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REVISTA ELETRÔNICA JUSFEPI, Itajubá: FEPI, v. 02/2016, n.4, jun./dez.2016. 33 AMPAROS PARA NÃO REDUZIR A MAIORIDADE PENAL NO BRASIL Ana Celeste Passos Silva 34 Emerson Barsottini 35 Pâmila Aparecida da Silva 36 RESUMO: No Brasil, a imputabilidade penal é fixada a partir dos 18 (dezoito) anos, conforme consta o artigo 228 da Constituição Federal, juntamente com o Código Penal e Estatuto da Criança e do Adolescente. O presente trabalho analisa primeiramente a possibilidade de alteração da Constituição da República, sob o fato da imputabilidade penal ser considerada cláusula pétrea por renomados Doutrinadores de Direito Penal. Posteriormente, dá um enfoque social, filosófico e jurídico da questão da redução da maioridade penal, sob o ponto de vista do direito constitucional de voto, sanções estipuladas no Estatuto da Criança e do Adolescente, problema de criação de políticas públicas pelo Estado e por último uma análise estatística sobre o menor infrator. Verifica-se de maneira categórica a impossibilidade de redução da maioridade penal no Brasil, conforme se verifica na argumentação abaixo. Percebe-se que a solução da criminalidade se reside no problema do Estado cumprir políticas públicas para assegurar o cumprimento dos dizeres constitucional, do Código Penal, da Lei de Execuções Penais e principalmente do Estatuto da Criança e do Adolescente. Palavras chave: imputabilidade penal; redução da maioridade penal. 1. INTRODUÇÃO A redução da maioridade penal é um assunto que repercute em todo nosso país, tendo inclusive um alto índice de aprovação pela sociedade. A questão toma ampliação principalmente quando impulsionadas pela mídia sensacionalista ao calor dos acontecimentos, ainda com a consciência pedindo vingança e justiça, sem ao menos se analisar quais medidas seriam mais eficazes para conter a criminalidade em nosso país. Importante frisar que ao noticiar que um adulto cometeu um crime bárbaro não chama tanta a atenção quando ao publicar que um adolescente cometeu um ato infracional. Sob esta ótica, pretende com este 34 Acadêmica do 3º período do Curso de Direito da Fundação de Ensino e Pesquisa de Itajubá – FEPI. Email para contato: [email protected] 35 Acadêmico do 3º período do Curso de Direito da Fundação de Ensino e Pesquisa de Itajubá – FEPI. Email para contado: [email protected] 36 Acadêmica do 3º período do Curso de Direito da Fundação de Ensino e Pesquisa de Itajubá – FEPI. Email para contato: [email protected]

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REVISTA ELETRÔNICA JUSFEPI, Itajubá: FEPI, v. 02/2016, n.4, jun./dez.2016.

33

AMPAROS PARA NÃO REDUZIR A MAIORIDADE PENAL NO BRASIL

Ana Celeste Passos Silva34

Emerson Barsottini35

Pâmila Aparecida da Silva36

RESUMO: No Brasil, a imputabilidade penal é fixada a partir dos 18 (dezoito) anos,

conforme consta o artigo 228 da Constituição Federal, juntamente com o Código Penal e

Estatuto da Criança e do Adolescente. O presente trabalho analisa primeiramente a

possibilidade de alteração da Constituição da República, sob o fato da imputabilidade penal

ser considerada cláusula pétrea por renomados Doutrinadores de Direito Penal.

Posteriormente, dá um enfoque social, filosófico e jurídico da questão da redução da

maioridade penal, sob o ponto de vista do direito constitucional de voto, sanções estipuladas

no Estatuto da Criança e do Adolescente, problema de criação de políticas públicas pelo

Estado e por último uma análise estatística sobre o menor infrator. Verifica-se de maneira

categórica a impossibilidade de redução da maioridade penal no Brasil, conforme se verifica

na argumentação abaixo. Percebe-se que a solução da criminalidade se reside no problema do

Estado cumprir políticas públicas para assegurar o cumprimento dos dizeres constitucional, do

Código Penal, da Lei de Execuções Penais e principalmente do Estatuto da Criança e do

Adolescente.

Palavras chave: imputabilidade penal; redução da maioridade penal.

1. INTRODUÇÃO

A redução da maioridade penal é um assunto que repercute em todo nosso país, tendo

inclusive um alto índice de aprovação pela sociedade. A questão toma ampliação

principalmente quando impulsionadas pela mídia sensacionalista ao calor dos acontecimentos,

ainda com a consciência pedindo vingança e justiça, sem ao menos se analisar quais medidas

seriam mais eficazes para conter a criminalidade em nosso país. Importante frisar que ao

noticiar que um adulto cometeu um crime bárbaro não chama tanta a atenção quando ao

publicar que um adolescente cometeu um ato infracional. Sob esta ótica, pretende com este

34 Acadêmica do 3º período do Curso de Direito da Fundação de Ensino e Pesquisa de Itajubá – FEPI. Email para contato: [email protected] 35 Acadêmico do 3º período do Curso de Direito da Fundação de Ensino e Pesquisa de Itajubá – FEPI. Email para contado: [email protected] 36 Acadêmica do 3º período do Curso de Direito da Fundação de Ensino e Pesquisa de Itajubá – FEPI. Email para contato: [email protected]

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trabalho explanar ideias do ponto de vista constitucional, jurídico, social e filosófico sobre o

tema em análise, partindo do pressuposto da presente indagação. Será que a redução da

maioridade penal resolveria o problema da criminalidade? A imutabilidade da imputabilidade

penal ao ser considerada indiretamente cláusula pétrea, insuscetível de Emenda

Constitucional, bem como outros argumentos para a solução do conflito para a diminuição da

criminalidade dos adolescentes.

1.1. OBJETIVO

Pretende-se contribuir com as discussões em relação às propostas de Emenda à

Constituição Brasileira, que tratam da redução da maioridade penal e as consequências que

irão provocar, caso essas propostas sejam aprovadas, considerando a falência do sistema

prisional em diversas unidades da Federação.

Está claramente definido como princípio basilar dos pais, da família, da sociedade e do

Estado, o desafio de passar da democracia representativa para uma democracia participativa,

atribuindo-lhes a responsabilidade de definir políticas públicas, controlar ações, arrecadar

fundos e administrar recursos em benefício de crianças e de adolescentes, priorizando o

direito à vida, à saúde, à educação ao lazer à profissionalização, à dignidade, ao respeito, à

liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de

discriminação, exploração, violência crueldade e opressão. Estes princípios e direitos são a

expressão da Normativa Internacional pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos

da Criança, promulgada pela Assembleia Geral em novembro de 1989 e ratificada pelo Brasil,

mediante voto do Congresso Nacional, portanto, passou a integrar a lei e a fazer parte do

Sistema de Direitos e Garantias, os direitos e garantias expressos nesta Constituição e não

excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados

internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

A maioridade penal corresponde à idade em que o indivíduo passa a responder

integralmente pelos seus atos criminosos perante a lei penal, sendo está fixada no Brasil aos

18 (dezoito) anos.

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A princípio, no início do século XIX, vigorava as Ordenações Filipinas, na qual a

responsabilidade penal iniciava-se aos 7 (sete) anos de idade, no entanto, com algumas

restrições, pois o menor era totalmente isento da pena de morte, constituindo-se uma espécie

de redução da pena cominada. Existia um sistema do “jovem adulto”, no qual incluía os

jovens entre 17 (dezessete) e 21 (vinte e um) anos, onde estes podiam ter suas penas

reduzidas e até mesmo serem condenados à pena de morte, permanecendo a imputabilidade

penal plena aos maiores de 21 (vinte e um) anos de idade.

Após a Proclamação da Independência, surge o primeiro Código Penal Brasileiro, o

qual foi denominado de Código Criminal do Império. Nesse código foi adotado o critério

psicológico, baseado no discernimento, segundo o qual a idade penal iniciava-se aos 14

(quatorze) anos, que determinava o encaminhamento do agente infrator às casas de correção

nos casos em que o menor tivesse consciência do ato praticado.

3. ASPECTOS LEGAIS A RESPEITO A MAIORIDADE PENAL

A imputabilidade penal é a qualidade atribuída ao agente que possui condição

intelectual para determinar a sua conduta e, mentalmente capaz de compreender a ilicitude

dos seus atos, ou seja, é a capacidade do indivíduo de se autodeterminar sobre a licitude ou

não de sua conduta e ainda assim agir em conformidade com esse entendimento. Está

presente em todos os regulamentos punitivos conhecidos até então, variando o marco

inicial da responsabilidade penal ou o critério adotado para sua fixação.

3.1. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS

A questão da maioridade penal foi elevada a nível constitucional, uma vez que o art.

228 da Constituição Federal enobreceu a condição de norma constitucional a

imputabilidade penal dos maiores de 18 (dezoito) anos, dando assim, maior proteção à

inimputabilidade do menor. Estabelece o citado artigo que:

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas da legislação especial.

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Foi fixado este limite de idade com base no artigo 1º da Convenção sobre o Direito

das Crianças, adotada pela ONU em 20 de novembro de 1989, onde dispõe: “Nos termos da

presente Convenção, criança é todo o ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da

lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo”.

Tal convenção não impede que a imputabilidade seja determinada abaixo dos 18

(dezoito) anos, posto que não traz normas a respeito do assunto, e ainda, traz a possibilidade

da imposição de penas privativas de liberdade para as crianças, conforme determinado em

seu artigo 37, ficando assim, a critério dos países signatários desta convenção a fixação

da idade penal e o tipo de pena a ser aplicada.

Feito isso, o Brasil adotou o critério puramente biológico para a fixação da

imputabilidade, levando se em conta a idade do agente e não o seu discernimento acerca

do caráter ilícito ou não de sua conduta.

3.2. ASPECTOS PENAIS

O nosso atual Código Penal adotou o critério puramente biológico, desta forma, o

Código Penal não leva em conta o desenvolvimento mental do indivíduo menor, pois

embora tenha plena capacidade de entendimento do caráter de ilicitude de um fato, e mesmo

assim agir de acordo com esse entendimento, ao menor não poderá ser imputado nenhuma

responsabilidade penal por suas ações.

Contudo, atualmente há uma grande discussão acerca dos fundamentos que o

legislador de 1940 utilizou para justificar o tratamento dado ao menor e ainda, os motivos

que o legislador de 1984 manteve tal tratamento.

Desta forma, ao ficar constatada a menoridade, o agente é tipo por inimputável,

estando sujeito somente à legislação especial, isto é, ao Estatuto da Criança e do

Adolescente, não sendo admitido que seja questionado acerca da capacidade de entendimento

deste.

3.3. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Este diploma legal, criado em 1990, instituiu a responsabilidade penal a partir dos

dezoito anos de idade. Este marco foi estipulado por critérios políticos que se articula a um

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processo de maturação neurológica e psicológica que depende muito do ambiente social

onde se vive. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA tem por finalidade subsidiar

as discussões das propostas das emendas constitucionais, visto que, antes da sua criação não

existia em nossa legislação uma política de atendimento que pudesse atender integralmente às

necessidades de crianças e adolescentes. Hoje, tornou-se real a existência de uma política de

Proteção Especial que atende as reivindicações da sociedade civil organizada em prol dos

menores púberes e impúberes. Vale ressaltar ainda que o ECA não se restringe ao menor em

situação de risco, visa principalmente a proteção integral à criança e ao adolescente.

Internacional do Estado violador. É oportuno destacar os três sistemas considerados basilares

para sustentação do Estatuto da Criança e do Adolescente:

1. Sistema primário - trata das Políticas Públicas de Atendimento a criança e ao

adolescente;

2. Sistema secundário - cuida das medidas de proteção dirigidas às crianças e

adolescentes em situação pessoal ou social, enquanto vítimas que têm direitos violados;

3. Sistema terciário - trata das medidas socioeducativas, aplicáveis aos adolescentes

em conflito com a lei que passam à condição de vitimizadores.

3.4. PRINCÍPIOS

A Constituição Federal de 1988 tem como uma de suas bases o Princípio da

Dignidade da Pessoa Humana, que é efetivado por diversos direitos fundamentais. O

legislador constitucional ponderou como direitos fundamentais tudo aquilo que é

indispensável para que se desenvolva uma vida digna à pessoa humana, e para que esses

direitos possam ser exercidos foram criados os princípios.

A sistemática principiológica que abrange crianças e adolescentes não pode ser

colhida apenas do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois a fonte primordial é a

Constituição Federal, devendo assim, serem interpretados em consonância com os direitos e

garantias atinentes aos menores.

Pode-se dizer que, o modelo de inimputabilidade pátrio está baseado no Princípio

da Igualdade, sendo este uma maneira de dar tratamento diferenciado para determinadas

categorias de pessoas, com o intuito de garantir igualdade de condições, justificando assim, o

tratamento especial atribuído à criança e ao adolescente na Constituição Federal.

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4. IMPUTABILIDADE PENAL

A problemática causada pelo presente estudo encontra primeiramente respaldo no

texto Constitucional:

“Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeito às normas da legislação especial”.

Já o Código Penal brasileiro, de 1940, manteve estabelecido o limite de 18 (dezoito)

anos para a ocorrência da imputabilidade penal, conforme se verifica em seu artigo 27:

“Art. 27. Os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial. ”

Atendendo o mandamento constitucional, o Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA), Lei Federal n.º 8069/90, estabeleceu em seu artigo 104, que são penalmente

inimputáveis os menores de 18 (dezoito) anos, sujeitos às medidas previstas nesta lei.

4.1. CRITÉRIOS PARA DETERMINAÇÃO DA IMPUTABILIDADE PENAL

Na doutrina existem três critérios que se dispõem avaliar a imputabilidade penal,

sendo eles: o critério biológico, o critério psicológico e o critério biopsicológico.

4.1.1. CRITÉRIO BIOLÓGICO

Este critério foi de inspiração francesa, onde a inimputabilidade penal é considerada

pelo ponto de vista das ocasiões biológicas. Por este critério biológico ou também conhecido

como critério etário, a maioridade penal será atingida aos 18 (dezoito) anos, sendo

completamente dispensada em relação ao menor qualquer avaliação psicológica ou qualquer

nível de discernimento entre o que certo ou errado, não se admitindo prova em contrário. Não

importa se o menor tem ou não consciência sobre a ilicitude do seu ato, somente

responderá por este se no momento em que praticou o ato criminoso o sujeito contar com

18 (dezoito) anos completos, do contrário, o menor cumprirá apenas determinada medida

socioeducativa.

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4.1.2. CRITÉRIO PSICOLÓGICO

Pelo critério psicológico, o foco é a personalidade do agente infrator, verificando se

no momento do crime, ou seja, do fato típico e antijurídico, apresentava aptidão de

compreender a ilicitude do fato. Assim, os jovens podem ser sujeitados ao processo penal por

este critério, desde que estes possuam capacidade suficiente para distinguir o que é certo e

o que é errado.

4.1.3. CRITÉRIO BIOPSICOLÓGICO

Por este critério, a inimputabilidade decorre da junção dos dois critérios anteriores.

Desde que o agente do ato infrator entenda a ilicitude do seu ato, ou tenha a

possibilidade de comportar-se de acordo com esse entendimento, apesar de ter idade inferior

ao limite permitido pela legislação, há uma possibilidade de impor penalidades a estes

indivíduos que pratiquem tais atos.

No Brasil, o Código Criminal do Império de 1830 foi o primeiro que adotou o critério

biopsicológico, onde a maioridade penal absoluta se iniciava aos 14 (catorze) anos. Porém, os

abaixo dessa idade poderiam ser responsabilizados se agissem com certo discernimento em

relação ao seu ato.

Logo após, surgiu o Código Penal dos Estados Unidos, também chamado de Código

Penal Republicano, de 1890, no qual estabelecia que seriam encaminhados à análise de

discernimento os maiores de 9 (nove) anos e menores de 14 (catorze) anos, que agissem

em desacordo com a lei e ainda compreendessem o caráter de ilicitude do ato.

Importante ressaltar que, grande parte da doutrina adota tanto o critério psicológico

quanto o critério biopsicológico, em razão da carência de procedimentos apropriados para a

aferição do discernimento do indivíduo na época da prática ilícita.

5. CLAUSULA PÉTREA E A PROTEÇÃO DA IMPUTABILIDADE PENAL

Primeiramente, cumpre frisar que nossa atual Constituição é classificada como rígida,

ou seja, todo o processo legislativo é dificultoso e burocrático para se alterar um texto

constitucional. No Brasil exige um procedimento especial, sendo votação em dois turnos, nas

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duas casas, com um quórum de aprovação de pelo menos 3/5 (três quintos) do Congresso

Nacional.

Do ponto de vista jurídico é muito questionável que se possa alterar a Constituição

brasileira para o fim de reduzir a maioridade penal. A inimputabilidade do menor de dezoito

anos foi constitucionalizada. Há discussão sobre tratar-se de cláusula pétrea. O art. 60 § 4º,

veda a deliberação de qualquer emenda constitucional tendente a abolir direito ou garantia

individual.

"Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais."

Os juristas Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino37 expõem em seu livro de Direito

Constitucional que:

A garantia insculpida no art. 60, §4º, IV, da CF alcança um conjunto mais amplo de

direitos e garantias constitucionais de caráter individual dispersos no texto da Carta Magna.

Neste norte, o grande Jurista Dalmo Dallari reforça a ideia de imutabilidade do artigo 228 da

Constituição Federal, por considerar tal dispositivo cláusula pétrea38.

"Segundo a Constituição, não pode ser objeto de deliberação emenda tendente a abolir

os direitos e garantias individuais. E não responder criminalmente é direito individual do

menor." Para o jurista, a solução para a criminalidade é conhecida: Acesso dos jovens à

educação e trabalho”.

Arremata Martha de Toledo Machado39 sobre proteção Constitucional de Crianças e

adolescentes que:

“Com perdão a obviedade: se o caput do art. 5º da CF menciona a vida, a liberdade, a igualdade, para depois especificar os inúmeros desdobramentos (ou facetas) desses direitos nos seus incisos, e se o art. 227, caput, refere-se expressamente à mesma vida, liberdade, dignidade, para em seguida desdobrá-la, seja no próprio caput, seja no § 3º, seja no art., 228, evidente, que se trata de direitos da mesma natureza, ou seja, dos direitos fundamentais da pessoa humana”.

37PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 14ª edição Ed. Método. São Paulo, 2015. p. 632 38 OLIVEIRA, Maristela Cristina de Monografia: Redução da Maioridade Penal: Uma abordagem jurídica; Universidade Estadual de Londrina, 2008. 39RESINA ALVES, Márcia Cristina. Monografia: Diminuição da idade penal; UniFMU – Centro Universitário, São Paulo, 2006.

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6. OUTROS FATORES PREPONDERANTES PARA A IMUTABILIDADE

Muito se discute a imposição da redução da maioridade penal, considerando o direito

constitucional de voto aos 16 (dezesseis) anos. Tal argumento não merece prosperar, visto que

não concede os direitos universais de ser votado, bem como de não obrigatoriedade do voto.

Além do mais, o critério utilizado para a maioridade penal é o biológico, sendo, no

Brasil, aos 18 (dezoito) anos. Isso não quer dizer que o indivíduo de 17 (dezessete) anos não

tenha discernimento de compreender a ilicitude de seus atos, mais sim de estabelecer um

critério objetivo para assegurar a segurança jurídica em nosso país. A Lei é feita para todos,

não podendo individualizar a idade para cada pessoa através de seu discernimento, sendo

necessário se estabelecer critérios.

Outro fator que merece destaque são os presídios estão totalmente superlotados, não

conseguindo atender a demanda que a Justiça requer. A pena tem a finalidade de ressocializar

o indivíduo. Não se consegue ressocializar um menor ao colocá-lo com outros criminosos

experientes. O Estado ainda não é capaz de cumprir o papel descrito na Constituição Federal,

Código Penal, Lei de Execução Penal e muito menos ainda o disposto no Estatuto da Criança

e do Adolescente.

O que se pode inferir é que o Estatuto da Criança e do Adolescente tem vários

princípios adotados e uma forma regular de reintegrar o adolescente infrator na sociedade. O

que se deve questionar é a capacidade do Estado cumprir o disposto na legislação,

implementando políticas públicas destinadas à criança e ao adolescente. O Estado não

consegue manter os dizeres constitucionais e assegurar ao menor uma educação de qualidade,

acesso à cultura, uma estrutura familiar, alimentação, dentre outras garantias.

A diminuição da idade penal põe em risco todas as conquistas que foram feitas sobre

direitos da criança e do adolescente. O Estatuto é claro quando estabelece punição para o

adolescente infrator e formas para que volte ao convívio social. Nos artigos 101 e 112 do

Estatuto estão descritas medidas de proteção e socioeducativas: advertência, obrigação de

reparar o dano, prestação de serviço à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de

semiliberdade, internação em estabelecimento educacional – significando, inclusive, privação

de liberdade. Essas medidas, mais justas e apropriadas ao adolescente em desenvolvimento,

são bem mais eficientes que a simples diminuição da idade penal e o consequente ingresso do

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adolescente no precário sistema penitenciário brasileiro. A responsabilidade para que elas

sejam aplicadas é do governo.

7. REDUZIR A MAIORIDADE PENAL NÃO REDUZ A VIOLÊNCIA

Muitos estudos no campo da criminologia e das ciências sociais têm demonstrado que

não há revelação direta de causalidade entre a adoção de soluções punitivas e repressivas e a

diminuição dos índices de violência. No sentido contrário, no entanto, se observa que são as

políticas e ações de natureza social que desempenham um papel importante na redução das

taxas de criminalidade. Dados do Unicef revelam a experiência mal sucedida dos EUA. O

país, que assinou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aplicou em seus

adolescentes, penas previstas para os adultos. Os jovens que cumpriram pena em

penitenciárias voltaram a delinquir e de forma mais violenta. O resultado concreto para a

sociedade foi o agravamento da violência.

7.1. REDUZIR A MAIORIDADE PENAL É TRATAR O EFEITO, NÃO A CAUSA

A constituição brasileira assegura nos artigos 540 e 641 os direitos fundamentais.Com

muitos desses direitos negados, a probabilidade do envolvimento com o crime aumenta,

sobretudo entre os jovens.

O adolescente marginalizado não surge ao acaso. Ele é fruto de um estado de injustiça

social que gera e agrava a pobreza em que sobrevive grande parte da população. A

marginalidade torna-se uma prática moldada pelas condições sociais e históricas em que os

homens vivem. O adolescente em conflito com a lei é considerado um ‘sintoma’ social,

utilizado como uma forma de eximir da responsabilidade que a sociedade tem nessa

construção.

Reduzir a maioridade é transferir o problema. Para o Estado é mais fácil prender do

que educar. A educação é fundamental para qualquer indivíduo se tornar um cidadão, mas é

40 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. 41 Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.

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realidade que no Brasil muitos jovens pobres são excluídos deste processo. Puni-los com o

encarceramento é tirar a chance de se tornarem cidadãos conscientes de direitos e deveres, é

assumir a própria incompetência do Estado em lhes assegurar esse direito básico que é a

educação.

As causas da violência e da desigualdade social não se resolverão com adoção de leis

penais mais severas. O processo exige que sejam tomadas medidas capazes de romper com a

banalização da violência e seu ciclo. Ações no campo da educação, por exemplo,

demonstram-se positivas na diminuição da vulnerabilidade de centenas de adolescentes ao

crime e à violência.

Precisamos valorizar o jovem, considerá-los como parceiros na caminhada para a

construção de uma sociedade melhor. E não como os vilões que estão colocando toda uma

nação em risco. O Brasil não aplicou as políticas necessárias para garantir às crianças, aos

adolescentes e jovens o pleno exercício de seus direitos e isso ajudou em muito a aumentar os

índices de criminalidade da juventude.

O que estamos vendo é uma mudança de um tipo de Estado que deveria garantir direitos para

um tipo de Estado Penal que administra a panela de pressão de uma sociedade tão desigual.

Deve-se mencionar ainda a ineficiência do Estado para emplacar programas de prevenção da

criminalidade e de assistência social eficazes, junto às comunidades mais pobres, além da

deficiência generalizada em nosso sistema educacional.

8. O BRASIL ESTÁ DENTRO DOS PADRÕES INTERNACIONAIS

São minoria os países que definem o adulto como pessoa menor de 18 anos. Das 57

legislações analisadas pela ONU, 17% adotam idade menor do que 18 anos como critério para

a definição legal de adulto. Tomando 55 países de pesquisa da ONU, na média os jovens

representam 11,6% do total de infratores, enquanto no Brasil está em torno de 10%. Portanto,

o país está dentro dos padrões internacionais e abaixo mesmo do que se deveria esperar. No

Japão, eles representam 42,6% e ainda assim a idade penal no país é de 20 anos.42

O UNICEF expressa sua posição contrária à redução da idade penal, assim como à

qualquer alteração desta natureza. Acredita que ela representa um enorme retrocesso no atual

estágio de defesa, promoção e garantia dos direitos da criança e do adolescente no Brasil. A 42 KAHN, Tulio. Revista Igualdade XXXII: Delinquência juvenil se resolve aumentando oportunidades e não reduzindo idade penal, 2008.

REVISTA ELETRÔNICA JUSFEPI, Itajubá: FEPI, v. 02/2016, n.4, jun./dez.2016.

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Organização dos Estados Americanos (OEA) comprovou que há mais jovens vítimas da

criminalidade do que agentes dela. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a

Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Fundação ABRINQ lamenta publicamente a

tentativa de redução da maioridade penal no país43.

Figura 1 - Mapa mundial da Maioridade Penal

9. POSIÇÃO JURISPRUDÊNCIAL E LEGISLATIVA

Ao fazer uma análise doutrinaria sobre a não redução da maioridade penal no Brasil,

veremos a análise do judiciário e do legislativo em relação ao tema exposto. Por tratar-se de

uma garantia individual é de competência do Estado protegê-la. Uma breve síntese, o poder

judiciário sempre desloca o menor infrator para a Legislação Especial (ECA) como manda a

Constituição Federal e o Código Penal em seus artigos 228º e 27º, respectivamente; e o

43 GRAMACHO, Moema. Notas da Câmara de Deputados: Contra a redução da maioridade penal, 2015.

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Legislativo não aceita a proposta de ementa a Constituição por se tratar de matéria pactuada,

uma vez que o Brasil se submeteu a cumprir O Pacto de São José da Costa Rica.

9.1. POSIÇÃO DO JUDICIÁRIO

9.1.1. STJ - HABEAS CORPUS: HC 189441 SP 2010/0202958-3

Ementa: PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL.

DESCABIMENTO. MODIFICAÇÃO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO

STJ, EM CONSONÂNCIACOM ORIENTAÇÃO ADOTADA PELO PRETÓRIO

EXCELSO. ATO INFRACIONALEQUIPARADO AO CRIME DE TRÁFICO DE

DROGAS. ECA. SENTENÇA DE EXTINÇÃODA LIBERDADE ASSISTIDA IMPOSTA

AO ADOLESCENTE. MAIORIDADE PENAL. IRRELEVÂNCIA.

O Supremo Tribunal Federal, pela sua Primeira Turma, passou a adotar orientação no

sentido de não mais admitir habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Precedentes: HC

109.956/PR, Rel.Min. Marco Aurélio, DJe de 11.9.2012 e HC 104.045/RJ, Rel. Min.

RosaWeber, DJe de 6.9.2012, dentre outros.

O Superior Tribunal de Justiça, na esteira desse entendimento, tem amoldado o cabimento

do remédio heroico, sem perder de vista, contudo, princípios constitucionais, sobretudo o do

devido processo legal e da ampla defesa. Nessa toada, tem-se analisado as questões

suscitadas na exordial a fim de se verificar a existência de constrangimento ilegal para, se

for o caso, deferir-se a ordem de ofício. A propósito: HC 221.200/DF, Rel. Min. Laurita

Vaz, DJe 19.9.2012.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu art. 121, § 5º, admite a possibilidade da

extensão do cumprimento da medida socioeducativa até os 21 anos de idade, abarcando

qualquer que seja a medida imposta ao adolescente.

De fato, a maioridade penal apenas torna o adolescente imputável, porém, não afasta a

possibilidade de manutenção da medida socioeducativa anteriormente imposta, mesmo

quando esta é cumprida em meio semiaberto. Habeas corpus não conhecido.

Acordão: Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,

acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na

conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não

conhecer do pedido. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Jorge Mussi, Marco Aurélio

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Bellizze e Campos Marques. (Desembargador convocado do TJ/PR) votaram com a

Sra. Ministra Relatora.

9.1.2. STJ - HABEAS CORPUS: HC 225597 MG 2011/0277865-5

Ementa: PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO.

DESCABIMENTO. MODIFICAÇÃO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL DO

STJ, EM CONSONÂNCIA COM ORIENTAÇÃO ADOTADA PELO PRETÓRIO

EXCELSO. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE ROUBO

QUALIFICADO E ESTUPRO. INTERNAÇÃO. PROGRESSÃO DE MEDIDA

SOCIOEDUCATIVA. LAUDO PERICIAL. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO

MOTIVADO. MAIORIDADE PENAL. EXTINÇÃO DA MEDIDA. INVIABILIDADE.

O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento da Primeira Turma do Supremo

Tribunal Federal, passou a inadmitir habeas corpus substitutivo de recurso próprio,

ressalvando, porém, a possibilidade de concessão da ordem de ofício nos casos de flagrante

constrangimento ilegal.

A medida socioeducativa de internação é possível nas hipóteses taxativas do art. 122 da Lei

nº 8.069/1990, a saber: a) quando o ato infracional for praticado com grave ameaça ou

violência contra a pessoa; b) quando houver o reiterado cometimento de outras infrações

graves; ou c) quando haja o descumprimento reiterado e injustificado de medida

anteriormente imposta.

Na hipótese dos autos, a internação foi imposta ao paciente em perfeito acordo com a

legislação de regência (art. 122, I, da Lei 8.069/1990) e em atenção às peculiaridades do

caso, uma vez que se trata de atos infracionais graves, equiparados aos delitos de roubo

qualificado pelo emprego de arma de fogo e estupro.

Com base no princípio do livre convencimento motivado, o juiz não está adstrito ao parecer

psicossocial emitido pela equipe técnica, ainda que seja favorável ao paciente. Logo,

quando houver fundamentação suficiente da decisão para manutenção da medida

socioeducativa aplicada, não se faz necessária a vinculação do magistrado ao parecer

técnico.

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Com efeito, o Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu art. 121, § 5º, admite a

possibilidade da extensão do cumprimento da medida socioeducativa até os 21 anos de

idade, abarcando qualquer que seja a medida imposta ao adolescente.

De fato, a maioridade penal apenas torna o adolescente imputável, porém, não é levada em

consideração para a continuidade da medida socioeducativa, que tem o fim de educar e

ressocializar o menor. Habeas corpus não conhecido.

Acordão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os

Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e

das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do pedido. Os Srs.

Ministros Laurita Vaz, Jorge Mussi, Março Aurélio Bellizze e Campos Marques

(Desembargador convocado do TJ/PR) votaram com a Sra. Ministra Relatora.

9.2. POSIÇÃO LEGISLATIVA

9.2.1. CÂMARA REJEITA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

A Câmara dos Deputados rejeitou na madrugada de quarta-feira (01/07/2015) a

proposta de redução da maioridade penal (PEC 171/93). O texto determinava

que adolescentes pudessem ser punidos como adultos, a partir dos 16 anos, nos casos de

crimes hediondos, como estupro, latrocínio e homicídio qualificado. A proposta precisava de

ao menos 308 votos para ser aprovada, mas o resultado foi de 303 votos a favor e 184

contrários.

O substitutivo rejeitado na terça-feira nasceu de uma articulação do presidente da

Câmara, Eduardo Cunha44 (PMDB), com a chamada Bancada BBB (Boi, Bala e Bíblia), que

defende diversas pautas conservadoras, entre elas a redução da maioridade.

O substitutivo veio a partir do relatório de Laerte Bessa45 (PR-DF) e teria, na avaliação

de Cunha e seus aliados, mais chances de ser aprovado do que o projeto original, apresentado

44 Eduardo Cosentino da Cunha é um economista, radialista e político brasileiro, filiado ao PMDB. Exerceu o

cargo de deputado federal entre fevereiro de 2003 e setembro de 2016, quando teve o mandato cassado pelo

plenário da Câmara dos Deputados. 45 Laerte Rodrigues de Bessa é um político brasileiro. Atualmente exerce mandato de deputado federal do

Distrito Federal, filiado ao Partido da República. Foi filiado ao Partido Social Cristão.

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em 1993. Isso porque o original poderia ser considerado muito radical para alguns

parlamentares e pela sociedade.

A votação aconteceu em meio a protestos de estudantes e deputados. O parlamentar

Arnaldo Jordy (PPS-PA) criticou a pressa de Cunha. Essa proposta está tramitando há mais de

vinte e dois anos na câmera dos Deputados.

O relator, Deputado Marcos Rogério46, em seu voto, argumenta que o texto

constitucional brasileiro seguiu a tendência internacional consagrada no art. 1º da Convenção

sobre os Direitos da Criança, adotada pela Resolução nº 44/25 (XLIV), da Assembleia-Geral

da Organização das Nações Unidas, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 99.710, de

21 de novembro de 1990, que estabelece ser criança todo ser humano com menos de 18 anos

de idade.

Artigo 37 - Os Estados Partes zelarão para que:

a) Nenhuma criança seja submetida a tortura nem a outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. Não será imposta a pena de morte nem a prisão perpétua sem possibilidade de livramento por delitos cometidos por menores de dezoito anos de idade.

Outro argumento utilizado é da não infringência ao Pacto de São José da Costa Rica,

do qual o Brasil é signatário, vedaria a redução da maioridade penal. Entretanto, é possível

verificar, que o referido Pacto não faz qualquer vedação dessa natureza. O único dispositivo

que trata de matéria criminal em relação a menores de idade assim dispõe:

Artigo 5º: Direito à integridade pessoal §1. Toda pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. §2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. §3. A pena não pode passar da pessoa do delinquente. §4. Os processados devem ficar separados dos condenados, salvo em circunstâncias excepcionais, e devem ser submetidos a tratamento adequado à sua condição de pessoas não condenadas. §5. Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e conduzidos a tribunal especializado, com a maior rapidez possível, para seu tratamento. §6. As penas privativas de liberdade devem Ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos condenados.

46 Marcos Rogério da Silva Brito é um político brasileiro, sendo atualmente deputado federal. Foi filiado ao PDT

e atualmente é filiado ao DEM.

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Como se vê, o Pacto de São José da Costa Rica, no §5º do art. 5º, não veda a redução

da maioridade penal; muito pelo contrário: ao dizer que “os menores, quando puderem ser

processados (...)” admite a possibilidade do processo criminal aos menores de idade em

termos civis – no caso do Brasil, os menores de 18 anos.

Segundo o nobre Relator, o art. 228 da Constituição da República seria cláusula

pétrea, e, por isso, não poderia ser objeto de Proposta de Emenda.

Essa tese merece alguns reparos. O art. 60, §4º, da Constituição da República, o qual

estabelece o rol de cláusulas pétreas dispõe que:

Art. 60 C.F. § 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais.

Evidente que o disposto no art. 228 da Constituição não se enquadra em nenhum dos

quatro incisos do §4º acima reproduzido. Nesse ponto, importa registramos o pensamento

exposto pelo professor Miguel Reale Júnior47 em audiência pública realizada por esta CCJC48

em novembro de 1999:

“Entendo, por outro lado, que não se estabelece no art. 228 CF um direito e

garantia individual fundamental que deva ser preservado como cláusula pétrea. Acredito que não exista no direito pétreo a inimputabilidade. Ou seja, não há nada que justifique que se deva considerar como imutável, como fundamental, além da estrutura do Estado Democrático, por que foi isso que a Constituição pretendeu fazer ao estabelecer as cláusulas pétreas. Isto é, além da proibição de abolição da Federação, da autonomia e da independência dos Poderes, o voto direto, secreto, universal e periódico e, ao mesmo tempo, falando dos direitos e garantias individuais enquanto estruturas fundamentais para a preservação do Estado Democrático. Não vejo, portanto, que no art. 228 esteja contido um princípio fundamental, um direito fundamental que deva ser basilar para a manutenção do Estado Democrático. Por esta razão não entendo que o preceito que está estabelecido no art. 228 venha a se constituir numa cláusula pétrea.”

47 Miguel Reale Júnior é um jurista, político e professor brasileiro. É advogado e foi ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso e professor titular de direito penal da Universidade de São Paulo. 48 Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania

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Este também foi o entendimento expressado pelo eminente ministro do STF Luís

Roberto Barroso49, na nota emitida em 14 de março de 2009, em atendimento à solicitação

desta CCJC, segundo a qual:

“(...) parece mais adequado o entendimento de que o art. 228 da Constituição (“São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos as normas da legislação especial”) não constitui uma cláusula pétrea, não descrevendo um direito ou garantia individual imutável, nos termos do art. 60, §4º, IV. A modificação ou não do dispositivo, portanto, dentro de certos limites, é uma possibilidade que se encontra disponível a avaliação política do Congresso Nacional.”

Importante destacar que o §4º do art. 60 expressamente veda a edição de PEC tendente

a abolir cláusulas pétreas. A Constituição Federal é feita para gerações, portanto, não pode ser

fechada ao ponto de inviabilizar sua mutação conforme as exigências da própria sociedade.

10. CONCLUSÃO

A criminalidade do menor infrator ainda é um problema que assola o Brasil. No

entanto, o que se verifica é a incompetência do Estado em realizar políticas públicas

necessárias para se cumprir o que está previsto na Constituição Federal e no Estatuto da

Criança e do Adolescente.

A redução da maioridade penal não irá reduzir o problema da criminalidade infantil,

além de ser tratado como direito fundamental, não podendo ser objeto de Emenda

Constitucional, sendo muitas vezes já barrada no Congresso Nacional.

Além do mais, a legislação do menor vigente no país é muito efetiva, desde que

cumprida pelo Poder Público, possuindo princípios próprios, assegurando integral proteção do

menor.

Como visto, o menor infrator sofre sanções chamadas medidas socioeducativas, que se

cumpridas do modo previsto na legislação pode solucionar o problema melhor do que a

redução da maioridade penal. Melhor seria se o Estado investisse em políticas públicas na

área de educação, cultura, saúde e lazer, assegurando os dizeres constitucionais e cumprindo a

função de Estado Democrático de Direito.

49 Luís Roberto Barroso é um jurista, professor e magistrado brasileiro. É ministro do Supremo Tribunal Federal desde 26 de junho de 2013, havendo anteriormente atuado como advogado e como procurador do Estado do Rio de Janeiro.

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