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Ditadura Nunca Mais

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Page 1: Revista Especial Golpe Militar de 1964
Page 2: Revista Especial Golpe Militar de 1964

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ANA LUTA

Líder da Bancada: Deputado Vicentinho (SP)

Chefe de Gabinete: Marcus Braga - Coordenação da Imprensa: Denise Camarano (Editora-chefe); Paulo Paiva Nogueira (Assessoria de Imprensa) - Editores: Vânia Rodrigues e Tarciano Ricarto

Redação: Benildes Rodrigues, Gizele Benitz, Héber Carvalho, Rogério Tomaz Jr., Tarciano Ricarto, Vânia Rodrigues e Késia Oliveira (estagiária) - Rádio PT: Ana Cláudia Feltrim , Chico Pereira e Ivana Figueiredo

Fotógrafos: Gustavo Bezerra e Salu Parente Video: João Abreu - Projeto Gráfico: Sandro Mendes - Diagramação: Sandro Mendes e Ronaldo Martins - Web designer e designer gráfico: Claudia Barreiros

Secretárias de Imprensa: Maria das Graças e Maria do Carmo - Colaboração: Assessores dos gabinetes parlamentares e da Liderança do PT.EX

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Completa-se agora meio sécu-lo do Golpe Militar que manchoua história brasileira, torpedeandoa democracia e os direitos dostrabalhadores. Foram longos esombrios 21 anos, resultado daunião entre forças do atraso comgrupos estrangeiros, sob as dire-trizes da CIA, num alinhamentoautomático com os interesses dosEstados Unidos, no âmbito da

Guerra Fria. Transformou-se o Brasil num País sem voz noconcerto das nações, sem projeto nacional, sem distribui-ção de renda e justiça social.

Sob a égide do anticomunismo, ao amparo de uma draconia-na Lei de Segurança Nacional, direitos humanos foram ignora-dos, adotando-se o uso sistemático da tortura, desaparecimen-tos e assassinatos. O rompimento constitucional no Brasil abriucaminho para uma sequência de golpes na América Latina.

Foram tempos tristes, em que empresas apoiaram finan-ceiramente o golpe e, posteriormente, deram suporte à re-pressão, divulgando informações sobre seus funcionários paraos agentes da ditadura, ampliando a exploração de classe paraacelerar a acumulação capitalista.

A classe trabalhadora sentiu na carne a repressão. Muitasvítimas tombaram na resistência ao regime de exceção, comoo companheiro Manuel Fiel Filho, Rubens Paiva, Vladmir Her-zog e tantos outros. Rendemos nossas homenagens aos he-róis da resistência e nos solidarizamos com seus familiares,muitos dos quais sem o direito básico de sepultar os restosmortais de seus entes queridos, que “desapareceram” depoisde presos por forças do Estado.

Outros foram vítimas da violência da tortura, como a pre-sidenta Dilma Rousseff, exemplo de fibra e determinação eque chegou, pela via democrática, ao cargo. Pelo voto do povobrasileiro, e não por articulações golpistas na calada da noite,

Lições de 1964com apoio das armas dos quartéis, comanda um governo queconsolida um projeto transformador, com crescimento, dis-tribuição de renda e justiça social. Dai extraímos a principallição: é pela democracia que levaremos o Brasil a um plenodesenvolvimento econômico e cultural, com sustentabilida-de e respeito aos interesses nacionais.

Vivemos o nosso mais longo período democrático, con-quistado pela luta de diferentes segmentos da sociedade bra-sileira. Nós, os trabalhadores, tivemos papel estratégico, apartir de amplas mobilizações contra o arrocho salarial e emfavor do respeito aos direitos humanos. Cito o papel de Lula,companheiro e ex-presidente da República, uma liderançaatuante e de destaque na defesa dos trabalhadores, que,como presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Ber-nardo e Diadema, liderou a greve de trabalhadores em ple-na Ditadura Militar, marcando definitivamente o ressurgi-mento do movimento sindical classista no Brasil. E que deuenorme contribuição para a abertura política e o processode redemocratização do País.

Foi ali que percebemos os limites da ação sindical e a necessi-dade de organizar uma ampliação da mobilização social para, jun-tamente com muitos companheiros sindicalistas, criarmos em 10de fevereiro de 1980 o Partido dos Trabalhadores.

Há 34 anos, temos no Brasil um partido político nascido apartir dos trabalhadores, para a defesa dos interesses dos tra-balhadores e de toda a sociedade. E com o oxigênio da demo-cracia, que tem que ser aprofundada, com medidas como umaprofunda reforma política e tributária, ampliação dos direitosdos trabalhadores e tantos outros desafios, muitos presentesna agenda do governo deposto em 1964.

Como se vê, há tarefas que estão na agenda há cinquentaanos, e vamos realizá-las. Para um País mais democrático ejusto, que enterrou de vez um passado sombrio e macabro.

Deputado Vicentinho (SP)

Líder da Bancada do PT na Câmara

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Obscurantismo, autoritarismo, fim das liberdades civis, repres-são, tortura, sequestros, perseguição, assassinatos, cassações, Con-gresso fechado, Judiciário tutelado, imprensa censurada ou cúm-plice do regime, terrorismo de Estado... Em maior ou menor medi-da, tais práticas vigoraram no Brasil entre 1964 e 1985. Um perío-do onde a democracia foi sufocada e deixou marcas e sequelasainda hoje sentidas na vida da sociedade brasileira.

Após intenso processo de industrialização e urbanização nosanos 50, além de um grande avanço no campo dos direitos tra-balhistas, o Brasil de 1964 preparava-se para dar um passo adi-ante e desfrutar do desenvolvimento também no aspecto social,e não apenas no setor econômico. O então presidente João Gou-lart apresentou à nação as propostas para as chamadas “refor-mas de base”: reforma agrária, reforma educacional e mudançasestruturais nas áreas tributária e administrativa, entre outras.

Enquanto Goulart dialogava com a população em comícios eoutras atividades, setores da direita reacionária nas Forças Ar-madas e na sociedade civil já conspiravam para derrubar o gover-no. “O golpe foi desferido pelo mesmo grupo de militares queimpediu a posse do vice-presidente João Goulart como previa aConstituição, em agosto de 1961”, lembrou o deputado NilmárioMiranda (PT-MG) em discurso, na Câmara, sobre os 50 anos dogolpe que instaurou a ditadura. Nilmário é ex-ministro da Secre-taria de Direitos Humanos e vice-presidente da Comissão de Di-

reitos Humanos da Câmara.Conforme mostram pesquisas do

Ibope jamais divulgadas, mas desco-bertas pelo pesquisador Luiz AntonioDias e publicadas no livro “O jornalis-mo e o Golpe de 1964: 50 anos depois”,Jango tinha amplo apoio da socieda-de, inclusive nas grandes cidades e nasclasses mais abastadas, para realizar asreformas. Em vez disso, a partir do gol-pe, que teve participação direta e de-cisiva do governo dos Estados Unidos

Triste memória: Golpe Militar de 1964 calouo País com repressão, torturas e mortes

Vitórias de Lula e Dilma simbolizam aprovação popular à luta contra a Ditadura MilitarPara parlamentares do PT, as três vitórias consecutivas

nas eleições presidenciais desde 2002 também são frutodas lutas de enfrentamento e resistência à ditadura. OPartido dos Trabalhadores nasceu em 1980, mas suasraízes são bem anteriores a esse momento e estão nosmovimentos sindical, camponês, estudantil, docente, co-

munitário, entre muitos outros setores da sociedade.“A esquerda, os democratas e progressistas foram

aqueles que resistiram ao Golpe de 64. O partidosurgiu a partir das lutas pela redemocratização,

especialmente do movimento sindical e dosdemais movimentos populares. O PT é, por-tanto, herdeiro dessas lutas e a partir delasse transformou no maior partido de es-

querda da América Latina”, destaca o deputado Arlindo Chinaglia(PT-SP), líder do Governo, fundador do partido e ex-presidente daCentral Única dos Trabalhadores de São Paulo (CUT-SP).

A deputada Dalva Figueiredo (PT-AP) lamenta que “váriasgerações foram colocadas na clandestinidade” durante a dita-dura, mas enxerga nas campanhas vitoriosas de Lula e Dilmasímbolos do êxito das lutas democráticas. “Milhares foram per-seguidos, presos, torturados, assassinados e tiveram mandatosparlamentares cassados. Mas a prova de que a luta contra oRegime Militar foi vitoriosa foram as eleições para a Presidên-cia da República de um operário e de uma ex-combatente queresistiram à ditadura. Lula e Dilma são símbolos vivos de queaquela luta por democracia valeu a pena e foi vitoriosa!”.

“Os nossos governos, especialmente no âmbito do

Dilma Vana Rousseff. Belo Horizonte, 14 de de-zembro de 1947. Economista. Política brasileira.Filiada ao Partido dos Trabalhadores. Presidenta daRepública Federativa do Brasil eleita em 2010. Pri-meira mulher eleita para o posto de chefe de Estadoe de governo do País.

Nascida em família de classe média alta, inte-ressou-se pelos ideais socialistas durante a juven-tude, logo após o Golpe Militar de 1964. Militantede esquerda, integrou organizações que defendiam aluta armada contra o regime militar, como o Comandode Libertação Nacional (Colina) e a Vanguarda Arma-da Revolucionária Palmares (VAR-Palmares).

Passou quase três anos presa entre 1970 e 1972pela ditadura militar brasileira, primeiramente du-rante a Operação Bandeirante (Oban), onde recebeusessões de tortura, e, posteriormente, no Departa-mento de Ordem Política e Social (Dops).

Depoimento de Rose Nogueira, líder do grupo Tor-tura Nunca Mais em São Paulo e companheira de celadurante a ditadura de Dilma Rousseff, em 1970, con-ta que ela era muito culta e muito estudiosa. “Dis-cutíamos as notícias quando deixavam entrar algumjornal. Dilma foi uma das mais preparadas de nossageração; tem a noção que um Brasil justo é maior queum sonho de juventude”, comentou.

Em 2011 a presidenta do Brasil Dilma Roussefffoi incluída na lista das 100 personalidades maisinfluentes do planeta pela revista Time, como aterceira mulher mais poderosa do planeta e 22ª pes-soa mais poderosa do mundo pela revista Forbes.

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Triste memória: Golpe Militar de 1964 calouo País com repressão, torturas e mortes

e da imprensa, o Brasil iniciou uma etapa de forte concentração derenda, grave deterioração da economia, aguda ampliação das desi-gualdades sociais e permanente violação dos direitos humanos.

“Foi uma fase difícil, de tristes lembranças, que afetou to-dos aqueles que lutavam por um País justo e democrá-tico”, completa o deputado Assis do Couto (PT-PR),presidente da Comissão de Direitos Humanos e Mi-norias da Câmara.

“O País mergulhou então em um profundo obs-curantismo, graças à censura que se aba-teu sobre a vida cultural da nação e à tor-tura, que se tornou o método preferenci-al de interrogatório aplicado contra os di-reitos humanos nos porões da ditadura”,afirma o deputado Ronaldo Zulke (PT-RS),que participou da resistência aos governos militares atuandonos movimentos estudantil e sindical.

A ditadura também foi responsável direta por aquilo que odeputado Zezéu Ribeiro (PT-BA) chama de “atraso na formação dajuventude”. Para o parlamentar baiano, a geração que “desabro-chava” nos anos 1960 teve abortada a sua tentativa de construçãode um projeto de desenvolvimento nacional. “Em todas as áreas –educação, cultura, política, esporte, ciência e outras – florescia umdebate intenso que desaguava nas reformas de base, mas que foiabruptamente interrompido. Esse foi o mal maior causado peladitadura e, infelizmente, a juventude de hoje não tem consciênciadisso, desse projeto que foi perdido. Por isso, a recuperação damemória sobre aquele período é fundamental”, explica Zezéu.

Outras consequências do regime de exceção, segundo o de-putado Luiz Couto (PT-PB), foram a disseminação dos “esqua-drões da morte” e a institucionalização da tortura. “A bibliogra-fia sobre a ditadura demonstra que a ação dos grupos de exter-mínio e de pistolagem, bem como a tortura sistemática nas de-legacias e prisões, são fenômenos que nasceram naquele perí-odo de repressão”, aponta Luiz Couto.

O deputado Renato Simões (PT-SP) acredita que a “agenda

das reformas de base” continua atual. “Ainda que os governos doPT nos últimos 11 anos tenham conseguido grandes avanços emtermos de políticas públicas, ainda precisamos realizar as reformasestruturais que já eram necessárias nos anos 1960 e que a ditaduraimpediu. O Brasil teria avançado muito se não fosse a ditadura,que representa um atraso de décadas para o País”, diz Simões.

Para o deputado Márcio Macêdo (PT-SE), toda a sociedade brasi-leira deveria refletir sobre o significado e as implicações do Golpe de1964 e da ditadura encerrada em 1985. “É importante que o Brasiltodo possa debater, nesse marco dos 50 anos do golpe, o que signifi-cou aquela ditadura militar. As sedes do DOI-CODI deveriam ser visita-das como são os campos de concentração nazista na Alemanha, paraque nunca mais se repita essa experiência tão nefasta”, sugere.

Assis do Couto defende que a garantia do direito à memória eà verdade é um passo fundamental para que a sociedade possasuperar completamente o trauma da ditadura.

Para Nilmário Miranda, ele próprio vítima da repressão mili-tar, o Brasil deve agradecer a luta de mulheres e homens quehoje são “reconhecidos como verdadeiros heróis, os familiaresdos mortos e desaparecidos políticos, que nunca desistiram daluta pela verdade, pela memória e pela justiça”.

Vitórias de Lula e Dilma simbolizam aprovação popular à luta contra a Ditadura Militargoverno federal, têm reiterado o compromisso por uma sociedademais justa, democrática e por um País soberano”, acrescenta ArlindoChinaglia.

O deputado Alessandro Molon (PT-RJ) considera que todaa “ebulição de movimentos de resistência à ditadura desaguouna fundação do PT” e que as gestões petistas são consequênciadireta das lutas contra o autoritarismo. “O PT é filho e herdeiroda resistência à Ditadura Militar, e a atuação dos governos doPT, dos governos Lula e Dilma, é exatamente o desdobramentodesses sonhos que acalentamos na ditadura, especialmente ode construirmos uma nação democrática, soberana e inclusiva”.

Para o deputado Afonso Florence (PT-BA), os avanços al-cançados com os governos petistas são desprezados por seto-res conservadores, e os episódios que levaram à ditadura de-

vem servir de lição. “O Golpe Militar foi orquestrado pela di-reita e por parte da mídia. Na atualidade, a população sofreataques similares e temos que aprender com o passado paraconsolidarmos as conquistas do presente”, avalia Florence.

Na opinião do deputado Francisco Chagas (PT-SP), o regime deexceção “trouxe para o Brasil uma grande mancha no processo civi-lizatório”. “Em que pese hoje, de maneira inadvertida, ainda existaquem se pronuncie a favor da volta da ditadura, não podemos per-mitir que isso ocorra”, afirma.

O deputado Paulão (PT-AL) cobra uma “avaliação profunda”sobre o que ocorreu na ditadura. “Passamos por um regime deexceção no qual foi abolida a liberdade. É necessário que essahistória seja lembrada para que a juventude possa compreendero passado, fazer uma avaliação do presente e projetar o futuro”.

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AI-5 foi “golpe dentrodo golpe” com prejuízosirreparáveis ao País

Embora já tenha virado lugar comum, a expressão “golpe den-tro do golpe” é a que melhor resume simbólica e politicamente osignificado do Ato Institucional nº 5 (AI-5), baixado pelo governomilitar no dia 13 de dezembro de 1968. A norma ditatorial inaugu-rou um período onde a repressão desprezou qualquer garantia fun-damental e não teve pudor algum em utilizar a violência e o siste-mático terrorismo de Estado para alcançar um único objetivo: eli-minar qualquer traço de oposição ou resistência.

O “recesso” do Legislativo foi uma das medidas anunciadas peloato e dissipou qualquer dúvida sobre o fato de o Brasil estar viven-do uma ditadura, já que a propaganda oficial anunciava que o Paísrespirava a normalidade constitucional. Para o deputado MarcoMaia (PT-RS), a interdição do Parlamento foi uma “estúpida violên-cia” contra a democracia. Ele lembra que, além das repugnantesprisões, torturas e assassinatos, o fechamento do CongressoNacional resultou em dramas pessoais, afetando profundamente avida de inúmeros parlamentares e servidores.

“Não bastasse isso, foi abandonado o campo iluminado pelodiálogo e pela soberania da representação popular pelo obscurocaminho das decisões de uma reduzida elite sustentada pela forçabruta, dissociada dos interesses da maioria do nosso povo. Ditadu-ra nunca mais!”, afirmou Marco Maia, que presidiu a Câmara dosDeputados entre dezembro de 2010 e fevereiro de 2013.

Outras determinações do AI-5 foram a suspensão do habeascorpus, a proibição de manifestações ou atividades políticas – o quelançou na clandestinidade todos os movimentos sociais, em especi-al as entidades sindicais e estudantis –, a instauração da “liberdadevigiada” e a possibilidade de intervenção nos estados e municípios.

Segundo o deputado José Mentor (PT-SP), o AI-5 foi “uma rea-ção da ditadura às mobilizações sociais” que cobravam a redemo-cratização. “Foi um golpe duríssimo, o mais duro que a ditaduraimpôs à sociedade”, apontou Mentor.

Na opinião do deputado Cláudio Puty (PT-PA), o AI-5 “selou a

dureza da ditadura” ao conferir “superpoderes” aos golpistas. “Atéhoje, a política e a sociedade brasileira ressentem as consequênciasdesse ato, como a perda de lideranças importantes, torturadas emortas nos porões do regime. Dentre elas, estudantes da UNE que,depois da Marcha dos Cem Mil, em 1968, foram literalmente caçadosporque simbolizavam a esperança por um Brasil democrático emelhor”, disse Puty.

Avaliação semelhante possui o deputado Policarpo (PT-DF). “OAI-5 colocou na clandestinidade praticamente toda a sociedade ci-vil que se opunha ao governo ilegal, e toda uma geração foi penali-zada com a perda de direitos e com a impossibilidade de lutar pelademocracia. O ato foi uma tragédia que se faz sentir ainda hoje”,considerou Policarpo.

Para o deputado Décio Lima (PT-SC), o AI-5 “sangrou profunda-mente a alma” do povo brasileiro, mas a resposta da sociedade veiomais tarde. “O AI-5 foi a flecha que sangrou o coração da nossagente, mas a indignação que ele gerou fez com que nunca mais opovo permitisse tal desventura”, resumiu Décio Lima.

O deputado Vicente Cândido (PT-SP) calcula como “enorme eirreparável” o prejuízo da sociedade brasileira com o Golpe de 1964e o AI-5. “Poderíamos estar vivendo hoje uma democracia muitomais consolidada, sobretudo do ponto de vista socioeconômico, commenos desigualdades, mas sofremos com a ditadura e o AI-5 umatraso de pelo menos 40 ou 50 anos”, lamentou Cândido.

A cassação de senadores, deputados federais e estaduais, vere-adores, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e até do Supe-rior Tribunal Militar (STM) foi consequência imediata do AI-5, bemcomo o recrudescimento da censura à imprensa.

O deputado Ricardo Berzoini (PT-SP) entende que o AI-5 foi uma“vitória da linha dura dentro das forças que sustentavam o regime” eque o episódio merece “nada menos que o repúdio” da sociedadebrasileira. “Só podemos repudiar esse momento da história brasilei-ra em que vivenciamos uma ausência de democracia”, disse Berzoini.

Capítulo dos mais controversos, ocorrido já nos estertores doregime, a aprovação da Lei de Anistia, em 1979, é considerada umato ilegítimo do ponto de vista político e ilegal do ponto de vista doDireito Internacional.

“Aquelas pessoas que resistiram à ditadura foram presas e con-denadas por tribunais militares e pela Justiça da época. Além deterem passados anos nas prisões, inclusive nos centros de deten-ção clandestinos, foram torturadas e muitas foram mortas. Mas osagentes que sequestraram, torturaram e assassinaram jamais fo-ram julgados e responsabilizados pelos seus atos. Que tipo de anis-tia é essa?”, questiona o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), um dosque defendem a revisão da Lei 6.683/79.

O Brasil é signatário, desde 1914, de uma série de tratados, con-venções e protocolos internacionais que visam coibir crimes huma-nitários e determinam punições para tais atos. Tortura, maus tratosa prisioneiros e execuções sumárias são alguns dos crimes de lesa-humanidade e que são considerados imprescritíveis. Além disso, a

Lei da Anistia é ferida aberta da Ditadura Militarjurisprudência das cortes internacionais não reconhece a validadedas leis de autoanistia concedidas por regimes autoritários. Nessesentido, em dezembro de 2010, a Corte Interamericana de DireitosHumanos afirmou a “incompatibilidade” da Lei de Anistia “com asobrigações internacionais do Brasil contidas na Convenção Ameri-cana [de Direitos Humanos]”.

Em abril de 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou umaação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que pedia a revisãoda lei. Para o deputado Luiz Couto (PT-PB), a negativa da Corte Su-prema significou a manutenção da impunidade, e a não revisão daAnistia representa uma nódoa na história do País e uma dívida doEstado com a sociedade. “Na prática, os torturadores e aqueles quemataram tantas pessoas durante os governos militares continuamna impunidade. Em alguns países que passaram por regimes autori-tários, houve pelo menos um pedido público de desculpas dos seusagentes, como ocorreu na África do Sul após o fim do Apartheid.Aqui, nem isso aconteceu e toda vez em que se fala em revisão da

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Gama e Silva durante anúncio do AI-5, em dezembro de 1968

O 50º aniversário do Golpe de 1964 tem deixado a direita nostálgica do Regime Militarassanhada. Desprovida de bandeiras e de propostas confessáveis ao grande público, a oposiçãomantém uma tática tão agressiva quanto desesperada. O centro desta tática é a criminalizaçãoda política expressa num falso moralismo inconsistente, que está perdendo terreno até noSupremo Tribunal Federal; esta atitude perniciosa, já que a desmoralização da políticaenfraquece a democracia, só serve aos interesses inconfessáveis dos golpistas.

Essa tática tem se mostrado ineficaz, só tem produzido derrotas. Nas eleiçõesmunicipais de 2008, as oposições conquistaram municípios que abrigavam 40% dapopulação brasileira. Em 2012, esse número caiu para a metade, 20%. Isso tende arepercutir na eleição para deputados neste ano, pois há uma relação entre o número deprefeitos e o número de deputados.

Um dos sintomas do desespero da oposição é seu recurso reiterado a uma extrema“judicialização” da atividade política. O PSDB já tentou processar a presidenta Dilma Rousseffpor ter usado vestido amarelo, alegando talvez usurpação das cores nacionais; ou porqueapareceu numa foto sorrindo ao lado do ex-presidente Lula, como se isso fosse um crime. Teme-se agora que o PSDB protocole um pedido de liminar, no Tribunal Superior Eleitoral, para proibir ouso do tomate vermelho na salada, alegando que esse hábito favorece o PT e constitui uso indevidoda preciosa hortaliça. Este aspecto cômico da atuação da oposição sugere uma falta de rumo. Masexistem outros aspectos da tática da oposição que são menos engraçados.

Mantendo uma velha tradição de combater qualquer governo progressista, a imprensamonopolista desempenha papel da vanguarda na tentativa de desestabilizar asadministrações do PT. Ela pratica uma espécie de censura contra as notícias que possamparecer favoráveis ao governo, ainda que remotamente. Manipula e distorce as informaçõese não dispensa sequer a colaboração com o crime organizado, como ficou evidente noepisódio Carlos Cachoeira e em outros casos. Mas tudo cai no vazio. A crise econômica, odescontrole da inflação, o colapso total dos projetos do governo vaticinados todos os diaspela imprensa não se verificaram. O governo segue, a economia mostra vitalidade e o campodemocrático não tem porque temer as eleições de outubro.

Outro front importante desta batalha vem sendo assumido pessoalmente pelo tucanoAécio Neves. Multiplicou declarações falsas para tentar mostrar que o governo quer ocontrole da internet, como supostamente também dos meios de comunicação. Espalha amentira justamente num momento em que o governo batalha para garantir um marco legalcom neutralidade da Internet, já aprovada pela Câmara dos Deputados.

É certo que cresce na oposição a ideia de deixar esse negócio de eleições de lado e departir para a solução pura e simples de um golpe para sepultar a democracia. Esse ardor golpistaexibido pela oposição é uma herança da velha UDN liderada por Carlos Lacerda, que inspiramuitos líderes da oposição e que sempre tramou contra os processos democráticos e muitocontribuiu para o Golpe de 1964, mas terminou cassado por seus amigos generais. O golpismorevela que a oposição está plenamente consciente de quem, por meio de eleições democráticas,ela tem reduzidas chances de chegar ao governo.

Essa opção em nada contraria as tradições das elites brasileiras, herdeiras de um segmentosocial que ao longo de cinco séculos governou contra o povo. Essa elite brasileira, que hojevolta a namorar o golpe, é a mesma que sustentou durante quase quatro séculos a escravidãodos índios e dos negros, que assegurou ao Brasil a triste glória de ser o último país das Américasa abolir a escravidão, fez com que, no processo de independência do continente, fôssemos aúnica monarquia, enquanto os demais países optaram pela forma república. Essa herançacolonial nos legou um rosário de atrasos e vícios que devem ser superados, pois muitos delesainda parasitam nossa caminhada rumo à construção de uma nação democrática e justa.

Neste momento, o dever dos democratas é combater todos os ataques à democracia, contribuirna defesa e no respeito ao calendário eleitoral e participar de um debate amplo destinado a mostrarque o Brasil está no caminho certo. Muito já fizemos, mas ainda temos muito a fazer.

* Militante petista histórico e ex-chefe de Gabinete da Liderança do PT na Câmara.

Lei da Anistia é ferida aberta da Ditadura Militar

50 anos depois, a direitatenta reviver o Golpe de 1964

Athos PAthos PAthos PAthos PAthos Pereira (*)ereira (*)ereira (*)ereira (*)ereira (*)

Anistia há uma dura reação. Essa ferida ainda não foi ci-catrizada”, lamenta Luiz Couto.

O deputado Nilmário Miranda (PT-MG) lembra quea Lei de Anistia foi aprovada numa votação apertada,com apenas 206 votos da Arena contra 201 do MDB,num Legislativo composto por inúmeros senadoresbiônicos. “A democracia e o povo foram derrotados porapenas cinco votos do Congresso, com maioria parla-mentar oriunda do casuísmo do Pacote de Abril de 1972.Chegou a hora de rever essa decisão equivocada”,cobra Nilmário.

Para a deputada Margarida Salomão (PT-MG), “umacoisa é combater politicamente, outra coisa é praticarterrorismo de Estado”, com perseguições, sequestros, tor-turas e assassinatos. “Esses são crimes contra a humani-dade, e não podemos aceitar que fiquem impunes. Porisso, precisamos revisar a Lei de Anistia”, explica.

OPINIÃO

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“O AI-5 colocou na clandestinidade

praticamente toda a sociedade civil

que se opunha ao governo ilegal, e toda

uma geração foi penalizada com a

perda de direitos”

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Nos últimos anos da década de 1970, em pleno Regime Militar,começou a surgir no Brasil um novo movimento sindical com atua-ção destacada e que influenciou decisivamente na abertura demo-crática e na história do País. No contexto do arrocho salarial emque vivia o Brasil, uma onda grevista teve início em 1978, quandomilhares de metalúrgicos do ABC paulista cruzaram os braços emresistência à Lei Antigreve em vigor, abrindo caminho para umasérie de paralisações que se seguiu em outras categorias, rompen-do o silêncio imposto pela ditadura à classe trabalhadora.

Em 1980, no governo do general João Batista Figueiredo, o últi-mo presidente do regime de exce-ção, uma nova greve ocorreu em SãoBernardo do Campo, durando 41dias e mobilizando 300 mil metalúr-gicos. Essa greve abalou os alicercesda Ditadura Militar. A força do sindi-calismo brasileiro encorajou a lutacontra o regime e o movimento pelaredemocratização do País.

Lideranças sindicais se destaca-ram no enfrentamento da ditadu-ra, e entre elas Luiz Inácio da Silva– o Lula, presidente do Sindicatodos Metalúrgicos de São Bernardodo Campo. Lula foi preso, enqua-drado pelo regime militar na Lei deSegurança Nacional, e, após ser sol-to, ainda em 1980, uniu-se a outrossindicalistas, intelectuais e repre-sentantes dos movimentos sociaispara fundar o Partido dos Trabalha-dores, tornando-se o seu primeiropresidente da legenda.

Também nesta época, o entãometalúrgico e hoje líder da Banca-da do PT na Câmara, deputadoVicentinho (SP), filiou-se ao Sindi-cato dos Metalúrgicos de São Ber-nardo do Campo e Diadema einiciou a sua carreira sindical no ABCpaulista. Em 1981, Vicentinho é elei-to vice-presidente do sindicato e, em 1983, participa da primeira gre-ve geral desde o Golpe de 1964. Também em 1983, participou dafundação da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e, em 1994, já emplena democracia, foi eleito presidente da CUT Nacional.

O deputado Vicentinho afirma com propriedade que o movimen-to sindical foi decisivo no processo de redemocratização do Brasil. “Agente queria ser respeitado, queria aumento de salário, mas, princi-palmente, queria um País democrático. E o movimento sindical foi fun-damental para ajudar a enterrar a Ditadura Militar no Brasil”, analisa.

Durante o Regime Militar, trabalhadores que lutaram por seus di-reitos foram perseguidos, presos, torturados e mortos. As organiza-ções sindicais foram censuradas, sofreram intervenção e foram fecha-das. Entretanto, mesmo diante da repressão e da manobra do gover-no militar de controlar os sindicatos escolhendo seus líderes, os traba-lhadores mantiveram suas lutas, promovendo greves e mobilizações

Força do sindicalismo encoraja lutapela retomada da democracia no País

que foram decisivas para a derrubada do regime.Esse movimento, na opinião do deputado Bohn Gass (PT-RS),

desencadeou uma nova proposta sindical para o Brasil. “Era neces-sário que se proclamasse a independência sindical, e foi isso queaconteceu, a autonomia dos sindicatos. A partir desse movimento,surgiram os partidos de esquerda, como o PT. Então, a retomadada democracia passou muito pela luta sindical”.

A opinião também é compartilhada pelo deputado CândidoVaccarezza (PT-SP), para quem o movimento sindical foi um instrumen-to eficiente na luta contra o controle dos sindicatos e demais representa-

ções pelo governo militar. “A ativi-dade sindical não se restringiu à lutapela melhoria salarial e pelo fim doarrocho. Os sindicatos se incorpora-ram à luta geral, com o movimentoestudantil e setores progressistasque pediam liberdade democrática”.

O papel de destaque das gre-ves e das organizações sindicaiscomo contribuição para a aber-tura política é ressaltado tam-bém pelo deputado João PauloLima (PT-PE), primeiro presiden-te da CUT em Pernambuco. “De-pois de todo o trabalho de resis-tência, retomamos os sindicatose esse movimento cumpriu pa-pel fundamental no combate àDitadura Militar e no restabele-cimento da democracia no País”.

A sociedade também reagiu àsarbitrariedades do governo. Em1983, ainda em plena ditadura,uma greve geral mobilizou cerca detrês milhões de trabalhadores emtodo o Brasil e representou um dosmaiores desafios operários contraa política de arrocho econômico esalarial e se configurou num mar-co que contribuiu para o fim do

Regime Militar. A greve envolveu 35 entidades sindicais.A sociedade brasileira foi reconquistando seu espaço de partici-

pação política, lembra o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), quedestaca a unificação dos sindicatos, de entidades estudantis e outrasforças progressistas para acelerar a queda da ditadura. “Nessa união,houve respeito entre todas as categorias e, a partir daí, a ditaduracomeçou a ruir. Com a politização foram criado o PT e a CUT”.

E o berço da redemocratização do Brasil, lembra o deputadoHélcio Silva (PT-SP), foi a região do ABC paulista. “Lá foi o palcode grandes lutas que iniciaram as transformações em nosso Paíse hoje resultaram na democracia em que vivemos”.

Com a contribuição do movimento sindical, o Brasil viu a quedada ditadura e a abertura política, caminhando para consolidar odemocracia, com a Constituição Cidadã, de 1988, que inseriu di-reitos e assegurou proteção ao trabalhador, às mulheres, aosíndios, aos negros e ao conjunto da sociedade brasileira.

Lula fala para 100 mil trabalhadores no Estádio da Vila

Euclides durante a greve dos metalurgicos do ABC

Vicentinho participa de assembleia de

metalúrgicos ao lado de Luiz Inácio Lula da Silva

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CUT rompe modelocorporativo e reinaugura

sindicalismo de lutaEm agosto de 1983, logo depois da histórica greve geral, é fundada a Central

Única dos Trabalhadores, durante o 1º Congresso Nacional da ClasseTrabalhadora (Conclat), em São Bernardo do Campo. Surge no Brasil uma centralsindical que reúne trabalhadores do campo e da cidade para apresentar umaproposta de sindicalismo independente e sem vínculos com o governo. A criaçãoda CUT representou um passo na ruptura com a estrutura sindical oficial, queera baseada na Carta del Lavoro, de Benito Mussollini, imposta desde os anos30 pela ditadura Getúlio Vargas.

A CUT nasceu para combater o modelo corporativo, dependente do Estado, epara lutar pela liberdade e autonomia sindical com o objetivo de consolidar umsindicalismo classista, de luta, de massas e organizado a partir da base. Essa é aavaliação de um dos seus fundadores e ex-presidente, o deputado Vicentinho, atuallíder da Bancada do PT na Câmara.

“A semente para a criação da CUT foi a Articulação Nacional dos MovimentosSindicais e Populares (Anampos). A CUT cumpriu o seu papel na luta pela liberdadee autonomia sindical, por um sindicalismo democrático, de base, e é hoje uma grandereferência no mundo do trabalho”.

Na defesa da liberdade e autonomia sindical, a CUT conseguiu reunir “o quehavia de mais militante” no mundo sindical brasileiro, como explica o deputadoLuiz Alberto (PT-BA). “A CUT participou plenamente do processo das eleições dire-tas e da elaboração da nova Constituição, quando pediu uma constituinte livre,democrática e soberana”.

E a cental nasceu para ser a nova ferramenta dos trabalhadores pós- ditadura,visando à organização sindical, defende o deputado Eudes Xavier (PT-CE), que pre-sidiu a CUT no Ceará. “Os sindicatos do ABC paulista foram a grande referência paraa construção da CUT, que nasceu com uma experiência totalmente diferente dascentrais sindicais do passado, com proposta de fortalecer as organizações no localde trabalho, o que na Ditadura Militar era proibido”.

A entidade hoje é considerada a maior central de trabalhadores da América Latina.

PT é o grande protagonistada redemocratização

Em 10 de fevereiro de 1980, nasceu o Partido dos Trabalhadores, um dos mai-ores e mais importantes organizações de esquerda da América Latina. O PT foicriado no contexto das intensas mobilizações sociais que marcaram a históriapolítica, econômica e social brasileira a partir da segunda metade da década de1970. Tendo à frente o líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva, o PT foi oficialmentereconhecido como partido político pelo Tribunal Superior Eleitoral no dia 11 defevereiro de 1982.

Naquele momento surgiu o partido que, hoje, está no rol dos mais importantesdo mundo. Tem as suas bases construídas nos anseios da classe trabalhadora emantém uma estratégia de luta focada na busca por uma sociedade mais justa eigualitária, como afirma o líder da bancada petista na Câmara, deputado Vicenti-nho, protagonista da fundação do partido.

“O Partido dos Trabalhadores foi a grande novidade pós-Ditadura Militar, nomomento de abertura, em que ocorreram importantes debates. Nasceu com umaconcepção de que os trabalhadores são capazes de gerir o seu próprio destino.Hoje em dia, a pergunta a ser feita é o que seria do Brasil sem o PT. Não que o PTsozinho seja capaz de resolver todos os problemas. Mas o Partido dos Trabalhado-res é o grande protagonista da história vivida pelo Brasil nas últimas décadas”, res-saltou Vicentinho.

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Militantes durante ato de fundação do PT

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Trabalhadores em congresso de criação da CUT

Mulheres pedem fim de intervenção em entidades

Manifestantes reivindicam autonomia sindical

Liberdade sindical: luta permanente durante ditadura

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Antes do Golpe Militar, a educação bra-sileira motivava uma grande expectativaem relação ao futuro. Não obstante apre-sentasse índices preocupantes, como nocaso do analfabetismo (o mais grave àépoca), que alcançava 39,5% da popula-ção distribuídos na faixa entre 15 e 69anos (segundo dados do IBGE), o gover-no do presidente João Goulart tomava

medidas para enfrentar o problema. Entre elas, o lan-çamento do Plano Nacional de Alfabetização, inspira-do no método do educador Paulo Freire. A ação pre-

via alfabetizar todas as crianças, adoles-centes e jovens entre sete e 23 anos deidade, até 1970.

Com o Golpe Militar, a política educa-cional do País foi totalmente modificada.Uma das primeiras medidas foi a extinçãodo Plano Nacional de Alfabetização. O au-tor do método usado no Plano passou a serperseguido pelo regime. “Um dos feitosmais cruéis do golpe sobre a educação foi aperseguição a Paulo Freire, que cometeu o‘crime’ de idealizar uma educação inclusi-va para o País”, explica a deputada FátimaBezerra (PT-RN), coordenadora do Núcleode Educação e Cultura do PT na Câmara.

Além de aniquilar a política educacio-nal progressista do governo João Goulart,o Regime Militar também passou a per-seguir educadores e estudantes contrári-

os ao golpe. Ainda em 1964, por exemplo, a Universi-dade de Brasília (UnB) foi invadida por tropas militares,e o reitor, Anísio Teixeira, destituído do cargo.

“Passou a haver uma enorme ingerên-cia e corte na autonomia administrativadas universidades”, recorda a deputadaIara Bernardi (PT-SP). De acordo com o de-putado Newton Lima (PT-SP), os militaresviam na atividade acadêmica e estudantil“uma grave ameaça ao regime ditatorial”.“E com o exílio e a prisão de centenas dedocentes, também houve um imenso pre-juízo à produção científica e de pesquisa noPaís”, destaca.

Ainda em 1964, o governo militar tam-bém colocou na ilegalidade entidadescomo a União Nacional dos Estudantes(UNE), e todas as outras organizações es-tudantis. “Não satisfeito com tudo isso, ogoverno militar ainda invadiu e incendioua sede da UNE. Com esse ato de barbari-

dade, a intenção do regime era sufocar qualquercontestação dos estudantes à ditadura”, ressalta o de-

Regime Militar persegue educadorese estudantes, promove retrocesso naeducação e elitiza ensino superior

putado Reginaldo Lopes (PT-MG).Contestação – Apesar da força empregada pelo

regime para intimidar os estudantes, o plano dos mi-litares apenas acirrou os ânimos. Em São Paulo, gru-pos paramilitares de direita do Comando de Caça aosComunistas (CCC), composto por vários estudantesda universidade Mackenzie e apoiados pela polícia,invadiram, em 1968, o prédio da Faculdade de Filo-sofia, Ciências e Letras da Universidade de São Pau-lo (USP). No confronto entre estudantes das duas uni-versidades, morreu o jovem José Guimarães, alunoda USP, baleado na cabeça.

No mesmo ano, a polícia invadiu o restaurante cen-tral dos estudantes no Rio de Janeiro, conhecido comoCalabouço, onde estavasendo organizada umamanifestação contra o au-mento no valor das refei-ções. Na confusão, polici-ais avançaram com casse-tetes sobre os estudantesque reagiram atirandopaus e pedras. Durante oconfronto, o estudante se-cundarista Edson Luís deLima Souto, então com 17anos, foi assassinado comum tiro a queima roupadado pelo comandante datropa, o oficial da PM, as-pirante Aloísio Raposo.

A revolta pela mortedo estudante estimulou amaior manifestação decontestação à ditaduramilitar: a passeata dos 100mil, no Rio de Janeiro. Organizada pelo movimentoestudantil, a passeata contou com apoio significativoda população e com a participação de artistas, inte-lectuais e outros setores da sociedade civil.

Perseguição – Poucos meses depois, o movimen-to estudantil tentou realizar o XXX Congresso daUNE, em Ibiúna (SP), que visava reorganizar a enti-dade colocada na clandestinidade pela ditadura.Mas a polícia descobriu a chácara onde líderes es-tudantis de todo o País estavam reunidos e pren-deu cerca de mil estudantes.

Em 13 de dezembro de 1968, o governo editou oAto Institucional nº 5 (AI-5), que vigorou até dezem-bro de 1978 e produziu um elenco de ações arbitrári-as, definindo o momento mais duro do regime.

A partir desse momento, centenas de professores,alunos e servidores identificados como opositores doregime foram aposentados compulsoriamente, demi-

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Extensão do direito ao vototambém motivou golpe e Paísainda deve reforma política

Regime Militar persegue educadoresestudantes, promove retrocesso na

educação e elitiza ensino superiorEntre as causas do Golpe Militar de 1964, além da tão propalada “amea-

ça comunista”, alegada pelos militares à época, dois fatos também contribu-íram para o afastamento forçado do então presidente João Goulart: a exten-são do direito ao voto para os analfabetos e militares de baixa patente.

Em um País que contava com 39,5% de analfabetos (segundo dados doIBGE), a medida era encarada pelas forças elitistas e conservadoras comouma forma de reduzir a chance de a oposição assumir o poder. Já o direitoao voto dos militares de baixa patente, trazia ao alto oficialato o temor da“quebra da hierarquia”.

Após 50 anos do golpe, com os analfabetos e militares de todas aspatentes com direito a voto, outras ações ainda precisam ser tomadaspara fortalecer a democracia brasileira. Na avaliação de vários parlamen-tares petistas, o País precisa aprovar uma ampla reforma política queestimule o debate de ideias, incentive a participação popular na vidapolítica do País, reduza a influência do poder econômico no processoeleitoral e fortaleça os partidos.

Para o relator da reforma política na Câmara, deputado HenriqueFontana (PT-RS), o desinteresse da população pela política, “estimula odescrédito da classe política e das instituições”. Fontana afirma queapenas uma ampla Reforma Política pode alterar esse cenário.

“Essa é a única forma para revertermos essa curva. E, apesar de peque-no, esse descrédito é um risco para a democracia”, admite. Fontana dizainda que uma das principais maneiras de fortalecer a democracia é redu-zir a influência do poder econômico na política.

“A democracia é cada vez mais dominada pela força do dinheiro. E,infelizmente, o interesse econômico tem muito mais força no CongressoNacional do que os programas partidários que deveriam estar aqui repre-sentados pelas bancadas eleitas pela população”, ressalta.

Na mesma linha de pensamento, o deputado Rubens Otoni (PT-GO) afir-ma que o atual sistema político “já não é suficiente para representar os ansei-os da sociedade”. “Não basta votar de quatro em quatro anos. É preciso mes-clar elementos da democracia direta e participativa, dando ao povo a realpossibilidade de atuar nas transformações por que o País passa”, pontua.

Igualdade – Segundo a ex-coordenadora da Bancada Feminina na Câ-mara, deputada Janete Rocha Pietá (PT-SP), a reforma política é a únicaforma de aumentar a participação feminina no Parlamento. “Sem financi-amento público de campanha, sem lista fechada e paridade, o Legislativovai continuar sendo masculino e branco e não colocará como prioridadeas políticas públicas que defendemos”, afirma.

Custo – O alto custo das campanhas eleitorais também é visto comoum fator de enfraquecimento da democracia brasileira. Na avaliação dodeputado Sibá Machado (PT-AC), o aumento crescente no valor das cam-panhas eleitorais “tem colocado alguns parlamentares e o próprio Parla-mento em situações vexatórias”.

Já em relação à suposta antipatia que a proposta de financiamentopúblico de campanha enfrenta junto a setores da população, o coorde-nador da Frente Parlamentar Mista de Combate à Corrupção, deputadoFrancisco Praciano (PT-AM), acredita que uma campanha pode esclareceras vantagens do novo sistema. “Isso vai ocorrer quando a sociedade en-tender que é ela quem paga o custo altíssimo, por exemplo, de uma em-preiteira que patrocina um deputado”, observa.

“Toda forma de poder deve envolver a sociedade para que a populaçãoparticipe e ajude a construir o melhor sistema para o País”, destacou odeputado Miguel Corrêa Jr (PT-MG). Na avaliação do deputado OdairCunha (PT-MG), a construção de um novo sistema político é urgente. “Oatual modelo político já se esgotou, e precisamos pensar em um novo. Porisso é necessário que o Congresso Nacional vote a reforma política”, opinou.

tidos, presos, torturados, assassinados ou simplesmentedesapareceram. Foi o caso do ex-presidente da UNEHonestino Guimarães, que em 1973 foi preso pelo apa-rato de segurança do regime e nunca mais foi visto.

Reforma – Além da repressão, o Regime Militarentendeu que o setor poderia continuar estimulandocontestações à ditadura. Por isso, adotou medidas parasufocar qualquer movimento contrário ao regime,como o decreto da Reforma Universitária (4.024/68).Entre outros pontos, a ação centralizava as decisõesdo setor no Executivo, legitimava a repressão políti-co-ideológica, subordinava os reitores ao presidenteda República e institucionalizava as intervenções mi-litares nas universidades.

Dentro do mesmo pacote re-pressivo, o governo militar emitiuainda o Decreto-lei 477/69, queproibia manifestações de estudan-tes, professores e servidores em es-tabelecimentos de ensino. “O Gol-pe Militar instaurou no País umperíodo de arbítrio, nocivo à edu-cação, com a perseguição de pro-fessores e estudantes, e de restri-ção à liberdade de pensamento”,detalha Waldenor Pereira (PT-BA).

O regime militar alterou aindaa forma de acesso às universida-des. Para tentar resolver o proble-ma dos excedentes (alunos que ti-nham nota, mas não entravam nauniversidade por falta de vaga), aditadura militar criou o vestibularclassificatório. “Infelizmente a ado-ção desse método, entre outrasações, elitizou o acesso à educação

superior pública”, explica o deputado Ângelo Vanhoni(PT-PR). “A partir do golpe, o processo de privatizaçãodo ensino foi acelerado, com a ampliação dos cursossuperiores privados, aliada à deterioração da escola pú-blica”, diz Artur Bruno (PT-CE).

Currículo – Visando ainda influenciar ideologica-mente os estudantes no apoio à ditadura, os militarestambém implementaram a Reforma do 1º e 2º graus(Lei 5.692/71). Entre outras ações a reforma excluiudo currículo o ensino de Sociologia e de Filosofia, en-trando no lugar a Educação Moral e Cívica e Organiza-ção Social Politica Brasileira (OSPB). As disciplinas as-sumiam um caráter panfletário pró-ditadura, eliminan-do estrategicamente todo o caráter crítico e reflexivoda Filosofia e da Sociologia. “Essas mudanças tiveramefeitos negativos sobre a formação democrática detoda uma geração”, lamentou o deputado AntonioCarlos Biffi (PT-MS).

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Dia 25 de março de 2014, faltando pouco menos de uma se-mana para os 50 anos do golpe que tomou de assalto o regimedemocrático brasileiro, o coronel reformado do Exército PauloMalhães deu detalhes do que ocorria do lado de dentro da cha-mada “Casa da Morte”, um imóvel situado à rua Arthur Barbosa,no bairro Caxambu, na cidade de Petrópolis – região serrana doRio de Janeiro. Diante do depoente, integrantes da Comissão Na-cional da Verdade (CNV).

“Acho que eu cumpri com o meu dever”, disse Malhães, semaparentar culpa ou remorso pelas atrocidades que ocorreram na-quele local, como humilhações, torturas, estupros e mortes. Ape-sar de enfático ao dizer que “não” se arrependia dos atos que co-meteu, foi evasivo e tranquilo ao responder à pergunta de quan-tos matou: “Ah, não sei”.

O depoimento do militar passou a fazer parte de mais um capí-tulo da história que está sendo revista e reescrita pelos membrosque formam a CNV. Juntar pedaços do quebra-cabeça em que setransformou um período mal contado da vida política e social doBrasil – o Regime Militar – é uma das atribuições da comissão, cria-da pela Lei 12.528, de 2011, no governo Dilma Rousseff.

“Um país não pode construir seu futuro se ele não consegue seolhar no espelho, se não consegue contemplar sua memória. En-tão, a Comissão da Verdade é imperativa, para que o Brasil se re-concilie consigo mesmo”, analisa a deputada Margarida Salomão(PT-MG). Ela destaca que essa contextualização é fundamental,sobretudo, à juventudebrasileira. “É necessáriorecolocar numa moldurahistórica mais completaas recentes movimenta-ções de rua, as aspira-ções e a luta que hoje setrava, até para que sepossa construir, de ma-neira mais consequente,um sentido para tudoisso”, completa.

É justamente essa in-terface entre passado epresente que a Comissãoda Verdade se propõe afazer, restabelecendo fa-tos históricos que foram omitidos ou deturpados. Com o objetivode apurar graves violações de direitos humanos ocorridas no Brasilentre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988, período quecompreende o governo dos generais, a comissão formada por setemembros está percorrendo o País desde 2012, ano em que foi insta-lada, para recolher provas, juntar documentação, ouvir depoimen-tos, promover seminários e fazer audiências públicas.

O prazo para a comissão entregar seu relatório final, inicial-

mente previsto para maio deste ano, foiprorrogado para dezembro, mas antes dechegar a um documento conclusivo osmembros da comissão já estão, aos pou-cos, revelando partes do que ficou escon-dido por décadas.

No dia 18 de março, por exemplo, o coor-denador da Comissão Nacional da Verdade,advogado e professor Pedro Dallari, entregouao presidente da Câmara dos Deputados, Hen-rique Eduardo Alves (PMDB-RN), relatório pre-liminar sobre o caso do desaparecimento do de-putado federal cassado Rubens Paiva, ocorrido em janeiro de 1971.

Com base em exaustiva pesquisa documental e provas testemu-nhais, o material aponta que o hoje general José Antônio NogueiraBelham, que à época era major no comando do Destacamento deOperações e Informações (DOI), do I Exército, não tomou providên-cia alguma para impedir as torturas ou prestar qualquer socorro aodeputado, mesmo alertado de que o preso poderia morrer.

CONHECER HISTÓRIA PARA EVITAR RECUO

“O grande sentido de refletir sobre as atrocidades ocorridasdurante a ditadura é fazer com que o passado ilumine o presentee o futuro, evitando a repetição de erros trágicos. Ninguém está

imune a retrocessos. Temos países que alcançaramelevado índice civilizatório e depois recuaram.O que impede o recuo é o conhecimento,é a análise, é o reconhecimento do que significouaquele passado. E para isso é necessário alcançaressa verdade histórica”, explica o deputadoNilmário Miranda (PT-MG).

Outro resultado preliminar do trabalho da co-missão foi divulgado por ocasião do depoimen-to do coronel Paulo Malhães sobre a Casa daMorte. A CNV expôs por meio de filmes, foto-grafias e documentos tudo o que já foi recolhi-do e investigado acerca daquele local clandesti-no que se transformou em Centro de Informa-ções do Exército (CIE), para desenvolver açõesde tortura, morte e ocultação de cadáveres.

O ponto de partida do trabalhonesse caso específico foram as denúncias de InêsEtienne Romeu, única sobrevivente da casa. Apartir dos relatos de Inês, que viveu 96 dias emcárcere privado, e de outras pessoas, a CNVrealizou investigações, diligências e identifi-cou torturadores. Aos poucos, a história vaisendo recontada...

“A Comissão da Verdade vai per-

É necessário recolocarnuma moldura histórica

mais completa as recentesmovimentações de rua, asaspirações e a luta quehoje se trava, até paraque se possa construir,

de maneira maisconsequente, um sentido

para tudo isso

Comissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuro

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Agentes da repressão ou figuras da ditadura militar tive-ram seus nomes estampados em praças, vias e locais públi-cos por todo o Brasil. Para mudar esse equívoco histórico,vários projetos de lei tramitam no Congresso Nacional, emAssembleias Legislativas e Câmaras Municipais. A luta é paratrocar as placas e substituir os nomes dos que mancharama história do País.

Uma dessas iniciativas é o Projeto de Lei 7218/14, apre-sentado pelo deputado Renato Simões (PT-SP), que sugerea renomeação da “Ponte Presidente Costa e Silva (Rio-Nite-rói) para “Rubens Paiva”. A tentativa é antiga. Em 2012, pro-jeto com o mesmo teor foi apresentado pelos deputadosAlessandro Molon (PT-RJ), Janete Rocha Pietá (PT-SP),Erika Kokay (PT-DF), Luiz Couto (PT-PB), Padre Ton (PT-RO)e outros parlamentares, mas foi arquivado.

Foi o presidente Costa e Silva que instituiu o AI-5, per-mitindo o uso indiscriminado da tortura durante o RegimeMilitar. “Há um forte simbolismo na troca do nome atual daponte, substituindo um dos algozes pelo nome de uma dasvítimas”, diz Simões.

Em São Paulo, o prefeito Fernando Haddad (PT) sancionouuma lei que permite a substituição dos nomes dos logradou-ros que levem o nome de autoridade que tenha cometidocrime de lesa-humanidade ou graves violações de direitos hu-manos. O primeiro logradouro a ter o nome trocado será aRua Doutor Sérgio Paranhos Fleury,na Vila Leopoldina.

Fleury foi um delegado linha dura, que atuou no extintoDepartamento de Ordem Política e Social (Dops), e é acu-sado de praticar torturas e homicídios na ditadura. A ruapode ser rebatizada de Frei Tito, frade dominicano cea-rense que foi capturado por Fleury e torturado durante oregime autoritário.

Resgate históricoem espaços públicos

mitir ao povo brasileiro saber o que, de fato,aconteceu. Não é uma questão de revanchis-mo, é uma questão histórica, porque todossofreram com a ditadura, a começar pela baseda pirâmide social, que foi atingida em suaspequenas organizações, com a perda desuas lideranças comunitárias, que desapa-recem e nem constam nos relatos históri-cos. Conheço bem o atraso que a ditadura

representou para essas comunidades, a inter-ferência que ela trouxe à célula familiar e a dizimação prati-

camente total que promoveu nas famílias”, recorda a deputadaBenedita da Silva (PT-RJ), que à época da ditadura já participa-va dos movimentos comunitários.

RECOMPOR MEMÓRIA E PROMOVER JUSTIÇA

Para o deputado Nelson Pellegrino (PT-BA), a relevância dotrabalho da Comissão da Verdade, além de levantar a veracidadedos fatos históricos, é recompor a memória e promover a justiça. “Épreciso identificar na história do Brasil aqueles que mataram, quetorturaram, que espancaram, que fizeram desaparecer... É precisoidentificar aquelas pessoas que mentiram aos brasileiros ao dizerque havia uma ameaça comunista, quando na verdade o que sequeria era promover a qualidade de vida, era fazer as grandesreformas de que o Brasil precisa até hoje”, diz Pellegrino.

A Comissão Nacional da Verdade também pretende traçar umaradiografia da participação civil nas ações que levaram ao GolpeMilitar de 1964 e que deram sustentação à ditadura. A ideia, entreoutros pontos, é investigar que empresas apoiaram financeiramen-te o golpe e deram subsídios à repressão ao repassar informaçõessobre seus funcionários. Também pretende avaliar a amplitude doaparato estatal montado para perseguir trabalhadores.

“A importância da Comissão Nacional da Verdade é dar às fa-mílias uma explicação e uma posição que permita um basta a todoesse processo de tortura. Restaurar a verdade dos acontecimen-tos vai permitir dissipar esta página que manchou a democraciabrasileira”, opina José Airton (PT-CE). “O Golpe Militar trouxe pre-juízos elevados para a sociedade, porque sufocou o direito de or-ganização. Essa é uma marca vergonhosa na história do País. Coma comissão desvendando a história, conheceremos quem massa-crou a sociedade e cuidaremos para que isso não se repita”, anali-

sa Assis de Carvalho (PT-PI).A CNV trabalha, enfim, em várias frentes. Está engaja-

da numa rede com dezenas de outras Comissões da Ver-dade nos estados e nos municípios brasileiros. Está divi-

dida ainda em vários grupos de trabalho, cada um delesincumbido de desvendar aspectos específicos, casos emble-

máticos da época da Ditadura Militar. É a história se refazen-do, se recompondo...

AÇÕES REPARADORAS NA AMÉRICA

Diferentemente do Brasil, países como Argentina, Bolívia, Chile,Paraguai e Uruguai, entre outras nações latino-americanas, inicia-ram seus processos de Justiça Transicional de forma bem mais efeti-va e há muito mais tempo. Para o deputado Dr. Rosinha (PT-PR),apesar da criação da Comissão da Verdade, o Brasil é o país quemenos buscou a verdade sobre o seu regime ditatorial.

“A Argentina está punindo seus torturadores, seus ditadores. ABolívia, sobre a qual ouvimos tão pouco, também tem um dos seusditadores [Luis García Meza] na cadeia há mais de dez anos. O Chiletambém avançou muito, mas o Brasil começou atrasado esse pro-cesso e ainda não avançou muito”, lamenta o deputado.

Comissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuroComissão busca verdade para que passado ilumine presente e futuro

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“Bandidos terroristas – Procurados pelos órgãos de segurança nacional”. A frasecostumava estampar cartazes espalhados em locais de intensa circulação, com o ob-jetivo de angariar ajuda civil à caçada militar contra os opositores do regime de exce-ção. As fotos dos “criminosos” eram publicadas logo abaixo, geralmente acompa-nhadas de nomes e apelidos.

“Ao ver qualquer deles, avise ao primeiro policial que encontrar”. Era o chama-mento comum aos “cidadãos de bem”, a fim de que cooperassem para extirpar aameaça tão próxima que poderia estar bem ali, entre eles. “Ajude a proteger a suavida e a de seus familiares”. A intenção era passar a ideia de que os procurados eram“bandidos” perigosos: “Para a sua segurança, coopere, identificando-os”.

A sanha militar contra aqueles que se opunham ao governo dos generais nãopoupou estudantes, professores, militantes de esquerda em geral, artistas, intelec-tuais, índios, advogados, jornalistas, parlamentares, sindicalistas, camponeses... Mi-lhares de pessoas foram presas e torturadas. Centenas delas desapareceram, semque se saiba até hoje de que forma morreram e o que foi feito com seus corpos.

Dados do documento “Brasil: nunca mais”, produzido pela Conferência Nacionaldos Bispos do Brasil (CNBB) e compilado em 6.891 páginas, dão conta de 1.843 rela-tos de torturas de presos entre 1964 e 1979. O número é certamente bem maiselevado, já que os depoimentos foram tomados quando esses inimigos do regimeainda estavam sob o jugo do Estado repressor, o que pode ter feito muitos delesrecuarem na decisão de detalhar as torturas para evitar mais represálias.

Outras informações reveladoras estão no livro “Direito à Memória e à Verdade”,publicado no segundo governo do ex-presidente Lula, com a intenção de detalhar ostrabalhos da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, criada nogoverno de FHC. O objetivo da comissão era reconhecer formalmente caso por caso,aprovar a reparação indenizatória às famílias e buscar a localização dos restos mor-tais que nunca foram entregues para sepultamento. Em 11 anos de trabalho, 475casos de mortos e desaparecidos foram analisados pela comissão.

A Lei da Anistia, de agosto de 1979, trouxe ao convívio social brasileiro presos eexilados, mas sentenciou as famílias de mortos e desaparecidos à perda definitiva deseus parentes, já que, sequer eles retornaram sob a condição cidadã de mortos, sema formalidade de um atestado de óbito.

“Penso que não podemos construir um imaginário de Nação se não nos apropri-armos da nossa própria história. Isso é fazer o luto da ditadura. E o Brasil ainda nãofez esse luto, por isso, ainda convivemos com pedaços da repressão na nossa con-temporaneidade sem que possamos identificá-la como tal”, avalia a deputada ErikaKokay (PT-DF), integrante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara.

Para muitas famílias, a Lei de Anistia impôs uma condição humilhante ao eximir aditadura de suas arbitrariedades e evitar a elucidação dos crimes cometidos. Um doscasos emblemáticos de desaparecido e morto pela ditadura é o do ex-deputado fede-ral Rubens Paiva, que anteriormente havia sido cassado pelo regime, ficando exiladodo País. De volta ao Brasil, foi preso em janeiro de 1971 e nunca mais foi visto.

Diante do surgimento de fatos novos que podem elucidar sua morte e apontarseus culpados, a Comissão da Verdade, que está incumbida, dentre outras coisas, deinvestigar casos de mortos e desaparecidos, pediu recentemente ajuda da Câmarados Deputados na apuração do episódio.

Em 2012, a Câmara devolveu simbolicamente o mandato de Rubens Paiva, cassa-do em 1964, e agora está prestes a homenageá-lo com a inauguração de um bustono Anexo II da sede do Legislativo. Junto ao busto, a inscrição: “Deputado RubensPaiva – (1929-1971) – Defensor da liberdade e da democracia”. O deputado PauloTeixeira (PT-SP), um dos autores da homenagem, destaca o papel do Parlamentoneste momento de resgate da história.

“A Lei de Anistia precisa ser rediscutida para que os responsáveis pelas tortu-ras e desaparecimentos da época da Ditadura Militar sejam punidos. Nesse sen-tido, o Parlamento tem um papel central e decisivo, porque ele pode ajudar afortalecer a apuração dos casos de abusos de direitos humanos e pode rever aLei de Anistia”, avalia Teixeira.

Embora os documentos oficiaissubavaliem os números daviolência no campo, investigaçõessobre o tema dão conta de queela foi a mais implacávelperseguição cometida durante oRegime Militar. O livro“Camponeses Mortos eDesaparecidos: Excluídos daJustiça de Transição”, lançado noano passado, busca esclareceresse período da história e oreconhecimento oficial de 1.196casos de camponeses mortos edesaparecidos entre setembro de1961 e outubro de 1988 – sendo756 apenas no período dogoverno militar.A obra já foi encaminhada àComissão Nacional da Verdade,que tem uma subcomissão queanalisa especificamente os casosde violação aos direitos decamponeses e indígenas. Váriosdeputados do PT que militam hojena área do campo por reformaagrária e por melhores condiçõesde trabalho para camponeses ecamponesas, destacam a luta dequem foi vítima da perseguiçãodos militares.

“A Ditadura Militar foi um corteno movimento sindical rural, dasLigas Camponesas e de todo omovimento que estavaefervescente na luta pela reformaagrária. Os militares vieramreprimir e massacrar, mas oscamponeses permaneceram como seu trabalho, com as suasformas de lutas, e ressurgirambravamente ainda sob os efeitosdo golpe. Todas as conquistasposteriores em benefícios doshomens e mulheres do campo sãofruto dessa resistência”Beto Faro (PT-PA)

“A terra é sagrada para o camponês equando você mexe com ela

Perseguição acamponeses foia mais cruelda ditadura

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Dentre as milhares de vítimas da Ditadura Militar no Brasil, os indígenas pas-saram quase despercebidos, muito embora tenham sofrido as mais diversas for-mas de violência durante o governo militar. As técnicas dos algozes incluía, alémde métodos cruéis de tortura, trabalho escravo, cárcere privado, abuso sexual,caçada humana, apropriação e desvio dos recursos oriundos do patrimônio indí-gena, expulsão dos índios de suas terras e extermínio de tribos inteiras.

Esses e outros dados constam do Relatório Figueiredo, documento de quasecinco mil páginas produzido entre 1967 e 1968 e encontrado no ano passadono Museu do Índio, no Rio de Janeiro, pelo Grupo Tortura Nunca Mais de SãoPaulo. Elaborado pelo ex-procurador Jader de Figueiredo, coordenador de umgrupo que percorreu o País, o trabalho é resultado de uma comissão de investi-gação do extinto Ministério do Interior, que apurou denúncias de crimes come-tidos contra a população indígena. O dossiê era dado como perdido em umincêndio no ministério ocorrido há mais de quatro décadas.

Jader de Figueiredo e sua expedição percorreram mais de 16 mil quilôme-tros e visitaram mais de 130 postos indígenas. Após um ano, o Relatório Figuei-redo foi apresentado ao então ministro do Interior, general Afonso Augusto deAlbuquerque Lima. O documento teve repercussão internacional, e o generalAlbuquerque Lima chegou a recomendar a demissão de 33 pessoas do Serviçode Proteção aos Índios (SPI) e a suspensão de 17, mas, posteriormente, muitasdelas foram inocentadas pela Justiça.

Um dos muitos relatos contidos no dossiê descreve o “massacre do paralelo 11”,em que bananas de dinamite foram lançadas de um pequeno avião sobre a aldeiade índios Cinta Larga na divisa dos estados de Mato Grosso, Pará e Rondônia sobalegação de que era necessária a expansão de terras para a produção agrícola. Trin-ta pessoas morreram, apenas duas sobreviveram para contar a história.

A descoberta do documento também repercutiu no Congresso Nacional,onde a Frente Parlamentar de Apoio aos Povos Indígenas, presidida pelo depu-tado Padre Ton (PT-RO), iniciou uma série de debates sobre o Relatório Figuei-redo. “Essas atrocidades foram cometidas por funcionários públicos, ou seja,pelo Estado, que deveria proteger os índios e, ao contrário, foi conivente com omassacre. Tudo o que foi revelado pelo Relatório Figueiredo deve ser investiga-do, e os direitos dos índios reparados”, avalia Padre Ton.

Indignação é a palavra que define o sentimento de outros parlamentarestambém integrantes da Bancada do PT na Câmara sobre o conteúdo do Rela-tório Figueiredo. Para os deputados Amauri Teixeira (PT-BA), Edson Santos(PT-RJ), Leonardo Monteiro (PT-MG) e Zé Geraldo (PT- PA) o documento é “umaconstatação” do que foi o período ditatorial no Brasil. Amauri Teixeira afirmaque os indígenas brasileiros “foram vítimas de um verdadeiro massacre em ple-no século XX”. “Então é preciso mostrar à sociedade o quanto é ruim viver numregime ditatorial”, diz Teixeira.

Os parlamentares do PT defendem a apuração do conteúdo do ponto de vistahistórico. De acordo com os petistas, mesmo que os funcionários públicos res-ponsáveis pelos atos relatados no documento já não estejam mais vivos, “é im-portante apurar os fatos para que a sociedade brasileira conheça a verdade sobrea sua história e para que fatos como esses não voltem a se repetir no País”.

Relatório Figueiredomostra tortura eextermínio depopulação indígena

compromete interesses dos que nãoquerem que esse bem seja partilhadocom a maioria. Muitos doscamponeses desapareceram noRegime Militar porque resistiram,sabendo da importância que a terratinha para a nossa democracia.Lutaram pela reforma agrária, queaté hoje é atacada por setores daelite. Manter a terra sob domínio depoucos é manter o poder”.Luci Choinacki (PT-SC)

“Foi uma luta, de fato, intensa dostrabalhadores e das trabalhadorasrurais. Muitos até hoje sãoignorados, nunca foram localizados ereconhecidos como perseguidospolíticos. Eles deram uma grandecontribuição numa linha deresistência, de buscar criar condiçõespara superar a ditadura, para termosde fato um regime democrático. Aroça sempre fica por último,prejudicada e, às vezes, atédesprezada. É preciso reconheceressa luta.”Padre João (PT-MG)

“As Ligas Camponesas e asorganizações sindicais cumpriramum papel fundamental para omomento de democracia quevivemos hoje. O que causa surpresa éperceber que quem atuou no meiorural foi esquecido, e isso representaum prejuízo histórico, uma injustiça.É preciso que todos aqueles eaquelas que lutaram e defenderamsuas organizações sejamreconhecidos, porque o nosso Paísnão pode contar meia história.”Valmir Assunção (PT-BA)

“A luta camponesa da época daditadura foi uma luta pela reformaagrária, pela distribuição da terra,que começou no início da década de60 e que, com o Golpe de 64, sofreuuma perseguição e uma matança.Essa violência continuou mesmoapós o fim do regime. Foramcentenas e centenas de liderançascampesinas que foram perseguidas etorturadas. Essa resistência permitiuque fizéssemos a Nova República echegássemos à democracia.”Marcon (PT-RS)

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Os anais da história do Brasil revelam que o golpe que desestabi-lizou a democracia brasileira em 1964 contou com a participação desetores da sociedade, entre eles, a imprensa. Os editoriais dos gran-des veículos de comunicação à época, como os jornais O Globo, O

Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã, Folha de S.

Paulo e Diário de Notícias comprovam o alinhamento desses veícu-los ao Golpe Militar de 1964, que destituiu o então presidente daRepública, João Goulart. O presidente Jango, que prometia fazer re-formas de base no País, transformou-se em alvo a ser combatido.

As ideias abertamente defendidas e estampadas em editoriase manchetes no período que antecedeu o golpe e às vésperas de31 de março de 1964 clamavam pela intervenção militar, que pu-desse ser capaz de conter a “ameaça comunista” personificada nogoverno de João Goulart. Posteriormente, as manchetes dessesjornais festejavam o golpe e a ditadura que foi instalada no País.

“Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasi-leiros devem agradecer aos bravos militares que os protegeram deseus inimigos”, dizia o editorial do jornal O Globo, de 2 de abril de1964. Dois dias depois o mesmo jornal estampava em suas páginas:“Ressurge a democracia! Vive a nação dias gloriosos. (…), o Brasillivrou-se do governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo pararumos contrários à sua vocação e tradições”.

O editorial do Jornal do Brasil, do dia 1º de abril de 1964,afirmava que havia sido instalada no Brasil a “verdadeira” legali-

Golpe de 1964:Página infelizda imprensa

dade. Segundo o informativo, instaurou-se a “legalidade que ocaudilho não quis preservar, violando-a no que de mais funda-mental ela tem: a disciplina e a hierarquia militares. A legalidadeestá conosco e não com o caudilho aliado dos comunistas”.

O jornal o Correio da Manhã, de 31 de março de 1964, trazia oeditorial cujo titulo era “Basta!” “O Brasil já sofreu demasiado como governo atual. Agora, basta!” No dia seguinte ao golpe, com oeditorial intitulado “Fora!”, o Jornal Correio da Manhã grifou: “Sóhá uma coisa a dizer ao Sr. João Goulart: Saia!”

Já o jornal O Estado de S. Paulo, de 1º de abril, estampava o título“Minas desta vez está conosco!” Disse: “Dentro de poucas horas, essasforças não serão mais do que uma parcela mínima da incontável legiãode brasileiros que anseiam por demonstrar definitivamente ao caudi-lho que a nação jamais se vergará às suas imposições.”

Com a manchete, “Fugiu Goulart e a democracia está sendorestaurada”, o jornal O Globo afirmava que “atendendo aos ansei-os nacionais de paz, tranquilidade e progresso, as Forças Armadaschamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seusdireitos, livrando-a do amargo fim que lhe estava reservado pelosvermelhos que haviam envolvido o Executivo Federal”.

Sete anos depois, o jornal Folha de S. Paulo, afirmava em edi-torial do dia 22 de setembro de 1971: “Um governo sério, respon-sável, respeitável e com indiscutível apoio popular, está levando oBrasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça so-cial – realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que omundo todo reconhece e proclama”.

Em 1984, 20 anos depois, O Globo, em editorial assinado pelo jor-nalista Roberto Marinho, dono das Organizações Globo, reconhece oapoio dado à ditadura militar e a classifica de “revolução”. “Participa-mos da Revolução de 1964 identificados com os anseios nacionais depreservação das instituições democráticas, ameaçadas pela radicaliza-ção ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada”.

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Monopólios são “entulhos” do antigo regimeUm dos momentos emblemáticos da história da comuni-

cação no Brasil teve início no Golpe Militar de 64 com asrestrições impostas à imprensa brasileira pela ditadura e oreforço do modelo de concessões públicas de rádio e TV.

A concessão pública transformou-se em monopólio de pou-cos. Grupos empresariais e familiares dominaram os meios decomunicação do País. O modelo oriundo da década de 60, con-siderado entulho da Ditadura Militar perdura até os dias atuais.

Pesquisas revelam que o “latifúndio” midiático está sob odomínio de sete grupos familiares: Marinho (Globo), Civita (gru-po Abril), Frias (Folha), Saad (Bandeirantes), Abravanel (SBT) eMacêdo (Record). Pode-se incluir no rol dos grandes monopóliosa família Sirotsky, que controla a Rede Brasil Sul (RBS).

No campo da censura, lembram os deputados do PT PauloTeixeira (SP), André Vargas (PR), Paulo Pimenta (RS), Weli-ton Prado (MG) e Iriny Lopes (ES), o governo militar sabiado papel importante dos meios de comunicação na dissemi-nação da notícia e na formação da opinião pública. Aquelesque se opunham ao regime eram censurados.

“A restrição à liberdade de expressão, aliada à censura pré-via, foi um tormento na vida da imprensa brasileira. O regimemilitar controlava a manifestação artística, o conteúdo das obrasde arte e das matérias jornalísticas. Tudo tinha que passar pelamão dos censores. O povo brasileiro era impedido de conhecero que estava acontecendo no País”, lamenta Paulo Teixeira.

E a imprensa que serviu de aparelho ideológico na pre-

paração do Golpe de 1964 e contribuiu para a consolidaçãodo Regime Militar no Brasil também foi a que mais se bene-ficiou dele, construindo impérios de comunicação.

Para o vice-presidente da Câmara, deputado AndréVargas, “esse alinhamento da imprensa com o Golpe de 64,que derrubou um presidente eleito democraticamente,serve de reflexão para se tentar alterar o modelo deconcessão de rádio e TV que vem desde os anos 60 e privilegiauma minoria”.

O deputado e jornalista Paulo Pimenta observa que o mo-nopólio dos meios de comunicação mostra como a impren-sa foi beneficiada pelos serviços prestados ao Golpe Militar.“Um exemplo é a Rede Globo, considerado o maior conglo-merado de comunicação do País, que é parte integrante des-se cenário tenebroso da história brasileira e que ampliou seupoderio econômico a partir desse cenário”, observa.

O deputado Weliton Prado analisa que todos os veículosapoiadores do Golpe Militar foram beneficiados de alguma for-ma e ressalta “que o alinhamento com o momento histórico de64 serve como reflexão e mostra a necessidade de esse setorter regras claras, onde se aplicam direitos e deveres”.

Para a deputada Iriny Lopes, o Brasil, 50 anos depois, ain-da vive os ranços da ditadura. “Temos uma imprensa distantedo seu papel social. Ela mantém o monopólio, se comportacomo partido político no processo político nacional, não per-mite contraditório e não respeita direitos humanos”.

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Ao atuar contra o processo democrático, a mídia, que pregavaabertamente a deposição do presidente João Goulart, contribuiupara que fosse escrita a página mais triste e violenta da históriado País. História de repressão, torturas, assassinatos, sequestros,marcas desse período “nefasto”, que, sem o apoio expresso daimprensa, não teria acontecido. Essa é a opinião de deputados daBancada do PT na Câmara.

“Foi claro o engajamento dos principais jornais e dos canais detelevisão ao Golpe Militar de 64. O Globo, Folha de S. Paulo, Estado

de S. Paulo, entre outros, foram, de fato, responsáveis pela criaçãode um clima desestabilizador da democracia, que gerou o golpe quedestituiu João Goulart”, lamenta Fernando Ferro (PT-PE). Esses veí-culos, ao anunciarem apoio ao golpe, contribuíram para a constru-ção de uma ditadura sangrenta, com perseguição política, cercea-mento de liberdade, censura às manifestações culturais, tortura,mortes e atentados.

“No Brasil aconteceram vários atentados à bomba, como odo Riocentro, o da sede da OAB no Rio de Janeiro, além dastorturas que levaram à morte de Rubens Paiva, Vlademir Herzog(Vlado) e Manoel Fiel Filho”, lembra Fernando Ferro.

O deputado Jorge Bittar (PT-RJ) classifica todo o processo quelevou ao Golpe Militar de “profunda agressão” à democracia. Deacordo com ele, à época, foi feita uma campanha que distorcia osentido do programa de reformas de presidente João Goulart. “Jan-go tinha clareza de que precisava construir o caminho de desenvol-vimento para o País. Esse desenvolvimento seria mais independen-te e não alinhado às políticas dos países desenvolvidos, emboraGoulart pretendesse manter um relacionamento democrático comesses países”, lembrou. Bittar frisou que nesse período a imprensaassumiu “uma postura claramente golpista e continuou dando sus-tentação aos governos militares”.

Partidos políticos – Jorge Bittar avalia que alguns veículos da impren-sa brasileira mantêm o mesmo viés de décadas passadas. Eles funciona-vam à época e, até hoje funcionam, como se fossem partidos políticos enão órgãos de imprensa. “O que me causa estranheza é que esses jornaisnão fizeram autocrítica e continuam a atuar segundo seus interesses po-líticos, muitas vezes distorcendo a notícia, para fortalecer o seu projeto depoder”, diz Jorge Bittar.

Na mesma linha, o deputado Nazareno Fonteles (PT-PI) destacaque esses grupos de comunicação continuam tendo um peso muitogrande no debate político. “Exercem o papel de opositores políti-cos ao lado de grupos financeiros, econômicos e políticos do País,na linha sempre conservadora, evitando as reformas progressistasde interesse do povo e atravancando o avanço do processo demo-crático do País”, analisa Nazareno.

Imprensa alternativa – O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) reco-nhece que a imprensa brasileira foi “conivente” com o golpe quedestituiu João Goulart. Por outro lado, exalta aqueles veículos queresistiram ao apelo golpista e da ditadura militar. Entre eles, Teixeiradestacou a atuação dos jornais alternativos Opinião, Movimento,Em Tempo e Pasquim. “A resistência desses jornais merece nossoreconhecimento e homenagem. Eles enfrentaram a censura e as ar-bitrariedades impostas pelo regime, sem se abaterem. Aos poucos,foram rompendo esse cerco”, observa Teixeira.

Sem apoio da mídia,golpe não vingaria

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Mais recentemente, um dos episódios que gerou revolta nasociedade brasileira foi o editorial do dia 17 de fevereiro de 2009,do jornal Folha de S. Paulo. O jornal dizia que o regime ditatorialbrasileiro (1964-1985), se comparado com as ditaduras de outrospaíses da América Latina, teria sido uma “ditabranda” – ou seja,“menos violenta”.

“É estranho esse jornal dizer que a repressão que ocorreu noBrasil pode ser classificada de ‘ditabranda’. Ora, o que aconteceuaqui foi uma ditadura violenta e sangrenta. Os atentados a bom-ba e a tortura que aconteceu nos cárceres no DOPS e no DOI-CODI foram iguais àqueles praticados na Argentina, Uruguai e Chi-le”, critica o deputado Fernando Ferro.

“Não há ditadura branda. Houve regimes militares truculen-tos que abrangeram toda a América do Sul. Mataram pessoas, in-terromperam vidas de famílias, impediram jovens de colocar emprática seus ideais. Isso representou um atraso não só para a de-mocracia, mas para o desenvolvimento do nosso País”, completao deputado Jorge Bittar.

Folha causa indignaçãoao chamar ditadura

de “ditabranda”

“Ressurge a democracia! Vive a nação

dias gloriosos. (…), o Brasil livrou-se

do governo irresponsável, que insistia

em arrastá-lo para rumos contrários

à sua vocação e tradições”.

“O Brasil já sofreu demasiado com

o governo atual. Agora, basta!”

“Só há uma coisa a dizer ao Sr.

João Goulart: Saia!”

“Um governo sério, responsável,

respeitável e com indiscutível

apoio popular, está levando o

Brasil pelos seguros caminhos

do desenvolvimento”

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EUA:participação decisivano Golpe Militar de 1964

gãos de fachada mantidos pela CIA e grupos empresariais para aguerra psicológica e defesa dos interesses do tio Sam. Instilavamsentimentos ‘’democráticos’’ e anticomunistas no Congresso, nasForças Armadas, na Igreja e em outros setores da sociedade.

A televisão e demais meios de comunicação faziam o serviçode doutrinação diária, alimentados com fartos recursos vindosdo Ibad e Ipes, veiculando material feito por inspiração da CIA.

A CIA estava onipresente, até entre as senhoras católicas daMarcha da Família com Deus e pela Propriedade. É o que mostrao cientista político Luiz Alberto Moniz Bandeira, autor, entre ou-tras obras, de O Governo João Goulart - As lutas sociais no Brasil

(1961-1964). “Ninguém mais pode negar o papel dos EUA no gol-pe, está tudo comprovado”, diz Moniz Bandeira.

Ele alerta que as ameaças continuam contra os governos pro-gressistas da América Latina. “Hoje a estratégia de desestabilizaçãofoi aperfeiçoada, como pode-se ver na derrubada do presidente daUcrânia, Viktor Yanukovich, e que eles tentam fazer na Venezuela”.Mas ele não vê, hoje, maior perigo para a democracia brasileira.“As Forças Armadas, no Brasil, não estão dispostas a dar qualquergolpe de Estado. Têm consciência que foram desgastadas peladitadura e que o fundamental é manter hierarquia e a disciplina, oque começa pelo respeito ao Presidente da República”.

O deputado Dr Rosinha (PT-PR) alerta que os governos progressistasda América Latina continuam como alvo permanente do imperialismodos EUA, pois têm práticas que contrariam os interesses de Washington,como o sepultamento da Alca e a solidariedade a Cuba. “A presentecampanha contra a Petrobras, com certeza é promovida por interessesdos EUA e seus prepostos aqui, de olho na mega jazida do Pré-Sal”.

Fernando Marroni (PT-RS) e Josias Gomes (PT-BA) lembram queas recentes revelações de espionagem dos EUA sobre governos devários países, incluindo o Brasil, indicam que a CIA e outros órgãosde segurança dos EUA são permanentemente uma ameaça. “Podenão haver golpes nos moldes tradicionais, mas há ações para favore-cer interesses dos EUA, como espionagem relacionada ao Pré-Sal e àPetrobras”, diz Marroni. “Os EUA conti-nuam com métodos antidemocráticos,na defesa de seus interesses imperialis-tas. Nossas instituições são sólidas, masprecisamos ficar atentos”, afirma Josias.

Para Jesus Rodrigues (PT-PI), osEUA deviam fazer um pedido de des-culpas para o Brasil e todos os paíseslatino-americanos onde sangrentosgolpes militares foram patrocinadospela CIA. “O pior é que há ainda essas

ações desestabilizadoras, que provocam mortes e turbulências,como ocorre hoje na Venezuela. Espionam e até no Brasil continu-am atuando, há suspeitas de boicote dos EUA ao Programa MaisMédicos, por contar com cubanos. É preciso manter vigilância” .

Para Luiz Sérgio (PT-RJ), fica clara a hipocrisia dos EUA. “Di-zem respeitar os ideais democráticos, mas ajudaram de maneiradecisiva a instalar, no Brasil e na América Latina, ditaduras san-grentas em nome de seus interesses econômicos e geopolíticos”.

O deputado Marco Maia (PT-RS) aponta a permanência de se-quelas do regime militar, como na área de educação. “Os militaresassinaram acordo com os EUA, priorizando o ensino privado em detri-mento do público. Lutamos até hoje para aproximar cada vez mais o

aluno da educação pública”. Ele lembraque o Brasil tem riquezas que desper-tam cobiças externas, como o Pré-Sal ea biodiversidade da Amazônia.

Pedro Uczai (PT-SC) sublinha que osEUA têm sofisticado esquemas de espio-nagem e se aliam a elites subalternas paratentar detonar governos progressistas.“Cabe a nós enfrentarmos essas ameaçase defender nossa soberania e o principioda autodeterminação dos povos”.

...Os EUA deviam fazerum pedido de desculpas

para o Brasil e todos ospaíses latino-americanos

onde sangrentos golpesmilitares foram

patrocinados pela CIA.

“”

Petistas alertam que governos progressistascontinuam alvo do imperialismo

Documentos recentemente revelados comprovam a participaçãodecisiva do governo dos Estados Unidos, numa aliança com as clas-ses dominantes do País, na realização do Golpe Militar de 1964. Parasepultar as reformas de base, e com elas a democracia, usaram-sefartos recursos financeiros oriundos da CIA para irrigar as contas depolíticos de direita, sindicatos, imprensa e militares golpistas. O go-verno João Goulart era reformista, mas para os reacionários brasilei-ros e Washington era ‘’comunista’’ e podia “cubanizar” o Brasil.

Jogou-se um vale-tudo: guerra psicológica com apoio de meiosde comunicação, sabotagens, guerras econômicas, ameaças, finan-ciamento de candidatos a cargos eletivos, assassinatos, suporte apasseatas contrárias ao governo popular de Jango. As técnicas dedesestabilização aplicadas no Brasil foram depois repetidas em pa-íses da América Latina, para sepultar democracias e pôr em seulugar governos sanguinários alinhados a Washington.

A embaixada dos EUA, então no Rio de Janeiro, em 1963, con-tava com 1200 funcionários, dezenas da CIA. Era um QG do golpe,sob liderança do embaixador Lincoln Gordon e do general Ver-non Walters, encarregado das conexões com os militares golpis-tas brasileiros. Surgiram entidades como o Ibad (Instituto Brasi-leiro de Ação Democrática) e o Ipes (Instituto de Pesquisa e Estu-

dos Sociais), ór-

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Quem viveu o Regime Militar como eu vivi, menino ainda, nãodeseja jamais que a atual ou as futuras gerações revivam aquele pe-ríodo. Ditadura nunca mais. As afirmações são do deputado JoséGuimarães (PT-CE), que, naquela época, não compreendia o signifi-cado da prisão do seu irmão, o ex-deputado José Genoino . “E só vima compreender o significado daquela prisão bem depois. Uma prisãopor ele lutar contra um regime que oprimia, que torturava e negavaos direitos elementares de cidadania”.

José Guimarães recorda que tinha nove anos de idade quan-do a sua família recebeu a visita de Genoino, lá na comunidadede Várzea Redonda, distrito de Encantado, em Quixeramobim (CE).“Ele veio de Fortaleza, onde estudava, se despedir da família. Asua frase ficou gravada na minha memória. Ele disse que estavaindo embora e não sabia se algum dia voltaria. Genoino estavaindo para a Guerrilha do Araguaia”. Emocionado, Guimarães lem-bra que esse momento foi muito duro e de profundas incertezas.

“Naquela época, nossa família não compreendia as razõespelas quais José Genoino estava fazendo esse caminho inverso ade qualquer filho de pequeno agricultor familiar cearense”. O na-tural, segundo Guimarães, seria ir para a cidade grande fugindoda seca, estudar e ajudar a família.

O deputado destaca que em Várzea Grande não tinha luz, nãotinha água tratada e não tinha banheiro. “E Genoino saiu dali nãoapenas para mudar a realidade da nossa família. Ele foi para aluta armada acreditando que mudaria a realidade do nosso País”.

Nessa volta ao passado, José Guimarães relembra um dosmomentos mais duros para a sua família nesses anos em queGenoino ficou na clandestinidade. “Ele sumiu. Só deu notícia em1974. Minha mãe, que era muito religiosa, nas principais datascatólicas rezava e nos obrigava a rezar pela alma dele. Ela tinha osentimento de que Genoino tinha sido jogado no mar”.

Outro momento difícil, recorda Guimarães, foi quando rece-

História do PT de hoje seráreescrita, assim como a da geraçãode 68 foi recontada, diz Guimarães

Capítulo dos mais emblemáticos do período ditatori-al, a Guerrilha do Araguaia foi um movimento de resistên-cia armada aos militares no poder, com atuação localizadana região conhecida como “Bico de Papagaio”, abrangen-do áreas fronteiriças do Pará, Maranhão e Goiás (atual-mente Tocantins). O foco guerrilheiro foi instalado por vol-ta de 1967 e durou até 1974, quando todos os seus partici-pantes foram presos, assassinados ou deixaram o local.

O ex-deputado José Genoino foi um dos protagonis-tas do episódio, que gerou uma condenação ao Estado brasileiro na Corte Inte-ramericana de Direitos Humanos, em 2010, em razão de ainda não terem sidolocalizados os restos mortais de vários militantes desaparecidos, tidos comoexecutados pelas tropas do Exército enviadas para reprimir a guerrilha.

Genoino relata que a experiência “marcou profundamente” sua vida e que aluta armada era considerada uma “opção factível” na época. “Todo mundo, dageração de 68, tinha em relação à luta armada uma opção concreta. Ou você iapara o exílio ou era preso e torturado. A outra opção era tentar sobreviver na lutaarmada, que também poderia acabar em tortura e prisão”, explica o ex-parlamen-

beu uma carta dirigida à sua fa-mília informando que Genoinoestava preso em Fortaleza. “Foiuma explosão de sentimentos,de dor, de choro, de tristeza e dealegria. Ele saiu de casa quandoeu tinha 9 anos e quando eu o vi de novo eu já estava com 17.Foram oito anos sem vê-lo, sem notícias, sem qualquer contato.Tudo isso marcou profundamente a família”.

José Guimarães conta que todos esses acontecimentos o leva-ram a ingressar na luta do Comitê Brasileiro pela Anistia. “Eu in-gressei, a princípio, para tentar soltar meu irmão. Essa militânciae as conversas com Genoino, no entanto, me levaram ao caminhoda política, do PT e do nosso programa partidário para a constru-ção de um Brasil mais justo e democrático”.

Atualmente Guimarães e sua família reviveram momentos di-fíceis com uma nova prisão do ex-deputado Genoino. “Quandofui visitá-lo pela primeira vez no presídio aqui em Brasília, eu olheiaquele muro...., as grades, parecia que eu estava revivendo o anode 1976 e os portões verdes do presídio Paulo Sarasate. Foi umacoisa violenta, dilacera, corta o coração e a alma”. A diferençaagora, segundo Guimarães, é que Genoino tem mais solidarieda-de. “As pessoas sabem que o que ele está passando é uma perse-guição contra o PT, contra o nosso projeto”.

Assim como a história da geração de 68 foi recontada e aplau-dida pelo Brasil, essa história de hoje, do PT, acredita Guima-rães, vai ser reescrita. “Mais cedo ou mais tarde, eles vão serabsolvidos, inocentados. A sociedade vai percebendo que o quehouve foi uma ação milimetricamente pensada para criminali-zar o PT, colocar o partido na clandestinidade e inviabilizar ogoverno Lula. Mas a democracia que construímos é tão forteque conseguimos sobreviver”.

Guerrilha do Araguaia: Luta armada foi tentativade resistência de setores da esquerda

28/3/2014 PT NA CÂMARA

tar, que registrou sua memória sobre a Guerrilha no livro“Entre o sonho e o poder: a trajetória da esquerda brasilei-ra através das memórias de José Genoino”.

Para Genoino, a fragmentação da esquerda, acossa-da pela repressão do governo, é um elemento prepon-derante daquele período e que se refletiu também nasações das guerrilhas urbanas e rurais. “A esquerda sepulverizou muito naquela época, havia várias organiza-ções de esquerda de luta armada e cada uma tinha sua

estratégia, sua tática e seu cenário. Pelas próprias condições da época, era muitodifícil haver uma ação coordenada de toda a esquerda. Quando veio o AI-5aquilo tudo se aprofundou ainda mais”, conta Genoino.

Genoino crê que na Guerrilha do Araguaia se repetiu a tradição de forterepressão do Estado às lutas sociais. “Cabe hoje à população, aos políticos, àacademia, analisar os fatos. Trata-se de uma experiência de luta na qual amaioria dos integrantes foi morta. E de uma maneira que repete a históriadas rebeliões populares do Brasil, com suas cabeças cortadas, aniquilações esumiço de corpos”, compara Genoino.

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Zarattini ainda luta porreparação ao pai que foivítima da ditadura

O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) viveu a adolescência no período mais obscuro da nossa história - a Ditadura Militar. Filho do ex-presopolítico Ricardo Zarattini, ele viu bem de perto as violações de direitos humanos e conheceu o sabor amargo das perseguições. Cresceu convivendocom a ausência do pai que, além de preso e torturado, foi banido do Brasil.

Emocionado, Carlos Zarattini conta nesta entrevista que não teve dificuldades para entender a determinação do seu pai na luta por um Brasil melhor,mais justo e democrático. “Eu compreendia, mas sentia a sua falta. Houve momentos muito doloridos, passamos um longo período sem nenhum contato.Tudo isso marca profundamente. Era preciso muita politização para entender tudo aquilo e não se submeter aquela visão estereotipada da oposição, queconsiderava terroristas aqueles que lutavam contra o Regime Militar”.

Carlos Zarattini destaca, com a voz embargada, que a Comissão da Verdade foi fundamental para inocentar publicamente seu pai da acusaçãode ter sido um dos responsáveis pelo atentado a bomba no aeroporto de Guararapes, em Pernambuco. “A gente tinha a convicção da inocência dele,mas é muito bom ver essa reparação, ver corrigida uma injustiça”.

O que foi o Golpe Militar para o senhor e como foi serum adolescente filho de pai militante e um dos prota-gonistas da luta contra a ditadura e pela democratiza-ção do Brasil?

Primeiro, é preciso lembrar que esse foi o períodomais sombrio da nossa história. Foram anos muito difí-ceis, nos quais nós perdemos todas as nossas liberdades.O Brasil retrocedeu do ponto de vista democrático, viví-amos em um ambiente de grande opressão. Qualquer possi-bilidade de manifestação era reprimida duramente, in-clusive com a prisão de pessoas que muitas vezes tinhampouquíssima participação nas manifestações oposicionis-tas. Então, foi muito difícil, eu tive uma infância euma adolescência muito dura. Meu pai estava diretamenteenvolvido nesse processo. Ele foi perseguido e presovárias vezes pela ditadura militar.

E como o senhor conviveu com esses períodos de ausên-cia do seu pai?

Mesmo com o meu pai agindo na clandestinidade, nósnos encontrávamos bastante. Eu tinha 9 anos de idadenesta época e, quando a gente se encontrava, nósconversávamos muito. Ele me explicava o que estava acon-tecendo, o porquê de tudo aquilo. Eu nunca tive dificul-dade para entender, mas eu sentia a sua falta. Houvemomentos muito doloridos, por exemplo, quando ele foipreso, torturado e depois banido do Brasil. Passamos umlongo período - foram quase dois anos - sem nenhumcontato. Tudo isso marca profundamente.

Quais as principais lembranças que o senhor tem doRegime Militar?

São muitas as lembranças, algumas boas e alegres,outras bem tristes, de muito sofrimento. As boas eramquando nós encontrávamos com o meu pai, tanto aqui noBrasil como depois que ele foi banido,encontros em Cuba onde ele estava exila-do. Também o encontrei no Chile e na Ar-gentina. Então, foram vários momentos bonsdentro daquela noite que era a ditaduramilitar. Os momentos amargos eram quandochegavam notícias ruins, como as de quan-do ele era preso, que ele estava sendotorturado. Eu me lembro de um momento -em 1978 – quando ele viveu um novo perí-odo na clandestinidade aqui no Brasil etinha sido preso outra vez - isso no go-

verno do general Ernesto Geisel - e eu tive a oportuni-dade de encontrá-lo no Dops (Departamento de Ordem Polí-tica e Social). A situação era muito crítica e ele mepediu que denunciasse o que estava acontecendo. Foi ummomento muito difícil. Então, fomos na Folha de S.Pauloe encontramos o Perseu Abramo lá, que nos apoiou.

E a vivência nesse ambiente, as conversas com seu pai,isso te influenciou na escolha da carreira política?

Sem dúvida toda essa vivência me proporcionou umapolitização muito grande. Eu tinha a clareza do queestava acontecendo no Brasil. De que lado cada um esta-va. É bom dizer que naquela época os oposicionistas,aqueles que eram contrários ao Regime Militar, eramqualificados de terroristas. Era preciso muita politi-zação para entender tudo aquilo e não se submeter aquelavisão estereotipada da oposição.

E como é agora, com o trabalho da Comissão da Verdade,ver o seu pai inocentado das acusações e de crimes aele imputados, inclusive a história da bomba noaeroporto de Guararapes em Pernambuco?

É muito bom ver essa reparação pública, ver corrigidauma injustiça. A gente tinha a convicção da inocênciadele o tempo todo e também já tínhamos muitas provas,mas a Comissão da Verdade foi fundamental porque elesencontraram um documento da própria Agência de Informa-ções da Aeronáutica afirmando que não tinha sido ele.Então, isso já estava documentado desde 1970 e ficou láescondido. Durante muitos anos, mesmo com todas as pro-vas da sua inocência continuava-se dizendo que ele era oautor daquele atentado. E a luta não acabou ainda, agoramesmo estamos brigando para que o Supremo Tribunal deJustiça condene o jornal Diário de Pernambuco – que é umjornal conservador – que passou todo esse período

acusando ele (meu pai) de ter feito esseatentado. Já ganhamos em primeira ins-tância, mas eles recorreram ao STJ e es-tamos nessa luta para que o Supremo reco-nheça o erro e condene o Diário de Per-nambuco.

E o que é o seu pai para você? Ah! Ele é o meu grande amigo. Ele

sempre me apoiou muito. Em todos os mo-mentos eu contei com ele 100%, ou melhor,o seu apoio foi de 150%.

DEMOCRACIA

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Zeca Dirceu: “Cresci como exemplo do meu pai deluta pelo Brasil”

O deputado Zeca Dirceu (PT-PR), 35 anos, não viveu o período da ditadura, não viu o Golpe de 64, mas cresceu no lar de um dos protagonistasda luta pela democratização do Brasil, o ex-deputado José Dirceu (SP). Compreendeu muito cedo que o povo é capaz de ser o agente das suaspróprias transformações, que era possível mudar o País, melhorar a vida das pessoas. E isso foi o seu combustível. “Eu, na verdade, cresci como umjovem que não viveu naquela época, mas que tinha todas as referências e perspectivas do que aconteceu. Talvez, até por isso, entrei prematuramentepara a militância estudantil e política”.

Pelo seu DNA político, ele, que não sofreu as perseguições da ditadura, tem enfrentado patrulhamentos na sua vida pública, principalmente nasduas vezes em que foi prefeito de Cruzeiro do Oeste (PR). “Eu sabia que não poderia cometer nenhum pequeno erro porque ele se transformaria emum erro de repercussão nacional”.

Emocionado, Zeca Dirceu fala nesta entrevista da sua família, lembra sequelas e traumas e destaca o exemplo do sucesso e as vitórias quevieram com a democratização do País. Otimista, mesmo acompanhando “uma nova história de perseguição” a seu pai, acredita que ele (José Dirceu)vai dar a volta por cima. “Meu pai sempre teve atitudes corretas que hoje são incompreendidas por uma parcela da população, pelo próprio Judici-ário, como também foram incompreendidas as atitudes dele na época da ditadura. Ele foi preso, torturado, foi banido do País. Pagou um preço atémais caro naquele período, mas ele estava certo. Eu não tenho nenhuma dúvida de que o tempo vai fazer justiça ao meu pai”.

O que foi para o senhor a ditadura no Brasil? Foi um período amargo que levou o Brasil a perder

décadas de avanços sociais e de desenvolvimento. Um perí-odo em que muitas pessoas tiveram os seus direitos deliberdade e de expressão podados. Levou tempo para o povoentender as vantagens da democracia. Eu nasci em 1978,sou uma pessoa que praticamente não viveu esse períodoobscuro . Agora eu estudei, li e tive a convivência com omeu pai que participou efetivamente da luta contra aditadura, pela redemocratização do País. A história deleno período em que eu ainda não tinha nascido, no Paraná,em Cruzeiro do Oeste, na clandestinidade, na busca jápela retomada de discussão da organização do País, ficouno meu DNA. A minha mãe também me conta períodos da vidadela de estudante, de toda a repressão daquela época. Eucresci como um jovem que não viveu naquela época, mas quetinha todas as referências do que aconteceu. Talvez, atépor isso, prematuramente comecei a participar dos movi-mentos sociais e das organizações estudantis. Me torneisecretário municipal com 21 anos e prefeito com 25 anos eme elegi deputado federal com 32 anos.

Sua infância foi no pós-ditadura. Que lembranças temdesse período, como era a convivência com o seu pai?

Eu vou falar do sentimento que vejo na minha família.Tem dois opostos. Vou citar o exemplo da minha avó mater-na. Ela teve sequelas, traumas daquele período em queficou sem ter notícias do meu pai, talvez por mais de umadécada. Muitas vezes ela imaginava que ele estava morto,desaparecido. E depois, mesmo com o fim da ditadura, coma anistia, ela continuava com medo. E tem o outro lado,ai eu falo por mim, por meus primos e minhas irmãs. Todosnós crescemos com o exemplo e o espírito de luta que eledemonstrou. Ele arriscou a vida, se desapegou da famíliapara lutar pelo Brasil, pela democracia,para buscar o fim da ditadura.

O senhor enfrenta pressões, as pessoaso comparam com seu pai?

Eu sempre me senti muito patrulhado.Não chegou a ser ruim porque isso me fezcada vez ter mais cuidado com a maneira deconduzir as coisas. Eu sabia que não pode-ria cometer nenhum pequeno erro porque ele

teria repercussão nacional. Eu fui prefeito por duas vezese sempre tive esse zelo e cobrei da minha equipe. Deucerto, terminei os meus dois mandatos com minhas contasaprovadas, nunca respondi processo. Estou exercendo o meuprimeiro mandato de deputado federal na mesma linha. Agoratambém tem o outro lado positivo. Meu pai tem a históriaque ele tem. Ter o envolvimento familiar que eu tenhosempre me pareceu uma credencial, embora eu nunca tenhausado disso. Sempre procurei escrever a minha história domeu jeito, com as minhas convicções. Mas acabou sendo umareferência. Tanto é que o meu nome foi mudando. Eu era oZeca, depois passei ser o Zeca do PT e depois de 2003 aspessoas - eu nunca divulguei isso - foram me chamando deZeca do Dirceu e, por fim, Zeca Dirceu.

Como está sendo viver esse momento atual em que seupai, de certa forma, está revivendo uma história deperseguição, de cassação e de prisão?

Com a mesma convicção com que ele (meu pai) lidou noperíodo da ditadura. Com a mesma convicção que a minhafamília lidou. Que ele vai dar a volta por cima. Elesempre teve atitudes corretas que hoje são incompreen-didas por uma parcela da população, pelo próprio Judici-ário, como foram incompreendidas na época da ditadura.Ele foi preso, torturado, banido do País. Pagou um preçoaté mais caro naquele período, mas ele estava certo. Eunão tenho nenhuma dúvida de que o tempo vai fazer justi-ça e ele vai, daqui a 5 ou 10 anos ser reconhecido portudo que viveu e que está sofrendo.

O que é o seu pai para você?É uma pessoa que eu amo e admiro. Hoje sofro junto com

ele por tudo que está vivendo, mas confio na garra dele,na capacidade dele para se superar. Ele vai dar a volta

por cima. Ele está preparado para qualquerdificuldade e eu sempre digo isso obser-vando o que ele fez com a saúde dele, comose cuidou. Meu pai, talvez, estava progra-mado pra viver até os 85, 90 anos, como aminha avó, que tem 93. Mas ele se repro-gramou para viver até os 100, 110. Então,se alguém acha que vai conseguir tirar eleda vida pública, do convívio com o País,vai ter que esperar ai uns 40 anos.

DEMOCRACIA

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22 PT NA CÂMARA 28/3/2014

Faria tudo de novo. Não conseguiria não fazer. Assim o deputadoPedro Eugênio (PT-PE), que foi preso e torturado no período da DitaduraMilitar no Brasil, começa a relembrar a sua militância estudantil epolítica, iniciada na década de 60. Muitas vezes com lágrimas nos olhose com a voz embargada, ele vai buscando na memória fatos que mar-caram a sua história e a sua luta por um País mais justo e democrático.“Eu sou hoje o que se construiu nesses anos. Só tenho a agradecer ocurso da vida por ter me colocado nesse caminho”.

Nesta breve visita a seu passado, Pedro Eugênio faz questão dequebrar “um certo estigma” que coloca os militares contra o povoe o povo contra os militares. “Sou filho de coronel do Exército, dalinha progressista da corporação. Ele faleceu em setembro de 1963,poucos meses antes do golpe mas aprendi com o meu pai a ter umsentimento muito forte de justiça. Ele nunca me disse para ser deesquerda, mas pelo seu exemplo eu aprendi que o lado do povoera o lado correto. E esse ensinamento guiou a minha vida”.

Mesmo estudando em Colégio Militar, ele era engajado nasdiscussões da história e da sociedade. Foi vice-presidente da soci-edade literária, que pelo rigor do Colégio Militar, equivalia a umdiretório acadêmico. Passou um ano estudando fora do Brasil(1967/68). Quando voltou, ingressou nas faculdades de engenha-ria e de economia, onde reencontrou colegas. “Isso foi logo de-pois do AI 5 e do Decreto 447, do Jarbas Passarinho, que proibiaatividades políticas nas universidades. Mesmo assim, começamosuma militância em condições extremamente precárias porque jáencontrei os diretórios destruídos do ponto de vista jurídico, ins-titucional e físico. Passaram trator por cima”. Naquele momentoquem quisesse ter algum tipo de atividade legal não conseguia.

“Ou você não fazia nada ou tinha que fazer de forma ilegal eclandestina ao mesmo tempo”, conta Pedro Eugênio, que optou pelasegunda alternativa. Foi nesse processo que ele se juntou ao PartidoComunista Brasileiro Revolucionário (PCBR). A sua participação eradar suporte para companheiros que precisavam de apoio, como SáBenevides, que era o coordenador geral do trabalho do partido.

Prisão e Tortura – O deputado reconhece que fazia um traba-lho que tinha um potencial de risco muito grande porque não esta-va apenas ligado ao movimento estudantil. “Embora não militassena linha de frente, eu estava em contato com aqueles que erammuito procurados pela polícia por terem participado de ação”. Asua prisão aconteceu em 1972, apósum acidente de carro que matou SáBenevides e a sua esposa Míriam Ver-bena, que também era militante dopartido. “Essas mortes nunca foram es-clarecidas. Acredita-se que foi uma ar-madilha para prender todos os que es-tavam ligados ao Sá Benevides”. Depoisdisso, recorda Pedro Eugênio, a polí-cia prendeu todos os que tinham semobilizado para apurar alguma coisa

sobre essas mortes. “E foi neste processo que me prenderam juntocom mais 28 companheiros(as). Ficamos presos e fomos tortura-dos, no DOI – CODI (Centro de Operações de Defesa Interna)”.

O deputado faz questão de informar que em Recife o DOI-CODI funcionava no interior do quartel general do Exército. “Oque evidentemente tira qualquer possibilidade de ser uma ins-tância desconhecida das autoridades militares da época. Nãoera no subúrbio, em que se poderia dizer que a tortura era feitapor um grupo paramilitar. Infelizmente se tratava de algo insti-tucionalizado, embora clandestino e também ilegal”. SegundoPedro Eugênio, “eles colocavam o capuz e logo já começava apancadaria. Foi um mês de tortura”, relembra Pedro Eugênio,na época com 23 anos. “Não tinha hora, era de manhã, de noi-te, de madrugada a gente até perdia a noção de tempo”.

Pedro Eugênio conta que a sua família sofreu muito com a faltade notícias suas nesse período. “Era difícil fazer contato, minha famí-lia era vigiada, a minha namorada – hoje minha esposa Carminha –era perseguida. Ela, inclusive, não conseguiu me repassar dinheiropara minha fuga, antes da minha prisão. O que pode ter salvo aminha vida, pois eu iria para o Rio de Janeiro, onde eu acreditava serpossível fazer contato com o pessoal do partido, mas um ano depoistodos companheiros que foram para o Rio estavam mortos”.

Recomeço - Com medo, deixou a militância assim que foi ino-centado e liberado da prisão. Passou nove meses preso. Foi traba-lhar como vendedor, mesmo tendo passado em concurso público,por causa da “ficha suja”. “Por uns quatro, cinco anos, não militei.Fiquei muito apavorado, com medo e tendo pesadelos. Hoje, quan-do penso em tudo que eu passei naquele período, eu nem enten-do como eu consegui organizar a minha cabeça, não ficar doido.Acho que a gente não faz isso conscientemente. Uns conseguem,outros não, muitos companheiros ficaram loucos até morrer”.

Pedro Eugênio só voltou a militar no período da redemocrati-zação. “Eu já estava mais estruturado e voltei a militar, não partida-riamente, mas em movimento social”. Em 1987 entrou de vez napolítica, primeiro como secretário de Agricultura do governo Arraes,em Pernambuco, depois foi deputado federal, foi presidente doBanco do Nordeste no governo Lula e novamente deputado federal.

Anistia – Por opção, Pedro Eugênio é um dos poucos militantesque não entrou com processo de anistia para receber indenização.

“Respeito quem tem o direito e pediu a re-paração. Mas eu não fiquei com sequelasnem física nem psicológica que me impe-disse de trabalhar. Superei tudo isso, estu-dei e conquistei os meus espaços públi-cos, políticos e institucionais de trabalho ede militância política. Portanto, não voupedir uma indenização ao Estado brasileiroque hoje é democrático, que teve Lula pre-sidente e que tem Dilma presidenta. Nãome sinto a vontade para faze-lo.

Vítima da repressãomilitar, PedroEugênio diz que nãoentende como nãoficou louco

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“ “

“ “

““ “

” ”O Golpe Militar foi um atentado à democracia de

nosso País, que só foi restabelecida depois de

muitas lutas. Esses 50 anos devem ser lembrados

para que a democracia brasileira jamais sofra

qualquer outra quebra de continuidade.

VANDER LOUBERT (PT-MS)

A luta contínua da geração da resistência à

ditadura pelo sonho das liberdades

democráticas deve ser lembrada nesses 50 anos

do golpe. Essa foi a geração da reconstrução

democrática e do sonho de governo do PT. Da

minha geração, veio a luta e a certeza do poder

popular: a democracia direta!

GABRIEL GUIMARÃES (PT-MG)

””

”Não podemos esquecer que a Ditadura

Militar foi uma marca dolorida na vida

do nosso povo, para que isso nunca mais

aconteça no País.

ANSELMO DE JESUS (PT-RO)

A educação foi uma das áreas que mais

sofreram o efeito nefasto da ditadura, com

perseguição a educadores e lideranças

estudantis. Isso interditou o debate de

ideias e causou enorme atraso no

desenvolvimento do setor.

SÁGUAS MORAES (PT-MT)

O Golpe Militar foi um momento de negação de

direitos e ampliação da corrupção, sob o

comando de militares que desrespeitavam as

liberdades individuais. O Brasil espera que os

trabalhos da Comissão da Verdade restabeleçam

a história e contribuam para aumentar a

consciência política dos brasileiros.

VANDERLEI SIRAQUE (PT-SP)

””

O Regime Militar foi um período de violência e

tortura em que muitos companheiros

desapareceram. Porém, nós, do movimento

sindical e da esquerda, contribuímos bastante

para os avanços dos direitos do povo, em busca

da democracia e da liberdade de expressão.

MIRIQUINHO (PT-PA)

O fato marcante na minha vida foi a

militância política das greves do ABC, que me

deu uma dimensão da força do povo

brasileiro. Até então, eu desconhecia esse

poder da sociedade, e aquele momento

incentivou minha participação no movimento

estudantil e, posteriormente, na política.

ROGÉRIO CARVALHO (PT-SE)

A força da classe operária que antecedeu o período da Ditadura Militar teve um papel decisivo nas

grandes conquistas do País, mas toda essa luta foi reprimida pelo regime que tinha os sindicatos como

inimigos declarados. No entanto, nos anos de 1978 e 1979, várias medidas foram tomadas com o objetivo de

estabelecer o gradual fim do Regime Militar. Esses dois anos foram decisivos para a luta de classes no Brasil, e

a força de uma nova e poderosa classe operária obrigou o Regime Militar a acelerar a abertura, conceder a

anistia e, um pouco mais tarde, permitir a legalização dos partidos políticos, principalmente o PT, que não

estava em seus planos. Ao mesmo tempo, o ‘sindicalismo autêntico’, dirigido por Lula, procurou encabeçar o

movimento grevista e construiu um projeto político e sindical próprio.

TAUMATURGO LIMA (PT-AC)

O mal que a ditadura militar fez ao Brasil

foi enorme, contribuindo para a destruição de

sindicatos e entidades estudantis, causando

prejuízo à formação de representações dos

trabalhadores. Também fui vítima da

ditadura, quando fui afastado do Ministério

da Agricultura por ser contra um decreto

presidencial relativo a questões salariais.

GERALDO SIMÕES (PT-BA)

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