revista diálogo urbano

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Graffite nas comunidades Mudando o cenário das favelas Agentes Multiplicadores da Sustentabilidade Nova Iguaçu prepara comunidades para consciência ambiental O valor das Lan Houses Espaço de convivência e inclusão digital Agentes Comunitárias no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu

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criação e diagramação das páginas 2, 3, 12 a 19 e 27. Rio de Janeiro, 2010.

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Page 1: revista Diálogo Urbano

Graffite nas comunidadesMudando o cenário das favelas

Agentes Multiplicadores da SustentabilidadeNova Iguaçu prepara comunidades para consciência ambiental

O valor das Lan HousesEspaço de convivência e inclusão digital

Agentes Comunitárias no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu

Page 2: revista Diálogo Urbano

Março e Abril de 2010

Conselho Editorial Luiz Calvão Roberto Tostes

Projeto gráfico e diagramação Diálogo Urbano Comunicação

Equipe de Arte Mariana Pérez Thiago Costa

Colaboradores Beatriz Coelho Silva David Amen Fabiana Oliveira Flávia Domingues Leandro Lima Maycom BrumPaulo Britto

A Revista Diálogo Urbano é uma produção realizada pela Diálogo Urbano Comunicação.

Redação e endereço para correspondênciaPraia do Flamengo, 278, sala 1102, Flamengo 22210-030 – Rio de Janeiro – RJTel: (21) 2553-9017 ramal 225

E-mail: [email protected]

TiRAgeM DeSTA eDiçãO: 8.000 exemplares

Capa Arte sobre foto de Roberto TostesTurma de agentes comunitários do Projeto de educação Ambiental e Sanitário da Prefeitura de Nova iguaçu no Parque Natural Municipal de Nova iguaçu

EDITORIAL

Um Diálogo cada vez mais UrbanoVoltamos com força total, trazen-

do para as páginas desta edição da

Revista a energia que captamos neste

início de 2010:

Pessoas estão realmente queren-

do fazer coisas, mudar, assumir uma

postura mais efetiva e clara, dizer o

que pensam, mostrar seu valor. Não

são poucos:

gente de Nova iguaçu que assume

o papel de agente de defesa e preser-

vação do meio ambiente. Jovens de Ni-

terói que descobrem o teatro como for-

ma de Arte e educação. Crianças que

através do Basquete percebem uma

nova forma de dar um salto na vida.

Falamos do que acontece nas Lan

Houses, opção real para quem preci-

sa se conectar, estar ligado, mostrar-

se presente nas redes sociais e correr

atrás da informação.

Olhamos para as paredes, mu-

ros e espaços urbanos com um novo

olhar. Ali o graffiti encontra seu verda-

deiro espaço, nas ruas e nas casas das

comunidades.

grafitar passa a ser dar vida,

transformar o uso e fim destas áreas

urbanas, colorindo becos e caminhos

com idéias e formas.

Também acompanhamos a velo-

cidade nas ruas. Na necessidade de

conquistar áreas próprias para bikes

e skates como mostra o SBR da Roci-

nha, que relata as manobras e sonhos

de uma galera cheia de energia.

A comunidade vibra, no ritmo e no

som da bateria comandada por Felipão,

que divide sua experiência do samba

com seu trabalho no Sindicato dos Mé-

dicos e na lição de vida de cuidar da

comunidade e na arte de fazer amigos.

A energia está no ar. Vamos man-

ter o pique e trazer muita coisa nova

este ano!

Contamos também com a partici-

pação de vocês, para levar este diá-

logo para mais ruas e casas de cada

comunidade!

Luiz Calvão e Roberto Tostes

Page 3: revista Diálogo Urbano

Nova Iguaçu promove

sustentabilidade

Curso muda conscientização para

preservação do meio ambiente

Lan House no Alemão

Como funciona e quem frequenta para

ter acesso à internet e às redes sociais

Graffiti colore ruas

Arte urbana ganha espaço e se

integra às comunidades

Basquete Social em Santa Cruz

Esporte abre novas opções

para futuro de jovens

Rocinha sobre rodas

Associação de Skate e Bike da

Rocinha (SBR) acelera nas pistas

Arte e Educação em Niterói

”Entrando por uma Porta”

trabalha com teatro voltado para

as relações comunitárias

Cacique de Ramos faz história

Tradição do samba chega aos 49 anos e

vira patrimônio cultural da cidade

Líder do samba e da comunidade

Felipão do Santa Marta fala de seu talento

para comandar a bateria e fazer amigos

Ponto FinalSustentabilidade ou ética?

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AGENTES DEAlém de promover a urbanização de comunidades,

o PAC Nova Iguaçu conclama os moradores para preservar o meio ambiente

“Por muitos anos convivemos com enchentes e andando no barro. Hoje so-mos felizes e sabemos como cuidar do ambiente em que moramos”, diz Maria da Penha Alminar, 39 anos, nascida e criada no bairro de Cabuçu, em Nova Iguaçu. Conhecida por muitos anos como “cidade dormitório”, Nova Iguaçu prova que nos últimos anos essa ten-dência vem se revertendo com o cres-cimento econômico e com melhorias na qualidade de vida por meio do Progra-ma de Aceleração do Crescimento (PAC). Além de promover a urbanização de ruas e dragagem dos principais rios da região, o PAC Nova Iguaçu conscientiza a comunidade para a preservação do meio ambiente.

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Por: Flávia DominguesFotos: Roberto Tostes:

TRANSFORMACAÇÇO

Agentes Comunitárias no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu

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Penha Alminar é nascida e criada em Nova Iguaçu, a maior cidade da Baixada Fluminense com mais de 830 mil habitantes. Ela conheceu o PAC Nova Iguaçu a partir do trabalho social que é desenvolvido junto com as comunidades no intuito de mantê-las inseridas e informadas sobre todas as ações das obras.

“Acabei me tornando parte da equipe, fazendo o trabalho de conscientização e ouvindo recla-mações e sugestões de melhorias dos moradores”, conta Penha. Ela conta que antes da interven-ção do PAC na região, a rua em que mora não era urbanizada e pavimentada, além de ser bem difícil o acesso nos dias de chuva. “Cabuçu, o bairro em que moro, hoje vive uma outra realidade. As principais ruas estão asfaltadas e mais iluminadas”, relata.

MAIS QUE UM PROJETO DE URBANIZAÇÃO

Uma das principais características do PAC Nova Iguaçu, parceria entre o Governo Federal e a Prefeitura de Nova Iguaçu, é o envolvimento com as comunidades em prol do Desenvolvimento Sustentável, principalmente em questões relacionadas ao meio ambiente. “Mais do que fazer obras o que se quer é estimular que os moradores cuidem do meio ambiente com mais consci-ência”, explica Luiz Rosado, consultor da área de capacitação da Rever Urbano, empresa que está conduzindo o relacionamento com as comunidades beneficiadas pelo programa.

Para envolver o maior número possível de moradores foi criado o Programa de Capacitação para a Formação de Agente Comunitário do Meio Ambiente. A idéia é formar agente comunitá-rios multiplicadores para contribuir no processo de Desenvolvimento Sustentável de Nova Iguaçu. Já foram capacitados 96 agentes, entre os meses de fevereiro e março, de distintas faixas etárias, dos bairros Prados Verdes, Jardim Guandú, Palhada, Jardim Palmares e Austin.

Durante a capacitação, os participantes tiveram acesso à conteúdos e conceitos básicos de ética ambiental, meio ambiente, preservação ambiental, educação sanitária, entre outros.

“Achei o curso muito válido. Aprendi bastante sobre meio ambiente e relembrei muita coisa que aprendi na época da escola, como o ciclo da água na natureza. Acaba que inspira a gente em pensar em ações para preservar ainda mais o lugar em que vivemos”, conta Penha.

MULTIPLICANDO

Durante a formação, todos os agentes são instru-mentalizados a planejar, organizar e conduzir palestras de conscientização ambiental. Os 96 agentes capacita-dos já estão botando a mão na massa. Divididos em dois grupos, eles já promoveram algumas palestras e outras estão para acontecer. Os temas são os mais diversifica-dos: coleta seletiva e recursos hídricos; controle de veto-res e higiene; saneamento básico e saúde preventiva; cidadania e sustentabilidade e ecologia humana.

O trabalho dos agentes é fundamental também para a melhoria da saúde dos moradores. “Acredito que falan-do de morador para morador será mais fácil falar de hi-giene para prevenção doenças, recolhimento correto do lixo, por exemplo”, conta Penha. Ela complementa que é muito importante esse tipo de capacitação para preser-var o meio ambiente para gerações futuras.

“O PAC foi muito positivo para a gente. Hoje não te-mos mais esgoto a céu aberto, os rios foram dragados e as ruas urbanizadas. Temos que cuidar disso”, finaliza.

inspira a gente em pensar em ações

para preservar ainda mais o lugar em

que vivemos Maria da Penha Alminar

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QUESTÃO DE SAÚDE

Nova Iguaçu, assim como outras cidades da região metropolitana do Rio de Janeiro, sofre com a carência de saneamento básico, o que afeta as con-dições de vida de seus moradores. Além de obras de urbanização e infra-es-trutura, melhorias que notoriamente vão apoiar na diminuição dos índices de doenças, noções de higiene são fundamentais para prevenir alguns males.

Existem doenças associadas à falta de higiene na manipulação de ali-mento como a Salmonela. Outras são causadas pela falta de higiene pessoal como a Escabioses e a Pediculoses. A falta de saneamento básico provoca a proliferação de doenças como as mais diversas Verminoses, até as mais graves como a Tuberculose, Hanseníase.

O estudante Renato de Freitas, 27 anos, morador de Austin, acredita que a capacitação foi muito válida para ampliar o entendimento sobre meio am-biente, reciclagem de lixo e preservação da água.

“Achei a formação muito interessante. A gente vai poder informar a co-munidade sobre noções básicas de higiene, orientar sobre o destino do lixo e a importância do uso da água potável”, afirma Freitas.

Freitas conta que o grupo de agentes que faz parte percorre as ruas do bairro para mobilizar os moradores para as palestras que geralmente acon-tecem em locais tradicionais das comunidades. O estudante conta que as principais dúvidas dos moradores estão relacionadas ao descarte do lixo do-méstico, a manipulação correta dos alimentos e sobre água potável.

“É muito importante dar esse tipo de noção de higiene e de conscientiza-ção sobre o destino do lixo para os moradores, principalmente para aqueles que moram em ruas que tem valões ou esgotos a céu aberto e a quem tem crianças em casa. Esses tem mais chances de terem doenças”, conta Freitas.

O estudante conta que eles estão fazendo um abaixo-assinado para so-licitar à Prefeitura de Nova Iguaçu que coloque cestas de lixo recicláveis nas ruas do bairro para fazer a coleta seletiva de lixo.

“Mas acredito que também deve existir alguma iniciativa da prefeitura no momento do recolhimento já que o pessoal da companhia de limpeza com certeza vai sair misturando tudo”, avalia.

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É uma unidade de conservação integral criada em 5 de junho de 1998. Esta Unidade de Conservação foi estabele-cida visando não apenas à proteção da fauna e flora exis-tentes, mas também à formalização de uma opção de lazer para a população local.

É um importante remanescente da Mata Atlântica e a área abriga valores ecológicos, históricos, culturais e geoló-gicos, além de locais representativos da história geológica da região.

Ganhou também o título de Geoparque pelo Departa-mento de Recursos Minerais (DRM) por ser classificado como uma área de relevantes acidentes geológicos, apresentando formações de rochas vulcânicas e uma cratera de um vulcão extinto há milhões de anos.

PARQUE NATURAL MUNICIPAL DE NOVA IGUACÇU

Fotos das oficinas de capacitação e da entrega dos diplomas aos

agentes comunitários

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Por: Fabiana OliveiraFotos: David Amen

Mesmo com os computadores mais baratos e expansão da internet banda larga, as lan hou-ses continuam sendo um serviço útil para a população. Segundo informações do site do Comitê Gestor da Internet no Brasil (www.cgi.br), o número de brasileiros que utilizam o serviço em lan houses é o mesmo que o de usuários residenciais: cerca de 28 milhões. Isto mostra que investir na área ainda é um bom negócio.

LAN HOUSE, conexao digital da galera

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Uma sala com diversos computadores pode ser mui-to mais que uma simples loja de acesso pago à internet. Popularmente conhecidas como lan houses, além de ponto de encontro para a garotada, esses espaços têm contribuído bastante com a inclusão digital no Brasil.

Morador do Complexo do Alemão, Zona Norte do Rio, Emmanuel Silveira Coelho é proprietário de duas lan houses – uma em Irajá, ou no asfalto, como ele mesmo diz, e outra na Estrada do Itararé, próximo de sua casa. Emmanuel conta que começou o negócio, em 2006, num cenário bem diferente do atual.

“Na época o grande “boom” eram as lan houses. Aí decidi investir também. Sempre fui apaixonado por infor-mática por ser um campo muito aberto. Quando come-cei, computador ainda era bem caro e as pessoas não tinham condições de comprar. Isso foi o que mais me motivou. Outro motivo foi também trabalhar com o pú-blico, que sempre é muito bom; a gente aprende muitas coisas”, diz.

Segundo Emmanuel, tanto no asfalto, como na co-munidade a clientela da Cyber Nel ainda é formada, em grande parte, por crianças e adolescentes que utilizam os espaços para torneios de jogos eletrônicos e também para realizarem pesquisas para trabalhos escolares:

“Acho instrutivo, além de ajudar a tirar a criança da

Emmanuel junto com cliente em frente a filial da Cyber Nel, no Complexo do Alemão:

negócio diminuiu, mas continua rentável.

rua, do caminho errado. Uma brincadeira como um jogo, por exemplo, pode acabar se tornando um aprendizado. Ainda tem muita gente que não tem computador em casa e a lan house acaba contribuindo também com a in-clusão digital”.

O estudo da Fundação Padre Anchieta mostra que as lan houses e tele-centros respondem por quase 60% do acesso à internet no país. São cerca de 38 milhões de usuários, sendo 24 milhões das classes C, D e E. Pessoas como o adolescente Vitor Guedes, 13 anos. Ele, que ainda não tem computador em casa e teve seu primeiro contato com a máquina aos nove, atualmente auxilia quem não tem tanta facilidade assim com as teclas, links e ícones digitais.

Vitor guedes, 13 anos

“Fico aqui direto ajudando o pessoal que acessa. No inicio mexia mais em jogos, mas hoje ja uso tambem MSN, orkut e baixo jo-gos, videos e musicas para MP3”

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Para todas as idades :)Não só as crianças e adolescentes curtem o espaço, jovens e adultos acessam também com

muita frequência, mas para demandas diferentes como, enviar e-mail, currículo, verificar vaga de emprego, entre outros serviços.

Mesmo com computador em casa, Jorge Luiz, 46 anos, diz que é cliente assíduo de lan houses. Ele, que aprendeu a mexer no computador há pouco tempo - cerca de três anos - vê as lan houses como muito úteis à população: “Meu micro quebrou e não consegui consertar ainda. Se não fosse este espaço como eu iria ver meu e-mail, MSN e fotos no orkut?”, pegunta.

Negocio para entendidosCom o preço mais acessível dos computadores e da banda larga, Emmanuel diz que o movimen-

to caiu bastante, segundo ele, cerca de 55%. No início de abril, o primeiro estabeleciemnto a utilizar o nome de lan house no Brasil, a Monkey Paulista, em São Paulo, fechou as portas, um exemplo da diminuição da demanda pelo serviço. Mas para Emmanuel, o setor ainda é rentável para quem é bom administrador e também domina informática:

“Muitas pessoas abrem um negócio e acabam falindo porque não tem informações sobre seu próprio ramo, os benefícios, o ambiente social, entre outros assuntos. Para conseguir hoje manter uma lan house é necessário, principalmente ter conhecimento de informática e não depender de mão de obra externa para manutenção de computadores”, alerta Emmanuel, que além dos vários cursos na área também cursa Adminitração para melhor gerenciar seu empreendimento.

Emmanuel ainda dá outras dicas para quem quer investir na área: “bom atendimente, atualizar as máquinas diariamente e ter sempre novos jogos, além, é claro, de conhecer informática e gostar muito do ramo”, ensina. E Juan de Azevedo, 15 anos, assina embaixo: “o que mais me chama aten-ção são os jogos porque na lan dá para jogar com várias pessoas. Venho também para distrair minha cabeça porque aqui sempre encontro o pessoal”, diz.

LAN HOUSE E LEGAL

Em audiência no Congresso, o presidente do Laboratório Brasileiro de Cultura Digital, Claudio Prado, defendeu a importância das lan houses como forma de ampliar e qualificar o acesso da população ao mundo digital:

“A lan house é fantástica para democratizar o acesso e instruir as pessoas. Pode ser um local onde a pessoa aprende a usar a tecnologia pela primeira vez. As lan houses podem também oferecer oficinas, inclusive de multimídia, estimulando a produção de conteúdos digitais.”

Vitor passa boa parte do tempo acessando e ajudando quem ainda se enrola em frente à telinha.

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Matéria e fotos: Flávia Domingues

Orgânicos das RitasMoradoras da comunidade Colônia Juliano Moreira

mostram que é possível ter uma alimentação saudável e sustentável

Quando se fala de Colônia Juliano Moreira, na Taquara, Jacarepaguá, a primeira lembrança que vem à cabeça é de uma instituição que acolhia e tratava pessoas portadoras de doenças mentais. Mas, ao se chegar no local para conhecer a comunidade, depara-se com uma pequena “Copacabana”. Isso porque a colônia, ao longo dos seus 77 km, abriga cerca de 20 mil habitantes entre antigos funcionários e in-vasores, tem linhas de ônibus e transporte alternativo, além de um pequeno comércio local que atende bem aos moradores. Desde 2009, um projeto da prefeitura com recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está mudando a vida na Colônia e a transformando em um bairro carioca.

Andar pela Colônia traz surpresas. Uma delas é a produção de alimentos orgânicos dentro da pró-pria comunidade. A iniciativa partiu de Dona Rita Maria Barbosa, 53 anos, após participar do projeto Guardião e de uma capacitação em hortas comunitárias, no ano 2000. D. Rita decidiu investir numa produção própria, porém diferente: cultivar somente alimentos orgânicos. “Procurei me informar mais sobre alimentos vivos e fiz alguns cursos na Fiocruz”, conta D. Rita.

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Sabedoria popular A pernambucana D. Rita, que estudou somente até a antiga quarta série primária, chegou ao

Rio com apenas 15 anos de idade. Com dificuldades financeiras e de habitação foi morar num morro na Praça Seca, Jacarepaguá. Por causa do medo da violência do lugar, D. Rita e seus quatro filhos se tornaram uma das 79 famílias que invadiram as terras pertencentes à Colônia no dia 1º de novembro de 1990. “A invasão foi pacífica, mas tivemos muita resistência. Trazíamos tijolos nas bolsas para não levantar suspeitas”, relembra.

Filha de agricultores, D. Rita já foi doméstica e trabalhou em cozinhas industriais. A partir dos cursos que fez sobre alimentação saudável resolveu apostar numa horta orgânica, também com o intuito de conscientizar a comunidade sobre a importância da ingestão de alimentos sem agrotóxicos. “Aprendi rápido a forma de cultivo. Parece que nasci para isso”, brinca.

D. Rita tem verduras como alface, couve, acelga, rúcula, taioba, frutas como abacate, limão, côco, banana, tangerina, e temperos como açafrão e colorau, além de café orgânico tipo arábico.

A horta ocupa um espaço de 45 X 33 m. “Quem olha percebe que tudo é mais vivo, mais verde, mais saudável”, ressalta. Todo o adubo é feito pela própria D. Rita. A partir da mistura de restos de verduras e folhas, ela vai misturando a terra que de tempos em tempos vai sendo re-gada e misturada até que fique pronto o adubo natural. Para combater pragas como formigas, a receita de D. Rita é simples: basta colocar próximo à plantação borra de café.

Logística e geração de renda A estratégia de D. Rita para escoar a produção é simples e tem dado muito certo. Além de

uma vendinha na frente da horta, ela coloca carrinhos com os produtos em lugares de bom mo-vimento na comunidade. As verduras são vendidas a R$ 1,00. “Inclusive vendo para pequenos comércios e mercadinhos aqui da localidade mesmo”, conta.

Para ajudar a cuidar da horta e das vendas, entra em campo a sua fiel companheira e amiga, Rita Correia, de 46 anos. “Além de ter aprendido bastante sobre alimentos vivos, o que me abriu muito a mente, trabalhar na horta é uma forma de garantir renda para minha família, já que sou pai e mãe de três filhos”, destaca Rita. As duas Ritas ainda preparam engradados de pimenta (também cultivada na horta) e temperos frescos para serem vendidos. “A gente aproveita também para mostrar aos moradores como preparar alimentos sem cozinhar, mantendo suas vitaminas e fibras sempre vivas. Muita gente nos procura para saber mais”, destaca Rita Correia.

Receio e preocupação D. Rita está aprovando bastante as obras do PAC. “As melhorias estão sendo ótimas para

todos”, reforça. Mas ela tem uma grande preocupação: funcionários da Prefeitura a visitaram e informaram sobre a necessidade de desocupar o terreno onde está a horta. “ Para mim será uma tristeza tirar a horta daqui porque além de gerar renda para a gente é também um importante projeto de conscientização sobre alimentação saudável para a comunidade, já que a maioria é carente”, conta emocionada.

Serviço: Orgânicos das Ritas: R. Viana do Castelo, 38, comuni-dades Entre-Rios Colônia Juliano Moreira, Taquara, Rio de Janeiro.

Dica de suco vivo para melhorar as funções intestinais.

Juntar folhas de capoeraba, capim, trevo de três folhas, urtiga brava branca e mostarda. Lavar bem todas as folhas e bater no li-quidificador. Acrescente a um suco de sua preferência. “Tudo isso você encontrar em matagais sem gastar nada e é um santo remédio para o intestino preso”, reforça D. Rita.

Conscientização Ambiental na Colônia

No âmbito do PAC da Colônia Juliano Moreira, foi desenvolvido junto à comunidade um Programa de Educação Sanitária e Ambiental, cujo nome é “Lixo Legal”.

Este Programa é resultado de um processo participativo orienta-do pelo Trabalho Técnico Social do PAC em conjunto com a Comuni-dade e o Poder Público.

Um de seus objetivos princi-pais é oferecer melhorias na qua-lidade de vida para a população e o desenvolvimento sustentável da comunidade.

Neste Programa estão pre-vistas campanhas de conscienti-zação, oficinas, eventos e cursos de hortas orgânicas comunitárias, técnicas de compostagem, viveiros florestais, hortos fitoterápicos, for-no solar e outras atividades .

D. RitaRita Correia

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Lembro-me bem quando os amigos se reuniam para participar de encon-tros organizados por Fábio Ema quando ele dava aula de graffiti no Morro da Mangueira. Eu estava iniciando minha “correria” como grafiteiro e foi o primeiro momento que tive contato com alguma informação sobre tinta nos muros de favelas. Também não esqueço quando meu amigo Mario Band’s disse: “agora só pinto em favelas!”. Aquilo marcou e me fez refletir sobre esta questão (afinal, a rua, os trens sempre foram os focos dos grafiteiros). Percebi um novo horizonte no meio da arte urbana carioca. Algo que vinha para, de fato, servir como promotor de informação dentro de espaços menos favoreci-dos como nossas comunidades. É como diz meu camarada Rine, “é aqui que merece a pintura de verdade, passar a mensagem!”. Não existe um ângulo ruim ou perspectivas sem plano de fundo, a moldura sempre é perfeita diante do interesse e compromisso do artista.

A “invasão” já comecou

Grafiteiros, também conhecidos como escritores, dos mais diversos lu-gares do Rio de Janeiro não estão nem aí se o muro está desnivelado ou se é apenas tijolo cru, o que vale para este pessoal que sobe os morros e leva arte de maneira responsável e de impacto social, é se alojar e aproveitar da melhor forma o que está disponível em sua arquitetura e redeco-rar as vielas com painéis coloridos e figuras que ganham sentido e sentimento especial ao se misturarem com um ambiente peculiar e uma realidade de pouco acesso a manifestações artísticas e culturais espalhadas pelo restante da cidade. O graffiti tem sido uma arma perfeita para mudar este cenário.

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Por David Amen Jornalista, grafiteiro e coordenador de comunicação do Raízes em MovimentoFotos: arquivo pessoal David Amen e Criz Silva

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Tem uma galera forte se organizando e idealizan-do ações que, além do graffiti, levam para o interior destas comunidades todo contexto político, social e cultural encontrado no Hip Hop. É desse jeito que, tudo acontecendo voluntariamente, numa data e local marcados, rola um dos mais emblemáticos e pioneiros eventos desse porte, o “Mutirão de Graffiti” que, desde 2006, reúne um exército de artistas para uma batalha de grande valor nestas áreas cheias de contrastes so-ciais. A proposta começou em Recife e foi adaptada ao formato e a realidade das favelas cariocas.

Para muitos, há uma diferença entre estar na rua pintando um muro abandonado, com pessoas indo e vindo sem parar e estar dentro de uma área es-pecífica, pouco acessível e participando do dia a dia daquela população, isso amplia a sensibilidade de quem pinta. “Imagina gente entrando na sua casa, com uma música que se fala mais do que se canta, pintando tudo e rolando no chão. Esse foi o desafio, tornar tudo isso agradável e ao mesmo tempo um in-formativo cultural, acho que conseguimos o objetivo”, enfatiza, um dos organizadores, Criz.

Para este artista de 33 anos, morador de Bangu, o Mutirão tem uma grande importância, além de produzir graffitis, que é a atitude de levar novas possibilidades de informação e diversidade cultural de forma voluntária para o interior de um ambiente marginalizado e que so-fre pela ausência do poder público. Este tipo de atividade passa a ter um valor especial, afinal “você passa um novo horizonte para as pessoas de lá, com o graffiti e o hip hop, porque na favela o que predomina, por exemplo, são o funk e o pagode normalmente, e quando você che-ga com algo novo causa estranheza e admiração. Notei que as pessoas querem conhecer coisas novas”, conclui.

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É tinta que critica e envolve

Tudo isso tem servido como inspiração para resgatar valores dentro de lugares onde as pessoas, muitas vezes, estão desacreditadas da possibilidade de uma mudança. As cores trazem vida àquela rua apertada, os cenários passam mensagens que valorizam o cotidiano, a música, a dança, as pessoas, tudo isso cria um ambiente saudável e prova que não é necessária tanta burocracia para al-cançar melhorias, “a união das várias expressões de arte, estilos, classes sociais, raças, credos... numa convivência pacífica (até fraterna, eu diria), enche o nosso coração de esperança, pois vemos que é possível uma sociedade melhor”, afirma o escritor Gleydston (Barba). Não existe apoio político partidário ou das instâncias do governo, o que é realizado vem da força de vontade e compro-misso individual, “todos trabalhando pelo bem comum. É uma mostra de que podemos muito se pararmos de olhar para nosso próprio umbigo!”, destaca.

As pinturas não são para, simplesmente, deixarem um lugar bonito ou serem vistas como vaidade pessoal, pelo contrário, a idéia que predomina vai além. O mundo precisa perceber que a população dos morros e favelas também tem seus direitos e são capazes de construir uma sociedade justa, são locais de terra fértil para plantar op-ções e colher frutos maduros de conhecimento. “Nesse tipo de encontro quem vai se sente em casa, serve de lição para muitos, penso que os que vão para pintar de-vem se conscientizar disso, as pessoas abrem as portas da comunidade e de suas casas de coração, aprendi nes-ses anos que as pessoas em comunidades, muitas vezes, têm muito pouco e são as que mais oferecem”, ressalta Marcelo Ment.

Hoje muitos grafiteiros já conseguem criar pers-pectivas profissionais de sua capacidade artística de criação. O graffiti passou a ocupar um espaço consi-derável no assunto mercado de trabalho, artistas vão além de oficinas ou pintura de fachadas comerciais, grupos estão se organizando para garantirem seu sustento a partir de ações particulares.

O graffiti possibilitou o avanço de uma sé-rie de produções artísticas. Com estilo próprio, ele veio para qualificar as tecnologias da co-municação social e artes em geral, que são as mais exploradas por este pessoal, ou seja, você pensa design gráfico, ilustrações, tatuagem, tem grafiteiro produzindo, os horizontes são

Viver da arte do graffiti: é possível?!infinitos para esta rapaziada, tem gente expondo seus “trampos” em galerias de arte da Europa e tudo mais.

Um dos melhores exemplos para ilustrar esta his-tória é falar dos irmãos Otávio e Gustavo Pandolfo (Os Gêmeos) que têm seus trabalhos expostos em diferentes cidades dos Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Gré-cia, Cuba, entre outros países. Os temas vão de retratos

de família à crítica social e política; estilo trazido nas bagagens tanto do hip-hop tradicional como da pichação.

Um dos momentos considerados mais impor-tante de suas carreiras foi quando em maio de 2008, executaram a pintura da fachada da Tate Modern, de Londres, para a exposição Street Art.

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O início de tudo...Tudo começou lá pelos anos 70 nos guetos ame-

ricanos. Grupos rabiscavam paredes dos becos, li-xeiras, e o mais famoso de todos: os trens que cor-tavam bairros e levavam os nomes das gangues ou dos escritores para toda parte da cidade e, assim, au-mentava a fama de cada um e uma certa sensação de domínio de território. Aos poucos a demarcação foi tomando segundo plano para uma verdadeira e nova forma de expressão artística, onde o surgimen-to de novas formas e estilos de fazer graffiti ganha-ram sentido na vida dessa galera.

Alguns anos se passaram e pintar paredes pas-sou a ter uma nova concepção. Questões políticas, crítica social, mensagens e cores foram um dos prin-cípios concebidos neste momento. O grafiteiro ago-ra é mensageiro da mudança, utiliza sua capacidade criativa para questionar e levar vida para locais ofus-cados pelo abandono.

No Brasil, o graffiti chega ao final dos anos 80, a cidade de São Paulo foi privilegiada por ser a precur-sora desta história e até hoje é referência brasileira quando se toca no assunto. A partir daí a coisa foi se alastrando de maneira viral até que hoje não existe uma cidade, sequer, sem cores e traços coloridos fei-tos por bicos de spray.

Alguns sites:www.daviamen.blogspot.com | www.espacorabisco.com www.meetingofavela.blogspot.com | www.graffiti.org.brwww.grafftube.com | www.4graffiti.com

A comunidade agradece“Parabéns, tá ficando bonito”, “porque que não fizeram na minha

casa?”, “isso podia acontecer mais aqui no morro...”. Estas são algumas das coisas que mais se ouve quando se está pintando nas comunidades. O morador estampa o sorriso no rosto quando vê sua casa transformada e quando se deparam com criações que expressam um bombardeio, mas desta vez, de muita paz, alegria e liberdade de direitos. Nas favelas, o que falta é isso: valorização territorial que incentive seu desenvolvimento. A vida nestas localidades é dura e precária, a arte vem quebrar esta rotina e trazer novos ares para uma transformação social.

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A “Perseverança” do grafiteiro Mário Band’sFoto de Sadraque Santos

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O relógio marca 6h. Do alto dos seus 2,01m de altura, Wanderson Gere-mias ou, simplesmente, WG, como é conhecido, já se espreguiça, mas com cautela para não tocar no teto. Assim que termina a higiene pessoal, inicia sua rotina cotidiana: ler e responder e-mails de amigos, empresas, emisso-ras de TV; entrar em contato com parceiros em potencial para o projeto de basquete de rua que desenvolve há cinco anos no Cesarão, em Santa Cruz, na zona oeste do Rio de Janeiro.

Em dezembro de 2005, o projeto de Basquete de Rua do Cesarão, de-nominado de “Cultura na cesta”, saiu do papel. No início eram apenas cinco crianças e, hoje em dia, existem 182 inscritos e a procura continua aumen-tando. As oficinas são realizadas às terças e quintas, das 17h às 19h, no Cen-tro Integrado Sementes do Amanhã (CISA). A quadra disponível não possui refletores, mas isso não impede que as atividades beirem à noite. Outro fa-

Matéria e fotos: Paulo Brito

Basquete Pela arte, Pela Vidator marcante é a determinação e a força do improviso: qualquer espaço, seja o quintal da sede ou a rua prin-cipal da comunidade, servem como quadra imaginária para as ações recreativas implementadas por WG.

O objetivo do ex-jogador de basquete profissional e um dos mentores da iniciativa, Wanderson, que chegou a atuar pelo Botafogo, é o de desenvolver um trabalho esportivo, cultural e de integração social, num proces-so contínuo. A formação de atletas que possam atuar pelos clubes brasileiros sempre é uma meta, mas não a principal. O que se pretende, realmente, é a construção, em grupo, de uma consciência cidadã, por intermédio do esporte.

Wendell Said gira a bola na ponta da caneta, uma das técnicas mais praticadas pelos meninos do projeto “Cultura na Cesta”

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“Se você entrega um livro para uma criança ou uma caneta, ela olha, analisa, mas não é certo que vá participar de algo, que surja um interesse natural por aquilo. Agora, entrega uma bola e diga para essa criança que ela só vai participar se estiver estudando e bem no colégio, se tiver respeitando os pais. O interesse é quase que automático. A nossa vontade é de fazer a criança e o jovem terem conhecimento dos direitos e deveres no mundo. E a bola faz essa conexão legal”, diz.

De acordo com WG, o espaço hoje utilizado para a realização das oficinas era praticamente deserto e sem iluminação, o que contribuía para um mau uso do terreno, no passado. Alguns menores utilizavam o espaço para poderem se desvincular do mundo através do uso de entorpecentes. A partir do momento em que o projeto começou a ser implantado, um desses jovens pediu para participar das atividades desenvolvidas ali. Os olhos de Wanderson brilham ao comentar que, por falta de uma base familiar sólida e, ainda, devido à pouca infra-estrutura do projeto que engatinhava, o menino permanecia na vida à margem da sociedade. WG fez questão de ressaltar a reintegração do rapaz durante o tempo em que ele resolveu participar do “Cultura na cesta”.

“No local onde a gente começou a praticar o basquete tinha umas movi-mentações estranhas. Aí, quando o projeto foi iniciado, as pessoas que po-deriam fazer algo de errado saíram do local, pois viram a seriedade do nosso trabalho. Uma dessas pessoas chegou até a participar de algumas atividades conosco, porém, a falta de uma base familiar e, ainda, a pouca estrutura que tínhamos, não foram capaz de convencê-lo a ficar mais tempo”, lamenta.

Por ironia do destino, apesar de lidar com mais de uma centena de jo-vens, Wanderson sofre, silenciosamente, o drama de se ver afastado de uma criança em especial, sua filha, devido a problemas conjugais. Ele mesmo ad-mite que não gosta de misturar o lado pessoal com o projeto, por isso evita tocar no assunto.

sementes que já dão frutosAtualmente, oito meninos que começaram no “Cultura

na cesta” estão espalhados pelo Vasco e pelo Flamengo. O sonho de WG faz coro ao sonho de todos, inclusive ao de uma das coordenadoras de projeto, Vania Geremias Nunes, que espera, algum dia, ver um dos jovens vestindo de um grande clube profissional e, ainda, da seleção.

“Sonho que eu ainda vou ver alguns deles parti-cipando da seleção. Em 2016 teremos algumas de nossas crianças representando o país e eu estarei aqui torcendo”, idealiza.

Um dos meninos atendidos pelo projeto já trei-na no Vasco da Gama. Cheio de sonhos e com um futuro promissor, Daniel dos Santos, de 12 anos, é apontado por Wanderson como um provável grande jogador. O garoto se destaca pela habili-

dade e rapidez e, tal qual seus companheiros de projeto, se imagina defendendo um grande clube de basquete do país e, também, a seleção brasileira. Daniel conta como conseguiu entrar no Vasco da Gama:

“A peneira do Vasco foi aqui perto, eles vieram até a gente. Os técnicos estavam presentes e eu, graça a Deus, junto com mais outros quatro meninos, passei e hoje trei-no lá em São Januário. No futuro eu estarei vestindo a camisa da seleção”, diz otimista.

dificuldade em conseguir Parceiros“Eu ouço ‘não’ há cinco anos”. Wanderson reclama das

dificuldades em conseguir parcerias para um desenvolvi-mento maior do projeto que ele executa. A complexidade em angariar fundos de empresas é inversamente propor-cional à ajuda recebida através de pessoas comuns. Para o instrutor, o fato do Cesarão não ser uma comunidade que está sempre na mídia, atrapalha neste sentido.

“A gente é a ‘comunidade da comunidade’. É status mo-rar na Rocinha, no Vidigal, na Cidade de Deus. Lá tem 500 projetos. Agora vai ver quantos projetos tem aqui no Cesa-rão. Nossa dificuldade é maior ainda, pois moramos numa comunidade onde ninguém quer fazer nada”, desabafa.

Com perseverança e bom humor, WG não pensa em desistir de tentar patrocínios. A ideia é, futuramente, construir um Centro de Treinamento de Basquete de Rua, na comunidade, além de aumentar o número de pas-seios culturais e de apresentações realizados pelos meni-nos. No que depender do esforço, tudo será conquistado

em breve. “Hoje em dia está tudo complicado pra gen-

te, mas eu estou batendo na janela. Se a porta é fechada, eu tento entrar pelos fundos. Se, mes-mo assim, não abrir, eu começo a gritar, pois uma hora vai aparecer alguém”, brinca. O tom de WG volta à seriedade ao falar sobre o traba-lho que promove e da imagem que pretende passar: “A gente quer mostrar que o basquete não é só esporte. Queremos mostrar que o bas-quete é cultura e arte também”, conclui.

As aulas costumam ser dadas na quadra do Centro Integrado Sementes do Amanhã (CISA), mesmo durante à noite, apesar da falta de refletores

WG ergue o troféu de Campeão do Campeonato Brasileiro de Basquete de Rua de 2008. Na ocasião, ele era o capitão do time do Cesarão que conquistou o título

Saiba mais sobre o projeto Cultura na Cesta:http://culturanacesta.webnode.com/Tel: (21) 3158-4681 - 3157-7110 - 8737-5962

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A ASBR (Associação de Skate e Bike da Rocinha) surgiu em 1998, auge do skate na Rocinha.

Rubens Carvalho e Alê Braghin buscavam locais para que pudessem an-dar de bike e skate. Mas devido a falta de recursos e apoio, não conseguiram um espaço para praticar.

Na época, a praia e um pátio de uma concessionária em São Conrado eram os principais points da galera que curtia rock, hip hop e esportes radicais.

“O pessoal ficava esperando a concessionária fechar e os carros saírem do pátio para termos espaço. E o piso era perfeito para andar de skate, por isso era bastante concorrido cada metro daquele lugar. Aí era skate, patins e bicicleta, tudo ao mesmo tempo.” Conta Aldemir Ferreira, um dos praticantes daquele lugar na época.

Rubens Carvalho, um dos idealizadores do projeto de esportes radicais da

Nando Dias, Rubens Carvalho, Vinicius “Da vela” e alunos no Complexo Esportivo da Rocinha

Rocinha

Rocinha conseguiu um espaço no CIEP Ayrton Senna e as-sim, pôde dar continuidade ao seu sonho: dar aula de bike para crianças. “O começo foi diversão mesmo, procurando lugares para praticar. E quando foi conquistado esse espa-ço no CIEP, procuramos fabricar obstáculos para o pessoal praticar.” Diz Rubens.

E foram estes mesmos “obstáculos” que chamaram a atenção de Nando Dias. Surfista e fotógrafo, Nando ficou curioso ao ver Rubens carregando o material e não se conteve para perguntar o que era aquilo exatamente. Foi assim que nasceu o SBR Rocinha Radical. Unindo o lado esportivo de Rubens com a visão profissional de empre-endedor do Nando Dias.

“Foi engraçado, eu não lembro se estava indo ou vol-tando da praia, quando vi o Rubens carregando aquelas coisas. Fui perguntar e ele veio me falando de projetos, de aulas, local para praticar... eu pedi calma a ele e depois conversamos melhor sobre o assunto. Aí me dei conta de que a idéia era muito boa e era uma iniciativa que al-guém teria que fazer nessa comunidade.” conta Nando.

O SBR cresceu, e como qualquer projeto, teve pro-blemas no início. Enquanto comemorava o seu registro oficial em cartório, sofria com o espaço cedido na região conhecida como Roupa Suja. A pista não teve um acom-panhamento profissional e sua estrutura era precária, e ainda assim, era disputado com outras pessoas que tam-bém buscam espaço, como crianças e comerciantes. O espaço acabou tornando-se para o SBR um point para

Sk8levanta vôo na

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A meta agora é apresentar ao público a nova geração de pratican-tes de esportes radicais e colocar o nome da comunidade nos maiores torneios nacionais e quem sabe, atingir o público estrangeiro.

Planos para o futuroO SBR Rocinha Radical planeja

iniciar ainda esse ano um circuito es-tadual, ampliar os obstáculos móveis, retomar o Tour Radical com mais con-forto e segurança e buscar patrocínios para que o projeto seja reconhecido e assim, ajudar os alunos com equipa-mentos novos e acompanhamento individual. Rubens reforça a preocu-

encontros e eventos. Segundo Rubens, faltou apoio para que aquele local se tornasse o primeiro lugar para as ati-vidades esportivas do projeto.

“Ali não houve tanta estruturação. O SBR sempre

buscou dar valor aos esportistas e procurando novas

maneiras de dar apoio e suporte aos praticantes, fa-

zendo eventos para acabar com o preconceito que o

esporte radical tinha na Rocinha, até mesmo porque

esta modalidade acompanha o rock como conceito

musical que não é muito bem vindo na comunidade.

Mas existia essa galera na Rocinha. O SBR só trouxe

esse pessoal de volta e o movimento ganhou força e

respeito.” Explica Nando Dias.O projeto, mesmo com muitas dificuldades, não via

limites e criou o “tour radical”. A equipe recolhia dinheiro dos participantes para alugar o ônibus e comprar lan-

“A chuva parou! Vamos andar de skate!” grita Wallace olhando para o céu.

pação com os praticantes e também com o futuro da Rocinha: “Não adian-ta o aluno vir aqui e fazer boas ma-nobras na pista, ele tem que estudar e ser algo além de um esportista. Fico feliz quando vejo uma criança carre-gando um skate, mas fico orgulhoso quando ela também carrega uma mochila indo para a escola”.

“Daqui a um ano você verá a evolução do SBR. Ver pais orgulho-sos com seus filhos fazendo o que gosta com toda a segurança e acom-panhamento profissional. Ver em an-damento um projeto social e cultu-ral, como o Afroreggae por exemplo. Temos muito o que oferecer.” explica Nando Dias.

Wallace Pereira, de 14 anos é um dos alunos que estavam na pista no momento da entrevista. Sempre quando há ameaça de chuva, é um momento de tensão entre os prati-cantes, e desta vez não foi diferente:

“A chuva parou! Vamos andar de skate!” grita Wallace olhando para o céu.

ches e assim, todos conheciam novas pistas por todo o Rio de Janeiro. Do Aterro do Flamengo a Nova Iguaçu, o SBR assim, expandia seus horizontes e ao mesmo tempo, seus sonhos.

Vinícius “Da vela” só tem boas lembranças do tour:“No tour radical conhecíamos o Rio de Janeiro de

forma diferente. As pessoas estranhavam quando a ga-lera descia do ônibus animada para andar de skate e isso chamava muita atenção. Conhecemos muita gente e muitas pistas.”

SBR Rocinha acelera na pistaO PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)

chegou na Rocinha e teve como um de seus projetos, um complexo esportivo, colocando as principais modali-dades esportivas à disposição dos moradores da comu-nidade. Rubens, Ale, Nando e Vinícius junto com George Rotatori acompanharam todo o processo da construção do skatepark até a inauguração do Complexo Esportivo. Hoje, a pista é uma das melhores do Rio.

O skatepark tem um pouco mais de um mês em uso, e com as chuvas, o local ficou paralisado por alguns dias, mas isso não desmotiva os alunos. Os horários já estão todos preenchidos e ainda há espera por vagas. Agora o desafio do projeto é aumentar o nível não só das ma-nobras e também buscar nas crianças o começo de uma nova era na Rocinha.

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O Complexo Esportivo recebe atletas de várias regiões

SBR busca novos talentos na comunidade da Rocinha

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Arte e saúde

Em parceria com o CBA (Associação Brasileira de Acreditação de Sistemas e Serviços de Saúde), o ‘Entrando Por Uma Porta’ vai estar na casa dos moradores das co-munidades do Fonseca, em Niterói. A proposta do grupo é construir um curso de formação técnica de Agentes Co-munitários de Saúde, formando profissionais para aten-der com técnicas de teatro oprimido, saúde preventiva, prevenção ao uso de drogas, cidadania, entre outros.

“Nosso público-alvo são jovens atendidos pelos pro-gramas pró-jovem, idosos, líderes comunitários, técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem e demais inte-ressados acima de 16 anos”, explica S’Antana. O curso técnico será ministrado na sede do grupo, em Niterói. O espaço será um local para troca de informações acadê-micas e experiências comunitárias bem sucedidas, como os outros Agentes Comunitários de Saúde do Brasil. Com o curso, o grupo espera que os participantes ampliem sua prática profissional, contribuindo para a melhor re-lação com as comunidades carentes. A data de abertura das matrículas ainda será divulgada.

“Avaliamos semestralmente as nossas atividades. Cada vez mais tenho certeza de que mais que uma cons-trução social, o trabalho do grupo é uma arma e um remédio contra a violência e o tráfico de drogas. Todos estão convidados a participar”, afirma S’Antana.

Na contra-mão da tendência cidade de “muros” O encontro de Ana Suely Malta, 53 anos, com o Grupo Entrando Por Uma

Porta foi meio que por acaso. A atriz estava na sede do SATED (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversão do Estado do Rio de Janeiro) quando conheceu Reinaldo S’Antana, um dos idealizadores, que a convidou a conhecer mais sobre o projeto.

“Me encantei com a proposta de trabalho com as comunidades e entre-guei-me completamente”, conta Malta que faz parte do grupo há mais de 11 anos. Além de levar arte e cultura para as comunidades cariocas, o ‘Entrando Por Uma Porta’ tem um papel social importante, funcionando como espaço de diálogo com moradores do “asfalto”. “Eu sempre fui e continuo sendo mo-radora de Jacarepaguá. Tinha muito pavor de passar perto das comunidades por medo de violência. Era uma burguesinha mesmo. Depois que conheci o grupo de teatro minha visão mudou completamente. A gente interage o tempo todo com os moradores e hoje posso dizer que tenho grandes amigos e freqüento sim favelas cariocas com um novo olhar”, revela Malta.

Já o ator Marcos Teles, 24 anos, que desde adolescente participava de atividades ligadas às artes, diz que ampliou sua visão cênica ao participar do ‘Entrando Por Uma Porta’.

“Exercitando a função teatral percebi que os ensinamentos e técnicas passadas para mim no início da minha carreira, não foram o suficiente para eu me engajar em espetáculos como o Periferias, por exemplo. Ali, junto a outros integrantes da comunidade da Maré e de Ivri na França, aprendi a enxergar com outros olhos o verdadeiro sentido da arte, que além de emo-cionar, fazer rir e entreter o público, o teatro tem o principal papel de fazê-lo refletir e levá-lo a conhecer aspectos, sentimentos, situações em que jamais viveu”, reforça Teles.

SERVIÇO: Casa de Cultura Dona Zezé Prates: Rua Álvaro Neves, 9, Fonseca, Niterói-RJ Tel: 21 2625 7493

Núcleos de Cultura: Colégio Estadual LuisCarlos da Vila, Manguinhos, e Colégio Estadual Brigadeiro Schor-cht, em Jacarepaguá.

Blog do grupo:http://grupoentrouporumaporta.blogspot.com/

Ensaio do Peripherias Entrou Por Uma Porta, Vila Olimpica da Maré e CAPE SUR IVRY- RJ - 2009

Alberto Eloy (Quijote) e Carlos Mutalla (Sancho) na Cena do Espetáculo Multicultural El Quijote na Rede Latino Americana - SP - 2009

Reinaldo San’tana e Iléa Ferraz após a apresentação no Mecado Kaponte em Benguela/ Angola - 2009

Alex Porto construindo a Cenografia do Periferias - RJ - 2009

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Por Fabiana OliveiraFotos: Fabiana Oliveira e Acervo Cacique de Ramos

Há 49 anos a roda de samba do Cacique de Ramos, que fica entre o bairro de mesmo nome e Olaria, anima as tardes de domingo da Zona Norte carioca. Para além do lazer, à sombra da tamarineira foram revelados grandes nomes da música brasileira, como Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Jovelina Pérola Negra, Almir Guineto, Dudu Nobre, Jorge Aragão, Arlindo Cruz, Sombrinha, entre outros.

Recentemente, o local foi tombado como patrimônio cultural do Rio de Janeiro e receberá investimento da prefeitura para cons-trução de nova sede, com ginásio coberto. Mesmo com as obras, previstas para terminarem em sete meses, o samba continua rolando solto, sempre a partir das 17h, com entrada e estacionamento gratuitos.

E não é qualquer samba. Segundo Bira Presidente, integrante do Fundo de Quintal, e como o próprio nome define, presidente do Grêmio Recreativo Cacique de Ramos desde sua fundação em 1961, o diferencial é que por ali só se escuta samba de raiz e como o próprio Bira defende, da melhor qualidade:

“Meus antepassados sempre foram ligados ao samba. Como meu pai convivia com o pessoal da velha guarda como Pixinguinha, Candeia, Cartola, entre outros, crescemos no meio deles. Então fizemos daqui de dentro um reduto daquilo que aprendemos com essas pessoas. Aqui cantamos samba puro, de raiz”.

Frequentadores assíduos do local, o casal Simone Costa e Álvaro Santos aprovam não somente a música, como também o am-biente. Segundo Bira, a Casa - que não possui segurança - desde sua fundação nunca registrou uma ocorrência policial.

“Aqui é nosso programa de final de semana. Particularmente acho que é um lugar adequado para tudo. É um ambiente muito fa-miliar. Sempre que posso trago meu filho de oito anos para cá”, diz Simone, que também é vocalista do grupo de samba Mafuá de Iaiá.

49 anos de ritmo e tradição

Casal Simone Costa e Álvaro Santos,frequentadores assíduos do local

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No período de carnaval, da quadra de 2500 metros quadrados, o Cacique de Ramos ganha o Centro do Rio, encerrando - todos os dias - o desfi-le dos blocos carnavalescos, na Avenida Rio Bran-co, sendo acompanhado por todos os foliões. A passagem do Cacique, com suas diversas alas, é considerado um dos pontos altos da festa.

Neto de indígenas, Celso Anísio de Oliveira, presidente de uma das alas da agremiação, a Ta-moio, vê o Cacique como uma forma de valorizar suas raízes: “Nas alas o pessoal se veste de índio, com as roupas próprias. Por ser neto de indíge-nas, isso tem um valor enorme para mim. Já te-nho quase 36 anos de Cacique e isso para mim é a realização de um grande sonho”.

Enquanto o carnaval não chega, Marco Antô-nio, morador de Ramos, não perde um domingo de samba no Cacique: “Venho sempre. Aqui é o celeiro do samba. Praticamente uma escola para tudo quanto é sambista. Sem contar que é o me-lhor samba de mesa.

Aqui é tudo ao vivo, sem microfone. Só canta e toca quem tem talento. Se não tiver, nem entra na roda”.

E para as comemorações do cinqüentenário do Cacique, em 20 de janeiro de 2011, o Presiden-te avisa que o bloco, que já é tese de doutorado, ganhará uma exposição no Museu da Repúbli-ca, show no Terreirão do Samba, documentário de Luiz Carlos Lacerda, além da reedição do livro “Cacique de Ramos: uma história que deu samba”, do antropólogo Carlos Alberto Messeder.

Vida longa ao Cacique!

RODA DE SAMBA DO CACIQUE DE RAMOSTodos os domingosHorário: 17h30Endereço: Rua Uranos, 1326, Olaria – Rio de Janeiro.Tel.: 3888-9248Entrada e estacionamento: Gratuitos

No CarnavalConcentração todos os dias, na Avenida Rio Branco, esquina com Av. Presidente Vargas, às 18h. Fantasias: R$ 40 (napa) e R$ 25 (Ala do Cura Ressaca). Contatos: 3880-9248 e 9363-2973.

TOME NOTASAIBA MAIS

O Samba de Raiz é uma autêntica expressão da cultura musical brasileira. Em

um grupo de samba de raiz, vemos o pandeiro de couro, o cavaquinho, cuíca, surdo,

violão e violão de sete cordas. O banjo, pandeiro sintético, repique de mão e tan tan

foram introduzidos principalmente nas rodas do Cacique de Ramos e por integrantes

do grupo Fundo de Quintal, tendo esses instrumentos vindo para somar.

O samba de raiz também traz outros importantes instrumentos como: ganzá, reco-

reco, tamborim, bandolim, entre outros. O samba divide-se em vários tipos, todos eles

integrantes do “Samba de raiz” como o samba de partido alto (versos de improviso),

samba dolente, samba de quadra, samba de terreiro, samba do recôncavo baiano...

Fonte: Wikipédia – www.wikipedia.org

Da quadra para Avenida

Bira Presidente no tradicional bloco de rua

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Por: Beatriz Coelho SilvaFotos: Diálogo Urbano

Os médicos do Rio de Janeiro já sabem: qualquer questão com o seu sindicato pode ser resol-vida pelo auxiliar administrativo Luiz Fernando Cassiano Gomes. Os moradores do Morro Santa Marta contam com ele para ajudar nas horas de aperto, para organizar festa, desfiles de carna-val, e dar uma força em tudo que a vida comunitária pede. Mas, se você quiser achá-lo no Santa Marta ou no Sindicato, deve procurar pelo Felipão, nome pelo qual esse rapaz nascido e criado na comunidade de Botafogo e que, há mais de 20 anos, é uma referência nos dois ambientes, o sindical e o do carnaval carioca. Afinal, entre dezembro e março, ele é mestre Felipão, que dirige a bateria dos blocos de Segunda, Suvaco de Cristo, Desculpa pra Beber e Barbas, liderado pelo Nelson Rodrigues Filho.

Não que durante o ano ele se afaste da festa. Além de ensaiar com a bateria ao menos a cada 15 dias, já que os ritmistas precisam estar afiados quando chega a hora de animar festas e desfiles, Felipão gosta de reunir os amigos em churrascos e rodas de samba, com motivo, como na sexta-feira, dia 23 de abril, para celebrar São Jorge, no dia do santo guerreiro, ou sem motivo nenhum. “É preciso estar sempre em contato porque ninguém vive sozinho, sem os amigos a gente não chega a lugar nenhum”, ensina.

um líder afinado com as pessoas, a música e o trabalho

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Ele faz questão de enumerar os amigos, boa parte deles do Santa Marta, alguns parentes de sangue, outros por afinidade: tem o primo Tião Belo, Chininha (passista) e os 15 ritmistas fixos da bateria, que têm que tocar para si e para os outros quando desfilam. “Chega muita gente querendo tocar, médicos, advogados, arquitetos e, mais que tudo, são amigos durante o ano todo”, diz Felipão. Não deixa de falar também no falecido Zé Diniz, “que tinha uma folia de reis no Santa Marta” .

Nascido no morro Santa Marta, cuja família é pioneira naquela comuni-dade que, Felipão saía na furiosa (banda de metais) do pai, era seu auxiliar na condução da bateria da Escola de samba São Clemente e ainda acompanha-va a avó, dona Neném, que o criou, aos pagodes de Botafogo e adjacências. E, para quem pensa que samba só vem da zona norte e dos subúrbios do Rio, o ex-bairro aristocrático da zona sul é berço de bambas como Paulinho da Viola, Walter Alfaiate e Mauro Diniz, só para citar os que ganharam fama.

Felipão herdou do pai o jeito de ser líder, conseqüência da vontade per-manente de ajudar o próximo e ver as coisas acontecerem. Herdou também o talento para tocar e harmonizar ins-trumentos de percussão. Foi passista e ritmista da escola de samba Beija-flor de Nilópolis nos anos 1970 (com os en-redos campeões de Joãosinho Trinta) e organizou blocos e alas de escolas de samba. Nos anos 1980, largou o samba, mas não a comunidade do Santa Marta. Continuou ativo, constituiu família e aumentou o círculo de amizades para além, para o asfalto. Foi assim que voltou ao samba, conta ele, sorrindo da lembrança:

“Em 1988, eu era contínuo no Sindicato dos Médicos e meu chefe era o advogado Fernando Cacaldi. Ele me chamou para organizar a bateria do Blo-co de Segunda, da publicitária Evelyn Sussekind (conhecida no samba como Loloca), o arquiteto Carlos Fernando de Andrade, e funcionários de empresas estatais do bairro, de bar e praia. Levei meus amigos do Santa Marta porque sozinho não iria a lugar nenhum.” Hoje a bateria sai nos quatro blocos, faz apresentações todo mês na quadra da escola de samba Mocidade Unida do Santa Marta, da qual é fundador e presidente do Conselho. “Quando chega perto do carnaval, as apresentações acontecem todo fim de semana, de sex-ta a domingo, ou mesmo começando na quinta”, conta.

Assim como ele, a maioria dos outros 15 ritmistas fixos têm outras ati-vidades, pois esses shows e desfiles são a única remuneração que o samba lhes dá. Os blocos pagam um cachê – que é dividido entre todo mundo -, lanche e fantasia para a bateria. “Não dá para viver com esse dinheiro, mas geralmente compro o material escolar para as crianças com o que ganho nes-ta época”, explica. A família dele, no entanto, não é muito de samba. “Minha mulher, Juliana, não gosta (mas coleciona o arquivo de fotos e reportagens que saem sobre ele). Meus filhos também não vão. O mais velho, Luiz Felipe, de 25 anos, já trabalha, também como auxiliar administrativo. O segundo, Álvaro Felipe, com 15 anos, ainda estuda.”

“Se eu tivesse que escolher entre o samba e o sindicato, não sei o que faria, gosto dos dois igualmente. No samba, nasci e fui criado porque, minha mãe, Lilita, foi passista e meu pai tinha a furiosa”, continua. “No sindicato,

gosto de resolver problemas, ver as coisas andarem. Nos 22 anos em que estou aqui, minhas atribuições só cres-ceram.”

No morro também. Não satisfeito com a roda viva de ensaios dos vários a que pertence, Felipão criou o bloco Pela Saco, que sai há dez anos, às terças-feiras gordas. Luta também para manter na ativa a Mocidade Unida de Santa Marta, que atualmente desfila num grupo de aces-so em Campinho. “A escola dá mais trabalho que bloco porque tem que olhar carro alegórico, fantasia das alas, transporte para o povo todo no desfile e tudo mais”, lem-bra Felipão. Para quem não tem referência, é a escola de samba que aparece no videoclipe que Michael Jackson gravou no Rio em 1996. E também encantou a superstar

Madonna, quando visitou o morro no ano passado.

“A visita do Michael Jackson foi demais”, conta Felipão, destacando o impacto da presença do astro pop no Santa Marta. “Já a Madonna eu não vi, estava no trabalho”., lamenta.

Para dar conta do samba e das 8 ou 9 horas de batente no sindicato, Felipão corre de um lado para o outro,

rotina que fica mais intensa de dezembro a fevereiro. En-saios e festas de blocos entram pela madrugada e, às 9 horas, pontualmente, ele está no Sindicato dos Médicos, sempre solícito e disposto. “Quase não conto com ele, nem nos fins de semana porque fica enfiado no samba”, brinca a mulher de Felipão, Juliana.

Emotivo, Felipão,destaca sua relação com os inte-grantes da bateria: “Não posso deixar de citar também o meu pessoal, que me ajuda a organizar a bateria porque sozinho a gente não é ninguém”, conclui Felipão com seu melhor sorriso.

Se eu tivesse que escolher entre o samba e o sindicato, não sei o que faria, gosto dos dois igualmente.

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Ensaio fotográfico no alto do Complexo do Alemão. Modelo Dayane Rocha.

Rua da Concórdia à noite, fiz uma longa exposição e o resultado foi esse (Complexo do Alemão).

Tirada da minha laje um dia antes das chuvas que castigaram o Rio de janeiro (Complexo do Alemão).

Foto: Maycom Brum

Foto: Maycom Brum

Foto: Maycom Brum

ParticipeMande sua foto para

[email protected]

Resolução: 300 DPI

Maycom Brum

e-mail: [email protected]

www.flickr.com/photos/maycom_brum/

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Page 27: revista Diálogo Urbano

Qual o significado da palavra sustentável?Feita há poucas décadas atrás esta pergunta poderia ficar sem

resposta. Para alguns, no entanto, a resposta seria clara e estaria associada à preservação do meio ambiente. Não é por acaso, uma vez que o conceito de sustentabilidade, durante muitos anos, foi apropriado por aqueles que viam na questão ambiental um dos maiores, senão o maior, problema do Planeta.

Não tendo a menor dúvida de que se não adotarmos uma pos-tura radicalmente diferente em relação aos nossos padrões de con-sumo e poluição não teremos futuro, temos também clareza que muito mais precisa ser feito.

Foi a partir desse entendimento inicial e de uma nova visão sobre o futuro da humanidade que a palavra sustentável e o termo sustentabilidade passaram a incorporar outras dimensões.

A mesma questão, hoje formulada, talvez leve a outra pergunta. Sustentável em que dimensão? Econômica, social ou ambiental?

Analisar a sustentabilidade sob a ótica das dimensões, se por um lado pode nos ajudar a visualizar melhor o conceito, pelo outro pode nos levar a uma visão fragmentada do mesmo.

Será que é possível a sustentabilidade econômica sem a social? E a econômica sem a ambiental? E, e, e...

Será que existem outras dimensões a considerar? Que tal a cultural? E a política?

Para todos que procuram enxergar o conceito dentro de uma visão holística, talvez não faça muito sentido falar nas dimensões, ou seja, o termo sustentabilidade deve ser visto dentro de sua vi-são ampla que incorpora absolutamente todos os aspectos neces-sários. Dentro desta abordagem as dimensões passam a ter um caráter mais didático para facilitar a compreensão e o verdadeiro sentido da palavra.

Sustentabilidade

ou Ética?

Aser CortinesConsultor independente e Diretor

da Universidade da Experiência

Em uma roda de amigos, nas conversas de botequim, nos en-contros empresariais, nos atos religiosos, no meio político, enfim em todos os momentos da vida que envolvem gente, as palavras sustentabilidade e ética estão cada vez mais presentes. Utilizadas de forma completamente distintas, estas duas palavras estarão cada dia mais conectadas.

Para que possamos falar de ética, precisaremos falar inicial-mente sobre a palavra moral. Os termos moral e ética vêm sendo utilizados por muitos com o mesmo sentido e não sem razão, uma vez que recorrendo as origens latinas e gregas das duas, encontra-remos a palavra costumes.

Como tem dito a professora Terezinha Rios é importante fa-zer a distinção entre estas duas palavras. Moral será para nós o conjunto de normas, regras, procedimentos e leis que nos permi-tem viver em sociedade. A ética, por ter na sua essência o bem comum, está pautada em princípios e tem como papel principal exercer uma crítica permanente sobre a moral. Dentro desta lógica, diferentemente da moral, que se ajusta quando temos grupos e culturas diferentes, a ética tem a pretensão de ser universal e per-manente. Podemos citar, como exemplo, o que estamos vivendo no momento, em determinado País da África, que é a discussão sobre a pena de morte para o homossexualismo. Caso aprovada, a nova lei passará a fazer parte do código de moral desse País. A questão que se coloca é: Seria ético? A resposta para muitos é ób-via, mas existem ainda aqueles, e que não são poucos, com uma visão diametralmente oposta.

O conceito de ética, mesmo com a pretensão de ser universal e mais permanente no tempo, tem avançado e irá avançar ainda mais à medida que a humanidade evolua no seu nível de consciência.

E aí surge a seguinte questão: será possível admitir sustenta-bilidade sem ética? E sermos éticos com atitudes e posturas não sustentáveis?

Por esta razão estas duas palavras estarão cada vez mais co-nectadas e talvez em um futuro muito mais próximo do que imagi-namos, representem a mesma coisa.

Indo à essência da essência dos conceitos de sustentabilidade e ética chegaremos ao que poderíamos chamar de um mundo me-lhor para todos. Mesmo não estando ainda preparados ou absolu-tamente convictos de que mundo queremos para nós, talvez seja possível chegar a um consenso de qual é o mundo que queremos e sonhamos para nossos filhos e netos.

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