revista in guardia.3ª edição

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Revista com teor católico, apostólico, romano.

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Page 1: Revista In Guardia.3ª edição
Page 2: Revista In Guardia.3ª edição

Ano I, nº 03, Dezembro 2011

Revista Bimestral

Edição:

Emanuel de Oliveira Costa Jr.

Diagramação

Emanuel de Oliveira Costa Jr.

Design e Logos:

Ellen Jordana Portilho Mendes

Colaboradores Colunistas dessa Edição:

Ana Maria Bueno da Cunha

Bruno Dornelles de Castro

Carlos Ramalhete

Diego Guilherme

Evelyn Mayer de Almeida

Pe. Inácio José do Vale

Ian Farias

Ivanaldo Santos

Ives Gandra da Silva Martins

Jorge Ferraz

Kairo Rosa Neves de Oliveira

Karen Mortean

Lenise Garcia

Lizandra Danielle Araújo da Silva

Márcio Antônio Campos

Pedro Brasilino Peres Netto

Rafael de Mesquita Diehl

Rafael Vitola Brodbeck

Contato:

[email protected]

Sessão Carta do Leitor Cartas para a sessão carta do leitor poderão ser enviadas para o

blof como comentário em www.binguardia.blogspot.com ou ao

e-mail de contato da revista: [email protected].

Página no Facebook

https://www.facebook.com/InGuardia

Os artigos dessa revista poderão ser reproduzidos desde que se

indicada a fonte.

O conteúdo das matérias assinadas é da responsabilidade dos

respectivos autores.

Essa revista tem o cunho essencialmente católico apostolico

romano, não devendo ser entendido sob outro prisma ou

filosofia.

Sumário Nossa capa.

Cristo Rei do Universo. Nossa Equipe nessa Edição. Editorial

Pense como os Santos

A vida dos Santos com Ana Maria Bueno

A Imaculada Conceição.. A homilia de Pedro

Homilia do Papa João Paulo I na Tomada de posse da Diocese de Roma—1978 A homilia do Papa

Homilia em Benim—África - Novembro 2011 Brasil sem Aborto Com Lenise Garcia Células-tronco: ciência e ética, verdades e falácias . Idade Média com Rafael Diehl A Igreja e a preservação do saber antigo. Educação, Política e Humanidades com Evelyn Mayer - A Educação na Colônia, Jesuítas e Marquês de Pombal .

Aspectos do matrimônio com Karen Mortean De irresistíveis a imcompatíveis. Tubo de Ensaio com Márcio Antônio Campos Entrevista: Rafael Vicuña,. Diário de Bordo da JMJ com Pedro Brasilino Seu nome completo. Apologética da Fé com Pe. Inácio José do Vale Espíritas e demônios. Coluna do Ives Gandra

Os Borgs e a Comissão da Verdade Cívitas com Rafael Brodbeck - O sentido da festa litúrgica de Cristo Rei . DSI—Doutrina Social da Igreja com Bruno de Castro. Por que o socialismo é incompatível com a doutrina católica?

Lo Student della Liturgia com Kairo Neves As Vigílias no Rito Romano .

Milagres com Lizandra Danielle A Santa Casa de Loreto

Chesterton no Brasil com Diego Guilherme Chesterton, eterno amigo do homem

Dicas e Indicações de Literárias com Igson Mendes da Silva. O cérebro espiritual

Catecismo com Carlos Ramalhete O Catecismo.

Coluna do Jorge Ferraz

As razões da nossa Fé

Exegetica Expositio com Ia Farias Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo.

Coluna do Prof Ivanaldo

O Estado laico e a discriminação religiosa

Indicações e Dicas

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Nossa Capa Cristo Rei do Universo.

Cristo Rei é um título de Jesus baseado em várias passagens bíblicas e, em geral, usada por todos os cristãos. A Igreja Católica, a Igreja Anglica-na, bem como várias outras denominações cristãs protestantes, incluindo os presbiterianos, luteranos e metodistas, celembram, em honra de Cristo sob este título. Obviamente que a Festa de Cristo Rei no último domingo do ano litúrgico, antes que o novo ano comece com o primeiro domingo do Advento, não é devidamente celebrada pelas denominações protestan-tes uma vez que elas sequer costumam ter um calendário próprio de fes-tas. O título de Rei é utilizado para Cristo em diferentes formas na Bíblia: Rei dos séculos, Rei de Israel, Rei dos Judeus, Rei dos Reis, Rei dos santos, Soberano dos Reis. Pilatos escreveu e mandou colocar sobre a Cruz a ins-crição INRI, da frase latina IESVS NAZARENVS REX IVDAEORVM, que se traduz como "Jesus de nazaré, Reo dos Judeus". As principais idéi-as sobre o reinado de Cristo estão expressas na encíclia Quas Pri-mas do Papa Pio XI, publicada em 1925. Nessa edição teremos alguns artigos específicos sobre essa festa e esse título de fundamental que Cristo recebe por puro merecimento. Decidi-mos dedicar boa parte de nossa revista para apresentar exatamente essa festa, suas nuances litúrgicas e teológicas, históricas e políticas. O título "Cristo Rei" acabou por ser frequentemente usado para denomi-nar igrejas, escolas, seminários, hospitais e institutos religiosos. Cristo Rei

é Jesus Cristo de Nazaré para os protestantes. O termo também foi utili-zado por movimentos políticos, como Realistas franceses durante a Rebelião de Vendeia, Cristeros mexicanos que combateram o gover-no anticlerical do Presidente Plutarco Calles e os guerrilheiros de Cristo Rei - organização paramilitar espanhola - que combateu o governo Franco.

Colocada no fim do ano litúrgico, aparece à solenidade de Cristo Rei co-mo síntese dos mistérios de Cristo comemorados no curso do ano, como o

vértice em que resplandece com mais intensa luz a figura do Senhor e Salvador de todas as coisas.

Domina nas duas primeiras leituras a majestade e o poder régio de Cristo. Contempla a profecia de Daniel (7, 13-14) seu apareci- men-

to nas "nuvens do céu" (ibidem, 13), fórmula tradicional que indica a volta gloriosa de Cristo no fim dos tempos para julgar o mundo. "Todo o poder lhe foi dado, toda a glória e império. Todos os povos, nações e lín-guas o servirão. Seu poder é poder eterno. Seu reino não terá fim" (ibidem, 14). Deus - "o Ancião" (ibidem, 13) - o constituiu Senhor de toda a criação, conferindo-lhe um poder que ultrapassa os confins do tempo. Na 2ª leitura (Ap 1,5-8), realça-se este conceito com a famosa expressão: "Eu sou o Alfa e o Omega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que vem, o Onipotente" (ibidem, 8). Cristo, Verbo eterno; é "aquele que é" e sempre foi, princípio e fim de toda a criação. Cristo, Verbo encarnado, é aquele que vem para salvar os homens, princípio e fim de toda redenção e que um dia virá para julgar o mundo. Ei-lo que vem entre as nuvens e todos os olhos o verão, também os que o traspassaram e, por causa dele, hão de se lamentar todas as tribos da terra “(ibidem, 7). Impressionante é que, no Evangelho de João - o evangelista teólogo - es-teja o tema da realeza de Cristo constantemente ligado ao da Paixão. E que, na realidade, é a Cruz o trono régio de Cristo. Da Cruz abre os braços para apertar a si todos os homens, da Cruz governa com seu amor. Para que reine sobre nós, temos de nos deixar atrair e vencer pelo seu amor. Oração. *Deus eterno e todo-poderoso, dispusestes restaurar todas as coisas no vosso amado Filho, Rei do universo, Fazei com que todas as criaturas, libertas da escravidão do pecado, e servindo à vossa Majestade, vos glori-fiquem eternamente.

Dezembro 2011 / In Guardia 03

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Nossa Equipe

Emanuel de Oliveira Costa Jr. - Editor Católico, casado, coordenador do Grupo de Coroi-nhas e Acólitos da Paróquia do Imaculado Coração de Maria em Goiânia/GO, advogado militante, professor, autor de artigos científicos publicados em revistas impressas e virtuais. Mantém o Blog d o E m a n u e l J r . : www.blogdoemanueljr.blogspot.com Twitter:

http://twitter.com/emanuelocjr Facebook: Emanuel Jr.

Rafael Vitola Brodbeck - Colu-nista Católico, casado, é Delegado de Polícia em Sta Vitória do Pal-mar, RS, coordena o site "Salvem a Liturgia". Colu-nista da "Catequese Litúr-gica", na revista mensal "O Mensageiro de Santo

Antônio", dos Frades Menores Conventuais, membro da Sociedade Internacional Santo Tomás de Aquino (SITA/Roma), e da Academia Marial de Aparecida. É incor-porado ao Regnum Christi (1998). Pa-lestrante de Liturgia e doutrina. [email protected] Twitter: http://twitter.com/rafael_brodbeck

Kairo Rosa Neves de Oliveira - Colunista Católico, solteiro, estudante universitário, cursa Engenharia Civil na UNESP de Ilha Solteira - SP. Colaborador do site "Salvem a Liturgia", na coluna de paramentos litúr-gicos e dando dicas para solenizar a cele-bração. Atua no site Movimento Liturgico, responde dúvidas litúrgicas. Mantém, ain-da, um blog de imagens litúrgicas, o Zelus.

E-mail: [email protected]

Evelyn Mayer de Almeida - Colu-nista Uma filha de Deus, católica, esposa e mãe desejosa em cumprir a doce mis-são que o Senhor a deu. Professora de Língua Portuguesa, é também dona do

blog Fazei o que Ele vos disser e colaboradora do site Rainha dos Apóstolos. Já foi coordenadora da Missão Kerigma Christi. Interessa por Filosofia, Educação, Política e Humanidades.

Twitter: @evelynsmalmeida Facebook: Evelyn Mayer de Almeida

Pedro Brasi-lino Peres Netto - Colunis-ta Soltei-ro, Católico, estudante de Biomedicina na Universi-dade Federal de Goiás-

UFG, coordenar a Pastoral da Juventude na Paróquia do Imaculado Coração de

Maria em Goiânia. Facebook: Pedro Brasilino.

Ives Gandra da Silva Martins - Colunista. C a t ó l i c o .

D i s p e n s a maiores apresenta-

ções. Ganhador de di-versos prêmios, profes-sor em diversas facul-dades. Professor Emérito e honoris causa em

várias universidades. Doctor Honoris Causa da Universidade de Craiova – Romênia. Um dos

mais conceituados tributaristas brasileiros. Supernumerário da Opus Dei. Colar de

mérito judiciário em diversos Tribunais do país, bem como medalhas e comen-

das de mérito cultural.

Lenise Garcia - Colunista Católica, graduada em Farmácia e Bio-

química pela Universidade de São Paulo, mestrada em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo e doutorada em Microbiologia e Imunologia pela Uni-versidade Federal de São Paulo. Atual-mente é professora adjunta da Universida-de de Brasília, no departamento de Biolo-gia Celular. Numerária do Opus Dei. Pre-sidente do Movimento Nacional da Cida-dania pela Vida – Brasil Sem Aborto

Márcio Antônio Campos - Colunista Católico, formado em Jornalismo pela USP e passou pelo Curso Estado de Jornalismo. Jorna-lista do Jornal Ga-zeta do Povo. Des-

de setembro de 2010 é editor de Economia da Gazeta do Povo, e também mantém o blog Tubo de Ensaio, sobre ciência e religião.

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Nossa Equipe

Pe. Inácio José do Vale - Colunista É sacerdote católico e Pároco da Paróquia São Paulo Apóstolo em Resende/RJ, é es-pecialista em Ciência Social da religião pesquisador de seitas e conferencista, é Professor de Teologia Sistemática na Faculdade de Teologia de Volta

Redonda/RJ. E-mail: [email protected]

Ana Maria Bueno da Cunha - Colunista Casada, católica, Farmacêutica- bioquími-ca, dona de casa, mãe de dois filhos em -

Praia Grande/SP. Católica amante da Igreja, da Santíssima Virgem, do Santo Padre o Papa e sempre seden-

ta da graça de Deus. Mantém o b lo g B lo g : É R a zo á ve l C r e r ? h t t p : / /razoavelcrer.blogspot.com

Ellen Jordana Portilho Mendes - Capista e desenvolvedora de logos. Católica, casada, mãe de dois filhos, professora municipal, formada em Educação Física pela UFG. Coorde-nadora do Grupo de Acólitos e Coroinhas na Paróquia do Imacula-do Coração de Maria e Goiânia/

Lizandra Danielle Araú-jo da Silva - Colunista.

Católica, solteira, estudante de Controle Ambiental no Instituto

Federal de Goiás. Coroi-nha há 6 anos na Paró-quia do Imaculado Cora-

ção de Maria em Goiânia. Twitter: _lizdaniele

Bruno Dornelles de Castro - Colunista Católico, solteiro, formado em Direito. Dá forma-ções de Doutrina Social da Igreja. Mantém um blog onde escreve sobre política e filosofia (brunodornellesdecastro.blogspot.com). É incor-porado ao Regnum Christi. Facebook: Bruno Dornelles de Castro

Rafael de Mesquita Diehl - Colunista Historiador e Professor for-mado pela Universidade Fe-deral do Paraná (UFPR) e atualmente mestrando em História na mesma institui-

ção. Estuda História Medieval e participa dos apostolados virtuais Reino da Virgem Mãe de Deus (www.reinodavirgem.com.br) e Salvem a Liturgia! (www.salvemaliturgia.com). Também é catequista e ministra formações na área de História da Igreja e Arte sacra.

Karen Fernandes—Colunista Esposa, mãe, enfermeira, especializada na área da educação, instrutora do Método Billings da Ovula-ção p e lo W OOMB /

Cenplafam-BR.

Carlos Ramalhete—Colunista Casado, pai de dois filhos adolescentes, e licenciado em filosofia pela Universidade Católica de Petrópolis. Trabalha como pro-fessor de filosofia e sociologia, além de manter uma coluna no jornal Gazeta do Po-vo (Curitiba) e o apostolado A Hora de São

Jerônimo, o apostolado de apologética católica mais antigo da internet brasileira (www.hsjonline.com).

Igson Mendes da Silva - Colunista Leigo Católico, Solteiro, Analista de Siste-mas do Tribunal de Contas do Amazonas, graduando em Teologia, membro da Paró-quia de Santa Luzia, palestrante sobre dou-trina, ética aplicada aos meios de comunica-ções sociais; formador, colabora com movi-mentos eclesiais ligados a Igreja Católica,

Dirige o Apostolado Spiritus Paraclitus que se dedica em promover a fé católica. E-mail: [email protected]

Ivanaldo Santos - Colunista. Ivanaldo Santos é filósofo, doutor em estudos da linguagem, professor do Departamento de Filosofia e do Progra-ma de Pós-Graduação em Letras da UERN. Possui vários livros publica-dos, entre os quais destacam-se: Teologia da Libertação: ensaios e refle-xões e Linguagem e epistemologia em Tomás de Aquino. E-mail: [email protected].

Jorge Ferraz - Colunista Solteiro, católicos, Bacharel em Ciência da Computação, Centro de Informática / UFPE , mantém o site www.deuslovult.org/

Ian Farias de Carvalho Almeida - Colu-nista Solteiro, católico, Seminarista do Seminário Papa João Paulo II, Diocese de Jequié-BA, cursa Filosofia na Instituto de Teologia de Ilhéus. http://beinbetter.wordpress.com/ o u : h t t p : / / w w w . r e f l e x o e s f r a n c i s c a n a s . c o m . b r / Twitter: @ianfariasca Skype: ianfarias

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Dezembro 2011 / In Guardia 06

Editorial Chegamos a terceira edição! Uma luta é travada a cada vez que cada edição está para sair. Colunistas que querem seus textos cada vez melhores cor-rem para suas revisões, diagramação tentando ajustar tudo e divulgação a todo vapor. É assim que trabalhamos uma revista que pretende ser sempre gratuita, on line e ortodoxa. Sempre com Pedro e sob Pedro. Não é fácil, mas ninguém nunca nos prometeu facilidades. Pelo contrário: nos prometeram que seríamos cordeiros em meio a lobos. Nos prometeram portas estrei-tas e dificuldades mil. Aceitamos. Vamos em frente! Nessa edição nos atemos com especial atenção a Cristo Rei. Essa solenidade cujo significado muitas vezes acaba escondido em algum recôncavo de nossa história ou de nossas mentes. Nem sempre damos a especial atenção que ela merece, e como ela merece. Tentamos atingir o âmbito religioso, teológico, litúrgi-co, político e todos os mais que essa festa acaba en-globando e já englobou na história do catolicismo e da

humanidade. Não podemos nos esquecer também da festa da Imacu-

lada Conceição, dia 08 de dezembro. Dia de preceito. Dia de todos irem a missa. Celebração que advém de

dogma e que precisa ser aceito muito antes do que enten-dido. É com a mesma especial atenção que damos boas vindas aos nossos novos colunistas. São seminaristas, sacerdotes e leigos de todas as partes do Brasil que, graças à internet conseguem se encontrar e trocar ideias, conseguem se juntar e fazer de uma proposta paroquial uma revista lida e ao alcance de todos. Uma boa leitura a todos vocês.

Page 7: Revista In Guardia.3ª edição

Pense como os Santos.

Pe. Pio

Dezembro 2011 / In Guardia 07

Ainda que o mundo vire às aves-sas, que tudo fique em trevas, fu-maça ou tumulto, Deus estará sempre conosco.

A profissão de fé mais bela é a que, como um raio, dis-sipa as trevas da sua alma.

Quando cair, humilhe-se, proponha-se de novo a submeter-se à vontade de Deus e depois levante-se e siga adiante.

Deus nos ama; prova disso é que tolera nos-sas ofensas com indul-gência.

Se Deus permite que você vacile em al-guma fraqueza, não é porque te aban-donou; ao contrário, Ele está lhe forta-lecendo na humildade e na vigilância.

Muitas ve-zes o Se-nhor não nos escuta para não nos tornar mais ingra-tos.

Sofro muito por-que não posso conduzir todos os meus irmãos a Deus!

A beneficência, venha de on-de vier, é sempre filha da mesma mãe: a providência.

Deus fala a quem tem um cora-ção humilde diante dEle, e o enriquece com Seus dons.

Fique em silêncio quando puder, pois quando estamos sozinhos Deus fala livremente com nossa alma, e a alma fica mais dis-

Tema o julgamen-to de Deus, não o dos homens.

Page 8: Revista In Guardia.3ª edição

Dezembro 2011 / In Guardia 08

Somente quem recebe de Deus uma graça especialíssima, compreende, aceita e louva, o Dogma da Imaculada Conceição de Maria. O compre-ende quem medita

sobre a extrordinária grandeza de um Deus concebido no seio de uma mulher; uma criatura que gera o divino -, mulher esta con-cebida de forma excepcional para nos trazer Deus que é San-tíssimo, puro e poderoso – A Fé vem nos auxiliar, juntamente com a Igreja que é aquela que nos desvenda os mistéiros divi-nos.

Maria em seu coração ima-culado é o refúgio dos pecado-res, porque Maria nunca come-teu a menor falta, e por isso esta mãe amada tem mais compaixão dos seus pobres filhos – do qual fazemos parte -, que não gozam, como Ela, do privilégio da isen-ção da concuspicência. Maria venceu o pecado, o demônio e a morte, por isso seus filhos, ao verem tão grande mãe, tem for-ças para vencer – com ajuda da graça, o pecado, o demônio e a morte, para a glória de Deus.

Desde sempre a Igreja, a-traves de seus fieis e dos santos padres, já compreendia, aceitava e anunciava a verdade da Imacu-lada conceição de Maria. Mas foi em 8 de dezembro de 1854, que o papa Pio IX, na Bula Inef-fabilis Deus, fez a definição ofi-cial do dogma da Imaculada Conceição de Maria. Assim, o Papa se expressou: “Em honra da santa e indivisa Trindade, pa-ra decoro e ornamento da Vir-gem Mãe de Deus, para exalta-ção da fé católica, e para incre-mento da religião cristã, com a autoridade de Nosso Senhor Je-sus Cristo, dos bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, e com a nossa, declaramos, pronuncia-mos e definimos a doutrina que sustenta que a beatíssima Vir-gem Maria, no primeiro instante

de sua conceição, por singular graça e privilégio de Deus oni-potente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado origi-nal, essa doutrina foi revelada por Deus e, portanto, deve ser sólida e constantemente crida por todos os fiéis”

Voltemos um pouco em nosso Credo – Cremos em Nos-so Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus. Verbo nascido do Pai antes de todos os séculos e con-substancial ao Pai. Por Ele tudo foi feito. Encarnou por obra do Espírito Santo, da Virgem Maria e se fez homem. Cremos que pe-lo sacrifício da Cruz, nos remiu do pecado original e de todos os pecados pessoais, cometidos por cada um de nós (Cfr Credo do Povo de Deus).

Tudo isso só aconteceu porque Deus no seu eterno amor, desde toda eternidade escolheu o homem: escolheu-o no Filho. Deus escolheu o homem, a fim de que possa atingir a plenitude do bem, que é posse d’Ele mes-mo, mediante a participação da sua mesma vida: Vida Divina, por meio da graça. Deus nos fez filhos no Filho. É uma escolha

irreversível. Portanto, nem o pe-cado orginal, nem todas as cul-pas humanas, todos os pecados sociais, puderam dissuadir o e-terno Pai de seu plano de amor. Não anularam a escolha de nós no Filho.

É assim que Deus prepara, também desde toda eternidade, prevendo a queda do homem, seu Filho para redentor. Para tanto, foi preciso se fazer ho-mem, e foi pelo Pai constituído cabeça da humanidade, tendo agora condições de expiar per-feitamente nossas culpas. Sendo a ofensa de Adão infinitamente grande, porque foi feita a Deus e como não havia sequer um justo, Deus em Seu Filho feito homem, como nos diz Tanquerey – “conciliou os direitos de justiça, com os da bondade, reparando completamente a culpa. Efetuou a justiça perfeita que constituía a reparação adequada, igual à o-fensa, oferecida por um repre-sentante legítimo. Fez isso com a Encarnação e Redenção “

Para que o Filho viesse co-mo Homem, Deus escolheu e pré-ordenou, uma Mãe, Santíssi-ma e pura, para conceber este Filho Santo e puro. Como nos diz o Papa João Paulo II:

A vida dos Santos por Ana Maria Bueno

A Imaculada Conceição “Digo com os santos: A divina Maria é o Paraíso Terrestre do novo Adão, onde Ele encarnou por obra do Espírito San-to, para aí operar maravilhas incompreensíveis. É o grande, o divino mundo de Deus, onde há belezas e tesouros inefá-veis. É a magnificência do Altíssímo, onde Ele escondeu, como em seu Seio, o seu Filho Único e n’Ele tudo o que há de mais excelente e precioso. Que grandes e misteriosas coisas fez o Deus onipotente nesta admirável criatura, se-gundo ela própria é forçada a dizer, a despeito da sua pro-funda humildade: “ O poderoso fez em mim maravilhas, San-to é seu nome!”(Lc 1,49). O mundo não conhece estas ma-ravilhas, porque é incapaz e indigno disso” - (São Luis Maria Grignon de Monfot – Tratado da verdadeira devoção à San-tíssima Virgem Maria – pag 18)

Page 9: Revista In Guardia.3ª edição

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“Escolheu-a desde o princípio, desde o primeiro momento da conceição, tornando-a digna da maternidade divina, para a qual no tempo estabelecido seria cha-mada. Fê-la primeira herdeira da santidade do próprio Filho. Primeira entre os remidos pelo Seu sangue, d’Ela recebido hu-manamente falando. Tornou-a imaculada no momento mesmo da conceição”(Basílica Santa Maria Maior – dia 8 de dezem-bro de 1978 – Festa da Imacula-da Conceição).

Ora, pelo pecado de Adão, todos nós nascemos com a man-cha do pecado original, ou seja, sem a graça que nos capacita a viver em Deus e para Deus. Por natureza, nenhuma criatura teria condições de estar diante de Deus, que é puro espírito santis-simo e pleno. Deus o fez dando a Adão este dom, este bem, fazen-do-nos portanto, herdeiros d Ele mesmo, fazendo parte de sua fa-mília divina. Mas Adão rejeitou este bem ao pecar, e no Filho, através dos méritos adquiridos na Cruz, recebemos o perdão e a graça perdida pelo nosso pai. Deus, então nos modifica de u-ma forma acidental, é certo, em nossa natureza e capacidade de ação, não nos tornando Deus – longe disso, mas nos torna como diz Tanquerey “deiformes”- se-melhantes à Ele, capazes de atin-

gi-lo pela visão beatífica, quando esta graça for trans-formada em glória e de o ver face a face, como Ele se vê assim mesmo.

Se para nos dar condi-ções de estar com Ele na glória, Deus nos transfor-ma, nos eleva, nos perdoa, nos envia o próprio Filho para morrer numa cruz e nos restituir a graça, o di-reito à herança, o direito de ve-lo uma dia na glória ce-leste, -, quanto mais Ele não faria com aquela que deveria gerar o Filho santís-simo e que sem concurso de varão gerou o próprio

Filho feito Homem?

Que santidade plena, que pureza, que equilibrio, que formosura, que santidade, que mãe! Não se-ria porventura verdadeiro cha-ma-la: Arca da Ailança, Vaso insigne de devoção, vaso honorí-fico, conforme em sua Ladai-nha? Não seria porventura, nossa obrigação ter para com ela verdadei-ra devoção? A-mando-a, imitan-do-a, louvando-a, porque em ultima instância é Deus mesmo que ama-mos nela? Sua gradeza, sua hu-mildade, sua obe-diência nos leva a dar louvores a Deus, já que todo bem cumulado nesta serva vem de Deus. Honran-do-a, é Deus que honramos, por-tanto.

Maria foi concebida sem pecado, pelos mé-ritos de Cristo. Recebeu a graça que a capacitaria a gerar o Filho do Altíssimo. Foi preservada da

mancha do pecado recebendo a Graça já no momento de sua conceição. Por conta disso, tinha Maria todo o equlibrio das pai-xões, toda sua vontade era intei-ramente conformada com a santa vontade de Deus, tudo que fazia não tinha a menor sombra de pe-cado, justamente por conta da plenitude da graça que a cobriu, pela ação do Espírito Santo – que é o próprio Deus agindo nela e por Ela. Ora, se Deus é pleno numa pessoa, esta pessoa é, por-tanto, santíssima e com totais condições de gerar seu Filho. “Quem fará sair o puro do impu-ro? Ninguém!” (Jó 14,4).

Ela, apesar de livre, não contradiziria à Deus, se sujeitou à sua vontade, tão logo o anjo lhe revela sua maternidade divi-na, apesar de sua pouca idade, não titubiou, sabia e confiava que em Deus tudo era possivel. Toda obra redentora estava sus-pensa no Fiat de Maria.E a Vir-gem bem disso sabia e no fundo entendeu o que lhe estava sendo proprosto. Sem condições e sem restrições, faz do desejo de Deus uma certeza e se entrega.

A vida dos Santos por Ana Maria Bueno

Page 10: Revista In Guardia.3ª edição

Dezembro 2011 / In Guardia 10

São Tomás nos fala assim de Maria, que durante todo o curso de sua vida foi santissima: “Deus prepara e dispõe a quem elege para algo, de modo que se fazem idôneos para os quais são elegidos: “Nos hão feitos minis-tros idôneos do Novo Testamen-to (II Cor III,6)”. Se pois, a Bem-Aventurada Virgem foi e-leita por Deus para que fosse Mãe de Deus, não deve duvidar-se que Deus a fez idônea para isto por sua graça, segundo o an-jo disse: “Há achado graça dian-te de Deus; eis que conceberás...(Lc I,30). Não havia sido, se al-guma vez houvesse pecado; já porque a honra dos pais redunda nos filhos, segundo aquilo: “Glória dos filhos são seus pais (Prov. XVII,6), e pelo contrário a ignomínia da mãe redundaria no filho; já também porque teve singular afinidade com Cristo, que recebeu dela sua carne. Se diz na 2ª carta aos Corínthios (VI,15): “Que concórdia entre Cristo e Belial? O que tem em parte o fiel com o infiel? Já tam-bém, porque o Filho de Deus, que é a Sabedoria de Deus, habi-tou nela de modo singular, não somente em sua alma, senão também em seu seio. Mas se diz no Livro da sabedoria (I,4): “Por quanto na alma maligna não en-

trará a sabedoria, nem morará no corpo submetido a pecados”; por conseguinte, é preciso reconhe-cer que a Bem-Aventurada Virgem não cometeu pecado al-gum, nem mortal, nem venial; para que assim se cumprisse nela o que se diz: “Toda é formosa, amada minha, e mácula alguma há em ti (Cant IV,7)”- (Sum Theol. 3ª ,q.XXVII,a.IV)

Eis o que nos diz o Credo do Povo de Deus: “Certamente, era de todo conveniente que esta Mãe tão venerável brilhasse sempre adornada dos fulgores da santidade mais perfeita, e, imune inteiramente da mancha do peca-do original, alcançasse o mais belo triunfo sobre a antiga ser-pente; porquanto a ela Deus Pai dispusera dar seu Filho Unigêni-to — gerado do seu seio, igual a si mesmo e amado como a si mesmo — de modo tal que Ele fosse, por natureza, Filho único e comum de Deus Pai e da Vir-gem; porquanto o próprio Filho estabelecera torná-la sua Mãe de modo substancial; porquanto o Espírito Santo quisera e fizera de modo que dela fosse concebido e nascesse Aquele de quem Ele mesmo procede”

A vida dos Santos por Ana Maria Bueno

Quem neste mundo gerou um Deus – Ho-mem , pela força do Espirito Santo?

Louvado seja Jesus Cristo!

Contemplamos vossas maravilhas, ó Se-nhor. Sim, a Tota Pulchra deve salvar o mundo, o mistério da Imaculada Concei-ção.

Louvado seja Jesus Cristo!

Digamos: “Totus Tuus ego et ominia Tua sunt. Accipio Te in mea omnia! (Sou todo teu e tudo o que tenho é teu. Sê tu a mi-nha guia em tudo

Ilustração sobre a proclamação do dogma da Imaculada Conceição na Bula Ineffabilis Deus, de 8 de dezembro de 1854.

Page 11: Revista In Guardia.3ª edição

A homilia de Pedro.

Agradeço de coração ao Cardeal Vigário as delicadas palavras com que — também em nome do Conselho Episcopal, do Cabi-do Lateranense, do Clero, dos Religiosos, das Religiosas e dos fiéis — quis expressar a dedica-ção e o propósito de colaboração prática, na diocese de Roma. O primeiro testemunho concreto desta colaboração pretende ser a soma ingente recolhida entre os fiéis da diocese e posta à minha disposição a fim de prover de igreja e de estruturas paroquiais um bairro periférico da Cidade, ainda destituído destes essenci-ais auxílios comunitários de vida cristã. Agradeço, sinceramente comovido.

1) O mestre de cerimónias esco-lheu as três leituras bíblicas para esta liturgia solene. Julgou-as a propósito e eu vou procurar ex-plicá-las.

A primeira leitura, Isaías 60, 1-6, pode ser referida a Roma. Ë de todos sabido que o Papa adquire autoridade sobre toda a Igreja porque é Bispo de Roma, isto é, sucessor, nesta cidade, de Pedro. E especialmente graças a Pedro, pode a Jerusalém, de que falava Isaías, ser considerada figura, prenúncio de Roma. Também de Roma, como sé de Pedro, lugar do seu martírio e centro da Igreja católica, se pode dizer: Sobre ti levanta-se o Senhor e a sua gló-ria te ilumina. As nações cami-nharão para a tua luz (Is. 60, 2). Recordando as peregrinações dos Anos Santos e as que se vão realizando nos anos normais com ininterrupta afluência, po-de-se com o profeta apostrofar

Roma deste mo-do: Levanta os olhos e vê à tua volta:... os teus filhos chegarão de lon-ge... para ti afluirá a multidão das gentes do mar, e as fileiras dos povos virão a ti (Is. 60, 4-5). Realizar-se isto é honra para o Bispo de Roma e para vós todos. Mas é também respon-sabilidade. Encontrarão aqui os peregrinos um modelo de verdadeira comunidade cristã? Com a ajuda de Deus, seremos nós capazes, Bispos e fiéis, de reali-zar aqui as palavras de Isaías, escritas antes das supracitadas? Refiro-me a estas: Já não se ouvirá falar de violência na tua terra... o teu se-rá um povo todo de justos(Is. 60, 18.21). Há poucos minutos, o Professor Argan, Presidente da Câmara de Roma, dirigiu-me corteses palavras de saudação e bons votos. Algumas das suas palavras trouxeram-me ao espíri-to uma das fórmulas que, sendo criança, eu repetia com a minha mãe. Eram as seguintes: "Os pe-cados que bradam ao céu são... opressão de pobres..., não pagar o salário a quem trabalha". Por sua vez, o pároco interrogava-me no catecismo: "Os pecados, que bradam vingança diante de Deus, porque são eles dos mais graves e funestos?". E eu respondia se-gundo o catecismo de Pio X: "Porque são directamente con-trários ao bem da humanidade e são odiosíssimos, tanto que pro-vocam, mais que os outros, os castigos de Deus" (Catecismo de

Pio X, n. 154). Roma será verda-deira comunidade cristã, se Deus for nela honrado não só com a afluência dos fiéis às igrejas, não só com a vida privada, vivida morigeradamente, mas também com o amor aos pobres. Estes — dizia o diácono romano Louren-ço — são os verdadeiros tesou-ros da Igreja; devem, portanto, ser ajudados, por quem pode, a terem e serem mais, sem recebe-rem humilhações e ofensas com riquezas ostentadas, com dinhei-ro esbanjado em coisas fúteis e não investido — quando possí-vel — em empresas de utilidade comum.0

2) A segunda leitura, Hebreus 13, 7-8; 15-17; 20-21, adapta-se aos fiéis de Roma. Escolheu-a, como disse, o Mestre de cerimó-nias. Confesso que, falando ela de obediência, me embaraça um tanto. É tão difícil, hoje, conven-cer, quando se põem em con-

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HOMILIA DO PAPA JOÃO PAULO I NA TOMADA DE POSSE DA DIOCESE DE ROMA

Patriarcal Arquibasílica Lateranense Sábado, 23 de Setembro de 1978

João Paulo I e o Cardeal Karol Wojtyla, que se tornou Papa João Paulo II

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A Homilia de Pedro.

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fronto os direitos da pessoa hu-mana e os direitos da autoridade e da lei! No livro de Job é des-crito um cavalo de batalha: salta como um gafanhoto e está ofe-gante; escava a terra com o cas-co e depois lança-se com ardor; quando a trombeta dá sinal, re-lincha de júbilo; de longe fareja a batalha, a voz atroadora dos chefes e o alarido dos guerreiros (Cfr. Job 39, 15-25). Símbolo da liberdade. A autoridade, pelo contrário, assemelha-se ao cava-leiro prudente, que monta a ca-valo e — ora com voz suave, ora usando moderadamente as espo-ras, o freio e o chicote — o exci-ta, ou pelo contrário lhe modera a corrida impetuosa, o enfreia e o faz parar. Pôr de acordo cavalo e cavaleiro, liberdade e autorida-de, tornou-se problema social. E também problema da Igreja. No Concílio tentou-se resolvê-lo no quarto capítulo da Lumen genti-um. Eis as indicações conciliares para o "cavaleiro": "Os sagrados pastores conhecem perfeitamen-te quanto os leigos contribuem para o bem de toda a Igreja. Pois aqueles próprios sabem que não foram instituídos por Cristo para se encarregarem por si sós de toda a missão salvadora da Igreja para com o mundo, mas que o seu cargo sublime consiste em pastorear de tal modo os fiéis e de tal modo reconhecer os seus serviços e carismas, que todos, cada um segundo o seu modo próprio, cooperem na obra co-mum" (L.G., 30). E mais ainda: sabem também, os pastores, que, "nas batalhas decisivas, é às ve-zes da frente da hoste que par-

tem as mais felizes ini-ciativas" (Ibid. 37, nota 3. ). Eis, porém, uma indicação do Concílio para o "ousado cavalei-ro", isto é, para os lei-gos: "os fiéis devem aderir ao seu Bispo, como a Igreja adere a Jesus Cristo, e Jesus Cristo ao Pai" (Ibid. 27). Peçamos ao Se-nhor que ajude tanto o Bispo como os fiéis, tanto o cavaleiro como os cavalos. Foi-me dito que, na diocese de Ro-ma, são numerosas as pessoas que se dedi-cam generosamente pelos irmãos, e nume-

rosos os catequistas; muitos es-peram ainda um aceno para in-tervirem e colaborarem. O Se-nhor nos ajude a todos para constituirmos em Roma uma co-munidade cristã viva e operante. Não foi sem motivo que citei o capítulo quarto da Lumen genti-um: é o capítulo da "comunhão eclesial". O que fica dito refere-se porém, de maneira especial, aos leigos. Os sacerdotes, os reli-giosos e as religiosas têm uma posição particular, ligados como estão ou pelo voto ou pela pro-messa de obediência. Recordo, como um dos momentos solenes da minha existência, aquele em que, tendo as minhas mãos entre as do Bispo, disse: "Prometo". Desde então sinto-me obrigado por toda a vida e nunca pensei se tivesse tratado de cerimónia sem importância. Espero que os sa-cerdotes de Roma pensem do mesmo modo. A eles e aos religiosos recordaria São Francisco de Sales o exemplo de São João Baptista, que vi-veu na solidão, longe do Se-nhor, embora bem desejoso de estar perto. Porquê? Por obediência; "sabia — escreve o Santo — que encontrar o Senhor, fora da obediência, significava perdê-l'O"(F. De Sales, Oeuvres, Annecy, 1896, p. 321).

3) A terceira leitura, Mateus 28, 16-20, recorda ao Bispo de Roma os seus deveres. O primeiro é "ensinar", propon-do a palavra do Senhor com fidelidade tanto a Deus como aos ouvintes, com humildade

mas com franqueza sem timidez. Entre os meus santos predeces-sores Bispos de Roma, dois são também Doutores da Igreja: São Leão, o vencedor de Átila, e São Gregório Magno. Nos escritos do primeiro há um pensamento teológico altíssimo e cintila nele uma língua latina estupendamen-te arquitectada; não julgo poder imitá-lo nem de longe. O segun-do, nos seus livros, é "como pai, que instrui os próprios filhos e lhes comunica os cuidados que toma a fim de que se salvem" (I. Schuster, Liber Sacramentorum, vol. I, Turim 1929, p. 46). Dese-jo fazer o possível por imitar o segundo, que dedica todo o livro terceiro da sua Regula Pastora-lis ao tema "qualiter doceat", - isto é, como deve o pastor ensi-nar. Em nada menos de 40 capí-tulos inteiros, indica Gregório de modo concreto várias formas de instrução segundo as várias cir-cunstâncias de condição social, idade, saúde e temperamento moral dos ouvintes. Pobres e ri-cos, alegres e melancólicos, su-periores e súbditos, doutos e ig-norantes, atrevidos e tímidos, e assim por diante; naquele livro estão todos, é como o vale de Josafat. No Concílio Vaticano pareceu novo que fosse chamado "pastoral" não já o que era ensi-nado aos pastores, mas o que os pastores faziam para correspon-der às necessidades, às ansieda-des e às expectativas dos ho-mens. Aquele "novo" Gregório já o fizera vários séculos antes, tanto na pregação como no go-verno da Igreja.

O Papa João Paulo I, nascido Albino Luciani

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A Homilia de Pedro.

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O segundo dever, expresso pela palavra "baptizar", refere-se aos Sacramentos e a toda a liturgia. A diocese de Roma seguiu o programa da Conferência Epis-copal Italiana "Evangelização e Sacramentos"; já sabe que evan-gelização, sacramento e vida santa, são três momentos dum caminho único: a evangelização prepara para o sacramento, o sa-cramento leva quem o recebeu a viver cristãmente. Desejo que este importante conceito seja a-plicado em medida cada vez mais larga. Desejava também que Roma desse bom exemplo em matéria de Liturgia celebrada p i e d o s a m e n t e e s e m "criatividades" destoantes. Al-guns abusos em matéria litúrgica favoreceram talvez, como reac-ção, atitudes que levaram a to-madas de posição em si insus-tentáveis e em contraste com o Evangelho. Ao apelar, com afec-to e com esperança, para o senti-do de responsabilidade de cada um perante Deus e a Igreja, de-sejaria poder dar a certeza que todas as irregularidades litúrgi-cas serão diligentemente evita-das.

E eis-me chegado ao último de-ver episcopal: "ensinar a obser-var"; é a diaconia, o serviço de guiar e governar. Embora eu te-nha sido já vinte anos Bispo em

Vittorio Véneto e em Veneza, confesso nã o te r a inda "aprendido o ofício". Em Roma entrarei na escola de São Gregó-rio Magno, que escreve: "Esteja (o pastor) perto de cada súbdito com a compaixão; esquecendo o seu grau, considere-se igual aos súbditos bons, mas não tenha receio de exercer, contra os mal-vados, os direitos da sua autori-dade. Recorde-se: enquanto to-dos os súbditos levantam ao céu o que ele tenha feito de bem, ne-nhum se atreve a repreender o que fez de mal; quando ele repri-me os vícios, não deixe de reco-nhecer-se com humildade igual aos irmãos por si mesmo corrigi-dos; e sinta-se diante de Deus tanto mais devedor, quanta mais

impunes ficam as suas acções diante dos homens" (Reg Past., Parte segunda, cc.5 e 6 passim).

Aqui termina a explicação das três leituras bíblicas. Seja-me permitido acrescentar uma coisa só: é lei de Deus que não se pode fazer bem a pessoa alguma se primeiro não se lhe quer bem. Por isso, São Pio X, entrando como Patriarca em Veneza, ex-clamou em São Marcos: "Que seria de mim, Venezianos, se não vos amasse?". Eu digo aos Romanos coisa semelhante: pos-so assegurar-vos que vos amo, que só desejo começar a servir-vos e pôr à disposição de todos as minhas pobres forças, aquele pouco que tenho e sou.

Vaticano, 26 de agosto de 1978, vinte dias após a morte do papa Paulo VI, os cardeais reunidos em conclave na Capela Sistina, votam o nome de um novo papa. Os votos são contados e queimados, formando uma fumaça branca. “Habemus Pa-pam!” (Temos Papa), anunciava o deão. Na va-randa principal aparecia Albino Luciani, já feito sumo sacerdote, com o seu sorriso peculiar no rosto, dando a sua benção ao mundo católico.

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A Homilia do Papa.

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Homilia em Benim - África

VIAGEM APOSTÓLICA AO BENIM

18-20 DE NOVEMBRO DE 2011

SANTA MISSA

E ENTREGA DA EXORTAÇÃO APOSTÓLICA

PÓS-SINODAL AOS BISPOS DA ÁFRICA

"Stade de l’amitié" - Cotonou

Domingo, 20 de Novembro de 2011

Amados Irmãos no episcopado e no sacerdócio,

Queridos Irmãos e Irmãs!

Seguindo os passos do meu pre-decessor, o Beato João Paulo II, é uma grande alegria para mim visitar pela segunda vez este querido continente africano, vin-do ter convosco ao Benim para vos dirigir uma mensagem de esperança e de paz. Quero, antes de mais nada, agradecer de todo o coração a D. Antoine Ganyé, Arcebispo de Cotonou, pelas su-as palavras de boas-vindas e sau-dar os bispos do Benim, bem co-mo todos os cardeais e bispos vindos de vários países da África e doutros continentes. E a todos vós, irmãos e irmãs bem ama-dos, que viestes participar nesta Missa celebrada pelo Sucessor de Pedro, dirijo a minha sauda-ção mais calorosa. Penso natu-ralmente nos habitantes do Be-nim, mas também nos fiéis dos países francófonos vizinhos: To-

go, Burquina-Faso, Níger e ou-tros. A nossa celebração eucarís-tica nesta solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Uni-verso dá-nos ocasião de agrade-cer a Deus pelos cento e cin-quenta anos passados do início da evangelização do Benim e também pela segunda Assem-bleia Especial para a África do Sínodo dos Bispos que teve lu-

gar em Roma há diversos meses.

O texto evangélico, que acaba-mos de ouvir, diz-nos que Jesus, o Filho do Homem, o juiz supre-mo das nossas vidas, quis assu-mir o rosto daqueles que têm fo-me e sede, dos estrangeiros, dos que estão nus, doentes ou pre-sos… enfim, de todas as pessoas que sofrem ou são marginaliza-das. E, por conseguinte, o com-portamento que tivermos com eles será considerado o modo como nos comportamos com o próprio Jesus. Não vejamos nisto uma mera fórmula literária, nem uma simples imagem; toda a vi-da de Jesus é uma ilustração dis-so mesmo. Ele, o Filho de Deus, tornou-Se homem, partilhou a nossa vida mesmo nos detalhes mais concretos, fazendo-Se ser-vo do mais pequenino dos seus irmãos. Ele que não tinha onde repousar a cabeça, seria conde-nado a morrer numa cruz. Este é o Rei que celebramos!

Isto pode, sem dúvida, parecer-nos desconcertante! Ainda hoje,

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A Homilia do Papa.

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como há 2000 anos, habituados a ver os sinais da realeza no suces-so, na força, no dinheiro ou no poder, temos dificuldade em a-ceitar um tal rei, um rei que Se faz servo dos mais pequeninos, dos mais humildes; um rei cujo trono é uma cruz. E todavia – como ensinam as Escrituras – é assim que se manifesta a glória de Cristo; é na humildade da sua vida terrena que Ele encontra o poder de julgar o mundo. Para Ele, reinar é servir! E aquilo que nos pede é segui-Lo por este ca-minho: servir, estar atento ao clamor do pobre, do fraco, do marginalizado. A pessoa bapti-zada sabe que a sua decisão de seguir Cristo pode acarretar-lhe grandes sacrifícios, às vezes até mesmo o da própria vida. Mas, como nos recordou São Paulo, Cristo venceu a morte e arrasta-nos atrás de Si na sua ressurrei-ção; introduz-nos num mundo novo, um mundo de liberdade e felicidade. Ainda hoje temos muitos vínculos com o mundo velho, muitos medos que nos mantêm prisioneiros, impedin-do-nos de viver livres e felizes. Deixemos que Cristo nos liberte deste mundo velho. A nossa fé n’Ele, vencedor de todos os nos-sos medos e misérias, faz-nos entrar num mundo novo: um mundo onde a justiça e a verda-de não são objecto de burla, um mundo de liberdade interior e de paz connosco, com os outros e com Deus. Tal é o dom que Deus nos fez no nosso Baptismo.

«Vinde, benditos de meu Pai, recebei como herança o Reino,

que vos está preparado desde a criação do mun-do» (Mt 25, 34). Aco-lhamos esta palavra de bênção que o Filho do Homem, no dia do Juí-zo, há-de dirigir aos ho-mens e mulheres que tiverem reconhecido a sua presença nos mais humildes dos seus ir-mãos, com um coração livre e repleto do amor do Senhor. Amados ir-mãos e irmãs, esta pas-sagem do Evangelho é verdadeiramente uma palavra de esperança, porque o Rei do univer-so Se fez solidário con-nosco, servo dos mais pequeninos e dos mais humildes. Daqui queria fazer chegar uma palavra amiga a to-das as pessoas que sofrem, aos doentes, a quantos estão infecta-dos pela sida ou por outras doen-ças, a todos os esquecidos da so-ciedade: Tende coragem! O Papa pensa em vós e recorda-vos na oração. Tende coragem! Jesus quis identificar-Se com os pe-queninos, com os doentes; quis partilhar o vosso sofrimento e, em vós, reconhecer irmãos e ir-mãs para os libertar de todo o mal, de todo o sofrimento! Cada doente, cada pobre merece o nosso respeito e o nosso amor, porque, através dele, Deus indi-ca-nos o caminho para o céu.

Hoje convido-vos também a ale-grar-vos comigo. Com efeito, há 150 anos que a cruz de Cristo foi implantada na vossa terra, que o

Evangelho foi anunciado nela pela primeira vez. Neste dia, da-mos graças a Deus pela obra rea-lizada pelos missionários, pelos «obreiros apostólicos» originá-rios da nação ou vindos doutros lugares: bispos, sacerdotes, reli-giosos, religiosas, catequistas… todos aqueles que, ontem como hoje, permitiram a difusão da fé em Jesus Cristo no continente africano. Queria aqui fazer me-mória do venerado Cardeal Ber-nardin Gantin, exemplo de fé e de sabedoria para o Benim e pa-ra o continente africano inteiro.

Amados irmãos e irmãs, todos aqueles que receberam o dom maravilhoso da fé, este dom do encontro com o Senhor ressusci-tado, sentem também a necessi-dade de o anunciar aos demais. A Igreja existe para anunciar es-ta Boa Nova. E este dever per-manece urgente. Depois de 150 anos, são numerosos aqueles que ainda não ouviram a mensagem da salvação de Cristo; aqueles que se mostram reticentes em abrir o próprio coração à Palavra de Deus; aqueles cuja fé é débil, e cuja mentalidade, costumes, estilo de vida ignoram a realida-de do Evangelho, pensando que a busca dum bem-estar egoísta, do lucro fácil ou do poder seja o fim último da vida humana. Com entusiasmo, sede testemunhas ardorosas da fé que recebestes! Fazei brilhar por todo lado o ros-to amável do Salvador, em parti-cular diante dos jovens que, num mundo difícil, andam à procura de razões de viver e de esperar.

Papa Bento XVI cumprimenta o presidente de Benin, Thomas Yayi Boni

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A Homilia do Papa.

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A Igreja no Benim recebeu mui-to dos missionários; deve, por sua vez, levar esta mensagem de esperança aos povos que não co-nhecem, ou deixaram de conhe-cer, o Senhor Jesus. Amados ir-mãos e irmãs, convido-vos a sentir esta ânsia pela evangeliza-ção, no vosso país e no meio dos povos do vosso continente e do mundo inteiro. Isto mesmo no-lo recorda, com insistência, o re-cente Sínodo dos Bispos para a África! Sendo um homem de es-perança, o cristão não pode de-sinteressar-se dos seus irmãos e irmãs. Isto estaria claramente em contradição com o comporta-mento de Jesus. O cristão é um construtor incansável de comu-nhão, de paz e de solidariedade – dons estes, que nos foram conce-didos pelo próprio Jesus. Perma-necendo fiéis a isto, colaboramos na realização do plano de salva-ção que Deus tem para a huma-nidade.

Por isso, amados irmãos e irmãs, convido-vos a reforçar a vossa fé em Jesus Cristo, com uma autên-tica conversão à sua pessoa. Só Ele nos dá a vida verdadeira, e pode libertar-nos de todos os nossos medos e entorpecimen-tos, de todas as nossas angústias. Reencontrai as raízes da vossa vida no Baptismo que recebestes e que faz de vós filhos de Deus. Que Jesus Cristo vos conceda a todos a força de viver como cris-tãos, procurando transmitir gene-rosamente às novas gerações a-quilo que vós mesmos recebestes

dos vossos Pais na fé. AKLUNƆ NI KƆN FƐNU TƆN LƐ DO MI JI [O Senhor vos cumule das suas graças]!

On this feast day, we rejoice together in the reign of C-hrist the King over the whole wor-ld. He is the one who removes all that hinders recon-ciliation, justice and peace. We are reminded that true royalty does not consist in a show of power, but in the humility of service; not in the oppression of the weak, but in the ability to protect them and to lead them to life in abundance (cf. Jn 10:10). Christ reigns from the Cross and, with his arms open wide, he embraces all the peoples of the world and draws them into unity. Through the Cross, he breaks down the walls of division, he reconciles us with each other and with the Father. We pray today for the people of Africa, that all may be able to live in justice, peace and the joy of the Kingdom of God (cf. Rom 14:17). With these sentiments I affectionately greet all the English-speaking faithful who have come from Ghana and Nigeria and neighbouring coun-tries. May God bless all of you!

[Neste dia de festa, compartilha-mos a nossa alegria pelo domí-

nio de Cristo Rei sobre toda a terra. É Ele que remove tudo o que dificulta a reconciliação, a justiça e a paz. Sabemos que a verdadeira realeza não consiste numa demonstração de força, mas na humildade do serviço; nem na opressão dos fracos, mas na capacidade de os proteger e conduzir à vida em abundância (cf. Jo 10, 10). Cristo reina a partir da Cruz e, com os seus braços abertos, abraça todos os povos da terra, atraindo-os para a unidade. Pela Cruz, abate os muros da divisão, reconcilia-nos uns com os outros e com o Pai. Hoje rezamos pelos povos da África, para que todos sejam ca-pazes de viver na justiça, na paz e na alegria do Reino de Deus (cf. Rm 14, 17). Com estes senti-mentos, saúdo afectuosamente todos os fiéis de língua inglesa vindos do Gana, da Nigéria e dos países limítrofes. Que Deus vos abençoe a todos!]

Queridos irmãos e irmãs da Áfri-ca lusófona que me ouvis, a to-dos dirijo a minha saudação e convido a renovar a vossa deci-são de pertencer a Cristo e de servir o seu Reino de reconcilia-ção, de justiça e de paz. O seu Reino pode ser posto em perigo no nosso coração. Aqui Deus cruza-se com a nossa liberdade. Nós – e só nós – podemos impe-di-Lo de reinar sobre nós mes-mos e, em consequência, tornar difícil a sua realeza sobre a famí-lia, a sociedade e a história. Por causa de Cristo, tantos homens e mulheres se opuseram, vitoriosa-mente, às tentações do mundo para viver fielmente a sua fé, às vezes mesmo até ao martírio. A seu exemplo, amados pastores e fiéis, sede sal e luz de Cristo na terra africana! Amen.

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Brasil sem Aborto por Lenise Garcia.

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Nas últimas se-manas, diversas vezes as células-tronco voltaram a merecer a aten-ção da sociedade, por diferentes motivos.

O Pontifício Conselho para a Cultura promoveu uma confe-rência internacional sobre o de-senvolvimento científico na área e as questões éticas relacionadas: Células estaminais adultas: a ciência e o futuro do homem e da cultura. O Papa Bento XVI ali fez um discurso, no dia 12 de Novembro. Mostrando apoio à pesquisa com células-tronco a-dultas (que a Santa Sé inclusive financia), e restrição às embrio-nárias, disse o Papa:

...o diálogo entre ciência e ética

é de grande importância para garantir que os progressos mé-dicos nunca sejam realizados pagando um preço humano ina-ceitável. A Igreja contribui para este diálogo ajudando a formar as consciências de acordo com a reta razão e à luz da verdade revelada. Ao fazer isso, procura não obstacular o progresso cien-tífico mas, ao contrário, orientá-lo numa direção que seja verda-deiramente fecunda e benéfica para a humanidade.

Se esse posicionamento do Papa era esperado, o que surpreendeu a muitos foi a declaração da em-presa Geron, pioneira nas pes-quisas com células embrionárias e dona das principais patentes relacionadas a elas, que acaba de anunciar a sua desistência dos testes com voluntários. E a razão não é ética, mas médica e, prin-

cipalmente, financeira. Sem que-rer assumir o fracasso dos expe-rimentos, a Geron saiu pela tan-gente, como relata o texto do Globo:

“Nos testes, pessoas paralisadas por lesões na medula receberam injeções de células nervosas de-rivadas de células-tronco embri-onárias. Até o momento, porém, nenhum dos quatro pacientes deu sinal de melhora. Mas isso não era esperado nos testes inici-ais, contou John Scarlett, presi-dente da Geron, destacando que eles foram idealizados para ava-liar a segurança da terapia e nes-te ponto teriam sido um suces-so”.

É verdade que os primeiros tes-tes clínicos são sempre para ava-liar segurança, mas certamente eles não estariam desistindo se

Células-tronco: ciência e ética, verdades e falácias .

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Brasil sem Aborto por Lenise Garcia.

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os testes estivessem dando os bons resultados que estão sendo obtidos aqui no Brasil com célu-las-tronco adultas, que já permi-tiram a um paraplégico dar os seus primeiros passos.

Fica evidente que, além da falta de ética no uso dos embriões, também os doentes que eventu-almente seriam tratados com es-sas células não foram considera-dos de modo ético, o que trans-parece claramente na fala de Da-niel Heumann, integrante do conselho de administração da Fundação Christopher e Dana Reeve, ao Washington Post: Es-tou enojado! Deixa-me doente ver eles pegarem as esperanças das pessoas e depois tomarem essa decisão apenas por questões financeiras. Estão nos tratando como ratos de laboratório.

Era previsível esse desfecho? Volto um pouco no tempo para mostrar que sim.

Em 5 de maio de 2008, antes do julgamento no Supremo Tribu-nal Federal (STF) que questiona-va o uso de embriões humanos para pesquisa, fiz parte de um grupo de cientistas, parlamenta-res, juristas e lideranças nacio-nais de movimentos em defesa da vida humana, que divulgou a “declaração de Brasília” sobre a pesquisa com células-tronco em-brionárias humanas.

Dizíamos, já àquela altura:

“Pretende-se contrapor a vida dos embriões congelados... à te-rapia e cura de muitos que pade-

cem de doenças graves em nosso país. Não temos receio em afirmar, com toda ênfase, que tal dilema é falso... Ao contrá-rio do que tem sido veiculado e acriti-camente aceito pela opinião pública, as células-tronco em-brionárias não são a grande promessa para gerar terapias. Na verdade, são as células-tronco a-dultas que têm pro-duzido expressivos resultados...”.

Nessa declaração, na histórica audiência pública que houve no STF e no material que encami-nhamos aos senhores ministros, esclarecíamos que todos os e-xemplos mostrados de sucesso no uso de células-tronco em se-res humanos, haviam sido obti-dos com o uso de células-tronco adultas. Frisamos que já havia mais de 20 mil pacientes em tes-te clínico, envolvendo pelo me-nos 73 doenças diferentes, usan-do células adultas. E concluía-mos:

“Sendo o Brasil um país que não dispõe de grandes recursos para aplicação em pesquisa, é crucial que sejam bem empre-gados. No que se refere à bus-ca de terapias, certamente o campo das células-tronco adul-tas é já uma realidade, e muito mais promissor para o futuro, conforme reconhecido por gran-

des cientistas internacionais. Ve-rifica-se, do que foi exposto, que o respeito à vida e à dignidade do ser humano, que deve infor-mar toda a pesquisa científica, não está dissociado de resultados terapêuticos positivos, mas sim a ele associado.”

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Idade Média com Rafael Diehl

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Uma boa quantidade de o-bras gregas e lati-nas da Antiguida-de Clássica che-gou para nós até

os dias de hoje, embora natural-mente uma grande parte tenha se perdido devido às inclemências do tempo e outros fatores. Pois bem, a Igreja Católica teve um papel importante na preservação do saber antigo que influenciou a nossa Civilização Ocidental. Isso não significa negar que essa pre-servação tenha sido igualmente feita por outros grupos ou insti-tuições, como os povos islâmi-cos. Significa somente reconhe-cer que na sociedade ocidental, foi a Igreja o principal transmis-sor desse conhecimento.

Nossa cultura tem sido influenci-ada a alguns anos por uma Revo-lução Cultural de caráter forte-mente anticristão. Desta forma, difunde-se cada vez mais a idéia de que a Igreja era avessa ao co-nhecimento e aos saberes. É co-mum aprendermos na escola que o “Renascimento” dos séculos XV e XVI teria “recuperado o saber e a arte da Antiguidade Clássica”. A verdade é que a An-tiguidade Clássica nunca foi re-legada à escuridão do esqueci-mento na Europa cristã medie-val. Os povos bárbaros pagãos que ocuparam as regiões do anti-go Império Romano do Ocidente desde o século III queriam se legitimar como herdeiros das tra-dições romanas e viam na Igreja a depositária dessa rica tradição cultural. Some-se a isso o fato que durante o longo período das migrações e invasões bárbaras, a vida social concentrou-se no meio rural e as escolas e centros de saberes das grandes cidades acabaram entrando em declínio, restando os bispos como as gran-des autoridades culturais e admi-nistrativas dentro das cidades. E é por isso que o episcopado pas-sa a ocupar um destaque político e cultural nas cidades romanas, de forma que os reis e as aristo-

cracias dos bárbaros germânicos se aproximaram dos bispos. As-sim, vemos, por exemplo, a pre-sença de São Remígio, Bispo de Reims, na corte do rei dos fran-cos Clóvis I, em finais do século V, mesmo antes da conversão do dito monarca ao Cristianismo.

Desde o século III haviam mos-teiros em várias regiões do anti-go Império Romano. Os monges cenobitas eram cristãos que abraçavam o estado de vida religioso mediante uma regra e vida em comum sob os votos de pobreza, casti-dade e obediência. Fo-ram esses mosteiros os grandes centros de pre-servação do saber anti-go. No século IV, o mos-teiro de Tours, na Gália (parte da atual França), já realizava a cópia de manuscritos antigos. O primeiro mosteiro a do-tar-se de uma biblioteca para guardar escritos an-tigos greco-romanos foi o mosteiro de Vivarium, no sul da Itália, fundado pelo monge Cassiodoro. Nota-se que não bastava

simplesmente guardar os livros, mas copiá-los em materiais no-vos, para garantir que as infor-mações não se perdessem quan-do os materiais dos livros velhos deteriorassem. Nos diversos mosteiros copiavam-se manus-critos de todo tipo: escritos lati-nos e traduções latinas de textos gregos sobre Filosofia, História, Matemática, História Natural,

A Igreja e a preservação do saber antigo

“[...] a Igreja é impelida a interessar-se continuamente pelo ver-dadeiro bem temporal dos homens. Pois, não cessando de advertir a todos os seus filhos que eles "não possuem aqui na terra uma morada permanente" (cf. Hb 13,14), estimula-os também a que contribuam, segundo as condições e os recursos de cada um, para o desenvolvimento da própria sociedade humana; promovam a justiça, a paz e a união fraterna entre os homens; e prestem ajuda a seus irmãos, sobretudo aos mais pobres e mais infelizes. Destar-te, a grande solicitude com que a Igreja, Esposa de Cristo, acom-panha as necessidades dos homens, isto é, suas alegrias e esperan-ças, dores e trabalhos, não é outra coisa senão o ardente desejo que a impele com força a estar presente junto deles, tencionando iluminá-los com a luz de Cristo, congregar e unir a todos Naquele que é o seu único Salvador. Tal solicitude entretanto, jamais se deve interpretar como se a Igreja se acomodasse às coisas deste mundo, ou se tivesse resfriado no fervor com que ela mesma espe-ra seu Senhor e o Reino eterno.” (Papa Paulo VI. Credo do Povo de Deus, n. 27. 1968)

Iluminura do século XI ilustrando um monge copistas

Page 20: Revista In Guardia.3ª edição

Idade Média com Rafael Diehl

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Poesia, Gramática e mesmo tex-tos religiosos pagãos. Contudo, a preservação desse saber não deu-se somente na cópia de manus-critos. Motivados pelo desejo de conservar a cultura romana, di-versos monges, padres e bispos passaram a escrever a História da Igreja nas regiões onde residi-am em latim, com vistas a pre-servar a língua latina do esqueci-mento. Notamos isso por exem-plo em São Gregório, bispo de Tours que ao escrever a História da Igreja entre os francos lamen-ta-se da escassez de conheci-mento letrado e confessa sua vontade de escrever, mesmo que julgando-se indigno, para que o conhecimento e a escrita latina pudessem ser preservados e pas-sados adiante.

“A multidão lamentava-se dizendo: ‘Desgraçado seja o nosso tempo, pois o estu-do das letras pereceu entre nós e já não se encontra ninguém que possa traduzir por escrito os acontecimen-tos presentes.’ Decidi-me, movido por estas queixas e outras semelhantes, repeti-das todos os dias, a trans-mitir aos tempos vindouros a memória do passado; e, se bem que falando uma linguagem inculta, não pu-de no entanto calar nem o empreendimento dos maus, nem a vida dos ho-mens de bem. O que sobre-tudo me excitou foi ter muitas vezes ouvido dizer, entre nós, que poucos ho-mens compreendem um reitor que fale como filóso-fo; quase todos, pelo con-trário, compreendem um narrador falando como vul-gar [...]” (São Gregório de Tours. Historia Ecclesiasti-ca Francorum, lib. I, t. I. Citado em: PEDRERO-SÁNCHEZ, Maria Guada-lupe. História da Idade Média – Textos e Teste-munhas. São Paulo: Edito-ra da UNESP, 2000, p. 43.)

Essa História que observa-mos, contudo, não vive somente de uma passiva preservação de textos, mas também de uma ação criadora. Ao mesmo tempo, a cultura romana mesclava-se com a cultura germânica, formando

aos poucos uma no-va cultura. Um e-xemplo disso é a produção dos livros: não somente copia-vam-se os escritos como dava-se um desenvolvimento es-pecial à caligrafia e às iluminuras que ilustravam os códi-ces e pergaminhos, de forma que o pró-prio livro era conce-bido como que uma obra de arte. Logo também passaram a surgir novos escritos comentando e discu-tindo os textos clás-sicos. Ao mesmo tempo, os clérigos e monges usavam-se nos métodos educa-cionais greco-romanos para as suas próprias escolas. Também no âmbito prático, os mosteiros desenvolveram e a-primoraram as antigas técnicas de agricultura, melhorando o cultivo, algo que se tornara es-sencialmente importante em uma sociedade predominantemente rural.

Podemos ver após essa bre-ve exposição, a importância da Igreja, especialmente nos mos-teiros, para a preservação do co-nhecimento antigo em seus di-versos aspectos. E isso nos mos-tra a visão positiva que a Igreja tem da produção cultural huma-na, quando retamente ordenada. Prova disso é que a Igreja não somente preservou o antigo sa-ber, mas o desenvolveu segundo uma ótica cristã. Pois a Igreja não descuida das realidades tem-porais, mas busca iluminá-las à luz da sabedoria do Evangelho. Assim, a Igreja aproveitou-se da Filosofia grega e do Direito Ro-mano para construir as bases de uma ordem jurídica e social de acordo com a moral cristã, como bem recordou o Papa Bento XVI em seu recente discurso do Par-lamento alemão em setembro desse ano.

SAIBA MAIS:

AQUINO, Felipe. Uma História que não é contada: o Trabalho da Igreja Católica para salvar e

construir a Nossa Civilização. Lorena: Cleófas, 2008.

COSTA, Ricardo da; FILHO, Orlando Paes; VENTORIM, Eli-ane. Monges Medievais. São Paulo: Planeta, 2004.

WOODS Jr., Thomas E. Como a Igreja Católica construiu a Ci-vilização Ocidental. São Paulo: Quadrante, 2008.

Iluminura de cerca do ano 1000 ilustrando copistas em um "scriptorium"

Afresco anglo-saxão de um abade do século VII

Page 21: Revista In Guardia.3ª edição

Educação, Política e Humanidades com Evelyn Mayer.

A Reforma Pombalina foi u-ma resposta à E-ducação Jesuíta que ocorreu con-comitantemente à Colonização. Para Marquês de Pom-

bal, a educação Jesuíta era retró-grada e movida por interesses. É fato que os Jesuítas poderiam incomodar, visto que usavam da educação para evangelizar, incu-tindo na mentalidade dos cate-quisandos valores morais que assim a Igreja entendia. O ad-vento do Iluminismo ignora cla-ramente os ensinamentos da I-greja, pois para eles o pensamen-to já não é mais Teologal, mas sim Racional. Agora é o homem quem está no centro do Univer-so.

Segundo Paulo Freire, a Educa-ção Jesuíta inaugurou o analfa-betismo no Brasil. Discordo, é claro, visto que os Jesuítas, uma das Congregações mais intelec-tuais da Igreja, que deu à huma-nidade grandes nomes da Ciên-cia, Filosofia e História, por mais que elucidassem o ensino pelo viés da fé, nunca consegui-riam impedir a liberdade de pen-samento. Mesmo que a história nos diga que para eles os índios deveriam apenas obedecer e nunca pensar, o pensamento ja-mais é limitado. Poderia, sim, criar naquele que reflete senti-mentos de culpa, porém nunca de impedimento. Tanto isto é verdade que houve, ao longo da história brasileira, grandes ho-mens que romperam paradigmas. E mesmo que tenham rompido com os ensinamentos católicos, devem obrigatoriamente à Igreja, pois foi por meio dela que des-cobriram o saber e a arte de pen-sar. Foi por ela que adquiriram conhecimento, e com isto, a ver-dadeira liberdade.

Fato é que Marquês não queria a Igreja por perto, pois os Jesuítas, além de detentores do Conheci-mento, da Ciência, das Artes e da Cultura (além de conheci-mentos agrários, pois os livros de História evidenciam que os padres ensinaram os índios a plantar, arar a terra e colher), os Jesuítas recebiam impostos que eram arrecadados na Co-lônia. Pombal queria dinheiro para reformar a Nação Portu-guesa. Como o pensamento Iluminista ganhava forças, era necessário romper com o pensamento religioso para agir apenas pelo pensamento livre. Juntou, então, o adven-to do Iluminismo com a ga-nância por dinheiro, logo se deu a expulsão dos Jesuítas. A educação brasileira sofreu demasiadamente, pois não tinha estrutura física e huma-na para tanto. Apesar de ter criado os “Alvarás”, a Refor-ma Pombalina não obtinha grande êxito. O curso de Hu-

manidades, possibilitado pelos Jesuítas, foi substituído pelas “Aulas Régias” que eram manti-das por impostos coloniais. Con-tudo, os aspectos burocráticos não facilitaram a implantação das aulas.

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A Educação na Colônia, Jesuítas e Marquês de Pombal .

Conceituando a Educação da Colonização até os dias atuais.

Segundo Paulo Freire, a Educação Jesuíta inau-gurou o analfabetismo no Brasil. Discordo, é cla-ro, visto que os Jesuítas, uma das Congregações mais intelectuais da Igreja, que deu à humanida-de grandes nomes da Ciência, Filosofia e Histó-ria, por mais que elucidassem o ensino pelo viés da fé, nunca conseguiriam impedir a liberdade de pensamento. Mesmo que a história nos diga que para eles os índios deveriam apenas obede-cer e nunca pensar, o pensamento jamais é limi-tado. Poderia, sim, criar naquele que reflete sen-timentos de culpa, porém nunca de impedimen-to. Tanto isto é verdade que houve, ao longo da história brasileira, grandes homens que rompe-ram paradigmas. E mesmo que tenham rompido com os ensinamentos católicos, devem obrigato-riamente à Igreja, pois foi por meio dela que descobriram o saber e a arte de pensar.

Marquês de Pombal.

Page 22: Revista In Guardia.3ª edição

Educação, Política e Humanidades com Evelyn Mayer.

É notório que Marquês de Pom-bal, por não querer os ensina-mentos católicos por perto, não pensou no futuro da educação brasileira. Ela era real em suas idéias, mas inviáveis no cotidia-no. Fato é que com a expulsão dos Jesuítas, o ensino que era oferecido gratuitamente, passa a ser cobrado. Enquanto a Igreja evangelizava índios e negros, Pombal elitiza a educação. Já não existe mais educação para todos (como hoje, aliás, defende Freire), mas apenas para os lati-fundiários. Os professores, por terem péssima remuneração, a-cabam desenvolvendo outras ati-vidades na Colônia, não tendo, assim, tempo para dedicar-se aos estudos e ao conhecimento.

Deste modo, os habitantes do Brasil – colônia passam a ser e-ducados pela Ordem Francisca-na, também pelos Beneditinos, pelas Irmãs Carmelitas e alguns leigos de outras profissões. Ha-via precariedade na educação, mas não porque davam continui-dade ao modo Jesuíta, e sim, porque Pombal, ao expulsá-los, não deu condições físicas e hu-manas para a evolução do pensa-mento.

Deste processo reformador, sur-gem os cursos literários e teoló-gicos em Olinda e no Rio de Ja-neiro pelo Bispo Azevedo Couti-nho. Seguiam uma estrutura ló-gica, com planejamentos prévios das aulas pelos Professores, a-lém dos estudantes reunidos em sala para os estudos. Isso só mu-dou com a chegada da Corte Re-al, que deu ao país um novo con-texto político-econômico, além de preparar os cidadãos para as-sumir cargos de interesse da mesma.

É preciso enfatizar que o proces-so educacional brasileiro pauta-se demasiadamente no papel do oprimido, vitimizando o povo com a intenção de salvá-los de um passado negro. Verdade é que os mecanismos adotados na-quela época ainda trazem resquí-cios no cotidiano. Ainda há em alguns lugares deste país escra-vidão e analfabetismo. Só que o Brasil ainda não aprendeu a ca-minhar rumo ao crescimento in-telectual. A educação continua em caminhada ao precipício da mediocridade. Criar cotas para

negros e índios, por exemplo, é dar vazão à idéia de que ainda são escravos do tempo da Desco-berta, e que para tanto, não con-seguem por conta própria alcan-çar seus objetivos, realizarem-se profissionalmente. E esta Ideolo-gia Marxista/Socialista em que enfatiza a necessidade de iguali-tar o homem, esquecendo de su-as peculiaridades, auxilia no re-trocesso educacional. O país, as-sim, não avança à liberdade inte-lectual. Prova disto é a necessi-dade de “vender” diplomas. Com o advento dos cursos à distância, (criação esta do Governo atual, que está muito mais interessado em números que qualidade) além das leis que proíbem a reprova-ção dos alunos, tornando o ambi-ente escolar ainda mais deplorá-vel, sem disciplina, faz com que os brasileiros continuem à mar-gem do verdadeiro saber.

O acesso à educação, em alguns lugares do Brasil, ainda são invi-áveis. E a formação de um Ma-gistério que tenha acesso a bons livros, boas universidades e que assim possam auxiliar seus alu-nos no processo de transforma-ção, construindo homens livres a partir do conhecimento, é quase impossível. Há, por exemplo, professores de “boa-vontade”, que dão aulas nos becos desta Terra de Santa Cruz sem ao me-nos terem terminado o Ensino Fundamental. E este processo continuará ainda por muitos e muitos anos, pois o Governo deste país não trabalha em prol

da massa. É também herança da Reforma Pombalina priorizar a elite e esquecer o necessitado. E não adiantará, creio eu, escrever-mos livros supervalorizando o oprimido, pois quem deveria ler, não o faz, e quem lê, ignora. Ali-ás, creio que já passou da hora do País abandonar esta visão vi-timista de si mesmo. Se temos acesso a tantas linhas de conhe-cimento (Arte, Música, Pecuária, Letras, Ciências), devemos gran-demente aos Jesuítas. Então que façamos bom uso do que eles nos deixaram e ajamos em prol do crescimento intelectual, sem vítimas nem vitimadores.

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Brasil colônica: educação jesuítica e reforma pombalina.

Page 23: Revista In Guardia.3ª edição

Aspectos do matrimônio com Karen Mortean

Antes do casamento todo casal de namo-rados vive a experi-ência intensa de um cativamento mútuo: são olhares profun-

dos, abraços e conversas intermi-náveis e sensações que de tão intensas e agradáveis, mal se po-dem definir. Os encontros são preparados com todo zelo e es-mero, sejam eles uma mera ida ao cinema, ao restaurante ou a um parque, e as suas cenas são sempre uma pintura repleta de doçura, de elogios e escutas inte-ressadas, de ambas as partes.

Então como compreender o fato de que essas mesmas pessoas, que se uniram livremente e para sempre por uma força irresistí-vel, com apenas um, dois ou três anos após de seus solenes "sim" acabam querendo dizer "não" um ao outro, alegando para isso incompatibilidade de gênios?

Estudos de profissionais de a-conselhamento e orientação fa-miliar (Dr. Harley, Jr. W.F), su-gerem que a mudança de com-portamentos no casamento obe-decem dois motivos principais: 1) marido e mulher falham na intenção de fazer um ao outro

feliz; 2) marido e mulher fazem um ao outro infelizes por seus comportamentos objetivos.

Na primeira situacão o casal está frustrado porque suas expectati-vas não estão sendo atendidas, e na segunda situação, deliberada-mente já estão lutando um contra o outro. Aqui cabem duas per-guntas: É possível de forma tão repentina que esposos se tornem tão diferentes? Por que as expec-tativas de ambos não estão sendo atendidas?

Quanto a primeira pergunta: sim, é possível tal mudança, contudo ela é muitíssimo improvável e reservada a casos extremos de falsidade e até patologia. Na maioria dos casos o que existe é um estado temporário de ceguei-ra mútua, provocada pelo foco no processo de conquista alheia, quando a renúncia das próprias vontades e a motivação em fazer o outro feliz ocupam corpo e al-ma do pretendente na sua inten-ção de fazer o relacionamento dar certo. Nesses períodos inten-sos de conquista conjugal o que vale é atender expectativas e ter sucesso emocional, ficando o conhecimento mais profundo das personalidades e das naturezas intrínsecas de cada um para se-gundo plano, aliás, num plano quase dormente ou inexistente.

Quanto a segunda pergunta: tudo é uma questão de motivação. Se na etapa pré-matrimonial o moti-vo para o esforço na busca pela satisfação dos desejos alheios era culminarem no "sim" defini-tivo (ainda que inconscientemen-te), na etapa seguinte, tal motivo parece escorrer pelas mãos pela simples realidade de que tiveram sucesso em suas empreitadas e de que a partir de agora não exis-tem mais perigos de fracasso pa-ra o relacionamento (afinal, jura-ram-se um ao outro). E é exata-

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De irresistíveis a imcompatíveis.

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Aspectos do matrimônio com Karen Mortean

mente aí aonde mora o perigo.

Com o passar do tempo, a ausên-cia habitual daquelas renúncias orientadas a felicidade alheia, daquelas dedicações interessadas pelo outro e daqueles outros tra-ços de empenho emocional po-dem ir afrouxando o zelo conju-gal, e a capacidade de uma con-vivência harmônica e feliz co-meça a prejudicar-se em menor ou maior grau.

As frustrações são facilmente comentadas durante encontros entre amigos(as) e as reclama-ções sobre como o comporta-mento do outro os incomoda são frequentemente semelhantes en-tre os casais. E são semelhantes por uma simples e notória razão, que homem e mulher são real-mente diferentes e não podem agir de outra forma.

Uma estrofe musical conhecida diz o seguinte: "... o horário é que nunca combina, eu sou fun-cionário ela é dançarina. Quando pego o ponto ela ter-mina". O fato é que não existe casal no mundo que não viva a realidade das diferenças. As diferenças fazem parte da natureza humana, que se fazem evidentes visualmente na distin-ção corpórea mas também em toda a dimensão psíquica, que aqui os distinguem na dualidade da forma de se manifestar: " ...entender a natureza humana, como sexuada de dual, é algo que com muita frequência é deixado de lado, o que dificulta a compreensão do caráter com-

plementar da masculidade da feminilidade" (Casais Inteli-gentes Filhos Resolvidos. Dora Porto).

Um breve esforço mental já nos recorda algumas dessas diferen-ças entre os sexos. Fisicamente o homem é mais forte e mais ca-paz de esforços braçais, já a mu-lher tem constituição mais deli-

cada e frágil. O homem é mais focado e objetivo enquanto a mulher é mais dispersa

(enquanto fala no telefone faz com-pras cuidando de 3 filhos) e subjeti-va. A mulher fala para pensar (por isso tem tanta ne-cessidade de falar muito), o homem pensa antes de fa-lar (por isso a ne-cessidade de se manter em silên-cio). Além das di-ferenças somáti-cas, também cére-bros masculinos/femininos respon-dem ao mesmos estímulos de for-mas diferentes nos

campos fisiológicos e emocio-nais. Estas diferenças que quan-do analisadas com maior cuida-do podem parecer triviais, estão contudo, nos bastidores de mui-tas discórdias, conflitos e má-goas.

Quando tais diferenças são igno-radas por tempo demais acaba-mos vendo uma falha no geren-ciamento de expectativas do ca-sal e consequentemente a intro-dução de um clima de hostilida-de e frustração geral entre am-bos. Um tenta satisfazer o outro baseado nas suas próprias expec-tativas (ou na suposição das ne-cessidades do outro) e acaba se magoando quando recebe a re-pulsa natural de uma necessida-de não satisfeita. Um exemplo muito comum dessa dificuldade se dá na vida sexual do casal. A necessidade física dos homens em relação ao sexo é muito obje-tiva e direta; por sua vez as mu-lheres apresentam maior carên-cia de afeto para a entrega cor-poral já que suas motivações com o sexo são mais subjetivas e indiretas. Quando o homem, no processo de desejo e atração por sua esposa, ignora as necessida-des do envolvimento sexual da mulher, acaba sentindo-se rejei-tado após perceber a menor pro-pensão a união sexual por parte de sua esposa.

É importante entender que as expectativas conjugais são sem-pre entrelaçadas, e quando um dos cônjuges se sente atendido em sua expectativa, naturalmen-te inclina-se a satisfazer o outro na expectativa correspondente.

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As frustrações são facilmente comen-tadas durante en-contros entre ami-gos(as) e as recla-mações sobre como o comportamento do outro os inco-moda são frequen-temente semelhan-tes entre os casais. E são semelhantes por uma simples e notória razão, que homem e mulher são realmente dife-rentes e não podem agir de outra for-ma.

Page 25: Revista In Guardia.3ª edição

Aspectos do matrimônio com Karen Mortean

As necessidades emocionais de cada conjuge são tão poderosas que quando não satisfeitas indu-zem a infidelidade com mais fre-quência do que se espera. É evi-dente que o mais importante não é ficar na prevenção da infideli-dade, mas no fomento a entrega mutúa, naquela entrega plena e feliz que um dia já viveram in-tensamente na fase de conquista pré-matrimonial. Ambos se sen-tirão mais felizes e essa felicida-de se repercutirá em toda famíla.

Nas promessas matrimoniais se garantem ao esposo(a) o exclusi-vo direito de encontrar no outro a satisfação de suas necessidades mais íntimas. A fórmula do con-sentimento matrimonial é um comprometer-se total com a feli-cidade alheia, que exige absoluta fidelidade, respeito e amor em quaisquer condições que se pos-sa suportar, por todos os dias da vida. E como essa fórmula na verdade não tem nada de mági-ca, mas sim de esforço e decisão, acaba gerando muitas vezes uma falsa garantia de casamento bem sucedido, aonde nada ou quase nada precisa efetivamente ser feito para sustentar o amor. A realidade é que o sucesso de um casamento depende demais de certas habilidades e capacidades que não são infundidas sobrena-turalmente diante do altar, mas que requerem o compromisso contínuo com o desenvolvimen-to interpessoal desta nova união. Boas intenções não são suficien-tes para manter-se casado, tam-pouco é questão de sorte.

Todos somos altamente reativos. Se recebemos indiferença, possí-velmente devolveremos indife-rença. Se recebemos irritacão, devolveremos irritacão. E de rea-ção em reação, vamos nos enfi-ando dentro de um ciclo vicioso.

É necessário uma decisão firme em romper com este ciclo e formar a consciên-cia de que a entrega matri-monial é um ato de amor que deseja prioritariamente o bem do outro, a felicida-de do outro e perceber que estes atos por consequên-cia também nos fazem fe-liz. Um exemplo prático para uma esposa é tentar ser uma companhia agra-dável para o marido en-

quanto ele assiste ao futebol be-bendo sua cerveja, e para o mari-do, atenciosamente auxiliar a es-posa a escolher um sapato novo.

Atitudes como estas repetidas com frequência predispõem o outro favoravelmente pois quem recebe amor tende a se manifes-tar com amor. Alguns casais

quando começam a fazer essa nova experiência de "reprogramação" tendem a pen-sar que esta atitude de agradar o outro com o pensamento de uma resposta favorável é algo deso-nesto, mau intencionado, mas saibamos que tal desconfiança se faz equivocada pois como diria Aristóteles: "somos o que repeti-damente fazemos. A excelência,

portanto, não é um feito, mas um hábito."

Sabemos ainda que o esforçar para agradar o próximo é conse-lho cristão de dois milênios: "amarás ao teu próximo como a ti mesmo" (Mt. 22, 39) e não há dúvida de que o maior próximo do esposo(a) é a esposa(o). A paciência, a generosidade, a hu-mildade são partes fundamental do matrimônio cristão porque abrangem a prática das virtudes, ou seja: "uma disposição habitu-al e firme para fazer o bem" (São Gregório de Nissa)

Também não é gratuito relem-brar sempre que o matrimônio é um sacramento que dispõem ao casal todas as graças necessárias para solucionar as dificuldades e fortalecer o amor: "esta graça própria do sacramento do matri-mônio destina-se a aperfeiçoar o amor do cônjuges e a fortalecer a sua unidade indissolúvel. Por meio desta graca, eles auxiliam-se mutuamente para a santidade, pela vida conjugal e pela procri-ação e educacnao dos fi-lhos" (LG11).

Responda agora e depois busque práticas concretas para realizar plenamente a pessoa com quem você casou:

- O que faz feliz o meu esposo (a)?

- Como poderia surpreender mi-nha esposa(o)?

- Há situações em que minha es-posa (o) pode se sentir humilha-da por minha causa?

- Há quanto tempo (podem ser minutos, horas, dias, meses, ou anos) não faço um elogio sincero ao meu esposo (a)?

- Gosto de estar sozinho com mi-nha esposa?

- Fazemos planos?

- Como anda nosso relaciona-mento sexual?

- Damos risada juntos?

- Pense nos temas das suas con-versas. Ou mesmo se há momen-tos de conversa.

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Nas promessas ma-trimoniais se ga-rantem ao esposo(a) o exclusivo di-reito de encontrar no outro a satisfa-ção de suas necessi-dades mais íntimas. A fórmula do con-sentimento matri-monial é um com-prometer-se total com a felicidade a-lheia, que exige ab-soluta fidelidade, respeito e amor em quaisquer condi-ções que se possa suportar, por todos os dias da vida.

Page 26: Revista In Guardia.3ª edição

Tubo de Ensaio com Márcio Antônio Campos

O entrevistado é o o bioquímico chile-noRafael Vicuña, membro e diretor da Pontifícia Academia de Ciências Vicuña foi um dos palestran-

tes do VI Congresso Latino-Americano de Ciência e Religi-ão, de que participei na Cidade do México entre os dias 19 e 21 de outubro desse ano, e tratou do tema "O que é a vida? Algumas noções a partir da Bioquímica (para um diálogo com a Teologi-a)". Perto do encerramento, ele me deu a seguinte entrevista, en-quanto pedia para não deixar de mencionar o orgulho que sentia na semana em que seu time, o Universidad de Chile, havia go-leado o Flamengo no Rio de Ja-neiro:

________________

Como é o funcionamento da Pontifícia Academia de Ciên-cias?

Temos dois tipos de reuniões: existem as plenárias, das quais participam todos os membros da Academia, com a presença ocasional, embora rara, de al-gum cientista convidado. Como aí estão todos os cientistas da Academia, que somos de varia-das áreas do conhecimento, discutimos temas mais gerais, como por exemplo os valores culturais da ciência, o valor do descobrmento científico, a complexidade da ciência (que é nosso próximo tema). Assim, o astrônomo, o biólogo, o filóso-fo, o matemático, o químico, podem abordar esses temas dentro de sua própria perspecti-va. E a Academia, três ou qua-tro vezes por ano, organiza pe-quenos workshops ou encon-tros sobre temas mais específi-

cos; nesses casos – como o dos glaciares, de que participei; ou o das células-tronco, dos trans-gênicos, da morte encefélica, da astrobiologia –, algums membros da Academia, os que mais estão ligados ao tema, convidam os maiores especia-listas do mundo na área (mesmo que não sejam mem-bros) para podermos analisar um tema mais a fundo.

Qual o critério para a escolha dos temas? O Papa intervém na decisão sobre os assuntos discutidos pelos acadêmicos?

Os próprios integrantes da Aca-demia propõem temas à direção – como eu estou atualmente na direção, estou bem envolvido

com esse processo –; eles dizem "vejam, está havendo essa ou aquela tendência em tal área da ciência, então seria bom que convidássemos os especialistas para ter uma discussão a respeito aqui na Academia, no Vaticano". Mas ocasionalmente pode ocor-rer que o Papa ou membros da hierarquia católica nos sugiram temas. Quanto discutimos a morte encefálica, eu não estava na direção, mas tive essa impres-são, como se a hierarquia quises-se ter mais informação a respeito da morte encefálica e tivesse nos perguntado "por que vocês não covocam uma reunião?" E assim ocorreu, com algums membros da Academia e muitos especia-listas, principalmente médicos neurologistas.

Dezembro 2011 / In Guardia 26

Entrevista: Rafael Vicuña, bioquímico: "a Pontifícia Academi-a de Ciências não entra em conflitos desnecessários"

Plenária da Pontifícia Academia de Ciências: temas mais genéricos para que todos os cientis-tas possam participar.

E a Academia, três ou quatro vezes por ano, organiza pequenos workshops ou encontros sobre temas mais específicos; nesses casos – como o dos glaciares, de que participei; ou o das células-tronco, dos transgênicos, da morte encefélica, da astrobiologia

Page 27: Revista In Guardia.3ª edição

Tubo de Ensaio com Márcio Antônio Campos

Mas nem todos os resultados das discussões da Academia acabam se transformando em textos pontifícios ou magisteri-ais.

Depende. Por exemplo, o texto sobre a morte encefálica se con-verteu em documento oficial e foi publicado pela Academia; dizer que é da Academia é, de certa forma, dizer que é da Igre-ja. Tecnicamente, claro, não é a mesma coisa que um documen-to, por exemplo, da Congrega-ção para a Doutrina da Fé, mas as pessoas entendem nossos do-cumentos como um pronuncia-mento oficial que tem a aprova-ção do Vaticano. No entanto, também há ocasiões em que nós, da Academia, fazemos declara-ções e as publicamos, mas sem vinculá-las à Academia, especi-almente quando há conferências episcopais com diferentes pon-tos de vista. Aconteceu, por e-xemplo, com os transgênicos; bispos de várias partes do mun-do não tinham opiniões favorá-veis e percebemos que, se fizés-semos uma declaração oficial a favor, criaríamos um conflito desnecessário. No fim, a decla-ração foi publicada, mas não co-mo um documento oficial da A-cademia; ele saiu só com a assi-natura dos cientistas – inclusive com a minha, porque sou favorá-vel aos transgênicos.

E em que temas a Academia vem trabalhando?

Estamos pensando num congres-so sobre educação – sempre te-mos workshops de educação porque este é um tema que nos interessa muito. Ano que vem teremos um encontro sobre célu-las-tronco; já tratamos deste as-sunto antes, mas surgem novida-des e novos desafios éticos, en-tão é bom voltar ao tema perio-dicamente. Será naquele modelo em que alguns poucos membros da Academia convidam os me-lhores especialistas do mundo. A sessão plenária do próximo ano será sobre a complexidade na ciência.

Às vezes se ouve uma crítica de que a Igreja deveria reagir

mais rapidamente às novida-des científicas e tecnológicas. Como o senhor avalia esta questão?

A Igreja é muito sábia, orienta-dora e formadora de todos os que pertencemos a ela, e não pode ser precipitada. Como ci-entista, eu realmente gostaria de ver a Igreja com uma atua-ção mais explícita em algumas áreas da ciência. No caso da evolução, por exemplo, acho que ela poderia dar um passo adicional. Mas, por outro lado, sei que esses assuntos não têm a ver com o lado mais pastoral da Igreja, com os dogmas, ou com problemas de filosofia an-tropológica. Eu gostaria – mas é uma opinião muito pessoal – que a Igreja assumisse um pa-pel de mais protagonismo nesse caso. João Paulo II deu um grande salto em 1996 e eu acho que poderia ocorrer de novo.

Houve uma certa polêmica no Brasil quando o neurocientis-ta Miguel Nicolelis foi nomea-do para a Academia; católi-cos se perguntaram como o Papa poderia nomear alguém que defende o aborto e a uni-ão homossexual, e esquerdis-tas acusaram Nicolelis de "se vender ao Papa" por ter acei-to a nomeação. Como ocorre esse processo na Academia?

Os novos integrantes são no-meados por votação direta dos acadêmicos, a partir de nomes sugeridos pelos próprios mem-bros. A Academia faz algumas averiguações e confia no critério de quem sugere nomes. Como a Academia é vista pelo pú-blico como um órgão do V a t i c a n o , muitos pode-riam querer que os inte-grantes com-partilhassem dos princípios e da ética ca-tólicas, mas temos muitos

membros que não são católicos por várias razões, e são todos bem vindos. A Academia é in-ternacional; nem todos são ca-tólicos, mas é preciso que todos estejam de acordo com alguns princípios éticos básicos. Quando incorporamos um aca-dêmico, esperamos que conti-nue com sua ciência e sua bus-ca pela verdade, e o faça no es-pírito de tolerância e respeito, como temos feito na Academia. Um exemplo bem relevante é o de Stephen Hawking, que é membro da Academia e vem falando da falta de necessidade de um Criador; isso reflete a pluralidade da Academia e o respeito que temos pelos não religiosos.

Essa diversidade traz que tipo de desafios?

Há diversas opiniões de mem-bros sobre eutanásia, células-tronco, e um lado ruim disso é que, quando queremos fazer u-ma declaração, nem sempre po-demos ter respaldo da Igreja porque algumas vezes as decla-raões têm termos de que eu par-ticularmente não compartilho. Por exemplo, eu concordo com a Igreja que não podemos destruir embriões para tirar células-tronco; penso assim não só por fidelidade à Igreja, mas também como cientista.

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Diretoria da Pontifícia Academia de Ciências durante sessão plenária:

Rafael Vicuña é o primeiro à direita.

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Diário de Bordo da JMJ com Pedro Brasilino

Nesta edição gostaria de contribuir para uma visão do que é uma Jornada Mundial da Ju-ventude a partir de alguns depoi-

mentos. Para isso conto aqui com a carinhosa contribu-ição de duas pesso-as amigas que tive a oportunidade de

conhecer durante o encontro. Amizades que espero muito re-ver na JMJ 2013, no Brasil, a fim, também, de poder retribuir toda a acolhida que nos foi dis-pensada na Espanha.

Mireia Planas Serradel nasceu e mora em Vic, cidade mãe da Congregação Filhos do Imacu-lado Coração de Maria, Espa-nha.

A JMJ foi uma experiência mui-to boa. Para mim foi viver numa autêntica família. Estávamos u-nidos, jovens de todo o mundo, por um mesmo Espírito. Unidos no amor de Deus e de santo An-tonio Maria Claret, uma pessoa que através de sua vida e das su-as palavras nos ensinou a viver como pregadores do evangelho onde for preciso e através de to-dos os meios possíveis. Durante os dias de JMJ, senti-me numa

família onde o que não faltava era alegria e louvor.

Acho que temos que ter claro o sentido da JMJ. Não é um sim-ples encontro com o Papa, senão é um encontro para comemorar o amor de Deus. Para nos encon-trar com o Cristo ressuscitado, e tudo isso na presença da pessoa que representa a nossa Igreja, o Papa. Juntos, faz-se essa come-moração da alegria que sentimos de sermos filhos de Deus.

O que mais me chamou a aten-ção na Jornada foi como jovens de todo o mundo, mesmo sem se conhecerem, eram capazes de ter uma união. Realmente sentíamos o Espírito conosco, nos sentía-mos todos apaixonados por Cris-to e por Deus.

Quero que chegue logo a JMJ no Brasil. Vai ser uma experiência de reencontro com a “minha fa-mília Claretiana”, que conheci em Madrid e o poder comemorar essa JMJ com o povo que tão bem me acolheu e tanto me deu.

Espe Calleja tem 17 anos, nas-ceu e vive em Sevilla.

A Jornada Mundial da Juventude foi uma experiência incrível e única. Ajudou-me a crescer na minha fé e graças a está experi-ência pude ver a grandeza de Deus e podido aprender muito de pessoas de diferentes culturas. Sempre vou ter está experiência em meu coração. Graças a esse encontro pude ver Deus mais de perto.

Impressionou-me na JMJ a gran-de quantidade de pessoas que tinham a mesma crença. Um mesmo Espírito que não tinham fronteiras de países ou línguas e, também, a alegria que havia por todas as partes cheias do amor de Deus.

Um dos momentos que mais gostei foi em “Cuatro Vientos”, o momento da Adoração da cus-tódia. No silêncio que se fez nes-se momento e impressionava ver como dois milhões de pessoas ali reunidas eram capazes de per-manecer em silêncio dessa ma-neira.

Espero estar no Brasil, se Deus quiser, pois espero pessoas mui-to amáveis e simpáticas. Um pa-ís exótico e com muita cultura. Uma comida, que suponho tropi-cal como muitas frutas.

“Un beso muy grande!”

A juventude é um tempo da vida propício para a descoberta da vocação. É um bom momento onde se pode descobrir onde tra-balhar os dons que Deus nos concedeu. A Igreja deve eviden-temente ser o espaço onde o jo-vem deve fazer as perguntas que seguem inerentes a uma decisão em direção a vocação. Na juven-tude o mundo quer fazer acredi-tar que existem muitos cami-nhos, quando na verdade o Ca-minho único é Cristo. O discer-nimento dessa realidade cristã nem sempre é fácil. Contudo, os dias de preparação para uma Jor-nada Mundial da Juventude com as leituras das mensagens do Pa-pa, a oração pessoal e a presença constante e devocional nas cele-brações Eucarísticas, constituem

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Seu nome completo.

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Diário de Bordo da JMJ com Pedro Brasilino

uma valorosa oportunidade de descoberta de Cristo, que assim, nos revela a nós mesmos. (Mt 16,13-17)

Com o aprofundamento no conhecimento de Jesus, Ele nos revela e nossa vocação. En-tretanto, esse conhecimento a-cerca de Jesus não deve ser feito como em uma simples leitura de uma biografia de alguém impor-tante, mas, sim com o sentido de uma relação entre amigos, que cresce na constância em que se encontram e dialogam. Não se pode amar o que não se conhece, pois o amor toma forma com o conhecimento e com a intimida-de. Sobre o amor disse, assim, são João da Cruz: "O amor não consiste em sentir grandes coi-sas, mas em despojar-se e sofrer pelo amado." Para aqueles que viveram a maravilhosa experiên-cia da JMJ, em Madrid, podem recordar com a frase de são João da Cruz, um dos padroeiros do evento, os dois dias em “Cuatro Vientos”. Onde primeiro os pe-regrinos sofreram com o sol, os poucos recursos, mínimas aco-modações, comida muito dife-

rente, depois, forte vento, chuva, frio, mas como citou Espe Calle-ja, veio o silêncio na Adoração da Eucaristia e o sentimento era o de que tudo havia valido a pe-na. Milhões de jovens silencio-samente felizes. Felizes porque estavam entre amigos. Felizes porque estava na presença do Senhor. Felizes!

Enquanto as lembranças e a saudade ainda povoam a mente e o coração daqueles que estive-ram em Madrid, a Cruz e o Ícone de Nossa Senhora peregrinam pelas diversas dioceses do Bra-sil.

Jovens Conectados: “... a peregrinação começou mesmo no dia 18 de setembro, quando uma grande festa realizada em São Paulo marcou a acolhida da Cruz dos Jovens e do Ícone de Nossa Senhora no Brasil. Desde então os dois símbolos máximos da Jornada Mundial da Juventu-de (JMJ) já passaram por várias dioceses. Os jovens das dioceses têm participado em peso em to-das as atividades. Têm, inclusi-ve, colaborados na cobertura

fazendo maté-rias, vídeos e fo-tos.”

Arquidiocese de Goiânia: “A da-ta de chegada da Cruz da Jornada Mundial da Ju-ventude e o Ícone de Nossa Senho-ra aqui na Arqui-diocese de Goiâ-nia será entre os

dias 26 e 29 de maio de 2012. Dias de profunda manifestação de fé da juventude de nossa arquidiocese serão muito bem preparados pelo Setor Juven-tude e Vocação.”

Dias e momentos em que os jovens, em suas diversas dioceses, poderão ter uma bo-nita oportunidade de voltar seus sentidos para a Cruz de Cristo, bem como, o Ícone de Maria sua mãe e nossa. Opor-tunidade dos jovens colocarem suas esperanças, suas vidas, suas alegrias nas mãos do Fi-lho do Homem. Oportunidade de fazer do Senhor um amigo próximo e sempre presente. Fazer caminhar as jovens ove-lhas em direção ao Bom Pas-

tor.

A Jornada do Rio já co-meçou, e isso é “#Fato”. Dessa maneira devemos rezar e traba-lhar (ora/ação) para que as difi-culdades, que como sabemos, são grandes; corrupção, violên-cia, falta de infraestrutura nos vários aspectos não nos impeça de bem receber a juventude cató-lica. Assim, o sonho de partici-par dessa festa da Igreja de Cris-to deve se transformar em se-mentes, para que sejam semea-das com o objetivo de que alcan-cem terras férteis e dêem bons frutos.

“Alegra-te, pois, ó jovem, na tua adolescência, e teu coração este-ja no bem durante a tua juventu-de;... pois a adolescência e a ju-ventude são vaida-de” (Eclesiastes 11,9b.10)

Sites recomendados: www.rio2013.com

www.arquidiceosedegoiania.org.br

www.jovensconectados.org.br

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Logo da Jornada Mundial da Juventude do Brasil/2013.

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Apologética da Fé com Pe. Inácio José do Vale.

Uma das formas do espiritualismo en-ganoso é a Astrolo-gia, cuja prática é condenada por Deus (Levítico 19:31: Isaías

47:13). O erudito filósofo e teó-logo, Doutor da Igreja, Santo A-gostinho de Hipona (354-430), condenou categoricamente a As-trologia e toda forma de espiri-tismo. Disse: “Os astrólogos pre-tendem que no céu se acha a causa inevitável do pecado: foi Vênus, Saturno ou Marte que nos fez executar esta ou aquela ação. Querem assim isentar de culpa o homem, que é carne, sangue e verme soberbo, e pro-curam transferir a responsabili-dade para Aquele que criou e governa tanto o céu como as es-trelas”.

Vejamos a sua afirmação refe-rente a um astrólogo convertido á santa fé de Cristo Salvador: “Ele, seduzido pelo inimigo, em virtude de sua boa fé, foi durante muito tempo astrólogo, seduzido e sedutor, enganado, e engana-dor. Atraiu, enganou, proferiu muitas mentiras contra Deus, que teria dado aos homens o po-der de fazer o bem, e não o de cometer o mal”.

Quem é o inimigo sedutor da Astrologia e de toda forma de espiritualismo enganoso?

Deus, o grande Construtor do Universo (Salmo 19.1-14; Ro-manos 1.19,20), criou uma mul-tidão de criaturas espirituais muito antes de criar os seres hu-manos (Jó 38:4,7), uma dessas criaturas nutriu o desejo egoísta e soberbo de que as criaturas es-pirituais, ou seja, os anjos o ado-rassem em vez de adorar o único Deus Verdadeiro (Isaías 42:8; 45:5; João 17:3). Em busca des-se objetivo terrível, esse anjo e-xaltado (Isaías 14:11-15; Ezequi-el 28:11-19), opôs-se ao Criador e o caluniou, chegando a dar a entender a Eva que o bom Deus era mentiroso. A primeira sessão espírita no Jardim do Éden, foi tomada por uma catástrofe de engano (Gênesis 3.4,13; morte espiritual 3:7-10; dores 3:16-19: e expulsão do Éden 3:23,24).

Por isso foi apropriado que essa horrível e malévola criatura espi-ritual, exarcebada de rebeldia se tornasse conhecida como Sata-nás (Hebraico, Adversário, opo-sitor), o diabo (Grego, calunia-dor, enganador). Pai da mentira e homicida (João 8.44). Os seres espirituais que seguiram a Sata-

nás, tornaram-se de-mônios, ou espíritos imundos (Marcos 5:13; 6:7; Lc 10:17-20). O diabo com os seus demônios são os mestres na arte de en-gano nos Centros Es-píritas. Os médiuns são enganados pelos ditos espíritos de luz, que na verdade são espíritos das trevas (Atos 26:18; Efésios 5:11,12; 6:12). Daí São Paulo Apóstolo afirma: “Homens en-ganando e sendo en-ganados” (II Timóteo 3:13).

O fator primordial do diabo e dos demônios

é voltar às pessoas contra Deus. O diabo usa várias religiões, sei-tas e filosofias para enganar as pessoas e levar elas pelo erro a serem inimigas de Deus. Assim, esses demônios têm desencami-nhado, perturbado, separando casais, causando enfermidades, assustando, atacando e matando as pessoas no decorrer de toda a história da raça humana, (João 10:10; Apocalipse 12:9). Há e-xemplos ocorridos na atualidade que confirmam que a violência dos demônios hoje é maior do que nunca. É só observar a tec-nologia a serviço do mal. Para apanharem as pessoas numa cila-da, o diabo muitas vezes usa o espiritualismo em todas as suas formas. Como o diabo usa esse chamariz?

O espiritualismo enganoso é a-málgama de todos as correntes filosóficas, teosóficas, esotéricas e mediúnicas, desde o Jardim do Éden até os dias atuais da Nova Era. Dentro desse contexto, está o espiritismo contemporâneo.

O que é o espiritismo? É envol-vimento com os demônios, por via direta ou por intermédio de um médium. O espiritismo faz para os demônios o que o cha-mariz faz para o caçador: atrai presas. E, assim como o caçador usa uma variedade de chamari-zes para atrair os animais para a armadilha, do mesmo modo os espíritos iníquos incentivam vá-rias formas de espiritismo para

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Espíritas e demônios. “Os mat emát i c o s (astrólogos), constituem uma categoria de ho-mens desleal para os poderosos, enganadora para os esperançosos”. Tácito (c.60 – c.120) Decano dos Historiado-res Romanos

Astrologia: um sedutor engano.

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Apologética da Fé com Pe. Inácio José do Vale.

colocar os seres humanos sob seu controle. (Leia Salmo 119:110). Algumas dessas for-mas de espiritismo são: adivi-nhação, magia, presságios, feiti-çaria, encantamentos, consulta a médiuns e comunicação com os mortos, passes, despachos e as-trologia.

O chamariz funciona, porque o espiritismo atrai pessoas do mundo todo. Quem mora em po-voados na selva consulta curan-deiros, e pessoas que trabalham em escritórios nas cidades con-sultam astrólogos. O espiritismo prospera mesmo em países que se dizem cristãos. Há pesquisas que indicam que nos Estados U-nidos umas 30 revistas com cir-culação conjunta de mais de 10.000.000 de exemplares dedi-cam-se a várias formas de espiri-tismo. Todo ano os brasileiros gastam mais de 500 milhões de dólares em artigos espíritas. No entanto, 80% dos que freqüen-tam terreiros no Brasil são infe-lizmente católicos batizados. É nosso dever catequizar com todo ardor o nosso povo. Vamos li-vrar o nosso povo católico de toda forma de espiritualismo en-ganoso (ler Judas vv. 22 e 23).

Se lhe ensinaram que algumas formas de espiritismo, são meios

de contatar espíritos bons, talvez, fique surpreso ao aprender o que a Sagrada Escri-tura diz sobre o espiri-tismo. O povo de Deus foi alertado. “Não vos vireis para médiuns espíritas e não consulteis prog-nosticadores profis-sionais de eventos, de modo a vos tornardes impuros por e-les.” (Levítico 19:31; 20:6,27). A Palavra de Deus adverte-nos de que ‘os que praticam o espiritismo’ acaba-rão no “lago que quei-ma com fogo e enxo-fre. Este significa a segunda morte (morte eterna)”. (Apocalipse 21:8; 22:15). Todas as formas de espiritismo são desaprovadas por Deus (Deuteronômio 18:10-12). Todas as

mensagens atuais do mundo dos espíritos vêm de espíritos iní-quos. A prática do espiritismo pode levar ao molestamento ás mãos dos demônios ou até á pos-sessão demoníaca. Portanto, Deus amorosamente nos adverte de que não nos devemos envol-ver em nenhuma prática espírita (Deuteronômio 18:14; Gálatas 5:19-21).Além disso, se continu-armos a praticar o espiritismo depois de sabermos qual é o con-ceito de Deus sobre isso, estare-mos tomando o lado dos espíri-tos imundo, rebeldes, e seremos inimigos de Deus. I Samuel 15:23; I Crônicas 10:13, Salmo 5:4.

Uma forma muito comum de espiri-tismo é a adivi-nhação – tentar descobrir o futuro ou o desconhecido com a ajuda dos espíritos. Algumas formas de adivi-nhação são: a as-trologia, a bola de cristal, a interpre-tação de sonhos, a quiromancia e ver a sorte com as car-tas de tarô. Muitas pessoas encaram a

adivinhação como passatempo inofensivo, mas a Bíblia mostra que os adivinhos e os espíritos imundos andam de mãos dadas. Por exemplo: Atos 16:16-19, menciona um “demônio de adi-vinhação” que habilitava uma moça a praticar “a arte do vaticí-nio (adivinhação)”. No entanto, sua habilidade de predizer o fu-turo foi perdida quando o demô-nio foi expulso. É óbvio que a adivinhação é um chamariz usa-do pelos demônios para atrair as pessoas para sua armadilha.

Se você estiver chorando a morte de um familiar amado ou de um amigo achegado, poderá ser fa-cilmente engodado por outro chamariz. Um médium espírita talvez lhe dê informações espe-ciais ou fale com uma voz que se parece com a do falecido. Cuida-do! Tentar comunicar-se com os mortos leva a uma armadilha. Por que? Porque os mortos não falam. Como sem dúvida se lem-bra, a Palavra de Deus diz clara-mente que na morte a pessoa “volta ao seu solo; neste dia pe-recem deveras os seus pensa-mentos”. Os mortos “não estão cônscios de absolutamente na-da”. (Salmo 146:4; Eclesiastes 9:5,10) Além disso, na verdade os demônios é que imitam a voz do falecido e dão ao médium es-pírita informações sobre essa pessoa. (I Samuel 28:3-19) Por-tanto, quem ‘consulta os mortos’ é enlaçado pelos espíritos imun-dos e age contrário á vontade de Deus (Deuteronômio 18:11, 12; Isaías 8:19).

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Apologética da Fé com Pe. Inácio José do Vale.

REJEIÇÃO AO ESPIRITUA-LISMO ENGANOSO

Ao acatar os conselhos da Pala-vra de Deus sobre o espiritismo, você rejeita o chamariz dos de-mônios. (Leia Salmo 141:9,10 Romanos 12:9) Será que isso significa que os demônios param de tentar capturá-lo? Absoluta-mente não! Depois de tentar Je-sus três vezes, Satanás “retirou-se dele até outra ocasião conve-niente”. (Lucas 4:13) Semelhan-temente, os espíritos obstinados não só atraem as pessoas mas também as atacam.

Satanás atacou Jó, o santo servo de Deus. Esse inimigo do Cria-dor causou a perda de seus reba-nhos e a morte da maioria dos seus servos. Satanás chegou a matar os filhos de Jó. A sua es-posa o abandonou. A seguir, ele feriu o próprio Jó com uma do-ença dolorosa, seus amigos cau-saram perturbações, mas Jó man-teve a fidelidade a Deus e foi muito abençoado. (Jó 1:7-19; 2:7, 8; 42:12). Todo sofrimento de Jô está dentro da vontade per-missiva de Deus e dentro de um contexto pedagógico. Desde en-tão, os demônios às vezes fazem com que as pessoas fiquem mu-das, surdas, paralíticas ou cegas e continuam a deleitar-se no so-frimento dos seres humanos. (Mateus 9:32, 33; 12:22; Marcos 5:2-5; Lucas 13:11-16). Hoje, há relatórios que mostram que os demônios molestam sexualmente a algumas pessoas e levam ou-

tras à loucura. Claro, que tudo isso via um processo de posses-são e pela prática de vícios peca-minosos. Eles incitam outras pessoas a cometer assassinatos ou suicídio, que são pecados contra Deus. (Deuteronômio 5:17; João 3:15). O diabo atenta e perturba o ser humano para que ele quebre os santos manda-mentos de Deus. Dizia Santa Te-resa de Ávila: “Não se deixe per-turbar, nem deixar a oração – que é o que o demônio preten-de”. No entanto, milhares de pessoas que já estiveram enlaça-das pelos espíritos imundos con-seguiram liberta-se. Como con-seguiram isso? Dando passos muito importantes para o Cristo Libertador.

Qual é uma maneira de opor-se

aos demônios e proteger a si mesmo e a sua família das arma-dilhas deles? Os cristãos do pri-meiro século, em Éfeso, que pra-ticavam o espiritismo antes de se tornar cristão tomaram uma ati-tude. Lemos que “um número considerável dos que haviam praticado artes mágicas trouxe-ram os seus livros e os queima-ram diante de todos” (Atos 19:19). Mesmo que você não pratique o espiritismo, livre-se de tudo que seja usado no espiri-tismo ou que tenha implicações com o espiritismo. Isso inclui livros, revistas, vídeos, posters, gravações musicais e objetos u-sados para fins espíritas. Estão incluídos também ídolos, amule-

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Mesmo que você não pratique o espiri-tismo, livre-se de tudo que seja usado no espiritismo ou que tenha implicações com o espiritismo. Isso inclui livros, re-vistas, vídeos, posters, gravações musi-cais e objetos usados para fins espíritas. Estão incluídos também ídolos, amuletos e outras coisas usadas para dar prote-ção, e presentes recebidos de praticantes do espiritismo. (Deuteronômio 7:25, 26; I Coríntios 10:21). O cristão não deve re-ceber passes, presentes e convite para vi-sitar centros espíritas. A Santa Madre I-greja não aceita a participação de católi-cos no espiritismo.

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Apologética da Fé com Pe. Inácio José do Vale.

tos e outras coisas usadas para dar proteção, e presentes recebi-dos de praticantes do espiritis-mo. (Deuteronômio 7:25, 26; I Coríntios 10:21). O cristão não deve receber passes, presentes e convite para visitar centros espí-ritas. A Santa Madre Igreja não aceita a participação de católicos no espiritismo.

Para a pessoa se opor aos demô-nios, outro passo importante é aplicar o conselho de São Paulo Apóstolo de revestir-se da arma-dura espiritual que está em Efé-sios 6:11-17.

O cristão precisa conhecer a sua doutrina e o poder de Deus para vencer as forças das trevas. “Tomando sobretudo o escudo da fé com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno” (Efésios 6:16).

Qual é o meio para receber esse poder? Estudar o Catecismo da Igreja Católica, examinar siste-maticamente as Sagradas Escri-turas, (Mateus 22:29; João 5:39; Colossenses 1:9,10; II Pedro 3:18) e viver verdadeiramente os Sacramentos da Santa Igreja de Deus.

A medida que você continuar esse santo estudo e praticar pie-dosamente adoração a Deus em casa e na sua igreja, sua vida se-rá tomada pelo poder do Espírito Santo. Isso será uma poderosa arma contra as tentações dos de-mônios. Para fortalecer a fé, a mente e a vida espiritual são ne-cessários: meditação, a oração, o jejum e retiros espirituais (Mateus 6:6 -16; 14:23; 17:21; Lucas 2:37).

O cristão deve opor-se poderosa-mente aos demônios e aos seus ataques (Efésios 4:27; Tiago 4:7). Deve procurar a forte pro-teção de Deus. Em Provérbios 18:10: “Torre forte é o nome do Senhor; para ela correrá o justo, e estará em alto retiro”. (Ler Sal-mo 145:18-20).

O Criador permite que o diabo e seus demônios continuem a exis-tir, mas ele mostra seu poder, especialmente a favor do Seu povo, e Seu nome está sendo de-clarado em toda a terra. (Êxodo 9:16). Se você permanecer ache-gado a Deus, não precisará temer

o s d e m ô n i o s ( N ú m e r o s 23:21,23; Tiago 4:7,8; II Pedro 2:9) O poder desses espíritos é limitado. Foram expulsos da pre-sença de Deus. (Judas 6; Apoca-lipse 12:9; 20:1-3,7-10,14) De fato, eles têm pavor da sua vin-doura destruição. (Tiago 2:19) Portanto, quer os demônios ten-tem atraí-lo com algum tipo de chamariz quer o ataquem de al-guma outra forma, você poderá opor-se a eles (II Coríntios 2:11).

O grande mestre da fé cristã Santo Agostinho nos ensina: “O diabo é como um cão amarrado que muito pode latir e fazer es-tardalhaço mas só morde a quem chegar perto dele”. E a Doutora da Igreja Santa Catarina de Sena afirmava: “O demônio é fraco e nada pode além daquilo que Deus Lhe permita”.

CONCLUSÃO

Rejeite toda forma de espiritua-lismo enganoso. Estude pra valer o Catecismo da Igreja Católica, comungando sempre da Santíssi-ma Eucaristia e vivendo as dou-trinas da Igreja. Cresça na graça e no conhecimento de Jesus Cristo (II Pedro 3:18). Ande sempre na unção e direção do Espírito Santo. (Rm 8:1-16; I Co 3:16, Ef 4:27-30; 5:18; I Ts 5:19,20; I Pe 5:6-9; I Jo 2:13-27; Ap 22:17). É bom afirmar que temos o anjo da guarda para nos proteger ( Salmos 34:7; 91: 11: Atos 12:7,8 e 15).

A maior vitória sobre o espiritu-alismo enganoso e as legiões di-

abólicas é o poderoso nome de Jesus Cristo. É o nome sobre to-dos os nomes. É o nome que cu-ra, liberta, dá vitória e salva. (Marcos 16:17,18; Atos 4:10-12; Filipenses 2:10,11; Apocalipse 19:13).

O ínclito Abade de Claraval e Doutor da Igreja São Bernardo experimentava a máxima conso-lação em repetir o santíssimo no-me de Jesus. Era como se tivesse mel na boca e sentia uma paz deliciosa no coração”.

Louvado seja Nosso Senhor Je-sus Cristo!

Pe.Inácio José do Vale

Pároco da Paróquia São Paulo Apóstolo

Professor de História da Igreja

Faculdade de Teologia de Volta Redonda

E-mail:

[email protected]

B I B L I O G R A F I A

SOLIMÃO, Plínio Maria. Os Santos Anjos: nossos celestes protetores, São Paulo: Editora Padre Belchior de Pontes, 1998.

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O cristão precisa conhecer a sua doutrina e o poder de Deus para ven-cer as forças das trevas. “Tomando sobretudo o escu-do da fé com o qual podereis apa-gar todos os dar-dos inflamados do maligno” (Efésios 6:16).

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Coluna do Ives Gandra Martins.

Sou um admirador das séries de “Startrek”. As cinco edições re-fletem muito a histó-ria da humanidade.

Os Borgs são um po-vo de humanos robotizados, os quais respondem a um comando central único, que pretende “assimilar” todos os povos do universo. Assimilar é fazer com que pensem rigorosamente como eles e obedeçam, como uma só unidade. Senão, são mortos.

Os Borgs representam as ditadu-ras ideológicas, que não admi-tem contestação e que procuram dominar os povos, eliminando as oposições e as verdadeiras de-mocracias.

Se a 1ª. Guerra Mundial foi um embate pela realocação de pode-res na Europa, a 2ª. guerra já foi uma guerra entre as democracias e os regimes totalitários (alemão, italiano e russo, visto que, no início, Stálin apoiou Hitler, na invasão à Polônia).

A vitória de princípios democrá-ticos naquele conflito, que gerou a Declaração Universal dos Di-reitos Humanos, em 10/12/1948, nem por isto eliminou esta luta permanente entre ideologias to-talitárias, que não admitem con-testação e que continuam poluin-do a convivência das nações , e as democracias.

Rawls, em dois de seus livros “Uma teoria da justiça” e “Direito e Democracia” mostra que a democracia só pode ser vivida se as teorias políticas não forem abrangentes em demasia e possam conviver, em suas di-versidades, com outras maneiras de pensar. Teorias abrangentes provocam ou a eliminação dos opositores ou a “assimilação”,

no estilo dos Borgs da “Startrek”, daqueles que vivem sob seu julgo.

Estamos no início de um novo governo, tendo a presidente sina-lizado, mais de uma vez, que quer fazer um governo de união, mas com respeito aos opositores.

Não creio que a Comissão da Verdade venha auxiliar muito este seu projeto, na medida em que, sobre relembrar fantasmas do passado e rememorar doloro-sos momentos de uma história em que militares e guerrilheiros torturaram e mataram, tende a abrir feridas e acirrar ânimos.

Como ex-conselheiro da OAB da Seccional de São Paulo, du-rante seis anos no período de ex-ceção, estou convencido de que com a arma da palavra fizemos muito mais pela redemocratiza-ção do país do que os guerrilhei-ros com suas armas, que, a meu ver, apenas atrasaram tal proces-so.

À evidência, sou favorável a que os historiadores -e não os políticos- examinem, pela perspectiva do tempo, o ocorrido naquele período, pois não são os polí-ticos que contam a história, mas aqueles que se preparam pa-ra estudá-la e exami-nam-na , sem pre-conceitos ou espírito de vingança.

Apoio, entretanto, o entendimento do Mi-nistro Nelson Jobim de que , se for insta-lada Comissão da Verdade, que deva refletir o pensamen-to dos dois lados do

conflito. Tenho fundados receios de que uma pequena ala de radi-cais , a título de defender “direitos humanos” por um úni-co e distorcido enfoque –e os vocábulos permitem uma flexibi-lização infinita para todos os gostos-, pretenderá “assimilar” , à maneira dos Borgs na “Startrek”, todos os que não pen-sem da mesma maneira, transfor-mando uma Comissão da Verda-de em Comissão da Vingança. Pessoalmente, como combati o regime de então –sofri em 1969, inclusive, pedido de confisco de meus bens e abertura de um IPM, processos felizmente arqui-vados- e participei da Anistia Internacional, enquanto tinha um ramo no Brasil, por ser visceral-mente contra a tortura, sinto-me à vontade para criticar a “ideologização” dos fatos passa-dos, a meu ver enterrados com a lei de Anistia de 1979.

Que os historiadores imparciais -e não, o ideólogos- contem a verdadeira história da época, pois são para isto os mais habili-tados.

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Os Borgs e a Comissão da Verdade

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Histórico e neces-sidade da festa

“O dever de prestar a Deus um culto autêntico diz res-peito ao homem in-

dividual e socialmente. (...) O dever social dos cristãos (...) [e]xige que levem a conhecer o cul-to da única religião verdadeira, que subsiste na Igreja católica e apostólica. Os cristãos são cha-mados a ser luz do mundo. As-sim, a Igreja manifesta a realeza de Cristo sobre toda a criação e particularmente sobre as socie-dades humanas.”[1]

Desde o Renascimento e a Re-forma Protestante, foi-se proje-tando, na Europa católica, sua progressiva descristianização. Com efeito, o período imediata-mente posterior à Idade Média caracterizou-se por uma crise sem precedentes, desembocando, pela ação dos novos filósofos dos séculos XVII e XVIII, no laicismo inaugurado pela Revo-lução Francesa, em 1789. Nesta, institucionalizou-se o já crescen-te distanciamento entre as esfe-ras temporal e espiritual.[2] Expulsou-se, na prática e na teoria, Cristo de Seu legítimo Reinado sobre as sociedades ci-vis. Tolerar-se-ia, no máximo, o

culto na dimensão privada, no foro íntimo das consciências, o que contraria a perene doutrina católica, exposta na citação aci-ma, por exemplo.

Sempre foi entendimento da I-greja que Nosso Senhor, ao dar a primazia ao espírito e fundar um Reino sobretudo transcendente, não abdicou de Sua soberania sobre o campo temporal, i.e., não-religioso. Tanto isto porque os cristãos, cidadãos do céu, vi-vem como súditos na terra – e não se pode servir a dois senho-res –, e também pelo fato de que,

guardando-se a natural indepen-dência entre Estado e Igreja em suas esferas próprias d ação, o bem terreno subordina-se indire-tamente ao celeste. Outrossim, a salvação conquistada por Jesus, plenamente gozada na vida por-vir, inicia-se aqui no “exílio da terra” – para usarmos uma lin-guagem mais teresiana.

Pelo liberalismo do século XIX, desenvolvimento político e filo-sófico do Illuminismo e da Re-nascença, o erro laicista, anticle-rical, contrário ao justo domínio de Cristo também na esfera civil – por meio do Estado, claro, e

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O sentido da festa litúrgica

de Cristo Rei

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não em uma confusão teocrática de sabor islâmico –, foi reafir-mado. Precisou a Igreja lembrar a todos sua doutrina tradicional.

Para tanto, na esteira de tantos Papas, notadamente o Beato Pio IX, Leão XIII e São Pio X, que combateram sem cessar o inimi-go da ordem social cristã e sa-cral, qual seja o liberalismo – e o Estado Moderno, a filosofia ilu-minista, a concepção juspositi-vista do Direito, as distorções do que sejam a razão e a liberdade etc –, o Santo Padre, Pio XI, ins-tituiu em 1925, pela Encícli-ca Quas Primas, a festa de Cris-to Rei.

Com o pomposo título oficial de Festa – hoje Solenidade – de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, a data, na época a ser observada por ocasião do úl-timo Domingo de outubro – hoje XXXIV Domingo do Tempo Comum –, era uma proclamação do que sempre a Igreja sustenta-ra, e uma convocação aos cris-tãos para que, pela oração, pela liturgia própria do dia, pela con-sagração a Cristo Rei, e pela a-ção apostólica contrária ao lai-cismo, ao liberalismo e à secula-rização, se empenhassem na res-tauração do Reinado do Salvador sobre os Estados e as sociedades. Além de Rei das almas e da Igre-ja, Cristo também o era da esfera temporal: Seu Reino era o uni-

verso!

Em nossos tempos, os frutos do laicismo nós os vemos abundan-tes: relativização da moral; indi-ferença religiosa; falsificação do conceito de liberdade; diminui-ção dos fiéis católicos; ridicula-rização de símbolos sagrados; legislações incompatíveis com a Lei de Deus, as quais permitem o aborto, a eutanásia, o divórcio, o “casamento” homossexual, a eliminação dos embriões huma-nos, o cerceamento da proprieda-de privada, a violação dos direi-tos humanos fundamentais etc. Quando Cristo foi destronado de Seu Reino sobre o campo civil e as Nações passaram a governar-se sem referência a Deus, a rea-

ção dos cristãos deveria ser mais forte. “Foi instituída esta festa para combater o indiferentismo e o laicismo e para excitar os cristãos a renovar sua homena-gem de submissão a Jesus Rei, a reparar os ultrajes que recebe da parte dos súditos rebeldes e a promover os interêsses de seu reino, trabalhando para que a realeza de Jesus seja reconheci-da efetivamente pelos indiví-duos, pelas famílias e pelas na-ções.”[3]

Relacionou o Papa a devoção a Cristo Rei ao culto de Seu Sa-grado Coração. De fato, a espiri-tualidade do Reinado e Cristo, tão presente na mente da Igreja em todos os tempos, muito se

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Em nossos tempos, os frutos do laicismo nós os ve-mos abundantes: relativização da moral; indiferença religiosa; falsificação do conceito de liberdade; dimi-nuição dos fiéis católicos; ridicularização de símbolos sagrados; legislações incompatíveis com a Lei de Deus, as quais permitem o aborto, a eutanásia, o di-vórcio, o “casamento” homossexual, a eliminação dos embriões humanos, o cerceamento da propriedade privada, a violação dos direitos humanos fundamen-tais etc.

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identifica com as revelações a Santa Margarida Maria de Ala-coque.

“O culto o Sacratíssimo Cora-ção de Jesus tem suas bases fir-míssimas nas Sagradas Escritu-ras. Os Santos Padres o revela-ram profusamente, sobretudo com o fato histórico da lança do soldado ao peito de Cristo. No Medievo, a meditação sobre esta passagem bíblica relembrada na liturgia levou a aprofundar-se muito a devoção ao Coração de Jesus Cristo, principalmente no mosteiro beneditino de Helfta (Alemanha), de modo especial com Santa Matilde e Santa Ger-trudes.

No século XVIII muito divulgou seu culto São João Eudes, que compôs um texto litúrgico para sua festa. Nesse mesmo século as revelações a Santa Margari-da Maria de Alacoque levaram-na a que propugnasse sua apro-vação por Roma como festa li-túrgica para toda a Cristandade. Esta difusão deu-se, sobrema-neira, pela mediação dos Bispos poloneses, nos tempos de Cle-mente XIII, em 1765. O culto di-fundiu-se por vários lugares e em 1856 Pio IX estendeu a festa a toda a Igreja Universal. Leão

XIII consagrou o mundo ao Co-ração de Jesus em 11 de junho de 1899.[4] Pio XI elevou a fes-ta ao grau de primeira classe com oitava privilegiada, em 1928. Depois do Concílio Vati-cano II, com a renovação do Calendário Litúrgico, tal festa tem o caráter de Solenida-de.”[5]

“A devoção e culto ao Sagrado Coração de Jesus, ainda que tenha precedentes muito anti-gos, encontra sua forma plena por ocasião das revelações pri-vadas recebias por Santa Mar-garida Maria de Alacoque (1647-1690), religiosa da Visi-tação. Esta espiritualidade foi abençoada com freqüência pe-los Papas com o maior apreço, como síntese perfeita de toda a espiritualidade cristã.

Em 1856, o Papa Pio IX instau-ra para toda a Igreja a festa li-túrgica do Sagrado Coração. Leão XIII consagra o gênero hu-mano ao Coração de Jesus, e prepara o ato em sua Encícli-ca Annum Sacrum (1899). No Magistério Apostólico sobre este tema convém recordar especial-mente Pio XI, nas Encícli-cas Miserentissimus Redemptor (1928) e Caritate Christi Com-pulsi (1932); Pio XII, nas Encíclicas Summi Pontificatus (1939) e Haurietis Aqu-as (1956); Paulo VI, em sua Carta Apostóli-caInvestigabiles Divi-tias (1965); e João Paulo II, na mensagem por ocasião do cente-nário da consagração do gênero humano ao Sagrado Coração de Jesus (1999).

A devoção ao Coração de Jesus é uma escola perfeita de vida espiri-tual cristã, e por isso mesmo sintetiza har-

moniosamente todos os valores da vida em Cristo – Amor divi-no, Trindade, Cruz, Eucaristia, espírito reparador de expiação, atitude sacerdotal e sacrifical, amor à Igreja etc. Aqui (...) fi-xar-me-ei sobretudo no valor desta devoção como eficacíssima reação orante dos cristãos e da Igreja diante dos males do mun-do atual”[6], qual sejam o rela-tivismo, a imoralidade, o desres-peito pela Lei de Deus, a recusa da ordem temporal em submeter-se a Cristo Rei.

Quando o Papa Pio XI instituiu a festa alusiva ao Reinado de Nos-so Senhor, em 1925, não fez mais do que aplicar à já tradicio-nal devoção do Sagrado Coração de Jesus as características pró-prias da Sua realeza. Enfatizou a Quas Primas o aspecto do Rei-nado do Coração de Cristo. Para o Papa, reconhecer Cristo como Rei é sinônimo de obedecê-Lo livre e amorosamente, pela con-sagração total a Seu Coração Sa-grado. Notável é constatar que a imagem de Cristo Rei seja exata-mente a mesma que representa o Sagrado Coração de Jesus, desta feita com trono, capa real, cetro e coroa. No dia de Cristo Rei,

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A devoção ao Coração de Jesus é uma escola perfeita de vida espiritual cristã, e por isso mes-mo sintetiza harmoniosamente todos os valores

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outrossim, recomenda a Igreja a prática de renovar a consagração do gênero humano ao Coração de Jesus, o que é enriquecido com indulgência plenária. As duas devoções, percebe-se, estão intimamente ligadas.

Falando dos séculos XIX e XX, Pio XI fortalece essa ligação en-tre o culto a Nosso Senhor sob as invocações de Cristo Rei e de Seu Sagrado Coração, de modo que podemos concluir ser a pre-tensão papal o restabelecimento na esfera civil, do Reinado do Sagrado Coração de Jesus Cris-to. “Como no século precedente e no nosso, pelas maquinações dos ímpios, chegou-se a depreci-ar o império de Cristo, Nosso Senhor, e a declarar publica-mente a guerra à Igreja, com leis e moções populares contrá-rias ao Direito divino e à lei na-tural, e até houve assembléias que gritavam: ‘não queremos que reine sobre nós’ (Lc 19,14). Por causa desta consagração [ao Coração de Cristo] a que aludíamos [realizada em 1899 por Leão XIII], a voz de todos os amantes do Coração de Jesus irrompia unânime, opondo-se com toda a força, para reivindi-car sua glória e assegurar seus direitos: ‘é necessário que Cris-to reine (1 Co 15,25); venha a nós o vosso Reino.’”[7] Dizer Cristo Rei equivale a rogar: “Sagrado Coração de Jesus, ve-nha a nós o Vosso Reino”, como reza uma tradicional jaculatória.

O sacerdote espanhol Pe. José María Iraburu resume esse pro-fundíssimo nexo entre a devoção ao Sagrado Coração de Jesus e a consciência do Reinado de Cris-to não só sobre as almas, mas sobre a esfera temporal. O libe-ralismo dos séculos XVII, XVIII e XIX, o laicismo, a radical se-paração entre Igreja e Estado – “legitimando-se” que o último desobedeça a Lei d Deus e ins-taure um pernicioso “direito ao erro” –, e mesmo a escandalosa

cooperação de alguns católicos a setores maçônicos e liberais, são os alvos a ser combatidos pela devoção ao Coração de Cristo e pela luta a favor de Cristo Rei. “A devoção ao Coração de Jesus, a partir sobretudo do sé-culo XIX, difundiu-se entre o po-vo cristão precisamente quando os ‘católicos liberais’ entram e clara cumplicidade cm o mundo. E assim, tal espiritualidade aju-da os fiéis a serem muito consci-entes do pecado do mundo; a viverem livres do mundo, e con-seqüentemente do diabo e de seus enganos; e a serem capa-zes, portanto, de atuar sobre o mundo para melhorá-lo, curá-lo e elevá-lo, consagrando-o a Cristo Rei. Neste sentido, mos-trou-se nos últimos séculos como a espiritualidade mais forte e mais profundamente popular, a

mais capaz, se for o caso, de guardar fidelidade até o martí-rio – pensemos no México, na Espanha ou na Polônia. Daí, tal-vez, precisamente, a especial a-versão que a ela sentem os cris-tãos amigos do mundo, e o em-penho que fazem e falsificá-la e desprestigiá-la.”[8]

Eis, sucintamente, os motivos pelos quais Sua Santidade, o Pa-pa Pio XI, instituiu a festa de Cristo Rei: realçar a soberania do Coração de Jesus sobre o mundo com uma data distinta daquela que a Seu culto está des-tinada; combater o liberalismo, o laicismo, o Estado Moderno, pe-la oração, por uma Missa pró-pria, e por uma espiritualidade visivelmente militante e belico-sa; e reafirmar o Reinado de Cristo nas almas e na esfera tem-

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Pio XI fortalece essa ligação entre o culto a Nosso Senhor sob as invoca-ções de Cristo Rei e de Seu Sagrado Coração.

O sacerdote espanhol Pe. José María Iraburu resume esse profundíssimo nexo entre a devoção ao Sagrado Co-ração de Jesus e a consciência do Reinado de Cristo não só sobre as al-mas, mas sobre a esfera temporal.

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poral, conforme sempre ensina-ram os Papas – sobretudo a par-tir da crise da Cristandade e da secularização que a ela se se-guiu.

“Infelizmente permanecem ain-da, inclusive nas sociedades de-mocráticas, expressões de laicis-mo intolerante, que hostilizam qualquer forma de relevância política e cultural da fé, procu-rando desqualificar o empenho social e político dos cristãos, porque se reconhecem nas ver-dades ensinadas pela Igreja e obedecem ao dever moral de ser coerentes com a própria consci-ência; chega-se também e mais radicalmente a negar a própria ética natural. Esta negação, que prospecta uma condição de a-narquia moral cuja conseqüên-cia é a prepotência do mais forte sobre o mais fraco, não pode ser acolhida por nenhuma forma legítima de pluralismo, porque mina as próprias bases da convi-vência humana.”[9]

A liturgia da festa

Passada a breve notícia histórica que explica a criação da hoje So-lenidade de Cristo Rei, e dada sua ligação com o culto o Sagra-do Coração de Jesus, analisemos os textos litúrgicos para ela com-postos. Importa salientar que há uma data própria para a Soleni-dade do Sagrado Coração de Je-

sus, qual seja a sexta-feira após o segundo Domingo depois de Pentecostes; iremos ver, isto sim, o formulário alusivo à Sole-nidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo, come-morada no último Domingo do Ano Litúrgico, segundo o Calen-dário Romano, que vem a ser o XXXIV Domingo do Tempo Comum.

Omitiremos os formulários da Liturgia das Horas, para a qual há um ofício solene próprio, com salmos, hinos e orações específi-cas correspondentes a cada Hora Canônica – I Vésperas, Ofício de Leituras, Laudes, Teça, Sexta, Nona, II Vésperas e Completas. Interessa-nos, no presente estudo

– e ao leigo não habituado à reci-tação do breviário –, mostrar as composições litúrgicas feitas pa-ra a Missa da Solenidade.

Com a reforma do Missal Roma-no efetuada pelo Papa Paulo VI, o próprio de Cristo Rei pouco foi alterado. De fato, o Intróito (Antífona da Entrada), a Oração sobre as Oferendas (Secreta), o Prefácio e a Antífona da Comu-nhão permanecem exatamente os mesmos:

“O cordeiro que foi imolado é digno de receber o poder, a di-vindade, a sabedoria, a força e honra. A ele glória e poder a-través dos séculos.”[10]

“Oferecendo-vos estes dons que nos reconciliam convosco, nós vos pedimos, ó Deus, que o vos-so próprio Filho conceda paz e união a todos os povos. Por Cristo, nosso Senhor.”[11]

“Com óleo de exultação, consa-grastes sacerdote eterno e rei do universo vosso Filho único, Je-sus Cristo, Senhor nosso. Ele, oferecendo-se na Cruz, vítima pura e pacífica, realizou a re-denção da humanidade. Subme-tendo ao seu poder toda criatu-ra, entregará à vossa infinita majestade um reino eterno e uni-versal: reino da verdade e da

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vida, reino da santidade e da graça, reino da justiça do amor e da paz.”[12]

“O Senhor em seu trono reina para sempre. O Senhor abençoa o seu povo.”[13]

Já a Coleta (Oração do Dia) e a Oração depois da Comunhão (Post Communio) foram leve-mente modificadas. Alegou-se, para isso, certa adequação às ne-cessidades atuais. Quanto a isso é lícito aos fiéis discordar, desde que o façam reverentemente, fundamentadamente, sem escân-dalo nem crítica às autoridades da Igreja. Discordar – pois não se trata de questão de fé ou mo-ral –, mas obedecer – eis que a reforma litúrgica é obra da legíti-ma autoridade da Igreja e a mu-dança dos textos é da competên-cia do Santo Padre, a quem de-vemos submissão quando dá or-dens não contrárias à Lei de Deus, o que é o caso. De qual-quer maneira, mesmo alterando-se um ou outro ponto, a doutrina que as antigas preces representa-vam é a mesma, sempre atual – pois a doutrina católica é imutá-vel! Outrossim, é permitida ain-da hoje a utilização do Missal

Romano em sua forma tradicio-nal, edição de 1962, anterior à reforma de Paulo VI. Com efei-to, em muitos lugares – princi-palmente nas igrejas da Admi-nistração Apostólica São João Maria Vianney e da Fraternidade Sacerdotal São Pedro –, usa-se não o rito romano moderno ou reformado, mas o rito romano tradicional, chamado também “tridentino” ou “de São Pio V”.

A Coleta antiga – em uso pelos que adotam a forma tradicional do rito romano – diz:

“Deus eterno e todo-poderoso, que dispusestes restaurar todas as coisas no vosso amado Filho, Rei do Universo, concedei be-nignamente que todas as famí-lias das nações, desunidas por causa da feria do pecado, sub-metam-se ao seu poder suavíssi-mo. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo, por todos os séculos dos séculos.”[14]

Mantendo idêntica referência ao Reinado de Cristo e à restaura-ção de tudo na Pessoa de Jesus – e “tudo” significa as esferas es-piritual e civil –, a nova fórmula

é menos explícita quan-to ao aspecto temporal. Talvez porque, à época de Pio XI, os liberais devessem ser enfrenta-dos com mais belicosi-dade e hoje, no julga-mento da Igreja, o com-bate deva adotar táticas diferentes, em face de vicissitudes que assim o recomendam.

“Deus eterno e todo-poderoso, que dispuses-tes restaurar todas as coisas no vosso amado Filho, Rei do Universo, fazei que todas as cria-turas, libertas da escra-vidão e servindo à vos-sa majestada, vos glori-fiquem eternamente.

Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espí-rito Santo.”[15]

De todo modo, suprimida da fór-mula litúrgica a expressão “que todas famílias das nações (...) submetam-se” a Cristo Rei, a

doutrina que a inspirou permane-ce. Ademais, com menos clare-za, porque talvez assim peça a prudência eclesiástica hodierna, na Coleta reformada está presen-te o espírito de súplica à restau-ração do Reino de Cristo sobre a esfera temporal. Senão, vejamos: a) todas as criaturas devem ser-vir a Deus, e isto inclui as socie-dades e as Nações, quer porque sejam obras criadas pelo Senhor, quer porque sejam compostas de seres humanos, vocacionados ao serviço de Cristo pela graça; b) para servir a Cristo, as criaturas, no texto da Coleta, precisam es-tar libertas da escravidão, e esta tanto pode ser o pecado – escra-vidão por antonomásia –, do qual maior expressão é a insub-missão a Deus por parte dos ho-mens, das sociedades, das Na-ções, dos Estados etc, quanto po-

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Mantendo idêntica referência ao Reina-do de Cristo e à res-tauração de tudo na Pessoa de Jesus – e “tudo” significa as esferas espiritual e civil –, a nova fór-mula é menos explí-cita quanto ao as-pecto temporal. Tal-vez porque, à época de Pio XI, os libe-rais devessem ser enfrentados com mais belicosidade e hoje, no julgamento da Igreja, o comba-te deva adotar táti-cas diferentes, em face de vicissitudes que assim o reco-mendam.

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de ser também o conjunto das filosofias contrárias ao estabele-cimento de Cristo Rei sobre o campo civil – o falso conceito de liberdade do liberalismo acaba gerando uma limitação da que é autêntica, por sustentar um ab-surdo “direito ao erro”, por des-vincular a liberdade da moral e da verdade (escravidão espiritu-al), e por desencadear regimes totalitários (escravidão física); c) o serviço é à majestade de Deus e à Sua glória eterna, o que im-plica necessariamente em reco-nhecer o Reinado de Cristo nas almas e nas sociedades.

Na época em que o primeiro for-mulário foi composto não se questionava o Reinado de Cristo nas almas, ao menos entre os ca-tólicos. O grande debate travava-se no que se refere à esfera tem-poral: deveria Cristo também nela reinar? Para defender a po-sição tradicional, a Coleta res-pondia tal dúvida pela súplica a Cristo Rei, concentrando a argu-

mentação na questão disputada. Hoje, apa-rentemente vencedor, o laicismo liberal retirou-nos a própria consciên-cia do Reinado de Cris-to mesmo na esfera es-piritual, de modo que é preciso resgatar primei-ramente nesse campo a soberania de Deus.

Em uma sociedade mais cristã, em que todos ou a maioria confessa-se súdito de Cristo, e o problema reside ape-nas no tocante às relações entre Estado e Igreja e ao culto que se deve a Deus pela submissão das leis, da família, da cultura, das artes, das ciências etc, à Sua Lei, é neste último aspecto que se de-ve centralizar a apologética e a reafirmação da doutrina. E a Co-leta antiga reflete essa preocupa-ção. Quando, atualmente, nem a sociedade é mais cristã, nem a maioria se declara súdito de Cristo, este é o problema princi-pal, e a moderna Coleta a isto faz referência. Antes se expulsou Deus das sociedades, hoje Ele está como que expulso das pró-prias almas! De nada adianta pe-lejarmos pelo Reinado de Cristo na esfera temporal se as almas, que formam esta mesma esfera temporal, d’Ele estão afastadas. Conquistadas as almas, as socie-

dades em que vivem serão tam-bém conquistadas se soubermos pregar a doutrina completa.

Precisamos, pois, de uma Nova Evangelização, e nela a primazia está na conquista das almas para Cristo, no apostolado explicita-mente evangelizador. Tudo, po-rém, sem renúncia à dimensão temporal, eis que é nesta que vi-ve o homem, alvo da misericór-dia divina e da salvação mereci-da por Cristo na Cruz do Calvá-rio. Urge, evidentemente, ganhar almas para Jesus, mas também é necessário reformar as estruturas temporais, tarefa que o Vaticano II, com muita propriedade, re-lembrou!

Iremos, no decorrer deste estudo, mencionar o Reinado de Cristo nas almas, porque, no espírito do que dissemos, parece-nos, na si-tuação contemporânea, a missão primordial. Contudo, nossa in-tenção está num tema por muitos esquecido e por tantos outros distorcido e até combatido: o Reinado Social de Cristo, i.e., a soberania de Nosso Senhor na esfera temporal, nas Nações, na sociedade civil, nos Estados, na vida pública.

Antes, para não deixarmos in-completa a citação do próprio da Missa, as orações que faltam e breve notícia das leituras previs-tas pelo Lecionário.

A Pós-Comunhão do Missal an-terior à reforma litúrgica:

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“Alimentados pelo pão da imortalidade, nós vos pedi-mos, ó Deus, que, gloriando-nos de combater sob o estan-darte de Cristo Rei, possamos reinar eternamente na pátria celeste com ele, que convosco vive e reina.”[16]

Reformada, a oração restou como segue, e as diferenças se devem aos motivos já ex-plicados:

“Alimentados pelo pão da imortalidade, nós vos pedi-mos, ó Deus, que, gloriando-nos de obedecer na terra aos mandamentos de Cristo, Rei do universo, possamos viver com ele eternamente no reino dos céus. Por Cristo, nosso Se-nhor.”[17]

Note-se que, entre os manda-mentos de Cristo, tomados em seu sentido lato, encontram-se, pela voz de Sua Igreja, todo o ensinamento social, o Reinado de Nosso Senhor sobre o campo temporal, e o respeito aos direi-tos de Deus. Ainda que a ênfase da prece esteja na soberania so-

bre as almas – obedecer aos mandamentos, i.e., não pecar –, pelos motivos já elencados, há implícito o comando quanto ao estabelecimento do domínio temporal do Salvador. Além, é claro, da doutrina, essencialmen-te perene.

Sobre as leituras, o Lecionário “tridentino” dispunha: a) Cl 1,12-20 (Epístola); b) Sl 71 (Gradual/Salmo Responsorial); c) “O seu poder é um poder eter-

no, que não lhe será tirado: e o seu reino é tal, que não será jamais corrompido”. (Aclamação ao Evan-gelho); d) Jo 18,33-37 (Evangelho).

Com o novo Missal Romano, em 1969, as-sim apresentou os Le-cionário no que toca às leituras:

Ano A: a) Ez 34,11-12.15-17 (Primeira Leitura); b) Sl 22 (Gradual/Salmo Res-ponsorial); 1 Co 15,20-26.28 (Segunda Leitu-ra); d) “É bendito a-quele que vem vindo, que vem vindo em no-me do Senhor; e o Rei-no que vem, seja ben-

dito; ao que vem e a seu Reino, o lou-vor!” (Aclamação ao Evan-gelho); e) Mt 25,31-46 (Evangelho).

Ano B: a) Dn 7,13-14 (Primeira Leitura); b) Sl 92 (Gradual/Salmo Responsori-al); c) Ap 1,5-8 (Segunda Leitura); d) a mesma acla-mação; e) Jo 18,33b-37 (Evangelho).

Ano C: a) 2 Sm 5,1-3 (Primeira Leitura); b) Sl 121 (Gradual/Salmo Responsori-al); c) Cl 1,12-20 (Segunda Leitura); d) a mesma acla-

mação; e) Lc 23,35-43 (Evangelho).

Fundamentos teológicos do Reinado de Cristo

A lógica aponta para o Senhorio de Jesus. Sendo Cristo Deus, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, o Verbo inefável, o Logos eterno, o Filho do Altíssi-mo, haveria de ser Senhor e Rei. “Aleluia! Eis que reina o Senhor, nosso Deus, o Domina-dor!” (Ap 19,6) Quanto a Seus inimigos, os que se opõem a Seu Reinado sobre as almas e as so-ciedades, “[c]ombaterão contra o Cordeiro, mas o Cordeiro os vencerá, porque é Senhor dos senhores e Rei dos reis. Aqueles que estão com ele são os chama-dos, os escolhidos, os fiéis.” (Ap 17,14)

A Tradição Apostólica é unâni-me em proclamar Cristo Rei do Universo, concordando com ela a Sagrada Escritura. Cumpre no-tar que o Reino é espiritual, não material: “O meu Reino não é deste mundo.” (Jo 18,36) Já e-xiste pela Igreja e tornar-se-á pleno quando Jesus vier em gló-ria. Todavia, Seu Reinado espiri-tual comunica-se com as realida-des temporais, uma vez que nós, Seus súditos, não somos puro espírito, e também porque vive-

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Hans Memling, Cristo rodeado por anjos (porm.) (1480-81)

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mos no mundo, na matéria, cria-da igualmente por Deus. O Rei-no é espiritual, mas domina to-das as coisas criadas e deve in-fluenciar as várias obras tempo-rais: a política, o Direito, a ciên-cia, a cultura, as artes. Impossí-vel que alguém se afirme cristão em sua vida privada, e atue pu-blicamente em contradição à Lei de Deus. Absurdo um médico católico que interrompa uma gravidez, mesmo amparado por uma legislação permissiva, ale-gando que a fé é meramente es-piritual e de foro íntimo. Como igualmente errôneo um político que se diga seguidor de Cristo e que aprove uma lei autorizando o “casamento” homossexual, in-vocando a autonomia do Estado frente a Igreja para “justificar” sua ação.

Nesse diapasão, o Reino é espiri-tual, mas relaciona-se com o mundo material, assim como a alma está no corpo, animando-o. Espiritual e temporal são esferas diferentes, mas a primeira ilumi-na e anima a segunda. A inde-pendência de ambas não implica em ruptura da natural e necessá-ria subordinação indireta do tem-poral ao espiritual. Quando o corpo não se sujeita à alma, su-cumbe às paixões e vilezas mais torpes. Se, ao radicalizar, rompe-se o laço que une corpo e alma, o resultado é a morte. Da mesma maneira, o terreno religioso e o civil, como a alma e o corpo, têm suas funções próprias e dis-tintas, são independentes as au-toridades que os regulam em seu próprio campo: mas devem cola-borar nas questões mistas, subor-dinando-se indiretamente o tem-

poral ao espiritual, como o corpo à alma, sob pena de dar vazão à vida de sentidos e ao descontrole passional – como vemos hoje –, ou à própria morte do tecido so-cial. Cristo é Rei espiritual, mas Seu Reinado reflete-se na terra, na matéria, na esfera temporal. O Reino é no céu, porém na terra deve haver seu reflexo.

Apontaremos algumas noções sobre Cristo enquanto Rei, toma-das das lições de Enrico Pardo Fuster:[18]

A realeza de Jesus Cristo foi profetizada no Antigo Testamen-to: “Fui eu quem me consagrei rei em Sião, meu monte san-to.” (Sl 2,6) “Exulta sem medi-das, filha de Sião, e lança gritos de alegria, filha de Jerusalém! Eis que vem a ti o teu rei, o justo e vitorioso, humilde e montado em um jumento, no potro, filho de uma jumenta.” (Zc 9,9)

As qualidades de Jesus Cristo como Rei também foram profeti-zadas no Antigo Testamento:

defensor da verdade, da piedade e da justiça (cf. Sl 45,4);

prudente e justo (cf. Jr 23,5).

Jesus Cristo foi eleito Rei por Deus Pai em benefício dos ho-

mens: “Olhai que dias virão – oráculo de Javé – em que susci-tarei de Davi um gérmen justo: reinará um rei prudente, prati-cará o direito e a justiça na ter-ra.” (Jr 23,5) “Ele edificará o Templo de Javé[19] e levará as insígnias reais, sentar-se-á e do-minará em seu trono.” (Zc 6,13)

Deus constituiu a Cristo Homem como Rei Supremo de toda a hu-manidade: cf. Nm 24,17; Sl 2,7-8;44,7;71,7-8; Is 9,5-6; Jr 23,5; Dn 2,44;7,13-14; Zc 9,9; Mt 25,31.34.40;28,18; Lc 1,31-33; Jo 18,37; 1 Co 15,25; Hb 1,2; Ap 1,5;19,16.

Jesus Cristo foi constituído Rei de todo o Universo pela União Hipostática:[20] “Ele existe an-tes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem nele. Ele é a Cabeça da Igreja, Seu Corpo. Ele é o Princípio, o Primogênito dentre os mortos, tendo, por is-so, o primeiro lugar em tudo. Pois a Deus aprouve fazer habi-tar nele toda a plenitude, e re-conciliar por ele e para ele to-das as coisas, pacificando, medi-ante o preço do próprio sangue na Cruz, tudo o que há na terra e nos céus.” (Cl 1,17-20)

Jesus Cristo mesmo afirma que é Rei: “‘És tu o Rei dos judeus?’ Respondeu Jesus: ‘Tu o di-zes.’” (Mt 27,11) “Então Pilatos lhe disse: ‘Logo, tu és Rei?’ Res-pondeu Jesus: ‘Sim, sou Rei.’” (Jo 18,37)

Jesus Cristo, como homem[21], é Rei por direito próprio, nati-vo: “(...) tudo foi feito por ele e para ele.” (Cl 1,16)

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Jesus Cristo foi eleito Rei por Deus Pai em benefício dos homens: “Olhai que dias virão – oráculo de Javé – em que suscitarei de Davi um gérmen justo: reinará um rei prudente, praticará o direito e a justiça na terra.” (Jr 23,5) “Ele edificará o Templo de Javé[19] e le-vará as insígnias reais, sentar-se-á e dominará em seu trono.” (Zc 6,13)

Jesus Cristo mesmo afirma que é Rei: “‘És tu o Rei dos judeus?’ Res-pondeu Jesus: ‘Tu o dizes.’” (Mt 27,11) “Então Pilatos lhe disse: ‘Logo, tu és Rei?’ Respondeu Jesus: ‘Sim, sou Rei.’” (Jo 18,37)

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Jesus Cristo, como homem, é também Rei de todos os homens por direito de conquista, por ser a Cabeça da Igreja, e por direito de herança:

por direito de conquista: cf. 1 Co 6,20; 1 Pe 1,18-19;

por ser a Cabeça da Igreja: cf. Sl 8,6-7; Cl 1,17-20;

por direito de herança: cf. Hb 1,2.

Jesus Cristo, enquanto homem, é Rei da Igreja[22]: “Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai, Davi. E reinará sobre a casa de Jacó por todos os séculos e seu reino não terá fim.” (Lc 1,32-33)

Jesus Cristo não foi feito Rei por hereditariedade, por ainda que tenha descendido de família real, não descendeu da linha de Salo-mão, à qual se aderia a sucessão hereditária ao trono, mas da li-nha de Natã: cf. Lc 3,23-31.

Jesus Cristo não foi feito Rei por eleição, pois quando as massas pretenderam fazê-lo Rei, não a-ceitou: cf. Jo 6,15.

Jesus Cristo não feito Rei por aquisição do trono, exceto en-quanto esta se fundamentava na União Hipostática: cf. At 20,28.[23]

Jesus Cristo anunciou que havia chegado Seu Reino, o mesmo predito pelos profetas: cf. Mt 3,2;6,33.

Jesus Cristo afirmou a chegada do Reino: cf. Mt 3,2; Lc 9,1-2;10,8-9. “Ide proclamar que o Reino dos céus está próxi-mo.” (Mt 10,7)

Jesus Cristo cumpriu a promessa de um Reino Eterno: cf. Lc 1,32-33.

A extensão do Reino de Cristo por todas as Nações da terra foi

profetizada no Antigo Testamen-to: “Pede-me e dar-te-ei por he-rança todas as Nações, e por propriedade os confins da ter-ra.” (Sl 2,8) “Vou colocar-te co-mo luz para as Nações, para que minha salvação alcance até os confins da terra.” (Is 49,6)

Jesus Cristo, como homem, foi feito verdadeiramente Rei de to-da a terra, tanto das coisas tem-porais quanto as espirituais, e tem domínio direto sobre todas as criaturas:“(...) o fizeste Se-nhor de todas as obras de tuas mãos. Tudo foi posto por debai-xo de seus pés.” (Sl 8,7); cf. Mt 28,18; Ap 19,6.

Jesus Cristo, enquanto homem, teve domínio direto sobre todos os reinos do mundo e sobre to-das as coisas criadas:

teve domínio direto “em ato pri-meiro”, que é a potestade consi-derada em si mesma: cf. Mt 28,18; At 10,36; 1 Co 15,27; Ap 1,5;19,16;

não teve domínio “em ato segun-do”, i.e., não exerceu a potestade em nenhum reino do mundo[24]: cf. Jo 18,36.

Jesus Cristo destruiu o império de Satanás com Seu poder sobre os demônios, inaugu-rando o Reino Messiâ-nico: cf. Mt 12,28; Lc 10,17-20.

Jesus Cristo exerce Seu poder de Rei so-bre as coisas espiritu-ais: cf. Jr 23,5; Lc 1,32-33.

Jesus Cristo não exer-ce diretamente[25] Seu poder admi-nistrativo de Rei sobre as coisas temporais: cf. Lc 12,13; Jo 18,36.

Jesus Cristo não pre-

tendeu estabelecer um Reino que fosse material e terreno: cf. Jo 6,54;18,36.

O Reino de Cristo é:

espiritual: cf. Jo 18,36;

eterno: cf. Lc 1,33;

universal: cf. Mt 28,18;

de verdade: cf. Jo 14,6;18,37;

de vida: cf. Jo 10,10;14,6;

de santidade: cf. Cl 2,9-10;

de graça: cf. Jo 1,15.16;

de justiça: cf. Rm 2,6;

de amor: cf. Jo 15,9.13;

de paz: cf. Is 9,6; Lc 2,14.

O Reinado de Cristo não terá fim: cf. Mt 16,18.

O poder executivo de Cristo, co-mo homem, foi profetizado no Antigo Testamento: cf. Is 9,6.

O poder legislativo de Cristo, como homem, foi profetizado no Antigo Testamento: cf. Is 2,3.

O poder judiciário de Cristo, co-mo homem, foi profetizado no Antigo Testamento: cf. Is 2,4.

Jesus Cristo, como homem, constituído Rei, exerce Seus po-deres:

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legislativo, promulgando a Lei evangélica: cf. Mt 28,20; Jo 2,3;13,34;14,15; 1 Co 9,21;

executivo, regendo os destinos dos homens para que triunfem os planos do Reino de Seu Amor sobre todos eles: cf. Ap 1,18;

judiciário, com a potestade rece-bida do Pai e por ter sido consti-tuído juiz dos vivos e dos mor-tos: cf. Jo 5,22.27; At 10,42;17,31; 2 Ts 1,7-8;4,1.

Jesus Cristo, como homem, constituído Rei, exerce também Seu poder judiciário:

sobre os anjos: cf. 1 Co 6,3[26];

pelo ministério que exercem os santos sobre os anjos: cf. Mt 4,11;8,21.

O poder de Jesus Cristo como Rei é fonte e origem de todo po-der civil, i.e., poder do Estado sobre as coisas temporais: “Por mim é que os reis reinam e os magistrados administram a justi-ça. Por mim os príncipes gover-nam e os grandes julgam toda a terra.” (Pr 8,15-16)

O conteúdo da Quas Primas de Pio XI

A Encíclica de Pio XI sobre o Reinado de Cristo foi publicada por ocasião do Ano Santo de 1925. Foi uma excelente oportu-nidade de manifestar, solene-mente, a atualidade do domínio de Nosso Senhor sobre o mundo, nas esferas espiritual e temporal.

Na introdução, o Papa fala que a Cristandade nada mais é do que a paz de Cristo no Reino de Cristo. Após, desenvolvendo o tema do jubileu de 1925, inicia as partes da Encíclica em si.

Primeiro trata da Realeza de Cristo, em seus aspectos teológi-cos, dando fundamentos do An-tigo Testamento e do Novo Tes-tamento, bem como da Liturgia: e mostra o Reinado do Salvador

pela União Hipostática e pela Redenção.

Na segunda parte, fala do caráter da Realeza de Cristo: no campo espiritual e no campo temporal, dando provas da mesma no Ma-gistério dos Papas, na Tradição e na Sagrada Escritura.

Terceiro ponto é a festa de Jesus Cristo, Rei do Universo, destina-da a celebrar a Realeza de Jesus, principalmente nos tempos em que esta é negada – notadamente no campo temporal.

“E se agora mandamos que Cristo Rei seja honrado por to-dos os católicos do mundo, com isso proveremos também as ne-cessidades dos tempos presentes, e poremos um remédio eficacís-simo à peste que hoje infecciona a sociedade humana. Julgamos peste de nossos tempos o chama-do laicismo, com seus erros e abomináveis intentos; e vós sa-beis, veneráveis irmãos, que tal impiedade não amadureceu em um só dia, senão que fora incu-bada desde muito antes nas en-tranhas da sociedade.”[27]

O Reinado de Cristo na esfera espiritual

Sobretudo, Jesus Cristo estabele-

ceu Seu Reino nas coisas do es-pírito. É nos Céus que ele se rea-liza, e quando do Juízo Final es-tará consumado. Na terra este Reino espiritual é construído e dilatado na Igreja e através da Igreja.

Com efeito, ser cristão é reco-nhecer-se súdito de Cristo, tribu-tar-lhe a honra devida ao Rei dos reis e Senhor dos senhores. Tro-no de Cristo é, portanto, também a nossa alma. Não basta dizer-se seguidor de Jesus. É preciso que Ele reine sobre nós (cf. 1 Co 15,25), e isso consubstancia-se em mudarmos nossa mente pela de Cristo, nossos pensamentos e sentimentos pelos d’Ele, tudo submetendo a Seu império.

No acertado ensino de Sua Santi-dade, o Papa Pio XI, é “necessário que Cristo reine na inteligência do homem, que, com perfeito acatamento, há de assentir firme e constantemente às verdades reveladas e à dou-trina de Cristo.”[28] O Reinado de Jesus sobre as almas efetiva-se por darmos nosso intelecto a Ele pela fé, que vem a ser justa-mente, nesse sentido, o ato atra-vés do qual a inteligência, movi-da pela vontade, adere à verdade por Deus revelada, que é manti-da, preservada, guardada, prega-

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da, explicitada e defendida pelo Sagrado Magistério da Igreja.

A vontade, logo, também deve ser submissa à realeza do Salva-dor. Por isso continua o Santo Padre: “É necessário que reine na vontade, que há de obedecer às leis e preceitos divinos. É ne-cessário que reine no coração, que sobrepondo os afetos natu-rais, há amar a Deus acima de todas as coisas. É necessário que reine no corpo e em seus membros, que, como instrumen-tos, devem servir para a interna santificação da alma.”[29]

O Reinado de Jesus Cristo sobre o homem, em suma, manifesta-se na alma e no corpo. Reina Je-sus na alma quando a inteligên-cia, a vontade e o coração a Ele estão submetidos, nos termos do exposto acima. Tal domínio so-bre a alma deve refletir-se neces-sariamente no corpo, sob pena de sacrificarmos em nome de um platonismo a própria antropolo-gia cristã, que vê no homem uma unidade fundamental só dissolvi-da temporariamente pela morte e refeita na ressurreição da carne.

A inteligência na qual Cristo rei-na é aquela que, pela fé, adere à doutrina pela Igreja pregada. A vontade na qual Cristo reina é aquela que obedece à Lei de Deus, fazendo o bem, evitando o mal e mantendo a comunhão com a autoridade – o Papa e os Bispos. O coração no qual Cristo reina é aquele que ama a Deus sobre todas as coisas e enxerga n’Ele o princípio da caridade com a qual deve amar o próximo como a si mesmo.

O império de Nosso Senhor so-bre o corpo, por sua vez, é o re-flexo de Seu Reinado nas potên-cias da alma. O corpo no qual Cristo reina, por isso, é aquele que serve de instrumento à santi-ficação, não se deixando escravi-zar por paixões desordenadas e apegos carnais. Não deve o cor-

po ser desprezado, num conceito novamente platônico e, por isso mesmo, estranho à Fé da Igreja, mas submetido à alma de forma a demonstrar o senhorio de Jesus sobre o homem todo.

Sinal da relação entre alma e corpo, ambos de domínio de Cristo, é a ligação das realidades espirituais com as temporais, te-ma do próximo tópico.

Por ora, ressaltemos que o Rei-nado espiritual de Jesus não se dá somente em cada cristão indi-vidualmente. Como formamos um Corpo, a Igreja, do qual, ali-ás, é Ele a Cabeça, temos que Cristo é Seu Rei.

Jesus é Rei da Igreja por ser Rei de cada um de seus membros, e também por direito próprio, eis que ela é obra Sua, fundada por Ele mesmo em São Pedro e nos Apóstolos, continuada nos su-cessores destes.

Esta Igreja, da qual Cristo é Rei, anuncia e prepara a plenitude do Reino, que, longe de uma pers-pectiva gnóstica e milenarista, chegará, no fim dos tempos, por especial intervenção de Deus, quando dos novos céus e da no-va terra.

O Reinado de Cristo na esfera temporal

“(...) erraria gravemente quem subtraísse a Cristo-Homem o Seu poder sobre todas as coisas humanas e temporais.”[30]

Alma e corpo têm independência em seu campo próprio de atua-ção. Em sua esfera, porém, ainda que livre, não pode o corpo con-trariar a alma, e nos conflitos com questões mistas, esta última deve prevalecer.

Da mesma maneira, ensina Leão XIII na Immortale Dei, o gover-no do gênero humano foi reparti-do entre Estado e Igreja. Na es-fera temporal, cuidando dos ne-

gócios civis, atua o Estado livre-mente, independente e sobera-no. “A autoridade não é força incontrolável, é sim faculdade de mandar segundo a sã razão. A sua capacidade de obrigar deri-va, portanto, da ordem moral, a qual tem Deus como princípio e fim.”[31] Na esfera espiritual, cuidando dos negócios religio-sos, atua a Igreja livremente, in-dependente e soberana. Ambos são instrumentos de Deus para a ordenação do bem comum: tem-poral e espiritual.

Como, todavia, o bem temporal é transitório e subordina-se ao espiritual, temos que a Igreja, segundo o Magistério dos Papas, tem uma supremacia sobre o Es-tado. As duas autoridades não se confundem, tampouco se sepa-ram. Não pode, outrossim, o Es-tado ter supremacia sobre a Igre-ja, nem esta o ter de maneira di-reta em relação àquele. A supre-macia da Igreja sobre o Estado é indireta: mesmo em seu campo de ação, a esfera temporal, o Es-tado não pode gerir os negócios civis em desrespeito à Lei de Deus e à lei natural; e nas ques-tões mistas, havendo conflito, prevalece a vontade da Igreja, pois a regra máxima é a salvação das almas. De tal maneira, Cristo reina sobre o Estado. Este, como súdito de Jesus, não pode deso-bedecê-Lo.[32]Assim, imoral uma lei que permita o aborto, pois contraria as Leis de Cristo, Rei do Universo.

Pio XI pontifica que “o dever de adorar publicamente e obedecer a Jesus Cristo não somente obri-ga aos particulares, senão tam-bém aos magistrados e gover-nantes.”[33]

As pessoas das quais Cristo é Rei vivem em uma sociedade, em uma Nação, sob um Estado. Também nestes Jesus deve rei-nar. O Papa São Pio X, em seu lema – inspirador da Coleta da Missa de Cristo Rei –, pretendia restaurar todas as coisas em Cristo. Ele é Senhor não só das

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realidades espirituais, mas tam-bém das temporais; deve-se a Ele obediência privada e pública.

“Quando o cristianismo não constitui a alma da vida pública, do poder político, das institui-ções públicas, então Jesus Cristo tratará a tal país como este país trata a Ele. Reservará sua graça e suas atenções para os indiví-duos que o servem, mas abando-nará a sua sorte as instituições e poderes que não o servem.”[34]

Como Cristo reina sobre a esfera temporal?

Considerado o Reinado em si mesmo, Jesus Cristo reina dire-tamente sobre a sociedade civil, sobre as Nações, sobre todos os reinos do mundo. O exercício desse Reinado, entretanto, não é direto, mas através das autorida-des políticas, os Estados, que a Ele se submetem. Também atra-vés da Igreja, que os auxilia, se-gundo o princípio da supremacia indireta formulado pelo Beato Pio IX, por Leão XIII, e por São Pio X, e dos leigos, os quais têm por vocação própria ordenar as estruturas temporais segundo Deus.[35] É doutrina católica que, sendo Cristo o Rei do Uni-verso – e, portanto, também da esfera temporal –, as leis positi-vas civis não podem contrariar os preceitos da Lei de Deus e da lei natural. Antes, devem promo-

vê-los, explicá-los, e livremente legislar no campo que lhes é pró-prio, nunca contradizendo os di-reitos divinos. “Não menos noci-vo se mostra o erro contido na-quelas concepções que não hesi-tam em dispensar a autoridade civil de toda e qualquer depen-dência do Ente supremo, causa primeira e Senhor absoluto tanto do homem como da sociedade, e de todo liame de lei transcen-dente, que deriva de Deus como de fonte primária, e lhe conce-dem uma ilimitada faculdade de ação, abandonada à onda in-constante do arbítrio ou tão-somente aos ditames de exigên-cias históricas contingentes e de interesses relativos. Renegada assim a autoridade de Deus e o império da sua lei, o poder civil, por consequência inevitável, ten-

de a atribuir a si aquela absolu-ta autonomia que compete ao Autor Supremo, a substituir-se ao Onipotente, elevando o esta-do ou a coletividade a fim último da vida, a critério sumo de or-dem moral e jurídica, e interdi-zendo todo o apelo aos princí-pios da razão natural e da cons-ciência cristã.”[36] Em razão desse Reinado sobre as socieda-des, as Nações e os Estados – ainda que estes não o aceitem –, é dever do cristão “militar pelo restabelecimento do Reino de Jesus Cristo na Nova Evangeli-zação, (...) trabalhar intensa-mente, sem demoras nem repou-sos, para ajudar a Igreja a for-jar em nossas sociedades a civi-lização da justiça e do amor cristãos. (...) Unicamente procu-ramos fazer com que os homens, e por conseguinte as sociedades, qualquer que seja sua organiza-ção e seu regime, encontrem em Cristo e em Seu Evangelho a inspiração profunda de toda a sua vida.”[37]

O laicismo liberal contaminou de tal maneira o mundo que os Estados hoje querem fazer a vontade da maioria – liberalismo democrático –, a vontade do so-berano – monarquia absolutista –, a vontade da raça – nazismo –, a vontade do proletariado ou do partido que diz representá-lo –

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comunismo e demais sistemas socialo-esquerdistas –, a vontade da Nação – fascismo –, mas se esquecem de fazer a vontade de Deus! Quando o Fundador do Regnum Christi e dos Legioná-rios de Cristo foi à Europa pela primeira vez, em 1946, consta-tou esse triste espetáculo de se-cularização, começado no Re-nascimento e vitorioso na Revo-lução Francesa e na filosofia ilu-minista. Mais tarde, diria: “dei-me conta de que as ideologias laicistas e materialistas atéias queriam enfraquecer o dinamis-mo apostólico da Igreja, procu-rando limitar sua ação à esfera privada ou às práticas de culto, favorecendo a reclusão dos sa-cerdotes nas sacristias e ador-mecendo a consciência missio-nária dos leigos.”[38]

Sustentando o Reinado de Cristo sobre a esfera temporal, discur-sava o Papa: “É inaceitável, bem como contrária ao Evangelho, a pretensão de reduzir a religião ao âmbito estritamente privado, esquecendo paradoxalmente a dimensão essencialmente públi-ca e social da pessoa humana. Saiam, pois, às ruas, vivam sua fé com alegria, façam chegar aos homens a salvação de Cris-to, que deve penetrar na escola, na cultura, na vida políti-ca!”[39]

O Reino de Cristo, pois, espiritu-al, deve ser refletido em todos os âmbitos e estruturas da esfera temporal, na política como nos demais: a cultura, a filosofia, os meios de comunicação, as artes, o lazer, o esporte, a educação, a família, o pensamento jurídico, as ciências etc. As leis humanas devem servir e favorecer o cum-primento da Lei de Deus, e a lei positiva civil nunca contrariar a divina, a eterna e a natural. Os costumes humanos precisam ser coerentes com a Moral revelada. Toda ação e pensamento dos ho-mens são terreno propício para a sua santificação. “O Reino de

Cristo não é deste mundo, mas se encontra neste mundo. Deve levedar toda a massa.”[40]

A reforma das estruturas tempo-rais – as quais, na Idade Média e em certos ambientes da moderni-dade, estavam submetidas a Cristo Rei – identifica-se com a expansão do Reinado de Jesus sobre a sociedade civil, e é, na prática, um projeto que vi-sa “chegar a atingir e modificar, pela força do Evangelho, os cri-térios de juízo, os valores que decidem, os centros de interesse, as linhas pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da humanidade que se a-presentam em contraste com a Palavra de Deus e os desígnios de salvação.”[41] Causa dos problemas contemporâneos é a Revolução cultural anticristã, de caráter gnóstico, laicista, liberal, antropocêntrico e igualitário, que desvincula fé e razão, sociedade religiosa e sociedade civil, Igreja e Estado, esfera espiritual e tem-poral, culto privado e culto pú-blico. Negando-se à benéfica submissão a Jesus Cristo, Rei do Universo, o mundo afunda na loucura em que tudo passa a ser permitido e a natureza é violen-tada, com leis abortistas e pró-gay, v.g.. “A ruptura entre a or-dem espiritual e a ordem racio-nal é o maior problema que o mundo moderno tem a enfren-tar.”[42]

Somos levados pelos inimigos da Igreja a criticar o período em que a doutrina de Cristo inspira-va toda a sociedade. A falsifica-ção da História é das manobras aquela que mais ajudou a que tantos “torçam o nariz” quando se fala na Idade Média.

A Igreja, contudo, da Idade Mé-dia diz palavras as mais elogio-sas. “Tempo houve em que a fi-losofia do Evangelho governava os Estados. Nessa época a influ-ência da sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam as

leis, as instituições, os costumes dos povos, todas as categorias e todas as relações da sociedade civil.”[43]

Tudo, portanto, deve ser subme-tido à sadia influência de Cristo e Sua doutrina. Somos cidadãos do céu, mas vivemos na terra, e aqui nossa luta é pelo Reino de Jesus nas almas e por tudo o que puder favorecer esta causa. Nis-so, o reflexo do Reinado na esfe-ra temporal é conseqüência natu-ral da universalidade do Senhori-o ed Jesus Cristo, e também uma obra de apostolado que impulsi-ona a salvação de todos, a glória de Deus e o respeito aos direitos da Igreja. Impregnando a socie-dade civil, as leis, o Estado, com os valores do Evangelho, não só Deus será amado e obedecido como serão possibilitados me-lhores instrumentos para que as almas se salvem. Se, pois, o Rei-nado de Cristo na esfera tempo-ral é reflexo do Reinado sobre a esfera espiritual, podemos dizer, por outro lado, que este último é ajudado e expandido pelo pri-meiro. Como Cristo usou de Sua natureza humana para a Reden-ção dos homens, e nós precisa-mos do corpo para a santificação da alma, o Reino, substancial e fundamentalmente espiritual, serve-se das realidades tempo-rais para a sua expansão. Cada qual dos membros da Igreja tem seu papel nessa obra grandiosa.

Na contemporânea conjuntura social, os Estados, as Nações, as leis, a cultura, não estão mais submetidos ao Reinado de Cris-to. A filosofia moderna, inclusi-ve, tratou de separar radicalmen-te a Igreja do Estado, o que sem-pre gerou protestos dos Papas. O mundo de hoje, impregnado de laicismo, não reconhece sua de-pendência ao império de Jesus, Nosso Senhor, e, por isso, os ca-tólicos têm de:

tolerar – mas não aprovar! –, se-gundo as ordens da Igreja, e em

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estrita fidelidade ao Santo Padre, o Papa, o Estado Moderno, laico, liberal, como único existente na atualidade;

condenar o mesmo Estado Mo-derno, enquanto princípio, por sua obstinada recusa em subme-ter-se a Cristo Rei, crendo tal realidade, no máximo, mal me-nor;

lutar pela restauração do Reina-do de Cristo na esfera temporal, igualmente em fidelidade ao Ro-mano Pontífice, o que constitui verdadeiro apostolado de recris-tianização da sociedade, tarefa própria dos leigos, segundo res-saltou o Vaticano II.

“Por outra parte, erraria grave-mente quem negasse a Cristo-Homem o poder sobre todas as coisas humanas e temporais, posto que o Pai lhe confiou o direito absolutíssimo sobre as coisas criadas, de tal sorte que estão submetidas a seu arbítrio. (...) Portanto, a todos os homens se estende o domínio de Nosso Redentor, como afirmam as pa-lavras de nosso predecessor, de feliz memória, Leão XIII, as quais fazemos nossas com muito gosto: ‘O império de Cristo se estende não só sobre os povos católicos e sobre aqueles que tendo recebido o Batismo per-tencem de direito à Igreja, ainda que o erro os tenha extraviado ou o cisma os separe da carida-de, senão que compreende tam-bém aos que não participam da fé cristã, de sorte que sob a po-testade de Jesus se acha todo o gênero humano.’ (...)

Ele é, com efeito, a fonte do bem público e privado. Fora d’Ele não há que se buscar a salvação em nenhum outro; pois não foi dado aos homens outro nome debaixo do céu pelo qual deve-mos nos salvar. Ele somente é quem dá a prosperidade e a feli-cidade verdadeira, tanto aos in-divíduos como às Nações: por-

que a felicidade da Nação não procede de fonte distinta daque-le que dá a felicidade aos cida-dãos, pois a Nação não é outro coisa que o conjunto concorde dos cidadãos. Não se neguem, pois, os governantes das Nações a dar por si mesmos e pelo povo mostras públicas de veneração e de obediência ao império de Cristo se querem conservar in-cólume sua autoridade e fazer a felicidade e a fortuna de sua pá-tria.”[44]

O combate pela restauração do Reinado de Cristo na esfera temporal

“Já nos dizia Leão XIII: Nós venceremos com o sinal do Co-ração de Cristo. É na riqueza desta devoção e nas promessas que ela guarda para os seus a-póstolos que está fundamentada toda a minha esperança de que, algum dia, Cristo reinará no mundo inteiro por meio dos ho-mens do Reino.”[45]

A Cristandade foi progressiva-mente sendo atacada desde o fim da Idade Média. Com o Renasci-mento, pagão, gnóstico, caracte-rizado pelo humanismo autôno-mo – tão condenado pelos Papas e pela Gaudium et Spes –, e a Reforma Protestante, a primeira etapa de um mesmo processo revolucionário.

Segunda etapa será a Revolução Francesa, com todas as funestas teorias iluministas sendo aplica-das e um novo passo igualitário inaugurado. Este estado de coi-sas conduz ao liberalismo do sé-culo XIX e às grandes persegui-ções do início do século XX.

Por fim, terceira etapa inaugura-se na Revolução Russa de 1917, quando o comunismo – transpo-sição das idéias igualitárias da Reforma e da Revolução France-sa ao campo social e econômico – saiu-se vitorioso. A mesma e única Revolução prepara sua

quarta etapa, com a total dessa-cralização da sociedade e a ex-clusão completa do Reino de Deus – vide a União Européia sem referência a suas raízes cris-tãs, o movimento homossexual, a terceira via do socialismo, a Nova Era, o progressismo teoló-gico, o relativismo moral (condenado por João Paulo II na Veritatis Splendor, em reite-ração de condenações anterio-res), certas tendências panteístas e igualitárias na idéia ecológica, o aborto, o feminismo etc.

O pensador católico brasileiro, Plínio Corrêa de Oliveira, estu-dando o processo histórico e fi-losófico que se inicia com a de-cadência da Cristandade Medie-val, demonstra em várias de suas obras como tal evento foi guiado por desordens humanas, especi-almente o orgulho e a sensuali-dade, que favoreceu o estabeleci-mento gradual de uma ordem de coisas antagônica à noção católi-ca de civilização. O referido pro-cesso – secularizante, igualitário, liberal, anárquico – foi conside-rado pelo escritor “a” Revolução[46], por antonomásia, a qual precisava ser combatida pela Contra-Revolução.[47]

Quando a Revolução adquire fei-ções violentas, por vezes é ne-cessário, em legítima defesa, se-guindo as diretrizes da Moral Católica quanto á guerra justa, contrapor-lhe uma Contra-Revolução também armada. As-sim, os franceses católicos que se opuseram à revolta de 1789; os cristeros, os quais comanda-ram a luta militar conhecida co-mo Cristiada, para defender a fé e a liberdade religiosa contra o governo liberal e maçônico me-xicano; os monarquistas espa-nhóis que combateram os comu-nistas na Guerra Civil.[48] “Se as leis do estado discrepam a-bertamente com o direito divino, se impõem um agravo à Igreja ou contradizem aos que são de-veres da religião, ou violam a

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Cívitas com Rafael Brodbeck.

autoridade de Jesus Cristo no Pontífice Máximo; então, em verdade, resistir é um dever, e obedecer, um crime.”[49] É a realização prática da resistência armada legítima, conforme ensi-nada pela Igreja: “A resistência à opressão do poder político não recorrerá legitimamente às ar-mas, salvo se ocorrerem conjun-tamente as seguintes condições: 1) em caso de violações certas, graves e prolongadas dos direi-tos fundamentais; 2) depois de ter esgotado todos os outros re-cursos; 3) sem provocar desor-dens piores; 4) que haja uma esperança fundada de êxito; 5) se for impossível prever razoa-velmente soluções melho-res.”[50]

Todavia, mesmo em “tempos de paz”, a Revolução anticatólica avança intelectual e culturalmen-te. Para combatê-la, cabe um au-têntico apostolado contra-revolucionário. Ao lado da evan-gelização explícita, para mudar os corações e submetê-los a Cristo Rei, é urgente a recristia-nização da sociedade, uma Con-tra-Revolução Cultural. Esta se faz pela impregnação das reali-dades temporais com o Evange-lho, pela evangelização da cultu-ra, pela defesa da família, pela cristianização das artes e das ci-ências, pela ação política e jurí-dica – no governo, na elaboração das leis, na filosofia jurídica (revitalização do jusnaturalismo tomista, e estudos no constitu-cionalismo católico) –, pela for-mação de uma elite tradicional nos valores cristãos, pela divul-gação da causa entre os católi-cos.

“É porém específico dos leigos, por sua própria vocação, procu-rar o Reino de Deus exercendo funções temporais e ordenando-as segundo Deus. Vivem no sé-culo, i.e., em todos e em cada um dos ofícios e trabalhos do mun-do. (...) A eles, portanto, cabe de maneira especial iluminar e or-

denar de tal modo todas as coi-sas temporais, às quais estão intimamente unidos, que elas continuamente se façam e cres-çam segundo Cristo, para louvor do Criador e Redentor.”[51]

“É porém plano de Deus acerca do mundo que os homens, em espírito de concórdia, construam a ordem temporal e sem cessar a aperfeiçoem.

Todas as realidades que consti-tuem a ordem temporal, como sejam os bens da vida e da famí-lia, a cultura, economia, artes e profissões, instituições políticas, relações internacionais e outros assuntos deste teor, junto com a evolução e o progresso deles, não constituem apenas subsídios para o fim último do homem, mas possuem valor próprio por Deus nelas colocado, seja quan-do consideradas em si mesmas, seja como partes de toda uma ordem temporal: ‘e viu Deus que tudo quanto realizara era mes-mo bom’ (Gn 1,31). (...)

É tarefa de toda a Igreja colimar este objetivo, a saber, capacitar os homens para instruírem com retidão a ordem universal das coisas temporais e para orientá-la por Cristo a Deus. Aos pasto-res compete enunciar claramen-te os princípios acerca do fim da criação e do uso do mundo, prestar assistência moral e espi-ritual, para renovar-se em Cris-to a ordem das coisas temporais.

Faz-se porém mister que os lei-gos assumam a renovação da ordem temporal como sua fun-ção própria e nela operem de maneira direta e definida, guia-dos pela luz do Evangelho e pela mente da Igreja, e levados pela caridade cristã. Cooperem como cidadãos com os cidadãos, com sua competência específica e responsabilidade própria. Pro-curem por toda a parte e em tu-do a justiça do reino de Deus. De tal sorte deve ser reformada

a ordem temporal, que, conser-vando-se integralmente suas leis próprias, se conforme aos prin-cípios mais altos da vida cristã e se adapte às condições diferen-tes dos lugares, tempos e po-vos.”[52]

Na Encíclica Redemptoris Mis-sio, o Papa João Paulo II expõe o lamentável estado dos países cristãos, conseqüência da Revo-lução, da descristianização soci-al, política e cultural. As Exorta-ções Apostólicas Ecclesia in A-mérica e Ecclesia in Euro-pa retomam o assunto, convi-dando os leigos à tarefa da Nova Evangelização e da reforma da sociedade sob Cristo Rei.

Pensadores como Joseph de Maistre, Ortega y Gasset, e Juan Donoso Cortés analisaram pro-fundamente o processo revolu-cionário, dando pistas a uma co-esa ação contra-revolucionária, a qual deve ser guiada pela Moral e pela Fé.

Denunciar os erros nas legisla-ções positivas civis, mormente quando agridem a vida, a família e os direitos de Deus, é um exce-lente modo de pelejar por Cristo Rei. Também o é a divulgação da doutrina da Igreja sobre o te-ma, e dos valores tradicional-mente vinculados à ordem social católica, através de palestras, li-vros, escritos, eventos. A con-quista das almas para Cristo, ou-trossim, não só é obra do Reina-do de Jesus sobre a esfera espiri-tual, mas contribui para que se efetive sobre a esfera temporal. Aliás, mais correto é dizer que o Reinado sobre a esfera temporal contribui para o Reino espiritual.

Importa ao católico, além disso, pautar sua ação política baseado nos princípios da doutrina social da Igreja. Defender a subsidiari-edade, a solidariedade, a desi-gualdade harmônica, a proprie-dade privada.

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Cívitas com Rafael Brodbeck.

Sobre a solidariedade como prin-cípio social da doutrina católica, o Magistério é claríssimo:

“Ninguém, com efeito, é tão rico que não careça dos outros; nin-guém é tão pobre que não possa, em alguma coisa, ser útil a ou-trem.”[53]

“Sobretudo em nossos dias, urge a obrigação de nos tornarmos o próximo de todo e qualquer ho-mem, e de o servir efetivamente quando vem ao nosso encontro, quer seja o ancião, abandonado de todos, ou o operário estran-geiro injustamente desprezado, ou exilado, ou a criança ilegíti-ma que sofre injustamente por causa de um pecado que não co-meteu, ou o indigente que inter-pela a nossa consciência, recor-dando a palavra do Senhor: ‘cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais peque-ninos, a mim o fizestes’ (Mt 25, 40).”[54]

“A solidariedade ajuda-nos a ver o ‘outro’ – pessoa, povo ou nação – não como um instru-mento qualquer, de que se explo-ra, a baixo preço, a capacidade de trabalho e a resistência físi-ca, para o abandonar quando já não serve; mas sim, como um nosso ‘semelhante’, um ‘auxílio’ (cf. Gen 2,18.20), que se há de tornar participante, co-mo nós, no banquete da vida, para o qual todos os homens são igualmente convidados por Deus.”[55]

“Mais do que qualquer outro, aquele que está animado de ver-dadeira caridade é engenhoso em descobrir as causas da misé-ria, encontrar os meios de a combater e vencê-la resoluta-mente. Artífice da paz, prosse-guirá o seu caminho, ateando a alegria, e derramando a luz e a graça no coração dos homens, por toda a terra, fazendo-lhes descobrir, para lá de todas as fronteiras, rostos de irmãos, ros-

tos de amigos.”[56]

Sobre a subsidiariedade:

“Deve-se respeitar o princípio de subsidiariedade: uma socie-dade de ordem superior não de-ve interferir na vida interna de uma sociedade de ordem inferi-or, privando-a das suas compe-tências, mas deve antes apoiá-la em caso de necessidade e ajudá-la a coordenar a sua ação com a das outras componentes sociais, tendo em vista o bem co-mum.”[57]

“Permanece, contudo, imutável aquele solene princípio da filo-sofia social: assim como é injus-to subtrair aos indivíduos o que eles podem fazer com a própria iniciativa e esforço, para o con-fiar à coletividade, do mesmo modo passar para uma socieda-de maior e mais elevada o que sociedades menores e inferiores, podiam conseguir, é uma injusti-ça, um grave dano e perturba-ção da boa ordem social. O fim natural da sociedade e da sua ação é coadjuvar os seus mem-bros, e não destruí-los nem ab-sorvê-los.”[58]

“Não precisamos de um Estado que regule e domine tudo, mas de um Estado que generosamen-te reconheça e apóie, segundo o princípio de subsidiariedade, as iniciativas que nascem das di-versas forças sociais e conjugam espontaneidade e proximidade aos homens carecidos de aju-da.”[59]

“A comunidade política está o-brigada regular as próprias re-lações com comunidade civil de acordo com o princípio de subsi-diariedade: é essencial que o crescimento da vida democrática tenha início no tecido social. As atividades da sociedade civil ? sobretu-do voluntariado e cooperação no âmbito do privado-social, sin-teticamente definido como ‘setor

terciário’ para distingui-lo dos âmbitos do Estado e do merca-do ? constituem as modalidades mais adequadas para desenvol-ver a dimensão social da pessoa, que em tais atividades pode en-contrar espaço para exprimir-se plenamente. A progressiva ex-pansão das iniciativas sociais fora da esfera estatal cria novos espaços para a presença ativa e para a ação direta dos cidadãos, integrando as funções atuadas pelo Estado. Tal importante fe-nômeno tem sido freqüentemente atuado por caminhos e com ins-trumentos largamente informais, dando vida a modalidades novas e positivas de exercício dos di-reitos da pessoa, que enrique-cem qualitativamente a vida de-mocrática.”[60]

“À atuação do princípio de sub-sidiariedade correspondem: o respeito e a promoção efetiva do primado da pessoa e da família; a valorização das associações e das organizações intermédias, nas próprias opções fundamen-tais e em todas as que não po-dem ser delegadas ou assumidas por outros; o incentivo oferecido à iniciativa privada, de tal modo que cada organismo social, com as próprias peculiaridades, per-maneça ao serviço do bem co-mum; a articulação pluralista da sociedade e a representação das suas forças vitais; a salvaguarda dos direitos humanos e das mi-norias; a descentralização buro-crática e administrativa; o equi-líbrio entre a esfera pública e a privada, com o conseqüente re-conhecimento da fun-ção social do privado; uma ade-quada responsabilização do ci-dadão no seu ‘ser parte’ ativa da realidade política e social do País.”[61]

Embora concentremos nossos esforços na dilatação do Reino sobre as almas, sabemos que tal ação reflete-se necessariamente na economia, na política, na cul-tura e em todos os aspectos da ordem temporal.

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Cívitas com Rafael Brodbeck.

[1] Catecismo da Igreja Católica, 2105

[2] Veremos melhor o assunto num próximo estudo.

[3] Missal. Para Domingos e Festas, São Paulo: FTD, 1952, p. 528

[4] Tal consagração não foi ape-nas uma manifestação piedosa do Papa, sem efeitos práticos, mas uma profunda demonstração da submissão do mundo tempo-ral ao Reinado de Cristo.

[5] BONAÑO, D. Manuel Garri-do, OSB. Año Litúrgico Patrísti-co, vol 3 – Pascua, Pamplona: Fundación Gratis Date, 2002, p. 84

[6] IRABURU, Pe. José Marí-a. Oraciones de la Iglesia en Ti-empos de Aflicción, Pamplona: Fundación Gratis Date, 2001, pp. 56-57

[7] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Miserentissimus Redemptor, de 8 de maio de 1928, nº 4

[8] IRABURU, Pe. José Marí-a. De Cristo o del Mundo, Pam-plona: Fundación Gratis Date, 1997, p. 121

[9] Pontifício Conselho Justiça e Paz. Compêndio da Doutrina So-cial da Igreja, nº 572

[10] Missal Romano; Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Intróito

[11] Missal Romano; Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Oração sobre as Oferendas

[12] Missal Romano; Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Prefácio

[13] Missal Romano; Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Antífona da Comunhão

[14] Missal Romano, ed. 1962; Festa de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Coleta; trad. livre do original em latim

[15] Missal Romano; Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Coleta

[16] Missa Romano, ed. 1962; Festa de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Oração depois da Comunhão; trad. livre do original em latim

[17] Missal Romano; Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo; Oração depois da Comunhão

[18] FUSTER, Enrico Par-do. Fundamentos Bíblicos de la Teologia Católica, vol. II, Pam-plona: Fundación Gratis Date, 2001, pp. 262-266

[19] Ou seja, a Igreja.

[20] Ou seja, pela união em uma só Pessoa divina entre a natureza divina de Cristo, gerada desde a eternidade pelo Pai, e Sua natu-reza humana, gerada no ventre da Santíssima Virgem por obra do Espírito Santo em um tempo histórico determinado, por ocasi-ão da Encarnação. Cristo, por ser Deus, é Rei. Sua Realeza decorre da natureza divina: é Rei porque é Deus, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Mas tam-bém, enquanto homem, é Rei, seja pelos méritos adquiridos na Cruz, seja pela União Hipostáti-ca, uma vez que de Maria não nasceu apenas o homem Cristo, mas o Cristo Total, eis que as duas naturezas unem-se em uma só Pessoa. Nossa Senhora é Mãe de Cristo – uma só Pessoa! – e não mãe da Sua natureza huma-na apenas. É certo que não foi ela quem gerou a natureza divi-na, existente desde sempre e a ela superior, mas ambas as natu-rezas – a divina gerada pelo Pai, e a humana pelo Espírito Santo em seu ventre – unem-se em u-ma única Pessoa. Por isso dize-mos que Maria é Mãe de Deus.

[21] Cristo, vimos, é Rei porque é Deus. Mas também pe Rei en-quanto homem: os motivos fo-ram descritos na última nota de rodapé e iremos explicitar no texto.

[22] Dizemos “enquanto ho-mem” porque a Realeza de Cris-to sobre a Igreja por virtude de Sua Divindade é evidente. Te-mos aqui a intenção de demons-trar a mesma Realeza em razão de Sua humanidade.

[23] “O valor da Redenção deri-

va da União Hipos tá t i -ca.” (FUSTER, Enrico Pardo.op. cit., p. 264)

[24] Cristo tem o Reinado sobre a esfera temporal, mas não o e-xerce por Si mesmo, e sim atra-vés do Estado, o qual livremente deve reconhecer-se Seu súdito.

[25] O exercício do Reinado de Cristo sobre as realidades tem-porais é indireto, ainda que o do-mínio, o Reinado em si mesmo, seja direto.

[26] “Se os santos julgarão os anjos com a autoridade de Cris-to, é evidente que Cristo tem a potestade judicial sobre e-les.” (FUSTER, Enrico Par-do. op. cit., p. 266)

[27] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quas Primas, de 11 de dezembro de 1925, nº 23

[28] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quas Primas, de 11 de dezembro de 1925, nº 34

[29] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quas Primas, de 11 de dezembro de 1925, nº 34

[30] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quas Primas, de 11 de dezembro de 1925

[31] Sua Santidade, o Papa João XXIII. Encíclica Pacem in Ter-ris, de 11 de abril de 1963, nº 47

[32] “Sob o aspecto social, a I-greja reafirma a disposição de trabalhar conjuntamente com as forças da sociedade livremente organizada e dos poderes tempo-rais constituídos para promover ações capazes de erradicar defi-nitivamente a miséria. Do ponto de vista moral, a Igreja considera o subjetivismo e o individualis-mo exacerbado, o consumismo ilimitado, o utilitarismo pragmá-tico, o imediatismo irresponsá-vel, a cultura do descartável e, principalmente, o hedonismo, a prepotência do mais forte sobre o mais fraco, a supremacia de um povo sobre outro, a escravi-dão dos mais pobres aos mais ricos, a corrupção ativa e passi-va, como práticas que ferem os princípios éticos, distanciando as pessoas umas das outras, acirran-do o egoísmo e os ódios incontá-veis, enfim, afastando os seres

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Cívitas com Rafael Brodbeck.

[humanos da solidariedade e do afeto, necessários para uma con-vivência menos aterradora. Fi-nalmente, sob o prisma espiritu-al, a Igreja reforça a fé na salva-ção do homem, quando cada um de nós for capaz de se libertar dos condicionamentos que nos amesquinham diante do próximo e de Deus, e quando o manda-mento maior de Cristo for viven-ciado por todos com verdadeira intensidade. Por defender os va-lores que dignificam a vida hu-mana é que a Igreja permanece viva e atuante. ‘O respeito pela pessoa humana implica que se respeitem os direitos que decor-rem de sua dignidade de criatura. Estes direitos são anteriores à sociedade e se lhe impõem. São eles que fundam a legitimidade moral de toda autoridade. Con-culcando-os ou recusando-se a reconhecê-los na sua lei positiva, uma sociedade mina sua própria legitimidade moral.’ (Catecismo d a I g r e j a C a t ó l i c a n º 1930).” (Sua Eminência, Dom Geraldo Magella, Cardeal Agne-lo, Arcebispo de São Salvador da Bahia e Primaz do Brasil. A Igreja se posiciona. Comunicado da CNBB, em 17 de julho de 2004, reproduzido por Zenit, ZP04070517)

[33] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quas Primas, de 11 de dezembro de 1925, nº 33

[34] PIE, Cardeal Louis. A-pud CATTA, E., La doctrine po-lítique et sociale du Cardinal Pie, P a r í s : 1 9 5 9 , p . 85

[35] cf. Concílio Ecumênico Va-ticano II. Constituição Dogmáti-ca Lumen Gentium,de 21 de no-vembro de 1964, nº 31

[36] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Summi Pontifica-tus, de _____, nº 38 a 39

[37] MACIEL, Pe. Marcial, LC. A Caridade Evangélica

[38] MACIEL, Pe. Marcial, LC. Apóstolos da Nova Evange-lização

[39] Sua Santidade, o Papa João Paulo II. Homilia na Santa Missa pela Consagração da Catedral de Almudena, em ______

[ 4 0 ] G R I N G S , D . D a -deus. Dialética da Política. His-tória Dialética do Cristianismo, Porto Alegre: EDIPUCRS, 1994, p. 313

[41] Sua Santidade, o Papa Pau-lo VI. Exortação Apostóli-ca Evangelii Nuntiandi, de 8 de dezembro de 1975, nº 19

[42] DAWSON, C. Religione e Cristianesimo nella Storia della Civiltà, Roma: Paoline, 1984, p. 152

[43] Sua Santidade, o Papa Leão XIII. Encíclica Immortale Dei, de 1º de novembro de 1885

[44] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quas Primas, de 11 de dezembro de 1925, nsº 15-16

[45] MACIEL, Pe. Marcial, LC. Carta de 2 de julho de 1946

[46] Essa idéia de Revolução co-mo uma doutrina, um sistema, já foi demonstrada por Joseph De Maistre, para quem ela era não um acontecimento, mas uma é-poca. Outros pensadores, todos muito católicos e autorizados, sustentam o mesmo. “A Revolu-ção foi um vasto empreendimen-to premeditado de descristianiza-ção e de hostilidade ao Reinado Social de Cristo Rei e de sua I-greja. E os dois séculos que se seguiram continuaram esta obra nefasta: revolta contra Deus e contra os verdadeiros direitos do homem.” (RIFAN, D. Fernando Arêas. Bicentenário da Revolu-ção Francesa, in “Quer Agrade, Quer Desagrade”, Campos: ed. do autor, 1999, p. 113) “Ela é uma doutrina, ou, se se preferir, um conjunto de doutrinas, em matéria religiosa, filosófica, po-lítica, social.” (FREPPEL, Mons. Apud RIFAN, D. Fernan-do Arêas. Bicentenário da Revo-lução Francesa, in “Quer Agra-de, Quer Desagrade”, Campos: ed. do autor, 1999, p. 113). “A Revolução é o ódio de toda or-dem social que o homem não estabeleceu e na qual ele não é rei e deus ao mesmo tempo. Ela é a proclamação dos direitos do homem sem preocupação com os direitos de Deus. É a fundação do estado religioso e social sobre a vontade do homem no lugar da

vontade de Deus. Ela é a Revo-lução, quer dizer, destruição, de-sordem.” (GAUME, Mons. A-pud RIFAN, D. Fernando Arê-as. Bicentenário da Revolução Francesa, in “Quer Agrade, Quer Desagrade”, Campos: ed. do au-tor, 1999, pp. 113-114) “Em ou-tros termos, a Revolução é uma revolta contra Deus e contra Je-sus Cristo. Em conseqüência, é revolta contra a Igreja, contra seus ministros, contra o Rei. Co-mo disse o Cardeal Pie, ela tende ‘para uma completa seculariza-ção, isto é, para uma ruptura ab-soluta entre a sociedade leiga e o princípio cristão.’ (...) E porque ela não foi apenas um aconteci-mento do passado mas um certo estado de espírito, uma doutrina ainda presente nos espíritos e instituições, o combate continua ainda entre a verdadeira Igreja e a Revolução.”(RIFAN, D. Fer-nando Arêas. Bicentenário da Revolução Francesa, in “Quer Agrade, Quer Desagrade”, Cam-pos: ed. do autor, 1999, p. 114)

[47] “Se a Revolução é a desor-dem, a Contra-Revolução é a restauração da Ordem. E por Or-dem entendemos a paz de Cristo no Reino de Cristo. Ou seja, a civilização cristã, austera e hie-rárquica, fundamentalmente sa-cral, antiigualitária e antilibe-ral.” (OLIVEIRA, Plínio Corrêa de. Revolução e Contra-Revolução, 2ª ed., São Paulo: Diário das Leis, 1982, p. 42)

[48] Tanto na Cristiada quanto na Guerra Civil, os católicos combatiam bradando “Viva Cris-to Rei!”, significando que dese-javam o Reinado de Jesus na es-fera temporal, coisa que não es-tava acontecendo com governos liberais e comunistas. Também os que morriam – mártires! – gritavam “Viva Cristo Rei!” an-tes de encontrar o Senhor no Céu. Muitos cristeros mexicanos e contra-revolucionários espa-nhóis foram beatificados por Jo-ão Paulo II.

[49] Sua Santidade, o Papa Leão XIII. Encíclica Sapientiae Chris-tianae, de ____

[50] Catecismo da Igreja Católi-ca, 2243

[51] Concílio Ecumênico Vatica-no II. Constituição Dogmáti-

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Cívitas com Rafael Brodbeck.

ca Lumen Gentium, de 21 de no-vembro de 1964, nº 31

[52] Concílio Ecumênico Vatica-no II. Decreto Apostolicam Ac-tuositatem, de 18 de novembro de 1965, nº 7

[53] Sua Santidade, o Papa Leão XIII. Encíclica Graves de Com-muni, de _____, nº 22

[54] Concílio Ecumênico Vatica-no II. Constituição Pasto-ral Gaudium et Spes, de 7 de de-zembro de 1965, nº 27

[55] Sua Santidade, o Papa João Paulo II. Encíclica Sollicitudo Rei Socialis, de ____, nº 39

[56] Sua Santidade, o Papa Pau-lo VI. Encíclica Populorum Pro-gressio, de ____, nº 75

[57] Sua Santidade, o Papa João Paulo II. Encíclica Centesimus Annus, de _____, nº 48

[58] Sua Santidade, o Papa Pio XI. Encíclica Quadragesimo An-no, de ____, nº 79

[59] Sua Santidade, o Papa Ben-to XVI. Encíclica Deus Caritas Est, de 25 de dezembro de 2005, nº 28

[60] Pontifício Conselho Justiça e Paz. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, nº 419

[61] Pontifício Conselho Justiça e Paz. Compêndio da Doutrina Social da Igreja, nº 187

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DSI—Doutrina Social da Igreja com Bruno de Castro.

Não é raro vermos sacer-dotes e pessoas que se dizem parte da Igreja Católica confundirem o ob-jetivo da Doutrina

Social da Igreja, que busca inte-gralmente o bem comum, da doutrina socialista que finaliza um bem estritamente coletivo. Isso ocorre em razão da tentação que se oferece através do texto marxista, no qual é possível, pa-ra os que nele tem fé, uma nova salvação. Para o socialismo é possível "transcender" na terra, e assim, aliado à metafísica do E-vangelho, economiza-se a paci-ência humana no sentido de não ser mais necessário esperar o tempo de uma vida para adentrar à perfeição plena do Reino dos Céus. Certamente, da forma que estou expondo soa como um de-sequilíbrio patológico, e é. Veja-mos: quais são os requisitos para que isso ocorra? Se executa a "justiça social" na terra e se im-

põe à todas as pessoas condições materiais de forma completa-mente igual, para que assim se distribuam os bens dos que já os

possuem aos que não pos-suem, independentemente da vontade dos seus pro-prietários de fato. Porém, isso é moralmente correto? É este o sentido da busca do "bem comum" enfatiza-do pela Doutrina Social da Igreja?

A resposta é clara e simples: absolutamente não. A Igreja Católica ja-mais defendeu uma forma coletiva e totalmente equi-parada de bens meramente materiais, uma vez que es-ses bens, apesar de neces-sários para a realização da pessoa são meramente transitórios à transcendên-cia divina. Outro argumen-to é que a total igualdade

desses bens não produzem qual-quer justiça, pois se exclui gra-vemente o mérito corolário a ca-da pessoa humana.

O que a Santa Igreja defen-de, diferentemente do que a Teo-logia da Libertação defende, é uma forma prudente e perfeita de subsidiariedade, no sentido de que apenas um bem material de-ve ser procurado: o bem comum, que é o bem de um (no sentido individual) e o de todos (no sen-tido coletivo), naquilo em que todos temos em comum: a digni-dade. Não obstante, esse bem se divide sim no sentido individual e coletivo do ser, mas para ser realizado necessita produzir um reconhecimento pessoal de que não há bem próprio sem haver um bem coletivo. Em outras pa-lavras: minha felicidade, seja ter-rena ou transcendente, está con-dicionada à felicidade do próxi-mo.

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Por que o socialismo é incompa-tível com a doutrina católica?

Marx e Engels: o início de uma nova etapa no pensamento socialista.

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DSI—Doutrina Social da Igreja com Bruno de Castro.

Sendo assim, é desse reconhecimento pessoal que a dignidade de cada um vai sendo contemplada, amando e perdoan-do ao próximo como se dele de-pendesse toda a nossa felicidade, é esse o verdadeiro sinônimo de vida em comunidade. O Papa João Paulo II foi mais além, afir-mando que sem essa participa-ção social da pessoa e sem este reconhecimento em relação ao próximo, o ser está fadado ao comportamento antissocial e as-sim renuncia à sua própria digni-dade na medida em que seu de-sinteresse pelo bem vai levá-lo a comportamentos que somente se remetem à sua falta de reconhe-cimento social, o que podemos aplicar, por exemplo, a uma situ-ação em que um criminoso, por razão desnecessária, fútil ou ma-

terial, comete um crime median-te ameaça ou tira a vida de ou-trem. Não há, portanto, que se falar em plena dignidade de quem comete delitos de forma natural e sem consciência, uma vez que à essa pessoa foi dada uma noção relativa - mas poten-cialmente inteligível - do que é certo e errado, principalmente no sentido do mal que pode ser feito ao próximo. Isso quer dizer que a dignidade não se recupera após renunciada? Certamente se recu-pera, visto que após a pena terre-na pode haver o perdão, se o cri-minoso assim desejar.

Já a prática coletivista, as-sim como a individualista (que se remete às doutrinas liberais), é totalitária e impositiva, pois mede apenas o bem coletivo sem

qualquer consi-

deração à individualidade de ca-da um, que também é formadora da pessoa humana. Essa doutrina marxista pode ser traduzida co-mo socialismo ou, embora seus praticantes neguem, de comunis-mo. A diferença de ambas é tra-duzida apenas pela impopulari-dade da palavra comunismo, a-pós o desastre humano que cul-minou na morte de mais de 200 milhões de pessoas nos países que adotaram seu sistema desu-mano. Ademais, independente da forma etimológica, o Papa Pio XII publicou em 1949 o ''Decreto contra o comunismo'' proibindo desde a filiação de ca-tólicos em partidos comunistas até qualquer defesa da doutrina materialista, sob pena de exco-munhão latae sentenciae - no momento em que se praticou a conduta delituosa. Anteriormen-te, em 1937, já havia sido publi-cada por Pio XII a encíclica Di-vini Redemptoris, que também havia condenado fortemente o comunismo.

Porém, como o socialismo chegou dentro da Igreja Católica após inúmeras condenações dos romanos pontífices a essa doutri-na? Através da Teologia da Li-bertação, influenciada pelo mé-todo de dominação (ou adequa-ção) cultural de Antonio Grams-ci para promover o marxismo sem necessitar uma nova guerra de classes. É certo que nos dias de hoje Leonardo Boff, o funda-dor da Teologia da Libertação, tenta se afastar de sua imagem de comunista, mas não pode ne-gar o que declarou no livro ''Manifesto Comunista comenta-do por Chico Alencar'', verbis:

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Pio XII.

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DSI—Doutrina Social da Igreja com Bruno de Castro.

Li o Manifesto comunista pela primeira vez em 1962, quando estudava filosofia em Curitiba. (...) Ele representa um sonho, a construção de uma hu-manidade reconciliada consigo mesma, com a natureza, a apre-sentação do caminho para essa reconciliação final, que é o soci-alismo como maneira de cons-truir o comunismo para todos[grifo nosso]. E aí eu percebi grande força, eu diria judaico-cristã, do Manifesto, que é o so-nho do cristianismo originário, de colocar tudo em comum e não haver pobres entre os seres hu-manos[grifo nosso].

A Igreja também já repro-vou diversas vezes a Teologia da Libertação por seu teor materia-lista, e a publicação do Catecis-mo tem amenizado essa forma-ção marxista dentro dos seminá-rios, o que prova que a corrente herege está cada vez a perder mais praticantes. O marxismo eclesiástico está a acabar, mas deixou presente uma ênfase forte em dar preferência ampla aos pobres nas ações apostólicas, o que não é de todo errado, desde que não estejamos falando de pobres no sentido meramente material, mas também no sentido espiritual. Em relação aos ricos, condenados pela Teologia da Li-bertação, o próprio Evangelho fala que Cristo não fechou o Rei-no dos Céus a eles, mas sim ape-nas os alertou dos perigos maio-

res que correm os ricos no senti-do da soberba, do apego material e da busca intensa por prazeres terrenos.

Sendo assim, como agir em face de doutrinas humanas cole-tivistas dentro da Igreja Católi-ca? Deus nos pede que sejamos promotores da verdade, mas não exige que todo apostolado vincu-lado à nossa pessoa tenha de ser destruído em razão de uma situa-ção reprovável. Todos os mo-mentos tem as suas peculiarida-

des, mas todas devem ser equili-bradas visando o amor ao próxi-mo - no sentido de procurar não ofender a pessoa e nem de vedá-la a uma emenda após um supos-to repúdio gerado - e à prudência - sabendo quando agir, como a-gir e, o mais importante, se de-vemos de fato agir.

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Lo studente della liturgia com Kairo Rosa Neves de Oliveira

Na última edição, fa-lamos sobre a vigília pascal, tendo como ponto de vista a “desquaresmação” da liturgia e do júbilo próprio dessa celebra-

ção. Hoje, porém, falamos das vigílias como um todo. O simbo-lismo comum a todas elas e as principais vigílias do Rito Ro-mano.

Introdução

Desde muito cedo a Igreja de Roma iniciou a prática das vigí-lias, orações noturnas na qual se clamava a Deus. Não é de se es-tranhar que a Igreja, não apenas no ocidente, mas também no ori-ente adotasse essa prática de ora-ção, dada que ela tem raízes bí-blicas. A mais notável das passa-gens é a noite que antecedeu a paixão de Nosso Senhor, na qual ele próprio vigiou e pediu para que os apóstolos orassem tam-bém por Ele, até o momento de sua entrega.

A noite sempre teve uma conota-

ção de pecado; e considerando as

atividades humanas, não poderia

ser de outra maneira. Os ladrões

preferem a noite, os adúlteros

preferem essas horas, também os

assassinatos são mais comuns a

essas horas. Eis um fato pratica-

mente universal que tem uma

explicação simples: as trevas en-

cobrem os atos. Quem trai anoite

tem menos chances de ser visto;

quem mata, melhores chances de

se esconder. Verdadeiramente a

noite sempre foi “a

hora do poder das

trevas”.

Nesse sentido, nas-

ce a oração de vigí-

lia com forte signi-

ficado, sendo este s

relacionado com o

símbolo da luz. A

luz que nasce entre

as trevas e as dis-

solve. Não por aca-

so, foi em meio à

noite que Cristo ressuscitou. O

mais luminoso dos mistérios,

teve seu lugar cercado de trevas.

Como em toda a história da sal-

vação, nosso divino mestre mos-

tra que o médico é útil aos doen-

tes, a graça aos pecadores e a luz

àqueles que vivem entre as tre-

vas.

Como símbolo de nossa fraqueza

humana e da necessidade da bus-

ca da força de

Cristo, somos

convidados à o-

ração noturna,

não para, como

as religiões pa-

gãs, festejar a

noite e seus mis-

térios, mas para

buscarmos a cla-

ridade em meio à

escuridão. Pois só na presença

da luz a Verdade poderá ser con-

templada, os criminosos serão

punidos e os justos recompensa-

dos.

Na liturgia latina, várias soleni-

dades possuem um formulário

próprio para as celebrações de

vigília, entre elas citamos a Pás-

coa, o Natal, Pentecostes, que

possuem missa com vigília com

liturgia da palavra ampliada, e

São Pedro e São Paulo, Imacula-

da Conceição, Assunção de Nos-

sa Senhora, São João Batista,

que não possuem em sua estrutu-

ra nenhum rito que difere essen-

cialmente das vigílias.

Vigílias – Ofício das Leituras

O primeiro caso notável de vigí-lia é no Ofício Divino, o ofício das leituras, mesmo com a possi-bilidade de ser feito a qualquer momento do dia, conserva-se como uma forma diária de vigí-lia.

O rito apresenta sempre um hino

mais apto à celebração noturna

da vigília de grande utilidade pa-

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"...Porquanto vós todos sois filhos da luz, e fi-lhos do dia; nós não somos da noite, nem das

trevas." 1 Ts 5,5

As Vigílias no Rito Romano

Page 59: Revista In Guardia.3ª edição

Lo studente della liturgia com Kairo Rosa Neves de Oliveira

ra as comunidades, mormente as monásticas, que conservam o costume de sua celebração du-rante a noite ou às primeiras ho-ras o dia, antes do nascer do sol.

E não apenas isso, os apêndices trazem ainda um conjunto de cânticos a serem usados nas vigí-lias de celebração mais longa. Há ainda a possibilidade da lei-tura evangélica em ocasiões es-peciais, como domingos e sole-nidades, com trechos do evange-lho diferentes do da Missa.

O Ofício das Leituras é, sem dú-vida a mais ordinária e presente celebração em formato de vigília que temos no rito romano. Essa celebração nos lembra a cada dia que devemos vigiar sem cessar, pois o dia do senhor chegará não sabemos o dia nem a hora.

Missas Rorate

No tempo do advento, grande escatológico. Um tipo particular de celebração pode ser encontra-do são as missas “Rorate”. Seu nome deriva do introito da missa “Rorate coeli...”. Essas celebra-ções na forma extraordinária consistem da memória facultati-va de nossa senhora no sábado. Na forma ordinária, podem-se usar os textos de missa votiva de

nossa senhora, segundo as rubri-cas.

Essa missa tem de diferente em relação às outras, a ausência de iluminação abundante e o uso de velas para iluminar toda a igreja. O símbolo da luz, grande símbo-lo das vigílias, está maciçamente presente nessas celebrações que são uma antecipação da grande vigília natalina, vigília esta mais plena de luz, que está por vir no tempo certo.

Vigília de Natal

A solenidade do Natal foi, desde muito cedo, munida de uma mis-sa de vigília. Esse uso, advindo da narração bíblica de que Nosso Senhor nasceu durante a noite. Mais uma vez, escolhendo a noi-te para manifestar a luz.

A solenidade do natal de nosso senhor possui o formulário mais rico que qualquer outra celebra-ção, até mesmo que a páscoa. Embora a páscoa possua uma grande vigília, consta apenas de três formulários: A vigília pascal e a missa do dia, esta última com uma pequena variância no evan-

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Page 60: Revista In Guardia.3ª edição

Lo studente della liturgia com Kairo Rosa Neves de Oliveira

gelho para a missa da aurora. A missa do natal apresenta quatro formulários distintos: missa da vigília, missa da noite, missa da aurora e missa do dia.

A grande missa de natal que aqui tratamos, conhecida como “Missa do Galo” é a segunda. Podemos dizer que essa seja a segunda vigília mais importante do ano, perdendo apenas para a Vigília Pascal. A missa de natal, assim como sua irmã mais im-portante, possui um rito de ex-tensão. Esse rito é naturalmente retirado do ofício das leituras. Acrescenta-se, segundo as rubri-cas, os salmos e leituras no iní-cio da celebração. Pode-se ajun-tar ainda a este rito a leitura das Kalendas de natal.

No Vaticano esses salmos e lei-turas são feitos não dentro do rito da missa, mas antes dela, como forma de preparação e também para evitar estender muito o tempo do papa na cele-bração, dado que no outro dia há a bênção Urbi et Orbi.

Vigília Pascal

É, de longe, a mais conhecida e mais importante vigília do Rito Romano. Do uso da igreja pri-mitiva de se vigiar, herdamos o uso das velas na liturgia. Não é por acaso que o principal símbo-lo da Mãe de todas as vigílias é, ainda hoje, um grande círio mar-cado com as marcas do Cristo e aceso com fogo abençoado.

As bênçãos do círio e do fogo são o rito inicial da Vigília Pas-cal. Esse é o símbolo máximo e constante em toda a vigília e mesmo em todo o tempo. O círio é o símbolo do Cristo que em meio às trevas se faz luz.

Essa celebração possui na se-quencia o belo canto do Exultet, proclamação da Páscoa. Esse canto tem relação direta com a simbologia da luz, sendo canta-do enquanto se acendiam as lâm-padas da Igreja. A seguir tem-se, à semelhança do Ofício das Lei-turas, uma longa sequencia de leituras e salmos. Não é atoa que quem participa da vigília pascal omite o ofício das leituras, uma vez que essa celebração é a ora-ção noturna por excelência.

Na forma extraordinária a bên-ção da água se faz nesse primei-ro momento, ainda dentro da li-turgia da palavra, na ordinária, após a homilia. Em ambos os casos a água é abençoada mergu-lhando-se nela o círio pascal.

A vigília possui ainda outros im-portantes símbolos: o canto do Glória, a volta dos enfeites, des-coberta dos santos, a volta da água benta à pias, etc.

Vigília de Pentecostes

Dentre as solenidades que possu-em vigília, é notável a de Pente-costes. Embora, a vinda do Espí-rito Santo, sustenta a tradição, veio sobre os Apóstolos e Nossa Senhora na hora nona; desde muito cedo, a igreja se reuniu para vigiar e pedir a Deus a vin-da do Espírito Santo.

O que geralmente não se conhe-ce é que o rito romano prevê a possibilidade de uma vigília es-tendida para Pentecostes, à se-melhança da Vigília Pascal e da Vigília Natalina. O rito, que se encontra no apêndice do Missal Romano, à página 997. Após o início da missa o missal propõe uma monição inicial que intro-duz uma liturgia da palavra am-pliada.

As leituras seguem uma ordem semelhante à da vigília pascal, isto é, leitura, salmo e oração. As leitura são as apresentadas como opções. As orações ditas pelo celebrante tem conclusões bre-ves: “per christum dominum nostrum”. Esse ciclo se repete, entretanto, apenas 4 vezes; 3 a menos que as 7 leituras do anti-go testamento lidas na vigília pascal. Então tem-se o Glori-a, terminando com a oração do dia.

Por fim, diz-se a oração do novo testamen-to e segue-se à leitura do e-vangelho, pre-cedido pelo Aleluia, como de costume. Permite-se ain-da dizer ao fi-nal dizer a des-

pedida e sua resposta seguidos por “aleluia, aleluia” como na oitava da páscoa.

Conclusão

Como vimos, o rito romano pre-za muito pelas celebrações no-turnas, possuindo diferentes ritos para fazê-lo. Temos na liturgia das horas, ofício das leituras, que se faz diariamente e possui for-mas mais ricas para celebrações especiais. As principais celebra-ções também possuem missas de vigílias, algumas delas também com rito ampliado. A primeira delas a vigília pascal, com um rito de 7 leituras do antigo testa-mento, intercaladas com salmos e orações. Seguindo o mesmo esquema temos a Vigília de Pen-tecostes, que possui apenas 4 lei-turas. A vigília de natal estendi-da tem uma estrutura um pouco diferente, consta da união do ofí-cio das leituras à missa da noite.

Todas essas celebrações de gran-de diversidade em formas e ritos, incluindo celebrações da santa missa e liturgia das horas, são uma riqueza inestimável do rito romano, fundamentado na tradi-ção apostólica da oração noturna e do simbolismo da luz que se faz presente nas trevas para dis-sipá-las. Devem, todas elas ser preservadas a fim de que possam estar presentes nas paróquias, auxiliando as almas que vivem num mundo de trevas a buscar a luz que vem do alto.

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Milagres com Lizandra Danielle

No século III, quando a impera-triz Santa Helena foi até Nazaré (Galiléia), man-dou construir uma igreja onde se en-contrava a casa que Maria Santís-

sima viveu com seus pais Santa Ana e São Joaquim, onde disse SIM à Deus com a notícia do Ar-canjo Gabriel que seria a mãe do Verbo encarnado:

“E, no sexto mês, foi o anjo Ga-briel enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposa-da com um homem, cujo nome era José, da casa de David; e o nome da virgem era Maria. E, entrando o anjo aonde ela esta-va, disse: Salve, agraciada; o Senhor é contigo; bendita és tu entre as mulheres. E, vendo-o ela, turbou-se muito com aque-las palavras, e considerava que saudação seria esta. Disse-lhe, então, o anjo: Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus. E eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um fi-lho, e por-lhe-ás o nome de Je-sus. Este será grande, e será chamado filho do Altíssimo;” Lucas 1, 26),

E também onde Maria e José moraram com Jesus quando vol-taram do Egito.

Com a invasão e a conquista mulçumana no reino franco da Terra Santa (Jerusalém) muitas igrejas cristãs católicas e monu-mentos religiosos foram destruí-dos. Em 1291, dia 8 de maio, a casa da Sagrada Família também foi demolida pelos mulçumanos.

Passado dois dias, dia 10 de mai-o, foi encontrada uma casa total-mente sem alicerces em um ter-reno desigual, e com as mesmas características da Santa Casa de Nazaré, em Tersats próximo ao mar Adriático na antiga lugoslá-

via e atualmente na Croácia, por sinal era muito diferente para sua região chamando assim muita atenção dos moradores que não sabiam como ela poderia ter pa-rado ali, no interior da casa tinha um altar e ao lado uma imagem de Maria segurando no colo o Menino Jesus.

Tersats ficava aproximadamente 2.000 km de Nazaré onde a casa se encontrava dois dias antes.

Com o alvoroço o governo local pediu ao bispo Alexandre de Modruzia para que verificasse se realmente aquela era a casa da Sagrada Família. O bispo estava enfermo e de cama a três anos. Ele pediu a intercessão de Maria para que ela o curasse da enfer-midade se essa fosse realmente a casa onde o Verbo tinha se En-carnado, segundo a tradição, foi a própria Maria que havia apare-cido a ele dizendo ser aquela a

casa onde viveu quase toda a vi-da e como prova iria curá-lo.

No dia seguinte o bispo estava curado e foi até o local onde a suposta casa teria pousado. Tem-pos depois foi reunida uma co-missão de homens, para ir até Nazaré onde a Casa da Sagrada Família deveria se encontrar, pa-ra verificar se a casa realmente teria desaparecido do local. Não foi encontrado nenhum vestígio de escombro da casa. No lugar onde foi demolida havia somente os alicerces da casa que coincidi-am com os da casa que estavam em Tersats. A partir daí foi afir-mado que realmente aquela era a casa de Nazaré que milagrosa-mente foi transportada pelos ares por anjos, até Tersats.

No dia 10 de dezembro de 1294 três anos depois da transportação da santa casa para Tersats, de repente a casa começou a flutuar

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A Santa Casa de Loreto

Page 62: Revista In Guardia.3ª edição

Milagres com Lizandra Danielle

e ficou toda iluminada como se estivesse enfeitada com luzinhas brancas e douradas, foi um espe-táculo no céu ao mesmo tempo assustador para quem via aquele acontecimento sobrenatural.

A casa desapareceu novamente e foi encontrada em Recanati uma cidadezinha Italiana, próximo a um bosque de loureiros, vindo daí o nome de Casa de Loreto e Nossa Senhora de Loreto.

Várias testemunhas tanto do pri-meiro quanto do segundo lugar (Tersats- Recanat) deram depoi-mentos espantados por terem

visto uma casa muito iluminada voando pelo céu com a ajuda dos anjos do Senhor.

Os aviadores se identificaram com o fato de que a casa voou pelos ares, uma missão cumpri-das pelos anjos, assim adotaram Nossa Senhora de Loreto como

sua padroeira, pois sua casa de algum modo e em algum momento se fez voadora, como um lindo avião ilumi-dado.

Esses acontecimen-tos foram ficando cada vez mais fa-mosos e atraindo mais romeiros e curiosos, a Casa de Loreto é conhecida mundialmente e recebe milhares de visitantes por ano. Muitos santos já passaram por lá, como Santa Terezinha do Menino Jesus, o Beato João Paulo II, Santa Hele-na, São Luiz IX (rei da França), etc.

A casa foi se transformando em uma linda igreja, começada pelo Papa Paulo II e cada sucessor fez uma parte. O Papa Leão X colo-cou mármore branco para desta-car os relevos contornando assim as paredes da casa, o Papa Sixto V pediu que gravasse uma ins-crição feita á ouro: “Casa da Mãe de Deus. Onde o Verbo se fez carne.” Grandes transforma-ções foram sendo feitas até che-gar nessa magnífica construção, uma igreja que possui forma de cruz latina. A casa tem 8,9 me-tros de comprimento por 3,8 me-tros de largura. Não possui ne-nhum alicerce e se encontra so-bre um terreno desigual, fazendo com que um dos lados da casa não toque o chão. As paredes são feitas de pedras avermelhadas com algumas rajadas amarela-das.

Curiosidades

Estudos arqueológicos feitos pe-lo arquiteto Nanni Monelli, con-firmaram a veracidade desse mi-lagre, pelo fato de que as pedras do altar da santa casa, possuem a mesma origem das que são en-contradas na gruta da Anuncia-ção em Nazaré.

Depois de séculos, a casa ainda permanece em pé sem nenhum apoio ou alicerce, podendo até mesmo passar uma barra de ferro por baixo da casa de um lado pa-ra o outro.

As pedras que formam toda a casa, são encontradas em Nazaré e não na Itália, utilizadas comu-mente nas construções da Gali-léia.

As dimensões da casa são idênti-cas com as fundações que fica-ram em Nazaré.

Vários estudos provam que os tijolos com que a casa foi cons-truída, foram mesmo fabricados na Palestina à mais de 2000 a-nos.

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Page 63: Revista In Guardia.3ª edição

Chesterton no Brasil com Diego Guilherme

Nosso ami-go Gilbert Keith Chesterton (1874-1936) sempre surpreen-deu seus adversá-rios pela suas respostas parado-xais entrelaçadas

de genial senso comum. Sua vi-são da realidade era aguçada a tal ponto que a comparação com Tomás de Aquino (1225, 1274) não poderia ficar apenas no porte físico. Chesterton tinha a alegria angelical de saber que se Deus criou todas as coisas, Ele, por-tanto, mandaria e controlaria tu-do. Não o preocupava as teorias evolucionistas efervescentes em sua época, e que ainda hoje é dogma nas escolas. Sua descren-ça em relação ao evolucionismo se dava pelo simples fato dele saber que "se a evolução sim-plesmente significa que algo po-sitivo chamado macaco transfor-mou-se lentamente em algo posi-tivo chamado de homem, então ela é inofensiva para o mais or-todoxo; pois um Deus pessoal poderia muito bem criar coisas de modo lento ou rápido, especi-

almente se, como no caso do Deus cristão, ele estivesse situa-do fora do tempo."1

A fé estava indissociável da vida dele. Como de fato está em todos nós. Temos ou não temos fé. Mas sua ausência faz toda a dife-rença. A ausência de fé é uma característica marcante do ho-mem moderno. Entorpecido e doutrinado pelo ceticismo, mate-rialismo e hedonismo. Desde cri-ança os homens têm perdido o sentido de suas vidas. O relati-vismo, característica que marca tanto o tempo de Chesterton quanto o nosso, tem escravizado os pensamentos impossibilitan-do-os de navegarem por mares que, apesar de tempestuosos, possuem um - somente um - por-to seguro que é visível ao longe por sua Cruz e pelo estandarte de Nossa Senhora eternamente fixa-dos que servem como farol aos navegantes.

Chesterton sempre retornava à analogia do navegante que no afã de descobrir novas terras vol-tava ao mesmo território. No de-sejo de descobrir novos e refres-

cantes ares retornava ao mesmo lar. Ou, ao caso do homem que cansado de sua casa, vida e famí-lia, decide procurar um local me-lhor para viver e, ao dar a volta ao mundo, descobre o seu antigo lar. “Todo lugar na terra é o co-meço ou o fim, segundo o cora-ção do homem.”2 Chesterton uti-lizava dessas analogias para nos demonstrar que somos muitas vezes esses homens que saem em busca do lar quando muitas vezes estamos nele e nem nos damos conta.

Essas analogias tão recorrentes nas obras de Chesterton expres-sam com clareza o percurso espi-ritual deste ‘grande’ homem. Sua vida foi marcada pelo sincero e apaixonado desejo pela verdade. No bonde (peço a licença para me expressar assim) dos anglo-católicos Chesterton não titube-ou ao pedir parada em frente à Igreja Católica. Ele foi pelas tri-lhas deixadas pelo grande beato

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Chesterton, eterno amigo do

homem

Page 64: Revista In Guardia.3ª edição

Chesterton no Brasil com Diego Guilherme

Newman que apesar de todas as críticas e perseguições largou tudo, inclusive um futuro (garantido) promissor no Angli-canismo. Que mistério é este que orienta a vida dos grandes ho-mens? Se analisarmos bem, ve-remos que o desejo sincero pela Verdade e a Humildade são co-mo a Porta e Fechadura para um novo lar.

“Chesterton é um verdadeiro ho-mo religiosus. Suponho que inu-meráveis de seus leitores não se importem com religião. Sei que a qualidade “literária” de suas obras não se mudou depois de sua conversão ao catolicismo. Que desde então o olhar que ele deita ao mundo se tornou ainda mais profundo, mais alegre e mais seguro, que o seu coração e seu espírito foram ungidos e ace-sos pelo mistério da graça que sacramentalmente penetrou em sua vida. Eis aí uma coisa que só o cristão “interior” percebe, e que percebem, sobretudo aqueles que pessoalmente são atingidos pelo fluido sobrenatural de re-nascimento, irradiado pelo Ches-terton católico.”3

Os escritos de Chesterton são para nós hoje um remédio. São como um fôlego de racionalida-de e bom senso que podemos nos servir para curar e proteger nossa razão dos tantos absurdos que vemos. “Nos seus livros pu-lulam todas as coisas do mundo, mas em dança harmônica, no e-quilíbrio divino reconquistado, que só é possível em torno do centro místico da vida”.“4

Neste ano se encerram excelen-tes novidades que apareceram para os admiradores das obras de Chesterton. Pela primeira vez foi publicada a tradução de Here-ges5; relembramos os 75 anos de falecimento de Chesterton6 e o centenário da obra Sabedoria do Padre Brown7, publicado em 1911. Comemoramos também o primeiro aniversário do site Chesterton Brasil8. São fatos que demonstram claramente que Chesterton é e será um eterno amigo daqueles que desejam a Verdade.

NOTAS

1 CHESTER-T O N , G . K. Ortodoxia. São Paulo: Mun-do Cristão, 2008. p. 58-59

2 C o n -to Homesick at home, do li-vro The Colou-r e d Lands, Londres, 1938. Tradução de Francisco Barbosa de Re-zende.

3 PFLEGER, Karl. Chesterton o aventureiro da Orto-doxia. Tradução de O. Durieux, O.F.M.. Rio de Janeiro: Stella edito-ra, 1943. p. 25

4 Ibdem, (43)

5 Foi publicado pela primeira vez em portu-guês pela editora Ec-clesiae. Tradução de Antônio Emílio An-gueth de Araújo e Már-cia Xavier de Brito.

6 Confira a matéria ‘Iniciativa brasileira recorda os 75 anos do falecimento de Gibert Keith Chesterton’, publicado no site ChestertonBrasil.org

7 Leia o artigo ‘O Centenário da obra A Inocência do Padre’, au-toria de Diego Guilherme da Sil-va, publicado no site Chesterton-Brasil.org

8 Site brasileiro dedicado a pro-mover a divulgação da vida e obra de Gilbert Keith Chester-ton. O site foi inaugurado em dezembro do 2010 e completa um ano de existência. Os saldos são muito animadores, a contar pelo número de visitas de apro-ximadamente 40 mil neste 1º a-no.

Oração pela beatificação de Chesterton em português

Deus Nosso Pai,

Tu que enchestes a vida de teu Servo Gilbert Keith Chesterton com aquele sentido de assombro e alegria, e lhe destes aquela fé

que foi o fundamento de seu in-cessante trabalho, aquela espe-rança que nascia de sua perene gratidão pelo dom da vida hu-mana, aquela caridade para com todos os homens, particularmen-te em relação aos seus adversá-rios; faz com que sua inocência e seu riso, sua constância em combater pela fé cristã em um mundo descrente, sua devoção de toda a vida pela Santíssima Virgem Maria e seu amor por todos os homens, especialmente pelos pobres, concedam alegria a aqueles que se encontram sem esperança, convicção e ardor aos crentes tíbios e o conheci-mento de Deus àqueles que não tem fé.

Te rogamos que nos outorgue os favores que te pedimos por sua intercessão, (e especialmente por....), de maneira que sua san-tidade possa ser reconhecida por todos e a Igreja possa pro-clamá-lo Beato.

Tudo isto te pedimos por Cristo Nosso Senhor.

Amém.

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Page 65: Revista In Guardia.3ª edição

Dicas e Indicações de Literárias com Igson Mendes da Silva.

É de conhecimento que o homem é um animal racional, isto é, um ser pessoal composto de corpo e alma. O corpo e alma do homem são distin-

tos entre si, mas se unem intima-mente para formar um único ser. A alma humana é o princípio vi-tal que comunica ao corpo vida, sensitividade e pensamento. Sa-bemos, efetivamente, que a sim-ples matéria não vive, nem sente, nem pensa. Nós vivemos, senti-mos e pensamos. Logo, devemos ter um princípio que está acima da matéria, a alma.

Infelizmente, as correntes mate-rialistas: epicurismo, positivis-mo, marxismo, niilismo, freudis-mo, existencialismo, desconstru-tivismo francês acabou por con-taminar o meio científico, contri-buindo para o que se conhece hoje por materialismo cientifico.

O materialismo científico afirma só existir matéria em evolução. A mente humana é resultado me-ramente de inúmeras atividades cerebrais. Segundo essa teoria, tudo que vivenciamos é perfeita-mente explicável por causas ma-teriais e o mundo físico é a única realidade possível. Desta forma, a visão sobrenatural em relação ao homem é excluída. Porém, é bom salientar que, não é de com-petência da ciência emitir pare-ceres a este respeito, e se isto acontece, é em função da visão materialista aplicada por trás dos conceitos científicos.

Será mesmo a mente humana resultado meramente de inúme-ras atividades cerebrais?

Como resposta a pergunta, indi-co um ótimo livro escrito por um profundo conhecedor da área neurocientífica. Nele é desmas-carada a visão materialista por

de trás do campo de estudo da mente humana - que visa não só excluir a Deus, mas também, as experiências religiosas, espiritu-ais ou místicas. No livro, O cé-rebro espiritual, do neurocientis-ta Mario Beauregard e da jorna-lista Denyse O’Leary há a con-testação da ciência convencio-nal, além de apresentarem pro-vas que desafiam o pensamento materialista.

Baseado em um estudo com frei-ras carmelitas, Beauregard de-fende a existência de um estado de consciência mística, no qual seria possível vivenciar aspectos da realidade não acessíveis em outros estados, explica como os neurônios atuam durante esse processo. Os autores analisam os recentes esforços para localizar um “gene de Deus” em alguns de nós – visão que tenta reduzir os fenômenos e as praticas espi-rituais a meras atividades cere-brais, ou seja, materiais – e mos-tram como o desenvolvimento do cérebro humano tornou pro-penso a atestar a verdade religio-sa.

O livro trata de temas como: a) Existe um programa de Deus? b) Para uma neurociência espiri-tual. c) Mente e cérebro são i-dênticos? d)Para uma ciência não materialista da mente. e) Quem vive experiências místicas e o que as provoca. e) Foi Deus quem criou o cérebro ou foi o cérebro que criou Deus? f) Os estudos carmelitas: uma nova direção. e etc...

Como explicar os efeitos da vi-vência da fé, a ação da mente sobre a matéria, a intuição as ex-periências místicas? Ao refutar as respostas da ciência tradicio-nal tomada pelo materialismo, O cérebro espiritual, busca desven-dar as verdadeiras origens de to-dos esses mistérios.

O que nos impressiona na leitura é a grande complexidade que é o cérebro humano, demonstrando rastros de um ser perfeitíssimo. Afinal de contas, só um Ser ab-solutamente perfeito, pode criar coisas perfeitas. Nada menos do que a perfeição pode vir de um Ser absolutamente perfeito, e é próprio de um Ser perfeito criar somente coisas perfeitas.

Diante da perfeição do cérebro humano, composto de vários mecanismos complexos, funcio-namento composto de detalhes incríveis, só nos resta crer em um Designer Criador. Designer este que em hipótese alguma seja o acaso, ou até mesmo, “o na-da”; Pois do nada, nada se cria. Excluindo também a própria ma-téria em evolução, tendo em vis-ta a mesma não ser inteligível.

Assim, para os que ainda resis-tem em reconhecer o Ser perfeito por de trás de tão grande obra, a atitude mais nobre seria rever os próprios conceitos e reconhecer um Deus que a tudo criou!

A todos que tiverem a oportuni-dade de ler a obra indicada, óti-ma leitura!

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O cérebro espiritual Mario Beauregard e Denyse O’Leary

Page 66: Revista In Guardia.3ª edição

O Catecismo com Carlos Ramalhete.

O Catecismo de João Paulo II co-meça com uma afirmação curio-sa: “O Homem é ‘capaz’ de Deus” (aspas no

original).

A afirmação é curiosa por várias razões: a primeira delas é que ela poderia ser lida, de maneira ex-tremamente heterodoxa, como significando que o homem, sozi-nho, sem auxílio da graça, pode-ria se salvar. Evidentemente, não é este o sentido do texto; daí as aspas.

Outra coisa curiosa é perceber que esta afirmação inicial não encontra correspondência em catecismos mais antigos, que co-meçam diretamente tratando da virtude da Fé, dom de Deus.

O que fez com que o Santo Pa-dre houvesse julgado convenien-te começar seu catecismo com tal afirmação? Para responder a esta pergunta, é necessário per-ceber as circunstâncias em que foi escrito este catecismo, radi-calmente diferentes das circuns-tâncias dos catecismos anterio-res. Como já dissemos no artigo inicial desta série, cada catecis-mo procura responder às deman-das, aos problemas e às questões de um determinado momento histórico da vida da Igreja e de sua relação com o mundo em que seus filhos vivem, exilados.

A primeira edição deste catecis-mo foi lançada em 1992, quando ainda estava tremendamente viva uma percepção, depois condena-da repetidamente por João Paulo II e por Bento XVI, de que a I-greja seria hoje “outra coisa”, que o Concílio Vaticano II teria mudado a doutrina, jogando ao lixo a Fé de sempre e abrindo as portas para que fosse pregada,

em seu lugar, a “sabedoria deste mundo [, que] é loucura diante de Deus” (1 Cor III,19).

A “sabedoria deste mundo”, no Século XX, consiste na negação de Deus, na negação de Sua pre-sença ou, ao menos, de Sua ação. Dizem os “sábios deste mundo”

que se Deus existe, Ele Se man-tém afastado do mundo, como alguém que tenha criado um me-canismo de relojoaria e deixado com que ele funcionasse sozi-nho.

Ora, isto é flagrantemente falso: a Graça divina age a cada instan-te no mundo, hoje como há mil anos, e é o próprio Deus que mantém em existência tudo o que há. Quem se afasta, nesta relação de Deus e do homem, não é Deus, mas o próprio ho-mem, que O nega e finge que Ele não existe. Este afastamento foi facilitado tremendamente pe-los desenvolvimentos técnicos da sociedade ocidental, que fize-ram com que a sociedade, pela primeira vez na história, pudesse garantir a todos os seus mem-bros condições de subsistência confortável quase sem esforço. Enquanto em qualquer outro mo-mento da história era necessário fiar para ter roupas e plantar para ter comida, na sociedade ociden-tal de hoje a industrialização da produção de gêneros alimentí-

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O Catecismo

Page 67: Revista In Guardia.3ª edição

O Catecismo com Carlos Ramalhete.

cios e da tecelagem fez com que roupas e comida se tornassem praticamente gratuitas. Hoje é possível nunca repetir uma roupa e sempre comer até se empanzi-nar, vivendo apenas de esmolas e vestindo apenas roupas doadas por pessoas caridosas.

Do mesmo modo, as casas de hoje, dotadas de luz elétrica, á-gua encanada, sistemas de esgo-to e outras maravilhas tecnológi-cas ausentes até mesmo no pas-sado próximo fazem com que o conforto físico seja considerado por todos algo natural. Os remé-dios, especialmente os analgési-cos, fazem com que as mazelas físicas pareçam ter desaparecido. A própria morte é quase ignora-da, sendo os moribundos tranca-dos em hospitais para que mor-ram sem testemunhas.

O que temos, portanto, é uma sociedade que procurou, e em grande medida conseguiu, es-conder algumas das consequên-cias mais evidentemente desa-gradáveis do Pecado Original. Foge-se da dor, tem-se pouco trabalho e muitos bens, esconde-se a morte.

Outras consequências, outras de-sordens, são abraçadas pela soci-edade como se fossem bens: é o caso da luxúria, da gula, do or-gulho e de todos os outros peca-dos capitais.

Numa tal sociedade, a impressão que se tem é que o homem não necessita de Deus. Para quê re-correr a Deus, se a farmácia en-trega em casa 24 horas por dia?

Para quê recorrer a Deus, se quando as preocupações se tor-nam demasiadas é sempre possí-vel tomar um calmante e assistir a novela?

É por isso que o Beato João Pau-lo II viu a necessidade de come-çar seu catecismo com a afirma-ção de que Deus não está suma-mente distante; Deus não se reti-rou do mundo. Foi o homem que construiu um mundo em que Deus parece ausente e desneces-sário. O homem, ensina-nos a Igreja, tem inscrito em seu cora-ção um desejo de Deus. Este de-sejo, que a nossa sociedade tenta desviar para o sexo, o dinheiro, o prazer, as drogas, a diversão ou o consumo de bens efêmeros, aponta para o único modo em que o homem pode, realmente, ter vida plena. A vida plena, ao contrário do que quer a sabedori-a deste mundo, não é ter um car-ro novo a cada ano, uma casa num condomínio fechado e cen-tenas de canais de televisão para evitar que se tenha qualquer pen-samento ou preocupação. Vida plena é ser o homem que Deus nos criou para ser, ser em Deus, numa “união íntima e vital” com Ele.

Dentro de nós, lembra-nos o Ca-tecismo, está uma porta que so-mos insistentemente chamados a abrir; uma porta que leva muito além de si mesmo, e mais além ainda do mundo criado. Este chamado incessante de Deus, no coração de cada homem, é um chamado à abertura de uma porta para a Graça da Fé, à abertura de

uma porta que nos leva a sair do tempo e do espaço e mergulhar na Eternidade para a qual fomos criados.

O início do Catecismo de João Paulo II, que continuaremos a examinar nesta série de artigos, aponta que o espetáculo perma-nente de luzes e cores, de praze-res e passatempos da nossa soci-edade é que é a verdadeira dis-tração, a verdadeira prisão. A liberdade verdadeira, de que so-mos, sim, capazes pela graça de Deus, não está nos bens exter-nos, não está nas preocupações do mundo, mas na re-ligação (re-ligio) do homem a Deus, que só pode ocorrer plenamente na religião verdadeira, pois Deus é a Verdade.

Os catecismos anteriores, escri-tos em tempos mais civilizados, não precisavam apontar este fa-to. Não era necessário lembrar que Deus criou o mundo quando o que se via era a obra magnífica da Criação, ao invés de paredes de cimento e pisos de asfalto. Não era necessário lembrar que existe a Providência Divina, quando o normal era plantar para comer e tecer para vestir. Não era necessário lembrar que o ho-mem é chamado por Deus, que o homem é, sim, “capaz” de Deus. Deus está aí, e nos chama. A nós cabe atender ao Seu chamado.

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Page 68: Revista In Guardia.3ª edição

Coluna do Jorge Ferraz.

A Fé é a virtude teologal por cujo meio nós damos a nossa adesão intelectual a tudo aquilo que Deus revelou e a Igreja propõe para crer,

e o fazemos por conta da autori-dade de Deus que, sendo Perfei-tíssimo, não pode enganar-Se e nem nos enganar. Esta é uma de-finição que consta nos catecis-mos clássicos e que, aparente-mente, o homem moderno co-nhece pouco e entende menos ainda. Dela decorrem as respos-tas a muitos dos lugares-comuns errados que infelizmente abun-dam no nosso século XXI, como por exemplo “religião não se dis-cute”, “Fé é uma coisa subjeti-va” ou “eu até que queria acredi-tar, mas não consigo”.

Podemos distinguir aqui três ele-mentos importantes: Fé é “adesão intelectual”; o conteúdo da Fé é “o que Deus revelou e a Igreja propõe”; e damos o nosso assentimento a este patrimônio intelectual “por conta da autori-dade de Deus”. Detenhamo-nos com um pouco mais de calma sobre cada um destes aspectos.

I - Fé é “adesão intelectual”

O ser humano possui uma alma racional com potências intelectiva e volitiva; ou seja, é capaz de conhecer as coisas e é ca-paz de querê-las. Para a a-desão intelec-tual da Fé con-correm estas duas potên-cias: o homem se depara com um conheci-mento e emite sobre ele um juízo de valor que diz “sim, isto é verdadeiro”. Não se trata de um sentimento que se recebe passivamente (como “frio”, “medo” ou “euforia”) e cuja e-xistência independe por comple-to das ações que tomemos ou deixemos de tomar. Ao contrá-rio, para a virtude da Fé concor-rem por um lado a Verdade do Deus que Se revela e, por outro, o homem que toma contato com esta Verdade e diz “sim, Senhor, eu creio”. Diferentemente da dor ou da empatia, a Fé passa pelo

crivo do julgamen-to humano e com-pete ao homem de-cidir-se por ela ou pela descrença. Fé não é sentimento, e sim conhecimento; não é algo que se “sente”, e sim algo que se “sabe”.

Ora, disto decorre que a Fé pode ser transmitida por meio do ensino, como Cristo man-dou aos Apóstolos - «Ide, pois, e ensinai a todas as nações; (...) Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi.» (Mt 28, 19a.20a) - e a Igreja sempre obe-

deceu. E, se é por meio do ensi-no, tratase de um conteúdo que pode ser racionalmente expresso, avaliado e assimilado. Fé não é uma “imposição” cega de uma coisa “absurda” (a Fé, diz-se, supera a razão humana mas não a contraria), mas ao contrário: é a aceitação racional das respos-tas às questões últimas que a I-greja apresenta ao homem que A interroga a respeito de si mesmo e do mundo.

E o que é racional é, por defini-ção, passível de avaliação inte-lectual. O que é racional está su-jeito às regras da lógica e da ra-zão humana e, portanto, à luz destas a Fé Verdadeira pode ser comparada com as outras cren-ças, pode ser provada, pode ser indagada e discutida. Se a Fé é um conjunto de verdades, estas estão sujeitas às mesmas exigên-cias racionais de qualquer outro conhecimento: não podem ser contraditórias ou irracionais de nenhuma maneira. Assim a Fé, enquanto modalidade de conhe-cimento, é passível de ser ensi-nada, argumentada, discutida, argüida e comparada, até que o homem se convença de sua razo-abilidade frente às objeções que porventura se levantem contra ela.

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As razões da nossa FéAs razões da nossa FéAs razões da nossa FéAs razões da nossa Fé

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Coluna do Jorge Ferraz.

Disto decorre também, como di-zíamos, que Fé não é sentimento. Ora, o sentimento não pode ser “ensinado” e nem ninguém pode propriamente “produzir” senti-mento algum em si ou em ou-trem. Se a Fé pode ser racional-mente transmitida - e já vimos que ela o pode -, então ela é de natureza racional. É possível ir mais além e dizer que Fé é o contrário mesmo de algo que se “sente”. Tomemos, p.ex., a San-tíssima Eucaristia: n’Ela está presente Nosso Senhor em Cor-po, Sangue, Alma e Divindade. E isto, convém repetir, não se “sente”; isto se sabe. Os senti-dos, ao contrário, enganam, e só são capazes de perceber as apa-rências do pão e do vinho. É por isto que a Igreja canta: Praestet fides supplementum sensuum de-fectui. Ou seja, a Fé vem justa-mente suprir a deficiência dos sentidos. Trata-se de uma ilumi-nação da inteligência que lhe confere um conhecimento que, pelos sentidos, ela não é capaz de obter.

II - Tem-se Fé naquilo “que Deus revelou e a Igreja pro-põe”

Também o conteúdo da Fé não é “qualquer coisa”, nem muito me-nos uma coisa “pessoal” e “subjetiva”, uma “experiência de vida” nem nada do tipo. A Fé é uma Doutrina, cujo conteúdo é objetivo e se resume àquilo que Nosso Senhor Jesus Cristo reve-

lou aos Apósto-los quan-do esteve neste mundo e, desde então, a Igreja preserva e trans-mite. Tratam-se de verdades acessí-veis a todos os homens e que são iguais para todos os que crêem. Só existe a “minha Fé” enquanto esta ex-pressão se refere à Fé da Igreja.

A Fé, naquilo que lhe é próprio, exclui todas as opiniões: nela não há espaço para “eu acho as-sim”, “eu penso diferente”, “é questão de ponto de vista”. A legítima guardiã da Sã Doutrina é a Igreja Católica com o Seu

Magistério: é portanto o Papa em união com os bispos quem tem autoridade para dizer o que faz parte da Fé e o que não faz, bem como em que sentido tal ou qual ponto deve ser entendido. Este é um dos fins próprios da Igreja fundada por Nosso Senhor: ga-rantir a correta transmissão da Verdade revelada, assegurar-se de que a Sã Doutrina seja trans-mitida com integridade ao longo

dos séculos sem acréscimos nem supressões.

É importante notar que há um nexo inseparável entre aquilo “que Deus revelou” e o que “a Igreja propõe para crer”. Não são duas coisas opostas ou mes-mo complementares: trata-se de uma só e a mesma coisa. Aquilo que Deus revelou é exatamente o que a Sua Igreja, «Coluna e Sus-tentáculo da Verdade» (1Tm 3, 15), propõe para que seja crido; e aquilo que a Igreja de Cristo propõe à crença dos fiéis é exa-tamente o que Deus revelou. A infalibilidade da Igreja garante que, no tocante à Revelação, na-da será suprimido (e, portanto, tudo o que foi revelado a Igreja propõe para crer) e nem nada será acrescentado (de modo que tudo o que a Igreja propõe para crer foi de fato revelado). Esta garantia é o que nos confere a segurança de sabermos, sem pos-sibilidade de erro, exatamente em quê devemos acreditar. Sem ela, esvaziar-se-ia a Fé de toda a objetividade e estaria reduzida à miséria das limitações intelectu-ais de cada um de nós.

III - Nós acreditamos “por conta da autoridade de Deus”

Um outro aspecto precisa ser considerado porque, sem ele, correríamos o risco de transfor-mar a Fé em algo exageradamen-te humano, demasiadamente na-tural, perigosamente horizontal. A Fé, não o podemos jamais es-quecer, trata-se de uma resposta do homem a Deus; portanto, a razão de crermos não está no fa-to de que as verdades apresenta-das à nossa inteligência são lógi-cas, plausíveis ou agradáveis.

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A Praça de São Pedro pretende ser grandes braços que abraçam todos os católicos em torno da única e verdadeira fé. Unidade: a proposta de Cristo seguida pela Igreja.

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Coluna do Jorge Ferraz.

Ora, o que é verdadeiro é sem dúvidas lógico e plausível, e a história da Salvação contada pe-lo Cristianismo é indubitavel-mente agradável; enganar-se-ia, no entanto, quem achasse que basta isso para produzir um ver-dadeiro ato de Fé.

Se tal fosse assim, a Fé seria al-go de “automático”: todos os que tivessem conhecimento so-bre o catolicismo teriam ipso facto a Fé Verdadeira, e isto não é verdade. A Fé não basta ser conhecida; precisa ser acreditada e, com isso, queremos afirmar a imperiosa necessidade de se di-zer “Senhor, eu creio que é as-sim, porque assim Tu revelaste”. A Fé nos fala de muitas coisas que, embora perfeitamente coe-rentes, não são objeto de intui-ção imediata, de raciocínio dedu-tivo ou de experimentação pelos sentidos: coisas como a Reden-ção ou os Novíssimos, por e-xemplo, não são evidentes por si mesmas. Não basta, portanto, conhecê-las: é preciso responder a Deus que se tem tais coisas por verdadeiras porque Ele disse que elas eram assim, em sujeição à autoridade d’Aquele que é a pró-pria Verdade. Assim se completa a resposta do homem a Deus, assim a Fé transcende a simples razão e põe a natureza humana em contato com o Deus Altíssi-

mo: Senhor, tu és a Verdade. Se-nhor, tu disseste que é assim. Se-nhor, eu acredito que é assim.

IV - Conclusão

Nosso Senhor Jesus Cristo veio ao mundo para revelar uma série de coisas aos homens. Ele pró-prio disse que era «o Caminho, a Verdade e a Vida» (Jo 14, 6) e, sendo Deus, Ele não pode men-tir. Estas coisas que Ele ensinou foram confiadas à Igreja Católi-ca para que Ela as ensinasse a todos os homens de todos os

tempos; portanto, é por meio da Igreja que nós temos contato com a Doutrina legada por Cris-to aos Apóstolos, e é a esta Dou-trina que nós temos que dar a nossa adesão para que se com-plete assim o nosso ato de Fé, através do qual nós podemos en-trar em contato com o Deus que é nosso Criador e nosso Reden-tor.

Não estamos sozinhos neste mundo, nem estamos perdidos num mar de opiniões duvidosas ou impressões particulares sem que nos seja possível saber onde está a Verdade. Ela pode ser en-contrada no ensinamento público da Igreja fundada por Nosso Se-nhor, e a sua veracidade pode ser posta à prova pelo testemunho dos cristãos de todos os tempos. E, como sustentáculo deste edifí-cio intelectual, nós podemos en-contrar o Deus que é Criador do mundo e que nos revela todas estas coisas; o Deus que nos cha-ma a Si e ao Qual é imperativo darmos uma resposta. Oxalá possamos permanecer cada vez mais firmes nesta Fé que Nosso Senhor nos deixou para que pu-desse conduzir-nos a Ele; e oxalá possamos responder-Lhe a cada dia mais convictamente: “Sim, Senhor, Tu és a Verdade, e eu creio em Ti!”.

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Exegetica Expositio com Ian Farias.

No domingo úl-timo do Tempo Comum, a Igre-ja convida-nos a celebrarmos a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo,

Rei do Universo, instituída pelo Papa Pio XI, de venerável me-mória. Este convite é propício em um período histórico singu-lar, onde mais do que nunca so-mos chamados a reafirmarmos o primado e a soberania do reinado de Jesus Cristo sobre todos os homens e todas as coisas. Toda a história tem início em Deus, e nEle terá o seu fim, e a vida do homem só tem verdadeiro senti-do se estiver subordinada a seu salvífico desígnio. Na hodierna sociedade que tende a endeusar o que é próprio do homem, e até mesmo o homem em si, este re-conhecimento da realeza de Nos-so Senhor, faz-nos recordar que sem Deus o homem perde o seu sentido existencial, e cai em um

profundo vazio, um nada pelo qual será tomado. Recorda-nos isso o Sumo Pontífice Bento XVI, de feliz reinado, na sua Carta Encíclica Spe Salvi, sobre a esperança cristã (cf. nº 2). So-mente há esperança, somente há vida, onde Deus se fizer presen-te. Por outro lado, onde os ho-mens excluem Deus nada poderá gerar senão morte e destruição. E tudo isso tem como conse-quência a queda do homem em um abismo do qual não sairá sem que antes reconheça a ne-cessidade de Deus. Nesse senti-do é que a oração nos convida a rezarmos para que “todas as cria-turas, libertas da escravidão e servindo à vossa majestade, vos glorifiquem eternamen-te” (Oração da Coleta na Soleni-dade de Cristo Rei). De nossa parte, bons ou maus, somos sú-ditos. Aos que agem corretamen-te serão chamados a comparti-lharem com o Senhor de uma eterna alegria.

Na primeira leitura do livro de Ezequiel, vemos a censura que o profeta faz aos crimes dos pasto-res, reis e chefes leigos do povo. O Senhor, diante de toda aquela situação, ordena que Ezequiel clame contra esses “pastores de si mesmo”, que visam apenas o seu bem estar, a sua comodida-

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Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo.

Page 72: Revista In Guardia.3ª edição

Exegetica Expositio com Ian Farias.

de, e desta forma quebram os laços de relacionamento com o próximo e afastam-se dEle por descumprirem uma promessa. Avisa o Senhor que tirará, des-tes, o pastoreio e apascentará Ele mesmo o Seu rebanho: “Eu mes-mo vou procurar minhas ovelhas e tomar conta delas” (v. 11). Gostaria de debruçar-me por um momento sobre a figura do pas-tor.

Esta figura está presente, segun-do as Escrituras, desde o começo do mundo, quando Abel apre-senta ao Senhor o fruto de seu trabalho: as ovelhas; Caim, por sua vez, apresenta os frutos da terra que cultivava (cf. Gn 4, 3-4). O Senhor olha com maior a-grado para a oferta de Abel, o que acaba por gerar uma inveja em Caim, que mata o seu irmão. Essa história reflete uma atitude de hostilidade perpétua entre pastores e camponeses. “O culti-vo da terra restringe o direito de livre pastagem de rebanhos, e o pastoreio danifica as terras e co-lheitas do campo. O camponês pensa que o pastor é um bandido faminto; o pastor pensa que o camponês é um cavador mesqui-nho” (McKenzie, Jhon L., Dicio-nário Bíblico. São Paulo: Ed. Paulinas, 1983, p. 697).

Também o Senhor é caracteriza-do como o pastor por excelência, e de várias formas nos é apresen-tada seu modelo, por assim di-zer, de pastoreio. A mais conhe-cida é a representação israelita, descrita na forma clássica do sal-

mo 23: Aquele que guia as ovelhas, que as faz repousar nas verdes pas-tagens, que as guarda de todos os perigos seja na mesa com os inimigos, seja ainda no trânsito pelo vale da sombra da morte e, enfim, vem a certeza de que quem possui o Senhor, possui a verdadeira felicidade.

No Novo Testamento a figura do pastor reduz-se em relação ao Antigo, porém um dos textos que por nós é conhecido e tão caro é o do Evan-gelho de São João, capí-tulo 10. Jesus mesmo apresenta-se como o

“Bom Pastor”, que vem indicar o caminho às ovelhas e alertar contra os falsos pastores. Alguns exegetas afirmam que essa pas-sagem não teria sido dita pelo próprio Cristo, mas fora ali a-crescentada pela comunidade joanina. É preciso que tenhamos em mente, porém, que ainda que essas palavras não tenham sido ditas pelo próprio Cristo, elas são também pertencentes da Re-velação e não menos são Palavra de Deus.

Os pastores da ho-dierna sociedade, chamados por Cris-to para apascentar o Seu rebanho, preci-sam configurar-se a Cristo, e tal qual ouvira os pastores da época de Eze-quiel, precisam pas-torear o povo de Deus, e não busca-rem conforto e pri-vilégio. Aliás, cabe aqui recordar a fra-se do Santo Padre Bento XVI: “Jamais devemos esquecer – como sacerdotes – que a única ascensão le-gítima em direção ao ministério pas-toral não é aquela do sucesso, mas da Cruz” (Celebração das Vésperas com os estudantes da Universidade Pon-tifícias de Roma,

pelo início do Ano Acadêmico, 4 de novembro de 2011). Aos meus irmãos seminaristas peço, com a santa humildade, que me-ditem na figura do Bom Pastor, capaz de doar-Se sem reservas por suas ovelhas. Devemos dar alegria a Cristo pelo serviço que prestaremos a Ele e a Igreja. A-bandonemos a busca pelos pra-zeres e busquemos a verdadeira felicidade, que tem um nome: Cristo Jesus. Nosso protótipo é Ele, e um padre que nEle não fixa o Seu olhar, não conhece o verdadeiro sentido do sacerdó-cio.

Qual seriam as atitudes do sacer-dote, que deveriam condizer com a sua missão? A primeira leitura apresentar-nos-á: “Vou procurar a ovelha perdida, reconduzir a extraviada, enfaixar a da perna quebrada, fortalecer a doente e vigiar a ovelha gorda e forte. Vou apascenta-la conforme o direito” (Ez 34, 16). Eis o mode-lo ideal! Cristo é por excelência este pastor. Duas coisas a indicar e que são essencialmente signifi-cativas para uma boa vida pres-biteral: O zelo pastoral, firmado pelo cuidado com as ovelhas e a unidade com a Igreja, que pode-ríamos associar ao Direito.

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Exegetica Expositio com Ian Farias.

Na segunda leitura São Paulo, para falar do Reino de Cristo faz antes uma referência à sua morte e ressurreição. Tal referência le-va-nos imediatamente a pensar que Cristo deveria sujeitar-se à morte para manifestar a plenitu-de de sua realeza. Isso não seria necessário Àquele que é Deus, mas Ele, por vontade do Pai e em comunhão com o Pai, quis sujeitar-se à morte, não para a-possar-se da Sua realeza, pois desde sempre a teve e para sem-pre a terá, senão para manifestá-la aos homens. Desta forma tor-na-se compreensível que o reina-do de Cristo não é da matéria e do poder, mas da humildade e do serviço, do amor e da misericór-dia. E aqueles que acham que a salvação depende apenas disso estão enganados, pois é de con-vir que haja ricos humildes e que sabem o valor do amor, mas há também pobres orgulhosos e presunçosos. Por isso bem diz São Tiago: “Fides sine operibus mortua est – A fé sem obras é morta” (Tg 2, 26).

A profundidade teológica pela qual esta exortação paulina vem amparada é belíssima. A morte não deve ser motivo para deses-perarmos, mas ao contrário, se confiarmos na certeza da nossa ressurreição em Cristo ela tor-nar-se-nos-á motivo de alegria e esperança, a ponto de já agora sermos chamados a configurar nossas vidas a Ele. Assim o Rei-no de Deus, mais do que realida-de escatológica, fala aos homens agora, é, de certa forma, uma re-alidade já manifesta.

“Como em Adão todos morre-ram, assim também em Cristo todos reviverão. Porém, cada qual segundo uma ordem deter-minada: Em primeiro lugar, Cristo, como primícias; depois, os que pertencem a Cristo, por ocasião de sua vinda. A seguir, será o fim, quando ele entregar a realeza a Deus-Pai, depois de destruir todo principado e todo poder e força” (1Cor 15, 22-24).

A morte vem pelo pecado. O pe-cado entrou no mundo por meio dos nossos primeiros pais e tam-bém foi herdado por nós, que-brando os nossos laços com Deus. Cristo, reconciliador de todas as coisas (cf. Cl 1, 20), é tido como “primícias”. Primícias

(primitiae, do latim), designa tudo o que precede a alguma coi-sa. Essas primícias são de certa forma relacionadas à sua primo-genitura. Ele é o “primogênito de toda a criação” (Cl 1, 15), que ressuscita para que um dia tam-bém nós possamos ressuscitar. Devemos, no entanto, entender que a primogenitura de Cristo não se converge para a mentali-dade de que Ele também tenha sido também criado. De fato, não fora Ele criado, mas gerado, e possui a mesma substância do Pai, como comumente professa-mos no Credo Niceno-Constantinopolitano. Daí que sua primogenitura seja conferida pelo Pai, dando-Lhe supremacia entre os homens. O seu Sacrifí-cio é uma oferta agradável a Deus, e Neste encontram-se a Redenção e a salvação.

Em segundo vêm a ressurreição final, que dar-se-á no advento definitivo de Nosso Senhor, em sua Parusia, pela qual todos pas-saremos, e quando Jesus entrega-rá a “realeza a Deus-Pai”. Inte-ressante essa afirmação paulina, pois entra em sintonia com a passagem evangélica desta Sole-nidade, que é sobre o Juízo uni-versal. Esta situa-se na conclu-são do discurso escatológico em Mateus e ele descreve-a como a gloriosa vinda do Senhor, rei-messias. Também está em um intrínseco relacionamento com a primeira leitura, já meditada. É bem provável que também esta parábola não tenha sido contada por Jesus, mas venha da Tradi-

ção anterior, daí que ao se falar do trono de glória o Rei é Deus, e tenha apenas sido inserida com alguns ajustes por Mateus, inclu-sive da realeza de Jesus.

Em nenhum momento Jesus se identifica como rei e nunca rei-vindicou para Si esses títulos. Mas diz Ele: “Quando o Filho do Homem vier em sua gló-ria” (Mt 25, 31). Não diz: “Quando Eu vier em minha gló-ria”, mas usa um termo com o qual referia-Se a Si próprio: Fi-lho do Homem (ben Adam, ב ן

) . א ד ם E este Filho é retratado na parábola como Aquele que ocu-pa o trono do Rei: Deus.

Esta expressão, apesar de ser misteriosa, é utilizada comumen-te no judaísmo quando denota um ser humano, uma pessoa. Quando usado no plural (bnei Adam, ב נ י א ד ם ( faz-se referência a humanidade.

O Papa Bento XVI, em seu livro Jesus de Nazaré afirma: “Distinguem-se normalmente três grupos de palavras sobre o Filho do homem. O primeiro grupo consiste em palavras sobre o Filho do homem que vai che-gar, nas quais Jesus não se de-signa a si mesmo como sendo este Filho do homem, mas, con-trariamente, distingue-se dele. O segundo grupo é formado por palavras sobre a ação terrena do Filho do homem; o terceiro fala dos seus sofrimentos e da sua ressurreição” (Ed. Planeta, p. 274).

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Exegetica Expositio com Ian Farias.

Vindo então o Filho do homem, acompanhado de todos os anjos e sentado em seu trono glorioso, “todos os povos da terra serão reunidos diante dele, e ele sepa-rará uns dos outros, assim como o pastor separa a ovelha dos ca-britos. E colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua es-querda” (Mt. 25, 32).Todas as nações serão julgadas, fica-se claro isto! E todos receberão a sentença merecida. Aos bons é dado o Reino celestial, aos maus é dado o “fogo eterno, preparado para o diabo e para os seus an-jos” (Mt 25, 41). Sobre esta vin-da, afirma o Padre Julien Thiriet: “Eles verão o Filho do Homem vindo com grande poder e ma-jestade. Ou seja, com força in-vencível, para confundir e casti-gar Seus inimigos, mas também com uma glória resplandecente, uma majestade divina, para re-compensar e coroar Seus eleitos. Assim, depois de ter aparecido sob uma forma humilde e des-prezível na Sua primeira vinda, aparecerá na última vinda como poderoso Rei e soberano Senhor do Céu e da terra. Todos os ho-mens verão em Seu Corpo as gloriosas cicatrizes de Suas cha-gas, e os pecadores, conforme disse o profeta Zacarias, reco-nhecerão Aquele que transpas-saram” (Explication des Evan-gelis du dimanche. Hong Kong: Société des Missions Étrangères, 1920, p.2).

“O Rei dirá aos da direita: ‘Vinde, benditos de meu Pai!

Recebei como herança o Reino que meu Pai vos preparou desde a criação do mundo... ’” (Mt 25, 34). A seguir Jesus enumera as obras de misericórdia corporais pelas quais foram salvos. O con-vite é feito apenas aos da direita

para participarem com Cristo das eternas alegrias, não a todos, pois muitos preferiram se ausen-tar de sua missão. Também a nós o Senhor dirige-se: Vinde! E nós, iremos? Se também tiver-mos praticado as obras de mise-ricórdia e tivermos humildade para reconhecermos o quão in-digno somos não seremos menos dignos de entrar com Ele para as eternas alegrias.

No entanto, cabe-nos aqui a per-gunta: Que Reino é este prepara-do aos eleitos? Existem três di-mensões desta contemplação do Reino. Em primeiro lugar vemos a dimensão cristológica, caracte-rizada por Orígenes. Jesus Cristo

traz o Reino de Deus consigo; Ele é o próprio Reino (autobasiléia). O segundo aspec-to, também apresentado por Orí-genes, vê o Reino de Deus situa-do no interior do homem. O ho-mem traz consigo o Reino de Deus. E o terceiro e último ponto é o Reino de Deus eclesiológico, ou seja, o Reino de Deus que é prefigurado já na Igreja. Se por um lado estes são distintos em certos aspectos, por outro são muito ligados.

As novas mentalidades teológi-cas que estão em desacordo com a Doutrina da Igreja, afirmam que o Reino de Deus é uma uto-pia e que ele deve ter uma con-sumação agora, visível. Ora, os que assim pensam esvaziam e deturpa o verdadeiro sentido deste Reino. O Reino de Deus não é instrumento de revolução social e não pode ser pensando assim.

Em contrapartida o Rei dirá aos da esquerda: “Afastai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno preparado para o diabo e para os seus anjos” (Mt 25, 41). Terrível hora, caríssimos! Queira Deus que dela sejamos oposito-res! Não deixemos os pequeni-nos de Nosso Senhor à margem do nosso trabalho cristão. Não nos hesitemos das práticas de misericórdia corporais. Lembre-mo-nos da frase insistente e salu-tar de Jesus: “Todas as vezes que não fizestes isso a um desses pe-queninos, foi a mim que não o fizestes” (v. 45).

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No entanto, cabe-nos aqui a pergunta: Que Reino é este prepara-do aos elei-tos?

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Coluna do Prof. Ivanaldo

Nos últimos tempos tem se falado muito em Estado laico. É como se o Estado tivesse se transfor-mado em laico a

poucos meses ou a apenas al-guns anos atrás. No entanto, a laicidade do Estado vem sendo construída desde a Idade Média. Oficialmente ela consiste no fato do Estado não ter uma religião oficial. Com isso, o Estado deve ser acessível a todos os indiví-duos e a todas as confissões reli-giosas. É preciso deixar claro que Estado laico não significa, em hipótese alguma, Estado a-teu, antirreligioso e perseguidor da liberdade de culto e da ex-pressão religiosa. O Estado laico não tem uma religião oficial, mas ele deve, em tese, respeitar todas as religiões.

O problema é que atual-mente a expressão “Estado lai-co” está sendo interpretada de forma diferente. Está sendo am-plamente divulgado que o Esta-do laico representa a completa separação entre os direitos do cidadão – o exercício da cidada-nia – e a prática religiosa. Essa divulgação é feita, por exemplo, na mídia, na universidade e até

mesmo dentro do judiciário.

Nada mais precon-ceituoso do que afirmar que o Estado laico repre-senta a com-pleta separa-ção entre os direitos do cidadão e a prática religi-osa. Imagi-nem a seguin-te situação. O Estado chega para uma pes-soa e pergun-ta: você tem alguma religião? Se a pessoa dizer “Sim”, então ela não terá qualquer direito como cidadã. Com isso, o direito a ci-dadania está reservado a uma minoria de aproximadamente 3% da população que não seguem uma religião ou não acreditam em Deus. Uma minoria que ofi-cialmente é ateia ou agnóstica.

Essa história de que o Esta-do laico representa a completa separação entre os direitos do cidadão e a prática religiosa não

passa de uma forma de dis-criminar a grande maio-ria da popula-ção que crer em Deus e não está satis-feita com os rumos que a elite política está dando a sociedade. Trata-se da grande maio-ria do povo que, de forma preconceituo-

sa, é rotulado de conservador e fundamentalista. Atualmente u-ma elite que se alto proclama de esclarecida e revolucionária, está querendo que a grande maioria da população seja sistematica-mente retirada do exercício da cidadania. Tudo porque a popu-lação crer em Deus e prática al-guma religião. Trata-se da tirania de uma elite de ateus e antirreli-giosos.

Infelizmente a atual socie-dade não está dando um passo rumo ao aprimoramento da de-mocracia e da cidadania. Pelo contrário, estamos voltando à época da revolução francesa, no século XVIII, onde os jacobinos desejavam, a qualquer custo, em nome da razão, destruir toda e qualquer manifestação religiosa. Os jacobinos eram radicais que acreditavam que a razão era a única a guiar o homem. Por cau-sa disso não haveria a fé ou qual-quer outro valor religioso. Eles perseguiram duramente a religi-ão, especialmente os cristãos, e estabeleceram um regime de o-pressão e autoritarismo.

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O Estado laico e a discriminação religiosa

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Coluna do Prof. Ivanaldo

O problema é que os ve-lhos jacobinos estão de volta. Eles voltaram disfarçados de no-va esquerda, de esquerda cultu-ral, de esquerda light e outros adjetivos. No entanto, ninguém deve se enganar com a nova es-querda, a esquerda light. Ela tem os mesmos ideais e os mesmos preconceitos dos jacobinos. Para a nova esquerda a grande maiori-a da população, que crer em Deus e tem alguma prática reli-giosa, não passa de uma massa de alienados e conservadores, uma massa de incultos que não são guiados unicamente pela ra-zão. O que fazer com a grande maioria da população que tem vida religiosa? Para a nova es-querda, assim como para os ja-cobinos, a resposta é simples: negar qualquer direito de cidada-nia. Para a nova esquerda a cida-dania é para quem rejeitou qual-quer vinculação religiosa. O Es-tado que a nova esquerda quer construir, assim como o Estado construído pelos jacobinos du-rante a revolução francesa, é es-sencialmente antirreligioso. É por causa disso que atualmente anda-se espalhando, em diversos ambientes sociais, esse mito de que o Estado laico representa a

completa separação entre os di-reitos do cidadão e a prática reli-giosa. Se isso realmente aconte-cer estaremos revivendo a época do terror que os jacobinos esta-beleceram na França no século XVIII, onde, por exemplo, reali-zar uma demonstração pública de fé (orar, ler Bíblia ir a igreja, etc) era proibido.

Ao invés da nova esquerda tentar recriar os velhos precon-ceitos dos jacobinos, ela deveria lutar para que o Estado laico possa incorporar as religiões

dentro de suas políticas a ações. Ao invés de ficar rotulando a grande maioria da população de “conservadora” e “fundamentalista”, a nova es-querda deveria ver que essa po-pulação tem o direito de crer em Deus e ter uma vivência religio-sa. Esse direito tem que ser res-peitado. Numa sociedade verda-deiramente democrática não se elimina direitos, mas se convive com o diferente.

O Estado laico, em hipóte-se alguma, é uma negação dos direitos sociais dos crestes, mas, pelo contrário, representa a real possibilidade de participação so-cial e política dos fiéis. É por causa disso que, dentro do Esta-do laico, os fiéis podem ir para as ruas e protestarem contra o aborto, a eutanásia e outras práti-cas contrárias a dignidade da vi-da humana. Também é por causa disso que os fiéis podem votar e, com isso, eleger políticos que tenham profundas convicções religiosas. O Estado laico é para ser uma porta para a participação social dos fiéis e não o contrário, ou seja, uma forma de eliminar, de proibir a participação dos fi-éis.

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O Estado que a nova esquerda quer construir, assim como o Estado cons-truído pelos jacobinos durante a re-volução francesa, é essencialmente antirreligioso. É por causa disso que atualmente anda-se espalhando, em diversos ambientes sociais, esse mito de que o Estado laico representa a completa separação entre os direitos do cidadão e a prática religiosa.

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Blogs, Sites e páginas on line.

Blogs e Sites

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Indicações e Dicas

http://www.vatican.va/phome_po.htm

www.salvemaliturgia.com

http://blogdoemanueljr.blogspot.com

http://www.gazetadopovo.com.br/blog/tubodeensaio

http://www.movimentoliturgico.com.br

http://www.zelusdomustuae.com http://sociedadecatolica.com.br

http://www.chestertonbrasil.org

http://www.inguardia.blogspot.com

www.paraclitus.com.br

http://www.reinodavirgem.com.br/

http://www.reinodemaria.com/