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1 REVISTA DE MANGUINHOS | MAIO DE 2014

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sta edição da Revista de Manguinhos foca o futuro. A reporta-gem da capa da publicação apresenta o ousado projeto que aFiocruz desenvolve e que levará à criação do Complexo dos Institu-tos Nacionais de Saúde (CIN), que ocupará uma área de 100 milmetros quadrados na Zona Norte do Rio de Janeiro. O Complexo

reunirá as novas sedes do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança edo Adolescente Fernandes Figueira (IFF) e do Instituto Nacional de InfectologiaEvandro Chagas (antigo Instituto de Pesquisa Clínica, o Ipec) e tem seu projetobaseado na experiência de hospitais de excelência nacionais, como o HospitalSírio-Libanês, e internacionais, como a Escola de Altos Estudos em Saúde Públi-ca da França (Ehesp). Além disso, o CIN proporcionará uma integração com oshospitais universitários e com os outros três institutos nacionais sediados no Rio: oInstituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), o Instituto Nacional deCâncer (Inca) e o Instituto Nacional de Cardiologia (INC). O CIN, cujas obrascomeçam este ano e deverão estar concluídas em 2018, representará um ganhoimenso para o Sistema Único de Saúde (SUS).

Ainda imaginando o porvir, esta revista também trata do Programa Fiocruzde Neurociência (FioNeuro), que visa consolidar e expandir as competênciasinstitucionais de pesquisa e inovação nesta área do conhecimento, tendo comoinsipiração a avaliação da Organização Mundial de Saúde (OMS) de que asdoenças do sistema nervoso estarão entre aquelas que produzirão os maioresproblemas de saúde pública a partir de 2020. Ainda no segundo semestre de2014 será lançado um edital, com financiamento previsto para 2015, visandoformar uma rede na Fiocruz. Duas outras ações também têm sido realizadas: oestímulo ao diálogo e a troca de experiências no cenário nacional e a projeçãode infraestrutura física para albergar a neurociência.

E outra aposta no futuro é a reportagem que conta o que foi debatido noEncontro sobre Tendências Tecnológicas em Plataformas Vegetais (ETPV), pro-movido pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fio-cruz) em Fortaleza. Em Eusébio, uma cidade vizinha à capital cearense, a Fiocruzcomeça a construir uma nova fábrica de vacinas e medicamentos para enfermi-dades raras, como o Taliglucerase Alfa Humana Recombinante, destinado àdoença de Gaucher. O encontro, realizado na Assembleia Legislativa, teve aparticipação do governador Cid Gomes, que afirmou que este “é o projeto maisimportante para o Ceará nos próximos 30 anos”. E para a Fiocruz é de extremarelevância ocupar o papel de vanguarda da ciência e da saúde pública – que,por sinal, vem de longe, pois os grandes patronos da Fundação, Oswaldo Cruz eCarlos Chagas, também enxergaram além do tempo em que viveram.

Outros destaques desta edição são o projeto Plataforma automatizada paratriagem de fármacos contra helmintos, que acaba de ser contemplado comrecursos da Fundação Bill & Melinda Gates, uma tese que propõe novas alter-nativas para o tratamento da síndrome metabólica, a nova micobactéria quefoi descrita no Brasil após quase oito décadas sem descobertas na área e aprodução de kits diagnóstico que oferecem rapidez, sensibilidade e alta capa-cidade de processamento. Entre outros temas igualmente importantes, quemostram a pluralidade da Fundação.

Boa leitura!

Paulo Gadelha

Presidente da Fundação Oswaldo Cruz

E

Biblioteca do Castelo Mourisco (foto de Ana Limp)

EDITORIAL

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Parceria16

Pesquisa

Parceria14

6 Notas

12 Pesquisa

Fundação Bill & MelindaGates financia projeto

10PresidentePaulo Ernani Gadelha Vieira

Vice-presidente de Ambiente,Atenção e Promoção da SaúdeValcler Rangel Fernandes

Vice-presidente de Gestão eDesenvolvimento InstitucionalPedro Ribeiro Barbosa

Vice-presidente de Ensino,Informação e ComunicaçãoNísia Trindade Lima

Vice-presidente de Pesquisae Laboratórios de ReferênciaRodrigo Guerino Stabeli

Vice-presidente de Produçãoe Inovação em SaúdeJorge Bermudez

Chefe de GabineteFernando Carvalho

Coordenadoria de ComunicaçãoSocial / Presidência

REVISTA DE MANGUINHOSNº 29 - MAIO/2014

Coordenação: Wagner de Oliveira

Edição: Renata Moehlecke e RicardoValverde

Colaboradores: Alexandre Matos, AlineCâmera, Ana Carolina Landi, DanielleMonteiro, Fernanda Marques, FilipeLeonel, Glauber Gonçalves, HaendelGomes, Isabela Pimentel, IsabelaSchincariol, Marina Lemle, PriscilaSarmento, Rodrigo Costa Pereira eVanessa Sol

Projeto gráfico e edição de arte:Guto Mesquita e Rodrigo Carvalho

Revisão: Ricardo Valverde

Fotografia: Gutemberg Brito, PeterIlicciev e Arquivo CCS

Administração: Diego Oliveira

Secretaria: Inês Campos

Auxiliar administrativo: Daniel Lima

Autorizada a reprodução deconteúdos desde que citada a fonte

O que você achou desta edição?Mande seus comentários [email protected]

Revista de ManguinhosAvenida Brasil 4.365 - ManguinhosRio de Janeiro - RJ - CEP 21.040-900Telefone: 55 (21) 2270-5343

Agência Fiocruz de Notíciaswww.fiocruz.br/ccs

Impressão: Gráfica Nova Aliança

ÍNDICE

13 Descoberta

Pesquisador descrevenova micobactéria

25 InquéritoQuinze mil servidoresparticipam de estudo

Um mal dostempos atuaisEstudo sugere alternativas paratratar síndrome metabólica

Rede de vacinasOs 14 anos de umacolaboração vitoriosa

Iniciativas emfavor do BrasilSBIm e Fiocruz:união pela saúde

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Capa

Imunobiológicos

A medicina queveio d’além marOs profissionais estrangeirosque percorreram o Brasil

Fio da História44

22

Tecnologia18

Multitestestrazem economiae segurançaKits de diagnóstico oferecemrapidez e sensibilidade

32

CAPA:Arte deRodrigo Carvalho

26 InovaçãoOs bons resultados dosprojetos de iniciação científica

29 Saúde da mulherEstudo analisa fim do cicloreprodutivo em soropositivas

30 InovaçãoPrograma da Fundação emneurociência ganha alicerce

40 Mercado editorialEspecialistas discutem futurodos impressos e apostam queeles não morrerão

42 ResenhaDuas obras são lançadasna coleção ‘Saúde dosPovos Indígenas’

As vacinasdo futuroEncontro promovidono Ceará discute ainovação tecnológica

Um novocampusFundação investe naconstrução de complexode institutos nacionais

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NOTAS

Uma instituição pública queelege os seus dirigentes. Assim é aFiocruz. Essa singularidade deu ori-gem ao documentário média-me-tragem Democracia Fiocruz, novaprodução da VideoSaúde Distribui-dora da Fiocruz que retrata o pro-cesso democrático da Fundação. Ofilme dirigido pelo pesquisadorEduardo Thielen foi lançado emsessão aberta ao público em 14 demaio, integrando as comemora-ções do mês do trabalhador e dos114 anos da Fiocruz.

A maratona de gravações in-cluiu desde a inscrição das candi-daturas, a campanha, a apuração,

O Centro de Relações Internacionaisem Saúde (Cris/Fiocruz) foi nomeadoCentro Colaborador para Saúde Globale Cooperação Sul-Sul da OrganizaçãoPan-Americana da Saúde/OrganizaçãoMundial da Saúde (Opas/OMS). Duran-te os próximos quatro anos, a instânciavai conduzir atividades focadas em te-máticas como determinantes sociais dasaúde, a Agenda do DesenvolvimentoPós-2015 e a saúde global e o fortaleci-mento dos sistemas de saúde.

Um dos objetivos do centro é ajudara materializar as propostas que constamda Declaração Política do Rio sobre osdeterminantes sociais da saúde, por meiode atividades de pesquisa e desenvolvi-

até as posses do presidente e dire-tores das unidades da Fiocruz. Aotodo foram 28 horas de material quecontém entrevistas dos ex-presiden-tes após a gestão do sanitarista Ser-gio Arouca; dos candidatos àpresidência em 2013, Paulo Gade-lha e Tânia Araújo-Jorge; de traba-lhadores, estudantes e usuários dainstituição. Além de imagens histó-ricas do acervo da VideoSaúde Dis-tribuidora da Fiocruz que ajudarama narrar o período de quase 30 anosde democratização da Fundação. Otrailer do documentário pode servisto na Agência Fiocruz de Notí-cias (www.agencia.fiocruz.br).

Documentário aborda processodemocrático da Fiocruz

O Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fio-cruz) vem investigando o potencial te-rapêutico da Uncaria tomentosa, umaplanta medicinal da Amazônia conhe-cida popularmente como unha-de-gato. Os resultados mais recentes destesestudos, conduzidos pelo Laboratóriode Imunologia Viral, foram apresenta-dos na tese do biólogo Raimundo Sou-sa Lima Júnior, defendida no Programade Pós-Graduação Stricto sensu em Bi-ologia Parasitária.

Os dados obtidos por estudos in vi-tro corroboram resultados anteriores depesquisadores do Laboratório de Imu-nologia Viral sobre o potencial da Un-caria tomentosa contra a dengue, quedesde 2008 têm demonstrado sua açãona redução da carga viral e na melho-ria da resposta imunológica. A princi-pal novidade nos estudos realizados porRaimundo sob orientação da pesquisa-dora Claire Kubelka, chefe do labora-tório e líder das pesquisas sobre o tema,está no nível celular: foi observado quea Uncaria tomentosa atenua a perme-abilidade de células infectadas com ovírus dengue, o que pode ser um efei-to fundamental para evitar o agrava-mento da doença.

Estudo investigapotencial de plantada Amazônia na lutacontra a dengue

mento de cooperação técnica e de for-mação de RH. A instância também vaiprestar apoio ao programa e-portuguêse auxiliar na implantação da ParceriaAfricana para a Segurança do Paciente(APPS, na sigla em inglês), que visa for-talecer a capacidade institucional dehospitais no aprimoramento das ativida-des na área. Ainda entre as responsabi-lidades do centro está o fortalecimentoda capacity building dos estados-mem-bros na vigilância, na prevenção e nocontrole de doenças, por meio dos Insti-tutos Nacionais de Saúde, das Escolasde Saúde Pública e das Escolas de Téc-nicos de Saúde na América do Sul e empaíses africanos de língua portuguesa.

Fiocruz é designada Centro Colaborador paraSaúde Global e Cooperação Sul-Sul da OMS

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Aprender sobre vacinas de formadescomplicada e divertida. Com esteintuito, o Instituto de Tecnologia emImunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fio-cruz), em parceria com o Museu da

A Diretoria de Saúde da Marinha ea Fiocruz assinaram, em abril, um acor-do de cooperação técnica que tem porobjetivo reativar as instalações do antigosanatório da Armada, localizado emNova Friburgo (RJ) e desativado desde adécada de 1980. Para a Diretoria deSaúde, a parceria com a Fundação tam-bém serve para identificar interesses co-muns que justifiquem a reforma e areativação do espaço – o antigo hospitalestá em uma área de Mata Atlântica decerca de 1 milhão de metros quadrados.

Novas ações com o PasteurO Instituto Pasteur, da França, e a

Fiocruz vão selar acordo para a reali-zação de colaborações conjuntas noscampos de vigilância epidemiológica,genômica e proteômica, neurociênci-as e biotecnologia. O anúncio foi feitoem encontro entre o diretor do institu-to francês, Christian Bréchot, e repre-sentantes da Fundação.

O acordo vai incluir ações de inves-tigação e vigilância epidemiológica naAmazônia e em sua fronteira, com ên-fase em vírus emergentes e reemergen-tes, assim como o desenvolvimento daregião por meio da biotecnologia. “Umasugestão seria trabalharmos conjunta-mente em estudos de medicamentosantiparasitas na área. As duas institui-ções já desenvolvem atividades no cam-po, mas ainda falta a coordenação deum trabalho conjunto”, propôs o pes-quisador da Fiocruz e ex-diretor do Insti-tuto Pasteur, Luiz Hildebrando.

A parceria também prevê a estrutura-ção de uma rede internacional de biologiacomputacional, genômica e proteômica,utilizando-se como matriz as redesROCC e RIP, além da criação de umarede internacional em neurociências.

Jogo de vacinas é criado para estimular imunizaçãoVida da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), lançou, na Vila Olímpica deSanta Cruz, no Rio de Janeiro, o Jogodas Vacinas. O jogo é voltado para opúblico infanto-juvenil e todos os par-ticipantes devem ser “vacinados” eficar protegidos contra as doenças, an-tes que o tempo se esgote.

O jogo é do tipo Ludo e é forma-do por uma lona de 20 m², cartas,dado gigante e marcador de tempoe comporta quatro grupos de joga-dores. A faixa etária indicada é apartir de 8 anos. A atividade é uma

batalha coletiva para que todos osparticipantes sejam vacinados e fi-quem protegidos contra doenças an-tes que o tempo se esgote. Alémdisso, existem outros objetivos com-plementares: conhecer algumas ca-racterísticas do mundo microbiológicoe entender a importância das vaci-nas na prevenção de doenças cau-sadas por micro-organismos, comovírus e bactérias. A base é o calen-dário nacional de vacinação infantil,no qual constam oito vacinas que pro-tegem contra diversas doenças.

O Sanatório Naval de Nova Fribur-go (SNNF) foi inaugurado em 30 de ju-nho de 1910, com a missão de tratar asvítimas de beribéri entre oficiais e pra-ças da Armada e também os convales-centes de outras doenças. No entanto,a partir de 1933 a prioridade voltou-separa outra enfermidade: a tuberculose.Atualmente, o Sanatório Naval, alémde contribuir para a eficácia do Sistemada Saúde da Marinha, apoia campa-nhas promovidas pelas secretarias esta-dual e municipal de Saúde.

Acordo prevê reativar sanatório navalSanatório Naval de Nova Friburgo

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A tuberculose (TB) se mantémcomo um dos principais problemas desaúde no Brasil, atingindo principal-mente os povos indígenas. Para des-crever a situação epidemiológica daTB, segundo raça/cor no Brasil, o alu-no do mestrado em Epidemiologia emSaúde Pública da Escola Nacional deSaúde Pública (Ensp/Fiocruz) PauloVictor de Sousa Viana avaliou os ca-sos novos de TB notificados no Siste-ma de Informação de Agravos deNotificação (Sinan).

Referência para o Ministério daSaúde no cuidado materno-infan-til, o Instituto Nacional de Saúde daMulher, da Criança e do Adolescen-te Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz)completou, em abril, 90 anos deexistência. A comemoração incluiuatividades culturais para todas asidades, como peças de teatro e lan-çamento de livro, entre outras.Inaugurada por Antonio FernandesFigueira e Carlos Chagas em 1924com o nome de Abrigo Arthur Ber-nardes, a instituição marcou o pon-

Aumenta em 10% a incidênciade tuberculose em indígenas

to de partida para a política de pro-teção à primeira infância e à ma-ternidade no Brasil.

A partir da incorporação à Fio-cruz, nos anos 70, já com o nomedo seu patrono e fundador, o Insti-tuto Fernandes Figueira ampliou suaárea de atuação, unindo atividadesde pesquisa e ensino a uma formamais integral de entender a aten-ção à saúde. O desenvolvimento ea avaliação de novas tecnologias, as-sim como a execução de projetosde cooperação técnica em âmbito

Noventa anos em defesa da saúde materno-infantil

Parceria com FundaçãoMerieux busca vírus portrás dos casos desíndrome respiratória

Tosse, febre e dificuldade de respi-ração são as principais característicasda síndrome respiratória aguda grave(SRAG). Para identificar exatamentequais vírus estão por trás destes casos,o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz)e o Instituto Nacional de InfectologiaEvandro Chagas (INI/Fiocruz) lideram,no Brasil, um projeto de pesquisa emrede desenvolvido em parceria com aFundação Merieux/Lyon, da França. Oobjetivo é investigar a correlação en-tre o vírus Influenza e outros vírus res-piratórios em paciente com a doença.A iniciativa já é realizada em paísescomo China e Espanha.

O estudo adotará formato multicên-trico e contará com a colaboração dehospitais do Rio de Janeiro, de Fortale-za e de Porto Alegre. Os pesquisado-res também pretendem avaliar oimpacto das infecções respiratóriaspara o serviço hospitalar.

No período de 2008-2011, foramnotificados 278.674 casos novos noBrasil, correspondendo a uma incidên-cia média de 36,7/100 mil habitantes.Segundo raça/cor, as taxas revelamque os indígenas apresentaram asmaiores incidências, registrando-seaumento de 95,4/100 mil em 2008para 104/100 mil em 2011, um incre-mento de aproximadamente 10%.Houve predomínio de casos em doen-tes homens e, na faixa de 20 a 44 anos,em todas as categorias de raça/cor.

nacional einternacio-nal, se tor-naram, aolongo dasu l t i m a sdécadas,componen-tes indispensá-veis para o subsídio depolíticas públicas vol-tadas para a saúde damulher, da criança edo adolescente.

De acordo com o estudo, houve predomínio de casos em doenteshomens e, na faixa de 20 a 44 anos, em todas as categorias de raça/cor

NOTAS

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PESQUISA

Vanessa Sol

besidade, hipertensãoarterial, sedentarismoe maus hábitos alimen-tares são alguns dosfatores diretamente rela-

cionados à síndrome metabólica. Adoença, considerada um mal moder-no, é avaliada principalmente pelacircunferência do abdômen e aumentasignificativamente as chances do surgi-mento de doenças cardiovasculares ediabetes. Em recente estudo produ-zido pelo Instituto Oswaldo Cruz(IOC/Fiocruz), especialistas testaram osefeitos de medicamentos anti-hiperten-sivos que já estão disponíveis no mer-cado como possíveis alternativas detratamento para a síndrome metabóli-ca. Nos experimentos, realizados emratos, foram observados benefícioscomo a redução das taxas de açúcar ede colesterol no sangue.

Um dos principais ganhos em es-tudos como este é que, ao testar apossibilidade de novas aplicaçõespara fármacos disponíveis no merca-do, corta-se uma série de etapas.Questões regulatórias, aprovaçõespara comercialização, definição dedosagem e numerosos aspectos queestariam relacionados ao estudo deuma substância recém-descoberta

O

não se aplicam, ou se aplicam ape-nas parcialmente. O resultado é atendência de maior velocidade entrea descoberta científica realizada so-bre a substância nas bancadas de la-boratório e sua liberação para serreceitada nos consultórios médicos.

O estudo foi tema da tese de dou-torado do farmacêutico Alessandro Ro-drigues do Nascimento, defendida noPrograma de Pós-Graduação strictosensu em Biologia Celular e Molecu-lar do IOC, sob orientação dos pes-quisadores Eduardo Vera Tibiriçá eMarcos Adriano da Rocha Lessa, am-bos do Laboratório de Investigação Car-diovascular. Esta é uma das primeirasdefesas realizada em cotutela com aUniversidade de Strasbourg, na Fran-ça, por meio da coorientação do pes-quisador Pascal Bousquet, em regimede dupla titulação.

Modeloexperimentale resultados

A pesquisa testou 50 roedores de ex-perimentação que durante 20 semanasforam alimentados com uma dieta hi-percalórica a base de açúcar, gordura,amido e sal com o objetivo de induzir oquadro de síndrome metabólica. “Apósesse período, foi constatado que os ani-mais apresentaram aspectos caracterís-ticos da doença, como alteraçõesmetabólicas e microcirculatórias, acom-panhadas de elevação da pressão arteri-al e da frequência cardíaca, entre outrosaspectos”, descreve Nascimento.

Ao longo do experimento, os animais

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foram separados em diferentes grupos.Cada um destes grupos recebeu um tra-tamento específico, durante quatro se-manas, incluindo os anti-hipertensivosClonidina (de primeira geração), Rilme-nidina (de segunda geração) e LNP 599(de terceira geração), que foram admi-nistrados em doses diferentes e ajusta-das de acordo com o peso dos animais.

Nascimento conta que os animaistratados com os medicamentos de se-gunda e terceira gerações apresen-taram resultados positivos após otratamento. “Demonstramos uma re-dução dos níveis glicêmicos e verifi-camos que a Rilmenidina e o LNP 599foram capazes de reduzir a gorduravisceral nos animais. Também confir-mamos o efeito benéfico dessas te-rapias sobre a pressão arterial, afrequência cardíaca e as taxas decolesterol e de triglicerídeo”, explicao recém doutor. Em relação à resis-tência à insulina, foi observado quetanto a Rilmenidina quanto o LNP 599tiveram efeitos positivos.

Os pesquisadores também consta-

taram um efeito adicional: no caso dofármaco de terceira geração houve au-mento da densidade capilar nos animaiscom síndrome metabólica. A reduçãodo número de capilares é uma das con-sequências associadas à hipertensão eà síndrome metabólica, podendo preju-dicar a irrigação sanguínea de órgãos etecidos. “O tratamento conseguiu au-mentar o número de capilares de for-ma significativa, revertendo a rarefaçãocapilar presente nestes animais”, afir-ma Nascimento. Segundo ele, o con-junto de resultados obtidos no estudoindica que os fármacos de segunda eterceira gerações contribuíram para amelhora dos índices lipídicos e glicídi-cos, além do reestabelecimento dosparâmetros microcirculatórios e cardía-cos deste modelo experimental de sín-drome metabólica.

Além disso, o fármaco de terceirageração não apresenta efeitos colate-rais, como boca seca e sonolência, pre-sentes nos compostos de outrasgerações. De acordo com o autor dotrabalho, os resultados apontam para

um estímulo da indústria farmacêuticaa produzir o LNP 599 para o tratamen-to humano, assim como já acontececom a clonidina e rilmenidina. “O LNP599 é um composto descoberto hápouco tempo e ainda não produzidopela indústria para tratamento huma-no. Porém, com os resultados da pes-quisa, queremos demonstrar os efeitosbenéficos de compostos relacionadose a possibilidade de sua utilização notratamento da síndrome metabólica”,conclui Nascimento.

Síndromemetabólica

A doença é caracterizada poruma associação de fatores comoobesidade, diabetes, hipertensãoarterial, além de triglicerídeos e co-lesterol em níveis aumentados. Osfatores influenciam diretamente odesenvolvimento de distúrbios cardi-ovasculares nos pacientes acometi-dos pela síndrome metabólica.

Em relação à resistência à insulina, os pesquisadores observaram que tanto a Rilmenidina quanto o LNP 599 tiveram efeitos positivos

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Vanessa Sol

s estudos para triagem denovos fármacos contra hel-mintos são realizados pre-dominantemente por meioda inspeção visual do pa-

rasito. Essa avaliação costuma deman-dar tempo e comporta o risco dasubjetividade do observador – caracte-rísticas como o padrão de movimenta-ção e o formato do parasito precisamser consideradas para que se tenha cer-teza sobre o funcionamento do fármacoem teste. Este tipo de análise, emboramuito utilizada, é sujeita a erros. Com oobjetivo de minimizar este desafio cien-tífico, o Laboratório de Bioquímica deProteínas e Peptídeos do Instituto Oswal-do Cruz (IOC/Fiocruz), chefiado pelo pes-quisador Floriano Paes Silva Junior,elaborou o projeto Plataforma automati-zada para triagem de fármacos contrahelmintos, que acaba de ser contempla-do com recursos da Fundação Bill &Melinda Gates. O projeto, que receberárecursos da ordem de US$ 100 mil,foi escolhido por apresentargrande potencial de ino-vação no âmbito dos

O

PESQUISA

grandes desafios de saúde, tendo sidoselecionado entre 3 mil projetos avalia-dos pela Fundação no edital Grand Chal-lenges Exploration. Esta é a primeira emvez que a Fiocruz é contemplada com ofinanciamento.

O pesquisador conta que o projetodesenvolverá uma metodologia automa-tizada inovadora para identificação demoléculas ativas contra o Schistosomamansoni, parasito causador da esquistos-somose. Com esta metodologia será pos-sível capturar imagens em larga escalapor meio de microscópio automatizado,sem que seja necessário realizar qualquertipo de marcação química no parasito –um procedimento normalmente necessá-rio em métodos de larga escala atuaisusando formas larvais do parasito.

“O equipamento poderá coletar deforma automática dados de imagens demais de 90 amostras de uma única vez”,explica o pesquisador. Segundo ele, anova metodologia é menos suscetível a

erros quando comparada às técnicas atu-ais. “Esta metodologia é interessante por-que supera a estratégia tradicional, maissujeita a erros, e parte para uma novametodologia que tem maior confiabilida-de nos resultados”, esclarece Silva. “Alémde analisar se e como o fármaco funcio-na, esse método vai apontar a dose ne-cessária para matar os parasitos na faseadulta, a mais nociva ao organismo hu-mano. Pretendemos testar inicialmente640 moléculas aprovadas pelo Food andDrug Administration (FDA), dos EstadosUnidos para um estudo de reposiciona-mento de fármacos”, ressalta.

O pesquisador revela, ainda, queoutro ponto de destaque é a possibilida-de de os dados analisados originarem umbanco de informações sobre como fár-macos já conhecidos funcionam, poden-do-se correlacionar estes dados com opadrão de atuação de novas moléculaspara gerar hipóteses sobre o mecanismode ação destas últimas. O trabalho serádesenvolvido no equipamento de análi-se de alto conteúdo (HCA), que tem os

recursos aprovados para sua aqui-sição por meio de edital da

Agência Brasileira deInovação (Finep).

Projeto inovador recebe financiamento internacional da Fundação Bill & Melinda Gates

Ataque aos helmintos

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Projeto inovadorrecebe financiamentointernacional daFundação Bill & MelindaGates

Isabela Schincariol

os idos da década de1930, o pesquisador doInstituto Oswaldo CruzJosé da Costa Cruz des-creveu um novo bacilo

ácido-resistente patogênico para o ho-mem, o Mycobacterium fortuitum. Pas-sados quase 80 anos sem novasdescobertas no Brasil, o cientista doCentro de Referência Professor HélioFraga, vinculado à Escola Nacional deSaúde Pública (Ensp/Fiocruz) Jesus Ra-mos anunciou a descrição da Mycobac-terium fragae – uma nova espécie demicobactéria isolada no país.

Micobactérias são bactérias do gê-

Nnero Mycobacterium, que inclui mais de150 espécies, inclusive a M. tuberculo-sis, agente causador da tuberculose e aM. leprae, causador da hanseníase. Bac-térias como ela estão na classificaçãode não causadoras de tuberculose(MNT), no entanto causam outras im-portantes infecções para o homem. Apartir da descoberta, acredita-se queserão identificados novos casos dessa es-pécie em todo o mundo. Quanto maisinformações existirem sobre as micobac-térias, mais preciso e rápido será o di-agnóstico de casos de micobacterioses,que muitas vezes são confundidos como conjunto de sintomas da tuberculose.

A pesquisa de Ramos seguiu umadiretriz institucional que propôs o le-

vantamento de informações relacio-nadas ao acervo de cepas e DNA demicobactérias do Laboratório de Re-ferência Nacional em Tuberculose eoutras Micobacterioses, localizado noCentro de Referência Professor HélioFraga, no Rio de Janeiro.

A nova espécie foi descrita a partirde um caso de pneumopatia no Cea-rá. Esta micobactéria ficará disponívelpara acesso e estudo de outros pesqui-sadores, que podem requisitar umaamostra da cepa tipo M. fragae. Elafoi depositada na Coleção de Micror-ganismos de Referência do InstitutoNacional de Controle de Qualidade emSaúde (INCQS/Fiocruz) e no Leibniz-Institut DSMZ, da Alemanha.

DESCOBERTA

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Isabela Pimentel

onectando o mundopor uma causa. Comesse lema, a Rede deProdutores de Vacinasdos Países em Desen-

volvimento (DCVMN) vem, desde suacriação, em 2000, lutando para quemais pessoas ao redor do globo te-nham mais acesso a vacinas de quali-dade e preços acessíveis. Assim, o quehá 14 anos parecia um sonho distan-te, idealizado em uma reunião de ape-nas seis laboratórios, em Bandung, naIndonésia, tornou-se realidade. Hoje,a rede reúne mais de 39 fabricantesde 40 tipos de vacinas distribuídos por15 países e é responsável pela produ-ção de 70% das vacinas distribuídaspelo Fundo das Nações Unidas pelaInfância (Unicef).

O grupo reúne os maiores fabri-cantes de vacina dos países emergen-tes e tem um papel estratégico. Opresidente do Conselho Político e Es-tratégico do Instituto de Tecnologiaem Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz), atual tesoureiro do grupo eque já esteve à frente da DCVMN porquatro anos (2008-2012), Akira Hom-ma, lembra que a origem da redecontou com o apoio da OrganizaçãoMundial de Saúde (OMS), que tinhao interesse de aumentar o número depaíses produtores de vacina e tam-bém a oferta de imunobiológicos parasuprir demandas globais.

“Bio-Manguinhos é parceiro doDCVMN desde sua criação por consi-derar esta iniciativa importante paracompreender melhor os desafios, di-lemas e as tecnologias que os paísesprodutores utilizam e estratégias de in-corporação de novas tecnologias deprodução de imunizantes”, afirma. Oreconhecimento internacional do tra-balho vem junto com a obtenção docertificado de pré-qualificação da OMSpara seus produtos, resultando na pos-sibilidade de participação nas licitaçõesinternacionais das agências das Na-ções Unidas (ONU) e o intercâmbio eestreitamento de laços entre labora-tórios públicos e privados de todo omundo. “Agindo assim conseguimos

C

PARCERIA

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abrir discussões com entidades comoa Aliança Mundial para Vacinas e Imu-nização (Gavi) e a Fundação Bill & Me-linda Gates”, diz Homma.

Workshopsinternacionais

Nos últimos dois anos, a rede in-tensificou suas atividades, o que foipossível graças à criação de uma se-cretaria-executiva totalmente dedica-da às atividades do DCVMN. Desdeentão, têm sido realizados workshopstemáticos em várias regiões do mun-do. Já ocorreram dois na China, ou-tros dois na Índia e umno México. O primeirorealizado no Brasil sedeu em outubro de2013, na Escola Naci-onal de Saúde Pública(Ensp/Fiocruz). O even-to reuniu membros daindústria farmacêutica,parceiros de Bio-Man-guinhos e laboratóriospúblicos nacionais, comoa Fundação Ataulpho dePaiva, Instituto Butan-tan e Vital Brazil paradebater os desafios dogerenciamento do siste-ma de qualidade e asabordagens para avali-ação de risco.

Na ocasião, a coordenadora doPrograma de Qualidade da OMS, NoraDellepiane, apresentou os esforçosque a OMS desenvolve para fortale-cer a qualidade e a segurança de pro-dutos biológicos e farmacêuticos. Asecretária-executiva da DCVMN, So-nia Pagliusi, explicou como a atuaçãodo grupo de produtores de vacinas temsido positiva no combate a diversas en-fermidades. “As doenças infecciosasnão têm fronteiras e por isso estamospreocupados em atuar internacional-mente”, explica, citando como caso desucesso a erradicação da poliomielitena Índia, em 2011. Pagliusi acrescen-tou que uma das principais motivaçõesdos workshops internacionais é promo-

ver a democratização da informaçãoentre os membros. “O foco é semprea qualidade e manutenção do diálo-go, adequando os temas às necessida-des locais, para que todos tenhamacesso à informação, com equidade”,comenta.

Atuação globalAlém dos workshops, a rede pro-

move encontros anuais entre seus paí-ses membros. Em 2013 o encontroocorreu em Hanoi, no Vietnã, e foi mar-cado pela realização de debates sobremedidas para melhorar o acesso àsvacinas de alta qualidade, sobretudo

para as populações mais pobres domundo e apresentados os programasde vacinação nacionais, com ênfase naerradicação global da poliomielite.

Outros temas abordados foram odesenvolvimento de novas vacinas esuas tecnologias de produção, parceri-as tecnológicas e transferência de tec-nologia, além dos adjuvantes. AkiraHomma, ao lado do cientista TranHien, coordenou a mesa sobre ciênciaregulatória. "Um dos pontos altos dodebate foi a oportunidade do encontroentre os diretores dos laboratórios pro-dutores, com troca de ideias e discussãode problemas comuns nas atividades dedesenvolvimento tecnológico e produ-ção, além de políticas de desenvolvi-mento institucional e a busca de

sinergia para fortalecimento das ativi-dades de produção", ressalta.

DestaquesEle destaca que as discussões mais

recentes do grupo estão focadas noaumento do número de vacinas pré-qualificadas para incrementar a ofer-ta de vacinas para as agências dasNações Unidas a um preço mais bai-xo, para os países que delas necessi-tam. “Temos estudado a possibilidadede acordo entre os laboratórios dospaíses do DCMVN. Um exemplo é aatuação da Indonésia, que fornece bulkpara vacinas OPV (poliomielite oral)

para vários labo-ratórios indianose a transferênciade tecnologia cu-bana para Áfricado Sul”, observa.

A cada doisanos, o grupo,do qual apenasdois laboratóriosbrasileiros fa-zem parte (Bio-Manguinhos e oInstituto Butan-tan) elege umnovo presidente.Até 2014, o car-go será ocupadopor Mahendra

Suhardono, diretor de produção da em-presa PT Bio Farma, da Indonésia.

Um dos desafios a serem supe-rados pelo grupo nos próximos anos,afirma Homma, é a diferença daslegislações sanitárias entre os paí-ses, em especial as que regulam aprodução de vacinas, o que dificul-ta trocas e produção compartilha-da. O tema certamente será pautado encontro, que ocorrerá de 27 a29 de outubro, em local a ser defi-nido. “Em 2014 queremos fortale-cer a nossa atuação, colaborandocom instituições internacionais paraharmonizar os procedimentos de re-gulação e normalização e adaptarmelhores sistemas de gestão dequalidade”, conclui.

Um dos pontos altos do debate foi a oportunidade doencontro entre os diretores dos laboratórios produtores,com troca de ideias e discussão de problemas comuns

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COLABORAÇÃO

Rodrigo Costa Pereira

uas instituições distintas,mas com algo em co-mum: a busca constantepor uma imunização dequalidade capaz de ofe-

recer bons níveis de proteção aos bra-sileiros. A Sociedade Brasileira deImunizações (SBIm) e o Instituto deTecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) atuam em dife-rentes esferas – a primeira é umaassociação privada, enquanto a uni-dade da Fundação é um importanteagente do Sistema Único de Saúde(SUS) –, têm atividades próprias e es-trutura de governança particulares. No

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Sociedade Brasileirade Imunizações eBio-Manguinhos têminiciativas em comum emprol da saúde do brasileiro

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entanto, ambas fazem da proteção àsaúde da população sua missão. Nãoà toa, a relação entre as duas foi seestreitando ao longo dos últimos trêsanos, impulsionada por interesses co-muns e ações em parceria.

Anualmente, a SBIm promove a Jor-nada Nacional de Imunizações. Em2011, o seu presidente convidou repre-sentantes de Bio-Manguinhos para mi-nistrar um curso pré-congresso, focadoem produção de vacinas. Foi quandoocorreu a primeira aproximação formal.Desde então, o instituto vem sendo con-vidado a participar das jornadas. Em2013 não foi diferente. Em um hotel deSão Paulo, a coordenadora da Assesso-ria Clínica do instituto, Maria de Lour-des de Sousa Maia, foi a responsávelpelo curso, que levantou assuntos comodesenvolvimento, estudos clínicos, regis-tro e produção de vacinas. Profissionaisde 22 países prestigiaram o evento, quenesta edição foi realizado em conjuntocom a Sociedade Latino-Americana deInfectologia Pediátrica (Slipe).

Maria de Lourdes, por sinal, é umadas grandes responsáveis pelo estrei-tamento da parceria. Com relações es-tabelecidas ainda quando eracoordenadora do Programa Nacionalde Imunizações (PNI) do Ministério daSaúde, ao ser convidada a trabalhar

em Bio-Manguinhos ela procurou man-ter essa proximidade. “A nossa rela-ção sempre foi muito boa. Com éticae respeito. Nós entendemos a partici-pação do setor privado na vacinaçãodo nosso país, assim como eles enten-dem o nosso papel na oferta de vaci-nas à população, trabalhando comprioridades epidemiológicas”, conta.

A SBIm é uma sociedade compos-ta por médicos de diferentes especiali-dades, que trabalham tanto em clínicasprivadas quanto na rede pública desaúde. Com seis diretorias regionais e11 representações estaduais, a socie-dade surgiu em 1998 com o objetivode atuar na área da imunização. Issocompreende atualização científica, re-ciclagem profissional, elaboração decalendários e manuais, atuação juntoaos órgãos públicos, participação nasdecisões do PNI, regulamentação daatividade e, fundamentalmente, a va-lorização permanente das vacinas comoferramenta vital em saúde pública. Des-sa forma, fica fácil entender por que Bio-Manguinhos se tornou um parceiro daorganização. “A SBIm é um ator estra-tégico no mercado de imunobiológicos.Coloca, continuamente, em pauta nasociedade brasileira, o tema vacinolo-gia. E isso nos ajuda, pois as pessoaspassam a dar a devida importância à

proteção de seus filhos e asua também”, explica Ma-ria de Lourdes.

Aproximaçãoformal

No final de 2012, o pre-sidente da SBIm, Renato deÁvila Kfouri, e a presidenteda regional do Rio de Janei-ro, Isabella Ballalai, estive-ram em Bio-Manguinhospara oficializar a parceria quejá vinha sendo costurada háalgum tempo. Na ocasião,eles foram recebidos pelo di-retor Artur Couto, pelo vice-diretor de Produção, AntonioBarbosa, e por Maria de Lour-des, com quem conheceram

as obras do Centro Integrado de Protó-tipos, Biofármacos e Reativos para di-agnóstico (CIPBR), empreendimento queserá inaugurado este ano.

Mais recentemente, em outubro,um grupo de 25 pessoas, dentre elasmembros do Conselho Consultivo, esti-veram no instituto. Após uma apresen-tação do diretor, houve um bate-papoentre os presentes, com perguntas e res-postas, numa iniciativa de aproximarainda mais os integrantes da SBIm dasatividades de Bio-Manguinhos.

Não raro Bio-Manguinhos é convi-dado a participar de eventos organiza-dos pela SBIm, como foi o caso do 1ºFórum de Ética em Imunizações, no Riode Janeiro. Sempre com foco em imu-nização, a atuação da sociedade visaqualificar o mercado e a oferta de imu-nobiológicos e assim se estende tam-bém a cursos de atualização de redesde frios, de como organizar uma salade vacinação, sobre eventos adversos,dentre outros.

Interesses e campos de atuaçãocomuns, guardadas as devidas dife-renças, marcam as trajetórias tantode Bio-Manguinhos quanto da SBIm.Nestes caminhos que se cruzaram eque têm trechos que são percorridosem plena parceria, quem chega maislonge é a população brasileira.

O diretor de Bio-Manguinhos,Artur Couto, comenta a parceriaentre a unidade da Fiocruz e a SBIm

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Foto: Ascom/Bio-Manguinhos

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Marina Lemle

apaz de identificar nosangue a presença dosvírus da Aids e da he-patite C nos períodosde janela imunológica

– intervalo de tempo entre a infecçãoe a produção de anticorpos pelo orga-nismo – o teste molecular Kit NAT HIV/HCV evita transfusões de sangue con-taminado. Um total de 3 milhões deamostras de bolsas de sangue de doa-dores já foram testadas desde 2011em 14 hemocentros do país com o KitNAT. Desenvolvido pelo Instituto de

CTecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) em colaboraçãocom o Instituto de Biologia Moleculardo Paraná (IBMP), a Universidade Fe-deral do Rio de Janeiro (UFRJ) e algunshemocentros, o produto pioneiro foiuma encomenda do Ministério da Saú-de para auxiliar na triagem de doado-res de sangue e complementar os testesconvencionais (sorológicos), aumentan-do a segurança transfusional nos he-mocentros brasileiros.

Registrado pela Agência Nacionalde Vigilância Sanitária (Anvisa), o KitNAT é um teste de ácido nucléico quepermite detectar o material genético

dos vírus, possibilitando uma reduçãosignificativa no período denominadocomo janela imunológica, o que nãoocorre com os outros testes sorológi-cos utilizados na triagem de doadoresde sangue. A plataforma do Kit NATcongrega três equipamentos e cinco sof-twares, que funcionam de forma inte-grada e oferecem grande capacidadede processamento: mais de mil amos-tras de sangue de doadores por dia,em duas ou três rotinas com até 552bolsas de sangue cada.

De acordo com o gerente do Progra-ma de Reativos para Diagnósticos do Ins-tituto de Tecnologia em Imunobiológicosde Bio-Manguinhos, Antonio Ferreira, oteste garante total rastreabilidade e custatrês a quatro vezes menos que os produ-tos similares comercializados por empre-sas privadas multinacionais. Até 2009,apenas dois laboratórios internacionais ofe-reciam o produto/serviço e a preços altos.

Segundo Ferreira, o Kit NAT foi de-senvolvido para atender as necessida-des e demandas da hemorrede públicabrasileira. Com a produção em Bio-Man-guinhos, o Ministério da Saúde terá umaeconomia em torno de US$ 28 milhõespor ano. Uma rede centralizada em 14serviços de hemoterapia, dotada de in-fraestrutura, equipamentos e profissio-nais capacitados, deverá processar atotalidade de amostras coletadas nahemorrede pública brasileira.

“O produto é um exemplo da polí-tica afirmativa do Ministério da Saúdede investir em capacitação e acumulode competências técnicas, nacionaliza-ção de insumos e produtos estratégi-cos e no fortalecimento do Complexo

TECNOLOGIA

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Industrial da Saúde. Oferecer um pro-duto inovador a um custo viável signi-fica também fomentar a políticapública de autossuficiência em preven-ção e diagnóstico, sem onerar os co-fres do governo. Isso é resultado de umtrabalho permanente para diminuir de-pendências tecnológicas e oferecer,cada vez mais, produtos estratégicosde excelente desempenho", afirma.

Mesmo sendo comparável aos me-lhores testes do mundo em precisão,profissionais de Bio-Manguinhos e doIBMP vêm trabalhando para tornar oKit Nat ainda mais sensível, capaz dedetectar mínimas frações de vírus. Numfuturo próximo, o teste também deve-rá ser capaz de identificar nas bolsasde sangue os vírus da hepatite B (HBV)e da dengue.

Teste detecta sífilisem 15 minutos

Outra inovação de Bio-Manguinhosé o teste rápido Sífilis Duo, para detec-tar sífilis em cerca de 15 minutos. Atecnologia Dual Path Platform (DPP®)conjuga dois tipos de exames – tria-gem e confirmação – numa única pla-taforma tecnológica.

Antonio Ferreira explica que o testedetecta dois tipos de anticorpos produzi-dos em resposta à infecção do patóge-no. A detecção isolada de um dosanticorpos pode sugerir uma cicatriz so-rológica ou até uma infecção bastanterecente e deve ser confirmada, mas adetecção de ambos anticorpos no sorodo paciente indica infecção ativa e pos-sibilita a imediata entrada no tratamen-to. O teste é capaz de fornecer resultadosaltamente sensíveis e específicos usan-do volumes mínimos de amostra.

Além do diagnóstico rápido e pre-ciso, o teste permite fácil execução emcampo, dispensa equipamentos e in-fraestrutura laboratorial e facilita o trei-namento dos profissionais de saúde. Aleitura é simples, pois os resultados po-dem ser obtidos tanto visualmente oucom a ajuda de um leitor portátil, e ainterpretação destes resultados se dápela presença ou ausência de bandas/linhas nas áreas de teste e controle.

A tecnologia é indicada para situa-

ções especiais, tais como a triagem dainfecção em maternidades, Centros deTestagem e Aconselhamento, ações doMinistério da Saúde e para a amplia-ção da testagem em áreas remotas ouque não contam com uma estrutura la-boratorial para o diagnóstico da sífilis.O teste Duo, de triagem e confirmação,está em processo de obtenção de regis-tro e estará disponível ainda em 2014.Já o teste só de triagem vem sendo en-tregue regularmente ao Ministério daSaúde desde 2011 e é amplamente uti-lizado em todo território nacional.

“Produzindo e fornecendo um pro-duto nacional, de qualidade superior ealtamente confiável, Bio-Manguinhosespera contribuir para a ampliação edemocratização do diagnóstico da in-fecção de sífilis e, desta forma, ajudarno combate a esta doença que, aindanos dias atuais, é um grave problemade saúde pública”, afirma Ferreira.

Ele conta que os técnicos estão tra-balhando em ensaios multiteste. “Atu-almente estamos trabalhando paradisponibilizar um novo formato de teste(multiplex) que contemple HIV e sífilis emum único procedimento. Este novo en-saio trará um diferencial muito interes-sante em vários aspectos, como ooperacional, a facilidade para o usuárioe uma redução de custos de transportee armazenamento”, adianta. Outra van-tagem dos testes multiplex é serem adap-táveis a diferentes tipos de fluidos corporais(sangue, soro, plasma ou saliva).

O teste de triagem treponêmico foidesenvolvido pela empresa norte ame-ricana Chembio Diagnostic Systems eadaptado as amostras brasileiras porBio-Manguinhos em 2012. No momen-to encontra-se num processo de code-senvolvimento entre Chembio eBio-Manguinhos. O multiteste combo(HIV + sífilis) deverá seguir a mesmadinâmica: desenvolvimento pelaChembio e adaptação para a realida-de brasileira por Bio-Manguinhos.

Todas em umO desenvolvimento de um multi-

teste para detecção de todas as doen-ças que precisam ser detectadas natriagem sorológica do sangue doado(HIV 1 e 2, HTLV I / II, sífilis, doença de

Chagas, hepatite B e C) a partir de umaúnica amostra de sangue é o objetivodo projeto Microarranjos Líquidos, ini-ciado em 2008 no Instituto de BiologiaMolecular do Paraná (IBMP) e Bio-Man-guinhos. Fruto de pesquisas de mes-trado e doutorado, o projeto foifortemente apoiado pela Secretaria deCiência, Tecnologia e Insumos Estraté-gicos do Ministério da Saúde, a Fiocruz,Hemobrás e, recentemente, pelo Fun-tec/BNDES. A plataforma utilizada per-mite um processamento rápido, comelevados níveis de sensibilidade e espe-cificidade, de muitas amostras ao mes-mo tempo – cerca de 90 – e com umacapacidade de multiplexidade elevada– de 50 a 100 doenças por ensaio.

De acordo com o vice-diretor da Fio-cruz Paraná e coordenador de Gestãodo IBMP, Mario S. Moreira, no momen-to, o projeto se divide em dois subproje-tos. Um é a validação da plataforma porBio-Manguinhos, a partir de um estudopiloto, a ser realizado provavelmente noHemocentro de Belo Horizonte para, emseguida, se iniciar um estudo multicên-trico, em pelo menos três diferentes es-tados, quando então se prepara toda adocumentação necessária para o regis-tro do produto junto à Anvisa.

O outro subprojeto é desenvolvimen-to e validação das proteínas (antígenos)que comporão o teste pelo Instituto Car-los Chagas e o IBPM, já em fase final.“Cerca de 60% das proteínas já foramdesenvolvidas e validadas em laborató-rio e agora seguem para Bio-Manguinhosdesafiá-las na plataforma que será utili-zada no campo. A expectativa é de queeste produto seja comercializado a par-tir de 2015”, afirma.

Patógenos dasepse rastreadosem menos detrês horas

Iniciado em 2013 na Fiocruz Para-ná por solicitação do Instituto Nacionaldo Câncer (Inca), como parte da coo-peração entre as instituições, o projetoSepsis é agora uma encomenda verticaldo Ministério da Saúde, via Finep.

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O objetivo é desenvolver uma platafor-ma multiteste para o diagnóstico si-multâneo dos principais patógenosassociados à sepse no território nacio-nal, com especificidade, sensibilidade eagilidade para orientar o manejo clíni-co dos pacientes sépticos nos hospitais,contribuindo para reduzir drasticamen-te os índices de morbidade e mortalida-de nas unidades de terapia intensiva, edeterminar ações de controle e vigilân-cia epidemiológica de micro-organismosno ambiente hospitalar.

Mário Moreira explica que existemdiversos estudos epidemiológicos publi-cados a respeito da sepse, e que os da-dos brasileiros são bastante preocupantes.De acordo com a Global Sepsis Alliance(GSA), ocorrem cerca de 30 milhões denovos casos por ano no mundo. No Bra-sil, estima-se que esse número seja emtorno de 400 mil novos casos por ano,contribuindo para ocupação de 30 a40% dos leitos de UTI disponíveis.

“O Brasil é um país com alta taxa demortalidade quando comparado a outrospaíses, conforme demonstrado no estu-do Progress, realizado em 2009, que in-cluiu quase 12 mil pacientes. Pôde-seobservar que a mortalidade brasileira ésuperior a 56% e só perde para mortali-dade da Malásia”, revela. SegundoMoreira, há dois estudos brasileiros – oBases, que incluiu cinco centros públicose privados e mostrou uma mortalidadepor sepse de 33,9%, por sepse grave de46,9% e por choque séptico de 52,2%– e o Sepse Brasil, feito com 75 centrosno país, e que confirmou esses dados dealta mortalidade.

“Para se ter ideia da gravidade dasepses, o risco de óbito aumenta em7,6% para cada hora em que este paci-ente recebe o antimicrobiano inadequa-do. Se o tratamento correto for instituídonas primeiras horas após a instalação doquadro séptico, a chance de sobrevivên-cia do paciente é de 80%. Entretanto,se a terapia antimicrobiana correta forinstituída após 24 horas da instalação doquadro séptico, a chance de sobrevivên-cia é de apenas 10%”, explica. De acor-do com Moreira, o projeto encontra-sena fase inicial de desenvolvimento, comresultados bastante promissores e a ex-pectativa de que o produto seja registra-

do na Anvisa em 2015, para então serdisponibilizado para o SUS.

Uma importante colaboração foi es-tabelecida com o Hospital das Clínicas(HC) da Universidade Federal do Para-ná (UFPR). “Com recursos da Finep es-tamos modernizando os laboratórios debiologia molecular e microbiologia, nosquais parte dos estudos serão realiza-dos. Pesquisadores e técnicos do HCestão diretamente envolvidos no proje-to, o que é um diferencial importantepara que o produto atenda plenamenteas necessidades de um laboratório hos-pitalar”, esclarece.

A plataforma é constituída de umequipamento de execução do teste, umdispositivo de lavagem e secagem dobiochip, um dispositivo de concentraçãoe enriquecimento de amostras, o biochipe um software de integração, analise eemissão de resultados. “É uma platafor-

ma concebida no conceito lab on a chip,flexível às mais diversas necessidades,dada a elevada capacidade de multiple-xidade. O objetivo do projeto é fornecerum teste capaz de diagnosticar o agen-te causador da sepse em menos de trêshoras. Este tempo, aparentemente ele-vado, é bem menor do que o oferecidopelas tecnologias convencionais (hemo-cultura), que é de 24 a 48 horas, e comníveis de sensibilidade e especificidadebem abaixo do necessário”, explica.

O projeto reúne tecnologias que se-rão transferidas do exterior com tecnolo-gias e inovações nacionais, fruto daparceria da Fiocruz Paraná com a em-presa de equipamentos Lifemed, locali-zada no Rio Grande do Sul. A plataformaescolhida para este desenvolvimento doteste, In-Check (STMicroeletronics), com-bina dois métodos moleculares – PCRmultiplex e microarranjo – o que permi-

O Kit NAT é um teste de ácido nucléico que permite detectar o material genéticodos vírus, possibilitando uma redução significativa no período denominado comojanela imunológica, o que não ocorre com os outros testes sorológicos

Para Antonio Ferreira, o testegarante total rastreabilidade ecusta de três a quatro vezesmenos que os produtos similarescomercializados por empresasprivadas multinacionais

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te a detecção e identificação de múlti-plos alvos num único ensaio. Nas fasesfinais de desenvolvimento, dois hospitaisda Fiocruz (Ipec e IFF), no Rio, o GrupoHospitalar Conceição, em Porto Alegre,e o Instituto Nacional do Câncer partici-parão dos estudos multicentricos paravalidação do teste.

Multitestepara grávidasem meia hora

Outra inovação da Fiocruz Paraná éo projeto Rede Cegonha, este 100%nacional. Trata-se de um multiteste apre-sentado em duas versões: um lab on achip capaz de diagnosticar até 20 doen-ças num só ensaio, a partir de uma amos-tra única de sangue, com resultados emcerca de 30 minutos, para ser usado nosconsultórios médicos e postos de saúdeque apoiam o programa Rede Cegonhae que necessitam realizar poucos testesdiariamente; e um multiteste baseadona plataforma Luminex, com capacida-de para realizar muitos testes ao mesmotempo, para ser instalado nos hospitaisque compõem a Rede Cegonha.

“O proposito é realizar o teste no mo-mento do atendimento às mulheres grá-vidas, durante a realização das consultaspara atendimento pré-natal. Com essaestratégia, o médico poderá receber osresultados do exame durante a consulta,o que facilita e torna mais eficaz a orien-tação terapêutica em caso de algum re-sultado positivo”, explica Moreira.

Inicialmente o multiteste esta sendodesenvolvido para diagnóstico de toxo-plasmose, rubéola, citomegalovirose, sí-filis, Aids e hepatites A, B e C. Principalfruto do INCT Diagnósticos, o projeto seiniciou em 2012, também financiado poruma encomenda vertical do Ministérioda Saúde, por meio da Finep. O projetojá ultrapassou as fases de prova de con-ceito e está na fase de prototipagem dosdispositivos e validação das proteínas(antígenos). A previsão é que os produ-tos entrem em testes de campo (piloto emulticêntrico) no final de 2014, para re-gistro em 2015.

Inovação em áreas de ponta comoresposta aos desafios do SUS

De acordo com o vice-presidente de Produção e Inovação em Saúdeda Fiocruz, Jorge Antonio Zepeda Bermudez, os reativos hoje colocados àdisposição do Sistema Único de Saúde no Brasil representam a respostada Fiocruz aos desafios que o SUS, maior sistema de acesso universal nomundo em desenvolvimento, enfrenta em seus 25 anos de existência.“Mais uma vez, Bio-Manguinhos e o ICC lideram no campo dos reativospara diagnóstico e mostram não apenas capacidade e compromisso, massobretudo que inovam em áreas de ponta”, afirma.

Fiocruz Paraná

A Fiocruz Paraná vem se consolidando como centro de referência nodesenvolvimento de dispositivos para diagnósticos laboratoriais. Um marcoimportante neste processo foi a criação do Instituto Nacional de Inovaçãoem Diagnósticos para Saúde Pública (Indi Saúde), em 2008, quando aFiocruz Paraná/IBMP foi designada como um dos Institutos Nacionais (INCTDiagnósticos) criados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Coordenado pelo Instituto Carlos Chagas (ICC), o Indi Saúde integrauma rede multidisciplinar composta por ICC, Bio-Manguinhos, Fiocruz Bahia,IBMP, Tecpar, UFPR, UTFPR, UFSC e UFRGS. Essa rede de cooperaçãovem se ampliando constantemente, incluindo mais universidades, centrosde pesquisa e empresas do setor industrial, nacionais e internacionais, oque permite unir conhecimento e tecnologias das ciências biológicas, demateriais, química, física, engenharia, mecatrônica entre outras, numaabordagem complementar para inovação no campo dos diagnósticos.

A Fiocruz Paraná, em cooperação com seus parceiros, vem recebendouma série de encomendas tecnológicas do Ministerio da Saúde voltadaspara o desenvovimento, validação, registro e produção de soluções no campodo diagnóstico para o SUS. Uma vez atendida a demanda do SUS e dopaís, há planos para distribuição destes produtos em outros países. “Hoje aFiocruz dispõe de base científica, tecnológica e industrial para oferecer aoMinistério da Saúde a possibilidade de coordenar esforços e a agenda tec-nológica neste segmento”, afirma o vice-diretor Mário Moreira.

Bio-Manguinhos

Para atender prioritariamente às demandas da saúde pública nacio-nal, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos) pro-duz 10 vacinas, 11 reativos para diagnóstico e 3 biofármacos. Fundadoem 1976, o Instituto registrou em 2012 o seu maior quantitativo de entre-ga: 11,1 milhões de frascos. O fornecimento de reativos para diagnósticotambém alcançou o número recorde de 8,8 milhões de reações.

Biomanguinhos é uma unidade técnico-científica da Fiocruz, com amplaparticipação nas políticas públicas de saúde. Em suas instalações, no campussede da Fiocruz, no Rio de Janeiro, são realizadas atividades de produção edesenvolvimento de vacinas, reativos para diagnóstico e biofármacos. Com57,8 mil m² de área construída, Bio-Manguinhos tem um dos maiores parquesindustriais para a produção de imunobiológicos da América Latina. Para ampli-ar sua capacidade de resposta ao Ministério da Saúde e atender aos requisitosdas agências reguladoras, o Instituto estabelece parcerias com instituições pú-blicas e privadas que garantem acordos de transferência de tecnologia e dedesenvolvimento tecnológico, contribuindo para a evolução dos projetos.

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Ricardo Valverde

acinas comestíveis. Vaci-nas produzidas a partir deplataformas vegetais,como o milho, o arroz, ococo e o tabaco. Um pos-

sível imunizante contra a dengue. Es-ses foram alguns dos temas debatidosno Encontro sobre Tendências Tecno-lógicas em Plataformas Vegetais(ETPV), promovido pelo Instituto deTecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) na AssembleiaLegislativa do Ceará, em Fortaleza. Oevento também apresentou o projetoda fábrica de vacinas com produçãobaseada na tecnologia de plataformasvegetais, vinculada à unidade regionalda Fundação que será erguida no mu-nicípio de Eusébio (CE).

V

Encontro no Ceará debate produção de imunizantes em plataformas vegetais

Vacinas do

futuroIMUNOBIOLÓGICOS

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Estiveram presentes à solenidadede abertura do ETPV o governador CidGomes, o presidente da Assembleia,deputado José Albuquerque, o secre-tário de Saúde do estado, Ciro Gomes,o presidente da Fiocruz, Paulo Gade-lha, além de reitores de universidadescearenses, dirigentes de empresas,pesquisadores, convidados internacio-nais e líderes de Bio-Manguinhos. Aunidade da Fiocruz no Ceará produzi-rá inicialmente medicamentos paradoenças raras, como o TaligluceraseAlfa Humana Recombinante, para adoença de Gaucher, e a primeira vaci-na do mundo a partir de uma planta,contra a febre amarela.

Para o governador do Ceará, CidGomes, a instalação de Bio-Mangui-nhos no estado “é o projeto mais im-portante para o Ceará nos próximos 30anos. Comparável ao que foi a criaçãoda usina siderúrgica em Volta Redon-da (RJ), no final da década de 1940. Ainiciativa vai gerar empregos, renda,maior qualificação profissional e tec-nologia de vanguarda. Terei orgulho esatisfação em contar aos meus netosque o projeto teve início na minha ad-ministração”, afirmou o governador.Segundo Gomes, já existem 11 proje-tos de empresas e instituições interes-sadas em se instalarem no PoloIndustrial, que terá Bio-Manguinhos/Fio-cruz, o Centro Tecnológico Renato Ar-cher (vinculado ao Ministério daCiência e Tecnologia) e a empresa Iso-farma como âncoras – o que facilitaráo processo de desenvolvimento esta-dual. “O Ceará tem 4,5% da popula-ção nacional mas gera apenas 2,16%do PIB brasileiro – número que, embo-ra baixo, é o recorde histórico do esta-do. E que também nos mostra o quantoprecisamos crescer”.

De acordo com o presidente da Fio-cruz, Paulo Gadelha, a unidade produ-tora de vacinas levará o Ceará a umnovo nível de desenvolvimento. “O pro-cesso de descentralização da Funda-ção tem como uma das metas ajudara alavancar as instituições dos estados,em uma parceria científica e tecnoló-gica em favor da saúde da população.Bio-Manguinhos será, no Ceará, a pon-ta de lança desse movimento de trans-formação”, disse Gadelha. “A Fiocruz

tem compromisso com um projeto denação que vem desde a sua fundação,no início do século 20, e isso tem im-pactos extremamente positivos no de-senvolvimento da saúde e datecnologia, além de seguir diretrizes jáconsolidadas pelos governos do ex-pre-sidente Lula e da presidente Dilma.Para Gadelha, a presença da Fiocruzno Ceará, como animadora e catalisa-dora, contribuirá para planejar o futu-ro, ampliando a cadeia de inovação(insumos e medicamentos) e levandoo estado a um outro patamar. “A metaé que essas tecnologias vegetais per-mitam, mais para frente, levar a des-dobramentos que gerem novas vacinase medicamentos”.

O diretor de Bio-Manguinhos, Ar-tur Couto, disse que a fábrica de vaci-nas será a primeira oportunidade dea unidade sair do Rio de Janeiro, ex-pandir sua base e chegar a outras re-giões. “Bio-Manguinhos produzatualmente 10 vacinas, 11 reativospara diagnóstico e 3 biofármacos. Ex-portamos vacinas para 74 países esomos o único laboratório brasileiroque tem certificação da OMS para dis-tribuir imunizantes no exterior. Aquino Ceará vamos continuar crescendo,em sintonia com a política de desen-volvimento da indústria nacional pre-conizada pelo governo federal”,afirmou Couto. Ele adiantou que oterreno onde ficará a fábrica tem 220mil metros quadrados, sendo 88 milde área construída. Serão gerados 400postos de trabalho, num investimentode R$ 170 milhões. As obras começa-rão em 2014. A fábrica deverá serinaugurada em 2016 e o primeiro lotede vacinas ficará pronto em 2018. “E,antenado com os nossos dias, o pro-jeto de Bio-Manguinhos se destacapelo respeito ao meio ambiente, pelodesenvolvimento da cadeia produtivados fornecedores, pela capacitaçãoem recursos humanos nesse setor epor ganhos em P&D para o Ceará”.

O presidente do Conselho Políticoe Estratégico de Bio-Manguinhos e ex-diretor da unidade, Akira Homma, dis-se estar entusiasmado com o apoio queo projeto vem recebendo do governodo Ceará e da Assembleia Legislativa.“Fomos recebidos pelo governador e

pelo presidente da Assembleia, que es-tão dando todo o incentivo necessário.Assim como os empresários e a socie-dade civil, irmanados nesse processoque vai estabelecer um núcleo de tec-nologia de ponta em terras cearenses”.

No futuro,vacinas comestíveis

A pró-reitora de Pesquisa e Gradu-ação da Universidade Federal Rural dePernambuco, Maria Madalena Guerra,representando a Rede Nordeste de Bi-otecnologia (Renorbio), disse que a ins-talação da Fiocruz no Ceará dará umacontribuição de grande relevância aodesenvolvimento da região e tem a seuver um acertado foco de íntima rela-ção com a indústria local, visando ain-da promover a interação desta com aacademia. “A Renorbio, formada por12 instituições nucleadoras, as univer-sidades federais do Nordeste, quer par-ticipar dessa proposta trazida pelaFiocruz. Temos 800 projetos em anda-mento nas instituições associadas, naárea da biotecnologia”.

Para o pesquisador Julian Ma, res-ponsável pelo Departamento de Imu-nologia Celular do Hospital SaintGeorge, da Universidade de Londres,uma das oportunidades que se abrempara a nova fábrica é a de produzirmedicamentos a custos muito maisacessíveis e com chances bem maio-res de chegarem à população. “Hámuito dinheiro envolvido na pesquisae fabricação de remédios, sem falar notempo que é gasto. De cada 10 milprojetos pesquisados, apenas 1 se tor-na medicamento”, afirma Ma, quedesenvolveu a primeira descrição deum anticorpo monoclonal expresso emplantas e suas aplicações clínicas emimunoterapia humana contra a cáriedentária. Segundo o pesquisador, tra-balhar com plataformas vegetais é bemmais barato e, portanto, o projeto daFiocruz significará uma substancial eco-nomia para os cofres públicos. Ele tam-bém comentou a possibilidade decriação de vacinas comestíveis, quepermitiriam uma imunização mais efi-caz e fácil de ser feita. “O Exército dosEstados Unidos tem investido conside-

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ráveis somas de dinheiro em projetosdo tipo e o balanço das iniciativas épositivo. No futuro, teremos capacida-de de produzir em uma escala muitomaior, barateando tratamentos e incre-mentando ações de saúde pública”.

Ma disse que hepatite B, cólera edisinteria, Aids, tuberculose, raiva e di-abetes são algumas das doenças quepoderão ser combatidas por meio daingestão de alimentos geneticamentemodificados, como frutas e legumes. Osistema consiste em selecionar o frag-mento do DNA do vírus que produz aproteína capaz de combatê-lo e trans-feri-lo em laboratório para o alimentoque, uma vez ingerido, permite o de-senvolvimento de anticorpos específicoscontra as enfermidades. O acordo fir-mado por Bio-Manguinhos com o Insti-tuto Fraunhofer para BiotecnologiaMolecular e a iBio, para produzir umnovo imunizante contra a febre amare-la, mais seguro e eficaz, com baixo ín-dice de reações ou eventos adversos nospacientes, e que será desenvolvido pormeio de plataforma vegetal foi citadopelo pesquisador como um exemplo deparceria internacional em área de pon-ta da biotecnologia.

O pesquisador da Embrapa ElibioRech disse que em breve existirão imu-nizantes produzidos a partir de outrasplataformas vegetais, como o milho, oarroz, o coco e o tabaco. “Uma das prin-cipais apostas para o futuro é a soja”,disse Rech, que esteve à frente do de-senvolvimento da soja transgênica emontou um laboratório-estufa com cer-ca de 600 plantas com anticorpos anti-câncer, hormônios do crescimento emoléculas anti-HIV inseridos em seu DNA.Mas ele deixou claro que esses produtosnão se destinam ao consumo humano e

são estudados apenas para produzirmedicamentos. Comparando com pes-quisas feitas com animais, o uso de plan-tas é 40 vezes menor. De acordo comRech, a Embrapa tem desenvolvido mo-léculas transgênicas recombinantes,como a insulina transgênica e o hormô-nio do crescimento. Ele afirmou que aempresa tem testado diversas plantastransgênicas, para saber quais podem serviáveis economicamente. “A soja, porexemplo, numa estufa com 24 horas deluz, produz 10 vezes mais. Se no campoa planta gera 100 sementes, em nossaestufa esse número pode chegar a milsementes. Queremos montar uma bio-fábrica, que permita vencer antigos pro-blemas de saúde enfrentados pelaHumanidade. Acredito que estamos nocaminho certo”.

Em busca deuma vacinacontra a dengue

A dengue, doença contra a qual nãoexiste imunizante, foi abordada pela pro-fessora Maria Izabel Guedes, da Univer-sidade Estadual do Ceará (Uece). Apesquisadora e seu grupo de trabalhodesenvolvem um projeto que pretendeobter uma vacina contra a dengue base-ada em tecnologia vegetal. “Usamos ofeijão de corda para produzir a proteínado vírus da dengue em nosso projeto.Com o crescimento das plantas, as pro-teínas do vírus da dengue se multiplicame a planta se torna uma biofábrica. De-pois de alguns dias, com a coleta dasplantas e a consequente trituração de-las, extraímos as proteínas purificadas dovírus”, observou Maria Izabel. Ela acres-centou que os resultados obtidos até o

momento são promissores e que abrema possibilidade de se chegar à primeiravacina contra a dengue.

Os estudos, no entanto, não bus-cam apenas gerar vacinas para doen-ças contra as quais não há aindaimunizantes, mas também apresentarnovas propostas para vacinas que já exis-tem. A bioquímica Rosane Cuber, deBio-Manguinhos, discorreu sobre a pes-quisa que poderá levar a um novo imu-nizante contra a febre amarela.Segundo ela, isso se deve ao fato de avacina atual ter gerado eventos adver-sos graves com as cepas 17DD e17D204. “Apesar de estaticamente osnúmeros serem bem baixos, ainda as-sim estamos trabalhando em um imu-nizante que seja mais seguro, semcontar com proteína animal, e eficaz,com custos de produção menores, demanufatura mais simples e com escalade fabricação maior”, afirmou Rosane.

Outra possibilidade foi apresentadapelo pesquisador da UnB Tatsuya Na-gata, especialista em vírus vegetais ehumanos. Em seus estudos, Nagata vemtentando obter um reagente que per-mitirá detectar a dengue. O reagente,feito a partir de alface no qual foi inje-tado o gene do vírus da dengue, produ-zirá uma partícula viral defeituosa queserá aproveitada e misturada ao san-gue coletado. Conforme a reação, omedicamento indicará se o paciente estácom os anticorpos do vírus da dengue.Nagata disse que o reagente será umaalternativa também para que não se-jam mais necessários os testes com ca-mundongos, já que atualmente opreparo do antígeno resulta na mortedos animais. E é possível que, no futu-ro, o método torne viável a elaboraçãode uma vacina comestível.

Maquete da futura fábrica de vacinas da Fiocruz no Ceará

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Isabela Schincariol

o Código de Endereçamen-to Postal (CEP) ao códigogenético. Esta é a meta dedescobertas do Estudo Lon-gitudinal de Saúde do Adul-

to (Elsa-Brasil), uma investigação decoorte multicêntrico que está sendo fei-ta com 15 mil funcionários ativos e apo-sentados de seis instituições públicas deensino superior e pesquisa das regiõesNordeste, Sul e Sudeste. O estudo bus-ca ampliar a visão do processo de cau-salidade das doenças crônicas nãotransmissíveis (DCNT), especialmentediabetes e doenças cardiovasculares. Amaior força do Elsa-Brasil não é a pre-valência, mas sim os estudos de associ-ação e de incidência.

Como resultados da primeira onda- fase de coleta de dados com os parti-cipantes - do estudo, realizada entreos anos de 2008 e 2010, a pesquisaapontou que mulheres têm chance40% maior do que os homens de ter apressão arterial controlada, uma vezque tomam medicamento para tal.Além disso, quanto maior a escolari-dade, inclusive com diferenças signifi-cativas entre formação universitária epós-graduação, maiores são as chan-ces de terem a pressão controlada.

As investigações indicaram equilí-brio entre homens e mulheres. Sobreo comportamento relacionado à saú-de, pouco mais da metade dos traba-lhadores declarou fazer exercício físico,mais de 10% relatou que fumavam ecerca de 50% referiram consumir fru-tas diariamente.

Dados específicos do Centro de In-vestigação do Rio de Janeiro (CI), da Fi-ocruz, mostram que, em relação adoenças, foi notada prevalência deobesidade em 23,6% dos participan-tes. Somando a taxa de sobrepeso àobesidade este número chega-se aquase 70% dos profissionais da Fiocruz.A hipercolesterolemia foi averiguada em60% deles e o estudo encontrou uma

D

taxa de 34,2% de participantes comhipertensão. Já a diabetes apresentoutaxa maior que 17%. Um dado bastan-te relevante é que estes números, quelevam em consideração diversos critéri-os clínicos, são muito mais altos do queo número de diabéticos auto-referidos.Ou seja, apesar de ser uma instituiçãocom alto nível de escolaridade e na qualmuitos têm acesso aos serviços de saú-de, numerosos participantes se desco-briram diabéticos no Elsa.

Em outubro, a coordenação do Elsa-Brasil no Rio de Janeiro, na Fiocruz - quehá sete anos estava nas mãos das pes-quisadoras da Escola Nacional de Saú-de Pública (Ensp) Dóra Chor e MariliaSá Carvalho -, foi transferida para aspesquisadoras Rosane Härter Griep, do

Retratos do BrasilPressão arterial alta e sobrepeso estão entre as maiores taxas encontradas em estudo com 15 mil servidores

Instituto Oswaldo Cruz e Maria de Je-sus Mendes da Fonseca, da Ensp. Ocontexto de proposição do Elsa foramas rápidas mudanças demográficas,nutricionais e epidemiológicas ocorridasem todo o mundo. Outro fator determi-nante foi o aumento do interesse depesquisadores em estudar doenças crô-nicas não transmissíveis e observar oimpacto destas mudanças no Brasil emum contexto particular de desigualda-de e desenvolvimento socioeconômico.

Apesar do estudo ter uma popula-ção restrita, há uma ampla variedadesocioeconômica no grupo, o que permi-tiu que o Elsa analisasse o risco de doen-ça, sua progressão e controle de acordocom determinantes como classe social,escolaridade, renda e educação.

INQUÉRITO

O estudo buscaampliar a visãodo processo decausalidade dasdoenças crônicas nãotransmissíveis (DCNT),especialmentediabetes e doençascardiovasculares

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Alexandre Matos

ão do Instituto de Tecno-logia em Fármacos (Far-manguinhos/Fiocruz) osdois melhores projetos deiniciação científica da Fio-

cruz. Enquanto um está voltado para adoença de Chagas, o outro é sobreuma enzima que poderá ser usada parafins terapêuticos. Os trabalhos forampremiados na Reunião Anual de Inicia-ção Científica (Raic), dentro de umuniverso de 686 estudos envolvendobolsistas de todas as unidades da Fun-dação. Os contemplados receberamum certificado e uma medalha em re-conhecimento ao potencial de seusestudos. A escolha reafirma o papel deFarmanguinhos como centro de refe-rência em pesquisa e desenvolvimen-to tecnológico, além de ajudar aconsolidar a unidade como geradorade conhecimento na área científica.

SOs trabalhos foram premiados no

Programa Institucional de Bolsas de Ini-ciação Científica (Pibic) e o ProgramaInstitucional de Bolsas de Iniciação emDesenvolvimento Tecnológico e Inova-ção (Pibiti). A coordenadora dos doisprogramas na Fiocruz, Raquel Elisa daSilva López, explica a diferença entreas duas modalidades. “No Pibic os pro-jetos estão relacionados com a pesqui-sa básica, são estudos que geramconhecimento que servirá de base paraoutros estudos. Já os projetos relacio-nados ao Pibiti têm foco no desenvol-vimento de um produto ou processotecnológico”. Dentre outros critérios, acomissão avaliou a qualidade dos pro-jetos e dos resultados gerados, os rela-tórios e a apresentação oral dos alunos.

Enzima vegetalO projeto da estudante de Quími-

ca e bolsista da Área de Produtos

Naturais Rayane Natashe Gonçalvesfoi escolhido o melhor Pibiti. O tra-balho é sobre uma leguminosa cujaenzima tem importante atividade naquebra de proteínas. “O prêmio Pi-biti significa o reconhecimento detodo trabalho, além da dedicaçãoempenhada e sendo mais um de-grau alcançado nesta longa jornadaprofissional”, diz Rayane.

O trabalho é coordenado pelapesquisadora Raquel Elisa. “O estu-do busca proteases, ou seja, enzi-mas com importante atividade naquebra de proteínas que agreguemexcelente estabilidade em altas tem-peraturas e na presença de agentesquímicos. Sob essas condições, asenzimas reúnem as característicasessenciais para serem formuladas eempregadas como proteases tera-pêuticas, que poderão ser usadas notratamento de diversas enfermidadese condições”, explica a cientista.

INOVAÇÃO

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De acordo com Raquel, o objetivoé transformar essa pesquisa num me-dicamento. “A expectativa é continuartrabalhando para desenvolver formula-ções terapêuticas, além da formaçãode recursos humanos especializados”,enfatiza. Para atingir esses patamares,é necessário superar algumas dificulda-des. “A pesquisa no Brasil carece demais apoio. Um projeto como esse, porexemplo, que visa ao desenvolvimentode um produto farmacêutico, requermaiores investimentos”, observa.

Doença de ChagasO trabalho de Rodolfo Rodrigo Flo-

rido França, que é aluno de Química ebolsista da Síntese Orgânica, foi esco-lhido o melhor Pibic. Sob a orientaçãode Núbia Boechat e do doutorando Fre-derico Silva Castelo Branco, Françaquebrou um jejum, já que há seis anosFarmanguinhos não vencia a Raic namodalidade Pibic. O último ocorreucom um trabalho também orientadopor Núbia, com a aluna Fernanda daCosta Santos.

Castelo Branco explica que apesarde a doença de Chagas ainda não ter

cura em sua fase crônica, tratamentosexperimentais conseguiram promoveresse feito. No entanto, os compostosusados nesses estudos são complexose, se forem aprovados, vão gerar umtratamento de alto custo. “No traba-lho, intitulado Síntese de novos deriva-dos triazólicos com potencial atividadeantichagásica, o objetivo é conseguirnovas moléculas ativas na fase crônicada doença de Chagas, porém, de bai-xo custo de obtenção. Então, nossotrabalho pretende levar a cura à po-pulação que sofre com essa doençanegligenciada e, ao mesmo tempo,não ter impacto substancial no orça-mento do SUS e nos sistemas públicosde saúde de outros países em desen-volvimento”, ressalta.

Para França a premiação teve va-lor especial. “Parecia que não dariacerto. O projeto foi classificado na ca-tegoria Ciências da Vida, quando, naverdade, acreditávamos que deveriaconstar de Ciências Exatas, já que en-volve a química. Em outras palavras,concorri com trabalhos específicos dasciências da saúde e biológicas. Diantedas circunstâncias, vencer a Raic foimuito importante. O maior benefício éo incentivo e a certeza de estar fazen-do a coisa certa”, frisa.

Raquel Elisa (à direita, na foto decima) coordena os dois programasde iniciação científica

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Danielle Monteiro

ntre as pessoas que vivemcom Aids no mundo, me-tade são mulheres, segun-do dados da ProgramaConjunto das Nações Uni-

das sobre HIV/Aids (Unaids). A práticade sexo desprotegido, a baixa percep-ção do risco de infecção pelo HIV e adificuldade de negociação do uso dopreservativo, aliadas à manutenção daatividade sexual no climatério, podemlevar a um aumento global de mulhe-res que terão que conviver com a doen-ça quando alcançarem a menopausa.Foi diante dessa nova realidade que oaluno de doutorado em Pesquisa Clíni-ca de Doenças Infecciosas, no InstitutoNacional de Infectologia Evandro Cha-gas (INI/Fiocruz), Guilherme Calvet de-cidiu investigar os fatores associados àidade da menopausa e a eficácia daterapia antirretroviral nessa parcela dapopulação. “Muitas mulheres HIV-posi-tivo, além de ficarem expostas às com-plicações metabólicas comuns à fase depós-menopausa decorrentes da perdade estrogênio, podem possuir previa-mente outros fatores de risco ou com-plicações relacionadas à infecção peloHIV e ao uso prolongado do tratamentopara a doença”, justifica Calvet.

O estudo, que envolveu 667 mu-lheres HIV-positivo a partir de 30 anosde idade em acompanhamento noIpec/Fiocruz, revela que aspectos rela-cionados à saúde, ao estilo de vida, àreprodução, além do tempo de expo-sição ao tratamento para a doença,estão intimamente associados à idadeda menopausa. A tese foi dividida emdois artigos. O primeiro analisou os fa-tores associados à menopausa natural(cessação do ciclo menstrual) e à me-nopausa natural precoce (cessação dociclo menstrual com idade menor ouigual a 45 anos).

Os dados apontam que fatores comomenarca precoce (primeira menstruaçãoem menores de 11 anos de idade), imu-nodeficiência avançada relacionada aoHIV, exposição inferior a dez anos ao es-quema antirretroviral, coinfecção hepa-tite C/HIV e tabagismo têm influênciana antecipação da idade natural da me-nopausa. “Esses resultados têm impor-tantes implicações para a saúde pública,uma vez que a antecipação da meno-pausa tem sido associada ao aumentode morbidades como aterosclerose, do-enças cardiovasculares, osteoporose, fra-turas ósseas e crescimento da taxa demortalidade”, destaca.

Do total de mulheres estudadas,160 haviam chegado à menopausanatural, sendo que a idade média en-tre o grupo foi de 48 anos. Ter maisde três filhos mostrou asso-ciação com entrada maistardia nessa fase do ci-clo reprodutivo. Os resul-tados também indicaramque 27% entraram namenopausa precoce.

Já o segundo artigo, quecompara a resposta imunoló-gica e virológica da terapia an-tirretroviral de primeira linhaentre mulheres pré e pós-meno-pausadas, indicou que os dois gru-pos reagem de forma semelhante emrelação à resposta imunológica em até24 meses após início do tratamento. “Oresultado assegura que mulheres podemser tratadas de forma similar indepen-dentemente de sua idade”, explicaCalvet. De um total de 383 mulheres,85% estavam na fase pré-meno-pausa e 15% na pós-me-nopausa.

Para o pesquisa-dor, os resultados su-gerem necessidadede estudos sobre areposição hormo-

Menopausa em focoEstudo investiga fatores associados ao fim do ciclo reprodutivo em mulheres soropositivas

nal em mulheres soropositivas, especi-almente entre as que se encontram emmenopausa precoce, avaliando benefí-cios à saúde, redução de sintomas, au-mento da qualidade de vida, análise dasinterações medicamentosas e seguran-ça. “Estudos futuros são necessáriospara avaliar estratégias de otimizaçãoda terapia antirretroviral nesta popula-ção, em função do número crescentede mulheres pós-menopausadas em usode terapia antirretroviral e do impactoda reconstituição imune (resposta infla-matória a uma infecção oportunista) nasobrevida”, conclui.

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SAÚDE DA MULHER

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em benefício da saúde públicaFundação constroi os alicerces para o Programa Fiocruz em Neurociência

NeurociênciaINOVAÇÃO

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Renata Moehlecke

os últimos 20 anos, o Bra-sil tem atravessado diver-sas mudanças sociais,como o aumento da ex-pectativa de vida, melho-

rias no saneamento básico e no acessoà saúde, que tem contribuído para oestabelecimento de um novo perfilepidemiológico. Segundo o Ministérioda Saúde (MS), tem sido observadauma queda na mortalidade por doen-ças infecciosas e um predomínio dedoenças crônico-degenerativas não-in-fecciosas e de causas externas (aciden-tes ou violência). Nessa mesmaperspectiva, a Organização Mundial deSaúde (OMS) aponta que as doençasdo sistema nervoso estarão entre aque-las que produzirão os maiores proble-mas de saúde pública a partir de 2020.Ciente da mudança de cenário na saú-de mundial e brasileira, a Presidênciada Fiocruz, por meio de sua Vice-Presi-dência de Pesquisa e Laboratórios de

Referência (VPPLR), estabeleceucomo uma de suas prioridades a

criação de um Programa Fiocruzde Neurociência (FioNeuro), quevisa consolidar e expandir ascompetências institucionais depesquisa e inovação nestaárea do conhecimento.

“Começamos a posicio-nar a Fiocruz dentro de umcampo de vanguarda doconhecimento, apta a trans-por problemas decorrentesdo novo perfil epidemioló-gico da população”, expli-ca o vice-presidente dePesquisa e Laboratórios deReferência, Rodrigo Stabe-li. O primeiro passo foidado no final de 2013.“Realizamos um mapea-mento abrangente dos

pesquisadores que, nasdiversas unidades téc-

nico-científicas da

Fiocruz, desenvolvem ou têm interes-se em desenvolver projetos de pesqui-sa em neurociências. Recebemos 60propostas, iniciativas esparsas queexistiam nas unidades da Fundação eque agora poderão ser congregadas,fortalecendo o trabalho e a troca deexperiências realizada na área”, com-plementa.

Ainda no segundo semestre de2014, será lançado um edital, com fi-nanciamento previsto para 2015, visan-do a formação de rede na Fiocruz. Duasoutras ações que já têm sido realiza-das: o estímulo ao diálogo e a troca deexperiências no cenário nacional e aprojeção de infraestrutura física paraalbergar a neurociência. “É importan-te destacar que a Fiocruz ainda nãotem tradição em neurociência, mas oBrasil precisa disso, principalmente, noque tange a área de saúde pública. Senos associarmos a instituições com ex-pertise já consolidada em neuroci-ência, é possível que pesquisadores daFundação sejam capazes de ampliar oleque de ações, auxiliando o preenchi-mento de lacunas ainda existentes”,observa o coordenador do FioNeuro,Wilson Savino.

Seminário e parceriacom instituiçõesnacionais einternacionais

“Estamos entrando em contatocom outras instituições brasileiras jáespecializadas na área, como o Insti-tuto Estadual do Cérebro, no Rio deJaneiro, o Instituto do Cérebro de Na-tal e o Instituto de Ciências Biomédi-cas da Universidade Federal do Rio deJaneiro. A ideia é que, no futuro, pos-samos compor uma espécie de siste-ma que gere conhecimento e auxilie aformação de recursos humanos volta-dos para neurociência e saúde”, dizWilson Savino. No que se refere à me-lhoria do quadro em recursos huma-nos, ele afirma que o edital para oConcurso Fiocruz 2014 incluiu uma vagapara especialista sênior em neurociên-cia, estratégia que busca iniciar uma

estruturação que contribua desde jápara o cenário futuro dentro da pró-pria Fundação.

Outra estratégia para o fortaleci-mento da área de neurociência na Fio-cruz tem sido a busca de convêniosou parcerias com instituições estran-geiras. Em prol da ampliação da tro-ca de conhecimentos entre países, aFiocruz sediou um seminário interna-cional realizado em parceria com aAliança Nacional para as Ciências daVida e da Saúde (Aviesan), que en-globa as principais instituições france-sas de pesquisa biomédica em saúde.

Com o apoio do governo francês,o seminário contou com a participaçãode dez pesquisadores de Instituições-membro da Aviesan, incluindo o Insti-tuto Nacional de Saúde e PesquisaMédica (Inserm), da Universidade Pi-erre e Marie Curie (UPMC), do CentroNacional de Pesquisa Científica (CNRS),da Comissão de Energia Atômica(CEA) e do Instituto Pasteur de Paris.

“A intenção é montar um editalconjunto para formação de rede fran-co-brasileira entre os laboratórios en-volvidos”, esclarece Savino. “Umaoficina de planejamento, feita após asapresentações no seminário, serviupara delinear estratégias para os pro-jetos de colaboração entre a Fiocruz eo conjunto de instituições francesas”.Dentre as temáticas que foram abor-dadas no evento científico estiveram ouso de células-tronco no combate adoenças neurodegenerativas (como omal de Alzheimer), o impacto de do-enças infecciosas sobre o sistema ner-voso e as complexas relações entrealergia, imunologia e o cérebro.

O coordenador do FioNeuro tam-bém destaca que a Fiocruz tem consi-derado igualmente importante estreitaro diálogo e troca de experiências emneurociência com países do MercadoComum do Sul (Mercosul), particular-mente, a Argentina e o Uruguai. “AFundação já participa de um projetode parceria em pesquisa, educação ebiotecnologia aplicadas à saúde comesses países e essa atividade tambémpode gerar bons frutos para a área deneurociência”, ressalta.

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Renata Moehlecke

esafio: esse é o concei-to que norteia todo oprocesso de planejamen-to, execução e controledas atividades de im-

plantação do Complexo de InstitutosNacionais de Saúde da Fiocruz (CIN),futura sede do Instituto Nacional deSaúde da Mulher, da Criança e doAdolescente Fernandes Figueira (IFF)e do Instituto Nacional de Infectolo-gia Evandro Chagas (INI, antigo Insti-tuto de Pesquisa Clínica, Ipec),principais unidades assistenciais desaúde da Fundação no Rio de Janei-ro. Em dezembro de 2010, as porta-rias 4.159 e 4.160 do Ministério daSaúde (MS) transformaram ambas asunidades da Fiocruz em institutosnacionais, tornando-as órgãos auxili-ares do MS atuantes na formulaçãode políticas públicas, planejamento,desenvolvimento, coordenação e ava-liação de ações integradas para asaúde da mulher, da criança e doadolescente na área da Infectologia.

Atualmente, as duas unidades jásão sedes de importantes serviços dereferência em doenças infecciosascomo a tuberculose e a Aids, no casodo INI, e em aleitamento materno(como o Banco de Leite Humano), noIFF. "O INI e o IFF desempenham ativi-dades que os qualificam como insti-tutos nacionais, mas ainda nãodesenvolvem todas as ações atribuí-das a esse tipo de órgão em virtude,principalmente, da falta de espaço fí-sico. A trajetória de cada institutotambém é diferente: hoje, o IFF apre-

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senta uma vocação assistencial maisforte e o INI é mais voltado para apesquisa clínica", explica o coorde-nador executivo do Comitê Técnicodo CIN, Francisco Braga. "A criaçãodo complexo representa uma mudan-ça de escala e escopo para essasunidades da Fiocruz e permite quepassem a trabalhar com a maior efi-ciência possível, investindo igualmen-te no campo assistencial, na pesquisaclínica, na formação de recursos hu-manos e na investigação, elabora-

ção, implementação, acompanha-mento e avaliação de políticas públi-cas em suas áreas de atuação".

Com localização prevista em umaárea de cerca de 100 mil m² na Quin-ta da Boa Vista, em São Cristóvão, naZona Norte do Rio de Janeiro, o CINpossibilitará que ambas as unidadesnão só ampliem e otimizem seus es-paços físicos, mas também comparti-lhem plataformas de trabalho ereduzam os custos de forma sustentá-vel, preservando suas identidades e

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O comitê técnico responsável peloprojeto já efetuou um diagnóstico dasituação atual de cada unidade. Opasso seguinte tem sido a realizaçãode estudos prospectivos. "É importan-te percebermos, do ponto de visto de-mográfico, epidemiológico e atémesmo tecnológico, como o cenárioda saúde no Rio de Janeiro e no Brasilestará daqui a 15 ou 20 anos, com afinalidade de antever se esses institu-tos estarão preparados para os desa-fios futuros, considerando, inclusive,o impacto orçamentário e a sustenta-bilidade econômica do projeto", ex-plica o vice-presidente de Ambiente,Atenção e Promoção da Saúde da Fi-ocruz e coordenador do Comitê Téc-nico do CIN, Valcler Rangel.

Rangel também destacou que a in-tenção é que o projeto permita umamaior integração não só entre o IFF eo INI, mas com as outras unidades daFundação, inclusive com as de outrosestados. “Diante da complexidade doprojeto, pode-se afirmar que este é umdos principais desafios de gestão insti-tucional que a Fiocruz já enfrentou.Uma das metas é que os institutos con-tribuam como um todo na qualificaçãoda atenção básica no país em diversasesferas de complexidade”, esclarece.“É preciso ter em vista que não esta-mos isolados: o CIN precisa estar bemarticulado e ser um ponto de referên-cia dentro da rede de serviços do Sis-

tema Único de Saúde, garantindo tam-bém maior interação com hospitais uni-versitários, institutos de pesquisa quetem vocação para o ensino e com osoutros três institutos nacionais sediadosno Rio de Janeiro, o Instituto Nacionalde Traumatologia e Ortopedia (Into), oInstituto Nacional de Câncer e o Insti-tuto Nacional de Cardiologia (INC)".

Plano executivo erecursos humanos

O projeto prevê que o CIN tenha359 leitos (239 do IFF e 120 do INI),224 consultórios (112 para cada uni-dade), 74 módulos laboratoriais e 12salas de cirurgia-geral. Também estãoprevistos um auditório com 500 luga-res, 30 salas de aula, uma creche comespaço para 250 crianças, três restau-

rantes que comportarão 1,8 mil refei-ções por dia e um estacionamento com900 vagas. “A previsão é que as obrase a certificação seefetuadas de 2014 a2017 e que o CIN entre em operaçãoem 2018”, indica o coordenador deProjetos Estratégicos da Fiocruz, Leo-nardo Lacerda, que tem trabalhado emconjunto com o chefe de Gabinete daFundação, Fernando Carvalho. Toda aobra está orçada em R$ 490 milhões,sendo R$ 110 milhões destinados aoinvestimento em equipamentos.

Dentre as ações já concluídas, La-cerda aponta o levantamento topográ-fico e a sondagem do terreno onde oCIN ficará sediado, a elaboração deprojeto executivo de preparação do ter-reno com desmonte de rochas, os es-tudos de projetos de arquitetura,infraestrutura, edificações e urbaniza-ção, e os relatórios de impacto ambi-

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ental e de trânsito. Segundo ele, o pro-jeto do CIN propõe que este fique sedia-do em uma das áreas valorizadas no Riode Janeiro em função da Copa do Mun-do em 2014 e das Olímpiadas em 2016.“A posição estratégica na macrozonaurbana fica evidente com os recentesaportes de investimentos públicos e pri-vados, das obras do Porto Maravilha,do Porto Olímpico, do Maracanã, da re-forma e ampliação das estações de treme metrô. A posição do terreno é impor-tante também pela proximidade com atoda Zona Norte da cidade, a CidadeUniversitária, Manguinhos e o restantedo Centro", explicou.

Os planos de construção e transfe-rência do INI e do IFF para o novo espa-ço ampliado e conjunto apontam paraoutra necessidade: a de um projeto derecursos humanos. “Essa questão é pri-mordial e o pleito para novos concursosdeve estar ancorado na lógica de que oCIN é uma demanda ministerial; trata-se de uma ação a ser conquistada”, des-taca Gadelha. “É válido ressaltar queestudos prospectivos ajudarão a identi-ficar futuros profissionais que se ade-quem ao perfil epidemiológico domomento em que os institutos serãoinaugurados, já que a tecnologia médi-ca pode estar em um novo estágio”.

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Aline Câmera

om longa trajetória de-dicada à pediatria, em1924, o chefe da Inspeto-ria de Higiene Infantil An-tonio Fernandes Figueira,

em conjunto com o diretor de Departa-mento de Saúde Pública Carlos Chagas,inauguraram o Abrigo Arthur Bernardes.Criado com a proposta de unir mães ebebês nas enfermarias, o abrigo signifi-cou o ponto de partida para a política deproteção à primeira infância e à mater-nidade no Brasil. A partir da incorpora-ção à Fundação Oswaldo Cruz, nos anos70, já com o nome do seu patrono, oInstituto Fernandes Figueira ampliou suaárea de atuação, unindo atividades depesquisa e ensino a uma forma mais in-tegral de entender a atenção à saúde. Odesenvolvimento e a avaliação de novastecnologias, assim como a execução deprojetos de cooperação técnica em âm-bito nacional e internacional, se torna-ram, ao longo das ultimas décadas,componentes indispensáveis para o sub-sídio de políticas públicas brasileiras, vol-tadas para a saúde da mulher, da criançae do adolescente.

Contudo, foi em 2010, quando o IFFrecebeu a denominação de InstitutoNacional de Saúde da Mulher, da Crian-ça e do Adolescente Fernandes Figuei-ra, que passou a assumir oficialmente aatribuição de órgão auxiliar do Ministé-rio da Saúde (MS) na tarefa de desen-volver, coordenar e avaliar as açõesintegradas, direcionadas à área da saú-de feminina e infanto-juvenil em âmbitonacional. “A assinatura da Portaria nº4.159/2010 reflete o amadurecimento doIFF, ao mesmo tempo em que apresentaa resposta para uma lacuna na saúdepública brasileira”, afirmou, na oportu-nidade, o então ministro da Saúde JoséGomes Temporão.

Para o diretor do instituto, Carlos

CMaciel, a portaria representou a con-solidação de um conjunto de iniciati-vas. “Da implantação das açõesintegradas de qualificação da aten-ção perinatal em maternidades doNordeste e da Amazônia Legal, atéa ampliação da Rede Brasileira deBancos de Leite Humano, a criaçãodo Centro de Ge-nética Médica e aconsolidação daRede Cegonha,muitos foram os la-ços estreitados comas secretarias esta-duais e municipaisde Saúde ao longodos últimos anos. Acada novo projeto,a cada novo plane-jamento, amplia-mos o escopo deatuação”, destaca.

Em relação aoatual momento doFernandes Figueira,Maciel completa:“Se, por um lado,as responsabilida-des aumentaram,por outro tivemos oreconhecimento deque estamos no ca-minho certo e deque todas as conquistas são fruto dofortalecimento de nossos pilares”. Jácomo Instituto Nacional a unidadeampliou significativamente o seu por-tfólio de cooperação internacional. Aexperiência com o Banco de Leite Hu-mano, com o cuidado neonatal e coma inserção do brincar na assistênciafoi levada a nações latino-america-nas, europeias e africanas. Hoje, são23 os países com acordos de coope-ração técnica com o IFF.

Em parceria com a Área Técnicade Saúde da Mulher, a Área Técnica

da Saúde da Criança e AleitamentoMaterno e com a Política Nacionalde Humanização (PNH), o IFF passoua integrar o esforço do governo bra-sileiro no aprimoramento das políti-cas públicas com foco na atenção aoparto, ao nascimento e ao desenvol-vimento infantil de 0 a 24 meses. O

objetivo é organizar a rede de aten-ção à saúde desses grupos populacio-nais, garantindo acesso, acolhimento,resolutividade e, consequentemente,a redução da mortalidade. Partindode experiências concretas já exerci-das pelo IFF nesse contexto, a parti-cipação no apoio à implementaçãoda Rede Cegonha simboliza a possi-bilidade de articulação dos recursosexistentes na Fiocruz para o planeja-mento, o ensino e a produção deconhecimento.

Além de participar das diferentes

Instituto Nacional de Saúde da Mulher, daCriança e do Adolescente Fernandes Figueira

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frentes de trabalho que compõem asações do MS junto aos estados e mu-nicípios, o IFF é diretamente responsá-vel pela qualificação de quadrosestratégicos do SUS para a melhoriado cuidado e dos indicadores, comdestaque para atividades de formaçãoprofissional nas áreas assistencial e degestão por todo o Brasil. Confirmandoa tradição como hospital de ensino, aexpansão dos cursos de pós-graduação- com a inclusão do Programa de Pes-quisa Aplicada à Saúde da Criança eda Mulher e a criação das residênciasmultiprofissional e de enfermagem

obstétrica - representa um importanteganho na qualificação dos profissionaisque serão responsáveis por protago-nizar a produção inovadora no cam-po da saúde coletiva.

Ainda no que tange à formaçãocontinuada, pela primeira vez foi pos-sível estabelecer o compromisso ins-titucional direcionado para promover,estimular e apoiar as ações de pes-quisa no instituto. Por meio do lan-çamento do Edital de Programa deIncentivo à Pesquisa, todos os funci-onários com doutorado terão a opor-

tunidade de desenvolver projetos vol-tados para a resolução das deman-das em suas áreas específicas, o quedemonstra o avanço de mais uma eta-pa em prol da inovação e do desen-volvimento tecnológico. Contudo,além da promoção do conhecimentotécnico, outros componentes ganha-ram destaque no cuidado diário, sejana neonatologia nas enfermarias pe-diátricas ou nos ambulatórios especi-alizados. A criação do Núcleo deApoio a Projetos Educacionais e Cul-turais (Napec), como reflexo da ex-pansão do projeto Biblioteca Viva, e

a implementação da Classe Hospita-lar Fernandes Figueira são exemplosneste sentido.

Quanto à atenção à mulher, nu-merosas ações e programas ganha-ram destaque no cenário do InstitutoNacional. Na assistência, o foco re-cai sobre a gravidez de alto risco fe-tal e aumento do quantitativo departos. Procedimentos recentes, rea-lizados ainda no período intra-uteri-no, para o tratamento da HérniaDiafragmática Congênita (HDC) e Sín-drome de Transfusão Feto-Fetal (STFF)

são alguns destaques. Na atenção clí-nico-cirúrgica, valorizaram-se o tra-tamento das doenças ginecológicase o diagnóstico do câncer na mulher;as cirurgias de pequena, média ealta complexidade; o monitoramen-to das doenças ginecológicas benig-nas e do câncer de mama, além dosprocedimentos e exames de urodi-nâmica, colposcopia, histeroscopia ebiópsias de mama, colo uterino e en-dométrio.

Por fim, a modernização do par-que tecnológico e a remodelação doplanejamento estratégico e dos pro-

cessos de trabalho foram os princi-pais eixos de atuação da Área deGestão e Desenvolvimento Instituci-onal. É nesse contexto que a PolíticaNacional de Humanização (PNH) seconsolida como importante estraté-gia para a rediscussão coletiva dametodologia de gestão do instituto.‘Na medida em que são estimuladosnovos espaços de troca entre gesto-res, trabalhadores e usuários, cami-nhamos para o amadurecimento dagestão compartilhada e participati-va’, conclui o diretor Carlos Maciel.

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Ana Carolina Landie Priscila Sarmento

om as denominações deHospital de Manguinhos,Hospital Oswaldo Cruz,Hospital Evandro Chagas eCentro de Pesquisa Hospi-

tal Evandro Chagas, o Instituto de Pes-quisa Clínica Evandro Chagas (Ipec), foiplanejado pelo próprio Oswaldo Cruz,entre os anos 1910-12, e teve sua cons-trução concluída um ano após sua mor-te. Foi o primeiro hospital e único dopaís a ser criado com o objetivo de de-senvolver pesquisa. A ideia de Cruz eracriar em Manguinhos um hospital noqual pudessem os doentes ser cuida-dosamente estudados e conveniente-mente tratados à luz das mais recentesaquisições científicas.

A recuperação histórica é importantepara entender o momento em que o Ipecse torna Instituto Nacional de Infectologia(INI). “Desde a sua criação o Hospital deManguinhos tem como desafio dar res-postas a eventos de saúde pública emdoenças infecciosas. Essa estratégia ficaevidente, na década de 1940, após amorte de Evandro Chagas, quando paragarantir o escopo e as atividades do hos-pital e do Serviço de Grandes Endemias(Sege), a ele atrelado, o ministro da Edu-cação e Saúde, Gustavo Capanema, fir-mou um decreto oficializando a suamissão. Apesar disso, nas décadas de1960 e 1970, o hospital enfrentou umesvaziamento e diminuição de investimen-tos. A partir da década de 1980 e, princi-palmente nos últimos anos, o instituto,graças a uma concentração favorável de

Cprofissionais que se dedicam ao atendi-mento e a pesquisa clínica em doençasinfecciosas e negligenciadas como malá-ria, dengue, doenças de Chagas, HTLV,HIV/Aids entre outras, vem crescendo efortalecendo a ideia de que é importanteolhar para as pandemias e epidemias deforma mais estratégica”, diz Jois Ortega,médica infectologista e assessora técnicapara Cooperação com o SUS.

Segundo Jois, em 2008, quando co-meçaram os encontros de planejamen-to para que o Ipec fosse transformadoem Instituto Nacional, na gestão da di-retora Valdilea Veloso (2006-2013) ocor-reu uma grande mobilização dosservidores para este desafio. “Acredita-mos na relevância estratégica para apopulação brasileira, que será ter umaestrutura onde possamos ampliar e for-talecer a pesquisa clínica e os serviçosde referência e desse modo melhor co-laborar com o Ministério da Saúde naformulação de políticas públicas e napromoção e atenção na área da infecto-logia. Por isso a formalização, por meioda portaria do MS em 2010, que criou oInstituto Nacional de Infectologia Evan-dro Chagas, que é um reconhecimentodo trabalho e da atuação desenvolvidosna instituição”, complementa.

Para o atual diretor do instituto, Ale-jandro Hasslocher, o INI vai agregar umagrande expertise para as doenças infec-ciosas, área que ainda não tem um cen-tro de referência no Brasil, em caráternacional. “Os poucos hospitais com focoem doenças infecciosas são estaduais ouligados a universidades. O INI será umaorganização diretamente ligada ao Mi-nistério da Saúde”, diz. “Na área de as-

sistência, a Fiocruz nunca foi vista comouma instituição que oferece atenção clí-nica hospitalar aos seus pacientes damesma forma que acontece na pesqui-sa, na referência, no ensino e na produ-ção. A criação dos institutos, com umgrande espaço físico e uma infraestrutu-ra nova, vai alavancar a Fiocruz na suamissão em relação à assistência e aoatendimento clínico. É muito importanteque os institutos sejam reconhecidos na-cionalmente como espaços que fazemuma contribuição específica para a saú-de pública brasileira”.

Hasslocher cita ainda as duas princi-pais estruturas do Ministério da Saúderelacionadas às doenças infecciosas: assecretarias de Vigilância em Saúde (SVS)e de Atenção à Saúde (SAS). “A vigilân-cia em saúde funciona muito bem naparte de prevenção, controle de vetorese de atendimento a surtos. Grandes pro-gramas, como os de malária, doença deChagas e dengue, trabalham muito bema questão da cumplicidade ecológica einteração de ambiente”, afirma. “Mas,na atenção clínica, ficamos restritos atuberculose, HIV e hanseníase, mesmoassim dentro do contexto de atençãoprimária/secundária. Em contrapartida,oferece-se muito pouco na área de aten-ção clínica a doença de Chagas, HTLV,micoses sistêmicas, leishmanioses, hepa-tites, ou seja, doenças infecciosas suba-gudas ou crônicas. O INI terá umacontribuição importante na saúde públi-ca na parte de assistência clínica, detratamento e de diagnóstico, comple-mentando as ações vigentes de preven-ção e controle de doenças infeciosas doMinistério da Saúde”.

Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas

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M

MERCADO EDITORIAL

Fernanda Marques

ais gente com livros nasmãos é melhor para todosnós”. A frase, dita peloescritor Deonísio da Silva,resume bem as motiva-

ções do seminário O futuro do livro é olivro, realizado pela Editora Fiocruz emcomemoração aos seus 20 anos. Osdebates travados contribuíram para dis-solver a falsa dicotomia livro de papelversus livro digital, mas sem cair noreducionismo da convivência pacíficaentre impresso e on-line. “Temos o de-ver de não sermos inocentes diante dasmutações tecnológicas, pois elas tra-zem consequências civilizatórias. Em-bora haja vantagens, é claro, nãopodemos embarcar nessa fábula felizdo simples acréscimo”, ponderou opresidente da Fundação Biblioteca Na-cional, Renato Lessa, que proferiu aconferência de abertura do evento.

As consequências, conforme apon-tado por outros convidados, incluemmudanças nas formas de ler e escre-ver influenciadas pelo fetiche da velo-cidade. “O papel não é sagrado. O quenão se pode perder de vista é a aten-ção e a troca entre seres humanos”,

afirmou o pesquisador Luis David Cas-tiel, professor da Escola Nacional deSaúde Pública (Ensp/Fiocruz). “Vivemosa era da produtividade transbordante,do ‘recorta e cola’, porque publicar éuma necessidade. É preciso também‘ir direto ao ponto’, porque não há tem-po a perder. Escrever é ‘twitar’ e ler é‘browsear’. Mas cuidado: entrever nãoé ver!”, alertou. Castiel, que se refe-ria, em especial, ao universo acadêmi-co, fez uma analogia dos tempos atuaiscom o filme de ficção científica Fahre-nheit 451, inspirado no romance de RayBradbury (1920-2012).

O filme apresenta um futuro ondeas opiniões próprias são consideradassubversivas e os livros, proibidos e quei-mados. Por um lado, estaríamos viven-do o avesso de Fahrenheit 451: nãopadecemos pela falta dos livros cassa-dos, mas pelo excesso de informaçãoque nos chega – “como um astronautaque aterrissa em um planeta desconhe-cido, no meio de um redemoinho”,definiu Castiel. Por outro, não estaría-mos tão distantes de Fahrenheit 451:afinal, a rapidez exigida dos pesquisa-dores para que publiquem artigos nãolhes permite o exercício da crítica, mastão somente uma destreza administra-

Livro: futuro do presenteReunidos no seminário comemorativo de 20 anos da Editora Fiocruz, especialistasdiscutem o futuro do livro e chegam à conclusão de que ele não morre, mas renasce

“tiva. “Leitura e investigação não com-binam com essa rapidez”, disse. “Énecessário defender a lentidão da leitu-ra porque o exercício do pensamento élento”, concordou Lessa. “E artigos emperiódicos não comportam elegânciaestilística”, arrematou Castiel.

Não se trata de desprezar os arti-gos. Muito pelo contrário. Eles têm umaimportância e um peso enorme na vi-sibilidade e na disseminação do conhe-cimento científico que se produz. Noentanto, reconhecer o papel do livroe, em especial, do livro acadêmico érecuperar outros valores, tanto científi-cos quanto humanistas. “Nosso com-promisso é com uma produção culturale não apenas técnico-científica. Nossaprodução deve ter um impacto intelec-tual, de vanguarda, com caráter for-mativo mais geral e pluridisciplinar”,destacou o editor-executivo da Eduerj,Italo Moriconi.

A defesa do livro como bem cultu-ral se fez presente na fala de todos osparticipantes. “O que está primordial-mente em pauta aqui é o livro livro, oproduto livro, a cultura do livro, o livrocomo obra em si, a cultura da íntegra,do todo – e não do fragmento”, assi-nalou o editor-executivo da Editora Fio-

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cruz, João Canossa, atual presidenteda Associação Brasileira das EditorasUniversitárias (Abeu). Segundo Canos-sa, uma das principais contribuições doseminário era a de “compartilhar re-flexões e sentidos, na busca por maise melhores cenários para o livro – e,com este, para a cultura, para a arte,para a ciência, do Brasil ou de qual-quer rincão outro, em prol de nossas ede outras populações”.

Opinião similar foi expressa pelosecretário-executivo do Plano Nacionaldo Livro e Leitura (PNLL), José CastilhoMarques Neto. “As editoras universi-tárias precisam assumir seu compromis-so com a formação de leitores por meioda qualidade da leitura que oferecem.O leitor é conquistado por textos bons,bem editados. O livro acadêmico é umaprestação de contas para a sociedadeque nos sustenta, mas o retorno deveir além dos conteúdos científicos disse-minados, porque o leitor ganha tam-bém no prazer da leitura”, ressaltou.

Uma bela prova disso pode ser en-contrada nas memórias do médico mi-neiro Pedro Nava, tema da palestraapresentada pelo professor da UFRJAndré Botelho. Os volumes da obra nãosão peças de autoconsagração do indi-víduo, mas um convite ao mergulho emuma memória coletiva. “É uma espé-cie de autorretrato do Brasil, uma inter-pretação com a qual, mesmo passados30 anos, o leitor contemporâneo se iden-tifica”, afirmou Botelho. Pedro Nava ilus-tra, assim, a máxima de que o autornão escreve para si, mesmo em se tra-tando de suas próprias memórias.

“O livro é um prazer do autor parao leitor: eles se tornam confidentes”,disse Silva, professor aposentado daUFSCar (SP) e consultor das universida-des Estácio (RJ) e Unisul (SC). E mais:“o livro é um objeto preguiçoso, que sóganha vida a partir do leitor”, comple-tou o presidente da Fiocruz, Paulo Ga-delha. Essa interdependência ajuda aexplicar a relação sensível que se esta-belece entre o leitor e o objeto livro.

De acordo com o presidente daBiblioteca Nacional, a biblioteconomiaé necessária às bibliotecas, mas nãosuficiente. Segundo Lessa, bibliotecastambém precisam, por exemplo, de

urbanistas, porque elas são parte dacidade e precisam estar muito bem in-tegradas ao espaço urbano. “As bibli-otecas precisam persuadir as pessoas.Se o mundo atual é o da velocidade,do instantâneo, do imediato, da cap-tação imagética, então as bibliotecasprecisam ser o espaço do experimen-tal, da expansão do pensamento”,apostou. E foi além: “o cheiro dos li-vros é uma experiência visceral. A re-lação sensível com os livros não édispensável. Por isso, não podemossimplesmente acabar com as formasporque preservamos os conteúdos”.

Entretanto, como lembrou o coor-denador do programa SciELO, uma dasprincipais contribuições do digital é jus-tamente esse desprendimento do con-teúdo em relação ao suporte. “Issocoloca em xeque a definição clássicade livro”, problematizou Packer. Segun-do Moriconi, porém, a publicação digi-tal não deslanchou no Brasil. “Tirandoo mundo anglo-saxônico, a expansãodo digital não é tanta quando se preco-nizou anos atrás. E o problema não éde produção, de capacidade tecnológi-ca, mas de acesso, de consumo”, argu-mentou o editor da Eduerj. “Nãopodemos restringir a discussão ao livrodigital em si. A questão é muito maisampla e inclui o número de analfabe-tos funcionais e o poder aquisitivo paraacesso às máquinas, além dos interes-ses econômicos de uma sociedade ca-pitalista”, acrescentou o acadêmicoDomício Proença Filho. “Nem as edito-ras comerciais avançaram tão rapida-mente no digital”, avaliou Moriconi.

Aliás, a questão das editoras co-merciais, notadamente nos EstadosUnidos e na Grã-Bretanha, foi o temada conferência de encerramento, pro-ferida pelo professor de sociologia JohnB. Thompson, da Universidade de Cam-bridge. Em uma apresentação basea-da na pesquisa que originou seu livroMercadores de cultura, recentementetraduzido para o português e lançadopela Editora Unesp, Thompson descre-veu uma profunda mudança no cená-rio editorial, com o fortalecimento depoucas grandes corporações e o enco-lhimento dos editores independentes,estes pressionados por uma conjunção

de fatores econômicos e tecnológicos.Ainda em relação aos aspectos tec-

nológicos, Moriconi acredita que a pro-messa revolucionária do digital resideno hipertexto. “Seria a finitude do li-vro versus a infinitude do hipertexto; ofim do sentido versus a explosão deuma multiplicidade de sentidos, no plu-ral. Mas nossa forma de pensar aindaé baseada no suporte, com começo,meio e fim, argumentação lógica e hi-erárquica, divisão em capítulos”, pon-derou. Já Packer vê outro desafio.“Atualmente, temos capacidade e in-fraestrutura tecnológica para produzire tornar disponíveis e-books acadêmi-cos. Mas em relação à visibilidade, aouso e ao impacto desses e-books, es-tamos mal nos parâmetros internacio-nais”, advertiu.

Se a avaliação dos e-books acadê-micos é um assunto em aberto, tampou-co essa discussão foi superada para oslivros acadêmicos impressos. “Devemosempreender uma reflexão sobre o livrono âmbito do sistema de avaliação dapós-graduação”, sublinhou a vice-presi-dente de Ensino, Informação e Comuni-cação da Fiocruz, Nísia Trindade Lima.“Precisamos estabelecer para o livro cri-térios de avaliação, classificação e pon-tuação, e não apenas de premiação”,defendeu o diretor de Avaliação da Ca-pes, Lívio Amaral.

Apesar dos desafios, os especialis-tas reunidos no seminário estavam con-vencidos de que não faltam motivospara celebrar o renascimento do livro.“As editoras brasileiras venderam 435milhões de exemplares no ano passa-do; o MEC é o maior comprador delivros do mundo; o português é a ter-ceira língua da internet; eu posso lerno celular e também manter uma bi-blioteca convencional. Temos mais éque falar de literatura. Popularizarmesmo”, recomendou Silva. Não poracaso a Editora Fiocruz manifestou ointeresse de realizar o evento na Aca-demia Brasileira de Letras, que gentil-mente acolheu o pedido. “A ABL temcompromisso com a história e com ofuturo. Acreditamos no livro e não abri-mos mão de participar do contemporâ-neo”, disse o acadêmico Marco Lucchesina mesa de abertura do seminário.

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Fernanda Marques

ompreender o processode emergência das me-dicinas tradicionais indí-genas no campo daspolíticas públicas de saú-

de indígena. Esta é a proposta do livroMedicinas indígenas e as políticas datradição: entre discursos oficiais e vo-zes indígenas, de Luciane OuriquesFerreira, que analisa os discursos pro-feridos por uma diversidade de atores– indígenas e não indígenas, governa-mentais e não governamentais, nacio-nais e internacionais. Revela-se umadinâmica que vai do global ao local, etransforma os contextos envolvidos,originando novas formações culturais.A obra pertence à coleção Saúde dosPovos Indígenas, assim como Proces-sos de alcoolização indígena no Brasil:perspectivas plurais, de MaximilianoLoiola Ponte de Souza (org.), outro lan-çamento da Editora Fiocruz.

Problemas relacionados ao uso deálcool aparecem como importantesproblemas de saúde pública entre ospovos indígenas, embora a produçãoacadêmica nacional sobre o assuntoainda seja relativamente escassa. Acoletânea organizada por Souza mos-tra que o uso do álcool é uma questãode contornos complexos, em especialquando se consideram os povos indí-genas. Como o álcool adquire umavariedade de funções em diferentesgrupos sociais, a análise não pode serestringir à ingestão da bebida em si: épreciso relacionar o consumo a proces-sos socioculturais e político-econômicos.O livro descreve e analisa as caracte-rísticas específicas dos diversos modosde uso de álcool em diferentes povosindígenas brasileiros.

Os capítulos trazem relatos teóricos,etnográficos, historiográficos e de inter-

Coleção sobre povos indígenasganha dois novos títulos

Medicinas indígenas eas políticas da tradição:entre discursos oficiais

e vozes indígenas

Luciane Ouriques FerreiraR$ 36 | 202 páginas

Processos dealcoolização indígenano Brasil: perspectivasplurais

Maximiliano LoiolaPonte de Souza (org.)R$ 45 | 252 páginas

Outras informações:www.fiocruz.br/[email protected](21) 3882-9007

venções culturalmente orientadas. Bus-cam superar os enfoques limitados aosaspectos patológicos do consumo deálcool: demonstram que os efeitos dabebida não podem ser dissociados deseus aspectos sociais, econômicos e psi-cológicos. Essa complexidade apontapara a necessária complementaridadeentre as perspectivas da biomedicina eas das ciências sociais. O livro tambémratifica a importância do protagonismoindígena no enfrentamento dos proble-mas relacionados ao uso de bebidas al-coólicas e reconhece que estratégiasdesenvolvidas em outras realidades nãopodem ser diretamente transpostas parao contexto indígena.

Questões como essas também apa-recem no livro de Luciane. Segundo aautora, as políticas públicas que quali-ficam os seus objetos e público-alvo coma categoria “tradição” conformamuma formação discursiva, definida pelapesquisadora como “políticas da tradi-ção”. Um exemplo são as políticas vol-tadas à saúde indígena, que têmbuscado reconhecer a eficácia dasmedicinas tradicionais indígenas e ar-ticulá-las com o sistema oficial de saú-de. No entanto, “ao serem apropriadospelos povos indígenas, os discursos ofi-ciais são postos a serviço dos seus inte-resses culturalmente situados – assim,estamos diante do fenômeno da indi-genização”, diz Luciane. E essa “indi-genização” se refere aos processos“levados a efeito pelos povos indíge-nas ao se apropriarem das políticas pú-blicas a fim de manter a sua autonomiae reverter a seu favor o controle que oEstado passa a exercer sobre o mundoda vida de suas comunidades”. O livrobusca contribuir para a consolidação dodireito indígena à atenção diferencia-da à sua saúde, considerando as rela-ções historicamente construídas entrepovos indígenas e Estado.

RESENHA

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A política pública comocampo multidisciplinarEduardo Marques e Carlos AurélioPimenta de Faria (orgs.)

Muitas são as disciplinasque têm se dedicado ao es-tudo das ações do Estado,sobretudo a partir dosanos 1980, quando co-meçaram a ganhar fôle-

go as pesquisas sobre aspolíticas públicas. Não só diferentes dis-ciplinas se voltaram para esse campo,como os estudos passaram a focar umagrande variedade de temas. Se, por umlado, a pluralidade de olhares contribuipara o avanço das pesquisas, por outro,a dispersão disciplinar e temática indicaum risco de fragmentação do campo. Anecessidade de sistematizar os estudosna área, mas sem abrir mão de um pa-norama abrangente, motivou o lança-mento desta coletânea, que propõe umdiálogo entre ciência política, sociologia,administração pública, antropologia, di-reito, psicologia, demografia, história erelações internacionais. Os capítulos apre-sentam as teorias e os enquadramentosconceituais que têm sido produzidos eutilizados por cada disciplina. O objetivoé que esse quadro favoreça uma inter-pretação colaborativa, construída sobrebases teóricas compartilhadas.

R$ 42 | 282 páginas | Coedição coma Editora Unesp

Médicos, medicinapopular e Inquisição:a repressão das curasmágicas em Portugaldurante o IluminismoTimothy D. Walker (tradução: Maria-na Pardal Monteiro)

Este é um trabalho ori-ginal que combina fontesda história da Inquisiçãoe da história da medici-na, além de muitas ou-tras – baseia-se emdocumentação de nu-

merosos arquivos em Lisboa, Évora eLondres. Examina a contradição de pro-fissionais médicos treinados durante o

Iluminismo português que utilizavam oaparato repressivo da Inquisição paraeliminar seus competidores mais rústi-cos e iletrados: os curandeiros popula-res. Analisa a equação de interessesenvolvidos nessa perseguição a curan-deiros na Inquisição portuguesa, de-monstrando uma concorrência: de umlado, uma classe emergente de profis-sionais médicos formados; de outro,praticantes da cura nas comunidades.Sob a crescente influência dos primei-ros, aumentam as hostilidades contraos segundos, aos quais são imputadasacusações e aplicados castigos.

R$ 60 | 423 páginas | Coedição coma Editora do Instituto de CiênciasSociais da Universidade de Lisboa

Segurança alimentar enutricional: perspectivas,aprendizados e desafiospara as políticas públicasCecília Rocha, Luciene Burlandy eRosana Magalhães (orgs.)

O desafio: entender asegurança alimentar e nu-tricional como um bempúblico em sociedadespautadas em economi-as de mercado e comouma questão ampla que

demanda a articulação de ações relaci-onadas à produção, comercialização,abastecimento, acesso e consumo dealimentos. O caminho: reflexões teóri-cas e metodológicas articuladas a aná-lises sobre experiências implementadasno Brasil. O resultado: esta coletâneaque discute as conexões entre dinâmi-ca alimentar, sistema alimentar e políti-cas públicas, direitos sociais e padrõesde desenvolvimento equitativos. A cons-trução do conceito de segurança alimen-tar e nutricional é o assunto exploradona primeira parte do livro, que tambémaborda as interfaces com os campos daeconomia, nutrição, sociologia e políti-cas públicas. Já na segunda parte, dis-cutem-se as experiências de diferentesprogramas e ações, bem como ques-tões de planejamento e avaliação. Aterceira parte é dedicada a segmentospopulacionais específicos.

R$ 32 | 225 páginas

Os sentidos da saúdee da doençaDina Czeresnia, Elvira Maria Godinhode Seixas Maciel e Rafael AntonioMalagón OviedoColeção Temas em Saúde

Pergunte a várias pes-soas o que significa tersaúde ou estar doentee, certamente, cadauma delas terá umaresposta diferente.Embora saúde e doen-

ça sejam conceitos com os quais lida-mos no dia a dia, não é simples tentardefini-los. A elaboração conceitual, lin-guística, não consegue apreender todaa complexidade da experiência do ado-ecimento. Saúde e doença, então, po-dem não ser definidas do mesmo modona perspectiva da medicina e na da-queles que as experimentam? Refletirsobre questões como essa é o objetivodeste livro. Os autores não consideramsatisfatórias definições de saúde e do-ença estritamente científicas, funda-mentadas apenas no conhecimentomédico e biológico, e em parâmetrosquantitativos.

Ao longo do livro a saúde é apre-sentada como uma capacidade paralidar com a existência, salientando-seque uma vida saudável não pode ex-cluir tensões. Logo, a saúde é umapotência para que se criem estratégiasde adaptação ao meio e, nesse senti-do, aprender com a experiência dadoença é também um sinal de saúde.Pensar os sentidos da saúde, portanto,exige uma reflexão sobre ética e umaarticulação com dimensões políticas,artísticas e filosóficas. As transforma-ções dos conceitos de saúde e de do-ença ao longo do tempo também sãoanalisadas na obra.

R$ 15 | 119 páginas

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COMO COMPRAR:

Web:www.fiocruz.br/editora

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FIO DA HISTÓRIA

Glauber Gonçalves

bril de 1928. Depois detecer críticas ao sistemade saúde do estado emque vivia, um médico ale-mão com larga atuação

no país, porém sem diploma reconhe-cido, passou a ser hostilizado por seuspares brasileiros. Foi chamado de “re-trógrado prussiano”, “histrião”, “rui-vo julgador” e “truculento barão”. Senão é verdade que a história se repe-te, um recorrido pelos 513 anos des-

A medicina que cruzou o Atlântico

Do período colonial à República, médicosestrangeiros percorreram o interior doBrasil e as capitais, trataram imigrantese brasileiros e estabeleceram hospitais

de a chegada dos portugueses ao Bra-sil deixa ao menos uma sensação dedéjà vu e torna inevitáveis compara-ções. Decorridos 86 anos do episódio,médicos que se opuseram ao progra-ma Mais Médicos – que em 2013 bus-cou profissionais estrangeiros paralevar atendimento primário a regiõesdesassistidas – recorreram igualmen-te a insultos com referências pejorati-vas à nacionalidade e à aparência físicapara desmerecer os profissionais quevieram de Cuba. Em coro, gritavam:“escravos” e “volta para a senzala”.

Houve até quem reclamasse que asmédicas vindas da ilha caribenha ti-nham “cara de empregada domésti-ca”, num surto de preconceito.

A celeuma envolvendo o médicoalemão Ernst Wolfgang von Bassewitzno Rio Grande do Sul na primeira me-tade do século passado, relatado pelohistoriador René E. Gertz em artigo pu-blicado na revista História, Ciências,Saúde – Manguinhos, da Casa deOswaldo Cruz (COC/Fiocruz), mostraque a atuação de profissionais estran-geiros no Brasil – e os conflitos que a

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presença deles gera - não é uma no-vidade. Do período colonial à Repú-blica, profissionais da saúde de paísestão diferentes quanto França e Japãopassaram por terras tupiniquins pelosmais variados motivos e em contex-tos diversos. E nem sempre precisa-ram de revalidação de título paraexercer a medicina. Em alguns casos,um diploma de curso superior na áreaera totalmente dispensável para tra-balhar legalmente.

A vinda de médicos estrangeiros aoBrasil foi recorrente ao longo do perío-do imperial. Muitos vinham com o ob-jetivo de “fazer a América”. “Era muitocomum médicos estrangeiros com al-guma formação virem aqui com a ideiade fazer fortuna. Eles andavam pelossertões e pelas capitais fazendo cirur-gias, ganhavam seu dinheiro e, às ve-zes, ficavam, mas geralmente iamembora”, afirma o historiador FlávioEdler, chefe do Departamento de Pes-quisa da COC. O reconhecimento deque gozava a medicina francesa naprimeira metade do século 19 ajudoua impulsionar o fluxo de médicos deParis. “Como a medicina francesa ti-nha um grande prestígio, era comuma vinda e a boa receptividade aos pro-fissionais de lá. Os médicos que opera-ram dona Leopoldina e a Princesa Isabeleram franceses”, conta o pesquisador.No entanto, a reputação dos médicosda Cidade Luz não foi suficiente parablindá-los de críticas dos pares locais.Já incomodados com a atuação de cu-radores de diversos tipos, com quemacabavam disputando pacientes, osbrasileiros achavam que os colegaseuropeus representavam uma concor-rência adicional.

Antes disso, ainda no período colo-nial, a escassez de médicos não era umproblema exclusivo do interior. Em arti-go também publicado por Histórica,Ciências, Saúde – Manguinhos, opesquisador Márcio de Sousa Soaresrelata que, em 1796, o próprio vice-rei,conde de Resende, lamentou, numacarta a dona Maria I, a falta de médi-cos e suas “funestas consequências”,sobretudo para os escravos e popula-ção pobre da cidade do Rio de Janeiro.

Dados da Academia Nacional de

Medicina levantados pelo pesquisadormostram que, entre 1831 e 1850, 39estrangeiros passaram pela FaculdadeNacional do Rio de Janeiro. Eram médi-cos nascidos e formados no exterior que,tendo ou não obtido o grau de doutorem suas instituições de origem, defen-deram tese no Brasil como pré-requisitopara a revalidação de seus diplomas.Com isso, podiam exercer legalmentea medicina. Mas nem todos os estran-geiros que atuavam na cidade tinhamteses catalogadas na faculdade. Umregulamento da Junta Central de Higie-ne determinava que aqueles que tives-sem obra científica publicada ou que

comprovassem ter lecionado em univer-sidades estrangeiras estariam dispensa-dos do exame. Uma prática daqueleperíodo faz supor que o popular “jeiti-nho brasileiro” data de muito tempo eque alguns médicos estrangeiros seadaptaram bem a ele. Alguns profissio-nais conseguiram licenças e autoriza-ções de autoridades ministeriais doImpério e de presidentes de provínciapara clinicarem no Brasil à revelia dospareceres em contrário ou dos protes-tos da Junta.

Na década de 1860, diante da cons-tatação de que faltavam profissionaispara tratar a população sertaneja, CruzJobim, um respeitado médico que estu-dou em Paris, propôs a formação demédicos de segunda categoria para atu-

ar no interior do Brasil. A inspiração veioda França, onde a população do cam-po era atendida pelos officiers de santé(oficiais de saúde) – profissão do perso-nagem Charles Bovary, do romanceMadame Bovary, de Gustave Flaubert.“Eles teriam uma formação secundária– algo mais que um enfermeiro e me-nos que um médico. Isso foi fortementecriticado. Os acadêmicos temiam que,como não se conseguia controlar o exer-cício da medicina, esses médicos vol-tassem para as capitais e aumentassema concorrência. A categoria tambémconsiderava que qualquer redução naqualidade da formação de médicos,considerada deficiente naquela época,comprometeria muito a qualidade. Aproposta não foi para frente.

No período republicano, o Brasilcontinuou recebendo médicos de fora.Ao longo do século 19, profissionaisestrangeiros desembarcaram por aquina esteira de uma intensa onda migra-tória. Expostos a doenças tropicais,colonos alemães e japoneses que seembrenhavam pelo interior precisavamde atendimento médico. Com parcoou sem nenhum conhecimento do por-tuguês, profissionais que falassem seusidiomas eram bem-vindos. Nas déca-das de 1920 e 1930, o Japão incenti-vou fortemente a fixação de seusnacionais em terras estrangeiras, inclu-indo o Brasil. A medida era vista comouma das saídas para o problema dasuperpopulação do país asiático, quevivia uma realidade de fome e pobre-za disseminada. Os que sobreviviam àviagem de dois meses, cruzando trêsoceanos, eram alocados muitas vezesem regiões insalubres do país.

A situação dos japoneses no Brasilé relatada pela pesquisadora da COCKaori Kodama, no livro Cerejeiras e ca-fezais: relações médico-científicas en-tre Brasil e Japao e a saga de HideyoNoguchi, organizado em conjunto comJayme Benchimol e Magali Romero Sá.De acordo com números do consuladojaponês em São Paulo publicados emum jornal da época e levantados pelahistoriadora, entre 1929 e 1934, 4.739imigrantes tinham sido vitimados pordoenças, entre as quais tifo, disente-ria, verminoses, problemas gastrointes-

O médico alemão ErnstWolfgang von Bassewitz

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tinais e doenças pulmonares. Malária,leishmaniose e tracoma também eramproblemas sérios. No livro, Kaori contaque dois médicos japoneses que fize-ram um giro pelas colônias no Brasil sedepararam com a dura realidade deseus compatriotas: em uma escola de128 alunos, 124 estavam com traco-ma, doença oftalmológica altamentecontagiosa, que é causada por umabactéria e pode levar à cegueira. Di-ante da situação, um acordo firmadoentre o governo de São Paulo e repre-sentantes consulares japoneses garan-tiu a vinda de cinco médicos do paísoriental, além de cinco farmacêuticose igual número de parteiras.

Em visita às colônias do interior deSão Paulo em 1921, o cônsul japonêsToshiro Fujita também constatou as pre-cárias condições de saúde dos imigran-tes, o que o levou a pedir providênciasao Ministério dos Negócios Estrangei-ros do Japão. O reclamo resultou na vin-da de mais quatro médicos ao Brasil,em 1923, e na aprovação de um pro-grama de longo prazo de assistência aosimigrantes. Com recursos recebidos doMinistério do Interior, deu-se o primeiropasso para formar a Zai Burajiru Nihon-jin Dojinkai – Sociedade de Beneficên-cia Japonesa no Brasil – reconhecidapelo governo brasileiro em 1926. A en-tidade deu ênfase à medicina preventi-va e, diferentemente do que ocorreu nascolônias japonesas na Ásia, atuou exclu-sivamente em benefício dos imigrantes.Entre os feitos da Dojinkai, está a cons-trução do hospital Santa Cruz, ainda exis-tente na cidade de São Paulo.

A sociedade era responsável peloenvio de médicos para as colônias es-palhadas pelo Brasil quando havia sur-tos epidêmicos. Nas décadas de 1920e 1930, outros médicos emigrarampara o Brasil, de acordo com KaoriKodama. Em Cerejeiras e cafezais, elarelata que alguns dos médicos japone-ses que atuaram aqui revalidaram seudiploma na Faculdade de Medicina doRio de Janeiro.

Por um período, no entanto, a re-validação não era uma exigência dealcance nacional. No Rio Grande do Sul,vigorou por um período a chamada “li-berdade profissional”. Influenciada pela

doutrina positivista, a Constituição es-tadual de 1891 vetava a edição de leisque regulamentassem qualquer profis-são. Dizia o texto: “Não são admitidos[...] no serviço do estado os privilégiosde diplomas escolásticos ou acadêmi-cos, quaisquer que sejam, sendo livreno seu território o exercício de todas asprofissões de ordem moral, intelectuale industrial”. Essa disposição estava in-timamente ligada à vinda de médicosalemães para o estado, explica ReneGertz, professor da Pontifícia Universi-dade Católica do Rio Grande do Sul(PUC-RS). O médico Ernst Wolfgang vonBassewitz, personagem do início dessareportagem, foi um dos alemães quese beneficiou da regra.

Insatisfeitos, médicos formados fi-zeram oposição à “liberdade profissio-nal”. As vozes contrárias mais fortesvinham da Faculdade de Medicina dePorto Alegre. O conflito de posições,conta o pesquisador, foi um dos elemen-tos que levou à criação de uma segun-da escola para médicos, a EscolaMédico-Cirúrgica de Porto Alegre, porum grupo heterodoxo, formado inclusi-ve por homeopatas. O primeiro diretorfoi da instituição foi justamente Bas-sewitz. Diferentemente dele, algunsprofissionais que atuaram no Rio Gran-de do Sul não tinham diploma universi-tário na Europa. Foi o caso do austríacoGabriel Schlatter, que teve apenas pre-paro de cerca de meio ano como “mé-dico naturalista” em Berlim. Ele atuou

no interior gaúcho e fundou um hospi-tal que existe até hoje. Depois da edi-ção das leis que restringiam o exercícioda medicina a profissionais formados, apartir do início da década de 1930, elefoi substituído por seu filho e mudou-separa uma localidade chamada Poço dasAntas, onde continuou atuando “clan-destinamente”, conta Gertz.

Segundo o pesquisador, esses mé-dicos desempenharam papel relevan-te ao levar serviços de saúde ao interior.“Algumas pessoas que não possuíamdiploma tinham méritos que eram re-conhecidos pela sociedade. Se o Esta-do aparecesse lá para fechar umconsultório de um desses médicos, cer-tamente a população se rebelaria. Elestiveram uma função muito importan-te, pois tinham a confiança dessa po-pulação por falar o sua língua econseguir entendê-los [...]”. Passadoquase um século, a diferença de idio-mas, que um dia representou uma bar-reira entre médicos que falavam oportuguês e imigrantes alemães, estáde volta a consultórios Brasil adentro,agora com a promessa de aproximarprofissionais de saúde da população dosrincões do Brasil. Mas desta vez a vari-ação linguística – entre a língua deCamões e o espanhol dos profissionaisdo Mais Médicos – e as diferenças cul-turais são bem menos marcadas. Ago-ra é esperar para saber como osmédicos estrangeiros do programa se-rão lembrados na História.

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