovei-tandoanecessidadedeestabelecimentodumaco-orte de crianças para determinação da incidênciaehistórianaturaldeFEM,foirealizadoumestudoparadeterminaçãodafrequênciadeeosinofilianapopulaçãoescolardoDistritodeInharrime.

População e Métodos

Descrição do Distrito de InharrimeODistritodeInharrimelocaliza-senacostasul

deMoçambique.Temumaextensãogeográficade2744Km2.Asededodistritositua-sea400KmsdacidadedeMaputo.Naalturadoestudotinharecen-seadaumapopulaçãode76518habitantes.Odistri-toestádivididoem5Localidades,queporsuavezse dividem em áreas administrativas menores de-signadasPovoados.ExistememInharrime49povo-ados,cadaumdosquaiscomumaescolaprimária.

Amostragem e Critérios de InclusãoA amostra foi obtida por selecção aleatória de

conglomerados. Foram inicialmente selecionadaspor amostragem simples 10 escolas primárias doDistrito, distribuídas pelas suas 5 localidades. Emcadaumadestasescolasforamconsideradaselegí-veisparaoestudotodasascriançasfrequentandoasegundaclasse.Aospaiseencarregadosdeeduca-çãodascriançaselegíveisfoisolicitadaumaautori-zaçãoescritaparaaparticipaçãodascrianças.

Recolha de Dados EntreJulhoeSetembrode2006foramcolhidos

dados demográficos das crianças participantes no

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estudo, através do preenchimento de questioná-riospadronizados.Foiatribuídoacadacriançaumnúmero único de identificação no estudo. Todascriançasforamsubmetidasaecocardiografiatrans-torácicausandoecográfoportátil(VividI,GeneralElectrics).

Uma amostragem sistemática foi realizada se-lecionando cada 5ª criança da lista dos alunos daturma para colheita de sangue periférico da veiacubitalparadeterminaçãodafórmulaleucocitária.Forampreparadosesfregaçosdesangueperiféricono local de colheita e feita contagem manual dosleucócitostotaisedeeosinófilosnasinstalaçõesdoCentro de Saúde de Inharrime, usando coloraçãode May-Grunwald Giemsa. A hipereosinofilia foidefinida como contagem absoluta de eosinófilosigualousuperiora1.5x109/L.

Análise estatísticaAsfrequênciassãodadasemnúmerosabsolutos

epercentagensouproporções;variáveiscontínuassão reportadas como médias (desvio padrão). Otestechi-squarefoiusadoparacompararaspercen-tagens entre grupos. A associação entre variáveiscontínuasfoimedidausandoocoeficinetedecor-relaçãodePearson,comumteste-tparacorrelaçãozero.Osinal“±”significaaextensãodo intervalodeconfiançade95%.Asanálisesforamfeitasusan-doMinitabRelease13(MinitabInc,StateCollege,PA)eSAS8.02(doSASInstitute,Cary,NC).

Aspectos éticosPara todas as crianças participantes foi obtido

consentimentoinformadoassinadopelosseuspaisouencarregadosdeeducação.Odiagnósticoobtidoapósavaliaçãofoifacultadoaospaispelosinvestiga-dores.ÀscriançasdoentesfoioferecidotratamentoeseguimentonoPostodeSaúdelocalouCentrodeSaúdedeInharrime.

Resultados

Das 363 crianças elegíveis 296 (81.5%) foramincluídas no estudo. A idade média das criançasavaliadasfoide8(±1)anose195(53.7%)eramdosexofeminino.

Setentaeumacriançasforamselecionadasale-atóriamente para exames laboratoriais; destas 65

eramsaudáveise6tinhamsinaisecocardiográficosdefibroseendomiocárdica.Aidademédiafoi8anos(±1.6);37eramdosexofeminino(52.1%).Acon-tagemmédiadeleucócitostotaisfoide8.0x109/L(±2.4).Acontagemmédiadeeosinófilosfoi1.2x109/L(±0.9);apercentagemmédiadeeosinófilosde14.5%(±9.0; range0-44).Apercentagemmé-diadeeosinófilosdesgranuladosfoi15.8%(±14.3;range0-52),enquantoamédiadapercentagemdeeosinófilosvacuolizados foide7.8%(range0-45).A idadedascriançascomhipereosinofilianão foidiferente da de crianças com contagem normalde eosinófilos (idade media 8 em ambos grupos;p=0.58 two-sample t-test), e não houve diferençasignificativanapresençadehipereosinofiliaseveraentreraparigaserapazes(p=0.96;chisquaretest).

A ecocardiografia mostrou que 25 (8.5%) ti-nham fibrose endomiocardica. Destas criançascom sinais ecocardiográficos de FEM 13 (52.0%)tinhamanomaliasestruturaismoderadasaseverasmasnenhumareportouespontâneamentesintomasdedoença.Amédiadosníveisdeeosinófiloscircu-lantesnas6criançascomfibroseendomiocárdicafoi1.5x109/L(±0.9);estevalornãofoiestatística-mentediferentedamédiaemcriançassemmiocar-diopatia da mesma população (1.1x 109/L(± 0.8);p=0.54).Nãohouvediferençasignificativadeidade(p=0.69),dacontagemdeleucócitos(p=0.99)oudecontagemdeeosinofilos(p=0.54)entreparticipan-tescomesemmiocardiopatia.

Discussão

Foi encontrada elevada frequência de hipereo-sinofiliaseveranapopulaçãoescolardoDistritodeInharrime.Estefactoestáprovavelmenterelaciona-docomo factodeodistrito ter co-endemicidadeparaparasitoses intestinais transmitidaspelosolo,schistosomíaseefilaríaselinfática8.

Os eosinófilos constituem normalmente umapopulação menor dos leucócitos circulantes, compercentagensvariandoentre1e4%totaldeleucó-citoscirculantes.Emcondiçõesbasaisestascélulassãoobservadasexclusivamentenotecidodamedu-laóssea (localde suaorigem)eno intestino.Du-ranteumainfestaçãoparasitária,asuaproduçãoéincrementadalevandoaumaumentodeeosinófilos

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circulanteseàsuamigraçãoparaoslocaisondeosparasitas se encontram, de modo a cumprirem asuafunçãodefensiva.

O conhecimento actual sobre os efeitos dehipereosinofilia no coração foi obtido através doestudo da síndrome hipereosinofílico encontradonas regiões temperadas. Assim, sabe-se que ahipereosinofilia associada a doenças parasitáriaspode causar trombose intracardíaca. Os tromboscardíacos formados à superfície do endocárdioevoluemparanecrose,afectandoporcontinuidadeo endocárdio e subendocárdio. A necrose doendomiocárdio ventricular evolui para fibroseformando placas extensas com localizaçãopredominante nas regiões apical e subvalvar9.Contudo,ateoriadeafibroseendomiocárdicaserumavariantetropicaldosindromahipereosinofílico4temsidodifícildeprovarpelofactodeodiagnósticodestamiocardiopatianasregiõesendémicasocorrergeralmente em fases avançadas, com extensivafibroseepoucainflamação.

InharrimeéodistritodaregiãosuldeMoçam-buiquedeondeprovémamaiorpartedosdoentescomfibroseendomiocárdicaassistidosnaunidadehospitalardereferêncianacional10.Noestudoqueaquiapresentamos,aproporçãodecriançascomfi-broseendomiocárdicaencontradafoide8.5%,cor-respondente a cerca de metade da prevalência de19.8% obtida num estudo comunitário da mesmapopulação,realizadoumanoantesconhecidaparaestapopulação2.Osníveisdeeosinofilianascrian-ças diagnosticadas com fibrose endomiocárdicanãoforamdiferentesdosencontradosemcriançassaudáveis,corroborandodadosdeoutrasregiõesdeÁfricaendémicasparaasduascondições.11

UmestudonaNigérianãoencontroudiferençasignificativaentreaprevalênciadeparasitosesempacientescomfibroseendomiocárdicaeindivíduossaudáveisdamesmapopulaçãopareadosporidadeesexo.11Emsérieshospitalarescompostasmaiorita-riamentepordoentescomfibroseendomiocárdicaavançadaapresençadehipereosinofiliaévariável3eoperfilbiológicodospacienteséinespecífico,nãorevelandoinfecçãoouparasitismo.12

EmrelaçãoaMoçambique,numregistode175pacientesassistidosnumaunidadesanitáriadere-ferênca,acontagemmédiadeeosinófilosfoide1.2x109/Lecercade25.4%dospacientestinhamhi-pereosinofilia em níveis superiores a 1.5 x 109/L.5

Dadaapersistênciadeeosinofiliaemfasescrónicase após tratamento efectivo de parasitoses, algunsautores consideram a hipereosinofilia um factorindependentedoparasitismoempacientescomfi-broseendomiocárdica.13

O advento de ecocardiografia portátil, ao per-mitirodiagnósticoprecocedefibroseendomiocár-dica em comunidades rurais endémicas, permitedesenhar estudos prospectivos com seguimentolaboratorialeecocardiográfico,incidindosobrein-divíduosassintomáticoscomhipereosinofilia.Taisestudospermitiriamprovavelmenteesclarecerare-laçãoentreestasduasentidadesemzonasendémi-casparafibroseendomiocárdica.

A taxa de participação no estudo foi aceitávelconsiderandoqueenvolveucolheitadesangue.Talgrau de participação pode ser explicado pelo fac-todeestetrabalhoseguir-seaumoutrorealizadonascomunidadespelomesmogrupodepesquisa,queidentificouafibroseendomiocárdicacomoumproblemadesaúdepúblicanodistrito.Oenvolvi-mentodasautoridadesadministrativas,líderesco-munitárioseprofessoresnafasededesenhoeim-plementaçãodapesquisafoioutrofactordeadesãoaoestudo.

Éimportanteapontaralgumaslimitaçõesdesteestudo. Tendo sido realizado em escolas, exclui àpartidacriançascomdoençasincapacitantes,den-treasquaisahipereosinofiliacomplicadaoufibroseendomiocárdicasintomática.Poroutrolado,ava-riaçãosazonalna incidênciadeparasitoseseoco-trrênciade seusvectorespode ter influeneciadoaprevalênciadehipereosinofiliaencontrada.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Harefield Research Foundation pelo financiamento deste projecto depesquisa,eaosProfessoresMariaBeatrizFerreira(Instituto do Coração) e Magdi Yacoub (Imperial

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College)peloapoioprestadonodesenhoeimple-mentaçãodapesquisa.

Conclusão

A frequência de hipereosinofilia severa na po-pulaçãoescolardodistritodeInharrimeéelevadatanto em crianças sem cardiomiopatia como na-quelascomsinaisecocardiográficosdefibroseen-domiocárdica. Há necessidade de se investigar ascausasdehipereosinofilianestapopulaçãoinfantilededeterminarasuahistórianatural,bemcomodeexplorararelaçãoentrehipereosinofiliaefibroseendomiocárdicanodistrito.

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Validação do Método ELISA com Antígenos de Cysticercus cellulosae para o Imunodiagnóstico da Cisticercose

Noormahomed E.V., MD, PhD1,2, Nhancupe N.1, Zalis M.1, Assane Y1, Buene T1., Banze L1, Afonso SMS, MDV3, Guthrie C2,

Schooley R.T., MD2. Cappuccinelli P., MD.4, Colombo M.5 1LaboratóriodeParasitologia,DepartamentodeMicrobiologia,FaculdadedeMedicina,UniversidadeEduardoMondlane(UEM)[email protected],2DepartmentofMedicine,UniversityofCalifornia,SanDiego,SanDiego,CA,USA,3LaboratóriodeParasitologia,DepartamentoParaclínica,FaculdadeVeterinária,UEM,4DipartimentoScienzeBiomediche,FacoltàdiMedicina,

Sassari,[email protected],5DipartimentoBiologiaeBiotecnologia,UniversitàdiRomalaSapienza,[email protected],UEM

AutorparaCorrespondência:Noé[email protected]

ResumoIntrodução e objectivos: A cisticercose e neurocisticercose (NCC) causadas pela larva de T. solium, o Cysticercus cellulosaeéumaenfermidadenegligenciadaresponsávelporepilepsiadeiníciotardioeconvulsõesemcriançassemfebrenospaísesendémicos.A faltade inquéritos epidemiológicos emeiosdediagnóstico simples, sensíveis ebaratos têmcontribuídoparaodesconhecimentodoimpactonegativodestaenfermidadenomundoeparticularmenteemMoçambique.OsmeiosdediagnósticocomooELISAparadetecçãodeanticorpos/antigénioseainmunotransferênciapossuemsensibilidadeeespecificidadevariáveis.OsescassosestudosexistentesemMoçambiquerevelaramumaseroprevalênciadeanticorposanticisticercoempopulaçãoassintomáticaquevariaentre14,9-20,8%,enquantoquenapopulaçãocomtranstornosneuropsiquiátricos a seroprevalência varia entre 7,6-51,4%. Estes dados sugerem que a cisticercose e NCC sãoendémicasnopaís.Métodos: A fim de contribuir para o diagnóstico desta enfermidade, foi desenvolvido e validado um teste ELISAusando como fonte antigénica cistos da larva de T. solium e soro humano. Foram testados 82 soros de pacientesdodistritodeAngónia,emMoçambique,usandosimultaneamenteoextractototalantigénicodecisticerco(ETAC)preparadoapartirdecistosextirpadosemporcosdomesmodistritoeaELISAcomercial(EC).Umasubamostrade22sorosfoitestadapelométododeimunotransferênciausandoumkitcomercial.Resultados:Dos82sorostestados,44(53,6%)forampositivosparaoETACe6(7,3%)positivosusandooEC.Nasubamostrade22soros,10(45,5%)forampositivosaimunotransferência,13(59,1%)paraoETACe5(27,7%)aoEC.Conclusão:OELISA,usandoETAC,possuiumasensibilidadede60%eumaespecificidadede42%,enquantoqueoECcomercialreveloupossuirumasensibilidadede40%eumaespecificidadede92%epodeserusadocombaixocustoemMoçambiqueenasregiõessemhidatidoseondepoderiamocorrerreaçõescruzadas

Palavras-Chave: Cisticercose,Neurocisticercose,Diagnósticocisticercose,ELISAcisticercose.AbstractIntroduction and objectives:Cysticercus cellulosae isaneglecteddiseaseresponsible forepilepsyof lateonsetandseizuresinchildrenwithoutfeverinendemiccountries.Thelackofepidemiologicalsurveysandsimple,sensitiveandinexpensivediagnosticstoolshasresultedinalackofknowledgeaboutthenegativeimpactofthisdiseaseintheworldincludingMozambique.DiagnostictoolssuchasELISAandWesternimmunoblottingvaryinsensitivityandspecificity.FewstudiesinMozambiquerevealedaseroprevalencerangingfrom14.9to20.8%inasymptomaticpopulationand7.6to51.4%inthosewithneuropsychiatricdisorders,suggestingthatcysticercosisandNCCareendemicinthecountry.Methods:InordertodiagnosemoreeasilythisdiseasewedevelopedandvalidatedacheapELISAmethodusingT. soliumlarvaextract(TSLE)asasourceofantigen.Usingthismethod,wetestedserafrom82patientsfromAngóniadistrict,Mozambique,andcomparedresultstothoseofacommerciallyavailableELISA(CE)kit.Asubsampleof22serawastestedbyWesternimmunoblotmethodusingacommercialkit.

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Results: Outof82seratested44(53.6%)werepositivetotheTSLEand6(7.3%)werepositiveusingCE.Inthesub-sampleof22sera10(45.5%)werepositivebyWesternimmunoblot,13(59.1%)werepositivetoTSLEand5(27.7%)werepositivetoEC.Conclusion:TheTSLEusingELISAhad60%sensitivityand42%specificitywhilethecommercialCEwasfoundtohave40%sensitivityand92%specificity.Givenitslowcostandincreasedsensitivity,thesefindingssuggestthattheTSLEcouldbeusefulinMozambiqueandregionswithouthydatiddiseasethatcouldgivecrossreactions.

Keywords:Cysticercosis,Neurocysticercosis,Cysticercosisdiagnoses,ELISAcysticercosis.

Introdução e objectivos

A cisticercose é uma enfermidade parasitárianegligenciada considerada pela OMS como umadas6doençaspotencialmenteradicáveis1.Éprovo-cadapelalarvadeTaenia solium,oCysticercus cellu-losae.Ohomeminfecta-seaoingeriracidentalmen-tealimentosouáguacontaminadoscomovosdeT. solium. Uma vez no estômago os ovos eclodem elibertamaslarvasqueatravessamamucosagástri-caeporviasanguíneavãoalojar-senosmúsculos,olhosesistemanervosocentral(SNC)ondeseen-cistam.QuandoocistoselocalizanoSNCadoençachama-seneurocisticercose(NCC),constituindoaformaclínicamaisgravedacisticercose2.

A NCC constitui uma das causas parasitáriasmais frequentes de vários transtornos neuropsi-quiátricos nos países endémicos, entre eles a epi-lepsiadeiníciotardioeasconvulsõesemcriançasnaausênciadefebre3-4epodeserassintomáticapormuitos anos. As crises epilépticas manifestam-seem70%a90%dospacientesinfectadoscomalar-vadecisticercus5-6.Alémdasconvulsõeseepilep-sia,aNCCpodesemanifestarcomcefaleiagrave,cegueira,hidrocefalia,meningitecrônica,sintomasdevidoalesãoocupandoespaçonosistemanervo-socentral,edemência5-6.

Operíododeincubaçãodacisticercoseéextre-mamentevariáveleaproporçãodecasosdeinfec-tadosque irãodesenvolverNCCédesconhecida5.AduraçãodossintomasassociadosaNCCeapro-porção de casos que se irão recuperar totalmentedosmesmoscomousemtratamentopermanecemmal definidos5. Existe controvérsia se se deve ounãotratarospacientescomsintomas,empartede-vidoàreaçãoinflamatóriaquesedesenvolveapós

aadministraçãodadrogacestocidaeconsequentemortedoparasita,oquepodeagravaroquadroclí-nicodopaciente6.

AamplitudeeorealimpactodestaenfermidadesãodesconhecidosnomundoeMoçambiquenãoconstituiexcepçãodevidoainexistênciadeinqué-ritos epidemiológicos e métodos de diagnóstico,simples,sensíveis,específicosebaratos4-8.

Estima-se que existem mais de 50 milhões depessoas infectadas por cisticercos de T. solium nomundoequecercade50.000morremanualmentedevidoaNCC.AprevalênciadeepilepsiaemÁfri-ca varia entre 0,22 a 5,8% e suspeita-se que entre30-50%dessescasospodemserdevidosaNCC3,9-10.

Vários estudos realizados em Moçambique re-velaram uma seroprevalência de anticorpos antiCisticercus cellulosae em população assintomáticainfantileadultaquevariaentre14,9-20,8%7.

Na população com transtornos neuropsiquiá-tricosa seroprevalênciadeanticorposeantígenosanticisticerco varia entre 7,6-51,4%7. Estes dadossugeremclaramentequeacisticercoseeNCCcons-tituemtambémumgraveproblemadesaúdepúbli-canonossopaís.

OdiagnósticodaNCCbaseia-senaconjugaçãodos dados clínico-epidemiológicos e de imagem,comoatomografiacomputadorizadaearessonân-ciamagnéticanuclear,bemcomonaserologiaparadetecçãodeanticorposouantígenosusandováriastécnicascomoaELISA,ahemaglutinação,a imu-notransferênciaemaisrecentementerecorre-seaoPCRparaadetecçãodoDNAdoparasita.

Os testes serológicos possuem sensibilidadee especificidade variáveis e podem dar reacçõescruzadas com outros helmintos, em especial o

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Echinococus granulosus11-12.Abiópsiaparavisualizara presença do parasita por vezes não é fácil derealizar,devidoàinacessibilidadeanatómica.

TécnicasmolecularesparaadetecçãodoDNAdalarvadeT. soliumnolíquidocefalo-raquidiano(LCR)têmsidoigualmentedesenvolvidaseusadas,mostrando uma alta sensibilidade e boa especifi-cidade13-15. Contudo,nospaísesemviasdedesen-volvimento,odiagnósticogeralmentebaseia-seemserologiaparadetecçãodeanticorposeantígenos,conjugadaàimagiologia.

A imunotransferência, usando glicoproteínaspurificadas, é hoje considerada o método “goldstandard”paraodiagnósticodaNCC,permitindoadetecçãodeanticorposantiCysticercus cellulosae comumasensibilidadeeespecificidadeaté98%e100%respectivamente,16-17. Tanto a imunotransferência,oELISA,comooPCR,exigemequipamentocaroe pessoal altamente qualificado. De igual modo,os testes comercialmente disponíveis não sãobaratos,oque limitao seuusonodiagnósticoderotinanossistemasdesaúdenospaísesemviasdedesenvolvimento,taléocasodeMoçambique.

Tendo em conta o impacto negativo destaenfermidadena saúdepúblicaenaeconomiadospaísesafectados,aliadoà inexistênciademétodosdediagnósticoserológicoparaodiagnósticodestazoonose em Moçambique, e à necessidade dedesenvolver testes laboratoriais baratos, rápidoscomaltasensibilidadeeespecificidade,realizamosopresentetrabalhocujoobjectivofoiodeestabelecere validar um teste ELISA de baixo custo, paraauxiliarodiagnósticodacisticercoseeNCC.

Material e métodos

Local do estudo Este trabalho foi realizado nos laboratórios de

ParasitologiadaFaculdadedeMedicinadaUniver-sidadeEduardoMondlane(UEM)edoCentrodeBiotecnologiadaUEM,noperíodoentreJaneiroeJulhode2009.

Fonte de antígenoOs cistos intactos da larva de Taenia solium

queserviramdefonteantigénicaforamextirpados

nosmúsculosnaturalmenteinfectadosdumporcocomprado no mercado informal da cidade deTete,emMoçambique.Oscistosforamremovidosmanualmente com ajuda de um bisturi e pinça.Após a extirpação, os cistos foram lavados váriasvezescomumasoluçãodePBS(0.15M)pH7.4paraeliminar qualquer líquido intersticial que pudessecontaminaroantígenoeconservadosa-80°Catéàsuautilização.

Fonte de soro humanoParavalidaronossoensaioforamutilizadossoros

depacientesmoçambicanosdodistritodeAngónia,naprovínciadeTetepreviamenteconhecidoscomopositivos e negativos a cisticercose detectadospelo ensaio Ag ELISA18-19. Estes soros são partede um outro estudo intitulado “Human Taenia Solium Cysticercosis in the District of Angónia,Mozambique:Epidemiology and Clinical Aspects”levadoacabonodistritodeAngónia,provínciadeTete,Moçambique.

ELISA e imunotransferenciaOs cistos da larva de Taenia solium para a

preparaçãodoantígeno foramsuspensosemumasolução de 1:1 w/v, de tampão carbonato (0.1M,Na2CO3,NaHCO3,pH9.6)esubmetidosatrêsciclosdecongelaçãoedescongelaçãoa-80ºC,esmagadoscom um vidro homogeneizador e submetidos aquatrociclosdeultrasonicaçãoa50ciclos/segundo,durante um minuto, num balde de gelo (VibraCellTMSonics&MaterialsIncDanbury,CTUSA).Depoisohomogeinadofoicentrifugadoa18.000gpor30minutoa4ºC,eosobrenadante foiobtidopordiáliseque se feza4ºCdurante12horas, emtampãocarbonato20,21.AconcentraçãodeproteínasfoimedidautilizandoométododeBradford22.

Paradeterminarapositividadeounegatividadedos soros em estudo foi realizado um ELISAutilizando o método descrito por Larraldeet al.23, com algumas modificações feitas por

Noormahomed et al.20, em 82 soros de pacientesobtidosnodistritodeAngónia.

Afim de comparar os resultados obtidos noELISA, usando o extracto total antigénico decisticercus fabricado pelos autores, os mesmos

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sorosforamprocessadosutilizandookitcomercialpara ELISA (MAGIWELTM enzyme immunoassay Cysticercosis).

AconfirmaçãodepartedosresultadosobtidosnosdoistestesELISAfoifeitaatravésdoprocessa-mentoporimunotransferênciadeumasubamostrade 22 soros usando o Kit comercial (Immunetics, QualiCode™ Cysticercose Kit).

NoELISA,usandooextractototalantigénicodeCysticercus cellulosae,foramconsideradospositivostodosossoroscujosvaloresdeabsorvânciaforamiguaisousuperioresamédiadosvaloresdeabsor-vância obtidos com os soros controles negativos,maistrêsvezesoseudesviopadrão20.

Seguindoasinstruçõesdosfabricantes,paraaELISAcomercialforamconsideradospositivosto-dosossoroscomvaloresdeabsorvânciaiguaisousuperioresaodosorocontrolefracopositivo;paraa imunotransferência consideraram-se positivostodosossorosquereagiramcompelomenosumadas seis glicoproteínasespecíficasdacisticercose,GP50,GP42-39,GP24,GP21,GP18eGP14respe-tivamente.

Asensibilidadeeespecificidadedosdois testesELISA foram calculadas com base no método deGalen & Gambin24, tendocomo“goldstandard”osresultadosdossorosobtidosemimunotransferên-cia.O testegold standard éo testequedáodiag-nósticodefinitivodeumacondiçãoparticulareser-vedereferênciacomaqualtodososoutrostestesdiagnósticosirãosercomparados.Asensibilidadeéafracçãodosqueobtiveramrespostapositivanotesteentreaquelesquepossuemadoençaeédadapela seguinte fórmula: VP:(VP+FN)x100% ondeVPéoverdadeiropositivoeFNéo falsonegati-vo.Aespecificidadeéafracçãodosqueobtiveramresposta negativa no teste entre aqueles que nãopossuemadoençaeédadapelaseguintefórmula:VN:(VN+FP)x100emqueVNéoverdadeironega-tivoeoFPofalsopositivo24.

Considerações éticasOprotocoloparaoestudodospacientesdodis-

tritodeAngóniafoiaprovadopeloComitédeÉticada Faculdade de Medicina da UEM, pelo ComitéNacionaldeBioéticaparaaSaúdedeMoçambique

epeloComitéÉticodeInvestigaçãoBiomédicadaDinamarca.

ResultadosDas82amostrastestadasporELISAusandosi-

multaneamenteo extracto total antigénicode cis-ticercos fabricado pelos autores e o kit comercial,encontramos44(53,6,%)e6(7,3%)sorospositivosa anticorpos anti Cysticercus cellulosae respectiva-mente.

Dos22sorosprocessadosusandoométododaimunotransferência 10 (45,5%) foram positivos aanticorpos anti Cysticercus cellulosae e 12 (54,5%)deramresultadosnegativos.Osmesmossoros(22)deramumapositividadede13(59,1%)e5(27,7%),respectivamente,paraoELISA,usandooextractototal antigénico de cisticercos e ELISA comercial,Tabela1.

O ELISA, usando extracto total antigénico decisticercos, revelou possuir uma sensibilidade de60%eumaespecificidadede42%,enquantoqueoELISAcomercialdeuumasensibilidadede40%eumaespecificidadede92%,tabela2.

Conclusões e RecomendaçõesConseguimosestabelecerpelaprimeiravezem

MoçambiqueummétododeELISAusandoextrac-tototalantigénicodecisticercosparaodiagnósticoda cisticercose e NCC com uma sensibilidade de60%eespecificidadede42%,oqueestádeacordocomosdiferenteskitscomerciaisdisponíveisparaodiagnósticodacisticercose.

As diferenças na sensibilidade e especificidadeverificadasnosdoistestesELISApodemserexpli-cadas pelo facto de, no caso do ELISA preparadopelos autores, o mesmo ter sido feito a partir doextractototalantigénicodecisticercosquecontemsimultaneamenteantigéniosdolíquidovesicularedamembranadocisto,enquantoquenoKitcomer-cialforamusadosapenasantigéniosdolíquidove-sicular.Porisso,ELISApreparadopelosautoressemostroumaissensívelmasmenosespecífico22.

AexistênciadediferentespopulaçõesgenéticasdeT. solium,provavelmentepoderiaestaraexpli-caraslimitaçõesnasensibilidade,especificidadee

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reproducibilidadequeaportamas técnicasseroló-gicasdisponíveisparaodiagnósticodacisticercose,bemcomoparaodesenhodevacinaseficazes25-28.

OkitcomercialparaoELISAutilizadopelosau-tores revelou uma sensibilidade mais baixa (40%)queoELISAusandoETAC.Istopodedever-seaofactodeomesmoserfabricadoapartirdecistosdeporcosdaAméricaLatinaquepodemsergenetica-mentediferentesdoscistosdeMoçambique25-28.Es-tudosfuturosdeverãoserconduzidosnopaíscomvistaadeterminarasvariantesgenéticasdoparasitaqueaícirculam.

Apreparaçãoantigénicautilizadaneste estudoserológicopelosautoreséconhecida,comodandopoucasreacçõescruzadascomanticorposdeoutroshelmintos12,16. Por isso, dadas as características dazonadeestudoeaprovávelinexistênciadehidati-dose humana em Moçambique29

, que poderia darreacções cruzadas com antigénios de Cysticercuscellulosae, a técnica ELISA, empregando extractototal antigénicodecisticercos, conjugadacomosdadosclínicos,revela-sebastanteútilparaoapoionodiagnósticodacisticercoseeNCC.

Tendoemcontaosresultadosobtidosnestepro-cesso de validação do método ELISA, o laborató-riodeParasitologiadaFaculdadedeMedicinadaUEMpoderápassarafabricarumELISAaocustodemenosde$1 contraos $10por testedoskitscomerciais.Aestepreçopoder-se-iapensarnain-trodução da serologia nos sistemas nacionais desaúdedopaísedaregiãoparaodiagnósticodestaenfermidade negligenciada especialmente para osgruposcommanifestaçõesneurológicasdeetiolo-giadesconhecidaparticularmente,aepilepsia.

No futuro, os investigadores irão continuara trabalhar no sentido de estabelecer o métodode purificação do antígeno de modo a melhorara especificidade do método desenvolvido,permitindo-lhedestemodoestabelecer tambémométododeimunotransferênciaparaodiagnósticodacisticercose.

Agradecimentos

A realização deste trabalho foi possível graçasaofinanciamentodisponibilizadopelaCooperação

Universitária Italiana (projecto CICUPE), do Mi-nistério da Ciência e Tecnologia de Moçambique(Projectonº0032-INV/2008)edaFundaçãoGileaddosEstadosUnidosdaAmérica (FosterCity,CA,USA)paraareabilitação,compradeequipamentoereagentes,aosquaisendereçamososnossosagra-decimentos.

Os autores agradecem igualmente o apoio re-cebidodoscolegasdoCentrodeBiotecnologiadaUEM, e em especial aos pacientes do distrito deAngóniaquedeformavoluntáriaedesinteressadaaceitaramparticiparnesteestudo.

Conflito de interesse

Osautoresdeclaramquenãohánenhumcon-flitodeinteressequerdeordempessoal,comercial,académico,políticoefinanceironomanuscrito.

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Lista de abreviaturas

NCC-neurocisticercoseELISA-Enzyme-LinkedImmunoSorbentAssayETAC-extractototalantigénicodecisticercusEC-ELISAcommercialOMS-OganizaçãoMundialdeSaúdePCR-PolymeraseChainReaction

DNA-DeoxyribonucleicacidLCR-líquidocefaloraquidianoUEM-UniversidadeEduardoMondlaneVP-verdadeiropositivoFN-falsonegativoVN-verdadeironegativoFP-falsopositivo

Tabela 1: IlustraosresultadosdoensaioporimunotransfêrnciaeELISAusandoETACeokitcomercial,respectivamente.

Tabela 2: IlustraCálculodasensibilidadeeespecificidadeobtidapara oensaiocomELISAusandoETACeokitcomercial,respectivamente.

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ARTIGO DE OPINIÃO

Saúde, Estilo de Vida e Urbanização em Moçambique: Problemas e Perspectivas

Antonio Prista1, Silva Magaia2, Carla Silva-Matos3, Albertino Damasceno4

1FaculdadedeEducaçãoFísicaeDesporto,UniversidadePedagógica,2ParqueNacionaldoLimpopo,3MinistériodaSaúde4FaculdadedeMedicina,UniversidadeEduardoMondlane

AutorparaCorrespondência:AntónioPristaFaculdadedeEducaçãoFísicaeDesporto,UniversiadePedagógica-Tel:21426678

email:[email protected]

O presente manuscrito constitui uma síntese das intervenções havidas no Simposium “Sedentarismo e Urbanismo: Implicações para a Saúde Pública em Moçambique”, realizado no âmbito das XIV Jornadas Nacionais de Saúde, 2012.

ResumoA irreversibilidade do processo de urbanização da população mundial está a atingir Moçambique de uma formaabruptacommúltiplasconsequênciasparaasaúdeebem,estar.Entreoutros,oaumentodamecanização,otempodetelevisão,ousodoautomóveleorecursoaalimentaçãoartificial,estáatransformar,empoucosanos,umapopulaçãoactivaempessoassedentáriassujeitasàpoluiçãoeníveisdeansiedadeatéentãodesconhecidos.Osestudosdisponíveisdemonstramdeformaclaraumaenormereduçãodosespaçosparaarecreaçãoactivaeumaconcomitantereduçãododispêndioenergéticoporactividadefísicahabitual.Comoconsequência,osdadosepidemiológicosindicamumaumento,nascidades,daobesidade,hipertensãoediabetesemadultos.Porseuturno,ascriançasemidadeescolarestãoaconhecerumcrescimentoemtodososfactoresderiscodedoençacardiovasculareumareduçãodoseuníveldedesenvolvimentomotor.Afaltadeplaneamentonocrescimentourbanoestáaterconsequênciascatastróficasnasaúdedapopulaçãourbana.Nestequadro,adenominadatransiçãoepidemiológicaacontecesobaformadeacumulação,dadoqueapopulaçãocontinuamuitopermissivaadoençastransmissíveisesofreagoraaacumulaçãodeumgrupodepatologiasassociadasaosedentarismoedesiquilíbrionutricional.

AbstractTheprocessofurbanizationoftheworldpopulationisreachingMozambiqueratherabruptlywithmultipleconsequencesforthehealthandwellbeing.Increasedmechanization,screentime,caruseanduseoffastfoodarecausing,inashorttimeperiod,adramaticchanginginlifestyle.Populationisreducingtheiractivitylevels,thatusedtobehigh,the stress levels are increasing as well as the environmental pollution. The available studies demonstrate a hugereductionofspacesforactiverecreationandaconcomitantreductionofenergyexpenditureforphysicalactivity.Asaconsequence,epidemiologicaldataindicateanincreaseintheprevalenceofobesity,hypertensionanddiabetesinadults.Inturn,studiesaredemonstratingthattheschoolagedchildrenareincreasingprevalenceinallriskfactorsforcardiovasculardiseaseandareductionintheirlevelofmotordevelopment.Lackofurbanplanningonurbangrowthseemstocausedisastrousconsequencesonthehealthoftheurbanpopulation.Thus,theso-calledepidemiologicaltransitionarehappeningintheformofaccumulationsincethepopulationremainsverypermissivetotransmissiblediseasesaddingtothemanincreasedinthesedentarylifestyleandnutritionalimbalancerelateddiseases.

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Urbanização: um processo irreversível que afeta a saúde e o bem estar

A urbanização é um processo irreversível. Oscidadãos tendemamigrardocampoparaacida-deeocampotendeaurbanizar-se.Porsuavez,apopulaçãourbanamultiplica-sedeformanatural.Éassimquenoanode2008apopulaçãourbanaul-2008apopulaçãourbanaul-trapassou,pelaprimeiravez,apopulaçãorural.Es-Es-tima-seque,de2000para2030,Áfricaaumentaráemmaisdodobroapopulaçãourbanae,aocontrá-riodopassado,amaiorpartedapopulaçãourbanamundialestaránoterceiromundo1.Asimplicaçõesdestefenómenoparaasaúdeecondiçãodevidadoscidadãossãodeinquestionávelimpacto.

Arelaçãoentreaurbanizaçãoeasaúdeebem-estar dos cidadãos é multifactorial e de extremacomplexidade.Dopontodevistadoestilodevidaesaúde,aformacomodecorreaconcentraçãopo-pulacionaltemvindoareflectir-senegativamenteem vários aspectos, com particular realce para oaumento do sedentarismo e os constrangimentosà actividade física 2-3. Características como o or-denamento territorial, o saneamento, a densidadepopulacional,a infra-estruturaparaospedestres,cicloviaseoutrosmeiosactivosdedeslocação,jun-tamentecomapoluiçãoeasegurança tornam-sedecisivosnaatitudedoscidadãos4.Oplaneamentourbano carece de cuidados específicos que, a nãoseremtomadosemconta,afectamdefinitivamenteavidadoscidadãos.

Atransiçãodaspopulaçõesruraisparaacidadecomportaumconjuntodeevidentesvantagens.Aspopulações procuram melhores oportunidades detrabalho,melhorsegurança,maiseducaçãoediver-sificaçãodoconsumoeactividadesde lazer. Esteprocesso,contudo,acarretaconsequênciasque,nospaísesnãodesenvolvidoscomoocasodeMoçam-bique,nãosendoacauteladas,podemtrazerefeitosnefastosemuitasvezesirreversíveis.

Níveiselevadosdeansiedade,faltadecondiçõeshabitacionais condignas, poluição, insegurança,trânsitocaótico,entreoutras,podemtornarasci-dades mais nefastas para a qualidade de vida doscidadãosqueafaltadecondiçõesnaszonasrurais.

Entre outros factores, a falta de planificaçãodo crescimento urbano torna o recurso rotineiro

ao automóvel individual como uma “imaginária”conquista dos cidadãos. Em face a esta visão,promove-seumarededeestradaslargas,constroem-se enormes dormitórios desprovidos de infra-estruturassociais,egrandescentroscomerciaisondetodasasnecessidadesdoscidadãosseconcentram.Oscidadãosafastam-sedaszonasdeserviços,edosseus locaisde trabalhoe,desprovidosde sistemascomunitários de transporte público, recorrem aosautomóveisprivados,tornandoascidadesrepletasde viaturas. Esta solução leva a que os cidadãospassem uma boa parte do seu tempo em grandesfilas, poluindo o ambiente e exponenciando osedentarismo5.

Oimpactodoautomóveledasuarelaçãocomasopçõesurbanísticastemsidoestudadodeformacrescente6-8.Emmuitascidades,comojáécasodosmaiores centros urbanos de Moçambique, quemandadecarrogastamais temponassuasdesloca-çõesdoquequemofazapéoudebicicleta.Paraasaúdepública,oscongestionamentosdotráfegour-banoactuamcomoaseca.Sãoumaverdadeiraca-lamidade.Matamlentaesilenciosamenteeporissopassammuitasvezesdespercebidoscomoaverda-deiracausa.Sedentarismo,poluiçãodoar,poluiçãosonoraestressassociam-seaestaenormefontedeansiedadequetornaoscidadãosmaisagressivos.

Não apenas o automóvel tornou os homenssedentários. A industrialização e posteriormenteo avanço tecnológico transformou o trabalhomecânicoemserviços,olazerdeixoudeseractivo,aconfecçãodealimentosdeixoudeexigirdispêndioenergéticohumano9.

“Construida”paraomovimento,amáquinahu-manapareceestarareagiraestaabruptamudançaemdirecçãoaosedentarismo.Aevoluçãogenéticaparece não ter acompanhado estas súbitas alter-açõesculturaispeloqueosnossosgenescontinuamadaptadosàscondiçõesexistentesnaalturadasuaselecçãopelosmecanismosDarwinianos.Asdoen-çasdofórumcardiovascularpassaramaassumirocomandonascausasdemortalidademundial.Hoje,juntamentecomocancro,oenfartodomiocárdioeo acidente vascular cerebral constituem a primei-ra causa de morte nos países desenvolvidos10. Asdoençasdecoluna, emmuitoassociadasaoestilo

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de vida moderna, constituem uma das principaiscausas de ausência ao trabalho.11 O recurso aosserviços clínicos por doenças não transmissíveisultrapassou,nessespaíses,emmuitoodasdoençastransmissíveis.

Esta alteração do paradigma epidemiológicolevou a Assembleia Geral das Nações Unidas aassinar com os Estados Membros a DeclaraçãoPolíticaA/64/265paraaPrevençãoeControlodasDoençasNãoTransmissíveis.Estadeclaraçãoobrigaaos Estados Membros a desenvolverem políticasnacionais e a implementar actividades concretasparaaprevençãodasDoençasNãoTransmissíveis(DNT),dandoênfaseàdiminuiçãooueliminaçãodosfactoresderiscoparaestegrupodepatologias.

O processo de urbanização, sendo irreversível,tem um profundo impacto na saúde e bem-estardoscidadãos.Oestudoereflexãosobreaurbani-zação,seusmecanismoseimpactotornamseindis-pensáveis. A necessidade de adopção de medidasque minimizem ao máximo os efeitos nefastos, epotencializem as suas vantagens constituem mo-tivação suficiente para o estudo da urbanização esuasrelaçõescomasaúdeebem-estar.

Urbanização em Moçambique

São praticamente inexistentes estudos publica-dossobreoprocessodeurbanizaçãoemMoçambi-que.Dopontodevistadapercepçãodoscidadãos,ficaevidentequeascidades,emMoçambique,co-nheceram um enorme crescimento populacional,tendo aumentado de forma relevante a densidadepopulacional, o número de viaturas, as constru-ções,assimcomodiminuídoosespaçosverdes,derecreaçãoactiva,ospasseiosparaospedestreseapossibilidadededeslocaçãoemveículosnãomoto-rizados.Aspossibilidadesdeandarapéoudebici-cleta nas cidades reduziram-se de forma drástica.Nãohá,contudo,dadosquepossamconfirmarestapercepção.

Faceaestaausênciadeinformaçãofoirealizado,atitulodeensaioecomcarácterpiloto,umestudoque,nãoobstanteassuaslimitaçõesmetodológicas,poderá constituir uma primeira abordagem siste-matizada sobre a ordenação territorial associada

aoestilodevidaesaúde.Utilizandoumaimagemsatélite extraída do Google Earth, foram definidasduasáreasdeamostragem,sendoumaemMaputoeoutraemNampula.

No caso de Maputo a área de amostragem foiconfinadanumcírculocomcercade5quilómetrosde raio, abrangendo o centro e parte da periferiada Cidade. Nesta área procedeu-se à localizaçãodos espaços formais e informais dedicados à prá-ticadesportivaederecreaçãoactiva.Atravésdumacontagem visual e do conhecimento do terreno,foramidentificadasnestaáreacercade50instala-çõesdesportivas,nasuamaioriacamposdefutebol.Dentreestesespaços,constatou-seque8jáhaviamsidoconvertidosparaoutrasfinalidades.Nãoestádisponível qualquer estatística sobre o uso dessesrecintosemborahajaapercepçãodequesãocarac-terizadosporumafortemovimentaçãodesportivaaos fins-de-semana, particularmente nas manhãsdeDomingo,juntandocidadãosdetodasasidadesedeambosossexosnadisputadetorneiosoupar-tidasdeconfraternização.EstacaracterísticanãoéúnicadaCidadedeMaputo,assistindo-seasitua-çãosemelhantesemquasetodooPaís,inclusivenaszonasruraisepequenasvilas.

Embora a distribuição destas instalações pelaáreadereferêncianãosejauniforme,havendozonasmelhor servidas que outras, e na impossibilidadededeterminarcomsuficienteprecisãoapopulaçãoabrangida e a área de cada uma das instalaçõesde modo a calcular o rácio área desportiva útil por habitante, procedeu-se ao exercício poraproximações baseadas no número de instalaçõesidentificadas dentro da área de referência enuma estimativa da densidade populacionalbruta da cidade. Para tal foram assumidos algunspressupostos,nomeadamente:

a. Admitiu-sequeaáreatotaldapartecontinentaldo Município perfaz 150 km2 (excluindo osDistritosMunicipaisdeKaTembeeKaNhaca)

b.Foi estimada uma densidade populacionalbrutade10.000habitantes/km2(100hab/ha).

c. Paraos42equipamentosdesportivoscontabi-lizadosnessaáreafoiassumidaumaáreaútilde4.000m2(80mx50m),oqueperfazumaáreadesportivatotalde168.000m2.

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Assumindoestespressupostos,aáreadesportivaútil por habitante será de 0,22 m2/habitante. Parase aferir o significado real deste resultado, refira-seque,emcondiçõesideais,aáreadesportivaútilrecomendada por habitante é de 4m2, o que é omesmoquedizerqueaCidadedeMaputositua-sequase20 vezes abaixodosníveisaceitáveis.

Nos casos em que existe informação suficien-tementefiávelsobreadensidadepopulacionaleasdimensões dos espaços dedicados ao desporto e/ou actividade física numa determinada zona, esteexercício pode ser realizado para áreas mais pe-quenasdentrodoterritóriodacidadeouvila,au-mentando a precisão dos resultados. Para testar aracionalidadedestadefinação,aanálisedaCidadedeMaputofoirepetidausandoamostrasespaciaismais pequenas à volta dos equipamentos despor-tivos identificados. Sabendo-se que para grandescampos(aproximadamente5.000m2)oraiodein-fluênciarecomendadoparadeslocaçõesapééde2a3km,ou15a20minutosusandotransportepú-blico,procedeu-seàanálisedemonstrativadazonadesordenada de dois bairros de grande densidadeeondedarequalificaçãoeocupaçãoespontâneasóescaparam dois campos de futebol localizados aescassos1000metrosumdooutro.Porestarazãoforamconsideradasparacadaumdoscamposáreasdereferênciacom500metrosderaio.

Nestes dois casos, da malha mais apertadaem redor da vizinhança dos campos resultaramrácios de 0.77 m2/habitante e 0,92 m2/habitante,respectivamente,valoresaindamuitoaquémdos4m2/habitantedesejáveis.

NocasodacidadedeNampula,enumexercíciosemelhante realizado para três bairros daquelacapitaldazonanortedeMoçambique,recorreu-seao procedimento ao procedimento da malha finautilizadoemdoisbairrosdeMaputo.Osresultados(tabela 1) sugerem que a população da cidade deNampulaémelhorservidaqueacidadedeMaputo,muito provavelmente devido às característicasainda marcadamente rurais de grande parte dosseus bairros, que resultam em baixas densidadespopulacionais.

Urbanização e saúde em Moçambique

Asprevisõesdequeoprocessoabruptodaur-banizaçãoemMoçambique teriaumimpacto im-portantenoquadroepidemiológiconacionalforamconfirmadasnumestudoem crianças e jovens de Maputo sobre alterações no padrão de actividade física em função da urbanização e determinantes socio-culturais.12 A prevalência das doenças nãotransmissíveis associadas ao processo de urbani-zaçãotemconhecidoumcrescimentosignificativo.Hipertensãoarterial,obesidade,diabetesentreou-trosfactoresderiscotêmvindoaserestudadosten-docomopanodefundoasalteraçõesnoestilodevidaque seprocessamnoquadrodocrescimentourbano, nomeadamente nos hábitos de actividadefísicaenutrição.

Independentementedecontrovérsiassobreetio-logia,relaçõescausaisevalidadedepontosdecorte,éconsensualapresençadeumaelevadaprevalênciade HTA em Moçambique. Estudos realizados emcriançaseadolescentesrevelam(1)queaprevalên-cia de HTA aumentou assustadoramente nas últi-masduasdécadas,(2)equeesseaumentoafectoudiferentesclassessociais(Tabela2).Poroutrolado,dados publicados à escala nacional sobre a HTAem adultos sugerem igualmente uma associaçãoentre HTA e Urbanização. A prevalência de indi-víduosMoçambicanoscomtensãoarterialsuperioraodesejáveléde41%nascidadescontra26.8%naszonasrurais13.

Constituindo factores intimamente associadosaestefenómeno,osobrepesoeobesidadesãohojegrandespreocupaçõesdasaúdepublicamundial14.Oexcessodegorduracorporalestáassociadoaumconjunto amplo de co-morbilidades que incluem,para além da HTA, a diabetes, a hiperlipidemia,doençasosteo-articularesentreoutras15.Asconse-quênciasdaobesidadeassumemtamanhoimpactoqueasuaelevadaprevalênciaéconsideradajáumepidemiaàescalamundial.

Os dados em adultos em Moçambiqueapontam para um panorama preocupante onde aurbanização tem um contributo decisivo. A taxa

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desobrepesonaszonasurbanasàescalanacionaléde16.3%emhomense23%emmulheres16.Osdados comparados entre zonas rurais e urbanasevidenciam uma nítida clivagem entre o campoe a cidade. Se analisarmos os dados da cidadede Maputo essa clivagem acentua-se dado quena Cidade Maputo a prevalência de sobrepesoencontrada foi de 26% no homens e 51% nasmulheres(dadosnãopublicados).

Outrosfactoresderisco,comodiabetesebaixaactividadefísica,aindaquetenhamvaloresrelativa-mentemenoselevados,sãosistematicamentemaisprevalecentesnaszonasurbanas,ilustrandooefeitonefastodaurbanizaçãonessesfactores(tabela3).

Em crianças, existem diferentes critérios declassificação,oquefazcomqueosvaloresvariemsubstancialmente conforme a opção seleccionada.Contudo,sejaqualforocritérioutilizado,osdadosemcriançaseadolescentesmostramumatendênciacrescentenosníveisdesobrepesonapopulaçãoemidadeescolar.(tabela4)

Amonitorizaçãodasalteraçõesnacomposiçãocorporal,enãoapenasdamassacorporalemsi,temreveladoque,comoeradeseesperar,oaumentodepesoresultadeumaumentodegorduracorporal.Dadosrelativosàspregasdeadiposidadesubcutâ-nea,medidasemanosdiferentes,nasescolaspúbli-casdaCidadeMaputo,revelamqueatendênciadeaumentodagorduracoporaléconsistenteemtodososescalõesetários(figura1).

A informação disponível sobre a hipertensãoarterial e o sobrepeso ilustram as consequênciasnefastas, jávisíveis,dumprocessodeurbanizaçãoabruptoepoucocuidadoemtermosdeplaneamen-to.Umdosaspectos essenciaisnesteprocessoéoambiente “obesogénico” que se cria, do ponto devistadoplaneamentofísico,emtornodeumcres-cimentocentradonaconstruçãonãoprogramada,nadestruiçãodosespaçosdelazer,naausênciadeparqueserecintosderecreaçãoactiva,naocupaçãodospasseiosparaestacionamentoenatransforma-çãodaszonasdemovimentoemzonasdeconsumo.

Deentreasváriasdeterminantesdaelevaçãodosfactoresderiscodedoençacardiovasculardestaca-

se de forma acentuada o crescente sedentarismo.Aocontráriodassociedadesindustrializadas,eatéaofinaldo séculoXX,Moçambiquecontinuavaaserumpaíscomumapopulaçãofisicamenteactiva,frutoemgrandepartedastarefasdesobrevivênciaesocialização.Mesmonascidades,otransporteac-tivo, os jogos ao ar livre, a prática espontânea dadança, asatividadesdomésticasnãomecanizadas,entre outras, mantinham uma população com ní-veisdedispêndioenergéticodiárioconsiderável19-20

A comparação dos níveis de actividade na ci-dadeenazona rural é evidentementea favordaszonasrurais21.AcomparaçãodentrodaCidadedeMaputo,nosúltimos20anos,demonstraumaevi-dentereduçãodaactividade22.Estáassimestabele-cidaumaassociaçãonegativaentreocrescimentourbanoquetemosestadoaassistireareduçãodosníveisdeactividadefísica.

Estareduçãodeactividadefísicanãoestácomcerteza alheia ao crescimento em obesidade nascriançaseadolescentes(bemcomonosadultos)eàreduçãodosníveisdeaptidãofísicaqueseverifi-camnascrianças.Amonitorizaçãodaaptidãocar-diorrespiratóriaemcriançasdasescolaspúblicasdeMaputo,umdosgrandesindicadoresdaactividadefísicaedasaúdecardiovascular,temsidodemons-tradaporestudosrealizadosemMaputo(figura2).

Transição ou acumulação?

Épordemaisevidentequeanossaconstituiçãoanatómicaefisiológicasefoiconstruindoemtornodeumaevoluçãocentradanomovimento.Sejadopontodevistadafisionomia,sejadopontodevistadasfunçõesfisiológicas,osHominídeosforamevo-luindoemfunçãodeumaadaptaçãocontextualemqueomovimentoparaexercerfunçõesdesobrevi-vênciaconstituiufactorcentral.

A procura de comida feita por caça a colecta,aprocuradeáguaeafugaaosperigosconduziamdeformainvariávelaumdispêndioenergéticoele-vado23. Foram milhões de anos de adaptação bio-lógica,moldandonossosgenes,queiniciaramumprocessolentodereversãoapenascomoiníciodaagricultura, há cerca de 150 mil anos24. Mesmo

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assim,aquedaabruptadodispêndioenergéticoàescalamundialcomeçoudefactocomarevoluçãotecnológicainiciadanoséculoXX.

Oprocessoinicialdaindustrializaçãogerouumcrescimento urbano desordenado aumentando osaglomeradosegerandoproblemasdesaúdepúbli-cacomplexosnasgrandescidades.Éassimquenofinal do século XIX a morbilidade e mortalidadeeramdominadaspordoençasdecaráctertransmis-sível.AsgrandescapitaisdaEuropaedosEstadosUnidos,sededaindustrialização,padeciamdemáscondiçõeshigiênico-sanitáriaspeloqueasdoençasdiarreicasinfantis,asdoençasrespiratóriaseatu-berculoselideravamascausasdemorte,chegandomesmo a apresentar momentos de característicasepidêmicas.

Aolongododesenvolvimentoindustrial,epos-teriormente tecnológico, com particular destaquepara depois da 2ª Guerra mundial, estas capitaisalteraram de forma marcante as suas condiçõesem infraestruturas, serviçosde saúdee educaçãooqueoriginouumareduçãodastaxasde morbi-lidadeemortalidadepordoenças transmissíveisealteroudrásticamenteopanoramaepidemiológico.

Emcontraposiçãoaestesucessoqueelevoudeforma extraordinária a esperança de vida apare-ceramoutrosproblemasdosquais sedestacamasalterações nutricionais e os hábitos de actividadefísica.Acomidadeixoudeserprocuradaouprodu-zidamasencontradanosupermercado,norestau-ranteounofast-food take-away.Acaçaaosanimaispassouaserumdivertimentodepoucosenquantoocidadãocomumsimplesmentesedirigeaotalhopara comprar todo o tipo de animais. O gás ou aelectricidade chegam a casa ao invés de se ter deprocurarlenha.Oprazer,queinicialmentecome-çoupelodesporto,mudou-separaousodetecno-logias -vídeo,televisão, internet,tableteetudoomais.Arevoluçãodosedentarismofoidetalordemqueseestimaqueumhomemmédio,habitualmen-tedotadoparadespender1000caloriasdiáriasemactividade física passou a despender no máximo300calorias.25

Énestecontexto,quepareceexplicar-seaalte-raçãodoquadroepidemiológico.Osedentarismo,

eosnovoshábitosnutricionais,terãolevadoaquehoje,nospaísesindustrializados,asprincipaiscau-sas de morte sejam as doenças cardiovasculares eocancro,ambasdofórumnãotransmissíveleex-tremamente associadas à falta de actividade físicaeobesidade.

Os países não desenvolvidos, como moçam-bique, mantiveram-se até há muito pouco tempoimunes a esta mudança. A grande ruralizarão e amanutenção das tarefasdesobrevivênciaede la-zer comcaracterísticasnãomecanizadas e activasmantiveramestaspopulações“livres”doambiente“obesogênico”.Contudo,apobrezanãodeixouqueestesmesmopaísesselibertassemdosgrandespro-blemasassociadosàmánutriçãoefaltadecuidadoshigiênico-sanitários, mantendo elevados níveis demorbilidadeemortalidadepordoenças transmis-síveis.

A abrupta urbanização fez-se, como vimos,de forma desordenada. As cidades da África e daAméricaLatina,porexemplo,cresceramemmuitopouco temposema infraestruturanecessária.Ascondições higiênico-sanitárias, as condições nu-tricionaisea infraestruturaparaumavidaactivanãoforamgarantidas.Cresceram,comovimosnocasodeMoçambique,osíndicesnegativosderiscocardiovascular.IstolevouaOMSadenominarestespaísesde“paísesdetransição”,comoseestivessemdeixando de terdesepreocuparcomasdoençastransmissíveis. Acontece porém que, da formacomo o processo de urbanização é realizado, au-mentamastaxasdemorbilidadeemortalidadeemdoenças cardiovasculares de forma relevante mas,infelizmente, mantêm-se os elevados índices dedoenças infecto-contagiosas, como malária, HIV/SIDAeturberculose.Assim,aoinvésdeestarmosnumasociedadedetransiçãoparecequeenfrenta-mosumprocessode“acumulação.

Oprocessodetransiçãodaactividadefísica(fi-gura 3) parece irreversível. Contribuem para estefacto a opção de transporte por automóvel priva-do,adificuldadedecircularapédevidoàocupaçãodospasseios,areduçãodosespaçospúblicosdere-creaçãoactivacomojardinserecintosdesportivos,oaumentodapoluiçãoeasuperconcentraçãode

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prédios semanecessária infraestrutura, entreou-tros.

Nosúltimosanosaprocuradeumnovopara-digma relativo ao transporte urbano tem sido departicularinteresse.Afaltadeumapolíticacoeren-tedetransporteconstituiumaspectodeparticularimpactonasaúde.Apoluição,aansiedade,otempodespendidodentrodefilasintermináveis,areduçãodrásticadetempoepossibilidadeparaaactividade,entreoutras,sãohojemotivodealteraçãodopara-digma.Senopassadoosgrandescentrosurbanosconsideravamessencialmenteasuaprojecçãofísicaparaousodoautomóvelprivado,hojeprocura-sereconverteraarquitecturaurbanaparaquealémdoautomóvel as cidades possibilitem meios para an-darapé,debicicletaetransportepúblico.Nãofazsentidoqueascidadesemcrescimentodospaísesmais pobres, conhecendo de antemão as conse-quêncianefastasdosedentarismoebaixaatividadefísica,nãoseprotejamnestesentido.

Perspectivas

Éevidentequeoprocessodeurbanizaçãotemde ser planeado de forma equilibrada. A equaçãoque determina a tomada de decisões nas urbesnacionaistem,necessáriamente,queprevertodosos aspectos, que são muitos e complexos, dosquaistêmdeserpriorizadosasalvaguardadobemestar e saúde dos cidadãos e o desenvolvimentoharmoniosodassuascrianças.

Aserembemaproveitadaseintegradasnospro-cessosdeplaneamentodousodosolo,asiniciativasdesportivas associativas, comunitárias e escolares,emparticularoenvolvimentoespontâneodosmo-radoresnautilizaçãoemanutençãodeespaçosparaapráticadesportiva,podemajudarapreservarge-rações e elevar as cidades moçambicanas a níveisde referência internacional, permitindo que con-corramemigualdadedecircunstânciascomoutrosexemplos já reconhecidos, sobretudo agora quecertos interesses económicos internos e externoscolocam a ocupação e uso da terra no centro dassuasatenções,pondoemcausaalivrealocaçãodeespaçosparafinssociaisquecontribuamparaman-terocorpoeamentesãos.Casocontrário,Moçam-

biquecorreoriscodeexibirnofuturoumaecono-miarobustasemcidadãoscomsaúdeparaestaremàfrentedodesenvolvimentonacional.

Parece imperioso que os planos de desenvol-vimento dediquem maior atenção à promoção daactividade física através de investimentos signifi-cativosemequipamentosderecreaçãoactiva,àse-melhança do que tem sido feito, por exemplo, noalargamentodasredesdeestradaseacessoaáguapotável. Entretanto, a materialização deste ensejosó será viável se houver uma conjugação legítimadesinergiasentretodososintervenientes.

Os dados disponíveis mostram uma situaçãode tendência negativa com sinais de piorasrápidas.Urgecorrigirestasituaçãopoisprocessosurbanísticosmaldimensionadossãonormalmenteirreversíveis.

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Bairro No. de Recintos

çrea Desportiva

(m2)

Populaç‹o (Hab) R‡cio

Napipine 3 17320 3247 5.33

Karrupeia 3 30662 8226 3.73

Namicopo 3 17400 14095 1.23

Tabela 1: RácioÁreaDesportivaÚtilporHabitanteem3BairrosdaCidadedeNampula

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 Rapazes   Raparigas  

 Centro   Periferia   Centro   Periferia  

1992   31.7%   29.9%   24.1%   47.5%  

1999   37.7%   68.2%   43.1%   75.6%  

2012   67.1%   63.8%   70.4%   63.9%  

 

Tabela 2: PrevalênciadehipertensãoarterialsistólicaemcriançaseadolescentesdaCidadedeMaputonosanosde1992,1999e2012(dadosdoprojectoVariabilidadeBiológicaHumanaemMoçambique)

Factor  de  risco Mulher  Urbana   Mulher  rural   Homem  Urbano   Homem  rural  

Sedentários   16.8   6.8   21.1   8.4  

Diabetes   4.9   1.2   5.5   2.4  

Hipertensão   41.0   26.8   40   33.5  

Excesso  de  peso   23.0   6.8   16.3   6.1  

Obesidade   16.4   2.4   5.2   0.8  

 

Tabela 3: Prevalência(%)defactoresderiscodeDCVemadultosMoçambicanos

Rapazes Raparigas Critério   Ano   Centro   Periferia   Centro   Periferia  OMS17 1992 1.5% 3.8% 18.1% 9,2%

1999 8.1% 3.7% 22.3% 9.1%

2012 21.4% 8.8% 28.7% 26.6%

Cole18 1992 0.0% 2.7% 1.2% 4.1%

1999 3.8% 1.4% 13.3% 3.8%

2012 11.2% 4.1% 18.6% 12.9%  

Tabela 4: TaxadesobrepesonapopulaçãoescolardeacordocomocritériodaOMS17edeCole18

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Figura 1: MédiasdepregasdeadiposidadetricipitaldapopulaçãodasescolaspúblicasdeMaputode1992,1999e2012

Figura 2: AptidãocardiorrespiratóriadapopulaçãoescolardeMaputoao longode idademédidapelavelocidademédiadecorridanumtestede1600metros

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 55

Estilo de vida tradicional• Trabalhomanualintenso

• Caminhar como formaprincipaldetransporte

• Reduzidotempodelazer

Estilo de vida moderno• Trabalhosedentário

• Transportemotorizadocomomeiopreferencial

• Lazersedentário

Figura 3: Factoresdeterminanteseresultadosparaasaúderesultantesdatransiçãoematividadefísica(adaptadodereferência26,comadevidaautorização)

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RESUMOS (Português)

Critérios de Diagnóstico Ecocardio-gráfico de Cardiopatia Reumática – Directrizes Baseadas em Evidência

Reményi B, Nigel Wilson, Andrew Steer, BeatrizFerreira, Joseph Kado, Krishna Kumar, JohnLawrenson, Graeme Maguire, Eloi Marijon,Mariana Mirabel, Ana Olga Mocumbi, CleoniceMota, John Paar, Anita Saxena, Janet Scheel,John Stirling, Satupaitea Viali, Vijayalakshmi I.Balekundri, Gavin Wheaton, Liesl Zühlke andJonathanCarapetis

NatRevCardiol2012Feb28;9(5):297-309

Resumo por: Ana Olga Mocumbi, MD PhD, Instituto Nacional de Saúde – Moçambique

Acardiopatiareumáticaéconsequênciadalesãodeválvulascardíacasporumprocessoimunológicoqueresultadeinfecçõesrepetidaspelostreptococ-cusbetahemolíticodogrupoA,edeataquesrepe-tidosdefebrereumática.Afebrereumáticaafectasobretudo crianças e adultos jovens e tem comoúnicasequelapermanenteacardiopatia.Acardio-patiareumáticapodeserprevenidacomocorrec-to tratamentodosepisódiosde febre reumática, eatravésdousoregulardepenicilinaapósestesepi-sódios ou após diagnóstico de lesão valvular reu-mática.Estaprofilaxiasecundáriaéumamedidadeelevadocusto-benefício,masemváriospaíses emdesenvolvimentoacardiopatiareumáticacontinuaum problema de saúde pública, sendo a principaldoençacardíacaadquiridaemcriançasejovens.Asua elevada morbilidade e a mortalidade precoceestãoassociadasacomplicaçõestaiscomofibrilha-ção auricular, acidente vascular cerebral, insufici-ênciacardíacaeendocardite.

Nosúltimosanosousodedespisteecocrardio-gráfico de valvulopatia reumática na comunidadetem revelado prevalências mais elevadas do que

as anteriormente estimadas em várias regiões domundo, incluindo na população de Moçambique.Contudo,osestudosquereportamestasaltaspreva-lênciasapresentamdiferençassistemáticasnaabor-dagemdiagnósticadavalvulopatiareumática,oquereflectesobretudodiferençasnaexperiêncialocalenospadrõesclínico-patológicosdedoença.PorestarazãoumgrupodeinvestigadoresconsultoresparaaFederaçãoMundialdeCardiologia(WorldHeartFederation), que incluia especialistas de duas ins-tituiçõesdesaúdemoçambicanas,desenvolveuumconjunto de critérios de diagnóstico baseados emevidência, que são extensivamente detalhados noartigodeRemeneyecolegas.

Estes critérios padronizados visam permitir aidentificaçãorápidaeconsistentedeindivíduoscomvalvulopatiareumáticasemhistóriaclaradeepisó-diosdefebrereumáticaprévia,umachadocomumempaísespobres,demodoaincluí-losemprogramasdeprevençãosecundária.Baseam-senadetecçãodealteraçõesmorfológicasvalvularesenaavaliaçãodopadrãodefluxosanguíneoatravésdasvávulascardí-acas,feitodeformasimplificadaeacessívelanãoes-pecialistas,podendoserensinadosaprofissionaisdesaúdeaváriosníveis.Daíasuarelevânciaparapaísescomfracosrecursosemqueexisteelevadaprevalên-ciadadoençaouemquesediscuteaimplementaçãodeprogramasecontroledadoença.

Este manuscrito reporta um projecto decolaboração entre pesquisadores de várias partesdo mundo utilizando novas tecnologias para apadronizaçãododiagnósticodumadoençacardíacanegligenciada. Apesar de persistirem algumaspreocupaçõesrelacionadascomacondutaemcasosdelesãovalvularmuitoligeiraenaquelassituaçõesemquenãoéaudívelumsoprocardíaco,espera-seque estes critérios diagnósticos propostos possamser aplicados por não cardiologistas, utilizandoecógrafossimpleseportáteis,demodoamassificaro diagnóstico precoce e garantir a prevenção devalvulopatiareumáticagravenasregiõesendémicas.

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58 Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014

Inquérito Demográfico e de Saúde (IDS), Moçambique 2011

MinistériodaSaúde,InstitutoNacionaldeEstatísticaeICFInternational.2013.InquéritoDemográficoedeSaúde2011.Calverton,Maryland,USA:MISAU,INEeICFI.

Resumo por: Celso Inguane

Em2011MoçambiqueimplementouoInquéri-toDemográficoedeSaúde(IDS2011),oterceiroaseguiraosIDS1997e2003.OIDSéimplementa-doemmaisde90paísesdesde1984,devendoserrepresentativo a nível nacional. Utiliza métodos eprotocolos padronizados de amostragem e de re-colha de dados, rigorosos controlos de qualidade,consistência e continuidade que garantem a suaelevadareputaçãoecomparabilidadeinternacional.Oquestionáriopode seradaptadoaocontextodecadapaís.

O IDS 2011 teve uma amostra probabilística,multi-etápica e estratificada, selecionada a partirdosdadoscartográficosdoIIIRecenseamentoGeraldaPopulaçãoeHabitaçãodeMoçambiquede2007.Na primeira etapa foram selecionadas unidadesprimáriasdeamostragem,comprobabilidadepro-porcionalaoseutamanho(númerodeagregadosfa-miliaresporestratoprovincial).Nasegunda,foramselecionados,comprobabilidadesiguais,osagrega-dosfamiliaresavisitaremcadaáreaurbanaerural,apósaactualizaçãodoseunúmeromediantelista-gem.Finalmente,foraminquiridasmulheres(15-49anos)ecolhidosdadossobrecriançasmenoresde5anosemtodososagregadosselecionadose, inqui-ridoshomens(15-64anos)em30%dosagregados.

O IDS 2011 incluiu 13.964 agregados familia-resnosquais foram inquiridos17.848 indivíduos,tendo sido obtidas taxas de resposta bastante ele-vadas(99%paramulherese98%parahomens).Oinquérito explora características socioeconómicasdosagregadosfamiliaresedapopulaçãoestudada,comoacomposiçãodosagregados,níveldeescola-ridade,acessoaáguaetipodefontesdeáguapara

beber,tipodeinfraestruturassanitárias,caracterís-ticas da habitação e posse de bens duráveis (paraconstruçãodequintisderiqueza-indicadorapro-ximadodonívelsocioeconómico).Sãoigualmenteapresentadosdadossobreafecundidade,intençõesreprodutivas, planeamento familiar e actividadesexual.Relativamenteàsaúdedamulher,inclui-seinformaçãosobrecuidadospré-nataisepós-parto,nutrição da mãe, mortalidade materna e acesso acuidadosdesaúde.Osdadossobreasaúdeinfantilenfocamnamortalidadeinfanto-juvenil;nutrição;imunização; prevenção, prevalência e tratamen-to das principais doenças na infância. O enfoquenas principais endemias em Moçambique incluidados sobre medidas de prevenção, prevalência etratamentodamalárianasmulheresgrávidaseemcriançasmenoresde5anos;econhecimentosobreaprevençãoetransmissãodoHIV,estigmacontrapessoas vivendo com o HIV/SIDA, cobertura detestagemdeHIVecomportamentosderiscoparaainfecçãoporHIVemadultos,jovenseadolescentes(15-24anos).DuasnovidadesrelativamenteaoIDS2003sãoosdadossobreoestatutodamulher(em-poderamentoeviolênciadoméstica).

A representatividade (nacional, provincial e porárea de residência – urbano/rural), padronização,consistênciaecontinuidadedoIDSpermitemousodosseusdadosparamonitorartendênciasdediversosindicadoresedeterminantesdesaúde,reportadosnosIDS1997e2003,InquéritoNacionaldePrevalência,RiscosComportamentaiseInformaçãosobreoHIVeSIDAemMoçambique(INSIDA2009), InquéritodeIndicadoresMúltiplos(MICS2008),Inquéritoso-breIndicadoresdaMalária(MIS2007),ecompararainquéritossimilaresrealizadosinternacionalmente.OsdadosdoIDS2011permitem,consequentemente,avaliararespostanacionalaosprincipaisproblemasdesaúdeeoníveldecumprimentosdosObjectivosdeDesenvolvimentodoMilénio,especialmenteoal-cancedaescolaridadeprimáriauniversal;promoçãodaigualdadedegêneroeempoderamentodamulher;reduçãodamortalidadeinfantil;melhoriadamater-nidadematernae;combateaoHIV/SIDA,maláriaeoutrasenfermidades.

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 59

“How Point-of-Care Testing Could Drive Innovation in Global Health”

IleshV.JanieTrevorF.Peter

NEnglJMed.2013Jun13;368(24):2319-24.

Resumo por: Ilesh Jani, MD PhD, Instituto Nacional de Saúde - Moçambique

A recente expansão dos serviços de saúdea nível global tem conduzido a uma crescentedemanda de testes diagnósticos. No entanto, ostestes diagnósticos clássicos não são apropriadospara satisfazer necessidades globais, pois sãodependentes de infraestrutura complexa, técnicosqualificadosecorrenteeléctricaestável.Éesperadoquetecnologiassimplificadasdediagnóstico(TSD),que não requerem infraestrutura laboratorial,joguem um papel cada vez mais importante naexpansãodoscuidadosdesaúdeempaísesdebaixaemédiarenda.

AsTSD(porexemploostestesrápidos)têmsidolargamente usadas para diagnosticar condiçõescomoHIVemalária.EstaprimeirageraçãodeTSDébaseadaembio-marcadoresdefácildetecçãotaiscomoanticorpos,antígenosereacçõesbioquímicas.Como consequência de progressos tecnológicosrecentes,umasegundageraçãodeTSDvislumbra-se agora no horizonte, sendo capaz de detectarbio-marcadores mais complexos tais como ácidosnucleicosemarcadoresdesuperfície.Umaterceirageração de TSD, ainda em desenvolvimento, irápossibilitaradetecçãosimultâneadealvosmúltiplos(multiplex)eiráfazerusodebio-marcadoresmaisfiáveis. Esta revolução tecnológica irá permitir aextensão de cada vez mais serviços diagnósticosparaaclínicaeparaacomunidade.

As TSD podem ter um efeito transformador.No entanto, o seu impacto poderá ser limitadopor fraquezas dos sistemas de saúde. Os sistemasde saúde têm sido desenhados com base ou nodiagnósticosindrómicoouentãonousode testesexecutadosnolaboratório,enãoestãoadaptadosaousodeTSD.Quatroáreasprincipaissãopropostas

paraintroduçãodemudançasnossistemasdesaúde:i) políticas de testagem; ii) sistemas operacionais;iii) desenho, operação e fluxo das unidadessanitárias; e, iv) iniciativas de descentralização eretenção. As TSD só serão custo-eficientes se ainovação tecnológica que elas constituem foremacompanhadasporinovaçãodossistemasdesaúde.

Inquérito Nacional de Prevalência, Riscos Comportamentais e Informa-ção sobre o HIV e SIDA em Moçambi-que (INSIDA 2009)

1InstitutoNacionaldeSaúde,Moçambique;2CenterforDiseaseControl,EUA

Resumo por: Mussagy Mahomed1, Carlos Botão1, Acacio Sabone1, Francisco Mbofana1, Peter Young2.

Osinquéritosnapopulaçãogeralestimamoní-vel de prevalência de HIV com maior fiabilidade,pois são baseados na comunidade, e incluem mu-lheres,homensecrianças.Estes inquéritospodemrecolherinformaçãosobreosfactoresderiscodain-fecçãoporHIVesobreoimpactodasintervençõesdeprevenção.OInquéritoNacionaldeHIV/SIDA(INSIDA)foipelaprimeiravezrealizadoem2009.Oobjectivodesteinquéritofoideterminarapreva-lênciadainfecçãoporHIVnapopulaçãomoçambi-canade0-64anos.Elefoidesenhadoparafornecerdadosdenívelnacional,urbano/ruraleprovíncial.

Foramseleccionados6,232agregadosfamiliaresem270áreasdeenumeraçãoruraiseurbanas,nas11provínciasdopaís.Todasasmulhereseosho-mensde15-49anoseadolescentesde12-14anosresidentes nos agregados familiasres selecionadosparaoinqueritoeramelegíveisparaaentrevistaeparaacolheitadeamostrasdesangue.Adicional-mente,emmetadedosagregadosfamiliaresabran-gidos pelo inqueríto, foram colhidos dados sobrecrianças de 0-11 anos a partir dos pais ou encar-

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regados.Foramaindacolhidasamostradesangue:amostrasdecriançascom0-23mesesforamtesta-dascomPCRenquantoasamostrasdosindivíduosentre2e64anosforamtestadascomalgoritmodedoistestesELISAemsérie,havendoaindarecursoaumterceirotesteparadesempate.

Em 2009 foram inquiridos 18,338 indivíduosde12-64anosecriançasde0-11anos(atravésdosseuspaisouencarregados)dosquais foramtesta-dos 16,597 indivíduos de 0-64 anos. A estimativadaprevalênciadeHIV foide11.5%(Intervalodeconfiança de 95% [IC]: 10.3-12.6%) nos adultosde 15-49 anos, sendo mais elevada nas mulheres(13.1%[IC:11.7-14.5%])doquenoshomens(9.2%[IC:8.0-10.4%]),nosjovensde15-24anosapreva-lênciafoide7.9%(IC:6.6-9.2%),sendo11.1%(IC:9.0-13.2%)raparigase3.7%(IC:2.6-4.9%)rapazes.Paraosadultosde50-64anosaprevalênciadeHIV

foide8.5%eentreadolescentesde12-14anosfoide1.8%(IC:1.0-2.7%).Paracriançasde0-11anosaprevalênciafoide1.4%(IC:1.0-1.9%)sendoentreasmenoresdeumanode2.3%.Aprevalênciadein-fecçãoporHIVentreadultosde15-49anosfoisu-periorentreosresidentesdeáreasurbanas(15.9%)comparativamente aos das áreas rurais (9.2%). AprovínciadeGazamostrouteraprevalênciamaisalta(25.1%),enquantoadoNiassaapresentoumaisbaixaentreadultos(3.7%)dos15-49anos.

OsdadosobtidosdoINSIDArevelamqueMo-çambique é o país com 8ª maior prevalência deHIV/SIDAdomundo.Asmulheressãomaisafec-tadosquehomenseaepidemiamostragrandedi-versidadegeográfica,comprevalênciasprovínciaisquevariamde<5%até25%.Aimplementaçãore-gulardoINSIDApermitiráamonitoriadapreva-lênciadeHIVemMoçambiqueaolongodotempo.

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RESUMOS (Inglês)

World Heart Federation criteria for echocardiographic diagnosis of rheumatic heart disease an evidence-based guideline

Reményi B, Nigel Wilson, Andrew Steer, BeatrizFerreira, Joseph Kado, Krishna Kumar, JohnLawrenson, Graeme Maguire, Eloi Marijon,Mariana Mirabel, Ana Olga Mocumbi, CleoniceMota, John Paar, Anita Saxena, Janet Scheel,John Stirling, Satupaitea Viali, Vijayalakshmi I.Balekundri, Gavin Wheaton, Liesl Zühlke andJonathanCarapetis

NatRevCardiol2012Feb28;9(5):297-309

Summary by: Ana Olga Mocumbi, MD PhD, Nacional Institute of Health – Mozambique

Rheumaticheartdiseaseisaresultofcardiacvalvedamagebyanimmunologicalprocesswhichresults from repeated infections by streptococciofAbeta-haemolyticgroup,andrepeatedattacksof rheumatic fever. Rheumatic fever affectsmainly children and young adults and its onlypermanenteffectistheheartdisease.Rheumaticheart disease can be prevented with the propertreatment of episodes of rheumatic fever, andthrough the regular use of penicillin after theseepisodesorafterdiagnosisofrheumaticvalvularinjury. This secondary prophylaxis is a highcost-benefit measure, but, in many developingcountries, rheumatic heart disease remains apublic health problem, and it is the main heartdisease acquired by children and young adults.Its high morbidity and premature mortality areassociated with cardiovascular complications,such as arterial fibrillation, stroke, heart failure,andendocarditis.

Inrecentyears,theuseofecocardiacscreeningforrheumaticvalvediseaseinthecommunityhasrevealed higher prevalence rates than the ones

previously estimated in various regions of theworld,includinginMozambique.However,studieshavereportedhighprevalenceof thesesystematicdifferencesinthediagnosticapproachofrheumaticvalve disease, which mainly reflects differences inlocal expertise and clinical-pathological patternsof disease. Therefore, a group of consultantresearchers to theWorldHeartFederation,whichincluded experts from two health institutions inMozambique,hasdevelopedasetofcriteriaforthediagnoses of this disease. These criteria are basedon evidence, as it is extensively explained in thearticlepresentedbyRemeneyandcolleagues.

These standardized criteria are designed toenable the rapid identification and consistent ofindividualswithrheumaticvalvediseasewithoutaclearhistoryofprior episodesof rheumatic fever,a common finding in poor countries, in order toincludetheminprogramsofsecondaryprevention.They are based on the detection of valvularmorphologicalchangesaswellasontheevaluationof standard blood flow through the heart valves,which can be made in a simplified and accessiblewaybynon-expertsand,therefore,itcanbetaughtto health professionals at various levels. Thisexplainsitsrelevancetopoorcountrieswherethereishighprevalenceofthediseaseorwherethereisa discussion about the implementation of diseasecontrolprograms.

This paper reports a collaborative projectbetweenresearchers fromaroundtheworldusingnewtechnologiestostandardizethediagnosisofaneglectedheartdisease.Inspiteofsomeconcernsabout the procedures in cases of very slightvalvular lesion as well as in situations where theheartmurmurisnotaudible,weexpectthattheseproposeddiagnosticcriteriacanbeappliedbynon-cardiologistsusingsimpleandportableechographs,sothattheearlydiagnosiscanbespreadtoensurethepreventionofsevererheumaticvalvulardiseaseinendemicregions.

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Demographic and Health Surveys (DHS), Mozambique 2011

Ministry of Health, National Institute of StatisticsandICFInternational.In2013.DemographicandHealth Survey 2011. Calverton, Maryland, USA:MOH,INEandICFI.

Summary by: Celso Inguane

In 2011, Mozambique implemented theDemographicandHealthSurvey(DHS2011),thethirdafter theDHS1997and2003.TheDHShasbeenimplementedinover90countriessince1984,and it must represent the entire nation. It usesstandardizedmethodsandprotocols for samplingand data collection, accurate quality control toensureconsistencyandcontinuity,andthisassuresits high reputation and international acceptance.Thequestionnairecanbeadaptedtothecontextofeachcountry.

The DHS 2011 had a probabilistic sample,multiple and stratified layer, selected from themappingdataofIIIPopulationandHousingCensusof Mozambique 2007. In the first stage, primarysamplingunits,withprobabilityproportionaltoitssize(numberofhouseholdsperprovincialstratum)were selected. Second, with equal probability,households in each urban and rural area to bevisited,afterupgradingits listingbynumberwereselected. Finally, women (15-49 year-old) wereinterviewed and data on children under the ageof5inallselectedhouseholdswascollected.Menbetweentheages15-6 in30%ofhouseholdswerealsosurveyed.

The DHS 2011 included 13,964 householdswith 17,848 individuals were interviewed, havingbeenobtainedfairlyhighresponserates(99%forwomen and 98 % for men). The survey exploressocio-economic characteristics of householdsand the population studied, such as householdcomposition, education, access to water and

type of sources of drinking water, type of healthinfrastructure, housing characteristics andownershipofdurablegoods(forbuildingsourcesofwealth-roughindicatorofsocioeconomicstatus).Data on fertility, reproductive intentions, familyplanning and sexual activity are also presented.In respect to women’s health, this data includesinformation on prenatal care and postpartummother’snutrition,maternalmortality,andhealthcareaccess.Dataonchildhealthfocusesonissuesof child mortality; nutrition, immunization,prevention, prevalence and treatment of majordiseasesinchildhood.Thefocusonmajorendemicin Mozambique includes data on prevention,prevalence and treatment of malaria in pregnantwomenandchildrenunder5years,andknowledgeaboutpreventionandtransmissionofHIV,stigmaagainstpeoplelivingwithHIV/AIDS,coverageofHIVtestingandriskbehaviourforHIVinfectioninadultsandadolescentsandyouth(15-24years).Tworelativelynewtothe2003DHSdataindicatethestatusofwomen(empowermentanddomesticviolence).

The representation (national , provincial andarea of residence - urban/rural), standardization,consistency and continuity of the DHS allowstheuseof theirdata tomonitor trendsofvariousindicatorsanddeterminantsofhealth,reportedintheDHS1997and2003NationalSurveyPrevalence,Behavioural Risks and Information on HIV andAIDS in Mozambique (INSIDA 2009), MultipleIndicator Cluster Survey ( MICS 2008), MalariaIndicatorSurvey (MIS2007) , andcompare it tosimilarsurveysconductedinternationally.DHSdata2011may,therefore,evaluatethenationalresponsetomajorhealthproblemsandtheleveloffulfilmentoftheMillenniumDevelopmentGoals,particularlyin regards to universal primary education;promotion of gender equality and empowermentof women; reduction of child mortality; maternalhealth improvement; prevention of HIV/AIDS,malariaandotherinfectiousdiseases.

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Revista Moçambicana de Ciências de Saúde, Vol. 1, n.1, 2014 63

How Point-of-Care Testing Could Drive Innovation in Global Health

IleshV.JanieTrevorF.Peter

NEnglJMed.2013Jun13;368(24):2319-24.

Summary by: Ilesh Jani, MD PhD, National Institute of Health – Mozambique

The recent expansion of health services atthe global level has led to an increasing demandfor diagnostic tests. However, the classicaldiagnostic tests are not suitable to meet theoverall needs, because they are dependent oncomplex infrastructure, skilled technicians, andstable electricity current. Simplified diagnostictechnologies(SDT)whichdonotrequirelaboratoryinfrastructure are expected to play an increasingimportant role in the expansion of health care inlowandmiddleincomecountries.

TheSDT(e.g.rapidtests)havebeenwidelyusedtodiagnosediseases,suchasHIVandmalaria.Thisfirst generation of SDT is based on bio-markersfor easy detection, such as antibodies, antigens,and biochemical reactions. As a result of recenttechnological developments, a second generationof SDT has emerged now on the horizon, beingable to detect more complex biomarkers, suchas nucleic acids and surface markers. A thirdgenerationofSDT,stillbeingdeveloped,willallowthe simultaneous detection of multiple targets(multiplex) and will make use of more reliablebiomarkers. This technological revolution willallowanincreaseofdiagnosticservicestotheclinicandtothecommunity.

The SDT can have a transformative effect.However, their impact may be limited because ofweaknesses in the health systems. Health systemshavebeendesignedbasedonsyndromicdiagnosisorelseintheuseoftestsperformedinthelaboratory,andarenotadaptedtotheuseofTSD.Fourmainareasareproposedto introducechangestohealthsystems: i) testing policies, ii) operating systems,iii)design,operationandflowofhealthunits,and,

iv) decentralization initiatives, and retention. TheSDTwillonlybecost-effectiveifthetechnologicalinnovation they represent is accompanied byinnovationinthehealthsystems.

National Survey on Prevalence, Behavioural Risks and Information on HIV and AIDS in Mozambique (INSIDA 2009)

1Instituto National Health, Mozambique; 2CenterforDiseaseControl,EUA

Summary by: Mussagy Mahomed1, Carlos Botão1, Acacio Sabone1, Francisco Mbofana1, Peter Young2.

Generalsurveysinthepopulationestimatethelevel of HIV prevalence with greater reliability,because they are community-based, and theyinclude women, men, and children. Thesesurveys can collect information on risk factorsof HIV infection and the impact of preventioninterventions. The National Survey on HIV/AIDS(INSIDA) was first performed in 2009. The aimof this surveywas todetermine theprevalenceofHIV infection in Mozambican population aged0-64years.Thesurveywasdesignedtoprovidedatafornational,urban/ruralandprovincialareas.Forthis survey,6,232households in270enumerationareasinruralandurbanregionsofall11provincesofthecountrywereselected.Allwomenandmenaged 15-49 years as well as all adolescents aged12-14 years, living in those selected households,were also eligible for the interview and for thecollection of blood samples. Additionally, in halfof the selected households covered by the survey,datawascollectedonchildrenaged0-11yearsfromtheirparentsorguardians.Bloodsampleswerealsocollected:samplesfromchildren0-23monthsweretestedbyPCRwhilesamplesofindividualsfrom2and64yearsweretestedusinganalgorithmoftwo

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ELISAtestsappliedoneaftertheother;athirdtestwaslaterusedfortiebreakereffects.

In 2009, 18,338 12-64 years individuals weresurveyed and 0-11 years children (through theirparents or guardians) of which 16,597 0-64 yearsindividualsweretested.TheestimatedprevalenceofHIV was 11.5 % ( confidence interval 95 % [CI] :10.3-12.6%)inadultsaged15-49,beinghigherinwomen(13.1%[CI:11.7-14.5%])thaninmen(9.2%[CI:8.0-10.4%]);inyoungpeopleaged15-24 years the prevalence was 7.9 % (CI: 6.6-9.2 %)and11.1%(CI:9.0-13.2%)ingirlsand3.7%(CI:2.6-4.9%)inboys.Foradultsaged50-64years,theprevalenceofHIVwas8.5%andamongadolescentsaged 12-14 years was 1.8 % (CI: 1.0-2.7 %). For

childrenaged0-11years,theprevalencewas1.4%(CI:1.0-1.9%)andyounger thanoneyearamongchildren 2.3%. The prevalence of HIV infectionamong adults aged 15-49 was higher amongurban residents (15.9 %) than rural areas (9.2%).The province of Gaza had the highest prevalence(25.1%),whileNiassashowedthelowestamongtheadultsaged15-49(3.7%).

TheINSIDAdatareveals thatMozambique is the8thhighestHIV/AIDSprevalencecountryintheworld.Womenaremoreaffectedthanmenandtheepidemicshows great geographical diversity, with provincialprevalence ranging from < 5 % to 25 %. Regularimplementation of INSIDA will allow monitoring ofHIVprevalenceinMozambiqueovertime.