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Revista de Sociologia e Política ISSN: 0104-4478 [email protected] Universidade Federal do Paraná Brasil Jardim, Márcia Palanque eletrônico em eleições locais: aspectos do acesso dos municípios ao HGPE na televisão Revista de Sociologia e Política, núm. 22, junho, 2004, pp. 45-58 Universidade Federal do Paraná Curitiba, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=23802205 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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Revista de Sociologia e Política

ISSN: 0104-4478

[email protected]

Universidade Federal do Paraná

Brasil

Jardim, Márcia

Palanque eletrônico em eleições locais: aspectos do acesso dos municípios ao HGPE na televisão

Revista de Sociologia e Política, núm. 22, junho, 2004, pp. 45-58

Universidade Federal do Paraná

Curitiba, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=23802205

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Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 22: 45-58 JUN. 2004

RESUMO

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, 22, p. 45-58, jun. 2004

Este trabalho apresenta aspectos do acesso ao horário gratuito de propaganda eleitoral (HGPE) na televisãoem eleições locais nos municípios do estado de São Paulo. Evidências empíricas comprovam a existência dedois modos distintos de fazer campanhas eleitorais locais em municípios com mesmo perfil (conforme critériossociais, econômicos, políticos e demográficos): os eleitores do Estado de São Paulo podem ser divididosentre aqueles com acesso ao HGPE na televisão para decidir em quem votar para Prefeito de sua cidade eos que não têm acesso a tal fonte de informação política. Apesar de a capital contar com um “palanqueeletrônico” para eleger o seu Prefeito desde a eleição municipal de 1985, municípios da região metropolitanade São Paulo não contam com o mesmo recurso – os eleitores de toda a região do ABCD, mais Guarulhos eOsasco, assistem na televisão à propaganda eleitoral dos candidatos da cidade de São Paulo. Este artigoapresenta resultados do levantamento “Aldeia global paulista”, que procurou explicar as razões quelevaram à configuração desse cenário e identifica a totalidade dos municípios com “campanha eletrônica”para Prefeito.

PALAVRAS-CHAVE: horário gratuito de propaganda eleitoral; eleições para Prefeito; estado de São Paulo;palanque eletrônico.

PALANQUE ELETRÔNICO EM ELEIÇÕES LOCAIS:ASPECTOS DO ACESSO DOS MUNICÍPIOS

AO HGPE NA TELEVISÃO1

Recebido em 1 de novembro de 2003Aprovado em 8 de maio de 2004

Márcia Jardim

I. INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta aspectos do acesso aohorário gratuito de propaganda eleitoral (HGPE)na televisão em eleições locais de algunsmunicípios do estado de São Paulo2 . Evidênciasempíricas comprovam a existência de dois modosdistintos de fazer campanhas eleitorais locais emmunicípios com mesmo perfil, de acordo com

critérios sociais, econômicos, políticos edemográficos. Dessa forma, os eleitores do estadode São Paulo podem ser divididos em eleitorescom acesso ao HGPE na televisão para decidirem quem votar para Prefeito de sua cidade e oseleitores que não têm acesso a essa fonte deinformação política. Apesar de a capital contarcom um “palanque eletrônico” para eleger o seuPrefeito desde a eleição municipal de 1985,municípios da região metropolitana de São Paulo3

não contam com esse recurso. Os eleitores detodo o ABCD, Guarulhos e Osasco assistem, natelevisão, à propaganda eleitoral dos candidatosda cidade de São Paulo. Este artigo apresentaresultados do levantamento “Aldeia global paulista”,que procurou explicar as razões que levaram àconfiguração de tal cenário e apresenta a tota-lização dos municípios com “campanha eletrônica”para Prefeito.

1 Este texto é parte dos resultados da pesquisa originalrealizada para o programa de Mestrado em Ciência Políticado Instituto de Filosofia e Ciências Humanas daUniversidade Estadual de Campinas (IFCH-UNICAMP),O mapa da mídia eletrônica em eleições locais no estadode São Paulo, de dezembro de 2002 e foi apresentado noXI Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado naUNICAMP em setembro de 2003. A autora agradece aleitura crítica e as sugestões feitas pelos pareceristasanônimos da Revista de Sociologia e Política, que foram,sempre que possível, incorporadas. Os erros e limitaçõesque permanecem são de exclusiva responsabilidade daautora.

2 Apesar de o universo da pesquisa ser o estado de SãoPaulo, o resultado permite sugerir que a tendência encontradadeve repetir-se nos outros estados, considerando que tantoa legislação eleitoral quanto a regulamentação dastelecomunicações é de abrangência nacional.

3 A região metropolitana de São Paulo, segundo a FundaçãoSEADE, é composta por 38 municípios mais a capital eresponsável por cerca de 59% do eleitorado do estado(SEADE, 2002; TRE-SP, 2004). É consensual que essesmunicípios desempenham importante papel no cenário polí-tico e econômico, não só do estado, mas também do país.

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Do ponto de vista teórico, o trabalho insere-seno amplo campo de estudos sobre as relações entrea mídia e a política e desenvolveu-se sob a óticada modernização dos processos políticos-eleitoraiscaracterizados, principalmente, pela centralidadedos meios de comunicação de massa nascampanhas4. As democracias contemporâneas, aolongo do tempo, sofreram transformações comefeitos sobre a forma como se dá a representaçãopolítica. O período recente é caracterizado pelodeclínio da identificação partidária comodeterminante do voto, a importância das pesquisasde opinião e a centralidade da imagem nosprocessos político-eleitorais (MANIN, 1995).

A partir das eleições presidenciais de 1989, épossível perceber, também no Brasil, as transfor-mações na forma de representação política apon-tadas. O papel central que a televisão desempenhouna campanha eleitoral que marcou a redemocrati-zação representou uma surpresa, uma “novidade”que estimulou o debate e o desenvolvimento deestudos sobre o impacto da televisão nos processoseleitorais. Após mais de dez anos de “campanhasmodernas” no Brasil para Presidente, governa-dores, senadores, deputados federais, deputadosestaduais e prefeitos das capitais, a pergunta quese apresentava era: como esse “processo demodernização das campanhas” dava-se no nívellocal, nos municípios do interior do estado de SãoPaulo? O cenário que se apresentava tinha a marcada diferença: havia municípios com acesso aoHGPE na TV para eleição de Prefeito e municípiosque não tinham acesso a esse recurso de campanhaeleitoral. Para explicar a configuração deste cenáriodo acesso aos meios de comunicação eletrônicosem eleições locais também foi preciso realizar umlevantamento sobre a legislação eleitoral, no perío-do de 1958 a 2000, e sobre a rede de emissorasde televisão no estado.

Como resultado desse trabalho de pesquisa,explicamos que o acesso ao horário gratuito depropaganda eleitoral na televisão, em eleiçõeslocais, dá-se a partir de uma complexa articulaçãoentre aspectos de um contexto legal e de um

contexto técnico referente às telecomunicações.Ambos os contextos apresentam questõesespecíficas significativas e problematizá-lasconsiste no objetivo principal deste artigo.

II. RELAÇÕES ENTRE MÍDIA E POLÍTICA

O papel central desempenhado pelos meios decomunicação eletrônicos nos processos político-eleitorais das democracias contemporâneas é algoconsensual na literatura como uma das principaisevidências da modernização das campanhaseleitorais na “era midiática” (MATOS, 1994;RUBIM, 1994; 2002; AZEVEDO, 2001). SegundoRubim (2002), as eleições podem ser consideradascomo momentos diferenciados no cotidiano doseleitores, como um período em que as atenções,de alguma forma, ficam mais voltadas para osdebates políticos. Após quarenta e um anos depropaganda eleitoral na televisão, o horário gratuitojá faz parte da cultura política brasileira (ALBU-QUERQUE, 1995) e sua transmissão determinapara o eleitor, de maneira inequívoca, o início do“tempo da política” (VIDAL, 1998).

As campanhas eleitorais, principalmente pormeio da ação da mídia, são momentos de grandeaumento da circulação de informações políticasque, tornadas públicas, podem ser levadas emconsideração pelo eleitor no processo de decisãodo seu voto (HOLBROOK, 1996). Com base emuma ampla gama de estudos nacionais (STRAU-BHAAR, OLSÉN & CAVALLARI, 1991; AVELAR,1992; PORTO, 1996; VIDAL, 1998) e interna-cionais (SKIDMORE, 1993; WOLTON, 1996)podemos considerar a televisão como uma dasprincipais fontes de informação política na contem-poraneidade: “A dominância da televisão enquantofonte de informação política dentre os meios demassa foi confirmada por um survey com amostranacional de 2 680 entrevistados, realizado emoutubro de 1989 pelo IBOPE”5 (STRAUBHAAR,OLSÉN & CAVALLARI, 1991, p. 50).

Nesse sentido, este trabalho considera aexistência da propaganda política na televisão umaimportante fonte de informação para o eleitor eum dos principais fatores na definição de umacampanha eleitoral moderna. Com pouco mais demeio século de existência, a televisão é o meio decomunicação de massa por excelência e é nessecenário da sociedade de massa que ela deve seranalisada. Na verdade, desde o seu início, a tele-

4 É importante esclarecer que não é intenção deste artigodiscutir uma possível oposição entre “campanha tradicio-nal” e “campanha eletrônica” e suas conseqüências para aDemocracia, tendo em vista ser este um debate atual e não-conclusivo nas Ciências Humanas. Trata-se, aqui, princi-palmente de chamar a atenção para a coexistência das duasformas de campanha e as razões que configuraram estecenário. 5 Todas as traduções são da autora.

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visão tem sido cercada de concepções ambíguas,em uma mistura de fascínio e desconfiança, devalorização e desprezo. Para Wolton (1996), atelevisão desfruta de inegável sucesso popular,porém lhe falta prestígio. Segundo o autor, a tele-visão desempenha um papel essencial no espaçopúblico contemporâneo: o de “laço social”. Nãose trata de negar a centralidade da imagem, masde recusar uma visão da televisão como sendo“manipuladora de consciência”. Wolton mostra queo sucesso da televisão reside em outros fatoresque não só a transmissão de imagens, masprincipalmente na relação singular que elaestabelece, a partir da programação, com o “grandepúblico”: um telespectador ativo que sabe que nelaencontrará informação, igualdade e diversão. Porum lado, temos uma variada oferta de imagens;por outro lado, um telespectador ativo e inteligenteque articula recursos na seleção e interpretaçãodessas imagens. Como apontou Wolton, ascaracterísticas desse processo de comunicaçãoencerram inúmeras contradições e apresentamgrandes limitações – mas o que importa é resgatara possibilidade de sua dimensão democrática.Assim, a forma como a televisão relaciona-se coma política, por exemplo, nos processos eleitorais,não está dada a priori; ou seja, ela não énecessariamente negativa nem positiva e essarelação poderá ser mais ou menos democrática,dependendo do contexto político do país naquelemomento.

Identificamos os recursos de comunicaçãopolítica utilizados em campanhas eleitorais paraPrefeito com o objetivo de caracterizar uma“tipologia” de campanha. É possível dizer que emuma campanha eleitoral existem dois conjuntosde ações: um que envolve ações de contato diretocom o candidato majoritário e outro que utilizarecursos para mediar a relação eleitor-candidato.Para uma melhor caracterização desse universo,definimos duas categorias de campanha política:a tradicional e a eletrônica.

A campanha política “tradicional” utiliza comorecursos de comunicação política a distribuiçãode material gráfico6, a realização de comícios7,

reuniões com a presença do candidato, carreatase o tradicional corpo-a-corpo dos candidatos comos eleitores; nos municípios com emissoras derádio, também existe a transmissão de propagandaeleitoral8. Já a segunda categoria de campanha,que passaremos a denominar de “eletrônica”, fazuso exatamente dos mesmos recursos utilizadosna campanha “tradicional”, porém com umsignificativo instrumento adicional: a mídia eletrô-nica (a televisão).

III. A PERSPECTIVA INSTITUCIONAL-LEGAL

Em uma tentativa de dimensionar o contextoinstitucional-legal, é possível identificar dois blocosde questões legais: um ligado à propagandapropriamente dita e um segundo relativo aos meiosde comunicação de massa. Como indicativo daimportância do primeiro bloco, podemos lembrarque a própria existência do HGPE, principalmenteno caso de eleições locais, depende diretamentedas leis vigentes e dos seus mecanismos deinterpretação e fiscalização9.

O segundo bloco de questões institucional-legais trata das implicações, de caráter eminente-mente político, das regulamentações das modalida-des e concessões de emissoras e retransmissorasde televisão, ou seja, das relações do poder públicocom os meios de comunicação de massa(GUIMARÃES & VIEIRA, 1989; LIMA, 1989;1996; CAIAFA, 1994). A política de concessãode emissoras e retransmissoras de televisão e rádio

6 Tradicionalmente, os materiais gráficos utilizados emcampanhas políticas no Brasil são: cartazes, modelos decédulas, jornais, folhetos e “santinhos”.

7 Existe uma tendência de “espetacularização” dos comíciospolíticos. No início, em sua origem, contavam apenas coma presença de lideranças políticas e o candidato majoritário

era a maior “estrela” do evento. Nas décadas de 1950 e1960 os comícios dos candidatos a governador eramtransmitidos ao vivo pela televisão. Atualmente, oscomícios, mesmo nos pequenos centros urbanos, têm-seconvertido em verdadeiros espetáculos, com queima defogos de artifício e presença de artistas famosos.

8 Deve-se notar que, por um lado, a transmissão depropaganda eleitoral gratuita no rádio obedece à mesmalegislação eleitoral estabelecida para as emissoras detelevisão. Por outro lado, a rede de emissoras de rádio estálargamente disseminada pelo estado de São Paulo, sendomuito difícil encontrar uma cidade com mais de três milhabitantes que não disponha de uma estação de rádio local.

9 Outro aspecto importante relativo à legislação eleitoral eque mereceu inúmeros estudos é a análise do efeito dasregulamentações sobre o potencial de comunicabilidade dapropaganda eleitoral (CUNHA, 1994; RONDELLI &WEBER, 1994; RUBIM, 1994; ALBUQUERQUE, 1995;JORGE, 1995; LIMA, 1996; MIGUEL, 1997).

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tem sido objeto de exaustivas pesquisas, quedemonstram uma grande capacidade dosestudiosos em vencer as dificuldades da falta desistematização dos dados e elaboração teórica parao desenvolvimento de um novo conceito decoronelismo, o “coronelismo eletrônico”(MOTTER, 1994; COSTA & BRENER, 1997)10.

O modelo brasileiro de propaganda política natelevisão (o HGPE) apresenta especificidades queo tornam único, apresentando consideráveisdiferenças dos modelos existentes em outrospaíses11. O HGPE brasileiro, ao longo dos seus41 anos de existência, tem oscilado entre osmodelos americano e francês. A semelhança como modelo americano refere-se ao período anteriora 1962, quando a nossa propaganda eleitoral erapaga e não sofria praticamente nenhum tipo deregulamentação. Já a semelhança com a Françapode ser observada no excessivo número deregulamentações e restrições do período que vaide 1985 a 1992 (ALBUQUERQUE, 1995).

Algumas especificidades do modelo brasileirochegam a soar até mais como curiosidades do quecomo mecanismos democráticos de igualdade deacesso aos meios de comunicação (candidatos) eà informação (eleitores). Hoje, o período e o tempode duração da propaganda eleitoral estão definidosem 45 dias com 130 minutos diários para aseleições gerais; do total, cem minutos estãodivididos em dois grandes blocos, um no horáriodo almoço e outro à noite, no “horário nobre”; os30 minutos restantes destinam-se aos spots quesão distribuídos ao longo da programação diária12.O período de propaganda eleitoral gratuita brasileiroé o maior tempo destinado a esse fim entre todosos países que dispõem do recurso (SCHIMITT,CARNEIRO & KUSCHNIR, 1999).

Um dos efeitos perversos da tradição dolegislativo brasileiro de reformar, constantemente,a legislação é a existência de um HGPEextremamente complexo e todo remendado. Omodelo brasileiro, a partir das eleições de 1996,caracteriza-se pela existência de dois formatos deprograma: o mais tradicional (de longa duração) eum modelo mais moderno, com inserções curtas(com duração de 30 a 60 segundos) que seassemelham ao padrão dos spots comerciais. Acomplexidade do modelo brasileiro, além dedesvirtuar o objetivo que justificou sua existênciaprimeira (processo de eqüidade de acesso aosmeios de comunicação de massa), consegue aincrível proeza de desagradar a todos os atoresdiretamente envolvidos no drama das campanhaseleitorais. As emissoras de televisão são asprimeiras a queixar-se do “abuso” do horáriogratuito que só serve para ocasionar prejuízos e“afugentar” a audiência. A classe política nuncachega a um acordo com relação às característicasdo modelo, insistindo, assim, no eterno “estica,encurta, soma, subtrai” dos dias, horários etempos. A Justiça Eleitoral, por sua vez, reclamada falta de estrutura e recursos para regulamentare fiscalizar eleições em um país de dimensõescontinentais13.

Analisando a legislação, as resoluções doTribunal Superior Eleitoral (TSE) e do TribunalRegional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) e osprogramas do HGPE de 1958 a 2000, é possívelidentificar algumas estruturas que se destacam emfunção dos efeitos que produzem na forma, noconteúdo e na apresentação dos programas depropaganda eleitoral e, conseqüentemente, sobreo seu potencial de comunicabilidade e audiência(JORGE, 1997). Pequenas alterações podemsignificar grandes diferenças nos efeitos e impactosdos programas de propaganda eleitoral gratuitasobre os eleitores. Evidências dessa afirmaçãoaparecem na ação intervencionista da JustiçaEleitoral a fim de não deixar nenhum detalhe semuma norma específica de controle(ALBUQUERQUE, 1995). Ao longo do período

10 Para uma análise detalhada dos aspectos legais queenvolvem a propaganda eleitoral e a concessão de emissorasde televisão no Brasil, cf. Jardim (2002, cap. 2, 3).

11 Sobre os modelos de propaganda eleitoral emdemocracias ocidentais contemporâneas, cf. Jardim (2002,cap. 2, item 2.3).

12 É atribuição do Tribunal Regional Eleitoral elaborar umPlano de Mídia com antecedência para a distribuição,bastante complexa, entre todas as emissoras e durante todaa programação, dos spots a que tem direito cada partidoenvolvido na disputa.

13 Em 2002, as eleições gerais foram totalmenteinformatizadas, ou seja, com urnas eletrônicas. O Brasil é oúnico país do mundo com domínio dessa tecnologia,desenvolvida a partir de programas (softwares) totalmentenacionais.

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estudado – 1958 a 2000 – o horário gratuito depropaganda eleitoral apresentou-se como sendomais ou menos informativo e com maior ou menorpotencial de comunicabilidade. Mas nesses últimos41 anos – à exceção do período em que vigoravaa Lei Falcão14, de 1976 a 1982 – o HGPE sempredesempenhou, se não um papel decisivo comodesejavam alguns, pelo menos um papelimportante no processo de disputa pelo poderpolítico travado pelos partidos políticos e seusrespectivos candidatos. Existe um conjunto de leiselaboradas especificamente para regulamentar ospleitos municipais, apresentando variaçõessignificativas com relação às eleições paragovernadores e Presidente. Mas, para além dessasvariações na legislação, existe um ator cuja atuação,por si só, pode definir o acesso de determinadomunicípio à propaganda eleitoral na televisão: aJustiça Eleitoral.

IV. A JUSTIÇA ELEITORAL

A Justiça Eleitoral foi instituída por meio doCódigo Eleitoral de 1932 com o objetivo de pôrfim às fraudes, vícios e práticas de corrupção atéentão usuais nas disputas eleitorais (LEAL, 1975).Durante o Estado Novo, os partidos políticos, aseleições e a Justiça Eleitoral foram extintos até aConstituição de 1946, quando ela foi criadanovamente (TRE-SP, 2004). A Justiça Eleitoral éa única área da justiça brasileira que não possuiquadro próprio de funcionários e juízes. Ela é umaramificação da Justiça Federal. O Artigo 121 daConstituição Federal de 1988 prevê edição de LeiComplementar dispondo sobre a organização ecompetência dos tribunais, dos juízes de Direito edas juntas eleitorais, mas, até setembro de 2000,ela ainda não havia sido elaborada.

Com a finalidade de aperfeiçoar as eleições,várias foram as atribuições que passaram a ser decompetência exclusiva da Justiça Eleitoral:alistamento eleitoral, registro e cassação decandidatos, julgamento de crimes eleitorais,fiscalização da propaganda eleitoral, apuração,proclamação e diplomação dos eleitos (ibidem).Para organizar, administrar e controlar os pleitos

a cada eleição e de acordo com a necessidade, aJustiça Eleitoral edita resoluções com normas eprocedimentos para cada pleito específico.

A divisão eleitoral do país obedece a critériospróprios da Justiça Eleitoral, mas guarda algumassemelhanças com a divisão político-social daFederação. A Justiça Eleitoral é dividida eminstâncias autônomas, porém hierarquizadas. Seuórgão máximo é o Tribunal Superior Eleitoral ecada estado possui um Tribunal Regional Eleitoral.Os municípios são divididos em zonas eleitorais eestas em seções com um número máximoaproximado de 400 eleitores cada. Para cada ZonaEleitoral é designado um Juiz Eleitoral de primeirainstância.

O funcionamento da Justiça Eleitoralassemelha-se ao da Justiça Comum. O TribunalSuperior Eleitoral, responsável pela coordenaçãodas eleições nacionais, e os tribunais regionais,responsáveis pelas eleições estaduais, possuemestrutura mínima de pessoal e definição clara decritérios para nomeação dos juízes (SADEK,1995)15. Essa realidade não se reproduz emeleições municipais, a começar pelo critério deacesso ao cargo de Juiz Eleitoral, que não se dápor intermédio de eleições. Os Juízes Eleitorais deprimeira instância são indicados por uma espéciede colegiado entre os Juízes da Comarca quedeclaram interesse na nomeação, em que um dosprincipais critérios utilizados nesse processo denomeação é o de antigüidade, ou seja, os anostrabalhados no Judiciário.

Os procedimentos adotados para nomeação deJuízes Eleitorais de primeira instância evidenciama ausência de uma política de competência oumérito no desempenho das funções de JuizEleitoral. Também não há regras definidas para o

14 Lei n. 6 339, de 1. jul.1976, que limitou a propagandaeleitoral na televisão e rádio à veiculação exclusiva da fotoe currículo dos candidatos, sendo totalmente vetado qualqueroutro tipo de propaganda.

15 “Nas eleições estaduais atuam os tribunais regionaiseleitorais, com a função de coordenar e centralizar o registrode candidatos e a proclamação e diplomação dos eleitos.Esses tribunais são compostos por dois desembargadorese dois juízes da Justiça Estadual, eleitos por um período dedois anos pelos respectivos tribunais de Justiça, dois juristase um Juiz Federal. Nas eleições nacionais o processo écoordenado pelo Tribunal Superior Eleitoral, formado portrês ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), doisministros do Superior Tribunal de Justiça e dois juristasescolhidos pelo Presidente da República, a partir de listastríplices elaboradas pelo STF” (SADEK, 1999).

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tempo de permanência do Juiz que pode exercer afunção por apenas um ou dois pleitos. Na maioriadas vezes, o Juiz Eleitoral acumula funções eatribuições de sua outra ocupação junto à JustiçaFederal, o que significa acumular responsabilidadese também vencimentos.

O Juiz Eleitoral de primeira instância16 temautonomia total para decidir sobre as consultas earbitrar sobre os processos da sua área dejurisdição (naturalmente com base na legislação,que é a mesma para todo o território nacional).Apenas nos casos de conflito, ou seja, dediscordância da decisão do Juiz local, autoridademáxima na eleição municipal, é que a parte que sesente prejudicada recorre ao Tribunal RegionalEleitoral (TRE), podendo levar seu recurso até aúltima instância, o Supremo Tribunal Federal(STF). Caso contrário, o Tribunal Regional nãochega a tomar conhecimento do julgamentoocorrido em nível municipal.

Nesse sentido, a mecânica de funcionamentoda Justiça Eleitoral, que garante independência eautonomia aos juízes eleitorais de primeirainstância, possibilita a existência de interpretaçõesdiferentes, muitas vezes contraditórias, de ummesmo artigo, em municípios de um mesmoestado da Federação. Está configurada a “lega-lidade da diferença de condições”. Essa situaçãonão só é possível como bastante freqüente,motivando duras críticas às atribuições da JustiçaEleitoral17.

V. CONTEXTO TÉCNICO DAS TELECOMU-NICAÇÕES

No Brasil, a radiodifusão de sons e imagens éuma atividade de concessão pública18 regulada porum conjunto de leis e de exploração privada.Segundo o Decreto Federal n. 3 965 de10.out.2001, é de responsabilidade do Ministériodas Comunicações conceder as outorgas, normati-zar e fiscalizar o conteúdo da programação. É pormeio do Plano Básico de Radiodifusão que pode-mos verificar as emissoras de televisão legalmenteinstaladas e os canais ainda disponíveis para utili-zação. Compete à Agência Nacional de Telecomu-nicações (ANATEL), entre outras responsabili-dades, as questões de regulamentação e fiscalizaçãotécnica da utilização do espectro radioelétrico.

Existem quatro modalidades principais deemissoras de televisão em operação no territórionacional: as geradoras comerciais, as educativas,as retransmissoras e as retransmissoras educativasmistas. Também existem as emissoras “piratas”,que atuam na ilegalidade; elas não foram incluídasno estudo porque – até onde esta pesquisa sondou– em nenhuma delas ocorreu veiculação depropaganda eleitoral19. As definições apresentadase os dados sobre os números das emissoras noestado de São Paulo foram extraídos dos sítios daANATEL e do Ministério das Comunicações, dosarquivos do jornal Folha de S. Paulo e da FundaçãoPadre Anchieta:

- “Geradora de Televisão”: emissora capaz degerar e transmitir sons e imagens, destinados aorecebimento direto e livre pelo público em geral.Modalidade presente em dezessete municípiospaulistas20 mais a cidade de São Paulo.

16 No caso de a Comarca ter mais de uma Zona Eleitoral,cada zona terá um Juiz responsável e os julgamentos edecisões de matérias concernentes às eleições locais serãode responsabilidade do Juiz da Zona Eleitoral de menornúmero de registro.

17 Segundo Sadek (1995), a estrutura de funcionamento daJustiça Eleitoral não pode ser considerada como o únicofator responsável pela pluralidade de interpretações.Aspectos relativos ao Poder Judiciário e à instabilidadeeleitoral também contribuem para a heterogeneidade dasdecisões e também devem ser levados em consideração.Também merecem atenção as evidências de abuso doexercício do papel fiscalizador da Justiça Eleitoral(JARDIM, 2002).

18 De acordo com a Lei n. 9 472/97, a concessão de serviçode telecomunicação consiste na delegação de tal prestação,mediante contrato, por prazo determinado, no regimepúblico, sujeitando-se a concessionária aos riscosempresariais, remunerando-se pela cobrança de tarifas dosusuários ou por outras receitas alternativas e respondendodiretamente pelas obrigações e pelos prejuízos que causar(BRASIL, 1997a).

19 Os políticos têm sido os principais fiscais deirregularidades praticadas pelos meios de comunicação noperíodo de campanha eleitoral porque, na maioria das vezes,sentem-se prejudicados em seus interesses pessoais.

20 Campinas, Santos, Ribeirão Preto, São José dos Campos,Sorocaba, São José do Rio Preto, Mogi das Cruzes, Bauru,Franca, Limeira, Taubaté, Presidente Prudente, Americana,São Carlos, Araraquara, Araçatuba e Jaú.

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- “Retransmissora de Televisão”: é a estaçãocapaz de captar sinais de sons e imagens e retrans-miti-los, simultaneamente, para recepção pelo pú-blico em geral.

- “Televisão Educativa”: é a estação que realizatransmissão sem fins comerciais, sendo vedadainserção de publicidade.

- “Retransmissora Educativa Mista”: retrans-missoras das redes educativas nacionais – TVCultura, vinculada à Fundação Padre Anchieta, eTV Educativa-Rede Brasil, vinculada à FundaçãoRoquette Pinto – com autorização especial parainserção de programação de interesse comunitário(programação local) em até 15% da programaçãonormal daquelas Emissoras Educativas. Modalida-de presente em quarenta e oito municípios paulis-tas, dos quais apenas seis também são sede degeradoras.

- “Plano Básico de Radiodifusão”: é a relaçãode canais aprovados pela ANATEL para todo opaís; para que o canal seja incluído no Plano Básicosão necessárias a sua publicação no Diário Oficialda União e aprovação por meio de consultapública.

Chama a atenção o número bastante reduzidode municípios-sede de geradoras no estado de SãoPaulo – dezessete mais a capital –, pertencentesàs diferentes emissoras comerciais; no entanto, asomatória das suas redes de retransmissoras resultaem uma cobertura de sinal de sons e imagens de100% dos municípios paulistas21 .

Das modalidades de emissoras de televisãoexistentes, as relacionadas ao acesso dos municí-pios ao HGPE em eleições locais são as geradorascomerciais e as retransmissoras educativas mistas,pois são as únicas em plenas condições técnicaspara a geração de imagem própria. Em outraspalavras, todas as geradoras comerciais estãoobrigadas a transmitir o HGPE para todos os pleitossejam proporcionais, sejam majoritários –Presidente, Governador e Prefeito, senadores,deputados federais, deputados estaduais evereadores. Da mesma forma, as retransmissoras

educativas mistas, pois são elas as responsáveispela transmissão de programação local22, veicu-lando informações e aspectos da cultura e políticado Município onde estão sediadas e que não têmespaço nas grandes redes comerciais de caráterestadual e nacional.

As retransmissoras educativas mistasapresentam características tão específicas queconfundem até mesmo os profissionais da áreade comunicações. Foram criadas oficialmente em1991, por meio da Portaria Interministerial n. 236,de 29.out.1991, dos Ministérios das Comunicaçõese da Educação. Essa modalidade de televisão, quepassarei a denominar de “emissora local”, nadamais é do que uma retransmissora de TelevisãoEducativa – TV Cultura-SP ou TV Educativa-RedeBrasil-RJ – com autorização para inserção deprogramação de interesse comunitário em até 15%da programação da emissora cabeça-de-chave. Éimportante dizer que as retransmissoras mistasexistem em todo o território nacional. As“emissoras locais” não devem ser confundidascom “televisão comunitária”23 nem com os canaisdisponíveis nas televisões por assinatura24.

Quando se analisa o conjunto de regulamen-tações sobre as Retransmissoras Educativas Mis-tas, mais uma vez – como nos casuísmos sofridos

21 Eventualmente um ou outro município, principalmentenas regiões de divisa do estado, pode receber o sinal degeradoras sediadas em municípios pertencentes a outrosestados.

22 As retransmissoras educativas mistas, quando autoriza-das pelo Juiz Eleitoral local, também estão tecnicamentehabilitadas para a transmissão da propaganda eleitoralgratuita nas campanhas para prefeitos.

23 Ao contrário do que ocorre com a modalidade rádio, afigura da “televisão comunitária” não existe legalmente. Ocusto envolvido na montagem e manutenção de umaemissora ou retransmissora de televisão é relativamenteelevado – o que, por si só, inibe iniciativas de pirataria.

24 Coincidentemente, a televisão paga no Brasil –inicialmente via cabo e depois via satélite – também teveinício em 1991. A televisão paga trouxe novas tecnologiasde difusão de sons e imagens e opções de programação;possibilitou, inclusive, a segmentação da audiência. Alegislação que regulamentou este serviço de telecomunicaçãopermitiu a participação de capital estrangeiro e exigiu, emtroca da autorização de funcionamento, a apresentação decanais para fins de utilidade pública, ligados ao poder públi-co e às universidades. Assim nasceram a TV Senado, a TVCâmara e uma infinidade de televisões vinculadas às assem-bléias legislativas e câmaras municipais. São os canais comu-nitários da cabodifusão que têm sido exemplo de práticademocrática – já que, muitas vezes, são partilhados por vá-rias entidades – e na variedade das informações veiculadas.

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pela legislação eleitoral – observa-se que osinteresses políticos têm desempenhado importantepapel nas mudanças ocorridas na legislação. Noentanto, é importante ressaltar que os interessesda classe política não são os únicos fatores adeterminar mudanças, muitas vezes radicais nasregras de funcionamento dessas emissoras. Aforma de atuar das “emissoras locais”, nem sempreatentas ao cumprimento da legislação em vigor,apesar de bastante heterogêneas quandocomparadas entre si, também vem influenciandoas decisões do poder Executivo25.

VI. A LEGISLAÇÃO ELEITORAL E O HGPE NATV: IMPRECISÕES E HETEROGENEI-DADE26

No Brasil, a história da propaganda política natelevisão confunde-se com a história da própriatelevisão. Desde o início da sua operação, ospolíticos souberam explorar esse poderoso meiode comunicação. A relação da propaganda eleitoralcom a legislação eleitoral teve início com a Lei n.4 115, de 22.ago.1962, quando o Deputado Federalpor Pernambuco, Adauto Lúcio Cardoso, teveaprovado seu Projeto de Lei que instituía o horáriogratuito de propaganda eleitoral – o “GuiaEleitoral”. Conhecida como Lei Adauto Cardoso,em seu Artigo 11, parágrafo 3º, previa a gratuidadeda propaganda eleitoral nas “estações deradiodifusão e televisão de qualquer potência”. Atelevisão era coisa recente no país e sua abran-gência e cobertura bastante limitadas, além de asemissoras serem em número bem reduzido. Aimportância da televisão, na vida cultural e políticado país, ainda estava por ser construída.

Em 1974, com a Lei n. 6 091 de 15.ago.1974,chegou ao fim a propaganda política paga natelevisão que, desde 1962 com a Lei Adauto,convivia com a propaganda gratuita. A partir deentão, observou-se que na redação dos artigosreferentes à propaganda eleitoral na televisão existe

uma preocupação em deixar clara a obrigatoriedadeda transmissão gratuita (lembrando que aobrigatoriedade de transmissão da propagandaeleitoral no rádio e na televisão é prevista para todosos pleitos, majoritários e proporcionais). Até aeleição municipal de 1988 a aplicação desseaspecto da legislação eleitoral transcorreu dentroda maior tranqüilidade, sem nenhuma divergênciaquanto à transmissão da propaganda eleitoral natelevisão. Em 1989, na primeira eleição direta paraPresidente da República depois de 29 anos, a únicanovidade foi a exigência de formação de redenacional. Não houve dificuldade, em todo oterritório nacional, para o cumprimento dessanorma, já que as emissoras comerciais dispunhamde acesso a satélites desde a década de 1970. Aeleição para governadores em 1990 não apresentounovidades – inclusive porque foi regulamentadaapenas pelo TSE, na medida em que os parla-mentares do Congresso Nacional perderam o prazopara aprovação de lei eleitoral27.

Por outro lado, os pleitos municipais que seseguiram a 1990 tiveram nova dimensão, que foidada pela Portaria Interministerial n. 236, de29.out.1991, que criou a figura das Retransmis-soras Educativas Mistas. Até então, apenas osmunicípios-sede das geradoras transmitiam oHGPE na televisão. A partir das eleições municipaisde 1992, passaram a existir as “emissoras locais”e, com elas, a possibilidade de “palanque ele-trônico” para as eleições locais de municípios quenão eram sede de geradoras comerciais. Assim,tiveram início as divergências de interpretação dalegislação eleitoral, que persistem até o mo-mento28.

A lei que disciplinou a eleição municipal de 1992(Lei n. 8 214, de 24.jul.1991) foi elaborada eaprovada em julho de 1991, ou seja, foi anterior àcriação das “emissoras locais”, o que poderiajustificar a ausência de sua menção. A Lei n. 8713, de 30.set.1993, que estabeleceu as normaspara as eleições gerais de 1994, apresentou várias

25 Para uma discussão sobre as retransmissoras educativasmistas, ver texto do jornalista Gabriel Priolli (2002).

26 Este artigo limita-se apenas aos aspectos que dizemrespeito à obrigatoriedade e gratuidade da transmissão dapropaganda eleitoral na televisão. Em mais de quarentaanos do HGPE, foram dezenas de leis e resoluções sobre amatéria que não apresentam um significado maior quandomencionadas isoladamente. Nesse sentido, é importanteanalisá-las em seu conjunto e no contexto político em queforam elaboradas.

27 De acordo com o Artigo 16 da Constituição Federal de1988, a legislação eleitoral precisa ser aprovada com umaantecedência mínima de 12 meses da realização do pleito.

28 Até a conclusão deste texto, prevalecia em vigor a Lein. 9 504, de 30.set.1997, que tem no teor do seu Artigo 57o conteúdo das interpretações divergentes sobre as emisso-ras de televisão, que estariam obrigadas a transmitir o HGPE.

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novidades com relação à propaganda eleitoral natelevisão29. Mas, como já mencionado, nossointeresse está centrado na transmissão do HGPEna televisão para eleições locais, ou seja, o“palanque eletrônico” para eleição dos prefeitosno estado. Nesse sentido, merece destaque oArtigo 58 da Lei n. 9 100/95: “Não havendoemissora de televisão no Município, os órgãosregionais de direção da maioria dos partidosparticipantes do pleito poderão requerer à JustiçaEleitoral que reserve, dentre as geradoras deimagens que alcancem, aquela que deixará deformar rede para transmitir o programa gratuitodos candidatos do Município.

§ 1º – A Justiça Eleitoral, recebendo o pedido,designará a emissora de maior audiência, dentreas geradoras, para transmitir o programa doscandidatos do Município-sede, e as demais, naordem do eleitorado de cada município por elasalcançado, até o limite das disponíveis.

§ 2º – Nesse caso, na abertura do programaeleitoral, cada uma das emissoras informará quaisos municípios cujos programas serão transmitidose quais as emissoras que os transmitirão.

§ 3º – O órgão de direção municipal de partidode município contemplado com a geração doprograma de seus candidatos poderá ceder partedo tempo de que dispuser a candidatos do mesmopartido, de outros municípios [...]” (BRASIL,1995).

É fácil perceber, apenas pela leitura do artigo,que ele é de difícil execução. São muitos osinteresses e as variáveis envolvidos. A legislaçãono Brasil é feita pelos senadores e deputadosfederais, muitas vezes após discussão e aprovaçãonas Comissões e, também, após sugestões deespecialistas e assessores técnicos. Apesar dessesprocedimentos, não é incomum a aprovação deleis inviáveis ou de difícil execução prática.Também não se pode perder de vista que osparlamentares são, em sua maioria, eternoscandidatos e acabam legislando em causa própria.

O Artigo 58 da Lei n. 9 100/95 parecia, emprincípio, um mecanismo bastante interessante ejusto para solucionar o problema dos municípioscom grandes contingentes de eleitores eimportância política, mas que não contavam com

“palanque eletrônico” para suas eleições locais. Noentanto, esse artigo teve sua viabilidade questionadapela Associação Brasileira de Rádio e Televisão(ABERT)30, que chamava a atenção para asdificuldades técnicas de implementação dasegmentação geográfica do HGPE na televisão,como ficou conhecido esse artigo. Essa primeirabarreira foi ainda mais agravada pelas imensas eintransponíveis barreiras políticas locais. A leiprevia que as direções da maioria dos partidosparticipantes do pleito do município interessadofizessem a requisição do tempo. A observação darealidade tem indicado que, se não é impossível, aformação de consenso entre as direções de partidospolíticos concorrentes é bastante difícil. Umasegunda dificuldade, também de ordem política,residia na pressão que, muito provavelmente, seriaexercida pela direção regional dos partidos sobreas executivas municipais ao verem a “pupila dosolhos” das campanhas eleitorais – o “palanqueeletrônico” – segmentar-se entre os municípiospelas emissoras de televisão. Não há como negarque a confusão inicial causada pela não-formaçãode rede de transmissão poderia causar queda nosíndices de audiência. Tampouco é factível com arealidade política o § 3º, que previa a cessão departe do tempo dos diretórios municipais paracandidato do mesmo partido de municípiodesprovido de geradora comercial. Qual ocandidato que concordaria com a perda de minutostão preciosos para sua campanha? Previsivelmente,esse artigo caiu com a lei subseqüente, a Lei n. 9504, de 30.set.1997. Não encontramos, nem nosregistros do TRE-SP nem nos arquivos do jornalFolha de S. Paulo, referências ao uso de tempona televisão proveniente da segmentaçãogeográfica.

A Lei n. 9 504/97 interessa-nos em particularporque disciplinou o pleito municipal de 2000 edisciplinará o de 2004. Em substituição à inviávelsegmentação geográfica, o Artigo 48 prevê : “Naseleições para Prefeitos e Vereadores, nos Muni-

30 Apesar de ser um serviço de concessão pública, asemissoras de rádio e televisão são reembolsadas pelogoverno federal, por meio de ressarcimento fiscal pelotempo cedido para transmissão do HGPE. As emissoras,de maneira organizada, passam não só a acompanhar oprocesso de reformulação da legislação, mas também buscammecanismos de influência e pressão para verem seusinteresses garantidos.29 Para detalhes, cf. Jardim (2002).

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cípios em que não haja emissora de televisão, osórgãos regionais de direção da maioria dos partidosparticipantes do pleito poderão requerer à JustiçaEleitoral que reserve dez por cento do tempodestinado à propaganda eleitoral gratuita paradivulgação em rede da propaganda dos candidatosdesses Municípios, pelas emissoras geradoras queos atingem.

§1º – A Justiça Eleitoral regulamentará odisposto neste artigo, dividindo o tempo entre oscandidatos dos Municípios vizinhos, de forma queo número máximo de Municípios a serematendidos seja igual ao de emissoras geradorasdisponíveis [...]” (BRASIL, 1997b).

Novamente, dificuldades à vista. Mais uma vezse requer consenso da maioria da direção dospartidos envolvidos no pleito e, desta vez, a leiespecifica suas direções regionais. As emissorasnão poderão alegar dificuldades técnicas nem oscandidatos poderão alegar confusão porque atransmissão continuará feita em rede. A novidadeé que se poderá requerer 10% do tempo do horáriolongo destinado à propaganda eleitoral gratuita paradistribuição entre os candidatos dos municípiosatingidos pelas geradoras. Sem grandes contasmatemáticas, pode-se prever que três minutos nahora do almoço e mais três minutos no horárionobre – para serem divididos entre todos oscandidatos dos municípios atingidos pelas gera-doras – afinal não despertam tanto interesse assim.É verdade que o Artigo 48 da Lei n. 9 504/97 nãoé muito divulgado, mas, mesmo que fosse, aprodução da propaganda, mais a negociação entreos partidos e candidatos dos municípios envol-vidos, mais os requerimentos legais junto à JustiçaEleitoral tendem a desequilibrar a relação doscustos e benefícios envolvidos nessa “odisséiatelevisiva”.

Mas é o Artigo 57 da Lei n. 9 504/97 que maisdiretamente importa, pois é com base em suainterpretação que os juízes eleitorais de primeirainstância justificam os pareceres dando permissãoou proibição de as “emissoras locais” veicularemo HGPE em eleições locais: “As disposições destaLei aplicam-se às emissoras de televisão queoperam em VHF e UHF e os canais de televisãopor assinatura sob a responsabilidade do SenadoFederal, da Câmara dos Deputados, dasAssembléias Legislativas, da Câmara Legislativado Distrito Federal ou das Câmaras Municipais”(ibidem).

Em geral, como em muitas outras decisões dopoder Judiciário, nem sempre os critérios quenorteiam as decisões são transparentes. Como jámencionado, os juízes eleitorais dos municípios(juízes de primeira instância) têm autonomia e oTribunal Regional Eleitoral só toma conhecimentodas matérias julgadas no nível dos municípios emgrau de recurso por parte interessada. Essa lógicafaz que existam municípios autorizados pelo JuizEleitoral local a transmitir o HGPE na televisãopara Prefeito e municípios que estão proibidos.Outros municípios já transmitiram no passado eforam proibidos na eleição de 2000, como é o casode Mococa. Existem, ainda, aqueles que trans-mitem o HGPE em situação relativamente irregular,ou seja, sem nenhuma determinação oficial porparte da Justiça Eleitoral, que só poderá manifestar-se caso algum partido participante da eleição sinta-se prejudicado e entre com representação judicial.Por fim, há os municípios que possuem “emissoraslocais” mas cujos políticos, líderes partidários eos responsáveis pelos meios de comunicaçãolocais não têm conhecimento – pelo menos nãodivulgado publicamente – da possibilidade deveiculação do HGPE, em contraste com outraslocalidades que o fazem.

Na verdade, o que se verifica é que não existeuma regra. O Artigo 57 da Lei n. 9 504/97 prevê aobrigatoriedade da transmissão do HGPE apenaspara emissoras que operem em VHF e UHF e paraos canais por assinatura sob responsabilidade dospoderes públicos. É exatamente a designação de“emissoras” que dá margem a diferentes interpre-tações. Alguns juízes do estado de São Paulointerpretam “emissoras” como referindo-se – únicae exclusivamente – aos dezoito municípios-sedede geradoras comerciais existentes no estado.Sendo assim, proíbem, sob pena de puniçãoprevista na legislação em vigor, a veiculação doHGPE para Prefeito nos municípios-sede dasRetransmissoras Educativas Mistas. Por outrolado, outros juízes interpretam “emissoras” comoreferindo-se a qualquer tipo de emissora detelevisão, seja Geradora Comercial, sejaRetransmissora Educativa Mista, permitindo atransmissão do HGPE para as eleições locais.

Como reflexo dessa lógica de funcionamentoda Justiça Eleitoral e da autonomia dos juízeseleitorais, encontramos uma grande diversidadede situações nos municípios-sede de “emissoraslocais” com relação à veiculação do HGPE na

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televisão em eleições locais. No Município deSertãozinho, por exemplo, o Juiz Eleitoral acatousolicitação dos partidos locais para que nãohouvesse o HGPE na televisão na eleição de 2000.Já em Mococa, que veiculava a propagandaeleitoral gratuita há duas eleições, o Juiz Eleitoraldeterminou – após julgar pedido encaminhado porum dos partidos que se sentiu prejudicado – aproibição do “palanque eletrônico” nas eleições de2000. Um dos argumentos recorrentes utilizadostanto por políticos como por juízes é o de que apropaganda eleitoral na televisão em centrosurbanos de pequeno e médio porte31 encareceriaas campanhas. No entanto, não há nenhumacomprovação de que o HGPE na televisão torneas campanhas eleitorais mais caras, possibilitandoque candidatos possam alegar desigualdade decondições ou abuso de poder econômico. Pelocontrário, em municípios de porte médio poder-se-ia dizer justamente o oposto, que o HGPE natelevisão contribui para o barateamento dacampanha, pois, contando com o apoio dapropaganda televisiva, poderia produzir materialgráfico em menor quantidade e substituir os“showmícios” pelo “palanque eletrônico”. Assim,a análise das decisões dos juízes eleitorais nosmunicípios-sede de “emissoras locais” podeentendê-las como práticas arbitrárias e mesmoautoritárias32, em que os interesses políticos dasforças locais têm prevalecido sobre o direito doeleitor de ter acesso à informação política.

VII. PALANQUE ELETRÔNICO NAS ELEIÇÕESDE 2000

Em resumo, do ponto de vista do principal meiode comunicação de massa da sociedadecontemporânea – a televisão –, existem duascategorias de campanha eleitoral para eleiçõeslocais no estado de São Paulo, a tradicional e aeletrônica. A campanha tradicional utiliza comorecursos de comunicação a distribuição de material

gráfico, ações de contato direto com o candidatomajoritário (reuniões, passeatas, carreatas ecomícios) e, quando o município é sede de estaçãode rádio, propaganda gratuita no rádio. A “cam-panha eletrônica” faz uso dos mesmos recursosda campanha tradicional, mas tem acesso a umsignificativo recurso adicional, a mídia eletrônicatelevisiva.

A pesquisa “Aldeia global paulista” mostrou queesse contexto do acesso ao palanque eletrônicoem eleições locais é marcado por uma complexaarticulação de aspectos legais e técnicos. São doisos aspectos legais envolvidos: o primeiro trata dalegislação eleitoral e o segundo, das atribuições elógica de funcionamento da Justiça Eleitoral. Aanálise da legislação no período de 1958 a 2000indica que tem sido reservado apenas um artigoem todo esse período para disciplinar o uso damídia eletrônica na transmissão da propagandaeleitoral gratuita e que a referência à obriga-toriedade de transmissão tem sido feita apenas às“emissoras”. O segundo aspecto legal envolve aatribuição da Justiça Eleitoral de interpretar alegislação eleitoral em vigor, produzindo deter-minações. Em eleições municipais o Juiz Eleitorallocal tem poder decisório de primeira instância e,tradicionalmente, essa referência às “emissoras”tem sido interpretada como significando “gera-doras” de televisão.

Todavia, são várias as modalidades deemissoras de televisão em operação no estado deSão Paulo, o que nos remete aos aspectos técnicosenvolvidos na transmissão da propaganda eleitoralna televisão em eleições locais. A coexistência dediferentes modalidades de transmissão de sons eimagens deve-se, em grande medida, ao modeloadotado pelo regime militar para a expansão dosistema de telecomunicações do Brasil e à criaçãoda modalidade das retransmissoras educativasmistas em 1991.

Do ponto de vista exclusivamente técnico,apenas as modalidades “geradora” e “retrans-missora educativa mista” estão habilitadas atransmitir a propaganda eleitoral para eleição local,pois são as únicas que dispõem de recursos paraa geração de imagem própria. Apesar de aabrangência da cobertura das redes de televisãoatingir a totalidade dos municípios paulistas, amodalidade “geradora” está presente em apenasdezoito, os demais recebendo sinais por meio dasretransmissoras e repetidoras. Os quarenta e dois

31 Este estudo definiu como sendo município de pequenoporte aqueles com até 30 000 eleitores e de porte médio, osmunicípios com eleitorado entre 30 000 e 80 000 eleitores.

32 Alguns juízes sedimentam sua justificativa no incisoIII, § 1º, do Artigo 1º da Lei Falcão que previa que “apropaganda dos candidatos às eleições em um municípiosó poderá ser feita pelas emissoras de rádio e televisão,cuja outorga tenha sido concedida para esse mesmo muni-cípio, vedada a retransmissão em rede” (Lei n. 6 339/76, de1.jul.1976, revogada em 1985 com a Lei n. 7 332/85).

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municípios-sede, exclusivamente, de retrans-missoras educativas mistas, apesar de habilitadospara a transmissão, ficam na dependência de deci-são do Juiz Eleitoral local para veicular o HGPE.

Dessa forma, juízes eleitorais de diferentesmunicípios, com base na mesma legislação,julgando a mesma matéria (a transmissão depropaganda eleitoral em emissoras de mesmamodalidade), em eleições para o mesmo cargo(Prefeito) no mesmo ano, produzem pareceresabsolutamente opostos. Um Juiz pode adotar umaregra em uma eleição e – ele mesmo ou um outroJuiz – adotar regra oposta na eleição seguinte.Como o Tribunal Regional Eleitoral, apesar deconhecer o problema, não disciplinou a questão,configura-se uma instabilidade que comprometea confiabilidade nos procedimentos eleitorais.

A pesquisa “Aldeia global paulista” mostrou que47% do eleitorado teve acesso ao horário gratuitona televisão como fonte de informação políticanas eleições municipais de 2000, no estado de SãoPaulo. Mesmo se excetuando a capital – querepresenta 29% do eleitorado –, ainda ficamos comum universo bastante significativo representado

por 18% do eleitorado, distribuído em 28 muni-cípios espalhados pelo estado33. A grande ausênciaentre os municípios com palanque ele-trônico paraeleições locais é a região da Grande São Paulo,cujos municípios recebem o sinal da propagandados candidatos da capital.

Recentes alterações nas regulamentações doMinistério das Comunicações, obrigando as re-transmissoras educativas mistas a migrarem parao Plano de Geradoras, transformando-se em gera-dores, produzirão um aumento considerável nopotencial de municípios com “palanque eletrôni-co”. Por outro lado, permanecem as questões decaptação de recursos e estrutura técnica e de pes-soal para a produção da programação local. Nestemomento, não há base para fazer-se uma estimativade quantas das quarenta e oito “emissoras locais”terão condições técnicas, administrativas e finan-ceiras para passar para o Plano de Geradoras. Essaalteração ocorrerá, muito possivelmente, já naspróximas eleições municipais de 2004.

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33 Para tabelas com nome dos municípios e respectivoseleitorados, cf. Jardim (2002).

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