revista científica da ong narrativa da imaginação...
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Revista Científica da ONG Narrativa da Imaginação voltada para a análise de experiências e pesquisas sobre
role playing
EDITOR-CHEFE RESPONSÁVEL
Rafael Correia Rocha – Universidad de la Empresa (Uruguai)
CONSELHO EDITORIAL
CONSELHO EXECUTIVO
Dr. Sergio Paulo Morais - UFU
Dr. Túlio Barbosa - UFU
Ms. Rafael Correia Rocha - Universidad de la
Empresa (Uruguai)
Esp. Fernando Paulino de Oliveira - UFU
Fernando José Calazan Florêncio - UFU
CONSELHO CONSULTIVO
Alessandro Eleutério de Oliveira - UFSCAR
Dilma Andrade de Paula - UFU
Edvaldo Souza Couto - UNICAMP
Gercina Santana Novais - USP
Lucas Ferreira de Paula - UFU
Márcio Roberto do Prado - UNESP
Marialva Pinto Moog - Universidade do Vale do
Rio dos Sinos
Maria do Perpétuo Socorro Calixto Marques -
Unesp - Universidade Júlio de Mesquita
Michele Mogami - Universidad de La Empresa
(Uruguai)
Sonia Aparecida Silva Gonçalves - Uniube
Waléria Furtado Pereira - USP
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP
Roberta Amaral Sertório Gravina, CRB-8/9167
REVISOR: Maria Nilda Macedo de Assunção
CAPA: Rafael Correia Rocha (foto disponível em <
http://img.americanas.com.br/produtos/01/00/item/6788/5/6788571_1gg.jpg> acesso em 20 de agosto de
2014)
INDEXADORES: Sumários.org.; Latinex e Geodados
DISPONÍVEL EM: http://www.narrativadaimaginacao.com/p/revista-mais-dados.html
CORRESPONDÊNCIA
ONG Narrativa da Imaginação
Av: Estrela do sul, 1946 – B. Osvaldo Resende - CEP 3840-399 – Uberlândia/MG
E-mail: [email protected]
MAIS DADOS é uma publicação virtual da ONG Narrativa da imaginação.
Número editado pela mesma em janeiro de 2015
R349 Revista Mais Dados (Edição Especial): Role playing e
ensino de História – Ano 2, v. 1 (2015) -
Uberlândia, MG: Narrativa da Imaginação, 2015.
v. : il. ; 15 cm.
ISSN: 2358-1301.
1. Educação 2. Jogos 3. Role-playing game (RPG) I.
Título
CDD 794
CDU 79
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Agradecimentos
Nunca sabemos o que encontraremos no caminho de uma pesquisa, nem as pessoas que conheceremos, nem
como nos envolveremos com elas, nem o que pensarão elas sobre nós e nós sobre elas.
A aproximação de outro ser humano é um mistério, um processo improvável. Parabenizo estes sete
historiadores geniais e corajosos que aceitaram desafiar a escola, a História e a si mesmos, sendo pioneiros
do devir.
Agradeço, imensamente, a estes sete pelo empenho, por encararem os desafios estruturais da escola, seus
receios e medos de ir além do que se esperaria fazer em uma sala, quebrando o silêncio das regras e criando
suas próprias regras junto com seus alunos ou, melhor dizendo, seus amigos.
Rafael Rocha
Editor Chefe
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Prefácio
Olhei crianças brincando durante o recreio e disse a um amigo que estava ao meu lado:
- Elas estão aprendendo mais agora do que quando estavam na sala de aula.
Ele olhou estranhamente e disse-me:
- Mas por que diz isso? Não faz sentido.
- Faz sim, porque agora elas estão felizes, antes não estavam.
Não podemos pensar em aprendizagem distante da felicidade.
O professor e os alunos podem ser felizes na sala de aula.
Já perceberam como as pessoas estão dispostas em uma empresa? Há sempre alguém que coordena alguém,
que manda em alguém, que chefia ou vigia alguém, que se responsabiliza por alguém.
Já em um jogo, não existe alguém que chefie, controle ou vigie; inexistem cargos, mas o jogo, mesmo assim,
funciona. Os participantes são responsáveis por si mesmos e têm funções a executar, não exclusivamente
para eles, mas para todos e, mesmo que sejam funções exclusivas, estão dentro do todo.
As escolas de hoje parecem-se com as indústrias de ontem e com as empresas de hoje.
Esse pensamento não é um convite ao caos; existem regras em jogos e em empresas, mas é um desafio ao
caos. Pensemos assim: quando se dá alimento a um faminto, esse come excessivamente, e o mesmo ocorre
quando se dá liberdade a quem inicialmente não a tinha. Talvez toda bagunça, na sala de aula, seja de um
sujeito faminto de liberdade.
Quando a sala de aula torna-se um templo do caos, o professor normalmente vai gritar e querer controlar os
alunos; aí ele vai sofrer, ficando infeliz.
O caos faz parte do jogo, sendo um estágio da experiência que o professor poderá viver de maneira
produtiva junto aos seus alunos.
O caos quebra as regras para depois recriá-las coletivamente. Estou falando do caos produtivo, da expressão
dos sujeitos, que recompõe e põe a estrutura do jogar.
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O professor é aquele que faz o convite.
E o aluno, aquele que aceita participar.
Logo após, os dois participantes-jogadores se tornam
produto disso. São sujeitos completamente
transformados pelo contato com a liberdade para
criarem, experimentarem e encontrarem-se com a
natureza humana.
Todo esse processo, que será descrito por sete olhares, nas vivências do projeto de pesquisa “Cidade de
Uberlândia: História Regional e Local, ensino aprendizagem e jogos narrativos”, n° CHE - APQ-03413-12,
financiado por uma parceria entre Fapemig/Capes de 2013 a 2015, no qual os professores produziram, ao
final, artigos individuais, com liberdade de formas de acordo com a percepção individual sobre a
experiência. Vejo como fundamental ressaltar que o curso realizado foi muito breve e tinha, em seu
propósito, vivenciar a experiência prática do jogar como vetor da teoria, ou seja, antes de aplicar qualquer
jogo, o professor deveria jogar e tornar-se jogador. Articulado na modalidade extensão, com duração de 3
meses, no segundo trimestre de 2014.
Os professores, ao concluírem o curso, produziram os artigos
finais com liberdade visto que, há tempos, estavam distantes
da escrita acadêmica; por isso, são apresentados nesta edição
especial. Todavia continuaram produzindo novos jogos,
mesclando elementos de maneira que pudessem identificar,
durante este processo, sua própria identidade docente; assim,
penso que o profissional da educação percebe-se durante sua
produção tanto ou até mais que em seu próprio exercício, pois
a produção gera reflexão enquanto o exercício promove a
consolidação da mesma.
Rafael Rocha
Editor Chefe
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Aplicação de RPG em aula de História
Lucas de Sousa Medeiros1
Dentre as elencadas obrigações do professorado atuante na educação pública básica no estado de
Minas Gerais, a formação continuada e o progressivo refinamento de métodos, didáticas e práticas intra e
extra-sala de aula são facilitados por uma série de iniciativas benfazejas de parte de alguns educadores
preocupados com a melhoria da qualidade da educação no Brasil. O curso de aplicação de jogos narrativos
ao ensino de história, promovido pelo projeto “Cidade de Uberlândia: História regional e local,
aprendizagem e jogos narrativos”, ofertado aos professores da educação básica - municipal e estadual - de
Uberlândia, é uma dessas iniciativas. No decorrer do curso, foi-nos apresentado uma série de metodologias
passíveis de serem aplicadas em sala de aula como LARP (live action role playing), jogos de tabuleiros ou
cartas e RPG assim como foi propiciado um ambiente de troca de experiências entre os docentes.
Como profissional “novato” na atividade docente, com apenas um ano integralizado em sala de aula,
e atuando pela primeira vez nos ciclos iniciais - 8º ano, senti-me compelido a buscar novas maneiras de
re/estabelecer a ludicidade salutar ao bom aprendizado em sala de aula. Também estava buscando uma
maneira de estimular a prática da pesquisa em história, dentro da sala de aula, por parte dos alunos e de
integrar-me em um ambiente de pesquisas em ensino de história, contribuindo para o campo e realizando
experiências passíveis de documentação, que poderiam ser utilizadas futuramente para estudos sobre as
práticas de ensino.
O contato com o curso se deu através de divulgação direta por meio de panfletos distribuídos na
escola e a intervenção do ministrante - Rafael Correia Rocha, em horário de aula, para convidar os docentes
de história da referida escola a participar do curso. Inicialmente, não houve interesse por parte desse
depoente em se inscrever no curso, tanto devido à incompatibilidade de horários, o que o levou a não
comparecer em algumas das aulas, quanto por uma certa visão pedagógica estreita que não conseguia
compreender o RPG vinculado ao ensino escolar. Cabe ressaltar que sou um jogador experimentado de RPG
1 Professor da Escola Estadual Doutor Duarte Pimentel de Ulhôa, em Uberlândia/MG e mestrando do Programa de Pós-
Graduação em História Social da Universidade Federal de Uberlândia (PPG/Inhis-UFU).
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e que, na última década e meia, de forma intermitente, participei de diversas mesas, entrando em contato
com diversos sistemas e cenários; apesar disso, o RPG, em minha experiência pessoal, estava fortemente
apartado da vida profissional, sendo relegado a espaço circunscrito do lúdico, do prazeroso, do diletantismo,
do intimamente pessoal e, por oposição, do não público, não didático, não profissional. Tratava-se da
manutenção de um pensamento corrente entre os docentes, no qual o ensino de ordem escolar ainda é, em
certa medida, uma educação bancária, cuja realização é inerentemente vertical, hierarquizada, de trocas
desiguais, conteudista e, em última instância, árida. O lúdico, o divertido, o apreender fazendo ou simulando
só seria aceito como uma distensão controlada sob o olhar vigilante do professor, da coordenação
pedagógica e da diretoria da escola.
A escola na qual exerço a atividade docente - a Escola Estadual Doutor Duarte Pimentel de Ulhoa -
também não se apresenta como um ambiente favorável à experimentação de metodologias não
convencionais de ensino. Trata-se de uma escola de referência na cidade, tendo sido adotada como escola
modelo de educação no ciclo fundamental 1 pelo governo de Minas Gerais e, portanto, constantemente
sujeita a intervenções por parte da Superintendência Regional de Ensino (SRE). Esperava-se que isso a
tornaria mais receptiva à iniciativa individual dos professores em realizar projetos pedagógicos ou
implementar práticas diferenciadas de ensino, mas o que se percebe é o contrário. Sendo uma escola de
referência, a preocupação inicial é a de manter essa posição, que, por sua vez, beneficia a escola diretamente
através de verbas, fortalecendo-a em termos de negociação com os órgãos governamentais; tal postura,
entretanto, torna a instituição muito pouco afeita a correr riscos. Soma-se a isso que, não raro, é outorgado à
escola algum projeto governamental - em caráter experimental ou não - que pode, ao sabor dos
acontecimentos, alterar o planejamento anual dos docentes. Evidenciar a posição precária da escola (em
relação aos órgãos governamentais) é necessário, pois no decorrer desse relato, o leitor irá perceber como
isso influenciou na aplicação de jogos narrativos em sala de aula.
O curso compreende uma parte prática de aplicação e registro nas escolas, efetuado pelo professor
participante e por uma equipe do projeto, destinada a documentar a atividade. Um dos resultados previstos
da parte prática é esse relato de experiência em formato de artigo. Trata-se de um esforço de pesquisa sobre
ensino de história, metodologicamente definido e rigorosamente criterioso, a ser aplicado por uma série de
professores da rede pública nos diferentes anos iniciais e, eventualmente, por docentes no ensino superior,
com o objetivo de promover um arcabouço de experiências que suporte futuras teorizações assim como
estimular essa metodologia entre os professores participantes e instigá-los a pesquisarem (eles mesmos)
formas de melhorarem o ensino de história. Em reunião com o professor ministrante, Rafael Rocha, ficaram
decididos o tema a e metodologia que seriam trabalhados em sala de aula. Como enunciado anteriormente,
minha participação no curso foi subaproveitada devido a uma série de conflitos de agenda que me privaram
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das exposições de algumas das metodologias abordadas; dessa forma, o leque de opções a serem aplicadas
em sala de aula tornou-se bastante limitado. A metodologia escolhida foi o RPG tanto por minha experiência
prévia com essa modalidade de jogo narrativo quanto por ter sido uma das aulas em que estive presente e,
em consequência, por me sentir mais confiante em aplicá-la em sala de aula.Estando responsável por 6
turmas do 8º ano do ciclo Fundamental 1 - antiga 7ª série, perfazendo um cargo completo no Estado,
dispunha da vantagem de uma única matriz de conteúdo a ser aplicada em todas as turmas, respeitando as
particularidades de cada uma.
Como definido pelo Currículo Base Comum (CBC) de história, compreende apresentar aos alunos do
8º ano regular as revoluções liberais do século XVIII, temática essa escolhida para ser abordada na
atividade. A matéria escolhida dentro desse tópico foi Revolução Francesa e sua escolha foi motivada pelas
seguintes razões: 1- é uma matéria que suscita questionamentos e participação dos alunos, tanto por seu
alcance como pela carga simbólica e emocional nele presente; 2- possui um extenso arcabouço iconográfico
de fácil acesso na forma de filmes, imagens, quadrinhos e outros; 3- apresenta um protagonismo difuso, no
qual os “grandes nomes” podem ser subsumidos em um sujeito indeterminado que seja a “massa” ou estratos
da população; 4- facilita criar e trabalhar com personagens arquétipos; 5- instiga a pesquisa por parte dos
alunos e, por ser uma área densamente documentada, a chance de enfoques parecidos é menor.Algumas
dessas características não existiam no projeto inicial, mas surgiram no decorrer das conversas com o
ministrante, com as leituras realizadas e com o confronto entre a teoria e a minha própria vivência como
praticante de RPG. Uma das principais dificuldades estava em como adaptar o RPG de uma atividade para
poucos participantes para uma sala de aula com dezenas de alunos. Usualmente, no RGP sem finalidades
didáticas, cada jogador presente assume uma personagem e, através de uma série de elementos narrativos,
desenvolve personagens dentro de uma trama2. Sua estrutura básica é apresentada por Jackson Reis como:
O narrador expõe uma situação e diz aos ouvintes o que seus personagens
vêem e ouvem. Em seguida, os ouvintes descrevem o que seus personagens fazem
naquela situação e o narrador, então, diz qual o resultado das ações dos personagens
ouvintes [...] e assim por diante. A história vai sendo criada pelo narrador e pelos
ouvintes à medida que ela é contada e vivenciada como uma aventura (JACKSON;
REIS, 1999, p. 63).
Em uma mesa de RPG com até 10 participantes, o narrador consegue aplicar essa dinâmica a
personagens individuais sem grandes riscos de ter a narrativa comprometida ou de enfrentar grande
dispersão por parte dos jogadores. Mas como fazê-lo com 30-40 alunos? A alternativa apresentada pelo
ministrante foi não utilizar personagens individuais, mas, ao contrário, utilizar personagens coletivos. Essas
personagens seriam arquétipos adaptados à determinada situação como: “a multidão”, “os guardas”, os
“escravos”, os “nobres” e sua utilização é coletiva, partilhada pelos alunos. Cabe ao professor gerenciar essa
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utilização com intervenções pontuais, garantindo que não haja excluídos e que todos se sintam participantes
da experiência.
Essa é uma alternativa interessante, pois independe do número de alunos envolvidos, podendo ser
aplicada sem grande prejuízo - mesmo diante de um súbito esvaziamento da classe. Outro aspecto a ser
considerado é a promoção de um outro tipo de visão dos sujeitos históricos no qual o protagonismo não se
restringe às grandes figuras ainda presentes em muitos livros didáticos, mas se dissemina aos sujeitos
anônimos, partícipes silenciosos da história, mas nem sempre lembrados. A noção da atividade coletiva,
construída cotidianamente, é mais próxima da realidade dos alunos do que os grandes feitos. Em uma escola
central, desprovida de uma comunidade de bairro como é o caso da E.E Dr Duarte, a composição do público
costuma ser fortemente heterogênea, abarcando alunos tanto dos bairros mais abastados quanto dos mais
pobres. O critério de identificação deles com as personagens é difuso, favorecendo criações generalistas em
detrimento de particularidades acentuadas, mas igualmente permitindo uma multiplicidade muito grande de
aproximações diferentes a uma mesma personagem.
Via de regra, a individualidade de cada personagem na mesa de RPG é mediada por um sistema
quantificado de valores, a ficha de atributos. Essa quantificação é desnecessária em sala de aula e só serviria
para dificultar a interação dos alunos. As situações de conflito podem ser resolvidas com o auxílio de objetos
de probabilidade (dados, moedas, roletas, entre outros) que tanto afastam o fantasma da arbitrariedade do
mestre - o que romperia o elemento lúdico - quanto oferecem um elemento de tensão à narrativa, podendo
ser utilizado como uma forma de integrar determinados sujeitos dispersos ou de reestabelecer o fluxo da
narrativa.
Por fim, o RPG é um jogo de simulação e é nisso que reside sua maior força. Como praticante, já
conhecia a capacidade do jogo de criar cenários e situações, que provocavam alteridade, e já tinha entrado
em contato com vários cenários históricos que instigavam a pesquisar mais sobre o tema e a aplicar
efetivamente esses conhecimentos nas partidas, exercitando o pensamento histórico com uma preocupação
em evitar o anacronismo que raramente se vê em sala de aula. Para jogar, é necessário estabelecer um pacto
ficcional entre os participantes, no qual eles se despem de seus conhecimentos, de sua visão de terceira
pessoa, oferecem ao mestre o monopólio da posição de narrador onisciente e entram na brincadeira. Ao se
assumir como uma personagem, sua margem de manobra é diretamente proporcional aos seus
conhecimentos sobre ela e o sobre o cenário no qual ela está inserida. O jogador que não domina o cenário, a
personagem e a dinâmica acaba tateando durante a partida, descobrindo novas coisas e se tornando mais
confiante à medida que apreende.
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A partir das considerações expostas acima, percebi, como docente, dois momentos propícios para
aplicar a atividade em sala de aula - o início e o final de uma determinada temática. Se aplicada no início de
uma matéria nova, serve para testar os conhecimentos gerais dos alunos sobre determinado período histórico
e para já inteirá-los sobre algumas das principais questões abordadas e já fazer um chamamento para que os
alunos se interessem pelo assunto. No decorrer das aulas, o professor poderia sempre se remeter à aplicação,
pedindo aos alunos para relembraram aquilo que simularam e, à medida que o domínio sobre o tema se
ampliasse, perguntar a eles se manteriam determinadas atitudes que tomaram durante a partida ou se fariam
de forma diferente, ou porque tal personagem não jogador agiu de tal forma, ou se seria possível
determinado pensamento, ou ação no período estudado.
Se a aplicação acontecer ao final de um bloco temático, seu papel seria de fixar a matéria e promover
um diagnóstico do aproveitamento dos alunos. O professor pode criar cenários mais complexos e estimular
os alunos a abordarem diferentes pontos de vista ao mesmo tempo que pode colocá-los interagindo com
“grandes vultos” na forma de personagens controlados pelo narrador. Em ambos os casos, o RPG aparece
não como um parêntese na matéria, como muitas vezes são os filmes utilizados em sala, mas é integrado ao
planejamento pedagógico na forma de uma dinâmica, influenciando e sofrendo influência do conjunto geral
das aulas.
A escolha inicial foi aplicar a atividade no início do bloco temático sobre “Revoluções Liberais”
concomitante ao fim das aulas no curso de jogos narrativos; todavia, uma série de complicações levou a
adiar indefinidamente a aplicação, sendo que a essas complicações dedicarei alguns parágrafos.
Um dos objetivos programáticos do curso de jogos narrativos é a criação de um arcabouço de jogos a
serem adaptados e levados a escolas para que sirvam a outros professores que se interessem em aplicar jogos
narrativos em sala de aula. Para levar à frente, esse objetivo compreende a documentação das aplicações nas
escolas, sejam em vídeo, fotos, áudio ou por relatório (como é o caso desse), e qualquer tipo de
documentação em imagético está sujeito a uma série de termos legais que garantam que não será ferido o
direito de imagem dos alunos, do docente e da escola, assim como a justa utilização dessa documentação. O
primeiro problema que tive foi em relação a isso.
O curso disponibilizou aos professores um termo de compromisso a ser levado à escola e esse termo
foi passado à diretoria. Antes, a proposta foi levada à coordenação pedagógica que inicialmente a aprovou,
inclusive a aplicação e a possível documentação da mesma. Aproximadamente 1 mês depois, quando do fim
do período de aulas no curso e o início da fase prática, a coordenação pedagógica começou a criar
dificuldades para a execução da atividade. O motivo alegado é que me encontrava, pela análise da
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coordenação, atrasado na matéria e que não estava em posição de “desperdiçar uma aula” fazendo dinâmica
com os alunos.
Foi-me pedido que apresentasse um plano de aula detalhado para ser aprovado pela coordenação
pedagógica, antes que o termo fosse levado até a diretoria. Tal atitude não era completamente inesperada,
devido ao próprio funcionamento interno da escola, mas foi o primeiro movimento de uma longa opereta de
tons tragicômicos que envolveria a aplicação.
A aprovação do termo de compromisso era absolutamente necessária para a boa execução do projeto,
pois tratando-se de uma pesquisa, faz-se mister a documentação da experiência e sua posterior divulgação. O
bom cumprimento da função pública da aplicação compreendia duas etapas, isto é, uma permissão da escola
e uma permissão dos pais dos menores envolvidos. Esperava um processo fácil e dentro das possibilidades,
informal, pragmático e direto, mas o encontrado foi um longo processo burocrático que terminou
inconcluso, obrigando-me a uma radical reformulação dos planos e a uma execução muito abaixo das
expectativas.
Mesmo com o plano de aula aprovado previamente pela coordenação pedagógica, a diretoria
demandou uma cópia do mesmo para avaliação e aceitou receber o termo de compromisso; todavia, já
avisando que não permitiria que ele fosse repassado aos pais dos estudantes antes de prévia análise por parte
da superintendência regional de ensino. O envolvimento do SRE foi uma supresa, mas analisando o
retrospecto da escola, mais a situação particular dessa com os órgãos estatais de ensino, não foi de todo
inesperado.
Como uma escola modelo, há um cuidado muito grande em relação à imagem veiculada na
comunidade; imagem essa que, de uma forma ou de outra, é sempre mediada pelo corpo administrativo da
instituição, seja em reuniões com os pais3, em ações públicas e no trato com os do Estado. Em contrapartida,
há uma aproximação maior dos órgãos responsáveis pela gestão da educação no estado (nomeadamente o
SRE) que, de forma intermitente, envia fiscais à escola e fiscaliza os planejamentos, notas e controle de
disciplina de forma mais rigorosa em relação às outras escolas estaduais do município. Essa relação limita a
independência pedagógica da escola, seja por intervenção direta ou de forma significativamente mais
comum, através de uma espécie de autocensura, que atinge principalmente os professores designados, cujos
projetos e políticas pedagógicas não encontrariam continuidade nos anos seguintes.
Os trâmites burocráticos que envolvem a aprovação do termo são reconhecidamente demorados,
sendo que a própria diretora avisou que tomariam por volta de 15 dias úteis para emitir uma resposta, um
tempo de espera considerável. Diante desse empecilho, a aplicação que estava planejada para o início do
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bloco temático na última semana de Abril foi adiada para a 3ª semana de maio, período para o qual estava
planejado o fim da unidade temática. Isso obriga a uma mudança no enfoque e objetivo da atividade, como
explicado anteriormente, transferindo-a de uma dinâmica introdutória para um exercício de revisão e fixação
do conteúdo a ser aplicado uma semana antes das provas bimestrais.
À parte do planejamento e do aspecto técnico burocrático, cabia escolher se a atividade seria aplicada
de forma ampla e irrestrita a todas as seis turmas de 8º ano da escola ou se seria restrita a uma única turma,
aquela na qual seria documentada. A escolha inicial seria escolher uma turma cujos laços professor-aluno
fossem sólidos e que se mostraria mais receptiva à atividade. Por outro lado, os sucessos encontrados com o
método de aplicação de jogos narrativos, tanto os expostos na bibliográfica e aulas quanto os narrados em
primeira mão por outros colegas participantes do curso, instigavam o professor a aplicar a atividade - e
talvez até documentá-la - também em alguma das turmas consideradas mais “problemáticas”.
Todas essas preocupações seriam abandonadas no decorrer dos acontecimentos. Na 3ª semana de
maio, ainda sem respostas por parte da SER, a dinâmica normal da escola seria abalada pelo falecimento do
pai da diretora, que teve de se ausentar para cumprir o luto junto à família em outra cidade, desguarnecendo
a escola de sua liderança imediata por quase 2 semanas. Juntou-se a isso um afastamento temporário da vice-
diretora devido a problemas médicos e da coordenadora pedagógica devido a um curso promovido pela
superintendência - felizmente ocorrências em dias separados. Tais acontecimentos foram imediatamente
anteriores à semana de provas bimestrais, ocorrendo na semana convencionalmente utilizada para revisões e,
portanto, na semana em que planejava aplicar a atividade com os alunos.
Alienado do vínculo com a superintendência e tratado em regime de emergência, a aplicação passou
a correr real risco de não acontecer. Por convenção, não poderia ser aplicada durante a semana de provas,
pois poderia vir a atrapalhar as faixas de prova ou o rendimento dos alunos - que, supõe-se, utilizariam as
aulas dos professores para se preparam para as provas, não necessariamente da matéria ministrada; e a
semana posterior à prova seria utilizada para aplicação de provas e trabalhos de recuperação bimestral,
apresentando praticamente as mesmas dificuldades. A semana com maior possibilidade de sucesso na
aplicação seria justamente a 3ª semana de Maio, imediatamente anterior à semana de provas bimestrais, na
qual poderia ser utilizado como uma atividade de fixação e revisão do conteúdo, previamente ministrado e
contaria com ampla presença dos alunos.
Consultada a equipe do projeto, foi sugerido abandonar a pretensão de ter a aplicação documentada
em vídeo e apenas aplicá-la registrando as impressões obtidas em um relatório feito pelo docente. Restava
ainda o problema da execução. Foi escolhida uma turma de caráter intermediário, cujo rendimento
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acadêmico é considerado baixo, mas cuja relação com o docente é considerada boa, sendo uma turma
participativa e que apresenta um grau elevado de engajamento e iniciativa pessoal por parte dos alunos.
Por três vezes a aplicação foi marcada e desmarcada. Inicialmente, na 3ª semana de maio quando
fomos surpreendidos pela súbita ausência de grande parte do corpo administrativo da escola, impondo uma
sobrecarga de trabalho aos professores. Posteriormente, na 4ª semana, teve de ser desmarcada por coincidir
com as provas da 1ª fase da Olimpíada Brasileira de Matemática, aplicada a todos os alunos da escola.
Marcadas para o ocorrerem no 2º e 3º horários, foram transferidas para o 4º e 5º horários devido a aplicação
de uma prova bimestral no 3º horário. Adiada novamente para a 1ª semana de julho, não pode ser realizada
por coincidir com o festival de talentos.
Toda essa confusão com o calendário é devido a um caráter fortemente precário das atividades na
escola, a despeito de acordo prévio, que resultou em uma série de arranjos de última hora para viabilizarem a
realização das provas bimestrais de todos os professores e, ainda, oferecerem um tempo mínimo de correção
e fechamento das notas, assim como elaboração e aplicação das atividades de recuperação bimestral. Esses
arranjos forçaram a adaptação de uma série de atividades não relacionadas diretamente ao planejamento
individual dos professores, como a Olimpíada de Matemática e o Festival de Talentos.
Com a própria realização comprometida, fui forçado pelos acontecimentos a marcar a aplicação de
RPG na 2ª semana de junho, praticamente 1 mês depois do previsto e a última semana de aula antes das
férias. Realizada após o termino das provas de recuperação e do fechamento de nota, os professores não
podem executar nenhuma atividade avaliativa e são influenciados tanto pelos colegas quanto pela diretoria e
pelos alunos a não trabalharem a matéria, recorrendo a subterfúgios como filmes, dinâmicas recreativas – tal
como: liberar os alunos para educação física - ou revisões generalistas. Os alunos, já sabendo dessa
dinâmica, vivenciada em outros anos naquela ou em outras escolas, costumam faltar coletivamente, gerando
um esvaziamento muito grande das turmas.
Apesar do esvaziamento já esperado, propus-me a aplicar a atividade em cada uma das turmas, com
os alunos presentes, a partir do dia 9 de junho. Naquela data, apliquei a atividade em 3 turmas, os 8º anos -
1, 3 e 4, todas consideradas turmas de “fácil trato”. O cenário escolhido foi a Revolução Francesa, narrando
as desventuras de uma personagem coletiva, “a massa”, na figura de um pequeno grupo amorfo de umas 20-
30 pessoas que começariam sua jornada diante do palácio de Versalhes, como parte de uma multidão maior
de manifestantes, que atacados pela cavalaria real se dispersariam, expelindo na fuga o grupo de pessoas que
formariam a personagem jogável. Essa personagem seria acuada por um pequeno grupo de cavaleiros (2-4) e
esperava-se, se envolveria em combate com os mesmos. Após essa primeira situação de crise, seria através
de discurso narrativo direto do mestre ou por discurso narrativo indireto por parte de uma personagem não
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jogadora, controlada pelo mestre, foi proposto aos alunos voltarem ao palácio e reassumirem o cerco ao
lugar, onde, como resultado de uma série de estratagemas narrativos, eles seriam guiados para dentro do
palácio, confrontados por uma série de situações que serviriam de forma a mostrar o abismo social, jurídico
e comportamental entre as massas de trabalhadores e pobres urbanos e a nobreza aristocrática do período.
Por fim, como clímax da narrativa, os alunos, na figura da “massa”, seriam confrontados por um grupo de
nobres no qual está o próprio rei da França.
Essa “aventura” tem como objetivo explorar diversos aspectos do período: a vida cotidiana dos
trabalhadores e suas condições de vida; a situação socioeconômica da França revolucionária; as aspirações e
exigências heterogêneas dos revoltosos; o caráter fragmentário e não monolítico dos revolucionários, assim
como os principais discursos envolvidos; o processo civilizador aristocrático; o contraste social e econômico
entre os três estados na França; a força das construções simbólicas de nobreza, igreja e realeza durante o
Antigo Regime, dentre outras. Tudo isso seria apresentado aos alunos de forma lúdica, estimulando-os a
articularem os conhecimentos estudados em uma narrativa causal. Para auxiliar a narrativa, optei por não
utilizar nenhum elemento iconográfico ou sonoro, apenas a narração direta; contei com uma moeda como
objeto gerador de possibilidades, resolvendo as situações de tensão ou de ação através de jogadas de “cara
ou coroa”. A moeda, apesar de ser limitada como gerador de possibilidades aleatórias, possui um caráter
lúdico que atrai a atenção dos jogadores, mesmo quando eventualmente cai no chão e tem de ser procurada
pelos participantes.
A atividade foi programada para durar aproximadamente 40-45 minutos, o suficiente para uma aula,
dado o tempo inicial para arrumar a sala. Nos 2 dias de aplicação, ela foi executada 4 vezes; dessas, 3 podem
ser consideradas um sucesso e seguiram alguns elementos comuns que detalharei agora.
No dia 11 de julho, já havia um grande esvaziamento entre os alunos, sendo que a média de alunos
em cada turma era de por volta de 15 alunos. Esse esvaziamento, todavia, não significa um corte radical no
perfil dos alunos, mantendo uma amostragem representativa de cada classe. Havia alunos que esperavam
aula, alunos que estavam lá para jogar bola, alunos obrigados, alunos que estavam lá só para zoar, mas em
geral não se tinha o clima sério que marca as semanas usuais de aula. Esse ambiente, indubitavelmente
facilita a ludicidade presente na aplicação, mas é uma lâmina de 2 lados, pois, também, ameaça a seriedade
da atividade que pode ser tomada apenas como mais uma brincadeira e descartada pelos alunos sem nenhum
engajamento.
A primeira aplicação, feita com a turma 8-1, foi cercada de inexperiência, marcada por uma série de
improvisações que depois seriam incorporadas à narrativa com as outras turmas. Havia 14 alunos, desses,
dois alunos da 8-2 que haviam preferido ficar na atividade em vez de assistirem filme com o resto de sua
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turma. A atividade correu sem nenhuma interferência externa e com grande participação dos alunos que,
dispostos em semicírculo em volta do professor, podiam ser interpelados com facilidade. Cabe ressaltar que
já havia 2 alunas na sala que se declararam jogadoras regulares de RPG de mesa e cuja participação foi
significativamente mais ativa do que o restante dos alunos. Não consegui terminar a narrativa no decorrer de
1 aula, tendo chegado apenas à metade da narrativa.
Na segunda turma, no 8-3, com 22 alunos em sala (maior quorum dentre os oitavos anos), preferi
começar a atividade explicando-a, dizendo o que é RPG e o que estava propondo realizar com eles, fazendo
uma descrição mais longa e densa do cenário, de forma a evitar futuras perguntas redundantes dos alunos.
Nessa turma, já havia uma clara discrepância de interesse entre os alunos, sendo que alguns deles, esperando
que continuariam sem aula, reagiram mal desde o anúncio da atividade e recusaram-se, recorrentemente, a
participarem da atividade, mesmo sendo interpeladas várias vezes. Outro problema encontrado: constantes
tentativas dos alunos de dramatizarem certas passagens da narrativa, mesmo avisados de que isso tomaria
tempo útil da narrativa e comprometeria o andamento da história. Entre esses dois extremos de atitude, em
relação à atividade, criou-se uma grande dificuldade em gerir a participação comum, mas a atividade
desenrolou-se de forma relativamente suave.
A 3ª aplicação foi com a turma 8-4, com apenas 7 alunos e no último horário, mas, de forma
surpreendente, foi a turma que mais se envolveu e melhor participou da atividade. Cabe ressaltar que foram
interrompidos na janela por alunos de outras turmas que queriam conversar e, até mesmo, distribuirem
guaraná e bolo de uma festa de aniversário feita no dia, mas os alunos envolvidos na atividade os
dispensaram, eficiente e repetidamente, sem prejuízo algum à atividade.
No dia 12, com um número de alunos levemente inferior ao do dia 11, mas uma divisão interna
diferenciada, pois muitos dos alunos que vieram no dia anterior, esperando receberem aula, não retornaram
nesse dia. Outro contratempo observado foi a ausência de 3 professores atuantes no 8º ano que demandou
uma atitude por parte da vice-direção. A aplicação documentada, com a presença do professor ministrante
do curso de jogos narrativos, Rafael Correia, estava marcada para o 4º horário do dia 12, com a turma 8-2.
Durante o intervalo, a vice-direção decidiu resolver o problema da falta dos professores, unindo os
alunos presentes em duas salas, uma composta pelos 8º, 1 ao 3 e outra, do 4 ao 6. Cada uma dessas turmas
ficaria sob a responsabilidade de um professor, uma delas iria assistir a um filme e a outra iria ser submetida
à atividade de jogos narrativos. Diante de minhas críticas sobre a atitude tomada, argumentando que não
seria produtivo colocar na mesma turma alunos que já haviam feito a atividade e alunos que ainda não a
haviam feito e que, ademais, eu tinha feito um planejamento e me comprometido com ele, com uma entidade
externa (o curso) e não poderia alterar isso de última hora, foi-me respondido:
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“Você está só brincando com os alunos, não tem direito de reclamar e não vamos trocar suas turmas,
pois esses são os alunos mais complicados e você vai distraí-los para que eles não fiquem me perturbando
enquanto os meus alunos assistem filme.”
Resolvida a situação - não a meu favor - fiquei responsável por uma turma mista composta de,
aproximadamente, 35 alunos de pelo menos 4 turmas diferentes, muitos deles enviados especialmente para
não atrapalharem as atividades de outros professores. Dispondo de dois horários - aproximadamente uma
hora e meia de tempo útil - o primeiro problema encontrado foi que as salas de aula estavam trancadas, e a
funcionária responsável por abrir as salas não estava com a chave da sala que seria utilizada. Uma vez
resolvido essa situação e arregimentado os alunos, o professor ministrante aplicou a primeira mudança à
metodologia até então utilizada, fechando completamente a sala, janelas e portas, estabelecendo com os
alunos um acordo de que a nenhum deles seria facilitada a saída da sala para não atrapalhar a atividade.
Tentando explicar aos alunos o que seria realizado, houve uma segunda interferência, que o
ministrante disse que não deveria ser explicada aos alunos, pois a boa aplicação do jogo dependia da
manutenção de um pacto ficcional que funcionava melhor sem uma explicação inicial. Logo nesse início, já
percebíamos múltiplos focos de conversa, tanto entre colegas da mesma turma quanto de turmas diferentes,
e uma necessidade urgente de atrair a atenção dos alunos. O ministrante, tendo subido em uma cadeira e
teatralmente atraindo a atenção dos alunos, fez a introdução do cenário, devolvendo a narrativa à minha
pessoa. Esse tipo de dinâmica se repetiria várias vezes no decorrer da narrativa, quase sempre quando se
percebia dispersão por parte dos alunos.
Além dos múltiplos focos de conversa, outro dos principais problemas enfrentados foram constantes
intervenções externas na sala. Funcionários da escola vieram, várias vezes, durante a aplicação, para retirar
um ou outro aluno da sala para resolver questões administrativas ou passar algum recado. Alunos de outras
turmas vinham, regularmente, até a janela para tentar conversar com quem estava na sala e tinham de ser
dissuadidos de fazê-lo. O uso de celulares por parte dos alunos dentro de sala também foi um problema de
difícil trato, praticamente inexistente nas outras aplicações, fazendo com que vários alunos ficassem
constantemente pedindo para irem ao banheiro com objetivo de se encontrarem com alunos fora da aula e
atrapalhando a atividade.
Dentro de sala, cada uma dessas intervenções externas quebrava o pacto ficcional com os alunos e
aprofundava ainda mais o desinteresse dos alunos. No fim, as intervenções feitas pelas jogadas de ação,, e o
uso do dado mais estavam provocando situações de conflito do que reestabelecendo o ritmo da narrativa. Ao
final da atividade, muitos dos alunos já haviam se alienado completamente da aplicação, em especial aqueles
que já a haviam realizado em outras turmas. Dispondo de 2 horários para sua realização, quase não foi
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possível terminar a parte narrativa, e o balanço final da atividade não pôde ser realizado devido a uma
postura praticamente hostil do público. Todas essas situações levaram a creditar a aplicação como um
fracasso.
Vitimada por uma série de problemas extra-sala, realizada em condições precárias e até indesejáveis,
a aplicação não atingiu seu objetivo - a despeito dos esforços desse professor e do ministrante convidado –
que estava lá apenas para documentar, sem obrigação de se envolver na atividade. As outras aplicações
foram realizadas com condições diferentes, também adversas, mas obtiveram sucesso em suas propostas.
Cabe a necessidade premente de reaplicar a atividade em condições “normais”, dentro daquelas inicialmente
propostas no plano de aula.
Bibliografia:
REIS, Alessandro Viera dos. Módulo Básico FLER: Ferramenta lúdica de ensino por representação.
Florianópolis: Edição do autor, 2002.
ROCHA, Rafael Correia. Narrativa da imaginação: proposta pedagógica, metodologia role playing e
reflexões sobre educação. Uberlândia: [s.n.], 2014.
1 Professor da Escola Estadual Doutor Duarte Pimentel de Ulhoa, em Uberlândia/MG e mestrando do
Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal de Uberlândia (PPG/Inhis-UFU)
2 Pode-se também perceber o jogo como uma contação de histórias interativa, quantificada, episódica e
participativa, atribuída de personagens com características determinantes e um cenário com regras
prefixadas na resolução da interação entre os personagens (SCHMIT, 2008).
3 É fortemente desencorajado que um professor atenda qualquer responsável sem a presença de um membro
da administração, e há um forte incentivo sobre uma maneira adequada de tratar com os pais de forma a
preservar a imagem da escola sobre a imagem do corpo docente.
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Descrição sobre o jogo
A seguinte descrição se refere a um plano de aula aplicado a uma turma de ensino fundamental, mas
adaptável para aplicação em uma turma de ensino médio a critério do professor.
Fruto do curso de aplicação de jogos narrativos em ensino de história, ministrado pela ONG
Narrativa da Imaginação em parceria com a pesquisa da Fapemig “Cidade de Uberlândia: História regional e
local, aprendizagem e jogos narrativos”; esse projeto de atividade foi gestado no decorrer dos 4 meses de
curso e foi aplicado em campo na Escola Estadual Doutor Duarte Pimentel de Ulhôa.
Dentre os modelos disponíveis de jogos narrativos, foi escolhido o RPG devido a sua demanda baixa
de insumos materiais, limitado a um objeto gerador de probabilidades (dado, roleta, moeda, etc) e o grande
papel exercido pelo professor na figura do mestre do jogo - narrador, que facilita o controle da classe
durante a atividade, oferecendo estímulos ou coibindo atitudes à medida de sua necessidade. Isso se dá
devido à preponderância do elemento narrativo sobre todos os outros elementos presentes na atividade e a
narração, apesar de partilhada com os alunos, conflui sempre ao professor, nas palavras de Correia Rocha:
A plasticidade do elemento narrativo permite que o conteúdo seja conduzido de acordo com
as necessidades etárias e locais. Recursos como Data show, multimídia, objetos e
equipamentos são totalmente opcionais, podendo ser transformados ou resinificados. O
proposito desta ação serve para que o (a) educador (a) não mantenha dependência de nada
além dele mesmo, ele é o gestor do recurso infinito da imaginação. (ROCHA: 2012, p. 23)
Dessa maneira, o jogo, aqui apresentado, pressupõe apenas o uso de uma moeda - que pode ser
trocada por qualquer outro elemento de probabilidade - da voz e de imaginação; quaisquer outros objetos são
opcionais e podem ser utilizados pelo docente para incrementar a cena. É recomendado aplicar o jogo no
início do bloco temático que abarca a Revolução Francesa ou ao final dele. Se aplicado no início de uma
matéria nova, serve para testar os conhecimentos gerais dos alunos sobre determinado período histórico e
para já inteirá-los sobre algumas das principais questões abordadas. Se a aplicação acontecer ao final de um
bloco temático, seu papel será de fixar a matéria e promover um diagnóstico do aproveitamento dos alunos
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O jogo
Temática: Revolução Francesa
Objetivos: Explorar diversos aspectos do período tais como: a vida cotidiana dos trabalhadores e suas
condições de vida, a situação socioeconômica da França revolucionária, as aspirações e exigências
heterogêneas dos revoltosos, o caráter fragmentário e não monolítico dos revolucionários (assim como os
principais discursos envolvidos), o processo civilizador aristocrático, o contraste social e econômico entre os
três estados na França, a força das construções simbólicas de nobreza, igreja e realeza durante o Antigo
Regime.
Insumos: Um objeto gerador de probabilidade e a critério do professor: giz, imagens, som, data show, entre
outros.
Participantes: Uma sala de aula com até 50 alunos e 1 professor que exercerá o papel do mestre.
Duração: Uma aula, aproximadamente, 40-45 minutos
Quanto à preparação prévia, o professor deve possuir domínio da dinâmica de RPG, pois cabe a ele
manipular a narrativa, dando-lhe o tom, promovendo intervenções ou atuando através de personagens não
jogadores; portanto, não é recomendado aos professores que não possuam contato algum com RPG. Deve-se
levar em conta que o RPG, jogado cotidianamente, possui objetivos e metodologias diferentes daquele a ser
aplicado em sala de aula. No primeiro, seu objetivo é diversão e se encerra nisso; no segundo, é promover
aprendizado, aliando-o a metodologias lúdicas. O professor deve, também, compreender que, apesar do
improviso ser uma parte importante dentro do RPG, não deve nunca ser o elemento predominante em um
jogo didático. Ele deve se comportar como em uma aula normal, com uma estrutura definida e intervenções
pontuais que guiem a aula de volta a esse eixo.
Antes de realizar a atividade, pode ser avisado aos alunos, previamente, que haverá uma atividade
diferente, porque isso ajuda a quebrar, principalmente, a predisposição negativa de alguns deles sobre
atividades, pois a atividade com RPG, dificilmente, é avaliada em termos de pontos e cria uma expectativa
positiva em relação à aplicação.
22
A boa realização do jogo narrativo depende do estabelecimento de um pacto ficcional com os alunos,
no qual eles se despem de seus “eu reais” e assumem uma nova personagem, integrada a um cenário
projetado, submetem-se a uma vontade exterior na figura do mestre ao mesmo tempo que aceitam um papel
de sujeito ativo da narrativa, constituindo, em sua última instância, um jogo de simulação. Porém, esse pacto
ficcional é extremamente frágil, pois durante todo o processo de criação foi-nos ensinado que a realidade é a
instância dominante da vida, e a imaginação é secundária. Ademais, o próprio ambiente escolar é
historicamente constituído como um lugar hostil à imaginação, ao lúdico e ao prazeroso e os alunos, em
quase sua totalidade, foram expostos a essa escola árida, pragmática e racionalista.
O professor deve evitar, sobremaneira, intervenções externas durante a aplicação, pois elas rasgam o
tecido de fantasia duramente construído para a aplicação. Então, é mister avisar os outros professores e
funcionários para evitarem, o máximo possível, qualquer intervenção na classe, limitando-a a questões
emergenciais, assim como separar a classe em um microcosmo, fechando janelas e portas e isolando-a do
mundo exterior. Também é recomendado que o professor peça aos alunos que desliguem seus aparelhos
celulares, pois eles representam um link direto com o mundo exterior e, portanto, são indesejáveis durante a
atividade.
Não é recomendado que o professor explique a atividade aos alunos, pois se trata de um jogo que
valoriza muito a intuição e, à medida que os alunos se esforçam para compreender a dinâmica por si
mesmos, eles se envolvem com o cenário e com as personagens. O jogo, como uma piada ou um truque de
mágica, perde grande parte de seu encanto quando é explicado.
O jogo é dividido em 3 momentos que se remetem às estruturas mitológicas clássicas, condensadas
por Campbell no “mito do herói”:
Apresentação: Uma pessoa normal em um mundo comum até a chegada de um acontecimento inusitado
que conturba essa realidade pacata. Campbell (1988) denomina este acontecimento de “o chamado para a
aventura”, e o indivíduo se sente tentado a sair de seu cotidiano monótono.
O conflito - O indivíduo, agora definido por Campbell como herói, encontra-se com uma rica diversidade de
aliados, inimigos, mentores, testes, provações, desafios e adquire saberes importantes para seu
desenvolvimento pessoal.
A resolução - O herói vence a suprema provação, soluciona a fonte do desequilíbrio e retorna para seu
mundo.
23
Por se tratar de uma aula, ao final desses 3 movimentos, há um 4º que é integrar aquilo que foi
simulado com a matéria e articular as impressões dos alunos com os objetivos desejados pelo professor. Para
critério de praticidade, dividiremos a atividade em 4 partes, cada uma representando um dos movimentos
explicados anteriormente.
Apresentação
A primeira preocupação do professor - ao iniciar um jogo narrativo - é a contextualização da
aventura. Tem-se de definir, espacial e temporalmente, a zona de ação. No nosso caso, Paris, 1789, durante
os anos iniciais da Revolução Francesa. Só isso não é suficiente para promover a imersão dos alunos no
cenário; então, é necessário realizar uma descrição densa do ambiente.
“Paris era uma cidade mal planejada, as reformas urbanas recentes foram feitas por sobre a
cidade medieval, fora das poucas grandes avenidas temos uma série de ruelas com centenas
ou milhares de anos, de chão batido ou pedras mal ajeitadas, ladeadas por pequenas casas de
madeira ou alvenaria muito mal feita. A cidade, para a maioria das pessoas era feia. ”
O quão mais vasta e diversificada for a apresentação do cenário, maior a chance dos alunos se
envolverem com o cenário. Tente provocar neles diferentes sentidos do que apenas o da visão abstrata,
falando de cheiros, gostos, sensações táteis, construindo um sujeito sensível como personagem. Sobre a
personagem, é preferencial escolher uma personagem coletiva. Essas personagens seriam arquétipos
adaptados a determinadas situações, tais como: “a multidão”, “os guardas”, os “escravos”, os “nobres”, e sua
utilização é partilhada pelos alunos. Cabe ao professor gerenciar essa utilização com intervenções pontuais,
garantindo que não haja excluídos e que todos se sintam participantes da experiência.
Como personagem coletiva, escolhida para essa aventura, o “povo”. Um pequeno grupo amorfo de
30-40 pessoas, composto de gentes da classe trabalhadora. Após a apresentação do cenário, deve-se
apresentar a personagem com uma rápida fala sobre como é a vida dos trabalhadores franceses, a dura
carestia à qual estavam submetidos e os principais traços de sua mentalidade; novamente, fazendo-o com
cores vivas e um vasto aspecto sensível. O professor pode falar sobre as condições de higiene, de
alimentação, o pensamento religioso, a fragilidade do processo civilizador entre as massas, tomando o
cuidado de não tratá-los como uma unidade homogênea, mas como um grupo de pessoas diferentes, unidas
por objetivos similares e pontuais.
Toda essa parte de descrição deve ser feita de forma breve, sem tomar mais do que 3-5 minutos,
especialmente se os alunos já foram apresentados previamente ao período estudado. Se o professor se
demorar demais nessa parte, corre o risco de enfrentar dispersão antes mesmo de iniciar a partida.
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A personagem coletiva deve ser colocada em uma situação que rompa com o ordinário, dotando-a de
protagonismo. No nosso caso, a narrativa se inicia diante das portas do Palácio de Versalhes, onde o grupo
controlado pelos jogadores está protestando contra as medidas autoritárias e de austeridade, tomadas pela
coroa, junto a uma multidão significativamente maior de algumas centenas ou milhares de pessoas. A
situação de tensão que corresponde ao “chamado para aventura” se dá com a dispersão a força dessa
multidão devido a uma carga de cavalaria.
“1- Multidão protestando diante do palácio. 2- Personagem como parte dessa multidão. 3-
Os portões se abrem revelando a cavalaria real. 4- A cavalaria realiza uma carga sobre a
multidão com objetivo de dispersá-la. 5- A multidão começa a correr e o grupo representado
pelas personagens se desgarra do conjunto da multidão. ”
Esse ato inicial separa as personagens do conjunto da multidão, dotando-a de individualidade; o
próximo passo é dotá-la de protagonismo. Nessa hora, se o professor ainda não começou a utilizar o objeto
gerador de possibilidades aleatórias, ele deve começar a fazê-lo. Ofereça situações para os alunos tais como:
“jogue essa moeda, se cair cara, você percebe alguma coisa” ou “vocês perceberam uma ruela que oferece
uma saída fácil da avenida; o que vocês fazem? ”. Essas intervenções dotam a personagem de protagonismo
e ligam os alunos ao destino da personagem; agora, eles passam a se preocupar mais com ela, pois ela os
representa e dá-lhes posição ativa dentro da narrativa.
“1- A personagem percebe uma ruela que oferece saída do meio da multidão e promete
segurança em relação à carga de cavalaria. 2- Os jogadores são induzidos a escolherem se
encaminhar por aquela ruela. 3- A personagem percebe que está sendo perseguida por um
pequeno grupo de cavaleiros. 4- Ocorre algum acontecimento que cessa a perseguição;
alguém tropeça, os cavaleiros atiram, chegam em um beco sem saída. 5- A personagem é
confrontada com a possibilidade de reagir. 6- Embate com os cavaleiros. 7- Vitória da
personagem. 8- Confrontar a personagem sobre o que fazer depois. 9- Induzir os jogadores a
resolverem voltar ao palácio. ”
Conflito:
Passadas as desventuras iniciais, espera-se que os alunos já tenham domínio aceitável da dinâmica de
jogo, assim como já estejam emocionalmente ligados ao personagem e integrados ao pacto ficcional. Nessa
parte, podemos alterar o foco das cenas de ação para a interação entre personagens com o cenário, parte mais
rica do ponto de vista educacional. As jogadas não são mais focadas em embates físicos, mas em percepção,
algo que o aluno percebe, alguma informação que recebe e isso leva a questionamentos. Ele tem de
posicionar-se, ativamente, diante do ambiente à sua volta e perceber as sutilezas de suas ações, assim como
as consequências delas para o meio.
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A personagem retornaria aos portões de Versalhes, agora desguarnecidos, e o professor utilizaria o
elemento de probabilidade para decidir se algum aluno, relapso, disperso ou hiperativo percebe uma falha
nos portões. Uma vez caídos, há uma série de intervenções da parte do professor para instigar os alunos a
explorarem o local e, a partir disso, proceder com uma descrição densa sobre o estilo de vida da nobreza
francesa no Antigo Regime, as diferenças entre ele e o estilo de vida das massas trabalhadoras.
O clímax dessa parte se daria quando a personagem encontrasse no meio de sua exploração do
castelo, um grupo de nobres escondidos, dentre eles o próprio rei de França. Ai, os alunos seriam
interpelados por uma série de personagens não jogadores que promoveriam um amplo debate sobre a
situação da França.
“1- A personagem chega aos portões de Versalhes. 2- Os portões caem e a personagem
adentra o território do castelo. 3- Uma série de explorações no castelo. 4- Encontro com a
nobreza. 5- Climax”
Resolução:
Independente da ação tomada pelos alunos e levada a cabo pela personagem, ela encerra a parte narrativa do
jogo. A finalização da aula se dá com o levantamento da opinião dos alunos, o que eles perceberam de
importante e sobre o destino (o real e/ou o criado no cenário alternativo) da França após a Revolução
Francesa.
Bibliografia:
ROCHA, Rafael Correia. Narrativa da imaginação: proposta pedagógica, metodologia role playing e
reflexões sobre educação. Uberlândia: [s.n.], 2014.
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LARP no processo de aprendizagem em História
Priscilla Fagundes Brunelli2
Resumo
No presente relato busco explicitar minha experiência com a utilização do live action role play (LARP),
associado com cartas no processo de aprendizagem da Reforma Protestante no conteúdo de História em uma
turma do 7º ano do ensino fundamental, com o objetivo de promover a temática através da interpretação de
grupos envolvidos no contexto, de forma a promover um diálogo a partir dos conhecimentos e experiências
incorporados pelos alunos. Identifico, ainda, a partir da elaboração da proposta sugerida pelo Curso Play
Testing da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), uma mudança das minhas concepções sobre a
técnica adotada, o que possibilitou a percepção de um novo entendimento sobre jogos, fazendo com que eu
tivesse um novo olhar, também, para a minha prática enquanto professora de História.
Palavras-chave: LARP. Reforma Protestante. Ensino de História.
Introdução
O conceituar jogos tem sido um desafio, assim como sua compreensão e utilização na educação. É a
partir desta constatação que este relato de experiência procura demonstrar uma nova perspectiva e
percepções de jogos, voltados para o ensino de História.
Neste relato, busco descrever sobre o desenvolvimento de uma proposta de ensino para a temática da
Reforma Protestante no 7º ano, do ensino fundamental, na Escola Municipal Prof. Sérgio de Oliveira
Marquez, em Uberlândia, utilizando, como técnica de ensino, o live action roleplaying (LARP) ou em
português - interpretação de personagens ao vivo, associado a cartas, que tem como função caracterizar o
contexto estudado.
Nessa proposta, o objetivo geral foi promover a aprendizagem sobre a Reforma Protestante,
utilizando LARP com cartas; para tanto, foram traçados como objetivos específicos: interpretar membros de
classes e grupos sociais relevantes no contexto da Reforma Protestante; discutir a experiência como forma
2 Graduada em História pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); professora da E.M. Prof° Sergio Oliveira Marques
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de compreender as relações entre os grupos e seus interesses no contexto da Reforma Protestante, a partir
das ações incorporadas pelos participantes.
A utilização do LARP e das cartas se justifica enquanto possibilidade de trazer a experiência do jogo
de interpretação ao vivo para fornecer aos alunos condição de levar o estudo para além do livro didático, e
ser uma experiência a ser debatida a partir do experimentado, do vivido. Nessa perspectiva, não só o
conteúdo ganha significância, mas é fomentado o interesse para além da experiência do LARP, gerando uma
busca voluntária dos alunos pelo conteúdo estudado.
Foram traçadas como hipóteses nesse processo, a possibilidade de promover o aprendizado de forma
lúdica, levando em consideração o que o aluno traz de conhecimento e experiência para incorporar ao jogo,
de forma a criar uma maior empatia por parte dos alunos com o conteúdo trabalhado.
Revisão da Literatura
Ao refletir sobre a melhor metodologia no desenvolvimento do aprendizado de História, questões
inquietantes são companheiras no processo de escolha das técnicas e métodos mais adequados a cada
conteúdo e turma. Nessa perspectiva, compartilho o pensamento de Pinsky, que defende que:
O passado deve ser interrogado a partir de questões que nos inquietam no presente
(caso contrário, estudá-lo fica sem sentido). Portanto, as aulas de História serão
muito melhores se conseguirem estabelecer um duplo compromisso: com o passado
e o presente. (PINSKY, 2003, p.23)
A partir de Pinsky, tomo como papel do professor de História oportunizar aos alunos a aproximação
de sua realidade com o conteúdo trabalhado, de forma que o diálogo entre passado e presente promova
relevância em sua vida, favorecendo reflexões e posicionamentos quanto a situações no presente e futuro.
Respaldando esse pensamento, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), em suas orientações
didáticas gerais, afirmam que:
Para que os alunos dimensionem a sua realidade historicamente é importante que o
professor crie situações de aprendizagem escolares para instigá-los a estabelecer
relações entre o presente e o passado, o específico e o geral, as ações individuais e as
coletivas, os interesses específicos de grupos e os acordos coletivos, as
particularidades e os contextos, etc. (BRASIL,1997, P.53)
Norteada por esse direcionamento do ensino de História, a nova questão que se apresenta é a escolha
das melhores técnicas de ensino para atingir tal objetivo e ao conhecer um pouco mais sobre jogos como
roleplay games (RPG), LARP, jogos de cartas e tabuleiros, voltados à educação, pude perceber que, a partir
deles, poderia aumentar a relevância do estudo de História em um contexto em que a experiência dos alunos
fizesse papel fundamental.
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Ao participar do Curso Play Testing - Design de jogos para o ensino de História, oferecido pela
Universidade Federal de Uberlândia (UFU), fui confrontada com minhas definições sobre o uso do jogo na
educação por ser apresentada às possibilidades que não se engessavam em regras que fechavam as questões
e definiam caminhos estáticos a serem percorridos.
Convidada a conhecer um pouco mais sobre o LARP, fui apresentada a uma proposta de jogos que se
adequam à educação e que sugerem a utilização de regras como norteadoras do ambiente, relações e
conceitos necessários para desenvolver uma temática, mas que, antes de tudo, seja pensada e se organize
contando com o que os alunos incorporam de seu, através da sua imersão e interação no ambiente criado
para o jogo, de forma voluntária. Para tanto compreendo por LARP:
O LARP se aproxima muito do teatro, a diferença é que é todo feito de improviso e
baseado em conhecimentos sobre os personagens aos quais cada jogador ou grupos
estão inseridos. (...)A liberdade proporcionada pelo LARP, também permite que os
estudantes rompam com a barreira do pensamento adquirido e passem a refletir mais
sobre os problemas apresentados e vivenciados na simulação. (Ilustra&narrativa)
Apresentada a essa nova perspectiva de jogos, aproprio-me do conceito de Huizinga (2000) quando
delimita características essenciais para que compreendamos os jogos em seu caráter voluntário, porém
dotado de regras próprias que vigoram em uma esfera temporária. Nesse sentido, observo que:
(...)o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e
determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas,
mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de
um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da “vida
quotidiana”. (HUIZINGA, 19.., p.24)
Descrição do Objeto
Para esse relato, descrevo o objeto do meu estudo, que teve início com o Curso Play Testing,
oferecido pela UFU, que foi a experiência com o desenvolvimento da temática da Reforma Protestante em
uma sala de 7º ano, do ensino fundamental, na Escola Municipal Prof. Sérgio de Oliveira Marquez, em
Uberlândia, utilizando como técnica de ensino os jogos.
Após as orientações e aulas práticas sobre cada modalidade de jogos apresentados no Curso,
aproximei-me dos jogos de tabuleiros e cartas, por acreditar que poderiam oferecer um “ambiente seguro”
no desenvolvimento do conteúdo.
É importante, nesse momento, entender o que eu compreendia por um “ambiente seguro”. Desta
forma, descrevo que a prática dos jogos em minha sala de aula sempre me acompanhou, pois acredito que
desenvolver um ambiente lúdico, divertido e instigante é fundamental para promover o interesse do aluno.
Sendo assim, pensar em jogos era pensar em uma estrutura que poderia moldar todos os pontos que eu
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gostaria de fazer o aluno compreender do início ao fim do jogo; nessa estrutura, eu deveria delimitar e
pensar em todas as possibilidades que cercassem os conceitos e relações que seriam trabalhados para que
eles fossem passados aos alunos. Nessa perspectiva, eu fixava regras, pensava em objetivos a serem
alcançados e caminhos que deveriam ser percorridos.
Durante o processo de orientação para a elaboração do jogo a ser aplicado em sala de aula,
contemplar as perspectivas que o Curso ofereceu já não parecia algo fácil, pois batiam de frente com a
crença que eu tinha construído do “ambiente seguro”. No período de orientação e nos debates que se fizeram
durante e com a aplicação do jogo, a proposta era promover um território histórico que seria contemplado no
jogo, mas promovendo o aluno como agente de seu aprendizado, através das questões que ele próprio
poderia sugerir ao incorporar um personagem do período proposto.
Nesse contexto, o jogo de cartas e tabuleiros já não era uma opção que eu consegui desenvolver;
restou acatar a sugestão da utilização do LARP, associado com cartas e descontruir a ideia de controle, que
eu tinha com o “ambiente seguro”, experimentando ousar e observar os frutos desse trabalho.
O carácter livre no LARP ofereceu à minha proposta de aprendizagem a possibilidade de promover o
aluno enquanto agente ativo de seu processo de aprendizagem, uma vez que vinculou, à vivência do
ambiente da Reforma Protestante, elementos de sua experiência cotidiana, que puderam ser aproveitados em
um segundo momento no debate, de forma comparativa, no diálogo entre o passado e o presente.
Métodos
O caminho a ser percorrido nessa proposta baseia-se em uma metodologia ativa, em que o aluno
constrói seu próprio conhecimento a partir das experiências vivências em grupo. Com isso, o papel do
professor é de mediador e fomentador do aprendizado, aproveitando as experiências dos alunos para
promover o diálogo entre o presente o passado.
Para desenvolver essa proposta, tomei como técnica de aprendizagem a promoção do LARP,
associando-o com cartas, sendo que, através das cartas, os alunos foram divididos em 5 grupos que
representavam classes com interesses distintos, sendo: luteranos, católicos, povo, burguesia e nobreza. Cada
aluno recebeu uma carta que continha informações exclusivas sobre o grupo a que pertencia, oferecendo
uma ideia de seus interesses e dificuldades para obtê-los. Como cada carta continha uma característica
diferente, o primeiro passo seria conhecer as informações do próprio grupo, aumentando seu conhecimento
sobre a classe em que estava inserido.
O debate inicial entre os grupos ofereceu argumentos para que os alunos percebessem seus interesses
em comum, mas deu oportunidade a cada um deles para agir de forma individual quando em interação com
30
grupos diferentes. E, como as ações foram individuais, puderam trazer para a interpretação dos personagens
seus valores e concepções pessoais, ampliando a temática proposta.
O jogo foi desenvolvido a partir de um objetivo em comum entre luteranos e católicos, que seria
arrebanhar o maior número de fiéis, tentando convencê-los a voltarem a seus grupos religiosos. Dadas as
informações básicas através das cartas, a dinâmica do jogo se desenvolveu a partir das ações dos
participantes, que trouxeram para a interpretação argumentos ricos para a compreensão do processo da
Reforma Protestante, a partir das classes e grupos envolvidos.
O passo seguinte foi um debate a respeito da encenação feita pelos alunos e das questões que eles
levantaram durante o jogo. Nessa proposta, as questões vivenciadas nortearam a reflexão sobre a Reforma
Protestante no sentido de comparar o vivenciado com o que de fato aconteceu. Os participantes puderam dar
significado a sua encenação no momento em que se confrontaram com o que haviam feito e com o que, de
fato, aconteceu no contexto da Reforma e perceberam que o que eles propuseram se aproximava das atitudes
dos personagens reais e de seus grupos com o que a história oficial trazia.
Análises
A experiência com LARP e cartas no processo de aprendizagem, no ensino de História para o 7º ano,
se mostrou um recurso que atingiu as hipóteses propostas e foi além, uma vez que ampliou o debate a partir
de questões levantadas na encenação dos personagens e grupos pelos próprios alunos.
Com o debate, observei que muitas das questões levantadas foram feitas pelos alunos em função do
interesse que a encenação promoveu nos participantes. Ao dar relevância e contextualizar cada escolha que
fizeram no jogo, com o contexto da Reforma Protestante, os alunos deram ênfase a todas as experiências
vividas no jogo, como um processo de investigação, em que o livro didático e eu tomamos o papel de
mediador no processo de aprendizagem.
A atividade foi gratificante para os alunos que se sentiram ativos no processo de aprendizagem e
empolgados com a possibilidade de vivenciar o que, antes, só poderia ser entendido nas linhas do livro de
história.
Entender a História, a partir dos pontos levantados pelos alunos com a imersão promovida pelo jogo,
incentivou uma pesquisa voluntária por parte dos alunos que, nas aulas subsequentes, continuaram a fazer
questionamentos sobre o assunto trabalhado.
Enquanto professora, a experiência motivou uma análise crítica sobre minha prática e os usos de
técnicas de ensino para a História.
A partir da concepção de um jogo para o ensino da Reforma Protestante, estive em constante debate
sobre minhas escolhas. O período de orientação para a criação do jogo me fez observar que, em minha
prática, buscava estratégias capazes de promover a aprendizagem de forma lúdica, divertida, instigante, mas
31
não conseguia incorporar, em todos os recursos e temáticas, a experiência dos alunos, de modo a fazer delas
gatilhos para a compreensão do conteúdo.
O encontro com o LARP ofereceu condição para que eu pudesse ampliar minha compreensão sobre
jogos e ver a possibilidade de entendê-los fora de um formato engessado, controlado, com caminhos e
objetivos fechados.
Conclusão
Com o uso do LARP no processo de aprendizagem em História, pude dar novo significado ao
conceito e percepção dos jogos enquanto técnicas de ensino. Nessa nova perspectiva, os jogos podem
promover o aprendizado de forma divertida, crítica, com regras definidas, mas que estão longe de fornecer
um fim em si mesmos ou de estabelecer caminhos fechados para compreensão de um conteúdo.
Por outro lado, atendem à necessidade de tornar o conhecimento e experiência do aluno parte
integrante no desenvolvimento do aprendizado em História, em qualquer conteúdo trabalhado.
Referências
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: história, geografia.
Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1997.
Ilustr&narrativa, Linha de Pesquisa do Grupo Histórias Interativas do IAD-UFJF. Disponível em: <
http://historias.interativas.nom.br/ilustrenarrativa/?author=19> Acesso em 19 de julho de 2014.
HUIZINGA. Johan. Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura. Tradução de João Paulo Monteiro.
São Paulo: Perspectiva, 2000.
PINSKY, Jaime e PINSKY, Carla Bassanezi. O que e como ensinar: por uma história prazerosa e
consequente. In: KARNAL, Leandro (org.) História na sala de aula: conceitos, práticas e proposta. São
Paulo: Contexto, 2003.
.
32
Design de jogos educacionais para professores de História
Gabriella Tito3
Este trabalho faz parte da conclusão do curso de Play Testing, oferecido através da Universidade Federal de
Uberlândia. É de fundamental importância para o constante aprendizado e desenvolvimento dos educadores
iniciativas semelhantes, que instrumentalizem os profissionais para uma atuação mais em consonância com
as demandas da educação atual, e não são poucas. Por outro lado, se a aposta é em democratização da
educação e do ensino, as práticas educativas, também, devem ser democráticas e visar não só o aprendizado,
mas, também, o bem estar dos discentes. Neste aspecto, ferramentas que abordam o lúdico são vitais. Outro
ponto importante se refere ao bem estar do próprio educador poder usufruir de abordagens que também lhe
proporcionem bem estar, satisfação, alegria e aprofundamento das relações humanas com seus alunos,
também, tem que estar em pauta. No decorrer do curso, passamos por três períodos distintos; no primeiro,
vivenciamos diversos jogos educacionais, ou seja, jogamos. Em seguida, seguiu-se a fase de
desenvolvimento, em que, com orientação do professor Rafael Rocha, desenvolvemos nosso próprio jogo
para aplicar em sala de aula. Neste período, vários encontros de orientação foram necessários para discussão
do tema, do tipo de jogo a ser usado, das fontes e, também, das questões práticas: dia a ser aplicado, horário,
turma, etc. A última etapa destinou-se à aplicação do jogo em sala de aula e à escrita do relato da
experiência vivida em sala. O curso foi bastante rico e demonstrou, em inúmeras ocasiões, como se faz uso
dos jogos sem atingir o seu verdadeiro potencial; como poderia ser dito em inglês, há um
“misunderstanding” ou um mal entendimento no uso dos jogos. Na maioria das vezes, se usam jogos em que
o foco é apenas o conteúdo, e a experiência e a vivência de jogo ficam sublimadas. Os jogos ficam,
portanto, subexplorados, pois diversas modalidades de jogos podem ser trabalhadas com enfoques
diferentes, que visem um processo educacional e um formar-se sujeito enquanto joga. É a experiência
vivida, sentida e subjetivada que traz significado ao aprendizado, inclusive do conteúdo, e apesar dele. Tais
conclusões, no entanto, não foram facilmente atingidas, pois a própria vivência de jogos da maioria dos
professores não é tão profunda.
Ao passar pelo primeiro período do curso Play Testing, muitas indagações se passaram na minha mente:
serei capaz de desenvolver meu próprio jogo, conseguirei aplicá-lo na sala de aula, meus alunos irão
realmente se engajar na tarefa e atingir conhecimento? E, embora o período de vivência tenha sido
prazeroso, justamente por isso, uma expectativa a mais se criou: meus alunos irão se divertir tanto quanto
eu? A opção que pareceu ser a mais envolvente para os alunos, e também para mim, foi o desenvolvimento
3 Professora graduada em História e Educação Física pela Universidade Federal de Uberlândia, atuante na E.M. Dr. Gladson
Guerra de Resende.
33
de um Live Action Role Playing com cartas, pois ansiava por estabelecer um novo e diferente canal de
comunicação com os estudantes, um canal em que os tradicionais papéis, atribuídos a cada parte, pudesse ser
driblado e uma conexão mais profunda pudesse ser estabelecida e, consequentemente, um aprendizado mais
significativo pudesse ser alcançado, pois segundo Huizinga (1938): o jogo ultrapassa as dimensões físicas e
biológicas, ele é uma função significante. O Live Action Role playing é definido segundo Falcão (2012)
como um jogo de interpretar personagens, mas não para ser visto, mas para ser vivido. O desenrolar de um
jogo de Live Action Roleplaying se dá conforme os personagens vão se relacionando, não há um roteiro pré-
definido. Isso foi fundamental na escolha, pois um dos objetivos era justamente desenvolver novas relações
entre os sujeitos da sala de aula. Outro aspecto constituiu-se em despertar nos alunos a percepção que
adquirir conhecimento pode ser, e é prazeroso, e ainda pode ser feito de maneira encantadora. Neste sentido,
o curso Play Testing permitiu a apropriação do jogo como o veículo por excelência para tal fim, já que a
fascinação é a própria essência e característica primordial do jogo (Huizinga, 1938). A turma escolhida para
a aplicação foi um 7º ano da Escola Municipal Dr. Gladsen Guerra de Rezende, onde a maioria dos jovens
tem por volta de 12 anos. A Escola Gladsen é uma escola com aproximadamente 600 alunos; no período da
manhã, funciona o ensino de 5º ao 9º ano; no período da tarde, as séries iniciais e no período noturno, a EJA
(Educação de Jovens e Adultos). Localiza-se no bairro Canaã, foi fundada em 1997 e atende à população
desta região e do bairro Jardim Célia; ocasionalmente, atende ás crianças de outros bairros no entorno:
Jardim das Palmeiras, Jardim Vica, São Lucas, Santo Inácio, Santo Antônio, Bela Vista, Jardim Holanda,
Nova Uberlândia, Eldorado e Cidade Jardim. É uma escola que se propõe a uma gestão democrática e
participa de diversos projetos como PIBID, Mais Educação e ECA. A equipe pedagógica é coesa e procura
manter-se em constante aprimoramento. Não foi encontrada nenhuma resistência para aplicação do jogo;
muito pelo contrário, o apoio foi irrestrito. Os 5º e 6º anos estão no andar térreo, com recreio entre as
08h40min e as 08h55minh, e no segundo pavimento, encontram-se os 7º, 8º e 9º, com recreio entre as
09h30minh e as 09h50minh. Ministro aula em todos os 9º anos e apenas neste 7º ano, em que se deu a
atividade, que é o único no piso inferior. Vinha enfrentando certa dificuldade de comunicação com esta
turma, assim como professores de outras disciplinas; sua característica é de intensa agitação com alunos que
desestabilizam o ambiente, nem sempre de forma positiva. Ansiava por um meio de estabelecer uma relação
mais orgânica com a turma quando, em encontro de formação continuada no CEMEPE - Centro de Estudos
e Projetos Educacionais Julieta Diniz - (o centro de apoio ao professor da Prefeitura), recebemos a proposta
do curso. No decorrer dos primeiros encontros, ficou clara a possibilidade do jogo como o meio para este
fim, sendo o jogo uma evasão da vida real (Huizinga, 1938). Os jovens teriam uma oportunidade de
expressarem uma realidade diversa da sua própria e, assim, dar vazão a emoções e atitudes que nem sempre
podem na realidade objetiva, abrindo novos canais de interação entre todos. O tema abordado foi
Renascimento Cultural europeu no século XV. Do ponto de vista do conteúdo, a meta era que os alunos
entendessem e vivenciassem os conflitos vividos pelos artistas do período que encontravam-se entre as
34
pressões da Igreja Católica, da nobreza absolutista e da emergente burguesia da época. Um dos pontos era
que eles percebessem o jogo de poder e de interesses que envolvia cada grupo e o importante papel dos
artistas, considerando a influência e a inserção que estes alcançavam na sociedade. Por outro lado, a
experiência do jogo poderia possibilitar uma alteração na dinâmica de poder da própria sala, fazendo com
que os alunos experimentassem papéis de influência diversos daqueles exercidos por eles costumeiramente
e, assim, expressar uma subjetividade, às vezes, impossível dentro da realidade comum. E assim foi: alunos
tímidos e introvertidos se tornaram grandes oradores e advogados no momento do jogo, outros
experimentaram indecisão, outros o respeito, alguns exerceram domínio sobre outros, e estes se sujeitaram,
ou seja, a sala de aula se tornou o território mágico; nossas relações ordinárias ficaram temporariamente
suspensas, não havia professor e alunos, mas artistas, burgueses, padres, inquisidores, cientistas, nobres, etc.
No dia da aplicação, a turma de aproximadamente 30 alunos (cerca de metade de meninas e meninos) foi
dividida em três grupos: a Igreja, os Mecenas e os Artistas. Cada grupo constituiu-se segundo uma
distribuição aleatória das cartas confeccionadas para o jogo. Da categoria Igreja, foram distribuídas as
seguintes cartas: duas de Cardeais, uma de Monge Copista, uma da Inquisição, uma de Inquisidores, uma de
Jesuítas, uma de Monges, uma de Padres e uma de Papa. Da categoria Mecenas, foram distribuídas as cartas:
um Banqueiro, Cosme de Médici, Francisco I, Galeazzo Maria Sforza, um Jovem Burguês, Lourenço de
Médici, duas de Mercador, uma Dama Viúva, uma Mulher Burguesa. Da categoria Artistas: Sandro
Botticelli, Miguel de Cervantes, Cristóvão Colombo, Dante Alighieri, Donatello, Galileu Galilei, Johannes
Gutenberg, Leonardo da Vinci, Michelangelo, Rafael, William Shakespeare. E, finalmente, uma carta sem
categoria, a Rainha Isabel de York. A Rainha desempenhou a função, dentro da narrativa, de convocar a
assembleia entre estes três grupos e determinar que cada artista optasse por pertencer a um dos outros dois
grupos, o dos Mecenas ou o da Igreja. Cada um destes deveria apresentar argumentos que convencessem o
artista a optar por ele. O argumento da Rainha, para a convocação da assembleia, era de que a indecisão dos
artistas entre as classes estava tumultuando o reinado e causando mal estar na corte. Durante a fase de
desenvolvimento, ficou claro que este personagem deveria representar a Inglaterra, uma das maiores
potências da época e com uma relação peculiar com a Igreja. Eu assumi este papel para melhor me encaixar
na vivência do jogo e ajudar no encantamento dos alunos; estilizei um figurino que se compôs de um vestido
longo, um cetro de brinquedo e uma coroa confeccionada por mim mesma. O professor Rafael Rocha, que
me auxiliou na aplicação, atuou como O Espírito Santo, “soprando” inspiração e dicas a quem necessitasse.
As carteiras foram separadas formando duas bancadas, uma de cada lado da sala e deixando um espaço livre
no meio para os Artistas. A cadeira da Rainha, no ponto central, voltada para todos os grupos.
Nas aulas iniciais, em que vivenciamos principalmente os jogos de Roleplaying Game e Live Action
Roleplaying, foi necessário sair de uma certa zona de conforto; a partir do momento em que se atravessou a
fronteira do espaço e tempo do jogo, naturalmente, houve um desligamento da realidade objetiva.
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Erroneamente, receei que os alunos, também, enfrentassem certo desconforto inicial; porém, ao contrário de
adultos, eles facilmente atravessaram a fronteira do cotidiano para a realidade mágica do jogo. O jogo foi
aplicado no terceiro horário que é logo após o recreio da sala e os alunos foram avisados com antecedência
que haveria um jogo naquele dia. Normalmente, eles não retornam prontamente ao bater o sinal; no entanto,
todos estavam aguardando na porta da sala antes do término do intervalo, deixando claro a força do aspecto
lúdico, contido nos jogos, e o quanto as atividades corriqueiras do aprendizado estão negligenciando este
aspecto. O que ocorreu a seguir foi surpreendente, pois, à medida que cada lado ia argumentando, a
discussão ia se tornando mais e mais inflamada e alunos de todos os grupos se manifestaram com
veemência, defendendo seus argumentos como se disso dependessem suas vidas. Os Artistas, ao se
decidirem por um dos lados, começavam a tentar convencer os outros artistas a se juntarem a eles. A
balbúrdia foi total, porém nenhum deles quebrou a regra estabelecida ou se comportou como “desmancha
prazeres” (Huizinga, 1938); todos viveram o jogo do seu início ao seu fim. Apenas um aluno resistiu no
início, mas, ao ver o entusiasmo dos colegas, acabou por se envolver na atividade. Alguns não abriram mão
de jogar, mas deram suas cartas a outros jogadores para que estes os representassem. Outro ponto a ser
discutido, e que foi observado, é a questão corporal. Os alunos, durante a narrativa, não puderam se conter
às suas bancadas, sentindo uma grande necessidade de utilizarem o corpo como forma de expressão. Ora, a
tradição ocidental, durante muito tempo, cindiu a educação entre mente e corpo, conferindo à razão lugar de
destaque, ou seja, postulando como argumenta Bracht (1999), a superioridade da esfera mental ou
intelectual, reduzindo a dimensão humana à racionalidade apenas, e, apesar de todas as mudanças nas teorias
e práticas educacionais, a estrutura escolar permanece na esfera do tempo de longa duração e muito de uma
mentalidade estagnada se percebe em relação à percepção e liberdade do corpo. Tal estrutura ainda favorece
uma sala de aula e uma prática pedagógica que engessam o corpo e associam a liberação deste com a
indisciplina e educar o corpo é, neste sentido, educar o comportamento. O corpo, no entanto, pode e deve
exercer um potencial subversivo e emancipatório. O movimento humano não só é veículo de aprendizagem
como também de comunicação. Através do entendimento da construção histórica da cultura corporal, o
educador pode desenvolver uma visão crítica da noção de corpo, de suas implicações e influências na cultura
escolar e, assim, contribuir para integrar este corpo no processo educacional. O jogo pode, também nesta
esfera, dar sua contribuição, especialmente o Live Roleplaying em que se joga com o corpo (Falcão, 2012).
A experiência foi extremamente liberadora neste ponto, pois a Rainha não tinha necessidade e nem
obrigação de conter seus súditos sentados nas carteiras e falando baixo. E artistas, burgueses e religiosos em
“guerra” também não precisavam conter-se em seus lugares e podiam esbravejar à vontade dentro dos
limites da civilidade. Uma única regra foi imposta no jogo: todos deveriam calar-se no momento preciso em
que a Rainha levantasse, manobra para aplacar os momentos mais explosivos, recurso que funcionou
relativamente bem. A liberação do corpo aliviou diversas tensões que pairavam sobre a turma, considerada
como uma das mais difíceis da escola. Ao encerrar-se do jogo, os alunos estavam muito entusiasmados e
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pediram se poderiam desenvolver uma peça de teatro sobre o Renascimento. A peça já está sendo escrita por
eles e a previsão é que seja encenada no segundo semestre deste ano. Equilibrar a educação, o formato e a
estrutura da escola, com o aprendizado efetivo e significativo, tem sido o desafio de muitos educadores.
Formar cidadãos, utilizar novas tecnologias, contemplar o conteúdo, alinhar-se a projetos e políticas
públicas, atender às necessidades do aluno contemporâneo, tudo isso esbarrando em falta de recursos ou
recursos obsoletos, problemas sociais terríveis que adentram o cotidiano e o espaço escolar, sem contar a
desvalorização da educação e dos seus profissionais, tem sido e é, ao que parece, tarefa Hercúlea. Neste
sentido, introduzir ou reintroduzir o lúdico no ensino tem se mostrado uma das saídas viáveis e, talvez, a
mais ao alcance do educador para lidar, ao menos em parte, com todas estas questões. O uso mais frequente
dos jogos pode mudar radicalmente as relações na sala de aula, já que permite vivências mais dialéticas com
o conteúdo e entre os participantes das aulas, incluindo-se obviamente o professor.
O jogo educacional cumpre aqui papel duplo, traz o aspecto lúdico com todas as suas implicações e, ainda,
permite que sejam trabalhados o conteúdo e a formação do sujeito. O desejo dos alunos em desenvolver a
peça de teatro, a partir do jogo, denota como inúmeros desdobramentos podem advir da utilização da
pesquisa-jogo pelo professor. Estes desdobramentos podem, inclusive, introduzir o aluno no caminho da
pesquisa. Portanto, passar por todas estas etapas, vivenciar, desenvolver, aplicar e relatar a pesquisa-jogo
demonstrou o grande valor e potencial desta metodologia e a importância do lúdico na experiência escolar
tanto dos alunos quanto dos professores. Por outro lado, levantou outras questões como a abordagem da
questão corporal e das relações estabelecidas dentro do contexto da escola e da sala de aula. Muito mais
pode surgir do uso regular dos jogos educacionais e, daí, uma mudança das relações aluno/aluno e
professor/aluno; cabe-nos a coragem para tal.
REFERÊNCIAS
PROJETO ARARIBÁ: História / organizadora Editora Moderna; obra coletiva concebida, desenvolvida e
produzida pela Editora Moderna; editora responsável Maria Raquel Apolinário. – 3 ed. – São Paulo:
Moderna, 2010.
BRACHT, Valter. A Constituição das teorias pedagógicas da educação física. Cadernos Cedes, ano XIX,
nº 48, Agosto/99.
BOULOS JUNIOR, Alfredo. História, Sociedade & Cidadania 7º Ano. FTD Editora,
FALCÃO, Luiz. Live! Live Action Roleplaying: Um Guia Prático para Larp. Núcleo de Pesquisa em
Live Action Roleplay Boi Voador, VAI: Valorização de Iniciativas Culturais, Prefeitura de São Paulo:
secretaria de cultura, 2012.
37
HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. Coleção Estudos. São Paulo: Editora Perspectiva: 2000.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23. ed. rev. e atual. São Paulo:
Cortez, 2007
PT-br.facebook.com/Escola Municipal Dr Gladsen Guerra de Rezende
www.mtgcardmaker.com Acesso em 15/05/2014
www.wikipedia.com Acesso em 15/05/2014
O jogo: Código Cinquecento
DESCRIÇÃO
O jogo é um Live Action Role playing e foi desenvolvido abordando o conteúdo do Renascimento Cultural
Europeu do Século XIV; é destinado ao 7º ano do ensino fundamental. Foi pensado para 31 jogadores e
utiliza 31 cartas, divididas em três categorias: Igreja, Mecenas e Artistas. Na categoria Igreja, são 9 cartas:
duas de Cardeais, uma de Monge Copista, uma da Inquisição, uma de Inquisidores, uma de Jesuítas, uma de
Monges, uma de Padres e uma de Papa. Nos Mecenas, são 10 cartas: um Banqueiro, Cosme de Médici,
Francisco I, Galeazzo Maria Sforza, um Jovem Burguês, Lourenço de Médici, duas de Mercador, uma Dama
Viúva, uma Mulher Burguesa. Na ordem Artistas, são 11 cartas: Sandro Botticelli, Miguel de Cervantes,
Cristóvão Colombo, Dante Alighieri, Donatello, Galileu Galilei, Johannes Gutenberg, Leonardo da Vinci,
Michelangelo, Rafael, William Shakespeare. E uma carta sem categoria, a Rainha Isabel de York.
JUSTIFICATIVA
O jogo foi pensado, levando-se em conta o período do ano, segundo bimestre, de acordo com planejamento
escolar anual. Porém, este não foi o fator determinante. O tema do Renascimento traz imensa riqueza, pois
trata-se não apenas de um movimento cultural, mas de todo o redimensionamento da sociedade europeia da
época em seus diversos aspectos: econômicos, religiosos, políticos, psicossociais, filosóficos e culturais.
Tais transformações causaram imenso impacto no modo de vida ocidental e, por consequência, nos
continentes Americanos, contatados neste mesmo período. Dentro deste contexto, coube ressaltar as relações
passado-presente e as implicações destas transformações no mundo contemporâneo. Por outro lado, pode ser
traçado um paralelo entre as tensões sociais do período e as tensões que envolvem os componentes da sala
de aula. Dentro da suspensão temporária das relações costumeiras entre professor e aluno e dos alunos com
os próprios alunos, proporcionada pelo jogo, podem ser estabelecidas novas formas de relacionamento e de
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expressão de subjetividades, sublimadas no comportamento ordinário. O jogo - como componente da vida e
aspecto lúdico do comportamento humano - é essencial ao bem estar dos discentes e, também, dos docentes
numa possibilidade de revitalização do espaço escolar.
OBJETIVOS
GERAL
Possibilitar aos alunos vivenciar um momento de ludicidade, de descontração e de alegria, em que o
aprendizado do conteúdo proporcionasse um aprendizado significativo e referenciado na subjetividade e em
relação com sua própria realidade.
ESPECÍFICOS
Entender as intensas transformações no decorrer dos séculos XIV, XV e XVI.
Entender as tensões, jogos de interesses e disputas pelo poder entre os diversos grupos sociais do
período: Igreja, burguesia, nobreza e pessoas comuns.
Vivenciar momentos de alegria e descontração em sala de aula.
Perceber o aprendizado de forma prazerosa.
Expressar outras possibilidades de subjetividade.
METODOLOGIA
As cartas devem ser distribuídas aleatoriamente; em seguida, os grupos se reúnem segundo sua categoria. A
Rainha não pertence a nenhuma delas; ela será o personagem que convoca uma assembleia entre a Igreja, os
Mecenas e os Artistas para mediar os conflitos da corte. A sala deve ser organizada em três bancadas ou três
espaços, um para cada grupo. Em cada carta, há argumentos ou missões; o papel da Igreja é o de convencer
os Artistas a estarem exclusivamente aos seus serviços e, para tal, as cartas contêm argumentos como
promessa de salvação, proteção, etc. Os alunos devem falar abertamente aos artistas e podem, também,
refutar os argumentos do grupo adversário. Os Mecenas, por sua vez, farão o mesmo, expondo seus
argumentos: financiamento, liberdade de criação, etc. Os Artistas podem entrar no debate, fazer indagações,
propor alianças; têm total liberdade e, então, devem optar por um dos lados e irem para a categoria de sua
escolha. Uma vez escolhido o lado, ele pode ajudar seu grupo. O jogo termina quando todos os artistas se
decidirem. Há apenas uma regra formal: quando a Rainha se levanta, todos devem parar imediatamente de
falar e prestar atenção em suas considerações e ordenamentos. A utilização de figurino fica à livre escolha
da sala e do professor.
CUSTOS
O custo do jogo é a impressão e plastificação das cartas. Caso se opte pelo uso de figurino, então haverá as
despesas com este; no entanto, pode ser confeccionado com materiais alternativos de acordo com as
possibilidades dos jogadores ou da instituição.
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REFERÊNCIAS
BOULOS JÚNIOR, Alfredo. História, sociedade & cidadania. Edição Reformulada 7º ano / Alfredo Boulos
Júnior. - 2 ed. - São Paulo: FTD, 2012.
PROJETO ARARIBÁ: História / organizadora Editora Moderna; obra coletiva concebida, desenvolvida e
produzida pela Editora Moderna; editora responsável Maria Raquel Apolinário. - 3 ed. - São Paulo:
Moderna, 2010.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Cortez,
2007
www.mtgcardmaker.com Acesso em 15/05/2014
49
Role Playing em sala de aula
Maria Helena Raimundo4
Resumo
Este trabalho é uma narrativa das experiências vividas e relatadas durante o curso Play Testing,
realizado pelo professor Rafael Correia Rocha da Universidade Federal de Uberlândia, em que se discutiu
sobre a importância do lúdico no processo de ensino e aprendizagem. O homem é um indivíduo propenso à
felicidade; por isso mesmo, as brincadeiras e o jogo fazem parte dele desde sempre. É na infância e na
adolescência que os jogos são mais significativos e, portanto, é deste lugar, do lugar da ludicidade que deve
ocorrer o aprendizado. Mas o lúdico deve envolver, também, os professores; reaprender a brincar deve ser o
pontapé inicial para que o LARP possa ser utilizado como um instrumento de ressignificação do saber e da
própria vida.
Palavras chaves - lúdico, jogos narrativos, cardgames, LARP, aprender.
Ao longo de cerca de vinte e cinco anos de efetivo exercício do magistério, participei e observei
professores buscando alternativas que tornassem suas aulas mais agradáveis em função de uma série de
críticas da sociedade como um todo. Pais, alunos, outros profissionais da escola e fora dela, a mídia
principalmente, colocavam nos professores a responsabilidade pelo mau desempenho dos estudantes em
provas oficiais, que indicam índices de aprendizagem.
É preciso dizer que, embora o espaço de tempo seja curto, muitas coisas mudaram nas relações
escolares ao longo destes vinte e cinco anos e acredito essencial falarmos um tanto disto antes de entrar no
assunto jogos.
Por relações escolares, aqui, falo das relações entre professor/aluno (cuja importância está no topo
das preocupações de estudiosos em geral), falo das relações entre professor, aluno e família do aluno; falo
das relações entre aluno/ gestor; aluno/pedagogos e professor, gestor e pedagogos. O espaço escolar não se
4 Graduada em História pela Universidade Federal de Uberlândia, Professora nas redes municipal, estadual e particular de ensino.
Atividade realizada na E.E. Messias Pedreiro.
50
limita simplesmente às relações entre o professor e o aluno, mas a toda uma conjuntura, a um sistema
escolar em que o aluno é o começo e o fim de tudo.
Poderíamos listar uma gama de problemas nas relações de “ensino e aprendizagem”, que foram
estudados ao longo dos anos (neste caso não só dos últimos vinte e cinco) por pedagogos, psicólogos,
antropólogos entre outros, com vistas a melhorar a educação. Também foi criada uma série de teorias, falas,
sistemas e outros “ismos”, com a mesma finalidade; eu disse finalidade - encontrar um sistema educacional
que funcione. Em todos eles, o papel principal era o do professor!!!! Portanto, se as coisas não
funcionassem, e claro, a maioria não funcionou, a culpa também era do professor.
Importante ressaltar que poucos destes estudos foram feitos por professores com vivência em turmas
de alunos de ensino fundamental e médio, mas grande parte deles criou professores culpados.
Há que se considerar que todas as teorias educacionais, propostas por estudiosos renomados, com
exceção talvez do construtivismo5, teoria que parte dos questionamentos dos próprios alunos, deixaram de
considerar a historicidade das relações pessoais que estão acima, inclusive, das relações entre professores,
alunos e demais membros da comunidade escolar.
Considerar a historicidade das relações pessoais significa entender que tudo muda, que as relações,
também, são dinâmicas e que os problemas da escola continuarão existindo enquanto houver sujeito nessas
relações. Atualmente, o maior problema enfrentado pela escola em geral, e pelo professor de História em
particular, é a efemeridade dos fatos, o presentismo. Eric Hobsbawn em “Sobre a História” dizia que, "quase
todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o
passado público da época em que vivem."(2001) causado talvez, e não estou certa disto, pela tecnologia.
É claro que, muitas vezes, este e outros problemas, inclusive os familiares recaíram sobre a forma
com que o professor lida com seu aluno e não com o seu conteúdo. O professor não é o único culpado pelos
problemas da educação, mas parte ativa das relações sociais nas quais tanto ele quanto seu aluno estão
inseridos.
Entender que o professor, enquanto parte ativa das relações escolares, era responsável por uma aula
“feliz”, fez dele um pesquisador de ações que favorecessem a construção de metodologias que tornassem
isto uma realidade. Mas, muitas vezes, as metodologias que nos parecem boas, não o são para os estudantes
e, consequentemente, acabam se tornando um terror para nossas experiências pessoais. Os jogos pareciam
uma boa opção. E foram.
5 "Construtivismo significa isto: a ideia de que nada, a rigor, está pronto, acabado, e de que, especificamente, o conhecimento não
é dado, em nenhuma instância, como algo terminado. Ele se constitui pela interação do indivíduo com o meio físico e social, com
o simbolismo humano, com o mundo das relações sociais; e se constitui por força de sua ação e não por qualquer dotação prévia,
na bagagem hereditária ou no meio, de tal modo que podemos afirmar que antes da ação não há psiquismo nem consciência e,
muito menos, pensamento." http://www.crmariocovas.sp.gov.br/dea_a.php?t=011 Sobre Construtivismo ler ainda: CELESTIN
FREINET (1986 - 1966): Uma Escola Ativa e Cooperativa
PAULO FREIRE (1921 - 1977): Uma Escola Cidadã; JEAN PIAGET (1986 - 1980): Uma Escola Cognitiva; EMILIA
FERREIRO (1936 - ): Uma Escola de Vanguarda; LEV VYGOTSKY (1898 - 1934): Uma Escola Sócio Interacionista;
HOWARD GARDNER (1945 - ): Uma Escola que Valoriza o Ser
51
Os jogos de tabuleiro do tipo ludo ou trilhas são ótimos para a revisão de conteúdos. Os jogos de
raciocínio ou de lógicas também resolvem bastante a dificuldade de pensar o tempo e o espaço histórico
estudados. Ambos satisfazem a escola e o professor. Os alunos são capazes de realizar o jogo, revisar o
conteúdo sem atrapalhar a dinâmica da escola, isto é, sem barulho, sem bagunça. Mas faltava a interação de
fato com o conteúdo. Os jogos propostos não eram capazes de fazer com que o passado (objeto das aulas de
História) fizesse sentido! Era preciso fazer com que os alunos mergulhassem no tempo histórico desejado.
Quando surgiu a proposta do curso sobre os jogos narrativos, fiquei bem animada!!! Seria uma alternativa
possível!!!
Do jogo da Teoria
Durante conversa corriqueira com uma amiga psicóloga, surgiu a seguinte frase: a vida, na verdade,
é um jogo, uma forma de superarmos as frustrações, as decepções e continuarmos seguindo em frente.
Falávamos de como algumas pessoas conseguem manter relações violentas dentro de suas próprias casas.
Ouvindo mais um pouquinho, entendi que ela quis dizer que, ao longo da vida, as pessoas desenvolvem
formas de jogar entre si, que tornam a vida possível de ser vivida, apesar dos problemas marcantes que
surgem ao longo desta jornada. Ao procurar os teóricos do RPG, encontrei várias falas diferenciadas, mas
nenhuma que expressasse tão bem a fala da minha amiga psicóloga, quanto a de J Huizinga no prefácio de
Homo Ludens:
Seria mais ou menos óbvio, mas também um pouco fácil, considerar "jogo" toda e
qualquer atividade humana. Aqueles que preferirem contentar-se com uma
conclusão metafísica deste gênero farão melhor não lerem este livro. Não vejo,
todavia, razão alguma para abandonar a noção de jogo como um fator distinto e
fundamental, presente em tudo o que acontece no mundo. Já há muitos anos que
vem crescendo em mim a convicção de que é no jogo e pelo jogo que a
civilização surge e se desenvolve. (2000)
Huizinga afirma, em todo o texto, que o jogo faz parte da cultura humana por mais que seja um
desejo biológico de brincar, de ser feliz. Neste caso, é no jogo que surge o desejo pela organização social e
pelas formas de impor regras aos relacionamentos interpessoais.
A escola é o espaço, por excelência, organizado para repassar estas regras de convívio e onde o jogo
da vida se impõe de maneira mais elaborada. No entanto, passa a ser um jogo chato em que as regras sociais,
e mais ainda nos dias atuais, se confundem com as regras dos jogos familiares. Assim, deixa de ser jogo, isto
52
é, deixa de ser divertido. O jogo da vida não passa, então, de obrigações da vida para que ela se enquadre
nos padrões do comportamento socialmente aceitos.
Via de regra, estes padrões serão questionados não só por alunos, mas por todos que deixam de se
divertir no cumprimento dessas obrigações. E é neste momento que tentamos mudar as regras do jogo e
recriar a própria ludicidade da vida. O próprio Huizinga afirma:
As grandes atividades arquetípicas da sociedade humana são, desde início,
inteiramente marcadas pelo jogo. Como por exemplo, no caso da linguagem, esse
primeiro e supremo instrumento que o homem forjou a fim de poder comunicar,
ensinar e comandar. É a linguagem que lhe permite distinguir as coisas, defini-las
e constatá-las, em resumo, designá-las e com essa designação elevá-las ao
domínio do espírito. Na criação da fala e da linguagem, brincando com essa
maravilhosa faculdade de designar, é como se o espírito estivesse constantemente
saltando entre a matéria e as coisas pensadas. Por detrás de toda expressão
abstrata se oculta uma metáfora, e toda metáfora é jogo de palavras. Assim, ao dar
expressão à vida, o homem cria um outro mundo, um mundo poético, ao lado do
da natureza. (Huizinga 2000)
Assim, é na criação da própria vida que se estrutura o jogo de viver. Cabe-se ressaltar, porém, que,
sem perceber, transformamos este jogo em obrigações e a arte de viver se torna desafio e se transforma em
opressão. Percebendo isto, muitos educadores vêm pensando o papel do lúdico na educação. Em São Paulo,
um grupo de psicólogos e pedagogos intitulado “Os jogos e sua importância para a Psicologia e Educação”,
sob a organização de Lino de Macedo, pesquisaram e organizaram em livro o papel dos jogos na educação
infantil. Segundo Macedo:
Nossa hipótese é que jogos e desafios podem favorecer observações a esse respeito e
possibilitar análises, promovendo processos favoráveis ao desenvolvimento e a
aprendizagens de competências e habilidades dos alunos para pensar e agir com razão
diante dos conteúdos que enfrentam em sua educação básica. Mais que isso, supomos
que por meio deles podem encontrar – simbolicamente – elementos para refletirem
sobre a vida e, quem sabe, realizá-la de modo mais pleno. ( Macedo 2009)
Embora com uma visão diferenciada dos jogos de interpretação, Macedo e vários outros educadores,
inclusive Piaget, se mobilizam no sentido de mudar a educação através dos jogos, trazendo de volta o prazer
de viver o aprendizado. Segundo Monica Lisboa:
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A educação tem por objetivo principal formar cidadãos críticos e criativos com
condições aptas para inventar e ser capazes de construir cada vez mais novos
conhecimentos. O processo de Ensino/Aprendizagem está constantemente
aprimorando seus métodos de ensino para a melhoria da educação. O lúdico é um
desses métodos que está sendo trabalhado na prática pedagógica, contribuindo
para o aprendizado do alunado possibilitando ao educador o preparo de aulas
dinâmicas fazendo com que o aluno interaja mais em sala de aula, pois cresce a
vontade de aprender, seu interesse ao conteúdo aumenta e dessa maneira ele
realmente aprende o que foi proposto a ser ensinado, estimulando-o a ser
pensador, questionador e não um repetidor de informações. (Lisboa 2014)
A proposta dos jogos narrativos não é a de jogos com objetivos educacionais. Isto é, não têm a
pretensão ou finalidade de ensinar, são jogos cujo objetivo é a diversão; talvez por isso, seu efeito se mostrar
tão eficaz - mesmo que a princípio não pareça.
Os jogos estabelecem um diálogo com a educação formal e, além de tornarem as aulas mais
divertidas, estimulam as pesquisas. Por exemplo: em jogos de cartas, é possível pedir aos alunos que
pesquisem na biblioteca da escola, que busquem soluções na internet, que façam entrevistas com professores
e outros profissionais da escola, mostrando aos alunos as diversas facetas do trabalho que envolve a
educação, do mesmo modo que indicam como as pesquisas podem e devem ser realizadas. Desta forma, o
aluno, ao mesmo tempo em que aprende, ensina e cria um foco no assunto a ser abordado na aula.
Conforme diria o professor Rafael Correia Rocha “O fim real desta proposta pedagógica está na melhoria
constante das relações professor-aluno (relações humanas) por meio da ludicidade e expressão,
manifestada na criação de diferentes formas do jogar de maneira a mobilizar os sujeitos envolvidos no
processo de ensino aprendizagem” (2014 p26).
Os jogos
Ao longo do curso sobre os jogos de interpretação, aprendemos duas coisas importantes, e uma delas
já fazia parte do meu cotidiano: divertir-se no trabalho! Sem a possibilidade de nos divertirmos, a aula de
História se torna repetitiva e sem sentido para o professor. É como se nos perguntássemos a todo momento:
“o que eu estou fazendo aqui?”. É claro que todo professor tem na ponta da língua a resposta sobre a
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importância da disciplina que ele ensina. Mas é óbvio que, diante dos desafios da própria sociedade
tecnológica, esse discurso de importância deixa de fazer sentido.
O segundo item importante é aprender a jogar! Se eu sou apenas o professor observador, o jogo perde
o sentido.
As experiências que vou relatar aqui (sim, serão mais de uma) partem de duas posições: a de
professora jogadora e a de professora observadora. Mas, primeiro, preciso explicar o jogo ou os jogos.
Jogo 01 – “Estamos todos mortos!” LARP – combinado com jogo de cartas
Essa primeira experiência de jogo parecia fadada ao fracasso! Em primeiro lugar, fiquei
animadíssima em poder experiênciar, com os alunos, a Crise do século XIV. Eram alunos do 7º ano de uma
escola particular da cidade que, em função de sua situação financeira, tem pouco ou nenhum contato com o
mundo mais propenso a epidemias e crises financeiras. Em geral esses alunos estão, por assim dizer, do lado
do poder. E este foi meu primeiro grande obstáculo.
A fim de protegê-los, a escola não permitiu nem a filmagem, nem liberou as imagens dos alunos.
Também não permitiu nenhuma observação que não fosse a minha própria. Fazia sentido, porém me senti
desestimulada; fui para a sala de aula e apliquei o jogo. Isto mesmo - APLIQUEI! Parece injeção isto!!!
Uma injeção em mim... Daquelas bem doloridas!!! Eles se divertiram no caos e inventaram o próprio jogo!
Escolhi como primeira experiência o LARP (live action role-playing, ou interpretação ao vivo em
português); em um live action, você não imagina o cenário narrado pelo Mestre (ou Narrador), mas utiliza o
espaço à sua volta como o cenário de jogo. Em uma sessão de RPG comum, cada jogador pega a sua ficha e
senta-se à mesa, como em um jogo qualquer, representando ali o seu papel sem nenhuma interação real com
outros jogadores. Já o live action é o estilo de RPG que mais se aproximaria de um teatro de verdade. Você
representa o seu personagem exatamente como um ator representaria um papel. É como uma peça de teatro
em que cada jogador representa um personagem: As diferenças são que esses personagens foram construídos
antes com ajuda do mestre e que estes personagens não seguem um roteiro ou 'script' pré-definido e, sim,
improvisam ações baseados na construção e história, criadas por eles.
Meus alunos do 7º ano foram, então, convidados a mergulharem no século XIV, por volta do ano de
1370, na França. Eles já haviam, como tarefa de casa, lido sobre todos os fatos que provocaram a crise do
século XIV e sabiam, de antemão, que naquele ano a peste negra havia devastado a França que, também,
sofria com a Guerra dos Cem anos e com as Revoltas camponesas.
O desafio era fazê-los compreender o que significava uma crise, como os acontecimentos do século
XIV se influenciaram e de que forma o poder dos reis foi reforçado durante o processo.
Cada um deles recebeu uma cartinha dizendo qual era o personagem a ser interpretado e o que eles
deveriam fazer durante o jogo. A maioria cumpriu com o ‘combinado’, porém, a seu modo e, como
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estava apenas como observadora, achei a situação caótica! Todos falavam alto e gritavam ao mesmo
tempo; alguns alunos aproveitaram-se para fugir da disciplina tão comum no dia a dia daquela escola.
Pela primeira vez, eles tinham autorização para falar alto, gritar com os colegas e alguns personagens
foram além do ‘previsto’; o rei não deveria morrer, mas foi assassinado!!! Outras personagens que
deveriam morrer de febre foram assassinadas pela fúria de camponeses que deveriam organizar a
rebelião!!!
Terminei o jogo antes do previsto por “medo” de represálias. Em seguida, com os alunos em círculo
e sob controle, discutimos sobre o significado da crise, no contexto do século XIV, e sobre o próprio jogo.
Fui embora frustrada, guardei as cartas no fundo da gaveta, tranquei a mesma e joguei a chave
fora!!!!!!!!!!!!!!
Na primeira aula pós-jogo, os alunos deveriam produzir um texto, como forma de avaliação,
narrando a crise do século XIV a partir da experiência do jogo, isto é, sendo ele um indivíduo daquele
tempo. Foi fantástico, além do esperado. Eles haviam compreendido mais do que foi dito ou lido sobre o
assunto. Como eu esperava o fracasso, demorei a ler e corrigir os textos; quando o fiz, não pude resgatar
nenhum para publicar, in off, nesse trabalho. Mas posso enumerar os avanços:
Souberam relacionar passado e presente estabelecendo paralelos com epidemias atuais como a
dengue e o ebola na África (alguns alunos são filhos de médicos), que inclusive eu não tinha a
informação de que estava fora do controle.
Estabeleceram críticas aos papéis dos governantes. No jogo, o rei não teve chance de agir!!!!
Fizeram análises sobre o significado da palavra e da própria crise do século XIV como sendo
importante para a reconfiguração do mundo moderno.
Sucesso!!
Jogo 02 - “Todos contra o rei” - LARP - combinado com jogo de cartas
Gosto do LARP. Talvez haja mais em mim de tradicional do que eu gostaria de admitir. O fato é que
o LARP me proporciona a ideia de estar no controle. É um engano, mas uma sensação enganosa é tudo que
temos no jogo da vida. De verdade, ninguém controla nada !!! Como diria Leo Cunha:
Podem me prender no quarto,
eu saio pela janela.
Podem trancar a janela,
eu fujo pelo telefone.
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Podem cortar o telefone,
eu pulo dentro de um livro. (Castigo, Leo Cunha 2012)
No jogo do engano, voltei-me para os alunos do segundo ano de uma escola pública. A Escola
Estadual Messias Pedreiro, onde experimentamos o jogo com todos os segundos anos do turno vespertino.
As turmas têm, em média, trinta e cinco alunos por sala. Desta vez, resolvemos mergulhar no universo da
Revolução Francesa, e eu contava com o suporte do professor Rafael Correia Rocha que ministrou o curso
de formação.
Para iniciar o jogo, a turma foi separada em grupos e cada grupo recebeu um conjunto de cartas que
os inseria em um estamento da sociedade francesa revolucionaria setecentista e foram dadas a eles
instruções prévias sobre o que fazer durante o jogo.
Em seguida colocou-se uma situação problema: Uma grande festa estava acontecendo no Palácio das
Tulherias e toda a rica nobreza estava presente. Em frente ao palácio, um grupo de esfomeados tentava se
aquecer do rigoroso inverno francês, fazendo uma pequena fogueira. De repente, saem do palácio o rei Luiz
XVI e sua coquete rainha Maria Antonieta. A partir daí, o jogo seguia seu curso normal. Ou não!!!
Observações importantes:
7 turmas de 2º ano participaram do jogo e em nenhuma turma o jogo foi igual.
Algumas turmas fizeram muito barulho; em outras turmas, a discussão foi mais contida.
Uma turma mudou totalmente os rumos da Revolução Francesa; o rei conseguiu fugir e não foi
assassinado, e os sans-culottes tomaram o poder! Parecia Comuna de Paris e não a Revolução
Francesa.
Em todos os jogos foi possível entender a angústia dos revolucionários e, principalmente, a violência
da própria Revolução!
A partir do jogo, ficou mais fácil abrir o diálogo sobre as manifestações populares ocorridas no Brasil no
ano de 2013 e entender porque de algumas manifestações conseguem seus objetivos e porque outras apenas
abrem caminho para as mudanças.
Considerações finais.
Muito foi dito, durante o curso “Play Testing”, sobre as relações entre professores e alunos e sobre a
forma como jogos narrativos nos ajudariam a nos transformar, transformando, também, nossas aulas.
Considero, porém, alguns aspectos importantes: a) quando as pessoas fazem o que gostam, tendem a se sair
bem naquilo que fazem; b) a prática de sala de aula é tão desgastante quanto qualquer outro trabalho.
Invariavelmente, o professor sentir-se-á cansado e saturado em algum momento, e nenhum jogo narrativo
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dará conta disto; c) não nos esqueçamos jamais que, embora o ensino possa ser divertido, a aprendizagem
também é consequência de um ‘labutar’, um trabalho para que as coisas possam acontecer. Não iludam seus
alunos!!!
Faço estas considerações para que ninguém se esqueça do compromisso com o outro na educação, do
rigor científico, da cobrança por bons desempenhos e do respeito ao ser humano.
Alguns professores cantam, inventam músicas, fazem piadas, jogam, e outros não precisam de nada
disso para que a magia aconteça. E mais do que isso, parafraseando a máxima católica: Nós professores não
somos deuses... Humanos é que somos!
Referências Bibliográficas
CUNHA, Leo. Cantigamente, São Paulo. Nova Fronteira. 2012
LISBOA, Mônica. A importância do lúdico na aprendizagem, com auxílio dos jogos Disponível em
http://brinquedoteca.net.br/?p=1818 <
HOBSBAWM, Eric. Sobre a História. SP: Companhia das Letras, 2001. p. 13.
MACEDO, Lino. Jogos, psicologia e educação teoria e pesquisas. Disponível em
http://jogoscooperativos.files.wordpress.com/2012/06/jogos-psicologia-e-educacao.pdf
ROCHA, Rafael Correia Narrativa da imaginação: proposta pedagógica, metodologia role playing e
reflexões sobre educação - Uberlândia: [s.n.], 2014
VICENTINO, Cláudio. Viver a História. São Paulo: Scipione; 2002. p.101
Michaelis - Moderno Dicionário da Língua Portuguesa
Dicionário de Ciências Sociais.
www.institutoequilibrio.com.br. acessoem10/09/2011
http://www.grupoescolar.com/pesquisa/guerra-da-reconquista.html
Anexos
Jogo 01
Assunto - Crise do século XIV
Experiência - imersão no contexto histórico
Categoria - LARP e cardgames
7º ano - 17 pessoas
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Cenário - burgo e feudo
Sujeitos - comerciantes, clero, servos, nobres, mestres de ofício e aprendizes, trabalhadores livres (pedreiros,
oleiros, cervejeiros).
Motivação de cada grupo - resolver os problemas que surgiram com a ocorrência da Peste Negra.
Objetivo Geral - proporcionar ludicidade ao conteúdo de sala de aula
Objetivo específico - entender como as pessoas reagiram às diversas crises que se instalaram na Europa
durante o século XIV
Duração - 30 minutos
Custo: CR$19,00
Metodologia e estrutura de cada papel estipulado por uma carta.
O jogo tem duração de 30 minutos (para criar uma experiência intensa e favorecer o debate).
Coloca-se uma situação problema; neste caso, como cada estamento reagia durante a epidemia de
Peste Negra.
Cada carta vai estipular a função social do personagem e, se ele estiver contaminado, o horário de
sua morte após o início do jogo.
O clero tem que defender teosoficamente o que está acontecendo.
O comerciante deve vender algo importante; se o comerciante morre, acaba o fornecimento do
produto.
Quando acaba o produto, ele tem que buscar mais - com a professora que era a observadora e
reguladora da “confusão”.
Nobres - rei, senhor feudal, cavaleiros, baixa nobreza (os últimos cobram impostos e morrem de
febre).
Os senhores feudais deverão recorrer ao rei quando se sentirem acuados.
O servo vai trabalhar e morrer durante o trabalho; os sobreviventes acumularão funções.
Em algum momento os servos deverão cobrar providências do senhor feudal.
Referências Bibliográficas deste jogo
VICENTINO, Cláudio. Viver a História. São Paulo: Scipione; 2002. p.101
Michaelis - Moderno Dicionário da Língua Portuguesa
Dicionário de Ciências Sociais.
www.institutoequilibrio.com.br. acessoem10/09/2011
http://www.grupoescolar.com/pesquisa/guerra-da-reconquista.html
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Jogo 02
Assunto - Revolução Francesa
Experiência - imersão no contexto histórico
Categoria - LARP e card games
2º ano - turmas variando entre 30 e 40 alunos
Cenário - Ruas da França de frente ao Palácio das Tulherias.
Sujeitos - povo comum, girondinos, sans-culottes, jacobinos, Luiz XVI, Maria Antonieta, Danton, Marat,
Robespierre, Marianne, Guilhotina e alguns líderes jacobinos, girondinos e nobres.
Motivação de cada grupo - resolver problemas imediatos como a fome e o frio ou o desprezo das classes
abastadas com relação às dificuldades dos humilhados.
Objetivo geral - favorecer o debate sobre a Revolução Francesa e os objetivos de uma revolução.
Objetivo específico - discutir a ação dos partidos políticos no cenário político atual a partir das necessidades
do povo.
Duração 40 minutos
Custo - CR$ 25,00
Metodologia e estrutura das cartas.
Situação problema - um baile da nobreza em contraponto com a fome e a ausência de moradias do
Terceiro Estamento.
A turma é dividida em grupos e cada grupo recebe uma carta, indicando o que deve fazer.
As cartas sans-cullotes representam o povo.
Os jacobinos devem aliciar a população.
Marat deve disseminar a necessidade de uma Revolução através de jornais e panfletos.
Os Girondinos, também, estimulam uma transformação; porém, sem violência.
As cartas, como a Constituição e Marianne, representam a vitória de alguns grupos; a guilhotina
representa a morte.
Em geral, um objeto na sala de aula representa a Bastilha.
O Jogo deve terminar ou ser interrompido com a vitória da população.
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Referências Bibliográficas dos jogos
COSTA, Luís Cesar Amad e Mello, Leonel Itaussu A. História Moderna e Contemporânea. São
Paulo, Scipione.1999
CERQUEIRA, Célia; PONTES, Maria Aparecida e SANTIAGO, Pedro. Por dentro da História 2.
São Paulo:Escala educacional s/a. 2010
www.wikipedia.com.br acesso em 21/04/2014
Imagens disponíveis no acervo da professora
Modelo de Cartas disponível em <www.mtgcardmaker.com> Acesso em 10/05/2014
66
A História em guerra de representações
Keila Tatiane Pereira Sousa6
Este relatório tem como objetivo apresentar as experiências vividas no ambiente escolar, após a
aplicação do jogo didático, desenvolvido em um curso que foi oferecido pela Univesidade Federal de
Uberlândia - UFU - pelo projeto de pesquisa Cidade de Uberlândia: História Regional e Local, ensino-
aprendizagem e jogos narrativos. Participei do curso denominado: Play Testing, ministrado pelo Profº Rafael
Rocha no qual foi apontado o Jogo como uma estratégia para buscar o envolvimento dos alunos nas aulas de
História.
Durante o curso, ocorreram aulas teóricas, mescladas com a aplicação de jogos, demostrando
várias modalidades que podem ser desenvolvidas em sala de aula. À medida em que frequentava as
discussões do curso, mudei minha concepção sobre o jogo; enxergava-o como um passatempo, divertimento
e passei a concordar com a definição de Johan Huizinga:
No jogo existe alguma coisa “em jogo” que transcende as necessidades imediatas da
vida e confere um sentido à ação. Todo jogo significa alguma coisa. Se verifcarmos
que o jogo se baseia na manipulação de certas imagens, numa certa “imaginação” da
realidade(ou seja, a transformação desta em imagens), nossa preocupação
fundamental será, então, captar o valor e o significado dessas imagens e dessa
“imaginação”. Antes de mais nada, o jogo é uma atividade voluntária. Sujeito a
ordens, deixa de ser jogo, podendo no máximo ser uma imitação forçada7.
Partindo dessa definição, foi elaborado o jogo como introdução ao conteúdo “A Segunda Guerra
Mundial”. Desenvolvemos o jogo na Escola Municipal Prof. Leôncio do Carmo Chaves (situada na Rua do
Engenheiro, 416 - Planalto, Uberlândia - Minas Gerais). A escola Leôncio Chaves é uma das escolas
referências na rede municipal de ensino. Diante da proposta dessa atividade, direção e equipe pedagógica
apoiaram, incentivaram, além de ficarem bastante curiosas quanto ao Curso Play Testing, como seria esse
jogo e se seria possível desenvolver jogos para as turmas infantis.
O objetivo do jogo, para os alunos, buscou o aprendizado e a interação dos mesmos com as
aulas, destacando a importância do conteúdo na sua formação enquanto cidadãos. Ressaltamos, ainda, a
pesquisa como princípio educativo, motivando a criatividade do próprio educando. Nessa concepção,
buscamos:
6 Graduada em História pela Universidade Federal de Uberlândia, professora da E.M. Prof° Leôncio do Carmo Chaves.
7 HUIZINGA, Johan. Homo Ludens - vom Unprung der Kultur im Spiel. Junho, 2014. Disponível em:
www.editoraperspectiva.com.br. Acesso em: 25 junho 2014.
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Rever o conceito de aprendizagem, relacionada ao de ensinar, sempre restritos os
dois a posições receptivo-domesticadoras. Educação aparece decaída na condição de
instrução, informação, reprodução, quando deveria aparecer como ambiente de
instrução criativa, em contexto emancipatório. O que conta aí é aprender a criar. Um
dos instrumentos essenciais da criação é a pesquisa. Nisto está o seu valor também
educativo, para além da descoberta cientifica8.
Ressaltando o papel da pesquisa, a ideia, a princípio, foi abordar a participação dos soldados
brasileiros na Segunda Guerra Mundial por meio de documentos que seriam pesquisados no Quartel do
Exército. Porém, como residem, em Uberlândia, ex-combatentes do conflito, optou-se por realizar a
entrevista com um soldado, pensando sobre o quanto seria enriquecedor, para o professor e as turmas, um
relato pessoal demostrando as emoções e experiências de alguém que viveu o fato histórico.
Apresentamos a seguir a proposta e os resultados do jogo aplicado para os alunos do Ensino
Fundamental, turmas 9º anos.
O jogo foi montado pensando em uma contribuição como vivência; partindo dessa proposta,
abordamos o tema: A Segunda Guerra Mundial, primeiro como História Regional. Nessa abordagem, foi
utilizada uma entrevista com um ex-combatente do conflito, o soldado Mario Pereira da Silva, e após uma
aula expositiva sobre o envio da Força Expedicionária Brasileira (FEB) para a cidade Monte Castelo e
debate com as turmas sobre o relato do Sr. Mario Pereira da Silva, observamos grande interesse dos alunos
por saber que reside em Uberlândia um personagem que esteve na guerra, aumentando a curiosidade sobre a
atividade que desenvolveríamos. Segue trecho da entrevista com o Soldado brasileiro Mario Pereira da
Silva9, utilizado como ilustração para a aula expositiva e debate realizado com os alunos, antes da aplicação
do jogo:
Estivemos na Itália até terminar; retiramos os alemães de lá, nós e os americanos;
ficamos lá 4 meses. Estavam na montanha Monte Castelo, já tinham tomado a cidade
de Montese. Nós chegamos e reconquistamos a cidade de Montese e fomos combater
no front em Monte Castelo. Os alemães a 1200 metros de altura e nós lá embaixo;
nós, a tropa brasileira e americana. Toda vida eu fui patriota, caxias, como se diz! Eu
fui servir! Sabia que não ia voltar! As batalhas com canhões, só canhões em torno da
montanha. Depois de 2 meses, ocorreram os combates corpo a corpo. Fizemos os
alemães prisioneros; ai acabou a guerra, mas durou quase dois meses de combate.
Dormíamos no mato, na montanha. Não dormia não! Ficávamos combatendo dia e
noite. Morreram muitos brasileiros; eu escapei dessa. Usávamos rifles,
metralhadoras, canhões;os alemães ficavam no topo da montanha e nós embaixo. Os
alemães eram 100%, muito fortes! Os maiores soldados do mundo foram os alemães.
8 DEMO, Pedro. Pesquisa: principio científico e educativo. São Paulo: Cortez, 1996.
9 Entrevista concedida por Mario Pereira da Silva(Maio 2014). Entrevistador: Keila T. P. sousa, Uberlândia, 2014. Arquivo
pessoal Keila T. P. Sousa.
68
Eles ficaram, no final do combate, como se fossem os vencedores da tropa, os
alemães. Se você visse os brasileiros e os alemães; os coronéis, soldados brasileiros,
o major pareciam presos deles. E eles, os perdedores, orgulhosos, orgulhosos! Quase
200 prisioneiros e pareciam que eles tinham vencido guerra; orgulhosos, orgulhosos
mesmo! Você vê um coronel e um alemão, você pensa que o coronel é o alemão. A
pose deles! Depois de rendidos, prisioneiros, perdido a guerra, parecia que tinham
vencido a guerra. Os alemães são os soldados mais corajosos do mundo. Se você
pensar em um vencedor, são eles; pareciam os donos do mundo. Se renderam porque
acabou a comida e a munição. O Brasil fez um sucesso terrível junto com os Estados
Unidos, combateu Brasil e Estados Unidos e lá, nós retomamos a Itália. Quando
voltamos, quem quisesse ficar no exércíto, ficava; quem não quisesse, aposentava10
.
A entrevista foi realizada como parte da elaboração do jogo, ressaltando a importância da
vivência, também evidências, pesquisa e fontes orais como determinante na construção do jogo e como
sentido para o aprendizado dos fatos históricos, visando diminuir a distância entre o passado e seus reflexos.
Nas turmas, enfrento problemas de indisciplina, sendo que na escola existe uma preocupação da
direção, supervisão e corpo docente com o comportamento dos alunos. As estratégias utilizadas pela escola
para minimizar o problema se baseiam em conversas entre aluno e o supervisor e, por último, chamam os
pais. No geral, essas medidas funcionam uma ou duas semanas de aula, retornando ao mesmo
comportamento. Acredito que o problema da indisciplina está ligado à falta de limites, problemas na
estrutura familiar, dentre outros, e, também, ao desgaste causado pela rotina na sala de aula.
A partir dessas análises, sobre o comportamento dos alunos e o interesse pelas aulas,
participação, disciplina e empenho na resolução dos exercícios. Observo, ainda, que as turmas preferem
atividades em grupo, consideram a disciplina História complexa; na visão destes, é difícil se dedicar ao
aprendizado de fatos passados que, na concepção deles, não têm ligação com suas vidas. Conhecendo a
realidade dos alunos, buscamos outros meios para interagirmos com as turmas com propósito de produzir
conhecimento. A proposta do jogo abaixo procurou fazer essa ligação, contribuindo para a diversificação das
aulas.
10 Sd Mario Pereira da Silva, ex-Combatente da 2ª Guerra Mundial integrava o 6º RI - Regimento de Infataria -
Regimento Ipiranga. Nascido no ano de 1923, na pequena cidade de Ribas do Rio Pardo, interior do Estado de Mato
Grosso (hoje Mato Grosso do Sul), Mario era o filho mais velho de seis irmãos (três homens e três mulheres), do
casal José Vitoriano da Silva e Abadia Pereira da Silva. Foi o único convocado para guerra. Melhor dizendo
voluntário.
69
Após aula expositiva e debate sobre a participação da FEB (Força Expedicionária Brasileira) na
Segunda Guerra Mundial, aplicamos um jogo de cartas que, de acordo com a definição do Profº Rafael
Rocha, se encaixou na modalidade LARP (live action role-playing game ou jogo de interpretação) e Cartas.
Os jogos de cartas na visão Johan Huizinga:
Os jogos de cartas diferem dos jogos de tabuleiro na medida em que jamais chegam
a Elimar completamente o fator sorte. Quanto mais este predomina mais eles tendera
a cair na categoria dos jogos de azar e como tais, é aqui que se manifesta mais
fortemente o elemento de seriedade ou até de excesso de seriedade. Desde os tempos
da quadrilha até aos do uíste e do bridge, os jogos de cartas passaram por um
processo de aperfeiçoamento cada vez maior, e só com o bridge e as técnicas sociais
modernas se apoderaram inteiramente do jogo11
.
Quanto ao LARP, oferecia aos alunos a participação por meio da representação, segundo o autor
Luiz Falcão12
:
Larp é ao mesmo tempo um jogo de interpretar personagens e um tipo de arte
participativa. Ele pode até ter elementos da performance ou do teatro e em alguns
momentos se parecer com uma dessas linguagens, mas o larp tem uma linguagem
própria. A principal diferença é que ele não é feito para ser visto, é para ser vivido. O
larp também pode ser desenvolvido como uma experiência imersiva, uma vivênca e
um jogo relacional e todas essas perspectivas estão corretas. Em um larp não há
platéia, cada um dos participantes - que podemos chamar também de jogadores -
interpreta um personagem para si mesmos e uns para os outros.Também não há um
roteiro ou script a ser seguido. A partir de alguns dados que todos conhecem no
início do jogo, os participantes vão improvisando suas ações e se relacionando uns
com os outros como se fossem seus personagens. A história se desenrola a partir das
escolhas e ações dos jogadores, na medida em que interagem uns com os outros.
Como o objetivo do jogo foi proporcionar vivência aos alunos, as cartas desenvolvidas no curso
Play Testing apresentavam personagens e algumas descrições para os alunos representarem. Na montagem
do cenário, elaboramos um desenho, representando a cidade de Berlin sendo bombardeada, no quadro, e
explicamos para os alunos que eles estavam naquele cenário em um banker e que o jogo acabaria quando o
banker fosse invadido pelos soldados nazistas ou destruído. Arrumamos as carteiras de forma a separar em
quartos o banker e diminuímos a luz, durante o recreio. Nas cartas, colocamos cidadãos comuns; ricos,
11
HUIZINGA, Johan. Homo Ludens - vom Unprung der Kultur im Spiel. Junho, 2014. Disponível em:
www.editoraperspectiva.com.br. Acesso em: 25 junho 2014.
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FALCÃO, Luiz. LIVE! Live Action Roleplaying - Um Guia Prático para Larp. 2ª edição. Fevereiro 2013. Disponível em:
HTTP://nplarp.blogspot.com. Acesso em: 20 maio 2014.
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pobres, industriais, bancários, o prefeito, médicos, idosos, crianças, feridos e figuras perseguidas pelo
regime nazista, tais como: judeus, deficientes físicos, homossexuais e outros.
Por estarem refugiados no abrigo, as notícias que os personagens recebiam sobre a guerra eram
transmitidas por um televisão, representada por mim. As notícias visavam aumentar as dificuldades vividas
dentro do abrigo, o medo da invasão,a fome, a falta de remédios e a convivência com pessoas perseguidas
pelos soldados, consideradas “traidores”, para os alunos buscarem a solução para esses problemas e sentirem
as consequências das escolhas. Por exemplo: decidir quem iria receber os remédios ou não, distribuição da
comida e se entregariam os personagens perseguidos para os soldados.
No jogo, os alunos buscaram representar o seu personagem, considerando a situação de guerra e
os comportamentos variaram de acordo com a noção que os mesmos têm sobre risco, perigo, medo e dentro
de suas possibilidades enquanto adolescentes. Por exemplo: os alunos que representaram os judeus - quando
se sentiram ameaçados por uma notícia transmitida pela televisão ou a perseguição de outro personagem - se
escondiam embaixo das carteiras, imaginando que assim escapariam de serem capturados. O personagem do
prefeito, na busca por soluções para diminuir os problemas do banker, se mostrou aflito por lidar com tantas
queixas e pedidos e utilizava os soldados para colocar ordem no abrigo. Os soldados, por sua vez,
obedeciam ao prefeito e queriam prender ou matar todos os “desordeiros”.
Toda vez que a TV dava uma notícia, a turma ouvia com atenção e, em seguida, continuavam
representando, abordando o novo problema. Quando era anunciado um bombardeio à cidade de Berlin,
representada no quadro, em locais como: escola, hospital, casas, os alunos ficavam preocupados por verem
os bombardeios se aproximarem do banker onde estavam localizados.
Embora fosse um jogo, os alunos buscavam sobreviver e não queriam que acabasse com a
explosão do banker, e todos os personagens mortos. Por se tratar do último horário, o jogo foi encerrado
com este fim. Mas a turma reclamou e pediu que repetíssemos em outro dia, quando fossem dois horários
seguidos para a trama durar mais tempo.
Durante o desenvolvimento do jogo, a princípio, os alunos ficaram curiosos e agitados e, no
decorrer do trabalho, participaram, avaliando-o como uma atividade satisfatória e inovadora. No
aprendizado adquirido durante o desenvolvimento das tarefas propostas, notamos uma simpatia por parte dos
alunos, sendo que a turma sugeriu que ocorressem mais jogos durante o ano letivo.
O jogo durou cerca de 30 minutos em cada turma, aplicado dentro das salas; acredito que na
quadra ou no quiosque teria sido mais adequado, tendo em vista o barulho feito pelos alunos que causou um
incomodo na escola; porém, apresentou os pontos positivos esperados. Os alunos se interessaram em
produzir o que lhes foi proposto. Ocorreram algumas dúvidas sobre o que fazer, principalmente por parte do
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personagem - o prefeito - que deveria comandar, mediar e solucionar os problemas apresentados pelos
outros personagens.
Através do entusiasmo dos alunos, notamos que os mesmos se divertiram com uma atividade
diferente em sala de aula, confirmando nossas justificativas e objetivos propostos, facilitando o aprendizado,
nas aulas, sobre o conteúdo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
HUIZINGA, Johan. Homo Ludens - vom Unprung der Kultur im Spiel. Junho, 2014. Disponível em:
www.editoraperspectiva.com.br. Acesso em: 25 junho 2014.
Entrevista concedida por Mario Pereira da Silva(Maio 2014). Entrevistador: Keila T. P. sousa, Uberlândia,
2014. Arquivo pessoal Keila T. P. Sousa.
FALCÃO, Luiz. LIVE! Live Action Roleplaying - Um Guia Prático para Larp. 2ª edição. Fevereiro 2013.
Disponível em: HTTP://nplarp.blogspot.com. Acesso em: 20 maio 2014.
Projeto Araribá: história/organizadora Editora Moderna; obra coletiva concebida, desenvolvida e produzida
pela Editora Moderna; editora responsável Maria Raquel Apolinário . – 3 ed. – São Paulo: Moderna 2010.
DEMO, Pedro. Pesquisa: principio científico e educativo. São Paulo: Cortez, 1996.
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O jogo
Categoria Larp + cards
Conteúdo Segunda Guerra Mundial
Experiência proporcionada Vivência das dificuldades civis durante um conflito/
guerra
Fonte Livro didático: projeto Araribá
Fonte para História regional e local Entrevista com Ex-combatente, Soldado Mario
Pereira
Escola e ano que aplicará 9° - prof. Leôncio
N° de alunos 30
Duração aproximada 30 minutos
Motivação Despertar a consciência do aluno sobre as questões
sociais de conflitos em relação a seu papel no mundo
Forma de registro Fotos
Cenário: Berlin
Todos no banker com a comida e os remédios acabando.
Com a TV dando informações (trazer uma televisão antiga, representação do professor).
Personagens e quantidades de cartas: judeus (6), deficientes físicos (2), idosos (2), crianças (3), doentes
(2), homossexuais (2), bancários (2), industriais (2), Prefeito de Berlin (1), soldados (4), ateu (1), rabino (1)
e padre (1).
Descrição de orientações para cada personagem:
judeus: (só ajudam quem for do grupo judaico; todos são ricos, podem dialogar com bancários e
industriais, têm interesse em reivindicar direitos dos judeus ao prefeito).
deficientes físicos (cego, paraplégico e Alzheimer).
73
idosos (limitação de movimento e necessidade de remédios, rabugentos, razinzas e irritados).
crianças (dependentes dos idosos, agitadas, medrosas, famintas),
doentes (tuberculose e baleado sangrando e perdeu audição com uma bomba).
religiosos (1 Rabino, 1 padre e 1 ateu).
homossexuais (um é médico - atenciosos, carinhosos e gentis)
médico (atencioso, carinhoso e gentil).
bancários (ricos egoístas, orgulhosos e individualistas - querem manter os judeus em segurança
devido a suas relações econômicas e, ao mesmo tempo, manter a amizade dos industriais e prefeito).
industriais (ricos, orgulhosos, exigentes, manipuladores, querem soluções rápidas do prefeito e
médicos, buscam seus interesses em exclusivo).
Prefeito de Berlin (não gosta dos judeus; gosta dos industriais e bancários e está com alguns sintomas
de tuberculose).
Soldados (estão sob as ordens do prefeito - agressivos, rígidos e fechados, cara de bravos).
Observações em sala:
- Fechar janelas, escurecê-las com papéis e deixar as luzes acesas;
- Distribuir cartas, mas não falar quem é quem, a não ser médicos (fita branca - representa jaleco), idosos
(fita azul), crianças (fita amarela) e deficiente visual (venda).
- Ninguém se conhece exceto: prefeito, industriais e bancários/industriais, bancários e judeus (não é
interessante para os bancários e industriais que os judeus sejam descobertos)
- Utilizar lousa e parede para colar folhas ou desenhar informações da guerra, número de mortos, tomada da
cidade, ações dos exércitos, fotos, etc.
- Deixar apenas 1 médico como homossexual para deixar o grupo em dúvida; quem tiver a carta de médico
homossexual deve negar para sobreviver;
- Outro homossexual pode ser um industrial ou banqueiro;
- O rádio ou tv: deve denunciar os grupos, com anúncios esporádicos, como se o aparelho sofresse
interferência dentro do banker, com muitos chiados.
- Há quanto tempo os alunos estão no banker? Acabaram de chegar, estão lá há uma semana? Um mês?
- O jogo termina quando o banker for invadido, a TV ou rádio vai informar a proximidade do ataque ao
banker.
Custo para os materiais utilizados:
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A televisão de tubo (só a caixa, sem peças) consegui de graça em uma loja de assistência técnica, pois não
precisava funcionar já que era somente para representar; quanto mais o modelo for antigo, melhor para os
alunos no processo de imaginar e representar. Como a TV estava sem peças, utilizei uma imagem de exame
de raio-x para representar a tela.
As fitas: amarela, branca e azul - utilizei um metro de cada, custando R$ 2,00 cada metro. Comprei de cetim
em loja de aviamentos.
Os remédios foram representados com um tic-tac R$ 3,00.
Para a venda utilizada pelo cego utilizei um elástico preto, cerca de 50 cm. Valor R$ 2,00.
Utilizei uma lanterna para focar nos personagens, porém não comprei por ter em casa. Caso não tenha
disponível, não utilizar.
Desenho da cidade no quadro realizado com o pincel, utilizado nas aulas, de preferência azul ou vermelho.
As cartas foram confeccionadas pela UFU
Custo total dos materiais R$ 11,00.
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Situação de queixas e pedidos dos personagens junto ao prefeito (aluno blusa branca).
Personagens na enfermaria,
médico e doente (tuberculose).
Alunos - personagens pedindo
remédios na enfermaria.
Prefeito debatendo com o rabino,
aluna com blusa branca e judia,
blusa vermelha.
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Prefeito (blusa preta) expondo as medidas tomadas para sobrevivência.
Os alunos com os casacos na cabeça são soldados.
Aluna - personagem judia se
escondendo para não ser presa.
Situação de queixas e pedidos dos personagens
junto ao prefeito (aluno, blusa preta).
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Personagem fazendo uma reclamação e reproduziu a saudação nazista.
Cartas utilizadas no jogo
As notícias sendo transmitidas pela
professora.
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Idade média
Cássio M. Viana Mendes13
Este relatório visa apresentar as experiências bem como os motivos que levaram o professor a participar do
curso Play Testing: Design de jogos educacionais para professores de História, realizado pela UFU
(Universidade Federal de Uberlândia). Vinculado à pesquisa e financiado pela FAPEMIG/CAPES (
CIDADE DE UBERLÂNDIA: HISTÓRIA REGIOBAL E LOCAL, ENSINO-APRENDIZAGEM E
JOGOS NARRATIVOS/APQ - 03413-12. Este curso objetiva a capacitação de professores para o
desenvolvimento e aplicação de pesquisa-jogos, utilizando a estrutura de jogos na categoria: board game,
card game, role playing game e live action role playing, com o intuito de estimular o senso crítico do aluno,
assim como o desenvolvimento docente. A experiência de docência do professor iniciou-se na rede estadual
de ensino quando o mesmo ainda cursava o Curso de Bacharelado e Licenciatura no Instituto de História da
UFU. Apesar do contato com alunos no Estágio Supervisionado, tanto na fase de observação quanto na
prática, a realidade se torna bastante diferente no momento em que o professor se torna titular e assume
turmas, cuja responsabilidade social, metodológica e disciplinar recai sobre o mesmo. Quanto a estas
responsabilidades, enfatiza-se, na primeira, a necessidade de inserir o gosto do conhecimento e da pesquisa,
acreditando que tal empreendimento possa contribuir para uma ascensão sociocultural destes jovens, que, na
maioria das vezes, não são estimulados e não encontram exemplos da importância da educação em seus
lares. Diante de tal problemática, o professor se vê obrigado a buscar novas alternativas metodológicas com
o objetivo de atrair a atenção bem como a participação dos alunos nos conteúdos curriculares oferecidos a
eles. Fora isso, compete ao professor a dificílima tarefa de manter a disciplina bem como a harmonia entre
os alunos e um bom relacionamento entre o docente e os discentes. E foi com base neste raciocínio que o
professor foi levado a participar do Curso Play Testing, pois:
Nossos adolescentes também detestam a história. Voltando-lhe ódio entranhado e
dela se vigam sempre que podem, ou decorando o mínimo de conhecimento que o
“ponto” exige ou se valendo lestamente da “cola” para passar nos exames. Demos
ampla absolvição à juventude. A história como lhes é ensinada é, realmente, odiosa. 14
13
Graduado em História e mestrando em História pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); professor da E.E. Presidente
Tancredo Neves. 14
MENDES, Murilo. A História no Curso Secundário. São Paulo, Gráfica Paulista, 1935, p 41
83
Este ódio, transmitido pelos alunos à disciplina de História, pode ser percebido no dia a dia em sala
de aula: falta de atenção nas explicações, deixar de fazer as atividades propostas pelo professor, brincadeiras
importunas em sala de aula bem como uma série de atitudes desenvolvidas pelos discentes que podem ser
entendidas como forma de luta e resistência à matéria ou à forma metodológica utilizada pelo professor.
Em uma sociedade em que as transformações tecnológicas, sociais e culturais caminham em uma
rapidez impensável no século passado, o professor atento há de pensar que tais mudanças chegam à sala de
aula. Por este viés, acredita-se na necessidade de desenvolver uma metodologia dinâmica que acompanhe
tais transformações, que cative a atenção dos alunos, que permita que os mesmos desenvolvam uma
consciência crítica dos fatos históricos e, ao mesmo tempo, lhes proporcione a ideia de serem atores do fazer
histórico. Assim sendo, acredita-se que o professor deve assumir uma responsabilidade social e política com
o momento vivido.
Por este prisma, o professor sempre questiona a sua postura e metodologia em sala de aula, buscando
alternativas que amenizem o repúdio e resistência dos seus alunos ao aprendizado de história e lhe forneçam
alternativas metodológicas diferentes, que contribuam para uma maior dinâmica e flexibilidade nos
conteúdos disciplinares. Assim, de forma sistemática, foram utilizadas várias metodologias ao longo da
experiência docente do mesmo. Entretanto, deve-se ressaltar que, apesar da utilização desses recursos,
percebe-se que com qualquer metodologia, utilizada em sala de aula, sempre houve alunos, que de certa
forma, insistiam em resistir ao aprendizado. Tal princípio, a não participação e envolvimento do aluno, traz
ao professor certa frustração que motiva uma série de conversas entre ele e orientadora pedagógica da
escola, visando a busca de alternativas metodológicas diferentes.
Ao ser procurado e convidado para participar do curso Play Testing pelo pesquisador: Rafael Correia
Rocha (pesquisador bolsista da Fapemig BAT-1/INHIS/UFU), o professor não hesitou, aceitando o convite
prontamente. De início pensava-se que tal curso, pelo não conhecimento do professor acerca dos jogos a
serem desenvolvidos ao longo do aprendizado, utilizaria jogos oriundos de computadores; entretanto, no
primeiro encontro, o professor verificou que a intenção e proposta do curso eram totalmente diferentes
daquilo que o professor pensava, almejando uma participação mais dinâmica entre os alunos e professor.
Acredita-se importante relatar, em primeiro lugar, um fato referente ao dia a dia do Curso,
envolvendo aluno e professor e que ocorreu antes mesmo da primeira aula de apresentação das propostas de
aprendizado. Um aluno, que há muito não fazia atividades, faltoso e cuja disciplina era nula, não fez uma
atividade avaliativa, o que levou o professor a lhe dizer que iria registrar sua conduta no livro de ocorrência
e pedir à orientadora pedagógica para comunicar ao Conselho Tutelar, para que este verificasse, com os seus
pais, os motivos de suas faltas e o não cumprimento das atividades proposta pelos professores, visto que não
era só na disciplina do professor de história que o aluno estava displicente. O professor surpreendeu-se
84
quando o aluno levantou e o chamou para conversar fora da sala de aula; mais surpreso ficou com o relato
do aluno:
“_ Professor, o Sr. não pode acionar o conselho tutelar, pois eu tentei suicídio, e minha mãe está
sendo investigada. Se o Sr. acionar o conselho tutelar, eles irão me tomar da minha mãe”.
Tal relato deixou o professor atônito, levando-o a procurar a orientadora pedagógica da escola e
relatar o ocorrido. Ao relatar a história do aluno, a orientadora, por não saber do ocorrido, aconselhou-me a
chamar o aluno para conversar no horário de módulo. Ao começar a conversa, apesar da resistência por parte
do aluno, o professor aos poucos foi conquistando a sua confiança e, resumindo, toda a sua problemática se
concentrava no fato do mesmo ser viciado em jogos, e tanto a mãe quanto a irmã implicam com tal fato e lhe
dizem que ele nunca seria alguém. Juntando-se a tal fato, a irmã do aluno sempre fora uma excelente aluna e
já estudava na UFU (Universidade Federal de Uberlândia). Percebia-se na fala do aluno certo pessimismo,
frustração, sentimento de inferioridade. “Eu sou um bosta” disse-me o aluno, “um Zé ninguém”, “eu nunca
serei nada”.
Com o intuito de anular este espectro de inferioridade que assolava o adolescente, o professor lhe
contou que tinha sido convidado a participar de um curso na UFU (Universidade Federal de Uberlândia),
sobre jogos, e que não entendia muito sobre o assunto e que precisava de um parceiro para ajudá-lo a
entender o funcionamento dos jogos, bem como auxiliá-lo na confecção de um jogo metodológico para ser
trabalhado em sala de aula. A receber o convite, o aluno mudou de feição e atitude; aproveitando tal
mudança comportamental do aluno, o professor disse ao aluno que não iria mais registrar a ocorrência e
comunicar ao Conselho Tutelar, que o aluno não era e nunca seria um “bosta” e que ele poderia ser um
grande desenvolvedor de jogos e que, a partir daquele momento, ele, juntamente com o professor, seriam
grandes parceiros. Houve um aperto de mãos e abraço simbólico como pacto da futura parceria. Apesar
desta conversa, o aluno ficou uma semana sem ir à escola, o que levou o professor a ligar para o telefone da
residência do aluno. A mãe, que atendeu ao telefone, ao ser informada do motivo da ligação, disse: “Graças
a Deus, professor”. Tal expressão, proferida pela mãe, de certa forma, mostra-nos evidências de sua
preocupação com o filho. Ao conversar com o aluno, disse-lhe que estava precisando muito dele para
começar o nosso trabalho de construção do jogo; ele disse-me que no outro dia iria à escola para
começarmos. No dia seguinte, estava em sala de aula, quando chegou a orientadora da escola, chamando-me
para conversar com o pai do aluno em questão. O pai do aluno, que é separado da mãe do mesmo, mora no
Estado de São Paulo, onde trabalha na equipe pedagógica de um colégio particular. Ao ter conhecimento do
ocorrido com o filho, veio a Uberlândia para verificar os acontecimentos e fora notificado pela mãe e pelo
aluno do convite por mim feito; fora isso, o filho comentou sobre a nossa conversa, minha atitude e os
conselhos que eu tinha lhe dado. Para minha surpresa, o pai estava em minha frente com olhos cheio de
85
lágrimas, agradecendo-me pela iniciativa que tive com seu filho; tinha levado o menino com ele para me
agradecer e despedir-se, além de pegar a transferência, pois ele levaria o aluno para morar no Estado de São
Paulo. Passado este fato, percebe-se de imediato, a importância e o peso que o Curso de Play Testing pode
ter no currículo de um professor.
Tanto minha educação quanto a metodologia, utilizada pelos meus professores no ensino
fundamental, seguiram os caminhos tradicionais e conservadores, em que o professor explicava, líamos os
textos do livro didático (quando tinha), fazíamos exercícios, corrigíamos e o professor explicava novamente,
tirando dúvidas dos alunos. Não existia uma interação entre aluno e professor e não havia espaço para o
aluno pensar de forma diferenciada da metodologia do professor. Quando um ou outro aluno falava algo
diferente, respondia questões que diferenciavam daquilo visto em sala de aula; mesmo se estivesse correto,
era repreendido e, às vezes, até criticado pelos professores, salvo alguns casos. Hoje, percebe-se que tal fato
e procedimento, por parte dos docentes, pode de certa forma impedir a criatividade do aluno bem como o
desenvolvimento cognoscível do mesmo. Daí, a necessidade do professor de buscar novas metodologias
para aplicar em sala de aula. De início, em minha carreira de professor, não nego que tive certa dificuldade
de aceitar metodologias modernas, principalmente aquelas que se baseiam no lúdico. Acredita-se que tal
resistência está em sintonia com a educação por mim adquirida, na qual, eu inconscientemente, queria
repetir em minhas metodologias aquilo que os meus professores fizeram comigo, visto que aprendi muita
coisa boa com eles.
As aulas teóricas e práticas do curso foram além do objetivo de passar o conhecimento teórico dos
jogos, pois, a cada encontro debatiam-se as dificuldades e os desafios que a vida docente traz na
contemporaneidade. Houve várias discussões e contribuições do Prof. Rafael no que diz respeito à
integração professor-aluno.
Entretanto, fora a prática, ou seja, o ato de jogar, a parte mais dinâmica, pois, acredita-se que boa
parte da equipe em curso não tinha familiaridade com os jogos. A cada jogo, a cada prática, percebia-se a
viabilidade desta metodologia em sala de aula, pois os professores se envolviam nos desafios trazidos pelo
jogo. Apesar dos encontros serem realizados em um ambiente formal da universidade, terem as
características de um curso acadêmico com leituras, debates, explicações, pesquisas, dentre outras
peculiaridades da vida acadêmica, a sensação que percebia nos integrantes não era a formalidade da
academia. As aulas transcorriam com risos, empolgamento e muito aprendizado.
Após as primeiras aulas do curso, o professor Cássio Murilio comentou com os seus alunos que os
mesmos teriam uma aula diferente, baseada em um jogo que poderia ser de RPG, LARP com ou sem cartas;
os alunos ficaram entusiasmados com a possibilidade e em quase todas as aulas perguntavam em que dia iria
ser a aula do jogo. De imediato, pude verificar o interesse e entusiasmo das turmas pela novidade. Tal
86
interesse confirma o pensamento de Huizinga (2000), segundo o qual o jogo tem a capacidade de excitar os
humanos, de atrair a atenção, de fascinar, de ser uma atividade voluntária, livre e capaz de absorver a
qualquer momento o jogador.
De início, pensou ser difícil o planejamento da aula-jogo e a confecção das cartas para o jogo.
Portanto, após as aulas práticas e a interação dos professores nos jogos, proposto pelo mediador Rafael,
consegui elaborar o plano de aula e as cartas para o jogo em uma tarde. O professor leciona para os 7º e 8º
anos e optou por trabalhar com os primeiros com o tema Idade Média. Finalizando o plano de aula e a
confecção das cartas para o jogo, o professor as postou na rede social “Facebook”, em um grupo específico
que o professor mantém para ter contato com os alunos. Ressalta-se que este espaço virtual foi criado para
interação entre aluno, professores e pais de alunos. Ao postar as cartas, a mãe de uma aluna fez um
comentário que ela gostaria de participar da aula, alegando que no tempo em que estudava nunca teve uma
aula com tal metodologia. Entretanto, os alunos do 8º ano começaram a me questionar o motivo pelo qual
eles não teriam uma aula como aquela. Expliquei para eles que iria desenvolver a metodologia com eles no
segundo semestre. Mesmo com a justificativa e promessa, é difícil uma aula na qual os alunos do 8º ano não
toquem no assunto, perguntando se o professor já esta preparando a aula de RPG.
Dias antes da aula-jogo, o professor teve uma conversa com os alunos para explicar que as cartas que
seriam sorteadas tinham personagens de ambos os gêneros (masculino e feminino) e que, durante o sorteio,
um menino poderia pegar uma carta cujo personagem seria do sexo feminino; logo, o aluno deveria
representar no jogo como se fosse uma mulher ou vice-versa no caso das meninas; tal explicação visava
evitar brincadeiras e bullyng durante e após o jogo. Todos os alunos compreenderam e concordaram com a
preocupação do professor.
Enfim, chegou o grande dia esperado tanto pelos alunos quanto pelo professor, pois este acredita
estar ansioso para aplicar a metodologia. A aula ocorreu em uma sala de aula que não é utilizada, pois a sala
foi montada especialmente para a aula, onde tiraram as fileiras e colocaram as carteiras em uma espécie de
círculo para facilitar o jogo. Distribuídas as cartas, começou-se o jogo; de início, os alunos ficaram tímidos,
mas logo entraram no espírito do jogo; todos participaram. Uns mais, outros menos. Não se pode deixar de
relatar a participação do mediador Rafael, pois o professor empolgou-se tanto com o jogo que se esqueceu
do seu papel de mediador e só queria jogar com os alunos, fato que levou aquele a intervir no
desenvolvimento do jogo e, no intervalo da aplicação de uma sala para outra, aconselhá-lo a utilizar mais o
quadro para mediar as jogadas do que ficar no meio dos alunos jogando.
Foi interessante a forma com que os alunos encarnaram os personagens e a forma com que
encaravam as problemáticas lançadas durante o jogo. Quando o Sr. Feudal disse aos membros da nobreza
que precisava de dinheiro para ir para as cruzadas e, se eles não o ajudassem a arrecadar dinheiro para tal
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empreendimento, ele iria tomar as terras que pertenciam a eles. Um dos membros da nobreza teve a ideia de
pedir dinheiro a um banqueiro, outros queriam aumentar os impostos sobre os servos e havia aqueles que
sugeriram uma guerra contra outro feudo para saquear as suas riquezas. Neste contexto, percebe-se uma
capacidade por parte dos alunos para resolver problemas, respeitando as possibilidades daquele período
histórico. As evidências mostram que tal atitude reflexiva dos discentes, possivelmente, não seria tão
espontânea em uma aula normal.
Outra questão, que merece ser destacada, foi a criatividade por parte dos alunos que representavam
os servos, guiados por um personagem representado pelo professor Cássio, chamado Jacques; eles
conseguiram convencer o banqueiro a participar de uma cilada contra o nobre que pedira dinheiro
emprestado. Eles interceptaram o carregamento de ouro e deram uma porcentagem do roubo ao banqueiro.
Tal fato levou o Senhor Feudal a confiscar os bens do nobre.
Na segunda turma, percebeu-se a mesma motivação da primeira. Por este prima, percebe-se a
viabilidade da metodologia lúdico-jogo em sala de aula, como uma espécie de ponte entre os adolescentes e
o saber, visto a sua capacidade de despertar nos alunos o fascínio, a habilidade da imaginação, criando
contextos de um período histórico que não pertence às suas realidades. Assim acredita-se que:
Na brincadeira, temos uma licença para explorar a nós mesmos e a nossa sociedade.
Na brincadeira, investigamos a cultura mas também a criamos. (SILVERSTONE,
2002, PP, 124-125)
Tal experiência rompeu os espectros que impediam o professor de utilizar metodologias lúdicas,
libertando-o para novos desafios metodológicos. Assim posto, e buscando Dinello (2009), a expressão e a
criatividade são impulsionadas a se manifestar por meio do lúdico, ou seja, através do jogo, estes alunos
foram levados a se expressar historicamente falando, e tal processo, como verificado, se fez pelo e para o
próprio aluno participante. Nas aulas testes, não houve expectadores, e sim construtores de uma história, em
que cada aluno, mesmo os mais tímidos, contribuíram para a construção de um contexto histórico.
Seguindo este raciocínio, não podemos deixar de lado a experiência vivida por cada um dos
integrantes do jogo. Por terem vivenciado cenas fortes, e de caráter histórico, mesmo que ficcional, acredita-
se que estes jovens absorveram o conteúdo da Idade Média, principalmente sua divisão social em clero,
nobreza e servos. Fora isto, ressalta-se que o RPG possibilita ao aluno uma habilidade plástica de construir e
reconstruir fatos históricos, agregar outros sistemas de jogos. Juntamente com estas possibilidades, ao
agregá-lo como metodologia disciplinar, abre-se um leque de alternativas dinâmicas para o professor
trabalhar em sala de aula.
Enfim, a experiência, que de início era rejeitada pelo professor, que descartava o jogo e a fantasia
como ferramentas para serem trabalhadas em sala de aula, se mostrou como instrumento eficaz, que
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consegue trazer a atenção do aluno bem como o interesse dos mesmos ao conteúdo disciplinar. Assim sendo,
tal metodologia, doravante, será uma ferramenta constante em sua carreira profissional.
O jogo
Nos dias atuais, o professor atento deve buscar alternativas metodológicas com o objetivo de atrair a
atenção dos seus alunos à pesquisa. Assim, resta ao professor de história esta dificílima tarefa, visto a
presença de certa apatia na maioria dos alunos por este conteúdo. Um dos motivos desta resistência pode ser
explicado pela utilização de metodologias arcaicas que não acompanharam a evolução técnica e vivenciada
no dia a dia destes jovens. Assim sendo, vê-se no Jogo uma possibilidade de despertar em nossos jovens o
gosto pela História bem como o incentivo à pesquisa. Esta leitura busca mostrar esta possibilidade
metodológica a ser trabalhada em sala de aula.
O primeiro passo para o desenvolvimento de um plano de aula cuja base está contida no jogo é
escolher a categoria - Board Game, Role Playing Game e Live Action Role Playing, dentre outros - que se
adapta com a turma e o conteúdo a ser trabalhado. O professor em questão optou pela categoria LARP (com
cartas) e a Sociedade Feudal como conteúdo.
Feitas as escolhas, inicia-se o processo de construção do plano de aula. Aqui, leva-se em conta os
objetivos da aula, a expectativa do professor na formação sociocultural do aluno. Neste caso, buscou
desenvolver, nos estudantes, gosto pela leitura e pesquisa bem como a possibilidade de representar a
sociedade feudal em suas características próprias, no tempo presente. Este plano, também, visava a reflexão
das permanências e rupturas daquele momento histórico nos dias atuais, através de um debate que seria feito
após a aula jogo.
E necessário salientar que, juntamente com plano de aula, o professor deve ir tecendo as estratégias
do jogo, ou seja, as possíveis problemáticas a ser enfrentadas pelos jogadores durante a aula. Neste sentido,
verifica-se a necessidade de uma narrativa inicial, feita pelo professor para situar os alunos no espaço físico
em que os fatos ocorrerão. Seguindo este caminho, viu-se a necessidade de utilizar o quadro negro para
desenhar o espaço físico, castelo feudal, burgos, floresta, igreja, prisão, estradas, etc.. Assim, durante a
narrativa, o mediador tem a possibilidade de mostrar a cada grupo de jogadores o seu devido lugar de
atuação. Assim, nos momentos em que professor entra como mediador durante o jogo, ele pode dirigir-se a
determinado aluno e apontar no esquema desenhado no quadro a sua trajetória; este mecanismo pode ser
utilizado como arma para prender a atenção de todos os alunos durante o desenvolvimento do jogo.
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Na narrativa, deve conter a problemática do jogo; no modelo escolhido pelo professor, foi utilizado o
seguinte problema: a nobreza, para manter seu status e luxo, resolve aumentar os impostos pagos pelos
servos. Tal fato criará uma série de revoltas dentro da sociedade em questão (Feudo de Bourbon). Assim, os
alunos de posse da narrativa e a problemática do jogo começam a pensar as possíveis ações a serem
desenvolvidas durante o jogo.
Outra forma do professor entrar no desenvolvimento do jogo, como mediador, pode ser feita através
da participação direta do mesmo como jogador. Neste caso, o professor escolheu três personagens centrais
na trama: Jacques, um servo revolucionário, o Arcebispo e o Sr. Feudal. É bom ressaltar que, para uma
maior dinâmica do jogo, quando o professor assume um de seus personagens, ele deve ter um símbolo; no
caso proposto, ele utilizava um cachecol quando representava o Sr. feudal, um crucifixo no caso do
Arcebispo e uma máscara quando atuava como Jacques. Assim, o professor tem a possibilidade de interagir
lançando os problemas a serem resolvidos pelos alunos. A mediação, também, pode ser feita através de um
dado; em caso de não envolvimento de um ou de outro aluno, o dado pode ser dado a este aluno e,
dependendo do resultado tirado, o aluno tem o poder de decidir um fato importante no contexto do jogo.
Há de se pensar na fonte a ser utilizada pelo professor e pelos alunos antes e durante o jogo. Neste
caso, o professor utilizou o livro didático (Projeto Araribá) para o jogo e o Jornal “Correio de Uberlândia”
para o debate que iria acontecer na aula seguinte após o jogo. Acredita-se que as reportagens do dia a dia da
cidade de Uberlândia poderiam oferecer aos alunos um leque de possibilidade para refletir as permanências
e rupturas da sociedade feudal.
Outra questão a ser pensada no plano de aula foi a distribuição dos alunos durante o jogo. Como o
conteúdo escolhido foi a sociedade feudal, viu-se a possibilidade de separar a turma em três grupos,
representando respectivamente as classes sociais da idade média: o Clero, a Nobreza e os Servos. Para não
haver discussão entre os alunos para pertencer a esta ou aquela classe, o professor decidiu separar os grupos
utilizando os números de chamada, assim: CLERO: 10 alunos (1, 4, 7, 10, 13, 16, 19, 22, 25, 28);
NOBREZA: 10 alunos (2, 5, 8, 11, 14, 17, 20, 23, 26, 29); SERVOS: 10 alunos (3, 6, 9, 12, 15, 18, 21, 24,
27, 30). O professor pensou, também, sobre o local e como estes grupos ficariam na sala de aula. A nobreza
ficaria sentada nas carteiras do lado direito da sala e o clero sentado do lado esquerdo. Os servos ficariam
em pé no meio da sala de aula. Tal disposição tinha por objetivo mostrar o contraste de sofrimento e de
exploração dos servos em detrimento ao luxo e boa vida, tanto da nobreza quanto do clero.
Após estes procedimentos, foi necessária a confecção das cartas que iriam definir os personagens a
serem interpretados pelos alunos. É necessário que estas cartas contenham a classe social, bem como as
características psicológicas do personagem para que o aluno se situe em suas estratégias durante o jogo.
Abaixo, segue um exemplo de cada grupo ou classe social.
90
Neste caso, por haver personagens de ambos os gêneros em cada grupo social e pelo fato das cartas
serem escolhidas aleatoriamente pelo aluno, viu-se a necessidade de uma conversa, antes do jogo, para
conscientizar os alunos da possibilidade de um aluno do gênero masculino escolher uma carta cujo
personagem a ser interpretado pertenceria ao gênero feminino e vice-versa no caso das meninas. Tal
conscientização se faz necessária para evitar brincadeiras e ou até mesmo bullyng durante e após o jogo.
Caso o professor tenha blogs e grupos, em redes sociais, para interagir com seus alunos, seria
interessante, após a confecção das cartas, disponibilizá-las na rede para que os alunos tenham contato com
os possíveis personagens que os mesmo irão interpretar.
Assim, feito este trabalho, resta esperar o dia da aula-jogo.
Plano de aula 7º Ano
CATEGORIA: RPG + CARDS
CONTEÚDO: A divisão da Sociedade Feudal
EXPERIÊNCIA: Desenvolver nos alunos o hábito da pesquisa e leitura através do lúdico, sendo o jogo o
aporte da aula. Antes da aula-jogo, será proposta para os alunos a elaboração de uma pesquisa com o
objetivo do conhecimento da sociedade em questão.
Tempo: 1:10 Dividido em dois momentos; no primeiro, explorando a sociedade feudal (primeira aula) e no
segundo, trazendo a discussão para a sociedade atual, objetivando uma reflexão dos alunos ao pensar as
permanências e rupturas nos períodos históricos.
Material: Cartas, quando, pincel e muita imaginação.
Livro / Fonte: Projeto Araribá
91
História regional e local: Jornal Correio de Uberlândia
Divisão da sala em grupos
CLERO: 10 alunos (1, 4, 7, 10, 13, 16, 19, 22, 25, 28)
NOBREZA: 10 alunos (2, 5, 8, 11, 14, 17, 20, 23, 26, 29)
SERVOS: 10 alunos (3, 6, 9, 12, 15, 18, 21, 24, 27, 30)
Cada aluno receberá uma carta, que gerará uma problemática dentro do enredo, sendo que os mesmos terão
toda a liberdade de criar as possíveis soluções dentro deste contexto histórico. O professor aparecerá como
mediador ao longo do processo, encarnado em personagens da época pré-estabelecido.
Livros/fonte: projeto Araribá
História Regional e Local: jornal
Roteiro
Problema: A nobreza, para manter seu status e luxo, resolve aumentar os impostos pagos pelos servos. Tal
fato criará uma série de revoltas dentro da sociedade em questão (Feudo de Bourbon).
Personagens do Cássio.
Nobreza: senhor feudal, Jean Bourbon III (Ganancia)
Clero: Arcebispo de Colin, Louise Batist, amigo do senhor feudal (ganancioso, tem implicância com
franciscano que entra em contato com povo, que é filho de um senhor feudal muito poderoso).
População: Jacques, ladrão revoltado, protegido pelo franciscano, que rouba os nobres e a igreja para
alimentação do povo.
1° Senhor Feudal eleva os impostos para armar seu exército e ampliar seu feudo e envia um mensageiro para
avisar a população.
2° Arcebispo envia mensageiro para a nobreza assim que fica sabendo do aumento de impostos. Tal
mensagem tem como objetivo cobrar a parte da Igreja referente ao aumento dos impostos.
3º Jacques intercepta o mensageiro e fica sabendo do aumento de tributos de que os servos serão vítimas.
4º Senhor feudal envia cavaleiros para reter as revoltas no campo.
Obs: franciscano e arcebispo brigam e tentam persuadir o clero para ficar dentro desta disputa de um dos
lados.
92
RPG e História: possibilidades e reflexões
Alinne Grazielle Neves Costa15
RESUMO:
O referido artigo tem por objetivo fazer um relato de experiência sobre uma modalidade de jogos de
interpretação, conhecido como RPG (Role Playing Games), produzido e aplicado para uma aula de História
com alunos do 2° ano do ensino médio de uma escola privada, localizada na cidade de Uberlândia. O relato
abordará o desenvolvimento do jogo de RPG, “Guerra de secessão e a vida dos escravos sulistas”,
apresentando suas regras, as peças, a narrativa, a dinâmica e o depoimento dos alunos e das alunas que
participaram dessa atividade.
Palavras Chave: Ensino de História, Jogos Didáticos e RPG.
ABSTRACT:
The article aims to make an experience report on a form of role-playing games, known as RPG (Role-
Playing Games), produced for a history lesson with students of 2nd year of high school at a private school
located in Uberlândia. The report will address the development of the RPG game "War of secession and the
lives of Southern slaves", with its rules, the parts, the narrative momentum and the testimony of the students
who participated in this activity.
Keywords: Teaching History, Teaching Games and RPG.
15
Mestre do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia - professora de História das escolas privadas
São Paschoall e Teresa Valsé - [email protected]
93
Um jogo é tanto melhor quanto mais engendra mistério e oportuniza (física ou
mental). Assim, as condições em que é possível brincar são aquelas em que o indivíduo que
brinca é sujeito da brincadeira, e não mero espectador, passivo, como também é provocado,
desafiado. (FORTUNA, 2004, p.47)
INTRODUÇÂO
A citação de Fortuna (2004) reflete a importância do jogo como um processo que
favorece o empoderamento de seus participantes, ou seja, além da diversão, o jogo comporta
o elemento da liberdade, pois cada aluno e aluna tem a escolha de agir da maneira que deseja
enquanto joga.
Assim, o sujeito que joga libera a possibilidade, o poder e a potência que cada pessoa
tem para ser sujeito da sua vida.
Nesse sentindo, as motivações para realizar uma atividade de jogo em uma aula de História se
justifica em compreender, segundo as palavras de Paulo Freire (1996), que a prática docente deve ter uma
dimensão social e deve ser favorável a autonomia do aluno e da aluna.
Embora estejamos avançando, o modelo, infelizmente, ainda vigente nas instituições de ensino, tanto
públicas quanto privadas, é a educação bancária; o educador deposita "comunicados" que os educandos
recebem, memorizam, repetem e, por isso, são avaliados. O saber é dado, fornecido de cima para baixo, de
forma autoritária, pois “manda quem sabe”. Nas palavras de Freire, fica o alerta:
Por isto repudio a ‘pedagogia bancária’ e proponho e defendo uma pedagogia crítico-
dialógica, uma pedagogia da pergunta. A escola pública que desejo é a escola onde
tem lugar de destaque a apreensão crítica do conhecimento significativo através da
relação dialógica. É a escola que estimula o aluno a perguntar, a criticar, a criar; onde
se propõe a construção do conhecimento coletivo, articulando o saber popular e o
saber crítico, científico, mediados pelas experiências do mundo (FREIRE, 2001,
p.83).
Ainda segundo os ensinamentos de Paulo Freire (1996), ensinar não é apenas transferir
conhecimento: exige risco, curiosidade, alegria, esperança, comprometimento, saber escutar, disponibilidade
para o diálogo, humildade, tolerância; exige apreensão da realidade, entre outros atributos.
94
Ao experimentarmos o jogo no ambiente da sala de aula, os alunos e as alunas poderão, primeiro,
vivenciar as ações, acima citadas por Freire, que tornam a práxis docente realmente eficiente aos envolvidos
no processo. E, segundo, potencializa os processos de ensino e aprendizagem, pois nesse caso específico, o
jogo experienciado não tinha um caráter lúdico, e sim uma dimensão pedagógica com a intenção de
estimular o conhecimento histórico e, também, o convívio social.
Em síntese, quando o aluno e a aluna jogam, eles terão a possibilidade de vivenciar espaços
educativos nos quais favoreçam a sua capacidade de questionar, de pensar, de cooperar, de respeitar os
outros e as regras, de interagir, de trocar saberes, de apreender oportunizando diversas formas de reflexão,
com práticas que efetivem a autonomia, tornando-os responsáveis no processo de construção de seu próprio
conhecimento.
E por que escolhemos experimentar o Role Playing Games (RPG) na sala de aula?
A ESCOLHA PELO RPG
Em geral, existem vários tipos de jogos que poderiam também ser aplicados em sala de aula, mas,
diferentemente da maioria, no RPG, não há vencedores ou perdedores; basicamente, pode ser compreendido
por um jogo de interpretação de personagens. Esse fator foi determinante para a escolha e aplicação dessa
modalidade de jogo.
Além dessas características primordiais, podemos definir, segundo Meinerz, o RPG como:
jogos de interpretação mediados por um mestre, que constrói um mundo a ser
vivenciado pelos diferentes jogadores. O mestre conduz a narrativa do jogo, lança
desafios, tarefas e acontecimentos. Cabe aos jogadores optarem por diferentes ações
que são confirmadas ou negadas através do jogo de dados. (MEINERZ, 2013, p.112)
Somados a existência de personagens, as regras e os roteiros pré-estabelecidos, o RPG permite, em
seu desenvolvimento, uma história interativa com um processo de criação e participação dinâmico, em que
todos os alunos e as alunas podem participar a qualquer momento; não há exclusão no processo.
Desta forma, o RPG, no ambiente escolar, permite a cooperação entre os alunos e as alunas que
unirão suas habilidades e conhecimentos, interagindo uns com os outros para superar obstáculos, vivenciar
contextos e aprender conceitos propostos pelo Mestre/professor.
Não há como negar, a aula e o processo de ensino-aprendizagem são encarados por todos os
participantes como uma aventura agradável, uma aula diferente, interessante e dialógica.
Portanto, a escolha da modalidade de jogo RPG para o ensino de História se justifica por se tratar de
uma atividade de interpretação verbal que permite a interação e a cooperação entre os alunos e as alunas que
poderão construir dialogicamente o conhecimento histórico proposto.
95
JOGO DIDÁTICO PARA O ENSINO DE HISTÓRIA: GUERRA DE SECESSÃO E A VIDA DOS
ESCRAVOS SULISTAS16
A temática da Guerra de Secessão no ensino de História em síntese propõe, principalmente, que os
alunos e as alunas saibam identificar as principais diferenças entre os estados sulistas e nortistas, além dos
motivos que desencadearam essa Guerra Civil de grandes proporções e consequências para a sociedade
norte-americana.
No entanto, em meio a essas exigências, emerge um desafio importantíssimo para a compreensão
dessa temática - a questão da escravidão dos negros nas fazendas de algodão dos estados sulistas dos
Estados Unidos da América que foi um marco para a História dos afro-americanos inseridos nessa
sociedade.
A abordagem sobre a vida, o cotidiano e a cultura dos negros no sul dos Estados Unidos, antes,
durante e no fim da Guerra de Secessão, permite tratar da História e Cultura Africana em nosso continente
como é proposto na Lei 10.639/03.
É importante destacar que essa Lei chega ao Brasil no bojo do debate da implantação das políticas de
ações afirmativas para a população negra. Assim, altera os dispositivos da LDB (Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional) tornando obrigatório o ensino da História e Cultura Africana nos estabelecimentos
de ensino de educação básica, sejam estes públicos ou privados. E, ainda, institui a data de 20 de novembro,
no calendário escolar, como dia da consciência negra.
O exposto permite constatar a relevância curricular e social de se discutir e refletir sobre a situação e
o cotidiano dos negros escravizados nas fazendas sulistas. Através dessa premissa e das exigências
curriculares para abordagem dessa temática, criou-se o jogo de RPG “Guerra de secessão e a vida dos
escravos sulistas”.
A preparação e criação do jogo contaram com um processo de pesquisa em livros didáticos e artigos
sobre a temática. A grande preocupação foi construir um jogo fiel aos relatos históricos e evitar os
anacronismos para não comprometer o aprendizado dos envolvidos nesse processo.
Para realização do jogo, foi utilizada uma sala de aula que não era a mesma das turmas envolvidas
nessa atividade e que foi preparada para recriar para os alunos e as alunas um ambiente de fazenda sulista.
Ao longo do caminho para a sala ambientada, os alunos se deparavam com cartazes que diziam Bem-
vindos ao Mississipi e Você está na fazenda Estrela do Sul, assim como tinham, no caminho, serragem e
algodões.
16
Jogo criado e desenvolvido em 02.06.2014, por Alinne Grazielle Neves Costa para uma aula de História na escola privada São
Paschoal .
96
Já na sala de aula ambientada para a atividade, que também tinha um espaço com serragens e
algodões, os alunos e as alunas são avisados que, naquele momento, todos deveriam representar um escravo.
Para tal, cada aluno e aluna recebe, aleatoriamente, uma carta que representa as características e
habilidades do perfil de escravo que ele deverá representar. E mais, ao receber sua carta, os alunos e as
alunas não devem mostrá-la a ninguém.
As cartas, nesse jogo, têm por finalidade sugerir cinco perfis de escravos a ser representado: o
letrado, o adaptável, o religioso, o rebelde e o suicida como mostra a imagem abaixo:
97
FIGURA 1 - Cartas produzidas para o jogo de RPG
.
As imagens presentes nas cartas são africanas - conhecidas como adinkra - conjunto de símbolos que
representam ideias expressas em provérbios.
Abaixo de cada adinkra, há expressões africanas que estão associadas à imagem e ao perfil do
escravo, ao tempo e de que maneira ele chegou a essa fazenda de algodão, suas habilidades e possíveis
atitudes ao longo do jogo.
Além das cartas para esse jogo, foi necessária a utilização de um dado, elemento neutro, que serviria
para gerar possibilidades de ações durante a narrativa.
Para o desenvolvimento do jogo, é fundamental a figura do Mestre que foi assumida pela professora
que deveria dominar a dinâmica do jogo, permitindo que todos os alunos e as alunas participem.
O precisa ficar atento às tomadas de decisões dos alunos e alunas dentro do jogo para estabelecer
conexões, posteriormente, ao conteúdo trabalhado apresentado as possibilidades para o contexto histórico e
conceitual apresentado na narrativa. Mestre/professor tem o conhecimento de todas as possibilidades da
narrativa, mas isso não impede que as decisões dos alunos e das alunas levem o jogo a um rumo
surpreendente.
Nesse sentido, o professor
Cabe destacar que, para a realização desse jogo, optou-se que os alunos e as alunas não tivessem, em
aulas anteriores, o conhecimento do conteúdo que seria vivenciado no jogo. Assim, a avaliação dos
conhecimentos prévios dos alunos e das alunas sobre a temática seriam melhor explorados e a experiência
autenticamente vivida.
O jogo de RPG “Guerra de secessão e a vida dos escravos sulistas” é ambientada na fictícia fazenda
de algodão no Mississipi, chamada Estrela do Sul. Seu dono é o sulista Senhor Calvin Candie17
.
17
Esse nome é fictício e foi extraído de um personagem do filme Django Livre de Quentin Tarantino.
98
O início do jogo se dá por meio de uma narrativa apresentando o congado, manifestação
afrodescendente, emblemática na cidade de Uberlândia, principalmente no mês de outubro quando há os
cortejos.
Dessa maneira, associa-se o sentimento de preservação da vida, da ancestralidade e da própria cultura
africana em Uberlândia aos escravos que viviam nas antigas colônias sulistas.
A estratégia inicial do jogo é partir daquilo que está próximo da vivência de muitos alunos e alunas,
ou seja, da história local para a história geral.
O desafio proposto na narrativa do jogo é que os escravos deverão ir até a cidade buscar mantimentos
para uma festa que o dono da fazenda irá realizar em comemoração ao seu aniversário e, também, pela
vitória do exército sulista na batalha da Virginia (1861).
Porém, nenhum feitor irá escoltar esses escravos na execução dessa tarefa, pois todos conhecem a
fama do Senhor Calvin Candie, impiedoso e cruel, com os escravos fujões. E mais, o grande desafio dessa
narrativa é que todos os escravos precisam retornar à fazenda até o fim da tarde, senão todos serão
torturados até a morte, tanto os que chegaram quanto os que fugiram.
O jogo segue apresentando no quadro da sala um mapa do trajeto que os alunos e as alunas deverão
percorrer que parte da senzala, passando pela floresta, estrada que leva à cidade, à praça da cidade, às
mercearias e ao caminho inverso que os levarão de volta ou não. Para cada ambiente transitado pelos
escravos, situações/problemas irão acontecer que exigirão tomada de decisões por parte de cada escravo.
Veja abaixo o roteiro da narrativa utilizada para a representação dessa história:
Muito bem, vocês estão caminhando pela floresta. Alguns de vocês estão cantando
louvores a Deus, outros estão lamentando, outros observando tudo e muito atentos,
outros estão pensando na possibilidade de fugir e outros já estão com medo dos
castigos que irão receber. Em meio a esses pensamentos um grito surge em meio a
floresta:
- Pelo amor de Deus me ajude!!!! Eu não quero morrer!!!! Me ajude!!!!
Vocês estão vendo um escravo todo ensanguentado, preso a uma árvore e dois
feitores segurando dois enormes cachorros que latem sem parar; parecem famintos e
desejosos de se alimentar desse escravo. O que vocês fazem?
Na estrada para a cidade - Vocês caminham mais um pouco e já estão na estrada
que dá para a cidade - um escravo vê um papel no chão. O que você faz? Pega ou não
pega? Você esconde o papel? Lê em voz alta para todos? Fica com a informação só
para você?
Informação contida no fragmento do jornal “A liberdade”, que está noticiando que
existem escravos sendo convocados para compor o regimento militar do exército dos
ianques (nortistas) na Virginia ocidental. Essa luta é pela sua liberdade e pela
liberdade dos Estados Unidos!
99
- O que você vão fazer? São dois dias de caminhada? Se vocês não voltarem para a
fazenda, os feitores vão caçá-los até encontrá-los e matá-los.
Vocês acabam de chegar à cidade. Ela está bem tumultuada. Bem à frente de vocês,
alguns homens Brancos estão empunhando rifles e outros segurando um livro grosso
nas mãos e estão gritando: “Não foi por causa de sua aparência ou raça, como uma
pessoa, que nós abraçamos essa causa, mas porque todos os escravos são os filhos de
um Pai comum, criados de acordo com a mesma imagem divina, tendo os mesmos
direitos que os nossos”.
- O que vocês querem fazer mediante o que estão ouvindo nesse discurso?
Vocês se dividiram e fizeram todas as compras dos mantimentos. Agora é hora de
voltar; já está tarde e vocês precisam chegar antes por do sol.
Retorno - Vocês estão voltando para a fazenda quando são surpreendidos por um
grupo de escravos que acabaram de colocar fogo e fugir de uma pequena fazenda que
é vizinha da fazenda aonde vocês estão. Eles estão correndo e gritando: Bora
gente!!!! Estamos fugindo, venham conosco!!!! O que vocês irão fazer?
Nota-se que a narrativa está repleta de questionamentos. Indaga-se, o tempo todo, dos alunos e das
alunas participantes sobre o que eles farão mediante a determinadas situações impostas pela narrativa.
Assim, o desenvolvimento do jogo dependerá das decisões que serão tomadas pelos alunos e pelas
alunas, mediado pelo Mestre/ professor que deverá estar preparado para conduzir a narrativa conforme as
escolhas do grupo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS: POSSIBILIDADES E REFLEXÕES
Apresentamos na seção acima, de forma sucinta, a dinâmica do jogo de RPG “Guerra de secessão e a
vida dos escravos sulistas”, criado para uma aula de História e que foi aplicado em uma aula de 50 minutos,
para cada uma das duas turmas dos 2° anos da escola privada São Paschoall.
Após a aplicação desse jogo de RPG, no mesmo dia, havia mais um horário com as turmas do 2° ano,
que foi utilizado, primeiro, para sondar o conhecimento prévio dos alunos e das alunas ao que foi
contextualizado, suas percepções sobre o que foi vivenciado e avaliar a atividade.
Através desse diálogo, começamos a construir coletivamente, com e entre os alunos e as alunas, o
aprendizado necessário para a compreensão do conteúdo proposto e experienciamos, assim, as palavras de
Freire (1996, p.22) “que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua
produção ou a sua construção.”
Além disso, segundo (Hoffmann, 2009), a avaliação do aprendizado adquirido com os jogos é
“mediadora”, ou seja, desvincula-se da concepção de verificação de respostas certas e erradas, passa a ser
um sistema investigativo e reflexivo do professor sobre as manifestações dos alunos e das alunas.
De modo geral, avaliamos que o desenvolvimento do jogo de RPG teve uma excelente aceitação
pelos alunos e pelas alunas. Sua dinâmica correu de forma bem interativa e participativa, principalmente
100
porque contamos com o apoio e o suporte de um integrante18
que auxiliou a professora na construção e na
condução da dinâmica dessa atividade.
Essa percepção avaliativa foi possível, visivelmente, durante a dinâmica do jogo e, posteriormente,
confirmada com um simples instrumental de avaliação no qual foi pedido aos alunos e às alunas que
redigissem um pequeno texto, avaliando a atividade e propondo sugestões, como podemos observar nos
trechos abaixo:
Eu achei a atividade bem interessante, pois pude aprender que havia vários tipos de
escravos. (...) A atividade em si foi bem interessante e acho que todos nós realmente
interpretamos nosso papel e vivenciamos a situação proposta. (...). (Registro da
avaliação feita por L.B, realizada no dia 30.06.2014)
Eu gostei muito da maneira como esta proposta foi elaborada, colocando-nos no
papel dos escravos que não tinham voz (...). Ano que vem poderíamos auxiliar na
preparação de um cenário das estâncias do Sul no século XIX, reservando mais
tempo para a atividade (...) (Registro da avaliação feita por B. G. C, realizada no dia
30.06.2014)
O tempo infelizmente não foi suficiente (...). Poderia ter feito uma tarde e separar
duas horas para cada turma. (...). (Registro da avaliação feita por A. C, realizada no
dia 30.06.2014)
Essa atividade me inspirou em inúmeros sentidos, por se tratar da vida dos escravos.
(...). É bem mais fácil aprender por meio da prática, afinal, é como se vivêssemos
naquela época. Quando “entramos” no personagem é como se toda a época voltasse.
(...) (Registro da avaliação feita por D. C. A, realizada no dia 30.06.2014)
(...) Acho que esse tipo de atividade ajuda no entendimento da contextualização, mas
deve ser seguido da aula que completa o RPG. Assim, acredito que poderia ser feito
novamente sobre outros assuntos históricos, pois é uma forma simples e eficaz de
explicar a matéria (...). (Registro da avaliação feita por N. P. B, realizada no dia
30.06.2014)
Percebe-se, na maioria dos registros avaliativos feitos pelos alunos e pelas alunas, que o jogo
agradou como proposta metodológica de aprendizado. Para eles, representar um papel permite se colocar no
18
Ms. Rafael Correia Rocha pesquisador projeta de Extensão financiada pela CAPES/FAPEMIG com a pesquisa CIDADE DE
UBERLÂNDIA: HISTÓRIA REGIONAL E LOCAL, ENSINO-APRENDIZAGEM E JOGOS NARRATIVOS (APQ – 03413-
12).
.
101
lugar do sujeito histórico estudado e em seu contexto. E, dessa maneira, fica mais fácil compreender o
conteúdo.
Os alunos e as alunas, também, demonstraram interesse em participar de mais aulas com jogos de
RPG para apreenderem novos conteúdos. Reclamaram do fator tempo para execução dessa atividade que foi
de apenas 50 minutos; como mencionado acima, desejavam mais tempo que poderia ser em outro turno, ou
seja, voltariam à escola para jogar e aprender.
Esses fragmentos de registros feitos pelos alunos e pelas alunas permitem-nos constatar que o RPG,
nessa experiência e para essa turma, foi uma possibilidade riquíssima para a prática pedagógica de ensino-
aprendizagem.
Na discussão sobre o uso de jogos no ensino de História existem aqueles que não concordam com
essa prática, pois afirmam se tratar apenas de um jogo, nada sério, ou seja, nas palavras de muitos, é apenas
uma “brincadeira”. Mas o relato dessa experiência permitiu-nos reafirmar as palavras de Huizinga (2000,
p.35) “a seriedade procura excluir o jogo, ao passo que o jogo pode muito bem incluir a seriedade”.
Desta forma, é possível usar o jogo como um recurso sério, eficiente e interativo no Ensino de
História.
Parafraseando Fortuna (2004), “jogar no ensino é uma aposta”. Apostamos com a prática do jogo de
RPG: “Guerra de secessão e a vida dos escravos sulistas” e, nessa experiência, todos os envolvidos saíram
vitoriosos.
Referências Bibliográficas
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Cultrura Afro-Brasileira” no currículo oficial da rede de ensino. Diário Oficial da União, Brasília, 2003.
______. Lei 11645 de 10 de março. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela
Lei no 10639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir
no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e
Indígena”. Diário Oficial da União. Brasília, 2008
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e Terra,
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_______, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. 1ed. São Paulo: UNESP,
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FORTUNA, T. R. Vida e morte do brincar. In: ÀVILA, I.S. (org.) Escola e sala de aula: mitos e ritos.
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HOFFMANN, Jussara. Avaliação: mito e desafio, uma perspectiva construtivista. Porto Alegre:
Mediação, 2009.
102
HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000.
MEINEIRZ, Carla Beatriz. Jogar com a História na sala de aula. In: Marcelo P.G, Nilton M. P (org.)
Jogos e ensino de história. Porto Alegre: Evangraf, 2013. p.118-146.
103
AOS COLABORADORES NORMAS DE PUBLICAÇÃO
DA REVISTA MAIS DADOS
1. A Revista MAIS DADOS aceita apenas artigos inéditos para publicação.
2. Os artigos poderão ser enviados por meio eletrônico para o e-mail da revista:
3. Os textos encaminhados para publicação deverão ter de 15 a 30 laudas, aproximadamente com 30 linhas
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3.4. As citações constituem-se de transcrições de materiais com mais de três linhas. Devem aparecer abaixo
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3.5. As ilustrações (fotos, tabelas e gráficos) quando forem absolutamente indispensáveis, deverão ser
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3.6. As notas de rodapé deverão ser indicadas no corpo do texto por algarismo arábico em ordem crescente e
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104
linhas simples;
3.7. A publicação de jogos devem manter os seguintes elementos: titulo, nome do autor, justificativa,
objetivos, estrutura de funcionamento e referencia bibliográfica ou ludografia.
3.8. Fazer citação bibliográfica completa quando o autor e a obra estiverem sendo indicados pela primeira
vez; em caso de repetição, utilizar:
a) SOBRENOME, Nome. Op. cit., p.
b) Id., data, p.
c) Ibid., p..
4. A bibliografia é dispensável, se não incorpora outras citações às ja listadas nas notas. Em caso de
necessidade, a bibliografia deve ser relacionada ao final do texto em alfabética, obedecendo os seguintes
modelos:
4.1. Livro:
SOBRENOME, Nome. Título em negrito. Local de publicação:
Editora, data.
Ex.:
PORTELLI, Alessandro. República dos Sciuscia. São Paulo:
Salesiana, 2004.
4.2. texto em coletânea:
SOBRENOME, Nome. Título. In: SOBRENOME, Nome
(Org.). Título do livro em negrito. Local de publicação: Editora, data. p. inicial-final.
Ex.:
KHOURY, Yara Aun. Muitas memórias, outras histórias:
cultura e o sujeito de história. In: ALMEIDA, Paulo Roberto
de; FENELON, Déa Rirbeiro; KHOURY, Yara Aun; MACIEL,
Laura Antunes (Orgs.). Muitas memórias, outras histórias.
São Paulo: Olho d’Água, 2004. p. 116-138.
4.3. artigo em periódico:
SOBRENOME, Nome. Título. Título do periódico em negrito,
Local de publicação, volume, número, página inicial-página final, mês e ano da publicação.
Ex.:
SOBRENOME, Nome. Titulo. Titulo do periódico em negrito. Local de publicação, volume, número,
página inicial- página final, mês e ano da publicação.
EX: MARTINS, Estevão. Historiografia: o sentido da escrita e a escrita do sentido.Historia &
Perspectivas, Uberlândia, n. 40, p. 55-80, jan.-jun. 2009.
105
4.4. Trabalho acadêmico:
SOBRENOME, Nome. Título em negrito: subtítulo. Ano de Depósito. Folhas.
Teses/Dissertação/Monografia/Trabalho de conclusão de curso (Nome do Curso)–Unidade onde foi
defendida, Universidade, Local, ano de defesa.
Ex.:
FREITAS, Sheille Soares. Por falar em cultura: história
que marcam a cidade. 2009. 209 f. Tese (Doutorado em
História Social)–Instituto de História, Universidade Federal
4.5. Artigo e/ou matéria de jornal:
SOBRENOME, Nome. Título. Título do jornal, Local, data.
Caderno, p.
Ex.:
HOFLING, E. Livro descreve os 134 tipos de aves no campus
da USP. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 15 out. 1993.
Cidades, Caderno 7, p. 15. Depoimento a Luiz Roberto de
Souza Queiroz.
4.6. Imagens em movimento:
TÍTULO: subtítulo. Diretor, produtor. Local: Produtora,
Data. Especificação do suporte em unidades físicas. Notas complementares.
Ex.:
BAGDA Café. Direção: Percy Adlon. Alemanha: Paris Vídeo Filmes, 1988. 1 filme (96 min)
4.7. Documento iconográfico ( fotografias, cartões postais, gravuras e outros):
SOBRENOME, Nome. Título. Data. Características físicas (especificações do suporte, indicação de cor,
dimensões).
Se o documento estiver em forma impressa ou meio eletrônico, acrescentam-se os dados da publicação
(local, editora, data) ou endereço eletrônico.
Ex.:
COMETA de Harley, 1986. 1 fotografia, p&b., 12cm x 8 cm. NORMANDIA: Lago Caracaranã.
Normandia: Desenho Letra e Música, 1986. 1 cartão-postal, color., 11cm x 15cm.
RAUSCHER, B. B. da S. Dublê de Corpo. 1985. 10 gravuras,
xirograv., p&b., 61cm x 92cm. Coleção Particular.
4.8. Documento eletrônico:
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Para documentos em suporte eletrônico, são necessárias, ainda, as informações sobre o endereço eletrônico,
apresentado entre os sinais < >, precedidos da expressão “Disponível em:” e a data de acesso ao documento,
precedida da expressão
“Acesso em:”.
Ex.:
AUTONOMIA universitária: anteprojeto da Andifes.
Disponível em: <http://www.ufba.br/autonomia-andifes.html
>. Acesso em: 30 abr. 1989.
4.9. Jogo
Desenvolvedor. Titulo. Categoria. Local: ano.
Ex: Grow. Perfil 5. Tabuleiro. São Paulo: 1997
5. Ao final do texto, em página anexa, informar o endereço anexo completo para correspondência e telefone
de contato.
6. A simples remessa dos originais implica em autorização para publicação, que fica condicionada a
provação de pelo menos 2 pareceristas do conselho executivo. Todos os trabalhos serão previamente
apreciados pelo Conselho Executivo da Revista e enviados, para análise, aos pareceristas indicados por ele.
7. Os originais submetidos à apreciação do Conselho Executivo não serão devolvidos. A Revista
compromete-se a informar os autores sobre a publicação ou não de seus artigos.
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